Sobpressao 12

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Artigo

Dahiana Araújo

O blog surgiu na década de 90 como uma ferramenta de socialização e ganhou popularidade pelo grau de interação que propõe aos internautas. Esse caráter foi atribuído ao blog por representar uma forma de manifestação íntima na rede, tendo, assim, um papel na Cibercultura definida por Pierre Lévy. Quando a burguesia toma as rédeas da sociedade patriarcal, entre os séculos XVIII e XIX, novos conceitos e valores são embutidos. Um dos valores defendidos pela burguesia era individualidade dos membros da família. O espaço íntimo passa a ser valorizado como uma forma de auto-conhecimento. Com isso, era possível encontrar caminhos de aceitação dentro de um universo pessoal. O diário íntimo é um desses caminhos e sua produção sempre teve o caráter real de narrar algumas experiências vividas e identificar características do eu. Isso acontecia durante a produção do diário escrito. Quando o diário é digitalizado, sua estrutura muda e novas funções são atribuídas. Além disso, o diarista (blogueiro) também assume novas posições e se enquadra em definições e aspectos sociais e psicológicos diferenciados. Paula Jung Rocha, doutora em comunicação social, define os blogs como “diários virtuais que se proliferam na Internet como ferramentas de uma narrativa híbrida (mistos de diários, crônicas jornalísticas e correspondência), que representa, simultaneamente, a individualidade e a coletividade, dimensões presentes no imaginário da sociedade pós-moderna”. No momento em que as pessoas gastam seu tempo e atuam na rede produzindo um diário íntimo, elas estão certamente representando papéis: de autoconhecimento e aceitação. E, quando essas mesmas pes-

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soas atuam na rede como expectadores de outros blogs, elas agem como voyeurs. No primeiro momento, o de auto-conhecimento e aceitação, os blogueiros criam seus diários para serem lidos, para atrair pessoas com as quais se identificam. Durante a postagem do dia, os textos íntimos refletem o eu do indivíduo que está se conhecendo ao passo que produz. No cenário virtual, o conteúdo do diário assume formas diversas. Em forma de poesia, crônica, músicas e até fotografia, as pessoas expõem seus sentimentos e opiniões no ambiente livre da Internet. Os assuntos partilhados no blog não são mais o “conteúdo que deve ser guardado”, como afirmava o historiador francês, Gerard Vincent, sobre o segredo. Em sua dissertação de mestrado em comunicação, Denise Schittine afirma que o conteúdo do blog é, na maioria das vezes, explícito e chamativo. Esse conteúdo remete à idéia de exposição, legitimação e aceitação. Isso porque os diaristas partilham agora coisas

em comum de cotidianos muitas vezes distantes. Finais de semana inesquecíveis, notas de provas, brigas entre familiares e descrições de momentos íntimos. O diário íntimo virtual é uma projeção do diário íntimo que outrora era secreto e se apresentava somente para o próprio autor. Mas essa projeção adquire agora características peculiares que puderam ser construídas a partir das transformações tecnológicas, ocasionando, assim, uma mudança cultural: a criação do diário íntimo virtual construindo uma intimidade assistida. A atuação do voyeur acontece de forma mais gradativa. As pessoas espiam e atribuem juízos de valor às publicações diárias, ou posts, com os quais se identifi-

cam ou não. O prazer do voyeur é espiar o que acontece na intimidade de terceiros. Os blogs, diferentes dos diários secretos, não partilham mais segredos, partilham convívios, experiências de momentos marcantes ou de dias comuns. O que não deixa de ser íntimo e, portanto, interessante para o voyeur. Inserido na rede como uma forma de aceitação pessoal e voyeurismo, o blog tem ganhado notoriedade, espaço na mídia e estruturas diversificadas no ciberespaço. Isso ocorre porque o blog representa uma forma de revelar anseios, opiniões e até segredos numa linguagem acessível e num ambiente onde várias identidades se cruzam, se aceitam e se espiam: a Internet.

ANO 4 - Nº 12

Jornal-Laboratório do Curso de Jornalismo da Universidade de Fortaleza

Bailarinos de Paracuru Projeto social leva o ensino do balé clássico para meninos e meninas do litoral do Estado em uma das escolas no País com o maior número de garotos dançando. Veja como este trabalho é desenvolvido e como a Companhia de Dança de Paracuru se mantém na ativa no Ceará (páginas 12 e 13)

Sentimentais e unidos Conheça a tribo dos emos, que vem cada vez mais se fortalecendo e saiba qual o real motivo dos jovens de hoje participarem dela (páginas 22 e 23)

Jogos eletrônicos Diversão levada a sério: como ganhar dinheiro real ao brincar nos games online (páginas 6, 7, 8 e 9)

Divulgação

Blog: voyeurismo na rede mundial de computadores

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HQs alternativas As histórias em quadrinhos vão muito além dos mangás e superheróis. Confira as publicações produzidas no Ceará (páginaS 10 e 11)


“Post - it”

A prática aliada à experimentação Exercitar a prática do fazer jornalístico sem esquecer a experimentação, comum e necessária no meio acadêmico. Esses foram e sempre serão os objetivos do SobPressão. Desde a elaboração das pautas, passando pela apuração e chegando à escrita das matérias, a tentativa de tornar a sala de aula o mais parecida possível com o ambiente de uma redação foi levada a sério por todos. A inovação e a busca por novas formas de contar histórias também não foram esquecidas, acima de tudo porque é dentro das faculdades de comunicação que surgem outros caminhos para a longa estrada do jornalismo. Produto da disciplina de Projeto Experimental em Jornalismo Impresso, esta edição do Sobpressão foi ancorada nas discussões sobre quais são os propósitos de se fazer jornalismo e qual a

razão básica de se fazer um jornal-laboratório. Os primeiros resultados começaram a ser sentidos já na elaboração das pautas. Sugestões foram surgindo e alguns temas começaram a ganhar ares de matérias importantes. A essência do jornalismo foi captada e o brilho nos olhos de alguns alunos foi o sinal de que esse era o caminho a ser seguido. Surfistas de Cristo, Escola de Dança de Paracuru, quadrinhos alternativos, EMOs, jogos on-line e radioamadorismo são algumas das matérias que enchem as páginas do jornal de investigação, informação e opinião. O jornalismo se sobressaiu ante as dificuldades encontradas na apuração e sobrou vontade e entusiasmo para fazer um jornal agradável e com qualidade. Acreditamos que você, leitor, nosso principal motivo de inspiração, concordará conosco.

“Tem muita gente que tem preconceito. Eu acho que isso é uma profissão como outra qualquer. Eu acho é bonito. Toda a dança tem que ter um parceiro. Já imaginou a bailarina sem o homem para lhe segurar e amparar? Fica sem graça. O homem tem que fazer parte sim”. Renata Cavalcante Rodrigues – manicure “Não tenho preconceito. Acho bonito. Eu mesmo gostaria de fazer balé, mas não tenho oportunidade. No bairro onde eu moro não oferecem o curso de dança. Algumas meninas perto lá de casa vão fazer escolinha fora. Um dos motivos de eu não fazer dança é o preconceito das pessoas”. Paulo Sérgio – treinador de lanchonete

“Eu acho que, no fundo, pelo senso comum, a gente tem certo preconceito sim, por a dança clássica ser algo mais delicado, feminino. Mas é um espaço que eles (homens) podem conquistar, da mesma forma que as mulheres conquistaram espaços predominantemente masculinos”. Ana Cíntia Gondim – estudante “Eu acho legal. É como se fosse um esporte só que, além de trabalhar o corpo, desenvolve também a mente. Existe o preconceito, mas existem tantas companhias com bailarinos famosos e isso não interfere”. Gedson de Oliveira auxiliar de eventos sócio-culturais

Cadê a cultura que estava aqui? Pequena definição de cultura Segundo Alfredo Bosi, cultura é definida como “um conjunto das práticas, das técnicas, dos símbolos e dos valores que devem transmitir às novas gerações para garantir a reprodução de um estado de coexistência social”. Pena que esse conceito de cultura não tem sido aplicado hoje. O que ocorre é uma perda do laço que nos une aos nossos antepassados. Estamos vivenciando uma época onde nossa identidade, aos poucos, é sugada por uma cultura homogênea que pode ser inserida em qualquer lugar, pois não possui raiz. Exemplos desse distanciamento com a cultura local são os shoppings centers, as lanchonetes de fast food, os aeroportos.

Os não-lugares Na contemporaneidade presenciamos o surgimento dos não-lugares. Termo criado pelo francês Michel Maffesoli, os não-lugares são produtos da cultura globalizante, onde se deixa para trás os costumes locais geradores da nossa individualidade. Mas não digo para olharmos essa nova manifestação, em voga no mundo contemporâneo, como algo apocalíptico. Temos, sim, que compreender esse processo. O que nos faz diferentes de qualquer outro grupo ou sociedade é a nossa história. É ela que nos dá indícios para sabermos o que somos hoje. O que vivemos ficará somente nas estantes dos museus? Por que não pensamos em um resgate dessa cultura que está meio empoeirada? Repensar sobre como estamos cuidando de nosso legado, dos costumes que nos fazem único é nosso dever como participantes de uma sociedade.

Que caminho seguir? É uma pergunta difícil que levanta várias questões. Estamos presos a essas novas situações impostas pela modernidade? Talvez fosse mais confortável ignorá-las, mas é inevitável não refletirmos sobre essa perda de identidade que pode se voltar contra nós e nas gerações posteriores. Somos seres que precisamos de referência, de uma raiz, e esse desligamento com nossos antepassados acarretará danos no futuro. Como se formará as futuras gerações sem o mínimo de conhecimento e percepção das riquezas que um dia possuímos e que, até então, foram esquecidas ou esgotadas? Volto à circularidade: e agora que caminho seguir?

Na busca de solução Fazemos parte dessa nova realidade e convivemos com ela porque já está intrínseca ao nosso cotidiano, queiramos ou não. Ter uma visão extremista de que essa cultura global é o mal da sociedade é uma visão deturpada e radical. A solução não está simplesmente em deixar de ir às compras nos shoppings ou evitar o hamburger do McDonald´s. A chave para essa mudança está em cada um de nós, no que fazemos para o resgate e a preservação da nossa identidade. Ter uma visão crítica acerca desse processo, manter certos hábitos que nos são peculiares e repassá-los já é um bom começo.

Felipe Teixeira tem apenas dezoito anos e assume ser um emo. Mas será que, por se assumir, ele realmente pode ser considerado um? Para ele, ser emo é apenas uma questão de estilo, de vestimenta, de atitudes diferenciadas. Felipe ainda afirma que é sentimental ao extremo e que considera importantes coisas que outros jovens da mesma idade nem mesmo conseguem perceber. Mas, segundo ele, a recepção por parte de seus pais não foi muito boa. “Meu pai odiou quando falei que era emo”, relembra. Sâmia afirma que isso deve ser encarado como um processo natural na vida do adolescente. “Essa identificação com um grupo é positiva porque ele pode ir juntando elementos desse grupo e ir construindo a sua identidade”. Para ela, os pais devem ter cuidado apenas em observar se, de fato, o que está se dando é a construção de uma identidade própria ou a imposição de uma outra. “Por exemplo, quando você quer usar o cabelo de um jeito e tem que usar de um outro jeito só porque o grupo impõe, então isso é negativo. Chamamos isso de processo de inautenticidade”, diz. A inautenticidade ocorre quando um jovem, durante o processo de construção de sua identidade, tem seu “eu” reprimido, seja por seus pais, grupos sociais ou pela sociedade como um todo. O adequado é que quando o jovem perceba a exigência de repressão de sua vontade, ele sobreponha sua vontade a essa força repressora. Dessa forma, segundo a psicóloga Sâmia Gomes, ele estará fortalecendo a sua identidade. Muitos pais adotam uma postura bastante rígida em relação a seus filhos quando começam a presenciar certas atitudes “estranhas” neles, como por exemplo, um homem

AMIGAS??? Não! Maridas!!!!!!!! Esse é o termo utilizado para demonstrar grande amizade entre as meninas que fazem parte dessa tribo

usar fivelinhas coloridas no cabelo. “Isso ainda causa um certo impacto numa sociedade tão machista como a nossa”, diz Felipe. Para Sâmia, não há problemas em ser um emo, desde que essa decisão seja reflexo da vontade própria deste adolescente. Nesse caso, o engajamento em um grupo só fará bem e ajudará no processo de desenvolvimento social da pessoa. A psicóloga Mariza Santos, que trabalha em um colégio particular de Fortaleza, afirmou que, durante a adolescência, pertencer a um grupo é fundamental no processo de diferenciação das figuras paternas e na construção da própria identidade. “Os jovens costumam se agrupar de acordo com preferências e valores, formando as tribos, que são várias. Entre elas, o meio jovem identifica os emos”, garante. Outro fator importante é que a escola é um espaço coletivo. Os adolescentes sentemse mais à vontade quando estão entre seus pares. Ela acredita que nos pontos de encontro fora da escola, as manifestações “tribais” sejam mais visíveis. Assim, na escola, ser emo ou integrante de qualquer outra tribo não é motivo de diferenciação, seja no rendimento, relacionamento ou necessidade de atenção por parte dos professores. A psicóloga observa grupo como uma das manifestações de identidade tão comuns na adolescência. Mariza acrescenta que, nas escolas, é necessário que os alunos sigam um padrão na maneira de se vestirem e de se comportarem. “É recomendável que os alunos não usem maquiagens muito pesadas na escola e nem certos acessórios. Essa é uma medida que vale para todos, seja um emo ou não”. Ainda segundo Mariza, “o comportamento diferente sempre causa um pouco de estranhamento por parte dos demais alunos, mas nós, professores, buscamos tratar todos da mesma forma”, conclui a psicóloga. Alguns professores afirmam que o fato desses jovens estarem um pouco diferentes da maioria ainda não tem afetado o desem-

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penho escolar deles e até mesmo o funcionamento da escola. Para outros, é importante que haja um acompanhamento forte por parte não só da escola, mas da própria família, para que a situação não fique fora de controle. “Na escola é bem normal. Os professo-

res aceitam normalmente e os nossos amigos até brincam. É que a gente não é igual aos outros do colégio, somos mais reservados. Mas a nossa maquiagem incomoda um pouco. A minha diretora até já me pediu que eu parasse de usar”, acrescenta Felipe Teixeira.

