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1ยบ SIMPร SIO INTERDESIGNERS
Primeiro Simpósio Interdesigners Livro de Atas
Autores Prof. Dr. Luis Carlos Paschoarelli Profa. Dra. Paula da Cruz Landim Guilherme Rodrigues Colosio Julia Yuri Landim y Goya Mellina Mayumi Yogui Yonashiro Murilo Silva Tanajura Natalia Botteon Tomazela
ISBN 9788599679555
90000 >
9 788599 679555
1º SIMPÓSIO INTERDESIGNERS
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APRESENTAÇÃO
Há 23 anos, a partir da iniciativa de estudantes assim denomiado de Desenho Industrial da UNESP, aconteceu o Interdesign, com o apoio do então Departamento de Desenho Industrial e da Diretoria da FAAC. A proposta era a criação de um evento para que os alunos, estudantes de um curso da área de Exatas, pudessem discutir suas disciplinas e possíveis soluções para aqueles que iriam ingressar em um campo da área de Humanas no mercado de trabalho. O evento daquela época, hoje em dia podendo ser comparado a um Grupo de Discussão, viu a importância dos alunos de diferentes anos discutirem junto com professores a melhoria do curso, assim como da profissão. O evento acabou se tornando um local onde professores, profissionais e estudantes da área pudessem discutir, trocar informações e divulgar seus trabalhos, promovendo a vivência pura do conhecimento prático e teórico do Design. Deste modo, o evento reunia um grande número de participantes, sempre propiciando a integração entre os estudantes, estimulando e divulgando trabalhos, promovendo o intercâmbio entre atividades profissionais e acadêmicas, além de mostrar novas possibilidades de atuação na vida profissional aos participantes. Grandes nomes já participaram do evento, mas vale frisar que ele era feito, principalmente, de oficinas e palestras de alunos graduandos e graduados, mostrando o que cada um tinha de melhor, contando a experiência de vida de cada, fazendo com que, ao longo dos anos, o evento adquirisse destaque e construísse uma identidade própria. Em 1996, adquiriu o perfil do atual Interdesigners, nome que perdurou ao longo de suas edições posteriores. Em 2002, promoveu-se a 12º edição de um dos eventos mais importantes de design do país, o NDesign (Encontro Nacional dos Estudantes de Design). Em 2008, o Interdesigners se tornou o R Design (Encontro Regional dos estudantes de Design de São Paulo), sendo lembrado até hoje como um evento exemplar. Após 2008, o evento antes bienal, começa a ser desenvolvido anualmente. Os alunos passam, portanto, a se organizar
continuamente em comissões, inspirados pelo clima de troca de conhecimento e afeto, para realizar eventos maiores e melhores que o ano anterior. Sempre tentando mostrar do que o “Inter”, como nós carinhosamente o chamamos, verdadeiramente é feito. Podemos dizer que organizar um “Inter” é uma experiência única, porque depois de quase um ano de esforços, ver acontecendo é algo indescritível, mágico. Ao mesmo tempo, participar é o que a maioria dos alunos espera para os últimos meses de aula: confraternização e trocas de todos os tipos. Em 2014, a Comissão Organizadora do 16º Interdesigners volta novamente a promover a edição do 8º Encontro Regional, sendo este um evento itinerante feito por estudantes, sem fins lucrativos e que ocorre ao longo dos últimos 10 anos em diferentes regiões do país. Assim, o 8º R Design 2014 da regional paulista será realizado em Bauru, nomeado de R Misto, pela comissão da cidade sanduíche, em conjunto com o Interdesigners. O espírito não mudou. Nosso “Inter” apenas cresceu de tamanho, mas continua o mesmo. Aliado à proposta inicial do evento, que procura atingir um critério científico, surgiu uma nova ideia. Com o apoio do Departamento de Design, do curso de Pós-Graduação em Design, e com a iniciativa dos alunos do curso de Design da UNESP, a Comissão Organizadora concebeu e o I Simpósio Interdesigners, que ocorre durante os dias 3, 4 e 5 de novembro de 2014. O Interdesigners sempre foi, não importa o tamanho, um evento feito por alunos para os alunos, e em todas as comissões que já passaram por Bauru, vê-se essa diferença em nosso evento. Essa é a nossa identidade. E assim queríamos criar um evento de caráter científico, com a mesma sintonia criada ao longo dos anos, sem toda a seriedade imposta por aqueles com títulos acadêmicos, e principalmente, valorizando sempre o trabalho do aluno de graduação e sua formação dentro de seu curso. O simpósio terá por propósito geral despertar o interesse acadêmico nos alunos de graduação,
6 promovendo a propagação do conhecimento gerado por projetos de Iniciação Científica na área do Design, assim como de Projetos de Extensão Universitária; e do contato com diversos grupos e linhas de pesquisa do meio. O grande diferencial que esta comissão percebe é o ideal de estudantes organizando um evento científico, quebrando barreiras antes longínquas, criando uma identidade mais familiar e simples para o evento, sendo fruto dos esforços de alunos de graduação. Em sua tentativa de superar o habitual, o evento pretende transformar paradigmas ao estimular o pensamento científico em meio ao Encontro Regional de Estudantes de Design, propondo o conhecimento e as demais parcelas da vivência acadêmica não mais como imiscíveis, como são tratadas pelos alunos, mas complementares. Neste primeiro ano do evento tivemos 51 artigos submetidos das regiões do Maranhão, Paraná, Paraíba, Goiás, Ceará, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo, destes trabalhos tivemos 23 da cidade de Bauru. Além de trabalhos internacionais, como da Argentina. Vimos como promissor mais da metade dos trabalhos serem de fora da cidade, mesmo tendo ficado felizes que outras universidades além da UNESP também participaram. A área com mais artigos submetidos foi a de Design Gráfico, sendo seguida por Ergonomia e Acessibilidade e Design de Produto, e depois Comunicação Visual. Totalizando então para este o I Simpósio Interdesigners 47 artigos, com a nota média nas avaliações de 8.37, a serem apresentados durante o evento. Agradecemos principalmente aos dois professores que mais nos apoiaram na criação deste evento científico, e, quem sabe, mais um legado para a UNESP de Bauru a ser dado continuidade. O professor Luis Carlos Paschoarelli e professora Paula da Cruz Landim, que no momento são coordenador e vice do programa da Pós Graduação de nosso curso, mas que, antigamente, fizeram parte da primeira comissão do Interdesign e coordenaram o evento em seus anos iniciais,
7 respectivamente. Agradecemos não pelo apoio neste ano, mas pela iniciativa anos atrás que fez com que, vinte anos depois, surgisse outra como essa. Esperamos que nos próximos 20 anos isso continue acontecendo. Assim sendo, a Comissão Organizadora do I Simpósio Interdesigners saúda os alunos que participam desta edição, do que se espera, um dia, se tornar um grande evento científico de âmbito nacional, pois acredita-se que nossos esforços se centralizaram em inaugurar um novo patamar aos alunos de Design, abrindo horizontes para o potencial que aqui se vê. Por fim, estes anais representam mais do que simplesmente os registros acadêmicos, mas uma memória e um marco para o nosso meio. Nós, a comissão, escrevemos este texto, pensando em tudo o que passamos e nos frutos que colhemos. Esperamos que nossos esforços sejam de prestígio de todos e que nosso carinho e conhecimento seja passado adiante. Que as trocas perdurem. Humildemente, Comissão Organizadora do I Simpósio Interdesigners. Gui, Ju, Mel, Mugga, Nat, Moon.
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PREFÁCIO A prática do design está se tornando incrivelmente exigente. A profissão requer avanço, pensadores criativos que possam entender as circunstâncias complexas e propor respostas (efetivamente) inovadoras. De fato, a produção do Design enfatiza o fazer, mas só é possível fazer com coerência e crítica, se houver anteriormente o pensar, a articulação das ideias. Acreditamos que Design seja, antes de tudo, um ato intelectual. E diante esta perspectiva surge a seguinte questão: estamos pensando/ refletindo o Design, ou estamos apenas fazendo Design? Poucas profissões estão tão ligadas ao ensino universitário como o design, sua auto-imagem passa pela Universidade desde a criação da Bauhaus. O papel da pesquisa universitária está na criação de ‘um mapa de conhecimento’. Principalmente se entendermos que a pesquisa em Design ainda apresenta elevado potencial de crescimento, e, portanto as Universidades têm um papel chave para o futuro da área. No Brasil, o desenvolvimento do design está intimamente associado aos seus aspectos produtivos (evolução artística, cultural e industrial) e de ensino e pesquisa (educação e ciência) na área. O primeiro curso surgiu no início da década de 1960, na Escola Superior de Desenho Industrial, Rio de Janeiro (RJ). Mas já no final desta mesma década é criado, na FEB - Fundação Educacional de Bauru, o curso de Desenho e Plástica, o qual foi decisivo para a criação da FAAC - Faculdade
de Arquitetura, Artes e Comunicação, e do curso de Desenho Industrial e Comunicação Visual, ocorrido há exatamente 38 anos. Em 1987 a união desses cursos derivou em Desenho Industrial, com habilitações em Projeto de Produto e Programação Visual; e no início da década de 1990, foi implantado o Programa de Pós-graduação “Projeto, Arte e Sociedade”, com área de concentração “Desenho Industrial”. Atualmente, o Programa de Pós-graduação em Design da UNESP apresenta o conceito “5” junto à CAPES – Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, e podemos afirmar que estabelecemos as bases futuras para um centro de pesquisa científica em Design de EXCELÊNCIA. Ao apoiar a iniciativa dos alunos do curso de Graduação em Design, integrantes da COIDe (Comissão Organizadora do Interdesigners), evento que ocorre há mais de vinte anos, em criar o “Simpósio Interdesigners”, cujo objetivo é congregar alunos de Design e seus respectivos estudos em nível de Iniciação Científica, temos certeza da forte integração entre Graduação e Pós-graduação. De fato, acreditamos que iniciativas desta natureza caracterizam a ponte entre os dois níveis de ensino e, especialmente, na formação de FUTUROS PESQUISADORES EM DESIGN no Brasil. Os papers apresentados neste “Anais do I Simpósio Interdesigners” refletem uma amostra expressiva do potencial de desenvolvimento da pesquisa científica em Design no Brasil. ‘
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ÍNDICE
APRESENTAÇÃO 4 PREFÁCIO 8 COMUNICAÇÃO VISUAL 16 A Importância da marca e identidade corporativa.
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Análise de Marcas no Mercado através da Ergonomia Informacional
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Estudo para o redesign da marca de refrigerantes Dolly
27
Lomografia e Instagram: um encontro entre o analógico e o digital na fotografia contemporânea
35
DESIGN DE PRODUTO
42
Design de mobiliário público modular com diretrizes sustentáveis
43
Função Estética e Simbólica na Criação de Joias
51
O Design Aplicado ao Desenvolvimento de Componentes Construtivos Sustentáveis
58
ORIGAMI CONTEMPORÂNEO: Um estudo sobre o design de dobras dentro do projeto de produto, medicina e nanotecnologia
67
Percepção auditiva e visual – possíveis relações entre preferências de gêneros musicais e design
74
Reflexões Sobre a Importância do Sketch no Processo Criativo e Sua Desvalorização frente às Tecnologias Digitais
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DESIGN GRÁFICO
88
Aria: A importância da personagem feminina nos games
89
Design gráfico circense: O legado dos cartazes no circo tradicional e a linguagem gráfica circense contemporânea.
96
Design gráfico para crianças: criando um pré-livro sobre design
102
Redesign do website Freecycle.org com base na Experiência do Usuário
109
Velhas Lembranças, Memórias de Vida
116
DESIGN INCLUSIVO
122
Andador para reabilitação de crianças com deficiência
123
DESIGN TÊXTIL E VESTUÁRIO
130
ECO DESIGN
154
Desenvolvimento de protótipos de mobiliário público a partir da madeira serrada de eucalipto
155
Design com chapas planas de madeira reconstituída e aplicação de conceitos de sustentabilidade
161
Design Sustentável com Bambu e a replicação do conhecimento adquirido na Universidade
168
ERGONOMIA E ACESSIBILIDADE
176
Análise ergonômica dos produtos de Design de Moda no Brasil: um estudo bibliométrico
177
Aspectos Ergonômicos Relacionados ao Design de Almofadas para Cadeira de Rodas: estudo de revisão
185
Design Ergonômico: Parâmetros Ergonômicos Aplicados ao Design de Produtos
192
As razões do desconforto gerado pelas etiquetas nas peças do vestuário e suas possíveis alterações
131
Moda inclusiva e social: desenvolvimento de vestuário sleepwear para idosas institucionalizadas
Interface para Rede Social: Responsividade e Usabilidade 200
136
Intervenção ergonômica no trabalho de funcionários de uma sede administrativa em São Luís – MA
DESIGN URBANO In Palpável: Design de instalação, seguindo os conceitos de work in progress , afeto, corpo e coletivo
144 145
Usabilidade De Embalagens De Macarrão Instantâneo: Aplicação De Métodos Subjetivos
206 214
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FUNDAMENTOS TEÓRICOS
222
O design de brinquedos e os papéis sociais de gênero: inter-relações
223
Princípios ergonômicos para o design de jogos eletrônicos
231
HISTÓRIA DO DESIGN
240
Contribuições filosóficas em busca do sentido da arte no cenário industrial da Europa
241
ESDI – 50 anos de fundação
247
MATERIAIS E PROCESSOS
256
“Entranhas” - acoplamentos sensíveis tecnológicos para performances
257
Design e Ilustração: as influências das novas tecnologias sobre o processo de criação
264
NOVOS PRODUTOS NA ARQUITETURA: Possibilidades de Uso dos Materiais Compósitos.
271
SEMIÓTICA 278 Inconfissões – Construção de uma instalação performática sensorial
279
COMITÊS 284
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COMUNICAÇÃO VISUAL
A Importância da marca e identidade corporativa. The Importance of brand and corporate identity. Ferreira Junior, Francisco Neudimar ; Universidade Federal do Cariri
juniisq@gmail.com Roque, Isaac Brito; Universidade Federal do Cariri
isaacbritoroque@gmail.com
Resumo O presente artigo tem como objetivo mostrar a importância da marca e da identidade visual de uma empresa, organização sem fins lucrativos ou de um indivíduo que queira se destacar entre as mais diversas opções no mercado. A marca é a imagem da empresa expressa, e sua identidade pode afirmar ou negar seus objetivos, por isso se faz necessário que ela seja coerente e atrativa para todos que a utilizem, desde funcionários, fornecedores até seus clientes. Palavras Chave (no máximo 4): marca; identidade ; design; corporativa.
Abstract This article aims to show the importance of brand and visual identity of a company, nonprofit organization or an individual who wants to stand out among the different options on the market. The brand is the image of the express company, and your identity can affirm or deny their goals, so it is necessary that it is consistent and attractive for everyone to use it, since employees, suppliers to their clients. Keywords (maximum 4): brand; identity; design; cooporative.
Metodologia
Introdução
A pesquisa constrói um caminho para que seja possível o reconhecimento da realidade, ou que seja descoberta a verdade, por isso é considerada um método de reflexivo, no qual requer um tratamento cientifica. (LAKATOS; MARCONI, 2011) Para realização deste artigo foi realizado uma ampla pesquisa bibliográfica, através de livros, revistas, publicações avulsas e na imprensa escrita. Segundo os autores (Ibidem), a pesquisa exploratória tem como finalidade colocar o pesquisador diretamente cm contato com aquilo que já foram publicados.
A humanidade sempre se expressou através de símbolos para mostrar suas individualidades, orgulho, fidelidade e também a propriedade. Essa necessidade de comunicar visualmente, vem de uma série de perguntas universais: Quem sou? Quem precisa saber? Porque é preciso saber? Como eles vão descobrir? Como quero que eles respondam? Todas essas perguntas refletem na identidade de um individuo, comunidade e organizações. (WHEELE 2008, p. 10) No mercado, as inovações tecnológicas estão avançando rapidamente, as empresas que não conseguem transmitir ao consumidor o diferencial do seu produto ou serviços, para SRUNCK (2007), elas tornam-se “empresas que passam a brigar somente por preço com seus
18 concorrentes”. O grande patrimônio dessas empresas são suas marcas, pois através delas que são transmitido ao publico seus valores.
19 direcionamento e planejamento de ações de comunicação e até o gerenciamento da marca. (VALESE, 2009. p. 29)
Branding
A marca é a imagem da empresa, pois a partir dela a empresa é reconhecida e diferenciada, seja ela de qualquer tamanho ou lugar. De acordo com Scott M. Davis (Apud WHEELE, p.23), as marcas “ajudam os consumidores a cortar caminho através do mar de escolhas disponíveis em cada categoria de produto e serviço”, e está associadas à cultura e as percepções as quais a empresa almeja diante de si mesma. Para WHELLE (2008) a marca é “o pináculo de uma pirâmide na gestão de marcas, o seu reconhecimento alimenta o conforto e a fidelidade”.
O processo fundamental para construção de uma marca é chamado de branding. Esse processo é através da criação de vínculos e emoções para os consumidores, amplificando o potencial de uma marca. Para Ronal Kapaz (apud VALESE, 2009 p.29), sócio titular da Oz Design, o branding é “uma nova matéria destinada a desenhar os cenários profissionais e culturais futuros” e ainda define como “uma metodologia de reflexão que busca incorporar valores culturais, sociológicos e comportamentais”. Hoje em dia empresas de pequeno porte , e até indivíduos, perceberam a importância e o quão é indispensável que se construa uma marca, para que seus produtos e serviços sejam diferenciados,diante da infinidade de escolha entre seus concorrentes. Essa preocupação antes era exclusiva das grandes marcas. Uma marca, segundo TOMIYA (2009), representa a cultura de todas as pessoas que tem contato com ela, não somente com o cliente, portanto qualquer posicionamento derivado dela deve ser consistente com sua identidade, essência e valores.
Criação de uma marca
Identidade da marca
A marca está associada ao reconhecimento, a identificação e a distinção de um produto ou empresa. A criação de uma marca é utilizada para representar um artefato a ser formado, segundo WHEELER (2008), a marca tornou-se sinônimo do nome da empresa e de sua reputação. Criar uma marca é uma das atividades do design, especialmente por se tratar de uma área que promove a elaboração de novas linguagens, principalmente, as de natureza gráfica. (VALESE, 2009). Os escritórios de design têm desenvolvidos metodologias próprias para criação de marcas, que envolve desde a conceituação participativa das marcas, avaliação qualitativa,
As empresas tem a necessidade de se destacar diante de seus concorrentes no mercado, como também ela tem a necessidade se diferente. A identidade da marca pode reposicionar uma marca coorporativa, quando uma empresa sente a necessidade de uma mudança, é necessário criar uma identidade própria, há vários casos onde isso acontece. Como por exemplo, a empresa é nova, ou quando muda de nome, quando duas empresas se fundem. Para WHEELER (2008) uma nova identidade pode expressar que tipo de organização você é, garanti ao publico que você realmente é aquilo que diz ser, pode conectar imagens e ideias a sua empresa. O autor diz que:
Figura 01: Marcas
“A identidade ajuda a gerenciar a percepção de uma empresa e a diferencia do seus concorrentes. Um sistema inteligente confere respeito para o consumidor, e torna mais fácil a compreensão das vantagens e dos benefícios. [...] Uma identidade efetiva proporciona a sintonia de elementos, tais como um nome que seja fácil de memorizar e um design de embalagem diferenciado para um produto” (WHEELER, 2008. P.23)
Seja qual for a natureza dos negócios ou tamanho da empresa, alguns ideais caracterizam-se com as melhores identidades. As características ou ideais não se referem a meros critérios estéticos. A excelência no design é um dos requisitos, para o autor (Idem) “as melhores identidades são mais eficientes porque ajudam a impulsionar a marca da empresa” A necessidade de uma identidade da marca é necessária quando há uma nova empresa, ou produto, troca do nome da empresa, quando quer revitalizar uma marca e/ou sua identidade, quando duas empresas se fundem, entre outros. Segundo WHEELER (2008) os novos empreenderes tem necessidade da identidade da marca para se comunicar com seus primeiros consumidores, assim vai construindo sua imagem até ao conhecimento como as grandes empresas. O autor ainda afirma que: “empresas pequenas, mesmo as que não tem fins lucrativos, também precisam construir o seu branding equity, ou seja, o valor da sua marca. O seu sucesso futuro depende da construção de consciência coletiva, da preservação de sua reputação e do crescimento do seus valores” (Wheeler, 2008, p.23)
É vital para uma empresa que ela compreenda as aspirações mais amplas de uma identidade da marca, essas aspirações são características, que vão alem dos aspectos estéticos, alguns critérios funcionais (fig. 02) são necessários para impulsionar a marca da empresa.
Figura 02: Critérios funcionais
Estes critérios fazem com que as empresas tenham reconhecimento imediato, comunique a personalidade da empresa, que a mesma seja de fácil memorização, segundo STRUNK (2007) e WHEELER (2008) a visibilidade em diferentes mercados e mídias é ligado diretamente ao valor de uma marca. O design tem que ser apropriado na empresa, sua cultura e valores. E é a identidade da marca que vai expressar sua autenticidade, qualidade, metas e é a voz da sua personalidade. As empresas precisam se compreender para construir sua identidade, esse processo se inicia a o parti de sua posição, e que ela seja forte e crie soluções sustentáveis. Wheeler (2008) afirma que autenticidade “não é possível se a empresa não tenha bem clara sua razão de ser”.
Considerações finais Com o crescimento quantitativo de marcas no mercado, com grande aumento da competição, as marcas precisam aumentar a percepção do valor que seu consumidor tem a respeito. As marcas atribuem vários aspectos, quando não há investimento em sua identidade, pode atribuir aspectos negativos. Quando há investimento na marca e sua identidade ela pode atribuir outros valores, como confiabilidade, qualidade, além de se destacar diante de seus concorrentes. Os consumidores aumentaram suas exigências, e tem adotados postura cada vez mais ética, e se faz necessário que as marcas
20 também tenham um investimento social. Se faz necessário estudar as especificidades culturais para criar um laço entra a marca, sua identidade e as pessoas envolvidas no processo. Para Martins (apud VALESE, 2009, p.27) a marca “é uma entidade com personalidade independente. E a parte mais sensível em sua construção é a formação das características emocionais que vai carregar”.
Agradecimentos Agradeço ao Programa de Educação Tutorial - Cambada PET Design – Escritório Modelo de Design – da Universidade Federal do Cariri, por ter me proporcionado o ensino de forma pratica, aprender e compartilhar o conhecimento com todos.
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Referências SRUNCK, Gilberto Luiz Teixeira Leite. Como criar identidades visuais para marcas de sucesso: um guia sobre o marketing das marcas e como representar graficamente seus valores. Rio de Janeiro: Riobook, 3. Ed, 2007. TOMIYA, Eduardo. Um processo para gestão do Valor de Marca. In: Portal do Branding. Disponível em http://portaldebranding.com/ v1/?p=2849, 2009. Acesso em: 03/09/2014 VALESE, Adriana. Faces do design 2: Ensaio sobre arte, cultura visual, design gráfico e novas midias. São Paulo: Rosari, 2009. WHEELER, Alina. Design de Identidade da marca. Porto Alegre: Bookman, 3. Ed., 2008.
Análise de Marcas no Mercado através da Ergonomia Informacional Analysis of Brands in the Market through Informational Ergonomics Trabachini, Taty Any Mizoguchi; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
ta_trabachini@yahoo.com.br
Abstract Currently, the excess of visual information is becoming common, facing an increasingly competitive and demanding market. The society is clearly influenced by the overload of elements in daily lives, whether through advertising, internet or any other media. This research project aims to evaluate a certain segment of existing brands in the market, providing a discussion of how they are willing to users and how they relate to issues of informational ergonomics. Keywords: Ergonomics; Graphic Design; Visual Identity; Guidelines.
Introdução O excesso de elementos visuais tem se tornado cada vez mais comum, passando a fazer parte do cotidiano da população. Diariamente, somos submetidos a uma grande quantidade de informações através de diversos meios de comunicação, estando presentes no mundo físico e até mesmo no virtual. Além da influência geralmente negativa exercida sobre os indivíduos, essa situação gera um desconforto visual e espacial nos ambientes urbanos, desvalorizando-os e caracterizando poluição visual (Figura 01). Quanto ao meio virtual, esse excesso causa um evidente problema de navegabilidade, tornando-se desagradável aos internautas.
Silva, João Carlos Riccó Plácido da; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
joaocarlos_placido@hotmail.com Paschoarelli, Luis Carlos; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
paschoarelli@faac.unesp.br
Resumo Atualmente, o excesso de informações visuais está se tornando comum, diante de um mercado cada vez mais competitivo e exigente. A sociedade é claramente influenciada pela sobrecarga de elementos em seu cotidiano, seja através da publicidade, internet ou qualquer outro meio de comunicação. O presente projeto de pesquisa tem por objetivo avaliar um determinado segmento de marcas existentes no mercado, possibilitando uma discussão de como as mesmas estão sendo dispostas aos seus usuários e como elas se relacionam com as questões da ergonomia informacional. Palavras Chave: Ergonomia; Design Gráfico; Identidade Visual; Diretrizes.
Figura 01: Times Square, New York (Fonte: http://timessquarefashionweek.com /portfolio/sponsor/)
São vários os motivos que levam ao excesso de informações, tais como a necessidade de se destacar em um mercado cada vez mais competitivo, a busca por maior lucro tanto por parte das empresas quanto pela mídia, o progressivo aumento do consumo, entre outros. Porém, os sentimentos causados por esse exagero nem sempre são positivos, visto que os consumidores podem considerar essa situação incômoda, causando um efeito oposto ao desejado pelas empresas. “Inserindo-se nesse caos visual a que os usuários estão submetidos, o design gráfico deve se preocupar com o uso exagerado da informação, e, também, em como utilizar os meios publicitários de tal maneira que não contribuam, ainda mais, para agravar o problema.” (SILVA, 2012). Vale ressaltar que a comunicação através de elementos visuais sempre esteve presente em nossa cultura e, dependendo da forma como é transmitida, a mesma pode se tornar importante. A identidade visual, por exemplo, tem a função de representar visualmente uma empresa, um nome, um conceito, produto ou serviço através de um conjunto de elementos. “É sempre um desafio para o designer gráfico criar e desenvolver uma identidade visual para uma determinada instituição, uma vez que a marca tem de transmitir as ideias, intenções e mercado em que aquela instituição atua. Identidade visual essa que ainda que seja de fácil compreensão para todas as pessoas, não importando o repertório de conhecimento que elas possuam. Entretanto, apesar dessa
22 importância, ainda são poucos os estudos científicos, assim como os parâmetros para a análise e o desenvolvimento da identidade visual, o que torna seu processo de criação pouco sistematizado e profissional.” (SILVA, 2012).
O design tem grande importância para a sociedade, sendo uma das principais soluções para o desconforto visual e espacial, visto que um dos compromissos dos profissionais dessa área é solucionar problemas encontrados na sociedade através de planejamentos e projetos, seja para melhorar a comunicação, tornar algo mais prático e acessível, entre outras soluções. Contudo, é necessária uma metodologia eficaz e bem aplicada, pois sem projeto não há design. “A identidade visual é o conjunto de elementos formais que representa visualmente, e de maneira sistematizada, um nome, ideia, ideologia, produto, empresa, instituição ou serviço.” (STRUNCK, 1989). É importante que a mesma seja facilmente compreendida e associada a seu nome, serviços ou produtos, tanto para o benefício dos usuários quanto para a empresa. “A identidade visual ou marca é um apelo aos sentidos, sendo possível ver, tocar, agarrar, ouvir, observar e mover. Ela alimenta o reconhecimento do usuário e amplia a diferenciação de seus produtos e ideias, além de reunir elementos díspares, unificando-os em sistemas integrados.” (WHELLER, 2009).
“A falta de parâmetros para o desenvolvimento da identidade visual resulta em projetos incompreensíveis, e na constatação da quantidade de instituições que crescem e buscam um espaço no mercado; os equívocos no uso das cores e formas resultam em sobrecarga informacional, entre outros. Além disso, quando o desenvolvimento da marca não é bem realizado, o elemento visual pode acabar por não sintetizar o produto ou serviço, chegando a confundir a percepção e a recepção do consumidor. A definição de parâmetros por meio da usabilidade visual, bem como os conceitos de
23 gestalt e design, podem auxiliar na redução de erros durante a criação, e na aplicação adequada de identidades visuais para instituições públicas e privadas e seus produtos.” (SILVA, 2012).
De acordo com Raposo (2008), se a marca não for usada de forma coerente e consistente, ou se os elementos restantes da identidade não forem uma unidade, acaba-se por perder a lógica do discurso gráfico que permite seu reconhecimento. A marca não pode ser considerada publicidade ou história em quadrinhos, portanto, não tem a pretensão de transmitir todos os valores corporativos. É papel da publicidade demonstrar a qualidade do produto ou do serviço que a instituição presta. Ela deve explicar o posicionamento da marca e apresentar seus significados ou valores. Na elaboração de uma identidade visual, devem ser considerados quatro principais elementos gráficos: logotipo, símbolo, cor e alfabeto. O logotipo seria a parte reconhecível da marca, um símbolo em que representa o conceito da mesma como um todo. O símbolo é um elemento gráfico em que é possível identificar um nome, um conceito, um produto. A cor pode ser um fator determinante na identidade visual, tendo muitas vezes maior reconhecimento do que o próprio logotipo ou símbolo, visto que o ser humano é capaz de associar as cores rapidamente a alguma empresa ou produto. O alfabeto é responsável por escrever as informações complementares, sendo importante estar relacionado ao logotipo. Outro fator de grande importância para a sociedade é a Ergonomia. Para o design, a mesma é essencial no desenvolvimento de produtos, sistemas, ambientes, posto que a mesma pode ser definida como o estudo das interações entre o ser humano e os outros elementos do sistema, levando em conta as necessidades, habilidades e limitações dos usuários. Segundo Chapanis (1985), ergonomia é um corpo de conhecimentos e análise sobre as habilidades humanas, suas limitações e outras características relevantes para os projetos de
design, o que inclui os aspectos informacionais. A ergonomia informacional está relacionada ao processo de cognição do ser humano. “A ergonomia informacional faz o uso dos princípios da teoria da informação, ou seja, enviar essa informação correta para a pessoa certa no momento pretendido, de forma mais eficaz e eficiente, trazendo assim uma satisfação ao usuário respeitando sempre a sua diversidade. Para alcançar este objetivo ela contempla a cognição e a percepção e abrange os aspectos da linguagem verbal e não verbal.” (Martins e Moraes, 2002).
“A ergonomia e usabilidade de sistemas de informação tratam da comunicação humanotarefa-máquina em outros suportes que vão além dos computadores, entre eles, avisos, advertências em embalagens, sistemas de informação, ilustrações estáticas, manual de instrução, cor.” (MORAES, 2001).
Os profissionais da área de design devem se preocupar com a comunicação entre o usuário e o produto, garantindo a melhor interação possível entre eles. “A usabilidade como conceito trata da adequação do produto à tarefa, onde o desempenho se destina a adequação deste com o usuário e o contexto ao qual será utilizado. A preocupação com a usabilidade normalmente tem ocorrido no final do ciclo de design, durante a avaliação do produto já finalizado, o que acaba resultando em poucas modificações, devido ao custo elevado. Portanto, desde o início da atividade projetual, a usabilidade deve estar presente em seu desenvolvimento.” (MORAES, 2001).
Assim como a ergonomia, outro fator que pode ser importante para o design e o desenvolvimento de identidades visuais é o príncipio da Gestalt.
“William James, filósofo norte-americano, influenciou muito os fundamentos dessa escola, ao considerar que as pessoas não observam os objetos como pacotes formados por sensações, mas como uma unidade, concluindo que a percepção do todo é maior que a soma das partes captadas. A fenomenologia de Emund Husser também teve influência na formação da Gestalt. Ela baseia-se no princípio de que toda consciência relaciona-se com alguma coisa e, nesse sentido, não é uma substância, mas sim uma atividade constituída por atos, percepção, imaginação, especulação, volição, paixão, entre outros, com os quais é possível visar algo.” (DONDIS, 1997).
“A percepção realiza ao nível sensório o que no domínio do raciocínio se conhece como entendimento... os mesmos princípios atuam em várias capacidades mentais porque a mente funciona como um todo... o ver é compreender” (ARNHEIM, 2000). “Esses estudos surgiram como reação às teorias contemporâneas estabelecidas e que se fundamentaram apenas na experiência individual e sensorial. Partem do princípio de que o objeto sensível não é apenas um pacote de sensações para o ser humano, pois a percepção está além dos elementos fornecidos pelos órgãos sensoriais. Eles se fundamentaram nas afirmações de Kant, de que os elementos por nós percebidos são organizados de forma a fazerem sentido e não somente através de associações com o que se conhece anteriormente.” (GOMES FILHO, 2000).
O cérebro possibilita uma interação entre os elementos apresentados a ele, utilizandose de princípios da organização perceptual. Com isso, o mesmo possui a capacidade de auto-organização dos estímulos recebidos pelos sentidos. “De acordo com os princípios da Gestalt, existem oito aspectos principais na percepção de objetos e formas: Unidade, Segregação, Unificação, Fechamento, Continuidade, Proximidade, Semelhança e Pregnância da Forma.” (GOMES FILHO, 2000).
24 A Unidade pode ser constituída por um único elemento, que se define por si só, ou como parte de um todo, sendo um conjunto de vários elementos que se tornam um todo. A segregação é a capacidade da percepção em separar, identificar ou destacar unidades formais em um todo ou em partes deste. A Unificação se configura na igualdade ou semelhança dos estímulos produzidos pelo campo visual contido no objeto. O fechamento constitui-se uma sensação de fechamento visual da forma, em que a mesma se dirige espontaneamente para uma ordem espacial que tende à formação de unidades em um todo. A Continuidade é a impressão visual, uma tendência dos objetos acompanharem uns aos outros, a fim de permitirem uma boa continuidade dos elementos. A Proximidade pode ser observada quando mais objetos tendem a ser vistos juntos, no intuito de se tornar um todo, ou diferentes unidades dentro deste todo. A Semelhança se constitui em uma igualdade de formas e desperta a tendência de construir unidades e estabelecer agrupamentos de partes semelhantes. Pregnância da forma pode ser definida como qualquer padrão de estímulo que tende a ser visto como uma estrutura simples.
25 através da ergonomia informacional (Figura 02), possibilitando a captação de mais dados referentes à identidade. É relevante também relacionar e avaliar os dados de acordo com recursos da ergonomia informacional, os princípios da Gestalt, análise de cores, tipografia, o conceito por trás da marca, entre outros, visto que esse método pode trazer informações mais profundas e importantes, ajudando a compreender melhor sobre o processo de criação das respectivas identidades visuais. Posteriormente serão selecionadas com alguns aspectos definidos as que mais se compactuam as necessidades da pesquisa de acordo com a revisão da literatura. Os dados serão tabulados para direcionar quais serão dispostas ao questionário online aplicados a usuários finais. O questionário servira de medidor da capacidade de compreensão do usuário a determinada marca apresentada.
Materiais e Métodos O conhecimento obtido através de referências bibliográficas deve ser aplicado nos objetos de estudo em questão. Inicialmente será realizada uma revisão bibliográfica que relaciona a aplicação da usabilidade visual e ergonomia informacional na identidade visual. Também serão definidos os parâmetros para captação e análise de marcas. Com as definições de direcionamento de segmento de marcas, as mesmas serão captadas no mercado para análise. Será definido e captado uma série de marcas de um ramo específico encontradas no mercado, no intuito de possibilitar uma análise mais ampla deste tipo de comércio e como ele se apresenta para os clientes. Estas serão avaliadas com a ficha de análise de marcas
Figura 02 – Ficha de análise de marcas através da ergonomia informacional (Fonte: Silva, 2012)
“A ficha de análise demonstrou-se muito eficaz na divisão e estudo das marcas gráficas. A ficha foi desenvolvida utilizando critérios da ergonomia visual na sua divisão, a fim de possibilitar uma observação mais aprofundada das marcas, separando a análise em pontos específicos, como a existência do símbolo, se é utilizado ou está incluso dentro da marca, ou mesmo se é inexistente.” (SILVA, 2012)
que as perguntas fiquem claras e possam gerar respostas objetivas. Outro fator importante a ser definido é o tempo dedicado à entrevista, não podendo de forma alguma prejudicar o trabalho dos entrevistados. A duração deve ser curta, para que não se desfoque do assunto e não fique entediante para ambos.
Haguette (1997) define entrevista como um “processo de interação social entre duas pessoas na qual uma delas, o entrevistador, tem por objetivo a obtenção de informações por parte do outro, o entrevistado”. A entrevista funciona como uma coleta de dados sobre um determinado tema científico, e é a técnica mais utilizada no processo de trabalho de campo. Os pesquisadores buscam informações, ou seja, coletam dados objetivos e subjetivos. Os dados objetivos podem ser obtidos também através de fontes secundárias, tais como: censos, estatísticas, etc. Entretanto, os dados subjetivos só poderão ser obtidos através de entrevistas, pois se relacionam com os valores, as atitudes e as opiniões dos entrevistados. É essencial também a formulação de um questionário online, em que o pesquisador deve tomar cuidado ao elaborar as perguntas, que não podem ser ambíguas, tendenciosas, deslocadas. As perguntas devem ser elaboradas de acordo com as respostas do entrevistado, levando a uma sequência de pensamentos que facilitem a compreensão do entrevistador (BOURDIEU, 1999). Há vários tipos de entrevistas, porém a que mais se adequa nesse caso seria uma pesquisa online, no qual o pesquisador não interage com o entrevistado, permitindo a valorização das impressões do pesquisado. Pode-se ser utilizada também a técnica de entrevistas fechada, aquela onde se direciona as respostas em questões de múltipla escolha, para uma pesquisa quantitativa, sendo possível aprofundar-se mais nos assuntos discutidos e direcionados. As questões feitas nos questionários online devem abordar importantes pontos, de modo
Os resultados serão organizados a fim de facilitar a percepção final, possibilitando uma análise clara e objetiva. Através da revisão bibliográfica nas bases de dados espera-se analisar mais profundamente o tema e as propostas do estudo, utilizando recursos como a definição dos parâmetros de análise, por meio de cruzamento entre informações teóricas, a análise de marcas na estrutura ambiental urbana, entre outros. Outra parte importante na obtenção dos resultados é a tabulação de dados, que apresenta os parâmetros finais. Por meio deste e da análise dos resultados gráficos será possível a definição de exemplares para serem avaliados com usuários finais. Nesse processo, as marcas podem ser divididas em categorias, o que possibilitaria um estudo mais profundo e completo dos dados, comparando apenas as marcas relacionadas a um mesmo setor, para no fim comparar todos os resultados das análises realizadas. Pressupõe-se que através do contato por meio de entrevistas e outros meios obtenhase as principais informações necessárias para o resultado do estudo, visto que as os usuários finais estão diretamente relacionados aos objetos de estudos.
Resultados e Discussões
Conclusão Reunindo todos os recursos utilizados para o estudo, a bagagem teórica através de pesquisas e referências bibliográficas, o contato com os usuários através de um questionário online, a captação de informações e organização por meio de fichas de análise, entre outros, supõese a obtenção de informações necessárias,
26 visando o objetivo da pesquisa. Ao selecionar marcas que já estão presentes no mercado permite-se identificar como estas já estão sendo apresentados para os clientes em potencial, principalmente na disposição que estes são apresentados nas gôndolas do mercado. Espera-se que as informações sejam claras e objetivas, a fim de analisar os métodos empregados no desenvolvimento de identidades visuais e compará-las. Dessa forma, é possível obter visões diferentes no desenvolvimento de projetos, aprofundandose na área de design. Por fim, a partir dos resultados concretos e informações relevantes sobre a metodologia e desenvolvimento de identidades visuais, o estudo pode ser usado para futuras análises na área de identidade visual e em outros campos da área gráfica.
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Referências Bibliográficas ARNHEIM, R. Arte & Percepção Visual: Uma Psicologia da Visão Criadora. São Paulo: Pioneira, 13 ed., 2000. BANKS, A. O Guia Completo da Cor. São Paulo/SP: Editora Senac, 2007. BOURDIEU, P. A miséria do mundo. Tradução de Mateus S. Soares. 3a edição Retropolis: Vozes, 1999. DONDIS, D. A. A sintaxe da imagem visual. Barcelona: Editora Gustavo Gili, 1997. GOMES FILHO, J. Gestalt do Objeto: Sistema de Leitura Visual da Forma. São Paulo: Escrituras Editora, 2000. HAGUETTE, T. M. F. Metodologias qualitativas na Sociologia. 5a edição Petropolis: Vozes, 1997. MARTINS, L.B. & MORAES, A. Ergonomia Informacional: Algumas Considerações sobre o Sistema Humano-mensagem Visual. In Gestão da Informação na Competitividade das Organizações. Recife: Editora Universitária da UFPE, 2002 v.1 p 165 a 181. MORAES, Anamaria de; FRISONI, Bianka Cappucci (org.). Ergodesign: Produtos e Processos. Rio de Janeiro: 2AB, 2001. RAPOSO, D. Design de Identidade e Imagem Corporativa. Lisboa/Portugal: Editora IPC, 2009. SILVA, J. C. R. P. Diretrizes para Análise e Desenvolvimento de Identidade Visual – Contribuições para o Design Ergonômico. Dissertação (Mestrado em Design) – Universidade Estadual Paulista, Bauru, 2012. STRUNCK, G. Identidade visual: a direção do olhar. Rio de Janeiro: Editora Europa, 1989. WHELLER, A. Design de Identidade da Marca. Porto Alegre: Editora Bookman, 2009.
Estudo para o redesign da marca de refrigerantes Dolly Study for the redesign of the sodas brand Dolly Bordignon, Jonathan. Faculdade de Administração e Artes de Limeira, Faal.
jonathaun@gmail.com Sniker, Tomas Guner. Faculdade de Administração e Artes de Limeira, Faal / Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, Fau-usp.
tsniker@usp.br
Resumo Dolly é uma marca de refrigerantes presente no mercado brasileiro desde 1987. Apesar de conhecida nacionalmente e contar com um volume de vendas expressivo, principalmente junto as classes C e D, possui uma imagem negativa perante boa parte do consumidores, devido a sua identidade visual e posicionamento. Nestes termos, este trabalho relata os resultados de uma pesquisa conduzida para o Redesign do Sistema de Identidade Visual e novo posicionamento do Guaraná Dolly. Para isso, analisou-se o sistema atual e as últimas campanhas publicitárias do produto. Com base nestes dados, foi utilizado o método de Peón (2001) para o desenvolvimento. Palavras-chave: Sistema de Identidade Visual, Redesign, Dolly, Publicidade e Propaganda, Marca.
Abstract Dolly is a brand of soda present in the Brazilian market since 1987. Although it’s nationally known and have a significant volume of sales, primarily along the C and D classes, it has a negative image in much of the consumers, due to its visual identity and position. Accordingly, this paper reports the results of a survey conducted for the Redesign of Visual Identity and new positioning of Dolly Soda. For this, we analyzed the current system and the latest product advertising campaigns. Based on these data, the method Peón (2001) was used for the development. Keywords: Visual Identity, Redesign, Coolant Dolly, Advertising and Propaganda System, Brand.
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1. Introdução Dolly é uma empresa de refrigerantes presente no mercado brasileiro desde 1987, que ganhou destaque como a primeira fabricante brasileira a introduzir o refrigerante dietético no país. A partir de 1994, expandiu o seu portfólio para os refrigerantes adoçados com açúcares, nos sabores guaraná, limão, uva, laranja e cola, atingindo assim, um grande público e, consequentemente, ganhando notoriedade no país (DOLLY, 2013). A empresa possui um ótimo número de vendas principalmente junto as classes C e D, e apesar de atualmente ser muito conhecida em todo o país, conta com uma imagem negativa perante boa parte do mercado consumidor, devido a sua identidade visual e posicionamento de mercado. Nestes termos, como consequência da grande popularidade alcançada pelo guaraná Dolly, percebe-se que a marca da empresa e do produto necessita de uma redefinição dos seus conceitos chave, ou seja, um projeto de redesign capaz de tornar sua marca mais forte, com mais valor agregado e criar uma identidade melhor vista pelo público geral, ou seja, tornar a marca visualmente agradável, para que ela possa ser melhor aceita por todos. A mudança traria benefícios tanto para a marca quanto para o consumidor. Para a marca, o redesign ajudaria a conquistar novos públicos, superando o preconceito que existe com a atual identidade, e também traria mais um produto competitivo para que o consumidor pudesse escolher na hora da compra. Nestes termos, o presente artigo objetiva a relatar a pesquisa desenvolvida para o redesign da identidade visual e de um novo posicionamento estratégico para a marca de refrigerantes Dolly. De início, foi feita uma análise da marca atual do refrigerante e de suas campanhas publicitárias. Na sequência, para o desenvolvimento prático, foi utilizado o método de Peón (2001) para concepção de Sistemas de Identidade Visual, que dividese em três fases-chave: problematização,
29 concepção e especificação. Estes três tópicos guiaram os estudos, pesquisas e avaliações, com objetivo de identificar como a marca era vista pelo público geral e também prever reações em relação a possíveis mudanças, além de encaminhar a aceitação do resultado final.
2. A marca Dolly Segundo a Associação dos Fabricantes de Refrigerantes do Brasil (AFREBRAS), o setor apresenta uma estrutura mercadológica concentrada, onde 75% do mercado é dominado por apenas duas corporações, a Coca-Cola e a AmBev, que apesar de ter maior participação na indústria cervejeira, ainda possui 5% do mercado de refrigerantes. O segmento de refrigerantes regionais é composto por 240 pequenas empresas, que apesar de atuarem em mercados limitados em suas regiões de origem, contribuem com a economia do país sendo importantes geradoras de renda e emprego para uma parcela da população (AFREBRAS, 2013). A Dolly concentra-se principalmente na região Sudeste, mais precisamente no estado de São Paulo. Trata-se de uma marca 100% nacional que, segundo seu site oficial , tem como objetivo oferecer o melhor para os consumidores de seus produtos. Segundo a empresa mundial de pesquisa de marketing ACNielsen, a Dolly possui 10% do mercado nacional de refrigerantes e 30% do mercado do Estado de São Paulo, alcançando o segundo lugar de vendas na região (ACNIELSEN). Nos últimos anos, a fabricante de refrigerantes buscou ganhar mais notoriedade junto às camadas mais populares do Brasil fazendo uso de uma estratégia fundamentada em cores contrastantes e comerciais voltados basicamente para chamar atenção para a marca, no entanto, sem preocupar-se devidamente com a qualidade da produção em si.
2.1 Análise visual Chamar a atenção do consumidor por intermédio das embalagens dos produtos trata-
se de uma estratégia bastante recorrente no mercado alimentício. É fato: a configuração da embalagem influencia no ato da compra, dado que o tempo que as pessoas podem gastar nos supermercados está cada vez menor devido à correria do dia-a-dia. O rótulo consiste no principal elemento da embalagem e, assim como a identidade visual da marca Dolly, os seus rótulos pecam pelo excesso de elementos gráficos, causando uma poluição visual. O excesso de elementos gera pouco contraste, tornando-o pouco atrativo e dificultando a leitura. Assim, o produto tende a passar despercebido entre os seus concorrentes nas gôndolas dos supermercados. O rótulo, além de compor o design de sua embalagem, é o elemento de maior destaque do produto nos pontos de venda, então ele deve ser o mais atrativo e direto possível. No caso da Dolly, a aplicação da marca em seus rótulos, é feita sobre cores sólidas, juntamente com uma espécie de onda azul, sendo prejudicial à sua identificação.
Figura 1 – Rótulo Dolly Fonte: Foto do autor.
Figura 2 – Logotipo Dolly Fonte: DOLLY, 2013
Analisando exclusivamente o logotipo, a Dolly apresenta apenas o nome da marca escrita em uma fonte pesada com serifas grossas, não apresentando características marcantes. A cor cinza metalizada dificulta muito sua aplicação perante os variados rótulos da marca, sendo necessário o uso de uma sombra sólida, que em cada embalagem é inserida com uma cor diferente, isso torna a embalagem e os meios aplicados pesados e poluídos visualmente. A marca ainda conta com um diferencial em sua identidade visual: a mascote Dollynho. Esta mascote é basicamente uma representação do próprio produto: a garrafa pet, mas representada de forma humanizada. Porém, esta representação apresenta algumas falhas que prejudicam o seu resultado final. Analisando sua postura, é possível ver que o Dollynho tem a anatomia próxima a de um humano, com cabeça, tronco e membros bem definidos, e esta análise se torna real quando a mascote é vista em seus comerciais dançando e cantando como uma criança de 7 anos.
As diferentes fontes utilizadas não apresentam um critério claro de aplicação, ora é usado uma fonte com serifa suave, ora com serifa quadrada, ocasionando desconforto visual. As fontes em tamanhos exagerados também contribuem para deixar o rótulo poluído.
Figura 3 – Dollynho Fonte: DOLLY, 2013
30 Seus olhos são grandes e brilhantes, a boca bem delicada, o nariz empinado com as bochechas e o queixo bem marcados completando a expressão de um bebê sorridente. A sua finalização em 3D o torna um pouco incomum, pois além da mascote ser verde, sua textura plastificada permite o reflexo da luz, deixando-a brilhante, o que a torna um pouco deformada dependendo do movimento que executar (Figura 3). Outro ponto falho que pode-se destacar é a presença do gargalo da garrafa bem definido na extremidade da sua cabeça. A Dolly é uma empresa que possui boa visibilidade na TV aberta brasileira, mais precisamente com anúncios de 30’’ ou 15’’ em canais assistidos pelo seu público alvo, como a RedeTV!, Gazeta, Band e Rede Record, onde os telespectadores das classes C e D prevalecem. Por seus comerciais terem conotação infantil, eles são veiculados durante a programação dos desenhos para crianças. Em seus comerciais, a empresa aposta muito na fixação da marca. A palavra “Dolly” é repetida inúmeras vezes em um intervalo de tempo muito curto. Analisando-se o comercial de 30 segundos intitulado: “Dolly Show”, é possível ouvir o nome da marca repetida 15 vezes pela mascote Dollynho: “Oi pessoal, eu sou o Dollynho, seu amiguinho, vamos cantar? / Dolly, Dolly guaraná Dolly, o melhor. Dolly guaraná, o sabor brasileiro / Dolly, Dolly guaraná Dolly, o melhor. Dolly guaraná, o sabor brasileiro / Dolly guaraná, Dolly guaraná / Eu sou o Dollynho, seu amiguinho / Dolly, Dolly, Dolly, Dolly, Dolly”. Ainda neste comercial, a mascote aparece cantando e dançando e por se tratar de uma animação 3D mal renderizada, acaba pecando no quesito acabamento. O Dollynho executa movimentos duros e mal executados com aspectos robóticos. Sua voz lembra a de uma criança que acabou de começar a falar e não completa todas as sílabas fonéticas das palavras. O cenário é cheio de luzes e garrafas gigantes espalhadas pelo palco em que a mascote apresenta o Show da Dolly. Todos estes elementos resultam em um anúncio bastante
31 poluído e pouco agradável de ser visto. Merece menção o jingle da campanha, que embora seja fácil de decorar, com o passar do tempo, o excesso de repetições no commercial o torna grudento demais e gera certa repudia com a marca.
2.2 Piada Virtual Segundo dados da Folha de São Paulo, em matéria divulgada em seu site oficial no dia 16 de maio de 2013, 47% da população brasileira tem acesso a internet e, consequentemente, boa parte destes possuem um perfil em alguma rede social. As marcas e grandes instituições não poderiam ficar de fora deste mundo virtual, onde tudo é mais rápido e fácil de se encontrar (FOLHA DE SÃO PAULO). A Dolly possui um perfil oficial na rede social Facebook, e procura estar ativa com postagens diárias programadas estrategicamente em horários de pico, que favoreçam o seu conteúdo, como exemplo, na hora do almoço e do jantar. Apesar de possuir esta página, em outra rede social (Twitter), um usuário tomou a liberdade de criar um perfil denominado @ DicasdoDollynho, que usa como imagem do perfil a mascote Dollynho. Este perfil publica diariamente “dicas” e frases com fundo sarcástico, com humor negro e até mesmo palavrões para todos os usuários que o seguem (9.335 pessoas em 21/04/2013), estes, por sua vez, acabam repostando as mensagens, ou seja, os posts chegam aos monitores de muito mais de 10.000 usuários. Estes acontecimentos na internet são suficientes para provar que a marca conta com problemas relacionados a sua comunicação perante uma parte considerável dos consumidores, muitas vezes como alvo de piadas. Segundo Strunck (2007, p. 67) “hoje, se uma empresa não tem uma boa imagem, não causa uma boa impressão à primeira vista, isso irá certamente refletir em sua receita.” Conclui-se então, que a Dolly apresenta problemas relacionados a sua identidade visual e comunicação.
3. Desenvolvimento A marca Dolly não declara exatamente qual o seu público, contudo ao analisar-se sua comunicação é possível deduzir algumas das principais características do perfil que ela busca alcançar. Com veiculações dos seus comerciais em canais de TV populares, pela linguagem informal de sua comunicação e pelo tom repetitivo de fixação da marca é possível correlacionar o público alvo da marca aos telespectadores dos canais, com especial destaque para a classe C. Atualmente, esta classe tem crescido muito, os meios de comunicação estão se popularizando, o acesso à internet tem se tornado cada vez mais comum e o público C está ficando mais exigente com o que consome, aceitando pagar até um pouco mais para suprir alguma necessidade psicológica, como pode-se notar nas palavras de Viviani: O consumidor agora, com mais renda, não quer mais o produto barato que não tem respaldo de imagem. Quer um produto percebido como melhor. E migram de marcas. Os reis dos produtos populares, alguns deles, apontam para queda de vendas neste momento. Outros devem seguir pelo mesmo caminho (VIVIANI, 2011).
Viviani comenta que somente baixar os preços para atingir tal público é um desrespeito. Segundo o autor seria o mesmo que dizer que este público não merece bons produtos, nem investimento de posicionamento correto ou criação de identidades e planejamento de marketing a longo prazo. Tratar bem o consumidor não é baixar o preços, e sim elevar a imagem da marca propiciando a ele outros benefícios. Por esta grande exigência do público C, o estudo busca o desenvolvimento da nova identidade visual da marca Dolly. Mas, além de aprimorá-la, busca também torná-la uma marca universal, sem um público realmente declarado, até porque a Dolly vende refrigerante, e isso é um produto muito comum entre todas as
classes, estando presente nas casas dos públicos A, B, C, D ou E. O aprimoramento também irá tirar a referência da Dolly com a de um produto de baixa qualidade ou sinônimo de coisas ruins. Para iniciar o desenvolvimento de uma maneira concreta e cumprir as etapas definidas pelo método, foi elaborado e disponibilizado na internet um questionário referente ao consumo de refrigerantes e o conhecimento e avaliação da marca Dolly. A pesquisa foi feita com questões de múltipla escolha e somente duas questões com respostas abertas. As perguntas tinham o objetivo de descobrir como o público em geral considerava a marca, se ele a conhecia, se tinham contato frequente, o que achavam das campanhas e do visual da marca Dolly e se um possível redesign seria bem vindo ou não. No período de uma semana, a pesquisa obteve 110 respostas, número suficiente para uma análise concreta. Resumidamente, a pesquisa possibilitou levantar alguns pontos críticos sobre a Dolly: Coca-Cola, Fanta e Pepsi são as três marcas preferidas do público; A marca Dolly tem um nível considerável de memorização na mente do consumidor, mas, na maioria das vezes, o público a compara a coisas inferiores; O principal motivo que faz o consumidor comprar um refrigerante é o seu sabor, e segundo a nossa pesquisa, a Dolly peca muito neste quesito; O principal motivo que faz o consumidor comprar o refrigerante Dolly é o seu valor bem acessível, sendo este o ponto mais forte da marca; A identidade visual (logotipo, rótulos, mascote, comerciais etc.) da marca não agradam o público geral, necessitando um redesign.
3.1 Concepção da nova identidade Enumerados os problemas da marca, iniciou-se a fase de concepção. Para encontrar o conceito, foi utilizada a técnica de brainstorm, onde foi possível destacar várias palavras referentes a marca Dolly: refrescante, suave, alegria, felicidade, celebrar, sem açúcar, engraçado, divertido, 100% brasileiro, orgulho, diet, verde e Brasil.
32 Analisando-se as palavras e termos, foram selecionados‘felicidade’e‘100% brasileiro’como aqueles que mais refletiriam as qualidades da Dolly. Perante estas duas opções, optou-se por uma junção, dando origem ao conceito “100% brasileira”, fundamentado na “felicidade”, afinal um completa o outro. Nos próximos anos, Brasil estará em grande evidência graças aos eventos esportivos como a Copa do Mundo e as Olimpíadas. O conceito também é bastante amplo devido à variedade de raças e culturas presentes no país, além de o povo brasileiro ser sinônimo de carisma e simpatia, agregando pontos positivos ao conceito escolhido. Com isto definido, foram estudadas algumas formas e estabelecidas as bases para a continuidade do projeto. Analisando o desenho do mapa do Brasil, encontrou-se uma forma interessante e com potencial para o projeto, porém foi preciso simplificá-la para deixá-la mais harmônica, mas sem descaracterizar o mapa original.
Figura 5 – Mapa simplificado. Fonte: Do autor
Para que a marca não sofresse mais mudanças bruscas em sua identidade, optou-se por manter a sua cor original, apenas alterando o seu tom. A cor ainda agrega pontos favoráveis ao conceito estipulado, uma vez que o verde é uma cor significante do país e também transmite esperança, felicidade e tranquilidade. Além disso, buscou-se desenvolver um logotipo que utiliza formas suaves, que representem a dinâmica e o bem-estar esperado na hora de se refrescar ao tomar um refrigerante. Começouse então a unir a forma simplificada e fluída do mapa brasileiro com uma tipografia que se encaixasse nestas mesmas definições e depois de muitos sketches, chegou-se a duas opções de logotipos para a nova identidade.
33 A pesquisa também foi muito bem aceita pelos entrevistados, tendo como análise final a segunda proposta como a mais indicada para continuidade deste estudo.
Figura 6 – Propostas finalizadas Fonte: Do autor
A primeira destas duas originou-se de uma tipografia já existente, neste caso, a fonte Sansita One, que apresenta formas harmônicas com uma serifa orgânica. Na sequência, para tornar a tipografia do logotipo exclusivo para a marca, foram feitas algumas modificações necessárias para deixar as formas ainda mais fluídas e dinâmicas como mostra a figura abaixo, chegando então ao resultado desejado. A segunda opção foi desenhada com os mesmos critérios: o de fluidez e equilíbrio, ou seja, manteve-se a dinâmica na disposição das letras e nos contornos e foi respeitado as espessuras, extremidades e equilíbrio. Com as duas propostas então devidamente finalizadas, chegou a hora de elaborar algumas questões sobre legibilidade, conceito, formas e simpatia que comprovariam a escolha e a aceitação do público geral de uma das opções. Na sequência a pesquisa foi aplicada de forma qualitativa com perguntas claras e objetivas para o novo público alvo, a fim de identificar possíveis alterações significantes nos logotipos apresentados. Os entrevistados reagiram bem perante a pesquisa e algumas sugestões em relações às formas apareceram, sendo então feitas e os logotipos ficaram como mostra a figura. Após isto, outra pesquisa foi realizada, sendo agora direcionada aoa profissionais da área de design, publicidade e comunicação, assim obteríamos uma análise mais criteriosa e fundamentada nos aspectos de construção de identidades visuais.
Figura 7 – Novas propostas finalizadas Fonte: Do autor Figura 8 – Novo Dollynho
3.2 Concepção da nova mascote A nova mascote deveria relacionar-se com a nova comunicação da marca, ou seja, deveria aparentar ser alegre, além de contar com traços simples, assim como o novo logotipo desenvolvido. Outra mudança considerável consistiu em sua finalização. O novo mascote foi finalizado em 2D, no estilo de ilustração vetorial, deixando-o livre de qualquer ruído visual que pudesse prejudicar o seu resultado final. O resultado apresenta aparência mais encorpada e robusta, com os braços e pernas mais grossas que o anterior, isso deu maior estabilidade física para a composição. A proporção do rosto com os olhos grandes e o nariz pequeno foi mantida, para que se criasse uma relação com o mascote antigo, porém, o olhar foi alterado e as pupilas diminuídas para representar uma idade mais avançada, acima de 10 anos de idade. A mudança de idade foi definida com objetivo de buscar maior identificação junto ao publico. A nova mascote mascote é um pré-adolescente, enquanto o antigo era praticamente um bebê.
Fonte: Do autor
Um detalhe que fez toda a diferença na nova proposta foi a retirada do gargalo definido no topo da cabeça. Foi inserido um boné com aspecto de tampa de garrafa para representar o aspecto de ‘menino’ esperando formar uma identificação com o público e também para esconder o gargalo. Os tênis foram retirados com a intenção de deixar a mascote mais leve. Além disso, foi criado também um símbolo a partir do novo logotipo, simplificando a identidade da marca sem perder as suas características. A finalização em 2D foi feita utilizando traços firmes com espessuras diferentes, cores chapadas e uma iluminação uniforme, o que tornou o resultado final bastante satisfatório.
3.3 Concepção da campanha e rótulos Tendo em vista a divulgação do redesign da identidade visual e a construção do novo posicionamento estratégico foi desenvolvida uma campanha de divulgação para diferentes mídias. O conceito criativo seguiu a mesma linha da nova identidade, focando brasilidade e felicidade. A frase da campanha “Viva as diferenças” assina a ilustração que representa a cultura, as raças e costumes brasileiros, além de apresentar uma paleta de cores referente ao Brasil.
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Figura 9 – Cara da campanha Fonte: Do autor
Em relação às embalagens dos refrigerantes, foram desenvolvidos novos rótulos utilizando cores chapadas, tornando o logotipo mais evidente. As tipografias utilizadas dialogam com o novo logotipo, não comprometendo o resultado final. Ao fundo do rótulo foi inserido uma imagem sutil de um líquido, da própria cor do rótulo, remetendo a ideia de refrescância e fluidez.
Figura 10 – Novo rótulo Fonte: Do autor
O novo rótulo contém as mesmas informações dos rótulos antigos, porém, de uma forma simples e direta, prevalecendo o entendimento e a identificação das informações.
4. Conclusão Os resultados do desenvolvimento do redesign da marca de refrigerantes Dolly foram alcançados devido a pesquisa realizada e ao método de projeto aplicado. Cabe frisar que o posicionamento adotado pela marca nos
35 últimos anos não é errado, mas sim arriscado, gerando amor ou ódio nos consumidores. A marca Dolly sofre com comparações de produtos de baixa qualidade por uma parte do público geral e acaba passando a imagem de uma marca de segunda linha. Por outro lado, a Dolly possui números de vendas expressivos, comprovando que existem muitos consumidores que identificam-se com a marca ou simplesmente não se importam com publicidade. O estudo afunilou esta margem de interpretação, deixando a comunicação da empresa possível de ser mais aceita pelo público geral e abrindo portas para novos consumidores.
5. Considerações finais Este trabalho apresenta o resultado do estudo e desenvolvimento de um Trabalho de Conclusão do Curso da Faculdade de Administração e Artes de Limeira (FAAL) do curso de bacharelado em Design Gráfico. Após a apresentação acadêmica, a nova identidade visual, bem como suas aplicações, foram publicadas em um site de portfólios online e obteve um grande número de visualizações e compartilhamentos em sites e blogs relacionados a design, publicidade e propaganda. O site onde o trabalho está publicado conta com mais de 30.000 visualizações, porém este número está aquém do número real, pois muitos outros sites postaram o trabalho sem referenciar a sua origem. Este “boom” digital envolvendo o trabalho representa o grande interesse gerado pela marca Dolly, e funcionou como um “termômetro” em relação à aceitação do público.
6. Referências ACNIELSEN. Disponível em: <http://www. muitotudo.com/dolly-refrigerante-saborbrasileiro/>. Acesso em: 18 abr. 2013.
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Lomografia e Instagram: um encontro entre o analógico e o digital na fotografia contemporânea Lomography and Instagram: a meeting between analog and digital in contemporary photography MARGADONA; Laís Akemi. Universidade Estadual Paulista (UNESP)
laisakemi.ma@gmail.com HENRIQUES, Fernanda. Universidade Estadual Paulista (UNESP)
ferdi@faac.unesp.br
Resumo Vivemos em uma época em que a plataforma digital trouxe diversos benefícios ao ato de fotografar; entre eles, a facilidade de captura, pós-produção e compartilhamento das imagens capturadas. Em outra via, vemos a difusão da estética analógica através do popular aplicativo para dispositivos móveis Instagram e das produções do movimento de fotógrafos analógicos denominado Lomografia. Mister afirmar que tais obras, as quais resgatam o analógico, têm sido divulgadas sistematicamente em meio digital. Sendo assim, buscamos analisar neste trabalho o diálogo entre ambas plataformas na fotografia, bem como suas intersecções e divergências, utilizando como ponto de partida a Lomografia e o Instagram. Palavras-Chave: Lomografia; Instagram; Fotografia analógica; Fotografia contemporânea.
Abstract We currently live in an age where the digital platform has brought many benefits to the act of shooting pictures, like the ease of capture, post-production and sharing of the resulted images. On the other hand, we noticed the spread of analog aesthetic through the popular mobile device app Instagram, and the productions from the movement of analog photographers called Lomography. It must be noted that such productions, which recover the analog technology, are systematically disseminated in digital media. Therefore, we analyze in this work the dialogue between both technologies in photography, as well as their intersections and divergences, using Instagram and Lomography as a starting point. Keywords: Lomography; Instagram; Analog photography; Contemporary Photography.
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Introdução A instantaneidade, a facilidade de compartilhamento e o largo fluxo imagético são as tônicas da fotografia contemporânea. Desde a elaboração da primeira câmera completamente digital nos anos 1990, até a democratização da captura fotográfica por dispositivos móveis neste início de século XXI, temos visto que “nunca se fotografou tanto (...) Fotografa-se tudo, a qualquer momento, em qualquer lugar, sob qualquer pretexto” (MARTINS, 2014, p.16). Neste contexto, a Eastman Kodak Company, empresa largamente responsável pelos avanços na fotografia em filme, progressivamente retirou produtos analógicos do mercado – incluindo o lendário filme Kodachrome, cuja produção foi descontinuada em 2009. Segundo Silva Junior (2012, p.1), “os severos prejuízos sofridos pela tradicional marca [a Kodak] se devem, sobretudo, ao pouco sucesso da mesma diante da alta concorrência existente no mercado da fotografia digital”. Para Thales Trigo (2012, p.15), “o filme fotográfico, apesar de suas inegáveis qualidades e ligação absoluta com a história da imagem e da cultura, está destinado nos próximos anos, a ter um uso muito limitado”. Já no início de 2008, outra importante empresa do ramo, a Polaroid Corporation, decretou falência, o que interrompeu definitivamente a produção das tradicionais câmeras e filmes polaroides da marca. Apesar do panorama desfavorável à tecnologia analógica, é possível notar um movimento reverso ao da extinção desta plataforma na fotografia. Em 2011 e 2012, duas lojas da Lomography, marca oficial de equipamentos analógicos vinculada ao movimento lomográfico, foram inauguradas no Brasil. A cultura lomográfica, no entanto, não é recente: seu marco inicial é em 1991, em Viena, associado à popularização da câmera russa LOMO LC-A. Naquele ano, um grupo de estudantes austríacos descobrem-na por acaso, e iniciam a captura informal das ruas de Praga e de si próprios. Ao visualizarem as
37 fotografias ampliadas, os jovens fotógrafos se surpreenderam com o aspecto saturado e brilhante das imagens. “Eles se maravilharam como as fotos pareciam diferentes e vibrantes. Pareciam agora capazes de visualizar o mundo através de olhos diferentes” (LOMOGRAPHY, 2012b, p.16, tradução nossa). Com rapidez, a câmera se popularizou entre os vienenses. Em 1992, os lomógrafos publicaram o manifesto “As Dez Regras de Ouro da Lomografia”, que incluem preceitos como fotografar a todo momento sem preocupações com regras formais. Recentemente, os preceitos lomográficos têm sido amplamente difundidos por meio digital, bem como suas produções fotográficas, as quais são digitalizadas e transformadas em arquivo de imagem. Ademais, diversos equipamentos analógicos também têm sido comercializados pela loja virtual da Lomography – incluindo as tradicionais câmeras LOMO LC-A, Diana, Diana F e Lubitel, em versões aperfeiçoadas e atualizadas.
filme. Através da aplicação de filtros digitais em imagens recém-capturadas por dispositivos móveis, o Instagram viabiliza o processo de pós-produção e publicação instantâneos da imagem. O fluxo de uso do aplicativo é simplificado e intuitivo: basicamente, dividese nas etapas de captura, aplicação de filtros e compartilhamento da imagem final na rede social do aplicativo. Fazendo referência aos tradicionais filtros fotográficos que eram anexados às objetivas das câmeras, os filtros digitais são configurações fixas e pré-definidas para a edição das imagens, e são nomeados com termos como Valencia, Willow, X-Pro II e Lo-Fi – os dois últimos nomes são emprestados de conceitos típicos do analógico: a revelação cruzada (X-Pro) e o low-fidelity (do inglês “baixa fidelidade”). O resgate da estética da fotografia em filme é obtido através de efeitos como vinhetagens, cores saturadas ou esmaecidas, conversão da imagem em preto e branco, simulação de alta granulação e aplicação da tradicional borda dos filmes fotográficos.
milhões de usuários ativos num fluxo de 60 milhões de novas imagens postadas ao dia. Tendo em vista estes fatos, suscitamos a seguinte pergunta: como a fotografia analógica tem se contextualizado na contemporaneidade digital? Acreditamos que em um encontro de atualização e beneficiamento mútuo, embora ainda sejam mantidos alguns distanciamentos. Esta pesquisa foi desenvolvida através de projeto de iniciação científica pela Pró-Reitoria de Pesquisa (PROPe) da UNESP.
Revisão Bibliográfica Foram vitais para esta pesquisa a descrição técnica e de desdobramentos conceituais da fotografia analógica e digital efetuada por Martins (2014), assim como os depoimentos colhidos pelo autor de renomados fotógrafos nacionais. Ademais, foram consultados o estudo detalhado de Trigo (2012) acerca das tecnicidades da fotografia digital; a descrição dos processos físico-químicos da fotografia analógica efetuados por Browner (1967) e Busselle (1977); bem como os dois volumes da obra “Lomo Life: The Future is Analog” (2012), publicados pela Lomography. Adicionamos também à revisão artigos científicos e outras produções recentes, como as dissertações de Ymayo Filho (2003) e Burmester (2006), e o artigo de Silva Junior (2012), de modo a trazer ao projeto reflexões acadêmicas mais atualizadas e próximas aos objetos de estudo.
Materiais e Métodos Figura 1: Uma das primeiras fotografias lomográficas, capturada pelos jovens vienenses nos anos 1990. Extraído de: <microsites.lomography.com/lca+/history/>, acesso em: 14/09/2014.
Ainda mais recentemente, o aplicativo para dispositivos móveis Instagram, lançado originalmente para iOS em 2010, usufrui de imensa popularidade desde os últimos anos de sua criação. As fotografias digitais manipuladas pelo aplicativo remetem ao visual analógico, buscando adicionar ao arquivo em pixel a nostalgia e apelo retrô das antigas imagens em
Figura 2: Fotografia digital com aplicação do filtro Nashville. Extraído de: <instagram.com/laisakemi>, acesso em: 14/09/2014.
Os números relacionados ao Instagram são estonteantes: após ser lançado para o sistema operacional Android, o aplicativo alcançou cerca de 1 milhão de downloads em 24 horas. No mesmo ano, o aplicativo foi comprado pela rede social Facebook por 1 bilhão de dólares. Em março de 2014, atingiu-se a marca de 200
A metodologia deste trabalho consistiu em: • Fragmentação do processo de fotografia em três etapas (ou categorias) principais – Produção: Captura e Registro; Pós-Produção: Tratamento de Imagem; Compartilhamento dos Resultados; • Utilizando como base a classificação acima, coleta das principais características da fotografia analógica e digital tradicionais, separadamente, de modo a melhor compreender ambos processos fotográficos; • Análise das mesmas características, desta
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vez, relacionadas à Lomografia e ao Instagram; • Associação dos dados obtidos dos dois objetos de estudo de caso às duas plataformas de captura fotográfica; • Sintetização dos resultados em gráficos e diagramas de conjunto, a fim de obter melhor visualização dos diálogos e divergências entre as plataformas na fotografia.
Produção e Pós-Produção, visto que em ambas é efetuada a aplicação dos filtros com aparência analógica:
Resultados e Discussão Cerca de 55 características dos processos fotográficos foram investigadas, subdividas nas três categorias já citadas. Dentro de Produção: Captura e Registro, analisamos itens como tecnologia do material sensível à luz, tipos de máquinas fotográficas e natureza do processo de captação da imagem. Em Pós-Produção: Captura e Registro, verificamos como são feitos o tratamento de imagem e obtenção de cópias a partir do original. Finalmente, a etapa de Compartilhamento dos Resultados envolve elementos como o suporte da imagem publicada e o feedback do público ao fotógrafo. As categorias foram baseadas na classificação de Boris Kossoy (2000, p.37-38) e Burmester (2006): A produção fotográfica é a captura ou a fabricação da imagem, o instante fotográfico que documenta um assunto pré-selecionado pelo fotógrafo. Já a pós-produção é a fase na qual a imagem, ao ser preparada para o processo de publicação, sofre adaptações, cortes e ajustes visando à sua inserção na página do jornal, da revista, do cartaz, etc. (BURMESTER, 2006, p.11)
Em seguida, os dados obtidos da fotografia analógica foram comparados com qualidades da captura lomográfica. Como este tipo de imagem é nativamente analógico, buscamos identificar quais itens acabaram divergindo do que é tradicional na fotografia em filme:
Figura 3: Gráfico – A Lomografia e a Fotografia analógica.
É possível observar que especialmente a pós-produção e o compartilhamento acabam sendo atípicos na Lomografia, visto que ela desfruta das facilidades de tratamento de imagem e publicação do digital. O processo de digitalização (ou escaneamento) permitiu que a fotografia analógica se desvinculasse de seus suportes físicos e pudesse finalmente ser difundida em ambientes virtuais – e até reproduzidas em impressoras caseiras. Já o processamento do negativo através de minilabs permitiram a redução dos pesados custos da manipulação em laboratório. Verificamos, na homepage da Lomography Brasil, por exemplo, diversos registros analógicos publicados em meio digital:
Figura 4: Homepage da Lomography Brasil. Extraído de: <www.lomography.com.br>, acesso em: 12/09/2014.
Logo após, comparamos o Instagram com características da fotografia digital, de modo a investigar se existem tipicidades que se desviam de sua plataforma nativa. Basicamente, as principais divergências estão na etapa de
Figura 7: Diagrama de conjunto – Lomografia e Fotografia digital.
Figura 5: Gráfico – O Instagram e a Fotografia digital.
Apesar de poucas divergências quantitativas, é importante lembrar que o produto final do uso do Instagram tem aparência híbrida, apesar da metodologia de sua produção ser eletrônica. O compartilhamento é tipicamente digital, através da rede social do próprio aplicativo, capaz de fornecer uma plataforma de publicação e feedback imediatos:
Os defeitos visuais inerentes ao processo físico-químico – oriundos, por exemplo, do manejo incorreto dos produtos químicos ou de máquinas fotográficas de baixa qualidade técnica – eram antes execrados por fotógrafos analógicos de todo o mundo; no entanto, são o diferencial estético da Lomografia. Os produtos finais típicos de uma fotografia lomográfica são os filmes revelados e as cópias digitalizadas em arquivos de imagem – daí as intersecções “pixel”, “tratamento de imagem rápido” e “imagens digitais”, conservando o grão à Lomografia. Como foi visto anteriormente, as imagens também podem ser facilmente compartilhadas pelo site da Lomography ou em outras redes sociais.
Figura 6: Fotografia do aplicativo Instagram visualizada na rede social pela interface web. Extraído de: <instagram.com/laisakemi>, acesso em: 14/09/2014.
O diagrama de Venn, abaixo, foi elaborado para melhor visualizarmos as intersecções e divergências entre a Lomografia, nativamente analógica, e a fotografia digital:
Figura 8: Diagrama de conjunto – Instagram e Fotografia analógica.
Analisando o diagrama do Instagram e sua plataforma não-nativa, notamos na intersecção os defeitos visuais do processo físico-químico
40 – tipicidade, aliás, da Lomografia. Alguns distanciamentos já eram esperados: o sensor digital e a imagem final em pixel são premissas da fotografia digital, bem como o filme fotográfico e a ampliação em grãos de prata são qualidades da fotografia analógica tradicional – cujos processos químicos em laboratório encarecem substancialmente o custo do clique. Novamente, são justamente as imperfeições do analógico que são incorporadas às imagens do Instagram. Graças aos avanços da plataforma digital, o tratamento de imagem é agora feito rapidamente por processo inteiramente eletrônico, através da interface do aplicativo. No entanto, o Instagram fornece apenas 19 opções de filtros gratuitos, enquanto que um fotógrafo em laboratório pode manipular uma infinidade de resultados visuais. Por fim, a fotografia analógica tradicional apenas dispõe da divulgação em mídias impressas, enquanto que as imagens do aplicativo, nativamente digitais, podem ser divulgadas mundialmente através da World Wide Web. Assim, podemos afirmar que as imagens do Instagram se valem de um visual tipicamente analógico gerado por filtros digitais; porém, sem se submeter às dificuldades técnicas, lentidões e custos do processo físico-químico. Para Silva Junior (2012, p.2-3), trata-se de um “(...) conceito de fotografia em redes, instantâneo, de circulação mundial e que cabe no bolso.” Já a Lomografia pode conservar boa parte do processo da manipulação do filme e ainda dispor da publicação digital.
Considerações Finais Acreditamos que a fotografia contemporânea vive um momento de encontro e hibridização entre ambas tecnologias, analógica e digital, num processo de ampliação mútuo. Resumidamente, a plataforma digital oferece a facilidade de compartilhamento e publicação, enquanto que o analógico é capaz de disponibilizar uma valiosa estética diferenciada num contexto de superprodução imagética. Para Silva Junior (2012, p.7), este quadro representa “um movimento típico de
41 expansão, de aquisição de espaços com e a partir de interações com meios precedentes, ou já existentes”. Se a queda dos dois gigantes analógicos Eastman Kodak Company e Polaroid Corporation implicou na relegação dos equipamentos em filme, observamos no decorrer deste trabalho, um movimento de resgaste da tradicional técnica, efetuado pelo Instagram e a Lomografia. Novas questões têm sido suscitadas neste contexto da fotografia contemporânea: Ymayo Filho (2003, p.15) afirma que a facilidade de compartilhamento permitido pela telefonia celular “é algo que está revolucionando o mundo dos negócios e o comportamento das pessoas” e Silva Junior (2012, p.5) acrescenta que “agora, no início do século XXI, as fotografias são vistas de muitas maneiras. E a grande maioria delas não envolve a ideia clássica presente até os anos 1990”. Movimento semelhante tem ocorrido entrementes no design gráfico: técnicas tradicionais têm sido recriadas e ressignificadas em ambientes virtuais, através de softwares e aplicativos de edição de imagem. Famílias de fontes digitais buscam simular o visual dos antigos tipos móveis, e aplicativos como o Calligraphy Practice criam ferramentas digitais para a caligrafia manual. O mesmo também tem sido notado no cinema: para Youngblood (1970), a coligação entre o cinema tradicional e os novos recursos computacionais tem gerado um modelo híbrido, denominado por ele como cinema expandido. Na fotografia, não só o Instagram e a Lomografia são responsáveis pela ressignificação do analógico: antigos funcionários da Polaroid Corporation fundaram o The Impossible Project, responsável pela fabricação e venda de filmes polaroides para as antigas câmeras da Polaroid; a Fujifilm continua a comercialização da câmera instantânea Fuji Instax; e no digital, vemos diversas novas ferramentas similares ao Instagram, como o aplicativo Retrica e o programa Pixlr-o-Matic. No Instagram, produções analógicas digitalizadas tem sido publicadas com hashtags como #savethefilm (“preserve o filme”), #keepfilmalive (“mantenha
o filme vivo”) e #filmisnotdead (“o filme não está morto”). Assim, é importante afirmar que, diferentemente das previsões pessimistas dos profissionais da velha guarda, a plataforma analógica tem sido retomada e ressignificada pelos jovens fotógrafos. Para a Lomografia, “o futuro é analógico”, ou seja, aqueles que nasceram dentro do domínio da fotografia digital agora podem desfrutar das “novas” possibilidades expressivas da fotografia analógica na contemporaneidade.
Agradecimentos À orientadora Profa. Dra. Fernanda Henriques – esta pesquisa não teria sido viabilizada sem seu acompanhamento acadêmico, amizade e apoio; à Pró-Reitoria de Pesquisa da UNESP (PROPe), pela oportunidade de desenvolver este projeto através do Programa Institucional de Iniciação Científica sem Bolsa (ISB), projeto n. 26748; e à minha família, pela paciência e amparo durante a redação deste trabalho.
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DESIGN DE PRODUTO
Design de mobiliário público modular com diretrizes sustentáveis Modular Public Furniture Design With Sustainable Guidelines Mattara, Laura Gonçalves; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
laura.mattara@gmail.com Guari, Cainã Brinatti; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
caina_guari@hotmail.com Matos, Isabella Martino; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
martinomatos@gmail.com Nakata, Karina Sayuri; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
sayurinakata@hotmail.com Brigatto, Aline Cristina; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
aline.brigatto@gmail.com Barata, Tomas Queiroz Ferreira; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
barata@faac.unesp.br
Resumo Este artigo apresenta o processo de projeto e produção do protótipo do banco Modular com base nos princípios estudados no projeto de extensão universitária MUDA design da Unesp Bauru. Através do estudo de conceitos de mobiliário urbano, aliado a escolha do eucalipto como matéria prima e às diretrizes de sustentabilidade, o projeto visa expor e discutir os resultados obtidos afim de proporcionar uma reflexão sobre a participação do designer na geração de alternativas para o desenvolvimento sustentável na produção de mobiliário público. Palavras Chave: sustentabilidade; mobiliário urbano; materiais renováveis; eucalipto.
Abstract This paper presents the project’s and production’s process of the bench Modular prototype based on the principles studied by the extention group MUDA design from Unesp Bauru. Trough the study of urban furniture concept combined with the choice of eucalipt as a raw material and with the sustainability guidelines, the project aims expose and discuss the results obtained with the intention of providing reflection about the designer’s participation in the generation of alternatives to the sustainable development on the production of urban furniture. Keywords: sustainability; urban furniture; renewable materials; eucalipt.
1. Introdução O sistema produtivo que não se preocupa com o consumo desmedido dos recursos naturais é um aspecto que vem sendo discutido em nossa sociedade nas últimas décadas. Existem argumentos que embasam a busca por
alternativas que viabilizem o desenvolvimento mais consciente e sustentável. Neste cenário, o designer tem como função estabelecer o equilíbrio entre sanar as demandas de consumo da sociedade contemporânea e contribuir com a preservação do meio ambiente (REIS, 2010). Em outras palavras, cabe ao profissional
44 a preocupação em desenvolver projetos de qualidade que atendam as necessidades dos consumidores atuais, mantendo o foco nos parâmetros da sustentabilidade. Com essa perspectiva, o projeto de extensão universitária, MUDA Design, da Faac-Unesp, campus de Bauru realiza pesquisa, desenvolve projetos e produz protótipos de mobiliários com ênfase na aplicação de conceitos de sustentabilidade no design de produtos. A principal justificativa para a realização das atividades de extensão e pesquisa do projeto é o atendimento das demandas atuais da sociedade no que se refere à produção e ao consumo responsável de produtos inovadores que incorporem conceitos de sustentabilidade no seu ciclo de vida. Atualmente o projeto desenvolve suas atividades no Laboratório Didático de Materiais e Protótipos (LDMP), em parceria com a Estação Experimental de Bauru (EEB) pertencente ao Instituto Florestal do Estado de São Paulo, objetivando a melhoria e a qualificação do espaço público de lazer da EEB e do campus de Bauru da Unesp, com a adequação e instalação de mobiliários e componentes préfabricados. Para tal, faz-se uso de madeira de reflorestamento, mais especificamente de eucalipto (Floresta Estadual de Pederneiras), matéria-prima proveniente da própria região onde serão produzidos e implantados os protótipos. O uso de tal material condiz com a diretriz principal do projeto, uma vez que é de fonte renovável e de baixo impacto ambiental. Tendo em vista tais aspectos, o objetivo principal do artigo é apresentar o processo de desenvolvimento projetivo, a produção e a análise dos indicativos de sustentabilidade do mobiliário urbano denominado “Modular”. O banco foi desenvolvido de forma a suprir as necessidades da EEB, a partir da análise das deficiências no mobiliário público existente no local. É possível assim, observar neste projeto a preocupação com os diferentes usuários e com a forma de interação com o espaço, através de um design convidativo para que o ambiente se torne agradável, propiciando práticas sociais
45 e interações com o meio. Além desse ponto, o design também é desenvolvido dentro do conceito de sustentabilidade, levando ao público uma espécie de “conscientização subjetiva” graças à composição do espaço, o design sustentável e a interação do público atingido.
