MARCA DE SEDUÇÃO – Tara Pammi O siciliano implacável: Casado por vingança. Stefan Bianco tem apenas uma coisa em mente: vingança! E a última pessoa que esperava ver nos braços de seu inimigo era a estonteante Clio Norwood – a única mulher que resistiu a sua sedução. A vida de Clio tornara-se uma sombra do que fora no passado. Porém, o olhar ardente de Stefan traz de volta todos os sentimentos adormecidos. Clio tem os meios para seu plano de vingança, e Stefan a chave que abre as portas para a liberdade dela... mas só se Clio aceitar sua proposta inesperada.
VOTOS DE DESEJO – Andie Brock O sheik sedutor: Casado pelo dever. O recém-coroado sheik Zayed Al Afzal precisa ganhar apoio do povo. E isso significa algo que esse playboy convicto sempre evitou – casamento! Seus conselheiros podem ter apresentado pretendentes belíssimas, mas quando Zayed pôs os olhos na estonteante Nadia Amani, soube que havia encontrado a mulher perfeita. E só depois da cerimônia, ele descobre o segredo de Nadia: ela é filha de seu inimigo! Porém, nas estreladas noites do deserto, o ódio se transforma em um desejo que precisa ser saciado.
Tara Pammi Andie Brock
CASAMENTOS DA SOCIEDADE 2 DE 2
Tradução Ligia Chabú Tina TJ Gouveia
2016
SUMÁRIO
Marca de sedução Votos de desejo
Tara Pammi
MARCA DE SEDUÇÃO
Tradução Ligia Chabú
Junto de suas famílias,
Clio Norwood & Stefan Bianco convidam você a unir-se a eles no dia em que se tornarão
marido e mulher. Hotel Chatsfield, Nova York. Recepção a seguir. … mas apenas se Stefan conseguir conquistar sua noiva inesperada!
CAPÍTULO 1
ELA SENTIA-SE como vidro, tão tensa que um tapinha gentil poderia destruí-la para sempre. Apertando seu xale nos dedos, Clio Norwood olhou ao redor, procurando seu noivo, Jackson. Ashley, a secretária dele, que tinha chegado para interromper a reunião deles com uma cliente importante, não estava em parte alguma também. Alguma coisa desagradável pairava na mente de Clio, como se esperando para atacar. Com a pequena festa dos ultrarricos no auge, acontecendo no topo de Empire State Building, Manhattan brilhava em volta deles. Geralmente, a atmosfera vibrante da cidade que se tornara lar para Clio durante a última década a preenchia com muita energia. Tal atmosfera a motivara mesmo quando ela estivera em dificuldades, depois da formatura em Columbia University. E a ajudara a engolir seus fracassos e suas expectativas ingênuas de vencer sozinha na cidade que nunca dormia. Mas esta noite, nem mesmo Nova York conseguia destruir o medo que começara a penetrá-la ultimamente. Jackson havia voltado na noite anterior, depois de uma viagem de três semanas no exterior, e estivera num péssimo humor, porque perdera alguma negociação imobiliária. Eles mal tinham se falado durante o dia, uma vez que Clio estivera no trabalho. Quando ela voltara ao apartamento luxuoso, onde eles estavam morando pelo último ano, ele comandara que ela se aprontasse para a festa desta noite. Comandara, e não pedira. Um padrão que estava se tornando cada vez mais óbvio para Clio. Entretanto, ela conhecia o estresse do trabalho de Jackson, e entendia a necessidade de deixar uma marca no mundo, portanto cedera. Apesar de ainda estar exausta pela gripe que tivera, uma semana atrás. Esta noite, Jackson precisava dela para convencer a sra. Alcott, uma velha amiga dos pais de Clio, a contratá-lo como seu investidor pessoal. Com as propriedades que possuía na Inglaterra e os negócios substanciais da família, Jane Alcott seria uma grande vitória para a carreira já bemsucedida de Jackson.
Mas ele nem tinha cumprimentado Jane propriamente, antes que Ashley abordara Jackson com um brilho desesperado no olhar. Não querendo criar uma cena, Clio cerrara os dentes e sorrira serenamente, mesmo enquanto via os olhares curiosos entre as esposas e namoradas dos clientes de Jackson. Até a pergunta de Jane sobre se estava tudo bem entre Jackson e ela tinha sido insuportável. O que estava acontecendo com ele? O que estava acontecendo entre eles? Porque Clio sabia, com uma clareza nauseante, que Ashley tinha a ver com o que estava acontecendo entre ela e Jackson. Subitamente, pareceu absurdo que Ashley o tivesse arrastado dali, como se ele fosse uma propriedade sua. Endireitando os ombros, Clio começou a andar. Detestava criar uma cena, detestava os olhares especulativos e de piedade que lhe eram dirigidos frequentemente nos últimos meses, mas suportara tudo silenciosamente. Por esta noite, bastava. Ela parou ao reconhecer uma figura alta e dominadora, os olhos verdes e a boca generosa causando-lhe um impacto instantâneo. Stefan Bianco. Seu primeiro instinto foi ir para o elevador, antes que ele pudesse vê-la, ir embora da festa. Mesmo seus pais, com seu silêncio desaprovador, teriam sido bem-vindos. Ela não queria que o homem que conhecia por um longo tempo, um de seus amigos mais antigos, a visse esta noite. Stefan, Christian, Rocco e Zayed formavam o Quarteto da Columbia... os quatro jovens que ela conhecera quando todos estudavam juntos na faculdade, e que tinham se tornado solteiros ricos, bem-sucedidos e cobiçados. Homens para quem o mundo era um playground, e suas lindas mulheres eram brinquedos. Mas antes que todos se tornassem bem-sucedidos, Clio os vira todos os dias, durante quatro anos, e compartilhara seus medos e esperanças mais profundos com eles. E o fato de que queria fugir de uma das pessoas que verdadeiramente a conhecera, entendera-a, deixava um gosto amargo em sua boca. Ela era um fracasso tão grande? Estava fugindo de Stefan ou do que havia se tornado? STEFAN BIANCO olhou para a vista brilhante de Manhattan e enrijeceu o maxilar. A pulsação vibrante da cidade, as memórias de quase uma década atrás, sua própria ingenuidade quando estudara em Columbia com seus outros três amigos, pareciam sufocá-lo. Entretanto, como o diretor de uma imobiliária multimilionária, Nova York era inevitável, embora ele tentasse reduzir o número de vezes que ia para lá. Mas desta vez, tinha uma razão para estar nesta festa, no topo do Empire State Building. Precisava encontrar um jeito de deter Jackson Smith. A lembrança do rosto pálido de seu assistente executivo Marco, na cama de hospital, depois de uma tentativa de suicídio, o rostinho rechonchudo da filha de cinco anos de Marco, contorcido em confusão, enquanto ela perguntava para Stefan o que tinha acontecido com seu pai... A impotência que ele sentira era como ácido em seu estômago.
Jackson havia levado Marco à falência, até que seu assistente, tendo perdido tudo, não vira saída... A insegurança, a sensação de ser um fracasso total, de decepcionar todos que tinham contado com ele... fitar os olhos de Marco fora como olhar para seu próprio reflexo de alguns anos atrás. A culpa o corroía. Se ele ao menos tivesse encontrado uma maneira de deter Jackson anos atrás, quando ele enganara o próprio Stefan... Aquela fora a pior época de sua vida... a traição de Serena, sua culpa impedindo-o de voltar para seus pais na Sicília, e as horas infindáveis que ele trabalhara para garantir uma negociação... Stefan perdera o pouco que tinha ganhado, por causa da traição de Jackson. Teria feito o mesmo que Marco, se não fosse por seus amigos Rocco, Christian e Zayed, apoiando-o, se ele já não tivesse acordado para a realidade da vida por Serena, a mulher que declarara amá-lo. Desta vez, Jackson precisava ser detido, custasse o que custasse. Como se o pensamento de Stefan invocasse Jackson, o americano riu num grupo a poucos metros de distância. Uma loira baixa, vestida de jeans e camiseta justa, puxou Jackson para tirá-lo dali, interrompendo a conversa. Com a fisionomia tensa, Jackson inclinou-se em direção à outra mulher no grupo, uma ruiva alta, e sussurrou alguma coisa. Um pedido de desculpas, Stefan assumiu. O que não funcionou, considerando como a mulher encolheu-se e virou a cabeça para o outro lado. Curioso, Stefan observou quando os ombros desnudos da mulher enrijeceram. Tudo sobre a postura dela gritava tensão, e mais alguma coisa. Jackson permitiu-se ser levado de lá, mesmo quando a mulher alta ergueu a cabeça e ficou totalmente imóvel, parecendo que quebraria se algum ventinho soprasse na sua direção. O rosto dela estava envolto em sombras, e havia um ar de dignidade sobre a mulher. E então, ele notou o cabelo. Apesar de penteado para trás do rosto angular e preso num nó elaborado, aquele cabelo ruivo era inconfundível, assim como o nariz arrebitado e a inclinação teimosa do queixo. Aquele rosto seria oval, com olhos verdes como esmeraldas. Quando ela sorrisse, um canto da boca se curvaria mais do que o outro. Clio Norwood, a única mulher que ele nunca domara. Cada célula do seu corpo entrou em alerta. Que diabos Clio estava fazendo com Jackson Smith? Houvera intimidade no jeito que Jackson se inclinara sobre ela e sussurrara alguma coisa, no modo que ele lhe acariciara o braço desnudo. Todavia, Stefan viu a tensão dela enquanto o grupo ficava em silêncio. Viu os olhares especulativos se voltando para Clio. E conhecendo Jackson e sua deslealdade, um milhão de pensamentos passou pela sua cabeça. Stefan não queria contato com nada ou ninguém conectado a Jackson. Entretanto, pegou-se andando em direção a ela, seu olhar deleitando-se com a visão do pescoço longo e do rosto bonito. Ele parou, ciente de que sua pulsação tinha acelerado, e sua respiração se tornado ofegante. Clio estava tão maravilhosa como sempre fora, mesmo um pouco magra demais. Sua mente viajou para mais de uma década atrás, para seus dias de faculdade com Rocco, Christian e Zayed... que haviam se tornado mais irmãos do que amigos... para o entusiasmo de
conhecer o mundo e saber que este poderia estar aos pés deles, para a glória de descobrir mulheres e a atração que eles sentiam por elas, e para Clio Norwood... a mulher que conhecera o Quarteto da Columbia tão bem quanto eles se conheciam entre si. Uma perfeita aristocrata que não queria mais ser, ela frequentemente ria das explorações deles, vendo suas escapadas com outras mulheres com divertimento e distância. Ela rejeitara os avanços deles naquele primeiro ano, com a mesma facilidade que rejeitara a fortuna e posição nas quais havia nascido. De todos os homens do planeta, o último homem com quem Stefan poderia ter imaginado Clio era com Jackson Smith. Sem vontade de entrar em outra discussão com Jackson, especialmente quando sua paciência estava por um fio, Stefan esperou. Após alguns minutos, com uma graciosa inclinação da cabeça, Clio pediu licença e afastou-se do grupo. Ignorando o estranho disparo em seu coração, Stefan abordou-a no momento seguinte. – Ciao, Clio. Ele segurou-lhe o braço. Ouviu-a respirar fundo, antes que ela se virasse. Uma expressão de medo dançava nos olhos verdes. Até que ela piscasse, os cílios longos escondendo sua expressão. – Stefan... que surpresa... Eu não tinha ideia que você estava em Nova York. Aquele sotaque... sempre mexera com ele, despertando-lhe um misto de carinho e ardor. Mas o tom de voz agora era reservado e artificial, irritando-o. Certo, então eles não se viam há um tempo, porém, durante quatro anos, Clio fizera parte de sua vida... uma parte integral, e uma da qual ele lembrava sem amargura. Colocando o braço em volta dela em direção a uma balaustrada, ele prendeu-a ali, protegendo-a do resto da multidão. – Você saberia se tivesse mantido contato, não é, bella? Os ombros delgados estavam visivelmente tensos. – Você mal pisa em Nova York, enquanto aqui é meu lar. – Verdade. Mas você não achou importante ir ao casamento de Rocco. Sua nova... vida não permite espaço para velhos amigos, Clio? Ela não se encolheu como fizera com Jackson, mas a expressão de medo voltou a brilhar nos olhos verdes. Dio, qual era a associação de Clio com Jackson? – Eu sempre estive aqui, Stefan. – Um remanescente da velha Clio... cheia de aventuras e planos para uma vida nova... surgiu no olhar dela. – Não sou eu a pessoa determinada a apagar da memória qualquer coisa relacionada com nossa vida em Nova York. – Talvez eu tenha percebido que não restara nada de valor para mim aqui em Nova York. Não é como se Rocco, Christian ou Zayed morassem aqui. Ela apenas o olhou. Por que Clio não o colocava no seu lugar, com uma observação ferina, como costumava fazer? De onde vinha esta necessidade de agredi-la com palavras? E por quê? Apenas porque Clio tinha algum tipo de associação com Jackson Smith, enquanto rejeitara seus avanços no passado?
Ele não precisava que seu ego fosse validado pelo interesse de Clio. Mulheres o rodeavam o tempo inteiro. Ele gostava de sexo, possuía uma libido saudável, e quando a satisfazia, afastava-se da mulher, ela gostasse disso ou não. Não havia lugar ou uso para uma mulher em sua vida, exceto na sua cama. Todavia, passara dois minutos com Clio e estava interessado nos pensamentos e ações dela. Ele a viu respirar fundo. Viu-a vestindo a máscara que cobria a óbvia agonia, dando lugar a anos de boas maneiras. Exatamente a coisa que ela estivera determinada a superar em si mesma... – Foi bom ver você, Stefan – murmurou ela com um sorriso. – Mas eu tenho coisas a fazer. Ele segurou-lhe o braço. – Você não respondeu minha pergunta. Por que não foi ao casamento de Rocco? O desespero brilhou nos olhos verdes, antes que ela escondesse a expressão. – Eu estava ocupada com trabalho. Nenhum de nós transformou os sonhos pessoais em realidade de uma maneira tão incrível como você fez com sua imobiliária global. – Eu comecei com nada como você, Clio. Nunca tirei um centavo de meus pais depois que eles me renegaram. – Christian me contou. Depois de Serena, você... – Ela devia ter capturado a raiva em seu olhar, porque fez uma careta e continuou: – Depois de tudo que aconteceu no último semestre, você nunca olhou para trás. Então pare de pôr toda a culpa em mim por uma amizade que não durou. Nos primeiros dois anos, Christian me manteve a par do que estava acontecendo com vocês. Depois disso, foi fácil acompanhar seu sucesso, com os quatro saindo em listas dos jovens mais milionários do país. Mas eu não sou amarga o bastante para lamentar seu sucesso, Stefan. – Eu estou perguntando agora, bella. O que aconteceu com seus sonhos, Clio? – Eu descobri como é difícil ter sucesso neste mundo. Então parabéns para você, por ter conseguido. Agora, conte-me sobre o casamento de Rocco. – Era óbvio que ela queria mudar de assunto, mas ainda assim, o semblante se tornou caloroso ao falar o nome de Rocco. – Teria sido incrível ver Rocco apaixonado. Olivia Fitzgerald deve ser muito especial. – Olivia é definitivamente especial, e Rocco está muito apaixonado – concordou Stefan. Ele notou que o olhar dela ia toda hora para a entrada do terraço, para a mesma porta vaivém pela qual Jackson e a loira tinham passado. – O casamento só estava a uma passagem de avião de distância, Clio. Se o problema foi falta de dinheiro para a passagem, você poderia ter pedido para um de nós. – Não estou pobre, Stefan – disse ela num tom cansado. – Depois que Christian pagou meu aluguel por alguns meses aquela vez, eu me virei bem. Stefan ficou chocado. Christian tinha ajudado Clio com o aluguel, uma vez? A situação dela estivera tão ruim? Mas ele sabia por que Christian não falara uma palavra sobre aquilo. Seu amigo crescera na pobreza nas ruas de Atenas, e entendia o que significava se virar, quando você começava do nada. Stefan entendia por que tinha sido Christian a quem Clio recorrera. Todavia, não gostava que as coisas tivessem ficado tão ruins para ela, e que ele não soubera de nada. Estudou-a.
A fisionomia de Clio revelava um medo oculto, instigado por alguma coisa que ele não tinha ideia do que era. Sem dúvida, algo relacionado com Jackson. Um propósito renovado o preencheu. Ele precisava ajudá-la a sair de qualquer situação que ela estivesse. – Se você precisava de alguma coisa, era só pedir. – Eu não quero caridade. A sua nem a de ninguém. Paguei Christian, quando fui capaz. Estou bem agora. – Então, por que não foi ao casamento? Por que empalideceu quando me viu? – Eu lhe disse. Muitas coisas estão acontecendo e... – É isso, ou é o fato de que suas novas associações e seu novo modo de vida não permitem que você veja seus velhos amigos? Ela empalideceu, outra vez. – Seja lá o que você estiver implicando, fale sem rodeios, Stefan. Não é como se você se preocupasse com o sentimento dos outros, é? – Jackson Smith. Ela ficou muito imóvel, e Stefan soube. Jackson roubara a cor da pele de Clio. – O que... o que você quer dizer? – Ele viu-a engolir forçosamente. – Você não está bem, bella? Clio afastou-se, a respiração ofegante. – O que... tem... Jackson, Stefan? – Jackson é um patife. Um patife egoísta de fala mansa. A melhor coisa que posso dizer sobre ele é que não lhe falta companhia feminina, onde quer que ele vá. A risada irônica de Clio o interrompeu. – Eu poderia dizer o mesmo sobre você. – Uma modelo eslava e a confusão que ela criara dois meses atrás lhe vieram à mente. Ela o olhou com raiva. – O que foi? O sobrenome Bianco deveria ser Bastardo. Você nem sequer sai com a mesma mulher duas vezes. O fato de ela defender o patife enfureceu Stefan. – Você não tem ideia de quem Jackson realmente é. As práticas profissionais dele são extremamente nebulosas. Há muito tempo venho procurando uma prova para prendê-lo. Ele é um canalha ganancioso, uma sanguessuga que usará qualquer um para escalar um pouco mais, usará quaisquer meios, mesmo os meios ilegais, para conseguir o que quer. Qualquer que seja sua conexão com ele, corte-a e vá embora, antes que Jackson a leve para a lama consigo. Ainda mais pálida, Clio replicou: – Eu não acredito em você. Sei que Jackson pode ser impetuoso e, às vezes, até rude, mas ele... – Então você também se tornou uma tola e não é digna do meu tempo ou de meus conselhos. A fúria por ela o colocar no mesmo nível de Jackson deixou um gosto amargo na boca de Stefan. Esta não era a mulher que ele conhecera e admirara, uma vez. – Ou talvez, esta seja a vida que você leva agora, Clio. Talvez, afastar-se da riqueza e posição nas quais você nasceu não tenha funcionado, como você acreditava que funcionaria. Talvez, a fachada de status e riqueza que Jackson lhe oferece faça valer a pena ser parte das falcatruas dele.
Em vez da raiva que ele esperava, mágoa brilhou nos olhos verdes, e, novamente, essa fraca imitação da Clio que ele conhecera um dia lhe causou um nó na garganta. – Você não pensa assim realmente. – Uma década é um longo tempo. Talvez, você tenha tanta sede de poder e de ser mantida quanto à maioria das mulheres que conheço. – E você deve ter se tornado um cretino frio para me dizer essas coisas. Aquelas palavras foram como água em pedras. Ele se tornara sentimental sobre Clio, porque a conhecera uma década atrás? Clio não era diferente. Mulheres com autorrespeito, mulheres que não faziam qualquer coisa para conseguir o que queriam, podiam ser contadas nos dedos de uma mão, como a Olivia de Rocco. – Touché, bella. Talvez nós sejamos estranhos um para o outro. – Sem mais nada a dizer um ao outro. Ela parecia estar presa numa armadilha, sem saída. – Dio, Clio... está em algum tipo de encrenca? Apenas me conte como você o conhece. Ela levantou o queixo. – Eu trabalho para ele há cinco anos. Jackson me deu um emprego, quando ninguém me contrataria, mostrou-me uma maneira de vencer em Nova York, quando eu teria voltado para casa, na Inglaterra, repleta de vergonha. Tenho de acreditar que você está errado. Tenho de acreditar, para meu próprio bem, que tudo que você disse... – Ela tremeu, então acrescentou: – Jackson é meu noivo. – Você está... – Enrijecendo o maxilar, Stefan conteve a resposta que estava na ponta de sua língua, esperou que o choque percorrendo seu corpo se abatesse. Como Clio, entre todas as mulheres do mundo, podia estar noiva de Jackson Smith? Ela mudara tanto assim? Tudo que importava a Clio era brilho, e não substância? Uma memória antiga de Clio rindo, o cabelo ruivo lustroso esvoaçando ao seu redor, enquanto ela o desafiava a apostar uma corrida pelo campus, preencheu sua cabeça. – “Duas estradas divergiram em um bosque, e eu... escolhi a menos viajada, e esta escolha fez toda a diferença.” – disse ele, cortando parte do poema favorito dela, de Frost. Lágrimas brilharam nos olhos cor de esmeralda. – Eu costumava pensar em você como uma explosão, Clio. Vibrante, feroz e tão destemida. Costumava pensar que você era a mulher mais forte que já conheci. Não me fale que tudo está bem na sua vida, bella. Porque posso ver que não está. – Ele apertou-lhe um dos ombros. Sentiu-a tremer. Ela o fitou, o choque e a incredulidade estampados no rosto lindo. – Eu estarei hospedado no Chatsfield por alguns dias. Se você precisar de alguma coisa, qualquer coisa, procure-me. – Nós tomaremos um drinque e você me contará tudo sobre a garota que conheci no primeiro dia da faculdade, procurando pela aula de artes. O cabelo da cor do fogo, o sorriso tão grande quanto o oceano... a alegria em cada passo que ela dava por estar finalmente livre...
– Ela era uma visão para ser contemplada. – Dois anos depois, ela apostou com o time campeão de quatro remadores – ele estava sorrindo agora, pensando em si mesmo, Zayed, Rocco e Christian cheios de autoconfiança, impressionados com a ruiva que os desafiara, enquanto todas as outras mulheres adoravam o chão que eles pisavam –, que andaria nua pelo gramado da faculdade, em vez de torcer para eles, no final do torneio. Dizendo-lhes que suas cabeças arrogantes já estavam muito cheias de si mesmas. – E na noite que eles venceram a competição, ela correu ao longo do gramado, totalmente vestida e embriagada, como um feixe de luz. Porque achou que eles exigiriam que ela pagasse a aposta. – Acho que não me lembro de ter rido tanto como naquela noite. Com uma mão que não estava muito firme, Stefan secou uma lágrima que rolou pelo rosto dela. Sussurrou o lema pelo qual ele e o resto do Quarteto da Columbia viviam. Palavras que tinham ajudado Rocco, Christian, Zayed e o próprio Stefan, mais de uma vez. – Memento vivere, bella.
CAPÍTULO 2
LEMBRE-SE DE viver... Clio inclinou-se contra a balaustrada, suas pernas tremendo, seu coração violentamente disparado. Um lema pelo qual Rocco, Christian, Zayed e Stefan viviam... Ela sempre rira do jeito que eles cotavam tal lema, como o usavam para conquistar o mundo que tinha sido seu playground... Rira tão facilmente, porque, é claro, ela fora um exemplo maravilhoso daquilo... Tinha sido aquela garota, um dia? As palavras de Stefan abalaram-na com a força de um tsunami, formando uma imagem tão clara em sua cabeça da mulher que ela havia sido tanto tempo atrás que quase parecia produto de sua imaginação. Todavia, aqui estava ela hoje, esperando um homem que declarara amá-la. Permitindo que ele ditasse sua escolha de roupas, seus horários e até mesmo o que ela fazia com sua vida. Esperando que ele a olhasse novamente, como a olhara três anos atrás. Desejando desesperadamente que ele ainda a amasse. Como ela se tornara esta pessoa? E onde estava Jackson? Cansada de esperar, Clio desceu a escada para o piso inferior. E parou abruptamente quando uma risada rouca, acompanhada por um sussurro feminino, chegou aos seus ouvidos. Uma desconfiança horrível encheu-a de medo. Cada passo parecia em direção a sua própria maldição. Sua pele arrepiou-se quando um gemido sensual preencheu o ar, adicionado pelo farfalhar de roupas. – Jackson... oh, querido... eu não posso continuar com isso, Jackson. Eu o amo e... Diga a ela que está acabado, Jackson. Lágrimas inundaram os olhos de Clio, enquanto ela ficava parada ali, a respiração presa na garganta, seu mundo desmoronando a sua volta. Ela ouviu mais gemidos, antes que Jackson falasse:
– Somente mais dois meses, querida. Você sabe o quanto nós precisamos das conexões dela. Clio tem sangue aristocrata, do tipo que eu não encontrarei novamente. Você viu o tamanho das propriedades de Jane Alcott? Mais alguns clientes assim, e nós estaremos estabelecidos. – Mas, Jackson... – Clio podia imaginar o biquinho na boca grande de Ashley. – Minha gravidez estará aparecendo até lá. É assim que você quer que nossa vida nova comece? Eu me escondendo, no caso da srta. Meticulosa me ver, enquanto você finge ser o noivo apaixonado dela? O pensamento de você a tocando me deixa tão... Ashley está grávida... Os golpes vindo na direção de Clio pareciam intermináveis. Jackson falou em tom ofegante: – Eu não tenho desejo de tocá-la. E você sabe muito bem que não me resta forças depois de uma de nossas tardes ardentes, mesmo se eu sentisse vontade. Clio tampou os ouvidos quando ouviu a risada satisfeita de Ashley. – Dê-me apenas mais dois meses. – A voz de Jackson era melada. – Ela ainda é muito útil para nós. Uma vez que eu usar todas as conexões que Clio pode nos oferecer, eu me livrarei dela. Até lá, aparências são cruciais. – E se ela desistir antes disso? – Desistir do quê? A fim de escapar da família e do homem com quem eles querem que ela se case. Clio está desesperada para ser amada, para sentir que teve sucesso em alguma coisa, mesmo se for em apenas conseguir um homem. – Não havia hesitação na voz de Jackson. – A mulher que ela é agora... não há outro homem que tocaria Clio Norwood com um bastão, muito menos que a desejaria. O gosto da bile subiu à garganta de Clio, e ela virou-se da porta. Desceu apenas meio lance de escada, antes que suas pernas cedessem, e ela caísse no chão sujo. Desesperada para ser amada, para sentir que teve sucesso em alguma coisa... Batendo a cabeça contra a parede, Clio fechou os olhos, sentindo as lágrimas escorrerem através de suas pálpebras cerradas. Como ela podia ter julgado Jackson tão erroneamente? Como podia não ter visto o que estava acontecendo? Quantas vezes precisava aprender esta lição? Nunca fora valorizada por nada além do nome de seu pai, nunca fora valorizada por si mesma. Por mais que ela corresse, seu nome e tudo que este representava a alcançavam. Fúria e autodesgosto a inundaram. Durante meses, deixara Jackson fazê-la de tola, deixara Ashley zombar dela na frente de amigos. Houvera tantos jantares de negócios, tantos bailes beneficentes nos quais ela havia ido, em vez de ficar onde preferia estar... Houvera mais exibição dos dois do que qualquer outra coisa. Clio desfilara muito no braço de Jackson, falara muito sobre a linhagem aristocrática de sua família e sobre conexões. Tinha sido sufocada por regras, esmagada por expectativas. Sido muito uma Norwood, filha de uma das famílias mais poderosas da Inglaterra. Sido muito a noiva do ambicioso financista Jackson Smith. E tinha sido muito pouco ela mesma, apenas Clio.
Por toda sua vida, ela ansiara pela aprovação de seu pai, mesmo quando não se encaixara nas conexões aristocráticas de sua família. Alimentara a tola esperança de que ele se orgulharia dela, se Clio fizesse o que ele lhe pedia. Tentara ser a filha perfeita. Até descobrir que seu pai arranjara seu casamento. Então, ela se libertara. Para cair na mesma armadilha com Jackson. Todos os sinais haviam estado lá, e Clio fora cega para vê-los, muito desesperada para ser bemsucedida em alguma coisa na vida. Ela se conduzira para o mesmo lugar que deixara em seu país natal mais de uma década atrás, para a mesma vida onde não conseguia respirar. Cada sentimento desconfortável que reprimira, cada dúvida que engolira, para não estragar as reuniões e festas dele, subitamente subiu a sua garganta, roubando-lhe o fôlego. Sua identidade, de alguma maneira, se rompera e se atara, em pedaços, a de Jackson. E tudo para quê? Para que ele pudesse trai-la, para que ele pudesse engravidar a secretária. Seu amor e seus medos não tinham importado para Jackson, em absoluto. E não enxergar essa verdade havia sido culpa dela.
CAPÍTULO 3
– DESCULPE-ME, SENHORA. Eu não posso permitir que suba à suíte de sr. Bianco. Clio ouviu o recepcionista atrás do balcão de mármore preta e olhou ao redor confusa. Ela perguntara por Stefan? Por onde tinha andado? Observou o saguão ultraluxuoso do hotel Chatsfield de Nova York. Um banco de elevadores com paredes de vidro ficava de um lado. – Quer que eu o informe de sua chegada, senhora...? Piscando, Clio voltou a atenção para o jovem homem. – Clio. Só Clio – respondeu ela. Apenas o pensamento de falar o sobrenome Norwood lhe deu um calafrio. Seu corpo inteiro parecia estar operando em algum tipo de automecanismo que ela não soubera possuir. Por que mais iria procurar um homem cujo poder e ambição eram dez vezes aqueles de Jackson? Um homem que a olhara como se ela estivesse manchada apenas por sua associação com Jackson? – Espere, srta... Clio. Corando diante da óbvia curiosidade do recepcionista, Clio passou os braços ao redor de si mesma. – Desculpe ter perturbado você. Eu preciso ir embora. Ela nem mesmo percebera como ou quando decidira andar até o Chatsfield, para ver Stefan. Os enigmáticos olhos verdes e boca desdenhosa surgiram na sua mente, e ela balançou a cabeça. Não tinha forças para se expor a este tipo de verdade e avaliação, para lutar contra a memória de uma mulher que havia sido um dia. O desapontamento de Stefan, mais cedo, ainda doía como um tapa. Se ela o visse do jeito que estava se sentindo agora, ele a feriria com suas palavras cruéis, acabando com qualquer autorrespeito que ainda lhe restasse. O pensamento de lhe contar o que ouvira, o pensamento de como seria a reação de Stefan fez Clio se mover rapidamente. Ela deu alguns passos em direção à porta rotatória quando seu nome foi chamado novamente.
– Srta. Clio, sr. Bianco autorizou um cartão-chave permanente para você. Em todas as nossas filiais internacionais. Ele deixou instruções específicas para que providenciássemos qualquer coisa que você pedir ou precisar. O recepcionista pôs um cartão-chave sobre o balcão brilhante, e alguma coisa no olhar gentil do rapaz tirou Clio do estado de entorpecimento no qual se encontrava. Era naquilo que se transformara? Numa mulher tão perdida na vida que despertava a piedade de um estranho? Ela não sabia o que queria fazer, não sabia como dar o próximo passo em sua vida. Sentia-se totalmente perdida, sozinha. Tudo o que queria era enterrar-se no buraco mais próximo e nunca mais emergir. Entretanto, uma pequena parte sua se recusava a chorar como uma vítima, e era essa parte que a levara ao hotel de Stefan. Sua carreira, sua vida, seu autorrespeito e seu coração... tudo desmoronara aos seus pés. Clio sabia que precisava de ajuda. Descobrir o que fazer com aquilo que queimava em seu interior, enquanto todo o resto virava cinza. Ela pegou o cartão-chave e forçou-se a colocar um pé na frente do outro, a inalar profundamente. O barulhinho suave do elevador, enquanto este a levava para o 52º andar, sibilava contra seus nervos já à flor da pele. Quando as portas finalmente se abriram, ela saiu no imenso foyer que ostentava quatro terraços protegidos por vidros, e que ofereciam vistas de tirar o fôlego de uma das cidades mais belas do mundo. Era como um castelo construído entre as nuvens. Passando por uma estátua de ouro no meio do foyer, Clio chegou ao saguão. Cores em tom champanhe e marrom reinavam, com adornos dourados e vermelhos aqui e ali, combinando com o temperamento tempestuoso do homem que um dia ela conhecera. O que ela estava fazendo lá? No momento que se virou em direção do elevador, ouviu a voz sedosa de Stefan perguntando: – Já indo embora? Fechando os olhos, Clio ordenou a si mesma que se acalmasse. Por mais absurdo que parecesse, estava grata que ele a avistara antes que ela tivesse fugido. Porque agora, sabia que Stefan não a deixaria ir embora. Agora, se ela apenas conseguisse encontrar forças para falar o que tinha ido falar, sem trair a si mesma... Todas as suas dúvidas desapareceram quando ele adentrou o saguão com a graça flexível que os olhos de Clio seguiram, como se ela estivesse hipnotizada. Uma toalha branca em volta dos quadris estreitos contrastava com o peito bronzeado. Gotas de água aderiam-se aos pelos que cobriam músculos bem definidos. O maxilar recém-barbeado falava de arrogância, enquanto os olhos verdes a prendiam no lugar. A visão foi como um golpe nos sentidos de Clio, e ela balançou onde estava de pé. – Clio, está tudo bem? – perguntou ele, jogando uma toalha branca menor em volta do pescoço. Clio voltou à realidade. Subitamente, pedir a ajuda de Stefan pareceu a ideia mais absurda que já tivera.
Antes que pudesse piscar, ele cobriu a distância entre eles. O aroma másculo de Stefan a fez prender a respiração. Ela meneou a cabeça. – Eu estou bem. Pode me servir uma bebida? Por longos segundos, ele permaneceu parado ali, encarando-a. Impossivelmente largo, com 1,92m de masculinidade siciliana, e todo o foco estava nela. A intensidade dos olhos verdes a fazia se sentir exposta. Não que Clio confiasse na resposta de seu corpo. Finalmente, ele moveu-se para o bar luxuoso que cobria um lado do saguão. – O que você gostaria de beber? – Apenas água, por favor. – Havia um conforto falso em falar sobre alguma coisa tão mundana. Talvez porque isso a lembrasse de que o mundo não desmoronava, apesar do terremoto em sua vida. – Álcool me dá... – Enxaqueca, eu sei. Elas ainda são tão ruins como costumavam ser? Ele lembrava. Clio reprimiu a sensação calorosa que o fato lhe causou. Então, um dos milionários mais jovens do mundo tinha boa memória. Não era uma grande surpresa. – Eu nunca achei nada que me ajudasse. Portanto, nunca bebo – disse ela, dando de ombros. O som da geladeira se abrindo, de cubos de gelo contra o copo de vidro, parecia acentuar o silêncio carregado de consciência. Ela nem sequer lhe dissera por que estava lá. E ele não perguntara. Todavia, era como se tivesse alguma coisa no ar, uma onda de correntes circulando a volta deles, prendendo-os na sala enorme. E ela encolheu-se ao pensar em lhe contar o que tinha acontecido esta noite. Stefan riria por sua estupidez de não ter visto a falsidade de Jackson por tanto tempo? Clio pegou o copo da mão dele e deu um grande gole. – Desculpe-me por ter vindo aqui sem avisar – murmurou ela. – Eu nem mesmo percebi que tinha começado a andar nesta direção... Capturando o brilho zombeteiro nos olhos verdes, ela parou. Ele tirou o copo de seus dedos trêmulos. – Clio Norwood... epítome das boas maneiras e decoro... desmoronando. – Eu não estou desmoronando. Stefan segurou-lhe o queixo e inclinou seu rosto para cima. Em pânico, devido ao desejo que estava sentindo por ele, ela segurou-lhe o pulso para afastá-lo de si. A pressão dos dedos fortes aumentou. – Então por que você está tão nervosa? Não havia compaixão na voz dele, e por isso, Clio estava muito grata. Uma palavra gentil de Stefan arrebentaria o pequeno fio que a mantinha unida. Desmoronar, na frente de Stefan, não era uma opção. – Eu não estou nervosa. Estou apenas... – Um nó fechou sua garganta. – Conte-me o que está acontecendo, Clio.
O comando inerente na voz profunda abalou-a, de alguma maneira, assim como o pulso peludo roçando seu queixo a estava abalando, causando-lhe uma série de sensações. Clio abaixou a mão dele, o coração disparado. – Você já jantou? – Não. – Como chegou aqui? Ela ergueu o olhar. – O quê? – Ao Chatsfield? – Eu vim a pé. – De onde? – Da festa. – No Empire State Building? – Sim. Ele praguejou de modo tão veemente que Clio abraçou a si mesma, instintivamente. – São quase 15 quarteirões daqui, e são 9h30 da noite. O que há de errado com você para que ande de noite em plena Nova York? Ela permaneceu calada, nenhuma resposta lhe ocorrendo diante da observação dele. Stefan suspirou. – Termine aquela água, então peça alguma coisa do serviço de quarto. Eu vou me vestir e já volto. E então, você poderá me contar porque parece... Ansiedade preencheu-a em ondas. Se ele desaparecesse, Clio sabia que iria perder o que a levara tão longe. Evitar humilhar-se na frente dele se tornaria mais importante do que seguir com sua própria vida. – Não, espere. Não vá embora. Eu... – Então, livre-se dessa expressão nos seus olhos, bella – disse ele. – Eu não posso suportá-la. – Uma ponta de emoção coloriu a declaração. – Que expressão? Aproximando-se, ele uniu as mãos. Os músculos nos bíceps poderosos se flexionaram sedutoramente, e Clio tremeu por dentro. Sua vida estava desmoronando, entretanto, a visão de Stefan seminu podia distraí-la como nada mais poderia. – Como se você estivesse com medo de mim – replicou ele com os dentes cerrados. – Podemos ter nos tornado estranhos um para o outro, mas eu nunca a machucaria, bella. Qualquer coisa que Jackson tenha feito, liberte-se disso. Eu não sou um perigo para você, Clio. Oh, mas ele era, pensou Clio, sua pulsação acelerando. Se Jackson a reduzira a uma sombra de si mesma ao longo dos anos, Stefan poderia destruir a pequena parte sua que ainda estava intacta. O fato de que sabia como ela fora um dia, e o que era agora, era uma arma que ele poderia empunhar com facilidade e sem emoção, se não gostasse do que ela estava prestes a dizer.
O jovem que Clio conhecera em Columbia não tinha sido apenas idealista, mas também gentil, com uma visão otimista do mundo. O homem que ele era agora mexia com Clio em muitos níveis. Mas ela não tinha intenção de deixar um homem definir seu senso de si mesma. Nunca mais. O pensamento lhe deu coragem para falar o que queria falar. – Eu decidi aceitar sua oferta. Preciso de sua... Preciso de ajuda, Stefan. Alguma emoção que ela não foi capaz de decifrar brilhou nos olhos dele. O maxilar definido enrijeceu. Ele moveu-se para uma pequena mesa lateral e pegou um talão de cheques. Abrindo o talão, posicionou a caneta na mão esquerda. – De quanto você precisa? Boquiaberta, e sentindo o gosto de ácido na garganta, Clio o encarou. Então ele achava que ela o procurara por dinheiro. Mesmo enquanto lembrava a si mesmo de quem tinha sido, era óbvio que Stefan já a declarara como uma causa perdida. Aquilo doía tanto quanto a traição de Jackson. Ela sentia-se como se estivesse sendo partida ao meio. Mas já era hora de começar a lutar por si mesma. Hora de começar a criar determinação. – Quanto, Clio? – Você me daria quanto eu quisesse, Stefan? Que tal um milhão de dólares? – ela o desafiou, a fim de ver quão longe ele iria. Ele nem piscou. – Um milhão de dólares, bella. Eu direi ao meu financista que este ano nossa contribuição beneficente irá para a Fundação Clio Norwood. Eu não quero sua caridade. Engolindo a bile que subiu a sua garganta, Clio lembrou-se de não se encolher, de não trair a mágoa que as palavras dele lhe causavam. Não sabia por que estava fazendo aquilo consigo mesma, mas não conseguia parar. – E se eu voltar para pedir mais? – Eu lhe darei mais. – Ele jogou o talão de cheques sobre a mesinha de centro entre eles. – Você pode ter quanto quiser, Clio. Tudo que precisa fazer é sair da vida daquele canalha. Independentemente do quanto estiver envolvida, você pode sair. – Por quê? Por que você me ajudaria? – Uma vez, você foi minha amiga. Uma vez, eu costumava achá-la o máximo. Vê-la assim... Alguma emoção indecifrável brilhou nos olhos dele, e para Clio, foi como ver uma sombra do velho Stefan. – Se eu puder ajudá-la a se livrar de... – ele fez uma careta, como se detestasse até mesmo pronunciar o nome de Jackson outra vez – , eu a salvarei, mesmo se tiver de ser de você mesma. É como levar um amigo ou um membro da família a uma clínica de reabilitação para tratamento de vícios. – Apesar de você achar que eu não valho o chão que piso? Stefan sorriu. – Palavras suas, bella, não minhas.
Um calafrio a percorreu. Uma coisa era pensar aquilo de si mesma, outra era ouvi-lo confirmar suas palavras. Mas com Stefan não havia nada, exceto honestidade. Honestidade dilacerante, mas honestidade, de qualquer maneira. – Mas, sim, apesar disso. Eu faria o mesmo por Rocco, Christian e Zayed. Clio sempre invejara a amizade do Quarteto da Columbia, o elo inviolável que eles haviam formado. Ser incluída agora como alguém que ele tinha de salvar de si mesma... – Uau, pelo menos num aspecto, eu estou em companhia ilustre, não estou? Ele rodeou a mesinha de centro, e foi como observar um animal em movimento. Com graça e propósito. No momento que ele estava ao alcance de seu toque, Clio encolheu-se de tensão. Ainda assim, o calor emanando do corpo másculo a fez tremer. – Não me faça uma pergunta, se você não tem força para ouvir a verdade, Clio. Sem resposta, Clio apenas assentiu com a cabeça. Stefan Bianco era um siciliano alfa em seu auge. Fisicamente magnífico, poderoso além de sua imaginação mais louca, muito, muito rico. Uma combinação potente de masculinidade e calor que poderia provavelmente forçar uma pedra a reagir, se ele assim pretendesse. Uma mulher como ela, com baixa autoestima e derrotada, era nada. Clio abraçou a si mesma, como se para bloquear a presença dele. Se ela não fosse cuidadosa, Stefan a dominaria de tal forma que Clio seria motivada a tentar esclarecer aquele desinteresse enigmático que ele projetava tão facilmente. Como muitas mulheres tentavam... enganando-se ao pensar que podiam derreter o coração gelado sob o exterior feroz do temperamento siciliano. Stefan enterrara seu coração tão profundamente, e há tanto tempo, que provavelmente nem mais possuía um. Afastando-se, ela o encarou de cabeça erguida. – Eu nunca quero ouvir nada, exceto a verdade de você, Stefan. – Combinado – disse ele com um sorriso indulgente, que era mais uma ameaça do que uma promessa tranquilizadora. – Agora, é hora de pôr suas cartas na mesa, bella. Sem medo. Ela sabia exatamente qual era sua posição com ele. O tipo de amizade que Stefan oferecia... sincera e sem um pingo de pretensão... era o que ela precisava para se refazer, se redefinir. Ele era o caminho perfeito para que Clio se tornasse dona de si mesma, novamente. – Por mais gratificante que seja saber que eu poderia ter milhões, se fizesse de mim mesma seu caso de caridade, eu não vim aqui por dinheiro. Não quero nada de você de graça. – O que você quer, então? O peito de Clio estava tão apertado que ela teve de quebrar o contato ocular. Teve de forçar-se a falar, apesar do som da risada de Jackson e de Ashley estar ressonando em sua cabeça. A traição de Jackson, o fato de ele a ter usado por suas conexões, reduzindo sua identidade ao valor que ela lhe oferecia nos negócios, afetara-a. Mas o fato de que ele podia ser tão cruel sobre seus sentimentos, traindo cada aspecto da vida que eles levavam, juntos, rindo de seus medos e inseguranças às suas costas, doía como uma ferida profunda.