Local de encontro O ponto de encontro dessa galera é a Praça Portugal, uma das rotatórias mais congestionadas da cidade. Situada entre as Avenidas Dom Luís e Desembargador Moreira, ela consegue atrair jovens de bairros distantes bem como de outras cidades, como, por exemplo, Itapipoca. É fácil encontrar muitos deles por lá nas tardes de sábado, conversando e trocando idéias. Um outro lugar onde essa galera costuma ir é a Praia de Iracema, nos arredores do Centro Cultural Dragão do Mar. Lá existem alguns bares e casas de show bem ao estilo deles. Diferente do que acontece na Praça Portugal, na Praia de Iracema, a presença de diferentes grupos num mesmo espaço acaba gerando conflito. Tanto que, durante a entrevista, pudemos presenciar o ataque de um grupo de três jovens skinheads (movimento surgido na década de 1960 no Reino Unido. Os integrantes são caracterizados pelo culto ao racismo e ao nazismo) a um garoto Punk. Uma cena brutal. “Esse tipo de coisa acontece, eles são uns animais! Hoje tá pior porque tá muito misturado, é metaleiro, punk, gótico... quando não tá tão misturado, fica melhor” afirma Daniela Silva, 16 anos.

Poser: Hoje, a palavra poser significa mais uma pessoa que gosta de se vestir conforme o estilo de um determinado grupo seja ele musical ou social. Assim, temos os poser de emo, de metaleiro, punk, pagodeiro e por aí vai. Quando surgiu, a palavra designava um gênero musical marcado pela rebeldia contra o modelo de sociedade no qual viviam. Podemos citar como alguns exemplos o grupo Guns N' Roses e Aerosmith. Hardcore: Significa literalmente miolo, ou centro, duro. Também é o nome atribuído a variação extrema de algo, por isso, boa parte dos grupos musicais que surgiram como um segmento do rock and roll recebem este sufixo.

Expediente Jornal Laboratório do Curso de Jornalismo da Universidade de Fortaleza (Unifor) - Disciplina: Projeto Experimental em Jornalismo Impresso - Fundação Edson Queiroz - Universidade de Fortaleza (Unifor) - Diretor do Centro de Ciências Humanas: José Batista de Lima - Coordenadora do Curso de Jornalismo: Erotilde Honório Reportagem e Edição: Ana Júlia de Alencar, Ana Paula Almeida, Carolina Fernandes, Dahiana Araújo, Elisa Parente, Emersomar Rodrigues, Gabriella Antunes, Juliana Lôbo, Lilian Amaral, Martha dos Martins, Mirela Filgueiras, Rafaele Esmeraldo, Thiago Mena - Projeto gráfico: Eduardo Freire - Diagramação: Aldeci Tomaz - Professor orientador: Antonio Simões - Conselho Editorial: Adriana Santiago, Geísa Mattos e Erotilde Honório - Supervisão gráfica: Francisco Roberto - Impressão: Gráfica Unifor - Tiragem: 3.000 exemplares - Estagiário de Produção Gráfica: Anne Nogueira, Caio Castelo e Eduardo Viana - Estagiários de Redação: Elisa Parente, Maria Isabel Medal, Pery Negreiros - Revisão: Profa. Claudia Matos - Primeira página: Aldeci Tomaz - Colaboração: Prof. Aderson Sampaio e Carlos Normando - Editorialista: Emersomar Rodrigues

Roupas escuras e coloridas: o contraste é uma das mais fortes características emo

Glossário

Juliana Lôbo

Fotos: Raphael Villar

O que acha do homem fazer dança clássica?

Luíza Kelly Gurgel

Emo: uma questão de escolha

Juliana Lobo

Editorial

Skinhead: A violência é a maior característica das pessoas que são desse grupo. Costumam usar o cabelo raspado e possuem um estilo particular de vestir-se, como botas e calças em estilo militar. Eles surgiram no Reino Unido, em 1960 e espalharam-se pelo resto do mundo. São um exemplo claro de xenofobia, ou seja, aversão ao estrangeiro, porém, são contra negros, homossexuais e, facilmente confundidos com os nazistas.

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Juliana Lobo

Franjinha no cabelo e olhos pintados são as marcas dos emos

Conheça os emos Alegres, sentimentais e unidos. Estas são algumas das características dos emos de Fortaleza. Seja na Praça Portugal ou na Praia de Iracema, com um jeito diferente de ser, eles chamam a atenção das outras tribos de adolescentes e da sociedade Juliana Lôbo e Thiago Mena

Tênis listrado, roupas pretas, acessórios infantis, franjinha no rosto, olhos pintados de preto. Fica mais fácil identificar um emo quando aspectos como esses são percebidos. Mas, afinal, o que é ser emo? O nome emo vem de Emotional Hardcore, que em português significa Som Pesado Emocional, uma vertente do punk rock surgida na década de oitenta, em Washington, nos Estados Unidos. Ela é caracterizada por unir letras extremamente românticas a um som de batidas pesadas. Existem muitas lendas a respeito da criação desse nome. Há quem diga que surgiu quando um cantor desse estilo musical, em uma

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entrevista, falou: “I’m emo”, que em português significa “Eu sou emo”, como uma maneira de abreviar o nome do estilo. A moda pegou, surgiam os emos. Mas, para outras pessoas, o nome se popularizou quando um fã, durante um show, gritou "You´re emo!" (Você é emo!). Atualmente, em todo o mundo, é bastante comum encontrar essa galera aos pulos de alegria agarrados uns aos outros ou chorando juntos, por coisas que a maioria das pessoas poderia achar bobagens, como uma paixão não correspondida, uma briga entre amigos, uma desilusão. No Brasil, a quantidade de jovens emos é cada vez maior. Somente no Orkut, site de relacionamento da Internet, existem mais de mil

comunidades destinadas aos emos. Algumas delas possuem mais de quatro mil pessoas inseridas. Em Fortaleza, ainda é difícil dizer ao certo quantos são eles, mas na comunidade “emos de Fortaleza” existem cento e sessenta membros. Diante de jovens de várias tribos, surge uma dúvida: quais deles são emos ? Como podemos diferenciá-los? As características são muito fortes, mas, ao mesmo tempo, não garantem, num primeiro contato, se algum jovem é ou não emo. Aliás, existe um detalhe que torna ainda mais complicado afirmar com certeza quem realmente pertence a essa tribo. Segundo a provável emo Rebeca Santos, 19 anos, nenhum emo assume que é emo. Pertencer a esta nova tribo não é apenas questão de gostar das mesmas músicas ou usar as mesmas roupas. Muitos afirmam que nem é preciso tudo isso para uma pessoa ser um emo, basta que ela tenha os mesmos sentimentos que os outros do grupo têm.

Isso chega a ser filosófico, afinal, Marx já afirmava que “negar ainda é uma forma de afirmar porque exige a defesa da sua não existência e, para isso, é necessário pensar nela, para rebatê-la”. Por isso, somos levados a pensar: será que ao negarem sua identidade, eles não estariam apenas tentando afirmar algo que são? Sócrates já dizia que a reflexão a respeito de si é uma volta a si mesmo. O problema com essa galera é que, para esse processo ser perfeito, como disse Sócrates, ele deveria estar apartado de todo e qualquer sentimento, ou seja, insensível, coisa que para os emos é impossível. Justamente por serem eles super sentimentais. Para a psicóloga Sâmia Gomes, é natural o adolescente buscar outras identidades diferentes das de seus pais nesta fase de suas vidas. “É natural o adolescente buscar um grupo para se engajar, para buscar uma identidade, e isso não é uma coisa ruim”, afirma.

Artigo

O mercado da religião

Mirela Filgueiras

O homem é um animal racional que, desde os primórdios da sua existência, criou deuses e anseia por uma vida além da morte. Algo nada lógico nem racional, porém a vida em sociedade demonstrou que uma crença, uma fé em algo superior, divino, além de unir as pessoas, conforta e alivia a nossa sensação de impotência e o nosso medo da morte. A história do homem também é marcada pela busca do poder e sua legitimação ideológica. A fé transformada em religiões sempre foi usada nesse processo de dominação e manipulação. Milhões de pessoas foram mortas no decorrer da história da humanidade por uma manipulação política travestida de guerras santas. O poder corrompe e falseia as crenças religiosas e as utilizam como armas de controle e alienação. A partir do momento em que o dito “divino” é exercido por homens em suas instituições religiosas, com seus dogmas e sua busca pelo poder, este divino passa a servir aos interesses de seus comandantes. Nisto criam seus soldados para expandir seus domínios. Os fanáticos religiosos servem de exemplo. Com uma intransigência ignorante e desrespeito às outras religiões, tentam impor suas doutrinas em pregações, não aceitam qualquer fato que contrarie seu fanatismo e simplificam todas as respostas através da sua crença. E, nos casos mais graves, chegam a cometer assassinatos. Portanto, desde já cabe a distinção entre fé e religião. A primeira não necessita de controle ou templos, a segunda os criou pelo poder. A fé por si só não necessita de provas ou explicações. As religiões é que tentam se justificar através delas, seja pelos chamados milagres ou criando uma “explicação” da nossa existência. Se a fé é inabalável e não precisa de provas, está imune a qualquer fato. Já a religião, para manter seus dogmas e legitimidade, não. Dessa forma, a descoberta da suposta ossada de Jesus, de Maria Madalena, que seria sua esposa, e de um filho de ambos, pode afetar a Igreja Católica em um dos seus maiores pilares: a ressurreição e castidade de Jesus. Nunca teremos a prova, a certeza de qualquer fato que venha a contrariar a Igreja e seu poder. O recente documentário “The Lost Tomb of Jesus” (A Tumba Perdida de Jesus) e o livro “The Jesus Family Tomb” (O Túmulo da Família de Jesus), encabeçados pelo diretor de cinema James Cameron, o mesmo de “Titanic”, pelo cineasta Simcha Jacobovici e pelo escritor Charles Pellegrino, são notícias requentadas de uma descoberta feita em 1980 por arqueólogos no sul de Jerusalém. Na época, a descoberta foi anunciada, porém, deixada de lado, e novamente enterrada de acordo com a tradição ortodoxa judáica, deixando as tumbas com inscrições e resíduos para serem testados. Em 1926, outra tumba com a inscrição “Jesus, Filho de José” também foi anunciada. A probabilidade das tumbas se tratarem realmente de Jesus e de sua família é de 1 para 600. Questões como os nomes serem comuns no ano 01 D.C. entre os judeus daquela época, as tumbas serem bem ornamentadas e o fato delas terem sido encontradas em Jerusalém, por exemplo, tornam pouco prováveis as chances de uma família pobre e analfabeta de Nazaré arcar com as despesas. Esta descoberta pode até ser mais válida para a venda de um documentário e de um livro, uma jogada polêmica e lucrativa como o livro “Código Da Vinci”, de Dan Brown. O que não pode são fatos e descobertas serem abafados em nome de uma religião rica e poderosa, deixando os seres humanos alienados de fatos que têm o direito de saber.

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A Missão Surfistas de Cristo aposta na aplicação de princípios cristãos para oferecer aos atletas do mar e amantes da natureza uma nova visão de vida, fundamentada na palavra de Deus

Gabriella Antunes e Rafaele Esmeraldo

Na onda da

A Missão Surfistas de Cristo (MSC) Brasil surgiu em 1989, na cidade de Olinda, em Pernambuco. O objetivo central da Missão é contribuir para a melhoria da qualidade de vida dos surfistas, através da aplicação de princípios cristãos, utilizando o surf como ferramenta de integração e bemestar social. A Missão no Brasil estende-se pelo Ceará, Fernando de Noronha, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Bahia, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. O trabalho é desenvolvido sob a ótica do relacionamento em três valores: consciência pessoal (relacionamento com Deus), consciência coletiva (relacionamento com o

próximo) e consciência ecológica (relacionamento com o meio ambiente). Os Surfistas de Cristo acreditam que existe um Deus, um criador supremo, que não apenas verbalizou sua palavra, como também disseminou-a através das ondas. Assim, a MSC está mobilizando surfistas para alcançar outros atletas, e expandir os preceitos cristãos. “Não oferecemos religião nenhuma e, sim, um relacionamento com Deus. Para isso, usamos a Bíblia como o nosso mapa orientador. É dela que pregamos e falamos”, afirma o líder estadual da Missão no Ceará, Yohan Baltrusaitz. O pastor Armando Bispo, da Igreja Batista Central (IBC), que adotou a MSC como um ministério de sua instituição em uma espécie de parceria, afirma ser extremamente relevante a atuação da Missão em alcançar

Rafaele Esmeraldo

espiritualidade

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Reunião da MSC no anfiteatro da Beira-Mar de Fortaleza

para se resguardar de algum bug. Era uma parafernália enorme, mas nenhum garantiu 100% de eficiência. Quando chegou na nossa parte, humildemente, nós dissemos o seguinte: ´Olha, temos um rádio, antena e temos bateria´. Alguns até riram, mas depois eles entenderam. É o meio de comunicação mais confiável que existe. Porque em caso de pane ou queda de energia nós não precisaríamos de energia elétrica por parte da Coelce, nós não precisaríamos de provedor, nós não precisaríamos de nenhuma companhia de telefonia fixa para fazer contato com quem quer que seja, só a bateria, e com um banco de baterias grande, você tem autonomia até para uma semana. Eles pediram que nós montássemos estações dentro do Serpro, na Coelce e em vários outros órgãos. Nós tínhamos banco de baterias e estávamos nos comunicando com a Central de Emergência que é a Rener (Rede Nacional de Emergência de Radioamadores) que funciona em Brasília dentro do Ministério das Comunicações e a cada instante Brasília tinha a informação precisa do que estava acontecendo no País inteiro.

