Grupos de gestão uma experiência oi kabum

Page 1

GRUPOS DE GESTÃO: uma experiência Oi Kabum! Base Conceitual e Metodológica de Implementação


GRUPOS DE GESTÃO: uma experiência Oi Kabum! Base Conceitual e Metodológica de Implementação

Redação: Débora B. Santos Revisão: Fernanda Pedrosa Projeto gráfico e diagramação: João Victor Alves


Índice:

I. Conceitos e Fundamentos dos Grupos de Gestão................................... 8; Principais objetivos a serem alcançados com os grupos de gestão.................. 10; II. O planejamento dos Grupos de Gestão................................................ 16; A organização da grade curricular para implantação dos Grupos de Gestão...................................................... 16; O envolvimento dos educadores para a prática............................................ 18; Algumas estratégias utilizadas para definir o cardápio dos Grupos de Gestão................................................................ 20; A comunicação da prática dos Grupos de Gestão aos jovens......................... 21; III. Estrutura e dinâmica de funcionamento............................................ 24; A alocação dos jovens nos grupos de gestão.................................................. 24; A organização dos componentes de cada Grupo de Gestão........................... 26; A dinâmica típica de um encontro............................................................... 26; O cardápio dos Grupos de Gestão e suas atribuições.................................. 26; IV. Registro e avaliação............................................................................. 29; Algumas referências sobre gestão compartilhada.......................................... 32;


Rio de Janeiro, 18 de novembro de 2014.

Este documento serve como base norteadora para o processo de implementação dos Grupos de Gestão nos programas de educação do Oi Futuro. A partir do desejo das escolas de se apropriarem da iniciativa com vistas à experimentação, várias questões conceituais e metodológicas surgiram em função de contextos e processos pedagógicos diferenciados. Surge, então, a demanda por um documento que sintetizasse a experiência mineira de forma reflexiva mas também expositiva, no sentido de relato. O Oi Futuro elaborou um roteiro indicando as questões mais recorrentes e solicitou à pesquisadora da Oi Kabum! BH que elaborasse o texto. Esta versão está editada com vistas a servir como material orientador da prática. Os Grupos de Gestão são, comprovadamente, uma experiência inovadora, premiada e alinhada com os princípios e objetivos dos Programas de Educação do Oi Futuro. Desejamos que essa iniciativa colabore para aprofundar processos que culminem numa formação integral dos jovens. Além de apoiar experiências como esta, o Oi Futuro deseja que esta seja uma de várias edições de documentos sistematizadores de experiências inovadoras nas escolas tendo em vista a disseminação de conteúdos e metodologias que expressem os valores do programa. Cada escola tem em si a oportunidade e responsabilidade de compartilhar suas práticas e vivências de modo que outras escolas possam, dentro de seus contextos e desejos, se apropriarem e se reinventarem. Registramos aqui mais uma vez o agradecimento à Débora Braun e aos demais educadores da Oi Kabum! BH na reflexão e redação desta experiência. Boa leitura e boa experiência!

Oi Futuro


I.

Conceitos e Fundamentos dos Grupos de Gestão

Os Grupos consistem na gestão bem como na reflexão sobre as políticas (lógicas, concepções, princípios), fluxos e dinâmicas de funcionamento da escola, o que inclui: a infra-estrutura e organização, políticas de uso e compartilhamento de espaços físicos e equipamentos, a participação de pessoas nas diversas tarefas, sistemas de circulação de informações, produção de conhecimento e tomadas de decisão sobre temas de interesse coletivo. Há uma carga horária semanal dedicada diretamente para a organização e funcionamento dos grupos. Os preceitos básicos da prática dos Grupos de Gestão podem ser assim enumerados: sistema de organização coletiva que seja representativo de todas as esferas da comunidade escolar (inclusive fortalecendo a relação com a família e a comunidade), que permita a tomada de decisões justificadas, com razões expostas e que dialoguem com as políticas da escola, que legitime opiniões e pontos de vista diversos, que favoreça a troca de ideias e argumentos e que tenha abertura para o questionamento e a discordância, de modo que os processos decisórios provoquem na comunidade escolar a reflexão sobre o senso de justiça, o bem estar comum e a colaboração. No processo decisório, a opinião de todas as pessoas concernidas no assunto em questão deve ser ouvida e as decisões tomadas tendo em vista o bem coletivo. O conflito, elemento necessário para a própria dinâmica da Gestão Coletiva, prescinde da discordância para que haja negociação. É importante reconhecer a importância da discordância para o aprendizado coletivo, já que ela pressupõe um esforço de diálogo e argumentação que gera deslocamentos e demanda abertura e flexibilidade. Isso implica a compreensão de que, mesmo garantindo que o processo deliberativo tenha tais características, é impossível (e mesmo indesejável) que se alcance o consenso – porém, mesmo insatisfeitas, as pessoas tendem a aceitar as decisões, na medida em que o processo tiver ocorrido segundo os preceitos acima identificados, pois eles garantem legitimidade às decisões.

