ANO 2 - Nº 05
Abril/ 2005
Jornal Laboratório do Curso de Jornalismo da Universidade de Fortaleza
Entrevista: Coordenador do Fórum Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil propõe mobilização da sociedade (página 3)
Enquanto algumas crianças brincam num domingo na praia, outras trabalham para se sustentar (páginas 4 e 5)
Sob o manto da caridade, famílias exploram o trabalho doméstico infanto-junvenil (páginas 6 e 7)
Peça de teatro “Você viu a Rosinha?” discute o trabalho doméstico infantojuvenil (página 8)
Projeto Somar é opção de trabalho para adolescentes amparado por lei (página 9)
Meninas e meninos se sustentam com a exploração de seus corpos. (páginas 10 e 11)
ONGs e políticas públicas tentam reverter quadro com ações assistencialistas (página 12)
Trabalho infanto-juvenil Cerca de 200 mil crianças trabalham no Ceará, quando deveriam estar na escola. Entre as atividades destacam-se o trabalho doméstico, a atividade de ambulante e exploração sexual.
Editorial
Trabalho infanto-juvenil é Trabalho infantil em Fortaleza caridade ou exploração? Trabalho infantil é ilegal. Mas cerca de 200 mil crianças e adolescentes vivem em situação de trabalho no Ceará, quase sempre por necessidade, submetidos a condições de risco para a saúde e perdendo a oportunidade de brincar e viver a infância. É a infância perdida, muitas vezes trocada por míseros R$ 200, no caso de meninas ou meninos explorados sexualmente, uma das formas mais infames de trabalho infanto-juvenil. Por seu lado, as políticas públicas desenvolvidas nas diversas instâncias governamentais esbarram na falta de recursos, são ineficientes diante da amplitude do problema, obrigando o cidadão, consciente ou inconscientemente, a conviver com essa ilegalidade, já quase considerada banal. O “Relatório 2002/2003 - Infância na mídia: a criança e o adolescente no olhar da mídia brasileira”, publicado pela Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi) e pelo Instituto Airton Senna, duas das mais respeitadas instituições do terceiro setor na defesa dos direitos das crianças e adolescentes, revela que a temática, principalmente o trabalho doméstico, é um dos problemas menos recorrentes na mídia brasileira. Neste aspecto, consiste a relevância desta edição, ao abordar assunto de grande importância para a sociedade, ela própria que gera e alimenta o problema. Em sua quinta edição, o Sobpressão mantém a preocupação editorial de discutir os problemas de Fortaleza. Suprindo lacuna constatada na grande mídia, procura enfocar o assunto do trabalho infantojuvenil na realidade da cidade, questionando o que tem sido feito para erradicá-lo e as conseqüências trazidas às crianças. O leitor, nas páginas seguintes, conhecerá alguns casos de crianças que estão perdendo a infância para garantir a sobrevivência. Um passeio na praia, à noite ou pela manhã, denuncia claramente a reali-
dade com a qual somos obrigados a conviver. Se ainda há choques quando casos de exploração sexual infantil, tão comuns na Praia de Iracema, são narrados; por outro lado, pela manhã, compra-se tranqüilamente, sem peso na consciência, o queijo assado que a criança vende. No senso comum, prevalece a idéia de que é melhor a criança trabalhar, em vez de estar na rua, onde elas encontram caminho fácil para o mundo do crime e da marginalidade. Comumente escuta-se a frase conformista e conservadora de que “é melhor a criança trabalhar do que roubar e matar”. Na lógica desse raciocínio, o trabalho infanto-juvenil - principalmente nos casos do trabalho doméstico - aparece como caridade feita por famílias aos jovens condenados a esta situação. Pouco se resolve ao pensar desta forma, como também não há nenhuma opinião contrária de que comprar algo vendido pela criança, ou tornála empregada é apenas uma forma de mascarar o problema. A questão parece sem solução. Inúmeros projetos, do Estado e do terceiro setor, admitem a ineficiência. Trabalhos pontuais, apesar de importantes, não conseguem reverter o quadro, pois trata-se de problema social bem mais profundo, que macula as relações humanas. Em essência, prevalece a lógica de um sistema desigual em que há exploradores e explorados. Nesta edição, o leitor encontra um pequeno recorte do universo do trabalho infanto-juvenil. Os casos de Rosa, Joana e Miguel – as reportagens aqui apresentadas preservam as identidades das crianças retratadas - simbolizam milhares de crianças na mesma situação. Espera-se, portanto, ter contribuído para o debate de assunto tão pouco discutido na mídia brasileira. Que cada um procure ver a Rosinha que está próxima de você.
“Quando a criança trabalha um período e no outro tem o direito de estudar, não é exploração, é uma ajuda. Assim ela vai ter condições de estudar e se sustentar. Quando ela trabalha o dia todo e não estuda, aí sim é exploração.” Eveline Almeida, estudante de enfermagem
“É melhor a criança tá numa casa trabalhando, pra ganhar o dinheiro dela ou pra ajudar em casa, do que tá no meio da rua fazendo o que não presta, roubando, se prostituindo e usando drogas.” Neurice Diniz, vendedora
“Eu acho que é exploração, a criança deve estudar. E se quer ajudar, tem que ajudar de outro modo, não dando trabalho.” Luis Pires, professor
“Na maioria dos casos não é exploração quando se respeita os direitos trabalhistas da criança. Muitas vezes, dependendo do tratamento a criança se torna parte da família.” Kélvia Alves, estudante de jornalismo
“As crianças acham que estão ajudando na renda de casa, nesse caso seria exploração dos pais para com os filhos. Mas tem que ver que a situação tá preta.” Paulo Montenegro, estudante de publicidade
“Eu acredito que o trabalho infantil seja exploração, porque a criança não pode fazer um trabalho que corresponde a de um adulto. As crianças têm que estudar e brincar. E quem tem uma criança ou adolescente como doméstica em casa não tá fazendo caridade, tá se aproveitando.” Solange Teles, professora
Expediente Jornal Laboratório do Curso de Jornalismo da Universidade de Fortaleza (Unifor) - Disciplina: Projeto Experimental em Jornalismo Impresso - Fundação Edson Queiroz - Universidade de Fortaleza (Unifor) - Centro de Ciências Humanas - Diretor do Centro de Ciências Humanas: José Batista de Lima - Coordenadora do Curso de Jornalismo: Erotilde Honório - Reportagem e Edição: Ana Karine, Paula Neves, Izakeline de Paiva, Juliana Rolim, Tiago Coutinho - Fotógrafos: Ana Karine, Paula Neves, Juliana Rolim, Tiago Coutinho, João Henrique e Arquivo do Diário do Nordeste - Projeto Gráfico: Eduardo Freire - Diagramação: Aldeci Tomaz - Professores orientadores: Nilton Melo Almeida e Aderson Sampaio- Conselho Editorial: Geísa Matos, Jocélio Leal, Nilton Melo Almeida e Paulo Ernesto Serpa - Impressão: Gráfica Unifor - Tiragem: 1000 exemplares - Revisão: Cláudia Matos - Colaborou nesta edição: Silvia Maria Alves.