2. Revisão Bibliográfica O conceito de sustentabilidade é definido, segundo o relatório “Nosso Futuro Comum” (Our Common Future, 1987) escrito pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, como a capacidade de sanar os anseios presentes sem comprometer o potencial das gerações futuras de satisfazerem suas próprias necessidades. O relatório aponta que o desenvolvimento sustentável não deve ser visto como um estado fixo de equilíbrio, mas sim como um processo de mudança na relação entre a exploração de recursos naturais, a direção dos investimentos, o desenvolvimento tecnológico e as mudanças institucionais sejam coerentes com as reais necessidades presentes. Partindo dessa premissa, podemos enxergar o desenvolvimento sustentável como uma necessidade que se faz globalmente presente, e obrigatoriamente aplicado ao Design. O designer deve tomar consciência da inevitável mudança que está acontecendo e então direcionar sua trajetória para a orientação mais favorável (MANZINI e VEZZOLI, 2011). Ainda segundo os autores, o projeto do produto deve ser pautado no conceito de Life Cycle Design (LCD), cujas etapas de produção, distribuição, utilização e descarte de um produto devem ser consideradas como uma unidade. No ciclo de vida do produto devem ser prioritárias a minimização do uso de recursos e a escolha de processos de baixo impacto ambiental. Iniciar o pensamento projetual de modo a objetivar a redução energética em todas as fases do ciclo de vida e simultaneamente estender a vida útil do produto e seus componentes são duas das estratégias mais utilizadas no desenvolvimento de novos produtos tendo em
vista a redução dos impactos sobre os recursos naturais. (SILVA e HEEMANN, 2007, p.10)
Ramos (2001) pontua diversos exemplos de estratégias de redução de impactos ambientais, como redução do uso dos recursos naturais por meio da simplificação das formas, evitando superdimensionamentos e utilizando materiais encontrados em abundância na região do local de produção; redução do uso de energia utilizando fontes alternativas para o processamento e produção do produto em toda a sua linha produtiva e redução de resíduos, aplicando materiais reciclados na produção, além de evitar outros tipos de materiais que possam produzir algum tipo de emissão tóxica. O autor pontua também exemplos de estratégias de extensão da vida útil de produtos, que merecem atenção durante a fase de concepção de novos projetos, como aumentar a durabilidade facilitando a manutenção e a substituição de peças que estejam com algum tipo de problema; projetar para reutilização facilitando a desmontagem do produto final, prevendo atualizações tecnológicas e projetando intercâmbio de peças; projetar para a reciclagem agregando valor estético aos materiais reciclados aplicados e também planejar o fim da vida útil dos materiais/ produtos utilizando materiais biodegradáveis em produtos de vida breve. De acordo com Manzini e Vezzoli (2011), os materiais, por serem naturalmente a composição dos produtos, determinam diversas formas de impacto ambiental e diversos efeitos em nossa saúde e no ecossistema em que vivemos. O designer deve, portanto, se ater, ao conceber seu projeto, à escolha de matérias prima que possam condizer com o Desenvolvimento Sustentável. Tendo em vista tais princípios, está cada vez mais presente na sociedade a busca por produtos inovadores que incorporem os conceitos de sustentabilidade em seu ciclo de vida. Desta forma, o setor moveleiro apresenta um crescente interesse por madeiras de rápido crescimento. Campinhos (2001) comenta
que a ampla utilização da madeira serrada proveniente de florestas plantadas pode diminuir o consumo da madeira de florestas nativas, cada vez mais sujeitas às restrições de corte, de governo e de sociedade. “Além das condições naturais bem favoráveis, o Brasil possui excedentes de mão-de-obra no meio rural, bem como considerável domínio tecnológico nas atividades ligadas à formação de florestas e produção de madeira.” (FERREIRA; JOÃO; GODOY, 2008 p.05) O Eucalipto possui inúmeras vantagens para ser a principal madeira de serraria do país. Ferreira, João e Godoy (2008) apontam que o gênero apresenta vários aspectos que o diferenciam, como: rápido crescimento volumétrico e potencialidade para produzir árvores com boa forma; características silviculturais desejáveis (como bom incremento, boa forma, facilidade a programas de manejo e melhoramento, tratos culturais, desbastes, desramas etc.); grande plasticidade (devido à grande diversidade de espécies, adaptando às mais diversas condições de clima e solo); elevada produção de sementes e facilidades de propagação vegetativa. O Conselho de Informações sobre Biotecnologia (2008) ainda ressalta que o eucalipto sequestra grande quantidade de gás carbônico (CO2) da atmosfera, contribuindo para minimizar o efeito estufa e melhorar o microclima local. Sendo assim, o Eucalipto se apresenta como grande alternativa para a produção de mobiliários sustentáveis, uma vez que é uma matéria-prima de baixo impacto, forte e resistente, além de ser biodegradável podendo suportar aplicações nos mais diversos locais, com alto desempenho em diversas finalidades. Dentre as várias possibilidades, existe o mobiliário urbano que recebe grande atenção por parte dos estudos em Design. Segundo Oliveira (2011), o mobiliário urbano e o local onde este se encontra implantado tem uma função subjetiva aos seus usuários, não servindo como um simples local comum às pessoas, mas também como incentivo às práticas
46 sociais. Fica claro, dessa maneira que o design desses móveis implantados nos locais públicos também tem uma enorme importância sobre a receptividade das pessoas e a geração das prática sociais. “As funções públicas do mobiliário urbano variam conforme o tipo de usuário, o horário e o tipo de uso que se faz dos equipamentos” (ASSUNÇÃO, 2000, p.34). Dessa forma, podemos entender como se faz a composição do espaço público com o tipo de mobiliário aplicado ao local, já que existem outros elementos mais fortemente relacionados ao uso desses equipamentos do que apenas a sua aplicação para o uso dos cidadãos que compõem o tipo de local. Também é levada em conta a aplicação da função estética do mobiliário, esta, por esse lado, é vista como uma das mais importantes funções empregadas pelos designers. Segundo Vargas (2011), a função estética dos objetos é formada por vários aspectos, dentre eles formais, decorativos e as vivências de seus cidadãos em relação ao contexto local. Contudo, em alguns casos a estética se sobrepõe às outras funções comprometendo o desempenho do produto (MONTENEGRO, 2005), o que deve ser alvo de cuidado para os seus idealizadores já que o uso dos cidadãos também deve ser levado como fator importante na instalação de um mobiliário público. Desta forma, os elementos urbanos cumprem sua função utilitária quando atendem aos aspectos fisiológicos de uso e necessidades do usuário como conforto, proteção contra intempéries, requisitos ergonômicos e condições de manutenção do mobiliário. (VARGAS, 2011, p.20)
Vargas (2011) ainda comenta que a desconsideração dos aspectos utilitários no ato de se projetar pode gerar resultados que não cumpram os seus papéis ou não sejam utilizados adequadamente pelos usuários, não atendendo as necessidades locais de determinada cultura e comprometendo a
47 funcionalidade dos espaços públicos.
3. Materiais e Métodos A metodologia aplicada ao trabalho teve como propósito gerar um produto inovador através da resolução de problemas específicos relacionados ao design de mobiliários públicos e ao processo produtivo em marcenaria. Dessa forma, a estrutura metodológica para o desenvolvimento das atividades projetivas e as etapas de produção do protótipo em laboratório consiste em nove etapas principais que foram sistematicamente divididas em: 1. Pesquisa de referências e projetos similares; 2. Estabelecimento de diretrizes sustentáveis aplicadas ao design de mobiliários públicos, caracterizando também a matéria-prima e os equipamentos disponíveis para produção do protótipo físico no LDMP; 3. Geração de alternativas com a elaboração de sketches manuais, seguindo uma análise de demanda e identificando o perfil do usuário; 4. Processo de seleção de alternativas e produção de modelagens virtuais paramétricas com emprego de software; 5. Execução do modelo em escala reduzida em laboratório; 6. Revisão e reformulação do projeto; 7. Desenvolvimento do projeto executivo; 8. Elaboração do processo produtivo dos protótipos físicos em escala real, compreendendo a usinagem das peças, montagem e acabamento; 9. Análise dos dados coletados na etapa de produção de protótipo.
4. Resultados e Discussões Tendo em vista a metodologia aplicada ao processo completo do mobiliário, os resultados apresentados a seguir são partes relevantes a serem avaliadas. A seguir são discutidos os conceitos de sustentabilidade aplicados ao mobiliário, o processo de projeto e o processo produtivo do protótipo.
4.1. Conceitos de Sustentabilidade Aplicados ao Mobiliário No início do desenvolvimento das atividades projetivas do banco Modular foram definidas diretrizes sustentáveis a serem incorporadas no projeto do protótipo. Material A matéria-prima empregada na produção do protótipo é a madeira serrada da espécie Eucalyptus citriodora, que provém da mesma região em que o mobiliário foi produzido e instalado, propiciando um gasto energético reduzido na logística. Além disso, o material apresenta alta durabilidade e resistência para suportar a exposição às intempéries. Desenho As peças do móvel têm cortes planejados para possibilitar maior aproveitamento da prancha de madeira e facilitar a manutenção, uma vez que propiciam a substituição das partes. As formas limpas e linhas retas do desenho contribuem para a vida útil do banco, pois fazem com que o design do móvel seja atemporal e não se torne obsoleto. Este desenho também assegura o transporte do móvel de forma simplificada e sua montagem facilitada, com um sistema descomplicado e eficaz. Modularidade Já a modularidade é um aspecto essencial aplicado ao projeto, sendo responsável até mesmo pelo nome do móvel. Através deste conceito, o banco permite diversos arranjos, facultando sua adaptação a diferentes situações. 4.2. Processo de Projeto A criação do banco Modular nasceu da necessidade de um banco para favorecer uma dinâmica pedagógica denominada “roda de conversa” facilitando a interação e as atividades lúdicas entre professores e alunos que visitam o local (EEB). Tendo em vista essa necessidade, foi elaborado um mobiliário com assento em dois níveis de altura, com o objetivo de acomodar ergonomicamente tanto adultos
como crianças. Além disso, o banco é um móvel que pode ser disposto de diferentes maneiras e assim, gerar desenhos diversos, adequando-se a novas propostas e potencializando o espaço público. O desenvolvimento do projeto teve início com o estudo da demanda, a pesquisa de similares e a análise de formas de incorporar os conceitos de sustentabilidade no mobiliário. Em seguida, foram produzidos sketches manuais (Figura 01) e, assim que visualizadas, as melhores alternativas foram modeladas em softwares 3D (Figura 02), possibilitando uma análise mais detalhada e o reajuste do projeto.
Figura 01: Sketches manuais do protótipo.
Figura 02: Modelagem 3D do módulo e sua composição.
Após a definição da proposta final desenvolveu-se o desenho técnico do projeto e pranchas com alto nível de detalhes das peças do mobiliário, a fim de facilitar e otimizar o processo produtivo.
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4.3. Processo Produtivo Com um projeto técnico detalhado iniciouse o processo de produção em laboratório. A matéria-prima utilizada, madeira de eucalipto, é proveniente da Floresta Estadual de Pederneiras. A madeira teve seu processamento primário realizado no Horto Florestal de Manduri, onde ocorreu o desdobro e beneficiamento das toras. Após esta etapa, os pranchões de espessura de 45mm e largura variada foram armazenados e entabicados para secagem natural na EEB (Figura 03).
de Stain intercaladas com lixamento para que, assim, a produção do protótipo fosse concluída.
5. Conclusão
Figura 04: Processamento secundário.
Figura 03: Processamento primário e armazenamento para secagem natural.
banco (30x50mm) fossem realizadas de uma maneira diferente do proposto. Esse detalhe proporcionou maior gasto energético e, consequentemente, maior tempo de usinagem e elevada geração de resíduos.
Após tais etapas, as peças foram organizadas e separadas no LDMP, identificadas para que a montagem fosse realizada de forma mais rápida e prática. Na sequência, as peças foram lixadas em todas as suas faces para que uma parte da finalização do banco fosse facilitada, já que depois de montado, nem todas as faces ficariam acessíveis para um bom acabamento. Então, as peças foram furadas, escareadas e unidas por barras roscadas, dando forma ao banco (Figura 05).
O processamento secundário (Figura 04) ocorreu de forma conjunta entre o EEB e o LDMP. Neste momento iniciou-se o corte das peças do mobiliário. Foram realizados, primeiramente, os cortes em comprimento e a retirada das costaneiras. Posteriormente, os módulos passaram pela desengrossadeira e desempenadeira, a fim de se obter as dimensões desejadas. As peças foram cortadas, na serra circular, até chegarem às especificações corretas para o prosseguimento da produção.
Figura 06: Lixamento, acabamento e resultado final.
Durante o processamento secundário e a finalização do protótipo, vários dados referentes ao impacto da produção foram coletados. A figura 7 apresenta as quantidades de tempo gasto em cada equipamento durante o processo de produção do protótipo, a fim de visualizar quais máquinas foram usadas por mais tempo, consumindo mais energia.
Figura 07: Gráfico do tempo gasto por equipamento
Figura 05: Furação das peças e montagem do mobiliário.
Por fim, o banco foi novamente lixado e após ser limpo, recebeu uma demão de cupinicida para que ficasse protegido de pragas e insetos, aumentando assim sua vida útil (Figura 06). Após a secagem, o banco recebeu três demãos
Como visto a serra circular (EEB) foi o equipamento no qual ocorreu o maior consumo de tempo. Tal máquina é responsável pelos cortes preliminares dos pranchões. Como a madeira serrada disponível na EEB não possuía as dimensões previstas na concepção das peças do projeto, uma situação atípica se deu na produção do protótipo, fazendo com que a obtenção das peças constituintes do
Considerando a definição de diretrizes sustentáveis, as atividades projetivas e o processo produtivo do protótipo do banco Modular foi possível observar um resultado satisfatório. O projeto detalhado, com auxílio de modelos virtuais e a produção física do protótipo em escala real, aliado aos conceitos de sustentabilidade se mostraram eficazes na concepção e produção do móvel, possibilitando aos envolvidos no processo o contato com as aplicações práticas das teorias estudadas. O material escolhido se mostrou viável para produção do modelo. O design do móvel se apresentou adequado à demanda que se propunha a resolver. O acompanhamento de todas as etapas de produção viabilizou uma análise quantitativa e qualitativa do protótipo. É necessário observar, contudo, que as dimensões da matéria-prima acabaram por resultar num grande processamento o que gerou maior gasto energético e maior geração de resíduos. Com o intuito de tornar o projeto mais sustentável, propõe-se a avaliação prévia da matéria-prima disponível para a definição das medidas e especificações das peças do projeto, e ainda o emprego de um desenho com um número menor de peças, sendo essas de dimensões maiores, exigindo menos usinagem por móvel produzido. O projeto do banco Modular propiciou também uma reflexão sobre a metodologia de análise de resíduos, que poderia ser aprimorada com o intuito de ser mais precisa e apresentar dados mais consistentes sobre os produtos.
6. Referências ASSUNÇÃO, R. B. Eco-design e seleção de materiais para mobiliário urbano. Dissertação
50 (Mestrado). Ouro Preto: REDEMAT - UFOP/ CETEC/UEMG, 2000. CAMPINHOS, E. A. A importância da produção de madeira de Eucaliptus geneticamente melhorado para os setores moveleiro e de construção civil: perspectivas e desafios. In: Seminário Madeira de Eucalipto: tendência e usos, 2001, Curitiba. Anais... Piracicaba: IPEF/ IPT, 2001. EUCALIPTO - Oportunidades para um desenvolvimento sustentável. São Paulo: Conselho de Informações sobre Biotecnologia, mai. 2008. FERREIRA, A. R.; JOÃO, D. M.; GODOY, L.P. A Utilização da Matéria-prima Eucalipto na Indústria Moveleira como Estratégia para o Desenvolvimento Sustentável. In: IV Congresso Nacional de Excelência em Gestão, 2008, Niterói. Anais…Niterói: UFF, 2008. MANZINI, E.; VEZZOLI, C. O desenvolvimento de produtos sustentáveis: os requisitos ambientais dos produtos industriais. São Paulo: Edusp, 2011. MONTENEGRO, Glielson N. A produção do mobiliário urbano em espaços públicos: o desenho do mobiliário urbano nos projetos de reordenamento das orlas do Rio Grande do Norte. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Natal: UFRN, 2005.
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Função Estética e Simbólica na Criação de Joias Symbolic Function and Aesthetics in Jewelry Creation Takamitsu, Helen Tatiana
ht.e.ht@hotmail.com Menezes, Marizilda dos Santos; Universidade Estadual Paulista.
marizil@faac.unesp.br
Resumo A estética e o simbolismo representado por uma joia são fatores determinantes para a sua escolha. Este artigo tem como objetivo realizar uma análise e crítica sobre o uso destes fatores na criação de novos produtos, sendo o enfoque principal a criação e concepção de uma joia. Recentes pesquisas na área de design e moda enfatizam os símbolos, a emoção e o apelo visual dos produtos como um dos principais temas de projetos de design joalheiro. O trabalho a seguir pretende abordar essa área de pesquisa focando no apelo visual e emotivo como item primordial na concepção de um produto de moda. Palavras Chave : joias, design, estética e simbolismo.
Abstract Aesthetics and symbolism represented by a jewel are determinative factors for its choice. This article has the objective to realize an analysis of the use of these factors in new products creation, being the principal approach to creation the jewel. Recent inquiries of design and fashion areas emphasize symbols, emotion and appearance of products like one of principal design subjects. This paper intends to board this inquiry area focusing in visual and emotional appeal like primordial item in fashion products. Keywords : jewel; design; aesthetics and symbolism.
Introdução As escolas de Design no Brasil, por muito tempo tiveram como objeto de estudo principal o desenvolvimento de produtos focados para a funcionalidade. Os produtos eram excessivamente técnicos com pouca preocupação estética. O desenvolvimento tecnológico e a globalização fez surgir novos produtos com características resultantes destes fenômenos, o consumidor passou a ter novas exigências em especial ás de caráter estético. O mercado atual é um reflexo da evolução do pensamento estético e simbólico do consumidor e de sua consequente influência na indústria, onde este deseja um produto que possua qualidades de excelência técnica e de manutenção preditiva aplicada, aliados a
diferenciais estéticos inovadores, expressando desta forma suas individualidades. O objeto de estudo do presente artigo é a joia. Por sua própria natureza expressa simbolicamente valores, significados e ritos, dentro do repertório de costumes da vida urbana. As joias, que visualmente se expressam por meio de formas e cores não podem ser reduzidas a simples ornamentos. Sua valorização é resultado de seus componentes preciosos e do status relacionado a seu uso. A joia brasileira é um produto de destaque internacional, com design reconhecido por suas formas inovadoras, utilização de materiais e gemas diferenciadas. Isto é comprovado através dos vários concursos internacionais
52 onde designers brasileiros possuem lugar de destaque e do sucesso de marcas brasileiras no exterior. De acordo com o Instituto Brasileiro de Gemas e Metais (2013) o Brasil é o maior produtor mundial de gemas coloridas, possui reservas de ouro calculadas em 30 mil toneladas e é responsável por 1 a 2% da produção mundial de diamantes de qualidade. Apesar do crescimento do mercado de joias, dos cursos técnicos e de graduação, existe pouca bibliografia disponível sobre o processo de criação de uma joia. A maioria dos livros são focados em desenho de joalheria, feitio de joias artesanais e normas técnicas. O enfoque do processo de criação de uma joia possui um grande potencial de desenvolvimento. O objetivo deste estudo é analisar o uso da estética e do simbolismo na criação de joias e com isso definir uma proposta de processo de criação focado no aspecto visual do produto.
A estética e o simbolismo O design pode dar formas tangíveis e permanentes sobre as ideias, o perfil, os anseios e comportamento das pessoas. A forma é um dos muitos aspectos a ser levado em conta em um projeto e não é um fenômeno isolado. Tem relação direta com as outras variáveis do produto. O design não pode ser classificado como uma atividade ligada apenas à arte ou à tecnologia, mas, sim, uma atividade projetual multidisciplinar que conjuga e harmoniza conhecimentos dessas duas áreas, entre muitas outras. Segundo Munari (1993) a arte e a estética são fundamentais no ofício de projetar, devendo estar presentes nos objetos e produtos de design. É função do designer projetar produtos funcionalmente adequados, aplicando os conhecimentos técnicos e da ergonomia, mas com qualidades estéticas e simbólicas a fim de conquistar o consumidor. Esta função só será cumprida de forma eficiente se o profissional souber fazer uso simultâneo dos fatores racionais e emocionais em seus projetos. Os fatores emocionais são os primeiros a serem
53 percebidos. Decidimos se gostamos ou não de um produto, apenas com uma exploração visual, olfativa ou auditiva, já os racionais são mais demorados, pois dependem do uso ( LÖBACH, 2001). O estudo das emoções tem interessado cada vez mais aos designers, devido a sua grande importância na tomada de decisões, já que em muitos casos, é o fator primordial na escolha dos produtos; os aspectos racionais acabam ficando em segundo plano. Para Baxter (2000) o consumidor confia no produto quando o mesmo consegue refletir a sua autoimagem e constrói a sua imagem perante os outros. Os designers fazem isso incorporando algum tipo de valor estético e simbólico nos produtos. A estética é a primeira característica observada pelo consumidor num produto em exposição, segundo Carpes Junior (2004), contribuindo decisivamente para a venda. Na maioria das vezes a função estética determina o ato da compra, ao invés das funções práticas de um produto industrial, funções estas percebidas apenas a médio e longo prazo ou durante a utilização do produto (LÖBACH, 2001). A Estética pode ser definida como a ciência das aparências captado pelos sentidos, de sua percepção pelos homens e sua importância para eles como parte de um sistema sociocultural (LÖBACH, 2001). Na verdade é a faceta de um processo, onde são estudados os aspectos estéticos do produto percebidos pelo usuário tendo como objetivo principal reconhecer e descrever os pontos perceptíveis dos objetos. Para se desenvolver produtos com excelência estética é necessário o conhecimento dos mecanismos de percepção visual, aliados à compreensão destes em conformidade com as normas socioculturais e principalmente os conceitos de valor aplicados por determinada sociedade (CARPES JUNIOR, 2004). O valor estético é resultado da função estética, tendo como definição a medida do prazer estético percebido pela aparência visual do objeto ao usuário. Este não é fixo, e depende das aparências sociais, está sujeito a mudanças
e é único para cada estrato social e individuo (LÖBACH, 2001). Simbolismo do produto é a imagem transmitida pela aparência do produto, são os valores humanos associados aos produtos (BAXTER 2000). “A linguagem é um signo mediador por excelência, pois ela carrega em si os conceitos generalizados e elaborados pela cultura humana” (REGO, 2007). Os pensamentos e atos são estruturados pelas representações simbólicas do ser humano enquanto tal tem do universo, e estas representações são manifestas nas ideias, nas comunicações e nas ações (DOMINICIANO, 2008). Löbach (2001) comenta que o designer precisa receber ou diagnosticar as indicações precisas sobre o efeito e a importância do símbolo pretendido. A dificuldade está em encontrar um conjunto adequado de meios estéticos para produzir o efeito simbólico pretendido. A configuração visual de sua aparência é a primeira hipótese para isto. A tarefa principal do designer industrial na criação de produtos industriais com alto grau de função simbólica continua recaindo sobre a aparência formal dos produtos, principalmente com o uso dos meios estéticos. O artefato é resultado das concepções e valores resultantes da leitura do designer sobre a cultura e a sociedade a que pertence. O planejamento e a concepção dos produtos envolvem a configuração de comportamentos e a atribuição de significados aos objetos de uso cotidiano. O ornamento serve como elemento narrativo da própria História da humanidade, o ser humano atribuiu-lhe valor simbólico, principalmente mágico e com isso deu significado ao seu adorno. Posteriormente ao valor simbólico deu valor estético e por fim o valor material (BRAGA, 2008). Para os empresários, a utilização dos significados simbólicos é fundamental para o sucesso comercial. O produto, para ter êxito, deve incorporar as ideias para torná-lo comercializável, e a tarefa específica do design é provocar a conjunção entre essas ideias e os
meios disponíveis de produção. (FORTY, 2007) O usuário considera o produto esteticamente agradável a partir do momento que percebe certos aspectos. Estes seriam de acordo com a Teoria do Gestalt: simetria, proximidade, similaridade e continuidade. Esta teoria foi criada por psicólogos alemães no início do século XX, consiste que a visão humana tem uma predisposição para reconhecer determinados padrões, ao olharmos um objeto pela primeira vez o nosso cérebro programa para extrair certos padrões visuais e arrumálos em uma imagem com significado (BAXTER, 2000). A simetria torna o foco observado mais agradável e gera o equilíbrio entre os componentes do objeto apreciado. Gerase a proporção no todo e, normalmente, é complementado por uma padronagem capaz de ornar o objeto com elementos, formas e cores. Essas premissas observadas nos dão a sensação de harmonia, ou seja, o conjunto de todos os componentes citados capazes de atrair a atenção e a consequente sensibilização do observador BRAGA (2008). Baxter (2000) cita em seu livro uma pesquisa realizada pelo psicólogo Daniel Berlyne sobre os objetos considerados atrativos onde foi criada uma curva de preferência para a complexidade visual (Figura 1) . Os produtos considerados muito simples ou muito complexos apresentaram baixo grau de preferência, em relação aos intermediários. Enquanto que um nível intermediário apresenta alto grau de preferência, esses produtos estão classificados em um nível denominado “ótimo de complexidade”, ou seja, possuem um alto grau de atratividade, esta resulta de uma combinação adequada de elementos simples e complexos com significado simbólico.
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Figura1 — Modelo de Berlyne Fonte: Baxter (2000, p. 35)
A leitura estética e simbólica de um produto pode ser comparada a uma leitura de obra de arte, a imagem possui dois aspectos diferentes - a qualidade semântica (denotativa, descritiva) e a qualidade estética (conotativa, valores que se descobrem, quer no plano de conhecimento, quer no plano da sensibilidade). Esta última depende dos ritmos, formas, espaços, cor e luz (DOMICIANO, 2008) . Bamonte (2005) cita o fato de a função estética muitas vezes sobrepor à funcionalidade do produto e com isso deixa de ser produto de consumo para se tornar objeto de arte onde o simbolismo anula a função. Dominiciano (2008) comenta que Villafañe na busca de definir uma “teoria da imagem”, fala da importância de se entender o papel da percepção, pois ela é o processo responsável pela seleção da realidade. A percepção é a faculdade mais primária do ser humano. Através da percepção toma-se consciência de si mesmo e do mundo ao redor. Usa-se para isso as capacidades sensoriais. A princípio, interessa-nos a percepção visual, esta é um fenômeno físico, onde informações luminosas são recebidas e decodificadas num processo que envolve inúmeros partes do olho, sistema nervoso e cérebro. Nesta decodificação discernimos o grau de luminosidade, as cores, bordas, e outros fenômenos mais complexos, como profundidade, movimento e perspectiva (DOMICIANO, 2008).
55 A Joia e seu processo de criação. Braga (2008) comenta que a palavra joia possui origem latina – jocalia – seu significado: “ coisas festivas, alegres e supérfluas”. A joia é uma ornamentação com o intuito de celebrar, comemorar, enfeitar, sensibilizar, reluzir, valorizar e, também, de proteger. Em uma definição mais tradicional as joias são objetos feitos de metais nobres, pedras preciosas ou de pérolas, cujo trabalho prevalece á característica artesanal. No decorrer do tempo a joia teve várias funções, além da de símbolo de posição social; a de função mágica do amuleto, fazendo uma ponte entre o homem e a natureza. Seja qual for sua função, elas têm representado a necessidade da representação de si mesmo e da própria vida. A joia teve sua função inicial de status e de seu valor intrínseco modificado, seu conceito tornou-se mais amplo, seu uso foi ampliado e difundido mais democraticamente. Este conceito amplia principalmente os materiais possíveis para sua fabricação, e seu diálogo com as peças do vestuário. Seus materiais preciosos se misturam a materiais naturais, resinas, plásticos e vidros. Ao se analisar as joias, na ausência de qualquer informação imediata sobre o contexto histórico e técnico, o espectador sente o impacto da aura destes objetos, sua emanação incomparável. Nesta aura, a presença real e as imagens mágicas às quais ela remete, são ressaltadas com a mística das peças e finalmente com a análise do passado do objeto. São investidas de uma carga semântica estabelecendo uma ponte à imaginação e um convite para o observador às projeções associativas, na busca de expressões de desejos e construção de uma autoimagem. O objeto está investido de muitos significados, como, por exemplo, status. O valor material é o resultado da somatória do valor estético e simbólico, pois o objeto estimado torna-se precioso. O designer de moda usa intensivamente os fatores emocionais na formulação de novas configurações para os produtos e ao mesmo tempo em que cria o produto, planeja sua
materialização, para o mesmo ser especificado dentro de uma realidade produtiva (BRAGA, 2008). Todo o material empregado tem seu valor simbólico na construção de uma peça, independente da preciosidade dele. Preuss (2003) cita que a joalheria evoluiu muito nos últimos anos e hoje utiliza das novas tecnologias para ter sua importância no mercado. No Brasil é um mercado em crescimento e tem representado o design brasileiro no cenário internacional. Ela tem seu desenvolvimento junto com a evolução da tecnologia e junto com as mudanças na arte, moda, sociedade e culturas. A descoberta das gemas brasileiras e suas especificidades representaram um rompimento com a joia tradicional, e uma nova dimensão de fantasia como se observa hoje, nas novas coleções de joalherias brasileiras como a Vancox (Figura 2).
escritório de criação esculturas de papel, arame e massa de modelar, feitas a mão (Figura 4), pois ele as utiliza no processo de criação das novas peças, a fim de transformar palavras, matemática e temas inspirados nas artes, na natureza e no comportamento humano, em joias. As descontraídas esculturas substituem os metais e, assim, surgem como diálogo entre ideia e matéria. São, portanto, simbolicamente o retrato do domínio técnico e da liberdade criativa do designer.
Figura 4 – Designer Antônio Bernardo manuseando sua escultura. Fonte: www.puretrend.com.br
Figura 2 – Anel e Brinco Vancox Fonte: www.vancox.com.br
O poder criativo pode estar relacionado com um novo tipo de liga e de usinagem para o metal, no qual podem existir diversas variantes. Outras vezes, esse poder criativo pode estar vinculado a pedras preciosas, onde o tipo de lapidação e/ou cravação pode dar um novo aspecto, uma nova vida para a joia (REBELLO, 2007). De acordo com Grunow (2007), o designer de joias Antônio Bernardo, possui em seu
A fase inicial de criação é a inspiração e a escolha de um tema para guiar as fases seguintes, como por exemplo, a forma das peças a serem produzidas. Geralmente cada coleção é baseada num tema e a partir deste são criados minicoleções. Na fase de observação, coleta de imagens e informações algumas características podem vir a originar a base de uma joia, sendo criado um esboço da peça a mão livre ou por um software específico. Toda a informação levantada para a criação do produto pode vir a expor o designer a um grande número de ideias projetuais (REBELLO, 2007).
56 Vários esboços e rascunhos são feitos, os melhores são aproveitados para serem prototipados, mas nada é descartado, pois os esboços não aproveitados podem conter traços e ideias para servirem de base a outros componentes. Rebello (2007) comenta que a competitividade do mercado de joias criou uma demanda por peças com estilo e personalidade e com isso abriu as portas para a criatividade e o uso de novos materiais e técnicas na confecção das mesmas. Ao projetar e desenhar, o designer deve criar desenhos o mais próximo possível da realidade com detalhes bem representados, uma perspectiva e vista mostrando os detalhes, dimensões, acabamentos e colocações de pedras. Este cuidado com os detalhes do desenho é fundamental, pois o ourives irá executar a peça de acordo com a representação gráfica da peça criada. No mercado de pequena produção de joias ou de peças exclusivas, a criação e os desenhos são processos essencialmente manuais e artísticos. O fato de serem peças elaboradas e únicas criam um valor agregado ao produto. A joalheria ainda utiliza muito os processos manuais na sua fabricação, mas existem novas tecnologias para auxiliar se não em todo o processo, mas pelo menos em uma parte para alcançar uma maior precisão no projeto e na fabricação da peça piloto (WINKLER, 2013).
Modelo proposto A joia é um produto cujo maior apelo de venda é sua estética e simbolismo transmitido ao consumidor. Por ser um produto cuja principal função é de adorno do usuário, ela apresenta as mais diversas formas, variações de modelos e inúmeros e diferentes materiais como componentes. Está ligada diretamente com as tendências de comportamento e de estilo vigentes no mercado. Esta influência pode não ser tão aparente como no vestuário, mas não deixa de existir, pois na primeira etapa de levantamento de informações, imagens, enfim de material de inspiração e
57 de apoio para a criação, as macrotendências de comportamento e as tendências de moda vigentes na época irão exercer grande influência de decisão do design final do produto. Este estudo propõe um processo de criação do produto joia focado no aspecto visual, com ênfase na função estética e simbólica (Figura 5). Vale lembrar que a proposta não é de desenvolver um processo de desenvolvimento da joia, pois o desenvolvimento será de acordo com a tecnologia e as ferramentas disponíveis. A primeira etapa no processo de criação é a análise do público alvo do produto e de seu mercado de atuação. A segmentação neste caso deve ser feita de acordo com o estilo de vida, estilo de comportamento e aspirações do consumidor. Deve ser definido o valor estético do produto de acordo com o período de tempo da sua comercialização, ou seja, da estação. Esta etapa deve ser desenvolvida tendo como ferramenta de apoio uma pesquisa de mercado. O valor estético depende das aparências sociais, está sujeito a constantes mudanças e é específico de cada estrato social. É a medida do prazer estético proporcionado pela aparência visual do produto industrial no usuário, não é um número absoluto, ou uma regra definida e imutável, na verdade este pode ser definido como várias características visuais consideradas esteticamente agradáveis para certo público alvo, características estas dotadas além do valor estético, mas também de valor simbólico. A principal função da estética e do simbolismo no projeto é a de criar um elo de ligação e de empatia com seu usuário para definir a escolha de compra do produto. No valor estético de uma joia está inserido o tipo de metal a ser utilizado, o uso ou não das gemas, o tipo de gemas, as cores, a forma e o estilo do produto. Após a definição do valor estético percebido pelo público alvo da empresa, o design do produto, ou seja, sua configuração será desenvolvida de acordo com o valor estético definido com a influência das tendências de moda previstas e de acordo com a tecnologia de produção disponível na empresa.
Este simples processo de criação é baseado no processo de comunicação estética desenvolvido por Löbach (2001). A criação da joia se assimila ao desenvolvimento de uma coleção de vestuário onde o aspecto visual e a empatia gerada pelo produto irá determinar sua compra. A pesquisa de mercado e do comportamento do consumidor exerce influência direta no projeto como um todo.
de design de joias. O estudo apresentado foi efetuado através de levantamento bibliográfico. O resultado foi a proposta um modelo de criação de joias enfatizando o aspecto visual do produto de acordo com os valores estéticos e simbólicos percebidos pelo consumidor. Este simples modelo deve ser aperfeiçoado e testado. O design de joias apresenta uma grande demanda de estudos na área para aprimorar e promover o crescimento sustentado do mercado. Para isto ocorrer além de incentivos governamentais na área, a rica indústria joalheira deve investir no desenvolvimento do design brasileiro como diferencial competitivo e amadurecimento do mercado de joias no Brasil.
Referências
Figura 5 : Esquema do modelo de criação proposto
Conclusão A estética é o primeiro item observado pelo usuário e contribui para a decisão de compra, mas não é mais importante do que a funcionalidade. A estética (forma) e função estão em pé de igualdade, um bom projeto de produto deve ter uma relação harmoniosa de ambas. A estética garante a atratividade do produto e a funcionalidade à consistência dele. A joia é um produto do mercado de moda, onde a estética e o simbolismo da peça são fatores decisivos para a venda do produto. O design brasileiro no mercado de joias é amplamente reconhecido no mercado internacional, seja pelo sucesso de joalherias brasileiras ou dos concursos onde muitos brasileiros apresentam lugar de destaque. Apesar deste crescimento do mercado e da demanda de profissionais no setor, existem poucas obras literárias abordando o ensino
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O Design Aplicado ao Desenvolvimento de Componentes Construtivos Sustentáveis The Design Applied to Development of Sustainable Building Components João Victor Gomes dos Santos Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
joaovoti@gmail.com Tomás Queiroz Ferreira Barata Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
barata@faac.unesp.br Marco Antônio Pereira Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
pereira@feb.unesp.br
Resumo Este artigo aborda o desenvolvimento de protótipos de componentes construtivos pré-fabricados e conexões estruturais com o emprego de madeira de eucalipto e bambu da espécie Guadua angustifolia. A pesquisa apresenta o processo de concepção e desenvolvimento do design dos protótipos, abordando desde a etapa inicial de geração de ideias na forma de esboços ao desenvolvimento das alternativas com emprego de software de modelagem virtual paramétrica. Visando comprovar a viabilidade construtiva desses componentes como uma alternativa sustentável para substituição integral ou parcial dos materiais convencionais na construção civil, foram produzidos três protótipos cujo processo de produção também está apresentado neste artigo.
Palavras Chave: design de produto; componentes construtivos; sustentabilidade.
Abstract This article discusses the development of prototypes of prefabricated building components and structural connections with the use of eucalyptus wood and bamboo of Guadua angustifolia species. The research presents the conception process of design and development of prototypes, approaching from the initial stage of idea generation in the form of sketches to the development of alternatives with the use of parametric modeling software. Aiming to prove the viability of these constructive components as a sustainable alternative to full or partial replacement of conventional materials in construction, three prototypes were produced whose production process is also presented in this article. Keywords: product design; building components; sustainability.
Introdução Atualmente o desenvolvimento sustentável é uma realidade econômica na indústria da construção civil, com mercados em forte crescimento e uma tendência no aumento da demanda por materiais e produtos ecologicamente adequados aos novos paradigmas do design, da arquitetura e da engenharia civil. As grandes empresas tomaram consciência de que a aplicação das exigências da sustentabilidade permitiu realizar uma produção mais eficiente, visando o reforço de sua imagem de marca e uma diferenciação de mercado (GAUZIN-MULLER, 2002). Nas últimas décadas, os projetos arquitetônicos e de bens de consumo em geral, passaram a adotar critérios de sustentabilidade cada vez mais rigorosos considerando todo o ciclo de vida do produto. Esta postura visa à melhoria na qualidade de vida das populações e o uso racional da energia e dos recursos naturais disponíveis (MANZINI, E.; VEZZOLI, 2005). A construção e o uso de edificação são as principais causas da demanda de energia e de materiais que produzem gases de efeito estufa. Para reduzir e então reverter com sucesso o aquecimento global e o esgotamento dos recursos naturais no planeta, a construção civil vem enfrentando novos desafios, tanto no que se refere ao emprego de materiais renováveis de base florestal, como no tocante à forma de pré-fabricação de componentes estruturais que utilizem técnicas menos impactantes para o meio ambiente (KEELER, 2010).
Além de possuir inúmeras vantagens como excelente relação resistência/densidade e bom desempenho como isolamento térmico, a madeira de reflorestamento apresenta-se como um substituto viável a outros materiais de maior impacto ambiental contribuindo para a preservação e a sustentabilidade das florestas nativas (HANSES, 2008). Além das propriedades específicas da madeira, o adequado gerenciamento da cadeia produtiva é imprescindível para sua correta aplicação e bom desempenho do material, dos componentes pré-fabricados e do sistema construtivo como um todo. Desta maneira, é de extrema importância o controle de qualidade, considerando a elaboração do projeto do produto, processamento primário e secundário da madeira, etapa de secagem, tratamento preventivo, pré-fabricação, transporte e montagem do sistema construtivo em canteiro de obra. O uso do bambu in natura como material de construção também pode ser considerado como uma alternativa viável ao uso abusivo do aço e do concreto, seu emprego também pode favorecer a redução da pressão sobre o uso de madeira proveniente de florestas nativas e plantadas. O bambu apresenta uma admirável vitalidade, uma grande versatilidade, leveza, resistência e facilidade de ser trabalhado com ferramentas manuais simples, qualidades que tem lhe proporcionado o mais longo e variado papel na evolução da cultura humana, quando comparado com qualquer outro tipo de planta (PEREIRA, BERALDO 2008).
60 Segundo CARDOSO JR (2000), HIDALGO (2003) e OBERMANN & LAUDE (2008) atualmente estão sendo desenvolvidas novas técnicas de conexões estruturais e ensaios com componentes de bambu, em busca de soluções que, de maneira eficiente, aproveite toda a capacidade de resistência mecânica do bambu da qual se pode destacar a resistência à tração, à compressão e ao cisalhamento. Estas propriedades alcançam melhores condições de resistência quando utilizados colmos maduros e secos e quando são aplicadas paralelamente às fibras. Segundo OLIVEIRA (2013), as características de resistência à tração mecânica do bambu podem ser comparadas à de compostos e compósitos sintéticos de alta tecnologia, em razão das suas características genotípicas de formação e seu arranjo intramolecular.
Revisão Bibliográfica O conteúdo da revisão bibliográfica aborda os conceitos, técnicas e ferramentas aplicadas ao projeto e à produção dos componentes construtivos. Há também um levantamento de sistemas construtivos similares que empregam estes materiais como elementos estruturais e uma análise do design de suas conexões. Design e produção sustentável Nas últimas décadas, os projetos de desenvolvimento passaram a adotar critérios ecológicos cada vez mais rigorosos em seu desenvolvimento, abrangendo os projetos gráficos, territoriais, arquitetônicos e de bens de consumo, em busca da melhoria na qualidade de vida das populações e na disponibilidade futura de matérias-primas e energia. Estas atividades projetuais que adotam conceitos ecológicos em seus desenvolvimentos são representadas pelo termo ecodesign que, segundo Fiksel (1996 apud WOLFF, 2004 p. 21), pode ser considerado como uma estratégia de projeto, cujo desempenho respeita o meio ambiente, a saúde e segurança, ao longo de todo o ciclo de vida de um produto ou processo, tornando-os ecoeficientes.
61 Com a constante avaliação em relação às implicações ambientais que o projeto possa acarretar, seja de um produto ou serviço, o design para sustentabilidade visa o desenvolvimento de seus projetos de maneira completa, ou seja, de todo o seu ciclo de vida, que pode ser determinado pela sua pré-produção, produção, distribuição, uso e descarte. Esta metodologia é definida pelo Life Cycle design que tem a constante busca de minimizar os efeitos negativos da produção. A extração dos recursos necessários para produção dos materiais (“nascimento”) também é considerada neste método, bem como o tratamento final dos materiais após o uso (“morte”), marcando o início e o fim da vida de um produto cujo processo de produção é constituído por uma série de atividades e processos que absorvem matéria e energia, transformando-se, gerando resíduos e emitindo substâncias diversas. Em um sistema de produção ecologicamente correto, essas emissões são controladas e os resíduos reintegrados à linha de produção, fechando o ciclo. A metodologia fundamentada do Life Cycle design aliada à estratégia de inovação do design para a sustentabilidade, constituem uma ferramenta completa para o desenvolvimento de produtos e serviços sustentáveis, possibilitando o desenvolvimento inovador com baseamento técnico. O PNUMA – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – propôs oito níveis de implantação do ecodesign durante o projeto de novos produtos, abrangendo desde o desenvolvimento de conceitos e estratégias para o desenvolvimento de novos produtos até o planejamento do destino final desses produtos. Durante todas as etapas, prioriza-se o uso de materiais e técnicas de baixo impacto ambiental, buscando o desenvolvimento de novos produtos de maneira eficiente e sustentável.
Prototipagem virtual no design de componentes construtivos No desenvolvimento de novos produtos, a construção de modelos tridimensionais é uma etapa essencial quando se é necessário avaliar características diversas do projeto. Essa construção pode-se dar de duas maneiras principais: construção de modelos não funcionais (modelo, mock-up ou maquete) e de modelos funcionais (protótipo). Este último, pode ser classificado como físico, ou seja, elementos tangíveis que permitem a avaliação de aspectos do produto como ergonomia e estabilidade (GRIMM, 2005), ou virtual, que representam o produto de maneira intangível (ULRICH; EPPINGER, 2000) e possibilitam a simulação de experimentos funcionais, análise estética e testes físicos do produto. O recurso da prototipagem virtual pode ser aplicado quando a prototipagem física é inviável (GRIMM, 2005), pois permite modificações e ajustes em menos tempo e, praticamente, sem custos. Contudo, a prototipagem virtual não substitui a prototipagem física, os dois recursos se complementam (ULRICH; EPPINGER, 2000), constituindo um sistema de projeto efetivo na avaliação de projeto e na identificação de possíveis falhas não previstas antes de sua produção definitiva, otimizando o processo de fabricação, e reduzindo custos e tempo de produção. Grande parte desses problemas encontrados no processo de produção de um determinado objeto decorre de falhas no seu projeto inicial. Parte destas falhas são causadas pela limitação da representação 2D do projeto, ocasionando a omissão de detalhes, que poderiam ser observados em um modelo 3D, ou mesmo a incompreensão do produto por outros indivíduos envolvidos no projeto. Dessa maneira, um protótipo virtual confere ao projetista a possibilidade de apresentar sua proposta de maneira clara e completa. A prototipagem virtual pode ser vista como um sistema constituído pela integração de softwares CAD (Computer Aided Design), CAE (Computer Aided Engineering) e CAM (Computer
Aided Manufacturing), com a intenção de produzir um objeto virtual de maneira mais fiel possível ao objeto que será produzido. Além dos recursos CAD, CAE e CAM incorporados ao projeto, Naveiro e Borges (2008) afirmam que existem ainda aqueles voltados à simulação visual virtual e à realidade virtual. O objetivo da simulação visual virtual é a visualização fotográfica virtual do produto antes de sua materialização enquanto que, na realidade virtual, o intuito é antecipar as interações do usuário com o produto final. Outros recursos também podem ser incorporados à PV a fim de otimizar a interação do usuário com o protótipo virtual, promovendo uma maior colaboração entre designers, engenheiros, comerciantes e clientes (MCLEOD, 2001). A madeira aplicada na fabricação de componentes construtivos sustentáveis Segundo Pfeil (2008), a madeira é possivelmente o material de construção mais antigo dado a sua disponibilidade na natureza e relativa facilidade de processamento. Contudo, as teorias e técnicas construtivas só foram estabelecidas na primeira metade do século XX. Atualmente, o emprego legal da madeira como material de construção é baseado em técnicas modernas de industrialização e reflorestamento, bem como padrões internacionais e procedimentos que conciliam a extração da madeira e a conservação de seus recursos naturais, gerando produtos de elevada qualidade e ecologicamente aceitos. O incentivo ao desenvolvimento de políticas no setor florestal é uma das alternativas que o Brasil tem buscado para a abertura de novas possibilidades no mercado interno e externo (Calil et al. 2003). Aliado a atitudes como esta, o emprego de métodos racionais de exploração nas atividades florestais podem conciliar a expansão econômica com a conservação da qualidade de vida (OLIVEIRA 1997). Comparada a outros materiais de construção e por tratar-se de uma matéria-prima de fonte renovável, a madeira constitui um excelente substituto a outros materiais de maior impacto ambiental contribuindo para a preservação e a
62 sustentabilidade das florestas nativas, além de possuir inúmeras vantagens como excelente relação resistência/densidade e excelente isolamento térmico. Contudo, algumas observações referentes às suas propriedades físicas e métodos de tratamento devem ser consideradas antes de sua aplicação. Dentre todas as propriedades, a mais precisa e significativa para qualificação e caracterização da madeira na construção civil é a densidade de massa, uma vez que se correlaciona com diversas outras características (HELLMEISTER, 1983). Outras propriedades importantes a serem analisadas são a umidade e a estabilidade dimensional (retração ou inchamento). Além das propriedades citadas, para a correta aplicação da madeira e de qualquer outro material como material de construção, é essencial o conhecimento de todas as outras propriedades referentes ao material, como a resistência e elasticidade, que podem ser obtidas pelos ensaios de flexão, compressão, tração e cisalhamento e de outros testes que devem ser executados seguindo os padrões e normas oficiais. O tratamento preventivo da madeira à deterioração e ação de fungos e insetos também deve receber atenção especial, caso contrário, seu desempenho e tempo de vida útil poderão ser comprometidos, especialmente em situações em que a madeira tem contato direto com o solo ou água. Após o seu tratamento, a madeira deve passar pelo processo de secagem para reduzir a deformação dimensional, inibir os ataques de fungos, melhorar a trabalhabilidade e aumentar a resistência física da madeira. O tempo de secagem se baseia no tipo da madeira, na umidade da madeira e na espessura do material. O emprego do bambu como material de construção sustentável Segundo Vasconcellos (2006) o bambu sempre foi utilizado por indígenas nas construções de suas habitações. Suas excelentes características físicas, mecânicas, rápido crescimento e outras numerosas qualidades, garantiram sua permanência em diversas culturas até
63 os dias atuais. Hoje o bambu é visto como matéria prima de forte potencial sustentável na construção civil, arquitetura, design de produtos e outras muitas áreas nas quais o bambu é empregado. Outro aspecto que torna o bambu uma excelente alternativa aos materiais convencionais, é a pouca energia necessária para seu processamento. Segundo Ghavami et al. (2003), essa energia pode chegar a 50 vezes menor se comparada à energia consumida para o processamento do mesmo volume de aço e oito vezes menor para produzir o mesmo volume de concreto. Não somente consome pouca energia, mas também contribui para a retirada de toneladas de dióxido de carbono da atmosfera, uma vez que são colhidos apenas quando maduros, enquanto que o restante da moita continua em fase de desenvolvimento onde ocorre o maior consumo do gás (Pereira e Beraldo, 2007). O Brasil possui a maior diversidade e maior índice de florestas endêmicas de toda América Latina, contando com 137 espécies, o que representa 32% das espécies da América Latina, e 17 gêneros ou 85%, sendo que os estados de São Paulo, Minas Gerais, Santa Catarina, Bahia e Paraná, possuem a maior diversidade de florestas de Bambu (LONDONO, 2000). Somando esses dados às qualidades do bambu, pode-se obter uma excelente matéria prima natural com alto potencial econômico e ecológico. A versatilidade do bambu permite que ele seja aplicado em diversas situações, seja utilizando seus colmos inteiros em sua forma natural (cilíndrica), processado na forma de ripas de bambu, tiras, cordas, pisos, paredes, portas, janelas, forros e coberturas ou ainda em conjunto com outros materiais como argamassas, fundações e estruturas, substituindo a madeira proveniente de florestas nativas, o aço e outros materiais convencionais da construção civil, que, por sua vez, é um dos setores que mais consomem recursos naturais atualmente. Entretanto, a utilização do bambu na construção civil no Brasil pode ainda ser considerada praticamente irrisória (TEIXEIRA,
2006). Apesar das iniciativas de incentivo ao cultivo do bambu como prevê a Lei nº 12.484 (de 8 de Setembro de 2011) e de diversas pesquisas relacionadas à área, seu uso ainda é restrito, visto que, no Brasil, ainda não é um material normatizado. Os ensaios ainda são efetuados com aplicação das metodologias e normas referentes às de madeira maciça, o que dificulta a comparação dos resultados e a sua aplicação. Segundo Cardoso Jr (2000), Hidalgo López (2003) e Obermann e Laude (2008) atualmente estão sendo desenvolvidas novas técnicas de conexões estruturais e ensaios com bambu, contudo, ainda não houve uma que fosse aplicada de maneira eficiente que aproveite toda a capacidade de resistência mecânica do bambu para ser estabelecida como padrão de referência. O bambu é um material ortotrópico, oco, variável no tamanho e espessura e possui diminuição gradual do diâmetro do colmo no sentido da base para o topo, seus colmos não são 100% retilíneos e a distância entre os nós é variável (GHAVAMI; MARINHO, 2005; Judziewicz et al., 1999). Sua forma geométrica tubular com seção circular lhe confere resistência estrutural no sentido vertical enquanto que os nós sequenciais contribuem para a resistência à flambagem. Por outro lado, essas características conferem ao bambu uma relativa dificuldade quando aplicado como material de construção, portanto, para o desenvolvimento pleno de conexões de bambu, essas características específicas devem ser previamente estudadas com o objetivo de empregar o bambu de maneira correta de acordo com suas propriedades físicas e, consequentemente, diminuir o custo de produção, facilitar o transporte e sua trabalhabilidade (GHAVAMI, 1989).
Materiais e Métodos A estrutura metodológica adotada neste estudo se baseia no processo abordado por Lawson (2011), e está apresentada na figura 1 pelas etapas: 1) Revisão bibliográfica e análise de projetos similares; 2) Levantamento da
madeira de reflorestamento e bambu na região central do Estado de São Paulo; 3) Etapa de concepção e desenvolvimento de projetos; 4) Processo de produção de protótipos físicos; 5) Análise dos dados coletados; 6) Elaboração de diretrizes de reformulação de projetos e; 7) Elaboração de relatórios conclusivos.
Figura 1 - Fluxograma com as etapas metodológicas da pesquisa.
Os materiais utilizados para confecção dos protótipos foram: bambu in natura (Guadua angustifolia) com 10,5 centímetros de diâmetro em média, madeira roliça (Eucalyptus citriodora) de aproximadamente 8,0 centímetros de diâmetro, ferro chato de 2” x 1/4”, tubo de aço de 1.1/2” x 3/20“, vergalhão de 5/8”, chapa de aço de 3/5” e ferragens (barra roscada, porcas, arruelas e parafusos). O bambu e a madeira foram cedidos pelo Projeto Bambu da Unesp, campus de Bauru, enquanto que os outros materiais de construção foram adquiridos no mercado local. Quanto aos os procedimentos metodológicos da pesquisa estão divididos em atividades de campo e em atividades laboratoriais, ambas descritas a seguir: a) Processo de desenvolvimento de projeto com uso de software de modelagem virtual paramétrica; b) Extração e processamento do bambu; c) Processamento da madeira roliça; d) Processamento das conexões metálicas; e) Montagem dos protótipos físicos no Laboratório Didático de Materiais e Protótipos – LDMP (FAAC -UNESP) e no Laboratório de Processamento de Madeira e Bambu (FEBUNESP) e; f ) Aplicação de questionários com empresas do setor madeireiro e de bambu na
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região central do Estado de São Paulo.
Resultados e Discussões Os resultados a serem apresentados são: análise de projetos e produtos similares; levantamento de plantios e produtos de bambu e madeira serrada na região central do Estado de São Paulo; processo de desenvolvimento do design com auxílio de modelagem virtual paramétrica e etapas de produção dos protótipos físicos com emprego de bambu in natura e madeira roliça.
Análise de Similares Nesta etapa foi executado um levantamento e análise de dez projetos que adotam o bambu como principal componente estrutural. Observa-se que os projetos analisados possuem limitações em alguns aspectos e vantagens em outros. Esta análise contribuiu para o estabelecimento de diretrizes para o desenvolvimento dos projetos das conexões e dos componentes, procurou selecionar os aspectos positivos dos projetos e descartar os aspectos negativos adotando-se os seguintes critérios: facilidade de produção e manutenção de peças e componentes, elevado grau de construtibilidade em canteiro de obra e emprego de equipamentos manuais. Para este artigo, foi selecionado o principal projeto dos dez analisados.
Figura 2 – Chinauta House, Fusugasugá, Colombia 2006 (Fonte: Zuarq Arquitectos).
A figura 2 apresenta uma construção executada na Colômbia na qual foi utilizado bambu da espécie Guadua angustifolia. O uso do bambu mais interessante a ser destacada nesta análise é sua aplicação como pilar composto. Observa-se que o componente construtivo foi projetado levando em conta as propriedades físicas do bambu, de maneira que a transferência das forças aplicadas é uniforme e estável. Além disso, a utilização de três colmos permite uma conexão mais eficiente aliando estabilidade, estética e eficácia ao conectar dois elementos da cobertura em apenas um pilar. Contudo, observa-se que não somente a coluna, mas diversos outros componentes estão incorporados ao concreto o que constitui um aspecto negativo, pois não permite a troca dos colmos em casos de deterioração dos mesmos e também por facilitar o acúmulo de umidade nos pontos de intersecção. Levantamento de plantios e produtos de bambu e madeira serrada Com o intuito de verificar a atual situação do mercado regional de madeira e bambu, foi elaborado um questionário pela plataforma do Google Forms. O questionário foi divulgado em grupos de empresas e produtores que atuam na área e também via e-mail para algumas empresas do setor. No total, foram formuladas dez perguntas para cada setor, contudo, para este artigo, foram selecionadas apenas as questões mais relevantes cujos resultados estão apresentados abaixo na forma de tabelas:
Tabela 1 – Com qual (ais) espécie (s) de madeira sua empresa trabalha?
Tabela 2 – Com qual (ais) espécie(s) de bambu sua empresa trabalha?
A tabela 2 apresenta os dados sobre qual espécie de madeira as dez empresas entrevistadas trabalham, a análise dos resultados apontam que a espécie mais utilizada é o Eucalyptus citriodora, com registro de oito empresas, seguido pela espécie Pinus elliottii. A tabela 1 apresenta os dados sobre qual espécie de bambu as dez empresas entrevistadas trabalham. Constatou-se que a espécie mais utilizada é o Phyllostachys aurea, em seis empresas e com um percentual de utilização de 60% a 100%, em três delas.
Seguido pela espécie Guadua angustifolia em cinco empresas, com um percentual de utilização de 60% a 100%, em duas empresas.
Processo de desenvolvimento de projeto O processo de desenvolvimento de projeto teve início após a etapa de revisão bibliográfica e análise de projetos e produtos similares. Como diretrizes de projeto foram estabelecidas os seguintes pontos: utilização de materiais locais de fontes renováveis, processo de produção
66 com equipamentos manuais de manejo simples e procedimentos de montagem e manutenção das conexões com alto grau de simplicidade. A próxima etapa realizada foi à geração de ideias que se baseou no desenvolvimento de alternativas na forma de esboços à mão livre. Em seguida, os esboços passaram por uma triagem cujo critério de seleção adotado era a compatibilidade em relação aos conceitos do projeto e a viabilidade de produção.
Figura 3 – Esboços, modelagem virtual e detalhamento técnico do protótipo 3 (Fonte: do autor).
As ideias que atenderam as diretrizes estabelecidas foram encaminhadas para a fase de aprimoramento das ideias onde os esboços foram aperfeiçoados e analisados de maneira mais detalhada em busca de possíveis dificuldades na produção e aplicação. Para uma melhor análise, o esboço foi modelado em ambiente virtual e então foram aplicadas as dimensões aproximadas para análise comparativa de proporção e dimensionamento de ferragens. Uma nova triagem foi realizada e três alternativas foram detalhadas na etapa seguinte de prototipagem virtual. Além do software de modelagem virtual, foram também empregados softwares de edição de imagem, renderizadores e simuladores para estudos de implantação e ensaios físicos virtuais dos protótipos. Os protótipos virtuais passaram então para a etapa de detalhamento técnico, onde foram geradas peças gráficas com as dimensões de cada elemento, especificação de itens, quantificação de peças e outras informações para a produção efetiva dos protótipos.
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Figura 4 – Protótipos virtuais finalizados e testes mecânicos virtuais. (Fonte: do autor).
Os protótipos físicos em escala real foram produzidos no Laboratório Didático e Materiais e Protótipos (LDMP) da FAAC/UNESP e no laboratório de Processamento de Madeira da FEB/UNESP. O processo de produção dividese em quatro etapas principais que são: a) Processamento do Bambu; b) Processamento da madeira roliça; c) Usinagem dos componentes metálicos; d) Produção das bases de concreto.
Figura 5 – Etapas de produção dos protótipos. (Fonte: do autor).
já que, com o desenvolvimento de projetos virtuais 3D e de pranchas técnicas, os erros foram previstos antes da produção física dos protótipos. O desenvolvimento desta pesquisa também contribuiu para o aprimoramento do conhecimento à cerca do cultivo, manejo, processamento e aplicação do bambu in natura como material de construção, bem como o processamento de metais, de madeira e concreto.
Agradecimentos
Referências BARATA, T. Q. F. Propostas de painéis leves de madeira para vedação externa adequados ao zoneamento bioclimático brasileiro. 264f. Tese (Doutorado em Engenharia Civil) – Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo, Universidade Estadual de Campinas – FEC/ UNICAMP, Campinas, 2008. PEREIRA, M. A. R.; BERALDO, A. L. Bambu de corpo e alma. Bauru: Canal 6, 240p. 2007.
Agradecimentos à Pró-Reitoria de Pesquisa (PROPe) da Unesp pelo financiamento desta pesquisa através do programa RENOVE (Processo 0060/008/13 – PROPE/CDC).
ORIGAMI CONTEMPORÂNEO: Um estudo sobre o design de dobras dentro do projeto de produto, medicina e nanotecnologia CONTEMPORARY ORIGAMI: A study about the design of folds within the product design, medicine and nanotechnology Teixeira, Samanta Aline; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”.
laranjasat@gmail.com Marar, João Fernando; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”.
Figura 6 – Protótipos físicos finalizados. (Fonte: do autor).
fermarar@fc.unesp.br Rossi, Dorival Campos; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”.
Conclusão Através dos resultados obtidos, comprovouse a viabilidade da produção de conexões para pilares de bambu aliados à madeira e componentes metálicos, permitindo a criação de componentes desmontáveis, resistentes, leves, baratos, ecologicamente corretos e de fácil produção, atendendo as diretrizes estabelecidas pelo ecodesign. A metodologia adotada neste estudo contribuiu para o planejamento da pré-produção dos protótipos, proporcionando uma produção rápida, eficiente e com ocorrências mínimas de falhas,
bauruhaus@yahoo.com.br
Resumo Este artigo almeja investigar as dobraduras como forma vasta de práxis ao design contemporâneo. O origami vem permeando projetos das mais diversas naturezas em todo o mundo. Ele se apresenta como mediador e eficaz ferramenta aplicada na computação, nanotecnologia, medicina e matemática. Os estudos de materiais inteligentes, suas compactações e expansões, a estética da dobra e sua mutabilidade natural fazem do origami um instrumento conceitual de fundamental importância para os processos em design. Palavras Chave: origami; design; contemporâneo; dobra.
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Abstract This article aims to investigate the folding as a extensive form of praxis in the contemporary design. Origami has permeated projects of diverse natures worldwide. It presents itself as a mediator and effective tool applied in computing, nanotechnology, medicine and mathematics. The studies of smart materials, their compressions and expansions, the aesthetics of the fold and its natural mutability make origami a conceptual tool of fundamental importance for the processes in design. Figura 1: Coleção de moda Eco-Origami 2012/2013, desenvolvida pelo estilista Issey Miyake com o auxílio do cientista computacional Jun Mitani. A roupa dobrada passa a ter tanta importância estética quanto a sua forma final desdobrada. Retirado de: ROBLEDO, C. Issey Miyake. Buenos Aires: [s.n], 2012. Disponível em: <http://blog.decyng.com.ar/?s=issey+miyake>. Acesso em 23 mar. 2014.
Keywords: origami; design; contemporary; fold.
Introdução Deleuze (1991, p. 18) introduz-nos a potencialidade que o paradigma dobra armazena em seu âmago no que diz respeito ao processo criativo em geral: “A ciência da matéria tem como modelo o origami, diria o filósofo japonês, ou a arte de dobrar o papel.”. O origami tem sua origem desde os anos 1600 (HULL; LANG, 2005) e sua natureza oriunda desde os seus primeiros indícios na China até a sua adaptação e consagração no Japão tem desencadeado uma série de mudanças ao design mundial. A prática e busca do conhecimento através do origami está se expandindo especialmente por conta da natureza das dobraduras, que abarcam não apenas a mutabilidade da dobra, mas toda a filosofia e cultura oriental. Assim constata Flusser (2007, p. 209): “Enquanto no Ocidente o design revela um homem que interfere no mundo, no Oriente ele é muito mais o modo como os homens emergem do mundo para experimentá-lo. Se considerarmos a palavra estético em seu significado originário (isto é, no sentido de “experimentável”, de “vivenciável”), podemos afirmar que o design no Oriente é puramente estético”. Dobrar não significa mais um ato tátil mecânico que modifica a configuração de um papel - a dobra deixou de ser encarada como uma arte fechada ao origami tradicional para ser vista, em essência, como uma filosofia (e consequentemente como uma ferramenta)
complexa e extremamente renovadora aos olhos do mundo contemporâneo. Ao que se nota, o origami contemporâneo encontra-se no seu melhor momento atualmente (HULL; LANG, 2005): “Durante os últimos 35 anos ou mais a arte do origami tem renascido”. A cada dia ouve-se falar cada vez mais em milhares de aplicações do origami em plataformas distintas, em raciocínios inusitados e inéditas contribuições benéficas à sociedade como um todo. É este o principal objetivo desta investigação, elucidar e medrar com alguns dos projetos lançados pelo mundo que incorporam a linguagem da dobra como principal alicerce de pesquisa, concepção projetual e inovação tecnológica. Graças à divulgação científica do físico, engenheiro, administrador e origamista em tempo integral Robert Lang (2010), o origami científico vem sendo demonstrado mundialmente de forma séria e inédita. Com suas palestras em todo o globo e também disponíveis online, Lang mostra todo um panorama particular das dobraduras que definitivamente fogem do padrão comum o qual as pessoas estão acostumadas a imaginar. Ele aponta na dobra um processo deveras vantajoso no que diz respeito à sua mutabilidade. Diversos serviços, processos/ produtos e ciclos de transporte necessitam do que Robert chama de “pequeno para viagem e grande para o destino”. De modo geral, pode-se perceber como funciona e as vantagens deste raciocínio nos exemplos a seguir:
Figura 2: O Viva-voz Viva Docking Speaker, projetado por Jang Sechan, usufrui da dobra simples e minimalista para o seu princípio compacto, um claro exemplo da aglutinação entre as velhas linguagens (origami e craft) com as novas linguagens (eletrônicos portáteis). Retirado de: SECHAN, J. Viva Docking speaker: Product Design. Coreia do Sul: [s.n.], 2013. Disponível em: <https://www.behance.net/gallery/Viva-Docking-speaker/10925823>. Acesso em 23 mar. 2014.
Figura 3: A cadeira Rising Chair, desenvolvida por Robert Van Embricqs, utiliza linhas de madeira entrelaçadas entre si como princípio do design de produto em fusão com a noção de dobra, muito semelhante a um ramo específico do origami - o kirigami (que utiliza dobras e cortes). Retirado de: EMBRICQS, R. V. Architectural & Furniture Design. Amsterdam: [s.n.], 2014. Disponível em: <http://www.robertvanembricqs.com/rising%20chair.html>. Acesso em 23 mar. 2014.
Todos os produtos acima possuem algum tipo de compactação em suas estruturas: tanto suas formas finais como as originais complementam-se em um mesmo processo indissolúvel, são perpetuamente mutáveis. O caminho de ida e de volta não comprometem o uso do produto e facilita o transporte e/ou o armazenamento do mesmo. Essa economia
saudável confirma o foco científico do origami afirmado por Thomas Hull e Robert Lang (2005): “Talvez não seja surpresa que tais pessoas com interesses científicos sejam atraídos pelo desafio do design do origami, cujas regras de economia e restrições físicas do papel devem ser superadas”. O raciocínio da dobra agregado à concepção de produtos e de outras áreas do conhecimento e inovação demonstra o papel importante que o designer tem dentro da sociedade contemporânea, como constata Argan (2005, p. 263): “Ao design caberá a tarefa de evitar igualmente a penúria e o desperdício, a insuficiência e a redundância da informação. A chamada austeridade não será um sacrifício imposto pelas circunstâncias, mas o Grundbegriff de um novo equilíbrio”. O origami aplicado ao design nos projetos acima (e em muitos outros ao longo do globo) confere economia de combustível para o transporte, maior número de produtos transportados, versatilidade de espaço ocupado e uma estética diferenciada e dinâmica. Onde e como introduzir um fio entre dois fios, por onde passar, por qual espaço? É preciso ir de dimensão a dimensão para compreender melhor. Onde e como introduzir uma folha entre duas páginas, por onde passar, por qual espaço? (...) É preciso imaginar dobraduras, invaginações, situações extraordinariamente complexas que generalizam a prática e a noção de nó em todas as dimensões imagináveis. (SERRES, 2001, p. 74-75). Para Michel Serres, dobrar e atar um nó constituem-se como atividades virtuais muito próximas entre si. Significa essencialmente plasmar uma ideia (virtual) para então estar apto a concretizá-la em um produto, objetivo ou ato (real). Este ato elucidado e alicerçado do conceito pelo próprio conceito pode ser essencial em qualquer tipo de projeto, seja ele grande ou trivial. Com a revolução digital das informações, a mistura de linguagens e paradigmas ganhou outro patamar, ficando difícil saber onde começa ou termina a atuação das ciências exatas, biológicas ou humanasassim encara o autor Vilém Flusser (2007, p.
70 32): “Fazia sentido, antigamente, diferenciar a ciência da arte, o que hoje parece um despropósito”. Em verdade, diversos ramos/disciplinas/áreas que antes eram cuidadosamente separadas pelas escolas estão sendo aglutinadas e incorporadas entre si, especialmente por causa da auto-consciência do pensamento complexo e que este, combinado com caos e ordem, faz mais jus à nossa realidade, como confirma Edgar Morin: A complexidade é efetivamente o tecido de acontecimentos, ações, interações, retroações, determinações, acasos, que constituem nosso mundo fenomênico. (...)A dicotomia não era mais possível. Foram necessárias estas últimas décadas para que nos déssemos conta de que a desordem e a ordem, sendo inimigas uma da outra, cooperavam de certa maneira para organizar o universo. (MORIN, 2006, p. 13-61). Pode-se dizer que o início dessas junções de áreas do conhecimento começou com o design, de acordo com Flusser (2007, p. 183): “A cultura moderna, burguesa, fez uma separação brusca entre o mundo das artes e o mundo da técnica e das máquinas. (...) A palavra Design entrou nessa brecha como uma espécie de ponte entre esses dois mundos”. Para Flusser (2007, p. 28), a informação não está apenas na língua e nas escritas, mas também nas formas que o designer cria. Portanto, conscientizar-se dos diferentes tipos de ferramentas e de como as formas são “informadas” precisam estar conscientes ao designer desde o início. É a partir de então que o design oriental entra como uma informação relevante, sendo uma forma de raciocínio vasta e ao mesmo tempo simples, contundente: “Podemos observar como surgem formas entre as mãos dos orientais, por exemplo, ideogramas escritos com pincel, flores de papel (...). Em todos esses casos não se trata de uma ideia imposta sobre algo amorfo; trata-se de fazer surgir de si mesmo e do mundo circundante uma forma que abarque ambos”. Azevedo (1994, p. 75) também constata na cultura japonesa, a relevância necessária para os nossos olhos
71 ocidentais: “Buscar inspiração na natureza é uma tarefa difícil nos tempos de hoje, mas os japoneses parecem lidar com a eletrônica com a mesma facilidade com que seus antepassados ouviam o vento”. O origami entra no grande leque de signos orientais como parte visceral de sua cultura e filosofia de vida. Mas o origami contemporâneo já não faz mais parte do Japão ou China: ele partiu do mundo asiático para se tornar propriedade intelectual de todo o globo. O design da dobra não modificou apenas suas plataformas e modos de atuação, mas também sua localização, como será exemplificado aqui por dois projetos: o Origami Heart Stent e o Dispositivo Origami DNA.
Revisão Bibliográfica Esta investigação busca aumentar o paradigma do origami contemporâneo em conexão com o design e inovação tecnológica. Citam-se projetos que utilizam a linguagem da dobra dentro do design de produtos em geral com os designers Issey Miyake e Jun Mitani (ROBLEDO, 2012), Jang Sechan (SECHAN, 2013) e Robert Van Embricqs (EMBRICQS, 2014). A análise mais aprofundada da dobra projetual é dada na aplicação do raciocínio dobradura dentro da área medicinal – Origami Heart Stent (BELL, 2012), e nano tecnológica – Dispositivo Origami DNA (KOMIYAMA, M. et. al, 2011. Por fim, com o auxílio referencial dos autores Argan (2005), Azevedo (1994), Deleuze (1991), Flusser (2007), Lang e Hull (2005), Morin (2011) e Serres (2001), uma reflexão dentro da filosofia subjetiva e da complexidade é construída para elucidar a ferramenta virtual origami/dobra e, por conseguinte, seus benefícios ao designer e à sociedade.
Materiais e Métodos Para a execução dessa investigação, procuramos fontes bibliográficas que relacionam o origami, o contemporâneo e o design. Utilizamos artigos científicos, livros, revistas e sites para o levantamento de
dados teóricos e aplicados. Considera-se as informações da internet, procurando sempre o compromisso dos endereços eletrônicos com a verdade e com a atualização das informações, principalmente no que diz respeito às empresas atuais, cuja trajetória ainda é muito. Damos atenção especial aos artigos publicados recentemente em áreas diversificadas de projetos científicos que fazem conexão com o origami como o Origami Heart Stent e o Dispositivo Origami DNA.
Resultados e Discussões Dentro da aplicação medicinal, Susan Bell (2012) e Robert Lang (2010) citam o trabalho de Zhong You e Kaori Kuribayashi-Shigetomi, da Universidade de Oxford, que desenvolveram o Origami Heart Stent. Trata-se de um tubo que é introduzido por cateter ao coração e que desobstrui uma artéria bloqueada por gordura e sangue, processo cirúrgico conhecido como angioplastia.
se separam em partes de partes, mas dividemse até o infinito em dobras cada vez menores, dobras que sempre guardam certa coesão”. Tal coesão está na geometria que o origami carrega- característica vantajosa, pois lhe é inato o ato de se dobrar e se desdobrar. Assim se dá o origami heart stent, sua forma inicial precisa ser reduzida para viajar do meio externo até a artéria do coração, e precisa ser expandida para restabelecer o fluxo sanguíneo. Conforme descreve Bell (2012), o produto final foi feito com bioplástico, sua forma inicial possui 1,2 centímetros de largura e sua expansão pode chegar a 2,3 centímetros. Para quem está familiarizado com o mundo dos diversos modelos de origami que existem atualmente, especialmente os mais famosos e divulgados, poderá notar então que a diferença entre o Origami Heart Stent e o “Magic Ball”, dobradura de autoria por Kade Chan, é meramente a mudança de plataforma, ou ainda, do material e aplicação.
Figura 5: Os vários estados do mesmo origami: “Magic Ball”, modelo de Kade Chan. Elaborado pela autora, com base na pesquisa realizada.
Figura 4: Protótipo do Origami Heart Stent, design de Zhong You e Kaori Kuribayashi-Shigetomi, feito com aço inoxidável. Retirado de: BELL, S. Know How to Fold ‘Em: How Origami Changed Science, From Heart Stents to Airbags. Los Angeles: LA Weekly, 2012.
Se tal cirurgia já existia desde os anos 80, o processo ganhou considerável rapidez e melhores resultados com o raciocínio da dobra aplicado a ele. De acordo com Deleuze (1991, p. 17,18), o paradigma dobra é uma maneira particular de plasmar algum material que não o modifica permanentemente: “Um corpo flexível e elástico tem ainda partes coerentes que formam uma dobra, de modo que elas não
Em perspectivas plásticas, as formas entre o origami de Kade Chan e do heart stent de Zhong You e Kaori Kuribayashi-Shigetomi são as mesmas. Doravante, pode-se concluir que uma singela modificação de aplicabilidade e materiais para uma mesma formação transmigra do plano da ideia pura e inata para um projeto inovador e que salva vidas. Por conseguinte, quando se dobra um origami qualquer, ativa-se um pensamento que não se trata apenas da concepção de meros objetos de arte que não se conectam com a vida cotidiana e suas necessidades. O origami é, antes de tudo, um paradigma que carrega um potencial deveras contributivo para os novos adventos tecnológicos e, portanto, para as melhorias da
72 sociedade e meio-ambiente. Como exemplo do origami aplicado aos novos adventos da Nanotecnologia, citase o Dispositivo Origami DNA, trabalho dos autores Akinori Kuzuya, Yusuke Sakai, Takahiro Yamazaki, Yan Xu e Makoto Komiyama (2011) membros do Centro de Pesquisa Avançada em Ciência e Tecnologia na Universidade de Tóquio, e do Departamento de Química e Engenharia de Materiais na Universidade de Kansai. Segundo os autores (2011), o artigo trata sobre o Origami DNA que “diz respeito ao dobramento de uma cadeia de DNA simpleslonga através de estruturas projetadas com o auxílio de cordões de fibra curta; tais estruturas podem permitir o desenvolvimento de dispositivos de DNA nano mecânicos úteis”.
Figura 6: O comportamento moldável do DNA Origami ao se conectar com uma molécula-alvo. Retirado de: KOMIYAMA, M. et al. Nanomechanical DNA origami ‘single-molecule beacons’ directly imaged by atomic force microscopy. Londres: Revista Nature Communications, 2011.
Conforme a figura acima, o origami DNA se molda a uma molécula-alvo qualquer, possibilitando a observação das interações intermoleculares desta última- o que não seria possível com os equipamentos tecnológicos disponíveis atualmente. Com o uso do AFM (Atomic Force Microscopy, ou Microscopia de Força Atômica) e a aplicação do dispositivo origami DNA é possível monitorar a ação da molécula-alvo em tempo real e com resolução molecular, o que lhe confere maior precisão no colhimento de dados. Para diversos tipos de moléculas, até mesmo para íons metálicos, o origami DNA conseguiu se encaixar sem mudar a sua estrutura principal e, assim, demonstrar as diferentes presenças moleculares e seus comportamentos particulares, revelando-se como uma ferramenta consideravelmente flexível e multifuncional.
73 De acordo com os autores (2011), tal aplicação revela um novo passo para a nanotecnologia, pois a maioria dos cientistas atua apenas em cima da análise em nível médio, ou seja, investigam um conjunto de moléculas e não cada uma das moléculas em particular. Na maioria das vezes essa atitude é tomada devido à restrição tecnológica atualmente que, ainda que muito avançada, possibilita a observação molecular somente até certo ponto. Com o origami DNA, a observação em cima de uma única molécula é assustadoramente precisa e, por isso mesmo, muito mais reveladora. Com essa manipulação através do dispositivo biológico pode-se atuar de forma mais ativa dentro das aplicações nano tecnológicas, por exemplo, a pesquisa em cima do surgimento e avanço de doenças complexas como o câncer. O mais importante a ser observado na pesquisa sobre o origami DNA é que existe nesse tipo de interferência nano tecnológica um pensamento aplicado que foge do padrão comum. Quer dizer, há ali uma inovação tanto no aspecto tecnológico quanto paradigmático. Ao invés de conterem suas investigações e curiosidades para caminhar conforme as limitações dos aparatos técnicos, os cientistas projetaram um dispositivo, ou uma plataforma, para poderem alcançar níveis ainda mais intangíveis para o ser humano e, assim, chegar mais perto de uma nova realidade e experimentação científica. O design existe justamente para isso: resolver problemas de forma inteligente, com economia, responsabilidade e contribuição social. O origami DNA é um exemplo atípico de design aplicado - dado sua área original, que é o artesanato em papel -, mas que demonstra claramente que conhecimentos diversificados podem perfeitamente caminhar juntos para solucionar e/ou explorar diversos tipos de problemáticas.
Conclusão Procuramos neste artigo expandir um pouco mais o conceito de origami, dobra, design e contemporâneo, todos estes em conexão
dinâmica e inovadora. Vimos que as dobras saíram do papel para serem aplicadas à microbiologia, medicina, design de produtos e moda. Mas tais exemplos são apenas meros pontos dentro de uma enorme trama que tem se formado a dobra contemporânea. O origami atual possui muito mais projetos tecnológicos do que se possa imaginar. Elencá-los e aproximá-los com teorias da filosofia subjetiva e teorias do design têm sido nosso objetivo de pesquisa há quatro anos (TEIXEIRA; ROSSI, 2012). Ainda que o origami projetual e científico seja foco de estudos e aplicações já há algum tempo no exterior, principalmente Estados Unidos, França e Japão, no Brasil as dobraduras contemporâneas ainda caminham a passos modestos, sendo objeto de estudos, em grande parte, no ensino e matemática. Portanto, a maior dificuldade de pesquisa da dobra atual não se instala na quantidade ou qualidade de assunto, pois este é rico e cada vez mais atualizado, mas no transporte de informações para o nosso espaço, língua e cultura. Todavia, também é desta dificuldade que nasce a importância do assunto para o nosso país, dado que é inédito e extremamente diversificado. A investigação em cima do origami dos dias de hoje continua, pois acreditamos ser de grande valia não apenas para os pesquisadores e designers, mas também para a sociedade. Percebemos que através destes infindos trabalhos com as dobraduras ao longo do mundo, o origami definitivamente passou do plano do papel artístico para atuar como agente principal nos projetos sociais e tecnológicos como um todo, trazendo inovação, sustentabilidade e dinamismo projetual.
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Percepção auditiva e visual – possíveis relações entre preferências de gêneros musicais e design Auditory and visual perception - possible relationships between preferences of musical genres and design Campanha, Érica dos Santos Malheiros; Faculdades Oswaldo Cruz
ericampanha.esmc@gmail.com Camargo, Eleida Pereira de; Faculdades Oswaldo Cruz
eleidapc@gmail.com
Resumo O design é capaz de solucionar grandes desafios e gerar transformações sociais, porém enfrenta dificuldades para a aceitação dos produtos criados. A música pode ser um parâmetro para a coleta de dados dos usuários a que se destinam os produtos. Nesta pesquisa, buscamos estabelecer possíveis relações entre preferências musicais e segmentos de design de produtos. A divulgação dos questionários foi feita via internet e inloco, nas salas de aula. Os resultados nos possibilitaram estabelecer correlações entre fatores de personalidade (definidos por conjuntos de gêneros musicais) e as preferências relacionadas ao design de produto. Palavras Chave: design de produtos; psicologia do consumidor; música; jovens.
Abstract The design is capable of solving major challenges and generate social change, but struggling for acceptance of products created. Music can be a parameter to collect data from users that the product is intended. In this research, we seek to establish possible relationships between music preferences and segments of product design. The disclosure of the questionnaires was done via internet and inloco, in classrooms. The results allowed us to establish correlations between personality factors (defined by sets of musical genres) and preferences related to product design. Keywords: product design; consumer psychology; music; young.
1.INTRODUÇÃO A preferência musical das pessoas revela aspectos de sua personalidade, assim como os critérios que utiliza na escolha dos produtos que elege e com os quais se identifica. O design é capaz de solucionar grandes desafios e gerar transformações sociais, porém enfrenta dificuldades para a aceitação dos produtos criados, mesmo quando se faz investimentos prévios em pesquisa de mercado. É possível estabelecer diversas relações entre música e design, uma vez que ambos envolvem diretamente apelos estéticos. A música e os objetos fazem parte do nosso cotidiano e a
maneira como nos relacionamos com eles, traduzem sentimentos e aspectos característicos de cada um. Quando as pessoas optam por um produto, seja uma música ou uma peça de design, procuram identificar-se nele, pois as escolhas pessoais revelam aspectos de sua personalidade. Podemos citar alguns trabalhos relevantes neste campo de investigação científica. O estudo de Pimentel (2008), relacionou 20 gêneros musicais a 3 fatores de personalidade. Os gêneros musicais escolhidos foram: sertaneja, pagode, pop music, funk, forró, samba, MPB, música clássica, rap/hip hop, heavy metal, punk/ hard core, reggae e música religiosa.
Uma das referências utilizadas pelo pesquisador foi o estudo de Rentfrow & Gosling (2003), que relacionou 14 gêneros musicais a 4 fatores de personalidade, a saber: Fator I - Estilo Reflexivo e Complexo, Fator II - Estilo Intenso e Rebelde, Fator III - Estilo Convencional, Fator IV - Estilo Energético e Rítmico. Como resultado de suas pesquisas, os dois pesquisadores agruparam os gêneros musicais aos fatores de personalidade, de forma muito similar, reforçando a hipótese de que a seleção musical se correlaciona diretamente a um determinado perfil comportamental do indivíduo. Neste contexto, haveria uma relação direta entre as seleções feitas no campo da visualidade e da musicalidade, que permitiria a definição de um perfil psicológico do consumidor? Motivados por esta questão, iniciamos esta pesquisa, que busca estabelecer paralelos entre gostos musicais e visuais. Estamos cientes da complexidade da questão, dado o caráter intangível destas características que dificulta o alcance de resultados objetivos, contudo, nos pareceu interessante investigar parâmetros que nos permitam uma antecipação de mercado, baseados em possíveis perfis de consumidor.
2.OBJETIVO Nesse estudo, procura-se investigar a relação entre preferência musical e visual/formal (Design de Produto).
3.METODOLOGIA Elaboramos um questionário, constituído de 3 questões sobre design e 20 sobre música. Após a análise das respostas sobre música, os gêneros musicais eram relacionados a 10 fatores de personalidade. As 3 questões sobre design eram constituídas por 6 imagens, cada questão referente à áreas do design (moveleiro, automobilístico e eletroeletrônico). Os 20 gêneros musicais
selecionados foram baseados nas pesquisas de Pimentel (2008) e Rentfrow & Gosling (2003), respeitando a característica da cidade de São Paulo. Os fatores de personalidade são estabelecidos por meio do conjunto de gêneros musicais preferidos das pessoas (Rentfrow & Gosling, 2003). Dos fatores de personalidade, 4 deles foram definidos em pesquisas anteriores (Rentfrow & Gosling, 2003), sendo: Fator I - Estilo Reflexivo e Complexo, Fator II - Estilo Intenso e Rebelde, Fator III - Estilo Convencional, Fator IV - Estilo Energético e Rítmico. Os demais fatores, presentes nessa pesquisa, devem-se às combinações dos 4 fatores existentes, pois durante a análise dos dados, observou-se que parte significativa da amostra não se definia apenas nesses 4 fatores. As perguntas do formulário referentes aos 20 gêneros musicais, foram escalonadas de 1 a 5, sendo 1 para “detesto” e 5 para “amo”. Nas 3 perguntas sobre design, o respondente escolhia uma cadeira (dentre 6 possibilidades, cada uma representando um segmento de design), depois escolhia um automóvel e por fim um aparelho eletrônico (vide tabela 3). Ressalta-se que a vinculação de imagens aos 6 segmentos de design foi feita experimentalmente e requer um estudo específico. Por exemplo, o Ecodesign foi associado à multifuncionalidade, aproveitamento de espaço, materiais alternativos e economia na produção, já o Design de Luxo não foi traduzido com exemplares genuínos, pois eles se confundiam com os demais segmentos de design, como o Design orgânico, quando buscou-se a cadeira Anêmona, dos Irmãos Campana (figura 1). A cadeira anêmona é um objeto que pode ser definido como pertencente ao Design Orgânico, mas também é um objeto de Design de Luxo. Alguns objetos escolhidos para o formulário mesclam em si características de mais de um segmento, porém, a estética formal que predomina no objeto é o que o define em um dos 6 segmentos de design.
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77 atribuições feitas quanto aos gêneros não relacionados nos estudos anteriores, devese puramente a associações baseadas em conhecimentos musicais.
