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// editorial A partir deste mês, você provavelmente irá se perguntar o que é esta revista de informação mensal, voltada para o público jovem. Consinto que se questionará ainda sobre o que há de novo em uma revista que traz informações do mês anterior, aponta tendências do mês vigente e propõe debates. Também aposto que você comparará a visão de mundo de POST com a exposta em outras publicações e até com a sua própria visão. Mas, acredite: essas questões não sairão da sua cabeça, mês a mês, a cada vez que você se deparar com uma nova edição de POST. Isso porque POST é mais do que uma revista para jovens. É uma publicação que busca informar uma geração de pessoas de estilo de vida e desejos próximos que, mesmo cheia de recursos tecnológicos, vive perdida. Uma geração que, embora perdida, encara o viver com curiosidade e atitude. Pessoas que deixam para trás as inseguranças e enfrentam seus medos, buscando inovar o jeito de viver e olhar o mundo. Uma geração que não é definida por uma idade fixa, não é enquadrada em gênero XX ou XY, não é avaliada pela cor nem questionada pelo seu credo ou suas práticas afetivas. É essa geração, o leitor de POST: um leitor de idéias. E, principalmente, um leitor de idéias jovens e inovadoras. POST surge para falar, ouvir e dialogar com esse leitor de idéia jovem (que pode ter quatro ou 100 anos), que tem a vida marcada por inconstâncias e descontinuidades e que vive em um mar de sentidos e informações, mas que está “antenado”, ligado em tudo, disposto a aprender. Acredite: POST não vai dar a você conselhos sobre padrões e morais que devam ser seguidos. Muito menos apresentará conceitos de forma panfletária. POST é uma publicação de ideais e de valores sólidos. É uma revista múltipla, disposta a encarar desafios, tem espírito de liberdade e a mente aberta a idéias e opiniões diversas. Não propomos um mundo diferente do que vivemos. Apenas procuramos retratá-lo de forma mais moderna, menos careta e com valores mais reais e menos tradicionais e hierárquicos. Defendemos a necessidade de entender as manifestações artísticas e os hábitos culturais dessa geração, mas também reforçamos a necessidade de se repensar o que de fato é uma idéia contemporânea, quais são os atores políticos que agem de forma inovadora e o que fazer diante do esgotamento dos recursos naturais. POST te convida a ter novos olhares, a arriscar novos rumos e a viver sempre intensamente. Postar é o ato de publicar informações. E a partir de agora, postaremos muito por aqui. Queremos ajudar a fazer do nosso mundo um lugar melhor para se viver, por mais clichê que isso possa parecer. E esperamos poder contar com você. Seja bem-vindo ao mundo de idéias de POST.
Kleyson Barbosa
g
Editor-chefe
EXPEDIENTE POST g Editor-chefe: Kleyson Barbosa g Orientação: Carmen Dulce Vieira g Editores assistentes: Thays Prado (Estilo de Vida & Quali-
dade de Vida), Rodrigo Ortega e Braulio Lorentz (Arte e Cultura & Favoritos) g Conselho Editorial: Eliane Cantanhêde, Juliana Benício, Marlise Matos, Vitória Jacob g Produção: Kleyson Barbosa, Larissa Coelho g Produção e reportagem: Kleyson Barbosa, Braulio Lorentz, Bruna Sanielle, Carlos Reiss, Henrique Fares, Manoella Oliveira, Nara Vargas, Thays Prado g Favoritos: Kleyson Barbosa, Braulio Lorentz, Carlos Castilho, Daniel Oliveira, Mariana Marques, Miguel Anunciação, Rodrigo Ortega g Colunistas: Kleyson Barbosa, Conrado Mendes, Juliano Sá, Mariza Tavares, Rodrigo Lima Silva, Rodrigo Moreira, Zeca Camargo g Cronista: Marcelino Freire g Projeto gráfico: Vanessa Siqueira g Diagramação: Marina Renault, Rodrigo Moreira, Vanessa Siqueira g Ilustração: Fernando Guerra, Gustavo Frota, Paulo Barbosa
POST 00 // JUNHO 08
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// índice
mês
qualidade encontros 12,54 satisfação 54,70 políticas públicas
40,52
.br profissão
46,52,54
media arte e cultura
mães ambiente processos
inovação
lazer insatisfação
52,7
idéia jovem 18,66 posições
18,70
participação
educação
54,58
18,52
54,70
estilo
54,73 representação
7,68
alternativa
7,76
30,40 7,48,66
lá fora fórum_pág07 para entender o mês_pág12
14,32 participação popular
.br_pág16
moderno 14,38 tribos 35,46,68
lá fora_pág32
finanças 14,16 janelas 28,68
estilo de vida_pág38 educação emprego_pág52
política 18,32
qualidade de vida_pág58 eficácia
7,16
media_pág68 arte+cultura_pág72
organização
manifestações 7,32
diálogo
32,66,70
7,68
favoritos_pág78
O
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POST 00 // JUNHO 08
// fórum.
ONGS SERVEM PARA TUDO? Rodrigo Horochovski, 37, é professor da UFPR, cientista político e trabalha com pesquisa nas áreas de associativismo civil, processos de empoderamento e accountability política.
Pedro Chaltein, 26, é coordenador da ONG SVI BRASIL, criada este ano. A SVI BRASIL tem como finalidade promover intercâmbio de serviços voluntários internacionais e faz parte de um movimento pacifista global.
José Welmowicki é mestre em História e professor da Uniban. É também editor da revista Marxismo Vivo e pesquisa sobre Sociologia do trabalho e a questão da cidadania no mundo do trabalho.
por_Kleyson Barbosa
As Organizações não-governamentais (ONGs) são entidades do terceiro setor que têm origem na sociedade civil e que se declaram com finalidades públicas e sem fins lucrativos. As ONGs surgiram no país nos anos 1970, em apoio aos movimentos sociais e como uma alternativa às discussões dominantes no campo dos regimes autoritários. No período de transição democrática, muitas ONGs passaram a ter um caráter de intervenção e a realizar projetos complementares à ação do Estado e, já no final dos anos 1980, foi esse modelo que acabou prevalecendo. Desse período
até hoje, com a disseminação do discurso da utilidade pública dessas entidades, o termo ONG passou a representar várias atividades, de prestação de serviços a luta por direitos. Mas, afinal, para que servem as ONGs? Para debater sobre o tema, POST convidou José Welmowicki, Pedro Chaltein e Rodrigo Horochovski. Em uma sala de bate-papo do UOL, discutiuse sobre a função das ONGs, sua eficácia e a relação dessas entidades com o dinheiro público. O resultado você confere nas próximas páginas.
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“É TUDO ONG? NÃO HÁ UM USO INDISCRIMINADO. QUANDO O CONCEITO VIRA UMA GRIFE?” POST:
Qual o papel das ONGs e por que elas são importantes? Rodrigo Horochovski:
Para uma perspectiva emancipatória e libertária, o papel é de reivindicação por cidadania e eqüidade. Mas, por outro lado, as ONGs surgem nos hiatos deixados pelo Estado na promoção de políticas públicas. Além disso, destaco as reivindicações pelo fortalecimento da sociedade civil e pelos chamados direitos difusos, de minorias, de mulheres, negros, povos da floresta, entre outros. José Welmowicki:
As ONGs se propõem a ser organizações não governamentais e prestar serviços sociais e sem interesse, mas não é isso que acontece na prática. Pois a perspectiva de uma reforma passo a passo não dá conta de transformar efetivamente a sociedade. Não é possível resolver os problemas de fundo da sociedade com ações de entidades da dita sociedade civil. Pedro Chaltein:
O papel de uma ONG é simples: ser uma ferramenta para a sociedade civil atuar de forma organizada na sociedade. Porém, a prática pode ser bem mais complicada. Realmente, muitas ONGs existem para preencher hiatos nas ações do Estado. Esse quadro de apatia do Estado, simplesmente delegando suas funções às ONGs e as viciando nos recursos públicos, é só um dos quadros possíveis. Existem ONGs independentes do Estado. E existem Estados independentes de ONGs. Existem ainda relações realmente construtivas e com uma boa accountability entre ONGs e Estado. José Welmowicki:
O Estado capitalista se retira das tarefas sociais e encarrega as entidades da sociedade civil, em especial as ONGs, que muitas vezes servem de biombo a essa ausência do Estado e podem ser financiadas por ele e acabam sendo apêndices, mesmo que a inten
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ção de seus participantes seja a melhor possível. O problema de fundo é que na época do neoliberalismo, as ONGs acabam sendo uma pretensa saída para a cada vez mais difícil situação dos trabalhadores e setores espoliados. Rodrigo Horochovski:
A questão é: é tudo ONG? Não há um uso indiscriminado. Quando o conceito vira uma grife? Isso acontece na virada para os anos 90. José Welmowicki:
Concordo também com isso. Uma coisa que irrita é essa campanha da Rede Globo pedindo voluntários para escola, enquanto as verbas para educação pública são sistematicamente cortadas. Rodrigo Horochovski:
Para mim isso é mais filantropia. É positivo, mas não resolve as questões. José Welmowicki:
Mas existem muitas ONGs com esse discurso. POST:
Alguns estudiosos acusam algumas ONGs, como o Greenpeace, por exemplo, de se concentrarem sobre problemas locais antes de pensarem nos problemas de maneira mais ampla. Vocês consideram que falta uma visão mais global às ONGs? Rodrigo Horochovski:
Discordo. As melhores ações são as locais, conectadas com redes mais amplas. Até porque as ONGs não agem isoladamente. Há uma tendência de constituição de fóruns. Pedro Chaltein:
Eu acho que o questionamento parte de uma generalização simplista. José Welmowicki:
Permitam-me discordar. Creio que um dos problemas centrais das ONGs é a falta de uma visão global, a idéia do “local” predomina.
Rodrigo Horochovski:
Depende da ONG. José Welmowicki:
Os “forunas” agrupam, mas os diálogos são setorizados. Estive em quase todos os Fóruns Sociais mundiais, e o enfoque era local, a não ser dos movimentos sociais, dos que colocavam questão da luta contra o império, etc. Pedro Chaltein:
Mas esse não é um problema só das ONGs, é uma imaturidade na cultura de ação social do mundo todo, talvez com exceção da Suécia. POST:
Mas será que uma ONG que intervém para ajudar uma escola, por exemplo, faz o link em relação à falta de estrutura gerada por um governo que investe mal os recursos públicos? José Welmowicki:
Acho que se não se parte da dominação capitalista, tende-se a isolar cada aspecto, e as ações se tornam impotentes. Pedro Chaltein:
Ela pode fazer ou não esse link. Mas que ela deveria fazer, isso sim. Rodrigo Horochovski:
Aí tem de ver as fronteiras entre a ONG e o movimento social, que são fluidas. Já houve mais convergência entre ONGs e movimentos sociais. Penso nas lutas pela redemocratização. Hoje a agenda mudou bastante. Há um certo pragmatismo em ONGs que no passado eram mais reivindicatórias. José Welmowicki:
Para mim, a diferença é que um movimento organizado, seja dos trabalhadores, dos camponeses, dos estudantes, tem que estar preocupado com sua representação, sua luta. Uma ONG pode ser declarada apenas com um punhado de gente sem maior relação com um setor social. Rodrigo Horochovski:
Infelizmente, pode. Não há monopólio semântico para todos: Ninguém é dono do termo ONG.
mas realmente é problemático quando uma ONG se torna dependente financeiramente de um órgão do Estado ou de um grupo político partidário. POST:
O balanço divulgado pelo TCU em 2006 apontou que 54% das verbas federais repassadas a ONGs atenderam a entidades sem capacitação para exercer suas atividades. Como vocês observam essa realidade? Rodrigo Horochovski:
Não é a maior parte das ONGs. Até porque é um universo imensurável. Também depende dos mecanismos de accountability. O TCU é um mecanismo. Há outros. Por isso o diagnóstico. José Welmowicki:
Acho que os problemas crescentes detectados nas auditorias têm a ver com a contradição que mencionamos antes. À medida que uma ONG recebe verbas do Estado, que é gerenciado por um governo X, abre a possibilidade de servir de biombo a malversações de fundos, como se viu largamente no Brasil em 2006. Pedro Chaltein:
Podemos melhorar nossas ONGs, mas se o Estado continuar financiando grupos sem a capacidade atuação, o quadro não mudará. Rodrigo Horochovski:
E a ONG precisa prestar contas, formalizar-se, há muita burocracia. POST:
ma dissertação defendida recentemente na FGV U mostrou que, de um lado, há problemas de controle na maior parte dos contratos, convênios e termos de parceria, em todos os níveis da administração. Por outro lado, apontou que, na maior parte das vezes, os problemas apontados pelo TCU são relacionados aos aspectos formais da prestação – muitas pequenas ONGs não têm capacitação ou acompanhamento profissional para prestar contas devidamente. Não há capacitação para que
POST:
Como vocês vêem a utilização de recursos públicos pelas ONGs? Rodrigo Horochovski:
Não vejo problema, desde que haja transparência. O problema é o discurso de que a ONG substitui o Estado, uma grande falácia. José Welmowicki:
Em primeiro lugar, é uma contradição uma ONG receber verba estatal. Pedro Chaltein:
Não acho que seja uma contradição uma ONG receber dinheiro do Estado, se houver transparência,
“UM DOS PROBLEMAS CENTRAIS DAS ONGS É A FALTA DE UMA VISÃO GLOBAL” JUNHO 08 // POST 00
os grupos que se organizem para atender demandas entendam como fazer uma prestação de contas adequada. Como vocês observam isso? Rodrigo Horochovski:
Isso é caro. Há capacitação. Só que às vezes as pessoas não têm acesso. Está nos grandes centros. É necessário apoio profissional de advogados, contadores. Não é fácil operar na formalidade. Pedro Chaltein:
Realmente, uma prestação de contas profissional é cara. Porém, se as ONGs forem treinadas a prestar contas, elas poderiam fazer isso bem feito, com os recursos humanos que já têm. Rodrigo Horochovski:
Já abri uma ONG. É um inferno kafkiano. Fechar é pior ainda. Tem de haver burocracia, mas tem de haver mais apoio. No Brasil, pressupõe-se a desonestidade dos agentes. É cultural. POST:
O problema está somente no acesso a essas informações, a essa profissionalização ou está também no próprio desenho das políticas públicas e na maneira como as metas são estabelecidas?
Rodrigo Horochovski:
O desenho das políticas depende de quem está no poder. Acho que estamos num período relativamente favorável, ao menos no nível nacional. Lembro que os maiores inimigos das ONGs estão na direita. Sem querer polemizar muito. POST:
O que seria uma ONG eficaz? Rodrigo Horochovski:
Uma ONG que mais facilite do que determine o que as pessoas devem fazer. Deve ser transparente. Realizar seus objetivos e metas organizacionais; permitir a participação do público-alvo na gestão da ONG; promover a participação, dentro e fora da ONG, ou seja, nos espaços de cidadania. Não é fácil. Pedro Chaltein:
Uma ONG eficaz é uma ONG com clareza de objetivo; clareza de método de atuação; independência financeira; com uma administração transparente; e, talvez principalmente, que promova a participação, dentro e fora da ONG (como disse o Rodrigo). Não é fácil. Mas não é impossível, e é um desafio que vale a pena.
Pedro Chaltein:
Há problemas em todos os processos formais de organização social. Também existem muitas políticas públicas mal desenhadas, muitas vezes justamente porque falta participação popular real na formulação das políticas públicas. Voltamos ao problema cultural.
“É PROBLEMÁTICO QUANDO UMA ONG SE TORNA DEPENDENTE FINANCEIRAMENTE DE UM ÓRGÃO DO ESTADO OU DE UM GRUPO POLÍTICO PARTIDÁRIO” 10
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// para entender o mês *
* JOVENS DEFINEM 22 PRIORIEDADES Nos quatro últimos dias do mês de abril, jovens de todo o país participaram da primeira Conferência Nacional da Juventude, em Brasília. O encontro teve debates intensos e também momentos de descontração. Foram definidas as 22 prioridades dos jovens brasileiros, que no evento foram representados por cerca de 2 mil delegados, eleitos nas etapas preparatórias, que envolveram mais de 400 mil jovens brasileiros. A mobilização demonstra o interesse da juventude em participar da vida política do Brasil. As 22 propostas serão referência para políticas públicas. Entre as prioridades mais votadas estão a defesa do reconhecimento e aplicação do Poder Público das resoluções do primeiro Encontro Nacional de Juventude Negra (Enjune), destinação de parte da verba do ensino básico para o modelo integral e pedagógico dos Centros Integrados de Educação Públicas (CIEPs) e a aprovação, em regime de urgência, da PEC 138/03, que inclui o conceito de juventude na Constituição, do Plano Nacional da Juventude e do projeto de lei que estabelece os Direitos da Juventude.
SAI MINISTRA MARINA SILVA, ENTRA CARLOS MINC A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, pediu demissão, no mês passado. Os motivos para a saída não foram divulgados, mas a falta de apoio do presidente Lula é ponto chave para a saída dela. O estopim foi a interferência do ministro de Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger, em assuntos do meio ambiente. Cinco dias antes de pedir demissão, o presidente Lula anunciou Mangabeira como coordenador do Plano Amazônia Sustentável (PAS). Para substituí-la, Lula escolheu o secretário do Ambiente do Estado do Rio de Janeiro, Carlos Minc. O ex-governador do Acre, Jorge Viana (PT), também foi cotado para ocupar a pasta. Marina agora volta para o senado, reassumindo sua vaga que era ocupada pelo seu suplente, Sibá Machado (PT-AC), desde 2003, quando assumiu o posto de ministra.
NEGROS SERÃO MAIORIA POPULACIONAL DO PAÍS AINDA ESTE ANO
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Estudo desenvolvido pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) aponta que a população negra (soma de pretos e pardos) será a mais numerosa do pais ainda este ano, superando a população branca. O trabalho indica também que, em 2010, negros serão maioria absoluta entre os brasileiros, ultrapassando a soma dos brancos, amarelos e indígenas do Brasil. No entanto, o estudo prevê que a equiparação de renda entre os negros e brancos só deve ocorrer em 2040. Segundo dados do IBGE, atualmente a renda medi salarial dos negros representa 53% da renda media dos brancos. POST 00 // JUNHO 08
MARCHA DA MACONHA É PROIBIDA NAS PRINCIPAIS CAPITAIS a marcha da maconha foi proibida em nove cidades brasileiras que fariam parte do circuito de manifestações que acontecem em outros 19 países. A Justiça proibiu a manifestação em Belo Horizonte (MG), Brasília (DF), Cuiabá (MT), Curitiba (PR), Fortaleza (CE), João Pessoa (PB), Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA) e São Paulo (SP). Em todos os casos, o Ministério Público Estadual foi que moveu o pedido de impedir do evento, argumentando que a Marca faz apologia às drogas. Apenas Porto Alegre (RS), Florianópolis (SC), Recife (PE) e Vitória (ES) realizaram a Marcha. Em São Paulo, algumas pessoas se reuniram no local onde seria realizada a Marcha e fizeram manifestação. No Rio de Janeiro, um homem foi preso no local que seria realizada a Marcha da Maconha, por apologia ao uso de drogas e por desobediência à ordem judicial.
ma mu a r a e nci ir d anu part posta . ) EA el, a om a (C ponív m é c 5 e ncia c i ê 00 bé dis ôm S gia At estar e tam esde 2 epend anho m E R tam e, e LA ner eve , qu to d r a d ELU a de E que d equipe proje reduzi cho do valent a C s i á ARA rance ênio e res. A lha no ivo de cartu o equ stituir P F a g a b O t a m l I o u ab je ci ro su lu GÊN omissã de hid es ce Bic, tr o ob -se de propi l não rido. O R n e m e a HID s da C à base telefo nics e vel co . Trat e qu bustív erá híb A os ctro ustí lhos soso om as ore na HA PIL quisad funcio rregar croele comb apare nio ga lha a c sistem Pes a que a reca STMi ilha a esses drogê . A pi to. O s pilh 0, par resas icrop uso d itir hi omun lemen p m 1 o c m 0 n a e m s mp 2 as e olveu létrica az de ateria m co l e p env a e ou ob cap i des nerg ueiro a cinc á com r e de m isq e três ciona u n d u , e f d rgia as ene ria, m e bat
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ANÚNCIOS EM REDES SOCIAIS DEVEM CHEGAR A US$ 2 BILHÕES ESTE ANO A empresa de pesquisa eMarketer divulgou estudo que aponta que serão gastos, em 2008, US$ 2,02 bilhões (cerca de R$ 3,34 bilhões), em anúncios de redes sociais. Cerca de 70% do total desses anúncios refere ao mercado norte-americano. Contudo, a mesma pesquisa revê suas previsões para 2011 e aponta uma queda dessa expectativa: de US$ 4,7 bilhões para US$ 4,3 bilhões. O eMarketer aponta as causas da revisão para baixo do crescimento no cenário: o atual cenário econômico e o fato de que sites de relacionamento, como o Myspace, Facebook e Orkut, ainda trabalharem no desenvolvimento de sistemas eficazes de anúncios. A pesquisa indica que o MySpace será responsável pelo maior número de investimento de anunciantes nos EUA: US$ 755 milhões.
