arginália
M ANO 02 NÚMERO 01
IGREJAS INCLUSIVAS
A teologia inclusiva e o evangelho direcionado às pessoas LGBTTTI
L UCIFERANISMO Tudo o que você queria saber
mas morre de medo de perguntar
S ALVE O XUM
DAS ÁGUAS DE TODO SOM Centro espiritualista faz festa em tons de ouro pra Oxum
marginais MARTINS, Aline. 1991. REPORTAGEM Estudante de jornalismo, da comunicação, do impresso, do rádio e da televisão. Tem por convicção a felicidade. Possui fé, não muitas crenças, mas acredita em Deus.
SOUZA, Camila. 1982. REPORTAGEM & DIAGRAMAÇÃO Historiadora por formação, filha por profissão, jornalista pro convicção, fofoqueira por vocação. Não acredito em deus, buda, alá ou kardec, desconfio da física, não entendo a filosofia e duvido da semiótica. Eu tenho fé na força do silêncio.
MARCONI, Dieison. 1992. REPORTAGEM Acadêmico de Jornalismo da UFSM e pesquisador de iniciação cientifica em cinema, documentário e identidade das minorias sexuais. Para alguns, um militante LGBT só porque tenta fazer o obvio. E até lamento não me considerar um, pois dentro de mim há mais anseios de luta por amor às causas (nem tão) perdidas do que práticas concretas. E como canta Caetano ao ouvir uma canção de Madonna, diferentemente de Osama e Condoleezza, eu não acredito em Deus.
DALENOGARE, Marília. 1993. REPORTAGEM Uma estudante de jornalismo que sonha em conseguir um emprego bom em um veículo alternativo, mas que provavelmente cairá em algum jornal preconceituoso e com tendências políticas bem definidas. Quanto aos gostos pessoais, é louca por audiovisual e literatura, gosta mais ainda quando os dois se cruzam e se transformam em uma terceira coisa. Em relação a religião, crê em algo, em uma força superior, mas ainda não descobriu em que. Por influência da criação, da família e da beleza que acompanha as catedrais, se considera católica, mas não praticante. Mesmo assim, foi batizada, fez eucaristia, crisma e sonha em casar na igreja. ROHDE, Josafá 1992. REPORTAGEM Apaixonado por comunicação, balada, Saramago, filmes e uma pitada de diversão no dia a dia. Impaciente e ansioso está sempre pronto para novos desafios. Cheio de fé, mas com poucas crenças. Acredita nas energias do universo, em horóscopo (só um pouco), cartas e outras 'forças' mais. Contraditório ou não, é agnóstico, e hoje em dia já desistiu de provar qualquer coisa sobre religião. Respeita todos os credos e quer conhecer mais de perto um punhado de religiões e crenças.
Editorial MARGINÁLIA (latim marginalia, plural neutro de marginalis, -e, marginal) | s. f. 1. Conjunto de anotações nas margens de um livro ou de outro documento. 2. [Brasil, Informal] Conjunto de marginais.
S
egundo o censo de 2010 a população gaúcha já ultrapassava os 11 milhões de habitantes, sendo que destes, mais de sete milhões se declararam católicos. Quando comparamos esse número com o segundo maior índice de fiéis decla-
rados é que percebemos sua real proporção: após o catolicismo, as religiões com maior número de adeptos são as vertentes evangélicas com quase dois milhões de adeptos. Além de representarem mais da metade da população só no estado do Rio Grande do Sul, o numero católicos é quase quatro vezes maior que evangélicos e quando comparado às outras religiões listadas no censo o contraste é maior ainda, depois dos evangélicos e pentecostais (quase um milhão de adeptos), nenhuma outra religião chega perto da casa do milhão de fiéis. Mesmo com a célere expansão das religiões evangélicas no país, o catolicismo ainda é a maior fé declara no Brasil. Mesmo vivendo num estado democrático laico, a religião oficial do país é o catolicismo. Paradoxos a parte, o predomínio da Igreja Católica se estende a todas as esferas de poder. Travando ferrenhas batalhas com a bancada evangélica, até perdendo algumas, a Igreja Católica, ainda que cambaleando, se mantém no centro das atenções. Para isso ela conta com uma forte aliada: a grande mídia. Os principais meios de comunicação brasileiros ainda são grandes devotos do Santo Papa. Aliás, a visita de Sua Santidade às terras tupiniquins rendeu muitas pautas para a grande mídia, podendo ser comparada a Copa do Mundo – o suprassumo dos eventos de massa. A despeito da factualidade da vinda de Francisco I, a Igreja tem seu lugar garantido no céu da mídia. E tem como principal aliada simplesmente a maior emissora de televisão do país (plim, plim). Se em âmbito nacional e regional a Igreja Católica têm garantido seu status de “A” religião, o que sobra para a pequena Princesa do Médio e Alto Uruguai com seus quase 30 mil habitantes vivendo sob a tutela do Monsenhor? Em Frederico Westphalen, nosso local de fala, a presença da Igreja é lembrada de 15 em 15 minutos pelos sinos da Catedral. As mídias, o capital e a política ainda estão intimamente associados à colonização catequista do interior do Estado. Nesse cenário que se materializa a segunda edição da Revista Marginália. Continuamos tentando trazer ao centro o marginalizado, o que está fora, nas beiradas, escamoteado, escondido pela grande mídia e renegado pelo status quo. E como bons marginais, gostamos de colocar o dedo na ferida, queremos falar daquilo que todos calam. Depois do sexo, por que não religião? Ou melhor, religiões? Ou ainda não-religião? Se religião não se discute, pois é disso que vamos falar! Não estamos aqui para julgar a fé católica, nem seus fiéis. Não cabe a nós dizer que religião é melhor ou pior. Buscamos apenas dar voz a todas as outras religiões que, por inúmeros motivos, não comungam com a grande mídia como a Igreja. Imbuídos pelo espírito marginal, procuramos todo tipo de devoto, culto, rito, mito, fé e religião que não se sente representado midiaticamente e lhes pedimos para falar. Sem discriminação ou preconceito. Por motivos óbvios esta edição não contempla as principais religiões do mundo, nem mesmo todas as religiões reconhecidas pelo Censo brasileiro. Mas olhando por cima os dados do Censo de 2010 podemos dizer que uma boa parte da população não-católica está representada nesta Marginália. Evangélicos, adventistas, testemunhas de Jeová, espíritas, mórmons, umbandistas, wiccas,sincretistas, luciferanistas, indígenas e ateus abençoam as páginas da revista com suas experiências religiosas. Amém! Axé! Namastê! Saravá! Aloha! Shalom! Hare Krishna!
M A R G IN Á L IA 0 1
S UMÁRIO
WICCA
03 IGREJA
E VA N G É L I C A
06 IGREJAS I N C L U S I VA S
08
LUCIFERANISMO
12
A MEDIUNIDADE
PA L AV R A D A
M E N I N A M O R TA
15
30
S A LV E OXUM
17 O
25
FÉ
32
PODER DE VER O
F U TU R O
OS
DESANA
ANDARILHOS DA
27
MAÇONARIA
41
A QU E L E
QU E E M
NADA CRÊ
44
M A R G IN Á L IA 0 2
W ICCA: RELIGIÃO, FÉ E LIBERDADE
TE X TO
DIEISON MARCONI
Foto Arquivo Pessoal
S
emplo, que na Wicca não há maniqueísmo do
do saxão witch ou do inglês arcaico wicce.
bem ou do mal, como forças e práticas con-
Pode significar girar, moldar ou dobrar. Es-
trárias, um demônio em oposição a um deus.
tudiosos afirmam também que esta palavra
E tão pouco é uma pratica sobrenatural,
vem da raiz germânica wit que significa sa-
mesmo que suas práticas e ideias também
ber. Há os que dizem que sua origem vem da
estejam baseadas na crença de que alguns
raiz indo-européia wikk, significando "ma-
objetos e operações sejam capazes de causar
gia", “bruxaria”, "feitiçaria". Esta etimologia
o efeito desejado sobre os seres e fenôme-
móvel da palavra Wicca pode explicar muita
nos naturais.
coisa, principalmente no que tange ao escla-
Mas a melhor forma de compreender o que
recimento do que é a Religião Wicca, suas
é a Wicca é acompanhar e conhecer as opi-
práticas e rituais.
niões, as ideias, a filosofia e a pratica ritua-
Wicca é uma religião neopagã, mítica, poli-
lística de seus sacerdotes e sacerdotisas.
teísta, iniciática e de culto dualista. Reco-
Assim, para também esclarecer dúvidas e
nhecida
pelo
contribuir para desmantelar preconceitos,
governo federal brasileiro, faz parte dos
a Marginália traz uma entrevista com Diogo
espaços de dialogo inter-religioso. Mas ape-
Ribeiro, Wiccano e vice-presidente da União
sar de reconhecida, é comum o fato de mui-
Wicca do Brasil. A religião Wicca é extrema-
tos a reduzirem a uma mera filosofia de
mente diversificada em suas tradições e Di-
vida. Por desconhecimento, se insiste na vi-
ogo pertence à tradição Heládica, que é uma
são simplista de que nela não há dogmas
vertente conservadora, não eclética, cujo
universais, hierarquias, valores, crenças e
panteão de culto é exclusivamente o dos
iniciações, apesar da diversidade de tradi-
deuses gregos. No dia a dia a prática religi-
ções e panteões de culto. Há também os que
osa de Diogo é solitária, exceto durante os
sabem que a Wicca é uma religião, mas insis-
festivais e demais celebrações religiosas,
tem em agir como se ela não o fosse. Isto
quando a prática é feita em grupo, junto
pode ser explicado pelo fato de que na Wicca
com seus irmãos de coven. Na prática soli-
há uma interessante busca por uma convi-
tária, Diogo faz suas orações diárias, man-
vência harmônica e sustentável com a natu-
tém seu altar limpo, troca periodicamente
reza, por uma convivência pacífica em
as oferendas que nele deposita. Reserva pe-
sociedade, pautada na liberdade e no res-
lo menos alguns minutos diariamente para
peito à diversidade e a busca pelo aprimo-
contemplar a natureza e se conectar com
ramento
do
ela, mesmo que seja apenas enquanto cuida
autoconhecimento. E por fim há aqueles
do seu jardim, ou olhando a lua e as estrelas
que acostumados a radicalidade das reli-
pela janela.
giões monoteístas, não concebem, por ex-
Confira a entrevista!
mundialmente,
pessoal
inclusive
através
M A R G IN Á L IA 0 3
egundo dicionários, a palavra Wicca vem
MARGINÁLIA: COMO SURGIU SEU INTERESSE PELA WICCA?
Aceitei a oferta, e a partir de então, ele co-
D i o go : Minha espiritualidade despertou em 1990, aos nove anos de idade. Nessa época
Em 2004, após um ano de avaliação, ele me
eu colecionava pedras, quando me deparei com um livro sobre as propriedades curativas dos cristais. A partir de então, comecei a me interessar pelo amplo universo esotérico, em especial cromoterapia, mantras, meditação e elementais. Com o passar dos anos fui me tornando mais seletivo, e meu interesse se voltou para o estudo das mitologias e da magia prática. Finalmente, em 1997, aos 16 anos, tive meu primeiro contato com a Wicca, através de sites da internet e salas de bate papo. De imediato senti uma grande identificação com esta religião e tive a certeza de que tinha encontrado meu caminho. Hoje, aos 32 anos, tenho orgulho de dizer que já sou wiccano há metade da minha vida.
meçou a me avaliar e a transmitir seus conhecimentos teóricos de maneira informal. considerou pronto para o próximo passo rumo ao sacerdócio, e me convidou formalmente a fazer parte de seu coven. Aceitei o convite e passei pelo ritual de dedicação, onde perante aos deuses, proferi meus votos de sigilo e me comprometi com o processo iniciático. Durante um ano, vivenciei na prática todas as celebrações do calendário religioso, ininterruptamente, e me foram transmitidos alguns dos mistérios da Tradição.Após esse período, fui iniciado em 2005, tornando-me oficialmente um sacerdote de primeiro grau. Depois, em 2007, foi iniciado no segundo grau; E finalmente, em 2009, alcancei o terceiro grau, tornandome um sumo sacerdote apto a realizar todos os ritos de passagem da tradição, inclusive iniciar outras pessoas. Mas na Wicca
MARGINÁLIA: COMO VOCÊ FEZ PARA INGRESSAR NA RELIGIÃO? GERALMENTE
também há um ritual homólogo a um batismo que é chamado de “wiccaning”. Nele, os pais apresentam a criança a seu círculo so-
HÁ UM SACERDOTE QUE FAZ A INICIAÇÃO
cial e pedem para seus deuses que a aben-
DE OUTRAS PESSOAS, COMO SE FOSSE
çoem e protejam; E diferentemente do
UMA ESPÉCIE DE CRISMA.
COMO
FOI
SUA INICIAÇÃO NA WICCA? D i o go : Como a maioria das pessoas recémchegadas à Wicca, no início fiquei praticando minha fé de forma solitária. Em resumo, eu estudava muito, lendo diversos livros sobre Wicca e mitologia; E nos dias sagrados do calendário religioso, eu fazia uma pequena consideração para não deixar a data passar em branco: Em um altar no meu quarto, eu oferecia frutas e flores aos deuses, acendia velas e incensos, e fazia orações simples, porém de coração. Em 2001 conheci um sacerdote wiccano, com o qual mantive contato esporádico. Com o passar do tempo, ainda trilhando o caminho solitário, nossa amizade foi se solidificando, até que em 2003 ele me perguntou se eu gostaria de começar a estudar com ele.
batismo cristão, não há nenhum comprometimento da criança com a religião, uma vez que ela é menor de idade, e não tem consciência ou poder de escolha. Por isso, na Wicca, somente maiores de idade podem ser
iniciados.
MARGINÁLIA: E
D i o go : De fato, um wiccano deve dedicar muito de seu tempo ao aprendizado, que
COMO FUNCIONA ESTA
não se resume apenas ao conhecimento in-
HIERARQUIA DE SACERDOTES? D i o go : Na Tradição Heládica, os iniciados de primeiro grau são sacerdotes que só podem celebrar os Sabbaths e presidir o Wiccaning (Batismo). Os iniciados de segundo grau são sacerdotes que, além dos rituais acima, também podem celebrar o Handfasting (Casamento). Já os iniciados de terceiro grau são sumos sacerdotes, portanto, além de todos os ritos acima, também podem celebrar o Requiem (Funeral), e iniciar outras pessoas. As vestes ritualísticas na Tradição Heládica são um pouco diferentes das usadas nas demais tradições. Por nossa tradição ter uma origem grega, não costumamos usar uma túnica com capuz, ao estilo medieval. Ao invés disso, usamos uma roupa mais ao estilo grego, semelhante a um chiton branco básico por baixo, com um cordão amarrado à cintura, e sobre ela uma espécie de himation, este sim de acordo com as cores do grau hierárquico. Por eu ser um sacerdote de terceiro grau, a cor do meu himation é preta.
telectual, mas também à sabedoria que só a
MARGINÁLIA: PARA
SER UM WICCANO É
PRECISO MUITO TEMPO DE APRENDIZADO E IMERSÃO NOS ESTUDOS DA RELIGIÃO?
vivência diária do sacerdócio pode outorgar. Primeiramente, é essencial adquirir uma certa bagagem cultural, que vai muito além dos dogmas, crenças e práticas da Wicca, incluindo um amplo conhecimento de mitologia, história, filosofia, psicologia, arte e diversos sistemas mágicos. Além disso, um wiccano deve se empenhar em seu aprimoramento pessoal, buscando se autoconhecer, moldando seu caráter, tendo uma postura ética, sendo paciente, respeitando a todos, e cultivando a humildade. Por essas razões, o respeito aos nossos superiores hierárquicos e aos mais velhos é tão importante na Wicca, pois reconhecemos sua experiência e reverenciamos sua sabedoria.