Aquilo a manchava tanto que Clio começava a desprezar a si mesma. E não seria capaz de seguir em frente, não seria capaz de se olhar no espelho, a menos que mostrasse a Jackson que ele não poderia fazer aquilo com ela, sem sofrer consequências. A menos que provasse a ele e a si mesma que era mais do que ele pensava. – Eu quero dar uma lição em Jackson que ele jamais esquecerá. O olhar de Stefan tornou-se gelado, e ele deu um passo atrás, como se ela fosse uma praga. O maxilar enrijeceu tanto que parecia a ponto de quebrar. – Eu não farei jogos baixos, para que você o deixe com ciúme e o reconquiste. Se foi para isso que veio, vá embora. Agora. Antes que eu a impeça fisicamente de voltar para aquele desgraçado. – Eu não quero deixá-lo com ciúme. Quero remover Jackson de cada parte da minha vida. Não quero nem que a sombra dele me toque mais. – Isso é tão simples quanto abandoná-lo, Clio. – Não sem fazê-lo perceber o que ele fez comigo. A incredulidade brilhou nos olhos verdes. – Mais cedo, você não acreditou numa palavra que eu disse. Como sei que não vai correr de volta para ele no minuto que o patife começar a sussurrar palavras de amor, novamente? – Mais cedo, eu era uma tola que teria feito qualquer coisa pelo homem que amava. Agora... não sinto nada, exceto desgosto e pena daquela mulher. Minha pele se arrepia quando penso que passei todos aqueles anos... Isso o satisfaz? Ou quer que eu me humilhe até que você acredite em mim? Ele a estudou por um momento. – Você está zangada e emotiva agora. Amanhã, irá perdoá-lo e rastejar de volta para ele... – Ouça a minha proposta, primeiro. Depois, tome sua decisão. Clio estava tão cansada de homens fazendo seus jogos com ela, controlando-a, definindo-a, possuindo suas alegrias e dores. Tão cansada de perder-se, de novo e de novo. A ironia de recorrer a outro homem para pedir ajuda, e deixá-lo ver seus piores medos, um homem que era mil vezes mais poderoso que Jackson ou seu pai, não passou despercebida por ela. Mas Jackson estivera errado. Ainda restava um caminho a Clio, e ela se jogaria neste. – Você quer expor a realidade de Jackson para o mundo? Alguma coisa mudou na expressão dele, e ela soube que o capturara. Pela primeira vez em meses, sentiu uma onda de positividade preenchê-la. – Dar-lhe um milhão de dólares é fácil. O que você está sugerindo é muito mais elaborado, e requer grande envolvimento da minha parte. – Mas você fará isso – afirmou ela, forçando confiança no tom de voz. – Por quê? – Porque eu vi isso no seu rosto esta noite. Quando eu disse que ele era meu noivo, sua expressão foi de tanta raiva, de tanto desgosto. Não sei o que Jackson lhe fez, mas sei que você não perdoará ou esquecerá. Ele estudou-lhe o rosto por um longo momento. – Vejo que ainda há um pouco da velha Clio em você, bella. – Você encontrou o elo fraco na vida de Jackson. Sou eu.
– Eu derrubarei aquele homem, se nós começarmos nesse caminho. Não haverá meias medidas, nem retorno. Você não voltará para ele. Jamais. – Eu não sou fraca, Stefan, não nisso. Engoli o desgosto que me envolveu hoje, e vim procurá-lo, sem o conhecimento de Jackson. – Conte-me o que aconteceu. Por um segundo, Clio não reagiu diante da autoridade com a qual ele demandava uma resposta. – Importa o que aconteceu? Se eu tiver de me olhar no espelho, se eu tiver de... Eu lhe darei qualquer informação que precisar sobre os negócios e a empresa de Jackson. Mas somente se você concordar com a minha proposta. – Qual é a sua proposta, Clio? Clio olhou para Stefan e forçou-se a colocar a última parte de seu plano em palavras. Um plano que tinha girado em sua mente como um tsunami, sacudindo tudo no caminho, rindo de sua determinação fraca, de seus medos. Ela não podia voltar atrás agora, por mais assustador que fosse unir seu destino ao de Stefan, mesmo que temporariamente. Stefan Bianco, uma vez um amigo querido, e agora um estranho implacável, seria o fogo através do qual ela teria de andar. E quando emergisse daquele fogo, homem algum teria o poder de feri-la novamente. Homem algum chegaria perto dela. – Eu quero que você declare amor eterno por mim. Num gesto que capture a atenção da mídia. Quero que me peça em noivado, transformando toda sua arrogância em amor feroz e possessivo por mim. Quero que você me dê o poder de seu status como o playboy que não olharia duas vezes para a mesma mulher, muito menos teria um relacionamento com ela. E quero tudo isso feito de um jeito que Jackson não possa nem piscar, sem que nosso noivado seja jogado no rosto dele. Então, eu lhe contarei tudo que você precisa saber para expô-lo.
CAPÍTULO 4
– NÃO. A palavra saiu da sua boca, antes que Stefan pudesse processar a proposta ultrajante de Clio. O mero pensamento de amarrar-se a uma mulher, qualquer mulher, preenchia suas veias com gelo. E a alguém como Clio, de quem ele gostara uma vez... o mero pensamento era insuportável. Esfregando o queixo, ele a olhou. Desespero e alguma outra coisa eram evidentes nos olhos dela. Mechas de cabelo começavam a escapar do penteado elaborado. Ainda no vestido preto sem mangas que parecia deixá-la pálida, Stefan soube que ela havia ido diretamente da festa ao seu encontro. De alguma maneira, ela encontrara forças para chegar a ele. Ele reprimiu o impulso que sentiu de querer protegê-la. Fazia muito tempo que uma mulher não o surpreendia com palavras ou ações. O fato de que era Clio, uma mulher que ele declarara uma causa perdida, intensificava a surpresa. – Por mais tentadora que sua proposta seja, eu não tenho intenção de me associar romanticamente a uma mulher, bella. Nem mesmo numa farsa. Nem mesmo por alguns meses. Nem mesmo para salvar uma amiga. Eu nunca serei bom para a mulher que ocupar este papel na minha vida, Clio. O pequeno queixo abaixou, mas havia determinação nos olhos dela. – É só uma farsa, Stefan. Eu não pedirei nada de você. – Não. – Então você não terá nada de mim sobre Jackson. E apenas para que você saiba o que está negando, eu sou membro do quadro de diretores da financeira dele. – É claro, não tenho sido nada além de uma autoridade simbólica por todos esses anos, mas, pelo menos, tenho acesso irrestrito a tudo... às finanças da companhia, às contas bancárias e até aos investimentos de Jackson no exterior. – Alguma coisa suspeita já chamou sua atenção? Ela meneou a cabeça.
– Eu nunca tive motivo para duvidar dele. – No minuto que a mídia unir meu nome ao seu, Jackson a fechará do lado de fora. Você não será útil para mim. Nossa antipatia é mútua. Exalando lentamente, as feições de Clio relaxaram. – Obviamente, esta é minha primeira vez tramando alguma coisa cruel, então você terá de me desculpar se eu não tenho um plano Kill Bill no momento – disse ela, referindo-se ao drama de vingança que homenageava filmes japoneses de samurai, entre outros gêneros. Ele riu, satisfeito de ver um pouco de cor retornando ao rosto dela. – Então, vamos colocar um traje amarelo e uma espada de samurai nos planos, sì? A primeira parada será o Japão. Um pequeno sorriso curvou a boca rosada, e Stefan teve a estranha vontade de provocar aquela boca. Um desafio... era o que ela poderia se tornar para Stefan, se ele assim permitisse. Porque, mesmo uma década atrás, ele a quisera, perseguira-a obstinadamente naquele primeiro ano. Todavia, uma vez que eles tinham se tornado amigos verdadeiros, Stefan recuara, cultivando ainda mais aquela amizade. Então conhecera Serena e se apaixonara. Ele adoraria vivenciar com Clio a experiência que eles não tinham vivenciado no passado. Mas havia muitas mulheres desejáveis e descomplicadas no mundo. Clio, para ele, estava fora de cogitação. Todavia, não pôde evitar provocá-la: – Pelo que posso ver, você está em forma, então isso é bom. Silêncio se estendeu entre eles. – Uma vez que estamos calculando se eu lhe serei útil ou não, você está considerando a minha proposta? Havia uma autodepreciação no tom de Clio que mascarava outra emoção. Pela postura tensa dela, Stefan soube que era medo. Qualquer coisa que Jackson tivesse feito, ela ainda estava flutuando naquela onda de adrenalina. O que significava que ela estouraria logo. E ele não tinha dúvidas de que Clio voltaria atrás, que até mesmo se encolheria diante da ideia de eles unirem forças para derrubar Jackson. A jovem que ele conhecera em Columbia possuíra o maior coração que Stefan já vira, possuíra uma capacidade incrível de amor e perdão. O fato de ela tê-lo procurado assim, de estar considerando aquele caminho, expunha o dano que Jackson devia ter lhe causado. A fúria diante da ambição de Jackson o preencheu. Se Stefan não cuidasse dela, Clio poderia acabar como Marco. Ou pior. E o pensamento de qualquer coisa acontecendo a Clio pelas mãos de Jackson deixou-o em pânico. Com um controle que levara anos para aperfeiçoar, ele forçou-se a soar casual: – Sua proposta é benéfica para mim. Então, sim, eu estou considerando-a. – O que eu preciso fazer para convencê-lo completamente? – perguntou ela.
O que Stefan precisava agora era de tempo com Clio. Tempo no qual Clio não visse Jackson. Tempo no qual ela reforçaria o que a estava motivando no momento, e desistisse de considerar voltar para ele. Stefan não tinha intenção de deixá-la voltar para aquele homem. Sentia-se responsável por Clio. Não importava de onde vinha esse sentimento, apenas que assim era. – Eu aceitarei sua proposta com uma condição. CLIO FORÇOU-SE a dar de ombros, mostrando uma casualidade que estava longe de sentir. Soubera que o homem que Stefan era hoje não aceitaria seus planos tão facilmente. Todavia, o fato de que ele exigia alguma coisa dela lhe causava medo. – Eu não tenho mais nada para lhe dar. Minha carreira, minha vida, até mesmo minhas economias estão presas a Jackson e à empresa dele. Neste momento, nem sequer tenho um lugar para onde voltar. – Isso é perfeito para o que eu tenho em mente, então. – E o que seria? Um sorriso misterioso curvou os cantos da boca dele. – Se você quer se tornar minha noiva publicamente, se quer que eu faça o papel de noivo apaixonado, primeiro precisa me provar que tem coragem suficiente para ir até o fim nisso. Não permitirei que você volte para ele quando nossa farsa acabar. – Eu já lhe disse que isso é... Ele meneou a cabeça. – Meu jeito, ou nada feito, Clio. Ela suspirou. – Certo. O que eu tenho de fazer para provar que irei até o fim nisso, que você não terá uma mulher histérica louca para voltar para Jackson? – Você tem de ir comigo ao casamento de Christian e Alessandra. Aquela era a última coisa que ela esperara que Stefan dissesse. A última coisa que queria fazer. Ainda estava impressionada com sua própria força para ter ido procurar Stefan esta noite. Mas não tinha coragem de encarar Rocco, Christian e Zayed, vendo a incredulidade e pena nos olhos deles quando a encontrassem. – Você não vai ganhar nada me levando ao casamento de Christian. – Isso sou eu quem decide – replicou ele em tom arrogante. – Stefan, ouça. Eu voltarei para Jackson esta noite e fingirei que nada aconteceu, por mais nauseante que a ideia seja para mim. Durante a próxima semana, continuarei mantendo a boca fechada, como fiz nos últimos anos, e o deixarei pensar que ainda sou a mesma Clio fraca e sem personalidade. – Só de pensar naquilo lhe causava calafrios. – Esperarei até que você volte do casamento de Christian. Pela sua lógica, haverá muitas chances de eu voltar atrás. Mas estarei aqui, esperando. Então você saberá que estou levando isso a sério. – Não. – Por que você se importa se eu vou ao casamento de Christian ou não?
– Se você quer começar uma vida nova, bella, por que não começá-la voltando para seus velhos amigos? – Eu não posso, Stefan. Não tenho... – O quê? Ele pegou-lhe a sua mão. Imediatamente, os dedos de Clio enrijeceram, mas ele não a soltou. – Nenhum de nós irá se beneficiar mentindo para o outro ou omitindo coisas, Clio. Se esta farsa tem alguma chance de dar certo, precisamos ser abertos entre nós. Capisce, bella? – Sim, mas eu não entendo por que levar esta farsa para nossos amigos, também. Você será capaz de mentir para Rocco, Christian e Zayed? – Se quisermos que o mundo acredite no nosso noivado, sim. Deixe-os comigo. Você não falará uma palavra para ninguém sobre o que está acontecendo entre nós. – Com Rocco já casado e Christian fazendo o mesmo, os olhos do mundo inteiro já estão no Quarteto da Columbia. Não será difícil convencê-los de que eu estou seguindo os passos de meus amigos e ansioso para me casar com a mulher que amo. – Eu não conseguirei fingir. Mentir e enganar nunca foram coisas fáceis para mim. – Não se preocupe, Clio. Você será tão boa nisso quanto qualquer outra mulher que eu já conheci. – Pare de me insultar, Stefan. Eu não sou uma de suas... – Veremos – interrompeu ele, sem emoção. – Pense assim, bella. Para convencermos a mídia e a todos do nosso noivado, precisaremos criar uma base. E que maneira melhor de começar um caso amoroso do que indo a um casamento de um velho amigo em comum? Isso é o que nós precisamos para iniciar nosso romance de conto de fadas. Um romance de conto de fadas com um dos homens mais lindos, arrogantes e implacáveis que ela já conhecera... era um destino do qual Clio teria fugido uma década atrás. Tinha sido o destino do qual ela fugira. Mas unir forças com Stefan era sua única opção, lembrou-se. Encontrando-lhe o olhar, assentiu. – Tudo bem. Vamos ao casamento de Christian. Mas terei de encontrar Jackson amanhã. – Não. – Se eu tenho de vasculhar as finanças dele, não posso abandoná-lo ainda. – Então, eu irei com você. – Não. Eu não desmoronarei, Stefan. Não amanhã, não nos próximos dias. – ONDE VOCÊ estava, Clio? Não atende ao celular, não está no trabalho... Com a respiração presa na garganta, Clio entrou na sala do apartamento onde morava há mais de quatro anos. Jackson pôs seu notebook sobre o sofá, levantou-se e andou na direção dela. E Clio automaticamente deu um passo atrás. Não traia a si mesma, bella. Com o aviso de Stefan soando em seus ouvidos, ela forçou-se a não se encolher diante da proximidade de Jackson.
– Clio? Com 1,80m, ela era alguns centímetros mais alta do que ele. Olhando-a fixamente, Jackson segurou-lhe o rosto nas mãos. – Está tudo bem? A doçura falsa no cumprimento dele a fez se sentir nauseada. – Na verdade, eu não estou bem. Não havia necessidade de fingir sobre seu humor. Ela sabia que não conseguiria, nem se tentasse. Afastando-se dele, andou para a geladeira e pegou uma garrafa de água. Evitando encará-lo, Clio olhou em volta da sala de jantar. Desesperada para ser amada, para sentir que teve sucesso em alguma coisa... Seu peito estava tão apertado que era um milagre que ela estivesse respirando. Porque, para todo lugar que olhava, não havia traços seus no espaço onde vivera por quatro anos. Era tudo uma extensão da personalidade de Jackson ou a residência de um financista de Nova York. Nada sobre o apartamento refletia Clio. Como ela não vira isso até agora? Bebeu um gole da água. – Clio, você saiu da festa ontem sem me avisar. Não voltou e não deu notícias, exceto por aquela mensagem de texto. Onde estava? – Com uma velha amiga – replicou ela, finalmente o encarando. Não havia um único fio dos cabelos loiros fora do lugar. Ele estava vestido num terno cinzachumbo impecável... a camisa azul-claro escolhida especificamente para realçar o azul dos olhos. Escolhida por ninguém menos que Ashley, e pega na lavanderia toda semana por Clio. Ele dormia com a secretária e tinha a ousadia de pedir satisfações a Clio. Sem a menor vergonha ou culpa. Tinha sido tão fácil zombar dela, usá-la? – Clio... explique-se ou... – Ou o quê, Jackson? – a pergunta saiu numa onda de raiva. Fechando os olhos, Clio respirou fundo e contou até dez. No minuto que Stefan a levara ao quarto de hóspedes, ela caíra na cama. O sono, todavia, não viera, a consciência que tentara reprimir por tanto tempo ganhando força. Ela pressionou os dedos contra a têmpora. – Eu não estou me sentindo bem. A expressão de Jackson foi de desgosto. – Não me diga que outra enxaqueca está chegando. Realmente, Clio, você deveria saber o que desencadeia esses episódios... É muito inconveniente de sua parte ter uma enxaqueca toda vez que alguma coisa importante está acontecendo. Perversamente, a falta de preocupação de Jackson encheu os olhos de Clio com mais lágrimas do que a traição dele. – Eu não as planejo, Jackson. – Foi por isso que você partiu da festa ontem, enquanto Jane e eu esperávamos? Sabia como aquela reunião era importante para mim.
– Eu fiquei doente por duas semanas, Jackson. Um conceito que você não parece entender, porque me arrastou para a festa, mesmo depois que eu lhe contei. Enquanto você viajava o mundo a negócios, eu fiquei aqui sozinha, com gripe. Mal tinha me recuperado quando você chegou e pediu que eu me aprontasse para aquela festa. Jackson praguejou e quase empurrou o telefone sem fio no rosto dela. – Tudo bem. Tome alguns comprimidos. Ligue para Jane Alcott, nos próximos minutos. Marque outro encontro. Depois, ligue para Savoy e reserve uma mesa para almoço amanhã. Quero fechar o negócio com Jane. E certifique-se de parecer bem-humorada. A velha tagarela me fez uma centena de perguntas depois que você foi embora, ontem à noite. Olhou-me como se eu fosse responsável por suas enxaquecas. E, metade do tempo, eu nem consigo entender que diabos ela fala. – Meu Deus, Jackson, tenha algum respeito por ela. Ele a olhou com tanta incredulidade que Clio se encolheu interiormente. Estava chocado diante do pequeno protesto dela? – O que há de errado com você? Está com uma expressão estranha nos olhos. Não está grávida, está, Clio? – Como eu poderia estar, quando você não me toca há quatro meses? No minuto que falou aquilo, Clio piscou. Era de admirar que ele pisara sobre ela? O jeito que Clio formulara a pergunta significava que ela lhe dera todo seu poder. Cada aspecto do relacionamento deles tinha sido ditado por Jackson. Alguma coisa que parecia vergonha cruzou as feições de Jackson. Ele se desculparia? Prendendo a respiração, Clio esperou. – Isso não é culpa minha, é? – disse ele, desviando o olhar. E alguma coisa monumental esfarelou-se dentro de Clio. Se existisse um som para tristeza, seria o som que ela capturou em sua garganta. – Metade do tempo, você está infeliz consigo mesma, e a outra metade, está infeliz comigo. E tem diversos bloqueios sobre sexo. Pelo amor de Deus, Clio, sexo nem sempre é sobre aconchego e compartilhar sonhos e palavras de amor. Às vezes, sexo deveria ser apenas sexo. Não há nada errado em se libertar na cama. Mas você nunca consegue fazer isso, não é? – Você não se importa nem um pouco com o que eu sinto, Jackson? – A pergunta patética saiu de sua boca, antes que ela se desse conta. O desespero em seu tom de voz, que também continha um toque quase esperançoso, levou bile a sua garganta. Era como assistir a uma versão alternada de si mesma conversando com Jackson, esperando que ele lhe desse uma resposta que consertasse tudo que ela ouvira na noite anterior, como se esta pudesse magicamente apagar a feiura do relacionamento deles. Aquele pequeno fio de esperança era a coisa mais patética que Clio já vira na vida. Não confio em você para não voltar para ele, enquanto eu estiver fora. As palavras de Stefan preencheram sua mente, e ela virou-se de costas para Jackson. Tudo em seu interior tremia. Clio queria desmoronar e ceder à dor que a dilacerava. Mas não podia. Não ainda. Endireitando os ombros, virou-se novamente para ele. Tinha sido ensinada, pelas melhores babás da Inglaterra, a se aguentar firme, mesmo quando o mundo a sua volta estava em caos.
– Eu não posso ligar para Jane hoje. Não tenho tempo. – Por que diabos não? – Vou para Atenas. Tenho um milhão de coisas para fazer antes disso. – Atenas, Grécia? Um sorriso irônico curvou a boca de Clio. – Sim. O casamento de Christian Markos não acontecerá em qualquer outro lugar, suponho. – Christian Markos? O Christian Markos? Você foi convidada para o casamento dele? – O brilho que surgiu nos olhos de Jackson e o súbito sorriso que ele deu adicionou outra camada de gelo em volta do coração de Clio. Ela não significava nada para ele. Embora soubesse disso, a verdade ainda a abalava. – Por que você nunca mencionou que ele era seu conhecido? – Ele não é um mero conhecido. Christian é um amigo muito próximo. – Isso é ainda mais fantástico. – Jackson pegou o telefone e discou um número. O de Ashley, ela estava certa. Clio tirou-lhe o telefone da mão no minuto que Ashley disse “alô”, e desligou. – Você não foi convidado, Jackson. O que ela vira nele algum dia? , Clio perguntou-se. Como pudera se enganar tanto, quando tudo em Jackson era falso? – Você precisará de um acompanhante. E quem mais levaria, senão eu? Não é como se tivesse muitos amigos, além dos meus. Porque ela construíra sua vida inteira em torno dele. – Eu não levarei ninguém. Christian e meus outros amigos são... – Que outros amigos? – Rocco Mondelli, Zayed Al Afzal e – ela hesitou –, Stefan Bianco. A mídia gosta de chamá-los de... – O Quarteto da Columbia – Jackson terminou com um brilho ambicioso nos olhos. Clio podia quase ouvir o movimento das engrenagens mentais dele, podia ver seu lugar patético na vida de Jackson se estendendo por mais alguns meses, enquanto Ashley dava a luz a seu filho. – Você conhece bem todos eles? Até mesmo aquele siciliano arrogante, Bianco? – Sim, Stefan é um amigo, também. – Clio forçou um sorriso e cruzou os braços. – Os quatro são insanamente protetores de suas vidas privadas, e eu não quero impor sobre eles. Jackson passou uma mão sobre os cabelos, estudando-a. – Este não é um bom momento para você sair de Nova York, Clio. Cancele a viagem. Preciso de você aqui para fechar o negócio com a financeira de Jane, e então há... Clio meneou a cabeça, enojada pela forma que ele mudara de tática instantaneamente. – Foi isso que você disse quando Rocco se casou, também. Eu permiti que você me deixasse perder o dia mais importante na vida de um de meus melhores amigos. Também tenho uma vida, Jackson. – Tem? – Sim – sussurrou ela, não gostando da expressão nos olhos dele. – Uma cuja existência eu esqueci nos últimos anos.
– Certo. Vá para Atenas. Socialize-se com seus amigos. E quando você voltar, nós teremos uma conversa sobre Stefan Bianco. Aquele homem tem sido uma pedra no meu sapato por tempo demais. No minuto que Jackson saiu, as pernas de Clio cederam. Ela afundou-se no tapete grosso, as paredes brancas impecáveis se fechando ao seu redor. Dizendo a si mesma que passara pela pior parte, respirou fundo. Então, levantou-se e foi para o estúdio de Jackson, vasculhando gabinetes e gavetas. Seu coração estava disparado, mas ela sabia que ele não voltaria esta noite. Não havia nada para salvar no seu relacionamento com Jackson. Ele pisara em seu coração e destruíra sua confiança. Clio ligou o computador e digitou a senha para acessar o banco de dados da empresa deles, imaginando se algum dia seria inteira novamente.
CAPÍTULO 5
CLIO OLHOU ao redor da estrutura antiga do Partenon e experimentou uma onda de paz que não sentia há muito tempo. O casamento de Christian na noite anterior tinha sido uma linda cerimônia. Decidir andar a curta distância do hotel luxuoso para ver as ruínas antigas de perto era a melhor decisão que ela tomara. O almoço de hoje no terraço com Rocco e Olivia, Zayed, Christian e sua nova esposa Alessandra, e Stefan começara tão bem. Ela se sentira entre amigos. Olivia fizera muitas perguntas sobre a época que os quatro homens e ela estiveram juntos em Columbia, e Clio lhes contara histórias divertidas. Até que a discussão se voltara para sua própria vida. O que Clio fizera durante todos aqueles anos? Estava envolvida com alguém? As perguntas haviam sido educadas, de pessoas que estavam interessadas em sua vida. Mas o que ela tivera de dizer a eles? Virando-se, Clio tirou mais algumas fotos com sua câmera digital. Sua mão erguida parou no momento que ela viu a figura alta e grande de Stefan se aproximando. O sol de junho brilhava atrás dele, deixando o rosto bonito em sombras. A camisa branca de algodão acentuava os ombros largos e abdômen reto. Embora ele não pudesse vê-la, Clio impediuse de baixar seu olhar. Não precisava ver as pernas poderosas envoltas em jeans. Ela já notara muito aquele corpo poderoso durante o voo deles para Atenas. O avião particular luxuoso, que Stefan admitira ser quase um lar para ele, deixara Clio sem palavras. Mas era o homem em si que ocupara sua mente durante toda a viagem. Stefan não tinha sido nada além de cortês e atencioso durante o voo. Entretanto, toda vez que seus olhares se encontravam, ou que eles acidentalmente se tocavam, uma energia latente pulsava, até que um dos dois desviasse o olhar ou desse um passo atrás. Ele parou a poucos metros de distância, observando-a. Sentindo-se compelida a quebrar o silêncio intenso, ela gesticulou uma mão.
– Não acredito que Christian obteve acesso privado ao Partenon. Até mesmo eu estou impressionada por esta demonstração de poder e status. Alessandra significa tanto assim para ele, então? Stefan deu de ombros. – Se Alessandra fosse o tipo que se impressionasse por isso, faria sentido. Apesar de todo sucesso que ele alcançou, Christian tem uma atitude negativa sobre onde começou na vida. Ainda não percebe que Alessandra é uma dessas raras mulheres que não se importa com a riqueza ou posição dele. Clio piscou. Era seu comentário casual de que uma mulher ficaria impressionada pelo poder que o Quarteto da Columbia possuía que o fizera parecer tão hostil? Ele ainda pensava em Serena, a mulher que lhe partira o coração? Achava que todas as mulheres eram como Serena, que Clio era como ela? É claro que ele achava, percebeu Clio. E ela apenas confirmara o ponto de vista de Stefan, indo lhe pedir ajuda, sugerindo que queria usar o poder e posição dele como seu escudo. Ela não podia começar a se importar com a opinião de Stefan. Não quando tudo já estava decidido. Não quando sua autoestima estava em frangalhos. – Você acha que ele está apaixonado por ela? – questionou Clio. – Eu diria que não. Mas mudei de ideia sobre Rocco e Olivia, então, quem sabe? – Stefan aproximou-se mais. – Eu não sabia que fugir era um hábito seu. Clio o fitou. – Não sei o que você quer dizer. – Você fugiu naquela noite do Empire State Building, em vez de confrontar o imbecil. E fugiu hoje. – Eu não... fugi. – Olivia disse que você parecia estar tendo uma crise de ansiedade. Ela ficou preocupada com você, assim como eu. Por que partiu? – Parece haver muito atrito entre Christian e Rocco. – Rocco precisará de tempo para perdoar Christian por ter se envolvido com sua irmã mais nova. Mas o fato de que ele está aqui mostra o quanto Alessandra significa para ele. – Eu me senti uma intrusa. – Zayed e eu estávamos lá. – Vocês fazem parte uns das vidas dos outros. Rocco e Christian precisam de seu apoio para ultrapassarem esta fase difícil. Eu sou pouco mais que uma estranha. – Não. Você sabe que estava agindo como uma boa divisora lá. As histórias que contou da época da faculdade fizeram todos rir. Ele estendeu o braço e pegou-lhe a mão. Uma eletricidade instantânea crepitou entre eles. – Você disse que as alunas em Columbia costumavam invejá-la, ao mesmo tempo que a bajulavam, de modo que pudessem obter um pouquinho de nós. Do que chamou a si mesma? Clio sentira o olhar dele sobre si como uma carícia física durante todo o almoço. Agora, sentia-se desconcertada ao saber que Stefan se lembrava de cada palavra que ela dissera. – A Ponte de Ligação para o Quarteto da Columbia.
Ele sorriu, os olhos calorosos. – Rocco estivera como um touro feroz durante todo este tempo, mas até mesmo ele sorriu disso. Então, você desapareceu. Achei que tivesse fugido. – E para onde eu iria? Trazendo-me para cá no seu avião particular, você se certificou de que eu não tivesse para onde ir, exceto na sua companhia. Até mesmo pediu que desfizessem minha mala e pegassem meu passaporte. Não me manipule, Stefan. O gelo cobriu as palavras dele: – Eu fiz isso para seu próprio bem. Clio não poderia voltar atrás. Se não se impusesse agora, nunca o faria. O relacionamento deles... a farsa... era temporário, entretanto ela queria ter voz ativa ali. Nunca mais se permitiria perder seu senso de identidade para um homem. – Não presuma saber mais do que eu o que é melhor para mim. – Mas não é isso que noivos apaixonados fazem, bella? Atendem cada desejo ou capricho seu, mimando-a com luxo e agindo de maneira possessiva? Sabendo o que é bom para você melhor do que você mesma? Clio encolheu-se, a facilidade com que ele usava sua história para provar um ponto, cruelmente eficaz. – Supostamente, nós estamos nos apaixonando agora. Acha que o mundo irá acreditar que Stefan Bianco deixou sua pretendente viajar com uma companhia aérea comercial? – Talvez o mundo pensasse que Stefan Bianco finalmente encontrou uma mulher que não cai aos seus pés? – retorquiu ela, erguendo o queixo. Ele sorriu e deslizou um dedo pelo queixo dela. – Por que você não tem dificuldade em me colocar no meu lugar, bella? – Aproximando-se, ele segurou-lhe os ombros e virou-a em direção ao terraço. – Sabe como você parecia do terraço, Clio? Clio meneou a cabeça. O calor do corpo dele atrás dela era como uma carícia. Ela deveria se afastar, sabia disso. Cortar aquela linha de conversa antes que começasse. Não havia espaço para observações pessoais ou experiências compartilhadas entre eles. Não havia nada, exceto um objetivo em comum. Mas alguma coisa no tom de voz de Stefan impediu-a de falar. Ele ergueu-lhe o queixo. – Eu devo lhe contar? Stefan a estava provocando. Desafiando-a. Ela lera que o Partenon tinha servido como uma igreja, uma mesquita, e até como depósito de munições durante a ocupação turca da Grécia. Todavia, a construção continuava lá, majestosa, linda, um monumento para uma das maiores civilizações do mundo. E ela estava com medo de ouvir a opinião de um homem sobre sua pessoa. Estava com medo até mesmo de encarar a verdade estampada nos olhos dele. Tudo estava em ruínas na sua vida, como o Partenon. Mas Clio decidiu arriscar. Apenas pelo momento, escolheria ser destemida. Fingiria ter se tornado a mulher que queria ser na época da Columbia University. A mulher que Stefan respeitara e admirara.
A palma dele estava contra a parte baixa de suas costas, queimando sua pele. Virando-se, Clio encontrou-lhe o olhar, lutando contra a vontade de fugir. – Conte-me como eu parecia, Stefan. Os olhos verdes se arregalaram. Ver que ela o surpreendera foi uma recompensa por sua coragem. – Com esse vestido cobrindo apenas um ombro, seus cabelos esvoaçando para trás, o sol tornando sua pele dourada, você parecia a própria deusa Atenas. Por alguns segundos, eu fiquei impressionado. E faz tempo que deixei de acreditar em qualquer tipo de mito. Uma risada amarga escapou da garganta de Clio, perdendo-se na vastidão ao seu redor. – Eu não sou como ela, Stefan. – Virando-se novamente, ela suspirou. – Você estava certo. Eu fugi do terraço, porque não conseguia respirar lá. – Por quê? – Esqueça, Stefan. – Não. – Você não viu o bastante? Não vai me deixar ao menos com uma fachada atrás da qual me esconder? – Não, não vou. Melhor eu do que o mundo inteiro, bella. Ou do que o homem corrupto que você deixou para trás. Jackson não vai aceitar docilmente nosso noivado. Isso só atrairá mais... – Atenção sobre mim? Eu sei. Ela era patética, pensou Clio. Por um minuto, pensara que ele insistia porque se importava. Ela não passava de um meio para um fim, aos olhos de Stefan. Assim como tinha sido para Jackson. Só que com Stefan, não havia mentiras, enganações. – Eu vi Olivia Fitzgerald, a supermodelo. Vi Alessandra Mondelli, a fotógrafa mundialmente famosa. Pessoas que construíram uma vida, que deixaram sua marca no mundo. Então vi meu reflexo numa jarra. Quem diria que uma jarra poderia fazer tanto por você? E ambas as mulheres, enquanto lindas e bem-sucedidas, tinham homens que as respeitavam e as amavam. – Lá estava eu, sentada entre as mulheres mais realizadas do planeta, e o que eu tinha para contar sobre uma década de trabalho árduo, de anos fugindo de uma vida segura... – Nada. – Eu não podia ficar mais um minuto e estragar a felicidade de tanta gente. Você ainda me vê como a deusa Atenas, Stefan? Os dedos dele se apertaram em seus braços desnudos, a expressão feroz enquanto ele a encarava. – Você o deixou. Pelas suas próprias palavras, saiu rastejando do ponto mais baixo de sua vida e veio a mim. E teve bastante coragem para usar o que viu no meu rosto naquela noite em sua própria vantagem. – Eu sei o que é necessário para seguir em frente a partir daquele momento que seu coração está despedaçado e não existe nada além de um buraco em seu peito. – Tudo que você precisa agora é persistir e construir sua vida do jeito que quiser. E até que possa travar sua própria batalha, eu farei isso por você. Clio assentiu.
Apesar de toda a implacabilidade de Stefan, ele era gentil. Ele a estava usando, e ela o estava usando. Aquele era o relacionamento perfeito para duas pessoas que haviam sido feridas pelo amor, que haviam tido seus corações pisoteados. Um homem que pudesse amá-la incondicionalmente... Clio nem sabia mais o que isso significava. Talvez, nunca tivesse merecido tal amor. Mas queria muito que chegasse o dia em que ela não fugisse de vergonha, quando não sentisse este vazio interior enorme diante do sucesso de outra mulher. Um dia quando ela não fosse um fracasso na vida. Ela fez uma reverência diante de Stefan, deixando a esperança preencher seu corpo inteiro. – Então eu estou pronta para o treinamento, mestre. Sorrindo, ele retornou a reverência, então deu um passo atrás numa pose elaborada, usando os braços como se cortasse o ar em movimentos perfeitamente sincronizados. – Vamos começar, Clio. Balançando a cabeça, Clio riu. Para qualquer um que os observassem do hotel, eles pareceriam cômicos. – Se você me disser que é faixa preta em karatê, ou algo assim, eu terei de quebrar seus dentes, Bianco. Não posso aguentar tanta perfeição masculina, sem que esta comece a me asfixiar. Ele riu. Com os cabelos caindo na testa, as feições lindas banhadas pelo sol, Stefan parecia um daqueles guerreiros que poderia ter conquistado o Partenon. – Tanta perfeição masculina, huh? – disse ele, as maçãs esculpidas do rosto corando. Estreitando os olhos, Clio aproximou-se. – Deixe-me ver você – murmurou ela, rindo. Ele protegeu o rosto com o braço e Clio o abaixou. – Oh, meu Deus, você está vermelho. – Ela levantou sua câmera e tirou diversos close-ups de Stefan, enquanto ele tentava pegar a máquina. Empurrando o peito largo com uma mão, ela sacou mais algumas fotos. Ainda rindo, Clio tirou a câmera do alcance dele. – Esta é minha sorte. Mulheres do mundo inteiro irão enlouquecer com isso. Uma fotografia do siciliano arrogante Stefan Bianco fazendo alguma coisa tão mundana e humana como enrubescer. – Pare com isso, bella. – Ora, como se você não soubesse que é atraente. Por que acha que aquela modelo enlouqueceu quando você a dispensou? – Os presentes regulares que ela encomendava para si mesma da Tiffany? O champanhe e caviar, e as viagens para Paris, Londres e Hong Kong no meu avião particular? Os contratos de modelagem que ela conseguiu através de mim? Com a câmera balançando de sua mão erguida, Clio ficou imóvel. Ele se tornara tão cínico, ela lembrou-se de Christian dizendo alguns anos depois que eles tinham acabado a faculdade. Mas ver aquela dureza se tornando uma parte tão intrínseca de Stefan era um contraste agudo com o homem que ela conhecera. Ele achava que não possuía qualidades pessoais para atrair uma mulher sincera? Ou tornara isso verdade enterrando tudo que houvera de bom em si mesmo? – Você não acha que todas as mulheres são assim, acha, Stefan?
– É claro que não. Não vamos esquecer minhas proezas masculinas – acrescentou ele com uma piscadela que não camuflou a verdade fria nos olhos verdes. Clio socou o braço dele, escondendo o tremor que a percorreu. – Eu mostrarei minhas grandes qualidades em pequenas doses para você, sì? Sei que está vibrando por dentro diante do pensamento de me ter todinho para si mesma. Clio riu mais ao se lembrar de ele tentando conquistá-la em Columbia durante o primeiro ano de faculdade. As atenções de Stefan eram quase uma reação instintiva a qualquer mulher relativamente atraente. Oh, ela se divertira tanto colocando Stefan em seu devido lugar, toda vez que ele tentara atrair seu interesse. Mas perdera a chance de fazer aquilo quando ele se apaixonara por Serena. – Você precisa desinflar um pouco seu ego, Bianco. Com as mãos nos quadris, ele a olhou. – E você é a mulher que vai fazer isso, Norwood? Ela excitou-se diante do desafio, por mais zombeteiro que fosse. – É claro que sou. Se eu não tivesse diminuído seu senso de autoimportância na época da faculdade, uma segunda cabeça teria crescido em você. Ele sorriu. – Eu tenho uma segunda cabeça... Corando e rindo, Clio bateu a mão na boca dele. Dentes afiados enterraram em sua palma, e ela gritou. Seu estômago doía de tanto rir, e lágrimas escorriam por suas faces, enquanto Clio corria e ele a perseguia, ambos lançando desafios há muito esquecidos um para o outro. Há quanto tempo ela não ria assim? Stefan tinha acabado de pegá-la quando eles ouviram o barulho de rotores. O som quebrou o momento com tanta eficácia que ela encolheu-se. Instintivamente, Stefan puxou-a para trás de si. Chocada por quão baixo o helicóptero estava voando e pela câmera de longo alcance dirigida para o terraço, Clio agarrou a camisa de Stefan e escondeu o rosto nas costas musculosas. – Isso tudo é para que eles tenham uma história de Alessandra? – perguntou ela, lembrando-se do escândalo que envolvera a irmã de Rocco. – Sim. Todavia, no que depender de mim, eles não obterão nada dela. Clio sentiu as costas de Stefan enrijecerem sob seus dedos. – Como você vai impedir? Nem mesmo você pode produzir asas e bloquear o helicóptero. Num movimento rápido, ele a puxou para frente. Tropeçando em seu próprio pé, ela caiu sobre Stefan. E tremeu diante do súbito calor que a inundou. Um braço forte circulou sua cintura, o aroma másculo cercando-a. – Eu não posso produzir asas, bella. Mas tenho uma linda mulher ao me lado, e posso dar aos cães de caça um pedaço mais suculento de carne, primeiro. No momento que eles acabarem conosco, Christian terá sua própria equipe de segurança armada, e Alessandra protegida do pior disso. Percebendo tarde demais o que ele pretendia, Clio empurrou-lhe o peito.
– Não, Stefan. Tem de haver outro jeito. Mas ele era tão sólido e impenetrável quanto às paredes do Partenon. Segurou-lhe o rosto entre as mãos e inclinou-o na sua direção. – Olhe para mim, bella. Finja que não pode ter o bastante de mim. Ela não precisava fingir. O pensamento errante deixou-a em pânico. Não precisava fingir que já estava caindo na névoa que ele lançava sobre seus sentidos. Ela lutou novamente, e as pernas de ambos se entrelaçaram, as coxas grossas roçando contra as suas. – Espere... eu... As palavras se derreteram dos lábios de Clio quando o polegar dele traçou a curva de seu lábio inferior. – É só um beijo, bella. Se você se encolher cada vez que eu tocá-la, ninguém irá acreditar na nossa farsa. Muito menos Jackson. Clio sentiu um peso quase insuportável no seu peito. A última coisa que queria era um beijo, muito menos de um homem que poderia, tão facilmente, destruir a pequena parte sua que ainda estava intacta. Mas o lembrete não funcionou tão bem quanto deveria. Porque quando ele abaixou a cabeça e tocou seus lábios, Clio sentiu-se queimar de desejo, sentiu o tremor que abalou o corpo sólido dele. Os lábios de Stefan eram suaves, os pelos despontando no maxilar roçavam sua pele, e os cílios grossos não escondiam, por uma vez, a expressão chocada nos olhos verdes. – Cristo, bella – sussurrou ele, tocando a testa na sua. – Stefan – suplicou ela, desesperada para fugir, ao mesmo tempo, ansiando por sentir aquela boca na sua, novamente. – Não faça isso. Dedos fortes envolveram sua nuca, o olhar dele quase zangado. – Eu não posso parar, Clio. Não agora. Ele cobriu-lhe a boca com a sua. Um desejo feroz a inundou, e Clio tremeu inteira. Stefan parou de beijá-la, enterrou o nariz no seu pescoço e inalou. – Você tem cheiro de sol e laranjas, bella. Dio, seu gosto... Clio não sabia o que mais ele dissera. Toda a luta abandonou-a no momento que ele encontrou sua boca novamente e aprofundou o beijo, explorando, mordiscando, como se ela fosse um banquete para ser saboreado. Ele beijou-a como se não houvesse nada mais que quisesse fazer, como se nada, exceto a rendição total dela, servisse. E Clio rendeu-se. A ele e, mais ainda, ao desejo em seu interior. Seus corpos se fundiram, enquanto eles atravessavam uma linha que não deveriam. UM DIA depois, Clio e ele partiriam para Nova York em duas horas, e o abismo de desejo que o beijo abrira continuava aberto para Stefan. Ele a beijara com a única intenção de desviar a atenção da mídia.
Mas um gosto daquela boca rosada e trêmula o nocauteara. Todas as fantasias que tivera com Clio quando tinha vinte anos tornaram-se uma realidade inebriante. Andando pelo interior acarpetado de sua suíte, ele olhou para a cobertura do vídeo daquele beijo, que já estava em cada site que se alimentava de sua vida, seu humor aos poucos saindo de controle. Assim como sua libido saiu de controle diante das lembranças daquela boca quente, do aroma de Clio, do jeito que ela havia tremido e gemido quando o beijo se aprofundara. Ver o beijo deles na tela não deveria ser a experiência mais erótica que ele já tivera. Com um suspiro, Stefan reconheceu que era. O casamento e a festa de Christian e Alessandra tinham acontecido sem uma visita feia da mídia, graças a sua tática de desvio. Mas havia uma expressão traída nos olhos de Clio que o perturbou quando ela encontrou seu olhar, agora. Como se ele tivesse cruzado uma fronteira imaginária entre os dois. E o fato de que ele não podia pensar em nada, exceto em lhe remover o medo e a dúvida, substituindo ambos os sentimentos por luxúria, provava que ela estava certa. Fazia muito tempo que um beijo não o virava do avesso com desejo. Mas Stefan teria preferido que isso tivesse acontecido com qualquer pessoa, menos com Clio. O curto clipe já estava na maioria dos sites de fofocas sobre celebridades, espalhando-se como um vírus. A especulação começara. Suas feições tinham estado distintas. Portanto, a mídia sabia que era ele. O que ainda não haviam descoberto era a identidade dela. E estavam loucos, tentando descobrir quem era a nova mulher na sua vida, ansiando para saber quem mais estava na lista de convidados do casamento de Christian. A imprensa a apelidara como a Ruiva de Bianco, um nome que ele sabia que a ruiva em questão detestaria. Stefan pegou o controle remoto no momento que Rocco entrou na sua suíte sem bater. E com uma carranca. Ele olhou para a tela de plasma na parede, segundos antes que Stefan a desligasse. O silêncio pesou, enquanto Rocco, seu velho amigo, o estudava. – Seja lá o que você queira falar, não fale – disse Stefan. – É verdade que nós quatro tratamos o mundo e as mulheres como se fossem nosso playground por anos – começou Rocco, sem rodeios – mas eu sempre achei que ainda restasse um pouco de honra em todos nós. Primeiro Christian com Lessie, e agora você e Clio... Dio, não achou outra pessoa com quem brincar, além de sua amiga antiga, Stefan? Stefan tivera todas as intenções de contar a verdade aos seus amigos. Mas agora, a interferência bem-intencionada de seu amigo deixou as palavras presas na garganta de Stefan. Subitamente, revelar a confidência de Clio e o acordo deles pareceu privado demais. Íntimo demais para ser compartilhado. Ele lutou por um tom de voz casual. Um beijo, e era como se o Monte Etna tivesse entrado em erupção. – Eu não estou brincando com ela.
– Não? Numa década, eu não o vi formar um único elo significativo com outra pessoa, muito menos com uma mulher. E você sempre teve uma “queda” por Clio. Não pode brincar com ela, e então descartá-la... – Basta, Rocco – interrompeu ele entre dentes. Controlando seu temperamento, porque não queria mostrar o quanto aquele beijo o afetara, Stefan sorriu para Rocco. – Apenas porque você casou-se com Olivia, não significa que pode esperar que todos nós já tenhamos mudado, fratello. Clio... está segura de mim. Sorrindo, Rocco bateu-lhe nas costas. E mais uma vez, Stefan impressionou-se em como amor e Olivia faziam bem a Rocco. Nunca vira seu amigo tão feliz e tão em paz. – Você sabe que eu tinha de... – Desnecessário explicar, Rocco. Rocco o olhou como se quisesse dizer mais alguma coisa. Em vez disso, abraçou Stefan e se despediu. Servindo-se de um drinque, Stefan foi para a varanda. Olivia e Clio estavam sentadas no Café ao ar livre no piso inferior. Clio não estava rindo, como Olivia, mas um sorriso curvava a boca bonita. E alguma coisa relaxou no peito de Stefan. Que bom que ela estava sorrindo de novo. Ela perdera aquela palidez, aquela aparência abatida que ele vira quando Clio fora a sua suíte. Como se pudesse sentir os olhos dele sobre si, ela olhou para cima. À distância, eles se entreolharam. Stefan levantou seu copo, e ela fez o mesmo, assentindo com um gesto da cabeça. Ele precisou de muita força de vontade para desviar o olhar e voltar a entrar em sua suíte. Não poderia tocá-la novamente, não poderia arriscar quaisquer complicações. Mulheres e sexo eram coisas descomplicadas para Stefan. Esse era o único jeito que ele conseguira se recompor e seguir em frente, depois da traição de Serena. Clio merecia muito mais. Ele não tinha nada a lhe oferecer, exceto memórias do que ela havia sido, exceto ser a força falsa dela para enfrentar um homem que ele abominava. A única razão pela qual Stefan concordara com aquilo era porque precisava que justiça fosse feita com Marco. Necessitava da ajuda de Clio para destruir Jackson. Ligando seu celular, ele fez uma ligação para seu Relações Públicas e para seu chefe de segurança, instruindo-o a vazar o nome dela como a mulher no clipe. Quanto antes eles realizassem o plano que os unira, mais depressa Clio sairia de sua vida, intocada e ilesa.