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Trabalho infanto-juvenil afeta 199 mil crianças e adolescentes
Paula Neves
Sobpressão: Qual a situação do trabalho infanto-juvenil em Fortaleza hoje? Raimundo Coelho: A gente não tem uma pesquisa específica de Fortaleza mas, na última Pesquisa Nacional por Amostragem e Domicílio (PNAD), publicada em 2004 com dados de 2003, os números indicam 199 mil crianças e adolescentes de 5 a 15 anos em situação de trabalho no Ceará. Sobpressão: Quais as principais atividades que essas crianças e adolescentes praticam? Coelho: Hoje, nos grandes centros, temos principalmente o trabalho doméstico e o trabalho na rua, os ambulantes. Além disso, existem aqueles que estão vivendo da coleta do lixo, catando sucatas, os flanelinhas, gazeteiros e engraxates. Sobpressão: Quais as atividades mais prejudiciais ao desenvolvimento das crianças e dos adolescentes que trabalham? Coelho: O trabalho doméstico é gravíssimo, já que a criança sai do seu convívio familiar e comunitário. Sabemos que aí pode entrar a questão da exploração sexual, ou mesmo o trabalho nos três turnos. A criança nessa situação, mesmo quando vai à escola, acaba sem condições de aprendizado. Sem falar na dificuldade de fiscalização que a Delegacia Regional do Trabalho enfrenta, dada a questão da inviolabilidade do lar. O trabalho nas ruas, por sua vez, é insalubre, prejudicial, sujeito a acidentes, a exploração, ao abuso dos adultos e é um passo para as drogas, para a moradia na rua. Além desses, o trabalho em carvoarias, na coleta do lixo, nas indústrias de sal, nas pedreiras, na coleta de castanha de caju são bastante prejudiciais.
Sobpressão: Em relação a outras capitais, como o sr. avalia a situação de Fortaleza quanto ao atendimento? Coelho: Em relação a outras capitais, Fortaleza ainda tem um número pequeno de atendimentos. Isso se deu porque quando o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) foi lançado no País alguns estados se adiantaram, enquanto a gente foi um pouco lento em encaminhar propostas. No ano passado, houve ampliação do PETI, que é o principal programa nacional. Nessa abertura de vagas, o Ceará foi o primeiro a receber o maior número de ampliações, em torno de 7.500, o que fez com que avançássemos para 20 mil crianças atendidas. Isso aconteceu porque o Ceará era, nos índices do Ministério da Assistência Social e do Combate à Fome, o que menos tinha crianças e adolescentes assistidos pelo programa. Sobpressão: Como surgiu a idéia do Fórum Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil? Coelho: O Fórum Estadual é um espaço de articulação política, de forças, mobilização, de sensibilização da sociedade em relação ao trabalho infanto-juvenil, mostrando os danos e tentando evitar o paralelismo, competições e duplicidade de ações. É uma rede. Em 2004, por exemplo, foram realizadas as caravanas nacionais, pensadas no sentido de trazer pro espaço político a questão. Todos os estados participaram e houve audiência com governadores, que se comprometeram a desenvolver programas de erradicação. As caravanas terminaram em dezembro, em Brasília, com um compromisso assinado pelo presidente Lula. Sobpressão: Em 2005, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) comemora 15 anos de existência. Que resultados o sr. aponta do trabalho desenvolvido até hoje?
Foto: Paula Neves
Cerca de 199 mil crianças e adolescentes trabalham irregularmente no Ceará. Embora a lei proíba qualquer tipo de atividade a menores de 14 anos, essa é uma realidade que ainda faz parte do nosso dia-a-dia, seja mascarada na caridade que culturalmente se acredita estar fazendo com o trabalho doméstico infanto-juvenil, seja ao fechar os olhos para as milhares de crianças e adolescentes que exercem algum tipo de atividade nas ruas dos grandes centros urbanos. Raimundo Coelho de Almeida Filho, integrante do Fórum Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil e coordenador da ONG Curumins, que desenvolve trabalho de abordagem de rua e assistência social, acredita que somente por meio da construção de uma rede de mobilização política e da sensibilização da sociedade será possível mudar os paradigmas atuais de desrespeito aos direitos das crianças e adolescentes.
Coelho: sensibilização da sociedade surge por meio de uma rede de mobilização política Coelho: Apesar da gente não ter conseguido ainda implementar tudo o que diz o Estatuto, ele permitiu grandes avanços. Conseguimos dar uma virada na concepção da política da criança com a doutrina da proteção integral, segundo a qual a criança é um sujeito de direito e não um ser menor, como estava antes no código. Porém, há muito o que avançar. Muita coisa precisa ser implementada, até para combater a visão de que o Estatuto serve apenas para proteger infratores. Vemos que existe hoje uma macro-estrutura perversa, mas apostamos no ECA para garantir a proteção integral desse povo, que precisa, nessa fase especial, ser atendido nas suas necessidades, ter investimento na formação, no desenvolvimento para que possa responder de forma mais instrumentalizada aos desafios. Sobpressão: Como o sr. analisa o discurso do senso comum de que muitas vezes é melhor a criança ou o adolescente estar trabalhando do que ficar na rua? Coelho: É uma visão que nós temos discutido no Fórum. Ela prega que o trabalho dignifica, forma. Mas, o que a gente tem que fazer é uma distinção. Uma coisa é você orientar uma criança para ter responsabilidade de alguns afazeres, o que é salutar. Agora, haver cobrança de trabalho na fase em que elas deveriam estar sen-
do formadas, é atropelar o seu desenvolvimento. E mesmo no trabalho adolescente regulamentado a ênfase que deve ser dada é educativa. Como diz o professor do Centro de Saúde da UECE, Jackson Sampaio, o mito de que o trabalho é digno soa falso. Para ele, se o trabalho não é digno, ele não pode dignificar. Dizer que o trabalho de uma criança que cata lixo, por exemplo, é digno, é algo enganoso, incorreto. Sobpressão: Na Associação Curumins vocês tentam melhorar a auto-estima das crianças e adolescentes. Como isso pode ajudar na construção de uma nova realidade para eles? Coelho: O processo de fortalecimento da autoestima está na base. Aestima da criança que se vê na obrigação de trabalhar está muito ruim. Então, quando ela chega à Curumins, ela começa a desenvolver atividades esportivas, culturais e sociais e começa a se sentir importante, a se sentir criança. Porque é isso que está sendo roubado dela. É preciso fortalecer esse gostar de si. Ela precisa enxergar que não sabe apenas vender, fazer trabalhos domésticos, ser instrumento de abuso sexual, mas é capaz de fazer arte, de tocar, de dançar, de representar. E isso significa auto-estima, isso engrandece, traz alegria para a criança e um alento para que se fortaleça a estrutura da personalidade da criança ou do adolescente.
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Queijo assado, camarão, brincos, tatuagens de hena, radinhos de pilha, ovos de codorna são opções garantidas para os banhistas da Praia de Futuro. O problema é que esses produtos são frutos de uma atividade ilegal: o trabalho infatil Tiago Coutinho
A Praia do Futuro ainda se encontra esvaziada, o sol não se manifesta tão forte, e o garoto Gabriel de oito anos brinca distraidamente com seus brinquedos. É domingo. Gabriel chegou à praia, juntamente com sua mãe e seus tios, por volta das nove. Deverá ficar por lá até uma da tarde, quando retornará ao lar, tomará banho, almoçará, jogará um pouco no seu videogame playstation e, mais tarde, se ainda tiver força, irá ao cinema com sua mãe. Ao longo da semana, Gabriel vai pela manhã à escola, o Instituto Infantil Tia Neuma, onde cursa a 2ª série; à tarde, assiste, na televisão, aos seus desenhos favoritos, Tom e Jerry e Pernalonga; brinca com o seu vizinho e gosta de sair com a avó para passear. Na praia, ele parece bastante entretido com seus bonecos do Homem-Aranha e Robin. Aos poucos, o sol vai ficando mais forte, a praia começa a ficar lotada. Enquanto Gabriel brinca, mãozinhas pequenas e bronzeadas oferecem aos banhistas óculos escuros, cangas, brincos, queijo assado, camarão, bronzeador, sanduíche natural, radinhos de pilhas, dentre outras mercadorias. As mãos são de crianças, que ao contrário de Gabriel, não seguram brinquedos, e sim a fonte de sustento delas e da família. Assim como Gabriel, elas também acordaram cedo para estarem ali, mas os objetivos são distintos. Gabriel fora brincar, elas foram trabalhar.
