Território purpurinado: diversão e subversão nas ruas de São Paulo

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TERRITÓRIO PURPURINADO:

diversão e subversão nas ruas de São Paulo



Julia Junqueira Ribeiro Pinto Território purpurinado: diversão e subversão nas ruas de São Paulo Trabalho de Conclusão de Curso; Escola da Cidade – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Orientador: Prof. Me. Eduardo Gurian Coorientador: Prof Me. Alexandre Benoit São Paulo, 2017.



agradecimentos

À Associação Escola da Cidade – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Ao meu orientador Eduardo Gurian, pela confiança. Ao meu coorientador Alexandre Benoit, pelos encontros enriquecedores e pela inestimável contribuição a este trabalho. A todos os meus professores, amigos e familiares, pelas conversas e ajudas diversas, pelo grande incentivo, apoio e suporte.



sumário

9 apresentação 11 introdução 13 nota 15

Carnaval, carnavalesco, carnavalização: riso, humor e teorias

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Brasil/SP: identidade cultural e imprensa carnavalesca

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o evento e a construção da cidade

29 resistência e afirmação étnica-sócio-cultural

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outras resistências e afirmações

41 de vila à metrópole: diversos carnavais

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51 “progresso”

61 tempo

65

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a rua e o percurso

crítica política e urbana | século XXI mapa: percursos dos blocos na Subprefeitura da Sé em 2017

87 fontes 103

caderno II: fontes

107 glossário

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apresentação

Essa pesquisa aborda o Carnaval da cidade de São Paulo sob a perspectiva da relação do paulistano com seus espaços públicos, com a rua – na cidade formal, principalmente no centro. Pensando a recente retomada do Carnaval de rua na capital paulista como elemento representativo de um movimento mais amplo de apropriação e uso da cidade, esse estudo busca estabelecer aproximações entre o desenvolvimento urbano e as festas carnavalescas na rua. Além disso, busca entender esse persistente evento centenário que é muitas vezes usado pelo povo como um instrumento de crítica social, política e urbana. Apesar de haver vários estudos sobre o Carnaval nas cidades do Rio de Janeiro, Salvador, Recife e Olinda1, prin1 Alguns exemplos sobre esses estudos: 1) no Rio de Janeiro: História do carnaval carioca (1958), de Eneida de Moraes; O carnaval carioca através da música (1965), de Edigar de Alencar; Escola de samba, ritual e sociedade (1978), de José Sávio Leopoldi; Carnaval, carnavais (1986), de José Carlos Sebe Bom Meihy; Carnaval carioca: dos bastidores ao desfile (1994), de Maria Laura Viveiros de Castro Cavalcanti; As escolas de samba do Rio de Janeiro (1996), de Sérgio Cabral; Carnaval: seis milênios de história (2000), de Hiram da Costa Araújo; 100 anos de carnaval no Rio de Janeiro (2001), de Haroldo Costa; Ecos da folia: uma história social do carnaval carioca entre 1880 e 1920 (2001), de Maria Clementina Pereira Cunha; Blocos: uma história informal do Carnaval de Rua (2002), de João Pimentel; Inventando Carnavais: o surgimento do Carnaval carioca no século XIX e outras questões carnavalescas (2005), de Felipe Ferreira; 2) em Salvador: História do Carnaval da Bahia - 130 Anos do Carnaval de Salvador (2014), de Nelson Varón Cadena; O Carnaval de Salvador e suas Escolas de Samba (2017), de Geraldo Lima; 3) em Recife e Olinda: O folclore no carnaval do Recife (1967), Katarina Real; Olinda, carnaval e povo: 1900-1981 (1982), de José Ataíde; Carnaval do Recife (2000), de Leonardo Dantas Silva; Carnaval: cortejos e improvisos (2002), de Maria Alice Amorim e Roberto Benjamin; Memórias da folia: o carnaval do Recife pelos olhos da imprensa (1822-1925) (2004), de Evandro Rabello; Bo-


cipalmente nos campos da antropologia, da sociologia e da história, raros são aqueles que se debruçam sobre essa manifestação festiva na capital paulista, menos ainda sob a ótica de um(a) arquiteto(a) e urbanista. Segundo a antropóloga Valéria Souza, o Carnaval de São Paulo é injustamente desvalorizado apesar de ser marcado por uma “história de luta, resistência, persistência, autonomia, criatividade e negociações” (SOUZA, 2014: 15). Dessa maneira, o presente trabalho se baseia em uma bibliografia diversa, além de músicas, filmes documentários, mapas, fotos e do acompanhamento dos preparativos e cortejos do Carnaval de rua de São Paulo de 2017. O estudo foi desenvolvido em dois cadernos complementares entre si: este, com formato acadêmico, que contém um ensaio textual, um mapa do percurso dos 119 grupos carnavalescos que desfilaram na Subprefeitura da Sé em 2017 e um glossário com definições de manifestações populares mencionadas; e outro, que, por meio de uma linguagem gráfica, busca criar uma atmosfera carnavalesca paulistana subjetiva e sintética – um cortejo gráfico. “No imaginário permanece uma dimensão ambiental, uma matriz, uma atmosfera [...]. O imaginário é uma força social de ordem espiritual, uma construção mental, que se mantém ambígua, perceptível, mas não quantificável. O imaginário, mesmo que seja difícil defini-lo, apresenta, claro, um elemento racional, ou razoável, mas também outros parâmetros, como o onírico, o lúdico, fantasia, o imaginativo, o afetivo, o não racional, o irracional, os sonhos, enfim, as construções mentais potencializadoras das chamadas práticas. De algum modo, o homem age por que sonha agir. O que chamo de ‘emocional’ e de ‘afetual’ são dimensões orgânicas do agir a partir do espírito” (MAFFESOLI apud BARROSO; GONÇALVES, 2016: 2). necos na ladeira: valorizando a cultura popular da cidade de Olinda (2011), de Adriana Victor. 10


introdução

“‘Saiu do nosso controle’, diz secretário” (O Estado de São Paulo, 20 fev. 2017). Em 2017, o Carnaval de rua de São Paulo reuniu 3,5mi foliões e 381 blocos – nome genérico adotado para se referir a organizações carnavalescas (Uol, 8 mar. 2017). Foi o carnaval de rua que mais cresceu neste ano no Brasil em relação ao número de blocos. Em 2016 foram 355 distribuídos em 29 regiões da cidade, um crescimento de 40% em relação a 2015, com 260, segundo o website www.carnavalderua.prefeitura. sp.gov.br, da Secretaria Municipal de Cultura (SMC) da prefeitura de São Paulo.

Carnaval é uma f(r)esta de liberdade e resistência.

A popularidade recente desse festejo na rua relaciona-se com o discurso contemporâneo de apropriação e retomada do espaço público na cidade de São Paulo, no qual participam também outros movimentos culturais e onde o centro da cidade assume certo protagonismo. Por anos, projetos urbanos para a cidade que priorizam um modo de vida individual e fechado, de carros e muros, geram o abandono e o medo no espaço público. A região central também foi esvaziada, apesar de sua concentração de infraestruturas. Seja pela sua grande oferta de transporte público e de vias largas, seja por apresentar áreas com poucas residências, ou ainda por reunir camadas históricas, símbolos e significados, a região central é recorrente palco de manifestações e eventos populares. Não à toa, esta área concentrou o maior número de festejos carnavalescos oficiais em 2017, com 119 blocos na Subprefeitura da Sé, seguida pela Subprefeitura de Pinheiros, com 89 (Prefeitura de São Paulo, 13 fev. 2017).

É possível traçar paralelos entre o modo de se feste11


jar o carnaval com o modo de se pensar e viver a cidade. Ao observar as manifestações carnavalescas é possível espacializar atuações de diferentes grupos sociais e territorializar disputas e negociações entre diversos agentes: poder público, imprensa e mídias sociais, capital e economia (indústria cultural, turismo, etc.) e sociedade. Certamente parcial e fragmentário, este trabalho busca discorrer sobre o Carnaval de rua na região central de São Paulo, pensado aqui como manifestação popular representativa da relação entre cidadão e espaço público. Busca também construir uma narrativa, um imaginário, por meio de breve mergulho na caixa de pandora que é o Carnaval, a cultura popular brasileira e a história da cidade de São Paulo, tomando como desafio pensar o presente e “[...] o encanto de uma festa que evolua com a civilização” (A Cigarra, 8 fev. 1916: 32).

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nota

Se carnaval pode ser entendido como movimento de relativização de verdades (BAKHTIN, 1965) e da aparente plausibilidade do mundo (DAMATTA, 1978), contar histórias da cidade por meio de carnavais é também relativizar a história da cidade.

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Carnaval, carnavalesco, carnavalização: riso, humor e teorias

“O Carnaval é invenção do Diabo que Deus abençoou”

Trecho da música Deus e o Diabo de Caetano Veloso, gravado no álbum Muitos Carnavais (1977).

A origem do termo carnaval é controversa. Atualmente esta palavra é usada para remeter principalmente a duas ideias: um período temporal (o Carnaval) e qualquer manifestação, confusão, alegria coletiva (carnaval; mais ligado a uma ideia de carnavalesco, carnavalização). O pesquisador Felipe Ferreira resume: “no Carnaval existe a carnavalização, mas nem toda carnavalização é um Carnaval” (FERREIRA, 2004: 24). No primeiro capítulo de sua publicação O Livro de Ouro do Carnaval Brasileiro (2004), Ferreira faz um esforço no sentido de reunir diversas teorias e festas associadas ao termo carnaval ao longo dos anos. Nele, Ferreira coloca que há quem defenda a forte ligação da expressão com festas cíclicas da antiguidade greco-romana caracterizadas pelo exagero: as festas dionisíacas, que aconteciam em março – em homenagem a figura mitológica de Dionísio/Baco, deus da fertilidade, das festas, do teatro, do vinho, do êxtase religioso e ritual; as festas lupercais, em fevereiro – em homenagem ao deus Luperco/Pã, protetor dos rebanhos, associado também a fertilidade e a comportamentos licenciosos; as festas saturnais, em dezembro – em homenagem ao deus Saturno, deus da agricultura e das sementes, com festividades caracterizadas pela comilança, bebedeiras e trocas de presentes. Ainda segundo Ferreira, outras pessoas vinculam o termo com festas do Antigo Egito: a festa Navigium Isidis (o Barco de Ísis) ou ploiaphesia (Festa do Barco Lançado), que ocorria durante a primavera 15


– em homenagem a deusa Ísis, deusa da castidade, que se vinculava a atos piedosos e a ideia de superar tragédias da vida; a procissão do boi Ápis – na qual a figura de um touro enfeitado era celebrada durante sete dias. Ou ainda com festividades das antigas civilizações mesopotâmicas: as sacéias, que ocorriam na Babilônia – nas quais durante cinco dias havia uma inversão de valores, de modo que os escravos davam ordens aos seus donos e um prisioneiro escolhido assumia o lugar do rei, podendo se exibir, comer à vontade e até dormir com esposas reais, mas que era, no último dia, chicoteado e enforcado.

“Ê Boi Ápis, lá no Egito, festa de Ísis. Ê deus Baco, bebe sem mágoa, você pensa que este vinho é água. É primavera, na lei de Roma a alegria é que impera. Ó que beleza, máscara negra lá no baile de Veneza” Trecho do samba-enredo Festa profana escrito em 1989 pelos compositores J. Brito, Bujão e Franco para o GRES União da Ilha do Governador.

Em alguns desses festejos da Antiguidade, haveria desfiles com carros em forma de barco, fato que serve de argumento para a teoria de que a palavra carnaval derivaria da expressão em latim carrus navalis (carro naval). Uma outra vertente etimológica, que, entretanto, não fora apresentada por Ferreira, defende que o termo teria originado das palavras alemãs “Karne ou Karth, ou ‘lugar santo’ (isto é, a comunidade pagã, os deuses e seus servidores) e de val (ou wal) ou ‘morto’, ‘assassinado’” (BAKHTIN, 1987: 345). Significaria, portanto, “procissão dos deuses mortos”, destronados. Uma terceira hipótese da etimologia da palavra, porém, predomina entre os estudiosos atuais: carnaval derivaria do latim medieval canelevãre ou carnileãria, associando-se a abstinência de carne exigida na Quaresma. Ferreira ressalva que só existem referências ao termo carnaval a partir do século XI, quando a Igreja oficializou o período da Quaresma, 16


idealizado como tempo reservado a questões espirituais pelo papa Gregório I no ano 604. Tendo em vista o rigor religioso da contrição, penitência e abstinência desse período, os dias anteriores a seu início na Quarta-feira de Cinzas começaram a concentrar, em contraponto, a loucura, o descontrole e a esbórnia. Após algum tempo, o período do Carnaval se fixaria como principal festa profana na civilização ocidental, “três dias de loucura” entre Dia dos Reis e a Quarta-feira de Cinzas, conhecido também como tríduo momesco ou dias gordos. Nas palavras de Ferreira, “daí em diante, a festa vai tomar várias formas até que, no século XIX, a burguesia parisiense ‘inventa’ o Carnaval tal como o conhecemos atualmente”, um modelo com bailes, sociedades, passeios que seria copiado por vários lugares do mundo (FERREIRA, 2004: 15). A partir dessa organização, porém, as cidades iriam desenvolver a festa a seu modo, refletindo suas peculiaridades. Segundo Ferreira, desde os primeiros anos depois de Cristo até o século XVIII, todas as celebrações populares que determinavam momentos especiais, marcadas por exageros, inversões, usos de máscaras e fantasias, como as citadas anteriormente, dentre outras – como a Festa dos Loucos durante a Idade Média, Festa do Asno, etc. – eram vistas pela Igreja Católica como manifestações populares demoníacas e condenáveis e genericamente denominadas de “paganismos”, sinônimo de “folia” ou “carnaval” (FERREIRA, 2004: 21, 22). Essa maneira de pensar o termo perdurou e ganhou força a partir de meados do século XX, quando, na década de 1960, o linguista e filósofo russo Mikhail Bakhtin discorreu sobre a ideia de “carnavalização” em seu livro A cultura popular na Idade Média e no Renascimento: o contexto de Fraçois Rabelais (1965). Com “carnavalização”, Bakhtin caracteriza um “mundo das festas do povo”, que tem ligação com o exagero, caricatura e humor, e que atinge uma excepcional liberdade, ainda que relativa e efêmera. Ele usa o termo para qualificar 17


tudo que se contraponha ao sistema oficial, às hierarquias, classes e padrões, e que, por meio do riso, relativizam a verdade e o poder. Segundo o autor, o carnaval aproxima contrários de modo que “as distinções entre elevado e baixo, interdito e autorizado, sagrado e profano perdem toda a sua força” (BAKHTIN, 1987: 416). O carnaval seria um tempo reservado à transgressão, no qual o centro simbólico é apropriado, numa espécie de explosão de alteridade, em que se privilegia o marginal, o periférico, o excludente. Para Bakhtin, a máscara e a fantasia simbolizam a confusão e dissolução das identidades pessoais e sociais e o triunfo da alteridade e da ambivalência. Bakhtin reforça a importância destes elementos que, longe de serem apenas adornos, têm função essencial libertadora para provocar mudanças na concepção de mundo, carregando um “simbolismo inesgotável” (BAKHTIN, 1987: 35). Nesse processo de multidão popular, organizada – não uma multidão qualquer – o corpo individual dá lugar a um corpo coletivo. Indivíduo é “parte indissolúvel da coletividade”, na qual troca-se de corpo mutuamente, renova-se: “o povo sente a sua unidade e sua comunidade concretas, sensíveis, materiais e corporais” (BAKHTIN, 1987: 222). A forma ideal do carnaval seria material e espiritual, entregues à universalidade – muito diferente do cotidiano compartimentado em suas horas, tarefas e funções.

Como se pode ver, inexiste uma definição única do termo. Este foi apenas um pequeno apanhado das hipóteses, controvérsias e mistérios sobre o Carnaval. Uma coisa, entretanto, é certa: é recorrente a tentativa de apropriar-se do termo, reivindicando seu significado segundo uma visão de mundo. Ainda que se possa identificar semelhanças e relações com festas e celebrações antigas, é preciso não as confundir com o que entendemos como Carnaval atualmente. Há tempos concentrando um grande número de folias, este 18


tempo/evento acumula inúmeras alegorias, simbologias, figuras típicas, estruturas, apetrechos, etc. É um momento de tensão e disputa criadora entre as muitas festas que compõem a Grande Festa, “isenta da obrigação de ter um sentido preestabelecido” (FERREIRA, 2004: 71). Como coloca Ferreira, “abrem-se, com isso, as portas da folia para tradições e novidades, para antigos formatos e novas propostas, para a velha baiana e os novos repiques, para os antigos deboches numa praça medieval europeia e para os sons elétricos dos trios nas ruas de Salvador” (FERREIRA, 2004: 71).

