Influxo #2
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Influxo#2
Minas Gerais - Brazil
FOUNDER / EDITOR IN CHIEF Alexandre Kocian
ART DIRECTOR / GRAPHIC DESIGNER Alexandre Kocian
VIDEO Victor Imesi
TRANSLATORS Karime Navarro Isabel Munro
SPECIAL THANKS IMS - Instituto Moreira Salles (Poços de Caldas) / Dalmoni Lydijussi Flavio Danza / Grupo Imagens De Poços / Jornal Da Cidade (Poços De Caldas) Jornal Brand-News / Jornal da Mantiqueira / Tv Plan / Tv Poços
Direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do conteúdo desta publicação. InFluxo online utiliza o material publicado com a autorização de seus autores e proprietários. Copyright reserved. Reproduction in whole or parts is prohibited. InFluxo online uses all materials with permission from owners. 2016. InFluxo Online.
Superfície poços-caldense Alexandre Kocian, 2016
E
m solo mineiro, muito distante das grandes capitais que concentram a produção
cultural, flui esta despretensiosa publicação online. InFluxo busca viabilizar trabalhos - mesmo que virtualmente - e amplificar as vozes da expressão artística. Afinal, a internet não tem limites, e as visualizações da primeira edição atingiram milhares de pessoas nos quatro cantos do globo. Não que isso seja melhor que outros tipos de saída: somos fãs das impressões fine art, dos fotolivros e das galerias. Firmando os pés ao chão e analisando nossa realidade, descobrimos InFluxo como uma plataforma viável, simples e eficaz, que sem dúvida contribui para a consolidação do movimento artístico. Recentemente, conquistamos o apoio do Instituto Moreira Salles de Poços de Caldas, sede do primeiro encontro de artistas com o público, em que os objetos de discussão foram os ensaios publicados neste magazine. Ao publicar virtualmente trabalhos formatados “materializamos” as obras e criamos múltiplas possibilidades de enriquecimento cultural. Com humildade, desprendimento e trabalho é possível somar coletivamente e, principalmente, se divertir, o que é a base de tudo. Nesta segunda edição apresentamos trabalhos de artistas locais, regionais e nacionais. Temos como convidado especial Francisco Santos (Curitiba), um dos destaques do Prêmio Conrado Wessel 2016, autor de livro com passagem em diversos festivais de fotografia pelo mundo. Mais próximo de nós, antes da fronteira com Minas Gerais, publicamos um artigo do experiente Gil Sibin, artista visual, colecionador, curador e diretor do Gloc. O professor Luciano Costa, em parceria com o escritor Stelio Marras, divulga seu novo ensaio “A cara da riqueza”. Dois artistas poços-caldenses, Karime Navarro e Leandro Moretti apresentam seus trabalhos nesta edição. E encerramos com o trabalho experimental que estamos desenvolvendo junto ao Grupo Imagens de Poços, O Bairro em Arte, que consiste em exercícios de saídas em grupo nos bairros e periferias da cidade. Divirta-se!
Alexandre Kocian
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Paisagens biogrรกficas [Ancestral biography].....................................................10
#2 Apocalipse .....................................................................................................................32 #3
A cara da riqueza ........................................................................................................44
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O enigma do empacotamento [The Packaging Enigma]..............................82
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Resto que nos pertence [Our Remains]...............................................................88
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O bairro em Arte [Art neighborhood]................................................................108
paisagens biogrรกficas ancestral biography
photographs
LEANDRO MORETTI
curator / text LUCIANO B. COSTA
Susan Sontag em um de seus ensaios Sobre a Fotografia nos fala sobre a ambígua atividade do fotógrafo: “O fotógrafo saqueia e também preserva, denuncia e consagra”. Diante daquilo que se apresenta frente a câmera, um ato de apropriação das infinitas expressões do mundo se é praticado. Fazemos do fotografável o desejo de perpetuar o outro em sua sensível diferença, aproximando-nos, sem perder a distância, sem nos envolver, como quem só observa aquele que dança. Mas poderia o fotografar ser um modo de superar a nossa própria limitação em aceitar o diferente, em compartilhar da dança, da alegria, da ancestralidade que reconhecemos no outro. Ou ainda, quem sabe, promover o encontro com uma memória vivida? O olhar talvez, assim, não só se aproprie do que retrata, mas também guarde, consagre e revisite aquele que se apresenta ao fotógrafo, buscando nesse ato uma memória, uma carícia, uma benção por meio do próprio ato de produção das imagens. Nas fotografias de Leandro Moretti somos convidados a esse movimento em que o gesto de observação se comunica com aquele de fotografar. Por vezes, as faces se impõe como verdadeiros monumentos ao olhar, outras vezes se sucedem como simples inventário de tipos, ou ainda ampliam em cores e ritmos ao sabor da dança. Nesse jogo de aproximação e recuos, vai se construindo a consagração de uma identidade cultural. Mas, também o reencontro com as memórias de infância do fotógrafo quando, junto à sua avó, Moretti frequentava centros de umbanda e festividades culturais onde o ritmo Afro com seus tambores e danças festivas marcavam este momento de sua vida. Memórias também nossas, aprendidas no contato com aquele que nos é diferente, fascinados ou incomodados pela expressão do outro que se exibe e nos convida a partilhar da dança. Dança agora nossa, sob os reflexos de luz, das tonalidades de cinza, dos olhares atentos a nossa presença.