MARGINÁLIA: TU
JÁ SOFRESTE ALGUMA
ESPÉCIE DE PRECONCEITO POR SER UM
Continua...
P ENTÁCULO : Objeto em forma de disco com um pentagrama entrelaçado circunscrito. Acredita-se que esse símbolo em forma de estrela tenha se originado na civilização Sumério-babilônica e se difundiu por várias culturas, tendo chegado à Grécia antiga, aos alquimistas europeus e a diversos sistemas mágicos. Atualmente ele é um dos maiores símbolos da bruxaria. O pentáculo é rico em significados: A estrela de cinco pontas parece um homem de pé e de braços abertos, e representa o Deus Cornífero, o Sol, o princípio masculino e o microcosmo; e cada ponta da estrela representa os cinco elementos (fogo, terra, água, ar e éter). Já o círculo que a envolve representa a Deusa, a Lua, o princípio feminino e o macrocosmo. A fusão da estrela e do círculo representa o Deus dentro do útero da Deusa, e conseqüentemente os eternos ciclos de nascimento, morte e renascimento da natureza. Na Wicca, o pentáculo é usado para diversas funções: abrir e fechar portais; evocar, concentrar e banir energias; consagrar objetos, abençoar pessoas e também como amuleto de proteção. O pentáculo representa o elemento terra, devendo ser posicionado ao norte ou no centro do altar.
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WICCANO? D i o go : Nunca fui vítima de intolerância direta, apenas de forma velada. O máximo que já experimentei foram algumas piadinhas discretas e sutis comentários debochados, daqueles que se percebe nas entrelinhas, nos olhares. A maioria deles partiu de cristãos, especialmente evangélicos. O preconceito religioso não vem apenas do fundamentalismo, mas também da ignorância de pessoas que não leva a sério a magia, pois não percebem que ela não tem nada de sobrenatural, e que é algo que ela está presente em todas as religiões. Esses fatores ajudaram a perpetuar uma imagem equivocada e distorcida dos bruxos, ao longo da história, e por isso, muitos não entendem que somos sacerdotes de uma religião que deve ser respeitada como qualquer outra.
FERRAMENTAS MÁGICAS DA W ICCA
FERRAMENTAS MÁGICAS DA W ICCA VASSOURA: Acredita-se que a vassoura tenha sido um disfarce utilizado pelas bruxas para ocultar seus cajados mágicos durante a Inquisição. Por seu uso em algumas danças ritualísticas e transes, a vassoura foi associada pelos inquisidores ao “vôo das bruxas”. Essa alteração em sua forma original lhes acrescentou novas propriedades e atributos. O que antes era uma ferramenta de energia exclusivamente masculina passou a incorporar as duas polaridades, pois o cabo representa o falo do Deus e as cerdas a vagina da Deusa. Assim, tornou-se um símbolo da cópula sagrada e conseqüentemente de fertilidade. Por esse motivo, durante as cerimônias de casamento em algumas tradições wiccanas, os noivos costumam pular uma vassoura para pedirem fertilidade. Por ainda possuir atributos do elemento fogo, esta ferramenta também é utilizada para a limpeza energética de lugares; banir maldições e pessoas indesejáveis quando colocadas na posição invertida, atrás da porta de entrada da casa. Algumas tradições também usam a vassoura nos limites do círculo mágico como uma espécie de ponte para que as pessoas entrem ou saiam dele. Apesar de ser um dos objetos mais tradicionalmente associados às bruxas e de possuir múltiplas funções, a vassoura não é uma ferramenta amplamente utilizada em todas as tradições wiccanas.
MARGINÁLIA: COMO SÃO OS SABBATHS E A ESBATHS?
MARGINÁLIA: QUAL
WICCA ABORTO,
É A POSIÇÃO DA
EM RELAÇÃO A TEMAS TABU COMO
D i o go : Os Sabbaths são os oito festivais sagra-
SEXO E HOMOAFETIVIDADES?
dos do calendário litúrgico wiccano, conhecido
D i o go : Para a Wicca, a diversidade é sagrada,
como “Roda do Ano”. Cada um desses festivais
pois reflete a própria natureza: múltipla em
representa uma fase do ciclo anual de nasci-
suas formas, cores e manifestações. Assim, a
mento, morte e renascimento do princípio divi-
homoafetividade é encarada de forma tão na-
no masculino, que chamamos de Deus
tural como qualquer outra orientação sexual.
Cornífero, que se reflete na própria natureza.
Wiccanos são livres por natureza: Não reco-
Os Sabbaths coincidem com os solstícios e equi-
nhecemos a dualidade maniqueísta bem e mal,
nócios do ano, e as datas sazonais de plantio e
tampouco cremos em conceitos como pecado e
colheita entre eles. Os Esbaths são as celebra-
culpa. O código de ética wiccano é norteado pela
ções das treze lunações de um ano. Eles repre-
liberdade de fazermos o que quisermos, mas
sentam o ciclo de transformação do princípio
cientes de que somos os únicos responsáveis
divino feminino, que chamamos de Grande Deu-
por nós mesmos e que sempre devemos arcar
sa, em seus três aspectos de Donzela, Mãe e An-
com as consequências de nossas ações. Assim, a
ciã, que se refletem nas fases lunares.
Wicca não preconiza estímulos ou proibições em
relação a comportamento sexual ou aborto.
bruxos, pagãos e politeístas, e Feliciano não nos
Cada um é livre para fazer suas escolhas.
representa!
D i o go : Marco Feliciano tem um claro discurso de
costais, que é transmitido aos fiéis por seus dirigentes desequilibrados e cheios de ódio, e que a cada dia ganham mais espaço nas bancadas governistas. Felizmente, nem todos agem dessa maneira. Alguns pastores e uns poucos membros de suas congregações têm bom senso e fazem parte da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa, lutando ao nosso lado e de diversos outros segmentos religiosos pelo respeito e pela paz
MARGINÁLIA: PARA AS RELIGIÕES MINORITÁRIAS COMO A WICCA, QUAL SERIA O MAIOR MARGINÁLIA: EM SUA OPINIÃO, QUAL SERIA O EFEITO COLATERAL DA PRESENÇA DO PASTOR MAIOR ENTRAVE PARA A LIBERDADE RELIGIOSA MARCO FELICIANO NA CDHM? APROVEITAN- NO BRASIL? DO O BORDÃO, VOCÊS SENTEM-SE REPRE- D i o go : Sem dúvida, o fundamentalismo religioso de algumas igrejas evangélicas neopenteSENTADOS POR ELE? intolerância e ódio que incita os demais religiosos fundamentalistas que o seguem. Creio que sua permanência na CDHM só tende a piorar o preconceito e a discriminação sofrida tanto por wiccanos quanto por outras religiões minoritáviolência contra esses e outros grupos. Também aproveitando o bordão: Somos wiccanos,
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rias, podendo inclusive vir a estimular atos de
E SCOLHAS, BÊNÇÃOS E FÉ
CONHEÇA UM POUCO MAIS DA IGREJA EVANGÉLICA TE X TO E F O TO S
A L I N E M A R TI N S
T
ânia Bonesso, 43 anos, é evangélica há 18 e
(921 mil) e metodistas (340 mil). Entre os pen-
converteu-se à religião após sua filha nas-
tecostais e os neopentecostais, os grupos com o
cer com um tipo de deficiência mental raro. De
maior número de seguidores são a Assembleia
acordo com ela, a decisão foi difícil. “Eu era jo-
de Deus (12,3 milhões), a Congregação Cristã no
vem quando minha filha nasceu, passei por Brasil (2,3 milhões), a Igreja Universal do Reino muitos problemas quando detectamos a defici- de Deus (1,8 milhão) e a Igreja do Evangelho ência mental dela, recorri a vários médicos e
Quadrangular (1,8 milhão).
não obtive respostas. Como minha mãe já era
Um dos ritos da religião que se destaca dentro
integrante da igreja resolvi me converter, bus-
da igreja é o ato da revelação. O pastor revela,
cando a cura da minha filha”, afirmou. Além
no culto, problemas que os cristãos enfrentam
disso, Tânia ressaltou que já se acostumou com
em diversos âmbitos, e oferece-lhes a salvação
as privações que a religião impõe. “Eu sabia co-
divina. Todos os que estão presentes podem ser
mo funcionava quando me converti, então não
revelados, porém, é de espontânea vontade que
reclamo. Já são 18 anos que não corto o cabelo,
recebem a graça alcançada. Práticas de exorcis-
que não sei o que é usar uma calça ou ter TV em
mo também são aplicadas pelos pastores.
casa, sinceramente, já não sinto mais falta”,
Marilene Batista, 56 anos, tem pela católica sua
destacou.
religião, mas ao menos uma vez por semana
Não sendo a história de Tânia a única, são vários
frequenta uma igreja evangélica. “Já alcancei
os seguidores que se converteram a religiões
muitas graças dentro da igreja evangélica, já fui
evangélicas em busca de graças, curas de doen-
revelada muitas vezes, não me sinto pronta pa-
ças ou conquistas profissionais. Comum também
ra me converter, mas sempre que posso estou
é perceber presentes nos cultos, integrantes de
nos cultos”, ressaltou.
outras religiões.
Para o pastor, Sebastião Silveira, da igreja Deus
Dados do Censo 2010, do Instituo Nacional de
é Amor – uma das que adota as características
Geografia e Estatística (IBGE) sobre religião
já mencionadas – ter os fieis dentro da igreja, é
confirmam o crescimento da religião evangélica
uma forma de fazer Deus presente nos lares.
e a redução do número de católicos, tendência
“Revelo todos os dias dezenas de problemas que
registrada desde o início do século XX, mas ace-
diversas famílias passam. Também trabalha-
lerada desde o Censo de 2000. O protestantis-
mos para que o demônio presente naquela pes-
mo é o segundo maior segmento religioso do
soa saia, em nome de Deus, mas o mais
Brasil, representado principalmente pelas
importante de tudo isso é a fé”, disse.
igrejas evangélicas, com cerca de 42,3 milhões
No Brasil, a miscigenação dos povos fez com que
de fiéis, o que representa 22,2% da população
diversas religiões, crenças, crédulos, entre ou-
brasileira. Entre as maiores denominações pro-
tros, surgissem. Os populares “crentes” – co-
testantes do Brasil em número de adeptos es-
nhecidos assim pelo senso comum – buscam
tão os batistas (3,7 milhões), adventistas (1,5
salvação, bênçãos e um lugar no céu, como tan-
milhão), luteranos (1 milhão), presbiterianos
tos outros.
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N
ão matarás. Não roubarás. Não darás falso testemunho. Estes são alguns dos mandamentos presentes na Bíblia, seguidos por diversos adeptos do evangelho e conhecidos pela grande parte da população. Entretanto, algumas religiões não se restringem a cumprir apenas tais leis, mas também
impõem regras próprias a seus seguidores, que as adotam após o batizado. Algumas destas religiões possuem, ainda, o "Regulamento Interno para Obreiros" (RIO) que é uma expressão utilizada nos meios pentecostais para se referir a uma série de determinações feitas pelas igrejas aos seus membros quanto à vestimenta, comportamento e postura social. Não obstante, que os mesmos se encontram na Bíblia Sagrada. Abaixo, segue algumas das regras contidas no RIB. • Ter e ver TV – não é permitido assistir a nenhum tipo de programação, pois a televisão, principalmente as novelas e filmes, são meios de se propagar mentiras, enganos, destruição de famílias, dentre outros fatores que afetam a nossa sociedade atual; • Não é permitido escutar programas não evangélicos no rádio (porém rádios de conteúdo musical evangélico e de notícias são permitidos); • Praticar qualquer tipo de esportes – (os adolescentes podem participar das Aulas de Educação Física e até usar calça no caso das mulheres, mas somente no horário das atividades da Educação Física, ou somente em colégios e lugares obrigatórios conforme circular de reuniões e do
novo regulamento interno da igreja); • Exercer qualquer profissão que exija o uso de armas de fogo (segurança, polícia militar, forças armadas); • Não é permitido para os membros fazer tatuagem (Co 3:16-17); As mulheres são proibidas de: • Usarem calças compridas, alegam não somente ser roupa de homem, mas uma vestimenta indecente (podendo usar somente saias abaixo do joelho sem fenda ou vestidos compridos) (Tm 2:9-11); • Usarem qualquer tipo de maquiagem (Pe 3:3-4);
#VouProInferno* bem vs. o mal. Há quem se incline para trás, emita palavras de alguma língua desconhecida e até quem afirme ter visitado o céu em sonho. O cenário que abriga tudo isso pode parecer familiar, se você tiver assistido a filmes sobre sanidade ou de terror. Mas não é. A receita é de um culto evangélico, que não varia muito de um para outro, e nem para os filmes. Deve ser a vida imitando a arte. Tudo isso se trata de fé. Crença doentia? Talvez. Mas fé capaz de fazer pessoas acreditarem em seres e experiências maravilhosas, dignas da Grécia antiga. Sem muitos nem conhecerem a história de tais civilizações, que criaram uma mitologia que hoje é retratada nos livros de história como ficção. Há controvérsias em qual gênero enquadrar. Talvez sejam parte de um livro bíblico perdido. Aposto que seja de São Zeus. A história está repleta de magia, e não diferente acontece Exatamente
agora,
Já os homens não podem: • Usar bermudas ou shorts (mesmo dentro de casa ou para dormir, devem sempre usar calças compridas); • Andar sem camisas ou com as mesmas abertas (não sendo permito regatas ou camisetas sem manga); Ter bigodes, costeletas ou cabelos crescidos
criança e precisava me purificar dos pecados em água cor- toda, para talvez, ter direito ao camarote divino.
Gritos. Orações. Demônios. Anjos. Homens e mulheres. E o
atualmente.
• Cortar os seus cabelos (sendo proibido tosquiar, ou seja, cortar até mesmo as pontas); (Co 11:15); • Não podem usar brincos e enfeites (com exceção da aliança de casamento, formatura ou noivado e relógio);
(10/12/2013
às
19h43min), milhares de pessoas no mundo todo ovacionam Rússia e África do Sul. O mundo parece precisar de magia para viver. Não diferente, há 14 anos atrás me pegava entrando em um lago. Com sete anos de idade estava no limite, acabara de me tonar um pecador. Havia deixado de ser
hesitava em ser batizado. A pressão paterna por se purifi- ver. Mesmo criança, era possível perceber a união das car e começar o resto da vida, de pecador, me fizeram pessoas daquela comunidade. Cada irmão, como se tratam adentrar as águas turvas. Afinal, quem quer ir para o in- os evangélicos daquela igreja, era realmente irmão. Como ferno? Local habitado pelo diabo e criaturas que irão so- todos nós nascemos de Adão e Eva, isso é o que se pressufrer pela eternidade. Criaturas que pecaram em sua vida põem. Sendo assim todos se ajudavam e estendiam a mão terrena. Há chances de você ser um destes (ler a Marginá- para quem precisasse. Era a coisa bonita de toda aquela fé lia é pecado).
que não deixava as mulheres cortas um centímetro sequer
Foi rápido. Em poucos segundos fui levado ao fundo do la- de cabelo. A fé que não deixava ninguém arrancar um pelo go, com um lenço prendendo a respiração, pelo pastor da pubiano que fosse, que não deixava praticar qualquer tipo igreja. Um homem alto, de voz grossa, que residia em na de esporte, não deixava mulheres dirigirem, não deixava cidade onde ficava a sede da igreja, há 300 KM de distância mascar chiclete, ver televisão, ouvir música e mais outras dali. Pronto, batizado. A felicidade dos demais fiéis era vi- infinitas atividades. Ah, calças para mulheres eram proisível. “Mais um que se salvará”, pensavam. Pensavam. bidas, apenas saias até os pés. A lista é enorme. “É proibiAgora sim eu poderia entrar no reino dos céus. Local onde do proibir” infelizmente não está na bíblia. apenas batizados têm acesso (#ficaadica). O @criador não Se para você parece tudo coisa de outro mundo, e neste aceita quem não se banhou nas águas como ele. Tudo se- momento pensa estar lendo sobre Islamismo, se enganou. gundo a bíblia.