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Brasil/SP: identidade cultural e imprensa carnavalesca

Não bastasse toda essa complexidade e sobreposição de referências, associações e alegorias, o Carnaval no Brasil reúne inúmeras outras camadas. Desenvolveu uma relação íntima com a cultura popular e sociedade brasileiras, e consagrou-se como potência de convergência multicultural, incorporando costumes europeus com expressões de diversas etnias africanas e indígenas. Neste processo, o movimento moderno dos anos 1920 teve importante participação ao atentar-se para as manifestações populares e buscar uma identidade nacional, ideia desenvolvida depois por Getúlio Vargas durante o Estado Novo (1937-1945). O escritor Oswald de Andrade, figura ímpar do movimento moderno brasileiro, faz menções ao Carnaval em seu Manifesto da poesia pau-Brasil (1924) e no Manifesto Antropófago (1928). Explicita a relação brasileira com a festa no excerto: “Nunca fomos catequizados. Fizemos foi o Carnaval. O índio vestido de senador do Império” (ANDRADE, 1928). Tanto a catequese quanto o Carnaval são costumes europeus, mas o primeiro pode ser associado ao controle cristão enquanto o segundo ao descontrole pagão. Ao invés de domados pelo rigor (religioso, burocrático, etc.), os brasileiros se apropriaram daquilo que justamente representava o marginal e o extraoficial. Segundo a pesquisadora Beatriz Azevedo, nesse trecho Oswald afirma que foi por meio da “existência desorganizada” do carnaval que se fugiu da catequização, ou seja, por meio do oposto de uma “resistência organizada” (AZEVEDO, 2012: 130). A figura do índio, pessoa local que segundo a perspectiva europeia era um selvagem a ser “educado” e “controlado”, é quem se destaca e se traveste de uma posição de comando nesse trecho – uma inversão que brinca com a expressão “índio vestido”, o índio aculturado, domesticado. 21


Como aponta Azevedo, a contraposição da imagem do homem nu e do homem vestido também aparece no livro Humano, demasiado humano (1878), de Nietzsche, em que ele afirma que é preciso visitar as populações selvagens e semi-selvagens (AZEVEDO, 2012: 168). O filósofo é influência central nas obras de Oswald, que o referencia constantemente. Em um artigo publicado no jornal Correio da Manhã em 1944, Oswald, inclusive, o relaciona diretamente com a Grécia antiga e o Carnaval: “O senhor conhece Nietzsche? É um filósofo alemão que descobriu a outra Grécia, não a de Renan e de Bilac, a Grécia de Baco, pai do Rei Momo…” (ANDRADE apud AZEVEDO, 2012: 167, 168). Essa passagem remete às reflexões desenvolvidas por Nietzsche no livro O nascimento da tragédia (1872), em que ele relaciona a ideia de catarse que Aristóteles encontra no teatro grego, quando a tragédia leva os cidadãos a um expurgo das patologias da sociedade, com uma perda da razão revelada nos ritos religiosos populares com cantos e procissões em que o coro domina a cena, aos que se refere como transe ou dionisíaco (NIETZSCHE, 1992: 157). Pensando as origens da tragédia grega, Nietzsche coloca ainda que o teatro é uma arte que aproxima as figuras opostas e complementares de Apolo, imagem e aparência, e Dionísio, música e essência, figuras que se manifestam fisiologicamente pelo sonho e pela embriaguez – estado de euforia, desejo e vontade (NIETZSCHE, 1992: 28). Todas essas ideias, de Oswald e de Nietzsche, foram recuperadas de algum modo pelo Teat(r)o Oficina em São Paulo a partir de 1968, quando a companhia teve que se reinventar após um incêndio. A partir de então, desenvolveu importantes trabalhos tanto dramaturgicamente como espacialmente – com o projeto dos arquitetos Lina Bo Bardi e Edson Elito de palco em pista, do teatro atravessado por uma rua, passarela – no sentido de refletir sobre o caráter popular e político do teatro na cidade, retomando origens da tragédia grega. Sob a perspectiva ancestral dos ritos antigos, o teatro se esbarra com Carnaval. Nas palavras do dramaturgo e diretor do Oficina José Celso Martinez Corrêa, “no Teatro reina a Monarquia, 22


governo de Momo, o Carnaval permanente que desfila comendo solto na pista em busca da sua apoteose, servindo banquetes periódicos seguidos de grande seca” (CORRÊA, 1999). No caso da cidade do Rio de Janeiro, mundialmente famosa por suas celebrações carnavalescas, a relação com esta festa popular tem uma longa história. A cidade ganhou grande importância econômica a partir do século XVIII, fortalecendo-se com a vinda da família real portuguesa em 1808 que a eleva à capital do Reino Português. A partir de então, ela assume um “papel de núcleo disseminador dos folguedos” de Carnaval (QUEIROZ, 1999: 24). Em 1822, com declaração de independência do Brasil, o Rio de Janeiro passa a ser capital do Império do Brasil, reforçando-se como “centro propagador de ideias e comportamentos” (QUEIROZ, 1999: 24). Só em 1960, com a transferência da capital para Brasília, é que a influência do Rio de Janeiro sobre o país diminui. Entretanto, a cidade continua em uma posição de centro intelectual, das artes e da moda até os dias atuais. A implantação do Carnaval no Brasil, porém, ocorreu já nos primeiros tempos da colonização portuguesa. É citado em documentos de 1605 com o nome entrudo, manifestação carnavalesca típica de Portugal que se tornou muito popular. O entrudo era uma espécie de brincadeira na qual as pessoas se jogavam água, farinhas e polvilho, limões de cheiro, café, tinta, groselha, lama, urina, etc. nas ruas das cidades, espaços rurais e até mesmo dentro das casas (QUEIROZ, 1999: 11, 12). Por ser considerada violenta, acabou proibida e reprimida, perdendo força apenas no século XX. Em nome de um Carnaval elitizado, toda manifestação popular de fins do século XIX foi chamada genericamente de entrudo, forçando uma conotação negativa e pejorativa.

“Oi joga água que é de cheiro Confete e serpentina, lança perfume no cangote da menina”

Trecho do samba-enredo Festa profana escrito em 1989 pelos compositores J. Brito, Bujão e Franco para o GRES União da Ilha do Governador. 23


A imprensa nacional sempre foi animadora e entusiasta desta grande festa e, sem dúvidas, teve importante contribuição para sua transformação ao longo da história. Segundo o jornalista e pesquisador José Ramos Tinhorão, entre meados 1870 até fins de 1950, existiu uma imprensa exclusivamente carnavalesca, fenômeno autenticamente brasileiro (TINHORÃO, 2000: 112). Essas publicações desenvolvidas por todo o país assimilavam influências de tradições como as verrinas dos pasquins e os pufes1 (TINHORÃO, 2000: 113). De acordo com o pesquisador Eduardo Granja Coutinho, durante a Primeira República (1889-1930) houve uma grande reorganização da cultura e reconstrução da memória. Em suas palavras: “de alguma forma, os cordões, os ranchos e os blocos carnavalescos encontraram nas crônicas da folia não apenas um espaço livre das perseguições policiais, mas uma fala que, pela proximidade em relação à cultura popular, pelo seu caráter irreverente, burlesco e muitas vezes crítico, foi capaz de expressar as aspirações de um amplo setor marginalizado da sociedade” (COUTINHO, 2006: 4). Cronistas, ilustradores e jornalistas influenciaram diretamente comportamentos e modos de se festejar o Carnaval no Brasil e tiveram ativa participação na discussão sobre a nacionalização dessa festa que se tornou ícone da cultura popular brasileira. Depois de quase um século de atuação nacional, os periódicos da imprensa carnavalesca foram desbancados pelo fascínio da modernidade representada pela televisão (TINHORÃO, 2000: 165). Se por um lado as grandes mídias potencializaram em escala nacional a cultura popular e o Carnaval inclusive, vide a figura do Chacrinha, elas contribuíram também para a pasteurização das festividades e a transformação de muitas manifestações em uma cultura de massas esvaziada e homogênea. 1 Segundo o Michaelis Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, verrina é uma crítica ou censura exaltada, com caráter violento, em sua maioria escrita e elaborada no formato de discurso público. Ainda segundo esse dicionário, pufe ou puff é uma expressão usada no jornalismo e publicidade para se referir a uma extravagante mensagem de propaganda, por vezes imprudente. 24


Nesse processo, as escolas de samba cariocas se tornaram referência nacional e se espalharam como modelo pelo país. Em um artigo de 1949 nomeado Guerra às escolas de samba nota-se a indignação com invasão desse modelo em Recife: “esses intrusos que pretendem impor ao Carnaval pernambucano já tão descaracterizado essa modalidade de folguedo que não se coaduna em absoluto com os nossos costumes” (Maskarado apud TINHORÃO, 2000: 165).

Cada região do Brasil, cada cidade, desenvolveu seus modos de festejar o Carnaval relacionando-se com tradições locais, histórias e territórios. Por vezes, firmaram alguns formatos próprios, por exemplo, ranchos e escolas de samba no Rio de Janeiro, trios elétricos em Salvador, frevos, troças e maracatus em Recife e Olinda. Em São Paulo, isso não parece tão claro. Talvez os cordões carnavalescos sejam a manifestação mais próxima a uma autenticidade paulistana. Claramente sempre houve disputas de forças com relação a cultura carnavalesca, nas quais se observam repressões e imposições de padrões. De qualquer maneira, a cultura é viva e mutante, e as diversas manifestações influenciam-se mutuamente gerando novas maneiras inventivas de se festejar. Atualmente as mídias sociais, como o Facebook, tem importante papel na organização e divulgação das festas de Carnaval. Essas redes possibilitam a rápida troca de informações sobre as festas e veloz difusão dos eventos. Se por um lado a comunicação é de certo modo mais acessível, popularizando e “democratizando” a festa, por outro pode gerar aglomerações inesperadamente desproporcionais à organização e a infraestrutura do espaço, causando muitas vezes o desconforto. Para driblar esse efeito alguns grupos têm adotado medidas como fazer voluntariamente uma festa extraoficial à organização da prefeitura, não criar um evento na mídia social ou divulgar o local apenas alguns dias ou horas antes. 25


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o evento e a construção da cidade

O Carnaval relaciona diretamente cidade e cidadão. O evento se adapta a seu tempo, transforma-se com a cidade e com a postura das pessoas em relação a seus espaços públicos. O diálogo entre festa e cidade é constante, seguem paralelas e coincidentes. Os modos de se pensar, se construir e se recordar da cidade são diversos, assim como as letras de músicas, os ritmos e os folguedos que compõem o Carnaval. Tal riqueza plural permite uma visão com múltiplas perspectivas sobre a festa/cidade passada-presente-futura.

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resistência e afirmação étnica-sócio-cultural Até metade do século XIX, São Paulo era uma província de menor importância. Ganhou prestígio político no cenário nacional com o tripé café-indústria-imigração, que gerou um aumento brutal da população e consequentemente intensas modificações urbanas. Foi nessa época a expansão da ocupação passou dos limites do triângulo histórico, “o que significou o início da cisão geográfica entre as classes ricas e pobres, além do estímulo ao fortalecimento da embrionária classe média urbana” (CALLIARI, 2016: 102). Até então, senhores, escravos e forros conviviam espacialmente muito próximos, o que por um lado proporcionava uma diversidade étnica, por outro, favorecia o controle dos brancos sobre costumes e ações. Conforme se tem registros, o entrudo já estava presente em São Paulo algumas décadas após a fundação da cidade e era possível encontrar mascarados nos folguedos de Carnaval a partir de meados do século XIX (CALLIARI, 2016: 96). Até então, a cidade era a capital com mais escravos indígenas, visto que os escravos negros eram mais caros e por isso se concentravam em cidades com maior importância política e econômica, como Salvador e Rio de Janeiro. Apesar disso, nessa época, negros africanos eram incluídos como coadjuvantes no carnaval burguês que reproduzia o modelo veneziano, com luxo e ostentação. Essa seria a primeira manifestação negra no carnaval paulistano. Em seus estudos, a antropóloga Olga von Simson revela que nessa São Paulo colonial, pobre e com influência indígena marcante, negros criaram uma dança dramática que saía à frente de procissões, contando a história de um curumim filho do cacique apenas com movimentos corporais e expressões faciais ao som de percussão. Na dramatização, 29


o jovem índio era morto por um branco invasor, e ressuscitado em seguida por uma figura que reúne saberes de mágico e sábio, o pajé. Este ato provocava a alegria de todos os personagens, que seguiam com suas danças. Não à toa essa manifestação chamava-se Caiapó, em referência a única tribo indígena que os bandeirantes não conseguiram dominar, que ocupava uma região de Goiás. Vistos como bárbaros e rebeldes, esta tribo representava a resistência, e a dança era uma forma de denúncia do domínio branco sobre as etnias de cor (SIMSON, 2008: 42). Com seu bailado exótico e com o som de seus grandes tambores, os negros podiam se apresentar pois atraíam pessoas para acompanhar a procissão religiosa. Porém, em 1850, eles foram proibidos de manifestar-se nessas ocasiões. Com devida autorização, passaram a dançar nos largos São Bento e São Francisco após o recolhimento da procissão para dentro dos tempos religiosos. Essa permissão durou dois anos até que foram proibidos novamente. A dança passou então da procissão para o período do carnaval, sendo anualmente celebrada até fim da década de 1910. Como observa Simson, a raiz carnavalesca negra paulistana está ligada à religiosidade, assemelhando-se as origens pastoris e baianas dos ranchos cariocas. Entretanto, diferente dos cariocas, os paulistas já usavam o espaço da procissão e do Carnaval como brecha para denúncia e resistência cultural com “função didática”, ou seja, sem embate físico. Nas palavras da pesquisadora, esta manifestação “indicava o início da construção do longo processo de afirmação étnico-sócio-cultural desse grupo na cidade” (SIMSON, 2008: 43). Nesse processo, o samba também tem um papel importante. Apesar de estigmatizada pelo controverso comentário do músico Vinícius de Moraes que se referiu a São Paulo como “túmulo do samba”, a capital paulista tem, em realidade, muito samba sim, com características bastante diferentes do samba carioca. 30

A rica história desse samba de São Paulo é retratada


com detalhes nos documentários Samba à Paulista: fragmentos de uma história esquecida (2007), de Gustavo Mello em parceria com estudantes da Universidade de São Paulo (USP), e Batuque Paulista: a trajetória do samba de São Paulo, do rural ao urbano (2016), de Thaís Lopes e Lucas Pena. Além desses dois trabalhos, o álbum Plínio Marcos: Em Prosa e Samba com Geraldo Filme, Zeca da Casa Verde e Toniquinho Batuqueiro (1974) é uma exímia obra para o samba paulista. Com contos e músicas, ele destaca elementos cruciais do samba de São Paulo, dos territórios negros e da própria cidade. Relativamente isolados nas fazendas cafeeiras do interior paulista, as comunidades negras preservaram costumes e rituais africanos. Com o fim da escravatura, determinada pela Lei Áurea (1888), um grande contingente dessa população migrou para a cidade de São Paulo e levou consigo suas músicas e danças que dariam origem ao samba paulista, das quais destacam-se o batuque de umbigada, o jongo e o samba de roda. O samba paulista, portanto, carrega uma herança rural e tem raízes em gêneros musicais nos quais o tambor grave conduz o ritmo e por vezes é solista. Assim, o samba paulista é comumente caracterizado como “rústico, pesado, mais africano”. É importante frisar que música, dança e religião fazem parte de uma mesma filosofia de vida. Compartilham questões comuns – como a forma de roda, observado na capoeira, candomblé, samba, etc. –, de modo que é muito difícil separar essas manifestações da crença. Em religiões afro-brasileiras, por exemplo, o tambor é sagrado. Na construção do samba paulista, a antiga e tradicional festa anual da cidade de Pirapora do Bom Jesus teve grande importância. Inicialmente uma festa religiosa cristã e branca, acabou reunindo muitos negros, que vinham da capital, do interior e até da área rural de outros estados. De dia, havia a procissão religiosa. À noite, festa nos dois barracões que abrigavam os negros, onde havia tambu, batuque, zabumba, samba-lenço, desafio, cururu, etc. Os negros, portanto, não ficaram como simples expectadores, e começaram a integrar o cenário cultural da cidade. Essas reuniões e fes31


tas tiveram seu ápice em fins do século XIX, e os barracões foram demolidos no século XX. Atualmente, o samba de bumbo é referência em Pirapora.

A segunda metade do século XIX foi marcada pelo nascimento da urbanidade na cidade de São Paulo, o começo de uma multidão, a convivência entre diferentes, e, não obstante, o conflito. Em 1867, a ferrovia São Paulo Railway foi aberta ao tráfego, um importante acontecimento do ponto de vista infraestrutural. A expansão urbana seguiu seu traçado, transpondo o Tamanduateí à Leste e o Anhangabaú e à Oeste (BASSANI; ZORZETE, 2014: 47). Em pouco tempo, a vila que era São Paulo se transformaria em um grande centro urbano baseado na economia cafeeira. Em 1886, o Código de Posturas promulgado em 1875 foi revisado. Com viés sanitarista, higienista, e com preocupações quanto a desobstrução das ruas, ele legislava sobre questões urbanas como “edificação, arruamento, higiene, segurança, lazer e vida cotidiana, [...] um instrumento claro de dominação política do espaço pela elite” (CALLIARI, 2016: 107, 108). Contribuiu indiretamente para a cisão territorial socioeconômica, uma vez que proibia os cortiços na região central, e, dessa maneira, forçava o isolamento e realojamento da população mais pobre. Nessa época também, o entrudo foi mais uma vez reprimido e a elite começou a associar o conceito de lazer a viagens de férias e de fim de semana, reforçando o distanciamento das classes (CALLIARI, 2016: 108). Enquanto o centro histórico recebia benfeitorias urbanas em nome da “eficiência” e salubridade do espaço, áreas periféricas na época e que atualmente são consideradas centrais, consolidaram-se como territórios negros na cidade: Barra Funda, Bixiga, Baixada do Glicério, Lavapés, Liberdade (SIMSON, 2008: 51). Eram áreas desvalorizadas naquele tempo, áreas de várzea, alagadiças. Conforme a cidade foi crescendo, esta população foi sucessivamente sendo expul32


sa para a periferia na medida em que obras de drenagem e urbanização retrabalhavam esses solos para receber bairros de classe média. Nesse movimento, o intenso redesenho da cidade foi apagando a maioria das referências da ocupação desse grupo, principalmente na área central. Apesar do evidente aumento da população negra em São Paulo após o fim da escravatura, não houve nenhuma política pública de inclusão. As mulheres negras trabalhavam com funções domésticas nas casas de famílias ricas, já os homens não conseguiam emprego. Dessa maneira, em busca de trabalhos informais, eles frequentavam principalmente dois redutos da cidade: o Largo da Banana, oficialmente chamado de Praça Brigadeiro Galvão, que ficava próximo à estação ferroviária Barra Funda – onde hoje é o Viaduto do Pacaembu –, e a praça da Sé, no centro. Em meio a serviços esporádicos como carregadores de caixas, ambulantes e engraxates, eles se reuniam para conversar, cantar e jogar tiririca, semelhante à pernada carioca e à capoeira baiana. Nesses encontros, foi-se criando e consolidando o samba paulista.

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outras resistências e afirmações

O Carnaval, como se pode notar, é há tempos um canal de voz encontrado pela comunidade negra, um período expressivo para a comunicação de suas histórias, organizações e territórios. Atualmente, há alguns blocos negros que percorrem o centro de São Paulo enfatizando a cultura afro-brasileira e a luta contra o preconceito racial, como o Bloco da Abolição (2011), o Bloco Afro Ilú Inã (2017) e o CarnaKOO – Bloco da Batekoo (2017). Além da população negra, outras parcelas da população oprimidas socialmente encontraram também no Carnaval uma possibilidade de resistência e luta política. A festa hoje tem a capacidade de projetá-las para posições de visibilidade e protagonismo que dificilmente ocorrem em outros momentos do ano. Dessa maneira, mulheres, LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros), moradores de rua e dependentes químicos apropriam-se dessa qualidade do Carnaval para reivindicar inclusão e emancipação social. É importante lembrar que, apesar de haver atualmente alguma harmonia entre estes grupos, nem sempre isso ocorreu, como é possível observar neste trecho da matéria É a briga, a escola nasce publicada em 1968 pelo jornal O Estado de São Paulo: “A Unidos do Parque Peruche surgiu em janeiro de 56 por causa de uma briga. Carlão, Gilbertinho e Boi Lambeu eram batuqueiros da Escola de Samba do Vai-Vai da Bela Vista e não gostaram da entrada de travestis em algumas alas. Como não podiam ficar sem sair no Carnaval, resolveram formar uma nova escola de samba” (O Estado de São Paulo, 24 fev. 1968: 9).

