Núcleo Técnico de Operações Urbanas estudos 2007-2010

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Núcleo Técnico de Operações Urbanas: estudos 2007 - 2010


Zeca Brandão Organizador

N964

Núcleo Técnico de Operações Urbanas : estudos 2007-2010 / Zeca Brandão (organizador) ; coordenação executiva Cláudio Cruz e Carolina Brasileiro ; design gráfico Cláudio Cruz e Rafaela Liberal. –Recife : CEPE, 2012. 183p. : il.

Inclui anexos.

1. Desenvolvimento Urbano – Pernambuco. 2. Urbanismo – Recife (PE). 3. Urbanismo – Olinda (PE). 4. Urbanismo – São Lourenço da Mata (PE). 5. Brandão Neto, José de Souza, 1957 – Entrevista. I. Brandão Neto, José de Souza, 1957-. II. Cruz, Cláudio. III. Brasileiro, Carolina. IV. Liberal, Rafaela.

PeR – BPE 12-0438 ISBN: 978-85-7858-111-4

CDU 711.4 CDD 711.4

Núcleo Técnico de Operações Urbanas: estudos 2007 - 2010


Sumรกrio

1. Capitania

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2. Memorial Arcoverde

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3. Centro Administrativo

73

4. Porto

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5. Copa

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Apresentação

Apresentação

O Governo do Estado de Pernambuco tem planejado ações estruturadoras em todo o seu território, mas considerando que na atualidade mais de 80% da população pernambucana reside nas cidades, especial atenção passou a ser dada às questões urbanas. Este foco nas cidades está em sintonia com as conquistas nacionais iniciadas com a inserção da questão urbana na Constituição Federal, em 1988, e com o Estatuto da Cidade, de 2001. Neste sentido, é de especial importância a atuação da Secretaria de Planejamento e Gestão – SEPLAG responsável por planejar, desenvolver ações e executar as políticas do governo relativas ao desenvolvimento urbano. No período de 2007 a 2010, a SEPLAG investiu na melhoria da estrutura das cidades pernambucanas, principalmente para adequação aos grandes eventos que o País deverá receber como a Copa do Mundo FIFA 2014. Além disso, as ações deste Governo têm se pautado em dar suporte ao vigoroso desenvolvimento econômico dos últimos anos que se deseja sustentável para as nossas cidades e os nossos cidadãos. Este livro revela parte da contribuição da SEPLAG, por intermédio do trabalho realizado no Núcleo Técnico de Operações Urbanas, no enfrentamento das urgentes questões urbanas. Ele expõe a amplitude da atenção do governo estadual no complexo universo das ações administrativas que influenciam positivamente a vida da população pernambucana.

A Secretaria de Planejamento e Gestão (SEPLAG) tem por finalidade e competência planejar, desenvolver e acompanhar ações que visem ao desenvolvimento territorial, econômico e social do Estado de Pernambuco. Desta forma, reconhece a relevância do protagonismo do poder público no processo de planejamento urbano e controle do desenvolvimento do território. Entende que a atuação de um grupo técnico formado por arquitetos e urbanistas é de fundamental importância para maximizar as ações de planejamento e otimizar os resultados das políticas públicas do Estado. A SEPLAG abrigou o Núcleo Técnico de Operações Urbanas (NTOU) dentro de sua estrutura organizacional, durante o período de 2007 a 2010. O NTOU desenvolveu com competência uma série de estudos de operações urbanas dos quais foram selecionados cinco para fazer parte desta publicação que agora vem a público. Dentre estes estudos, ressaltam-se: a operação urbana que deu origem à Cidade da Copa, pela sua importância estratégica em consolidar, definitivamente, a Nucleação Oeste da Região Metropolitana do Recife, em São Lourenço da Mata; e a operação urbana Porto Novo na área portuária do Recife, que recupera um enorme patrimônio urbano, ambiental e histórico. Estas duas operações estão em obras e fazem parte do esforço do Governo do Estado em preparar a Região Metropolitana para a Copa do Mundo FIFA 2014.

Eduardo Campos Governador do Estado de Pernambuco

Geraldo Júlio de Mello Filho

Secretário de Planejamento e Gestão do Governo do Estado de Pernambuco


Introdução O Núcleo Técnico de Operações Urbanas (NTOU) foi constituído em 2007 na Secretaria de Planejamento e Gestão do Governo do Estado de Pernambuco (SEPLAG), com o propósito de, por meio de um corpo técnico capacitado em planejamento, arquitetura, urbanismo e modelagem financeira, consolidar conhecimentos para uma atuação de natureza consultiva, propositiva e articuladora de projetos arquitetônicos e intervenções urbanas de interesse do Governo do Estado1. O principal argumento para a formação deste grupo foi a constatação, em avaliações de governos recentes, do baixo impacto que grandes obras e investimentos econômicos têm na qualidade de vida das cidades e conseqüentemente da população. Observa-se que diversas intervenções urbanas contemporâneas mostraram-se pontuais e desarticuladas, não respondendo às esperadas vantagens sociais (mesmo na presença de grandes incentivos fiscais e econômicos). Projetos são implantados sem sintonia com outros investimentos, tornando as ações pouco efetivas e sem rebatimento na elevação do capital social, humano e ambiental. A formação de um grupo técnico de operações urbanas, junto ao Governo do Estado de Pernambuco, buscou, portanto, responder a necessidade de maximizar as oportunidades proporcionadas por grandes projetos através de operações consorciadas locais. Tais operações são reconhecidas em todo o mundo, como as experiências mais efetivas na transformação de áreas urbanas. Elas são concebidas como um conjunto de intervenções físicas fruto de parcerias público-privada, com o objetivo de alcançar transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e valorização ambiental. No entanto, distorções ocorrem quando o poder público abdica de seu papel formulador e coordenador para aceitar unidirecionalmente os interesses do capital privado. A ausência do poder público no processo de coordenação das operações urbanas consorciadas pode resultar em intervenções urbanas de pouca coesão social e espacial. Social, porque a concentração do capital imobiliário pode promover e/ou consolidar áreas de exclusão social. Espacial, porque pode não resultar em melhoria efetiva do espaço, sobretudo quando não 1

Atualmente, o NTOU está inserido na estrutura da Secretaria das Cidades.

existe um projeto urbano norteador das intervenções propostas. Neste contexto, o Estado ao contar com um núcleo técnico capaz de pensar, propor, e coordenar operações urbanas de naturezas diversas, maximiza resultados assim como fortalece suas políticas públicas. Entre os anos de 2007 e 2010, período que esteve vinculado a SEPLAG, o NTOU desenvolveu dezenas de estudos urbanos para a implementação por meio de operação urbana consorciada. Dentre estes, os cinco mais significativos, todos localizados na Região Metropolitana do Recife, foram compilados nesta publicação: (1) Capitania, (2) Memorial Arcoverde, (3) Centro Administrativo, (4) Porto e (5) Cidade da Copa. Destes, os dois últimos já estão sendo implantados pelo Governo do Estado de Pernambuco e terão suas obras concluídas no ano de 2014. É importante salientar que, de fato, nenhum desses projetos pode ser tecnicamente considerado operação urbana consorciada, uma vez que além de não serem conduzidos pelo Poder Municipal, e sim Estadual, não foram objetos de lei municipal específica, conforme recomenda o Artigo 32º do Estatuto da Cidade (BRASIL, 2001)2. O Estatuto define operações urbanas consorciadas como “o conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público Municipal, com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar em uma área transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e valorização ambiental”. Ainda assim, esta atuação está em total consonância com o ideal do Estatuto da Cidade quanto aos objetivos, estratégias e metodologias das propostas. Sabe-se que uma década após sua instituição em lei federal, as operações urbanas consorciadas são objeto de constante reavaliação decorrente de sua aplicação ou de tentativas de aplicação em diversas realidades urbanas. Pernambuco, portanto, contribui, em nível estadual, para uma avaliação crítica mais ampla da eficiência na aplicação deste instrumento que, no Brasil, já existe, em nível municipal, desde o final dos anos de 1980, quando foi institucionalizada pelo Plano Diretor da Cidade de São Paulo (Lei 10.676/1988). Em Pernambuco, este tipo de intervenção compreende o reaproveitamento das áreas estatais de escala urbana através de modificações de uso, visando a geração de novas fon2

BRASIL. Estatuto da Cidade, Lei nº 10.257 de 10 jul. 2001. Brasília, 2001.


tes de recursos pela cessão de uso a terceiros. A revitalização destas áreas poderá ser feita mediante a recuperação e adequação dos aspectos originais, e/ou a construção de novas edificações que viabilizem a implantação do empreendimento proposto. Além da obtenção de vantagens econômico-financeiras pelo estado, a reintegração destas áreas revitalizadas possibilitará, a toda a região próxima, um desenvolvimento espontâneo provocado pelo impacto sócio-econômico da intervenção. Assim sendo, esta publicação reúne dois estudos de operações urbanas já implementadas e coordenadas pelo Governo do Estado de Pernambuco e três estudos que, por motivos múltiplos, ainda não ultrapassaram o plano propositivo. Está estruturada em cinco capítulos que correspondem aos cinco mais significativos estudos de operações urbanas selecionados. O Capitulo 1 apresenta o estudo desenvolvido para a quadra urbana atualmente ocupada pela Capitania dos Portos de Pernambuco – CPPE, no Bairro do Recife. Introduz diferentes atividades (como comércio, serviços, museu e convenções) e propõe uma intervenção articulada às diferentes escalas da estrutura urbana pré-existente do Bairro do Recife em detrimento de uma ocupação tradicional do plano urbanístico. O Capitulo 2 apresenta a proposta de requalificação urbana e ambiental da área em torno do Parque Memorial Arcoverde, situada entre Recife e Olinda, por meio de um master plan formulado para desenvolver a região. Propõe a valorização dos equipamentos e dos espaços públicos como estratégia catalisadora de investimentos e do desenvolvimento local. O master plan foi fundamentado em diretrizes de legibilidade, conectividade, implantação de novos equipamentos, permeabilidade e integração. O Capitulo 3 reúne três estudos para a implantação de um Centro Administrativo para o Governo de Pernambuco nos bairros de Santo Amaro, Santo Antônio e Campo Grande, no Recife, visando atender aos anseios do Estado em equacionar as demandas da prática administrativa e gestão estatal contemporâneas. A metodologia de análise das áreas para implantação fundamentou-se em dados governamentais. A partir de levantamentos cadastrais foram identificadas seis áreas subutilizadas do centro de Recife e submetidas à análise urbanística ad hoc pautada em oito critérios, dentre eles a reabilitação ambiental urbana. As três áreas seleciona-

das possuem os atributos para receber tal empreendimento e promover reabilitação urbana; configuram oportunidades para reabilitar o centro tradicional da cidade, em detrimento de criar novos centros urbanos em áreas suburbanas, uma prática comum na locação dos centros políticos administrativos brasileiros desde os anos 1970. O Capitulo 4 apresenta o projeto de requalificação e reutilização da área não-operacional do Porto do Recife para abrigar um complexo de turismo, cultura e lazer, de escala metropolitana, a ser executado pela iniciativa pública e com uso cedido a particulares, nos termos da lei. O projeto prevê a requalificação de todo o trajeto do cais do Porto, transformando os espaços obsoletos em espaços de convivência e contemplação. Por fim, o Capitulo 5 apresenta os estudos desenvolvidos para a Cidade da Copa, discute o processo de seleção de áreas para localização da arena entre as três localidades cogitadas - Olinda (Arena Recife Olinda), São Lourenço da Mata (Cidade da Copa) e Recife (Arena Jiquiá) – e detalha o projeto urbano desenvolvido para a área selecionada, situada no município de São Lourenço da Mata, na Zona Oeste da Região. O projeto, fundamentado em princípios de sustentabilidade e urbanidade, permitiu a inclusão do Estado como sede da Copa do Mundo FIFA 2014. Os textos, portanto, são reflexões teóricas sobre a atuação prática do NTOU, extraídas de artigos elaborados pelos seus integrantes, publicados em seminários e congressos nacionais e internacionais entre 2007 e 2010. Refletem a experiência do Núcleo no resgate do planejamento urbano como instrumento de ação efetiva para o desenvolvimento do território, tendo o Estado como principal articulador dos diversos agentes públicos e privados.

José de Souza Brandão Neto Secretário Executivo de Operações Urbanas do Governo do Estado de Pernambuco


1.Capitania


Capitania

1

Zeca Brandão e Cristiano Borba

O

estudo realizado pelo Núcleo Técnico de Operações Urbanas na quadra ocupada pela Capitania dos Portos de Pernambuco – CPPE, no Bairro do Recife, apresenta as estratégias de projeto desenvolvidas na reciclagem de uma estrutura urbana em área central, degradada e subutilizada. Como proposição metodológica, sugere-se que, ao invés de utilizar o instrumento tradicional do plano urbanístico, deve-se investir em uma abordagem para resultados de curto prazo mais eficientes: aproveitar a projetualidade – de caráter arquitetônico – inerente às menores escalas de intervenção. Tal postura pode se revelar bastante apropriada aos contextos particulares dos centros urbanos das grandes cidades brasileiras em processo de reestruturação, como no caso em estudo, do Bairro do Recife, onde, na última década, tem-se verificado um crescente aporte de empresas para o chamado Porto Digital, uma organização social responsável pela instalação e manutenção de um ambiente de oportunidades no setor da Tecnologia da Informação e da Comunicação (TIC). Neste contexto particular do Bairro do Recife, núcleo urbano original da cidade, ocupado desde meados do século XVI pelas atividades portuárias, a chegada destas novas atividades econômicas agregou uma função urbana mais ampla: o favorecimento do processo de reciclagem do capital edificado, incentivando a implantação de empresas em imóveis históricos e revitalizando a ambiência do bairro como um todo. 1 Este capítulo é uma versão revisada do artigo “A projetualidade da pequena escala: Intervenção na quadra da Capitania dos Portos”, publicado nos anais do Seminário Internacional Urbicentros: Memória, Cultura e Ambiente, realizado em João Pessoa, em 2010.

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O Plano de Desenvolvimento do Porto Digital pressupõe a identificação das oportunidades de adaptação do centro histórico às demandas das empresas que venham a fazer parte do empreendimento. Algumas das diretrizes são: o aproveitamento dos conjuntos vazios ou subutilizados – principalmente aqueles em risco –; a melhoria da qualidade do espaço urbano; a ampliação das áreas de lazer; e acesso rápido e circulação franca e segura, priorizando as necessidades de pedestres, usuários de transporte coletivo e ciclistas. Além disso, o plano procura compor uma oferta variada de atividades atrativas para os usuários do Bairro, promovendo qualidade de vida associada à sustentabilidade do ambiente urbano de trabalho, moradia, lazer e visitação e o desenvolvimento de alternativas de gestão compartilhada para as questões urbanas (PORTO DIGITAL, 2008). Diante de tal cenário, o Núcleo Técnico de Operações Urbanas entendeu que as estratégias necessárias, para que a intervenção na quadra ocupada pela CPPE funcionasse como oportunidade de desenvolvimento integrado, deveriam ser traçadas previamente a partir de uma experiência piloto. A oportunidade proporcionada pela demanda do Porto Digital permitiu refletir, projetualmente, sobre o setor Norte do Bairro do Recife, com a idéia de que se pode chegar ao estabelecimento de uma metodologia de intervenção em áreas urbanas com características similares às encontradas no local. Tomando a Rua do Observatório como eixo de referência entre o Norte e o Sul do Bairro do Recife, a parte Sul se caracteriza como uma zona que abrange o perímetro de tombamento do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e, portanto, guarda algumas características de ocupação do século XVII, detém um rico acervo edificado de inspiração eclética do início do século e tem atraído diversos empreendimentos. Excetuando-se alguns edifícios isolados como o Forte do Brum e a Igreja do Pilar, a parte Norte, por sua vez, constitui uma zona caracterizada por uma ocupação mais recente, que remonta à expansão das atividades portuárias da primeira metade do século XX. Corresponde, morfologicamente, a uma malha regular com quadras

parceladas em grandes lotes, em que permanecem algumas ocupações próximas à função original, como armazéns portuários, fábricas e moinho, a Zona Operacional do Porto do Recife, a zona ocupada pela administração pública na margem oeste da ilha, além do único núcleo habitacional da região, representado por uma ocupação informal de cerca de 460 famílias denominada Comunidade do Pilar, ou “Favela do Rato”, como é popularmente conhecida. Pode-se afirmar que o conjunto edificado na zona Norte do Bairro do Recife não possui a mesma relevância histórica da zona Sul. O edifício da Capitania dos Portos, objeto desta intervenção, está localizado no setor Norte do bairro, na Praça do Arsenal da Marinha, espaço público adjacente à Torre Malakof, um dos monumentos de referência desta parcela urbana. (Figura 1).

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1 Zona Norte

BAIRRO DO RECIFE

Zona Azul

Quadra da Capitania dos Portos

3

2 BACIA PORTUÁRIA

1- Forte do Brum 2- Igreja do Pilar 3- Comunidade do Pilar Eixo da rua do Observatório

OCEANO ATLÂNTICO Zona Operacional do Porto Zona de Administração Pública Setor de Intervenção Controlada

Figura 1- Localização da quadra da CPPE, zonas e pontos de interesse no Bairro do Recife


A parte central deste setor onde se encontra localizada a área de intervenção, apresenta grandes terrenos e equipamentos subutilizados que a tornam atrativa para a implantação de empresas com características diferentes das que se incorporaram ao Porto Digital até então. O aporte destes novos empreendimentos, com necessidade de plantas mais amplas e infra-estrutura adequada, enseja a construção de maiores equipamentos, dotados de condições propícias para a implantação deste segmento da atividade econômica. Com esta crescente demanda pela geração de área útil qualificada, o Porto Digital e a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente do Governo do Estado de Pernambuco (SECTMA) – responsável pelo fomento às atividades de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) – assumiram o compromisso de liberar áreas de imóveis da porção Norte do Bairro do Recife, tornando premente, portanto, uma avaliação sobre as capacidades apresentadas pelas estruturas urbanas e edilícias existentes na região para comportar tal desenvolvimento. Motivado por essa liberação, o Núcleo Técnico de Operações Urbanas propôs uma intervenção na quadra da CPPE adotando, como estratégia para que o processo resultasse em desenvolvimento integrado da referida parcela urbana, uma experiência piloto traçada previamente. A metodologia de intervenção utilizada pode ser empregada em áreas urbanas com características similares às encontradas no caso do Bairro do Recife. O método proposto consiste em utilizar a projetualidade própria das menores escalas de intervenção como estratégia para um processo de transformação mais amplo: a construção de múltiplas oportunidades de atuação (BLAU, RUPNIK, 2007). Não se trata, portanto, de um plano geral de intervenção/requalificação, mas do lançamento de um modelo de intervenção pontual, que considere a possibilidade de realização em diferentes etapas e a flexibilidade para adequação a eventuais novas demandas ou limitações que pudessem emergir no processo de implantação. A aplicação do referido método deve emergir mais facilmente se for tomado um

caso prático como exercício sobre a sua projetualidade. Compreendendo-se a quadra como a menor escala de intervenção urbana para a obtenção de resultados expressivos (TI-NAN, 2008), a quadra onde se encontra o edifício da CPPE, pertencente à União, pôde ser trabalhada nesta perspectiva. O projeto de uma quadra, necessariamente dotado de maior precisão no desenho de modo a tornar a ação interventora mais ágil, é posto logo abaixo da escala dos planos urbanos; ao mesmo tempo, posiciona-se imediatamente acima da escala edilícia, arquitetônica – de modo a trazer conseqüências mais abrangentes que a da intervenção restrita aos limites do lote (BRANDÃO, 2002). O estudo teve como base três conceitos gerais: permeabilidade, contextualização e urbanidade. Por permeabilidade, entende-se a capacidade de se realizarem movimentos do usuário entre os espaços constituintes do ambiente construído urbano: a possibilidade de se deslocar não somente através de uma dada rua, mas a facilidade de se deslocar de uma rua para outra – quanto menos mudanças de direção no deslocamento, maior a permeabilidade (HOLANDA, 2002). Na cidade tradicional, as quadras plenamente ocupadas funcionam como barreiras ao movimento entre os espaços públicos. Em termos de estratégia de projeto, o aumento do grau de permeabilidade, se desejado, pode ser obtido pelo favorecimento das possibilidades do atravessamento das quadras em vários sentidos. O conceito de contextualização trata da relação morfológica entre as massas construídas dos edifícios. Não significa, portanto, uma mimese dos aspectos plásticos do entorno ou de repetição de estilismos, mas sim da consonância entre as volumetrias preexistentes e as propostas (SECCHI, 2006). Tal consonância pode advir, por exemplo, da manutenção de gabaritos, alinhamentos ou pela delimitação dos volumes construídos através do prolongamento de eixos urbanos pré-existentes que limitam avanços e recuos no perfil do objeto proposto. Já o conceito de urbanidade está ligado à relação entre o ambiente construído e as

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possibilidades de uso que ele suporta. Espaços urbanos com alta densidade de ocupação tendem a gerar mais contatos entre os edifícios e a rua – seja através de aberturas, como portas e janelas, seja pela constância de movimentos de pedestres que suscita. Um alto grau de urbanidade está relacionado a espaços naturalmente vigiados pela população (JACOBS, 2001). A ocupação do térreo por usos de alta freqüência, como o pequeno comércio, favorece tal propriedade, bem como a qualidade e a quantidade dos espaços públicos. Tal preocupação se traduziu na preferência pelo uso misto do edifício, favorecendo a sua utilização durante os diversos horários do dia e os diversos dias da semana. Neste sentido, muitos dos princípios utilizados neste estudo são confluentes com a idéia de L’ilot ouvert (quadra aberta), defendida por Portzamparc (2008): buscou-se obter, concomitantemente, autonomia plástica e salubridade dos edifícios (iluminação em todas as fachadas, arejamento) e a garantia de continuidade dos espaços públicos com os espaços interiores à quadra – princípios que tornam o padrão morfológico mais adequado, inclusive, às exigências legais contemporâneas, além de permitir a inserção de medidas de conservação de energia, recomendáveis a qualquer novo empreendimento. Há de se salientar, porém, as particularidades do método proposto para o estudo da quadra da CPPE. A preocupação com a continuidade das linhas de visadas e com os alinhamentos pré-existentes para permitirem que os princípios de intervenção preservassem aspectos da memória histórica do lugar – quesito indispensável ao se lidar com o Bairro do Recife. A quadra merece destaque especial no conjunto urbano do Bairro do Recife por se apresentar em posição intermediária entre as convencionadas zonas Norte e Sul neste estudo. Ela não está contida dentro do perímetro de preservação rigorosa do Bairro do Recife definido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), mas entende-se que devem ser mantidas suas características por estar inserida em área classificada como Setor de Intervenção Controlada, segundo o Plano Específico de Revitalização da Zona Especial de Preservação do Patrimônio Histórico-Cultural 09 - Sítio Histórico do Bairro do Recife, que estabelece condições especiais de uso e ocupação do solo, e cria mecanismos de planejamento e gestão (RECIFE, 1997) (Figura 2).