Sobpressão - Existe um projeto de Lei para reduzir as alíquotas de importação para os equipamentos? Roberto Batista - A gente não quer transformar isso em comércio, até mesmo porque a sugestão que a gente deu é de regras rigorosas em termos de compra, venda e revenda desses equipamentos. Então, a gente está pleiteando isso. Na

Sobpressão - Existiram outros casos de emergência? Roberto Batista - Nada mais concreto do que o 11 de setembro. Quando as principais centrais de telefonia celular, que ficavam no World Trade Center em Manhattan, desabaram, todo mundo ficou sem comunicação, tanto da Ilha para o Continente e vice-versa. Então a RRL (entidade americana que cuida do radioamadorismo nos EUA) acionou a rede de emergência americana e foi um batalhão de radioamadores para dar assistência aos bombeiros e à polícia, e funcionou. Andando mais pra frente, temos o Tsunami, que foi um negócio incrível porque nas ilhas onde houve a maior devastação, que foi Andaman e Nicobar, o governo indiano proibiu radioamadorismo lá. Ele alegava que era de segurança nacional e não podíamos operar lá. A última operação tinha sido 10 anos antes do Tsunami. Em novembro, eles autorizaram uma expedição de radioamadores naquela ilha. Então eles iam ficar lá e aproveitar o ano novo. Era um casal de indianos. Na ocasião do Tsunami, o casal estava num ponto alto da ilha, colocaram a antena e estavam lá se comunicando. Na hora em que ocorreu o Tsunami, eles simplesmente pediram a comunidade radioamadorística do mundo inteiro que cessassem os contatos porque a partir daquele momento eles iam atender a comunidade, a população que estava necessitada, porque era o único meio de comunicação da ilha com o continente. Por causa disso o governo indiano viu a necessidade e passou a ver o radiomadorismo com outros olhos.

legislação passada foi aprovado em todas as comissões, mas o deputado que apresentou não foi reeleito, ele (projeto) tem que ser apresentado novamente. Sobpressão - O radioamador interfere na comunicação dos aviões? Roberto Batista - Se tiver de interferir vai ser em outro radioamador. Os aviões operam em estações distintas das nossas, o que mais interfere na aviação são as FM’s piratas. Nós radioamadores somos os principais guardiões das nossas freqüências. Agora, se eu tiver um rá-

dio que transmita na freqüência da aviação esse rádio é ilegal, porque todos os nossos equipamentos são homologados e certificados pela Anatel.

tro de casa. Foi mantido o contato com ele, que também é radioamador, foi assim o primeiro radioamador brasileiro a chegar no espaço.

Sobpressão - Existe uma linguagem própria entre os radioamadores? Roberto Batista - A linguagem que nós utilizamos, que inclusive é oficial e regula-

Sobpressão - Há quanto tempo você está no radioamadorismo e como mantêm acessa a chama do hobby? Roberto Batista - Entrei no radioamadorismo em 1982, já vou completar 25 anos em junho. E foi um negócio meio estranho, me lembro como se fosse hoje. Eu fui estudar na casa de um amigo para prova de segundo científico e, quando cheguei na casa dele, o irmão dele estava falando no rádio. Fiz várias perguntas e ele já tava se aborrecendo, então eu perguntei se existia alguma associação que eu pudesse me informar e ele me deu o telefone e eu fui atrás e comecei a ver, comecei a gostar. Eu comecei a achar interessante que o radioamadorismo me fez pôr em prática várias coisas que eu vi como matéria no colégio e muita gente diz assim, mas isso vai servir para quê? Eu nunca vou usar. Começou a história da geografia, porque o cara dizia, eu tô falando aqui com um radioamador no Nepal... Nepal, aí você vai ao mapa e começa a procurar. O camarada dava a resposta da seguinte forma, eu estou a tantos graus de latitude sul e longitude leste. O radioamadorismo começa a sugar isso de você que de certa forma é um ensinamento, na prática, do que você viu na escola. E isso me fez ver que quanto mais jovem a pessoa ingressar no radioamadorismo e gostar, mais rápido ela vai aprender as matérias pertinentes a tudo isso. Sem contar o inglês. Porque eu fui forçado a fazer contato em inglês e o cara começava a falar, e eu tive que aprender, aprendi também um pouco de espanhol.

E isso me fez ver que quanto mais jovem a pessoa ingressar no radioamadorismo e gostar, mais rápido ela vai aprender as matérias pertinentes a tudo isso. Porque eu fui forçado a fazer contato em inglês e eu tive que aprender. Aprendi também um pouco de espanhol.

mentada internacionalmente, é o código Q (ver quadro). Ele foi criado em 1918 para as comunicações do Exército, Marinha e Aeronáutica e os serviços auxiliares. Esse código é usado para abreviar frases. Ao invés de dizer eu vou estar lá no horário das 21 horas eu chego e digo QTR de 21. Sobpressão - É verdade que já teve radioamador brasileiro no espaço? Roberto Batista - É verdade. Mantive contato com o cosmonauta brasileiro Marcos Pontes com um simples rádio den-

Saiba mais

Significado dos principais códigos “Q” utilizados pelos Radioamadores: QRA - Qual é o nome de sua estação?

QSB - A intensidade de meus sinais varia?

QRG - Qual é a minha freqüência exata (ou freqüência exata de .....)?

QSL - Pode acusar recebimento?

QRL - Você está ocupado? QRT - Devo cessar a transmissão? QRU - Tem algo para mim? QRV - Está preparado?

QSO - Pode comunicar-se diretamente? QSQ - Há médico a bordo? QTH - Qual é a sua posição em latitude e longitude ou de onde você fala? QTR - Qual é a hora certa?

QRX - Quando me chamará novamente? QRZ - Quem me chama?

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Hobby que virou paixão. O Presidente da Labre junto a seus equipamentos

Sobpressão - E o que são essas competições? Roberto Batista - As principais são as internacionais. Tem uma, por exemplo, que são 48 horas para você fazer o maior número de contatos possíveis. Esses contatos são registrados em um determinado programa de computador. Após o término dos contatos, você envia o arquivo para a central de apuração que fica nos EUA, lá ele vai fazer o confronto de todas as informações, de todos os contatos. Nesses últimos anos a gente tem ficado entre os cinco primeiros lugares no mundo nessas competições, fazendo cerca de cinco a sete mil contatos por competição. Sobpressão - Qual o panorama do radioama-dorismo hoje no Brasil? Roberto Batista - O radioamado-

Sobpressão - O radioamadorismo seria então o precursor do celular e da Internet? Roberto Batista - Nós utilizávamos a mesma forma de comunicação do celular há 30 anos. Se você analisar o mecanismo de comunicação daquela época, hoje é o celular. E os praticantes do radioamadorismo são os que realmente gostam e não aqueles que utilizam apenas para fins caseiros. Sobpressão - Cite um acontecimento recente no radioamadorismo brasileiro. Roberto Batista - De 1999 para 2000 surgiu aquela história que ia parar tudo, o bug do milênio. Nessa ocasião, os órgãos de comunicação, as companhias telefônicas, de água, todos eles, não sabiam o que realmente poderia acontecer e fizeram uma operação de guerra para acompanhar a passagem do ano. Aconteceu uma reunião do Quartel do Comando Geral da 10ª Região Militar e foram chamados alguns órgãos de telefonia celular, telefonia fixa, a Coelce, a Cagece, o Serpro e eles apresentaram o que tinham

Marquito Santos

Sobpressão - Como o radioamadorismo interfere no teu dia-a-dia? Roberto Batista - Eu sou tão fanático pela coisa que a pergunta deveria ser como é que o meu dia-a-dia interfere no meu radioama-dorismo. Eu estou no radioamadorismo desde a época de solteiro. A minha esposa, quando me conheceu, já sabia que eu era radioamador. Mas, depois que eu casei, eu adeqüei o hobby aos horários dela. É lógico que você não vai ficar a vida inteira diante de um rádio porque tem a vida para curtir também. Eu sou um radioamador que gosto de competição. O meu dia-a-dia é um pouco mais puxado pelo cargo que eu exerço que é a presidência nacional da Labre. Tenho as reuniões que participo com a Anatel em Brasília e me desloco para lá para essas reuniões. E também as provas de admissão na Labre que são nos finais de semana. Dependendo da localidade, a gente leva a família e passa o final de semana. E se diverte.

rismo hoje está como há 30 anos. Em que sentido? No sentido da prática do hobby. Há 30 ou 40 anos, quando surgiu o radioamadorismo no Brasil, por volta da década de 1920, era uma coisa totalmente informal, não tinha nem regulamentação nesse sentido. Em 1934 é que surgiu a entidade (Labre). Até então o que era o radioama-dorismo? Eram pessoas que gostavam de comunicação e que usavam o rádio para bater papo a longas distâncias sem nenhum compromisso formal. A população percebeu que aquilo podia trazer benefícios pra ela, então começou a pedir medicamento, querer falar com um parente muito distante, porque você imagina a comunicação via telefone naquela época. Foi aí que começou o auxílio à comunidade. O tempo foi passando e começaram a surgir os fazendeiros que não tinham como se comunicar com suas fazendas no interior do Estado ou em outras capitais e utilizavam o rádio para esse fim. Surgiu, então, o primórdio do celular como a gente chama os hand talks (rádios portáteis), que você saía com ele na cintura e de onde estivesse acionava uma linha telefônica que era acoplada a uma estação repetidora e falava com sua casa. Era um celular das antigas.

O Coordenador da MSC no Nordeste, Marcos Santos, o Marquito, 29 anos , natural de Pernambuco, é surfista desde os nove anos e se converteu através da MSC em 1996. Depois tornou-se missionário, trazendo a MSC para Fortaleza no ano de 2000. Marquito iniciou o Projeto Vila Mar na praia do Titan (Titanzinho), através de aulas de surf com abordagem em conceitos de cidadania, para crianças e adolescentes carentes daquela região. “O surf é a ferramenta para a gente se aproximar das crianças. Para se engajar no projeto, esses jovens precisam estar na escola e fazendo aulas bíblicas. Só depois passam a praticar o surf”, diz Marquito. O projeto do núcleo no Titanzinho já acolhe mais de 40 crianças, adolescentes e até adultos, que montaram um grupo de música chamado “Profetas do Hap”, composto por quatro integrantes. Um deles é Carlos Irlando, de 28 anos, que se envolveu com drogas ainda jovem. Com uma sentença penal a ser cumprida de seis meses, lhe foi dada a chance de revertê-la em trabalho comunitário dentro do Projeto Vila Mar. Irlando diz ter se identificado muito, tanto que se converteu e participa do projeto até hoje. O Projeto Vila Mar trabalha também com música, ballet, teatro, artes plásticas, computação, futebol de praia e futsal, mas, segundo Sérgio Cleiton Andrade, líder do Núcleo MSC no Titan, todas essas atividades são envolvidas com a espiritualidade. O objetivo é acompanhar os jovens até dezoito anos para serem encaminhados a um emprego pelo projeto “Jovem Aprendiz”. “Estamos desenvolvendo um curta metragem sobre o Projeto Vila Mar, o bairro Serviluz e o surf dos jovens. As reuniões da MSC no Titan acontecem semanalmente, às

Divulgação

Roberto Batista Pereira, presidente nacional da Liga de Amadores Brasileira de Rádio Emissão (LABRE), demonstra grande entusiasmo ao falar sobre radioamadorismo. Na entrevista a seguir, ele comenta o seu hobby desde o início e o atual panorama da categoria, além de desmistificar alguns conceitos que são tomados como verdade pelo senso comum

Resgatando Valores

sextas-feiras, dentro do próprio Projeto”, diz Cleiton Andrade. Esses encontros também são realizados no Anfiteatro da Avenida Beira Mar, às segundas-feiras, onde reúnem um público médio de 300 integrantes. Mas, mensalmente, ocorre uma reunião que conta com um público bem maior. Nela, há apresentação de uma banda, exibição de vídeos e um pregador convidado. Nessas ocasiões, a freqüência chega a dobrar. “Queremos ser uma boa referência. Expandir a palavra cristã, servindo à comunidade do surf e comunicando o evangelho ao máximo de surfistas possíveis. A base da nossa missão é o relacionamento”, relata Marquito.

Laurêncio Lima

Mitos e verdades sobre o radioamadorismo

pessoas, proporcionando um ideal de evangelização. “A Missão, aqui no Ceará, alcança, acompanha e tem cuidados com os integrantes e suas famílias, oferecendo amparo”, afirma Bispo.