Essa fé acontece no Brasil, e eu pratiquei por nove anos.
Começada minha vida na igreja, as visões de gente falando Me livrei. E graças a separação de meus pais, ingressei na línguas, orando, pastores gritando e milagres acontecen- religião católica, assunto para outro relato, e por fim, aos do tornaram-se ainda mais frequentes. Assim como o te- 18 anos, ateu. Mesmo com tanta fé o diabo invadiu nosso mor a deus. Era tão bondoso, mas ao mesmo tempo tão lar e destruiu tudo. cruel. Era capaz de castigar de formas horríveis. #Medo, Lição: sempre é necessário crer mais e mais #temor e #oração. Não poderia fugir disto por uma vida *depoimento anônimo
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seus deuses. De China a Japão, Estados Unidos a Brasil, de
rente. Com medo de morrer afogado, ou algo do gênero, Mas em meio a tudo isso algo se sobressaia e era bonito de
I GREJAS INCLUSIVAS
DE PORTAS ABERTAS E SEM PRECONCEITOS
U
TE X TO DIEISON MARCONI
Foto As Travestidas
m desenho
bissexuais, travestis, transexuais, transgê-
milhões, ou 22,2% dos brasileiros. Em 1991,
minimalista
neros e intersexuais. Minorias muitas vezes
o percentual de evangélicos era de 9% e,
com dois ho-
impedidas de congregar com sua fé devido
em 1980 de 6,6%. Co-
mens e duas
ao discurso homo/transfóbico de algumas
mo um dos efeitos
mulheres de mãos dadas. Esta imagem po-
religiões, em especial, de algumas igrejas
colaterais resultan-
deria ser a identidade visual de um grupo ou
cristãs evangélicas.
tes desse aumento demo-
coletivo de militância pelos direitos das mi-
Evangélicos nem de longe podem ser consi-
gráfico, surge um segmento
norias sexuais, mas não é. O desenho em
derados minoria no Brasil atual, mas sim
evangélico fundamentalista
traço minimal é de uma Igreja intitulada Co-
um segmento religioso que cada vez mais
que também adentra as vias
munidade Cristã Nova Esperança, anterior-
agrega fiéis. Segundo dados do Instituto
do legislativo, não rara-
mente chamada de Igreja Inclusiva do Brasil,
Brasileiro de Geografia e Estatística divul-
mente propondo projetos
e que não raro é rotulada como igreja gay.
gados em 2010, o número de evangélicos no
obsoletos que ferem a inte-
Este último rótulo não é gratuito: a Comu-
Brasil aumentou 61,45% em 10 anos. Em
gridade civil e humana de
nidade Cristã Nova Esperança é um dos pri-
2000, cerca de 26,2 milhões se disseram
minorias sociais. Isto faz com que muitos
meiros espaços cristãos no Brasil voltados a
evangélicos, representando 15,4% da popu-
questionem ainda mais a existência de um
receber de braços abertos homossexuais,
lação. Em 2010, eles passaram a ser 42,3
Estado realmente laico e democrático, en-
Vinde a m os que cansa oprim e eu vos a
Mt. 11
quanto outros já clamam pela reformulação
lei 1411/2011 que permite que organizações
meninas que chegaram a ser presas por se
do código eleitoral para impedir que grupos
religiosas expulsem de seus espaços as pes-
beijarem durante um culto comandado por
e partidos utilizem a polí-
soas que "violam seus valores, doutrinas,
Marco Feliciano há alguns meses.
tica como extensão de seu
mim todos conservadorismo religioso. e estão Entre os tantos exemplos ados e de um Estado contaminado por dogmas religiosos que midos, se poderia citar, fica regisaliviarei trado a proposta de
crenças e liturgias". A proposta ainda “de-
São por discriminações como estas que sur-
sobriga” igrejas a celebrar casamentos em
gem pelo Brasil as chamadas Igrejas Cristãs
"desacordo com suas crenças". Um dos obje-
Inclusivas. Baseadas em uma teologia in-
tivos é evitar que decisões judiciais obri-
clusiva, muitas delas nascem com o slogan
guem a celebração de uniões entre
de que “Jesus não faz acepção de pessoas”
homossexuais, por mais que a PEC do Casa-
(Atos 10:34), tendo como missão propagar o
mento Igualitário e as decisões do Supremo
amor de Deus sem distinção de cor, renda
Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribu-
econômica, orientação sexual e identidade
vetar judicialmente
nal da Justiça (STJ) visam regularizar e ofi-
de gênero. Pregam uma releitura contextu-
a presença de “su-
cializar
civil
alizada da Bíblia, rejeitam o fundamenta-
jeitos indesejados” em templos religiosos.
homoafetivo. O projeto também permitiria
lismo cristão e afirmam que a Bíblia não
Em outubro de 2013, a Comissão de Direitos
a retirada de manifestantes que fizerem
condena pessoas LGBTTTI e outras minorias.
Humanos de Minorias aprovou o projeto de
protestos dentro de templos, como as duas
1:28
apenas
o
casamento
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A Comunidade Cristã Nova Esperança, criada em 2010 é uma delas. Sem fins econômicos, em 2013 se faz presente em 13 cidades brasileiras: São Paulo, Porto Alegre, Recife, São Luiz, Natal, Fortaleza, Chapecó, Osasco, Guarulhos, Jandira, Santo André, Franco da Rocha e Vitória. Como está escrito em seu site, busca promover a paz, a tolerância, o respeito ao próximo, o amor ao próximo, o aperfeiçoamento do ser humano, o respeito à diversidade humana, o respeito à vida humana e a confraternização universal. Em Porto Alegre, a Comunidade Cristã Nova Esperança congrega cerca de 30 fiéis, com cultos às 20h00 nas quintas feiras e às 18h00 nos domingos. Richard Pinto Carvalho, 24 anos, é um dos fiéis que encontrou nesta igreja um lugar para poder expressar sua fé sem reprimir ou patologizar sua orientação sexual. Nascido em uma família evangélica, frequentou Assembleia de Deus por alguns anos, mas largou a igreja devido suas doutrinas conservadoras. Foi aí que recebeu um convite da sede da Comunidade Cristã Nova Esperança localizada em São Paulo para inaugurar um braço da comunidade na capital gaúcha. Hoje Richard é pastor na Comunidade Cristã Nova Esperança em Porto Alegre e prega em uma igreja que acolhe aqueles que se sentiram expulsos de outros templos. O escritor Fernando Cardoso diz em seu livro intitulado O evangelho Inclusivo e a homossexualidade (2010), que a criação da primeira igreja inclusiva é creditada ao Reverendo Troy Perry, norte americano nascido no ano de 1940 em Los Angeles. Perry era homossexual, discriminado e impedido de pregar na comunidade pentecostal que frequentava. Em 1968 criou a Igreja da Comunidade Metropolitana voltada para pregar o evangelho para homossexuais, bissexuais e pessoas trans*. No Brasil, durante a década de 1990 havia contato entre militantes e mem-
bros da Igreja da Comunidade Metropolitana, mas ainda era um contato demasiado tímido para a criação de uma sede brasileira da igreja. Na verdade, a Metropolitan Community Church chegou às terras tupiniquins de uma forma bem insólita. Marcos Gladstone, na época estudante de Direito e com 28 anos, quando descobriu o site da Metropolitan Community Church traduziu o material on-line e lançou uma versão em português do site. Em um ano a 'Igreja da Comunidade Metropolitana', ainda virtual, tinha alcançado 20 Estados. A partir daí nasciam grupos locais que se reuniam em praças e clubes até a inauguração de uma sede oficial da Igreja, da qual Marcos se desligaria em 2005. Hoje ele é teólogo reconhecido, trabalha na Comissão de Direito Homoafetivo da Ordem dos Advogados do Brasil (OABRJ) e é fundador da Igreja Cristã Contemporânea, a qual segue a doutrina do evangelho inclusivo. No entanto, ainda segundo Cardoso, a teologia inclusiva teria registros mais antigos do que o templo de Perry. Ela teria nascido muitos anos antes por meio de uma gama de pesquisas acadêmicas teológicas em relação à releitura de trechos bíblicos supostamente condenatórios. Sobre estes trechos, Fernanda Gabriela da Costa, fundadora e Pastora da Igreja Inclusiva Nova Aliança localizada em Recife (PE),argumenta de forma categórica: “se pegarmos textos bíblicos, como por exemplo, livro de Levítico/capítulo 20/versículo 13 vemos a condenação dada pela lei de Moisés, dita por Deus, a um homem que deite com outro homem. O Livro de Levítico, capítulo 18, versículo 22, fala a mesma coisa. Mas há um fato que alguns funpassar despercebido, que é a interpretação da bíblia. Quando tais textos, por exemplo, falam a respeito de ‘um homem
não
deitar com
outro,
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damentalistas insistem em deixar
pois é abominação’, relata diretamente o fato de homens, naquela época, deitarem com outros homens para adorarem a deuses pagãos. Ato ritualístico muito comum naquela época. Um dos deuses mais adorados chamava-se Maloque. Para praticar o momento de adoração a esse Deus, eram feitos alguns atos de orgias, tanto entre homens e mulheres, como entre mulheres com mulheres e de homens com homens. Quando apontam tais versículos para condenação dos homossexuais, tais acusadores não reparam, por exemplo, que em nenhum momento Deus relata algum tipo de proibição para construção de um
relacionamento
homoafetivo,
nem heteroafetivo. Ele condena a prática idolátrica a um deus pagão”. Ainda segundo Gabriela, que atualmente é casada com a diaconiza Cristina Pelizari, as leis de Moisés relatadas na bíblia somam-se em mais de 600 leis, com proibições para diversos atos que tinham a intenção de fazer a separação entre o povo de Deus e o povo pagão: “no mesmo livro de Levítico, no capítulo 22, versículo 22, é dito que pessoas cegas, aleijadas, que possuam verrugas, não podem adorar a Deus. Também relata no capítulo 11, versículo 20, que é proibido comer animais que tenham quatro patas. E muitos outros versículos que falam centenas de proibições para atos realizados naquela época por um povo pagão.” E a pastora finaliza: “A palavra homossexual, por exemplo, foi criada em 1868 d.C. E a bíblia foi concluída no ano 90 d.C. Se a palavra homossexual foi criada em 1778 anos depois que a bíblia foi escrita, como pode estar na bíblia? A palavra original na bíblia, que não é homossexual, é a palavra "Arsenokoitai", que refere-se a práticas idolátricas entre homens, mulheres e até crianças em adoração a dois deuses muito conheci-
M A R G IN Á L IA 1 0
dos dessa época, Dona Dea e Baco. No entanto, essa leitura contextualizada da bíblia que Gabriela faz não é reconhecida por muitos cristãos, muito menos pelos fundamentalistas. Por isso, além das preocupações com o avanço teológico e da criação de espaços para que pessoas não sejam discriminadas, há a preocupação com a identidade da comunidade evangélica e de outros cristãos perante a população. Tais discursos homo/transfóbicos traduzem o pensamento da maioria da comunidade? Estes discursos preconceituosos de alguns líderes “sujam” a imagem dos evangélicos? Que ameaça este fundamentalismo apresenta para o diálogo inter-religioso no país? Estas preocupações não são apenas de homossexuais, bissexuais, pessoas trans* e religiões minoritárias, mas também dos próprios evangélicos que não são LGBT’s, como Barbara Corrêa. Com 20 anos de idade e graduanda em Comunicação Social na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Bárbara argumenta que discursos conservadores e fundamentalistas vão além da degradação da imagem da igreja evangélica: “eles também ferem a imagem de Jesus, que é querido, humilde e amável, e muitas vezes não é visto dessa forma por causa das palavras desses líderes fundamentalistas”. Um Jesus querido, humilde, amável e de braços abertos é o guia que muitos LGBT’s, negros, mulheres, profissionais do sexo e outras minorias procuram nas igrejas inclusivas. Um Jesus que alguns cristãos não reconhecem por diferentes motivos: uns por ignorância e falta de leitura contextual do livro pelo qual se guiam. Outros por estratégia política ou por ausência de dignidade intelectual. Mas no final das contas, pra quem ainda insiste em ser um nó, as Igrejas inclusivas dizem: somos nós.
O ensaio fotográfico que ilustra esta reportagem foi usado no projeto Translendário, ou seja, um calendário artístico de duas edições (2012/2013) em que travestis interpretam imagens, santos de várias religiões e pinturas sacras famosas. São elas fotografadas na Santa Ceia, como Pietá, na Criação de Adão, dentre outras imagens. O Ensaio foi produzido pelo grupo As Travestidas, um coletivo Artístico de Fortaleza composto por Atores, Transformistas, Artistas Plásticos, Fotógrafos, Músicos, Publicitários e Designers. O grupo é resultado de uma pesquisa de 10 anos, realizada pelo ator e diretor Silvério Pereira, sobre o universo das travestis e transformistas. O primeiro passo desse processo está na construção do solo Uma flor de dama (2005), que após oito anos de existência firma-se como um dos espetáculos mais representativos da atual cena nordestina, somando mais de 300 apresentações, entre inúmeras temporadas, festivais, mostras e intervenções, e uma excelente repercussão junto ao público e à opinião especializada, contabilizando mais de 80.000 espectadores em todo o Brasil, além de mais de 10 prêmios. Outros trabalhos conhecidos do grupo são: Cabaré da Dama, Engenharia Erótica- Fábrica de Travestis, Cabaré show: Yes, nós temos bananas e Quem tem medo de Travesti?!
“ O BICHO NÃO É
TÃO FEIO QUANTO PARECE ” PRÁTICAS E CRENÇAS DO LUCIFERANISMO
TE X TO A L I N E M A R TI N S F O TO S A R QU I V O P E S S O A L
Acreditar no que você conhece. Mos-
mesmo tempo é subjetivo, baseado
trar para as pessoas o que você quer em experiências e aceitação pessoais, que elas vejam. Isso pode ser pratica-
sofrendo influências de outras cren-
do como filosofia de vida por alguns
ças. Assim, não possui uma base rígi-
ou como conduta por outros, mas di-
da de dogmas a serem seguidos,
ferente do pré-conceito estabelecido
sendo transmitido oralmente e pra-
pela sociedade, estes são seguimen-
ticado, geralmente, de forma indivi-
tos abordados pelo Luciferanismo.
dual.
Ainda excluído por grande parte da
Historicamente, não há uma origem
população, a crença adora a Lúcifer e
precisa sobre o início do Luciferianis-
acredita que a Terra é seu reino.
mo. Mas há um conjunto de conceitos
O Luciferianismo é uma doutrina de-
que se desenvolveu ao longo dos
rivada do Satanismo, que busca vir-
tempos em várias culturas distintas e
tudes como iluminação, sabedoria,
resultou na crença conhecida atual-
orgulho, independência e liberdade
mente.
de sua principal divindade, Lúcifer. Ao
M A R G IN Á L IA 1 2
As serpentes e os dragões, que são represen-
leira proíbe qualquer tipo de intolerância re-
pelos praticantes é que todos têm o livre ar-
tações de Lúcifer em várias culturas, são
ligiosa, sendo sua prática geralmente livre
bítrio, ou seja, o trabalho é feito, mas as
também símbolo de sabedoria e eternidade.
no país. Segundo o "Relatório Internacional conseqüências – boas ou más – retornam
Estes animais eram alvos de adoração no Egi-
de Liberdade Religiosa de 2005", a "relação
para quem o encomendou. Lívia explica que
to, Babilônia, Pérsia, e entre os Incas ameri-
geralmente amigável entre religiões contri-
os trabalhos realizados se constituem em
canos. Assim, supõe-se que esta filosofia já
bui para a liberdade religiosa" no Brasil. Po-
uma troca. “A pessoa irá fazer uma troca de
era praticada há muitos séculos.
rém, seguidores do Luciferanismo ainda
favor comigo, ou seja, você vai ficar devendo
Num aspecto geral, o Luciferianismo pode ser passam por muitos julgamentos, na maioria,
um favor para o meu pai. A lei do retorno é
subdividido em duas categorias, nas quais as
pelo fato das pessoas não compreenderem o
de quem pede. Se me pedem para fazer o mal,
denominações variam e não são tão significa-
sentido da crença e suas práticas.
eu faço, mas o mal vai voltar para quem pe-
tivas para sua compreensão. As modalidades
Denominada Bruxa de Hecate, Lívia Ferreira,
diu, assim como o bem”, disse.
são conhecidas como Deísta e Agnóstico, Tra-
49 anos, é Luciferanista há mais de 21 anos.