DEU NO “LONDON TIMES”: GASTOS E CONSUMISMOS EXCESSIVOS ESTÃO FORA DE MODA O jornal britânico realizou uma pesquisa que aponta que um novo grupo de consumidores cresce no cenário global: os Scuppies (Standing for Socially Conscious Upwardly Mobile Persons), um híbrido de hippies e yuppies, que se importam com meio-ambiente e causas sociais, mas também se preocupam com o saldo bancário. O inventor do termo e responsável pelo manifesto sobre o nome estilo de vida, “The Scuppie Handbook”, é o americano Chuck Faila, que acredita que ser eco-friendly não implica em abrir mão do prazer. A reportagem traçou o perfil dos scuppies e aponta como características do grupo usar lençóis de algodão orgânico para dormir e freqüentar a Starbuck’s, mas só tomar café que tiver o Selo Fair Trade. E mostra ainda que a glamourização da conscientização ecológica é moda entre pessoas de altos níveis da sociedade.
CRÍTICA DE MÍDIA UMA PARADA SEM SENTIDO
Mais uma vez a mídia desvia-se da discussão do reconhecimento e da aceitação da diferença por Conrado Mendes 3,4 milhões de pessoas. 300 mil turistas. 23 trios elétricos. Quase que invariavelmente, a 12ª Parada do Orgulho Gay de São Paulo, ocorrida no último dia 25, foi coberta pela imprensa televisiva e impressa pelo viés das cifras, dos grandes números. Evidenciou-se a existência de um grande evento. Disso não restaram dúvidas. Mas afinal que evento é esse? E o que ele representa? Uma Parada do Orgulho Gay é, sob alguns aspectos, semelhante ao Dia da Consciência Negra e ao Dia Internacional da Mulher. Gays, negros e mulheres têm oficialmente um dia no ano (ou um grande evento) para manifestar a sua não-conformidade em relação ao status que possuem social e politicamente. Numa sociedade patriarcal, na qual ser branco e heterossexual é considerado desejável, como é a brasileira, os gays estão ainda atrás das mulheres e dos negros em termos de reconhecimento, aceitação e respeito. A cobertura dada pela mídia contribui para com a manutenção do gay num lugar que é considerado diferente, estranho. Ao mostrar apenas uma grande festa, ao dar ênfase aos lucros trazidos pela Parada e ao destacar figuras exóticas, os órgãos de imprensa deixam de discutir um fato fundamental: o significado dessa manifestação. Afinal, pessoas que vivem à margem da sociedade saem às ruas – pelo 12º ano – para reclamar os mesmos direitos civis de indivíduos heterossexuais. E como todos os anos, as paradas têm um slogan, e o desse ano merece ser destacado: “Homofobia mata: por um estado laico de fato”. A cobertura midiática parece não perceber a Parada Gay como uma grande manifestação que representa o desejo de mudanças de um grupo, mas apenas como uma grande festa – o elemento material festa e multidão. Ao tratar a Parada como uma coisa física, e não o que essa coisa representa, ou seja, ao desprover a Parada Gay de um sentido, a mídia mais uma vez desvia-se da discussão do reconhecimento e da aceitação da diferença, e o que se vêem são apenas travestis, cores, plumas e homens fortes dançando sobre trios elétricos. 14
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// .br.coluna
A Falácia do
Pagamento da Dívida Externa
Brasileira
Os números não mentem, mas preocupa a interpretação que deles fazem.
Diferentemente do propagado aos quatro ventos pela imprensa brasileira, o Brasil não resolveu o problema da dívida externa. Basta olhar os números do Banco Central e constatar que existe uma obrigação de quase 200 bilhões de dólores a ser paga em prazos diversos. O fato de o país ter acumulado ativos externos capazes de cobrir as obrigações não as extingue: é tudo uma questão de administração das finanças públicas internacionais. A dívida existe, e seu montante é considerável, portanto, deve-se cuidar, competentemente, de sua gestão. Aterradora é a ingenuidade da cobertura “oficialesca”! Para não dizer acéfala, ou não comprometida com o rigor jornalistíco. Faz bem perguntar: a quem serve tal versão? Por que deveriam os brasileiros deixar de se preocupar com o pagamento da dívida externa (se é que em algum momento se preocuparam)? A quem interessa formar esse “senso comum” na população não-especializada? E quem são os doutos especialistas do jornalismo econômico midiático? Começo pelo fim, os especialistas nada mais são do que os reprodutores do saber convencionado nos bancos, consultorias e mercado financeiro. O mesmo saber que hoje, mais do que nunca, é contestado pela crise do mercado imobiliário americano (crise esta que começa a alastra-se para o mercado de crédito e para outros países). É interessante notar que esse mesmo saber nunca (salvo raríssimas excessões) preocupou-se com a validade dos modelos e informações utilizadas para fazer a análise de risco dos títulos, atrelados às hipotecas estadunidenses. Em outras palavras, qual a qualidade das fontes desses especialistas? É muito fácil reproduzir uma convenção, sem submetê-la a críticas das mais diversas. Qual a credibilidade dos doutos? E a quem serve, se não à própria mídia e aos interesses ligados ao governo, a criação desses consensos sobre tema que já fora “a causa das mazelas nacionais”. Preocupa o que não se faz para ganhar dinheiro e potencializar os ganhos políticos das manchetes de jornais. Seria muito diferente se viessem a público dizer que, a partir de determinado momento, o país teria condições de pagar seus compromissos, mas não o faria pois não seria um bom negócio do ponto de vista da matemática financeira. Dessa forma, conclui-se que se haveria de conviver com esse passivo externo por alguns anos, até que, em condições muito melhores, liquidar-se-ia com ele (e se fosse interessante). Não se questiona a elevação do patamar de gestão da dívida (a situação é bem melhor), mas se relativiza seu efeito conformador da opinião pública. De outra forma: não se conseguiria o mesmo apelo popular (médio) se se contasse outra versão dos fatos. Os números não falam, mais os torturadores de informações não param de tagarelar o que mais lhes convém. 16
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Rodrigo Lima Silva é economista e, no momento, está, voluntariamente, fora das estatísticas do Ministério do Trabalho. É iconoclasta, humano, demasiado, mas, humano. Adora futebol de botão, brincar de cabracega e comer tudo o que é doce e o que não presta.
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// .br
A NOVA
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CARA
DA POLÍTICA BRASILEIRA HÁ UM JEITO JOVEM DE SE FAZER POLÍTICA? Termina este mês de junho o prazo para que os 27 partidos políticos brasileiros escolham seus candidatos a prefeito, vice-prefeito e vereador dos 5.564 municípios que realizam a votação em cinco de outubro – apenas Brasília não participa das eleições municipais. Este ano, cerca de 128 milhões de brasileiros têm a oportunidade de eleger seus representantes municipais. Em um País visivelmente apático e descrente nas instituições, merecem destaque políticos de idéias jovens e contemporâneas: candidatos que se preocupam com os principais temas políticos atuais e procuram uma nova forma de fazer política. Mas o que seria esse jeito inovador de agir politicamente e como trazer grandes temas políticos para as questões relacionadas aos municípios? por_Kleyson Barbosa
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Escolhidos os candidatos, os partidos têm até o dia 5 de julho para protocolar o registro dos candidatos e já no dia seguinte, 6, começa a corrida eleitoral. A partir daí, pelas ruas de todos os municípios serão realizados comícios, distribuídos santinhos, e candidatos, entre um aperto de mão e outro, apresentarão suas propostas. O dilema da população é como escolher, sem ser seduzido apenas por promessas, quem vai, durante quatro anos, executar melhorias em sua cidade, cuidar do transporte urbano, da infra-estrutura pública, da saúde, do combate à violência, da educação básica, de questões como moradia e iluminação urbana. E também cobrar desses candidatos posturas inovadoras sobre temas como cidadania, direitos humanos, conhecimento, ética e liberdade e o fim de práticas políticas tradicionais como o clientelismo e o loteamento de cargos. As eleições municipais mais relevantes, que indicam tendências e projetam futuros cenários, acontecem nas 26 capitais de estados e nas outras 54 cidades com mais de 200 mil eleitores. Mas a escolha do prefeito é tão importante para o morador de Borá, no estado de São Paulo, município com menor número de habitantes do Brasil, quanto para o morador do município mais populoso do país, a cidade de São Paulo. Em um país visivelmente apático e descrente em relação às instituições, ganham destaque, nesta eleição, propostas inovadoras que procuram um novo olhar sobre a forma de se fazer política. Os personagens daquela que seria a “nova cara” da política brasileira são jovens que buscam inovar e romper com o modelo vigente da política que afasta a população. Mas, definitivamente, esse jeito novo e moderno de participar politicamente não está necessariamente relacionado à idade, nem mesmo a heranças políticas. Entre os postulantes ao cargo de prefeito das capitais brasileiras que representam forças políticas jo-
vens destacam-se: Marta Suplicy (PT), 63, e Soninha Francine (PPS), 40, em São Paulo, município mais populoso do País, com pouco mais de 8,2 milhões de eleitores; Fernando Gabeira (PV), 67, e Jandira Feghali (PCdoB), 51, no Rio de Janeiro, que possui cerca de 4,5 milhões de eleitores; ACM Neto (DEM), 29, em Salvador, que tem quase 1,8 milhões de eleitores; Luciana Genro (PSOL), 37, e Manuela d’Ávila (PCdoB), 26, em Porto Alegre, que tem aproximadamente um milhão de eleitores; e Cesar Souza Júnior (DEM), 28, em Florianópolis, que tem pouco mais que 300 mil eleitores. Jandira Feghali (PCdoB) e Fernando Gabeira (PV) não são tão novos assim, mas são políticos reconhecidos por suas idéias jovens e inovadoras. Gabeira, que participou da luta armada contra o Regime Militar de 1964 e juntamente com o MR-8 (Movimento Revolucionário 8 de Outubro), seqüestrou o embaixador norte-americano Charles Elbrick e teve importante atuação durante a crise política de 2005 e no processo que levou à renúncia de Severino Cavalcanti, então presidente da Câmara dos Deputados. No lançamento da sua candidatura para a prefeitura fluminense, ele impôs aos aliados PSDB e o PPS seu modelo de fazer política. Afirmou que não irá aceitar indicações políticas para cargos no governo e que fará uma candidatura que não seja de oposição aos governos federal e estadual, mas centrada nos problemas da cidade. Jandira Feghali é uma das líderes de pesquisa no Rio e Janeiro. Em 2005, travou batalha contra a Igreja Católica quando propôs a legalização do aborto. Analistas políticos acreditam que sua derrota nas eleições para o Senado, em 2006, contrariando as pesquisas de opinião, ocorreu justamente por esses motivos. JUNHO 08 // POST 00
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Outra que, mesmo com a idade, continua jovem, é Marta Suplicy (PT), que, segundo pesquisas, lidera a disputa na capital paulista. Ela se tornou conhecida nos anos 1980, quando já falava com desenvoltura sobre temas como orgasmo e masturbação no programa TV Mulher, da Rede Globo. Enquanto deputada federal (1995-1998) propôs projetos como a parceria civil para pessoas do mesmo sexo e a regulamentação do direito ao aborto. E nem por isso deixou de chocar parte dos paulistanos em abril de 2001, quando se divorciou do senador Eduardo Suplicy, e, dois anos e meio depois, casou-se com o franco-argentino quatro anos mais jovem, Luis Favre. Mas nas eleições de 2008, Marta terá uma “pedra no sapato” chamada Soninha Francine (PPS), que, por possuir eleitores em comum, pode roubar alguns pontos importantes para a petista. Soninha não tem aparentemente nenhuma herança política, mas acredita na política e nesse que seria um novo jeito de agir politicamente. Ela é radialista, foi VJ da MTV nos anos 1990 e, depois, tornou-se apresentadora de um programa na TV Cultura, onde permaneceu até 2001, quando foi demitida, após estampar a capa da revista
Época em que afirmava ser usuária de maconha. O episódio deu visibilidade política nacional à atual vereadora do PPS – no período, várias figuras importantes em todas as áreas pronunciaram-se sobre o assunto, que foi tema de debates durante semanas. Soninha reconhece a relevância política do episódio e considera que suas posturas e a própria posição diante do ocorrido é até hoje importante na sua forma de fazer política. “O lado positivo (de eu ter me posicionado na revista) é que as pessoas perceberam que eu defendo uma opinião de verdade, mesmo que seja ruim pra mim. Eu não vou mentir só para não me prejudicar, só para não me fazer mal. E as pessoas dão valor a isso. Elas sabem que quando eu digo alguma coisa é porque eu acho e não porque é conveniente dizer. Então elas podem confiar na minha opinião. E é um jeito que eu acredito de levar a vida. Eu não vou mudar de opinião só porque vai pegar mal”, afirma. Contudo, ela admite que até hoje existem pessoas que a conhecem como “a da maconha” e só sabem isso a respeito dela. E pessoas que, num momento de divergência se referem a ela como “aquela maconheira” – desde vereadores da Câmara de São Paulo a freqüentadores dos blogs da radialista.
“EU NÃO VOU MENTIR SÓ PRA NÃO ME PREJUDICAR, SÓ PRA NÃO ME FAZER MAL. E AS PESSOAS DÃO VALOR A ISSO” [da esquerda para a direita: Cesar Junior, ACM Neto, Fernando Gabeira, Jandira Feghali, Manuela d’Ávila, Luciana Genro, Soninha Francine e Marta Suplicy]
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Outra que se destaca por si só é Manuela d’Ávila. A ex-presidente da UNE é referência da esquerda em Porto Alegre e, segundo pesquisa do Datafolha, de novembro passado, briga por uma vaga no segundo turno contra o atual prefeito e candidato à reeleição, José Fogaça (PMDB), com Maria do Rosário (PT) e Luciana Genro (PSOL), que é outra referência jovem da cidade. A bela política tornou-se um fenômeno de votos nas últimas eleições para a Câmara dos Deputados, em 2006, no Rio Grande do Sul. Ela foi a candidata mais votada, com vantagem superior a 66 mil votos para o segundo colacado do estado. Em 2004, já havia se destacado como a vereadora mais jovem da história da capital gaúcha. Manuela é conhecida pela expressão “E aí, beleza?” e tem destaque por sua plataforma de políticas públicas para a juventude.
Luciana Genro iniciou sua trajetória política com 14 anos, como militante, no Colégio Júlio de Castilho, tradicional referência do movimento estudantil em Porto Alegre. Ela é filha de Tarso Genro, atual ministro do governo Lula, e vivenciou, dentro da própria casa, o embate contra a ditadura e na luta pelas PPS E PSOL POSSUEM MENOS
“A MINHA DIVERGÊNCIA ERA PORQUE O PT ESTAVA MUDANDO E SE TRANSFORMANDO CADA VEZ NUM PARTIDO IGUAL AOS OUTROS”
DE 500 MIL FILIADOS.
O PSOL, apesar de ser representado no Congresso Nacional por três deputados federais e um senador, tem cerca de nove mil filiados. Já o PPS, que possui quatorze deputados federais, um deputado distrital e nenhum senador, tem cerca de 450 mil filiados. PMDB, PP, PSDB e PT são as únicas agremiações que ultrapassam mais de um milhão de filiados: 2.002.449, 1.237.672, 1.109.428 e 1.063.719, respectivamente.
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eleições diretas em 1984, que ela acompanhou quando ainda tinha 13 anos. “Minha atenção para a política começou acompanhando o meu pai, que foi militante ainda na época da ditadura. Quando eu era recémnascida, ele teve que fugir do Brasil para não ser preso, e eu acompanhei depois, já crescida, o desenrolar dessa história”, comenta. Nesse caso, o sobrenome, Genro, constitui uma das mais expressivas rupturas com o modelo da geração anterior de se fazer política no país. Desde seu segundo mandato como deputada estadual (19992002), quando votou contra a direção do Partido dos Trabalhadores (PT) e chegou a ser punida, ficou visível sua discordância com algumas posturas do partido. Mas a divergência ficou notória em 2003, quando foi expulsa do PT e, em junho de 2004, juntamente com os também expulsos, Heloísa Helena, Babá e João Fontes, fundou o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). “A minha divergência era porque o PT estava mudando e se transformando cada vez num partido igual ao outros. E quando isso aconteceu, nós
nos rebelamos. A gente resgatou e se manteve fiel às bandeiras que o próprio PT sempre defendeu e que abandonou completamente quando chegou ao poder”, justifica. Mas nem sempre o sobrenome, em gerações distintas, traz uma nova forma de se fazer política. O nome da família pode não significar uma ruptura, mas a consolidação de um modelo. É o caso de ACM Neto, que, com apenas 29 anos, está entre os seis parlamentares baianos mais influentes do parlamento brasileiro, em levantamento produzido pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), em 2007. ACM Neto traz na bagagem familiar o fato de ser neto do falecido Antônio Carlos Magalhães (ACM), herdeiro político daquela que é considerada umas das mais tradicionais oligarquias do país. Ele tem chances de chegar ao segundo turno em Salvador. Outro caso de sobrenomes tradicionais é o do deputado estadual de Santa Catarina, Cesar Souza Junior, que embora não tem o sobrenome Bornhau-
“EU CLASSIFICO A POLÍTICA NA IDEOLOGIA. EU SOU SOCIALISTA, E ISSO PRA ALGUNS É UMA POLÍTICA DINOSSÁURICA, PRA MIM NÃO”
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sen, é apoiado pela família. Ele é dos mais jovens candidatos nas capitais e, nas últimas pesquisas de opinião, seu nome figura no segundo lugar na disputa em Florianópolis. Cesar Junior apresenta programas na televisão e no rádio sobre direito e comunicação, para esclarecer dúvidas dos telespectadores. O jovem promete uma atitude inovadora entre os membros do legislativo, que são postulantes a cargos públicos: irá licenciar-se do cargo, já neste mês, para se dedicar unicamente ao pleito municipal. O deputado deve utilizar da licença até o final de outubro. Soninha Francine e Luciana Genro conversaram com a POST sobre temas políticos importantes, jeito jovem de fazer política e as eleições municipais. Segundo pesquisa do Datafolha, realizada em maio passado, Soninha teria 2% das intenções de votos dos eleitores paulistas. Já Luciana Genro, segundo pesquisa de novembro passado do mesmo instituto, briga com Maria do Rosário (PT) e Manuela d’Ávila (PCdoB) por uma vaga no segundo turno com o atual prefeito e candidato à reeleição, José Fogaça (PMDB). Luciana Genro considera que o principal problema do Brasil é a dívida pública. “Temos hoje um endividamento de mais de um trilhão de reais, em títulos do governo, e cerca de 26% do Orçamento de 2008 vai ser destinado para pagar juros e amortização dessa dívida. É por isso que faltam recursos para a educação, para a saúde, para a segurança pública”, justifica. E aponta também a reforma tributária como outro tema crucial do país. “Não esse arremedo de reforma que o Lula está fazendo, mas uma reforma tributária que inverta a lógica atual, que é de tributar fortemente o salário e o consumo e, em muito menor medida, a riqueza e a propriedade. Inverter o sistema tributário é fazer com que essa enorme carga tributária saia dos ombros dos assalariados, da classe média, e recaia sobre os bancos, sobre o capital financeiro, sobre as cinco mil famílias mais ricas do Brasil”, acrescenta. Já Soninha acredita que o grande tema político atual é a reforma política. Ela considera o sistema eleitoral “completamente desengonçado”, desde o voto obrigatório, passando pela representação partidária, até o modelo presidencialista. A radialista questiona a fidelidade partidária. “Não é por impedir a mudança de um partido para o outro que se dá consistência a um partido. Temos que criar mecanismos que não permitam a criação de legendas que não se sustentam e que impeçam o fisiologismo. O cara pode não mudar de partido e continuar vendendo o seu voto” – alfineta a candidata, que saiu do PT no final do ano passado. Soninha critica ainda a necessidade de uma Assembléia Legislativa permanente nos estados. “A atribuição legislativa do estado, no nosso modelo de federação, é muito limitada. Você acaba tendo
deputados que são despachantes da sua região, para tratar muito mais de questões orçamentárias, como acontece com os vereadores”, conclui. E considera que a educação e o ensinamento de “como funciona a política” são essenciais para motivar os eleitores a participar da vida política. Soninha acredita que existe um jeito jovem de fazer política, que é desatrelado a idade. “Eu vejo nos jovens parlamentares ou nas juventudes dos partidos simplesmente a reprodução do modelão, do estereótipo. É o jovem político imitando os que vieram antes deles na dinastia e, muitas vezes, é um caso de dinastia mesmo”, avalia. Ela acredita que um jeito jovem de fazer política é contestar a própria. “Contestando de verdade, não fazendo o discurso clichê que o povo quer ouvir. Mas no modo de fazer, não no discurso simplesmente”, explica.