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Uma reconhecia expoente neste movimento de resistência, tanto negro quanto feminista, que perpassa a história do Carnaval brasileiro, é a compositora e maestrina Chiquinha Gonzaga, autora da marcha-rancho Ó abre alas (1899), considerada a primeira marchinha de carnaval, escrita para o cordão carnavalesco carioca Rosa de Ouro. A composição consagrou a musicista, que ganhou reconhecimento pelo seu pioneirismo e coragem. Filha de um militar e uma escrava alforriada, dedicou-se profissionalmente à música e ao piano enfrentando todas as muitas forças contrárias a esta vontade, o que era um fato inédito para uma mulher em sua época. Tornou-se compositora e maestrina, e com seu trabalho denunciava o preconceito e atraso social. Promoveu concertos de violão, que ainda era um instrumento estigmatizado, e comprou a alforria de escravos negros com o dinheiro arrecadado pela sua dedicação à música. Em uma passagem de seu livro Carnavais, malandros e heróis (1978), o antropólogo Roberto DaMatta coloca que “no carnaval, invertemos as posições. A glorificação não é da Virgem-Santa [...]. Ao contrário, é da puta. A grande puta que, trazendo consigo a vida, impõe que se pense sobre o encontro físico, a penetração sexual e evidentemente a reprodução do mundo” (DAMATTA, 1997: 142). Este trecho evidencia a ideia de autonomia e liberdade da mulher vinculada ao Carnaval, ainda que sua formulação possa ser muito debatida na atualidade – pela escolha da palavra puta, que se refere a uma profissão; pela glorificação de um ou outro estereotipo de mulher; por ignorar a hiper-sexualização e o assédio sofrido pelas mulheres, especialmente em dias de Carnaval; e, no limite, por adotar a perspectiva de quem olha a mulher, e não a perspectiva da mulher em si. De qualquer maneira, o Carnaval é um ponto de referência: “Eu não espero o carnaval chegar pra ser vadia, sou todo dia, sou todo dia”, trecho da música Todo dia, de Rico Dalasam, gravado em 2017 por Pabllo Vittar. 36


Atualmente, há em São Paulo grupos carnavalescos formados por uma bateria exclusivamente feminina, que, dentre outras bandeiras, levantam a da liberdade individual da mulher, como Bloco Afro Ilú Obá de Min (2005) e Bloco Pagú (2017). Durante o Carnaval, ambas se apresentam na zona central. O Bloco Afro Ilú Obá de Min está vinculado a uma instituição de mesmo nome que desenvolve outros projetos e atividades durante todo o ano em sua sede na Barra Funda. Em seus trabalhos, o grupo preza também por reverenciar e enaltecer a cultura afro-brasileira. O grupo LGBT, mesmo sendo amplo e diverso, é representado por um grande número de blocos de carnaval na São Paulo atual: Sisiricando (2017); Siga Bem Caminhoneira (2017); Desculpa Qualquer Coisa (2017); MinhoQueens (2015); Será que el_ é? (2017); Heteronormadiva (2016); Meu santo é Pop (2014); Bloco da Diversidade (2015), que é organizado pela Associação da Parada do Orgulho LGBT de São Paulo (AOPGLBT); etc. Esses concentram-se principalmente próximos ao Largo do Arouche, região que tornou-se referência para a comunidade LGBT. Alguns outros passam pela Rua Augusta, também um território referencial para o grupo. Num ato simbólico, em várias cidades do mundo o prefeito entrega as chaves da cidade para o Rei Momo, uma representação mímica, farsa satírica, personagem humorístico considerado o rei do carnaval. A partir desse momento, dá-se o início do Carnaval oficial na cidade, sob alegórica liderança do Momo pelo tempo que durarem as comemorações. Em 2017, pela primeira vez o tradicional concurso organizado pela União das Escolas de Samba de São Paulo (UESP) para eleger a corte do Carnaval da cidade de São Paulo, composta pelo Rei Momo, Rainha e Princesas, contou também com uma Rainha trans, outra drag e uma terceira travesti (O Globo, 13 jan. 2017). Essa postura inclusiva é um marco expressivo para a luta contra preconceitos. 37


Há ainda organizações que dão visibilidade a outros grupos sociais. É o caso do bloco Unidos da Rua (2015), que promove a inclusão dos moradores de rua em um cortejo pelo Bixiga e Bela Vista, “tradicionais pontos de resistência dos moradores de rua da cidade” (Mídia Ninja, 28 fev. 2017). De acordo com a matéria publicada no website do Mídia Ninja O estandarte dos ‘invisíveis’: os moradores de rua também tem voz no carnaval, os moradores de rua tomaram conta da bateria do bloco pela primeira vez em 2017.

Outra organização carnavalesca que dá destaque a um grupo social vulnerável é o Blocolândia (2015), bloco da Cracolândia, região da Luz conhecida pela grande concentração de usuários de crack, de problemas sociais e de disputas políticas, de modo que vive sob permanente tensão e violência. De acordo com a matéria Blocolândia, o carnaval da Cracolândia, publicada no website dos Jornalistas Livres, o bloco é formado pelos dependentes químicos e por diversos grupos, coletivos e organizações, e conta, também, com uma parceria com o Programa Recomeço, do Governo do Estado, e o Projeto De Braços Abertos, da Prefeitura da Cidade de São Paulo. Nas palavras de Cristiano Vianna, do coletivo CasaRodante, que faz parte do projeto: “se aqui é Cracolândia, aqui também é Luz” (Jornalistas Livres, 12 fev. 2016). Nas palavras de Julio Dojcsar, a intenção do bloco é “mostrar que por mais que a galera seja usuária de drogas, tá todo mundo vivo. Antes de ser usuário, já era uma pessoa, continua sendo uma pessoa” (Jornalistas Livres, 12 fev. 2016). Ainda segundo a matéria, as oficinas de máscaras, instrumentos e fantasias e a criação de uma bateria própria, a Coração Valente, formada em 2016, promoveu alegria, e possibilitou um melhor diálogo entre a vizinhança e os participantes das atividades.

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Enfim, há no Carnaval certa flexibilidade para discussões sobre raça, gênero, sexualidade e vulnerabilidade social, que muitas vezes fazem uso de uma crítica política satírica. Ainda que momentânea e efêmera, esta possibilidade de voz fortalece movimentos que lutam contra preconceitos e que reivindicam a liberdade individual e inclusão social, sempre em diálogo com os espaços da cidade. É interessante observar que cada movimento está atrelado a certo território, mas que pela natureza ambulante das festas carnavalescas estes grupos por vezes se encontram e se sobrepõem no espaço urbano.

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de vila à metrópole: diversos carnavais O crescimento e a industrialização da virada do século, além dos crescentes conflitos na Europa que culminaram na I Guerra Mundial, que fizeram com que a ocupação europeia em São Paulo se desse de modo expressivo nas primeiras décadas do século XX. Essa nova grande camada popular de trabalhadores operários brancos europeus instalou-se nas proximidades da ferrovia e das indústrias, principalmente na região de Brás, Mooca, Água Branca e Lapa (SIMSON, 2008: 45). Apesar de terem sido empregados formalmente nas indústrias, suas condições trabalhistas eram precárias e abusivas, típica de uma organização social em que não havia nenhuma lei trabalhista. No mesmo sentido, os bairros operários apresentavam condições insalubres, mas pelas suas próprias naturezas densa e ativa, possuíam muita vitalidade (CALLIARI, 2016: 121, 122). Com a Proclamação da República em 1889, foi criada a Prefeitura de São Paulo. O primeiro prefeito da cidade, Antônio Prado, esteve preocupado com a modernização e europeização da cidade, representados pelo símbolo máximo que é o Teatro Municipal. Sua gestão focou na construção de bens e áreas públicas, além de diversas reformas de grandes espaços públicos, como o Anhangabaú, Praça do Patriarca, Praça da Sé, Parque Dom Pedro II, mudanças nas ruas centrais e o alargamento da Avenida São João. Como coloca o urbanista Mauro Calliari, “se a casa era a referência nos séculos anteriores, a descoberta da rua é parte da nova cidade” (CALLIARI, 2016: 113).

“No coração da cidade, hoje mora uma saudade, a velha praça da Sé, nossa tradição. Na praça da ba41


tucada, agora remodelada, só ficou recordação. Até o engraxate foi despejado, e teve que se mudar com sua casa. Ai que saudade da batucada feita na lata de graxa” Samba Lata de Graxa, de Geraldo Blota e Mário Vieira, gravado por Germano Mathias no álbum Em continência ao samba (1958).

A presença das mulheres nas ruas era crescente. Não de todas, nem em qualquer horário, nem em qualquer lugar, mas, de qualquer maneira, era um pequeno avanço para esta parcela da população. Junto com o advento do consumo e do lazer, o comércio de luxo dominava o triângulo histórico. Surgiram vitrines envidraçadas e as galerias mudaram a configuração e paisagem do Centro Novo (CALLIARI, 2016: 114). A aristocracia e elite paulistana migravam nesta época para regiões como Campos Elísios, Higienópolis e Paulista. Inaugurada em 1891, a Avenida Paulista seria anos depois local de referência para o Carnaval paulistano. Com grandiosidade e opulência, a avenida abrigava mansões de milionários, que já dispunham do serviço de bonde elétrico na década de 1900. No entanto, para a arquiteta e urbanista Regina Meyer, mais do que a presença da modernidade, suas dimensões e traçado vigorosos marcam o prestígio “da sociedade afluente que a construía” (MEYER, 1993: 17). Essa foi a primeira via asfaltada, já em 1909, e em 1912 passou a receber o corso carnavalesco da elite paulistana que antes acontecia na Praça da República (O Estado de São Paulo, 13 fev. 2015). Com automóveis conversíveis, tecnologia muito cara na época, as pessoas mais ricas de São Paulo desfilavam e se exibiam pela avenida nos moldes da guerra das flores do Carnaval de Nice, na França. Com aponta Maria Isaura Pereira de Queiroz em seu livro Carnaval brasileiro: o vivido e o mito (1992), havia também no Brás um corso de famílias menos abastadas, que raramente é lembrado (QUEIROZ, 1999: 17, 18). Posteriormente, esse costume elitista na Avenida Paulista, em que o povo apenas olhava passivamente, foi gradativamente se popularizando, na medida em que a 42


ascensão social permitiu a mais pessoas o acesso ao aluguel ou compra de um carro. Ainda segundo Queiroz, as elites, então, começam a passar o Carnaval fora da cidade ou em clubes e bailes fechados. Com a popularização, o esvaziamento das elites e a crescente dificuldade em encontrar automóveis conversíveis, os corsos carnavalescos começaram a entrar em decadência em fins da década de 1930. O distanciamento entre os pobres e ricos foi se acentuando. O contraste de realidades era (e ainda é) evidente: enquanto os bairros de elite dispunham de infraestrutura e tecnologia, bairros populares como o Brás não tinham pavimentação nem luz elétrica ainda em 1912, além de condições tão insalubres de trabalho que eram comparáveis no início da Revolução Industrial inglesa (CALLIARI, 2016: 121). São Paulo passava por intensas modificações de desenho da cidade e profundas alterações das relações sociais, além de reorganizações econômicas, políticas e culturais. Como observado no documentário Batuque Paulista: a trajetória do samba de São Paulo, do rural ao urbano, durante esse processo foca-se na consolidação de uma imagem da cidade, uma cidade branca, moderna, cidade do trabalho – trabalhos formais, excluindo a população negra –, destacando a figura do imigrante branco europeu enquanto a presença e protagonismo do negro são pouco reconhecidas e legitimadas. Ainda segundo o documentário, é no mínimo conveniente que italianos se instalassem no Bixiga e os orientais, na Liberdade, pois ao se tornaram referências nesses bairros antes negros, os espaços de memória negra foram praticamente eliminados. Neste contexto, trabalhadores informais negros na rua não eram bem vistos, eram associados à promiscuidade e vadiagem, e tradições culturais e religiosas afro-brasileiras eram consideradas delitos passíveis de punição. Mas a comunidade negra tomou para si a oportunidade e abertura do Carnaval para expressar suas mensagens. Em 1914, Dionísio Barbosa funda o Grupo Carnavalesco da Barra Funda (atual Escola de Samba Camisa Verde e Branco), um cordão carnavalesco, que, segundo a antropóloga Olga 43


von Simson, era a “primeira manifestação surgida como criação específica do carnaval popular de São Paulo” (SIMSON, 2008: 44). Marceneiro da Barra Funda, Dionísio decidiu criar o grupo após ficar extasiado com os ranchos e bandas maciais cariocas carnavalescas que conheceu durante uma vivência de três anos trabalhando na cidade do Rio de Janeiro. Segundo Simson, além de absorver influências destas duas manifestações cariocas, o grupo também se inspirava no samba rural do interior de São Paulo pois Dionísio nasceu e cresceu próximo a zona cafeeira, em Itarapina (SIMSON, 2008: 44). Só em 1930 seria criado no Bixiga o Cordão Carnavalesco e Esportivo Vae-Vae (atual Escola de Samba Vai-Vai) e, cinco anos depois, a primeira escola de samba de São Paulo no bairro Pompeia, chamada Escola de Samba Primeira de São Paulo, hoje extinta. A segunda e mais antiga escola de samba ainda em atividade foi fundada em 1937 na Baixada do Glicério pela Madrinha Eunice, a Escola de Samba Lavapés. Enquanto isso, a população branca, operária e imigrante, principalmente de origem italiana, espanhola e portuguesa, organizava desfiles de Carnaval com forte influência das procissões burguesas europeias. Com grandes habilidades artesanais, estes trabalhadores se reuniam durante cinco meses em barracões localizados em bairros operários para construir carros alegóricos, uma válvula de escape ao trabalho fabril repetitivo que permitia exercitar seus múltiplos talentos (SIMSON, 2008: 48, 49). Toda a criação destes operários/artesãos voltava-se para os aspectos visuais e os carros do desfile, enquanto a música ficava a cargo de uma banda contratada que reproduzia a marchinha ou samba de sucesso do ano. Concomitantemente, havia ainda, dentre outras manifestações, os corsos carnavalescos, como os citados acima; o entrudo, que era veementemente reprimido; e as festividades promovidas pelas Grandes Sociedades Carnavalescas, instituições que copiavam um modelo burguês de Paris, na França. Simson lembra que este modelo de Grandes Socie44


dades só surgiria em São Paulo em 1885, vinte e oito anos depois do que as Rio de Janeiro, que datam de 1857 (SIMSON, 2008: 43, 44).

Em seu estudo sobre o Carnaval popular paulistano do século XX, Olga von Simson destaca duas principais vertentes no início do século: a do branco operário e a do negro dos cordões. Em uma a concepção visual era preponderante e em outra toda a dedicação era voltada à elaboração da música e da dança. Uma copiava o modelo burguês veneziano e luxuoso de Carnaval, outra baseava-se “nas raízes do catolicismo rústico, isto é, em procissões e folguedos de origem religiosa luso-brasileira e em cortejos africanos, como os cucumbís, adaptados à realidade carnavalesca” (SIMSON, 2008: 45). Ambas vertentes, entretanto, trabalhavam a união, coletividade e identidade dos bairros, refletidos nas especificidades de cada grupo. Os ranchos operários se apresentavam primeiro nos bairros de origem, e depois competiam entre si no centro da cidade. Os cordões carnavalescos também competiam entre si no centro, mas, caso se encontrassem no caminho para o desfile, havia um grande embate corporal e agressivo que poderia acarretar na eliminação de um grupo antes mesmo de se apresentar, caso seu estandarte fosse roubado e rasgado. Ao entrevistar aqueles que participaram dessas manifestações no começo do século, Simson identificou que para o grupo branco operário o Carnaval estava ligado a uma fase da vida, a juventude, a uma época em que viviam em um bairro com certa coesão social, mas que após ascender socialmente haviam mudado de bairro e se distanciando daquele lugar e das pessoas que ali viviam. Já no grupo negro a maioria das pessoas continuaram envolvidas com o Carnaval e conservaram sua história, pois para eles esse era um período de máxima expressividade, era sua vida. 45


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a rua e o percurso

“Dionísio já não conhece outra arquitetura senão a dos percursos e trajetos” (DELEUZE, 2006: 14).

No Carnaval grupos a festejar percorrem ruas da cidade sem direção ou rumos certos, “gozando intensamente o ato de andar, ocupando as ruas do centro comercial da cidade, local das leis impessoais e desumanas do trânsito do mundo diário” (DAMATTA, 1997: 114). O antropólogo Roberto DaMatta coloca que ao invés da circulação frenética de automóveis e ônibus, acontece uma marcha com necessária ausência de objetivo, um caminhar despreocupado, e por esta razão altamente consciente, ritualizado e alegre. Para DaMatta, o Carnaval é um rito sem dono (um festival com múltiplos planos), que aglutina pessoas no universo espacial das praças, avenidas, e sobretudo, do centro da cidade. Ele destaca que, diferente de outros feriados em que se observa um movimento de distanciamento do centro e de áreas de trabalho, no carnaval o centro passa a ser o centro, e a direção do fluxo de deslocamento das pessoas assemelha-se a de um dia comum de trabalho (DAMATTA, 1997: 112). Ao invés de promover reuniões familiares nas casas, o Carnaval objetiva o encontro de indivíduos nas ruas (DAMATTA, 1997: 138). Para interpretar o espaço e o mundo ritual do Carnaval, DaMatta demonstra a dicotomia do sistema social brasileiro vigente por meio da oposição entre rua e casa: o descontrole e massificação e o controle e autoritarismo; a possibilidade de escolha e as associações sanguíneas e de parentesco; o mundo urbano e público e o mundo privado e pessoal; o que fica fora para ser exibido e o que fica dentro, 47


escondido. Ele conclui, então, que o espaço do Carnaval é especial, é um encontro entre rua e casa, é a rua domesticada, pois “se a festa tem aspectos públicos (como o desfile e os grupos formais), ela permite um conjunto de gestos (e ações sociais) que, em geral, só se realizam em casa” (DAMATTA, 1997: 137). DaMatta coloca ainda que, se em geral é da casa que se vê a rua, no Carnaval “é da rua que se observam as casas” (DAMATTA, 1997: 140). Há um diálogo entre estes espaços. Assim, para além de seu programa estritamente funcional, a cidade é suporte para a convergência social e para a ação do usuário, e suas arquiteturas são ativadas pelo movimento dos corpos – ideias desenvolvidas pelo arquiteto Bernard Tschumi em seu livro Architecture and Disjunction (1996). Referindo-se ao texto de Tschumi, o arquiteto Daniel Corsi coloca que para “compreender e aceitar nossa paisagem contemporânea em toda sua complexidade” é preciso reconhecer que “a cidade se constitui também de uma natureza invisível – movimentos, fluxos, forças, presenças, ausências, campos” (CORSI, 2014: 100). Voltando à análise feita por Roberto DaMatta, o Carnaval é marcado pela alegria e por valores considerados positivos, ensaiando uma vida com mais liberdade e individualidade. Opera pela a neutralização ou inversão de valores, e dramatiza com humor a realidade social, de modo a formar um campo social aberto suspendendo temporariamente as regras hierárquicas e repressoras do universo do cotidiano e a aparente plausibilidade do mundo. É uma comemoração “cósmica” capaz de lançar sobre os espaços e estruturas sociais um novo significado, possibilitando alternativas de transformação. É a “invenção de momento especial que guarda com o cotidiano brasileiro uma relação altamente significativa e politicamente carregada” (DAMATTA, 1997: 40). O antropólogo observa que a palavra loucura é recorrente na descrição desse cenário: “loucura [...] porque nosso mundo social, tão preocupado com as hierarquias e as lógi48


cas do ‘você deve saber o seu lugar’ e do ‘sabe com quem está falando?’ [...], está oferecendo mais aberturas do que aquelas em que podemos realmente entrar” (DAMATTA, 1997: 118). No Carnaval deixamos de ser – de uma família, classe, grupo moral, etc. – e passamos a existir e viver. Nesse sentido, DaMatta coloca que todos podem se entrecortar, mudar de grupos, criar novas relações de “insuspeitada solidariedade” (DAMATTA, 1997: 121). O Carnaval, portanto, estaria mais ligado a uma experiência sensível com a própria existência e com o mundo dos sonhos, no qual não se busca chegar em algo concreto, palpável e quantificável. É possível estabelecer paralelos desse caminho ritual do Carnaval, que se concentra no próprio caminhar, com uma ideia de labirinto, na medida em que “antes de ser forma, o Labirinto é um estado sensorial” (JACQUES, 2003: 84). Em seu livro Estética da ginga: a arquitetura das favelas através das obras de Hélio Oiticica (2001) Paola Berenstein Jacques desenvolve essa ideia, que, segundo ela, é um espaço em movimento, dançado, é o caminhar urbano, é um “espaço bêbado”, em que “do desequilíbrio nasce o êxtase” (JACQUES, 2003: 85, 86). Em suas palavras: “a dança condensa a música e dilui a arquitetura. A dança transforma o espaço em movimento: temporaliza o espaço. A música, disciplina temporal, e a arquitetura, disciplina espacial, se casam na dança, disciplina do movimento. O espaço labiríntico é o espaço em movimento” (JACQUES, 2003: 85). Portanto, o espaço labiríntico, é o espaço do Carnaval. E o Carnaval faz parte da natureza invisível da cidade.