Rituais também são realizados por adeptos
dicional ou Moderno (termos absorvidos do
Católica praticante até então, levava a pala-
do Luciferanismo, entre eles está o que é
Satanismo).
vra de Nossa Senhora de Fátima até os lares.
chamado de obrigação, quando um presente é
Os adeptos do Luciferianismo Deísta identifi-
Ao passar por um problema e não ter em
dado a Lúcifer ou para um Exu (geralmente
cam Lúcifer como o criador do universo, um
Deus o resultado que esperava, foi levada
um cabrito). “Quando há um ritual, quando
ser onipresente e onipotente. Neste caso, Lú-
por uma amiga a uma casa de religião e lá
há uma matança como na Umbanda, Candom-
cifer assume as características principais
tista, Aleister Crowley.
Há um misticismo por nós mexermos com magia negra, mexermos com a vida das pessoas e aí então não somos bem vistos
Mas em todas as variações, Lúcifer é visto co-
sentiu o conforto do qual necessitava. “Lá eu
de uma divindade. Já os luciferianos agnósticos veem Lúcifer como um arquétipo, ou seja, uma referência de virtudes que são visadas por seus adeptos. Esta variação é nitidamente influenciada pelo Satanismo moderno promovido por Anton LaVey, no qual não há uma divindade específica, mas cada indivíduo eleva-se a ponto de considerar-se "seu próprio Deus". Este conceito também nos remete a ideologia do Thelema, tendo como seu principal divulgador o ocul-
mo um ser que abriga em si os opostos entre luz e trevas, e por conseqüência, o equilíbrio entre os pólos. Este conceito é totalmente contrário a muitas religiões que possuem figuras que representam os arquétipos de bem e mal de forma distintas. A aceitação de uma única referência que é paralelamente luz e trevas, segundo os adeptos, é a principal diferença do Luciferianismo em relação aos outros sistemas religiosos. Dessa forma, no Luciferanismo, não há um confronto entre "Deus x Diabo"; ao contrário, há uma união dessas forças que são igualmente responsáveis e necessárias para a evolução humana. A religião no Brasil é muito diversificada e caracteriza-se pelo sincretismo. A Constituição prevê a liberdade de religião, e a Igreja e o Estado estão oficialmente separados, sendo o Brasil um Estado laico. A legislação brasi-
me identifiquei porque eu me senti bem e isso me ajudou, me levou adiante”, disse. Além disso, Lívia relata que associam o Luciferanismo com a prática da maldade. “Ainda há mui-
blé ou Quimbanda, realmente nós fazemos uma obrigação para um Exu ou damos um presente para Lucifer, nós tomamos o sangue enquanto está quente antes que ele coagule. Mas o que é o sangue? Sangue não é vida? Sem o sangue nós não sobreviveríamos, então o que nós estamos fazendo de errado? Não estamos fazendo nada errado, estamos alimentando o nosso organismo com um sangue forte e nem por isso somos vampiros e nem saímos matando animais por aí”, salienta Lívia. Lívia, que é intitulada sacerdotisa, trabalha com Hecate – concubina de Lúcifer que teve um grande amor na vida e morreu por conta dos católicos. “Sou sacerdotisa porque atravesso três ângulos: dentro da magia, dentro do ocultismo e dentro do voduísmo, além de
ta informação desencontrada, as pessoas
ser mãe de santo”, explicou.
trário, se nós fizermos qualquer coisa erra-
nistas. Devido a isso, os seguidores tentam de
acreditam que por sermos filhos de Lucifer O pré-conceito e a discriminação ainda são vamos sair por aí fazendo maldade, pelo con- atos presentes na vida e rotina dos Luciferada, vão dizer: são filhos do diabo, fizeram errado porque são filhos do diabo”, salientou.
alguma forma, informar as pessoas sobre sua crença, esclarecendo mitos sobre o pai a quem eles servem e as práticas realizadas.
A seguidora explica também que o Lucifera-
“Eu posso dizer para você que eu tenho um
ça, a magia negra é trabalhada para diversas
delidade, eu tenho respeito. Ele faz o que eu
nismo é tido como persona non grata por protetor, que tudo que eu peço é instantâneo, trabalhar com magia negra. Dentro da cren- mas eu tenho fé, eu tenho amor, eu tenho fifinalidades, seja para curar alguém de alguma doença ou para matar alguém que esteja no caminho. Entretanto, o que fica bem claro
peço e em troca eu dou a minha fidelidade e procuro fazer com que as pessoas entendam que o bicho não é tão feio quanto parece”, finalizou Lívia.
≠
Satanismo Luciferanismo Apesar de popularmente Lúcifer e Satã serem
co, Shai'tan, e significa "Adversário"; podendo ser trono, e no monte da congregação me assentarei,
quase sinônimos e esta idéia estender-se ao Sa-
também uma variação do nome da divindade
tanismo e ao Luciferianismo, há diferenças pri-
egípcia Set-hen. Dessa forma podemos deduzir nuvens, e serei semelhante ao Altíssimo. E, con-
mordiais entre eles e, por conseqüência, aos
que, genericamente, o Luciferianismo busca a
tudo levado serás ao inferno, ao mais profundo
sistemas religiosos que os cercam.
iluminação através de Lúcifer. Enquanto o Sata-
do abismo" (Isaías – Cap. XIV – Versículo XII a
Ao longo dos séculos, estes dois personagens
nismo pode caracterizar-se pela oposição, neste
XV).
também foram representados artisticamente de
caso, ao cristianismo. Assim, os luciferianos con-
Este trecho narra as intenções do rei da Babilô-
formas distintas. Por ser um anjo, Lúcifer, é co-
sideram que sua filosofia é um "aprimoramento"
nia que almejava tornar-se maior que Deus, mas
mumente retratado como um homem com asas e,
do Satanismo, apesar de não ser tão conhecido
São Jerônimo, que ao traduzir a Bíblia do grego
por vezes, empunhando um cajado. Enquanto Sa-
quanto a doutrina promovida por LaVey.
para o latim no século IV, associou esta passa-
tã tem sua imagem associada ao homem com chi-
A combinação da imagem de Lúcifer ao "demônio
gem com Lúcifer e à serpente tentadora, ou seja,
fres e patas de cabra, muito semelhante ao deus
cristão" foi ocasionada por uma interpretação
a simbologia do diabo cristão. Anteriormente,
Cornífero (ou Pã), divindade masculina e símbolo
equivocada do livro de Isaías: "Como caíste desde
Lúcifer não havia essa relação. Tanto que, ofici-
de fertilidade cultuada entre os pagãos.
o céu, ó estrela da manhã, filha da alva! Como
almente, a Igreja não atribui a Lúcifer o papel de
O termo Lúcifer origina-se no latim e significa "O
foste cortado por terra, tu que debilitavas as
diabo, mas apenas a condição de "anjo caído".
portador da Luz" (Lux ou Lucis = Luz + Ferre =
nações! E tu dizias no teu coração: Eu subirei ao
Carregar). A palavra Satã origina-se no hebrai-
céu, acima das estrelas de Deus exaltarei o meu
aos lados do norte. Subirei sobre as alturas das
M A R G IN Á L IA 1 3
Quem é Lúcifer? De acordo com a instituição luciferanista satânica, Casa Rosa Negra, desde a antiguidade, passando pelos filósofos e desembocando na figura conhecida erroneamente como o "demônio cristão", diversos personagens da mitologia e divindades cultuadas em inúmeras e distantes culturas, possuem alusões a seres, sejam arquétipos ou concretos, que trazem consigo as características conhecidas em Lúcifer. A literatura contemporânea também o aborda amplamente, como as citações ocultistas de Helena Blavatsky e Eliphas Levi, e na
A POCALIPSE 12:7 A 17 7E houve batalha no céu; Miguel e os seus anjos batalhavam contra o dragão, e batalhavam o dragão e os seus anjos; 8Mas não prevaleceram, nem mais o seu lugar se achou nos céus. 9E foi precipitado o grande dragão, a antiga serpente, chamada o Diabo, e Satanás, que engana todo o mundo; ele foi precipitado na terra, e os seus anjos foram lançados com ele. 10E ouvi uma grande voz no céu, que dizia: Agora é chegada a salvação, e a força, e o reino do nosso Deus, e o poder do seu Cristo; porque já o acusador de nossos irmãos é derrubado, o qual diante do nosso Deus os acusava de dia e de noite. 11E eles o venceram pelo sangue do Cordeiro e pela palavra do seu testemunho; e não amaram as suas vidas até à morte. 12Por isso alegrai-vos, ó céus, e vós que neles habitais. Ai dos que habitam na terra e no mar; porque o diabo desceu a vós, e tem grande ira, sabendo que já tem pouco tempo. 13E, quando o dragão viu que fora lançado na terra, perseguiu a mulher que dera à luz o filho homem. 14E foram dadas à mulher duas asas de grande águia, para que voasse para o deserto, ao seu lugar, onde é sustentada por um tempo, e tempos, e metade de um tempo, fora da vista da serpente. 15E a serpente lançou da sua boca, atrás da mulher, água como um rio, para que pela corrente a fizesse arrebatar. 16E a terra ajudou a mulher; e a terra abriu a sua boca, e tragou o rio que o dragão lançara da sua boca. 17E o dragão irou-se contra a mulher, e foi fazer guerra ao remanescente da sua semente, os que guardam os mandamentos de Deus, e têm o testemunho de Jesus Cristo.
obra poética de John Milton, Paradise Lost. Segundo o mito cristão, Lúcifer era o mais forte e o mais belo de todos os Querubins e conquistou uma posição de destaque entre os demais. Porém, Lúcifer tornou-se orgulhoso de seu poder e revoltou-se contra Deus. O Arcanjo Miguel liderou as hostes divinas na luta contra Lúcifer e os anjos o derrotaram e o expulsaram do Reino do Céu. Mas a idéia de que Lúcifer rebelou-se contra o Criador e foi expulso também está presente em outras culturas, além do Cristianismo
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O CAMINHO DA MEDIUNIDADE O RELATO DE UMA JOVEM MÉDIUM TE X TO
COLABORADORA
DÉBORA VIEGAS F O TO D I LV U L G A Ç Ã O
D
esde pequena, aos poucos, tive contato com o universo do espiritismo e que, de longe, me parecia bastante tranquilo. Entrar em contato com a mediunidade vivenciada por uma jovem médium abre as janelas de experiências bastante
íntimas, mas que, ao mesmo tempo, esperavam uma chance de serem contadas. Foi esta a primeira sensação que tive, ao convidar a G. N., de 17 anos para a entrevista. O sim animado veio junto com uma ansiedade visível de relatar as experiências, anseios e tudo aquilo que há muito tempo ficou guardado por conta da dúvida alheia. Dúvida, medo, ignorância de amigos e familiares que assim como ela, não sabiam e até hoje não sabem lidar com as manifestações mediúnicas e todos os aspectos sociais que tem relação com o Espiritismo. A adolescente que mora em Frederico Westphalen, no interior do Rio Grande do Sul, optou por utilizar somente as iniciais do seu nome. A proteção da identidade garante, para ela, o relato mais livre e sem a preocupação com o julgamento equivocado de outras pessoas. Na Doutrina Espírita, codificada por Allan Kardec, a mediunidade é uma potência da alma, uma faculdade que se manifesta em cada um de acordo com o seu objetivo reencarnatório e seu processo evolutivo. Os médiuns, segundo o Livro dos Médiuns, de Allan Kardec, são pessoas que podem servir de intermediário entre os espíritos e os seres humanos. Segundo dados do Censo 2010, divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 3,8 milhões de brasileiros se declararam espíritas. Em uma década, o índice cresceu 65%, o que revela uma crescente adesão em decorrência da difusão da Doutrina Espírita. Mesmo com o grande crescimento, hoje o espiritismo ainda traz muitos dos pré-conceitos formulados ainda no século XX, quando a sociedade considerava as manifestações como patologia. Enquanto o espiritismo não é entendido (nem respeitado) por muitas pessoas, os familiares e amigos, que são as pessoas mais próximas dos médiuns, demoram a compreender a real situação da pessoa que passa por todas as experiências. Seja por não acreditar ou não entender o como e/ou o porquê estas manifestações acontecem, as pessoas acabam, muitas vezes, se distanciando deste universo, prejudicando, ainda mais, a condução da mediunidade. No primeiro contato que tive com a família, a mãe, sem muitas reservas, esclareceu seu posicionamento quanto à mediunidade da filha. Bastante emocionada, contou sobre a angústia de ver a filha sofrer e o seu desejo de distanciá-la de tudo aquilo que levasse ela a este caminho. Mesmo procurando ficar afastada a mãe, que não quis se identificar, incentiva G. a percorrer o caminho dela, como ela preferir. Não estava preparada para ouvir aquele relato. Confesso que o choque foi grande, mas a aventura em poder ir mais a fundo nesta história me deixou animada e também ciente da responsabilidade que a partir dali iria carregar.
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O início, o medo e a solidão
tendia, achava que era bobagem. Ela falava
“Minha mãe fala que, desde pequena, eu fa-
‘essas coisas’[...] e não tinha como eu evi-
lava que sentia alguma coisa perto de mim. Eu dizia que meu anjo estava ali”. Desde os três ou quatro anos, como lembra das histórias que sua mãe conta, G dizia estar rodeada de pessoas e via amiguinhos por perto, quando as duas estavam sozinhas no apartamento. Mais tarde, por volta dos seis ou sete anos, G. lembra que não conseguia dormir, estava com pânico dessa situação e já não podia ver nada relacionado ao assunto. A partir dos onze anos, G. começou a pedir para frequentar centros espíritas, por indicação também de seu pai, que é médium e orientava cautelosamente os passos da filha. “Meu pai sempre foi espírita e ele me falava que é por que eu tenho mediunidade que acontece essas coisas”. Mesmo com o conselho do pai, G. diz que, por não saber trabalhar com sua mediunidade, isso atrapalhava muito sua vida e a deixava com medo. A mediunidade mexe com todos os aspectos da vida do médium, principalmente, quando se trata de situações que exigem a confiança do outro. G. conta o exemplo das amigas. “Algumas que eu sabia que acreditavam, eu contava, porque o resto não dá
que não era pra eu me meter ou procurar tar”. Além da grande sensibilidade mediúnica, a jovem possui também outro tipo de mediunidade, que é conhecida como desdobramento (nome que se dá o fenômeno de exteriorização do corpo espiritual ou perispírito durante o sono). O desdobramento aconteceu pela primeira vez por volta dos doze ou treze anos de G.. “Eu fui deitar pra dormir, tipo de tarde e quando olhei estava vendo meu corpo do meu lado e comecei a ver sombras e ouvir vozes e me ver dormindo. Aí eu pensei: ‘Meu Deus, eu morri!’. G. procurava se afastar de sua mediunidade, achando que as manifestações iriam diminuir, mas ao contrário, foram ficando mais freqüentes e intensas. A relação com a escola também era bastante complicada e por isso, seu desempenho ficou prejudicado. “A mediunidade me atrapalhava muito na escola. Imagina, eu chegava na sala de aula e começava a ver a áurea azul e branco na cabeça da mi-
A pessoa que tem mediunidade e não desenvolve, acaba ficando perdido. quando eu cheguei lá, parece que eu me encontrei
pra falar, as pessoas ainda tem muito preconceito [...] Depois de um tempo, as pessoas começaram até a me ligar pra pedir algumas coisas, mas... eu não consigo nem me ajudar, como eu ia conseguir ajudar alguém?!”. A partir deste momento, G. sentia vergonha de sair de casa, com receio de ver ou ouvir alguma coisa, e por isso, decidiu passar mais tempo no lar. Seguidamente entrava em estado de pânico, por causa das visões que tinha enquanto fazia suas orações. “No começo eu sentia muito pânico e enfrentava isso sozinha, porque a minha mãe não en-
nha professora e dos meus colegas [...] e pensava ‘meu Deus, eu quero sair daqui, vou pra casa, vou dormir’”. G. conta que quando acontecia isso, procurava sair da sala, tomar água, lavar o rosto e tentar voltar a prestar a aten-
ção na aula. Mas confessou que era difícil.