Tabela 1 – Os 6 segmentos de Design de Produtos e a relação com os objetos escolhidos
Tabela 2 – A relação entre os fatores de personalidade e os gêneros musicais desse estudo
3.1 Coleta de Dados
Figura 1 – Cadeira Anêmona dos irmãos Campana, de 2001 Fonte: Istoé
Nessa pesquisa, 20 gêneros musicais foram escolhidos: clássica, blues, jazz, ópera, MPB, instrumental, rock, heavy metal, punk/ hard core, country/sertaneja, pop, pagode, religiosa, brega, rap/hip hop, funk nacional, reggae, samba, forró e eletrônica. Tais gêneros foram atribuídos inicialmente aos 4 fatores de personalidade de Rentfrow & Gosling (2003), com o agrupamento dos gêneros baseados nos resultados obtidos por Pimentel (2008). Para a execução da tabela abaixo, respeitou-se as definições de fatores de Rentfrow & Gosling (também consideradas no estudo de Pimentel), sendo o fator I ligado ao reflexivo e complexo, sendo assim, gêneros como MPB e música instrumental; fator II ligado ao caráter intenso e rebelde, como o heavy metal; fator III ligado ao otimista e convencional, com estrutura simples, como pagode e brega; fator IV atribuído ao caráter energético e rítmico, como eletrônica e funk nacional. Com esse estudo, não se pretende relacionar preferência musical com personalidade, mas sim com escolhas de Design de Produto. As
A coleta de dados foi feita em duas faculdades, uma pública (UNIFESP) e outra particular (Faculdades Oswaldo Cruz, participação mais expressiva). A amostra com 313 estudantes foi probabilística e simples. A aplicação do questionário foi feita na internet. Na faculdade pública, a divulgação foi feita em um grupo de uma rede social; na particular, a divulgação foi feita em 40 salas de aula.
4.DESENVOLVIMENTO A preferência musical das pessoas revela aspectos de sua personalidade, assim como os critérios que utiliza na escolha dos produtos que elege e com os quais se identifica. O design é capaz de solucionar grandes desafios e gerar transformações sociais, porém enfrenta dificuldades para a aceitação dos produtos criados, mesmo quando se faz investimentos prévios em pesquisa de mercado. É possível estabelecer diversas relações entre música e design, uma vez que ambos envolvem diretamente apelos estéticos. A música e os objetos fazem parte do nosso cotidiano e a maneira como nos relacionamos com eles, traduzem sentimentos e aspectos característicos de cada um. Quando as pessoas optam por um produto, seja uma música ou uma peça de design, procuram identificarse nele, pois as escolhas pessoais revelam aspectos de sua personalidade. Podemos citar alguns trabalhos relevantes neste campo de investigação científica. O
estudo de Pimentel (2008), relacionou 20 gêneros musicais a 3 fatores de personalidade. Os gêneros musicais escolhidos foram: sertaneja, pagode, pop music, funk, forró, samba, MPB, música clássica, rap/hip hop, heavy metal, punk/hard core, reggae e música religiosa. Uma das referências utilizadas pelo pesquisador foi o estudo de Rentfrow & Gosling (2003), que relacionou 14 gêneros musicais a 4 fatores de personalidade, a saber: Fator I - Estilo Reflexivo e Complexo, Fator II - Estilo Intenso e Rebelde, Fator III - Estilo Convencional, Fator IV - Estilo Energético e Rítmico. Como resultado de suas pesquisas, os dois pesquisadores agruparam os gêneros musicais aos fatores de personalidade, de forma muito similar, reforçando a hipótese de que a seleção musical se correlaciona diretamente a um determinado perfil comportamental do indivíduo. 4.1 Sobre a classificação dos segmentos de design de produto Os segmentos de Design de Produto são detectáveis ao longo da história do design, porém não são claramente classificados, para se tornarem informações facilmente acessíveis, como uma taxonomia. Dessa forma, elaboramos nossa própria classificação baseada em estudos sobre estética formal (Bürdek, 2006), de Dieter Mankau, na HfG Offenbach, em que esse pesquisador determina 5 configurações, que foram atribuídas a segmentos de Design de Produto, a saber: Configuração aditiva: Produtos por redesign ou Design Retrô Produto ou figura que tenha sido configurado de tal forma que as características técnicas ou as funções práticas mantenham completamente suas características visuais. Configuração contínua: Design Escandinavo ou nórdico Poucos elementos formais básicos. Incluemse aí a esfera, cilindro, quadrado e pirâmide (corpos geométricos altamente estáveis, por motivo de pregnância cognitivo-cultural).
Configuração escultórica: Design de Luxo Interpretação individual ou artística das funções, que se manifesta com uma forte componente simbólica. Configuração natural: Bionic Design ou Design Orgânico Remete a princípios biológicos (biônica) e permite também associações naturais. Configuração integrativa: Ecodesign ou Design Sustentável As perturbações visuais, que à primeira vista se manifestam pelo uso de diferentes funções técnicas ou práticas e os materiais a serem utilizados podem ser reduzidos de forma clara com o uso de meios formais. Um sexto segmento de design também citado por Bürdek (2006), definido por Bill Moggridge e Bill Verplank, foi considerado no presente estudo: Design de Interação Significa como lidamos com um produto digital (quer hardware ou software). São as estruturas de ação que nos indicam um procedimento de uso.
5. RESULTADOS No que diz respeito ao perfil sóciodemográfico, a pesquisa revelou que 62% dos entrevistados declarou-se como pertencente à classe B, com idade média de 22 anos, sendo 72% do sexo feminino. A classificação sócioeconômica foi estabelecida de modo espontâneo. O segmento de Design de Produto mais expressivo foi o Design de Luxo (38,1%), seguido do Design Retrô (23%), Design Interativo (18,3%), Design Escandinavo (13,8%), Ecodesign (3,9%) e Design Orgânico (2,8%). A amostra, formada por jovens das chamadas geração Y e geração Z, ao apontar um gosto maior pelo Design de Luxo e não pelo Ecodesign, demonstra uma inclinação maior para o consumismo em relação à preocupação com o meio ambiente, ainda que a pesquisa IBOPE Mídia 2011 tenha mostrado um aumento significativo dessas duas gerações quanto
78 ao interesse de preocupação com o meio ambiente. O Ecodesign foi mais escolhido pelas pessoas do fator I (clássica, blues, jazz, ópera, MPB e instrumental); o Design Retrô se destacou entre as pessoas do fator II (rock, heavy metal e punk/ hard core); o Design de Luxo ligou-se mais ao fator III, além do fator II e IV. Todos os fatores e suas relações significativas com o segmento de Design de Produto podem ser mais bem visualizados na tabela 3 (consultar também tabela 2):
Tabela 3 – Fatores e segmentos de Design de Produto correspondentes
79 por pessoas que tem como gêneros preferidos o jazz, blues, ópera, instrumental, música clássica, MPB. Já o Design de Luxo, segmento que predominou nas escolhas, é mais contemplado por pessoas que gostam de pagode, brega, pop, religiosa, rap/hip hop e country/sertaneja. Lembramos também que os perfis psicológicos definidos na pesquisa são oriundos de levantamentos realizados em outros estados e países, não havendo, portanto, um equivalente específico para a cidade de São Paulo, onde o presente estudo foi realizado. Nos pareceu necessário, também, ampliarmos a gama de perfis psicológicos aos quais faríamos referência, pois os 4 fatores utilizados (Rentfrow & Gosling, 2003) mostraram-se insuficientes para essa pesquisa, principalmente em um país como o nosso, que é musical, com muitas etnias e de grande diversidade cultural. É importante ressaltar que os segmentos enumerados no campo do design são uma livre interpretação da pesquisadora, baseada em levantamentos bibliográficos imprecisos, permitindo apenas uma aproximação do que seria uma categoria taxonômica para as classificações no que se refere ao design. Uma classificação de segmentos de Design de Produto seria interessante, para que estudos como esse, possam ser mais frequentes e sejam aplicados em diferentes Estados, revelando particularidades de preferências e escolhas.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Tabela 4 – Porcentagens da amostra quanto aos fatores e ao Design de Produto
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Esse estudo aponta uma possível relação entre preferência musical e segmentos de Design de Produto. Por exemplo, os produtos do segmento Ecodesign, com características como a multifuncionalidade, o aproveitamento de espaço, o uso de materiais alternativos e a economia na produção, são mais apreciados
BAXTER, Mike. Projeto de Produto: Guia prático para o design de novos produtos. 3ª ed. São Paulo: Editora Blucher, 2011. 342 p. BÜRDEK, Bernhard E. Design: história, teoria e prática do design de produtos. 2ª ed. São Paulo: Editora Blucher, 2010. 496 p. CENTRO DE DESIGN PARANÁ. Demanda por Design no setor produtivo brasileiro. FÓRUM DE RELAÇÕES COM O CONSUMIDOR, 2011, Centro Britânico, São Paulo. Palestra Gerações Y e Z: Juventude Digital. IBOPE
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Reflexões Sobre a Importância do Sketch no Processo Criativo e Sua Desvalorização frente às Tecnologias Digitais Reflections on the Importance of the Sketch Creative Process and Its Devaluation front of Digital Technologies Souza, Michel Silvestre de; Universidade Estadual Paulista
michel_silvestre@msn.com Nakata, Milton Koji; Universidade Estadual Paulista
milton@faac.unesp.br
Resumo Novas tecnologias têm surgido na área da computação gráfica, principalmente na área do design, onde muitos profissionais e estudantes têm usado de forma exagerada, muitas vezes eliminando ou deixando de lado algumas técnicas de desenho manual, como o sketch, no processo criativo. Sendo assim procurou-se identificar a importância dessas técnicas em várias fases da vida do designer, suas possíveis falhas em seus trabalhos, técnicas de criatividade no desenvolvimento e futuras pesquisas para complementação deste trabalho. Palavras Chave : sketch; design; processos criativos; tecnologia.
Abstract New techniques has arisen in the área of computer graphics, mostly in the area of design, where many profissionals and students has used an exaggerated way, many times eliminating or leaving aside some techniques of hand drawing how the sketch, in the creative process. So we tried to identify the importance of these techniques in various stages of life of the designer, its possible flaws in their work, creativity techniques and future research in development for complementation this work. Keywords : sketch; design; creative processes ; technology.
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Introdução Muitas tecnologias têm surgido no mercado para facilitar a vida do ser humano, dando agilidade as tarefas e diminuindo o tempo de serviço, isso acontece em várias áreas, mas na computação gráfica voltada para design é possível ver o quanto contribuem os softwares utilizados no processo de criação de um produto. Esses softwares possibilitam nos trazer imagens realísticas dos produtos já definidos tanto bidimensionalmente como tridimensionalmente, acelerando assim um processo criativo e diminuindo o tempo de trabalho exigido pelo mercado. Porém, o uso extremo desses softwares por parte de designers e estudantes de design podem causar problemas no processo de criação no que se refere a “queimar” etapas, pois acabam deixando de lado alguns métodos que possibilitam uma melhor compreensão do problema e consequentemente um melhor resultado, além de que os profissionais utilizam os softwares sem saber desenhar e acabam não conseguindo utilizar todas as ferramentas disponíveis no programa. Dentre esses métodos, desenhar é uma parte importante, e o sketch como ferramenta para reprodução rápida no processo criativo pode trazer benefícios no resultado final, mas é possível observar que nos últimos anos, designers e estudantes tem deixado o desenho de lado para se“aventurar”em programas afim de reduzir seu tempo. Também nas universidades, os estudantes já não são encorajados a treinar o desenho como ferramenta e o mercado de trabalho acaba dando mais ênfase ao resultado do que os processos para chegarem aos resultados. Portanto, este artigo propõe reflexões sobre até onde o uso extremo dos softwares podem influenciar positivamente ou negativamente no desempenho do designer, como o sketch pode ajudar no processo criativo de um produto e o que é preciso mudar para chegar a resultados mais satisfatórios, para um melhor desenvolvimento dos designers.
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Entendendo os desenhos: o que?, de onde? e para onde? Através do desenho o homem pode se comunicar registrar seu cotidiano, mostrar seus pensamentos e ideias, inclusive através dos tempos. Entender a importância do desenho para o Design tem o mesmo significado que o surgimento da escrita teve para o homem. (NAKATA/SILVA, 2012). Segundo o Dicionário Michaelis desenho é:
estavam ligadas a religião servindo de veículo para crenças religiosas, suas pinturas eram padronizadas, sendo muito marcada a lei da frontalidade (Figura 02), que segundo Santos, essa lei determinava que o tronco da pessoa fosse representado sempre de frente, enquanto sua cabeça, suas pernas e seus pés eram vistos de perfil. (SANTOS, 1999, p. 19).
1 Arte de representar objetos por meio de linhas e sombras. 2 Objeto desenhado. 3 Delineação dos contornos das figuras. 4 Delineamento ou traçado geral de um quadro. (MICHAELIS, 2014).
Antes de existir a linguagem escrita o ser humano já desenhava histórias e até emoções nas paredes de onde se abrigavam, chamadas pinturas rupestres (Figura 01) que era pinturas pré-históricas encontradas nas cavernas, que nos permite compreender aquela sociedade na época em que viviam.
Figura 03: Cálice em perspectiva de Paolo Ucello (1430-1440), semelhante com um desenho em CAD no modo “wirefrime”. Fonte: PIPES (2010). Figura 02: Pintura egípcia. Fonte: BEPELI (2014)
Paolo Ucello, um pintor renascentista italiano, buscou intensamente a perspectiva (Figura 03) e juntamente com o arquiteto Filippo Brunelleschi foram os responsáveis pela invenção por volta de 1420.
Figura 01: Bisão, pintura rupestre nas cavernas de Altamira, Espanha. Fonte: SANTOS (2006)
Desde os primeiros desenhos pré-históricos feitos a partir de minerais de carvão e sangue de animais, os desenhos em sua história foram evoluindo, tanto em materiais utilizados quanto em capacidade para representar suas formas e o que estavam representando. As pinturas egípcias, já em aproximadamente 3.000 a.C.,
Leonardo Da Vinci, que teve habilidade de trabalhar em várias áreas, utilizava muito o desenho para representar suas invenções, sempre desenhava em perspectivas, fazia desenhos explodidos e em corte, fazia muitos detalhamentos para auxiliar na explicação do funcionamento interno de suas invenções, além de fazer várias anotações para deixar registrado e explicado o passo a passo do desenvolvimento. Fez muitos projetos e desenhos de máquinas de guerras (Figura 4), invenções de máquinas voadoras, primeiro esboços de um conceito de uma bicicleta, e fez muitos estudos sobre o corpo humano.
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83 Com a evolução do desenho, padronização, normatização e a tecnologia foram se evoluindo a forma de desenhar e como desenhar, foram projetadas pranchetas grandes para se poder trabalhar mais e com maior qualidade e são utilizadas ainda nos dias de hoje para algumas áreas. E com as tecnologias os desenhos começaram a ser feitos por computadores, os chamados desenhos CAD que tem uma maior precisão, onde temos diversos softwares e recentemente com as novas tecnologias digitais também surgiu as mesas digitalizadoras e os tablets onde se desenham diretamente na tela do dispositivo. Os dispositivos tecnológicos nos fazem refletir sobre o futuro do desenho, será que futuramente não será mais utilizado papel como fonte de registro de desenhos? Existem muitas opiniões diferentes, mas hoje em algumas áreas já não é mais utilizado papel, apenas desenham diretamente nas telas dos seus dispositivos.
O desenho na vida do designer
Figura 04: Conjunto de imagens de desenhos de Leonardo da Vinci. Fonte: DRAWINGS OF LEONARDO (2014).
Oscar Niemeyer também utilizou muitos croquis (Figura 05) como forma de desenho rápido para representar seus projetos.
Figura 05: Conjunto de imagens de croquis de Niemeyer, Catedral de Brasília e Congresso Nacional. Fonte: SKY SCRAPER CITY (2014).
O desenho entra na vida do ser humano ainda na infância, é onde as crianças gostam de desenhar e é por isso que desenhar acaba ficando lembrado como “coisa de criança” e muitas vezes não é levado a sério. Percebemos também que as crianças são desestimuladas a desenhar, e isso fica mais crítico quando completam dez anos de idade, pois se entende que já não são crianças pequenas e tem que ter outras responsabilidades, e vão crescendo e com eles aumentando a dificuldade em desenhar também, até que chegam às universidades e não sabem mais como se desenham. Toda criança tem sua fase de rabiscos, que são, na verdade, expressões das curiosidades, das tentativas e descobertas, e que jamais devem ser reprimidas pelos adultos, as conhecidas “garatujas”, uma palavra que significa escrito ou desenho mal feito. São os chamados traços aparentemente sem nexo ou sentido que as crianças pequenas iniciam, geralmente quando completam um 01 ano de vida, cuja tentativa é
a de representar o mundo que as cercam. Como visto, esse processo de rabiscar e desenhar é nato no ser humano. (NAKATA/SILVA, 2012).
Ainda na universidade, percebemos que muitas delas não oferecem em sua grade curricular a disciplina de desenho, não desenvolvendo todos os potenciais de seus alunos, e não cumpri o objetivo dos cursos de graduação em Design, pois é desenhando que os designers se comunicam em seus projetos. Então é possível pensar e refletir, porque as universidades não dão a devida importância nas disciplinas de desenho? Elas deveriam dar mais importância a essas disciplinas? O mercado de trabalho enxerga o processo de desenho como brincadeira ou algo de criança dentro do processo criativo? Vemos também no mercado de trabalho que designers não tem o tempo suficiente para focar no processo criativo, tendo que ter soluções rápidas e pouco pensadas para seus problemas. Os estudos das técnicas de materiais expressivos, do desenho de observação, propiciam o desenvolvimento da percepção visual dos designers. A universidade não oferece essas opções, e o que observamos é que jovens designers estão se formando com portfólios cheios de teorias e pobres em projetos idealizados e expressos por sketches. No entanto, o trabalho que é desenvolvido no mercado é praticamente todo visual. (NAKATA/SILVA, 2012).
Também vemos os alunos de design ignorando o desenho manual devido as novas tecnologias que estão cada vez sendo mais utilizadas em computadores, softwares, tablets, etc. Porém o uso dessas ferramentas limita o designer a atingir seu total potencial, pois acabam pulando etapas essenciais da ideias, mas os designers que já desenham muito bem, conseguem explorar com mais facilidade e atingem melhores resultados. Os alunos deveriam se conscientizar e treinar mais as técnicas de desenho manual?
Para a arquitetura e o design, desenhar é tão importante quanto escrever, mas arquitetos, designers e estudantes têm deixado de lado para utilizar ferramentas digitais, perdendo ou mesmo não despertando a criatividade desenvolvida pela ação de coordenar mão/olho/ cérebro (NAKATA; SILVA, 2012);
Diante disso, percebemos um domínio e manuseio das ferramentas digitais, que se torna cada vez mais uma prática habitual. Esta generalização passa a ser tão ampla que, em alguns cursos de ensino superior, questionamse o significado e importância do croqui como uma das fases do processo criativo, nesta nova metodologia de projeto. (MARTINO, 2007, p. 01)
A importância do Sketch Em design a palavra que melhor define esboços ou rascunhos é sketch. Resumindo o significado de esboço segundo o Dicionário On Line de Português é primeiro traçado de um desenho ou de um projeto de arquitetura, onde se indicam somente o conjunto e as divisões principais da obra. Tem como sinônimos as palavras bosquejo, debuxo, desenho, escorço, rascunho e traçado. Os termos rascunho, esboço ou até mesmo croquis, possuem basicamente na sua essência o mesmo valor de significado. São caracterizados por desenhos rápidos, com o objetivo de expressar graficamente uma ideia ou conceito e considerados como o gesto ou ataque do artista frente ao papel. (NAKATA/ SILVA, 2012). Desenhos são testemunhas do processo criativo...e, de modo mais imediato que trabalhos publicados, dão uma compreensão a respeito da vida espiritual de um artista. Assim, eles são documentos de peso para o estudo e entendimento da atividade do artista. Woldemar vom Seidlitz. (PIPES, 2010).
84 Rascunhos são estudos preliminares, são o ponto de partida para que ideias sejam registradas e aos poucos modelando até obter o resultado final, facilitando a elaboração de ideias e suas modificações conforme for necessário. Sketch é basicamente um esboço, no design, é o termo utilizado representa uma técnica de esboços soltos e descompromissados, feitos por roteiristas de histórias em quadrinhos. Esboços podem e devem ser feitos em poucos minutos, de forma muito rápida, sem qualquer tipo de refinamento gráfico e sobre qualquer tipo de material. A ideia é que se registrem de forma rápida e que consigam trazer as principais ideias que vem na cabeça, pois as ideias não voltam mais e acabam perdendo informações que poderiam ser importantes. A agilidade também esta ligada a execução do desenho, pois o olho recebe a informação envia para o cérebro que encaminha estímulos para a mão desenhar, esse processo olho/mão/ cérebro acontece de forma muito rápida e pode se perder detalhes no desenho por não transmitir as ideias rapidamente para o papel. Um melhor acabamento será dado no desenho em outras etapas do processo criativo.
Materiais de desenho para Sketch Para criar então os sketchs com tanta rapidez e agilidade, existe ferramentas de desenho que tem essas características de serem fáceis de manusear e representar no papel uma ideia, essas ferramentas também conseguem representar os tipos de materiais mais usados em produtos e em desenhos como plásticos, madeiras, metais dentre outros. Como ferramentas mais utilizadas temos o grafite, lápis, lapiseiras, lápis de cor, aquarela, canetas esferográficas, canetas nanquim, marcadores, tintas, pastel e giz de cera, também é importante os suportes onde serão registrados os desenhos que são os papeis. Dependendo do tipo de ferramenta que será usado, varia também o tipo de papel que será
85 utilizado. Mas muitos designers e estudantes que não treinam desenho, não sabem utilizar e representar corretamente seus desenhos, mas deveriam pois melhoram a comunicação dos sketchs. A inserção dos computadores no processo de projeto alterou em muito as formas de se projetar. Modificou as possibilidades de manipulação do projeto e do processo criativo. Hoje é comum que muitos designers trabalhem à frente do seu computador, do começo ao fim do projeto sem colocar a mão no lápis. Porém, vários estudos e pesquisas que confrontam os meios tradicionais (lápis e papel) com os meios informatizados no processo criativo, apontam que o meio tradicional ainda leva vantagem em relação ao meio informatizado. (NASCIMENTO; NEVES, 2010, p. 118).
A mescla inteligente de recursos manuais e digitais de representação permite ao designer industrial potencializar sua competência em todas as fases do desenvolvimento de um produto, combinando a percepção do talento do artesão ao afinado senso analítico da engenharia. Os tradicionais meios manuais de representação, como o desenho à mão livre e as maquetes e mock-ups esculpidos manualmente, têm sido combinados ou mesmo substituídos por softwares gráficos 2D e 3D (em duas ou três dimensões), viabilizando novos produtos com a precisão do cálculo matemático e grande qualidade gráfica. (STRAUB et al, 2004, p. 10).
Conclusão Entendemos que o ato de desenhar modifica nossa vida e nosso comportamento enquanto designer nos fazendo enxergar mais detalhes, ser mais atento e sensível às possibilidades. O futuro no mercado de trabalho tende a diminuir o papel, hoje em dia, já é possível ver na área de comunicação visual o não uso do papel, trabalham diretamente nos dispositivos como tablets e computadores.
Porém muitos designers não conseguem utilizar de forma completa os softwares e suas ferramentas digitais pois na universidade ou na própria área de trabalho, não souberam utilizar e treinar os desenhos manuais, assim não conhecem todas as técnicas e não conseguem aplica-las nos programas. Muito também porque as universidades não dão a devida importância as disciplinas de desenho, então os alunos saem da graduação de design sem saber desenhar. O método de ensino nesse caso é sempre aprender primeiramente o desenho manual, para depois sim, adentrar nas tecnologias digitais e usufruir com conhecimento e maior qualidade os softwares que só tem a acrescentar se usado de forma concisa. O Sketch é uma ferramenta que auxilia o designer em sua profissão, nos permiti prever alterações e modificações de projetos, diminui gastos futuros, além de deixar o profissional da área mais completo e com uma visão com mais qualidade. É importante também nas etapas do processo criativo, geração de ideias, brainstorm, mapa mental, painel semântico, etc. pois a quantidade de desenhos é muito importante, além de seus detalhes. Essa técnica tem que ser mais utilizada em processos de criação, mas não estamos contra a tecnologia e nem é proposto deixar de utiliza-la, o pensamento é saber aplicar as técnicas de desenho para depois progredir para softwares que só tem a ajudar o ser humano a atingir níveis de maiores qualidades. Este artigo deixa claro que a tecnologia é de suma importância para os designers, não se desfazendo de nenhuma maneira como foi aplicado no artigo, apenas demonstrando a importância de um metodologia no ensino e no desenvolvimento, com desenhos manuais e posteriormente as ferramentas digitais. Também fica um espaço para futuras pesquisas a partir deste contexto, onde se possa investigar como as universidades estão formando profissionais e egressos e qual o perfil proposto para eles; como os estudantes e os profissionais andam trabalhando e desenvolvendo seus
projetos, quais os softwares e ferramentas digitais que utilizam ou existem no mercado de trabalho e indicar as principais técnicas de criatividade para se trabalhar juntamente com a técnica de sketch.
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DESIGN GRÁFICO
Aria: A importância da personagem feminina nos games Aria: The importance of female characters in games SANTOS, Ana Carolina Simões, Universidade Sagrado Coração
anacssnts@gmail.com SILVA, João Carlos Plácido Riccó, Universidade Sagrado Coração
joaocarlos_placido@hotmail.com
Resumo O mundo dos games tem crescido de maneira exorbitante, de forma paralela com a aproximação do publico feminino à esta forma de entretenimento, como demonstram pesquisas. Grupo esse que sempre fora negligenciado pela indústria, uma vez que os jogos seguem o cliché da “donzela em perigo”, protagonizando personagens masculinos como heróis com certa frequência, dentre outros aspectos degradantes à mulher moderna. Uma análise feita no mercado atual demonstra uma tentativa por parte dos desenvolvedores de inserir a mulher como protagonista nos games atualmente. Mas estas acabam sendo caracterizadas de forma fraca e sexualizada, afim de agradar o público tradicional masculino. Notando essa carência de personagens femininas realistas por parte da indústria, optou-se por desenvolver um concept-art de um game voltado, primeiramente, para o público feminino, fazendo uso de métodos de desenvolvimento de design para se chegar em um resultado mais completo, deixando-o preparado para o mercado atual. Palavras Chave: design gráfico, game design, concept-art
Abstract The world of gaming has grown exorbitantly, in parallel with the approach of the female audience to this form of entertainment, as shown by researches. This group has always been neglected by the industry, seeing that games follow the “damsel in distress” cliché, starring male characters as heroes with a certain frequency, among other aspects degrading the modern women. An analysis on the current market demonstrates an attempt by developers on introducing the women as the protagonist in games nowadays. But these characters end up being characterized poorly and sexualized in order to please the traditional male audience. Noticing the industry’s lack of realistic female characters, it was decided to develop the concept-art of a game aiming primarily the female audience, making use of methods of design development to achieve a complete result, leaving the project prepared for the current market. Keywords: graphic design, game design, concept-art
Introdução O faturamento do mercado de consoles de videogames no Brasil cresceu 43% em 2012, movimentando cerca de R$ 1 bilhão (Gfk, 2013) . Jogos como Super Mario já venderam mais de 290.260.000 unidades no mundo (Kotaku,
2010). Foi comprovado que 70% das mulheres entre 12 a 24 anos jogam videogames (Mitchel, USA Today, 2013). Apesar de ter grande aceitação pelo público feminino, são poucos os jogos que tem a mulher como protagonista de sua própria história. Durante a conferência do Xbox One, novo console da empresa Microsoft
90 que será comercializado em novembro de 2013, a empresa anunciou diversos jogos. Em uma apresentação de aproximadamente 1 hora e 30 minutos, a empresa anunciou o total de zero jogos exclusivos para Xbox One com personagem do sexo feminino como protagonista. O público feminino de videogames vem crescendo com o passar dos anos, mas ainda existe certa dificuldade por parte das empresas em desenvolver videogames com personagens do gênero feminino como protagonistas. Sendo assim, este projeto apresenta a conceptart (do inglês, arte-conceito) e o manual do game ”Aria”, com uma protagonista do gênero feminino. Serão apresentadas as concept-art dos personagens principais, cenários, mapa, gameplay, identidade visual e manual do jogo. Concept art é, de maneira sucinta, uma forma de ilustração digital ou tradicional que visa representar um personagem, figurino, cenário ou cena, antes que o produto final seja produzido. É considerado um rascunho do produto final, mostrando a evolução, adoção e exclusão de ideias no decorrer de um projeto. Concept-art é um processo utilizado em projetos de videogame, cinema, televisão, automóveis e até projetos arquitetônicos. Apesar de ser uma das etapas mais livres durante o desenvolvimento de um projeto, ao criar as concept-art, será levado em conta os seguintes princípios: o menor uso de estereótipos negativos em relação ao sexo feminino (como a sexualização e dependência em relação à outros personagens); sensibilidade ao evitar elementos simbólicos e culturais; criação de algo com quem o público alvo consiga se identificar e também ter o máximo de originalidade possível. O próprio ato de desenhar pode ser um modo de cristalizar a ideia vaga que vale a pena ou não perseguir. Frequentemente, a feitura de um esboço simples para expressar um conceito pode, em si mesma, sugerir futuras ideias conceituais. (Pipes 2007, p. 113)
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1 - Levantamento teórico 1.1 - Concept-art Segundo Novak (2011) a arte-conceito envolve a criação do personagem visto de diferentes ângulos (frontal, lateral, traseiro) usando rascunhos a lápis ou representações digitais planas. Seguindo esta linha, o artista deve criar desenhos, sketches e esboços dos personagens, cenários, e objetos. Também pode ser feito o uso de “storyboards”, imagens sequenciais que pretendem ilustrar determinadas cenas de maneira mais sucinta. Essa técnica foi desenvolvida por Walt Disney Studios durante o começo da década de 1930. [Concept art é a] arte capaz de traduzir ou vender uma ideia, de representá-la de forma que uma história possa ser lida; seja o resultado um elemento, um personagem, um ambiente ou um mundo inteiro de sonhos. Essa forma de arte pode ser expressa pela ilustração, escultura e muitas outras, é mais requisitada hoje pela indústria de entretenimento e é o âmago artístico por trás de um novo título de game ou filme vencedor de Oscar. Aqueles que assumem essa tarefa são altamente especializados, pois há uma demanda seleta para esse tipo de trabalho. (ZUPI, 2010, p. 04) Entendendo isso, a arte-conceito é a forma do designer pensar e propor um produto, mostrando a evolução de cada conceito, a adoção e exclusão de ideias, até chegar ao produto final. Frederic St-Arnaud relatou à Zupi (2010 p.37) que considera o melhor aspecto do concept-art o fato de não existirem regras ou um processo específico a ser seguido. Mesmo sendo considerada uma arte livre, o artista deve se atentar ao máximo em dar características únicas na aparência de um cenário, objeto ou personagem, de forma que o mesmo seja reconhecido com facilidade em relação aos outros, evitando estereótipos negativos. 1.2- Gênero fantasia Fantasia é um gênero de arte, literatura, games e até mesmo música. De maneira
simples e resumida, pode-se dizer que o gênero da fantasia é aquele que faz uso de aspectos e elementos irreais, como magia, animais falantes e elementos sobrenaturais. Um exemplo icônico são os livros do escritor J. R. R. Tolkien, como “O Hobbit” e “O Silmarillion“. Segundo Timmerman (1983, p. 1, tradução), o gênero da fantasia faz mais do que simplesmente reestruturar uma realidade que já conhecemos, pois oferece uma realidade paralela, que nos dá uma enorme e insaciável vontade de fazer uma pausa. E como o ritmo da vida moderna acelera inexoravelmente, o fascínio pela literatura de fantasia acelera simultaneamente. Na chamada “High Fantasy”, ou fantasia épica, faz-se uso de um mundo fantástico com seres, raças e elementos que diferem da realidade. Prickett (1970) é citado por Jackson (1981) quando diz que a fantasia épica é definida por uma história de um mundo muito rico e complexo para ser contido pelas convenções do naturalismo (p. 89, tradução). No projeto, os elementos usados de fantasia são: mundo fantástico que difere do mundo real; raças e espécies irreais; magia; civilizações com características medievais e elementos de monomito (também conhecido como Jornada do Herói), como visto na Figura 01.
Figura 01 – Diagrama Fonte: geracao-rasca.blogspot.com
O monomito é um conceito e padrão narrativo ciclico comumente presente em histórias de ficção, segundo o antropólogo Joseph Campbell, autor do livro “O Herói de Mil Faces”, onde retrata o conceito. Existem centenas de histórias com elementos do monomito, mesmo que muitas destas tenham sido escritas antes da análise desenvolvida por Campbell. Algumas das mais famosas delas são O Senhor dos Anéis (literatura, 1954), Star Wars (cinema, 1977), The Legend of Zelda (videogame, 1991), Final Fantasy VII (videogame, 1997), O Rei Leão (cinema, 1994), Homem de Ferro (cinema, 2008), Cisne Negro (cinema, 2010), Tomb Raider (videogame, 2013) e entre muitos outros. É evidente que o monomito é frequentemente usado em narrativas de literatura, cinema e videogame, independente do gênero da história sendo contada. 1.3- As mulheres dos videogames Nos meios de comunicação, em comparação com personagens do gênero feminino, personagens masculinos aparecem com mais frequência, falam mais, e interagem com comportamentos mais notáveis, tais como realização de tarefas e demonstração de liderança. (Thompson & Zerbinos, 1996, apud Mou & Peng, 2009, p. 923, tradução). Poucas são as personagens femininas que são representadas como independentes ou líderes. Personagens femininas também não constam nas listas de personagens mais populares do mundo. Os leitores da Famitsu Weekly (2010), a mais famosa revista de videogames do Japão, selecionaram seus 50 personagens favoritos da história dos videogames. Ao analisarmos esta lista, vemos com clareza que as personagens do sexo feminino mais populares no Japão são poucas e personagens masculinos são muito menos propensos a serem vistos e vendidos como objetos sexuais em comparação com as personagens do sexo feminino. A Tabela 01 a seguir mostra os 10 personagens, independente de gênero, mais populares dentro desta lista:
92 Tabela 01 – Personagens favoritos de 2010
Nome Snake Mario Cloud Strife Slimes de Dragon Quest Sora Link Yuri Lowell Amaterasu Pikachu Sonic
Gênero Masculino Masculino Masculino Não informado Masculino Masculino Masculino Feminino Não informado Masculino
Vendido como objeto sexual Não Não Não Não Não Não Não Não Não Não
Se ignorado os personagens homens, as 10 personagens do sexo feminino mais populares no Japão seriam as personagens conforme a Tabela 02 abaixo: Tabela 02 – Personagens femininos mais populares no Japão
Nome Amaretsu (8° lugar) Yuna (16° lugar) Sakura (17° lugar) Tifa Lockhart (19° lugar) Aerith Gainsborough (24° lugar) Lightning (34° lugar) Bayonetta (35° lugar) Chihaya Kisaragi (39° lugar) Mitsu Hatsune (45° lugar)
Vendida como objeto sexual Não Sim Não Sim Não Sim Sim Sim Não
93 Nene Anegasaki Sim (46° lugar) Personagens mulheres são mais propensas a serem representadas de forma hipersexualizada: estando parcialmente nuas, caracterizadas com imagem corporal irrealista e apresentadas usando trajes impróprios, sexuais e reveladores. (Mou e Peng, 2009, tradução). Analisando esta lista, onde 6 dentre 10 personagens são vendidas como objetos sexuais, fica bastante claro que o mercado de games consome esse tipo de interpretação do gênero feminino com grande naturalidade. Com exceção das personagens citadas na Tabela 02, a lista de personagens favoritos do Japão, segundo a Famitsu Weekly, consta com apenas mais 3 personagens do gênero feminino em sua lista, totalizando 13 personagens dentre 50. E, dentre estas 13 personagens, apenas 5 delas são protagonistas dos jogos dos quais são inseridas. Fora a sexualização de personagens femininas, também existem os clichés narrativos que essas personagens acabam sendo submetidas. O mais famoso desses clichés é o da “donzela em perigo”, onde uma personagem, comumente feminina e categorizada como “princesa”, se encontra em uma situação de perigo, mais comumente sequestrada, tornando-se o troféu do jogo. (TV Tropes, 2004, tradução) Alguma das donzelas mais conhecidas são Princess Peach Toadstool de Mario Bros, Princess Zelda de The Legend of Zelda, Pauline (ou Lady) de Donkey Kong, Aerith Gainsborough de Final Fantasy VII, Yuna de Final Fantasy X e Kairi de Kingdom Hearts, entre muitas outras. Muitas dessas personagens e/ou seus respectivos heróis constam nas tabelas anteriores (Link, Mario, Cloud, Aerith, Yuna e Sora), mostrando que este cliché é extremamente popular e aceito pelo público consumidor de videogames. O cliché da donzela em perigo acarreta na infeliz interpretação desses jovens e adultos que jogam videogames, que entendem
que mulheres não podem ser suas próprias heroínas, são todas objetos sexuais e devem ser consumidas dessa maneira. O público alvo falha em entender que mulheres podem ser seres independentes e fortes, visto que não foi isso que aprenderam com as mídias de comunicação durante a infância e juventude. Esse tipo de interpretação acarreta em jovens com falsas expectativas sobre mulheres, que pode resultar em depressão e outros transtornos mentais. Os estereótipos negativos são ativados de uma fonte, que expressa preconceito contra um alvo, fazendo com que o alvo possa vir a sofrer de depressão. (Cox, Abramson, Devine e Hollon 2012 p. 427, tradução) 3.2.1- História e conceito O Projeto Aria trata-se da concept-art e manual do game fictício chamado Aria. O game aqui desenvolvido conta a história de “Aria”, protagonista do gênero feminino da família real do reino fictício de Rhyllia que tem a missão de resgatar o trono de sua família da vilã Gergana. Gergana se apossou do trono logo depois da repentina e misteriosa morte do rei, viúvo da rainha, mãe de Aria. Sem a família real de Rhyllia, o reino caiu em desgraça. Aria deve enfrentar a poderosa rainha Gergana e criaturas místicas e poderosas. Uma dessas criaturas é “O Coruja”, homem encapuzado que visitou o castelo da família real com a promessa de curar a rainha, poucos meses antes das mortes misteriosas do rei e de sua esposa. Além d’O Coruja e de Gergana, Aria também é perseguida por um dragão gigante que trabalha sob o comando da nova rainha regente. Seu nome é “Hazsull, o gigante”. Hazsull tem a missão de manter a princesa Aria presa em uma torre do outro lado do continente, afim de que Gergana possa casá-la futuramente com algum rei ou príncipe de algum reino distante para criar novas alianças. Os estilos dos personagens estão demonstrados na Figura 02.
Figura 02 – Aria, Gergana, Coruja e Hazsull
O game faz uso do gênero literário da fantasia épica. É um game de ação-aventura, RPG e plataforma em terceira-pessoa, um gênero de games semelhante ao usado no game Tomb Raider (2013). A arte e concept-art do game foi desenvolvida imaginando-se que este seria publicado para a quarta geração de consoles de videogame (Ninentedo WiiU, Playstation 4 e Xbox One). Por isso tem atribuído para si grande riqueza de detalhes para personagens e cenários, como é demonstrado na arte finalizada a seguir de “Gergana no trono”, Figura 03.
Figura 03 – Gergana no trono
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6. Conclusão
Referências
São grandes os desafios de se desenvolver um game. Apesar deste projeto apenas realçar o desenvolvimento do concept-art geral, pôde-se entender o dia-a-dia e processo criativo no desenvolvimento de um projeto de video-game. É preciso ressaltar a necessidade de um processo de desenvolvimento bem direcionado. Neste projeto houve a necessidade de usar a criatividade de maneira organizada e direcionada. Todos os projetos, de design ou não, têm metas a serem cumpridas. Foi baseando-se no cumprimento de pequenas metas e prazos de entrega que o cronograma foi desenvolvido e usado de maneira efetiva. Quando visualizamos um projeto final de design mal podemos imaginar quantos desenhos diferentes foram desenvolvidos para chegar naquele produto. Esse tipo de desenvolvimento é encontrado em projetos de produto e projetos gráficos, e não seria diferente com um projeto de game. É muito interessante chegar no final de um trabalho como o aqui desenvolvido e poder analisar o desenvolvimento de cada traço, de cada personagem, graças ao artigo científico. Se assemelha muito a uma linha do tempo, e é um processo bastante rico. Para que este projeto fosse concebido, foram analisados vários processos de desenvolvimentos de filmes como O Rei Leão e de games como The Legend of Zelda: Skyward Sword. É clara a maior compreensão do trabalho como um todo quando esta linha de pensamentos é dividida com outras pessoas, de fora do projeto. Nesse brilhante compartilhamento de pensamentos e ideias, o designer pode contribuir com outros projetos que muitas vezes não tem nada em comum com o seu. Espera-se que este artigo possa guiar e servir de inspiração à outros designers no desenvolvimento de seus próprios projetos.
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Design gráfico circense: O legado dos cartazes no circo tradicional e a linguagem gráfica circense contemporânea. Circus graphic design: The legacy of the traditional circus posters and the contemporary circus graphic language. Barbosa, Caroline Carvalho; Universidade Federal de Minas Gerais.
carolzinhacb@hotmail.com
Resumo
Palavras Chave: Design gráfico; Circo; Cartaz; Cirque du Soleil.
Abstract The circus is a type of artistic expression of great value and contribution to humanity, being of great importance for graphic design with a huge legacy of posters, originated especially from Europe and North America. This article proposes research features such as color, typography and illustrations, in addition to the mode of production of posters of circus disclosure. Through the literature search and analysis of the graphic pieces used by traditional circuses and the contemporary circus, Cirque du Soleil, it was possible to identify all of these points and finally make a qualitative comparison of the visual aspects found. Keywords: Graphic design; Circus; Poster; Cirque du Soleil.
Assim como tudo aquilo o que necessitava de divulgação na crescente sociedade capitalista do século XIX, o circo foi um grande adepto na utilização de cartazes para a divulgação de seus espetáculos. Esse tipo de material publicitário possuía os requisitos de “[...] seduzir, exortar, vender, educar, convencer e atrair” (SONTAG, 2010, p.210) que visavam justamente àquilo que todos os novos empreendimentos mais desejavam: “[...] estimular uma crescente parcela da população a gastar dinheiro em
do público, e misturadas aos diferentes estilos tipográficos conseguiam passar o aspecto lúdico transmitido pelo circo.
Os cartazes tipográficos
O circo é um tipo de expressão artística de grande valor e contribuição para a humanidade, sendo de grande importância para o design gráfico com um enorme legado de cartazes, oriundos principalmente da Europa e América do norte. O presente artigo propõe pesquisar características, como cores, tipografia e ilustrações, além do modo de produção dos cartazes de divulgação circense. Através da pesquisa bibliográfica e a análise das peças gráficas utilizadas pelos circos tradicionais e pelo circo contemporâneo, Cirque du Soleil, foi possível identificar todos esses pontos e por fim fazer uma comparação qualitativa dos aspectos visuais encontrados.
O cartaz como principal peça gráfica utilizada pelos circos tradicionais
Até o surgimento de outros meios de comunicação e o desenvolvimento da tecnologia virtual, os cartazes foram as peças gráficas que mais conseguiam retratar ao espectador, o mágico, misterioso e glamoroso mundo circense. Em princípio, a divulgação dos shows era feita através das fontes gigantes dos cartazes impressos por tipos de madeira. Em seguida vieram os famosos e chamativos cartazes litográficos, que permitiam a reprodução de gravuras realistas em cores.
bens de consumo de baixo valor, diversão e arte” (SONTAG,2010, p.212). Também de acordo com Sontag (2010, p.210) “[...] o pôster procura atrair aqueles que, em outras circunstâncias, poderiam ignorá-lo [...]”, pois “[...] ele chama atenção a distância [...] e é visualmente agressivo”, justamente o que circo precisava. Segundo Cockerline (1995, tradução nossa): “O circo gastou mais com publicidade do que qualquer outro componente do seu funcionamento, e para a maioria dos shows da história, o cartaz foi o elemento mais importante. Devido a isso, os cartazes constituíram como um dos principais produtos da indústria de impressão comercial ao longo do século 19.”
Até meados do século XVIII, a impressão tipográfica, através dos tipos em madeira, foi o principal processo utilizado para a fabricação de peças promocionais. Os cartazes tipográficos circenses seguiam basicamente o padrão da maioria dos impressos publicitários da época: orientação vertical; o uso de uma “[...] combinação de tamanhos de tipos e estilos definido em linhas horizontais, com um alinhamento central ou justificado, formando uma unidade visual” (BELLA, 2012, tradução nossa); além de outros elementos gráficos, como linhas, sombreamentos e pequenos desenhos. As letras de estilo toscano e decorativas foram uma das mais utilizadas pelo circo tradicional, tanto que estas se tornaram um ícone comum de referência do mundo circense para muitas pessoas. As letras sem serifas, em seu início, normalmente não tinham um uso de destaque como aconteceu em outras décadas. Estas eram usadas apenas para subtítulos e pequenas legendas que normalmente apareciam abaixo das enormes e decoradas fontes de exibição (MEGGS; PURVIS, 2012). Alguns dos cartazes tipográficos também fizeram o uso de cores (fig.1), porém como a impressão colorida ainda era pouco desenvolvida, os pigmentos encontrados raramente variavam do amarelo, vermelho e azul, o que futuramente pode ter ajudado a criar uma identidade visual cromática circense. As cores também ajudavam a atrair a atenção
Figura 1 - Cartaz circense utilizando a cor azul e vários estilos tipográficos, 1883.
Com o passar do tempo, a presença exclusiva da tipografia não estava satisfazendo as companhias circenses, que começaram então a inserir algumas ilustrações nos cartazes (fig.2). A impressão dessas imagens também era relevográfica , obtida por meio de blocos de madeira esculpidos.
Figura 2 - Exemplo de cartazes tipográficos com uso de cores e imagens.
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Os cartazes litográficos A partir de 1870 a impressão tipográfica começou a perder um grande número de clientes para outro tipo de impressão que vinha se aprimorando e ainda possibilitava a produção de cartazes ainda mais ilustrados e coloridos: a litografia . Uma das principais características dos cartazes circenses, em grande maioria, foi o uso das ilustrações naturalistas. Esses desenhos ajudavam a retratar um mundo mágico e fantasioso, mostrando, pessoas, criaturas e movimentos que não faziam parte do dia-adia da sociedade (fig.3). Com as ilustrações, os circos também tinham uma maior liberdade criativa, permitindo a manipulação e uso de montagens de imagens, que até mesmo uma fotografia não conseguiria compor naqueles tempos (fig.4). Em alguns cartazes também é possível encontrar retratos referentes aos donos das companhias circenses (fig.5).
Figura 5 - Litografia com retratos de organizadores do espetáculo, 1908.
A tipografia empregada nos cartazes também se apossou da liberdade de movimento que a litografia permitia. A maioria dos textos eram desenhados em linhas curvas ou diagonais (fig.6). Apesar disso, as fontes simples, sem serifas, contornadas nas cores vermelha, amarelo ou azul, normalmente eram repetidas em várias peças de diferentes circos. Nesses cartazes a imagem, quase sempre, tinha o papel principal de persuasão e a tipografia não podia ofuscá-la.
uma unidade padrão chamada sheet, ou folha, que continha aproximadamente um metro por setenta centímetros. “Estas dimensões foram baseadas nas dimensões padrão de uma pedra litográfica que um único homem poderia manipular ou transportar” (COCKERLINE, 1995, tradução nossa). Para produção dos cartazes, os circos também podiam pedir tamanhos múltiplos da medida padrão, assim as peças eram produzidas separadamente e depois coladas como um quebra-cabeça nos muros e paredes das cidades. Além disso, algumas companhias também faziam vários tamanhos menores que o padrão para ocupar outros pontos do local em que passavam, como janelas e balcões de lojas. Como se pode perceber, em diversos cartazes circenses as cores utilizadas eram vibrantes e assim como nas peças tipográficas, houve o uso repetitivo das cores vermelho, amarelo e azul. Essas peças gráficas conseguiam produzir imagens incrivelmente detalhadas e naturalistas usando apenas algumas poucas cores. Cockerline (1995) afirma, no entanto, que há alguns raros cartazes que utilizaram até quatorze cores diferentes, gerando ilustrações incrivelmente realistas (fig.7).
Figura 3 - Ilustração com cena surreal envolvendo animais.
Figura 6 - Tipografia em movimento com a ilustração litográfica.
Figura 4 - Cromolitografia com visão érea do espetáculo, 1890.
De acordo como Cockerline (1995, tradução nossa) “as dimensões dos cartazes circenses são extremamente importantes historicamente, e podem ajudar a identificar o período de produção”. Inicialmente os tamanhos desses cartazes eram totalmente aleatórios, dependo apenas do tamanho da pedra de impressão que iria ser utilizada. Porém com a popularização da litografia, assumindo, portanto, grande parte da indústria gráfica, os impressores decidiram padronizar as medidas dos cartazes, adotando
os artistas eram divididos por especialidades: “[...] um único artista era especializado em desenhar letras, enquanto outro era especializado em cavalos, e um terceiro especializado em retratos das estrelas circenses [...]. Os artistas se tornaram tão hábeis em seu ofício que alguns projetos eram executados diretamente sobre as pedras litográficas, fazendo desenhos conceituais desnecessários.” (COCKERLINE, 1995, tradução nossa)
Grande parte dos cartazes circenses se enquadra em uma categoria denominada stockposters, que eram projetos de ilustrações prontas e genéricas que podiam ser utilizadas por qualquer circo que as comprasse (fig.8). Isso acontecia, pois as impressoras litográficas normalmente tinham que produzir grandes tiragens em um curto espaço de tempo, e acabavam elaborando um estoque de desenhos prontos para impressão. Grande parte das empresas já deixava um catálogo de projetos prontos, bastava o dono ou funcionário do espetáculo, responsável pela divulgação, escolher o que mais o agradava, e acrescentar o nome do circo. Os stockposters, além de mais práticos, eram também mais baratos, o que possibilitava a divulgação dos circos menores (COCKERLINE, 1995). Esse tipo prática é comum até hoje, com a existência de bancos de imagens que abrigam milhares de fotografias e ilustrações prontas, no qual o designer pode pagar para utilizá-la em um de seus projetos.
Figura 7 - Litografia hiper-realista do Ringling Bros Circus, 1900.
A produção de um cartaz circense, desde sua concepção até seu acabamento, era um esforço de equipe, feito por vários funcionários que se dividam em setores, como qualquer sistema fabril. Na fase de projeção do layout do cartaz,
Figura 8 - Exemplo de um Stockposter com uma ilustração utilizada por dois circos diferentes. .
A partir do século XX alguns artistas que trabalhavam no projeto de litografias, começaram a se destacar pela grande
100 habilidade na geração de layouts para os circos. Assim alguns deles eram contratados pelas companhias para executar projetos inteiros e exclusivos. Essas peças únicas normalmente traziam como destaque alguma celebridade circense ou a representação de atos específicos daquele grupo de artistas.
“Provavelmente, a maior imagem já produzida como um projeto de pôster circense foi a de um tigre pulando, desenhado pelo ilustrador Charles Livingston Bull em 1914 (fig.9).” (COCKERLINE, 1995, tradução nossa)
101 também determina toda a coreografia e trilha sonora. Assim para a promoção de cada show é elaborada uma nova identidade visual, que reflete um pouco da história que será retratada. Nas peças gráficas dessa companhia também se percebe algumas características do design pós-moderno. A própria vontade de rompimento com estética predominante encontrada nos cartazes de circos tradicionais, já era um indício deste novo ideal presente. Um dos maiores pontos de ruptura do design gráfico utilizado pelo Cirque du Soleil, com o circo moderno, foi o uso da imagem conceitual e abstrata, tendo como o maior exemplo desse aspecto, o cartaz de divulgação do espetáculo Kooza (fig.10). Toda a tipografia encontrada no material gráfico do Cirque é projetada ou modificada especialmente para determinado show. Ela consegue envolver o espectador com suas formas e cores que traduzem o conceito do espetáculo, além de brincar e interagir com os outros elementos visuais presentes, como no cartaz do show Ká (fig.11).
Figura 9 - Litografia de Charles Livingston Bull.
O circo contemporâneo: a linguagem gráfica do Cirque du Soleil O Cirque du Soleil revolucionou não só o mundo dos espetáculos como também a divulgação dos shows circenses por meio do uso de uma nova linguagem gráfica e novos suportes. Os cartazes agora, em sua maioria, são difundidos no meio virtual, pela internet, e a divulgação impressa é feita por outros suportes, como outdoors. As características das peças de divulgação produzidas para o Cirque se aproximam muito do mundo cinematográfico, que também faz grande uso da manipulação fotográfica para criação dos cartazes de divulgação dos filmes. Os espetáculos, diferentemente dos circos tradicionais, são regidos por um tema, que
Figura 10 - Cartaz do espetáculo Kooza.
Figura 12 - Sensação de movimento na ilustração litográfica e na composição fotográfica do Cirque du Soleil.
Figura 11 - Cartaz do epetaculo KÁ..
Análise comparativa entre a linguagem gráfica circense tradicional e a contemporânea O circo tradicional e o circo contemporâneo não se diferem apenas pelas caraterísticas performáticas, como também nas peças gráficas utilizadas para a promoção de seus shows. A época em que ambos apareceram e se popularizaram como forma de entretenimento, certamente influenciou o aparecimento e o uso de determinados elementos visuais, além dos suportes utilizados para difundir o material de divulgação. Algumas dessas características gráficas sofreram grandes mudanças entre as duas concepções de circo, porém outros aspectos ainda predominam até hoje. A necessidade da imagem naturalista é uma das características que se repete no design circense até hoje, mesmo após o início da utilização de elementos abstratos pelo Cirque du Soleil. Por meio de ilustrações ou manipulação fotográfica, os circos conseguem atrair espectadores, demonstrando o mundo mágico e fantasioso presente nos espetáculos. A dinâmica dos personagens e elementos da cena é outro traço em comum, sendo raros os cartazes circenses que apresentam um cenário estático e sem qualquer representação de movimento (fig.12). A diferença é que nos cartazes dos circos tradicionais os desenhos exibiam varias cenas, que eram cheias de detalhes e componentes decorativos, enquanto as peças gráficas do Cirque buscam reduzir a informação visual a uma imagem (fig.13).
Figura 13 - Cartaz litográfico com a presença de varias cenas e peça gráfica do Cirque du Soleil com o foco em apenas uma cena.
Outro elemento gráfico importante para a divulgação dos circos é a tipografia. Os circos modernos quase sempre seguiam certa padronização, tanto nos cartazes tipográficos, que se utilizava de modelos e estilos limitados, como nos cartazes litográficos, que mesmo permitindo uma maior liberdade de criação do layout se utilizava de estilos e cores bastante parecidos. Ao contrário dessa padronização, o Cirque du Soleil traz uma nova linguagem tipográfica, totalmente livre, que se define de acordo com tema do espetáculo. As cores utilizadas nas peças promocionais de ambos os circos, também possuem certa semelhança por, quase sempre, apresentarem uma vibração intensa. Apesar disso, pode-se perceber que o material de divulgação do Cirque du Soleil possui uma maior gama de cores e tonalidades diferentes das que normalmente eram utilizadas pelo circo tradicional. O uso recorrente das cores amarela, vermelha e azul, nos cartazes litográficos, provavelmente se deve pelo tipo de tecnologia de impressão utilizada, que
102 dificultava a utilização de uma grande variação de cores, já que para a impressão de cada uma delas necessitava de uma nova pedra. Logo, percebe-se que o design gráfico circense se altera de acordo com a mudança de concepção do próprio espetáculo ao passar dos séculos. Também se pode afirmar que a transformação da sociedade, ao longo da história, e a evolução das tecnologias de impressão e de criação gráfica, foram fatorares relevantes que levaram às novas variações do design circense. Ainda sim, apesar de ter sofrido grandes mudanças, alguns elementos ainda preservam características visuais tradicionais presentes em um circo, como as imagens naturalistas e as cores vibrantes, além de continuar refletindo a mistura cultural e étnica presentes nesse tipo de espetáculo, ao combinar elementos gráficos de diversos estilos.
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Referências
1.Introdução
BELLA, Peter. Thypography & the American Circus Poster. Disponível em: <http:// peterbella.com/blog/circus-posters-typehistory/>. Acesso em: Janeiro de 2013. COCKERLINE, Neil C. Ethical Considerations for the Conservation of Circus Posters. WAAC Newsletter, Volume 17, n.2. Maio de 1995. MEGGS, Philip ; PURVIS, Alston. Meggs’ History of Graphic Design. 5ª.ed. Nova Jersey: Wiley Publisher, 2012, 624p. SONTAG, Susan. Pôster: anúncio, arte, artefato político e mercadoria. Trad. Fernando Santos. In: BIERUT, M., HELFAND J., HELLER S., POYNOR, R. (Orgs.). Textos clássicos do design gráfico. São Paulo: Martins Fontes, 2010, p. 210235. VILLAS-BOAS, André. Produção gráfica para designers. Rio de Janeiro: 2AB, 2008, 192p.
Este projeto aborda a temática dos livros infantis sem texto e pré-livros, usandose a concepção de Munari (1981) e Linden (2011), suas fundamentações, seus conceitos, características, criação e produção. Especificamente, apresenta o projeto experimental de um pré-livro que busca mostrar para a criança, de forma lúdica, o que é design gráfico. Através de pesquisa teórica, o produto busca estar de acordo com a linguagem infantil. No Brasil, ainda há muitos analfabetos, semianalfabetos ou pessoas que abandonam os estudos, os quais nunca leram um livro. Segundo Paiva (2010), crianças não leem mais por não serem incentivadas, o que muitas vezes causa “fracasso escolar do aluno e futuramente seu fracasso enquanto cidadão”. Novas iniciativas precisam ser tomadas, buscando criar instrumentos que capacitem o leitor infantil. Bier (2004) afirma que é necessário
Design gráfico para crianças: criando um pré-livro sobre design Graphic design to children: creating a pree-book about design Biazi; Naiane Quirino de. Universidade Estadual Paulista
nane_ic14@hotmail.com Domiciano; Cássia. Universidade Estadual Paulista
cassiacarrara@gmail.com
Resumo Para criar um livro, um adulto não pode pretender transmitir a realidade do seu ponto de vista, segundo Bier (2004, p. 51), a criança irá rapidamente perder o interesse diante do livro, ou então, incitará, indiretamente, a mudar o sentido da mensagem, caso se estabeleça, apesar de tudo a comunicação. Esse é um artigo de um “pré-livro” criado que busca explicar para a criança - de forma indireta – o que é design gráfico, e para isso, pesquisou-se bibliograficamente a melhor forma para estar de acordo com a linguagem infantil. Palavras Chave: designer gráfico; design editorial; leitor criança.
Abstract To create a book, an adult may not want to convey the reality of his point of view, according to Bier (2004, p. 51), the child will quickly lose interest on the book, or encourage, indirectly, to change the meaning of the message, if it is established, after all the communication. This is an article about a “pre-book” created that seeks to explain to the child - indirectly - what is graphic design, and to make this possible we looked at Bibliographically the best way to comply with the children’s language.. Keywords: graphic design; editorial design; child reader.
Conhecer e considerar a origem e a evolução da linguagem da criança; conhecer também o mecanismo mental e sensitivo delas, e, para tal, analisar sua evolução nas diferentes etapas atravessadas por sua psique, para saber qual a literatura mais atraente e em que quantidade e oportunidade servirá aos diferentes interesses e tendências da criança (BIER, 2004)
Os autores precisam ainda conhecer e mergulhar no mundo poético da criança, identificando-se com ela e criando uma obra descontraída e alheia às convenções (BIER, 2004). Segundo Lins (2001, p. 37), é preciso verificar o que as crianças de cada tempo têm acesso, não se tratando de valorizar o modismo, apenas prestando atenção que a partir do século XXI houve significativo aumento de “informações fragmentadas pelo controle remoto e pela velocidade com que são transmitidas, superpostas e tendo as mais variadas mídias como suporte”. O trabalho desenvolvido busca essa “nãoconvencionalidade”, com textos visuais que
possibilitam leituras múltiplas, buscando uma solução específica que cada livro deve ter. Como não há palavras, o texto verbal só se constrói quando a criança interage com o objeto, sendo assim, um livro/objeto interativo. O pré-livro é indicado para crianças de 3 a 7 anos. O tema escolhido para o projeto foi o design gráfico como profissão, onde se buscou apresentar ludicamente o que um designer faz.
2. Objetivos O objetivo do produto é possibilitar que a criança conheça desde cedo a profissão e a trate como qualquer outra. Além de pouco conhecido, o design é pouco valorizado, mesmo estando presente em muitas coisas do nosso dia a dia. Se perguntarem às crianças se elas gostariam de ser designers, muitas delas vão se perguntar “o que é isto?” Já as profissões mais conhecidas, como atores, engenheiros, médicos, são mostradas para a criança através de brinquedos, desenhos, filmes, etc. Segundo Meggs (2010), pode-se considerar que entre os estudos de um designer inclui-se: tipografia, ilustração, história da arte, identidade corporativa, sistemas visuais, imagem conceitual e revolução digital, os quais serão o foco do livro.
3. Materiais e Métodos Nesta pesquisa utilizou-se primeiramente de materiais bibliográficos, pesquisando imagens digitais, uso de seminários apresentados em sala de aula como referência e testes de materiais. As imagens utilizadas na maioria do projeto foram retiradas do acervo pesquisado digitalmente, sendo muitas modificadas, como exemplo da Figura 1.
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105 anseios estéticos de todas as partes envolvidas, além de atender às expectativas emocionais e psicológicas do público leitor que escapam da teoria e de toda a metodologia de trabalho. (LINS, 2001, p. 44)
Figura 1- Figura retirada de http://desenhoparacolorir.net/ desenho-de-hamburger-para-colorir e modificada pela autora.
Também se utilizou de imagens de marcas conhecidas, como logos de empresas alimentícias e televisivas (TV Globo, SBT, Burguer King, etc.). Para construir e entender o funcionamento de imagens em 3D, se utilizou de referências sites como “comofazer.wiki” o qual disponibilizou um molde de óculos 3D para ser impresso e testado. Assim, o trabalho teve seu início no momento de pesquisa para realização de seminário, posteriormente foi feita a pesquisa bibliográfica e acervo de imagens, e então se fez o layout das páginas de forma digital, usando o programa do Adobe Photoshop CS6 e Adobe Illustrator CS6, e então, as páginas foram impressas e montadas, adicionando texturas a algumas, e recortes em outras, e por fim as páginas foram unidas para formar o livro.
4.Desenvolvimento: O livro infantil ilustrado 4.1 Breve história e aspectos do livro infantil Sabe-se que existem vários tipos de livros voltados para a criança, mas para sua criação é preciso pesquisar vários aspectos do público alvo, do mercado e as técnicas disponíveis. Sendo um produto industrial, o livro infantil está sujeito a imposições técnicas e pedagógicas, é resultado de um trabalho artístico e cooperativo e, como tal, tem que responder aos
Atualmente, existem várias técnicas para se ilustrar livros infantis graças aos novos recursos, utilizando-se desde o grafite, tintas até as formas digitais, além de serem impressos em materiais diferentes do papel, como madeira, pano, plástico e metal. Há também livros com sons, digitais, com cheiro e com variedade de recurso tátil e de texturas. Esses livros de diversos estilos e materiais “além do enriquecimento visual, incentivam o espírito criativo da criança na busca de soluções alternativas e no relacionamento com a diversidade” (LINS, 2001, p. 47). Sabe-se que nem sempre tivemos essa variedade de opções e essa afirmação do espaço e status da imagem, sendo a xilogravura, até o final do século XVIII, a única técnica que permitia compor numa mesma página caracteres e figuras, com mais facilidade e rapidez, e foi com ela que se realizaram os primeiros livros para criança que continham essas imagens, afirma Linden (2011). Segundo a mesma autora, ainda no final do século XVIII, Aloysius Senefelder desenvolveu a litografia que possibilitava desenhar diretamente na pedra utilizando lápis, pincel ou penas. Assim, foram sendo desenvolvidas formas diferentes de diagramar páginas de livros, misturando tipografia e imagens. No século XIX, ilustrados como Bertall e Randolph Caldecott, passaram a usar o estêncil para criar imagens coloridas, sempre buscando usar pequenos textos relacionados junto a elas. Segundo Linden (2011), em 1919 o livro de Edy-Legrand, Macao et Cosmage, consagra a inversão da relação de predominância do texto sobre as imagens, utilizando texto curtos e imagens com cores atraentes, privilegiando-as. Munari (1998, p. 218) cita que os primeiros livros sem textos, feitos com diferentes materiais, foram expostos em 1950, em Milão,
sendo que um desses livros foi, posteriormente, editado pelo Museu de Arte Moderna de Nova Iorque. Treze anos depois, em 1963, Maurice Sendark introduz uma nova concepção da imagem, que segundo Linden (2011), passa a representar o inconsciente infantil na obra Onde vivem os monstros, ainda buscando a atenção para as ilustrações. Com a fundação em 1965 da editora L’École des Loisirs por Jean Fabre e Arthur Hubschmid, grandes artistas se dedicaram a criar livros infantis ditos “de qualidade” e que procuram técnicas diferentes, como a utilização de imagens abstratas, fotografia, sem presença de textos, entre outros. A partir daí, novas editoras foram sendo formadas e muitos livros infantis de estilos diferentes foram criados, até chegarmos a livros altamente tecnológicos, interativos e digitais. Observa-se o retorno da utilização do lápis de cor, da tinta, xilogravura e colagem, pois com o scan fica mais fácil editar e reproduzir em série, todavia, há grande dificuldade de se dizer o que foi feito digitalmente e o que não foi. Percebe-se que desde sempre há uma grande variedade de estilos de ilustrações, formatos, diagramações, molduras etc., que não precisam seguir nenhuma norma. No pós-guerra, artistas que trabalharam para a revista The New Yorker foram chamados de cartunistas, já nos livros ilustrados infantis de Christophe Besse percebe-se “um traçado magistral, irregular e expressivo” (LINDEN, 2011, p. 40) possuindo caricaturas, que também pode ser associada a cores acentuadas. Linden ainda diz que por influência de Alain Le Saux, alguns ilustradores têm o seu trabalho com cores densas, contornadas com espessos traçados de tinta preta, com uma marca vívida do pincel que demonstram emoções e que se perpetua hoje em dia, mas com menos efervescência. Ainda há vários outros estilos, como efeito de espessura da tinta; materialismo, minimalismo e caderno, que são livros que se assemelham ou imitam cadernos escolares. A respeito de formatos, percebemos que há livros verticais, horizontais, quadrados e com outras formas geométricas ou irregulares,
além de possuírem ou não dobras e facas especiais. Segundo Lins (2001), o formato mais comum é o BB, com folha no tamanho 66 x 96 cm, utilizando-se um papel inteiro, dobrado e cortado até o formato final do livro, chamando isso de “caderno”. É válido lembrar que o número de páginas é sempre múltiplo de 4. A diagramação de um livro ilustrado tem maior variação quando o livro possui textos, podendo ele estar associado, dissociado, compartimentado ou em conjunto com a imagem. Segundo Linden (2011, p. 84), “quanto mais o tipo de diagramação se impõe claramente nas primeiras páginas, mais o efeito de ruptura de revela eficaz”, assim, é preciso impor o estilo da diagramação principalmente nas duas primeiras páginas. A tipografia em um livro ilustrado pode variar bastante. Texto e imagem devem estar na mesma linguagem, se comunicando; o tamanho dos caracteres, a cor, o formato, disposição na página, tudo é importante e traz efeitos diferentes, mesmo quando é colocado o texto separado da imagem; quando colocados juntos, as palavras se tornam ilustrações. O ilustrador Jean Alessandrini mostra isso realizando uma “iconicidade” do texto apresentando imagens feitas de tipografia. 4.2. O leitor de livro ilustrado Segundo Linden (2011, p. 29) uma das especificidades do livro infantil é atingir o público adulto, que é o mediador, pois compram o livro e muitas vezes o lê para o público alvo, tal atitude gera inúmeras repercussões, pois “de fato editores e criadores orientam seus projetos mais ou menos em função das supostas expectativas dos mediadores”, sendo esses mediadores pais ou educadores. Apesar de ter leitores adultos e infanto-juvenis, o livro ilustrado não tem o mesmo alcance que as HQs, por exemplo, mas ainda busca atingir mais leitores que não sejam apenas esses mediadores citados anteriormente. Designers gráficos e ilustradores buscam esses livros, que não são dirigidos ao público infantil, em função de “suas qualidades formais e, seguramente, pela liberdade que ele oferece” (LINDEN, 2011, p. 31).
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5. Criando o livro sobre design: “Mamãe, quero ser designer” Até poucos anos atrás no Brasil, o ilustrador“era contratado apenas para executar as ilustrações e a sua participação na produção do livro era mínima e até evitada tanto pelas editoras quanto pelos próprios artistas” (LINS, 2001, p. 55), vemos que atualmente o projeto gráfico de livros infantis é, muitas vezes, executado pelo ilustrador, que passa a ter o papel de projetista gráfico também – assumindo papel do designer -, tento assim maior controle sobre o resultado do livro. Segundo a obra de Guto Lins (2001) “Livro Infantil?”, os livros infanto-juvenis precisam seguir algumas divisões, sendo elas: 1ª Capa, com título, editora, nome do autor; 4ª capa, com textos de venda ou bibliografia do autor, ou apenas com o código de barras; 2ª e 3ª capas, normalmente em branco; folha de guarda, que correspondem à 1ª e última página do livro, que podem ser auxiliares para acabando ou acrescentarem informações; folha de rosto, contendo praticamente os mesmos dados da capa, podendo ter acrescido o nome do ilustrador e número de edição; dedicatória, que contém um texto curto que ocupa uma página inteira; miolo, com todo o corpo do livro, com páginas numeradas ou não; e créditos, com dados bibliográficos. Lins também recomenda a construção de um “boneco” antes de montar o livro original, para ter-se definido o formato e tamanho do livro e fazer-se testes. O boneco pode começar apenas com rabiscos, e à medida que o projeto vai evoluindo ele vai se tornando cada vez mais parecido com o livro final. Assim, o livro a ser criado foi planejado no papel e iniciado digitalmente, foi necessária a montagem do layout no programa Adobe Photoshop e com auxílio de uma mesa digitalizadora. O tamanho das páginas no layout foi de 21 x 38, utilizando apenas a metade (21 x 19) para posteriormente possibilitar a dobra da folha impressa (Figura 2).
placas que indicam masculino, feminino e deficiente físico. Na próxima página, de número cinco, optou-se em criar uma embalagem fictícia para doces, colocando uma imagem de uma tesoura e uma cola, indicando para a criança recortar, montar e colar a embalagem (Figura 4).
acabamento. As páginas, a capa, a contracapa e as figuras auxiliares foram impressas em folha A3 140g/ m², por ser mais espessa, e foram recortadas (Figura 5) e montadas cada uma do seu jeito. Nas páginas onde a brincadeira consiste em arrastar objetos, foram cortados com estilete e auxílio de régua os caminhos que eles farão (Figura 6).
Figura 2. Imagem de tela da página sobre Identidade visual (foco em logotipo). Foto elaborada pela autora.
Como visto na figura 2, optou-se por criar uma página voltada para a identidade visual com foco em logotipos. Esta é a primeira página do livro e traz um jogo do qual a criança é testada para identificar e agrupar os tipos de “logo”, sendo eles de empresas alimentícias ou televisivas. A segunda página do livro, voltada para tipografia, foi feita com três tipos de fontes, sendo uma sem serifa (Impact), uma caligráfica (Lucida Handwritting) e uma com serifa mais infantil (Cooper Std), posteriormente, cada fonte teria uma textura com relevo e cor diferente. A terceira página é voltada para o game design, onde possui um labirinto em que o objetivo é a criança levar o cachorro até o osso (Figura 3).
Figura 3. Imagem de tela. Foto elaborada pela autora.
Na quarta página, voltada à sinalização de ambientes, se utilizou a mesma lógica que a primeira e terceira páginas, que seria induzir a criança a arrastar o objeto/personagem de um lugar para outro. Nesta página, as crianças podem sinalizar as portas de banheiro, com
Figura 4. Imagem da tela. Foto elaborada pela autora.
A página seguinte é voltada para tecnologia, consistindo em um desenho de uma tablet com seus ícones e com três imagens de figuras 3D, vistas de forma correta com os óculos adaptado que virá acompanhado com a página. Por fim, na sétima página encontra-se a referência à fotografia, com um Pop Up (imagem que parece saltar da página) de uma câmera e três fotos de boa qualidade embaixo, sendo elas de animais para se aproximar mais com o universo infantil. Na capa do livro, escolheu-se uma ilustração de estilo infantil e que remetesse ao designer, com uma faixa escrita “design gráfico” fazendo parte. O título está em caixa baixa e alta, sendo em caixa baixa as palavras “mamãe, quero ser” (na fonte Franklin Gothic Medium Cond, 48 pt) e em caixa alta, para destacar, está a palavra “designer” (na fonte Universal-College, 69 pt). Na contra capa está centralizado a cima o nome da autora e o ano da criação do livro (em Calibre regular, 24 pt) e abaixo está o logotipo e nome da instituição, no caso, a UNESP. a) Impressão e montagem Segundo Lins (2001, p. 45) os livros para crianças menores são como brinquedos, sendo assim é necessário que possuam material mais resistente, tanto em material quanto em
Figura 5. Recorte de página. Foto elaborada pela autora.
Figura 6. Recorte de caminhos. Foto elaborada pela autora.
Para segunda página - referente à tipografia - foram adicionados tecidos ou papel celofane no formato adequado às fontes para dar volume e textura às mesmas. Na sexta página, foram adicionadas abas com mais duas fotos em 3D, além de uma que já estava impressa junto com a página. Para o Pop up da última página – a qual é a única de folha dupla -, foram feitas pesquisas de referências e testes antes de
108 montá-la, a página funciona melhor á 90º de inclinação de um lado. A solução escolhida para colocar os objetos a serem arrastados foi usar papel com maior gramatura. Foram colados papeis embaixo da impressão dos objetos para eles ficarem com maior espessura, para juntá-los à página foi preciso colar um pequeno papel auxiliar ainda mais espesso embaixo dos “caminhos” juntamente com outro papel ainda menor, da largura dos caminhos, que poderia unir o papel auxiliar ao objeto. Para unir cada página foi preciso colar um papel com a mesma textura na página que ficava ao lado, unido à página anterior com a seguinte, e assim se fez com todo o livro, inclusive para unir com a capa e contra capa. Para estas ficarem com maior espessura que as páginas de miolo foi necessário colar um papel mais espesso e com maior rigidez. b) Planejamento para produção “em série” A gramatura das folhas do miolo e para as folhas de rosto (coladas na capa e contra capa) precisa ser de 140 g/m² caso se faça da mesma forma que o projeto feito à mão, ou seja, dobrando ao meio (as folhas do miolo, apenas) e colando um lado no outro da folha, caso isso não seja feito na produção, é necessário utilizarse de uma folha mais espessa, de cerca de 240 g/m², podendo ser feito com o papel reciclado. É indicado para cada objeto que se move nas páginas, impressão com papel Couchê de 250 g/m², e também para a estrutura que vai dentro do livro (que faz o objeto se mover). Para a capa e contra capa, é indicado utilizar o papel “Supremo Alta Alvura” 300 g/m² por ser mais resistente e espesso, ou um papel Cartão de 240 g/m² coberto por Couchê mais fino, de 115 g/m². Nas páginas um, três, quatro e sete é necessária a utilização de faca especial. Na página dois, é preciso fazer colagem de tecido (textura) manual. Na página seis, precisa-se de colagem de imagens impressas folhas de espessura de 140 g/m². Por fim, é necessária a fabricação de um óculo
109 “3D” com papel Couchê L-2 calandrado (brilho nos dois lados) de gramatura 270 g/m².
6.Conclusão Podemos dizer que o objetivo do livro foi cumprido, pois nesta pesquisa buscou-se selecionar os mais populares trabalhos de um designer para ilustrar o pré-livro, sendo eles: fotografia, tipografia, jogos, embalagens, webdesign, identidade visual e sinalização. Em cada página a criança poderá realizar exercícios de raciocínio lógico e habilidade motora, como arrastar um objeto de um lugar a outro. Essa interferência ajuda na assimilação da ideia do livro e estabelece a empatia da criança com o objeto. Dessa forma, há incentivo à criança para leitura e simpatia com outros livros e também com a profissão de designer, ainda pouco conhecida pela massa popular. O desenvolvimento do projeto proporcionou uma ampliação nos conhecimentos sobre um público tão especial, a criança. Também possibilitou a concepção de um produto exclusivamente através da linguagem visual, o que é bastante proveitoso para a formação de um futuro designer.
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Redesign do website Freecycle.org com base na Experiência do Usuário Redesign of Freecycle.org website based on User Experience Pereira Júnior, Hamilton Oliveira; Faculdade de Administração e Artes de Limeira (FAAL)
ragaroto@gmail.com Sniker, Tomas Guner; Faculdade de Administração e Artes de Limeira (FAAL) / Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, FAU-USP
tsniker@usp.br Fernandes, Fabiane Rodrigues; Faculdade de Administração e Artes de Limeira (FAAL) / Faculdade de Arquitetura, Artes Comunicação, UNESP
fabyfernandes@gmail.com
Resumo Freecycle.org é uma ONG (Organização Não-Governamental) com website na internet para doação de bens, que traz uma proposta inovadora. Porém os dados levantados nessa pesquisa demonstraram que seu website conta com uma interface problemática, além de oferecer poucos atrativos para os novos usuários. Nestes termos, este artigo propõe um redesign deste site com base em uma pesquisa que mensura a experiência do usuário. Durante o desenvolvimento da nova interface foi identificado que grande parte dos erros não estava apenas relacionados aos aspectos visuais, mas também, aos aspectos funcionais, como arquitetura de informação e design de interação. O resultado obtido é um sistema consistente, amigável e modular, cuja interface encurta os caminhos para realizar tarefas cotidianas por meio de micro interações e menores taxas de atualizações de páginas. Palavras Chave: Design, Experiência do Usuário, Usabilidade.
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Abstract
2 Desenvolvimento
Freecycle.org is an NGO (Non-Governmental Organization) with website on the internet for donated goods, which brings an innovative proposal, but the data collected in this study showed that its website has a problematic interface, while offering little interest to new users. Accordingly, this paper proposes a redesign of this site based on a survey that measures the user experience. During the development of the new interface was identified that most of the errors were not only related to visual aspects, but also to the functional aspects such as information architecture and interaction design. The result is a consistent, friendly and modular system, whose interface shortens the ways to perform everyday tasks through micro interactions and lower rates of page updates.
2.1 Referencial Teórico O termo interface é muito utilizado nos dias de hoje para, inclusive, tratar de interações entre departamentos e organizações, porém, teve o seu surgimento em meados de 1880, não sendo muito popular até 1960, quando, com o advento da informática e VDU’s (Visual Display Unit) passou a ser frequentemente utilizada pela indústria computacional. Já em 1970, o termo passa a se firmar quando pesquisadores começam a estudar a “Interface do Usuário” (UI), também conhecida como Interface Homem Máquina (PREECE, ROGERS e SHARP, 2007). Rebelo (2009) define que “a interface é a ponte de comunicação de qualquer sistema (...) o meio utilizado pelo usuário para obter êxito na realização de tarefas”. Segundo Souza (1999 apud Rebelo 2009) a interface pode ser tanto “um meio para a interação usuário-sistema” como também “uma ferramenta que oferece os instrumentos para esse processo comunicativo”. Para Moran (1981) a interface é “a parte de um sistema computacional” no qual a pessoa tem um contato físico, perceptivo e conceitual. É o elemento necessário para que exista o estímulo a interação, que será percebida pelo sistema, que por sua vez, dará seu feedback (REBELO, 2009). O Design de interfaces é um campo em crescente discussão, pois as interfaces digitais interativas invadiram nossas residências, serviços e fazem parte da sociedade contemporânea. Para Fernandes (2013) da mesma forma que o campo do IHC (Interação Humano-Computador) se preocupa com as questões que fazem parte da relação dos aspectos humanos e os sistemas tecnológicos, também, da mesma maneira o Design se preocupa em “em diminuir os problemas existentes entre usuário e tecnologia, visando garantir produtos mais adaptados aos fatores humanos”. Para essa autora o Design está ligado “às questões da Experiência do Usuário (UX) e da Usabilidade”, pois as falhas de usabilidade comprometem a realização da tarefa (objetivo
Keywords: Design, User Experience, Usability.
1 Introdução Em 2003, Dearon Beal, diretor financeiro da Proter&Gamble (P&G), que recolhia e reciclava suprimentos de escritório e outros objetos, como computadores e móveis de escritório locais, começou a ter dificuldades para achar novos donos para os bens de consumo que coletava. Pois, ainda que estivessem muitas vezes com a qualidade impecável e funcionando, eram poucas as instituições que aceitavam esses itens. Ao se casar, Beal precisou se desfazer de sua cama e novamente a dificuldade de doar surgiu em seu caminho. Percebendo esse problema, Dearon tem a ideia de criar uma lista de doações no site Yahoo, que batizou de Freecycle (BOTSMAN & ROGERS, 2011). Em pouco tempo a lista do Freecycle passou de 80 para 800 participantes. Hoje o site conta com sete milhões de usuários em 95 países, no qual cerca de 99% dos produtos oferecidos são doados com sucesso em um termo relativamente curto. O jornal americano “The New York Times” apontou o site como uma das 100 ideias que irão revolucionar o consumo no próximo século (KELLEY, 2004). As plataformas de acesso a web são recursos tecnológicos que mudam de forma extremamente rápida, sendo assim um site como o Freecycle.org (figura 1), criado em 2003, se mostra defasado, com recursos e configurações ultrapassados. Nos dias de
hoje, a área do Design deve preocupar-se não somente com a funcionalidade e a estética, mas também, com a experiência de uso, que deve ser gratificante ao usuário. Para Fernandes (2013) as características estético-funcionais precisam ajudar a garantir uma boa qualidade do uso. Segundo Nielsen (2004) um site tem apenas 12% de ser revisitado caso a experiência do usuário tenha sido ruim, sendo bem provável que nunca mais volte. A usabilidade permite a realização de interações com o sistema de maneira mais eficaz, eficiente e agradável, ou seja, facilidade de uso e aprendizado, efetividade no desempenho, custos humanos aceitáveis, utilidade percebida e adequação as tarefas e aos usuários (FERNANDES e PASCHOARELLI, 2012).
Figura 1:Tela inicial da Freecycle.org, parte acima da dobra. Fonte: Freecycle.org (2013).
do usuário) e “e impossibilitando que a Interface contribua para o sucesso da Experiência do Usuário” (FERNANDES, 2013). A ISO 9241-210 (2010) define a Experiência do Usuário como sendo “a percepção de uma pessoa e as respostas eu resultam do uso ou utilização prevista de um produto, sistema ou serviço”. Já a usabilidade está ligada a qualidade de uso, ou seja, o quão bem uma interface atende seus usuários, permitindo a realização da tarefa com o mínimo de dificuldade. Para Nielsen (1993) a usabilidade não é uma propriedade única e unidirecional da interface do usuário, pois está relacionada a outros componentes e associada a cinco atributos da interface, sendo elas: aprendizagem, eficiência, memorização, poucos erros e satisfação. 2.2 Metodologia Este artigo apresenta parte dos resultados de pesquisa maior, que, com base na Experiência do Usuário desenvolveu um novo projeto (redesign do site Freecycle.org) com o objetivo de proporcionar uma plataforma mais simples de anúncio de doações entre pessoas próximas. Primeiramente, foi realizada uma avaliação de experiência do usuário com o site atual, através do método proposto por Fernandes (2013) que trabalha com escala de pontuação e divide a avaliação em antes do uso (impressões iniciais), durante o uso (eficácia e eficiência) e após o uso (impressões finais – grau de satisfação). Para a realização desta pesquisa, do site atual com seus usuários, foram selecionados 21 voluntários (total de 19 protocolos respondidos), selecionados em chats, grupos e fóruns, com o seguinte perfil: • Ter experiência de uso da internet; • Ter um conhecimento mínimo da língua inglesa; • Ter conhecimento de projetos como os desenvolvidos pelo Freecycle.org. Após uma pré-seleção, os voluntários recebiam um link para a realização da pesquisa com os usuários. A segunda etapa foi a de concepção do projeto, o redesign do site Freecycle.org com base na metodologia de Lobach (2001).
112 2.2.1 Avaliação da Experiência do Usuário A avaliação da experiência do usuário com o website Freecycle.org atual foi dividido, conforme metodologia proposta por Fernandes (2013) em 03 partes: • Antes do uso (impressões positivas iniciais): é avaliada a expectativa do usuário com relação à interface por meio da escala de Likert (de 0 a 4 pontos), no qual a soma máxima dos pontos de 16 pontos significa uma máxima impressão positiva; • Durante o uso (eficácia e eficiência): se divide em duas avaliações, da eficácia (conclusão da tarefa) e eficiência (conclusão acrescidas de variáveis como tempo, grau de dificuldade), no qual a pontuação máxima para uma boa eficácia é de 4 pontos • Após o uso (grau de satisfação): é avaliada a satisfação do uso através do protocolo SUS (TULLIS e ALBERT, 2008), no qual a pontuação de 44 pontos é o grau máximo de satisfação. Quanto à tarefa, os voluntários foram solicitados a criar uma oferta de doação e as subtarefas eram: • Criação de cadastro; • Encontrar o grupo de São Paulo; • Criação de uma oferta de doação. 2.2.2 Metodologia de desenvolvimento do projeto Segundo Lobach (2001) a motivação ou ponto de partida para um processo de Design é constituído pela descoberta de um problema, que se desenrola em um processo de Design de acordo com o tipo de problema. Foi então a primeira tarefa realizada, uma pesquisa de satisfação de uso que poderia expor possíveis problemas, falhas e erros que poderiam ser solucionados através de uma abordagem metodológica de Design Industrial aplicado a interfaces Web.