8

A proposta de Gestão Coletiva coloca os sujeitos em situações que desestabilizam suas posições hierárquicas, provocando diversas inversões de papéis. A desestabilização das hierarquias é um aspecto fundamental, trazendo aprendizados essenciais para a formação profissional dos jovens ao diversificar o leque de competências adquiridas por eles (e também por educadores, coordenadores e equipe técnica). A quebra desta distância dada a priori entre os que sabem e os que ignoram, entre os que dominam determinada área de conhecimento ou knowhow técnico e os leigos, é fundamental para encorajar os jovens a se arriscarem na realização de tarefas que sempre lhes foram negadas e os despertarem para a possibilidade concreta de participação. A proposta solicita, tanto dos educandos quanto dos educadores, um exigente processo de transformação pessoal. Os jovens são convocados a abandonar o papel social de indivíduos incapazes de se ocupar de uma série de tarefas que exigem responsabilidade “demais”. Eles são motivados a sair da posição de meros receptores de conteúdos e a participar dos processos formativos como sujeitos ativos, aptos a fazer escolhas, tomar decisões, e, sobretudo, assumir as consequências da autonomia. O processo pelo qual os jovens adquirem consciência da responsabilidade que devem assumir, na medida em que suas liberdades se ampliam, é longo e gradual. Observamos que rapidamente os jovens passam a ocupar os espaços abertos para sua participação, envolvendo-se nos debates, opinando nas questões que os concernem e vivenciando plenamente a liberdade que lhes é concedida – mesmo que ainda pouco instrumentalizados para tal participação. Eles facilmente se apropriam do discurso da autonomia, da horizontalidade e da importância da democracia, com energia e empolgação. Mas a qualificação desta participação e a vivência consciente e responsável desta liberdade se dão progressivamente e demandam um processo mais longo e complexo. É essencial a toda a equipe da escola e às instituições parceiras a consciência de que os educandos desenvolvem gradualmente a responsabilidade necessária para protagonizar deliberações de modo inteiramente autônomo, bem como a maturidade e seriedade que lhes permite arcar com suas consequências. Fazer com que a autonomia e a liberdade sejam acompanhadas pela responsabilidade – eis um grande desafio, como afirma Paulo Freire.

9


O desafio do educador é utilizar sua autoridade de forma legítima, sem tornar-se negligente ou licencioso. É preciso mediar as discussões e saber intervir quando necessário, assumindo sua responsabilidade como educador. Surgem questões delicadas: como se colocar? Até que ponto intervir, orientar os debates, influenciar as decisões e conduzir as ações nos momentos em que percebem imaturidade da parte dos jovens? Como usar a autoridade? Quais os limites para a inversão de papéis e funções? Não se trata de tarefa fácil. A lida saudável com a hierarquia é, para todos os sujeitos que atuam dentro desta proposta, um exercício delicado e constante. Principais objetivos a serem alcançados com os grupos de gestão De forma geral, o objetivo mais amplo do funcionamento dos grupos de gestão é os jovens e a equipe experimentarem a complexidade dos fluxos e dinâmicas de funcionamento de uma instituição, aprendendo a lidar com demandas e burocracias, realizar negociações, enfrentar obstáculos e procedimentos nem sempre imediatos ou de fácil resolução.

Como desdobramento dessa finalidade, podemos ainda elencar:

1. Desenvolvimento de habilidades de organização pessoal. Os jovens e a equipe aprendem a planejar suas ações, estabelecer metas, criar estratégias para concretizá-las, seguir prazos, entender e expressar com mais clareza o que visam realizar, na medida em que desempenham semanalmente tarefas deste tipo nos grupos, que exigem planejamento, produção etc. 2. Desenvolvimento de autonomia e versatilidade, habilidades e competências que reverberam no mundo do trabalho, pois tanto os jovens quanto os funcionários da escola se tornam profissionais mais autônomos e com habilidades que extrapolam a atuação em áreas específicas, evitando a superespecialização e a fragmentação dos campos do saber e do fazer.

10

Exemplo: o jovem aprende não apenas a fotografar ou filmar, mas a produzir um evento, fazer uma planilha, redigir uma ata, negociar um orçamento etc. O educador experiencia os desafios da gestão pedagógica e se ocupa da reflexão e da condução de processos tipicamente centralizados pela coordenação, como orçamentos, negociações institucionais, definição de procedimentos e princípios pedagógicos como matriz curricular, avaliação, critérios de seleção dos estudantes etc). 3. Conscientização acerca da importância do cuidado com o espaço que se ocupa e com a infraestrutura que se utiliza. Na medida em que passam a se ocupar de tarefas ligadas à manutenção, organização e conservação de materiais, equipamentos e locais da escola, os jovens e a equipe sensibilizam seu olhar e se tornam mais atentos no uso dos mesmos, revendo hábitos e comportamentos inadequados ou danosos aos bens coletivos. Exemplos para os três últimos itens: i) um jovem do grupo da Biblioteca acompanha o processo de compra de um livro (participa de tarefas como fazer pesquisas em livrarias, levantar orçamentos, comparar, analisar se o preço cabe no orçamento da escola, acompanhar encomenda, entrega e recebimento, catalogar o livro e colocá-lo no acervo). O jovem então percebe que o livro não “sai da livraria e aparece na prateleira da escola” e passa a ter cuidado com os exemplares que utiliza. ii) Um jovem do grupo de equipamentos realiza tarefas de organização (identificação dos materiais por etiquetas, distribuição em caixas, prateleiras etc), catalogação (levantamento de todo o acervo para compor uma planilha válida, controlando a entrada de novos equipamentos e a saída daqueles em uso) e desenvolvimento da política de uso. Os jovens deste grupo passam a ter grande cuidado com os equipamentos pela consciência que ganham da importância do uso adequado – pois passa a saber das fragilidades que os equipamentos possuem, dos problemas que a falta de cuidado pode causar, da dificuldade para consertar equipamentos danificados, dos preços altos dos equipamentos novos, etc.

