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espiral deste lado
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ATENÇÃO! espiral deste lado
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NOME: _________________________
2-Bloco(1)
Associação Pró-Ensino Superior em Novo Hamburgo - ASPEUR Centro Universitário Feevale
Novo Hamburgo - Rio Grande do Sul - Brasil
2005
PRESIDENTE DA ASPEUR Argemi Machado de Oliveira REITOR DO CENTRO UNIVERSITÁRIO FEEVALE Ramon Fernando da Cunha COORDENAÇÃO EDITORIAL Inajara Vargas Ramos REALIZAÇÃO Instituto de Ciências Exatas e Tecnológicas Curso de Arquitetura e Urbanismo EDITORA FEEVALE Celso Eduardo Stark - Coordenação Maiquel Délcio Klein - Analista de Editoração Fabíula Zimmer - Assistente de Editoração Sabrina Martins - Assistente de Editoração CAPA Juliano Caldas de Vasconcellos Foto da fachada do Prédio Arenito: Ana Carolina Pellegrini EDITORAÇÃO ELETRÔNICA Ana Carolina Pellegrini Juliano Caldas de Vasconcellos REVISÃO Ana Carolina Pellegrini Juliano Caldas de Vasconcellos IMPRESÃO Gráfica Nova Prova Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Centro Universitário Feevale - RS/Brasil Bibliotecária responsável: Lílian Amorim Pinheiro CRB 10/1574
Bloco (1): penso, logo registro / Organizadores: Ana Carolina Pellegrini, Juliano Caldas de Vasconcellos. – Novo Hamburgo : Feevale, 2005. 295 p. ; 21 cm. ISBN 85-86661-96-1 l. Arquitetura – Estudo e ensino 2. Computação gráfica 3. Tecnologia 4. Desenho (Projetos) I. Pellegrini, Ana Carolina II. Vasconcellos, Juliano Caldas de CDU 72
© Editora Feevale - TODOS OS DIREITOS RESERVADOS - É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei nº 9.610/98) é crime estabelecido pelo artigo 184 do Código Penal.
CENTRO UNIVERSITÁRIO FEEVALE Campus I: Av. Dr. Maurício Cardoso, 510 - CEP: 93510-250 - Hamburgo Velho - Novo Hamburgo - RS Campus II: RS 239, 2755 - CEP: 93352-000 - Vila Nova - Novo Hamburgo - RS Fone: (51) 3586.8800 Site: www.feevale.br
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Agradecimentos: Nossos agradecimentos aos acadêmicos Bernard Piccoli, Laura Moura e Thaís Luft da Silva, estagiários do Laboratório de Projetos e do Laboratório de Computação Gráfica, que colaboraram em diferentes etapas do processo de edição, e aos colegiados do Curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário Feevale e do Instituto de Ciências Exatas e Tecnológicas, que acolheram de braços abertos a proposta desta publicação, especialmente aos professores Alessandra Brito, Leandro Manenti e Luciana Martins, fiéis apoiadores deste projeto.
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Apresentação Projetar é o verbo do arquiteto. Ainda que o objeto de nossa profissão seja a idéia materializada, sua realização parte sempre da premissa do projeto. Um projeto idealizado por arquitetos, entretanto, não se limita ao planejamento de edificações ou cidades. Esta publicação é prova disso. Bloco(1) é a realização de uma idéia que nasceu no início do ano de 2005 nos corredores do nosso jovem “Prédio Arenito”, onde se concentram as aulas de nosso também jovem Curso de Arquitetura e Urbanismo. Mais do que o resultado tangível, o projeto Bloco(1) almeja a socialização da produção intelectual de nossos alunos e professores e o intercâmbio de informações entre os demais cursos do Centro Universitário Feevale, entre outras escolas e com a sociedade em geral.
Le Corbusier: bloco de notas é registro histórico sobre o projeto do edifício-viaduto para o rio de janeiro em 1936. (CORBUSIER. Rio de Janeiro 1929 1936. Rio de Janeiro: C.A.U.R.J., 1999. 1 disco laser)
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O ponto de partida para esta publicação foi o bloco de anotações. Enquanto o jogo de esquadros, o compasso, a régua paralela e outros apetrechos que figuravam sobre a mesa de trabalho do arquiteto foram, com o passar do tempo, cedendo espaço aos recursos da computação gráfica, o bloco e a lapiseira continuam a acompanhar os profissionais e estudantes de arquitetura no seu cotidiano. O bloco do arquiteto se abre com agilidade para o registro de croquis, poemas, breves relatos, recortes, fotografias... Memórias e esboços que poderão sair do papel para colorir a vida. “Penso, logo registro”: é este o conceito da Bloco(1). Uma compilação de idéias e reflexões sobre as atividades de nosso curso, assuntos pertinentes à arquitetura, ao urbanismo e aos temas que cercam a profissão do arquiteto. Alguns mais elaborados, outros ainda incipientes, os pensamentos assumem a for-
ma de imagens e palavras e vêm a público visando, principalmente, a instigar a discussão a respeito de nossas atividades acadêmicas e dos rumos da escola que queremos continuar a construir. Bloco(1) reflete, portanto, o perfil do Curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário Feevale. Para que esta publicação fosse possível, contamos com a ajuda de estudantes e professores, todos os que se dispuseram a enviar seus textos e imagens em tempo hábil, o que resultou na reunião de um material heterogêneo, composto de variados assuntos, que, revela a interdisciplinaridade como forte determinante do perfil da Bloco(1). Na medida em que os textos foram chegando até nós, o material a ser publicado foi se dividindo, naturalmente, em duas partes: a primeira, mais descontraída na forma e no conteúdo, é apresentada no
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formato vertical e traz as contribuições relacionadas às experiências que envolvem diretamente os estudantes. Nesta primeira parte, o leitor poderá compartilhar com os integrantes do curso algumas das etapas de sua breve história, como viagens de estudo, atividades desenvolvidas em laboratórios, trabalhos de aula e experiências extracurriculares. Para finalizar este trecho, surgem os passatempos: os jogos são um pretexto para abordar a arquitetura de forma lúdica. Apresentam alguns “desafios arquitetônicos”, os quais pretendem incluir os diversos perfis de leitores, desde os iniciantes na arquitetura até os mais experientes. Já a segunda parte é para ser lida no formato convencional e reúne a produção intelectual de integrantes do corpo docente e discente da Feevale, além da colaboração de cinco arquitetos convidados: Andréa Soler Machado, César Wagner, Clovis Ilgen-
fritz da Silva, Tiago Holzmann da Silva e Vinicius Netto, cujos textos versam sobre suas respectivas palestras, ministradas em diferentes momentos da história do curso e estão organizados em ordem cronológica. Em seguida, novamente a prata da casa: as contribuições percorrem fragmentos de dissertações de mestrado, teses de doutorado, impressões de viagens, reflexões sobre questões históricas ou contemporâneas da arquitetura e do urbanismo. Bloco(1) é o produto de um esforço conjunto para atingir nossa permanente meta de arquitetos-professores: o comprometimento com o ensino da arquitetura e do urbanismo. Temos a convicção de que aprender pode e deve ser prazeroso. Acreditamos que a atividade acadêmica pode e deve ser estimulante. Portanto, podemos e devemos oferecer alternativas para a socialização do conhecimento que proporcionem, além
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do intercâmbio de informações, alguns momentos de diversão. Este é o primeiro passo. Esperamos poder chegar ainda mais longe. Ana Carolina Pellegrini e Juliano Caldas de Vasconcellos.
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• Viajar é preciso vivenciar a arquitetura também .............. 13 • Laboratório de Projetos Experimentando a Arquitetura ................ 23 • Um olhar fotográfico na Arquitetura ....... 41 • Esboçar e croquisar é desenhar ............ 51 • Mies 3D Extrusões e movimentos no Laboratório de Computação Gráfica............................... 67 • Uorquixópi Uma visão antropofágica..................... 75 • GD Real................................... 83 • Gincana Uma forma de integração entre aprendizagem e tecnologia .................................. 89 • Concurso Design Brasil.................... 95 • Passatempos............................... 103
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• Marginais do Bloco - Croquis de Le Corbusier, Oscar Niemeyer, Richard Rogers, Aldo Rossi e organizadores
Sumário Bloco vertical
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ECISO VIAJAR É PR VIVENCIA R A ARQUITETURA TAMB É M
Profª. Ms. Alessandra Brito ________________________ A palavra “viagem”, segundo o dicionário Aurélio, é “ato de ir de um lugar a outro mais ou menos afastado” . Confesso que fiquei um pouco decepcionada com o conceito, já que esta palavra, no meu ponto de vista, é repleta outros de significados além do simples “deslocamento”. Para mim, viajar é descobrir novos lugares, sentir novas sensações, outros aromas e sabores... Alguém já disse que viajar é viver e eu concordo plenamente! Como em todos os grandes acontecimentos felizes (casamentos, formaturas, nascimentos...) a viagem envolve o “antes, durante e depois”. São três etapas bem distintas, mas cada uma com o seu valor. A preparação da viagem é muito estimulante, pois diante das várias opções de descobertas de um novo lugar podemos fazer um “menu personalizado”, isto é, selecionar os locais de interesse pessoal ou aqueles que possuem um maior significado para nós. Considero esta etapa como se fosse a de uma preparação psicológica e emoECISO VIA JA R É PR
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Regist ros da viagem mais recente. Brasília/DF Julho-2005
(FOTOs: alison silva)
cional para o que vamos encontrar. Também tem um pouco daquele sentimento de não deixar nada importante para trás, dar o verdadeiro sentido ao que vamos ver com o intuito de saborear cada lugar e momento com os “cinco sentidos” e não através da fotografia revelada. Fiquei impressionada quando visitei o Louvre e vi centenas de turistas olhando as obras de arte através das lentes das câmaras fotográficas e correndo atrás da guia que falava e andava rapidamente diante daquelas maravilhas. Aquele momento foi apenas “registrado” mas, com certeza, não foi verdadeiramente “vivenciado”. Entretanto, o mais fascinante de tudo é que, por mais que a etapa de preparação seja feita de maneira muito detalhada e profunda, o “durante” sempre nos apresenta surpresas e experiências inesquecíveis... às vezes boas, às vezes ruins, mas faz parte!!. Por mais que tentemos imaginar e pesquisar os locais a serem visitados, nunca conseguimos ter a verdadeira dimensão do que vamos encontrar. Além disso, cada pessoa sente o espaço de um jeito diferente: o contexto, as companhias, a escala, as experiências de vida ECISO VIA JA R É PR
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Lembranças da viagem a São Paulo!
pintam um “quadro” único que fica impregnado na lembrança. Nem sempre os lugares mais badalados ou exuberantes são os que mais impressionam. Às vezes, pequenos momentos ou locais, geralmente aqueles não fotografados, são os que ficam para sempre na memória. Parece que sou contra a fotografia, né?! Mas não é isso... adoro tirar e ver as fotografias das minhas viagens para reviver os momentos inesquecíveis. Mas, o que tenho observado é que as fotografias possuem muito mais significado para nós (viajantes) do que para as pessoas para as quais mostramos, acredito que justamente por causa daquele “significado” que comentei inicialmente, que é único e particular de cada um. Além disso, a gente nunca volta a mesma pessoa de uma viagem, pois os nossos horizontes e ECISO VIA JA R É PR
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i, a prim eira Mapa do sul do Uru gua viag em inte rna cion al.
Antônio Prado e arredores...
cultura são ampliados, algumas barreiras e preconceitos são transpostas, amizades são consolidadas, o sentimento de patriotismo e/ou “bairrismo” são exacerbados. Nos damos conta de quão pouco sabemos e conhecemos, sem falar naquela vontade de quero mais... Para onde vamos na próxima vez? Gosto muito de um trecho do livro “Mar sem fim” do navegador Amyr Klink, que exprime muito bem o verdadeiro sentido de uma viagem:
“... Hoje entendo bem meu pai. Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou tv. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas próprias árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar do calor. E o oposto ... Um homem precisa viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser; que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e simplesmente ir ver”. Nesta ótica de ser um eterno aprendiz, de aprender com o que se vê e de vivenciar a arquitetura, ECISO VIA JA R É PR
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Reprodução da lista de estudantes presentes na primeira viagem.
o curso de Arquitetura e Urbanismo da Feevale iniciou em 2002/2 as suas viagens de estudo. A primeira viagem foi singela em termos de distância e número de alunos (aproximadamente 18), mas fundamental para dar o “start” neste processo. O roteiro foi o centro histórico de Porto Alegre/RS. A partir desta visita, surgiu aquele “gostinho de quero mais” falado anteriormente, e os próprios alunos já cobravam quando seria a próxima viagem. Em 2003, as cidades escolhidas foram Pelotas/RS (no primeiro semestre), além de São Paulo/SP e Curitiba/PR (no segundo semestre), aproveitando a 5ª Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo. A visita à Bienal já rendeu frutos, visto que um grupo de alunos participou este ano do Concurso Internacional de Escolas de Arquitetura e foi selecionado!
frente ao a nc e” em . “Per fo rm u ru g u aio) to en m a pa rl PE LL EG RI NI A A CA RO LIN (FOTOS : AN
ECISO VIA JA R É PR
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A turma que participou de ambas as viagens já era maior, em média 35 alunos e 5 professores. Já não era necessário nem muita divulgação, pois os alunos já se articulavam para participar. Instituiu-se, então, a prática de ofedo m as p. registro soares) recer duas viagens por ria rita (FOTO: ma ano, uma de curta e outra de longa duração. Em 2004, as cidades escolhidas foram Antônio Prado/RS, para conhecer a arquitetura italiana e contemporânea da cidade, e a primeira viagem internacional, incluindo as cidades de Montevidéu, Colônia e Punta Del Este, no Uruguai. Desde Pelotas, também instituiu-se a inclusão no roteiro das viagens o contato com os cursos de Arquitetura e Urbanismo locais e/ou com arquitetos cuja produção arquitetônica fosse significativa na cidade. Acreditamos que isto reforça o caráter da “viagem de estudo” e possibilita novos contatos e oportunidades entre instituições e cursos. ECISO VIA JA R É PR
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a domin ada. Aven ida Pa ulist ian o de lim a) (FOTO : lui s fab
Em 2005 o roteiro escolhido para a viagem de longa duração foi o centro-oeste brasileiro: Goiânia, Brasília, Belo Horizonte, Ouro Preto e Mariana e, para o futuro, intercâmbios internacionais. Depois de participar das cinco primeiras viagens, posso dizer que, a cada ano, foram melhorando de qualidade. Os conhecimentos adquiridos, os momentos e lugares compartilhados, as pessoas que conhecemos, as festas que fizemos (no ônibus, nos bares, nas praças), as músicas que cantamos e tocamos (a pipa do vovô não sobe mais, Será - do Legião Urbana) e os jargões recitados (ninguém merece, hâ) criaram uma amizade e integração muito saud áveis entre corpo docente e discente que, como diz aquela propaganda de cartão de crédito, “não tem preço”! Do meu tempo de estudante de arquitetura, as viagens de estudo foram alguns dos bons momentos que guardo na memória e que hoje estou tendo a grata oportunidade de vivenciar e compartilhar novamente, desta vez, no papel de professora!
ECISO VIA JA R É PR
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Laboratório de Projetos -experimentando a arquitetura
Profª. Ms. Ana Carolina Pellegrini ______________________________ A palavra “laboratório”, sem dúvidas, inspira respeito. Quando se quer atribuir credibilidade a um produto numa campanha publicitária, ou quando se quer ratificar a confiabilidade de uma pesquisa científica, lá vem ele: o laboratório. “Testes de laboratório comprovam...” Segundo o Dicionário Aurélio, em sua primeira definição, laboratório é “o lugar destinado ao estudo experimental de qualquer ramo da ciência, ou à aplicação dos conhecimentos científicos com objetivo prático (exame e/ou preparo de medicamentos, fabricação de explosivos, exame de líquidos e tecidos do organismo, etc.)”. Até o final da primeira parte, concordo plenamente. Mas o conteúdo entre os parênteses... será que é ele o responsável pelo senso comum costumar relacionar a palavra apenas a áreas como química, biologia, medicina, etc.? A quarta definição apresentada por Aurélio me parece mais adequada, mas vem com um alerta já no começo:
“Fig”, indicando que o sentido é figurado. Talvez, por isso mesmo, eu a considere mais interessante. Expressar-se no sentido figurado não é tão fácil como parece... portanto, aí vai: “Teatro de notáveis operações ou transformações”. Será que nosso Laboratório de Projetos é um laboratório no sentido figurado? Recorri novamente ao dicionário: “figurado. Adj. 1. Em que há figuras ou alegorias; metafórico, tropológico. 2. Alegórico, imitativo; representado. 3. Não existente; hipotético, suposto. 4. Diz-se de dança popular ou de salão com passos e marcações variados, movimentados.” Bem, já de primeira, um alento: é adjetivo e, de acordo com o que se costuma aprender na escola, um adjetivo confere “qualidade” a alguma coisa (ainda que seja no sentido figurado)... Já a terceira definição me deixou bastante insegura, e a quarta, evidentemente, está se referindo a outro assunto. Cheguei à conclusão, então, de que nosso Laboratório de Projetos é as duas coisas: Um Laboratório de Projetos
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S.m. – substantivo masculino – e um S.m.Fig. Afinal de contas, fazemos ciência, aplicamos conhecimentos científicos com objetivo prático e temos buscado, modéstia à parte, produzir “notáveis operações e transformações”. Para quem não conhece, o Laboratório de Projetos do Curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário Feevale é um projeto vinculado a um programa de extensão chamado Arquitetura Comunitária. Coordenado por mim, conta, neste momento, com dois professores colaboradores Prof. Juliano Vasconcellos e Profª Alessandra Brito - e dois estagiários – Bernard Piccoli e Thaís Luft da Silva. Inicialmente, o Laboratório de Projetos se chamava Escritório Modelo. Entretanto, na medida em que se foi delineando mais precisamente o perfil e a vocação do projeto, o nome trocou.
Laboratório de Projetos
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Enquanto um Escritório Modelo está, geralmente, mais voltado à prestação de serviços, o Laboratório de Projetos desenvolve atividades essencialmente direcionadas ao crescimento acadêmico. É claro que, uma vez vinculados a um programa de extensão, é fundamental que voltemos nossos olhares, também, para a comunidade. E é o que temos procurado fazer. Partindo da premissa de colaborar exclusivamente com grupos coletivamente organizados e comprovadamente carentes, a primeira comunidade com a qual o Laboratório de Projetos trabalhou foi a Horta Comunitária Joanna De Ângelis, em Novo Hamburgo. A “Horta”, como é conhecida na região, não é apenas uma “horta”, mas sim, uma instituição sem fins lucrativos, que beneficia crianças, jovens e adolescentes carentes, os quais participam, fora de seu horário escolar, de cursos de informática, floricultura e artesanato. Naquela oportunidade, no final do ano de 2003, o Laboratório de Projetos ainda não tinha estagiários e contava com a disposição de estudantes voluntários, os quais desenvolveram com a orientação de professores, estudos para a implantação de um espaço de lazer para os Laboratório de Projetos
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adolescentes e jovens da Horta. O trabalho contemplou visitas ao local, reuniões com a coordenação da instituição, dinâmicas de grupo com os adolescentes, levantamento planialtimétrico do terreno e, finalmente, o desenvolvimento do estudo preliminar para o projeto da área de convívio, que contará com arquibancadas, pista de skate, palco para apresentações, mesas de jogos, além de um pequeno estúdio de rádio. No ano de 2004, o Laboratório de Projetos foi procurado pela associação de moradores da Vila Martin Pilger, que se situa ao lado do Campus II do Centro Universitário Feevale. Depois de algumas reuniões, procedeu-se o levantamento planialtimétrico de toda a área ocupada pela vila, com vistas a auxiliar a comunidade na composição da documentação necessária ao encaminhamento judicial da regularização dos terrenos, que não são de propriedade dos moradores. O Laboratório realizou, ainda em parceria com a associação da vila, numa atividade conjunta com a Agência de Comunicação Laboratório de Projetos
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da Feevale (AGECOM), levantamento e estudo para compartimentação e reforma do galpão da associação de moradores, que vinha sendo utilizado para atividades com as crianças da comunidade, mas não apresentava condições salubres de ocupação. Outra comunidade com a qual o Laboratório trabalhou, também com vistas à colaboração no levantamento das condições de ocupação do lugar e da regularização dos lotes, foi a chamada “Grande Gala”. O objeto do trabalho tratava-se de uma antiga fábrica de calçados abandonada, que, há muito, foi ocupada pelos ex-funcionários a empresa. Para adequarem o local à moradia, “lotearam” o galpão da fábrica sob a forma de pequenos apartamentos e ali permaneceram durante décadas até que, atualmente, o edifício de madeira encontra-se a ponto de ruir e deixar pelo menos dez famílias desabrigadas. Além dos moradores do prédio, há novas residências que foram construídas no entorno da antiga fábrica, as quais formaram uma vila informal que, agora, carece de regularização. Laboratório de Projetos
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Importante salientar que os levantamentos topográficos mencionados sempre contaram com a coordenação dos professores Marisa Freitas Furtado e Reginaldo Macedônio, responsáveis, em diferentes épocas, pelo Laboratório de Geoprocessamento e pela disciplina de Topografia.
Passaram até agora pelo Laboratório de Projetos, além dos professores já mencionados, os seguintes acadêmicos: •Adriane Wild Brack •Ana Paula Jaeger •Bernard Piccoli
Passarela da Educação
•Cândida Bacarin Pereira •Carolina Schneider
Ainda que o caráter comunitário seja de comprovada importância, o Laboratório de Projetos vem adquirindo, paulatinamente, perfil mais acadêmico, enfatizando a interdisciplinaridade de suas atividades. Isto não significa que a preocupação social tenha sido abandonada. Pelo contrário, se mantém como objeto de trabalho para as atividades que, atualmente, têm procurado privilegiar o crescimento do aluno, como agente transformador da sociedade. Neste sentido, dentre as atividades mais recentes do laboratório, pode-se destacar a participação na organização do Concurso PróDesign Social (ver artigo da Profª. Suzana Vielitz), juntamente com o Curso de Design do Centro Laboratório de Projetos
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•Eduardo Jaeger •Elisabeth Schneider •Geovana GuizolFI •Jésun Rigotto Carpeggiani •Márcia Wingert •Maria Rita Soares •Mônia Fries •Rodrigo Martini •Tatiana Becker •Thaís Luft da Silva •Vivian Klein
Universitário Feevale, a organização desta publicação em parceria com o Laboratório de Computação Gráfica e a participação da Sexta Bienal Internacional de Arquitetura e Design. Apresentando como desafio para o Concurso Internacional de Escolas de Arquitetura o tema da habitação social no século XXI, a comissão organizadora da Bienal propunha que se projetasse inserção numa parcela de tecido urbano existente na região da escola concorrente. Como o Laboratório de Projetos já vinha, há algum tempo, trabalhando com a Vila Martin Pilger e essa fica justamente ao lado da Feevale, nada mais natural do que escolhêla para desenvolver o projeto da Bienal. O Concurso, entretanto, previa que os estudantes trabalhassem com uma área de, no mínimo, 10ha e, no máximo, 20ha. Tratou-se de agregar ao projeto parte da Vila Colina da Mata, que também fica próxima ao Centro Universitário, mas do outro lado da RS – 293, estrada que estabelece a ligação entre a BR 116 e municípios da região do Vale dos Sinos, como Sapiranga e Campo Bom. Laboratório de Projetos
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A equipe de projeto, formada pelos acadêmicos Ana Paula Jaeger Martha, Eduardo Jaeger, Jésun Carpeggiani, Márcia Wingert e Tatiana Becker realizou levantamento fotográfico dos locais, manteve contato com lideranças das comunidades e pesquisou outras soluções urbanísticas para problemas análogos até que chegou ao conceito que deu origem a todo o projeto: Passarela da Educação. O grande problema detectado pelos alunos é a barreira determinada pela estrada estadual RS – 239. Ao mesmo tempo em que configura uma conexão intermunicipal, a via torna-se perigosa barreira para os que vivem à s suas margens, especialmente os que estão restritos ao lado norte da estrada (Vila Colina da Mata), pois o município de Novo Hamburgo se desenvolve a partir da margem sul da rodovia. Um sem-número de acidentes envolvendo veículos automotores, ciclistas, pedestres e veículos de tração animal vem atingindo a população de uma vila e de outra. Iniciativas como a implantação de dispositivo de controle de velocidade (pardal) atenuaram o número de ocorrências, mas não resolveram definitivamente o problema. Laboratório de Projetos
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Inicialmente, pensou-se em projetar uma passarela sobre a RS-239 para que os moradores pudessem cruzar em segurança de um lado para outro. Logo, a idéia evoluiu para uma praça elevada, que permitisse real integração entre as duas partes da cidade criando uma unidade espacial que até então é inexistente. O termo “passarela”, além da acepção relativa à possibilidade de travessia, alude também à moda, ao carnaval. O conceito de passarela, por sua vez, remete à idéia de lugar dos acontecimentos especiais. Neste sentido, o projeto procura situar na praça elevada sobre a RS-239 os elementos especiais do projeto. Sobre a faixa, que atua como “curativo” da área cortada pela RS 239 (no sentido norte-sul), localizam-se equipamentos que servem tanto às comunidades estudadas, quanto à cidade de Novo Hamburgo. Sobre a passarela poderão trafegar veículos de tração animal, bicicletas, Laboratório de Projetos
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além, evidentemente, de pedestres. Os veículos automotores poderão utilizar o viaduto já existente algumas centenas de metros adiante, na direção de Campo Bom. Os principais usos previstos para a passarela são as escolas técnicas. Ali a população do município e da região poderá qualificar-se profissionalmente sem depender unicamente do ensino superior. No entender dos acadêmicos, a educação superior não é o único caminho para a qualificação profissional e boa parte de problemas, como falta de mão de obra qualificada e excesso de candidatos a vagas nas universidades brasileiras, seria resolvida com a implantação de mais escolas técnicas compatíveis com a realidade econômica de cada região. Além disso, a passarela contará também com espaço destinado a feiras para comercialização das mercadorias produzidas nas escolas, biblioteca e centro de informática social. A idéia, portanto, é a de criar um “ciclo educacional”, o qual será composto pela Escola Básica a ser implantada no coração da Vila Colina da Mata, pelas escolas técnicas sobre a passarela e pelo Centro Universitário Feevale, Laboratório de Projetos
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cujos profissionais egressos podem dar o retorno de seu aprendizado às próprias comunidades de origem. A implantação da praça elevada levou em consideração as características topográficas do terreno, a fim de que fossem evitadas grandes movimentações de terra. Do lado sul, ela coincide com o nível da rua. Na extremidade norte, entretanto, possui dois acessos distintos. O primeiro deles é rampeado, numa inclinação adequada tanto aos pedestres quanto aos portadores de necessidades especiais. É neste trecho que se situa um anfiteatro para pequenas apresentações, o qual aproveita a declividade da passarela para a configuração da platéia. O outro acesso é através de uma escadaria que leva à Praça da Igreja. Intencionalmente monumental, ela interrompe a passarela e possibilita, mais do que uma passagem de nível, um outro local de permanência. Quanto aos blocos de habitação social, os quais estão dispostos sobre Laboratório de Projetos
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as duas extremidades da passarela - já em terreno plano - a solução adotada priorizou as questões da sustentabilidade, mobilidade e identidade regional. Os módulos residenciais contarão com uma estrutura principal independente (metálica) e os planos verticais terão apenas a função de vedação, sendo preenchidos por painéis compostos de material reciclado. A alternativa é ecológica e permite que os profissionais formados na escola técnica e empregados na Usina de Reciclagem, ambas previstas pelo projeto, trabalhem na construção dos blocos de habitação social.
A equipe acredita que o caminho para a qualidade de vida e inclusão social no século XXI parte do investimento em educação. Um projeto urbanístico deve contemplar questões como avanço tecnológico e adequação ecológica, mas não pode prescindir, em hipótese nenhuma, da sustentabilidade social, ratificando o habitante como protagonista da cidade do novo milênio. O projeto, na época em que está sendo escrito este artigo, encontra-se em fase de desenvolvimento. A equipe de estudantes preparase para expor o resultado de seu esforço para os milhares de visitantes da Sexta Bienal Internacional de Arquitetura e Design. É a Laboratório de Projetos
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primeira vez que nosso jovem Curso de Arquitetura e Urbanismo estará representado em evento de tamanha envergadura, o que alegra a todos os envolvidos nesta tarefa. O gostinho de “primeira vez” torna o trabalho ainda mais instigante e sua divulgação através de meios como esse visa a incentivar que, nos próximos anos, cada vez mais estudantes se interessem em participar. O Laboratório de Projetos, portanto, caminha para estas próximas oportunidades e sempre estará aberto aos acadêmicos interessados em fazer da reflexão sobre o problema social da arquitetura uma ferramenta de projeto, um meio de efetuar “notáveis operações ou transformações”, num sentido cada vez menos figurado.
(As imagens publicadas neste artigo pertencem ao acervo do laboratório de projetos).
Laboratório de Projetos
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Um olhar fotográfico
na Arquitetura
O grego filósofo Aristóteles foi um dos primeiros pensadores ocidentais a demonstrar o seu interesse empírico sobre a técnica e o processo óptico da fotografia. Também vamos encontrar os árabes, os chineses e os renascentistas a realizarem diversos experimentos e práticas no campo da técnica, processo e linguagem. Aproximadamente 185 anos já se passaram desde os seus primeiros registros fotográficos feitos com daguerreótipos, mas a fotografia continua a exercer um enorme fascínio para o homem.
rar as possibilidades temáticas ao máximo. No âmbito da arquitetura, a fotografia adquire um interesse similar. Ambas têm como objeto de interesse expressar linhas, formas, texturas, composições e luzes sobre o trabalho final. Todo fotógrafo diante de uma construção ou obra arquitetônica tem a obrigação de retratar as formas já criadas, ou seja, as residências foram feitas para serem habitadas, as igrejas para servirem como local de adoração, as bibliotecas como local de pesquisa e reflexão, as fábricas como local de trabalho. A fotografia deve manter esta verdade e identificação dos ambientes internos e externos de inúmeras construções.
A fotografia foi colocada ao alcance de todos e, ao mesmo tempo, permite a cada indivíduo explo-
Diante de alguma construção, o fotógrafo deve possuir algumas noções de estilos arquitetônicos.
Prof. Ms. Donaldo Hadlich ______________________
Um olhar fotográfico
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Além disso, ele deve estudar e esgotar todas as possibilidades de ângulos e enquadramentos possíveis para o tema. Os diferentes pontos de vista, enquadramentos, luzes e composições, olhar estético e criativo irão contribuir, certamente, para que todo o fotógrafo e a sua imagem fotográfica representem e expressem os detalhes e grandes planos arquitetônicos. A preservação e o resgate do patrimônio histórico sinaliza a busca de uma época passada. A fotografia adquire um significado especial, quando deseja obter representações fiéis e expressivas de determinadas obras arquitetônicas. Entretanto, caso o fotógrafo pretenda incorporar em seus registros fotográficos uma interpretação e significado especial, ele não deve se esquecer de realizar um estudo aprimorado e cuidadoso de seu tema fotográfico e arquitetônico.
A proposta de ensino e trabalho prático para os alunos do curso de Arquitetura e Urbanismo da Feevale, aborda conceitos e normas do universo da fotografia, assim como também propõe o emprego de sua técnica, processo e linguagem para a área da Arquitetura. Os acadêmicos da disciplina de Fotografia Aplicada à Arquitetura, Carlos Rogério Weber, Eduardo Jaeger, Jésun Rigotto Carpeggiani, Helio Kehl Baptista, Marlon Vinicio Krake, Marlon Eduardo Bauer conciliaram princípios básicos e fundamentais da fotografia com outros elementos, que traduzem questões e noções de escala, espacialidade, composição, luminosidade e reflexos, verticalidade e horizontalidade, etc. Através de um olhar estético e arquitetônico, eles realizaram registros fotográficos repletos de detalhes, texturas, paisagismos e demais características peculiares próprias das edificações de nossa região.
Um olhar fotográfico
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Marlon Krake
Detalhe das estruturas de uma antiga construção enxaimel.
Detalhe do telhado em madeira de antigas residências.
Detalhe da Igreja São Pedro.
Textura em madeira da Igreja São Pedro.
Um olhar fotográfico
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Eduardo Jaeger
Detalhe do antigo telhado de residências habitadas por imigrantes em Ivoti/RS.
Praça Harmonia de Ivoti teve colaboração do paisagista Burle Marx.
Interior da nova Igreja São Pedro de Ivoti/RS.
Sede da antiga Igreja São Pedro.
Um olhar fotográfico
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Helio Kehl Baptista
Céu terra e água em Ivoti, no meio rural...
...e o contexto urbano.
Outro olhar sobre a torre da igreja.
Vista lateral da Ponte do Imperador.
Um olhar fotográfico
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Marlon Bauer
Planos e ref lexos em enxaimel tradicional.
Arquitetura como tradução de uma época...
Na rua da Cascata está concentrado o maior Núcleo enxaimel do estado.
Antiga construção dos primeiros produtores de água ardente do município.
Um olhar fotográfico
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Jesun R. Carpeggiani
Antiga construção serviu como pequeno armazém e açougue.
Vista de parte superior da Ponte do Imperador.
Ponte do Imperador. Serviu de local e descanso para o Imperador Dom Pedro II.
Detalhe do telhado de uma antiga mercearia.
Um olhar fotográfico
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Carlos R. Weber
Versões monocromáticas dos vitrais da igreja em Ivoti.
Luz e sombra na Praça da Harmonia.
Sociedade de Canto Harmonia, obra de 1922.
Um olhar fotográfico
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Esboçar e croquisar é desenhar (*)
De uma atividade da disciplina IAU1
Conforme Watelet, apud Lapuerta, 1997: “a mente perde sempre o ‘fogo’ devido à lentidão dos meios que se tem para utilizar, para expressar e fixar suas concepções... é esta rapidez de execução o ‘princípio do fogo’ que vemos brilhar nos esboços dos pintores de gênio. Reconhecemos o traço do movimento de sua alma, calculamos sua força e fecundidade”.
Fig. 01 - Um rápido esboço preliminar.
Prof. Ms. José Arthur Fell _______________________ É pr ática do homem, e isso é uma das habilidades que o distingue dos demais seres, sinalizar numa superfície qualquer sua presença, seus dias e seus desejos. Não importa a tecnologia que utilize, o desenho é uma das primeiras expressões de suas idéias. Assim que algo surge no interior da mente humana, um desenho, por mais sintético que seja, brota onde quer que possa ser riscado. Um animal na parede de uma caverna paleolítica, um ideograma oriental, o desenho produzido por uma criança, riscos na areia da praia, a idéia genial do arquiteto... todos são gerados pelo mesmo Esboçar e croquisar é desenhar
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Fig. 02 - Parede de caverna de Lascaux, FR. (Fonte: lapuerta, 1997)
(*) disciplina de introdução a arquitetura e urbanismo I.
processo. Todo cérebro, quando produz pensamentos, produz imagens internas; e, quando detêm uma idéia, a comunica externamente tanto pela palavra como por gestos, por mímica, enfim, por desenhos, os quais, para serem a mais exata manifestação, devem ser riscados imediatamente e rapidamente, pois todo pensamento é veloz, evanescente e fugidio como a chama que crispa numa fogueira; ele necessita ser registrado rapidamente, pois em poucos segundos já não será mais o mesmo. Assim, desde o tempo mais remoto, as habitações humanas são erguidas a partir de desenhos, são guiadas e resultam do plano esquematizado por traços riscados. As técnicas evoluíram: desenhos no chão da obra, desenhos em quadrículas, a ajuda da geometria, o uso de escalas, a perspectiva, o desenho assistido por computador e o passeio arquitetônico virtual; porém, estas são todas
Figs. 03 e 04 - Esboços partindo da observação de ambientes residenciais.
Esboçar e croquisar é desenhar
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manifestações, externalizações de idéias primordiais internas ao pensamento humano. Esboços são de natureza íntima, se transformam em belos croquis (fig. 05 e 06), revelam uma característica pessoal; e, mais adiante, deles se originam desenhos técnicos para consignação pública, para o reconhecimento da idéia. Ainda não existe instrumento melhor para uma reflexão instantânea do espaço tridimensional como os esboços, pois, como mostram as figuras 03 e 04, de alunas de IAU1, mesmo não possuindo ainda precisões geométricas, são rápidos como um ato reflexivo e permitem uma série de variações até o entendimento do objeto observado, como nestes casos (fig. 05), ou imaginado, como numa situação projetual na qual o objeto é uma idealização interior (fig. 08). Esboços são para o arquiteto como as anotações são para o escritor ou para o químico; materializam, registram e garantem o frescor no exato momento do ato criativo, acompanham longas e suadas maturações; assim destinam para o computador apenas o grandfinale projetual, se não faltar luz. Os textos a seguir - um tratando de aspectos até a Idade Média e outro mostrando o grande Esboçar e croquisar é desenhar
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Fig. 05 - Esboços de um desenho de observação: o desenho rápido, momentos de reFlexão.
Fig. 06 - Croqui de um desenho de observação: o desenho mais evoluído.
impulso surgido a partir do Renascimento - e alguns desenhos apresentados aqui - dois tipos desenhos de observação: esboços e croquis - são de alguns alunos de uma disciplina de primeiro semestre, Introdução a Arquitetura e Urbanismo 1, voltada para desenvolver em calouros a expressão gráfica básica e conceitos elementares. Resultam de duas atividades, entre outras, para a compreensão não apenas da importância de se desenhar um objeto observado, utilizandose não mais do que o olho, o lápis e o papel, mas também para a constatação da importância que o desenho, em suas modalidades, desempenhou para o desenvolvimento da idéia arquitetônica ao longo dos séculos.
Fig. 07 - Croqui de um desenho de observação: o desenho mais evoluído a partir dos estudos da observação de uma cena.
Fig. 08 - Esboços da Winton Guest House - Frank Gehry, Minessota, 1983. (Fonte: lapuerta, 1997)
Esboçar e croquisar é desenhar
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Dois textos com um pouco da história 1. O desenho do projeto até a Idade Média Acadêmica Karen Kirsten, IAU1 - 2005.01 ___________________________________ O desenho, apesar de ser uma coisa simples - que você faz com um simples graveto no chão, é um instrumento que, desde a época remota das cavernas, é utilizado para expressar sentimentos e pensamentos: o chamado desenho mental (interno). A criatividade desde então foi se desenvolvendo com a aparição de vários materiais artísticos. Mais tarde, foram criados desenhos muito mais elaborados, cuidadosos e estudados, chamados, então, de desenhos de arquitetura; (desenhos externos), que não são apenas desenhos simples, mas uma representação gráfica, técnica e regulamentada do artista, que externaliza uma idéia. Mas, antes disso, o artista passa por vários processos; o primeiro é o esboço que trata de desenvolver os primeiros traços entre o desenho mental e o desenho externo, é o início Esboçar e croquisar é desenhar
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Fig. 09 - planta de um jardim egípcio encontrado gravado na pedra de uma parede. (Fonte: fariello, 2000)
para os primeiros traços de um grande projeto; o segundo é o croqui que já é uma mostra mais definitiva e mais detalhada daquilo que se pensa fazer. Para qualquer tipo de arte, podendo ser arquitetura, pintura ou escultura, o esboço e o croqui servem como estudo daquilo que se quer construir ou formar; e, apesar de não serem feitos com grandes cuidados estéticos ou geométricos, pois seus traços devem ser leves e rápidos, não é por isso que podemos desprezar sua beleza porque eles têm tanto valor quanto a obra final. No Egito, por exemplo (fig. 09), desenhava-se com os materiais que se tinha em mãos, como em lâminas de pedra, que eram usadas para fazer os esboços esquemáticos para guiar a marcação; o arquiteto não podia se ausentar da obra porque só ele sabia como eram feitas as marcações com estacas e cordas e como eram feitas as fundações das edificações. Já na Grécia, o agente geral da arquitetura era o mestre de obras, que agia não com a ajuda de projetos detalhados, mas muito com a exposição oral do arquiteto, o qual dava a palavra final; percebe-se, através da perfeição de como eram executadas as fachadas, que o arquiteto detinha uma posição na sociedade. No Império Romano, o arquiteto também mantinha seu status Esboçar e croquisar é desenhar
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Fig. 10 - fachada de um prédio, provavelmente para a família Sansedoni,1340, com um con trato de construção no rodapé do papel – encontrado por toker, F. e seu artigo “gothic architecture by remote con trol: an illustrated building contract of 1340”. Nota-se a simplicidade do traço, uma característica até essa época, com menos recursos materiais e técnicos para o desenho. (Fonte: lapuerta, 1997)
e desenvolvia novas técnicas geométricas. O mestre de obras se tornou uma pessoa sobrecarregada porque cuidava de vários outros mestres de obra como: mestre carpinteiro, mestre ferreiro mestre pedreiro, etc. e ainda combinava em si o arquiteto moderno, o contratante de obra e o supervisor. Porém, a partir do século XII, o desenho de arquitetura se estende e se torna fundamental para a execução da obra juntamente com o arquiteto, uma pessoa que detinha grandes conhecimentos relacionados à atividade de construir e com o desenho de arquitetura. E mesmo que seus esboços ainda não fossem instrumentos adequados para dirigir os demais mestres de obra, eles eram usados mais para sua própria organização nos processos técnicos da construção. Contudo, a partir daquele século, o desenho em arquitetura começa a se tornar um instrumento cada vez mais importante e sofisticado para
a execução da obra. Assim todo estudante que estava nos últimos anos da sua instrução fazia muitos esboços para treinar o desenho e a geometria, aperfeiçoando cada vez mais seu traçado e memorizando as várias fórmulas de montagem na justaposição das diversas partes dos elementos suportantes da construção medieval. Eles também usavam esses esboços e croquis para incentivar o cliente a construir e, desta maneira, arrecadar algum dinheiro. Pelo fato de, neste extenso período medievo, o desenho para arquitetura estar mais rígido e mais definido às necessidades construtivas, alguns meros esboços representavam apenas a idéia inicial e muitos planos de projetos incluíam o desenho e o contrato escrito juntos (fig. 10).
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2. O emprego do esboço desde o Renascimento até hoje Acadêmica Amanda Jaqueline Schefer, IAU1 - 2005.01. __________________________________________ O homem que sabia que seria ‘diferente’ dos outros, por causa do ofício, foi o arquiteto renascentista, utilizando suas técnicas de esboço e projeto. Era visto como cavalheiro, destacando-se por sua habilidade mental e sua capacidade de se expressar. Alberti diz que a função do desenho é dar uma composição adequada às construções através apenas do desenho em si, fazendo com que elas dependam basicamente dele. Foi no Renascimento Italiano que a pintura, escultura e arquitetura se tornaram um conjunto chamado de ‘arte do desenho’. Demonstrando sua importância para as três modalidades da arte, ele tornou-se um instrumento fundamental e insubstituível para a realização de um projeto bem estudado. No período do século XVI, diferentemente do arquiteto medieval e junto às técnicas de perspectiva, geometria, esboços e croquis, surgiram novas definições por causa das tendências humanistas de não se usar mais os esquemas dos antepassados. Esse novo arquiteto necessitava de novos tipos de desenhos, com vários croquis e esboços para não Esboçar e croquisar é desenhar
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ter que ir várias vezes no canteiro de obras. Havia a necessidade de projetos mais detalhados também para se ter mais bem documentados os edifícios clássicos. Com um novo tipo de desenho, os arquitetos garantiam definitivamente suas necessidades de status. Miguel Ângelo (fig. 11) e Bramante (fig. 12) utilizaram esse método. Exemplo é a Basílica de São Pedro, cuja contrução que foi longa e demorada, permitindo que vários arquitetos se sucedessem e continuassem ou redefinissem os desenhos do antecessor. Nos séculos XVIII e XIX, as nações dominantes ditavam as regras, aumentando assim as tecnologias e conseqüentemente uma luta contra as imperfeições. O desenho fica cada vez mais evoluído, passa a ter mais organização, mais relação entre as escalas, usa-se mais a perspectiva. Assim, esses fatos quase levaram à supressão do croqui. O século XVIII, de uma certa maneira, colocou ‘na gaveta’ borrachas e croquis, pois todas as linhas começavam a ser feitas com mais regras e instrumentos, bem como começava a haver uma distinção entre o processo projetual (estudos) e o próprio projeto (final). A academia francesa École des Beaux Arts, em Paris, grande Meca do ensinamento Esboçar e croquisar é desenhar
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Fig. 11 - esboço de michelangelo buonarotti, da tumba da capela funerária dos médicis, em São Lorenzo, IT, em 1518. (Fonte: lapuerta, 1997)
Fig. 11 - esboços da basílica de são pedro, em roma, 1505 - 06, de donato bramante. (Fonte: lapuerta, 1997)
da arquitetura, tornava muitas vezes os alunos presos dentro de um jogo de regulamento e, para mudar isso, treinavam esboços e criavam testes anuais para estimular a criatividade. O arquiteto modernista Le Corbusier dizia que, para fazer a Capela de Ronchamp (fig. 13), armazenou vários dados sobre o projeto em sua memória durante alguns meses e depois nasceu o projeto; desenhava traços e traços e, cada vez mais, seus esboços tornavam-se claros croquis e estes, desenho técnico. Muitos arquitetos apresentam a seus clientes, junto ao projeto final, seus esboços e croquis, pois são bem valorizados esses desenhos esquemáticos como sinal de talento. Pei, arquiteto modernista que projetou a National Gallery (fig. 14) em Washington, nos Estados Unidos, desenhou seu primeiro esboço na parte de trás de um maço de cigarros durante um vôo que fazia voltando para sua cidade. Algo difícil de se acreditar é que a “casa da cascata”, de Frank Lloyd Wright, foi desenhada num único movimento, sem qualquer esboço. O que importa é admitir que o arquiteto pode adotar um processo personalizado assim como pode consignar sua idéia apenas com um croqui.