Não são poucas. Rute (nome fictício), de apenas nove anos, juntamente com seu tio, caminha, há dois anos, pelas barracas, nos passos vagarosos e com a mochila pesada nas costas, oferecendo ovos de codorna, protetor solar e bronzeadores. “Quando eu ganho muito dinheiro, eu gosto de vir; mas normalmente eu ganho pouco”, explica. Rafael (nome fictício), há cinco anos vai à praia nos finais de semana. Em vez de brincar na areia, tenta garantir seu sustento vendendo brinquedos, bóias, bolas de futebol, algodão doce, bonecos, possibilitando a outras crianças o divertimento a ele impedido. Ele não acha tão ruim, afinal, seu faturamento é de aproximadamente R$ 30 por dia trabalhado. Seria impossível contar a história de todos. Miguel (nome fictício) tem treze anos e diz estar trabalhando na praia há pouco tempo. Começou nas férias de janeiro, quando ia todos os dias. No entanto, quando as aulas começarem, ele trabalhará apenas nos finais de semana. Está na oitava série e quer cursar Direito. Durante a semana, Miguel vai à escola de manhã, à tarde freqüenta o reforço escolar e, à noite, brinca com seus amigos na rua. Trabalhando na praia, Miguel ganha por dia, em média, R$ 20, na venda de cangas. Sua mãe guarda metade do dinheiro, e a outra metade ele gasta. “Eu prefiro evitar que minha mãe tenha gastos. Aí eu pago as coisas que eu preciso”, explica.
Rute trabalha na praia desde os sete anos de idade e ganha em média R$ 5,00 por dia
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Crianças brincam e trabalham, na praia, lado a lado, sem causar grandes estranhamentos aos Ele é um menino corajoso. Não usa protetor solar, nem outra forma de se proteger do sol. “Mas eu não fico direto no sol. Vou pra sombra, fico lá um pedacinho. Eu bebo muita água e também tomo banho de mar. Não tenho problemas de saúde, me alimento muito bem”, completa. Por um momento, ele pára a entrevista para tomar vitamina de banana. A casa de Miguel fica no Cristo Redentor, onde mora com os pais que não vão com ele à praia. O pai dele é mecânico e ganha, aproximadamente, R$ 450 por mês. A mãe trabalha numa fábrica e recebe salário mínimo. “Eu não preciso trabalhar, faço isso pra ajudar em casa”, ressalta. Miguel sabe da proibição de trabalho infantil, porém continua a vender suas cangas. “Eu sei que é errado, mas não era pra ser. Me diz, o que estou fazendo de errado?”, questiona. A opinião do garoto facilmente é apoiada por outros. Na praia mesmo, encontramse rapidamente cidadãos defendendo o traba-
lho infantil. “Se é de as crianças estarem sendo criadas nas ruas, sem os pais, é melhor eles estarem trabalhando. É triste ver crianças vendendo as coisas, o pior é você vê-las pedindo”, opina Helena Pompílio, dona de casa. Naquele domingo, ela fora passear na praia com a netinha de apenas um ano. Já para o banhista Rafael Viana, professor de Geografia, o fato de você estar comprando só faz aumentar o problema. “Não costumo comprar, nem dar dinheiro. Criança é para brincar, trabalhando ela perde a infância”, ressalta. Trabalho infantil é ilegal. Existem inúmeras entidades tentando resolver o problema. A Secretaria de Ação Social do Estado, atualmente, desenvolve o Projeto de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti). Em Fortaleza, a Fundação Criança da Cidade (Funci) é a instância responsável pelo projeto. O Peti desenvolve trabalho específico com crianças trabalhadoras de praia. O projeto funciona em parceria com as ONG’s próximas às regiões litorâneas. Hoje, o Peti atende, em Fortaleza, cerca de 400 crianças, em
O ônus do ofício
Fotos: Tiago Coutinho
Problemas físicos e psicológicos para as crianças Os perigos para as crianças expostas ao sol principalmente entre os horários de dez da manhã e três da tarde são enormes. Mesmo se elas utilizassem protetor solar, segundo a dermatologista Andréa Pinheiro, haveria malefícios provocados pelo excessivo contato com o sol. “Essas crianças têm pretensão a serem vítimas de câncer de pele precocemente, além do risco das doenças pré-cancerosas”, complementa. Como elas não usam protetor, a pele, por si só, se utiliza de mecanismos de defesas para se proteger, provocando o escurecimento e o engrossamento da pele. “As crianças têm a pele muito escura, mas não é aquela a sua cor natural e sim a reação da melanina. No entanto, depois de algum tempo, devido ao contato recorrente, a melanina contiua agindo, mas os danos à saúde tornam-se inevitáveis”. Além dos problemas fisiológicos, o trabalho infantil, segundo a psicóloga e coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Criança (Nucepec), Andréa Cordeiro, deixa as crianças sujeitas a restrições em função das atividades exercidas, provocando prejuízos emocionais.
A praia traz, porém, uma especificidade por ser um espaço lúdico, onde as crianças trabalhadoras se deparam com outras que brincam. “Esse contraste coloca as crianças que trabalham frente a frente com a injustiça social, podendo criar as mais diferentes reações, emoções e conflitos”, complementa Andréa. A psicóloga também acrescenta a possibilidade de quanto menor a idade da criança, mais ela sensibilizará os banhistas, daí porque se encontram crianças cada vez mais novas exercendo este tipo de atividade. Da mãe de Gabriel ao repórter, o problema do trabalho infantil incomoda a muitos, principalmente quando não se vê avanços ou perspectivas melhores para aquelas crianças. O sol esquenta, a pele começa a arder. Gabriel fora para casa no horário previsto. Rute, Rafael e Miguel ficaram mais tempo. O apurado dos três juntos deve ter sido inferior a uma única conta, dentre aquelas inúmeras mesas que já convivem pacificamente com as mãozinhas pequenas e escuras oferecendo doces, queijos, óculos, cangas e brinquedos.
banhistas, que convivem com o fato e, algumas vezes, até apóiam parceria com a Associação Curumins; Projeto Titanzinho e Projeto Vicente Pinzón. Para a coordenadora do Peti em Fortaleza, Francisca Aparecida, o atendimento de crianças assistidas pelos projetos é insuficiente. O projeto ainda não tem número aproximado de quantas crianças trabalham na praia. O levantamento está sendo feito. O grande problema, segundo Aparecida, está no fato de os jovens participarem do projeto e, mesmo assim, continuarem indo ao litoral vender seus produtos. Em vez de buscar combater o trabalho infantil, o projeto objetiva dar acompanhamento às famílias e desen-
volver a conscientização. Mas Aparecida ressalva que a necessidade de melhoria da renda da casa fala mais alto do que qualquer trabalho de conscientização feito com as famílias. Alguns banhistas sugerem a regulamentação do trabalho infantil na praia. A coordenadora rebate ser inviável. Primeiro pelo fato de ser ilegal trabalho de jovens com menos de catorze anos. Segundo, mesmo tendo a idade necessária, para se regualemtar o trabalho, deve-se seguir uma série de exigências. Entre elas, a inexistência de riscos para a saúde da criança. Nesse ponto, a praia está longe de ser ambiente de trabalho saudável .