11


4. Desenvolvimento de aprendizados ligados ao próprio campo da arte, pois os grupos oferecem aos jovens a possibilidade de desenvolver competências não enfocadas em outros processos formativos. Exemplo: o grupo de Montagem se ocupa da organização do acervo da escola e pensa formas criativas e eficazes de armazená-lo e torná-lo visível. Os jovens têm contato com obras de outros artistas (seus colegas da turma anterior) e se dão conta da importância das referências para o trabalho artístico, pois ao manusear estas obras, eles experimentam o surgimento de novas ideias e possibilidades para seus próprios trabalhos, o que enriquece seus processos criativos. Manuseando trabalhos já concluídos e armazenados, os jovens ainda refletem sobre toda a trajetória que uma obra percorre. Ao se dar conta de que a criação artística não termina no momento em que a obra é finalizada – pois aí será necessário investigar possibilidades para a exibição, armazenamento e conservação – os jovens aprendem a pensar as técnicas, suportes e dispositivos para seus trabalhos na relação com a totalidade desta trajetória. Outros exemplos de grupos ligados diretamente a aprendizados artísticos são o audioclube e o cineclube, mas quase todos os grupos realizam ações que envolvem criação e que se ligam às atividades artísticas da escola. 5. Sensibilização para a atuação política e desenvolvimento de competências fundamentais para a formação humana. Os jovens e a equipe podem experienciar o processo de tomada de decisão e assim compreenderem a importância dos critérios democráticos. Os aprendizados da gestão coletiva reverberam rápida e diretamente na vida dos jovens fora da escola (na família, no trabalho, na escola regular e nas relações interpessoais): eles passam a identificar situações e contextos sociais, externos à Oi Kabum!, em que são levados em conta princípios semelhantes aos da proposta de Gestão Coletiva por um modo de funcionamento democrático, que considera critérios como a participação dos envolvidos nas tomadas de decisão, a flexibilização das hierarquias, a troca de ideias e opiniões, o respeito à diversidade e a capacidade de trabalhar em grupo. Por outro lado, eles também modificam seus próprios comportamentos e antigas formas de ver o mundo e de se relacionar. Eles passam a exigir em outras esferas de sociabilidade que as relações sejam pautadas por critérios democráticos, eles mesmos demonstrando o esforço para orientar suas ações nesse sentido. 12

Sarau do Grupo de biblioteca.

Oficina de Photoshop oferecida por jovens no Grupo Escambo.

13


Oficinas oferecidas aos alunos da Escola Estadual Helena Teixeira de Carvalho, de Buritizeiro, em visita Ă Oi Kabum! BH no dia 11/10/2013.

Show de Frauke Aulbert realizado pelo Grupo Audioclube.

14

Plantio de Citronela: Campanha contra a dengue do Grupo de Sustentabilidade.

Escolhas e pesquisas sobre filmes para o cronograma do mĂŞs promovidos pelo Cine Club.

15


II.

O planejamento dos Grupos de Gestão

A organização da grade curricular para implantação dos Grupos de Gestão Os Grupos de Gestão existem na Oi Kabum! BH desde a primeira turma. A experiência vem da AIC, principalmente do Conselho de Jovens da Rede Jovem de Cidadania, e está sistematizada e descrita no capítulo VII do livro “Mídias Comunitárias, Juventude e Cidadania”. Foram realizadas duas ações iniciais para a implantação dos grupos. A ideia foi inspirada pelo pensamento de Boaventura Souza Santos, sobretudo pelas propostas da ecologia de saberes, da sociologia das ausências e da universidade livre. Em cartazes afixados no corredor da escola, os jovens responderam às questões “o que quero aprender?” e “o que posso ensinar?”. A equipe fez um cruzamento destes desejos e criou grupos de apoio e trocas de saberes (o escambo de saberes). A outra ação foi uma avaliação inicial, na qual toda a comunidade escolar (jovens, educadores e coordenação) responderam às questões: “o que a escola precisa?”, “o que falta na escola?” e “o que posso fazer para colaborar com a Oi Kabum!?”. Novamente, a equipe fez o cruzamento e organizou os grupos pelas naturezas de cada ação. A coordenação indicou algumas pessoas de acordo com a oferta de ajuda. Os cartazes com os grupos e tarefas foram colados nas paredes e cada um se inscreveu em um grupo. A cada semestre, os grupos foram rearranjados por uma dinâmica parecida, e a partir da avaliação feita por cada grupo. Para inserir os grupos de gestão na grade, formalmente, basta definir um horário por semana (1h50) para eles. Pode não parecer tão simples subtrair parte da carga horária das demais disciplinas, já que o tempo de formação é curto e isso pode impactar na quantidade e qualidade dos conteúdos trabalhados. Porém, efetivamente, trata-se de um ganho não apenas de tempo na formação, mas, sobretudo, de um ganho de novos aprendizados essenciais para a formação humana, política e profissional dos jovens. São aprendizados não trabalhados em outros espaços e que reverberam neles diretamente, inclusive melhorando a qualidade da aprendizagem dos jovens, potencializando-a, já que os grupos contribuem diretamente para uma mudança de postura na relação dos jovens com o conhecimento.

16

Ao trabalhar a autonomia, a divisão de responsabilidades, o respeito ao outro, a experiência do trabalho coletivo, o cuidado com a escola, os espaços e equipamentos etc, os grupos otimizam processos e relações dentro e fora de sala de aula. Sendo mais autônomos, por exemplo, e desenvolvendo uma postura pró-ativa, de iniciativa, de confiança em si mesmo para resolver coisas sozinho, a tendência é que o jovem desembole os exercícios e desafios propostos nas disciplinas com muito mais eficácia e rapidez, que ele trabalhe melhor em grupo, seja mais compromissado, que a lida com os recursos e materiais usados em aulas seja otimizada etc. Isso fica ainda mais evidente no desenvolvimento dos projetos finais, quando os jovens têm que resolver mais coisas por conta própria. Dois outros aspectos são o trânsito entre áreas de saber e a mobilização propiciados pela experiência na gestão. Neste sentido, ela contribui diretamente para que jovens e equipe compreendam e vivenciem a proposta de transdisciplinaridade, facilitando o entendimento da importância de se desenvolver habilidades múltiplas e não restringir o percurso formativo a uma só área de conhecimento. Além disso, em termos logísticos, os grupos ajudam a resolver diversas demandas práticas e estruturais da escola que teriam que estar sendo resolvidas por educadores ou outros membros da equipe apenas em horários extra-classe (organizar um almoxarifado, catalogar equipamentos, organizar a biblioteca, desenvolver um sistema de informação, divulgar notícias e pensar a comunicação da escola, organizar atividades artísticas como sarau e cineclube, investigar problemas, avaliar e melhorar fluxos dos processos formativos como é feito no grupo de pesquisa etc). A diferença é que, ao invés de fazerem isso sozinhos, a equipe irá realizar estas tarefas junto com os jovens, transformando-as em processos formativos, e unindo o útil ao agradável – ou seja, ao mesmo tempo resolvendo demandas concretas e diárias da escola e formando os jovens, tanto em competências profissionais quanto políticas importantes. Estes processos podem ser, à primeira vista, mais lentos ou menos imediatos quando trazidos para os Grupos de Gestão, ao invés de serem conduzidos unicamente por profissionais especializados. Porém, a médio e longo prazo, tais processos se tornam mais eficazes. Isto porque, na medida em que a equipe e os jovens foram envolvidos e participaram direta ou indiretamente do desenvolvimento