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1 5 3

BAIRRO DO RECIFE Quadra da Capitania dos Portos

2

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Polígono de trombamento Federal

Monumentos Federais 1- Forte do Brum 2- Igreja do Pilar 3- Igreja da Madre de Deus

BACIA PORTUÁRIA

Monumentos Estaduais 4- Torre Malakoff 5- Estação do Brum

Zona Operacional do Porto Zona de Administração Pública Setor de Intervenção Controlada

OCEANO ATLÂNTICO

Figura 2 - Zonas Especiais de Preservação Histórica do Bairro do Recife Fonte: RECIFE, 1997.


A planta de ocupação do entorno da quadra da CPPE (Figura 3) ilustra seus limites. A Sul, a Rua do Observatório; a Oeste, a Rua do Brum; a Norte, a Rua de Tiradentes; e a Leste, a Rua de São Jorge. O conjunto da CPPE ocupa uma área de 13.048,40 m² do total de 15.336,05 m² da quadra – ou seja, corresponde a quase 85% da quadra. A área restante, de 2.287,65 m², é ocupada por sete imóveis privados voltados para a Travessa Tiradentes e dois voltados para a Rua do Brum, além do edifício pertencente à empresa Moinho Recife, na esquina da rua de São Jorge com a Travessa Tiradentes. Estes imóveis são sobrados datados do século XIX, em sua maioria desocupados ou subutilizados – exceto a edifício do Moinho Recife, de arquitetura mais recente, constituído de térreo e mais três pavimentos.

Praça Tiradentes

Legenda Quadra da Intervenção Imóveis da CPPE

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Imóveis particulares

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Praça do Arsenal

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Porto do Recife

BACIA PORTUÁRIA

Figura 3 - Planta de ocupação do entorno da quadra da CPPE.

A Rua do Brum apresenta, também, alguns sobrados do século XIX com variados níveis de descaracterização e imóveis com características plásticas do início do século XX. Já a Rua de São Jorge apresenta como destaque o conjunto proto-moderno dos prédios da Secretaria da Fazenda, Receita Federal (h= 22m) e dos silos de grãos do Moinho Recife (h= 45m). A Torre Malakoff, construída em 1853, hoje um equipamento de uso cultural, e a sede da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente, um edifício de meados do século 20, se situam em quadras isoladas voltados diretamente para a Praça do Arsenal. Considerando a importância do patrimônio construído e a metodologia proposta, entendeuse que algumas características pré-existentes deveriam servir de referência para a ocupação e composição volumétrica do presente estudo, resguardando a heterogeneidade cronológica e estética da inserção urbana. Algumas características do partido adotado resultaram da reprodução de alguns princípios reguladores da ocupação da quadra, outros do próprio edifício da CPPE. Neste sentido, foi estabelecido que os imóveis de relevância no processo histórico de ocupação da quadra deveriam ser mantidos, como o edifício-sede da CPPE, que ocupa a maior parte do limite com a Rua de São Jorge até a esquina com a Rua do Observatório. Os demais edifícios que compõem a quadra são passíveis de demolição, pois não se constituem como referências de valor histórico que mereçam ser preservados. Todavia o edifício pertencente ao Moinho Recife, embora não apresente características estéticas de destaque, serve como referência para o alinhamento do novo edifício e baliza o seu gabarito, sendo também preservável, desde que incorporado como parte do empreendimento (Figura 4).

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Imóveis do Moinho Recife Equipamentos Culturais Usos institucionais Imóveis privados, sobrados, armazéns do porto, usos diversos

Rua do Observatório

Imóveis da CPPE Imóvel do Moinho Recife

Rua de São Jorge

Figura 4 - Fachadas da quadra da CPPE voltadas para a Rua de São Jorge.

Travessa Tiradentes


Assim como devem ser mantidas as edificações números 132 e 142, voltadas para a Rua do Brum (Figura 5).

O edifício da CPPE não apresenta nenhum acesso direto pela Rua do Observatório. Volta-se para o espaço verde oferecido pela Praça do Arsenal por meio de um extenso plano de fachada contínuo sem aberturas no pavimento térreo (Figura 7).

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Rua do Observatório

Travessa Tiradentes

Rua do Brum

Imóveis da CPPE Imóveis particulares

Rua do Brum

Rua de São Jorge

Imóveis da CPPE

Rua do Observatório

Imóvel do Moinho Recife

Figura 5 - Fachadas da quadra da CPPE voltadas para a Rua do Brum.

Figura 7 - Fachada da quadra da CPPE voltada para a Rua do Observatório.

E também as edificações números 159, 149, 157, 131, 121 e 127, voltadas para a Travessa Tiradentes (Figura 6).

Rua do Brum

Travessa Tiradentes

Imóveis particulares Imóvel do Moinho Recife

Travessa Tiradentes

Figura 6 - Fachadas da quadra da CPPE voltadas para a Travessa Tiradentes.

A configuração apresentada pelo edifício existente – um bloco de predominância horizontal e caráter linear – e das demais edificações da quadra – ocupando apenas a periferia – fazem com que o conjunto se apresente como uma quadra fechada, encerrando um amplo pátio em seu interior, onde há o complexo desportivo da CPPE. O novo empreendimento deveria ser edificado justamente neste pátio – hoje, uma área livre de aproximadamente 10.200 m² (Figura 8).


Além de questões relacionadas ao contexto morfológico, foram consideradas, para fins projetuais, outras particularidades locais para que as estratégias fossem adequadas e viáveis. A primeira questão diz respeito aos próprios limites impostos pela legislação. Além de ser uma área adjacente a um sítio histórico, existe a necessidade de criação de considerável número de vagas de garagem e manutenção de 40% do solo natural do terreno. Por isso, como princípio de composição principal, promoveu-se uma releitura da organização dos volumes em um corpo contínuo, como uma barra única, ou uma fita, que se dobra sobre si mesma com o objetivo de, ora delimitar espaços no interior da quadra, ora delimitar o perfil da quadra em si, mas sempre com a capacidade de resguardar espaços livres no interior da quadra e responder satisfatoriamente às exigências de ordem legal. A conformação desta fita foi balizada por linhas referenciais enquanto elementos para a concepção urbana e definição da volumetria resultante, sendo: • Alinhamento do paramento das ruas do Brum e São Jorge (Figura 9-A); • Alinhamento do paramento do edifício original da CPPE da Rua São Jorge (Figura 9-B); • Alinhamento das fachadas posteriores dos sobrados da Travessa Tiradentes (Figura 9-C); • Parâmetros para ocupação estabelecidos pelo alinhamento das fachadas internas do edifício original da CPPE (Figura 9-D); • Eixo de visada entre os imóveis da Receita Federal e Ministério da Fazenda (Figura 9-E); • Linha resultante para afastamento ao norte do edifício original (Figura 9-F); • Linha resultante para a travessia perpendicular à quadra no sentido leste-oeste (Figura 9-G).

Figura 8 - Quadra da CPPE com o complexo desportivo no centro e entorno. Fonte: Porto Digital.

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A proposta utiliza o interior da quadra para a geração de espaços semi-públicos, com possibilidade de conter cobertura vegetal e solo natural. Foram criados dois grandes pátios: um para o edifício novo, delimitado pelos novos volumes; e outro fazendo a complementação daquilo que se insinuaria na conformação em “U” do edifício antigo, tendo como limites o corpo do edifício da CPPE e uma fachada interna à quadra do novo edifício. A ocupação periférica busca a manutenção dos alinhamentos tradicionais, conforme se vê na implantação (Figura 10)2.

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Figura 9 - Linhas referenciais.

A totalidade das linhas referenciais traçadas (Figura 9-H) trouxe possibilidades de organização volumétrica da fita na quadra e geração de espaços, como: • A definição de pátios como espaços semi-públicos que fazem a mediação entre o edifício e ruas do bairro, com a possibilidade de interpenetração do espaço público urbano e a quadra; • A adequação da composição tipológica com lâminas de largura compatível à flexibilização dos espaços internos e à demanda por iluminação natural nos ambientes; • A promoção de uma legítima interlocução entre o contexto urbano, os imóveis a preservar na quadra e um novo conceito proposto de inserção do edifício em contexto pré-existente de referência histórica.

Figura 10 - Implantação.

A viabilidade desta intervenção estaria atrelada à relocação das atividades exercidas pela CPPE na quadra em estudo, para um novo terreno. Neste sentido, um novo prédio foi proposto para um terreno da União localizado no Cais de Santa Rita e o seu custo foi adicionado à modelagem financeira da intervenção como um todo, considerando que esta operação seria parte da contrapartida pela cessão da área no Bairro do Recife à iniciativa privada. 2


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Para todo este conjunto se propôs estimular um mix funcional que fosse viável e satisfizesse as demandas do território por espaços tecnologicamente preparados e ambientalmente qualificados. Na intenção de promover maior grau de urbanidade e incrementar a qualidade da ambiência urbana, em conformidade aos conceitos norteadores da metodologia proposta, recorreu-se ao planejamento das ocupações dos pavimentos mais baixos, diretamente ligados aos movimentos dos pedestres. Estes usos de caráter mais público deveriam se localizar, preferencialmente, nestes níveis, garantindo, assim, a sinergia e a dinâmica urbana favoráveis ao contexto local, até então marcado pela segregação e transformação paulatina da tipologia original. A idéia de gerar a interface entre rua e quadra foi complementada por travessias no nível do pavimento térreo: da Rua de São Jorge para a Rua do Brum e da Rua do Observatório para a Travessa Tiradentes. Elas garantiriam fluxos de pedestres através dos volumes construídos. Os fluxos transversais à quadra gerariam espaços cobertos livres no pavimento térreo, na transição dos pátios, incorporando os ambientes fechados. Ter-se-ia, assim, um percentual de ocupação pouco denso – menos de 40%, considerando as edificações preservadas e privilegiando o espaço para o uso público, com a valorização das perspectivas do conjunto arquitetônico na franja da quadra. Grandes empresas de tecnologia da informação, mescladas com usos mais dinâmicos de comércio e serviços, se articulariam com espaços de cunho cultural, como museu e salas de convenções, no pavimento térreo do antigo edifício da CPPE. Complementarmente, seria prevista a destinação de 300 vagas de estacionamento para toda a área do subsolo e para uma pequena parte do primeiro pavimento – uso fundamental para a viabilidade e sucesso do empreendimento. Para o segundo pavimento e os superiores foram previstos usos de serviço e garagem. A flexibilidade da planta permitiria ajustar, sempre que possível, a proporção entre as áreas destinadas a estacionamento e trabalho. (Figura 11).

1- Estacionamento 2- Comércio 3- Hall 4- Museu 5- Serviços


No estudo realizado na quadra ocupada pela CPPE algumas das posturas metodológicas se tornariam visíveis, portanto, na composição e na relação das novas massas construídas com as estruturas pré-existentes: a manutenção do gabarito e dos alinhamentos do entorno imediato; a reprodução de princípios compositivos de edificações de destaque na quadra – como o pátio e o edifício linear. Procurou-se enfatizar, principalmente, a escala do observador, que poderia circular, ao nível da rua, através da quadra (Figura 12).

Figura 12 - Perspectiva vista do pátio interno.

Figura 13 - Perspectivas vistas externas (página ao lado).

33


Foram, ainda, contempladas estratégias conjugadas de manutenção e de substituição de edifícios. Embora o novo edifício se caracterizasse como um elemento nitidamente contemporâneo, ele valorizava as escalas e épocas dos imóveis mais antigos (Figura 13). O novo edifício não foi concebido como um objeto isolado, mas como um elemento compositivo da quadra e da cidade como um todo. Entendeu-se que, ao servir como interface entre o alinhamento da quadra tradicional e do edifício da CPPE, a proposta promoveria uma costura morfológica, cronológica e estética, na intenção de articular a diversidade do entorno (CHOAY, 2001) . Esta abordagem eminentemente projetual sobre a reciclagem de estruturas urbanas foi possível dada à pequena escala da intervenção – uma prática do que se poderia chamar de um “micro-urbanismo” (TI-NAN, 2008), com aplicação possível em outras quadras do Bairro do Recife ou em outras localidades com características semelhantes, no processo de adequação de estruturas urbanas tradicionais às exigências contemporâneas dos novos programas e atividades – típicas de momentos de transição (BLAU; RUPNIK, 2007) . O estudo aqui exposto configurou-se, por fim, como uma experiência piloto realizada a partir do (re) desenho de uma unidade pontual da cidade. Ao se reproduzir a experiência, seria possível garantir uma nova ambiência urbana, mais ampla, com incremento paulatino da qualidade ambiental.

Referências BLAU, E.; RUPNIK, I. Project Zagreb: transition as condition, strategy, practice. Barcelona: Actar, 2007. BRANDÃO, Z. O papel do desenho urbano no planejamento estratégico: a nova postura do arquiteto no plano urbano contemporâneo. Arquitextos 025 Texto especial 134, São Paulo: Romano Guerra Editores, 2002. Disponível em: <http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp134.asp>. Acesso em: 27 set. 2011. BRANDÃO NETO, Z.; NASCIMENTO, C. A projetualidade da pequena escala: intervenção na quadra da Capitania dos Portos. In: Seminário Internacional Urbicentros, 1., 2010, João Pessoa. Anais... João Pessoa, 2010. CHOAY, F. A alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação Liberdade/UNESP, 2001. HOLANDA, F. O espaço de exceção. Brasília: Unb, 2002. JACOBS, J. Morte e vida nas grandes cidades. São Paulo: Martins Fontes, 2001. PORTO DIGITAL. APL de tecnologia da informação e comunicação Porto Digital. Recife, 2008. Disponível em: < http://www.mdic.gov.br/arquivos/dwnl_1247146850.pdf>. Acesso em: 15 set. 2011. PORTZAMPARC, C. L’ilot ouvert: le concept de l’urbaniste. Disponível em: <http://projetsarchitecte-urbanisme.fr/ilot-ouvert-portzamparc-concept/>. Acesso em: 10 Set. 2011. RECIFE. Lei nº16290, de 1997. Aprova o Plano Específico de Revitalização da Zona Especial de Preservação do Patrimônio Histórico-Cultural 09 - Sítio Histórico do Bairro do Recife, estabelece condições especiais de uso e ocupação do solo, cria mecanismos de planejamento e gestão, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.legiscidade.com.br/lei/16290/>. Acesso em: 19 set. 2011. SECCHI, B. Primeira lição de urbanismo. São Paulo: Perspectiva, 2006. TI-NAN, C. Microurbanism. Disponível em: <http://www.chitinan.net/english/index.asp>. Acesso em 27 set. 2011.

35


2.Memorial Arcoverde


Memorial Arcoverde

1

Zeca Brandão, Claudio Cruz e Luís Moriel

U

ma leitura do ambiente natural e construído do município de Olinda demonstra, em seu processo de ocupação, uma dinâmica que distancia claramente a área do núcleo histórico do restante do território. Isto foi reforçado ao longo do tempo, pois enquanto a legislação e o controle urbano mostraram-se mais eficazes e enérgicos na área de preservação histórica, nas demais áreas o cuidado foi muito menor, resultando em um território vulnerável, com pouco planejamento e ações públicas restritas, sem estímulo ao desenvolvimento urbano e ambiental. Numa tentativa de reverter este cenário, foram realizadas discussões, recentemente, em torno de ajustes do Plano Diretor do Município de Olinda (OLINDA, 2008). No âmbito do Projeto Recife-Olinda - um conjunto de ações propostas pelos poderes executivos federal, estadual e municipais do Recife e Olinda com a participação e consultoria da Organização Social Núcleo de Gestão do Porto Digital e da empresa pública portuguesa Parque Expo (REYNALDO, 2009) - foi prevista a renovação e requalificação urbana de doze setores destas duas cidades, cada um com diretrizes específicas e com previsão de implantação a longo prazo. O Projeto Recife-Olinda introduziu o conceito de uma mega operação urbana em áreas predominantes de propriedade da União e do Estado. A área da Operação Urbana Memorial Arcoverde, proposta pelo Núcleo Técnico de Operações Urbanas (NTOU), está inserida totalmente na Zona de Abrangência do Projeto RecifeOlinda (Figura 1). 1 Este capítulo é uma versão revisada do artigo “Território de Oportunidades : Master Plan Operação Urbana Memorial Arcoverde”, apresentado e publicado nos anais do V Seminário Projetar, realizado em Belo Horizonte, em 2011.

39


OLINDA O Projeto Recife-Olinda demonstrou uma nova maneira de enfrentar os problemas metropolitanos. Ele se destaca pela convergência de proposições e implementação de empreendimentos com grande potencial de reestruturação urbana e ambiental, outrora planejadas de forma desarticulada. Este potencial habilita a localidade ao desenvolvimento social, econômico e ambiental do município e propõe cenários de investimentos integrados à reestruturação urbana desta porção do território metropolitano. O princípio da Política Urbana definida no Plano Diretor do Município de Olinda, por sua vez, trata a “integração do município com competitividade econômica, relativamente à Região Metropolitana do Recife e ao Estado de Pernambuco”, enquanto “território estratégico de oportunidades” (OLINDA, 2008), conceito que se insere neste estudo elaborado pelo Núcleo Técnico de Operações Urbanas (NTOU). Este estudo visa, portanto, atrair e promover a requalificação urbana da área do Complexo Salgadinho, através de operações urbanas consorciadas entre o setor público e a iniciativa privada, um instrumento jurídico da política urbana previsto no Plano Diretor (OLINDA, 2008). Neste território são previstos parâmetros e índices urbanísticos especiais, que devem objetivar a qualidade ambiental, a articulação e mobilidade entre equipamentos metropolitanos, a integração entre os ambientes natural e construído, a valorização paisagística e a melhoria da habitabilidade com inclusão social e coerente ao contexto histórico-cultural inerente a este meio urbano. Neste sentido, propõe-se a regeneração urbana de uma área com aproximadamente 270 hectares, situada no município de Olinda, no limite com o Recife, objetivando reestruturar e reordenar a ocupação do solo, aumentar a densidade populacional, ativar a economia local e permitir o desenvolvimento ambiental sustentável (Figura 2).

Projeto Recife-Olinda

Operação Memorial Arcoverde

Oceano Atlântico

RECIFE Projeto Recife-Olinda

Figura 1 - Áreas do Projeto Recife-Olinda e da Operação Urbana Memorial Arcoverde.

41


OLINDA

OLINDA Operação Memorial Arcoverde

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Figura 2 - Área da Operação Urbana Memorial Arcoverde. nic

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Oceano Atlântico

Delimitação da área de estudo O Complexo Rodoviário de Salgadinho é a área central das intervenções propostas pela Operação Urbana Memorial Arcoverde. Sua área foi considerada como a soma da área entre as duas pistas expressas do sistema viário que liga o Recife a Olinda no sentido Norte-Sul e a área dos lotes adjacentes a estas pistas, totalizando aproximadamente 130 hectares. Assim sendo, ele limita-se a Norte e Leste pelo Rio Beberibe, ao Sul com a cidade do Recife e a Oeste com a avenida Andrade Bezerra. Caracteriza-se pela condição de planície costeira de confluência entre o rio e o mar, que cria condições para o desenvolvimento de manguezais ainda presentes em alguns trechos. Do ponto de vista urbanístico, a área apresenta uma condição especial de transição e de amenização da paisagem entre os municípios de Olinda e Recife (Figura 3). Figura 3 - Área da Operação Urbana Memorial Arcoverde, Complexo de Salgadinho e sistema viário (página ao lado).