Susan Song in one of her essays, On Photography, tells us about the ambiguous photographer activity: “The photographer plunders and also preserves, denounce and consecrates”. Faced with what is presented in front of a camera, an act of appropriation of the infinite expressions of the world is practiced. We do photographed the desire to perpetuate the other in his sensitive difference, bringing us closer without losing distance, without us involved, as one observes only whom is the dancer. But could the photograph be a way to overcome our own limitations accepting what is different, a way to share dancing, joy and the ancestry that we recognize in other? Or, who knows, to promote the encounter with a vivid memory? The look may thus not only take ownership of it portrays, but also save, enshrines and revisit that which is presented to the photographer, looking for this act a memory, a caress, a blessing through the imaging act itself. In Leandro Moretti photographs we are invited to this movement where the act of observation communicates with the shooting. Sometimes the faces is imposed as true monuments to look, sometimes they are as simple as inventory types, or expanding in colors and rhytms to the flavor of the dance. In this game of approach and setbacks, it will build the consecration of a cultural identity, but also the reencounter with the photographer´s childhood memories when, next to his grandmother, Moretti attended Umbanda and cultural festivities. This moment of his life was marked by the African rhythm with their drums and festive dances. All of this represents also our memories learned from the contact with who is different to us. Fascinated or uncomfortable by the expression of the other we are invited to share the same dance. Now, we are part of this dance, under the light reflections, the shades of gray, and the alert eyes to our presence.
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Leandro Moretti
A descoberta da beleza do exótico, manifestada na particularidade oculta de cidadãos comuns, muitas vezes só é perceptível através da fotografia. Este ensaio fotográfico é dedicado ao negro e a sua ligação com seus ancestrais, em um clima de suspense, devoção, música, dança e fé.
The exotic beauty of discovery, manifested in the hidden feature of ordinary citizens, often only It is noticeable through photography. This photo essay is dedicated to the black people and its connection with their ancestors, in a climate of suspense, devotion, music, dance and faith.
Leandro Moretti
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Leandro Moretti
*francisco santos desenvolve projetos pessoais há 6 anos. Representado pela Galeria Portfolio de Curitiba, lançou seu primeiro livro em 2015, Anastácia, classificando-o em 2016 na convocatória do Festival de la Luz em Buenos Aires. santos foi finalista do Prêmio Conrado Wessel 2016 , um dos mais importantes do país. Conta com trabalhos selecionados em diversos concursos, como o Festival de Tiradentes, Paraty em Foco, Festival Internacional de Cabo Verde, Confluência do Olhar de Pernambuco, Iberencontros de Portugal, Foto 13 do México, revista Arpia da França e revista Calle Nuestra do México. O fotógrafo tem na literatura sua maior fonte de inspiração e seus trabalhos, que dialogam com o documentarismo imaginário, são originados nas percepções que envolvem o seu ambiente mais próximo. O cotidiano é objeto de interpretação em suas fotografias. *o artista prefere que seu nome seja escrito com letras minúsculas
APOCALIPSE
[convidado especial]
francisco
APOCALIPSE
osantos
[special guest]
*francisco santos has been developing personal projects for 6 years. Anastácia, released last year was his first book, and it was also selected at the Festival de la Luz 2016, in Buenos Aires, Argentina. santos was finalist at Conrado Wessel 2016, one of the most important contests of photography in Brazil. Between 2015 and 2014, he also had works selected in differents contests , Tiradentes’s Photography Festival, Paraty in Focus, Confluência do Olhar de Pernambuco, Iberencontros Portugal, Foto 13 do Mexico, Cabo Verde’s International Festival. Beyond, works published in the magazines Arpia, from France and Calle Nuestra, from México. The photographer´s inspiration comes majorly from the literature. But his work has a dialogue with the imaginary documentarism, with its origins comes from his nearst environment. The Daily life is the object of interpretation in santo´s photograpys. *lowercase was used as a request of the artist.