113 Análise do Problema A partir da descoberta de problemas no sistema atual do Freecycle.org e com a intenção de solucioná-lo, foi realizada uma cuidadosa análise do mesmo, onde foi realizada uma importante coleta de informações sobre o sistema para a utilização em uma fase subsequente. Todos os dados foram importantes para a construção de uma base sólida de entendimento do universo macro do sistema de doações Freecycle.org. Análise da Necessidade A melhoria do sistema irá beneficiar cerca de sete milhões de usuários (BOTSMAN & ROGERS, 2011), que é o número de usuários no sistema atual do Freecycle.org, sendo uma quantidade de pessoas maior que a população da Dinamarca, entretanto distribuídos em cerca de 95 países. Análise das configurações estético-funcionais do sistema atual Através da análise da análise estrutural e informacional dos itens (link, menu, layout, barras de navegação, campos de pesquisas, botões, contraste, legibilidade, etc.), foi possível criar requisitos para o projeto de redesign, no quais os pontos mais críticos a serem solucionados são: • •
•
•
Inconsistência: falta de padrão; Navegação improdutiva: o usuário precisa passar por muitas páginas para fazer uma ação simples e muitas vezes os mesmos não sabem onde estão; Carga de memória: o site exige que o usuário use muito de sua memória, pois não facilita as tarefas para o usuário. Muitas vezes o site o leva para outro site (endereço eletrônico) e depois retorna, exigindo muito da percepção do usuário; Prevenção de erros: o site não envia feedback após cada ação, facilitando ou conduzindo ao erro.
2.3 Resultados 2.3.1 Pesquisa com o site atual – Avaliação da Experiência do Usuário Para a análise, antes do uso, das expectativas iniciais dos usuários (n=19) quatro afirmativas foram feitas, utilizando como resposta uma escala de cinco pontos (figura 2). É possível perceber o quão baixo foram os resultados quanto às expectativas iniciais positivas do usuário a respeito do sistema Freecycle.org, totalizando 6,47 pontos de média, ou seja, 40,46%, ficando dentro de uma margem considerada preocupante (FERNANDES, 2013).
Para a análise após o uso, da satisfação (impressões finais) foram feitas primeiramente quatro perguntas que utilizam uma escala de dois pontos e, posteriormente, foram feitas dez afirmativas, intercaladas em afirmativas e negativas, conforme questionário de satisfação SUS (TULLIS E ALBERT, 2008), como mostra a figura 4. É possível perceber que a interface não obteve um bom grau de satisfação já que a média de pontuação foi de 22,57 pontos, ou seja, 51,31%, margem também considerada preocupante (FERNANDES, 2013). Oito participantes da pesquisa tiveram a soma total de pontos abaixo dos 22 pontos, valor correspondente a metade da pontuação mais alta (44 pontos).
Figura 2: Apresentação dos resultados das expectativas iniciais (antes do uso). Fonte: Elaborado pelo autor (2013).
Para a análise durante o uso, da eficácia (conclusão da tarefa, através das subtarefas) quatro perguntas foram feitas utilizando como resposta uma escala de dois pontos (figura 3). É possível perceber que a grande maioria dos voluntários conseguiu realizar algumas subtarefas, totalizando uma média de pontuação de 2,57, ou seja, 64,47% das subtarefas concluídas, margem ainda considerada preocupante (FERNANDES, 2013). Três participantes da pesquisa não conseguiram realizar nenhuma das subtarefas.
Figura 3: Apresentação dos resultados da eficácia (durante o uso). Fonte: Elaborado pelo autor (2013).
Figura 4: Apresentação dos resultados da satisfação (após o uso). Fonte: Elaborado pelo autor (2013).
Esse resultado demonstra a necessidade de um redesign na interface do website Freecycle. org com a intenção de garantir uma melhor satisfação do uso. 2.3.2 A nova proposta – Redesign do site Freecycle.org Após análise estético-funcional e com os resultados da avaliação da experiência do usuário, algumas especificações foram criadas para o novo site, divididas em especificações funcionais e de conteúdo.
114 Para o novo projeto do site Freecycle.org, foi feito uma reestruração de páginas e informações e utilizado uma ferramenta online, chamada de OptmailWorkshop onde voluntários (online) organizaram as informações (páginas do Freecycle.org) que se encontravam espalhadas virtualmente, em forma de cartões, de acordo com sua lógica, o que lhe parecesse ser a forma mais natural. Dessa forma, os resultados foram organizados de acordo com a pesquisa e contexto de uso, onde a arquitetura melhor aceita foi desenvolvida levando-se em consideração a experiência do usuário, contexto de uso e os dados da matriz de aproximação obtidos através da pesquisa com o OptimailWorkshop. Após essa etapa foi definido como seria o fluxo de interação para o cadastro (figura 6), para entrar em um grupo e para anunciar um produto. A intenção era diminuir o número de interações, em todos os métodos permitidos no site apenas uma página carrega e são necessárias duas interações.
Figura 6: Fluxograma de interações (criação de um cadastro). Fonte: Elaborado pelo autor (2013).
Alguns esboços foram criados (figura 7) e um Wireframe foi desenvolvido para mais uma etapa de avaliação do layout, da arquitetura de informação e da interação.
115 limpa clara e objetiva, trabalhando com muitas figuras e analogias e textos curtos (figura 8, item C). Já no rodapé foi utilizada uma barra de navegação para questões legais do site, que segundo a pesquisa inicial, não eram relevantes para o usuário novo ou quem só está passando pelo site (figura 8, Item D).
um sistema consistente, amigável e modular, cuja interface projetada encurta os caminhos para realizar as tarefas cotidianas dos usuários através de micro interações e menores taxas de atualizações de páginas, além do novo conceito visual que aplicado à interface fortalece a identidade visual da marca e seu branding.
Referências
Figura 7: Esboço do novo site da Freecycle.org. Fonte: Elaborado pelo autor (2013).
O desenvolvimento do wireframe (figura 8) do projeto foi baseado na pesquisa de satisfação, no qual os usuários informaram que o sistema atual do site exigia muita navegação e um alto índice de recarregamento de página. Sendo assim toda a sinergia do desenvolvimento se voltou para uma navegação, sendo que as principais ações do usuário pudessem ser feitas através de modais e menus presentes na mesma tela, utilizando todo o potencial das tecnologias (html5 e o conceito de site SPA Single-Page-Aplication) que estão presentes na grande maioria dos sites hoje em dia provendo sites mais rápidos e dinâmicos. Esses conceitos foram aplicados à página inicial, onde o objetivo primário foi comunicar ao usuário “Onde ele está”, inserindo o logo em alto contraste com o fundo em uma área nobre, que fica localizado na barra superior de navegação (figura 8, Item A) estando presente em todas as páginas do site. Como objetivo secundário, os textos e cabeçalhos inseridos abaixo da barra de navegação, foram diagramados de forma que informe ao usuário o assunto que o site aborda, trabalhando para que não dispute a atenção com outros componentes do site, os deixando com uma margem de respiro ao seu redor, livre de qualquer distração, para facilitar a leitura ao usuário (figura 8, item B). Os demais componentes da página inicial se focaram em deixar as informações referentes de como o site funciona e as vantagens de utiliza-lo de forma
Figura 8: Resultado da proposta final do redesign do site Freecycle.org. Fonte: Elaborado pelo autor (2013).
3 Conclusão A Freecycle.org mantem sete milhões de usuários doando e recebendo coisas ao redor do mundo e conta com tecnologias que já não serve mais ao seu tamanho nem as exigências do público atual, conforme mostram às pesquisas realizadas nesse estudo, cujo site não atendeu as expectativas dos usuários tão pouco trouxe uma experiência satisfatória de uso. Durante o desenvolvimento da nova interface foi identificado que grande parte dos erros não estava apenas relacionada aos aspectos visuais, como cores, grade e fontes, mas também, aos aspectos funcionais, como arquitetura de informação e design de interação, cujas etapas exigiram pesquisas e testes com usuários durante o desenvolvimento da nova proposta, para validar o quão assertivo a nova proposta de interface irá ser comparada a sua anterior. O resultado final obtido com este projeto é
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Velhas Lembranças, Memórias de Vida Memories, An Eye To The Pursuit Of Life Melara, Lucas Furio; Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho
lucasmelara@hotmail.com Andrade, Ana Beatriz Pereira de; Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho
anabiaandrade@openlink.com.br
Resumo A pesquisa teve início a partir do estudo da obra da fotógrafa Annie Leibovitz. O objeto de estudo é promover visibilidade, sob forma de fotografias e registros de memória oral as lembranças de idosos. O recorte se dá em Bauru, São Paulo, junto a idosos abrigados em uma instituição conhecida como Paiva. A proposta é desenvolver um projeto teórico-prático com o uso de fotografia e textos resultantes das reflexões provenientes de referencial teórico e de relatos dos interlocutores. Para a construção, são consideradas a metodologia da cartografia, a Teoria do Ator Rede e o princípio do Design Social. Palavras Chave: design; fotografia; idosos; memória.
Abstract The research started from the study of the path and work of the photographer Annie Leibovitz. The object of study is to promote visibility in the form of photographic images and oral memory the regarding of the elderly. The clipping occurs in Bauru, São Paulo, with the elderly sheltered in an institution known as Paiva. Methodologically, the cartography, the Actor Network Theory and the principles of the Social Design are tools. The proposal is to develop a theoretical-practical work using photography and writings that result from reflections from theoretical background and stories of the interlocutors. Keywords: design; elderly; photography; memory
1. INTRODUÇÃO A presente pesquisa tem por objetivo investigar questões acerca das memórias, lembranças e relatos orais de idosos abrigados na Associação Beneficente Cristã em Bauru, cidade localizada no interior do estado de São Paulo, e produzir resultados com registros imagéticos (fotográficos) e iconográficos. Para isto, faz-se necessário reunir saberes interdisciplinares fundamentais para o processo metodológico. Optou-se pela cartografia, como forma descritiva, tal como proposto pela psicóloga Suely Rolnik, no sentido de considerar questões no campo do sensível. Também, a Teoria do Ator Rede proposta pelo sociólogo Bruno Latour, a fim de colocar em cena visibilidades e invisibilidades. Tornam-se necessários levantamentos antropológicos, socioculturais e históricos, a fim de atingirmos o objetivo geral. Seja o de proporcionar visibilidade à importância do idoso no meio social, com o uso de ferramentas relacionadas ao Design, sobretudo no campo da fotografia, já verificadas como possíveis em relação ao objeto de estudo. Este impulso inicial deu-se em meio acadêmico, na disciplina de Metodologia Cientifica ministrada pela docente orientadora do projeto. A proposta foi de realizar um projeto acadêmico voltado à questões sociais, que se utilizasse das ferramentas que se tornam disponíveis em fotografia, com inspiração em fotógrafo profissional partindo de questões técnicas e/ou conceituais. Optou-se por a produção da fotógrafa norte americana Annie Leibovitz. Annie nasceu em Waterbury, no estado de Connecticut, no dia 2 de outubro de 1949. Foi durante o curso de artes do Instituto de Artes de São Francisco, em um workshop de fotografia, que encontrou sua afinidade com a profissão. Sua especialidade são retratos em estúdio ou ao ar live. Começou sua carreira na fotografia em 1969, em São Francisco, na revista Rolling Stone, que ainda era uma publicação sem grande expressão. Annie registrou momentos decisivos
da história dos Estados Unidos, bem como momentos únicos dos principais músicos das décadas de 70 e 80. No início de sua carreira, seguia uma estética simples, sem grandes produções, dando preferência a imagens em preto e branco. De acordo com a fotógrafa: “Coisas acontecem na sua frente e você tem de estar preparado para decidir quando usar a câmera. Esse é um dos aspectos mais interessantes e misteriosos da fotografia.” (LEIBOVITZ:2008) O reconhecimento internacional de Annie veio por sua habilidade em retratar histórias de pessoas, como o exemplo que segue abaixo.
Figura 01: Patrick Stewart e Sir Ian McKellen fotografados por Annie Leibovitz
No caso deste trabalho, inspirado pelo de Annie Leibovitz, tem o recorte na cidade de Bauru, interior de São Paulo. Fundada em 1896, e é a cidade mais populosa do Centro-Oeste paulista. Um dos principais motivos para sua povoação foi a Marcha para o Oeste, criada pelo governo Getulio Vargas para incentivar o progresso e a ocupação da Região Central do Brasil. Além da importância econômica, Bauru também tem grande importância cultural para a região. Tem densidade populacional de 510,83 habitantes por km², segundo o censo de 2010. O Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M) é de 0,825, o de longevidade de 0,758 (o nacional é de 0,638), e a renda per capta é de 0,810. De acordo com o IBGE, em Bauru a população da chamada melhor idade corresponde a 13% do total de moradores da
118 cidade. Em comparação ao senso do IBGE de 2000, o numero de idosos da cidade cresceu em 3% e a previsão da Prefeitura Municipal é a de que esse índice atinja 17% do total da população em 2025. Para o desenvolvimento da pesquisa, considera-se necessário reunir saberes interdisciplinares fundamentais para o processo metodológico. Faz-se também necessário considerar as histórias, e os relatos orais serão fonte de informação para registros e compreensão das lembranças destas pessoas. Estes serão princípios norteadores para registros fotográficos. Neste sentido, pretendese agregar os princípios da cartografia, tal como propostos por Suely Rolnik. Segundo a pesquisadora: “(...) o cartógrafo serve-se de fontes as mais variadas, incluindo fontes não só escritas e nem só teóricas.” (ROLNIK: 1989)
2.SITUAÇÃO DO IDOSO NO PAÍS O contingente idoso é o que mais vem crescendo comparado aos demais segmentos etários. Estudos mostram que o numero de pessoas idosas cresce em ritmo maior do que o número de pessoas que nascem. O aumento da expectativa de vida, dentre outros fatores, modificam a estrutura de gastos dos países em uma série de áreas importantes. Especificamente no Brasil, o ritmo de crescimento da população idosa tem sido consistente. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD 2009, o país contava com uma população de cerca de 21 milhões de pessoas com 60 anos idade ou mais . A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica cronologicamente como idosas, pessoas com mais de 65 anos em países desenvolvidos e 60 anos em países em desenvolvimento. No Brasil, toda pessoa com idade igual ou superior a 60 anos é classificada como idosa de acordo com o artigo segundo da Lei 8.842, de 04 de Janeiro de 1994 (que trata da Política Nacional do Idoso). Porém, de acordo com a geriatria, a pessoa é considerada
119 de terceira idade a partir dos 75 anos. Não existe um acordo acerca do que defina a idade da pré velhice ou da velhice. Nesta pesquisa, parte-se do princípio de que idosos possuem uma grande bagagem cultural e emocional. Vivenciaram muitas questões, alguns constituíram família, trabalharam bastante, e, por vezes, sofrem com o descaso e o preconceito social. No Brasil, embora com o recente Estatuto do Idoso, verifica-se que ainda há o que fazer a fim contribuir para modificar estas situações.
3. ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE CRISTÃ Voltada ao cuidado do idoso, a Associação Beneficente Cristã, conhecida pelos moradores da cidade de Bauru como Paiva, foi fundada em 08 de abril de 1949 por Sebastião Paiva. É uma entidade filantrópica, sem fins lucrativos, que integra a Rede de Proteção Social da Política Nacional de Assistência Social. Sua história teve inicio como um hospital psiquiátrico, porem se tornou um abrigo para os pacientes remanescentes quando, em 1988, a nova Constituição Federal extinguiu os hospitais psiquiátricos no Brasil. Atualmente oferece atendimento integral institucional à pessoa idosa, sem vínculos familiares ou, com vínculos rompidos, bem como para aquelas que tenham seus direitos ameaçados e/ou violados. O Paiva atende hoje a 124 abrigados, oferecendo serviços de atendimento com uma equipe multidisciplinar. A instituição também presta serviços a crianças de seis a onze anos de idade e a famílias carentes,que vivem em situações de risco e/ ou vulnerabilidade social. São realizados, periodicamente, diversos eventos beneficentes que visam angariar, junto à população bauruense, recursos necessários para manter o funcionamento. Além de chás, almoços com sorteios de prêmios doados pelos comerciantes locais, uma vez por mês é realizada a festa de comemoração de aniversário dos abrigados.
Assim, por meio desta pesquisa, pretendese investigar questões relativas à posição do idoso no âmbito nacional, com foco na instituição Paiva. A intenção inicial é a de realizar levantamentos históricos, culturais e antropológicos, para atingir o objetivo geral, seja o de revitalizar lembranças e memórias com o uso da fotografia acompanhada de textos registrados a partir de memória oral. Colocase em cena as áreas do Design, a Tecnologia (Fotografia) e as Ciências (consideradas as Humanas e Sociais). Segundo Ecléa Bosi: “A memória dos velhos desdobra e alarga de tal maneira os horizontes da cultura que faz crescer junto com ela o pesquisador e a sociedade em que se insere.”(BOSI: 2003)
Figura 2: Abrigados do Paiva com alunos do curso de Design da UNESP
4. CONCLUSÃO O projeto de pesquisa apresentado está em fase de desenvolvimento. Apresentaram-se breves conclusões sobre o rumo demográfico do contingente idoso no país. Também se buscou informar sobre a importância do trabalho de instituições filantrópicas sem fins lucrativos. Considera-se que as ações da Associação Beneficente Cristã para a sociedade, principalmente em relação aos idosos, que vivem em situação de riscos, abandono e/ou vulnerabilidade social. Dentre os objetivos para os desdobramentos
da pesquisa está em pauta o princípio de aprofundar as questões propostas em torno do titulo proposto: Velhas Lembranças, Memórias de Vida. Encontra-se em andamento a organização, leitura e sistematização do referencial teórico, incluindo imagético e iconográfico. Em seguida, será feita a coleta de relatos de memória oral, a fim de compreender e relatar as lembranças e memórias dos idosos. Este processo está sendo desenvolvido em conjunto com as pessoas trabalham diretamente com os idosos, a fim de seguir o proposto como metodologia por Rolnik e Latour. A Teoria do Ator Rede (TAR), ou Actor Network Theory (ANT) em inglês, é uma ferramenta para abordar as relações interpessoais e os acontecimentos com os quais os seres humanos interagem. A Teoria incentiva um foco aos detalhes existentes nesse processo. As redes, por sua vez, são resultantes de interações e trocas de experiências nas quais o ator é um alvo móvel de um enxame de entidades que se fundem sobre ele. Considera-se sobretudo os princípios do Design Social para o desenvolvimento dos registros. Conforme a designer e professora Heliana Pacheco: “O Design Social, na verdade, tem uma relação de trabalho onde o designer trabalha com alguém e não para alguém.” (PACHECO:1996)
O aspecto iconográfico está sendo pesquisado a partir de percepções e análises do trabalho da fotografa Annie Leibovitz, referencial principal para a execução de etapas do produto. Por fim, compreende-se que a execução do projeto possa ter importância para a manutenção da identidade dos idosos. Tanto perante sua possível homogeneização no meio rotineiro e coletivo do abrigo, quanto a sua importância para a sociedade, que muitas vezes pode vir a discriminar esta classe etária.
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REFERÊNCIAS BOSI, Ecléa. Memória e sociedade. São Paulo: Companhia das Letras, 2005 BOSI, Eclea. Memoria da cidade: Lembranças paulistanas. São Paulo: Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo. Disponível na internet em: http:// w w w. s c i e l o. b r / s c i e l o. p h p ? p i d = S 0 1 0 3 40142003000100012&script=sci_arttext>. Acesso em 07 Mar. 2014. FEITLER, Bruno e STOLARSKI, André. O design de Bea Feitler. São Paulo: Cosac Naify, 2012 IBGE. Cresce a proporção de idosos na população. Disponível na internet em: http:// teen.ibge.gov.br/mao-na-roda/idosos> . Acesso em 06 Mar. 2014. Jornal Bom Dia. Numero de idosos cresce em Bauru. Disponível na internet em: http://www. redebomdia.com.br/noticia/detalhe/59720/ Numero+de+idosos+cresce+em+Bauru+>. Acesso em 07 Mar. 2014. LEIBOVITZ, Barbara. Annie Leibovitz: A Vida Através das Lentes. Imagem Filmes. 79 minutos. Documentário/Biografia. Dolby Digital 2.0
121 NEWTON, Helmut. Helmut Newton. São Paulo: Taschen do Brasil, 2009. PACHECO, Heliana S. O Design e o Aprendizado: Barraca. Quando o Design Social Deságua No Desenho Coletivo. 2009 154 f. Dissertação (mestrado) – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. ROLNIK, Suely. Cartografia Sentimental: Transformações contemporâneas do desejo. São Paulo: Ed. Estação Liberdade, 1989. ROUILLÉ, André. A fotografia entre documento e arte contemporânea. São Paulo: Editora Senac, 2009 SONTAG, Susan. Sobre a Fotografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2004. TESTINO, Mario. Mario de Janeiro Testino. São Paulo: Taschen do Brasil, 2009. VREELAND, Lisa I.; PERLMUTT, Bent-Jorgen; TCHENG, Frédéric. The Eye Has To Travel. ANDERSSON, Magnus; CURTIS, Ron; GRAY, Jonathan. VREELAND, Lisa I. Reino Unido. 2012. 86 minutos. Documentário/Biografia. Dolby Digital 2.0
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DESIGN INCLUSIVO
Andador para reabilitação de crianças com deficiência Walker for rehabilitation of children with disabilities Moura, Francisco Islard Rocha de; Universidade Federal da Paraíba
islardrocha@hotmail.com Neves, Eduardo J. T. G.; Universidade Federal da Paraíba
ej_jorge@hotmail.com Freitas, Marllon de Oliveira; Universidade Federal da Paraíba
marllonsatierf@hotmail.com Livramento da Silva, Renato Fonseca; Universidade Federal da Paraíba
fonsilva3@hotmail.com Pereira, Kleber Cristiano Souza; Universidade Federal da Paraíba
kleber.cristiano89@gmail.com
Resumo Este artigo apresenta e descreve um projeto de produto desenvolvido por graduandos do curso de bacharelado em Design da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) durante a disciplina de Projeto de Produto I, em parceria com a Fundação de Apoio a Pessoa com Deficiência (FUNAD). O projeto teve como objetivo desenvolver um produto que auxiliasse, de forma satisfatória, algum problema do cotidiano dos pacientes com deficiência física, durante o seu tempo de reabilitação na FUNAD, tendo em vista que o paciente possa ter o maior conforto possível durante seu tratamento. Palavras Chave: Design; Design Inclusivo; Tecnologia Assistiva; Deficiência Física.
Abstract This paper presents and describes a product design developed by graduate students of the Bachelor of Design, Federal University of Paraíba (UFPB) during the course of Product Project I, in partnership with the Foundation to Support People with Disabilities (FUNAD). The project aimed to develop a product that could help in a satisfactory manner, a problem of the daily lives of patients with physical disabilities during their rehabilitation time in FUNAD, considering that the patient can have the greatest possible comfort during their treatment. Keywords: Design; Inclusive Design; Assistive Technology; Physical Disability.
1. INTRODUÇÃO Produtos desenvolvidos para pessoas com deficiências estão, ainda que de forma lenta, crescendo cada vez mais no mercado atual. A conscientização de uma parcela cada vez maior da população e a existência de mais políticas públicas de apoio à inclusão social, tem trazido mais incentivo para quem procura atender as
necessidades desse público, através da criação de produtos e serviços. Como é o caso dos profissionais da área de design, engenharia, fisioterapia etc. Nos aspectos relacionados ao design, essa preocupação está ligada a área do “Design Inclusivo”, que visa conceber produtos, serviços e ambientes adequados a diversidade humana. Conforme Renato Bispo e Falcato Simões:
124 O Design Inclusivo é por vezes confundido com o desenvolvimento de soluções específicas para pessoas com deficiência, mas este não é, de todo, o seu objectivo. O envolvimento de pessoas com deficiência é encarado como uma forma de garantir a adequação para aqueles que, eventualmente, terão mais dificuldades de utilização, assegurando, desta forma, a usabilidade a uma faixa de população mais alargada. ( SIMÕES, BISPO – 2006 p.08)
A inclusão de pessoas com deficiências têm políticas públicas que já datam de algumas décadas, como é o caso da criação de instituições que atendem e dão apoio a esse público. Temos como exemplo a lei nº 7.853, de 24 de outubro de 1989, que: “dispõe sobre o apoio às pessoas com deficiência, sua integração social, sobre a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência - Corde institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou difusos dessas pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público, define crimes, e dá outras providências”. No mesmo ano da criação dessa lei, foram instauradas uma quantidade significativa de fundações e instituições de apoio a pessoas com deficiência. No estado da Paraíba a fundação que apoia à pessoa com deficiência , é A FUNAD (Fundação de Apoio ao Deficiente), que é uma Fundação criada no ano de 1989, pela Lei nº 5.208 de 18 de Dezembro de 1989, e tem como atribuição básica habilitar, reabilitar, profissionalizar e inserir no mercado de trabalho, pessoas com deficiência, bem como desenvolver programas de prevenção e capacitação de recursos humanos. Gerenciando ainda as ações de educação especial em todo o estado da Paraíba. A fundação que atende as pessoas com deficiência mental, visual, auditiva, física, múltipla, acidentados do trânsito e do trabalho, sequelados de hanseníase e pessoas com necessidades educativas especiais é dividida em coordenadorias, e cabe a cada uma delas a assistência a seus usurários. Dentre as coordenadorias está a CODAFI (Coordenadoria de Atendimento à Pessoa
125 com Deficiência Física), que assiste as pessoas para prevenção, habilitação e reabilitação das funções motoras. Esse trabalho é feito desde crianças até idosos, e tem foco em gerar autonomia para os que estão em reabilitação. Gerar autonomia para os pacientes é conseguir, com os serviços e assistência que é oferecida na fundação, que seus usuários venham a desempenhar atividades cotidianas como, por exemplo, tomar banho, alimentarse, andar, se comunicar, entre outros, com ajuda mínima ou sem ajuda de aparelhos e produtos auxiliadores. Há, nessa situação, uma inversão notável de valores, em que atividades tidas como simples e até mesmo de pouca importância, passam a ser de grande valia para quem está em reabilitação e para os reabilitadores. A reabilitação para que o usuário possa começar ou voltar a se locomover, é um dos exemplos de assistência que é bastante comum na fundação, pela CODAFI. Nesse tipo de tratamento cada etapa tem que ser desenvolvida com grande cautela, qualquer erro ou interrupção trará complicações significativas para o usuário. Um público que necessita bastante dessa assistência são as crianças, que precisam desenvolver a marcha motora , uma vez que estão em fase de crescimento e desenvolvimento. A fase em que as crianças começam a dar seus primeiros passos é bastante delicada, em que é preciso o uso de produtos que auxiliem os reabilitadores durante o processo de reabilitação. Há uma diversidade de produtos na fundação para as mais diversas funções, embora muitos deles tenham sido produzidos com pouca ou quase nenhuma preocupação com critérios ergonômicos, o que por muitas vezes dificulta o trabalho dos reabilitadores. Os andadores, equipamento essencial utilizado no processo de estimulação para que as crianças adquiram a marcha motora, é um claro exemplo de produtos que apresentam problemas ergonômicos graves, além do baixíssimo apelo estético. O problema mais
grave está na inadequação do equipamento ao reabilitador, contraponto princípios básicos da ergonomia, segundo Itiro Iida: A ergonomia é a adaptação do trabalho ao homem. O trabalho aqui tem uma acepção bastante ampla abrangendo não apenas aqueles executados com máquinas e equipamentos, utilizados para transformar materiais, mas também toda situação em que ocorre o relacionamento entre o homem e uma atividade produtiva. ( IIDA, Itiro – 2005 p. 02)
Os reabilitadores se adaptam ao andador uma vez que ele não dispõe de regulagens, o que pode acarretar em problemas de saúde, pois o equipamento é utilizado em posturas incorretas. Entre outros problemas, estão: não dispor de regulagens, rodas pequenas e que emperram com facilidade, travas de difícil uso, quinas que podem machucar os usuários, não há revestimento onde o usuário interage com o produto.
que tenham uma estética agradável, mas não deixem de lado as preocupações ergonômicas e estéticas. É de extrema importância social e mercadológica o desenvolvimento de produtos que auxiliem na reabilitação dos usuários da CODAFI, que prezem pela saúde e bem estar tanto dos reabilitadores quanto dos que estão em reabilitação.
2. DESENVOLVIMENTO 2.1 Objetivo Geral Desenvolver um produto que ajude na reabilitação de crianças com dificuldade de locomoção ou que estejam aprendendo a andar. 2.2 Objetivos específicos - Fazer o redesign do andador utilizado pelos reabilitadores da FUNAD. - Facilitar o desenvolvimento das crianças. - Criar produto que não prejudique a saúde dos reabilitadores. - Tornar menos traumático o uso do produto pelos usuários. - Aplicar princípios do design universal e ergonomia no projeto.
3. METODOLOGIA
Figura 1: Andador utilizado na FUNAD. Fonte: Autor
O equipamento, que é todo em ferro e tem aparência hospitalar, não busca através da sua forma, materiais, cores e texturas trazer nenhuma sensação agradável. Também não tenta diminuir o trauma e a aversão que as crianças muitas vezes adquirem a esse tipo de produto. Há uma tendência no design que busca amenizar esses traumas e melhorar equipamentos utilizados por pessoas com deficiência, através da criação de produtos
3.1 Método O método utilizado foi o SATIERF, criado para o desenvolvimento deste projeto e que possui como base o método proposto por Munari (2008). O SATIERF é dividido em seis partes: A Colheita, Diretrizes, Análises e Definições Técnicas, Geração e Análise de Alternativas, Aprimoramentos e Considerações Finais. O método na prática não segue rigidamente a ordem das etapas, como o usuário está no centro do método, todas as ações de projetação ocorrem de acordo com a dinâmica imposta pelo contexto. Contudo, este fato, proporciona, quando necessário, uma sequência de avanços e retrocessos no processo, mas mantendo sempre um diálogo constante com o usuário ou grupo de usuários participantes em tempo real.
126 Desta forma, foi possível buscar respostas que imediatamente foram aplicadas ao processo de projetação. Sendo assim, por consequência, foi possível um ajustamento contínuo das demandas reais dos usuários em relação às ações de projeto. Esse tipo de método é uma tendência atual no design e está muito presente na área do design inclusivo, que tem o usuário ou grupo de usuários como principal foco de atenção. É de extrema importância a utilização de métodos, pois dá mais alicerce para o ato de projetar que é seguir uma linha de operações que vão ser necessárias para se chegar a uma solução adequada de um problema, para o objetivo possa ser atingindo da melhor forma possível com o menor esforço. 3.1.1 Colheita Na etapa inicial do projeto, a Colheita, buscase coletar o máximo de dados referentes a todos os aspectos que compõem vir a ser o problema, problemática, ou de algum público-alvo em potencial. No primeiro momento foi feita uma visita técnica à FUNAD, na qual houve uma palestra dos profissionais das cinco grandes áreas atendidas pela fundação, em que cada palestrante mostrou seu trabalho na fundação e como ele era desempenhado. A partir do que foi explanado, ficou decidido que o público seria os usuários da CODAFI. A Coleta de dados foi mais específica, voltada para os usuários da coordenadoria. Foram levados em consideração todos os aspectos do meio técnico e social que a fundação oferece para os reabilitadores trabalham na CODAFI. Contudo, foram realizadas entrevistas com coordenadores e reabilitadores, visando absorver o máximo do ambiente de trabalho em que estão inseridos, com isto, foi possível uma imersão na realidade social que esses profissionais experimentam diariamente. Essa etapa é de fundamental importância para o projeto, pois é nela que o grupo responsável pela projetação consegue perceber, de forma mais alargada, as primeiras impressões do que vai ser trabalhado, para que após a colheita se possa analisar os dados e gerar diretrizes para o projeto.
127 3.1.2 Diretrizes Problema, problemática, público alvo geral e específico. As diretrizes do projeto são definidas neste passo. Após todos os dados coletados na primeira etapa, é feita uma análise mais detalhada, descartando dados que não sejam interessantes para a continuidade do projeto. Assim, definimos o problema e a problemática. Foram percebidos vários problemas gerados por produtos utilizados durante o tratamento dos usuários da CODAFI. Muitos destes produtos não atendem satisfatoriamente as suas demandas, o que gera dificuldades durante o tratamento dos pacientes, acarretando também em problemas de saúde para os reabilitadores. A problemática definida foi a necessidade de projetar um produto que seguisse princípios ergonômicos e do design universal, que auxiliasse os reabilitadores da CODAFI, de forma mais eficiente, durante a reabilitação de usuários com problemas de locomoção. Depois de definidos problema e problemática, foi realizada uma visita técnica à fundação, com objetivo de decidir qual público alvo e, posteriormente, quais definições técnicas o projeto deveria seguir. Nessa visita foi notado que as crianças são um público alvo em potencial, uma vez que o tratamento para que elas adquiram a “marcha motora” era auxiliado por um andador que tinha problemas ergonômicos significativos. Levando esse aspecto em consideração, nosso público alvo geral, que é a CODAFI juntamente com a fundação, foi definido que as crianças que utilizam o andador durante o tratamento assistido pelos reabilitadores seriam nosso público alvo específico. Sendo assim, ficou definido que o problema específico está relacionado com os produtos (andadores) que não atendem de forma satisfatória os reabilitadores da fundação durante o trabalho de reabilitação das funções motoras de crianças. 3.1.3 Análise e Definições Técnicas Nesta etapa de análise e definições técnicas, foram analisados todos os dados existentes
até o momento, que se tivesse certeza que os requisitos e parâmetros que fossem definidos para o projeto, atendessem de forma satisfatória as necessidades da fundação. Segue tabela de requisitos e parâmetros:
Tabela 1: Requisitos e parâmetros
Os requisitos e parâmetros descrevem aspectos que o produto pode vir a ter. Tais aspectos subdividem-se em quatro categorias: Mercado, Estrutura, Ergonomia, e Estética. São também classificados pelo grau de prioridade, que pode variar entre opcional, recomendável e obrigatório. A partir desses princípios se geram diretrizes (valores) para a fase de geração de alternativas, assegurando assim, que as alternativas que forem geradas possam seguir uma mesma ideia norteadora para o projeto. Além dos quatros princípios, foi definido que as alternativas buscassem seguir os sete princípios do Design Universal desenvolvidos pela equipe liderada por Ron Mace do Centro para o Design Universal da Universidade Estadual da Carolina do Norte (EUA) no início da década de 1980, estes princípios, buscam de forma alargada, ser aplicados também para guiar projetos de Design acerca das características que tornam os objetos e os ambientes mais fáceis de serem usados. Segundo Bispo e Falcato (2006) são eles os sete princípios: - Uso equitativo: Produto ser útil e vendável para qualquer pessoa, tentar evitar segregar ou estigmatizar qualquer utilizador. - Flexibilidade no uso: Devem-se levar em consideração as capacidades individuais de cada usuário e procura atender da melhor
forma possível, como por exemplo, atender a destros e canhotos. - Uso simples e intuitivo: O produto ser de fácil uso independente da experiência anterior, capacidade linguística, nível de concentração do usuário. - Informação Perceptível: Comunicar de forma eficaz a quem vai utilizar o produto as informações necessárias para uso, independente das condições do ambiente ou sensorial do usuário. - Tolerância ao erro: Minimizar risco de acidentes intencionais ou não intencionais. - Baixo esforço físico: O produto ser utilizado de forma eficaz e confortável com o mínimo de fadiga. - Tamanho e espaço para aproximação de uso: Estudar as medidas antropométricas do usuário para que o produto seja projetado com tamanho e espaço apropriados para a sua manipulação e uso. A definição das diretrizes específicas não limita a criatividade do projetista, apenas define o cenário em que essa criatividade deve ser aplicada de uma forma mais objetiva. A criatividade não significa improvisação sem método (...). A série de operações do método projetual é feita de valores objetivos que se tornam instrumentos de trabalho nas mãos do projetista criativo. (MUNARI, Bruno, 2008, p. 11) 3.1.4 Geração e Análise de Alternativas Nesta etapa do projeto foram utilizados métodos que estimulassem a criatividade como, por exemplo, Brainstorm e o Método 635. Além de leituras complementares para que ocorresse um maior entendimento e imersão na problemática. Após a geração das alternativas foi escolhida uma que atendia ao maior número de diretrizes. A escolhida, através de um método que não é voltado para o usuário, seria agora aprimorada e posteriormente seria gerado um modelo físico. Porém, como o método preza pela maior interação com usuário durante o tempo de projetação, a alternativa foi levada para análise de coordenadores e reabilitadores
128 da FUNAD. Após algumas sugestões e mais alguns requisitos técnicos que os reabilitadores acharam essenciais para o produto, a alternativa escolhida foi levada para a fase de aprimoramentos.
129 um material leve e de fácil fabricação, em que o sistema de regulagem pode ser aplicado e que pode ser reciclado.
Figura 4: Simulação da utilização do andador. Fonte: Autor Figura 2: Esboço de Alternativas. Fonte: Autor.
3.1.5 Aprimoramentos Na etapa de aprimoramento, foram adicionadas ao produto as sugestões dos reabilitadores e foi iniciada a fase de detalhamento técnico da alternativa, estudo de cores e análise relacionadas ao cumprimento dos princípios do Design Universal, além da representação em modelo 3D e criação do desenho técnico.
Figura 3: Modelo 3D da alternativa escolhida
O desenho do objeto foi pensando para que o reabilitador tenha facilidade na locomoção com o carrinho durante os trabalhos de reabilitação. Por isso sua forma com um eixo central principal, para que sua utilização na hora da locomoção seja facilitada uma vez que as pernas do reabilitador ficarão mais livres. O alumínio foi definido para toda estrutura, pois é
A alternativa escolhida tem estrutura toda em canos tubulares de alumínio, as suas regulagens são feitas por um sistema de manípulos (facilmente encontrados no mercado), o banco em que o reabilitador fica sentado, assim como seu apoio e a o apoio da criança, são reguláveis para que usuários de diversas estaturas e dimensões corporais possam utilizar o produto. O apoio da criança e o apoio do reabilitador são revestidos para um maior conforto. As rodas são de borracha maciça, uma vez que não furam e são de grande durabilidade. As rodas, o banco e o sistema de regulagens que foi inserido no projeto, visaram que a FUNAD, caso precise fazer algum reparo e/ou manutenção no produto, possa encontrar as peças mais facilmente no mercado, o que evita que o produto seja trocado com frequência. Depois do modelo em 3D foi preciso o desenvolvimento de um modelo físico para as últimas análises. 3.1.6 Considerações Finais Na última etapa do método SATIERF, foi desenvolvido um modelo físico em escala reduzida do andador para que fosse possível avaliar algumas questões ergonômicas, de dimensão e interação com o usuário.
4. CONCLUSÕES Foi relatada a necessidade da FUNAD de ter produtos que tenham uma preocupação maior
com os critérios ergonômicos, o que acarretará em mudanças positivas na fundação, com tratamentos e reabilitações mais eficientes uma vez que os produtos não gerarão dificuldades para os reabilitadores, e sim de fato os ajudarão no processo reabilitação dos seus pacientes. O que trará benefícios diretos aos usuários que vierem a utilizar os serviços da FUNAD. O resultado alcançado foi positivo visto que o andador segue princípios do design universal, a exemplo temos: - Uso equitativo: O produto mesmo sendo para um público específico pode ser utilizado por vários usuários, devido as suas regulagens. - Flexibilidade no uso: Devesse levar em consideração as capacidades individuais de cada usuário e procura atender da melhor forma possível, como por exemplo, atender a destros e canhotos. - Uso simples e intuitivo: O produto é de fácil uso, tanto para os reabilitadores que já são capacitados para a tarefa quanto para as crianças que vierem a utilizá-lo. Os manípulos que já são bastante difundidos no mercado, devido a isso não vai ser encontrando problemas de como pode-se regular o produto. - Informação Perceptível: As cores do produto mostram as principais funções do andador, tornando de mais fácil percepção seu uso. - Tolerância ao erro: Foram evitadas na forma do andador, formas pontiagudas com ângulo de 90º, além de revestimento onde o usuário mais utiliza o produto.
- Baixo esforço físico: O alumínio, material leve, foi escolhido para que o andador tenha baixo peso para que o reabilitador faça menos esforço físico ao utilizá-lo. Também foram levados em consideração fatores ergonômicos básicos, João Gomes Filho (2003), envoltório dos alcances físicos, estereótipo popular, tipo e dimensão de pega, as posturas em que o andador será utilizado, segurança, limpeza e manutenção do produto. O andador, por ser de alumínio, pode ser reutilizado após seu descarte, e as peças que não são de alumínio virão com selos indicadores para que possam ser recicladas mais facilmente após seu descarte. Contudo, fica entendido que o andador atendeu as expectativas da instituição e cumpriu de forma satisfatória as demandas.
5. REFERÊNCIAS BISPO, R; SIMÕES, F. Design Inclusivo: Acessibilidade e Usabilidade em Produtos, Serviços e Ambientes. 2ª Edição. Centro Português de Design, Portugal, 2006. Filho Gomes, João. Ergonomia do Objeto. Editora Escrituras, São Paulo, 2003. IIDA, Itiro. Ergonomia: Projeto e Produção. Editor Edgard Blücher, São Paulo, 2005. MUNARI, Bruno. Das coisas nascem coisas. Martins Editora. São Paulo, 2008.
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DESIGN TÊXTIL E VESTUÁRIO
As razões do desconforto gerado pelas etiquetas nas peças do vestuário e suas possíveis alterações The reasons the discomfort caused by labels on clothing details and possible changes Anteveli, Giovana; Universidade Estadual de Maringá
gianteveli@gmail.com Fiorin, Marcia Berti; Universidade Estadual de Maringá
mbfiorin@gmail.com Miranda, Ana Paula Segato; Universidade Estadual de Maringá
ana_pmiranda@hotmail.com Obici, Giovanna Cortez; Universidade Estadual de Maringá
giovanna_cortez@hotmail.com Pasqualinotto, Julia Rosolino; Universidade Estadual de Maringá
juliarosolino@gmail.com Neotte, Linda Lara; Universidade Estadual de Maringá
linda_neotte@hotmail.com
Resumo O presente estudo tem como objetivo identificar os principais incômodos, na opinião das pessoas, gerados pelas etiquetas nas peças do vestuário, e sugerir algumas soluções para este problema. Para isso, foi realizada uma pesquisa de campo com cinquenta pessoas de idades e localidades diferentes, através de um questionário com nove questões a respeito das etiquetas. Os resultados e sugestões obtidos estão tabulados e dispostos ao decorrer do artigo. Palavras Chave: Incômodo; Etiqueta; Vestuário.
Abstract This study aims to identify the major annoyances in the opinion of the people, generated by the labels on items of clothing, and suggest some solutions to this problem. For this, a field survey with fifty people of different ages and localities was conducted through a questionnaire with nine questions about the labels. The results obtained are tabulated and suggestions and willing to throughout the article. Keywords: Nuisances; Labels; Clothing.
Introdução As etiquetas são indispensáveis à indústria fashion, pois têm como objetivo fornecer informações sobre as peças do vestuário aos seus “clientes”, porém, são consideradas um incômodo, sendo muitas vezes retiradas das roupas.
Com o intuito de compreender melhor as causas de tal desconforto e, possivelmente, gerar uma opção menos desconfortável, o norte deste artigo foi analisar uma pesquisa de campo feita com cinquenta pessoas, sem sexo ou faixa etária pré-determinada, de modo a analisar as razões do desconforto gerado pelas etiquetas nas peças do vestuário, relacionando-
132 as com o tamanho, modelo, composição e local das mesmas.
Fundamentação Teórica Consideradas, muitas vezes, incômodo nas peças do vestuário, as etiquetas desempenham um papel importantíssimo na indústria fashion. As etiquetas têm como objetivo fornecer informações sobre as peças do vestuário aos seus “clientes”, como o nome da empresa fabricante, a composição têxtil, a maneira correta de conservar, entre outros. Existe o regulamento do Inmetro e o do Ipem, que seguem as mesmas normas, e neles estão especificadas todas as informações que são necessárias nas etiquetas. Por lei, segundo o Ipem, todo produto têxtil deve conter cinco categorias informativas obrigatórias ao consumidor, dentre elas: nome, razão social ou marca registrada e CNPJ da empresa fabricante; país de origem do produto; nome das fibras ou filamentos têxteis e suas porcentagens; tratamentos e cuidados para melhor conservação do produto; e indicação de tamanho ou dimensão. De acordo com o IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), as leis que envolvem o uso das etiquetas no vestuário surgiram em 1973, com o intuito de padronizar e globalizar um informativo nas roupas. Em 1978, o Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia) e o Ipem (Instituto de Pesos e Medidas do Estado do Paraná) começaram a fiscalizar as empresas para verificar se as etiquetas estavam sendo usadas, se as mesmas continham todas as informações necessárias e, com o intuito de obter livre comércio entre os países do MERCOSUL, criouse também uma norma da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) em 2006, a ABNT NBR ISO 3758, que especifica os códigos de cuidados usando símbolos e métodos laboratoriais. Dessa maneira, verifica-se que a etiqueta é um detalhe indispensável às roupas, porém, é considerada um incômodo na mesma, pois
133 gera muito desconforto, sendo muitas vezes retirada da peça. Nesse sentido, o objetivo principal deste trabalho foi analisar as razões do desconforto gerado pelas etiquetas nas peças do vestuário, relacionando-as com o tamanho, modelo, composição e local da mesma, além de identificar quais locais e modelos seriam mais confortáveis e viáveis para a produção das roupas.
Metodologia Para o desenvolvimento deste trabalho, foram realizadas pesquisas bibliográficas e de campo, que serviram de base para a fundamentação teórica e análise dos dados gerados pelo mesmo. O critério da metodologia foi desenvolver uma pesquisa de campo com 50 (cinquenta) pessoas, de ambos os sexos e sem faixa etária pré-determinada, onde foi aplicado um questionário com 9 (nove) questões relacionadas ao tamanho, modelo, localização, composição, incômodos e sugestões relacionadas às etiquetas das peças do vestuário. Resultados Dentre os 50 entrevistados, 34 são do sexo feminino e 16 do masculino, gerando uma porcentagem de 66% e 32%, respectivamente. Apesar de não possuir uma faixa etária específica, pode-se perceber, conforme exposto na Figura 1, que a grande maioria dos entrevistados se encontra entre os 15 e 25 anos, representando 60% do total.
Figura 1- Faixa etária dos entrevistados Fonte: Elaboração própria
Quando questionados a respeito das etiquetas serem ou não um incômodo constante nas peças do vestuário, apenas 4% responderam que não, ou seja, 96% afirmam que se incomodam com elas, sendo que 72% dos entrevistados confirmam já terem estragado uma roupa tentando retirá-las, conforme se observa na Figura 2.
Figura 3 - Quais são as peças de roupa em que a etiqueta mais incomoda Fonte: Elaboração própria.
A pesquisa também verificou quais locais das roupas elas mais incomodam. Relacionando com o gráfico anterior, a cintura, nuca e gola foram as que apresentaram maior porcentagem entre os entrevistados, pois é onde são inseridas em blusas, representando 28%, 28% e 16%, respectivamente, seguido do cós traseiro, local típico das etiquetas de calças e shorts, com 19%.
Figura 2 - Número de entrevistados que estragaram uma peça de roupa ao retirar a etiqueta Fonte: Elaboração própria
Para poder identificar melhor a questão do incômodo gerado pelas etiquetas, foi preciso descobrir quais peças de roupas e em quais locais estas são mais desconfortáveis. Aplicando o questionário, foi possível determinar que as blusas e peças íntimas são as roupas que mais causam incômodo, totalizando 29% e 20% das respostas, seguido da calça, com 14%.
Figura 4 - Quais locais as etiquetas geram mais desconfortoFonte: Elaboração própria
Observando a Figura 5, no que diz respeito aos modelos de etiquetas, os modelos 2 e 4 (Figura 6) são os que mais incomodam, tendo respectivamente 37% e 22% dos votos, e a que menos incomoda é o modelo 6 (Figura 6) com total aceitação. Portanto, conclui-se que os modelos grandes e de costuras apenas nas laterais são os que mais incomodam e geram desconforto.
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Figura 5 - Modelos de etiquetas que mais incomodam Fonte: Elaboração própria
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Figura 8 - Tamanho ideal para as etiquetas Fonte: Elaboração própria
Em relação à aceitação da etiqueta em carimbo/silk, pode-se notar que seriam uma boa alternativa para acabar com o incômodo ocasionado pelos demais tipos, pois 98% dos entrevistados responderam que o uso desse modelo seria satisfatório. Figura 6 - Modelos de etiqueta 2, 4 e 6, respectivamente Fonte: Elaboração própria
Sobre a composição das etiquetas, o questionário apontou que as de cetim e de couro não causam incômodo. Já as sintéticas e com lurex foram as mais votadas pelos entrevistados, totalizando 42% e 24%, respectivamente. Figura 9 - Aceitação do modelo de etiqueta em carimbo/silk para solucionar o incômodo nas peças do vestuário Fonte: Elaboração própria
Figura 7 - Composição de etiqueta que mais incomoda Fonte: Elaboração própria
No que diz respeito ao tamanho, conforme exposto na Figura 8 abaixo, 73% dos entrevistados opinaram que a etiqueta pequena seria a melhor opção, enquanto 22% declararam-se a favor da média e 4% da grande.
Os entrevistados também foram questionados a respeito de terem alguma sugestão para resolver esse problema do incomodo. Dentre as respostas, mudar a composição para algo mais confortável, como o algodão, colocar – la junto com a tag da marca, usar a técnica de silk/carimbo já citada na pesquisa, ou ainda, fazer uma etiqueta destacável. Estas foram as opções mais interessantes, pois se forem viáveis financeiramente, podem se tornar ótimas alternativas para solucionar o problema.
Conclusão Com esta pesquisa, conclui-se que as etiquetas são indispensáveis às roupas no que diz respeito às informações dirigidas aos consumidores. No entanto, a maioria dos entrevistados sentese incomodado com as mesmas, tanto no
sentido do tamanho e localização quanto no da composição. Sendo assim, mudanças foram sugeridas pelos próprios entrevistados para que desse modo não sejam mais causadoras de transtornos, tais como as opções destacáveis, de silk/carimbo, ou ainda, que venham junto com a tag da marca e possam ser jogadas fora logo após a compra da peça. Caso não seja possível fazer nenhuma alteração na forma que a etiqueta é “comercializada”, é possível optar pelos modelos e composições que menos incomodam. De acordo com os resultados da pesquisa, pode-se concluir que as de algodão, sugeridas pelos entrevistados, e as de cetim, são as mais apropriadas para a fabricação, já que quase não incomodam. Outro fator a ser levado em consideração é o local onde é colocada. Segundo o questionário aplicado, nuca e gola são os locais que mais geram desconforto nas peças do vestuário. Portanto, seria interessante que as peças de roupa tivessem etiquetas em locais diferenciados e estratégicos, para que sejam mais confortáveis aos consumidores.
Referências BRASIL. MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO EXTERIOR. Resolução n.º 02, de 6 de maio de 2008. Dispõe sobre a aprovação do Regulamento Técnico Mercosul Sobre Etiquetagem de Produtos Têxteis. Disponível em: <http://www.inmetro.gov.br/ legislacao/resc/pdf/RESC000213.pdf>. Acesso em: 26 set. 2013. COMFORT CONCENTRADO. Dicas e cuidados. Disponível em: <http://www.comfort.com.br/ Dicas?gclid=CM_0sefj0rkCFc9i7AodqxYAAw>. Acesso em: 26 set. 2013. INSTITUTO DE PESOS E MEDIDAS DO ESTADO DE SÃO PAULO (IPEM-SP). Produtos têxteis. Disponível em: <http://sindilav.com. br/noticias/wp-content/uploads/2012/07/ Cartilha_textil_IpemSP-13-9-2010.pdf>. Acesso em: 26 set. 2013. MARINHO, Nathilucy do Nascimento; SILVA, Etienne Amorim Albino da. Etiquetas: uma abordagem informativa da conservação adequada dos produtos têxteis. In: ENCONTRO DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO DA FACULDADE SENAC, 2., Recife, 2008. Anais ... Disponível em: <http://www.pe.senac. br/ascom/faculdade/edital/IIEncontro/cd/ ETIQUETAS.pdf>. Acesso em: 26 set. 2013. OLIVEIRA, Gabriele P. de; QUEIROZ, Rayana S. de. Etiquetagem e Conservação de Têxteis. Disponível em: <http://www.ipt.br/centro_ colunas_interna.php?id_coluna=10&id_ unidade=6&qual=colunas>. Acesso em: 26 set. 2013.
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Moda inclusiva e social: desenvolvimento de vestuário sleepwear para idosas institucionalizadas Fashion social and inclusive: development of sleepwear garments for institutionalized elderly Anteveli,Giovana; Universidade Estadual de Maringá
gianteveli@gmail.com Martins, Ana Caroline Siqueira; Universidade do Oeste do Paraná
lf_carol@hotmail.com
Resumo Os problemas físicos consequentes da idade avançada, como alterações no corpo, dificultam o uso de produtos do vestuário. Percebe-se a importância de desenvolver uma pesquisa para atender as necessidades específicas de idosas institucionalizadas, com baixo reconhecimento social e qualidade de vida. Há o interesse em pesquisar as transformações decorrentes do processo de envelhecimento e as necessidades de idosos institucionalizados, em especial os do Recanto dos Velhinhos de Cianorte- PR, para assim, através de diretrizes resultantes, desenvolver produtos que melhorarão sua qualidade de vida, bem como o trabalho daquelas que cuidam das mesmas. Palavras Chave: Idosas; Moda; Desenvolvimento de produto.
Abstract Consequent physical problems of old age, such as body changes, hinder the use of garment products. Realizes the importance of developing a survey to meet the specific needs of institutionalized elderly women with low social recognition and quality of life. There is interest in researching the changes resulting from the aging process and the needs of institutionalized elderly, particularly those of the Recanto dos Velhinhos de Cianorte - PR, thus, resulting through guidelines, to develop products that will improve their quality of life as well as the work of those who care for them. Keywords: Elderly; Fashion; Product development.
Introdução O processo de envelhecimento vem sendo debatido em diversas áreas do conhecimento, mostrando-se pertinente também na moda. O número de brasileiros com mais de 60 anos representará 29% da população em 2025 (IBGE, 2010), um percentual expressivo que notadamente no setor do vestuário ainda é pouco explorado, sendo que as necessidades destes se alteram significativamente com o passar dos anos. Alguns estudos sobre roupas para idosos apontam que o conforto é um
elemento essencial, além do suprimento de necessidades especificas da idade. No intuito de entender sobre esta temática surgem novas discussões sobre as experiências do envelhecer e sobre maneiras de tornar este processo mais prazeroso no sentido do bem estar social, físico e mental. Neste sentido, entende-se que por meio do vestuário é possível melhorar o bem estar do idoso, principalmente daqueles residentes em “casas de repouso”. A cidade de Cianorte - PR possui o Recanto dos Velhinhos de Cianorte, uma entidade beneficente administrada por irmãs
de caridades que se propõem a dar atenção integral a aproximadamente 30 idosas. Este artigo é resultado de pesquisas realizadas nessa instituição, oriunda do trabalho de um projeto de extensão do curso de Moda da Universidade Estadual de Maringá. Considerando que Cianorte é intitulada a capital do vestuário e que grande parte de sua economia provem deste mercado, tendo também duas universidades de moda, tornase pertinente o incremento de projetos sociais que possam por meio da moda contribuir para o desenvolvimento social, principalmente para uma parcela menos favorecida,e através de pesquisas desenvolver novas possibilidades de vestuário. É também uma forma da universidade, por meio de projetos de extensão, retribuir os benefícios recebidos pela indústria da moda por meio de estudos em que as roupas possam ser agente importante no desenvolvimento humano. Melhorar a qualidade de vida deve ser uma tarefa de todas as áreas do conhecimento. Na atualidade, viver cada dia mais e melhor tem sido o desejo de grande parte da sociedade, neste intuito, o desafio parece ser envelhecer mantendo uma boa qualidade de vida. Para os profissionais da moda o desafio é atender as expectativas de melhor conforto social, físico e mental desenvolvendo produtos que possam atender tais necessidades. De acordo com Lurie (1997), a palavra moda, do latim modus, que significa modo, maneira; não está unicamente a servir de um produto, mas também imbuída na satisfação, fluição, ou seja, em qualidades subjetivas. Esta afirmação leva a consideração de que moda também é um sistema ligado à autoestima, qualidade de vida e inclusão social. O produto desta e sua criação estão estreitamente ligados a conceitos de projeto, ou seja, o item em prol de sua função e as etapas de desenvolvimento a ele pertinentes, por isso a necessidade de uma nova metodologia adequada e ajustada a este processo para idosas institucionalizadas. Pesquisas recentes acabaram com o mito de que o Brasil seria um país de jovens. Lomba (2009) relata que de acordo com pesquisa do
IBGE cerca de 10% da população brasileira é constituída por idosos, e ainda que em 2025 o país estará na sexta posição de mais envelhecido do mundo. Segundo Camarano, (1999, p. 4), “a Organização Mundial da Saúde (OMS) considera como idosas as pessoas com 60 anos ou mais, se elas residem em países em desenvolvimento, e com 65 anos ou mais se residem em países desenvolvidos”. A respeito do envelhecimento, Lemos, Palhares, Pinheiro e Landenberger (2011) relatam que é um processo que está rodeado de muitas concepções falsas, temores, crenças e mitos. A imagem que se tem da velhice mediante diversas fontes históricas, varia de cultura em cultura, de tempo em tempo e de lugar em lugar. Esse processo é caracterizado por diversas alterações de aspectos ambientais, saúde física e mental, e interação social que levam a efeitos danosos na qualidade de vida, induzindo a obter uma desestruturação orgânica mais rápida afetando assim a aptidão funcional do idoso e a diminuição de algumas capacidades físicas inerentes na prática de suas atividades da vida diária (LIMA; DELGADO, 2010). Sobre qualidade de vida, Paschoal (2000) salienta que é uma escrita de difícil conceituação, que veio sofrendo transformações ao longo do tempo. Em sua pesquisa a palavra qualidade é definida como indicador de superioridade e a palavra vida inclui saúde, relações familiares satisfatórias, condições financeiras estáveis, entre outros aspectos. As vulnerabilidades físicas do idoso como suas necessidades específicas de locomoção e alimentação, por exemplo, tem sido um dos motivos pelo qual atualmente famílias optam por deixar seus entes em lares que possam suprir as necessidades pontuais destes. A família brasileira está se modificando com a modernização da sociedade. A entrada da mulher no mercado de trabalho, a redução do tamanho das famílias e a falta de tempo na vida atual vêm transformando a relação e o cuidado com os idosos. Somada a essas mudanças, a falta de alternativas para se manter os idosos
138 em casa, além daqueles que não possuem referência familiar têm aumentado à demanda nos asilos e casas de apoio (LIMA; DELGADO, 2010). Lomba (2009), relata que um levantamento inédito que está sendo feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) aponta a existência de 6 mil instituições de longa permanência para idosos no país, o nome formal para asilos, casas de repouso e geriátricas, todos estes com o objetivo em comum de oferecer uma melhor qualidade de vida para estes indivíduos. Este dado demonstra a grande quantidade de instituições de longa permanência, o que salienta a importância desse projeto, em proporcionar conhecimento especifico na área, podendo ser utilizado de modelo para outras instituições. Os idosos perdem força e massa muscular em torno de 10% a 20% ocasionando a diminuição das capacidades e habilidades motoras. Conforme Matsudo et al. (2000), uma das mais evidentes alterações que acontecem com o aumento da idade cronológica é a mudança das dimensões corporais. Com o processo de envelhecimento existem mudanças principalmente na estatura, no peso e na composição corporal. De acordo com Balsamo e Simões (2005) durante o envelhecimento as variáveis antropométricas e a estrutura óssea do corpo humano, sofrem uma considerável alteração, sabe-se que há uma maior redução na coluna vertebral, considerada um dos pontos mais fracos do organismo, que é o achatamento das cartilagens intervertebrais, ocasionando a curvatura da coluna para frente e posteriormente levando a cifose torácica progressiva. Essa alteração começa a acontecer a partir dos 40 anos de idade, com cerca de um centímetro por década, entre 60 e 80 anos essa taxa de diminuição de altura é de cerca de dois centímetros, podendo atingir até doze centímetros em casos de extrema perda óssea. Segundo Spirduso (2005) há onze fatores que afetam a qualidade de vida dos idosos: função emocional, sensação de bem-estar, função cognitiva, satisfação pessoal, condição
139 financeira, atividade recreativa, função social, função sexual, função física, condição de saúde e energia e vitalidade. A criação de peças, bem como marcas do vestuário destinadas exclusivamente para a terceira idade ainda é pouco notória, verificando a necessidade de pesquisa e desenvolvimento de produtos para que esse público se sinta reconhecido socialmente, além do aumento de sua autoestima, autonomia e mobilidade no caso dos idosos residentes em asilos. Tanto uns usuários quanto os outros querem mais do que a roupa em seu aspecto material. Em ambos os casos, nota-se o desejo de se identificar com uma mensagem que tais produtos podem emitir por meio de associações, muitas vezes bastante complexas para alguém estranho ao grupo, porque fazem uso de mais de um elemento simbólico em sua construção vestimentar”. (GARCIA; MIRANDA, 2007).
Para o desenvolvimento de um vestuário adequado aos idosos, uma entidade beneficente de longa permanência denominada Recanto dos Velhinhos de Cianorte foi escolhida, esta, segundo entrevista feita com a irmã Nilza, responsável pela entidade, foi fundada em fevereiro de 1972 e desde então recebe mulheres idosas, tendo uma coordenação formada pelas Filhas de Caridade de São Vicente, freiras que se dedicam ao máximo para oferecer uma qualidade de vida digna a essas idosas que apresentam situação de risco social, econômico e de abandono. O recanto, que tem capacidade para receber 45 senhoras, no momento atende 30, oferecendo um atendimento com responsabilidade e respeito à cultura de cada uma e de suas capacidades, para que se adaptem as atividades, amenizando o sofrimento pelo abandono dos familiares. As Irmãs realizam atividades artísticas, passeios, festas, visitas, rezam terços e ainda, para aquelas que podem, fazem com que realizem trabalhos domésticos conforme a capacidade de cada uma, desta maneira sentem-se em casa e em ambiente familiar, contando também
com a ajuda de fisioterapeutas, e recebem todo acompanhamento médico necessário. Segundo a irmã é a primeira vez que uma universidade de moda se interessa em fazer um trabalho social e voluntario na entidade. Segundo o Ipea em pesquisa realizada entre 2007 e 2008, o vestuário representa (1,3%) dos gastos das instituições de longa permanência. A baixa proporção de gastos com vestuário e mesmo com alimentos pode ser explicada pelas doações da comunidade ou mesmo dos familiares dos residentes, indicando o papel fundamental da comunidade na manutenção destas entidades, o que demonstra a pertinência de também a moda, prestar sua contribuição, visto que o mercado de produtos específicos para idosos está fora do ambiente de padrões estabelecidos para produção do vestuário, gerando dessa forma um grande número de usuários, que, por suas peculiaridades físicas e (ou) fisiológicas, não é contemplado, a exemplo dos obesos, adultos muito pequenos ou muito grandes, pessoas portadoras de necessidades especiais, entre outras. No âmbito do desenvolvimento de projetos de produto do vestuário, é possível resolver os problemas do vestuário já na fase de concepção, introduzindo os princípios ergonômicos, pois nele se trabalha com a perspectiva de revisão constante dos fatores de risco, adequação e qualidade do produto, sem descuidar das questões econômicas. A aplicação desses princípios pode evitar, por exemplo, discrepância entre o desenvolvimento do produto e a “vestibilidade” das peças confeccionadas, inadequações de formas e materiais, restrição da mobilidade requerida pela roupa (SCHUTZER, GRAVES, 2004).
Materiais e Métodos A metodologia usada foi a revisão bibliográfica e a pesquisa de campo. A pesquisa de campo foi realizada através de visitas de toda a equipe do projeto ao Recanto dos velhinhos de Cianorte, instituição escolhida para a pesquisa, onde foram aplicados questionários para constatar as necessidades e desejos do público alvo, mais
precisamente através do toque dos tecidos e das estampas dos mesmos, para a medição das medidas antropométricas das idosas, para a prova, ajustes e correção dos protótipos, e por último para a entrega das peças confeccionadas e assim obter o feedback final das idosas contempladas pelo projeto. Durante as visitas ao Recanto, foram realizadas também, entrevistas pontuais com algumas cuidadoras, para saber as maiores dificuldades na hora de vestir e despir as idosas. Para o desenvolvimento do projeto os materiais utilizados foram notebook com acesso a internet, livros, questionários impressos, canetas, lápis de cor, tecidos, materiais de modelagem e costura.
Discussão de Resultados Na pesquisa realizada com as idosas residentes do Recanto notou-se que 90% das entrevistadas possuem mais de 66 anos, sendo que 50% delas já passaram dos 75 anos, o que evidenciou uma maior necessidade de auxilio para execução de suas atividades diárias. As alterações na capacidade funcional do idoso podem acarretar vários danos à saúde, um deles é a maior probabilidade de quedas. Idosos de 75 á 84 anos, que necessitam de ajuda para realizar atividades da sua vida diária (comer, tomar banho, higiene intima, vestirse, sair da cama, incontinência urinaria e fecal) têm uma probabilidade 14 vezes a mais de cair do que pessoas da mesma idade que são independentes. Essas quedas muitas vezes resultam em fraturas graves devido aos efeitos danosos do envelhecimento, necessitando de grande cuidado (SILVA et. al, 2008). A entidade recebe frequentemente novas idosas, 50% delas vivem no Recanto a menos de três anos enquanto 40% residem a mais de sete anos, o que demonstra a permanência longa de muitas na instituição. Quando questionadas por qual motivo usam peças do vestuário, 60% das idosas responderam que por necessidade e proteção, mas 40% responderam que se vestem para se sentirem bonitas e 20% para se sentirem jovens, ficando clara a importância dos artigos
140 de moda para manutenção da autoestima e vaidade das mesmas. Na pergunta “Quais fatores fundamentais na roupa” em que as entrevistadas puderam responder mais de uma alternativa, verificou-se que a maioria prefere o conforto e a facilidade ao vestir, ambas com 50%. A respeito de qual parte do corpo gostariam de disfarçar por meio das roupas, a maioria delas, 40% indicaram braços flácidos e surpreendentemente, também com 40% responderam que não gostariam de disfarçar nenhuma parte do corpo, que estão satisfeitas com ele. Ao serem questionadas quanto ao vestuário, os itens mais citados com relação ao incomodo no momento de se vestirem foram “muitos botões” com 70% e” zíper nas costas” com 60%. Com relação ao artigo têxtil considerado mais confortável, 78% escolheram a meia malha 100% algodão, e em seguida optaram pela viscolycra, moleton, cetim e viscose, todos com 44%, ressaltando que o moletom foi escolhido considerando o período de inverno e o cetim pelo brilho. Ainda sobre artigos do vestuário, 60% das idosas responderam que preferem peças lisas, 70% largas, 50% amplas, 100% não decotadas e 70% compridas. Das que responderam que preferem peças estampadas, o floral e o poá foram as escolhidas, O vestido foi à peça de vestuário com maior aceitação entre as entrevistadas, 50% responderam ser ele sua roupa preferida. Também no questionário, as idosas responderam que gostam mais de cores fortes como o rosa, laranja, vermelho e verde (60%) e que para o fechamento de suas roupas elegeram o zíper (desde que seja lateral ou frontal) ou peças sem necessidade de fechamento como botões, amarrações ou feches, ambas alternativas com 30%. Ainda relataram que pernas apertadas e mangas apertadas são partes do vestuário que mais incomodam fisicamente, respectivamente com 80% e 70%. As idosas residentes no Recanto dos Velhinhos de Cianorte ainda responderam com 60% que optam por se vestirem com peças separadas em detrimento de conjuntos (40%).
141 Também arguidas quanto a qual perfil de corpo consideravam ser o delas, a maioria se considera com corpo oval, 40%, em que a largura da cintura é maior que a dos ombros e quadris, seguida pelo corpo pera com 30% (ombros e cintura mais estreitos que os quadris.), corpo ampulheta ( ombros e quadris têm a mesma medida, sendo a cintura mais estreita.) com 20% e com 10% com corpo retângulo (quadris, cintura e ombros têm praticamente as mesmas medidas), confirmando a revisão de literatura que indicou que na velhice a região abdominal concentra maior gordura, mudando assim a composição do corpo. Durante a entrevista foi questionado sobre a alfabetização das idosas em que se comprovou que 50% sabem ler e escrever e 50% não são alfabetizadas, dado importante para criação de estampas e bordados, evitando mensagens escritas para aquelas não alfabetizadas. Também foi perguntado sobre a religião das mesmas, no intuito de auxiliar também no momento de criação das peças, evitando símbolos e mensagens que de certa forma pudessem agredir a religião das idosas, sendo a maioria católica, 60%, seguido de evangélicas, 30%, e sem religião, 10%. Na pesquisa, verificou-se que pelo menos 50% das idosas residentes no recanto possuem dificuldades de se locomoverem sozinhas, além de terem uma grande carência afetiva. Também comentaram sobre o interesse por produtos de vestuário, de participarem da escolha das peças que vestem e do desenvolvimento dos produtos; atualmente elas não participam da escolha de suas roupas, a figura 1 mostra idosas residentes do Recanto.
Figura 1 - Idosas residentes do Recanto dos Velhinhos de Cianorte Fonte: Acervo digital do Recanto dos Velhinhos de Cianorte
Foi possível perceber ainda que o conforto e a funcionalidade são fundamentais, a roupa tem que se adequar ao corpo, além é claro de ser fácil de vestir e durável, quesito relevante para a própria manutenção das roupas na entidade. Segundo Farias e Buchalla (2005) o termo funcionalidade refere-se às condições de saúde de uma pessoa, identificando o que esta pode ou não pode fazer em sua vida diária, relacionando com suas limitações e participações sociais no meio em que vive. O “conforto”, por sua vez, pode ser definido como um “estado de harmonia física e mental com o meio ambiente, baseado na ausência de qualquer sensação de incômodo” (NICOLINI 1995). O desconforto é devido aos movimentos já retardados pela velhice, muitos não conseguem levantar os braços por completo, por exemplo, e a roupa não deve dificultar mais ainda esse processo. Com os problemas físicos, a dificuldade com as vestimentas se torna um incomodo, zíperes atrás de vestidos ou saias são difíceis de serem completamente fechados por eles, muitos botões também não ajudam, recortes no busto ou na cintura chamam a atenção, por exemplo, para partes do corpo que inclusive as mulheres querem disfarçar como os seios, a possível “barriguinha” saliente, os braços que ficam normalmente flácidos. Os dados obtidos pelas pesquisas resultaram em diretrizes para o desenvolvimento de
produto. Inicialmente foi analisado e definido os problemas de design a serem solucionados por meio do projeto, o que originou as seguintes diretrizes para o desenvolvimento de produtos voltados a idosas e em especial para as institucionalizadas: Diretrizes funcionais: aviamentos práticos; material flexível, com resistência e conforto; facilidade no vestir e despir; conforto térmico; conforto tátil; modelagem observando cavas, decotes, alturas, quadril, cinturas, ombros, circunferências; tecidos que não escorregam (antiderrapante, principalmente para as cadeirantes para que não escorreguem nas cadeiras); elásticos; materiais antialérgicos, bactericidas; Diretrizes estéticas e simbólicas: carência afetiva e emocional; estimulação da memória dos sentidos (visual, tátil, olfativo); atentar à aspectos de pudor; disposição do nome da senhora na peça – a importância do nome; Diretrizes do universo do público - alvo (físicas e psicológicas), sendo as físicas: Dificuldade de mobilidade; menos ágeis e flexíveis; Perda de força e massa muscular; Mudança das dimensões corporais; Aumento da proporção de gordura corpórea; Decréscimo da estatura; Perda da sensibilidade olfativa, gustativa e auditiva; Ressecamento e fragilidade da pele; Maior sensibilidade ao frio; Diminuição da quantidade de água no organismo; Diminuição do tecido gorduroso dos braços e pernas; Na zona inferior ocorre um alargamento da anca, um acumular de massa corporal no baixo abdômen e também um aumento da largura das pernas, em detrimento da sua altura. E as psicológicas: carência afetiva e emocional; baixa autoestima; memoria debilitada; sentimento de incapacidade. Além das diretrizes, um importante recurso para os estudos nas áreas alcançadas foi possível realizar por meio das pesquisas, as etapas do desenvolvimento de produtos de vestuário voltados a alguns aspectos específicos identificados nos estudos. Devido o projeto não possuir recursos financeiros, toda matéria prima foi oriunda de doações de indústrias
142 de confecções da cidade que se identificaram com o objetivo do mesmo e apoiaram, por isso, no primeiro resultado em termos de confecções dos produtos foram realizadas apenas algumas adaptações, conciliando assim as necessidades do público e a realidade em se conseguir todos os materiais necessários. Os produtos confeccionados e entregues as idosas do recanto dos Velhinhos de Cianorte no dia 09 de setembro de 2014 contemplaram, entre outras questões, adequação as medidas do corpo de cada idosa, adequações antropométricas considerando as mudanças decorrentes da idade, aspectos pessoais como as restrições físicas e de locomoção, onde foram feitos vestuários sleepwear diferentes para cadeirantes e para as acamadas. Também foi considerado os gostos pessoais como cor, modelo e religião, em que foram confeccionados a grande maioria das peças na cor rosa, identificada como de preferência da maioria, mas para uma idosa foi criado vestuário azul e branco, conforme seu pedido. Foram desenvolvidos conjuntos para grande parte das idosas e camisolas para aquelas que por conta da religião não usam calças. Ainda, os produtos foram desenvolvidos pensando na facilidade de vestir tanto daquelas idosas que se vestem sozinhas quanto para aquelas que necessitam de auxilio das cuidadoras. Um dos modelos confeccionados, por exemplo, possui abertura nas costas, sendo vestido pela frente, com transpasse para ajuste, possibilitando assim a vestibilidade pelas cuidadoras, tendo as idosas que posicionarem os braços apenas para frente, na altura dos ombros e não para cima como geralmente são colocadas as roupas da parte superior do corpo. Outro exemplo que pode ser arguido foi a confecção de outra peça de vestuário sleepwear, que manteve a cor rosa, predominante na preferencia das entrevistadas, e conteve detalhes em estampas de poá (bolinhas), uma forma de atender o desejo das idosas, seus gostos e assim contribuir para seu bem estar e autoestima, tal recurso também foi inserido nas camisolas. Tanto os conjuntos
143 quanto as camisolas continham identificação do nome de cada idosa residente no Recanto dos Velhinhos de Cianorte, uma solicitação das cuidadoras para a identificação de cada interna, e uma forma de valorizar cada idosa, oferecendo um produto personalizado as suas necessidades e com seu nome. Além disso, as idosas receberam junto ao vestuário sleepwear um sachê aromático em formato de vestido.
Com o estudo, notou-se que a moda/vestuário pode contribuir para uma melhor qualidade de vida física e psicológica das idosas, adequandose as suas necessidades e integrando-as socialmente. O projeto ainda possibilitou conhecimento sobre esse segmento pelos alunos e professores, bem como a elaboração de diretrizes norteadoras sobre as características de idosas institucionalizadas para produtos destinados as mesmas residentes em Instituições de longa permanência. O projeto ainda demonstra um caráter social do curso de moda, uma vez que todos os participantes são voluntários e as peças foram doadas para a instituição.
Referências
Figura 2- Protótipo dos produtos confeccionados, com abertura nas costas, traspasse e identificação. Fonte: Acervo digital do Recanto dos Velhinhos de Cianorte
Conclusões A pesquisa foi muito importante para constatar primeiramente a realidade da vida cotidiana de instituição de caridade, para perceber as necessidades que tanto residentes quanto colaboradores possuem e principalmente que, ao conhecer a dinâmica da entidade, é possível desenvolver soluções viáveis que possam contribuir para o bem estar de todos. O vestuário sendo uma forma de diminuir dificuldades detectadas no Recanto. Durante o projeto, todo o processo como pesquisa, criação, modelagem, confecção, identidade visual, entre outros, foram abordados. A próxima etapa do projeto é a produção de um dossiê impresso com todas as informações e etapas do projeto, que será arquivado na universidade como material de pesquisa aos alunos e professores.
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DESIGN URBANO
In Palpável: Design de instalação, seguindo os conceitos de work in progress , afeto, corpo e coletivo In Palpável: Design installation, following the concepts of work in progress, affection, body and collective Musmann, Thomas; Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, UNESP
thomasmusmann@gmail.com Carvalho, Ana Luiza de; Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, UNESP
analuiza.alsc@yahoo.com Avancini, Carolina; Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, UNESP
caavancini@gmail.com Bonadio, Dora; Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, UNESP
dorabonadio@gmail.com Rossi, Dorival Campos; Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, UNESP
bauruhaus@yahoo.com.br
Resumo Para o desenvolvimento do projeto In Palpável foram estudados uma série de conceitos, tais como work in progress, design sensorial, emotion design, coletivo e corpo em movimento. Sendo assim foi desenvolvida uma instalação in progress em que o espectador não tem uma função meramente passiva, mas participa de forma integral para que a instalação se complete. Sendo capaz de interagir com o corpo todo o corpo em movimento é afetado pela obra e, em recíproca, afeta o ambiente e todos os que estão em volta. Palavras Chave : instalação; corpo; afeto; coletivo.
Abstract To develop the project In Palpável, many concepts, such as work in progress, sensory design, emotion design, collective and body movement were studied. After this was developed an installation in progress in which the viewer does not have a merely passive role, but participates in a intensive manner. Being able to interact with the whole body the body in motion is affected by the environment, and reciprocal, affects the environment and everything that is around. Keywords: installation; body; affection; colletive.
Introdução As sensações, as emoções são conceitos virtuais plausíveis de serem transcritos na forma de real, palpável. Criar meios de transcrevê-los em forma é uma tentativa diária que passa despercebida às pessoas. Atualizar
(LEVY) esses conceitos, ou seja, resolver os problemas da virtualidade, é um dos objetivos do projeto, que pretende tornar possível o “in palpável”. Através do corpo é possível sentir, ser afetado, ter sua potência de agir aumentada ou diminuída (ESPINOSA). O corpo é agora um corpo perturbador, “que transforma um
146 ambiente, seja pelo bem ou pelo mal” (GREINER, Christina). Nesse processo de transformação ele realiza trocas com o ambiente ficando à mercê de mudanças como resultado desses cruzamentos com o meio. Dentro desse contexto, a instalação desenvolvida pelo projeto pretende integrar corpos, promover trocas, sensações, atualizar conceitos que se firmam no virtual. Trata-se de criar uma zona de fuga dentro do meio urbano capaz de integrar corpos e suas experiências. Há uma nova forma de sociedade surgindo que é a comunidade virtual, esta é rizomática, desprendida do tempo e do espaço, ela se baseia muito mais nas trocas. A instalação desenvolvida tenta propor essa nova forma de comunicação baseada na troca não só de informação, mas de experiências, de afeto, de corpo. “Se a vida é um processo de conhecimento, os seres vivos constroem esse conhecimento não a partir de uma atitude passiva e sim pela interação” (MATURANA, H.; VARELA, F.; online) O corpo muda o ambiente e este influencia no corpo, o processo é in progress, não tem finalização, um está apto a mudanças assim como o outro, de forma acidental, ou seja, imprevisível. Nosso ambiente instalacional é assim, composto por um sistema autopoiético, ao mesmo tempo produtor e produto. (MATURANA, H.; VARELA, F.) O mundo que nos cerca é formado a partir de nossas percepções, nosso corpo, nossas experiências, nossas trocas influenciam na construção da realidade de cada um, pois esta é subjetiva. Sendo assim, nosso mundo é a nossa visão de mundo, ele é aquilo que somos. Dessa forma, se cada realidade depende daquilo que cada um é, ou seja, depende de um indivíduo, existem tantas realidades quanto pessoas ativas.
O conceito: Instalação e work in progress O projeto consistirá no estudo das instalações inseridas no processo de working in progress, processo este que opera através da superposição de estruturas, incorporação de diversos conteúdos e emoções, em que
147 o paralelismo entre o produto e o processo baseia toda essa linguagem. Como há diversas definições para o termo “instalações”, para uma melhor abordagem do tema, este trabalho adotará a seguinte concepção: um espaço modificado, fechado ou não, que será ocupado por um corpo em movimento. O corpo, envolvido por este ambiente, é manipulado por experiências estéticas, porém ele também manipula o meio, trazendo ao ambiente sempre uma nova interpretação. Este corpo, para que possa usufruir do meio, deve estar aberto às novas experiências e sensações. A partir deste conceito, podemos asseverar que, neste processo as instalações ganham maior interatividade, a relação produto e espectador é reforçada. O espectador deixa de ser apenas um observador e começa a fazer parte do conjunto da obra, tornando-se um interator (aquele que vê e participa) (COHEN, 2006). Desta forma, o ambiente nunca chega a ser finalizado, pois as modificações causadas pela presença do interator dão á instalação um caráter in progress; são únicas a cada vez que são vistas. Este tipo de instalação pode ser feito em diversos lugares, transpassando as quatro paredes das galerias, museus, teatros. Isso gera, portanto, certa dessacralização do espaço da arte, uma vez que também podem ser feitas em espaços públicos, onde há fluxo natural de pessoas, dando uma conotação sublime ao espaço/tempo diário. A In Palpável não prima por nenhum sentido, a visão, o tato, a audição, todos esses estão presentes de forma a transportar o interactor para uma TAZ. Seja vendo as formas que a instalação tomará, ou por sentir as texturas diferentes e mudá-las de lugar, mexer, interagir com elas e criar novas, seja simplesmente por passar algum minuto sentado ali, ouvindo o som, sentindo a luz, aproveitando o espaço com uma nova visão. Na instalação in progress o processo e o produto assumem a mesma importância. Não há uma obra acabada quando esta for regida por este processo, há sempre uma “obra em processo” (COHEN, 2006), porém não significa que seja uma obra “mal acabada”, mas sim uma obra que em sua incompletude mora sua maior virtude.
As instalações no work in progress estimulam um modo de pensar baseado no imprevisível, além de ser interativo, já que sua incompletude a deixa permeável para interferências do público. Compostas por 36 placas de madeira, cobertas por três camadas de texturas diferentes, passíveis de mudanças e trocas, a instalação realizada abre caminhos para novas estéticas construtivas, ou seja, com ela pode-se formar inúmeras formas e disposições simplesmente trocando essas texturas e essas placas de lugar. Uma área de relaxamento, em que sentir o espaço e todas suas sensações faz parte do proposto e ajuda o interactor a criar uma realidade paralela a que ele tinha ao passar pela rua. Alguns minutos de interação conseguirão fazer com que ele se sinta à vontade mesmo estando num espaço público. O som, as texturas diferentes e a maciez do ambiente transportarão este corpo a um outro espaço tempo diário. O design contemporâneo tem que se aproximar das pessoas, deve ser inserido no cotidiano delas acrescentando e modificando algo nelas. Dessa forma, cria-se uma relação de parceria, a instalação oferece a comunidade um espaço de fuga dentro do cotidiano delas e em troca, ela pede pela presença do corpo para que se complete. Essa cumplicidade é a essência da instalação in progress proposta. Sendo assim, cada pessoa que interagir com a instalação realizada pelo projeto poderá transformá-la de modo que o próximo que vier usufruir do espaço já não a encontrará da mesma forma que a anterior a encontrou. Cada um é responsável por mantêla viva, mutante. Disponibilizando os quadrados de formas diferentes, trocando as texturas e os módulos, todo e qualquer tipo de interação transformará e criará um espaço novo. Sendo assim ela é ao mesmo tempo efêmera e eterna.
O corpo O projeto buscou abranger o corpo em movimento como forma de ligação do interactor ao objeto. O objetivo principal ao tratar do corpo foi reavivar os movimentos e os sentidos a partir da interação. Tratar o corpóreo através
do corpo foi a maneira escolhida como forma mais coerente, tendo em vista os conceitos já citados. O trabalho buscou então fundamentarse em possibilitar uma troca entre os envolvidos através do toque e do movimento. A interação é livre, não é preciso ter um repertório específico para participar da obra, não há uma mensagem a ser entendida. A ideia é criar um campo onde cada um possa fazer suas descobertas e ter uma experiência diferente a partir de suas próprias vontades e especificidades. Nesse sentido, o corpo, como um todo, deve ser afetado por uma experiência, por sua interação não apenas intelectual mas também física com o objeto. Criar a interação a partir das ações, movimento e sensações, vai além de criar apenas um objeto contemplativo. O objeto do trabalho funciona como um corpo, na medida em que existe e é definido a partir dos seus limiares com outros corpos, pela interação, pela mudança e pelo encontro. É só através desse encontro que é possível medir suas propriedades, e elas estarão sempre em transformação, pois apenas por si só o objeto é inanimado e estático. A relação entre corpo e mente foi amplamente discutida na filosofia, mas foi Espinosa que propôs uma visão diferente nessa relação, indo contra as definições mais comuns que partiam do princípio de que tratavam-se, antes de tudo, de duas partes separadas do homem, e de que era possível pensá-los como propriedades diferentes, mesmo havendo ligação entre suas ações, proveniente do pensamento dualista de Descartes. Contrário a essa ideia, para Espinosa, mente e corpo não eram partes distintas do ser humano, e sim manifestações da mesma substância, como pensamento e extensão, sendo a mente a ideia do corpo, e de suas afecções. O ser humano é, em Espinosa, definido como um composto de complexo corporal e de um complexo psíquico, em que o corpo é um conjunto de vários corpos de complexidade menor e a mente, igualmente, um conjunto de ideias. Na linha de pensamento espinosiana, um corpo é capaz de afetar e ser afetado por outros corpos, e possui em si o Conatus, impulso natural de querer manter a si próprio e buscar afetos que aumentem sua potência de existir. Ele é o
148 desejo de conservação de todos os corpos, em que afetos positivos aumentam sua potência e negativos a diminuem. Ainda para Espinosa, o corpo, devido a sua propriedade de afetar e ser afetado por outros corpos em vários aspectos, é definido pelas suas relações com outros corpos. Portanto ele não é pensado separadamente do seu entorno, do mundo exterior e dos corpos com os quais troca afetos, mas sim como parte de um sistema. O corpo humano é definido como um complexo de junção de corpos de várias naturezas e complexidades. Ele está unido pela capacidade de afetos exteriores e de afetar e mudar o exterior, assim como o exterior possui essa mesma capacidade de mudança ao interagir com ele. Além disso, ele possui o conatus, seu desejo de manter-se, ele possui uma potência própria. Assim sendo, Espinosa define os corpos pela sua capacidade de modificar-se e modificar o meio. Mais ainda, o ser humano conhece a si mesmo através dos afetos exteriores em seu próprio ser. É com o contato com outros corpos que ele pode perceber o seu próprio corpo e sua natureza. O que é relevante é o papel na interação entre corpos, e não sua materialidade, visto que esse é o fator de classificação de corpo. O corpo é movimento, ação e contato. É fundamental, portanto, o encontro e a troca entre mundo, corpo e ideias, como forma de estudo das propriedades humanas.