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Fig. 13 - esboço de le corbusier para a Capela de notre-damedu-haut, em ronchamp, FR. (Fonte: boesiger, 1998)
Fig. 14 - esboços das primeiras reFlexões do arquiteto pei, para a national gallery. (Fonte: lapuerta, 1997)
Conclusões Não seria fácil o ofício dos gênios das artes, da pintura, da escultura e da arquitetura se os mesmos, por dom natural ou por dom adquirido, não tivessem compreendido desde cedo que todo desenho nasce de uma imagem. As informações do pensamento são imagens; percebemos o mundo através de imagens. Organizações, planejamentos, idéias, emoções, palavras e até mesmo o tato, o gosto e o olfato produzem em nosso cérebro milenar imagens. Portanto, quando se traça uma linha qualquer em qualquer superfície, ela resulta de uma imagem, nem sempre nítida ou precisa, mas certamente suficientemente clara para disparar o movimento do braço e da mão através de comandos mentais e reflexos neuro-musculares. O interessante é que este processo, que nasce de uma imagem interior ao pensamento, gera tanto desenhos abstratos, racionais e objetivos como concretos, emocionais e subjetivos. A diferença aqui, entre abstrato e concreto, reside em fatores lógico-filosóficos, isto é: a abstração, conforme FERREIRA, é o “ato de separar mentalmente um ou mais elementos de uma totalidade complexa” para logo julgá-los Esboçar e croquisar é desenhar
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Figs. 15 e 16 - respectivamente esboço e croqui a partir da observação da fachada parcial de uma casa.
e ponderá-los, enquanto que as situações ou as coisas concretas referem-se ao enunciado “de coisa ou de representação que se apresenta de modo completo, tal como lhe é próprio apresentar-se na sua realidade existencial” e que não sofre julgamentos maiores. De certa maneira, as explicações acima se referem ao modo dual e simultâneo como o cérebro funciona – uma referente ao meridiano esquerdo e outra ao direito. Contudo, o mais importante de tudo que foi dito nas linhas acima é que todo desenho, para gerar objetos ou situações arquitetônicas, começa com atitudes e procedimentos racionais (abstratos e objetivos). Isto é, inicia sob um julgamento atento e minucioso de um conjunto de objetos e formas (por exemplo, os objetos nas figuras 17 e 18) para depois abstraílos e reagrupá-los objetivamente, através de traços sobre o papel, de
Figs. 17 e 18 - respectivamente esboço e croqui a partir da observação de um móvel.
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maneira que a forma resultante não se torne um peixe ou um relógio, mas sim, uma mesa, com portas e espaço para um computador. É isto: em arquitetura, desenhos são a mais fiel representação do objeto observado. Por isso, o esboço – o meio mais rápido de se representar um todo – é a ferramenta mais íntima ao pensamento. Suas imagens se expressam melhor quanto mais rápido são representadas. Depois, após esses instantes iniciais de esboço, de estudos e de reflexões, por redução cartesiana, esses primeiros traços começam a ser burilados e aperfeiçoados até que o desenho, agora com aparência de croqui, se transforme numa representação idealizada de um objeto observado.
Figs. 17 e 18 - respectivamente esboço e croqui a partir da observação da fachada de uma casa.
E, contrariamente a estes aspectos de realidade, mesmo que esboços e croquis sejam pertinentes exclusivamente ao mundo das idéias e dos sonhos - como no caso de Esboçar e croquisar é desenhar
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novas propostas, novos projetos, novos planejamentos ou mesmo novos paradigmas ou novas utopias este procedimento esboço-croqui reflexivo e escrutinador - mostrase efetivo, pois toda percepção mental, como já dito antes, é uma imagem e esta uma necessidade de representação.
Organização e revisão: Ms. José Arthur Fell, Arq. – arfell@feevale.br Lista das FIguras de alguns alunos de IAU1 – 2005.01: 01, 17 e 18 - Felipe Scholl; 03 - Idalise Gottshalk; 04 - Graziela Dienstmann; 05 - Fernanda Alves; 06 - Gabriela Birk; 07 - Liuá Hauser; 15 e 16 Jéssica Castilho; 19 e 20 - Denis Cicarolli. Estes exemplos aqui apresentados foram escolhidos por contribuírem ao tema apresentado.
Enfim, desenhistas e projetistas da arquitetura, não se desviem; e vamos relembrar o coment á rio anterior da acadêmica Amanda de uma citação de Alberti, um dos grandes formadores da arquitetura, em sua obra De reaedificatoria, de 1485, apud Lapuerta (1997), que já argumentava:
Ressalva-se entretanto que outros exemplos de demais alunos poderiam ser aqui apresentados não fosse a brevidade deste espaço.
REFERÊNCIAS: BOESIGER, W. Le Corbusier. São Paulo: Martins Fontes, 1998 FARIELLO, F. La arquitectura de los jardines: de la antigüedad al siglo XX. Madrid: Mairea-
“É o papel e a função do desenho de dar aos edifícios e às partes dos edifícios uma composição adequada, uma proporção exata, uma organização apropriada, um plano harmonioso, de modo que toda a forma da construção nasça completamente do próprio desenho”.
celeste, 2000. FERREIRA, A. B. H. Novo dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989. LAPUERTA, J. M. El croquis, proyecto y arquitectura. Madrid: Celeste Ediciones, 1997.
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Mies 3D
Extrusões e movimentos no Laboratório de Computação Gráfica Prof. Ms. Juliano Caldas de Vasconcellos __________________________________ Desde o segundo semestre do ano de 2002, o Laboratório de Computação Gráfica do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Feevale trabalha nos exercícios bidimensionais e tridimensionais das disciplinas de Computação Gráfica I e II com a reprodução de exemplares arquitetônicos de excelência, reforçando a idéia de um curso de desenho digital* inserido em um contexto acadêmico. Dentro do conjunto de exercícios aplicados nestas disciplinas, destacam-se alguns exemplares da obra de Mies van Der Rohe, como o Pavilhão de Barcelona e a Casa Farnsworth. A precisão geométrica, a qualidade dos espaços e a “modularidade” presente nestes dois exemplos é fator decisivo para que a aplicação dos conceitos de desenho dentro do computador sejam compreendiMies 3D
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A Casa Farnsworth Farnsworth, modelada em Vectorworks e renderizada no art*lantis. (Acervo do laboratório)
Mies van Der Rohe visitando a obra da Casa Farnsworth. (Fonte: RILEY, Te-
rence. Mies in Berlin. Nova York: Museum of Modern Art, 2002. 392p )
(*) Dentro do Laboratório convencionou-se tratar o desenho feito no computador dessa forma.
dos já nos primeiros meses de trabalho. Nunca é demais frisar que os acadêmicos elaboram desenhos tridimensionais no segundo mês da primeira disciplina de Computação Gráfica I, o que evidencia uma curva de aprendizado bastante abatida, sendo os exemplares elementos importantes no rápido processo de entendimento das ferramentas disponibilizadas pelos softwares VectorWorks (modelagem 3D) e Art*lantis (foto-realismo). O Pavilhão de Barcelona foi o exemplar pioneiro, utilizado como avaliação tanto bidimensional quanto tridimensional. Na primeira etapa, em qualquer um dos exercícios, os acadêmicos reproduzem a planta a partir de um desenho em escala, utilizando ferramentas de parede, esquadria, escada etc. Com a base completa e modulada, o próximo passo é lançar mão dos comandos de extrusão, de pilares e formação pisos e coberturas, completando a base do
pavilháo de barcelona, modelo em Vectorworks. (Acervo do laboratório)
Mies 3D
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modelo 3D. Na seqüência, o desenho é exportado para o Art*lantis onde transparências, texturas, luzes e câmeras são adicionadas. Todo exercício é precedido de uma apresentação do exemplar a ser desenhado, através de fotografias, gráficos e panoramas em realidade virtual (no caso do Pavilhão), para que sejam reconhecidas as partes a serem graficadas e modeladas. Outro interessante trabalho desenvolvido pelo Laboratório é a pesquisa e desenvolvimento de desenhos e modelos tridimensionais de obras cujo material está “pulverizado” e/ou incompleto nas publicações existentes no acervo. O caso mais recente é do conjunto habitacional Weißenhofsiedlung, em Stuttgart (1925-27). Nesta obra, os desenhos existentes foram todos analisados a partir de 4 fontes diferentes e re-elaborados digitalmente, em 2D e 3D.
Conjunto Weißenhofsiedlung, Stuttgart, 1927 (Acervo do laboratório)
Mies 3D
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Sobre Mies va n der Rohe...
-A cad. Thaís lu ft da silva
A ob ra de Mie s va n de r Ro he se va le ta nto de ele me ntos do De Stijl , no qu e diz re sp eito à interce ptaç ão de pla nos e vo lu me s , pa ra a fo rm a compos itiva , qu anto do Siste ma Domin ó, no qu e se re fe re à ca ra ct erística estrut ural . As princ ipais ca ra cterística
s compos itivas da ob ra de Mie s er am a elegâ nc ia a sim pli cidade (ta mb ém en co nt ra das no De Stijl). Ele ar tic ul a pla nos ve rticais e ho rizontais, fo rm an do a vo lu metria de seja da . Na pa rte estrut ural, utilizou em abun dância o Sistema Dominó, o qu e possibi lit ou as plantas liv res, ca racterizando a Fluidez dos int eriores de Mies. Ain da do Sistema Domin ó, pôde tirar pr oveito e inspirar -se pa ra compor os delg ados pilares me tá licos e as fa chadas de gran des pano s envidraçados, o qu e posterior mente, tornou -se uma das principais ca racterísticas do Estilo Internacional, do qual foi precur sor.
(frag me nto de veriFic aç ão de co nhe cim entos
rea liz ada na dis cip lin a de Teo ria e Histó ria da Arq uitetu ra e Ur ban ismo II)
Mies 3D
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a
O resultado da produção dos acadêmicos que cursam as disciplinas no Laboratório é material de exposição desde o segundo semestre de 2003. Em maio deste ano ocorreu a primeira exposição multimídia, que mostrou não só os trabahos estáticos (desenhos e maquetes eletrõnicas), como os vídeos elaborados na disciplina de Computaçáo Gráfica II. Nesta exposição, os trabalhos foram editados e reunidos em um audiovisual, apresentado no saguão do Prédio Arenito. Neste segundo semestre de 2005 uma nova etapa do Laboratório se iniciou, com a abertura da terceira disciplina de CG (optativa). Esta, avançará ainda mais nas questões do desenho digital, procurando sempre a representação arquitetônica precisa e graficamente expressiva, nunca deixando de ter como referência o desenho tradicional, sempre tão bem empregado por Mies van der Rohe. Mies 3D
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Cartaz da 1 Expograf, exposição multimídia que reuniu grande parte da produção do Laboratório.
o vídeo da exposiçáo foi apresentado no saguão do prédio arenito. (foto: ana carolina pellegrini)
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– uma visão antropofágica. Prof. Ms. Leandro Manenti _______________________ Muito se discute hoje em dia sobre o perfil das universidades regionais e seu importante papel na descentralização do desenvolvimento, procurando soluções locais para problemas locais, face às respostas estandardizadas oferecidas por uma globalização cada vez mais massificadora. Porém, não podemos jamais esquecer o importante papel das trocas culturais entre os povos no desenvolvimento e afirmação de
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Os partici pantes ao Final do evento.
suas próprias culturas. A partir de experiências externas, podemos lançar luz sobre os nossos problemas localizados. Neste sentido, acredito que o Workshop Internacional de Projetação Arquitetônica, ministrado pelo grupo de pesquisa italiano “Cominciare a Progettare”, em uma promoção conjunta dos cursos de Arquitetura e Urbanismo da Feevale e da Univates, foi exemplar. Para um país onde ainda se está buscando a construção de uma identidade cultural, da qual a arquitetura é um fator decisivo, a experiência italiana nos aponta um caminho: a teorização baseada na análise critica da história. Seguindo a tradição de teóricos italianos como Vitrúvio, Alberti, Palladio2 e Aldo Rossi, o grupo de estudos da Politécnica de Torino baseia seu método de projeto na análise de precedentes arquitetônicos, buscando extrair relações formais do objeto em si e dele com o entorno, criando um sistema de composição baseado na articulação de elementos, por adição, subtração, sobreposição, etc. e regrados por relações de ritmo e proporções. Desta forma, o que acompanhamos nos encontros foi uma seqüência lógica de exercícios,
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embasados por esta carga teórica, ministrada pelo Professor Marco Trisciuoglio, que, em seqüência, era colocada em prática pelos participantes, com o assessoramento direto do professor italiano e de sua equipe, constituída pelas professoras Michela Barosio, Marcella Graffione e Verena Caetano da Silveira. O objetivo final do Workshop era que os participantes desenvolvessem individualmente uma proposta contemporânea para a reconstrução de uma galeria do século XVII, conhecida como Galleria dello Zuccari, que fez durante sessenta anos, a ligação entre o Palazzo Reale e o Palazzo Madama, no centro histórico da cidade de Torino. Iniciando pelo estudo do entorno e da configuração original da Galeria, os participantes realizaram sucessivos estudos sobre temas de composição arquitetônica, como a identificação de ritmos e da partição básica de um edifício em base, corpo e coroamento. Além disso, realizaram exercícios de aplicação de ordens clássicas, que, como havia definido Alberti no século XV, são uma maneira eficaz de se organizar um projeto, muito antes de serem meros ornamentos. Todos estes exercícios
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tiveram como objetivo instrumentalizar os presentes para que desenvolvessem uma proposta contemporânea e livre, porém com uma fundamentação teórica que permitiu mesmo aos mais iniciantes uma certa segurança para intervir em um ambiente tão distante e fortemente constituído. Paralelo ao Workshop tivemos ainda a palestra do Prof. Marco Trisciuoglio sobre as diversas considerações acerca da forma arquitetônica. Para ele, a forma arquitetônica segue um estilo quando considerada como o produto de uma regra, um cânone, como podemos observar no exercício sobre a aplicação das ordens clássicas propostas por Vignola. Já se a forma arquitetônica é resultado de um esquema de referência, como observamos nos estudos de Aldo Rossi, temos o tipo. Agora, se a forma arquitetônica é fruto de uma expressão pessoal, como muito observamos na arquitetura contemporânea, estamos lidando com linguagens. Em suma, para o Prof. Marco, temos uma evolução da arquitetura que inicia-se no estilo, passa pelo tipo e chega hoje nas linguagens.
?
Mas o que levamos, afinal, desta experiência
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Ao meu ver, além de uma bela teoria e de vocabulário básico em italiano, reforçamos a idéia de que “das coisas nascem coisas”3, de que a arquitetura nasce dela mesma, que o estudo e a teorização sobre o que existe é a fonte para a nova arquitetura; contemporânea, como não poderia deixar de ser, porém não alheia ao seu contexto. Que teorizar é uma forma de aprender arquitetura, e que práticas como esta devem ser repetidas, seja com presenças internacionais ou locais, pois exercitar a criatividade é essencial para alunos de arquitetura, senão para todos.
Notas: 1. Versão para Tupi elaborada pela profA . Ana Carolina Pellegrini. 2. Permito-me aqui simpliFIcar
Deglutimos a experiência italiana para aprender, mais uma vez, que temos que construir nossa(s) própria(s) teoria(s) antes que seja tarde, pois enquanto continuarmos importando cultura nunca teremos uma arquitetura brasileira contemporânea, atual e contextualizada. Mas onde iremos buscar nossas referências? Na Itália? Até podemos começar por lá, ou em qualquer outro lugar, mas importante é que não esqueçamos de incluir nossa própria história da arquitetura, já que, se até o mestre Le Corbusier tentou fazer parte dela, é sinal de que deve ter algum valor. “Tupi, or not tupi that is the question”4.
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e chamar Vitrúvio, Alberti e Palladio de italianos mesmo não havendo ainda a constituição de um estado italiano em seus respectivos períodos. 3. Título do livro de Bruno Munari. 4. Manifesto Antropofágico de Oswald de Andrade. (fotos deste artigo de luciana néri martins) (desenhos do acervo do curso de arquitetura e urbanismo da feevale)
-estudo das superfícies retilíneas desenvolvíveis e não desenvolvíveis. Prof. Marcelo Ferreira ____________________ Apresentam-se, através deste trabalho, alguns experimentos sobre a forma de protótipos e sua organização espacial, desenvolvidos como etapa da disciplina de Geometria Descritiva (GD) Aplicada. Trata-se de uma série didática de exercícios práticos, fundamentados no conceito das Superfícies Retilíneas Desenvolvíveis e não Desenvolvíveis, através dos quais se pretende demonstrar ao aluno o entendimento da boa forma – uma configuração que satisfaça a procura da unidade, do equilíbrio – e criar um senso crítico no campo da percepção visual. A superfície, como é chamado o resultado do trabalho, é considerada na sua acepção plástica visual, examinando-se algumas relações entre os princípios de sua organização perceptiva e sua
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apreensão estrutural. Esta apreensão não é tratada segundo o enfoque rigoroso dos cálculos estruturais. É, sim, abordada no seu plano empírico-estrutural, utilizandose procedimentos de estudos experimentais, visto que os alunos em questão estão no início do Curso de Arquitetura e Urbanismo, ainda sem o domínio dos fundamentos de esforços estruturais. Os estudantes, entretanto, contam com o auxílio do professor da disciplina, que atua como orientador. Este exercício não intenciona equacionar a forma plástica das superfícies, sobretudo no aspecto da criação. Desenvolve-se no campo da aplicação dos conhecimentos geométricos que possam ser averiguados no resultado final.
ETAPAS DO EXERCÍCIO As questões trabalhadas pelo exercício são as seguintes: 1. Análise e aplicação dos conhecimentos adquiridos na disciplina, através de propostas – projetos - desenvolvidos pelos alunos. É importante ressaltar que neste estágio do trabalho o aluno tem livre escolha de cores e materiais que serão utilizados na sua proposta. 2. Montagem de maquetes em escala reduzida para a percepção da forma, a fim de que os estudantes entendam por que há superfícies que se unificam e se integram plasticamente enquanto outras não correspondem ao objetivo proposto, e verificação da adequação dos materiais a serem utilizados na montagem do trabalho final. 3. A montagem das maquetes em escala natural, a fim de que se propiciem
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condições adequadas à manifestação do potencial criativo e do senso estético-estrutural, além da análise final do processo como um todo. Considerando o conjunto de resultados, o fato de a maioria das superfícies terem versado sobre arranjos das formas mais básicas - conóides, piramidais – é significativo, sobretudo porque a livre escolha das formas facultada aos alunos possibilitaria uma diversidade maior. Nesse contexto, a linha de estudo estético experimental se apresenta como um efetivo e produtivo apoio ao processo ensino-aprendizagem. Pode-se perceber um possível denominador comum entre a percepção, a estruturação espacial e a análise crítica da forma e sua organização, conforme indicam os exercícios já realizados. Através deste trabalho prático proposto para o estudo das Superfícies Retilíneas Desenvolvíveis e não Desenvolvíveis, os alunos começam a adquirir conhecimento e subsídios que lhe permitam criticar seus próprios trabalhos, a fim de apurar sua exigência rumo a um progressivo aperfeiçoamento qualitativo no que se refere aos aspectos formais e compositivos de seus futuros trabalhos acadêmicos.
85-Bloco(1)
(As fotograFIas deste artigo sÃo de autoria do professor Marcelo Ferreira).
Pink Floyd
- uma forma de integração entre aprendizagem e tecnologia.
“Another Brick In The Wall”
Prof. Ms. Reginaldo Macedônio da Silva __________________________________
Daddy’s home cross the Ocean. Leaving just a memory. The snapshot in the Family album.
Diante de um novo século, é preciso repensar sobre o processo de aprendizagem e criar novas idéias, através das quais é possível quebrar a muralha (The Wall – Pink Floyd) entre o saber e o aprendizado, entre o professor e os estudantes.
Daddy what else did you leave for me? Damn It! What did you leave behind for me? All in all it was just a brick in the wall. All in all it was all just bricks in the wall. We don’t need no education. We don’t need no thought control. No dark sarcasm in the classroom. Teacher leave the kids alone.
A dinâmica desse nosso “tempo moderno”, já foi apresentado por Charles Chaplin no seu filme “Tempos Modernos”, em que o homem tenta acompanhar o
Hey, teacher leave the kids alone! All in all it’s just another brick in the wall. All in all you’re just another brick in the wall We don’t need no education. We don’t need no thought control. No dark sarcasm in the classroom. Teachers leave those kids alone. Hey, Teacher leave those kids alone! All in all you’re just another brick in the wall. All in all you’re just another brick in the wall.
89-Bloco(1)
ritmo de produção e a evolução das máquinas. Hoje temos vários exemplos de uma grande evolução e desse nosso “tempo moderno”, como a internet, o telefone celular, o GPS (sistema de posicionamento global) entre outros. Na docência, evoluímos do giz para o projetor multimidia, do mimeógrafo para a impressora a laser e da pesquisa em livros de papel, para a pesquisa no meio digital, através do qual é possível entrar em diversas bibliotecas e acessar diversos “livros”, em diversas línguas e em diversos países. A área de topografia evoluiu muito em termos de equipamentos, com as estações totais (Total Station), GPS (Sistema de Posicionamento Global) e os novos computadores, cada vez mais rápidos, em seu processamento de dados e em sua capacidade de armazenamento. Já em termos de software, tivemos uma grande evolução com o surgimento de muitos aplicativos na área de topografia, melhorando a possibilidade de escolha, contribuindo para um melhor aprendizado.
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Nive la m en
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Diante de toda essa evolução, nada melhor do que o professor evoluir e criar novos procedimentos adequados a esse novo mundo que nos cerca. Na disciplina de Topografia, do Curso de Arquitetura e Urbanismo, criou-se, nesse semestre, uma GINCANA, como uma forma de integração entre professor e os estudantes e entre o aprendizado e a tecnologia, aplicando-se uma nova dinâmica no processo de aprendizagem.
ana de GPS no Cam pus II para a ginc Impl antação dos pontos
A participação dos alunos foi fundamental para a execução desse método, através do qual pode-se despertar o interesse pelos equipamentos e juntar as aulas teóricas com o aprendizado na prática. A GINCANA teve como objetivo o uso de equipamentos, como a Estação Total e o GPS, e tornou possível a união entre a teoria à prática, fora da sala de aula.
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Local do ponto, à noite...
Trabalhando com a Estação Total, os alunos tiveram que nivelar o equipamento, usando as informações aprendidas em sala de aula e nas aulas práticas e, nesse caso, pôde-se observar um maior interesse devido à competição entre eles. Já para o uso do GPS, eles utilizaram a informação de coordenadas de pontos, que foram distribuídos no Campus II da Feevale, sem saberem onde tinham sido colocados esses pontos. Apenas com a utilização do GPS eles puderam seguir as coordenadas para sua localização. No final da GINCANA, quem atingiu o menor tempo entre as duas etapas ganhou um acréscimo em sua nota final. Dessa forma pôde-se observar que a integração entre tecnologia e aprendizado pode ser estimulada de maneira diferente, atingindo-se o objetivo final, que é compreender as informações apresentadas em sala de aula. O professor pode, portanto, explorar essas atividades como uma nova ferramenta no processo de ensino.
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Integração entre os acadêm icos!
(fotos deste artigo de autoria de reginaldo macedônio da silva)
Concurso Design Brasil Profª. Suzana Vielitz de Oliveira ____________________________ Numa iniciativa dos Cursos de Arquitetura e Urbanismo e Design da FEEVALE, foi elaborada uma atividade interdisciplinar muito interessante: O CONCURSO PRÓ-DESIGN SOCIAL. Os alunos do Curso de Design já vinham participando, desde o 1º semestre de 2005, de vários concursos nas mais diversas áreas do Design, dentre elas: de móveis como o MACISA, ou HETTISCH International, ROMMANEL de jóias, ABRE de embalagens, como também havia alguns alunos interessados no concurso DESIGN DE CARÁTER SOCIAL. Após a leitura do edital, verificou-se que a Instituição só poderia enviar 5 trabalhos e, a partir disso, Concurso Design Brasil
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Maria Rita e Leonardo, premiados.
surgiu a idéia de promover o concurso interno, de modo a proceder de forma democrática e justa na escolha dos representantes. Neste momento, havia 23 alunos trabalhando e propondo com idéias e assessorando no Centro de Design, além dos estudantes do Curso de Arquitetura e Urbanismo, que buscaram orientação junto ao colegiado do seu curso. A atividade interdisciplinar se fez necessária e foi de grande interesse para efetivar o contato entre os cursos de Arquitetura e Urbanismo e Design em áreas nas quais suas atribuições se sobrepõem e complementam. Os alunos dos dois cursos citados manifestaram interesse em participar do concurso Design de Caráter Social, o qual necessitava de orientação técnica específica, acompanhamento dos projetos, bem como orientação e incentivo final para o envio de todo o material. Por esses motivos, entendeu-se que o mais adequado seria realizar a atividade em conjunto, de forma a dar mais peso à participação da Instituição, havendo possibilidade de envolver Concurso Design Brasil
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ANA CAROLI NA OLIVEIRA DA FONSECA e M Á RCIA BEATRIZ WINGERT, do Curso Arquitetura e Urbani smo e MANUEL E PETRY, do Curso de Design .
colegas, divulgar o que acontece nos cursos e apoiar os participantes. A comissão organizadora do Concurso PróDesign Social, formada pelos professores Ana Carolina Pellegrini (Arquitetura e Urbanismo), Victor Baptista (Design) e Suzana Vielitz de Oliveira (Design) elaborou um edital interno, que foi divulgado aos alunos. Os estudantes receberam a ajuda da comissão interna, que esteve à disposição para dirimir dúvidas, orientar, conduzir da melhor maneira todos os trabalhos. Além disso, os professores envolvidos determinaram e divulgaram os prazos, organizaram o evento de julgamento e premiação interna e, finalmente, acompanharam os classificados até os últimos momentos quando tudo foi embalado e postado. Foram entregues, no dia 20 de junho de 2005, nove trabalhos, dos quais quatro contemplavam a categoria veículo para coleta de materiais recicláveis, e cinco, a categoria mobiliário urbano para sítios protegidos pelo patrimônio histórico. Os critérios levados em conta para o julgamento foram pertinência ao tema, coerência entre forma e função, escala e proporções Concurso Design Brasil
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adequadas, ergonomia, informações como memorial descritivo, material adequado, aspectos de preservação de patrimônio ou leveza, agilidade, exeqüibilidade. A comissão julgadora decidiu por premiar dois trabalhos de cada categoria. Foram selecionados, na categoria veículo, o trabalho de JORGE RECHMANN MELLO do curso de Design, orientado pelos professores Victor Baptista e Suzana Oliveira, e o trabalho do grupo formado pelos alunos ALBERTO GISMOND SCHÄFFER, EVANDRO ALBRECHT e MARLENE TEREZINHA C. BECK, da disciplina de Projeto I, orientados pelo professor Everton do Amaral, do Curso de Design. Na categoria mobiliário urbano, foram selecionados os trabalhos do grupo interdisciplinar formado pelas alunas ANA CAROLINA OLIVEIRA DA FONSECA e MARCIA BEATRIZ WINGERT, do Curso Arquitetura e Urbanismo e MANUELE PETRY, do Curso de Design, cuja orientadora foi a professora Suzana de Oliveira. O 1º colocado na categoria mobiliário urbano foi o trabalho da dupla LEONARDO GIOVENARDI e MARIA RITA SOARES, do Curso de Arquitetura e Urbanismo, orientado pelo Prof. Leandro Manenti. Importante ratificar que nesta fase foram escolhidos os trabalhos que demonstraram melhor Concurso Design Brasil
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potencialidade para representar a Feevale no concurso nacional. Todos, entretanto, passaram por etapa de desenvolvimento antes de serem finalizados, a fim de tornarem-se aptos a participar do concurso nacional.
Além dos selecionados citados, participaram com entrega de projeto os acadêmicos: ROBERTO MARTINS PRETTO LÚCIO RAVANHOLI
Esta atividade acrescenta qualidade às nossas propostas, pois alunos e professores engajados, independentemente de cursos, poderão somar para que os conhecimentos sejam assimilados de uma forma mais rápida e intensa. Os alunos ficaram muito satisfeitos em participar e, mesmo aqueles que não foram selecionados, estavam felizes, pois aprenderam muito com o exercício. Nós, professores, sabemos que estas atividades extracurriculares são de suma importância para o crescimento, fazendo com que as áreas de interesse de cada um prevaleça. Os alunos da Feevale possuem pouco tempo para essas atividades extracurriculares, pois, na sua maioria, dedicam o turno oposto às aulas ao trabalho. Portanto, é louvável o interesse e vontade dos mesmos, que investiram vários Concurso Design Brasil
99-Bloco(1)
DIEGO BERNARDO BAGATINI JOSÉ ANTONIO DE OLIVEIRA PAULA DE DAVID TATIANA SABRINA BECKER EDUARDO JAEGER
finais de semana a fim de obterem um bom resultado no concurso; realmente os maiores ganhadores são os próprios alunos. Para alegria de todos nós, professores e estudantes, dentre os trabalhos remetidos pela Feevale, dois foram classificados para a 2ª etapa do concurso nacional. Foram eles os de Mobiliário Urbano, das equipes constituídas pelos alunos: ANA CAROLINA OLIVEIRA DA FONSECA e M Á RCIA BEATRIZ WINGERT, do Curso Arquitetura e Urbanismo e MANUELE PETRY, do Curso de Design e cuja proposta fixou-se no mobiliário para o cais do porto da cidade de Porto Alegre; e LEONARDO GIOVENARDI e MARIA RITA SOARES, do Curso de Arquitetura e Urbanismo, que trabalharam com propostas para o centro histórico da cidade de Antônio Prado. Agora, a próxima etapa os aguarda, sendo o resultado final será divulgado no dia novembro com premiação, na cidade de São Esperamos que nossos alunos estejam lá e isso ainda precisam elaborar uma maquete orçamento de suas propostas.
que 30 de Paulo. para e um
Concurso Design Brasil
100-Bloco(1)
(Imagens deste artigo de Leandro Manenti)
1
PALAVRAS-CRUZADAS 1
2
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21
22 23 24
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104-Bloco(1) Passatempos
HORIZONTAL
VERTICAL
1. Significativos meios de divulgação das vanguardas arquitetônicas, principalmente entre os séculos XIX e XX. Consagraram importantes edificações da história da arquitetura como o Palácio de Cristal, a Torre Eiffel, o Pavilhão do Esprit Nouveau e o Pavilhão de Barcelona. 3. Arquiteto espanhol que projetou o estádio olímpico de Atenas para as Olimpíadas de 2004. 7. Precursor da “Estação Total”, permite a elaboração de levantamentos planialtimétricos. 8. O primeiro arquiteto conhecido da história. 11. A mais robusta das ordens clássicas. 12. Cidade berço do Renascimento na Península Itálica. 15. Cidade objeto de estudo do segundo livro de Robert Venturi. 16. Bairro da capital mineira que abriga importante conjunto arquitetônico modernista projetado por Oscar Niemeyer. 18. Importante inovação no campo dos sistemas estruturais romanos. 19. Elemento da arquitetura clássica empregado para elevar a edificação e conferir imponência. 20. Instrumento para graficação, também conhecido como “aranha”. 22. Arquiteto que liderou a equipe de projeto do Ministério da Educação e Saúde Pública do Rio de Janeiro. 23. Movimento pré-moderno do qual fazia parte Antonio Sant’Elia. 24. Contavam as histórias bíblicas ao povo, que não sabia ler, e permitiam a entrada de luz colorida nas catedrais góticas. 25. O tratadista que formulou a tríade “firmitas, utilitas e venustas”.
2. Elemento responsável pela transmissão dos esforços das abóbadas para os contrafortes na arquitetura gótica. 4. Elemento horizontal do sistema construtivo trilítico. 5. Liderado por Peter Cook, o grupo se destacou pelos projetos para Walking City e Plug-In City. 6. Técnica construtiva divulgada por Le Corbusier e emuladora do Movimento Moderno. 9. A cidade que abriga a maioria das obras de Antoni Gaudí. 10. Tendência arquitetônica contemporânea característica do arquiteto espanhol Alberto Campo Baeza. 11. Elemento arquitetônico empregado no período românico, responsável pela ligação das naves laterais com as capelas radiais por trás do altar. 13. Projetou a cúpula de São Pedro, em Roma. 14. Projetou o conjunto Pruitt-Igoe, em Saint Louis, cuja implosão marcou o fim do Movimento Moderno, e as Torres Gêmeas, as quais sucumbiram ao ataque terrorista de 11 de setembro, em Nova Iorque. 17. Construção romana responsável pelo abastecimento de água das cidades. 19. O elemento que, segundo Le Corbusier, “eleva a massa edificada do solo”. 21. No século XV, delineou o papel do arquiteto em seu tratado De readeificatoria.
105-Bloco(1) Passatempos
2
LIGUE-LIGUE DĂŞ nome aos arquitetos e suas obras, depois relacione!
106-Bloco(1) Passatempos
3
JOGO DOS 5 PONTOS
Nos desenhos abaixo, circule aqueles que pertecem aos Cinco Pontos da Nova Arquitetura, enunciados por Le Corbusier:
107-Bloco(1) Passatempos
4
Nテグ SE REPETE Dos テ「ngulos abaixo, apenas um nテ」o se repete. Qual?
108-Bloco(1) Passatempos
5
OS DETALHES Abaixo, apenas um dos detalhes nรฃo corresponde a foto original. Qual serรก?
109-Bloco(1) Passatempos
6
CAÇA-PALAVRAS ABÓBADA CÚPULA PROPILEU JÔNICO ABSIDE NAVE PILAR
FRONTÃO BARROCO NÁRTEX INTERCOLÚNIO GÁRGULA CORNIJA GALERIA
110-Bloco(1) Passatempos
7
JOGO DOS ERROS Descubra as diferenรงas entre as duas imagens:
8
TIRINHA
Os Pescoรงudos - Caco Galhardo
111-Bloco(1) Passatempos
112-Bloco(1)
9
AJUDE A RECONSTRUIR O WORLD TRADE CENTER!
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113-Bloco(1)
Cole este lado em um papel de maior gramatura
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119-Bloco(1)
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121-Bloco(1)
Cole este lado em um papel de maior gramatura
SOLUÇÕES DOS PASSATEMPOS 1
1
E X P O S I Ç « Õ ’ E S M U N D I 3
7
T E O D O
9
10
11
B M D A I E 12 F L O R E N Ç « A C I M E M B L A U O L L N I A A S T Ó M ” 20 N O R M Ó ” G R A F O R I 22 L U C I O 24
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4
C A L A T R Q 6 U C L I T O T N Ó ” R I C A A R V E E T O 15 L A S R 16 P A M P A 19 P Ó ” D I I O L C O S T A T A I S S
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V U O
2
A I S R A V A C R O C B H O 8 I M H O T E P G A R N A T 13 M E M 14 M I I C E G A S N H O E 17 L H A R L 18 Q U A R C U Y N E A G D M E U A L 23 F U T U R I S M O O A K 25 V I T R U V 5
O 21
A L B E R T I O
Questões elaboradas pelos professores: Ana Carolina Pellegrini Juliano Vasconcellos Leandro Manenti Produção: Prof. Juliano Vasconcellos Software utilizado: Eclipse Crossword (freeware) http://www.greeneclipsesoftware.com/ eclipsecrossword/
Created with EclipseCrossword ó www.eclipsecrossword.com
2
Le Corbusier
Pq. Guinle
Lucio Costa
Guggenheim NY
Oscar Niemeyer
Ronchamp
Frank Lloyd Wright
Smith House
Richard Meyer
Hotel Ouro Preto
123-Bloco(1)
Fotos disponíveis em: http://architecture.mit.edu/~eghiseli/bw_corbu.jpg http://www.projetomemoria.art.br/jk/biografia/img/ g_foto56.jpg http://www.arpdf.df.gov.br/sites/200/226/ oscar%20niemeyer.JPG http://history.sandiego.edu/gen/USPics12/08323.jpg http://www.lifesciences.cornell.edu/otherSources/images/ meier2.jpg http://www.arcoweb.com.br/debate/fotos/28/parque_ %20guinle_foto.jpg http://web.mit.edu/~mip/www/photos/NY/ Guggenheim%20Museum.jpg http://intro2arch.arch.hku.hk/arch/Corbu/ ronchamp%20copy.jpg http://www.archfoundation.org/octagon/exhibitions/exhibi tion.structures.jpg http://www.csus.edu/indiv/o/oreyd/niemeyer/ ophotel.JPG
SOLUÇÕES DOS PASSATEMPOS 3 Pilotis
Fachada Livre
Planta Livre Janela em Fita
Terraco Jardim
Desenho de Le Corbusier publicado em: CURTIS, William J. R. Le Corbusier : ideas and forms. 1. ed. Nova Iorque: Phaidon, 2001. 240 p.
4
Imagem do Ministério de Educação e Saúde Pública (1936-42), de autoria de Lucio Costa e equipe publicada em: MINDLIN, Henrique. Arquitetura moderna no Brasil. Rio de Janeiro: Aeroplano, 1999. 286 p.
124-Bloco(1)
SOLUÇÕES DOS PASSATEMPOS 6
5
Produção: Prof. Juliano Vasconcellos Software: http://www.wordhunt.com/ Imagem: Pantheon, Roma, 118 a 126 a.C. Disponível em: http://www.cs.nott.ac.uk/~smg/photography/rome-pantheon.jpg Imagem do Modulor em concreto de baixo relevo publicado em: CURTIS, William J. R. Le Corbusier : ideas and forms. 1. ed. Nova Iorque: Phaidon, 2001. 240 p.
125-Bloco(1)
SOLUÇÕES DOS PASSATEMPOS 7
As duas imagens acima representam um silo em concreto armado de Bunge y Born em Buenos Aires, retirado da obra “Jahrbuch des Deutschen Werkbundes” de 1913 apresentados por Walter Gropious. Na imagem da esquera, a fotografia original da construção com os frontões decorativos. Na imagem da direita, o mesmo silo sem os ornamentos, editado e reproduzido por Le Corbusier em “Por uma Arquitetura”, como exemplo de uma construção de formas puras.
Fonte: VASCONCELLOS, Juliano Caldas de; Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Concreto Armado Arquitetura Moderna Escola Carioca: levantamentos e notas. 2004 313 p. Dissertação (Mestrado em Arquitetura) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2004
9
8 Tirinha gentilmente cedida por Caco Galhardo.
Desenhos do World Trade Center disponíveis no site Papertoys.com:
UOL - Caco Galhardo Corporation www2.uol.com.br/cacogalhardo
http://www.papertoys.com http://papertoys.com/world-trade-center.htm
Publicada Originalmente pela Folha de São Paulo em 21 de agosto de 1998.
Conforme as regras de direitos de cópia que constam do site.
126-Bloco(1)
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O Curso de Arquitetura e Urbanismo da Feevale tem muito orgulho de apresentar à comunidade mais esta conquista: Bloco(1), uma publicação que é o reflexo de nossa jovem trajetória iniciada no ano de 2000. Como tudo que é produzido por jovens, vem repleto de ideais e contradições: ao mesmo tempo que buscamos retornar à sociedade nossa produção acadêmica, gostaríamos de proporcionar diversão entre uma leitura e outra; queríamos registrar os inúmeros eventos já organizados pelo curso, sem deixar de refletir sobre questões filosóficas; queremos que o fruidor da Bloco(1) possa ter uma leitura agradável, acompanhada de imagens relevantes, sem sentir receio de registrar em suas páginas um croqui de uma idéia que não pode esperar para nascer. Como todo jovem, corremos o risco de não sermos levados a sério, mas também como todo jovem, temos disposição para tentar. Leandro Manenti Coordenador do Curso de Arquitetura e Urbanismo
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www.feevale.br/arquitetura
...a segunda parte é para ser lida no formato convencional
Le Corbusier: portabilidade e versatilidade do bloco de notas permitem o registro rápido da idéia, que extrapola o formato da folha horizontal. (CORBUSIER. Rio de Janeiro 1929 1936. Rio de Janeiro: C.A.U.R.J., 1999. 1 disco laser)
e reúne a produção intelectual de integrantes do corpo docente e discente da Feevale, além da colaboração de cinco arquitetos convidados: Andréa Soler Machado, César Wagner, Clovis Ilgenfritz da Silva, Tiago Holzmann da Silva e Vinicius Netto, cujos textos versam sobre suas respectivas palestras, ministradas em diferentes momentos da história do curso e estão organizados em ordem cronológica. Em seguida, novamente a prata da casa: as contribuições percorrem fragmentos de dissertações de mestrado, teses de doutorado, impressões de viagens, reflexões sobre questões históricas ou contemporâneas da arquitetura e do urbanismo.
131-Bloco(1)
Sumário
• Clovis Ilgenfritz da Silva
Bloco horizontal
Direito à Arquitetura ....................................................................134
Convidados • Tiago Holzmann da Silva Qualificar a cidade, democratizar a arquitetura .............................138 • Vinicius Netto Existe arquitetura além do edifício?..............................................144 • César Wagner O Privilégio da Solidão..................................................................156 • Andréa Soler Machado BH e Brasília, figuras e abstrações ................................................160
• Alexandra Staudt Follmann Baldauf Um panorama sobre os aspectos históricos da Coordenação Modular: dos gregos a Le Corbusier....................................................................180 • Ana Carolina Pellegrini O Vôo do Corvo .............................................................................194 • Eduardo Jaeger Não-lugares e Cidade Genérica: simbiose antropomórfica...............218 • Juliano Caldas de Vasconcellos Bases e construção do Sistema Dom-ino.........................................226 • Leandro Manenti Rio: Cidade Linear........................................................................242 • Luciana Néri Martins Um pouquinho da minha história na Espanha ...............................254 • Luciano A. Carvalho da Costa Arquitetura X Engenharia - Um reencontro conceitual ...................262 • Paula Ramos Caderno de Viagens ......................................................................266
Sumário Bloco horizontal Professores e Acadêmicos
Clovis Ilgenfritz da Silva
também, motivo de Moção na última Reunião Nacional do
Direito à Arquitetura
Conselho Superior do IAB – Instituto dos Arquitetos do Brasil, reunido em Porto Alegre em janeiro de 2005.
Honrado com o convite do Curso de Arquitetura e
Os Arquitetos brasileiros têm, historicamente, buscado
Urbanismo da Feevale através da Professora Arquiteta
contribuir com a nação no encaminhamento de propostas
Ana Carolina Pellegrini, participei, juntamente com o
que visem, através do seu trabalho, a buscar solução aos
Professor Arquiteto Albano Volkmer, da aula inaugural em
problemas que afligem a comunidade, em especial, nos
agosto de 2003.
aglomerados urbanos.
Foi para mim um evento muito importante que me
Entre as lutas dos Arquitetos e suas entidades
proporcionou o retorno à sala de aula.
representativas, destaca-se a necessidade de garantir
Discorremos e debatemos com uma qualificada platéia
o direito à arquitetura, aos amplos setores carentes
de estudantes e professores vários aspectos referentes
de recursos econômicos, para obter os serviços de
ao exercício da arquitetura, o cenário onde ela é
arquitetura e urbanismo que necessitam.
exercida, assim como os condicionantes (dificuldades) para o arquiteto-urbanista atuar, e, da mesma forma,
Seria desnecessário afirmar os aspectos econômico-
a realidade social brasileira que, pela má distribuição
sociais que dividem a sociedade brasileira entre incluídos
de renda, impossibilita às pessoas o uso do trabalho
e excluídos, num processo de profunda segregação social,
profissional do arquiteto.
em especial, pelo fenômeno da urbanização havido nos últimos 50 anos.