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“progresso”

“[...] até que o progresso entrou na parada e acabou com o recreio onde o pessoal das quebradas do mundaréu relaxava as broncas juntadas no dia a dia” Fala de Plínio Marcos em trecho do álbum Plínio Marcos: Em Prosa e Samba com Geraldo Filme, Zeca da Casa Verde e Toniquinho Batuqueiro (1974).

A cidade burguesa que se consolidou nas primeiras décadas do século XX trouxe consigo formalizações, tanto do ponto de vista do espaço urbano, quanto do ponto de vista do Carnaval. A historiadora Zélia Lopes da Silva em seu livro Os carnavais de rua e dos clubes na cidade de São Paulo: metamorfoses de uma festa (1923-1938) (2008) aponta que já em 1931 houveram várias medidas coercivas para o Carnaval que buscavam combater posturas e comportamentos, uma providência direcionada principalmente às manifestações populares. Dentre outras coisas, reprimia-se: a prática do entrudo; canções que atentassem contra o “decoro público”; pessoas que faltassem com respeito a família; desfiles com fantasias que não estivessem licenciados; e até o consumo de bebidas alcoólicas, exceto cerveja, chope e champanhe em bailes e vinho em restaurantes – uma “sutil discriminação” (SILVA, 2008: 133, 134). Desrespeitar essas regras poderia acarretar em multa, prisão e processo. Seguiu-se com sucessivas coibições do Carnaval paulistano, o que indicava a institucionalização da festa, pauta de discussão nacional desde início dos anos 1920. A partir de 1932 o poder público carioca começou a interferir incisivamente no evento, e o que era de início uma medida específica para a cidade logo se deslocou para nível nacional. O Carnaval 51


ganhava importância pois, segundo seus apoiadores, além de congregar interesses gerais da população, configurava uma possibilidade de valorização da história, lendas e mitos brasileiros que definiam contornos de brasilidade (SILVA, 2008: 127, 128). Fomentada pela imprensa, a campanha pela sua nacionalização se fortaleceu. “Trabalhar pela officialização é trabalhar pelo Brasil”1 (Correio da Manhã apud SILVA, 2008: 129) No Rio de Janeiro, então, concursos e desfiles carnavalescos passaram a ser organizados pelo poder público, com interferências cada vez mais recorrentes. O Rei Momo foi institucionalizado em 1934 e em 1937 a “prefeitura realizava o primeiro concurso entre as escolas de samba do Rio de Janeiro” (SILVA, 2008: 130). Sendo capital federal, o Rio era tido como referência e modelo. Assim, o formato institucionalizado do Carnaval carioca seria copiado por outras cidades, por exemplo por São Paulo. Foi em 1935 durante a gestão de Fábio Prado que a festa teve a primeira ampla organização da prefeitura paulistana, início de um período de institucionalização que se estendeu até 1938. O poder público se responsabilizava pelo baile de gala do Teatro Municipal, que abria os festejos, pelos concursos de Rei Momo e Rainha e pela comissão julgadora dos desfiles carnavalescos (SILVA, 2008: 150). Para essa comissão foram chamados “artistas plásticos e de teatro, os poetas e músicos de formação – os eruditos”, subordinando as manifestações à estética e aos gostos associados aos códigos clássicos (SILVA, 2008: 150). Essa medida bastante autoritária e de pouca representatividade da diversidade carnavalesca acabou regrando caminhos ao estabelecer e uniformizar padrões estéticos.

1 52

Foi mantida a grafia original, como publicada em 21 jan. 1932.


Enquanto isso, o cenário político e econômico do país era de notáveis mudanças. Na década de 1930 dava-se início a Era Vargas. A grande crise cafeeira da época foi seguida da implementação inicial de leis trabalhistas e o fomento à indústria nacional de base, fortalecendo as indústrias de São Paulo e a importância da cidade para o país. Além disso, durante esse governo houve também importantes discussões nacionalistas acerca da identidade brasileira, no qual o Carnaval teve papel relevante. Entretanto, após o golpe de Estado de 1937 que iniciou o Estado Novo, observa-se um refluxo do carnaval paulistano, notadamente o de rua. A prática de organização pública implementada pela gestão de Fábio Prado foi abandonada. Jornais, emissoras de rádio e posteriormente de TV, e esporadicamente iniciativas privadas, como clube de lojistas, assumem a organização de desfiles e concursos, que não faziam parte de um sistema unificado. Em nível municipal, o cenário político era de instabilidade: Silva lembra que só no ano de 1933 São Paulo teve cinco prefeitos (SILVA, 2008: 137). Segundo Silva, no mesmo ano o jornal O Estado de São Paulo concluiu que o carnaval paulistano era “uma festa de salão mais do que de rua”, destacando o crescente número de bailes em salões, clubes e hotéis (SILVA, 2008: 137). Observa-se que havia horários especiais de trem para o Rio de Janeiro durante o Carnaval, indicando que já nessa época havia grande afluxo para a cidade carioca durante as festividades. Não se pode esquecer que concomitantemente o corso carnavalesco começou a decair na cidade. Mas, ainda sim, o centro antigo e Brás eram lugares em que o carnaval de rua continuava notável e animado. Nesse período, a cidade de São Paulo passou por novas grandes mudanças de desenho urbano, principalmente ditadas pelo Plano de Avenidas implementado na gestão de Prestes Maia (1938-1945). Ao recusar o Plano Integrado de Transportes apresentado pela Cia. Light e implementar, ainda que parcialmente, o Plano de Avenidas, escolheu-se priorizar o transporte sobre rodas, principalmente o transporte individual motorizado. O plano propunha a construção de vias 53


circulares e concêntricas complementadas por outras grandes vias que se irradiavam a partir do centro. Este desenho redefiniu os fluxos e a ocupação do território. Progressivamente a cidade se adensava e se espraiava, numa urbanização dispersa. Em fins da década de 1930 construiu-se um novo Viaduto do Chá, o que favoreceu o desenvolvimento do Centro Novo, lado oeste do Anhangabaú. Esta área concentrava na época grande parte da vida social, pois a área oferecia comércios, serviços e lazer. É possível notar também pela região a inauguração de várias iniciativas artísticas: Teatro Brasileiro de Comédia – TBC (1948), Museu de Arte de São Paulo – MASP (1947) e Museu de Arte Moderna – MAM (1948) (CALLIARI, 2016: 131). O jardim do Anhangabaú deu lugar a uma grande via para automóveis, que só em 1951 seria em desnível. A construção de diversas avenidas de “fundo de vale”, área das várzeas de rios e córregos, foi muito utilizada a partir de 1940, como a Pacaembu sobre o córrego Pacaembu, a 9 de Julho sobre o Saracura, a Sumaré sobre o Sumaré e a 23 de Maio sobre o Itororó (CALLIARI, 2016: 126). Era notável uma crescente segregação do pedestre e o início do que seriam cicatrizes viárias na cidade. Essas transformações urbanas alteraram profun damente a paisagem urbana e o desenho da cidade. Nesse momento, foram feitas muitas escolhas quanto ao valor monetário e simbólico do território. Por exemplo, como aponta o documentário Batuque Paulista: a trajetória do samba de São Paulo, do rural ao urbano, o Largo da Banana que ficava próximo à estação ferroviária Barra Funda, e que era reduto negro e referência essencial para o samba paulista, foi completamente liquidado em fins dos anos 1950 para dar lugar ao Viaduto Pacaembu. Como essa estação era apenas para transporte de cargas, ela mal aparece nos mapeamentos antigos, assim como o largo. Pela escassez de registros fica claro que eram tidos como lugares menos importante. Atualmente não 54


há no local nenhuma menção à história e memória do largo, que só não se perde pela força da transmissão oral de conhecimento.

“Fiquei sem o terreiro da escola, já não posso mais sambar. Sambista sem o Largo da Banana, a Barra Funda vai parar. Surgiu um viaduto é progresso, eu não posso protestar. Adeus berço do samba, eu vou me embora, vou sambar noutro lugar” Samba Vou sambar n’outro lugar (terreiro da escola), gravado por Geraldo Filme no álbum Plínio Marcos: Em Prosa e Samba com Geraldo Filme, Zeca da Casa Verde e Toniquinho Batuqueiro (1974).

A década de 1950 foi marcada por um grande incentivo a indústria automobilística. O número de carros e ônibus em circulação cresceu exponencialmente na cidade de São Paulo, de modo que os bondes elétricos foram completamente descontinuados em fins dos anos 1960. As indústrias migraram para a nova periferia da cidade, impactando diretamente a vitalidade dos bairros operários. Consequentemente, formam-se novas centralidades regionais e uma certa dicotomia entre a vida nos bairros (vida cotidiana) e vida nos centros (vida pública). São Paulo crescia: atraía pessoas de outras regiões do país, tornando-se destino de um fluxo de migração interna, enquanto se espraiava e conurbava com outras cidades. Era crescente a separação física entre classes sociais, evidente as sucessivas expulsões dos negros e menos abastados das zonas centrais, e progressivas a redução do espaço do pedestre e o abandono do espaço público. Nesse cenário de gradativa rigidez formal e social da cidade, o Carnaval de rua em São Paulo já não era tão presente e diverso quanto no início do século. Foi nessa época, em 1960, que a capital administrativa do Brasil foi transferida para Brasília, diminuindo a influência do Rio de Janeiro sobre o país. Entretanto, a cidade continuou com uma posição de centro intelectual, das artes e 55


da moda. Em 1964 o Brasil sofreu um golpe de Estado, dando início ao período de regime militar que se estenderia até 1985. Durante esse tempo, não houve proibição específica para as festas carnavalescas, entretanto, qualquer manifestação popular era passível de truculentas repressões. De 1954 até o começo dos anos 1960 concursos carnavalescos promovidos pelas emissoras de TV aconteciam no Parque Ibirapuera, enquanto outros dispersos na cidade eram fomentados por iniciativas independentes. Desta data até fins de 1960 o poder público esteve completamente ausente da organização dos festejos. Cansados de serem perseguidos e reprimidos, integrantes de cordões carnavalescos e escolas de samba da cidade e organizadores dos folguedos carnavalescos decidiram tentar um diálogo com o poder público. Em 1967 o então prefeito Brigadeiro Faria Lima oficializou o Carnaval na cidade com o formato de show-business que conhecemos hoje. Carioca, ele implementou os modelos de escola de samba e de desfile do Rio de Janeiro, dispensando a estrutura das manifestações locais. Os cordões carnavalescos aos poucos se transformam em escolas de samba nos moldes cariocas ou se desfizeram, e essa expressão autêntica paulistana perdeu força. Além disso, o baile oficial, realizado no Teatro Municipal, foi adiantado uma semana, “para não coincidir com o que se realiza tradicionalmente na ex-capital federal” (O Estado de São Paulo, 18 nov. 1967: 12). Desde então, o “pré-carnaval” ganhou força em São Paulo. O primeiro desfile oficial de Carnaval nesses moldes foi realizado no ano seguinte na Avenida São João e no Vale do Anhangabaú. Até 1970 ocorreram dois concursos paralelos: o das escolas de samba e o dos cordões carnavalescos. Pouco tempo depois a dos cordões carnavalescos foi extinta. Como descrevem Olga von Simson e os documentários mencionados anteriormente, a estrutura das organizações do cordão paulistano e da escola de samba carioca 56


apresentavam várias diferenças. Porém, ao ser sufocado pela imposição do modelo carioca, a estética cultural local passou a ser vista sob um olhar pejorativo. O Carnaval tornou-se uma manifestação artística controlada e circunscrita. No mesmo ano do primeiro desfile oficial da cidade, em 1968, foi emitido pelo regime militar o Ato Institucional n° 5 (AI-5) que acentuou a já rígida censura e o controle. Portanto, apesar de oficializadas e reconhecidas as escolas de samba em São Paulo, ainda assim havia muita repressão e violência no cenário geral, além de atos racistas e preconceituosos direcionados ao samba. Em 1969, o sambista Pato N’água, apitador e um dos fundadores da Escola de Samba Vai-Vai, foi encontrado morto. Apesar do laudo constar enfarte, acredita-se que ele tenha sido assassinado.

“Silêncio, o sambista está dormindo, ele foi mas foi sorrindo, a notícia chegou quando anoiteceu. Escolas, eu peço o silêncio de um minuto, o Bixiga está de luto, o apito de Pato N’água emudeceu. Partiu, não tem placa de bronze, não fica na história, sambista de rua morre sem glória, depois de tanta alegria que ele nos deu. Assim, o fato repete de novo, sambista de rua artista do povo, e é mais um que foi sem dizer adeus. Silêncio...”

Samba Silêncio no Bixiga, gravado por Geraldo Filme no álbum Plínio Marcos: Em Prosa e Samba com Geraldo Filme, Zeca da Casa Verde e Toniquinho Batuqueiro (1974).

O medo no espaço público combinado com o abandono gradual desses espaços e do papel simbólico do centro resultou em edifícios fechados para a cidade, cercados e murados. O número de espaços privados de uso público se ampliou. O primeiro shopping center de São Paulo – símbolo máximo dessa lógica, junto aos condomínios fechados – foi inaugurado em 1966. Em seguida, outros edifícios dessa natureza pipocaram na cidade. 57


Num mesmo movimento, o Carnaval também se fecha ou “não existe”. A oficialização do evento e crescente formalização acabou comprometendo parte de sua espontaneidade. Uma característica peculiar das escolas de samba de São Paulo que começou a surgir nessa época é sua relação com torcidas organizadas de futebol. Algumas torcidas criam grupos próprios, outras associaram-se a escolas já existentes. Assim, a tensão nas competições e rixas entre os grupos se intensificaram, fatos que não necessariamente estão ligados apenas ao desempenho dos grupos nos desfiles carnavalescos. Em 1973 é fundada a União das Escolas de Samba de São Paulo (UESP), entidade responsável pela organização dos desfiles de carnaval a partir de então. Em 1977 o desfile oficial de Carnaval é transferido para Avenida Tiradentes, e em seguida, torna-se pago. Grande parte das pessoas deixam de frequentar o concurso e de festejar a data na cidade. Muitas aproveitam o feriado para viajar, isolando-se. Observa-se o esvaziamento das ruas.

“São Paulo, menino grande. Cresceu, não pode mais parar. No Pátio do Colégio quem lhe viu nascer, um velho ipê parece chorar. Não vejo a sua mãe preta na rua com seu pregão. Cafezinho quentinho sinhô, pipoca, pamonha e quentão. Lembrar, deixa-me lembrar, lalaiá lalaiá laiá. [...] Onde estão teus boêmios, a sua garoa, cadê seu orvalho? Lembrar, deixa-me lembrar, lalaiá lalaiá laiá” Samba São Paulo menino grande, de Geraldo Filme, gravado no álbum Geraldo Filme (1980).

Como resposta à provocação de amigos cariocas que zombavam da falta de folias carnavalescas em São Paulo e que atentavam para o fato de que a cidade não tinha uma banda de carnaval, o ator e dramaturgo Plínio Marcos e o sambista Carlos Costa (Carlão) fundaram em 1972 a Banda 58


Bandalha (atual Banda Redonda). A banda foi formada no ambiente do Teatro Arena e era frequentada por vários intelectuais. Em 1974, após uma briga com a Prefeitura pela falta de apoio, Plínio abandonou a banda, e Carlão a assumiu. Ela passou a se chamar, então, Banda Redonda em homenagem ao bar Redondo, em frente ao Teatro Arena, e continua ativa na cidade (Folha de São Paulo, 18 jan. 2005). Plínio Marcos foi uma figura importante para o Carnaval e o samba de São Paulo pois por meio de seus trabalhos dava voz às camadas populares. Em 1973 lançou o livro de contos Histórias das quebradas do mundaréu e no ano seguinte o álbum Plínio Marcos: Em Prosa e Samba com Geraldo Filme, Zeca da Casa Verde e Toniquinho Batuqueiro, nos quais histórias muito ricas são contadas: fala-se dos costumes e manifestações do povo, da formação e desenvolvimento do samba paulista, da repressão policial e do preconceito racial, do processo de urbanização e especulação de São Paulo, dos territórios negros apagados na cidade, etc. É preciso reconhecer o esforço para o registro e divulgação desse conteúdo haja visto a repressão e violência da época. A lei da Anistia assinada em 1979 reverteu as punições feitas entre 1961 e 1979 aos cidadãos brasileiros considerados criminosos políticos pelo regime militar, que só acabou em 1985. Entre os anos 1970 e 1980 muitos dos exilados políticos ligados a produção cultural do país retornaram ao Brasil, como os músicos Caetano Veloso e Gilberto Gil. Apesar disso, a década de 1980 ficou conhecida como “década perdida” pela crise e estagnação econômica do país. Nesse momento de retorno à democracia, fundaram-se alguns blocos carnavalescos em São Paulo que existem até hoje, como o Vai Quem Quer (1981), tradicional bloco da Vila Madalena/Pinheiros, e o Bloco da Ressaca (1984), atuante no bairro Cambuci, no centro da cidade. Houve também em 1986 a divisão da UESP: as grandes escolas saíram da união e formaram a Liga Independente das Escolas de Samba de São Paulo (LigaSP), enquanto a UESP ficou responsável pelos 59


grupos I a IV. Neste momento as Escolas de Samba passam a depender mais da TV. Isso foi ainda reforçado em 1991 com a transferência do desfile oficial do Carnaval para o Polo Cultural e Esportivo Grande Otelo, mais conhecido como Sambódromo Anhembi, projetado por Oscar Niemeyer2 durante a gestão da prefeita Luiza Erundina, e que seria concluído apenas em 1996, com capacidade de abrigar até 30 mil pessoas. Dessa forma, as competições entre escolas de samba isolaram-se das ruas da cidade em um ponto da Marginal Tietê e só são acessadas por meio da compra de ingressos. Essa dependência cada vez maior de veículos televisivos de comunicação reforçou o aspecto visual dos desfiles. Enquanto isso, ambas as formas de participação, desfilar e assistir, tornaram-se mais caras, excluindo parte da população, inclusive aqueles que lutaram pela oficialização das comemorações carnavalescas. Nesses moldes, estava consolidada a total espetacularização, mercantilização e pasteurização do evento. Nas décadas de 1980 e 1990 no Rio de Janeiro, porém, observou-se a ascensão acentuada de grupos carnavalescos e dos blocos de rua que divergiam desse sistema show-business. Eram grupos que buscavam uma renovação do país pós-ditadura. Movimento semelhante em São Paulo só aconteceria gradativamente por volta dos anos 2000.