17


dos mesmos, estão mais bem informados, conscientes e dominam melhor os fluxos de tais processos. A lida diária com seus resultados é portanto otimizada. Trata-se também de apostar em um ensino que é menos conteudístico (que abre mão de tempo de transmissão de conteúdos) para um ensino que promove emancipação e ensina o jovem a buscar seus aprendizados e interesses com mais autonomia¹. Todos estes exemplos mostram que inserir os grupos de gestão na grade é um ganho, em termos educativos, artísticos, políticos e logísticos. O envolvimento dos educadores para a prática Assim como os jovens, os educadores são sensibilizados para a importância da gestão coletiva à medida em que experimentam a prática diária e observam os resultados satisfatórios da proposta. Porém, em primeiro lugar, parece ser necessário que a equipe tenha como valor ou princípio pedagógico compartilhado a importância do trabalho coletivo, do cuidado com o que é público e comum, da importância de participar e se envolver em processos de discussão e de construção coletiva na qual todos tenham voz. Na medida em que os educadores considerarem estes aspectos (que são políticos) importantes, tão importantes quanto o ensino-aprendizagem dos conhecimentos técnicos e artísticos ligados às linguagens da escola, torna-se bem mais fácil envolvê-los para a prática. O envolvimento e a disposição da equipe para a Gestão Coletiva é também essencial para a democratização da gestão escolar como um todo. A equipe precisa estar disposta a realizar ações e tarefas que não são restritas ao seu escopo específico de atuação, a se envolver em processos coletivos de tomada de decisão, inclusive com a consciência de que as demandas, o volume de trabalho e a energia dispensada para esta multiplicidade de tarefas são maiores do que nos sistemas em que as responsabilidades são centralizadas e as áreas de atuação fragmentadas ou isoladas. 1

18

Neste sentido, a leitura de “O Mestre Ignorante”, do Rancière, é muito interessante

Para contribuir neste sentido, pode ser interessante prever momentos de formação da equipe, envolvendo leituras e proposições que discutam o tema da gestão coletiva e as questões políticas afins a ele (por exemplo, a importância da escola na construção da cidadania, da noção de sujeito político, da sensibilização para a participação e para o bem coletivo). Podem ser apresentados autores e pesquisas na área da educação que discutam como os sujeitos se tornam mais ou menos sensíveis à noção de bem coletivo de acordo com as experiências que vivenciam na infância e na juventude, sobretudo na escola, local importante no desenvolvimento da sociabilidade. Podem ser trazidos também trabalhos artísticos que façam interface entre arte e política (artivismo) para que se discuta como essa experiência da gestão coletiva influencia na visão de mundo dos jovens e tem relações e reverberações diretas em seu aprendizado em arte². Fazer com que os educadores compreendam todos os reflexos positivos da experiência seja para a logística da escola, seja por questões políticas e de formação humana, seja pela própria formação artística dos jovens - talvez seja a melhor forma de envolvê-los para a prática. Outra coisa importante da parte dos educadores é a abertura para sair da posição daquele que “sabe mais”, a abertura para se deslocar, para ver o jovem como sujeito que pode opinar e decidir assim como ele, a confiança na capacidade do jovem de atuar, decidir, conversar, planejar, resolver demandas. Isso, é claro, sabendo que o grupo é um processo formativo, por isso a presença do educador é importante. No entanto, as relações dentro dos grupos são ainda mais horizontais do que aquelas dentro de sala de aula. As decisões são tomadas pelo grupo inteiro, em conjunto, então o educador precisa estar aberto para ouvir os jovens, e para encarar os conflitos que essa abertura pode gerar. Ele precisa saber dividir responsabilidades e deixar os jovens “se virarem”, auxiliando, é claro, no que for necessário. Se o educador não acredita, por exemplo, que um jovem é capaz de ler ou montar uma planilha, que não é capaz de ir conversar com um profissional de fora da escola para resolver uma demanda, de tomar decisões sobre temas delicados etc, a proposta de Gestão Coletiva é seriamente comprometida. 2 Na Oi Kabum BH, por exemplo, muitos jovens desenvolvem projetos artísticos ligados a questões políticas e sociais de interesse comum, questões de suas comunidades, grupos ou lugares em que vivem e convivem. Muitos deles também criam coletivos, associações e grupos de arte e cultura após a formação, o que sabemos estar intimamente relacionado com o foco que a escola dá para o que é coletivo.

19


Algumas estratégias utilizadas para definir o cardápio dos Grupos de Gestão Define-se os grupos a partir de uma análise que conjuga: 1) as áreas de funcionamento da escola que precisam ser geridas, como em qualquer órgão ou instituição (como Biblioteca, Equipamentos, Comunicação e, mais recentemente, o grupo de Sistema de Informação); 2) eixos de atuação ou princípios pedagógicos centrais para a escola (a importância de ouvir os jovens e criar espaços concretos e diretos de participação e voz para eles, daí a existência do Conselho Gestor como um dos principais grupos; a importância de disseminar as experiências do programa para a escola pública, daí a criação do grupo Em Diálogo, a importância de considerar saberes de diversas naturezas, inclusive aqueles trazidos pelos jovens, e não apenas os saberes legitimados no sistema tradicional de ensino ou no cânone das áreas de conhecimento presentes na escola, daí a criação do grupo Escambo de Saberes; e também a importância da pesquisa e da relação com o saber, da sistematização e avaliação periódica dos processos e práticas para seu contínuo aprimoramento, daí a criação do grupo de Pesquisa); 3) vivências e práticas artísticas que não podem ser diretamente trabalhadas ou experimentadas em disciplinas ou em sala de aula (daí a criação inicial do Cineclube e também dos grupos de Montagem de Exposições e Audioclube); 4) questões políticas, sociais ou apostas da escola em temas relevantes que estão ligados a fluxos concretos e práticos que podem ser pensados e modificados (daí a criação dos grupos de Práticas Sustentáveis e de Saúde); Um dos aspectos mais interessantes dos Grupos é justamente que eles funcionam como um espaço flexível que permite à escola inserir na grade temas, questões e focos de atuação - sejam novos, de acordo com as demandas que surgem, sejam aqueles que não têm espaço para serem trabalhados dentro das disciplinas. Estas demandas geralmente são levantadas pela equipe, a partir da percepção e da escuta dos jovens e dos processos desenvolvidos junto com eles.