Dentre os temas discutidos, me detive, em especial, no problema da Assistência Técnica às famílias de baixa renda, o que procurei resumir no presente artigo que foi,
Página anterior: Favela da Rocinha (Disponível em < http:// bolerio.com/images/Rocinha6.jpg> Acesso em 25 ago. 2005)
135-Bloco(1)
Clovis Ilgenfritz da Silva - Direito à Arquitetura
O modelo de desenvolvimento vigente no país tem
Neste aspecto, nós, Arquitetos, temos o dever pátrio
reflexos cada vez mais contundentes e perversos, do
de colaborar com a solução desta mazela da sociedade,
ponto de vista humano, para milhões de brasileiros
quer exigindo o direito à moradia às pessoas, quer dando
que sofrem a necessidade de projetos sociais nas áreas
nossa contribuição técnico-profissional a essa enorme
da saúde, educação, cultura, segurança, saneamento,
carência da sociedade brasileira.
habitação, entre outros. É nesse sentido que propomos a instituição da O governo, em suas várias instâncias federativas,
*assistência técnica gratuita ao projeto e construção da
tem buscado juntamente com as comunidades e
moradia às pessoas, hoje, com dificuldades de acesso a
corporações organizadas, soluções para as áreas mais
esse serviço.
carentes. Resultado desses esforços foi a criação de importantes projetos: na área da saúde, por exemplo, a
Trata-se de uma proposta amplamente discutida e aprovada
implementação do SUS – Serviço Único de Saúde é, sem
no âmbito profissional, junto às comunidades e do
dúvida, o mais importante das últimas décadas. Mesmo
conhecimento dos poderes Executivo e Legislativo da nação.
sem atingir seus objetivos de excelência, o que seria da saúde pública brasileira se não existisse o SUS?
Sua aplicação se dará tanto na assistência individual (pessoa ou família), como na coletiva, para atender
O mesmo poderia ser afirmado com relação à Assistência
parcela significativa dos 6,5 milhões de déficit
Judiciária gratuita, da Defensoria Pública, hoje, utilizada
habitacional, divulgados pelo Ministério das Cidades,
pelos setores mais carentes, na busca da justiça.
recentemente.
As soluções de projetos sociais nas áreas da saúde e
Com a instituição do programa de assistência técnica,
justiça, não têm sido as ideais, mas a busca da solução
aproximadamente 20% deste universo já poderá usufruir
desses problemas está em andamento.
deste direito por já possuírem o terreno. Assim como toda a comunidade carente de habitação também terá
Para o problema da habitação popular, entretanto,
acesso a esse benefício.
não existe, ainda, um instituto tal como os anteriores.
136-Bloco(1)
Clovis Ilgenfritz da Silva - Direito à Arquitetura
A instituição deste programa se dará pelo Governo
No momento da sua formatura, o arquiteto assumiu um
Federal em parceria com as Prefeituras e as entidades
compromisso social para com a sociedade, agora é o
representativas dos Arquitetos. Este instituto deve
momento de reafirmar este compromisso.
ser urgentemente implementado em seus detalhes já definidos quanto à participação do Poder Público, dos
Propomos, portanto, que o IAB – DN, assim como os
recursos e dos profissionais.
Sindicatos de Arquitetos e a Federação Nacional, assumam de imediato e objetivamente, a criação deste programa
Será de grande valia para a implementação dos projetos
junto ao Governo Federal e Municipalidades Brasileiras.
de financiamento do Governo Federal (Caixa Econômica Federal) nas áreas de interesse social.
O apoio da Comunidade Universitária será muito importante.
O Arquiteto-Urbanista, passará a ser assim como os profissionais da saúde e do judiciário, um agente
*Projeto de Lei Federal nº6223/02, encaminhado por mim
técnico-social para a moradia em condições dignas, e
enquanto Deputado Federal em 2002 e reencaminhado
colaborará na fiscalização de financiamentos ou recursos
pelo Deputado Federal Arquiteto Zezéu Ribeiro, de
subsidiados à habitação, e na organização (hoje caótica)
nº889/03, na atual Legislatura.
dos aglomerados urbanos. Celebração das Cidades – Estatuto da Cidade Aula Inaugural do Curso de Arquitetura e Urbanismo Feevale ministrada juntamente com o Arq. José Albano Volkmer no dia 14 de agosto de 2003.
A universalização dos serviços de arquitetura e urbanismo servirá fundamentalmente para, além de atender às famílias carentes, criar mais um instrumento de promoção e inclusão social. Enquanto a saúde e a justiça são, espacialmente, invisíveis, a arquitetura é palpável e visível, e isto também é qualidade de vida, é a busca da saúde urbana.
Clovis Ilgenfritz da Silva é Arquiteto (UFRGS, 1965), sócio da ARQUIPLAN; foi presidente do Sindicato dos Arquitetos do Estado do Rio Grande do Sul (SAERGS), presidiu a Federação Nacional dos Arquitetos (FNA), foi vereador de Porto Alegre por 3 legislaturas, atuou como presidente da Câmara Municipal em 1997; foi secretário de Planejamento Municipal (1989), secretário estadual da Coordenação e Planejamento em 1999 e 2000; cumpriu mandato de deputado federal de 2001 a 2002. Atualmente é conselheiro da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (AGERGS).
137-Bloco(1)
138-Bloco(1)
Tiago Holzmann da Silva
processo democrático para a escolha da proposta técnica
Qualificar a cidade, democratizar a arquitetura
mais qualificada. Este processo garante ao Promotor a transparência desejada para os seus atos, assim como
O que há em comum entre a Ópera de Sidnei, o novo
oferece o melhor projeto para a cidade.
Parlamento Alemão em Berlim, a Pirâmide do Louvre ou o Arco de La Defense em Paris? O que há em comum entre
Os exemplos de outros grandes projetos selecionados
o Estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro, e o Teatro
por Concurso Público poderiam facilmente encher uma
Castro Alves, em Salvador? E o Plano Diretor de Brasília,
página, e os encontramos em quantidade nos livros de
que não é uma obra de arquitetura, também tem algo em
história e periódicos especializados. Promovidos tanto
comum com estes edifícios?
pela administração pública como por empresas privadas e instituições do terceiro setor, os Concursos Públicos de
Sim, a qualidade. Todos são ótimas soluções que
Arquitetura têm-se consagrado, ao longo dos anos, como
qualificam o espaço e as atividades que abrigam. Todos
a forma mais democrática e transparente de seleção de
são obras emblemáticas do milênio passado, dotadas
equipes técnicas para o desenvolvimento de projetos.
de alto conteúdo simbólico e referencial. Todos nos
Os Concursos têm contribuído de forma incontestável na
revelaram o talento de jovens arquitetos ou confirmaram
qualificação da estética urbana através da introdução de
a grande competência de nomes já consagrados.
conceitos inovadores nas edificações e no espaço urbano. A cidade e a comunidade são os maiores beneficiários do
Além da qualidade inegável destes grandes projetos,
processo de um Concurso Público. O Concurso proporciona
entretanto, há algo mais que os identifica: todos foram
ao Promotor (prefeituras, universidades, empresas públicas
selecionados através de Concursos Públicos de Arquitetura.
e privadas) uma grande oferta de soluções para um mesmo problema, muitas vezes superando a expectativa inicial.
O Concurso Público de Arquitetura é uma modalidade
Além disso, por ser um processo aberto e público, facilita o
de escolha para a contratação de projetos para obras
acompanhamento da comunidade além de sua divulgação
de Arquitetura, Urbanismo, Paisagismo e áreas afins.
contar com boa receptividade na mídia geral e especializada.
O objetivo principal do Concurso Público é garantir a construção de espaços de qualidade, através de um
Página anterior: foto-montagem acervo IAB/RS
139-Bloco(1)
Imagem cedida pelo IAB-RS
Tiago Holzmann da Silva - Qualificar a cidade, democratizar a arquitetura
A contratação de projetos para obras de Arquitetura,
seu artigo 22, o concurso como uma das modalidades
Urbanismo e Paisagismo através de Concurso Público
de licitação. O artigo 13 determina que “os contratos
tem como principal ponto positivo a transparência
para a prestação de serviços técnicos profissionais
do processo, a qual incentiva a fiscalização e o
especializados deverão, preferencialmente, ser celebrados
acompanhamento pela população e pela mídia. A
mediante a realização de concurso”.
participação é aberta a todos os arquitetos habilitados, julgados por uma comissão externa reconhecidamente
A promoção de Concursos Públicos tem sido,
competente, baseada em critérios eminentemente
historicamente, uma das principais bandeiras de luta
qualitativos. Por ser sigiloso, permite o acesso dos
dos arquitetos brasileiros. O Instituto de Arquitetos
profissionais mais jovens a grandes contratos, facultando
do Brasil (IAB), entidade representante da União
o mercado a profissionais competentes muitas vezes
Internacional de Arquitetos (UIA) no Brasil, possui
ainda desconhecidos.
atuação intensa na promoção e organização de seleções desta natureza. O IAB conta com competência
Os Concursos Públicos também são oportunidades
reconhecida pelo Poder Público como instituição
importantes na divulgação e discussão de conceitos
comprovadamente habilitada e idônea para a atividade
inovadores, introdução de tecnologias construtivas
de organização e gerência de Concursos Públicos de
avançadas e na qualidade da estética arquitetônica
Arquitetura e Urbanismo, não só pela quantidade de
e urbana, além de permitirem a abertura do mercado
Concursos organizados ao longo de sua história, mas
de trabalho de qualidade a um número cada vez
também, pela grande receptividade dos mesmos.
maior de arquitetos. A Praça da Matriz, em Porto Alegre, agrupa o conjunto No Brasil, a Constituição Federal determina, no seu
mais relevante das obras selecionadas por Concurso
artigo 37, inciso XXI, que, entre outros, os serviços
Público no Rio Grande do Sul: o Palácio da Justiça,
técnicos sejam contratados mediante processo de
a Assembléia Legislativa e agora o Anexo do Theatro
licitação pública, que são regulamentados pela Lei
São Pedro, concurso realizado em 1997 e com obra em
Nº 8.666/93 , que institui as normas para licitações
andamento.
e contratos da Administração Pública, definindo, em
142-Bloco(1)
Tiago Holzmann da Silva - Qualificar a cidade, democratizar a arquitetura
Nos últimos anos, o IAB/RS promoveu mais de 15
desenvolvimento da plataforma de trabalho SGC, Sistema
concursos, todos de caráter nacional. Em 2000, o IAB/RS
de Gestão de Concursos, para gerenciar o processo
promoveu o concurso para o Anexo do Solar Conde de
dos concursos pela Internet, a qual permite agilizar
Porto Alegre, atual sede da entidade. Recentemente tem
e qualificar os concursos ampliando sua abrangência,
realizado um grande esforço na promoção, divulgação e
reforçando o rigor nos procedimentos e rotinas de
organização dos concursos. Em 2003, foram realizados
gerenciamento, garantindo transparência, sigilo e ampla
os concursos para a Sede do Diretório Estadual do
divulgação, e permitindo o acompanhamento on line dos
PMDB, Reabilitação do Antigo Mercado Público de
que estão em andamento.
Itaqui, Complexo de Desporto e Lazer da Unisinos e Sede da FAPERGS; em 2004, para a Sede da Procuradoria
Os Concursos Públicos de Arquitetura são
Regional da República da 4ª Região, com mais de 100
inquestionavelmente mais DEMOCRÁTICOS, mais
projetos entregues, além do concurso para a Valorização
transparentes, mais participativos do que as tradicionais
da Paisagem Urbana de Santa Tereza. Neste ano de
contratações diretas ou licitações por menor preço.
2005, além de diversas oportunidades e concursos em
Os Concursos Públicos de Arquitetura são a garantia de
negociação, o IAB/RS já promoveu o Concurso Público
construção de espaços de QUALIDADE para a cidade.
para um Shopping Center na Universidade do Vale do Rio
Quem não quer arriscar faz concurso.
dos Sinos, em São Leopoldo. O Concurso Público de Arquitetura e Urbanismo como oportunidade para o jovem arquiteto. Aula Inaugural do Curso de Arquitetura e Urbanismo Feevale ministrada juntamente com Espaço Sideral Arquitetura Atômica no dia 23 de março de 2004.
Há, neste momento, vários Concursos Públicos de Arquitetura em andamento organizados por departamentos do IAB de outros estados. As informações a respeito destes e de outros concursos já realizados podem ser encontradas na página do IAB/
Tiago Holzmann da Silva é Arquiteto e Urbanista (UFRGS, 1993), Mestre em Arquitetura (UPC, 1996), 2º Vice-presidente do IAB/RS, professor titular do UniRitter e sócio da 3C Arquitetura e Urbanismo.
RS e no Portal Vitruvius . O IAB/RS tem-se destacado na qualificação da organização de concursos. A principal novidade é o
143-Bloco(1)
Vinicius Netto
moldá-la. A arquitetura é manifestação de uma vida
Existe arquitetura além do edifício?
social, de um viver em sociedade – é parte crucial de um ‘moldar o mundo’ para que as pessoas possam viver
O que pensamos que é arquitetura?
nele – juntas, cooperando, produzindo, interagindo.
Como arquiteto ou arquiteta, seremos aqueles profissionais que resolverão problemas de forma e função
Deixe-me tentar explicar como isso acontece. Uma
– mas será isso tudo o que nós faremos?
das perguntas que todo arquiteto e arquiteta se
Existe algo no fazer arquitetura além do ordenar
fazem, algo que sempre sentimos, mas quase nunca
estruturas, resolver plantas, solucionar um programa,
conseguimos explicar: a arquitetura influencia a
compor bem, chegar a volumetrias interessantes?
vida das pessoas? E a agregação de arquiteturas – o
Será que nosso fazer arquitetura se restringe à solução
espaço, a cidade – influencia a vida das pessoas?
dos problemas de forma e função? Entender se e como a arquitetura influencia a vida Essas perguntas nos levam a outras, talvez mais amplas...
das pessoas é um dos temas que proponho para
Será que meus gestos como arquiteto vão ter maiores
esta discussão. Entender a arquitetura como parte
conseqüências que o edifício pronto em si?
de uma cultura, de uma realidade social, tem sido
Será que meus gestos fazem parte de algo maior?
um desafio. Como arquitetos, nossa atuação se dá
Existe ‘algo mais’ na arquitetura?
sobre edificações – mas um tanto de forma isolada.
Existe na arquitetura algo que vai além do edifício?
Nos ocupamos principalmente do edifício. Mas como enxergar uma edificação em suas relações com o que
Existe sim algo mais... mais que o formal, que o
há em volta? Como ver que a arquitetura é parte de
visível; mais que o funcional.... Existe algo que a
algo maior, que não se encerra no próprio edifício ou
arquitetura expressa. A arquitetura não se encerra em si. Ela não existe independente do resto, do que acontece em volta, do mundo. Eu vou argumentar aqui que a arquitetura expressa uma forma de vida. Ela é manifestação dessa forma de vida. Ela ajuda a
Página anterior - vendo o invisível: câmeras registram o movimento pedestre e o uso estático de um espaço em Londres (Victoria Station). A forma da arquitetura, de suas justaposições, vai definindo caminhos onde pessoas tendem a circular e apropriar-se. (fonte: Space Syntax Laboratory)
145-Bloco(1)
Vinicius Netto - Existe arquitetura além do edifício?
projeto? Só parte dessas relações da arquitetura com
fisicamente em volta, ou com novas formas de ‘espaço’.
o ‘mundo’ é visível o tempo todo: a morfológica (a
Ela é parte fundamental do que não podemos ver... Falo
continuidade do espaço urbano). Há uma outra parte
em ‘ver’, em ‘visível’ porque pensamos que o que mais
‘invisível’ da arquitetura que ‘veremos’ em seguida.
importa em arquitetura é o que podemos ver; que ela só existe no ‘reino do visível’, só existe como algo que
Primeiro, como ‘enxergar’ as relações morfológicas da
pode ser visto e tocado, que apela sobretudo ao olho
arquitetura com seu entorno? Como conseguir enxergar
e ao sentido, que ela nos serve de proteção porque é
o edifício, como parte do que está fisicamente em volta?
‘tangível’, durável. Mas a arquitetura influi, e é resultado,
Por incrível que pareça, essas relações têm sido difíceis
de coisas que vão bem além do visível.
de entender... Ver a arquitetura e o espaço em volta como algo contínuo – um contínuo arquitetônico-urbano, e
Isso parece estranho. O que poderia ser esse ‘invisível
que não acaba na cidade mas que leva à região, a outras
da arquitetura’? Como a arquitetura poderia ter algo a
cidades, países – e mesmo a outros tipos de espaço
ver com o que é ‘invisível’ em primeiro lugar? Argumento
(chamados ‘virtuais’, como a Internet)... Como conectar
que o invisível da arquitetura é exatamente o mais
o espaço do nosso cotidiano, do nosso encontro, com o
importante, aquilo que envolve e produz arquitetura,
que acontece em espaços virtuais? Como ver edifícios
aquilo ao que a arquitetura serve e reproduz antes de
como parte desses fluxos eletrônicos, dessas trocas que
tudo, e o faz através de nós, arquitetos, mesmo que
são ‘transpaciais’, isto é, rompem com o espaço, com
não saibamos disso. Esse invisível da arquitetura é
a distância, para conectar lugares e pessoas, às vezes
exatamente o social, o cultural que produzem e precisam
tão longe, e em uma fração de segundo? Entender essa
da arquitetura (e do arquiteto e arquiteta). Claro, essas
continuidade de espaços nas nossas práticas (o real,
dimensões não são completamente ‘invisíveis’. Vemos
arquitetônico-urbano, e os virtuais, eletrônicos) tem sido
o que as pessoas fazem no edifício; projetamos para
um tremendo desafio.
que as pessoas façam coisas da maneira mais ‘prática’ possível, mais ‘fluida’; projetamos para que as pessoas
Mas deixe-me concentrar na segunda dimensão, ainda
se movimentem no edifício encontrando as ‘funções’
mais improvável: A arquitetura (o fazer arquitetura, e
adequadas, as áreas funcionais e as pessoas ‘certas’...
o edifício) não tem somente relações com o que está
146-Bloco(1)
Vinicius Netto - Existe arquitetura além do edifício?
Mas grande parte do que as pessoas fazem no edifício
serem contemplados pela arquiteta quando ela projeta
se relaciona com o que acontece fora dele. Não só
o edifício. Mas eles estão lá, o tempo todo.
pessoas vêm de outros lugares dentro e fora da cidade e ficam naquele espaço por tempo limitado (dia ou noite).
Vamos continuar explorando o espaço como
As pessoas também se comunicam com o que existe
manifestação de uma forma de vida, da necessidade
fora, com pessoas fora daquele espaço. O que elas
de viver em sociedade (então do espaço como forma
fazem (seja produto material seja informação, imagens,
de vida em si)... Mas será que o espaço é apenas um
idéias...) ‘vai’ para o exterior. O que acontece dentro
‘receptor’? Será que ele não gera nada, é apenas um
da arquitetura, o que é tornado parte da arquitetura (e
fim, uma projeção? O espaço recebe ‘vida’, mas não
dá sentido para ela) é ligado com o que acontece em
devolve nada para ela, para a vida social?
outras arquiteturas, outros edifícios – naquela cidade e em outras cidades... A arquitetura também é conectada
Não. Como forma de vida, como manifestação das nossas
a espaços novos, esses sim invisíveis, os espaços
atividades, de um processo social, o espaço não poderia
virtuais, espaços de comunicação como as palavras
se encerrar em si, ser um fim em si mesmo – o espaço
trocadas através de aparelhos e transmitidas por ondas,
não poderia ser um mero depósito de coisas sociais,
ou os textos e imagens, números e investimentos,
de funções, de atribuições. Senão o espaço, como diria
ligando lugares por fluxos eletrônicos. Essas relações
Foucault, seria ‘morto, estéril, não-dialético’. Mas o
do que as pessoas fazem dentro do edifício com o que
espaço, a arquitetura, as cidades estão muito longe
ocorre fora, o espaço que o edifício ocupa na vida das
de serem mortos, meros cenários, cascas para a vida
pessoas, as razões que o trouxeram a existir, que o
humana, para nossas experiências, nossas interações,
fazem ser utilizado são exatamente suas relações com
nossos encontros no espaço.
os contextos. São os contextos sociais que produzem arquitetura, que produzem espaço em primeiro lugar
A arquitetura, seu ‘espaço’, pulsa: ele molda, projeta,
– as razões para haver arquitetura, para que nós
define lugares e formas de encontro e interação. O espaço
façamos arquitetura... Esses fluxos, esse movimento do
arquitetônico-urbano (sim, devemos quebrar a distinção
que as pessoas fazem dentro do edifício com o mundo
entre ‘arquitetônico’ e ‘urbano’ e ver um espaço contínuo,
fora dele são difíceis de serem ‘vistos’, e difíceis de
arquitetônico-urbano, da sala e porta para corredores
147-Bloco(1)
Vinicius Netto - Existe arquitetura além do edifício?
e ruas e regiões...), esse espaço começa por instalar
intenções naquele momento. O espaço estrutura minha
uma situação social, um evento em nossa experiência.
ação, minhas atividades, rotina; minha comunicação
Quando cruzamos uma porta e entramos em um novo
com outros, minhas conexões com o mundo. O espaço
espaço, ali um novo ‘código’ se instala: ali inicia uma
da arquitetura, da cidade e da ligação entre cidades
nova atividade, com regras próprias, seu comportamento
estrutura as trocas dentro de uma sociedade. Isto é, ao
próprio. Não poderíamos cantar ou dançar dentro de
acessar espaços para minha ação, eu o faço entendendo
um banco; em uma faculdade de arquitetura, estamos
seus significados, entendendo que esses significados do
supostos a falar de arquitetura... A arquitetura ajuda a
espaço são os mesmos das ações que ocorrem dentro dele,
instalar regras de comportamento social – a arquitetura
das ações que me interessam naquele momento, ações
‘informa’ as pessoas o tempo todo do que fazer – como
das quais quero fazer parte. Em suma: o espaço estrutura
agir, com quem falar, o que é esperado de mim em um
minhas ações, e as ações e interações em uma sociedade. E
certo lugar ou situação... O próprio local – o edifício, o
o faz porque os significados que produzimos no espaço são
espaço aberto – sugere formas de conversa, delimita o
aqueles que produzimos quando fazemos, quando falamos,
escopo da comunicação.
quando nos comunicamos dentro de espaços – e vice-versa. Não há separação entre ‘ação’ e ‘espaço’: produzimos ações
Espaços são realmente ‘comunicativos’. Eles ‘falam’ – eles
e interações através dos significados que produzimos no
nos ‘falam’, nos informam sobre a natureza do que se
espaço, e como espaço: os significados das práticas sociais
fala! Na arquitetura, na sua definição semiótica (na sua
para as quais produzimos, como arquitetos, espaços. Há
tipologia, na sua forma) estão também sugeridos a forma
uma constante, múltipla, mútua referência entre espaço
da comunicação em si. Mais que isso: eu relaciono minha
e ação social: nossas ações se referem a espaços para se
ação com a de outras pessoas através do espaço: isto é,
referirem a outras (tantas) ações...
eu sei que posso me comunicar, interagir, coordenar minha ação com outras pessoas porque eu endereço seus espaços,
Então, como a arquitetura pode ser um fim em si mesma?
vou até eles. Nesses espaços, ‘me conecto’ com atividades,
Como ela poderia ficar de fora da vida das pessoas, da
pessoas, processos. Eu me valho dos significados que ‘vejo’
maneira como elas interagem, trabalham, da maneira
no espaço para orientar minha própria ação, para buscar
como a vida social é moldada, da forma como uma
pessoas para interagir comigo de acordo com minhas
sociedade se reproduz?
148-Bloco(1)
Vinicius Netto - Existe arquitetura além do edifício?
E mais que isso ainda. A arquitetura e a cidade (suas estruturas espaciais – suas paredes, a configuração de suas ruas, de acessos) ‘moldam’ aonde as pessoas vão se encontrar sem querer no espaço. Isto é: a influência do espaço vai além da definição do que se faz ou se fala ou como se interage... A arquitetura e a cidade vão ajudar a definir onde, com quem se fala, se encontra... Certas ruas vão ser mais movimentadas que outras; uma peça na casa ou edifício será adotada para nossa permanência, ação, conversa. Mas como isso pode acontecer? Proponho que comecemos a ‘ver o invisível’... Os arquitetos têm produzido espaços (desenhado esses edifícios, projetado essas ruas) por séculos sem se darem conta de que, de fato, certas estruturas de espaço vão ‘colocar as pessoas junto’ mais que outros... Ou melhor, os arquitetos têm produzido isso freqüentemente se dando conta disso sim: eles desejam que certos espaços sejam mais ‘sociais’, mais utilizados que outros. Mas nem sempre acertam: às vezes a sala fica mais vazia que a cozinha em uma casa; ruas que foram projetadas para ter comércio têm lojas falindo, e locais esvaziam-se, ou nunca atingem
(Foto: Ana Carolina Pellegrini)
a densidade esperada (como certas áreas em Brasília). Nossos encontros no espaço não são totalmente casuais. Do universo de encontros possíveis, alguns são sugeridos,
149-Bloco(1)
Vinicius Netto - Existe arquitetura além do edifício?
Fig. 2 - Arquitetos, por não conhecerem certas formas de uso do espaço (como princípios de visibilidade, menores caminhos e articulação de espaços) cometem freqüentemente erros. Os diretores da Tate Gallery em Londres não entendiam o porquê de certas salas serem tão desertas (veja figura esquerda, incluindo a famosa extensão de Stirling (o trecho de geometria mais contemporânea, à direita da planta). A resposta aparece na invisível estrutura topológica da planta, evidenciada à direita, com variação das faixas de visibilidade. [fonte Space Syntax Laboratory].
a acontecer. Isso é outra coisa que nós, arquitetos, não estamos acostumados a pensar. A arquitetura pode ser usada para moldar a maneira das pessoas viverem. O historiador Michel Foucault observou isso em um livro: melhor que qualquer outro arquiteto, ele nos disse que a separação funcional de ambientes na casa atendia uma necessidade de ‘moralizar’ comportamentos. “...a casa, até o século XVIII, [continua] sendo um espaço indiferenciado. Existem peças: nelas se dorme, se come, se recebe, pouco importa. Depois, pouco a pouco, o espaço se especifica e torna-se funcional...”
150-Bloco(1)
Vinicius Netto - Existe arquitetura além do edifício?
moldados pelo próprio espaço. Imagine: encontrei um amigo em tal lugar... Terá sido aquilo coincidência? Só até certo ponto. Entre questões como interesses em comum, condições sociais em comum, e bem além de questões ‘místicas’ como “era o nosso destino”, o espaço, a estrutura das nossas cidades responde largamente por essas ‘coincidências’. Ao nos encontrarmos em certa rua – ali está o espaço moldando nosso encontro de outra maneira ‘randômico’, imprevisível. Ao ir a um certo bar e conhecer alguém que mudará nossas vidas, ali está o espaço: aquele bar está em uma certa rua bastante acessível, conhecida (e conhecida por ser acessível
(Foto: Ana Carolina Pellegrini)
para muitas pessoas, ou as pessoas daquele ‘tipo’, classe, campo social). A estrutura do espaço responde pela posição daquele bar; responde pela maneira como eu conheci aquele lugar, decidi ir ali naquele dia, e encontrei a pessoa que, simplesmente por conhecêla, alterou um pouco do meu futuro. Mas é claro: essa estrutura influencia: ela não define um futuro, não define exatamente quem encontramos ou o que as pessoas dizem – ela só ‘concentra probabilidades’... Então esse ‘poder’ da arquitetura (e por conseqüência, da cidade) de influenciar, moldar, sugerir (até certo ponto) o rumo das coisas, dos nossos encontros e de nossa comunicação poderia ser usado para ‘forçar’ coisas
151-Bloco(1)
Vinicius Netto - Existe arquitetura além do edifício?
Fig. 3 - A mesma estrutura invisível que subjaz o edifício é achada na justaposição de edifícios – na produção das cidades. A estrutura das ruas distribui pessoas e encontros no espaço de maneira não completamente randômica: há concentrações e padrões de espaços que concentram padrões de encontro – e de interação potencial. Os mapas axiais à direita mostram as ruas onde homens, mulheres e crianças tendem a concentrar-se em função de suas diferentes maneiras de apropriação do espaço e interesses de atividades. [fonte Space Syntax Laboratory].
152-Bloco(1)
Vinicius Netto - Existe arquitetura além do edifício?
Um exemplo vai ser a cidade operária dos anos 18301870 na Europa: “A família operária será fixada; será prescrito para ela um tipo de moralidade, através da determinação de seu espaço de vida, com uma peça que serve como cozinha e sala de jantar, o quarto dos pais (que é o lugar da procriação) e o quarto das crianças...” Por que nós, arquitetos, não temos feito observações assim? Por que não temos tido essa atenção com a implicação cultural da arquitetura? “Seria preciso fazer uma ‘história dos espaços’ – que seria ao mesmo tempo uma ‘história dos poderes’ – que estudasse desde as grandes estratégias da geopolítica até
Fig. 4 - A densidade dos quarteirões com arquiteturas de fachadas alinhadas e térreos comerciais concentra o movimento pedestre nos passeios, algo que os princípios modernistas que influenciam nossos planos diretores renuncia e reverte (figura acima), dispersando o encontro, anulando usos públicos dos térreos, criando o edifício-objeto, algo passível de ser visto como independente em si mesmo, independente do entorno. (Foto de Berlin c.1930 fonte anônima).
pequenas táticas do habitat, da arquitetura institucional, da sala de aula ou da organização hospitalar, passando pelas implantações político-econômicas...” Eu ousaria responder a minha própria pergunta: porque nós, arquitetos, estamos envolvidos demais (cegos demais?) tentando resolver problemas de função, resolvendo plantas e formas, obcecados pelo visual, escravos do visível – agentes da mera eficiência econômica. Não sabemos que somos de fato agentes culturais – que produzimos e reproduzimos estruturas que vão bem além do visível, das paredes, dos pilares.
153-Bloco(1)
Vinicius Netto - Existe arquitetura além do edifício?
Reproduzimos formas de vida. Obcecados pela forma e pelo estético, esquecemos que o fim da arquitetura, seu fim mais nobre sem dúvida, é o social – a arquitetura serve as pessoas; o arquiteto serve as pessoas. Mas não serve cegamente; não é mera subserviência. Cegados pela idéia de função e eficiência e pela Esquema PPDUA. (fonte: Arq. Julio Vargas)
necessidade de sobrevivência, nos tornamos ‘pragmáticos’, agentes da ‘racionalidade estratégica’ (como diria Habermas); esquecemos que o social é maior que o funcional. Que a arquitetura molda a maneira como pessoas se encontram, está ativa no que dizem, e que o que acontece no espaço arquitetônico não se encerra ali: as ações e coisas que ali se fazem se conectam a muitas outras pessoas e outros espaços (reais e virtuais), em teias quase infinitas. Projetando arquitetura (ou fazendo arquitetura sem pensar...), temos nos desconectado do resto – desconectamos a arquitetura do resto do mundo – da vida. Isso é aparente não só na atuação do profissional no mercado: também é aparente na produção acadêmica, intelectual: abundam dissertações e teses sobre a arquitetura de tal período ou tal arquiteto – e
154-Bloco(1)
Vinicius Netto - Existe arquitetura além do edifício?
raramente se evidenciam os papéis da arquitetura na reprodução do que acontece naquele período. Um dos grandes problemas da nossa atuação é esse discurso egocêntrico, um tanto egoísta, mesmo autofágico: temos girado em torno do nosso próprio umbigo. Não sabemos conversar com o sociólogo, o jornalista, o geógrafo... Nos tornamos meros resolvedores de plantas e de formas (belas ou não). Mais do que ao funcional e ao visual, servimos ao social, à apropriação do espaço, à vitalidade da interação. Ao projetar, pensemos em espaços vivos, fluidos,
(Foto: Ana Carolina Pellegrini)
integradores, que concentrem o encontro; renunciemos as arquiteturas fechadas, segregadoras; estimulemos a comunicação através do espaço. Existe Arquitetura Além do Edifício? Palestra ministrada no Sabadarq do dia 11 de dezembro de 2004. Vinicius Netto é Arquiteto e Urbanista (UFRGS, 1997), Mestre em Planejamento Urbano e Regional (PROPUR – UFRGS, 1999), PhD em Advanced Architectural Studies pela University College London (UCL), 2005. Atualmente é professor da Unisinos (Projeto Urbanistico) e da UNISC (Projeto e Teoria da Arquitetura). Estuda as formas de integração entre arquitetura e urbanismo e as relações entre o espacial e o social em várias escalas.
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César Wagner O Privilégio da Solidão “Toda a verdadeira sabedoria deve ser encontrada longe da moradia do homem, na grande solidão, e somente será alcançada através do sofrimento. O sofrimento e a privação são as únicas coisas que podem abrir a mente àquilo que está escondido dos homens.” Igjugarjuk, um Caribou Esquimó, 1922 O que Truman mais queria na vida era largar tudo e escapar de mala e cuia para Fiji. Entretanto, o ideal da ilha paradisíaca, perdida no meio do Pacífico com suas praias de areias brancas, águas cristalinas e exuberantes palmeiras não era o principal motivo de tal escolha. Fiji, que também poderia ser uma duna no meio do deserto do Sahara ou uma cratera na Lua, representava o extremo oposto à sua artificial “Pleasant Ville”. Era o imaginário de um lugar intocado pelo ser humano e imperfeito por natureza.
Disponível em http://www.theatlantic.com/unbound/ graffiti/images/trupic1.jpg
Quando imaginamos tal lugar, as imagens que nos vêm à mente são de terras distantes e natureza exuberante (seria a Nova Zelândia do Senhor dos Anéis?), o que cria um contraste ainda maior com a nossa permanente experiência urbana. Sabendo disso, diariamente somos bombardeados por propagandas e anúncios
Página anterior: Praia de Karekare (foto do autor).
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César Wagner - O Privilégio da Solidão
publicitários, nos quais o ideal da “grande solidão”, do lugar remoto e isolado - somente seu - é oferecido e vendido como principal atrativo. A grande ironia está no fato de que, quando tal adjetivo é usado, significa que o lugar em questão pode ser alcançado por tudo e todos, perdendo, por assim dizer, o seu principal atrativo. O pronunciamento do esquimó, se verdadeiro, sugeriria também que qualquer coisa feita pelo homem tornaria o ideal da “grande solidão” impossível de ser obtido. Hoje, este tipo de isolamento é um privilégio disponível somente ao intrépido e, na sua grande (Foto: Ana Carolina Pellegrini)
maioria, abastado viajante. Se pensarmos que os lugares para estarmos sozinhos são importantes nas nossas cidades, como criá-los? O debate sobre as questões urbanas é baseado em assuntos da esfera pública - ruas, quadras, calçadões, praças e avenidas – e pertence à tradição das nossas cidades desde a Idade Média, passando pela Renascença até as novas cidades dos anos 50 e 60. Tais questões pressupõem lugares que atraiam grande número de pessoas. A famosa imagem Renacentista da Cidade Ideal apresenta uma composição solene, um lugar e uma proporção que, na minha opinião, aparenta ser completamente plástica e certamente nada “ideal”. Tem a qualidade asséptica de uma Suíça - alta qualidade de vida, mas sem vida. Lou Reed já
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César Wagner - O Privilégio da Solidão
dizia: “Não tenho medo de viver em Nova Iorque; tenho medo de não viver na Suécia.” Estaríamos erroneamente em busca do nosso Perfect Day? Muitos dos desenhos de Leon Krier descrevem tais espaços, que sugerem um tipo de comportamento pensado como sendo o melhor para você. É uma prescrição para a saúde, mas um tipo de saúde “artificial” que pertence a uma visão romântica da história. Lugares para a meditação, para a contemplação, para a solidão e o acaso, deveriam fazer parte da lista de prioridades de todo programa urbano. Nossas cidades
(Foto: Ana Carolina Pellegrini)
deveriam ser equipadas com espaços e artefatos que incentivassem os mais diferentes e possíveis tipos de comportamento. Onde o intelectual triunfasse sobre o material e o abstrato sobre o corpóreo. De fato, nós sofremos de uma falta terrível de lugares para sentar e, construtivamente, não se fazer nada.
Na viagem do arquiteto Aula Inaugural ministrada do Curso de Arquitetura e Urbanismo Feevale no dia 28 de fevereiro de 2005. César Wagner é Arquiteto e Urbanista (UFRGS, 1993), Mestre em Habitação e Urbanismo pela Architectural Association em Londres. Foi aluno de Miguel Angel Roca na Universidade de Buenos Aires e professor do departamento de urbanismo da FAUFRGS, tendo, nos últimos 10 anos, colaborado com escritórios de arquitetura no Brasil, Argentina, Holanda, Inglaterra e Nova Zelândia. Atualmente é professor no Institute of Technology - UNITEC em Auckland, Nova Zelândia, onde também desenvolve pesquisas nas áreas de habitação e urbanismo junto ao HRG - Housing Research Group.
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Andréa Soler Machado BH e Brasília, figuras e abstrações Este artigo nasceu de uma palestra que pretendeu mostrar um pouco da arquitetura de Belo Horizonte e de Brasília aos estudantes viajantes da Feevale. A viagem surge como mote e é metáfora na estrutura do texto. Os ares de depoimento demonstram vínculos e proximidades com partes desta história. O título expõe o eixo de ligação entre Belo Horizonte e Brasília, fio condutor de um pensamento que procura especular a respeito do contraste entre o espaço figurativo da primeira e abstrato da segunda. O roteiro sugere também o movimento de idéias produzido em Oscar Niemeyer, de 1940 a 1960, desde a inserção da moderna Pampulha no patrimônio histórico mineiro, até os Palácios envidraçados da nova capital
(Foto: Ana Carolina Pellegrini)
brasileira, construída a partir do projeto de Lúcio Costa, no coração desértico do cerrado brasileiro; Um vôo de volta à Belo Horizonte dos anos 198090, apresenta Éolo Maia e seus parceiros que marcam época ao produzirem arquiteturas que ora seguem e ora subvertem o estilo moderno e os preceitos urbanos instaurados por Brasília. Obras e projetos muito distintos
Página anterior: Foto de satélite de Brasília (Disponível em < http: //www.digitalglobe.com/gallery/anniversary/brasilia_bird_overview_col050202_dg.jpg> Acesso em 18 dez. 2002). Croquis da Pampulha por Oscar Niemeyer. (BRUAND, 1981)
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Andréa Soler Machado - BH e Brasília, figuras e abstrações
entre si, mas que têm em comum a pluralidade de
arquitetônicas garantem a permanência da cidade como
referências, internas e externas à disciplina, traço mais
objeto histórico vivo e mutante, que se renova em
característico da crítica à vertente funcionalista e
função do bem estar social.
purista da vanguarda moderna. O eixo principal da teoria de Aldo Rossi sobre a cidade 1. Figuras e abstrações: arquiteturas do tempo
gira em torno do processo dialético de transformação e permanência e apóia-se em certas analogias possíveis
Pensar conjuntamente Belo Horizonte e Brasília sugere
entre a cidade e as contribuições semiológicas de Saussure
muitas coisas. Cidades tão encantadoras e importantes
à lingüística. Rossi propõe duas grandes categorias,
se oferecem ao olhar por infinitos ângulos, reais e
através das quais a estrutura da cidade se organiza:
imaginários. O que mais me interessa é pensar a
os elementos primários ou permanências – em geral
cidade como uma segunda natureza construída e
monumentos, pontos fixos da dinâmica urbana, signos
modelada pela civilização, uma grande e magnífica
da vontade coletiva expressos através dos princípios
arquitetura do tempo, este grande arquiteto e escultor
da arquitetura –, em contraste com a transitória,
dos espaços humanos.
circunstancial e repetitiva arquitetura tipológica que conforma a zona residencial, a maior parte da superfície
De acordo com Raquel Rolnik, a cidade é um registro
urbana e a que mais se transforma.
análogo a uma escrita, materialização de sua própria história, inscrita entre a transformação e a permanência
Enquanto as permanências estão associadas à tradição
de seus elementos e dos processos históricos que
e memória de um lugar, as transformações indicam a
a modificam. Como um organismo vivo, cresce em
chegada do novo como complemento. É, porém, através
extensão e sobre si mesma, transformando-se ao longo
da interpretação veiculada por planos e projetos que
do tempo, mas muitos elementos da sua estrutura
os elementos permanentes se tornam monumentos,
original permanecem como pontos relativamente fixos
marcos de memória ligados à identidade da forma
durante o seu desenvolvimento, atribuindo-lhe uma
urbana, cumprindo o importante papel de propulsores do
identidade. Paradoxalmente, determinadas intervenções
processo dinâmico da cidade.
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Andréa Soler Machado - BH e Brasília, figuras e abstrações
Mais que suporte da vida, a arquitetura da cidade conduz
Contemporaine para três milhões de habitantes, de 1922,
os processos de formação identitária e impõe-se como a
ou na Ville Radieuse, de 1935, a segunda cidade da era
mais evidente representação simbólica de uma sociedade,
da máquina, a matriz figurativa de cidade cede lugar à
cuja história descreve um movimento em torno das
matriz urbana abstrata, tabuleiro geométrico de xadrez
permanências garantindo-lhe a durabilidade da matéria,
para o seu jogo arquitetônico.
no tempo e no espaço, simultaneamente. A cidade do solo liberado expressava não apenas a idéia No século XX, a arquitetura moderna desenvolve
de transformação do mundo através da arquitetura e
estratégias projetuais compatíveis com a era da máquina
do urbanismo, mas a criação de um novo mundo, no
e dá a luz a novas configurações urbanas que, se por
qual haveria liberdade para todos, cujo preço era a
um lado, procuram dar respostas positivas aos diversos
destruição das convenções da arquitetura urbana que,
problemas funcionais e ambientais que caracterizam a
tradicionalmente, haviam reforçado e dramatizado a
cidades desde o advento da industrialização, por outro,
distinção entre espaço público e privado.
representam certa ameaça a suas estruturas primárias, compostas pelas históricas permanências urbanas. Desta
Na cidade ideal moderna não haveria rua, nem
forma, sinalizam a passagem do paradigma figurativo,
praça, nem edifício honorífico. Nesta cidade com
representado aqui por BH, ao abstrato, proposto
cara de parque, não haveria mais a distinção entre
pela vanguarda européia moderna dos anos 1920 e
tecido e monumento. De moradia, de escritórios ou
concretizado nos anos 1950, na construção da nova
institucionais, os edifícios se pareceriam uns com os
capital brasileira.
outros. A variedade, ainda que mínima, seria o resultado de idiossincrasias do arquiteto ou de diferenças
Le Corbusier, o maior representante do urbanismo
programáticas que resultariam, naturalmente, em
moderno, considerava a cidade tradicional inapropriada
distinções construtivas. Independentes de seu sítio
para seus novos edifícios-máquina semelhantes a peças
e dos demais edifícios, nunca teriam que resolver os
de um jogo de dominó; e por isso, a sua epopéia urbana
incômodos problemas de articulação com seus vizinhos,
consistirá em subverter a ordem daquela, promovendo,
alinhamentos e, sobretudo, com a continuidade histórica,
como utopia, o avesso de uma tradição milenar. Na Ville
cuja única referência explícita são as folias dispostas
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Andréa Soler Machado - BH e Brasília, figuras e abstrações
nos jardins românticos da Inglaterra do século XVIII,
ocupam enormes terrenos e podem ser contempladas como
reinterpretadas contemporaneamente como “coleção de
monumentos à distância: monumentos à nova sociedade
armários repetitivos produzidos industrialmente”.
padronizada da era da máquina. Na cidade moderna, um estilo se estabelece para todas as categorias de
Steven Peterson descreve a cidade tradicional como
arquitetura. Públicos ou privados, cada edifício tem igual
cidade figurativa, composta por figuras espaciais
importância. De acordo com Richard Wesley,
correspondentes a seus espaços públicos organizados hierarquicamente e “esculpidos” no fundo constituído
“Os edifícios de igrejas, estado e instituições culturais
pela massa edificada, contra a qual se opõe a matriz
foram substituídos por edifícios que expressam noções de
espacial da cidade ideal moderna, por ele considerada
economia, eficiência e racionalidade.”
abstrata, porque concebida como um único espaço indiferenciado, contínuo e intocável que atua como
Isolados entre si, depois de séculos de ‘escravidão’,
fundo das figuras edilícias modernas.
finalmente libertam-se do árduo compromisso de configurar espaços públicos. Este já é um dado à priori.
A matriz urbana figurativa contém o espaço
Enorme e indiferenciado, contínuo e disforme, é quase
arquitetônico, configurando pátios no âmbito privado
um parque de exposições, representando uma visão
e um sistema de ruas e praças no âmbito público. A
ideal, monumental, otimista e alegórica da civilização
matriz abstrata corresponde a uma idéia de cidade que
industrial da era da máquina.
libera o espaço parcelado em superquadras retangulares, agrupadas em zonas funcionais de habitação, comércio e
O espaço contínuo e indiferenciado da cidade ideal
indústria, conectadas por um sistema de vias igualmente
moderna representa uma concepção, não mais “sub”, mas
hierarquizadas, segundo a sua função.