2 Segundo a matéria Sem dono publicada pela Folha de São Paulo em 17 fevereiro de 2012, ao ser consultado para uma reforma e ampliação do sambódromo, Oscar Niemeyer negou sua autoria. Ainda segundo a Folha, apesar de o projeto original da década de 1990 de Niemeyer ter sofrido modificações ao ser construído, o arquiteto nunca teria negado a autoria do projeto até então. 60


tempo

“O paulista não deve perder tempo. Como é que você vai dar o tempo do sambista? O sambista é aquele que perde o seu tempo, não está dentro da lógica de mercantilização do tempo. O sambista está dentro da lógica onde o tempo é a possibilidade da festa”. Fala do historiador Francisco Rocha extraída do documentário Samba à Paulista: fragmentos de uma história esquecida (2007). O geógrafo Milton Santos dedica um capítulo de seu livro A natureza do espaço (2006) para discorrer sobre O Tempo (os Eventos) e o Espaço. Segundo Santos, os eventos criam o tempo, por isso são sempre Presente. Se dão em conjuntos sistêmicos, são inter-relacionados e interdependentes, ao passo que também são fruto do Mundo e do Lugar. São a matriz do tempo e do espaço simultaneamente. Dissolvem as coisas e identidades, mostrando-nos que elas não são fixas. “Onde ele se instala, há mudança, pois o evento é uma brutalidade eficaz [...]” (SANTOS, 2006: 146). E a mudança das coisas pelo evento ocorre pela suscitação de novas características. “É desse modo que o espaço testemunha a realização da história, sendo, a um só tempo, passado, presente e futuro” (SANTOS, 2006: 156). O espaço reúne todos os tempos. Ou seja, “o espaço é a ordem das coexistências possíveis” (SANTOS, 2006: 159). O Carnaval, festa que se conecta a um tempo/espaço anterior a toda estrutura política, econômica e social atual, é um evento que suspende o tempo – o tempo mercantilizado do capitalismo. 61


“Ê ê ê, ê ê á, de janeiro a janeiro São Paulo, São Paulo não pode parar” Trecho da música São Paulo não pode parar de Joci Batista, gravado no álbum Modéstia à Parte (1977).

“São Paulo não pode parar” era o lema do político Ademar Pereira de Barros, que foi governador (1938-41/194751/1963-66) e prefeito (1957-1961) de São Paulo. Atrelando a ideia de desenvolvimento com a de velocidade, a cidade almejada era uma cidade futurista, moderna e cosmopolita em que o trabalho era ligado diretamente ao valor monetário do tempo. Assim, “tempo é dinheiro”. Atribuía-se, portanto, grande importância ao deslocamento, mas não o deslocamento coletivo e público, e sim o privado, motorizado e individual. O urbanismo da cidade foi praticamente reduzido a grandes obras viárias em nome do progresso. Essa ideia de cidade depois foi reforçada pelo prefeito Paulo Maluf (1969-71/1993-96). Um dos seus maiores feitos o Minhocão, elevado que configura uma emblemática cicatriz urbana. O slogan do atual prefeito da cidade João Dória Júnior (2017-xxxx) é “Acelera São Paulo”, remetendo também a ideia de velocidade. Entretanto, até o momento sem perspectivas de grandes feitos construtivos, sue concepção de velocidade parece não estar ligada necessariamente a um deslocamento físico e concreto, mas a uma ideia contemporânea da velocidade que é virtual, aproximando-se de transações econômicas, flutuações e ações bancárias. Sua preocupação maior parece ser com a publicidade do espaço, sua imagem virtual, e com a rapidez em que é alterada e vendida num campo que não necessariamente corresponde ao da realidade concreta. De qualquer maneira, ambas concepções moderna e contemporânea de velocidade mercantilizam o tempo. Esse tempo acelerado, medido em dólar, nada tem a ver com o tempo do Carnaval, em que propositalmente se perde tempo e o tempo se perde. Pela sua própria natureza antiga e remota, não linear, o tempo do Carnaval, que faz parte de todos os tempos ou é no limite atemporal, é por si só uma afronta a 62


qualquer ideia mercantilista de cidade. “O tempo do carnaval é cósmico e cíclico, remetendo os participantes do ritual para fora do contexto brasileiro, colocando-os em contato com o mundo sagrado, do divino ou do sobrenatural. (DAMATTA, 1997: 55)

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crítica política e urbana | século XXI

Após o fim da ditadura em 1985, várias capitais passaram por um período de redescoberta da liberdade e da vivência dos espaços públicos da cidade. O Carnaval acompanhou esse movimento tomando as ruas, o que aconteceu primeiro no Rio de Janeiro, seguido de Salvador, Recife e Olinda, depois Belo Horizonte, e finalmente São Paulo. Segundo a historiadora Maria Teresa Guilhon M. de Barros, os primeiros blocos carnavalescos cariocas dessa leva foram fundados no fim dos anos 1980 até os anos 2000, com discurso explícito de reapropriação dos espaços públicos (BARROS, 2013: 9, 10). Nessa época, o Carnaval oficial paulistano foi transferido para o sambódromo: São Paulo continuava com lógicas de uso dos espaços que se fecham para sua população, tradição que há décadas persiste na cidade. Em 2003, o Carnaval de rua carioca já era reconhecido pela prefeitura do Rio de Janeiro como manifestação cultural urbana legítima. Enquanto isso, em São Paulo, alguns grupos carnavalescos de rua começaram timidamente a surgir. Dentre eles destacam-se o Jegue Elétrico (2000), Agora vai (2004), Bloco Afro Ilú Obá De Min (2005) e Cordão Carnavalesco Confraria do Pasmado (2006). Em 2005, durante a gestão Serra-Kassab (PSDB-PFL/DEM), houve a primeira edição da Virada Cultural, evento promovido pela Prefeitura de São Paulo que oferece 24 horas de programação cultural nas ruas centrais da cidade. Essa iniciativa pública se consagrou como um grande incentivo ao convívio social, à ocupação e ao uso dos espaços públicos do centro de São Paulo. Para o urbanista Mauro Calliari, a implementação em 2002 do primeiro Plano Diretor Estratégico de São Paulo (PDE – Lei Municipal n° 13.430/2002) em consonância com o 65


Estatuto da Cidade (Lei Federal n° 10.257/2001) marca uma mudança na postura dos paulistanos em relação aos seus espaços públicos. É necessário frisar, porém, que tais medidas legislativas e políticas são resultado do colapso de um modelo caro de cidade e são resultado também – e não causa – dos processos sociais, seja como conquista dos cidadãos ou como instrumento de coerção, controle e ordem. De qualquer maneira, ambas as leis estabelecem importantes normas e instrumentos urbanísticos que regulam o solo urbano visando orientar o desenvolvimento da cidade tendo em vista o bem-estar social. Ainda que a implementação desses instrumentos jurídicos seja muitas vezes sabotada por forças dominantes, como o mercado imobiliário, gradativamente valores e conceitos se consolidam enquanto direitos universais, como o direito ao transporte, à moradia, ao lazer, etc. Por volta de 2010, enquanto o Rio de Janeiro firmava seu Carnaval de Rua (atraindo 5 milhões de foliões, segundo a pesquisa de Barros), toda a vontade reprimida da população paulistana de se apropriar do seu espaço público urbano explodiu na cidade na forma de uma intensa efervescência cultural, com a formação de diversos coletivos artísticos e urbanos. Dentre eles estão: grupos que propunham ações e intervenções urbanas, como MUDA_coletivo (2012), SampaPé (2012), Curativos Urbanos (2012), Bela Rua (2013), A Batata Precisa de Você (2014); novos grupos carnavalescos, como a Associação Carnavalesca Acadêmicos do Baixo Augusta (2009) – autoproclamado ativista e atualmente o maior bloco de São Paulo – e o Bloco Nois Trupica Mais Não Cai (2009); coletivos de festas em espaços públicos ou espaços vistos como degradados e abandonados, como a Voodoohop (2009), Carlos Capslock (2010), Calefação Tropicaos (2010) e Mamba Negra (2013); e festivais urbanos independentes, como o Festival Baixo Centro (2012). A maioria desses movimentos aconteceram na região central da cidade, cenário protagonista das manifestações 66


populares urbanas recentes que reclamam o espaço público. A região do Baixo Augusta – termo que se refere à Rua Augusta e redondezas do centro até a Avenida Paulista – teve grande importância: formaram-se ali o Acadêmicos do Baixo Augusta e o coletivo Voodoohop. Rapidamente esse coletivo se consolidou como um aglutinador de artistas, djs, vjs e performers que, apropriando-se de espaços públicos e ociosos, buscavam um lazer que “fugisse dos tradicionais clubes de padrão comercial que contaminavam a cena noturna de São Paulo” (SCHUTZER, 2014: 48). O coletivo incentivou a fundação de outros movimentos de festa semelhantes, citados acima. O próprio termo Baixo Augusta surgiu por volta de 2007 quando jovens de classe média e classe média alta começaram a frequentar em peso a região para se reunir e organizar festas. Conhecida nessa época por sua “decadência” por pessoas desses estratos sociais, a Rua Augusta em realidade talvez nunca deixou de ser usada intensamente como espaço público de encontro. Até então muito frequentada por punks, metaleiros, e outas tribos urbanas, essa área começou a ser apropriada por um outro perfil cultural e econômico, sendo “promovida” como algo cool, com a ajuda desse novo termo. Nota-se a importância dessa área como centro de efervescência cultural nesse período. Desde então, ali se instalaram novos bares, restaurantes e clubes fazendo com que a região passasse por intensas modificações. Paralelamente, o mercado imobiliário se apropriou dessa imagem urbana e cool para construir novos empreendimentos, inflacionando exponencialmente a região. Voltando aos movimentos de ocupação do espaço público, mesmo com todos esses grupos atuando na cidade, a prefeitura de São Paulo, sob direção do prefeito Gilberto Kassab (PFL/DEM), continuava opondo-se a manifestações populares espontâneas, chegando até a proibir o desfile do bloco Acadêmicos do Baixo Augusta em 2012 (Uol, 24 jan. 2013). Nesse mesmo ano, em reação às repressões, um grupo de 24 blocos escreveram o Manifesto Carnavalista, clamando pelo 67


direito à alegria e folia, pela valorização e afirmação de uma tradição paulistana, pela ocupação do espaço público como exercício da cidadania e pelo desenvolvimento de uma economia criativa (Vila Mundo, 7 nov. 2012). No ano seguinte, 2013, foram realizadas volumosas manifestações inicialmente contra o aumento das tarifas de transporte público em diversas cidades do Brasil. Nesses eventos, que ficaram conhecidas como Jornadas de Junho, a repressão policial foi violenta, principalmente na cidade de São Paulo, o que contribuiu para uma maior união e volume de manifestantes. Demonstrando clara insatisfação com o cenário político vigente, esses protestos representam uma nova etapa da democracia brasileira, e foram relacionados a outros movimentos que aconteciam no mundo, como o Occupy Wall St. e as Primaveras Árabes. Durante 2013, também, realizou-se em dezembro o Festival Na Mata Virgem do Parque Augusta, organizado por coletivos como a Voodoohop e o Parque Augusta. Com uma programação diversa, foi o primeiro evento a promover o terreno privado localizado na Rua Augusta entre as ruas Caio Prado e Marquês de Paranaguá como espaço de preservação e lazer, pressionando a prefeitura para que o transformasse em um parque público. Entretanto, há um complexo cenário de disputas políticas e econômicas por trás dessa discussão, e ainda hoje debate-se qual será o destino desse terreno. No desfile de Carnaval do Acadêmicos Baixo Augusta em 2017, por exemplo, a rainha do grupo se fantasiou de Parque Augusta, fomentando mais uma vez a transformação do terreno em um parque. Gradativamente a consciência da coletividade e da apropriação da cidade cresceu em São Paulo. A relação de parte dos paulistanos com os espaços públicos da cidade foi sendo transformada e renovada pela constante atuação de diversos grupos nesses espaços, após longos períodos de conflito ou mesmo negação deles (haja visto a quantidade de muros na cidade). Como esse movimento é muito recente, é 68


ainda difícil afirmar se há alguma homogeneidade nesse grupo, porém, vale frisar que, pelas pesquisas disponibilizadas pela São Paulo Turismo – Empresa de Turismo e Eventos da Cidade de São Paulo (SPTuris) e pela observação do perfil dos coletivos atuantes no centro da cidade, há indícios de que o movimento principal de “retomada do espaço público”, ao qual o Carnaval se vincula, seja em sua maioria um movimento de classe média e classe média alta. Isso não quer dizer que a população da periferia e de classes mais baixas não aproprie do espaço público, muito pelo contrário. Justamente pela ausência de equipamentos públicos, parques e espaços de encontro e lazer, a rua tenha sempre sido extremamente ocupada e usada. De qualquer maneira, em busca de direitos urbanos, qualidade de vida e harmonia a pressão da população conquistou recentemente políticas públicas que priorizam a convivência e o uso da cidade pelo pedestre, que foram implementadas mais expressivamente durante a gestão do prefeito Fernando Haddad (PT). Dentre elas estão: a criação em 2014 de uma Política de Desenvolvimento Urbano de um novo Plano Diretor Estratégico (PDE – Lei Municipal n° 16.050/2014); a instalação do programa Ruas Abertas em 2015 (consolidada por uma lei em 2016), em que a abertura da Avenida Paulista para os pedestres aos domingos é a mais representativa; a organização e promoção do SP na Rua (primeira edição em 2014), evento gratuito que reúne coletivos de festas no centro da cidade; e aprovação em 2014 do Plano de Apoio ao Carnaval de Rua da Cidade de São Paulo (Decreto Municipal nº 54.815/2014), decreto que disciplina o Carnaval de rua proibindo a permanência dos blocos em pontos fixos, além do uso de “cordas, correntes, grades e outros meios de segregação do espaço que inibam a livre circulação do público, permitindo-se o uso de vestuário distintivo que apenas identifique o respectivo grupo, sem que se constitua em elemento condicionante à participação” (Decreto Municipal nº 54.815/2014). Por um lado, disciplinar o Carnaval significa instrumentalizá-lo como um evento turístico, criando uma série 69


de normas e regras que podem engessar e distorcer essa manifestação – porém, como demonstrado acima em diversos episódios, é natural do Carnaval escapar às disciplinas cerceadoras. Por outro lado, é por meio desse decreto que a prefeitura garante aos grupos cadastrados no website www. carnavalderua.prefeitura.sp.gov.br a inserção na logística e agenda municipal de eventos; o subsídio para pagamento da taxa cobrada pela Companhia de Engenharia de Tráfego (CET); a inclusão no plano de comunicação e publicação (guia dos blocos); a adesão ao programa geral de patrocínios do Carnaval de rua; o bloqueio e sinalização do trânsito nas vias de seus percursos; o acompanhamento de ambulâncias e profissionais da saúde, dependendo do tamanho da manifestação; a presença de guardas civis metropolitanos; a limpeza das ruas por garis; e a disponibilidade de banheiros químicos (Decreto Municipal nº 56.690/2015). Além disso, o poder público intermedeia o diálogo entre associações de moradores e associações carnavalescas e organiza a logística dos percursos, horários de encontro e de dispersão de acordo com a infraestrutura dos blocos (equipamentos de som), sua expectativa de público e a viabilidade das vias. A partir da implantação desse plano de apoio, o número de blocos e foliões cresceu exponencialmente: foram 172 blocos em 2014, 270 em 2015, 355 em 2016 e 381 em 2017, reunindo 3,5 milhões foliões só nesse ano – sendo 10% de turistas, percentagem que triplicou em relação ao ano anterior (O Globo, 28 fev. 2017). O sucesso dessa grande festa é representativo quando se pensa a relação entre cidadão e cidade dos últimos 15 anos. Nas palavras da arquiteta e urbanista Raquel Rolnik: “[...] o Carnaval de São Paulo hoje é a expressão de um movimento muito mais amplo que está acontecendo na cidade de São Paulo já há pelo menos dez anos e que vai crescendo sem parar, que é uma mudança na cultura urbana, e um dos elementos centrais dessa mudança está na presença, permanência, apropriação dos espaços públicos da cidade pelas pessoas. As pessoas querendo estar nas ruas, nas 70


praças, nos parques, se apropriando disso e querendo estar para conviver, simplesmente para conviver” (ROLNIK, 2017).1

Se em fins do século XX manifestações carnavalescas de São Paulo eram comumente caracterizadas como ausentes no centro da cidade, com alguns poucos incentivos elas se tornaram rapidamente presentes, formando um grande evento. Desde 2010 a SPTuris coleta dados para pesquisas sobre o Carnaval na cidade, mas apenas a partir de 2015 ela começou a separar o Carnaval do sambódromo do Carnaval de rua. Nesse ano de 2015, o número de blocos já havia aumentado significativamente de modo que a organização realizada pela prefeitura incentivou a pulverização das festas e instalou também um palco no Largo da Batata. O ano de 2015 foi de grandes instabilidades políticas no país – que continuam em curso até o momento – culminando no impeachment da presidenta Dilma Roussef (PT) em 2016, substituída pelo presidente interino Michel Temer (PMDB). Para protestar contra o impeachment em São Paulo, cerca de 70 blocos carnavalescos se articulam em um movimento chamado Arrastão dos Blocos (Revista Fórum, 8 abr. 2016). Desde então, eles promovem manifestações de cunho político, como o protesto ocorrido durante o Carnaval de 2017 que contestava as políticas culturais da gestão de João Doria (PSDB) (Brasil de Fato, 25 fev. 2017). Há uma grande preocupação dos grupos carnavales cos com a possibilidade de distorções do caráter público e democrático do Carnaval de rua, haja visto que o Plano de Apoio ao Carnaval de Rua da Cidade de São Paulo é baseado em um decreto, instrumento político que facilmente pode ser alterado. No fim de 2016, por exemplo, o vereador Aureliano Nomura (PSDB) propôs o Projeto de Lei n° 279/2016 (ou “PL da Quarta-feira de Cinzas”) que interferiria no decreto. 1 Transcrição do áudio São Paulo: do trabalho para a folia da Rádio USP do Jornal da USP. 71


O que gerou mais polêmica nesse projeto de lei, entretanto, foi a emenda proposta pelo vereador Milton Leite (DEM), que sugere a privatização e formalização do Carnaval de rua ao obrigar que todos os blocos de rua tenham um CNPJ e que se filiem a uma associação de entidades carnavalescas. Assim, alguns blocos de rua e a ONG Minha Sampa se mobilizaram para protestar contra o projeto, conseguindo a adiamento de sua votação, que até o momento não ocorreu (Uol, 13 dez. 2016).