Cura Espiritual Paloma Nogueira, 19 anos, integrante da MSC, diz que as reuniões são a sua “segunda casa”, onde pode contar com amigos de verdade e se sentir bem acolhida. “Quando estou servindo à MSC me sinto mais próxima de Deus. Comecei a ter mais interesse pelo surf por causa da Missão, que também nos dá mais facilidade de se aproximar dos outros surfistas para evangelizálos”, diz Paloma. Anualmente, a MSC realiza a “Surf Trip”, uma viagem pelas praias do Brasil. A equipe cearense sai do local de origem e, por onde passa, deixa a sua contribuição às missões locais. As viagens são programadas e realizadas em parceria com as igrejas de cada região. O objetivo é levar a palavra cristã e a conscientização da necessidade de conservação das praias. Hoje, no Ceará, a missão tem três metas a seguir: treinar equipes para lidar com desafios; ajudar na luta contra a dependência química de alguns surfistas e passar técnicas de resgate no mar. Esta última em parceria com o Corpo de Bombeiros através do projeto Surf Salva. No Brasil, já aconteceram, desde 2004, três congressos da Missão Surfistas de Cris-

Integrantes da Missão louvando ao Senhor to: um em Porto de Galinhas, outro na Bahia e o último em Fortaleza, no ano de 2007. Já os congressos mundiais são realizados a cada dois anos. Em 2006, ocorreu um no Brasil, em São Paulo. O próximo, em 2008, será na África do Sul. Outro fruto da MSC é a Bíblia dos Surfistas. A idéia partiu do Christian Surfers International (Surfistas de Cristo Internacio-

nal) da Austrália e, hoje, já existe a versão em português, japonês e está sendo elaborada uma em espanhol. “Para quem está chegando agora à comunidade, nós encaminhamos esses surfistas cristãos para pequenos grupos. Eles precisam estar engajados em igrejas, de preferência evangélicas, e ter como prática esportiva o surf”, completa Marquito.

Projeto

Surf Salva O Corpo de Bombeiros do Ceará desenvolve, desde 1996, o Projeto Surf Salva, que tem o objetivo de treinar surfistas voluntários para auxiliar no socorro de banhistas em caso de afogamentos, diminuindo assim o tempo de resposta no atendimento às vítimas. O projeto treina surfistas para o salvamento aquático, além de proporcionar aos esportistas um caráter solidário. Atualmente, o Surf Salva atua em várias praias do litoral cearense. Podem participar do projeto jovens com idade a partir de 14 anos (desde que tenha permissão dos responsáveis). O curso tem carga horária de 24 horas/aula. Os voluntários recebem aulas de três disciplinas: salvamento aquático, primeiros socorros a afogados e instruções combinadas (simulações).

Christian Surfers International O surfista australiano Brett Davis dirige atualmente a Christian Surfers International (CSI), uma missão formada por surfistas cristãos. Existente desde a década de 70, surgiu com o objetivo de levar a palavra cristã aos surfistas, desmistificando um preconceito recorrente que vincula a imagem do surfista à malandragem, à vadiagem ou à marginalidade. Atualmente, a Missão está presente em vários países ao redor do mundo, incluindo Austrália, Nova Zelândia, Indonésia, Japão, Taiti, África do Sul, Reino Unido, França, Espanha, Portugal, Alemanha, Irlanda, Estados Unidos, Havaí, Costa Rica, Porto Rico, Venezuela, Peru, Chile, entre outros, com mais de 500 adeptos.

Os encontros acontecem de forma regular e os integrantes do CSI ainda se encontram durante treinos, reuniões, viagens, congressos e numa comunidade do site de relacionamentos Orkut. No Brasil, a Missão Surfistas de Cristo afiliou-se ao CSI em 2001. A comunicação entre o grupo no Nordeste do Brasil também é feita através do jornal virtual “MSC Ne News”, que circula entre os líderes da organização, e do site www.christiansurfers.net.

Serviço: www.missaosurfistasdecristo.com.br

Ação social com os jovens do Titan

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Emersomar Rodrigues

Personagens, imóveis, ilhas, tudo virtual, vendidos como mercadoria e comprados com dinheiro de verdade. No espaço virtual convivem servidores piratas e jogadores apaixonados pelos games ou pelo dinheiro que eles proporcionam. Esse é o mundo dos MMORPG (Massive Multiplayer Online Role Playing Game) ou jogos RPG online com múltiplos jogadores. Nesses ambientes surgiu também um novo tipo de comerciante: o fazendeiro de ouro. Ele comercializa de jogadores “sarados” até espadas e lanças no ambiente online e está se espalhando pela cidade (real) de Fortaleza Emersomar Rodrigues

Eles chegaram à Fortaleza. Estamos falando dos fazendeiros de ouro dos MMORPG, ou jogos RPG online com múltiplos jogadores. Segundo a Wikipédia, RPG, do inglês Role Playing Game (Jogo de Interpretação de Papéis), significa um jogo de estratégia e imaginação em que os jogadores interpretam diferentes personagens em diversos mundos, vivendo aventuras e superando desafios de acordo com as regras descritas no sistema escolhido. Nesses ambientes, comunidades de pessoas usam o espaço cibernético para construir lugares e personagens que só existem no mundo virtual, mas que já começam a penetrar na economia real. Os “fazendeiros” adquirem um personagem com o nível de iniciante e o levam até um patamar mais alto no jogo. Depois, o vendem para quem não tem tempo de jogar ou não consegue chegar a esse nível. Vendem também itens, como espadas, lanças e dinheiro sendo, por isso, conhecidos como “fazendeiros de ouro virtual”. Esse tipo de artimanha, se é que pode ser chamado assim, tem na China seu principal mercado. Lá, estudantes ganham 75 dólares por semana, cerca de R$ 150,00, para jogar e construir riquezas virtuais para outras pessoas. No Ceará, donos de lan house estão investindo no mercado, colocando garotos durante horas nos computadores para “upar”, ou seja, aumentar

Emersomar Rodrigues

Rádios de vários modelos podem ser usados para comunicação

também é responsável pelo Rio Grande do Norte e Piauí. Quanto às penalidades, elas variam de acordo com a infração. Existe uma legislação que regulamenta todas as normas (Norma 31/94) e que determina seis tipos de infrações, como a execução de serviços de radioamador sem observar os termos da licença da estação, a utilização de linguagem codificada não identificada pelo Ministério das Comunicações ou aceitar remuneração pelo serviço prestado. No caso de constatada alguma irregularidade, o infrator será notificado com prazo para defesa ou suspensão imediata do serviço. As penalidades são multa, suspensão e cassação, avaliadas a partir de três fatores: gravidade da falta, antecedente do infrator e reincidência.

Pequeno investimento

Linguagem universal

Para fazer parte desse seleto grupo não é necessário um grande investimento. O presidente nacional da Labre conta que no passado era mais difícil. “Antigamente, para se ter um rádio, você tinha que fabricá-lo e, para isso, tinha que ter as válvulas. O custo era muito alto. Até porque nós só tínhamos uma ou duas fábricas de equipamentos nacionais, hoje fechadas. Atualmente, os equipamentos usados ou novos vêm de fora. Mas temos equipamentos acessíveis em todos os preços, que podem variar entre R$ 300,00 a U$ 11.000,00 (aproximadamente 22 mil reais). Se você me perguntar qual a diferença entre um e outro, eu vou dizer o seguinte: é como ter uma Ferrari ou um Fusca. Os dois vão sair daqui e chegar a um determinado destino, só que num você vai ter mais conforto e chegar mais rápido, mas todos funcionam do mesmo jeito”, explica Beto.

Evolução

As lan houses são ponto de encontro de muitos jogadores em busca de construir personagens e riqueza, tanto no mundo virtual, quanto na vida real o nível dos personagens e depois revendê-los. O preço de cada “avatar” (personagem) varia de acordo com o jogo e o nível alcançado. Há também aqueles que comercializam personagens e bens do jogo por conta própria ou usam terceiros para isso. De acordo com o site Folha Online, o economista Edward Castronova, da

Universidade de Indiana (EUA), afirmou que os jogos se tornam cada vez mais populares entre adultos e que já há entre 10 milhões e 20 milhões de aficcionados no mundo. Segundo o site, a comercialização de itens virtuais está se tornando profissional. "Há mais e mais pessoas que vêem a obtenção de ouro (do jogo) como um trabalho”, afirmou Castronova, através do Folha Online. Existem sites especializados para esse

comércio, é o que afirma Eder Aguiar, dono da lan house Rizilyne, em Caucaia, Região Metropolitana de Fortaleza. Nesses sites, segundo Aguiar, você encomenda o seu “chá”, que é o personagem ou avatar do jogo, diz em que nível você o quer e paga por ele, por meio de uma transação via cartão de crédito ou depósito bancário. Ganha o dono do site, por cobrar uma taxa pela divulgação dos personagens, e o jo-

A Internet e o radioamadorismo

É necessário, ainda, passar por um exame de admissão, coordenado pela Labre e pela Anatel, no qual são feitas provas de legislação (da teledifusão no Brasil), técnica e ética operacional, radioeletricidade e telegrafia, recepção e transmissão (Código Morse). As provas são divididas por categorias: C, B e A. A diferença entre elas é o que delimita o acesso a determinadas freqüências. Na categoria A, o nível das provas é mais elevado. Nesse caso, o radioamador terá direito a acessar todas as freqüências permitidas pela Anatel. Para fazer a prova é necessário pagar uma taxa de R$ 16,00. Ao ser aprovado, o radioamador recebe um indicativo de chamada, que é um número único no mundo inteiro para cada operador, que identifica sua categoria e de onde está falando. A mudança de uma classe para outra ocorre após o cumprimento de um determinado tempo em cada categoria. A fiscalização é feita pela Anatel, que conta com uma equipe de fiscais. Eles monitoram tudo por satélite e ainda obedecem a um roteiro de visitas em todo o Estado do Ceará. A unidade do órgão no Estado

Existem radioamadores para todos os gostos. Há aqueles que estão ali para fazer experimento; tem o outro que só gosta de fazer rádio escuta, aquele que apenas acompanha as estações de fora e anota as suas freqüências. Tem, ainda, aqueles que gostam de conversar, participando das rodadas de bate-papo. Sales, por exemplo, sempre gostou mais de escutar do que de falar e afirma que tem boas condições de conversar em português, em inglês e sinais em Código Morse, mas que só faz isso por necessidade, e não por opção. Ele nos conta que se emociona ainda hoje quando presencia comunicações entre povos distantes e totalmente diferentes, como uma pessoa do interior do Nordeste brasileiro e um americano, por exemplo. “Uma das coisas mais lindas é ouvir: ‘oi, vosmecê tá me ouvindo?’ E ao tentar contactar uma estação de rádio americana: ‘I want to speak to you’. Numa linguagem singela, desinibida e fabulosa, mas de qualquer jeito a comunicação se dá”, confessa ele. Divulgação

Ganhe dinheiro real no mundo virtual

no dia-a-dia, mas comuns no radioamadorismo. Uma pessoa na Holanda, por exemplo, enviou medicamento solicitado no Ceará por uma rodada de bate-papo via rádio, com a remessa paga, só precisando ir pegar no aeroporto. “É esse o espírito do radioamador”, defende Sales. Existem até competições mundiais de radioamadorismo. Disputas estas que consistem, por exemplo, em ver quem consegue a maior quantidade de contatos em todo o planeta em um período de 48 horas. No Brasil, os radioamadores recebem suporte e orientação da Labre e são supervisionados pelo Ministério das Comunicações, por meio da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Entretanto, quem pensa que nesse meio só existem pessoas mais velhas ou que vivem o radioamadorismo há bastante tempo, engana-se. As novas gerações também são adeptas ao hobby. Beto fala de dois irmãos que começaram cedo no radioamador: há três anos, Lucas e Diego, na época com 10 e 12 anos, respectivamente, foram influenciados pelo pai, mas com o tempo se apaixonaram pela atividade. “No rádio, eles vêem na prática as matérias que estudam na escola, como física e geografia. Um dia, o pai de Lucas e um amigo disseram que tinham feito contato com alguém na Argélia. O menino correu para o mapa para saber onde ficava esse país”, fala. Os garotos até fazem brincadeira; combinaram de conversar em sala de aula batendo o lápis, através da linguagem do Código Morse, principal atrativo para eles. Lucas e Diego ingressaram na categoria C. Hoje, com três anos de radioamadorismo, já podem mudar de classe.