“anti” urbana, na qual o parque não é colocado à moda francesa ou à inglesa dentro da cidade, ao contrário,
Sobre as superquadras de cada zona, implantam-se,
a cidade é que para lá se desloca, criando um inédito
de acordo com uma mesma regra urbanística, edifícios
modelo de “urbanidade”: a cidade no parque, de acordo
muito parecidos entre si. Suas formas puras e abstratas,
com Comas, uma cidade moderna abstrata que se opõe
com janelas por todos os lados, rodeados de muito verde,
semântica e formalmente à cidade tradicional-figurativa:
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Andréa Soler Machado - BH e Brasília, figuras e abstrações
“O formato da cidade ideal moderna pode ser descrito como a acumulação de objetos construídos em um contínuo tratado como parque basicamente indiferenciado, cortado por autopistas e caminhos. Em contraposição, o formato da cidade tradicional pode ser descrito como a acumulação de espaços vazios – ruas e praças configuradas por fachadas contínuas alinhadas – dentro de uma massa construída predominantemente indiferenciada, perfurada por pátios e quintais privados. Desde o ponto de vista perceptivo, no formato tradicional, a figura é o espaço, o fundo é construção. No formato modernista, a figura é o edifício, o
Parma, planta de figura e fundo (Fonte: ROWE, Colin & KOETTER, Fred, Ciudad Collage, Barcelona: Editorial Gustavo Gili,1978, p. 67.)
fundo é paisagem.” 1.1. Brasília O melhor exemplo concreto da matriz abstrata é, sem dúvida, Brasília. Em 1956, sob o clima do tão esperado desenvolvimento através da internacionalização da economia e da entrada de capital estrangeiro, Juscelino Kubitschek, eleito presidente em 1955, promove o Concurso Público Nacional para o Plano Piloto da Nova Capital a ser construída do zero, no cerrado centrooeste desse país tropical, ao mesmo tempo em que encarrega o expoente da arquitetura moderna brasileira de exportação, Oscar Niemeyer, de todos os projetos arquitetônicos e urbanísticos a serem realizados.
Le Corbusier: projeto para Saint-Dié, planta de figura e fundo (Fonte: Idem, ibidem, p. 66.)
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Andréa Soler Machado - BH e Brasília, figuras e abstrações
O concurso, aberto em setembro de 1956 e concluído em 1957, teve como resultado uma produção urbanística moderna massiva com referências explícitas aos princípios da Carta de Atenas de 1933, e aos principais projetos urbanísticos modernistas da primeira metade do século XX, como: o Plan Voisin, de 1925, a Ville Radieuse, de 1935 e Chandigharh, de 1950, de Le Corbusier; as obras francesas de reconstrução após a Segunda Guerra Mundial, como Le Havre, de Perret, de 1945, as new towns inglesas, os planos de desenvolvimento urbano americanos, etc. Entre os premiados, aparecem nomes de destaque do panorama moderno brasileiro: Lucio Lucio Costa, Plano piloto original de Brasília, 1956. (Fonte: Brasília, Trilha aberta. Brasília:Secretaria da Cultura e Fundação Cultural do Distrito Federal, 1986. Coordenação geral: Vera Pinheiro, Afonso Heliodoro dos Santos, Ernesto Silva, Maria Helena da Silva Alves e Reynaldo Jardim. IN:LEME, Maria Cristina da Silva, (coord), Urbanismo no Brasil - 1895-1965, São Paulo: Studio Nobel; FAUUSP; FUPAN, 1999, p. 231).
Costa, (1º lugar), Ney Fontes Gonçalves e Boruch Milman (2º lugar), Rino Levi (3º lugar), M.M.M. Roberto (3º lugar), Henrique Mindlin e Giancarlo Pallanti (5º lugar) e Vilanova Artigas (5º lugar). O projeto vencedor de Lucio Costa parte de uma planta em forma de avião, cuja referência simbólica, fora do âmbito da arquitetura, é a máquina, não de morar, mas de voar. Baseia-se em zonas funcionais conectadas por autopistas e em tecido de baixa densidade, conformado por superquadras de 400m x 400m, ajardinadas e gerenciadas pelo poder público, sobre as quais se dispõem os edifícios. Preserva algum resquício da hierarquia da cidade figurativa em escala monumental, distinguindo o programa, a localização e o desenho do
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Andréa Soler Machado - BH e Brasília, figuras e abstrações
seu centro cívico das demais zonas: a Esplanada dos Ministérios e a Praça dos Três Poderes. A faraônica transferência da capital apresenta-se “como um antídoto para a corrupção, entendida como mal crônico da velha capital, Rio de Janeiro,” imagem simbólica da política desenvolvimentista que caracteriza os anos JK. Brasília é o grande evento arquitetônico do período, representativo de um projeto histórico e político exemplar em nível nacional e internacional. Este duplo paradigma explica as transformações edilícias
Brasília, vista do eixo monumental com a Catedral em primeiro plano, conduzindo à Praça dos Três Poderes. (Fonte: Elisabetta Andreoli e Adrian Forty, Arquitetura Moderna Brasileira, Londres: Paidon, 2004, p 130).
e espaciais que passam a atuar sobre as cidades do mundo ocidental. Nas cidades brasileiras, os planos diretores são o principal veículo de implementação e regulamentação da arquitetura e do urbanismo modernos. Atuando como intermediários entre a cidade social e a material, aceleram os processos de transformação urbana que historicamente desenvolviam-se no tempo: são a cidade no papel e determinam o papel social que a cidade deve ter; mas a cidade no papel põe em risco a cidade de pedra, ao preconizar a gradual e normativa substituição da fisionomia figurativa por uma nova cara que, incompatível com a textura tradicional, se expressa como uma caricatura da matriz abstrata.
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Andréa Soler Machado - BH e Brasília, figuras e abstrações
1.2. BH
da ruptura que a modernidade estabelece com o passado. Enquanto na maioria das cidades brasileiras
Apesar de constar no livro Urbanismo no Brasil ao lado
a modernidade conduzida pelos planos é sobreposta
de Goiânia e Brasília como uma nova capital projetada
à cidade colonial pré-existente, em Minas Gerais a
em sua totalidade, a partir de um plano geral que a
imagem colonial icônica de Ouro Preto é valorizada
faz nascer moderna, já em finais do século XIX, e de
como patrimônio, mas é considerada inadequada
constituir “experiência fundamental na história do
à capital republicana que, a partir de então, é
urbanismo no Brasil pela complexidade das iniciativas
transferida para o território praticamente vazio sobre
em que ela implicou, pela escala em que se deu e pela
o qual se traça o plano de Belo Horizonte.
amplitude de mobilização de saberes técnicos que promoveu” , em termos espaciais, Belo Horizonte não
Em 1893, o presidente Afonso Pena passa pelo poder
tem nada a ver com Brasília.
legislativo a lei que estabelecia um prazo de quatro anos para que a capital do estado de Minas Gerais, até então
Seus ideais primordiais alinham-se com os preceitos
sediada em Ouro Preto, fosse construída e transferida
urbanísticos oriundos do barroco e utilizados nas
para o Arraial de Belo Horizonte, antigo Curral D’El-Rey,
reformas implementadas pelo Barão Haussmann na Paris
uma espécie de grande anfiteatro entre as serras do
do século XIX, garimpados, não apenas do original, mas
Curral e de Contagem, numa altitude de 800m, distante
também das suas versões americanas, exemplificadas
100km daquela.
nos planos de L’Enfant para Washington e de La Plata, na Argentina. Em 1894, quando Aarão Reis elabora
Enquanto Afonso Pena e Bias Fortes asseguraram as
o plano da nova capital mineira, estas eram as mais
condições políticas e econômicas do empreendimento, os
novas técnicas em voga na época: eixos monumentais
engenheiros Aarão Reis, positivista convicto, e Francisco
estruturando os traçados; circular, sanear e embelezar,
Bicalho se revezavam na direção da Comissão Construtora
impondo-se como principais metas.
da Nova Capital, órgão criado para este fim. Na equipe de Reis constavam engenheiros formados pela Escola
Construída sobre ruínas de um antigo arraial, o
politécnica do Rio de Janeiro, artistas e arquitetos
surgimento de BH é uma espécie de metáfora
com alguma experiência internacional, como José de
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Andréa Soler Machado - BH e Brasília, figuras e abstrações
Magalhães, que cursou a École des Beaux-Arts, em Paris,
abrigando, a partir do conceito higienista haussmaniano,
o francês Paul Villon, discípulo de Alphand, e o suíço
seus equipamentos especiais de apoio. Uma zona de
João Morandi, que estudou na França e trabalhou na
sítios, com a função de abrigar colônias agrícolas que
construção de La Plata.
garantem o abastecimento da cidade, marca a faixa de transição entre a cidade e o campo, completando o
“A concepção do plano fundia as tradições
conjunto que a define como objeto limitado e controlado
urbanísticas americanas e européias do século XIX”:
pelo plano, característica que se torna um problema à
uma zona urbana articulada a partir de um centro
medida em que a cidade se expande.
administrativo e de uma grande avenida de cinqüenta metros de largura e três quilômetros de comprimento
Belo Horizonte é inaugurada em 12 de dezembro de
na direção norte-sul (Affonso Pena), tangenciada
1897, com 25.000 habitantes, consolidando-se como
por parque urbano de 800 por 800 metros, separada
cidade durante as primeiras três décadas do século XX.
de uma zona contígua suburbana por um bulevar
Símbolo de um Brasil independente que tenta apagar as
circundante, a avenida do Contorno.
lembranças do passado e busca seu estilo no ecletismo desse tempo, suas novas construções são proposições
A primeira caracteriza-se pela sobreposição de um
estilisticamente alternativas em relação à indesejável
racional e dinâmico sistema de linhas e direções
imagem então associada ao barroco colonial.
correspondente a um traçado que, por sua vez, é o resultado da sobreposição de uma dupla trama ortogonal
Os primeiros conjuntos urbanos logo se definem. A Praça
rígida, composta por quarteirões de 120 metros de lado,
da Liberdade aparece como grande paço municipal,
em ângulo de 45 graus entre si, à sensualidade ondulante
com as secretarias de estado e o Palácio do Governo.
da topografia, “ambígua união de sensualidade/relevo
O Parque Municipal, embora com seu traçado inicial
com razão/projeto” que definem “o caráter da cidade.”
modificado, se implanta no local previsto. A Praça da Estação, a avenida Santos Dumont, a rua da Bahia e
A segunda corresponde a um traçado mais flexível que
a avenida Afonso Pena são espaços construídos pelo
organiza o parcelamento de lotes maiores que o da zona
tempo, narrativas arquitetônicas que contam a trajetória
urbana, limitando a expansão indefinida da cidade e
da cidade. A cidade de Belo Horizonte surge a partir
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Andréa Soler Machado - BH e Brasília, figuras e abstrações
de uma teoria urbanística do final do século XIX e se consolida como conquista humana, horizonte planejado e como uma das maiores cidades brasileiras construídas como saudação ao século XX. 2. Oscar Niemeyer, de 1940 a 1960: de BH a Brasília A Pampulha, originalmente apenas uma lagoa artificial, criada em 1938 pelo represamento do ribeirão da Pampulha, na zona do Acaba Mundo, a 20 Km de Belo Horizonte, se torna um ícone da arquitetura moderna brasileira de exportação, a partir de um projeto exemplar realizado pelo, então, jovem e já considerado “moderno” arquiteto, Oscar Niemeyer, a convite do prefeito Juscelino Kubitschek, em 1940, por recomendação explícita do ministro Gustavo Capanema. O projeto da Pampulha nasceu com a idéia da construção de um cassino junto a lagoa e evoluiu para a idéia de um bairro residencial de luxo, dotado de equipamentos de esporte e lazer, como parte do programa de extensão e Plano fundacional da cidade de Belo Horizonte, 1894 (Fonte: Arquivo Público Mineiro, IN: LEME, op. Cit. , p. 224).
“embelezamento”, nas palavras de Kubitschek, da zona urbana de Belo Horizonte. Os edifícios especiais para programas de lazer público projetados por Niemeyer, para as margens da lagoa – o Cassino, atual Museu de Arte Moderna, Igreja
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Andréa Soler Machado - BH e Brasília, figuras e abstrações
de São Francisco de Assis, a Casa do Baile, o Iate Clube e um hotel não construído – constituem equipamentos programaticamente complementares e compositivamente centrais na organização do projeto da Pampulha, a partir dos quais estrutura-se o traçado ondulante da avenida arborizada e iluminada de contorno do conjunto, separada por uma faixa de 500m do parcelamento residencial de grandes lotes de 20m de frente e 1000m2 de área. Oscar Niemeyer, Igreja de São Francisco, Pampulha, Belo Horizonte, 1940, aquarela de João Diniz
As obras, concluídas em 1943, abrem novas oportunidades de trabalho para o arquiteto na capital mineira, como o Conjunto JK, em 1951, o edifício Niemeyer e a Biblioteca Pública, na Praça da Liberdade, em 1954, o clube Sírio Libanês, em 1952, o edifício Bemge, na praça Sete de Setembro, em 1953, o Colégio Estadual no bairro de Lourdes e diversos outros. A emblemática Pampulha representa um momento nacional em que a produção arquitetônica de qualidade e com características de vanguarda é impulsionada por circunstâncias econômicas que a viabilizam. Inserida em meio ao maior patrimônio barroco brasileiro é, talvez, o conjunto de obras mais exemplar da arquitetura moderna brasileira.
Oscar Niemeyer, Cassino, Pampulha, Belo Horizonte, 1940. (Fonte: Elisabetta Andreoli e Adrian Forty, op. Cit., p. 118).
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Andréa Soler Machado - BH e Brasília, figuras e abstrações
Vinte anos depois da Pampulha, Oscar Niemeyer projeta os
4-Edifícios tipo-escultóricos, correspondentes ao Teatro
Palácios envidraçados da nova capital brasileira utilizando,
e à Catedral, projetados em 1960.
basicamente, quatro tipos arquitetônicos básicos: A conclusão da nova capital inaugura os anos 1960 1-A caixa de vidro rodeada por uma espécie de peristilo
e uma nova etapa na arquitetura moderna brasileira.
clássico, adotada nos projetos dos Palácios que abrigam
Fascinado, quem sabe, com a produção americana e
os poderes federais, realizados entre 1957-67: o Palácio
com os prismas de Mies van der Rohe, e contaminado,
da Alvorada, residência presidencial, 1957-58; o Palácio
certamente, pelo falso brilho do Estilo Internacional
do Planalto, poder executivo, 1958-60; o Supremo
– que se baseia na crença numa tecnologia capaz de
Tribunal Federal, 1958-60; o Palácio dos Arcos ou
libertar o edifício de qualquer influência externa, de
Itamaraty, 1965-67; e o Palácio da Justiça.
ordem climática ou cultural – Niemeyer projetou em Brasília edifícios envidraçados ou tipo-escultóricos,
2-A barra longitudinal de planta retangular com
bem diferentes daqueles que caracterizaram a
dez pavimentos sobre pilotis, adotada nos edifícios
Pampulha e a Escola Carioca.
dos Ministérios, nos quais as fachadas maiores são envidraçadas e as menores, cegas.
Com exceção de Brasília, a cidade ideal moderna jaz no papel. Ela nem nos preocupa mais. Entretanto,
3-O edifício-plataforma, adotado no Congresso Nacional,
através de exaustivos Planos Diretores, o seu
de 1958, e em muitas obras de Utzon. Trata-se de uma
modelo passa a influenciar o desenho urbano das
imensa base edificada com caráter de plataforma sobre a
grandes cidades brasileiras. O seu ideal penetra,
qual estão dois volumes: a Câmara do Senado, em forma
assustador como um fantasma, sorrateiro como um
de cúpula e a Assembléia, em forma de cúpula invertida,
vírus incurável e vai matando aos poucos, a velha
ambos dispostos diante das duas torres gêmeas que
cidade das esquinas e praças, aquela cantada na
abrigam os escritórios. O descomunal vazio da esplanada
bossa nova, motivo das belas poesias do inesquecível
dos Ministérios que se estende a seus pés reforça o seu
Quintana, ou do romance urbano de 1930, do velho
caráter monumental, de um futurismo patético, mas não
Dyonélio Machado.
sem precedentes, recordando Versailles.
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Andréa Soler Machado - BH e Brasília, figuras e abstrações
A partir do final dos anos 1950, os seus edifícios, uma coleção de objetos e eventos anônimos, sem comunicação entre si ou com a cidade, invadem massivamente as cidades, eliminando pré-existências, devastando áreas consolidadas, impondo-se como verdade única, causando, enfim, prejuízos nunca antes vistos ou imaginados. Desencadeia-se um processo de mutilação urbana, tendo o automóvel e a televisão como fortes aliados. A arquitetura da era da máquina promove, na cidade tradicional brasileira, um espetáculo capaz de destruir a sua hierarquia, a ‘matriz’ do seu espaço público e a distinção fundamental entre tecido e monumento. 3. Anos 1980: amigos mineiros Os anos 1980 eram tempos de constatar esta devastação. A partir dos anos 1970, no contexto europeu, e nas últimas décadas do século XX, no Brasil, a crítica radical põe de manifesto o equívoco da “utopia vanguardista,” ao dar-se conta de que, na sociedade moderna, não
Oscar Niemeyer, Palácio do Itamaraty, Brasília/DF.(Fonte: http: //www.unb.br/fau/dimpu/images/itamaraty485.jpg).
existe uma estabilidade e a arquitetura, enquanto projeto de linguagem coletiva, se encontra submetida a um constante desgaste que faz impensável a velha codificação tratadística e a difusão orgânica das linguagens a todos os níveis da figuração arquitetônica. É quando volta a adquirir consistência a discussão a respeito das relações entre a cidade e a arquitetura como
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Andréa Soler Machado - BH e Brasília, figuras e abstrações
projeto de suas partes, em oposição aos grandes planos
anterior: re-valorizou a arquitetura como disciplina no
de sua remodelação total, sobretudo através dos artigos
meio acadêmico e a cidade como um lugar de memória,
de Colin Rowe.
significativo e ordenado, no qual o domínio público desempenha papel dominante e onde a história acontece
As transformações e revisões que, então, se davam
e permanece como rastro e registro, em termos de
alimentavam-se das demais artes. Enterramos
monumentos e tipologias. A partir de uma visão crítica
simbolicamente Le Corbusier na Faculdade de Arquitetura
em relação ao Movimento Moderno, a cidade emerge, no
da UFRGS, ressuscitamos a história e nos apaixonamos
pós-modernismo, como o lugar da arquitetura e como o
pelo pós-modernismo. Enxergávamos fortes ligações
contexto e matéria-prima do projeto arquitetônico. Em
entre a arquitetura e a música, tênues fronteiras entre o
1982, Aldo Rossi afirmou que, “a história da arquitetura
ofício e a festa, a continuidade entre o dia e a noite, o
constitui o material da arquitetura” e, em 1983, Jean
movimento da mão como expressão da alma. Usávamos
Castex defendeu a existência de uma estreita relação
calças deandê listradas, ouvíamos The Cure, Talking
entre a análise urbana e o projeto arquitetônico:
Heads, Ritchie e Legião Urbana, e arquitetura ocupava o mesmo espaço da paixão.
“(…)a análise urbana é a própria condição do projeto; evidentemente, não é uma obrigação da qual se tenha
A cidade era a grande personagem do momento, e
que livrar antes de segurar a lapiseira: esta análise
Roma Interrota e IBA de Berlim, as principais fontes de
condiciona o enunciado, o método e, finalmente, o lugar
repertório urbano. Revistas como a Architectural Design,
teórico do projeto.”
Architecture d´Aujourd´hui, Projeto, Pampulha e AU, estavam sempre na mesa de cabeceira. Arquitetos como
No Brasil, nossos melhores exemplos eram nossos amigos
Mario Botta, Ungers, Graves, os irmãos Krier, Richard
mineiros. Sylvio de Podestá, João Diniz e sua turma
Meier, Venturi e Aldo Rossi eram os grandes ídolos.
eram as figuras humanas e arquitetônicas que criaram, em torno de Éolo Maia, o ‘movimento dos gambás’ ou
O pós-modernismo, apesar de não constituir solução,
o chamado pós-modernismo mineiro, em protesto à
e muito menos um paradigma, adquiriu prestígio por
tristeza e falta de identidade da arquitetura produzida
constituir reação necessária ao agonizante movimento
pós Brasília. Idéias e gentes que muito influenciaram
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Andréa Soler Machado - BH e Brasília, figuras e abstrações
a arquitetura da UFRGS nos anos 1980, pois tornavam
“(…) aberto a diversas influências como a herança
realidade nossos novos sonhos, que aqui no sul,
colonial, a experiência modernista, as possibilidades
conservador, nunca foram muito bem recebidos.
tecnológicas advindas da indústria do aço e um largo mosaico contemporâneo de referências advindo de outras
A arquitetura se expande para além das imagens,
artes. Não existe um nome principal, uma escola ou uma
inaugurando espaços textuais de discussão e divulgação;
imagem definida. O resultado dos projetos produzidos com
não de um novo estilo, mas de um novo ponto de vista
qualidade variam entre o historicismo, o tecnicismo, o
convencionalmente denominado como regionalismo
minimalismo ou o expressionismo. Uma cultura variada às
crítico ou modernismo apropriado, caracterizado,
vezes aparentemente contraditória.”
sobretudo, pela crítica ao Estilo Internacional e pela busca de novas configurações capazes de, não mais
Obras importantes deste período são: o residencial
sobrepor, mas reinterpretar os valores universais
Buritis, de 1987, de Sílvio de Podestá, os edifícios Wall
inserindo-os no contexto local.
Street e Greenwich Village, de 1988, de Júlio Teixeira e Alberto Dávila, o Centro Empresarial Raja Gabaglia, de
Neste contexto surge, em Belo Horizonte, a revista de
1989, o Fashion Center, de 1993 e o Office Center, de
arquitetura Vão Livre, que logo se transforma na Revista
1994, de Éolo Maia e Jô Vasconcelos; o Centro de Apoio
Pampulha, organizada pelos arquitetos Éolo Maia, Sylvio
Turístico Tancredo Neves, atual Museu de Mineralogia,
de Podestá, Álvaro Hardy, Paulo Laender e diversos
mais conhecido como Rainha da Sucata, de 1992, de
outros. Entre 1979 e 1983, em 12 números, atuou como
Éolo Maia e Sylvio de Podestá; os Edifícios Tenco,
“ponto de referência fundamental na discussão nacional
Nashville, e Jules Rian, de 1992, de Flávio Almada; a
da arquitetura pós Brasília e pós-milagre”. Foi retomada
Escola Guignard e a Academia Mineira de Letras, de 1995,
sob a denominação de AP Cultural por Sylvio de Podestá
de Gustavo Penna; o Edifício Capri, o Omni Center e o
e Gabi Aragão na década seguinte, como editora e revista
Edifício Scala Workcenter, projetados por João Diniz em
de arquitetura, design, arte e cultura. Se a arquitetura
1989, 1991 e 1994, respectivamente. João Diniz produz
da Pampulha é exemplar em sua moderna concretude, a
mais intensamente a partir dos anos 1990. Trabalha,
revista Pampulha, torna-se um marco como arquitetura de
predominantemente, com o aço e com a idéia da
papel, cujo papel é a divulgação de um discurso pluralista,
invenção a partir de um cultivo da margem ou interface
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Andréa Soler Machado - BH e Brasília, figuras e abstrações
existente entre a arquitetura e as demais artes, com ecos tênues e respeitosos em relação à história e à tradição. Os edifícios Omni e Savassi, a casa Eugênia e o projeto Sensações fazem referência, por exemplo, tanto a um fragmento em curva da igreja de São Francisco de Assis na Pampulha, quanto à cobertura do Edifício Chrysler de Nova Iorque. Naqueles tempos férteis, descobri coisas que, até hoje, considero válidas: que arquitetura é a arte milenar de transformar a natureza em cultura; que a primeira João Diniz, Omni Center, Belo Horizonte, projeto de 1991, vista. (Fonte: DINIZ, João, op. Cit., p. 157).
noção do construir deve estar relacionada à noção de pensar a ecologia do planeta; que não devemos desistir de inovar apesar da dura realidade do mercado de trabalho brasileiro ainda muito refratário ao novo; que a arquitetura é disciplina autônoma em sua materialidade, mas um edifício só existe para conformar paisagens, lugares do planeta para sustentar a leveza do ser; que a arquitetura é mais que uma profissão, uma visão de mundo cuja essência é a mesma das demais artes: a vontade e capacidade de transformar, criar e compor um mundo melhor, não importa através de qual matéria ou suporte; que viagens convertem o conhecimento abstrato em experiência real; que a arquitetura brasileira, colonial ou moderna, passando pela neoclássica e a art-decó, sempre se caracteriza pela tropicalização dos estilos e formas de construir trazidas pelas diversas culturas que
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Andréa Soler Machado - BH e Brasília, figuras e abstrações
conformam a brasilidade; que o Patrimônio Histórico é tão importante quanto a nova arquitetura; que o moderno é um valor que só existe em relação ao antigo; Se, por um lado, a modernidade é uma reação à história e implica uma certa rebeldia, o paradoxo é que importantes arquiteturas modernas nasceram em lugares de forte peso histórico e cultural. Na Europa surgiu a arquitetura produzida pela primeira geração da vanguarda modernista, nos anos 1920 (Le Corbusier, Mies Van der Rohe, Walter Gropius, Alvar Aalto, etc.), da qual somos herdeiros diretos e legítimos; no Rio de Janeiro, primeira capital brasileira, se construiu, em 1936, o Ministério de Educação e Saúde, projeto de Lúcio Costa, Oscar Niemeyer e equipe, com a participação de Le Corbusier, tornando-se o marco inicial
João Diniz, Scala Workcenter, Belo Horizonte, projeto de 1994, croquis e vista (Fonte: Idem ibidem, p. 171).
da arquitetura moderna brasileira. A Pampulha é o melhor exemplo de que a cidade se constrói, historicamente, através da eterna disputa entre a tradição e a modernidade, constituindo-se em lugar de memória e patrimônio por excelência da humanidade. Preservar é preciso, mas achar o ponto no qual se insere o novo é fundamental para que a cidade seja um museu vivo, capaz de sempre se reinventar. BH e Brasília são patrimônio da humanidade, duas cidades muito importantes na história da arquitetura moderna brasileira, lugares onde ainda nunca estive,
177-Bloco(1)
Andréa Soler Machado - BH e Brasília, figuras e abstrações
mas conheço bem através dos livros, da imaginação e da conexão uai-tchê: a ponte virtual e afetiva construída através de vários intercâmbios estabelecidos entre Porto Alegre e Belo Horizonte nos últimos anos. Figuras e Abstrações Palestra ministrada no Sabadarq do dia 14 de maio de 2005. Andréa Soler Machado é Arquiteta (UFRGS, 1985), Mestre em Arquitetura (PROPAR/UFRGS, 1996); Doutora em História (PPGHIST/ UFRGS, 2003); professora do Departamento de Arquitetura FAUFRGS desde 1991.
Álvaro Hardy (Veveco), croquis dos gambás. (Fonte: Idem Ibidem, p. 11).
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Andréa Soler Machado - BH e Brasília, figuras e abstrações
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Alexandra Staudt Follmann Baldauf
estudos de Coordenação Modular, que se mostra como
Um panorama sobre os aspectos históricos da
um fator fundamental para que se traga à construção
Coordenação Modular: dos gregos a Le Corbusier
civil os benefícios que a industrialização trouxe a outros setores industriais.
A Coordenação Modular pode ser entendida como a ordenação dos espaços na construção civil através do
O texto a seguir tem por objetivo mostrar um
uso de componentes construtivos produzidos a partir de
panorama da Coordenação Modular sob um aspecto
uma unidade de medida básica - o módulo, normatizada
histórico e, já que o uso de um módulo de projeto
pela International Organization for Standardization (ISO)
aparece em várias composições arquitetônicas
em 10cm. A Coordenação Modular com um caráter
clássicas, começa-se pelos gregos, romanos e
mais industrial surgiu entre a Primeira e a Segunda
japoneses; depois passa-se pela Revolução Industrial
Guerras Mundiais e contribuiu de forma fundamental
e finaliza-se com o Modulor, de Le Corbusier.
na reconstrução de edificações residenciais nos países destruídos pela guerra, principalmente na Alemanha, em
O módulo
função da rapidez e da redução de custos proporcionadas pela sua utilização. A partir de então, muitos estudos
A palavra módulo tem origem no latim modulu, e
surgiram em vários países.
significa “uma medida reguladora das proporções de uma obra arquitetônica” ou “quantidade que se toma
O Brasil foi um dos pioneiros, em nível mundial,
como unidade de qualquer medida” (FERREIRA, 1999).
a aprovar uma norma de Coordenação Modular, a
A utilização do módulo em uma retrospectiva na
NB-25R, em 1950, tendo os anos 70 e início dos 80
história da Arquitetura leva à interpretação clássica
tomados por seus conceitos e estudos a respeito.
dos gregos, sob um caráter estético; dos romanos, sob
Apesar disso, poucos objetivos foram alcançados
um caráter estético-funcional e dos japoneses, sob um
mesmo com toda a promoção para a racionalização da
caráter funcional (ROSSO, 1976).
construção. No entanto, as atuais preocupações com as questões ambientais, de produtividade e de redução de custos no setor são aliados para uma retomada dos
Página anterior: as ordens gregas na interpretação de Scamozzi (BIERMANN et al., 2003)
181-Bloco(1)
Alexandra Baldauf - Um panorama sobre os aspectos históricos da Coordenação Modular: dos gregos a Le Corbusier
Os gregos A proporção dos elementos das ordens gregas era a expressão da beleza e da harmonia (CHING, 1998). Para a unidade básica das dimensões era utilizado o diâmetro da coluna. A partir deste módulo, criavam-se todas as demais dimensões, não só da própria coluna - como o fuste, o capitel e a base -, mas de todas as demais dimensões da obra arquitetônica. Também o espaço entre as colunas estava baseado no diâmetro das mesmas e a distância entre as colunas da esquina das edificações gregas é um excelente exemplo Fig. 1: vãos normais e de esquina na arquitetura grega. (NISSEN, 1976)
do conflito entre ritmo arquitetônico e exigências estruturais. Na arquitetura grega, o vão da esquina era menor em relação aos demais vãos para que os componentes “pré-fabricados” se mantivessem com a mesma dimensão daqueles existentes nos outros vãos. Baseados neste princípio, os frisos e as vigas mantinham a mesma dimensão ao longo de toda a fachada, inclusive nos vãos das esquinas. A figura 1 mostra que o vão menor “B” rompe o ritmo exato dos vãos “A”, mantendo dessa forma as dimensões dos frisos e vigas iguais. O vão normal é o “A” e o de esquina é o “B”. A linha tracejada mostra onde a coluna deveria estar posicionada se os vãos “A” e “B” fossem iguais.
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Alexandra Baldauf - Um panorama sobre os aspectos históricos da Coordenação Modular: dos gregos a Le Corbusier
Ainda contemplando esta questão estética da arquitetura grega, a figura 2 mostra uma residência de um pavimento, onde as fachadas foram projetadas com o módulo de A = 4 pés atenienses. Os dois tipos de frisos (métopas e tríglifos) determinam o intervalo das colunas, que corresponde a duas peças de cada um dos frisos. Com essa composição, os vãos das esquinas é que sofrem redução de medida, tornando-se menores. Mesmo sendo o diâmetro da coluna a dimensão moduladora da arquitetura grega, o tamanho das colunas variava conforme a edificação. Sendo assim, as ordens gregas - toscana, dórica, jônica, coríntia e composta - não se apoiavam em uma unidade de medida constante, mas cada uma seguia as suas proporções. Essas proporções podem ser visualizadas na figura de abertura deste artigo, em uma ilustração gravada em madeira, em 1615, pelo arquiteto italiano Vincenzo Scamozzi. Os romanos Na civilização romana, o planejamento das cidades e o projeto dos edifícios obedeciam a um reticulado modular baseado no passus romano, que era múltiplo do pes, uma unidade de medida antropométrica.
Fig. 2: casa grega de um pavimento, do ano de 448 a.C. (NISSEN, 1976)
Além de as composições estarem baseadas em um módulo antropométrico, os romanos, povo de caráter
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Alexandra Baldauf - Um panorama sobre os aspectos históricos da Coordenação Modular: dos gregos a Le Corbusier
essencialmente prático, tinham conseguido padronizar seus tijolos em dois tipos universais: o bipetalis e o sesquipetalis (ROSSO, 1976). Exemplo do planejamento das cidades é o traçado da cidade de Emona, baseado em um módulo de 60 passus, originando um reticulado de 360 passus x 300 passus, dando à cidade uma proporção de 6:5. Na figura 4 pode ser visualizada a malha pela qual a cidade de Emona, hoje Liubliana na Eslovênia, se organizava. Os romanos ainda serviram-se do módulo para estabelecer medidas tanto de componentes construtivos, como tubos cerâmicos, telhas, tijolos, colunas e ladrilhos, quanto de utensílios domésticos, como ânforas, copos e pratos. Pesquisas arqueológicas mostraram que os romanos utilizavam componentes padronizados e modulados. O Fig. 4: cidade de Emona (CENTRO BRASILEIRO DA CONSTRUÇÃO BOUWCENTRUM, 1972)
que mais chama a atenção é o fato de os componentes terem medidas de fabricação correspondentes a uma modulação que já levava em conta a espessura das juntas ou a sobreposição das peças. Mas a propriedade mais importante das séries dimensionais romanas no que tange à composição consiste no que Vitruvius, arquiteto romano do século
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Alexandra Baldauf - Um panorama sobre os aspectos históricos da Coordenação Modular: dos gregos a Le Corbusier
Componentes
Dimensões
Tubo cerâmico para água
Comprimento modular: 1 gradu (passo)
Tegula (telha)
Comprimento e largura modulares: 1 cubitu (osso longo situado na face interna do antebraço) = 6 palmi (palma: porção da mão entre o punho e os dedos)
Imbrex
Comprimento modular: 1 cubitu = 6 palmi
Laje de tijolos para hypocaustu (sistema de calefação)
Comprimento e largura modulares: 1 bipedalis (2 pés) = 8 palmi
Tijolo lydica
Largura modular: 1 pes = 4 palmi Altura modular: 1 palmus Comprimento modular: 1 cubitu = 6 palmi
Vários ladrilhos quadrados para pisos
Áreas modulares = 1 cubitu quadrado ou 1 pes quadrado ou 1 bes quadrado
Vários ladrilhos hexagonais
Largura modular: 1 bes ou 1 triens ou 2 unciae (polegadas)
Pequenas pedras e tijolos para mosaicos de pisos
Espaço modular: 1 uncia cúbica ou 1 semiuncia cúbica ou 1 silicus (rocha) cúbico
I a.C., chamava de ratio symetriarum1 : os tamanhos
Fig. 5: as medidas modulares romanas (baseado em CENTRO BRASILEIRO DA CONSTRUÇÃO BOUWCENTRUM, 1972)
modulares dos componentes construtivos romanos eram pequenos múltiplos de várias unidades-padrão. Portanto, também as composições de componentes romanos eram somas e múltiplos de várias unidadespadrão de medidas. A figura 5 mostra como as medidas modulares romanas para componentes construtivos e seus incrementos eram idênticas a pequenos múltiplos inteiros de uma medida-padrão romana. Todas as unidades romanas podiam ser usadas como módulos de acordo com as
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Alexandra Baldauf - Um panorama sobre os aspectos históricos da Coordenação Modular: dos gregos a Le Corbusier
circunstâncias. Dessa forma, os romanos aplicaram uma modulação flexível desde o pequeno componente até a grande cidade. Os japoneses Fig. 6: residência típica japonesa (CHING, 1998)
A unidade clássica de medida japonesa, o shaku, tem origem chinesa. Praticamente equivale ao pé inglês e é divisível em unidades decimais. Durante a segunda metade da Idade Média, no Japão, implantou-se outra medida, o ken. Ainda que no início só fosse utilizado para desenhar a separação entre duas colunas e não apresentasse uma dimensão fixa, logo foi normatizado para ser aplicado na arquitetura residencial. O ken passou a ser uma medida absoluta não só para a construção de edifícios, mas evoluiu até tornar-se um módulo que regia toda a estrutura, os materiais e os espaços da arquitetura japonesa. Com a trama modular do ken se instauraram dois métodos de projeto. No primeiro, o método inakama, a trama do ken (que passou a ser 6 shaku) determinava a separação entre os eixos das colunas. Por conseqüência, o tradicional tatame (3 x 6 shaku ou x 1 ken) variava ligeiramente, tendo em conta o diâmetro da coluna.
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Alexandra Baldauf - Um panorama sobre os aspectos históricos da Coordenação Modular: dos gregos a Le Corbusier
No segundo, o método ko-ma, o tatame tinha
Em uma casa tipicamente japonesa, a trama ken regia
dimensões constantes (3,15 x 6,30 shaku) e o entre-
a estrutura e a seqüência aditiva, de espaço a espaço,
colunas (módulo ken) oscilava entre 6,4 e 6,7 shaku
das diferentes habitações. A figura 6 mostra uma
(CHING, 1998).
residência típica japonesa, onde as medidas do módulo, relativamente pequeno, possibilitavam a disposição
O tatame, por ser usado em todos os locais
de espaços retangulares, de maneira totalmente livre
internos, levou à necessidade de os espaços serem
segundo modelos lineares, agrupados ou arbitrários.
dimensionados de forma a poderem receber, no piso, um número inteiro de tatames, dando à modulação um
Do módulo à Coordenação Modular
caráter prático-funcional (ROSSO, 1976). As medidas de uma habitação eram expressas pelo número
A primeira aplicação moderna da Coordenação Modular é
de tatames utilizados. No princípio, a dimensão
considerada como sendo o Palácio de Cristal, projetado
do tatame era a que permitia que duas pessoas
por Joseph Paxton e construído entre 1850 e 1851
estivessem comodamente sentadas, ou somente uma
para a Exposição Universal de Londres. Joseph Paxton
dormindo. Mas, conforme a trama ken se desenvolveu,
apresentou um estudo baseado nas suas experiências
o tatame perdeu sua dependência das dimensões
adquiridas com outros projetos. A concorrência foi ganha
humanas e se perderam também as necessidades de
e a edificação executada dentro do orçamento previsto e
um sistema estrutural e de separação entre colunas
no incrível prazo de 9 meses. Isso foi possível graças ao
baseados nesta modulação.
rigoroso estudo e detalhamento de todos os elementos da construção, do método de produção, do sistema
Em função de sua modulação 1:2, os tatames podiam
de montagem, do tempo de construção e do rigoroso
ser distribuídos em um grande número de posições
controle dos custos. Os elementos utilizados foram
para qualquer dimensão de habitação, e para cada uma
projetados para serem produzidos em massa, com as
delas se fixava uma altura de teto, que se calculava a
técnicas de fundição existentes na época, permitindo sua
partir da seguinte igualdade: altura de teto = número
montagem e desmontagem (BRUNA, 1976).
de tatames x 0,3.
187-Bloco(1)
Alexandra Baldauf - Um panorama sobre os aspectos históricos da Coordenação Modular: dos gregos a Le Corbusier
O pavilhão de 71500m 2 foi totalmente construído com componentes pré-fabricados produzidos e montados no próprio canteiro. O elemento condicionador da escolha do módulo foi o vidro, aplicado em grandes placas, cuja medida máxima de fabricação era de 8 pés (cerca de 240cm), dimensão esta que determinou o reticulado da malha. Os múltiplos do módulo (24, 48, 72 pés – cerca de 720cm, 1440cm, 2160cm, respectivamente) determinaram as posições e as dimensões de todas as peças. O Palácio de Cristal permaneceu em Sydenham até ser Fig. 7: Palácio de Cristal. (GÖSSEL; LEUTHÄUSER, 1991)
destruído por um incêndio em 1936. Uma foto do Palácio de Cristal, após sua reconstrução em 1854, na cidade de Sydenham, é mostrada na figura 7. Construtivamente o Palácio de Cristal representa uma síntese de componentes estudados separadamente e coordenados entre si por uma rede modular; o espaço resultante da somatória de elementos padronizados e industrializados era o fruto perfeito da tecnologia empregada e do estudo racional dos vínculos, dos limites econômicos e de tempo, dos condicionantes técnicos de produção e montagem. O Palácio de Cristal, na sua integridade de obra-de-arte, exprime a essência do próprio tempo, antecipando em cem anos a problemática que os arquitetos e engenheiros do pós-guerra na Europa
188-Bloco(1)
Alexandra Baldauf - Um panorama sobre os aspectos históricos da Coordenação Modular: dos gregos a Le Corbusier
deveriam enfrentar com a industrialização da construção,
Em 1921, o arquiteto Le Corbusier2 declarou que era
como a substituição da dimensão métrica pela dimensão
preciso que as casas fossem produzidas em série, em
modular, a produção padronizada dos componentes e
fábricas com linhas de montagem como Ford montava
também a consideração das necessidades econômicas,
seus automóveis (CHEMILLIER, 1980).
funcionais e técnicas. O arquiteto alemão Walter Gropius, na visão de Rosso O Palácio de Cristal parece ter sido realmente
(1976), é quem antecipa os tempos e as fases da
representativo. Em poucos anos, inúmeras estruturas
Coordenação Modular. Gropius projetou e construiu
semelhantes foram erguidas em todo o mundo. No
duas casas isoladas: a do bairro-operário Weissenhof3,
entanto, é difícil, à primeira vista, compreender por
em 1927, e a “Casa Ampliável”, em 1932. Elas foram
que a pré-fabricação, que parecia uma conquista aceita
montadas a seco com componentes pré-fabricados:
e largamente difundida, foi abandonada na segunda
estrutura metálica e vedação com painéis de cortiça
metade do século para ser retomada somente quase um
revestidos externamente com cimento amianto. Na
século depois.
casa de Weissenhof, a planta era modular e na “Casa Ampliável” Gropius obtinha o crescimento da edificação
Século XX
por adição de alguns corpos volumétricos. Estas casas eram, até então, os exemplos, em termos tecnológicos,
Com a industrialização que se processou em vários setores
mais aprofundados sobre os estudos de modulação, pois
no século XX, a construção civil também não poderia
nelas a escolha do módulo teve uma precisa justificação
deixar de passar por uma profunda revisão. Imbuídos pelo
técnico-produtiva.
espírito desta industrialização, não mais passível de uma regressão, profissionais da área iniciaram vários estudos
Mas o primeiro que desenvolveu a possibilidade de
a respeito da pré-fabricação e, conseqüentemente, da
utilizar um módulo para os propósitos da indústria
Coordenação Modular: a padronização dos componentes
moderna foi Alfred Farwell Bemis (CAPORIONI; GARLATTI;
era necessária de qualquer maneira, não era mais possível
TENCA-MONTINI, 1971), industrial de Boston, que,
suportar os altos custos e os longos períodos de obras
a partir de 1930, originou os primeiros estudos de
(CHEMILLIER, 1980).
uma nova técnica de construção, a qual denominou
189-Bloco(1)
Alexandra Baldauf - Um panorama sobre os aspectos históricos da Coordenação Modular: dos gregos a Le Corbusier
de “método modular cúbico”. Esses estudos foram
Ainda durante a Segunda Guerra, um estudo realmente
apresentados em 1936, quando expõe os fundamentos de
sistemático e completo do assunto é realizado pelo
uma teoria da Coordenação Modular, resumida no axioma
alemão Ernst Neufert. Na época, a Alemanha estava
pelo qual “todos os objetos que satisfaçam à condição
pressionada pelos graves problemas bélicos e Neufert,
de possuírem dimensões múltiplas de uma medida
antecipando os problemas futuros de reconstrução,
comum, são comensuráveis entre si e, portanto, também
concebeu e articulou no seu livro Bauordnungslehre,
o são em relação à construção, que integrados passam
publicado em 1943, um sistema de coordenação
a formar” (ROSSO, 1976). O cubical method of design
octamétrica (100 cm/8), baseado no módulo de 12,5cm.
por ele concebido, embora sob alguns aspectos passível
Neufert preocupou-se principalmente em conceber um
de críticas, pode ser considerado a primeira formulação
sistema dimensional que não alterasse substancialmente
4
correta de uma teoria da aplicação do módulo-objeto ,
as medidas dos tijolos tradicionais alemães.
voltada para as necessidades da industrialização. Bemis
Os estudos de Neufert foram tão importantes que a
indicou 4 polegadas como dimensão do módulo, pois
primeira norma alemã sobre Coordenação Modular, a
acreditava ser este o mais racional.