A realização de avaliações (questionários, grupos focais, assembleias, conversas na orientação etc) ajudam muito a escola a identificar a necessidade de trabalhar um certo tema, eixo ou prática, e assim definir o cardápio dos GG. Vale porém destacar que esse cardápio não muda com tanta frequência - a criação ou exclusão de um grupo deve ser bem pensada e justificada. A comunicação da prática dos Grupos de Gestão aos jovens Um esforço conjunto é fazer com que os jovens entrem na escola já sabendo da proposta de Gestão Coletiva, de preferência já tendo experimentado um pouco da vivência dos grupos, o que será possível agora com o processo seletivo estendido³. Já nas seleções anteriores, havia uma atividade de trabalho em grupo que dava subsídios para a conversa no momento da entrevista, na qual os educadores reforçavam que a Oi Kabum! BH tem um grande foco no trabalho e na atuação coletiva, colocando para o jovem a reflexão sobre seu desejo, interesse e abertura para trabalhar coletivamente. Ainda assim, em conversas e avaliações, muitos jovens da última turma afirmaram que, quando se inscreveram e foram selecionados para a Oi Kabum, não tinham ideia disso que viria a ser a experiência com a Gestão Coletiva. Nossa aposta agora é que, além de ser informado disso na seleção, o jovem vivencie um pouco da lógica dos grupos ao longo do processo (e de outros princípios fundamentais para a escola também, de forma que ele conheça bem a Oi Kabum! BH antes de entrar). Acreditamos também que isso irá facilitar o envolvimento posterior deles com a Gestão Coletiva, pois é um vínculo que começa a se construir e que fica claro antes mesmo de sua entrada. Passado este período inicial, de sensibilização, entramos numa etapa mais complexa e mais longa, que é de compreensão e envolvimento mais profundos com a proposta. Um dos aspectos principais dos Grupos de Gestão é serem um processo formativo de natureza essencialmente prática. Não há uma transmissão teórica e direta de conteúdos relativos à gestão coletiva. 3 No Programa Oi Kabum! o processo seletivo é dividido em etapas e contem oficinas que totalizam aproximadamente 30 horas durante as quais os educadores conhecem melhor os candidatos ao curso, e estes conhecem melhor a escola e seu projeto político-pedagógico.

20

21


Não existem documentos que estabeleçam regras claras de conduta, modelos ideais de ação ou detalhamentos de como o sistema deve funcionar. Não são especificados procedimentos a serem adotados nos processos decisórios ou na divisão de responsabilidades. Embora não exista nenhum manual ou explicações teóricas sobre o conceito de Gestão Coletiva, muito rapidamente os educandos demonstram apreender e compartilhar os pressupostos básicos da proposta, e isso ocorre justamente porque não se trata de um aprendizado teórico, mas de vivências experimentadas diretamente por eles ao desempenhar tarefas diárias, concretas e necessárias. Ao invés de discorrer sobre como o sistema deve funcionar, os educadores fazem com que os jovens partam para a ação e, ao longo dela, provocam-nos para agir tomando os princípios como base. Se os jovens fossem convidados a fazer constantes exercícios que simulassem tarefas, discussões e tomadas de decisão fictícias ou que não se conectam diretamente com sua experiência, acreditamos ser pouco provável que estes aprendizados fossem construídos com consistência suficiente para serem incorporados por eles em suas vidas. Mas na medida em que experimentam de fato a participação em processos deliberativos democráticos e a lida com demandas concretas, notamos que estas habilidades se desenvolvem com rapidez e eficácia.

dos educadores informações sobre os equipamentos: para que servem, como funcionam, como são utilizados, como devem ser armazenados, quanto custam, onde e como são comprados etc. O jovem que quer trabalhar com fotografia descobre a importância de conhecer diferentes tipos de câmeras e lentes, aprender a manuseá-las, ter noções acerca dos cuidados de armazenamento necessários. Observamos que os participantes deste grupo passam a compreender, por exemplo, que aprender a fotografar e trabalhar na área envolve diversas habilidades e conhecimentos técnicos, que não estão descolados dos aspectos estéticos e éticos da arte de fotografar. A lida com os equipamentos deixa de ser uma tarefa “chata” e torna-se atraente, na medida em que o jovem compreende sua importância e passa a dar sentido a ela, pelos reflexos que ela traz para ele próprio e para sua formação, para além da contribuição para o coletivo.

A experiência de participação que parte do desejo favorece a associação de tarefas coletivas ou atividades voltadas para o bem comum com o sentimento de prazer e satisfação pessoal. Os jovens relatam que as tarefas desempenhadas nos grupos de gestão, inicialmente, por vezes, sem muito entusiasmo, vão aos poucos ganhando sentido, na medida em que os aprendizados obtidos neste espaço formativo se tornam visíveis e concretos. Eles também manifestam prazer e a satisfação pessoal que, progressivamente, começam a sentir por estarem, simultaneamente, aprendendo, acessando conhecimentos que os interessam e desempenhando ações voltadas para o bem comum. Um grupo que exemplifica isso é o de equipamentos. Suas tarefas inicialmente parecem pouco atraentes, já que estão ligadas à organização e controle de materiais. Porém, à medida que manuseiam câmeras, cabos e microfones, para limpá-los, organizá-los ou cadastrá-los, os jovens vão recebendo 22

Grupo de Equipamentos fazendo a coleta dos equipamentos que necessitam manutenção.