CAPÍTULO 6
FALTAVA APENAS uma hora para que eles aterrissassem em Nova York. Finalmente, Clio reuniu coragem para ligar seu tablet e abrir um programa de busca. Uma tensão instalou-se nos seus ombros quando ela digitou o nome de Stefan. E seu coração disparou violentamente enquanto ela assistia ao vídeo, vendo o corpo de Stefan envolvendo o seu de maneira protetora, mesmo enquanto eles estavam perdidos um nos braços do outro. Aquilo falava do homem que ela conhecera uma vez. Fechando o arquivo do vídeo, Clio rolou a tela e congelou diante do título. A Ruiva de Bianco É Ninguém Menos que Clio Norwood, Noiva do Financista de Nova York Jackson Smith há Três Anos. Não havia fim para as perguntas postadas, para o número de links para outros artigos. Não havia fim para o jeito que a mídia falava sobre aquilo, como se ela fosse um prêmio para Stefan, não uma mulher com sentimentos e emoções. Como Stefan Bianco roubava Clio Norwood debaixo do nariz de Jackson Smith? Há quanto tempo o caso estava acontecendo? Era sério? Qual dos homens Clio escolheria no final? Mesmo tendo estado preparada para aquilo, raiva, incredulidade e frustração a inundaram. A Ruiva de Bianco... Meu Deus! Clio riu até que seus olhos lacrimejassem. Aceitou o lenço de papel que Stefan ofereceu e enxugou o rosto. Havia um alívio em perceber que vira o pior e sobrevivera àquilo. Stefan olhou-a com expressão atônita. – Clio, por que você está rindo? Clio apontou para o tablet. – A Loira de Bianco soaria melhor, não acha? Talvez, eu pinte os cabelos. Inclinando-se para frente, Stefan pegou uma mecha de seu cabelo ruivo entre os dedos, uma expressão reverente no olhar.
– Não, bella – murmurou ele com firmeza. Os olhos que a encaravam eram possessivos. – Não ouse mudar um fio do seu cabelo, Clio. Qualquer transformação que você acha que precisa, eu a proíbo de arruinar uma coisa tão gloriosa. A visão dos dedos dele entre seu cabelo, assim como o comando inerente na voz profunda, fez Clio tremer. Não havia nada sobre ele que não lhe tirasse o fôlego, que não lhe causasse a sensação de que queimaria se ele não a tocasse. Mas se ele a tocasse, se ela o deixasse explorar este calor entre eles, não sobraria nada. E a amizade sincera de Stefan era a única coisa preciosa que lhe restava. – Nós não podemos continuar fazendo isso, Stefan – disse ela, a voz rouca contradizendo suas palavras. – Eu não consigo raciocinar com clareza quando você me toca, e preciso de toda minha razão para lidar com Jackson. A magnitude de sua admissão pairou no ar, mas Clio preferiria encarar a atração que existia entre eles a fingir que não estava sempre presente. Lentamente, ele tirou os dedos de seu cabelo, com desapontamento e fúria evidentes em sua expressão. – Como sugere que finjamos estar noivos sem nos tocar, Clio? Se você é fraca o bastante para cancelar tudo, porque não consegue... – Eu não acho que sou fraca por reconhecer uma fraqueza. – Ela prendeu-lhe o olhar. – Fingir na frente dos outros é uma coisa. Mas não quero que nada mais estrague nosso relacionamento. – Funcionou perfeitamente para nós desta vez, mas não acontecerá novamente, sì? Clio assentiu. Quando Stefan fitou-a novamente, o semblante estava impassível. Mas agora que Clio provara o ardor do beijo dele, o vira sorrir e discutir com Rocco, ela sabia que aquela era apenas uma fachada endurecida. Stefan ainda possuía uma personalidade tão apaixonada quanto possuíra uma década atrás. Só que agora, toda a paixão e emoção estavam enterradas sob uma força de vontade implacável. E era triste pensar que aquela paixão, todo aquele amor que ele tinha para dar, nunca mais veria a luz do dia. Todavia, a aceitação instantânea de Stefan agora era o que ela precisava. – Mais alguma coisa, Clio? – Eu não serei feita de tola, novamente, Stefan. Nem mesmo num relacionamento de mentira. – Eu não entendo. Ela apontou para o tablet, imagens de Stefan com outras mulheres, acompanhadas de legendas como Predador Playboy em letras maiúsculas. Stefan trocava de namorada como ela trocava de roupa. E o beijo deles fizera Clio se sentir mais viva do que se sentira em anos. Dois fatos diferentes, e ela precisava aceitar ambos sem dar muito peso a eles. – Você nunca está sem uma mulher. Uma expressão travessa brilhou nos olhos verdes. – Ainda estou perdido, bella. Fale em palavras que eu possa entender. Esqueceu que inglês não é minha língua nativa?
Ela não era puritana. Mas pensar em Stefan e sexo na mesma sentença lhe causava um friozinho na barriga. Ele sabia como ela se sentia desconfortável com aquilo, entretanto, instigava-a. – O que você vai fazer para sexo, Bianco? Ele sorriu. – Isso foi tão difícil? – Não. – Clio retornou o sorriso. – Mas você não me respondeu. – Eu não tomarei uma mulher enquanto tudo isso estiver acontecendo, certo? Você tem a minha palavra, bella. E tenho certeza que alguns meses de abstinência não irão me matar. Se eu ficar desesperado, tenho duas mãos muito capazes – acrescentou ele, levantando-as. Enrubescendo ao imaginá-lo nu, Clio jogou sua bolsa nele. – Informação excessiva, Bianco. Stefan arqueou as sobrancelhas, e, meneando a cabeça diante da expressão libertina, ela riu. – Você tem uma risada tão linda, Clio. Deveria rir mais. Sem fala pela observação abrupta, Clio assentiu. – Nós iremos aterrissar em uma hora – disse ele. – Já começou a analisar os documentos de Jackson? Precisa de ajuda? – Não, eu posso fazer isso, sozinha. – Apenas ouvir o nome de Jackson fazia Clio se sentir suja por dentro. – Eu baixei e imprimi todos os documentos relacionados com as finanças dele e da empresa. Mas ainda não os analisei. Você tem certeza que... – Ele é corrupto? Sim. Aposto toda minha fortuna nisso. – Recostando-se, ele cruzou as mãos atrás da cabeça. Então, olhou-a longamente. Com intensidade. Clio desviou o olhar, sentindo o calor dos olhos dele como uma carícia, rezando para que não desmoronasse antes que tivesse a chance de ficar inteira novamente. Porque desta vez, não sobraria nem partes de seu coração e autorrespeito. Inclinando-se para frente, Stefan pegou-lhe a mão. Ela arfou ao ver o anel de diamante que ele deslizou no seu dedo. Estava prestes a recusar quando viu a expressão de Stefan. Desgosto e alguma coisa indecifrável brilhavam nos olhos verdes. Ele estava se lembrando de Serena, assim como ela estava pensando em Jackson? Aquele dia no apartamento, Clio removera o anel de diamante que Jackson lhe comprara. Finalmente, sentira-se livre, depois de tanto tempo. Olhando para o anel, forçou-se a se acalmar. Aquilo era apenas uma farsa. Mas pelo menos a joia era do seu gosto... o mais lindo diamante de corte princesa. Ela olhou para Stefan, que a observava atentamente. – Stefan, obrigada... por tudo. Eu... – Desnecessário, bella. Não pense, nem por um momento, que eu estou lhe fazendo um favor ou que há alguma coisa pessoal nisso. Você tem de cumprir sua parte no acordo, e eu a minha. Ele inclinou-se para desafivelar o cinto dela. – Nós encontraremos Jackson numa festa, esta noite, Clio. Eu me certifiquei de que ele não possa chegar a você antes desta noite. Mas, obviamente, ele estará furioso no momento que nos vir.
Jackson fará uma cena, bella, e se eu o conheço um pouco, será feia. Você tem o que é necessário para enfrentá-lo, Clio? – E se eu não quiser enfrentá-lo? – Então eu a levarei comigo de qualquer forma. Jackson precisa ser detido, e não terei uma oportunidade como esta novamente. O tom feroz na voz de Stefan a surpreendeu. Mais uma vez, ela perguntou-se por que ele desprezava tanto Jackson. Mas não o questionou. Por alguma razão, entender o que impulsionava Stefan era um território no qual ela não queria entrar. Então, reassegurou-o de suas próprias intenções. – Eu jamais quererei Jackson de volta na minha vida, Stefan. Esta semana me ajudou a ver mais do que apenas a traição dele. – Eu precisarei do seu apoio, esta noite, mas sim, estou pronto para derrotar Jackson. – Não havia dúvida nos olhos verdes que a estudaram. E Clio mediu seu próprio progresso naquele olhar firme, sentindo uma ponta de esperança para si mesma. – Você me tem, bella. Por quanto tempo quiser. No momento que Stefan ajudou-a a sair da limusine, na propriedade em Hamptons, onde era a festa, flashes de câmeras e microfones foram empurrados na direção de seus rostos de trás das cordas. Os nomes deles pareciam uma música em centena de lábios. Jackson também sempre fora um dos favoritos da mídia. Bonito, trabalhador, bem-sucedido... o perfeito exemplo para histórias de sucesso da América. Ou pelo menos, era isso que a imagem que ele tinha gostava de projetar. Todavia, a multidão esta noite não era nada como as que Jackson já tivera. Segurando o anel no dedo como uma corda salva-vidas, Clio abria e fechava as mãos enquanto guardas de segurança os conduziam para dentro da mansão, através da multidão. – Sr. Bianco, está saindo com sra. Norwood agora? – Sra. Norwood, é verdade que vocês namoraram quando estavam na faculdade em Columbia? – Você deixou Jackson Smith por sr. Bianco? Ou foram o status e riqueza maiores dele que a atraíram? Ela quase escorregou, antes que Stefan pegasse sua mão e a protegesse com seu corpo. Não havia fim para as perguntas, nem para as ofensas em relação aos motivos dela. Enrijecendo o queixo, Clio seguiu a liderança de Stefan, até que um repórter ousado estendeu uma mão através da corda e bloqueou o caminho de Stefan. – Dê-nos uma sentença, sr. Bianco. Sra. Norwood é apenas mais uma de suas beldades, ou há algo especial sobre ela? Stefan parou e olhou para a multidão com um sorriso dissimulado. Puxando-a para si, abraçou-a pela cintura. Alguma coisa brilhou nos olhos verdes, enquanto ele a fitava, e centenas de câmeras capturaram aquele olhar hipnotizador. O olhar dele era ardente, a boca um estudo em sensualidade. Ele ergueu sua mão para o rosto e beijou-lhe os dedos, certificando-se de que o anel de diamante capturasse o brilho de cada flash.
Clio tremeu descontroladamente. Pressionando-a contra si, Stefan absorveu os tremores como se seu corpo sólido fosse feito para amortecer as emoções dela. – Depois de todos esses anos, nós não levamos muito tempo para perceber como somos perfeitos um para o outro. Sra. Norwood deu-me a honra de aceitar meu pedido de casamento, sim. E, independentemente de quem esteve na vida dela até agora, é comigo que ela vai para o altar – anunciou ele, o tom de voz orgulhoso e possessivo. Era tudo uma representação, Clio lembrou a si mesma. Uma representação perfeita orquestrada por um homem que queria ferir seu oponente. A multidão enlouqueceu diante da óbvia referência a Jackson. Com a respiração presa na garganta, Clio agarrou-se a Stefan numa tentativa de escapar do ataque de mais perguntas. Sabia que deveria falar alguma coisa, mas o aperto em seu peito era tão forte que ela não conseguiu pronunciar uma única palavra. Clio não pôde evitar desejar que o tempo voltasse. Para antes que Stefan tivesse mudado e ela tivesse se perdido. Para antes que a vida os tivesse acordado para a realidade dura de tudo. – Sr. Bianco, vai morar em Nova York, agora que sua noiva está aqui? – Fará de Nova York a base das operações para a Imobiliária Luxuosa Bianco? Pela primeira vez naquela noite, Clio viu uma dúvida momentânea sombrear os olhos de Stefan. Ele apertou-lhe o pulso com muita força, e ela arfou. Instantaneamente, Stefan afrouxou o aperto, mas não hesitou em responder as perguntas deles, desta vez. CLIO PASSOU a maior parte da noite com sua compostura intacta. É claro que teve de lembrar-se com frequência que ela e Stefan estavam representando uma farsa. Porque era inebriante estar na companhia de um homem que não menosprezava ninguém para provar o próprio valor, um homem que podia reconhecer o valor de um concorrente, um homem que possuía uma autoconfiança admirável. E por causa da história que eles tinham vivido no passado, era fácil fazer o papel de noivos apaixonados, terminando as sentenças um do outro, rindo de uma piada compartilhada, sem precisar se comunicar. Mais de um homem de negócios conservador, alguns que Stefan alegava nunca ter gostado dele anteriormente, os abordaram para cumprimentá-lo. Para lhe dizer que ele fizera uma escolha fantástica finalmente desistindo da vida de playboy e se tornando um homem de família. Ele ria, enquanto seu celular continuava tocando, com ligações de seus membros do quadro de diretores do mundo inteiro. A pior parte da noite foi controlar o tremor que a percorria cada vez que ele a tocava casualmente. Uma mão em sua cintura, um beijo no seu rosto, os dedos longos se curvando em sua nuca... A química que eles tinham descoberto em Atenas parecia crescer mesmo sob os toques mais inocentes.
Aquilo a excitava e a assustava na mesma medida. Pedindo licença, Clio foi para a mesa do bufê. Determinada a estar com sua melhor aparência esta noite, ela passara o dia relaxando no spa luxuoso do Chatsfield, beliscando fatias de pepino e bebendo suco de couve, que a tinham feito parecer mais esguia em seu vestido de grife... arranjado por seu “noivo” arrogante... mas que também a deixara com fome. Uma enxaqueca estava começando, e ela queria detê-la antes que piorasse. Estava prestes a pegar um prato quando sua nuca se arrepiou e um aroma familiar fez seu estômago se contorcer em nós. Olhou ao redor e percebeu que Jackson a encurralara. – Eu não achei que você tivesse capacidade de seduzir alguém do nível de Bianco. Enganou-me, huh, Clio? Havia crueldade em cada palavra que Jackson falou. Mas Clio conteve o impulso de instantaneamente procurar Stefan entre a multidão. Era hora de ela cuidar de si mesma. Endireitando os ombros, virou-se. Os olhos azuis de Jackson a percorreram com tanto desprezo que suor brotou na pele de Clio. – Não faça uma cena, Jackson. – Ora, Clio. Depois daquele clipe de você se esfregando nele, para que o mundo visse... depois que você foi para a cama dele sem ao menos terminar comigo antes, você me enoja. Clio estava atônita que ele pensasse aquilo a seu respeito. – É você quem está me traindo há meses – disse ela, todos os avisos que dera a si mesma para não trair o que tinha visto desaparecendo. – Fazia sexo com Ashley e ria de mim, com ela. Alguma coisa que parecia vergonha preencheu o olhar dele, sendo substituída, um segundo depois, por uma expressão calculada. – Então é disso que se trata? Vingança? Você acha que vai se pendurar no braço de Bianco e que eu vou me arrepender do que fiz? Acha que voltarei correndo para você e suplicarei o seu perdão? Ele olhou para seu vestido chique, para o cabelo arrumado, para o diamante no seu dedo, como se estivesse catalogando tudo sobre ela. Uma satisfação venenosa brilhou nos olhos azuis. – É claro que é isso. Por que mais um siciliano de sangue quente como Bianco, que não fica com uma mulher por mais de uma semana, iria se casar com você, de todas as mulheres do planeta? Clio foi preenchida com uma fúria que nunca conhecera. Uma fúria purificadora, revigorante, e que queimava qualquer dúvida remanescente de que, de alguma maneira, aquilo tinha sido culpa sua. Ela não fizera nada errado, exceto confiar num homem traidor sem um pingo de honra. – Você já passou dos limites comigo, mas cuidado com o que fala sobre ele. Stefan não tem uma opinião muito boa a seu respeito. – Sua vadia estúpida – xingou ele, medo e alguma outra coisa sacudindo o corpo bemconstituído. – Não vê que ele só está usando você para me atingir? Eles estavam atraindo olhares. Clio detestava a ideia de estar no meio de uma cena e ser o centro das atenções. Mas não ia deixar Jackson intimidá-la. Não depois de tudo que ele lhe fizera. – Não ouse dar outro passo à frente, Jackson.
Alguma coisa em seu tom devia ter registrado, porque ele parou, a boca curvada numa expressão maldosa. – No minuto que ele perceber que você não tem mais utilidade, assim como não tinha para mim, Bianco irá dispensá-la. E quando ele dispensá-la, quando ele se mover para pastos mais verdes, eu ainda estarei aqui para rir de você, Clio. Você não passa de uma muleta para ser usada. O sorriso irônico nos lábios de Jackson, o tom desdenhoso na voz, o brilho nos olhos que diziam que ela não tinha valor para homem algum, o eco do maior medo de Clio de que nenhum homem a amasse por si mesma, e não pelo seu nome... desencadearam uma tempestade em seu interior. Ela queria gritar com Jackson, queria esbofeteá-lo. Mas ele não merecia nem mesmo sua raiva. Erguendo a cabeça, Clio deu-lhe um olhar imperioso. – Prepare-se para perder, Jackson. Tudo – disse ela, satisfeita que sua voz soou firme, confiante. Ela não poderia deixá-lo arruinar o que restava de sua vida na cidade que tanto amava. Não permitiria que ele a expulsasse de Nova York numa onda de escândalo e vergonha. Não permitiria que Jackson ainda tivesse tanto poder em sua vida, em sua felicidade. Mesmo se isso significasse correr o maior risco de sua vida, mesmo se isso significasse unir seu destino ao único homem que poderia ajudá-la a se tornar inteira, novamente, mesmo se ele fizesse isso enquanto a despedaçava. – Você é o primeiro a saber que Stefan e eu nos casaremos dentro de uma semana. Aqui em Nova York, no hotel Chatsfield. E sabe de uma coisa, Jackson? Você está convidado. DIO, NÃO! Clio não tinha acabado de falar aquilo. Parado atrás da multidão que estava observando a troca entre Clio e o patife do Jackson, Stefan ficou enraizado no lugar, uma centena de diferentes emoções o abalando. Aquilo o lembrou do momento em que Serena lhe dissera, sem um pingo de emoção, que estava tudo terminado, que ele não lhe servia mais, sem a fortuna dos pais. Num minuto, ele tinha perdido tudo... o respeito, o amor e a confiança de seus pais, a mulher por quem desistira de tudo, e, pior, sua crença em seu próprio julgamento, em suas emoções, em seu valor pessoal. Seu mundo inteiro entrara em colapso. Com os ombros delgados eretos, os olhos verdes emitindo faíscas, os seios pequenos subindo e descendo com a respiração... aquela era a Clio que ele admirara e desejara uma década atrás. Ela estava espetacular, parecendo realmente a deusa Atenas naquele momento, enquanto lutava contra o óbvio medo que sombreava seu olhar. Mas apesar do orgulho e admiração que ele sentiu por ela finalmente colocar Jackson no devido lugar, aquele era o pensamento mais terrível que ele já enfrentara. A ousadia de Clio em anunciar publicamente o casamento deles dentro de uma semana... Esse tinha sido o plano de Clio o tempo inteiro? A desconfiança e fragilidade nos olhos dela, o jeito que tremera sob seus lábios, fora tudo uma representação?
Praguejando, Stefan socou o pilar ao seu lado, lutando para conter suas emoções voláteis e seus pensamentos venenosos. Dio, ele não queria pensar nessas linhas sobre Clio. Entretanto, não podia evitar a desconfiança. Embora detestasse que ela estava mudando sua vida, sabia o quanto construir uma vida em Nova York significava para Clio, o quanto ela amava esta cidade. Suspirando, ele olhou para ela. Jackson havia desaparecido, e Clio estava cercada por simpatizantes. Um pouco de cor retornara ao rosto dela, quando ela olhou ao redor, procurando por ele. Clio mais do que o surpreendera, na verdade. Mas não poderia mais lhe causar tanta emoção... se surpresa, fúria ou este desejo por ela estavam se tornando forças contra as quais ele não podia lutar. Se ela quisesse se casar com ele, só havia uma maneira de Stefan fazer isso.
CAPÍTULO 7
QUANDO CLIO se mudara, uma década atrás, para estudar em Columbia, Nova York, os jovens playboys bonitos de quem ela se tornara amiga a tinham cativado. Nem nos piores momentos ao longo dos últimos dez anos, ela considerara voltar para sua casa na Inglaterra. Fizera planos tão espetaculares para quando se casasse em Nova York, onde moraria para o resto de sua vida. Mas nunca pretendera transformar seu sonho em realidade dessa maneira. Reprimindo um suspiro, olhou para Stefan. O inverno mais rigoroso de Nova York era menos gelado do que o olhar de Stefan no interior da limusine. Pelo resto da noite e do caminho de volta para Manhattan, eles não haviam trocado uma única palavra. Olhando pela janela, ele mantinha o celular colado à orelha durante todo o trajeto. E, julgando pela conversa, Clio percebeu que ele estava tentando resolver uma crise numa de suas filiais na Ásia. Clio teria preferido que ele tivesse gritado com ela. Pelo menos, assim, poderia avaliar um pouco a reação de Stefan. Porém, este silêncio gelado que parecia se irradiar de cada poro do corpo dele assustava Clio. Sentindo um peso no peito, ela o seguiu para dentro do hotel, cujo interior era opulento e extravagante. Nada, exceto o melhor para Stefan Bianco. Mas toda vez que ela passava pelas portas do Chatsfield, era lembrada que Stefan não possuía um lar. Em parte alguma do mundo. Ele vivia a bordo de seu avião particular, viajando pelo globo a negócios, sem qualquer conexão com o mundo. E ali em Nova York, entre todos os lugares, ele nem pretendera ficar uma semana. Eles tinham decidido que o noivado ficaria em aberto. Por mais assustadora que a perspectiva fosse, Clio até mesmo começara a procurar um emprego novo. O silêncio e a tensão continuaram enquanto eles entravam no elevador e subiam para a cobertura.
As vistas panorâmicas de Manhattan das varandas de vidro da suíte não as fascinaram como normalmente acontecia. Nada prendia seu interesse esta noite. Apenas o homem silencioso. Sem tirar os olhos dela, Stefan abriu os primeiros botões da camisa. Clio prendeu-lhe o olhar. – Droga, Stefan. Fale alguma coisa. Os olhos verdes que a encararam de volta eram duros. – Eu nunca fui manipulado de maneira tão pública e irrevogável, bella. Acho que isso me deixou mudo. Manipulado? Com o estômago em nós, Clio piscou. Não havia raiva ou ressentimento no tom dele, mas alguma outra emoção intensa. – Stefan, não sei o que deu em mim. Eu nunca perdi a cabeça daquela maneira. – Ela respirou fundo. – Sei que isso não é uma coisa que se pede para um amigo, mas eu ficaria lhe devendo uma... – Clio parou. Nem em seus sonhos mais loucos, imaginara que suplicaria para um homem se casar com ela, que pediria para alguém transformar uma grande mentira em realidade. Reconsiderou a ideia em sua própria cabeça. Se ela não valorizasse a si mesma, ninguém a valorizaria. Nem Jackson, nem o mundo, e, definitivamente, não Stefan. E precisava que Stefan a valorizasse, que a respeitasse. Subitamente, isso pareceu a coisa mais importante do mundo. – Eu lhe darei tudo que puder sobre ele, Stefan. Esta é a minha cidade e a minha vida. Não permitirei que Jackson roube mais de mim. – Pense bem, Clio. Você pode apenas estar trocando um homem horrível por outro. Porque eu não mudarei nada em minha vida por uma mulher, cara. Nem mesmo por uma esposa surpresa. Agora, não havia um sorriso provocante ou charme preguiçoso, apenas pura seriedade no olhar dele. Desesperada, Clio aproximou-se e agarrou as laterais de sua camisa. Seus rostos estavam tão perto que o calor masculino infiltrou-se em cada poro seu. – O que isso significa? O barulho da máquina de fax no estúdio aberto, emitindo documentos, preencheu o espaço enorme. Clio prendeu a respiração enquanto esperava uma resposta. Segurando-lhe os pulsos, ele a afastou. Então andou até a máquina de fax e retornou com um maço de papéis. Tirou uma caneta de algum lugar e gesticulou a cabeça em direção aos papéis. – Significa que o casamento será só no nome, Clio, um acordo contratual que nós dois assinaremos. Significa que tudo que você receberá de mim será uma pequena pensão. Significa que assinará um contrato pré-nupcial e um contrato de sigilo, prometendo que não revelará nada disso a outra alma viva, ou venderá a história ou escreverá um texto biográfico de nossas vidas, juntos, no futuro. Significa que você não ditará quem ocupa minha cama, depois que acabarmos com Jackson, e não fará declarações de amor para mim. Se você aceitar, e depois violar qualquer das condições citadas, as consequências serão grandes. Clio arfou, como se seu peito tivesse sido golpeado. Lágrimas inundaram seus olhos.
– Você acha... realmente acha que eu planejei tudo isso? – perguntou Clio, magoada. – Acha que orquestrei isso, de modo que nosso noivado falso se transformasse num casamento de verdade e eu me apoderasse de seus milhões? – O pensamento passou pela minha cabeça, sì – admitiu ele, sem piscar, sem se perguntar quanta dor estava lhe causando. Clio o esbofeteou com tanta força que seu braço se sacudiu com o impacto. Seu corpo inteiro tremia, mas isso não era nada comparado à dor em seu peito. Antes que ela pudesse inalar o ar novamente, foi pressionada contra o corpo sólido, seus braços torcidos atrás de si num aperto firme, seus seios esmagados contra o peito largo, seus pulmões preenchidos com o aroma dele. STEFAN NÃO sabia o que o chocava mais. O fato de que Clio lhe batera ou sua reação ultrajante àquilo. Ele devia ter se tornado um imbecil, porque a visão de Clio... descontrolada de raiva, perdendo a compostura, excitou-o como se um fogo tivesse sido acendido em seu sangue. O fato de ele tê-la motivado para ser a velha Clio novamente parecia mais uma vitória do que qualquer outra coisa. Stefan segurou-lhe ambas as mãos em uma das suas e tremeu quando os seios dela roçaram seu peito. Os bicos rijos eram visíveis contra a seda fina. O perfume feminino inundava seus sentidos. Dio, o cheiro de Clio era absolutamente divino. Ele acariciou-lhe o rosto com a mão livre. Ela possuía uma pele tão sedosa. – Você me manipula para um casamento primeiro, depois bate no meu rosto... mulher alguma chegou nem mesmo perto do que você fez hoje, tesoro. – Não ouse me chamar assim, seja lá o que isso significa. – Então não me obrigue a retaliar da única maneira que eu sei, bella. Ela tentou empurrá-lo, e quanto mais ela lutava, mais excitado ele ficava. Stefan cedeu ao momento e apreciou a novidade de sua própria reação. As mulheres com quem ele costumava sair estavam sempre querendo agradá-lo, atendendo a cada desejo seu. Nenhuma mulher que Stefan conhecia era ela mesma com ele... O fato de que Clio não hesitava em ser ela mesma com ele era um afrodisíaco incrível. Transformava seu desejo físico por ela em alguma outra coisa... – Sempre me perguntei sobre esse seu temperamento calmo, bella. Naquele primeiro ano em Columbia, eu passava horas imaginando se você alguma vez perdia a calma, e como ficaria se perdesse – murmurou ele e puxou-lhe o cabelo. O lindo cabelo caía sobre os ombros delgados como fogo. Ainda a segurando com uma mão, ele enrolou uma mecha nos dedos. Imaginou, pela milésima vez, como ela ficaria nua. – Eu nunca machuquei uma mosca na vida – murmurou ela, mas a voz estava rouca e instável. Uma satisfação o preencheu. Clio estava tão excitada quanto ele, lutando contra seu desejo, mesmo enquanto o desprezava por ele ter duvidado dela. – Isso faz eu me sentir superespecial. – Porque você é um cretino.
– Agora você está aprendendo, Clio. Stefan enterrou o rosto no cabelo dela e inalou profundamente. Havia uma liberdade que Clio entendia agora. Que finalmente descobrira que ele não era o amigo do qual ela se lembrava com tanta ternura. Que o homem que ele era agora podia desconfiar dos motivos dela, entretanto, desejá-la com uma ferocidade que não conhecia razão. Que Clio percebesse que ele não estava fazendo aquilo por ela, mas por causa de sua necessidade de derrubar Jackson. Ela não confiaria nele agora, não esperaria nada dele, e isso era um alívio. Subitamente, Clio relaxou contra ele, como se a luta a tivesse esgotado. E Stefan afrouxou os braços ao seu redor. – Por que você está fazendo isso? – ela finalmente perguntou numa voz fraca que o abalou mais do que o tapa. – Porque sou incapaz de confiar no seu motivo, incapaz de dar a uma mulher um lugar na minha vida, mesmo temporariamente. Isso não está claro, bella? O fato de que até mesmo estou contemplando fazer isso é porque preciso desta prova, Clio. Porém, certifique-se de não aumentar mais o preço. – Se você aceitar, nós nos casaremos na próxima semana. Aqui, no Chatsfield, como você quer. Mostraremos a Jackson e a Nova York um casamento que eles não esquecerão tão cedo. Você será a noiva mais linda que Nova York já viu. Um tremor a percorreu, e ele abraçou-a mais apertado. – Eu assinarei onde você quiser que eu assine. Aceitarei cada condição sua. Já... perdi tanto... Você terá sua vingança – disse Clio, com amargura. – Há definitivamente alguma coisa suspeita sobre os números de Jackson. – Ótimo – replicou ele, liberando-a e afastando-se. Stefan lhe mostrara seu verdadeiro eu, entretanto, parecia que tinha sido ele quem fora queimado. – BOA NOITE, Stefan – sussurrou Clio, uma onda de pânico envolvendo-a. O que tinha feito? Como pudera não ver no que sua declaração impulsiva o transformaria? Sem olhá-lo novamente, ela saiu andando com a cabeça erguida. PELA PRIMEIRA vez numa década, Stefan sentiu a paisagem de sua vida escorregar pelos seus dedos, e tudo por causa de uma mulher. Novamente. A única maneira que conhecia de proteger Clio e a si mesmo daquilo era estabelecendo regras, esquecendo o gosto dela, removendo-a de sua mente. Reprimindo a vontade de beijar a mágoa da boca de Clio, ele entrou em seu escritório e ligou a enorme tela de plasma posicionada na parede mais distante. Indo para o closet, despiu-se e vestiu um short de ginástica. Subindo na máquina de remo que mandara instalar em seu estúdio, começou a se exercitar. A descarregar a frustração sexual.
Logo, seus músculos queimando o acalmaram. A notícia logo se espalharia, ele sabia. O fato de que ele... o terceiro solteiro convicto entre o Quarteto da Columbia... ia finalmente se casar, e, em apenas uma semana, tão logo depois de Rocco e Christian, desencadearia uma tempestade que ele não poderia conter. Uma imagem de ele e Clio entrando no Chatsfield esta noite, imediatamente seguida de uma imagem dos dois, uma década atrás, nos degraus da Columbia University, com sorrisos amplos nos rostos, apareceram na tela. Nem todos confiam numa corporação com um playboy predatório no comando, ele ouvira os membros da diretoria falarem mais de uma vez, quando ele os questionara por que não tinham fechado uma negociação em particular. Uma noite sendo noivo de Clio já mudara a percepção do mundo dos negócios sobre ele. E roubar Clio de Jackson, como a mídia estava colocando aquilo, significava que o foco ficaria em seus negócios e nele. O que era bom para sua vida profissional, todavia, não para seu coração. Ouvir a frase “Namorados da Faculdade Reunidos” lhe causava calafrios. Stefan era o último homem que deveria ter uma história de conto de fadas se tornando realidade atada ao seu nome. O último homem para quem Clio deveria ter pedido ajuda, reconheceu agora com amarga resignação. Porque, mesmo se ele quisesse, não poderia mudar. O veneno que Serena levara para sua vida infiltrara-se em seu sangue. Tudo que lhe importava agora era destruir Jackson e manter Clio e a si mesmo intactos até o fim daquele casamento. – SE VOCÊ quer deixar tudo isso para trás, deixar Stefan para trás – Zayed sussurrou no ouvido dela, enquanto pegava sua mão, sob o olhar observador de Stefan, no final do vasto hall, do outro lado –, então, tudo que tem de fazer é falar isso, Clio. Eu faço um sinal para Rocco, e uma limusine aparecerá do lado de fora do hotel em segundos. Em poucas horas, você pode estar em Milão, Hong Kong ou onde quiser. Piscando, Clio desviou o olhar de Stefan. O Chatsfield brilhava e o murmurinho dos convidados alcançava seus nervos já abalados. Eles todos seriam testemunhas de sua união com um dos solteiros mais cobiçados do mundo. Lembrando-se de sorrir como uma mulher apaixonada, ela virou-se em direção a Zayed. E capturou a carranca de seu noivo no milésimo de segundo antes de se virar. Eles estavam de pé junto à entrada do Salão do Terraço, um pouco além das portas francesas do pátio do Chatsfield, um espaço histórico e charmoso. Engolindo um nó na garganta, Clio apertou os dedos de Zayed, e ele retornou a pressão. – Eu pensei que sua lealdade fosse para com Stefan, Vossa Alteza. – Não, você também, Clio – Zayed avisou-a, ainda com um brilho do príncipe playboy no sorriso. Em questão de dias, Zayed tinha passado de segundo filho pra o reinante de Gazbiyaa. E Clio nem podia imaginar o que devia estar passando na cabeça dele. – Eu pensei que você fosse aconselhar Stefan para ficar longe de mim, não o contrário.
Com profundos olhos castanhos brilhando com gentileza, Zayed sorriu e meneou a cabeça. Por que ela não o procurara para pedir ajuda, em vez de o teimoso siciliano? – Esqueceu que Rocco, Christian e eu conhecemos você tão bem quanto Stefan? E Stefan é mais que um irmão para mim, mas o vimos se tornar mais endurecido do que o resto de nós. Eu não quereria que a filha do meu inimigo fosse capturada naquele desdém de Stefan. E você... você é uma amiga, Clio. Clio abraçou o calor na voz dele. – Stefan não me forçou a nada, Zayed – murmurou ela, querendo que todos entendessem. Em cada passo do caminho, Stefan apenas a preparara para o que viria, inclusive para seu desdém. – A escolha foi minha. A fisionomia de Zayed não mudou. – Nenhum de nós a quer ferida, Clio. Ele poderia muito bem fazer isso, e depois não se perdoar. Clio finalmente entendeu a preocupação deles, a tensão que sentira entre Stefan e os três nos últimos dois dias. Stefan achava que seus amigos a estavam protegendo dele. O que não percebia era que Rocco, Christian e Zayed também estavam cuidando dele. Eles temiam que, ao feri-la, ele perdesse uma parte de si mesmo. Um nó se formou em seu peito diante da percepção de como seu futuro marido era complicado. Essa é a única maneira que sei fazer isso, Clio, ele lhe dissera quando ela havia assinado o contrato. Aquele era o único jeito no qual ele pensara para proteger o relacionamento frágil deles do que estavam passando? E ela resolveu não perdê-lo, não permitir que o desejo mútuo por vingança os destruísse. – Eu não deixarei que isso aconteça, Zayed. Acreditando nela ou não, Zayed deu-lhe um tapinha na mão. – Você tem amigos, Clio. Lembre-se sempre disso. Uma umidade preencheu os olhos de Clio, mas ela sorriu. Rocco e Olivia, Christian e Alessandra, e Zayed... todos tinham pairado sobre ela nos últimos dias, como mães galinhas. A sensação de saber que tantas pessoas se importavam com seu bem-estar era maravilhosa. Com os preparativos do que a mídia estava chamando de “Casamento de Contos de Fada da Década”, com pessoas que realmente se importavam ao seu redor, por alguns momentos durante a última semana, Clio quase acreditara que aquele era o casamento que quisera durante toda sua vida. Exceto que o homem no centro de tudo não fitava seus olhos há uma semana, e só lhe falara para discutir outra cláusula do contrato que ele a fizera assinar. Ele organizara um exército de pessoas para supervisionar cada detalhe do casamento. Clio mal tivera tempo de se arrepender do grande passo que estava dando. Ela empalidecera quando olhara para a designer que fora contratada para fazer seu vestido de noiva numa semana.
Com renda delicada sobre tule bordeando os ombros e o decote, o vestido tinha uma fileira de botões que descia entre suas omoplatas. Era o vestido mais lindo que ela já vira, e era difícil acreditar que havia sido criado em sua própria mente. Pulseiras de diamantes, adequadas para a noiva de Stefan Bianco... como tinham lhe dito quando ela protestara... haviam sido entregues numa caixa de veludo, juntamente com brincos combinando e uma elegante tiara de diamantes. Clio ficara perplexa diante de seu próprio reflexo, diante da perfeição com que o vestido caíra no seu corpo delgado. Os diamantes tinham brilhado nos três espelhos enormes que o staff do hotel colocara no quarto. E então, ela percebera. A quantidade de dinheiro que Stefan estava gastando no casamento devia ser astronômica. Ultrajada com aquilo, ela batera à porta do estúdio dele, uma noite. Para encontrá-lo na máquina de remo, vestido um short e banhado em suor. Uma visão que queimara em seu cérebro, em sua pele, em suas células. Deus, os quatro haviam sido campeões de remo em Columbia. E Stefan ainda parecia tão em forma quanto uma década atrás, se não melhor. Ela passara diversos minutos admirando-o, enquanto seu corpo vibrava com desejo. Quando finalmente encontrara a voz e expressara suas preocupações, ele lhe dera um olhar gelado. – Não se preocupe, bella. Isso não conta contra você. Afinal de contas, nosso acordo baseia-se na farsa de que eu quero dar para o amor da minha vida o casamento dos sonhos dela. Deparada com aquele desdém zombeteiro, Clio tivera de lutar contra o instinto de fugir de lá. – Eu estava estudando os mapas dos assentos e não vi os nomes de seus pais – observou ela. A expressão de Stefan fechou-se instantaneamente. – Eles não virão. Havia um aviso na voz dele. Mas, em vez de prestar atenção a este, Clio pensou no passado. O resto do Quarteto da Columbia e ela, inclusive, costumavam invejar o amor incondicional dos pais de Stefan. Os Bianco eram os típicos pais sicilianos para quem família vinha sempre em primeiro lugar. E fora um choque quando eles tinham ameaçado deserdá-lo, se ele não voltasse para casa depois da formatura. E Stefan não se importara com sua herança. Todavia, Serena o traíra ao perceber que não teria mais a fortuna dos Bianco. – Stefan, seus pais... eles perdoaram você, não perdoaram? Por ter confiado em Serena? – Eu não pedi que eles me perdoassem. Por quê? – Você não... Eu não entendo. Stefan levantou-se e abriu a porta para ela, a mensagem clara na ação. – Eles não estão na lista de convidados, porque eu não os convidei. Não precisamos envolver mais pessoas na nossa farsa, precisamos? – Não – respondera Clio, encolhendo-se perante o tom frio naquelas palavras.
O que ele quisera dizer com aquilo? Stefan não vira os pais durante todos aqueles anos? Como suportava mantê-los à distância? Naquele momento, Clio percebeu como ele era um estranho para ela. O jeito que ele desconfiava de seus motivos, a insistência para que eles fizessem as coisas pelas suas regras, as atitudes muito frias... Ela finalmente entendeu que Stefan enterrara tudo que possuía de bom e decente. Mas antes que ela saísse da vida dele, estava determinada a relembrá-lo quem ele havia sido um dia. E começaria levando os pais de Stefan de volta para a vida dele. Seus próprios pais nunca a tinham perdoado, mas Stefan poderia ter seus pais de volta. – Clio? Corando, Clio olhou para Zayed. – Muito obrigada por me lembrar que eu tenho amigos, Zayed. – Ela recordou-se das palavras imperdoáveis de sua mãe. – E por ter concordado em me entregar a Stefan. – Você me honrou ao me pedir isso. – Ainda sorrindo, ele olhou à frente. – Posso sentir o olhar de Stefan fixo em nós. Você está pronta para ele, Clio? Respirando fundo, Clio virou-se em direção ao noivo esperando. Vestido num terno preto, os cabelos penteados para trás, ele se destacava entre o resto dos homens. Stefan prometera que a ajudaria. E que manteria sua palavra. E Stefan Bianco era um homem de honra. – Eu estou pronta, Zayed. Segurando os lírios na mão trêmula, Clio seguiu a liderança de Zayed quando a música começou. Com seus pais e os pais de Stefan ausentes, ela decidira não ter uma dama de honra, escolhendo seguir poucas tradições. De alguma forma, aquilo parecia combinar com eles... o casamento entre amigos que eram como uma verdadeira família, na cidade que os recebera de braços abertos uma década atrás. Tudo sobre o casamento estava perfeito. Até mesmo o dia de junho estava lindo, com o sol brilhando. Não era um casamento de verdade, Clio lembrou-se quando eles chegaram a Stefan e Zayed entregou-a. Era tudo uma história que eles estavam criando para a mídia e Jackson. Seu coração disparou quando Stefan entrelaçou os dedos nos seus. Mas quando ela encontrou-lhe o olhar pela primeira vez em uma semana, e viu o brilho possessivo ganhando vida ali, tremeu. Como conseguiria resistir a ele, quando a luxúria nos olhos verdes parecia a única coisa real, hoje? Como conseguiria resistir a ele, quando, apesar de Stefan desconfiar dela, ele a fazia sentir como se ela importasse?
CAPÍTULO 8
ELE TINHA uma esposa. Uma que estava vestida em delicada renda branca que mostrava a pele cor de alabastro em toda sua glória. A fileira de botões descendo até a parte baixa das costas era tudo no que ele podia pensar. O cabelo cor de fogo, penteado para trás e preso num nó na nuca exibiam a linha do pescoço delicado. O vestido era elegante, sofisticado, abraçando o corpo delgado e os seios pequenos. Ele tinha uma esposa e não conseguia tirar os olhos dela. O pensamento foi tão perturbador que Stefan girou e girou a aliança de platina no seu dedo, como se pudesse fazê-la desaparecer, como se pudesse mudar a realidade recusando-se a aceitá-la. Ele não somente tinha uma esposa, como uma que queria desesperadamente beijar. E o fato mais chocante de todos era que sua nova esposa quase se encolhera quando Stefan lhe tocara os lábios com os seus. Ele, Stefan Bianco, o homem que saíra com algumas das mulheres mais lindas do mundo, queria muito tocar, beijar e seduzir sua esposa, a mulher que nunca deveria tocar ou desejar. Era como ele se sentira a primeira vez que vira Clio do outro lado do gramado do campus, uma década atrás... cheio de hormônios em ebulição, e uma ingenuidade quase risível sobre o mundo. Ele ainda queria com a mesma intensidade, exceto que no lugar da ingenuidade, havia uma voz que sussurrava que ele poderia ter Clio desta vez, se quisesse. Como o resto das mulheres do mundo, Clio Norwood também tinha um preço. E Stefan já pagara o preço. O pensamento era tão desgostoso que o enojou. Entretanto, ele não conseguia apagá-lo. Era isso que se tornara? Não restava mais nada honrável nele? Pela primeira vez em anos, Stefan olhou para dentro e perguntou-se o que mais perdera em nome de Serena. – Você irá quebrar a taça de champanhe se não parar de olhar para Zayed e Clio com tanta raiva, fratello – sussurrou Rocco atrás dele.