DIN 4172, foi extraída dos seus trabalhos e publicada em 1951. Desde então até 1965, 4.400.000 habitações
Em 1938, dois anos após a morte de Bemis, a American
foram construídas na Alemanha obedecendo ao sistema
Standard Association (ASA) iniciou um estudo para
octamétrico, o equivalente a mais de 50% de todas as
coordenar o dimensionamento dos componentes da
construções realizadas nesse período no país. Apesar
construção. Quase no mesmo período, na França,
de o sistema octamétrico ter sofrido várias objeções,
iniciaram-se estudos semelhantes que, em 1942,
principalmente em função do módulo decimétrico,
apresentados à Associação Francesa para a Normalização
opção da maioria dos países, os resultados obtidos com
(AFNOR) tornaram-se projeto de norma e, a seguir, norma
o seu uso comprovaram a viabilidade e a eficiência da
fundamental sobre o tema. A França foi o primeiro país
utilização da Coordenação Modular.
a ter uma norma de Coordenação Modular de caráter nacional. A ela seguiram-se Estados Unidos, que
Diante da norma recém publicada na França, e
publicou sua primeira norma em 1945, a Suécia em 1946
preocupado com os rumos da composição harmônica na
e a Bélgica, em 1948.
arquitetura, Le Corbusier passa a estudar, a partir de
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Alexandra Baldauf - Um panorama sobre os aspectos históricos da Coordenação Modular: dos gregos a Le Corbusier
1942, um sistema de proporcionalidade que adequasse as medidas antropomórficas àquelas necessárias à produção industrial (PADOVAN, 1999). Para que atingisse tal objetivo, Le Corbusier fundamentou Le Modulor, publicado em 1948, na matemática, utilizando as dimensões estéticas da seção áurea 5 e da série de Fibonacci6 e nas proporções do corpo humano, através das dimensões funcionais. Em 1954, publicou o segundo volume: Le Modulor II. Para Le Corbusier o módulo era um fator de multiplicação de 1,618... (número de ouro). A trama básica do Modulor
Figura 8: o Modulor (LE CORBUSIER, 1953)
era composta por três medidas: 113 cm, 70 cm e 43 cm. Estas medidas são proporcionais à seção áurea: 43 + 70 = 113; 113 + 70 = 183; 113 + 70 + 43 = 226. As medidas 113, 183 e 226 definem o espaço que a figura humana ocupa, respectivamente à altura do plexo solar, estatura e um homem de braços levantados. A partir das medidas 113 e 226, Le Corbusier desenvolveu, respectivamente, as séries Vermelha e Azul, escalas descendentes das dimensões relacionadas com a estatura humana (figura 8). Ele se baseou na estatura de 1,83 m por considerar que esta seria o melhor padrão, a ser usado por qualquer raça, em qualquer parte do mundo (LE CORBUSIER, 1953). Apesar de toda essa disciplina dimensional do Modulor dar um sentido harmônico às suas dimensões-chave, suas
191-Bloco(1)
Alexandra Baldauf - Um panorama sobre os aspectos históricos da Coordenação Modular: dos gregos a Le Corbusier
aplicações eram restritas. Isso se dá pelo fato de ter
Notas:
sido pensado mais em termos de instrumento de controle de arquitetura, do que como elemento de coordenação
1. Esta simetria era entendida por Vitruvius como a relação
entre concepção de projeto e produção industrializada da
matemática estável das partes entre si e de cada parte com o todo
construção. O uso da proporcionalidade antropomórfica
(WITTKOWER, 1995).
gera padrões dimensionais que devem ser usados com
2. Le Corbusier nasceu na Suíça sob o nome de Charles-Edouard
muita precaução, pois as dimensões reais das pessoas
Jeanneret-Gris. Em 1917, mudou-se para Paris e adotou o pseudônimo
variam segundo a idade, o sexo e a raça. No entanto,
de Le Corbusier.
isto não tira o seu mérito de ter contribuído para uma
3. Este bairro foi criado na cidade de Stuttgart; onze arquitetos
abordagem mais ampla do tema com outras motivações
participaram dos projetos das residências, nas quais puderam mostrar
além da tecnicista almejando uma síntese de módulo-
a “nova” arquitetura: a moderna.
7
medida com o módulo-objeto.
4. Módulo aplicado à industrialização (ROSSO, 1976). 5. A seção áurea, observada e estudada pela escola grega de
Para Le Corbusier (1953), no entanto, o Modulor não era
Pitágoras, algebricamente se expressa segundo a equação: a/b =
uma simples série numérica provida de uma harmonia
b/a+b. O valor numérico dessa razão é Ø: 1,618..., chamado número de
intrínseca, mas um “sistema de medidas que pode
ouro. Ele aparece em muitas relações do corpo humano, como a razão
governar sobre as longitudes, as superfícies e os volumes,
entre a altura de uma pessoa e a distância do umbigo aos pés, por
e manter a escala humana em todas partes. Pode prestar-
exemplo, e foi amplamente utilizado na arquitetura.
se a uma infinidade de combinações, garantir a unidade na
6. Leonardo Fibonacci, matemático italiano, escreveu em 1202 Liber
diversidade... o milagre dos números”.
Abacci no qual estuda o então denominado “problema dos pares de coelhos”, para saber quantos coelhos poderiam ser gerados de um par
Alexandra Staudt Follmann Baldauf é Arquiteta e Urbanista, graduada no ano de 1999 pela Faculdade de Arquitetura da UFRGS, Mestre em Engenharia na área de Construção, pelo Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil da UFRGS, professora do Centro Universitário Feevale dos cursos de Arquitetura e Urbanismo, Design e Design de Moda e Tecnologia.
de coelhos em um ano. Este estudo chegou a uma seqüência numérica, chamada série de Fibonacci: 1, 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, 34, 55, 89, ..., em que somando-se o 1° com o 2° número, obtém-se o 3°; somando-se o 2° com o 3°, obtém-se o 4° e assim por diante. 7. Módulo utilizado com finalidades práticas (ROSSO, 1976).
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Alexandra Baldauf - Um panorama sobre os aspectos históricos da Coordenação Modular: dos gregos a Le Corbusier
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Ana Carolina Pellegrini O Vôo do Corvo Leitura obrigatória nos tradicionais concursos de beleza, o texto “O Pequeno Príncipe”, de Antoine de Saint-Exupéry, tornou-se, nas últimas décadas, uma espécie de ícone literário de quem nada lê. Equivocadamente tomado como literatura infantil, o texto, depois de seis décadas, continua a despertar o interesse velado de leitores de todas as idades, ainda que sob as pechas de piegas e pueril. Diante deste panorama, parece inusitado tratar de “O Pequeno Príncipe” numa publicação de cunho acadêmico. Na contramão da erudição, uma narrativa singela e ingênua?
http://levoyage.joueb.com/images/Le_ Petit_Prince.jpg
De fato, não. O interesse pelo livro não surge apenas em função do conteúdo escrito que, aliás, conforme já insinuado, de pueril nada tem. A publicação chama atenção pela qualidade e riqueza de suas ilustrações, elaboradas pelo próprio Exupéry. As aquarelas, ternamente delineadas pelo autor do principezinho, são parte da narrativa e emocionam o leitor tanto quanto ou mais do que o próprio texto. Entretanto, não é
http://www.circoloalbatross.it/foto/ Saint-Exupery.gif
apenas nelas que reside o interesse pelo livro, conforme ficará claro nos próximos parágrafos.
Página anterior: acervo da autora.
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Ana Carolina Pellegrini - O Vôo do Corvo
Além de “O Pequeno Príncipe”, este estudo conta com outro protagonista. Trata-se do arquiteto francosuíço Charles Édouard Jeanneret, mais conhecido como “Le Corbusier”. Ao contrário do Pequeno Príncipe, os textos de Le Corbusier transitam pelo cenário da intelectualidade internacional, sendo motivo de regozijo acadêmico o profundo conhecimento de sua obra. Assim como Exupéry, Corbusier era um homem de vários talentos. Suas atividades não se restringiam ao projeto http://www.akg-images.co.uk/
de edificações; é igualmente sólida sua carreira de pintor e escritor. Mais de quarenta textos produzidos por ele versam sobre a arquitetura e o urbanismo da modernidade, dentre os quais pode ser destacada, por razões que serão elucidadas a seguir, a publicação “Precisões sobre um estado presente da arquitetura e do urbanismo”. Estes dois homens, mestres das artes e das letras, compõem o fio condutor deste ensaio, que visa a oferecer ao cenário acadêmico uma contribuição teórica não apenas fundamentada no rigor científico, mas sim, a versão de um fato que, apesar de exiguamente documentado, é capaz de despertar certo viés despretensiosamente poético.
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Ana Carolina Pellegrini - O Vôo do Corvo
O texto de Saint-Exupéry narra a história do encontro entre um aviador perdido no deserto e o pequeno príncipe viajante, apresentando ao leitor, de forma romanceada, uma seqüência de inusitados acontecimentos. Fantasiosos diálogos entre humanos e animais combinam-se a uma narrativa repleta de símbolos da modernidade, a qual apresentava ao mundo um imenso rol de avanços tecnológicos e ensejava uma reflexão sobre os rumos da espécie humana. Não é à toa que a história do principezinho tem um aviador como narrador, visto que o episódio do acidente aéreo pelo qual inicia a história sucedera de fato, no
SAINT-EXUPÉRY, Antoine de. O Pequeno Príncipe. Rio de Janeiro: Ediouro: Agir, 2002.
ano de 1935, com Exupéry. Era trabalhando como piloto de aviões que ele viabilizava seu ofício de escritor. Estava Exupéry prestes a realizar em tempo recorde a travessia aérea Paris-Saigon, quando se viu obrigado a realizar pouso forçado em pleno deserto. Andou durante cinco dias até encontrar uma caravana de nômades que o salvou. É provável que nesta oportunidade tenham vindo à mente do autor os primeiros esboços do enredo que, mais tarde, fascinaria gerações de leitores. É esta pequena história que sinaliza a primeira razão em juntar “Le Corbusier” e “O Pequeno Príncipe” num só estudo.
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Ana Carolina Pellegrini - O Vôo do Corvo
O apelido “Corbusier”, alude ao termo francês corbeau – corvo. A admiração de Charles Édouard pelos temas do ar, entretanto, não se resume à sua alcunha. Não são raros os desenhos nos quais o arquiteto se vale do esboço de aviões para conferir o caráter BOESIGER, Willy; GIRSBERGER, H. Le Corbusier 1910-65. Barcelona: Gustavo Gili, 1998.
da modernidade a seus projetos, em especial, os urbanísticos. A admiração de Corbu pela tecnologia e pela modernidade é tão evidente que, não por coincidência, um de seus mais famosos planos urbanísticos – para a cidade de Paris - leva o nome de uma famosa empresa francesa fabricante de automóveis e, claro, aviões – Voisin. A outra razão que sugere aproximar, num mesmo texto, Le Corbusier de Exupéry remete ao ano de 1929, mais precisamente ao mês de outubro. A data marca a primeira viagem do mestre arquiteto à América do Sul para uma série de conferências que foram professadas em países como Brasil e Argentina.
http://www.ffve.org/auto_ nostalgie/images/10_07.jpg
São estas explanações que estão documentadas, juntamente com as impressões sobre alguns países do continente sul-americano, no livro “Precisões sobre um estado presente da arquitetura e do urbanismo”, publicado pela primeira vez em Paris, no ano de 1930, e recentemente traduzido para a Língua Portuguesa.
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Ana Carolina Pellegrini - O Vôo do Corvo
Os trechos acima, entretanto, ainda não explicam o
Ainda que escassas e pouco precisas, as informações
papel de Saint-Exupéry no episódio.
sobre o possível contato de Saint-Exupéry com Le Corbusier, instigaram o desenvolvimento deste estudo,
Há relatos de que o romancista e aviador tenha estado
como uma homenagem à obra destes dois mestres na
na América do Sul, mais precisamente na cidade de
arte de contar histórias através de textos e imagens.
Buenos Aires, nos mesmos dias em que por lá esteve o famoso arquiteto. Especula-se, ainda, que o famoso
“en lo que parece haber constituido su primer viaje
vôo inaugural da Companhia Sudamérica de Aviação
aereo en vuelo comercial, (con el pilotaje de Saint-
– o mesmo que levou Le Corbusier de Buenos Aires a
Exupéry), camino de la ciudad de Corrientes, de
Assunción, tenha sido comandado por Exupéry.
colonias misioneras, de Posadas y de las orillas del Paraná, que mucho más tarde publica y comenta en su
“(...) há um fato dentre os mais reveladores desta
obra la Ville Radieuse. En su libro Precisiones cuenta
trama que, curiosamente, tem sido o mais velado
más tarde Corbu la fuerte impresión que le produce ese
– tanto por Le Corbusier como por seus biógrafos:
contacto con un mundo natural tropical e casi virgen.”
como consigna a exaustiva pesquisa de Liernur e
(GALDEANO, 2002)
Pschepiurca, Antoine de Saint-Exupéry (amigo pessoal de González Garaño) tinha chegado a Buenos Aires
A narrativa de Corbu sobre a, até então, dele
pouco depois do mestre (o dia 12/10/29), para fazer-
desconhecida América do Sul em muito se parece com a
se cargo da Companhia Sudamérica de Aviação; (...) a
do principezinho sobre os novos lugares que visitava. As
mesma em cujo vôo inaugural Le Corbusier realizara a
palavras do arquiteto compõem um relato que poderia ser
famosa travessia ao Paraguai, pilotada pelo ‘Capitão
classificado de emocional sobre a paisagem vivenciada do
Almonacid’. Assim, levando em conta a coexistência
alto. Com a perplexidade e encantamento naturais de um
de ambos no mesmo grupo social e na mesma cidade,
menino, Le Corbusier descreve o que vê em “Precisões”:
e levando em conta a similitude das descrições desse vôo que escrevem em forma simultânea, a omissão
“Vi, do avião, alguns espetáculos que se poderiam
no relato de Le Corbusier resulta particularmente
denominar cósmicos. Que convite à meditação, que
chamativa.” (PUGA, 2003)
chamado às verdades fundamentais de nossa Terra!
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Ana Carolina Pellegrini - O Vôo do Corvo
Partindo de Buenos Aires, atravessamos o Delta do Paraná, um dos maiores rios do mundo. (...) Visto do avião este delta evoca, em escala gigantesca, as gravuras italianas ou francesas da Renascença, que ilustram os tratados sobre a arte dos jardins. De avião, ainda compreendemos várias coisas: “A Terra assemelha-se a um ovo poché, é massa líquida esférica rodeada por um envoltório enrugado. A Cordilheira dos Andes ou o Himalaia nada mais são que rugas. Certas dobras das rugas romperam-se e eis a razão desses perfis de rochas audaciosas que nos proporcionam a noção do sublime!” (LE CORBUSIER, 2004) Não é apenas o tom da narrativa que aproxima a obra do arquiteto à do aviador; outra convergência se dá no que tange às ilustrações. Assim como Exupéry, Le Corbusier ilustra seu texto com eloqüentes imagens, as quais conferem à redação a complementação sígnica que extrapola as fronteiras da palavra. Tais desenhos, delineados com a rapidez do pensamento, foram elaborados durante suas conferências, em LE CORBUSIER. Precisões sobre um estado presente da arquitetura e do urbanismo. São Paulo: Cosac & Naify, 2004.
grandes folhas arrumadas para que o arquiteto pudesse expressar graficamente aquilo que professava verbalmente. São, portanto, componentes relevantes
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Ana Carolina Pellegrini - O Vôo do Corvo
do discurso do arquiteto e não consistem em mera complementação da narrativa. São protagonistas na fundamentação de suas idéias sobre a arquitetura e sobre as cidades. É deste emaranhado de idéias que surge o estudo “O Vôo do Corvo”, um ensaio que visa a apresentar ao leitor um jogo de imagens e palavras como pretexto para uma reflexão sobre a poesia da imagem. O Corvo e a Rosa O livro “O Pequeno Príncipe” começa com uma confissão do narrador. Como se tivesse intenção de conquistar a confiança do leitor transformando-o em cúmplice de suas vulnerabilidades, Saint-Exupéry, já na primeira página,
LE CORBUSIER. Precisões sobre um estado presente da arquitetura e do urbanismo. São Paulo: Cosac & Naify, 2004.
conta sobre sua pouca habilidade com o desenho. Para tanto, cita sua primeira experiência com o lápis, a partir de uma leitura sobre a “Floresta Virgem”. Conta, ainda, que ao mostrar seu desenho aos adultos, o mesmo foi interpretado como um chapéu! Insatisfeito com a primeira tentativa, partiu para uma segunda, desta vez, lançando mão de um recurso conhecido dos arquitetos: o desenho, (parcialmente) em corte, mostrava que a figura representada não se
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Ana Carolina Pellegrini - O Vôo do Corvo
tratava de um chapéu, mas sim de uma jibóia que havia comido um elefante. “As pessoas grandes aconselharam-me a deixar de lado os desenhos de jibóias abertas ou fechadas, e dedicar-me de preferência à geografia, à história, ao cálculo, à gramática. Foi assim que abandonei, aos seis anos, uma esplêndida carreira de pintor. Eu fora SAINT-EXUPÉRY, Antoine de. O Pequeno Príncipe. Rio de Janeiro: Ediouro: Agir, 2002.
desencorajado pelo insucesso do meu desenho número 1 e do meu desenho número 2. As pessoas grandes não compreendem nada sozinhas, e é cansativo para as crianças estar toda hora explicando.” (SAINT-EXUPÉRY, 2003) É deste singelo relato pessoal que nasce a imediata identificação entre o narrador da história e o Pequeno Príncipe. O primeiro encontro entre os dois se dá no Saara, depois de uma pane no avião do piloto-narador. Após uma noite passada ao relento, ouviu ao despertar do dia: “Por favor... desenha-me um carneiro!” Era um menino vestido como um pequeno príncipe, que parecia estar alheio às adversidades do deserto e, sem esclarecer o motivo de sua presença em tão insólito local, continuava em tom de reivindicação: “Desenhame um carneiro!” Diante do desafio, o narrador propôs o desenho da jibóia e do elefante – o único que sabia fazer. Insatisfeito, o Pequeno Príncipe reivindicou:
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“Não! Não! Eu não quero um elefante numa jibóia. A jibóia é perigosa e o elefante toma muito espaço. Tudo é pequeno onde eu moro. Preciso é de um carneiro. Desenha-me um carneiro.” O narrador, depois de várias tentativas frustradas, apresentou o desenho ao lado, o qual, por fim, satisfez o principezinho. SAINT-EXUPÉRY, Antoine de. O Pequeno Príncipe. Rio de Janeiro: Ediouro: Agir, 2002.
Firmado o primeiro contato, o menino contou que vinha de um distante e pequeno planeta. A limitação espacial era tanta, que lhe possibilitava, em poucos
ADULTOS NÃO VÊEM O CARNEIRO ATRAVÉS DA CAIXA!
segundos, dar uma volta caminhando ao redor de seu mundinho. O principezinho se ocupava diariamente da tarefa de limpar a terra para que as sementes de baobá – planta tão comum em seu reino – não germinassem e acabassem por alastrar-se por todo o espaço disponível. Dentre as fantásticas histórias contadas pelo Pequeno Príncipe, as que mais lhe emocionavam eram as lembranças de sua rosa. O principezinho contou que era possuidor de uma flor, única no mundo, “brotada de um grão trazido não se sabe de onde”. Sua flor havia passado dias se preparando para que, num amanhecer qualquer, revelasse todo o esplendor de sua beleza. Era linda, mas suas palavras revelavam certa dose de vaidade. Indefesa, passado algum tempo, reivindicou ao
BOESIGER, Willy; GIRSBERGER, H. Le Corbusier 1910-65. Barcelona: Gustavo Gili, 1998.
principezinho alguma espécie de proteção contra o vento e
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contra as intempéries. Sugeriu, então, uma redoma para que o cristal a protegesse. Entretanto, os recorrentes momentos de impertinência da rosa acabaram por tornar o Pequeno Príncipe infeliz. Não suportava a aspereza de suas palavras e decidiu partir. Aproveitou uma migração de pássaros para evadir-se. Depois de passar por inúmeros planetas, conhecer tipos diferentes, chegou à Terra. SAINT-EXUPÉRY, Antoine de. O Pequeno Príncipe. Rio de Janeiro: Ediouro: Agir, 2002.
Confessou ao seu novo amigo: “não deveria tê-la escutado, não se deve nunca escutar as flores. Basta olhá-las, aspirar o perfume. A minha perfumava o planeta, mas eu não me contentava com isso. (...) não soube compreender coisa alguma! devia tê-la julgado pelos atos, não pelas palavras. Ela me perfumava, me iluminava... não devia jamais ter fugido. Deveria ter-lhe adivinhado a ternura sob seus próprios ardis. São tão contraditórias as flores! Mas eu era jovem demais para saber amar.”
SAINT-EXUPÉRY, Antoine de. O Pequeno Príncipe. Rio de Janeiro: Ediouro: Agir, 2002.
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A flor e o cristal A metáfora da flor e do cristal há tempos permeia a história da arte e da arquitetura na busca de uma classificação para os padrões estéticos de uma e de outra. “A flor, órgão vegetal da reprodução, reúne os símbolos sensíveis da sedução, do amor e da recriação da vida.”(SUBIRATS, 1988) “No cristal, a matéria sensível concilia-se espontaneamente com a pureza formal, cuja ordem
SUBIRATS, Eduardo. A flor e o cristal. São Paulo: Nobel, 1988.
espiritual, geométrica ou matemática, percebemos antes mesmo de conhecer objetivamente suas leis.” (SUBIRATS, 1988) Bruno Taut, importante figura do movimento expressionista alemão, se valeu desta metáfora quando, em 1914, enunciou a ”Grande Flor”, que representava os novos caminhos da arquitetura. “La superficie de la Tierra cambiaría considerablemente si la arquitectura de ladrillo fuese desplazada de todas as partes por la arquitectura de cristal. Sería como si la Tierra se enjoyase y vistiese de esmaltes y dinamites.
http://www.arch.mcgill.ca/prof/sijpkes/ D+C-winter-2005/pavillions_concrete/ BrunoTaut.jpeg
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Tal esplendor es absolutamente inimaginable. Y entonces tendríamos en la Tierra cosas más exquisitas que los jardines de ‘Las mil y una noches’. Entonces tendríamos el paraíso en la Tierra y no necesitaríamos ya fijar nuestras miradas en el paraíso celestial.” (SCHEERBART in HEREU, MONTANER e OLIVERAS, 1994) http://www.artehistoria.com/tienda/banco/jpg/GRF17093.jpg
Paradoxalmente, o vidro, material tão exaltado pelos arquitetos expressionistas, é por eles empregado em composições que remetem à idéia de flor e não de cristal. Por conseguinte, pode-se especular que, a partir desta ambigüidade, a arquitetura passou a expressar de maneira combinada a metáfora da flor e do cristal, unindo a maleabilidade e versatilidade da estrutura metálica – uma das muitas conquistas da revolução industrial – com o vidro, o elemento que confere o significado de pureza e limpidez cristalina ao conjunto. Ou seja, uma fusão entre o elemento orgânico da flor e a dimensão racional do cristalino.
http://www.schiller-gymnasium-hof.de/ index.php3?ID=185
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Ana Carolina Pellegrini - O Vôo do Corvo
Corbu e a flor Dentre as quatro composições propostas por Le Corbusier, podemos encontrar volumetrias que correspondem às suas experiências projetuais no âmbito das construções residenciais, ou, como ele mesmo costumava chamar, suas “máquinas de morar”. Cada um dos esboços, numerados, segundo a figura ao lado – extraída de “Precisões”, de 123 a 126, corresponde, respectivamente, à Casa La Roche-Jeanneret, em Paris, à Casa Stein, em Garches, às casas em Stuttgart e,
SAINT-EXUPÉRY, Antoine de. O Pequeno Príncipe. Rio de Janeiro: Ediouro: Agir, 2002.
finalmente, à Casa Savoie, em Poissy. No primeiro exemplo, a Casa La Roche-Jeanneret, projetada em 1923, o arquiteto ressalta o caráter aditivo de sua composição volumétrica, resultado das agruras que o terreno a ser ocupado por não apenas uma, mas duas residências, lhe impôs. Notadamente intrincado, o partido volumétrico não peca pela fragmentação excessiva, mas deixa transparecer o fato de que o projeto envolve o terreno numa implantação à maneira dos redents, blocos de edifícios que conformariam parte do setor residencial do projeto da Ville Contemporaine, de 1922.
LE CORBUSIER. Precisões sobre um estado presente da arquitetura e do urbanismo. São Paulo: Cosac & Naify, 2004.
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“A planta parece muito irregular, pois as restrições brutais o exigiram e limitaram rigorosamente o uso do terreno. Ademais, o sol fica nos fundos da casa; com a orientação do terreno para o norte, foi preciso, através de certos estratagemas, buscar o sol na outra face. E, apesar desse caráter irregular imposto pelas condições adversas, predomina uma idéia: essa casa poderia ser um palácio.” (BOESIGER, 1998) http://www.e-architekt.cz/obrazky2004/stuttgart1927/14-xl.jpg
Corbu tinha sua flor. Um projeto que pode ser considerado morfologicamente orgânico, se tomado no contexto do rigoroso e purista modernismo corbusiano. Tais características, vale salientar, não se resumem ao exterior da edificação, mas permeiam também seu interior, rico em promenades architecturales, formadas por rampas, desníveis, visuais inusitadas e pés-direitos duplos. “Villa La Roche together with a villa for S. Marcel, which was never built, formed a neoclassical pentapartite composition. This composition resembles a series of investigations that Le Corbusier carried out during the same period paintings, manifesting on one
Ana Carolina Pellegrini
hand desire to conquer new, unexplored spatial-formal structures and on the other a return to Poussin and compliance with the classical canon. The same duality applies to the interior of the villa.” (TZONIS, 2001)
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Ana Carolina Pellegrini - O Vôo do Corvo
Corbu e o cristal Já a segunda composição, considerada por Le Corbusier a mais desejável, pois era “muito difícil” e demandava um maior esforço projetual e, por conseguinte, maior deleite estético, deu ao arquiteto seu cristal. “En Garches se observa una permanente tensión
BOESIGER, Willy; GIRSBERGER, H. Le Corbusier 1910-65. Barcelona: Gustavo Gili, 1998.
entre lo organizado y lo aparentemente fortuito. Conceptualmente todo está muy claro; pero, sensualmente, causa profunda perplejidad. Encontramos formulaciones de un ideal jerárquico, y contraformulaciones de otro ideal igualitario.” (ROWE, 1999) É no paralelepípedo áureo da casa projetada em 1927 que Corbusier atinge o seu propósito máximo da arquitetura cristalina – segundo a acepção que se procura atribuir neste estudo. O sólido platônico se ergue imponente sobre a rua e ostenta fachadas delineadas com notável rigor geométrico. Ainda que não possua os vastos planos envidraçados, tão comuns em outras experiências modernistas, e, principalmente no que mais tarde veio a ser denominado como Estilo Internacional, a Casa Garches é, indubitavelmente, um edifício de cristal,
CHING, Frank. Arquitetura: forma, espaço e ordem. São Paulo: Martins Fontes, 1999
uma gema rara da história da arquitetura.
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Ana Carolina Pellegrini - O Vôo do Corvo
A quarta composição resulta de um procedimento de subtração volumétrica, e o resultado final do projeto nos remete metaforicamente ao expressionismo alemão, uma vez que o partido arquitetônico sugere uma mescla da flor e do cristal. Na Casa Savoye, em Poissy, Le Corbusier lança mão de um invólucro regular para um miolo irregular. O arquiteto se vale dos Cinco Pontos da Nova Arquitetura – pilotis, planta livre, fachada livre, janela em fita e
Fonte: CURTIS, 2001.
terraço jardim – para proteger sua flor. “O local: um gramado vasto e encurvado. A vista principal dá para o Norte e, portanto, opõe-se ao sol. A frente normal da casa estaria, portanto, do lado contrário. A casa é uma caixa no ar, perfurada em toda a volta, sem interrupção, por uma janela corrida. Não se hesita mais em realizar jogos arquitetônicos com cheios e vazios. A caixa se eleva no meio dos prados, dominando o pomar.” http://www.culture.gouv.fr/culture/actualites/ celebrations2002/img/lecorbusier2.jpg http://www.rjohnwright.com/images/ newreleases/LittlePrince/PrinceAviator/ PrinceRose.JPG
(LE CORBUSIER, 2004) Como o principezinho de nossa história, Le Corbusier envolve cuidadosamente seu projeto com uma caixa de cristal que não esconde, mas sim, revela, através de suas fenetres en longueur, seu precioso conteúdo.
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O Pequeno Príncipe e a roseira Chegado à Terra, o Pequeno Príncipe havia percorrido vários lugares e experienciado várias paisagens antes do encontro que dá início à história. Foi numa dessas oportunidades que o menino chegou a um jardim repleto de rosas. Tomado por uma alegria passageira e perplexo por todas serem iguais à sua flor, o principezinho se dirigiu a uma delas e perguntou: “ - Quem sois? - Somos rosas.” SAINT-EXUPÉRY, Antoine de. O Pequeno Príncipe. Rio de Janeiro: Ediouro: Agir, 2002.
A naturalidade da resposta assustou o Pequeno Príncipe, que, decepcionado, deu-se conta da mentira de sua rosa, a de que era espécie única no mundo. Agora estava ele diante de muitas roseiras, talvez milhares de flores iguais a dele, e num mesmo jardim. “eu me julgava rico de uma flor sem igual, e é apenas uma rosa comum que eu possuo. Uma rosa e três vulcões que me dão pelo joelho, um dos quais extinto para sempre. Isso não faz de mim príncipe muito grande.” Deitado na relva, ele chorou.
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Ana Carolina Pellegrini - O Vôo do Corvo
Foi então que, segundo a história, apareceu a raposa. É ela que diz ao Pequeno Príncipe sobre a importância em se “criar laços” ao longo da vida. Explica ao menino que é o ato de cativar que torna algo ou alguém importante. “a gente só conhece bem as coisas que cativou. Os homens não têm tempo de conhecer coisa alguma. Compram tudo prontinho nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos, os homens não têm mais amigos. Se queres um amigo, cativa-me.” A criança lembrou-se imediatamente de sua rosa e compreendeu, que apesar de existirem milhares destas flores BOESIGER, Willy; GIRSBERGER, H. Le Corbusier 1910-65. Barcelona: Gustavo Gili, 1998.
no mundo, a dele era especial, pois o tinha cativado. Corbu e a roseira Foi em 1934, em seu projeto para a cidade de Nemours, na África do Norte, que Le Corbusier se deparou com sua roseira. A cidade contava com 18 Unidades de Habitação isoladas e posicionadas segundo a mesma, e mais favorável, orientação
BOESIGER, Willy; GIRSBERGER, H. Le Corbusier 1910-65. Barcelona: Gustavo Gili, 1998.
solar sobre a acidentada topografia do lugar, formando um anfiteatro de habitações. A principal estrada seria elevada, não interferindo nas demais vias de circulação.
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Em Nemours, Corbu lança mão da idéia da erosão dos blocos de habitação outrora projetados para a Ville Contemporaine e Ville Radieuse, e a independência das edificações não se resume a sua localização espacial, isolada, mas é levada ao extremo, inclusive no que tange a funcionalidade dos prédios. “Vós não sois absolutamente iguais à minha rosa, vós não sois nada ainda. Ninguém ainda vos cativou, nem cativastes ninguém. Sois como era minha raposa. Era uma raposa igual a cem mil outras. Mas eu fiz dela um amigo. Ela é agora única no mundo.” (EXUPÉRY, 2003) Corbu e a rosa BOESIGER, Willy. Le Corbusier. São Paulo, Martins Fontes, 1998.
A rosa, entretanto, resultou de uma ironia. As Unités d’Habitation, projetadas inicialmente para a cidade de Nemours, eram blocos habitacionais que reuniam, além dos apartamentos residenciais, todos os demais serviços básicos dos quais necessita o cidadão comum em sua vida urbana. Em tese, as Unidades de Habitação eram verdadeiras cidades verticais, independentes e isoladas formal e funcionalmente, conforme as experiências urbanísticas utopistas do século XIX. BOESIGER, Willy. Le Corbusier. São Paulo, Martins Fontes, 1998.
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Ana Carolina Pellegrini - O Vôo do Corvo
Le Corbusier tinha planos de consolidar e ampliar o conceito das Unités na reconstrução da França depois da Segunda Guerra Mundial, o que logo se demonstrou administrativamente inviável. Foram construídas, entretanto, algumas unidades isoladas, em caráter de exceção, o que transformava a Unité na “habitação coletiva elevada à condição de monumento” (ABREU, 1987, p. 67). Mais tarde, em 1945, foi encomendado a Le Corbusier, pelo Ministério de Reconstrução da França, o estudo para o projeto da Unidade de Habitação de Marselha. Pela primeira vez, o arquiteto teve liberdade para explorar maximamente suas concepções sobre o habitat moderno destinado à classe média. No projeto para Marselha, Le Corbusier apresentou apartamentos para todas as formas de morar, desde habitações de solteiros até as destinadas a famílias maiores. O arquiteto também procurou contemplar sua preocupação com o conforto ambiental, empregando elementos de proteção solar pré-fabricados e explorando a estrutura independente do edifício, o que ensejava a liberação de maior área de solo comum, explorada paisagisticamente. Foram previstos BOESIGER, Willy. Le Corbusier. São Paulo, Martins Fontes, 1998.
espaços para a instalação dos chamados serviços comuns de abastecimento, destinados a suprir as demandas funcionais cotidianas dos moradores da unidade.
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Ana Carolina Pellegrini - O Vôo do Corvo
O esquema de implantação das Unités, conforme idealizado por Le Corbusier, não chegou a se realizar totalmente. Ele previa a total urbanização das cidades segundo o conceito da barra compacta da Unidade de Habitação, tal qual foi imaginado para Nemours. A idéia era liberar a maior parcela de solo possível para o uso público, densificando os edifícios em altura. As unidades foram, no entanto, construídas em caráter de exceção, e não como elementos repetidos, homogeneamente dispostos sobre o tecido. Portanto, realizou-se exatamente o contrário do que fora
Fonte: CURTIS, 2001.
projetado no princípio. O que era para ser padrão tornou-se exceção. Ironicamente, foi esta inversão o fator que “cativou” as Unités d’Habitation. ”Eis o meu segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. o essencial é invisível aos olhos. -O essencial é invisível aos olhos, repetiu o principezinho, a fim de se lembrar. Foi o tempo que perdeste com tua rosa que fez tua rosa tão importante. Os homens esqueceram essa verdade. Mas tu não a deves esquecer. Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas. Tu és responsável pela rosa...” (EXUPÉRY, 2003)
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Ana Carolina Pellegrini - O Vôo do Corvo
Quando o moderno é patrimônio? Este ensaio apresenta uma singela, mas promissora, alternativa para abordagem acadêmica da história da arquitetura. A legítima exploração da metáfora não é exclusiva da literatura; pode significar qualificação da produção científica. A partir deste viés, o pesquisador – ou estudante – passa a estabelecer relações que rompem os convencionais limites do campo do saber, criando novas intersecções entre as diferentes áreas de conhecimento, o que ratifica o papel da universidade como agente de formação crítica e erudita, não apenas capacitando tecnicamente o egresso. Vale acrescentar que o texto é também fruto de uma monografia elaborada com fins de cumprir etapa de curso de doutorado pelo Programa de Pesquisa e PósGraduação em Arquitetura (PROPAR), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. A tese, cujas etapas preliminares vêm sendo desenvolvidas, versará sobre o seguinte tema: “Quando o moderno é patrimônio?” A contribuição deste estudo para a construção da referida tese vem sob a forma de reflexão. Mais do que a discussão a respeito da metáfora da flor e do cristal na arquitetura moderna, interessa transpor as fronteiras do tangível e identificar os fatores que
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Ana Carolina Pellegrini - O Vôo do Corvo
atribuem ao exemplar arquitetônico valor capaz de
Referências Bibliográficas
alçá-lo à condição de patrimônio. Quando o moderno
ABREU, Silvio. A vida tem sempre razão. O arquiteto, não. São Paulo:
é patrimônio? Quando é flor? Quando é cristal? Ainda
AU - Arquitetura e Urbanismo, vol. 3, n. 4, out./nov.1987.
no campo das metáforas poder-se-ia arriscar a afirmar:
BOESIGER, Willy. Le Corbusier. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
quando é rosa.
BOESIGER, Willy; GIRSBERGER, H. Le Corbusier 1910-65. Barcelona: Gustavo Gili, 1998.
“La arquitectura sirve a fines prácticos, está sometida
CHING, Frank. Arquitetura: forma, espaço e ordem. São Paulo: Martins
a un uso; pero también se halla conformada por
Fontes, 1999
ideas e fantasías, y éstas pueden clasificar, cristalizar,
CURTIS, William J. R. Modern Architecture since 1900. Londres:
hacerse visibles. En algunas ocasiones la cristalización
Phaidon Press Limited, 2001.
arquitectónica de una idea incluso puede adelantarse a su
GALDEANO, Ernesto. Le Corbusier: ¿Qué mas decir hoy sobre Le
expresión literaria;” (ROWE, 1999)
Corbusier? Disponível em: <http://arq.unne.edu.ar/areadigital/area2/ galdeano1corbusier.htm> Acesso em 06/12/2004.
Ana Carolina Pellegrini é Arquiteta e Urbanista, graduada no ano de 1999, pela Faculdade de Arquitetura da UFRGS, Mestre em Teoria, História e Crítica da Arquitetura, no ano de 2002, pelo Programa de Pesquisa e Pós-Graduação em Arquitetura (PROPAR) da UFRGS, professora adjunta do Curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário Feevale.
HEREU, Pere; MONTANER, Josep Maria; OLIVERAS, Jordi. Textos de arquitectura de la modernidad. Madrid: Editorial Nerea, 1994. LE CORBUSIER. Precisões sobre um estado presente da arquitetura e do urbanismo. São Paulo: Cosac & Naify, 2004. PUGA, Mariana. Soy loco por ti, América. Disponível em: <www.maxw ell.lambda.ele.puc-rio.br/> Acesso em 06/12/2004.
217-Bloco(1)
Eduardo Jaeger
que estas estabelecem entre si e com seus lugares. É
Não-lugares e Cidade Genérica: simbiose
exatamente nestes processos de mudança de relações
antropomórfica
que os principais problemas sociais são gerados, dentro de um transe contínuo no qual a incansável máquina que
Resumo
mantém as cidades permanece funcionando. Neste ponto já não existem mais relações humanas: podemos chamá-
Ao se falar em Não-Lugares, primeiro devemos considerar
las agora de relações sub-humanas ou, quem sabe, de
os lugares. O ser humano desde o princípio dos tempos
relações cyber-humanas. Este é o panorama presente
é um ser que configura o espaço e por ele é configurado,
nos não-lugares, onde já não existe mais espaço para a
para relacionar-se. Uma vez que o ser humano deixa de
vida provinciana, tampouco para o senso de coletividade
relacionar-se, o espaço perde seu sentido, tornando-
conhecido. O que se tem agora é um senso de
se um não-lugar. A cidade genérica é a soma dos
coletividade generalizada, no qual a falta de identidade
espaços humanos, que não possuindo um sentido,
é a premissa de uma sociedade padronizada. De maneira
descaracterizam-se e tornam-se um produto qualquer,
muito íntima, as cidades genéricas relacionam-se de
caindo na generalização. Este artigo aborda a relação
forma simbiótica com os não-lugares, os quais são a
entre o homem e seu espaço de coexistência, na relação
causa e a conseqüência de suas existências.
com a modernidade, a supermodernidade, a criação dos não-lugares e a configuração da cidade genérica.
O Lugar Antropológico
Introdução
Em algumas realidades ainda é possível encontrar um modelo de cidade no qual, em determinados dias, existe
O advento dos tempos atuais apresenta uma série de
uma feira livre, que, em horários marcados aos finais
benefícios que visam a facilitar e a melhorar a vida das
de semana, são celebrados cultos religiosos e que, em
pessoas, contudo traz consigo uma série de problemas.
certas datas do calendário, festas das mais variadas são
O ritmo de evolução das tecnologias e o incansável
preparadas para a convivência dos cidadãos. Todo este
ciclo econômico refletem diretamente não apenas no modo de vida das pessoas, mas também nas relações
Página anterior: acervo do autor.
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Eduardo Jaeger - Não-lugares e Cidade Genérica: simbiose antropomórfica
conjunto de fatores configura o que os antropólogos
ter, no mínimo, um sentido ou histórico, ou relacional
convencionalmente chamam de “lugar antropológico”.
ou identitário. Sendo histórico, o lugar remete sempre
Este lugar é o local de vivência das pessoas: é onde
a fatos importantes que ali aconteceram, o que sempre
se trabalha, onde se mora, onde o comércio acontece,
retrata a peculiaridade do lugar. Para ser um lugar
onde está a cultura; é a escola, é a praça, a rua...
relacional, o espaço configura-se pelas relações que este
enfim, é a cidade. Todos estes lugares estão ligados
estabelece entre os vários componentes do seu entorno
diretamente com as relações pessoais, que desde os
e a conformação que estes conferem, bem como os vários
tempos mais remotos têm sido o alimento da vida social,
segmentos sociais que por este espaço relacionam-
é por onde nos tornamos conhecidos, nos identificamos
se, existindo um sentimento de interconexão entre as
e nos relacionamos, renovando a sociedade. O lugar
partes. Sendo identitário, o espaço está relacionado à
antropológico nada mais é do que o espaço que o homem
forma como as pessoas se identificam com ele, estando
configura, não pela forma física, mas pela ideologia que
ligado ao jeito como apreendemos o mundo e como nos
é inerente a este local. Voltando um pouco no tempo,
sentimos confortáveis frente ao lugar como se configura.
os primeiros relatos de lugares antropológicos remetem
Os lugares são, portanto, os locais nos quais o uso que
a épocas ainda anteriores à da Grécia Antiga, onde o
lhes é atribuído e a relação que estes estabelecem
Ágora era o espaço destinado à convivência, à reunião
com seus usuários conformam um espaço virtual de
e às decisões sobre as coisas públicas. Com o passar dos
humanização, de caráter antropológico.
tempos, o espaço da Ágora foi se transformando, mas o caráter público, de coração da cidade, se mantém ainda
A Supermodernidade e os Não-Lugares
em muitas das praças das cidades contemporâneas. O que pode ser percebido é que os lugares estão
Para que seja possível entender o conceito de
relacionados com o sentido de humanização, ou seja,
supermodernidade é necessário, acima de tudo, entender
são espaços criados pelo homem e para o homem.
o que buscou a modernidade. A Modernidade foi um
Estando fundamentados em relações humanas, para
movimento em que uma das premissas era justamente
serem entendidos como “lugares”, três características
o sentido da coletividade. Na arquitetura, este sentido
são identificadas pelo antropólogo Marc Augé como
de coletividade está presente, principalmente no meio
princípios básicos. Para ser um lugar, o espaço deve
urbano, como o exemplo dos parques e praças de grandes
220-Bloco(1)
Eduardo Jaeger - Não-lugares e Cidade Genérica: simbiose antropomórfica
dimensões, que tinham o objetivo de abrigar o maior
se desnecessárias à medida que se tornam substituíveis
número possível de pessoas, indistintamente, que visavam
pela tecnologia ou pelo sentido de individualidade
a estimular um convívio social mais intenso. A experiência
marcado pelo mundo econômico. O advento da tecnologia
modernista não obteve o êxito conceitual esperado,
nos permite falar com as pessoas, a distâncias longas ou
configurando alguns espaços de pouco ou nenhum uso.
não, sem que seja necessário estar presente; para tanto,
O modernismo, foi um movimento humanista que buscou
a tecnologia evoluiu desde o telefone até a Internet. As
o desenvolvimento tecnológico, limpando elementos
tradicionais feiras de rua nas quais eram feitas as compras
desnecessários ao funcionamento dos prédios, como
do dia e que eram locais de encontro e permanência, agora,
em uma tentativa de buscar a “verdade absoluta”, sem
são substituídas pelos shoppings dotados de corredores
máscaras ou signos, como se refletisse a necessidade do
infindáveis que levam a um fluxo ininterrupto de pessoas,
espírito humano em buscar a pureza.
cujo objetivo está apenas na relação comercial a ser estabelecida.
A supermodernidade vem a ser o exagero da modernidade, ou seja, os conceitos chave do modernismo desenvolvidos
Em oposição ao espaço físico conformado pelas praças,
ao extremo, de forma que se tornam o oposto. Se na
nas quais as pessoas se encontravam, conviviam e
modernidade buscou-se o sentido da coletividade, tratando
relacionavam-se, a tecnologia oferece a Internet, que
cada cidadão indistintamente, na supermodernidade esta
passa a ser uma espécie de hiper-espaço no qual não
indistinção torna-se tão intensa que se transforma em
existem limites físicos, como se o usuário estivesse à
generalização, o que faz com que se perca o sentido de
deriva no espaço sideral, podendo locomover-se conforme
identidade social. O mesmo ocorre com o desenvolvimento
sua vontade a locais diversos, infinitamente distantes, à
da tecnologia, que buscou sempre facilitar a vida humana,
velocidade de um clique. Toda essa tecnologia substitui
e que atualmente substitui a mão do homem, tornando-o
a vida física do ser humano, fazendo com que a vida
cada vez mais acomodado e exigente.
cotidiana passe a ser medíocre aos olhos do padrão enlatado que a supermodernidade vende à sociedade.