Sistema viário

RECIFE

Rio Beberibe Perímetro da Operação Urbana


Na área da Operação Urbana Memorial Arcoverde destaca-se o Istmo de Olinda, a ZPAE 4 do Plano Diretor do Município de Olinda (OLINDA, 2008), uma faixa de terra que até meados do século XX ligava o porto do Recife à Olinda. Quando as obras de construção de uma base naval no porto romperam a extremidade sul, esta se transformou numa ilha, que abriga o Bairro do Recife. A parte norte, em Olinda, é conhecida como praia Del Chifre, cujos acessos são precários e inexistem equipamentos de suporte ao turismo, lazer e segurança, apesar da área possuir rara beleza natural, além do valor histórico-cultural. O Istmo é considerado uma área non aedificandi, com zoneamento cultural-ambiental que só admite construções de apoio aos parques (OLINDA, 2008). A área da Operação Urbana Memorial Arcoverde ainda foi objeto de diversos planos, projetos estruturadores, investimentos públicos e privados. Destacam-se a construção da Fábrica Tacaruna, em 1925, e a Escola de Aprendizes Marinheiros de Pernambuco, em 1948, que pioneiramente imprimiram uma dinâmica urbana, trazendo, inclusive, uma população operária para os bairros adjacentes de Santo Amaro e Campo Grande. Nos anos de 1970 foi implantado o Complexo Rodoviário de Salgadinho, que gerou forte impacto sobre a região entre as cidades de Recife e Olinda e urbanizou uma extensa área de mangue para dar passagem às vias expressas que complementam o traçado norte-sul da Avenida Agamenon Magalhães e Cruz Cabugá, no Recife, conectando-as à malha rodoviária estadual (PE 15 – Avenida Panordestina) e às avenidas Olinda e Presidente Kennedy, em Olinda. O sistema viário implantado configurou um conjunto de “ilhas”, espaços intersticiais segregados pelo fluxo intenso e pela alta velocidade do tráfego de veículos. A construção do Parque Metropolitano Memorial Arcoverde, pelo Governo do Estado, em 1992, intentou articular estes espaços com instalação de passarelas de pedestres sobre as vias. No lado Leste do Complexo Rodoviário de Salgadinho, entre a Escola de Aprendizes Marinheiros de Pernambuco e o rio Beberibe, foi criado o Coqueiral de Olinda, que conforma uma área verde com cerca de 1 km de extensão. No lado Oeste, fazendo limite com a malha urbana do bairro de Campo Grande e com a Fábrica Tacaruna, o Governo do Estado construiu o Centro de Convenções de Pernambuco, em 1976, equipamento voltado para o setor de turismo e negócios. Nas últimas três décadas foram implantados vários empreendimentos, a exemplo do Shopping Tacaruna, Chevrolet Hall e o parque Mirabilândia. O Centro de Convenções, o Mirabilândia e o

Shopping Tacaruna foram logo ampliados, comprovando o potencial da área em fazer prosperar investimentos voltados para o setor terciário (comércio e serviços). Além destes três equipamentos de escala metropolitana, em meados dos anos de 1990, o Governo do Estado instalou, dentro do Parque Memorial Arcoverde, o Espaço Ciência, equipamento de caráter educacional-científico. O Centro Brasileiro de Energia Eólica implantou a Usina Eólica Olinda no Coqueiral, hoje inoperante (Figura 4).Atualmente vários outros projetos para a área estão em fase de estudo ou em andamento, dentre eles se destaca a implantação do sistema público de transporte do Corredor Metropolitano Norte-Sul, um projeto de mobilidade urbana de linha expressa exclusiva para ônibus, com cerca de 46 quilômetros de extensão, que ligará o município de Igarassu a Jaboatão dos Guararapes, proposto pela Secretaria das Cidades de Pernambuco. Nele, está previsto o funcionamento de 80 estações, duas delas servindo ao Complexo de Salgadinho. A área ainda se caracteriza por abrigar uma grande população de baixa renda e ocupações irregulares, em terrenos alagáveis, de uso predominantemente residencial, exemplificado pela comunidade da Ilha do Maruim. Em síntese, caracteriza-se pelas vias expressas, pela concentração de áreas verdes, pela baixa densidade construtiva, pequena ocupação do solo e equipamentos metropolitanos que configuram a transição entre Recife e Olinda. A área tem potencial de abrigar empreendimentos, a exemplo da Arena Recife-Olinda para a Copa do Mundo FIFA de 2014, objeto de outro estudo de operação urbana desenvolvida pelo NTOU, como será visto no capítulo 5 deste livro. Tendo em vista as particularidades geográficas, urbanas, econômicas e sociais expostas, o perfil da região se destaca, portanto, pelo conjunto de variantes positivas ao desenvolvimento metropolitano. Neste sentido, o Metrópole 2010 - Plano Diretor da Região Metropolitana do Recife (PERNAMBUCO,1998) e o Plano Metrópole Estratégica (PERNAMBUCO, 2001) já consideravam a área como um “território de oportunidades”, de acordo com as seguintes variantes: • Localização estratégica; • Transição entre os núcleos de Recife e Olinda; • Contexto paisagístico histórico-natural; • Concentração de grandes equipamentos;

45


OLINDA • Fácil acessibilidade e visibilidade; • Implantação de sistema público de transporte (Corredor Norte-Sul); • Contexto potencial para o desenvolvimento físico-econômico e social.

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Salgadinho Sítio Novo

Ilha do Maruim

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Santo Amaro

Oceano Atlântico 1-Parque Memorial Arcoverde 2-Coqueiral de Olinda 3-Istmo de Olinda 4-Escola de Aprendizes Marinheiros 5-Shopping Tacaruna 6- Fábrica Tacaruna 7-Chevrolet Hall 8-Centro de Convenções 9-Parque Mirabilândia 10-Espaço Ciência 11-Usina Eólica Perímetro da Operação Urbana

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RECIFE

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Sistema viário

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11

Bacia Portuária

Todas estas potencialidades se deparam com o desafio de transformar o cenário atual onde se destacam as seguintes fragilidades: • Equipamentos metropolitanos desarticulados; • Falta de integração entre o ambiente natural e construído; • Baixa densidade populacional residente; • Fragmentação da área verde pelo fluxo de passagem entre Recife e Olinda; • Áreas segregadas e subutilizadas; • Restrição urbanística da legislação federal. Dentre estas fragilidades, merecem destaque as incompatibilidades legais de caráter urbanístico e patrimonial. As tendências de desenvolvimento do município de Olinda demonstram neste território uma dualidade entre o processo natural e perspectivas futuras de ocupação. A situação urbana de Olinda é hoje o reflexo das transformações sociais, políticas e econômicas que a cidade acumulou ao longo de sua história, o que reflete na necessária atualização e compatibilização das leis do município. A legislação para o município de Olinda esteve alinhada com os princípios da preservação do patrimônio histórico-cultural desde a criação do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – SPHAN, em 1937, quando foi iniciado o tombamento de monumentos da arquitetura religiosa e civil. Em 1968, o tombamento foi estendido ao conjunto arquitetônico da Cidade Alta, através da Notificação nº 100-04/68, que delimitou um polígono de preservação. Esta lei estabeleceu para a área litorânea o limite de gabarito de dois pavimentos. Com a construção do Complexo Salgadinho se abriu uma nova perspectiva de evolução urbana no entorno da Cidade Alta, com a possibilidade de ocupações em áreas de mangue e prováveis prejuízos à paisagem e ao meio ambiente. Em 1979 foi aprovada pelo Conselho Consultivo do SPHAN a ampliação do polígono tombado em 1968, sob a denominação de Figura 4 - Empreendimentos na área da Operação Urbana Memorial Arcoverde (página ao lado).

47


Notificação Federal 1155, que passou de 1,2 km² aproximados, para cerca de 10,4 km², quase 1/3 do território municipal. Neste momento “são estabelecidas normas de proteção de visibilidade e de preservação das áreas naturais, através de restrições de ocupação das áreas de entorno, sujeita ainda ao exame de seus efeitos pelo município e das modificações introduzidas na Lei Municipal 3826/73” (OLINDA, 1992). Com a criação do Sistema Municipal de Preservação e do Conselho de Preservação, através da Lei Municipal nº 4119/79, se institui a figura do tombamento municipal e se passa a trabalhar na adequação das normas contidas na Notificação 1155/79 à realidade da ocupação da cidade, estudos estes encaminhados ao Conselho Consultivo do IPHAN, sob a denominação de Rerratificação do Polígono de Tombamento do Município de Olinda e seu Entorno – nº 1155/79”, (BRASIL,1985) aprovada pelo SPHAN, o órgão normativo do IPHAN da época. Fica então instituído o polígono tombado, constituído pelo núcleo do Sítio Antigo e a sua área de entorno, formado ao sul pelo Complexo Salgadinho, Triângulo de Peixinhos, parte do bairro de Sítio Novo e, ao Norte, pelos assentamentos de ocupação recente de Bultrins e de Bairro Novo (Figura 5). Esta Rerratificação trata como objeto de preservação “não só os monumentos e casario, mas também, o meio ambiente, a paisagem e, primordialmente, o homem, seus anseios e necessidade atuais em termos de habitabilidade e conforto ambiental”. Remete a um projeto de lei municipal para uma maior abrangência e detalhamento, considerado desde então, competência constitucional do município legislar quanto ao uso do solo (BRASIL,1985). São considerados neste instrumento legal:

Setor H

Setor I

49 Setor E

Setor C

Setor A

Setor K

Setor I

Setor G Setor B

Setor D Setor J Setor E

Oceano Atlântico Setor A - Área urbana de preservação rigorosa

Setor I

Setor B - Área urbana de preservação ambiental Setor C - Área verde de preservação rigorosa

• A tipologia e cronologia das edificações; • A visibilidade dos monumentos; • As adaptações das edificações necessárias à habitabilidade e conforto ambiental; • O meio ambiente; • A paisagem.

Setor D - Área de proteção e ambiência do conjunto Setor F

Setor E - Área urbana de preservação ambiental Setor F - Área verde de importância ambiental Setor G - Área de importância ecológica Setor H - Área de proteção à paisagem (faixa dos morros) Setor I - Área de proteção à paisagem (áreas planas) Setor J - Área de contenção do rio Beberibe Setor K - Área industrial de Peixinhos

Figura 5 - Polígono de tombamento e preservação do município de Olinda/PE (página ao lado). Fonte: Mapa gerado a partir da Rerratificação do Polígono de Tombamento do Município de Olinda e seu entorno (BRASIL, 1985).


Da Rerratificação da Notificação nº 1155/79, merece destaque a Área de proteção à paisagem (Setor I, Figura 5), com o conceito de “área plana que assegura a visibilidade da paisagem”, e que se divide em sub-setores (I1, I2, I3, e I4), com destaque para a Zona Urbana de Salgadinho (I3), para os quais se estabelece os seguintes parâmetros aqui sintetizados: • Ter gabarito máximo de dois pavimentos, com altura máxima de 6,00 m; • Respeitar a taxa máxima de ocupação da área com edificação de 50% do terreno; • Respeitar a taxa de solo virgem, correspondente a 20% da área do terreno para fins de arborização (BRASIL, 1985). No entanto, o que se observa ao confrontar a legislação em vigor com a realidade é que as restrições rigorosas da legislação federal para esta localidade não condizem com a realidade de ocupação dos cenários atuais e futuros. O controle da ocupação da Zona Urbana de Salgadinho não foi efetivado de forma satisfatória. Hoje, tem-se nesta Zona uma degradação total do meio ambiente natural, com muitas ocupações irregulares e com padrão precário, principalmente nas porções próximas ao leito do rio Beberibe. Outras construções, até regulamentadas, já ocupam gabaritos superiores aos seis metros estabelecidos na lei como, por exemplo, um moinho que predomina verticalmente na paisagem (construção anterior à Notificação 1155/79). O próprio Centro de Convenções se camufla em um talude artificial gramado que, na verdade, abriga todo um pavimento abaixo de dois níveis superiores, minimizando assim, a sua aparência final. Na perspectiva de rever estes condicionantes legais, o Plano Diretor do Município de Olinda (OLINDA, 2008) propõe um novo zoneamento, menos restritivo, nas faixas a oeste do eixo da Av. Agamenon Magalhães, no sentido de readaptar os parâmetros à realidade local e à necessidade do município em estimular o seu desenvolvimento econômico. O Plano Diretor de Olinda divide o território do município em 11 zonas: I – Zona de Reserva Futura (ZRF); II – Zona de Consolidação da Ocupação (ZCO); III – Zona de Verticalização Moderada (ZVM);

IV – Zona de Verticalização Elevada (ZVE); V – Zona de Proteção Ambiental Especial (ZPAE); VI – Zona de Proteção Ambiental Recreativa (ZPAR); VII – Zona Especial de Proteção ao Patrimônio Cultural (ZEPC); VIII – Zona Especial de Interesse Social (ZEIS); IX – Zona de Grandes Equipamentos (ZGE); X – Zona de Aterro Sanitário (ZAS); XI – Zona de Interesse Estratégico (ZIE). Os mecanismos adotados pelo Plano Diretor de Olinda estabelecem Zonas de Verticalização Elevada - ZVE, uma delas na área do Complexo de Salgadinho (ZVE7), como áreas propícias à elevação do gabarito e à sua reestruturação urbana, através do instrumento das operações urbanas consorciadas, os quais devem compatibilizar seus parâmetros urbanísticos ao contexto paisagístico, histórico e cultural em questão. A área do Complexo de Salgadinho conta com outras zonas onde o Plano Diretor de Olinda prevê a aplicação de operações urbanas consorciadas com finalidade de promover a reestruturação urbana do município: uma Zona de Consolidação da Ocupação (ZCO12), duas Zonas de Grandes Equipamentos (ZGE1 e ZGE2) e uma Zona de Interesse Estratégico (ZIE4). A Zona de Interesse Estratégico está definida como “uma zona que pela sua localização, extensão e continuidade territorial assume importância estratégica para o desenvolvimento urbano do Município” onde os projetos “deverão priorizar usos que promovam o desenvolvimento municipal, contribuindo para o incremento da receita, geração de empregos e melhoria da qualidade da paisagem urbana” (OLINDA,2008). Não foram permitidas operações urbanas consorciadas nas Zonas de Proteção Ambiental Recreativa (ZPAR7 e ZPAR8), “que tem a finalidade de proteger áreas que, tendo em vista seus atributos ambientais, oferecem potencial para atividades recreativas”, e na Zona de Proteção Ambiental Especial (ZPAE4), correspondente ao Istmo de Olinda, definida como área non aedificandi destinada a proteger e conservar a qualidade ambiental e os sistemas naturais ali existentes. (OLINDA,2008) (Figura 6).

51


OLINDA

ZPAR7

Salgadinho

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Sítio Novo

Ilha do Maruim

ZVE7

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ZPAR8

Os estudos do master plan da Operação Urbana Memorial Arcoverde desenvolvidos pelo NTOU consideram a adequação da legislação de forma equilibrada, simulando uma nova ocupação do solo com padrões diferenciados de aproveitamento, no sentido de harmonizar a preservação ambiental e patrimonial da área com o desenvolvimento econômico e social do município. A proposta tem como objetivo geral promover uma requalificação urbana e ambiental a partir da valorização dos equipamentos e espaços públicos, em particular o Parque Memorial Arcoverde, como elemento catalisador de investimentos e do desenvolvimento integrado com inclusão social. Foi neste contexto particular que se realizou este estudo, justificado pela necessária valorização e ordenamento da área, de forma a reverter o quadro de fragilidades hoje vivenciado e transformar o local em espaço para a convivência citadina, de permanência e de lazer.

Master plan Operação Urbana Memorial ArcoVerde

Pra

ZGE1 ZIE4

Campo Grande

Oceano Atlântico

ZGE2 Perímetro da Operação Urbana

Santo Amaro

RECIFE

Limite municipal

ZPAE4

O master plan foi formulado para desenvolver a região e potencializar a qualidade de vida da população, tendo em vista as seguintes diretrizes: • Legibilidade do eixo metropolitano de transporte; • C onectividade entre os equipamentos metropolitanos; • I mplantação de novos equipamentos de uso público no parque; • M aior integração entre ambiente natural e construído; • Permeabilidade e mobilidade interna do parque. O master plan é uma estratégia de curto e médio prazo que considera a assimilação da vocação do território para focalizar esforços e identificar, de forma coerente e consistente, projetos detonadores do desenvolvimento. Ele foi organizado a partir de três Figura 6 - Zoneamento proposto para o Complexo Salgadinho (página ao lado). Fonte: OLINDA, 2008.

53


OLINDA eixos conceituais, para os quais convergem as principais diretrizes da intervenção. Eixo de Acessibilidade - melhorar a oferta de estacionamento; - facilitar o acesso e percurso de pedestres e bicicletas; - integrar o sistema de transporte público a um sistema interno de transporte.

Salgadinho

Ilha 55 do Maruim

Sítio Novo

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Eixo de Funcionalidade - diversificação de usos no parque e no seu entorno imediato para assegurar o pleno aproveitamento do espaço; - implantação de áreas multifuncionais com capacidade para receber instalações temporárias.

O master plan compreende um território com áreas pertencentes à União, ao Governo do Estado e de propriedade privada, sendo que a maior parte da área, 61,20%, pertence ao Estado de Pernambuco, conforme o Mapa da titularidade (Figura 7) e o Quadro da titularidade (Tabela 1). Sendo assim, este percentual é mais uma justificativa para que a proposta de intervenção na área seja uma iniciativa do Governo Estadual.

Figura 7 - Mapa da titularidade das áreas sujeitas à intervenções (página ao lado).

Pra

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Eixo de Sustentabilidade - introduzir usos privados como forma de manter os equipamentos públicos; - estimular a construção de empreendimentos no entorno do parque como forma de atração de novos usuários; - estabelecer um sistema de gestão compartilhada do parque.

Oceano Atlântico

Campo Grande Perímetro da Operação Urbana Propriedade privada Propriedade do Estado

Santo Amaro

RECIFE

Propriedade da União

Bacia Portuária


OLINDA Tabela 1. Titularidade das áreas sujeitas às intervenções.

61,20%

203.183

18,20%

Ilha 57 do Maruim

1

Sítio Novo

9 8

1.114.474

Como visto, a localização estratégica e presença de vários equipamentos metropolitanos conferem à área um significativo poder de atrair público. A criação de um mix de atividades complementares aos usos pré-existentes consolidará e potencializará esta característica. O estudo de mercado confirmará ou corrigirá os usos propostos, definindo o público potencial para os produtos imobiliários a serem desenvolvidos na operação, fator fundamental na definição dos arranjos funcionais e mercadológicos. Neste sentido, alguns usos foram preestabelecidos e distribuídos de acordo com a vocação, especificidade e potencialidade das áreas sujeitas às intervenções da operação. O master plan considerou uma ampla fase de planificação estratégica, identificando os recursos naturais e sociais; os setores mais competitivos e com maior potencial de crescimento; a qualidade e disponibilidade de serviços, infraestruturas e outros fatores de apoio aos usos existentes ou a implantar; o bem-estar social em geral; e a oferta imobiliária ampliada. A distribuição espacial, pensada para a definição de usos e implantação de novos equipamentos, se propôs a equilibrá-los funcionalmente e territorialmente, de forma a valorizar a região, ocupar e dar vida aos seus espaços, visando principalmente viabilizar e dar sustentabilidade ao Parque Metropolitano Memorial Arcoverde. Os novos usos e equipamentos foram distribuídos conforme exposto na Figura 8: Figura 8 - Usos e equipamentos do master plan Operação Urbana Memorial Arcoverde (página ao lado).

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Área total

356.345

Salgadinho

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União

Percentual 20,50%

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Estado

Áreas (m²) 157.652

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ia d

Privada

Usos Imóveis de usos diversos Parque Memorial Arcoverde Coqueiral de Olinda

Pra

Propriedade

2

Oceano Atlântico

5

Campo Grande

3

1 2 3 4 5 6 7 8 9

4

Santo Amaro

RECIFE

Bacia Potuária

Perímetro da Operação Urbana Residências e comércio Empresariais e hotel/flat Estação Shopping Ampliação shopping Oceanário Parque Mirabilândia Estação Arcoverde Memorial Luiz Gonzaga Pátio de eventos/kart


Figura 9 - Redesenho viário do master plan Operação Urbana Memorial Arcoverde (página ao lado).

Av .O

lin da

PE 1

Salgadinho

59 do Ilha Maruim

Sítio Novo

erra

Campo Grande

ia d Pra

C No orre rte do -S r ul

el C

hifr

e

de Bez

ra Av. And

Oceano Atlântico

Perímetro da Operação Urbana Sistema viário

n no me es a g . A lhã Av aga M

Vias modificadas Novas vias Túneis

Santo Amaro

RECIFE

Av Ca . Cr bu uz gá

Acessibilidade e mobilidade urbana são estruturantes no master plan. Considerando-se que o eixo viário do Complexo de Salgadinho funciona hoje como um sistema de binário e viadutos, o master plan propõe a desativação da faixa no sentido sul-norte, que separa o Parque Memorial Arcoverde do Coqueiral de Olinda, e a abertura de uma nova faixa paralela, que permita o sistema de mão dupla concentrado ao eixo. Nele, seria implantado o Corredor Norte-Sul, um sistema de transporte público de massa por ônibus biarticulados, em faixas exclusivas ao longo da Av. Agamenon Magalhães, conectadas às faixas centrais já existentes na rodovia PE 15. O redesenho viário atinge também as vias secundárias, com o objetivo de dar uma maior legibilidade ao eixo de transporte principal e garantir uma maior integração às áreas atualmente segregadas. Estações e terminais de passageiros estão previstos ao longo do percurso, em consonância com o master plan, com possibilidade de duas estações na área da Operação Urbana Memorial Arcoverde, sendo uma na altura do Shopping Tacaruna (Estação Shopping), para servir a este centro de compras e aos equipamentos próximos, e outra no Parque Metropolitano Memorial Arcoverde (Estação Arcoverde), para atender aos edifícios residenciais e comerciais propostos na imediação. Estas estações de passageiros são potencializadas, do ponto de vista da mobilidade, pelo mergulho do eixo viário em dois túneis, em pontos estratégicos deste trecho, a fim de facilitar a integração das áreas e de todos os equipamentos nela distribuídos (Figura 9).

5

OLINDA

Bacia Portuária


A proposta divide-se em três operações urbanas autônomas, porém articuladas, para conectar a área como um todo. Estas operações podem possuir fases de implementação distintas, mas resguardam o caráter de funcionalidade complementar, necessário ao efetivo desenvolvimento físico, social e econômico do território. As três operações foram criadas de forma a gerar uma maior sinergia e ampliar a demanda por áreas hoje ociosas ou subutilizadas. A concepção parte do incremento construtivo e populacional para promover maior intercâmbio entre os equipamentos existentes e justificar a criação de novos (Figura 10).

Salgadinho

el C

Oceano Atlântico

Campo Grande

Operação C Santo Amaro

RECIFE

Pra ia d

Parque Metropolitano

Operação B

hifr e

Ilha do Maruim

Operação A

Bacia Portuária

Operação urbana A A operação urbana A destina uma área ao incremento populacional residente e ao comércio e serviços locais, de forma a gerar um bairro mais dinâmico e ativo. Atrelada a esta proposta, aproveita-se o potencial de uma grande área verde à frente, com a transformação do Coqueiral de Olinda, do Parque Memorial Arcoverde e do Espaço Ciência em um grande e bem estruturado Parque Metropolitano Memorial Arcoverde. O incremento do uso residencial revela-se de fundamental importância para a sustentabilidade do parque, visto que uma profícua relação entre habitação e lazer costuma estar sempre presente nas propostas bem sucedidas para espaços públicos de grande escala (Figura 11). Com estes fins, esta operação envolve o reordenamento do solo, através de um desenho que garante a qualidade urbana, pela oferta de um mix funcional, estacionamento, e espaços livres urbanizados e verdes (públicos, semipúblicos e privados). O favorecimento do uso residencial possibilita, por sua vez, a apropriação dos espaços e o bem-estar da população.