Vida irônica e contraditória. Rute e seu tio Alberto(nome fictício)vendem protetor solar, mas nenhum dos dois têm condições de usá-lo para se protegerem. Eles trabalham nos horários mais prejudiciais e estão sujeitos a serem vítimas do câncer de pele. Gabriel brinca e aproveita o domingo
Rafael vende brinquedos há cinco anos
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Caridade mascara o trabalho doméstico infanto-juvenil O trabalho doméstico é uma das formas de trabalho infanto-juvenil mais difíceis de ser detectado. As atividades domésticas realizadas por crianças e adolescentes se confundem com a simples ajuda no cuidado da casa e da família Izakeline de Paiva Ribeiro
Foto: João Henrique Lopes
Família grande, pai alcoólatra e violento, mãe e seis filhos. Em um ano muita coisa muda. Depois de muitas discussões a mãe abandona os filhos com marido e não diz aonde vai. Joana ( nome fictício), a mais velha das irmãs, deixa de estudar para cuidar dos irmãos mais novos. A mãe com novo namorado, volta para pegar os filhos e começa a trabalhar como caseira de sítio. Devido à relação ruim com o padrasto, é convidada para “ajudar” na casa de uma das filhas da patroa de sua mãe. Com 14 anos, Joana já está na sua segunda experiência de trabalho. Trabalho? Sim. Trabalho doméstico infanto-juvenil. A primeira experiência aconteceu na sua própria casa quando parou de estudar para cuidar dos irmãos menores. Na segunda experiência, foi morar com dona Maria (nome fictício), matriculou-se em uma escola perto da residência e estuda pela manhã. Hoje, com 15 anos, Joana tem rotina diária de trabalho. Joana acorda cedo. Lava a louça do dia anterior, faz o café, varre e passa o pano no chão. Depois, toma o café da manhã para ir ao colégio. Às 10 horas, está de volta, ajuda a fazer o almoço, arruma os quartos, a cozinha, pára um pouco e almoça junto com a família. Em seguida, Joana lava as louças e até tem vontade de dormir um pouco. “ Mas não posso dormir porque tenho que estudar”, diz. Às 15 horas, Joana faz o café e vai comprar pão para o lanche da tarde. Quer assistir às novelas, porém dona Maria alerta que ela pode ficar viciada. À noite, brinca com a filha mais nova de dona Maria, de cinco anos, para não atrapalhar os estudos da filha mais velha, de 15 anos, a mesma idade de Joana. A filha de dona Maria está no 2 o ano do ensino médio, tem boas notas, estuda em escola particular e quer fazer vestibular para Medicina. Joana, repetindo a 5 a série do ensino fundamental em uma escola pública, não tem boas notas. Gostaria de ser
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professora. Dona Maria tenta incentivá-la a estudar mais, “se ela tivesse boas notas eu colocaria numa escola particular, mas lhe falta interessa”, comenta. “Não a tenho como empregada, ela me ajuda, não passa, nem lava, não tem obrigações, sempre anda junto com a família, dorme no mesmo quarto que as minhas filhas”, diz dona Maria, que decidiu dar mesada de R$ 30,00 para a filha e promete dar o mesmo valor para Joana, já que não é considerada empregada, não recebe salário. De acordo com dona Maria, Joana ainda é muito menina, gosta de brincar. “Ela não teve infância”, lamenta. Embora seja considerada da família, Joana algumas vezes pensa o contrário. “Às vezes eu acho que não sou da família quando um chega e pede uma coisa, vem outra pessoa e pede outra, mais um pede outra coisa, e sou só uma, não posso fazer tudo ao mesmo tempo, fico muito triste”, reclama Joana. O trabalho infanto-juvenil doméstico teve origem quando as filhas dos escravos eram levadas ainda crianças para servirem como empregadas nas casas dos senhores. Com a abolição da escravatura e o passar do
Todos os dias Joana acorda cedo. Lava a louça que ficou do dia anterior, faz o café, varre e passa o pano no chão.
tempo, o costume foi tomando nova forma, a caridade. A cultura de trazer crianças do interior para a cidade, ou mesmo filhas de vizinhos para trabalhar em residências como empregadas é maquiada pelo “gesto nobre” da caridade. Em geral, são crianças de origem pobre que encontram no trabalho doméstico a única solução para a sobrevivência, em troca de teto, alimentação e vestuário. Daí surge a idéia de caridade enraizada na sociedade fortalezense, mascarando a realidade da exploração do trabalho doméstico infanto-juvenil.
Foto: João Henrique Lopes
Privacidade do lar esconde o problema
Foto: João Henrique Lopes
Joana compõe as estatísticas da pesquisa Trabalho doméstico infanto-juvenil em Fortaleza . De acordo com a coordenadora do estudo, a economista doméstica Célia Chaves Gurgel do Amaral, a maior parte das crianças que participou da pesquisa não reconhece que está exercendo trabalho doméstico. Por outro outro lado, o levantamento também aponta reduzido número de meninas trabalhadoras domésticas fora do seu meio familiar. Nesse aspecto, explica a coordenadora, reside a maior dificuldade em identificar o trabalho doméstico, pois há “um descompasso conceitual entre o trabalho doméstico enquanto exploração da mão-deobra por outrem e aquele exercido no próprio espaço da família”, observa. Quando as meninas moram com suas famílias, mas cuidam de crianças ou realizam atividades domésticas em casas de vizinhos não há a percepção do trabalho doméstico. Mais de 12 mil crianças são trabalhadores domésticos em Fortaleza, estimativa subestimada porque, segundo Amaral, a privacidade do espaço doméstico impede maior visibilidade do problema. Embora os dados apresentem incidência de meninos envolvidos com o trabalho doméstico, a maior parte dos traba-
Amaral: “Descompasso conceitual”
lhadores domésticos em Fortaleza é formada por meninas, cerca de 2.315, na faixa etária de 10 a 14 anos. Os números são maiores na faixa etária de 15 a 17 anos, 8.622 meninas trabalham em residências. No caso dos meninos na faixa etária de 10 a 17 anos, há um total de 1.895. Os números da pesquisa tiveram como base a Pesquisa Nacional de Amostras de Domicílio (PNAD) de 2001 sobre o trabalho infanto-juvenil. Parceria da Associação Brasileira de Economistas Domésticos com os programas de extensão da Universidade Federal do Ceará - Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Gênero, Idade e Família , Núcleo Cearense de Pesquisas sobre a Criança (Nucepec) e Centro de Assessoria Jurídica , a pesquisa realizou-se entre julho de 2002 e julho de 2004 e tem como ponto de partida os dados do Unicef e da Pesquisa Nacional de Amostras de Domicílio (PNAD) de 2001 sobre o trabalho infanto-juvenil. Na investigação de campo, desenvolvida em seis escolas públicas de Fortaleza, uma em cada regional, as crianças e adolescentes feram abordados por meio de um questionário sobre a vida familiar e cotidiana. Com o encerramento da pesquisa, afirma a coordenadora, o mais importante são as ações desenvolvidas após os resultados. O mesmo grupo que realizou a pesquisa, por exemplo, também apresenta a peça teatral Você viu a Rosinha?, escrita por Amaral e interpretada pelos participantes do grupo ( Leia na página 8). O Artigo 60 do Estatuto da Criança do Adolescente (ECA) proibe qualquer trabalho a menores de 16 anos de idade, salvo na condição de aprendizes, a partir dos 14. Para o trabalho doméstico não existe a condição de aprendiz. Mesmo sendo uma profissão regulamentada, as atividades domésticas ferem os direitos da criança no que diz respeito às condições de trabalho. Como aprendiz o adolescente não pode exercer atividades perigosas, insalubres ou penosas (Art. 67). Entre atividades do trabalho doméstico incluem-se cozinhar (perigo ao lidar com fogo) , lavar banheiros (insalubre e perigo ao lidar com produtos químicos). Segundo Andréa Cordeiro, psicóloga e coordenadora do Nucepec, o tra-
Trabalhadores domésticos de 10 a 17 anos em Fortaleza segundo o sexo.