23


III.

Estrutura e dinâmica de funcionamento

A alocação dos jovens nos grupos de gestão A participação nos Grupos de Gestão se dá prioritariamente a partir da escolha dos próprios jovens. Ao início de cada semestre, é feita uma assembleia na qual os educadores e jovens (apenas os educadores, caso seja o início de uma nova turma) apresentam o grupo – qual é a proposta e o objetivo dele, quais as ações realizadas anteriormente (se for o caso) e quais as ações e o foco previsto para aquele semestre. Após a apresentação, os jovens preenchem uma ficha na qual marcam sua primeira e segunda opção de grupo. Caso haja mais demandas do que vagas em certo grupo, alguns jovens são encaminhados à sua segunda opção ou, em último caso, a um grupo pelo qual não optaram, de acordo com critérios de envolvimento e participação, como número de faltas e atrasos, comprometimento com as atividades da escola e avaliação individual feita pelo orientador. A participação nos grupos também é norteada pela regra de que, a cada semestre, o jovem deve participar de um Grupo de Gestão diferente. Tal regra não é fixa e incontestável. Pode ser permitido ao jovem permanecer no mesmo grupo de acordo com variáveis como a justificativa apresentada para a permanência, a relação entre procura e oferta de vagas e a natureza do grupo (que pode demandar a continuidade da condução de certas ações pelos sujeitos que as iniciaram). Em geral, a experiência da Oi Kabum! BH aposta na flexibilidade de toda regra e na revisão constante de suas práticas e procedimentos. Esta é uma das bases da Gestão Coletiva: todo acordo e toda regra estão constantemente abertos à justificação, à contestação, à argumentação e à revisão. No entanto, o procedimento de rodízio por grupos aposta na constante descoberta de novos interesses e possibilidades de atuação que até então o jovem não vislumbrava. Como discutimos, é importante que a participação parta do desejo, motivação ou interesse pessoal. Mas estes são sentimentos continuamente construídos e modificados pelas experiências vividas pelos

24

sujeitos. As preferências e interesses dos jovens não são sentimentos estanques, mas construídos a partir de um conjunto de influências de caráter social, cultural, político e interpessoal. Os desejos e aspirações de um indivíduo podem se modificar ao longo do tempo, diante de novos aprendizados e vivências. Por isso é relevante notar que o desejo e o interesse também são construídos. Da mesma forma que os jovens desenvolvem, ao longo do processo de atuação nos grupos, sensibilidade para a importância das atividades coletivas (o que é favorecido pela possibilidade de escolherem atividades pelas quais se interessam), eles também desenvolvem novos interesses e desejos ao tomar contato com novas experiências que, a princípio, tenderiam a rejeitar. Por isso existe essa regra. A fala de um jovem em um grupo focal explicita com clareza esta construção do desejo: “O meu primeiro grupo foi o de equipamentos, entrei porque é um gosto pessoal meu. Gostei bastante e queria continuar, mas caí nessa questão da regra. Então mudei pro Escambo contrariado, aí acabou que gostei demais. Queria continuar nele, pretendia dar aula de outras coisas e assistir também, pois tive uma experiência muito boa. Mas estava com problema para a escolha do representante pro Conselho Gestor na minha sala, precisava de dois candidatos e não tinha, então eu me dispus, pra não ficar chato. Acabou que eu me surpreendi. Eu não suportava a ideia de participar do [Conselho] Gestor, chegando lá eu vi que não era aquela coisa, essa imagem de ser pesado, que você tem que discutir o futuro da escola... Não é bem assim, tudo é discutido, é um grupo totalmente aberto. Gostei muito”. (Grupo Focal sobre Gestão Coletiva, 1º semestre/ 2012) Assim, tanto devido à dificuldade de alocar todos os jovens nos grupos de sua escolha, quanto devido à regra de mudar de grupo a cada semestre, é importante discutir com os jovens a flexibilidade e a abertura para novas experiências.

25


A organização dos componentes de cada Grupo de Gestão Os grupos contam com a presença de oito a doze jovens e um ou dois educadores, coordenadores ou membros da equipe técnica, que exercem ali a função de orientadores, isto é, não centralizam funções nem responsabilizemse individualmente pelas tarefas do grupo, visto que o objetivo é promover o desenvolvimento, pelos jovens, da autonomia e capacidade de auto-gestão por meio da divisão de responsabilidades4. A dinâmica típica de um encontro A dinâmica varia bastante de grupo para grupo, pois há grupos com ações de natureza muito diferente. Os conteúdos de cada encontro por grupo podem ser acessados por meio das planilhas de chamada, nas quais os educadores descrevem as atividades realizadas em cada dia de cada processo formativo. Num esforço de descrever uma dinâmica geral, pode-se dizer que os membros do grupo se reúnem, discutem seu foco de atuação, planejam o que é preciso realizar, dividem tarefas, partem para a ação, avaliam o que foi realizado, planejam os passos seguintes de acordo com isso e assim por diante, avaliando ao final o que foi realizado ou não, o sucesso e eficácia das ações. O cardápio dos Grupos de Gestão e suas atribuições Os Grupos de Gestão não possuem eixos temáticos fixos (com exceção do Conselho Gestor, explicado adiante), podendo ser reconfigurados de tempos em tempos. Alguns exemples de grupos são: Conselho Gestor, Comunicação, Biblioteca, Equipamentos, Práticas Sustentáveis, Escambo de Saberes, Em Diálogo, Montagem de Exposições, Pesquisa, Cineclube, Audioclube, Sistema de informação e Saúde. Cada um destes grupos se ocupa da gestão de uma área específica. Alguns grupos possuem nomes auto-explicativos (como Comunicação, Biblioteca, Equipamentos e Sistema de Informação). O grupo intitulado 4