Afeto Perceber o mundo vai além de ver, tocar, cheirar, saborear e ouvir, é preciso senti-las a fundo. É possível realizar todas essas ações sem perceber, e perdemos seu encanto, ou ainda, de tantas vezes que realizamos as mesmas ações deixamos de reparar na maneira com que elas nos afetam. Habituar um corpo a algo leva à monotonia e tudo se torna automático, operase sem a participação da vontade. O desejar de um corpo deixa de existir, o que gera a perda de intensidade dos encontros. Como seria vivenciar tantas coisas sem absorver suas emoções? Somos construídos por diversas ligações que ressoam em nosso ser. Experimentamos
149 sensações que ficam guardadas em nós até que em outro momento essa lembrança seja ativada por outra sensação, e juntas conseguem dar origem a uma terceira. Sentir o mundo de maneiras variadas é importante. Basta um olhar diferente, um toque devagar, um novo cheiro que impregna a roupa. Os sentidos recebem vários estímulos, que a mente pode ou não ter consciência disso, mas basta viver aquilo novamente para que a lembrança desperte, e o indivíduo por sua vez, perceba, sinta. O corpo deve ser lembrado para que tal prazer não caia em sono profundo. Como é dito por Michel Serres no livro “Os cincos sentidos - filosofia dos corpos misturados” é preciso trabalhar os sentidos para que eles acordem e aprendam a degustar. É necessário estímulos para que se desperte da anestesia do mundo corrido. É preciso retomar seus prazeres e se abrir para novos. A alma precisa de alimento para se enriquecer, e é através dos cinco sentidos que ela se alimenta. Toda essa movimentação cria experiências e enriquece o ser, é uma maneira de intensificarmos nossa potência. Corpo, mente e alma elevam a potência de cada um. Juntos chegam à plenitude pois se multiplicam, se transformam sem alterar sua essência. Com o ser humano ocorre o mesmo. Ele se torna mais potente quando se mistura com outro, trocando e criando experiências. Estar em grupo estabelece uma força maior para essas trocas. O seu ser não é mais seu, é um todo, quando se sente em conjunto as energias se multiplicam e ganham força para continuarem afetando outros seres. A afetividade envolvida no projeto está intrínseca ao movimento e sentidos do interactor. Trabalhar tato, visão e audição em uma instalação in progress contribuiu para que o corpo pudesse sentir e experimentar. Os afetos são estados de transição do corpo e da mente, portanto são ideias, mas possuem um diferencial importante - são muito mais que representações, são potência em processo de variação. Isso quer dizer que o afeto reflete diretamente em nosso ser, tanto de forma ativa ou passiva, ser afetado é passar de um estado para outro, um estado de perfeição menor para um maior, e vice e
versa. Nossa mente é formada por ideias, essas por sua vez possuem propriedades diferentes de consciência e inconsciência. Para provocar o pensar, as relações e os encontros devem acontecer. O projeto busca esse ideal, provocar e instigar as pessoas a participarem da obra. Tal encontro deve ser único e diferenciado para cada um. Inserir a instalação em um ambiente público, acessível para todos, a torna ainda mais significante. Afetar de forma positiva e compositiva se torna a essência que o público deve extrair da obra.
Coletivo Pierre Levy fala que jamais pensamos sozinhos, mas sempre em função do todo. A comunidade está sempre presente, em maior ou menor grau em nosso pensamento. É impossível exercer a inteligência independente de línguas, linguagens e sistemas de signos, o que são herdados através da cultura. Assim, o ser humano possui uma inteligência coletiva, em que vários indivíduos “somam” suas capacidades em torno de um objetivo comum. Isso ocorre em toda a sociedade. Conhecer um estranho e conquistar sua estima, sua confiança faz com que o indivíduo construa um laço, estendendo suas relações e possibilitando enriquecer seu próprio conhecimento através a soma de um novo pensamento que entrou em contato. Essa soma de pensamentos de pessoas diferentes acaba por engrandecer e aprimorar o conhecimento de uma só pessoa. Entretanto é necessário tomar cuidado para que a inteligência de cada indivíduo realmente se some ao invés de anular uma a outra. Para que essa inteligência coletiva seja construtiva, é necessário que ela seja planificada, que respeite as singularidades de cada parte e que ninguem seja, em momento algum, subjugado. Quando a inteligência é imposta de cima para baixo, hierarquizada, o coletivo acaba tendo sua capacidade anulada e as potencialidades de cada um homogeneizadas. A junção da inteligência de várias pessoas produz um resultado melhor que apenas a inteligência de um só indivíduo. Assim o
trabalho em grupo, formando um coletivo inteligente é o meio mais eficiente e o que produz melhores resultados na elaboração de um projeto. É possível também associar esses conceitos citados acima com a teoria de Open Design. Este é um conceito relacionado e derivado de Open Source. O termo Open Source está muito intrincado com a área de softwares. Inicialmente softwares eram desenvolvidos por seus criadores, e seus criadores apenas. Era liberado para uso público um programa pronto e fechado, sem que nenhum usuário pudesse modificar seu código. “O movimento Open Source decidiu compartilhar o código e não mais somente disponibilizar a interface” (ROSSI, Dorival; NEVES, Heloisa). O mesmo acontece com o Open Design. Com ele a barreira entre designer e usuário é diminuída. O trabalho é desenvolvido, modificado, atualizado por todos juntos. É a interação entre os indivíduos que permite o avanço de projetos Open Design. A instalação foi criada para que, além de fazer com que as pessoas se “unam” umas com as outras, ela propõe que cada indivíduo seja modificado com ela. Essa modificação do indivíduo é sustentada pela teoria da autopoiesis de Maturana e Varela. Basicamente, Maturana e Varela falam que a estrutura do ser vivo está em constante mudança, isso se dá a partir da interação entre o ser e o ambiente. O ambiente influência o indivíduo que por sua vez influência o ambiente de volta; o ambiente recebendo essas intervenções, responde ao indivíduo e assim sucessivamente. Isso é o que é chamado de Autopoiesis. Em outras palavras, a estrutura de um ser vivo está em constante mudança, se adaptando sempre às modificações do meio ambiente. As mudanças que os indivíduos sofrem pela influência no meio reflete em como ele irá se comportar. Por conseguinte, o mundo onde cada pessoa vive é uma representação das percepções delas mesmas. Essa percepção varia de acordo com o que a pessoa interagiu com o ambiente por toda a sua vida, que é diferente em cada ser vivo. Portanto pode falar que existem tantos mundos quanto indivíduos que o observam. Um dos conceitos principais usados no projeto é o conceito de Hakim Bey,
150 T.A.Z., Zona Autonoma Temporária (originado do inglês Temporary Autonomous Zone). O conceito de TAZ pode ser definido como uma fuga da realidade vigente. Uma fuga dos sistemas atuais, da política centralizadora e da sociedade hierárquica. Ocupa um espaço físico e temporal, porém é facilmente desmembrado e pode logo desaparecer. Cada pessoa pode encontrar essa fuga em diversos locais, em diversas maneiras. É uma junção de pessoas, que convivem harmonicamente de uma maneira a conservar a liberdade individual, sem que ninguém seja subjugado.
Metodologia A primeira fase do trabalho foi a fase de brainstorm. A procura e seleção de ideias duraram por um bom tempo. A preocupação principal foi achar uma forma em que toda a teoria estudada anteriormente fosse perfeitamente aplicada. Decidida a ideia, iniciou-se a fase de elaboração. Primeiramente foram realizados sketches de como o projeto seria feito, para organizar melhor as ideias. A partir desses desenhos a mão, passouse para o projeto computadorizado, dessa forma, foi feito um desenho técnico e uma representação digital no programa Solid Works para possibilitar uma melhor noção de como o trabalho ficaria quando finalizado e para que houvesse as medidas certas na hora da construção do projeto, ou seja, para ter a confirmação dos tamanhos e proporções. A instalação teria, se formasse um quadrado, 2,7m por 2,7m. Este tamanho foi escolhido por não ser muito grande e, ao mesmo tempo, grande o suficiente. O projeto é formado por 36 placas de compensado de 15 mm (45x45cm), 108 almofadas com texturas diversas sob as placas, dois cubos (45x45x45cm) que emitem luzes e o som do projeto. O objetivo sempre foi da interação com as pessoas, portanto era necessário escolher um material que fosse leve e fácil de manusear, sendo assim, foi decidido usar compensado de 15 mm para a base da instalação e para os cubos, pois o material era
151 leve, sustentável e esteticamente atendia às necessidades do grupo. Para o encaixe entre essas placas de compensado, foram coladas, em todas as bordas dos quadrados, quatro pedaços de velcro, assim todos os lados encaixariam entre si. A próxima fase foi pensar em uma maneira de como encaixar as almofadas nessas placas. Novamente várias ideias surgiram, porém a que prevaleceu foi a de um elástico saindo de cada quina do quadrado com um botão em sua extremidade. Com isso, as almofadas, possuindo essas alças poderiam se encaixar perfeitamente nas placas e seriam facilmente retiradas destas quando o interactor quisesse modificar a instalação. De acordo com o projeto, anteriormente decidido, seria necessário 108 finas almofadas para compor a instalação. Para tais foi necessária uma pesquisa de tecidos e texturas para melhor explorar as sensações das pessoas. Para a confecção das almofadas várias costureiras foram requisitadas, profissionais experientes que fizeram um trabalho rápido e de qualidade. Além dessa base, a instalação possui dois cubos de compensado. A estrutura principal dos cubos era relativamente simples. Quatro quadrados de compensado de 45x45cm formavam as laterais, e outros dois um pouco menores formariam a tampa e a base. Por o cubo ter uma parte elétrica sua tampa tinha a necessidade de ser retrátil, para ser usada como botão, ou seja, um dos lados do cubo seria um grande botão que ao ser acionado acenderia os LEDS dispostos no cubo. Dessa forma a tampa é um pouco menor que as placas laterais para permitir sua movimentação, responsável por acionar o botão e acender os leds. A tampa foi fixada sobre um conjunto de parafusos, molas e botões elétricos. A base foi feita do mesmo tamanho do tampo, e foi encaixada com dobradiças para que o acesso ao interior do cubo fosse possível bem como para a montagem da parte elétrica. As placas laterais foram furadas com 20 perfurações em cada lado com diâmetro de um centímetro, 16 para o perfeito encaixe dos leds e 4 que seriam usadas como saída do som. Depois de toda a estrutura concluída, a peça inteira foi lixada com diversos tipos de lixa para proporcionar uma melhor sensação
ao toque e retirar eventuais imperfeições. Na próxima parte, como os quadrados do chão, foi passado seladora e verniz. Para a montagem da parte elétrica do interior do cubo foi necessário o envolvimento de um professor de engenharia elétrica, pois ele teria conhecimentos práticos úteis para a elaboração e montagem de todo o sistema elétrico. O projeto dessa parte consiste em pontos luminosos no cubo que acenderiam com seu manuseio. Foram instalados sessenta e quatro leds em cada cubo, sendo 16 em cada face, de cores variadas. Foram necessários vários componentes para fazer com que o circuito funcionasse, dentre eles: resistores, fios elétricos, material de soldagem e bateria. A bateria tinha que atender às especificações restritas que o circuito exigia, assim, levouse muito tempo de pesquisa para encontrar uma bateria que atendesse perfeitamente às necessidades do projeto, ela teria que atender não apenas as exigências elétricas, mas também teria que ser leve, pequena e fácil de recarregar. A bateria selada de 12V 1.3 ampér/ hora (AH) foi a ideal para o projeto. Para que a instalação permeasse por quase todos os cinco sentidos, não poderia faltar a audição. Dessa forma o som foi criado de modo a envolver o corpo do interactor tanto quanto as texturas o envolveriam. O som foi formado por diversos estilos, cada um com um objetivo próprio de atingir as pessoas de forma única. Sons que acalmassem, outros que dão uma sensação de alegria, de tristeza, de agitação, de drama, enfim, a tentativa sonora foi de ser múltiplo e singular ao mesmo tempo, pois os sons se mesclam, se conectam de certa maneira a formar um único som. Os sons foram colocados dentro dos cubos, de forma que ficassem sutis e leves, sem atrair toda a atenção do conjunto para si. Eles convidam a pessoa a se aproximar para escutá-lo de perto. O som é diferente dentro de cada cubos, sendo esses possíveis de serem ouvidos tanto juntos quanto separados, ou seja, seria dois sons e um terceiro formado pela união desses dois. O objetivo do som é para tornar mais agradável o espaço, mais relaxante. Para a aplicação do som nos cubos foi fixada uma caixa de som no interior de cada
um. Com a instalação pronta, o próximo passo foi apresentá-la ao público. Os locais escolhidos foram ambientes públicos e icônicos dentro da cidade de Bauru. Regiões de grande fluxo, nos quais as pessoas estavam em momento de lazer e diversão. A intenção do projeto era fazer com que as pessoas saíssem do seu cotidiano, e assim, fazerem uma pausa para aproveitar o meio em que estavam. O projeto visa acrescentar a esses espaços de lazer uma nova dinâmica em que a interação com o espaço o torna diferente. Foram escolhidos três locais em que os perfis de público fossem diferentes. A ideia era atingir, dessa forma, a sociedade em geral, sem excluir a participação de nenhum grupo. O In Palpável visava experimentar e observar as diferentes formas de interação do público com a instalação. Formas essas que variavam de acordo com o tipo de atividades que normalmente são realizadas em cada local. Dessa forma foram escolhidos três lugares que mais atendiam a essas especificações. São eles: Praça da Paz, Avenida Getúlio Vargas e o Teatro Municipal Celina Lourdes Neves. Conclusão A instalação In palpável foi criada pelos conceitos apresentados e montada a fim de dar aos interactors ferramentas para a construção e desconstrução da forma. A ideia era movimento, corpo, vivência e interação. Mover os módulos de lugar, deitar sob as almofadas e sentir as texturas, deixar o corpo e os sentidos livres. Texturas, encaixes, luz, placas e cubos de madeiras, o projeto estava pronto em sua materialidade, aguardando receber vida através da participação das pessoas. Colocada nas ruas, junto às pessoas e ao seu espaço diário a fim de proporcionar essa interação e fuga do meio habitual, visava contribuir de forma a elevar a potência de agir de cada um. O projeto foi um estímulo, aguçou a curiosidade e estimulou as pessoas a agirem. Durante todo tempo em que a instalação permaneceu nos locais, várias pessoas tiveram curiosidade e interesse em saber o que era a instalação e seu significado, porém não chegavam a interagir com ela, tinham receio, e se contentavam apenas em saber o que era. O hábito de não
152 poder mexer em nada, de tudo ter um preço ou precisar de um significado também foram questões observadas. Os adultos precisam de um significado maior por trás da instalação do que apenas criar uma vivência. Já as crianças mostraram mais abertura às experimentações. Elas emergiram na situação. Os adultos que interagiram tiveram tendência a deixar os módulos mais arrumados e alinhados, enquanto as crianças não se importaram em deixá-los de forma aleatória, transformando o espaço em um lugar de diversão. A forma com que se expressaram é muito verdadeira, houveram frases como “odeio amarelo”, “que gostoso”, “acendeu!” ou “vou levar essa daqui”. Esses detalhes foram retornos positivos que mostraram como o projeto alcançou seu objetivo, provocou boas reações nos participantes. Longe de ser algo rotineiro na vida da sociedade, esse tipo de experiência proporcionada pela instalação é algo diferente e que, nas observações feitas, causa estranhamento e distanciamento a primeira vista. Não é natural as pessoas se interessarem e quererem participar espontaneamente, pois seus corpos estão “travados” por amarras culturais. Aqueles mais habituados a trabalhar com o corpo, com arte e expressão conseguiram fruir melhor na instalação, não se sentiram tão intimidados em frente à vivência. O projeto In palpável visava que, naturalmente, as pessoas interagissem com a instalação, soltassem seus corpos em busca de conhecer o desconhecido, se abrissem ao novo e experimentassem do modo como melhor convinham a elas. Cada lugar com um perfil de público, cada pessoa com sua própria personalidade, cada um acrescentando ao espaço um pouco de si, adicionando à instalação sempre um novo olhar, uma nova disposição que dá sentido ao encontro.
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Referências
Figura 01: Sketches
Figura 02: Representação em 3D da instalação
Figura 03: Instalação montada
FLUSSER, Vilém. O Mundo Codificado. 2. ed.São Paulo: Cosacnaify, 2007. WOLF, F.A. Espaço, Tempo e Além. 4. ed. São Paulo: Cultrix, 1995. COHEN, Renato. Performance Contemporânea, São Paulo: Perspectiva, 2006 COHEN, Renato. Work in progress na cena contemporânea. 2.ed.- São Paulo: Perspectiva, 2009 O´DOHERTY, Brian. No Interior do Cubo Branco: A ideologia do Espaço da Arte (trad. Carlos S. M. Rosa). São Paulo: Martins Fontes, 2002. SERRES, Michel. Os cinco sentidos – Filosofia dos corpos misturados. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Sp, 2001. DELEUZE, Gilles e GUATTARRI, Félix. Mil Plâtos. vol. 1, Rizoma. LÉVY, Pierre. O que é Virtual?. . 1. ed. São Paulo: editora 34. 1996 DA COSTA, Rogério. Por um novo conceito de comunidade. Disponível em : http://www. scielo.br/pdf/icse/v9n17/v9n17a03.pdf. Acesso em 25 Mar.2013 ARAÚJO, Lindemberg Medeiros. Teoria do conhecimento em Maturana e VarelaMovimento realidade e Autopoiese . Disponível em http://www.prac.ufpb.br/copac/ extelar/producao_academica/artigos/pa_a_ movimento_realida de_e_autopoiese.pdf Acesso em 3 Abr. 2013 NEVES, Heloisa; ROSSI, Dorival. The Open Design. Disponível em http://heloisaneves. com/2011/09/14/open-design/ . Acesso em 13 abril 2013 HAKIM, Bey. TAZ, Zona autônoma temporária. Disponível em http://www.mom.arq.ufmg.br/ mom/arq_interface/4a_aula/Hakim_Bey_TAZ. pdf. Acesso em 13 abril 2013
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ECO DESIGN
Desenvolvimento de protótipos de mobiliário público a partir da madeira serrada de eucalipto Development of prototype public furniture from eucalyptus lumber Germer, Ingo Cescatto; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
ingocgermer@hotmail.com Mattara, Laura Gonçalves; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
laura.mattara@gmail.com.br Matos, Isabella Martino; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
martinomatos@gmail.com Barata, Tomas Queiroz Ferreira; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
barata@faac.unesp.br Machado, José Arimatéia Rabelo; Instituto Florestal do Estado de São Paulo
j.rabelomachado@yahoo.com.br
Resumo Esta pesquisa apresenta o desenvolvimento do design e realização da produção de protótipos de mobiliários para qualificação de espaços públicos utilizando o subproduto costaneira. A matéria prima utilizada na pesquisa é a madeira serrada de eucalipto das espécies Eucalyptus citriodora e Eucalyptus saligna Smproveniente de floresta plantada na região próxima ao local de produção e da área de implantação dos mobiliários,fato que contribui para uma logística com menor gasto energético desde a produção até o usuário final. O trabalho apresenta como resultados as diretrizes sustentáveis para desenvolvimento do protótipo, o processo de projeto e as etapas do processo de produção dos mobiliários. Palavras Chave: sustentabilidade; mobiliário público; eucalipto; madeira.
Abstract This research presents the development of the design and production of prototype for qualification of public spaces using wood processing residues. The raw material of prototypes research is sawn wood from Eucalyptus citriodora and Eucalyptos saligna species derivative from planted forests in the region close to the production site and the area of installation of the product, a fact that contributes to logistic with less energy loss from production to the end user.The paper presents results as guideline for the sustainable development of the prototype, the design process and the stages of the production process of the furniture. Key words: sustainability; public furniture; eucalyptus; timber.
1. Introdução Uma das demandas atuais da sociedade refere-se à produção e ao consumo
responsável de produtos inovadores que incorporem conceitos de sustentabilidade no seu ciclo de vida. O Conselho Internacional de Sociedades de Design Industrial (ICSID,
156 2013) considera o design um fator crucial para transformações culturais e econômicas, propondo assim, uma definição de design mais abrangente, correlacionada com as atuais demandas econômicas, sociais e ambientais, como por exemplo, a preocupação com o desenvolvimento sustentável. Este artigo relata as atividades de pesquisa referente ao desenvolvimento de projeto e ao processo produtivo de protótipos de mobiliários público com costaneira de madeira serrada de eucalipto. O objetivo da pesquisa é aplicar um subproduto da madeira de reflorestamento com ênfase na concepção e no desenvolvimento projetivo do design do produto e na análise do processo produtivo em laboratório. A viabilidade para a realização do trabalho teve origem através de parceria entre a Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação - FAAC/UNESP, campus Bauru e a Estação Experimental de Bauru (EEB), pertencente ao Instituto Florestal do São Paulo (IF). Esta parceria tem como objetivo principal a realização de um projeto de extensão universitária, denominado MUDAdesign, que visa à qualificação de espaços públicos na cidade de Bauru. Também participam deste projeto extensionista outras duas unidades do IF, Floresta Estadual de Pederneiras e Horto Florestal de Manduri. Considerando a demanda pela utilização de materiais locais de fontes renováveis, foi escolhida a madeira serrada de duas espécies de eucalipto (Eucalyptus citriodora e Eucalyptus saligna Sm). A matéria-prima provém da Floresta Estadual de Pederneiras, região próxima do local de produção e implantação dos protótipos, contribuindo desta forma para um baixo custo energético da logística de transporte do material desde sua origem até o usuário final. No processo produtivo dos protótipos também foram utilizados as unidades de beneficiamento primário e secundário de madeira do Horto Florestal de Manduri, a Estação Experimental de Bauru e o Laboratório Didático de Materiais e Protótipos (LDMP) localizado na UNESP, campus Bauru.
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2. Revisão Bibliográfica A fundamentação teórica da pesquisa está pautada em três aspectos principais: conceitos relacionados ao design sustentável, cadeia produtiva e geração de resíduos da madeira serrada de eucalipto, relação entre design, espaço urbano e mobiliário público. A partir da leitura e compreensão dos referidos tópicos visou-se analisar e utilizar informações presentes na literatura para compor embasamento teórico para a execução do presente projeto. 2.1 Conceitos relacionados ao design sustentável Na segunda metade do século XX, as análises negativas sobre o sistema produtivo e a constatação de que os recursos naturais disponíveis são limitados e finitos, atentaram para a necessidade de compreensão da dimensão ecológica e ambiental em todas as atividades humanas, no sentido de buscar uma forma de desenvolvimento sustentável (Kazazian, 2005). Segundo Pazmino (2007, p.7), design sustentável “é um processo mais abrangente e complexo que contempla que o produto seja economicamente viável, ecologicamente correto e socialmente equitativo". Ainda segundo a autora, esta vertente do design se propõe a não prejudicar o equilíbrio ambiental, garantindo-o para futuras gerações. Manzini (2011) aponta para haver o design sustentável, é preciso uma diminuição de consumo e redução de fabricação dos produtos materiais. O autor explica que agrupar essas duas questões tão divergentes requer uma habilidade primordial de design: A habilidade de gerar visões de um sistema sociotécnico sustentável; organizá-las num sistema coerente de produtos e serviços regenerativos, as soluções sustentáveis; e comunicar tais visões e sistemas adequadamente para que sejam reconhecidos e avaliados por um público suficientemente amplo, capaz de aplicálas efetivamente." (MANZINI e VEZZOLI, 2002, p.27)
2.2. Cadeia produtiva e geração de resíduos da madeira serrada de eucalipto Em relação ao material, a madeira serrada proveniente de florestas plantadas pode ser considerada como uma alternativa para o atendimento da demanda por matéria-prima de fonte renovável, visando à produção de mobiliário público e equipamentos urbanos em geral. Para Ponce (1995), a madeira de eucalipto é uma alternativa sustentável e de menor custo de produção, pois: O aproveitamento de florestas de rápido crescimento na produção de madeira serrada é fundamental na diminuição das concentrações de CO2 na atmosfera, pois o gás absorvido da atmosfera e contido na madeira é imobilizado durante toda a existência da madeira, sendo tanto mais efetivo, quanto mais duradouro é a peça de madeira. Assim sendo, enquanto a madeira existe na forma de móveis, objetos de madeira, construções e componentes para edificações, a atmosfera terrestre estará com menor concentração de CO2, o principal responsável pelo efeito estufa. Assim sendo o uso do produto florestal como madeira sólida além dos benefícios econômicos e sociais, gera também consequências positivas para o meio ambiente. (PONCE, 1995, p.51)
Esta alternativa de matéria-prima também pode ser aplicada ao mobiliário público, pois a produção de mobiliários sustentáveis no Brasil elaborados com materiais de base florestal tem passado por grandes avanços tecnológicos, além de um acentuado aumento de demanda dos usuários finais por produtos ambientalmente corretos e com certificação florestal (ALVES et al., 2009). Em se tratando do processamento da madeira e seu aproveitamento, tem-se que a perda de material, na forma de sobras ou resíduos, além de ser parte importante para o gerenciamento da produção, contribui significativamente para um desfavorável impacto ambiental. Com isso, quantificar e identificar resíduos do processamento da
madeira é etapa fundamental para o estudo de suas possibilidades de aproveitamento, que variam da geração de vapor para a secagem da madeira processada e produção de energia elétrica até confecção de outros produtos, como chapas, painéis e mobiliários (Fagundes, 2003). 2.3. Relação entre design, espaço urbano e mobiliário público O espaço e seu mobiliário têm uma função mais importante para a cidade do que simplesmente ser um local comum às pessoas. Existe uma função subjetiva de incentivar a população às práticas sociais, fazendo com que haja a utilização desses espaços pelo coletivo, passando o design a ser compreendido como intervenção cultural nestes ambientes. Não seria possível pensar na vida de hoje, tal como ela se apresenta ao homem urbano, sem a co-existência desse espaço sócio, político e cultural. A maioria da população mundial vive em cidades. Muitos dos momentos mais importantes de cada família ficam de algum modo, ligados às cidades ou às construções nelas erguidas (parques, igrejas, praças, avenidas, bancos de praças). (OLIVEIRA, 2011, p.8)
3. Materiais e Métodos 3.1. Materiais Foram empregados na produção do protótipo físico costaneiras de toras serradas de duas espécies de eucalipto (eucalyptus citriodora e eucalyptus saligna Sm). Por se tratar de material irregular, as dimensões (largura, comprimento e espessura) das costaneiras variam, fazendo com que o processo de escolha das peças tenha grande importância para o bom andamento da pesquisa. Para as realizações das conexões e ligações entre as peças foram utilizadas cavilhas da própria madeira de diâmetro de 8mm a 15mm e comprimento variável, resultando na redução dos resíduos e conferindo mais um aspecto relacionado à sustentabilidade do
158 produto final. Adicionalmente às cavilhas, foi utilizada cola branca PVA (polyvinyl acetate PVA), também foram empregados na produção do protótipo barras metálicas roscadas, conectores metálicos galvanizados e parafusos autoataraxantes ou tipo francês. Para a etapa de acabamento foi empregado stain a base d’água com filtro solar e ação hidro-repelente. Os equipamentos empregados na pesquisa são básicos: furadeiras, lixadeiras, esquadrejadeiras, serra de fita e plaina. 3.2. Métodos Considerando o desenvolvimento de projeto do protótipo, as etapas do processo produtivo e a coleta e análise dos dados, a seguir é apresentado a estrutura metodológica da pesquisa dividida em sete etapas principais: 1) Revisão bibliográfica e pesquisa de projetos similares; 2) Definição de diretrizes sustentáveis e desenvolvimento de sketches e peças gráficas para apresentação dos conceitos desenvolvidos para os mobiliários; 3) Desenvolvimento de modelagens virtuais e elaboração de projetos pré-executivos de protótipos dos mobiliários; 4) Processo de produção experimental de protótipos com prioridade para o emprego dos materiais selecionados. Nesta etapa objetiva-se coletar dados referente a etapa de processamento primário e secundários da madeira e verificar a construtibilidade dos modelos com a execução no Laboratório Didático de Modelos e Protótipos (LDMP) do Departamento de Design da FAAC/ UNESP, campus Bauru; 5) Análise dos dados coletados na etapa de produção (processos, equipamentos, geração de resíduos, consumo de energia e homem/hora por procedimento); 6) Elaboração de diretrizes de reformulação dos protótipos, modelagem virtual, elaboração de projeto executivo detalhado dos modelos finais reformulados; 7) Elaboração e redação de relatório final com a descrição das atividades, análise dos dados, resultados alcançados e divulgação da pesquisa.
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4. Resultados e Discussões São apresentadas a seguir a parte conceitual da pesquisa com as diretrizes sustentáveis para desenvolvimento do protótipo, a etapa referente ao desenvolvimento das atividades projetivas e o processo produtivo do protótipo físico. 4.1. Diretrizes sustentáveis para desenvolvimentodo protótipo Considerando a revisão bibliográfica e as análises sincrônicas foram relacionadas diretrizes para o desenvolvimento do protótipo físico: Utilização de material local e de fonte renovável; Otimização da matéria-prima com baixa geração de resíduo no processo produtivo; Alta durabilidade objetivando uma vida útil prolongada do mobiliário; Agregação de valor ao subproduto da madeira serrada; Qualificação espaços públicos. 4.2. Processo de desenvolvimento do projeto O processo de investigação projetiva adotou uma composição formal com formas puras e encaixes de simples execução, com destaque para formas cúbicas. Foram analisadas possíveis maneiras de usinagem e montagem do protótipo, com foco na geração de alternativas com elevada facilidade de encaixe e simplicidade construtiva (figura 1). Após análise das possíveis alternativas foi selecionada uma opção com quatro faces iguais e encaixe com angulação de 45˚nas extremidades dos planos colados e cavilhados (figura 2). Após a etapa de sketchs manuais foi realizada a modelagem virtual do protótipo (figura3).
costaneira é considerada um subproduto sem valor agregado (Figura 4). Após escolhida, a costaneira a ser usada passa pela fase de esquadrejamento e furação (Figura 5) sendo assim preparada para etapa de montagem de uma face (Figura 6). Com as faces montadas, é feito um corte de topo em 45° para a montagem (Figura 7). Por fim é dado um acabamento superficial em stain e adicionadas quatro rodas de silicone devidamente posicionadas na base do cubo. Figura 1: Sketch que demonstra a montagem feita com cavilha e em seguida a prensagem
Figura 4: Sketch manual e foto do corte da costaneira
Figura 2: Ilustração da face pronta e corte em 45° para montagem do cubo
Figura 5: Sketch manual e foto ilustrando as etapas de esquadrejamento e furação da costaneira selecionada
Figura 6: Sketch manual e foto do processo de montagem da face com cavilhas
Figura 3: Modelagem em software 3D do cubo finalizado
4.3. Processo produtivo de protótipos em laboratório O beneficiamento primário da tora de eucalipto é a primeira etapa do processo produtivo da pesquisa é obtida. Sendo a primeira fatia a ser retirada da tora, a
Figura 07: Sketch manual e foto da face do cubo montada
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161
5. Conclusão
6. Referências
Tendo em vista que o pesquisa se encontra em andamento, as conclusões ainda não são efetivas. O que se observou até o presente momento foi a dificuldade encontrada em estabelecer as ligações tanto das costaneiras a formarem uma face, quanto a junção das faces para construção do cubo em si. Para formar uma face foram anexadas três costaneiras devidamente selecionadas, esquadrejadase furadas para receber as cavilhas como elemento de ligação mais a cola branca para fixação dos componentes. Quanto à ligação das faces, considero esta a etapa mais crítica, pois exige completo alinhamento para uma montagem correta, observa-se que a face da porção interior é completamente irregular já que permanece sendo a parte do exterior da tora, isso confere singularidade na montagem de cada peça. Apesar de todas as dificuldades encontradas, o material ainda é uma alternativa muito viável e permite um maior rendimento do recurso florestal. Por se tratar do primeiro corte da tora, a costaneira apresenta características não interessantes para indústria, tais como: brocas,rachadura, galhada, pregos e outros, sendo assim na grande maioria das vezes sendo simplesmente descartada. São essas mesmas características que não interessam para indústria que motivam essa pesquisa já que cada costaneira é considerada única sendo assim apresenta uma infinidade de possibilidades de aplicação tanto na indústria moveleira quanto na construção civil.
FAGUNDES, H. A. V. Diagnóstico da produção de madeira serrada e geração de resíduos do processamento de madeira de florestas plantadas no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: PPGEC/UFRGS, 2003. KAZAZIAN, T. Haverá a idade das coisas leves. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, 2005. MANZINI, E.; VEZZOLI, C. O desenvolvimento de produtos sustentáveis: os requisitos ambientais dos produtos industriais. São Paulo: Edusp, 2011. OLIVEIRA, S.V. A Disciplina Mobiliário Urbano e Valores de Vida nas Cidades. In: Desenhando o futuro, Congresso Nacional de Design, 2011, Bento Gonçalvez, RS. Anais… Bento Gonçalvez, 2011, p.1-9. PAZMINO, A.V. Uma reflexão sobre Design Social, Eco Design e Design Sustentável. In: I Simpósio Brasileiro de Design Sustentável. Anais... Curitiba, 2007. PONCE, R. H. Madeira Serrada de Eucalipto: desafios e perspectivas. In: Seminário Internacional de Utilização da Madeira de Eucalipto para Serraria, 1995, São Paulo. Anais... São Paulo, 1995, p.50-8.
Design com chapas planas de madeira reconstituída e aplicação de conceitos de sustentabilidade Design with flat sheets of reconstituted wood and application of sustainability concepts Matos, Beatriz Martino; Universidade Estadual Júlio de Mesquita Filho – UNESP
beatriz.martino@gmail.com Barata, Tomás Queiroz Ferreira; Universidade Estadual Júlio de Mesquita Filho – UNESP
barata@faac.unesp.br
Resumo Esta pesquisa apresenta o projeto de design e realização da produção de protótipos de objetos utilizando chapas planas de madeira reconstituída com a aplicação de conceitos de sustentabilidade. Os materiais empregados foram placas de MDF (medium density fiberboard), com revestimento melamínico cinza, o equipamento utilizado na usinagem das placas foi uma fresadora Router CNC. Com o resultados são apresentados: pesquisa de projetos similares, diretrizes sustentáveis para o desenvolvimento do produto, o processo de desenvolvimento de projeto e as etapas de produção de protótipos físicos em laboratório. Palavras Chave: sustentabilidade; design; mobiliário; chapas de madeira.
Abstract This research presents the design project and realization of the production of prototype objects using flat sheets of reconstituted wood with the application of sustainability concepts. The materials used were plates of MDF (medium density fiberboard) with gray melamine coating equipment used in the machining of the plates was a milling CNC Router. With the results are presented: survey of similar projects, sustainable guidelines for product development, process of project development and stages of production of physical prototypes in the laboratory. Keywords: sustainability; design, furniture; wood sheets.
1.Introdução A primeira vez que foi feito uso do termo “desenvolvimento sustentável”, foi em 1987, em um documento da Comissão Mundial para o Ambiente e Desenvolvimento chamado “Nosso futuro comum”. Desde então a expressão tem se tornado cada vez mais utilizada e o termo vem sendo incorporado no cotidiano, desta forma estão surgindo diretrizes mais concretas e adequadas o processo de desenvolvimento de produtos em design. Segundo Manzini, a expressão “sustentabilidade ambiental” referese às condições sistêmicas a partir das quais as
atividades humanas, em escala mundial ou em escala local, não perturbem os ciclos naturais, além dos limites de resiliência dos ecossistemas nos quais são baseados, e ao mesmo tempo, não empobreçam o capital natural que será herdado pelas gerações futuras. Ao analisarmos a cadeia produtiva dos objetos, desde a extração de matérias-primas, passando pelo consumo, até o pós-consumo, observa-se altos impactos ambientais, tanto na produção, como na utilização, e principalmente no descarte dos produtos. A reciclagem e reutilização são soluções viáveis para minimizar a quantia de lixo e transformar resíduos
162 sólidos em matéria prima. Assim como propor alternativas para os descartes gerados durante a produção é algo igualmente importante. Este artigo está vinculado às atividades do projeto de extensão universitária MUDA design e tem como foco a análise do ciclo de vida do produto com materiais locais de fontes renováveis. Elaborando estudos de soluções na parte projetiva a fim de reduzir tanto os resíduos do processo de produção quanto do pós-uso. A pesquisa busca desenvolver e experimentar aplicações tanto para os resíduos gerados durante a produção dos mobiliários públicos elaborados com madeira serrada de eucalipto, quanto propor soluções de produtos com chapas planas de madeira reconstituída com a incorporação de teorias do design sustentável.
2.Revisão Bibliográfica A fundamentação teórica da pesquisa está pautada em três aspectos principais: Conceitos de sustentabilidade aplicados ao design de produtos, emprego do resíduo do setor madeireiro na produção de chapas de madeira reconstituída. Considerando a abordagem dos referidos tópicos visou-se analisar e utilizar informações presentes na literatura para compor embasamento teórico para a execução da presente pesquisa. 2.1 Conceitos de sustentabilidade aplicados ao design de produtos O desenvolvimento sustentável possui aspectos prioritários tais como, a satisfação das necessidades básicas da população, a solidariedade para com as gerações futuras, a integração com a população envolvida com troca mútua; a preservação dos recursos naturais e a elaboração de um sistema social de respeito. (SACHS, 2004) Com a crescente preocupação com as questões ambientais relacionadas ao desenvolvimento de produtos sustentáveis, o papel do estado e das instituições deve voltar-se a criação de políticas públicas de incentivo as pesquisas que visem à concepção e o desenvolvimento de produtos inovadores que incorporem conceitos e teorias
163 do design sustentável. Para os designers, empresas e também para os cidadãos comuns em suas comunidades e organizações, a possibilidade de ação recai na sua capacidade de dar uma orientação estratégica às próprias atividades, reinventando a realidade. Para isso, deve-se tomar consciência do ciclo de vida dos produtos desde a etapa de projeto, priorizando a utilização de materiais locais de fontes renováveis e a proposição de soluções eficazes considerando os possíveis impactos ambientais na produção de novos objetos. De forma ampla, pode-se considerar que a ação do designer recai na sua habilidade de definir objetivos e metas que atendam às necessidades e exigências dos usuários com os critérios de sustentabilidade que estão gradualmente vindos à tona na sociedade contemporânea (MANZINI, 2008), (MARGOLIN, 1992). A partir deste paradigma, o processo de criação em design deve priorizar, entre outros aspectos, a otimização da performance, inovação, qualidade, durabilidade, aparência e custos de cada produto. Manzini e Vezzoli (2002) utilizam a metodologia Life Cicle Design, em que na maneira de projetar considera toda a cadeia produtiva (pré-produção, produto, distribuição, uso e descarte). Sendo assim, o eco-design está relacionado ao ato de projetar, porém seu foco não está apenas no produto, mas em toda a cadeia produtiva, analisando desde a entrada dos recursos necessários para a produção, à verificação do processo produtivo, bem como a análise do resultado que é representado não somente pelo produto, mas pelo que é gerado como rejeito, no caso as sobras de matéria prima. 2.2 O emprego do resíduo do setor madeireiro na produção de chapas de madeira reconstituída Atualmente o setor florestal tem um peso significativo na economia do país, com elevado grau de tecnologia incorporada às atividades silviculturas de plantio e manejo. No entanto nem sempre foi assim, o setor recebeu grande impulso entre os anos de 1965 a 1988, quando entrou em vigor a política de incentivos fiscais ao
reflorestamento, com destaque para o plantio de espécies exótica de Pinus e Eucalyptus com características de rápido crescimento, alta qualidade da madeira serrada e boa adaptação às regiões Sul e Sudeste do país (VALVERDE et al, 2004). Com o tempo e com diversos incentivos econômicos ao reflorestamento, visando à alta produtividade e rentabilidade, grandes áreas foram ocupadas pela plantação dessas espécies. No entanto, apesar da valorização crescente da madeira serrada de eucalipto, o valor agregado aos resíduos gerados na cadeia produtiva pode ser considerado muito baixo. As galhadas e as costaneiras por exemplo, são utilizadas com lenha ou são simplesmente deixadas na área de extração. Já durante o processamento da madeira, geram-se resíduos mais finos, como pó de serra, cavacos e lascas. Segundo TUOTO (2009), no Brasil, a maioria destas sobras são queimadas ou acumuladas na área da própria indústria, resultando em danos ambientais e perdas econômicas significativas, ou então são utilizados para a geração de energia elétrica a partir da biomassa. O reprocessamento da madeira para a utilização em outros fins é uma solução eficaz para aquilo que seria um resíduo. Seja na formação de briquetes e pellets, que são usados para fins energéticos, em caldeiras, fornos industriais e até em lareiras domiciliares para a geração de energia térmica. Ou então, na produção de painéis de madeira reconstituída, podendose obter o aproveitamento integral da árvore, desde a casca, galhada ou resíduos da linha de produção. Porém, o grande problema é que a tecnologia aplicada a estes recursos para utilização dos rejeitos é obsoleta. Os resíduos também são tratados como descaso, pois eles não estão concentrados, e o manuseio, transporte, coleta e armazenamento acarretam um custo, que desmotiva as serrarias a proporem soluções para sua utilização. A ausência de políticas públicas também é desincentivadora. Em 2007, foi encaminhado para o Congresso Nacional o Projeto de Lei 2001/07, que fala da Política Nacional de Resíduos Sólidos. No entanto
essa política é bastante limitada e não contém especificações sobre o resíduo de madeira. (TUOTO, 2009).
3.Materiais e Métodos 3.1 Materiais O material selecionado para a realização da pesquisa é o MDF (Medium Density Fiberboard), trata-se de um painel de madeira reconstituída, produzido por meio da aglutinação de fibras de madeira com resinas sintéticas e aditivos. As placas de madeira são coladas umas sobre as outras com resina e fixadas através de pressão. O tipo escolhido foi de espessura de 18mm e placa nas dimensões 2750x1830mm revestido com material melamínico cinza. Por se tratar de um material processado, possui poucas irregularidades, o que permite alta precisão no projeto. O MDF utilizado na produção dos protótipos foi produzido por uma empresa localizada próxima à cidade de Bauru, na região existem florestas plantadas com madeira de eucalipto, da onde provém a matéria-prima da para a produção das chapas. No acabamento do produto foi utilizado fita de borda em PVC verde, conferindo um aspecto moderno ao mobiliário. O MDF foi escolhido por ser um tipo de chapa plana de madeira reconstituída, e apesar de ser de produção industrial e não ser resultado de algum resíduo gerado, ele é usado como parte experimental da pesquisa de iniciação científica, e serve como um meio para estudar como pode unir os conceitos de sustentabilidade ao projeto de produto. 3.2 Métodos O processo de corte da placa foi elaborado por uma fresadora comandado pelo sistema CNC (Computer Numeric Control). O comando funciona como um sistema operacional dos computadores desktops, possibilitando a comunicação com o operador/programador. O torno Router, é um equipamento que possui uma fresa com eixos x,y e z, e usina modelos elaborados a partir de softwares de modelagem virtual paramétrica e CAD. Sua alta precisão e planejamento de corte remete à um maior
164 aproveitamento da chapa e consequentemente à uma redução considerável de resíduo. Considerando que a pesquisa objetiva gerar conhecimentos e técnicas diretamente relacionados ao desenvolvimento de um produto e preocupa-se com aspectos da realidade e nas relações sociais com os objetos, além de analisar dados e resultados, a seguir é exposto a estrutura metodológica, dividida em 9 etapas: 1) Revisão bibliográfica e pesquisa de similares; 2) Definição de diretrizes sustentáveis para o desenvolvimento do produto; 3) Desenvolvimento de sketches e projeto de planificação da prancha; 4) Desenvolvimento de modelagem virtual e renderings; 5) Elaboração de protótipo em escala reduzida; 6) Produção de protótipo físico; 7) Análise do protótipo construído levando em conta as diretrizes sustentáveis; 8) Reelaboração de um novo projeto e/ou uma adaptação do mesmo; 9) Análise dos dados e dos resultados alcançados e divulgação da pesquisa.
4. Resultados e conclusões A seguir é apresentada os resultados do trabalho que se divide em: a) pesquisa de projetos similares, b) diretrizes sustentáveis para desenvolvimento do protótipo, c) etapa referente ao desenvolvimento das atividades projetivas e; d) processo produtivo do protótipo. 4.1 Pesquisa de projetos similares A pesquisa de similares focou em produtos que tivesse projetos em que o encaixe é feito com planos cruzados. As imagens selecionadas abaixo (figura 1 e 2) apresentam encaixes similares. A maioria tem encaixe cruzado macho-fêmea, encaixe estilo espiga e encaixes simples.
165 Nas imagens 4, 5, 6 consta o estudo do aproveitamento da placa, assim como o ângulo de corte dos pés. Priorizamos a planificação em que todas as peças se encaixassem como em um quebra-cabeça.
Figura 1: Banco Lapa
Figura 6: Maior ângulo possível
Figura 2: Mesas da marca Holandesa Fraaiheid
4.2 Definição de diretrizes sustentáveis para o desenvolvimento do produto Considerando a revisão bibliográfica e a pesquisa de similares foram definidas diretrizes sustentáveis adequadas ao projeto desenvolvido. São elas: • Utilização de materiais de origem local, no caso o MDF tem matéria prima extraída na região e é processado na cidade em que o projeto foi desenvolvido; • Monomaterial, o MDF é o único material utilizado para a construção do objeto, e só é utilizado fita de borda no acabamento do produto; • Usinagem rápida, feita em máquina de alta precisão, diminui os gastos energéticos; • Montagem e desmontagem, o que facilita o transporte e a troca de peças danificadas; • Formas atemporais, garantindo que o produto não se torne obsoleto rapidamente. 4.3 Processo do desenvolvimento de produto No processo de desenvolvimento do produto, foram elaborados estudos de projetos com formas puras e utilizando planos cruzados. Na figura 3 podemos ver esses esboços. Após selecionarmos o sketch mais adequado para a proposta, desenvolvemos a planificação dele, já levando em conta as medidas mais apropriadas.
Figura 3: Sketches manuais
Com esse estudo, percebemos que o melhor aproveitamento da placa estava na figura 5, em que utiliza menos material, além de não gerar pequenos cortes separados na placa e, apesar da área de cruzamento ser a menor apresentada nos três esboços, o tamanho já se mostrou suficiente para dar estabilidade a mesa. Foi feita então a modelagem 3D (figura 7) utilizando um software de CAD (computeraided design) e o rendering (figura 8 e 9).
Figura 4: Corte com ângulo de 45°
Figura 7: Modelagem 3D paramétrica
Figura 5: Menor ângulo possível
Figuras 8 e 9: Renderings
166 Foi desenvolvido um protótipo em escala reduzida (1:6) para testar os encaixes e estabilidade do mobiliário. Na imagem abaixo (figura 10) é apresentado o protótipo em escala reduzida desenvolvido no Laboratório Didático de Materiais e Protótipos (LDMP). Ao elaborar o modelo observou-se que a usinagem iria gerar grande quantidade de resíduo e dificuldades de produção com equipamentos manuais de marcenaria. Assim, optamos por utilizar a frezadora CNC do Centro Avançado de Desenvolvimento de Produtos (CADEP) para usinar a mesa (figura 11).
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Figura 13: Teste de montagem
Figura 14: Teste de montagem e usabilidade
5. Conclusões Figura 10: Protótipo em escala reduzida
Figura 11: Vetorização do desenho para usinagem
A imagem a seguir (figura 12) mostra o processo de produção de usinagem no CADEP. O tempo de usinagem foi de 33min47s. E nas figuras 13 e 14 está o teste de montagem e usabilidade.
Figura 12: Usinagem na CNC
Tendo em vista que a pesquisa está em andamento, as conclusões tiradas até o presente momento ainda não são definitivas, e sim parte do desenvolvimento do projeto. O que se observou até agora foi que o processo de projeto e produção mostrou que a usinagem na CNC é um processo muito mais rápido, gera menos resíduos e tem alta precisão nos cortes resultando em encaixes exatos. O uso de apenas encaixes para confeccionar a mesa, é um conceito de sustentabilidade importante, ajuda na montagem e desmontagem, no transporte, e torna o produto monomaterial. Assim, a máquina nos possibilitou que a produção fosse mais sustentável. Os encaixes de alta precisão deixaram o modelo estável, resultando em um produto de melhor qualidade e acabamento. O problema enfrentado pelo uso da CNC é que ao fazer o corte dos vincos, eles ficam arredondados e é necessário regularizar os cantos até formar um ângulo de 90° para que as peças se encaixem. A disposição dos vetores na placa (conforme figura 11) permite grande aproveitamento da mesma pois os únicos refugos gerados são aqueles do espaçamento necessário entre uma placa e outra, devido a configuração
da máquina, além do corte no meio, dos pés laterais. O restante da placa pode ser aproveitado facilmente para outros projetos, tanto a seção do meio quanto o resto da placa que não foi utilizada no projeto. Sendo assim, os resíduos gerados são mínimos, devido ao planejamento do desenvolvimento e a escolha de maquinário mais adequado a situação. Observamos que é interessante colocar uma trava na parte de frente, unindo o pé esquerdo ao direito para assegurar a sustentação do tampo de vidro. Apesar das dificuldades encontradas, o material ainda é uma alternativa viável, sendo importante estudar o uso de resíduos para a confecção de outros tipos de placas de madeira reconstituída, como forma de solucionar o problema do resíduo e produzir produtos sustentáveis. E através da produção das mesmas utilizar os processos e aprendizados feitos nessa produção experimental aplicados a nova placa, de forma a tornar todo o processo mais sustentável.
6. Agradecimentos Agradecimentos a PIBIC – Reitoria/2014, ao Laboratório Didático de Materiais e Protótipos (LDMP) e ao Centro Avançado de Desenvolvimento de Produtos (CADEP).
7. Referências BIAZUS, A.; HORA, A. B.; LEITE, B. G. P.; Panorama de Mercado: Painéis de Madeira. 2010. CASSILHA, A. C. et al. Indústria moveleira e resíduos sólidos: considerações para o equilíbrio ambiental. Revista Educação e Tecnologia, 2003. MARGOLIN, Victor, O design e a situação mundial. 1992. MANZINI, Ezio. Design para a inovação social e sustentabilidade: comunidades criativas, organizações colaborativas e novas redes projetuais. Rio de Janeiro: E-papers, 2008. SACHS, Ignacy. Desenvolvimento: includente, sustentável, sustentado. Rio de Janeiro: Garamond, 2004. TUOTO, Marco. Levantamento sobre a geração de resíduos provenientes da atividade madereira e proposição de diretrizes para políticas, normas e condutas técnicas para promover o seu uso adequado. Ministério do Meio Ambiente – Secretaria de Mudanças Climáticas e Qualidade Ambiental – Secretaria de Biodiversidade e Florestas – Projeto PNU BRA 00/20 Apoio às políticas públicas na área de gestão e controle ambiental. Curitiba, 2009. VALVERDE, S. R. et al. O Comportamento do Mercado da Madeira de Eucalipto no Brasil. Biomassa & Energia. v. 1, n. 4, p 393-403, 2004. CÉSAR, S. F.; GUEDES, J. P. L.; CUNHA, R. D. A. Aplicação de Design com Sustentabilidade na Produção de Móveis a partir de Madeira Reciclada. Recife, 2009
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169
Design Sustentável com Bambu e a replicação do conhecimento adquirido na Universidade Sustainable Design with bamboo and the replication of the knowledge acquired in the University Godinho, Giulianna de Moraes; Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho
giulianna_godinho@hotmail.com Pereira, Marco Antônio dos Reis; Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho
pereira@feb.unesp.br Sakomura, Letícia Canevazzi; Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho
lehsakomura@yahoo.com.br
Resumo Este trabalho apresenta de forma resumida, a atuação e o desenvolvimento do projeto Taquara, formado principalmente por alunos dos cursos de Design e Arquitetura. Projeto com foco no estudo e divulgação da cultura do bambu, na pesquisa e desenvolvimento de produtos e estruturas com maior valor agregado, procurando valorizar este importante recurso renovável e sustentável. Atua ainda capacitando e renovando anualmente o grupo de alunos, gerando e publicando o conhecimento adquirido bem como o transferindo, através da extensão para comunidades urbanas e rurais de Bauru e região de forma crítica. Palavras Chave: design; bambu; sustentabilidade; extensão.
Abstract This paper presents a summary of the activities and the progress of Taquara project, composed mainly by students of Design and Architecture. The project focused on the study and dissemination of the culture of bamboo, the research and development of products and structures with higher added value, looking for enrich this important renewable and sustainable resource. Acts still empowering and renewing each year the students group, generating and publishing the knowledge gained as well as transferring, through extension to urban and rural communities of Bauru and region critically. Keywords: design; bamboo; sustainability; extension.
Introdução O que começou ao redor do termo “ecologia” evoluiu para outro muito maior: “sustentabilidade”. Há anos ouve-se dizer sobre a importância de se preservar os recursos naturais do planeta e de ser sustentável, sendo uma das definições de sustentabilidade “modelo de sistema que tem condições para
se manter ou sustentar”, permitindo deixar às gerações futuras as mesmas condições de desenvolvimento e qualidade hoje existentes. É nesse cenário onde há a necessidade de um desenvolvimento mais sustentável, que surge com mais intensidade a busca por materiais renováveis e soluções capazes auxiliar neste processo. O bambu é uma gramínea, e cresce mais
rápidamente do que as espécies de árvores consideradas de rápido crescimento e, graças a esse crescimento vigoroso, seu rendimento em peso por hectare ao ano é superior ao das madeiras. Em 3 anos após seu nascimento, um colmo já está maduro para colheita, com propriedades físicas e mecânicas adequadas para utilização, enquanto uma árvore demora décadas para chegar à maturidade. Com cultura de produção anual e rápido crescimento (até 1 metro ao dia) é considerado um excelente seqüestrador de carbono, bem como um ótimo protetor e regenerador ambiental. Com grande diversidade de espécies e de aplicações pode substituir o uso de madeiras e outros materiais, contribuindo para diminuir a pressão sobre o corte de madeira de floresta. A cultura do bambu pode ser rapidamente implementada no campo, fornecendo anualmente material renovável de ótima qualidade, sendo, no entanto, seu conhecimento e uso no Brasil ainda pouco conhecido e pesquisado. Pensando nisso, em 1990, surge na UNESP de Bauru o Projeto Bambu, com a introdução e cultivo experimental de mudas de espécies prioritárias para pesquisa e divulgação. Com o desenvolvimento do Projeto Bambu, surge em 2009 o Projeto Taquara, formado inicialmente por alunos dos cursos de Design e Arquitetura, voltados à prática do design e o desenvolvimento de produtos e estruturas. Com renovação anual, o grupo Taquara além da capacitação de alunos, passou também a atuar na extensão com a comunidade. O projeto tem como objetivo estudar, pesquisar e valorizar esta matéria prima, transmitindo para a comunidade interna e externa à universidade a tecnologia desenvolvida. Os estudos abrangem a cadeia produtiva do bambu, envolvendo o conhecimento das espécies, plantio, manejo, colheita de colmos, produção de mudas, tratamento, processamento e confecção de produtos e estruturas leves. O processo de extensão com a comunidade está inserido no tripé ensino-pesquisa e extensão, que são os pilares da Instituição de
Ensino Superior (IES). A extensão faz com que o conhecimento desenvolvido na Universidade retorne a comunidade, por meio de ações extensionistas. Quando apropriada por pequenos agricultores rurais, a tecnologia do bambu pode se tornar um instrumento de desenvolvimento econômico e social. A produção anual de colmos e a facilidade de ser trabalhado com ferramentas simples facilitam a geração de renda e trabalho. Assim, a cultura do bambu pode contribuir para a fixação ao campo e desenvolvimento da agricultura familiar. Este trabalho apresenta resumidamente o desenvolvimento e atuação do projeto Taquara, envolvendo atividades de formação e capacitação de alunos, o desenvolvimento de produtos e estruturas, como também a extensão com a comunidade.
Revisão Bibliográfica “O conhecimento não se estende do que se julga sabedor até aqueles que se julga não saberem; o conhecimento se constitui nas relações homem-mundo, relações de transformação, e se aperfeiçoa na problematização crítica destas relações.” (FREIRE, 2006) “Pelo extensionismo rural desenvolvido nos Estados Unidos e as experiências de participação de universitários em campanhas educativas e assistência às populações carentes; o movimento estudantil, a partir de Córdoba, passou a atribuir às atividades de extensão, o objetivo de “fortalecimento da universidade, pela projeção ao povo da cultura universitária e a preocupação com os problemas nacionais.” (BERNHEIM, 1978)
“A Extensão é uma via de mão dupla, com trânsito assegurado à comunidade acadêmica, que encontrará na sociedade a oportunidade da elaboração da práxis de um conhecimento acadêmico. No retorno a Universidade, docentes e discentes trarão um aprendizado que, submetido à reflexão teórica, será acrescido a aquele conhecimento. Este fluxo estabelece a
170 troca de saberes sistematizados – acadêmico e popular -, e terá como conseqüência a produção de conhecimento resultante do confronto com a realidade brasileira e regional e a democratização do conhecimento acadêmico e a participação efetiva da comunidade na atuação da Universidade” (TAVARES, 2001)
Procurando, no contanto com a comunidade aprender e transmitir, possibilitando uma troca horizontal e recíproca. “Ao longo da história da extensão universitária, muitas vezes essa preocupação social tomou traços deturpados no que diz respeito a sua relação com a comunidade, passando a adotar uma postura autoritária e de verticalização dessa transmissão de conhecimento” (ROCHA, 2001)
A relação com a comunidade é sempre um tema discutido e trabalhado entre os membros, a fim de impedir postura autoritária. Ao praticar ações extensionistas é necessário compreender o outro, bem como respeitar valores e bagagem cultural. “Para que a extensão universitária ocorra de forma efetiva, promovendo uma construção social de transformação, identificando necessidades, disseminando informações, capacitando os participantes e propondo soluções, é necessário que haja interação e cooperação entre os estudantes universitários, agentes e a comunidade abrangida, mesmo que estes sejam de diferentes culturas, níveis educacionais e interesses” (SANTOS, 2013)
“A interpretação da sustentabilidade se vincula a efeitos sociais desejados, as funções práticas que o discurso pretende tornar realidade objetiva. Sustentabilidade é vista como algo bom, desejável, consensual. Sustentabilidade também pode ser considerada nova ordem de eficiência econômica que beneficia todos os cidadãos, em vez de beneficiar poucos em detrimento de muitos.” (SCHWEIGERT, 2007)
171 “Ações de responsabilidade sócio-ambiental devem considerar os pressupostos do paradigma de sustentabilidade. A responsabilidade social caracteriza-se pelas atitudes e atividades baseadas em valores éticos e morais para minimizar os impactos negativos que as organizações causam ao ambiente.” (CABESTRÉ, 2008).
“Contrariamente ao que se observa em países da América Latina (Colômbia, Equador, Costa Rica), no Brasil ainda não existe o desenvolvimento de equipamentos específicos para efetuar o processamento mecânico dos colmos e nem se dispõe de mão-de-obra qualificada para trabalhar com o material bambu” (PEREIRA & BERALDO, 2008).
Intitulado há pouco pela revista Abril como “madeira do futuro”, já é utilizado milenarmente por países como China e Japão, mas só recentemente seus estudos atingiram o ocidente e surpreende: o arquiteto Edoardo Aranha, pesquisador da Unicamp, faz coro: "Se tratado adequadamente, ele apresenta durabilidade superior a 25 anos, equivalente a do eucalipto, por exemplo,", afirma. “Por se tratar de uma planta tropical, perene, renovável e que produz colmos anualmente sem a necessidade de replantio, o bambu apresenta um grande potencial agrícola. Além de ser um eficiente sequestrador de carbono, apresenta excelentes características físicas, químicas e mecânicas.”(PEREIRA & BERALDO, 2008).
Um grande avanço em âmbito nacional foi a Lei 12484/11 (lei do bambu) que institui a Política Nacional de Incentivo ao Manejo Sustentado e ao Cultivo do Bambu tendo por objetivo o desenvolvimento da cultura do bambu no Brasil, como preconizado em seu artigo 5º parágrafo I “incentivar a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico voltados para o manejo sustentado, o cultivo, os serviços ambientais e as aplicações dos produtos e subprodutos do bambu” e parágrafo III
“incentivar o cultivo e a utilização do bambu pela agricultura familiar”.
Materiais e Métodos O Projeto Taquara é uma equipe permanente, contínua e multidisciplinar, formada por alunos dos cursos de Artes, Arquitetura, Design, Relações Públicas e Engenharia da UNESP-Bauru inserida no Projeto Bambu em desenvolvimento desde o ano 1990. O projeto tem como foco o estudo e a divulgação da cultura do bambu e atua capacitando e renovando anualmente o grupo de alunos na cadeia produtiva existente, desenvolvendo produtos e estruturas, gerando e publicando o conhecimento adquirido bem como transferindo o conhecimento para comunidades de Bauru e região de forma crítica. 1. Processo Seletivo e capacitação do grupo O projeto se inicia com a renovação do grupo pela entrada de novos membros, o que é feito anualmente através de processo seletivo, constando das seguintes atividades: aula inaugural, oficina de plantio, manejo, colheita, tratamento e processamento; oficina de produção de objetos; oficina de estruturas leves e entrevistas. Os novos alunos são capacitados pelos antigos no conhecimento já existente e serão os futuros capacitadores. 2. Desenvolvimento de produtos e estruturas Os novos membros são capacitados dentro das atividades já existentes no projeto, que envolvem a cadeia produtiva do bambu e a prática do design na confecção de produtos e estruturas leves, através de práticas e oficinas de campo e de laboratório ministradas pelo grupo já existente. São desenvolvidos protótipos com bambu in natura e em Bambu Laminado Colado (BlaC), segundo a tecnologia desenvolvida no Laboratório de Experimentação com Bambu. Este desenvolvimento acadêmico em forma de pesquisa inclui iniciações cientificas, trabalhos de conclusão de curso e dissertações. O conhecimento gerado é divulgado através da elaboração de artigos e a participação em
eventos e congressos. 3. Divulgação O projeto é divulgado através da mídia impressa, digital e falada, além de visitas de apresentação e convite a escolas, instituições de ensino e a comunidade em geral de Bauru e região. São elaborados e confeccionados folders e cartazes para auxiliar na divulgação. Anualmente é organizada a Mostra do Projeto Bambu, um evento aberto a comunidade que tem como objetivo chamar atenção para iniciativas de sustentabilidade e ações de ecodesign. Conta com exposição de trabalhos produzidos pelos alunos, oficinas, workshops e palestras. 4. Extensão com a comunidade No decorrer do ano o projeto é estendido à comunidade através de oficinas, cursos, mostras e participação em eventos. Mensalmente ocorrem atividades como colheita, tratamento e processamento dos colmos para obtenção de ripas laminadas e/ou seções de colmo para confecção de produtos artesanais e processados em bambu. O projeto está aberto e organiza oficinas com a comunidade como forma de transmissão do conhecimento e a introdução da cultura do bambu tanto para a comunidade acadêmica/escolar envolvendo alunos de primeiro, segundo e terceiro grau, até as comunidades rurais e o público em geral a fim de incentivar outras formas de geração de renda e conhecimento.
Resultados e Discussões 1. Processo Seletivo e capacitação do grupo A metodologia utilizada na gestão do grupo foi criada pelos próprios estudantes e pode ser alterada a partir de consenso geral. O grupo é horizontal, um tipo de sistema de gestão raramente encontrado no mercado de trabalho, e representa uma das características mais marcantes do Taquara. A horizontalidade é vista como um ganho geral, porque representa uma base mais forte, uma vez que as decisões passam pelo entendimento de não apenas um chefe,
172 mas de um grupo pensante e cooperativo. A gestão horizontal também é apontada como fonte de engajamento, visto que sendo conjunta a construção das resoluções, há maior envolvimento dos integrantes do grupo. Com os anos, o grupo também foi ganhando autonomia, possibilitando que a capacitação dos novos membros seja feita pelos próprios alunos. A permanência no projeto varia de aluno para aluno, porém há uma rotatividade anual de membros, sendo esta uma das maiores dificuldades encontradas para gestão, que induz o grupo a sempre estar se atualizando e evoluindo, sem deixar que o conhecimento se perca. No campo de design, a área de produto não ofusca a gráfica, o Taquara conta com membros no meio da programação visual, que são responsáveis pela coesão na representação da identidade visual do grupo, produção de banners, panfletos, logos, cartões de visita, vídeos de divulgação, registro das atividades, elaboração de material, entre outros. Estudantes de arquitetura são fundamentais para os projetos e incorporação de técnicas construtivas. Alunos de relações públicas auxiliam no entrosamento e imagem do grupo, assim como na manutenção e atualização dos meios de comunicação virtual e elaboração de artigos e editais. No entanto, essa diversidade não converge na segregação de tarefas, mas sim, em integrar o conhecimento, sendo a interação entre as áreas de grande valor para o crescimento profissional. O processo seletivo é uma forma de capacitação e disseminação dos conhecimentos acerca do bambu. Em 2014, o processo ocorreu no mês de abril. A primeira atividade foi uma palestra inaugural que tratava sobre bambu e extensão. A segunda atividade foi uma oficina de plantio e manejo, atividade essencial à manutenção do projeto. A terceira foi uma oficina de produção, na qual foi proposta elaboração de um chaveiro, que permitiu aos participantes utilizarem algumas ferramentas da oficina e se familiarizarem com o dia-a-dia de produção. A quarta atividade contou com
173 dinâmica para entrosamento dos participantes e trabalho em grupo, seguida pela produção de estruturas de bambu (Figura 01). Em seguida, sucederam-se as entrevistas.
e oficinas sobre as técnicas desenvolvidas e aprendidas no decorrer dos anos.
compreender o material, estudar encaixes e ampliar a visão do aluno sobre o projeto no papel e a tridimensionalização.
Figura 02: Banco curvo e Chaise Estações de Bruno Perazelli Figura 01: Construção de estruturas na vivência do Processo Seletivo 2014
2. Desenvolvimento de produtos e estruturas O desenvolvimento de produtos é essencial ao projeto, pois comprova a viabilidade da utilização do bambu como matéria prima. São elaborados projetos de artesanato para uma associação agroecológica, projetos de motivação pessoal dos participantes do grupo, propostos em Projetos de Pesquisa como Iniciação Científica e até como Trabalho Final de Graduação. Diversos alunos de design utilizaram da experiência adquirida no projeto para elaboração de seus Trabalhos de Conclusão de Curso. Como o Bruno Perazelli Farias Ramos que projetou “Chaise Estações” em BlaC, onde o foco foi o desenvolvimento da tecnologia para o curvamento das ripas (Figura 02); Mariana Lourenço ousou misturar o bambu com sistemas de arduíno, no seu projeto “Dó Brasil” criando uma mesa interativa de luz e som; e mais recentemente, Gabriel Fernandes dos Santos projetou um parquinho para o Assentamento Rural Horto de Aimorés, pesquisando técnicas alternativas de construção com terra e aplicando conceitos de design participativo. Antigos integrantes do grupo Taquara ainda mantêm contato com o projeto através de pesquisas de mestrado e pós graduação, estando disponíveis para a troca de conhecimento com os novos membros do grupo, tendo sido organizadas pequenas aulas
3. Divulgação A participação em eventos e apresentações permite aos alunos do projeto desenvolverem principalmente suas inteligências interpessoais e intrapessoais, a medida em que encontramse em uma situação na qual é necessário organizar seus pensamentos e falas de modo claro e didático, calcular bem o tempo, portarse calmamente diante de desconhecidos, saber ouvir e estar preparado para imprevistos e sugestões que mudam o rumo predeterminado; ou seja, passar por eventuais situações de coordenador e responsável na elaboração de projetos representando o grupo Taquara, acrescenta à capacidade de autocontrole dos alunos envolvidos. A organização da Mostra é feita pelos alunos e considerada uma grande experiência, visto que permite aos estudantes experimentar, discutir, formular, organizar e ministrar um evento (Figura 03). Adquirindo conhecimentos de diversas maneiras e diferentes áreas, acrescentando para seu processo de formação profissional e pessoal. Alcançada alguma visibilidade devido a contatos e eventos, surgem convites para parcerias, como a construção de barracas de bambu, co-produção de um curta, elaboração de porta banners, participação em feiras de agroecológia de Bauru e região, entrevistas em redes de TV, entre outros. Esse reconhecimento motiva a pesquisa e auxilia a por em prática a elaboração de produtos, sendo necessário
Figura 03: Oficina de luminária na 5a Mostra do Projeto Bambu
4. Extensão com a comunidade O Assentamento Rural Horto de Aimorés, distante 15 km da UNESP de Bauru, possui mais de 350 famílias assentadas pelo Incra. Em 2009, junto com o surgimento do grupo Taquara, iniciou-se o trabalho com um grupo de assentados. Esses passaram a frequentar a Universidade e receber a capacitação na cadeia produtiva, bem como produção de cestas de bambu para comercialização de orgânicos. Em 2011, o grupo de assentados capacitado na cadeia produtiva do bambu formou a Associação Agroecológica Viverde. Composta por agricultores com interesse na utilização do bambu para geração de renda, produzem objetos, móveis e estruturas em bambu de forma artesanal. Foi projetado e construído um galpão de bambu pelos estudantes, professores e comunidade, de forma colaborativa (Figura 04). A construção do galpão foi feita em mutirões e o interior é equipado com maquinário de oficina. Ao redor da construção foram plantadas 150 mudas de bambu, possibilitando com tempo, a autossuficiência em relação a Universidade (que atualmente cede a matéria-prima aos assentados). A Associação tem concessão do espaço construído na área comunitária. Outra conquista foi o início da geração de renda fixa, através da parceria obtida com o programa Caras do Brasil do grupo Pão de Açúcar, garantindo renda para os anos de 2013, 2014 e sequente, através
174 entregas mensais de cerca de 1000 colheres e espátulas. Buscando alternativas de sustentabilidade, fixação ao campo e geração de renda para a comunidade do Assentamento Rural Horto de Aimorés, o trabalho foi crescendo e ganhando outras formas. Por intermédio de Editais de financiamento, como do Prêmio UniSol (Grupo Santander) e Instituto 3M do Brasil, que foi possível não só a capacitação da comunidade na UNESP, bem como a transferência da produção para o assentamento, pela construção do galpão de bambu.
Figura 04: Construção do Galpão de bambu e inauguração do galpão/oficina
Existe também outra vertente da extensão, que abrange a comunidade de Bauru e região. Já ocorreram visitas da Escola Four C, Zuiani, Projeto Formiguinhas, parceria com a comunidade do Jardim Nicéia (Figura 05) e escola Eduardo Velho Filho, entre outros. Um exemplo é o trabalho com a Escola Estadual Luiz Zuiani, todas as salas do 5º ano 9º ano visitaram o projeto. As crianças foram levadas ao plantio experimental de bambus, onde foram explicadas características do material e como deve ser feito o plantio, manejo e colheita. Além da explicação oral, os alunos também podiam participar do processo, por exemplo, colhendo bambu e interagindo com o espaço. O aprendizado ocorreu de forma mais lúdica e participativa. As crianças também foram levadas a oficina na qual puderam observar a produção de uma colher. Além disso, ocorreram visitas à escola, onde foram realizadas oficinas com as crianças.
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Referências
Figura 05: Intervenção no Jardim Nicéia e visita dos alunos da Escola Zuiani
Conclusão O bambu é um material emergente e muito promissor para ser utilizado, em sua forma artesanal ou processado, por comunidades e cooperativas, podendo ser uma fonte geradora de renda e alternativa de crescimento e desenvolvimento para comunidades sem muitas possibilidades e recursos. O designer tem o papel de estudar as peculiaridades do material, auxiliar no seu manuseio, observar os aspectos naturais que possam ser explorados e projetar. Desde objetos simples, ergonômicos, decorativos a produtos laminados, com intuito de agregar valor ao objeto produzido e à matéria prima. A necessidade de se projetar com consciência, no quadro social brasileiro e a sustentabilidade indispensável ao mundo contemporâneo une os artesãos, os designers e os novos materiais alternativos à madeira, como é o bambu. Projeta-se uma realidade para um futuro próximo e urgente, que não se limita ao produto, mas estende-se à noção do trabalho coletivo como bem eficiente. Cria-se uma nova relação com a matéria prima, que compreende a importância de respeitar e conhecer o material, e desenvolve-se uma relação com a natureza, nem bucólica, nem devastadora, e sim, harmônica.
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ERGONOMIA E ACESSIBILIDADE
Análise ergonômica dos produtos de Design de Moda no Brasil: um estudo bibliométrico Ergonomic analysis of the products of Fashion Design in Brazil: a bibliometric study Brigatto, Aline Cristina; Universidade Estadual Paulista
aline.brigatto@gmail.com Neves, Erica Pereira das; Universidade Estadual Paulista
ericapneves@yahoo.com.br Paschoarelli, Luis Carlos; Universidade Estadual Paulista
paschoarelli@faac.unesp.br
Resumo As questões pertinentes ao vestuário vêm repercutindo exponencialmente nos últimos tempos. Dentre as áreas de investigação correlatas ao vestuário, destaca-se o crescente número de estudos que discorrem sobre os aspectos ergonômicos e de usabilidade da vestimenta bem como das particularidades de determinados segmentos de usuários (nichos). Nesse âmbito, por meio de um levantamento bibliométrico, a presente pesquisa objetivou traçar um panorama sobre as pesquisas ergonômicas dentro do campo da moda realizadas a partir de 1999 no Brasil. Para tanto, foram consideradas publicações de quatro eventos científicos e uma revista nacional. Palavras Chave: Ergonomia; Moda; Antropometria; Conforto.
Abstract The relevant issues related to clothing is growing exponentially in recent times. Among the research areas related to clothing, it's noticed a growing number of studies that discuss about the ergonomics and usability aspects of the clothing as well as the particularities of certain segments of users (niches). In this context, through a bibliometric survey, the present study aimed to give an overview on ergonomic research within the field of fashion published since 1999 in Brazil. Thus, publications of four scientific events and one magazine were considered. Keywords : Ergonomics; Fashion; Anthropometry; Comfort.
Orientações Gerais Atualmente, o aumento das exigências dos consumidores por produtos do vestuário diferenciados e com determinadas qualidades físicas, tal como a usabilidade (e, inerentemente, o próprio design), influencia cada vez mais as ações de projeto e de mercado do setor da moda. As estratégias de inovação e diferenciação são substanciais para o suporte
da relação entre empresa e cliente bem como o posicionamento da marca frente à concorrência. Nesse sentido, o entendimento de segmentos específicos de consumidores e usuários emerge como estratégia competitiva favorável ao desenvolvimento de produtos que se apresentem adequados e satisfatórios às suas necessidades e desejos. Nessa perspectiva, as questões pertinentes ao
178 vestuário vêm repercutindo exponencialmente nos últimos tempos. Dentre as áreas de investigação correlatas ao vestuário, destaca-se o crescente número de estudos que discorrem sobre os aspectos ergonômicos e de usabilidade da vestimenta bem como das particularidades de determinados segmentos de usuários (nichos). Neste sentido, o presente estudo, por meio de uma metodologia adaptada da bibliometria, visa traçar um panorama a respeito das pesquisas no campo interdisciplinar da ergonomia e da moda realizadas no cenário nacional desde o início deste século.
A evolução da indústria têxtil e de confecção: foco no usuário Entre a década de 1950/1960, a supremacia da Alta Costura parisiense sucumbiu à lógica industrial da produção em larga escala. A nova fase se caracterizou pelo que veio a ser conhecido no contexto da moda como prêtà-porter ou ready to wear. Evidencia-se, no entanto, a ressalva feita por Sant’anna-Muller (2011, p. 123) sobre a diferença dos dois termos. De acordo com a autora, o prêt-à-porter foi um caminho de adaptação da Alta Costura parisiense a “uma imagem de instituição moderna e atenta aos interesses econômicos de suas empresas”, sendo esse pautado sobre a inovação e a liberdade de criação do costureiro, não se atentando ao consumismo massificado. Por outro lado, o ready to wear visava à democratização da moda atendendo a uma massa ansiosa ao consumismo. Feita a observação, o conceito do ready to wear, como evidencia Baudot (2002), teve sua origem no período entre guerras, em especial após a crise de 1929 ocorrida nos Estados Unidos. De acordo com a autora, como medida protecionista, o país norte americano determinou custos elevados com relação à importação de roupas e itens de moda provenientes da França, com exceção de moldes e telas. Essa restrição, consequente, corroborou com o desenvolvimento de uma técnica de produção que fosse baseada na
179 reprodução e interpretação dessas bases. Os modelos de estrutura simplificada, fáceis de serem reproduzidos, rapidamente receberam gradações de tamanhos variados, dando origem às grades pré-definidas do vestuário: P, M,G (Baudot, 2002; Palomino, 2003). Paralelamente, o progresso dos materiais sintéticos corroborou para a massificação das peças confeccionadas à preços bem inferiores ao da alta costura. Nascia, assim, um sistema de produção rápido, com características industriais que se adequava às demandas cada vez maiores de produtos do vestuário. A rígida estrutura da alta costura cada vez mais se isolava aos méritos do luxo e da exclusividade de poucos clientes. Desse contexto, Baudot (2002) faz ressalva ao desenvolvimento do estilo sportswear americana. Como salienta a autora, a proibição das importações possibilitou que os americanos explorassem mais livremente a criatividade local, fazendo face aos racionamentos ocasionados pela guerra. Os produtos desenvolvidos se caracterizavam por serem peças intercambiáveis que permitiam às mulheres ativas adaptar suas roupas a diferentes circunstâncias do dia, lhes dando liberdade de fazerem elas próprias as combinações que quisessem (Baudot, 2002). Entre a década de 50/60, o prêt-à-porter já dominava grande parte das unidades industriais. As Maisons parisienses se adaptavam ao novo processo para tentar fugir da falência e das dívidas com lançamento de coleções (menos exclusivas) assinadas por estilistas renomados. Rapidamente o sistema foi difundido por diversas regiões do mundo, fortalecendo a indústria têxtil e de confecção. A demanda por produtos crescia significativamente face aos novos grupos sociais com poderes aquisitivos e às novas formas de consumos estabelecidas com a mecanização e a produção em massa. As etapas de concepção e construção dos produtos de moda, em especial o vestuário, cada vez mais se aperfeiçoavam tanto com relação às novas tecnologias quanto aos aspectos de interpretação dos movimentos sociais.
A nova realidade industrial refletia sobre o desejo de moda de uma sociedade voltada ao presente, ao novo e sobre à possibilidade de se expressar com liberdade. A forma hedonista de consumo estava cada vez mais presente face aos elementos estéticos e simbólicos dos produtos de moda. Como exemplo, podem-se citar os movimentos juvenis surgidos no final da década de 50 e início dos 60, tais como os Mods e os Rockabillies. Ambos os grupos se manifestavam por meio do vestuário e acessórios, os quais refletiam suas aspirações, pensamentos e desejos. A moda passava, assim, a cada vez mais ser sensível aos movimentos sociais. O consumidor passava a ser visto como fator determinante de concepção e produção. Paralelamente, percebe-se a flexibilização das peças, tanto nos seus aspectos estéticos e simbólicos quanto nos seus elementos construtivos e físicos. A rigidez de determinadas silhuetas começam a dar espaço para formas e estruturas mais adequadas às novas características do cotidiano. Essa consciência já delineava algumas adaptações em décadas passadas, tais como a das saias das mulheres na década de 40 às formas de transporte (bicicleta) e à praticidade do dia a dia do trabalho nas fábricas. Além disso, à tecnologia impulsionava o desenvolvimento de tecidos que se diferenciavam por suas estruturas compositivas, gramaturas, estampas, entre outros. Logo, a adequação do vestuário ao usuário, paulatinamente, começou a influenciar significativamente os aspectos de modelagem dos produtos de moda, em especial o vestuário. O público-alvo começou a ser analisado e considerado, principalmente quando as indústrias perceberam que para aumentar sua produção, precisavam estimular o consumo de maneira efetiva e contínua. O ato de comprar e o ter traduziam de forma não verbal a personalização do indivíduo, refletindo na maneira como este gostaria de ser percebido (Cobra, 2007). Martins (2008) destaca que a esse contexto inerente à industrialização, começaram a
ser inseridos conhecimentos ergonômicos advindos da Segunda Guerra Mundial. Como destaca a autora, a produção industrial impulsionou a necessidade de se estabelecer padrões de formas e medidas que visavam abranger os padrões dimensionais de uma série de variações individuais. “O ser humano é o nosso elemento central, base inicial para qualquer projeto. Nesse sentido, podemos dizer que ao conhecer o usuário, ao aquilatar suas necessidades, capacidades e limitações, evitamos a falta de adequação entre produto e usuário e nos instrumentalizamos para identificar com antecedência a ocorrência de acidentes, danos de saúde e desconforto.” (Martins, 2008, p. 322)
Nesse sentido, as pesquisas relacionadas aos consumidores e usuários passaram a extrapolar aos aspectos do marketing e da publicidade. A manipulação imagética pela mídia, a qual se faz presente principalmente desde meados da década de 1950, paulatinamente começa a não ser suficiente perante a vastidão de produtos que constituíam o mercado. A emergência de uma sociedade pós-industrial passou a não implicar mais somente nos aspectos ostentatórios e passa a ser experiencial e fundamentado na emoção (Colombo, Favoto, Carmo, 2008). No âmbito da moda, o produto do vestuário confere à esfera emocional canais de significação e identificação subjetiva. Além de composições simbólicas e estéticas, confere ferramentas indissociáveis à promoção de estados afetivos aos indivíduos. Nesse sentido, as funções básicas do vestuário extrapolam o vestir e o recobrir o corpo e associam-se às condições sociais de subjetivação e construção de identidade (autoimagem) (Neves, Paschoarelli, Menezes, 2014). Considerando sua relação direta com a “topografia do corpo e a epiderme, o produto de moda gera juízo de valor inerente à percepção dos aspectos de usabilidade, agradabilidade, conforto, prazer e satisfação de necessidades individuais e subjetivas” (Neves, Paschoarelli, Menezes, 2014).
180 Dessa maneira, as qualidades físicas e estruturais do vestuário (evidencia-se aqui conforto tátil e térmico) que constroem o produto de moda atuam de maneira direta na avaliação positiva desse produto. “Neste processo, a ergonomia e sua característica interdisciplinar se apresentam como elemento facilitador na mediação entre a relação sujeitoproduto oferecendo ferramentas construtivas provedoras de segurança, conforto e saúde” (Neves, Paschoarelli, Menezes, 2014).
A ergonomia e a moda A ergonomia, de acordo com Iida (2005), compreende: “(…) o estudo do relacionamento entre o homem e o seu trabalho, equipamento e ambiente, e particularmente, a aplicação dos conhecimentos de anatomia, fisiologia e psicologia na solução dos problemas surgidos desse relacionamento.”
Martins (2008) destaca que a Ergonomia está estreitamente relacionada ao dia-adia das pessoas, ao ambiente construído e a todo objeto utilizado. Segundo a autora, a ergonomia “leva em conta o ser humano, suas habilidades, capacidades, limitações e suas características físicas, fisiológicas, psicológicas, cognitivas, sociais e culturais” (Martins, 2008). A autora ainda enfatiza que para a ergonomia o corpo humano é o ponto inicial e correto para o dimensionamento de um produto. Retomando Iida (2005), os produtos devem possuir determinadas qualidades, sendo elas: a. Qualidade técnica: referente à execução da função para qual o produto foi projetado; b. Qualidade ergonômica: referente a boa interação do usuário com o produto, incluindo facilidade de manuseio e adaptação antropométrica; c. Qualidade estética: referente aos aspectos que possuem forte ligação com o prazer fornecido pela beleza, por meio de combinação de cores, formas, texturas,
181 materiais e acabamentos. Esses elementos, quando bem trabalhados, tornam o produto atraente e desejável aos olhos do usuário. Considerando o produto do vestuário, suas funções ultrapassam a mera ação de recobrimento e decoração corporal em face de sua relação direta com o corpo. Como destaca Grave (2004, pg. 11), o vestuário se envolve “com a saúde, tanto mental como física, podendo propiciar, sanar ou ainda alimentar” determinada problemática. “Um indivíduo envolvido em vestes exerce interatividade de ações e movimentos, expostos por meio de pensamentos e sentimento, fazendo delas uma extensão do seu próprio corpo. (…) O dia do homem vestido deve ser a representação da união, corpo e vestes abraçados, e não o desespero da volta para a casa, livrando-se dela, em um ato de abando do ‘estresse’”. (Grave, 2004, pg. 11-12). Grave (2004) também destaca a importância de se considerar e se atentar às articulações e mobilidade do usuário. De acordo com a autora, “todo o envolvimento de uma peça confeccionada deve considerar o tipo de superfície interior e exterior de articulação, amplitude e forma de movimento, que são de grande valia para a qualidade, tanto estética como ergonômica” (Grave, 2004, pg. 23). Broega e Silva (2009), por sua vez, ressaltam sobre a importância de se considerar no design do vestuário os aspectos de conforto, os quais se apresentam indissociáveis às suas qualidades físicas. Segundo as autoras, o conforto total do vestuário pode ser divido em quatro aspectos fundamentais: a. Conforto termofisiológico : estado térmico e de umidade à superfície da pele; b. Conforto sensorial de “toque”: conjunto de várias sensações neurais, quando um têxtil entra em contato com a pele; c. Conforto Ergonômico: capacidade que uma peça de vestuário tem de “vestir bem” e de permitir a liberdade dos movimentos do corpo; d. Conforto Psico-Estético: percepção subjetiva da avaliação estética, com base
na visão, toque, audição e olfato, os quais contribuem para bem estar total do usuário. Em face de tais aspectos, as considerações acerca das diferentes particularidades dos usuários corroboram com o desenvolvimento de produtos adequados que promovam segurança, conforto e notoriedade ao indivíduo. O conhecimento dessas peculiaridades se desenvolve como diretrizes projetuais que, junto com o design ergonômico, promovem ferramentas e métodos que podem direcionar com maior assertividade o alcance de produtos mais confiáveis, eficientes, seguros e confortáveis a determinados grupos de usuários. Para tanto, a realização de pesquisas que possam identificar e avaliar tais peculiaridades e especificidades é essencial para o desenvolvimento de produtos adequados. Somado a isso, ressalta-se a importância da aplicação dos dados obtidos às modelagens e aos demais aspectos físicos e estéticos do produto, uma vez que o produto vestuário se promove como extensão da identidade do indivíduo. O respeito ao tipo físico do usuário por meio das vestes, proporciona ao usuário sentimento de participação e integração, assegurando seu bem estar e saúde (Grave, 20010). Dessa maneira, “A melhoria no vestuário será garantida ao aumentar-se o grau de relacionamento entre indivíduo e este, levando-se em consideração o corpo humano e suas diferenciações e patologias como também se relacionando dados como toque do tecido, recortes, dobraduras, número de costuras, maciez e outros”. (Grave, 2010)
Objetivos Considerando o exposto anteriormente, podese dizer que a interação multi e interdisciplinar entre a ação projetual do vestuário e o design ergonômico é essencial para o progresso e para a solução dos projetos de produtos do vestuário, principalmente quando consideradas as diferentes peculiaridades de determinados
segmentos de usuários e suas exigências de usabilidade. Sendo assim, o presente estudo objetiva traçar um panorama sobre as pesquisas ergonômicas dentro do campo da moda realizadas a partir de 1999 no Brasil. Para isso, foi realizada uma análise bibliométrica acerca das publicações aprovadas em quatro eventos científicos de significativa relevância dentro do cenário nacional: Abergo; ErgoDesign; Colóquio de Moda e P&D. Como fonte complementar foram também considerados os artigos publicados na Revista Projética.