Fonte: Relatório de Pesquisa Trabalho Doméstico infanto-juvenil em Fortaleza com base na PNAD2001
Joana (nome fictício) em uma de suas atividades cotidianas balhador doméstico infanto-juvenil é privado do carinho e afeto familiar, mesmo que a criança ou adolescente seja considerado da família não terá os mesmos direitos que os filhos dos “patrões” têm. Mesmo quando Joana fica triste na casa de dona Maria, tem raiva ou pensa em ir embora, não quer voltar para a casa
do pai, a mãe abandonou novamente os irmãos menores, que estão em diferentes casas, e ninguém sabe onde ela está. Joana vê apenas uma opção :“Eu ia procurar outra casa de família para morar, depois a raiva passa e então eu paro de pensar nisso”, conforma-se. E assim a vida de Joana continua todos os dias na mesma rotina.
Políticas públicas não atendem a demanda social Para a conselheira tutelar da Regional IV, Cleuza Banhos, o trabalho doméstico é uma das opções de várias famílias com o objetivo de livrar as crianças da miséria e da pobreza, incluindo a possibilidade de exploração. Segundo ela, as políticas públicas são incapazes de suprir a demanda social, que cresce cada vez mais, não há escolas suficientes e empregos para que os pais possam suprir as necessidades da família, e sem trabalho falta renda, deixando famílias inteiras na miséria. Na região Nordeste, o problema se intesifica nos períodos de seca. A conselheira supõe que a pobreza gera a necessidade de mais mão-de-obra para tentar suprir as necessidades básicas da família. “Muitas vezes os próprios pais obrigam as crianças e os adolescentes a deixarem a escola para que possam trabalhar e desde cedo ajudar no sustento da família, ainda há os pais que abandonam os filhos e estes precisam procurar trabalho para sobreviver ”, acrescenta Cleuza Banhos.
A Regional IV, situada no bairro Itapery, recebeu apenas uma denúncia de trabalho doméstico infanto-juvenil nos últimos seis meses. O Conselho Tutelar não tem poder de polícia e, nos casos de trabalho doméstico, o conselheiro só age a partir de uma denúncia a ser investigada. Quando for confirmada, são tomadas providências, os pais são procurados, e devem assinar autorização visando retirar a criança da residência onde trabalha, encaminhá-la para uma escola, se ela não estiver estudando, e cadastrar a família nos programas oferecidos pelo governo, como bolsa-escola, por exemplo. Cleuza Banhos afirma que a realidade é que muitas famílias têm acesso aos programas, mas continuam explorando o trabalho dos próprios filhos, pois o dinheiro oferecido pelos programas é insatisfatório. Para Cleuza Banhos, além da necessidade de políticas públicas eficazes no combate ao trabalho infantojuvenil, a base do problema está na educação, e como base deve ser o ponto mais trabalhado nas políticas públicas.
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Você viu a Rosinha? Este é o título da peça que alunos de psicologia, economia doméstica e direito da Universidade Federal do Ceará criaram para despertar a questão do trabalho infantil e debater sobre os direitos da criança e do adolescente. Fotos: arquivo CIUMS
Juliana Rolim
A peça é o produto da pesquisa sobre o trabalho infanto-juvenil no ambiente doméstico, realizado por uma parceria dos projetos de extensão com o Negif, Caju e Nucepec (leia a página 7). O resultado do levantamento constatou a falta de visibilidade e de reconhecimento que crianças e adolescentes são exploradas. “A exploração é encoberta pelo manto da caridade, a própria criança não consegue ser vista como a vítima dessa exploração”, afirma Célia Chaves Gurgel do Amaral, coordenadora do grupo de pesquisa e autora do texto da peça. No decorrer da pesquisa levantaram-se dados sobre auto-estima, direitos humanos, Estatuto da Criança e do Adolescente. A idéia do grupo consistiu numa intervenção que se voltasse para o foco principal da questão, não apenas a criança, mas todo o circuito que monta a prática de receber crianças para trabalhar em casas de famílias. A proposta da peça surgiu a partir da problemática de como atingir o público mais generalizado e de como desenvolver atividades de sensibilização que combatam a exploração do trabalho doméstico infanto-juvenil. Dessa forma, os alunos envolvidos no projeto optaram pela arte dramática, vez que o teatro proporciona a dramaticidade e a encenação ao vivo. Segundo Andréa Cordeiro, professora de psicologia e coordenadora do Nucepec, o objetivo é desconstruir a idéia do ato caridoso e mostrar que o trabalho infantil constitui ato de violação e exploração dos direitos fundamentais da criança e do adolescente.
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Crianças assistem à peça “Você viu a Rosinha?” O texto e os diálogos da peça basearam-se nos perfis dos depoimentos colhidos durante a pesquisa em Fortaleza. “A peça dá visibilidade, porque o que antes era natural, as pessoas tendem a se reconhecer ou como Rosinha ou como alguém que já recebeu uma Rosinha em casa. A platéia identifica as sensações apresenta-
das na peça e reconhece a situação de exploração”, diz Andréa Camurça, atriz da peça e estudante do grupo de pesquisa. “Você viu a Rosinha?” trata da menina que morava no interior com a mãe e a madrinha a convida para trabalhar na casa dela. A mãe perde o contato e fica em busca da filha. No decorrer da peça são apre-
Texto: Célia Chaves Gurgel do Amaral Direção: Betânia Montenegro Elenco: Rosana Ximenes, Andréa Camurça, Paulo André Teixeira, Rejane Vasconcelos e Ana Paula Lima. Realização: Pró-Reitoria de Extensão- PREX/CIUMS Negif – Caju – Nucepec
sentadas situações que mostram o cotidiano de Rosinha na casa da madrinha. Depois da encenação, o elenco promove um debate a partir da pergunta chave, se a platéia acha que a história de Rosinha é verdadeira ou fictícia. O objetivo é fazer com que as pessoas contem histórias semelhantes. Terminado o debate, o elenco disponibiliza os contatos dos órgãos responsáveis para denunciar a exploração do trabalho doméstico infanto-juvenil. E é por meio dos depoimentos ao longo do debate e dos contatos para futuras apresentações, que o grupo tem indicação do alcance que está atingindo. A proposta do grupo de levar a peça para o interior do Estado, onde se registra o maior índice de saída de crianças e adolescentes para ocupar a posição de trabalho doméstico em Fortaleza, não conseguiu financiamento. Mas por meio da parceria com a Fundação Demócrito Rocha e Associação das Primeiras Damas dos Municípios do Estado do Ceará, as crianças e os professores dos municípios virão até a capital cearense. “Nós iremos atingir os municípios com grande índice de evasão sem nos deslocarmos”, garante Cordeiro. O texto da peça também vai ser editado no formato de livro infantil. O livro será mais uma ferramenta visando formar sujeitos multiplicadores para atuar na erradicação do trabalho doméstico infanto-juvenil e no combate à exploração do trabalho de crianças e adolescentes.