26

Escambo de Saberes promove a troca de conhecimentos entre membros da comunidade escolar, organizando micro-aulas e oficinas de conteúdos diversos. Tanto jovens quanto educadores e demais funcionários podem, no grupo de Escambo, ensinar conteúdos dos quais têm conhecimento ou habilidade, não importando em qual área: dança, artesanato, culinária, música, tecnologia etc. O grupo Em Diálogo promove a relação entre a Oi Kabum! BH e as escolas dos jovens, organizando apresentações e visitas a escolas públicas e outras instituições de ensino. O grupo do Cineclube organiza exibições semanais de filmes, se ocupando também da manutenção do auditório onde elas ocorrem e dos equipamentos de áudio e vídeo nelas utilizados. O grupo de Pesquisa desenvolve mini-pesquisas conduzidas pelos jovens sobre temas de interesse da escola, como frequência, evasão, relação da família com a Oi Kabum!, satisfação com os métodos de ensino adotados, entre outros. O grupo de Montagem de Exposições cuida da organização e armazenamento do acervo de trabalhos artísticos, organizando mini-mostras e exposições itinerantes dentro e fora da escola. O grupo de Práticas Sustentáveis conduz reflexões e práticas ecológicas de sustentabilidade, como coleta seletiva, reciclagem, conscientização e redução do desperdício. O Grupo de Saúde discute temas e propõe ações ligadas à saúde, compreendida de forma ampliada e integral (corpo e mente), dentro e fora da Oi Kabum! BH (destacando-se a parceria com o Hospital das Clínicas de BH, que envolve a presença de uma funcionária do Hospital nos encontros do grupo e intervenções artísticas realizadas no local). O Audioclube envolve ações e discussões de natureza diversas, relacionadas à música e ao som em geral (estudo e ampliação de repertório musical, pesquisas sobre o uso de fones de ouvido, sobre frequências sonoras, shows e intervenções na escola, registro sonoro de outros eventos e atividades etc). Perpassando as ações de todos estes grupos, e com um papel central na proposta de Gestão Coletiva, está o Conselho Gestor, uma instância de representatividade dos jovens em diálogo com a coordenação. Diferentemente dos demais grupos, o mecanismo para a participação nele é eleitoral. Os interessados se candidatam e os jovens votam nos colegas que irão representálos nesta instância. São eleitos dois representantes de cada turma, em um total de 10 a 12 jovens, cuja função é levar demandas, problemas, temáticas e

Os encontros são semanais, com uma carga horária de 1h50, no total de 112h ao longo do curso.

27


sugestões para a pauta de discussão do Conselho. Eles têm também a função de informar e dialogar sobre as discussões realizadas, dando retorno aos colegas sobre o que foi deliberado, proposto ou que está em debate. Um representante do Conselho Gestor não é apenas um representante de sua turma, mas sim do conjunto dos jovens da escola. A natureza destas demandas é diversa: por exemplo, uma questão levantada por um vegetariano ou por um grupo de pessoas ligadas ao vegetarianismo sobre a alimentação oferecida no refeitório pode ser levada para a discussão no Conselho por qualquer representante. Segundo o projeto pedagógico da escola, os principais objetivos do Conselho Gestor são “promover a tomada de decisões compartilhadas sobre questões que dizem respeito ao funcionamento da escola”, “possibilitar o planejamento conjunto de ações e estratégias para o uso dos recursos disponíveis” e “acompanhar as atividades dos outros grupos, núcleos e espaços da escola”. O projeto pedagógico explica também como se dá a progressão, no tempo, da natureza das questões tratadas no Conselho: No início, são discutidas questões mais simples e focadas, que permitem decisões rápidas e a apropriação de valores como cooperação e autonomia. Temas como segurança, alimentação e regras de utilização de equipamentos mostramse interessantes nesse momento inicial pela imediaticidade com que suas consequências podem ser percebidas na prática. Paulatinamente, as ações do Conselho se voltam para questões mais complexas, envolvendo a gestão mais ampla da escola e dos recursos disponíveis. (Projeto Pedagógico, Parte 2: A Estrutura da Escola/ Grupos de Gestão/ Conselho Gestor, pg. 68)

28

IV.

Registro e avaliação

Há diversas formas de registro e sistematização. Na planilha de chamada, os educadores devem postar as atividades realizadas ou conteúdos trabalhados em cada encontro, para todos os processos formativos, e os grupos funcionam no mesmo sistema. Portanto, há para todos os grupos um registro do que foi feito em cada encontro ao longo do semestre. Ao final de cada semestre, os educadores fazem uma avaliação de todos os processos formativos via formulário, o qual contém também o cronograma da disciplina, além de uma avaliação crítica dos educadores. (As três questões abertas respondidas pelos educadores no formulário são as seguintes: 1. “Mencione, sucintamente, a sequência de atividades realizadas no período avaliado.” / 2. “Escolha uma atividade ou um aspecto do processo formativo e faça uma avaliação mais aprofundada, do ponto de vista que julgar mais importante ou interessante.” / 3. “Indique possíveis conexões entre proposições desenvolvidas no período avaliado com tópicos ou proposições trabalhadas em outras disciplinas.”) Ao fim do processo, geralmente nos últimos encontros, os educadores têm o hábito de realizar avaliações das disciplinas com os jovens, para levantar, a partir do ponto de vista deles, os sucessos e falhas das ações e atividades propostas. Estas avaliações podem ser feitas oralmente (e acabam refletindo no relato feito pelos educadores nos relatórios) ou podem ser mais formalizadas, feitas por escrito ou via formulário, dependendo do tipo de processo formativo. Com os grupos, tais avaliações costumam ser mais orais, pelo próprio caráter dinâmico da prática. Alguns grupos realizam ainda outras formas de registro e monitoramento mais periódico, de acordo com suas necessidades e sua natureza. O Conselho Gestor, por exemplo, produz atas para cada uma das reuniões. O Grupo de Comunicação fez registros de suas atividades nas redes sociais. Além disso, quando um grupo realiza atividades mais amplas e de maior visibilidade (como sarau do grupo de Biblioteca, exibições do Cineclube, shows do Audioclube etc), ou atividades externas (como visitas do grupo Em Diálogo às escolas