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a
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riqueza
Havia uma aglomeração na praça da Cascatinha, bairro da cidade mineira de Poços de Caldas.
Imagens Luciano Textos
Costa
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“É o ensaio da Vivaldinos”, disseram. Sim, ali fervia um samba-enredo sob o batuque eletrizante da “locomotiva magnética”, a bateria da escola de samba Vivaldinos da Vivaldi. Aproximava-se o carnaval de 2016 e o tema da Vivaldinos desenvolvia-se em torno da tradicional Festa de São Benedito. Era caso de ver e escutar de perto.
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Luciano Costa + Stelio Marras
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A cara da riqueza
Luciano Costa + Stelio Marras
Luciano Costa + Stelio Marras
“Mas não é Nossa Senhora da Saúde das Águas de Caldas, aquela que fica ali na Igreja Matriz, a padroeira da cidade?”, perguntou o desavisado e quase gritava para ser ouvido no meio ruidoso. “Diz que sim”, respondeu-lhe um local. “Mas a
A cara da riqueza
e curioso turista que se aproximou
gente gosta mesmo é do Ditinho. Com ele a gente bebe, come, dança e canta. Pra ele, o primeiro café preto de todo dia, sá?”
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O estrangeiro calou e pensou antes de replicar: “Ah, é santo dos negros, né?”. O nativo, ele nem bem branco e nem bem negro, deu um sorrisinho de lado e continuou: “Oh não, é santo negro mas não só de preto. É de todo mundo aqui. É da brancaiada também, sô” – e deu agora uma risada aberta e sonora enquanto virava uma cachaça: “tem que molhar as palavra”.
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Luciano Costa + Stelio Marras
“Entendi. É santo dos pobres, né?”, insistiu o turista aprendiz, entre confuso e já um respondeu (parece que fingiu não ouvir, como para não ser descortês com o gringo), preferindo entoar o refrão que naquele preciso momento
A cara da riqueza
pouco insolente. Seu interlocutor da terra não
levantava toda a praça. Sua companheira, porém, ela que tudo acompanhava, virou-se para a praça e depois para o perguntador:
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“Mas o senhor vê mesmo pobreza aqui?” O homem franziu lábios e sobrancelhas. Pareceu acuado. A mulher, claro, seria gentil. E então devolveu um delicado sorriso franco e apontou para aquela ágora órfica: “Onde aqui há pobreza? Tá vendo aquele cabelo? Ó lá a alegria do samba, a cara dos menino. Isso aqui é a cara da riqueza, viu? Pobreza é coisa triste. Né? Cadê a tristeza aqui?”, levando o olhar para a praça. Teve silêncio no meio de tanto barulho.
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Caía a noite do último ensaio antes da ave
sustada pela comunidade atenta. Mas o tur
Já até arriscava cantar e sambar. Conseguiu u seguinte.
Luciano Costa + Stelio Marras A cara da riqueza
enida. Vieram dizer que uma briga foi logo
rista jรก se sentia confiante e algo seguro ali.
uma fantasia para participar do desfile no dia
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Agora lá estava ele entre as alas, ainda passeando de lá pra cá na concentração, um pouco embriagado e atento a tudo. Viu congo e caiapó dando graças ao santo bendito. Já não mais atinava em distinguir o que ali havia de branco, negro, indígena ou mestiço. Nem mesmo rico, pobre, remediado ou classe média.