Com o crescimento do Carnaval de rua na cidade, é esperada a inclinação para a cobrança de regras e exigências cada vez mais rígidas para o desfile oficial dos blocos por parte do poder público, além da maior interferência na festa por parte do mercado, principalmente relacionado ao turismo, ao comércio de álcool e a indústria cultural. Com cerceamentos e vínculos monetários, é provável que o evento se aproxime a uma lógica capitalista mercantilizada e pasteurizada. Porém, é natural do Carnaval se reinventar antropofagicamente e encontrar novos modos de hackear a cidade e seus sistemas. O Rio de Janeiro, por exemplo, já passou por essa situação de formalização e logo começaram a surgir blocos que propositalmente não são e nem querer ser oficiais, blocos com caráter de certo ativismo musical que se mobilizam pela internet e que priorizam a interação, espontaneidade e proximidade com o público (BARROSO; GONÇALVES, 2016: 8). Assim como em outras cidades, observa-se muitas diferenças entre os grupos carnavalescos paulistanos: gênero musical, público alvo, infraestrutura, etc. É possível notar, entretanto, certas vertentes discursivas e espaciais: 1. grupos que são ligados a instituições, que geralmente circulam próximo a sua sede ou lugar representativo para seu coletivo, como o Bloco Acadêmicos da 9 de Julho (2016), formado por alunos e ex-alunos da Fundação Getulio Vargas (FGV), e que circula por volta dessa instituição de ensino; 72


2. grupos que estão ligados a festas e movimentos de ocupação do espaço público, que geralmente circulam por lugares emblemáticos para essa causa, como o bloco SP Beats (2017), que em 2017 circulou nos arredores do Teatro Municipal e contou com a presença de Carlos Capslock; 3. grupos propositalmente menos ordenados e pequenos, que não almejam fazer parte da programação oficial da cidade e que geralmente têm uma relação próxima com o bairro por onde circulam, como o Bloco do Água Preta na Pompeia, que desfila ao som de uma banda com uma pequena caixa de som; 4. grupos que vão no embalo da crescente festa, formados nos últimos dois anos por aqueles que também querem ter o seu próprio bloco, que circulam por lugares variados, como o Blokoké (2015), uma espécie de karaokê ambulante que promove cortejos com variados percursos; 5. grupos que estão ligados a bares, clubes ou festas fechadas, que geralmente iniciam o desfile em frente a esses lugares, como o bloco 1007 Augusta (201-), criado pela casa noturna de mesmo nome; 6. grupos que têm um modelo empresarial, que são grandes e geralmente originários de outras cidades, que circulam por lugares que podem receber uma grande quantidade de foliões, como a Avenida Consolação – ideal sambódromo urbano, com poucas residências, é uma linear e larga via de fácil acesso e controle –, como o bloco bahiano Pipoca da Rainha (s.d.), da cantora, compositora e instrumentista Daniela Mercury. Todos os grupos ocupam os espaços públicos e se sobrepõem, convivem. Porém, aqueles que tendem para essas três primeiras vertentes parecem ser mais conscientes sobre a sua ocupação, sua presença como indivíduo e coletivo na cidade. O Carnaval é então usado como um instrumento de crítica social, política e urbana, não só em São Paulo, mas no Brasil todo numa tendência da cultura urbana contemporâ73


nea. Em Recife, por exemplo, há a Troça Empatando2 Tua Vista, grupo organizado que parasita os desfiles carnavalescos “empatando” a vista de todos, que surgiu em 2014 como uma crítica privatização do Cais José Estelita e da possível construção de grandes torres na área, que “empatariam” a vista do centro histórico da cidade (Direitos Urbanos, 27 fev. 2014). Em São Paulo, também refletindo sobre questões urbanas contemporâneas, o Bloco do Água Preta (2012) critica o descaso com os rios e córregos da cidade. Na vertente não oficial, esse pequeno bloco percorre o caminho do atualmente canalizado córrego do Água Preta na Pompeia ao som de uma marchinha autoral elaborada anualmente. De modo semelhante, o Bloco Fluvial do Peixe Seco (2014) promove cortejos carnavalescos por diversos rios e córregos canalizados da cidade, buscando dar visibilidade a essa natureza escondida.

“Encontrei sua bacia hidrográfica naquele carnaval dramático e caí num poço sem fundo e acabou-se o mundo, vou embolar, se pá pirar na piracema do lençol freático. [...] Vamo cavar buraco, vamo quebrar concreto, deixar o rio correr a céu aberto! [...] Água mole, pedra dura, o Água Preta tanto pula até que fura” Marchinha de Carnaval 2017 do Bloco do Água Preta.

Na vertente de grupos ligados a instituições ou entidades, os blocos fazem parte um corpo mais amplo e organizado que geralmente promove outros projetos ao longo do ano e muitas vezes reivindicam igualdades e direitos sociais. Destacam-se o já citado Bloco Afro Ilú Obá De Min (2005) e o Bloco UMES Caras Pintadas (1993), que se reúne em frente à sede da União Municipal dos Estudantes Secundaristas de São Paulo (UMES-SP) no Bixiga. 2 Empatar na linguagem coloquial significa impedir, atrapalhar, bloquear. 74


Ligados a festas de rua e a cena eletrônica de São Paulo, desfilaram em 2017 o Bloco de Concreto (2017), promovido pelo coletivo audiovisual Metanol FM (2009), e bloco SP Beats (2017), que reuniu festas como Carlos Capslock (2010), Soul. Set (2011), Gop Tun (2012), Sonido Trópico (2014), ODD (201-), e MBR (201-). Outros grupos notáveis que percorrem o centro de São Paulo são o bloco Tarado Ni Você (2014), que toca apenas canções do cantor, compositor e instrumentista Caetano Veloso, e o Espetacular Bloco do Charanga do França (2013), bloco do compositor e instrumentista Thiago França que percorre o bairro Santa Cecília ao som de instrumentos de sopro e percussão, sem fazer uso de amplificadores sonoros. Com forte inclinação política, desde 2015 o Bloco Me Ocupa Que Sou da Rua (2015) promove desfiles carnavalescos no centro histórico da capital durante a madrugada, característica incomum entre os grupos de Carnaval. Outro grupo que se destaca pelo seu discurso político é o já citado Arrastão dos Blocos (2016), que em realidade é um coletivo de grupos carnavalescos. É comum notar alinhamentos com pensamentos de esquerda nesses grupos politicamente engajados, em maior ou menor medida, como o explicitamente comunista Bloco Soviético (2013), que percorre a Rua Augusta, ou mesmo o Acadêmicos do Baixo Augusta (2009), que já fora mencionado acima.

“Na praça Ramos Diante do municipal nasce o primeiro bloco da madrugada do carnaval. Vai desfilando pelo centro da capital onde falta água, mas sobra bomba de efeito moral. Me ocupa que eu sou da rua! Essa cidade também é sua! Me ocupa que eu sou da rua! Na madrugada a cidade fica nua! Nem no viaduto os coxinhas tem colher de chá. Na rua direita a esquerda vai sapatear. E é na rua que rola a revolução! E na madrugada a gente também quer busão!” Marchinha de Carnaval 2015 do Bloco Me Ocupa Que Sou da Rua.

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Presente na cidade há quase dez anos, o Acadêmicos do Baixo Augusta se tornou o maior bloco carnavalesco paulistano. Devido a sua popularidade, em 2016 transferiu seu desfile da Rua Augusta para a Avenida Consolação, e em 2017 reuniu cerca de 350 mil pessoas. Reforçando o discurso de apropriação do espaço urbano, o tema de seu desfile em 2017 foi “A cidade é nossa”, frase que, encomendada pelo grupo, foi ilustrada por Rita Wainer em uma fachada cega voltada para a Praça Roosevelt. Apesar de sua evidente retórica de democratização dos espaços públicos e do cunho político do grupo, é possível observar certos descolamentos entre o discurso e as ações desse bloco que é hoje muito maior e mais formalizado do que poucos anos atrás. Por exemplo, sob os gritos de “A cidade é nossa” o desfile de 2017 ocorreu quase até o fim com uma corda que segregava o espaço e o público. Essa corda deveria apenas proteger as pessoas das rodas do trio elétrico, mas na realidade permitia uma certa “área VIP” que reunia celebridades, políticos e intelectuais. Havia inclusive pulseiras que permitiam o acesso a essa área. Se por um lado o grupo criou descompassos como esse, por outro conseguiu reunir pessoas de todos os cantos da cidade para festejar. Parece que quanto maior e mais estruturado se torna o bloco ou o Carnaval de rua como um todo mais difícil é se manter coerente e inclusivo. Haveria um tamanho e formato ideais? Certa espontaneidade, flexibilidade e maleabilidade intrínsecos da natureza carnavalesca são certamente mais raros em manifestações de grandes proporções. São características mais prováveis em grupos menores, aglomerações de pessoas que se unem em resposta a impulsos e objetivos momentâneos e comuns de modo rápido, expressivo, eficaz e despretensioso, como no Bloco Unidos do Fora Temer (2017), ato político-folião crítico e efêmero. “Fora Temer” é um grito recorrente em agrupamentos de praticamente qualquer caráter e esteve notadamente presente em manifestações carnavalescas de todo o país durante 2017, caracterizado em 76


várias mídias como o mais político dos carnavais (O Globo, 28 fev. 2017). Vale observar que durante os carnavais é possível encontrar marchinhas, músicas e gritos que defendem ou criticam variados políticos de diversos partidos, ou seja, não é exclusividade de Michel Temer. Chama a atenção a reunião popular e populosa festiva nesse contexto. Tendo em vista que o Carnaval se relaciona com aspectos renovação e alternância, suas festividades, segundo a leitura de Bakthin feita pelas pesquisadoras Flávia Magalhães Barroso e Juliana Gonçalves, podem ser associadas “aos tempos de crise, onde as festas têm papel relevante em dar visibilidade a anseios populares de mudança da ordem” (BARROSO; GONÇALVES, 2016: 7).

“Essa turma ninguém derruba, nem Moscou, nem Cuba. Todos chupando jujuba no esfrega da suruba! Mamãe eu quero fora Temer, fora, fora Temer!”

Marchinha Fora Temer de Tom Zé, lançada em São Paulo durante o Carnaval de 2017.

No crescente do Carnaval de rua de São Paulo, é possível estabelecer três períodos: 1. de 2000 a 2008, iniciando-se com a estruturação de alguns grupos, como o Jegue Elétrico; 2. de 2009 a 2013, com a formação por exemplo do coletivo Voodoohop e do Acadêmicos do Baixo Augusta; 3. de 2014 até o momento, com e a aprovação do Plano de Apoio ao Carnaval de Rua da Cidade de São Paulo, que reconhece e organiza o Carnaval de rua, com o PDE de 2014 e o incentivo público a outras apropriações da cidade. O Carnaval de rua ascendeu com um forte viés crítico e político, alinhado a outros movimentos que exercitam a cidadania e a coletividade. Segundo o arquiteto Daniel Corsi, “as proporções que assumem certos eventos paulistanos [...] podem apontar algumas características de uma construção experiencial do tempo que cada vez mais clama a superação de sua vivência exclusiva77


mente individual” (CORSI, 2014: 102). Nesse sentido, são de suma importância para entender e pensar a cidade grupos carnavalescos críticos, com manifestações inventivas nas quais a cidade, e principalmente o centro, são palco e trama indispensáveis. Nas palavras de Rolnik, o atual Carnaval de rua “parece expressar um novo desejo das pessoas em sua relação com a cidade” (ROLNIK, 2014). A dimensão espacial e o caráter social dos blocos são diretamente ligados ao território. Eles indicam conflitos urbanos e por meio da observação de suas manifestações é possível perceber a expressão geográfica do poder social. Por décadas negados, tanto o Carnaval de rua quanto o espaço público de São Paulo passaram a ser espaços mais habitados e, consequentemente, espaços de frequentes disputas. Todo esse movimento carnavalesco e suas disputas reverberam nas mídias, no governo e no mercado. Por exemplo, a BBC Brasil publicou em fevereiro de 2017 a polêmica matéria Carnaval de rua é exemplo de ‘crise do conceito de cidadania’, diz secretário de SP na qual expõe uma entrevista com o atual secretário de Cultura de São Paulo, André Sturm. Em seguida, o portal Revista Fórum publicou Juca Ferreira: Carnaval de rua é festa da cidadania, escrita pelo próprio Juca Ferreira, sociólogo, ex-ministro da Cultura durante os governos de Lula e Dilma Rousseff e ex-secretário de Cultura de São Paulo durante parte da gestão de Fernando Haddad. Só pelos títulos é possível notar que elas dialogam por meio de ideias divergentes, discorrendo sobre e aproximam Carnaval, cidade e cidadão.

“Na madrugada, os resistentes da folia, bem de surpresa como cavalo de Tróia, vêm grafiteiro, vêm sem teto, sambando na cara do Doria. E os vampiros chupam sangue, privatizam até folião, mas nosso samba não se vende... não se engane!”

Marchinha de Carnaval 2017 pelo Bloco Me Ocupa Que Sou da Rua. 78


Em tempos de tendências conservadoras e reacionárias da atualidade, o movimento carnavalesco paulistano pode caminhar para a formalização excessiva, e está sob ameaça de ser incorporado às lógicas do mercado. Marcas de bebidas alcoólicas já estampam grande parte do material de divulgação oficial da prefeitura e de alguns blocos, e dominam espaços no evento por meio dos milhares de vendedores ambulantes (por vezes em quantidade excessiva). Em Salvador, por exemplo, o Carnaval foi engolido pelo capital: abadás são vendidos a preços caríssimos e os blocos privatizam o espaço público por meio de cordas. Pela primeira vez em 2017, entretanto, esse sistema perdeu popularidade para os eventos gratuitos da cidade (Folha de São Paulo, 27 fev. 2017). Também é preciso estar atento à repressão e à censura que se proliferam em alguns carnavais, como no de Recife, em que a Troça Empatando Sua Vista de Recife teve seu estandarte e fantasias apreendidas pela Polícia Militar em 2017 por criticarem o Governo de Pernambuco e a Prefeitura de Recife (O Globo, 25 fev. 2017). Nesse mesmo ano, em São Paulo a violência policial foi registrada na dispersão de foliões que se reuniram na Praça Roosevelt (O Globo, 1° mar. 2017). Serão os grupos carnavalescos paulistanos capazes de resistir a distorções e cerceamentos, manter uma distância saudável do capital e revigorar seus discursos democráticos? Como registros centenários desse grande evento apontam, o Carnaval é uma f(r)esta de liberdade e resistência que tem a propriedade inerente de se reinventar, se atualizar e se emancipar sucessivamente de regras. Espera-se que o Carnaval de rua paulistano se fortaleça nesse sentido, como um potente tempo e espaço capaz de estreitar os laços afetivos e identitários entre cidadão e cidade.

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mapa: percursos dos blocos na Subprefeitura da Sé em 2017

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2017


Reproduzidas em parte ao lado, as pesquisas realizadas pelo Observatório de Turismo da SPTuris durante o Carnaval de rua de São Paulo nos anos de 2016 e 2017 indicam que a maioria dos frequentadores desse evento possuem uma renda familiar mensal de 4 a 5 salários mínimos. É possível observar também que as porcentagens quanto a região de São Paulo aonde o público reside são razoavelmente equilibradas. Entretanto, é necessário lembrar que as zonas Central e Oeste são muito menos populosas do que as zonas Norte, Sul e Leste. Portanto, apesar de haver porcentagens semelhantes, proporcinalmente não há um equilíbrio participativo. Se houvesse, por exemplo, a zona Leste deveria apresentar a maior porcentagem, ou seja, o contrário do que ocorreu em 2017.

fonte: CARNAVAL paulistano 2017: sambódromo e rua. Observatório de Turismo e Eventos da Cidade de São Paulo São Paulo Turismo. Disponível em <http://www.observatoriodoturismo.com. br/?s=carnaval>. Acesso em: 10 mar. 2017. 85


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álbuns/músicas

BATISTA, Joci. São Paulo não pode parar. In: BATISTA, Joci. Modéstia à parte. [s.i.]: Copacabana; Beverly; AMC, 1977. 1 disco sonoro. Lado A, faixa 2. Bloco do Água Preta. Marchinha de Carnaval 2017. Disponível em <https://www.facebook.com/blocodoaguapreta/photos/ pcb.716185551887183/716185181887220/?type=3&theater>. Acesso em: 10 mar. 2017. Bloco Me Ocupa Que Sou da Rua. Marchinha de Carnaval 2017. Disponível em <https://goo.gl/EfJCe2>. Acesso em: 10 mar. 2017. _________. Marchinha de Carnaval 2015. Disponível em <https://goo.gl/tUisiy>. Acesso em: 10 mar. 2017. BLOTA, Geraldo; VIEIRA, Mário. Lata de Graxa. In: MATHIAS, Germano. Em continência ao samba. [s.i.]: RGE, 1958. 1 disco sonoro. Lado A, faixa 3. BRITO, J.; BUJÃO; FRANCO. Festa profana. Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=7FeAPD47-2c>. Acesso em: 10 mar. 2017. DALASAM, Rico. Todo dia. In: VITTAR, Pabllo. Vai passar mal. [s.i.]: BMT Produções Artisticas, 2007. 1 CD. Faixa 6. FILME, Geraldo. São Paulo menino grande. In: FILME, Geraldo. Geraldo Filme. [s.i.]: Eldorado, 1980. 1 disco sonoro. Lado B, faixa 3. GONZAGA, Chiquinha. Ó abre alas. Disponível em <https:// www.youtube.com/watch?v=m_vaRKqCDYM>. Acesso em: 10 mar. 2017. Plínio Marcos: Em Prosa e Samba com Geraldo Filme, Zeca da Casa Verde e Toniquinho Batuqueiro. [s.i.]: Warner, 2012. 91


1 CD. VELOSO, Caetano. Deus e o Diabo. In: VELOSO, Caetano Veloso. Muitos Carnavais. [s.i.]: Philips, 1977. 1 disco sonoro. Lado A, faixa 4. ZÉ, Tom. Fora Temer. Disponível em <https://www.youtube. com/watch?v=VqnfNlTSBQc>. Acesso em: 10 mar. 2017.