A ajuda Somente depois de passar quase toda a infância e início da adolescência sofrendo com medo e dúvidas sobre a sua mediunidade, G. recebeu uma ajuda, de sua prima Raquel, 27 anos, quanto a orientação do caminho que devia seguir. A partir de uma conversa com a mãe, Raquel e sua amiga, que trabalhavam em um centro espírita, orientaram G. a aprofundar os estudos na Doutrina Espírita.
A prima Raquel, que também é médium, con-
receber o passe ou então a energização
tou em entrevista, como começou a orientar
através do Reiki – técnica milenar que equi-
e ajudar G. “Na verdade, por ver a forma de-
libra os Chakras (pontos ou centro de ener-
la agir, e por eu ter passado também por es-
gias) do corpo através da imposição das
sa situação”. Ela fala que a primeira coisa
mãos. Além da energização, o que a mantém
que acontece é as pessoas duvidarem daqui-
bem são as leituras dos livros da Doutrina
lo que o médium diz, por isso é difícil de li-
Espírita. Ela conta que o entendimento
dar com a mediunidade no início.
acerca do que estava acontecendo com ela
Ela fala então, sobre o dia em que ela contou
começou quando viu na estante de seu pai,
para G. sobre sua mediunidade e que as duas
um livro e por curiosidade começou a ler.
dividiram algumas sensações “Num dia nós estávamos na sala e eu estava vendo um vulto e ela também. Aí ela começou a ficar assustada, eu disse: ‘G. você ta vendo alguma coisa?’ e ela: ‘sim’ aí eu disse que também estava vendo. Então foi aí que começou!”. A partir deste momento, Raquel começou a
Eu vi, que não tinha problema em ver espíritos na minha frente, ouvir coisas. Que eles não podiam me fazer mal além do meu psicológico
“Meu pai sempre foi espírita
ainda
quando eu era pequena, as pessoas falavam pra minha mãe que eu tinha mediunidade e eu deveria procurar a Doutrina Espírita”. G.
conversar com ela sobre o as-
e
conta
que
sunto e orientá-la a ler muitos livros. Ra-
sempre sentiu curiosidade sobre o espiri-
quel diz conseguiu ajudar G. por fazer um
tismo, mas tinha muito medo no início.
único gesto: acreditar.
“Conforme eu ia estudando e via o que esta-
Então recentemente, quando tinha quinze
va acontecendo, eu percebia que é melhor eu
anos, G. trabalhou por cerca de três meses
estudar e me aprofundar, que daí não tinha
em uma casa espírita na cidade de Seberi
mais medo [...] principalmente quando eu ia
(RS), mas depois de um tempo teve que se
na casa espírita e via outras pessoas tam-
afastar, pois passava muito mal durante as
bém passavam mal e que então não ia acon-
sessões. “Tinha pessoas que, no que chega-
tecer nada de mal comigo”. G. diz que ao ler e
vam no meu lado, eu já sentia falta de ar,
estudar a doutrina “tu começa a entender
bocejava, sentia um peso na cabeça. Aí eles
tudo. O teu nascimento, a tua morte, tudo.
tinham que me levar lá dentro e me dar um
Vai muito mais além daquilo que tu pensa,
passe”.
que a vida não é só isso, tem muito mais”.
Não percas a tua fé entre as sombras do mundo. Ainda Que Os Teus pés estejam sangrando, segue para a frente, erguendo-a por luz celeste, acima De ti mesmo. Crê e trabalha. Esforça-te no bem e espera Com paciência. Tudo passa e tudo se renova na terra, mas o que vem do céu permanecerá. De todos os infelizes os mais desditosos são os que perderam a confiança Em Deus e em si mesmo, porque o maior infortúnio é sofrer a privação Da fé e prosseguir vivendo. Eleva, pois, o teu olhar e caminha. Luta e serve. Aprende e adianta-te. Brilha a alvorada além da noite. Hoje, é possível que a tempestade te amarfanhe o coração e te atormente o ideal, aguilhoando-te com a aflição ou ameaçando-te com a morte. Não te esqueças, porém, de que amanhã será outro dia.
C HICO X AVIER
Ela conta que o período foi bom, porque pode estar mais em contato com o trabalho mediúnico. Mas o envolvimento com os sentimentos e emoções das pessoas que buscavam ajuda, desestabilizavam a adolescente. A partir do seu relato, entendi que, depois daquele momento sua vida passou a ser mais tranqüila por conta do entendimento sobre o assunto.
O entendimento
O futuro G. fala sobre o momento em que decidiu não esconder mais e trabalhar o seu dom. “Comecei a sentir muita energia ruim e aí comecei a rezar, procurar melhorar. Foi então que eu vi que não adiantava ficar parada, eu tinha que trabalhar isso”. Sobre o futuro, G. fala: “Eu sei que vou ter que voltar a trabalhar no centro espírita. É única forma de
Hoje, G. freqüenta alguns centros espíritas de Frederico Westphalen, mas somente para
sofrer tanto”
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cumprir o meu dever como médium e não
S AUDAÇÃO A O XUM TE X TO
E F O TO
DIEISON MARCONI
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Orixá do Amor, da Bondade e do Ouro. Rainha da Beleza, Senhora dos Rios, Lagos, Açudes e Cachoeiras. O XUM : Senhora das Águas Doces S INCRETISMO : Nossa Senhora Aparecida D IA DA S EMANA: sábado COR: amarela S AUDAÇÃO : "Ayê Yêu" - "Yê Yêw" - "Ora minha Oxum - "Òsun"
Louvação a Oxum Orarei a Oxum Que adoro Oxum Sei que sim Xinguinxi comigo Orarei a Oxum Que adoro Oxum Sei que sim Xinguinxi comigo
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R
osas amarelas, vestidos brancos rodados, pés descalços e capas de um amarelo dourado rodando no centro do terreiro. Ayê Yêu, Oxum! São
Filhas de Oxum! Os presentes fazem fila, aguardam a benção. Ao toque de Oxum fecham os olhos, as mãos da Orixá acariciam seus rostos, deslizam pelos seus braços, lhe envolvem com mantos dourados. Quem quiser a benção, que se deixe tocar. Oxum não fala, Oxum abençoa com as mãos, sente, emana, vibra. E ao som do tambor elas seguem abençoando a comida, a bebida, as pessoas presentes, fazem passes numa expressão dolorida e alegre, atendem pedidos de amor, protegem.
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A
festa era pra Oxum, mas há o som do tambor que clama por Iemanjá e sua fertilidade E ela
dá o ar da graça, seu temperamento cor de mar. Logo, todos os orixás se fazem presentes. Ogum com sua força e bravura. Xangô, senhor do fogo, da justiça e do trovão. Oxossi e Yansá, fluindo no ambiente, descarregando sentimentos. Todos aos olhos de Oxalá. Êpa-Bábá! Epaô-Bábá!
M AMRAGRIN Á LÁIA G IN L IA 2 22 1
A
definição clássica do que é umbanda foi aprovada na II Convenção Nacional da Umbanda, realizada pelo Conselho Nacional Delibera-
tivo da Umbanda e dos cultos afros - Condu/RJ, nos dias 25 e 28 de agosto de 1978. Umbanda é uma manifestação divina, culto de caráter místico religioso, projetado no plano astral do Brasil, com fundamento na caridade. “Uma vibração de amor, trazida pelas entidades espirituais”. No entanto, suas origens são muito mais antigas do que esta convenção no Condu. A palavra umbanda deriva de m'banda, que em língua quimbundo significa "sacerdote" ou "curandeiro". Os cultos combinam elementos da filosofia espírita kardecista, dos vários cultos afro-brasileiros, tradições indígenas, do cristianismo católico e modernamente, conhecimento vindo de cultos esotéricos. Fundamentos da Umbanda, segundo a Convenção Nacional da Umbanda 1. A existência de um Deus único; 2. Filosofia Religiosa Universal; 3. A existência dos Orixás, entidades evoluídas; 4. A Reencarnação; 5. A Lei de Causa e Efeito; 6. A existência de outras vidas, de outros Planos e de outras Linhas de Evolução; 7. A natureza trina do homem: Espírito, Alma e Corpo; 8. A prática da Mediunidade; 9. A manifestação dos Guias Espirituais, ainda em evolução nos Planos Intermediários e que são os mensageiros dos Orixás; 10. A prática do BEM, através dessas manifestações.
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Eu vi mamãe Oxum na cachoeira Sentada na beira do rio Colhendo lírio lirulê Colhendo lírio lirulá Colhendo lírio Pra enfeitar o seu congá Ê areia do mar que o céu serena Ê areia do mar que o céu serenou Na areia do mar mar é areia Maré cheia ê mar marejou
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O PODER DE VER O FUTURO TE X TO E F O TO S
JOSAFÁ ROHDE
“
Em 2014 vejo o mundo muito revoltado, muito
vida para sempre. “Há muitos anos atrás estavam refor-
protesto por todo o lado, o pessoal não vai se
mando a igreja no centro da cidade. Eram cinco horas da ma-
acalmar”, prevê Luana Porto, logo após ela pedir para eu ti-
drugada e eu acordo com uma mulher de branco no meu
rar quatro cartas de um baralho. Graduada em letras e mes-
quarto. Ela não falava nada, não abriu a boca, mas veio tudo
tre em educação, autora de quatro livros, Luana é
na minha mente o que ela queria me dizer”, conta a vidente,
cartomante na cidade de Palmitinho, interior do Rio Grande
que ficou assustada com a visita inesperada.
do Sul. Acredita em Deus, nos Orixás, em Buda, Jesus Cristo e
“Eu não sei te explicar como funcionava. Mas ela me dizia as-
em santos. “Eu acho que Deus é a força maior. Santos, Maria,
sim, ‘eu não quero que esse homem que está reformando a
a mãe de Jesus e Buda, eu acho que foram espíritos bons que
igreja morra. Ele vai cair do andaime e vai morrer. Avise al-
passaram na Terra e que tinham dons”, defende.
guém’. Pensei, ‘meu Deus o que vou fazer?’. Eu recém havia
Luana se diz sem religião e de um punhado de crenças forma
chegado na cidade. Fui até o dono da rodoviária e contei tudo.
sua própria fé. Luana é sincretista. Nascida em Porto Alegre,
Pedi para ele ir até a obra e avisar para eles se cuidarem com
está no norte do estado há quase duas décadas. O espaço on-
o andaime”. Ele acreditou em Luana e deu o recado ao grupo
de atende suas clientes fica em seu próprio apartamento. Um
que reformava a igreja. Então todos começaram a usar uma
local onde se misturam imagens e símbolos da sua fé. O espa-
espécie de corda na cintura para proteção. Luana relata que
ço onde joga as cartas tem ao centro uma mesa com baralhos,
dois dias após o aviso o homem citado pelo espírito caiu do
rosário, velas e outros adereços.
andaime. “Mesmo com a corda se machucou, mas não mor-
Ainda pequena Luana descobriu sua espiritualidade. “Quando
reu. E você pode ir até a rodoviária e pedir sobre isso. O dono
criança eu vi alguns espíritos, eu era uma médium visual, eu
de lá é minha testemunha. Até hoje me impressiono com este
enxergava. Mas eu não gostava de ver e pedia para não ver episódio”. mais”, relata. Hoje em dia a cartomante se define como uma Desde a infância que Luana vê espíritos e joga cartas. A carmédium sensitiva. “Eu tenho sensibilidade para ler um orá-
tomante diz que aprendeu a jogar o baralho cigano com a
culo, ler as cartas, essa minha sensibilidade me permite is-
avó, que também era médium. “Minha avó percebeu minha
so”.
mediunidade e me ensinou a jogar o baralho cigano. Ao logo
É com essa sensibilidade que Luana diz ajudar suas clientes. A
da minha vida aprendi a jogar outros baralhos também. Eu
maior parte das previsões que faz vem do baralho cigano. A
também já fiz vários cursos”, revela. Reiki, florais, tarô,
cartomante relata que as dúvidas mais frequentes são em
formação psicanalítica dentre outros fazem parte da lista.
relação a vida amorosa. “As pessoas geralmente querem sa-
Mas então, ler cartas é ciência?, pergunto. “Não. Eu desde
ber sobre seus relacionamentos, pessoas que estão envolvi-
criança lia as cartas pela sensibilidade, mas os cursos aju-
das ou se envolvendo. Também procuram saber sobre a vida
dam aprimorar a leitura”, conta ela.
profissional e sobre o futuro em geral”, conta. E sobre as
Além disso, Luana faz previsões astrológicas e faz numero-
previsões, você só conta o lado cor de rosa, pergunto. Luana
logia. “São duas coisas totalmente diferentes, e também das
diz que não. “Não trabalho assim, eu falo o que eu vejo. Se eu
cartas. Fiz cursos e aprendi a trabalhar nesta área também.
vir que você está se envolvendo com alguém que não será
Mas eu trabalho pouco nesta área, o que o pessoal mais gos-
bom para você eu falo, nunca escondo”, garante.
ta são as cartas e os florais, por serem mais práticos”.
Em meio a tantas dúvidas que chegam todos os dias, muitas
E trabalhos, os ‘feitiços’, Luana faz? A cartomante garante
respostas vem sem haver perguntas. Muitas delas já tiraram
que não. “Já me procuraram para fazer. Eu sei que existe,
o sono da cartomante, como em um episódio que marcou sua
mas não sei fazer e não faço. A única coisa que eu trabalho
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são com cartas e energização.
O destino Luana acredita que muitas coisas estão pré-determinadas, mas temos livre arbítrio. “Tem coisas, por exemplo, que não vai mudar. Se eu sentisse na tua energia um acidente, eu ia te falar e você poderia reverter. Destino a gente vai fazendo, mas algumas coisas chaves em nossas vidas estão determinadas”, acredita. Já que muito do que vai acontecer já está pré-determinado, pedimos para Luana fazer algumas previsões para 2014, acompanhe:
O B ra s i l e m 2 0 1 4 : estranho. Vejo muita violência contra mulheres, muitos assassinatos, é o que mais chama atenção no próximo ano para o país. O m u n d o e m 2 0 1 4 : bem agitado, não vejo tranquilidade. O mundo todo vai protestar em 2014, há uma inquietação geral. O s m é d i co s cu b a n o s n o B ra s i l: eles fazem um bom trabalho. Mas como está todo mundo de olho neles, vai vir a tona na mídia muitos episódios sobre eles que não serão muito bons. D i lm a Ro u s s e ff: vejo um cenário complicado para ela. Não será fácil ela se reeleger, há possibilidade dela não ganhar as eleições
em 2014. Ta rs o G e n ro : Luana ri, e responde, “reclamam e reclama, mas aparece muito bem, mostra que ele vai se reeleger”. Lu la : o Lula tem que cuidar da saúde dele! Parece que câncer vai voltar, ou uma doença mais séria. Ele vai fazer uma retirada em 2014, não vejo ele se sentindo bem. Vla d i m i r P u ti n : esse homem é louco. Ele vai sofrer muito ano que vem por causa do conservadorismo. Muitos protestos contra ele, e terá que voltar atrás em algumas decisões. Ei ke B a ti s ta : todo mundo acha que ele tá falido, mas tem muito dinheiro em outros in-
vestimentos que ninguém desconfia. Ele perde, ganha, é uma loucura. É um homem muito namorador... O que ele quer é namorar! Pa p a B e n to XVI : vai continuar mexendo na igreja e desagradando muita gente. Mas ele tem que tomar cuidado, porque tem muita gente de olho e podem aprontar para ele. Ele deve fazer muitas mudanças em 2014. Mas será que tudo isso vai acontecer, mesmo? Luana responde: “uma pessoa que lê cartas há 20 anos, se as previsões dessem errado, as clientes iriam continuar voltando em uma cidade de seis mil habitantes?” E você, acredita?