O conceito de um Não-Lugar implica a negação da condição humana de espaço antropológico dos espaços que a
O grande problema desta padronização é o fato de
supermodernidade conforma. As relações humanas tornam-
que, estando de fora, a pessoa passa a tornar-se
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Eduardo Jaeger - Não-lugares e Cidade Genérica: simbiose antropomórfica
ilhada diante da vida que ocorre a sua volta. É neste
às demandas econômicas e tecnológicas. Não obstante,
ponto que nossa consciência se desliga. Desliga para
para que se possa ser um usuário dos benefícios da
vivermos uma série de procedimentos e conhecimentos
supermodernidade, é necessário, a cada passo, validar e
pré-estabelecidados, como um robô executando a
comprovar a inocência de caráter à sociedade, de forma
função para a qual foi desenvolvido, que uma vez não
que, para acessar a Internet, é necessário senha, para
fazendo a tarefa como programado, torna-se obsoleto
pegar dinheiro, senha; para abrir um cadastro é preciso
e pela linha de produção é descartado.
demonstrar como foi sua vida nos cinco últimos anos... Não existe mais um sentido relacional, pois a
Quando pensamos nesta forma de viver, segundo os
segmentação das diversas atividades sociais faz com que
conceitos e facilidades impostos pelo meio, percebemos
estas se individualizem, não havendo uma inter-relação
que a supermodernidade transforma a sociedade em
que não seja aquela meramente comercial e de curta
uma indústria produtora de “homens médios”. Estes,
duração. E como não poderia faltar, não existe mais uma
na verdade, são os cidadãos moldados pela tecnologia
identidade que faça as pessoas sentirem-se em casa
vigente, detentores de uma cultura padrão na qual
ou com a qual elas possam se espelhar. Um caso muito
qualquer passo que seja dado em uma direção não
característico é o da cultura japonesa, que vivendo um
programada pode representar um desafio possivelmente
constante desenvolvimento econômico e tecnológico,
desastroso e, no mínimo, muito perigoso à continuidade
mundializou sua cultura, que pode ser encontrada em
do padrão massificante.
qualquer parte do planeta, em releituras muito diversas, seja no oriente, seja no ocidente.
Os não-lugares passam a ser, então, o ambiente de convívio destes homens médios, nos quais as relações
A cidade Genérica
efêmeras são o ponto chave para seu funcionamento. Mais do que isso, os não-lugares existem para atender às
Pode-se dizer que a Cidade Genérica é também
necessidades essencialmente superficiais destes homens
um produto da supermodernidade, que alimenta a
médios. Os lugares passam a não ter mais uma relação
supermodernidade. A cidade e suas relações mudaram
histórica com as pessoas, pois à medida que são criados,
com o passar dos anos. O que antes caracterizava uma
também são modificados constantemente para atender
cidade, devido ao grau de peculiaridade, hoje não é
222-Bloco(1)
Eduardo Jaeger - Não-lugares e Cidade Genérica: simbiose antropomórfica
mais tido como um fator que a destaque dentre outras.
pode ser percebido na cidade genérica é que, quanto
Muito pelo contrário, ela passou a ser mais uma entre
mais afastado se está do seu centro de funcionamento,
tantas outras. Essa homogeneização é o que caracteriza
menor será o impacto sofrido pela vida que esta
a falta de identidade que as cidades, especialmente
oferece. Um bom exemplo disso são as propriedades
as novas, desenvolvem cada vez mais. Não é possível
rurais que, embora afastadas do centro das cidades,
fazer de uma cidade a cópia de Londres, ou de Nova
lutam para manter a vida como esta sempre foi, mas
Iorque, mas grande parte das cidades desenvolve
não deixam de ter o conforto da rede de água e luz e,
aspectos que procuram copiar estes modelos existentes.
muitas vezes, a comunicação automatizada, que é a
A própria tecnologia é o veneno que proporciona
supermodernidade se infiltrando discretamente onde ela
da desidentificação das cidades. É aceitável que a
ainda não alcançou completamente.
tecnologia esteja ao alcance de todos, contudo a Não-Lugares e a Cidade Genérica
expansão da tecnologia uniformiza seu uso. O processo de homogeneização das cidades faz com que a cidade não se torne apenas um xerox barato de
Os não-lugares são os locais apropriados ao
modelos pré-existentes, faz com que a cidade torne-se
desenvolvimento da cultura da supermodernidade,
efêmera, atendendo aos gostos e às tendências que a
criados pela cidade genérica. Embora a cidade genérica
moda determina. Esta é a jogada que o mundo econômico
não possa ser integralmente adaptada ao conceito de
configura em prol do consumismo e que rege a vida dos
Não-Lugares, segundo a acepção de Rem Koolhaas e Marc
homens médios. Para atender a essa falsidade efêmera
Augé, esta cria condições ao seu desenvolvimento. Na
que vive a cidade, um processo de renovação constante
cidade genérica, ainda existem as praças, o comércio, os
é disparado, fazendo com que não apenas o comércio
centros culturais, as escolas, etc... contudo, a tecnologia
esteja beneficiado com a supermodernidade, mas as
que visa a facilitar a vida das pessoas cada vez mais as
indústrias e, por conseguinte, toda a economia.
individualiza, trazendo como exemplo a Internet, que
Pensando desta forma, a cidade genérica pode ser
está presente no pacote tecnológico do padrão social
comparada a um fractal, no qual desde as mais infinitas
contido na cidade genérica. Então, embora a humanidade
e pequenas partes, existe uma reprodução do todo, que
tente viver de forma harmônica e homogênea, os Não-
é uma reprodução do todo que já é conhecido. O que
Lugares brotam como o refúgio ao cotidiano, nos quais
223-Bloco(1)
Eduardo Jaeger - Não-lugares e Cidade Genérica: simbiose antropomórfica
não existe dimensão espacial ou temporal que torne
a supermodernidade. Havendo um cliente que procura
a vida complicada, dolorosa ou confusa. O problema
um arquiteto para o desenvolvimento de um shopping
está nas pessoas que estão fora dos padrões da
center, o que pode o arquiteto fazer para reduzir o efeito
supermodernidade, que sofrem e confundem-se para se
que este exemplo de não-lugar representa? Em uma
adaptar à série de procedimentos e rituais.
primeira análise, cabe destacar que a oportunidade de
De forma semelhante, os não-lugares desenvolvem a
um trabalho grande é, na grande maioria das vezes,
cidade genérica, uma vez que são frutos de um padrão
muito difícil, fazendo a lei da concorrência falar mais
repetitivo presente desde as realidades mais pobres
alto. Quanto às definições de projeto, cabe ao arquiteto,
às mais ricas. Os não-lugares interconectam a cidade
atendendo seu cliente, viabilizar o uso dos espaços e
genérica, criando uma rede infinita e homogênea, seja
promover a atividade do comércio, contudo não deve
pelo comércio, seja pela tecnologia, seja pelo espaço.
restringir-se apenas a isto. Hoje em dia, é comum
E é nesta relação bivalente que a supermodernidade
encontrar shoppings nos quais as mais diversas funções
permanece, dando sentido ao seu ritmo contínuo
estão destacadas, como o comércio, o lazer, a educação,
e incansável, formando não apenas uma sociedade
em alguns casos cultura, restaurantes, etc... Contudo,
mediana, mas tabulando todos os aspectos da vida,
estes espaços estão disponíveis apenas a quem está
sejam eles humanos ou não.
dentro do shopping. Algumas estratégias poderiam funcionar bem, como permitir às lojas do térreo a
Discussões
integração com a rua, quem sabe até permitir que seu acesso ocorra pela rua, devolvendo o comércio ao local
Diante da forma como a sociedade se configura, o papel
que antes o possuía. O interior do shopping não precisa
do arquiteto é peculiar no processo de humanização da
ser um espaço hermeticamente fechado, no qual se perde
cidade. É fácil compactuar com a necessidade econômica
a noção das horas do dia. Pode haver uma parte que seja
que o mercado de trabalho impõe, tanto que a própria
permeável ao exterior, como um átrio central ou terraços
concorrência é o termômetro que regula não apenas a
habitáveis, para que não se percam as relações com o os
arquitetura, mas todas as áreas da economia.
elementos existentes na cidade, como um dia de sol, ou
Citando um exemplo prático, torna-se mais claro
uma chuva, ou o barulho da rua, enfim, toda uma série de
exemplificar o papel do profissional da arquitetura frente
fatores que tornariam o lugar menos padronizado e mais
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Eduardo Jaeger - Não-lugares e Cidade Genérica: simbiose antropomórfica
humanizado, menos previsível e mais dinâmico.
Referências bibliográficas
E a respeito dos materiais, é possível propor o uso de materiais conceitualmente menos “high tech”, por que não
1 – AUGÉ, Marc. Não-lugares – introdução a uma antropologia da
o uso de materiais comumente disponíveis na região em
supermodernidade. São Paulo: Ed. Papirus, 2003.
que o projeto se insere??? Como um determinado tipo de
2 – BAUDRILARD, Jean. Tela total : mitos, ironias da era do virtual e da
madeira ou pedra... estas decisões criam uma identidade
imagem. Porto Alegre: Ed. Sulina, 1999.
ao projeto e ao lugar, tornando-o belo e peculiar. E, sendo
3 – MITCHEL, William. E-topia. Barcelona: Ed. Gustavo Gili, 2001.
peculiar, passa a ser um lugar.
4 – KOOLHASS, Rem. MAU, Bruce. S,M,L,XL. Nova Iorque: Monacelli Press.
Quanto ao urbanismo, o projeto de praças que sejam
Eduardo Jaeger é acadêmico do Curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário Feevale.
acessíveis e atrativas é um forte instrumento que motiva as pessoas ao retorno da vida cotidiana. A conformação de espaços que não sejam apenas aqueles onde não existe diferença entre ter ou não estado neste ou naquele local. Os espaços carecem de uma significância, exortando o fantasma do projetar pelo projetar, ou seja, encontrar uma solução para o problema, sem vivenciar a experiência de usar o lugar, quando ele ainda está sendo desenvolvido. A profissão da arquitetura é extremamente humana, embora possa parecer essencialmente técnica. Uma vez que o homem projeta espaços para uso do homem, a arquitetura é humana. É segundo este pensamento que o profissional da arquitetura deve atuar, buscando a excelência não apenas do objeto construído por seu trabalho, mas das relações que dele irão resultar.
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Juliano Caldas de Vasconcellos Bases e construção do Sistema Dom-ino O presente artigo procura abordar as questões construtivas do Sistema Dom-ino – divulgado por Le Corbusier entre 1914 e 1915 – reforçando o conceito de uma compilação de idéias perfeitamente correntes na época, destacando a participação de dois engenheiros no cálculo da proposta e dimensionando o sistema a partir de documentos e desenhos publicados. É ressaltada a importância do balanço como elemento fundamental para que a fachada seja livre e os argumentos apresentados por Le Corbusier sobre a estrutura independente, encerrando com as razões do esmorecimento do processo. Precedências construtivas O conceito estrutural que seria apresentado pelo sistema Dom-ino, em 1914, é originado construtivamente em um princípio de utilização de elementos já perfeitamente ortodoxos naquele ano (FRAMPTON, 1979, p. 66). Além das prematuras lajes nervuradas concebidas por Wilkinson na metade do século XIX, as realizações de C.A.P. Turner e Maillart,
Fig. 01 - Esquemas comparativos entre os sistemas de armaduras e capitéis de Claude Turner [esq] e Maillart [dir] (GASPARINI, 2002):1244
no início do século XX já indicavam que as vigas aparentes não eram mais elementos indispensáveis na formação do plano em concreto armado (fig. 01).
Página anterior: acervo do autor.
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Juliano Caldas de Vasconcellos - Bases e construção do Sistema Dom-ino
O sistema de lajes planas também era descrito oficialmente em um manual de 1912 – que fazia parte da biblioteca pessoal de Corbusier – publicado pela 01
Associação de Cimento Portland dos Estados Unidos . Como exemplo europeu pode-se citar uma realização na Inglaterra (fig. 02) onde em 1913 foi aplicado entre 02
outras obras no The British-American Tobacco Co . A construção de pisos com a utilização de elementos cerâmicos ou assemelhados possibilitaram não só a construção rápida requerida, mas também o aumento Fig. 02 - Gordon & Guton: The British-American Tobacco Co., LTD., Londres, 1913. Distribuição das peças cerâmicas e montagem das ferragens. (CONCRETE and Constructional Engineering, nov. 1913 Vol. VIII nº11): 750
da resistência dos planos referente aos esforços de punção, derivados principalmente do aumento da seção das lajes. Este fato contribuiu também para que os capitéis de engrossamento fossem gradativamente reduzidos e os pilares se tornassem cada vez mais esbeltos, ambas características importantes para um sistema que tinha como objetivo primeiro a industrialização e feitura em série, mas que avançou nos anos seguintes como um ícone representativo da nova arquitetura.
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Juliano Caldas de Vasconcellos - Bases e construção do Sistema Dom-ino
Domus de construção rápida “Corbusier recorda que, nos idos de 1914, quando lhe ocorreu a idéia das casas Dom-ino, les inventions plastiques magnifiques de Lloyd Wright e les saines créations de Auguste Perret eram os únicos intentos a opor-se a uma renovação arquitetônica precária [...]. Deriva a idéia das casas flamengas dos séculos XV ao XVII e diz que lhe tomou quinze anos reconhecer que o esquema de ossatura então proposto era a chave duma solução unitária para a arquitetura do século, a chave duma unidade arquitetônica
Fig. 3 - Le Corbusier: Sistema Dom-ino,1914. Perspectiva cônica do sistema conforme foi concebido. (LE CORBUSIER, 1914)
abarcando casas e palácios, aldeias e cidades, resultado duma abordagem disciplinar integrando coordenadas sociais, industriais e estéticas.” (COMAS, 2002) Considerado por muitos como ponto de partida da visão pessoal de Le Corbusier sobre a nova arquitetura e da aplicação de novos materiais, o sistema Dom-ino – nome que evoca Domus (casa em latim) e o jogo de dominó (pela peça retangular marcada por seis pilares) – é proposta elaborada com a co-autoria dos engenheiros 03
Max Du Bois e Juste Scheneider .
Fig. 4 - Perspectiva gerada por computador a partir das dimensões obtidas através das planta e cortes do esquema original. (desenho do autor)
Concebida originalmente como um sistema estrutural válido para possibilitar a rápida construção de casas em série – um mercado aberto depois do começo da guerra de 1914, se aplica com esta finalidade somente em
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Juliano Caldas de Vasconcellos - Bases e construção do Sistema Dom-ino
04
1929 com a Loi Loucheur . O interesse de Le Corbusier pelo concreto armado tinha origem principalmente na influência de Auguste Perret, para quem trabalhou durante sua visita a Paris em 1907. Este interesse aumentou após o contato com o engenheiro e amigo Du Bois. Em colaboração, desenvolveram o sistema construtivo que se apoiava nos princípios formulados por Emil Mörsch de quem Du Bois foi discípulo na politécnica de Zurique (FRAMPTON, 1979, p.64). O sistema consistia numa estrutura reticular simples em concreto armado, ligeiramente elevada do chão, com três lajes planas horizontais balançadas nos lados maiores, 05
sustentadas por oito pilares de seções idênticas apoiados em oito blocos de fundação (fig. 4a e 05), com quatro lanços de escada apoiados pelos patamares. A figura da laje plana direcional sem vigas aparentes foi Fig. 4a - Le Corbusier: Planta e cortes do sistema estrutural, 1914. (LE CORBUSIER, 1914)
possível através da utilização de um sistema semelhante ao caixão perdido (hollow pots), que proporciona que o vão maior (4m) seja vencido por uma laje de espessura de 40cm. Cada laje é dividida longitudinalmente em 10 módulos de 75cm, correspondente aos alvéolos marcados pelos vazios das formas retangulares. Esta armação da laje em módulos produz 11 “vigotas” transversais [A] de 15cm de largura entre cada cavidade.
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Juliano Caldas de Vasconcellos - Bases e construção do Sistema Dom-ino
As dúvidas sobre o sistema Alguns aspectos sobre o sistema se mostram obscuros na descrição de 1914 publicada na Œuvre Complète, principalmente sob o aspecto da execução da estrutura. Primeiramente, o texto se refere que o concreto era, pelo menos em parte, pré-fabricado – existem referências a uma indústria que entregaria parte dos elementos construtivos na obra – porém, os pilares e lajes eram, na realidade, fundidos in loco, e os únicos elementos pré-fabricados eram as formas reutilizáveis e escoras de metal. Nenhum texto até hoje esclarece esta questão, nem mesmo os arquivos da Propriété Industríelle (que detém o registro de todas as patentes da França). As
Fig. 5 - Le Corbusier: Planta e cortes do sistema estrutural, 1914. (LE CORBUSIER, 1914)
conjecturas a partir dos parcos esboços levam a crer na seguinte descrição elaborada por Taylor (1973): “As fundações são igualmente espaçadas no solo, e a primeira laje repousa diretamente sobre eles. Os pilares de concreto armado são concretados até o primeiro piso, utilizando (presumivelmente) tradicionais formas de madeira. Uma vez curados, são fixadas peças de metal que armam uma estrutura retangular de apoio para suportar as formas reutilizáveis. Sobre ela são colocadas vigas menores em intervalos regulares (1m) que servirão de apoio para as peças cerâmicas ocas. As ferragens são posicionadas entre
Fig. 6 - Planta do pavimento superior de uma unidade habitacional (sistema Dom-ino). As paredes leves, coincidentes com os pilares tinham o objetivo de compartimentação rápida. (Disponível em <http://www.geocities.com/darq_estudio/lecorbu/lcdo02.jpg> Acesso em 24 jul. 2003)
as pequenas vigas I. O concreto é introduzido preenchendo
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Juliano Caldas de Vasconcellos - Bases e construção do Sistema Dom-ino
Fig. 9 - Corte demonstrando o sistema de suporte temporário.[FRAMPTON, 1979]:69d Fig. 7 - Planta baixa do sistema sem a porção da escada. (FRAMPTON, 1979):69b
Fig. 8 - Planta baixa com os pilares e o sistema de suporte temporário.[FRAMPTON, 1979]:69c
Fig.10 - Perspectiva axonométrica demonstrando a montagem das lajes. [FRAMPTON, 1979]:69a
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Juliano Caldas de Vasconcellos - Bases e construção do Sistema Dom-ino
os espaços entre as peças cerâmicas, consolidando a estrutura. Assim sendo, a superfície inferior da laje coincide com o topo das vigas menores. Após a cura do concreto, toda estrutura metálica é removida, deixando assim, tanto o teto quanto o piso, completamente planos.” Esta descrição deixa algumas questões pendentes, ou pelo menos duvidosas: 1) A necessidade de formas de bordo que aparassem o concreto nos lados menores durante a concretagem não é citada. 2) Também não são mencionadas formas – ou suportes inferiores – para as vigas longitudinais que conectam os pilares com as 11 vigas transversais. 3) Salvo as construções em grande escala, não há evidências de que o sistema de formas em aço seria realmente mais barato que o sistema tradicional em madeira. 4) A montagem e desmontagem das formas de aço levaria tempo, bem como a mão-de-obra requerida para a execução deveria ser muito mais especializada. Os aspectos acima descritos, juntamente com o custo da produção das formas em comparação com outros sistemas
Fig. 11 - Le Corbusier: Sistema Dom-ino, 1915/1916. Croquis demonstrando os suportes temporários das lajes e suas partes constituintes. (FRAMPTON, 1979):65a
estruturais, sugerem alguns dos motivos pelos quais este esquema não foi implementado da mesma forma que foi concebido, mesmo que Le Corbusier tenha utilizado esta concepção semelhante de laje plana na construção de villas de grandes industriários – que foram seus
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Juliano Caldas de Vasconcellos - Bases e construção do Sistema Dom-ino
primeiros clientes – como é o caso da Villa Schwob (fig. 12), de 1916. Deve ser enfatizado mais uma vez que estas descrições não passam de conjecturas, já que as informações sobre o sistema não são abundantes. A falta de evidências e descrições mais detalhadas torna impossível averiguar qual das propostas era a solução final, já que dentro do mesmo conjunto de documentos publicados existem diversas inconsistências e assincronias.
Dimensões do protótipo* Vão maior
4m
Vão menor
2m
Balanços
1,2m
Espessura laje
0,40m
Pé-direito
2,5m
Pilares
0,15x0,15m
[*] Dimensões levantadas a partir da escala gráfica.
Fig. 12 - Le Corbusier: Villa Schwob, 1916. A imagem indica um sistema construtivo de laje plana semelhante ao utilizado no sistema Dom-ino. (FRAMPTON, 1979):64
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O avanço do balanço “Em nota intitulada De Joseph Monier a Le Corbusier, Tarsila do Amaral
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vê a herança do inventor do
concreto armado repartida entre os irmãos Perret (com Auguste à frente) e Corbusier (com o primo Jeanneret por trás) numa frente única contra o academismo sobrevivente, embora julgando que a segunda linha é a mais forte, a mais inteligente, a mais arrojada. A raiz da diferença que Tarsila não descobre, Corbusier silencia e os italianos evitam é o balanço fundamental para que a fachada possa ser livre[...]” (COMAS, 2002) O balanço estrutural – que surgiu como um ensaio na Maison Hennebique de 1903 e cresceu acanhado no 25 bis de Perret de 1905 – desponta agora como elemento com força estrutural – pelos diagramas de momento fletor elaborados por Corbusier (fig. 13) – e formal – pela liberdade que ele outorga à fachada. Sua realização não apenas revela o controle sobre o comportamento do plano contínuo e liso de Maillart, mas também colabora – quanto maior a dimensão de seus balanços – para que o vão se amplie na razão inversa da espessura da laje.
Fig. 13 - Le Corbusier: Esquema comparativo entre a construção com paredes portantes e o sistema de estrutura independente, através de diagramas de momento fletor. Neste desenho, Corbusier demonstra o ganho em desempenho e economia com o advento do balanço estrutural. (LE CORBUSIER, 1930):41
De fato, a explicitação por parte de Le Corbusier do avançamento do plano do piso ou cobertura é muito mais que apenas uma compensação das solicitações
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Juliano Caldas de Vasconcellos - Bases e construção do Sistema Dom-ino
de momento fletor ou cortante. Neste aspecto, o sistema Dom-ino incita que o plano vertical de fachada é independente da ossatura do edifício, e que o retrasamento dos seus apoios em relação à prumada da vedação acaba por libertá-la das marcações provenientes de sua presença, como se pudessem, em um estalar de dedos, as fachadas da garagem da rua Ponthieu de Perret (1905) ou da fábrica da Ford de Albert Kahn (1909) se desobrigar da forte presença da Fig. 14 - Le Corbusier: Sistema Dom-ino, 1914. Maquete do sistema estrutural. (FONDATION LE CORBUSIER. Le Corbusier: architecte/ artiste. London: Infinitum publications, 1997. CD-ROM. Macintosh)
visível grelha formada pelos pilares e vigas. É evidente – pelas plantas e pelas elevações que acompanhavam o esquema – que, em um primeiro momento, Corbusier não percebeu os aspectos formais deste revolucionário recurso. O balanço estava ali como um elemento que colaborava estruturalmente no funcionamento estático do esqueleto independente, ampliando a projeção da laje e proporcionando que as medidas das vigas embutidas na laje fossem compatíveis com uma construção que se propunha ser rápida e econômica.
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Juliano Caldas de Vasconcellos - Bases e construção do Sistema Dom-ino
Corbusier como compilador Em termos gerais, pode-se definir o Dom-ino como a compilação de muitas idéias represadas por um longo período. FRAMPTON (1979, p.72) elabora uma cronologia que auxilia a separar os elementos desta síntese sob o aspecto arquitetônico: 1) por razões econômicas, os arquitetos modernos seriam forçados, eventualmente, a utilizar os novos materiais e técnicas construtivas. Era uma questão urgente que os arquitetos e engenheiros cooperassem para desenvolver o vocabulário formal da nova arquitetura. 2) a revolução na indústria da construção, na qual um processo agora poderia ser utilizado para qualquer tipo de edifício. Se o problema central da arquitetura moderna fosse a casa, então teria que ser considerado
Fig. 15 - Le Corbusier: Planta associativa de 2 unidades. (FONDATION LE CORBUSIER. Le Corbusier: architecte/artiste. London: Infinitum publications, 1997. CD-ROM. Macintosh)
em termos do ambiente urbano inteiro. Deste modo, a arquitetura moderna se estende ao urbanismo, assumindo uma dimensão social nova, envolvendo estudos dos aspectos sociológicos. 3) a nova lei de decisões administrativas e econômicas para construir e o aumento inevitável dos projetos conduziria à organização comercial da arquitetura. Em seu caderno de esboços, Jeanerret visualiza a situação ideal: uma lucrativa e crescente empresa de arquitetura
Fig. 16 - Le Corbusier: Sistema Dom-ino, 1914. Perspectiva do conjunto. [FONDATION LE CORBUSIER. Le Corbusier: architecte/artiste. London: Infinitum publications, 1997. CD-ROM. Macintosh]
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Juliano Caldas de Vasconcellos - Bases e construção do Sistema Dom-ino
interessada em projetar e fabricar elementos de construção ou até mesmo cidades inteiras. 4) o avanço da economia provocariam novos agentes: industriais, homens de negócios e instituições públicas, inclusive governos. Para persuadí-los, o arquiteto moderno teria que dominar os argumentos econômicos a favor de seus projetos, explorando a publicidade e jogando em manobras políticas. Fig. 17 - Le Corbusier: Sistema Dom-ino, 1914. Estudo associativo das unidades habitacionais. (FONDATION LE CORBUSIER. Le Corbusier: architecte/artiste. London: Infinitum publications, 1997. CD-ROM. Macintosh)
5) finalmente, apesar de todos estes aspectos, a arquitetura, útil e nobre, teria que continuar expressando valores funcionais e espirituais, e o arquiteto moderno, como todos os seus antecessores, permaneceria com um artista por definição. Na arquitetura moderna, proporção seria essência: elementos padronizados garantiriam uma expressão controlada de diversidade, dando ritmo, ordem e unidade a totalidade do projeto.
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Juliano Caldas de Vasconcellos - Bases e construção do Sistema Dom-ino
O esmorecimento do processo
em relação ao registro da patente. Como engenheiro, ele considerou a idéia sob o ponto de vista da construção,
“Le Corbusier se deu conta que de que tal produção só
não percebendo nada de extraordinário, já que sob este
seria alcançada através do exercício de muita perícia e de
aspecto, o plano não tinha nada de inovador. Para ele,
uma produção industrial de alto nível, uma combinação
aquilo era “uma idéia simplista”, ao mesmo tempo que
de circunstâncias que era rara na indústria da construção.
para Corbusier era algo revolucionário.
Reconheceu essas limitações em sua proposta da Maison Dom-ino, que, à parte a construção das formas e a
Arquitetonicamente, a idéia era revolucionária: “um
instalação das armaduras de aço, se destinava a ser
toque de clarim para os arquitetos abraçarem a nova
construída por uma mão-de-obra não qualificada.”
revolução do edifício”
(FRAMPTON, 2000, p.183)
desta revolução participando efetivamente de uma nova
08
e dessa forma fazer parte
arquitetura. Talvez para esta razão também, Du Bois É interessante observar que, apesar de todo o mérito e
estava certo: a idéia não era material para uma patente,
prestígio que se atribui ao sistema, ele não tenha sido
que por definição limita o seu uso em função do registro.
aplicado de imediato na forma como se propôs desde o início de sua concepção. Não só a falta de mão-de-obra especializada e os problemas de uma industrialização quase inexistente na construção civil da época. Alguns acontecimentos da cronologia histórica e o contexto
Juliano Caldas de Vasconcellos é Arquiteto e Urbanista, graduado no ano de 2000 pela Faculdade de Arquitetura da UFRGS, Mestre em Teoria, História e Crítica da Arquitetura, no ano de 2005, pelo Programa de Pesquisa e Pós-Graduação em Arquitetura (PROPAR) da UFRGS. Professor dos Cursos de Arquitetura e Urbanismo e Design do Centro Universitário Feevale.
auxiliam a desvendar algumas possibilidades que motivaram a desarticulação em torno do lançamento da idéia a partir de 1916: a continuidade da Primeira Guerra até 1918 atrasa os planos de reconstrução das cidades e conseqüentemente a aplicação do sistema e seu patenteamento; a oportunidade perdida na 07
exposição La Cité Reconstituée (organizada pelos órgãos higienistas franceses) e falta de entusiasmo de Du Bois
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Juliano Caldas de Vasconcellos - Bases e construção do Sistema Dom-ino
Notas:
Fundador da Societé d’Application de Béton Armé (S.A.B.A) que tinha como objetivo promover o uso do concreto armado em edifícios
01. SLOAN, M M. The Concrete House and its Construction. Association
industriais. Juste Schneider, Engenheiro suíço de Genebra, juntou-se a
of American Portland Cement Manufacturers, Philadelphia, 1912.
Du Bois na S.A.B.A.
[De acordo com Brian Brace Taylor (apud FRAMPTON, 1979, p.80), este
04. Louis Loucheur (1872-1931) Ministro do Trabalho e da Previdência
livro estava na biblioteca pessoal de Le Corbusier, mas não aparece no
Social da França no período 1926-30. A lei que levou seu nome previa
catálogo de Paul Turner até 1920. Assim sendo, não pode-se afirmar
a construção de 260 mil alojamentos no pós-guerra. [Disponível
que Corbusier conhecesse o livro em 1914. Pode-se supor, entretanto,
em <http://perso.wanadoo.fr/chateauroux45-2000/logement/
que o princípio era conhecido de maneira geral, ao menos pelos dois
Loi%20Loucheur.htm> Acesso em 02 mai. 2003]
engenheiros que fizeram parte da equipe que elaborou o sistema, especialmente Juste Schneider.]
05. Os dois pilares que completam o apoio dos patamares das escadas não são representados na clássica perspectiva de 1914.
02. A referida obra utilizava vãos de aproximadamente 6m entre apoios, com vigas de aço mergulhadas no concreto que tinha o claro
06. Tarsila do Amaral, De Joseph Monier a Le Corbusier, in Arquitetura
objetivo de proteção contra incêndios. Conforme pode se observar nas
e Urbanismo, setembro-outubro 1936, pp. 185-6.
imagens, as vigas eram visíveis no plano inferior, o que não invalida o exemplo já que, dependendo da altura da laje e do vão suportado, as
07. Exposição de projetos realizada em Paris entre maio e junho
vigas ficam embutidas no plano da laje. [CONCRETE and Constructional
de 1916 com a finalidade de apresentar novas soluções para os
Engineering, nov. 1913 Vol. VIII nº11]
problemas urbanísticos surgidos com a guerra. Tudo estava pronto para a exposição do projeto do sistema Dom-ino até que Le Corbusier
03. Max Du Bois (1884-19--) Engenheiro suíço de Le Locle (próximo a
abandona a idéia aconselhado por Perret, que propôs uma ação
La Chaux-de-Fonds) relacionado com a família Jeanneret pela amizade
“privada” de divulgação por parte da S.A.B.A antes de expor o
de sua tia com a mãe de Corbusier. Graduado pela escola politécnica
trabalho. [FRAMPTON, 1979, p.70]
de Zurique, em 1907, trabalhou em Paris para Gros e Loucheur. Em 1909 publica a tradução de Eisenbeton Bau (Le Béton Armé, Béranger,
08. IBIDEM p.71
1909) de Emil Mörsch o qual ele concede uma cópia a Corbusier.
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Juliano Caldas de Vasconcellos - Bases e construção do Sistema Dom-ino
Referências Bibliográficas
COMAS, Carlos Eduardo Dias. Precisões Brasileiras. Paris: Tese de Doutorado, 2002. LE CORBUSIER, and Pierre JEANNERET. Œuvre complàte. vol. 1-8. Zurich: Les Editions D’Architecture, 1995. LE CORBUSIER, Por uma arquitetura. São Paulo: Editora Perspectiva, 2000. FRAMPTON, Kenneth (organizador). “The Dom-ino idea.” Oppositions 15/16. Cambridge. 1979: p. 61-79. GASPARINI, D. A. “Contributions of C. A. P. Turner to Development of Reinforced Concrete Flat Slabs 1905-1909.” Journal of Structural Engineering - ASCE. out. 2002, vol. 128, n. 10: p. 1243-1252. CONCRETE and Constructional Engineering, nov. 1913 Vol. VIII nº11)
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Leandro Manenti Rio: Cidade Linear A cidade do Rio de Janeiro é famosa por suas belezas naturais, sua geografia ímpar, que sempre fascinou a todos que a visitam e que ali vivem, desde turistas descompromissados até arquitetos e urbanistas, que presentearam a cidade com projetos para os seus mais diferentes problemas. Esta mesma topografia, composta de vários tipos de acidentes geográficos, como morros, baías, enseadas e vales, também contribui para a dificuldade de conexão entre os vários pólos de desenvolvimento da cidade, e portanto dificultando o seu crescimento. Isto tem levado à construção de várias obras bastante caras, como pontes, viadutos e túneis; e outras mais radicais como a eliminação dos morros do Castelo e de Santo Antônio, e a construção do aterro do Flamengo, possibilitando assim o crescimento da cidade e a integração das zonas norte e sul. Projeto de Leonidov para Magnitogorsk em 1930 (FRAMPTON, 1997, p.213).
Dentre estas várias propostas para integração da cidade, está a do edifício autopista, que Le Corbusier desenvolveu em suas visitas ao Rio de Janeiro em 1929 e 1936. Consistia de um imenso edifício, elevado por pilotis, que possuía no seu terraço uma autopista,
Página anterior: Le Corbusier, 1998 (CD-ROM).
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Leandro Manenti - Rio: Cidade Linear
fazendo assim a ligação dos diversos bairros das zonas
A proposta do espanhol Arturo Soria y Mata, em 1880,
sul e norte com centro da cidade. Esta proposta de
era de uma cidade linear com quinhentos metros de
cidade linear assemelha-se bastante com o plano para
largura, com uma linha férrea ao centro, que ligaria
Argel que Le Corbusier desenvolveu na mesma época em
centros urbanos importantes, abrangendo uma escala
que esteve no Rio.
regional, podendo expandir-se indeterminadamente, formando uma rede triangular de cidades lineares.
O projeto do edifício autopista, apesar de nunca
Outra proposta de descentralização das cidades era a
construído, influenciou várias outras propostas para a
de Ebenezer Howard, que consistia em uma cidade-
cidade, como os conjuntos habitacionais do Pedregulho,
jardim radiocêntrica, finita, que seria circundada
das Catacumbas e da Gávea, projetados por Affonso
por uma estrada de ferro que faria a ligação entre
Eduardo Reidy nas décadas de 40 e 50, que apesar de
as várias cidades-jardim e as cidades centrais. Para
não serem propriamente uma cidade linear, incorporam
Kenneth Frampton:
o conceito de distribuição de equipamentos ao longo de um edifício de crescimento aparentemente ilimitado, que
“Além de ser a antítese da cidade planificada radial, a
atravessa as mais diferentes topografias, o que evitaria
cidade linear era um meio de construir ao longo de uma
o deslocamento constante dos habitantes em busca de
malha triangulada de vias preexistentes, conectando um
serviços e trabalho.
conjunto de centros regionais tradicionais” (FRAMPTON, 1997, p.22.).
As Cidades Lineares O conceito de cidade linear vai reaparecer na O conceito de cidade linear surge na Europa, no final do
União Soviética, onde a Associação dos Arquitetos
século XIX, impulsionado pelo grande desenvolvimento
Contemporâneos, a OSA, vai tentar implantar cidades
dos transportes, sobretudo pelas estradas de ferro, que
lineares com o intuito de descentralização da produção e
permitiam um deslocamento regular e rápido entre os
de conexão de todo o país, seguindo os ideais socialistas.
locais de trabalho e as residências, que eram cada vez
Dentre os projetos mais significativos está o de Milyutin,
mais localizadas em subúrbios, onde a qualidade de vida
que propunha, em 1930, uma cidade linear com seis
era melhor do que nos centros urbanos industriais.
faixas, conforme explica Frampton:
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Leandro Manenti - Rio: Cidade Linear
“Essas zonas seriam ordenadas na seguinte seqüência: 1° uma zona ferroviária; 2° uma zona industrial contendo em seu interior, além dos centros de produção, centros de educação e pesquisa; 3° uma zona verde que acomodasse a estrada de rodagem; 4° uma zona residencial subdividida em instituições comunitárias, moradias e uma área para os jovens, com escolas e jardins de infância; 5° uma zona de parque com construções destinadas aos esportes, e por último, 6°, uma zona agrícola.” (FRAMPTON, 1997, p.212.) Nesta mesma época, final dos anos 20, Le Corbusier estava desenvolvendo o seu projeto para a Ville Radieuse, no qual, diferentemente do que propunha em seu Immeuble-Villa, com casas individuais com terraços jardins, trabalhava com blocos de apartamentos mínimos, onde os espaços de lazer eram compartilhados ao nível do solo, liberado pelo uso de pilotis. Frampton diz: “As transformações em seus protótipos urbanos da década de 1920, em que a hierárquica Ville Contemporaine de 1922 se converteu em Ville Radieuse “sem classes” de 1930, implicou mudanças significativas no modo de Le Corbusier conceber a cidade da era da máquina; dentre elas a mais importante foi o abandono de um modelo urbano centralizado, que avançou para um conceito teoricamente ilimitado cujo princípio de ordem
Lês trois établissements humains, de Le Corbusier. (BOESINGER, 1994, p.169).
provinha do fato de ser dividido, como a cidade linear de Lilyutin, em zonas e faixas paralelas.” (FRAMPTON, 1997, p.217.)
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Leandro Manenti - Rio: Cidade Linear
Foi a partir de seu contato com os russos que Le Corbusier introduziu os apartamentos duplex em um estudo para a sua Unité d’Habitation, e a cidade industrial linear em sua tese de planejamento regional intitulada Les trois établissement humains, de 1944. Neste estudo, Le Corbusier aplica a idéia de Soria y Mata dos subúrbios lineares como conexão entre as cidades radiocêntricas existentes, aproveitando os interstícios para desenvolver cooperativas agrícolas. Outros projetos que Le Corbusier admirava eram o edifício da fábrica da FIAT em Turim, de Matté Trucco, onde a pista de testes de veículos está localizada no telhado; e também o projeto de Edgar Chambless para a chamada “Roadtown”, que é definida por Curtis como: “Um tipo de palácio serpente contínuo com uma estrada de ferro no porão, casas nos níveis intermediários e autoestrada no topo” (CURTIS, 1986, p.120). De um modo geral, as cidades lineares tiveram grande influência no urbanismo do século XX. Apesar de nunca terem sido implantadas integralmente, seus princípios de “Roadtown” de Edgar Chambless. (CURTIS, 1986, p.125.)
integração e distribuição de infra-estrutura podem ser vistos em vários projetos, como os de Le Corbusier e de Affonso Eduardo Reidy para o Rio de Janeiro.
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Leandro Manenti - Rio: Cidade Linear
O Rio de Janeiro como cidade linear “As ruas da cidade se dirigem para o interior, nos estuários de terra plana entre as montanhas que descem do alto dos planaltos seriam como as costas de uma mão se comprimindo totalmente aberta, a beira do mar. As montanhas que descem são os dedos da mão, elas tocam o mar. Entre os dedos de montanhas, existem estuários de terra, e a cidade está dentro” (LE CORBUSIER: Rio de Janeiro 1929 1936, 1998). Foi assim que Le Corbusier definiu a cidade do Rio de Janeiro em uma de suas duas visitas, em 1929 e 1936. Deslumbrado pelas belezas naturais do local, ele viu o Rio de Janeiro como uma cidade linear natural, colocada
Fábrica da FIAT, Turim. (LE CORBUSIER: Rio de Janeiro 1929 1936, 1998).
em uma faixa estreita entre as montanhas e o mar. Em sua visita à América do Sul, em 1929, Le Corbusier chega ao Rio de Janeiro vindo de uma seqüência de visitas a Buenos Aires, Montevidéu, Assunção e São Paulo, onde faz estudos para o desenvolvimento destas cidades, sempre propondo a introdução de grandes estruturas como solução para o crescimento das mesmas. Para o Rio de Janeiro, Le Corbusier propõe um edifício autopista, de cem metros de altura, elevado por um pilotis de quarenta metros. Ele seria responsável pela
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Leandro Manenti - Rio: Cidade Linear
expansão demográfica e o desenvolvimento da cidade, garantindo a ligação entre os bairros das zonas sul e norte com o centro. Os pilotis de grandes dimensões permitiriam que a cidade histórica tradicional se desenvolvesse normalmente abaixo, e a grande altura da auto-estrada permitiria a transposição dos diversos morros da costa. Para ele, no Rio estava propenso a acontecer o que havia ocorrido com Chicago, onde as margens do lago estavam densamente ocupadas, formando um paredão de edificações pertencentes às classes mais abastadas, Croquis para São Paulo (LE CORBUSIER: Rio de Janeiro 1929 1936, 1998).
enquanto que o interior estava ocupado por habitações de um só pavimento pertencentes às classes operárias. Para ele esta distinção não poderia acontecer também no Rio, pois todos teriam que ter o seu direito ao sol e à vista privilegiada. O projeto do edifício autopista de 1929 vai ser retomado em 1936, quando Le Corbusier volta ao Rio de Janeiro e propõe outros traçados para o mesmo. Nesta visita, ele profere uma seqüência de palestras nas quais procura difundir os ideais do urbanismo moderno. Segundo ele, o sonho humano de possuir uma casa com um jardim já não corresponde mais aos grandes centros urbanos, gerando
Croquis para o Rio de Janeiro em 1929 (LE CORBUSIER: Rio de Janeiro 1929 1936, 1998).
assim um êxodo populacional para os subúrbios, levando os habitantes a perderem horas em deslocamentos.
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Leandro Manenti - Rio: Cidade Linear
Como solução, ele propõe as cidades jardim verticais, elevadas do solo por pilotis, liberando assim o terreno para os parques e áreas de lazer. Com o empilhamento de residências, servidas por ruas internas, poder-se-ia economizar em redes de infra-estrutura e as cidades teriam um tamanho reduzido, encurtando o tempo gasto nos deslocamentos. No projeto do edifício autopista, Le Corbusier soluciona, a seu modo, dois dos problemas da cidade: a habitação, que passa a ser digna, possuindo
Croquis para o Rio de Janeiro em 1929 (LE CORBUSIER: Rio de Janeiro 1929 1936, 1998)
insolação adequada e garantindo a vista para todos; e a circulação, que sempre foi dificultosa no Rio devido aos seus vários acidentes geográficos. Nestas conferências, Le Corbusier mostrou ao público presente seu projeto para a cidade de Argel, chamado plano Obus, desenvolvido em 1930, logo após sua primeira visita ao Rio de Janeiro, em 1929. Este plano assemelha-se muito ao projeto do Rio, pois inclui um edifício linear, com uma autopista em um pavimento médio, disposto ao longo da costa, em um local de topografia acidentada. Para Frampton: “Essa proposta inspirada (a do Rio de Janeiro) levou diretamente aos projetos para Argel, desenvolvidos de 1930 a 1933” (FRAMPTON, 1997, p.218.).