Serviço: Contatos para apresentação 3288.7353 / 3288.7354 prexms@ufc.br
Lei obriga contratação de jovens-aprendizes O projeto Somar, desenvolvido pela Secretaria da Ação Social do Estado do Ceará, objetiva incluir jovens de 16 a 18 anos no mercado de trabalho. A lei, que obriga a contratação de jovens-aprendizes, garante os direitos trabalhistas e os horários de estudo, permitindo a adolescentes complementarem a renda familiar sem prejudicar seu desenvolvimento. Fotos: Ana Karine Zaranza
Ana Karine Zaranza
Thayana Barbosa tem 16 anos e há quatro meses deu o que considera um grande passo na vida. Uma colega lhe indicou o projeto Somar, iniciativa da Secretaria da Ação Social do Estado do Ceará (SAS), que insere adolescentes de 16 a 18 anos no mercado de trabalho. Ela queria ajudar em casa e conquistar a independência com que todo jovem sonha nessa idade. Thayana é um dos 3.680 jovens atendidos pelo Somar. O projeto é uma opção para os adolescentes que querem e precisam trabalhar. Segundo a coordenadora do Somar, Ana Bandeira, existem duas categorias: o estagiário e o jovem-aprendiz. O estagiário, segundo a lei federal 6.494/77, não tem carteira assinada, deve cursar o ensino médio ou profissionalizante. Recebe a bolsa de meio salário mínimo e vale transporte, trabalhando quatro horas diárias. Além disso, o jovem precisa obrigatoriamente participar de um dos cursos oferecidos pelo projeto e ter, no mínimo, 75% de presença na escola e no curso. Rosana Lopes, 16 anos, é estagiária atendida pelo projeto há quatro meses. A irmã dela já tinha participado e quando Rosana completou 16 anos foi à SAS. “Eu queria me ocupar e ajudar minha mãe em casa”, conta entre risos a menina. Rosana é aluna do curso de informática e estagia no Sesc desde janeiro. Com o salário de Rosana a renda familiar para manter cinco pessoas chega a R$ 600,00. A mãe da menina, dona Maria do Carmo Lopes, 45 anos, está muito feliz e confessa que o dinheiro veio em boa hora. “Para ela, não é fácil porque a gente mora muito longe, no Curió, às 5h10min ela está na parada e só chega às 22h30min, quando sai da aula. Mas damos graças a Deus”. A outra modalidade é do jovem-aprendiz. A lei 10.097/2000 garante aos adolescentes de 14 a 18 anos carteira assinada, 13° salário, salário mínimo hora e curso profissionalizante contando como hora trabalhada. Mas, no Somar, a faixa etária atendida é maior, de 16 a 18 anos. Ana Bandeira argumenta que com 14 anos, os adolescentes ainda são muito imaturos. Davi Mendes, 17 anos, trabalha na Fortalnet como jovem–aprendiz e ajuda a mãe, camareira, a manter a família de cinco pessoas. Só os dois têm renda fixa. Segundo dona Rita
Rosana e Davi participam do projeto SOMAR Mendes, 41 anos, o filho mudou para melhor. “Está parecendo um adulto, criando juízo. E o melhor é que ele está gostando. Comprou até um despertador para não perder a hora”. Antes ele ia para escola e quando chegava a casa ia brincar com os colegas de jogar bola. Agora, segundo a mãe, prefere estudar. As empresas que contratam jovensaprendizes também saem ganhando. Ao invés de 8% do FGTS, recolhem apenas 2%. O que muita gente não sabe é que por lei, as empresas, exceto as micro e optantes do imposto simples, são obrigados a empregar em seus quadros de 5% a 10% dos funcionários, que não são de nível superior e de diretoria, de jovens-aprendizes. A Secretaria tem parceria com 162 empresas privadas, que empregaram 680 aprendizes, e com 55 órgãos do Governo, com um número de 3.000 estagiários. Entre as empresas parceiras, incluem-se a Dona Benta, Casa Pio, Pão de Açúcar, Secretaria da Fazenda, Secretaria da Saúde e Ministério da Fazenda. Para que esse número aumente, é necessário que a Delegacia Regional do Trabalho amplie a fiscalização visando ao cumprimento da lei. Thayana, a adolescente que queria independência, hoje trabalha como estoquista nos Supermercados Pão de Açúcar, continua estudando e cursando Informática. Ela pode não ter conseguido realizar ainda sua meta, mas com seu primeiro salário já pagou uma
prestação de roupas para a mãe e comprou uma calça que tanto queria para ir à festa da escola. “Agora é estudar muito para me formar e ser psicóloga”, aposta. Serviço: Os jovens que querem participar do projeto devem procurar o Centro Comunitário ou o ABC mais próximo da sua casa a partir do dia 1° de maio. Os critérios para seleção são: faixa etária entre 16 a 18 anos incompletos, estar cursando o ensino médio e renda familiar de meio salário mínimo per capta.
Andi analisa espaços da mídia Dentre os problemas que afetam crianças e adolescentes, a exploração do trabalho infantil e o trabalho infantil doméstico são dois dos temas menos abordados pela mídia brasileira, segundo o Relatório 2002/2003 - Infância na mídia: a criança e o adolescente no olhar da imprensa brasileira, publicado pela Agência de Notícias do Direito da Infância (Andi) e Instituto Ayrton Senna. Uma das explicações para tímida aparição do tema na chamada grande mídia é cultural. Ainda se considera, principalmente o trabalho infantil doméstico, a atitude como um grande favor prestado à sociedade e à criança. Segundo a Andi, outras pautas esquecidas pela grande mídia, no período pesquisado, foram a exposição que os meninos e meninas de rua tem às doenças sexualmente transmissíveis e, principalmente, à Aids; a diversidade sexual na adolescência e a deficiência ou limitação física, motora, sensorial e mental. Entre os temas mais noticiados pelos jornais brasileiros, destacam-se os crimes sexuais, como abuso e exploração, que estão em primeiro lugar. Em segundo, vem a educação, abordando a qualificação e as necessidades para o processo de educação infantil e médio, seguidos por temas sobre direitos e saúde da criança e do adolescente.