Simpatia para aumentar sorte Numa quarta feira, encha um recipiente com água, e coloque de manhã em baixo do sol, e uma estatueta de coruja em um lugar resguardado, dentro da casa. Deixe a água o resto do dia, até que o sol se ponha no horizonte. A noite, use a água para salpicar (ou esborrifar com um spray) na estatueta de coruja. A simpatia pode ser feita todas as quartasfeiras de um mês, mas lembre-se, a água não deverá ser a mesma. Para cada dia, deverá ser trocada, e cuide para que ninguém mexa na estatueta enquanto o ritual estiver sendo realizado.
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O S ANDARILHOS DA FÉ TE X TO
MARÍLIA DALENOGARE F O TO S MARÍLIA DALENOGARE GISLENE GOULART
mundialmente por sua prática, J áa conhecidos pregação de porta em porta é uma carac-
e se tornaram a base da religião. As testemu-
terística intrínseca das Testemunhas de Jeová.
dos cristãos do primeiro século. “Visto que Je-
Religião essa que teve início no século XIX, nos
sus é o fundador do cristianismo, nós o consi-
Estados Unidos, com um grupo de estudantes
deramos o fundador de nossa organização”,
da Bíblia. Há aqueles que acreditam que a pre-
explica o site da religião.
gação é uma obrigação para os integrantes da
O nome da religião é justificado porque, se-
religião. Porém, eles garantem que não, é um
gundo a Bíblia, Jeová é o nome de Deus, e tes-
trabalho voluntário, baseado em uma ordem
temunha é alguém que declara publicamente
de Jesus, para que seus seguidores ‘fizessem
as verdades que tem conhecimento. Logo, eles
discípulos de pessoas de todas as nações’.
se identificam como um grupo de cristãos que
“Eu me tornei testemunha depois que eu rece-
declaram a verdade sobre Deus/Jeová, a par-
bi a visita de outras testemunhas, as quais me
tir dos ensinamentos da Bíblia.
ensinaram os ensinamentos bíblicos. Quando
As testemunhas atuam nas suas reuniões, em
cheguei aqui eu não queria sair para pregar,
que analisam a Bíblia e colocam em prática os
pensava que nunca ia fazer. Hoje faço com ale-
seus ensinamentos e, além disso, fazem simu-
gria. É muito bom ser bem recebido em uma
lações das visitas as residências. Estudando
casa e ver alguém escutando o que você fala.
argumentos e formas eficazes de convencer os
Ver que você fez alguma coisa importante pa-
moradores a aceitarem os ensinamentos bí-
ra alguém, que teu trabalho funcionou”, conta
blicos. Também se reúnem nos salões dos rei-
um dos integrantes do reino de Frederico
nos para as últimas orientações nos sábados e
Westphalen. O modo que esse membro aden-
domingos, antes de sair pregar de porta em
trou a religião é um dos mais comuns, diver-
porta.
nhas esclarecem que eles seguem o modelo
sos fiéis procuram o salão do reino após ter Após a reunião, elas se dividem em duplas e recebido a visita de pregação, contam as tes- traçam os seus roteiros, dividindo a cidade em territórios, alcançando grande parte da po-
As testemunhas de Jeová não usam a palavra
pulação. Como nem todos os municípios pos-
igreja, mas sim salão. Isso acontece porque na
suem salões, também são responsáveis por
Bíblia, a palavra “igreja” se refere a um grupo
pregar em algumas cidades da região. Eles sa-
de adoradores, não ao local onde eles se reú-
lientam que as reuniões são abertas e não são
nem. Por isso, o local de reuniões é chamado
feitas coletas.
de “Salão do Reino”. A religião teve início no
O financiamento da religião se dá através de
século XIX, quando um grupo de estudantes da
caixas de donativos disponíveis nos salões. As
Bíblia da Pensilvânia (EUA), começou a anali-
testemunhas não são obrigadas a doar, nem
sar sistematicamente o livro. Esse trabalho
pagam dízimo. Todo o trabalho realizado na
era feito para comparar as doutrinas ensina-
religião é voluntário. Os donativos também
das pelas outras igrejas com o que dizia na Bí-
servem para ajudas humanitárias em desas-
blia. Suas conclusões foram sendo publicadas
tres, apoio aos missionários e construções dos salões ao redor do mundo.
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temunhas.
Dados sobre a religião A pregação é feita em 239 países; As bíblias e publicações são produzidas em 595 idiomas; Existem 111.719 congregações; A religião conta com 7.538.994 evangelizadores; Até o momento, 19 milhões de pessoas assistem as reuniões ou congressos; Nos últimos dez anos, 20 bilhões de publicações bíblicas foram produzidas.
Cada congregação é supervisionada por um
é realizada em mais de 230 países.
grupo de anciãos, que são aqueles que fazem
E o que é essa pregação? O ancião explica. “a
parte da religião há algum tempo, tem um
Testemunha vai falar o que aprendeu na Bíblia,
grande conhecimento sobre a Bíblia e foram
na perspectiva de que o Reino de Deus é a solu-
capacitados para a função. Cerca de 20 congre-
ção dos problemas da humanidade. Temos a in-
gações formam um circuito e cerca de 10 cir-
tenção de mostrar para as pessoas os
cuitos formam um distrito. A sede mundial se
ensinamentos bíblicos. Ela que escolhe se quer
encontra em Nova York (EUA), juntamente com
ou não fazer parte do grupo”, destaca. O livro
o Corpo Governante, um grupo de Testemunhas
das testemunhas é uma sequência de estudos
de Jeová experientes que instruem acerca da
bíblicos, o estudo completo levará de seis me-
Bíblia.
ses a um ano, com encontros semanais. Após o
O ancião do Salão do Reino das Testemunhas de
fim do livro, para ter acesso a mais material,
Jeová de Frederico Westphalen, Jaime Francis-
ela deverá ingressar na igreja.
chet, conta que para integrar a religião é ne-
A recepção dos moradores é um reflexo da
cessário ter uma vida em harmonia, pacífica,
atenção que aquela pessoa dá a Bíblia, destaca
amor ao próximo, viver de acordo com os prin-
o ancião. “Aqui em Frederico Westphalen anti-
cípios bíblicos, ser uma pessoa exemplar na co-
gamente era diferente, hoje a população está
munidade e enaltecer e defender a soberania
mais acessível, as pessoas estão mais educa-
de Deus. Quanto ‘a pregação das boas novas do
das. A recepção está bem melhor”, explica. Po-
Reino de Deus’, ele salienta que não é uma obri-
rém, apesar das boas novas, mesmo com a
gação, mas é um requisito bíblico. Em Frederico
rejeição as testemunhas não desistem. “Nós
Westphalen, a religião está presente há mais
vamos e oferecemos o estudo bíblico gratuito.
de 40 anos e atualmente conta com 31 mem-
Se a pessoa não quiser, voltaremos lá em outro
bros fixos.
momento, porque as pessoas mudam de ideia”,
Francischet também explica que são as pessoas
destaca.
que demonstram interesse em pregar, e a par-
A má recepção por parte dos moradores não
tir disso, os anciãos fazem uma consideração.
impede o trabalho dos pregadores. “Só vai pa-
“Para isso a pessoa precisa ter um estudo bí-
ra a rua a pessoa que estudou um pouco e tem
blico regular e, com isso, quando ela sentir a
uma experiência. Ela vai preparada para rece-
vontade para visitar as casas, nós avaliaremos
ber um sim ou um não. E ela entende que o
e se ela estiver disposta, ela poderá ir”, sali-
“não” não é para ela, e sim para o que está
enta Jaime. Atualmente, a pregação da religião
pregando”, diz Franceschet.
Algumas crenças das testemunhas Os membros da religião seguem Jesus Cristo, se baseiam na Bíblia e acreditam que agem em conformidade com o Cristianismo praticado no primeiro século. São cristãos porque agem de acordo com os ensinamentos de Jesus, são batizados em seu nome e acreditam que ele seja a autoridade maior sobre todos os homens. Porém, creem que Jesus é filho de Deus, não parte de uma trindade, que a alma não é imortal e que não há o inferno, pois Deus não torturaria as pessoas eternamente nesse local. Além disso, as Testemunhas de Jeová acreditam que aqueles que têm responsabilidades na congregação não devem receber títulos que os coloquem acima dos demais. Não existe separação entre clérigos e leigos, todos os membros batizados são ministros ordenados e participam na obra de pregação e ensino. As Testemunhas de Jeová também não cultuam a cruz, pois Jesus morreu em uma estaca ou poste, segundo a Bíblia. Além disso, eles evitam adorações, pois o que identifica os seguidores de Jesus é o amor, não qualquer imagem ou altar, por exemplo. Se uma Testemunha de Jeová batizada viola o código de moral da Bíblia e não se arrepende, ela é desassociada.
Nada de celebrar o Natal Segundo o ancião Francischet, o Natal não é uma data bíblica e sim inventada, por isso não é celebrada pela religião. O que eles celebram é um acontecimento presente na Bíblia, a morte de Jesus. Todos os anos eles se reúnem para celebrar o dia em 14 de Nissan, uma data do calendário judaico.
A polêmica da transfusão de sangue
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Um dos assuntos mais contraditórios sobre as Testemunhas de Jeová é o fato deles não aceitarem transfusão de sangue. Esse assunto gera polêmica, principalmente por informações de que pessoas em todo o mundo morrem ao manter essa regra. Segundo a religião, a explicação para esse princípio é que o Velho e o Novo Testamento ordenam a abstenção de sangue. Além disso, é uma forma de respeitar Deus como o doador da vida. Eles aceitam tratamentos médicos e remédios, não acreditam em cura pela fé, mas sim em procedimentos médicos e até cirúrgicos que não usam de transfusão de sangue.
Outros peregrinadores: os Mórmons Assim como as Testemunhas de Jeová, os mórmons também realizam um intenso trabalho de evangelização de porta em porta, o grande destaque da religião. Provavelmente todos já viram aqueles jovens loiros de camisa branca e com uma Bíblia na mão andando pela cidade. Sim, eles são os mórmons. E é assim, de visita em visita, que as perspectivas de crescimento dos praticantes estão se confirmando. O número atual de 12 milhões de mórmons pretende crescer para 50 milhões dentro de 40 anos. O maior aumento está previsto para os EUA, terra natal da religião. Porém, somente aqui no Brasil, nos últimos seis anos, o número de mórmons cresceu 460%. Hoje em dia existem 928 mil membros no nosso país. Os mórmons fazem parte de uma igreja denominada “A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias”, que teve início no século XIX, nos EUA. O primeiro profeta Mórmon foi Joseph Smith, que teve uma visão da vinda de Deus e Jesus Cristo para a Terra, mais especificamente para os EUA. Na oportunidade, a liderança religiosa solicitou que o jovem criasse uma nova religião, recuperando as diretrizes da verdadeira igreja. Esse acontecimento ficou conhecido como “A Primeira Visão”. O Livro de Mórmon foi escrito por Smith, a partir da visita de Deus e Jesus Cristo à Terra. Ele demorou cerca de 10 anos para produzir todo o material compilado por um dos profetas que acompanhavam a viagem, o Mórmon. O seu livro ficou conhecido como o capítulo seguinte do Novo Testamento. Uma das curiosidades do livro é que a poligamia masculina era permitida, o homem pode ter mais de uma parceira. Devido a sua polêmica, a prática foi extinta pelos praticantes em 1890, a partir de uma “revelação divina”. Atualmente, cerca de 60% dos jovens mórmons acima de 19 anos saem para pregar em todos os continentes, prática que teve início há 177 anos e segue se fortalecendo a cada visita. Uma das principais crenças dos mórmons é de que aqueles que seguem os mandamentos podem chegar à divindade e se tornarem Deus.
E os adventistas, também pregam? A resposta geral para essa pergunta é não.
pessoas nas suas residências é através de
mo. Além disso, eles não usam de adornos
Pelo menos, não da forma como as Testemu-
serenatas. Essa atividade é feita pelos mem-
como joias e enfeites, apenas a aliança sim-
nhas de Jeová ou os Mórmons fazem. A pre-
bros da igreja junto aos seus amigos, famili-
bolizando o casamento. Inclusive, relações
gação para os Adventistas do Sétimo Dia é
ares e demais simpatizantes da religião.
sexuais são permitidas apenas dentro do
realizada em momentos específicos. Um dos
Nessa oportunidade, eles cantam músicas de
matrimônio. A religião também incentiva a
casos mais comuns é quando alguém vai até
amor a Jesus.
manutenção do conhecimento, através dos
a igreja e se interessa pelos ensinamentos
A religião é baseada na crença de que Jesus
estudos, e a boa vivência na comunidade.
bíblicos. Nessa situação, os adventistas vão
voltará para a terra e levará seus filhos
Segundo o pastor adventista, Eliandro Ni-
até a casa dessas pessoas que solicitaram
com ele para o Reino de Deus. Por isso, eles
derstrasser, a prática surgiu oficialmente
conhecer a Bíblia e levam os ensinamentos
não acreditam que a morte é como um sono,
em 1863, nos Estados Unidos, com um grupo
acerca dela. Os interessados podem solicitar você não vai a lugar algum, apenas repousa
que passou pelo desapontamento de não
essa visita junto aos frequentadores da
enquanto espera o retorno de Jesus. Além
presenciar o advento, a volta de Jesus, e
igreja também.
disso, a religião salva os sábados, do pôr do
passou a estudar a Bíblia e formar as dou-
Outro trabalho realizado de casa em casa
sol de sexta-feira ao pôr do sol do dia se-
trinas dos adventistas. A religião é compos-
pelos adventistas é a venda de material de
guinte.