Materiais e métodos A primeira etapa da pesquisa constituiu na análise bibliométrica de todos os artigos aprovados nos quatro eventos e na revista. A pesquisa considerou as publicações aprovadas (artigos e pôsteres) a partir do ano de 2000. Sendo assim, foram consideradas 08 edições do Abergo (1999-2010); 14 edições do ErgoDesign (2001-2014); 09 edições do Colóquio de Moda (2005-2013); 07 do P&D (2000-2012). Como fonte complementar foram também considerados os artigos publicados em 07 edições (2010-2013) da Revista Projética da Universidade Estadual de Londrina. A determinação de sua inclusão se deu devido à importância de sua contribuição ao campo da moda. A pesquisa foi realizada essencialmente por meio digital, com exceção da edição de 2000 do P&D, na qual foi feita por meio impresso. As palavras-chave para a pesquisa foram: ergonomia, antropometria, usabilidade e conforto. Após a identificação dos artigos, esses foram separados por temas, os quais foram determinados de acordo com a amostra considerada. Evitando excluir algum estudo que pudesse ser significativo para o resultado desta análise bibliométrica, foram considerados também os artigos (e pôsteres) que apresentassem em seu corpo de texto algumas das palavras-chave. Em seguida, os artigos foram acessados individualmente para que fossem analisadas as particularidades metodológicas utilizadas nos estudos.
182 A priori, ressalta-se que algumas limitações foram observadas no decorrer dos procedimentos de análise. Percebeu-se que muitos artigos, principalmente os mais antigos, nem sempre apresentavam as palavras-chave de maneira explicita e esclarecedora. Salientase, no entanto, que foram apenas considerados os artigos que se desenvolviam sobre alguma das palavras, sendo descartados os estudos que usavam os termos apenas como citação ou complemento de alguma ideia. Outro critério de exclusão foi com relação à utilização das palavras no título, porém, no corpo do texto o conceito das mesmas não era desenvolvido.
Resultados Foram considerados como amostra 186 artigos. A partir desta amostra foram realizadas as seguintes subdivisões temáticas: Calçados; Conforto térmico e tátil; Antropometria; Deficiências físicas; Ergonomia e aspectos de projeto; Roupa íntima feminina; Público Idoso; Roupas esportivas; Gestantes; Inclusão social e conforto Psicológico; Vestuário Masculino (e roupa íntima) e outros; como mostra a figura 01. A inclusão da temática do calçado foi considerada devido ao número significativo de publicações vinculadas ao tema, o qual representou 13% do total. A maioria dos estudos era relativa às questões que tratavam da adequação de calçados ao público com alguma deficiência ou limitação física, ou acerca dos sapatos femininos. As implicações de uso dos calçados de salto alto também foram significativamente discutidas. Um dos artigos focou a utilização de sapatilhas de ponta de ambos o sexo para a prática de Ballet. A temática sobre calçado apenas não superou ao tema Ergonomia e aspectos de projeto, o qual representou 22% do total das publicações. As principais abordagens se deram por meio de revisões bibliográficas que evidenciavam a importância de se considerar os aspectos ergonômicos no desenvolvimento dos produtos da moda. Nesse tema, incluem-se também a análise do desenvolvimento do produto de
183 moda, bem como a elaboração de modelagens adequadas que considerem a topografia do corpo, a mobilidade e articulações do usuário. O terceiro tema mais pesquisado foi a antropometria, com 11%. Os trabalhos essencialmente retrataram sobre a necessidade e a importância de um levantamento antropométrico que caracterize adequadamente a população brasileira. Salientam também sobre a importância de tabelas de medidas bem estruturas e definidas para o desenvolvimento de produtos dentro das confecções. Três trabalhos evidenciam tabelas de medidas próprias para o público infantil, obeso e idoso. Outro tema explorado, com 10% do total considerado, foi Conforto térmico e tátil. As abordagens se deram sobre revisões bibliográficas sobre a temática bem como pesquisas que evidenciam a utilização de novos tecidos e tecnologias. Alguns estudos deram ênfase principalmente ao conforto térmico e ao desenvolvimento de novas fibras que contribuíssem para a “respirabilidade” das peças. Representando 10% das publicações, as pesquisas que focavam as desabilidades físicas trouxeram estudos sobre vestuário para cadeirante, portadores de hidrocefalia, paralisia cerebral, entre outros. Outros 7% foram representados por pesquisas sobre o vestuário íntimo feminino, as quais abordaram largamente sobre o desconforto durante o uso das peças que compõe seus conjuntos (sutiãs/ calcinhas). Estudos referentes às roupas esportivas totalizaram 6% e focaram essencialmente conforto térmico e tátil dos materiais têxteis aplicados a essa tipologia de vestimenta. Estudos sobre o vestuário e as particularidades do usuário idoso representaram 5%. As pesquisas relacionaram conceitos de envelhecimento, proteção do corpo, conforto térmico e tátil, e adequação de modelagem. Sobre o universo do vestuário masculino, apenas 3% das publicações direcionaram seus estudos a esse gênero, sendo o principal foco
a usabilidade, ergonomia e identidade dos usuários. A temática sobre gestantes representou 2%. Os estudos consideram o desenvolvimento de produtos funcionais e adequados a esse segmento, tal como camisolas que facilitem a amamentação e vestido multifuncional. Outros 2% foram representados por temas referentes à inclusão social e desconforto psicológico. Os artigos sobre essa temática se desenvolveram sobre o papel do vestuário na sociedade e como esse pode conferir ao indivíduo sentimento de inclusão social e conforto psicológico. A subdivisão Outros inclui estudos que abrangem áreas do vestuário infantil, trabalho (função), sleepwear, meia idade e acessórios. Separadamente, esses artigos não possuem porcentagem expressiva, no entanto, juntos totalizam cerca de 9% do total das publicações.
Figura 01: Gráfico de frequência de artigos por tema
Conclusão O levantamento revelou que as pesquisas vinculadas a Ergonomia e os aspectos de projeto dominam significativamente os estudos na área interdisciplinar da moda e ergonomia. Pode-se dizer que a consciência acerca da importância do design ergonômico dentro da metodologia e do desenvolvimento de produto esta se formalizando, paulatinamente. Outra área que vem se desenvolvendo é referente aos calçados, principalmente com relação aos portadores de necessidades especiais e mulheres. Grande parte das pesquisas que tratavam sobre problemáticas de segmentos específicos de usuários, tais como portadores de
deficiência ou idosos, foi formulada com base em levantamentos bibliográficos. Poucos foram os estudos que se desenvolveram sobre uma abordagem exploratória, por meio de questionários ou análise observacional das tarefas e das peculiaridades de cada um quanto à mobilidade, necessidades pessoais, entre outros. O foco nas questões sobre conforto se caracterizam tanto por abordagens ergonômicas de usabilidade quanto às características térmicas e táteis dos tecidos e fibras têxteis desenvolvidas para o setor de confecção. Contudo, a maioria das pesquisas que se desenvolveu sobre uma abordagem mais direta e exploratória junto ao usuário não foi clara quanto aos seus procedimentos metodológicos. Essa realidade dificulta a formalização de uma metodologia clara e assertiva que possa se promover dentro do campo científico da moda por meio de parâmetros e métodos bem definidos. As contribuições metodológicas dessas pesquisas (infelizmente) não foram explicitadas, porém poderiam ter sido tão importantes quanto os próprios resultados. Durante a pesquisa, percebeu-se expressivamente a permeabilidade entre as áreas de conhecimentos. Partindo pela definição das temáticas, por vezes um mesmo artigo poderia ser encaixado em mais de uma categoria. Sendo definido o foco central do artigo como critério de classificação, essa realidade ilustra a importância de uma visão integradora que possa unir informações e técnicas pertinentes ao desenvolvimento de produtos de moda, tanto no âmbito do vestuário quanto calçado e acessório. Como exemplo pode-se citar a contribuição da antropometria para o desenvolvimento de tabelas de medidas padronizadas e, por conseguinte, para modelagens bem resolvidas e adequadas ao usuário final. Nota-se, a partir dessas publicações, que, mesmo timidamente, o pesquisador de moda está começando a se sensibilizar às necessidades dos usuários, principalmente dos que possuem determinadas peculiaridades.
184 Essas contribuições poderão futuramente oferecer diretrizes de projeto que serão significativas para as empresas do setor. À medida que as empresas conhecem mais profundamente as particularidades dos seus indivíduos, elas melhoram sua capacidade de encontrar novos usuários, além de fidelizar os que já possuem. Para tanto, é essencial que as expectativas, necessidades, desejos e valores desses usuários sejam identificados e transferidos ao produto de moda, uma vez que esse se configura como extensão identitária do próprio indivíduo.
Agradecimentos Agradecimentos especiais ao CNPQ (processo 31235) e a FAPESP (processo 2013/11156-1).
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Aspectos Ergonômicos Relacionados ao Design de Almofadas para Cadeira de Rodas: estudo de revisão Ergonomic Aspects Related to the Design of Wheelchair Seat Cushions: a review Franchini, Ana Elisa; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
anafranchini94@gmail.com Gonçalves, Diego Duarte; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
diego_aka@ymail.com Sardella, Adrieli; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
adrielisardella@gmail.com Medola, Fausto Orsi; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
fausto.medola@faac.unesp.br Paschoarelli, Luis Carlos; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
lcpascho@faac.unesp.br
Resumo A cadeira de rodas é um equipamento de tecnologia assistiva utilizado para melhorar a mobilidade de pessoas com deficiência. No entanto, seu uso prolongado tem sido relacionado a diversos problemas, dentre os quais se destaca a úlcera de pressão. O design de almofadas de cadeira de rodas tem despertado crescente interesse científico, uma vez que influencia nas pressões na interface do assento e conforto to usuário. Este estudo tem como objetivo discutir os aspectos ergonômicos relacionados ao design de almofadas de cadeira de rodas, contribuindo para a atuação de designers no projeto de almofadas com interface ergonômica para o usuário. Palavras Chave: Almofada, Cadeira de Rodas, Design, Ergonomia.
Abstract The wheelchair is an assistive technology device aimed at improving the mobility of people with disabilities. However, long term wheelchair usage has been related to a number of problems, among which pressure ulcers are one of most concern. The design of wheelchair seat cushions has been of increasing interest among researchers, as it can influence seat interface pressure and thus user’s comfort. The aim of this study is to discuss the ergonomic aspects related to the design of wheelchair seat cushions, contributing to the work of designers in the design of ergonomic cushions for the user. Keywords: Seat Cushion, Wheelchairs, Design, Ergonomics.
1. Introdução A principal função da cadeira de rodas é suprir a necessidade de locomoção de indivíduos portadores de deficiência e possibilitar a sua participação nas atividades comunitárias.
Entretanto, apesar de ser uma tecnologia assistiva amplamente utilizada, seu uso por tempo prolongado está relacionado aos diversos problemas que, em última análise, podem causar desconforto, dores e lesões na pele.
186 Dentre os diversos problemas relacionados ao uso de cadeira de rodas, a úlcera de pressão é possivelmente o de maior preocupação e que, em vista de suas consequências potencialmente graves ao usuário, tem recebido atenção especial de designers e fabricantes no projeto de assentos ergonomicamente adequados. De acordo com Tasker et al.(2014), a úlcera de pressão pode ser entendida como uma lesão localizada na pele, geralmente sobre uma proeminência óssea, podendo ser causada por pressão, atrito ou mesmo cortes. Estimase que entre 36% a 50% dos casos de úlcera de pressão estão relacionadas ao uso de cadeira de rodas (Zacharkow, 1984), o que evidencia a necessidade de pesquisas que estudem os aspectos relacionados à ergonomia do sentar em cadeira de rodas, bem como identificar as características do design da interface de suporte que determinam a melhor distribuição de pressão em sua interface. Uma vez que muitos dos problemas de movimento que levam o usuário à cadeira de rodas comprometem - em alguma extensão também a sensibilidade do corpo, o design da interface de suporte assume grande relevância, no sentido de melhor distribuir as pressões na interface assento/corpo do usuário, reduzindo assim os riscos de lesões na pele. Neste sentido, este estudo tem como objetivo discutir os aspectos ergonômicos relacionados ao design de interfaces de suporte de cadeira de rodas. Trata-se de um estudo de revisão de literatura, realizada por meio de busca de artigos científicos em bases de dados de periódicos nacionais e internacionais. Ainda, foi realizada busca por modelos de almofadas comercialmente disponíveis, em sites de compra online.
2. Fundamentação Teórica 2.1 Posicionamentos sentado em cadeira de rodas por tempo prolongado A cadeira de rodas cumpre sua função assistiva ao possibilitar àqueles com limitações do movimento a mobilidade na posição sentada. No entanto, para a grande maioria
187 dos usuários, a cadeira de rodas não é simplesmente um dispositivo de mobilidade, mas também de suporte postural, uma vez que é utilizada durante a maior parte do dia. O estudo de Sonemblum et al. (2012) demonstra que, de fato, a interação entre usuário e cadeira de rodas é intensa durante o dia: apesar de estar efetivamente em movimento em aproximadamente uma hora, o tempo de ocupação diária da cadeira é em média 11 horas. Portanto, a função de suporte postural da cadeira de rodas é tão importante quanto a mobilidade. Em vista da intensa interação entre usuário e cadeira de rodas durante a maior parte do dia, a inadequação ergonômica da interface postural pode resultar em diversos problemas que, em última análise, comprometem o conforto, segurança e satisfação com o uso do equipamento. Além das lesões na pele, da deformação no tecido muscular dos glúteos e na alteração do fluxo sanguíneo, que diminui quando um indivíduo permanece sentado por tempo prolongado, resultando no acúmulo de sangue nas panturrilhas, a posição sentada provoca uma série de modificações, como rotação da pelve e tensões musculares, principalmente nos músculos isquiotibiais. (Keegan, 1953; Bridger, 1988). Esse excesso de tensão ocorre porque, nessa determinada posição, a carga da cabeça e do tronco é transmitida para a base da bacia e como o tecido localizado na parte inferior das coxas é incapaz de distribuir igualmente o peso do corpo pela superfície do assento, a tensão concentra-se nessa área (Corlett, 2006). Além disso, o estudo de Vergara e Page (2002) demonstrou que a dor na região lombar é considerada o principal motivo do desconforto na posição sentada, e está diretamente relacionada com posturas mantidas por tempo prolongado. 2.2 Almofadas para cadeira de rodas comercialmente disponíveis (Materiais) Uma das soluções para melhorar o conforto postural com o uso da cadeira de rodas é a utilização de almofadas, pois reduzem a pressão entre a superfície do assento e a pele, podendo
contribuir para a prevenção de úlceras de pressão. Para usuários de cadeira de rodas, alguns autores sugerem que a escolha da almofada deve ser baseada nas especificações do corpo do paciente (Garber e Dyerly, 1991; Garber e Krouskop, 1982; Souther et al., 1974). Por essa razão, projetos de assentos personalizados, incluindo assentos com formato anatômico e vários dispositivos de assentos modulares, tornaram-se importantes opções para alívio de pressão, especialmente quando os tamanhos disponíveis no mercado são pequenos e as variações de necessidades e exigências individuais são grandes (Kang; Mak, 1998). Além do formato das almofadas, o material com o qual é confeccionada é também um aspecto ergonômico importante para a interface do produto. Existem diversos tipos de almofadas que diferem em suas características específicas de forma, tamanho e material. Atualmente, os tipos de almofadas mais comumente comercializadas são: ar, espuma, gel, água e material visco elástico. As almofadas de ar são ótimas superfícies de apoio, principalmente as que contêm células e câmaras que permitem controle de sua pressão (FIGURA 1). Mas o seu bom funcionamento depende da membrana impermeável que a envolve, pois se ela não for capaz de armazenar adequadamente o ar a eficácia da almofada é prejudicada. Além disso, elas são ajustáveis e podem ser infladas de acordo com a necessidade do usuário. Mas tal ajuste deve ser feito de maneira adequada, já que uma almofada indevidamente inflada (tanto mais dura quanto mais macia) perde seu potencial.
(Figura 1) Modelo Roho Mosaic Air. Almofada preenchida a ar. Fonte: http://www.spinlife.com/
As almofadas de espuma se adaptam a qualquer formato, absorvem bem cargas de impacto e, se tiverem rigidez e densidade adequadas, garantem um apoio apropriado e uma vida útil efetiva (FIGURA 2). Contudo, esse material é mais quente e requer o uso de uma capa protetora, pois a luz e a umidade podem danifica-lo.
Figura 2. Modelo de almofada de espuma. Fonte:http://www. spinlife.com/
Por sua vez, as almofadas fabricadas com gel se adaptam à forma do corpo, entretanto, apesar de serem capazes de absorver vibrações e minimizarem o calor, não são muito eficientes contra impacto e costumam ser mais pesadas em comparação às de espuma (FIGURA 3).
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Figura 3. Modelo Gel “E” 3. Almofada em gel. Fonte: http:// www.spinlife.com/
Há também almofada feita de espuma visco elástica (FIGURA 4), cujo material se amolda ao corpo, proporcionando alto conforto. Possui alta densidade e capacidade para suportar até 120 kg. O produto disponibiliza três graus de maciez – macia, mediana e firme, de forma que um leque maior de necessidades sejam supridas. Além disso, é uma peça de alta impermeabilidade devido à camada externa feita de pele integral.
Figura 4. Modelo de almofada visco elástica. Fonte: http:// www.tecnologiademateriais.com.br/
Devido aos diversos tipos de materiais disponíveis, cada almofada apresenta uma particularidade, o que pode dificultar uma análise comparativa entre elas. Por esse motivo, buscou-se na literatura estudos que investiguem, sob o ponto de vista ergonômico, a eficácia dos diferentes modelos de almofadas. Bar (1991) realizou um estudo comparativo entre três tipos de almofadas: espuma
189 (densidade de 96 kgm³); gel; e a de células de ar interligadas (Roho). As três almofadas tiveram um resultado aceitável de valor de distribuição de pressão, porém, a Roho apresentou a menor pressão (50,6mmHg). Além de uma distribuição de pressão menor e mais simétrica, a almofada de gel apresentou o segundo melhor resultado (68,6mmHg), e por último a de espuma, com pressão de 87,6mmHg. Em um estudo mais recente de GilAgudo et al. (2009) comparou quatro diferentes tipos de almofadas para cadeira de rodas: de ar de perfil baixo; de ar de perfil alto; de compartimento duplo da Roho e uma feita de espuma e gel. Assim como no estudo de Bar (1991), avaliaram a pressão das almofadas e a que apresentou menores valores foi a Roho, as duas da marca Kineris tiveram o segundo melhor desempenho e não apresentaram diferença significante entre si, e a de espuma e gel apresentou os maiores valores de pressão. Defloor e Grypdonck (2004) investigaram a diferença entre quatro tipos de almofadas: Repose (FIGURA 5) e Waffle (FIGURA 6), ambas as almofadas de ar, a Tempur-Pedic de Polietilenouretano, e por último a Water cushion. Embora as duas almofadas de ar tenham diminuído a pressão, a Repouse, ao contrário da Waffle, é muito elástica e estica igualmente em duas direções. Além disso, a Waffle é feita de PVC, o que pode causar aumento da temperatura e da umidade e, consequentemente, aumentar o risco de úlcera de pressão. O resultado também indica que as almofadas de água, além de serem pesadas e instáveis, não amenizam a pressão tão bem quanto os outros tipos de almofadas. Apesar das diferenças entre os modelos, as quatro almofadas selecionadas conseguiram reduzir a pressão, sendo, portanto de alguma forma úteis na prevenção de úlceras de pressão. No entanto, é importante que se conheça os produtos que oferecem maior eficiência na redução da pressão, e suas características devem ser consideradas quando do design de novas soluções para interfaces de suporte corporal/almofadas para cadeira de rodas.
(Figura 5) Modelo de almofada de ar Repouse. Fonte: http:// www.reposedirect.com/
(Figura 6) Modelo de almofada de ar Waffle. Fonte: http:// www.ehob.com/
2.3 Qual a melhor almofada para cadeira de rodas? Levantamento preliminar das evidências científicas. A utilização de almofadas como solução para problemas relacionados à distribuição de pressão está presente em diversos estudos encontrados na literatura. Brienza e Karg (1998), desenvolveram um método para avaliar as características da posição sentada afim de projetar uma superfície de assento que minimize a deformação do tecido muscular. O instrumento utilizado foi Computer-Aided Seating System (CASS), o qual é capaz de avaliar o formato do assento enquanto mede a pressão aplicada nas nádegas. De acordo com a pesquisa, após o assento ter sido otimizado pelo CASS, os valores da rigidez da almofada diminuíram e ficaram mais homogêneos pela superfície. O estudo é consistente com os resultados de outras investigações que estudam os efeitos das almofadas de espuma de contorno
personalizado. Outro estudo que buscou avaliar a teoria de que almofadas personalizadas com o formato das nádegas são mais eficientes é o do Sprigle et al (1990). Um sistema de posicionamento ajustável foi construído para estudar a posição do corpo, o seu contorno e a distribuição de pressão, tudo por meio dos sensores utilizados em um indicador de contorno. O resultado mostrou que almofadas com contorno customizado apresentam melhor distribuição de pressão do que as de espuma plana e parece fornecer uma interface que é potencialmente menos prejudicial ao tecido mole. O estudo de Tasker et al. (2014) concentrouse em investigar a relação entre a forma de uma superfície de apoio e o risco de úlceras de pressão. Para isso, foram avaliados três tipos de almofadas: plana básica (FIGURA 7), a qual serviu de parâmetro para proporcionar medidas de base; uma almofada comercialmente disponível com contorno genérico do corpo humano; uma almofada com contorno customizado. Para cada participante três modelos foram produzidos com o mesmo material, de forma a garantir a mesma densidade e resistência mecânica. De acordo com o resultado da pesquisa, almofadas com formato anatômico, quando comparadas com almofadas disponíveis no mercado, são eficientes para reduzir a pressão da interface, promovendo assim uma redução no risco de úlcera de pressão.
(Figura 7) Material utilizado-exibindo almofada plana. Modificado de (Tasker et al 2014)
190
3. Conclusão Há um número considerável de pesquisas envolvendo assentos de cadeira de rodas, sendo a grande maioria voltada para o desenvolvimento de métodos e tecnologias para avaliar aspectos ergonômicos relacionados à postura sentada, incluindo o formato, distribuição de pressão na interface, percepção de desconforto, entre outros. De forma geral, os estudos encontrados objetivavam avaliar de maneira comparativa os diferentes tipos de almofadas, tanto as comercialmente disponíveis quanto novos modelos desenvolvidos pelos próprios pesquisadores. A análise dos estudos encontrados demonstra que o formato anatômico e a composição por células de ar interligadas (Roho) são características que melhor contribuem para a ergonomia da almofada, com relação à redução da pressão na interface e, desta forma, contribuem para a prevenção do desenvolvimento de úlceras de pressão. Tais informações contribuem de forma importante para o designer ao prover fundamentos científicos que direcionem o projeto de interfaces de suporte com melhores características ergonômicas, favorecendo o uso saudável, seguro e confortável a longo prazo.
Agradecimentos Ao CNPq (Processo N. 458740/2013-6) e à PROPe/FUNDUNESP (Processo N. 0411/001/14), pelo suporte financeiro e bolsas de iniciação científica.
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192
193
Design Ergonômico: Parâmetros Ergonômicos Aplicados ao Design de Produtos Ergonomic Design: Ergonomics Parameters Applied on Product Design Silva, Melissa Fonseca Alves da; Univ. Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho"
melissaf.alves@yahoo.com.br Silva, Danilo Corrêa; Univ. Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho"
danilo@idemdesign.net Paschoarelli, Luis Carlos; Univ. Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho"
paschoarelli@faac.unesp.br
Resumo Este artigo tem como propósito discutir a pesquisa em ergonomia e suas aplicações no design de produtos. Muitos estudos ergonômicos relacionam as capacidades biomecânicas dos usuários durante o uso dos mais variados produtos. Os parâmetros coletados podem ser úteis no desenvolvimento de produtos e sistemas mais acessíveis, principalmente aos usuários com menores capacidades. No entanto, ainda não há sinais claros de que essas informações realmente são aplicadas ao design de produtos. Nesse sentido, esse artigo apresenta uma técnica simples para dimensionar as exigências biomecânicas em produtos cujo uso requer a aplicação de forças biomecânicas. Palavras Chave: design ergonômico; ergonomia; design; pesquisa.
Abstract This article aims to discuss the research in ergonomics and its application in product design. Many ergonomic studies relate the biomechanical capabilities of users during the use of various products. The parameters collected can be useful in the development of products and systems more accessible, especially to users with smaller biomechanical capacities. However, there are still no clear signs that these information are actually applied to the design of products. Thus, this article presents a simple technique to scale the strength requirements for products whose use requires the application of biomechanical forces. Keywords: ergonomic design; ergonomics; design; research.
Introdução A ergonomia é a ciência cujo objeto de estudo é a interface entre o Homem e o a Tecnologia, seja ela representada por um produto, sistema ou ambiente. Segundo Iida (2005), a ergonomia busca a melhor maneira de se realizar atividades, do ponto de vista humano, com a preservação da saúde e do bem estar.
A sua atuação não se restringe a fatores físicos, mas engloba também aspectos psicofísicos e até sociais. Sua natureza multidisciplinar garante contribuições de diversas áreas, como a fisioterapia, a psicologia, a medicina, a engenharia e o design. Com isso, é comum encontrar equipes de trabalho compostas por profissionais de diversas formações. Essa multidisciplinaridade também oferece
um campo de pesquisa com uma base relativamente sólida, capaz de oferecer métodos, técnicas e ferramentas para diversas áreas de atuação, inclusive o design. Dessa interação surge o Design Ergonômico, ou Ergodesign, disciplina que tem como propósito aplicar o conhecimento ergonômico nas áreas de atuação do design. O Design Ergonômico se caracteriza por diversos métodos projetuais, cujos princípios baseiam-se na análise da atividade e na determinação de critérios ergonômicos e de usabilidade para o desenvolvimento de produtos (PASCHOARELLI, 2003). O Design Ergonômico tem trazido o foco de suas abordagens para interações com produtos de uso cotidiano, tanto em aspectos físico/ fisiológicos quanto psicofísicos e psicossociais. Os aspectos físicos da interação humanotecnologia são, geralmente, avaliados por meio de técnicas bem estabelecidas, que fornecem resultados objetivos e com pouca variação. Já os aspectos psicofísicos e psicossociais, embora contem com técnicas cada vez mais robustas, ainda apresentam grandes variações, e requerem um tratamento e interpretação cuidadosos. De qualquer maneira, o ambiente e as interações entre os seres humanos e o ambiente, fora do contexto ocupacional, estão presentes em diversas pesquisas realizadas no Laboratório de Ergonomia e Interfaces - LEI - FAAC/UNESP. Alguns estudos compararam diferentes designs em busca de melhores configurações, outros colheram parâmetros para o design de produto, em sua maioria parâmetros físicos. No entanto, o impacto dessas pesquisas fora do ambiente acadêmico ainda é incerto. Os resultados e parâmetros levantados nessas pesquisas estão contribuindo efetivamente para o design de produtos? Os designers estão cientes desses dados e sabem como utilizá-los? Essas são algumas questões que apenas uma pesquisa muito ampla poderia responder. Ainda assim, pretende-se iniciar essa discussão e fornecer algumas diretrizes.
Dessa forma, esse artigo tem como objetivo discutir alguns estudos realizados no LEI e suas possíveis aplicações no campo profissional do design. Para isso, são levantados na bibliografia alguns estudos representativos, seus métodos, seus resultados e possíveis aplicações.
Revisão Teórica Como mencionado, o Design Ergonômico tem ampliado sua abordagem para as situações não ocupacionais, em especial as Atividades da Vida Diária (AVD). Produtos de uso cotidiano também podem ter uso intensivo, tal como sua contraparte em ambientes ocupacionais. Além disso, as expectativas de uso podem diferir, pois em ambientes domésticos não se espera enfrentar situações parecidas com aquelas vividas em indústrias, por exemplo. Assim, estudos envolvendo AVD estão se tornando cada vez mais comuns. Nessas atividades muitas vezes são necessárias grandes forças biomecânicas para executar alguma tarefa, o que compromete o uso do produto e caracteriza um problema ergonômico. As situações avaliadas envolvem embalagens, ferramentas e outras interfaces presentes na vida cotidiana. As avaliações quase sempre envolvem variáveis físicas, principalmente a força biomecânica, associada à percepção do usuário, comumente o esforço percebido. Razza (2007) avaliou a força de tração associada à diferentes preensões e pegas, utilizando uma amostra de 60 sujeitos destros, distribuídos igualmente entre gêneros. As preensões utilizadas foram a bidigital, a tridigital, e a pulpo-lateral. Já as interfaces consistiram de pegas prismáticas de 40 mm, 20 mm, e 1 mm (tecido). O autor utilizou uma escala gráfica (escala contínua) para avaliar a percepção de esforço durante as interações com as pegas de seu estudo. Os resultados dessa avaliação podem ser visualizados na Tabela 01.
194 Interface
Preensão
Forças (D.P)
Bidigital
43,6 (14,7)
Tridigital
60,5 (21,3)
P u l p o lateral
54,5 (16,1)
Bidigital
42,3 (11,0)
Tridigital
62,5 (18,9)
P u l p o lateral
51,6 (14,0)
Esforço (0 a 100)
40 mm 59,7
195 de forças. De maneira geral, os resultados indicaram que tampas com menores áreas de contato são recomendáveis para impedir que as crianças abram acidentalmente o produto. A Tabela 02 exibe os valores de força encontrados para cada embalagem analisada. Embalagem
20 mm
38,7 (12,5)
Tridigital
59,2 (18,2)
P u l p o lateral
55,5 (12,5)
Força média (D.P) 0,88 (0,36)
2
35 x 25 mm
1,10 (0,43)
3
29 x 15 mm
0,68 (0,23)
53,2
1 mm (Tecido) Bidigital
1
Tampa (Diâmetro x altura) 36 x 19 mm
47,4
Tabela 01: Valores médios de força encontrados em cada pega (em newtons). Adaptado de Razza (2007, p. 66, 83).
O autor relatou em seu estudo que não houve diferenças significativas entre as forças aplicadas com as mãos direita e esquerda, portanto a Tabela 01 apresenta os valores para a mão direita. Através dos parâmetros apresentados por esse estudo é possível estabelecer limites de força aplicáveis para diversas situações cotidianas, como realizar a abertura de embalagens plásticas através de rasgo (salgadinhos, petiscos, etc.), alavancas de acionamento, etc. Outros estudos abordaram não somente a capacidade de aplicação de forças, mas como essa capacidade pode aumentar a segurança do usuário. Em um estudo envolvendo as capacidades biomecânicas de crianças de dois a cinco anos, Dahrouj (2009) discutiu como esses parâmetros podem ser utilizados para reduzir o problema dos acidentes domésticos envolvendo domissanitários e crianças. A autora realizou um levantamento das forças manuais em uma simulação de abertura de embalagens de água sanitária. O estudo envolveu 104 indivíduos, de ambos os gêneros, e três embalagens adaptadas para a coleta
Tabela 02: forças médias de torque para cada modelo de embalagem de domissanitários (em newtons x metro). Adaptado de Dahrouj (2009, p. 49)
A autora também destacou não haver diferenças significativas entre as mãos direita e esquerda. Com isso, na Tabela 02 são exibidos os maiores valores encontrados (no caso, com a mão esquerda na tampa). Entre as aplicações desses parâmetros pode-se destacar o design de tampas de proteção, tanto para produtos de limpeza quanto para remédios, por exemplo. O desenvolvimento de travas de segurança em geral também pode ser realizado com base nesses parâmetros. Em uma situação análoga ao estudo anterior, Bonfim (2014) avaliou diferentes embalagens de enxaguantes bucais. Nesse caso, as embalagens possuem tampas requerem uma força de aperto associada à torção (squeeze and turn), ou seja, necessitam da coordenação e habilidade de movimentos, com vistas a prevenir acidentes com crianças. Porém, o autor discute e avalia em seu estudo se essa exigência estaria prejudicando o uso por parte de indivíduos idosos, uma vez que as capacidades biomecânicas diminuem com o
avanço da idade. O autor analisou a influência do desenho das tampas na capacidade de aplicação de forças de torque por 24 sujeitos idosos (acima de 60 anos) e 22 crianças (entre 3 e 5 anos de idade. Ao todo foram avaliadas três embalagens diferentes de enxaguantes bucais. Da mesma forma, o autor também previu a utilização de duas preensões diferentes: a bidigital e a tridigital. Da mesma forma que o estudo anterior, os resultados desse estudo indicaram que a superfície de contato e o diâmetro da tampa são determinantes na aplicação de forças para a abertura do produto. Os dados levantados para a preensão bidigital podem ser visualizados na Tabela 02. Embalagem
Crianças
Idosos
0,44
0,98
0,58
1,25
0,48
0,99
Tabela 02: Forças médias de torque para cada modelo de embalagem de enxaguante bucal (em newtons x metro). Adaptado de Bonfim (2014, p. 100, 108)
Os resultados desse estudo também podem servir como referência para o design de tampas de proteção, tanto para produtos de limpeza quanto para remédios, por exemplo. O desenvolvimento de travas de segurança em geral também pode ser realizado com base nesses parâmetros. Devido à sua abrangência nas AVD, as embalagens têm sido objeto de vários estudos. Em um estudo envolvendo embalagens PET para refrigerantes, Silva (2012) comparou o
momento de força necessário para abrir essas embalagens com a real capacidade de aplicação de forças de usuários de diversos grupos em cinco diferentes modelos dessas embalagens (todas com 2 litros de capacidade). Nesse caso, o autor preferiu avaliar a percepção dos usuários utilizando o termo "dificuldade" de abertura. Nesse sentido, os sujeitos deveriam levar em consideração não apenas o esforço, mas as características gerais da interface, como as dimensões e as características da pega. O desconforto percebido nessa atividade foi avaliado paralelamente por Inokuti, Silva e Paschoarelli (2012). Os resultados da avaliação das embalagens apontou o valor médio de 1,37 N.m (D.P. 0,25 N.m) como a força necessária para abrir esse tipo de embalagem. Os resultados da coleta com os sujeitos são apresentados na tabela 03, cujos valores representam as médias de força encontrados para cada modelo de embalagem com a mão dominante na tampa (com a qual os sujeitos realizaram as maiores forças).
196
Modelo
Média (D.P)
Dificuldade (1 a 5)
1,35 (0,16)
3,13
197 etc.), quanto às subjetivas (percepção de esforço, de dificuldade, etc.). Nesse sentido, é relevante obter o máximo de informações sobre a interface do ser humano com os produtos, tanto em situações laborais, quanto nas AVD.
Parâmetros de Força Biomecânica no Design de Produtos 1,37 (0,16)
3,02
1,59 (0,18)
2,90
1,68 (0,19)
2,47
1,62 (0,18)
2,70
Tabela 03: forças médias de torque para cada modelo de embalagem de refrigerante (em newtons x metro). Adaptado de Silva (2012, p. 64, 71).
Os dados levantados nesse estudo podem ser utilizados como diretrizes no design de sistemas de fechamento de embalagens de bebidas refrigerantes, ou até mesmo em outros produtos que utilizem sistemas parecidos. O projeto de ferramentas ou controles (manípulos, dials, etc.) que possuam características parecidas também podem se beneficiar de estudos dessa natureza. Todos esses estudos demonstram que o design é um fator determinante na usabilidade de um produto. Essa afirmação pode ser estendida tanto às variáveis biomecânicas (posturais, capacidade de aplicação de forças,
Primeiramente é preciso destacar que os estudos mencionados apresentam tabelas completas com informações divididas segundo diferentes grupos de usuários, como diferentes faixas etárias, gêneros e sexos (gêneros). Nesse sentido, os dados apresentados aqui são genéricos (médias), na medida que não consideram os efeitos que essas variáveis têm nas capacidades dos usuários. A utilização desse tipo de parâmetros no design de produtos envolve o uso de estimativas estatísticas simples. Um uso desse recurso foi realizado por Silva (2012) para estimar qual parcela da população não seria capaz de realizar a abertura das embalagens de refrigerantes. Da mesma forma, pode-se utilizar os valores tabelados como referência para estimar o dimensionamento de força para que parcelas da população consigam abrir tais embalagens ou realizar uma determinada tarefa. Esses cálculos envolvem o uso de medidas separatrizes, normalmente os percentis, que a disciplina de ergonomia geralmente apresenta aos graduandos durante os tópicos relativos à antropometria. Assim, é possível utilizar os dados dos usuários para estimar que 95% dos usuários consigam abrir uma embalagem utilizando como referência o valor de força que delimita os 5% "mais fracos" da população. Da mesma forma pode-se estimar que 95% das crianças de uma faixa etária não consigam abrir uma tampa utilizando como referência o valor que separa os 5% "mais fortes". É comum a utilização de percentis 5%, 50% e 95%, mas diversas outras referências podem ser utilizadas. A escolha de um limite ou outro depende de
diversos fatores, inclusive da existência (ou não) de regulamentação à respeito. De maneira geral, o cálculo de percentis envolve uma lista de valores ordenados, bem como a quantia de observações (n). De maneira geral, uma vez que a maioria dos dados são distribuídos normalmente, a forma mais simples de se encontrar os valores limítrofes com certa segurança envolve o uso de tabelas de distribuição normal e o uso da equação 1 (TRIOLA, 1999). ou (1) Onde: Z é o valor padronizado de x x é o valor limítrofe µ é a média das observações σ é o desvio padrão das observações O que essa técnica proporciona é a probabilidade de que a força exercida por um sujeito escolhido aleatoriamente esteja acima ou abaixo do parâmetro utilizado. Para utilizá-la é necessário obter apenas dois parâmetros dos dados apresentados: a média e o desvio-padrão. Esses dados são comumente encontrados em referências para caracterizar os dados levantados (estatística descritiva) na forma de tabelas ou gráficos. O primeiro passo a ser realizado é identificar qual é o limite a ser utilizado. Em casos em que se pretende garantir que a maioria da população consiga exercer força suficiente para realizar a tarefa, convém utilizar um percentil baixo, como o 5%, e vice-versa. Para os percentis 5% e 95%, os valores de Z são respectivamente 1,65 (0,0495) e 1,65 (0,9505). O percentil 50% corresponde à média, por isso não é necessário cálculo. Tomando como exemplo o caso mais crítico das embalagens PET para refrigerantes (modelo E1), a força de torque média aplicada foi de 1,35 N.m com um desvio padrão de 0,16 N.m. Para que 95% da população consiga realizar a abertura dessa embalagem, deve-se considerar como limite a força exercida pela parcela dos 5% "mais fracos", ou seja o percentil 5%. A equação 2 exibe o cálculo do valor limítrofe
para essa situação. x = -1,65 . 0,16 + 1,35 (2) x = 1,09 Com isso, para que 95% da população consiga abrir a embalagem mencionada seria necessário que o fabricante reduzisse o momento de força necessário para a abertura de 1,37 N.m (momento de força necessário atualmente) para 1,09 N.m. Deve-se fazer a ressalva de que os dados utilizados são genéricos, não levando em consideração diferenças entre gêneros ou faixas etárias. Um melhor dimensionamento poderia ser realizado utilizando os dados do grupo menos favorecido (mulheres idosas, por exemplo). No caso das embalagens de domissanitários, o fabricante da embalagem 2 pode garantir que 95% das crianças com idade entre 2 a 5 anos não tenham força necessária para abrir a embalagem. Para isso, basta utilizar a força média aplicada na mesma (1,10 N.m), o desvio padrão (0,43 N.m) e o valor de Z correspondente a 95%. A equação 3 exibe o cálculo do valor limítrofe para essa situação. x = 1,65 . 0,43 + 1,10 (3) x = 1,81 Com isso, para que 95% das crianças com idades entre 2 a cinco anos não consiga abrir a embalagem, o fabricante deve garantir que a embalagem seja aberta apenas com forças de torque maiores do que 1,81 N.m. Os exemplos acima são apenas uma amostra de como essa infinidade de valores levantados nos estudos ergonômicos envolvendo forças biomecânicas pode ser aplicado em situações reais. O design, as engenharias e outras áreas podem fazer uso desses dados para desenvolver seus produtos e sistemas com base em informações de desempenho humano, e não apenas nas necessidades técnicas.
Discussão O design ergonômico é o foco de muitas pesquisas científicas no LEI-FAAC/UNESP. O objetivo principal dessas pesquisas é analisar
198 as interações do ser humano com a tecnologia, de modo a prover melhores condições de uso aos seus utilizadores. Grande parte desses estudos centralizam informações decorrentes de avaliações realizadas com diversos produtos, principalmente os de uso cotidiano. Uma vez que as necessidades são centradas no usuário, é necessário que se conheça a fundo quais são as capacidades e limitações dos utilizadores dos produtos. Assim, é comum serem realizados levantamentos razoavelmente completos sobre as capacidades biomecânicas dos indivíduos. Porém, todos esses dados representam apenas o início de um ciclo, no qual servem de parâmetros para o desenvolvimento de produtos e sistemas mais eficientes, seguros e confortáveis. Nesse sentido é necessário que os designers e outros profissionais correlatos estejam cientes desses dados, saibam como localizá-los e aplicá-los em seus projetos. Infelizmente, essa ainda parece ser uma realidade distante, uma vez que poucos produtos são anunciados com essas virtudes. Parece ainda haver uma lacuna entre a produção científica na área e a sua produção tecnológica, talvez pela relativa complexidade pela qual os dados são apresentados, talvez por desconhecimento de que eles estão disponíveis, ainda que em estágio inicial. Outra questão relevante é se, mesmo após encontrar os dados, os designers saberão como utilizá-los. Os dados de forças biomecânicas comumente são divulgados por meio de valores médios e desvios-padrão. A aplicação pura desses dados em projetos causa um erro amplamente conhecido no campo da ergonomia: o projeto para o "homem médio". Uma vez que esse é um conceito puramente abstrato, deve-se fazer uso de faixas de valores, obtidos através da fragmentação da escala de dados. Assim, os quartis, decis e percentis são necessários para o estabelecimento de parâmetros projetuais relativos às dimensões corporais (antropometria) e também aos biomecânicos (força, por exemplo).
199 A utilização dos dados depende, entre outras coisas, da observação de dois aspectos básicos: quais dados selecionar (grupo mais vulnerável, média global, grupo menos vulnerável, etc.); e também como fragmentar a escala (percentil utilizado como referência). Como mencionado, a escolha pode depender tanto de critérios arbitrários como também da existência de regulamentação sobre o tema. Porém, uma vez que a tabela de dados completa geralmente fica reservada ao autor do trabalho, pode se fazer uso de estimativas. Nesse sentido, vale lembrar que os dados biomecânicos comumente seguem a distribuição normal de probabilidades. Assim, com auxílio de uma tabela e uma simples fórmula pode se estimar parcelas que se deseja atender, visto que atender toda a população é improvável. A aplicação desses parâmetros tem efeito cascata, pois ao projetar para os mais vulneráveis, os menos vulneráveis também serão aptos a utilizar o produto ou sistema de com eficiência. De maneira geral, esse artigo procurou demonstrar e discutir a importância dos estudos em design ergonômico. Também ilustrou como os parâmetros divulgados, que podem parecer tão abstratos para o público em geral, podem contribuir para o desenvolvimento de produtos mais eficientes, seguros e confortáveis.
Agradecimentos Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP (Proc. 2013/24629-5) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq.
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aplicado ao desenvolvimento de tampas seguras para embalagens de domissanitários. Dissertação [Mestrado]. Bauru: Universidade Estadual Paulista “Júlio de mesquita Filho,” 2009. INOKUTI, É. S.; SILVA, D. C.; PASCHOARELLI, L. C. Avaliação de desconforto em atividades manuais a partir do uso de mapas da região palmar: a influência da idade. 2 Conferência Internacional de Design, Engenharia e Gestão para a inovação. Anais... Florianópolis: 2012 PASCHOARELLI, L. C. Usabilidade aplicada ao design ergonômico de transdutores de ultrassonografia: uma proposta metodológica para avaliação e análise do produto. Tese [Doutorado]. São Carlos: Universidade Federal de São Carlos, 2003.
RAZZA, B. M. Avaliação de forças manuais em atividades funcionais cotidianas: uma abordagem ergonômica. Dissertação [Mestrado]. Bauru: Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho,” 2007. SILVA, D. C. A influência do design na aplicação de forças manuais para abertura de embalagens plásticas de refrigerantes. Dissertação [Mestrado]. Bauru: Universidade Estadual Paulista “Júlio de mesquita Filho,” 2012. TRIOLA, M. F. Introdução à Estatística. Rio de Janeiro: LTC, 1999. TRIOLA, M. F. Introdução à Estatística. Rio de Janeiro: LTC, 1999.
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Interface para Rede Social: Responsividade e Usabilidade Interface to Social Network: Responsivity and Usability Costa, Matheus; Universidade Sagrado Coração
matheuscosta@email.com Valderramas, Renato; Universidade Sagrado Coração
rvalderramas@gmail.com
tornando-o mais agradável aos olhos; e Interface plana – Composta a partir de formas limpas e claras, que trazem simplicidade aos elementos visuais empregados. Por fim, este trabalho parte de uma linha de estudos constituída a partir de sketches, para, em seguida, ser continuada por meio de wireframes. A partir desse ponto, são montados os mockups digitais para, só então ser implementado o código funcional.
Resumo
Revisão Bibliográfica
O projeto teve o objetivo de criar a interface digital para um site de rede social com foco em música. Para tanto foram pesquisados sobre usabilidade e interface. Por meio dos métodos de design, como a pesquisa de similares; geração de alternativas; prototipagem em baixa fidelidade com wireframes; mockups em alta fidelidade; e o protótipo funcional, desenvolveu-se um leiaute responsivo, sem a necessidade de compilação de aplicativos nativos para cada plataforma, buscando solucionar problemas de usabilidade e acessibilidade.
No início do século XXI, quando projetavase o design de um website, o requisito era um leiaute para monitores com a resolução máxima de 1024x768 pixels. Esse cenário tem passado por constantes mudanças, e atualmente a resolução de 1024x768 tornou-se apenas mais uma no meio de tantas outras. Essa mudança deve-se ao fato incontrolável do surgimento de novos meios de comunicação com interfaces diversificadas. A interface, definida como uma forma do software permitir a interação do usuário e seu computador (Johnson, 2001), é o motor desse encontro, ou seja, ela necessita ser clara para que haja uma interatividade plena e não-tediosa por parte do usuário. Ocorre que não é mais apenas com o computador que acontece esse tipo de interação. Nos últimos 8 anos houve um aumento considerável no número de aparelhos celulares – também chamados de smartphones – que não são apenas celulares, mas sim minicomputadores de bolso (figura 01). Esses aparelhos são dotados de capacidades diversas como de acessar a internet, tirar fotos, ser utilizados como GPS ou até mesmo para assistir filmes.
Palavras Chave: web design; usabilidade; acessibilidade; rede social.
Abstract The project aimed to build a digital interface to a social network website which has its focus on music. Thus, usability and interface were researched. Through design methods, such as research of similar social networks websites, sketches, wireframes in low fidelity, high fidelity mockups and the final prototype, a responsive lay out was developed, without the necessity of compiling native applications for each platform, trying to solve problems of usability and affordability. Keywords: web design; usability; accessibility; social network.
Introdução Ao pesquisar o cenário das redes sociais, pode-se encontrar diversos tipos de sites atendendo a segmentos com variados públicos. Uns com objetivo de unir profissionais, outros de compartilhar vídeos, assim como os que buscam frisar o ramo fotográfico. O intuito é o de buscar e melhorar aspectos de usabilidade presentes em redes sociais musicais, ou seja, basicamente criar um espaço onde o usuário possa compartilhar facilmente seus gostos, coleções, criações ou até mesmo ouvir trilhas sonoras sem limitações. O segmento-alvo do presente projeto são
indivíduos de ambos os sexos com idades entre 15 e 40 anos, pertencentes a classe média que ouvem música e possuem algum ídolo musical. A escolha foi feita pelo fato da música ser uma vertente universal, que não necessita de especialidades para ser apreciada, causando emoções nos mais variados segmentos de público. Desta forma, o foco do projeto recaiu sobre alguns pontos essenciais: Design responsivo – que nada mais é do que a adaptação funcional do conteúdo independente da resolução do aparelho utilizado (tablet, celular ou computador); Leiaute ajustável – Solução que permite adequar a intensidade do leiaute,
Figura 01: 8 years
Isso relega um peso profundamente relevante ao design, pois é necessário prever o uso em cada aparelho, uma vez que o website aparecerá de determinada forma em cada um deles, apresentando uma interface que pode ou não agradar a quem navega. Portanto, foi buscado soluções de usabilidade para tal. O conceito de usabilidade pode ser definido da seguinte forma: É importante perceber que a usabilidade não é uma propriedade singular, unidimensional de uma interface com os usuários. A usabilidade tem componentes múltiplos e é tradicionalmente associada a estes cinco atributos: - Ser fácil de aprender: o sistema deve ter simples aprendizado para que o usuário possa rapidamente começar a trabalhar. - Ser eficiente na utilização: o sistema deve ser eficiente para que assim que o usuário aprenda como utilizá-lo, possa alcançar altos níveis de produtividade. - Ser fácil de ser recordado: o sistema deve ser fácil de ser lembrado, para que o usuário possa voltar a utilizá-lo depois de algum período inativo, sem ter que aprender tudo novamente.- Ter poucos erros: a taxa de erros do sistema deve ser baixa, para que os usuários cometam poucas falhar durante a utilização, e, mesmo que cometam erros, consigam facilmente recuperar o que foi perdido. Erros incorrigíveis não devem ocorrer. - Ser subjetivamente agradável: o sistema deve ser agradável de ser usado, para que os usuários fiquem satisfeitos ao utilizá-lo. Eles devem gostar
202 dele. NIELSEN (1993) apud MEMÓRIA (2005, p. 7)
Em suma, pode-se dizer que o design para a web precisa ter foco no usuário, trazendo mecanismos que contagiem o contato e a permanência dele no website. (figura 02)
Figura 02: Áreas-chave para a metodologia de projeto centrada nos usuários
Web site significa informações de comunicação. Não importa o quanto é bom seu design ou como seu leiaute é de ponta, se seu site não falar com seu público, não será um site tão bem-sucedido que informa algo e de modo claro. (Watrall, 2005, p.72), ou seja, o segredo para um bom site, sistema ou aplicação, é ter boa usabilidade, pois uma interface desorganizada pode causar constrangimento e medo. Sendo assim, manter usuários utilizando o website, significa um sucesso adquirido.
Materiais e Métodos De início, buscou-se informações sobre o tema definido e levantou-se os problemas mais agravantes. Em seguida foram analisadas referencias similares e por meio de sketches, iniciou-se o processo de geração de alternativas. Após a escolha do leiaute, foram criados os mockups em baixa fidelidade, através dos wireframes, para então produzir fielmente os mockups digitais e, por fim, gerar o protótipo funcional. O termo Rede Social, de acordo com Watts (2003, p.28) apud Recuero (2004) “são laços sociais conectados por nós que estão em
203 constante atualização, sofrendo ações e evoluindo dinamicamente”. O que frisa que o site, aplicativo ou sistema, deve possuir uma interface gráfica equivalente a proporcionar tais interações e principalmente buscar trazer todos os recursos para que o usuário usufrua-o em qualquer dispositivo digital móvel, seja notebook, tablet ou smartphone. Vale lembrar que na era digital momentânea, não é recomendável produzir uma rede social apenas com linguagens de programação web e evitar o uso de um aplicativo nativo, pois por mais que o site seja completo nos dispositivos móveis, somente aplicativos nativos podem trazer a melhor experiência de usuário (Fowler, 2012). Por outro lado, é a melhor opção para atender todos os públicos, pois de acordo com a figura 03, sites responsivos possuem maior acessibilidade do que aplicativos nativos e como o foco do projeto é atingir o maior número de usuários sem restrições, optou-se por essa opção.
planejado o fluxo do site como apresentado na figura 04. Nele pode-se observar que o usuário parte da página home, onde, caso ele possua um login de acesso, avançará até a página de perfil, caso contrário, será redirecionado para a página de cadastro e só após preencher os formulários poderá acessar as páginas internas. Com base nesse fluxograma iniciouse o processo de geração de alternativas para o leiaute das páginas
Figura 05: Sketch Página Inicial
Figura 04: Fluxograma
Figura 03: MultiMobile
Outro problema encontrado ao utilizar aplicativos nativos, é a falta de suporte universal aos mesmos, que seria nada mais do que dar importância para todas as plataformas de maneira similar. Muitos desenvolvedores acabam manchando o visual da empresa por falta de atenção. Sem contar a falta de cuidado com os padrões de estilo. Em um sistema X existe um uso de formas 3D, sombras e gradientes em excesso, já em Y, opta por um estilo mais limpo, com formas chapadas. A criação da arquitetura de navegação do site iniciou-se por meio de sketches, onde foi
Na página inicial, adotou um estilo bastante utilizado atualmente, conhecido por full-widthpage, que distribui os elementos decorrendo sem um limite visível, isto é, cada bloco de conteúdo aparece por completo na tela do usuário, independente de tamanho. (Figura 05).
Finalizando os sketches, deu-se inicio ao processo de prototipagem em baixa fidelidade. Esse processo, também é conhecido como desenho de wireframes, isto é, visa distribuir as formas estruturais apenas em linhas e textos com atenção à proporção, sem a aplicação de cores, volumes, efeitos e outros elementos presentes no produto final. Na figura 06, observa-se uma estrutura mais próxima do produto final, como a presença de ícones, a escala dos títulos, textos e links e como se dará a divisão de conteúdo nos cenários PC, mobile e tablete respectivamente. Começa a figurar também o logotipo, cujo processo de criação será apresentado a seguir.
Figura 06: Wireframe
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Resultados e Discussões Radio iBop, foi o nome definido para o produto. O logotipo faz alusão de um fone de ouvido entre as letras d e b, como pode ser visto na figura 07. A tipografia usada é AbeatByKai, geométrica e com linhas finas, para buscar a forma desejada.
Figura 07: Logotipo
O design visual da Radio Ibop tem como base 3 cores predominantes, que são o laranja, o preto e o branco. Para que houvesse uma melhor usabilidade, foram feitas variações dessas cores, tanto para o mais claro como para o mais escuro, buscando um conforto visual e evitando perda de atenção. (figura 08)
Figura 08: Mockup digital
A estrutura do site pode ser separada em 3 partes: cabeçalho, corpo e rodapé. O cabeçalho – quando na página inicial, mantém a cor de fundo – divide o conteúdo do corpo por uma borda e permanece fixo na tela, buscando manter os comandos principais sempre acessíveis ao usuário; No corpo predomina a cor cinza em um tom claro no fundo. Esse tom pode ser alterado pelo usuário para o cinza chumbo, invertendo o esquema para uma melhor visualização; O rodapé busca tons de
205 cinzas mais fortes, como o grafite, para deixar claro o fim do conteúdo, juntamente com links que redirecionam para as páginas principais do site. A tipografia foi definida por duas fontes: Multicolore para os títulos e links, pelo fato de ser arredondada e sem serifa, pode destacar bem e ser sobreposta acima de qualquer imagem; e Helvetica Neue para os textos menores, por possuir uma boa legibilidade em dispositivos eletrônicos. Os ícones foram divididos em duas categorias: monocromáticos quando acompanhado de formas ou botões de ação, trazendo simplicidade e função ao elemento em destaque, e policromáticos, quando acompanhado de textos ou frases, para remeter objetos. Vale ressaltar que ambos os estilos trazem características do design limpo, atualmente conhecido como flat design, em que se abandona o uso de degrades, sombras, texturas e volumes, apresentando o conteúdo ao usuário de maneira simples e rápida, facilitando o entendimento da ação oferecida. Uma particularidade que pode ser observada é a mudança do cabeçalho quando o usuário faz o seu login. Nota-se a inversão das cores e o surgimento de 3 botões de ação, disponíveis somente para usuários cadastrados no site, conforme mostra a figura 09. Tais botões são: o de notificações à esquerda – alertando o usuário ao que acontece relativo a ele; o de bate-papo à direita – trazendo outros usuários da lista de amigos que estão disponíveis para conversar; e o do player, mais próximo ao logotipo – que permite ouvir músicas, rádios e playlists.
Figura 09: Cabeçalho
Outro ponto importante do site é a opção de mudança de contraste, onde o usuário pode escolher entre qual contraste manter, buscando uma melhor usabilidade em termos de conforto visual. (figura 10)
Por padrão, o site busca a localização do usuário e compara a base de dados. Caso esteja no período da manhã, mantém o leiaute claro, caso contrário, alterna para o escuro. Porém, sabe-se que o usuário pode estar em algum ambiente muito claro ou muito escuro, independente de hora, oferecendo assim a possibilidade de deixa-lo escolher quando mudar.
Figura 10: Contraste
Para construir os mockups em baixa fidelidade, utilizou-se um software de criação de wireframes, chamado Balsamiq. O mesmo possui uma interface enxuta, com sistema de uso baseado no esquema “arrastar e soltar”, que possibilitou a montagem dos wireframes adequadamente. Os mockups em alta fidelidade foram elaborados no software Adobe Photoshop, que por possuir ferramentas específicas, atendeu perfeitamente aos resultados esperados. A partir dele, foi possível preencher todo o leiaute, utilizando as cores exatas e mantendo o alinhamento dos elementos para cada tela. Analisando os pontos de produção, alguns itens foram essenciais para o processo de construção do protótipo final. O uso de frameworks, ou seja, estruturas de códigos criadas e disponibilizadas gratuitamente na internet para serem customizadas por desenvolvedores, contribuíram de maneira plenamente satisfatória na economia de tempo da codificação. Ferramentas como Bootstrap, foram utilizadas para adequar a função de responsividade do site, assim como FontAwesome, otimizou o tempo de
carregamento dos ícones, pois este altera imagens para o sistema vetorial, obtendo uma velocidade de download com performance superior a de imagens do tipo bitmap.
Conclusão Levando em conta os processos desenvolvidos e esclarecidos, concluiu-se que a estrutura e a interface do site foram finalizadas. O restante das páginas continuam em processo de desenvolvimento e codificação para que possa haver um completo funcionamento do sistema. Durante o desenvolvimento ficou evidente que os métodos de design contribuíram para o planejamento e a elaboração da parte visual do produto. A parte funcional, entretanto, depende de outra área, programação para ser concluída. É objetivo do autor, dar continuidade ao desenvolvimento do projeto que encontra-se registrado em seu nome.
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Intervenção ergonômica no trabalho de funcionários de uma sede administrativa em São Luís – MA Ergonomic intervention in the work of employees in a headquarters in São Luís - MA MAIA, Paula dos Santos; Universidade Federal do Maranhão.
p.maia_10@hotmail.com SILVA, Samuel Renato de Oliveira; Universidade Federal do Maranhão.
sanno07@hotmail.com BARROS, Rubenio dos Santos; Universidade Federal do Maranhão.
rubeniobarros@hotmail.com DINIZ, Raimundo Lopes; Universidade Federal do Maranhão.
diniz@ufma.br
Resumo O presente artigo apresenta os resultados de uma intervenção ergonômica enfocada no levantamento, análise de problemas e propostas preliminares de solução para os postos de trabalho da Sede Administrativa de uma associação de professores, a partir de diretrizes ergonômicas conforme a legislação vigente (Norma Regulamentadora 17 - (Ministério do trabalho, 1994)) e a literatura atualizada. Os resultados apontaram constrangimentos ergonômicos de várias classes incluindo problemas no mobiliário e na infraestrutura. Palavras Chave (no máximo 4): Intervenção Ergonômica; Sede Administrativa; Condições de Trabalho.
Abstract This article presents the results of an ergonomic intervention focused on survey, analysis of problems and preliminary proposals for solving the jobs of an association of teachers Administrative Headquarters, from ergonomic guidelines according to current legislation (Norma Regulamentadora 17 - (Ministério do trabalho, 1994)) and the current literature. The results showed ergonomic constraints of various classes including problems in furniture and infrastructure. Keywords (maximum 4): Ergonomic intervention; Administrative Office; working conditions.
1. Introdução Segundo Santos (2006), entende-se por posto de trabalho a menor unidade onde o indivíduo realiza uma atividade, sendo o ambiente de trabalho o local que abriga esses postos. Visando compreender a interação de determinados fatores (comportamento etc.) com o próprio ambiente e os trabalhadores, realizou-se em
uma sede administrativa de uma associação de professores, uma Intervenção tendo como base a metodologia da Intervenção Ergonomizadora (IE), proposta por Moraes e Mont’Alvão (2009), tendo como foco a sua primeira fase, denominada Apreciação Ergonômica. Incorporou-se ao levantamento de dados, a ferramenta de Design Macroergonômico – DM, proposto por
Fogliatto e Guimarães (1999). Desta forma, pretendeu-se desenvolver uma adequação no levantamento e coletas de dados de acordo com as necessidades e características do posto de trabalho analisado.
2. Estratégia de Intervenção A partir de estratégias de coleta de informações que privilegiam a opinião dos usuários, o DM permite discriminar as diferentes demandas, denominadas Itens de Demanda Ergonômica (IDEs), em função das atividades dos sujeitos. Na sede administrativa entrevistaram-se 5 (cinco) funcionários que mais tempo passam na sede e o diretor. As entrevistas foram individuais e duraram aproximadamente, entre 30 e 40 minutos. Os dados das entrevistas foram analisados estatisticamente e o resultado serviu de base para a confecção de questionários. As respostas por afinidade e a sua tabulação permitiram o estabelecimento de um ranking de importância quanto à demanda ergonômica dos usuários. O questionário englobou ainda questões formuladas a partir da observação dos pesquisadores, da análise das atividades da tarefa, com base no trabalho real ou descrito. De maneira geral, o questionário foi composto por questões quanto ao meio ambiente, o posto de trabalho, as condições dos equipamentos e ferramentas utilizadas, a organização do trabalho, as exigências físicas, cognitivas, mentais e psíquicas, a percepção dos funcionários sobre seu trabalho e também, questões sobre a ocorrência de desconforto/ dor durante a jornada de trabalho. No total, o questionário contou com 106 questões. A técnica do Design Macroergonômico (Fogliatto e Guimarães, 1999) recomenda o uso de uma escala com duas âncoras nas extremidades (insatisfeito e satisfeito, etc.) e uma âncora no centro (neutro) para indicar o nível de satisfação em relação as questões propostas. Esta escala tem 15cm e ao longo dela o trabalhador marcará a sua percepção sobre o item. Os dados dos questionários foram analisados estatisticamente e o resultado indicou as prioridades dos IDEs (Índices de Demanda
Ergonômica).
3. Métodos e técnicas A presente pesquisa é do tipo descritiva. Segundo Gil (2008), a pesquisa descritiva é descrever as características de determinadas populações ou fenômenos. Uma de suas peculiaridades está na utilização de técnicas padronizadas de coleta de dados, tais como o questionário e a observação sistemática. O metodologia empregada foi a Intervenção Ergonomizadora (IE) que possui 5 (cinco) fases: Apreciação Ergonômica, Diagnose ergonômica, Projetação Ergonômica, Validação e Detalhamento. Nesse estudo, englobou-se apenas a fase 1 – Apreciação Ergonômica. Ela é uma fase que compreende o mapeamento dos problemas ergonômicos da empresa. Consiste na sistematização do sistema homemtarefa-máquina (SHTM) e na delimitação dos problemas ergonômicos. Fazem-se observações no local de trabalho e registros fotográficos. Esta etapa termina com o parecer ergonômico, apresentação dos problemas, a modelagem e as disfunções do SHTM.
4. Resultados e Discussões 4.1 Sistematização do Sistema Homem Tarefa Máquina Na modelagem da caracterização e posição serial do sistema encontra-se o sistema alvo que são os funcionários da Sede Administrativa de uma associação de professores que tem como meta garantir assistência necessária a diretoria da associação com comprometimento. O sistema alimentador da Sede é a Diretoria da mesma, as entradas são solicitações de documentos (circulares, ofícios, relatórios), materiais de divulgação das ações e etc. As saídas são documentos expedidos e materiais de comunicação divulgados. As restrições são os recursos financeiros e o planejamento administrativo. Para os requisitos tem-se a competência profissional, infraestrutura, máquina e equipamentos em bom funcionamento e de qualidade, etc. Para
208 resultados desproporcionados tem-se: Cansaço, acidentes e lombalgias nos funcionários. De acordo com a modelagem da Ordenação Hierárquica do Sistema constataram-se níveis hierárquicos superiores (supra-sistema: Associação de professores da Universidade Federal do Maranhão; supra-supra-sistema: Associação de professores da Universidade Federais do Brasil (Geral); ecossistema: Sindicato das Instituições de Ensino Superior – ANDESSN) e níveis hierárquicos inferiores (subsistema: secretaria, financeiro, diretoria, assessoria de comunicação e ambiente físico). Observou-se com relação à modelagem da Expansão do Sistema que o sistema alvo apresenta outros sistemas paralelos: Advocacia da associação de professores, Instalações (circulação, elétrica, ambiente arquitetônico); e recebe a entrada de solicitações provenientes do sistema serial: Diretoria. Analisou-se através da modelagem Comunicacional do Sistema que os sistemas humanos envolvidos na tomada de informação/percepção foram visão, tato e audição; para os subsistemas humanos de resposta/regulação (ações realizadas): com as mãos (segurar), com os dedos (pressionar clicar); os subsistemas da máquina que fornecem informações para serem processadas pelo homem/ fonte de informação da máquina: arquivos no computador, documentos na impressora e chamada no telefone; subsistemas da máquina que recebem as ações do homem/ comandos da máquina: pressionar os botões, clicar com o mouse, digitar com o teclado e abrir a bandeja para colocar papel na impressora. Quanto à modelagem do Fluxograma Operacional do Sistema observou-se o sequencial das funções/operações/atividades de cada trabalhador, mas, no geral, tudo começa com a entrada do trabalhador na Sede Administrativa, ele pega a ATA da reunião para saber qual tarefa executar (dependendo de cada cargo que são: auxiliar financeiro, estagiária de comunicação, secretária e jornalista) liga o computador de mesa ou laptop, impressora, executa a atividade e depois encaminha a diretoria da Sede para aprovação da mesma
209 pelo conselho. Constatou-se que cada posto de trabalho possui funções definidas e específicas, resultando na descrição separada de cada função. A figura 1 abaixo mostra, por exemplo, o trabalho do auxiliar financeiro.
Figura 1: Fluxograma Operacional do Sistema.
4.2 Resultados para Entrevistas abertas Analisou-se a partir da tabela 1 (Pesos para IDEs por ordem de menção), que os 04 (quatro) primeiros itens mais citados pelos trabalhadores na entrevista aberta foram: 1-Cadeiras desconfortáveis; 2-Mesas de trabalho desconfortáveis; 3-Espaço reduzido para as atividades; e 4-iluminação deficiente, atingindo respectivamente, peso 3,8; peso 2,0; 1,7 e 1,6.
Tabela 01: Pesos para os IDEs por ordem de menção.
4.3 Resultados para Entrevista Estruturada Os gráficos (figuras 2, 3, 4, 5, 6 e 7) a seguir mostram os índices de satisfação dos entrevistados na entrevista estruturada, nos seguintes aspectos: Como resultados para o constructo ambiente físico (Figura 2), os funcionários da sede administrativa apresentaram-se muito insatisfeitos com o nível de ruído que às vezes é externo nas proximidades da Sede Administrativa. Ressaltase que os itens “temperatura do ambiente” e “iluminação do ambiente” foram os que mais se aproximaram do nível de satisfação entre os respondentes.
do trabalhador. Para o constructo biomecânico (Figura 3), o item que apresentou menor índice de satisfação foi em relação às normas de acessibilidade que são ausentes na Sede. Segundo a NBR 9050 o ambiente deve proporcionar à maior quantidade possível de pessoas, independentemente de idade, estatura ou limitação de mobilidade ou percepção, a utilização de maneira autônoma e segura do ambiente, edificação, mobiliário, equipamentos urbanos e elementos. Os outros problemas que geraram a insatisfação dos usuários foram em relação ao estofamento das cadeiras, a satisfação com os mobiliários, altura da bancada da secretaria e a disposição dos equipamentos, esses com as notas variando entre 4,25 e 4,85.
Figura 2: Constructo Ambiente Físico.
A Norma Regulamentadora 17 afirma que nos locais de trabalho onde são executadas atividades que exijam solicitação intelectual e atenção constantes, tais como: salas de controle, laboratórios, escritórios, salas de desenvolvimento ou análise de projetos, dentre outros, são recomendadas as seguintes condições de conforto: a) níveis de ruído de acordo com o estabelecido na NBR 10152, norma brasileira registrada no INMETRO. Para as atividades que possuam as características definidas no subitem 17.5.2, mas não apresentam equivalência ou correlação com aquelas relacionadas na NBR 10152, o nível de ruído aceitável para efeito de conforto será de até 65 dB (A) e a curva de avaliação de ruído (NC) de valor não superior a 60 dB. Os parâmetros previstos no subitem 17.5.2 devem ser medidos nos postos de trabalho, sendo os níveis de ruído determinados próximos à zona auditiva e as demais variáveis na altura do tórax
Figura 3: Constructo Biomecânico/Antropometria.
O menor nível de satisfação apresentado para o constructo cognição (Figura 4) foi em relação à sinalização. A NR 26, que aborda sobre Sinalização de Segurança fala que a empresa tem por objetivo fixar as cores que devem ser usadas nos locais de trabalho para prevenção de acidentes, identificando os equipamentos de segurança, delimitando áreas. Em seguida encontram-se o entendimento do painel dos equipamentos dispostos no ambiente de trabalho e o nível de esforço cognitivo realizado pelos funcionários.
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Figura 7: Constructo Empresa.
5. Problematização do Sistema Homem-Tarefa-Máquina
Figura 4: Constructo Cognitivo.
Os funcionários demonstraram-se muito insatisfeitos com a disposição dos equipamentos inoperantes no ambiente de trabalho o que às vezes dificulta o trânsito dentro do ambiente. A privacidade no posto de trabalho vem a seguir como item de insatisfação, pois segundo os funcionários, às vezes eles perdem a concentração com pessoas transitando em sua área de trabalho, ocasionando a falta de silêncio e ainda tem que compartilhar equipamentos em seu turno por falta de equipamentos suficientes ou pela disposição dos equipamentos no ambiente. Após, veio em relação à segurança do ambiente de trabalho e ao fluxo de pessoas dentro do ambiente de trabalho, que ficaram abaixo do nível de insatisfação (Figura 5).
Figura 5: Constructo Cognitivo.
Durante a jornada de trabalho os funcionários sentem nível reduzido de desconforto/dor entre os segmentos corporais, sendo mais evidente nas costas, pescoço, ombro, mãos, nos braços, nas pernas e o nível de esforço físico exigido durante a sua carga-horária de trabalho, o que pode ser comprovado com a falta de mobiliário adequado (Figura 6).
Figura 6: Constructo Risco Desconforto/Dor.
Para o constructo empresa (Figuras 7), o item mais relevante refere-se a equipamentos de emergência e incêndios, como extintores, mangueiras e outros. Segundo a NR 23 sobre proteção contra incêndios, todos os locais de trabalho devem possuir equipamentos de proteção contra incêndio, saídas suficientes para a rápida retirada do pessoal em serviço e pessoas treinadas para utilizar tais equipamentos. Ainda, segundo a NR 23, todo local de trabalho deverá ter no mínimo 2 (dois) extintores e deverá cumprir com as condições determinadas pela mesma que diz que em uma área com 150 m² o risco de fogo é grande, o extintor inserido no local deverá ser o “C” (para equipamentos elétricos, motores eletrônicos e painéis) e a distância máxima a ser percorrida até o extintor deverá ser de 10 metros. Os extintores também deveram ser de fácil visualização, fácil acesso e onde haja menos probabilidade de fogo bloquear o seu acesso. Os itens citados a seguir foram o de espaço para armazenar os impressos que chegam à Sede como: jornais, editais, cartazes, folders e outros. Outro item relevante de ser citado foi em relação ao local de descanso para os funcionários, que, por vezes, foi dito como inexistente ou é o mesmo local de trabalho.
Para melhor apreender os problemas quando das primeiras visitas ao local de trabalho, durante a apreciação ergonômica, cumpre ter como orientação categorias de problemas ergonômicos (constrangimentos ergonômicos) que compreendem deficiências faltas e falhas específicas (MORAES, 2000). Os entrevistados citaram vários problemas das mais diversas classes: Classe A (Ambiente): Conservação do ambiente – gerando desconforto, doenças e estresse; Limpeza do ambiente – Proliferação de germes e bactérias, gerando infecções, alergias; Barulho lado externo, gerando estresse e comprometimento na concentração; Climatização do ambiente – gerando também estresse e comprometimento na concentração. A Figura 8 abaixo mostra ataque por agentes biológicos.
Figura 8: Ataque de agentes biológicos nas instalações elétricas.
Classe B (Biomecânico ou de Posto deTrabalho): Vários constrangimentos foram relatados, mas, no geral, destacam-se materiais abaixo da mesa proporcionando uma movimentação limitada dos membros inferiores; Dimensões das mesas e das cadeiras, gerando posturas inadequadas e limitações dos movimentos superiores e inferiores; Acesso aos arquivos nos armários – organização e disposição dos arquivos acessíveis, gerando estiramento de tronco e dos membros superiores e inferiores; Equipamentos e seus acionamentos – gerando dificuldade na compreensão dos equipamentos e execução das atividades. A Figura 9 abaixo mostra a disposição dos materiais e equipamentos na secretaria.
Figura 9: Disposição dos materiais e equipamentos na secretaria.
Classe O (Organização do Trabalho): Privacidade no posto de trabalho – gerando déficit de atenção, estresse e até constrangimentos; Equipamentos inoperantes – gerando dificuldades para execução das tarefas; Segurança do ambiente – podendo gerar dificuldade em procedimentos de emergência, lesões e até o óbito. A Figura 10 abaixo mostra a má disposição de materiais.
Figura 10: Materiais dispostos em locais inapropriados.
Classe R (Risco Desconforto/Dor): Nível de esforço físico exigido – Dificuldade na execução
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de algumas atividades, adoção de posturas e movimentos de elevado esforço físico, gerando DORT, contusões e distensão muscular. A figura 11 abaixo mostra a dificuldade de uma funcionária no acesso aos arquivos suspensos.
posturais corroborando a literatura (MORAES, A.; PEQUINI, S. M.; 2000; HALL, S. J.; 2009; COURY, H. C. G.; 1995; COSTA, l.; XAVIER, A. A. D. P.; 2006; ABNT, 1997; ABNT, 1998; GRANDJEAN, E.; 1998). A realização das outras fases da Intervenção Ergonômica seriam muito importantes para o aprofundamento dos problemas priorizados nesta pesquisa e testar predições.
Referências
Figura 12: Arquivos e materiais dispostos em caixas estocadas e alguns em locais não propícios.
6. Conclusão Figura 11: Funcionária mostra como tem acesso aos arquivos suspensos na sede.
Classe E (Empresa): Quantidade de tomadas – gerando dificuldade na execução de tarefas; Cabos e fiação elétrica – Falta de organização dos cabos de forma segura, gerando choques e podendo gerar incêndios, queimaduras e o óbito; Espaço para armazenar arquivos – gerando acúmulo de dados, documentos, papéis, dificuldade de locomoção interna; Espaço para guardar os objetos pessoais dos trabalhadores – gerando desorganização e podendo gerar furtos; Equipamento de emergência – Faltam equipamentos adequados às normas de segurança que auxiliem em situações de emergência, podendo gerar dificuldades na execução de procedimentos de emergência. Dentre muitos outros constrangimentos citados. A Figura12 abaixo mostra arquivos e materiais dispostos de forma a obstruir a área de acesso.
Os resultados da presente pesquisa apontam a presença de constrangimentos ergonômicos ou IDEs no trabalho dos funcionários da Sede Administrativa de uma associação de professores em São Luís, das suas mais diferentes classes, como os supracitados na problematização. Entretanto, no geral, estão relacionados ao ambiente, biomecânico, cognitivo, organizacional, risco desconforto/ dor e empresarial. Constatou-se que o trabalho realizado na sede administrativa é essencialmente realizado na posição sentada e eventualmente de pé. Observou-se uma má distribuição (organização) de equipamentos (Monitores, CPUs, Mouses, telefones, etc.) alocada sobre bancadas com layout linear, resultando em “cantos vivos” e fios aparentes, podendo causar acidentes, além disso, não possuem apoio de pés, este quadro pode ser o causador de inúmeras posturas inadequadas assumidas pelos funcionários. Já o posto de trabalho da estagiária apresenta-se confuso, pois não há um local fixo e seu trabalho é necessariamente orientado com a ajuda do notebook, o que pode acarretar em problemas
ABNT - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13962. Móveis para Escritório – Cadeiras – Características Físicas e Dimensionais. Rio de Janeiro, 1997. ABNT - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 14110. Móveis para Escritório – Cadeiras – Ensaios de estabilidade, resistência e durabilidade. Rio de Janeiro, 1998. ABNT - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13962. Móveis para Escritório – Cadeiras – Características Físicas e Dimensionais. Rio de Janeiro, 1997. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICA – ABNT. Norma Brasileira 1015 - Níveis de ruído para conforto acústico. Disponível em: http://www.vilavelha.es.gov. br/midia/paginas/NBR_10152-1987.pdf Acesso em: 06/10/13. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICA – ABNT. Norma Brasileira 9050 Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. Disponível em: http://www.pessoacomdeficiencia.gov. br/app/sites/default/files/arquivos/%5Bfield_ generico_imagens-filefielddescription%5D_24.pdf Acesso em: 06/10/13. COSTA, L.; XAVIER, A. A. D. P. Análise da relação entre a postura de trabalho e a incidência de dores nos ombros e no pescoço numa empresa de desenvolvimento e implantação de sistemas de GED. XXVI ENEGEP - Fortaleza, CE, Brasil, 9 a 11 de Outubro de 2006. COURY, H. C. G. Trabalhando Sentado: Manual para posturas confortáveis. 2ª ed. São Carlos: Editora da UFSCar, 1995. 88 p. FOGLIATTO, F. S.; GUIMARÃES, L. B. de M.
Design Macroergonômico: uma proposta metodológica para projeto de produto. In: Guimarães, L. B. (Ed.), Revista Produto & Produção. PPGEP/UFRGS: Porto Alegre, 1999. Vol. 3 GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2008. HALL, S. J. Biomecânica básica. [tradução Patrícia Neuman]. 5ª ed. Barueri, SP: Manole, 2009. 542 p. INSTITUTO DE METROLOGIA, QUALIDADE E TECNOLOGIA – INMETRO. Disponível em: http:// www.inmetro.gov.br/ Acesso em: 06/10/13. MORAES, Ana Maria de; MONT'ALVÃO, Claudia. Ergonomia: conceitos e aplicações. Rio de Janeiro: 2AB, 2009. MORAES, Ana Maria de; MONT'ALVÃO, Claudia. Ergonomia: conceitos e aplicações. Rio de Janeiro: 2AB, 2000. MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO – MTE. Norma Regulamentadora NR-17 Ergonomia. Disponível em: http://portal.mte.gov.br/data/ files/FF8080812BE914E6012BEFBAD7064803/ nr_17.pdf Acesso em: 06/10/13. MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO – MTE. Norma Regulamentadora NR 26 - Sinalização de Segurança. Disponível em: http://portal.mte.gov.br/data/ iles/8A7C816A350AC88201355DE1356C0ACC/ NR-26%20(atualizada%202011).pdf Acesso em: 06/10/13. MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO – MTE. Norma Regulamentadora NR 23 - Proteção Contra Incêndios. Disponível em: http://portal.mte.gov.br/data/ files/8A7C816A2E7311D1012FE5B554845302/ nr_23_atualizada_2011.pdf Acesso em: 06/10/13. MORAES, A.; PEQUINI, S. M. Ergodesign para terminais informatizados. Rio de Janeiro: 2B, 2000. 124 p. SANTOS, M. C. L. Estudos em design nas universidades estaduais UNESP e USP. São Paulo: Editora UNESP, 2006.
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Usabilidade De Embalagens De Macarrão Instantâneo: Aplicação De Métodos Subjetivos Usability Of Instant Noodles’ Packaging: Subjective Methods Application BAU, João Silvestre Medeiros. Universidade Estadual Paulista (UNESP)
sylverfalls@gmail.com FURLAN, Alexandre Santana. Universidade Estadual Paulista (UNESP)
a.sfurlan@gmail.com OLIVEIRA, Vinícius Pereira. Universidade Estadual Paulista (UNESP)
viniciusp.oliveira7@gmail.com PASCHOARELLI, Luis Carlos. Universidade Estadual Paulista (UNESP)
lcpascho@faac.unesp.br
desse alimento ter passado de 4 milhões, em 1971, para mais de 50 bilhões de pacotes a cada ano até 2007, ou porque só em 2012 foram consumidos mais de 101 bilhões de pacotes. A China é a maior consumidora desse tipo de produto, e o Brasil, o 10º nicho de consumo . Sendo assim, nota-se claramente que esta é uma embalagem que gera muitos constrangimentos, dado seu alto índice de consumo. Considerando o exposto, fazse necessário analisar a usabilidade destas embalagens, de modo a garantir parâmetros projetuais para a mesma e, consequentemente, favorecer o conforto do usuário durante o consumo do alimento. 1.1. Histórico
Resumo O atual estilo de vida tornou o macarrão instantâneo uma refeição rápida e completa. Com essa perspectiva, faz-se necessário estudar a usabilidade das embalagens deste setor a fim de oferecer produtos que garantam o conforto e a satisfação do usuário, mantendo suas propriedades e características mercadológicas. Para isto, foram aplicadas ferramentas de análise de interfaces de usabilidade, demonstrando sua possibilidade na avaliação de produtos do cotidiano, uma vez que as embalagens não deixam de ser a primeira interface de contato do usuário com o produto. Os resultados apontam que tais ferramentas são sensíveis aos diferentes desenhos analisados. Palavras-chave: alimento, embalagem, usabilidade.
Figura 1 – Linha do tempo até o ano de 2013.
Abstract The current lifestyle has turned instant noodles into a quick yet complete meal. Taking from this perspective, it has been made necessary to study the usability of the packaging in this sector in order to offer products that will ensure comfort and satisfaction to its consumer, and that may maintain property and marketing characteristics. Thus, analysis tools for interface usability have been applied so that it may demonstrate the possibility of its use in every day life products evaluation, considering packaging does not cease to be the first user contact interface with the product. The results show that such tools are sensitive to the different designs analyzed. Keywords: food, packaging, usability.