NÃO É À TOA QUE DUAS MULHERES ILUSTRAM ESSA MATÉRIA
As mulheres estão em destaque em nove das dez maiores cidades do país (apenas Recife não tem mulheres nos bastidores das negociações políticas das eleições de 2008). As já citadas Soninha (PPS) e Marta Suplicy disputam em São Paulo. No Rio de Janeiro, as candidatas são Solange Amaral (DEM) e Jandira Feghali (PCdoB). Luciana Genro (PSOL) e Manuela D’Ávila (PCdoB) compõe com Maria do Rosário (PT) o trio feminino que busca impedir a reeleição do atual prefeito em Porto Alegre. Em Belo Horizonte, Jô Moraes (PCdoB) é a alternativa ao bloco formado por PT-PSDB-PSB. Em Belém, Valéria Pires Franco (DEM) pode ser uma das candidatas. E, em Salvador, Lídice da Matta (PSB) e Olívia Santana (PCdoB) podem se candidatar ou ser vice de Walter Pinheiro (PT). Em Curitiba, a candidata feminina é Gleisi Hoffmann (PT). Em Fortaleza, Luizianne Lins (PT) e Patricia Saboya (PSB). Em Manaus, Vanessa Grazziotin (PCdoB) é candidata e Rebecca Garcia (PP) pré-candidata.
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Ela avalia, por exemplo, que na sua forma de fazer política, o que confronta muito o modelo vigente é tentar fazer, dentro da política institucional, exatamente o que os eleitores esperam que seja feito. “Parece bobagem, mas não é. As pessoas olham para aquela política toda rebuscada, toda dissimulada, em que você toma o maior cuidado com o que você vai dizer, porque de repente pode prejudicar um interesse seu mais adiante. E (o jeito jovem de fazer política) é não fazer isso. Não deveria ser, mas é revolucionário”, complementa. Já Luciana Genro não acredita que exista um jeito novo de agir politicamente. “Eu não classifico a política assim, como jovem, velha, moderna, antiga. Eu classifico a política na ideologia. Eu sou socialista, e isso para alguns é uma política dinossáurica, para mim não”, avalia. Luciana Genro acredita que o socialismo é o único meio de condição que pode oferecer um futuro para a humanidade. Nas eleições municipais deste ano, Luciana irá centrar suas propostas nas áreas de saúde, educação, segurança pública e transporte. Mas avalia que sua campanha possui um diferencial perante às demais, que é o combate à corrupção. “(A corrupção) é o ralo por onde escorre o dinheiro público que falta para os investimentos na saúde, na educação, na segurança, em todas essas áreas sociais que são muito importantes”, avalia. Ela acredita ainda que seu programa de governo é próximo do que será proposto pelos outras candidatos, mas reforça que esse compromisso com a ética na política é imprescindível. “Todo mundo vai vir com propostas bonitinhas e arrumadinhas para tentar ganhar voto. Mas só nós do PSOL temos a credibilidade de quem sempre cumpriu com seus compromissos e nunca traiu os seus eleitores”, justifica. Luciana Genro insiste que foi pela fidelidade aos compromissos assumidos com os eleitores que rompeu com o governo Lula, e com o PT, em 2003. Já Soninha propõe uma nova forma de organização da política, criando novas instâncias de participação política. “(É preciso) criar cada vez mais Conselhos, abrir para a população novas possibilidades de participação política, novas possibilidades de exercício da democracia”, sugere. Do ponto de vista político, analisa que possui divergências com o PT, com o PSDB, com o DEM e os outros partidos, mas avalia que não terá problemas em reconhecer avanços dos governos da Marta, Serra e Kassab. “É uma campanha de propostas para a cidade de São Paulo, que pode acolher proposta bem sucedidas de onde quer que elas venham, mas que finca a posição num jeito de fazer política que, esse sim, é diferente”, afirma.
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“É O JOVEM POLÍTICO IMITANDO OS QUE VIERAM ANTES DELES NA DINASTIA E MUITAS VEZES É UM CASO DE DINASTIA MESMO”
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ENCARCERADAS DETENTAS RELATAM O QUE SENTEM ATRÁS DAS GRADES. por_Bruna Saniele
Cláudia foi condenada por latrocínio e cumpre parte da pena em regime aberto, o que permite que ela saia durante o dia e retorne para a penitenciária à noite. Betânia conseguiu a progressão para o regime semi-aberto e, quando saiu para visitar a família por alguns dias, decidiu não voltar. Está foragida. Daniela foi acusada de matar o filho e foi presa em caráter provisório. Com 19 anos, está grávida. Cláudia, Betânia e Daniela são personagens reais cujas historias foram contadas no documentário “O Cárcere e a Rua”, de Liliana Sulzbach. Premiado como melhor documentário em Gramado, em 2004, a obra mostra problemas típicos do sistema penitenciário feminino. Com outros nomes, mulheres como Cláudia, Betânia e Daniela poderiam ser facilmente encontradas em alguma das 40 penitenciárias femininas brasileiras. 28
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Segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), órgão do Ministério da Justiça, em julho de 2007, existiam mais de 360 mil pessoas presas no sistema penitenciário e pouco mais de 58 mil pessoas sobre custódia da polícia civil. Desse total, cerca de 5% são mulheres. Embora o número de presas seja muito inferior ao número de presos, a população carcerária feminina cresce em ritmo acelerado em relação à população prisional masculina. Nos últimos seis anos, o número de mulheres presas cresceu duas vezes e meia mais do que o de presos. Na maioria dos estados brasileiros, o número inferior de presas impede que as mulheres enfrentem problemas de superlotação, comuns às instituições prisionais masculinas. No entanto, essas mulheres enfrentam outros problemas típicos.
[ foto_Shayan Sanyal ]
No Presídio Feminino José Abranches Gonçalves, em Ribeirão das Neves, região metropolitana de Belo Horizonte, as luzes se acendem às seis horas da manhã. Até às sete horas todas as presas devem estar de pé, com a cama arrumada. Nesse horário, aguardam o café da manhã, um pão de sal, um copo de leite e um copo de café, e esperam a revista matinal. Após a revista, as presas são encaminhadas ou para a escola ou para as oficinas. No presídio, que é rural, algumas detentas trabalham com artesanato enquanto outras trabalham com plantas. O local é conhecido pelas presas como um dos melhores locais para se cumprir pena no estado de Minas Gerais. Ainda assim, quem fica trancafiada por dias, meses e até anos não consegue se acostumar com a vida atrás das grades. “Dentro da prisão a gente não pode fazer nada. Eu sinto falta das pequenas coisas, de acender um cigarro, de escolher a hora em que vou comer, de poder dormir no horário que eu quero. Ser mandada o tempo todo é muito difícil”, afirma Ana (nome fictício), 27 anos, há cinco meses no local. Na tentativa de “tirar a cadeia” de forma mais fácil, gíria típica das cadeias, muitas mulheres procuram conforto se relacionando com outras mulheres. Rosilene Geralda Gregório, 36 anos, está presa na Penitenciária Feminina Estevão Pinto, em Belo Horizonte. É a segunda vez que é presa, sempre pelo
mesmo crime: tráfico de drogas. Foi na prisão que a mulher casada vivenciou uma nova experiência: a relação homossexual. O primeiro relacionamento aconteceu em 1998, três meses após a primeira chegada ao cárcere. “Não parecia normal, eu dizia que não ia beber dessa água não, mas aí resolvi experimentar para ver como é que era. Achei engraçado, era uma curiosidade. Parece que tudo que não pode é melhor, né?”, conta. Rosilene faz parte de um tipo muito comum nos presídios: a homossexual ocasional. Separadas da família, dos amigos e dos companheiros, muitas mulheres heterossexuais se abrem para relações homossexuais com outras colegas. Essas relações não tendem a prevalecer fora do cárcere. Essa é mais uma maneira de superar a solidão. De acordo com a psiquiatra da penitenciária, Nely Malta Ferreira, “toda pessoa que está em estado de confinamento tem a tendência a exibir uma conduta homossexual que, geralmente, não irá prevalecer quando cessada a situação adversa”. Ao contrário dos presídios masculinos, nos quais as relações homossexuais geralmente são forçadas, como uma relação de poder, nos presídios femininos elas são sempre consentidas. Luciana Cristina Romão, separada e mãe de cinco filhos, se rendeu aos encantos de Rosilene. Para Luciana, “Ela é muito carinhosa, companheira, me ajuda aqui dentro. É muito difícil para mim ficar sem meus filhos que estão em São Paulo. Ela faz minha cadeia passar mais rápido”.
PERFIL SÓCIO- ECONÔMICO DAS PRESAS NO BRASIL
Educação: Segundo dados do Ministério da Justiça, de julho de 2007, cerca de 4,7% das presas são analfabetas, cerca de 12,65 % são alfabetizadas, cerca de 44% têm ensino fundamental incompleto, cerca de 14% têm ensino fundamental completo, cerca de 12,5% têm ensino médio incompleto, cerca de 9,18% têm ensino médio completo, cerca de 1,75 % têm ensino superior incompleto, cerca de 0,80 têm ensino superior completo. Apenas 0,03% têm formação acima de superior. Faixa etária: cerca de 27% têm entre 18 e 24 anos, cerca de 24,5 % têm entre 25 e 29 anos, cerca de 19% têm entre 30 e 34 anos, cerca de 20,5% têm entre 35 e 45 anos, cerca de 7% têm entre 45 e 60 anos, cerca de 0,8% têm mais de 60 anos. Cor da pele/etnia: cerca de 43% se declararam brancas, cerca de 16% se declararam negras, cerca de 40% se declararam pardas, cerca de 0,55% se declararam amarelas, 0,25% se declararam indígenas. Fonte: www.mj.gov.br/depen
Cláudia Rullian, um das detentas retratadas em “O Cárcere e a Rua”. [foto_divulgação]
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MATERNIDADE
Emile tem cinco meses. Nunca passeou pela praça e só pega 20 minutos de sol de manhã. Emile está presa com sua mãe, Maria Cristina Costa Barreto, 26 anos, desde que as duas saíram da maternidade. A convivência quase exclusiva tem data para terminar. Quando a criança completar um ano terá que deixar as dependências da Penitenciária Estevão Pinto, em Belo Horizonte. “Não consigo nem pensar como vai ser minha vida sem ela. É ela quem me faz agüentar isso aqui. É ela quem segura a minha cadeia”. Em maio passado, 21 mulheres conviviam com seus filhos dentro da penitenciária. Com o aumento no número de mulheres presas, aumentou também a necessidade de leitos para gestantes. Este mês será inaugurado um complexo penitenciário para abrigar apenas mulheres no último trimestre de gestação e mães com crianças de até um ano de idade. “É uma solução paliativa. Enquanto houver necessidade vamos procurar atender cada vez melhor as mulheres presas”, afirma o superintendente de atendimento ao preso da Secretaria de Estado e Defesa Social (Seds-MG), Guilherme de Faria.
Outro recurso para fazer a pena “passar mais rápido” são os remédios. Segundo agentes penitenciárias entrevistadas, quase a totalidade das presas consome algum tipo de medicamento antidepressivo. Esse medicamento é recomendado após o PIR – Programa Individual de Ressocialização, no qual uma equipe multidisciplinar realiza exames médicos e psicológico e avalia o melhor tratamento para cada caso. “Não dá para segurar cadeia sem remédio. Aqui dentro é muito sofrimento, se não é remédio e cigarro, o tempo não passa”, garante Nívea. Dentro das prisões, o cigarro continua como um objeto de poder. Mas não é o único. Os mesmos “reais” que existem do lado de fora determinam quem é quem lá dentro. Muitas presas conseguem regalias pagando a outras presas serviços de limpeza de cela e de banheiro. Além disso, quem tem dinheiro ou visitas de parentes pode ter acesso a outros benefícios. As instituições criminais fazem, semanalmente, compras para as presas de artigos de higiene íntima, cigarros e alimentos. Assim, aquelas que têm dinheiro conseguem viver melhor. A detenta Nívea Alves Costa, 26 anos, que cumpre pena no Presídio Feminino José Abranches Gonçalves, em Ribeirão das Neves, região metropolitana de Belo Horizonte, comenta que muitas vezes faltam artigos de higiene íntima como absorvente e sabonetes. “Os que eles dão para a gente, não dá nem para usar. Vive bem só quem pode comprar ou recebe das visitas. Na cadeia a gente só tem amigos quando tem sacola. Se você tem (dinheiro) vale tudo, se não tem, não vale nada”.
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[foto_Ghostieguide]
Cláudia Rullian [foto_ diulgação]
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A FRANÇA FRATURADA PAÍS TEM AO MENOS CINCO MANIFESTAÇÕES POR DIA, E SARKOZY, O PRESIDENTE MAIS MIDIÁTICO DOS ÚLTIMOS TEMPOS, VÊ SUA POPULARIDADE BAIXAR.
por_Henrique Fares
“Atualmente, Paris vive a cada dia pelo menos cinco manifestações”. Esta afirmação do militante verde Gilles Pradeau é confirmada pela Polícia Federal francesa. Claramente, a situação é mais delicada após a eleição de Nicolas Sarkozy, do principal partido de direita francês, o UMP. Manifestação de universitários contra a reforma da educação, de colegiais contra a extinção de postos, de aposentados por aumento, dos franceses em geral pelo poder de compra... a lista é longa, aliás, inesgotável. A eleição de Sarkozy, há pouco mais de um ano, foi vivida de forma turbulenta nas ruas de Paris. Na praça da Bastilha, onde se reuniam os simpatizantes da candidata de esquerda, Segolène Royal, após o anúncio da vitória de Sarkozy, a temperatura aumentou. Polícia montada, esquadrão de choque e bombas de gás tentavam dissuadir uma pequena multidão, já indignada com a eleição do candidato bling-bling (expressão cunhada pela mídia francesa que ironiza a ostentação de Sarkozy). Em contrapartida, o clima na Praça da Concórdia era de festa entre amigos. Shows de artistas de renome, champagne e muita alegria em rostos vestidos em camisetas polo e blazers bem cortados. Uma diferença clara na visão sobre o futuro da França, acentuada pela fratura da sociedade, representada na diferença de perfis que notei nas duas manifestções populares.
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Manifestação intersindical na Praça da Bastilha, em Paris, em maio passado [foto_Claude Villetaneuse]
POPULARIDADE EM QUEDA
Existe uma antipatia natural dos militantes de esquerda por Sarkozy, mas agora, sua cota de popularidade também baixou. O estadista tem hoje a cota de popularidade mais baixa de um presidente na história recente da França. Em julho de 2007, Sarkozy gozava da confiança de 65% da população francesa, e, na última pesquisa do CSA, um dos principais institutos de sondagens da França, para maio de 2008, sua aprovação chega ao nível de 38%. Sarkozy, que ganhou as eleições prometendo reformas drásticas no sistema econômico, social e político francês, iniciou seu governo impondo uma nova ordem política respaldado por seus eleitores. Pouco diálogo social, anúncios inesperados de reformas, onipresença midiática e uma certa quebra do protocolo presidencial ajudaram a embasar as críticas. Para o sociólogo Jacques Rouet, do CNRS (Centro Nacional de Pesquisa Científica), “os políticos na França são habituados a fazer muitas promessas, e, com Sarkozy, este processo se acelerou por uma estratégia política. O acúmulo de propostas faz com que a mídia não consiga acompanhar e cobrar, e neste processo a pressão se dilui no tempo”. Visão que é corroborada por Gilles. “A gente tem um presidente que é onipresente, que polemisa o tempo todo, com isto, os movimentos sociais têm dificuldade em serem ouvidos, tendo que partir para ações cada vez mais espetaculares”, afirma. Nas últimas semanas vimos desfilar pelas ruas de Paris alguns milhões de franceses que se sentem longe de serem entendidos pelo governo. Um bom exemplo é a manifestação dos pescadores, que estão em protesto há mais de um ano pela invibialidade da atividade, devido à alta de custos. Nem a intervenção midiática do Primeiro Ministro, François Fillon, que prometeu um pacote de ajuda de mais de 300 milhões de euros para resolver o problema, não acalmou os ânimos. O debate em torno da forma Sarkozy de governar é longo, já dura mais de um ano, e ao que os ânimos das ruas indicam, está longe de se esfriar. Seu mandado, que acaba em 2012, deve continuar dividindo os franceses. Enquanto isso, a comemoração, no mês passado, dos 40 anos de maio de 1968 girou em torno da questão de que talvez seja a hora de recriar o movimento que pôs abaixo as imposições políticas daquela década – mesmo se para o presidente, 1968 seja “uma lembrança morta”.
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TEL AVIV Tel Aviv-Yafo
32°
WEST BANK
Bat Yam
Ramla Ashdod Ashqelon
MEDITERRANEAN SEA
GAZA
// láfora.