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Leandro Manenti - Rio: Cidade Linear
Outros arquitetos também viram no Rio de Janeiro uma situação possível para a instalação de estruturas lineares de habitação e serviços, vinculadas a auto-estradas, como por exemplo, o projeto de Leon D’Escoffier para uma ponte Rio-Niterói totalmente habitável. Porém o arquiteto carioca que mais absorveu as idéias do projeto do edifício autopista foi Affonso Eduardo Reidy, que já havia participado da equipe que projetou o Ministério da Educação, com a consultoria de Le Corbusier, em 1932. A partir de então, como arquiteto da prefeitura do Distrito Federal, Reidy desenvolveu uma séria de projetos que visavam a melhorar as conexões da cidade e proporcionar os meios necessários para o seu crescimento. No projeto do conjunto residencial Prefeito Mendes de Moraes, chamado de Pedregulho, de 1946, e destinado a Simulações do edifício autopista (LE CORBUSIER: Rio de Janeiro 1929 1936, 1998).
funcionários da prefeitura, já aparecem incorporadas as idéias de unidades de vizinhança, provendo no interior do conjunto vários equipamentos urbanos, como escola e centro comercial. Isto de certa forma relaciona-se com os preceitos das cidades lineares, onde a proximidade dos equipamentos urbanos e dos locais de trabalho com as habitações permite uma economia de tempo, que poderia reverter-se em horas de lazer. Outras comparações
Projeto para Argel (LE CORBUSIER: Rio de Janeiro 1929 1936, 1998).
possíveis entre os projetos estão na aparência externa,
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Leandro Manenti - Rio: Cidade Linear
visivelmente relacionada com o projeto de Le Corbusier, onde a sinuosidade resolve a implantação do prédio no terreno acidentado e o grande pilotis faz a transição entre as habitações e a vegetação nativa, que assim é preservada. Além disso, a rua interna para pedestres no pavimento intermediário, assemelha-se ao projeto
Projeto para a ponte Rio-Niterói de Leon D’Escoffier (O RIO JAMAIS VISTO, 1998).
de Argel. Além disso, este projeto incorpora o modelo de apartamentos duplex, que permitem uma melhor ventilação e distribuição dos aposentos. Estes mesmos elementos também vão aparecer no projeto do conjunto residencial da Gávea, em 1952. Neste projeto, destinado a população de baixa renda, o elemento autopista é marcante, pois é parte integrante do projeto, tanto assim que acabou por atravessar o próprio edifício, o que não era previsto no partido original Entre o desenvolvimento destes dois projetos, Reidy
Conjunto Residencial da Gávea (Foto: Leandro Manenti, 1999).
participa também do projeto do Conjunto Residencial Popular Catacumbas, onde o mesmo partido do edifício sinuoso elevado sobre pilotis reaparece, porém com um comprimento muito maior. Apesar de serem estes os projetos mais influenciados pelo projeto do edifício autopista de Le Corbusier, outros projetos de Reidy no período também tinham este sentido de integração da cidade. Podemos citar os projetos para as áreas do Castelo e do Santo Antônio,
Conjunto Residencial popular Catacumbas (CAIXETA, 2000, p.363.).
251-Bloco(1)
Leandro Manenti - Rio: Cidade Linear
ambos casos extremos, onde a total remoção de
Corbusier foi o primeiro a perceber isto. Neste sentido,
morros visava a desimpedir o crescimento do centro,
seu plano foi o mais abrangente dos até então realizados,
sempre relacionados com o elemento autopista. Além
pensava o Rio de Janeiro como um todo e não apenas
destes, podemos citar ainda o projeto para o aterro do
no problema da urbanização do seu centro. No plano de
Flamengo, onde os espaços para a implantação do parque
Agache, assim como em outros realizados antes e depois de
e da autopista são tomados do mar, fazendo a ligação
29, predominava o intuito de buscar nas áreas planas mais
dos novos bairros na zona sul com o centro, além de
alargadas – as famosas “esplanadas”- os locais onde fosse
disponibilizar uma grande área de lazer para a cidade.
possível aplicar o sistema radial ou a malha ortogonal, motivo pelo qual foram demolidos inúmeros morros.”
Considerações Finais
(CAIXETA, 2000, p.570.).
Na primeira metade do século XX, com o crescimento
Depois de Le Corbusier, Affonso Eduardo Reidy foi o
desordenado das cidades, a grande preocupação dos
arquiteto que mais percebeu que o Rio de Janeiro não
planejadores da época era a de viabilizar, de forma ordenada,
se adequava às soluções tradicionais, e também buscou
esta expansão demográfica. No Rio de Janeiro isto não foi
propostas inovadoras para o crescimento da cidade.
diferente, porém havia um agravante, que se tratava da topografia acidentada do local, onde soluções corriqueiras de
Segundo Caixeta:
desenho urbano convencional não resolveriam o problema,
“A imagem do edifício/ auto-estrada ou da auto-estrada
exigindo soluções inovadoras e particulares.
que comanda e ordena os espaços da cidade, ou melhor seus “meandros”, faz parte da concepção urbanística de
Para Le Corbusier, o edifício autopista era a solução,
Reidy desde o plano para a Esplanada do castelo, no qual
pois ao mesmo tempo em que previa uma grande
já estabelece a auto-pista perimetral, elevada, como
quantidade de habitações, também serviria como eixo de
grande eixo integrador da urbs. Ela tem seus reflexos
deslocamento. Em relação a isto, Eline Caixeta conclui:
nas propostas para os Conjuntos do Pedregulho e da Gávea e evolui na seqüência de estudos para o Aterro do
“Em verdade, a própria topografia do Rio de Janeiro se
Flamengo, que inicia-se com o planejamento da Esplanada
prestava à implantação da idéia de cidade-linear e Le
de Santo Antônio. As estratégias empregadas no Aterro
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Leandro Manenti - Rio: Cidade Linear
Glória-Flamengo também centram-se no princípio de
Referências Bibliográficas
<<desurbanização>> contido na cidade-linear de Soria y Mata e nas propostas de Le Corbusier para o Rio. A
BOESINGER, Willy (1994). Le Corbusier. São Paulo: Martins Fontes.
auto-pista, como grande obra de engenharia, torna-se o
BRUAND, Yves (1981). Arquitetura contemporânea no Brasil. São
novo “edifício” que ordena os meandros da metrópole.”
Paulo: Perspectiva.
(CAIXETA, 2000, p.570.).
CAIXETA, Eline M. M. P. (2000). Affonso Eduardo Reidy: o poeta construtor. Tese Doutoral, ETSAB-UPC, Barcelona.
Nestes projetos, pode-se ver que a grande preocupação
CURTIS, Willian J. R. (1986). Le Corbusier: ideas and forms. London:
de Reidy está em solucionar os problemas particulares
Phaidon Press.
do Rio com projetos também particulares, desenvolvidos
FRAMPTON, Kenneth (1997). História crítica da arquitetura
para cada problema específico. Porém, mantendo sempre
moderna. São Paulo: Martins Fontes.
uma visão unificada da cidade, permitindo a integração
HARRIS, Elizabeth D. (1987). Le Corbusier: riscos brasileiros. São
de cada uma das soluções com o restante do tecido
Paulo: Nobel.
urbano, e tratando cada projeto como uma micro-cidade,
KAMITA, João Massao (1993) O rigor do método. In: Au: Arquitetura
propondo uma descentralização dos equipamentos
e Urbanismo. São Paulo, vol.9 , n.47 (abr./maio 1993), p.73-84.
urbanos. Está é uma postura típica de uma cidade linear,
LE CORBUSIER: RIO DE JANEIRO 1929 1936. Rio de Janeiro: Secretaria
onde a fácil conexão e a descentralização visam, acima
Municipal de Urbanismo / Centro de Arquitetura e Urbanismo do Rio de
de tudo, a encurtar o tempo gasto nos deslocamentos
Janeiro, 1998. CD-ROM.
dos habitantes, revertendo-o em horas de lazer e,
O RIO JAMAIS VISTO (1998) In: Au: Arquitetura e Urbanismo. São
conseqüentemente, em uma melhor qualidade de vida.
Paulo, n.80, out./nov. 1998. p. 22. Exposição no Centro Cultural Banco do Brasil de outubro de 1998 a janeiro de 1999.
Leandro Manenti é Arquiteto e Urbanista (UFRGS/1997), Mestre em Arquitetura (PROPAR - UFRGS/2004), Professor Adjunto e Coordenador do Curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário FEEVALE.
PALAZZOLO, Carlo & VIO, Riccardo (1991). In the footsteps os Le Corbusier. New York: Rizzoli. PEDREIRA, Lívia Álvares (1998) Reidy, o desenho da razão. In: Au: Arquitetura e Urbanismo. São Paulo. Vol.4 , n.16 (mar. 1998), p. 76-81.
253-Bloco(1)
Luciana Néri Martins Um pouquinho da minha história na Espanha... ... não sei exatamente por onde começar, afinal são tantas as coisas para contar e escrever. Mas, como me foi pedido, devo escrever sobre a minha experiência de vida durante meu doutorado na Espanha... Para começar, posso dizer que esta é uma tarefa árdua, afinal, é difícil materializar neste papel tudo que vivi... mas vou tentar. Para que vocês entendam, estou aqui escrevendo a convite dos professores Ana Carolina e Juliano que, ao começarem a organizar o memorial do Curso de Arquitetura (se posso chamar assim!), me convidaram para escrever sobre a experiência que vivi nos últimos três anos da minha vida, longe aqui do Brasil. A Ana disse mais ou menos assim: “- Lu, tu poderias contar um pouco da experiência do teu doutorado, de morar lá fora, da Arquitetura da Espanha, enfim, de tudo um pouco!!!”... bem, e assim, estou eu aqui, hoje, tentando escrever este “de tudo um pouco” para vocês.
Letreiro da Cidade de Palma de Mallorca, localizado no Passeio Marítimo, e conhecido como o novo símbolo da cidade.
Para quem ainda não me conhece, eu sou a professora que iniciou o Curso de Arquitetura da Feevale... e saibam que é com muito orgulho que encho a boca para dizer isto, afinal, ele sem dúvida tem um pouquinho de mim. Quem já me conhece sabe que sou aquela que ficou entre a “cruz e a espada” quando fui selecionada
Página anterior: vista Panorâmica da parte final da Serra da Tramuntana – “Cap Formentor”.
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Luciana Néri Martins - Um pouquinho da minha história na Espanha...
para fazer doutorado em uma universidade espanhola. Afinal, o Curso estava apenas iniciando, e eu tinha um carinho muito grande por ele, já que tinha estudado e me esforçado muito para que se tornasse uma referência. Nesta ocasião, eu precisava decidir entre vê-lo crescer aqui de perto, ou sair em busca de formação e aperfeiçoamento, para que, no futuro, pudesse contribuir novamente para o seu crescimento. Foi então que resolvi aproveitar a oportunidade que me haviam dado, e ir cursar o doutorado na cidade de Palma de Mallorca, nas Vista da Cidade de Valldemossa, localizada na Serra da Tramuntana. Cidade onde viveu Chopin no inverno de 1838 a 1839 com sua amante, a escritora George Sand.
Islas Baleares, Espanha. Quando tomamos decisões na nossa vida, algumas vezes não nos damos conta que estamos escrevendo a nossa própria história, estamos dando rumo ao nosso futuro, no qual um pequeno sim, ou não, pode mudar completamente o nosso destino. Em fevereiro de 2002, quando saí rumo a uma nova fase da minha vida, sabia que estava indo em busca da realização de um sonho, que há muito tempo havia almejado. Certamente, ainda sem a plena consciência do reflexo e das conseqüências disto tudo em minha vida. Este sonho era estudar fora do país, para me aperfeiçoar mais, e, então, poder passar meus conhecimentos com mais propriedade (atividade que amo fazer...). Poder trocar com meus alunos minhas
Detalhe do pátio interno do Castillo de Bellver. Único castelo de planta circular construído na Espanha.
experiências vividas, não tendo a pretensão de ser mais que ninguém, mas de poder contribuir à formação, não só
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Luciana Néri Martins - Um pouquinho da minha história na Espanha...
acadêmica, mas para as suas vidas, deixando marcas de que participei em seus crescimentos. Estudei na Universitat de les Illes Balears – UIB, onde estou concluindo a tese em Ciências da Educação na área de Arquitetura Universitária, com o título: “Modelo Integral del diseño y evaluación de los espacios educativos universitarios: Las nuevas bibliotecas como servicios educativos.” Trata-se da criação de um Modelo para avaliar os espaços arquitetônicos universitários, tendo como objeto de estudo final as Bibliotecas Universitárias. Está sendo
Playa de Cala D’or. Única praia da Ilha da Mallorca que possui a mesma tipologia da arquitetura encontrada na Ilha de Ibiza.
um trabalho muito interessante e gratificante, através do qual, além de estudar muito - inclusive conceitos que eu desconhecia, já que esta área de estudo é inter e multidisciplinar, ou seja, inter-relaciona linhas de investigação dos campos da arquitetura, sociologia, psicologia e da pedagogia - eu ainda tive a oportunidade de aprender um pouco da cultura espanhola e, conseqüentemente, catalã e mallorquina. Para terem uma idéia, além do idioma oficial espanhol, fala-se outro idioma local, que é o Mallorquín (digamos que é um dialeto do catalão, já que as Islas Baleares fazem parte da região da Catalunya); então, imaginem
Vista da Calle Las Ramblas no inverno de Mallorca.
a confusão. Porém, pude fazer novos amigos, conhecer lugares novos, tornar-me estudante novamente.
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Luciana Néri Martins - Um pouquinho da minha história na Espanha...
O arquipélago das Ilhas Baleares é composto por quatro ilhas: Mallorca (a maior de todas), Menorca, Ibiza e Formentera. Para se ter uma relação de tamanho, Mallorca tem 3.640 km2 e possui aproximadamente 110 km por 75 km de extensão, que, comparados ao nosso Brasil, digamos que não é quase nada. Hoje é explorada pelo turismo, porém, muito antes dele surgir, esta ilha era parada obrigatória para todo conquistador, afinal, fica num ponto estratégico em pleno Mar Mediterrâneo. Como está muito bem descrito no principal museu da região, localizado na capital da ilha, que se chama Palma de Mallorca (cidade onde morei), no transcurso dos últimos três mil anos, cartagineses, romanos, vândalos, árabes e catalães satisfizeram sua ânsia de conquista, deixando suas pegadas e marcas por toda a ilha. A cultura árabe, por exemplo, é muito forte até hoje, já que o povo ocupou as ilhas por mais de cinco séculos. Belíssimo pôr-do-sol ao fundo de uns dos antigos moinhos encontrados no Pueblo de Campos.
A ilha é realmente mágica, pois, conforme se vai desvendando seus mistérios, vamos descobrindo, em cada dia, um encanto diferente. A sua paisagem é lindíssima e diversificada; se podem ver desde amendoeiras floridas, moinhos de ventos, pés de oliveiras – que em grande parte procedem do séc XVI, rebanhos de ovelhas, povoados típicos perdidos no interior da ilha, até os iates mais luxuosos e modernos que se
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Luciana Néri Martins - Um pouquinho da minha história na Espanha...
pode imaginar, afinal, Mallorca possui mais iates em sua costa, do que toda costa brasileira. Aqui se encontram montanhas que terminam no mar, neve em plena praia, galerias em baixo da terra, cafeterias do final do século XIX, uma comida farta e saborosa, um bom vinho e um povo que tem orgulho das suas raízes e que festeja e cultiva seus costumes. Cada ruela é uma surpresa, e, quando me deparei pela primeira vez com a Catedral de Mallorca, construída em 1230, fiquei muito emocionada, pois fiquei imaginando que nesta mesma época nosso Brasil ainda esperaria
Vista noturna externa da Catedral da Cidade de Palma de Mallorca, construída entre os séculos XIV e XIX.
mais 300 anos para ser descoberto... realmente esta é uma sensação mágica, e muito grandiosa. La Seu, como é conhecida a Catedral, possui uma rosácea de quase 1000m2, considerada o maior olho da arte gótica encontrado na Espanha. Ela tem seu interior reformado no final do século XIX, pelo arquiteto Antonio Gaudí, maestro do modernismo e idealizado por qualquer catalão que se preze. Porém, como vivia em uma ilha, da qual somente era possível sair de navio ou avião, tendo como objetivo maior concluir meu doutorado, com uma bolsa de estudos para sobreviver, num lugar onde o poder de compra é
Vista interna da Catedral da Cidade de Palma de Mallorca. Sua reconstrução interna foi projetada pelo arquiteto catalão Antoní Gaudí.
diferente do Brasil, com o nosso Real valendo quase quatro vezes menos que o Euro, não pude viajar muito.
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Luciana Néri Martins - Um pouquinho da minha história na Espanha...
Mesmo assim, pude conhecer algumas cidades da Espanha (Barcelona, Madrid, Valência, Bilbao, Salamanca, Toledo, Ibiza, Ávila, entre outras), o que fez apaixonar-me cada vez mais pela sua arquitetura. E sobre estas cidades... histórias é o que não faltam para contar... Como digo, às vezes, precisamos sair de perto do que mais gostamos para crescermos e aprendermos a lição, para podermos ver as coisas de um outro ângulo diferente, de um outro ponto de vista, o que sem dúvida, foi um grande aprendizado para mim, afinal, conviver com pessoas diferentes, uma cultura diferente da nossa, um idioma estranho, não é tão simples quanto parece. Sei que fiz dois doutorados, um no mundo corrente/ acadêmico e outro, para a minha vida pessoal. Hoje já se passaram 3 anos daquela decisão, e, sem dúvida, tenho muito o que contar a todos vocês. Na verdade, eu sempre aprendi muito com a experiência dos outros e acho que Fachada típica de uma residência em um “pueblo” do interior da Ilha de Mallorca.
esta pode ser um excelente campo de experimentação para a nossa própria vida, afinal, podemos sempre aprender com erros, conquistas e histórias. Quando olho para trás, e vejo tudo que passou, me dou conta de como mudei nestes anos, de tudo que aprendi e das coisas que conquistei, dos sufocos que passei, dos obstáculos que, com muito esforço, aprendi a superar, da saudade que senti das pessoas queridas e amadas,
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Luciana Néri Martins - Um pouquinho da minha história na Espanha...
aquela saudade que dói dentro do coração, que ecoa na nossa alma... estes anos fizeram com que eu aprendesse várias coisas, e hoje pudesse estar aqui contando um pouco desta experiência, o que, é claro, seria impossível de fazer em poucas linhas. Porém, agora estou de volta à terrinha, e saibam que sempre estarei a disposição para batermos aquele papo descontraído, em qualquer corredor do Prédio Arenito (que eu achei Show!!! Já que não estava aqui na sua construção), entre uma aula e outra, qualquer dia destes. Um abração a todos! Luciana Néri Martins é Arquiteta e Urbanista, graduada pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS (1996), Mestre em Engenharia Civil, com ênfase em Cadastro Técnico Multifinalitário, pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC (2001) e doutoranda em Ciências da Educação, na Universitat de les Illes Balears - UIB nas Ilhas Baleares/Espanha, tendo como tema de Tese, Arquitetura Universitária. É professora do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Feevale, do qual foi coordenadora, quando de sua implantação. (Fotos deste artigo de autoria de Luciana Néri Martins e Marcelo Iserhardt Ritzel)
Vista parcial do Castillo de Bellver a través de uma janela.
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Luciano A. Carvalho da Costa Arquitetura X Engenharia - Um reencontro conceitual Um dos grandes mitos presentes na universidade brasileira refere-se à tradicional disputa entre arquitetos e engenheiros. Não é necessária uma análise mais aprofundada para nos darmos conta que tal conflito não é apenas figurado. Existem sobreposições de responsabilidade profissional e questões formais que geram situações, no mínimo, desconfortáveis, sobre as quais não iremos tratar neste breve ensaio. O objetivo aqui é, a partir da visão de um engenheiro que leciona em um curso de Arquitetura e que propõe, em sua Tese de Doutorado, a relativização de alguns paradigmas tecnicistas, propor a construção de uma ponte entre esses dois mundos, aparentemente tão distantes, mas conceitualmente cada vez mais próximos. Quando comecei a pensar em como os alunos aprendem os conceitos de Estruturas, constatei que minha formação estava carente de uma visão mais sistêmica do assunto. A estrutura curricular da Engenharia, que se apóia em um modelo filosófico ainda positivista, não dá conta de uma visão mais integrada das diferentes disciplinas. É um modelo ainda atrelado aos ideais filosóficos da Revolução Francesa, que
Página anterior: “O Homem Vitruviano”. (http://www.nd.edu/ ~dharley/WCiv/Art&Sci/Leonardo-Vitruvian.jpg)
263-Bloco(1)
Luciano A. Carvalho da Costa - Arquitetura X Engenharia - Um reencontro conceitual
muito contribuíram para a consolidação dos estados
O que se propõe, a partir da utilização das Tecnologias
republicanos e democráticos, mas que precisam ser
de Informação e Comunicação – TIC’s, é uma nova forma
entendidos agora em um mundo pós-industrial, onde a
de se pensar a Educação em Engenharia, tendo como
segmentação das áreas de conhecimento e do mundo
foco os conceitos de Estruturas. Calcular o momento
do trabalho perderam o sentido. A conseqüência disto
fletor máximo em uma viga é importante, mas, antes
é que, neste contexto filosófico, surge uma pedagogia
disso, é preciso saber como foi construído o modelo
empirista, com excessiva valorização da experiência
matemático desta viga, e qual a influência da magnitude
e da transmissão, em detrimento das interações e das
e da posição da carga, do vão da viga e de outros fatores
construções. Mais importante do que entender, pensar
na determinação deste momento fletor. A educação
e construir, é ouvir, assimilar e repetir. Não é de se
à distância - EAD apoiada nas TIC’s, torna ainda mais
surpreender que a Educação Tecnológica brasileira, a
necessária a reflexão acerca do modelo pedagógico
partir deste modelo, acabou se tornando subalterna dos
a ser adotado. No momento em que se relativizam
interesses de outros fóruns mais atuantes na sociedade.
distâncias geográficas e temporais a partir da EAD,
Se observarmos a influência da Ordem dos Advogados
ainda mais relevante se torna a compreensão do que é
do Brasil – OAB - nas decisões dos rumos do nosso país,
mais importante de ser trabalhado como nossos alunos.
fica evidente o quanto as entidades ligadas às áreas
A partir do desenvolvimento de um ambiente virtual
tecnológicas acabam não participando dos debates
para avaliação da aprendizagem1, foi proposto um novo
nacionais. A questão da carência de infra-estrutura no
paradigma para a Educação em Estruturas, a partir da
Brasil, por exemplo, que tem limitado as exportações,
utilização de animações a atividades que priorizem a
mesmo com um crescimento industrial pequeno (na
construção e a interação com os modelos propostos,
ordem de 5%), por incrível que pareça, não é objeto de
deixando de se priorizar a mera reprodução de conteúdos.
mobilização da sociedade organizada ligada à Tecnologia no Brasil. Não se vê uma indução de movimentos em
Entre as conclusões da pesquisa, estão a possibilidade de
defesa deste pleito, que é legítimo, e que, por mais
se construir um novo modelo para a Educação Tecnológica,
imediata e pragmática que seja essa conseqüência, traria
a importância de se utilizarem atividades didáticas que
mais empregos para engenheiros, arquitetos e outras
promovam a interação com os modelos e a viabilidade
profissões de cunho tecnológico.
da utilização do ambiente virtual proposto em cursos
264-Bloco(1)
Luciano A. Carvalho da Costa - Arquitetura X Engenharia - Um reencontro conceitual
de formação. Além disso, abriu-se um horizonte para se
Nota:
construir novos modelos pedagógicos para a Educação
1 GPAREDE – software registrado junto ao INPI, tendo
Tecnológica, pois a posição da Banca Examinadora foi
como co-autora a Universidade Federal do Rio Grande do
unânime quanto à importância do tema e à profundidade
Sul
teórica do texto. Assim, torna-se possível a todos nós, engenheiros e arquitetos, pensarmos sobre nossa pedagogia e sobre nossa visão sobre educação. Qual o nosso papel enquanto educadores? Reproduzir ou induzir? Ouvir ou se posicionar? Submeter-se ou propor? Ser coadjuvante ou protagonista? A partir desta reflexão, acredito ser mais importante neste momento pensar a Educação Tecnológica brasileira no seu contexto amplo, eliminando barreiras e disputas formais, como esta tradicional entre arquitetos e engenheiros. Talvez este ainda seja um desejo utópico, mas é, antes de ser um simples desejo, uma posição teórica e fundamentada, a partir da qual, cumpre-se uma prerrogativa da academia: induzir e refletir sobre novas formas de pensar as relações com o conhecimento e com a ciência. Luciano A. Carvalho da Costa é Engenheiro Civil e licenciado em Matemática, graduado em 1994 e 1999, respectivamente, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS e Doutor em Engenharia, pela mesma universidade. Desenvolve pesquisa sobre Educação na Área Tecnológica, como docente do Centro Universitário Feevale.
265-Bloco(1)
Paula Ramos
A minha bolsa é um convênio entre o DAAD e o CNPq, ou
Caderno de Viagens
seja, entre o órgão do governo alemão para intercâmbio acadêmico e o CNPq, um dos principais fomentadores de
Este texto é um convite ao deleite com uma quantidade
pesquisa no Brasil. Ela é do tipo “Bolsa-Sanduíche”, de
substancial de testemunho pessoal. Comecemos pelo
apenas um ano. Assim, dos quatro anos de doutorado,
depoimento. Meu nome é Paula Ramos. Sou professora da
eu já fiz dois aí, junto à UFRGS, agora estou fazendo o
Feevale junto aos cursos de Arquitetura e Ensino da Arte
terceiro e, quando voltar, terei mais um ano para concluir
na Diversidade. Aí, na Arquitetura, trabalho sobretudo
a tese. E o que faço na Alemanha? A complementação da
com o pessoal do primeiro semestre e, portanto, não
minha pesquisa de campo, acerca dos artistas brasileiros
conheço muitos dos alunos mais “velhinhos”, digamos
modernistas que, durante os anos 20 e 50, trabalharam
assim. A minha disciplina é das coisas mais lindas
também com ilustração. Como a Alemanha tem uma vasta
do curso: Estética e História da Arte. E não é? Acho
tradição gráfica e foi berço do expressionismo, que muito
sensacional quando podemos apreciar o que o homem
influenciou a arte moderna, bem como a arte da ilustração
convencionou chamar de obra de arte (ou quando
no século XX, é o lugar ideal. Aqui, além de fazer consultas
simplesmente olhamos para um pote de barro!) e ver
a bibliotecas e a museus onde estão obras de referência,
nesse objeto a sociedade que o produziu, o grau de
tenho tido a oportunidade de visitar cidades lindas, conhecer
complexidade na feitura, o grau de complexidade
construções espetaculares, apreciar obras das quais falo
na idéia. Realmente adoro! No primeiro dia de aula,
durante as aulas... E é aqui que entra o deleite! Precisaria de
quando me apresento, muitos alunos ficam visivelmente
algumas páginas para descrever o quão sensacional é ficar
transtornados quando digo que sou jornalista. É verdade,
cara a cara com os tijolos esmaltados da antiga muralha de
jornalista. Continuo trabalhando com comunicação, mas
Babilônia, coisa de alguns milhares de anos, ou então o que
ultimamente tenho me dedicado muito mais ao ensino e à
significa permanecer a menos de 50 centímetros das pinturas
pesquisa, o que me dá um imenso prazer. E foi justamente
de Rubens, telas que chegam a 5 metros de altura! É óbvio
como pesquisadora que ganhei uma bolsa de estudos
que, se já encho os olhos de lágrimas durante as aulas,
no exterior para a complementação do meu Doutorado.
olhando para uma projeção de data show, imaginem diante
Estou, portanto, desde fevereiro, morando na Alemanha, onde estudo, pesquiso e vivo experiências maravilhosas.
Página anterior: acervo da autora.
267-Bloco(1)
Paula Ramos - Caderno de Viagens
disso tudo... É uma choradeira sem tamanho.
modernosos de todos os tempos, o Allianz-Arena, sede do
Bem, vai aqui um breve relato sobre meu tour em terras
campeão absoluto por essas bandas, o Bayer de München.
germânicas. Se me perguntassem algo do tipo cidades
É em München ainda que estão algumas das coleções
incríveis, eu posso ressaltar, entre as que eu conheço,
públicas de arte mais impressionantes do Ocidente,
é claro: München, Köln, Düsseldorf, Berlin, Frankfurt...
sobretudo de arte barroca e romântica. As Pinacotecas
Frankfurt, inclusive, é uma das mecas da arquitetura
da cidade, além de terem obras absolutamente pontuais
contemporânea na Europa. Ela é não apenas a cidade
da História da Arte, oferecem uma aula de museologia,
do dinheiro, a capital do Euro e das farfalhantes feiras
uma lição de como apresentar de maneira inteligente
industriais, como também da arquitetura de vidro, marca
pinturas, esculturas, instalações e objetos de design para
absoluta da cidade. Na quase totalidade dos cartões
o público, mesmo para o leigo. Ou seja, a cidade é tudo!
postais, o que se evidencia são os grandes e luminosos
Dá para ver nos rostos das pessoas que elas são felizes
prédios. Já em Köln está a gigantesca catedral gótica
lá. Idem em Düsseldorf, com suas ruas glamourosas, onde
do século XIII, uma coisa de arrepiar tudo. Eu nem havia
estão as grandes lojas de grife da Alemanha. Aliás, para
desembarcado do trem quando, ao ver as torres ao longe,
quem tem olhos, Düsseldorf pode ser uma experiência
desmanchei-me toda. Depois, quando botei os pezinhos
e tanto sobre montagem de vitrines. Seguramente, as
lá, foi um verdadeiro vexame, a ponto de uma senhora me
vitrines de loja mais sedutoras que vi até o momento
parar e perguntar se eu estava passando bem! Köln é ainda
estão nessa cidade. Já Berlin é diferente. Não há como
a cidade das centenas de bares às margens do rio Reno,
passear por essa metrópole sem sentir o peso de décadas
dos artistas de rua, do jazz em cada esquina, dos homens
de repressão e intolerância. Bastante pesado, eu diria
mais lindos da Alemanha (isso é muito importante!). E
pesadíssimo, mas Berlin é Berlin. Ali o multiculturalismo
München? É o arraso do arraso como cidade e lição de
impera e fascina. Todos os tipos de pessoas, dos mais
urbanismo. A capital da Baviera alia o antigo e o novo
variados credos, religiões, opções sexuais, estilos e tribos
de uma maneira interessantíssima. Ali podemos dar de
andam e convivem em silenciosa harmonia pela cidade.
cara com construções muito bonitas dos séculos XVIII e
É claro que, vez por outra, as ruas são sacudidas por
XIX, bem como com a cidade olímpica, construída para
manifestações neonazistas, contidas por policiais, quando
sediar a Olimpíada de 1972, além de ser em München que
não pelos próprios civis, que também gritam palavras de
está sendo finalizado um dos estádios de futebol mais
ordem condenando o passado recente da Alemanha, nódoa
268-Bloco(1)
Paula Ramos - Caderno de Viagens
difícil de depurar para os alemães como um todo. Mas Berlin é absolutamente envolvente. Museus, bibliotecas, música por toda parte, sempre. Inclusive é nela que está a melhor orquestra do mundo: a Filarmônica de Berlin, que eu já tive a honra de ouvir e, novamente, chorar de quase soluçar. Enfim, um mundo. (Adendo: a partir de setembro estarei morando lá! Eba!!!) Bem, como disse, poderia escrever, escrever, escrever, contar detalhes pitorescos, relatar vexames, experiências várias, mas o espaço é curto e eu tenho uma imagem a zelar! Ah, quero deixar aqui uma preciosa dica, que eu, particularmente, encaro como lema pessoal: “Sem tesão não há solução!” – como, aliás, já rezava o ditado popular, que o psicólogo Roberto Freire tratou de cristalizar em título de seu famoso livro. O que me trouxe para cá foi o tesão de fazer o que gosto: pesquisa. O que me move aqui é essa mesma energia. Para vocês que curtem estudar e aprofundar as idéias, eis o toque: integrem-se às equipes de pesquisa, comecem a propor temas e projetos. Vocês
Altstadt, Frankfurt
devem iniciar aí mesmo na Feevale. São essas experiências que formam o espírito de um pesquisador, que mostram possibilidades e que criam redes de relacionamentos. Pensem nisso com carinho. Um abraço enorme para todos vocês. E, acreditem, apesar de todas essas maravilhas, estou com saudades! Profe Paula.
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Paula Ramos - Caderno de Viagens
Subject: Ah, a Alemanha...
vôo, só que iam para Paris e depois para Barcelona.
Date: 03 de fevereiro de 2005 13:04
O meu vôo ia até Paris, depois Hannover. Tive sorte:
From: Paula Ramos <paulavivianeramos@yahoo.com.br>
troquei de poltrona e fomos conversando, comendo e tomando espumante até Paris. Foi ótimo!!! Chegando
Queridos amigos!
em Paris às 9h e 10min, tentei, desesperadamente, correr até um outro terminal (a quilômetros de
Bem, tudo começou na segunda-feira, dia 31, às 4h e
distância, sério!!!) para pegar o meu vôo que saía às
30min da manhã, quando me levantei para terminar de
9h35min. Não deu, é claro... esperei mais um pouco
arrumar as malas, dar um jeito básico na casa e essas
e fui encaixada em um outro vôo, duas horas depois.
coisas todas. É claro que me atrasei e é claro que entrei
Fui dormindo até Hannover. Acordei com o comissário
numa histeria provisória, que só aumentou quando vi o
me sacudindo. Olhei para fora e que visão linda:
engarrafamento nas ruas da cidade, devido ao retorno
campos verdes, com aqueles enormes “cata-ventos”
do Fórum Social Mundial. Aeroporto, 11h (meu vôo saía
de metal (não é bem isso, mas é parecido, eles servem
às 12h e 30min), novo ataque: a fila nos guichês da
para “catar” energia eólica), rios, chalés, tudo muito
Varig dava umas 7 voltas, por aí... Comecei a entrar em
bonito, bonito, bonito. Estava próxima de Hannover.
parafuso: calor horrível, estresse, cansaço, uma noite praticamente sem dormir, preocupação... o caos. Bem,
Chegando a Hannover, comecei a peregrinar atrás de um
embarquei num vôo para o Rio de Janeiro. Tudo certo.
“orelhão”, a fim de tirar a minha mãe da aflição, mas não
Cheguei ao aeroporto do Galeão e precisava então pegar
conseguia fazer ligação a cobrar. Bem, depois de tentar
um vôo da Air France. Estava lotadíssimo!!! Cerca de
me comunicar com um senhor “auf deutsche”, consegui
80% das pessoas eram provenientes de Porto Alegre:
ligar com moedas. Várias das moedas que ganhei
todas com as camisetas do fórum. Continuava nervosa,
em minha festa de aniversário e em minha festa de
com duas super mochilas, mais uma sacola com uma
despedida morreram ali mesmo, mas “kein problem”...
bota, mais um enorme casaco e só pensando em como levaria as minhas duas malas gigantescas depois... Meu
Aí, fiquei das 15h às 17h e 30min esperando por dois
nervosismo só passou quando encontrei a Liz Fonseca
colegas, o Arthur e o Fabiano, que iam para a mesma
e o Glauco, namorado dela. Ambos estavam no mesmo
cidade, Göttingen. Para azar do Fabiano e sorte minha, a
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Paula Ramos - Caderno de Viagens
Lufthansa perdeu as malas dele (temporariamente, é claro)
sinto nenhuma saudade daquela sauna gosmenta de
e daí ele pôde ajudar com as minhas. Pegamos um trem,
Porto Alegre, pelo menos no verão, é claro!
fomos a Göttingen e, de lá, ao Instituto Goethe. Depois seguimos para os alojamentos. O meu é um arraso: tenho
Bem, gurizada, eu vou escrevendo e contando as
cozinha e banheiro no quarto. Moro num alojamento para
novidades. Ah, uma coisa: já parei de converter euro para
estudantes de medicina que fica a cerca de 30 minutos a pé
real. Se ficar fazendo isso, não como, não bebo, não faço
do instituto. Todos os dias caminho um monte, o que me faz
nada... aqui as coisas são muito caras.
acreditar que vou emagrecer um pouco... Grande beijo para todos vocês e, por favor, escrevam-me! A cidade é linda! Tudo é limpo, organizado e arborizado.
Paula
As casas são umas gracinhas e as pessoas se locomovem principalmente por meio da bicicleta, o que eu achei o máximo! O pão daqui é um escândalo e a manteiga também. Ainda não experimentei a cerveja, mas não tardarei! Em minha sala de aula no Goethe há pessoas de várias partes do mundo: Tunísia, Arábia, África, EUA, Coréia... é muito divertido. Entre os estudantes, geralmente nos entendemos; agora, não é fácil a comunicação em geral. A sorte é que os alemães daqui são muito, mas muito pacientes. Vocês tinham de ver o que era eu ontem no supermercado, pedindo as coisas... uma piada. Mas eles se esforçam para nos entender e gostam (foi o que eu senti) de nos ver tentando falar alemão e não outra língua, como inglês, por exemplo. Reichstag, Berlin
Quanto ao frio: é maravilhoso!!! Sabem aquele frio seco e bonito? É esse! Um frio delicioso. Sinceramente, não
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Paula Ramos - Caderno de Viagens
Subject: As novidades da semana
quando vemos as fotos das pessoas assassinadas ao
Date: 07 de março de 2005 10:07
tentar cruzar o muro. É terrível. O distanciamento
From: Paula Ramos <paulavivianeramos@yahoo.com.br>
nos tira um certo senso de humanidade. Isso é certo. Eu, quando lia sobre o muro, conseguia, digamos
Queridos amigos!
assim, elaborar um certo discurso histórico-políticosociológico sobre a questão da “cortina de ferro”.
Bem, eu nem sei direito por onde começar... As duas
Entretanto, quando a gente vê aquilo tudo ali,
últimas semanas foram especialmente corridas. Aqui no
cruzando a cidade... Quando a gente vê, por exemplo,
Instituto Goethe nós temos aulas muito puxadas mesmo.
a “última bandeira” da antiga URRS pendurada num
São provas, exercícios, tudo para tentar fazer o povo
prédio, quando a gente vê antigas construções
sair do alemão “a + b = ab” e, no meu caso, para tentar
destruídas durante a guerra e mantidas daquele modo,
sair do “alemão spaguetti”. Tenho a esperança de que
para lembrar as pessoas das atrocidades que o homem
conseguirei me comunicar minimamente em mais quatro
é capaz de cometer... isso choca, e choca mesmo. Eu
meses de exercícios redobrados.
não consegui sair de Berlim sem uma certa sensação de tristeza. Mas, por favor, não me interpretem mal!
Na sexta-feira da semana passada, eu e mais 19 colegas
Como eu posso ficar triste numa cidade como Berlim?
aqui do Instituto Goethe fomos a Berlim: 2 horas para ir e 6 horas para voltar (com 4 trocas de trem!!!). Bem, o
Vocês acreditam que eu assisti à Filarmônica de Berlim?
que eu posso dizer sobre Berlim? Nem sei ao certo. É uma
Na realidade, foi um concerto de câmara, mas que
cidade realmente muito interessante. É claro que nós só
maravilha!!! Eu fiquei absolutamente arrepiada. Foi
olhamos a parte mais turística, mas foi sensacional assim
sensacional. Eles tocaram obras de Telemann, Bach,
mesmo. E triste também. Sabem, eu tive uma sensação
Haendel. Foi lindo!
muito confusa em Berlim. De um lado, a expressão de total liberdade, manifestada no modo como as pessoas se
Bem, entramos ainda no Reichstag, o parlamento alemão.
vestem, nos muros da cidade... de outro, uma melancolia
A história das eternas construções e reconstruções do
acentuada. Eu acho que não tem como não sentir isso
Reichstag é impressionante. Se eu não estou enganada,
quando se passa junto às ruínas do muro de Berlim, ou
ele já foi reconstruído 4 vezes. Uma vez, o teto pegou
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Paula Ramos - Caderno de Viagens
fogo, em outras duas, ele foi bombardeado e a quarta vez
bundinhas, das casas, dos cachorros, das bundinhas,
é a definitiva. O arquiteto que fez a obra desenhou uma
dos olhos, dos rostos, das bundinhas... não seria
grande cúpula com sistema de entrada e saída de ar. Ou
interessante? Enlouqueci mesmo lá dentro!
seja: essa cúpula “puxa” o ar frio para dentro e “joga” o ar quente para fora. Não é um ar-condicionado!!! É algo
Também vimos um show de jazz muito bom e fomos ao
sensacional. É enorme! A gente pode subir até o alto da
antigo Palácio dos reis da Prússia. Mas essa parte eu não
cúpula, tirar um monte de fotos... é muito lindo. Bem, eu
pude ver, pois inventei de comer um döner no sábado
tirei fotos de tudo isso, mas não consigo enviá-las. Não
à noite e, evidentemente, na madrugada de domingo
entendi até agora o que acontece. As mensagens sempre
comecei a me transformar em estado liquido. Vocês não
voltam, embora as imagens estejam em baixa resolução...
podem imaginar o quão patético foi. Na realidade, foi
Eu vou criar um arquivo de imagens no yahoo e depois
ridículo: eu me arrastando para cima e para baixo atrás
aviso a todos vocês, ok?
de banheiros... um horror. O cúmulo da decadência! Mas tudo bem, agora estou melhor.
Bem, visitei ainda o Museu Pérgamo. Nem sei o que dizer. Tive orgasmos múltiplos vendo o altar de Pérgamo;
Bem, é isso, queridos amigos! No mais, vou escrevendo!
o portal da antiga Babilônia, com seus mosaicos feitos
Um grande e fraterno abraço para todos vocês!
com tijolos vitrificados; toda aquela obra monumental
da amiga Paula.
retirada da antiga Assíria, com os relevos do Palácio de Assurbanipal em Nínive... Ah, indescritível. É claro que eu tirei foto de tudo. Foram mais de 200 fotos só no Pergamo!!! Muitas delas, é claro, das “bundinhas” das estátuas gregas. Que loucura aquilo! Todas essas fotos vão para as minhas aulas em Powerpoint, e as das “bundinhas” vão para uma seção especial nas minhas aulas: as bundinhas na história da arte! Não é um bom tema? Estou pensando seriamente em começar a segmentar certos assuntos: a representação das
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Paula Ramos - Caderno de Viagens
Subject: A Pergunta que não quer calar Date: 14 de junho de 2005 07:28 From: Paula Ramos <paulavivianeramos@yahoo.com.br> Liebe Leute! Como prometido, aqui estou com mais um informativo, desta vez com relatos menos picantes, para não assustar o povo (pôxa, vocês, hein… fazia tempo que não via tanta gente em estado de choque! Credo, como um escândalo pequeninho daqueles deixou tanta gente apavorada?). Bem, na semana retrasada, no sábado dia 4, estava eu sentadinha reescrevendo um texto para o meu amigo Nestor Candi, quando toca o meu celular: “Paula, onde tu estás?” Era a Carine, uma amiga dos Camarões que conheci no Goethe Institut (GI) de Göttingen. “Estou em Kassel.” E ela: “E a que horas tu vens a Göttingen?” Göttingen? Meu Deus, o que eu faria em Göttingen?, pensei comigo… E ela de novo: „Tu esqueceste do meu casamento?“ Ih… tinha esquecido! “Estou indo, Carine, estou indo!” E “me fui”. Comprei um presente bem legal, peguei o trem e me mandei. Antes, liguei Cartazes uns sobre os outros são marca das ruas de Berlin.
para a Seon-Young, uma outra amiga do GI, essa vinda da Korea, e perguntei se podia dormir lá na casa dela (na verdade, ela está morando no próprio GI). Ela disse que sim e, é claro, também foi ao casamento. Gente, que loucurada… Eram, na verdade, dois casamentos,
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Paula Ramos - Caderno de Viagens
sendo que os dois casais eram dos Camarões. A festa foi na Casa de Estudantes da Universidade de Göttingen. Pode? Tudo estava maravilhoso. Dancei até não poder mais, e aquela música africana, que eu adoro. Depois, comi umas comidas maravilhosas, tudo prato típico dos Camarões. Tinha pelo menos 10 pratos diferentes, um melhor que o outro. Aí, fui parabenizar a Carine por tudo e, principalmente, pelas comidas, e ela me soltou essa: “Que bom que tu gostaste! Eu passei os dois últimos dias fazendo tudo!” Num primeiro momento, não acreditei. Pode um negócio desses? Ela cozinhou tudo!!! Para vocês verem como as coisas são diferentes… E, detalhe: todos
Agora posando do alto, junto à praça central de Praga.
os pratos, talheres, copos e, inclusive, toalhas de mesa, eram de plástico, eram descartáveis. Eu fiquei realmente emocionada com aquele casamento. Emocionada mesmo! No dia seguinte, levanto para fazer um xixi ali pelas 9 da manhã. E volto a dormir, é claro. Nesse momento levanta a Seon-Young e começa a cozinhar arroz! Eu fiquei olhando para aquilo e ela me disse: “É que demora!” Uma hora depois estava ela me chamando para tomar o café-da-manhã, que era: arroz, algas, carne com cebola e molho doce, sopa de algas e tinha ainda uns bichinhos que pareciam uns vermes marinhos. Eu olhei para aquilo tudo, fiquei meio atordoada e, evidentemente, comecei a comer. Gente de Deus: fazia tempo que eu não comia algo tao sensacional (na verdade, fazia poucas horas...).
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Paula Ramos - Caderno de Viagens
Uma delícia, um escândalo de bom! Comemos tudo, ou melhor, eu comi quase tudo. Ela comeu pouquinho, mas eu raspei os pratos… Nunca havia comido algo da Korea. Que loucura! E vocês acreditam que ela ainda fez biscoitos de chocolate para mim? Ah, pessoal, nossa, fiquei muito, mas muito feliz! Ah, não fiquem pensando que o meu estado balonal só vai piorar… não verdade, estou fazendo ginástica todos os dias, duas horas!!! Ainda não deu resultado, mas espero que, em pelo menos um ano, deixar de ser mais uma musa do pintor Rubens… Köln.