1. INTRODUÇÃO Nos últimos anos as pessoas têm vivido um estilo de vida cada vez mais dinâmico. Isto exige a alteração de seus comportamentos sociais e interfere, inclusive, no modo como se alimentam. Essa necessidade já é presente
desde o início do séc. XX e, a partir da década de 1950, surge o macarrão instantâneo, também popularmente conhecido como “miojo”; de lá para cá, não somente uma massa rápida, mas também uma “ferramenta” de auxílio na alimentação da população mundial. É fácil compreender o porquê da produção
O macarrão instantâneo, o popular “miojo”, foi criado pelo chinês Momofuku Ando – o “Sr. Nissin”, nascido em 1910 e falecido em 2007 – como uma alternativa alimentícia ao tradicional macarrão e como forma de aproveitar a demanda de farinha de trigo que era importada dos EUA no pós-II Guerra Mundial da década de 1950. Ao se naturalizar japonês em 1948, Ando funda, no mesmo ano, a Nissin Produtos Alimentícios Ltda.; à mesma época o Ministério Da Saúde do Japão incentiva sua população a comer alimentos a base de trigo, o que fez com que dez anos depois a Nissin apresentasse o “Chikin Ramen”. Com o sucesso deste produto durante uma década, Momofuku decide melhorá-lo em 1968 e fabrica uma embalagem impermeável
a base de plástico poliestireno; o novo “Chikin” foi lançado três anos depois nos EUA com o nome “Cup Noodles”, conquistando também o mercado global nas décadas seguintes. A filial brasileira é conhecida como Nissin-Ajinomoto, presente desde 1965 . 1.2. Impacto Socioeconômico Segundo a Associação Japonesa Das Indústrias De Comidas Convenientes (JCFIA) existem no Japão mais de mil marcas de macarrão certificadas com o selo JAS (cerca de 80% do mercado de alimentos instantâneos); destas, 62,8% vêm em vasilhas descartáveis e 49% são produzidas pela Nissin. Após o lançamento do “Cup Noodles” em 1971 - primeiro no mercado estadunidense e depois pelo mundo – 14 concorrentes seguiram com alimentos semelhantes, multiplicando em cem vezes e em menos de dois anos a produção anual de macarrão, de 4 para 400 milhões de pacotes . O secretário geral da JCFIA Hidetoshi Hasuo afirma que este ramo do mercado encontrase saturado, com 5,4 bilhões de unidades produzidas anualmente; conforme indica, o total de macarrão instantâneo consumido no mundo saltou de 53,2 bilhões de porções, em 2001, para 85,6 bilhões, quatro anos depois. Já no Brasil, o aumento de 2,7% do PIB em 2011 permitiu ao país tornar-se a 6ª maior economia global no início do primeiro semestre de 2012, ultrapassando o Reino Unido; este crescimento é devido ao maior número de investimentos estrangeiros . Alcançando o 10º lugar em consumo de macarrão instantâneo no mundo, o país é um dos clientes prioritários da Nissin desde 1997; inclusive, em outubro de 2012 foi anunciada a fabricação de novos “Cup Noodles” com sabores locais para 2013: molho de churrasco, frango com requeijão e galinha caipira . De acordo com o estudo da Associação Brasileira Das Indústrias De Massas Alimentícias, Pão & Bolo Industrializado (ABIMA), o macarrão é um produto presente em 100% dos lares, e as massas instantâneas estão presentes em 90% das residências, o que significa que ainda há uma parcela a ser conquista pelas indústrias
216 do “miojo” nos próximos anos. A venda de macarrão instantâneo subiu em 31% no último ano, tendo como apelo e, como dito antes, "a praticidade, a rapidez no preparo e o preço"; a média brasileira de consumo familiar é de 15 a 30 pacotes ao mês . Até 2013, foram consumidos 101 bilhões de pacotes de macarrão instantâneo por todo o mundo. Apesar de ser o campeão em teor de sódio, no Brasil o governo, representado pela Agência Nacional De Vigilância Sanitária (ANVISA), juntamente com as indústrias alimentícias garantiu para 2013 produtos deste setor com menos sódio . 1.3. Sustentabilidade Todas as marcas de macarrão instantâneo préfabricado condicionam diferentes sabores que possibilitam o consumo na própria embalagem . Esta, por sua vez, segue um projeto que atende requisitos básicos, tais como a composição por materiais apropriados para o contato do usuário com o alimento (isopor ou poliestireno), que tenham também propriedades térmicas para o preparo do macarrão com água aquecida, e um “sistema de vedação” na tampa que permita manter a temperatura constante para finalizar o preparo do produto. Há, por exemplo, um monitoramento periódico nos processos de fabricação da Nissin a fim de identificar potenciais riscos na produção e no meio ambiente; a empresa adquiriu nos últimos anos certificados em gestão de qualidade (NBR ISO 9001), ambiental (NBR ISO 14001) e de segurança (HACCP), tendo inclusive uma Política sobre emissões de gases . Também, ao consultar seu site oficial, há informações que sustentam que as embalagens dos produtos são fabricadas com materiais cuja reciclagem é viável; entretanto, não há alguma indicação clara sobre isso nos rótulos de tais itens, isentando assim a responsabilização do fabricante. Notase então que para a concretização de uma reciclagem adequada é necessário que tais resíduos dependam de coleta de lixo local, ou da motivação do próprio usuário para separálos do lixo orgânico comum e ainda que este
217 usuário deva limpar as embalagens antes do descarte. Nesta pesquisa, não houve dados suficientes de outras empresas concorrentes da Nissin sobre o assunto.
universitários, com idade média de 22,00 anos (d. p. 2,91 anos). 3.3. Protocolos
2. OBJETIVOS Os objetivos do presente estudo foram estudar a usabilidade das embalagens de macarrão instantâneo, a partir de métodos subjetivos, verificando assim a possibilidade de aplicação dos mesmos neste tipo de abordagem.
3. MATERIAIS E MÉTODOS O presente estudo caracterizou-se como um recorte transversal, baseada em parâmetros métricos, porém deduzíveis de abordagem subjetiva. 3.1. Objetos De Análise
Figura 2 – Os produtos “Cup Noodles” e “Liggero!” utilizados na pesquisa.
Considerando a diversidade das embalagens existentes para macarrão instantâneo, foram analisadas duas das principais marcas deste setor e cujas características morfológicas e de uso são distintas. As marcas analisadas foram: a Nissin-Ajinomoto, já citada, representada pelo “Cup Noodles”; a Adria, indústria brasileira, representada pelo “Liggero!”. 3.2. Sujeitos Participaram do estudo 5 (cinco) voluntários, consumidores e usuários frequentes deste produto alimentar; esse número se justifica pelo fato de que estudos de usabilidade não exigem grandes amostras . Os sujeitos se caracterizam ainda por serem todos jovens e
Figura 3 – Formulários SUS e SD empregados no presente estudo.
Os procedimentos empregados neste estudo se caracterizam como descritivos e exploratórios através da identificação de constrangimentos pelos sujeitos com as técnicas do SUS (System Usability Scale) e SD (Semantic Differential) . O SUS – sistema de escala da usabilidade, em português – fornece uma ferramenta útil para mensurar a usabilidade de produtos. Esse sistema trata-se de um questionário com dez perguntas, sendo que, cada uma delas possui cinco alternativas que têm a graduação de “concordo totalmente” a “discordo totalmente” para as respostas. Idealizado por John Brooke em 1986, o formulário pode ser utilizado pra avaliar hardwares, softwares, dispositivos móveis, aplicativos e muitas outras aplicações, sendo que, nesta avaliação, o teste foi utilizado para a análise da interface das embalagens de macarrão instantâneo . Observando os parâmetros mensurados pelo SUS, pode-se perceber que esse é um sistema de perguntas e respostas de fácil assimilação por parte dos usuários avaliados e que também permite que os resultados obtidos sejam usados para diferenciação de sistemas utilizáveis e inutilizáveis, mostrando-se assim, um teste eficiente para a finalidade proposta
inicialmente. Por sua vez, o SD – “diferencial semântico” (DS), no Brasil – foi elaborado por Osgood em 1957 e serve para medir o sentido conotativo de objetos e conceitos. O entrevistado é convidado a avaliar um objeto ou conceito e assinala a sua opinião em uma escala de sete pontos (1 a 7) que é definida com adjetivos antagônicos em cada extremidade, como “forte e fraco”, “feio e bonito”, “fácil e difícil”, dentre outros. É importante que os adjetivos de aspectos positivos e negativos fiquem dispostos de forma diversificada pelos lados da escala para não influenciar as respostas para apenas um dos lados. O uso do SD para esta pesquisa permitiu a construção de gráficos de análise comparativa entre os produtos de marcas concorrentes. Também foram levantadas as seguintes questões livres sobre o conhecimento dos consumidores frente ao macarrão instantâneo: (A) Há algo no produto que deixou você frustrado? (B) Algo no produto te deixou alegre ou satisfeito? (C) Alguma observação positiva ou negativa, de maneira geral, com relação ao produto que você gostaria de registrar? 3.4. Procedimentos Individualmente, todos os sujeitos foram convidados a preparar os alimentos oferecidos, sendo 1 (uma) unidade (ou, embalagem) de cada marca pesquisada. Cada produto foi cozido separadamente e, a cada preparo e consumo, foram empregados os questionários SUS e SD; as questões abertas foram aplicadas ao final do processo, possibilitando aos usuários comparar as mesmas. Os voluntários foram instruídos a passar por todas as etapas que envolviam o uso do produto: o primeiro contato com a embalagem (fornecida pelos autores), a abertura desta, o cozimento e seu consumo. Após a avaliação, os dados foram tabulados e aplicados numa estatística descritiva a fim de verificar as tendências das observações dos sujeitos.
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4. RESULTADOS 4.1. Questões Abertas Os dados subjetivos caracterizaram por opiniões prós e contras cada uma das marcas. No caso do “Cup Noodles”, os resultados indicam: – prós: forma ergonômica que se adapta à mão; rótulo de fácil compreensão; embalagem reciclável; – contras: certa dificuldade para abrir a embalagem; a mesma não retém calor; a tampa rasga facilmente; a profundidade do copo pode dificultar um pouco a alimentação. Já o “Liggero!” apresentou os seguintes resultados: – prós: forma agradável por se assemelhar a um prato; rótulo fácil de compreender; material é reciclável; – contras: embalagem não retém calor; pouco ergonômica (circunferência muito grande); não tem tampa para preparo. 4.2. SUS Os resultados do questionário SUS são apresentados na figura 4.
Figura 4 – Infográfico do formulário SUS
4.3. SD Os resultados do questionário SD são apresentados na figura 5.
Figura 5 – Infográfico do formulário SD
De modo geral, observa-se que no questionário SUS, a diferença foi mais expressiva que no questionário SD. Por outro lado, neste gráfico os dois produtos foram considerados “aceitáveis”.
5. DISCUSSÃO Segundo os dados levantados, o formatocopo do produto “Cup Noodles” é ideal para condicionar a água aquecida; o lacre, segundo os rigores de fabricação, deve manter a temperatura durante o preparo do alimento; há um espaço vazio no fundo do copo que permite a água continuar fervendo enquanto todo o macarrão cozinha. Observou-se que mesmo contendo informações gráficas claras, nem todos os usuários se satisfizeram com a legibilidade e a descrição do produto no rótulo. Quanto ao produto “Liggero!”, mesmo a embalagem aparentando ser de plástico semelhante à embalagem anterior, seu recipiente tem um formato-prato que difere quanto à vedação da tampa que, em relação ao produto da Nissin, é um bom isolante térmico, permitindo manuseio manual durante o preparo da massa. Os problemas de usabilidade dos produtos observados são os seguintes: – o filme plástico de ambas as embalagens apresenta grande dificuldade em ser aberto; os usuários descreveram que no é possível rompêlo sem o auxílio de alguma ferramenta cortante (faca, tesoura, garfo, &c.). Este fato conflita com o interesse de ambas as marcas quererem que
seus produtos fossem destinados ao consumo rápido e prático; – nenhum dos produtos apresentou um isolamento térmico adequado em relação ao calor conduzido para o lado externo, onde há o contato direto com as mãos dos usuários; alguns acidentes brandos, como o chamuscar das pontas dos dedos, foram observados. Fazse necessário pensar na necessidade de uma alça ou cobertura para proteger a pega da mão; – também nenhum deles apresentou uma tampa adequada quanto à vedação/ manutenção do calor para o cozimento do alimento; materiais mais resistentes seriam mais bem empregados. Tomando-se tais fatos como norteadores, a resolução de qualquer problema em ambos os produtos é, estritamente, de usabilidade. Como adendo, tal solução poderia apresentar um caráter inovador a fim de tornar ambas as embalagens mais adequadas. Apesar de todas as unidades desses produtos terem a embalagem e o recipiente recicláveis, não se constatou algum incentivo explícito quanto a isso nas informações gráficas dos rótulos, o que as torna um lixo “garantido” e em curtíssimo prazo (se medido a partir da data de compra).
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS O consumo de alimentos de preparo rápido no mundo vem crescendo gradativamente nas últimas décadas, o que tem gerado uma elevada demanda para soluções de design no campo das embalagens. Muito além dos aspectos mercadológicos, tais embalagens exigem grande atenção no que refere os aspectos ecológicos e de usabilidade. No primeiro caso, alternativas tecnológicas, baseadas especialmente no uso de materiais adequados e sistemas informacionais que induzam a reciclagem das embalagens (no pós-uso) são alternativas já exploradas em diferentes abordagens do design sustentável. Já no que diz os aspectos de usabilidade, não existem expressivos estudos, especialmente no caso das embalagens de macarrão
instantâneo. Procurar responder as questões e os constrangimentos durante o uso deste tipo de produto caracterizou-se como um dos propósitos deste estudo. Para aplicar métodos de abordagem que exigem o uso do produto e a expressão (propriamente dita) dos usuários sobre sua experiência, a alternativa metodológica adotada, neste sentido, destaca-se no uso do SUS e do SD como ferramentas de abordagem. Particularmente quanto ao SUS, os resultados apontaram que os sujeitos percebem melhor qualidade de uso em uma embalagem, em oposição à outra. Isto já garante que o referido questionário é sensível à diferentes percepções geradas por embalagens distintas. O atual estudo permitiu identificar novas demandas, as quais podem ser satisfatoriamente atendidas, se forem consideradas: – formato, para uma pega da mão mais agradável; – materiais, para não haver acidentes térmicos; – tampa, de modo que esta consiga efetivamente realizar o cozimento do alimento e que sirva como um lacre definitivo; Muitas vezes essas tecnologias ainda são caras e dependem de mais aprofundamento e investimentos. Assim, faz-se necessária a realização de novos testes que envolvem a usabilidade do produto, preferencialmente considerando novas circunstâncias de uso, a fim de verificar também outros aspectos tangentes à usabilidade: segurança, ergonomia, entre outras. Além disto, continua ainda a demanda para os aspectos de sustentabilidade, cujo impacto esta presente em toda embalagem existente.
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FUNDAMENTOS TEÓRICOS
O design de brinquedos e os papéis sociais de gênero: inter-relações The toy design and social roles of gender: interrelationships Gomes, Deivide Eduardo de Souza; Universidade Federal de Campina Grande - UFCG/PB
deivide.edu@gmail.com
Resumo O presente artigo tem o objetivo de evidenciar a necessidade dos estudos acerca do caráter construcionista de gênero, como um aporte para o desenvolvimento de brinquedos, no âmbito acadêmico de design. Para tal, foram identificados brinquedos nacionais separados em categorias de gênero, disponíveis nos catálogos on-line de fabricantes brasileiros. Os resultados apontam para a necessidade de analisar a concepção de brinquedos, segundo padrões de masculino-feminino nos estudos de design, uma vez que a formação do designer deva fornecer o conhecimento das questões sociais que permeiam o entorno dos produtos por ele desenvolvido. Palavras Chave: design de brinquedos; relações de gênero; formação em design; transversalidade.
Abstract This article aims to emphasize the need of studying about the gender constructionist character, as a contribution to the development of toys, at the design graduation degree. For that matter, national toys were identified and divided into gender categories, available on online catalogues of Brazilians manufacturers. The results point out to the need of analyzing the conception of toys, according to malefemale patterns at design studies, once the designer’s graduation may provide the acknowledge about social matters that surround its developed. Keywords: toy design; roles gender; design graduation; transversality.
Introdução Por meio dos brinquedos e brincadeiras, as crianças trabalham o seu desenvolvimento emocional, cognitivo, sua coordenação motora e sua sociabilidade. E é neste momento de descobertas e identificações que a criança vai construindo significados, e reconhecendo o mundo em volta de si. Brinquedos são, simultaneamente, comunicações já produzidas e ferramentas com as quais se produzem significados, que podem ser textualizados de maneiras diferentes, através de estórias, filmes, desenhos animados, fotos, comerciais etc.
(CALDAS-COULTHARD, 2004). Alguns estudos evidenciam que o brinquedo traça aspectos da realidade, fazendo dele a reprodução de objeto atribuído de representatividade social (KISHIMOTO, 2008). As representações sociais do brincar e do brinquedo são imbuídas de referências cotidianas do ambiente, sejam elas das funções e ferramentas do mundo técnico/científico, da natureza, do modo de vida das famílias, do imaginário dos desenhos animados, porém, idealizando sua configuração por meio da idade e do gênero do público ao qual será destinado (KISHIMOTO, 2007). No entanto, esses objetos
224 lúdicos decorrem de uma construção formal e do seu entorno, pré-estabelecidos pelos familiares, antes da criança adquirir a condição de escolha (BROUGÈRE, 2004). O/a designer como parte do desenvolvimento da cultura material e agente construtor de artefatos, mostra-se com papel relevante nesse jogo de interpretações. Sobre a relação do/a designer com os brinquedos, Caldas-Couthard (2004, p. 11) expõe que: Brinquedos são objetos semióticos que são produzidos e distribuídos globalmente por poderosas empresas multinacionais. Frequentemente, transmitem mensagens para as crianças sobre o mundo social em que elas vivem. São produzidos como um sistema, que permite distinções quanto ao grau de realismo (ou abstração, ou exagero), com o qual representam elementos de práticas sociais. São, simultaneamente, ‘objetos’ para serem lidos como textos, e objetos para serem manipulados. Parte de seu significado é oferecido pelos designers da indústria. Podem, portanto, ter agendas explícitas e às vezes implícitas; neste sentido, brinquedos são um repositório das ideologias e ‘sistemas de valores’ sociais.
Essa inserção da criança em um mundo de significados é percebida também, através de relações dicotômicas de masculino x feminino, azul para meninos x rosa para meninas, carrinho x boneca fazendo com que sejam construídos em contextos excludentes entre si. Acerca dessas dicotomias, Carvalho (2009a, p. 09) afirma: A oposição dicotômica faz com que o primeiro elemento atue como “identidade-referência”, a partir da qual as identidades que dela se diferenciarem serão marcadas e constituídas como “o outro” (inferior ou marginal). A “identidade-referência” será considerada “nãoproblemática”, socialmente edificada como norma e, por conseguinte, sempre presumida.
Essa trama de relações dicotômicas está
225 intimamente vinculada aos estudos de gênero, inclusive, no âmbito dos brinquedos. O conceito de gênero aqui trabalhado está de acordo com a teoria feminista que tem o propósito de “desnaturalizar as diferenças de comportamento e o estatuto social de homens e mulheres, bem como a divisão social (sexual) do trabalho” (CARVALHO, 2003, 2009a). Carvalho (2009b, p. 17) apresenta essa polarização de gêneros como uma construção sociocultural atribuída a natureza biológica de homens e mulheres, variando entre classes sociais, idades, etnias o que, segundo ela, torna o gênero uma construção “mutável e plural”, e define gênero como: É uma estrutura de dominação simbólica (ideologia), um princípio de organização das práticas sociais (divisão de trabalho) e uma estrutura psicossomática (habitus, identidade).
Carvalho ainda expõe que os papéis sociais, padrões de comportamento, modelos de identidade, representações de homem e de mulher, que, quando utilizados de modo reducionista, se tornam estereótipos e servem para discriminar. E algumas representações sociais contidas nos brinquedos, podem ser um forte disseminador desses modelos estereotipados de gênero. Assim, o objetivo dessa análise é evidenciar a necessidade de estudos acerca das relações de gênero, no âmbito acadêmico do design, como um suporte dos estudos para concepção do brinquedo. A pesquisa justifica-se devido ao fato de fazer necessário compreender relações transversais do design, associadas ao caráter construcionista das relações de gênero nos brinquedos, tornando possível observar um entendimento inicial e multidisciplinar do design na formação discente, já que estas áreas são, em diversos momentos, analisadas em campos de estudos diferenciados.
Inter-relações do Design Atualmente, os aspectos comunicacionais que encontramos na sociedade suprimem
as possibilidades do design, resultando em sua banalização. Dessa forma, o coletivo passa a encarar o/a designer e seus campos de conhecimento de maneira limitada, como evidencia Lobach (2001) e Landim (2010) ao mostrar que a conceituação do design, por muito tempo, tem adquirido interpretações equivocadas e que acabaram por se impregnar no senso comum. Assim, na intenção de elucidar o exercício do design, o International Council of Communication Design (2013), expõe uma redefinição dos campos de atuação do/a designer, repensando o posicionamento do/a profissional como um/a trabalhor/a do conhecimento e atuante em uma profissão de atribuição intelectual, não reduzindo sua participação apenas a um negócio ou serviço para empresas. E define: Design é uma disciplina dinâmica e em constante evolução. O designer com formação profissional se aplica a intenção de criar o visual, material, espacial e ambientes digitais, cientes do experiencial, empregando abordagens híbridas e interdisciplinares para a teoria e prática do design. Eles compreendem o impacto cultural, ético, social, econômico e ecológico de seus esforços e da sua responsabilidade final em relação às pessoas e para o planeta em ambas as esferas comerciais e não-comerciais. Um designer respeita a ética da profissão design.
Dessa maneira, observa-se que o/a designer não só desenvolve produtos físicos e operacionais, mas está intimamente ligado/a aos processos que convergem para o entendimento do design como uma atividade voltada, também, para as questões humanísticas, podendo esta influenciar na maneira como as relações da sociedade lidam com seus artefatos. Assim confirma Bonsiepe (1988 apud Ono, 2004) ao apresentar o/a designer como um sujeito e objeto de fator influente da dinâmica cultural, no momento que este afeta direta ou indiretamente a vida das pessoas. O/a designer não é mais identificado
como um ser estático ante as alterações culturais de um povo, vendo que passou a se tratar de uma perspectiva abrangente sobre os valores simbólicos condicionados por ele/a. Sobre este jogo de relações entre necessidades tecnológicas e influências culturais, Ono (2004, p. 60) afirma: A natureza interdisciplinar da atividade design, confere-lhe uma importante dimensão antropológica cultural. No desenvolvimento de produtos industrializados, o design sofre, por um lado, o impacto do desenvolvimento tecnológico e dos processos técnicos, e, por outro, as pressões das transformações culturais decorrentes do surgimento de novos usos e necessidades, promovidos pelos artefatos inseridos na sociedade.
Considerando este posicionamento, Whiteley (1998, p. 64) expõe um modelo de formação que atente para a constante busca do profissional em correlacionar as diversas questões inseridas no contexto da prática projetual, as conectando com nuances que permeiam indagações teóricas encontradas tanto no produto desenvolvido quanto em seu entorno. Este ideal implica na observância em ministrar modelos acadêmicos que visem perspectivas de natureza cultural, ambiental, social e política. Dessa forma, ele afirma: É preciso atingir uma maior coerência entre as diversas partes da formação, a fim de permitir que as diversas qualidades e aptidões que se complementem - e até mesmo, se confrontem,de forma construtiva. A existência de habilidades de diferentes tipos deveria engendrar um senso de completitude e compreensão na busca da interdisciplinaridade e não um senso de confusão, incoerência ou desconfiança.
É perceptível dessa maneira, verificar que os parâmetros que delineiam o design atualmente se traduzem por meio da capacidade transversal que a área agrega ao abraçar diferentes campos de atuação. Clarificando esta inter-relação de conhecimentos, se parte em busca de modelos
226 projetuais que possibilitem ultrapassar as barreiras tecnicistas largamente difundidas na área. Como aponta Mefano (2005) e Celaschi (2013), ao evidenciar as áreas relacionadas ao comportamento humano como um viés amplamente significativo no desenvolvimento do projeto, tal como as questões técnicas inerentes à produção industrial, devendo favorecer à formação destes profissionais, uma mútipla perspectiva de conteúdos culturais, históricos, críticos e reflexivos.
Gênero no âmbito acadêmico do design O caráter interdisciplinar do design e a relevância do/a designer como fator influente na cultura material, evidenciam a necessidade de se discutir nos estudos acadêmicos, as influências socioculturais das relações de gênero no design de brinquedos, permitindo uma nova perspectiva sobre a disposição projetual da tríplice - informação-preparaçãosolução – muitas vezes condicionada unicamente aos fatores industriais/mercado. Entender essa dinâmica cultural na qual o/a designer está inserido/a, propicia ao estudante evitar trilhar por caminhos projetivos que levem à construção de modelos sexistas de brinquedos, viabilizando o desenvolvimento acadêmico de ideias coerentes com as questões sociais da atualidade, bem como a efetiva formação social do/a acadêmico/a de design. Como confirma Moraes (1999): Cabe a uma escola de design, entretanto, por meio de disciplinas como prática projetual e planejamento de projeto, fazer com que os alunos, utilizando-se de temas prévia e estrategicamente estabelecidos, pratiquem uma forma de projetação em que prevaleçam enfoques subjetivos e teóricos como elementos diferenciadores de projeto. Isso deve ocorrer até que essa prática se torne um fator natural e intrísceco do seu processo e métodos projetuais. Está se preparando, assim, não somente um dosador de diversos fatores e aspectos projetuais, mais um pensador para novas e diferenciadas
227 soluções.
Tendo em vista isto, verifica-se que, uma vez que a análise do caráter construcionista do gênero em brinquedos se dá posterior ao produto já desenvolvido, esta gera, muitas vezes, um distanciamento do estudante com a responsabilidade social de sua futura profissão. Na possibilidade de reavaliar maior abertura à discussão das relações de gênero nos esquemas projetuais de brinquedos, se faz necessário um estudo prévio de gênero fazendo com que tal análise sociológica passe, também, a ser parte inerente do desenvolvimento do projeto do brinquedo.
Figura 1 – Inserção (pré-análise) dos estudos de gênero no projeto do brinquedo. Elaborado pelo autor, com base na pesquisa realizada.
Este modelo de inserção pré-analítica dos estudos de gênero vem a contribuir na diferenciação do brinquedo, incentivando, na formação acadêmica, a quebra de padrões culturais esteriotipados de masculino e feminino. Pesquisas recentes traçam a situação do design de brinquedos no Brasil e nelas, se pode identificar fatores que influenciam a desassociação das questões pertinentes de gênero ao projeto de brinquedos, como se pode identificar no Relatório 2014 do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) do setor de design no Brasil. Verifica-se que não existem escolas de design especializadas no desenvolvimento de brinquedos, sendo apresentadas, em nível de graduação, quatro macro áreas: produto,
ambientes, gráfico e moda, estando o projeto de brinquedos inserido em uma ou mais delas. O desenvolvimento do projeto de brinquedos se dá muitas vezes por meio de profissionais autodidatas que buscam no mercado, a base de pesquisa, para a concepção de seus produtos, como afirma Mefano (2005). Outro fator importante a ser observado é que na absorção de informações para a análise de mercado e de atributos formais em projetos de brinquedos, o/a estudante se depara com produtos estabelecidos no setor que independem, na sua maioria, do conhecimento de gênero. O produto é então desenvolvido e, consequentemente, direcionado aos meios publicitários a fim sua divulgação no setor. Gera-se a repetição subjetiva de masculinofeminino no desenvolvimento do projeto, já que o acadêmico de design, ao desconhecer tais arquétipos, os reproduzem sem que sejam vistos como parte de um sistema cultural associado aos problemas sociais de gênero. Nessa construção do brinquedo, ocorre a dicotomia de gênero do artefato, que vai desde a sua estética até o seu discurso publicitário. Nesse sentido, se faz necessário compreender a disposição dos brinquedos no mercado brasileiro a fim de exemplicar possíveis modelos esteriotipados de gênero.
Procedimentos Metodológicos da Pesquisa O presente trabalho foi desenvolvido através análise, de caráter qualitativo, de brinquedos produzidos em fábrica, que apresentassem algum nível de representação de papéis sociais de gênero. A coleta foi realizada entre os meses de junho a julho de 2014, por meio de catálogos de brinquedos disponíveis em webpages de 26 empresas fabricantes de brinquedos. A escolha das amostras se deu na intenção de avaliar categorias de brinquedos que possuam características binárias de gênero segundo o estudo realizado. No primeiro momento, realizou-se uma busca no site da Associação Brasileira de Fabricantes
de Brinquedos (ABRINQ) de seus associados. Esta escolha se deu por entender que a análise da configuração dos brinquedos disponíveis no mercado é um dos pontos básicos na composição do projeto de brinquedos. No segundo momento, para identificar quais brinquedos as empresas consideravam de caráter masculinos e/ou femininos, foi identificado quais delas apresentavam, em seus sites, as seguintes categorias de produtos: “meninas”, “meninos”, “boys”, “girls”, “garotos”, “garotas”, “eles”, “elas”. Ao longo das categorias de brinquedos pré-determinadas nos sites das empresas observadas, foi possível classificálos em subcategorias referentes às suas particularidades formais, sendo esta uma maneira didática para compreender o contexto da pesquisa.
Resultados e discussão Na amostra pesquisada, foram identificados 888 brinquedos, dispostos para meninos e para meninas nos seguintes aspectos: I – Representações social de seres humanos; II – Casa e acessórios de uso doméstico; III – Acessórios para bonecas/os e cuidados pessoais/beleza; IV – Transportes. A categoria Representação social de seres humanos se refere a todos os brinquedos que apresentaram alusão de profissões ou apresentam seres humanos na fase infantil e/ ou adulta, com um total de 190 brinquedos, sendo 155 para meninas e 35, para meninos. • Foram identificados para as meninas: modelos, cozinheiras, veterinárias, princesas, médicas. Foram observados, também, 136 bebês com representação do sexo feminino e 01 boneco. • Para os meninos: heróis, robôs, policiais, bombeiros, militares, piratas, ninjas, lutadores, guerreiros, soldados e atletas. Na categoria “Casa e acessórios de uso doméstico”, foram analisados brinquedos que representassem configurações da casa e de seus espaços, bem como acessórios de uso doméstico. Foram identificados 180 brinquedos,
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todos desenvolvidos para meninas. São eles: castelos, supermercados/feiras, piscinas, salas de estar, dormitórios, lavanderias, produtos para limpeza de casa, ferros/tábuas de passar roupas, casinhas de boneca, sendo que 136 brinquedos desta categoria, são representações de cozinhas.
Figura 4 – Acessórios domésticos “para menina”: “Brinque Limpe”. Disponível em: <http://www.montelibano.com.br>
Figura 2 – Exemplo de representação humana “para menina”, a Boneca “Doce Encanto”. Disponível em: <http://www.adijomar. com.br> Figura 5 – Transporte de construção civl “para menino”: “Trator Truck”. Disponível em: <http://www.magictoys.com.br/>
Figura 3 – Exemplo de representação humana “para menino”, o boneco “Special Command”. Disponível em: <http://www. adijomar.com.br/>
Na categoria “Acessórios para bonecas/os e cuidados pessoais/beleza” foram identificados os brinquedos que apresentassem algum nível de interação com bonecos e/ou que interagissem com a criança por meio da representação do cuidado da imagem pessoal. Foram Identificados 60 brinquedos, todos direcionados para meninas. São eles: banheiras de bebê, carrinhos de bebê, berços, cadeirinhas de bebê e 28 brinquedos referentes aos cuidados de beleza da menina. Na categoria “Transportes” foram observados brinquedos que representassem o mundo dos transportes. Foram identificados 458 brinquedos, sendo 17 para meninas e 441, para meninos. • Para as meninas, foram identificados: carros
de passeio e 01 moto. • Para os meninos, foram identificados 441 brinquedos, sendo eles: pistas de corrida, aviões, helicópteros, bombas de gasolina. É interessante verificar que foram observados 250 carros de passeio do tipo esportivo ou similar e 157 transportes de construção civil. Os dados coletados na amostra evidenciam a clara existência das construções dicotômicas de gênero em diversos aspectos dos brinquedos, no mercado nacional. Neste sentido, observa-se o jogo excludente: enquanto são identificados inúmeros modelos de heroicização da figura masculina, à menina cabe a fragilidade e a função do cuidar. Ao verificar as representações humanas para meninos, e compará-las a das meninas, percebe-se que as suas profissões, bem como a configuração dos brinquedos direcionados ao público infantil masculino, se apresentam estritamente direcionadas as áreas de atuação que reafirmam as características de força e habilidades motoras. Os brinquedos direcionados às meninas estão no contexto da esfera do papel de mãe. Identifica-se que, mesmo aqueles que não se apresentaram como atividades domésticas, como carros de passeio, se encontravam com características formais que propiciavam o entendimento daquele brinquedo como algo voltado para esfera feminina, ou de aspecto futil como a atribuição da cor rosa em objetos ou roupas dos brinquedos. Cabe entender que o uso da cor rosa e da cor azul que servem para identificar os sexos masculinos e femininos, respectivamente, são, também, construções sociais de gêneros estritamente opostas, que devem ser avaliadas no desenvolvimento do projeto do brinquedo. Foi identificado também, que a representação de personagens humanizados está intimamente vinculada ao sexo da criança, corroborando para a construção binária do sexo, como confirma Carvalho (2009b). Este fato se comprova ao verificar que apenas um (01) boneco identificado para meninas possui representação do sexo masculino. Isto contribui para uma visão onde a natureza da criança, ou
seja, seu sexo, dita quais padrões culturais de masculinidade e feminilidade ela deva possuir.
Considerações A atenção para a análise projetual do design de brinquedos sobre os estudos de gênero, permite viabilizar não só o desenvolvimento mais coerente do produto em questão, como também o fortalecimento do conhecimento acadêmico do estudante sobre os pontos sociais que permeiam efetivamente o entorno dos brinquedos. Sugere-se, dessa maneira, o incentivo acadêmico em design, a modelos projetuais de brinquedos que visem, também, a análise das discussões de gênero. Cabe atentar-se de que não há desconsideração dos fatores industriais influentes na fabricação do produto, mas sim, da atual necessidade que se tem de abordar questões sociais tão influentes nos produtos, não mais subcategorizando teorias sociológicas em decorrência das constantes necessidades do mercado. Assim, o/a designer agrega um conhecimento mais amplo sobre o material desenvolvido, sendo agora, um fator reflexivo de seu próprio trabalho. Conclui-se então, que a formação acadêmica em design é de fundamental importância na construção/inserção de questionamentos sociais do/a designer industrial nos seus respectivos projetos e artefatos, o que viabiliza, assim, o desenvolvimento de um/a profissional atento/a para a equidade de gênero a fim de evitar preconceitos e desigualdades no entorno de seu produto.
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Princípios ergonômicos para o design de jogos eletrônicos Ergonomic principles for the design of electronic games SILVA, Samuel R de Oliveira; Universidade Federal do Maranhão
samuelrosilva@gmail.com MAIA, Paula dos Santos; Universidade Federal do Maranhão
p.maia_10@hotmail.com DINIZ, Raimundo Lopes; Universidade Federal do Maranhão
rl.diniz@ufma.br
Resumo Este artigo aborda um conjunto de princípios ergonômicos voltados para o design de jogos eletrônicos por meio de um levantamento bibliográfico, no sentido de apresentar alguns estudos que foram desenvolvidos na área da ergonomia e design, bem como analisar os jogos eletrônicos no contexto dos conhecimentos ergonômicos. A abordagem qualitativa e de pesquisa descritiva presente no referido artigo, objetiva apontar como a ergonomia pode ser um requisito fundamental na elaboração de jogos eletrônicos cada vez mais eficientes e adequados às características psicofisiológicas de seus usuários. Palavras Chave: Ergonomia, usabilidade, design, jogos eletrônicos.
Abstract This article discusses a set of ergonomic principles facing the design of video games through a literature survey, in order to present some studies that have been developed in the area of ergonomics and design, as well as analyze the video games in the context of ergonomic knowledge. Qualitative and descriptive research this approach in that article, objective point out how ergonomics can be a key requirement in the development of ever more efficient and responsive to psychophysiological characteristics of its users electronic game. Keywords: Ergonomics, usability, design, electronic games.
Introdução Existem muitas razões pelas quais o conceito de ergonomia é importante em jogos eletrônicos. A primeira parte do principio que jogar é um hobbie, logo podemos dizer que jogar é voluntário. Se o jogador encontra problemas que tornam jogar menos prazeroso que outras coisas, então não haverá nada que o impeça de parar. Esse é um grande risco, já que experiência do usuário
é muito sensível a problemas de usabilidade, e a presença desse tipo de falha pode fazer com que o usuário perca o interesse pelo jogo. Até os menores defeitos podem transformar um bom jogo em uma experiência irritante. Segundo Jordan (2002: p.6) apud Chammas (2011: p.17), “[...] o produto tido como útil e com boa usabilidade é o que inspira satisfação e realização em seu usuário, proporciona interação imediata e é incorporado à sua rotina, tornando-se indispensável.”
232 Soares et. al., (2008), a partir de uma análise ergonômica em um jogo de realidade aumentada, constataram a partir de entrevistas com especialistas que o jogo apresentou alguns problemas como pouca visibilidade do Score, do Time, ausência da barra de menu, do help, do feedback de erro, das instruções e da opção de salvar. Além disso, citaram o inconveniente sobre a captação de movimento ainda deficiente, por causa da diferença de luminosidade que interfere no jogo, houve ainda, relato de jogadores que se queixaram por fazerem movimentos repetitivos com os braços e que é exigido certo condicionamento físico. Certo usuário queixoso de sedentarismo, no momento do jogo não sentiu nenhuma dor, mas no dia seguinte disse que apresentou braços e pernas doloridos. Essa análise mostra o grau de importância que se faz necessária à aplicação de uma intervenção ergonômica em um ato simples, que é o de jogar vídeo game. Cybis et. al. (2010) afirmam que “[...] podese dizer que a ergonomia está na origem da usabilidade, pois ela visa proporcionar eficácia e a eficiência, além do bem-estar e saúde do usuário, por meio da adaptação do trabalho ao homem. Isso significa que seu objetivo é garantir que sistemas e dispositivos estejam adaptados à maneira que o usuário pensa, comporta-se e trabalha e assim, proporcionem usabilidade. Para construir interfaces ergonômicas e que proporcionem usabilidade, os diferentes profissionais que desenvolvem sistemas interativos devem, entre outras coisas, conhecer muito bem o usuário e o seu trabalho.” (CYBIS et. al., 2010, p. 16-17). Porém, o foco das intervenções ergonômicas mudam nos jogos, pois não se trata de desenvolver interfaces que suportem de forma direta e objetiva a execução de uma dada tarefa do usuário. O objetivo agora é oferecer entretenimento e a medida certa de desafios em um ambiente imersivo. Muitas vezes são os desafios propostos no ritmo certo que fazem com que valha a pena jogar um determinado jogo. (TAROUCO et al., 2010).
233 Entretanto, os modelos e métodos de avaliação ergonômica tradicionalmente em uso mostram-se pouco eficazes no desenvolvimento e avaliação de jogos digitais. Atualmente existe bastante conhecimento acumulado sobre como analisar softwares de trabalho com o foco em produtividade, tais como a Avaliação Heurística e Testes de Usabilidade envolvendo usuário.
Fundamentação teórica Com o crescente número de publicações, debates e palestras ocorridos nos últimos anos sobre a usabilidade de Interação HumanoComputador (IHC) evidencia que o interesse pelo tema é mais atual que nunca. Entretanto, os modelos e métodos de avaliação ergonômica tradicionalmente em uso mostram-se pouco eficazes no desenvolvimento e avaliação de jogos digitais
Design de games Cybis et al. (2010) consideram o vídeo game como uma mídia, no entanto, ainda sem processos formais quanto ao seu projeto e desenvolvimento. Hoje o projeto de games é focado em aspectos como: enredo, storyboard, personagens, sons, música etc. O Vídeo Game abrange todas as experiências computadorizadas de um jogo, sendo a tela a interface principal de exibição e interação (SALISBURY apud CYBIS et al., 2010); De maneira geral, são enfocadas as situações de desafios e as ações possíveis dos jogadores; Consideram-se, ainda, os processos da indústria de software (essencialmente quanto as avaliações de usabilidade e jogabilidade), garantindo assim a qualidade final do jogo. Já entre os anos 1990 e 2000 houve um desenvolvimento em computadores e novas versões de consoles e dispositivos móveis; evoluções no hardware (aceleradores em gráficos 3D) e software, e uma preocupação maior das indústrias com o bem estar de seu usuário, tendo maior preocupação com a opinião do usuário, tendo em vista que nesse
período começaram a aparecer os concorrentes, e a disputa pelo mercado passou a ser por detalhes, aí também entram questões como a usabilidade, estética e ergonomia nos joysticks (controles), no momento de uso. Porém, de acordo com Cybis et al. (2010), o foco das indústrias de games no cenário atual se preocupa mais com componentes gerais para a imersão e diversão em games como: Gráficos (cenários e personagens; estética de exibição das informações, elementos de escolha e orientação aos usuários); Som (música temática, incidental, efeitos); Interface (dispositivos de input/output, fácil aprendizado e uso, configurabilidade); Gameplay (diversão, graus de liberdade de movimento, regras, balanceamento, processos de aprendizagem do jogo, variedade de ações para alcançar metas); História (roteiro, conteúdo, navegação, personagens, metas a alcançar). Grassioulet (2002) apud Concilio et al. (2013) classifica os fatores para o projeto de games da seguinte forma: 1. O desafio é otimizado; 2. A atenção é completamente absorvida na atividade; 3. As metas são claras; 4. Existe feedback claro e consistente de que as metas estão sendo atingidas; 5. As atividades liberam o indivíduo de preocupações se frustrações, ao menos temporariamente; 6. Sentimento de controle da atividade; 7. Todos os sentimentos de auto consciência desaparecem; 8. Tempo se altera durante a atividade.
Princípios ergonômicos aplicados ao design de games Segundo Salen (2004) apud Dantas (2013), “a arte do Game Design reside em três pilares: Regras, Interação Lúdica e Cultura. As Regras estão focadas nas mecânicas do jogo e são
regidas por formalismos lógicos e matemáticos. A interação lúdica lida com experiência humana de se engajar no jogo e se relacionar com os demais jogadores nessa experiência. A cultura representa o contexto cultural onde o jogo está inserido. Esses três pilares ilustram o conhecimento teórico que um Game Designer necessita.” [DANTAS, 2013, p. 02.] De acordo com Schuytema (2008) apud Cruz & Horn (2012), para que o game “colha os frutos” do seu investimento, observa que cada game passa por diversas etapas; e que geralmente, há três grandes períodos em cada ciclo de desenvolvimento, que são a pré-produção, a produção e a pós-produção. Na pré-produção, um conceito de game é criado e a criação real de itens ainda não começa de fato. É quando a equipe de desenvolvimento do jogo trabalha na definição das linhas de produção, identificando as necessidades e usos das ferramentas que eles precisam para fazer o jogo, e delineando os detalhes por trás de design do jogo. Nesta etapa também é realizado o planejamento da interface e dos elementos visuais do jogo. (SCHUYTEMA, 2008 e IRISH, 2005 apud CRUZ & HORN, 2012, p. 04-05). Breyer & Padovani (2006) relata que: “o desenvolvimento de um jogo é um projeto multidisciplinar que envolve basicamente três áreas de atuação: o game design, a programação e a arte. A equipe de game design é responsável pela elaboração do conceito do jogo em todos os seus aspectos projetuais, como a criação do enredo, a caracterização dos personagens e do mundo do jogo, a formulação das regras e recompensas, etc. A equipe de programação é responsável pela implementação do código, desenvolvimento de motores gráficos, inteligência artificial e conexões de rede. A equipe de arte é responsável pela apresentação visual do jogo, como a criação das imagens conceituais (esboços e desenhos que definem previamente o visual que o jogo possuirá), a elaboração dos modelos tridimensionais caso essa plataforma seja escolhida pelo game designer para o jogo, a animação, texturas, efeitos especiais, design de interface etc.”
234 (BREYER & PADOVANI, 2006, p. 04). Luiz & Battaiola (2012) em um artigo sobre como adaptar um jogo de RPG e sua interface para o ensino de inglês citam Aki Järvinen (2008) para exemplificar que explorar o comportamento do jogo é necessário primeiramente realizar uma análise da identificação de 9 (nove) elementos e seus atributos, o que inclui: - Componentes: Os recursos de jogo; o que está sendo movido ou modificado fisicamente, virtualmente, em transações no jogo, entre jogadores, e no sistema. Peças, bolas, personagens, pontos e veículos são exemplos comuns de componentes do jogo; - Ambiente: O espaço do jogo (tabuleiro, grid, labirintos, níveis, mundos); - Conjunto de regras: Os procedimentos que moderam e definem o ato de jogar, sendo os objetivos a categoria mais importante a ser analisada; Mecânicas de Jogo: As ações que os jogadores tomam como meios para alcançar objetivos ao jogar. Posicionamento, tiro, manobra são exemplos do que os jogadores são colocados a realizar em muitos jogos; - Tema: O assunto no qual o jogo funciona como uma metáfora para o sistema e o conjunto de regras; - Informação: O que os jogadores precisam saber e o que o sistema do jogo armazena e apresenta nos estados de jogo: pontuação, pistas, limite de tempo etc; - Interface: ferramenta fornecida por meios físicos para que o leitor possa acessar os elementos de jogo; - Jogadores: Aqueles que jogam, em várias formações e motivações, através do desempenho das mecânicas de jogo objetivando atingir metas; - Contexto: Onde, quando, e porque o encontro de jogo se realiza, visando analisar qual o impacto na experiência de jogo que é causado por fatores informais e externos. Federoff (2002) identificou 40 recomendações de game design a partir do trabalho de autores diversos, compilando-as em três categorias: Interface, Mecânicas de Jogo e Gameplay. Devido ao objetivo desta investigação, essas recomendações estão listadas fora do contexto original: - Controles devem ser personalizáveis e adequados ao padrão da indústria; - Controles devem ser intuitivos e
235 apreendidos de maneira natural; - Minimize as opções de controle; - A interface deve ser tão menos intrusiva quanto possível; - Para games de PC, considere esconder a interface principal durante o jogo; - O jogador deve ser sempre capaz de identificar seu status e pontuação durante o jogo; - Siga os padrões ditados pela comunidade de jogadores para reduzir a curva de aprendizado; - O design da interface deve ser consistente quanto ao controle, cor, tipografia e dialogo; - Minimize as camadas de menu na interface; - Use o som para prover um feedback expressivo; - Não espere que o usuário leia o manual; - Providencie meios de prevenção e recuperação de erros através de mensagens de alerta; - Jogadores devem poder salvar o (estado do) jogo em diferentes situações; - A arte deve expressar sua respectiva função; - As mecânicas de jogo devem soar naturais, com densidade e sincronia adequados; - O feedback deve ser imediato para demonstrar o controle do usuário; - Leve o jogador a se envolver com rapidez e facilidade; - Deve-se apresentar/ sugerir um objetivo prioritário logo no início do jogo; - O nível de dificuldade deve ser variável; - Deve haver vários objetivos por nível; - “Um bom jogo dever ser fácil de aprender, mas difícil de se dominar.” (Nolan Bushnell apud Federoff, 2002, p. 14); - o jogo dever apresentar um desenrolar inesperado; - A IA deve ser, ao mesmo tempo, compreensível e imprevisível; - A jogabilidade deve ser balanceada de modo a não haver um caminho definitivo de vitória; - O jogo deve ser justo; - O jogo deve dar dicas, mas não de forma excessiva; - O jogo deve recompensar o jogador; - O jogo deve ser dosado para pressionar, mas não frustrar o jogador; - Providencie um tutorial interessante e absorvente; - Permita que os jogadores criem conteúdo; - Faça o jogo ser re-jogável; - Crie uma boa história; - Não deve haver uma estratégia perfeita para vencer; - Use efeitos visuais e sonoros para despertar interesse; - Ensine, com antecedência, habilidades que o jogador usará mais tarde; - Projete múltiplos caminhos para o jogador; - Uma das recompensas do jogo deve ser a aquisição de habilidade; - O mundo do jogo deve prosseguir, estando o personagem
lá ou não; - Se a jogabilidade não é irrestrita, ela deve parecer como tal ao jogador. Contudo, Cardoso (2008) apud Venturelli (2013) afirma que: “há muita discordância entre os teóricos e praticantes do design de jogos sobre os métodos, vocabulário crítico e objetivos da atividade. Embora a atividade de design (e de design especificamente voltado para jogos) tenha acompanhado a humanidade por centenas de anos, o estabelecimento do design como área do conhecimento é muito recente, datando do início do século XIX e a Primeira Revolução Industrial.” (CARDOSO, 2008 apud VENTURELLI, 2013, p. 22) Entretanto, Cybis et. al. (2010), consideram o videogame como uma mídia sem processos formais quanto ao seu projeto e desenvolvimento. Hoje o projeto de videogames é focado em aspectos como: enredo, storyboard, personagens, sons, etc. “O videogame abrange todas as experiências computadorizadas de um jogo, sendo a tela a interface principal de exibição e interação” (SALISBURY apud CYBIS et. al., 2010). Schell (2008) apud Venturelli & Freitas (2012), diz que: “sejam jogos eletrônicos ou não, todos são sistemas, e as regras desses sistemas determinam a experiência do jogador: o objetivo, como os jogadores podem interagir com o jogo, e como o jogo reage a essas interações. Já a interface no contexto de sistema de jogos pode ser descrita como os elementos que permitem ao jogador determinar quais são os movimentos possíveis em um dado momento, como o sistema se encontra, ou seja, seu estado atual e como ele responde às suas ações (output) e realizar essas ações (input).” (SCHELL, 2008 apud VENTURELLI & FREITAS, 2010, p. 02). Para Venturelli & Freitas (2012), o input e seu papel na usabilidade de jogos é a possibilidade de criar uma melhor experiência de usuário garantindo o melhor mapeamento de controles, a menor quantidade de comandos para executar uma ação e a melhor sensação física de interagir com o jogo. Há três aspectos fundamentais da interação jogador-jogo que
residem no output: a identificação do espaço de possibilidades, do estado do jogo, e o feedback. Os princípios ergonômicos aplicados ao design de games passaram a ser analisados com mais critério quando se passou a falar sobre injúrias musculares e psicológicas graves causadas pela utilização errada ou excessiva dos videogames. “Em casos mais extremos, não faltam relatos de pessoas que morreram por conta da jogatina desmedida — normalmente por causa da exaustão decorrente do uso prolongado em questões muito pouco saudáveis.” (FERREIRA, 2013) “No que se refere à maioria das plataformas de games, talvez o que mais valha seja aquele famoso refrão popular: “Tudo o que é demais faz mal”. Basicamente, a exposição prolongada e descuidada pode transformar uma diversão sadia em um problema de saúde”. (FERREIRA, 2013) Mendes et. al., (2008), de acordo com uma avaliação de produto, constataram através da coleta de dados realizada com 25 usuários do Playstation 2 e do Wii, que as principais características levadas em conta são: funcionalidade e durabilidade. Já a segurança foi pouco lembrada, assim como a estética. Foi observado que os usuários do DualShock 2 sentem mais desconforto que os do Wii, geralmente nas mãos, mas por ser um lazer muito envolvente, têm uma tendência a continuar jogando. Mesmo quando começam a sentir dores, a maioria dos usuários não pára a atividade. Entretanto, Santa Rosa e Liberato (2012), após verificarem a usabilidade e experiência do usuário entre as plataformas PlayStation 2 e Nintendo Wii, perceberam que entre o PlayStation 2 e Nintendo Wii, na área de jogos de luta - mais especificamente no jogo “Mortal Kombat: Armageddon” – o PlayStation 2 venceu em 3 categorias: preferência, satisfação e tempo de jogo. “O controle é objetivo quando usa de botões para o manuseio, é menos cansativo durante um longo tempo de jogo. Além disso, o jogador se sente no controle da situação, pois
236 não há necessidade de aprender movimentos ou técnica para enfrentar seu adversário. O Playstation 2 também é a plataforma mais encontrada nas casas dos jogadores. Contudo, o Wii e sua interação através de movimentos e controle sem fios atrai jogadores, tendo o poder de simular uma situação real. Isso não acontece, entretanto, no jogo “Mortal Kombat: Armageddon”, pois os movimentos que o jogador deve fazer com o controle não se assemelham a movimentos que seriam feitos em uma luta na vida real. Por serem movimentos às vezes um tanto quanto aleatórios, a plataforma Wii causou insatisfação por parte dos jogadores, que precisavam aprender como fazer os golpes para ter uma chance de lutar. Se não aprendiam, simplesmente balançavam o controle sem nenhum conhecimento, e isso era o suficiente para entretê-los. Essa situação mostra que, para os jogadores, o Nintendo Wii é atraente em situações específicas: quando não se pretende jogar por muito tempo, quando nunca se experimentou a plataforma e quando se deseja um tipo diferente de interação. Já o Playstation 2 é preferido por aqueles que tem experiência com os clássicos controles de botão, e quando se quer jogar por muito tempo.” (SANTA-ROSA e LIBERATO, 2012, p. 07). Chammas et. al. (2012), também em um estudo, compararam os resultados das Avaliações Heurística e Cooperativa numa interface de games para crianças de 9 a 11 anos e os resultados apontam para os ganhos que ambientes interativos infantis podem ter com a aplicação dos fundamentos da Ergonomia e com a participação do usuário final na pesquisa. “Foram observados a interface gráfica do game, as áreas clicáveis da tela, os mecanismos de ajuda, a disposição e quantidade de informações, e ainda as opções de interatividade que o game oferece. Todavia, a opinião geral dos especialistas é a de que, embora o game tenha um conceito interessante e motivador para as crianças, a Avaliação Heurística iluminou várias falhas e problemas de usabilidade que muito poderiam comprometer a aceitação, o uso continuado
237 e jogabilidade do Spore®. Observações e comentários feitos pelas crianças durante a Avaliação Cooperativa foram relevantes para perceber a dimensão dos efeitos dos problemas de usabilidade diretamente sobre a criança e indiretamente sobre sua tarefa. Para os autores, a voz do usuário, no caso a criança, enriqueceu a pesquisa e, de acordo com os fundamentos ergonômicos, deve ser ouvida desde o início do projeto.” (CHAMMAS et. al. 2012, p. 12). Pereira & Farias (2006), elaboraram um projeto que teve por objetivo desenvolver um joystick ergonomicamente adequado às necessidades de crianças de cinco a dez anos de idade, possibilitando também o uso ambidestro. Para a elaboração do joystick os autores adotaram a metodologia proposta por Löbach (2001) que consiste em: preparação, geração de alternativas, seleção das alternativas e a realização, e que devido à relevância das questões ergonômicas envolvidas, fez-se necessário a análise da tarefa de Baxter (2001) e as recomendações antropométricas de IIda (2005) bem como a literatura referente a manejos e controles. “O foco das intervenções ergonômicas muda nos jogos, pois não se trata de desenvolver interfaces que suportem de forma direta e objetiva a execução de uma dada tarefa do usuário. O objetivo agora é de oferecer entretenimento e a medida certa de desafios em um ambiente imersivo. Muitas vezes são os desafios propostos no ritmo certo que fazem com que valha a pena jogar um determinado jogo.” (CYBIS et al., 2010) Braga (2012) diz que: “no processo de desenvolvimento de jogos digitais, com finalidade de entretenimento, são feitos testes de usabilidade, avaliações com especialistas e design de interface como em outros sistemas, no entanto, há uma distinção no levantamento de requisitos. Em um jogo digital de entretenimento, o usuário quer se divertir em primeiro lugar, isso altera todo o contexto de interação em comparação a outros sistemas interativos projetados com foco no usuário. Existem requisitos de usuário e usabilidade
como em outros sistemas, no entanto, sendo a diversão do usuário uma necessidade fundamental em um jogo digital, isso pode ser observado como um dos requisitos mais importantes no desenvolvimento de um jogo digital. Esse tipo de abordagem implica uma situação na qual nem todas as necessidades do usuário são diretamente levantadas para se tornarem requisitos. O jogo digital é que cria a necessidade para o usuário, pois aquilo que o sistema deve oferecer está diretamente ligado ao que o usuário deve sentir.” (BRAGA, 2012, p. 02). “Um problema de ergonomia em se tratando de interface humano-computador, é identificado quando um aspecto da interface está em desacordo com as características dos usuários e da maneira pela qual ele realiza sua tarefa, já um problema de usabilidade é observado quando em determinadas circunstâncias uma característica do sistema interativo (problema de ergonomia) ocasiona a perda de tempo, compromete a qualidade da tarefa ou mesmo inviabiliza sua realização. Como consequência, ele estará aborrecendo, constrangendo ou até traumatizando a pessoa que utiliza o sistema interativo.” (CYBIS et al., 2010). “Então, um problema de usabilidade pode ter mais origem em mais de um problema de ergonomia, e um problema de ergonomia pode dar origem a mais de um problema de usabilidade [...]. Um problema de ergonomia será explícito, quando identificado por uma avaliação de ergonomia, ou implícito, quando inferido por meio de um teste de usabilidade. Enquanto a usabilidade é medida, a ergonomia da interface só pode ser inspecionada e/ou avaliada a partir de recomendações e critérios ergonômicos.” (CYBIS et al., 2010). Bastien & Scapin (1993) apud Cybis et al. (2010), indicam um conjunto de 8 (oito) critérios ergonômicos principais que se subdividem em 18 (dezoito) subcritérios e critérios elementares para interfaces humano-computador (IHC).
Figura 01 - Critérios ergonômicos proposto por Bastien e Scapin (1993) Fonte: Adaptado pelos autores
Considerações Finais e trabalhos futuros Neste estudo foi possível verificar a importância do design ergonômico no design de games e algumas técnicas de avaliação como a usabilidade e outros testes que podem ser usadas como etapas necessárias no processo de desenvolvimento de um jogo, devendo haver uma constante avaliação desde o principio com especialistas, prototipagem de aspectos menores e, como marco da transição entre as fases de pré-produção e produção, a aplicação de testes com o usuário. Ignorar estudos da usabilidade de um jogo em desenvolvimento certamente levará o jogador a frustração, prejudicando o principal fator que leva os jogos a serem procurados, seu caráter motivacional. A intenção futura é selecionar outras
238 ferramentas de inspeção reconhecidas com base no levantamento feito neste estudo e ampliar a análise deste método criterioso, sistemático e analítico, a fim de potencializar a aplicação de tais heurísticas e identificar a influência, das mesmas, no contexto de avaliar o grau de satisfação dos usuários (jogadores) através da utilização de tais ferramentas de mensuração.
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241
HISTÓRIA DO DESIGN
Contribuições filosóficas em busca do sentido da arte no cenário industrial da Europa Contributions towards the philosophical meaning of art scene in industrial Europe Brigatto, Aline Cristina; Universidade Estadual Paulista
aline.brigatto@gmail.com Guimarães, Denise G. W.; Universidade Estadual Paulista
denise_guimaraes@outlook.com Lelis, Viviane F.; Universidade Estadual Paulista
viviane.lelis@uol.com.br Silva, J. C. P.; Universidade Estadual Paulista
placido@faac.unesp.br Paschoarelli, Luis C.; Universidade Estadual Paulista
paschoarelli@faac.unesp.br
Resumo O desenvolvimento industrial na Europa do século XIX provocou diversos questionamentos sobre a produção artística e causou em artistas e filósofos da época profundas reflexões sobre o verdadeiro significado da arte e sua relação com a produção industrial. O trabalho pretende traçar um panorama histórico de acontecimentos do cenário europeu e sua relação com a Bauhaus. Palavras Chave: Design; revolução industrial; século XIX; cenário europeu.
Abstract Industrial development in nineteenth-century Europe provoked many questions about artistic production and caused to artists and philosophers of the time profound reflections on the true meaning of art and its relationship with industrial production. The paper aims to give an overview of historical events of the European scene and its relationship with the Bauhaus. Keywords: Design; industrial revolution; nineteenth century; european scene.
1 Introdução O século XIX, sobretudo nos últimos decênios, representa na história da Europa importante marco, cujos acontecimentos influenciaram movimentos artísticos e culturais. Notadamente o pensamento desta época influenciou o design moderno, bem como o design em sua
contemporaneidade. A efervescência econômica e o desenvolvimento industrial ocorridos no período geraram reflexões fundamentais sobre o homem, a arte e suas representações. Além disso, o pensamento no campo das ideias, representado por filósofos, muito agregou para os acontecimentos posteriores. Assim, para compreender a importância desses acontecimentos, faz-se necessário uma
242 breve análise da história por intermédio dos aspectos sociais e culturais, que culminaram no surgimento de uma das principais escolas do design moderno.
2. Fundamentação teórica 2.1 O desenvolvimento industrial O século XIX é marcado pela segunda fase da Revolução Industrial. Se, em um primeiro momento ela foi caracterizada pela mecanização da fabricação de tecidos de algodão, principalmente na Inglaterra, em sua segunda fase o desenvolvimento industrial atingiu também França e Alemanha e em proporções imensas. As mudanças sociais decorrentes deste desenvolvimento provocaram profundas alterações na configuração das cidades, com a migração da população rural para as áreas urbanas. Em um século, a cidade de Berlim registrou o crescimento espantoso de 872%, sendo considerado o maior aumento populacional na Europa no período, tal como refere Schnerb (1969). Ao final do século XIX, a Alemanha destacouse diante dos outros países europeus industrializados no nível tecnológico, e seus produtos começaram a abastecer o mercado francês e inglês, concorrendo com produtos das indústrias destes países. O ritmo de crescimento foi interrompido por uma crise econômica que irrompeu sobre a Europa de 1873 a 1877. Como conseqüência, pequenas empresas foram absorvidas pelas grandes indústrias, que cada vez mais aumentavam seu poderio econômico, já concentrado nas mãos dos grandes magnatas e banqueiros; estes detinham o controle do desenvolvimento industrial. Mas o quadro geral era de desenvolvimento. Inúmeras estradas de ferro foram construídas, havia o progresso na navegação e as indústrias produziam carvão, ferro e aço, além de outros bens de consumo. Nas últimas décadas do século XIX, a produção em massa foi elevada ao extremo
243 com os conceitos de produtividade de Henry Ford, com uma forma sistematizada de trabalho baseada das ideias de Frederick Taylor. O sistema permitiu o aumento da quantidade de mercadorias disponibilizadas no mercado consumidor. A estrutura das cidades, repletas de operários e burgueses, também era modificada continuamente com praças, edifícios, imóveis burgueses ou de proletariado. Conseqüentemente os contrastes se intensificavam; ao mesmo tempo em que a burguesia investia em boas moradias, com móveis e bibelôs para decoração, famílias inteiras de operários habitavam em um só cômodo. O período foi também de grandes invenções, geradas por uma verdadeira revolução tecnológica. Energia elétrica e as primeiras usinas hidrelétricas, telefone, telégrafo, utilização do petróleo como combustível, os primeiros motores de combustão interna, os primeiros automóveis e aviões (PEDRO, 1985). 2.2 A contribuição de Morris e Ruskin Diante do desenvolvimento intenso, alguns artistas e pensadores manifestavam descontentamento com a produção em massa, a mecanização dos produtos oferecidos ao consumo e, principalmente, com a arte. As críticas do escritor inglês John Ruskin (1819-1900) influenciaram a sociedade e os movimentos artísticos posteriores. Em sua opinião, em vista da excessiva produção de produtos industrializados, se fazia necessário um retorno ao artesanato como forma de busca da manifestação artística espontânea, principalmente porque o artesanato atravessava um período de falência por não conseguir concorrer com os preços cada vez mais baixos dos produtos da indústria. Ruskin era contrário aos produtos industrializados, os quais ele ainda considerava de qualidade e gosto duvidosos. Para ele, os objetos deveriam deixar transparecer “o esforço e esmero humanos” (Wick, 1989, p.16). Afirmava ainda que produtos mecânicos são objetos
sem vida e a mecanização era responsável por muitos problemas sociais da época. Mas embora crítico voraz da produção industrial, Ruskin associou sua concepção apenas ao estilo gótico, em busca do passado e com pouca visão do futuro. As ideias de Ruskin influenciaram fortemente o artista britânico William Morris (1834-1896), o qual, assim como Ruskin, via no artesanato a verdadeira manifestação artística, mas buscava nos modelos de produção coletiva inspirados na Idade Média a integração de artistas e artesãos. Seu maior objetivo era a produção de objetos do cotidiano de maneira artesanal. Morris era especialista em ornamento de superfície e fundou sua própria empresa em 1861, mas embora desejasse, não conseguiu produzir arte “do povo para o povo”, e seus objetos de decoração de interiores alcançaram apenas a população de maior poder aquisitivo. O próprio Morris reconheceu que sua produção servia de luxo aos ricos, ou seja, mesmo com relevância social, sua arte apresentava certa ostentação mediante a vontade em enobrecer ainda mais o sentido do artesanato em contrapartida a sua repulsa pelo movimento industrial. A especialidade de seu trabalho, voltado às artes decorativas e ornamento de superfície, pode ser visto na ilustração de um projeto papel de parede (Figura 1).
Figura 01: projeto de papel de parede “Alcachofra”, de John Hernry Dearle para William Morris & Co., 1897. Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/Arts_and_Crafts_movement
Mesmo assim, Morris pode ser considerado como o grande inovador da arte industrial do século XIX, conforme identifica Wick (1989). Os esforços de Morris no sentido de reviver a arte do artesanato são de importância não apenas estética, mas também social. Para Morris, o artesanato ‘sadio’ é sinal de uma sociedade ‘sadia’. A decadência do artesanato no século XIX é apontada por Morris como análoga à decadência da sociedade. Uma das grandes ilusões de Morris foi ter esperado a renovação do artesanato, cuja prática, segundo ele, seria capaz de devolver ao homem a alegria do trabalho, pudesse também melhorar as relações sociais; uma ilusão [...] (WICK, 1989, p. 18).
Assim, ainda mediante o autor, a análise que Morris fazia da questão social estava fortemente impregnada por seu pensamento estético, em que levaram à difusão do movimento Arts and Crafts. 2.3 Contextualização do pensamento europeu O pensamento europeu que abrangeu a Europa em seu processo de desenvolvimento teve uma personalidade cultural que transcende a diversidade das nações. Nesse sentido, a Europa constitui uma unidade de civilização única, sustentada por ideias e ideais em contrapartida aos inúmeros conflitos que sofrera. Possui por base a razão filosófica e científica, além do impulso artístico e cultural, fortemente presente em várias fases do progresso de sua história, como nos períodos Barroco, Romantismo, Renascimento, Iluminismo, entre outros. Inicialmente, o pensamento oriental era guiado pelo princípio da ordem, no sentido da divindade, em que se tinham os deuses e o homem como modelo de criação. Assim, Russ (1997) afirma que a primeira visão do mundo foi embasada pelas ideias que ainda hoje conduzem todo o mundo moderno, ou seja, a natureza indicando a única realidade: o homem inscreve-se nela e pertence-lhe; no mundo,
244 deuses e homens participam e obedecem às mesmas regras da natureza. Já a segunda concepção da realidade, ainda discutida pela mesma autora, é enriquecida pela revolução cristã, em que o homem domina a natureza e lhe dá sentido; de acordo com os desígnios de Deus e do homem, sujeito inteligente e sábio, mas também pessoa singular que ascende a uma dignidade nova. O século XIX leva esta visão do mundo ao seu ponto culminante. Este século é aquele em que triunfam a história, o humanismo, a razão e a ciência. Assim, é num universo de aparência totalmente racional que se inscreve o movimento do Espírito absoluto criado na história: assim se apresenta a filosofia hegeliana, para a qual Deus é o resultado, ponto de chegada, e não Juiz que transcende a história e o universo (RUSS, 1997, p. 14).
Nesse sentido, ainda consoante a autora, no final do mesmo século são eliminadas todas as referências ao divino, o que representa uma ruptura na história do pensamento, em que todos os valores se extinguem e faz enaltecer o homem aristocrata, ou seja, aquele que se inscreve no próprio movimento da vontade e do poder, enaltecendo sua natureza e a natureza. Assim, pode-se dizer que a moral aristocrática fundamenta-se no poder e na natureza. Como continuidade ao processo de construção das ideias do cenário europeu, na tentativa de estabelecer as ideias, diante da constante luta entre o universo e a natureza, tem-se que: [...] A longa série descobertas científicas que fizeram do homem um filho da natureza [...]. Da fractura da racionalidade brota, no século XX, um movimento virado para o irracional que nunca foi tão poderoso e que se exprime na estética moderna, mas também através do interesse que a ciência dedica à desordem, ao caos, ao irregular (RUSS, 1997, p. 15).
Russ
(1997)
questiona
quais
fatores
245 determinam as ideias e relata-as como forças dinâmicas que possuem uma existência objetiva e que condicionam o desenvolvimento das civilizações, ou seja, que as ideias constituem um elemento natural na existência dos seres humanos. As ideias nascem, têm uma vida própria e específica, alimentam-se e reproduzem-se, até que, finalmente, aparecem [...] Em luta com a adversidade da natureza, expostos a conflitos, os homens não poderiam viver sem conceber ideias (RUSS, 1997, p. 17).
Para tanto, a autora reforça que em todo o momento em que os seres humanos venham a refletir e/ou a pensar sobre o mundo que os rodeia, em que vivem, ou seja, é a forma ideal que engloba e dá sentido, unifica, ordena, esclarece e conduz os acontecimentos da história. As formas de pensar do homem são o que os impulsiona, no entanto frisa que a ideia se diferencia, por exemplo, do conceito de ideologia. A ideia distingue-se da ideologia, sistema de ideias ou de conceitos reunidos em torno de alguns princípios fundamentais e destinados a explicar o mundo [...] Enquanto as ideologias têm uma conotação pejorativa, a ideia, sem ser neutra, encarna uma representação mais aberta [...] Sem ideias, um indivíduo só pode definhar e morrer, pois é possível existir humanamente sem um conjunto ideológico protector e tranquilizante, mas nunca sem ideias (RUSS, 1997, p. 18).
Na segunda metade do século XIX, tem-se, pois, na Europa um avanço da ciência, em que o saber científico se firma e a filosofia passa a ser contestada, sobretudo em razão do aparecimento das ciências humanas, conforme explicita Russ (1997). O triunfo da ciência é, contudo, conseguido no meio da contestação, durante os dois últimos decênios do século [...] Finalmente. a ciência vê-se
confrontada, no interior do seu próprio processo evolutivo, com a desordem dos fenômenos: esta torna problemáticas as ideias de ordem e de determinismo absoluto (RUSS, 1997, p. 260).
2.4 As ideias filosóficas de Marx e Nietzsche A despeito do humanismo de Marx, Russ (1997) expressa: O homem tem de recuperar as suas forças alienadas numa evolução social, económica, religiosa. O comunismo designa, portanto, muito mais que uma doutrina económica. Encarna o destino do homem que recupera a sua verdadeira essência e identifica-se com o humanismo. O movimento humanista nascido do Renascimento encontra, assim, uma das suas realizações: o comunismo une-se a uma ideia de humanidade reconciliada consigo própria e que se liberta da alienação (RUSS, 1997, p. 268).
Para tanto, ainda conforme a autora, com Marx, o humanismo advém do socialismo transformado. No entanto, é Nietzsche que contribui com a verdadeira evolução das ideias européias, em que valores como a ciência, o progresso, o socialismo vem tomar o lugar de Deus. E assim na virada do século XIX para o século XX, a Europa tem sua consciência repensada, ou seja, fortemente fixadas nas ideias de Nietzsche. Mas que significa, em profundidade, esta morte de Deus? Na cultura do fim do século XIX, e muito depois dela, este acontecimento não deve ser entendido como um simples desaparecimento, mas sim como um homicídio que empenha a humanidade e exprime toda a nossa condição. A morte de Deus não tem nada de anedótico: ela revela o novo destino do homem, num mundo em que Deus deixou de ter lugar (RUSS, 1997, p. 269).
Desta forma,, a razão pela qual Deus “perdeu o lugar” se valida sempre que a ciência explica as condições da atualidade, com os seus avanços, aprimoramento, melhora de vida para
a sociedade, entre outros. O avanço da ciência contribuiu, pois para que o homem pudesse se fortalecer em relação às suas habilidades, desenvolver melhor as suas capacidades de compreensão e de explicar a realidade que o cerca, com maior fundamentação. Nietzsche postula que a ciência é o mecanismo mais sofisticado de se explicar com um mínimo de fundamentação a nossa constituição, a natureza e a sociedade de forma geral e as suas relações. 2.5 Outros âmbitos do cenário europeu Com a discussão do pensamento europeu, a sociedade fica perdida e sai em busca de uma nova identidade. No entanto, em contrapartida com o que vinha sendo apresentado até então, sobretudo por Marx e Nietzsche, é que: Freud destrói a concepção clássica do indivíduo: o eu já não é o senhor dentro da sua própria casa. A partir de 1900, com A Interpretação dos Sonhos, a antropologia freudiana torna antiquada a antiga definição do homem como sujeito que pensa (RUSS, 1997, p. 281).
Russ (1997) sobre a questão científica, afirma que a movimentação era tanto quanto às demais ocorrências. A física, as ciências da natureza e a matemática conhecem verdadeiras revoluções. Já no âmbito filosófico e cultural, pode-se diagnosticar uma crise da razão, o surrealismo e a psicanálise.
3. Conclusões
O cenário geral existente na Europa no século XIX foi fundamental para uma mudança de posicionamento de artistas e filósofos, ao mesmo tempo em que motivou uma verdadeira busca pela identidade da arte nos tempos iniciais da industrialização. Além disso, a revolução industrial possibilitou uma gama de reflexões sobre o homem, no que se refere ao campo das ideias e provocou grandes mudanças sociais, sobretudo nos grandes centros urbanos. Morris e Ruskin, descontentes com o
246 desenvolvimento intenso do final do século XIX pregavam o retorno do artesanato como forma de manifestação artística, dada a quebra do artesanato em comparação ao progresso dos produtos industriais. Nesse contexto Morris assume grande inovação da arte industrial no mesmo século. A Europa caracteriza-se por uma unidade de civilização única, a qual tem por base a razão filosófica e científica fortemente presentes. Para tanto, no cenário europeu do século XIX triunfam o humanismo, a razão e a ciência. No entanto, no final desde mesmo século, houve uma ruptura do pensamento do homem em que as referência de divindade são eliminadas, já que a partir da segunda metade do século em questão, têm-se um avanço da tecnologia, em que o saber se firma e a filosofia passa a ser contestada. Assim sendo, tais reflexões tiveram conseqüências importantíssimas para o design no modo como o conhecemos hoje. O avanço da ciência e o desenvolvimento tecnológico trouxeram ao homem a necessidade de buscar o desenvolvimento de suas capacidades e de representar-se diante do entorno. Contribui, portanto, com o fortalecimento da
247 capacidade humana para a busca de melhores possibilidades para com as necessidades e anseios dos seres humanos, da sociedade. Na tentativa de buscar sua individualidade, o homem compara-se aos demais, ao consumir os produtos industrializados iguais, o que possivelmente pode gerar uma falsa impressão de que o homem demarca sua personalidade particular no produto adquirido. No entanto, tem a perda da sua identidade, já que não mais possui a personalização tal como nos produtos artesanais.
Referências bibliográficas PEDRO, Antônio. História Geral: História moderna e contemporânea. São Paulo: Ed. Moderna, 1985. RUSS, Jacqueline. A aventura do pensamento europeu: uma história das ideias ocidentais. Tradução Maria da Graça Pinhão. 1ed. Rio de Janeiro: Terramar, 1997. SCHNERB, Robert. O século XIX: o apogeu da civilização européia. 3ed. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1969. WICK, Rainer. Pedagogia da Bauhaus. São Paulo: Martins Fontes, 1989.
ESDI – 50 anos de fundação ESDI – 50 years of fundation Alves, Ana Laura; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
nalaudesign@gmail.com Landim, Paula da Cruz; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
paula@faac.unesp.br
Resumo A introdução do curso de Design no Brasil teve um longo percurso. O ensino em nível superior teve início no ano de 1962, com a fundação da Escola Superior de Desenho Industrial – ESDI, que ocorreu em um contexto bastante agitado devido ao momento político instável em que se encontrava o país. O Design brasileiro se moldou a partir desse contexto histórico, dos modelos europeus préexistentes, além de outros fatores que também influenciaram. A ESDI se mantém no contínuo aprimoramento do campo acadêmico e de atuação profissional no Brasil, desempenhando até hoje a função de modelo para o ensino de Design. Palavras Chave: ESDI; fundação; Design Nacional.
Abstract The introduction of the Design course in Brazil had a long journey. His teaching in higher education began in 1962, with the founding of the School of Industrial Design – ESDI, this occurred in a context quite busy due to the unstable political moment he was in the country. The Brazilian Design is molded starting this political context, the pre-existing European models, besides other factors also influenced the National Design. The ESDI remains in continuous improvement of the field of academic and professional activities in Brazil, today playing the role of model for Design education in the same. Keywords: ESDI; fundação; Nacional Design
Introdução O processo de implantação do curso de Design no Brasil foi longo. As primeiras discussões a respeito aconteceram em ambientes vinculados à arte e à arquitetura e, apesar dos esforços e estudos, do planejamento e da organização do curso, a consolidação não foi imediata. O ensino do Design, em nível superior, iniciou-se em 1962, com a fundação da Escola Superior de Desenho Industrial – ESDI (ESDI, 2013). A ESDI foi criada em um cenário bastante conturbado. O Brasil, em 1962, tinha uma
situação política muito peculiar e instável, entre a renúncia de Jânio Quadros e a complexa posse de João Goulart. Nos anos de presidência de Juscelino (1956 a 1961), a população, devido ao acúmulo de capital e aumento do poder aquisitivo da classe média, apresentava-se disposta a consumir (Moraes, 2008). Diante das constantes manifestações da esquerda trabalhista, em busca do “progresso” desejado por grande parte da sociedade brasileira, João Goulart e seu partido apostaram no Design. Contudo, de acordo com Niemeyer, neste período a grande parte da indústria
248 brasileira nem mesmo sabia o que era Design, embora percebesse a importância do ensino de Design, decorrente da falta de mão de obra qualificada para suprir a demanda de projetos de produtos e de comunicação visual advinda do crescimento econômico e social (NIEMEYER, 2000). O projeto de modernidade e desenvolvimento industrial, simbolizado pela construção de Brasília, estava em evidência e uma posição contrária poderia ser interpretada como retrógrada ou conservadora. Seguindo a mesma linha, dentro da proposta de progresso, o Secretário de Educação e Cultura do Rio de Janeiro, Flexa Ribeiro, com a assistência do Grupo de Trabalho (GT) e apoio do governador Carlos Lacerda, viabilizou o início do curso de Design do Estado. Desde a fundação da ESDI, o curso de graduação passou por uma série de transformações (Cardoso, 2008). A partir da fundação da ESDI, o número de cursos de graduação na área ampliou-se de forma significativa. O Design Brasileiro atingiu um nível de maturidade que necessita de um aprofundamento qualitativo, visando assegurar sua relevância frente aos desafios cada vez mais complexos, colocados tanto pela sociedade quanto pelas novas tecnologias. Neste contexto, a ESDI participa deste contínuo enriquecimento do campo de ensino e de atuação profissional no país (ESDI, 2013). O objetivo desta pesquisa foi o de obter informações a respeito da fundação da ESDI e a sua importância para o Design Nacional, através de uma revisão bibliográfica, após 50 anos de sua fundação.
Fundamentação Teórica No início do século XIX, estava em curso o processo crescente de desenvolvimento da indústria, ao mesmo tempo em que, iniciavamse os primeiros debates e movimentos de questionamento do novo mundo industrial que surgia. O primeiro movimento de oposição, o Arts and Crafts, surgiu em Londres e foi idealizado e liderado por John Ruskin e Willian Morris (Moraes, 2008; Schneider, 2010).
249 O Arts and Crafts caracterizou-se fundamentalmente pela proposição de divisão da arte por meio de duas denominações distintas, a arte pura e a arte aplicada. Na mesma época, os objetos industrialmente produzidos eram denominados como arte decorativa e industrial. Outro questionamento de oposição, feito pelo movimento, era o modelo de atuação da indústria e dos produtos derivados deste sistema, a baixa qualidade. Sendo assim, pregavam a volta do sistema artesanal, como forma de produção e manutenção da autenticidade do produto em série. Um movimento que não encontrou ressonância, utópico e contrário à necessidade humana da busca do novo, além da demanda industrial de um aumento e diversificação da sua produção (Moraes, 2008; Schneider, 2010). O segundo movimento importante, o Art Nouveau, nasceu em Glasgow, no final do século XIX e se difundiu em diversas cidades da Europa. No mesmo período ocorreram movimentos migratórios da população do campo para as cidades, o que foi determinante para o crescimento dos empregos no setor terciário e o aumento da classe média europeia. O Art Nouveau se desenvolveu em um contexto de descobertas das ciências da biologia, botânica e fisiologia, onde os designers voltados para a natureza passaram a se expressar com formas orgânicas e não cristalinas, sensuais e não intelectuais (Moraes, 2008). O movimento, em decorrência da aglomeração populacional nas grandes cidades, propunha, ainda, ser um estilo industrializável, optando por materiais como o vidro, ferro, bronze e outros de fácil fundição e reprodução. A industrialização das cidades, associada à transformação urbana decorrente da introdução dos bondes, telefones, da fotografia, das redes de canalização, do metrô, exigia um novo modelo arquitetônico e artístico, que representasse o novo estilo de vida. Todas as inovações das cidades desencadearam a realização dos primeiros estudos sobre a influência da tensão da vida moderna no comportamento das pessoas. Assim como Freud, os participantes do
movimento tinham estes conceitos inseridos em suas obras (Moraes, 2008). Para Niemeiyer, o Art Nouveau herdou do movimento Arts and Crafts o conceito de unidade e harmonia entre as diferentes tarefas artísticas e artesanais, além da formulação de novos valores estéticos. Outra caraterística é a busca de novos signos para serem aplicados no mobiliário, em equipamentos domésticos e comerciais, na arquitetura, na ilustração e especialmente em itens industrializados, que passaram a receber um tratamento formal mais cuidado. De maneira geral e sintetizada, podese dizer que o movimento tinha como objetivo a articulação entre arte e indústria, função e forma, utilidade e ornamento. Deste modo, visava integrar arte, lógica industrial e sociedade de massas, porém, sempre questionando alguns princípios básicos da produção em série, como por exemplo, o emprego de materiais baratos e o Design de baixa qualidade. O estilo buscava reposicionar a importância da beleza, colocando-a ao alcance de todos, como indicam a arquitetura, o mobiliário, os objetos e ilustrações realizados por profissionais deste movimento (Niemeyer, 2000). Os dois movimentos tinham como tema principal, a associação entre arte, artesanato e indústria, a essência da experiência alemã da Bauhaus. Essa foi uma escola de Design, Artes Plásticas e Arquitetura de vanguarda, fundada em 1919, em Weimar, por Walter Gropius, que possuía o objetivo de: “[…] restabelecer a harmonia entre as diferentes atividades de arte, entre todas as disciplinas artesanais e artísticas, e torná-las inteiramente solidárias de uma concepção de construir” (GROPIUS apud Gullar, 1998). O curso da Bauhaus consistia em uma reforma total do ensino artístico e de uma recolocação do problema da arte nos termos exigidos pela civilização industrial. A proposta pedagógica da escola era a união entre arte e indústria, estética e vida cotidiana, modernidade e funcionalidade, fazendo uso da arquitetura como objeto de integração. Com isso, os estudantes aprenderiam as habilidades básicas
de cada ofício, familiarizando-se com materiais e métodos de fabricação e consequentemente, aproximando-se da indústria (Hatadani; Andrade; Silva, 2010). Segundo Moraes, uma escola para a pesquisa e o estudo de melhor qualidade da produção industrial e da experiência com o novo. Nessa nova proposta de escola, existia o conceito humanístico de Morris em Arts Crafts, a necessidade de união do artista com a indústria, passando ainda pelo conceito de qualidade do produto final perseguido por Muthesius. Apesar de apenas quatorze anos de existência, a escola Bauhaus entrou para a história ao transformar para sempre as relações do homem com a arte e com os produtos industrializados, formando profissionais capazes de empreender uma verdadeira mudança social por meio da arte (Moraes, 2008). Logo depois da Segunda Guerra Mundial, surgiu na Alemanha a necessidade de reerguer a identidade nacional. Como consequência, houve uma retomada do interesse pela Escola Bauhaus, que guiou o surgimento da Hochschule fur Gestaltung (Escola Superior da Forma), mais conhecida como “A Escola de Ulm” (Hatadani; Andrade; Silva, 2010). Essa escola foi idealizada para ser uma continuação da Bauhaus, contudo, com algumas modificações. O programa pedagógico dividia-se em três seções: Informação, Desenho Visual e Arquitetura e Urbanismo. Concomitantemente com o conhecimento adquirido nestas disciplinas, o aluno recebia noções gerais de Sociologia, Economia, Política, História Geral e História da Arte. Com isso, pretendia-se que o aluno tivesse uma visão da profissão atrelada aos problemas da vida. A instrução começava com um ensino básico que tinha a duração de um ano. Ao final dele, o estudante poderia ser aceito em uma das seções. O objetivo era o de: “proporcionar uma ampla educação mediante o trabalho em grupo e em estreito contato com os profissionais; o estudo e a prática se complementam e são um modelo para uma reforma da instrução” (GOMRINGER, apud Gullar, 1998).