Stefan não podia culpar seu amigo pela provocação, porque queria jogar a taça no chão, de modo que Clio parasse de sorrir para Zayed e olhasse para ele. – Ela sempre foi uma linda dançarina, não é? – comentou Christian, e agora a cabeça de Stefan parecia que ia explodir. Ele sabia muito bem que Rocco só tinha olhos para Olivia, e Christian para sua esposa grávida, a linda Alessandra. E também sabia que Zayed nunca tivera interesse em Clio. Mas saber daquilo e dizer para seu corpo e sua libido se comportarem de acordo eram coisas diferentes. Porque, no momento que pusera a aliança no dedo e tocara-lhe os lábios trêmulos com os seus, no momento que vira o desânimo nos olhos dela, se sentira como um homem das cavernas, querendo arrastá-la da celebração que se seguia e violentá-la. Queria tirar o pensamento de qualquer outro homem da cabeça de Clio, queria roubar-lhe o controle como ela roubava o seu tão facilmente. Queria que ela lhe sorrisse como sorria para o mundo. Stefan poderia seduzi-la, não tinha dúvida sobre isso. Havia uma energia explosiva toda vez que eles ocupavam o mesmo espaço. Alguma coisa que seus amigos muito inteligentes e observadores haviam observado durante a última semana. Mas Stefan não queria ver aquela traição nos olhos de Clio na manhã seguinte. Ela nunca dormiria com ele, então sairia intacta da experiência. E frágil como ela estava no momento, ele não queria ser outra má decisão da qual Clio se arrependesse. Queria-a consumida por ele como ele estava por ela. O que parecia uma fantasia distante no momento. Se Stefan pudesse esquecer o contrato que eles tinham assinado, quase poderia ter acreditado que ela fosse a velha Clio, divertindo-se, altamente feliz com sua vida e com todos. Exceto quando ela o olhava. Então, o sorriso desaparecia do rosto bonito imediatamente. Exceto quando eles haviam dançado. Clio ficara rígida, as feições congeladas numa máscara de educação gelada. Ela mal tocara no jantar, mas seu rosto se iluminara na hora do bolo que eles tinham cortado juntos. Cada vez que ela dera uma colherada da sobremesa, Stefan reprimira um gemido. – Venha tomar um drinque conosco – disse Rocco, interrompendo seus pensamentos. Mas antes de responder, Stefan ouviu outra risada de Clio, e olhou naquela direção, para vê-la inclinar a cabeça e sussurrar alguma coisa para Zayed. E, subitamente, bastou para ele. Stefan estava na pista de dança, interrompendo Zayed e Clio antes que soubesse o que estava fazendo. Como se adivinhando que ele estava agindo de forma irracional, seu amigo liberou Clio instantaneamente, um sorriso perspicaz nos olhos. Dos quatro, Zayed era o diplomata, todavia, Stefan não duvidava que ele também fosse o mais perceptivo. Zayed puxou-o para um abraço. Não havia humor no olhar dele, naquele momento. – Cuidado, Stefan. Nosso destino nem sempre pode ser controlado por nós, meu amigo.
Stefan também não sorriu. Ele sabia que tinha se tornado um patife desconfiado nos últimos anos, que enervara Rocco duvidando das intenções da maravilhosa Olivia em relação a seu amigo, mas Rocco, Christian e Zayed o haviam apoiado e o amado, independentemente de qualquer coisa. Aquele era o único relacionamento, a única coisa boa que Serena não destruíra na sua vida, uma âncora que o mantivera firme quando ele estava afundando. – Você acha que eu sou capaz de me apaixonar, Zayed? – Não, eu não acho. Não acho que você ou eu teremos a sorte de Rocco e Christian, nem nós queremos isso. Mas não destrua o bem que, de alguma maneira, entrou na sua vida. Com o conselho de Zayed soando em seus ouvidos, Stefan puxou sua esposa para si. Cada músculo do corpo enrijeceu quando ela entregou-se, circulando seu pescoço nos braços. Os pequenos seios roçaram seu peito, e a pulsação de Stefan acelerou. Segurando-lhe a nuca, ele inclinou a cabeça dela para trás, fitou-lhe os olhos e teve outro choque. – Você... precisa relaxar, meu querido marido – sussurrou Clio contra seu rosto, tocando os lábios em seu queixo. – Supostamente, nós estamos muito apaixonados, lembra? O toque dela era possessivo, impulsivo, fazendo-o esquecer o que era certo e errado. Segurando-lhe o rosto, ele estudou-a. Sua nova esposa estava embriagada. Um calor queimou em seu peito enquanto ele a olhava, vendo as pupilas dilatadas de Clio. Pondo mechas de cabelo soltas atrás da orelha dela, Stefan ergueu-a nos braços e ouviu assobios de encorajamento dos convidados. CLIO NUNCA imaginara que ficaria bêbada na noite de seu casamento. Nunca imaginara que se sentiria quase uma virgem da época vitoriana, que o pirata carregaria para seu navio e a violentaria. Nos últimos dois anos, quando Jackson tinha se esquivado de todas as conversas sobre o casamento deles, ela não imaginara que teria um casamento, muito menos uma noite de núpcias. Então, com tudo o que estava acontecendo na sua vida, o fato de estar bêbada era a coisa menos desconcertante sobre a noite. Não que ela tivesse planejado isso. Assinara o contrato, como Stefan quisera. Sorrira como uma mulher apaixonada até que seu queixo começasse a doer. Tentara não se encolher e trair o desejo que sentira quando ele tocara os lábios nos seus. Portanto, não sabia o que tornara Stefan cada vez mais frio e distante. A menos que fosse a mera visão do anel dele no seu dedo. Clio tomara sua primeira taça de champanhe sem comer antes. É claro, devorara o bolo, mas àquelas alturas, já estava meio zonza. O que facilitara tomar a segunda taça. A bebida a deixara destemida. Destemida, indiferente e livre. E porque ela adorara ser a velha Clio novamente, mesmo se pelo efeito do álcool, tinha bebido mais duas taças. Nem mesmo a certeza de que teria uma enxaqueca na manhã seguinte a detivera. Adorara dançar com Rocco e Christian. E Zayed flertara com ela de brincadeira. Ele fizera isso por piedade, porque seu marido nem sequer conseguia sorrir, muito menos fingir estar apaixonado.
Ainda assim, Clio apreciara aquilo. A coisa mais perturbadora sobre a noite, todavia, era o peito sólido contra o qual ela estava aninhada agora. O aroma de limão da colônia pós-barba de Stefan provocava suas narinas. Mas ela não queria ser segurada assim, não queria que ele sofresse por sua companhia, como se fosse obrigado a fazer isso. Naquele momento, o elevador chegou. Desistindo de fingir, Clio suspirou e agarrou-se mais a ele. Então sentiu a risada suprimida vinda do peito sob seus braços. Abrindo os olhos, ousou fitá-lo. Ele estava rindo. O imbecil que a olhara com raiva a noite inteira, como se ela fosse a mulher menos confiável do universo, que a levara a beber, quando ela geralmente não suportava álcool, estava rindo. Enfiando as mãos debaixo do colarinho da camisa dele, Clio ergueu-lhe o queixo de modo que seus olhos se encontrassem. – Do que você está rindo? – De você, bella. – Por quê? – Uma virgem da época vitoriana a bordo de um navio pirata, prestes a ser violentada? Um calor a inundou. Deus, ela falara aquilo em voz alta? – Eu estou bêbada – murmurou ela, adorando sentir a solidez de Stefan contra si. Sentia-se segura perto dele. – Tudo que eu falar esta noite deve ser desconsiderado. E não sou uma virgem vitoriana que precisa ser violentada, ou salva. – Considerando que eu não sou um tipo de herói salvador, isso é bom. – As portas do elevador se abriram, e ele saiu. – É quase assustador como somos perfeitos um para o outro. – “Namorados da Faculdade Que se Descobriram Depois de Tantos Anos?” – ela contou uma das manchetes sobre eles. – “Destino Reúne Antigos Amantes!” “Amor Verdadeiro Conquista Tudo”. Eu não teria desejado frases melhores para Jackson ler. Instantaneamente, o sorriso desapareceu da boca de Stefan, sendo substituído por uma expressão tão raivosa que Clio perguntou-se, por um segundo, se ele a deixaria cair no chão. Mas, é claro, isso não aconteceu. Stefan nunca lhe causaria danos, Clio sabia disso. Assim como ele nunca confiaria nela mais do que numa mulher estranha que conhecesse numa boate ou numa festa. Ela pensara que tinha aceitado tal fato, mas aquilo começava a importar mais do que deveria. Ele não deveria saber que tipo de pessoa ela era? Stefan atravessou o saguão enorme e carregou-a para um dos quartos. Lentamente, colocou-a de pé. Clio balançou e ele a segurou, abraçando-a por trás, para firmá-la. Com o corpo operando por vontade própria, Clio tombou contra ele. Mas os braços que envolviam sua cintura pareciam de ferro, mantendo-a imóvel, impedindo-a de se recostar. – Fique parada, Clio – sussurrou ele e fez a pele exposta do pescoço dela se arrepiar. Furiosa e confusa, Clio tentou se desvencilhar, mas acabou entrelaçando as pernas de ambos e tombando contra ele. Um tremor a percorreu.
Dedos longos se abriram nos seus quadris, queimando através da seda fina do vestido. Uma onda de calor inundou-a. Stefan envolvia todos os seus sentidos, e ela nunca sentira tanta vontade de mergulhar naquela onda. – Não acenda um fogo em mim com o qual você não está equipada para lidar, bella – sussurrou ele, antes de lamber a borda de sua orelha. – Eu não gosto particularmente de celibato, muito menos agora que tenho todo o direito, diante de Deus e da lei, sobre a mulher que desejo com desespero por tanto tempo. Ondas de choque espalharam desejo pelo corpo inteiro de Clio. As coxas dele eram sólidas atrás das suas. E a ereção viril roçava seu traseiro. Aquilo foi suficiente para levá-la de volta à realidade. Com a boca seca, Clio impulsionou-se para frente. Ou, pelo menos, tentou. Segurando-a com um braço, ele subiu o outro por sua barriga, seus seios, seu queixo. Dedos longos traçaram seus lábios, e ela esqueceu como respirar. Pare com isso, por favor, Clio queria falar, mas estava muito consumida pelo desejo ardente. Ainda traçando seu lábio, Stefan murmurou: – Abra a boca, Clio. – Ela abriu e ele inseriu o dedo ali. Fechando a boca em volta do dedo, ela o banhou com sua língua. A ereção de Stefan cresceu contra o vale entre suas nádegas, excitando-a ainda mais. Ela arfou quando os dentes dele enterraram em seu ombro. Dor e prazer se fundiram, enquanto Stefan lambia o ponto sensível, a respiração ofegante. E ele ainda não a deixava se mexer. Não lhe dava mais nada do que decidia. Ele segurou um de seus seios, e o calor inundou o sexo de Clio. Ela se contorceu, irrequieta. O deslizar de sua liga contra suas coxas, o roçar de sua própria pele... era tudo uma tortura. Com os dedos sob o queixo dela, Stefan inclinou-lhe o rosto para cima. Capturada pelo reflexo no grande espelho oval, Clio enrubesceu. Suas pálpebras estavam baixas, sua boca tremendo. E ele... ele poderia ter sido feito de mármore pela expressão nos olhos verdes. – Você teve o bastante, bella? Alguma coisa naquele tom zombeteiro incendiou Clio. Era uma fantasia acreditar que Stefan poderia sentir alguma coisa por ela... mágoa ou desejo... sem se permitir fazer isso, uma fantasia pensar que era capaz de afetá-lo de um jeito que ele não pudesse se controlar. Uma fantasia que a destruiria, se ela não a matasse agora. O medo penetrou a névoa de desejo e o efeito do álcool. – Você teve o bastante, Stefan? – disse ela, encontrando-lhe o olhar no espelho. – Provou a si mesmo que pode me deixar ofegante em segundos, que eu sou igual a qualquer outra mulher no planeta nisso? Não é este o jogo que está fazendo, caro marido? Stefan virou-a e ainda não havia emoção no rosto dele. Clio teria aceitado qualquer emoção, até fúria. Queria quebrar a concha dura que ele usava como armadura; queria quebrá-la e machucá-lo. E aquele era o pensamento mais perigoso que já tivera na vida. – Por que você bebeu esta noite, quando nunca bebe, bella?
– Porque você é um cínico desconfiado que me detesta e que acha que eu sou uma vadia manipuladora, querendo seus milhões. – Eu nunca disse isso. Clio não sabia por que estava tão zangada, apenas que a falta de emoção dele era insuportável. – Sua aparência durante a noite inteira falou por você. Depois do primeiro champanhe, eu descobri que era fácil não me importar com você e com sua opinião ao meu respeito. – Ou talvez, porque você soubesse o que estava se construindo entre nós durante a última semana, e, temendo enfrentar isso, quis uma escapatória. Quando ela não respondeu, Stefan tirou suas abotoaduras de ouro e dobrou as mangas da camisa, perguntando com confiança arrogante: – O efeito do álcool já está evaporando, cara? Clio o empurrou, um nó apertando sua garganta. – Já tive o bastante de você e de seu... – Não, não teve. – Ele capturou-a novamente. Desta vez, ela estava de frente para Stefan e não havia onde se esconder. – Pare de se esconder, Clio. A menos que você pare e enfrente, sempre haverá outra situação da qual fugir. – Eu não... – Você deixou a Inglaterra quando descobriu que seu pai tinha programado sua vida inteira, desde o que você estudaria até com quem se casaria. Foi uma coisa incrível o que fizera, mas ainda foi uma fuga. Durante todos esses anos, você se escondeu, mesmo sabendo que Jackson a estava traindo... você foi permissiva. Esta noite, bebeu porque não sabia o que fazer comigo. Ele colocou uma mão sobre um de seus seios, e Clio arfou. Stefan cobriu-lhe a boca com a sua e deixou-a ávida por mais. – O que você está fazendo comigo, parada aqui assim, com desejo nos olhos... Tem ideia de como isso é torturante para mim? E ele lhe deu o que ela queria. Aprofundou o beijo, mordiscou e provocou, enquanto ela se agarrava a ele, entregando-se inteira. – Você bebeu porque não queria ser responsável por isso, Clio – sussurrou ele contra sua boca. Então, afastou-a, criando distância entre seus corpos. – Apesar de tudo que a mídia pensa de mim, eu não a seduzirei esta noite e ficarei com a responsabilidade por isso amanhã, enquanto você culpa a bebida pelo que fez. Um desapontamento esfriou o corpo de Clio. – Não? – Não. Quando eu levo uma mulher para cama, não é por pena, vergonha, alegria ou raiva. É por puro desejo, bella. – Então, você não vai terminar o que começou? – Não, a menos que você fale as palavras. – Num gesto íntimo que a deixou em chamas, ele puxou seu decote delicado com dedos fortes. O vestido caríssimo rasgou, expondo o topo de seus seios. Stefan abaixou a cabeça arrogante e beijou-lhe o vale entre os seios.
Clio nunca conhecera um desejo tão intenso. Cada célula de seu corpo pulsava de desejo por ele. Pelo único homem que ela não deveria querer. Pelo homem que lhe dera tudo, mas realmente nada. – Diga-me que quer que eu rasgue seu vestido inteiro, bella. – A raiva coloria as palavras dele. – Peça-me para deslizar minhas mãos e boca por cada centímetro de sua pele, para mergulhar no seu calor, até que isso seja tudo que possamos sentir. Peça-me para dar a ambos de nós o alívio pelo qual ansiamos desesperadamente. Peça e cada desejo seu será meu comando, bella. A resignação era evidente no jeito frouxo como ele a segurava, no suspiro que deu contra sua pele. E foi essa resignação, o suspiro que parecia dizer que ele estava cedendo ao inevitável, mesmo quando detestava isso, que clareou a névoa na cabeça de Clio. Ela que, neste momento, estava chegando? Este era o único jeito que podia pensar em tê-lo, quando poderia absolver-se de toda a responsabilidade? Era assim que tinha deixado Jackson dominá-la? Sempre deixaria a vida acontecer para ela, em vez de tomar o comando da mesma? A vergonha esfriou sua pele, deixando-a trêmula. Puxando a renda rasgada do vestido para cima, Clio deu um passo atrás. Com a respiração ofegante, tentou se recompor. Queria muito ser abraçada e beijada por ele. Mas não assim. Não. Isso não era justo para nenhum deles. Ela olhou para ele. – Quando eu pensar sobre esta noite, daqui uma década, quero me recordar de alguma outra coisa além de seu desgosto por me desejar e de minha tentativa desesperada de fugir, como você colocou tão bem. – Clio... – É verdade, Stefan. Você detesta o fato de me desejar, não é? – Ela piscou, lutando por força. – Eu quero ter algo que me deixará orgulhosa sobre hoje. Quero que você vá embora. Obrigada por me salvar de mim mesma, mais uma vez. As feições de Stefan estavam tensas. Ele ficou imóvel, e aquela imobilidade, aquela força de vontade em ação, enquanto ele controlava o próprio desejo, era a coisa mais desconcertante que Clio já vira. – Como você quiser – respondeu ele com um olhar demorado, antes de virar-se e sair. Ela quase podia acreditar que suas palavras o tinham afetado. Quase. Clio sentou-se na cama e cobriu o rosto. Por mais cáustica que a análise dele sobre sua vida tivesse sido, Stefan os impedira de cometer um erro irrevogável. Ela deveria estar grata. Tudo o que precisava era se convencer disso. PARADO EMBAIXO do jato de água gelada, Stefan tremia. Seus dentes batiam uns nos outros, sua pele estava toda arrepiada. Se olhasse para baixo, provavelmente veria que seus testículos tinham se tornado roxos para sempre.
Mas nem mesmo a possibilidade de dano permanente a sua masculinidade podia apagar a imagem da sua esposa de sua cabeça. Ele nunca vira uma mulher mais linda. A vulnerabilidade de Clio brilhava nos olhos dela, o desejo real de ser qualquer coisa, exceto tentação... eram fascinantes de se observar. Era isso que Clio faria com ele? Ela o puniria, o torturaria, enquanto o incentivava a ser um homem melhor do que ele havia sido na última década? O fato de que ele resistira a ela, que não cedera ao seu desejo e tomara o que ela oferecera tão livremente, o fato de que a protegera, até de si mesmo, Stefan consideraria como uma vitória. Aquilo significava que ainda lhe restava um pouco de honra.
CAPÍTULO 9
QUANDO CLIO abriu os olhos na manhã seguinte, havia um martelo e uma agulha dentro de seu crânio, e alguém tinha aberto as cortinas e deixado que os raios de sol a punissem. Ou pelo menos, era essa a sensação. Virando-se, ela gemeu. A dor no topo de sua cabeça era tão forte que levou lágrimas aos seus olhos. Sua boca e garganta estavam secas. Ela tentou reabrir os olhos e estava prestes a se sentar, quando um braço forte puxou-a para cima com infinita gentileza. Um gemido escapou de sua garganta quando o aroma da colônia de limão, misturado ao cheiro masculino almiscarado, provocou suas narinas. Aquilo mexia com seus sentidos. Assim como o homem. Clio enrijeceu, mas ele não a soltou. Por que Stefan tinha de estar de pé antes dela na primeira manhã do casamento deles? Por que ela não pudera começá-lo estabelecendo uma atitude equilibrada? – Buon giorno, cara. As palavras suaves golpearam sua cabeça como se ele tivesse gritado. Clio gemeu novamente, e um sorriso curvou aquela boca pecadora. Cabelos molhados caíam sobre a testa de Stefan. O rosto estava recém-barbeado, e o cheiro de limpeza era tão delicioso quanto o bolo que ela devorara na noite anterior. Bastardo, ela balbuciou a palavra que ouvira Alessandra usar. Os lindos olhos verdes de Stefan brilharam com humor, o sorriso tão lindo que seu peito doeu. – Vá embora – disse ela, escondendo o rosto no travesseiro, muito ciente de seus cabelos despenteados, de sua camiseta velha da Columbia, que constituía sua camisola. – Tome isto – murmurou ele, abrindo a palma para revelar um comprimido para enxaqueca, e um copo de água na outra mão. Muito atordoada pela dor de cabeça, até mesmo para protestar, Clio pegou o copo e ingeriu a pílula. Voltou a se deitar, e o movimento súbito causou uma pontada violenta em sua cabeça.
Com o rosto bonito preenchendo sua visão, Stefan cobriu-a com o edredom até o queixo. Então, afastou-lhe os cabelos da testa. – Durma, cara. Sono e exaustão a atingiam em ondas, e Clio decidiu que a preocupação que ouvira na voz dele devia ser efeito colateral de seu remédio. NA MANHÃ seguinte, Stefan acordou em sua cama com o cheiro de café tentando-o. Olhou para o despertador sobre o criado-mudo, descobrindo que eram 8h da manhã. Os dígitos vermelhos queimaram seu cérebro. Não tinha ido olhar Clio há algumas horas. Saindo da cama, ele foi para o corredor e para o quarto dela. Parou ao descobri-lo vazio, com a cama arrumada. O cheiro de gardênias permeava o ar, e, antes que ele se desse conta, seus pulmões estavam preenchidos com o aroma. Passando uma mão pelos cabelos, Stefan olhou ao redor, alguma coisa mantendo-o dentro do quarto. Uma escova de cabelos estava sobre a cômoda oposta à cama, e havia uma calça jeans e uma blusa de seda dobradas sobre a cama. Um tremor estranho ao ver a cama vazia do corpo alto e atlético, depois de vê-la lá o dia anterior inteiro, o percorreu. Ela se recusara até mesmo a comer alguma coisa, pedindo apenas água e mais água. Silenciosamente suportando o sofrimento, como se fosse sua punição. Olhando-o com expressão chocada quando ele ia checá-la cada duas horas. – Por que você está vindo me ver toda hora? – ela perguntara uma vez, com olhos sonolentos. Clio o considerava tão insensível que estava chocada com sua preocupação? Ele lhe dera um motivo para pensar diferente? Por que Stefan se importava? Irritado com seus pensamentos, ele andou para a cozinha, seguindo o cheiro de café. Parou abruptamente diante da cena incomum diante de si. Clio estava ao balcão, de costas para ele, abrindo uma embalagem com café da manhã, ele presumiu, pelo cheiro de dar água na boca. Ela estava vestida num jeans que abraçava as pernas longas, e numa blusa sem mangas que exibia os braços bronzeados. O cabelo glorioso caía até a cintura, um misto de mechas castanhas e ruivas, brilhando onde o sol batia. Stefan observou, em fascinação, quando ela abriu uma caixa de plástico, pegou talheres e deu uma garfada. Panquecas com melado, bacon e café... sua refeição favorita quando ele estivera na faculdade. Todos o provocavam, porque Stefan comeria aquilo no café da manhã, almoço e janta. Com o rosto virado na direção das portas francesas, Clio fechou os olhos e gemeu enquanto mastigava. Depois lambeu a gota de melado que ficara no lábio, com outro gemido satisfeito. Repetiu o ritual, enlouquecendo-o de desejo. – A suíte vem com um mordomo à disposição 24 horas por dia, Clio – disse ele, adentrando mais a cozinha. – Você não precisa providenciar as nossas refeições, bella.
O garfo dela caiu sobre o balcão. Ela virou-se e fitou-o com aqueles olhos grandes, um rubor subindo pelo pescoço. A blusa de seda era tão transparente que ele podia ver o contorno do sutiã. – Na verdade, eu queria lhe fazer o café da manhã como um agradecimento – murmurou ela. – Mas esta cozinha sofisticada não tem sequer açúcar e leite. Então, andei um pouco e comprei café da manhã. – Um agradecimento? Por quê? O semblante de Clio era sincero. – Por você ter cuidado de mim, ontem. – Suas dores de cabeça sempre duram tanto tempo? – perguntou Stefan, pensando em como ela segurara a cabeça. Por algumas horas, ele não saíra do seu lado, uma ternura que esquecera que possuía mantendo-o lá, em vez de pedir ajuda de seu staff. Há muito tempo, não fazia alguma coisa tão simples e satisfatória como cuidar de alguém. Costumava fazer isso o tempo todo. Outro de seus traços natos que ele enterrara profundamente. – Sim. – Clio deu de ombros. – Esta semana foi muito estressante, então eu não comi nada no dia inteiro do casamento, depois tomei champanhe. Foi como convidar os demônios para brincarem dentro do meu crânio. – Por que a semana foi estressante? A planejadora do casamento não cuidou de tudo? – questionou Stefan, fechando a distância entre os dois. Quanto mais ele se aproximava, mais seu sangue fervia nas veias. Apenas o cheiro do sabonete e da pele dela lhe causava uma reação instantânea. Piscando, ela agarrou o balcão atrás de si. – Você está brincando, certo? – Por que você estava tão estressada, bella? – Porque eu ia me casar sob as condições mais estranhas, e porque a fera do meu futuro marido achou que eu tinha armado uma cilada para capturá-lo. Ele sorriu. – A fera? – Sim. De qualquer forma, sei que nosso contrato não estipula cuidar um do outro em caso de enxaquecas causadas por decisões estúpidas, então, estou realmente grata a você por... – Cale-se, Clio – interrompeu ele, impressionado com a facilidade que ela o fazia mudar de humor. Em somente 15 minutos do dia, Stefan experimentara uma sensação calorosa perante o jeito que ela ocupava cada centímetro da suíte que sempre estivera livre de intrusão feminina, assim como da cozinha, e agora ele estava irritado. Com Clio e consigo mesmo. Tudo que queria fazer era rasgar o bendito contrato, carregá-la para seu quarto e despi-la lentamente. – A enxaqueca passou agora? – Sim, obrigada – replicou ela, educadamente.
Era sua arrogância que o deixava irritado por ser dispensado? Ou eram os atrativos de uma mulher que não se apaixonara por ele imediatamente? Ele pegou um dos copos descartáveis de café e deu um gole. O gosto amargo em sua língua instantaneamente o lembrou de seu lar, um lar que não visitava há muito tempo. – Você achou uma marca siciliana em Manhattan? – perguntou ele, surpreso. Ela corou diante da pergunta. – Eu conheço um lugar que vende café siciliano. Vou lá de vez em quando. – Meu café da manhã e café favoritos. Grazie, Clio. – Inclinando-se ao lado dela, ele tentou reprimir suas emoções. Ofereceu-lhe um sorriso desconcertado. – Passe um dia tranquilo. Vá ao spa, se quiser. Ou posso pedir que o piloto a leve... – Eu não tenho outras intenções por trás de lhe trazer café, exceto agradecê-lo, Stefan. Sob o tom cáustico, havia uma ponta de mágoa que o fez refletir. Ele deveria ficar tão satisfeito que ela se importava com o que ele pensava? Mesmo enquanto estivera sob a ducha gelada na noite de núpcias, Stefan experimentara uma estranha alegria ao saber que tinha sido o motivo pelo qual Clio bebera. Aparentemente, possuía um traço sádico, além de ser um cretino desconfiado. Dio, a mulher o estava virando do avesso. – Eu fiquei apenas surpreso, Clio. – Porque eu lhe comprei café da manhã? É tão difícil entender que eu gostaria de fazer alguma coisa mundana para você? Vai pesar e dar um preço para cada pequena troca entre nós enquanto estivermos presos um com o outro? Presos um com o outro? Aquela sentença o irritou profundamente. Ele estava tão perto de Clio agora que pôde ver os olhos verdes escurecendo, pôde ouvir a respiração dela se tornando ofegante. – Dio, bella. Cale-se ou eu juro que... – O quê? Vai adicionar outra cláusula ao contrato... que eu não posso falar a menos que você me dê permissão? Agarrando os ombros delgados, Stefan puxou-a para si e beijou-a. Arfando, ela tombou contra ele, ancorando as mãos em seu peito. Segurando-lhe a cabeça, ele aprofundou o beijo, seu desejo, aos poucos, saindo de controle. Ela estava com gosto de melado e café, doce e amargo, como desejo fresco e velhas memórias... todas misturadas para levá-lo à distração. O aroma de gardênias provocava seus sentidos. Ele gemeu quando Clio entrelaçou os dedos no seu cabelo. Enrijeceu quando ela cravou os dentes no seu lábio inferior. Se ao menos ele pudesse terminar o que eles tinham começado na cozinha... Stefan não podia pensar numa única razão pela qual não podia levar sua esposa para cama. Ou por que beijá-la pela manhã, num cenário doméstico que deveria lhe causar urticárias, parecia tão natural.
SE ELES continuassem se beijando e pressionando-se contra o corpo do outro, não levaria muito tempo antes que Stefan estivesse investindo em seu centro úmido, na enorme cama do quarto dele. O pensamento, em vez de assustá-la, conjurou uma imagem erótica tão vívida que Clio gemeu contra a boca de Stefan. As mãos moldando seus quadris e seu traseiro relaxaram o aperto. – O que eu vou fazer com você, Clio? – sussurrou ele com voz rouca. – Nós deveríamos ter incluído uma cláusula para isso, bella. De alguma maneira, Clio encontrou um fio de autopreservação e escondeu o rosto no ombro dele. Incluir sexo no contrato deles tinha sido um pensamento irreverente de sua parte, mas ouvi-lo falar aquilo, ver que Stefan não podia pensar em nada entre eles, exceto como uma transação, golpeou-a com força total. Clio afastou-se, circulou o balcão de café da manhã e inclinou-se contra a parede. Suas pernas tremiam, sua respiração estava ofegante, mas ela finalmente colocara distância entre eles. E julgando pelo brilho nos olhos de Stefan, não havia sido uma façanha pequena. – Clio... – Sei que o foco da mídia ficará em nós por mais um tempo, mas eu ainda gostaria de ser mais do que um troféu no seu braço, e, aparentemente, “o recipiente de desdém e inveja de diversas exnamoradas suas” – disse ela, contando de um artigo que lera hoje. Tudo que fizera tinha sido ver as notícias mundiais na internet, como era seu hábito ao tomar café. Em vez disso, abrira a caixa de Pandora das ex-namoradas de Stefan Bianco, e a reação delas sobre o casamento dele. Era uma longa lista de modelos, atrizes e cantoras que deixaria insegura até mesmo uma noiva de mentira. Stefan franziu o cenho. – Mi scusi? Ela suspirou. – Eu estou começando Fase Um de minha reencarnação, começando uma vida que não é definida pela esposa ou noiva de quem eu sou. Recebi alguns retornos de alguns empregos aos quais me candidatei. Esperançosamente... Ele meneou a cabeça, interrompendo-a: – Isso não é necessário. Eu... – Se você fizer um comentário sobre eu o explorando... – Mantenha essa boca deleitável fechada, cara, ou conheço um jeito muito agradável de fazer isso por você. Christian me falou, a semana passada, que a instituição beneficente que nós quatro dirigimos precisa de um gerente. Eu acho que você seria boa para o cargo. Clio piscou. – Está falando sério? – Dio, bella! Por que você duvida tanto de suas próprias habilidades? Onde está a mulher que achava que podia enfrentar qualquer desafio na vida? Clio encolheu-se. Mais pelo fato de que não tinha resposta do que pelo tom de Stefan.
Ele ergueu-lhe o queixo e fitou-lhe os olhos com expressão terna. – Sim, estou falando sério. Eu nunca brincaria com você sobre isso, Clio. Em vez de virar as costas para todas aquelas conexões que seu nome traz, em vez de distanciar-se dos amigos poderosos que você tem, em vez de teimosamente recusar seu novo status como minha esposa, use-os, bella. Useos para construir sua carreira, para ajudar alguém que nunca teve as vantagens que tivemos, para fazer o que quiser de si mesma, Clio. Você já conquistou o maior obstáculo, mostrando a Jackson do que é capaz. – Mas eu jurei fazer alguma coisa de mim mesma, Stefan. Se eu... – Nada virá de todos os recursos e conexões de sua família, se você não for esperta o bastante para canalizar as coisas propriamente, Clio. Com uma leveza preenchendo-a, Clio passou os braços ao redor de sua própria cintura. Queria tanto abraçá-lo. Mas ele não gostaria disso. – Isto é, depois e se você achar alguma prova sobre as falcatruas de Jackson. – Eu acharei – replicou ela com confiança. – É só uma questão de tempo. – Então faça com que esse tempo seja agora, Clio. Enquanto estivermos vivendo esta farsa, você já tem um emprego de período integral, sendo minha esposa adorável. – Acredite, não é fácil lembrar-me da parte adorável – ironizou ela. Com pontaria certeira, Stefan jogou uma colher de plástico nela. – Os membros do meu quadro de diretores e suas esposas estão loucos para conhecê-la. E minha secretária me diz que fomos convidados para diversos jantares e bailes beneficentes, dentro e fora de Nova York. – Eu provavelmente deveria cobrar de você por fazer de mim uma escolta admirada. – Acho que escoltas oferecem outros serviços, bella. – Ele deu-lhe um olhar ardente. – Está oferecendo? – Você quer começar nosso casamento de conto de fadas com uma agressão doméstica, Bianco? Ele sorriu, e foi como se o sol pessoal de Clio tivesse entrado na sala, preenchendo-a com seu calor. – Não, sra. Bianco. Eu gostaria de começar o casamento com um beijo de minha esposa. Sem fala, Clio apenas o olhou. Aquilo não deveria perturbá-la. Ele estava provocando-a. Entretanto, as palavras pareceram queimar sua pele. Aparentemente satisfeito que a chocara, Stefan deu uma garfada da panqueca. – Não é culpa minha se todos querem conhecê-la. Parece que você é uma aquisição que qualquer homem sensato teria a sorte de possuir. – É claro. Não vamos esquecer de onde eu venho e como meu sangue azul é valioso. Porque não haveria outro motivo no mundo para um homem me querer, certo? – Não ponha palavras na minha boca, bella. Mas vou lhe dizer algo que você parece estar esquecendo. Foi preciso coragem para se unir a mim, Clio. Se você não sabia disso antes, sabe agora, certo? Eu não lhe darei nada, exceto o que ganhou de mim legalmente. Todavia, você não recuou. Foi preciso coragem para se manter firme em sua posição, quando Jackson lhe falou aquelas coisas horríveis. Você é muito mais forte do que acredita ser. Agora, descubra alguma coisa sobre Jackson durante o dia, enquanto encanta o mundo como minha esposa, à noite.
Clio olhou para as costas dele, pensando. Stefan estava certo. A decisão tinha sido inteiramente sua. Porém, apenas dois dias depois, ela questionava se aquilo era mais perigoso do que corajoso. ENCANTAR O mundo foi o que eles fizeram, e o fizeram tão bem que nem mesmo Clio podia dizer onde a farsa acabava e a realidade começava. Bailes e jantares beneficentes com homens de negócios poderosos, às vezes em Nova York, em Hong Kong e em Londres. Visitas a galerias de arte, escolas e abrigos patrocinados por caridade, no mundo inteiro... E toda vez que eles iam a eventos... grandes ou pequenos... a mídia os seguia. Em poucas semanas, Clio e Stefan tinham viajado quase o mundo inteiro no avião particular dele e se tornado o casal favorito da mídia. Frustrada por ainda não ter descoberto nada errado nas finanças de Jackson, Clio dedicara-se a aprender o máximo possível sobre a instituição beneficente que Rocco, Christian, Stefan e Zayed haviam aberto para ajudar crianças desprivilegiadas de muitas cidades a obterem um diploma, através de bolsas de estudo, e a encontrarem empregos. O alcance da instituição tirou-lhe o fôlego. Ela ficou tão orgulhosa em saber dos contínuos recursos e tempo que os quatro amigos colocavam ali, e estava animadíssima para fazer parte de alguma coisa tão realizadora. E, independentemente do que acontecesse depois de seu casamento com Stefan, ela queria ser parte da instituição pelo resto da vida. Na verdade, estava apreciando sua vida de mentira com Stefan mais do que apreciara sua vida de verdade com Jackson, por três anos, embora o estilo de vida fosse basicamente o mesmo... viagens em avião particular, eventos, fechando negócios durante jantares e drinques. O homem no centro daquilo, todavia, fazia toda a diferença. Estar perto de Stefan era como ser pega na órbita de uma estrela... revigorante e excitante. E fazendo-a nunca querer ir embora. Para todos os lugares que ela ia, encontrava conhecidos, mas parecia uma conclusão inevitável que Stefan fosse o vencedor contra Jackson. Ela sabia que não deveria sentir tanto prazer com aquilo, mas deleitava-se com cada pequena vitória. Porque a única vez que eles tinham encontrado Jackson, ele não ousara encontrar-lhe os olhos, muito menos lhes dirigir a palavra. Apenas o preço que ela pagava por isso parecia muito alto. A suíte mais luxuosa e mais espaçosa num dos hotéis mais finos em Nova York não era grande o bastante para eles. Ela sentiu a inquietude de Stefan por estar engaiolado na suíte, como uma força física, sentiu a solidão que era como uma concha em volta das emoções dele. O único momento que havia flashes do velho Stefan era quando um dos três amigos dele estava presente. Somente então ela via risada genuína no rosto dele. E quanto mais via deste novo Stefan, mais queria quebrar aquela concha. Apesar de saber que aquela era a última coisa que deveria fazer, Clio não podia evitar tentar. Já contatara os pais de Stefan, estava contando os minutos para quando eles chegassem a Nova York. Estava rezando para que ele não a expulsasse da suíte no momento que os visse.
– SUA ESPOSA é a criatura mais linda que eu já vi – seu gerente da contabilidade de 57 anos falou, e Stefan mal conseguiu conter a vontade de socar o rosto do homem. O velho patife já flertara com Clio quando Stefan a apresentara. Esforçando-se para sorrir, ele deu as costas para o homem, sem responder. – Pronta para ir embora? – perguntou ele, alcançando Clio. Mas antes que Clio pudesse responder, o celular de Stefan tocou e ele checou o identificador de chamadas. Era do hospital, onde seu assistente, Marco, ainda estava lutando pela vida. Seu olhar caiu sobre Jackson, na multidão, no segundo que ele desligou o telefone. Dois minutos de conversa, e uma dor profunda fechava sua garganta. Não confiando em seu temperamento, Stefan foi para o terraço e socou a parede. Mesmo a dor em sua mão e braço não foi suficiente para amortecer a dor de perder Marco. – Stefan? Ele ouviu os passos apressados de Clio, sentiu-a procurar sua mão. O desespero preencheu os olhos verdes quando ela puxou-lhe o braço para ver melhor as juntas de seus dedos. – Eu tenho um kit de primeiros-socorros no carro. Vamos. – Ela parecia estar quase chorando. – Não – respondeu Stefan, puxando a mão. – Vá embora, Clio. Peça para o chofer levá-la para casa. A mulher teimosa não se mexeu, uma inclinação resoluta do queixo. – Eu não vou a lugar algum. Não até que você me conte por que socou a parede com tanta força. Stefan, por favor, conte-me o que está acontecendo. – Meu assistente executivo, um homem que trabalha para mim há dez anos, foi enganado por Jackson. Ele viu a perplexidade nos olhos de Clio. – Este homem... ele não era apenas um empregado? De alguma maneira, ela alcançara o centro do problema. – Não. Marco começou comigo quando eu abri a imobiliária. Foi sempre tão leal que se tornou importante para mim, apesar do patife que me tornei. Estranho, não? Ela sorriu. – Não realmente. O quanto você pode negar sua própria natureza, Stefan? E o que aconteceu com Marco? – Ele tentou se suicidar e está hospitalizado. Hoje, ele morreu, deixando uma garotinha sem pai. Uma garotinha, bella... e aquele canalha ainda está livre para apreciar seu caviar na festa. Instantaneamente, Clio o abraçou, mas Stefan viu como ela ficara pálida. Viu o brilho de culpa nos olhos verdes, como se ela fosse responsável pelas ações de Jackson. Motivo pelo qual ele não tinha lhe contado até agora. – Sinto muito, Stefan... Eu... não sei o que dizer. Saindo dos braços dela, Stefan desviou o olhar. – Ele fez o mesmo comigo anos atrás, Clio. Foi depois que Serena partiu. Eu tinha ficado rico com alguns investimentos, e percebi que o mercado de imobiliárias de luxo era enorme, e queria uma fatia deste. Fiz muitas pesquisas e adquiri ações numa pequena empresa de capital aberto. Por
meses, pus tudo que eu possuía nesse único empreendimento. Numa questão de minutos, as ações que eu havia comprado despencaram, e perdi todo o dinheiro que investi nelas. Foi a pior fase da minha vida. Eu tinha perdido tudo depois que Serena partira, e o fato de ter sido derrubado dessa forma... me fez questionar tudo. Se não fosse pelo apoio de Rocco, Christian e Zayed, se não fosse pelo fato de que meu pai sempre me ensinara a me erguer depois dos golpes na vida, teria sido eu. – Lamento por seu amigo, Stefan. Mas você nunca teria feito isso. Deus, eu não posso nem pensar numa coisa dessas. – Eu preciso detê-lo, Clio. Assentindo, ela enxugou o rosto. – Nós iremos detê-lo. Eu prometo. Justamente quando ele relaxou os braços em volta dela e sentiu o nó em sua garganta se afrouxando, Clio distanciou-se. – Eu... eu o deixarei sozinho. Até mais tarde. – Fugindo de novo, bella? – perguntou ele com um sorriso zombeteiro. – Há dias que você vem evitando meu olhar. Você me toca, sorri para mim, me beija quando estamos em público, mas, assim que ficamos a sós... você não vê a hora de fugir. Por quanto tempo nós continuaremos assim, Clio? – Eu não permitirei que você transforme sexo numa transação, Stefan. Não serei mais uma de suas mulheres atendendo aos seus desejos. E você e eu... – O que sobre você e eu, cara? – Eu deixei que um homem me envolvesse num relacionamento por tudo, exceto pela razão certa. Querer você, estar ao seu lado e não tocá-lo, já é uma lição em si – declarou ela, chocando-o com sua honestidade. O jeito aberto com que Clio o olhava agora, sem esconder nada, abalou-o de uma maneira diferente. – Mas eu não posso ceder ao meu desejo, Stefan. Não posso ter sexo com você e fingir que nada mudou entre nós. Stefan observou, em fascínio e frustração, quando ela saiu sem olhar para trás. Alguma coisa havia mudado em Clio, e alguma coisa mudara entre eles. Ele não sabia o quê. Apenas que não podia se esconder da verdade que Clio apontara com tanta precisão. Virando-se, Stefan olhou para a noite escura. Jamais poderia reduzir Clio à outra mulher sem nome que satisfizesse seu corpo. Ele nem sequer contara aos seus três amigos como se sentira derrotado ao perder o que construíra, por causa de Jackson. Quão perto chegara de desistir e voltar para casa e para seus pais. Era tão fácil contar com Clio, confidenciar-se com ela. Mesmo que a censura dela o transformasse, de alguma maneira. Dormir com sua esposa significaria se redescobrir, porque Clio não o deixaria intocado. E esse era um risco que ele não poderia correr.
CAPÍTULO 10
TRÊS SEMANAS depois do casamento deles, Stefan teve sua reunião matinal online com a maioria dos seus executivos ao redor do mundo. O cheiro de café fresco, o qual Clio religiosamente fazia, levou-o à cozinha, como todos os dias. Ele serviu-se de uma xícara, deu um gole e observou Clio à mesa de jantar, mexendo em documentos e fazendo anotações. Ela estava com a testa franzida, lembrando-o da época que eles tinham estudado juntos para provas, anos atrás. Subitamente, experimentou uma explosão de calor em seu peito diante da visão dela, uma sensação quase esquecida. Aquele se tornara um ritual... um entre numerosos outros que eles haviam desenvolvido quando ele voltava para Nova York, entre viagens ao redor do mundo. Compartilhando uma xícara de café, analisando as finanças de Jackson, discutindo novas iniciativas para a instituição beneficente, e o melhor de tudo para ele, pessoalmente... redescobrindo os restaurantes em diferentes partes de Nova York que eles costumavam frequentar na época da faculdade. Ele pensou na determinação com que Clio o arrastara para tais lugares contra sua vontade, nas primeiras vezes. Como se ela quisesse apagar toda a amargura de seu caso amoroso com Serena, a amargura que Stefan deixara corromper suas memórias de Nova York e dos anos felizes que passara lá, a aversão que desenvolvera a se estabelecer num único lugar ou formar elos significantes com alguém. Ele franziu o cenho ao ouvir as portas do elevador se abrirem à entrada da suíte, seguido por vozes familiares. Clio instantaneamente ficou imóvel, apertando a caneta entre os dedos com visível tensão. Sentindo um nó no estômago, Stefan foi para o corredor e para o saguão, e olhou para a cena diante de si, sem palavras. Sorrindo, sua mãe praticamente correu para ele, jogando-se nos seus braços. Como acontecia por uma década, vergonha o envolveu, roubando sua habilidade de falar.
Seu pai, alto e forte como Stefan, estava mais distante, observando-o silenciosamente. Ele não via seu pai há quase dez anos, tendo visto sua mãe dois anos atrás, quando ela viajara para Villa Mondelli, para casa de Rocco em Milão, a fim de ver Stefan. Lágrimas escorriam pelo rosto de sua mãe, no momento que Clio chegou a eles. Seu pai, um homem geralmente tradicional e reticente, aproximou-se de Clio e pegou-lhe as mãos nas suas. Estudou-a com um misto de curiosidade e carinho. – Você é tão linda quanto é generosa, bella. A familiaridade que seu pai mostrou em relação a Clio deixou Stefan pasmo. E mudo. Clio meneou a cabeça, evitando olhar para Stefan. – Não é nada, sr. Bianco. Eu só estava cumprindo meu dever. Dever? – Obrigada por nos convidar para casa de vocês, Clio – disse sua mãe, de dentro do círculo de seus braços. – Vocês precisam nos desculpar, não é uma casa apropriada – replicou Clio, olhando para todo lado, menos para ele. – Mas lar é onde seu coração está, não é? – murmurou sua mãe, com lágrimas frescas preenchendo seus olhos. Stefan olhou entre Clio e seus pais diversas vezes, o choque roubando qualquer fala coerente. Uma década atrás, ele tentara convencer seus pais que se apaixonara por Serena e que queria ficar em Nova York. Seus pais haviam sido tão contra aquilo que ameaçaram deserdá-lo, e ele, tão ingênuo, tão apaixonado, dissera-lhes que não tinha problema com isso. Mas Serena não quisera nada com ele, sem a fortuna de seus pais. – Nós teríamos adorado vir ao casamento, mas não era para ser – murmurou sua mãe, ignorando o fato de que Stefan não os convidara. Exceto por telefonemas, ele não fora capaz de encarar os olhos de seu pai. – Ele é sortudo por ter uma esposa tão adorável. – Isso foi dito pelo seu pai. – Por favor, entrem – convidou Clio. – Vocês fizeram uma boa viagem? – Sim – replicou sua mãe. – A bordo no avião luxuoso de Stefan significa que não precisamos de nada. Outro choque o percorreu, e Stefan segurou o pulso de Clio e puxou-a para si. – Eu tenho de ligar para o mordomo e pedir que ele prepare alguma coisa para seus pais comerem – disse ela, recolhendo a mão. – Por quanto tempo você vai fugir, bella? – sussurrou ele, antes que sua mãe comandasse sua atenção novamente. Ele sentiu o tremor abalando o corpo delgado de Clio. A mulher atrevida armara tudo, até mesmo dera ordens ao seu piloto sem o seu conhecimento. Tudo que Stefan queria fazer agora era pedir licença para seus pais, seguir Clio e pedir uma explicação. Ou talvez, violentá-la primeiro, e pedir explicações depois. Porque seu desejo por sua esposa parecia ser uma coisa constante em sua vida ultimamente.