Thayana, no curso de informática, que ser psicóloga
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R$ 200: o preço de uma infância roubada Meninas e meninos sustentam suas famílias com a exploração sexual de seu corpo. Eles não se consideram vítimas, e os programas governamentais falham na missão de resgatá-los, não dando encaminhamento educacional, médico, psicológico e profissionalizante adequado. “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão” Art.227 da Constituição Federal
Ana Karine Zaranza
Foto: arquivo Diário do Nordeste
O rosto delicado e ainda pueril ressalta mesmo com o artifício da maquiagem. O corpo pequeno e franzino, embora bonito, parece causar ainda mais dúvida se quem desfila alegre na Beira Mar é menina ou mulher. O chiclete na boca, o salto alto, as unhas ruídas e as roupas provocantes revelam o paradoxo que é Rosa (nome fictício): ela ainda está desabrochando. A menina-mulher teve que crescer rápido para tomar conta de si. Escolheu um caminho difícil: a prostituição. Rosa diz ter 19 anos, apesar de a aparência teimar em mostrar que tem menos. Mas, segundo ela, “entrou na vida” com 12 anos, quando os pais adotivos colocaramna para fora de casa. “Eu tinha problemas com meu irmão. E como ele é o filho verdadeiro, minha mãe me expulsou”, lembra com lágrimas de ressentimento nos olhos. Assim como Rosa, a maioria dos adolescentes explorados sexualmente passam por problemas familiares. “Uma característica forte é que eles não têm um vínculo familiar. Moram em cubículos e não têm renda familiar adequada”, diagnostica, Fernanda Karla, assistente social do Projeto Sentinela Estadual (leia mais na página 11 ). No início, Rosa morou na rua e em casa de amigos. Agora divide uma casa com uma amiga que considera como mãe. Há sete anos, Rosa começou a ser explorada sexualmente, ganhando aproximadamente R$ 500 por noite. Hoje, ganha em média entre R$ 150 e R$ 200 e sabe que com a idade o preço do programa vai desvalorizando. “Eu me ‘aviciei’ com aquele dinheiro todo no bolso e por isso não saí mais dessa vida”, revela. Tanto dinheiro, quantia que jamais vira, deslumbrava a menina. Ela podia comprar o que quisesse. Segundo a assistente social, a maioria não sabe administrar o dinheiro. Obrigam-se a pagar os seguranças para entrar nas festas, comprar identidades falsas e roupas boas para não serem discriminadas.. “Muitas gastam o dinheiro em biscoitos, bombons e sorvetes, coisas típicas ligadas à infância perdida”, explica Karla. Além disso tudo, Rosa manda di-
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nheiro para o filho de dois anos que mora com a família paterna. E ainda assegura que guarda um pouco para comprar uma “casinha”, montar um negócio e trazer o filho de volta para o seu convívio. “Eu era pobre, assim mais ou menos, mas era feliz. Antes de sair de casa eu ia pro colégio, estudava, ia pra festas com minhas amigas. Hoje, minha vida é um lixo”, lamenta. Deixou de estudar na quinta série, mas sonha em voltar para a escola e ser enfermeira. Plano que Lucíola (nome fictício), 16 anos, não acalenta. Ela parou de estudar porque quis e não pretende voltar. “Eu não tenho mais paciência
“Não tem como a gente saber se ele vai estuprar a gente, não pagar. Nem como se proteger disso. Só rezar”.
pra isso, não, mesmo assim, para ser modelo, que é o que eu quero, não precisa”, confessa. Karla ressalta a dificuldade que essas meninas encontram para entrar na escola. “Como trabalham à noite, precisam dormir de manhã. E à tarde, alegam que se forem estudar ficam muito cansadas para trabalhar”. Lucíola conta uma história diferente de Rosa. A menina saiu de casa há dois meses para morar com uma amiga no bairro Autran Nunes. Elas vão todos os dias com outra amiga para a Beira-Mar e ficam sentadas na calçada, observando tudo. A amiga solta sem querer que um “gringo” já ofereceu à Lucíola R$ 200, que tenta negar, foge do assunto, mas acaba confessando. Dificuldade que as adolescentes exploradas sexualmente enfrentam quando começam é a demarcação dos territórios. Rosa conta que, no início enfrentou muitos proble-
mas com as prostitutas mais velhas e com os travestis. “Eles me roubavam e me batiam. Era porque eu era nova, hoje não acontece mais isso. Até porque eu e outras ‘novatas’ nos juntamos e prendemos uma que roubava a gente”. Ela diz que trabalha sozinha e que não é agenciada. Mas, durante a entrevista, um homem passou várias vezes pela mesa onde conversávamos e a chamou, dizendo que seu irmão queria conversar. O mesmo homem que antes da entrevista conversou com Rosa e outra amiga de profissão e as observava de longe. A jovem confessou que não se tratava do irmão, sem, no entanto, dizer quem era. Muitas meninas hoje atendidas pelo projeto Sentinela começaram a serem exploradas sexualmente, agenciadas por outras adolescentes. Os agenciadores ficam com 30% a 50% do valor do programa. “Uma menina de 13 anos entrou nessa vida, incentivada pela amiga de 17 porque queria uma blusa do Beco da Poeira, de R$ 10. Ela perdeu a virgindade por R$ 200, ficou com R$ 150 para comprar várias blusas, e a amiga, com o resto”, conta Karla. Inúmeras vezes, Rosa repetiu, entre choros, estar cansada e que se sente um lixo. Por isso, tentou trabalhar como empregada doméstica, mas segundo ela, “dava muita confusão”. Passou um ano fora da rua quando ficou grávida e se sustentava com R$ 50 que recebia de um programa do Governo e com o dinheiro que a família do namorado mandava para eles. Quando o filho completou três meses voltou. O choro causado pela auto-estima baixa se junta ao da saudade que tem do filho que há seis meses não vê. “Tenho medo do meu filho não me perdoar por eu ter abandonado ele, por eu ser ‘mulher da vida’. Mas eu não queria trazer ele comigo pra sofrer tudo o que eu sofro”, desabafa. Medo é um sentimento que acompanha as meninas. Rosa diz que nunca foi mal tratada por nenhum cliente. Mas conhece quem já foi. “Não tem como a gente saber se ele vai estuprar a gente, não pagar. Nem como se proteger disso. Só rezar”. Essa história é de Rosa e de Lucíola. Mas poderia ser das outras 63 crianças e adolescentes exploradas sexualmente atendidas pelo projeto Sentinela em 2004.
Projeto sem estrutura falha na missão Produção de foto: Ana Karine Zaranza
O Projeto Sentinela surgiu em 2001 como ação continuada do Governo Federal por meio do Ministério da Justiça em parceria com o Governo do Estado. Em Fortaleza, há dois projetos Sentinelas, um estadual e outro municipal. O Governo Federal é responsável pelo pagamento dos 18 funcionários e o Estado fornece a infra-estrutura. Entretanto, como não existe um orçamento definido para o social, segundo Fernanda Karla, o trabalho falha em diversas ações. “Falta água, papel, o salário dos funcionários atrasa. Às vezes, a gente não pode sair para fazer acompanhamento familiar na casa das vítimas porque não tem gasolina”, desabafa. As dificuldades não param nos problemas estruturais. O número de crianças e adolescentes acompanhados pelo projeto ainda é pequeno, apenas 67 em 2004. Em janeiro de 2005, só foram denunciados seis casos. Isso acontece porque os adolescentes não se sentem vítimas e não procuram ajuda. A popula-
ção prefere fazer vistas grossas. Dos canais de denúncia, segundo o projeto, o mais eficiente eram as blitze, mas pararam. As famílias dificilmente denunciam porque têm uma re-
lação desgastada com as vítimas. E as escolas são as que menos denunciam porque os professores estão despreparados para identificar a violência sexual.