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A cara da riqueza
Luciano Costa + Stelio Marras
Luciano Costa + Stelio Marras
Viu Santa Ifigênia em meio à fumaça da carne que estalava numa em cima do terceiro carro alegórico, aquele representando as barracas da festa homenageada. Sua mente
A cara da riqueza
churrasqueira que acabou
voltava a girar em êxtase e espanto.
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Como homem pio, passou agora a se incomod
Que coisa era essa de pĂ´r santo para samba
samba e oração, incensos e bebidas, festa e de religiosos?
Luciano Costa + Stelio Marras A cara da riqueza
dar com o que julgava ser sumamente profano.
ar na avenida? Qual perigosa mistura essa de
evoção, cruzes e patuás, corpos nus e mantos
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Luciano Costa + Stelio Marras
Quais reis eram esses? O que festa? O santo? A comunidade? A chamada cultura popular? A igreja? Quem fazia quem? Qual a “prima
A cara da riqueza
mesmo se homenageava? A
causa”? – pensou em latim.
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Aonde comeรงava o sagrado? Aonde terminava o mundano? Decidiu que devia molhar o pensamento e entornar uma cachaรงa.
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A cara da riqueza
Luciano Costa + Stelio Marras
Por muito pouco não desistiu de entrar na avenida. Já não se sentia dono de si quando foi empurrado pelo magote festivo (mas não teve certeza se estava mesmo sendo empurrado). Tarde demais. Agora a avenida se descortinava à sua frente. E lá foi ele para o seu destino.
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A cara da riqueza
Luciano Costa + Stelio Marras
Só voltou a si (mas qual si mesmo?) no dia seguinte. Aquela escola (“a minha escola”, passou a dizer, com o peito inchado) tornarase campeã do carnaval.
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A cara da riqueza
Luciano Costa + Stelio Marras
Verdade é que s
elas já não mais
transformado in
suas inquietações não desapareceram. Mas descobriu uma novidade:
s assumiam a importância de antes. Seu olhar de primeiro plano havia se
nteiramente.
A cara da riqueza 2016 Luciano Costa Sociólogo, curador e fotógrafo, Luciano Costa leciona sobre história e arte fotográfica no Instituto Moreira Salles (Poços de Caldas) e no curso de Arquitetura e Urbanismo da PUC Minas. Stelio Marras Escritor, professor e doutor em Antropologia Social pela Universidade de São Paulo.
Gil Sibin
[estudos em artes visuais]
o enigma do empacotamento Durante o período em estive mergulhado nos estudos na pós-graduação em Artes Visuais, Multimeios e Educação no Instituto de Artes da Unicamp, dentre tantas pesquisas busquei aprofundar a discussão sobre a motivação que se esconde sob o fato aparentemente banal de se escrever nas portas de banheiro. Diante de um novo desafio - expandir o tema e resignificá-lo em outro contexto, primeiramente ocupando o espaço físico do próprio banheiro, depois ‘levando’ este banheiro para um espaço aberto e, finalmente sintetizando o tema na criação de uma instalação-objeto, outros elementos puderam ser incorporados ao processo criativo, ampliando tanto o sentido quanto a proposta inicial. Ao estabelecer relações entre o espaço e os objetos, o individual e o coletivo, as instalações possibilitaram que os sentidos se evidenciassem, que outros códigos fossem sobrepostos, que a informação fosse questionada, dilatada, reinventada. Na amplificação dos sentidos e significados, foi possível ‘escancarar’ a porta e mostrar quanta dor, sujeira, preconceito, castração e repressão se escondem em nossos trancados banheiros mentais.
Gil Sibin, “Protegido n.1 e 2”, 2011, papel filme sobre superfície, vaso sanitário, cesto de lixo e objetos de um banheiro.
Gil Sibin
[visual art studies]
the packaging enigma
Gil Sibin, “Protected n.1 and 2” 2011, plastic wrap on the surface, toilet, wastebasket and objects of a bathroom.
During the time that I was involved in my studies at the post-graduation course in Visual Arts, Multimedia and Education at the Art Institute of Unicamp, among many researches I sought to deepen the discussion about the motivation that lies beneath the seemingly banal fact of writing on the doors of a WC. Faced with a new challenge to expand the subject and its meaning in another context, first occupying the physical space of the bathroom itself, then ‘leading’ this bathroom to an open space and finally synthesizing the topic by creating an installation object, other elements could be incorporated into the creative process, increasing both the sense and the original proposal. By establishing relationships between space and objects, the individual and the collective, the facilities made it possible for the senses to be evident, other codes to be overlapped, information to be questioned, dilated, reinvented. In amplification of the senses and meanings, it was possible to ‘throw open’ the door and show how much pain, dirt, prejudice, castration and repression lurk in our locked mental bathrooms.