Jericho Madaba
Bethlehem
Qiryat Gat
Dead Sea
Hebron
JORDAN
Khan Yunis
Beersheba Al Arish
SOUTHERN Bi'r Lahfan
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Amman
Jerusalem JERUSALEM
Gaza
Az Zarqa'
Ram Allah
Al Qatranah Ak Karak
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As Safi
Dimona
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Abu 'Ujaylah 'Ayn al Qusaymah
Zin NEGEV Mizpe Ramon
Bi'r Hasanah
Al Jafr Ma'an
EGYPT 30°
S
I
N
A
Ra's an Naqb
Al Kuntillah
I
30°
Yotvata
ISRAEL
An Nakhl
The designations employed and the presentation of material on this map do not imply the expression of any opinion whatsoever on the part of the Secretariat of the United Nations concerning the legal status of any country, territory, city or area or of its authorities or concerning the delimitation of its frontiers or boundaries.
Elat Taba
Al 'Aqabah
GUIA DE 34°
ap No. 3584 Rev. 2 nuary 2004
Gulf of Aqaba
UNITED NATIONS
ISRAEL
por_Carlos Reiss | fotos_Carlos Reiss
SAUDI Fanatismo religioso, guerras, bombas e terror. Essa é a imagem difundida pelo 36 mundo de um país sexaARABIA ° genário, menor que o estado brasileiro do Sergipe e que é citado todos os dias nos jornais. Apesar de Department of Peacekeeping Operations tudo, Israel é apenas um país diferente, um salada de Cartographic Section culturas, mas que tenta conviver, de forma natural, com mortes, dor e ódio. Israel luta para ser normal: quer ter suas prostitutas, seus políticos corruptos, seus escândalos sexuais, sua luta contra a inflação, seus crimes sem solução. Viver em Israel necessita de um olfato apurado, um paladar aguçado e uma visão milimétrica. O raio-x é feito todos os dias e mostra o sofrimento de um povo que quer viver em paz. O desafio do país no século XXI não é apenas solucionar o conflito com os palestinos: é livrar-se dos estigmas das particularidades e figurar como mais um “país como outro qualquer”.
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Um dos grandes dilemas do Israel moderno é o desafio do multiculturalismo. As idéias dos senhores judeus de barba longa do século XIX, que pensavam no futuro Estado, divergem da capa do “novo judeu”. Porque judeus, já há séculos, habitam diversas partes do mundo e possuem inúmeras características culturais, sociais e raciais. Seriam os “novos judeus”, os israelenses, colocados num grande caldeirão, misturados e retirados como o cidadão único, de cultura global e homogênea? Um melting-pot cultural, como nos Estados Unidos? Ou cada grupo manteria, apesar da identidade comum, seus traços culturais? Nem uma coisa nem outra. Ou os dois. É possível enumerar várias características do israelense comum, mas as diferenças culturais continuam abissais. Música, comida, gírias, enfim. Num país de pouco mais de sete milhões de pessoas, um milhão e meio são árabes. Mais de um milhão são russos. Há franceses, americanos, etíopes, latino-americanos, tailandeses, marroquinos, persas, filipinos, eslavos, turcos, indianos. Aos montes. Como um caleidoscópio, em que cada vez que é girado apresenta uma cor, uma forma, um contorno.
NÃO DISCRIMINE OS NEGROS. DISCRIMINE OS ÁRABES.
INFELIZMENTE, EM ISRAEL,
OS NEGROS SÃO OS ÁRABES.
Toda sociedade possui sua casta inferior, sua camada mais baixa, a base da pirâmide social. Aqueles empurrados para a sarjeta, que lutam no dia-a-dia pela sobrevivência com jornadas de trabalho intermináveis, salários mixos e olhar desconfiado nas ruas. Infelizmente. Houve um tempo em que se valorizou o “avodá ivrit”, o “trabalho hebraico”, a contratação de judeus para serviços básicos na construção civil ou nos restaurantes, por exemplo. Hoje, o setor é recheado não só de árabes, mas de tailandeses e filipinos. É mais barato. O negro em Israel, o etíope (e são milhares deles) não sofre preconceito pela cor da pele. Os árabes, “primos” dos judeus, sofrem. Infelizmente.
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Não adianta discutir. A cultura israelense está mergulhada no exército. O país inteiro é influenciado pelo serviço militar, política e economicamente é totalmente sabido. O grande problema está no aspecto cultural e social da população. No imaginário popular. No Brasil, por exemplo, é comum dois jovens se conhecerem e conversarem sobre os mais diversos assuntos. Futebol, profissão, negócios.
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Em Israel, o papo sempre começa ou termina em “o que você fez na tzavá?” A Tzavá (exército) determina a entrada do jovem na universidade, no mercado de trabalho. Transforma jovens, que no caso do Brasil estariam escolhendo seu curso superior, em robôs condicionados a obedecer ordens e cumprir leis militares. Por volta dos 24 anos, retornam de suas viagens volta-ao-mundo pós-tzavá (regadas a drogas e “libertação”), alugam apartamentos com amigos e começam a pensar no que fazer da vida. Mexe com a estrutura do país. Na base. Lá no fundo.
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Apesar da religião e de alguns traumas, Israel é um país que entendeu o século XXI. No sentido da moda e da sexualidade. Ou na discussão sobre elas. E não é somente uma questão estética ou de primeira vista como, por exemplo, chegar à Tel-Aviv e ver, em cinco minutos, uma dezena de casais homossexuais caminhando na praia ou abraçados nas sacadas. A discussão é mais profunda. Em Israel, essa liberdade se materializa em homens extremamente vaidosos: calças e blusas justas, pé e mão impecáveis, sobrancelhas perfeitas, salão de beleza. E em mulheres mais soltas, com calças largas, maquiagem pesada e palavreado chulo. De Jerusalém a Tel-Aviv, dois extremos separados por apenas 59 km.
TENHA UMA ARMA E NUNCA A USE.
Em Israel, não é tão fácil adquirir uma arma de fogo licenciada como nos Estados Unidos. Mas é fácil. Soldados vestidos à paisana desfilam nas boates com seus fuzis M-16 nas costas. Mães passeiam com os filhos no parque com uma pistola automática na cintura. A cultura da arma é latente, porém seu uso é restrito. Não apenas por leis, mas por consciência. Em apenas alguns dias, é possível assistir a discussões intermináveis no trânsito. Em várias delas, homens saem de seus veículos e se insultam veementemente. Muitas vezes, estão armados até os dentes. Meu Deus do céu, é hora de sair dali, alguém vai sacar uma arma. Mentira. Os homens podem até se atracar, quebrar os dentes um do outro, mas não sacam as armas. Nunca houve um caso. Podem até existir socos e pontapés, mas a arma está lá, na cintura ou à tiracolo, intocada. É fascinante.
Grite no trânsito, grite na loja, grite no restaurante. A falta de educação dos israelenses é notória. Dê palpites na fila do caixa do supermercado, de preferência “por que você não paga com cartão de crédito” ou “por que só isso de tomate”. Use garfo e faca apenas para o essencial. E finja comer apenas comida saudável. Finja. Se você não quer parecer suspeito, não haja como suspeito. Entre na casa de seus vizinhos sem ser convidado. Sem nem bater à porta. Diga “shabat shalom”, ou “bom final de semana”, para o máximo de pessoas que encontrar. Não converse com os motoristas de ônibus. Combine o preço da corrida de táxi. Pendure bandeiras de Israel na janela no Dia da Independência e as esqueça por lá. Se tiver um carro, tenha um viva-voz para celulares. Aliás, tenha vários celulares. Dois, três de preferência. E ande com todos. Não se assuste com as armas. Nem com os seguranças dos ônibus. Não pense em terroristas. Assista apenas ao futebol europeu. Jogue basquete. Ande sempre com sua carteira de identidade. Pague o ônibus e guarde o recibo. Viaje. Viaje muito. E volte sempre para casa.
Por mais que a influência de Jerusalém mantenha o País dentro de certo “controle”, temas são discutidos sem puritanismo. Sem tabus. Por mais que os religiosos batam os pés, o Israel moderno caminha para a libertação cultural e sexual. Tanto de homens vaidosos quanto de mulheres desleixadas. O Israel religioso continua na Idade Média.
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O LADO LUXUOSO
DO LUXO
Variações e vertentes da moda no luxo e do luxo na moda
Se a moda, por um lado, cria objetos de consumo tornando-os desejáveis pela sociedade naquele exato momento e define períodos na história, por outro, é também anulação. Considerando boas e devidas excessões, o “estar na moda” é se despir de quem você realmente é e fantasiar-se em objetos e comportamentos, tornando-se quem o outro desejado gostaria que você fosse (lembrando que esse desejo também é SEU, é parte das suas vontades e idealizações). Já a indústria do luxo, que por um lado se encaixa nesse sistema de moda, ao fazer com que um objeto torne-se artigo de luxo e, dessa forma, potencialize sua compra e satisfaça um gosto pessoal, por outro, tem a ver com satisfação verdadeira. Está certo que hoje grandes empresas de artigos de luxo buscam meios de emocionar o consumidor com tais produtos, proporcionando ao cliente no ato da compra outras sensações. Mas luxo tem a ver mesmo é com o prazer pessoal e sensorial, com a sensibilidade de cada um em sua intimidade. Está na satisfação individual. Não está fora, na exibição e na opulência. Este é o verdadeiro luxo. O luxo não está ligado a objetos de grande valor, e sim ao prazer que se tem ao comprar desde um All Star a um helicóptero. Satisfazendo cada um sua vontade com o uso. Depende do desejo REAL de quem compra. Não importa o que se compra, onde e o valor, o interessante é saber comprar. Existem coisas que se revelam de maior valor a uns e de menor valor a outros. A fórmula para criar uma marca ou objeto de luxo é esta: dá-se a produção de algo com algum diferencial, seja no campo estético, da matéria-prima ou na forma de produção. O produto, em seguida, passa pelos chamados árbitros de gosto, que são as “Vogues da vida” e os consumidores do topo da pirâmide (os mais endinheirados). Caso tenha aprovação (e, nesse caso, entenda por aprovação: consumir e divulgar tal achado), a marca passa então a ser associada a atributos como elegância, sofisticação, poder, status, entre outros adjetivos. Dessa forma, a marca adquire legitimidade perante seus consumidores, ditando o que é ou não “bom” (parte essencial do sistema de moda). Outra característica desses artigos “criados” é a exclusividade, que permite uma suposta distinção – como fez a nobreza no Renascimento, período em que surgiu o sistema de moda, que para se diferenciar da classe burguesa que tentou imitá-los, promoveram, em um curto período de tempo, mudanças drásticas na vestimenta, buscando distinção. Mas o grande lado luxuoso do Luxo pode ser a outra face da moeda. Luxo pode ser simplesmente saber comprar, como já foi dito. E é, essencialmente, fazer escolhas conscientes. Não é andar por aí todo grifado, sem estilo verdadeiro, sem satisfazer sua vontade honesta. Luxo mesmo é saber e poder editar sua própria vida. Pode ser ter uma horta em casa e consumir comida fresca diariamente, ter tempo para fazer coisas com calma, dormir, ler e ouvir sua música preferida. Luxo é ser quem você é, autêntico, e não se preocupar com a opinião do outro. Já olhou para o céu hoje? Enfim, luxo não é cópia, seja ela de comportamento, de coisas, do outro. É inovação. É não precisar do aval alheio para fazer suas escolhas! 38
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Juliano Sá é arquiteto e stylist. Tem mais sono no horário da manhã, mas prefere acordar cedo e ter o que fazer. Sempre desconfia de pessoas gracinhas demais.
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Status
ESTADO CIVIL: Mテウ
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Favela da Rocinha [foto_Fabio Venni]
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[foto_ Thays Prado]
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“Mãe, pai, tô grávida”. Talvez essa seja uma das frases que os adultos mais temam ouvir de suas filhas adolescentes. Nessa fase da vida, uma gravidez ameaça o brilhante futuro esperado para uma menina inteligente, bonita, saudável e com boas condições financeiras. A subversão da trajetória escola-intercâmbio-faculdade-carreira promissora-marido perfeito-filhos ideais, no devido momento, põe em risco a suposta felicidade prevista para a jovem e se constitui num verdadeiro drama familiar. Quando as expectativas em relação ao futuro são bem menores, como é o caso das meninas que moram em favelas, a gravidez não chega a ser nenhuma tragédia doméstica. Ali, não há muito o que se perder tendo um filho nos braços. “A possibilidade de mudança no estilo de vida dessas adolescentes de baixa renda é muito pequena. Nesse momento, elas já estão inseridas em um contexto feminino de cuidar dos irmãos mais novos, tomar conta da casa e, muitas vezes, já trabalham como empregada doméstica”, observa a psicóloga social Ingrid Nascimento. A bronca da mãe, ou do pai – que poucas vezes ainda faz parte da família –, costuma ter motivos mais práticos como o fato de haver mais uma boca em casa para alimentar ou o dilema de saber quem vai tomar conta da criança quando todos trabalham. Pode parecer ultrapassado, mas no grande matriarcado da favela, a maternidade é mais um fato natural da vida, um destino certo para o qual todas as mulheres nasceram. Em sua pesquisa de mestrado, a antropóloga Paula Camboim acompanhou a rotina de nove adolescentes grávidas ou com filhos em duas comunidades do Rio Grande do Sul e descobriu que a maternidade simboliza uma mudança de status na vida dessas garotas. Elas deixam de ser “gurias” – com muitas obrigações e nenhum reconhecimento ou visibilidade social – e passam a ser “mães novinhas”. “A maternidade embeleza a imagem pública da mulher, lhe conferindo prestígio em sua família e suas redes de relações. É uma porta de entrada para o mundo adulto”, aponta. Em São Paulo, nas favelas Jardim Peri Alto e Vila Dalva, três jovens que foram mães na adolescência demonstram, em meio a falas cheias de certezas contraditórias, que na maioria das vezes nem a gravidez enem os ganhos que ela traz são completamente conscientes – mas que eles existem, é impossível negar. Talvez seja para isso que as políticas públicas devam voltar sua atenção.
MENINAS-MÃES
Pâmela dos Santos tem 17 anos e é mãe de David Felipe, de 2. Quando soube que estava grávida, já ajudava a cuidar dos três filhos de sua irmã mais velha, hoje com 23 anos. Ela diz que só engravidou porque tinha alergia ao anticoncepcional e, na época, sua preocupação era saber se o namorado iria aceitar o bebê, já que “os homens são todos iguais”. Mas ele não só gostou da idéia de ser pai, como resolveu morar na casa da sogra. Quando Pâmela estava com sete meses de gestação, ele foi preso por envolvimento com drogas. Ela conta que a gravidez foi o que lhe deu suporte para agüentar o baque. “Eu não sabia o que ia acontecer com a gente, o que ia ser do nosso filho, mas imaginava um futuro bom para ele”, considera. Pâmela aguarda ansiosa pelo final do ano, quando seu marido deve sair da prisão. Iara Rodrigues engravidou aos 15 anos. Sem o apoio da mãe ou do namorado, que sugeriu aborto, ela bancou a gravidez sozinha. “Eu quis ter, eu queria ser mãe”, afirma. Meses depois, sua mãe também engravidou e, hoje, a jovem de 18 anos cuida das duas crianças. Ela preferia ter tido um menino, “porque menina dá mais trabalho e pode engravidar”. Pâmela e Iara não estudam nem têm emprego fixo, mas fazem bicos para ganhar algum dinheiro. Um domingo distribuindo panfletos em São Paulo rende de 15 a 20 reais. Mesmo nunca tendo usado preservativo com o namorado, Vanessa Vieira ficou surpresa quando engravidou pela primeira vez. Aos 21 anos, é mãe de Caio, de 5 anos, e Vinícius, de 2. Pouco tempo depois de dar a notícia da gravidez à família, sua mãe saiu de casa, e ela teve que aprender a cuidar sozinha não apenas de um recém-nascido, mas também dos quatro irmãos menores. Mesmo assim, Vanessa só se deu conta de suas responsabilidades quando engravidou pela segunda vez e seu pai a expulsou de casa. Acolhida pela avó, logo precisou enfrentar mais uma perda, quando o namorado, dependente químico, deixou Vanessa e as crianças. Ela estuda à noite e, durante o dia, trabalha em um lava-rápido, enquanto sua avó fica com os meninos. PELO LADO BOM
Paula Camboim observa que a maternidade traz novas necessidades para a rotina das adolescentes, e elas “amadurecem na marra”, para conseguir supri-las. Muitas vezes, a mudança de postura pelo fato de serem mães também as protege da violên-
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cia e pode lhes trazer um novo sentido para a vida. Desde que a filha nasceu, Iara nunca mais saiu para se divertir e diz que não sente falta disso. Pelo contrário, acredita que deveria dedicar ainda mais tempo para a menina, “porque ela é a coisa mais importante do mundo”. “Eu tinha mente de criança, agora tenho mente de adulto”, reflete em meio a seu quase absoluto silêncio. Pâmela também sempre recusa os convites para passear, mas diz que gostaria de poder aceitá-los. Em seguida, defende sua posição: “Quando a gente casa e tem filho, não tem mais nada no mundo. E não é a mesma coisa sair e deixar seu filho com alguém, porque você fica pensando se ela está olhando ele direito. É que a pessoa não tem o mesmo amor de mãe...”, argumenta. O dinheiro contado ganhou outros destinos na casa da mãe de David Felipe: “Você não pensa mais em você, pensa em comprar uma comida para o filho, um Danone, um objeto para a casa”, analisa. Apesar de dizer que não gostaria de ter sido mãe tão cedo, “esperaria até os 22, por aí...”, Pâmela conta que David é quem “tira as preocupações da cabeça e traz alegria para o coração. Se estou triste, penso que tenho um filho para cuidar”. No começo, Vanessa sentia vergonha de ser mãe e ficava com medo de que ninguém quisesse namorá-la por isso, mas enquanto contava sua história, vários rapazes passaram pela rua de carro e mexeram com ela, que sempre respondia sorrindo e voltava a ficar séria para a entrevista. “Todo mundo adora meus filhos”, comemora. Ela tem certeza de que se não tivesse engravidado teria sido morta em uma das baladas que freqüentava. “Eu era terrível. Hoje, não vou ficar usando drogas e, se saio com alguém, penso em uma pessoa que vai respeitar meus filhos”, reflete. Mesmo depois de relatar as dificuldades que enfrentou por causa da gravidez, Vanessa diz que ser mãe não teve um lado ruim. Seu pai demonstra amor pelos netos, parou de beber e passou a cuidar melhor dos próprios filhos. Ela está cheia de sonhos para Caio e Vinícius e se sente mais persistente na vida. “Agora, estou sempre dando risada, porque eles são
vida, e a gente tem que estar bem para a criança ficar bem. Também não tenho medo de serviço, quero dar a eles tudo o que não tive”, considera. CONTO DE FADAS
A antropóloga Paula Camboim e a psicóloga social Ingrid Nascimento apresentam dois pontos que ajudam a entender essa significação da maternidade para a população de baixa renda. Paula analisa que entre as classes mais baixas não existem muitas perspectivas de realização profissional. Segundo a antropóloga, a inserção no mercado de trabalho se dá por necessidades financeiras, e o reconhecimento para as mulheres só pode vir do fato de serem boas mães e boas esposas. No entanto, Ingrid revela que a concretização absoluta da entrada no mundo adulto só se dá por meio do casamento – símbolo de status moral e estabilidade. “Muitas meninas pensam que a vida é um conto de fadas. Elas engravidam porque acham que vão se casar, ter um marido, sair com ele no final de semana... E eles vão ficar bem com os filhos, os filhos vão estudar, eles vão ter uma casa só para eles, um carro, não vão passar fome nem ter problemas”, descreve Vanessa em meio a risadas. “Mas a realidade é bem diferente. O povo fala que onde come um, comem dois. Comem dois, mas comem mal”, avalia. Quando reflete sobre o motivo de ter engravidado, lembra que andava meio deprimida na época. “Eu preenchi o meu vazio. Apesar de o meu namorado me bater – graças a Deus que ele foi embora – eu acho que ele era a única pessoa que me dava valor”, relembra. Para ela, a mãe que tem filho mais cedo é a que mais luta para não deixar que ele passe pelas dificuldades que ela passou. “Se meu filho cai e machuca eu já fico desesperada, imagine se fosse uma coisa grave. Quando ouço o caso da morte de um bandido, penso que poderia ser o meu filho naquela situação. Quando alguém morre na favela, todo mundo pensa logo na mãe, em como ela deve estar”, afirma.