Aí, já voltando de Göttingen, passamos, eu e a SeonYoung, em uma loja de bicicletas que tem ao lado da Bahnhof. Só que a loja estava fechada. Porém, como ela também funciona como estacionamento de bicicletas (ah, acho que ainda não comentei isso, mas aqui o transporte oficial é a bicicleta!), entramos, apenas para ver. Aí me saltou uma mulher de 1,90 de altura, gritando que a loja estava fechada e que tínhamos que ir embora. Eu olhei bem para ela e comecei a latir! E, não apenas isso, comecei a latir e a rosnar… Não, voces tinham de ver a cara da mulher! Eu achei que ela fosse sair correndo atrás da gente! De volta a Kassel, nem deu muito tempo para eu pegar as minhas coisas e me mandar para Bochum, pertinho de Köln, onde eu assistiria às palestras do Arthur Danto.
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Paula Ramos - Caderno de Viagens
Para poupar o meu dinheirinho, inscrevi-me num site de caronas e me mandei com um rapaz que estuda lá. Aqui tem esquema bem interessante: tu te inscreves nesse site e procura caronas para o lugar desejado. Aí, entra em contato por e-mail e vai. Geralmente fica 1/3 do valor normal de trem. Para se ter uma idéia, o valor da passagem de Kassel a Bochum, pelo trem, era 30 euros (!!!), e isso levaria 2 horas e meia de viagem. Eu fui de carro, levou 1 hora e 15 minutos e ainda paguei 10 euros. Está bom, né? O menino só ficou meio assustado comigo, porque eu falei do início ao fim da viagem. Acho que ele não estava muito acostumado. Eu fui a Bochum
Visão bucólica de Cesky Krumlov, na República Tcheca.
porque ficaria na casa da minha amiga Valéria. Ela mora lá. Bochum é perto de Essen (onde mora o Arthur, outro amigo), de Duisburg (onde mora a Beatriz, outra amiga), de Düsseldorf e de Köln. A cidade fica junto ao Vale do Ruhr, uma região que tem crescido enormemente aqui. Trata-se de uma cidade totalmente universitária, com Campus voltado à área das Engenharias. Não, gente, vocês não têm noção do tamanho desse lugar. É absolutamente enorme, com vários prédios, todos em concreto, muito bonitos, com uma arquitetura bem modernista. Chegando a Bochum, encontrei, perto da casa da Valéria, um amontoado de coisas na rua. Aqui as pessoas têm esse costume de jogar as coisas velhas na rua. Só que as coisas velhas geralmente são ótimas. Eu mesma já recolhi um sofá
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Paula Ramos - Caderno de Viagens
lindo, no formato de concha (ah, a iconografia!), além de
Depois, recomposta, fui dar uma borboleteada no
uma estante para livros! Bem, e o que eu não encontro para
centro. E aí eu descobri onde estão os homens lindos da
a Valéria? Uma televisão (grande, bonita e funcionando!!!),
Alemanha! Fazia tempo que os meus olhos não ficavam
um colchão de molas (ótimo!), uma cadeira para escritório
tão felizes num único dia. É realmente um festival de
que mexe para tudo que é lado (igualmente ótima), uma
homens bonitos e bem vestidos. Sim, porque eu tenho
mesa para computador e uma poltrona. Pode um negócio
de dizer que o tipo básico alemão não é lá essas coisas,
desses? A Valéria me disse que eu atraio essas coisas
até porque 90% dos homens entre 20 e 40 anos usa um
kostenlos… Claro que ela ficou pra lá de faceira, pois
ridículo gel no cabelo… e ninguém merece isso! Ah,
montou o apartamento dela em dois toques.
e um detalhe: homens bonitos de todas as tendências sexuais… felizmente também tem heteros em Köln!
Bem, já na segunda-feira fui para Köln. Chegando à cidade, comecei a ter tremedeiras, pois o que se vê, quando o trem
Aí, deslumbrada com tudo que via, fui caminhando até
está chegando à Bahnhof, são as torres da Catedral de
a Universidade. E outro arraso! A Universidade de Köln
Colônia. Ela fica ao lado da Bahnhof (é a estação de trens)
foi criada em 1388, e o forte dela é a área das humanas.
e é uma das maravilhas do mundo. É óbvio que fui correndo
Entrei na „Aula 2“, auditório em que aconteceria a
e tremendo pra lá. Tinha um povo inacreditável lá dentro.
palestra do Danto, e comecaram a chegar dezenas de
Gente para tudo o que é lado, fotografando, fotografando
estudantes de filosofia e de história. E aí eu vi que
e fotografando. Eu prometi a mim mesma que, naquele
o mundo não tá perdido. Vocês sabem como é o tipo
dia, não iria tirar nenhuma foto. Aí comecei a deslizar
básico do estudante de história e de filosofia no Brasil,
pela catedral. Povo, que emoção. Aqueles vitrais, aquelas
né? Cabeludo, relaxado, despenteado… Ali não… Uns
colunas, aquelas abóbadas lá no alto, muito alto… não
estudantes lindos de morrer! E, ainda por cima (pelo
demorou dois minutos eu estava soluçando de tanto chorar.
menos os que falaram), inteligentes. Fizeram perguntas
Chorava de um jeito constrangedor. Aí, veio uma velhinha
altamente pertinentes, altamente interessantes. Fiquei
e me perguntou se eu estava bem. E eu, com as lágrimas
em êxtase!
quase que saltando na cara dela, disse que era só emoção. Não, que coisa aquilo. É lindo demais! Naquele dia agradeci
A palestra, tanto nesse dia quanto nos outros dois, foi
enormemente por estar ali.
em inglês. E eu tive que puxar o meu inglês spaghetti
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Paula Ramos - Caderno de Viagens
das profundezas do meu ser, mas até que consegui
delírio “a nível de pessoa humana” e para a desgraça da
entender a metade, digamos assim. Uma coisa muito
minha conta bancária) dezenas de livros maravilhosos,
interessante que aconteceu nesse seminário foi que o
inclusive um totalmente esgotado sobre (tchan! tchan!
Danto não ficou sendo bajulado o tempo inteiro, como
tchan! tchan!)… os artistas expressionistas alemães e
geralmente acontece quando um professor “de fora” vai
a ilustração literária!!! Pode? Não, gente, o livro tem
dar uma palestra nas nossas universidades, ainda mais,
tudo: reproduções das ilustrações, textos de época sobre
no caso do Danto, que, inclusive, foi homenageado com
ilustração e expressionismo, cronologia, lista dos livros
o título de “Albertus-Magnus Professur”, o mais alto
ilustrados por todos os grandes artistas expressionistas
da Universidade de Köln. Não, ele foi “sabatinado”. Dá
alemães, etc, etc, etc… além desse, encontrei diversos
para acreditar? Os professores da Universidade fizeram
catálogos e livros com materiais incríveis para a minha
diversas perguntas a ele e, inclusive, críticas! Muitos
tese. Ou seja: rendeu pra chuchu.
disseram que várias teorias e idéias dele não tinham fundamento filosófico! Pode? Mas tudo foi feito de uma
Como estava nas redondezas, fui a Essen, onde visitei
forma extremamente educada e respeitosa, criticamente,
o Museu Folkwang, maravilhoso!!! Lá tinha uma
porém de alto nível. Ou seja, que experiência que eu
exposição incrível sobre arqueologia e paleontologia,
tive! Agora, sem preconceitos, tenho de dizer que eu
numa montagem absolutamente arrasadora. Fiquei
fiquei meio “impressionada visualmente e auditivamente”
embasbacada nessa expo. Vi esqueletos de dinossauros,
com o Danto. Gente, vocês acreditam que ele é vesgo e
relevos de animais pré-históricos, conchas diversas,
gago? Quando ele lia os textos, tudo bem. Agora, quando
crânios… um arraso! No mesmo museu visitei, ainda,
ele falava, que caos!!! Ele não é um POUCO gago. Não,
o acervo permanente, que também deu um banho de
ele é TOTALMENTE gago!
montagem, mesclando as peças egípcias, gregas e africanas, por exemplo, com a arte dos novecentos e do
Bom, mudando de pato para galinha, mas sem sair
século XX. Muito, mas muito interessante. Ali tinha uma
do clube das aves, Köln é tudo! Encontrei um brechó
colecão impressionante de Nolde e de Gerard
alucinante lá. Roupas lindas e escandalosas… comprei
Richter, que é o arraso do arraso! Também vi nesse
algumas, é claro! Depois, uma loja em que tudo é feito
museu uma outra expo sobre a arte dos conventos na
com papel, tudo, tudo, tudo. Encontrei (para o meu
Idade Média. Sem comentários!
279-Bloco(1)
Paula Ramos - Caderno de Viagens
Para vocês verem como a minha semana rendeu, ainda
ou seja, o grupo dos pobres e dos que não gastam nada.
passei a minha sexta-feira em Düsseldorf… Sei que
Conceitualmente, eu não tenho nada a ver com esse
pareço a pessoa mais “desbundada” da face da terra, mas
grupo, mas, enfim… O engracado, porém, foi que, para
vocês não têm noção do que é essa cidade!!! Gente, que
poupar 20 euros (que é uma grana para um bolsista), eu
loucura aquilo. Na parte antiga, uma quantidade incrível
liguei, na maior cara de pau, para um amigo da Beatriz
de gente bonita nas ruas, bares nas calçadas, músicos
que mora em Köln perguntando se eu e a Cris não
e atores nas ruas… a cidade ferve. Também visitei o
poderíamos dormir na casa dele naquele sábado! Que
grande museu da cidade e tive ataques.
folgadas, hein? Ele, muito querido (aliás, ele morou no Brasil um tempo e inclusive quer voltar para lá, pois diz
De quinta até sábado, dormi em Duisburg, na casa da
que “odeia” a Alemanha e as mulheres da Alemanha…
Beatriz. No sábado pela manhã, a Cristiane, outra amiga
- contou-me que aqui, se as mulheres transam uma vez
do Brasil, foi a Duisburg e, de lá, fomos novamente a
por semana com os maridos/namorados, etc, eles têm
Köln. Além de alguns trajetos já descritos, no sábado
de levantar as mãos para o céu e agradecer!), deu-nos
fomos ao Museu Ludwig. Esse museu tem uma coleção
abrigo. Ainda nos levou para uma danceteria bárbara!
internacionalmente conhecida de arte moderna e
Às 6h e 30min da manhã do domingo, porém, as duas
contemporânea. É realmente impressionante. Agora, eu
já estavam de pé, pois precisávamos ir à missa! Fomos
tenho de dizer que a montagem é, no mínimo, sofrível.
primeiro à missa na Catedral (sem comentários… com
Uma bagunça total: arte pop no subsolo e depois no
direito a música tocada com órgão e tudo o mais!) e
terceiro andar, junto com Picasso!!! Não deu para
depois, na nossa peregrinacão pelos locais históricos,
entender. Fiquei até com vontade (olhem a petulância!)
entramos em outra igreja, dessa vez românica (cerca
de encaminhar uma cartinha para o museu, comentando
de 1100), onde estava sendo rezada uma missa em
o caos da montagem. Ah, e o museu é muito caro: 5,50
português de Portugal, com um coral maravilhoso. Ainda
euros para estudante!!!
entramos em outra igreja e assistimos a uma missa em grego! A igreja era ortodoxa. Gurizada, que emoção!
Ah, esqueci de comentar: todos os brasileiros que fizeram
Toda, toda a missa era cantada… e em grego! Outra vez
o curso-básico-de-alemão-e-salvação-da-lavoura no GI
chorei de forma um tanto quanto escandalosa.
de Göttingen formaram o chamado grupo “Kostenlos”,
280-Bloco(1)
Paula Ramos - Caderno de Viagens
É claro que aproveitamos para tirar dezenas de fotos de
Subject: eu, noch einmal...
todos esses lugares, além de termos rezado um pouco,
Date: 15 de julho de 2005 8:32
afinal, era não apenas dia dos namorados, como véspera
From: Paula Ramos <paulavivianeramos@yahoo.com.br>
do dia de Santo Antônio! Ai! Ai! Ai! E foi isso. Tem outras histórias no meio, mas creio que eu já escrevi pra
Liebe Leute!
lá de demais! Desculpem-me, mas eu me empolgo. É que
Sob um calor de mais ou menos 35 graus, numa das
essa semana foi pra lá de emocionante: museus incríveis,
3 salas de computadores da universidade, sem ar-
obras incríveis, livros incríveis, homens lindos...
condicionado e, tampouco, ventilador, escrevo… Como podem notar, as condições não são das mais
Ah, e depois de toda essa descricão, de todas essas
apropriadas… Pois é, para quem achava que na Alemanha
maravilhas, é claro que tem uma pergunta que nao quer
não tinha verão, aí está mais uma grata surpresa. E que
calar: O QUE EU ESTOU FAZENDO EM KASSEL? E olha que
calor! Socorro! O grande saco é que as casas, as lojas,
o Alfredo Nicolaiewsky havia me prevenido! É óbvio que
os ônibus, nada, absolutamente nada é preparado para
estou pensando seriamente em me mudar para Köln,
o calor. Vocês acreditam que os ônibus aqui não têm
Düsseldorf ou mesmo para alguma cidade vizinha. Nesta
janelas ??? Vocês acreditam que os trens regionais (mais
semana vou falar com a minha orientadora e ver se ela
baratos… são os que eu uso) até têm janelas, mas elas
me libera. Creio que sim, pois eu não tenho aula aqui.
não abrem? Então vocês tentem imaginar que coisa linda
Vamos ver... Só sei que eu não posso ficar mofando em
que não é passar o verão num ambiente desses…
Kassel enquanto tem um mundo de coisas acontecendo lá. Não, não, não!
Hoje é sexta-feira. É meio-dia e, em 1 hora, vou almoçar a minha linda salada verde com pedaços de queijo branco.
Beijão para todos e até a próxima, que será breve: neste
Uma delícia! Pois é… estou completamente adepta da salada
findi vou a Amsterdam!
por vários motivos: primeiro, amo saladas; depois, com esse
Paula
calor, nada mais desce; terceiro e muito importante, preciso urgentemente sair do meu estrado balonal. Então, salada, salada e salada, com direito a uma cerveja noturna. As novidades da vez são as seguintes: estou com visita!
281-Bloco(1)
Paula Ramos - Caderno de Viagens
Trata-se da Juliana Brandelli, filha da minha querida
Bem, seguimos para a casa da minha nova amiga Hilda,
amiga Amélia Brandelli e do Alexandre. A Ju morou 6
bióloga panamenha que conheci no maravilhoso e
meses em Londres, onde trabalhava como garçonete sem
tantas vezes lembrado encontro dos bolsistas do DAAD
ter quebrado uma única louça (apesar de ter tentado
em München. E ficamos ali por três dias. Foi muito
pelo menos 4 vezes!); aí, escapou dos atentados, pois
bom. Eu também não conhecia Frankfurt. Reviramos a
resolveu conhecer Espanha, França e Alemanha. No dia da
cidade caminhando, entramos em tudo que era lugar,
quebradeira em Londres estava aqui, lépida e saltitante
visitamos dois museus maravilhosos, com destaque
pelas ruas bucólicas e entediantes de Kassel. A estada
para a Schirn Kunsthalle. Que arraso! Ali vimos
da Ju aqui tem sido bem legal. Fomos a Frankfurt,
uma expo absolutamente maravilhosa, cujo nome é
Düsseldorf, Köln e Hannover. Tudo roteiro mais ou menos
“Wunschwelten”, ou algo como “Mundos do Desejo”, pelo
kostenlos, pois ficamos em casas de amigas minhas. Vai
menos foi essa a tradução que fiz. Gente, que arraso!
aí um breve relato.
Eu amei de paixão a expo. Demais mesmo! Trata-se de uma expo cujo foco são os novos artistas românticos.
Frankfurt: foi a primeira parada dela. Como a Ju foi
Então, vimos diversos trabalhos, em diversos suportes,
enganada pela companhia aérea, pois o vôo dela era
referenciando o velho sonho dos artistas dos séculos
Frankfurt-Hann, seu avião desceu no meio de uma
XVIII e XIX. Foi muito, mas muito legal. Fazia tempo
plantação de trigo. Aí, teve de pegar outro ônibus até
que eu não via uma exposição com uma curadoria tão
a verdadeira Frankfurt. Eu estava lá, esperando-a, mas
articulada, tão interessante. Os curadores são bem
nos desencontramos diversas vezes. Depois de algumas
novos: Max Hollein e Martina Weinhart. Aliás, pelo que li
horas com direito a chamada pelo alto-falante da
na revista ART, eles geralmente causam muita polêmica
Bahnhof, em português (êba!), encontramos a moça,
com as expos que apresentam, o que eu já adorei por
completamente alterada devido ao calor sufocante e ao
si só. Polêmica! Polêmica! Bem, entre os artistas desta
cheiro contaminante de suor e de budum que ela logo
mostra, destaque absoluto para David Thorpe. Eu
identificou em quase todos os ambientes da Alemanha,
confesso, envergonhada, que não o conhecia. Inglês,
sobretudo de Kassel...
tem um trabalho minucioso e artesanal de colagem de diversos e diversos elementos, com ênfase no papel. Lembrei-me direto do Alfredo Nicolaiewsky… Nossa,
282-Bloco(1)
Paula Ramos - Caderno de Viagens
gente, que trabalho lindo! Lindo demais. Vale a pena
do Reno tomando uma cerveja, ora às margens do Reno
vocês procurarem na Internet pelo nome dele. As obras
tomando outra cerveja. Foi ótimo. Ainda pegamos um
são de tirar o fôlego. Mesmo!
show de jazz sensacional em Köln, visitamos a catedral, para não perdermos o ar de espanto, e borboleteamos por
Ainda em Frankfurt, visitamos várias livrarias
tudo que era lugar. Aliás, falando em borboleta, a Hilda
estonteantes, mas eu fui obrigada a não comprar nada,
é a pessoa sem dúvida alguma mais fanática que eu já
pois estou completamente falida. A minha esperança,
encontrei. Ela ama borboletas há tempos. Sabem quantos
nesse sentido, é a Feira do Livro de Frankfurt, que
“focos” de borboleta contei na casa dela, entre abajur
acontece em outubro. Não, povo, vocês têm de entender
na forma de borboleta, móbile e decalque no banheiro?
que nessa feira os livros são vendidos em média com
56. Não, gente, absolutamente surreal. No passeio ainda
50% a 70% de desconto. Bom demais!
conseguiu comprar bolsa, blusa, chinelo e biquíni com estampa de borboleta…
Em Frankfurt estivemos duas vezes: na primeira, ficamos 3 dias; na segunda, 1 dia. Foi quando nos dirigimos a
Hannover: delírio total! Nunca pensei que fosse tão
Wiesbaden, onde o Klinger e a Eva, queridos amigos aí
interessante. Ali ficamos na casa da Cristiane. Também
de Porto Alegre (na verdade, o Klinger é lá do Pará, e a
fizemos o circuito cidade-antiga-cidade-nova-tudo-
Eva, aqui da Alemanha!!!), ofereceram uma fantástica
tudo, e depois fomos a outro museu sensacional: o
feijoada, com direito a laranja, farofa e… caipirinha!
Sprengel Museum. Trata-se de outro museu, a exemplo
Não, não, apesar da insistência do Klinger, não repeti o
do Ludwig, de Köln, criado a partir de uma coleção
escândalo da feijoada aqui de Kassel (apropriadamente
particular. Ali vimos, além do acervo maravilhoso, uma
“cortado” desse texto!)… Gente, foi ótimo! Estatelei-
expo que era uma aula, uma verdadeira aula de como
me naquele feijão, conheci um monte de gente legal, foi
trabalhar a relação arte moderna/contemporânea-
bom mesmo! Klinger, mais uma vez, muito obrigada!
crianças. Gente, um completo arraso! Havia pelo menos 6 propostas diferenciadas e interessantíssimas
Bem, em Düsseldorf e em Köln fizemos passeios mais
de arte-educação. Eu fiquei totalmente emocionada.
fortuitos. Éramos eu, Juliana, Hilda, Cristiane e Valéria.
Para “comentar” um quadro de Klee para as crianças,
Estava muito quente e preferimos ora sentar às margens
foi montado um grande play-ground, em que a gurizada
283-Bloco(1)
Paula Ramos - Caderno de Viagens
podia brincar com peças que imitavam os desenhos de
a imensa quantidade de esculturas públicas. A cidade é
Klee. Para tratar de Max Ernst, da série dele sobre os
tomada, absolutamente tomada. E o mais interessante
labirintos, foi montado um labirinto mesmo, em que a
é que muitos artistas são convidados para fazer
criança tinha de colocar a cabeça para fora, num espaço
intervenções em locais públicos e meio “tolos”, digamos
demarcado, e do qual ela via, então, a obra… Para tratar
assim, como, por exemplo, as paradas de ônibus! Então,
de Kurt Schwitters, de uma obra feita a partir de papelões
há paradas de ônibus nas mais variadas formas, como
e de caixas de embalagem, foi montada uma grande sala
rabo de peixe, seio de mulher, etc… um sarro ! Eu adorei
com diversas embalagens que, obviamente, tinham total
a cidade! Altíssimo astral mesmo! E ainda encontramos
relação com o quadro em questão. Ou seja: é óbvio que
um artista esculpindo sua obra em uma praça. Ah,
a criança, num local como esse, vai se sentir totalmente
detalhe: as obras permanecem ali!!! Não são roubadas,
próxima da arte contemporânea. Fiquei emocionada!
tampouco sofrem qualquer tipo de atentado!
Agora, ainda neste museu, pudemos ver uma expo
Depois de tudo isso (claro que tem muito mais…),
das ilustrações (sim, uma expo SÓ das ilustrações!)
voltamos a Kassel. Aqui as coisas não são tão
de Marc Chagall para a Bíblia, para o livro do Êxodo,
emocionantes, mas dentro das atuais parcas possibilidades
para as Fábulas de La Fontaine, para as Mil e Uma
financeiras, vou levar a Ju amanhã à Hann Münden, uma
Noites, etc, etc, etc… um arraso! Muita emoção! Amei
cidadezinha perto totalmente medieval, muito bonitinha
demais a mostra. E, ainda por cima, embora estivesse
mesmo. No domingo, ela segue para Londres e, depois,
completamente falida, encontrei um livro esgotadésimo
para o Brasil. E a partir de segunda eu vou encarar dois
(que existia na lojinha do Museu de Düsseldorf, mas
textos gigantescos que tenho de fazer. Ainda não sei que
estava 75 euros!!!), sobre os Artistas Surrealistas e a
solução vou encontrar para desviar-me do calor… talvez
prática da Ilustração… esse livro, mesmo nessa loja do
transferir a mesa do computador para o banheiro…
Sprengel Museum, custava 74 euros, mas daí o cara olhou para mim, viu que se tratava de uma estudante latino-
Sobre “eu enquanto pessoa humana”, sigo aqui, estudando,
americana pobre e falou “Ok, para você eu faço por 20
lendo, lendo, lendo. Nada de amores, nada de paixões,
euros”… ou seja: saí de lá completamente radiante.
nada de nada. Estou começando a achar que vou mesmo
Agora, uma coisa que chama a atenção em Hannover é
ficar para a minha querida tia Vaneide. Absolutamente
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Paula Ramos - Caderno de Viagens
nada acontece! Pode? A única coisa que posso contar é que sou o absoluto sucesso entre a comunidade africana… talvez pelo atual tamanho exagerado do meu quadril e arredores (argh!). Três caras pegaram no meu pé de um jeito constrangedor, a ponto de eu ter de dizer para um deles, quando ele começou a me seguir pela universidade (sim, até por isso eu passei): “Es tut mir leid… ich bin gay!”, ou, numa tradução rápida: “Sinto muito, sou gay”… Olhem a que ponto uma pessoa chega para se livrar de outro ser inconveniente! Logo eu, que apesar de tudo, gosto mesmo de homem!!! Pra matar! A situação é tão absurda que a Amélia Brandelli disse que vai fazer uma
Eu, noch einmal, tendo Praga ao fundo.
novena para ver se eu desencalho... Bom, para terminar de uma maneira mais positiva: em meados de setembro, vou à Eslovênia, participar do encontro da AICA, a Associação Internacional de Críticos de Arte. Fico uma semana lá e depois sigo para a Itália, onde verei a Bienal de Veneza, coisas sensacionais como as capelas pintadas pelo Giotto, Florença, Roma, Siena… essas coisinhas feias! Ah, sem esquecer dos italianos, para alegrar a vista. Bem, povo, hablamos! Espero que todos vocês fiquem bem, com muita luz, muita paz, muita saúde e também um tutu no bolso, né, que não faz mal a ninguém! Beijo grande, da Paula
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Paula Ramos - Caderno de Viagens
Subject: Dobrý! Date: 10 de agosto de 2005 06:57 From: Paula Ramos <paulavivianeramos@yahoo.com.br> Liebe Leute! Aqui estou eu de novo, solita numa das salas de Internet da Universidade, e isso significa que estou longe de possíveis cheiros desagradáveis, o que é tranqüilizador. Também estou escutando um CD maravilhoso que o meu amigo Walmor Correa me enviou. Simplesmente a nata da nata do samba do Brasil e a nata da nata da música “folk” de alguns países latinos. Uma delícia!!! Obrigada, Walmor! Bem, a grande nova foi a minha viagem à República Tcheca. Há cerca de 6, 7 anos, o Juarez Fonseca me disse: quando fores à Europa, não podes, de forma alguma, deixar de ir à Praga. Depois dele, várias outras pessoas me disseram o mesmo. E eu já conhecia algumas Praga... a cidade!
imagens de Praga e de arredores. Entretanto, nunca, nunca poderia imaginar que a cidade e que o país fossem tão interessantes. Estou até agora completamente abobalhada e feliz, pois prometi para mim mesma que voltarei lá, pelo menos, mais outras duas vezes. Bom, povo, para facilitar a vida, vou dividir o relato em nove capítulos temáticos:
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Paula Ramos - Caderno de Viagens
Capítulo 1 – A Viagem O plano era: sair de Kassel no dia 31 de julho, domingo retrasado; descer em Teplice, cidade que fica logo depois da fronteira com a Alemanha, onde mora a minha amiga Jana; seguir na quinta-feira até Ceský Krumlov, “lá em baixo”, quase na fronteira com a Áustria; e no sábado seguir para Praga, onde ficaria até a segunda-feira. E foi assim que se deu. Saímos de Kassel, eu e a minha nova amiga Veronica Ortiz, uma “chica” muito querida do México. Fomos de ônibus, um meio de transporte não muito usual na Europa, pois as pessoas preferem usar os trens, mais rápidos e com mais possibilidades de horários. Entretanto, os trens geralmente são muito mais caros. E eu, como sou uma bolsista pobre, resolvi, é claro, ir de ônibus. Foi bom. Já de cara encontrei um colega da Universidade, o George, muito querido. Ele nos ofereceu lugar para ficar em Praga, o que seria ótimo, pois não precisaríamos gastar com albergues, etc, além de contarmos com um tradutor! Estação de trens em Praga.
O ônibus estava totalmente lotado, e inclusive havia várias pessoas dormindo no chão, pode? Isso porque aqui (disse-me depois o pai da Jana, que é motorista de ônibus também) é proibido ter bancos que reclinam muito. Então, além de apertados, os bancos não reclinam... imaginem que bom! Uma viagem de 8 horas em uma situação assim, sem contar que o ar
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condicionado, os motoristas ligavam quando queriam, pois eles deviam sentir frio... Chegamos a Teplice por volta das 5h da segunda-feira, dia 1. Capítulo 2 – Teplice A cidade não é bonita, mas tem algumas coisas muito interessantes. Eu me senti meio que no Brasil, pois tudo era bastante caótico. Fazia tempo, por exemplo, que eu não via fio elétrico nas ruas. Aqui na Alemanha praticamente todos os fios são subterrâneos. Entretanto, lá os fios são não apenas muitos como estão espalhados em todas as direções. Como quase toda cidade de fronteira, tem uma aparência feia, as casas são maltratadas, os rebocos despencam, as ervas se multiplicam pelas ruas. Controle nenhum. Também tem um mercado grande para a prostituição. Russas, húngaras, polonesas... mulheres do Leste encontram ali um trabalho certo e, segundo a Jana, “bom”, pois os homens alemães estão sempre ali, torrando alguns Eu, posando diante da Ópera de Dresden.
“Krones”, a moeda tcheca. Como a cidade é bem mais barata que as da Alemanha, aproveitei para cortar o cabelo e tirar aquele loiro ridículo que inventei de colocar 2 semanas antes da minha viagem. Fiquei bbbeeemmmm melhor! Ufa! Também aproveitei para, depois de 6 meses, ir a uma manicure. Mas aí descobri que eu sou muito melhor que
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qualquer manicure daqui e de lá. Para começar, elas não
noite foi, sem dúvida, a descoberta da “Becherovca”,
tiram cutícula, tampouco usam água! Só usam um creme
bebida típica da República Tcheca, uma mistura de
e depois um aparelho para “empurrar” a cutícula... um
cachaça com licor, muito, mas muito bom mesmo! Não
saco! Penso que uma boa manicure brasileira aqui não
se trata de bebida docinha e enjoativa. Não, é uma coisa
apenas faria um sucesso enorme como enriqueceria.
muito diferente, absolutamente deliciosa. A Verônica se
Sério! Para vocês terem uma vaga idéia, uma manicure
gamou de tal forma na bebida que era só o que pedia, a
cobra, em Kassel, cerca de 20 euros!!! É um assalto!!! 20
qualquer hora do dia! Um vício.
euros!!! Gente, é muito dinheiro! Então, fiz essa pequena limpeza geral e depois fiquei lépida e faceira, com direito
No dia seguinte, quarta, fomos passear pela cidadezinha,
a fazer novas fotos 3x4.
que abriga um parque natural lindo, além de uma estação de esqui que é um sucesso enorme no inverno.
Bom, em Teplice iniciou a comilança. Os parentes da
Como a cidade está na fronteira e como tanto o meu
Jana, todos, têm algum boteco em algum lugar. Ou é um
passaporte quanto o da Verônica não tinham, assim,
bar, ou é um restaurante, ou é um botequinho. É claro
grandes carimbos, pedimos, com a maior cara de pau,
que, nesses lugares, tomávamos a melhor cerveja do
que a Jana fosse até a fronteira com a Polônia, apenas
mundo (não deixem de ler o capítulo sobre a cerveja!)
para ganharmos um carimbinho a mais. É claro que fomos
e ainda comíamos comidas típicas e maravilhosas. Um
motivo de riso, pois demos unicamente uma voltinha
escândalo sem tamanho. Ah, e tudo de “grátis”! Dessa
no pórtico da polícia e voltamos. E aí os policiais
forma, de bar em bar, conhecemos toda a família da Jana.
(lindos, lindos, lindos! Leiam o capítulo sobre os homens tchecos!) nos perguntaram se tínhamos esse costume de
Capítulo 2 – Tante Jana
“visitar” fronteiras... Bem, mas ganhei uns carimbos “tri-
Na terça-feira à tardinha, pegamos o carro e nos
legais”. À tardinha, voltamos para Teplice.
dirigimos para a cidade de Harrachov, na fronteira com a Polônia, onde moram os tios da Jana, e sua
Capítulo 3 – Ceský Krumlov
tia homônima, “Tante Jana” (Tante = Tia). Eles nos
A Valéria, companheira de outras aventuras, aí do
aguardavam com um Grill (eles acham que é churrasco)
Brasil, chegou a Teplice na madrugada de quinta-
e com mais cervejas. Outra comilança. Mas o melhor da
feira. De Teplice pegamos o rumo de Ceský Krumlov,
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parando em várias cidadelas ao longo do caminho,
cervejinha acabaram também comendo doces, comendo
conhecendo castelos e mais castelos, parques e mais
salgados... aquela farra. A Valéria, que não dorme no
parques, tomando cerveja e mais cerveja (a Jana, pobre,
ponto, ficou de flerte a noite toda com um menino
não podia! Na República Tcheca os motoristas não
lindo de matar. Não, lindo mesmo!!! Ele inclusive saiu
podem beber absolutamente nada de álcool! Ela estava
em várias das minhas fotos “sem querer”... Mas o auge
desolada...). No fim do dia chegamos ao nosso destino.
da festa foi um strip-tease. Não, socorro!!! O cara fez um strip mesmo! Ele estava totalmente trêbado e
Bem, Ceský Krumlov é um tudo! A cidade é uma tetéia sem
começou subindo numa das mesas. E aí foi rebolando e
tamanho. Lá era a sede dos antigos príncipes tchecos,
rebolando, e depois subindo a blusa, e depois descendo
descendentes dos Augsburgos. Então, a cidade possui um
a calça... cueca vermelha e fio dental!!! É claro que tirei
enorme castelo, lindo, lindo, lindo, que visitamos, é claro.
fotos, né? Bom, ri até não poder mais.
Esse castelo possui uma grande muralha, que circunda, digamos assim, a cidade. E a cidade, por sua vez, é
No dia seguinte, passeios e passeios e passeios. Castelo,
circundada por um rio. É como se fosse uma ilha dentro de
boteco, museu, boteco, lojinha, boteco. Nessa cidade
uma muralha. Dá para entender? Sei que parece loucura,
fica um Museu lindo, dedicado ao Egon Schiele. É que
mas é mais ou menos isso mesmo. Gente, é lindo demais!
o Schiele, quando jovem, chegou a morar em Ceský
Casinhas e mais casinhas do século XV, do século XVI...
Krumlov, cidade de sua mãe. E ele fez várias pinturas
quase nada de carro, pois as ruas são muito estreitas,
com o tema da cidade. Nesse museu, além de ver uma
lojinhas e mais lojinhas, uma graça!
expo bem simpática sobre o Egon, com direito a cartas, manuscritos diversos, etc., vi, ainda, uma expo sobre
Lá ficamos em um albergue muito legal, que, por sinal,
os expressionistas do “Leste”. Gente, que arraso!!!
era o grande point da cidade. No dia em que chegamos
Artistas que eu nunca tinha ouvido falar, todos eles com
teve um casamento numa capelinha no meio da rua
passagem pela ilustração literária. E fiquei imensamente
(que assistimos, no nosso primeiro passeio) e depois
surpresa com a proximidade dos trabalhos desses artistas
a festa foi, inclusive, no bar do albergue, porque os
com os trabalhos dos “meus” artistas, da minha pesquisa.
noivos haviam se conhecido ali. Bem, é claro que todos
Muito, muito interessante. Comprei o catálogo por um
que estavam no bar tomando ingenuamente a sua
preço barato e me fui.
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Capítulo 4 – Praga
estúpida, uma ignorante... disse um monte de baixarias.
Seguimos para Praga na manhã de sábado. Conseguimos
E acho que ela entendeu, porque pegou a vassoura e saiu
pegar uns 3 engarrafamentos. Na República Tcheca
atrás de mim, em plena estação de trens!!! Um nojo sem
as estradas, mesmo a (sim, “a”, pois só tem 1) Auto-
tamanho. Só parou quando eu já estava na escada... Bom,
Bahn deles, o que seria a pista de alta velocidade, não
povo, histórias com gente mal educada e nervosa podem
tem acostamento. Então, vocês imaginem: quando dá
acontecer em qualquer lugar, inclusive (pena!) em Praga!
acidente, tudo tranca... Uma vez em Praga, começamos a caminhar por tudo. Mas Chegamos a Praga e marcamos o encontro com o
o George e o amigo dele, o Gerhart (alemão), não tinham
George na Hauptbahnhof, ou seja, na estação central
muito pique para caminhar. Estavam sempre cansados.
de trens. Escândalo, escândalo, escândalo! A estação
Mesmo assim, foi ótimo. Fomos para tudo que era lugar,
é toda Art Nouveau, com luminárias lindas, esculturas
entramos em tudo que foi igreja, tomamos café em uma
impressionantes, um desenho arrasador. Um absurdo.
cafeteria chiquérrima, absolutamente maravilhosa, toda
Ah, historieta cômica: quando cheguei ali, estava com
em Art Déco... babamos na frente do relógio central,
uma vontade incrível de fazer xixi, e aí corri para o
babamos diante das lojas com lustres todos de cristal e
banheiro. Custava 5 Krones. Mas não tinha ninguém
porcelana, babamos diante das joalherias, com colares de
junto ao “guiche”, e eu entrei. Vocês acreditam que me
âmbar de deixar qualquer um prostrado, babamos dentro
apareceu uma mulher com mais ou menos 140 quilos,
da catedral gótica, do mosteiro maneirista, da igrejinha
segurando uma vassoura na mão, e que me tirou do
barroca. Babamos diversas vezes, em diversos horários,
banheiro, porque eu ainda não havia pago? Um horror!
diante das esculturas que ladeiam a ponte de Carlos.
E eu comecei a dizer que era uma emergência e tal, e
Babamos e babamos e babamos diante do esplendor
ela só pestanejava em tcheco. Bem, paguei e entrei.
arquitetônico que é Praga. Depois, ficamos tensos e
Quando saí, estava tão furiosa, tão furiosa, tão furiosa...
impressionados junto ao Antigo Cemitério Judaico (cheio
perguntei a ela: a senhora fala alemão? E ela: não! Ou
de pedras, cheio de lápides), junto ao Novo Cemitério
seja, a mulher, se falava algo, só tcheco. E eu disse a ela:
Judaico, onde está enterrado Franz Kafka, junto à
Bom, então vou lhe dizer em claro e bom português: a
Sinagoga. Não chegamos a entrar no Museu, pois tinha
senhora é uma ridícula, uma babaca, uma idiota, uma
uma fila incrível. E, ademais, o povo queria mesmo
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Paula Ramos - Caderno de Viagens
passear. E como eu voltarei, também não fiquei assim tão
gente começa a encontrar aqueles homens enormes,
arrasada. Só fiquei tristinha por não ter visitado a Bienal
sorridentes e com olhos azuis em tudo que é lugar e,
de Praga, que parece estar na sua segunda edição. Ela vai
fantástico, eles te olham!!! Não, povo, a minha auto-
terminar em setembro, e acho que não conseguirei voltar
estima foi e se mantém nas alturas. Até que enfim.
antes do término...
Eis mais um dos motivos para eu voltar para lá. Não, vocês não têm noção: o pedreiro na rua, o menino do
Bem, povo, só sei que eu estava sempre rindo, porque
caixa do supermercado, o garçom... todos, todos, todos
não conseguia ter outro sentimento. Mesmo quando
interessantes. E sempre sorrindo! Ah, estou nas nuvens.
chovia, e as chuvas de verão duram 10 minutinhos e
Aliás, Verônica e Valéria também. As duas saíram de lá
páram, estava sempre rindo, alegre, impressionada. Que
se sentindo as próprias rainhas da cocada-preta. Que
cidade! Que cidade!
remédio para o ego!
Capítulo 5 – O Povo
Capítulo 7 – A Cerveja
Tirando a velha louca do banheiro, o povo tcheco
Bom, devo dizer que a melhor cerveja do mundo é a
é maravilhoso! Eles estão sempre felizes, sorrindo,
tcheca. Para vocês terem uma idéia, a grande cidade
contando piadas. É apaixonante. Totalmente distinto dos
produtora de cerveja se chama Plzén. E qual é o nome
alemães, quase sempre emburrados ou de cara fechada. O
do tipo da nossa “loura gelada”? Pilsen! Por que será?
grande exemplo do povo tcheco está na família da Jana,
Ainda: a nossa mais antiga cerveja é a Bohemia. Por que
maravilhosa.
será? Porque o nome “poético” da República Tcheca é Bohemia... Ainda: a Budweiser norte-americana, o que
Capítulo 6 – Os Homens Tchecos
é? Uma homenagem (ou plágio!) à cerveja Budweiser
Bem, gente, foi como se eu estivesse num set de
– Budwar da República Tcheca... Mais: aqui existe uma
cinema: homens lindos, altos, olhos azuis, olhos azuis,
outra grande marca, Gambrinus... e em Porto Alegre não
olhos azuis... e olhem que eu nem sou muito de olhos
tem um restaurante maravilhoso no Mercado Público
azuis. Eu, por exemplo, preferia o Fabio Assunção
com esse nome? Tá bem, tá bem, aí já não sei se tem
quando ele fez a minissérie “Os Maias”, com aqueles
algo a ver, mas... Povo, só sei que a cerveja deles é
incríveis olhos castanhos. Sério! Agora, quando a
absolutamente maravilhosa. Sem nenhuma comparação
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com nada. Sei lá... acho que tem a ver com a água da região (que é estupenda! A gente pode tomar água da torneira sem estresse, além de ela ser ótima, levíssima), não sei. Mas posso dizer que foi uma overdose maravilhosa de “pivo”, como se chama cerveja lá. Era pivo para um lado, pivo para outro, sempre, sempre, sempre. Ah, paraíso! E, o melhor: 0,5 litro de cerveja = menos de 1 euro!!! Capítulo 8 – Dobrý! Dobrý é o “ótimo” deles. Eu só dizia isso, o tempo todo. Experiência, homens, dentes (ah, ver dentes bonitos não é a toda hora aqui), cervejas, comidas, cidades. Vale a pena, e como!!! Pessoal, pensem em visitar a República Tcheca, mas pensem logo, pois em cinco anos eles passam a usar o Euro, e as coisas todas devem ficar muito
A Ponte de Carlos, em Praga.
mais caras! Capítulo 9 – A nova da hora A grande novidade é que vou me mudar... É, finalmente! Consegui conversar com a minha orientadora e ela me apoiou totalmente, dizendo que, de fato, Kassel é muito lenta, que as coisas aqui custam a acontecer e que eu devia, mesmo, mudar-me para uma cidade com mais vida, até porque eu não assisto a aulas na universidade nem nada. (Ah, a ótima: descobri essa semana que acontecem coisas em Kassel, sim. Vocês lembram daquele caso do
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cara que foi comido pelo amante? Aquele caso famoso, de cerca de 1 ano atrás, dos dois que se conheceram pela Internet e que um pediu para ser comido – literalmente, por favor! Ou melhor: primeiro “comido” e depois comido... – pelo outro? Pois é... descobri que aquilo aconteceu num vilarejo a 50 Km de Kassel!!! Até isso!) E eu pesquisei, pesquisei e pesquisei, pensei, pensei e pensei e decidi morar em Berlim. Estava inclinada a ir para Köln, mas a cidade é muito cara. Então, pensei em Berlin, cidade na qual tenho de fazer pesquisa, cidade que fica perto de Leipzig, onde também tenho de fazer pesquisa de campo... cidade que é tudo. Está bem que ela fica lá no outro lado, perto de nada, mas, como disse um colega meu daqui, “perto de Berlim”. E estou muitíssimo feliz, mesmo! Sem contar que Berlim tem uma quantidade incrível de museus, bibliotecas, aeroportos (2) e a melhor orquestra do mundo, a Filarmônica de Berlim. Ou seja: o que é que um ser como eu pode querer mais? A primeira vista de Cesky Krumlov, na República Tcheca.
Anotem aí o meu novo endereço, a partir de 28 de agosto: Amsterdamstrasse, 20 13347 – Berlin Simpático, né? O apartamento é de uma alemã filha de brasileiros (Pauline é o nome dela!) que fará um intercâmbio em Paris. Aí, como ela não quer se
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desvencilhar do apartamento, vai alugá-lo para mim com tudo dentro. Ou seja: não precisarei comprar nada. Também terei telefone nesse apartamento (êba!), além de Internet. O apartamento fica no centro, numa região muito estratégica, a 5 minutos da Humboldt Universität. Não é o máximo? Gurizada, aproveito para refazer o convite a todos: minhas portas aqui, embora humildes, estão sempre abertas. Bem, Liebe Leute, é isso aí. Beijo enorme para todos vocês. Dobrý!
Catedral, Köln.
Paula. Paula Ramos é Jornalista, graduada pela UFRGS (1996), Mestre em História, Teoria e Crítica da Arte pela UFRGS (2002) e doutoranda, na mesma linha, também pela UFRGS. Atualmente desenvolve parte de sua pesquisa de doutorado na Alemanha, como bolsista do CNPq. É professora de História da Arte nos cursos de Arquitetura e Urbanismo e Arte na Diversidade, da Feevale, e no Curso de Design do UniRitter. (Fotos deste artigo de autoria de Paula Ramos)
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espiral deste lado
O Curso de Arquitetura e Urbanismo da Feevale tem muito orgulho de apresentar à comunidade mais esta conquista: Bloco(1), uma publicação que é o reflexo de nossa jovem trajetória iniciada no ano de 2000. Como tudo que é produzido por jovens, vem repleto de ideais e contradições: ao mesmo tempo que buscamos retornar à sociedade nossa produção acadêmica, gostaríamos de proporcionar diversão entre uma leitura e outra; queríamos registrar os inúmeros eventos já organizados pelo curso, sem deixar de refletir sobre questões filosóficas; queremos que o fruidor da Bloco(1) possa ter uma leitura agradável, acompanhada de imagens relevantes, sem sentir receio de registrar em suas páginas um croqui de uma idéia que não pode esperar para nascer. Como todo jovem, corremos o risco de não sermos levados a sério, mas também como todo jovem, temos disposição para tentar. Leandro Manenti Coordenador do Curso de Arquitetura e Urbanismo
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