Mesmo com toda a comunicação existente no radioamadorismo, a Internet não se torna um forte obstáculo? Nesse caso, tanto Sales quanto Beto concordam em afirmar que não. Para Sales, a resposta está na paixão verdadeira pelo rádio. Ele conta que nenhum de seus três filhos é radioamador. “O mais velho, Fernando, começou comigo e desistiu em face do computador. Quando você me pergunta se a Internet veio para atrapalhar o radioamadorismo, eu digo que não. Porque o meu filho, por exemplo, era radioamador por imitação, não era por gostar mesmo”, conta Sales. De acordo com Beto, o radioamadorismo não compete com a Internet, pelo contrário, veio para auxiliar. “O radioamadorismo não está aí para competir com a Internet e nem ser escravo dela. Quem é que vai usar o rádio se já existe a Internet? Aquele cara que gosta do rádio, gosta do hobby. O bom, como se diz na gíria do radioamador, é você secar a garganta para chamar o cara, para escutar, aprender a apurar o ouvido como a gente diz. Se eu ligar um rádio aqui, você vai dizer: mas está só chiando. Mas pra gente não é só chiado. Tem alguém falando e a gente está escutando. Você começa a educar o ouvido e é aí que está a paixão da coisa”. Talvez por toda essa paixão, o radioamadorismo está longe da extinção. PT7BZ ou Elísio Elvio Pinheiro é um radioamador com diversos títulos mundiais

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Emersomar Rodrigues e Lilian Amaral

De dentro do quarto, o aposentado Francisco Sales Carvalho, de 80 anos, ou simplesmente Sales, ou ainda PT7KP (identificação na esfera do radioamadorismo), fala com todo o mundo, literalmente. Às 4 horas da manhã começa a “rodada”; uma sessão de bate-papo com brasileiros que já dura mais

de 20 anos. Em outros momentos, ele também fala com pessoas da Sibéria, da França, da Inglaterra e dos Estados Unidos. Sales considera que a expansão da Internet não afastou os verdadeiros apaixonados pela transmissão de voz e dados via rádio, os radioamadores. Ele, por exemplo, não larga os aparelhos, que admite ser um vício. Sua mulher, com quem está casado há 52 anos, não gosta

do barulho emitido pelos rádios e concorda com o que ele chama de vício. “Só pode ser um vício mesmo, pois ele acorda de madrugada e todo mundo também, com essa chiadeira aí”, afirma a esposa inconformada, mesmo após tantos anos. Sales é calmo ao responder sua mulher. “Para ela é chiadeira, mas eu tenho o ouvido treinado e sei distinguir barulho de comunicação”, fala ele. Muitos usuários do radioamadorismo permaneceram fiéis a esse hobby. A qualquer hora do dia ou da noite, em todas as partes do mundo, ligam seus equipamentos, comunicando-se com várias pessoas nas faixas de rádio a eles reservadas. Nessas comunicações,

não é raro salvarem vidas, como afirma o cearense Roberto Batista Pereira, Beto (PT7YV), 40 anos, empresário e presidente nacional da Liga de Amadores Brasileira de Rádio Emissão (Labre). “Em eventos mais recentes, como o 11 de setembro e o Tsunami, na Ásia, os radioamadores foram imprescindíveis para o contato entre as forças de ajuda e as pessoas no meio dos desastres”, garante. Para Beto, os usuários do radioamadorismo contribuem diminuindo o sofrimento de pessoas angustiadas pela falta de notícias de entes queridos, enviando medicamentos ou providenciando a remessa dos mesmos. Sales também já presenciou fatos raros Emersomar Rodrigues

O veterano radioamador Sales passa horas se comunicando pelo rádio com gente do mundo todo

Espada de ouro Encontrar quem confesse ser um fazendeiro de ouro não é tarefa das mais fáceis, mas o estudante universitário Sílvio (nome fictício) é um deles. Ele afirma que já chegou a ganhar cerca de R$ 400,00 em um mês vendendo seu personagem de um jogo online. Arredio, Sílvio, que joga Lineage atualmente, teme os Game Master (GM), um tipo novo de “profissional” a serviço dos proprietários dos games. Infiltrados, eles fiscalizam e condenam abusos nos ambientes virtuais, como agressões verbais, ou ainda a venda de itens, fatos estes que interferem no bom andamento do jogo. O estudante de sistemas de informação, Johnatan Cruz, de 22 anos, é mais um fazendeiro virtual. Ele teme os GM, mas concorda em falar por acreditar não estar fazendo nada de errado. Ele joga Ragnarök há pelo menos dois anos e, nesse tempo, levou seu personagem, um cavaleiro que carrega seu nome pelos quatro cantos do mundo virtual, ao nível 97 de 99 possíveis. Ele afirma que jogava por diversão, até que há mais ou menos três meses um bruxo que estava recomeçando do zero no game, por ter vendido seu avatar recentemente, ofereceu R$ 300,00 por uma espada do seu estoque – rara no mundo de Ragnarök. Ele a vendeu e, daí por diante, esse jogador virou freguês costumeiro. “Dei o número de minha conta para ele via MSN (software de comunicação instantânea) e o depósito foi feito, desde então já vendi itens e dinheiro do jogo, cerca de 250 milhões de Zenys só para esse bruxo”, conta, satisfeito. Zeny é a moeda local de Ragnarök. Na sua conversão de Zeny para Real, Cruz vende 1 milhão de Zenys por R$ 7,00, seja em dinheiro ou bens virtuais como espadas e escudos. Segundo ele, as vendas já lhe renderam mais de R$ 2.000,00 em dinheiro real. Além de seu cavaleiro, ele tem um outro personagem, um mercador que cuida de seu comércio e vende seus itens no jogo por horas a fio. “Para cada servi-

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dor, podemos ter cinco personagens. Então, o deixo lá vendendo e trocando itens para mim”. Cruz explica que um programa que faz parte do game só permite que as trocas e vendas sejam concretizadas se forem previamente autorizadas pelo jogador. Os clientes de Cruz são pessoas como o estudante de Administração Ednardo Pinheiro, 17 anos, que pagava R$ 140,00 por mês para usufruir do game Tíbia. Pinheiro desembolsava R$ 70,00 por um avatar próprio, com o qual ele jogava e mais R$ 70,00 por outro. Esse segundo “chá” funcionava como uma espécie de escravo. “Ele ficava só parado, aumentando a minha riqueza no jogo”, afirma Pinheiro. Essa estratégia lhe renderia mais dinheiro virtual e o aumento do nível de seu personagem principal. Ele afirma que nunca comprou itens, mas que pensou nisso algumas vezes. Pinheiro conta que sua vida mudou muito depois que ele passou a se dedicar mais ao mundo virtual. “Jogava durante horas, levei seis meses para que o meu personagem chegasse ao nível 86 de um total de 100, gastei mais de R$ 800,00. Mas para tentar parar de jogar, pois tinha ficado de recuperação no colégio, tive que vender o meu chá por R$ 500,00, só para não ficar no prejuízo total, pois ele valia muito mais. Depois me arrependi e comecei o jogo do zero de novo com outro avatar”, confessa. Segundo informações da Folha Online, Andrea Bedricovetchi, diretora-geral da Level Up, proprietária do jogo Ragnarök, Lineage, entre outros, diz que a empresa não encoraja a venda de itens e personagens porque isso distorce os objetivos do game. A Folha informou também que Manja Herrmann, do atendimento ao consumidor do jogo gratuito Tibia, diz que a CipSoft, responsável pelo mesmo, estabelece nas regras que a venda de itens por dinheiro não é permitida. Para o advogado Cristiano Therrien, mestre em direito e informática, a forma para saber se a prática é legal consiste em, primeiramente, analisar os contratos ou licenças de uso dos jogos. Segundo ele, um avatar não é de propriedade da pessoa. Ela apenas adquire o direito de uso do ambiente. “É possível uma pessoa vender um avatar para outra, desde que esteja no contrato. E a justiça brasileira tem autoridade para julgar qualquer crime cometido nesses ambientes”, afirma Therrien.

Personagens e objetos são vendidos em negociações online Emersomar Rodrigues

Mesmo com as novas tecnologias, gente de todas as idades ainda utiliza o rádio para se comunicar. No Brasil, já são mais de 65 mil radioamadores. No Ceará, cerca de dois mil usuários levam a sério o hobby que não pára de encantar novos adeptos

gador responsável pelo “chá” anunciado. Não há compra apenas de personagens nesse mercado, existem outros produtos, como espadas, lanças, escudos e até ilhas, tudo pago com dinheiro real. De acordo com o site Nomínimo, uma ilha que só existe no mundo virtual foi vendida por U$ 26.500 no mundo real. Pergunto a Aguiar se isso é legal, ele sorri e diz não saber.

O mundo de Ragnarök é também local de negócios na vida real Foto: Divulgação

Radioamadorismo sobrevive à Internet

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Éder Aguiar cita outro mercado em expansão nos MMORPG: a criação de servidores piratas para os jogos em rede que são pagos. Ou seja, alguém que tem a licença cria um servidor pirata e coloca online para outras pessoas jogarem sem pagar pela mesma. Tem até ranking para esses servidores. Revistas especializadas divulgam a escolha dos leitores para os melhores servidores piratas, também chamados por alguns de alternativos. Eles funcionam à base de doações e da venda de ítens do jogo por meio de boleto bancário ou débito em conta. O criador do servidor, no entanto, não repassa nada para o criador do jogo. É num desses servidores piratas que o estudante da sétima série de um colégio de Fortaleza, Anderson Paulo Corrente, de 13 anos, se diverte jogando Ragnarök. Ele é um apaixonado pelo game. Seu personagem, “KiLL = D”, é um guerreiro que já conquistou muitos reinos. Pergunto a Corrente se ele perde ou ganha dinheiro com o jogo. Ele responde com certa timidez. “Não gasto nada, mas estou pensando em começar a ganhar algum dinheiro para ajudar meu pai”, afirmou, meio indeciso. Ele salienta que, para ganhar dinheiro, é só saber utilizar a moeda do jogo e investir no seu personagem, para depois

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Cresce a criação de servidores piratas ditos (ver quadro) dos games nos servidores oficiais. Ao adquirirem os cartões, as pessoas obtêm o direito de jogar em qualquer lugar, e tentar vencer os desafios do mundo virtual, seja por conta própria ou apelando para os “fazendeiros de ouro”.

Análise

O jogo Lineage II é um dos mais utilizados pelos fazendeiros de ouro vendê-lo. Indago quanto vale seu avatar, ele diz que “não vale R$ 200,00” e complementa: “eu vivo para jogar. Vender meu chá é a mesma coisa que vender minha vida”. Corrente afirmou ainda que em Ragnarök e outros games on-line o que mais gosta são as amizades. “Um jogo solitário não é jogo”, afirmou,

pensativo. Alguns dos principais jogos online, como World of Warcraft, Lineage, Tíbia, Ragnarök, Gunbound têm seus créditos e licenças vendidos em lan houses da cidade. Elas se credenciam junto às empresas fabricantes dos games para que lá sejam vendidos os cré-

De acordo com Paulo Amoreira, coordenador de mídia digital da Fundação de Cultura, Esporte e Turismo de Fortaleza (Funcet) e jogador de jogos online para fins de pesquisa, a medida em que as tecnologias de imersão e simulação ficam mais amigáveis, as pessoas migram naturalmente para lá levando suas frustações e desejos. Ele afirma que isso é uma migração natural do modelo econômico capitalista, da sociedade centrada no capital, no hedonismo, o que poderia explicar o porquê das pessoas pagarem para jogar e obter status dentro do jogo, mas não é só isso. “Na verdade, essas coisas acontecem porque existe uma demanda na sociedade e as pessoas não estão indo para esses ambientes do nada. Foi criada toda uma preparação para isso, é o resultado da sociedade do espetáculo, apregoada por Guy Debord em seu livro Sociedade do Espetáculo”, destaca Amoreira.

Novidade

Ainda sem ter uma versão em português, a última novidade em jogos online é o Second Life (SL) ou segunda vida. O jogo tem ambientes gráficos semelhantes ao mundo real. É possível andar, conversar com pessoas em volta e comprar coisas. Para fazer parte desse mundo, você pode escolher entre o cadastro gratuito que lhe permite jogar por 7 dias e um outro, no qual é paga uma taxa mensal de 9 dólares, cerca de R$ 20,00 e em troca você recebe uma mesada em Lindens, a moeda local. Segundo informações do portal de notícias G1, já são mais de quatro milhões de usuários registrados em todo o mundo no SL. No Brasil são seis mil novos jogadores por mês. Até mesmo palestras e shows podem ser feitos no jogo. A estatal brasileira Petrobras já fez palestra para seus fornecedores e a banda de punk rock cearense Montage realizou um show no mundo virtual do SL. O grupo cearense foi o primeiro da América Latina a se apresentar na comunidade virtual. De acordo ainda com o portal G1, o show virtual do Montage, que aconteceu às 22 horas (o que equivale a 17 horas no fuso de

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Second Life chega a Fortaleza

O jogo Second Life traz ambientes gráficos semelhantes a vida real Second Life), no dia 1º de março deste ano, foi realizado no Club Republik. A música foi pré-gravada e transmitida em streaming para o local do espetáculo. Enquanto os avatares da banda dublavam as canções no palco, o público podia dançar, conversar e até pedir suas músicas preferidas. No mercado das lans, a novidade ainda

não emplacou por aqui. O funcionário da lan house BC Net, Ronaldo Melo, afirma que a procura ainda é pequena, mas ele acredita que, quando a versão em português for lançada e a propaganda direcionada para o público específico desses jogos aumentar, o game vai emplacar por aqui. “Instalei e fiz o cadastro para conhecer o ambiente. Sei que ele vai pegar, só não sei

se daqui a uma semana ou um mês, mas a interface é amigável e ainda tem o apelo econômico por trás”, afirmou Melo. Mas se você não tiver Internet rápida ou banda larga nem tente baixar e muito menos jogar SL. O programa demora aproximadamente três horas para ser baixado por uma conexão discada. Depois de instalado, se você tentar explorar o ambiente, o avatar fica parado, devido à baixa velocidade de conexão, principalmente nos horários em que a ligação é mais barata, finais de semana e depois da meia-noite. Mesmo assim, baixei o SL, fiz o cadastro gratuito e criei Emerson Bleac, o meu avatar. Ele nasceu em uma ilha, mas de lá não saiu ainda. Vou tentar em uma outra oportunidade e quem sabe possa explorar melhor os ambientes virtuais que estão mexendo com a cabeça de muita gente, onde a questão financeira é um dos principais focos, despertando o interesse no mundo todo. Na China, pessoas já ficaram ricas vendendo imóveis virtuais. É esperar para ver quando os cearenses irão lançar olhares ambiciosos para mais essa mina de ouro virtual que pode lapidar pedras preciosas reais.