ta por 28 doutrinas fundamentais, todas
divulgação, prática realizada geralmente
Quanto a princípios básicos, os adventistas
retiradas dos ensinamentos bíblicos. E toda
por estudantes. Ou até mesmo a distribuição
condenam a bebida, o fumo, o café e algumas
a atividade do membro é pautada pelo Ma-
gratuita de folders, livros e demais ensina-
carnes, como o porco e camarão, pois eles
nual da Igreja, reformulado a cada cinco
mentos que baseiam a religião. Outra forma
têm um cuidado especial com a saúde. A reli-
anos. “Nenhum livro é superior à Bíblia, ela
curiosa dos adventistas interagirem com as
gião não obriga, mas indica o vegetarianis-
é a palavra final”, conclui o pastor
M A R G IN Á L IA 2 9
A PALAVRA DA M ENINA M ORTA A
lgumas
vertentes
religiosas,
em
especial o Cristianismo, são sexofóbicas:
abominam, preconceituam e marginalizam as relações sexuais, ao menos para com aquelas que são encaradas estritamente carnais. Do alto de um discurso conservador e anacrônico, essa sexofobia cristã tem suas raízes
na
formação
da
comunidade
abraãmica, um povo predestinado por Deus para procriar e firmar um projeto de civilização. Quem se deixa imergir no mito da formação de povo hebreu, o qual daria origem a nossa sociedade pró-natalista não teria
ficado
surpreso
com
Madonna
sensualizando com crucifixos e beijando santos nos idos dos anos 1980. Tão pouco se surpreenderia com homens e mulheres feministas enfiando em seus órgãos genitais imagens de santos que por milhares de anos foram e continuam sendo signos de opressão. Mas muitos se surpreenderam (e ainda irão se surpreender) ao assistirem A Festa da Menina Morta, filme de Matheus Nathergaele lançado em 2009 que gerou polêmica e esvaziou cinemas nacionais ao fazer
com
que
sexo
e
religião
atravessassem ritos e identidades dentro de uma população ribeirinha no alto Amazonas. Mas ao contrário do que faz a arte de Madonna e as ações de ativistas, em a Festa da Menina Morta as sexualidades não estão ali como embate e signo de resistência, embora não se deixem oprimir. E a religião, por sua vez, não é um signo opressor, mas acolhe e aceita estas sexualidades. Se por si só algumas religiões são sexofóbicas, seria um tanto obvio dizer que algumas delas são
TE X TO DIEISON MARCONI
Foto Divulgação
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homofóbicas, não é mesmo? O argumento? O mesmo para defender a aversão ao sexo: sexo foi feito para procriar. O mito de formação do provo hebreu ressalta que cada esperma desperdiçado é um verdadeiro crime de lesanacionalidade, pois todo sêmen deveria ser depositado no único receptáculo capaz de reproduzir um novo ser humano: o vaso natural da mulher. Dois homens transando, por exemplo, são duas sementes vitais desperdiçadas. Um ato, em essência, que deveria ser recriminado. Mas e quando um homem gay, afeminado e que desperdiça sua semente vital transando com seu próprio pai é considerado Santo por uma legião de fieis? Essa é a história de Santinho, personagem interpretada por Daniel de Oliveira em A Festa da Menina Morta. O filme, dentro de um espaço de forte crença religiosa traz um homossexual que não é considerado promíscuo, pecador, sujo e profano como geralmente são figuradas as homossexualidades dentro de algumas ideologias, crenças e cenários religiosos. Pelo contrário, é como se ao incorporar o status de santo, a homossexualidade de Santinho e inclusive sua prática sexual incestuosa fossem inteiramente naturalizadas e normalizadas. Ao romper com um padrão heteronormativo de ser e viver a sexualidade, inclusive visualmente através de suas vestimentas ou de sua corporalidade, Santinho permite que a religião não seja inquisitória. Pelo contrário, que não só aceite normalmente sua condição e expressão de sua sexualidade, como também o venera e encontra justificativa no próprio mito que o criou para aceitar o personagem como ele é. Mas o paradoxo e a surpresa do filme não estão apenas em uma personagem gay, incestuosa e santa, mas também na história real que deu origem ao filme. A Festa da menina morta foi gravado em 2008 no município de Barcelos, no Estado do Amazonas, e, segundo o próprio diretor, a ideia para o roteiro veio quando o mesmo filmava O Auto-da Compadecida em Cabaceiras, interior da Paraíba. Matheus presenciou uma cerimônia religiosa na casa de uma família que oferecia seu terreno para a celebração do milagre de sua filha que havia desaparecido e jamais foi encontrada, mas receberam seu vestido rasgado após muitas preces. Além de não compreender a comemoração de um milagre que parecia não existir, Matheus indignou-se ao ver que a comemoração assumia um sério teor comercial, com música ao vivo e venda de cerveja. De forma experimental e com ótimo elenco, após anos e anos com o roteiro na gaveta, Matheus transpôs esta história para o cinema. Acrescentando algumas particularidades na história, todos os anos, há duas décadas, a cidade de Barcelos celebra a festa da menina morta. A cidade recebe peregrinos que desejam obter a bênção de um jovem santo, conhecido como Santinho e que obteve tais poderes após o suicídio da mãe. Nesse mesmo momento, Santinho recebe em suas mãos, da boca de um cachorro, os trapos do vestido de uma menina desaparecida. A partir deste episódio, todos os anos esta menina fala pela boca do Santo em transe. Se aproveitando de um caso real, Matheus consegue colocar em tela todas as críticas possíveis aos nossos hábitos e tradições institucionalizadas, principalmente sobre nossos preconceitos, a construção de mitos, a necessidade de fé e a sua comercialização. No final das contas, diante de tantas opressões, realidades agonizantes e escapismo em mitos construídos, a palavra será sempre dor. E da dor, não podemos ter medo, é o que diz a Menina morta
A festa da menina morta A festa da menina morta É festa de quem já se foi É noite clara pra chorar, E se chorar... Lagrimas noite a dentro Se o medo imperar, peito pesar Pé, no châo. Olhe ao redor, veja quem vem Que o mundo é real ilusão Olhe ao redor, veja quem vem Que o mundo é real ilusão Mas se... O dia nascer azul Na mata fechada quero lhe encontrar deitada Pronta para despertar...
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Pronta para despertar,
DESANA OS RIBEIRINHOS DE SÃ TE X TO E F O TO S
CAMILA SOUZA
O JOÃO DO TUPÉ
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Qcoração da maior floresta tropical uase 2 milhões de pessoas moram no
mina o ritmo dos manauaras, lento. Lento como as águas do Rio Negro que
do mundo. Manaus é uma distinta se-
curre junto à cidade. O seria Manaus que
nhora brasileira com mais de 340 anos
corre junto ao rio?
de idade. Como uma boa dama, já viveu
Manaus assim o é em homenagem aos
seu auge, na juventude chegou a ser
que dali sempre foram. Antes dos ho-
considerada a Europa brasileira. Heran-
mens brancos e suas crenças e doenças
ça nobre que se vê nos contrastes, a ar-
avançarem até o coração da mata, dife-
quitetura imponente frequentada por
rentes etnias indígenas coexistiam na
um povo cor de cuia e enormes olhos ne-
selva amazônica. As margens dos 2.230
gros. A atmosfera é pesada, culpa da
km do Rio Negro milhares de almas (só
umidade. Muita água no ar. O que deter-
assim declaradas em 1537) constituíram
Logo depois do dilúvio Borika fincou o bastão no centro do mundo e marcou Norte, Sul, Leste e Oeste e em círculos o território indígena, por isso para os indígenas o mundo não tem fronteiras, eles são os pioneiros da Terra
Kissibi Kumu
sociedades que lutam há milhares de anos por sua sobrevivência. Enfrentaram desde as míticas bestas selvagens aos inimigos invisíveis do mundo civilizado. Os remanescentes destas tribos que por lá ainda vivem hoje estão representados pela Federação das Organi-
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zações Indígenas do Rio Negro (Foirn). Navegando à margem esquerda do rio Negro, distante aproximadamente 25km em linha reta do centro de Manaus, a uma altitude média 20m acima do nível
do mar, encontra-se a Praia do Tupé. O nome Tupé é um termo indígena, na língua Tupi significa entrelaçado (tecidos trançados com talos de arumã), usado para fabricar objetos de arte. E é também na comunidade de São João do Tupé que se localiza a tribo Desana, uma etnia milenar que tem descido o rio junto a correnteza. Os Desana tem sua origem no Alto Rio Negro, ás margens do rio Tiquié, próximo a fronteina com a Bolívia.
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Um índio descerá de uma estrela colorida, brilhante De uma estrela que virá numa velocidade estonteante E pousará no coração do hemisfério sul Na América, num claro instante Depois de exterminada a última nação indígena E o espírito dos pássaros das fontes de água límpida Mais avançado que a mais avançada das mais avançadas das tecnologias
Um índio Caetano Veloso
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Não faltam registros na internet, fotos e vídeos, da mesma maloca e o mesmo pajé, fazendo as mesmas danças. Hoje os desana vivem turismo. Por mais contraditório que pareça, a tribo está fixada em uma reserva de desenvolvimento sustentável (REDES), o que segundo o pajé Kisibi Sumu os impede de cultivar a terra. Segundo o governo municipal de Manaus “as REDES são unidades de conservação de uso sustentável e tem como objetivo básico preservar a natureza e, ao mesmo tempo, assegurar as condições e os meios necessários para reprodução e a melhoria dos modos e da qualidade de vida e exploração dos recursos naturais das populações tradicionais, bem como valorizar, conservar e aperfeiçoar o conhecimento e as técnicas de manejo do ambiente, desenvolvido por estas populações”. Já para a Central de Turismo Comunitário da Amazônia “a abertura de comunidades indígenas para a recepção de visitantes foi consequência de um intenso trabalho de suas Associações de Moradores em parceria com as organizações não governamentais
Nymuendaju
e
Instituto
de
Pesquisas Ecológicas (IPE) que visa à geração de trabalho e renda para os comunitários promovendo seu protagonismo na gestão da atividade turística local”. Polêmicas a parte, a realidade é que a tribo, que hoje não chega a trinta integrantes, investe no turismo como meio de subsistência. De hora em hora os desana se apresentam na maloca da aldeia. Kisibi passa corrido o mesmo texto, num português meio difícil de entender (afinal sua língua é o tukano), apresentando as danças e rituais da etnia.
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Se não existisse essa sombra, os indígenas não existiriam mais na Terra. Essa sombra que ensina os remédios com plantas, as orações tradicionais. O branco marca tudo no papel, o índio tem tudo na cabeça
Kissibi Kumu
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Se Deus quiser Um dia eu quero ser índio Viver pelado Pintado de verde Num eterno domingo Ser um bicho preguiça Espantar turista E tomar banho de sol
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Baila Comigo Rita Lee
M AÇONARIA UMA ATUAÇÃO SILENCIOSA TE X TO E F O TO S MARÍLIA DALENOGARE
O vulto de segredos que cerca a prática da Or-
implica uma entidade aberta à aqueles que se
dem Maçônica faz com que as mais diversas
interessem em participar. Para ser um maçô-
ideias sobre a fraternidade sejam ouvidas. Es-
nico você deve ser convidado por um membro
se segredo, ou “sigilo/descrição” como prefe-
de alguma loja. Um dos irmãos alertou que se
rem os maçônicos, leva a imaginação coletiva a
oferecer a um maçônico não fará com que você
correr solta. Grande parte da população acre-
seja convidado, mas a tentativa é livre.
dita que a ordem é responsável desde ações
O segredo acerca da fraternidade é tanto que a
maldosas até sacrifícios humanos. Um tópico
entrevista para essa matéria levou um bom
que faz as fontes dessa matéria, dois irmãos
tempo para ser marcada, pois o grupo teve de
da Augusta e Respeitável Loja Simbólica Rege-
deliberar sobre a exposição. Além disso, o en-
neração, rirem, provavelmente de tanto ouvir contro foi realizado à noite e em um carro, histórias assim. “Não, a maçonaria não come
para evitar os bisbilhoteiros. Apesar disso, os
criancinhas”, ressaltam os irmãos.
irmãos maçons garantem que não acham a
A identificação dos maçônicos entre si como ir-
fraternidade algo macabro. Há quem discorde.
mãos é um dos princípios da maçonaria. Se-
Essa matéria foi construída principalmente a
gundo as fontes, a Ordem Maçônica é uma
partir do depoimento dos dois irmãos maçôni-
fraternidade composta por homens, ou me-
cos citados acima, com a ajuda de pesquisas
lhor, irmãos, inclusive, as mulheres dos ir-
online. Porém, a internet acabou se mostran-
mãos são conhecidas como cunhadas. O termo
do uma fonte parcial no que diz respeito ao
“sociedade” que também se usa ao referir-se
tema. Por isso, ela foi pouco usada.
à fraternidade não é 100% correto, porque
Vamos às informações...
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Sobre a maçonaria
Uma criação incerta
Apesar de ser confundida com
maçônicos ressaltam a sua atua-
uma religião, a maçonaria é uma
ção filantrópica. A única diferen-
fraternidade composta apenas
ça, segundo eles, é que eles têm
por homens. Segundo as fontes
uma atuação silenciosa, que não
dessa matéria, ela não é contra,
precisa ser mostrada ao público
nem prega nada contra religião.
para ser realizada. Evitar a ex-
“Muito pelo contrário, para ser posição da ordem poderia ser aceito na maçonaria você tem que considerada a regra número um ter uma crença, independente de
da maçonaria. Para se fazer uma
qual for”.
relação lógica, os irmãos maçôni-
A fraternidade pode ser descrita
cos explicaram que o Rotary Clu-
como um grupo de homens que se
be e o Lions Clube, por exemplo,
reúnem para atuarem em prol da
foram entidades criadas por ma-
sociedade. Inclusive, os irmãos
çons e têm atuação semelhante.
A s Lojas Maçônicas Lojas são as estruturas simbólicas dos maçônicos. São os espaços em que eles atuam, equivalente às igrejas para os católicos e os terreiros para os umbandistas. Em Frederico Westphalen, a loja
maçônica foi inaugurada em 12 de março de 2012, e se mantém oculta para não haver má intenção ou colocação do que são ou realizam, como explicam as fontes.
Não é segredo, apesar de ser secreto Segredo não é uma palavra que os maçons gostam de usar para descrever sua atuação na sociedade. Preferem algo como sigilo ou descrição. Eles explicam que a maçonaria ainda é muito mal vista na sociedade atual e a culpa é da história. “Temos esse sigilo porque a maçonaria, como o catolicismo, por exemplo, já foi muito mal utilizada por certas pessoas, pois ela também tem certas capacidades que já foram usadas pelo mal. Alguns mancharam a história da maçonaria e foram tirados da fraternidade para não utilizá-la para o mal novamente. O sigilo existe para prevenir que a maçonaria se torne mais uma instituição falida”, destacam os irmãos. Porém, já que o sigilo não é acerca da existência deles, nem da sua atuação (em prol da sociedade),
sobre o que é esse segredo todo? Sobre as famosas práticas maçônicas. “Esse sigilo é de atos, momentos que só o maçom vive, para que ele possa fazer dentro da sociedade o que lhe foi proposto. Mas não é um segredo, não é errado um maçom contar que ele é um maçom, desde que ele não esteja mentindo, porém, ele não pode contar o que é feito, é algo dele e da loja dele”, explicam. Com a intenção de tirar essa áurea negra que paira sobre a maçonaria, existem lojas conhecidas como brancas, que são abertas à sociedade para que os interessados vejam a atuação dos maçons e conheçam a fraternidade. Porém, o que será visto é, basicamente, a atuação em sociedade baseada nos três princípios citados anteriormente.
Segundo os irmãos maçônicos da Augusta e Respeitável Loja Simbólica Regeneração, a real criação da maçonaria não tem data específica. Eles explicam que a integração e composição da maçonaria atual, contexto de onde surgiu a estrutura que é seguida pela ordem hoje em dia, é datada da época do Rei Salomão, século XVII A.C. Porém, são inúmeras as informações acerca da real origem da prática, alguns acreditam que os antecessores dos maçons foram guerreiros das antigas cruzadas ou até mesmo os egípcios responsáveis pelas pirâmides. O que se sabe é que o nome maçons é de “mason”, termo inglês para pedreiro, e que os primeiros registros se encontram na Inglaterra, no fim da Idade Média. Segundo a história, os pedreiros da época equivaliam a arquitetos, engenheiros e empreiteiros, que mantinham os segredos da profissão para não perderem o lugar no topo da construção civil, militar e religiosa. Esses profissionais passavam os seus macetes apenas paras seus aprendizes confiáveis em ocasiões especiais. Com o passar dos anos, as aulas viraram fóruns, atraíram pessoas de diversos lugares e foram transferidas para locais chamados lodges (em português, "lojas"). Com isso, em 1717, quatro unidades se unificaram na Grande Loja de Londres e, foi aí que surgiria oficialmente a maçonaria. Já no Brasil, a maçonaria teve início em 1797, com a Loja Cavaleiros da Luz, criada na povoação da Barra, em Salvador, Bahia. Acredita-se que a chegada dos
portugueses no Brasil e a colonização em diversos países, durante as invasões e chegadas, foram os responsáveis por levar a maçonaria para todos os continentes, se espalhando sutilmente. Segundo as fontes, os irmãos maçônicos tiveram participação ativa em diversos momentos históricos de extrema importância, tal como a Revolução Francesa, a Independência Americana e a Guerra dos Farrapos, que foi finalizada pelo aperto de mãos entre dois irmãos maçons. “A atuação da maçonaria no Brasil sempre foi pacificadora, com a intenção de melhorar o intuito da humanidade, de cada indivíduo”, destacam os irmãos. Segundo as fontes, existe um tipo de documento, uma constituição maçônica, a qual não pode ser revelada. “Se não tivéssemos o que seguir, não haveria movimento nenhum”, alega a fonte. A única informação que foi passada é de que a ordem é regida por três palavras, uma frase histórica, dita por maçons e criada em um momento em que os mesmos atuaram em prol da humanidade: Liberdade, Igualdade e Fraternidade! “Seria o princípio de toda a nação, mas é o princípio sistemático que a nossa fraternidade rege”. Além da trilogia que rege a maçonaria, há um lema para sustentar a atuação da ordem, que é: Ciência, Justiça e Trabalho. Ciência, para esclarecer os espíritos e elevá-los, justiça, para equilibrar e enaltecer as relações humanas e trabalho para os homens se dignificarem e se tornarem independentes economicamente.