O Sentinela trabalha encaminhando as vítimas para assistência psicológica, médica, escolar e cursos profissionalizantes. Os psicólogos tentam melhorar a auto-estima e convencê-los de que são vítimas. Os médicos fazem exames de prevenção, tratam as doenças sexualmente transmissíveis (DST’s) e possíveis agressões físicas. Mas na escola e nos cursos profissionalizantes, o processo trava. “As vítimas não querem voltar à escola porque atrapalha no trabalho noturno. E como os programas do Governo exigem requisitos de escolaridade e idade para entrar em cursos profissionalizantes e encaminhamento para empregos, uma minoria é contemplada”. Assim, os adolescentes explorados sexualmente continuam se vitimando para sustentar-se e manter a qualidade de vida conseguida com a venda do corpo. O Projeto também não oferece nenhuma bolsa para os assistidos.
Conseqüências Produção de foto: Ana Karine Zaranza
Exploração sexual causa danos psicossociais Rosa é um exemplo típico de adolescente explorada sexualmente. Ela apresenta características psicológicas que, segundo a psicóloga do Projeto Sentinela, Diana Texeira, são comuns: auto-estima baixa, estimulação precoce da sexualidade, vulnerabilidade, ingenuidade, confusão de sentimentos. Como não recebiam carinho, amor pelos integrantes da família, encaram um presente ou um afago de seus exploradores como sendo amor. Assim
como toda adolescente sonha com um príncipe encantado, elas também pensam em encontrar um homem estrangeiro que as tire da vida de exploração. Dentre os danos sociais, Fernanda Karla relaciona o envolvimento com drogas, a desestruturação do conceito de família e evasão escolar. Mas a família é o foco principal. “Às vezes, elas querem se vingar da família e se vingam em si mesmas”, explica a assistente social.
Serviço: Projeto Sentinela Rua Tabelião Fabião, 114 - Presidente Kennedy Disque denúncia local - 1407
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ONGs e poder público mesclam ações preventivas e assistencialistas Embora a lei proíba o trabalho a menores de 16 anos, essa prática consiste ainda hoje num dos grandes desafios da sociedade. Associações, entidades e governo tentam, a partir de ações direcionadas para prevenção e erradicação do trabalho infanto-juvenil, garantir que o lugar de crianças e adolescentes não é no trabalho, e sim na escola. “Trabalho não é brincadeira Só gente grande deve trabalhar Sou criança É tempo de escola É tempo de brincar É tempo de escola É tempo de brincar” (Parahyba) Paula Neves
O verso acima, embora a priori possa parecer lúdico, fala de uma situação grave. Faz parte da canção “Leve a sério”, incluída no CD de spots para rádio lançado recentemente em parceria com o Unicef, a Associação Curumins, Terra dos Homens e Catavento. Essas entidades estão buscando, por meio de ações como esta, dar continuidade às várias campanhas de sensibilização social pelo fim do trabalho infanto-juvenil, tema que cada vez mais ganha voz no Estado. Segundo a lei, é proibido qualquer tipo de trabalho a menores de 16 anos, com exceção para a condição de aprendiz, a partir dos 14 anos, de acordo com a Lei da Aprendizagem nº 10.097 (Art. 415), de dezembro de 2000. Já dos 16 aos 18 anos, o trabalho passa a ser permitido como aprendiz ou empregado, desde que não seja em atividades noturnas, perigosas, penosas ou insalubres, isto é, que causem de alguma forma danos morais para a formação da criança ou do adolescente. O Governo Federal, visando combater esse tipo de prática, criou em 1996 o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti). Os estados, por intermédio das suas Secretarias de Ação Social, fazem o levantamento dos casos para, assim, darem início ao trabalho. O repasse dos recursos aos municípios é feito pelo Fundo Nacional de Assistência Social. “Hoje, são atendidas 3.197 crianças em Fortaleza e 19.657 em 92 municípios do Estado. Esse número foi ampliado, no final de 2004”, contabiliza Mazé Castelo, coordenadora estadual do programa.
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O Peti atualmente oferece uma bolsaescola mensal no valor de R$ 25,00 para crianças e adolescentes da zona rural e R$ 40,00 para municípios com população acima de 250 mil habitantes. “Desenvolvemos parceria com as prefeituras no intuito de selecionar e capacitar monitores que trabalharão com crianças e adolescentes nas jornadas ampliadas, sejam elas de reforço, esporte, arte ou cultura”, acrescenta Castelo. Para isso, são repassados para cada prefeitura R$ 20,00 reais ao mês por criança ou adolescente. O compromisso do funcionamento do programa é assumido junto às famílias, que devem garantir freqüência mínima dos filhos na escola e na jornada ampliada de 75%; o não retorno ao trabalho (sobretudo de menores de 16 anos); e a participação das famílias
O trabalho infanto-juvenil, devido às causas estruturais e culturais, merece maior atenção da sociedade. Muitas vezes ele ainda é tido como complemento da educação. nas ações sócio-educativas e de ampliação e geração de renda. Mas o problema do trabalho infantojuvenil, devido às causas estruturais e culturais, merece maior atenção da sociedade. Muitas vezes ele ainda é tido como complemento da educação, ou considerado um ato de caridade para famílias de baixa renda. E para isso existem entidades que atuam no sentido de reverter esse quadro. “Nosso trabalho aqui é mais de apoio, mobilização, conscientização. Somos
articuladores”, pontua Ana Márcia Diógenes, assessora de comunicação do Unicef, que além de trabalhar em parceria com a Secretaria de Ação Social, faz parte do Fórum Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil e viabiliza financeiramente vários projetos na área. “Seguimos um plano nacional. Atualmente trabalhamos com a prevenção”, complementa Diógenes. Outra associação que atua nesse sentido é a Curumins, que nasceu em 1996 da parceria com outra entidade, a Terra dos Homens. Ela desenvolveu um sistema de diagnóstico e avaliação chamado “Sistema Criança-Rua”, pelo qual seus educadores observam as crianças e, posteriormente, visualizam projetos e meios para que elas saiam das ruas, sobretudo ajudando as famílias a encontrarem formas de renda dignas. “Nosso trabalho aqui é duplo. Tanto de ação direta, abordagem de rua, atendi-
mento à família e na associação, como de articulação”, explica o coordenador da ONG, Raimundo Coelho de Almeida Filho. Ele também faz parte do Fórum Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil, que funciona há cinco anos e atualmente atua em 65 municípios (leia entrevista na página 5). “Hoje são atendidas diretamente 125 crianças e adolescentes. São vários os projetos, e em torno de 25 sócio-educadores”, relata Coelho. Dentre os programas que ele menciona incluem-se o grupo de teatro, que se apresenta em estações de ônibus para ensinar sobre a cultura urbana, a banda de lata, que costuma tocar em eventos públicos, e outras atividades sócio-educativas, como a prática do skate, futebol etc. Enfim, além de um desrespeito constitucional, o trabalho infanto-juvenil consiste prática que prejudica o desenvolvimento físico, psicológico e social da criança e do adolescente. É por isso que a sensibilização para o problema e a necessidade de combatê-lo constituem desafios que devemE estar constantemente em pauta tanto no governo, como na sociedade em geral ou mesmo dentro das famílias.
Danos do trabalho precoce
Fonte: Fórum Estadual pela Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção do Trabalhador Adolescente no Ceará