250 Para Cardoso, a Ulm projetou uma face essencialmente tecnicista, baseada na racionalização como fator determinante para as soluções de design: “Abstração formal, uma ênfase em pesquisa ergonômica, métodos analíticos quantitativos, modelos matemáticos de projeto e uma abertura por princípio para o avanço científico e tecnológico, marcam o design ulmiano produzido na década de 60” (Cardoso, 2008). No Brasil, no período de pós-guerra, em 1951, foi criado por meio do Museu de Arte de São Paulo (MASP), o Instituto de Arte Contemporânea (IAC). Esse Instituto pode ser considerado como a semente do ensino do Design no Brasil, pois seu objetivo era preparar profissionais para atuar na emergente indústria nacional. O IAC dava acesso a informações, metodologia e treinamento para o processo criativo no Design. Neste sentido, entende-se que foi de fundamental importância para o esclarecimento e difusão do papel do Design no processo cultural e industrial brasileiro, revelando uma profissão que possibilitava uma nova visão da participação social do artista, embasada por uma formação educacional adequada. Alexandre Wollner, Antônio Maluf, Aparício Basílio da Silva, Carlos Galvão Krebs, entre outros, foram os primeiros alunos a assistirem as aulas no IAC, que contava com reconhecidos professores como Gatone Novelli, Leopold Haar, Flavio Motta, Roberto Sambonet e Max Bill. Este último chegou a levar alguns alunos (Mary Vieira, Almir Mavigner e Alexandre Wollner) para estudarem na Escola de Ulm, entre 1954 e 1958. Vieira e Mavigner se radicaram na Europa, enquanto Wollner instalou-se profissionalmente em São Paulo, onde foi sócio de Karl Heinz Bergmiller no Forminform; o primeiro escritório brasileiro de design (Niemeyer, 2000). Além dos cursos regulares, o Instituto oferecia palestras e oficinas temporárias com professores e artistas visitantes. Pietro Maria Bardi e Lina Bo Bardi esforçavam-se no sentido de manter o elevado nível de formação de seus estudantes, e para tanto, traziam conteúdos
251 como a história e a influência da moderna arquitetura e design internacional. O objetivo era o de auxiliar no desenvolvimento de uma consciência formal e uma capacidade intuitiva nos processos de criação de seus alunos. A falta de recursos financeiros acabou levando à desativação do Instituto, após seu terceiro ano de atividade, em 1953 (Dias, 2004). Apesar de sua breve atuação, a importância da escola de design do MASP está no fato de ter implantado conteúdos e procedimentos didáticos que anteciparam a introdução de disciplinas de desenho industrial na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo FAU/USP, em 1962, e também na fundação da Escola Superior de Desenho Industrial - ESDI, no Rio de Janeiro (Niemeyer, 2000). No mesmo ano, em 1953, foi idealizada a Escola Técnica de Criação (ETC), nas dependências do Museu de Arte Moderna, do Rio de Janeiro. Esta escola fazia parte de uma proposta, de Max Bill, para algumas alterações no projeto do MAM, que desta forma poderia oferecer também uma Escola de Design, seguindo o padrão da Escola de Ulm, com algumas adaptações à realidade universitária brasileira. O centro de ensino teria como objetivo desenvolver nos alunos qualidades artísticas que pudessem atender aos problemas e necessidades da época. O projeto do curso e a estrutura curricular de ensino da escola foram elaborados por Tomás Maldonado. Esse, pintor argentino, foi diretor da Ulm quando incluiu na formação de Design, matérias como: Sociologia, Psicologia Social, Antropologia, Teoria da Percepção, História da Cultura, Economia, entre outras, para dar suporte teórico e desenvolver a capacidade crítica, necessária aos alunos. Maldonado propunha para a ETC uma estrutura de curso rigorosa e interdisciplinar, com um programa estritamente tecnológico e científico. O projeto era considerado bastante inovador, entretanto, não havia recursos financeiros suficientes para a implantação do curso. O projeto da escola do MAM não foi consolidado. No entanto, é inegável que tenha colaborado para a criação da Escola Superior de Desenho Industrial, embasada
nos estudos anteriormente realizados para a criação da ETC (Hatadani; Andrade; Silva, 2010). O Decreto de criação da ESDI foi assinado pelo governador Carlos Lacerda, durante as solenidades de seu segundo ano de governo, no dia 5 de dezembro, de 1962. A fundação da ESDI tem origem que remonta ao design europeu, especialmente ao Design alemão, com destaque para a Bauhaus e a Escola de Ulm. Além da influência na construção da grade de disciplinas, o corpo docente também era formado por alguns ex-alunos da Ulm - Karl Heinz Bergmiller, Alexandre Wollner, Paul Edgard Decurtins – indicados por Max Bill. Destes, alguns faziam parte do Instituto de Arte Contemporânea, de São Paulo: Karl Heinz Bergmiller, Aloísio Magalhães, Alexandre Wollner e Goebel Weyne, todos participantes, desde o início, do grupo de trabalho que idealizou a ESDI. Como mencionado anteriormente, na mesma época foi criada a sequência de disciplinas de design na FAU/USP, consolidando, assim, a formação sistemática de profissionais de Design no Brasil (Cardoso, 2008; Gomes, 2009). A atividade econômica crescente e o desenvolvimento da indústria nacional colaboraram para a criação de uma escola de Design, além de outras motivações, como a possibilidade de evitar pagar royalties de patentes importadas e a possibilidade de fazer objetos de uso com qualidades funcionais e estéticas, destinados às massas e não só as minorias consideradas privilegiadas. A criação da ESDI pode ser vista como decorrência de uma série de fatores políticos, econômicos e sociais, porém, de forma simplificada, está diretamente ligada à ideologia nacional-desenvolvimentista dos anos 1950/60, época inserida em um universo de crenças modernistas (Hatadani; Andrade; Silva, 2010). Ao ser implantado, o curso da ESDI tinha quatro anos de duração, sendo que no primeiro ano frequentava-se ao Curso Fundamental, e nos três restantes seriam cursadas as disciplinas específicas da habilitação escolhida. A formação do seu primeiro corpo docente
resultou, em grande parte de indicações vindas de Oberg, Flexa Ribeiro e Lacerda, devido a vínculos profissionais ou de amizade. Os primeiros professores de projeto, Alexandre Wollner (1983), Paul Edgard Decurtins (1929) e Karl Heinz Bergmiller (1928) em especial, fizeram com que prevalecesse na ESDI a estética racionalista trazida da Escola de Ulm, que se caracterizava pelo predomínio de formas geométricas retilíneas e de tons acromáticos. A inflexibilidade dos modelos formais desses professores restringiu, por longo tempo, o ensaio de novas configurações nos projetos dos alunos. Os padrões formais implantados por esses professores, com formação estrangeira, obstaram a expressão da estética modernista na escola, ao contrário do que se deu na arquitetura nos anos 1930/40, onde a influência de Le Corbusier, não impediu que profissionais brasileiros dessa área construíssem uma linguagem formal própria (Hatadani; Andrade; Silva, 2010). Na área do Design Gráfico as influências mais marcantes ficaram por conta dos professores Alexandre Wollner, que desenvolvia projetos, sobretudo de identidade corporativa de empresas em São Paulo, e do pernambucano Aloísio Magalhães, pioneiro do Design Gráfico no Rio de Janeiro. Magalhães elaborou projetos que tiveram ampla repercussão como identidade corporativa da Petrobrás e o desenvolvimento das cédulas do cruzeiro (Hatadani; Andrade; Silva, 2010; Van Camp, 2012). Em julho, de 2003, foi lançado o livro A herança do Olhar – O Design de Aloísio Magalhães, dos professores da ESDI, João de Souza Leite e de Felipe Taborda, tratando da vida e do trabalho de Aloísio Magalhães, pioneiro do design no Brasil. Em agosto do mesmo ano, o designer paulista Alexandre Wollner, lançou na ESDI o livro Design Visual 50 anos, que mostra, década a década, sua produção (Van Camp, 2012). Alguns professores da ESDI, como Wollner, Bergmiller e Magalhães, que são considerados responsáveis por definir o que era ser designer em sua época, tinham grande influência e
252 aproximação com os alunos, oferecendo frequentemente, estágios em seus escritórios. Esta ligação com os alunos resultou em uma característica do ensino na ESDI: o processo de endogenia (Hatadani; Andrade; Silva, 2010). Segundo Niemeyer, o processo de endogenia deu-se, à primeira instância, devido ao longo período de direção de Carmem Portinho, a qual decidiu cercar-se ao máximo de ex-alunos que se ajustavam com a sua linha de gestão. Este procedimento foi determinante para a fixação de padrões bastante tradicionais, já que em grande parte das vezes os ex-alunos repetiam, enquanto docentes, as práticas e procedimentos aprendidos. A ação do governo por trás da ESDI também provocou falhas, como o favorecimento desmedido na escolha de alguns colegas, principalmente de Flexa Ribeiro, para a formação do corpo docente, em detrimento de pessoas melhor qualificadas, o que, em conjunto com o processo de endogenia, certamente gerou um prejuízo para a faculdade. Outro aspecto a ser considerado, é o fato de que, durante a criação da ESDI apropriou-se indevidamente do currículo da Ulm, que não se adequava à realidade do setor produtivo brasileiro (Niemeyer, 2000). Pedro Luiz Pereira de Souza, ao examinar a trajetória para concretização burocrática da ideia de criação da escola, em concordância com outros autores, também menciona a coincidência entre uma determinada concepção de Design e os anseios políticos do então governador Carlos Lacerda, que tinha o interesse em mostrar a face moderna de sua administração. No entanto, com relação a formulação do programa didático e curricular da ESDI, ressalta a especificidade da proposta da escola, contestando a clássica versão de que o programa era uma cópia da Hochschule fur Gestaltung de Ulm. Para Souza, as influências, são resultantes de um longo processo de discussão de quase oito anos, que acabaram por estabelecer uma combinatória saudável de princípios, cujo resultado “não seria apenas um papel carbono do currículo da HfGUlm”. Neste processo foi decisiva a presença
253 habilidosa de Aloisio Magalhães, que não estava atrelado com a racionalidade formal e com as metodologias sistemáticas. Acrescenta ainda, que o fator determinante do mal crônico da ESDI, não é “o modelo importado da HfG desvinculado da realidade brasileira”, mas sim, uma questão política. Embora a ESDI tenha sido criada pelo favorecimento do poder público, estando implícita em suas origens uma ordem econômica e social que lhe fosse favorável e que parecia objetivamente viável, as circunstâncias foram adversas e os primeiros anos da escola coincidiram com o período de grande turbulência política no país. Não bastando, a partir de 1969, ocorreu, o que Julio Katinsky descreveu como o “avanço sereno das multinacionais”, época em que, segundo ele, “a importação do projeto se tornou uma insolente realidade cotidiana” (Santos, 2009). No início dos anos 70, a ESDI foi a primeira escola a requerer filiação ao ICSID (International Council of Societies of Industrial Design). Um dos objetivos da ESDI é de preparar profissionais para atuar na indústria, e por isso mantém, além de um excelente leque de parcerias com empresas, convênios com nove universidades estrangeiras (Fachochschule Schwäbisch Gmünd, Hochschule für Gestaltung, Hochschule für Gestaltung Offenbach am Main, Bergische Universität Wuppertal, Hogelschool Antwerpen, Hoger Instituut voor Integrale Productontwikkeling, Korean Advanced Institute of Science and Technologyid, Ohio State University, University of Art and Design Helsinki, École des Beaux-Arts de Saint-Étienne, École Nationale Superieure de Creation Industrielle / Les Ateliers, Institut d'Arts Visuels d'Orléans, TU Delft, Faculteit Industrieel Ontwerpen, IADE Instituto de Artes Visuais, Design e Marketing) disseminadas ao redor do mundo, com as quais faz um intercâmbio anual de alunos e professores. Sobre os convênios, a instituição reconhece a devida importância em construir um diálogo internacional para o exercício da atividade do Design, buscando promover uma formação mais completa para os seus alunos ao mesmo tempo em que procura
o aprimoramento do seu corpo docente e a abertura de possibilidades de cooperações em projetos e pesquisas (ESDI, 2013). Os projetos de pesquisa e extensão da ESDI desenvolveram-se muito nos últimos anos, e apresentam ações bem sucedidas como a revista Arcos e o Motolab Esdi – uma parceria realizada com a Motorola, que construiu e equipou um laboratório de ponta na faculdade. Outro passo importante foi o estímulo ao empreendedorismo, colocado em prática desde 2007 por meio da incubadora de empresas de Design de Produto da escola, intitulada “design.inc” (ESDI, 2013). As atividades voltadas para o público externo à universidade, como exposições, seminários, palestras, cursos livres, ou a prestação de serviços, compõem a atuação de extensão da ESDI. Projetos como o mobiliário urbano desenvolvido para a empresa JCDecaux, ou como os Centros Integrados de Cultura da Secretaria de Estado de Cultura do Rio de Janeiro, entre outros, têm oferecido a oportunidade a professores e alunos trabalharem em conjunto, desenvolvendo uma prática profissional que dá continuidade às atividades desenvolvidas na escola. Entre as atividades de extensão importantes da ESDI está o programa ESDI Janelas Abertas, voltado para os alunos de cursos de nível médio interessados em ingressar na Escola, e responsável também pela publicação do "sinal", informativo eletrônico semanal da ESDI (ESDI, 2013). Em nova reforma da proposta curricular, foi então introduzido na ESDI, o curso integrado com durabilidade de cinco anos, que abrangendo tanto a habilitação em produto como em gráfico. Niemeyer ressalta que a questão das habilitações sempre foi discutida na ESDI, como também em inúmeras outras faculdades. Algumas instituições defendem a formação generalista, com o argumento de que a superespecialização do conhecimento resulta em uma prática profissional empobrecida e com maior dificuldade de adaptação no mercado. Já os que defendem o estudo mais direcionado, apontam que a
formação denominada combinada ou integral, gera como consequência, um curso superficial sem domínio de um campo de conhecimento específico da profissão (Niemeyer, 2000). Ventura, professor da ESDI desde a sua fundação, afirma que: [...] A ESDI foi para o nosso Desenho Industrial o que a Bossa Nova foi para a Música; o que o Cinema Novo foi para a Indústria Cinematográfica; a Arena para o Teatro, e Brasília para a Arquitetura. Foi um momento fundador, quando o mundo descobria um novo Brasil - de Glauber Rocha, Oscar Niemeyer, Tom Jobim, Pelé - e o Brasil descobria que tinha algo a ensinar ao mundo. Na parte que lhe coube, a ESDI nos deu regra e compasso, criou uma mentalidade, lançou enfim aquilo que é a base do Desenho Industrial: o projeto. Agora, tantos anos depois, se trata de um outro projeto - de ampliação do espaço físico e de atualização arquitetônica, para atender às novas exigências pedagógicas da instituição escolar. Novas formas seguindo novas funções” (Ventura, 2013).
Segundo Niemeyer, a ESDI tem desempenhado, desde sua fundação, o papel de modelo do ensino do Design no Brasil. Salientou que uma das grandes vantagens que a ESDI tem sobre as outras escolas de Design é que ela, por ser mais antiga, falhou mais. Sendo assim, o erro pode ser um excelente mestre quando é parte de um processo de crescimento e renovação, do contrário passa a ser a mola da repetição. Os professores da ESDI, especialmente aqueles que estão há anos na instituição, poderão promover uma reflexão crítica da experiência reunida em décadas de ensino do Design. Os resultados dessa avaliação serviram de base para uma nova fase do ensino do Design, fazendo com que a ESDI, mais uma vez, desempenhe os papéis de pioneira e de inovadora (Niemeyer, 2000). Desde 2000, o modelo de ensino, está sendo rediscutido, com ações de aproximação com o setor produtivo e para intensificar as experiências de intercâmbio. Em dezembro de 2012, a primeira Escola
254 Superior de Desenho Industrial, da América Latina, completou 50 anos. A grande parte das faculdades de Design que surgiram após sua criação espelhou-se em seu currículo e até mesmo em seus erros, buscando superar os pontos considerados negativos da ESDI. Na escola o estudante vivencia tanto o exercício da metodologia como da expressão pessoal, e ainda, é cotidianamente incentivado a refletir sobre o Design e as atividades desenvolvidas pelo profissional da área. Alguns aspectos devem ser reforçados não só no ensino da ESDI, mas de qualquer faculdade: a necessidade de formar designers que aprendam não apenas a desenhar e manipular programas computacionais, mas também, criar uma massa crítica, que possa contribuir com a definição do papel do designer, ainda em formação (Cardoso, 2008). Um longo percurso, para uma ideia que se mostrou adequada desde sua primeira hora, quando se planejava o desenvolvimento e a autonomia da realidade industrial do país (ESDI, 2013).
Conclusões A ESDI desempenhou e desempenha o papel de uma espécie de modelo para o ensino de Design no Brasil. Surgiu como um espaço institucional em que seria produzida a identidade nacional dos produtos e se transformou no ponto de partida para muitas escolas de Design quando muitos de seus exalunos se tornaram professores e disseminaram seus fundamentos.
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255 GOMES, R. Z. Ovo – O Hibridismo no Design Contemporâneo. 2009. Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – Campus Bauru, Curso de PósGraduação em Design. GULLAR, Ferreira. Etapas da arte Contemporânea: do cubismo à arte neoconcreta. Rio de Janeiro: Reva, 1998. HATADANI, P. S.; Andrade, R. R.; Silva J. C. P. Um estudo de caso sobre o ensino do Design no Brasil: A Escola Superior de Desenho Industrial (ESDI). 9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design, 2010. Disponível na internet por http em: <blogs.anhembi.br/ congressodesign/anais/artigos/69532.pdf>. Acesso em: 15 de mar. 2013. MORAES, Dijon de. Limites do Design. São Paulo: Studio Nobel. Paym Gráfica e Editora, 1999. NIEMEYER, L. Design no Brasil: origens e instalação. Rio de Janeiro, 2AB, 2000. SANTOS, M. C. L. DOS. ESDI-Biografia de uma ideia. Disponível na internet por http em: <http://resenhasbrasill.blogspot.com. br/2009/04/esdi-biografia-de-uma-ideia. html>. Acesso em 27 marc. 2013. SCHNEIDER, B. Design – uma introdução: o design no contexto social, cultural e econômico. São Paulo, Editora Blücher, 2010. VAN CAMP, F. 50 anos de Design no Brasil. Disponível na internet por http em: <http://designqualidade.blogspot.com. br/2012/12/50-anos-de-design-no-brasil. html>. Acesso em: 27 de marc. 2013 VENTURA, Z. Disponível na internet por http em: <http://www.esdi.uerj.br/novaesdi/p_ plot3.shtml>. Acesso em: 18 marc. 2013
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MATERIAIS E PROCESSOS
“Entranhas” - acoplamentos sensíveis tecnológicos para performances “Entranhas” - technological sensitive couplings for performances Oliveira, Filipi Dias de; Universidade Ferderal do Rio de Janeiro
filipidias@gmail.com Santos; Alana Aparecida dos; Universidade Ferderal do Rio de Janeiro
alanaaasantos@yahoo.com.br Neto, Aroldo Mascarenhas; Universidade Federal Fluminense
amneto@id.uff.br Nóbrega, Carlos Augusto M. da; Universidade Ferderal do Rio de Janeiro
gutonobrega@gmail.com Fragoso, Maria Luiza; Universidade Ferderal do Rio de Janeiro
malufragoso@gmail.com
Resumo “Entranhas” é título de ação performática idealizada por Alana Aparecida, realizada no âmbito das pesquisas em arte e tecnologia do Núcleo de Arte e Novos Organismos/EBA/UFRJ. Este artigo descreve o processo de construção do trabalho e uma reflexão sobre os conceitos/referências aplicados nele. A performance está centrada numa investigação sobre acoplamentos sensíveis, aplicados tecnologicamente ao corpo da performer, objetivando externar ao público as sensações e reações internas do corpo em cena. Percebeu-se como resultado, reações corporais inesperadas que interferiram e transformaram a ação da performer, criando camadas interativas com o ambiente, o público e o próprio corpo em performance. Palavras Chave (no máximo 4): performance; tecnologia; corpo; entranhas.
Abstract "Entranhas" is the title of a performative action devised by Alana Aparecida, held as part of research into art and technology at Nucleus for Art and New Organisms / EBA / UFRJ. This article describes the construction of the work's process and a reflection on the concepts/references applied to it. The performance is centered on research on sensitive couplings, technologically applied to the body of the performer in order to exteriorize to the public the internal sensations and reactions of the body on the scene. Reactions were sensed which interfered and transformed the action of the performer, creating interactive layers with the environment, the public and her body in performance. Keywords: performance; technology; body; entranhas.
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Apresentação “Entranhas” é o título de uma experimentação performática proposta por Alana Santos e realizada no contexto das atividades de arte e pesquisa do Núcleo de Arte e Novos Organizmos - NANO . A performance em questão está centrada numa investigação sobre acoplamentos sensíveis, aplicados tecnologicamente ao corpo da performer com o objetivo de expressar/externar ao público as sensações e reações internas do corpo em cena. O desafio foi buscar expressar, mesmo que simbólicamente, as sensações da performer na sua interação com o público. O trabalho esta inserido no contexto da investigação em arte, design e tecnologia voltados para a construção de uma percepção ampliada da consciência corporal a partir das relações que surgem do acoplamento entre corpo e próteses tecnológicas. Como suporte teórico, partimos de três abordagens: a primeira de cunho filosófico se baseia na necessidade de promover singularidades inconsumíveis para romper com o que o filósofo contemporâneo Bernard Stiegler (2007), em seu livro Reflexões (não) Contemporâneas, denomina de sociedade hiperindustrial, cujo objetivo é “formar os comportamentos no sentido dos interesses do consumo"; a segunda, inserida na prática da performance tomando como referencia a artista e pesquisadora Bia Medeiros, que por durante aproximadamente vinte anos atuou no contexto da arte e tecnologia, coordenadora do grupo Corpos Informáticos que nos situa em relação a performance sistêmica como possível construção da ação performática; a terceira, na interseção com as ciências buscamos no conceito de Metadesign de Maturana a necessidade de se construir um pensamento sistêmico em arte, conjugado com a vida, o corpo e os desejos. Enquanto referências artísticas o trabalho buscou na experiência da performer Alana Santos inquietações decorrentes de sua experiência como atriz e o desejo de criar um
259 sistema de interação sensorial que aproximasse o ator do seu público. Um trabalho pelo qual a performer se auxilia de um “corpo” tecnológico para externalizar seus afetos. Para tanto, Santos pesquisou outros artistas em outras linguagem para aprofundar nas questões da interação corporal. Como exemplo está o trabalho da artista e designer Lucy McRae , considerada uma arquiteta do corpo, que explora a relação entre o corpo, a tecnologia e os cruzamentos entre materiais sintéticos e orgânicos para inventar mundos imaginários sustentados pelas ferramentas de ficção científica. Podemos citar também a Artista Danielle Gotell em sua obra Impulse, onde ela mistura quatro batimentos cardíacos em uma instalação de vídeo. “Entranhas” foi proposta como uma ação de pesquisa e de oficina integrada às atividades do NANO e realizada durante a imersão S.H.A.S.T. em julho de 2014. Na ocasião, foram dedicados esforços concentrados para a confecção da vestimenta, sua interface eletrônica, os acoplados corporais da mesma e a realização da ação performática em si. Este artigo apresenta a experiência constitutiva dessa ação performática, seu passo a passo, suas surpresas, tomando como base conceitos do pensamento contemporâneo e experimentações artísticas, do meta design e da performance sempre no contexto da interseção entre arte- ciência- tecnologia. A ação teve como centro de investigação a intensão de criar uma veste-dispositivo que permitisse a interação da performer com o público durante a ação. Após a reflexão sobre a experiência ficam várias questões, dentre elas: a ação chegou a externar os reais sentimentos da performer? Consegui-se de fato demonstrar sentimentos, afetos, ou esses são sempre mascarados por camadas que nos protegem, sendo uma delas, paradoxalmente a atual camada tecnológica?
tubos, bolas, etc – corpos, afetos, sensações. Esses itens foram acoplados para a construção de um novo corpo sensível, em diálogo com a tecnologia. Na performance o corpo é transformado a partir de estímulos que recebe a partir da interação com o público e outros fatores externos. Tais estímulos servem de input para operar próteses sensíveis acopladas ao corpo. O mediador entre tais estímulos e as próteses (atuadores luminosos, sonoros e pneumáticos) é o coração. De forma mais descritiva podemos dizer que o espectador é convidado a refletir sobre o quanto ele pode transformar o outro, e a si mesmo, abrindo para um tema de grande complexidade que são as relações humanas. Os batimentos cardíacos são o veículo para tais transformações. A pulsação da performer é monitorada por sensores que a transduzem em luzes que reverberam pelo corpo. A sala escura e ilumina com a luz dos batimentos cardíacos criando uma ambientação orgânica. Em conjunto com uma sonoplastia pre-produzida e sincronizada com a frequência cardíaca viuse emergir um ambiente imersivo onde o que normante ficava escondido atrás da pele e da carne reverberava em toda a sala e sobre todas as pessoas, tomando conta do ambiente. Segundo a performer, o conjunto de sensações provocou uma troca de afetos que, por sua vez, estimulou o surgimento de um corpo estranho, estranho até para o próprio corpo natural.
A Performance em Imersão
A ênfase no processo experimental construtivo nos revelou muito desse caráter transiente do trabalho. Trânsito se dá pelo fato de ser o começo de vivência, que se estende pelo percurso da performer, que se desloca com esse sistema para um outro lugar. A imersão
A performance parte da construção de uma interface vestível (wearable) que se desenvolve através de acoplamentos de várias ordens: sensores, indicadores luminosos, materiais –
Figura 1: interação da performer com o público
na gênesis desse corpo, montado entre fios, balões, peles, pelos, e o foco no processo nos revelou muito do potencial desses primeiros passos, a ponto do processo virar obra, revelada no vídeo. Ainda sob depoimento da performer, após o experimento, foi possível intuir que se tornar um ser individual é algo muito complexo, pois sempre estamos em processo de troca entre pessoas, natureza, objetos, temperatura, ambiente. Tudo que é percebido pelo corpo gera uma resposta. Porém tal resposta pode ser modificada através de um controle que o “eu” exerce sobre as ações corporais, não transmitindo a resposta natural e sim uma resposta calculada. Durante a ação performática, a tentativa de conduzir os sentimentos através de alguma técnica de ator, o batimento cardíaco mudava, não era mais o verdadeiro sentimento. Da mesma forma que ao conduzir o sentimento através da respiração o batimento também muda gerando outra interação. A performer diz que após a experimentação a necessidade de expansão do corpo ultrapassando os limites físicos fica exposta esternalizando o que antes era imperceptível. Quando acontecer tal experimentação fica um questionamento para a artista. Como podemos definir um sentimento sendo uma verdadeira resposta ao estimulo do outro ou uma condução da emoção através de uma técnica teatral ou até mesmo uma armadura colocada entre a performer e o público onde o estimulo que chega não atingem a atriz e não é trasformado em uma resposta e sim barrado, o que gera uma resposta diferente do estimulo dado. Talvez a resposta gerada nesse caso seria o medo, a incerteza ou qualquer outro sentimento que barra essa resposta que podemos chamar de verdadeira. Porém se o que foi descrito anteriormente for comparado com o homem na vida cotidiana podemos levantas a questão. Realmente respondemos verdadeiramente o estimulo dado pelo outro ou usamos armaduras que modificam tal sentimentos? Alana tem como objetito levar para o espectador uma vivência, uma experimentação das emoções onde o
260 publico é levado a uma reflexão sobre as trocas interpesssoais e as barreiras colocadas entre elas.
Pulsações Luminosas
Figura 2: acoplamentos tecnológicos em funcionamento.
Para que fosse possível ao público ter um feedback visual dos sentimentos e emoções da performer, através de um reflexo da sua pulsação, um sistema eletrônico foi desenvolvido. Neste sistema, a pulsação da performer foi captada e sincronizada com o acionamento de indicadores luminosos estrategicamente posicionados em seu corpo. Assim, conforme os batimentos cardíacos se desaceleravam, mais vagarosamente os indicadores luminosos pulsavam, apresentando um possível relaxamento do corpo e determinada sensação da performer. Em contrapartida, com a aceleração dos batimentos cardíacos, as luzes pulsavam mais rapidamente. Esse sistema eletrônico tem como dispositivo chave a plataforma de prototipagem Arduino , amparada por um periférico específico de captura de pulsações chamado Pulse Sensor . Trata-se de um sensor de luz ambiente circular de 16mm de diâmetro. Seu tamanho e formato são adequados para se pregar no dedo ou no lóbulo auricular - este último, local escolhido nesta performance - e possui sensibilidade suficiente para detectar as variações da pulsação na pele que envolve os locais indicados. O Pulse Sensor se liga ao Arduino o qual processa o seu funcionamento segundo uma sequência programada de instruções. Esse algoritmo sincroniza os batimentos cardíacos da performer com os indicadores luminosos – no nosso caso, um conjunto de LED’s vermelhos. A cada pulsação da perfiormer um pulso elétrico é enviado ao Arduino. Segundo o algoritmo
261 implementado, quando esse pulso elétrico é captado, uma instrução do arduino determina que um copnjunto de LEDs se mantenha ativado em um intervalo com mesma duração da pulsação captada. Para uma maior dramatização e profundidade da iluminação, foi implementada uma espécie de fade-in e fade-out no acionamento e desligamento dos LED’s. Isso foi possível graças a técnica de modulação por largura de pulso PWM na sigla em inglês. Além disso, também é feita via Arduino e software de sonificação MAX/MSP a sincronia da pulsação da performer com um audio de um batimento cardíaco imprimindo maior realidade à performance.
Figura 3: Pulse Sensor, IDE Arduino e MAX/MSP.
Este tipo de sistema eletrônico de captura de pulsação refletida em indicadores luminosos é comumente utilizado em instalações artisticas. A obra Heart Dialogue de Anaisa Franco, faz uso de um sensor de batimentos para iluminação de um objeto sensitivo que é a materialização de um coração. A instalação interativa MASA de Rolando Sáncheze Andrea Sosa, também utiliza um sensor de pulsação que permite a iluminação de LED’s, mas possui uma interação com o público onde voluntários, que possuem os sensores instalados em seus dedos, são convidados a pular e se movimentar, para que sua pulsação aumente. Com a pulsação alcançando um número determinado de batimentos por minuto, uma projeção de um cadáver torna-se um ser vivo novamente.
Processo de Sonificação O PhD em acústica Tevor Cox viajou o mundo todo pesquisando o comportamento prático do som em determinados ambientes. Em seu livro The Sound Book, ele relata as análises e
observações de sua investigação sonora. Cox afirma que "é necessário ir além da dominância visual e explorar os outros sentido: audição, tato, olfato e paladar.". A fim de explorar os sentidos dos espectadores de maneira ampliada, utilizamos o som como elemento de expansão dos sentimentos em cena, criando uma atmosfera imersiva aos espectadores ali presentes. Além da resposta visual gerada pelos LEDs, propomos uma resposta sonora sincrônica, de maneira que sensações corporais da artista fossem amplificadas e a percepção pelo público intensificada. No sistema híbrido criado, a pulsação da performer captada pelo Pulse Sensor era processada pelo Arduíno, dando valores prédefinidos por uma programação específica. Sendo assim, o valor 0 indicava inatividade e o 1 indicava pulso. Tais valores eram enviados via USB para o computador e, por conseguinte, transmitidos para outra etapa de manipulação sonora. MAX/MSP é um software que usa um sistema de fluxo de dados para manipular sons, videos e imagens. No processo da performance, tinha como função a de captar esses valores 0 e 1, e de controlar o som da maneira desejada com o o patch (programação específica do software) criado. Primeiramente, um obtjeto seletor serial port (porta serial) selecionava o input (modo de entrada) do sinal e a seqüência de valores era recebida via USB. Em seguida, o objeto route desempenhava o papel de quando o valor 0 era recebido, a saída 1 era acionada; quando o valor 1 era recebido, a saída 2 era acionada. Logo, para o sample ser acionado apenas mediante à pusação da performer (valor 1), o restante do patch responsável pela geração sonora foi ligado na saída 2 do objeto. O sample se tratava de um áudio de uma pulsação do coração (sístole e diástole) de 00:03:02 segundos. O arquivo original WAV (windows media audio) 21409_greyseraphim_heart-beat.wav foi baixado do site freesound.com. Como o arquivo continha mais de 30 segundos de áudio, ele foi editado no software livre Audacity .
Figura 4: Esquema do funcionamento do sistema híbrido.
A importância do registo Durante montagem da performance e teste dos equipamentos, foram feitos pequenos registros dessa evolução. Com uma câmera Canon 600D e lente 50mm 1.8 f, foram usadas técnicas de vídeo como close na expressão facial da artista e profundidade de campo a fim de captar tanto texturas do figurino da artista quanto os detalhes dos equipamentos. Como resultado, temos um vídeo making of que reflete a sensibilidade inerente do processo da performance desde sua base poética, contrapondo a dureza e inécia dos equipamentos eletrônicos. A delicadeza dos gestos e concentração da performer foram captados pelas lentes da câmera e traduzidos em frames. A trilha sonora instrumental I am Piano de Peter Broderick envolve o espectador no processo de construção e cumpre novamente o papel central da performance em externar a emoção da artista. Nota-se a atmosfera poética evidente desde o início da montagem. Uma narrativa sensível das etapas de construção do que seria posteriormente extensão dos sentimentos da artista. Vídeo e performance dialogam no sentido de terem o mesmo apuramento estético, atestando que arte e tecnologia coexistem resultando em belos produtos finais.
Corpo expandido - percepção sensorial ampliada São muitas as abordagens artísticas
262 contemporâneas, bem como abordagens teóricas, que discutem a construção de uma percepção sensorial ampliada a partir das relações que surgem a partir do uso de próteses tecnológicas. Não nos cabe aqui citar ou descrever esses usos. Nossa intensão é discutir alguns conceitos que dão continuidade a uma reflexão sobre essa prática que vem sendo aplicada nas pesquisas desenvolvidas no NANO. Como apontado anteriormente, partimos de três abordagens teóricas, sendo uma filosófica, uma artística e outra científica. Essa leitura vem de encontro a tríade arte-ciênciatecnologia que serve de base para as nossas pesquisas que são motivadas pela necessidade de se pensar a arte em suas diversas formas de entrecruzamento com a ciência e as tecnologias contemporâneas, em especial nas questões inerentes as inter-relações homem-máquina. Bernard Stiegler publicou inúmeros livros e artigos sobre filosofia, tecnologia, digitalização, capitalismo, e desenvolveu seu trabalho sobre o problema da individuação no capitalismo de consumo, além de introduzir a noção de uma economia de contribuição. O aspecto que mais nos interessa das recentes publicações, inclusive aquela traduzida por Bia Medeiros, diz respeito a necessidade de se preservar e estimular as singularidades individuais. Stiegler (2007) nos alerta para um capitalismo cultural que se apropria dos desejos dos indivíduos para direcioná-los ao consumo programado. Essa perda de desejos, também entendida como um bloqueio da libido, transforma o indivíduo num consumidor facilmente manipulado, mas o que é pior, num indivíduo sem consciência de seus próprios desejos, de seu corpo, de seus prazeres. O autor faz referencia a necessidade da postura investigativa, e lamenta a mercantilização da arte e da cultura. Ainda assim, ressalta o papel fundamental do artista no contexto contemporâneo e de sua competência em criar o que Medeiros (2006) cita como “singularidades inconsumíveis, nãocontemporâneas e intempestivas”. Quando Alana Santos nos apresenta
263 uma proposta de acoplamentos sensíveis, entendemos esta como uma tática experimental de resistência a massificação do corpo e da consciência desse corpo expandido. Entranhas é uma ação performática que vai além do corpo e da pele trazendo a tona as reações inerentes ao organismo no ato da performance. Reações estas que se externalizam e se expõem para o público sem a possibilidade de uma simulação de emoção. A performer, inclusive, rejeita o treinamento de atriz para deixar fluir as sensações da interação com o público e a interação do próprio corpo com os dispositivos tecnológicos. Nesse sentido, os dispositivos não comprometem a libido ou os desejos da performer e sim externalizam como uma nudez orgânica, as sensações que o corpo expressa durante a experimentação. Segundo Bia Medeiros: O termo performance, ação, atuação, do inglês, vem sendo utilizado em diversos sentidos conforme a área de conhecimento a que se refere. Assim temos a performance de uma máquina, a performatividade de um sistema. Performance e performatividade mesuráveis, calculáveis na relação entre o in-put (energia dispensada) e o out-put (produtividade alcançada). Para esta utilização do termo, em português, dizemos desempenho, eficiência. Em francês accomplissement, résultat chiffré...Como estamos dentro do campo artístico, poderíamos tomar o enunciado performativo de Austin, e pensá-lo para a arte, não no sentido de ação eficientemente realizada, mas no sentido de efeito produzido. (MEDEIROS, 2014)
Medeiros dedicou aproximadamente vinte anos às pesquisas em performance e tecnologia. Atualmente, suas investigações mantém o viés da tecnologia mas não mais aquela que se refere ao ferramental computacional telemático que fez parte do trabalho do Corpos Informáticos durante muitos anos. Uma das quesões colocadas na década de 90 por Medeiros era a sobrevivência do corpo diante tamanha digestão tecnológica do mesmo. O corpo sobrevive? Que corpo
é esse que emerge de dentro da máquina? Foram questionamentos que expressavam o contexto do surgimento do vídeo digital e das performances em telemática. Já naquele momento, era empregado um pensamento sistêmico que viabilizava a realização das ações performáticas à distância e em rede. Era impossível planejar e executar as performances sem a utilização de um sistema que mensurava, mesmo que de forma experimental, o input e output de cada intervenção. Desempenho e eficiência ficavam por conta da subjetividade e exploraçào de uma linguagem peculiar à transmissão em rede de sons e imagens. Quando comparamos o ferramental eletrônico hoje disponível para a criação artística, como Arduinos, Lilypads dentre outros, e a disseminação dos sistemas DIY (Faça Você Mesmo) percebemos o quanto essa relação sistemica se modificou. Ao mesmo tempo que os sistemas telemáticos se aprimoraram e questões imagéticas de fluxos temporais se perderam na velocidade das redes, uma infinidade de sensores se tornaram nossos olhos, ouvidos, peles e pelos, pelos quais podemos explorar hoje novos fluxos sensíveis. Os sistemas performativos, como nos lembra Medeiros, se adaptam às novas ferramentas e nos possibilitam transformar as relações entre performer e público, como no caso de Entranhas. Para concluir nossa discussão, trazemos uma citação de Humberto Maturana sobre Metadesign (MATURANA, 1997) Penso que a questão que nós seres humanos devemos enfrentar é sobre o queremos que nos aconteça, não uma questão sobre o conhecimento ou o progresso. A questão que devemos enfrentar não é sobre a relação entre a biologia e a tecnologia, ou sobre a relação entre a arte e a tecnologia, nem sobre a relação entre o conhecimento e a realidade, nem mesmo sobre se o metadesign molda ou não os nossos cérebros. Penso que a questão que precisamos enfrentar nesse momento de nossa história é sobre nossos desejos e sobre se queremos ou não
sermos responsáveis por nossos desejos.
Com esta citação, retornamos ao problema colocado por Stiegler mas agora partindo do ponto de vista de que a decisão esta na reorganização, ou reprogramação, de nossas próprias existência. Maturana nos diz que ... sistemas vivos são máquinas (...) Numa publicação anterior com Francisco Varela, chamei esse tipo de sistemas de sistemas autopoiéticos. Sistemas vivos são sistemas autopoiéticos moleculares. Enquanto sistemas moleculares, os sistemas vivos são abertos ao fluxo de matéria e energia. Enquanto sistemas autopoiéticos, sistemas vivos são sistemas fechados em sua dinâmica de estados, no sentido de que eles são vivos apenas enquanto todas as suas mudanças estruturais forem mudanças estruturais que conservam sua autopoiese. (1997)
Trazer o conceito de autopoiesis para as artes pode nos auxiliar a compreender como as inovações tecnológicas contribuem para o sistema vivo ao mesmo tempo que este se renova e se expande. Para Maturana, a corporalidade é onde a autopoiese do sistema vivo ocorre. O corpo vai se transformar de acordo com a necessidade de existência do mesmo. A medida que nossa existência se torna híbrida e acoplada a sistemas artificiais, e nossos corpos incorporam esses dispositivos, ocorre uma transformação para que haja a preservação do sistema que permite essa existência. Esse sistema, a nosso ver, é a essência da vida corpórea e esta refletida ou rebatida na autopoiese. Entranhas se apresenta como uma singela proposta de experimentação artística performática onde se pretende vivenciar e refletir sobre como acoplamentos sensíveis, aplicados tecnologicamente ao corpo de uma performer são capazes expressar/externar ao público as sensações e reações internas do corpo em cena. Essa reflexão parte da necessidade de construir relações singulares, que venham reformular ações performáticas
264 sensíveis ao corpo tecnológico, e que alguma forma contribuam para emocionar e ressignificar a existência humana.
Referências
COX, Trevor. The Sound Book, Londres: W. W. Norton & Company. Inc., 2014. MATURANA, Humberto R.. Metadesign. Disponível em
265 <http://www.inteco.cl/articulos/006/texto_ ing.html> Acesso: 3 de setembro 2014. MEDEIROS, Maria Beatriz. http://olhodecorvo. redezero.org/tag/improvisoes/, publicado em 2006. ________. Disponível em <http://grafiasdebiamedeiros.blogspot.com. br/2014/04/bordas-rarefeitas-da-lingu agem. html> Acesso em: 3 de setembro de 2014.
Design e Ilustração: as influências das novas tecnologias sobre o processo de criação Design and Illustration: the influence of new technologies on creation process Nakata, Natália Mariê; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
nat_nakata@gmail.com Nakata, Milton Koji; Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
milton@faac.unesp.br
Resumo O esboço rápido à traços permite que conceitos sejam transferidos a suportes visíveis antes que essas desapareçam de nossas mentes. Entretanto, com o acelerado desenvolvimento do mercado de jogos, filmes e afins, a necessidade de representações mais completas – e ainda assim, rápidas – tornaram-se necessárias. Com isso, surgiram técnicas de ilustração capazes de expressar não apenas formas, como conceitos. Reforçadas por recursos digitais elas vêm proporcionando cada vez mais possibilidades. Este estudo compreende a análise de métodos de criação e apresenta um exemplo de como a tecnologia vem interferindo na produção de ilustrações em termos de qualidade técnica e conceitual. Palavras Chave (no máximo 4): ilustração; processo criativo; mídias digitais.
Abstract The quick sketch by lines allows that concepts are transferred to visible materials before these disappear from our minds. However, with the accelerated development of the games, movies and related market, the need for more complete representations - and still fast - became necessary. So emerged illustration techniques able to expressing not only forms but concepts too. Enhanced by digital resources they are providing increasingly possibilities. This study consist the analysis of methods of creation and shows an example of how technology is interfering in the production of illustrations in terms of technical and conceptual quality. Keywords (maximum 4): illustration; creative process; digital media.
1. Introdução As tecnologias digitais em seu contínuo desenvolvimento, têm se tornado cada vez mais intuitivas e acessíveis a qualquer tipo de usuário, mesmo àqueles que nunca tiveram contato com as mesmas. Essa facilidade de uso permitiu que muitos profissionais da área gráfica migrassem para este novo meio de representação visual. No entanto, vale ressaltar que os conceitos e conhecimentos acerca de ilustração não são intrínsecos a tais tecnologias, embora muito facilitadas por elas. Surgem neste contexto, os seguintes questionamentos: O esboço rápido à traços é uma prática entre ilustradores e designers, que permite que conceitos e ideias sejam transferidos a suportes visíveis rapidamente, mas os novos recursos são capazes de cumprir esta função com a mesma eficácia? Como as tecnologias digitais estão interferindo na produção de ilustrações e materiais gráficos, em termos de qualidade técnica e conceitual? A relação entre as técnicas tradicionais e digitais podem trazer bons resultados? Essas são algumas das questões que serão aqui discutidas e posicionadas.
2. O princípio da representação de ideias Existem muitos momentos da história em que nos deparamos com o recurso da ilustração auxiliando na representação de ideias, seja nos desenhos encontrados nas paredes das cavernas ou nos fantásticos estudos de Leonardo da Vinci, na época do Renascimento. Isso porque, como foi provado ao longo dos anos, o esboço é uma ferramenta bastante eficaz no registro e na transmissão de conceitos. No entanto, com o crescente desenvolvimento de recursos digitais o campo da representação visual vem ganhando novas formas de se apresentar ideias. Essas novas formas vêm causando certas discussões a cerca da qualidade dos recentes materiais visuais produzidos, uma vez que estes têm apresentado soluções bem distintas das até então conhecidas. Para melhor compreensão desta questão, serão
apresentadas a seguir duas vertentes de processos criativos: a que utiliza materiais tradicionais e a que possui influência das ferramentas digitais. 2.1. O uso dos materiais tradicionais no processo criativo de ilustrações Muitos estudantes de ilustração entendem, erroneamente, que depois de adquirir um estilo ou técnica própria, nada têm a aprender sobre ilustração. E embora a habilidade no traço e a capacidade de produzir obras únicas sejam coisas imprescindíveis a um bom ilustrador, é muito importante saber criar soluções fundamentadas em processos criativos sólidos, a partir de ideias coerentes. Boas ilustrações não são apenas bonitas, mas incitam o espectador a pensar e a se envolver ativamente, em busca de uma compreensão mais profunda da mensagem. Para isso, o desenvolvimento de uma ilustração deve passar por toda uma metodologia, a qual nós conhecemos por processo criativo. Muitas vezes ela tem seu início em uma simples folha de papel. Gerar ideias faz parte do papel do ilustrador, e a maioria das pessoas começa o processo no caderno de esboços (sketchbook). Um relacionamento muito especial pode se desenvolver entre o artista/ilustrador e seus cadernos de esboços – um lugar em que a comunicação é mais pessoal, onde o único público é o próprio artista, e em que a pura experimentação com conceitos e ideias pode começar. (Zeegen. 2009, p. 19)
Mesmo na fase dos esboços e da concepção geral das ideias, ocorrem abordagens capazes de trazer inspiração e definir conceitos. Uma delas, muito utilizada por ilustradores, é o painel semântico. Este painel costuma agrupar objetos e imagens que refletem a essência do projeto, podendo representar cores, formas, tonalidades e texturas, tornando-se um guia visual e fonte de referências.
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Figura 01: Painel semântico (fonte: http://chocoladesign.com/ como-criar-um-painel-semantico-ou-mood-board)
Outro método muito interessante para reunir inspirações e armazenar ideias é a criação de uma pasta contendo todos os materiais que tenham alguma relação com a ilustração a ser desenvolvida, desde contratos e formalidades relacionados ao projeto, quanto referências fotográficas. Estas pastas funcionam como uma versão mais expandida e focada do sketchbook, abrangendo tudo o que se relaciona ao projeto. Essa prática, no entanto, vem sendo realizada com maior frequência no meio digital, que tem se mostrado tão funcional ou até mais que sua versão física. 2.2. A influência das ferramentas digitais no processo criativo Com o desenvolvimento de softwares gráficos, podemos contar com grandes tecnologias capazes de nos oferecer uma série de recursos e ferramentas que nos permite criar imagens complexas. Ainda assim, em muitos casos o uso do lápis é tido como ferramenta essencial para a ilustração. Tal necessidade talvez tenha se mantido em decorrência do desenvolvimento acelerado da área do design gráfico. Estamos falando de uma questão econômica, que atrasou a participação da ilustração na revolução do design digital em quase dez anos. Em 1984, com o lançamento do Macintosh, da Apple, os designers gráficos tiveram acesso ao primeiro computador pessoal com interface gráfica. A partir de então, as agências e empresas
267 do ramo começaram a realizar treinamentos de utilização de softwares gráficos para seus funcionários, proporcionando a estes profissionais um desenvolvimento digital acelerado. Quando enfim tais tecnologias passaram a ser financeiramente viáveis para os ilustradores, o computador tornou-se um fator de grande influência para os métodos de ilustração como nenhuma outra ferramenta fizera anteriormente. A partir de então, com uma enorme gama de possibilidades, passamos a encontrar cada vez mais artistas com múltiplas habilidades. Um exemplo, segundo Taylor (2013), está na área de desenvolvimento de jogos. Nela existem dois tipos de ilustradores: os artistas de conceito que trabalham a linguagem 2-D na fase inicial de pré-produção, e modeladores 3D que “dão vida” aos conceitos, através de ferramentas digitais. Embora alguns profissionais prefiram se concentrar em uma única área, uma vez que o jogo venha a ser realista, estilizado ou cartunesco, trabalhar com apenas um estilo passa a ser uma desvantagem, caso este não seja o mesmo que o desenvolvedor busca. Isso faz com que o profissional busque conhecer técnicas e estilos variados para atender às mais diversas necessidades. Sobre o processo criativo, esse não costuma ser uma exigência específica dos desenvolvedores, no entanto em uma situação em que a ilustração está diretamente relacionada com aspectos do desenvolvimento do jogo, certos fatores deverão ser levados em conta para que haja uma coerência no projeto como um todo. Mais do que nunca, é possível perceber que a teoria “a forma segue a função” ainda vigora nos tempos atuais.
3. Técnicas de ilustração e o processo criativo Atualmente, nos deparamos com uma vertente de ilustradores que vêm buscando ocultar o processo digital em seus trabalhos, utilizando seus recursos apenas para facilitar o uso e aplicação de técnicas de ilustração
tradicionais, mantendo sua estética original, como é o caso de ilustrações que simulam pinceladas de tinta ou traços de lápis e giz. Esta prática vem se tornado muito comum, à medida que utilizar os softwares gráficos tornou-se algo “simples” para qualquer pessoa. Com isso, a valorização das habilidades manuais e o resgate das técnicas tradicionais vieram à tona. No entanto, na mesma velocidade em que nos são apresentados novos recursos, são cobradas novas e criativas soluções. Por este motivo, o caminho de um ilustrador rumo ao profissionalismo tornou-se algo intimamente relacionado ao domínio de materiais e processos. Tal domínio permitiu, por exemplo, que o ilustrador tirasse inspiração de métodos de trabalho tradicionais, como a serigrafia, ou recriasse técnicas de gravura analógica em formatos digitais, possibilitando a economia de tempo e de recursos, e podendo tornar soluções aparentemente impossíveis, possíveis. Analogicamente falando, se o lápis exercia um poder sobre a ilustração, o computador passou a explorar esse poder e permitir que o ilustrador transformasse um desenho a lápis em uma gama infinita de novos desenhos. Com base nessa premissa, um método de criação e estilização de animais foi desenvolvido pela autora, buscando contemplar as qualidades e potencialidades de ambas as técnicas: a tradicional e a digital. O intuito primeiro deste estudo era o de obter estilizações de animais mais expressivas, com detalhes realistas e menos elementos genéricos ou infantilizados. Para isso, inicialmente foram realizados esboços de animais a lápis em um sketchbook, tomando como referência fotos e ilustrações realistas. Nesta etapa, a grande preocupação foi representar fielmente as texturas e volumes, utilizando apenas o recurso de contorno e hachuras.
Figura 02: Desenho de observação de pássaro, feito a lápis sobre o papel (fonte: Natália Mariê Nakata, 2014).
Figura 03: Desenho de observação de animais, com atenção a detalhes de anatomia, feito a lápis sobre o papel (fonte: Natália Mariê Nakata, 2014).
Das 20 poses de animais ilustradas, 10 foram selecionadas e digitalizadas. Já no software gráfico, essas ilustrações sofreram manipulações quanto à forma das cabeças e corpo, tendo suas proporções modificadas exageradamente. Deformações distintas foram testadas, proporcionando 5 novas versões de cada animal: mais dinâmicas e estilizadas e num período de tempo bem mais curto. Em cerca de 3 horas, 4 ilustrações deram origem a novas 20. No total, foram geradas 50 novas ilustrações, situação difícil de se praticar por meio de recursos não-digitais.
268
269 Na figura 06, O cavalo do canto superior esquerdo é a ilustração original e os dois que seguem a sua direita foram manipulados antes do recorte dos elementos. Após essa ação, foram originados os cavalos da linha de baixo, cujas deformações se tornaram mais expressivas e com maior equilíbrio entre as partes.
Figura 07: Várias expressões distintas a partir de um mesmo desenho (fonte: Natália Mariê Nakata, 2014). Figura 04: Estilização do desenho de uma das poses do pássaro realizada em software gráfico (fonte: Natália Mariê Nakata, 2014).
4. Resultados e Discussões Em alguns casos, como ocorreu com a ilustração do cavalo, as poses ou estruturas não possibilitavam grandes mudanças, portanto tornou-se necessário o recorte digital do esboço para que a manipulação da imagem pudesse ser realizada com maior eficiência, sem que se perdessem as características do animal ou que os traços originais sofressem deformações indesejadas. Assim, foi possível trabalhar as proporções de cada elemento individualmente.
Figura 05: Recorte do desenho realizado em software gráfico (fonte: Natália Mariê Nakata, 2014).
Figura 06: Estilização do desenho feita a partir do recorte dos elementos, em software gráfico (fonte: Natália Mariê Nakata, 2014).
Foi interessante notar que alguns animais, embora permitissem diversos tipos de distorção continuavam representando o mesmo animal, como se vê na figura 07, onde as 5 novas versões passam a representar expressões e “personalidades” diferentes, mas ainda assim remetem à mesma espécie. Isso ocorre devido à possibilidade de se trabalhar com os elementos faciais responsáveis por transmitir certos sentimentos e emoções humanas, que são frequentemente aplicados a animais e objetos inanimados, em fábulas ou desenhos infantis. Tal conhecimento, mais uma vez, não está ligado à ferramenta do software gráfico, e sim ao repertório do ilustrador.
Utilizando esta metodologia na qual as estilizações ocorrem através de distorções proporcionadas por recursos digitais, o processo mostrou-se muito mais rápido e interessante que o planejado. Não estamos tratando aqui de um conceito completamente novo, uma vez que a distorção de proporções é um dos fatores ligados à estilização de elementos, no entanto, a facilidade em conceber ilustrações distintas em pouco tempo e manter grande parte dos detalhes da ilustração original, tornou possível o desenvolvimento de ideias antes de difícil concepção. Além disso, outro aspecto interessante que vale a pena ser ressaltado é a forma como certos animais acabaram se tornando criaturas completamente diferentes. Isso ocorreu com a iguana (figura 08), que passou a assemelharse a dragões, aves pré-históricas, entre outras criaturas inexistentes. Neste ponto, começamos a tratar não apenas da estilização de indivíduos, como também da criação deles, o que vem a reforçar a ideia de que as ferramentas digitais podem ter grande influência na etapa de geração de ideias e não apenas em sua artefinalização.
Figura 08:A estilização do animal descaracterizou-o, criando novas criaturas (fonte: Natália Mariê Nakata, 2014).
Ainda neste tópico, temos uma citação que ressalta um novo contexto na área dos ilustradores, apresentada nessa nova era onde as mídias tradicionais começam a dividir o espaço com as digitais: “A revolução acontecera por uma série de razões. A primeira delas foi a idade média do novo criador de imagens. Mais jovens, mas já com um domínio da tecnologia, provavelmente devido a um contato com o computador mais precoce que gerações anteriores, esses ilustradores sentiam-se fortalecidos e não estagnados. [...] Sem o peso da bagagem histórica e sem tentar pacificar a velha guarda ou encaixar-se em uma ordem existente, os renegados da “nova” ilustração tinham liberdade para experimentar. Outra razão para essa mudança veio do que realmente empolgava esses ilustradores cheios de novidade: o escopo que a mistura de técnicas digitais e analógicas oferecia.” (Zeegen, 2009, p. 81)
5. Conclusão Este estudo não teve a intenção de colocar a utilização de determinados processos criativos como corretos ou obsoletos, mas sim de ressaltar as características e potencialidades observadas em cada um e analisar a forma como estes podem interagir e sanar certas deficiências. As experiências aqui relatadas
270 ofereceram diretrizes de soluções que facilitam não somente o processo de finalização como também o processo de criação de ilustrações. Essa mistura de técnicas que vem causando grande polêmica entre os profissionais da área mostrou que pode trazer muitos benefícios no desenvolvimento técnico e estético. Afinal, não se tratam mais de duas vertentes que competem entre si, mas sim, que se combinam para trazer soluções inéditas e inovadoras, como todo fruto de um bom design.
Referências CARDOSO, R. Design para um mundo complexo. São Paulo: Cosac Naify, 2012.
271 CARDOSO, R. Uma introdução à história do design. São Paulo: Blucher, 2008 NAKATA, M. K., SILVA, J. C. P. Concept Art para design: criação visual de objetos e personagens. Bauru: Canal6, 2013. TAYLOR, F. Como criar um portfólio: e entrar no mundo profissional. 2.ed. São Paulo: Gustavo Gili, 2013. ZEEGEN, L. Fundamentos de ilustração. Porto Alegre: Bookman, 2009. FACCA, C. Blog de Design. In: Choco la design. Disponível em <http://chocoladesign.com/ como-criar-um-painel-semantico-ou-moodboard>. Acesso em: 07/09/2014.
NOVOS PRODUTOS NA ARQUITETURA: Possibilidades de Uso dos Materiais Compósitos. New products in architecture: possible use of composite materials. Alonge, Fernanda Aparecida; Universidade do Sagrado Coração
fer.alonge@gmail.com Chamma, Paula Valéria Coiado; Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho-FAAC-UNESP/Bauru
paulachamma@faac.unesp.br
Resumo Os princípios do Ecodesign devem guiar o desenvolvimento de produtos que buscam reduzir os impactos ambientais. A utilização de compósitos resume-se em uma mistura de plástico a um outro material de propriedades orgânicas que se torna atualmente uma excelente opção para a inovação no setor da construção civil, arquitetura e para o Design. Estudou-se neste trabalho um painel a base de plástico e casca de arroz, resíduo obtido a partir do beneficiamento do arroz, uma proposta possível de redução de custos no produto final. Palavras Chave: Ecodesign; compósitos; painel; casca de arroz.
Abstract The principles of Ecodesign should guide the development of products that seek to reduce environmental impacts. The use of composites, which boils down to a mixture of plastic to another material organic farms are now makes it an excellent option for innovation in the construction, architecture and the design sector. Was studied in this work a panel based on plastic and rice husks, residue obtained from processing rice, a possible proposal to reduce costs in the final product. Keywords : Ecodesign; composites; panel; rice hulls.
Introdução Nos meios de produção, busca-se a maior eficiência de produtos a partir do menor gasto possível de fabricação. Segundo Assis e Colombini (2002), a questão ambiental somada à gestão empresarial é vista hoje como necessidade para a sobrevivência dentro de um mercado competitivo, onde o mercado consumidor está à procura de melhores preços aliados à eficácia semelhante dos produtos tradicionais e às alternativas que apresentem um apelo ecológico e social aliados à um bem de consumo.
O termo “sustentabilidade” representa explorar áreas ou fazer o uso de recursos existentes no planeta, sejam eles naturais ou não, de forma a prejudicar da menor maneira possível o equilíbrio entre o meio ambiente, as comunidades humanas e toda a biosfera que dele dependem para existir. Segundo LOSCHIAVO (2014), o termo “ECOEFICIENTE” é um conceito que reúne materiais e ações que atendam às necessidades humanas, que ofereça qualidade de vida, que faça o uso de recursos naturais de maneira reduzida poupando assim o desgaste do planeta e que ainda ofereça um preço de
272 mercado competitivo, atraindo consumidor. As matérias primas básicas para a produção de plásticos podem ser de origem vegetal, mineral ou até mesmo animal, como nitrogênio, petróleo, calcário, cloreto de sódio, areia, carvão, material vegetal, leite, entre outros. Os plásticos destacam-se pela resistência à corrosão, plasticidade, baixa densidade, isolante térmico, pequeno peso específico, possibilidade de coloração como parte integrante do material, facilidade de adaptação à produção em massa, além do relativo baixo custo, que atrai os olhares do mercado produtivo. (LIMA; ROCHA E KONAGANO, 2012). O objetivo geral deste trabalho foi avaliar o incremento de produtos ecoeficientes na arquitetura e a produção de painéis utilizando, como matéria-prima, o plástico Polipropileno (PP) e um resíduo orgânico (casca de arroz). Desta forma, o objetivo específico foi produzir painéis com propriedades físicas e mecânicas apropriadas suficientes para a utilização como elemento arquitetônico. No presente estudo gerou-se um painel ecoeficiente com plástico virgem (Polipropileno – PP) e a casca de arroz como resíduo agronômico.
Revisão Bibliográfica A reciclagem é a revalorização dos descartes domésticos e industriais através de várias operações que permitem que os materiais sejam reaproveitados como matéria prima para outros produtos, aliando consciência ecológica ao desenvolvimento econômico e tecnológico. Reciclar segue as etapas de coleta e separação por tipos de materiais, revalorização que prepara os materiais separados para serem transformados em novos produtos e a transformação ou processamento dos materiais para gerar novos produtos a partir de materiais revalorizados. (FILHO 2000, p. 17). A casca de arroz é considerada um resíduo agronômico, subproduto do beneficiamento do grão de arroz e muitas vezes, as próprias beneficiadoras de arroz utilizam-se das
273 cascas como combustível para a secagem e parbolização dos grãos. Este resíduo agronômico em especial, está sendo alvo de vários estudos, uma vez que possui uma grande produção mundial, em torno de 120 milhões de toneladas ao ano, e assim tem se tornado um grande problema por ser de difícil eliminação no solo, devido às suas grandes concentrações de lignina e sílica. Muitos estudos têm sido realizados procurando tornar viáveis aplicações para este material, entre eles sua utilização como reforço em compósitos. Analisada através do aspecto econômico e tecnológico, a casca de arroz possibilita a confecção de materiais de baixo custo por atuar como material de enchimento ou até mesmo de substituição parcial da matériaprima (agregado miúdo) utilizada em materiais de construção convencionais. Já sob o aspecto ambiental, a utilização da casca de arroz permite a redução de seu descarte, ou da queima indiscriminada. (MILANI E FREIRE, 2006). A casca do arroz é um envoltório protetor formado durante o crescimento do grão e que apresenta baixa densidade e elevado volume, é um material fibroso contendo em sua estrutura um elevado teor de sílica, fator que dificulta o processo de decomposição da casca, permanecendo por vários anos no solo obrigando seus produtores a queimá-las o que acaba gerando inúmeros problemas ambientais. (CORRÊA e QUEVEDO, 2013). Nos meios de produção, busca-se a maior eficiência de produtos a partir do menor gasto possível de fabricação. Segundo Assis e Colombini (2002), a questão ambiental somada à gestão empresarial é vista hoje como necessidade para a sobrevivência dentro de um mercado competitivo, onde o mercado consumidor está à procura de melhores preços aliados à eficácia semelhante dos produtos tradicionais e às alternativas que apresentem um apelo ecológico e social aliados à um bem de consumo. O termo “sustentabilidade” representa explorar áreas ou fazer o uso de recursos
existentes no planeta, sejam eles naturais ou não, de forma a prejudicar da menor maneira possível o equilíbrio entre o meio ambiente, as comunidades humanas e toda a biosfera que dele dependem para existir. Em química e tecnologia, os plásticos são materiais orgânicos poliméricos sintéticos, de constituição macrocelular, dotada de grande maleabilidade, além de possuir a facilidade de ser transformado se trabalhado utilizando as ferramentas do calor e da pressão, e que serve de matéria prima para a fabricação dos mais variados objetos. (MACHADO, 2010). As matérias primas básicas para a produção de plásticos podem ser de origem vegetal, mineral ou até mesmo animal, como nitrogênio, petróleo, calcário, cloreto de sódio, areia, carvão, material vegetal, leite, entre outros. Os plásticos destacam-se pela resistência à corrosão, plasticidade, baixa densidade, isolante térmico, pequeno peso específico, possibilidade de coloração como parte integrante do material, facilidade de adaptação à produção em massa, além do relativo baixo custo, que atrai os olhares do mercado produtivo. (LIMA; ROCHA E KONAGANO, 2012). Os setores industriais, além dos demais segmentos econômicos da sociedade, estão se conscientizando da importância dos designers, que se preocupam não somente com a estética, mas também com a funcionalidade e racionalização de espaços e de produtos. Esses profissionais são importantes para agregar valor aos produtos lançados nos mercados interno e externo, tornando-os mais competitivos. (CHAMMA, 2004) No início do século XX, o designer era visto como o profissional responsável pelo projeto de um produto isolado, interferindo pouco nos aspectos produtivos e parcialmente no processo de ciclo de vida de um produto. Nos meados do século, esse mesmo profissional começou a projetar sistemas de produtos, passando a considerá-los não mais como aspectos isolados de produção, mas parte integrante de um todo que incluía fatores produtivos, de uso, ambientais e de mercado (MORAES,1997).
Diante da preocupação crescente com a manutenção do equilíbrio ambiental e com o consumo energético, designers passaram a incorporar em seus projetos o uso de materiais renováveis, recicláveis ou os que utilizam resíduos como matéria-prima, enquadrando-se ao conceito de Ecologia Industrial. A casca de arroz é considerada um resíduo agronômico, subproduto do beneficiamento do grão de arroz e muitas vezes, as próprias beneficiadoras de arroz utilizam-se das cascas como combustível para a secagem e parbolização dos grãos. Este resíduo agronômico, em especial, está sendo alvo de vários estudos, uma vez que possui uma grande produção mundial, em torno de 120 milhões de toneladas ao ano, e assim tem se tornado um grande problema por ser de difícil eliminação no solo, devido às suas grandes concentrações de lignina e sílica. Muitos estudos têm sido realizados procurando tornar viáveis aplicações para este material, entre eles sua utilização como reforço em compósitos. Analisada através do aspecto econômico e tecnológico, a casca de arroz possibilita a confecção de materiais de baixo custo por atuar como material de enchimento ou até mesmo de substituição parcial da matériaprima (agregado miúdo) utilizada em materiais de construção convencionais. Já sob o aspecto ambiental, a utilização da casca de arroz permite a redução de seu descarte, ou da queima indiscriminada. (MILANI E FREIRE, 2006). Os painéis produzidos com casca de arroz apresentam como característica fundamental a durabilidade, uma vez que sendo material nãolenhoso, torna-se imune ao ataque de brocas de madeira. Apresenta ainda características favoráveis à absorção de água e uma ótima resistência, sendo indicados a serem usados na construção civil. (PAULESKI, 2005).
Materiais e Métodos A confecção dos painéis foi realizada no Laboratório de Resíduos e Compósitos da
274 Faculdade de Ciências Agronômicas da Universidade Estadual Paulista, campus de Botucatu-SP, bem como os ensaios mecânicos. Os ensaios físicos de inchamento de absorção foram realizados no Laboratório de Materiais de Construção da Universidade Sagrado Coração, em Bauru-SP. Foram utilizados como matéria prima casca de arroz, Polipropileno (em grânulos) e Epolene (material aglutinante das misturas entre o plástico polipropileno e o material orgânico). Para gerar o painel utilizou-se inicialmente uma balança de precisão para pesar as amostras (Polipropileno, Epolene e casca de arroz), definindo a variação da porcentagem de fibra e plástico, sendo que cada uma das amostras teria no fim 1kgf. Para o experimento inicial (piloto) escolheuse a amostragem cujo delineamento tinha 10% de fibra e a amostra foi aglutinada e inserida na extrusora e posteriormente no triturador. Diante dos resultados dos ensaios pilotos apresentados na Tabela 1, chegou-se à conclusão de que o painel deveria ser moldado nas seguintes condições: densidade 0.70g/cm³, pressão de 100kgf/cm², temperatura de 170 graus Celsius (pois o polipropileno se funde a 165 graus Celsius) e deixando o material por cinco minutos na prensa. Foram realizados ensaios pilotos também na prensa quente/frio para identificar a melhor condição de prensagem. A amostra piloto 8 (apresentada na Tabela 1) foi a que melhor apresentou resultado final, chegando ao peso, temperatura e tempo ideais para preencher o molde e gerar a espessura desejada do painel, sendo seguido para as seguintes amostras de 10%, 20%, 40%, 50%, 60%, 70% de casca de arroz. O peso das amostras para a placa final foi baseado no resultado desejado, ou seja, obter uma densidade final em torno de 0,9g/ cm³. Foram realizadas 3 repetições para cada amostra.
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Tabela 1. Experimento de prensagem quente frio
Piloto
1 2 3 4 5 6 7 8
Experimento de prensagem quente/frio Peso (g) T e m p . Te m p o (ºC) (min) 44g 160 7 50g 170 9 50g 175 9 50 180 9 34,5g 180 9 35,5g 185 9 35,5g 200 9 36,5g 200 5
de água. Foram realizadas 3 repetições para cada amostra. Para facilitar a leitura dos resultados, definiu-se como legenda: • CA - para casca de arroz O número subsequente as letras referem-se a porcentagem da fibra e o número após o hífen refere-se repetição da amostra. Tabela 2. Quadro-resumo dos ensaios físicos
Os ensaios mecânicos foram realizados no Laboratório de Resíduos e Compósitos da Faculdade de Ciências Agronômicas da Universidade Estadual Paulista, campus de Botucatu-SP, cujos resultados, apresentados na Tabela 4, são resumidos (média dos três corpos de prova de cada amostra) das seis repetições dos corpos de prova de cada tratamento. Tabela 4.Quadro-resumo do ensaio de tração
Fonte: Elaborada pela autora, 2013.
Optou-se por essa prensa em busca de melhores resultados, já que a mesma oferece as prensagens a quente e a frio, garantindo um painel com melhores resultados finais, uma vez que o produto obtido sofrerá um choque térmico instantâneo, impedindo que sejam sofridas alterações como envergaduras causadas por um resfriamento natural por
Fonte: Elaborada pela autora, 2013.
Resultados e Discussões
Fonte: Elaborada pela autora, 2013.
Tabela 3. Porcentagem de inchamento e absorção
exemplo. A Figura 1 ilustra o painel produzido, ainda no envoltório metálico do molde, já na etapa finalizada do procedimento.
Figura 1. Procedimento de Prensagem e Painel Final de 10% de Casca de Arroz Fonte: Elaborada pela autora, 2013.
Após a prensagem e obtenção das placas finais, foram realizados os ensaios físicos e ensaios mecânicos. O ensaio físico foi realizado no Laboratório de Materiais de Construção da Universidade Sagrado Coração. A Tabela 2 apresenta resultados resumidos dos ensaios físicos realizados para obter a densidade. Na Tabela 3 apresentam-se os resultados do ensaio de inchamento e absorção
Fonte: Elaborada pela autora, 2013.
Notou-se pelos estudos que a densidade adquirida se manteve entre 0,83g/cm³ e 1,16g/ cm³, acima até do que foi almejado. Utilizandose como referência os painéis produzidos por Chamma (2004), conclui-se que em média o presente estudo obteve uma alta densidade, ou seja, uma média de 1,02g/cm³. O inchamento demonstrou pouca variação entre os tratamentos, chegando a uma média de 3,53%. A norma ANSI A208.1 (ANSI, 1993) especifica que o máximo permitido do inchamento em espessura é de 8% para painéis de alta densidade. Assim sendo, a porcentagem de inchamento para casca de arroz está dentro dos padrões aceitáveis. Em relação à absorção de água nota-se que a as repetições de casca de arroz apresentaram uma média de 1,41%, representando assim a resistência das partículas que constituem os painéis quando submersos em água. Esses ensaios são realizados sistematicamente pelas indústrias, indicando o controle de qualidade de seus produtos. Diante dos resultados dos ensaios mecânicos
276 é possível concluir que o material com 10% de casca de arroz foi o que apresentou melhores resultados, 70% de casca de arroz indicando assim que o resíduo agronômico tem bom desempenho à tração. Diante das demais amostras, a que apresentou os menores resultados foi a de 50% de casca de arroz.
Conclusão Considerando a possibilidade de reciclagem e de criação de produtos ecoeficientes torna-se claro que a utilização do plástico juntamente com um material orgânico pode ser rentável, além de garantir propriedades físicas, químicas e mecânicas de alto índice. Portanto, o uso da casca de arroz pode gerar um produto final de grande interesse ao mercado atual principalmente para a área da construção civil e arquitetura, áreas que sempre estão em busca de novos produtos, pela inovação, beleza, conforto, preços acessíveis além da durabilidade e de mitigar os impactos ambientais dos resíduos gerados pela sociedade, fatores que podem interferir na qualidade de uma obra. A partir de resíduos agroindustriais surgem fibras que podem dar origem a uma nova geração de plásticos. Esses plásticos podem ser mais leves, resistentes e ecologicamente corretos do que os polímeros convencionais utilizados industrialmente. Considerando a abundância de resíduos como a casca de arroz na sociedade brasileira, em função de fazer parte culturalmente dos alimentos por nós consumidos (arroz) e ainda considerando que não há amplo aproveitamento desse resíduo, conclui-se que o presente trabalho indicou um material em potencial para ser explorado, de baixo custo de produção e com características de um produto ecoeficiente que foi almejado neste presente estudo. Na construção civil, com destaque no Design, materiais como o que foi gerado nessa pesquisa têm grandes potencialidades para serem aproveitados como revestimentos, pisos, embalagens e na área de arquitetura de
277 interiores na fabricação de móveis, objetos e demais produtos, já que resultou em um aspecto bastante homogêneo e que se manuseado com a incorporação de corantes pode se tornar um material com aparência e textura de madeira, podendo facilmente substitui-la em diferentes aplicações. Conclui-se desta forma, que o material desenvolvido apresentou características físicas e mecânicas aceitáveis, indicando uma importância de aprofundamento de estudos sobre o mesmo e podendo chegar até à produção em escala industrial. O resultado foi satisfatório, não só por ter surpreendido com aspectos como cor e textura, mas por contribuir para geração de produtos sustentáveis.
Agradecimentos Os autores deste trabalho agradecem ao CNPq/PIBIC pela concessão de bolsa de Iniciação Científica ao primeiro autor para execução da pesquisa e ao Prof. Dr. Alcides Lopes Leão do Departamento de Recursos Naturais da Faculdade de Ciências Agronômicas da Unesp-Campus de Botucatu, que viabilizou a realização de parte dos procedimentos laboratoriais dessa pesquisa no Laboratório de Resíduos e Compósitos da Faculdade de Ciências Agronômicas da Universidade Estadual Paulista, campus de Botucatu-SP.
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SEMIÓTICA
Inconfissões – Construção de uma instalação performática sensorial Inconfissões - Construction of a sensory performance installation Gomes, Caroline Apolinário; Universidade Estadual Paulista - UNESP
caroline.agomes@gmail.com Wang, Marina Ling; Universidade Estadual Paulista - UNESP
marinalingwang@gmail.com Rossi, Dorival Campos; Universidade Estadual Paulista - UNESP
bauruhaus@yahoo.com.br
Resumo Qual forma teriam os questionamentos pessoais de cada um se fosse possível concretizá-los? Por meio de uma intensa investigação pessoal, as autoras pretendem transformar em algo palpável, tudo aquilo que as envolvem e as constrõem como seres humanos. Através de linguagem híbrida, integrando seus próprios corpos ao ambiente, o projeto possibilita criar sensações particulares, se concretizando na forma de uma instalação performática, que só se encerra com a participação do público. Palavras-chave: Design sensorial; Corpo; Instalação; Performance.
Abstract What form would it be if it was possible to materialize the personal questions of each? Through an intense personal investigation, the authors intend to turn into something tangible, everything that involve and build them as humans. Through a hybrid language, integrating their own bodies to the environment, the project creates particular sensations, taking shape in the form of a performance installation that only ends with public participation. Keywords (maximum 4): Sensory Design; installation; body; performance.
1. Introdução Qual o sentido da vida? O que é sagrado? Do que o espírito é feito? O que aconteceria se fosse possível colocar uma escada dentro de seu corpo e descer até o fundo? Esse estudo, realizado como Trabalho de Conclusão de Curso de Design, aborda de forma pessoal estes e outros questionamentos,
através de uma intensa investigação pessoal. Sendo realizado na forma de uma instalação performática, onde fora explorado o corpo em uma performance e a mente com uma instalação. O corpo foi escolhido como base do trabalho por ser uma extensão direta da mente, que através da consciência corporal, conectase com o universo mais íntimo e profundo de cada um.
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2. Fundamentação teórica Tratando-se de uma instalação que explora a essência do que constroi o ser humano, transformando os sentimentos das autoras em algo palpével, foi necessário uma pesquisa que adentrasse por areas aparentemente distintas, para que enfim, fosse possível imergir no universo do design sensorial. Tendo o corpo como base deste estudo, usado como uma forma de linguagem, a pesquisa iniciou-se através de Antonin Artaud, artista francês ligado ao movimento surrealista, que lutou contra o formato tradicional do teatro de sua época. O artista propõe um novo formato chamado de Teatro da Crueldade, criticando a expressão corporal subordinada ao texto, alegando que dessa forma as emoções seriam superficiais e sistemáticas, sem um verdadeiro envolvimento. O termo “crueldade” em nada tem haver com o seu sentido literal, mas sim, com o envolvimento do ator em cena, sendo cruel por expor o que existe dentro de cada um. Sendo assim, “[...] o ato de encenar traz à tona todas as forças profundas e ocultas que constroem o ser humano […]” (ARTAUD, 1935). Este mesmo autor busca um aprofundamento maior, o teatro puro que valoriza todo o processo teatral que o envolve – como um ritual. O palco seria então uma “reprodução de sonhos e exposição dos mistérios da alma humana” (Ibid., 1935). Para que essa “encenação” seja de fato verdadeira, Barba (1994) propõe o desnudamento do ator em cena, explicando que ao retirar suas máscaras, o mesmo terá um encontro real consigo mesmo “[...] por uma imersão desse artista em si mesmo, quando ele vai investigando questões próprias que possam alimentar seu processo criativo, para então serem devolvidas à cena, transmutadas em composição poética”. Ao externalizar os questionamentos internos através do corpo, Kazuo Ohno - criador da dança teatral Butoh – utilizou do sofrimento do povo japonês pós-guerra como forma de expressão para criar sua arte.
281 Segundo Caldeira (2006) apud Ohno “[...] o Butoh é a volta às origens, aos mistérios da vida [...] eu tento revelar com meu corpo todo peso e mistério da vida, seguir minhas memórias até o útero de minha mãe”. Dessa forma, o butoka vai além da estética corporal, buscando externalizar seu próprio eu, arrancando suas máscaras diante de si e de todos, para assim, mergulhar nas profundesas de seu subconsciente. Paralelamente ao Butoh, Greiner (2005) debate questões voltadas à estética, política e à experimentos artísticos envolvendo o corpo. O corpo não é somente o recipiente transmissor de informações, é o transformador delas, o ponto de contato entre o que já está registrado e o que é novo. Neste sentido, a mesma autora diz que o corpo está em contínuo processo de transformação, sendo “um contexto sensitivo, uma transição espaço-temporal onde percorrem informações de origem interna e externa [...] compreendendo-o como ativador de mediações”. Dessa forma, o corpo ganha uma nova visão, ao mesmo tempo em que não se pode separar corpo e mente é preciso entender que o mesmo não é apenas um envólucro. Esse corpo, da mesma forma que a mente, possui memórias. Sendo o corpo uma ferramenta de infinitas possibilidades, a pesquisa aprofundouse no campo da performance, sendo essa, uma forma híbrida de exploração corpo-mente. Goldberg (1979) enquadra a performance como sendo um “meio de expressar ideias, dar vida a ideias formais e conceituais das quais se baseiam as criações artísticas.” É através da arte conceitual que esse estilo se concretiza. (Arte conceitual seria o lugar onde as ideias são mais importantes que o produto final). Criada nos anos 70, a performance encontra até hoje dificuldades em ser traduzidas em palavra. Para Cohen (1989), pesquisador e performer brasileiro, “a performance se colocaria no limite das artes plásticas e das artes cênicas, sendo uma linguagem híbrida que guarda caracteristicas da primeira enquanto origem e da segunda enquanto finalidade”. Posto isto, a performance tem como caracteristica juntar diferentes formas de expressão, colocando o
corpo como objeto central, uma vez que esse não é apenas a ferramenta para transmitir a mensagem, ele próprio é a mensagem. A artista-performer Marina Abramovic, que atua desde os anos 70, possui trabalhos que exploram o limite do corpo e mente, onde através da consciente corporal atingida, consegue alcançar seu processo criativo. Para Abramovic (2010), um dos elementos mais importantes é o tempo. Para ela, o tempo explora tanto o performer como as próprias ações realizadas durante esse processo - ações consideradas banais e cotidianas ganham uma visão diferente, tornando cada momento do trabalho individualizado. O trabalho de Marina Abramovic engloba também conceitos do work in progress, que segundo Cohen (1999) seria “uma nova forma de trabalhar a performance (...) um teatro contaminado por outras mídias, tomado pelo hibridismo e fugindo as categorizações, se tornando assim um plano de criação intermídias, processual e instável.” O work in progress carrega a noção de trabalho e de processo. O trabalho se define em dois momentos: um, de obra acabada como resultado - produto final; e outro, do percurso, processo - obra em feitura. É a fuga do racional, do verbal, do linear. Um jogo dialético entre visível e invisível, o oculto e o evidente, o explicável e o inesplicável. “É hipertexto, você entra num lugar e já cai em outro” (Ibid., 1999). Juntamente aos estudos sobre o corpo performático, a pesquisa seguiu-se no campo da estética, onde o designer brasileiro Flávio Wild ampliou o campo de visão através da instalação “Porões da Mente”. Esta instalação foi apresentada durante o evento de performances da 3ª Bienal de Artes Visuais do Mercosul em 2001 e, mais tarde, premiada na 6ª Bienal de Design Gráfico - foi uma ambientação feita nos porões do Hospital Psiquiatrico São Pedro - em Porto Alegre. Sendo possível perceber a junção de todo o contexto histórico daquele local com o momento presente. Segundo o próprio artista "o trabalho estava fundamentado em uma linha
conceitual muito forte [...] a arte e o design não são limites de Porões da Mente, mas campos de existência e testemunho. A arte é o campo de emergência de Porões da Mente e o design surge como um campo de sobrevida”. O artista cria ambientes sinestésicos - a partir do jogo de luzes, cores, sons, imagens e objetos que já se encontravam no local, fazendo com que as pessoas adentrem num novo plano, se sentindo como parte daquilo. O francês Olivier de Sagazan, desenvolveu uma prática híbrida que integra pintura, fotografia, escultura e performance. Seu trabalho possui um aspecto forte, denso, expressivo, e segundo alguns críticos “inimitável”. Em seu trabalho Transfiguration de 2011, Sagazan constrou através de uma performance, um ser humano animalesco que busca romper com a mundo físico. Ao mesmo tempo em que é inquietante e profundamente comovente, esse novo corpo formado, quebra as fronteiras entre os sentidos físicos, intelectuais, espirituais e morais do ser humano. Sagazan consegue concretizar através delas toda a escuridão existente dentro do ser humano. Possuem um caráter sombrio e poético ao mesmo tempo. A essência dos trabalhos de Olivier carrega o mesmo peso “mórbido” que os fantoches de Ilka Schönbein. Schönbein é uma titereira, atriz e bailarina alemã, formada em “eurytmic dance” de Rudolph Steiner - defensor da aliança da alma e do gesto ao invés da técnica. Em “Winterreise” - A Viagem de Inverno, 2003 - é possível perceber, através de fantoches, bonecos, máscaras e próteses, as confusões e conflitos de existência dentro do ser humano. Suas peças são viscerais e intensas. Para conseguir concretizar esse emaranhado de conceitos expostos acima, foi necessário entender e conhecer melhor o que existe dentro do ser humano. Dessa forma, foi através dos Estados Alterados de Consciência que a pesquisa encontrou uma forma de dar vida a tudo que a envolvesse. Estados Alterados de Consciência são estados mentais capazes de alterar a consciência e percepção como um todo, levando ao encontro pessoal consigo
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Figura 01: Confecção de máscaras corporais com gesso e acabamento de spray e pó de bambu. Fotos: Autoras.
Figura 02: Confecção de tochas e bambu, máscaras corporais e de rosto. Fotos: Autoras.
Resultados e Discussões O projeto se concretizou na forma de uma instalação performática apresentada em uma clareia dentro do campus da UNESP de Bauru. A apresentação possuiu um local de encontro onde o público foi guiado através de um “mestre de cerimônias” vestido com uma máscara e roupas pretas. No começo da caminhada até a trilha, o público se deparou com uma mesa com velas da qual poderiam usar como auxílio durante a caminhada. Ainda neste trajeto os músicos apareceram, um a um, primeiramente o violino, servindo de base para uma construção sonora, em seguida, a escaleta e por fim, o bandolim. O som da apresentação foi criado por José Orlando Rubio e encontra-se em https://soundcloud.com/marina-wang-1/ inconfissoes
283 Ao chegaram à trilha, o público se deparou com um mato fechado e pouca luz, seguindo em caminhada, um a um, rumo à mata, adentrando de fato à instalação. A trilha foi composta por objetos que simbolizavam momentos da vida das autoras com fotos do nascimento, sapatinhos de bebê, brinquedos e diários antigos, foi possível traçar uma caminhada desde o momento do nascimento até o momento presente. Dentro da instalação, o ambiente foi formado por móveis, estátuas, fotos, pedaços impressos retirados do scketckbook Pensamentos Soltos, roupas e acessórios pessoais. A apresentação começou sem a presenta das autoras-atrizes, fazendo com que o público pudesse explorar o local presente e sentir tudo aquilo que o construia. Pouco a pouco, o público começou a se espalhar, explorando o local e seus elementos. A montagem foi dividida em dois momentos, o primeiro onde as autoras abordavam uma temática pessoal, através de falas desconexas aos sons de tambores e lentamente caminhavam para o encontra uma da outra. No segundo momento, acontece a conexão entre ambas, onde, em meio a lama e folhas secas, tiraram suas roupas e escreveram em seus corpos – CONSTRUA-ME. Nesse momento, com um cenário formado por roupas, sapatos, maquiagem e acessórios, as mesmas esperavam a interação do público, que poderia ou não acontecer, seguindo assim, para o fechamento do ritual. O fechamento se deu com a participação efetiva do público, a interação foi maior do que o esperado. As pessoas se envolveram com as autoras, vestindo seus corpos, fazendo uso de pinturas e desenhos, chegando até mesmo a amarrar seus corpos juntos, simbolizando a sintonia daquele momento. Ao final, todos se encontraram sentados ao chão, num longo período de silêncio e o ritual estaria alí, encerrado.
Referências bibliográficas
Figura 03: Trechos do dia da apresentação. Fotos: João Perussi
Considerações finais As perguntas feitas do início desse artigo, foram questões trabalhadas e discutidas ao longo de todo o projeto, e com o tempo foi possível perceber que elas não possuíam respostas claras e objetivas, pelo contrário, traziam junto de si, ainda mais questionamentos. Dessa forma, percebemos que a intensa busca pelo que existe dentro de nós, está apenas começando. A realização do projeto só foi possível após um longo processo de treinamentos e experimentos, tirando as autoras de suas zonas de conforto e as colocando em situação desconhecidas. Desse modo, o processo se faz tão importante quando o produto final, não existindo separação entre eles, uma vez que mesmo durante a apresentação, o projeto ainda estava em contínuo processo de construção. Essa forma de construção continuada foi escolhida tendo em vista que durante a criação, como já dito, as autoras se depararam inúmeras vezes com questões sem respostas concretas, optando assim por não ter um roteiro com um final fechado, pois não estaria em harmonia com todo o processo desenvolvido. Todo o projeto encontra-se online através de um site criado com a função de documentar e compartilhar referências, o link é http:// inconfissoesprojeto.tumblr.com/ , antes da apresentação do projeto também foi produzido um teaser como forma de lançar algumas ideias da instalação, seu link é https://www.youtube. com/watch?v=TUFNF34Qde8
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COMITÊS
Ana Beatriz Pereira de Andrade Comunicação Visual Design Gráfico Design Inclusivo Design Informacional
Cássia Letícia Carrara Domiciano Comunicação Visual Design Gráfico
Dorival Campos Rossi Comunicação Visual
Fausto Orsi Medola Ergonomia e Acessibilidade
Fernanda Henriques Comunicação Visual Design Gráfico
João Carlos Riccó Plácido da Silva Design de Produto Ergonomia e Acessibilidade
Luis Carlos Paschoarelli Ergonomia e Acessibilidade Design Inclusivo
Luiz Carlos Felisberto Eco Design Ergonomia e Acessibilidade Materiais e Processos em Design
Marizilda Menezes Design Têxtil e de Vestuário Fundamentos Teóricos
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Monica Cristina de Moura Design Têxtil e de Vestuário História do Design
Osmar Vicente Rodrigues Design de Produto Fundamentos Teóricos
Paula da Cruz Landim Design de Produto Design Urbano História do Design
Sérgio Luiz Busato Design Gráfico Comunicação Visual Semiótica em Design
Solange Maria Bigal Fundamentos Teóricos Semiótica em Design
Tomas Queiroz Ferreira Barata Design Urbano Eco Design Materiais e Processos
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ISBN 9788599679555
90000 >
9 788599 679555