O que leva um maçônico a ser expulso?
maçonaria e religião Ela não é uma religião, mas é religiosa. Isso porque ela reconhece a existência de um único criador, absoluto e supremo, conhecido na ordem como o “Grande Arquiteto do Universo”. Porém, também é progressista, pois não acredita
em dogmas e superstições, crê que a busca da verdade se dá pela razão através da ciência. Como citado anteriormente, os maçons devem ter uma crença e têm a liberdade de escolher sua religião praticante.
A boca maior do que a verdade. Foi isso que um dos irmãos respondeu ao ser questionado sobre as causas que levam à expulsão da ordem. Além disso, algumas outras infrações foram citadas: falar o que é realizado pelos ma-
Uma instituição patriarcalista e misógina?
Maçons juvenis?
O que muitos podem considerar machismo e preconceito, os maçons consideram normal. Para eles, o fato da fraternidade aceitar apenas irmãos homens é um resultado histórico, mas não um ato machista. Eles deixam claro que a mulher é um ser valorizado dentro da fraternidade, porém não tem o direito de participar ativamente. “Existem alguns movimentos como a Ordem Rosa Cruz, que integram mulheres. A maçonaria se baseia por alguns
Conhecidos por serem cavalheiros e corteses, segundo seu código de Ética, os DeMolay poderiam ser entendidos como um grupo pré-maçom, mas não é tão simples assim, o caminho não é direto. A Ordem DeMolay é uma sociedade independente da maçonaria, com suas próprias regras, porém patrocinada por ela. É uma iniciativa tão discreta quanto sua “ordem mãe”, destinada a jovens entre 12 e 21 anos. Fundada nos Estados Unidos, é também regida por caráter fraternal e filantrópico.
ocultismos e a sua história é composta por homens. Jesus, por exemplo, teve 12 discípulos homens, pela questão cultural, na origem eram os homens que participavam da sociedade. Hoje há tendências em inserir as mulheres na maçonaria. Em determinadas situações, elas têm participações na ordem, e têm deveres junto a sociedade, não são excluídas, são exaltadas”, declaram.
çons para os leigos e utilizar a maçonaria de uma forma errada para conseguir um bem individual. Ela tem que ser usada em prol de algo para todos, explicam os irmãos.
A ordem também é composta apenas por homens que seguem seu próprio código de ética e atuação, baseado na cortesia, confiança e respeito. Um dos irmãos maçons explicou que um DeMolay tem grandes chances de se tornar um maçom, mas não é uma certeza. “É um movimento de jovens que aspiram à maçonaria, geralmente filhos de maçons, mas nem sempre, se a pessoa que integra essa ordem tiver condições e interesse de ser maçom ela tem grandes chances de se tornar um”.
Quero ser maçom, o que faço? Quanto ao resto da comunidade, é uma escolha de cada um. “Você pode revelar para as pessoas que queira, para quem tu confias. É uma troca, que nem uma conversa normal com um amigo que você troca segredos, por exemplo”. Exigências: se espera de um maçom praticamente aquilo que se espera de um indivíduo em sociedade. Respeito às leis e regulamentos, amor à Pátria, respeito aos governos, boa conduta, e a dedicação aos rituais maçônicos. Não esquecendo, do já conhecido segredo acerca dos rituais que acontecem entre quatro paredes, ou não. Se você não é maçônico não deve saber também, e se sabe, não deveria.
Apesar de não ser explícito, estamos aqui! Como em qualquer entidade, existem encontros, jantares em nível nacional, estadual e municipal, porém, adivinhem: eles não podem ser descritos. Em alguns lugares do país, por exemplo, os maçons saem de cara limpa em passeatas, pregando a paz e a consciência, mas não em Frederico Westphalen. “Frederico Westphalen é uma cidade muito católica, muitos antigos acreditam que a maçonaria é
um movimento ruim, contra a igreja, há essa ideia que vem há séculos e faz com que as pessoas tenham medo, por isso não convém falar abertamente que somos maçons. As informações que estão por aí são resultado de maçons que não chegaram a níveis tão elevados e já quiseram falar sobre a ordem e foram expulsos, ou leigos que estudaram muito e atingiram conhecimentos bem próximos”.
M A R G IN Á L IA 42
Bom, como citado anteriormente, para ser maçom você precisa ser convidado por um, e isso acontecerá se eles conhecerem e gostarem da sua atuação na sociedade. Maçons são, geralmente, pessoas que se destacam e contribuem com a sua comunidade. Apesar de todos acreditarem que é necessário ser rico para integrar a sociedade, eles garantem que não. “A pessoa tem que ser homem, ter uma crença, não é necessário ser casada e não precisa ser rica, tem que ter a capacidade de se gerir, de se sustentar. Ter bom coração e mente aberta”, destaca um dos irmãos. Os irmãos maçônicos não são obrigados, mas devem contar para a sua família que são maçons.
Um “Big Brother”, literalmente A maçonaria se organiza numa hierarquia parecida com a União. Há as ordens nacionais, estaduais e municipais, além é claro, das milhares de lojas espalhadas por todo o mundo. Por ser uma sociedade secreta, ou melhor, discreta, não significa que sua força e atuação têm diminuído ao longo dos anos. Muito pelo contrário, contam os irmãos. “Ela tem uma po-
tência enorme, é gigantesca, há ligações em nível mundial. Sempre teve força, e sempre atuou em silêncio. Ela não grita, ela finaliza guerras, ela não mata, ela procura salvar vidas, então às vezes é tachada como esquecida, mas existem muitos maçons em todo o Brasil”, explica um dos irmãos.
Maçons famosos Uma das primeiras informações que aparecem sobre a maçonaria na internet é a identidade de maçons famosos. E como ninguém resiste a uma “espiadinha” na vida das celebridades, aqui vai alguns nomes de quem integrou a ordem no mundo das celebridades. Nomes não faltam, mas as
personalidades maçônicas mais conhecidas foram Abraham Lincoln, Benjamin Franklin, Bill Clinton, Eça de Queiroz, William Shakespeare, Oscar Wilde, Luiz Gonzaga, Neil Armstrong, Louis Armstrong, Napoleão Bonaparte, Walt Disney, Duque de Caxias, Pixinguinha e Rui Barbosa.
E aí, é legal ser maçom? “Me sinto feliz e completo, na maçonaria é um caminho diferente, mas que leva a uma grande exaltação, que é indescritível, inexplicável”, explica um dos irmãos. Já o outro também rasga elogios à ordem. “Tive uma grande identificação com a maçonaria, vim de uma família religiosa e caí em Frederi-
co, que é um caos de religiosidade e fanatismo. Na maçonaria me encontrei por ser uma fraternidade tolerante e que respeita as individualidades acima de tudo e que exalta as potencialidades de cada um. É muito bom”, salienta o irmão.
Como acontece há milhares de anos, a maçonaria se mantém abaixo do radar. Não há como saber as verdadeiras práticas da ordem, até que seus irmãos estejam dispostos a fazê-las com as portas abertas. O que dá para perceber é que faltam segredos para tanta especulação. Característica essa que também acaba alimentando a ordem. No entanto, podemos ter uma boa ideia acerca do que acontece. É com essa intenção que esse material foi produzido!
Uma fraternidade simbólica
“Maçonaria é hiperdotada de simbolismos que não podem ser identificados”. Apesar da internet ser cheia de símbolos maçônicos, nada é oficial, pode ou não pode ser. 50% de chance. Alguns símbolos maçônicos curiosos são a romã e a colmeia, por exemplo, que representam a união entre os maçons e a cooperação para atingir o desenvolvimento coletivo, por exemplo. Quanto aos seus símbolos tradicionais, os principais são a Estrela de Davi representa “Deus, a criação e a perfeição”, o triângulo com um olho no centro representa o Grande Arquiteto do Universo, que tudo vê e julga, e o círculo com um ponto central significando o Sol. Já os símbolos relacionados à construção, como o compasso e o esquadro, significam “medida na pesquisa” e “retidão na ação”, respectivamente. O prumo representa profundeza na observação, já o Nível, está relacionado com o emprego correto do conhecimento. A régua, por exemplo, alerta sobre a precisão na execução, e o avental – um dos símbolos mais importantes –, representa o trabalho constante. Outro significativo símbolo da maçonaria é a associação entre o esquadro e o compasso, surgido no século XVIII. O esquadro faz referência à própria terra. Já o compasso faz referência à imensidão dos céus. Juntos, Unidos, ressaltam a importância da associação fundamental entre o mundo espiritual e o mundo material. Uma das curiosidades acerca da fraternidade são os famosos três pontinhos. Segundo os irmãos, é apenas um charme. “Se você observar alguns símbolos e siglas maçônicas, como por exemplo, algumas fachadas de lojas, você verá os três pontos, é um charme, alguns se identificam pelo cumprimento, se reconhecem pelo olhar, pelo diálogo, e a assinatura é um meio opcional de se expressar como maçom”, destaca
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A QUELE QUE EM NADA CRÊ
“
Ateísmo é a negação ou a falta da
um trecho em que expõe ter o papel de “com-
crença na existência de deus(es).O
bater o preconceito e a desinformação a res-
termo ateísmo vem do prefixo grego ‘a’, signi-
peito do ateísmo e do agnosticismo, dos ateus e
ficando ‘ausência’, e da palavra grega theos,
dos agnósticos”.
significando ‘divindade’. A negação da existên-
Theodoro Cerutti, 16 anos, é ateu assumido.
cia de Deus é conhecida como ateísmo ‘ativo’ ou
Desde os 15 não alimenta crenças. Nascido em
‘forte’; a simples descrença é denominada
família católica, o estudante de ensino médio,
ateísmo ‘passivo’ ou ‘fraco’”. O dicionário deixa
que pensa em cursar física, conta que sempre
claro, ser ateu é não acreditar na existência de
se questionou sobre a pregada existência de
nenhuma divindade ou força superior. É tam-
uma força superior. “Gostaria de me manter
bém desacreditar em vida após a morte ou em
pacifico e ignorar as pessoas que acreditam em
qualquer outra crença propagada pelas reli-
divindades, quaisquer que forem. Porém, ao
giões ou seitas.
analisar o contexto da história, a religião sem-
No Brasil o número de pessoas que tem para si
pre fez mais mal mais do que o bem para a hu-
a ‘não crença’ é de 615 mil, conforme o Censo
manidade. Desde a Santa Inquisição, as
de (2010). Mesmo que os números pareçam pe-
Cruzadas, a Idade das Trevas, as queimas de
quenos perto daqueles que creem, os dados
pensadores e cientistas que apresentavam
mostram um grande crescimento dos sem fé.
ideias contrarias as da igreja eram mortos, co-
Em 1960 eram 0,6% da população agora re-
mo foi o caso de Galileu!”
presentam 8% (os índices também abrangem
Cassiano Ricardo, 21 anos, estudante de Enge-
os sem religião). Enquanto isso os católicos so-
nharia Ambiental, também questiona a exis-
mam 123,3 milhões de pessoas, e os evangéli-
tência de um deus. “Não me declaro ateu, sou
cos, 42,3 milhões no Brasil.
agnóstico, acredito que não é possível provar a
Uma página na internet da Associação Brasilei-
existência de um deus. Acho muito difícil que
ra de Ateus e Agnósticos (ATEA) reúne quase
exista”, opina o universitário que ainda diz não
300 mil seguidores. O espaço serve para com-
ter chegado a todas as conclusões possíveis pa-
partilhar mensagens que ‘desacreditam’ a
ra se declarar ateu.
crença, com mensagens, na sua maioria, volta-
A dúvida é sempre o fato chave para abando-
das ao cristianismo. A página tem na descrição
nar crenças. Cerutti cita a leitura de livros e revistas como essencial para “liberar o inte-
m
TE X TO E F O TO S JOSAFÁ ROHDE
lecto”. Parafraseando Robert Lanza, ele defen-
tificar, apenas com as inicias JC, de 20 anos,
de que a vida após a morte é um mito. “A vida
revela que quando descobrem que não acredita
não passa de uma atividade do carbono e uma
em deus há uma certa repulsa, e as vezes até
mistura de moléculas que dura por tempo de-
incompreensão. “É como se você fosse o pati-
terminado. O que morre é o nosso corpo que,
nho feio. As pessoas não concebem você não
então, se decompõe sob a terra”. Para o cien-
acreditar em vida após a morte, não ter uma
tista, que baseia suas alegações na física quân-
religião”, lamenta. A universitária conta, que
tica e no biocentrismo, a ideia de “morte”
dependendo do ambiente, não se sente confor-
apenas existe porque ela foi sendo passada de
tável para defender sua posição quando o as-
geração para geração, ou seja, porque fomos
sunto é fé.
ensinados a acreditar que morremos.
Theodoro, que diz não temer preconceito, de-
Se tem gente que se assume ateu em meio a
fende com unhas e dentes sua não crença. O
uma sociedade religiosa, há quem não tenha a
questiono sobre a criação, e ele é enfático em
mesma coragem. RL, de 16 anos, diz que não
afirmar: “a ciência ainda é jovem e está bus-
quer revelar o nome. O motivo? “Todos acredi-
cando teorias para o começo de tudo Temos a
tam em deus e eu sou menor de idade e moro
mais aceita, a teoria do ‘Big Bang’, entre outras
na mesma casa com meus pais, se soubessem a
mais complexas envolvendo física quântica.
convivência não seria a mesma”, revela o estu-
Enquanto a religião apresenta a hipótese de
dante. Ele também conta um dos motivos que o
que um ser extremamente complexo criou todo
levou a abandonar o cristianismo “Minha avó
o universo, as 300 bilhões de galáxias, cada
que sempre foi cristã, acreditava nesse tal
uma com suas bilhões de estrelas e bilhões de
deus, morreu do pior jeito possível. Aos poucos
planetas, e após criar toda essa complexidade
foi morrendo, sofrendo. e agora me diz o que
infinita, se resumiu a cuidar de um simples
ela fez de errado pra ir assim? Se todos, inde-
planeta e ficar julgando os organismos bioló-
pendentemente de família ou não, todos gosta-
gicos que nele vivem, lendo seus pensamentos
vam dela e sempre foi uma pessoa boa?”,
e condenando-os. Até ai tudo bem, mais na te-
indaga.
oria religiosa, acabamos por cair em um para-
Preconceito pode ser algo recorrente na vida
doxo: se deus criou o universo, quem criou
de quem não alimenta crenças. Outro estudan-
deus? Eis a questão como viste, a religião dá
te, desta vez uma mulher, que não quis se iden-
respostas incompletas”
a religião tem por objetivo controlar massas de pessoas e suas ideias
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arginรกlia
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