Começam as inovações As mudanças não pararam por aí, elas influenciariam até mesmo no preparo das tapiocas. Foram oferecidos, por meio de parcerias entre o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), o Sistema Nacional de Empregos (SINE/IDT) e o Instituto Centro de Ensino Tecnológico (CENTEC), cursos de empreendedorismo, gerenciamento, atendimento ao cliente, conservação de alimentos e de preparo da tapioca fina-recheada – a principal atração do CETARME. Antes, na Paupina, as tapioqueiras faziam apenas a famosa “tapioca tradicional”, aquela preparada com coco nas fôrmas redondas produzidas com a lata de goiabada (idéia das tapioqueiras). Com elas, criou-se uma padronização no tamanho e uma maior facilidade de manuseio no forno. Ainda hoje, elas são vendidas, mas admitem que a maior procura mesmo é pela tapioca fininha com recheio. São mais de 70 opções de recheios, entre elas: camarão, carne-de-sol, frango, caranguejo, queijo e presunto, com preços que variam de R$ 0,50 a R$ 5,00. A fama das tapioqueiras da CE-040, hoje, vai além das fronteiras do Ceará. Consideradas as produtoras da melhor tapioca de Fortaleza pela revista Veja de 2007, elas já atraíam, muito antes, importantes artistas e personalidades que passavam pela cidade. Fato que rendeu até homenagens. Tapioqueira da Xuxa, por exemplo, foi como ficou conhecido o box de Núbia

Raphael Villar

Tapioca acadêmica Fátima Farias, 23 anos, estudante de Ciências Sociais da UFC que escolheu a tapioca como objeto de pesquisa em sua monografia. Há quanto tempo você costuma ir às tapioqueiras e com que freqüência? Gosto de tapioca desde que me entendo por gente. Freqüento as tapioqueiras desde o tempo da Paupina. Não tenho, assim, uma freqüência regular, não. Mas vou de vez em quando.

Movimentação constante no Centro das Tapioqueiras Ferreira Lima. Ela conta com satisfação o ocorrido. “Eram oito horas da noite, a gente já tava fechando quando eu vi parando aqueles carros importados. Eu num imaginei, né? Aí foi arrodiando de seguranças e na hora nem tinha mais tapioca. Quando eu olhei, a Xuxa já tava era sentada. Aí todo mundo sorriu nessa hora! Eu disse: 'pessoal eu vou fazer tapioca!' (risos). Ela disse que queria tapioca e ficou esperando mais de uma hora, sentada. Ela comeu tapioca e tomou água de coco. Tinha café, mas ela não quis. Ela tava grávida de seis meses.” Núbia Ferreira conserva até hoje a cadeira que Xuxa sentou pregada na parede como

se fosse um valioso quadro. “Ninguém mais se sentou nela, não”, garante. A estudante Elisa Parente, 23 anos, freqüenta as tapioqueiras desde a época em que elas se concentravam na Paupina. Ainda pequena, acompanhada de seus pais, era parada certa quando a família estava indo ou voltando de seu sítio. Apesar das mudanças, Elisa continua indo pelo menos três vezes ao mês e diz que não perdeu o gosto pelas tapiocas, em especial pela tradicional com queijo, pois admite gostar só dessa. “O gosto da tapioca é diferente, ainda tem aquele sabor tradicional, diferente das tapiocas dos shoppings”, defende.

Por que escolheu a tapioca e, em especial, as tapioqueiras para seu objeto de pesquisa? Tenho interesse pelo estudo das manifestações culturais do Nordeste. Achei que seria interessante, além de contar a história, pensar a tapioca enquanto produto cultural, carregado de significados e gerador de um sentimento de identificação. O que a tapioca representa para o Ceará? As tapioqueiras afirmam que a tapioca é uma tradição local. Penso que a transformação do produto tapioca em tradição ou símbolo cultural não se deu de forma tão natural quanto às vezes parece ser. É preciso levar em consideração o desenrolar da história e o jogo de interesses que a movimenta.

Sabor regional com requinte Que a tapioca se tornou uma comida típica cearense já não é mais surpresa para ninguém, mas o fato novo é que a tapioca parece ter sido descoberta só agora pelos grandes comércios, como os shoppings e as casas especializadas em comidas regionais. O que teria ocasionado esse fenômeno não se sabe. Talvez deva-se ao sucesso das tapioqueiras da CE-040, que contribuiu para a divulgação da tapioca e das suas variadas possibilidades de recheios. De qualquer forma, um prato de preparo simples, de origem indígena e servido em qualquer mesa, por mais humilde que seja, hoje ganha ares de sofisticação pelos lugares em que é vendida e pelos inúmeros modos pelos quais pode ser incrementado. Daniel Machado, 32 anos, descobriu na comercialização da tapioca um investimento que só tem dado certo. Há um ano no mercado, com uma tapiocaria, ele revela que o sucesso de suas vendas se deve à vinda do comércio da tapioca para uma região mais central de Fortaleza. “As pessoas tinham que se deslocar para muito longe para apreciar a tapioca recheada. Hoje elas a encontram em lugar bem mais próximo, além disso nossos clientes podem contar com nosso serviço de

entrega”. Com 10 funcionários, a tapiocaria se tornou pequena para a boa clientela e tem promessas de se expandir para outros bairros e chegar até mesmo aos shoppings. Ana Paula Souza, 23 anos, trabalha próximo à tapiocaria e, pela correria das atividades, prefere recorrer aos pedidos por telefone. “Aqui, no trabalho, é certeza todo mundo pedir. As tapiocas chegam sempre quentinhas, embaladas com cuidado. Compensa muito,

pois além de serem gostosas, têm um preço acessível a qualquer um.” Apesar de achar uma ótima idéia o preparo das tapiocas recheadas, Ana Paula prefere a tapioca fininha com manteiga e sempre acompanhada por um bom cafezinho. Com 110 sabores de tapiocas no cardápio e com preços que vão de R$0,50 a R$5, Daniel diz que é necessário estar sempre inovando e alerta que a sua criação de tapiocas Fátima Farias

Tapioca com chocolate: beleza como diferencial

recheadas não vai parar por aí. Criatividade e determinação adquiridas em cursos e trabalhos em fast-foods nos Estados Unidos. Para Daniel Machado, a tapioca é um prato tradicional cearense, mas acredita que a forma como hoje ela está sendo comercializada, com os mais variados recheios, pode se tornar conhecida e apreciada no mundo inteiro. Ele comprova a idéia pela grande receptividade que seus pratos têm obtido e por experiências que têm dado certo em todo o Brasil. O fato é que a tapioca, seja ela na versão salgada ou doce, preparada com chocolates ou morangos, conquistou os mais diversos paladares, até os mais exigentes. Mas não somente paladares, a apresentação visual das tapiocas é um estímulo a mais para apreciá-la com gosto. As suas coberturas e seus recheios não nos deixam mentir. Daniel Machado garante que a beleza dos pratos é o grande diferencial em suas tapiocas. Simples ou sofisticada, em qualquer lugar que se possa comprá-la, a nossa tapioca se tornou mais do que nunca um prato apreciado por pessoas de lugares diversos, independente de status ou formação cultural. Além de tudo, é boa de comer e bonita de se ver, a criatividade cearense é quem manda.

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Carolina Fernandes Dahiana Araújo

O dia começa cedo para Maria José Gomes, 42 anos. Às 5 da manhã, ela já está de pé e se apronta com satisfação para mais um dia de trabalho. Tapioqueira desde criança, cresceu vendo o pai fazer tapiocas para vender, tradição que já vem de longe com as habilidades do avô. O seu destino, todas as

manhãs, é o box São Rafael, no Centro das Tapioqueiras e do Artesanato de Messejana (CETARME). No local, os fregueses vão chegando aos poucos. “Durante a semana, o movimento não é tão grande, melhora mesmo nos fins-de-semana”, informa Maria José. A lida, iniciada às 6 horas, só vai terminar por volta das 21 horas e se repete durante toda a semana, na qual as vendas são de sua responsabilidade, pois ela reveza o ponto com a irmã, Dahiana Araújo

Maria José, tapioqueira do box São Rafael

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Valdenize David, a permissionária do box. A rotina de Maria José é parecida com a da maioria das tapioqueiras da CE–040 (Av. Washington Soares), onde trabalha. São famílias inteiras que se dedicam e se dividem no preparo e no comércio das tapiocas, atividade que constitui a única fonte de renda para muitas delas. Reunidas em 26 boxes e numa estrutura montada há cinco anos, muitas tapioqueiras relembram com saudades a época em que se concentravam na Paupina. “Muitos, quando vieram para cá, até desistiram, porque a gente já morava lá, tudo era feito como se estivesse em casa; mas, por outro lado, nós ganhamos aqui uma ótima estrutura, com condições melhores de trabalho e só temos a agradecer ao governo da época”, reforça Maria José.

tão bem. A duplicação da CE-040 e a construção da nova Av. Washington Soares desviaram o fluxo de carros que comumente passava pela Av. Barão de Aquiraz. O movimento foi reduzido de forma significativa por lá, prejudicando conseqüentemente a venda das tapiocas. Foi um momento difícil para todas as famílias que tinham apenas essa fonte de renda. Segundo as tapioqueiras, a média de vendas nos finais de semana caiu de mil para cinqüenta e, durante a semana, havia dias que se vendiam apenas quatro ou cinco tapiocas.

Em ação

Para chamar a atenção das autoridades estaduais, as tapioqueiras fizeram uma manifestação com cartazes expostos na avenida. Queriam um retorno na pista para facilitar o acesso dos carros a seus pontos de Made in Paupina vendas. O pedido foi atendido, mas não reO antigo local, na Av. Barão de Aquiraz, sultou em grandes melhorias. Elas queriam foi reconhecido pelo então governo do Esta- uma iniciativa que revalorizasse o Ponto das do , na década de 1960, Tapioqueiras, algo que as como o Ponto das permitisse voltar a viver “Durante a Tapioqueiras do Ceará. Tudo da venda da tapioca, se possível, no mesmo local. começou quando alguns semana, o moradores da comunidade Foi aí que os técnicos da transformaram o fazer doSecretaria do Trabalho e movimento não méstico da tapioca em atiAção Social do Estado do é tão grande, vidade cotidiana para ajudar Ceará iniciaram um planenas despesas. As primeiras jamento para tentar solumelhora tapioqueiras improvisavam cionar as questões apreum forno a lenha em frente sentadas. mesmo nos as suas residências, um A melhor solução encontrada por eles foi a isopor para conservar quenfins-detinhas as tapiocas e algumas transferência das tapiosemana”, mesas e cadeiras. Pronto. queiras para um outro loEra só esperar os primeiros cal, às margens da nova informa clientes que chegariam por CE – 040, o que exigiu a volta das 6 horas da manhã. construção de uma nova Maria José Com o tempo, a freestrutura, esta que conheguesia começou a aumencemos hoje como tar e a ganhar caras novas. Nos fins-de-se- CETARME. As obras duraram aproximamana, quando o fluxo de carros era mais damente dois anos e as famílias tiveram que intenso pela Av. Barão de Aquiraz, (na épo- se sustentar como puderam. “Só com a graca a principal via de acesso às praias do li- ça de Deus é que nós passamos por esse toral leste), o Ponto das Tapioqueiras era período”, recorda a tapioqueira Maria José. parada obrigatória para os banhistas. Núbia Com o prédio novo, as tapioqueiras Ferreira, vice-presidente da Associação das teriam permissão para utilizá-lo como loTapioqueiras da Paupina e permissionária cal de trabalho e seria delas toda a resdo box Tapioqueira da Xuxa, relembra com ponsabilidade pela limpeza e segurança satisfação. “Se tivesse um movimento bom, do local. Diante da nova realidade, sob você sabe quantas tapiocas eu fazia lá num a orientação do Serviço de Apoio às domingo à tarde? Só do meio dia pra tarde, Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), seiscentas tapiocas. E não dava vencimen- elas passaram a se organizar a partir da to. Tinha movimento grande”, gaba-se. criação da Associação das Tapioqueiras A questão é que nem tudo continuou da Paupina (ATP).

Ana Paula Almeida

Jogos simuladores da vida real conquistam cada vez mais o espaço da rede e permitem a interação entre jogadores do mundo inteiro. The Sims e Second Life (SL) são os mais conhecidos, mas são diferentes em alguns aspectos. The Sims, que surgiu três anos antes do SL, não permite ao jogador obter lucros com o jogo. A versão on-line do game precisa de uma mensalidade de 10 dólares, mas os objetos adquiridos no jogo são comprados com o dinheiro virtual adquirido no próprio game. O jogo foi lançado em fevereiro de 2000 e criado por Will Wrigt, o mesmo que criou SimCity. The Sims levou sete anos para ser desenvolvido, mas sua versão online não fez tanto sucesso quanto era esperado. Os jogadores controlam famílias virtuais e devem fazer com que seus Sims, como são chamados os personagens, realizem atividades comuns a nossa rotina, como escovar os dentes, tomar banho, ir trabalhar ou ir à escola. Cada jogador escolhe a sua família e a quantidade de membros que ela deve ter. A Maxis, empresa distribuidora do game, também conta com as expansões do jogo, como The Sims –Vida de Universitário ou The Sims – Em férias. Tudo para atingir um público diversificado e cada vez maior. Segundo o site oficial da Eletronic Arts, o game é um fenômeno de vendas, sendo considerado o jogo para computador mais vendido nos anos de 2000, 2001 e 2002, atingindo a marca de 28 milhões de cópias vendidas e já traduzido para 17 idiomas. No Brasil, a comunidade The Sims – Bra-

Segundo a psicóloga e coordenadora pedagógica da Ilog Tecnologia em Santa Catarina, Daniela Karine Ramos, em entrevista realizada por e-mail, o que desperta o fascínio dos jovens é a autonomia e o desafio que o jogo proporciona. “As regras e valores dos jogos são diferentes dos da vida real. Os jogadores têm outras possibilidades de ação que não têm em seu dia-a-dia. São os heróis, assassinos, bandidos etc.”, explica. Daniela Ramos publicou o artigo “Jogos Eletrônicos e a Construção do Juízo Moral, das Regras e dos Valores Sociais”, a respeito de seu trabalho de pesquisa com os games Second Life e The Sims. Segundo ela, nos dados que coletou, as crianças demonstraram a capacidade de distinguir o que é real do virtual, mas certamente essas vivências no virtual podem refletir sobre comportamentos no mundo real.