OLINDA

Sítio Novo

O pressuposto do master plan é um novo ordenamento do solo e um maior potencial construtivo para a região, além da possibilidade de instalação de novos equipamentos públicos de médio e grande porte, de interesse da gestão privada, que possam alavancar o desenvolvimento local, além de viabilizar parte dos investimentos na reestruturação e requalificação urbana, principalmente nas intervenções estruturadoras, como o caso do eixo viário e do Parque Metropolitano Memorial Arcoverde.

Perímetro da Operação Urbana

Figura 10 – Parque Metropolitano e Operações urbanas A, B e C.

61


OLINDA

Salgadinho

Ilha do Maruim

livres semipúblicos em seu interior e o uso de comércio e serviços no pavimento térreo. Vagas de estacionamento são disponibilizadas dentro da própria quadra ou no edifício, para os proprietários e moradores; enquanto nas ruas internas (locais), calçadas largas e bem arborizadas se intercalam de forma sinuosa para garantir menor velocidade dos veículos e se compatibilizar com vagas de estacionamento para visitantes (Figura 12).

Pra ia

del

Ch ifr

e

Sítio Novo

Oceano Atlântico

Campo Grande

Perímetro da Operação Urbana

Santo Amaro

Figura 11 - Operação Urbana A.

RECIFE Bacia Portuária

Bacia Portuária

Estão previstos para esta operação edifícios de tipologia vertical (máximo 20 pavimentos), para o uso residencial, nas quadras (leste) fronteiriças ao parque e ao eixo viário (norte-sul), justamente para um maior usufruto da paisagem, além de manter uma melhor relação de proporção com a via. Uma outra tipologia ocupará as quadras (oeste) posteriores, voltadas para via de prolongamento da Estrada de Belém, para onde foram previstos edifícios de menor gabarito e escalonamento no sentido norte-sul (2 e 4 pavimentos nas duas primeiras quadras e 8 pavimentos nas demais). O escalonamento se justifica para manter uma melhor relação de escala com a Escola de Música de Olinda, um imóvel tombado pelo município, assim como garantir uma melhor transição para quem circula pela Estrada de Belém em direção à rua de Santa Tereza (antigo acesso à Olinda). A tipologia destes edifícios configura blocos fechando a quadra com espaços Figura 12 - Operação Urbana A (página ao lado).

63


Operação urbana B A operação urbana B propõe o uso de hotelaria e serviços complementando as demandas latentes do turismo cultural e de negócios gerado pelo Centro de Convenções, Chevrolet Hall e Centro Cultural Tacaruna. Com pouco menos de 2 mil leitos, segundo dados da Secretaria de Turismo de Pernambuco (PERNAMBUCO, 2011), constata-se que há um grande déficit de leitos na rede hoteleira olindense, haja vista o grande número de atrativos turísticos oferecidos pela cidade. Há falta de hotéis de qualquer categoria, sendo as pousadas com poucos leitos as únicas opções existentes (Figura 13).

OLINDA

Salgadinho Ilha do Maruim

Pra ia

de

lC hif

re

Sítio Novo

Oceano Atlântico Campo Grande Perímetro da Operação Urbana

Santo Amaro

RECIFE

Figura 13 - Operação Urbana B. Bacia Portuária

Esta operação está vinculada à relocação do Parque de Diversões Mirabilândia, situado junto ao Centro de Convenções, para a área do Coqueiral de Olinda. Em seu lugar se instalará um complexo funcional contendo os seguintes usos: hotel/flat, empresarial, estacionamento, auditório, comércio e serviços. Os usos foram pensados de forma a não concorrer com o centro de convenções e, sim, complementar as funções existentes. O edifício proposto se enquadra nos parâmetros da legislação municipal (Plano Diretor) e se configura a partir de uma grande plataforma que se nivela com a cota do pavilhão do Centro de Convenções, o que corresponde a dois pavimentos de estacionamento abaixo deste, um pilotis no pavimento térreo, com um pequeno percentual de ocupação (comércio e serviços), e seis pisos onde se distribuem os demais usos. Um volume independente de auditório e serviços de apoio complementa o programa proposto (Figura 14).

65

Figura 14 - Operação Urbana B


OLINDA

Salgadinho Ilha do Maruim

el C

hifr e

Sítio Novo

ia d

Na operação urbana C a possibilidade de ampliação do Shopping Center Tacaruna apresenta uma perspectiva futura real, na medida em que o desenho urbano concebido favoreça a mobilidade nesta região, amplie a oferta imobiliária e incremente ainda mais a procura pelo centro de compras. A inserção do Shopping no Parque haverá de trazer benefícios para ambos, considerando-se que as atividades de compras e lazer podem ser complementares. Os clientes do Shopping podem se sentir atraídos por uma atividade de lazer oferecida pelo parque, após realizarem suas compras, e vice-versa. Além da natural integração dessas atividades, ambos os empreendimentos poderiam voltar-se para a promoção de sustentabilidade do meio ambiente: o Shopping, agregando valor às marcas comercializadas e, o Parque, promovendo a existência de um meio ambiente urbano saudável (Figura 15). Esta operação está vinculada às mudanças viárias, com a construção do primeiro túnel (sentido sul-norte), de forma a eliminar trecho do sistema viário hoje existente, o que possibilita o acréscimo da área contígua ao Shopping Tacaruna e, portanto, facilita a sua ampliação. Outra condicionante importante é a conexão direta, em nível do pedestre, do Shopping com o Parque Metropolitano Memorial Arcoverde e, principalmente, com o Centro de Convenções, Chevrolet Hall, Fábrica Tacaruna e equipamentos do entorno.

Atualmente o Shopping conta com 100.093 m² de área construída (40.716 m² locável), tendo 260 lojas e 2.150 vagas de estacionamentos. Mensalmente recebe mais de 1 milhão de pessoas e gera cerca de 4 mil empregos diretos. A Operação Urbana propõe expandir o Shopping, aumentando-o em 14.636,00 m² a área construída, modificando e valorizando ainda mais o perfil econômico das áreas vizinhas.

Pra

Operação urbana C

Oceano Atlântico Campo Grande Perímetro da Operação Urbana

Santo Amaro

RECIFE

Bacia Portuária

Figura 15 - Operação Urbana C.

67


Parque Metropolitano Memorial Arcoverde Como parte resultante do conjunto das operações urbanas A, B, C e concluindo o Master plan Operação Urbana Memorial Arcoverde, o Parque Metropolitano Memorial Arcoverde é o grande trunfo da metrópole e de sua população, incluindo nesta modelagem a reestruturação viária necessária à implantação deste espaço público (Figura 16). Figura 16 - Parque Metropolitano.

Esta intervenção prevê a recuperação do parque existente, eliminação dos impactos negativos gerados pela implantação das vias de transporte rodoviário, conexão transversal ao eixo viário com o entorno próximo e a implantação de novos usos e equipamentos, assim como a valorização dos já existentes. A concepção do parque propõe a ampliação e valorização do Espaço Ciência, que se abre para o grande parque (Figura 17); a transferência e instalação do Parque de Diversões Mirabilândia, também ampliado e com possibilidade de instalação de novos e maiores brinquedos; a implantação de um oceanário, que se torne a maior atração do parque; contemplava um pleito da época para a implementação do Memorial Luiz Gonzaga; além de uma série de outras atrações, como área de eventos, pista de kart, museu, pavilhões e usina de energia eólica.

Figura 17 - Parque Metropolitano

69


A modelagem econômica da Operação Urbana Memorial Arcoverde está baseada no sistema de permuta, freqüente entre os proprietários de terrenos e os incorporadores imobiliários em Recife, no qual os primeiros cedem seus terrenos e recebem, como contrapartida, áreas construídas. Neste sistema de permuta foi mudado os atores: de um lado o Governo do Estado, detentor da área com benfeitorias infraestruturais e livre de qualquer embaraço legal, de outro a iniciativa privada investindo na área e destinando até 15% do lucro obtido na operação (receita total subtraída do valor investido) para o Governo do Estado reinvestir na mesma área. A Operação Urbana resultaria num custo próximo do zero para os cofres públicos. Fig. 18 – Proposta de ocupação do solo para o Parque Metropolitano Memorial Arcoverde.

O Master plan Operação Urbana Memorial Arcoverde, por fim, deve se estruturar para definir ações de curto e médio prazo, com uma visão comum e linhas estratégicas que promovam a inversão na organização do espaço urbano e contemplem atividades econômicas alternativas que se possam implantar na área, além de melhorar a qualidade de vida dos habitantes em seu âmbito territorial e em seu entorno. Merece também evoluir enquanto plano de ação com projetos detonadores de desenvolvimento, construir um modelo de gestão apropriado para suas interfaces e particularidades, assim como definir estratégias de financiamento à viabilidade dos empreendimentos.

71


Referências BRANDÃO NETO, José de Souza ; CRUZ, Claudio . Território de Oportunidades: Master Plan Operação Urbana Memorial Arcoverde. In: V Seminário Projetar / Processos de Projeto: Teorias e Práticas, 2011. Belo Horizonte, V Seminário Projetar, 2011.

73

BRASIL. Rerratificação do Polígono de Tombamento do Município e seu Entorno, por meio da Notificação de nº. 1155/79. Escritório Técnico de Olinda. 4ª DR/SPHAN/Pró-Memória e Fundação Centro de Preservação dos Sítios Históricos de Olinda, 1985. Disponível em: <http://iphanolinda. files.wordpress.com/2010/12/mapa-2-poligono-de-tombamento-e-preservac3a7c3a3o.pdf>. Acesso em: 24 jul. 2011. OLINDA. Projeto de Lei Complementar nº 032/2008. Plano Diretor do Município de Olinda. Disponível em: <www.olinda.pe.gov.br/portal/plano_diretor.php>. Acesso em: 20 mai. 2011. ___ . Legislação Urbanística dos Sítios Históricos de Olinda. Lei nº 4849/92. Disponível em <www. prpe.mpf.gov.br/internet/.../L%20MUNICIPAL4849.pdf>. Acesso em: 20 mai. 2011. PERNAMBUCO. FIDEM – Fundação de Desenvolvimento Municipal. Plano Diretor da Região Metropolitana do Recife – Metrópole 2010. Recife, 1998. PERNAMBUCO. Agência Estadual de Planejamento e Pesquisas de Pernambuco CONDEPE/ FIDEM. PROMETRÓPOLE. Metrópole Estratégica – Região Metropolitana do Recife/Agência CONDEPE/FIDEM. PROMETÓPOLE. Recife, 2001. PERNAMBUCO. Empresa Pernambucana de Turismo. Inventário do Potencial Turístico de Pernambuco - Invtur. Publicação eletrônica [mensagem pessoal]. Mensagem recebida por <ntoupe@ gmail.com> em 27 jul. 2011. REYNALDO, Amélia (org.). Projeto Urbanístico Recife-Olinda. In: Operações Urbanas: anais do seminário Brasil – França. Brasília: Ministério das Cidades, 2009.

3.Centro Administrativo


Ce nt r o A d m i ni s t r a tiv o

1

Zeca Brandão, Claudio Cruz e Robson Canuto

A

política de modernização da estrutura administrativa e a racionalização dos meios e dos custos operacionais recolocaram a necessidade de se projetar e construir um Centro Administrativo para Pernambuco na pauta das necessidades emergentes. Embora estudos para a implantação de um Centro Administrativo no Estado tenham sido desenvolvidos nos anos 1970, quando da consolidação das atividades do Pólo Metropolitano da Nucleação Oeste, do qual resultaram o Complexo Industrial do Curado, o Terminal Integrado de Passageiros e a linha do metrô, até o presente momento, nenhuma iniciativa prática a esse respeito foi tomada. A administração estatal continua espacialmente pulverizada no tecido urbano tradicional da cidade do Recife, em imóveis que nem sempre suportam as demandas funcionais e também não articulam as diversas partes administrativas. A ausência de um controle eficiente do Estado sobre os seus bens, ao longo dos anos, gerou total desconhecimento do valor de seu real patrimônio. Esta ausência favoreceu o surgimento de vários problemas legais, como a falta de escrituras e registros em cartório, concessão de áreas para usos inapropriados e invasões de propriedades, conforme dados fornecidos pela Secretaria de Administração do Governo do Estado de Pernambuco (SEAD), em 2007. A imprecisão das informações sobre estes bens pertencentes ao Estado tem Os resultados expostos neste capítulo também estão apresentados no artigo “Reabilitação ambiental urbana como critério na escolha da localização do Centro Administrativo de Pernambuco”, elaborado pelos mesmos autores, e aceito para apresentação e publicação nos anais do 5º Congresso Luso-Brasileiro para o Planejamento Urbano Regional Integrado e Sustentável - PLURIS 2012, a ser realizado nos dias 3 , 4 e 5 de Outubro de 2012, em Brasília. 1

75


submetido uma série de imóveis de sua propriedade a um progressivo processo de estagnação e deterioração. Isto pode ser observado, por exemplo, pela existência de grandes áreas urbanas e rurais ociosas e/ou degradadas, bem como em alguns imóveis que, apesar de possuírem um grande valor histórico e localização estratégica, encontramse em péssimo estado de conservação e/ou subutilizados. A ausência de um controle eficiente deste vasto patrimônio imobiliário gera grande despesa com a sua manutenção e conservação, pois muitos imóveis encontram-se sem função administrativa ou cedidos a outras instituições sem a devida rentabilidade. A busca por outros espaços é mais um elemento desfavorável à política patrimonial na gestão estatal. Esta demanda é suprida pela locação de imóveis privados que atendam às necessidades específicas de algumas secretarias, o que acarreta um déficit significativo no orçamento do Governo. A política de modernização da estrutura administrativa e a racionalização dos meios e dos custos de funcionamento da máquina, seja ela pública ou privada, obrigam a discussão de novas alternativas que ajudem a potencializar os recursos e ampliar a capacidade de investimentos, principalmente nos segmentos estratégicos que promovam o desenvolvimento econômico e social do Estado. Neste sentido, uma nova política patrimonial, criada a partir de condições técnicas adequadas à exploração dos bens do Estado, como fator de renda ou de promoção do desenvolvimento, poderá contribuir significativamente para o alcance efetivo da rentabilidade deste potencial imobiliário. Uma política patrimonial sugere ações de curto, médio e longo prazo, voltadas essencialmente para conjugar o conceito de modernidade através da centralização administrativa e física da gestão direta do Governo, a distribuição de órgãos da administração indireta nos imóveis tradicionais e de valor histórico e a geração de fontes de recursos alternativos para investimento na modernização do Estado, potencializando a utilização dos demais imóveis de seu patrimônio imobiliário. Em particular, a primeira destas ações – a centralização administrativa – viabilizase pela elaboração de um novo conjunto edificado urbano que concentre os órgãos da

administração pública direta, caracterizando um Centro Administrativo para o Estado de Pernambuco. O conceito de implementação deste Centro se articula através de três idéias centrais: a otimização da máquina pública administrativa, sua localização estratégica e o caráter cívico e público do equipamento enquanto catalisador de desenvolvimento urbano. O Centro Administrativo tem como objetivos principais equilibrar os gastos com imóveis públicos e ampliar a capacidade de investimento do Estado; revitalizar áreas e enclaves urbanos em processo de deterioração física e ambiental no centro metropolitano; e contribuir com o desenvolvimento urbano e a qualidade ambiental de um território. Assumem, com papel importante para inserção deste empreendimento, as seguintes diretrizes de localização: - Ser implantado em área de relativa proximidade com o centro expandido tradicional da cidade; - Ser dotado de alto grau de urbanidade, integrando-se às características urbanas pré-existentes (alta densidade, sobreposição de usos, integração com a oferta de serviços, comércio local); - Facilidade de acesso, com irrigação plena, prioritariamente, de vários meios de transporte público (linhas de ônibus e metrô ou VLP/VLT), qualidade de passeios públicos para a livre circulação de pedestres e o fácil estacionamento de veículos particulares; - Capacidade de reabilitação urbana do território, enquanto papel de responsabilidade pública na indução de políticas urbanas de promoção à revitalização de áreas degradadas e espaços urbanos segregados. Para o empreendimento em si, são premissas importantes: - A vitalidade urbana através de um mix funcional equilibrado e que garanta alta dinâmica e funcionalidade urbana;

77


- A integração com empreendimentos de natureza privada, sendo agregado a investimentos imobiliários voltados para habitação, comércio e serviço; - A potencial geração de espaços públicos de qualidade, com alto valor simbólico de caráter cívico que o empreendimento deve representar. Este estudo objetivou apresentar uma análise de possíveis zonas para a implantação de um Centro Administrativo com vistas a atender aos anseios do Governo do Estado de Pernambuco, no sentido de equacionar as necessidades geradas pelos princípios contemporâneos de prática administrativa e gestão estatal, com a melhoria do atendimento às funções públicas, partindo-se de um processo de modernização e valorização do seu patrimônio. Antes de tudo foi necessário ter em conta a capacidade física das potenciais localizações em dar suporte ao quantitativo da população de servidores. Os dados fornecidos pela Secretaria de Administração do Governo do Estado de Pernambuco (SEAD) informaram uma população total de aproximadamente 104.056 funcionários ativos, da administração direta e indireta, em todas as regiões do Estado. Neste sentido, para mensurar o número aproximado de funcionários diretos da administração estadual, foram aqui propostas, por secretaria, estimativas de percentuais que, de forma empírica, traduziram um total aproximado da população usuária para o futuro Centro Administrativo. Foram considerados então, cerca de 10.000 funcionários diretos a serem alocados nas futuras instalações do Centro Administrativo, para as quais foi estimada uma área de construção de 120.000m² (valendo-se da relação de 12 m²/funcionário). Pela legislação atual da Cidade do Recife, seriam necessárias 3.000 vagas de garagem para suprir as necessidades de tal empreendimento, o que elevou para 160.000m² a área de construção total. Os dados fornecidos pela Secretaria de Administração, bem como os percentuais considerados para o pré-dimensionamento do Centro Administrativo estão indicados na Tabela 1.

Tabela 1 – Estimativa da população usuária do Centro Administrativo. Fonte: Secretaria de Administração do Governo do Estado de Pernambuco, 2007. Número de servidores

Percentual considerado

Número de servidores considerado

Governadoria do Estado

246

100

246

Vice-Governadoria

26

100

26

Secretaria Especial da Casa Militar

297

100

297

Secretaria Especial dos Esportes

29

100

29

ÓRGÃOS

Sec. Chefe da Asses. Especial do Governador

23

23

23

Secretaria de Administração

606

100

606

Sec.de Desenv.Social e Direitos Humanos

3.290

25

987

Secretaria de Educação

41.922

5

2096,1

Secretaria da Fazenda

1.883

70

1318,1

Casa Civil, Imprensa, Cultura, Secretaria da Mulher, Articulação Social, Articulação Regional, Juventude e Controladoria Geral do Estado

199

100

199

Secretaria de Transportes

149

100

149

Não informado

Não informado

Não informado

Secretaria de Turismo

46

100

46

Secretaria de Agricultura e Reforma Agrária

869

100

869

Secretaria de Saúde

25.043

5

1.252,15

Secretaria de Defesa Social

6.185

10

618,5

125

100

125

Conservatório Pernambucano de Música

96

100

96

Secretaria de Planejamento e Gestão

290

100

290

Sec.Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente

109

100

109

Sec.de Desenv. Social e Direitos Humanos

Não informado

Não informado

Não informado

293

100

293

Secretaria de Justiça e Direitos Humanos

Secretaria de Desenvolvimento Econômico

Procuradoria Geral do Estado Secretaria das Cidades

56

100

56

Corpo de Bombeiros Militar

2.419

0

0

Polícia Militar de Pernambuco

19.620

0

0

104.056

--

9.731

TOTAIS

79


Vale salientar que, sendo uma estimativa, este total serviu como referência para uma primeira análise das possibilidades de implantação. Deve-se ter em conta que seria necessária a projeção do quadro funcional para os próximos anos de governo, para que se chegasse a uma definição mais precisa de dimensionamento e de um programa de necessidades.

• A área situada na Avenida Cruz Cabugá, ocupada pela Vila Naval, nas proximidades do Shopping Tacaruna e da Escola de Aprendizes dos Marinheiros, no bairro de Santo Amaro, propriedade da Marinha do Brasil (Figura 1, letra E). • A área inserida no complexo do Centro de Convenções e da antiga Fábrica da Tacaruna, onde hoje se encontra instalado o Parque de Diversões Mirabilândia, no bairro de Campo Grande, pertencente ao Governo do Estado (Figura 1, letra F).

81

Áreas potenciais A localização de cada uma das seis zonas na planta da cidade do Recife está indicada na Figura 1. No sentido de apresentar uma análise urbanística prévia sobre territórios potencialmente passíveis de atender a tais objetivos, a partir de levantamentos cadastrais, foram identificadas seis áreas livres ou subutilizadas, acima de 40.000 m², todas situadas no núcleo central da cidade do Recife, sendo elas:

CAMPO GRANDE

• Lote sito à Rua General Estilac Leal, 439, entre a Estação de Tratamento de Esgotos da Compesa e o Braço Morto do Capibaribe, onde funciona o 7° Depósito de Suprimento do Exército Brasileiro, no bairro do Cabanga. Trata-se de um território pertencente à União (Figura 1, letra A). • Área da extinta Rede Ferroviária (RFFSA), situada no Cais José Estelita, no bairro de São José. A Companhia Ferroviária do Nordeste (CFN) era, na época de elaboração deste estudo, concessionária desta propriedade. (Figura 1, letra B). • O estoque imobiliário construído, vazio e/ou subutilizado, dos edifícios das avenidas Guararapes e Dantas Barreto (trecho norte), no bairro de Santo Antônio território de referência simbólica do poder público, administrativo, de serviços e de representações comerciais e diplomáticas em Pernambuco. São imóveis particulares (Figura 1, letra C). • O estoque imobiliário construído, não operativo, vazio e/ou subutilizado, existente na face oeste do Porto do Recife, no Bairro do Recife. Os imóveis pertencem à União e são geridos pelo Estado de Pernambuco (Figura 1, letra D).