92


artigos/matérias

ACADÊMICOS do Baixo Augusta está livre para voar em 2013. Entenda! Uol, 24 jan. 2013. Disponível em <http://glamurama. uol.com.br/academicos-do-baixo-augusta-esta-livre-para-voar-em-2013-entenda/>. Acesso em: 10 mar. 2017. BAIANASYSTEM puxa coro ‘Fora, Temer’ e causa polêmica no carnaval da BA. O Globo, Salvador, 28 fev. 2017. Disponível em <http://g1.globo.com/bahia/carnaval/2017/noticia/2017/02/ baianasystem-puxa-coro-fora-temer-e-causa-polemica-no-carnaval-da-ba.html>. Acesso em: 10 mar. 2017. BLOCOLÂNDIA, o carnaval da Cracolândia. Jornalistas Livres, São Paulo, 12 fev. 2016. Disponível em <https://jornalistaslivres.org/2016/02/blocolandia-o-carnaval-da-cracolandia/>. Acesso em: 10 mar. 2017. BLOCOS e cordões criam manifesto pelo reconhecimento do carnaval de rua de SP. Vila Mundo, São Paulo, 7 nov. 2012. Disponível em <http://vilamundo.org.br/2012/11/blocos-e-cordoes-criam-manifesto-pelo-reconhecimento-do-carnaval-de-rua-de-sao-paulo/>. Acesso em: 20 jan. 2017. CARNAVAL. A Cigarra, São Paulo, ano II, n° 36, p. 30-32, 18 fev. 1916. Disponível em <http://www.arquivoestado.sp.gov.br/site/ acervo/repositorio_digital/jornais_revistas>. Acesso em: 10 mar. 2017. CARNAVAL de rua de SP terá 391 blocos com desfiles em várias regiões. Prefeitura de São Paulo, São Paulo, 13 fev. 2017. Disponível em <http://capital.sp.gov.br/noticia/carnaval-de-rua-de-sp-tera-391-blocos-com-desfiles-em-varias-regioes>. Acesso em: 10 mar. 2017. CCBB COMPILA a folia de Plínio Marcos. Folha de São Paulo, São Paulo, 18 jan. 2005. Disponível em <http://www1.folha.uol. com.br/fsp/acontece/ac1801200501.htm>. Acesso em: 10 mar. 93


2017. CISNEIROS, Leonardo. Empatando Tua Vista: humor e irreverência para criticar a verticalização excessiva nas cidades. Direitos Urbanos, Recife, 27 fev. 2014. Disponível em <https:// direitosurbanos.wordpress.com/2014/02/27/empatando-tua-vista-humor-e-irreverencia-para-criticar-a-verticalizacao-excessiva-nas-cidades/>. Acesso em: 10 mar. 2017. COUTINHO, Katherine. Bloco, troça, urso, maracatu... Saiba quem é quem no carnaval de PE. O Globo, Recife, 8 jan. 2012. Disponível em <http://g1.globo.com/pernambuco/carnaval/2012/noticia/2012/01/bloco-troca-urso-maracatu-saiba-quem-e-quem-no-carnaval-de-pe.html>. Acesso em: 10 mar. 2017. DECRETO que disciplina o Carnaval de Rua de São Paulo. Prefeitura de São Paulo, São Paulo, 7 dez. 2015. Disponível em <http://carnavalderua.prefeitura.sp.gov.br/decreto-que-disciplina-o-carnaval-de-rua-de-sao-paulo/>. Acesso em: 10 mar. 2017. É A BRIGA, a escola nasce. O Estado de São Paulo, São Paulo, p. 9, 24 fev. 1968. Disponível em <http://acervo.estadao.com.br/ pagina/#!/19680224-28489-nac-0009-999-9-not>. Acesso em: 10 mar. 2017. FERREIRA, Juca. Juca Ferreira: Carnaval de rua é festa da cidadania. Revista Fórum, São Paulo, 23 fev. 2017. Disponível em <http://www.revistaforum.com.br/2017/02/23/juca-ferreira-carnaval-de-rua-e-festa-da-cidadania/>. Acesso em: 10 mar. 2017. INTEGRANTES de troça do Recife denunciam apreensão de fantasias que criticavam governo e prefeitura. O Globo, Recife, 25 fev. 2017. Disponível em <http://g1.globo.com/pernambuco/ carnaval/2017/noticia/integrantes-de-troca-do-recife-denunciam-apreensao-de-fantasias-que-criticavam-governo-e-prefeitura.ghtml>. Acesso em: 10 mar. 2017. LONGO, Ivan. Blocos de Carnaval de SP saem às ruas contra o golpe e pela democracia. Revista Fórum, São Paulo, 8 abr. 2016. Disponível em <http://www.revistaforum.com.br/2016/04/08/ 94


blocos-de-carnaval-de-sp-saem-as-ruas-contra-o-golpe-e-pela-democracia/>. Acesso em: 10 mar. 2017. NASCIMENTO, Nadine. Mais de 70 blocos protestam no carnaval de São Paulo. Brasil de Fato, São Paulo, 25 fev. 2017. Disponível em <https://www.brasildefato.com.br/2017/02/25/ mais-de-70-blocos-protestam-no-carnaval-de-sao-paulo/>. Acesso em: 10 mar. 2017. O ESTANDARTE dos ‘invisíveis’: os moradores de rua também tem voz no carnaval. Mídia Ninja, São Paulo, 28 fev. 2017. Disponível em <https://ninja.oximity.com/article/O-estandarte-dos-invis%C3%ADveis-os-mo-1>. Acesso em: 10 mar. 2017. PEREIRA, Néli. Carnaval de rua é exemplo de ‘crise do conceito de cidadania’, diz secretário de SP. BBC Brasil, São Paulo, 8 fev. 2017. Disponível em <http://www.bbc.com/portuguese/ brasil-38901586>. Acesso em: 10 mar. 2017. PESQUISA aponta aumento de turistas em SP durante carnaval. O Globo, São Paulo, 28 fev. 2017. Disponível em <http://g1. globo.com/sao-paulo/carnaval/2017/noticia/pesquisa-aponta-aumento-de-turistas-em-sp-durante-carnaval.ghtml>. Acesso em: 10 mar. 2017. PITOMBO, João Pedro. Desfilando sem pagar, ‘folião pipoca’ ganha espaço no Carnaval da Bahia. Folha de São Paulo, Salvador, 27 fev. 2017. Disponível em <http://www1.folha.uol.com. br/cotidiano/2017/02/1862253-desfilando-sem-pagar-foliao-pipoca-ganha-espaco-no-carnaval-da-bahia.shtml>. Acesso em: 10 mar. 2017. PM DISPERSA foliões com bombas de gás na Praça Roosevelt, no Centro de SP. O Globo, São Paulo, 1° mar. 2017. Disponível em <http://g1.globo.com/sao-paulo/carnaval/2017/noticia/pm-dispersa-folioes-com-bombas-de-gas-na-praca-roosevelt-no-centro-de-sp.ghtml>. Acesso em: 10 mar. 2017. PREFEITURA institui oficialmente Programa Ruas Abertas. Prefeitura de São Paulo, São Paulo, 29 dez. 2016. Disponível em <http://capital.sp.gov.br/noticia/prefeitura-institui-oficialmente-programa-ruas-abertas>. Acesso em: 10 mar. 2017. 95


PREFEITURA oficializará o Carnaval. O Estado de São Paulo, São Paulo, p. 12, 18 nov. 1967. Disponível em <http://acervo. estadao.com.br/pagina/#!/19671118-28405-nac-0012-999-12not>. Acesso em: 10 mar. 2017. ROLNIK, Raquel. São Paulo: do trabalho para a folia. Jornal da USP, São Paulo, 23 fev. 2017. Disponível em <http://jornal.usp. br/atualidades/sao-paulo-do-trabalho-para-a-folia/>. Acesso em: 10 mar. 2017. _________. Carnavalizar as ruas de São Paulo. Blog da Raquel Rolnik, São Paulo, 27 fev. 2014. Disponível em <https://raquelrolnik.wordpress.com/2014/02/27/carnavalizar-as-ruas-de-sao-paulo/>. Acesso em: 10 mar. 2017. SACONI, Rose. O corso de carnaval da Paulista. O Estado de São Paulo, São Paulo, 13 fev. 2015. Disponível em <http://acervo. estadao.com.br/noticias/acervo,o-corso-de-carnaval-da-paulista,10767,0.htm>. Acesso em: 10 mar. 2017. ‘SAIU do nosso controle’, diz secretário sobre pré-carnaval em Pinheiros. O Estado de São Paulo, São Paulo, 20 fev. 2017. Disponível em <http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,a-situacao-saiu-do-nosso-controle-diz-secretario-de-doria-sobre-pre-carnaval-em-pinheiros,70001672177>. Acesso em: 10 mar. 2017. SEM dono. Folha de São Paulo, São Paulo, 17 fev. 2012. Disponível em <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/26403-sem-dono.shtml>. Acesso em: 10 mar. 2017. SOARES, Jussara. Vista aérea mostra extensão do Carnaval de Rua de São Paulo neste 2017. Uol, 8 mar. 2017. Disponível em <https://carnaval.uol.com.br/2017/noticias/redacao/2017/03/08/ vista-aerea-mostra-extensao-do-carnaval-de-rua-de-sao-paulo-neste-2017.htm>. Acesso em: 10 mar. 2017. _________. Com batucada, blocos evitam votação de lei que limita Carnaval de Rua. Uol, 13 dez. 2016. Disponível em <https://entretenimento.uol.com.br/noticias/redacao/2016/12/13/ com-batucada-blocos-evitam-votacao-de-lei-que-limita-carnaval-de-rua.htm> SOARES, Rodrigo. Carnaval 2017 de São Paulo terá corte 96


LGBT : ‘O samba é muito inclusivo’. O Globo, São Paulo, 13 jan. 2017. Disponível em <http://ego.globo.com/carnaval/2017/noticia/2017/01/carnaval-2017-de-sao-paulo-tera-corte-lgbt-o-samba-e-muito-inclusivo.html>. Acesso em: 10 mar. 2017.

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documentos jurídicos

BRASIL. Lei n° 10.257, de 10 de julho de 2001. Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 10 jul. 2001. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10257.htm>. Acesso em: 10 mar. 2017. SÃO PAULO (Cidade). Decreto nº 54.815, de 5 de fevereiro de 2014. Disciplina o Carnaval de Rua da Cidade de São Paulo. Diário Oficial da Cidade de São Paulo, São Paulo, 6 fev. 2014. Disponível em <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/upload/decreto54815_1391712846.pdf>. Acesso em: 10 mar. 2017. SÃO PAULO (Cidade). Decreto nº 56.690, de 7 de dezembro de 2015. Disciplina o Carnaval de Rua da Cidade de São Paulo. Diário Oficial da Cidade de São Paulo, São Paulo, 8 dez. 2015. Disponível em <http://www.docidadesp.imprensaoficial.com.br/NavegaEdicao.aspx?ClipId=5KK2US7CU2MFEeEIM9GE9FDVL8A>. Acesso em: 10 mar. 2017. SÃO PAULO (Cidade). Lei n° 13.430, de 13 de set de 2002. Plano Diretor Estratégico. Diário Oficial da Cidade de São Paulo, São Paulo, 13 set. 2002. Disponível em <http://www.prefeitura.sp. gov.br/cidade/secretarias/upload/infraestrutura/sp_obras/ arquivos/plano_diretor_estrategico.pdf>. Acesso em: 10 mar. 2017. SÃO PAULO (Cidade). Lei n° 16.050, de 31 de julho de 2014. Aprova a Política de Desenvolvimento Urbano e o Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo e revoga a Lei nº 13.430/2002. Diário Oficial da Cidade de São Paulo, São Paulo, 31 jul. 2014. Disponível em <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/chamadas/2014-07-31_-_lei_16050_-_ plano_diretor_estratgico_1428507821.pdf>. Acesso em: 10 mar. 2017. 98


SÃO PAULO (Cidade). Proposta de emenda modificativa ao Projeto de Lei n° 279/2016, de iniciativa do vereador Aurélio Nomura que dispoõe sobre as diretrizes para o Carnaval de Rua no Município de São Paulo e dá outras providências. Diário Oficial da Cidade de São Paulo, São Paulo, 5 jan. 2017. Disponível em <http://documentacao.camara.sp.gov.br/iah/fulltext/emenda/ EPL0279-2016.pdf>. Acesso em: 10 mar. 2017.

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filmes

BATUQUE PAULISTA: A TRAJETÓRIA DO SAMBA DE SÃO PAULO, DO RURAL AO URBANO (Ducomentátio). Direção: Thais Lopes e Lucas Pena. Produção: Naara Filmes. São Paulo: Naara Filmes e Faculdade Cásper Líbero, 2016. SAMBA À PAULISTA: FRAGMENTOS DE UMA HISTÓRIA ESQUECIDA. Direção: Gustavo Mello. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2007. Online. Parte 1 disponível em: <www.youtube.com/watch?v=KD1gx9xxVD8&t=887s>. Parte 2 disponível em: <www.youtube.com/watch?v=JS7aTo6G8KI>. Parte 3 disponívem em: <www.youtube.com/watch?v=c1lNz8Y9dhs>. Acesso em: 10 mar. 2017.

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websites

Carnaval de Rua <www.carnavalderua.prefeitura.sp.gov.br>. Gestão Urbana <www.gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/>. Michaelis Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa <www. michaelis.uol.com.br>. Secretaria Municial de Cultura (SMC) <www.prefeitura.sp. gov.br/cidade/secretarias/cultura/>. SP turismo – Observatório do turismo <www.observatoriodoturismo.com.br>.

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caderno II: fontes citações

“o reino da liberdade e do essencialmente humano”. DAMATTA, Roberto. Carnavais, malandros e heróis: para uma sociologia do dilema brasileiro. Rio de Janeiro: Rocco, 1997. p. 18. “um povo que não ama e não preserva suas formas de expressão mais autênticas jamais será um povo livre”. MARCOS, Plínio. In: Plínio Marcos: Em Prosa e Samba com Geraldo Filme, Zeca da Casa Verde e Toniquinho Batuqueiro. [s.i.]: Warner, 2012. 1 CD. “o tempo é a possibilidade de festa”. ROCHA, Francisco. In: SAMBA À PAULISTA: FRAGMENTOS DE UMA HISTÓRIA ESQUECIDA. Direção: Gustavo Mello. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2007. Online. Parte 1 disponível em: <www.youtube.com/watch?v=KD1gx9xxVD8&t=887s>. Parte 2 disponível em: <www.youtube.com/watch?v=JS7aTo6G8KI>. Parte 3 disponívem em: <www.youtube.com/watch?v=c1lNz8Y9dhs>. Acesso em: 10 mar. 2017. “os eventos dissolvem as coisas, eles dissolvem as identidades propondo-nos outras” SANTOS, Milton. A natureza do espaço. São Paulo: EDUSP, 1996. p. 146. “o espaço é a ordem das coexistências possíveis” SANTOS, Milton. A natureza do espaço. São Paulo: EDUSP, 1996. p. 159. ilustração:

MAPPIN STORES. [s.d.]

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jornais/revistas:

CARNAVAL: alugam-se janellas... O Estado de São Paulo, São Paulo, 1906. Disponível em <http://acervo.estadao.com.br/ noticias/acervo,alugar-janela-era-negocio-no-carnaval-de-sp,8888,0.htm>. Acesso em: 10 mar. 2017. É TÃO triste essa fantasia. O Estado de São Paulo, São Paulo, p. 9, 24 fev. 1968. Disponível em <http://acervo.estadao.com.br/ pagina/#!/19680224-28489-nac-0009-999-9-not/busca/t%C3%A3o+triste+fantasia>. Acesso em: 10 mar. 2017. FANTASIADOS de chuva: a fantasia mais commum do Carnaval Paulista. A Lua, São Paulo, ano 1, n. 4, fev. 1910. Disponível em <http://200.144.6.120/uploads/acervo/periodicos/revistas/LUA19100204.pdf>. Acesso em: 10 mar. 2017. MOMO já reina no Brasil inteiro. O Estado de São Paulo, São Paulo, p. 10, 24 fev. 1968. Disponível em <http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/19680224-28489-nac-0010-999-10not>. Acesso em: 10 mar. 2017. TEATRO de S. Paulo. O Correio Paulistano, 20 fev. 1857. Disponível em <https://saopaulopassado.wordpress.com/category/sem-categoria/page/8/>. Acesso em: 10 mar. 2017. ORA, a vida é tudo isto.... A Lua, São Paulo, ano 1, n. 4, fev. 1910. Disponível em <http://200.144.6.120/uploads/acervo/ periodicos/revistas/LUA19100204.pdf>. Acesso em: 10 mar. 2017. PREFEITURA oficializará o Carnaval. O Estado de São Paulo, São Paulo, p. 12, 18 nov. 1967. Disponível em <http://acervo. estadao.com.br/pagina/#!/19671118-28405-nac-0012-99912-not>. Acesso em: 10 mar. 2017. VIVA a folia. A Lua, São Paulo, ano 1, n. 4, fev. 1910. Disponível em <http://200.144.6.120/uploads/acervo/periodicos/revistas/LUA19100204.pdf>. Acesso em: 10 mar. 2017. 104


fotos:

ARQUIVO/AGÊNCIA ESTADO. Desfile da Escola de Samba Vai-Vai em São Paulo, 23 de fevereiro de 1966. In: CARNAVAIS de antigamente. Ig, 4 mar. 2011. Disponível em <http://especiais.ig.com.br/zoom/carnavais-de-antigamente/>. Acesso em: 10 mar. 2017. COIMBRA, Bia. Carnaval. 1 fotografia, publicada online em 25 fev. 2017. Disponível em <https://www.instagram.com/p/ BQ8yG0wgwVg/?taken-by=biarccoimbra>. Acesso em: 10 mar. 2017. SIMSON, Olga Rodrigues de Moraes Von. Carnaval em Branco e Negro: Carnaval Popular Paulistano: 1914-1988. Campinas: Editora da Unicamp; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2007. p. 265, 299, 308, 354, 366, 367. músicas:

Bloco Me Ocupa Que Sou da Rua. Marchinha de Carnaval 2015. Disponível em <https://goo.gl/tUisiy>. Acesso em: 10 mar. 2017. BLOTA, Geraldo; VIEIRA, Mário. Lata de Graxa. In: MATHIAS, Germano. Em continência ao samba. [s.i.]: RGE, 1958. 1 disco sonoro. Lado A, faixa 3. BRITO, J.; BUJÃO; FRANCO. Festa profana. Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=7FeAPD47-2c>. Acesso em: 10 mar. 2017. DALASAM, Rico. Todo dia. In: VITTAR, Pabllo. Vai passar mal. [s.i.]: BMT Produções Artisticas, 2007. 1 CD. Faixa 6. FILME, Geraldo. Silêncio no Bixiga. In: Plínio Marcos: Em Prosa 105


e Samba com Geraldo Filme, Zeca da Casa Verde e Toniquinho Batuqueiro. [s.i.]: Warner, 2012. 1 CD. Faixa 4. FILME, Geraldo. Vou Sambar n’Outro Lugar (Terreiro da Escola). In: Plínio Marcos: Em Prosa e Samba com Geraldo Filme, Zeca da Casa Verde e Toniquinho Batuqueiro. [s.i.]: Warner, 2012. 1 CD. Faixa 2. GONZAGA, Chiquinha. Ó abre alas. Disponível em <https:// www.youtube.com/watch?v=m_vaRKqCDYM>. Acesso em: 10 mar. 2017. LYRA, Carlos; MORAES, Vinicius de. Marcha da quarta-feira de cinzas. Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=Y88EguvjlVM>. Acesso em: 10 mar. 2017. SAMPAIO, Sérgio. Eu quero é botar meu bloco na rua. In: SAMPAIO, Sérgio. Eu quero é botar meu bloco na rua. [s.i.]: Philips, 1973. 1 disco sonoro. Lado B, faixa 5. VELOSO, Caetano. Deus e o Diabo. In: VELOSO, Caetano Veloso. Muitos Carnavais. [s.i.]: Philips, 1977. 1 disco sonoro. Lado A, faixa 4.