Momentos comuns ao dia-a-dia são simulados no game The Sims sil, no site de relacionamentos Orkut, reúne 95.978 membros que utilizam os fóruns para trocar experiências vivenciadas no computador. Juliana Rego Landahl Cabral, estudante de Direito, se considera apaixonada por jogos eletrônicos e The Sims é o seu preferido. Já passou mais de quatro horas em frente ao computador jogando. “Quando tenho algo muito importante a fazer, como estudar, tenho que desinstalá-lo do computador para não correr o risco de acabar me rendendo ao game”, revela. Uma preocupação que cerca o jogo é o risco dos jogadores se viciarem a ponto de deixarem

as suas vidas para atingir suas metas e sonhos no simulador ou mesmo começarem a confundir a realidade. “Já deixei de me divertir com os amigos e sair para alguns lugares por causa do jogo”, afirma Juliana. Fernando Luiz Moura Lopes, estudante de Comércio Exterior, se diz preocupado com o vício que o jogo traz para sua vida. “Chego do trabalho e vou direto jogar, nem converso mais com os amigos no MSN e nem com minha família”, revela.

Quanto pagar para jogar Jogo

Preços

Ragnarök

03 horas 12 horas 30 dias 90 dias 180 dias

Lineage II

**CD KEY R$ 49,90 30 dias R$ 29,90 60 dias R$ 54,90

Gunbound

*5.000 *10.000 *15.000 *20.000

R$ 3,00 R$ 7,90 R$ 16,90 R$ 43,90 R$ 79,90

R$ R$ R$ R$

Divulgação

As tapioqueiras de Messejana são destaque da cultura cearense. Desde a época em que se concentravam na Paupina, elas têm alimentado a tradição da iguaria com inovações e reforçam o seu reconhecimento como um prato típico do Ceará

Divulgação

Tapioca de Messejana recheada de modernidade

O cotidiano invade as telas dos computadores

13,00 25,00 37,00 49,00

Second Life

$ 9,95

The Sims

$10,00

*Moeda local do jogo ** Comprando o CD Key você ganha 30 dias grátis

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O outro lado das

Arquivo pessoal

HQs

Artigo

E a cultura popular, como fica?

Mangás, gibis, comics americanos. O mundo das histórias em quadrinhos (HQs) vai muito além destas populares revistas. E mais: no Ceará há uma intensa produção das chamadas HQs alternativas

Martha Dos Martins

O mercado de histórias em quadrinhos no Ceará é um dos maiores do Brasil. Prova disso é que em Fortaleza existem três comic shops (lojas especializadas em HQs), enquanto em Salvador, outra grande capital do país, não há nenhuma. No Brasil, existem cerca de 30 destas lojas. O que muita gente ainda não sabe é que o universo das histórias em quadrinhos vai muito além dos famosos mangás, gibis e super-heróis americanos. Os chamados quadrinhos alternativos têm um público igualmente fiel e está ganhando cada vez mais força. Para se ter uma idéia, “V de Vingança” e “A Liga Extraordinária”, ambos do cartunista britânico Alan Moore, e “Sin City”, do escritor e desenhista norte-americano Frank Miller, até já viraram filme. Segundo o cartunista e dono da Comic Shop Impacto Comics, Everton Luiz, as HQs alternativas vieram dos quadrinhos underground da década de 1960, ou seja, fanzines e revistas independentes financiadas pelos próprios autores. O americano Robert Crumb, que começou fazendo suas próprias publicações e vendendo nas ruas, é considerado o “pai” deste movimento. Everton explica que a principal diferença entre o alternativo e o comercial está no texto. “A linguagem alternativa é mais popular, os autores usam bastante palavrões. Além disso, os desenhos são quase sempre em preto e branco”, afirma.

O estudante Franzé Silva é fã de quadrinhos alternativos. Para ele, o grande atrativo destas revistas é a liberdade que os autores têm para escrever o que querem. “Você percebe que o artista está mais preocupado em seguir uma linha própria do que seguir o script da editora para agradar ao máximo aos leitores”, analisa. Já o quadrinista e professor de histórias em quadrinhos, Daniel Brandão, afirma que existem dois tipos de quadrinhos alternativos: autorais e não-autorais. “Por exemplo, um quadrinista pode ter uma revista independente e contratar outros artistas para desenhar. Estes artistas não vão fazer quadrinhos autorais deles, mas vão estar fazendo quadrinhos independentes, porque a revista vai ser publicada pelo próprio cartunista e não por uma empresa”, explica. De acordo com Sílvio Amarante, dono da Comic Shop Revista e Cia., os leitores de quadrinhos independentes normalmente têm alguma restrição com os quadrinhos comerciais. “O que eu acho uma baboseira. Tem muita coisa alternativa por aí que é porcaria. E outra coisa: qual o problema de querer ganhar dinheiro?”, questiona. Franzé faz parte desse grupo de leitores que despreza os quadrinhos comerciais. “Eu sinto que a coisa é pura picaretagem. Estendem histórias chatas, vazias e sem estilo por séculos a fio, só para vender mais”, critica. O estudante Anderson Veras se auto de-

Ana Júlia de Alencar Cysne

Guabiras: arte alternativa é a melhor do mundo fine como um fã de quadrinhos em geral, mas assume que prefere mesmo os quadrinhos populares, como “Batman” e “Spawn”, por terem roteiros mais fantasiosos e, na opinião dele, mais atraentes. “Na verdade, o sonho de toda revista alternativa é ser popular, mas falta oportunidade”, provoca. De acordo com Everton, os quadrinhos alternativos são pouco conhecidos porque falta investimento. “Esse tipo de HQ contém muita crítica à sociedade nos textos e isso não agrada muito às grandes empresas”, analisa. Mesmo

assim, ele afirma que há casos de sucesso, como “Snoopy”, de Charles Schulz, e “Calvin e Haroldo”, de Bill Watterson. Outro obstáculo para a massificação da maior parte das HQs alternativas é o preço. Os quadrinhos populares custam em média entre R$ 4,00 e R$ 6,00, têm formato de revista e são produzidos em grande escala, ou seja, são encontrados em qualquer banca de revista. Já os alternativos custam em média entre R$ 20,00 e R$ 45,00, têm formato de livro e são produzidos em pequena escala, o que os tornam difíceis de serem encontrados.

Resgate da cultura popular brasileira. Palavrinhas bonitas que juntas já se tornaram até uma “expressão”, uma bandeira que muitos levantam com tamanha convicção. Certo, mas será que este famoso “resgate” chega mesmo a ser praticado e realmente funciona? Boa vontade até existe por parte de muitos, mas por outro lado, há também a ignorância e o descaso de outros. Parece que não percebem o quão é importante valorizar a cultura popular. Ah! Já sei, você deve estar pensando: “lá vem a velha conversa sobre a ‘valorização da cultura popular regional’! Acorda, isso já está tão manjado”. E eu respondo assim: é irônico como um tema que já é “tão manjado” e “velho” ainda não foi resolvido. Muito pelo contrário, é até um assunto ignorado. Todos podem até “saber” sobre a necessidade da preservação e valorização de nossa cultura popular regional, mas, com certeza, não entendem, não enxergam isso de verdade. Os benefícios que o fortalecimento da cultura popular podem trazer a uma comunidade são muitos. Estou falando de desenvolvimento territorial, construção da cidadania, formação de consciências e valores. Um povo que tem sua cultura própria entranhada e viva em seu cotidiano é um povo forte que conhece realmente a sua capacidade e sabe aonde pode chegar. Imagine o quanto seríamos “vazios” e descaracterizados se não tivéssemos a nossa cultura popular. Imagine a falta que as lendas contadas por nossos avós, os nossos folguedos e tradições fariam para a construção de nossa história.

Identidade cultural É por isso que temos a necessidade de nos conhecer, de encontrar nossas raízes, descobrir a nossa tão falada “identidade cultural”. E não vejo instrumento melhor para nos levar a isso do que a prática da cultura popular. Incentivar e fortificar essa prática também é motivar as pessoas e despertar nelas um sentido para viver. Talvez seja esse o motivo da negligência governamental diante das questões culturais em nosso país. Quanto menos cultura existir, mais alienação e vulnerabilidade haverá. É isso, a relação é bem simples.

Mas, ressalto que a nossa postura com relação à cultura popular não é só culpa dos órgãos governamentais ou coisa parecida. Cada um de nós se torna responsável por esta desatenção a partir do momento em que sentimos uma certa “vergonha” de nossas origens, nosso sotaque. Somos causadores do enfraquecimento de nossa cultura quando abrimos, com tamanha receptividade, a porta de nosso país para o homo gringo, e ainda dizemos sorrindo de ponta a ponta: Welcome to BraZil! E eles agradecem em seu idioma natal, claro! Afinal, para que aprender português se aqui todos fazem questão de falar o universal inglês? Ora, brasileiro adora “inglesificar” tudo! “É tão bonito nome que tem muito y, w, apóstrofo, não é?!” Abro parênteses para um desabafo: nessas

horas, tristemente chego a pensar que Raul Seixas estava certo em sua canção “Aluga-se”: “Tá tudo pronto, é só vir pegar. A solução é alugar o Brasil”. Mas não quero acreditar nisso, não. Por favor, não me faça enxergar que, no nosso País, gringo recebe tratamento melhor do que o próprio brasileiro. Fecho parênteses.

Cidadania mundial Somos “assassinos” de nossa cultura também quando, por ironia do destino, fazemos dos negros e índios, exatamente duas das matrizes de nossa raça e cultura (sem esquecer dos portugueses), alguns dos grupos que mais sofrem preconceito no Brasil. Quanta ingratidão, não? E nossa “culpa” não pára por aqui... Atualmente, é comum ouvirmos muitas

pessoas dizerem, com todo orgulho e firmeza, que são “cidadãs do mundo”, leiase “globalizadas”, e defendem a “mistura cultural”, o intercâmbio e tudo o mais que envolva “troca” (o pior é que geralmente essa troca não é muito justa, sempre tem alguém que dá mais do que recebe). Tudo bem, nada contra isso. Só vejo esta “cidadania mundial” como algo preocupante a partir do instante em que ela causa detrimento a nossa cultura regional, a nossa identidade cultural. Não há nada de errado em conhecer ou gostar de outras culturas, porém, devemos privilegiar a nossa própria, aquela que faz parte de nossa história, nossa origem, aquela que nos concebeu como um povo. É esta que deve ser preservada e valorizada. A luta continua...

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Eduardo Jorge

Quadrinhos alternativos brasileiros a Dos Marth

No Brasil, as HQs alternativas surgiram nos anos 80, com a revista “Chiclete com Banana”, dos cartunistas Glauco, Laerte e Angeli. Posteriormente surgiram novos nomes, como Allan Sieber, Arnaldo Branco e André Dahmer. Os quadrinhos alternativos brasileiros também atraem muitos leitores, como o estudante Jorge Adeodato, que tem toda a coleção da Revista. “Também gosto muito da 'Tonto', do Allan Sieber”, conta. Já Franzé Silva assume que não conhece muito quadrinhos brasileiros, mas também gosta muito da obra de Sieber e dos “Malvados”, de Dahmer. Para Anderson, a “Chiclete com Banana” é uma das melhores produções alternativas. “As revistas brasileiras são muito legais, mas têm pouca divulgação e o acesso é difícil”, avalia.

Onde encontrar:

s Martin

No palco do Celina

O projeto Teatro Celina Queiroz Grandes Espetáculos, iniciativa da Divisão Sociocultural da Universidade de Fortaleza, já trouxe para a Universidade 17 espetáculos de renome nacional. Artistas como Marília Gabriela, Francisco Cuoco, Beth Faria e Regina Duarte passaram pelo espaço. Além de investir na produção artística local, a ação consolidou Fortaleza no circuito cênico nacional e o Teatro Celina Queiroz na rota cultural da cidade

Elisa Parente

O palco parece pequeno, mas a proposta é certamente grande. Com quase três anos de existência, o projeto "Teatro Celina Queiroz Grandes Espetáculos" já se tornou referência na rota artística de Fortaleza. Coordenado por Liádina Camargo, chefe da Divisão Sociocultural da Universidade, ele surgiu a partir de uma idéia de inserir uma programação cênica dentro da Universidade de Fortaleza (Unifor) e, por conseqüência, investir na produção local. Além de consolidar Fortaleza no circuito cênico nacional, a filosofia do pro-

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jeto é também repassar o recurso adquirido nas apresentações para um fundo de cultura que visa contribuir para a produção de espetáculos locais. "Fizemos uma temporada de peças infantis onde nós agraciamos quatro grupos diferenciados aqui de Fortaleza para fazer as suas temporadas no Teatro (Celina Queiroz). Também fizemos a montagem de duas peças infantis, pelo Mirante (grupo de teatro da Unifor). Fizemos duas mostras de artes cênicas dentro do Mundo Unifor (evento anual da Universidade que congrega palestras e encontros de pesquisa e iniciação científica, além de projetos de exten-

são) e entramos, em maio, com a nova temporada de peças infantis", afirma a coordenadora do projeto. A carência do público cearense de ter a oportunidade de assistir a grandes nomes das artes cênicas do país encorajou a Universidade a criar um projeto que pudesse trazer estes nomes com certa freqüência para a cidade. Segundo Liádina Camargo, "nós criamos o projeto na proposta de iniciarmos um processo cultural de artes cênicas". A iniciativa ganhou corpo e, hoje, com financiamento do Ministério da Cultura, o público cearense pode conferir espetáculos que geralmente se concentram no eixo artístico Rio-São Paulo.