DEPOIS DE um jantar delicioso, preparado pelo mordomo, a pedido de Clio, e muita conversa alegre... principalmente as perguntas curiosas de sua mãe sobre como eles tinham se apaixonado e para quando planejavam bambini, e as respostas mentirosas de Clio... o silêncio na sala enorme mexia com os nervos de Stefan. Toda vez que ele visitara Nova York durante a última década, ficava na mesma suíte no Chatsfield. Agora, era como se um vulcão tivesse entrado em erupção em sua vida, e não houvesse como conter os danos causados, impedindo-o de voltar para o lugar estéril e seguro que tinha sido um mês atrás. A mão de seu pai em seu ombro o tirou dos pensamentos. – Você está zangado com sua esposa por ela ter nos convidado. Stefan meneou a cabeça em negação automática, antes de capturar um brilho de compreensão nos olhos de seu pai. Seu pai nunca lhe mentira, nunca fizera nada exceto amar Stefan. – Você sabe que nós o teríamos recebido de braços abertos durante todos esses anos. – Não havia hesitação na voz de seu pai. – Por que não voltou para Palermo uma única vez? Por que se manteve tão distante, Stefan? A dor quase palpável na pergunta foi como um soco no estômago de Stefan, atravessando a concha que ele construíra em volta de si mesmo. Ele soubera, de alguma maneira, que seu pai perceberia como ele estava mudado por dentro? Temera que seu pai visse que não restava nada de bom no filho, depois do que Serena fizera? – Foi para nos punir por ter ameaçado deserdá-lo, todos aqueles anos atrás? – Não. – Seu pai não aceitaria nada, exceto a verdade. Pela primeira vez em anos, Stefan olhou para dentro de si mesmo. – Que tipo de homem fica longe de uma mãe que sonha em abraçar o filho novamente? Ouvir aquela resignação dolorosa na voz de seu pai desfez Stefan. Palavras saíram numa onda de culpa e vergonha: – Serena... tirou minha fé em mim mesmo quando me abandonou. Num único dia, tornei-me um estranho para mim mesmo. Eu não me reconhecia, e não podia encará-los como um fracasso. Eu... não era digno de você e de mamãe, depois de escolher uma mulher como Serena sobre vocês. Como poderia encará-los depois de ter destruído todos os seus sonhos tão egoisticamente? A compreensão surgiu nos olhos de seu pai. – E todos esses anos? Depois que você construiu seu império, que provou a si mesmo que podia ser um sucesso? Stefan balançou a cabeça, um nó na garganta. Não tinha resposta para seu pai. – Ela tomou tudo que era bom e gentil sobre você, também? Ela não tomara. Stefan desistira de seu lado bom de livre e espontânea vontade. Não quisera nada que pudesse deixá-lo vulnerável de novo. Juntamente com sua ingenuidade, ele também desistira de seu coração. Depois de tudo que fizera para limpar Serena de sua vida, ele ainda a deixara vencer. A percepção o atingiu. Agarrara-se à rejeição de Serena, agarrara-se, por tanto tempo, ao veneno que ela pusera em sua vida.
Deixara que Serena corrompesse tudo que tinha sido bom e puro na sua vida, apesar de estar determinado a provar que ela estava errada. Negara a si mesmo e aos seus pais a alegria de conviverem. Pegando as mãos de seu pai, Stefan falou: – Permiti que minha vergonha e culpa me impedissem de visitá-los durante todos esses anos... Eu queria me provar digno de vocês novamente, e, no processo, esqueci o que me ensinaram... esqueci tudo o que é importante na vida. Assentindo, seu pai bateu nas suas costas. – Sua mãe... não vê coisas. Mas eu teria ficado imensamente triste em ver meu filho se tornar assim... se não fosse por Clio, Stefan. Ver você com uma mulher como ela alivia meu coração. O que seu pai diria se soubesse que aquilo não passava de uma farsa? O que o estava impedindo de tornar sua a mulher que queria com tanto desespero? O pensamento foi como um golpe em seu âmago. As portas do elevador se abriram e seus pais partiram, sorrisos iluminando seus rostos. Instantaneamente, Clio pediu licença, e Stefan deixou-a fugir, por enquanto. Do jeito que estava se sentindo, era melhor ficar sozinho até que recuperasse o controle sobre suas emoções. Durante o dia inteiro, seus pais haviam comentado como Clio e ele combinavam, mostrando-se radiantes diante da pequena troca entre eles. Eles não tinham conseguido tirar os olhos de Clio quando todos estavam fazendo passeios turísticos na cidade. Haviam exigido ver o campus de Columbia University, todos os lugares em volta dos quais a mídia construíra a história de amor deles. Sua mãe pronunciara orgulhosamente que o casamento de Stefan e Clio duraria mais do que seu casamento de quarenta anos, que eles continuariam a tradição de uma vida em família longa e feliz, como os Bianco sempre tinham sido. O comentário de sua mãe abrira uma ferida que ele fechara muito tempo atrás, uma dor que poderia consumi-lo, se Stefan permitisse. Porque nunca seria capaz de confiar em outra mulher e alcançar aquela felicidade novamente. Clio levara seus pais para dentro da farsa deles, cruelmente mostrando a Stefan um futuro que nunca poderia ser dele. E o fato de ela fazê-lo desejar aquilo novamente era insuportável. CLIO ENTROU no seu quarto e fechou a porta. Um medo antecipado a consumia. Com os dedos deslizando nas teclas de seu notebook, ela digitou sua senha e acessou sua conta bancária. Com o suor escorrendo por suas costas, pegou uma folha de papel que deixara sobre o criadomudo. As finanças de Jackson... Um nó se formou em seu estômago quando ela finalmente localizou a discrepância que estivera procurando, e a verdade tremenda de sua situação financeira foi registrada. Jackson roubara cada centavo seu, literalmente...
Isso era prova suficiente para que a Comissão de Títulos e Câmbio Americana investigasse Jackson. Prova suficiente para condená-lo... Suas pernas cederam, e ela sentou-se à penteadeira, a respiração ofegante. Por que descobrira aquilo finalmente hoje, neste momento, depois de semanas tentando, não tinha ideia. Hoje, quando ela vira um sorriso verdadeiro na boca de Stefan, hoje, quando vira o brilho de pura alegria nos olhos dele... Hoje, quando parecera que ela fizera uma diferença na vida dele. Isto era tudo que Stefan precisava dela, o motivo pelo qual concordara em se casar com ela... E uma vez que ele tivesse acesso àquilo... Inclinando-se para frente e encostando a testa na penteadeira, Clio tentou reprimir as lágrimas. Ter Rosa Bianco olhando amorosamente para Stefan e ela, e tecendo sonhos para o futuro deles, durante o dia inteiro, havia sido como olhar para uma realidade que era ainda melhor do que aquela que Clio desejara por tanto tempo, uma que estava vivendo todos os dias, mas que ainda estava fora de seu alcance. Fingir ser a mulher que Stefan adorava era como uma droga da qual ela nunca queria abrir mão, que poderia distorcer a realidade e iludi-la. Entretanto, ela ainda não queria lhe dar a prova. – Você não deveria ter interferido, Clio. A voz de Stefan atrás dela continha raiva e emoção. Mas ela fizera o que tinha pretendido. Finalmente conseguira atravessar a concha de Stefan. – Vire-se e olhe para mim. Não há para onde fugir esta noite. Um aviso vibrava no tom de Stefan, juntamente com arrogância. E, em vez de aquilo assustá-la, estimulou-a. Alguém precisava mostrar a Stefan no que ele se transformara, lembrando-o da pessoa que ele costumava ser. Ainda sentada, ela virou-se para encará-lo. – Eu não interferi, Stefan. Nem tenho intenção de fugir. – Não? Porque tenho a impressão de que você está levando nossos votos ao pé da letra, bella? Tudo o que fez nas últimas duas semanas, tudo que acha que eu preciso... Você não tem dever em relação a mim, Clio. Ela endireitou a coluna. – Talvez eu não tenha dever em relação a você como esposa, Stefan. Deus sabe que nada, exceto aquele maldito contrato, define isso entre nós. Mas e quanto uma amiga que quer ajudá-lo, vê-lo sorrir novamente? Ele aproximou-se, segurando sua nuca de maneira possessiva. – Eu tenho três amigos que não interferem na minha vida pessoal. Não preciso de mais amigos. – Então, tudo que você fez por mim... – Essa é outra questão. Clio bufou, irritando-se. – Está ouvindo a si mesmo? Você me deu o direito de interferir na sua vida quando interferiu na minha. – Ela pausou. – Seus pais ficaram radiantes em vê-lo, Stefan. E sei que isso significou alguma coisa para você também. A expressão dele foi desdenhosa.
– Então, por que você não convidou seus pais, bella? Enterrando a dor que instantaneamente subiu à superfície, Clio deu de ombros. – Eu os convidei. Pensei na farsa que seria, mas este é o único casamento que eu terei. Minha mãe disse, Espero que você esteja melhor com ele do que com o americano. Eles não têm interesse na minha vida, Stefan. Não depois que fugi da vida que eles decidiram para mim. Mas tendo visto seus pais hoje, eu não me arrependo do que fiz. Eles o adoram, Stefan. Não convidá-los para o casamento... Rejeitar alguma coisa tão boa e pura, este não é você. – Eu duvidei de seus motivos para querer se casar comigo. Fiz você assinar um contrato horrível. Ainda não aprendeu a lição de quem eu sou agora, Clio? O Stefan ingênuo e romântico de quem você lembra morreu muito tempo atrás. No seu lugar, só há veneno, Clio, veneno que irá destruí-la. Eu estou lhe avisando, bella... deixe-me em paz. Ele emitiu um som sofrido. – Percebe o que fez envolvendo meus pais nisso? Eles acham que o sol nasce com você, agora. O que acontece quando tudo acabar? Como eu irei encará-los com outro fracasso na mão? Como explicarei a sua ausência na minha vida, Clio? O fato de que ele nem mesmo considerava o pensamento de algum tipo de futuro para eles, juntos, quando ela sonhava com isso o tempo todo, deveria tê-la detido. – Eu não sei. Nós nos unimos para arruinar Jackson. A felicidade de seus pais não pode ser uma coisa boa que resultará disso, Stefan? Nosso casamento tem de deixar apenas destruição no seu rastro? Porque era o que parecia, agora. Stefan a ajudara a recuperar seu autorrespeito, sua forças, mas também ia roubar uma parte sua. O dano, aparentemente, já estava feito. Como ela podia ficar longe dele, quando ele era tão lindo, gentil e honrável? Quando seu coração disparava com alegria ao vê-lo todas as manhãs? Quando sua garganta doía diante do modo que ele fechava suas emoções, como se não pudesse suportá-las? Ela levantou-se e abraçou-o, escondendo o rosto no ombro dele. Stefan ficou tenso imediatamente, segurando-lhe os braços para afastá-la. Mas Clio aninhou-se mais a ele, pressionando as curvas suaves contra o corpo sólido, até que eles se encaixassem com perfeição. A masculinidade de Stefan a fazia se sentir tão segura. E desejada. Os braços dele circularam-na finalmente, as mãos grandes acariciando suas costas, antes de descansarem em sua cintura. – Obrigado por ter trazido meus pais aqui. Por ter colocado sorrisos tão maravilhosos nos rostos deles. Uma emoção calorosa explodiu no peito de Clio, e ela lutou para contê-la. Assentindo, abraçou-o ainda mais apertado. – Você tem de me deixar entrar, Stefan. Só um pouquinho. – Um pouquinho, bella? Você é como um vírus teimoso. – O sorriso dele contra sua testa tirou a agressividade das palavras. Ela não podia nomear o que estava acontecendo. Apenas que, depois de anos de infelicidade e sofrimento, sorria tanto nas últimas semanas... Estava feliz.
Experimentava uma sensação de poder sobre sua própria vida, sobre suas emoções. Iria lhe contar sobre a prova contra Jackson, mas por estes poucos minutos, queria que o momento fosse somente dos dois. – Nós não teremos expectativas em relação ao outro, o que significa que também não nos machucaremos. Estamos seguros um do outro. Ele sorriu, sarcasticamente. – Estamos, bella? Porque cada minuto de cada dia, eu me sinto ansioso. Você sorri para mim, me provoca, desafia tudo que penso a seu respeito, de mim mesmo, do mundo. E agora, minha querida esposa, está se intrometendo na minha vida. Seguro é a última coisa que estou, com você por perto. E o que eu quero, tão desesperadamente de você – ele levou uma das mãos para o vale entre os seios de Clio, enquanto enterrava a boca quente em seu pescoço –, você não vai me dar, bella. Sinto como se eu tivesse esperado minha vida inteira para fazer amor com você. Ela se derreteu. – Você está me seduzindo com palavras, Bianco. – Eu estou seduzindo você, bella? – Stefan riu deliciosamente. Então, mordiscou-lhe o ombro. Sentindo a umidade em seu sexo, ela tremeu. Com um braço ao seu redor, ele absorveu os tremores do corpo de Clio, pressionando-a contra si. – Para alguém que reclama que eu defini tudo entre nós por aquele contrato, você me domina, Clio. Um poder e tanto, não acha? O sorriso curvou a boca de Clio, e ela cedeu. Desejo e alegria inundaram-na numa doce combinação. O fato de que Stefan não se ressentia do desejo entre eles... era um progresso. Clio sabia como ele queria definir e restringir o relacionamento deles. Stefan podia fazer tudo por ela, mas examinaria cada ação de Clio em relação a ele. Colocando um preço nesta ou rejeitando-a como indesejada. Mas ela não podia parar de tentar. Independentemente da imagem que eles apresentassem ao mundo, Clio precisava de alguma coisa real entre os dois. E parecia que tinha de ser este desejo, este fogo que consumia ambos. Ela levantou os braços e envolveu o pescoço dele. Beijou-lhe o canto da boca e inalou profundamente. O gosto e cheiro de Stefan explodiram em seus lábios, instigando-a a pressionar-se mais contra o corpo poderoso. – Eu quero que fique claro que isso não é uma dominação, uma transação ou uma cláusula em seu contrato, Bianco. Ele puxou-a para mais perto, até que sua ereção estivesse ousadamente em contato com o sexo dela. A boca de Clio secou. – Sì. – Quero que fique claro que estou fazendo isso porque é você. – Sem gratidão, bella. Eu não quero ser seu... – Não. – Ela cobriu-lhe a boca com a sua. – É porque você é o homem mais lindo que já vi, e porque... eu não posso respirar se você parar de me beijar. Os olhos dele brilharam.
– Dio, bella. Você será a minha morte. Os dedos longos apertaram seu traseiro, enquanto a língua de Stefan brincava com a pulsação em seu pescoço. Entrelaçando as mãos no cabelo dele, Clio puxou-o, até que ele levantasse a cabeça e encontrasse seu olhar. – Beije-me, por favor. Deixe-me sentir que eu posso fazer isso direito. Torne-me inteira novamente nisso, ela queria dizer, mas vergonha e medo a impediram de pronunciar tais palavras. Clio beijou-lhe o queixo, desta vez. Com uma urgência e coragem que nunca conhecera, puxou as lapelas da camisa masculina até que os botões arrebentaram e voaram. Mergulhou as mãos por baixo da camisa. Sentiu a pele quente e os músculos tensos. Ouviu-o arfar. Abaixou-se e finalmente provou-lhe a pele, lambeu o mamilo reto, marcando-o, saboreandoo, até que os dedos dele estivessem no seu cabelo, até que o corpo forte e grande estivesse tremendo. Até que o controle dele estivesse por um fio, como o seu estava. Ele tinha um gosto tão bom... e era todo seu. Pelo menos, por esta noite.
CAPÍTULO 11
ELA PARECIA uma rainha imperial, tão esbelta, entretanto, estava tremendo em seus braços. A boca rosada já estava inchada pelos seus beijos, os olhos nublados com desejo. Aquela era a fantasia de Stefan se realizando, e era muito melhor do que ele imaginara. Erguendo-a nos braços, Stefan carregou-a para fora do quarto. Clio riu. – A cama no meu quarto é ótima, Stefan. – Sim, é. Mas não é a minha, bella. Tenho passado inúmeras noites virando de um lado para o outro na cama, imaginando você nos meus lençóis. Uma vez que acabarmos no meu quarto, podemos voltar para o seu. Ou ir para espreguiçadeira na varanda, com vista para Manhattan. Ou para o terraço, onde você pode ver o céu, enquanto eu lambo seu corpo inteiro. Ela enrubesceu, e aquilo o excitou mais ainda. – Como você pode ser a sensualidade personificada e ainda enrubescer, bella? Quando eles entraram no quarto de Stefan, ele deslizou-a para o chão. Ela olhou em volta... absorvendo a vista do Central Park de um lado, e da cama king-size do outro. Pegando o controle remoto, Stefan acendeu todas as luzes. Ela virou-se para ele, uma súbita timidez no olhar. Ele puxou-a para si. O pensamento de que Jackson tinha colocado aquelas sombras nos olhos de Clio fez seu sangue ferver. – Clio, bella? Ela ergueu os olhos para ele. – Podemos apagar as luzes? Seu primeiro instinto foi recusar, dizer que ela não podia esconder nada dele, que era sua, com cicatrizes ou defeitos. Mas notou a vulnerabilidade nela e apagou as luzes. Segurando-lhe o rosto, beijou-a.
Com as feições de Clio visíveis apenas em flashes pela luz da lua, com as curvas femininas acessíveis a ele somente através do toque, todos os outros sentidos se intensificaram. O aroma dela, a pele sedosa, o deslizar hesitante da língua contra a sua, o gosto de mel... era tudo um banquete maravilhoso. Beijar uma mulher nunca tinha sido mais do que preliminar para liberação. Entretanto, ele poderia beijar Clio por horas, ouvir os gemidos baixinhos que ela emitia por dias. Perder-se naquela boca suave por séculos. Ele nunca teria o bastante dela, alguma coisa o avisou. Jamais se cansaria de possui-la. Nunca seria capaz de impedir que ela penetrasse sua vida, seus dias, sua respiração. Ela já estava em todos os lugares, impulsionando-o em direção ao homem que Stefan jurara que nunca seria novamente. Quebrando a concha que ele construíra ao seu redor e alcançando sua parte mais vulnerável. Logo, ela conheceria tudo sobre ele, conheceria seu maior medo. Saberia como ele se voltara contra sua própria natureza e enterrara seu coração e seus maiores desejos, de modo que pudesse seguir com sua vida. Saberia o quanto ele invejava Rocco por ter encontrado Olivia, a mulher que o adorava por quem ele era, e Christian, pela família que ele teria com a adorável Alessandra... Como, no processo de recompor-se, depois da traição de Serena, ele perdera algo fundamentalmente bom sobre si mesmo, enquanto observara Clio lutar com seus medos e inseguranças e emergir vitoriosa. Como ela o fizera desejar ser aquele velho Stefan novamente. Todavia, mesmo através da vulnerabilidade que ele tanto desprezava, não podia ir embora. O gemido de Clio, quando ele lhe mordiscou o lábio inferior, excitou-o de tal maneira que ele teve de lutar por controle. Dormira com inúmeras mulheres ao longo da última década, todavia, não sentira nada como a necessidade voraz que experimentava hoje, pensou, aprofundando o beijo. Uma mão segurava-lhe o cabelo para imobilizá-la, enquanto a outra envolvia a cintura fina, pressionando-a contra sua ereção. Qualquer coisa que Stefan fizesse para excitá-la, para enlouquecê-la, era ele quem se sentia possuído por ela, consumido por seu desejo. E era um sentimento que não podia conter. Tudo que parecia capaz era de mergulhar no sentimento, e foi o que fez. Mas se ele ia afundar, Clio também afundaria. A BOCA de Stefan era tão firme e perfeita sobre a sua, despertando nela um milhão de células nervosas que haviam estado dormentes em seu interior até agora. Ele era seu. Clio não podia impedir o pensamento que ressonava em sua cabeça. Ele era seu como nunca tinha sido de ninguém, ela sabia disso pela dança erótica da língua de Stefan. – Dio, bella. Eu sabia que não ser capaz de vê-la seria uma punição. Mas não desse jeito – disse ele, zangado.
Mas Clio não se importava por que ou como. Tudo que importava era que ele soava excitado. Apertando mais os braços em volta do pescoço de Stefan, ela roçou os seios contra ele. Stefan gemeu em resposta, antes de erguê-la novamente nos braços. Colocando-a sobre a cama alta, moveu-se entre as pernas dela. Segurou as extremidades da blusa de seda e puxou. Botões de pérola voaram em todas as direções. A urgência nele, em vez de assustá-la, preencheu-a com poder. O fato de ela ser capaz de fazer aquele corpo musculoso tremer, de deixá-lo naquele estado de desejo desesperado, era um bálsamo sobre as feridas que Jackson lhe infligira. Clio olhou para baixo ao mesmo tempo em que ele. E viu, sob a luz da lua, que seus mamilos estavam rijos contra a seda do sutiã. O som que Stefan emitiu enquanto traçava o contorno de seu sutiã com um dedo longo foi música para os ouvidos de Clio. Mas em vez de tocá-la, como ela queria, ele posicionou-a de joelhos e removeu-lhe o jeans. Jogando-o para o outro lado do quarto, acomodou-a na cama, novamente. Até que ela estivesse sentada na sua frente, de calcinha e sutiã, as pernas estendidas indecentemente a fim de dar espaço para o corpo grande de Stefan, expondo seu centro feminino. Mas Clio ficou imóvel, a escuridão da noite lhe dando uma coragem que ela não teria tido, se os olhos verdes ardentes estivessem sobre ela. Detestava que Jackson ainda estava em seus medos, quando não deveria estar, detestava ter permitido que ele roubasse sua confiança. – Stefan? – chamou ela, apenas agora percebendo a imobilidade dele. Segurando-lhe os tornozelos, ele empurrou-a deitada sobre a cama. No instante seguinte, as luzes se acenderam, e Stefan inclinou-se sobre seu corpo num movimento tão perfeito que Clio se esqueceu do brilho das luzes. O olhar dele percorreu-a como uma chama ardente, levantando pequenas faíscas onde tocava. Arfando, ela moveu-se para cobrir seu sexo, mas ele agarrou-lhe as mãos e ergueu-as acima de sua cabeça. – Eu não permitirei que ele leve embora nem uma única parte sua que deveria ser minha hoje, bella – disse Stefan, com determinação. – Não permitirei que aquele patife seja um fantasma neste quarto entre nós. O coração de Clio disparou tão violentamente que ela tremeu. O fato de que Stefan podia ler seus medos tão bem a fazia se sentir mais exposta do que suas partes mais íntimas à mostra para ele. – Você é tão maravilhosa, Clio. Dio, por que se esconderia de mim? Por que me negaria o prazer de vê-la, quando sabe o quanto eu a quero? Clio virou o rosto de lado, lágrimas de vergonha preenchendo seus olhos. Ele trilhou beijos quentes ao longo do contorno de seu sutiã, e ela se mexeu, irrequieta. Precisava das mãos dele em seus seios, precisava da boca de Stefan sobre seus pontos doloridos. Mas, é claro, ele não lhe daria o que ela queria, a menos que ela se despisse daquela última camada. Até que estivesse completamente exposta. Até que fosse inteirinha dele. Ele inclinou-se sobre ela, prendendo-lhe o olhar. – Fale.
– Eu não estava me escondendo. Tinha a esperança de não ver sua reação, Stefan. – Explique. – Não. – Sim. Estar nua na frente dele deveria tê-la feito se sentir desconcertada. Mas o círculo protetor dos braços de Stefan libertou-a de seu último medo. – Ele... Eu tenho sido infeliz há um tempo. Comigo mesma, na minha carreira e, é claro, no meu relacionamento com Jackson. Até fiquei sem amigas. E isso afetava tudo que eu fazia. Como eu me vestia, como eu comia, como interagia com outros. Até mesmo... – Sexo? – Stefan falou entre dentes cerrados, como se a mera ideia de Jackson e ela o enfurecesse. – Sim. Sexo tornou-se tanto uma obrigação que uma noite ele disse que o rio Hudson no inverno seria mais quente e receptivo. Depois disso, eu encontrava desculpas para não fazer aquilo. O fato de Jackson ter me traído por tanto tempo é imperdoável, mas não posso evitar pensar que eu o impulsionei para isso. Que foi por minha causa. Eu não quero ver o mesmo desapontamento no seu rosto, Stefan. Se as luzes estivessem apagadas, eu ainda poderia mentir para mim mesma sobre... Desnudar seu último medo parecia tão doloroso que ela parou. Fechando os olhos, esperou. Segundos se transformaram em minutos, mas ele não disse nada. Até que Clio sentiu dedos longos subindo por suas coxas, tirando sua calcinha e abrindo as dobras de seu sexo. De maneira invasiva e altamente excitante, ele pressionou, com o polegar, o ponto que estivera doendo por atenção. Massageou-o. Clio arqueou as costas, perdendo o fôlego. Um calor a inundou quando ele beijou a pele sensível de sua coxa. – Seu cheiro é tão divino, bella. – Num movimento rápido, ele inseriu dois dedos em seu interior, e Clio arfou diante da avalanche de sensações. – E você está tão molhada para mim. Virando-se em direção a ele, Clio encontrou-lhe o olhar. Inclinando-se, ele provou-lhe a boca. Provocou o bico rijo de um de seus seios. Clio gemeu dentro da boca dele. – Eu não estava brincando, Clio. Sempre quis você, mesmo no passado. A surpresa brilhou nos olhos dela. – Dormir com cada mulher que conhecia foi a sua resposta automática. – Eu sempre quis você. E agora, a realidade de tê-la em minha cama... não tem ideia de como você me enlouquece, Clio. Ele abaixou a cabeça e lambeu um mamilo. Deleitando-se na sensação, Clio agarrou-lhe o cabelo e arqueou-se contra ele, precisando de mais. Com um sorriso, Stefan continuou provocando-a com a boca, enquanto levava uma das mãos para entre suas pernas e recomeçava um fogo ali. Clio estava ofegante. Não havia nada além da sensação de prazer. Nada além de Stefan... os beijos dele, os toques, o corpo quente e as palavras eróticas que ele sussurrava no seu ouvido.
E ela esqueceu todos seus medos, suas dúvidas, quando seu clímax a atingiu em ondas incessantes, causando-lhe a sensação de que tinha sido destruída e refeita. Lágrimas escorreram de seus olhos. Sentindo os olhos de Stefan sobre si, ela abriu os seus e viu a expressão de êxtase no rosto dele. Arfou quando ele puxou-a para seu colo e tomou-lhe a boca num beijo ardente. Mas Clio queria mais, queria ser completamente possuída por ele. Deslizou as mãos pelo peito largo, deleitando-se nos músculos que se flexionavam sob seus toques, na respiração dificultada dele. Descendo as mãos, ela abriu a calça masculina e tocou-o, sentindo a ereção já rija crescer ainda mais em sua palma. Ajoelhando-se, ela passou os braços em volta de Stefan e lambeu-lhe a orelha. – O que mais eu fiz nessa fantasia? – perguntou ela, sentindo-se a mulher mais poderosa do mundo. – Outra hora, bella – sussurrou ele, as mãos quentes acariciando as costas dela. – Agora, Bianco – comandou ela, e abaixou-se para lamber um mamilo reto. As mãos dele se entrelaçaram em seu cabelo, se para segurá-la ali ou para afastá-la, Clio não tinha ideia. Beijando o corpo másculo que a fascinava, ela levantou a cabeça para ver a verdade brilhando nos olhos ardentes. Sorrindo, continuou descendo em sua trilha de beijos. Chegando onde queria, lambeu a cabeça do membro rijo. E foi recompensada por um gemido gutural. Na próxima respiração, Clio segurou a base do pênis e tomou-o na boca. A ação causou umidade entre suas pernas, enquanto Stefan tremia e gemia sob suas carícias. – Agora, eu me sinto com poder, Bianco – sussurrou ela, e, antes que pudesse respirar de novo, estava deitada sobre as costas na cama. – Veremos quem tem o poder, bella – disse ele e colocou-a de quatro. Sem demora, segurou-lhe os quadris e investiu contra seu centro úmido. Fechando os olhos, ela gemeu, enquanto ele estabelecia um ritmo que lhe tirou todos os pensamentos de poder da cabeça. Somente uma sensação permaneceu. Somente os dois permaneceram unidos no mais íntimo dos elos. E, quando ele levou-a à liberação e encontrou sua própria, somente o prazer permaneceu. Sem contratos, sem sombras de velhos medos, nada, exceto o homem que era perfeito para ela. Nada, exceto o homem que despertara cada parte de seu ser. – Eu achei a prova hoje, Stefan – sussurrou Clio, aconchegada nos braços dele. Talvez fosse o fato que, depois de muito tempo, ela se sentisse completamente em paz. Que se sentisse segura de si, da direção que sua vida estava tomando. Mesmo se o futuro ainda fosse um enigma. Talvez fosse o fato que o homem que a abraçava, como se não quisesse soltá-la nunca mais, a tivesse amado de maneira tão espetacular que lhe causara uma falsa coragem.
O que Clio sabia com certeza era que queria contar a ele. Não poderia remover a dor de Stefan por ter perdido um amigo de tantos anos, mas, pelo menos, poderia lhe dar a satisfação de fazer justiça no que dizia respeito a Jackson. Stefan ficou imóvel atrás dela. Tão imóvel que ela imaginou se ele respiraria novamente. – Eu perdi cada centavo que possuía – murmurou ela. – O que, bella? Clio virou-se de lado para olhá-lo. Viu a expressão resignada nos olhos verdes, antes que ele piscasse e esta desaparecesse. E finalmente, ela entendeu. Engoliu o nó de mágoa em sua garganta. Stefan achava que ela havia comentado sua situação financeira para lhe pedir ajuda. Sentando-se, ele ergueu-a, até que ela estivesse sentada ao seu lado na cama enorme. Quando ele fitou-a novamente, não havia nada além de curiosidade. – Do que está falando, Clio? Se você precisa de dinheiro, tudo que precisa fazer é... Clio cobriu-lhe a boca com a palma, antes que ele a ferisse ainda mais. Aquela era a reação automática de Stefan a qualquer questão, de qualquer mulher, no que dizia respeito a dinheiro, ela tranquilizou-se. Pegando-lhe uma mão na sua, ele entrelaçou os dedos de ambos e beijou-lhe a palma. – Clio? Balançando a cabeça para afastar suas dúvidas tolas, Clio sorriu-lhe. – Sinto muito. Eu não tinha registrado direito o que descobri, e falar em voz alta fez isso. Segurando-lhe o queixo, Stefan inclinou-lhe o rosto para cima. – Clio, eu quero honestidade entre nós. Acima de tudo. Foi como isso começou, e é como eu gostaria que continuasse. A mente ansiosa de Clio agarrou-se ao fato de que ele queria que aquilo, o que quer que aquilo significasse, continuasse. Ela estava sobre uma corda bamba nesse relacionamento, entretanto não sentia medo. Tudo que importava no momento era que ele a queria em sua vida, em qualquer posição que fosse. Seu coração bateu descompassado. – É claro. Lembra que eu contei para você e nossos amigos sobre tia Grace, uma vez? – Aquela que odiava seus pais e vice-versa? Sorrindo, Clio assentiu. – Ela sempre foi doce comigo enquanto eu estava crescendo. Faleceu alguns anos depois que vim para Columbia. Eu fui ao funeral de minha tia e descobri que ela me deixou uma pequena herança. Acho que foi o jeito que encontrou de me parabenizar por ter fugido de tudo que meus pais queriam para mim. Stefan sorriu. – Sua tia parece ter sido uma boa pessoa. – Ela era. De qualquer forma, levaram alguns anos para as legalidades ocorrerem, e eu recebi o dinheiro um ano depois que nós nos formamos. Aproximadamente 25 mil libras. Afastando-se, Stefan a encarou.
– Mas se você tinha esse dinheiro, por que pediu emprestado para Christian? Por que não o usou para pagar seu aluguel e seus estudos? – Porque meus pais sabiam que tia Grace me deixara a herança. Minha mãe até comentou que, apesar de todas as declarações que eu tinha feito, estava aceitando esmolas. Então, coloquei o dinheiro num fundo, determinada a me sustentar em Nova York, sozinha. E quando fiquei em dificuldades, foi melhor dever a Christian do que deixá-los saber que eu precisava de ajuda. – Você é uma mulher teimosa, bella. Não bastava ter virado as costas para uma família tão prestigiosa e começado uma vida nova do outro lado do mundo? – Por que você não voltou para seus pais depois que Serena partiu? Por que começar do zero, Stefan? A fúria brilhou nos olhos dele. – Eu não quero falar sobre ela. – Estamos falando do que nos tornou quem somos hoje. – Ajoelhando-se na frente dele, Clio segurou-lhe o rosto. – Estamos falando sobre você e eu, ninguém mais. A tensão era visível nos ombros largos. – Serena me abandonou porque eu não era nada sem a fortuna de meus pais. Ela me fez questionar a crença que eu tinha em mim mesmo. Eu estava determinado a provar que ela estava errada, determinado a fazer a fortuna que Serena queria, por minha conta. Estava tão mergulhado em orgulho e vergonha que magoei meus pais por muitos anos. As feições sofridas de Stefan mostravam como aquilo ainda o afetava. – Depois de todos esses anos, ainda não percebe que a perda foi dela, Stefan? Abandoná-lo porque seus pais o deserdaram, deixar para trás um homem como você... Deus, ele amara tanto aquela mulher não merecedora. Clio nem conseguia imaginar como seria ter um homem como Stefan amando-a daquela forma intensa e incondicional. Ela beijou-lhe a boca, experimentando um misto de desejo e profundo carinho. – Aquela mulher era uma completa idiota, na minha opinião. Um sorriso curvou a boca de Clio. – Tem certeza de que não precisa lavar a boca? – Oh, não me encoraje, Bianco. Poderia ficar muito mais suja, acredite. – Mal posso esperar, bella. Clio riu contra a boca dele, uma onda de alegria inundando-a. Como se fosse tão natural como respirar, Stefan capturou-lhe a boca com a sua. Clio sentiu-se derretendo. Era como se seu corpo soubesse o que ele podia dar e ansiasse por aquilo. Dentro de segundos no beijo ardente, eles estavam ambos ofegando. De alguma forma, Clio tinha subido no colo dele, e estava sentada de pernas abertas contra a ereção viril. Com um gemido, roçou seu sexo contra ele, enviando uma pulsação erótica para seu baixo-ventre. Praguejando, Stefan segurou-lhe os quadris, antes que ela pudesse fazer aquilo de novo. – Por mais que eu deseje estar dentro de seu calor úmido, bella, quero ouvir mais sua história. Com um suspiro dramático, Clio sorriu.
– Oh... negar sexo por uma história... Sua libido e vigor foram supervalorizados pela mídia, Bianco. Ele mordeu-lhe o lábio como punição, excitando-a. – Quanto antes você me contar, mais rapidamente pode me ter, sra. Bianco. – O sorriso de Stefan foi natural, e preenchido com aquela abertura que ele possuíra muito tempo atrás. – Do jeito que quiser. – Certo. Mas não se esqueça de sua promessa. Aquela era a primeira vez que ele sorria depois de uma conversa sobre Serena e o veneno que ela despejara na sua vida. Por aquele sorriso, Clio teria dado todo dinheiro do mundo. Ela abraçou o fato como uma realização orgulhosa. – E quanto ao dinheiro da herança de sua tia Grace, bella? Sabendo que o humor dele pioraria, Clio levantou-se. – Eu conheci Jackson alguns anos depois. Até lá, eu havia colocado o dinheiro numa aplicação que não podia mexer por cinco anos. O prazo acabou depois de um ano que eu o conheci. E Jackson me convenceu a investi-lo em ações de sua financeira. O quarto passou de quente a gelado em questão de segundos. Saindo da cama, Stefan aproximou-se. – E? – Eu desconfiava disso pelo o que ouvi aqui e ali no último ano. E agora, vi a prova. Jackson perdeu quase todo o dinheiro dos investidores. – Esse é um risco que você corre investindo em ações, bella. – Puxando-a para si, ele abraçou-a. – Sinto muito por você ter perdido o dinheiro que sua tia lhe deixou. E por ele tê-la enganado de tantas maneiras. – O problema não foi meu investimento arriscado. Porque, na verdade, este deveria ter crescido muito. – Ela foi para seu quarto e pegou os arquivos. Stefan estava indo para a cozinha, então Clio colocou-os sobre a mesa. Após alguns segundos manuseando os papéis, ele fitou-a com fúria nos olhos. – Estes registros mostram que seus investimentos tiveram retorno de quase cinquenta por cento. Mas a verdade é que Jackson perdeu todo o valor? Ele está fronteando os fundos de algum outro lugar? – É o que parece – sussurrou Clio. Instantaneamente, ela foi erguida do chão num abraço de urso. – Você conseguiu, bella. Achou a prova. – Colocando-a no chão, ele segurou-lhe o rosto. – Isso é tudo que precisamos para expô-lo. Jackson não vai se recuperar desta. – Isso não parece uma realização, Stefan. Sinto-me enojada. Tudo que ele fez, tudo que me disse... era uma grande mentira. Como eu pude um dia... Ela ficou surpresa quando ele sentou-se numa cadeira e puxou-a para seu colo. Beijou-lhe a testa e aninhou-a no seu abraço. – Psiu... A vergonha é dele, Clio. Não sua. Aquele era um lugar do qual Clio nunca queria sair, e o desejo era tão profundo que ela tremeu.
ABRAÇANDO CLIO enquanto ela tremia, vendo a dor no lindo olhar se abater quando ele beijou a curva de sua boca, Stefan finalmente se sentiu em paz, depois de muito tempo. Estranho, uma vez que ver seus pais depois de tantos anos, falar sobre sua vergonha e culpa com seu pai e fazer amor com Clio, o dia deveria ter sido uma montanha-russa emocional. Todavia, o que Clio descobrira sobre Jackson, o fato de que ele finalmente tinha a chance de fazê-lo pagar pelos erros que cometera com tantas pessoas, liberara alguma coisa em seu interior. Stefan não conseguia mais ficar zangado pela interferência de Clio. Em vez disso, sentia-se grato. Com as ações dela, Clio apenas lhe mostrara quanto poder ele tinha dado à rejeição de Serena sobre sua vida. Contudo, lá estava ela, lutando para se encontrar novamente, depois que Jackson lhe roubara tanto. Diante da força de Clio, Stefan sentiu um pouco de sua própria amargura se derreter. Erguendoa, carregou-a de volta para o quarto dela, deleitando-se na percepção de que uma pequena parte sua podia confiar numa mulher novamente. Apesar do jeito que o casamento deles começara, parecia que ele tinha uma esposa que usava seu nome com cuidado, honra e dever.
CAPÍTULO 12
DUAS SEMANAS depois, Stefan e Clio chegaram a Gazbiyaa, o reino deserto de Zayed, na noite anterior que o casamento de Zayed aconteceria. O lugar deserto brilhava com o pôr do sol, uma beleza de tirar o fôlego, um refúgio luxuoso no meio da paisagem perfeita do deserto. Stefan e ela estavam instalados numa suíte numa ala do palácio que era distante das festividades do casamento e proporcionava privacidade, assim como Rocco e Olivia e Christian e Alessandra. Com Stefan tendo ido conversar com Rocco e Christian, e ainda se sentindo um pouco frágil para encarar as outras mulheres, Clio fez um tour pelo palácio de Gazbiyaa com um grupo de criadas... ao menos pelas partes que podia ir sem infringir os costumes de um reinado agarrado as suas raízes tradicionais. Um reinado cuja guerra com a nação vizinha Zayed estava determinado a impedir. Para todo canto que ela olhava, festividades estavam acontecendo. Na noite seguinte, juntamente com a esposa de Rocco, Olivia, e Alessandra, que começava a mostrar a barriga de grávida, Clio visitou Nadia, a noiva de Zayed. Mesmo enquanto Stefan e ela estavam participando do casamento extravagante de Zayed, Jackson estava sob investigação em Nova York, pela Comissão de Títulos e Câmbio Americana. A culpa que ela sentira inicialmente diminuíra cada vez mais, conforme as falcatruas de Jackson eram descobertas. Movido por ganância, ele espoliara tanta gente. Sob a orientação experiente de Stefan em todas as coisas relacionadas a instituições de caridade e suas finanças, Clio estava tendo sucesso no seu trabalho. Quando ele a olhava agora, era com admiração e respeito. Ela realizara tudo que se propusera a fazer quando entrara na suíte dele no Chatsfield com sua vida em caos. Por mais que tivesse temido arruinar o frágil relacionamento deles, fazer amor com Stefan era o caminho mais natural que eles poderiam ter tomado. Mais de uma semana se passara, onde eles haviam se conhecido, explorado um ao outro, onde Stefan a seduzira tão completamente que Clio se sentia uma nova mulher, livre para abraçar seus desejos.
E quanto mais se sentia ela mesma com Stefan, mais ele a unia a si com os próprios desejos. Às vezes, ele a acordava com beijos e a amava com tanta ternura que Clio se emocionava. Outras vezes, o desejo dele era voraz e descontrolado, como a vez que ele a tomara contra a parede do hall, depois de voltar do enterro de Marco. Eu preciso tanto de você, bella, que uma semana pareceu uma vida inteira. Nessas ocasiões, ela sentia que não seria capaz de respirar, se ele parasse. Clio lhe suplicara para acompanhá-lo ao funeral de Marco, querendo compartilhar a dor do momento com ele. Mas Stefan negara teimosamente. Era como se ele pudesse se comunicar com ela apenas através do sexo. Agora, enquanto se arrumava para o casamento de Zayed, Clio tremeu quando a túnica de seda dourada deslizou sobre sua pele como uma carícia, imaginando Stefan removendo-a. Tudo a fazia pensar e lembrar-se de Stefan. Era como se ele tivesse se tornado uma parte permanente sua. Entretanto, ele não dava nada de si mesmo que não queria dar. Enquanto eles testemunhavam o casamento de Zayed, no meio da celebração extravagante, no meio de acres de jardim e banquetes como ela nunca vira, Clio finalmente localizou a raiz do pânico em seu interior. Era a incerteza do que o amanhã com Stefan traria. Contudo, ela não ousava perguntar-lhe sobre o futuro dos dois. Não suportaria ouvi-lo dizer que estava tudo acabado. Ainda não. Como de costume, seu traje chique para o casamento tinha sido arranjado conforme era adequado para a posição da sra. Bianco. Ele lhe daria tudo, mas lhe daria pelo menos um pedacinho de seu coração? Por quanto tempo ela estava disposta a conviver com essa incerteza? E como, novamente, encontrava-se naquele mesmo lugar onde a felicidade dependia dos caprichos de um homem, e de um que a avisara que não possuía nada para lhe dar? STEFAN GUARDOU no bolso o maço de papéis que coletara da impressora no escritório de Zayed e saiu no enorme jardim na frente do palácio de Gazbiyaa. As façanhas mais extraordinárias estavam sendo apresentadas em honra do casamento de Zayed, entretanto, a excitação que Stefan experimentava era mais estranha do que qualquer coisa que ele tinha visto. Pela primeira vez em anos, sentia que poderia ter um tipo diferente de vida, sentia que Clio seria capaz de preencher o vazio que ele estivera determinado a ignorar. Enterrar Marco, que tivera um futuro longo e maravilhoso pela frente, o fizera pensar sobre sua própria vida. Jamais poderia amar Clio, ser o homem que acreditava no amor. Mas queria um futuro com ela. E apenas a perspectiva de levar sua esposa para casa e fazer amor com ela na cama deles... era a melhor coisa pela qual ele ansiara em muito tempo. Avistando-a, Stefan entrelaçou os dedos nos dela. – O clube dos rapazes foi despachado pela noite? – perguntou Clio com um sorriso.