F

SANTO AMARO

E D BAIRRO DO RECIFE

RECIFE

C

SANTO ANTÔNIO

Oceano Atlântico

SÃO JOSÉ

B A

CABANGA

Figura 1 – Áreas para implantação do Centro Administrativo de Pernambuco na cidade do Recife.


A análise urbanística das seis áreas potenciais, definidas a partir de levantamentos cadastrais, se pautou em uma série de critérios estabelecidos como meio de traduzir as expectativas sobre a melhor localização para a implantação do Centro Administrativo. A equipe realizou uma abordagem quantitativa com a Escala Likert (LIKERT, 1932) de quatro pontos para mensurar a apreciação geral de critérios estabelecidos a partir de condicionantes urbanísticos. A Escala Likert é uma escala de respostas gradativas usada em pesquisas de opinião, neste caso, baseada no conhecimento ad hoc dos técnicos do NTOU. Realizou-se a verificação quanto à apreciação dos critérios (muito bom, bom, regular e ruim), através da obtenção da média da pontuação atribuída às respostas, relacionando a cada localidade a média da apreciação de cada técnico avaliador. Para uma melhor análise da localização foram atribuídos pesos a fim de ponderar a importância de cada critério na decisão da melhor escolha. A soma desses pesos é 10 e eles também foram atribuídos pelos técnicos do NTOU, considerando aqueles de preponderância na viabilização do empreendimento. Foram oito os critérios utilizados: Propriedade – Refere-se à titularidade do terreno; terrenos públicos recebem pontuação maior e terrenos privados recebem pontuação menor. Área – Refere-se metragem de área disponível para o empreendimento; quanto maior a área, maior a pontuação atribuída. Acessibilidade – Diz respeito à facilidade de se deslocar até o local, em todos os sentidos. Leva em consideração as conexões com as redes de metrô, ônibus, transporte individual de carros de passeio e sistemas de circulação de pedestres. Quanto mais conectado ou próximo desses sistemas pré-existentes, maior a nota atribuída. Legislação – Diz respeito à quantidade de restrições presentes na legislação, como na Lei de Uso e Ocupação do Solo, e órgãos de controle urbanístico, como a Companhia Pernambucana de Recursos Hídricos - CPRH, Prefeitura do Recife e Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, necessários para aprovação. Quanto menos restrições ao desenvolvimento de empreendimentos na área, maior a nota.

Sinergia - Proximidade com outros equipamentos e/ou projetos futuros pré-definidos. Quanto mais sinergia, maior a nota. Centralidade – Refere-se à condição de urbanidade em torno da área em questão. Quanto mais dinâmica socialmente e desenvolvida ambientalmente forem as suas proximidades, maior a nota atribuída. Reabilitação ambiental urbana – Refere-se à melhoria e valorização de áreas degradadas adjacentes ou próximas ao empreendimento. Quanto maior o potencial do empreendimento em promover um incremento ao ambiente urbano circundante, maior a nota. Potencial – Refere-se ao potencial construtivo do terreno. Quanto maior o potencial construtivo, maior a nota atribuída, considerando-se que com maior capacidade de geração de área útil, mais atrativo o empreendimento se torna, pois passa a ser possível a comercialização do excedente para o mercado imobiliário. A Tabela 2 sintetiza os resultados encontrados após atribuição de notas a cada área:

TABELA 2 – Análise da localização por atribuição de notas. Critérios

Propriedade

Área

Acessibilidade

Legislação

Sinergia

Centralidade

Reabilitação

Potencial

Pesos

1,75

1

2

0,75

1

1,25

1,25

1

10

São José

2

4

3

4

3

2

2

4

28,70

3

4

3

2

3

3

2

3

28,25

4

3

1

2

3

3

3

3

26,85

3

3

3

4

2

1

2

4

26,60

1

1

3

2

3

4

4

1

24,05

4

2

2

2

2

2

2

2

22,40

Santo Amaro Bairro do Recife Cabanga Santo Antônio Campo Grande

Escala: 1=Ruim; 2=Regular; 3=Bom; 4=Muito bom

83


Percebe-se, a partir da Tabela 3, que a área do Bairro de São José, ocupada pela RFFSA, atinge a maior pontuação dentre todas (28,70 pontos), embora esteja muito próximo do resultado obtido para a área do Bairro de Santo Amaro, ocupado atualmente pela Vila Naval (28,25). Na seqüencia, aparecem, também muito próximos, os terrenos do Bairro do Recife e do bairro do Cabanga (26,85 e 26,60, respectivamente). O território dos bairros de Santo Antônio (Av. Guararapes) e de Campo Grande (Mirabilândia) ocupam as últimas posições, com distâncias relativas dos resultados mais evidentes. Uma avaliação mais pormenorizada das impressões sobre cada uma das áreas é apresentada a seguir, explicando a pontuação de cada uma delas:

85

Rio Capibaribe

SÃO JOSÉ

São José Segundo a legislação urbanística vigente esta área de 155.000 m² possui coeficiente de utilização máximo de 4 e o potencial construtivo chega a 620.000 m². Dentre todas as possibilidades estudadas esta foi a que apresentou melhores condições de acesso viário, tanto por transporte coletivo, como por deslocamento de carros particulares através das Avenidas Sul e José Estelita, que articulam o Centro e a Zona Sul da cidade. Detém o atrativo de se localizar de frente para a bacia do Pina, com orientação Sudeste, que a valoriza não só para a criação de espaços públicos e de lazer contemplativo e náutico, como também para a exploração imobiliária, devido ao alto potencial construtivo do local. Além disso, é uma parcela urbana que integra uma porção antiga do bairro de São José, com os terrenos localizados às margens da Av. Sul e da Rua Imperial, objetos de propostas de investimentos para reabilitação ambiental urbana (Figura 2).

Rua

Sul Av.

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155.000 m2 Av.

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Bacia do Pina Figura 2 – Área no bairro de São José para implantação do Centro Administrativo de Pernambuco.


Santo Amaro

Bairro do Recife

Segundo a legislação urbanística vigente esta área de 165.000 m² possui coeficiente de utilização máximo de 2,4 e o potencial construtivo chega a 396.000 m². O terreno da Vila Naval, com acesso exclusivo pela Av. Cruz Cabugá, apresenta limitações para dar suporte a fluxos mais intensos, bem como um potencial construtivo reduzido, que diminui sua capacidade de atrair investimentos oriundos do setor imobiliário. Por outro lado, é uma área atrativa e nobre do ponto de vista paisagístico, pois estende-se no sentido Norte-Sul com uma extensa frente d’água para a bacia de Santo Amaro, além de encontrar-se próxima a uma região já consolidada como área de grandes equipamentos, localizados no limite entre Recife e Olinda (Figura 3).

Segundo a legislação urbanística vigente esta área de 150.000 m² possui coeficiente de utilização máximo de 2,4 e o potencial construtivo chega a 360.000 m². O terreno do Porto do Recife, pertencente à União e administrado pelo Estado de Pernambuco, foi avaliado como carente de conexões adequadas ao sistema de transporte existente, embora esteja localizado em uma área cujo processo de desenvolvimento é notório. A frente d’água do terreno voltase, como na área anterior, para a bacia de Santo Amaro, mas pelo lado Oeste, o que reduz seu poder de atração de investimentos provenientes do mercado imobiliário. O seu potencial construtivo é limitado por estar dentro do Bairro do Recife, que possui área de preservação tombada a nível Federal (Figura 4).

87

Bacia de Santo Amaro

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SANTO AMARO

165.000 m2 150.000 m2

Figura 3 – Área no bairro de Santo Amaro para implantação do Centro Administrativo de Pernambuco.

Bacia de Santo Amaro

Bacia Portuária

Figura 4 – Área no bairro do Recife para implantação do Centro Administrativo de Pernambuco.

BAIRRO DO RECIFE


Cabanga

Santo Antônio

Segundo a legislação urbanística vigente esta área de 127.000 m² possui coeficiente de utilização máximo de 4 e o potencial construtivo chega a 508.000 m². O terreno pertence à União, sendo utilizado, hoje, por uma unidade do Exército. Embora esteja localizada nas proximidades de diversas artérias de transporte, a área apresenta certo comprometimento no quesito acessibilidade, além de estar menos integrada com as propostas de reabilitação ambiental urbana do centro da cidade. É uma área voltada para o estuário dos rios Jordão, Tejipió e Jiquiá, que formam a Bacia do Pina, uma frente d’água com alto potencial construtivo, com capacidade de atrair o interesse imobiliário residencial, comercial e de serviços, e possibilidade de gerar espaços públicos de qualidade para o lazer contemplativo e náutico (Figura 5).

Não se trata de um terreno, mas sim de um estoque edificado já existente no eixo das avenidas Guararapes e Dantas Barreto. Tem como principal vantagem a localização, a centralidade, a pré-existência de dinâmica urbana e a proximidade com os prédios governamentais tradicionais. A principal desvantagem, por sua vez, é a exigüidade da área disponível, bem inferior ao total estimado para o centro administrativo – só comportaria o programa parcialmente, inclusive quanto ao número de vagas de estacionamento (Figura 6). Esta intervenção é dotada de grande potencial estratégico porque sua centralidade articula projetos urbanos pontuais em áreas da cidade que já estão em processo de recuperação ou devidamente recuperadas. Desta forma, a sua área de atuação se estende para o Bairro do Recife, a leste; áreas ao sul, no bairro de São José, que se tornaram atrativas para novos

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Rio Capibaribe

CABANGA

80.000 m2

Figura 5 – Área no bairro do Cabanga para implantação do Centro Administrativo de Pernambuco.

Av .G

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Av. Dantas B

Bacia do Pina

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127.000 m2

SANTO ANTÔNIO

Figura 6 – Área no bairro de Santo Antônio para implantação do Centro Administrativo de Pernambuco.


investimentos imobiliários públicos e privados; além de se comunicar de maneira muito direta com o bairro da Boa Vista, a oeste, que tem projetos articulados em torno do corredor de transporte Leste-Oeste, que liga o centro à Cidade da Copa. Pelo lado norte, a intervenção ainda se articula com a maior área verde preservada do centro do Recife - o entorno da Praça da República e seus edifícios históricos. Uma fraqueza desta intervenção diz respeito à titularidade múltipla dos imóveis, que demandaria muito tempo em negociações e resultaria num valor possivelmente muito alto das idenizações que tivessem de ser pagas pelas desapropriações. Esta situação inibe os benefícios que a intervenção traria à área em si e ao entorno.

das áreas incluídas na avaliação foram descartadas: a área do Cabanga, quarta classificada; a área do Bairro do Recife, terceira classificada; e a área do bairro de São José, a primeira classificada. Restaram, então, como áreas que preservaram a possibilidade de serem usadas para abrigar o Centro Administrativo de Pernambuco, as áreas do bairro de Santo Amaro, segunda classificada, do bairro de Santo Antônio, quinta classificada e a do bairro de Campo Grande, sexta classificada. Para cada uma destas áreas o NTOU fez um estudo de massa, apresentado a seguir.

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Campo Grande Segundo a legislação urbanística vigente esta área de 45.000 m² possui coeficiente de utilização máximo de 4,3 e o potencial construtivo chega a 193.500 m². A menor dentre todas as áreas, possui o inconveniente de ser dividida entre os municípios de Recife e Olinda, mas ao mesmo tempo beneficia-se por estar próxima a uma área de grandes equipamentos como o Centro de Convenções, o Shopping Tacaruna, o Chevrolet Hall, entre outros. A legislação restritiva só admite o gabarito máximo de oito pavimentos e o potencial construtivo só permite que sejam supridas as demandas do Centro Administrativo em si, sem deixar margem para empreendimentos imobiliários complementares. Mesmo sendo um terreno que conta com uma rede de acessos muito boa, podendo ter conexão com as Avenidas Andrade Bezerra e Agamenon Magalhães, tem pouca vocação para a geração de áreas públicas nobres dignas do programa administrativo estadual (Figura 7). Os técnicos do Núcleo Técnico de Operações Urbanas desenvolveram esta análise de melhor localização do Centro Administrativo de Pernambuco em 2008 quando, até então, havia a possibilidade destas áreas serem usadas para tal finalidade. Mas a dinâmica da cidade mudou as condições existentes e logo três

ezerra

Centro de Convenções

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45.000 m2 Chevrolet Hall

CAMPO GRANDE

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Shopping Tacaruna

Figura 7 – Área no bairro de Campo Grande para implantação do Centro Administrativo de Pernambuco.


Centro Administrativo de Pernambuco em Santo Amaro O Estudo para esta área aproveitou ao máximo o potencial construtivo e também o potencial paisagístico da extensa frente d’água da bacia de Santo Amaro, onde atualmente se localiza a Vila Naval. Esta deverá sofrer uma relocação para outra área próxima, a depender de permuta entre o governo do Estado e a União. A proposta se organiza como uma esplanada alinhada com o cais e a Avenida Cruz Cabugá, que faz a conexão entre o centro do Recife e Olinda. Paralelos a esta avenida foram locados os blocos que abrigam as atividades de atendimento direto ao público e o estacionamento, uma barra horizontal que interliga todas as edificações. Já os nove blocos das secretarias foram posicionados paralelos entre si e perpendiculares à Avenida Cruz Cabugá e ao cais, ocupando o espaço das ruas atuais e preservando, assim, a vegetação existente nos quintais da atual vila. O auditório e as salas de reunião ficaram na extremidade sul do conjunto edificado. O palácio do governo e a vice governadoria foram localizados no conjunto de edifícios ao norte, que está separado do restante do conjunto por um amplo espaço cívico. A área do terreno foi ampliada pela criação de um píer de uso público e recreativo que avança sobre a lâmina d’água. Este píer abrigará uma estação fluvial que conectará o Centro Administrativo com o sistema de navegabilidade previsto para operar no Recife, criando uma alternativa de acesso complementar à modalidade automobilística da Avenida Cruz Cabugá (Figuras 8 a 12).

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Figura 8 – Planta baixa do estudo para Santo Amaro.


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Figura 9 – Perspectiva do estudo para Santo Amaro.

Figura 11 – Perspectiva do estudo para Santo Amaro.

Figura 10 – Perspectiva do estudo para Santo Amaro.

Figura 12 – Perspectiva do estudo para Santo Amaro.


Centro Administrativo de Pernambuco em Santo Antônio A área central da cidade como um todo e, principalmente, a área do bairro de Santo Antônio, têm sofrido ao longo dos anos um lento processo de degradação, sem ter recebido a mesma atenção de programas de recuperação urbana, como aquele que beneficiou o Bairro do Recife. Constatando o crescente esvaziamento dos centros cívicos das cidades, inclusive o de Recife, este estudo propõe ocupar tais vazios com novos empreendimentos, redistribuindo os setores e as atividades produtivas para que a cidade se torne sustentável. O conjunto edificado no eixo da Avenida Guararapes data do final dos anos 1940, contemporâneo à abertura da avenida, sendo parte de um projeto urbano que demoliu grande parte da cidade cuja ocupação teve início ainda no século XVII. É um conjunto uniforme de edifícios em concreto armado, com altura superior a 8 pavimentos, apresentando no térreo uma galeria com sobrelojas em toda a extensão da avenida, com generosos pés-direitos e colunata. Contudo, este espaço semipúbilco dos prédios é usado de forma inadequada para abrigar paradas de ônibus. A proposta aproveita todo o capital edificado e prevê, ainda, sua ampliação, com a construção de dois blocos de estacionamento na parte norte da área - em um terreno de propriedade do Governo do Estado, onde existe o prédio da Secretaria de Educação - para suprir a falta de vagas de estacionamento necessárias ao funcionamento do Centro Administrativo. A saturação da malha viária desta área exige a proposição de alternativas de mobilidade complementares ao transporte automobilístico como, por exemplo, as que já estão em andamento e que prevêem a implementação do Corredor LesteOeste, a melhoria da conexão da área com a estação Central do Metrô do Recife e o aproveitamento do leito do rio Capibaribe, a oeste (Figuras 13 a 15).

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Figura 13 – Planta baixa do estudo para Santo Antônio.

Figura 14 – Perspectiva do estudo para Santo Antônio.


Centro Administrativo de Pernambuco em Campo Grande

Figura 15 – Perspectiva do estudo para Santo Antônio.

De todas as áreas a de Campo Grande é a menor, mas é a única cuja titularidade é do Governo do Estado, havendo apenas a necessidade de serem revistas algumas poucas desapropriações e concessões de uso, a exemplo do Parque Mirabilândia, que funciona no local e poderá ser relocado para uma área próxima, como parte da operação urbana Memorial Arcoverde, vista no capítulo anterior. O potencial construtivo foi utilizado até o limite máximo permitido. As secretarias foram reunidas num único bloco edificado de oito pavimentos que apresenta o partido de pátios internos para otimizar as condições naturais de iluminação e conforto térmico. Utilizou-se aqui o princípio da super-quadra, permitindo-se fazer uma releitura desta tipologia urbana, notadamente na modificação de seu uso original - de residencial para institucional. Contíguo a este bloco, na face leste, foram localizados um grande auditório e salas de reunião. O estudo também se aproveitou da proximidade com grandes equipamentos de escala metropolitana - como o Centro de Convenções, o Shopping Tacaruna, o Chevrolet Hall, entre outros - para propor um programa mais variado, como uma torre de hotel no lado oeste, onde seriam atendidas as demandas por vagas de hospedagem para turismo cultural, no centro histórico de Olinda, e de negógios, no Centro de Convenções. O uso compartilhado dos espaços públicos desses equipamentos foi otimizado, como no caso dos estacionamentos. Na proposta, dois novos pavimentos seriam inseridos, fazendo uso do desnível entre o terreno existente e o térreo do Centro de Convenções. A proposta fez uso da boa rede de acessos das avenidas Andrade Bezerra e Agamenon Magalhães e considerou que o aumento de fluxo na área, resultante do Centro Administrativo, seria atendido através da construção do Corredor Norte-Sul de transporte coletivo, a ser implantado como parte do plano de mobilidade da Região Metropolitana do Recife (Figura 16).

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A relevância das três propostas de desenho urbano para um Centro Administrativo de Pernambuco, apresentadas aqui, é que elas se caracterizam por estarem localizadas na área central do Recife ou muito próximas a ela. Estas são áreas urbanas consolidadas, com fortes valores concretos e simbólicos, que possuem condições de receber tal empreendimento e de beneficiar-se com ele, promovendo, principalmente, uma profunda reabilitação ambiental urbana, inclusive dos recursos hídricos navegáveis e do patrimônio histórico. As três propostas também exemplificam a tendência de ocupar o centro tradicional da cidade e as áreas já consolidadas, com usos passiíveis de substituição, sem expandir a malha urbana. Esta é uma tendência contrária àquela que a literatura expõe amiúde (SEGAWA, 2002), de localizar centros administrativos, estatais ou empresariais, em áreas suburbanas. As propostas que previram novas edificações, notadamente no bairro de Santo Amaro e Campo Grande, apresentam espaços públicos cujos desenhos encontram similaridade com princípios modernistas: volumetria concisa que resulta de princípios operativos, edifícios isolados, mas conectados, proposta de espaços verdes e vazios em contraste com a cidade tradicional, tipologias de torres e volumes horizontais prevendo, todavia, outros usos que não apenas o institucional e conectando a nova intervenção à malha urbana pré-existente. É necessário que as propostas contemplem, também, um plano de reocupar os edifícios que venham a perder suas funções administrativas oficiais. Caso contrário, podem surgir vazios urbanos contraproducentes à dinâmica e à vitalidade dos lugares.

Figura 16 – Perspectivas do estudo para Campo Grande.

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Referências LIKERT, Rensis. A Technique for the Measurement of Attitudes. Archives of Psychology, v. 22, n. 140, 1932.

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PERNAMBUCO. Assembléia Legislativa do Estado de Pernambuco: Lei nº 13.394. Disponível em: <http://200.238.107.83/c/document_library/get_file?uuid=18bfa7af-34ee-46fb-84e7a1ebe7c44a3f&groupId=11927>. Acesso em: 03 Nov. 2011. PERNAMBUCO. Constituição do Estado de Pernambuco. Disponível em: <http://www. alepe.pe.gov.br/downloads/legislativo/ConstituicaoEstadual.pdf>. Acesso em: 03 Nov. 2011. PERNAMBUCO. Decreto 27.122 de 25 de setembro de 2004. Disponível em: <http://200.238.107.83/c/document_library/get_file?uuid=a0df1476-534c-41fc-966a9a75367fe663&groupId=11927>. Acesso em: 03 Nov. 2011. RECIFE. Lei de Uso e Ocupação do Solo. Anexo 8. Requisitos de Estacionamento para Usos e Atividades Urbanas Disponível em: <http://www.recife.pe.gov.br/pr/leis/luos/index.html>. Acesso em: 03 Nov. 2011. SEGAWA, Hugo. Arquiteturas no Brasil 1900-1990. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2002.