Em entrevista à TV Unifor, Marília Gabriela, atriz e jornalista que esteve no Teatro Celina Queiroz com o espetáculo "A Senhora Macbeth", encerrando um ciclo de peças do "Grandes Espetáculos", afirmou que esta iniciativa da Universidade é modelo no país e que se sentia honrada de estar participando e contribuindo para a produção local. A próxima peça do projeto "Grandes Espetáculos" será “Eu te Darei o Céu”, com Mateus Rocha e Nany de Lima, prevista para o mês de julho.

Serviço Para mais informações: Liádina Camargo Lima - Chefe da Divisão Sociocultural Vice-Reitoria de Extensão e Comunidade Universitária Fone: 3477.3239 / liadina@unifor.br

Estúdio Daniel Brandão – Shopping Del Paseo, 8° andar Telefone: 3264-0051

Principais revistas independentes e preço: “Fritz, the cat”, de Robert Crumb.... R$ 37,00 “O Mundo é Mágico”, de Bill Watterson .................................... R$ 44,90 “Seis Mãos Bobas”, de Angeli, Glauco e Laerte ......................................... R$ 25,00 “Preto no Branco”, de Allan Sieber .... R$ 23,00 “Manicomics”............................... R$ 2,00

tras edições. Hoje, ele produz sete revistas alternativas: “Rocktrock”, “Catarro”, “Control Zine”, “Fiambre”, “Tutanofobia”, “Nóia” e “Los 3 Cangacêros”, este em parceria com Denílson Albano e Jefferson Portela. Além disso, ele tem um blog na internet (http://guabiras.blogspot.com), onde publica suas tirinhas e também as de outros autores. Guabiras publica suas tirinhas no Jornal O Povo desde 1998 e também não vê problema em trabalhar para uma empresa. Pelo contrário, ele até encontra um ponto positivo. “Até começar a trabalhar no jornal eu desenhava com caneta Bic. Com os anos fui aprimorando meus traços e, com o recurso do computador, pude fazer páginas mais elaboradas”, conta. Guabiras garante que nunca vai parar de fazer revistas independentes, porque, para ele, a arte alternativa é a melhor do mundo. Os designers Thyago Cabral, Julião Júnior, Wendel Alves e Pádua Sampaio são criadores da independente e escrachada “O Couro do Ovo”. Também inspirada em revistas alternativas brasileiras como “Chiclete com Banana” e “Geraldão”, de Glauco, Angeli e Laerte, a “O Couro do Ovo” já tem dois números. Everton Luiz assume que, se surgisse uma oportunidade, venderia o seu trabalho para uma editora. “Você pode ser o mais alternativo possível, mas pintou uma oportunidade, você vai pegar”, diz. Os criadores de “O Couro do Ovo” também pensam assim. “O alternativo também é um negócio. Quando o artista não perde as características, quando a editora não poda, acho que é viável”, opina Thyago, que acredita que a maior dificuldade de lançar uma revista independente é o dinheiro. Mas afinal, qual é o objetivo dos qua-

“O Couro do Ovo” ......................... R$ 3,00 “Tutanofobia” e outras revistas do Guabiras .................................... R$ 3,00

drinhos independentes? “Nós queremos contar histórias para o maior número possível de pessoas e, se alguém gostar, melhor ainda”, resume Daniel. Alternativa ou não, a arte das HQs é rica e se diferencia por unir desenho e texto. E, neste vasto universo, cada estilo tem o seu valor. Então, escolha o seu e se surpreenda com este mundo.

Martha Dos Martins

Cena do espetáculo "A Senhora Macbeth", com Marília Gabriela

Revista & Cia - Avenida Pontes Vieira, 1843 - Telefone: 3257-1057

Revista “O Couro do Ovo” thyagocabral@yahoo.com.br

No Ceará também tem disso Assim como existe um mercado muito forte de HQs alternativas no Brasil, no Ceará também há uma intensa produção delas. O maior exemplo disso é a revista independente “Manicomics”, que ano passado completou 10 anos, tendo ganho três vezes o prêmio nacional HQ Mix na categoria fanzine. Daniel Brandão é um dos criadores da “Manicomics”. Segundo ele, a HQ angariou leitores do Brasil inteiro e de algumas partes do mundo, o que lhe abriu portas. Hoje, Daniel está trabalhando para a DC Comics, uma das maiores editoras de quadrinhos do mundo, que detém os direitos de personagens como Batman e Superman. Daniel Brandão diz lidar bem com a pressão da editora. “Tenho que seguir uma série de regras ditadas pela DC Comics e não tenho nenhum problema com isso. Acho que toda profissão tem suas regras a serem cumpridas”, afirma. Apesar disso, Daniel não abandonou seus projetos pessoais. Outro quadrinista famoso no Ceará é Guabiras, que começou a produzir revistas independentes em 1993, com o fanzine “Marmota”. Ele vendia as cópias no colégio em que estudava e usava o dinheiro para comprar canetas Bic e papel, para as ou-

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Daniel Brandão concilia pressão da editora e projetos pessoais

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Sediada em Paracuru, município distante 84 km de Fortaleza, a Escola e Companhia de Dança da cidade, dirigida pelo professor e bailarino Flávio Sampaio, é um divisor de águas na vida de muitas crianças. O trabalho desenvolvido objetiva a formação e capacitação de crianças e adolescentes, proporcionando o contato com o meio artístico Elisa Parente

idealização de Flávio Sampaio, é hoje um dos projetos sociais na área de dança com maior repercussão no Estado. Juntamente com Dora Andrade e sua Edisca (Escola de Dança e Integração Social para Crianças e Adolescentes), a Escola de Dança de Paracuru é um projeto vencedor. O sentimento de empreendedorismo é visto no trabalho de cada professor da escola, todos bailarinos da companhia. Flávio Sampaio afirma que o resultado visto é fruto do esforço de cada um dos meninos e meninas, que gastam horas do dia

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Paracuru há muito deixou de ser apenas roteiro turístico do Estado. A programação cultural presente na cidade já atraiu companhias de dança nacionais e coreógrafos es-

trangeiros. O motivo: promover um intercâmbio com o grupo de 10 bailarinos que desenvolve hoje um trabalho reconhecido na cena da dança cearense. Dirigida pelo professor e bailarino Flávio Sampaio, a Companhia de Dança de Paracuru é motivo de orgulho não

apenas para os pais que vêem nos filhos as oportunidades que não tiveram, mas para os conterrâneos que aprenderam a ver a dança como objeto cultural acessível. Quem chega a Paracuru logo percebe que a cidade respira arte. Os bailarinos e alunos da escola e companhia de dança da cidade circulam pelas ruas e praças provocando olhares e comentários. Diferente do que se vê na capital, estes jovens, que adicionam a dança à rotina dos trabalhos escolares, são alvo de elogios e de alvoroço entre os outros jovens. A escola de dança, também

Cena do espetáculo "Por um fio"

A Escola O balé já foi prática comum para muitas garotas de classe média de Fortaleza. Poucas são as que nunca fizeram pelo menos uma aula de balé na vida. Sonho das mães que aspiravam calçar sapatilhas de ponta e que, de certa forma, empurravam as crianças para árduas aulas de balé nas academias da cidade. O ensino da dança clássica teve dificuldade de ser difundido no interior do Estado, pelo menos até os sonhos de Flávio Sampaio ganharem corpo. O programa de formação da Escola de Dança de Paracuru tem uma duração de dez anos, oito de aprendizagem e dois de estágio. As aulas gratuitas acontecem nas duas sedes da escola, Núcleo Boca do Poço, que atende atualmente 107 alunos, e Núcleo Riacho Doce, com mais 40 jovens. As crianças ingressam por meio de um processo de seleção e recebem acompanhamento médico e psicológico, além de alimentação e reforço escolar. A seleção consiste em teste físico, a fim de perceber se não há possíveis problemas corporais nos alunos, e um exame artístico para identificar a capacidade de improvisação, ritmo e criatividade das crianças. Anualmente, são ofertadas 30 vagas que geralmente aumentam para 45 vagas, devido ao grande número de inscritos. Todo o processo de divulgação da seleção é feito pelos professores da escola. A seleção, propriamente dita, é feita por Flávio. A primeira turma da escola está hoje na 4ª série. Até então, foram quatro anos de estudo em dança clássica e contemporânea, atendimento médico e psicológico, além de contato com outras crianças e adolescentes que fazem da dança um caminho alternativo a percorrer. Para fazer parte da escola, as meninas devem ter entre 8 e 12 anos e os meninos entre 8 e 15 anos, além de estarem matriculados no ensino regular e com boa média de notas. No total, são seis turmas com aulas de balé clássico e dança contemporânea sendo ministradas nas sedes.

A Companhia Grande parte do resultado visto em Paracuru é mérito do trabalho desenvolvido pelos dez bailarinos da companhia. O elenco é formado por Alexandre Santiago, Eduardo Teixeira, Fredson de Sousa, Itatiana Alves, Jefferson Freitas, Jocastra de Castro, Lairton Freitas, Miliane Moura, Rochele

Alunos da escola em aula de balé clássico: dificuldade de ser difundido no interior do Estado Conde e Wanderson de Sousa. Todos são professores da escola. Alexandre Santiago, 22, estudante do 3º ano do ensino médio, dança na companhia há oito anos. Fazia parte de um grupo que se reunia para aprender dança de salão. Começou sua formação técnica com Flávio há cinco anos e é professor da escola há três. Recebe R$ 375,00 por mês para desempenhar o trabalho na escola e na companhia. Aos professores é exigida uma carga horária de oito horas diárias divididas entre sala de aula, como professor e bailarino, e revezamento na secretaria da escola. Não houve processo de seleção para a companhia. Alexandre afirma que é porque “ainda não foi preciso”. Os bailarinos já tiveram a oportunidade de serem coreografados por grandes nomes da dança nacional, como o pernambucano Ivaldo Mendonça, no trabalho Folgança, e pelo coreógrafo da companhia goiana Quasar, Henrique Rodovalho, com a coreografia 12’37”. A companhia esteve em turnê durante o mês de maio e percorreu as cidades de Mossoró, João Pessoa, Campina Grande e Natal apresentando os trabalhos Folgança, 12’37” e Por Um Fio, último trabalho do grupo. O projeto recebe atualmente financiamento da Petrobras, Secretaria de Cultura do Estado e Prefeitura Municipal de Paracuru.

Este parece ter sido o grande divisor na vida artística destes meninos. A iniciativa de procurar um apoio para o desenvolvimento de uma dança mais técnica e rica de movimentação fez com que Flávio se disponibilizasse a oferecer aulas para eles. A partir daí, eles começaram a ter aulas de dança de rua com Luís Alexandre (diretor da Arte em Rua Companhia de Dança), jazz com Márcio Carvalho (bailarino e professor de dança em Fortaleza) e dança contemporânea com Adriano Araújo (professor da Escola e coreógrafo da Companhia de Dança de Paracuru). Foram os primeiros passos para a formação artística daqueles bailarinos. Decidido a criar uma companhia de dança que representasse sua cidade e desen-

volvesse seu sonho de transformação destes jovens, Flávio começou a ministrar aulas de balé clássico e Adriano Araújo de dança contemporânea. Com isso, a Companhia de Dança de Paracuru foi ganhando corpo e buscando um espaço na cena da dança cearense. Hoje, a Companhia de Dança de Paracuru é uma das poucas que ainda se mantém no Estado. Um trabalho que vem da praia, do mar, fruto dos pescadores, e que foi além dos limites das dunas que cercam a cidade, ganhando o país inteiro.

Serviço: Escola e Companhia de Dança de Paracuru Informações: (85) 3344.1936

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dança que praia

A vem da

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na aprendizagem da dança clássica e no empenho em dar o melhor de si. A Escola de Dança de Paracuru já foi comparada à Escola de Balé do Teatro Bolshoi, renomada escola de dança russa que tem sede em Joinville (SC). Esta é a escola de dança clássica com o maior número de bailarinos (no masculino mesmo) dançando no país. O segundo lugar fica para a escola de Paracuru. É interessante perceber a disparidade sóciocultural entre as duas cidades. Mas Joinville e Paracuru têm em comum a paixão pelo ensino da dança clássica.

História Antes mesmo de conhecer Flávio Sampaio, sete dos dez atuais bailarinos da companhia se reuniam toda semana para aprender e ensaiar modalidades da dança de salão. Na busca de apoio para capacitar-se e, quem sabe, firmar uma companhia, os garotos procuraram Ieda Sampaio, vereadora de Paracuru e irmã de Flávio Sampaio.

Cena final do espetáculo "Folgança"

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