Ele assentiu, sem se incomodar em esclarecer que não estivera com Rocco ou Christian. Ou que passara o dia no escritório de Zayed, num telefonema com seu advogado. Ou que não dormia bem há mais de uma semana, decidindo o que fazer. Puxando-a para seu lado, Stefan descansou uma mão no quadril dela quando o céu explodiu num milhão de cores. Um coro de risadas e gritos irrompeu da multidão. – Foi difícil encontrá-la depois da cerimônia, bella. Quase como se você estivesse me evitando. Aos poucos a tensão do corpo de Clio dissolveu-se. Levantando uma mão, ela afastou uma mecha de cabelo da testa dele. O gesto íntimo tocou um ponto vulnerável de Stefan. Ela recolheu a mão e olhou ao redor. – Eu só queria um tempo para pensar. Stefan enganchou os braços de ambos e afastou-a das festividades. Quando ela hesitou, ele virou-se para olhá-la. E não gostou da cautela que viu nos olhos verdes. Sabia que aquilo era por sua causa, porque ele a mantivera a distância nas últimas duas semanas. – Eu disse a um guarda que estava procurando uma mulher com cabelo da cor do fogo, olhos cor de esmeraldas e pele rosada. Disse-lhe que ela era a mulher mais linda da festa, vestida numa túnica dourada que flutuava com cada passo que ela dava, e que parecia uma rainha. Balançando a cabeça, Clio riu. – Elogios não o levarão a lugar algum comigo, Bianco. E é Nadia que é a sheika entre nós. Eu sou pobre, lembra? – O guarda me lembrou sobre a parte de Nadia. Mas falou que entendia por que eu tinha chegado a tal conclusão. Então, ele me apontou você. Quando eles chegaram a uma das tendas que estavam erguidas longe da celebração, ela parou. – Venha, bella. Eu quero lhe mostrar uma coisa. – Eu já vi isso, Bianco. E apesar de concordar que é espetacular, não acho que uma tenda no meio da multidão festiva seja o lugar para fazer o que você tem em mente. Ele deu uma gargalhada, então, ergueu-a nos braços e carregou-a para dentro da tenda. Assim que Stefan colocou-a no chão, Clio estudou as redondezas. As paredes internas eram decoradas com luxuosos tapetes persas e sedas inestimáveis. Divãs baixos, cobertos com almofadas coloridas ocupavam três lados. No quarto, havia uma cama de quatro colunas com um véu ao seu redor. UMA IMAGEM de Stefan e ela na cama instantaneamente preencheu sua cabeça, despertando-lhe desejo. Ao mesmo tempo, alguma coisa a fez recuar diante da ideia. Ela rira sobre aquilo do lado de fora, mas, por dentro, estava tremendo de raiva e sentindo uma impotência que detestava. Virou-se e encontrou o olhar de Stefan. O desejo nele instantaneamente esquentou sua pele. Quando ele envolveu-a nos braços, o corpo de Clio automaticamente ansiou por mais. Todavia, outra emoção emergiu, poluindo o desejo. Deus, ela tentara tão arduamente não pedir nada dele. Manter-se distante, não definir o relacionamento entre os dois.
Desgostosa consigo mesma, Clio afastou-se. Ele a estudou. – Clio, há algo errado? – Não. Sim. Detesto o que você está fazendo comigo. Detesto o que eu estou deixando você fazer. Detesto ser incapaz de dizer não quando você me toca. Stefan franziu o cenho. – Você está fazendo isso bem agora, bella. – Não posso me tornar a sombra de mim mesma, novamente, Stefan. Ou você quer esta coisa entre nós, ou não quer. – É só nisso que tenho pensado nas últimas semanas, Clio. Um maço de papéis materializou-se na mão dele. Era um contrato, ela sabia. Outro pedaço de papel que definiria sua saída da vida dele. E o mero pensamento de sair da vida de Stefan lhe causou uma dor tão profunda que ela tremeu. Oh, Deus, como tinha se apaixonado? De onde vinha esta avalanche de emoções? Como era possível que ainda possuísse tanta capacidade de sentir? Como era possível que, depois de tudo que passara com Jackson, rendesse seu coração para um homem ainda mais implacável? Como sobreviveria agora? Clio sentou-se num dos divãs, um buraco se abrindo em seu peito. Quando Stefan se acomodou ao seu lado, ela encolheu-se. – Fale de uma vez, Stefan. – Olhe para mim, bella. – Não. – Ela fechou os olhos. Não suportaria trair seus sentimentos, não suportaria o olhar de piedade dele. Não suportaria que ele soubesse como ela se apaixonara. Os dedos longos tocaram seu queixo, e Clio os empurrou. – Diga onde quer que eu assine, Stefan. Prendendo-lhe os braços, ele ajoelhou-se na sua frente. – Olhe para mim, Clio. Não é o que você pensa. Chocada, Clio o fitou. O olhar de Stefan tocou-a com um desejo tão honesto que seu coração doeu. Doía olhar para ele, tocá-lo, sentir seu coração e saber que ele nunca seria seu. – O que você quer dizer? – Quero que nós recomecemos, bella. Quero tentar este casamento para valer. Com o coração disparado violentamente, ela forçou as palavras: – Qual é a condição? O que são esses documentos? – perguntou ela, apavorada pela possível resposta, mas com esperança de que ele dissesse que não havia condições. Que tudo o que necessitava era da aceitação dela. Que tudo o que eles precisavam era de tempo, juntos. E Stefan esmagou sua esperança ao responder: – Você ganha quinhentos mil dólares quando assinar isto.
– Quinhentos mil dólares? Eu não entendo. – Independentemente do que aconteça no futuro, eu quero que você tenha segurança. Quero que... – Então, você não espera que nosso relacionamento dure? – Nada na vida é garantido, bella. Com náusea subindo à sua garganta, Clio estudou-lhe o rosto, imaginando se ele estava brincando. Rezando para que aquilo fosse um pesadelo do qual ela acordaria. Porque isso não podia estar acontecendo, podia? Outro homem estava medindo seu valor, equacionando seu amor com dinheiro? – Eu não entendo, Stefan. Você quer me pagar, de modo que possa comprar a confiança que aparentemente não tem em mim? Como os casais de celebridade que fazem acordos pré-nupciais para proteger seus bens um do outro? – Você não tem bens. – Exatamente. Então você está se protegendo? Ele praguejou. – Você está entendendo tudo errado. Eu rasguei o contrato anterior. Detesto como Jackson a traiu. Quero que você nunca se preocupe com... – Depois de uma década me conhecendo, você realmente acha que tudo que eu quero é uma carona de graça pela vida? – Não. Isso é algo que eu quero que você tenha, para minha própria paz mental. Clio meneou a cabeça, entendendo. Furiosa, levantou-se do divã. Era tão fácil pensar que aquilo era culpa sua, tão fácil pensar que Stefan estava fazendo isso porque Clio não tinha dinheiro, pensar que ele não confiava nos seus motivos, nela. Aquilo não era sobre ela, em absoluto. Stefan a conhecia melhor do que qualquer pessoa no mundo. Mas o pensamento libertador apenas deu lugar à outra verdade dolorida. – Quinhentos mil dólares... este é meu preço, Bianco? Porque tenho certeza que, se você tiver uma conversa com Jackson, ele lhe dirá que eu posso ser comprada por muito menos. Pura fúria brilhou nos olhos de Stefan. Ele segurou-lhe os braços com força, uma veia pulsando na têmpora. – Não ouse falar como se Jackson e eu fossemos o mesmo tipo de homem, bella. Não ouse se desvalorizar. – Então o homem sangra – ironizou Clio. – Pare de distorcer minhas palavras. Ela pegou o contrato e jogou-o no chão, com lágrimas escorrendo por suas faces. – Você ainda não entende, não é, Stefan? Este é o preço por tudo que nós compartilhamos, de nossa vida, juntos, da qual está falando. Você está me comprando, comprando minha afeição, manchando cada palavra que eu lhe diria, atando uma etiqueta de preço até mesmo ao sexo que temos. – Basta, Clio! Você está entendendo tudo errado. Ela balançou a cabeça.
– O mais triste é que você nem mesmo percebe isso. Está me dando dinheiro, porque assim, qualquer coisa que eu lhe oferecer, você já tem uma razão para isso. Porque não tem de aceitar nada que eu lhe der. – Não, bella. – Os olhos verdes esfriaram. – Você disse que não queria nada de mim. E eu disse que não quero nada de você. Tudo que eu gostaria era que você quisesse que nosso casamento fosse de verdade, que quisesse pelo menos tentar e ver onde poderíamos ir daqui. – Isso é o que eu quero, também. Muito – murmurou ela. – A coisa terrível é que estou tão ansiosa, tão tentada a assinar esses benditos papéis, a aceitar as migalhas que você joga para mim. Tão... tão apaixonada por você que estou disposta a aceitar qualquer coisinha que me der. Quão patético é isso? Afastando-se, Stefan pareceu como se tivesse sido golpeado. Como se não suportasse a confissão dela. Como se nunca mais quisesse vê-la. E foi aquela expressão apavorada no olhar dele que selou seu destino para Clio, que destruiu seu último fio de esperança. Ele nunca aceitaria seu amor. Nunca lhe daria sua confiança. – Você não está apaixonada por mim. Está se iludindo, como todas as outras mulheres com quem dormi antes. Eu lhe avisei sobre isso, bella. Aquelas palavras foram como um corte em seu coração, dilacerando-a. O fato de Stefan estar jogando o próprio passado no rosto dela, de estar manchando ambos e o que eles haviam compartilhado, apenas mostrava como a declaração dela o irritara, como o coração dele estava inacessível. Clio desejou que pudesse odiá-lo por aquilo. Mas tudo que sentia era uma tristeza profunda. – Eu não achei que pudesse me sentir assim novamente, que algum dia fosse querer colocar minha felicidade nas mãos de outro homem. Mas não é culpa minha. Mesmo com o bloco de gelo que você tem no lugar do coração, mesmo com o veneno ao qual vem se agarrando por todos esses anos, você é gentil, divertido e o homem mais honrável que já conheci. Ele encolheu-se, como se ela o tivesse golpeado novamente. – Isso prova que você ainda está perdida, Clio. – Não. Eu finalmente me conheço, Stefan. – Como pode esquecer a dor que Jackson lhe causou? Como sabe que o que você alega... é real? – Colocando um valor em você e em mim, na nossa felicidade, juntos, você me mostrou como eu sou inestimável, como meu amor por você é consumidor. E quão pouco este amor sempre significará para você... Como poderíamos fazer isso pela próxima década, e você continuaria não me dando o que eu quero, o que eu mereço. – Você é meu cavaleiro, Bianco, mais uma vez me salvando de meu próprio desespero. É o melhor amigo que uma garota poderia ter, o melhor amante para uma mulher com baixa autoestima. Mas passar uma vida ao seu lado... irá me destruir. Os olhos de Stefan escureceram. – Não faça isso, Clio – disse ele, agarrando-a e dando-lhe um beijo tão feroz que quase dissolveu a resolução dela. – Nós podemos levar uma vida boa, juntos.
Segurando-lhe o rosto, Clio o afastou, estudando os olhos verdes. Ele não estava intocado por aquilo. Mas isso não era o bastante. Nem de perto. Ela o queria inteiro. – Não. – Fique, bella. – Mesmo agora, ele comandava com aquele olhar duro, mesmo agora, mantinha o coração trancado. Mesmo agora, ralhava com Clio, porque ela ousara se apaixonar por ele. Sorrindo através das lágrimas, Clio meneou a cabeça. – Eu teria ficado, algumas horas atrás. Eu teria dançado de alegria, me atirado nos seus braços. Mas não posso, agora. Não quero seu dinheiro, e não quero o pouco que você oferece de si mesmo. Tenha uma boa vida, Stefan. E obrigada por me mostrar meu próprio valor. Sem olhar para trás, Clio saiu da tenda e foi para o campo aberto. Um milhão de sons e cheiros a cumprimentaram, mas nada podia abalar sua esperança de que ele a seguiria, que a abraçaria e diria que tudo ficaria bem. Que ele queria ser amado por ela. Mas Stefan não fez isso. E o vazio a sua volta fez Clio perceber o quanto queria aquilo. Queria o Stefan que admitira ter um sentimento louco e impulsivo por ela. Queria o Stefan que a admirava e a respeitava. Queria o Stefan que tinha sido um dos homens mais carinhosos e mais abertos que ela já conhecera. Queria perder-se nos braços dele e ser a mulher com quem ele perdesse o controle. Queria ser a mulher que o fizesse sorrir, e rir por muitos e muitos anos. Queria que eles fossem amigos, amantes e muito mais. Queria o contrato rasgado e queimado, queria que os milhões de Stefan e sua penúria nunca entrassem na equação entre eles. Queria que fossem apenas os dois e o amor que sentiam um pelo outro. E seu desejo era tão intenso que lhe causava dor física. Mas desta vez, ela não se contentaria com pouco. Não permitiria que um homem, mesmo o homem que amava com cada fibra de seu ser, definisse seu valor. Porque ela merecia Stefan inteiro. STEFAN ESTAVA sentado no divã, pensando nas acusações de Clio, pensando na confissão dela. Tão apaixonada por você... Como ela podia amá-lo? Como ele poderia começar a acreditar em Clio, quando não havia nada para amar, quando ele não lhe dera nada, exceto sofrimento? Como ela podia arruinar tudo, levando aquela palavra entre eles? O amor de Clio não lhe bastava. Ele não tinha nada para lhe dar em retorno. E a única coisa que quisera lhe dar, o gesto que fizera porque se importava com ela, Clio jogara fora no seu rosto. Por que ela deixara que aquela declaração destruísse o que eles tinham? Stefan gostaria de pensar que aquela havia sido uma explosão de raiva porque ele a ofendera, oferecendo-lhe dinheiro.
Mas Clio nunca tinha explosões de raiva, e não tinha fascinação por sua riqueza. Clio não dava indiretas para presentes, não pedia para ser apresentada aos seus amigos poderosos. Não flertava com outros homens para deixá-lo com ciúme. Clio não usava sexo como barganha. Em poucas semanas, ela o fizera rir mais do que ele rira numa década. Ele vivera mais, e, pela primeira vez em anos, fizera amor com uma mulher, em vez de procurar liberação física. Clio era totalmente diferente de Serena. Clio era Clio... generosa, amável e vibrante. Era a primeira mulher, além de sua própria mãe, que se importava com a felicidade dele. Clio andara pelo fogo de sua desconfiança e da traição de Jackson e emergira inteira. E ele... Dio, ele a tratara pior do que tratara qualquer mulher em sua vida. Punindo-a pelos seus próprios demônios, fazendo-a sofrer por causa de suas próprias inseguranças. Porque, de alguma maneira, Clio tornara-se um espelho no qual Stefan via o que se tornara. Ele desprezou a imagem que viu de si mesmo durante as últimas semanas. Porém, era tarde demais. Stefan enterrou a cabeça nas mãos e gemeu, com um abismo de dor o consumindo. A tenda reverberava com as palavras dela, com a pureza das emoções de Clio. Com sua própria solidão, sua grande frustração. Ele fizera exatamente o que Zayed previra. Arruinara a coisa mais maravilhosa que tinha entrado na sua vida, destruíra, com suas próprias mãos, qualquer chance de felicidade. Stefan não fora capaz de dar a ela nem mesmo uma pequena parte sua. Não fora capaz de aceitar o amor e a generosidade de Clio. Ainda não era. Não podia dar esse passo e se abrir para dor e agonia, novamente. Não era por isso que havia lhe oferecido o acordo, em vez disso, mesmo se tivesse percebido que era tarde demais? Mesmo depois de todos aqueles anos, mesmo quando encontrara a mulher perfeita, a mulher com quem sonhara por toda sua adolescência, a mulher que teria amado pelo resto de sua vida, ainda não podia dar o passo final, encontrar a coragem para ser o homem que entregasse seu coração.
CAPÍTULO 13
QUASE DOIS meses depois, Stefan estava no meio de uma reunião em seu escritório de Hong Kong, quando seu notebook avisou uma mensagem. Ainda ouvindo seu contador falar sobre os negócios asiáticos deles, ele olhou para a tela e franziu o cenho. O e-mail era da esposa de Zayed, a sheika de Gazbiyaa. Perguntando-se o que Nadia poderia ter lhe enviado, Stefan clicou no anexo. E seu coração disparou violentamente. Era uma fotografia sua com Clio na manhã do casamento de Zayed, que alguém devia ter tirado sem o conhecimento deles. Eles estavam de pé num dos terraços do palácio de Gazbiyaa, o sol matinal atrás de seus corpos. Ele lembrou-se do momento, instantaneamente. Rocco e Olivia, Christian e Alessandra, ele e Clio e Zayed haviam acabado de tomar café da manhã. Clio fora para o terraço, para onde Stefan a seguira. Ele lhe cobrira os braços desnudos, enquanto o aroma dela lhe roubava o fôlego. A mera lembrança lhe causou uma onda de desejo feroz, e Stefan fechou os olhos. Ela não se encolhera ou recuara quando ele a tocara naquela manhã. Aninhando-se ao seu corpo, Clio o olhara e sorrira. Ele abriu os olhos e estudou a foto, novamente. E a foto tinha capturado aquele sorriso. Não houvera hesitação, nem artifícios ali. Tudo o que ela sentia por ele... estava naquele sorriso. Um sorriso que falava de amor, de coragem e de alegria. Falava tanto sobre a intimidade deles, sobre quão gloriosamente perfeito aquele momento tinha sido na sua vida. A vida com Clio seria repleta de tais momentos indescritíveis... de amor e felicidade. Naquele instante, que Stefan experimentava um misto de impotência e desejo, ele percebeu o quanto a amava. Como faria qualquer coisa para assegurar que Clio sempre lhe sorrisse daquele jeito. Como se ele tivesse sido atingido por um raio, lavando o veneno que o consumira por tanto tempo, abrindo a dor em seu interior como uma avalanche.
E aquele sorriso, aquele amor que brilhava tão lindamente nos olhos dela, era o que ele jogara fora. As vozes ao seu redor pareciam vir de muito longe. A vista do quadragésimo andar desapareceu, enquanto ele lutava para respirar. A dor em seu peito, o medo em seu âmago, era tão visceral que Stefan levantou-se num sobressalto. Aquele momento trazia à superfície todo o vazio que ele sentira durante os últimos dois meses. Clio o banira de sua vida com tanta determinação que até ele ficara impressionado. Em dois meses, Stefan só ouvira sobre ela uma vez... através de um e-mail que havia lhe roubado qualquer esperança. Não volte para Nova York, por favor. Este é meu lar. Se você me valorizou algum dia, deixe esta cidade para mim. Deixe-me em paz, Stefan. E assim ele fizera. Contra sua própria natureza, ele a deixara para enfrentar a mídia. Deixara o casamento deles naquela situação incerta. Como seu império estava espalhado pelo mundo inteiro, tinha sido fácil ficar longe. Stefan não sabia se ela queria o divórcio. Ele não se importava. Enterrara-se no trabalho e passara 56 dias num inferno de sua própria criação, ansiando por ouvir a voz dela, ver-lhe o sorriso, imaginando se algum dia beijaria aquela boca novamente, ouvindo algumas informações de Clio através de Olivia, quem, ele tinha a impressão, adoraria vê-lo sofrer. Clio estava prosperando em sua nova posição na instituição beneficente. Ela fora chamada pela Comissão de Títulos e Câmbio para prestar depoimento no caso contra Jackson. Ela parecia bem. Cada dia, Stefan sentia-se um pouco mais quebrado por dentro, até que não havia nada. Mas não poderia continuar sendo covarde, não poderia aguentar outro dia sem vê-la, sem segurá-la em seus braços. Quão perdido ele estivera por colocar um preço em seu coração? Clio estivera certa sobre tudo. Ele lhe dera tudo, exceto a si mesmo. E a mulher na qual ela se transformara nos últimos meses não se contentaria com nada menos do que tudo dele. Stefan devia ter dito alguma coisa, porque, de repente, a sala de reuniões estava vazia ao seu redor. Pegando seu celular, ele deu um telefonema, seu coração batendo descompassado. Com voz sonolenta, Rocco atendeu. – Stefan? – Onde ela está, Rocco? – perguntou ele, sem preâmbulos.
Seu velho amigo entendeu imediatamente. – Em Nova York. – Eu sei disso. Mas onde? Sei que Olivia sabe. Sei que Clio a procurou. Eu preciso vê-la, Rocco. Agora. Depois do que pareceu uma eternidade, Rocco suspirou. – Sinto muito, Stefan. Acredite ou não, minha esposa teimosa não me contou onde Clio está. – Por que não? Ela é sua esposa. – Porque ela leva amizade a sério. Se você quer saber onde Clio está, terá de perguntar a Liv. Stefan... cuide-se, fratello. Stefan mal ouviu o aviso de Rocco. Em dois minutos, instruiu seu piloto para abastecer o avião, ordenou que sua secretária cancelasse todos os seus compromissos, indefinidamente. Nada em sua vida tinha significado sem Clio. Precisava de sua esposa, sua amiga, sua amante de volta. Precisava da mulher que o fizera se sentir vivo de novo, sorrir de novo. E ele suplicaria, se isso fosse necessário para trazê-la de volta a sua vida. ENQUANTO CLIO olhava para Stefan, parado na soleira da amiga de Olivia, o rosto cansado e com barba por fazer, os cabelos desalinhados e o colarinho amassado, seu mundo inteiro pareceu tremer. Sua respiração ficou presa na garganta. Ela uniu as laterais de seu cardigã, defendendo-se do olhar ávido e invasivo dele. Sem uma palavra, Stefan entrou no flat, fechou a porta e andou silenciosamente através do pequeno espaço. Clio entrou em pânico quando ele pegou a caixa de papelão que ela descartara, descuidadamente, sobre um dos sofás. A raiva brilhou nos olhos verdes, antes de transformar-se em fúria, depois em impotência. Ele girou a caixa nos dedos diversas vezes. – Quando você fez o teste? – perguntou ele, o tom de voz sofrido, enquanto amassava a caixa na mão. – Ontem de manhã. Um gemido baixo escapou dos lábios dele, o choque cobrindo-lhe as feições. – E? Clio engoliu em seco e, instantaneamente, envolveu os braços ao redor de sua barriga ainda reta. Esperara que ele lhe desse uma demonstração daquele temperamento siciliano explosivo. Esse óbvio conflito silencioso perturbava-a em muitos níveis. – Deu positivo. Marquei uma consulta no médico para daqui a dois dias, a fim de confirmar, mas... eu estou grávida. – E não pensou em me contar? – veio a resposta instantânea. Ele andou pelo pequeno espaço, praguejando. Parou muito perto dela, as feições contorcidas em agonia. – Dio, Clio... Você teria escondido isso de mim, se eu não tivesse vindo hoje? Com as mãos nos bolsos da calça, ele virou-se de costas. Como se não suportasse vê-la. A tensão em Stefan aumentou o pânico de Clio.
Ela sabia que aquele último fio do controle dele havia sido rompido, que a última parte da armadura fora quebrada. Sabia que ele estava ferido e que atacaria a qualquer momento. Sabia o que família e filhos significavam para seu sangue siciliano. Sabia que, sob a concha dura que Stefan adquirira ao longo dos anos, havia uma vulnerabilidade, com a qual ele uma vez quisera amor, família e alegria em sua vida. Sabia que ele seria um pai fantástico. Sabia que ela já estava enfraquecendo, depois de encarar a verdade sobre a gravidez, e vê-lo tão de perto, lembrando como tinha sido bom entregar-se a ele... Stefan era o homem que ela adorava com cada fibra de seu ser. Era o homem que lhe ensinara a ser forte, que lhe mostrara do que ela era feita. Ele lutaria pela custódia, Clio sabia. Faria o que considerava certo pelo filho deles. Ele a amarraria em cláusulas e contratos, usaria o fato de que Clio não lhe contara imediatamente, para uni-la a ele. Para conseguir o que quisera dois meses atrás. Apesar de abominar a ideia de sujeitar seu bebê a pais separados que moravam em partes opostas do globo, Clio tomou sua decisão como a mulher que ele a ajudara a se tornar. Era melhor que o bebê tivesse dois pais que o amassem, em vez de uma mãe que estaria em agonia para sempre, vivendo com o homem que jamais corresponderia ao seu amor, uma mãe que facilmente se tornaria uma sombra de si mesma. Clio endireitou a coluna e encarou-o. Esperou que a batalha mais difícil de sua vida começasse. – Não. Eu não teria escondido isso de você. Mas – ela engoliu as lágrimas –, eu teria me dado duas semanas para me preparar, primeiro. – PREPARAR-SE PARA quê? – perguntou Stefan, achando insuportável encontrar-lhe os olhos. Como as palavras dela machucavam! A negação de Clio não lhe trouxe o menor alívio. Ela teria tomado duas semanas para se preparar... O fato de que ele a levara àquilo lhe causava uma dor torturante. Stefan virou-se, incerto do que ia dizer, e parou. Com a mão aberta sobre a barriga, os olhos verdes brilhando com carinho e determinação, ela o encarou. O delicado lábio inferior tremia. Aquela era a visão mais linda do mundo, fazendo-o pensar, mais uma vez, o quanto amava esta mulher. Que felicidade ela ser a mãe de seu filho... – Por favor, me responda, Clio. Preparar-se para quê? – repetiu ele, fechando as mãos em suas laterais para se impedir de tomá-la em seus braços. Ela deu de ombros, mas o olhar era cauteloso. – Eu sabia que se tivesse lhe contado imediatamente, você chegaria armado até os dentes com cláusulas e contratos. Que iria querer este bebê e eu, e a coisa toda da família. Que me seduziria para sua vida e me convenceria que isso era para o bem de todos. Por mais triste que pareça, eu preciso fortalecer minhas defesas contra você. – Você acha que eu irei uni-la a mim em nome do nosso filho? Acha que eu sou tão sem coração assim, Clio? Lágrimas escorreram pelas faces de Clio.
– O que eu deveria pensar, Stefan? Dois meses se passaram e você não me ligou uma única vez. Dois meses nos quais me perguntei se eu algum dia o veria de novo. Dois meses nos quais cada minuto parecia uma eternidade. Dois meses nos quais eu lutei contra a vontade de procurá-lo, de implorar que você me aceitasse de volta de qualquer jeito que quisesse. Ele pegou-lhe as mãos, querendo que ela o entendesse. – Eu a feri tanto naquele dia. Não conseguia me olhar no espelho, pensando no que tinha arruinado. No minuto que você saiu, percebi o que havia feito, como estava errado. Tenho me perguntado se algum dia eu poderia desfazer o que fiz. Temia magoá-la ainda mais, depois de tudo pelo que você passou, Clio. Fico apavorado de pensar que talvez eu nunca seja digno de você, bella. Stefan ajoelhou-se a sua frente, passou os braços ao redor dela. Abaixou a cabeça, enterrando-se no calor de Clio, o amor que sentia por ela envolvendo-o. E, mesmo enquanto tremia diante do pensamento que talvez a tivesse perdido para sempre, podia sentir como se tudo tivesse finalmente em seu lugar. Lutando por controle, ele puxou-a para si e beijou-a. – Stefan? – sussurrou Clio. Havia tanta dor e esperança naquele sussurro que o abalou. Ele levantou a cabeça e encontrou-lhe os olhos verdes, extravasando suas emoções em palavras: – Eu estou desesperadamente apaixonado por você. Por cada célula do seu corpo. Com cada célula do meu ser. Vim a você hoje, com nada, exceto meu coração nas mãos, Clio. Tudo que quero é ser parte da sua vida, uma chance para lhe mostrar o quanto eu a adoro. Cada momento de minha vida, cada decisão que já tomei... me transformou nisso. Mas eu também trouxe a mim mesmo para você, bella. Apesar do patife que sou hoje, sou todo seu. Ajoelhando-se, Clio o abraçou. – Oh, Stefan... E no momento que Stefan pensou que não pudesse sentir mais dor, o som sofrido que ela emitiu o dilacerou. Stefan puxou-a para seu colo. Enterrou o rosto no cabelo exuberante e inalou. Esforçou-se para ser o homem digno da mulher corajosa e generosa que sua linda esposa era. – Por favor, Clio, não chore. Eu não irei desafiá-la por causa de nosso filho. Irei embora, assinarei qualquer papel que você quiser que eu assine. Tudo que quero é a sua felicidade, mesmo se o fato de ficar longe de você me mate. Encontrando-lhe o olhar, ela descansou a testa contra a dele. – Você realmente me quer? A mim, e não apenas à mãe de seu filho? Detestando que ela duvidava dele, detestando que lhe dera motivo para isso, Stefan abraçou-a. – Eu vim hoje porque não suportava mais ficar longe de você, Clio. Não conseguia respirar diante do pensamento de nunca mais vê-la sorrir. – Ele deslizou a mão para a barriga dela, arfando. – O fato de que você... está carregando parte de mim aqui dentro... é mais do que desejei nos meus sonhos mais loucos, bella. Será minha esposa de verdade, Clio, e me ajudará a ser novamente o homem que você merece? – Você já é tudo que eu sempre desejei, Stefan. Conhece-me melhor do que qualquer pessoa no mundo. E cuida de mim. Você me ama mais do que qualquer pessoa já me amou, mesmo se me
destruiu por um tempo. – Lágrimas encheram os olhos verdes e escorreram. – Amar você, de alguma maneira, apenas me tornou mais forte. O coração de Stefan batia aceleradamente no peito e seus olhos estavam marejados. – Eu a amo tanto, bella... Senti tanto sua falta... era como se uma parte minha tivesse desaparecido para sempre. Promete que nunca mais vai me deixar? Mesmo se eu cometer um erro, você promete que vai lutar por mim? Balançando a cabeça, Clio cobriu-lhe a boca com uma de suas mãos. Depois, entrelaçou ambas no cabelo dele e puxou-o para si, beijando-o longa e apaixonadamente. – Tudo que eu quero é meu amigo, meu amante e meu marido de volta, Stefan. Tudo que quero é o homem que me tornou o melhor que posso ser. E se nós cometermos erros, iremos discutir e gritar, mas sempre encontraremos nosso caminho um para o outro novamente. Stefan abraçou-a mais apertado. Com Clio ao seu lado, não haveria nada além de felicidade no futuro. Acariciando o cabelo dela, ele beijou-lhe a testa e sorriu. – Eu quero uma garotinha com o cabelo da cor do fogo. Clio sorriu de volta. Então ficou séria. – Você acha que nós seremos bons pais? A ponta de ansiedade na voz dela, o fato de que Clio estava lhe mostrando seus medos, o preencheu com alegria. – Seremos os melhores pais do mundo, bella. Se nós cometermos erros, ele ou ela terão avós e um bando de tios e tias com quem reclamar – murmurou ele, pensando em Rocco, Christian e Zayed, e suas esposas maravilhosas. Seu coração estava transbordando de amor. Seus amigos ficariam radiantes por ele ter finalmente encontrado a felicidade. – Nova York ou Sicília? – perguntou Stefan, as mãos deslizando pelas curvas de Clio. Com um gemido sensual, ela inclinou-se contra seu toque. Cobriu-lhe a boca com a sua e exigiu tudo. Mordiscou o lábio dele e provocou-o até deixá-lo rijo. Abrindo as pernas ao seu redor, ela esfregou-se em sua ereção e emitiu outro gemido longo. – Nova York e Sicília, com paradas regulares em Milão, Atenas e Gazbiyaa – respondeu Clio, os dedos ocupados com a fivela do cinto dele. No momento em que os dedos delicados dançaram sobre sua ereção, Stefan deitou-a sobre o tapete e cobriu-a com seu corpo. Desta vez, ambos gemeram, e a alegria preencheu o coração de Stefan. – Isso deve funcionar, bella – terminou ele e beijou a boca deleitosa de sua esposa.
Andie Brock
VOTOS DE DESEJO
Tradução Tina TJ Gouveia
Vossa majestade, o sheik de Gazbiyaa, Solicita a honra de sua presença no casamento real de
Zayed & Nadia Às 15h, no palácio de Gazbiyaa. A recepção será imediatamente após a cerimônia.
CAPÍTULO 1
NADIA ESPERAVA não ter chegado tarde demais. Enquanto se aproximava dos portões do palácio, pôde ver grupos de mulheres jovens que já estavam saindo. Seus trajes diáfanos flutuavam enquanto elas seguiam rapidamente como borboletas coloridas. Dentro da entrada abobadada do palácio, ela quase colidiu com o grupo do harém que saía, pois era do que se tratava. Eram as mulheres mais bonitas do reino a serem apresentadas ao recémcoroado sheik Zayed Al Afzal para sua diversão e prazer. Exceto que nenhuma delas fora considerada adequada. O sheik dispensara todas, não achando nenhuma delas boa o bastante para seus elevados padrões? Sem dúvida, pela expressão grave no rosto dos guardas, pela maneira como se certificavam de que as mulheres se retirassem, parecia que algo dera muito errado. Bem, ela teria de se empenhar mais. Agachando-se, Nadia segurou um trecho de sua saia esvoaçante e, tornando-se o menor possível em estatura, começou a abrir caminho por entre as pernas das convidadas que saíam. Conseguiu chegar até a porta, e a sorte estava do seu lado, pois os olhos do guarda alto foram momentaneamente atraídos pelas curvas generosas de uma mulher que saía. Aquela era sua chance. Começou a correr velozmente pelo largo vestíbulo, com as sandálias chiando no piso de mármore e os braceletes nos pulsos e nos tornozelos e o cinto de pedrarias formando uma cacofonia que poderia denunciá-la. Havia uma porta aberta à sua frente e correu às cegas até ela, determinada a não deixar que nada a detivesse. Tinha de ver o sheik Zayed Al Afzal. Parando, viu-se no meio de uma imensa sala luxuosa de ar formal. E ali, sentado num trono dourado numa plataforma ao fundo da sala, estava o sheik Zayed. Ambos se entreolharam. Ofegando, Nadia sentiu o detestável bustiê apertando-a e acentuando a curva de seus seios. Os músculos de seu ventre se contraíram enquanto ponderava que a exposição do corpo daquela maneira ia contra tudo que acreditava. E certamente atraía a atenção dele. Pôde sentir os olhos do sheik percorrendo-lhe o corpo seminu, e sua pele se arrepiou. Foi tomada por uma onda de constrangimento.
Sabia que aquele era seu momento, sua única chance, e tinha de fazer as coisas acontecerem. Mas ainda hesitou. Pois o sheik Zayed não era como imaginava. Ele era alto e extremamente bonito, com as pernas compridas esticadas à sua frente, cruzadas na altura dos tornozelos. Usava um terno escuro ocidental com elegância e, quando ergueu os olhos, Nadia notou-lhe o peito largo, a camisa branca e a gravata afastada para o lado. Percebeu que ele segurava com força a cabeça de cada leão nos braços do trono, o que contrastava com sua postura relaxada. Olhá-lo nos olhos era o que tinha a fazer agora. Respirando fundo corajosamente, pendeu a cabeça e preparou-se para olhá-lo em cheio. Podia fazer aquilo. Mas o que viu foi bem pior do que achara. Pois o que a fez ficar com a respiração em suspenso e abalou sua determinação não foi o olhar cruel do assassino impiedoso que estivera esperando, mas algo bem mais perigoso. Os olhos dele eram bonitos, de um castanho-escuro, intenso, e pareciam seguros e experientes. Eram do tipo capaz de derreter uma pessoa. De repente, Nadia notou a respiração ofegante de um guarda-costas atrás dela, mas era tarde demais. Ele já lhe segurava o antebraço com força. – Perdão, Majestade, esta passou por nós. “Esta”? Como o homem ousava falar dela daquele jeito? Tentando libertar furiosamente o braço, Nadia só sentiu a pressão aumentando. – Eu lhe agradeço se tirar suas mãos brutas de cima de mim! O guarda hesitou por um instante, enquanto ela ainda tentava se desvencilhar. – Você ouviu o que a dama disse. – Levantando-se, Zayed posicionou-se na beirada da plataforma do trono. – Solte-a. – As palavras ecoaram pela ampla sala. – Majestade. – A mão foi afastada e o guarda deu um passo atrás e curvou a cabeça. – E para que fique registrado, espero que as minhas ordens sejam cumpridas de uma maneira civilizada. Que todos saibam que não vou tolerar nenhuma forma de brutalidade. – Vossa Majestade. Nadia virou-se para dirigir um olhar altivo ao guarda repreendido e esfregou as marcas vermelhas no seu braço. Os malditos braceletes tilintaram. – E, então, senhorita. – Nadia viu-se no centro do olhar zangado de Zayed. – Qual é o seu nome? – Nadia – pronunciou o nome com clareza o bastante, mas numa voz alta, de uma maneira que a fez sentir-se ainda mais exposta. – Bem, Nadia, receio ter de lhe informar que você perdeu a viagem. – Ele se manteve alto e orgulhoso, com as pernas separadas e os braços cruzados sobre o peito, exatamente como o senhor no controle ali. – Como vê, não tenho o hábito de escolher minhas companheiras da maneira como foi organizado esta noite. Peço-lhe desculpas pelo inconveniente que lhe foi causado. De algum modo, pareceu mais uma reprimenda do que um pedido de desculpas. – Mas Vossa Majestade... – Com o coração disparado no peito, ela ergueu os olhos para fitá-lo e, então, baixou-os, piscando os cílios no que esperou ser um gesto sedutor. – Já que estou aqui, eu teria a permissão de dançar para Vossa Majestade? Sem esperar uma resposta, ela começou a mover os quadris de um jeito lento, hesitante, ondulando-os da maneira como vira as dançarinas fazendo em seu próprio palácio para o
entretenimento do seu pai e irmão. Ela as estudara o mais perto que pudera de seu esconderijo no salão de baile do palácio, memorizando os passos antes de correr para o seu quarto para praticar o que vira. Tentando não olhar para o seu reflexo nos olhos, ficara com as roupas de baixo e se movera diante do espelho. Agora, só precisava tentar se lembrar do que aprendera. Ergueu os braços acima da cabeça, girando as mãos uma em torno da outra da maneira sedutora que vira sendo feita. Moveu os quadris de modo mais provocante agora que os gestos lhe voltavam à memória, os badulaques acompanhando-lhe os movimentos. – Senhorita. – Zayed descera os poucos degraus da plataforma e andava pelo chão decorado por mosaicos coloridos na direção dela. A dança de Nadia se tornou mais ousada enquanto se esqueceu da humilhação e pensou na sensualidade, ondulando o ventre e girando os quadris com abandono. Ele estava bem diante dela agora. Era tão alto, sua figura muito próxima enquanto a observava dançar freneticamente. Ainda assim, Nadia não parou. Olhando para o peito do sheik, moveu os braços rapidamente diante do rosto dele. – Obviamente, não fui claro. – De repente, ele pegou-lhe as mãos no ar e baixou-as sem deixar de lhe observar o rosto corado. Todo movimento cessou, exceto pelo tremor de vergonha que percorreu Nadia. Segurando-a pelos ombros, ele virou-a gentil, mas firmementes na direção oposta. – A porta é por ali. ZAYED OBSERVAVA enquanto a jovem tentadora seguia depressa pelo corredor, acompanhada pelo guarda, que agora felizmente mantinha as mãos para si. Parecia ansiosa para ir embora, e os passos apressados moviam-lhe a cabeça de cachos negros que cascateavam pelas costas e deixavam-lhe o bumbum particularmente sexy, requebrando sob o tentador traje transparente. Mas o restante da postura era rígido. O que era estranho, levando-se em conta a dança sedutora dela de minutos antes. A performance com que o entretivera. Fora uma excelente dança, ele tinha de admitir. Não havia dúvida de que Nadia era uma beldade. A maneira como exibira a pele clara excitara-o mais do que admitiria a si mesmo. Se as circunstâncias fossem diferentes, se a tivesse conhecido num bar, por exemplo, teria tido o maior prazer em conhecê-la melhor, em todos os sentidos da palavra. Mas não ali, não daquela forma. Podia ter reputação de conquistador, mas seduzir uma mulher bonita era uma coisa. Ter pobres criaturas expostas diante dele feito gado era outra. Não que Nadia parecesse do tipo que se exporia daquele jeito. O modo que fora parar ali era um mistério. Franzindo o cenho, Zayed virou-se e, tirando o paletó, colocou-o por sobre o ombro. Parado no meio da opulenta sala do trono, olhou ao redor. Que diabo havia acontecido com sua vida? Cerca de dois meses antes, estivera expandindo seu império de negócios, viajando ao redor do mundo, adorando a emoção de intermediar aquisições de empresas de bilhões de dólares e a riqueza e as comodidades que acompanhavam o tremendo sucesso em seu trabalho. Mas isso tudo havia mudado, e dramaticamente, quando a mãe dele fizera o chocante anúncio de que ele deveria retornar para casa, no reino de Gazbiyaa. De que ele, Zayed, seria coroado como
o sheik seguinte de Gazbiyaa, e não seu irmão mais velho, Azeed. A decisão fora igualmente surpreendente para os dois irmãos: Zayed foi colocado de um momento para a outro no papel não familiar de sheik, algo para o qual nunca fora preparado, que nunca esperara e, com certeza, nunca quisera, e Azeed, que fora preparado para esse papel a vida toda, vira o título lhe sendo tirado bruscamente. Agora, o recém-coroado sheik Zayed Al Afzal, governante supremo do reino do deserto fabulosamente rico de Gazbiyaa, olhou amargamente em torno da sala vazia. Teria de fazer sérias mudanças ali e reafirmar rapidamente a sua autoridade antes de ser sujeitado a mais situações absurdas como a daquela noite. Um harém, pois sim. O que, afinal, havia sido aquilo? Ele só gostaria de ter detido tudo antes que as pobres mulheres tivessem chegado. O primeiro instante em que ficou sabendo a respeito foi quando um de seus conselheiros lhe indicara que entrasse na sala do trono com um gesto e anunciara que as mulheres mais bonitas do reino estavam à espera de serem escolhidas para o entretenimento dele. Momentaneamente perplexo, ele só pudera olhar com incredulidade enquanto a sala fora preenchida com criaturas em roupas diáfanas e pedrarias, de olhos brilhando, e corpos oscilando enquanto tinham se apresentado diante dele. Quando se recobrou da surpresa e ordenou que elas fossem retiradas, sua voz tinha se elevado e a raiva ficado óbvia, fazendo-o parecer alguma espécie de tirano bruto. Estava envergonhado de lembrar a expressão assustada nos olhos delas, enquanto foram reunidas e receberam a ordem para sair. Porque sua raiva não se destinara àquelas pobres garotas, mas a si mesmo. Pela posição que fora obrigado a aceitar e pela vida maluca em que agora se encontrava. Mas aquela última jovem. Nadia... Certamente não houvera medo em seus olhos. O olhar que ela lhe lançara por sobre o ombro antes de sair fora cheio de mistério e desafio e ainda contivera um quê de altivez como se não tivesse bastado o restante. De repente, ele descobriu-se tentando lembrar a cor daqueles olhos incríveis. Azuis? Violeta? Recobrando-se, Zayed respirou fundo e virou-se para deixar a sala. Por que estava desperdiçando seu tempo tentando se lembrar disso? Não tinha coisas mais importantes com que se preocupar? NADIA SENTIU o ar frio da noite passando por sua pele quente e estremeceu violentamente. O que fazer agora? Aquele guarda brutamontes a acompanhara até os portões do palácio sem uma palavra, trancando-os firmemente depois que ela saiu. Agora o olhava enquanto ele subia os degraus até a entrada, onde, sem dúvida, ficaria a postos para se certificar de que ela não tentasse subir novamente. Bem, ela teria de elaborar outro plano. Uma coisa era certa: não iria desistir agora. Não agora que estivera dentro do palácio e conhecera o sheik Zayed Al Afzal face a face. Se bem que conhecer era dificilmente a palavra certa. O ar desgostoso no rosto dele quando a dispensara da sala depois de sua dança ainda a fazia contrair o rosto de vergonha. Mas, apesar de sua humilhação, não havia dúvida de que aquele formidável sheik causara uma impressão inesperada em Nadia. Alto, de ombros largos e autoritário – ela notara todas essas coisas num só momento. Mas havia mais: uma inteligência tranquila, uma sofisticação urbana, que, combinadas a uma aparência estonteante, eram de tirar o fôlego. Certamente aquele era um
homem o qual ela nunca conhecera. E a fizera sentir algo que jamais havia sentido antes. Algo que não tinha intenção de pensar agora. Cruzando os braços sobre o peito, Nadia esfregou a pele gelada dos ombros, enquanto estudava o vasto palácio que estava tentadoramente fora do alcance. O epítome da opulência, ele reluzia contra o céu noturno, com as luzes realçando cada uma das numerosas janelas em arco, pórticos e cúpulas. A enorme cúpula principal no centro do telhado era azul, cintilando sob a lua crescente. Parecia irreal sob aquela luz, como um OVNI brilhante que tivesse pousado no deserto. Nadia estava acostumada à vida palaciana. Na verdade, era a única vida que já conhecera. Nascida princesa Nadia Amani de Harith, passara seus 28 anos inteiros como uma prisioneira virtual no palácio de Harith, confinada pelas regras arcaicas de protocolo do seu pai e irmão. Mas o palácio em que crescera, que conhecia tão bem, parecia humilde em comparação à magnífica construção à sua frente. O palácio de Gazbiyaa não deixava dúvida quanto à riqueza e ao poder daquele reino. Mas crescer num palácio ensinara uma coisa a Nadia: sempre havia um meio de se entrar. Tinha apenas de encontrá-lo. Estava prestes a se mover para começar a investigar quando um movimento numa das janelas no quarto andar chamou sua atenção. Escondendo-se nas sombras, embora não houvesse meio de poder ser vista ali embaixo, observou quando as portas-janelas foram abertas e pôde ver a silhueta do próprio Zayed contra a luz. Aqueles eram os aposentos particulares do sheik? Silenciosamente, Nadia contou quatro janelas a partir do pórtico central. Guardando a imagem na memória, sentiu o coração disparando no peito. Era aonde tinha de ir para cometer o mais corajoso, perigoso e possivelmente estúpido ato da sua vida. Mas primeiro tinha de encontrar um meio de entrar. RECOSTADO NO gradil da varanda do seu quarto, Zayed respirou fundo, sentindo o ar perfumado da noite. À sua frente, estendia-se o seu reino, vasto como uma tapeçaria cintilante. Os arranha-céus erguidos recentemente elevavam-se numa combinação de vidro e aço que levavam os sonhos dos arquitetos e as habilidades dos operários da construção para além dos limites. Cada edifício era mais alto, mais arrojado que o outro. Aquele havia sido o sonho do seu irmão, tornar o reino da Gazbiyaa uma nação importante. Não apenas no Oriente Médio, mas no cenário mundial. Mas a que custo? Azeed era impiedoso e determinado, e Zayed desconfiava que, se o irmão tivesse sido coroado sheik, ele não teria parado por nada em sua luta para tornar Gazbiyaa uma superpotência. E fora por aquela razão que a mãe de Zayed quebrara seu voto de silêncio no leito de morte, pondo um fim nos planos cada vez mais extremos de Azeed e precipitando a cadeia de eventos que levaram Zayed até onde estava agora. Através do ruído do tráfego da cidade, ele pôde ouvir o chamado à oração ecoando entre as dezenas de minaretes espalhados pela cidade. Deixando a sacada, Zayed rumou em direção ao banheiro para tomar um banho. Fora um longo dia.