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MÚLTIPESSOAS PLAS
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LETÍCIA NOVAES
Letícia Novaes, 26, é apresentadora do programa de turismo Oi Pelo Mundo e se prepara para lançar o CD “Letícia Novaes canta um samba transadinho”, em parceria com o namorado Lucas Vasconcellos, vocalista da banda Binários. Mas a vida de Letícia não se resume apenas à rotina de apresentadora de programa de TV e música solo. Escritora (escreve desde os cinco anos), ela canta nas bandas Letícios, Ménage à trois, Monkey Whores e é backing-vocal do cantor João Brasil. E ainda faz stand-up comedy com o grupo Tarja Branca, em bares cariocas. “Eu sou uma pessoa que não tem dia-a-dia, tem dia que eu posso acordar às 7h da manhã e tem dia que posso dormir até meio dia”, brinca. Ela relembra que desde criança faz várias atividades ao mesmo tempo. “Eu sempre fiz basquete, francês, espanhol. Eu sempre fui muito inquieta”. Dona de vozeirão e altura (ela tem 1,83m) impressionantes, Letícia é brincalhona e espontânea, características que considera terem sido essenciais para ser escolhida para apresentar o Oi Pelo Mundo. A multiartista confessa ter uma preocupação: de que um projeto não exclua os outros. “O contrato com a Oi tem data limite, tendo um limite, tranqüilo. Mas se alguém me propusesse um contrato de dois anos eu ia ter medo”. _Kleyson Barbosa 46
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LETÍCIA NOVAS E ADRIANA AMARAL, ÀS VEZES, RESPIRAM POST encontrou duas multigarotas surpreendentes. Elas são versáteis e procuram se expressar em mais de uma atividade, têm mais de um emprego e múltiplos desejos. Confira a rotina ? dessas jovens que fazem o que gostam e não só o que precisam.
ADRIANA AMARAL
Adriana Amaral, 32, é pesquisadora de cybercultura e professora universitária da Universidade Tuiuti do Paraná. Além de circular no meio acadêmico do campo de Comunicação e Cybercultura, trafega no mundo underground: é também DJ de gothic rock industrial e escritora de contos de horror. Autora do livro Visões perigosas: uma arqueologia do cybercult (fruto de sua tese de doutorado), tem contos publicados na coletânea Contos de Oficina. Ela sempre teve uma conexão forte com a música, mas nunca tinha pensado que pudesse trabalhar na área. Curiosamente, foi graças ao meio acadêmico que acabou virando DJ. “Em 2004, fui fazer meu estágio de doutorado nos EUA e lá acabei me interessando muito por música . E quando voltei para o Brasil, depois de defender a tese eu tive um tempo livre e acabei investindo nisso”. Adriana avalia que sempre se interessou por várias coisas ao mesmo tempo, mas faz o estilo metódica. “Eu tenho uma fase que me concentro mais em uma coisa, embora eu tente sempre tentar ter um pouco de tudo. Este ano, por exemplo, estou retomando as coisas de literatura que estão paradas”. A DJ-pesquisadora acredita que, além do prazer, as atividades do circuito underground ajudam até como uma válvula de escape do meio acadêmico, que ela considera muito duro. _Kleyson Barbosa
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// estilodevida.enquete
VOCÊ É A FAVOR DO
ABORTO DA ,
UNIÃO CIVIL ENTRE PESSOAS
DO MESMO SEXO E DA DESCRIMINALIZAÇÃO DA
MACONHA, ACREDITA EM DEUS?
VOCÊ ACHA QUE É IMPORTANTE
ASSUMIR ESSAS POSIÇÕES?
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Obrigado pelo convite, mas estou num momento de muito trabalho, preparando o lançamento de meu novo filme, e agora não posso te ajudar com a revista. Fica pra uma outra vez. Helvécio Ratton_é cineasta. Ganhou o prêmio de melhor direção no 39º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro – 2006, com o filme Batismo de Sangue.
Fábio Wanderley Reis_é cientista político e professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Só agora tive a oportunidade de me deter um pouco sobre as mensagens que me enviou e o pedido que as acompanha. Isso me levou a reconsiderar. Não entendo bem o que é um “leitor de idéia jovem”, a que supostamente a revista se dirige, e resolvi que não é o caso de responder para a sua revista, sem mais, perguntas da natureza das que me faz.
Mirian Assumpção e Lima_é Tenente-Coronel da Polícia Militar de Minas Gerais e diretora do Instituto Pauline Reichstul. Ganhou o Prêmio Direitos Humanos 2007 (honraria concedida pelo Governo Federal), na categoria “Enfrentamento à violência – Pessoa Física”.
Sou a favor do direito de escolha da mulher, acredito que as mais sábias escolham a prevenção. Sou a favor (da união civil entre pessoas do mesmo sexo). Sou contra (a descriminalização da maconha). Qual a garantia de que isso vá diminuir a criminalidade do tráfico? Que tal criminalizar a homofobia, a falta de educação, a saúde ineficiente e a corrupção na política antes de pensar nisso? Acredito em Deus. E, mais importante do que assumir é realmente se posicionar com honestidade – mesmo que seja de modo contrário ao que eu penso e acredito. Jorge Tarquini_é diretor de redação da revista DOM e autor do fenômeno O Doce Veneno do Escorpião - O Diário de uma Garota de Programa, livro em que conta a história de Bruna Surfistinha.
Num ano de eleições, a propensão é maior para o “eu prometo” do que “eu assumo”. Considerando que sou mineiríssima, não prometo mas ... não assumo! Melhor dizendo, depende. Depende do lugar, do público, da situação. Por quê? Sou mãe de dois filhos jovens; Tenente-Coronel Subdiretora de Recursos Humanos da Polícia Militar de Minas Gerais e dirijo o Instituto Pauline Reichstul. Assumir posições tem um impacto direto e significativo sobre as pessoas que convivem comigo e sobre a imagem das instituições que represento. Todo cuidado é pouco para eu não “causar” (aprendi isso com minha filha e uso sempre que posso). Há seis anos, um jornal mineiro publicou uma matéria com o título: “A beijoca na Major”, relatando um beijo que ganhei do Marcelo D2 no Pop Rock Brasil. Foi o suficiente para eu ter que explicar várias vezes que não era um ato simbólico em favor da descriminalização da maconha. Porque realmente não sei se sou. De outra feita, estava na Parada Gay de São Paulo onde encontrei amigos de Belo Horizonte que disseram: “Não sabia que você é militante”. Não sou, mas não discordo da união entre pessoas do mesmo sexo. Quanto ao aborto? Depende, é que esqueci de dizer que sou espiritualista. JUNHO 08 // POST 00
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Com relação ao aborto, sou favorável. Acho que é a mulher que tem que definir sobre a sua própria saúde. O Estado deve ver o aborto como uma questão de saúde pública e respeitar a autonomia das pessoas. Sobre a união civil, é uma discriminação muito grande que casais do mesmo sexo não tenham os mesmos direitos que casais do sexo oposto. Vários países já reconheceram isso e legislaram para eliminar essa forma de discriminação. Sou totalmente favorável à união civil entre pessoas do mesmo sexo. Quanto à descriminalização da maconha, vejo que é preciso procurar ter um ponto de vista ponderado a respeito. Sabe-se que hoje um dos fatores que gera um nível elevado de violência no País é o narcotráfico. Há vários países em que o uso da maconha é legalizado, sem que isso resulte em uma epidemia de dependência, e com o benefício de que sua comercialização legalizada deixa de incentivar a criminalidade. É tênue e culturalmente subjetiva a diferenciação entre algumas substâncias consideradas lícitas, como o álcool e o fumo, que também podem ser prejudiciais à saúde, e outras substâncias consideradas ilícitas, como a maconha. Eu pessoalmente sou favorável. Sobre Deus. Eu acredito na espiritualidade, mas o conceito de Deus para mim é um conceito de energia, que não é aquele Deus velho, barbudo, que diz o que é certo e errado. É uma força, uma energia, que me mantém. Nesse sentido, acredito em Deus, mas é um Deus construído a partir da minha vivência pessoal. Acho que temos que assumir posições, sim, desde que tenhamos elementos para defendê-las. Se assumimos posições sem ter elementos e argumentos claros, corremos o risco de reforçar dogmas e preconceitos baseados em lugares-comuns. Acho que temos que ter claro o porquê e o embasamento filosófico da nossa posição.
Robson Sávio Reis Souza_é especialista em Segurança Pública e coordenador de Informação e Comunicação/Secretaria Executiva do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública da UFMG (CRISP).
Em relação ao aborto: penso que deve ser encarada a discussão como um problema de saúde pública, menos pelo viés moral e moralista e levando-se mais em conta a situação das mulheres. Para todos os efeitos, deve-se ter políticas públicas claras e leis que regulamentam a questão para que se reserve o direito somente nos casos previstos e estritamente necessários. Quanto à união civil, não vejo nenhum óbice. Apesar do preconceito, penso que o mais importante nas relações humanas é o respeito, a promoção da dignidade da pessoa. Em relação a descriminalização da maconha: sou favorável, desde que haja um amplo debate social. Penso que o uso de drogas também deve ser tratado como questão de saúde pública. É fato que o Brasil precisa repensar todas as políticas públicas para usuários de drogas, desde políticas de redução de danos até liberação de determinadas drogas em casos específicos. Acredito em Deus. Tenho percebido que a religião se concretiza mais nas práticas de solidariedade e menos nos ritualismos. Por fim, acho que não há nenhum problema em assumir essas posições. É uma questão de coerência e de ética. Mas devo confessar que numa sociedade altamente individualista, pragmatista, cheia de estereótipos e ainda muito preconceituosa e moralista, cujos valores são muito relativizados, assumir posições implica, muitas vezes, ônus e custos. No meu caso, tenho plena consciência desses custos, mas prefiro correr eventuais riscos e garantir minha autonomia para não ser manipulado, direta ou indiretamente, por questões que restringem minha liberdade.
Toni Reis_é presidente nacional da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais Travestis e Transexuais (ABGLT).
Os questionamentos também foram enviados para os ganhadores do Prêmio Direitos Humanos 2007, José Gregori (CMDH), Padre Júlio Renato Lancellotti, Mirian Tsibodowapre (Povo Indígena Terena do MS); os estudiosos Leonardo Boff, Frei Betto e Boaventura de Souza Santos; os políticos Fernando Henrique Cardoso e Rogério Correa, deputados Paulo Bornhausen (DEM-SC), Leonardo Quintão (PMDB-MG) e Paulo Maluf (PP-SP), senadores Eduardo Suplicy (PT-SP) e Marcelo Crivella (PRB-RJ), Procurador Regional da República, Luiz Francisco Fernandes de Souza, Ministro da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Paulo de Tarso Vannuchi, Presidente do Conselho Nacio50
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nal contra a Discriminalização, Rogério Setti, promotor Joaquim Miranda; os artistas Fernanda Takai, Samuel Rosa e Grace Passô; a escritora Bruna Piantino; e para Renato Cinco (Marcha da Maconha/RJ), André Fischer (Mix Brasil), Marcelo Cerqueira (Grupo Gay da Bahia), Ivone Mendes (Fórum de Mulheres da Grande Belo Horizonte), Lúcia Stumpf (UNE) Oded Grajew (Instituto Ethos), Ricardo Young (Instituto Ethos), Milly Lacombe, Ricardo do Nascimento Correia de Carvalho (OAB Jovem Federal), Adriano Cardoso Silva (OAB Jovem BH), Pastor Paulo Leite (União das Igrejas Evangélicas Congregacionais do Brasil); mas não obtivemos resposta.
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// educaçãoeemprego.coluna
Águas passadas podem,
sim,
mover moinhos.
Com o aumento do número de pessoas com acesso ao ensino superior, percurso escolar é mais valorizado
Informes recentes do Ministério da Educação (MEC) mostram que o número de pessoas com acesso ao ensino superior cresceu significativamente nos últimos anos, tendo se ampliado a oferta de vagas e o tipo de cursos oferecidos – muitos deles grandes novidades –, tanto no ensino público quanto no privado. Isso representa maior número de pessoas com capacitação e/ou saindo das faculdades a cada semestre. Muita gente se formando e, cada vez com maior qualificação, traz como conseqüência quase direta maior dificuldade na obtenção de emprego e ampliação da possibilidade de ser utilizada outra forma de estrutura de contratação – nos dias atuais são mais comuns trabalhos por projeto ou esporádicos ou, ainda, em prestação de trabalho autônomo –, o que pode, é claro, deixar muita gente perdida. O desafio está lançado, especialmente aos jovens: conseguir sobreviver com o fruto do seu trabalho e sem as “benesses” comuns aos empregados formais tais como a carteira assinada, 13º salário, plano de saúde oferecido pela empresa e outros. Um bom curso de graduação, realizado numa instituição reconhecida, pode ser essencial para viabilizar uma boa formação. Por isso, hoje é mais que importante pesquisar a respeito da instituição em que o curso será feito. Não se pode desprezar esse reconhecimento junto às empresas ou empregadores, visto que existem muitos locais onde são oferecidos estágios ou empregos cujas vagas se direcionam a estudantes oriundos de instituições consideradas “de renome”. O mundo está mais conectado, e descobrir essas coisas é bem mais fácil. Mas só isso, no entanto, não garante a inserção profissional. Afinal, hoje, a “grife” da universidade ou faculdade não é o único item frente a uma contratação e pode não ser o principal critério de seleção para uma vaga de estágio/emprego. Considera-se muito o vínculo que a pessoa apresenta com sua escolha profissional ou com o curso realizado. Isso quer dizer o quê? Que as empresas analisam o quanto o aluno se envolveu com o curso escolhido: bom desempenho – traduzido por boas notas – e, mais, quantos estágios ele realizou, de quantos eventos ligados a seu curso participou – congressos, simpósios, workshops e outros –, monitorias, estudos ou projetos de pesquisa em que comprovadamente se envolveu. É um desafio cada vez maior conseguir estágio durante a realização do curso de graduação ou, mais, obter uma oportunidade de trabalho após a conclusão do curso. Para ajudar, nada como estar preocupado e “antenado” com a profissão e os assuntos que permeiam seu campo de trabalho. A obtenção de uma vaga de trabalho realmente começa muitos anos antes, tendo início com a vinculação e o compromisso com a escolha do curso – que se inicia por uma observação apurada sobre si mesmo –, continua com a busca de vinculação com a realidade do curso e da instituição na qual os estudos foram realizados e se concretiza com o afinco e dedicação a eles. O percurso escolar é, sem dúvida, o grande definidor da realização do sonho do emprego na área de formação: águas passadas podem, sim, mover os moinhos de vento da realização profissional! 52
POST 00 // JUNHO 08
Mariza Tavares é psicóloga, professora, palestrante e consultora. É casada e tem um filho. Considera seu trabalho “uma cachaça!” que a inebria e dele não pretende se livrar tão cedo. Apaixonada por música – especialmente MPB – gosta muito de cantar e, às vezes, lança mão de canções durante as aulas ou nas palestras para abordar os temas em foco. Seu cão, um cocker – Dartaghan – é seu companheiro inseparável, “quase sua sombra!”, está sempre por perto, quer quando ela está trabalhando no computador, escrevendo seus textos e preparando seus trabalhos, quer quando está na cozinha fazendo alguma guloseima – outro de seus hobbies.
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// trabalhoelazer
[foto_ Craig Jewell ]
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// educaçãoeemprego
PRAZER O DISCURSO DE SATISFAÇÃO NO TRABALHO JÁ VIROU JARGÃO, MAS A ROTINA DE RECLAMAÇÕES NÃO DÁ TRÉGUA
CORPORATIVO A rotina profissional é parte importante da vida das pessoas e para torná-la mais agradável uma alternativa seria unir prazer ao trabalho. Outra opção seria aplicar o salário recebido pelo trabalho em atividades prazerosas, mesmo que esse trabalho não seja tão prazeroso assim. Esses são apenas alguns dos dilemas de jovens e também de adultos que, entre uma e outra, navegam num imenso oceano de sentidos. Afinal, um olhar mais aguçado sobre a prática profissional pode indicar auto-conhecimento. por_Manoella Oliveira
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As correntes de e-mail dão a dica. São incontáveis piadinhas sobre o ambiente corporativo, calendários que antecipam o número de feriados do ano que está por vir – seguidos de comemorações, caso a quantidade ultrapasse a do exercício anterior – e musiquinhas depreciativas para os mais variados tipos de chefe, com direito a coral de fundo. Todo mundo já recebeu ou enviou uma mensagem dessas, muitas vezes em horário comercial. O discurso virtual diverge daquele que solícitos profissionais proferem para vestibulandos desesperados na hora de optarem por uma carreira e da mídia direcionada empresários. Onde está, nessas horas, o conceito relativamente novo, mas já desgastado pela freqüência do debate, de unir prazer ao trabalho? Para o professor e consultor de Gestão e Finanças, Haroldo Mota de Almeida, fala-se muito em ter satisfação no que se faz e, se não houver, a pessoa realmente não faz. Entram em cena os velhos artifícios de tomar cafezinhos a cada cinco minutos, conversas no corredor e tarefas alheias à competência do funcionário, que pouco ou nada contribuem com a produtividade da firma. Vem daí a pergunta fundamental de dez em dez entrevistas de emprego: “Por que você gostaria de trabalhar aqui?”. Porque, se não houver interesse, a pessoa simplesmente cumpre horário e diretores de empresas estão atentos a isso. 56
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“Mesmo as pessoas bem-sucedidas reclamam, por hábito. O ser humano é insatisfeito por natureza, o que gera reclamação inclusive na vida profissional. Um empresário vai falar mal do mercado e o funcionário vai chiar por causa do ajudante. É mais fácil e rápido jogar a culpa em outro”, brinca o especialista. Ele acrescenta que, no Brasil, existe associação direta entre erro e penalização e que uma não é causa da outra. “O erro é inerente a qualquer coisa que se faça na vida, ninguém deve ser punido por isso. No fim das contas, a insatisfação acaba sendo boa porque estimula uma busca constante por melhorias”, diz. CONTRAPONTO
Os mais práticos se conformam em separar, ao invés de unir, prazer e profissão. São pessoas que trabalham com o que convém a oportunidade de trabalho e se satisfazem em aplicar o salário em atividades prazerosas. “Trata-se de cumprir uma função para alcançar um objetivo de prazer, mas isso não é trabalhar. Quem está nessa situação deve procurar por outro empreendimento porque ela irá inventar maneiras de fugir das obrigações ou de adaptar sua tarefa a seu gosto”, explicou Almeida. É o caso de Túlio Rossi, 26, graduado em Ciências Sociais e mestre em Sociologia, que acaba de passar em primeiro lugar num concurso público pouco
relacionado à sua área. O ingresso foi uma opção justificada pela falta de oportunidade de emprego e por não ter passado na seleção do doutorado. “No exercício do cargo, vou tentar me aproximar de segmentos próximos ao que gosto, como realizar pesquisas e me envolver com projetos sociais. O que me atraiu nessa vaga foi a estabilidade, mas satisfação é fundamental. Acredito que esse serviço será passageiro, já que pretendo me enveredar pelo mundo acadêmico”, informa. Na opinião da jornalista especializada no mundo corporativo, Luciana Sampaio, é possível desempenhar uma tarefa com a qual não haja tanta afinidade desde que ela não seja vista como penitência, mas como um meio para sobreviver. “Trabalhar é uma maneira de se manter produtivo, cura várias doenças, mas se for visto como castigo, vira doença. Um problema mínimo vira motivo para uma reação exagerada. Isso não pode acontecer porque, por mais programado que esteja seu dia, você encontrará percalços”, afirma. Ela acredita que algumas carreiras demandam mais dedicação e investimento, principalmente as dos artistas que levam mais tempo para serem reconhecidos. “É válido associar esse dom a outras atividades. Você pode ter mil habilidades, basta querer ter”, diz. É o caso de Lina Lapertosa, 54, que há 28 concilia as profissões de bailarina do Palácio das Artes e de médica ginecologista e obstetra. Mas ela garante que não se trata do clichê da artista que era mal remunerada e incorporou ao talento um braço do capitalismo. “Sinto o mesmo prazer com a medicina e com o balé, não procurei uma por remuneração e outra por amor. Todas as atividades têm seus dias difíceis. No Palácio é ainda mais rígido, bato até cartão”, conta descontraída. Para a diretora da Ação Comercial de Belo Horizonte, Marcilene Almeida, a rotina profissional deve ser vista como uma parte importante da vida, algo a que se dedicar como uma parte de si. “A perspectiva de obrigação, muito associada ao histórico de escravidão, se transforma em um olhar diferente sobre o que estou exteriorizando e oferecendo para a sociedade. É auto-conhecimento. Assim, compreendemos de onde tiramos prazer no dia-a-dia. O problema não é a função, mas como a enxergamos, se me identifico com ela. Até uma festa pode ser chata”, afirma. De acordo com Marcilene, se analisarmos a geração que está se inserindo no mercado de trabalho atualmente, pode-se notar que ela busca no emprego uma forma de conquistar seus objetivos e um deles é o prazer. “Muita gente adoece porque o emprego se torna uma fonte de sofrimento e nem se dá conta disso, acham que trabalhar é um fardo e é assim mesmo. Não é. Podemos escolher ser felizes ou não no
[ilustração_Paulo Barbosa]
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SUBSTITUIR O
PETRÓLEO?