4 . Po r t o


Po r t o

1

Zeca Brandão, Cristiano Borba e Luiz Carvalho

A

história do Porto do Recife está ligada ao surgimento e ao desenvolvimento socioeconômico e cultural da cidade, do Estado de Pernambuco e do Brasil, a partir do Século XVI. Com a ocupação holandesa, no Século XVII, o Porto e a cidade ganharam expressão e importância, que se consolidaram nos séculos seguintes, durante os quais o Porto manteve sua operacionalidade no atendimento ao transporte de cargas em geral, principalmente exportação de matérias-primas e importação de manufaturas. Ao longo do tempo, o Porto passou por diversas reformas e ampliações, como a que foi concluída no começo dos anos 1920, e conferiu ao Bairro do Recife os aspectos urbanísticos que, em linhas gerais, permanecem até hoje (Figura 1). A configuração territorial do Porto, resultado destas reformas, corresponde à face leste da Ilha do Bairro do Recife e do Cais de Santa Rita, no Bairro de São José, e ao molhe de proteção construído sobre uma barreira original de arrecifes. Todo este perímetro está situado às margens da bacia do Pina e é delimitado pelo rio Capibaribe, pelos cais da Av. Alfredo Lisboa e de Santa Rita, e pelo braço da barra nova do rio Beberibe. Em decorrência deste contexto histórico, a área encontra-se enquadrada em legislações específicas de proteção patrimonial em níveis Municipal e Federal. No âmbito Federal, incluem-se a Praça do Marco Zero, localizada no Bairro do Recife Este capítulo é uma versão revisada do artigo “O pragmatismo do desenho urbano com memória: a operação urbana Cais do Porto”, apresentado no III Seminário Projetar, realizado em Porto Alegre, em 2007, e publicado nos anais deste evento e no VI Caderno de Arquitetura Ritter dos Reis. 1

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e inserida no perímetro de tombamento do IPHAN, e o entorno da Igreja do Pilar, tombada como monumento isolado. No âmbito Municipal, as parcelas do Bairro do Recife onde se localizam os armazéns do porto inserem-se no Setor de Intervenção Controlada, e o trecho do Cais de Santa Rita é considerado área de proteção ambiental, ou área de entorno, com propostas de ocupação sempre sujeitas a análises especiais quanto ao impacto ambiental. Como consequência da alteração da logística portuária nas últimas décadas, o Porto do Recife adaptou-se às necessidades do transporte marítimo até o limite a partir do qual se tornou imperativa a construção de outro porto, fenômeno também recorrente em demais contextos urbanos similares ao apresentado, no âmbito mundial. No caso presente, para atender a demanda do Estado de Pernambuco e das regiões vizinhas, optou-se pela construção do Porto de Suape, no final dos anos 1960. Localizado a cerca de 40 Km ao sul, o Porto de Suape recebeu, nos anos seguintes, muitas das atividades do Porto do Recife, reduzindo as operações deste e deixando áreas ociosas ou com usos passíveis de desativação. Estas áreas suscitaram discussões e planos para sua reocupação, implicando na transformação do Bairro, com a fixação da população residente e ampliação da oferta de comércio, serviços e lazer. A faixa costeira de Recife e Olinda, incluindo os terrenos ocupados pelo Porto, seus armazéns e equipamentos, já vinha sendo objeto de discussão de planos metropolitanos, como o Metrópole 2010 e o Metrópole Estratégica, elaborados pela Fundação de Desenvolvimento da Região Metropolitana do Recife - FIDEM, órgão estadual responsável pelo planejamento territorial metropolitano até 2003, quando se tornou Agência CONDEPE/FIDEM. Tais planos conceituavam o conjunto de terras da União situado nesta faixa, como um “Território de Oportunidades”. Entedia-se por “oportunidades”, a possibilidade de tais terras virem a ser cedidas para a realização de operações urbanas que trouxessem vantagens às municipalidades em que estavam localizadas, no caso, as cidades do Recife e de Olinda (PROJETO RECIFE | OLINDA, 2005; PROJETO URBANÍSTICO RECIFE-OLINDA, 2006). Figura 1- Vista aérea do atual Porto do Recife. Foto: Antônio Melcop

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OLINDA Sendo assim, convergiu para este “território” uma sinergia de esforços e interesses, que relacionavam o vínculo histórico e a tradicional interação econômica e cultural entre essas duas cidades, à possibilidade de atração de futuros investimentos públicos e privados às suas zonas de frente d’água. Com tal objetivo, foi delimitada uma área constituída predominantemente por terrenos vazios, ociosos ou com usos passíveis de desativação para ser alvo de futuras intervenções urbanas. O conjunto de ações propostas para estas áreas foi sintetizado pelo Projeto Recife-Olinda, um amplo projeto metropolitano de reestruturação urbana celebrado através de um convênio entre as três esferas de poder executivo (Federal, Estadual e dos municípios envolvidos) e realizado com a consultoria da empresa portuguesa ParqueEXPO. O projeto pretendia estabelecer uma centralidade metropolitana através do redesenho da faixa costeira, integrando as paisagens urbanas dos dois municípios. As diretrizes apresentadas pelo Projeto Recife-Olinda deveriam estar, ainda, em consonância com o valioso conjunto urbano edificado pré-existente e com as particularidades do meio ambiente natural e do contexto sócio-econômicocultural do território. A área do Porto do Recife está inteiramente inserida na Zona de Abrangência do Projeto Recife-Olinda (Figura 2).

Projeto Recife-Olinda

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Oceano Atlântico Bairro do Recife

RECIFE

Bairro de São José

Projeto Recife-Olinda

Figura 2 - Área do Projeto Recife-Olinda e, sobre ela, a área portuária do Recife.

Área Portuária


Figura 3 - Áreas não-operacionais do Porto do Recife liberadas para reciclagem (página ao lado).

111 ha Lin rea Fér

No início do ano de 2007, com a entrada de uma nova equipe de governo, verifica-se um redirecionamento político em Pernambuco. A nova equipe opta pela permanência das atividades na porção Norte do Bairro do Recife e pela manutenção das operações do Porto da capital, pelo fato deste ainda exercer papel relevante na economia de Pernambuco, devido a sua capacidade para exportação da produção açucareira e a importação e armazenagem de trigo. Por tal motivo, foi elaborado pela empresa Porto do Recife S/A um estudo de ocupação, sendo definidas as suas áreas operacionais e não-operacionais. O resultado desse estudo indica, efetivamente, quais áreas são passíveis de abrigar novos usos e quais devem permanecer com as atividades portuárias. A definição das áreas não-operacionais e o interesse em realizar intervenções sobre elas, favorecendo arrendamentos à iniciativa privada, foram aprovados pelo Conselho de Administração Portuária do Porto do Recife. Ficaram liberadas para propostas de reciclagem as áreas de cais do bairro do Recife e do bairro de São José, ocupadas por equipamentos desativados ou sem uso rentável (Figura 3). As áreas não-operacionais do Porto do Recife liberadas para reciclagem representam uma porção significativa do waterfront dos bairros de São José e do Recife, incluindo os armazéns e espaços adjacentes. A reciclagem se insere na área do Porto Organizado do Recife, integrada ao Programa de Arrendamento de áreas e Instalações Portuárias, e ao Programa de Revitalização de Áreas Portuárias - REVAP, da Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ. Diante deste contexto, das demandas surgidas com o novo posicionamento do Porto do Recife e tendo o Projeto Urbanístico Recife-Olinda como referencial, o NTOU redesenhou a área portuária não-operacional com o objetivo de abrigar um complexo de turismo, cultura e lazer, de escala metropolitana, a ser executado pela iniciativa pública e com uso cedido a particulares, nos termos da lei. O projeto foi desenvolvido em dois momentos e abrangeu a área não-operacional do porto situada no Bairro do Recife e de São José. Num primeiro momento, foi realizado um master plan para toda a área; e no segundo momento, esta primeira proposta

Bairro do Recife

RECIFE

Oceano Atlântico Armazéns

Arrecifes

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Armazéns

São José a nh a Li érre F


foi aprofundada, tanto na escala edilícia, quanto urbana, com projeto arquitetônico executivo para o setor de intervenção do Bairro do Recife. O objetivo do NTOU foi estabelecer diretrizes de desenho urbano, ressaltando a oferta qualitativa de espaços públicos, e desenvolver uma intervenção sobre a paisagem, considerando o contexto pré-existente. A estratégia utilizada considerou o redesenho de partes de projetos anteriormente propostos para a área portuária, em função de oportunidades específicas, como a Copa do Mundo de 2014, que terá o Recife como uma das sedes. Esta oportunidade de tratar as ações de forma articulada pode ser metodologicamente replicada em novos territórios e com as mais variadas escalas de planejamento urbano.

Caracterização da área de intervenção A área portuária, objeto da intervenção, compreende fragmentos tanto do Bairro do Recife, quanto do Bairro de São José, como delimitado anteriormente. As faixas de terra sobre as quais se situam os equipamentos correspondem aos aterros dos séculos XVIII e XIX do processo de expansão e reforma do porto, compondo os atuais cais do Recife e de Santa Rita, respectivamente. Ambos os casos são terrenos em frentes d’água, voltados para o estuário formado pelas bacias dos rios Capibaribe, Beberibe, Pina e Jordão nas suas desembocaduras no oceano Atlântico, que formam um braço de mar protegido das ondas pelo molhe. No Bairro do Recife, situam-se os armazéns 10 e 11, localizados ao norte do Marco Zero; e os armazéns 12, 13 e 14, posicionados ao Sul deste praça. Todos os equipamentso do cais do Bairro do Recife são acessíveis pela Avenida Alfredo Lisboa, que cruza o bairro no sentido Norte-Sul. Os demais equipamentos localizam-se no Bairro de São José, na porção Norte do Cais de Santa Rita. Nesta região, apenas o armazém 15 e o edifício do Pescado Silveira encontram-se sobre o cais propriamente dito, estando os armazéns 16 e 17 situados na margem oposta da Avenida Sul, que ladeia o cais.

Todos os equipamentos encontram-se sem utilização, com exceção dos armazéns 12 (que deveria funcionar como Terminal de Passageiros do Porto) e 14 (funcionando como palco de eventos, o chamado Teatro Armazém). Além desses, merece ressalva também o antigo prédio do Pescado Silveira, ocupado atualmente por 54 famílias sem-teto. O Pescado Silveira e o armazém 14 são exceções também com relação aos aspectos arquitetônicos. Enquanto que todos os demais apresentam características tectônicas semelhantes (construídos com estrutura pré-fabricada mista de concreto aparente e metal, fechamento em alvenaria simples e coberta montada sobre treliças metálicas), o armazém 14 apresenta todas as fachadas decoradas com motivos ecléticos, típicos de finais do século XIX e início do século XX. Já o edifício do Pescado Silveira é um exemplar que demanda especial atenção por ter sido originalmente concebido pela equipe do arquiteto modernista Luís Nunes 2 na década de 30 do século XX. É um edifício que apresenta características típicas do repertório formal do modernismo brasileiro da primeira geração, com estrutura independente em concreto armado, o uso de panos de cobogós e lajes planas. Dado o estado de abandono, seguido pela ocupação informal, muitos desses elementos encontram-se hoje descaracterizados ou deteriorados (Figuras 4 a 9). Outros dois elementos de destaque no perímetro de estudo são de natureza infra-estrutural. Um deles é a linha férrea que atravessa os dois cais (de Santa Rita e do Recife) e segue em direção ao Sul do município. Há o indicativo de que os trilhos devem ser mantidos em nome de eventuais necessidades de acesso de trens de carga à área operacional do Porto ao Norte do Bairro do Recife, além de se tratar de uma das mais antigas linhas ferroviáras implantadas no Brasil. O outro elemento de destaque é a ponte 12 de Setembro, que faz a conexão entre os bairros do Recife e São José por sobre o estuário Sul do rio Capibaribe. A atual ponte está situada ao lado das ruínas do embasamento da antiga ponte giratória. Tal ponte permitia, até meados do século XX, a entrada de embarcações, por via fluvial, até o Cais da Alfândega, este já voltado para o continente. Luís Nunes é autor de projetos referenciais da arquitetura moderna pernambucana, como a Caixa D’água de Olinda e o Pavilhão de Verificação de Óbitos (atual IAB Pernambuco), identificadas em publicações internacionais como o “Brazil Builds” e a revista Architecture d’Aujourd’hui. 2

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Figura 4 - Marco Zero do Recife com os armazéns 12 (direita) e 11 (esquerda) no Cais do Porto do Recife. Figura 5 - Armazém 14 (esquerda) e 13 (direita) no Cais do Porto do Recife

Figura 6 - Armazém 14 em primeiro plano; vista da área livre lindeira aos armazéns e à Av. Alfredo Lisboa. Figura 7 - Armazéns 16 e 17 no Cais de Santa Rita.

Figura 8 - Edifício do Pescado Silveira, Cais de Santa Rita. Figura 9 - Armazém 15, com o edifício do Pescado Silveira ao fundo. Fotos: Luís Moriel

Ainda merecem destaque dois elementos com caráter de lazer contemplativo. Um deles é o molhe do cais, que deve ser objeto de projeto específico de requalificação, visto que suas características naturais, aliadas à paisagem urbana e ao seu papel importante quanto às referências culturais e históricas, mostram-se como potenciais atrativos à visitação, cujo aproveitamento é restringido e inibido pela precária infraestrutura existente. Outro elemento é a Praça do Marco Zero, que está dentro do perímetro de tombamento do IPHAN, situada entre os armazéns 12 e 11. A praça e o molhe foram objetos de requalificação entre os anos 1999 e 2000. No molhe, foi erguido o Parque das Esculturas, de autoria de Francisco Brennand; já a praça do Marco Zero, ampliada, transformou-se num espaço multiuso, com piso tratado com um trabalho de Cícero Dias. Por conta de tantas particularidades e referências históricas e culturais presentes neste território, entende-se que quaisquer propostas de reutilização devem levar em conta não só questões técnicas e de viabilidade econômica, mas também contemplar reflexões sobre a permanência de registros da memória da história urbana do centro do Recife (BRASIL, 2005).

A proposta de reciclagem A proposta apresentada tem por objetivo conciliar os seguintes interesses: (a) do Porto do Recife, que espera transformar seu patrimônio ocioso em uma oportunidade de geração de renda; (b) dos potenciais investidores privados, que precisam ser apresentados à projeção de um cenário viável e atrativo para investimentos; e (c) dos poderes públicos, Estadual de Pernambuco e Cidade do Recife, que prezam pelas contrapartidas sociais e tributárias que os investimentos deverão propiciar. Além da conciliação de interesses, que pressupõe um equilíbrio entre rigidez e flexibilidade no desenho da proposta, entende-se que o projeto deve ainda resolver questões de natureza artística e cultural, haja vista a importância do território para a memória da cidade (BARNETT, 1982; SALES, 2005).

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Se concessões devem ser feitas para que o projeto seja atraente do ponto de vista econômico, algumas restrições também devem ser impostas – o cerne conceitual da proposta é a valorização do caráter público do lugar, a possibilidade da população usufruir os espaços costeiros, os usos poderem propiciar uma vivência democrática e permanente da cidade e que a intervenção extrapole a importância local e potencialize a revalorização da região central da Região Metropolitana como um todo (BRANDÃO, 2006). Em síntese, a proposta se orienta tanto por diretrizes gerais, que contemplam todo o perímetro do território (Cais do Porto do Recife, Cais de Santa Rita e ponte 12 de Setembro) dando-lhe coesão, como por recomendações pontuais, referentes a padrões de re-ocupação dos edifícios e dos passeios públicos, considerados individualmente em pormenor.

O programa O estoque edificado liberado pelo Porto do Recife deverá abrigar os seguintes usos: comercial, de serviços e escritórios; atividades de lazer, turismo e convenções; e estacionamento. Existe, ainda, a intenção de permanecer com atividades náuticas nas bacias do centro do Recife. Embora as atividades logísticas do terminal de cargas tenham se reduzido, as condições do porto de receber navios de turismo ainda se mantêm, sendo reforçada pela construção do terminal de passageiros na extremidade Norte do porto, que possui maior área de manobra e profundidade mínima adequada a este tipo de embarcação. Do mesmo modo, podem ser potencializadas a passagem e a permanência de embarcações particulares, aproveitando a posição privilegiada da cidade em relação às rotas marítimas do Atlântico Sul. Além do cais já existente, deve ser implantada uma marina flutuante ao longo do Cais de Santa Rita, trecho mais largo da bacia do Pina. Consequentemente, com o afluxo de pessoas à área, o potencial turístico se eleva e a necessidade de hospedar ou dar apoio hoteleiro aos visitantes ganha importância. Essa tendência termina por acarretar a necessidade de acrescentar ao programa equipamentos hoteleiros de nível internacional.

Sugere-se, ainda, a instalação de equipamentos culturais, mantendo a tradição da área de abrigar manifestações artísticas locais, nacionais e internacionais já preconizada pelo próprio Teatro Armazém.

Conceito geral - memória portuária e espaço público Um dado importante para a linha de raciocício projetivo é o desenho do “skyline” na área quando visto a partir da água. A visão da cidade a partir do mar é recorrente em relatos históricos, além da expectativa de que a utilização da água com fins de turismo e lazer na área tende a aumentar. Com isso o resgate da paisagem urbana, descrita pelos documentos históricos de portugueses e holandeses como a grande entrada da cidade, passa a ser imprescindível à lógica projetiva. Compreende-se que os usos estão sendo renovados, mas a relação cidade-água se intensifica. Sendo assim, conceitualmente, pretende-se manter e valorizar a memória portuária da área. Por manutenção da memória portuária, entende-se a conservação da paisagem consagrada no imaginário da cidade das atividades do porto - a imagem dos armazéns, a idéia do cais (espaço livre voltado para a água), as máquinas (gruas, guindastes). Além disso, por motivo de economia e coerência com a proposta, devem ser evitadas modificações estruturais na área dos cais que possam comprometer as suas integridades3. Outro princípio que norteia a proposta é a setorização dos usos programados para a área, considerando a relação que devem ter com a acessibilidade e/ou com a paisagem natural. Atividades que demandem maior facilidade de acesso devem facear a Avenida Alfredo Lisboa, enquanto as mais voltadas à permanência e contemplação devem se localizar sobre os cais, voltados diretamente para a água. De maneira geral, a proposta define o conjunto dos dois cais e da antiga ponte giratória como um grande espaço público linear e contínuo, com abertura de visuais para os corpos d’água. A conexão entre os cais de Santa Rita e do Bairro do Recife deve ser feita através de uma larga passarela implantada ao lado da ponte 12 de Setembro, de modo que se possam visualizar as ruínas da ponte giratória e também ressaltar a sua pré-existência como elemento fundamental da vocação flúviomarítima da cidade. Segundo prospecções, a estrutura física deste cais é consideravelmente frágil, tendo sido montada a partir de enrrocamentos e arrimos simples, sem estaqueamento. Torna-se inviável, portanto, realizar sobre eles escavações ou movimentações de terreno sob o risco de desmoronamento. Um reforço estrutural seria possível, mas acarretaria altos custos à intervenção. 3

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Intervenções na escala edilícia

Proposta para o Bairro de São José

O estudo, inicialmente envolvendo apenas a escala do desenho urbano, também foi dirigido para a escala edílicia, já que o projeto deverá prezar pela coerência das partes com o conceito articulador geral (BARNETT, 1982; BRANDÃO, 2002; LANG, 2005). Como diretriz geral, entende-se que as estruturas arquitetônicas devem ser mantidas, garantindo a originalidade e o caráter de intervenção sobre o existente. Caso necessitem ser removidas em sua totalidade, devem dar lugar a novos equipamentos que se proponham a dialogar com o contexto pré-existente, mas que apresentem características plásticas que denotem com clareza a sua contemporaneidade (BRANDÃO, 2002). Considerando essa diretriz e os próprios padrões tipológicos e morfológicos das edificações na área de intervenção, três modelos diferentes de ocupação são estabelecidos: (1) ocupação por inserção de novos elementos em estruturas pré-existentes com manutenção da leitura de “galpão”, mas com possibilidade de alterações volumétricas e das fachadas - referente aos armazéns 10, 11, 12 e 13 e 16 e 17; (2) ocupação apenas do interior do edifícios, com manutenção e restauração da volumetria e das fachadas originais - referente ao armazém 14 e ao edifício do Pescado Silveira; (3) ocupação por substituição de estruturas - referente à demolição do armazém 15 e implantação de novas estruturas edilícias de natureza distinta da original. Estes modelos de ocupação serão melhor aprofundados nas propostas realizadas para o Bairro do Recife que, como dito, teve o projeto arquitetônico realizado em nível executivo.

As propostas de intervenção para as áreas não-operacionais do porto localizadas no Bairro de São José compreendem os armazéns 15, 16, 17, 18 e o Edifício do Pescado Silveira, situados em ambas as margens da linha férrea que, nesse trecho, corre pela Avenida Sul, paralela ao cais (Figura 10 e 11). Como já dito, estes estudos foram elaborados a nível de master plan. O conjunto formado pelo edifício do Pescado Silveira e o armazém 15 demanda uma abordagem especial. Considera-se que o edifício do Pescado, da mesma maneira que o armazém 14, apresenta características bem definidas de um pensamento arquitetônico típico de uma determinada época. Merece, portanto, ser valorizado devendo ser referencial para as novas intervenções propostas no seu entorno. Sendo assim, as novas ocupações devem ser balizadas pelas suas características, abrindo-se mão da conservação do armazém 15 - que sendo uma repetição do mesmo modelo dos anteriores, não acarretaria em perda da memória do seu padrão arquitetônico. Propõe-se, portanto, a substituição do armazém 15 por um conjunto de edifícios que remetam ao padrão de ocupação do cais antecipado pelo Pescado Silveira (torre sobre pódio), considerando-se, porém, a relevância de se manter a permeabilidade visual e física no pavimento térreo. Sendo uma ocupação com grande área construída e estando em uma zona nobre no conjunto, próxima ao ponto previsto para a implantação da marina, entende-se que o complexo edificado sobre o Cais de Santa Rita deve abrigar o programa do hotel-marina. A concessão a um empreendimento de tal envergadura, inclusive com a necessidade de demolição do armazém 15, traria como contrapartida o benefício de garantir a revitalização do edifício do Pescado Silveira e elevá-lo à condição de patrimônio preservado.

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121

Armazém 15 Cais do Porto Edifício Pescado Silveira

Av e

ni

da

Su

l

Linha férrea

Armazéns 16, 17 e 18

Bacia Portuária

Figura 10 - Áreas portuárias passíveis de abrigar novos usos no bairro no Bairro de São José.

Figura 11 - Foto áerea do setor de intervenção no Bairro de São José. Foto: Luís Moriel


A distribuição do programa é a seguinte: na barra horizontal, administração e apoio do hotel e da marina e o estacionamento; no terraço (cobertura da barra horizontal), a área de lazer do hotel (piscina, bar, restaurante, etc.); nas torres, os apartamentos do hotel (Figuras 12 a 16). Para o conjunto formado pelos armazéns 16, 17 e 18, entende-se que o programa mais adequado é o de Centro de Convenções, em decorrência da sua localização mais distante do cais e da proximidade imediata ao complexo do hotel-marina. Considera-se, entretanto, que essa condição urbana dos armazéns somada ao processo de revitalização que ocorrerá nesta área com a operação urbana, justifica, ainda, a inserção de algumas lojas no pavimento térreo, transformando a estreita rua de serviço que hoje existe entre os dois em uma alameda comercial. Está prevista, ainda, a inserção de uma passarela de pedestres sobre a Av. Sul conectando o conjunto deste centro de convenções ao complexo do hotel, de modo que os dois programas funcionem em complementariedade. O programa distribui-se da seguinte maneira: térreo - lojas, área livre, apoio/serviços do centro de convenções e estacionamento; e pavimentos superiores - centro de convenções (Figuras 10 a 16).