FOI O Azan, o chamado à oração, que deu a Nadia sua chance. Seguira o muro até os fundos do palácio, onde, para seu desalento, descobriu que os portões eram igualmente altos e impenetráveis. Um pequeno grupo de homens jovens de túnicas brancas surgiu, correndo na direção em que ela estava escondida nas sombras. Observou quando um deles tocou um controle e os portões se abriram, dando passagem a todos. Nadia teve apenas tempo o bastante para entrar atrás dos homens antes que os portões se fechassem. Com o coração aos saltos, manteve-se nas sombras enquanto corria na direção do palácio amplamente iluminado e ia para além dos gramados bem-cuidados, fileiras de palmeiras e fontes que salpicavam o vasto pátio. Logo, estava a poucas centenas de metros da cozinha. Ali, ela parou, agachando-se atrás de um pé de romã para recobrar o fôlego e tentar pensar no que fazer em seguida. Uma solitária voz masculina alertou-a para a presença de um guarda do palácio falando ao celular diante da porta da cozinha. Da porta aberta da cozinha. Só precisava distraí-lo. Um plano começou a se formar em sua cabeça. Não passara anos assistindo a filmes de aventura na televisão para nada. Tateando ao redor, encontrou o que estava procurando e, pegando a romã, sentiu-lhe o peso na mão. Se conseguisse atirá-la para além de onde o guarda estava, isso poderia distraí-lo por tempo o bastante para que ela entrasse. Retirando os braceletes do pulso e descartando-os, ela se levantou e mirou, arremessando a romã com toda a força. O resultado foi melhor do que poderia ter imaginado. Por sorte, a pesada fruta caiu em cheio no capô de uma limusine preta que não havia notado. Como o alarme do veículo disparou, o guarda adiantou-se até lá depressa para investigar. Era a sua chance. Nadia correu na direção da porta aberta da cozinha e entrou. Olhando ao redor num misto de pânico e euforia, viu que a sorte estava a seu lado mais uma vez, pois a cozinha parecia estar completamente vazia. Andando na ponta dos pés de um cômodo a outro, eventualmente encontrou a escada de serviço. Subiu-a com uma velocidade febril e um pânico cego, nascido do fato de estar fazendo algo muito perigoso. Quando chegou ao quarto andar, estava ofegante, mas não pôde se permitir tempo para descansar. Espiou o comprido corredor. Tudo parecia quieto, embora não fosse fácil discernir considerando o disparo no coração e o ruído nos ouvidos. Levando as mãos trêmulas às têmporas, tentou se localizar, virando-se para um lado e para o outro. Quatro janelas desde o pórtico central na frente. Se seguisse aquele corredor até o fim, virasse à esquerda e contasse as portas... A mão dela estava na maçaneta agora. Se seus cálculos estivessem corretos, estava prestes a entrar nos aposentos do sheik Zayed Al Afzal. Lentamente, girou a maçaneta de latão. Ela moveu-se silenciosa e prontamente sob sua mão. Não havia volta agora. Seja lá o que o destino lhe reservasse do outro lado daquela porta, Nadia soube que sua vida jamais seria a mesma. ZAYED ESTAVA se enxugando quando ouviu um ruído vindo de seu quarto anexo. Gelou com a toalha na mão. Alguém estava ali, teve certeza. Apurou os ouvidos, mas não havia som algum agora. Um sexto sentido, porém, lhe advertiu que não estava mais sozinho. Havia trancado a porta do quarto? Não, era evidente que não. Apesar dos avisos de que a segurança era de extrema
importância ali, ele não conseguia romper o hábito de uma vida inteira. Quem, no mundo civilizado, trancava a porta do quarto antes de ir para a cama? A menos que não quisesse ser incomodado por uma razão diferente, era evidente. Agora, ele certamente desejou ter seguido o conselho. Olhou em torno do banheiro em busca de algum tipo de arma, qualquer coisa com que pudesse se defender. Mas não havia nada além de frascos de plástico de gel de banho e xampu. Teria de usar sua astúcia e seus próprios músculos. Era forte, estava em forma e sabia como desarmar um agressor, especialmente usando o elemento surpresa. Se houvesse apenas um intruso, mesmo que estivesse armado, ele poderia enfrentá-lo. Mais do que isso? Ele teria de contar com a sorte. Prendendo a toalha na cintura, preparou-se para abrir a porta silenciosamente. ENTRANDO NO quarto na ponta dos pés, Nadia respirou fundo e manteve-se assim, apreensiva demais para soltar o ar. À sua frente havia uma enorme cama elevada, cujo interior estava obscurecido por um dossel de tecidos suntuosos pendendo do suporte dourado acima. Onde ele estava? Aproximando-se silenciosa e vagarosamente, ela afastou um dos tecidos com a mão suada e trêmula. A cama estava vazia. Ele devia estar no banheiro. O ar, enfim, lhe escapou dos pulmões. Ali estava. Todos os seus planos cuidadosamente elaborados tinham levado àquele ponto. Descalçando as sandálias, subiu na cama o mais silenciosamente que pôde. Então, ajeitandose sobre os lençóis de cetim, tentou ficar numa posição sedutora antes de se deitar nos travesseiros com os olhos bem-fechados. Estava pronta para o seu destino. Houve um ruído, uma espécie de som gutural, seguido pelos lampejos de imagens de um peito forte e braços sendo flexionados no ar. E a coisa seguinte que Nadia soube foi que estava sendo presa à cama pelo peso considerável de um corpo forte quase nu e de mais de 1,80m de altura.
CAPÍTULO 2
– QUEM É você e o que quer? – indagou Zayed ao ouvido de Nadia, que estava deitada de lado no travesseiro com os cachos negros cobrindo-lhe parcialmente o rosto. Não podia falar; mal podia respirar, aliás. Com os braços acima da cabeça, os pulsos aprisionados por Zayed, o choque e o medo que a dominavam ameaçavam-na de perder a consciência. Lentamente, tentou virar a cabeça na esperança de que, quando ele visse que era apenas ela, Nadia, a soltasse e lhe desse uma chance de explicar. Se bem que não tinha certeza de como faria aquilo. Mas o que viu minou-lhe as esperanças. Porque os olhos castanho-escuros que a observavam ainda pareciam prontos ao ataque. Tudo no semblante dele parecia ameaçador, o maxilar fechado, o cenho franzido, os lábios apertados. Ele iria matá-la, não era? Ela iria morrer. – Sou apenas eu. – Engoliu em seco ruidosamente e seus olhos se arregalaram com pânico. – Nadia. – Moveu-se sob ele para tentar libertar alguma parte do corpo, mas seus gestos só aumentaram o contato entre ambos. Aquele espasmo em algum ponto abaixo onde seus corpos se encontravam tinha de ser medo, certo? – Sei muito bem quem você é. Mas o que não sei é porque diabo você está na minha cama. – A raiva se evidenciou na voz dele e na maneira como ainda lhe segurava os punhos com força. – Quero uma resposta agora. – Vossa Majestade. – Lutando para encontrar a voz, Nadia manteve-se bem quieta, piscando os olhos violáceos para seu captor destemido. Sua única chance de sobrevivência era tentar conversar razoavelmente. – Posso lhe garantir que não pretendo fazer mal algum. Apenas senti um forte desejo de vê-lo de novo. – Sim, é claro que sim. – O sarcasmo entremeou a voz de Zayed e mudou a posição do corpo acima dela, mas continuou prendendo-a. – Sua desculpa não é boa o suficiente. Para quem você está trabalhando e o que quer? – Para ninguém. Estou completamente sozinha. – Não acredito em você. – A voz dele era como uma carícia contra a pele dela. – Está aqui para me distrair? É isso? Para me manter ocupado enquanto seus cúmplices cortam a minha garganta? – Apoiando os cotovelos na cama agora, ele ergueu o peito nu o bastante para se virar e olhar por
sobre o ombro, como se um agressor ainda pudesse estar lá, empunhando uma faca, antes de voltar a baixá-lo até os seios de Nadia. Ela arregalou os olhos. O gesto tinha mudado o peso dele de lugar, os quadris, o ponto em que as coxas de ambos se encontravam. – Não, não é nada disso. Eu apenas... – Ou a garganta do meu pai? É do que se trata tudo isso? Sei que o meu pai tem muitos inimigos. – Não. Você tem de acreditar em mim. Não estou aqui para cortar a garganta de ninguém. Com os braços presos de cada um dos lados da cabeça, os seios empinados sob o peito forte de Zayed, ela não poderia ter se sentido mais vulnerável, mais exposta. E pior do que isso, com o peso total de Zayed em cima dela, com seu corpo virtualmente despido sobre ela, seu calor, Nadia se deu conta de um latejo crescente em seu ventre que não tinha nada a ver com a pressão apenas do peso dele. Respirou fundo, mas o ar estava repleto do cheiro dele, uma mistura inebriante de gel de banho e de feromônios. – Então, o que é você está fazendo aqui, Nadia? – Zayed baixou o rosto outra vez, ficando tão perto que o espaço entre ambos era quase inexistente. Os lábios estavam muito próximos dos dela ao acrescentar: – Tem exatamente um minuto para me contar a verdade. – E vou dizer. – Nadia mordeu o lábio inferior para tentar obter algum controle. – Quando você tiver me soltado. – Nada disso. Veja como as coisas funcionam. Ou você me diz a verdade agora, ou vou chamar os guardas do palácio. – Não! Não faça isso. –A tentativa dela de soar desafiadora ruiu. Aquilo não era mesmo o que planejava, acabar presa a uma cama como uma intrusa comum. Pretendera parecer sedutora. Levar Zayed à tentação e a um compromisso que impediria os reinos de ambos de entrarem em guerra. Aquele fora o plano, ao menos. Agora, o plano fora arruinado e o homem que deveria estar seduzindo demonstrava que preferia torná-la prisioneira a fazer amor com ela. Mas tinha de ser forte, tentar novamente. – Antes que eu diga alguma coisa, exijo que solte os meus pulsos. – Você exige, hein? Essa foi boa. Pode não ter notado, mas você não está em posição de fazer exigências. Sugiro que pare de bancar a superior agora mesmo. Dê-me uma boa razão para eu não chamar os guardas e ordenar que a prendam com correntes e a atirem nas masmorras do palácio. Você tem dez segundos e estou contando. – Está bem, está bem. – Nadia passou a ponta da língua pelos lábios secos. – Vim até aqui... – Ela pôde sentir seu coração disparado entre ambos, o contato dos pelos do peito de Zayed, uma fina camada de transpiração entre eles. – Vim até aqui sozinha porque esperei… esperei conseguir fazer você feliz. – As últimas palavras foram ditas depressa porque ela se sentiu ridícula dizendo-as. Uma coisa era certa: o sheik não parecia nem um pouco feliz. – O tempo acabou. – Não, espere. – O puro desespero dominou-a. Aquilo estava dando terrivelmente errado. Sozinha na sua cama no palácio de Harith obrigara-se a imaginar aquele instante, a se preparar, usando toda a coragem que pudera reunir para ajudá-la a enfrentar a tribulação que sabia que teria pela frente.
Convencera a si mesma que tudo valeria a pena. Se sua virgindade era o preço que teria de ser pago para cessar a ameaça de guerra entre os reinos de Harith e Gazbiyaa, faria aquilo sem hesitar. Porque amava seu país, embora nem sempre parecesse que o país a amava. E aquele plano maluco e extremamente perigoso fora o único meio de conseguir tentar fazer a diferença. Mas o sheik impiedoso, pelo qual havia se imaginado sacrificando sua honra, acabou se revelando completamente diferente na vida real. O homem bonito que a olhava com determinação causava muito mais preocupação. Pelo que conseguira ouvir de seu pai e do irmão, entendera que o sheik recém-coroado não passava de um hedonista brutal, um homem que passara seu tempo em bares e clubes noturnos tomando álcool e buscando seu único interesse: os prazeres da carne com as mulheres. Um homem que não se importava com seu povo ou seu país. Apesar de seu império nos negócios de bilhões de dólares, ele não tinha as habilidades e conhecimento necessários para governar um reino como o de Gazbiyaa. E era por essa razão que, como uma hiena cercando um leão vulnerável, Harith estava preparado para atacar. Mas Nadia já sabia que o pai e o irmão estavam errados em relação a Zayed Al Afzal. Longe de ser o mulherengo extravagante que haviam descrito, era obviamente um homem de inteligência elevada, perspicaz e perceptivo. Subestimá-lo seria catastrófico para Harith. Para todos. E ele nem sequer parecia interessado nos prazeres da carne. Não na dela, ao menos. Era ela cujo corpo experimentava um latejo não familiar sob a pele quente do seu captor. Mas quem podia culpá-la? A toalha que o envolvia estava encostada na cintura nua dela, o peso dele pressionava-lhe o cinto de pedrarias de encontro à pele. Podia sentir o volume da anatomia masculina dele de encontro ao corpo, quente, íntimo e completamente impossível de ignorar. Estava lhe afastando da mente qualquer discurso ensaiado que tivesse. Respirando fundo, Nadia se moveu com determinação numa última tentativa de se libertar. E sentiu que ele se ergueu dela, apenas alguns centímetros e por poucos segundos. Tirando o máximo de proveito do momento, arqueou os quadris, e acabou erguendo os seios também, na esperança de conseguir fazê-lo perder o equilíbrio de algum modo. Mas conforme o peso de Zayed preencheu o espaço entre ambos com ainda mais força, ela percebeu que sua ação teve um resultado diferente. Soltou uma exclamação surda. A ereção dele estava de encontro à sua virilha por sob a toalha. Ao olhá-lo nos olhos, viu que continham desejo e que seus próprios olhos, refletidos nos dele, espelhavam esse próprio desejo. Então, podia lhe causar aquilo. Não era totalmente alheio a ela. Nadia moveu-se mais uma vez, contente com aquela dose de poder que exercia sobre ele, admirada com as ondas de desejo que o contato com a ereção dele tinha lhe despertado. Talvez seu plano ainda pudesse dar certo. Talvez ainda pudesse tentá-lo a fazer amor com ela e começar a cadeia de eventos que gradualmente, de algum modo, levaria a uma paz duradoura entre as duas nações. Mas uma coisa era certa. Tinha de fazer valer aquele instante. – Vossa Majestade... – Fitou-o com um olhar sedutor – … se quisesse me possuir agora, eu não faria objeção. Seja lá o que me peça, eu farei de bom grado e me empenharei ao máximo para não desapontá-lo.
Instantaneamente, o desejo nos olhos de Zayed dissipou-se. – Basta! – Finalmente libertando os pulsos dela, ergueu o torso e apoiou-se nos cotovelos, olhando-a com desdém. – Pare com essa tentativa horrível de sedução. Posso lhe garantir que não tenho intenção de possuí-la. Esse decididamente não é o meu estilo. Nadia baixou os braços, tomando o cuidado de não tocá-lo e lutou para que a humilhação que as palavras dele causaram não transparecesse em seu rosto. – Fique sabendo que não tenho o hábito de fazer sexo com alguém só porque isso me foi oferecido. Especialmente jovens falsas que se escondem na minha cama e pensam que podem me seduzir em proveito próprio. Seja lá o que lucrem com isso. Nadia o olhou com desalento. Tivera certeza de que a maneira de seduzir um governante poderoso e impiedoso era oferecer a única coisa que era realmente sua – sua virgindade. Agora, apesar do óbvio interesse que despertara no corpo dele, a ideia parecia ridícula. Para um homem como o sheik Zayed tal prêmio não significava nada. Ao contrário, na verdade. Por que se interessaria por ela quando podia escolher entre as mulheres mais sofisticadas do mundo, mulheres com experiência sexual que saberiam exatamente como fazê-lo feliz? E mais do que isso, ali estava um homem com integridade e moralidade demais para ser tentado a fazer sexo com alguém só porque podia. Ela sabia daquilo agora. Entendera tudo da maneira errada e agora estava em apuros. – Peço-lhe desculpas, Vossa Majestade. Vejo que o meu comportamento o desagradou. – Pode parar de me chamar de “Vossa Majestade” – mencionou Zayed, ignorando-lhe o pedido de desculpas. – A situação em que estamos ultrapassou a necessidade de protocolo formal. Que tal você explicar que diabo estava querendo aqui e eu decido o que fazer com você? Ambas as coisas pareceram terríveis a Nadia. Fechando os olhos com força, tentou pensar num meio de sair daquela confusão. Mas quando tornou a abri-los, Zayed ainda a olhava, à espera de uma resposta e, quando ele ergueu a mão, ela esquivou-se instintivamente. – Ora, o que é isso, mulher? – Ele parou, torcendo-lhe uma mecha de cabelo negro entre os dedos. Apenas pretendera afastá-la do rosto dela. – Que tipo de bruto pensa que sou? Nadia sacudiu a cabeça. – Não, eu não... – Que desespero a traria para a cama de alguém que você obviamente acha que a esbofetearia? Se ao menos ele soubesse. Se ao menos ela pudesse lhe contar a verdade. Mas se revelasse quem era, se admitisse que era de Harith, tinha certeza de que o sheik levaria a ameaça adiante e mandaria prendê-la nas masmorras do palácio. Era o tipo de ódio entre as duas nações. – Não vou deixá-la ir enquanto não me disser, Nadia. – A voz dele soou baixa, e ela soube que o sheik se esforçava para manter a paciência e que seu silêncio o hostilizava ainda mais. Mudando o peso do corpo, ele se inclinou para frente de novo, com um braço musculoso de cada lado da cabeça de Nadia, o peito alguns centímetros acima do dela. – Estou esperando. – Está bem, está bem, vou lhe dizer. A razão que me trouxe aqui... De repente, Nadia parou, salva de ter de continuar por uma batida à porta do quarto. Zayed hesitou, à espera e alerta. Houve outra batida. – Vossa Majestade? – Uma voz masculina ouviu-se do outro lado da porta.
Zayed levantou-se abruptamente de cima dela e fechou o dossel. Arrumou a toalha em torno dos quadris antes de se adiantar até a porta. – Fique aí – ordenou por entre dentes. – Vou me livrar de quem estiver à porta. Nadia não tinha intenção de ficar ali. Se aquela fosse sua única chance de escapar, não a perderia. Sem perda de tempo, começou a engatinhar pelos lençóis de cetim na direção da beirada da enorme cama. – Oh, não, você não vai a lugar algum. – Nadia mal colocara um pé no chão e ele havia se aproximado outra vez, pressionando-a de encontro aos travesseiros. Desesperada agora, ela debateu-se sob ele, tentando agarrar qualquer coisa que pudesse segurar. O que acabou sendo uma ponta da toalha de Zayed. Quando a puxou inadvertidamente da cintura do sheik, acabou vendo as nádegas dele antes que tornasse a baixar o corpo em direção ao seu. – Hã... – Uma tosse educada alertou-os para a presença de alguém mais no quarto. – Perdoe-me, Vossa Majestade. – Vá embora! – Furioso, Zayed rosnou as palavras por sobre o ombro enquanto dirigia um olhar faiscante a uma imóvel Nadia. – Peço-lhe desculpas, Majestade, mas trago uma mensagem. – Houve outra tosse nervosa. – Do seu pai. Creio que é um assunto importante. NADIA SOBRESSALTOU-SE com o som da chave sendo girado na fechadura e virou-se rapidamente para olhar para a porta. Fazia cerca de meia hora desde que Zayed a aprisionara em seu quarto. Tendo colocado jeans e uma camiseta, com o rápido lampejo de suas nádegas arregalando ainda mais os olhos de Nádia, ele trancara a porta de comunicação entre o quarto e a sala dos aposentos e sacudira o molho de chaves diante dela para ver se entendera a mensagem. Enfim, dizendo algumas palavras por entre dentes para informá-la que lidaria com ela mais tarde, deixou o quarto trancando a porta principal. A princípio, Nadia achou que houvesse algum meio de fuga. Tateou as paredes revestidas, convencida de que devia haver alguma porta escondida em algum lugar. Mas, se houvesse, estava bem-escondida demais para que a descobrisse. E bastou o olhar da terrível altura das janelas do quarto andar para convencê-la de que, a menos que criasse asas antes de chegar ao chão, aquilo também não era uma alternativa de fuga. Assim, acabou andando de um lado ao outro do quarto, com a fúria impotente percorrendo-lhe as veias diante do fato de que ela, a princesa Nadia de Harith, estava sendo mantida prisioneira por aquele sheik exasperante. Estava furiosa também com o fato de seus planos terem dado errado e de não ver saída para aquela confusão. Andando pelo quarto, acabou chegando a uma grande mesa a um canto. Acima, havia um conjunto de aparelhos eletrônicos: um laptop, um smartphone, um tablet. Ela nunca tivera permissão para ter nenhuma daquelas coisas. O irmão insistira que teriam sido uma influência nociva sobre ela. Mas foi a foto num porta-retrato simples a um canto da mesa que lhe chamou a atenção. Apanhando-o, estudou os quatro homens usando trajes de formatura e sorrindo amplamente para a câmera. Dia de formatura. Quatro homens com o mundo a seus pés. Lá estava
Zayed com os braços em torno dos ombros dos amigos, vários anos mais jovem, mas já incrivelmente bonito. Nadia sentiu algo em seu íntimo. – O que está fazendo? – Nada. – Ela o encarou, esforçando-se para colocar o porta-retrato atrás de si na mesa. – Não estou em condições de fazer nada, trancada aqui como uma prisioneira. – E de quem é a culpa? – interrogou Zayed, proferindo as palavras na forma de um grunhido enquanto correu a mão pelo farto cabelo escuro. Ela reconheceu o cansaço no gesto, notou o peso da responsabilidade que ele carregava, além dos problemas que estava lhe causando. Quase lamentou estar lhe acrescentando mais preocupações. Quase. – Você tem sorte por eu não ter chamado a segurança. Ainda. Nadia percebeu que ele percorria seu corpo com o olhar novamente, começando pelo bustiê e descendo pelo torso quase nu até o abdome liso, os quadris adornados pelo cinto de pedrarias e as pernas longas e bem-feitas que o tecido diáfano do traje não conseguia esconder. Ela se moveu, pouco à vontade. Zayed pigarreou. – A questão é: o que faço com você agora? Pela expressão intensa no rosto dele, Nadia suspeitou que Zayed não aguardava uma resposta sua. Apesar de sua determinação em escapar, ela não soube o que faria se fosse liberta, para onde iria, especialmente usando aquele odioso traje. Retornar a Harith estava fora de cogitação. Sabia que àquela altura seu desaparecimento já teria desencadeado uma busca em larga escala pelo reino, que seu pai e irmão ficariam furiosos por ela não ter voltado da “ida às compras” que anunciara no início daquela manhã, uma manhã que parecia a anos-luz. Sabia que a mãe estaria bastante preocupada e por isso realmente lamentava. Teria adorado poder confiar nela, contar-lhe sobre seu plano ousado, mas não pudera. Anos sendo subjugada pelo marido e, depois, pelo filho haviam enfraquecido sua mãe fazendo-a passar da jovem inteligente, animada, até a mulher nervosa, amedrontada que era agora. Nadia observara-lhe o declínio sem poder fazer nada. Mas de uma coisa tinha certeza. Nunca permitiria que o mesmo lhe acontecesse. E, daquele modo, ela tivera sua fuga. Seguida de uma acompanhante, uma jovem chamada Jana com quem Nadia fizera amizade secretamente, ela saíra com instruções de comprar “as mais belas roupas para seu enxoval”. O dinheiro que a família lhe dera para tal tarefa fora extremamente generoso e, somado ao que Nadia estivera guardando ao longo dos meses anteriores, chegara a uma pequena fortuna. Na verdade, ela e Jana tinham feito apenas uma compra de roupa. O traje de harém que as duas tinham escolhido entre risinhos nervosos certamente não fora o que a família tivera em mente. Em seguida, pegando apenas o bastante para sua passagem de avião para Gazbiyaa, Nadia insistira para que Jana ficasse com o restante do dinheiro. As duas se abraçaram antes que Jana saísse rumo à própria aventura, voltando depressa para a família com o dinheiro para a operação da mãe escondido em segurança debaixo do hijab. Nadia só esperava que Jana estivesse tendo mais sorte do que ela.
Zayed atravessara o quarto, posicionando-se diante de uma das janelas da varanda com os braços cruzados sobre o peito e ar impaciente. Nadia não podia fazer nada a não ser aguardar silenciosamente enquanto ele decidia seu destino. – Sabe de uma coisa? – Ele deu um profundo suspiro. – Eu poderia ficar aqui a noite inteira, tentando descobrir o que você está fazendo aqui, por que invadiu o meu quarto. Mas francamente... – Fez uma pausa para percorrê-la com um olhar desdenhoso – ... nem sequer me importo. – Vossa Majestade, se me deixar explicar... – Não, Nadia. – Erguendo a mão com firmeza, Zayed deteve-a. – Eu me recuso a ouvir mais alguma das suas explicações. Já ouvi mais do que o bastante das suas tolices por uma noite. Mas, por mais que eu queira me livrar de você, não vou ser considerado o responsável pelo seja lá o que lhe aconteça andando pelas ruas da cidade a esta hora, vestida desse jeito. – Seu ar desgostoso deixou claro o que pensava do traje dela. – Você vai passar esta noite no palácio. Conforme Nadia abriu a boca para protestar, ele rosnou: – E isso é uma ordem. ADIANTANDO-SE ATÉ a credenza com tampo de mármore, Zayed pegou uma garrafa de Scotch e um copo de cristal e serviu-se de uma dose generosa. Então, puxando uma cadeira, sentou-se pesadamente, esticando as pernas longas a sua frente e flexionando um dos braços atrás da cabeça. Aquela noite estava sendo uma das mais bizarras da sua vida. Quando descobrira que ele, em vez do irmão Azeed, seria coroado sheik de Gazbiyaa, soubera de imediato que sua vida mudaria dramaticamente e para sempre. Jamais teria previsto as circunstâncias que o levaram àquela posição, mas o fato era que o futuro do reino estava agora em suas mãos e o dever para com o país e seus súditos tinha de vir acima de qualquer coisa. De um ponto de vista prático, ele podia fazer aquilo; sabia. Tinha absoluta fé em suas habilidades. Sua empresa multinacional extremamente bem-sucedida era prova de seu tino para os negócios e ele tinha certeza de que podia ampliar a prosperidade do reino. Mais do que isso, com sua inteligência aguçada fizera julgamentos astutos, sabendo quando seguir uma linha mais rígida, ou uma abordagem mais diplomática. Emocionalmente, contudo, ainda estava lutando para se adaptar à ideia de ser o sheik de Gazbiyaa. Aquela não era a vida que havia planejado, a vida que já quisera. E quanto mais a via, menos gostava. Por trás da fachada moderna que Gazbiyaa apresentava ao mundo, a fachada que ele se permitira acreditar quando estivera a milhares de quilômetros em Nova York dedicando-se à própria carreira, houve um leito de injustiça e ignorância. Como um manto do mais refinado brocado de ouro atirado em cima de um covil podre de lobos e cobras. O que o pai dele chamava honra e tradição, ele denominaria preconceito, e quanto mais examinava aquele lugar, mais via quanto estava arraigado ali. Era algo que sabia que teria de resolver. A conversa que acabara de ter com o pai não fizera nada para abrandar o fardo. Notícias haviam chegado de que Azeed, que fugira de Gazbiyaa num acesso de fúria ao saber que nunca seria coroado sheik, estava rumando para o reino de Harith. E longe de ser uma causa de alívio saber
que o irmão exilado estava são e salvo, a informação apenas aumentava a ameaça de guerra entre os dois reinos. O conflito entre Gazbiyaa e Harith datava de séculos, originando-se na disputa de território. A animosidade e a amargura de ambos os lados estavam tão arraigadas que suas raízes tinham sido esquecidas. O tempo não fizera nada para minimizar as diferenças entre as duas nações. Na verdade, a cada nova geração parecia que as barreiras do ressentimento só aumentavam. O que tornava aquele impasse em torno de Azeed ainda mais perigoso. Zayed sabia que sua primeira tarefa como o recém-coroado sheik teria de ser a de negociar uma iniciativa de paz diante da absurda ameaça de guerra entre os dois países. Somente depois poderia começar a resolver os demais problemas. Sorvendo um gole do uísque, pousou o copo numa mesa de canto e massageou os ombros com a mão para amenizar a tensão. Se os meus amigos pudessem me ver agora. Ele conteve um riso desdenhoso. Imaginou-se encontrando-se com Stefan, Rocco e Christian em algum bar movimentado e contando-lhes a história do que acontecera naquela noite. Os Quatro da Columbia, ele e os três amigos de confiança eram assim chamados porque haviam se conhecido na Columbia University. Os quatro partilhavam de suas experiências sempre que se reuniam e viviam de acordo com o lema que haviam adotado: memento vivere, lembrar-se de viver. Aquele estava sendo um ano de acontecimentos para todos, pois os três amigos haviam se casado em rápida sucessão. O último casamento, o de Stefan, fora um mês antes. Agora, como o solteirão que restava, cabia a Zayed prover o entretenimento. E podia criar uma boa história com o que houvera naquela noite. A beldade de olhos violáceos em sua cama, ele saltando para prendê-la com seu corpo, nada além de uma tolha em torno da cintura para cobrir sua nudez. Podia imaginá-los rindo a valer, dando-lhe tapas nas costas, pedindo uma nova rodada de drinques para brindar. O detalhe era que Zayed não se sentia com vontade de rir, nem de celebrar. Algo na expressão nos olhos extraordinários de Nadia quando foi levada do quarto por um criado desconcertou-o. Ainda não sabia o que ela estivera fazendo ali. O que teria levado uma jovem daquelas a fazer algo tão radical, tão perigoso? Pegando o copo com ar pensativo, ele levou-o aos lábios. Apesar do comportamento provocante, quanto mais pensava nela, mais tinha certeza de que Nadia não era o que aparentava ser. A altivez com que erguera o queixo, a maneira imperiosa como falara com ele, as mãos claras e delicadas que pareceram nunca ter enfrentado um dia de trabalho... Todos esses detalhes falavam de uma mulher diferente daquela mulher que se oferecera para se prostituir na sua cama. No dia seguinte, ele descobriria. E com súbita surpresa, deu-se conta de que já esperava por aquilo. Embora fosse de enfurecer, Nadia também era muito bonita, intrigante e, sem mencionar, sexy. Algo que suas partes masculinas estavam se recusando a ignorar.
CAPÍTULO 3
NADIA ACORDOU na manhã seguinte de encontro a suntuosos travesseiros numa cama dourada de dossel. Mas, de repente, lembrou-se de que não estava na segurança de seu quarto no palácio de Harith, mas em algum ponto no interior das muralhas do inimigo jurado de seu reino, no palácio de Gazbiyaa. Mas não por muito tempo. Presumidamente, seria levada até os portões e lhe diriam que desaparecesse. Não sabia onde nem sequer como, mas tinha de aceitar que sua missão ali fracassara. Sua tentativa de seduzir o sheik Zayed, de persuadi-lo a tirar sua virgindade e, depois, desposá-la por honra, havia falhado lamentavelmente. Longe de propiciar uma atmosfera amigável para tentar a paz entre as duas nações, tudo que conseguiu fazer foi hostilizar o homem que tentara seduzir e humilhar a si mesma. Quanto à sua família... Havia alguma possibilidade de que pudesse voltar para casa e esconder deles o que havia feito? Inventar alguma história plausível para sua ausência? Afinal, aquela era a sua única esperança agora, tudo a que podia se ater. Porque uma coisa era certa: se o pai e o irmão descobrissem que ela visitara o reino de Gazbiyaa, quanto mais que tentara se prostituir na cama do sheik, iriam considerá-la morta para eles. Algumas roupas haviam sido providas misteriosamente para ela: um traje recatado com uma saia de comprimento até os joelhos e uma blusa creme de seda. Era dificilmente o que ela teria escolhido, mas, com certeza, era mais apresentável do que o traje do dia anterior. Estava se vestindo quando houve uma batida à porta e uma criada entrou. – Vim com uma mensagem de Sua Majestade. – Ela manteve os olhos respeitosamente baixos. – Sua Majestade deseja lhe falar. Devo acompanhá-la até a ala dele. Nadia hesitou. Para ser sincera consigo mesma, presumira que seria a última pessoa que ele iria querer ver. Pela expressão desgostosa no rosto dele na noite anterior, parecera que nunca mais queria tornar a vê-la. Somente o temor de que ela enfrentasse perigos na noite de Gazbiyaa o impedira de mandar que a retirassem do palácio. Mas o sentimento era mútuo. Ter de enfrentar o bonito sheik sob a luz fria do dia, depois da maneira como havia se comportado, era mais do que podia suportar. Não, aquele era um novo dia e não havia razão para ter de aceitar ordens dele.
– Por favor, informe Sua Majestade que fiz outros planos. – Como se quisesse demonstrar quais planos, tanto para si mesma quanto para a criada, endireitou a saia e ajeitou a gola da blusa. – Receio que uma reunião esta manhã não será possível. – Sua Majestade está esperando que eu a acompanhe. Nadia sentiu-se tomada pela indignação. Embora não desejasse causar problemas à criada, que devia ter cerca de 1,50m e idade o bastante para ser avó dela, ela não parecia propensa a forçá-la a nada. Mas ainda enquanto aquele pensamento lhe ocorria, dois guardas corpulentos surgiram do nada, ladeando a criada e indicando que era melhor que Nadia fizesse o que haviam lhe dito. ZAYED ESTAVA sentado na extremidade de uma ampla mesa de reuniões quando Nadia foi levada até ali pelos guardas. Ela franziu o cenho ao se ver afundando numa cadeira oposta a dele. – Bom dia. – Ele dispensou os guardas com um gesto breve. – Dormiu bem? O cenho dela ficou ainda mais carregado. Como se ele se importasse com a maneira como dormira. Não tinha intenção de trocar falsas amenidades. – Talvez queira me dizer o que estou fazendo aqui – retrucou. – Interessante. – Bastante ereto na cadeira, Zayed estudou-a com um olhar fixo. – Presumi que seria você a me confessar o que faz aqui. Nadia moveu-se na cadeira de couro, ocorrendo-lhe que toda a esperança de que pudesse desaparecer sem enfrentar embaraçosas perguntas sobre a noite anterior desvaneceu-se. Examinou o homem do lado oposto da mesa. Enigmático, bonito, ele ainda irradiava a mesma confiança e autoridade de antes, mas agora uma determinação calma substituía o jeito mais acalorado da noite anterior. E uma impecável camisa branca lhe ocultava o torso musculoso. – Não creio que isso importe agora. – Pode não importar para você, mas não estou acostumado a encontrar mulheres estranhas escondidas na minha cama. Talvez ao menos mate a minha curiosidade. Não pareceu que ela tinha escolha. A voz de Zayed podia ter soado macia e persuasiva, mas o frio sarcasmo que continha era claro demais. – Está certo. – Respirando fundo, Nadia endireitou os ombros e ergueu o queixo. Podia lhe contar parte de sua história, ao menos. Esperava que aquilo fosse o bastante para satisfazer a irritante curiosidade dele e poder sair dali. – Vim até aqui para escapar de um casamento arranjado. – Um casamento arranjado? – Sim. – Ela tornou a respirar fundo. Não queria realmente enveredar por aquele caminho. – Meu pai arranjou um casamento para mim, mas eu não quero me casar com o pretendente e, assim, decidi fugir. – Deu de ombros, como se encerrasse o assunto. Ao menos aquela parte da história era verdadeira. O pai lhe arranjara um casamento. Depois que ela recusara obstinadamente a fila de pretendentes que havia lhe sido apresentada ao longo dos anos anteriores, ele finalmente perdera a paciência e anunciara que a escolha fora feita. Seria a segunda esposa do sheik de um reino vizinho, um homem quase trinta anos mais velho do que ela. Informaram-lhe que tinha sorte no fato de o sheik estar preparado para aceitá-la, considerando sua idade avançada de 28 anos e sua reputação de falar o que pensava.
Fora naquele ponto que o desespero a dominara e Nadia soubera que teria de agarrar a chance de fazer algo com sua vida antes que fosse tarde demais. E para fazer aquilo pensara em usar a única arma que tinha em seu arsenal: seu corpo virgem. Um plano ganhara forma em sua cabeça. Se tivesse de casar, iria fazer o sacrifício valer. Usaria o casamento para acabar com as diferenças entre Harith e Gazbiyaa e tentar impedir a guerra. – Perdoe-me se estou sendo estúpido aqui. – Os olhos perspicazes de Zayed diziam que não era o caso –, mas se isso é verdade, não consigo entender por que, para escapar de um casamento arranjado, você teve de subir na minha cama e se oferecer a mim. Nadia mexeu no botão de pérola no punho da blusa. Ele estava obviamente determinado a levar aquilo adiante. – Porque se você tivesse… se nós tivéssemos... teríamos precisado nos casar e eu não poderia ser obrigada a me casar com mais ninguém. – Alto lá! – Ele soltou um riso desdenhoso. – Não está indo um pouco longe demais? – Recostouse na cadeira, relaxado, como se estivesse se divertindo agora. – Não querendo parecer indelicado, por que presume que uma noite de paixão com você seria o bastante para me convencer de que deveria me casar com você no ato? Você obviamente valoriza muito os seus atributos. Nadia baixou os olhos. – Porque eu teria lhe dado a minha honra. E, com certeza, esse é o maior prêmio de todos, não? Zayed franziu o cenho. De repente, sentiu-se como se fosse o errado ali. Quando não aceitara a oferta dela atrapalhara-lhe os planos e a menosprezara ao mesmo tempo. Olhou ao longo da mesa até onde Nadia estava sentada e observou-lhe o reflexo na superfície polida. Sentada com as costas retas, a cabeça erguida, os cachos colocados para detrás dos ombros, parecia imperiosa e vulnerável. E ainda notavelmente sexy, apesar da roupa conservadora que lhe cobria o corpo tentador por baixo. Ele pigarreou. – Deixe-me entender isto direito. Você fugiu de um casamento arranjado para a cama de um completo estranho com a ideia de fazer com que ele se casasse com você. Como exatamente isso funciona? – Meu futuro marido teria sido um completo estranho. Pelo menos, deste jeito teria sido eu a tomar a decisão. Eu teria exercitado a minha livre vontade em relação a quem me desposaria. – Mesmo que o futuro marido que escolheu não tivesse essa liberdade de escolha. O comentário a fez estremecer, mas Nadia se recobrou quase de imediato apertando os lábios cheios e erguendo o queixo. – E esse homem? Aquele com quem não quer se casar. Quem é ele? O que tem de tão ruim? – Tudo. – Presumo que sua família não pense assim, certo? – Eles veem essa como uma união vantajosa. É tudo que lhes importa. Além do mais, querem me ver casada para que eu não lhes cause nenhum problema. – Você é do tipo que cria problemas? Quem teria imaginado? O ar sério nos olhos de Nadia dissipou o humor do comentário. Aquilo não era motivo de riso.
– Simplesmente, tenho opiniões, vontade própria. Como uma mulher que não é considerada aceitável. Algo que você não entenderia. Mas Zayed entendia. Sua própria mãe, a sheika Latifa Al Afzal, esperara até o último momento para dizer o que queria. Mas o que havia revelado e a maneira como escolhera fazê-lo abalara os alicerces do reino de Gazbiyaa. E alterara irrevogavelmente a vida de Zayed. Participando secretamente de uma entrevista num dos canais de televisão controlados pelo estado, Latifa Al Afzal começara dizendo ao público perplexo que estava sofrendo de câncer terminal. Numa voz fraca mas estável explicara que estava preparada para enfrentar o seu destino, mas primeiro tinha um anúncio importante para o povo do reino. Seguindo as tradições das leis da terra, o reinado do marido dela como sheik estava terminando. Mas ele deveria ser sucedido não pelo filho mais velho de ambos, Azeed Al Afzal, mas pelo filho mais novo do casal, Zayed. O fato era que Azeed não era filho biológico dela, mas filho de uma mulher com quem o marido tivera um breve relacionamento. Essa mulher morrera dando à luz e, embora Latifa tivesse criado Azeed como se fosse seu e o amasse como tal, havia um fato vital que não podia ser mais mantido em segredo. A mãe biológica dele havia sido de Harith. As repercussões daquela revelação tinham sido terríveis. O pai de Zayed explodira de fúria diante do fato de que a esposa expusera o segredo da paternidade de Azeed, em especial de uma maneira tão pública, mas a notícia da doença dela e o genuíno desespero dele por ela estar morrendo desviou sua raiva para os filhos, para o reino, para o mundo em geral. O reino de Gazbiyaa foi lançando num turbilhão, ficou chocado ao extremo com o fato de que o príncipe Azeed, que tinha sido visto como o futuro governante, tinha o mesmo sangue do maior inimigo do país. O pai de Zayed parecera perigosamente perto de perder o controle, e manifestações violentas nas ruas só tinham sido impedidas porque seu tempo de governo estivera prestes a terminar. Azeed, nesse meio-tempo, simplesmente desaparecera, indo embora sem uma palavra a ninguém. O choque da notícia o deixara tão arrasado que ele não pudera mais ficar lá um instante sequer. O que significou que todos os olhos se voltaram para o segundo filho, Zayed, o príncipe playboy. Três anos mais jovem que o irmão, Zayed levara uma vida despreocupada e privilegiada, educado primeiro em Eton College, na Inglaterra e, depois, na Columbia University, em Nova York. Na verdade, mal pensara no próprio país, pois estivera absorto demais na expansão dos próprios negócios e distraído com os amigos e muitas mulheres bonitas que haviam cruzado seu caminho. Gazbiyaa parecera distante, a herança do irmão e a responsabilidade dele. Mas a declaração extraordinária da mãe dele mudara tudo. Deixando imediatamente Nova York e a vida que ele fizera para si mesmo lá, Zayed chegara ao leito de morte da mãe bem a tempo de lhe pegar a mão frágil e ouvir sua explicação entrecortada. Com uma humildade de partir o coração, ela se desculpara por tê-lo enganado, explicando que quisera que ele crescesse sem o fardo do futuro pesando-lhe em tenra idade. Que ela sempre soubera que teria de revelar que ele, Zayed, devia ser coroado como o sheik seguinte de Gazbiyaa, graças ao direito de nascimento, no entanto, mais importante, para a estabilidade do reino, todavia esperava que tivesse desfrutado a liberdade que lhe dera até então. Com a voz dela falhando até quase um sussurro, Zayed se inclinara para a frente
e a mãe lhe implorara que conversasse com Azeed, que lhe explicasse por que fizera o que tivera de fazer. Azeed não apenas era inadequado para o papel de sheik em termos de temperamento, mas se continuasse a ameaçar guerra contra Harith, estaria inadvertidamente incitando um conflito contra um país cujo sangue corria nas suas veias. Enquanto o último fio de vida se esvaíra de sua mãe, Zayed prometera promover sua paz com Azeed e ela se permitira fechar os olhos. Agora, Zayed olhava para a jovem a sua frente. Tão cheia de vida, tão vibrante; podia sentir-lhe a determinação, a força de vontade. Podia ver a maneira que estava lutando para assumir o controle de seu destino agora, para evitar a vida nas sombras que a própria mãe dele aceitara. De maneira alguma ela esperaria até estar em seu leito de morte um dia para deixar sua marca no mundo. Ele admirava Nadia por aquilo. Era uma demonstração de coragem, sem dúvida, e somada à sua beleza, era uma fascinante combinação. Uma ideia maluca começou a se formar. Ele se obrigou a contê-la. – Devo ficar lisonjeado que tenha sido essa sua força de vontade que a trouxe até a minha porta. Ou devo dizer à minha cama? Nadia torceu o nariz delicado com ar desgostoso, como se ao lembrá-la de suas ações, ele estivesse denegrindo a si mesmo. Ele não tinha ideia da forma que ela fazia aquilo. – Você era certamente uma melhor opção. – Bem, isso é alguma coisa, eu suponho. De que maneira? – Vi apenas uma fotografia do meu pretendente, mas é velho, gordo e calvo. – Certo. – Rindo agora, Zayed recostou-se na cadeira e cruzou uma perna sobre o joelho, segurando o tornozelo. – Cuidado, Nadia. Não vai querer que isso me suba à cabeça. – Acho que é tarde demais para isso. Outro revide. Altivo e elegante, mas inútil. Embora Zayed soubesse que podia dominá-la num segundo, ainda tinha de lembrar a si mesmo quem estava brincando com quem. Surpreendia-se em descobrir que estava se divertindo. Algo em estar perto de Nadia animava-o e não andara tendo muito disso recentemente. Fora submetido a outro acesso de mau humor do pai naquela manhã. Ao que parecia, o palácio estava cheio de mexericos de que o novo sheik fora apanhado se contorcendo na cama com uma beldade desconhecida na noite anterior. Com sua imagem de playboy precedendo-o, aquele era todo o combustível que precisavam para confirmar as suspeitas de que o sheik Zayed era realmente um mulherengo. Que, ao contrário do irmão Azeed, jamais seria um governante forte. Que o reino de Gazbiyaa iria adotar alguma espécie de hedonismo se o sheik ocidentalizado tivesse as coisas à sua maneira. Zayed não se dera ao trabalho de tentar explicar sua inocência. Ou de apontar que o pai não era livre de culpa em se tratando de seus relacionamentos com as mulheres. Nem sequer sugerira que os criados deveriam ser mais discretos. De nada adiantava. Já aprendera que em Gazbiyaa um problema tinha de ser contornado para ser resolvido com êxito. E era por tal razão que aquela ideia maluca recusava-se a ir embora. – Bem, por mais que eu queira acreditar que foi a minha excelente aparência que atraiu você para mim, não posso deixar de me questionar se o fato de eu ser o sheik de um reino extremamente rico possa ter influenciado a sua decisão.