CRESCENTE DEMANDA POR BIOCOMBUSTÍVEIS E DESCOBERTAS RECENTES DE JAZIDAS DE PETRÓLEO PELA PETROBRAS LANÇAM O BRASIL COMO POTÊNCIA NO CAMPO DA ENERGIA. MAS, TODO CUIDADO É POUCO QUANDO SE TRATA DO MEIO AMBIENTE. ENTRAM EM CENA OS BIOCOMBUSTÍVEIS DE SEGUNDA GERAÇÃO. por_Kleyson Barbosa
[foto_Jacques Descloitres/NASA]
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As radicais altas do preço do petróleo e o crescimento da consciência sobre os efeitos nocivos dos gases do efeito estufa para o meio ambiente reascenderam, na agenda política mundial, o interesse pelas energias renováveis. E ainda colocaram o Brasil no centro das atenções de um dos temas mais importantes atualmente: a geração de energia. O País não só foi destaque pelas recentes descobertas da Petrobras dos campos de Tupi e Pão de Açúcar, mas também porque é hoje quem apresenta o maior potencial de expansão de produção de biocombustíveis no mundo. A agroenergia está em ascensão, mas especialistas alertam: a expansão na demanda por biocombustíveis está elevando o preço dos grãos, e os biocombustíveis podem piorar a crise climática se continuarem produzidos à custa de desmatamento. Estudo do Banco Mundial aponta que o Brasil pode duplicar sua produção de biocombustíveis sem derrubar florestas ou comprometer a produção de alimento, basta utilizar melhor essas áreas desperdiçadas. É na busca por substituir o petróleo enquanto fonte energética que se destacam também os biocombustíveis de segunda geração. Essa nova tecnologia, que ainda está em desenvolvimento, produziria combustíveis a partir de restos vegetais diversos, como os resíduos agrícolas. 60
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GIGANTE DO FUNDO DO MAR
Nos últimos meses, a Petrobras anunciou a descoberta de duas reservas de petróleo de alta qualidade na costa fluminense. Os campos de Tupi e Pão de Açúcar podem ampliar as reservas brasileiras dos atuais 12 bilhões de barris para cerca de 50 bilhões. O real potencial das reservas descobertas deve se mostrar nos próximos dois anos. Até agora, a alardeada auto-suficiência em petróleo não foi alcançada, mas com muito dinheiro e tecnologia, provavelmente em seis anos esse montante de petróleo pode chegar à superfície e ajudar no desenvolvimento do País. As descobertas da Petrobras são surpreendentes, mas o que se observa atualmente é que estão cada vez mais escassas as grandes descobertas. O petróleo vem sendo encontrado em lugares de mais difícil acesso e em condições mais difíceis. É, portanto, um petróleo mais caro. “À medida que o petróleo se torna mais caro para ser produzido de onde ele está e ser disponibilizado numa refinaria para ser transformado em produto, outras fontes de energia vão passar a ser competitivas. E aí a gente tem um leque de opções efetivamente renováveis”, avalia Mozart Schmitt de Queiroz, gerente executivo de Desenvolvimento Energético da Petrobras, empresa que inaugura este mês suas três primeiras usinas destinadas à produção industrial de biodiesel. Os biocombustíveis contribuem para a redução
das emissões de gases causadores do efeito estufa, vantagem em relação ao petróleo que, desde o início, sempre foi considerada, como avalia André Furtado, professor e pesquisador do departamento de Política Científica e Tecnológica do Instituto de Geociências da Unicamp. “Apesar de a combustão desses combustíveis poluir, o uso de biocombustíveis foi um fator que reduziu a poluição na cidade de São Paulo, por exemplo. Na década de 1980, vários poluentes caíram em função do uso de biocombustível”, avalia. E acrescenta: “O que é novo é que, com o novo surto dos preços do petróleo em 2003, os biocombustíveis que não eram, na maior parte dos países, competitivos, agora são. Além de serem renováveis, são mais baratos que o petróleo, uma vantagem adicional”. A inauguração das usinas de biodiesel de Candeiras (BA), Montes Claros (MG) e Quixadá (CE) é parte de um investimento de $ 1,5 bilhão que a Petrobras fará nos próximos cinco anos na área de biocombustíveis e energias renováveis. A meta é produzir 938 milhões de litros de biodiesel em 2012. As usinas inauguradas poderão processar óleos vegetais como algodão, dendê, girassol, mamona e soja e, de forma complementar, sebo animal e óleos residuais para produzir biodiesel. DA FLORESTA PARA A BOMBA
Os números da indústria da cana-de-açúcar também impressionam. Este ano, devem ser produzidos JUNHO 08 // POST 00
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separação, enquanto o álcool depende basicamente da matéria-prima agrícola. Outra diferença pode ser observada no balanço energético. A energia consumida para produzir uma unidade de álcool é menor que a do biodiesel. A cada unidade de combustível consumida, para o álcool se obtém 10, enquanto para o biodiesel aproximadamente três a seis. “A grande vantagem da cana é que você utiliza para o processo industrial a energia contida no bagaço”, explica André Furtado. [foto_ Unica]
cerca de 38 milhões de litros de álcool – aumento de aproximadamente 20% em relação ao ano passado. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) vem batendo recordes na produção do combustível. O setor também teve destaque com a compra da rede de 1.500 postos de combustível Esso pela Cosan, maior grupo sucroalcooleiro do País. A empresa desembolsou um bilhão de dólares no leilão da distribuidora de combustíveis e será o primeiro produtor de etanol totalmente verticalizado, controlando desde a produção da cana até a venda na bomba. Outro investimento veio de fora. A Beyond Petroleum (BP), antiga British Petroleum, será a primeira petrolífera estrangeira a investir no etanol brasileiro. A BP adquiriu, em abril, 50% da Tropical BioEnergia, empresa ligada ao grupo Maeda e Santelisa Vale, está construindo uma usina em Goiás e há planos de uma nova unidade. PIONEIRISMO
O Brasil é considerado pioneiro na produção de biocombustíveis pela experiência com o Programa Nacional do Álcool (Proálcool), que é hoje referência mundial e cuja produção superou a dependência do apoio governamental. Mas vale lembrar que biodiesel não é álcool, apesar de ambos serem biocombustíveis. A produção do biodiesel é mais complexa, porque demanda processo de transesterificação, envolvendo reações químicas e sofisticados processos de
Isso faz com que o álcool brasileiro seja uma alternativa atrativa também do ponto de vista ambiental. Evidentemente, não são todos os países que podem enveredar por esse caminho. “Praticamente um só no mundo, que é o Brasil, tem condições de aumentar significativamente a sua produção de álcool. Os demais países não tem condições tão favoráveis, vão fazer como os EUA, partir para essas culturas que competem com alimentos, que são mais poluidoras, que consumem energias fósseis”, analisa o pesquisador da Unicamp. NÃO SÃO SÓ FLORES
Apesar das vantagens energéticas, a indústria da cana de açúcar é veementemente criticada por pesquisadores, que a consideram uma cultura predatória do ponto de vista da mão-de-obra. O sociólogo e professor do Departamento de Sociologia da FFLCH/ USP, Francisco de Oliveira, avalia que o trabalho de cortar cana de açúcar é mais estafante que as atividades realizadas na primeira revolução industrial. “É uma coisa terrível, comparada a mineradores de carvão de fins do século XVIII. É um horror. (Os cortadores de cana) têm que cortar 10 toneladas de cana por dia, isso exige um esforço físico que ao fim do dia o trabalhador está liquidado. Aos 35 anos, o trabalhador está liquidado, está um bagaço, de fato, como a cana-deaçúcar”, comenta. Ele explica ainda que, além de pesado, é um trabalho “muito mal remunerado” e prevê que a modernização da indústria trará outro problema. “Aí vai ser o outro lado da desgraça, porque vai produzir um desemprego fabuloso”, comenta. E as críticas não param por aí. Oliveira avalia que as
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indústrias da cana-de-açúcar são altamente concentradoras de renda. “Veja a diferença entre a indústria da cana no Nordeste e a plantação de café em São Paulo. A plantação de café distribui renda, a indústria de cana-de-açúcar concentra. As cidades de Pernambuco e do Nordeste que sustentam a cana-de-açúcar são cidades mortas”, justifica. Outro ponto importante é que os biocombustíveis seriam apenas um complemento ao petróleo, como reconhece o gerente executivo de Desenvolvimento Energético da Petrobras. “Sem dúvida nenhuma, faltaria superfície no planeta Terra para substituir o petróleo por biocombustíveis. Então, o biocombustível deve ser visto como complemento, substituição parcial, do combustível fóssil”, avalia Mozart.
PESQUISADORES
CRITICAM INVESTIMENTO EM PRODUÇÃO DE
MATÉRIA-PRIMA COMO ESTRATÉGIA POLÍTICA
Além das críticas ao trabalho desgastante do cortador de cana e da concentração de renda desse tipo de indústria, o sociólogo Francisco de Oliveira vê como um retrocesso o investimento na produção de bens primários. “Isso é reprimarizar o país. Estamos voltando a quase um estatuto de colônia”, defende. Ele analisa que há um processo de desindustrialização no Brasil, devido à prioridade dada à produção desses bens. E teme a chamada “doença holandesa”, termo utilizado para identificar uma desindustrialização provocada pela reprimarização da economia. O professor da Unicamp, André Furtado, também vê perigo em se investir na produção de bens primários. Mas avalia que não é um desmérito exportar matéria-prima, desde que também se exporte conhecimento e tecnologia completares. Ele avalia que a indústria dos biocombustíveis é diferente da do petróleo. “Acho que o álcool no Brasil se fez a partir de um esforço nacional e de aprendizado tecnológico importante. Nós somos um País rico em recursos naturais, é preciso explorá-los de uma forma inteligente, sustentável”, aponta.
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PESQUISADORES APOSTAM NA SEGUNDA GERAÇÃO DE BIOCOMBUSTÍVEL No rol de energias que podem ser alternativas ao petróleo, as pesquisas tecnológicas apontam para a utilização do bagaço e da palha da cana-de-açúcar como uma das formas de se produzir energia. “É tanta energia que tem no bagaço da cana e na palha, que você poderia atender não somente o processo industrial, mas também gerar mais energia nos processos industriais”, indica o pesquisador da Unicamp. E não são apenas os resíduos da cana-de-açúcar que têm esse potencial de transformação, mas qualquer outro resíduo agrícola. Entram em cena, portanto, os biocombustíveis de segunda geração, que poderiam usar culturas que não servem nem para o homem nem para os animais a preços mais econômicos e de forma mais sustentável. E também é possível aprimorar as alternativas já em uso, porque pode se utilizar toda a planta (toda a biomassa). Os biocombustíveis de primeira geração utilizam os produtos agrícolas como insumo na produção de biocombustíveis, como os já citados biodiesel e etanol. Nos processos da primeira geração, somente sa-
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carose e amido são utilizados, deixando a maior parte da planta inutilizada para a geração de energia. Essa nova geração de biocombustíveis são de alta complexidade tecnológica, que utilizariam como matéria-prima justamente a sobra desses produtos, como também rejeitos e resíduos. Os combustíveis do futuro seriam obtidos através da transformação, em energia, do material celulósico, existente em maior quantidade na biomassa, através de processos de conversão diferentes dos de primeira geração. “Processos que vão permitir a transformação da celulose – que existe na palha, no bagaço, na madeira – em açúcar, e esse açúcar seria posteriormente fermentado e você obteria álcool”, explica André Furtado, que acredita que essa conversão de segunda geração diz respeito basicamente ao etanol. Entre esses processos, existem a hidrólise e outros que são processos químicos, que se apóiam na gaseificação. Outras duas propostas merecem destaque: Fischer-Tropsh e a ação de enzimas. O procedimento Fischer-Tropsh é um dos projetos mais promissores. Desenvolvido nos anos 1920, ele permitiria transformar a biomassa, através de uma queima com baixa concentração de oxigênio, em hidrocarboneto e depois transformá-lo em combustível.
Trata-se de um processo denominado BTL (biomassto-liquid), mas que ainda tem rendimento baixo. A outra iniciativa vem de um fungo conhecido como “devorador de tecidos”. Estudo publicado no no mês de maio na revista Nature Biotechnology por cientistas norte-americanos, decodifica o DNA do fungo Trichoderma reesei, que utiliza um número baixo de genes para produzir as enzimas que lhe permitem se alimentar de celulose. Com essa informação, os pesquisadores esperam descobrir maneiras mais rentáveis e eficientes de quebrar a celulose e produzir etanol. No Brasil, uma parceria entre Petrobras, Albrecht e várias universidades brasileiras estuda a produção de etanol a partir de resíduos agroindustriais com a utilização da tecnologia enzimática. A equipe pesquisa uma planta piloto de etanol de lignocelulose que passaria por um processo de quebra de moléculas com ação de enzimas. Os biocombustíveis de segunda geração podem também aproveitar culturas de solos pobres, funcionando como uma alternativa rentável para regiões mais frágeis. Espera-se, contudo, que esses combustíveis do futuro não promovam efeito contrário e criem uma guerra na disputa por biomassa, aumentando a destruição de florestas.
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NATEX
Natex é o nome do novo preservativo masculino produzido pelo Brasil. Trata-se da primeira camisinha a utilizar látex nativo em sua produção. O empreendimento é resultado da parceira entre o Ministério da Saúde e governo do Acre e terá capacidade de produzir cem milhões de unidades por ano, que serão vendidas ao Governo Federal e destinadas aos programas nacionais de combate a DST/Aids. O preservativo produzido em Xapuri, no Acre, será 10% mais barato e tem rentabilidade até 8% superior ao látex de cultivo. O projeto vai gerar 150 empregos diretos e conta com 24 seringais da Reserva Extrativista Chico Mendes e região para fornecimento de látex natural para a fábrica de camisinhas. Cerca de 550 produtores foram equipados com o kit de coleta do líquido, e espera-se que esse número chegue a 750 nos próximos meses. Com o Natex, acredita-se que o Brasil conseguirá reduzir a sua dependência na importação de preservativos, em especial de países asiáticos como China, Tailândia e Coréia, e aumentar a distribuição gratuita de camisinhas._Kleyson Barbosa
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CARROTMOB.ORG
”Nós precisamos de um grande suco de cenouras”. Este é um dos “lemas” do Carrotmob.org para ajudar a reverter o impacto das alterações climáticas. O projeto usou o consumo habitual dos norte-americanos como estratégia para forçar as empresas a fazerem ações sustentáveis. Brent Schulkin, organizador do projeto, colocou em prática a idéia de que se um grande número de pessoas adquirir produtos visando o bem-estar do meio ambiente, as empresas serão forçadas a adotar políticas sustentáveis para, claro, obterem mais lucro. Ele mapeou os mercados de seu bairro e perguntou aos donos quanto eles poderiam converter, das vendas de um dia, em melhorias em seus estabelecimentos para tornar a energia mais eficiente. O estabelecimento vencedor da campanha foi o mercado de David Lee, que converteu 22% das vendas para as melhorias. Um especialista analisou o estabelecimento, avaliou as mudanças necessárias e estabeleceu um valor aproximado do quanto seria gasto com a reforma. Em um dia escolhido pelo Carrotmob, ativistas foram até a loja comprar o que adquiriam normalmente em outros estabelecimentos. Eles gastaram cerca de US$ 9,3 mil, e o mercado pôde converter seu gasto energético de forma mais eficiente. Trata-se de uma iniciativa que pode ser organizada em qualquer bairro. _Kleyson Barbosa
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OS NOVOS MAPAS Pequenas subversões da cartografia virtual
Descobrimos novos mundos on e offline a todo momento e cada vez mais precisamos de instrumentos de orientação para não nos perdermos no oceano de imagens e informações que navegamos diariamente (um clichê, mas ainda uma verdade). Do mundo real, trazíamos a sensação que de restaram poucos lugares novos a serem registrados, demarcados e até mesmo visitados. Mas veio a internet, o mundo virtual, e com ele novos espaços foram abertos e caminhos inimagináveis de possibilidades para atingi-los. Abrir o browser em qualquer gadget é uma aventura. Não é a toa que embarcamos em explorers e safáris. E em mais um dos clichês que a internet trouxe, lidamos com tantas fontes de informação disponíveis que é impossível não se perder. A World Wide Web é um mundo que até pouco tempo não dimensionávamos ou cujo conteúdo não mensurávamos. Porém, a partir da necessidade de orientação, encontramos profissionais dedicados a mapear a rede virtual. Esses exploradores criaram novas ferramentas que possibilitaram experiências de navegação ainda não imaginadas. A relação com o espaço e com a informação virtual foi modificada a reflexo das transformações que a tecnologia implicou em nossas subjetividades. Para além dos mapas de geo-localização básica, a cartografia virtual sofreu subversões de toda a sorte. Diferentemente dos mapas geográficos desenhados nos séculos das grandes navegações marítimas, os mapas contemporâneos são essencialmente suporte para informações e imagens, traçando redes amorfas de conexão e inter-relações entre um ponto (porto?) e outro. Dos avanços mais interessantes com os quais contamos hoje, as ferramentas de visualization data, os projetos de arte e mídia locativa e mapas conceituais são bons indicadores das pequenas revoluções que testemunhamos. A visualization data mistura diversas ferramentas de busca e fontes, mesclando imagem, aúdio e texto para estabelecer relações entre sentidos e significados. O objetivo principal é evidenciar conexões no universo amorfo do mundo virtual, traçando paralelos em diversas mídias. Um bom exemplo é o site Tag Galaxy (http://taggalaxy. de/), que usa como interface o sistema solar, tendo o Flickr como fonte de busca das imagens. Com uma palavra inicial, o usuário percorre a superfície dos planetas formada por dezenas de imagens associadas à tag de busca. De modo mais conceitual e artístico, outra finalidade dos novos mapas pode ser registrar subjetividades do usuário. Mapear a rede por meio de sentimentos e emoções é a principal motivação do designer multimeios Jonanthan Harris (http://number27.org/). Em meados de 2000, quando a internet se afirmava como meio potencializador de expressão e informação, Harris já se preocupava em mensurar seu conteúdo, criando sistemas de busca que varriam sites e blogs a procura de expressões que indicavam como os usuários se sentiam. Em um dos projetos, We Feel Fine, a busca percorreu o conteúdo de blogs por toda a rede, identificando as expressões “I feel” e “I am feeling” que logo eram associadas a uma imagem, formando um banco de dados comparativo que forneceu material emotivo à internet. Já a mídia locativa usa os mapas geográficos como base de informações, mas não se limitam a eles. A estratégia mais comum é subverter o código do GoogleMaps para associar outras mídias aos pontos registrados no mapa. De ações publicitárias a informações mais práticas, o GoogleMaps tem sido utilizado para experimentos locativos de grande impacto e criatividade. 68
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Rodrigo Moreira é formado em Comunicação Social e estuda Design Gráfico. Integra o Coletivo Móbile, blog/escritório que realiza trabalhos experimentais em design e novas mídias. Tem uma tatuagem no peito, do lado esquerdo, onde está escrito o nome de um lugar secreto.