123

Figura 12 - Planta do estudo para o bairro de São José.

Figura 13 - Fachadas do estudo para o bairro de São José.


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Figura 15 - REVAP São José.

Figura 14 - Fotomontagem do estudo para o bairro de São José.

Figura 16 - REVAP São José.


Armazém 7

Proposta para o Bairro do Recife

Armazém 8

As propostas de intervenção para as áreas não-operacionais do porto localizadas no Bairro do Recife foram desenvolvidas tanto a nível de master plan, que também envolveu o setor do Bairro de São José, já apresentado, quanto a nível de projeto executivo, onde as escalas urbanas e edilícias do Cais do Porto do Recife foram melhor detalhadas (Figura 17 a 20). Os armazéns foram estudados conforme os modelos de ocupação estabelecidos no master plan. As propostas para os armazéns 9, 12 e 13 enquadram-se no primeiro modelo de ocupação, que mantém a leitura de “galpão”, mas introduz outros elementos arquitetônicos para comportar os novos usos. Neste sentido, as intervenções devem transformar os armazéns em edifícios com até dois pisos úteis e arranjos flexíveis que comportem variações, como inserção de mezaninos ou espaços com pés-direitos duplos. Considera-se a possibilidade de substituição dos fechamentos em alvenaria e avanços volumétricos para além da linha da fachada, como balcões em balanço ou decks avarandados, contanto que seja mantida a estrutura original. A leitura de galpão é garantida externamente com a permanência da volumetria geral do edifício e internamente com a manutenção do pé direito único nas suas extremidades, funcionando como grandes entradas dos equipamentos e permitindo a leitura espacial original dos armazéns. A distribuição do programa se apresenta da seguinte forma: no térreo são propostos bares, restaurantes, lojas e equipamentos de lazer em geral; e nos mezaninos e pavimentos superiores foram colocados escritórios (Figuras 21 a 24). O Armazém 14 enquadra-se no segundo modelo de ocupação, que prevê a manutenção e restauração da volumetria e fachadas originais. Para esta estrutura, propõe-se o uso de lazer e cultura, visto que a edificação já funciona como um teatro. A intervenção, por sua vez, considera as condições de conservação dos seus

Bacia127 Portuária

Linha Férrea

Armazém 9

Armazém 11

Cais do Porto

Praça do Marco Zero Armazém 12

Armazém 13

Figura 17 - Áreas portuárias passíveis de abrigar novos usos no bairro no bairro do Recife.

Armazém 14

Arrecifes

Armazém 10


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Figuras 18, 19 e 20 - Imagens da maquete física da intervenção no Bairro do Recife. Foto: Antônio Melcop


elementos de arquitetura eclética e propõe o restauro do envelope do edifício, sem a descaracterização das fachadas e da sua volumetria original. Também se considera necessária a manutenção do pé direito único na entrada principal do equipamento, para garantir a leitura espacial do galpão.

Figura 21 - Perspectiva axonométrica do armazém reformado. Figura 22 - Planta, cortes e fachadas dos armazéns reformados


Figura 23 - Vista interna do armazém reformado.

Figura 24 - Vista externa do armazém reformado.

Em relação aos espaços abertos em torno dos armazéns, entendidos na proposta como um grande espaço público linear e contínuo, e considerando ainda um provável incremento nas demandas por áreas livres e estacionamentos, o projeto atua na melhoria dos espaços destinados aos pedestres, na utilização de novas modalidades de transporte público e no incremento da capacidade de estacionamento de veículos, que no Bairro do Recife já está esgotada (Figura 25). Foi estimado para o conjunto de intervenções um total de mil vagas de estacionamento distribuídas ao longo da Avenida Alfredo Lisboa. A oferta de estacionamentos seria mais um serviço passível de arrendamento a empresas privadas e que renderia receita ao Porto. A continuidade espacial e a valorização da escala humana presentes na proposta devem ser levadas também ao nível do transporte coletivo. Os trilhos do antigo trem de transporte de cargas do porto merecem atenção especial e conservação (Figura 26). No Projeto Recife-Olinda, já havia a previsão de um meio de transporte coletivo leve, que fizesse a interconexão de forma rápida entre os diversos setores do projeto, margeando a frente marítima. Neste sentido, a possibilidade de instalação futura de um veículo leve sobre trilhos (VLT), não deve ser descartada, por se tratar de uma alternativa de baixo impacto ambiental, adequada para o espaço público, viável mesmo em zonas pedestrianizadas, que poderia conectar o bairro do Recife aos bairros adjacentes. Atrelado a este sistema também se propõe a implantação de uma ciclovia. Espera-se que a multiplicação das alternativas de transporte coletivo e o uso de bicicletas como meios de deslocamento dentro do território de frente d’água revitalizado funcionem em articulação com o sistema de estacionamentos propostos. Deveria ser possível ao usuário, por exemplo, chegar de carro ao local e, ao pagar pelo uso do estacionamento dentro das zonas previstas, ter direito de circular de um ponto a outro da área no VLT, sem a necessidade de uma tarifa adicional (figura 27).

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Figura 25 - Planta e vista da intervenção no bairro do Recife.

Figura 26 - Armazéns reformados com fachadas voltadas para o cais.

Figura 27 - Vista geral da intervenção.


sustentáveis. Seus desdobramentos tendem, inclusive, a se verificar em prazos mais curtos que os esperados nos tradicionais planos genéricos e generalizantes (PORTAS, 1998). Não menos importante é a experiência sobre a capacidade de conciliar investimentos em infra-estrutura e espaços públicos com geração de renda – tanto do setor privado como da municipalidade envolvida. Para os profissionais envolvidos na concepção projetiva, trata-se de um novo aprendizado – tanto da tentativa de levar para a práxis urbana os conhecimentos adquiridos sobre a qualidade de vida no espaço público, como da chance de repensar as referências negativas e as críticas infundadas sobre as potencialidades das parcerias com os agentes dos investimentos privados.

Figura 28 - Vista geral da intervenção.

Desenvolver uma prática reflexiva do projeto urbano para reciclagem das estruturas do Porto do Recife é provocar o surgimento de uma nova prática de planejamento das cidades do Estado de Pernambuco. Os hábitos tradicionais de macro-planejamento, voltados para a escala regional e, muitas vezes, guiados mais pelos índices econômicos que por dados da realidade construída da cidade padecem de imprecisão, resultando em cidades materializadas da maneira mais lucrativa somente para alguns dos agentes envolvidos. Historicamente, percebe-se que a vantagem é dos investidores, sem garantia de impactos positivos os seus moradores (MCGLYNN, 1993). O planejamento e gestão das operações urbanas, por sua vez, procuram garantir qualidades essenciais para a boa vivência urbana. Para tanto, entende-se que é a partir do projeto específico de pontos estratégicos da cidade, realizado através do desenho urbano e da modelagem financeira detalhada, que se viabiliza uma cadeia de intervenções integradas e Figura 29 - Vista da praça criada junto ao armazém 14.

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5.Copa


Copa Zeca Brandão, Luís Moriel e Vera Freire

A

definição do Brasil como sede da Copa do Mundo de Futebol da FIFA, em 2014, foi anunciada, oficialmente, em 2007. A partir de então começaram as expectativas para definição das 12 cidades-sedes, que foram anunciadas em maio de 2009: Belo Horizonte (MG), Brasília (DF), Cuiabá (MT), Curitiba (PR), Fortaleza (CE), Manaus (AM), Natal (RN), Porto Alegre (RS), São Lourenço da Mata (PE), Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA) e São Paulo (SP). Desde o início da candidatura do Brasil, o Governo do Estado de Pernambuco veio trabalhando para o estado acolher a Copa do Mundo, como já acolhera em 1950, quando sediou uma única partida, entre o Chile e os EUA, no Estádio da Ilha do Retiro. No âmbito do Poder Executivo, foi criado o Comitê Pernambuco Copa do Mundo 2014. O Artigo 1 do Decreto Nº 31.052, de 23 de novembro de 2007 determinava que competia ao Comitê: A concepção e o planejamento das ações necessárias a promover a inclusão do Estado como sede da Copa do Mundo de Futebol que se realizará em 2014, no Brasil, e, especialmente: I – promover a integração e a coordenação dos projetos e ações do Governo do Estado e das Prefeituras interessadas; II – avaliar a execução dos projetos e ações relacionadas ao projeto em questão; III – buscar apoio e parcerias com instituições públicas e privadas relacionadas ao evento, no Estado ou fora dele.

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As ações empreendidas foram decisivas para o desempenho do Estado ante a comissão da FIFA, que selecionou as cidades-sede. A seleção foi feita por meio de um estudo técnico encaminhado pelo Comitê Pernambuco Copa do Mundo 2014 propondo a Cidade da Copa em São Lourenço da Mata, Zona Oeste da Região Metropolitana do Recife. Para o estudo foram considerados os aspectos gerais da Região Metropolitana do Recife, desde sua história, passando pelo atual momento de crescimento econômico, vocação turística e como o ponto estratégico das rotas de viagem. Sem deixar de considerar, também, a tradição esportiva no futebol do estado e a expertise local em organizar eventos de grande porte, como o carnaval. Foram analisadas três localizações: uma em Olinda (Arena Recife Olinda), outra em São Lourenço da Mata (Cidade da Copa) e uma no Recife (Arena Jiquiá). Esta última foi avaliada como frágil, porque fugia ao conceito de planejamento integrado e resultaria em poucas perpectivas enquanto legado para a cidade metropolitana. Além disso, se constituiria como um empreendimento especificamente privado, o que tornaria vulnerável a candidatura de Pernambuco, uma vez que a desistência do investidor, inviabilizaria o Estado como sub-sede. Os estudos para a Arena Recife Olinda e Cidade da Copa, que não apresentam estes condicionantes desfavoráveis, serão apresentados a seguir.

Arena Recife Olinda Entre 2005 e 2006, o Governo Holandês promoveu, através das empresas Advisory Amsterdam Arena e PTZ Arquitetura e Consultoria, a elaboração de um estudo de viabilidade para a implantação de uma arena multiuso em Pernambuco, na perspectiva da Copa do Mundo de Futebol de 2014 vir a ser realizada no Brasil. Fez parte do Estudo o projeto básico da Arena, doado à Prefeitura de Olinda para os fins de cumprimento do Caderno de Encargos da FIFA em 2007.

A partir deste estudo viabilizado pelo Governo Holandês, o Núcleo Técnico de Operações Urbanas (NTOU) desenvolveu a proposta que ficou conhecida como Arena Recife Olinda, por se localizar na área limítrofe entre os dois municípios. As considerações técnicas definiram esta área como a mais atrativa em função, principalmente, dos seguintes elementos: • a mobilidade e acessibilidade; • a interface e sinergia com planos e projetos públicos estruturadores para a Região Metropolitana do Recife (Projeto Recife-Olinda, Prometrópole); • o contexto metropolitano, enquanto área de transição entre o Sítio Histórico de Olinda e o Centro Histórico de Recife; • o entorno com o conjunto de grandes equipamentos metropolitanos (Centro de Convenções, Shopping e Fábrica Tacaruna e Chevrolet Hall, entre outros); • o contexto potencial para o desenvolvimento físico-econômico e social. Todas as potencialidades desta área se deparam com o grande desafio de transformar um cenário de degradação física e ambiental - com ocupações irregulares em áreas de mangue, sem infraestrutura urbana e com baixos índices de habitabilidade - na promoção de uma requalificação urbana e ambiental, a partir da implantação de um equipamento de grande porte, capaz de atrair um conjunto de investimentos e o desenvolvimento integrado de forma sustentável, com inclusão social. Esta localização mostrou-se estratégica por conta, principalmente, da diversidade e facilidade dos acessos e, também, pela proximidade com os núcleos municipais do Recife e Olinda e da disponibilidade de serviços (saúde, hotelaria, entre outros), comércio e espaços de atração cultural que estas cidades oferecem (Figura 1).

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Aven Presi ida de Kenn nte edy

PE - 15

Rio Beberibe Manguezal

Manguezal

Avenida Olinda

Área das operações urbanas da Arena Recife Olinda

A proposta urbanística formulada para a área - constituída por espaços predominantemente vazios, ociosos ou com usos passíveis de desativação - levou em conta o conjunto urbano edificado e o meio ambiente. A proposta previa diversas operações urbanas que deveriam ser pensadas numa perspectiva de integração e coerência, tendo a Arena Recife Olinda como um dos elementos indutores da dinamização e re-espacialização urbana local. O empreendimento vai além de um estádio de futebol e incorpora o conceito de equipamento multifuncional, articulado com outros usos dinamizadores e complementares à formação de um núcleo urbano, com área de ocupação de 5 hectares, capacidade de 45 mil lugares cobertos, além de 140 camarotes, áreas de imprensa, restaurantes panorâmicos, banheiros, boxes de alimentação dimensionados em todos os setores, acessibilidade, áreas de circulação adequadas para grande público e estacionamento para 4 mil veículos, sendo 500 sob o edifício e 3.500 situadas entre os dois perímetros de segurança obrigatórios segundo as regras da FIFA (Figura 2).

Parque Memorial Arcoverde

M

Centro de Convenções e Mirabilândia

A Ag ven am ida ag en alh on ãe s

Complexo Rodoviário de Salgadinho

Coqueiral de Olinda

Rio Beberibe

Istmo de Olinda

Oceano Atlântico

Figura 1 - Localização estratégica da área das operações urbanas da Arena Recife Olinda.

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Habitação Comércio/Serviço Estacionamento

Rio Beberibe

Comércio/habitação Comércio/habitação/serviços Comércio/habitação/serviços Área verde

Ainda foram previstos empreendimentos complementares à Arena, como um centro de convenções, com área total de 4.300 m²; um teatro, com capacidade para 2 mil pessoas; um centro de entretenimento, com 6.400 m²; cinemas; praça de alimentação; e um centro empresarial, com 1.060 m² de área construída. O empreendimento deverá atrair para o entorno usos comerciais, escritórios, hotéis, flats e residências (Figura 3, 4 e 5).

Arena

Figura 2 - Implantação e proposta de usos na área das operações urbanas da Arena Recife Olinda em planta.

Figura 3 - Implantação da operação urbana Arena Recife Olinda.

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151

Figuras 4 e 5 - Implantação da operação urbana Arena Recife Olinda.


A Arena foi projetada como um edifício multiuso, baseado num modelo operacional que garante a conversão rápida do espaço de eventos futebolísticos para shows, festas sazonais e eventos das mais variadas naturezas. Esta versatilidade do espaço garante que ele seja ocupado durante mais dias na semana. Como estádio de futebol, o equipamento foi concebido em concordância total com as regras da FIFA e em muitos aspectos supera as exigências desta entidade. O projeto apresenta um alto padrão de conforto e segurança, tanto nas áreas reservadas, quanto nas áreas disponíveis para o público em geral. Todo este complexo terá a função de catalisar o desenvolvimento do entorno urbano (Figura 6 e 7).

Figura 6 - Arena Recife Olinda. Fonte: PTZ Arquitetura e Consultoria. Figura 7 - Arena Recife Olinda (página ao lado).

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A inserção de uma Arena multiuso no local escolhido buscou o aproveitamento da infraestrutura viária e de transportes existentes e previstas, e a incorporação aos equipamentos circunvizinhos. Neste contexto, foi previsto, ainda, um conjunto de investimentos, não só para viabilização do equipamento e da infraestrutura urbana mas, também, para a reestruturação urbana do entorno. A partir de então, diversas articulações e contatos se sucederam entre as empresas responsáveis pelo projeto, os governos locais, clubes e a iniciativa privada. A Prefeitura de Olinda adotou a Arena como ação estruturadora da gestão municipal e procurou se articular com o governo Estadual e Federal para promover os encaminhamentos necessários. Em 2007, foi encaminhado à Confederação Brasileira de Futebol (CBF) o Caderno de Encargos da FIFA, oficializando a candidatura de Recife e Olinda como sub-sede da Copa de 2014. Os trabalhos foram conduzidos pela Secretaria de Planejamento e Gestão, através do Núcleo Técnico de Operações Urbanas – NTOU, e pela Secretaria Especial de Esportes. A apresentação da candidatura de Pernambuco foi considerada positiva, merecendo destaque a ênfase dada pela comissão à qualidade do projeto da Arena e, principalmente, às preocupações ambientais e sociais propostas. A candidatura se mostrou consistente ao integrar à necessidade de construção de um novo estádio, um conceito mais amplo, não só pela possibilidade de gerar um equipamento multiuso mas, também, no aproveitamento que este empreendimento poderia ter ao dinamizar e desenvolver o entorno e a região. Estas intenções se consolidam através da articulação com outros projetos estruturadores para a RMR, previstos independentemente do evento e que justificam o conjunto de investimentos. Neste intermédio, algumas ações foram encaminhadas pelo NTOU, na medida em que o equipamento deveria se articular com a promoção de um conjunto de intervenções urbanas, na atração de investimentos públicos e privados mas, principalmente, para implementar uma reestruturação urbana e ambiental de abrangência global. Para o desenvolvimento da proposta de uso e ocupação do solo das operações urbanas, o NTOU e a Prefeitura de Olinda realizaram um levantamento prévio das características das

habitações e da situação fundiária dos imóveis inseridos na área de intervenção, além do cálculo estimativo dos valores necessários à desapropriação, re-assentamento e à infra-estrutura urbana para referenciar os estudos preliminares de modelagem financeira da operação. Os documentos desenvolvidos subsidiaram a elaboração de um documento de Consulta Prévia ao Banco Mundial, a fim captar recursos para o diagnóstico e para os projetos de infraestrutura pelo Prometrópole. Os recursos foram remanejados de áreas atualmente contempladas pelo Programa de Aceleração do Crescimento - PAC, estratégia a ser consolidada pelo Governo do Estado e o Município de Olinda para futura licitação de projetos de saneamento integrado. A Prefeitura de Olinda iniciou o processo de revisão do Plano Diretor e da Lei de Uso e Ocupação do Solo, já considerando o perímetro das operações urbanas. As propostas foram aprovadas pelo Conselho de Desenvolvimento Urbano e foram para análise na Câmara de Vereadores, na Companhia Pernambucana de Meio Ambiente e Recursos Hídricos – CPRH e no Instituto Artístico e Histórico Nacional – IPHAN. O maior empecilho para a proposta foi a posição do IPHAN que, preocupado com as “visadas” do Sítio Histórico de Olinda – cidade Patrimônio Cultural da Humanidade, solicitou o deslocamento do equipamento em 50m, tomando como referência a localização proposta, liberando o eixo da rua Prof. Andrade Bezerra e propondo o seu prolongamento até encontrar o caminho histórico de Santa Tereza. Apesar de sua congruência e unanimidade técnica, de premissas governamentais e andamento das ações, até o momento de definição final do local onde seria construído o estádio que sediará, em Pernambuco, os jogos da Copa do Mundo de 2014, esta área não atraiu o interesse do investidor privado, possivelmente pelas dificuldades aparentes na remoção das famílias instaladas no local e liberação total do terreno. O fator tempo para viabilizar a relocação das famílias e para atrair investidores dificultou a implementação desta proposta nos prazos determinados pela FIFA. Mesmo assim, ficou evidente que a área entre os municípios de Recife e Olinda é um “território de oportunidades”, como já anunciava o Metrópole Estratégica (PERNAMBUCO, 2001).

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Cidade da Copa Esgotadas as tentativas de viabilizar a Arena Recife Olinda, parte-se para uma nova abordagem, a criação de uma nova centralidade para a Região Metropolitana, que surge da oportunidade de atrelar à Arena, a implantação de novos equipamentos metropolitanos, enquanto demanda do Governo do Estado. Dentre estas demandas (centro administrativo, hospital, campus universitário), se acrescenta o atendimento ao déficit habitacional para os servidores estaduais, como público potencial à apropriação da oferta de moradia numa operação urbana. A área escolhida, situada praticamente no centro geográfico da Região Metropolitana, entre às margens do rio Capibaribe e a BR 408, na confluência dos municípios de Recife, Jaboatão dos Guararapes, Camaragibe e São Lourenço da Mata, reforça a conjectura de criar uma nova centralidade metropolitana, tendo em vista os grandes investimentos previstos neste contexto (Figura 8).

Figura 8 - Nova centralidade metropolitana (página ao lado).

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A escolha se justifica pelo potencial e capacidade de ampliação da infraestrutura existente (metrô, rodovias, terminal rodoviário, etc), pré-definida como reserva para expansão urbana, conforme projetos governamentais passados, dos quais se destacam: - O II Pólo Metropolitano (década de 70), como projeto precursor de criação desta nova centralidade, com a proposta de convergência funcional através da indicação do zoneamento para o centro urbano do Curado, com a implantação de conjuntos residenciais populares, Terminal Integrado de Passageiros – TIP, Centro Administrativo do Estado, Centro Atacadista e Distribuição, além do Distrito Industrial; - O Parqtel (década de 90), como parque tecnológico que se insere no Distrito Industrial do Curado, voltado para o setor de tecnologia da informação e comunicação; - O Plano Diretor de São Lourenço (anos 2000), o qual prevê esta área como zona de expansão urbana.

Zona Norte do Recife (Olinda)

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Cidade da Copa

Zona Oeste do Recife

Centro do Recife Oceano Atlântico

Este território vem sendo, atualmente, objeto de diversos investimentos, principalmente privados, legitimando a ocupação desta área, como no eixo da localidade de Aldeia, que compreende os municípios de Recife, Camaragibe e São Lourenço da Mata, onde predomina o uso residencial de baixa densidade e a tipologia de condomínios horizontais para uma população de média/alta renda, a exemplo do AlphaVille Francisco Brennand. Outras áreas desta região já estão sendo comercializadas e estudadas para uso residencial popular, outra tendência de ocupação, haja vista a oferta de emprego (TIP, indústrias, comércio, etc) e de mobilidade urbana oferecida pelos meios de transportes de massa (rodovias, metrô e Linha Leste-Oeste/Corredor Caxangá, Navega Recife) (Figura 9).