29


públicas ou do grupo de Saúde ao Hospital das Clínicas) são produzidos registros fotográficos e audiovisuais5. Os Grupos de Trabalho registram suas atividades em atas produzidas a cada encontro e armazenadas nas pastas coletivas da equipe no Google Docs. Nas assembleias, realizadas ao início e ao final do semestre, faz-se uma breve avaliação coletiva do que foi realizado, no momento de repasse e/ ou apresentação dos grupos, apontando-se o que foi realizado com sucesso, o que não foi concretizado e o que foi avaliado como devendo ser mantido ou mudado dentro do grupo. Este é mais um momento de avaliação e uma forma de compartilhar a avaliação interna feita dentro dos grupos com toda a escola.

e experiências mais significativos, os principais problemas ou dificuldades, os planos e expectativas após a formação etc). O formulário, porém, tem campos abertos (“Faça aqui críticas, elogios e sugestões para a formação da Kabum”) nos quais os jovens podem falar do que quiserem. Neste campo, bem como no campo relativo aos principais aprendizados, muitos jovens citam os Grupos de Gestão.

Ao final de cada semestre, na semana da avaliação, ocorrem os Grupos Focais, sendo um deles sobre a Gestão Coletiva. Neste momento, há um debate mais estendido e aprofundado sobre o que foi realizado pelos grupos, e maior liberdade de fala, crítica e sugestão da parte dos jovens. A participação nos grupos focais é livre, portanto nem sempre há representantes de todos os grupos. Ainda assim, a pesquisadora pede aos jovens a opinião deles sobre o que os demais grupos propuseram e realizaram, e eles trazem visões pessoais a partir de sua experiência e também visões dos colegas a partir do que conversam e escutam. Além dos grupos focais, na semana da avaliação, os jovens preenchem formulários de avaliação (e auto-avaliação) no qual avaliam diversos processos formativos, sendo um deles os Grupos de Gestão (o formulário traz o seguinte campo aberto: “como você avalia sua participação nos Grupos de Gestão?”). O conteúdo destes formulários pode mudar ao longo da formação, dependendo do momento. No último semestre (2014/1), por exemplo, por ser o semestre de conclusão do curso, o formulário de avaliação não incluiu uma pergunta diretamente relativa aos grupos, pois o instrumento focou em questões mais significativas para o momento de conclusão do curso (como os aprendizados 5 Todos estes registros e sistematizações estão em rede e são compilados e enviados para o Instituto Oi Futuro e para o Plug Minas por meio dos relatórios periódicos produzidos pela escola para os parceiros. Sendo assim, tais relatórios também são uma fonte de consulta dos mesmos.

30

31


Algumas referências sobre gestão compartilhada DIAZ BORDENAVE, Juan E. O que é participação. 8ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. (Coleção Primeiros Passos; 95). É um livro curto e objetivo, com linguagem simples, fácil de ler e muito elucidativo sobre os sentidos e dilemas da participação. Ótima leitura para educadores e jovens. RANCIÈRE, Jacques. O mestre ignorante – cinco lições sobre a emancipação intelectual. Trad.: Lílian do Valle. 3. ed. - Belo Horizonte: Autêntica, 2010. Neste link o livro está disponível on line: https://docs.google.com/file/ d/0B6eHj5egjfFvTDJBVmMzT2laZ1E/edit?pli=1 Narra a história de um professor que mudou de país e foi lecionar sem conhecer nada da língua local. Com uma atividade simples, de tradução, percebeu que os alunos podiam aprender sozinhos coisas que ele não podia ensinar, então começou a questionar o método explicativo da educação. A partir daí, começou a defender a tese de que era possível se ensinar o que não se sabe (daí o mestre ignorante), pois o ensino não é transmitir conhecimento, mas ensinar os alunos a buscar o conhecimento por conta própria. Tem muito a ver com a lógica da gestão coletiva – de desempenhar funções diversas, sair da especialização, acreditar no seu potencial e educar para a emancipação, e não para a dependência.

relata a experiência com o Conselho de Jovens da Rede Jovem de Cidadania, que foi uma das grandes inspirações para o Conselho Gestor da Oi Kabum! BH. SINGER, Helena. República de crianças: sobre experiências escolares de resistência. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2010. SANTOS, Boaventura. Renovar a teoria crítica e reinventar a emancipação social. São Paulo: Boitempo Editorial, 2007. Livro onde ele apresenta a proposta de Ecologia de Saberes, muito importante para a Gestão Coletiva.

Outras referências importantes: Projeto pedagógico da Escola da Ponte Protótipo da Unesco Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

BONDÍA, Jorge Larrosa. Notas sobre a experiência e o saber da experiência. (2001). Trad.: João Wanderley Geraldi . Universidade Estadual de Campinas, Departamento de Lingüística , 2002, nº 19. Texto curto e muito interessante! Leitura fácil para os educadores de outras escolas. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. Organizado em itens, é de leitura muito fácil e discute questões importantes para gestão coletiva como autonomia, emancipação, participação e autoridade. Fácil de achar na internet. LIMA, Rafaela Pereira (Org.). Mídias comunitárias, juventude e cidadania. Belo Horizonte: Autêntica/ Associação Imagem Comunitária, 2006. O capítulo VII

32

33


Este livro foi impresso na gráfica da Oi Kabum! BH Escola de Arte e Tecnologia. Belo Horizonte, 2014 A Oi Kabum! é um programa do Oi Futuro, instituto de responsabilidade social da Oi, executado, em Belo Horizonte, pela Associação Imagem Comunitária. É também um dos núcleos Plug Minas - Centro de Formação e Experimentação Digital do Governo de Minas.



Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.