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PESQUISADORES FAZEM FUTUROLOGIA SOBRE CONVERGÊNCIAS DE MÍDIAS E REDES DE CONEXÃO
TODAS AS MÍDIAS EM
UM SÓ APARELHO
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POLÍTICA PÚBLICA
O aumento da capacidade de integração de circuitos, como já podemos constatar atualmente, ao ouvir música em formato MP3 no aparelho celular, por exemplo, aliado à revolução no processamento da informação, foi possibilitado graças ao desenvolvimento acelerados de estudos como os do MIT. Junto dessas pesquisas, o desenvolvimento das comunicações via satélite e por fibras óticas permitiu o aprimoramento da difusão das novas tecnologias. As técnicas digitais transformaram a informação eletrônica em simples pacotes padronizados de sinais binários e permitiram o processamento e a transmissão de informação de forma mais rápida e mais eficiente por meios eletrônicos. Nesse novo paradigma tecnológico, a informação, com qualidade, é a matéria-prima, analisa Regina Mota. Ela avalia que o Brasil vive uma enorme desigualdade de condições informacionais e defende melhores no campo das políticas púlicas. “Eu não digo nem que o Estado regule, mas que ele faça sua política de universalização”, analisa. Regina defende que o Estado privilegie o coletivo, e não o indivíduo. “E eu estou invertendo a lógica do acesso. Eu não acho que seja tão importante neste momento que o indivíduo tenha acesso mas é fundamental que as comunidades tenham acesso. Eu acredito que você pode fazer uma mudança quântica se você permitir essa inserção de qualidade no mundo convergente digital, então tem-se que queimar etapa”, complementa.
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// arte+cultura.crônica
TODO JOVEM TEM 1.500 músicas no bolso. Se quiser, tem. Centenas de DVDs. Os filmes que ele baixa. Na internet. Todo jovem tem. Infinitos sites. Milhões de páginas on-line. Pornografia, MSN. Todo jovem tem mil amores. E comunidades. Num clique. Em dois. Em três. Cem cliques de uma vez. Todo jovem tem. Celular que toca. Fotografa. Assiste TV. Todo jovem tem centenas de canais a cabo. Tudo ao mesmo tempo, agora. Todo jovem tem. Mesmo o pobre tem. Vontade de ter. 1.500 músicas no bolso. Centenas de DVDs. Infinitos sites. MSN. Celular que fotografa. A namorada. Todo jovem tem uma dúzia de namoradas. Via e-mail. Via torpedo. Todo jovem tem. E não tem medo. Todo jovem tem armas de fogo. Games. Todo jovem é poderoso. Dono do mundo. Dono da verdade. Todo jovem tem um carro. Que corre, que bebe álcool. Todo jovem tem potência. Nenhuma paciência. Todo jovem tem espaço. Nos shoppings, nos postos, nas praias. Todo jovem tem prancha, óculos de marca. Mesmo o mais pobre tem. Vontade de pegar uma onda. Um sol na cara. Todo jovem tem direito. A se divertir. Nas boates e raves. E lan-houses. Todo jovem é assim. Todo jovem tem tudo. Só não tem livros. Todo jovem tem preguiça para ler. Todo jovem tem altas tecnologias. O futuro nas mãos. Todo jovem tem mais o que fazer.
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por_Marcelino Freire
Marcelino Freire é escritor. Autor, entre outros, de “Contos Negreiros” (Editora Record), vencedor do Prêmio Jabuti 2006. Para mais informações sobre autor e obra, acesse: www.eraodito. blogspot.com
// arte+cultura.
Eu quero é música!
Repórter comenta abertura do Stereoteca; projeto acontece de abril a outubro em Belo Horizonte por_Nara Vargas
O grito finalmente tinha saído. Um acúmulo de sentimentos e pensamentos, que “educadamente” eu tentava guardar para mim, explodiu como reação a uma noite em que vivi, à flor da pele, a provocante experiência de sentar numa cadeira de teatro e ser o público. Afinal, gente boa é aquela que só sorri e aplaude de pé?
Biblioteca Pública de Belo Horizonte [foto_ Marco Aurélio Prates] JUNHO 08 // POST 00
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PROPOSTA É INJETAR FÔLEGO NO MERCADO INDEPENDENTE
A terceira edição do projeto Stereoteca acontece de abril a outubro e apresentará 24 shows de lançamentos de CDS, semanalmente, no teatro da Biblioteca Publica de Belo Horizonte. Os idealizadores do evento acreditam que o formato extensivo e regular (com shows todas as semanas) proporciona a formação de público, e oferece à cidade uma opção cultural de qualidade, numa região de fácil acesso. A produtora e idealizadora do projeto, Danusa Carvalho, da Casulo Cultura, considera que “este ano o Stereoteca tem como objetivo intensificar seu papel na consolidação do mercado independente, estendendo seu formato e o alcance de suas ações, inclusive para outras cidades”. Todos os CDs lançados pelo Stereoteca estarão a venda no portal MUBI (Música Brasileira Independente – www.mubi.com.br).
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// arte+cultura.
TROCA DA (JOVEM) GUARDA ÍCONES HISTÓRICOS DA CANÇÃO POPULAR, ODAIR JOSÉ, LILIAN KNAPP E O TECLADISTA LAFAYETTE PREPARAM DISCOS EM PARCERIA COM BANDAS DE ROCK DA NOVA GERAÇÃO INDEPENDENTE
O VELHO E O NOVO
Lafaeytte e os Tremendões g disco de estréia no segundo semestre g o novo g integrantes de bandas cariocas como Autoramas e Canastra; e artistas solo como Érika Martins e Nervoso g o velho g Lafaeytte, tecladista da jovem guarda, o mais requisitado por Roberto Carlos. Kynna g disco de estréia em julho g o novo g canções de nomes da cena roqueira gaúcha (Bidê ou Balde, Júpiter Maçã, Graforréia Xilarmônica) g o velho g Lilian despontou ao lado de Leno, compondo uma das duplas vocais mais tocadas da jovem guarda. Odair José e The Dead Lover’s Twisted Heart g novo disco de Odair pode ter música do quarteto mineiro g o novo g balada composta pelo Dead Lover’s ganha versão em português na voz do cantor brega g o velho g José era conhecido como o “Bob Dylan da Central do Brasil” e completa 60 anos em 2008. 76
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LILIAN NA CONTRAMÃO
credita a volta de suas antigas canções à internet. “É assim que os jovens conhecem essas músicas antigas. Nem sei se merecia tributo...”, avalia o cantor. “Fui ouvir esperando pouco e só achei bons covers”. Também calcado em versões, o projeto de maior longevidade e notoriedade do segmento é capitaneado pelo tecladista Lafayette, famoso por ter apertado as teclas nos principais álbuns da jovem guarda, com destaque para os de Roberto Carlos. O músico toca com integrantes de grupos cariocas como Canastra e Autoramas há mais de dois anos. A banda Lafayette & os Tremendões prepara CD de estréia a ser lançado ainda em 2008. “É uma grande honra acompanhar um artista lendário como o Lafa”, orgulha-se Gabriel Thomaz, guitarrista e vocalista no projeto e no Autoramas. “Foi o cara que introduziu o órgão no rock, mundialmente falando. Antes o órgão era visto como instrumento de igreja”. Lafayette devolve: “Tinha uma idéia errada do pessoal jovem. Torço para que projetos com esse perfil virem moda. O Gabriel me chamou para tocar no casamento dele com a Érika (Martins, cantora), que também se apresenta com a gente, e daí teve a idéia de montar a banda”.
No caminho inverso de seus contemporâneos, Lilian – que formou com Leno um dos duos vocais mais famosos da jovem guarda – lança, em junho, disco de sua nova banda, Kynna, completada pelo guitarrista Luiz Carlini e pelo baterista Cadu Nolla. A estréia traz versões indies de grupos como Bidê ou Balde (“É preciso dar vazão aos sentimentos”) e Rádio de Outono (“Só o pó”). O destaque, porém, é “Um lugar do caralho”, do gaúcho Júpiter Maçã, e regravada pelo também gaúcho Wander Wildner. “Ela é minha preferida. Sempre que escuto, lembro dos tempos em que passava as madrugadas em bares no Leblon“, compara. Lilian recorda como foi o começo de seu projeto. “Fiz shows em 2007 com repertório que trazia America, Chicago e James Taylor, só com músicas de que gosto”, lembra a cantora, famosa por músicas como “Pobre menina”. “Desde 2000 tenho contato com o pessoal do Sul, como o Graforréia Xilarmônica. Fui apresentada ao tecladista Astronauta Pingüim, que toca no novo disco, e quis fazer algo um pouco mais underground. Os gaúchos têm um humor ácido”. Gabriel Thomaz, que também contribui no CD com “Música de amor”, dos Autoramas, empolgase com o projeto. “Achei muito legal ela ter gravado tudo do jeitinho dela. Lilian veio do rock, entende do assunto”, explica.
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CURVA DE EXPECTATIVAS FLUTUANTES TERMÔMETRO DAS MANIAS CULTURAIS autor_Zeca Camargo
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*Texto originalmente publicado em seu blog, no G1 http://colunas.g1.com. br/zecacamargo/. Cordialmente cedido pelo autor.
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O novo livro de Miguel Souza Tavares, “Rio das flores”, acaba de ganhar edição nacional, enquanto que Åsne Seierstad não despertou o mesmo entusiasmo de seus livros anteriores com seus retratos da Sérvia, em “De costas para o mundo”. Na TV, tenho usado todo meu espaço para gravar naquele novo aparelho digital que só agora estão oferecendo no Brasil para os episódios de “Em terapia”, da HBO. E enquanto as novelas de época, apesar de uma produção excelente (vide “Ciranda de pedra”), sinalizam um certo cansaço da audiência, a expectativa por “A favorita” está nas alturas – e nem preciso explicar os motivos, certo?
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Música? Fora o sucesso da remontagem de um musical clássico no Rio – “A noviça rebelde” – há uma boa expectativa para o quarto álbum do Coldplay, “Viva la vida”, e até para o disco solo de Marcelo Camelo (que ainda está no estúdio); elogios rasgados ao “retorno” de Ney Matogrosso; uma ligeira irritação com Madonna; e certo alívio com a carreira do músico (não do ministro) Gilberto Gil.
Zeca Camargo é jornalista. Desde 1996 integra a equipe do Fantástico, da Rede Globo, como editor-chefe, repórter e apresentador. Trabalhou ainda na TV Cultura, MTV, Folha de São Paulo e Capricho.
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Ainda nos filmes, “Sex & the city” está no limite da “superexposição”, e “Burn after reading”, o novo dos irmãos Coen (com George Clooney!), já está – por razões óbvias – no “pré-bochicho”, apesar de só estrear no segundo semestre.
RE SS A
Nessa temporada, temos filmes que não estavam passando pelo radar, como “Linha de passe”, e que, depois da premiação de Sandra Corveloni em Cannes (como melhor atriz), foi catapultado para um for-
te “bochicho”. Ou grandes decepções, como “Indiana Jones e o reino da caveira de cristal”, que escorregam rapidamente para a “ressaca”.
SA PO TU NT RA O D ÇÃ E O
A Curva de Expectativas Flutuantes é um material inspirado na revista americana “New York”. “Inspirado” é um eufemismo, claro. A Curva será aqui literalmente copiada daquela que foi inventada pela “New York”. Copiar, quando a idéia é boa, é bom — sempre que se dê o crédito. Você conhece o movimento: muito antes de alguma coisa boa aparecer, os mais “descolados” (não é um adjetivo adorável?) já começam a falar sobre aquilo — uma fase que vou batizar de “pré-bochicho”. Em seguida, o tal evento cultural (um filme, livro, artista, celebridade, etc.) passa a ser comentado abertamente — é o período “bochicho”. Então vêm as “ótimas críticas” — um doce período a atravessar. Mas logo chega o “ponto de saturação”, quando o tal produto cultural chega ao limite dos comentários positivos. Daí, é ladeira abaixo. Vem a fase da “superexposição” e, logo depois, da ressaca — onde as pessoas, de tanto ouvirem falar sobre aquilo se perguntam: “será que era mesmo tão legal assim?”. Mas, nesse irônico mundo maravilhoso da mídia e da cultura, tudo tem salvação: aquilo que já foi tão pichado pode voltar a ser bem avaliado, como se as pessoas dessem uma nova chance… e até voltassem a elogiar. Muito abstrato? Vamos aos exemplos práticos — bem ilustrados no quadro abaixo.
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DESTAQUE DO MÊS
SEXYCIBERDELIA: 3 NA MASSA, NA CONFRARIA DAS SEDUTORAS por_Rodrigo Ortega
Na Confraria das Sedutoras é o álbum brasileiro mais indecente dos últimos tempos. No projeto batizado de “3 na Massa”, Pupilo e Dengue, músicos da banda pernambucana Nação Zumbi, junto com o produtor Rica Amabis, convidaram atrizes e cantoras, como Leandra Leal, Alice Braga, Pitty e Thalma de Freitas, para 13 encontros pra lá de sensuais. O disco foi gravado no ano passado e lançado pela gravadora Deckdisc. Leandra Leal, que canta na faixa de abertura, é esposa de um dos ����������������������������������� compositores����������������������� do disco, Lirinha, vocalista da banda Cordel do Fogo Encantado��������� ������������������ . ������� As composições também têm as mãos de Rodrigo Amarante (Los Hermanos), Rodrigo Brandão (Mamelo Sound System) e Jorge Du Peixe (também da Nação Zumbi). A orgia da nova música popular brasileira é completa pelos músicos que fazem participações especiais nas gravações: Maurício Takara (Hurtmold), Catatau (Cidadão Instigado) e Bactéria (Mundo Livre S/A). O vocal em francês de Leandra em “Certeza” penetra suavemente nos ouvidos e já é suficiente para provocar um gozo precoce. O ato físico não se rea-
liza, mas a tensão sexual preenche todos os espaços dessa obra. A maior parte das músicas alterna trechos falados com melodias, o que dá um tom confessional e íntimo às canções Sambas suaves, soul e ritmos latinos cobrem a cama que a banda arruma para as divas se deitarem. “Arrepiou com um toque só / derramou molhado bom” (de “Doce Guia”, com Céu); “Utilizo os dedos para provocar sensações proibidas” (de “Pecadora”, com Simone Spoladore) e “Você é quem me dá tudo quente e espesso” (de “Certa Noite”, com Karina Falcão) são alguns dos versos libidinosos que desfilam pelo CD. Cruzar o som competente dos músicos da Nação Zumbi com sussurros de artistas já familiares à estética latina e retrô das músicas foi uma tacada garantida. Mas são uma roqueira e uma rapper que protagonizam dois dos momentos mais excitantes. Pitty sussurra versos surreais em “Lágrimas Pretas”, e Lourdes da Luz, em “Sem Fôlego”, declama a letra mais divertida do disco, com gírias “dos mano”. Ou melhor, das donas desse disco: “as mina”.
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TÁXI SEM PRESSA BANDA/CD Death Cab For Cutie Narrow Stairs
A maior contradição da indústria musical de massa é que os seus alimentos de maior sucesso costumam surgir de ingredientes que fogem da sua fabricação pasteurizada e em série. Esta receita pode explicar por que “Narrow Stairs”, o sexto mais “artesanal” trabalho da banda norte-americana Death Cab For Cutie, é também o seu produto de maior sucesso nas prateleiras. A banda surgiu como um fenômeno “indie” e foi chegando cada vez mais perto do grande público. O álbum, que alcançou um inédito primeiro lugar na Billboard, foi gravado com poucos retoques eletrônicos, praticamente ao vivo no estúdio. A primeira música de trabalho, “I will possess your heart”, tem uma linha de baixo instigante que se repete por mais de sete minutos, e a segunda, “Cath...”, tem uma beleza arrastada e sutil. Para quem se cansou de fast food, Narrow Stairs é uma iguaria.