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Este trabalho, que consistiu em revestir com papel filme um dos banheiros masculinos da Unicamp – Universidade Estadual de Campinas - a baia central, escolhida em função das inscrições fotografadas para o desenvolvimento do tema - foi idealizado a partir da percepção de que a pessoa que escreve nas portas de banheiro, protegida pelo anonimato, rompe com o que é convencionalmente aceito como ‘correto’ e expõe suas pulsões, manifestando sentimentos ou sensações que não teria coragem de expor de outra forma. Ao ‘proteger’ paredes, chão, vaso sanitário, lixo, porta-papel, enfim, tudo que está à volta do sujeito, a um só tempo confinado - porque ocupa um espaço restrito – e livre – porque fora do alcance do olhar do outro - a instalação se estabelece como uma metáfora de tudo aquilo que se situa no limiar da revelação. O material escolhido - o papel filme - é translúcido, mas quando utilizado causa um efeito de leve distorção da imagem, exigindo um segundo olhar para que o espectador se certifique de que realmente pode confiar nos seus olhos. E, neste sentido, evoca a névoa que envolve todos os temas-tabu, como a repressão, a castração, a opressão, a discriminação. Sob uma aparente proteção, se escondem todos os desejos e frustrações que se referem ao âmbito sexual, toda a sujeira que tem de ser oculta em nome da moral e dos bons costumes.
[estudos em artes visuais]
Gil Sibin, “Protegido n.3 e 4”, 2011, papel filme sobre superfície, vaso sanitário, cesto de lixo e objetos de um banheiro.
[visual art studies]
Gil Sibin, “Protected n.3 and 4” 2011, plastic wrap on the surface, toilet, wastebasket and objects of a bathroom.
This work, which was to cover one of the men’s toilets at Unicamp - State University of Campinas central bay, chosen according to the inscriptions photographed for the development of this issue - was designed from the perception that the person writing on the bathroom door, protected by anonymity, breaks with what is conventionally accepted as “correct” and exposes his drives, expressing feelings or sensations that would not have dared to expose otherwise. In order to ‘protect’ walls, floors, toilet, trash, paper holder, everything that surrounds the subject, in one confined time - because it occupies a small space - and free - because beyond the reach of the other’s gaze - the installation is created as a metaphor for all that is at the threshold of revelation. The chosen material – plastic wrap - is translucent, but when used causes a slight distortion of the image effect, requiring a second look from the viewer to make sure that he really trust his eyes. And in this sense, it evokes the fog enveloping all taboos, such as repression, castration, oppression, discrimination. Under an apparent protection, it hides all the desires and frustrations that refer to the sexual sphere, all the dirt that has to be hidden in the name of morals and good values. 85
Por outro lado, a textura ‘grudenta’, que ao mesmo tempo permite o toque, mas causa uma sensação incômoda, traz o espectador para uma espécie de ‘armadilha’. O mesmo revestimento que isola e impermeabiliza os objetos, conferindo-lhes um brilho que de fato não têm, esconde e camufla a sujeira real. Ao tornar o cenário mais ‘limpo’ e brilhante, o papel filme convida ao toque, mas quem é atraído por este apelo, acaba ‘capturado’ por uma sensação de desconforto. Por um instante a pessoa se sente parte de algo que a envolveu, sem o seu consentimento. Atração e repulsa coabitam o mesmo espaço. O conceito de ‘empacotamento’ na arte remonta ao início do século XX, com “O Enigma de Isidore Ducasse” (1920), do pintor e fotógrafo americano Man Ray. A instalação consistia num objeto não identificado enrolado em uma manta e atado com corda, que depois de fotografado pelo autor foi intencionalmente desmantelado. Um dos célebres ícones do Surrealismo-Dadaísmo, ao lado de “Ready-mades”, de Marcel Duchamp, esta obra influenciou diversos artistas do pós-guerra, inclusive Christo e Jeanne-Claude, que iniciaram sua pesquisa em “Packages” (1958). Da manipulação de objetos tridimensionais desenvolveram, durante sua trajetória, os famosos ‘empacotamentos’, construindo tendas de tecido e registrando o desenvolvimento das idéias, bem como os processos de intervenção, nos quais utilizam lonas, cordas e cabos de aço, propondo a renovação do olhar e um novo entendimento de um determinado espaço físico. Na década de 70, o compositor e escultor americano Walter Joseph de Maria cobriu o espaço da sala de uma galeria com um metro de terra vegetal, limitando-a com uma folha de vidro. Tanto esta instalação, que recebeu o nome de “New York Earth Room” (1977), como a que se seguiu a esta, “The Broken Kilometer” (1979), falam de um todo que se pode tocar, mas que não pode ser visto por completo.