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glossário

arrastão: Quando associada às festividades de Carnaval, a palavra arrastão pode se referir a um grupo pouco ordenado de pessoas em festa que percorre ruas atraindo, ou arrastando, mais pessoas para a celebração. baile: Segundo Luís da Câmara Cascudo, baile é sinônimo de dança, ou “reunião de danças. O baile popular compreende-se sambas, cocos, sapateados. O baile paulista, mineiro e do Rio Grande do Sul era o fandango, com suas incontáveis partes. O baile da classe média era o das danças europeias: valsas, polcas, xotes, quadrilhas, rumbas, congas, swings, jitterbugs etc. Para o povo, era difícil definir o baile, idêntico à batucada, ao assustado (se for improvisado), ao forrobodó, ao arrasta-pé” (CASCUDO, 2001: 42). banda marcial: Segundo o Michaelis Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, banda marcial é uma “banda militar formada por instrumentos de sopro (de metal e de madeira) e de percussão”(BANDA MARCIAL, 2017). batucada: De acordo com Cascudo, batucada é um “baile popular, com instrumentos de percussão, palmas, canto uníssono, com ou sem refrão, trejeiteando os participantes em gesticulação improvisada. A coreografia da batucada é a dispersão da dança em roda inicial, origem de todos os movimentos [...]” (CASCUDO, 2001: 58, 59). batuque: Segundo Cascudo, é uma “denominação genérica, dada pelos portugueses, a toda dança de negros na África” (CASCUDO, 2001: 59). Pode ainda se significar “casa de culto africano (candomblé ou macumba) no Rio Grande do Sul” e “luta popular de origem africana, também conhecida como batuque-boi, uma modalidade de capoeira muito praticada nos municípios baianos” (CASCUDO, 2001: 59). 107


bloco de carnaval: Atualmente a palavra bloco é usada como uma denominação genérica para se referir a organizações carnavalescas. Como apontam as pesquisadoras Flávia Magalhães Barroso e Juliana Gonçalves, os blocos de rua no século XX podem ser divididos em particularidades: bloco de enredo – com samba próprio se apresentam nos bairros onde foram criados; bloco de embalo – buscam “embalar quem estiver na rua”, de modo que não apresentam organização interna e não estão necessariamente ligados a um espaço específico; bloco sujos – fomentam a total inversão das ordens sociais (BARROSO; GONÇALVES, 2016: 5, 6). Caiapó: Segundo Cascudo, Caiapó ou Caiapô é um “folguedo de influência indígena encontrado em vários estados brasileiros: São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Goiás” (CASCUDO, 2001: 96). É uma coreografia sem diálogos no formato de cortejo pelas ruas da cidade apresentada “especialmente no Carnaval e nas festas dos santos padroeiros de devoção popular” (CASCUDO, 2001: 96). A dramatização descrita por Cascudo, porém, apresenta diferenças em relação à descrição da antropóloga Olga Rodrigues de Moraes von Simson ao se referir a essa manifestação na cidade de São Paulo nos séculos XIX e XX. Cascudo coloca que a coreografia “representa o rapto de uma bugrinha durante a colonização portuguesa” (CASCUDO, 2001: 96). Já nos estudos de Simson, ela representa a “morte do curumim, o pequeno filho do cacique, atingido pelo branco invasor”, que em seguida era ressuscitado pelo pajé (SIMSON, 2008: 42). Segundo Simson, era possível encontrar essa manifestação na cidade de São Paulo até 1910. capoeira: De acordo com Cascudo, com origens remotas angolanas, a capoeira era inicialmente uma luta praticada por negros em defesa da liberdade. Com o tempo – e, principalmente, com as novas condições sociais dos negros após a Abolição –, tornou-se um jogo que atualmente possui numerosos estilos (CASCUDO, 2001: 111, 112). A capoeira se caracteriza sobretudo por uma por uma roda de pessoas com dois capoeiristas no centro, diante de uma orquestra. 108


charanga: Charanga é um grupo musical composto principalmente de instrumentos de sopro. cordão: De acordo com Cascudo, cordão é um grupo de pessoas fantasiadas e/ou mascaradas que cantam e dançam conduzidos por um mestre durante o Carnaval ou em algumas festas tradicionais religiosas, como São João. Segundo Cascudo, a forma primitiva do corão “seria o desfile um a um, numa corda que aumentava e diminuía, segundo a cadência ou animação coreográfica. Não há gênero musical ou dança típica para os cordões. Cantam e dançam como desejam” (CASCUDO, 2001: 157). corso: O corso carnavalesco ou corso de Carnaval é uma manifestação de origem europeia em que pessoas fantasiadas desfilam em carros ornamentados, jogando entre si confetes e serpentinas. Foi muito popular no Brasil no início do século XX. cortejo: Cortejo é sinônimo de desfile. Significa também cumprimento ou saudação. É uma palavra muito usada para se referir aos desfiles carnavalescos na rua. cururu: Segundo o Michaelis Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, a origem etimológica de cururu é a palavra tupi kururú. No estado de São Paulo, é usada para se referir a um “repente ou desafio em que os cantadores improvisam ao som de violas, com temas sociais, políticos ou religiosos, que ocorre, principalmente, na região do médio Tietê; caruru” (CURURU, 2017). Nos estados de Goiás, Mato Grosso e São Paulo, alude também a uma “dança de roda, embalada por músicos e cantos de desafios, geralmente com temas religiosos” (CURURU, 2017). desafio: De acordo com o Michaelis Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, desafio é uma “disputa poética cantada em forma de diálogo, geralmente improvisado” (DESAFIO, 2017). entrudo: Entrudo é uma manifestação carnavalesca típica de Portugal que se tornou muito popular no Brasil durante o sé109


culo XIX. Por vezes, essa palavra foi usada como sinônimo de Carnaval. No entrudo, as pessoas a brincar se jogavam água, farinha, polvilho, limão de cheiro (uma bola de cera com água ou água perfumada dentro), etc. De acordo com o pesquisador Felipe Ferreira, predominavam dois tipos básicos dentre as variações dessa manifestação: “um que acontecia dentro das casas e entre amigos [...] e outro que tomava conta das ruas, envolvendo basicamente a população mais pobre e os escravos” (FERREIRA, 2004: 81). Segundo a socióloga Maria Isaura Pereira de Queiroz, a prática dessa manifestação no Brasil é citada já em documentos de 1605 (QUEIROZ, 1999: 12). O entrudo foi sucessivamente reprimido e proibido por ser considerado violenta e grosseiro, principalmente depois da Proclamação da República em 1889. Porém, só perdeu força no século XX. escola de samba: As escolas de samba surgiram no Rio de Janeiro como uma agremiação carnavalesca e são uma expressiva manifestação brasileira que promove o canto e dança do samba. A maioria das escolas de samba desenvolve anualmente um enredo e um samba-enredo para o desfile o Carnaval, muitas vezes com intuito competitivo. Esse desfile é carregado de alegorias e é caracterizado pelo samba-enredo, bateria, carros alegóricos e danças sincronizadas com aspecto cênico e teatral divididas em diferentes alas. As principais escolas de samba e, consequentemente, as principais competições entre escolas, se dão nas cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo, com apresentações majestosas e suntuosas. Grande parte das escolas possui a expressão “Grêmio Recreativo Escola de Samba” (GRES) antes de seu nome, por exemplo, G.R.E.S. União da Ilha do Governador. Há também variações dessa expressão, como “Grêmio Recreativo Cultural e Escola de Samba” (GRCES) ou “Grêmio Recreativo Cultural Social e Escola de Samba” (GRCSES). folguedo popular: Segundo Cascudo, folguedo popular é uma manifestação folclórica que têm seguintes características: letra, música, coreografia e temática. (CASCUDO, 2001: 241). 110


frevo: Frevo é um manifestação típica do Carnaval pernambucano. Segundo Cascudo, é uma “marcha de ritmo sincopado, obsedante, violento e frenético, [...] [em que] a multidão ondulando, nos maneios da dança, fica a ferver. E foi dessa ideia de fervura (o povo pronuncia frevura, frever) que se criou o nome frevo” (CASCUDO, 2001: 251). Ainda segundo Cascudo, é também uma dança não de grupo, mas de multidão, com raros gestos iguais. Acontece prioritariamente na rua, mas também pode ser encontrado em salão. De acordo com a matéria Bloco, troça, urso, maracatu... Saiba quem é quem no carnaval de PE, publicada em 2012 pelo jornal O Globo, um clube de frevo é uma manifestação festiva de trabalhadores urbanos, grupos de pessoas com geralmente a mesma profissão. “Cada clube costuma ter o seu próprio repertório, levando para a avenida uma orquestra composta por saxofones, clarinetes, pistões, trombones, tubas, taróis, surdos e bombardinos. A música é sempre o tradicional frevo de rua. Os clubes se apresentam, geralmente, com faixa ou abre-alas, diretoria, balizas-puxantes, damas-de-frente, destaques, cordões, porta-estandarte vestidos à Luiz XV, passistas, orquestra e, em alguns casos, carros alegóricos” (COUTINHO, 2012). jongo: Segundo o Michaelis Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, jongo é uma “dança de roda de origem africana, realizada em sentido anti-horário, em que a parte cantada tem papel muito importante e que é acompanhada por atabaques, puítas, cuícas, guaiás e chocalhos; o canto, em que se realiza uma espécie de desafio versificado, segue o modelo de estrofe e refrão, e a dança tem a função rítmica de orientar e facilitar os movimentos; caxambu, corimá, tambu” (JONGO, 2017). Cascudo observa que é comum nas danças africanas o sentido anti-horário, o sentido lunar (CASCUDO, 2001: 308). maracatu: Maracatu é uma manifestação popular com forte influência africana composta de música e dança próprias encontrada principalmente em Pernambuco, nos municípios de Recife e Igarassu. A mais importante apresentação dos grupos de maracatu ocorre durante o Carnaval. Há duas vertentes de maracatu: o maracatu de baque virado – “ligados às 111


religiões afro-brasileiras, em especial o Candomblé e a Jurema, os grupos de maracatu nação mais “tradicionais” têm estreitas relações com os orixás e outras entidades”; e maracatu de baque solto – conhecido também como maracatu rural, “tem uma grande ligação com as culturas afro-indígenas. O maracatu de baque solto traz uma fusão de vários folguedos populares existentes no interior de Pernambuco, como reisado, pastoril, cavalo-marinho, bumba-meu-boi e caboclinhos” (COUTINHO, 2012). marcha-rancho: Segundo o Michaelis Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, marcha-rancho é um “ritmo carnavalesco, de andamento lento” (MARCHA-RANCHO, 2017). marchinha: De acordo com o Michaelis Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, marchinha é “música de carnaval, de ritmo vivo e alegre, que se iniciou com os ranchos de carnaval; marcha” (MARCHINHA, 2017). pasquim: Nas palavras de Cascudo, pasquim é um “impresso ou manuscrito que circula sorrateiramente entre as populações com o objetivo de crítica, denúncia, protesto. É produção popular em prosa ou verso, às vezes com comentários jocosos, outras com conteúdo lírico ou narrativo, confundindo-se com as modas de viola. Na região de São Sebastião e Ilhabela, no estado de São Paulo, o pasquim é uma forma literária que se difunde em folhas de papel de formato variado, contendo, principalmente, críticas de natureza política e social. Reflete a opinião popular sobre determinados acontecimentos, sem que haja uma autoria definida.” (CASCUDO, 2001: 486, 487). pernada: Segundo Cascudo, pernada é um “jogo ginástico, brincadeira de agilidade, entre valentões, malandros” (CASCUDO, 2001: 511). É uma “forma complementar da capoeira” que requer grande esforço para ficar de pé, visto que o objetivo do jogo é justamente derrubar o adversário (CARNEIRO apud CASCUDO, 2001: 511). O jogo assumiu o nome pernada no Rio de Janeiro. Na Bahia ele é chamado de batuque-boi ou banda. rancho: De acordo com Cascudo, da “Bahia para o Sul é um 112


grupo de festeiros das solenidades populares no Natal, cantando e dançando, tendo ou não vestuário uniforme” (CASCUDO, 2001: 569). Ainda segundo Cascudo, o rancho, que pode ser também chamado de reisado, divide-se em duas categorias: “o terno, que é o Rancho mais sério e mais aristocrático, e o rancho propriamente dito, que é mais pândego e democrático...” (CASCUDO, 2001: 570). Cascudo diz ainda que nos Ranchos, além de pastoras, “havia balizas, porta-machados, porta-bandeiras, mestres-salas e ainda uma ou duas personagens, que lutavam com a figura principal, dando nome ao Rancho” (CASCUDO, 2001: 570). Nas palavras do autor: “durante o Carnaval no Brasil, no Rio de Janeiro preferencialmente, os Ranchos apareciam como grupos de foliões, com instrumentos de corda e sopro, cantando em coro versos musicados e alusivos ao grupo, a marcha do Rancho ou mesmo os mais populares na ocasião. Tiveram o nome de cordões, mas o de Rancho prevaleceu. [...] O diminutivo popular do Rancho era o bloco, Rancho pequeno, não de agrupação fortuita de foliões, mas com solfas ensaiadas, estandarte e alguns até mesmo com intenções de crítica social ou política” (CASCUDO, 2001: 570). samba: Segundo Cascudo, samba é um “nome angolano que teve sua ampliação e vulgarização no Brasil, consagrando-se na primeira década do século XIX. [...] O nome, entretanto, teve vulgarização lenta, e apenas em 1916 apareceu a primeira música impressa [...]. O samba possui atualmente uma grande variedade de tipos e de formas, rurais e urbanas [...]” (CASCUDO, 2001: 614). Ainda segundo Cascudo, a palavra samba pode se referir a “1) Baile popular urbano e rural, sinônimo de pagode, função, fobó, arrasta-pé, balança-flandre, forrobodó, fungangá. 2) Gênero de música popular em todo o Brasil. 3) Dança de roda, inicialmente o mesmo batuque, dançado, como elemento citadino, com par enlaçado” (CASCUDO, 2001: 614). samba de roda: Samba de roda é uma variante do samba, composto por música e dança próprias. Tradicional do estado da Bahia, é praticado principalmente na região do Recôncavo 113


baiano. Associa-se à capoeira e ao culto dos orixás. samba-enredo: Samba-enredo é uma variante do samba surgido no Rio de Janeiro. É uma canção feita especificamente para o desfile de uma escola de samba em um determinado ano. Caracteriza-se por apresentar temas históricos, sociais ou culturais que retratam o enredo escolhido para o desfile daquele ano. samba-lenço: Nas palavras de Cascudo, samba-lenço é uma “dança introduzida pelos negros africanos, ainda encontrada na capital paulista. Os homens vestem calças largas; as mulheres, saias rodadas coloridas, brincos e muitos colares, fazendo girar um lenço branco, que seguram o tempo todo como um complemento da dança. As melodias são simples, com versos improvisados ou tradicionais. Embora na maioria das vezes, as letras tenham caráter popular, os grupos cantam e dançam em louvor a São Benedito. Seus instrumentos musicais, que os próprios dançadores tocam, são o zabumba, o guaiá (um tipo de chocalho), o reco-reco feito de bambu e o caracaxá, feito de pinho, de formato retangular, com abertura em uma das extremidades.” (CASCUDO, 2001: 615). tambu: Segundo Cascudo, tambu é um instrumento de percussão presente nos batuques e jongos paulistas: um tronco oco de árvore com aproximadamente um metro de comprimento e com formado levemente afunilado, sendo que a mais larga extremidade tem de 35 a 40 centímetros de diâmetro, onde se prende um couro de boi esticado (CASCUDO, 2001: 664). Ainda segundo Cascudo, o tocador candongueiro o amarra ao corpo com uma corda, modo que “difere da demais vistas de jongo de Cunha, no batuque de Tietê, onde os tocadores de tambu sentam-se sobre ele com as pernas abertas, para tocar” (ARAÚJO apud CASCUDO, 2001: 664). O instrumento tambu pode ser chamado também de caxambu, e ainda, no estado do Rio de Janeiro, de gongaia ou cambin, gazumba e mirangueiro (CASCUDO, 2001: 665). Além de instrumento, tambu é o nome da própria dança. tiririca: Segundo o álbum Plínio Marcos: Em Prosa e Samba 114


com Geraldo Filme, Zeca da Casa Verde e Toniquinho Batuqueiro (1974), tiririca é um jogo semelhante à capoeira e à pernada, em que se objetiva derrubar o adversário. trio elétrico: Trio elétrico é um palco móvel com um de sistema de som de grande alcance, normalmente sobre um caminhão adaptado. troça: As troças carnavalescas são manifestações comuns no nordeste brasileiro, principalmente em Recife e em Olinda. Segundo a matéria Bloco, troça, urso, maracatu... Saiba quem é quem no carnaval de PE publicada em 2012 pelo jornal O Globo, as troças são originalmente pequenas agremiações marcadas pela irreverência, a descontração e o improviso. “A palavra “troça” vem do verbo “troçar” que significa “ridicularizar”, “escarnecer”, “zombar de”. O surgimento de uma troça está quase sempre ligado a uma história pitoresca, uma brincadeira nascida de uma reunião entre amigos” (COUTINHO, 2012). Muitas vezes o termo “mista” aparece no nome da troça indicando que o grupo é formado por homens e mulheres, por exemplo, TCM (Troça Carnavalesca Mista) Cachorro do Homem do Miúdo. “Na rua, a organização de uma troça no momento de sua apresentação obedece à seguinte seqüência: a diretoria, seguindo-se da comissão de frente, cordões, damas, passistas, fantasias de destaques, porta-estandarte e uma orquestra de metais, que encerra o desfile” (COUTINHO, 2012). umbigada: De origem banta, umbigada é o ato de bater com os umbigos nas danças, indicando geralmente a substituição de um dançarino por outro nas danças de roda. Cascudo observa que a umbigada aparece também “como uma constante, usada por todos os componentes no decurso da dança e não apenas para o convite à substituição. Nesse caso está o batuque paulista, que não é de roda, mas em filas paralelas, as umbigadas são sucessivas” (CASCUDO, 2001: 709). zabumba: Zabumba é um instrumento de madeira também conhecido como bombo, uma espécie de tambor com membrana nos dois lados e tocado na vertical (ZABUMBA, 2017). É 115


comum no sambas, batuques e maracatus. Terno de zabumba é uma manifestação popular encontrada majoritariamente no nordeste: um conjunto musical popular formado principalmente por instrumentos de percussão e de sopro, que acompanha uma dança.

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