Zona Sul do Recife (Boa Viagem)

Figura 9 - Cidade da Copa, mobilidade.


Um condicionante importante que diferencia este terreno do terreno da Arena Recife Olinda é que esta área é propriedade do Estado ou, mais precisamente, da Pernambuco Participações e Investimentos – Perpart. A titularidade pública da área é um fator positivo enquanto contrapartida do Estado, não só como gestor do processo, mas enquanto viabilizador de uma Parceria Público-Privado. Este modelo despertou interesse de um grupo que já vinha realizando estudos nesta região e que se compatibilizam aos interesses do Estado, o que culminou oficialmente numa manifestação de interesse, solicitando incorporar este terreno, juntamente com a Arena, como objeto de estudo para uma PPP. Os estudos até então realizados pelo NTOU/SEPLAG associam o empreendimento às necessidades imediatas do Governo – as demandas e interesses que se conferem no mercado atual para este cenário, para as quais se concebeu um Master Plan preliminar, que contempla o conteúdo programático de habitação, comércio e serviços, institucional, Arena para os jogos da Copa do Mundo de 2014 e extensas áreas verdes conectadas aos meios de transportes (Figura 10).

Estação do metrô

Rio Capibaribe

Arena

Habitação Comércio/Serviço Institucional Arena Área verde BR 408

Figura 10 - Cidade da Copa, conteúdo programático.

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A proposta sugerida para esta nova centralidade se reforça pelo conceito de sustentabilidade e urbanidade, incorporando princípios contemporâneos na busca por uma maior qualidade de vida, um maior respeito ao cidadão e ao meio ambiente, abaixo detalhados:

Distribuição equilibrada de usos e ofertas de serviços, valorização do uso misto, criação de centralidades e pontos de referência, sistema integrado de segurança – policiamento associado à vigilância eletrônica remota.

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Sustentabilidade - Interação com Mata Atlântica: Recuperação e preservação das matas residuais, conservação e proteção das matas ciliares e implantação de parque público na margem do Capibaribe. - Alta eficiência energética: Geração própria de no mínimo 20% da energia demandada, utilização de fontes renováveis na matriz energética (solar, eólica e produção de biogás), captação das águas pluviais e re-utilização das águas servidas, projetos arquitetônicos e urbanos baseados em normas de responsabilidade ambiental. - Carbono Zero: Adequação a padrões internacionais de índices de carbono, favorecimento de meios de transporte limpos (bicicletas, transporte público com propulsão elétrica, a gás ou tecnologias híbridas), monitoramento e controle de emissões poluentes.

Urbanidade - Qualidade do espaço público: Espaços livres adequados à circulação e permanência de pedestres, arborização planejada, controle urbano e favorecimento da vigilância social natural. - Mobilidade e Acessibilidade: Transporte público eficiente, capacitação das vias para transporte cicloviário, integração entre os meios de transporte de massa e individuais, variação gradual de usos, densidade de ocupação e das capacidades das vias. - Qualidade de vida: Figura 11- Cidade da Copa.


Pode-se ainda destacar como fundamentos da proposta, os elementos relativos à acessibilidade e mobilidade, o estímulo à dinâmica urbana (usos e equipamentos) e a proximidade ou implementação de um parque urbano metropolitano. Neste sentido, a escolha do local da Cidade da Copa está vinculada a sua viabilidade de execução e às “facilidades” para a sua implementação. Tais fatores se devem, em grande parte, às articulações políticas, mas, principalmente, pelos compromissos privados de investimento no equipamento; por se tratar de um terreno do Estado; por congregar outras intenções governamentais, na oportunidade de viabilizar outros equipamentos públicos metropolitanos; além da beneficie pública de desenvolvimento de um importante fragmento da metrópole estadual. A respeito da ausência de infraestrutura local, a escala do empreendimento proposto propicia a otimização e a justificativa desse investimento. A análise das alternativas identifica o alinhamento conceitual da Cidade da Copa às premissas de Governo no planejamento territorial e às demandas de implantação de uma série de outros equipamentos metropolitanos. Estes fatores se convergem na proposta para a margem do rio Capibaribe, um território ainda sem identidade, mas de grande oportunidade para a perspectiva futura de desenvolvimento físico, social, econômico, ambiental e cheio de significado, uma Nova Centralidade Metropolitana.

Figura 12- Cidade da Copa.

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Referências PERNAMBUCO. Decreto nº31.052, de 23 de novembro de 2007. Cria o Comitê Pernambuco Copa do Mundo 2014. PERNAMBUCO. Agência Estadual de Planejamento e Pesquisas de Pernambuco CONDEPE/ FIDEM. PROMETRÓPOLE. Metrópole Estratégica – Região Metropolitana do Recife/Agência CONDEPE/FIDEM. PROMETÓPOLE. Recife, 2001. PERNAMBUCO. FIDEM – Fundação de Desenvolvimento Municipal. Plano Diretor da Região Metropolitana do Recife – Metrópole 2010. Recife, 1998.

Figura 13 - Cidade da Copa.

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Anexo


Zeca Brandão discorre sobre a Cidade da Copa

provavelmente vai criar uma estrutura operacional específica para a Copa.

Entrevista concedida ao Informativo do Sindicato dos Engenheiros do Estado de Pernambuco - INFOSENGE (Março 2010, p. 3-6)

Qual o objetivo do Edital?

Qual a sua participação no processo de escolha de Pernambuco como uma das sub-sedes da Copa de 2014? Eu sou Secretário Executivo de Operações Urbanas da Seplag [Secretaria de Planejamento e Gestão] e coordeno o Núcleo Técnico de Operações Urbanas (NTOU). Em Maio de 2007 a Secretaria da Casa Civil me pediu que elaborasse uma proposta técnica para inserir o Recife como uma das cidades-sede para a Copa do Mundo de 2014. Como nada tinha sido feito até então tivemos apenas 15 dias corridos para

submetê-la à CBF. Caso não entregássemos a proposta dentro desse prazo estaríamos fora da Copa. O processo seletivo durou aproximadamente dois anos e haviam 19 cidades pleiteando a candidatura. Ao longo desses anos uma série de demandas foram feitas pela CBF e posteriormente pela própria FIFA. Todo esse processo foi conduzido politicamente pelo Secretário Ricardo Leitão e tecnicamente por mim. Qual o estágio atual do processo? Não estou totalmente a par do atual estágio do projeto porque participei dele até a definição das sub-sedes. O processo, agora, está sendo conduzido pela Secretaria da Casa Civil junto com a gerencia de PPP (Parcerias Público Privadas). O que sei é que já existe um edital na rua e que a licitação precisou ser adiada, mas está agora prevista para o final de Março. Pela amplitude do empreendimento e a agilidade por ele exigida, o Governo

O consórcio que vencer a licitação será responsável pela construção da arena e o seu gerenciamento, envolvendo também os empreendimentos do entorno. Já existe licenciamento ambiental? Por ser uma das exigências para a licitação já tiramos a LP [Licença Prévia] do empreendimento. Qual a previsão para a conclusão das obras? A previsão é que a arena e as obras de infraestrutura necessárias ao funcionamento do equipamento, como vias de acesso, estação de metrô etc estejam todas prontas em junho de 2013, pois a gente quer ser também umas das sub-sedes da Copa das Confederações. Essa Copa servirá para testar tudo: não só as condições do estádio, mas também as questões urbanas como acessibilidade, mobilidade, aeroporto, terminal marítimo, hospedagem e milhares de outras demandas

exigidas pela FIFA. As questões operacionais do evento também serão testadas durante a Copa das Confederações. Qual o custo total do empreendimento? No estudo inicial foi previsto aproximadamente R$ 500 milhões para a arena, R$ 1 bilhão para os empreendimentos imobiliários do entorno e R$ 300 milhões para a infra-estrutura pública. Desse valor, apenas os R$ 300 milhões referentes à infra-estrutura, que envolve a duplicação da BR 408, a estação de Metrô, o VLT (veículo leve sobre trilhos), saneamento básico, abastecimento de energia etc, seriam bancados pelo setor público. A arena e os empreendimentos imobiliários do entorno ficam a cargo do parceiro privado. Quantas unidades construídas?

residenciais

serão

Também de acordo com os estudos iniciais, dentro da cidade da Copa seriam 8 mil unidades residenciais. Repito, esses números fazem parte da nossa proposta de candidatura, como te disse, não estou acompanhando a modelagem econômica que está sendo feita pelo parceiro privado. O

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que eu acho fundamental é que se mantenha o conceito da proposta de se criar uma nova centralidade urbana naquela região. E para isso é preciso que algumas características sejam preservadas, como a diversidade de usos e de classes sociais. É preciso que o empreendimento contemple atividades comerciais, institucionais, residenciais e serviços, enfim, que seja a reprodução de um fragmento de cidade. Outro ponto imprescindível é que a arena seja multifuncional, e não um estádio dos anos 70, que serve apenas às práticas esportivas.

outras capitais e desenvolver ações conjuntas que tenham uma repercussão regional. Por exemplo: ter mais vôos diretos entre as cidades, melhorar o sistema rodoviário entre elas... Tem também a escala metropolitana. O Recife foi a única cidade que entrou como Região Metropolitana, as outras capitais são todas em escala municipal. Como o Recife tem um território pequeno e não pode abrigar certos projetos, a idéia da Cidade da Copa é exatamente criar um vetor de expansão, contemplando outras áreas metropolitanas.

A fonte de financiamento é o BNDES?

Então a Cidade da Copa é, sobretudo, uma estratégia de desenvolvimento?

O BNDES vai emprestar o dinheiro para construir a arena, apenas a arena. O projeto da Cidade da Copa se restringe a São Lourenço ou permite intervenções em escalas bem mais amplas? A proposta técnica tem como uma das principais características a diversidade de escalas, inclusive regional, onde além do Recife, mais três capitais nordestinas serão sub-sedes, que são Natal, Fortaleza e Salvador. Então, é possível a gente fazer um plano estratégico integrado com essas

Uma das estratégias de desenvolvimento urbano mais utilizada pelas principais metrópoles do mundo é exatamente sediar grandes eventos internacionais, porque eles, além de darem muita visibilidade atraem grandes investimentos públicos e privados. Isso permite fazer um grande plano estratégico, para que esses investimentos se transformem em legados com importantes efeitos econômicos e sociais. A Copa é, efetivamente, uma preciosa oportunidade de atrair não só investimentos financeiros,

mas também de capacitar os nossos recursos humanos. Entretanto, isto não é automático: sediou o evento e a cidade melhora. A palavra mágica aqui é planejamento. Muitas cidades importantes já usaram essa estratégia... A primeira foi Barcelona. Por razões políticas, a cidade, que mantinha uma postura de resistência à ditadura Franquista [comandada pelo general Francisco Franco, de 1939 a 1975], foi abandonada durante muito tempo pelo governo espanhol e se encontrava num caos urbano. A estratégia para reverter esse quadro foi exatamente sediar as Olimpíadas de 92. Foi feito um grande plano estratégico que possibilitou a reestruturação da cidade. Barcelona hoje é um dos principais destinos turísticos da Europa. E o último exemplo foi Pequim, que mostrou outro lado importante de se sediar um grande evento. Além de melhorar a infra-estrutura urbana de sua capital, a China aproveitou as Olimpíadas para mandar um recado para o Mundo: o de que pretende ser a maior potência política do século XXI. Os grandes eventos têm o valor adicional de

dar projeção às cidades, estados e países... Sim, e o Governo do Estado, no momento em que identificou o conjunto de benefícios que um evento internacional pode trazer, criou logo o Comitê de Pernambuco na Copa, com três grandes objetivos: promover a integração e a coordenação dos projetos e ações do Estado e das Prefeituras interessadas; avaliar as execuções dos projetos; e buscar parcerias com instituições públicas e privadas para viabilizar esses projetos estruturadores. O comitê tem coordenação geral do secretário da Casa Civil e é integrado por titulares de outras secretarias estaduais, como as de Esportes, Turismo, Planejamento e Gestão, Turismo, Cidades, Transporte e Imprensa. É composto também pelas secretarias Municipais de Planejamento da Região Metropolitana e pelo Núcleo Técnico de Operações Urbanas, o qual eu coordeno. Como funcionava, na prática, o comitê? Existiam duas Câmaras Temáticas. Uma tratava das questões esportivas e era coordenada pelo Secretário de Esportes George Braga. A outra, que eu coordenava, era relacionada com a infra-estrutura urbana integrada e tinha como preocupação maior o legado

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urbano que a Copa vai deixar. O projeto, como já disse, não se resume à Cidade da Copa, é bem mais amplo e tem ações em escalas regional, estadual, metropolitana e municipal. Na escala metropolitana, tomamos por base um plano elaborado pela Agência Condepe/ Fidem, intitulado “Metrópole Estratégica”. O objetivo geral é a melhoria de vida da população, com ações na área de habitação, inclusão social, redução da pobreza, aumento da competitividade da economia, conservação do patrimônio natural e construído e inserção do Grande Recife na rede mundial de Metrópoles, ou seja, colocar Pernambuco no mapa mundial. Outro objetivo, mais específico, voltou-se para a construção de arenas, centros de treinamento de última geração, terminal marítimo etc... Mas essas intervenções, que são necessárias há muito tempo, precisam mesmo que haja uma Copa para que sejam realizadas? Com uma Copa do Mundo cria-se um cenário muito mais favorável, inclusive no plano político, e surgem os investimentos privados até no âmbito internacional, porque

é um evento que tem muita visibilidade. Para você ter uma idéia, a expectativa da FIFA é que o jogo da final da Copa de 2014 seja assistido por mais de 1 bilhão de pessoas. Essa condição viabiliza recursos e alinhamentos políticos em nível municipal, estadual e federal. Todos os níveis de governo se comprometem com o evento, até porque isso é uma exigência formal da própria FIFA. As demandas da FIFA não se restringem à construção da arena. Ela cobra, por exemplo, boa qualidade no transporte público. Se não houver isso, não tem Copa. Qual a mensagem que tudo isso passa para a categoria dos engenheiros, arquitetos e agrônomos no sentido de geração de oportunidades? Se o planejamento for bem feito, o Grande Recife vai virar um canteiro de obras. O desafio maior não é o dinheiro, porque ele vai aparecer, tanto nacional como internacional. A crise econômica internacional deu uma freada, mas antes disso a gente estava sendo procurado por investidores de várias partes do mundo. E todos eles vão voltar, porque isso é um capital globalizado estruturado para ser investido em regiões que sediam eventos

com grande visibilidade internacional. Em minha opinião, a grande dificuldade será a nossa falta de tradição em planejamento e, sobretudo, em planejamento envolvendo parcerias público-privadas. É um obstáculo que a gente vai ter que superar. Foi o que fizeram as outras sedes e subsedes de Copa? Sim. Onde esses projetos foram bem sucedidos, houve trabalho estruturado em cima de parcerias público-privadas. Vamos ter que aprender a trabalhar assim, e a Copa pode ser um grande laboratório nesse sentido. Como eu disse antes, não é o fato de ser sub-sede que vai fazer o Recife virar, da noite pro dia, uma Barcelona ou uma Pequim, mas o primeiro passo nesse sentido é a elaboração de um bom e abrangente plano de reestruturação urbana. Os nossos gestores públicos geralmente apresentam grandes dificuldades para planejar, porque quando assumem os cargos encontram tantos problemas emergenciais e imediatos, que mal conseguem pensar “o futuro”. É preciso entender também que no planejamento que envolve as parcerias público-privadas, o protagonista tem que ser o estado e não o

setor privado. Na verdade, precisamos juntar a visão ampla e coletiva dos planejadores públicos com a agilidade e senso de mercado das instituições privadas. Essa combinação protagonizada pelo setor público, foi a base na maioria das experiências internacionais bem sucedidas. Um dos argumentos utilizados na proposta de candidatura foi a localização geográfica estratégica de Recife. Detalhe um pouco esse aspecto... Internacionalmente nossa localização é estratégica porque a gente está muito bem situado geograficamente em relação à Europa e aos Estados Unidos. Todos os aviões e navios que saem desses países em direção à América da Sul, por uma questão de segurança, passam próximo ao Recife. Isto facilita muito as questões logísticas de um evento desse porte. Regionalmente a nossa localização também é estratégica porque estamos bem situados geograficamente dentro do Nordeste. Num raio de 300 quilômetros, temos quatro capitais, quatro aeroportos internacionais e três regionais, cinco portos internacionais, mais de 12 milhões de pessoas e aproximadamente

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35% do PIB do Nordeste. Assim, se as ações desenvolvidas forem bem planejadas, toda região Nordeste pode se beneficiar com Recife sendo uma das sub-sedes da Copa. Já está mais que na hora de o Nordeste se integrar... O governador Eduardo Campos bate muito nessa tecla. Ele acha, e eu concordo com ele, que o Nordeste foi muito prejudicado, nas gestões passadas, devido à “Guerra Fiscal”, que gerou uma competição muito grande entre os estados nordestinos. No final, todos nós saímos perdendo. É fundamental a reintegração e acho que a Copa do Mundo pode ajudar muito nesse sentido. Como esse “espírito de integração” funcionaria durante a Copa? Dos turistas que vêm para a Copa, estimase que apenas 20% estão realmente interessados em ver os jogos. O certo é que a grande maioria vem mesmo é para conhecer o país, o país que está na moda, entre outras razões, por estar sediando a Copa do Mundo. Então, essas pessoas virão ao Recife, mas provavelmente não pretendem ficar só aqui. Assim, os estados nordestinos

podem e devem desenvolver uma série de ações conjuntas. No transporte aéreo, por exemplo, ampliando o número de vôos entre as cidades. No setor hoteleiro através de “pacotes” especiais. Existem várias formas de potencializar e aproveitar a Copa, inclusive, dentro dos próprios estados, beneficiando cidades do interior, o que tem muito a ver com umas das principais prioridades do Governador Eduardo Campos, que é a interiorização do desenvolvimento. De que maneira a Copa pode beneficiar diretamente o interior? Umas das idéias existentes é a criação de “arenas virtuais”, principalmente nas RDs, que são as Regiões de Desenvolvimento do Estado. A gente identificaria nas cidades pólo como Caruaru e Petrolina as áreas centrais que estivessem em processo de deterioração urbana, para recuperá-las e prepará-las para receber telões durante os jogos. A Copa do Mundo vai passar, mas as obras ficam. E não tem que ser apenas nos centros das cidades, pode-se criar novas centralidades. Por exemplo, em muitas dessas cidades existem estações de trem e áreas ao redor das estações que estão abandonadas. Essas áreas

também podem ser alvo de intervenção e, após os jogos, serem reintegradas às cidades oferecendo novas opções para a população local. Uma preocupação pertinente é o futuro da arena depois da Copa. O estádio não está correndo risco de se tornar mais um “elefante branco” depois dos jogos? Se o projeto for executado como originalmente concebido, criando uma nova centralidade naquela região, levando desenvolvimento econômico e urbano, levando atividades que não sejam só referentes à arena ou ao uso residencial, ou seja, se você realmente criar um novo bairro habitado por pessoas das diversas classes sociais, o projeto tem tudo para funcionar. Pelo seguinte: o Recife não tem mais para onde crescer e, por isso, está se verticalizando de uma forma absurda, o que nos levará ao caos urbano num futuro próximo. Se a cidade tentar crescer para o Norte, bate em Olinda; para o Sul, bate em Jaboatão; para o Leste, tem o mar. A saída é crescer para o Oeste. Já houve várias tentativas de levar o desenvolvimento e o crescimento para essa área, que é uma das mais problemáticas da Região Metropolitana,

mas que não deram certo. A Copa do Mundo e as intervenções urbanas necessárias para sua realização é a oportunidade que nunca tivemos, e provavelmente não vamos ter outra nem tão cedo, de viabilizar o desenvolvimento urbano e econômico dessa região. Essa foi uma das principais razões de propor a Cidade da Copa em São Lourenço da Mata, área altamente estratégica para a expansão da cidade. Portanto, se o projeto seguir com a proposta original, eu acredito que vai funcionar. Agora, como eu já disse, se o projeto for desvirtuado e for construído apenas um estádio de futebol cercado por um conjunto habitacional de baixa renda, aí poderemos ter um grande problema depois da Copa.

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Agradecimentos

Ficha técnica 179

Governo do Estado de Pernambuco Condepe/Fidem Empresa Pernambuca de Turismo - EMPETUR Prefeitura da Cidade do Recife

Organizador Zeca Brandão Coordenação Executiva Claudio Cruz e Carolina Brasileiro

Instituto da Cidade do Recife - Engenheiro Pelópidas Silveira Prefeitura Municipal de Olinda Prefeitura de São Lourenço da Mata Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN Universidade Federal de Pernambuco Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Urbano - MDU Capitania dos Portos

Design Gráfico Claudio Cruz e Rafaela Liberal Diagramação Claudio Cruz, Rafaela Liberal, Carolina Brasileiro, Robson Canuto e Luiz Carvalho Revisão e edição de texto Claudio Cruz, Carolina Brasileiro, Robson Canuto, Luiz Carvalho e Raquel Cantinha

Porto do Recife Porto Digital PTZ Arquitetura e Consultoria

Croquis Zeca Brandão Impressão e acabamento Companhia Editora de Pernambuco – Cepe


Equipe NTOU Secretaria Executiva José de Souza Brandão Neto Gerência de Planejamento Urbano Luís Eduardo Moriel Carneiro Robson Canuto da Silva Gerência de Arquitetura e Desenho Urbano Luiz Marcos de Carvalho Filho Gerência de Modelagem Financeira Fernanda Ferrario Soraya Santana dos Santos Roberto Sarmento Junior Gerência de Acessibilidade e Mobilidade Vera Chistine Cavalcanti Freire Assessoria Cristiano Nascimento Rodrigo Cabral de Vasconcelos Roberto Sarmento Junior José Rafael Souto Maior de Brito José Claudio Cruz e Silva Carolina Brasileiro Estagiários Rosa Gabriela Uchoa Thiago Valença Germana Santiago Carolina Brasileiro André Figueiroa Aline Harten Rodrigo Tavares Rafaela Liberal Gabriel Lins Raquel Cantinha Secretaria Silvana Chada Ilza Vasconcelos Motorista Alcides V. de Paula Filho

2007

2008

2009

2010

2011

2012


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