O SOUL AGUADO DA “NOVA AMY WINEHOUSE”
PRETENSÃO INDEPENDENTE Um terrorista convicto, um profeta sem fiéis, um amante desapaixonado, um padre pedófilo. Estes são alguns dos protagonistas de “A Redenção dos Corpos”, quarto disco da banda goiana Violins. Os conflitos entre as vontades carnais e religiosas destes personagens são o tema do álbum. Para os Violins, independência não é sinônimo de despretensão. A obra é dividida em duas partes, como nos tempos do vinil. Mas o que sobra de vigor nas letras, cada vez mais ousadas e bem construídas, falta no som. Violões e pianos entremeados com guitarras distorcidas e eventuais efeitos eletrônicos não os salvam do balaio de roqueiros sensíveis pós-Radiohead. Mas quando as músicas conseguem ser tão potentes quanto as letras, o disco se torna sublime. Em “Manobrista de Homens”, um verso resume o esforço de todos os personagens: “Tente permanecer vivo, preso aos impulsos dos seus próprios pés, da sua própria fé”. _Rodrigo Ortega
BANDA/CD Violins - A redenção dos corpos
BANDA/CD Duffy – Rockferry A cantora galesa de 23 anos lança por aqui sua estréia, “Rockferry”, com dois meses de atraso. São 10 faixas de um soul aguado. Uma orelhada no momento mais festejado do álbum, a grudenta “Mercy”, que passou cinco semanas no topo da lista européia de singles, resume bem o que está no pacote. Em clima de “Amy Winehouse está com anemia”, Duffy canta sobre uma overdose de órgãos sessentistas. Bernard Butler, guitarrista do Suede, finado grupo dos primórdios do britpop, pilota o disco e compõe quatro canções: “Rockferry”; e três dos pontos mais fracos do disco: a quase florida “Serious” e as arrastadíssimas “Syrup & honey” e “Distant dreamer”. Todas são parcerias com a intérprete de voz bem adestrada, porém por vezes irritante. Em “Serious”, Duffy soa como uma Corinne Bailey Rae, do hit “Put your records on”, que quer ser Aretha Franklin. A bonita “Warwick Avenue”, de pontes e refrões bem amarrados, é a única faixa que vale toda a badalação. Nela, a roupagem anos 60 não deixa Duffy espalhafatosa e sem jeito como nos demais momentos. _Braulio Lorentz
_Rodrigo Ortega
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EVENTO: IX Festival Internacional de Bonecos de Belo Horizonte g
ONDE: Belo Horizonte, Minas Gerais
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PS: “La Fin des Terres” (França) e “Tem D Marlene, Tem Dó” (MG/Brasil) g
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por_Mariana Marques
Para quem sempre gostou do seriado, não há do que reclamar. No filme Sex and the city a diferença é que a tela é maior. Dá para ver a as roupas de Carrie & cia com mais detalhes. E, claro, a história dura mais. Quem falou que é ruim para quem sempre gostou da série? Samantha Jones (Kim Cattrall) continua assustando a ala masculina. Sexo, sexo, sexo. Alguns acham que é só de direito deles querer tanto assim. Aos cinqüenta e com libido inesgotável, ela começa a questionar seu relacionamento com o ator Smith Jerrod (Jason Lewis), com quem mora em Los Angeles. As coisas pioram quando ela nota a presença de seu vizinho, sua versão masculina antes do namoro. Está tudo lá: sessão de fotos para a Vogue, desfile particular para as amigas, Semana de Moda em Nova Iorque. Se eu fosse homem, talvez acharia um exagero tanta roupa e sapato. Culpa de Carrie Bradshaw (Sarah Jessica Parker). E ela está lá, na mesma, com Mr. Big (Chris Noth). É por causa dela que homens propagam que “mulher gosta é dos cafajestes”. Charlotte York (Kristin Davis) representa o quinhão romântico feminino, que sabe o quanto é bom ter alguém ao lado. Apesar da falta de conflitos em
SEX AND THE CITY
DESTAQUE DO MÊS
sua vida de mãe e esposa, Charlotte está presente nos momentos mais dramáticos (o abraço em Carrie ao mesmo tempo em que seu olhar condena Big) e engraçados (seu comportamento no México). Há uma Miranda Hobbes (Cynthia Nixon) dentro das que racionalizam os sentimentos, mesmo que isso inclua fazer listinhas dos pós e contras. Quando a advogada se dá conta de que não transa com Steve (David Eigenberg) há seis meses, começa a crise no casamento, que só piora. É dos dois a história mais bonita, que dá vontade mesmo de chorar como uma mulherzinha. No longa, Carrie ganha mais uma amiga: sua também assistente pessoal Louise, de St. Louis. Impossível não simpatizar pela personagem de Jennifer Hudson, que, vinda do interior, muda-se para Nova Iorque “para se apaixonar”. A atuação de Hudson se torna ainda melhor ao lado das outras – exceto por Cinthia Nixon, não há nenhuma atuação com potencial para fazer uma carreira brilhante no cinema. Critica-se o filme por ser fútil-bobo-pseudofeminista-dramático-histérico-pramulherzinha. Falam mal porque Carrie e suas amigas são estereótipos e caricaturas. Ora, e no seriado não era assim?
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YOU TOMB
O PESADELO DE CASSANDRA
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FILME: Antes que o diabo saiba que você está morto (Before the devil knows you’re dead, EUA/Reino Unido, 2007) / ������ Dir.: Sidney Lumet
YouTomb (http://youtomb.mit.edu/) é um projeto do MIT Free Culture que tem como objetivo republicar e mapear o conteúdo retirado do Youtube por violação de direitos autorais. Como o YouTube não é muito transparente sobre os detalhes que cercam este processo e o software usado, o YouTomb conceived procura identificar as práticas do YouTube para encontrar e avaliar potenciais violações de direitos. A iniciativa serve tanto para ajudar o público em suas edições como para dar recursos aos usuários que tiveram seus vídeos retirados. O site já identificou 4.950 vídeos retirados por violação de direitos autorais e 16.449 vídeos retirados por outras razões. O monitoramento é em tempo real e impressiona a velocidade com que os updates acontecem. Infelizmente, não é possível assistir aos vídeos. _Kleyson Barbosa
UM CINEASTA INCONVENIENTE
A sinopse seria mais ou menos essa: os irmãos Andy (Hoffman) e Hank (Hawke) decidem assaltar a joalheria dos pais para resolver seus problemas financeiros, mas são obrigados a lidar com as conseqüências do fracasso da empreitada. Mas talvez a opção abaixo seria mais adequada: gente com caráter, ganância e problemas de gente toma uma decisão e comete erros típicos de gente e reluta em assumir a culpa por ferir os outros, numa atitude típica de...gente. Porque o filme de Sidney Lumet é uma história de pessoas comuns. O espectador passa quase duas horas de filme aguardando uma reviravolta mirabolante, a revelação da “agenda secreta” de algum personagem – típicos de um filme de roubo – e não há. Nenhuma solução fácil se apresenta no roteiro do estreante Kelly Masterson, o que cria uma inércia tóxica e asfixiante. E é na relação dos irmãos, no (des)equilíbrio dinâmico entre o “cérebro” e o “bonitinho”, e em como o pai catalisa isso tudo que Sidney Lumet alicerça sua tragédia. Porque o diabo se aproveita, mas quem aperta o gatilho somos sempre nós._Daniel Oliveira
Fim dos Tempos (The happening, EUA, 2008) / Dir.: M. Night Shyamalan M. Night Shyamalan tenta nos fazer pensar mais do que sentir. A apreensão e o envolvimento de seus filmes se dão mais através da busca por entender o que está acontecendo do que por uma identificação com seus personagens – desde “O sexto sentido” até “A dama na água”. Ele quer que nos indaguemos sobre aquele mundo, mas acabemos achando respostas sobre o nosso. Com “O fim dos tempos”, não é diferente. O longa narra os estranhos eventos de um dia em que pessoas por toda a costa leste norteamericana começam inesperadamente a se suicidar. Claro que o acontecimento é logo encarado como um ataque terrorista, já que a atitude é atribuída a um agente químico espalhado pelo ar que, aparentemente, inibe o instinto de sobrevivência. E nesse “mecanismo” – a perda do senso de preservação – está a chave da metáfora do filme. Há sérios problemas, principalmente no que diz respeito ao elenco, atuação e diálogos. Se fosse qualquer outro cineasta estreante, seria considerado um longa pertinente e promissor. Em se tratando de Shyamalan, espere ouvir por aí que é pretensioso – ou simplesmente que não é “O sexto sentido”. _Daniel Oliveira
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EVENTO: 3ª CineOP (Mostra de Cinema de Ouro Preto)
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ONDE: Ouro Preto, Minas Gerais
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QUANDO: de 12 a 17 de junho
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PS: Evento homenageia Glauber Rocha e
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Rogério Sganzer
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DESTAQUE DO MÊS
LITERATURA
DIGITAL por_Mariana Marques
Você passeia por Londres, pega o metrô, entra em museus. De repente, atravessa o mapa do Reino Unido e chega de avião a Edimburgo, na Escócia. Tudo isso através do GoogleMaps. A viagem faz parte da ficção 21 steps, publicação on-line dentro do projeto britânico We tell stories. O site (http://wetellstories. co.uk/), lançado pela editora Penguin e pela empresa digital Six to Start, reúne histórias inéditas. O criativo é que as ferramentas digitais realmente se diferenciam dos diversos livros publicados na rede. Todo dia surge um novo blog de contos, e não é difícil encontrar links piratas com obras na íntegra. Mas ainda não é possível definir o mercado para tais publicações. Isso porque é consenso a falta de comodidade para o leitor acompanhar toda uma obra pela tela do computador. Ainda assim, há quem enxergue um novo caminho para a literatura dentro do mundo digital. Existe até mesmo quem não condene a pirataria e chegue a mudar de roupa para apoiá-la. Paulo Coelho tira o chapéu de mago e coloca tapa-olho de pirata para interagir na rede. A identidade “Pirate Coelho”, usada em seu blog (http://piratecoelho.wordpress.com/) é dele mesmo, como admitiu no início deste ano no encontro Digital, Life, Design, na Alemanha. O escritor facilita a vida do leitor pirata, compartilhando
links com suas obras, em diversas traduções. Nos comentários dos internautas, lê-se agradecimentos em diversas línguas e também opiniões como “vou ler os primeiros capítulos e, se gostar, comprarei o livro”. Paulo Coelho afirma que, com o blog, a venda de seus livros cresceram consideravelmente. Daniel Galera é outro escritor brasileiro que também já colocou uma obra inteira na rede. Seu livro, Dentes Guardados, lançado em 2001 pela finada editora Livros do Mal, encontra-se para download em seu site (http://www.ranchocarne.org/). “Ofereci o livro de graça no meu site porque a edição estava esgotada e não havia a intenção de republicá-la em livro. Mas muitas pessoas ainda o procuram, me mandam emails querendo comprar um exemplar pelo correio. O leitor pode ler na tela ou imprimir, como preferir”, conta Daniel. O mesmo caso aconteceu com Clarah Averbuck, que tem seu livro Máquina de Pinball publicado gratuitamente na internet. A iniciativa foi da própria editora Conrad, que dá ao internauta a opção da compra on-line ou do download da obra. Em seu blog, a escritora opina: “Eu acho sensacional. Nunca vou ser bestseller e prefiro ser lida do que ficar esperando a merreca da porcentagem”. Novos formatos eletrônicos mais práticos já foram lançados no mercado, como o Librie, da Sony, e o Odissei, da Philips. Há quem diga que a sensação de comprar um livro e folheá-lo irá perder espaço para a chamada “literatura digital”. Daniel acredita que tal denominção nem mesmo devesse existir. “Existe literatura, ponto. E ela pode ser publicada em vários suportes diferentes. A internet é uma aliada dos autores”, afirma o autor.
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POST 00 // JUNHO 08
// favoritos.resenhas LIVRO: Lugares que não conheço, pessoas que nunca vi – Cecília Giannetti
ESBORRACHADA RESPONSÁVEL
DO BANAL AO SURREAL Você provavelmente nunca viu Cecília. Nem eu. Você e eu também não conhecemos o Rio de Janeiro. Não aquela cidade dos cartões postais, mas o Rio que mora dentro da cabeça da escritora Cecília Giannetti, 32 anos, e que está mapeado no seu primeiro romance, “Lugares Que Não Conheço, Pessoas Que Nunca Vi” (Ed. Agir). O desconhecido vai nos levar a dois caminhos. O primeiro é de ida, veloz na narrativa da autora, que leva em instantes do banal ao surreal. A história de uma jornalista que presencia um crime numa favela e se afunda em pensamentos e delírios. Neles, a capital carioca aparece em visões assustadoras. O terror e a desesperança, no fim das contas, não estão longe do que eu e você vivemos. No amargo caminho de volta, só o esquecimento pode levar à sanidade. De qualquer forma, vale a pena lembrar-se dela: Cecília Giannetti é um dos nomes mais comuns em listas da nova literatura brasileira. Aos 32 anos, já havia publicado contos em algumas coletâneas e artigos na Folha de S. Paulo e revistas Trip e Piauí. _Rodrigo Ortega
FICÇÃO (CIENTÍFICA, PERO NO MUCHO) LIVRO: Macacos Malvados – Matt Ruff Do celebrado escritor americano Matt Ruff, “Macacos Malvados” é um thriller em que são enfileirados diálogos sempre protagonizados por Jane Charlotte, acusada de assassinato já no começo da sinopse. Trechos de uma entrevista da moça ao Dr. Vale, na ala psiquiátrica da Cadeia Municipal, permeiam o relato de Jane. O quarto livro de Ruff é engraçado sem ser engraçadinho; esbarra no fantástico, mas passa longe do jeito místico a la Edgar Alan Poe de se contar uma história. Na obra, prevalece o deboche da personagem principal e o humor ácido que cativa já nas primeiras viradas de página. As idas e vindas das reminiscências da assassina confessa são recebidas com um “Ah, só podia ser a Jane”. Ok, você já percebeu que ela me colocou no bolso. Mas será que fez o mesmo com seus antagonistas no livro?
Na gíria jovem de skatistas, slam quer dizer tombo. Só que o tombo sofrido pelo narrador-personagem-principal, Sam, não foi cair do skate. Não exatamente. O garoto que é super ligado ao skate e aos heróis do esporte, relata as reviravoltas que uma gravidez indesejada causou em sua vida dois anos antes. O garoto tem um pôster gigante no quarto do campeão mundial de skate Tony Hawk, com quem “conversa” nos momentos reflexivos. É para Hawk que Sam conta seus dramas e problemas. Como nos demais livros, Nick Hornby recheia o texto com diversas referências do universo pop – de Britney Spears à J. K. Rowling, passado pela coqueluche tecnológica do iPod. Em Slam, o que poderia ser uma comédia se transforma, portanto, em uma análise sobre a “esborrachada” face à responsabilidade. _Kleyson Barbosa LIVRO: Slam – Nick Hornby
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EVENTOS
EVENTO: Espetáculo teatral Fragments (França) g
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ONDE: Teatro FILO (Rua Piauí, 211 - Galeria Vila RIca); Londrina, Paraná.
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QUANDO: dias 15, 16 e 17 de junho; às 21 horas (dia 17, sessão extra às 18h30) g
PS: O espetáculo é dirigido por Peter Brook. Integra o Festival Internacional de Londrina (FILO), que ocorre de 4 a 22 de junho g
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// favoritos.idéias
A REINVENÇÃO DO
DESTAQUE DO MÊS
JORNALISMO
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EVENTOS
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NOVA GERAÇÃO
LAROUSSE LANÇA ENCICLOPÉDIA ON-LINE
A editora francesa Larousse lançou, no último dia 15, uma versão on-line de sua enciclopédia (www.larousse.fr). A empresa pretende brigar com a Wikipédia no mercado de língua francesa. A versão on-line foi desenvolvida durante dois anos e associa artigos procedentes das edições em papel com as contribuições que qualquer internauta pode colocar no site. Para participar da Larousse on-line, é necessário fazer a inscrição no site, redigir um currículo e identificarse com uma foto. A editora ainda conta com uma enciclopédia de dois tomos e continua publicando seus dicionários famosos e edições de conhecimentos específicos. Mas fica uma pergunta: será o fim das grandes enciclopédias físicas? _Kleyson Barbosa
INCOMODA Lançado no último mês nos EUA, o livro de Mark Bauerlein vem causando polêmica. Bauerlein anda recebendo inúmeras críticas de internautas e da imprensa, porque ataca a geração com menos de 30 anos, ao dizer que a tecnologia, que supunha fazer os jovens mais astutos, diversificar os gostos e ampliar a mente, teve efeito oposto. “A ignorância é difícil de acreditar. Não é suficiente dizer que esses jovens são desinteressados em realidades mundiais. Eles são completamente desligados delas. Eles são focados em realidades mais imediatas, que fecham a circunstâncias posteriores – amigos, trabalho, roupas, carros, música , música pop, seriados, facebook”, escreve. Fundamentado em estudos do instituto de pesquisas Nielsen, imagens e em análise social e histórica, o livro é um estudo realístico da mente jovem americana neste momento considerado crítico. É notório o quanto essa nova geração incomoda Bauerlein. E já era de se esperar um livro como esse – em que alguém da geração anterior, que acredita ser mais informado e inteligente, tenta compreender aquilo que sempre será para ele incompreensível. Mas, também, qualquer mudança de geração sempre causará incômodo. _Kleyson Barbosa
LIVRO/AUTOR: The Dumbest Generation - How the Digital Age Stupefies Young Americans and Jeopardizes Our Future / Mark Bauerlein
// agenda.semana de 23_31_junho
EVENTOS
EVENTO: Motomix – The ROKR Festival g
ONDE: Parque do Ibirapuera (Av. Pedro Álvares Cabral, s/nº – Ibirapuera – São Paulo, SP)
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QUANDO: 28 de junho, das 15h às 21h g
PS: Shows de Venus Volts, Stop Play Moon, Nancy, Fujiya & Miyagi, The Go! Team e Metric. Entrada gratuita g
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// favoritos.artescênicas
DESTAQUE DO MÊS
BELO HORIZONTE SEDIA MOSTRA INTERNACIONAL
DE TEATRO
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EVENTO: 9° FIT- BH (Festival Internacional de Teatro Palco & Rua de Belo Horizonte) g
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Belo Horizonte, Minas Gerais g
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de 26 de junho a 6 de julho PS: Venda antecipada de ingressos nas bilheterias do Teatro Francisco Nunes, de 14 a 22 de junho g
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// favoritos.resenhas Festival de Teatro de Bonecos de BH
Cia.: Cia. de Teatro Os Satyros Artista/Comediante: Marcelo Médici Espetáculo: “Cada um com seus Pobrema”. Em cartaz há quatro anos ininterruptos, o espetáculo foi dirigido por Ricardo Rathsam, que assina o texto em parceria com Marcelo. Nele, um ator de teatro desiste de se apresentar para falar da própria vida, dos personagens politicamente incorretos que precisou interpretar. Só figuraças: um corintiano malandro, um mico-leão-dourado gay, uma Smurfete desempregada, uma faxineira com transtorno obsessivo compulsivo (TOC), uma apresentadora infantil que detesta crianças, uma vidente charlatã e um surfista/ modelo que vira ator. Se é que restou dúvida, na prática “Cada um com seus Pobrema” é o que o público americano nomeia stand-up comedy; traduzindo: um ator sozinho fazendo graça num palco. _Miguel Anunciação
Espetáculo: “Vestido de Noiva” A encenação de “Vestido de Noiva” pretende fazer uma abordagem contemporânea para o texto original de Nelson Rodrigues. Todos os recursos utilizados na escrita de Vestido de Noiva continuam extremamente ousados. A ordem não cronológica, sincronicidade, personagens e situações fragmentadas e absurdas nos remetem a um universo muito menos realista do que era a estética teatral da época. Ao situar grande parte da ação no universo imaginário de uma mulher à beira da morte, vítima de um atropelamento, Nelson Rodrigues retira a necessidade de qualquer consistência lógica cartesiana. No texto, o autor sugere a quebra em três planos: memória, alucinação e realidade. Esta divisão se tornou padrão e praticamente marca todas as montagens já feitas de Vestido de Noiva. Os Satyros pretendem afastar-se destes planos clássicos e propor uma releitura do texto. _Miguel Anunciação
Dois espetáculos destaque são destaque no Festival. “Gulliver” é uma tradicional alternativa de espetáculos divertidos e interessantes. A irrepreensível versão da companhia chilena Viaje Inmóvel (ex-La Troppa) para o clássico de Jonathan Swift, tem cenografia, iluminação, atuações, adaptação, direção e bonecos simplesmente cativantes. O grupo Tof Theater vem da Bélgica para três apresentações de “Bistouri”, um espetáculo de excepcional competência. E “O Caso da Cobra Pantera”, da companhia Augusto Bonequeiro e Ângela Escudeiro, versão para crianças da fábula de uma cobra sempre esfomeada, tem uma comunicação tão rara quanto absoluta com o público. Tanto infantil quanto adulto. Sobretudo o frescor da interpretação de Ângela, o dom de tornar o que é texto em fala, quase espontaneidade, compensa a história simples, quase singela. E torna o espetáculo do Ceará um programa imperdível. _Miguel Anunciação
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A DEVIDA IMPORTÂNCIA DO QUE TE MOVE
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