[estudos em artes visuais]
[visual art studies]
On the other hand, the ‘sticky’ texture allows the touch but it causes an uncomfortable feeling bringing the viewer into a kind of ‘trap’. The same coating that insulates and waterproofs the objects gives them a glow that they did not actually have, hiding the real dirt. By making the scene ‘cleaner’ and brighter, the plastic wrap invites to the touch, but who is attracted to this appeal is also ‘captured’ by a sense of discomfort. For a moment one feels part of something that involved oneself without the consent. Attraction and repulsion cohabit the same space. The concept of ‘packaging’ in art dates back to the early twentieth century with “The Enigma of Isidore Ducasse” (1920), by the American painter and photographer Man Ray. The installation consisted of an unidentified object wrapped in a blanket and tied with a rope that after photographed was intentionally dismantled by the author. One of the celebrated icons of Surrealism-dadaism, next to “Ready-mades” of Marcel Duchamp, this work influenced many artists of the postwar period, including Christo and Jeanne-Claude, who began their research on “Packages” (1958). Manipulation of three-dimensional objects developed during its course, the famous ‘packaging’, building fabric tents and recording the development of ideas and the intervention processes, which use tarps, ropes and steel cables, proposing the renewal of the look and a new understanding of a given physical space. In the 70s, the composer and American sculptor Walter Joseph de Maria covered a gallery room space with one meter of vegetal soil, limiting it with a sheet of glass. Both this facility which was named “New York Earth Room” (1977) and the next after this, “The Broken Kilometer” (1979), speak of all that can be touched, but can not be seen completely.
Gil Sibin Photographer, collector and post-graduate in Visual Arts, Multimedia and Education by the Art Institute of Unicamp State University of Campinas gilsibin@globalcultural.com.br 87
KARIME NAVARRO
Resto
que nos pertence
Our Remains
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Karime Navarro
Os restos também retraram a nossa existência e nos pertecem. Muitas vezes nos explicam e denunciam. Transformam-se, viram poesia, música, alimento, grito.
São fim, mas podem ser também começo. O começo que lhe pertencer.
The remains say much about us. Sometimes they can explain our personality, denounce our behavior.
Resto que nos pertence / Our remains
São de tanta coisa... de ilusão, de inocência, de sentimentos. Restos de amores.
Sometimes they turn into poetry, music, food, scream. They are so much… remains of innocence, feelings, hopes, stories. Remains of love… They are the end, but may also be the beginning. The beginning that belongs only to you.
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Karime Navarro
Photos Joรฃo Paulo Lemos/Victor Imesi/Gustavo Rodrigues/Luciano Pedrilio/Wagner Silva/Alexandre Kocian
Experimentos do Grupo Imagens de Poรงos / Experiments of Poรงos Images Group Poรงos de Caldas/Minas Gerais, Brazil
O BAIRRO EM ARTE / Art neighborhood
Mail box Joรฃo Paulo Lemos, 2016.
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O bairro em arte / The neighborhood in art
Imagens de Poรงos
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O bairro em arte / The neighborhood in art
Imagens de Poรงos
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O bairro em arte / The neighborhood in art
Imagens de Poรงos
Gustavo Rodrigues
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O bairro em arte / The neighborhood in art
Imagens de Poรงos
Alexandre Kocian
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O bairro em arte / The neighborhood in art
Imagens de Poรงos
Alexandre Kocian
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O bairro em arte / The neighborhood in art
Imagens de Poรงos
Wagner Sidney Silva
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Imagens de Poรงos
Influxo
inFluxo@openmailbox.org