– Não tenho interesse algum na sua riqueza. – Ali estava mais uma vez a indiferença. Mas Zayed acreditava nela. Encontrara algumas cavadoras de ouro com o tempo. Na verdade, orgulhava-se de saber identificá-las. E embora tivesse indagado, já soubera que Nadia não estava interessada em dinheiro. – Agora, se já encerrou os comentários ofensivos, tenho a permissão para ir embora? Ela começou a levantar, raspando a cadeira no piso, mas, do seu lado da mesa, Zayed levantou mais depressa e deteve-a com seus gestos. – Não, espere. Sente-se. – Ele se inclinou para a frente na mesa. De repente, deu-se conta de que não queria que ela fosse embora. – Ainda não terminamos a nossa conversa. – Acho que sim. – Nadia emitiu um murmúrio quase inaudível de contrariedade, mas tornou a sentar-se. – Posso ter uma proposta para você. – Que tipo de proposta? – Ela cruzou as pernas e, entrelaçando os dedos, repousou o queixo neles enquanto o observava com frieza. Zayed ficou admirado com a surpreendente pose. – Bem, pelo que entendi, você veio até aqui com a intenção de me persuadir a casar com você. Talvez fique surpresa em saber que estou levando a ideia em consideração. Ele fez uma pausa, estudando-lhe o rosto em busca da esperada surpresa, até perplexidade. Mas não havia nenhuma. Apenas calma, compostura. Ela arqueou as sobrancelhas bem-feitas para indicar que devia continuar. – Como sou o sheik de Gazbiyaa, deve entender que se espera que eu tome uma esposa. – É claro. – E no meu caso, quanto antes melhor, provavelmente. – Ele franziu o cenho de leve, ciente de que Nadia analisava cada palavra, que observava cada expressão facial sua. – Há certas ideias equivocadas a meu respeito, rumores sobre o meu passado. Preciso dispersá-los. Acho que um casamento rápido seria capaz disso. – Entendo. – As respostas curtas e frias dela começavam a mexer com os nervos dele. Começava a ter a sensação de que estava num tribunal e ela aguardava seu testemunho. Bem, não obteria nenhum. O passado dele lhe dizia respeito e não tinha de justificar nada. Endureceu a voz. – Assegurar a estabilidade do reino é de fundamental importância no momento. São tempos difíceis. Tenho de mostrar às pessoas que podem depositar sua confiança em mim, que estou totalmente comprometido com o papel de sheik e que vou governar este país de uma maneira justa e adequada. Vou fazer tudo que estiver ao meu alcance para obter isso. – E isso inclui se casar? – Sim. – Comigo? – Sim. Teoricamente. – Ele não podia crer que estava falando aquilo. – Então, está dizendo que, como sua esposa, eu ajudaria você a dar paz e estabilidade a Gazbiyaa? – Bem, indiretamente, sim. Finalmente, as camadas de gelo começaram a se dissipar e um brilho de entusiasmo surgiu nos olhos dela e em suas faces coradas. Puxa, ela era bonita.
Apesar do fato de que Zayed ficou ciente de que foi apenas a ideia de poder fazer algo para ajudar o reino que provocou aquela mudança nela em vez de algo relacionado a ele. Na verdade, ficou aborrecido em sentir o orgulho ferido. Não estava acostumado à indiferença de membros do sexo oposto. – E eu seria tratada como alguém igual a você. As minhas opiniões seriam ouvidas? – Acho que eu não conseguiria deter você. – Não era verdade? Ele percebeu que ela o estava examinando quando deveria ser o contrário. Mas seu entusiasmo era contagiante, sedutor. Extremamente sexy. Algo lhe avisou, a intuição talvez, que aquilo podia dar certo. E estava acostumado a confiar na intuição. Ela raramente lhe falhara nas finanças e o ajudara a assegurar negócios lucrativos que os concorrentes não haviam tocado e, igualmente importante, afastara-o de desastres que tinham parecido tão tentadores no papel. Aquilo podia ser descrito como um acordo de negócios? Se fosse o caso, era certamente incomum. Mas, para ser franco consigo mesmo, não era tanto a intuição que o estava levando àquela decisão, mas a libido. – Da maneira como vejo as coisas, um casamento entre nós poderia trazer benefício mútuo. Salvaria você de uma união indesejável e, em troca, você me ajudaria a restaurar a confiança do povo de Gazbiyaa. Mostrando-lhes que podem depositar confiança em mim, que eu sou um homem honrado. Chame isso de um contrato entre nós, se preferir. – Um contrato? – Sim. Um contrato de casamento. Ele observou enquanto Nadia assimilava a informação, a curva graciosa de seu pescoço, enquanto se virou ligeiramente para o lado para pensar, a concentração que demonstrou quando mordeu o lábio inferior com dentes alvos e pequenos. A sala estava silenciosa exceto pelo tique-taque de um relógio em algum lugar nas sombras e o murmúrio baixo do ar-condicionado. Finalmente, ela se virou para olhá-lo diretamente nos olhos. – Nesse caso, eu aceito a sua proposta. – Nadia sustentou-lhe o olhar com clareza. – Eu concordo em me casar com você.
CAPÍTULO 4
– TERMINAMOS, SENHORITA. – Finalmente satisfeita, a líder da equipe feminina de assistentes deu um passo atrás para que todas pudessem admirar o respectivo trabalho. Houve uma pausa expectante enquanto esperavam que Nadia se virasse e olhasse para seu reflexo no enorme espelho de moldura dourada, mas ela hesitou, precisando de um instante para conter os nervos. Sabia que assim que visse a si mesma, arrumada e com joias em preparação para a cerimônia, não haveria como se esconder do fato de que aquilo iria realmente acontecer. Estava prestes a se casar com o sheik Zayed Al Afzal. Tudo fora providenciado com desnorteante rapidez. Mal havia concordado com o contrato de casamento de Zayed e se vira sendo conduzida por uma série de corredores para levarem as alegres notícias ao pai dele. Com exceção de que não eram alegres notícias; era puramente um acordo prático. O exato uso da palavra “contrato” deixava isso perfeitamente claro e ela o odiava. Mas ela não estava em posição de exigir romantismo, não importando quanto, secretamente, pudesse apreciá-lo. Afinal, era culpada de um segredo, aquela que o estava enganando. Depois do casamento, teria de confessar quem realmente era – ninguém menos que a princesa Nadia de Harith. Só em pensar naquilo um nó de ansiedade já se formava em seu estômago. Até então, ninguém suspeitara de nada. O pai de Zayed, Ghalib Al Afzal não fizera perguntas quando o filho a apresentara como iminente esposa. Na verdade, mal a olhara antes de menear a cabeça brevemente para o filho por ele estar, enfim, fazendo algo para remediar sua imagem arranhada. Apesar de sua rudeza, Nadia viu ali um velho que estava obviamente lamentando a perda da esposa. De sua parte, Zayed presumiu que ela fosse de Gazbiyaa e, com tato, Nadia mantivera as coisas daquela maneira. Ajudou-a o fato de que poucos fora de seu país sabiam de sua existência e muito menos de como era sua aparência. O pai a mantivera escondida, como um bem valioso, para ser usada para fins de barganha apenas, para proporcionar o maior lucro. Ao mesmo tempo, ela odiara e se revoltara contra aquilo, desprezando a maneira como fora tratada e enfurecendo o pai ao recusar sua escolha de pretendentes. Mas agora seu anonimato trabalhava a seu favor.
Por insistência de Nadia, os convites de casamento foram mantidos deliberadamente vagos. Com tantas outras coisas ocupando seu tempo, Zayed aceitou a declaração veemente dela de que não queria que a família soubesse de seu casamento de imediato, presumindo que ela sabia o que era melhor e nem por um momento desconfiando da verdadeira razão. Ela o viu bem pouco durante as breves semanas que se passaram desde que o casamento foi decidido. Os deveres dele como sheik do poderoso reino pareciam intermináveis e era raro ter algum tempo livre. Se ela se sentia como se fosse apenas mais um dos projetos que ele conduzia era porque, na verdade, o era. O farfalhar de tecido lembrou-a de que vários pares de olhos a observavam, ansiosos por sua reação a todo trabalho árduo. Respirando fundo, Nadia virou-se devagar para seu reflexo. Soltou uma exclamação baixa de admiração. Nunca imaginara que pudesse parecer tão bonita. O vestido tinha um caimento perfeito. Cobrindo um dos ombros, deixava o outro nu e o corpete ajustado mantinha-lhe os ombros empinados e destacava a cintura fina. Os metros de seda que compunham a saia e o véu, que era preso na parte de trás da cabeça, eram finos como asas de libélula e brilhavam gentilmente sob a luz. De um verde-claro como as águas de uma lagoa rochosa, o traje inteiro era bordado à mão com fios de ouro e de platina e adornado com milhares de cristais e pérolas num desenho elaborado que descia diagonalmente desde o corpete e, então, se espalhava pela saia em várias direções. O efeito era sofisticado, etéreo e de tirar o fôlego. Um olhar mais de perto mostrou que nenhuma parte de seu corpo deixou de ser adornada pelo grupo de mulheres. Desde os pés delicadamente pintados com hena, que haviam sido calçados com sandálias douradas incrustadas de joias, até a incrível coleção de joias antigas carregadas de diamantes e pérolas que tinham sido fechadas em torno do pescoço, pendiam dos lóbulos das orelhas e lhe chegavam ao cabelo. A maior pérola em forma de lágrima pendia perfeitamente do centro de sua testa. – Obrigada – falou ela para o reflexo conjunto das assistentes depois que seu longo silêncio começara a deixá-las com o semblante preocupado. – Muito obrigada. – Gostaria de ter dito mais, mas não confiava em si mesma. Suas emoções já estavam instáveis e desconfiava que, caso se abrisse, mesmo que fosse para elogiar aquelas mulheres bondosas por seu trabalho árduo, acabaria desmoronando. Tornou a respirar fundo. Tinha de ser forte. Aquele era o dia do seu casamento. E que casamento seria. Se Nadia achara que seria uma cerimônia simples, com o tempo curto e o acordo pouco convencional a que ela e Zayed haviam chegado, não poderia ter estado mais enganada. O futuro sogro obviamente viu a ocasião como uma chance de mostrar ao mundo a extrema riqueza e prosperidade de Gazbiyaa, o que significou uma celebração como o reino nunca vira antes. Nadia se admirara com a transformação do palácio num suntuoso local de casamento. Todas as salas interligadas do trono tinham sido abertas e agora fileira após fileira de cadeiras brancas tinham sido posicionadas para a cerimônia. E encimando uma plataforma numa das extremidades do salão principal, dois tronos dourados aguardavam os noivos. Ao vê-los, Nadia sentiu uma onda de apreensão percorrendo-a, por saber que era ela que se sentaria num daqueles tronos. Que aquilo estava realmente acontecendo.
Todos os ambientes do palácio tinham sido enfeitados com as mais raras e belas flores exóticas que haviam sido importadas de várias partes do mundo. Estavam sendo cuidadas por hábeis floristas que as dispuseram em formatos de pavões e elefantes em tamanho natural ou as tornaram enormes arranjos pendendo dos tetos. Do lado de fora, hectares de jardins tinham sido transformados numa fantasia beduína com tendas amplas decoradas com belas sedas e inestimáveis tapetes persas por dentro. Ali os lugares eram dispostos para o entretenimento, com confortáveis poltronas e enormes almofadas posicionadas para a vista privilegiada. Nadia vira alguns dos artistas chegando: atores, malabaristas, acrobatas. Até assistira aos engolidores de fogo praticando da janela do quarto, iluminando o céu noturno com as façanhas de aspecto perigoso. Sabia que haveria desfiles de animais também, como de elefantes e camelos. Havia rumores até de que um pobre tigre havia sido transportado de avião e estava enjaulado em alguma parte do palácio, um convidado relutante do casamento. Bem, eram dois. Três, na verdade, caso se contasse Zayed. De maneira alguma os preparativos exuberantes do casamento refletiam os sentimentos dos noivos. No que dizia respeito à Nadia era um meio de se chegar a um fim, algo que deveria ser feito da melhor maneira possível para assegurar o futuro do reino. Se aquilo significava fazer parte daquele ridículo circo, então faria. Se significava partilhar de uma cama com o sheik Zayed, faria aquilo também. Sacrifícios tinham de ser feitos para um bem maior. Se bem que a ideia de ir para a cama com Zayed não era um sacrifício. Longe disso. Sozinha na cama, descobrira-se cada vez mais obcecada com a ideia de como seria entre ambos. A ideia de Zayed, nu e musculoso, tomando-a nos braços, cobrindo o corpo dela com o seu, não com raiva como na vez anterior, mas pronto para fazer amor com ela, tirar-lhe a virgindade, enchia-a de tanto desejo que fazia seu corpo se retorcer e ondular entre os lençóis, que a levava a colocar a mão de maneira hesitante entre as pernas para abrandar as sensações. Chocava-a aquela sensação que não era nada familiar, aquele pulsar, aquele despertar sexual que só o fato de pensar em Zayed podia produzir. Assustava-a também. Porque isso era acompanhado de uma perda de controle sobre seu próprio corpo e seus sentimentos por Zayed. E era algo que não podia deixar acontecer. – Você está bonita, Nadia. – Duas senhoras da família Al Afzal entraram no quarto, e as assistentes dela se retiraram em silêncio. Inclinando-se para a frente, uma delas ergueu o véu cuidadosamente para lhe cobrir o rosto. – Assim. Agora, você está pronta. NADIA MENEOU a cabeça, incapaz de falar. De acordo com a tradição, aquelas mulheres vestidas de maneira extravagante estavam ali para a acompanharem à nikha, a cerimônia de casamento e, embora não fossem más, certamente não eram a própria mãe dela, que não fazia ideia de que a filha estava se casando naquele dia. Tomada por uma sensação de que aquilo era surreal, ela se deixou guiar para ir ao encontro do noivo. O trio entrou na sala do trono através de uma porta que levava diretamente até os degraus da plataforma e, do outro lado da sala, Zayed fazia o mesmo. Nadia subiu os degraus com o coração aos saltos, sem olhar para o grande número de convidados que obviamente a olhava. Um murmúrio reverente se espalhou pela sala.
Ambos chegaram aos dois tronos ao mesmo tempo e pararam, olhando um para o outro. Ao ver o noivo, Nadia sentiu o restante do fôlego se esvair. Nunca vira um homem tão incrivelmente bonito. Ele usava um sherwani cor de marfim, e o pesado brocado do casaco justo até os joelhos era bordado com seda branca e dourada e a gola e os punhos incrustados de pérolas. Cinco botões de ouro e pérola estavam abotoados na frente. Alto e orgulhoso, ele estava magnífico, e Nadia esperou que o véu lhe encobrisse o rubor causado pelo anseio em vê-lo. Ambos se entreolharam e, por um breve segundo, foi como se houvesse apenas os dois se reunindo para embarcar naquela aventura. Zayed percorreu Nadia com o olhar e, quando tornou a fitá-la, apenas moveu os lábios para dizer “uau” em silêncio. Nadia sentiu uma tola onda de orgulho. Em seguida, ele lhe tomou a mão com gentileza e os dois se sentaram nos respectivos tronos. E a breve cerimônia começou. Com a voz sonora do imam lendo o Alcorão ao lado deles, Nadia arriscou um olhar para o mar de pessoas adiante. Havia centenas de convidados, englobando realeza e chefes de estado, primeiros ministros e dignitários, todos vindos dos quatro cantos do mundo para assistir ao casamento do sheik Zayed Al Afzal. E também para testemunhar a enorme riqueza e poder do reino de Gazbiyaa. Era algo que o pai de Zayed, que assistia a cerimônia imperiosamente na primeira fileira, estava determinado a demonstrar através daquele casamento. – Nadia Ayesha. Você aceita Zayed Omar Jamal como seu marido e companheiro para a vida? Aturdida, Nadia percebeu que o imam se dirigia a ela, que Zayed já pronunciara seus votos e que agora centenas de pessoas aguardavam sua resposta. Fazendo as palavras passarem pela garganta seca como a areia do deserto, ouviu-se dizendo: – Aceito Zayed Omar Jamal como meu marido e companheiro para a vida. Observou enquanto Zayed colocou a aliança de ouro no seu dedo e estendeu a mão para que fizesse o mesmo. Lutando para controlar o nervosismo, ela colocou, então, a aliança no dedo dele. – Eu os declaro marido e mulher. Zayed inclinou-se na direção de Nadia e seus olhos se encontraram brevemente antes que ele levantasse o véu e depositasse um beijo nos lábios dela, lábios que já haviam estado entreabertos à espera. Ela teve certeza de que ouviu um “aah” em alguma parte da multidão. – COMO VOCÊ está? Zayed olhou para sua linda esposa enquanto paravam ao lado do bolo de casamento que era mais alto do que ela. Nadia se comportara perfeitamente a tarde inteira, o exato exemplo da graça e do decoro, uma mistura da anfitriã impecável como a recém-casada recatada. Foi quase como se já tivesse feito aquilo antes. Havia conversado com os convidados, beijado, agradecido e abraçado uma leva interminável de pessoas, sorrindo graciosamente ou baixando os olhos com recato diante dos elogios. Havia encantado a todos. Assim como deixara a ele encantado também. Se bem que seduzido era uma palavra mais adequada no seu caso. Seja lá o que fosse, era uma força surpreendente e poderosa. Mas agora podia lhe ver o cansaço no rosto, e foi o que o levara a fazer a pergunta.
– Bem, obrigada. – Ela ergueu o queixo daquela maneira imperiosa que parecia reservar para ele. – Acho que está tudo indo muito bem. Não foi o que ele quisera dizer, e ela sabia daquilo, mas Zayed não iria discutir. – Venha, vejamos se conseguimos derrotar esta fera. – Ele sacudiu a espada cerimonial de leve na mão antes de levá-la até a camada mais baixa do bolo e esperar que Nadia se reunisse a ele. Sentiu-lhe a mão tremer de leve sobre a sua, e ambos pressionaram o bolo com a lâmina. O corte do bolo significava que o banquete terminara. Cem pratos diferentes preparados por chefs renomados de todo mundo tinham sido servidos e acompanhados pelos melhores vinhos para os que haviam optado por beber, e agora era hora do entretenimento começar. Gastronomicamente saciados, os convidados começavam a se levantar das mesas, passando pelas magníficas esculturas de gelo até a área externa onde a banda já começara a tocar, com as notas de música árabe ao fundo. – Zayed, Nadia, aqui! Do outro lado da sala, um homem bonito havia se levantado e fazia um gesto amplo para que se aproximassem. Nadia sentiu a pressão da mão quente de Zayed em suas costas enquanto a guiou pelo labirinto de mesas até o homem que os chamara. Imediatamente, dois outros homens à mesma mesa se levantaram. As três belas esposas deles sorriram amplamente e fizeram gestos a Nadia para que se juntasse a elas. Com beijos, cadeiras raspando e tapas nas costas, todos estavam sentados de novo. – Bem, Zayed, quem teria imaginado? Todos nós quatro casados! – Sim, Zayed, e acho que nos deve um pedido de desculpas. Faz apenas poucas semanas desde o meu casamento com Clio e não ouvi uma palavra sua desde então. Aliás, não houve uma conversa de que você teria de festejar duas vezes mais para compensar o fato de que nós três não estávamos mais livres? – Stefan! – Uma linda ruiva censurou o marido com um olhar significativo. – Por favor, perdoe meu marido. Receio que quando esses quatro se juntam, eles voltam a ser colegas de quarto da faculdade. É algo com que se tem de conviver. – Além do mais, imagino que, quando Zayed ficava falando em diversão, não havia conhecido a linda Nadia. – Ei! – Dessa vez, a repreensão partiu de Olivia ao fingir fuzilar o marido com o olhar. – O que foi? – Rocco deu de ombros de um jeito bem italiano. – Eu só estava dizendo... – Sabemos o que você estava dizendo, obrigada. Apenas tome cuidado com a maneira como diz. – Os olhos dela brilharam com ar maroto. – Não que algum de nós vá discordar de você. Nadia, você é linda. E eu não consigo tirar os olhos desse vestido. – Obrigada. – Nadia sorriu educadamente, mas sentiu uma ponta de mágoa em seu íntimo. Havia sido apresentada ao animado grupo na noite anterior: os três amigos mais próximos de Zayed e suas esposas. Pelo sorriso no rosto dele, podia ver que estava reservando alguns instantes para relaxar, para ser ele mesmo, para ser feliz. Aquelas pessoas representavam a vida anterior dele, a que tivera de deixar para trás quando fora obrigado a retornar para Gazbiyaa. Obrigado a se casar com ela. – E então, diga-me, quem é o estilista?
– Vejam só isso! Liv me diz para parar e agora quer falar sobre compras! – Rocco recostou-se com os braços atrás da cabeça e sorriu para todos à mesa. – Isto não é sobre compras. Bem, talvez um pouco. – Olivia riu e tocou o cabelo loiro. – Desculpe. Meu marido e eu estamos no ramo de moda e nunca conseguimos nos desligar totalmente. E Alessandra aqui é fotógrafa de moda. Ela e eu estávamos tentando adivinhar quem poderia ser o estilista. Se bem que, agora que vejo o seu vestido de perto, acho que não temos nenhuma ideia. O detalhe da costura é surpreendente. Veja, Alessandra. Alessandra afastou a cadeira para trás, precisando de espaço para o ventre de grávida antes de se inclinar para a frente e olhar o vestido de Nadia mais de perto. – E então, Zayed. – Christian afastou os olhos de adoração da esposa e inclinou a cabeça para o lado. – Este casamento foi bastante repentino. Não há nada que queira nos contar a respeito? – Christian! – Alessandra dirigiu um olhar zombeteiro ao marido antes de segurar a mão de Nadia. – Por favor, Nadia, nos tire da nossa angústia. Quem fez esta bela obra de arte? – Hum... – Nadia olhou para os rostos expectantes daquelas mulheres bonitas. O fato era que não fazia ideia. Não parecera fazer importância até o momento. Tivera mais coisas com que se preocupar do que com quem fizera o vestido. Mas, de repente, pareceu importar muito. Queria fazer parte daquele alegre grupo. Os homens haviam passado para outra conversa. Ela ouviu Rocco indagar a Zayed sobre o irmão, se ele estava ali no casamento, e Zayed responder um tanto brusco que ele recusara o convite. – Lamento muito – mencionou ela distraída por Zayed e aborrecida por não saber a resposta. – Não me lembro do nome. Estupidez a minha. – Ainda mais estupidez foi sentir a mágoa que tentou engolir e a ameaça de lágrimas que se esforçou para conter. – Bem, seja lá quem for fez um magnífico trabalho. – Afastando a cadeira para trás, Clio levantou-se. – Sabem de uma coisa? Acho que vou retocar a maquiagem. Você poderia me mostrar onde é o toalete feminino, Nadia? Embora eu tenha conhecido o palácio ontem à noite, é tão vasto que posso acabar me perdendo. – Também vou. – Alessandra levantou-se, pousando as mãos sobre o ventre. – Eu e este pequenino nunca recusamos uma ida ao banheiro. Olivia também se levantou e, logo, os quatro rostos delas estavam refletidos nos espelhos ornamentais do toalete. – Não estão errados quando chamam este de o grande dia, não é? – Clio passava um pente pelo cabelo ruivo, mas, ao mesmo tempo, estudava o rosto de Nadia. – Você precisa descansar um pouco, deixar que sua família e amigos apóiem você. Destinou-se a ser um conselho bondoso, mas quando os músculos de Nadia se retesaram visivelmente, as três mulheres perspicazes notaram de imediato. – Não tenho nenhuma família aqui. – A atitude defensiva a fez soar fria, pouco amistosa. E pelos olhares trocados e gestos quase imperceptíveis de ombros no espelho, pôde ver a surpresa delas. – Estou brigada com a minha família. – Oh. Bem, seremos a sua família agora, não é, meninas? – Animada, Olivia passou um braço em torno dela.
– Você e Zayed são perfeitos um para o outro, e tenho certeza de que vocês vão ser felizes... Ei, o que é isso? Conforme as lágrimas começaram a rolar pelo rosto de Nadia, Olivia estreitou-a junto a seu peito e Clio e Alessandra tomaram parte no abraço também. – Isso mesmo, um abraço em grupo. Sei como é. Suas emoções parecem fora de controle, não é? Mas você está fazendo um excelente trabalho e Zayed é um bom homem. Você tomou a decisão certa. – Vocês acham? – interrogou Nadia murmurando no meio do abraço. – Nós sabemos. Pergunte às centenas de outras mulheres que tentaram ganhar uma aliança dele, mas não conseguiram! – Mas, falando sério, Nadia. – O sotaque inglês de Clio soou bastante autoritário. – Conheço bem Zayed. Cursamos juntos a universidade, e ele entrou comigo na igreja no meu casamento, apoiou-me quando mais precisei. Não vai encontrar homem melhor. Houve uma pausa significativa, eventualmente rompida por Olivia. – E você não está sozinha, sabe? Pode contar conosco. Nós quatro temos de nos unir. Precisamos de toda solidariedade que pudermos obter para lidar com os nossos maridos alfa. – É verdade – concordou Alessandra. – O truque é fazê-los pensar que estão conseguindo as coisas à sua maneira quando estão fazendo o que queremos o tempo todo. Há um truque nisso, mas posso ensiná-la. – Obrigada! – Saindo do círculo para respirar, Nadia apanhou-se sorrindo e aceitando a caixa de lenços descartáveis que Olivia lhe estendeu. – Muito obrigada. Estou me sentindo melhor agora. Apenas deixei-me levar um pouco. – Lembre-se de que a melhor parte ainda está por vir. – Liv! – O quê? É a verdade. Aproveite, Nadia. A sua noite de núpcias é especial. Zayed é um homem de sorte por ter você. Certifique-se de que ele saiba disso. – Está bem, obrigada pelos conselhos. E pelo apoio também; significa muito para mim. – Com o ar determinado, Nadia inclinou-se para a frente na direção do espelho e, então, encolheu-se em desalento. – Oh, não. Eu estou péssima. – Tolice. Você está linda. Apenas a sua maquiagem está um pouco borrada, mas não é nada que alguns minutos nas mãos de especialistas como nós não possam resolver. Venham, meninas, peguem suas bolsas de maquiagem. Os maridos delas haviam deixado o salão de banquete quando as quatro retornaram. Assim, de braços dados, elas saíram para ver a movimentação da noite. Um grupo de homens jovens vibrava alto em uníssono e, conforme elas se aproximaram, ficou clara a razão. Observado a uma distância segura pelos convidados reunidos, Zayed estava sendo atirado no ar, o casaco sherwani se abrindo conforme subia e descia. No centro do grupo festivo estavam os rostos sorridentes e os braços musculosos de seus melhores amigos: Rocco, Christian e Stefan. Pela primeira vez naquele dia, Nadia apanhou-se rindo. Em especial quando Olivia lhe sussurrou ao ouvido: – Nós lhe afirmamos. Eles nunca crescem.
Conforme a noite foi passando, Nadia começou a relaxar e até se divertiu. Seria difícil não fazêlo, levando em conta o grau de entretenimento à volta, embora tivesse desviado o olhar quando chegara o momento das dançarinas do ventre. Podia ficar sem aquela lembrança de como chegara ali. Havia cantores e instrumentistas tocando tambores e alaúdes, passando por entre as fontes iluminadas, encorajando os convidados a se levantarem e dançarem sob os lustres gigantescos que pendiam das tendas. Vez ou outra Nadia avistava as novas amigas, contente em ver que estavam se divertindo. Mais comida foi servida: enormes bandejas de kebabs e tabule, pilhas de baklava de formato triangular e o bolo basbousa, além de frutas secas e frescas. Zayed, naquele meio-tempo, estava sendo o anfitrião perfeito, atencioso, charmoso e solícito, que sem dúvida era, aproveitando ao máximo a ocasião para fazer contatos. Nadia não teria esperado menos dele obviamente, mas Zayed estava desempenhando um papel, e ela também, e, por alguma razão, aquilo a magoava. Vez ou outra, ele aparecia a seu lado e ela tinha de conhecer algum dignitário estrangeiro, ou sua esposa antes que Zayed desaparecesse educadamente, deixando-a olhar a distância enquanto abraçava outra personalidade de túnica branca e turbante. Finalmente, as celebrações da noite estavam chegando ao fim. Enquanto os convidados eram encorajados a sair para assistir à queima de fogos de artifício, Nadia sentiu o braço de Zayed deliciosamente em torno de sua cintura ao seguirem na frente. – E, então, esposa, aqui estamos. – Sim. – Ela ficou surpresa em descobrir que gostou da palavra esposa. E decididamente gostou da maneira que ele a estreitou mais junto a si, deixando-a ciente de uma onda de desejo enquanto lhe inalava a agradável colônia cítrica. – Aqui estamos. Explosões reverberaram ao redor e uma série de fogos de artifício prateados e dourados iluminaram o ar. Ambos ergueram a cabeça para assistir. – Acho que ainda não lhe disse como você está linda. – Obrigada. – Nadia continuou a olhar para o céu. O calor do corpo de Zayed ao seu lado produzia uma queima de fogos à parte em seu íntimo. – Falo sério. Eu não poderia ter desejado uma noiva mais bonita. Você foi incrível, e não deve ter sido fácil. Quero que saiba como estou orgulhoso de você. Ela sentiu a espinha se retesar e o braço em torno de sua cintura pareceu subitamente controlador. Não queria que ele sentisse orgulho dela, não daquela maneira. Como a princesa Nadia de Harith ser a anfitriã perfeita havia sido uma das habilidades que haviam esperado que adquirisse. Parecer bonita, comporta-se com recato e, mais importante, guardar suas opiniões para si. Com certeza, não queria elogios, nem reconhecimento por aquilo. – Mas lamento que sua família não esteja aqui hoje, que você não pôde lhes contar sobre o nosso casamento. Nadia gelou, temendo que as palavras ditas ao acaso pudessem conter mais significado, que ele pudesse ter descoberto algo a seu respeito naquele dia.
Não tivera contato com a família desde que partira de Harith, exceto pelo envio de uma mensagem para lhes dizer que estava a salvo e bem. Os familiares não faziam ideia de que estava em Gazbiyaa e muitos menos de que acabara de se casar com o sheik Zayed Al Afzal. A desculpa que dera a Zayed, de que não podia lhes contar porque eles jamais a perdoariam por ter escapado de seu casamento arranjado, era apenas a ponta do iceberg a bloquear o sol do deserto se a família dela soubesse da verdade. Era algo que não podia acontecer enquanto a ameaça de guerra entre os dois reinos não tivesse terminado. Nadia virou a cabeça discretamente para tentar analisar o semblante de Zayed. De perfil, ele ainda olhava para o céu, seu rosto refletindo as cores brilhantes dos fogos de artifício, mas, percebendo que ela o observava, virou-se para olhá-la. – Quando as coisas tiverem se acalmado, encontraremos um meio de obter algum tipo de reconciliação. Não houve o menor vestígio de sarcasmo, apenas o desejo de vê-la reconciliada com a família. Aquilo tornou o fato de tê-lo enganado cem vezes pior. O encerramento dos fogos de artifício fez a multidão vibrar, e os nomes Nadia e Zayed surgiram no céu, reluzindo dentro de um coração dourado. Zayed riu e a puxou mais para si. – Nossos nomes cercados de luzes, Nadia. Quem teria pensado? Quem, de fato? Mas enquanto as últimas letras arderam e morreram, não deixando nada além de uma nuvem de fumaça, Nadia sentiu um gélido calafrio percorrendo-a. Um esplêndido espocar de celebração e, então, nada. Esperou que não fosse um presságio para o casamento de ambos.
CAPÍTULO 5
– BEM, ACHO que podemos dizer que esta é a suíte nupcial. – Fechando a porta atrás de ambos, Zayed observou a cena, o paletó que colocara no fim da festa suspenso por um dedo acima do ombro. – Ou isso, ou viemos parar no meio de um bolo de casamento. Nadia podia ver o que ele queria dizer. Diante de ambos, havia uma enorme cama de formato oval. Estava erguida numa plataforma incrustada com rosas creme e cor-de-rosa, com as flores perfeitas dispostas em fileiras meticulosas, como se tivessem sido espremidas de um saco de confeiteiro gigante. Mais pétalas de rosas estavam espalhadas pela cama e pelas enormes almofadas ao redor, ao passo que metros de um tecido suave branco formava um dossel desde o teto e caindo em camadas suntuosas até as laterais do quarto. Um par de arranjos florais gigantes de cada lado da cama completava o cenário extravagante. Secretamente, Nadia o achou bonito, tão romântico, o ambiente perfeito para a primeira noite de paixão entre um casal apaixonado. Mas aquele não era o caso, era? O que tinham ali não era amor, nem emoções verdadeiras, ao menos não do tipo romântico. Era o amor pelos respectivos países que os tinha feito entrar naquele contrato, não amor um pelo outro. O que fazia o perfume acentuado das rosas parecer estranhamente pungente. – Alguém obviamente teve muito trabalho. – Ela olhou ao redor, levando a mão ao pescoço com nervosismo. – É melhor não desperdiçarmos nada, então. – Zayed atirou a um canto o paletó. Então, subindo na plataforma, estendeu uma das mãos para ela. – Bem-vinda ao meu leito floral. Nadia sentiu-se sendo puxada para perto de Zayed. Seu coração disparou de encontro ao peito dele, que agora vestia um colete justo branco que se moldava ao torso como uma segunda pele. Seus braços a envolveram. Com a cabeça virada, Nadia podia lhe sentir as batidas do coração, inalar-lhe a fragrância máscula, sentir a intensidade sexual pulsando entre ambos como uma força física. Seu corpo inteiro era tomado por aquilo. Deu-se conta de que o desejava. Imensamente. Hesitante, ergueu os braços, correndo as mãos pelo colete dele, pelos ombros e descendo até a cintura da calça. Era tão bom tocar-lhe o corpo másculo. Era tão forte e atlético e, ainda assim,
estremecia de leve sob seu toque. Adorou exercer aquela espécie de poder sobre ele, o fato de que, a despeito de seu controle, de sua rígida autoridade, podia lhe fazer aquilo. Adorou também a crescente evidência de seu poder que agora se avolumava sob a calça dele, de encontro à virilha dela. Pendendo a cabeça para trás, Nadia fechou os olhos e sentiu o hálito quente e agradável em suas faces. A pura excitação sexual a percorria, produzindo-lhe uma onda de calor que ia até o centro de sua feminilidade, estimulando-lhe os lábios que ansiavam por um beijo que teria de acontecer a qualquer minuto. Mas não aconteceu. Em vez disso, sentiu Zayed se afastar para trás e, conforme ela abriu os olhos com ar cauteloso, viu que ele a estudava, estreitando os olhos. O rubor subiu pelo pescoço dela até as faces. Por que ele a estava olhando daquele jeito? Uma onda de humilhação dominou-a e o olhar punitivo dele colidiu com seu desejo até que deixou os braços caírem ao longo do corpo. Ela baixou os olhos para as sandálias incrustadas de joias a seus pés, desesperada para tentar esconder a evidência da traição de seu corpo. Esconder-se atrás da fachada que estivera lutando para manter o dia inteiro. Mas algo na energia nos olhos dele ameaçou finalmente roubar os resquícios de força que tinha. Desempenhar o papel da noiva perfeita o dia inteiro acabara sendo desgastante e, agora, diante daquele último desafio, tinha a sensação de que estava enfraquecendo. De repente, sentia-se bastante vulnerável, bastante sozinha. A enormidade do que havia feito, o maluco salto de fé que havia dado para estar ali, estava fazendo com que o quarto se fechasse em torno dela, causando-lhe uma onda de pânico. Estava presa a um casamento sem amor com um homem que mal conhecia. Um homem que ainda não sabia nada sobre quem ela era de verdade. O fato de que seu corpo inteiro o queria, de que ansiava pelo beijo dele, seu toque, de que desejava que ele a tomasse de uma maneira puramente carnal, só aumentava a solidão, o vazio que a tomavam de assalto. Como a força daquelas emoções a assustava... Não sabia como lidar com elas. E por aquele motivo não sabia como lidaria com a situação se ele a rejeitasse agora. Obrigando-se a respirar fundo para vencer o pânico, Nadia lutou para encontrar seu equilíbrio. Não podia esmorecer e cair agora. Era a única responsável pelo que estava enfrentando. Fizera a sua cama e, agora, deitava-se nela. Se bem que, ao observar Zayed outra vez e deparar com seu longo olhar, desconfiava que poderia se deitar nessa cama sozinha. Porque em vez de retribuir o desejo aberto, óbvio que ela lhe revelara ingenuamente, ele parecia estar considerando-a um entretenimento social de médio interesse. Se estava desesperada para que ele fizesse amor loucamente com ela naquela cama de contos de fadas, Zayed estava parado ali como a personificação do controle. Sem mencionar a personificação da fantasia de qualquer mulher. Ele tinha os braços nus e musculosos cruzados sobre o peito, a cintura baixa da calça permitia ver um trecho de pele salpicada de pelos negros abaixo do colete justo. Nadia engoliu em seco. Bem, podia se controlar também. Recuou, mas a sandália enroscou nos muitos metros da saia e ela tropeçou na beirada da plataforma.
– Cuidado. – Zayed envolveu-a imediatamente com seus braços novamente antes que caísse, segurando-a junto a si. – Este tipo de cama deveria vir com avisos contra perigos. Inalando a fragrância no cabelo de Nadia, Zayed se deu conta de que era ela que deveria ter os avisos contra perigos. O fato de estar sozinho com ela agora o colocava em perigo de perder todo o autocontrole que possuía. Seu corpo clamava para que cedesse, para que a possuísse. Tinha de fazer o que fosse preciso para aplacar o desejo que o dominara desde o primeiro instante em que a vira e que agora estava como uma fornalha. Mas, ainda assim, hesitou. Precisava ter certeza de que Nadia queria aquilo também. E embora ela tivesse demonstrado que estava ali de bom grado minutos antes, abraçando-o, correndo as mãos sobre o peito dele de um jeito delicado que o excitara de imediato, quando a fitara, o que vira em seus olhos o detivera. Desejo, sim, mas mesclado a ansiedade. E uma paixão também que parecia tê-la surpreendido em sua inocência. Mas fora uma paixão misturada a insegurança, dúvida. Zayed sabia que devia tentar ir devagar, que devia fazer as coisas da maneira certa para Nadia, mesmo que tivesse de recorrer a todo seu autocontrole. A questão era que havia algo deixando-a nervosa. Apesar de sua atitude extrovertida, do comportamento provocante no primeiro encontro de ambos, ele não tinha dúvida de que ela era sexualmente inexperiente. De que era virgem, de fato. Era por essa razão que estava tão tensa. Zayed não se lembrava da última vez que fizera sexo com uma virgem. Provavelmente dez anos antes na Columbia University. Ele e os amigos Christian, Stefan e Rocco tinham tido a reputação bem-merecida de namoradores. Mas agora era completamente diferente. Nadia era sua esposa; aquele relacionamento era permanente. Ele tinha de tentar descobrir o que estava se passando na bonita cabeça dela antes de poder levar as coisas adiante. – Por que não nos sentamos? – Ele pegou-lhe a mão e ajudou-a a sentar na beirada da cama, acomodando-se a seu lado. – Hoje foi um dia e tanto, não? – Sim, foi. – Espero que não tenha achado tudo trabalhoso demais. – Não, é claro que não. Foi tudo bastante agradável. – O tom curto dela destoou das palavras de algum modo. – Mas tenho certeza de que você deve estar cansada. – Não, estou bem. – Ouça, Nadia. – Virando-lhe a mão na sua, Zayed expôs-lhe a palma como se o enigma em torno dela pudesse ser lido ali. – Pode relaxar agora, sabe? Não se sinta como se tivesse de continuar com o faz de conta. – Que faz de conta? – Ela curvou a mão na dele e a voz soou um tanto brusca. – Não sei o que quer dizer. – O que quero dizer é que... – Zayed baixou a voz, determinado a fazê-la entender – ... não temos de fazer isto agora, sabe? – Indicou a imensa cama coberta de pétalas de rosas atrás de ambos. – Não tem de ser esta noite. Se não estiver realmente cansada, posso pedir que nos tragam drinques. Poderíamos apenas conversar, para conhecer um ao outro melhor. Eu gostaria de descobrir mais sobre a verdadeira Nadia. – Arqueou as sobrancelhas e até arriscou um sorriso.
– Não há nada a descobrir – Diante da resposta seca, Zayed sentiu que a petulância de Nadia começava a esgotar sua paciência. Deu um profundo suspiro. – Então, talvez seja melhor irmos para os nossos quartos separados. – Certo. – Puxando a mão de volta, Nadia usou-a para erguer a barra das saias, afastando-se um pouco dele. – Mas se você não quer fazer amor comigo, prefiro que diga logo. – Deus do Céu! – Com uma exclamação exasperada, Zayed ergueu-se e virou-se para olhá-la. – É claro que quero fazer amor com você. – Correu uma mão pelo cabelo escuro em pura frustração. – Acredite, não há nada que eu queira mais. Não era óbvio? Estava sozinho finalmente com a mulher mais sexy que já conhecera, com a dona de um irresistível erotismo inconsciente. Suas mãos ansiavam por lhe remover o bonito vestido, por deitá-la naquela cama ridícula, onde a devoraria da pura maneira carnal que desejava. O jeito que ela o fuzilava com o olhar só intensificava seu desejo: a maneira como erguia o queixo, como fremia as narinas perfeitas, como estreitava os incríveis olhos. Tudo nela era puro tormento. Zayed pigarreou, determinado a deixar prevalecer a razão. – Mas apenas se você quiser também. – Pousou as mãos com firmeza nos quadris. – O que estou tentando dizer é que fazer sexo comigo esta noite não é um dever que você tem de cumprir. Houve uma pausa, com o quarto em perfeito silêncio e o perfume das rosas preenchendo o ar. Então, erguendo-se, Nadia dirigiu-lhe um olhar sedutor. Lentamente, cruzou a mão sobre o peito e enfiou o dedo sob a alça do vestido. – Isto parece dever? Com uma descarga elétrica, Zayed observou a alça escorregar pelo ombro macio dela. Os músculos de sua garganta se contraíram, as pupilas se dilataram. – Ou isto? Agora, ela baixava o zíper lateral com os olhos sensuais fixos no rosto dele. Zayed engoliu em seco. A parte de cima do vestido dela caíra até a cintura, revelando um corpete estruturado branco que era casto e incrivelmente sexy ao mesmo tempo. Os seios se comprimiam no alto da peça, revelando curvas generosas, a cintura fina se destacava. – Talvez você queira me ajudar com o restante. – Nadia olhou para a ampla saia já se mexendo para fazer deslizar as dobras de tecido em torno dos quadris. – Não quero arruiná-lo. Zayed queria. Queria rasgar-lhe o vestido com uma urgência que o assustava, banquetear os olhos com o que havia por baixo com um desespero que nunca sentira antes. O que havia de errado com ele? Obrigando-se a manter um mínimo de autocontrole, estendeu os braços para ela e deu-se conta de que tremiam de desejo. Nunca uma mulher o afetara tanto. Movendo as mãos até os quadris de Nadia, observou o vestido escorregar por entre seus dedos até o chão, ainda dizendo a si mesmo que poderia parar a qualquer momento. Que estava apenas ajudando a esposa a despir o vestido de casamento. Mas enquanto observava Nadia pisando fora do vestido, se inclinando para pegá-lo e estendendo-o ao pé da cama, soube que estava perdido em meio ao anseio sexual. Na parte debaixo do corpete, ela usava cintas-ligas para prender meias de seda branca à peça. Usava uma minúscula calcinha branca por baixo. Se já houvera um ponto em que não havia mais volta, a visão adorável dela significava que ele já o ultrapassara. Qualquer resolução de que deveria resistir dissipou-se em seu anseio de possuí-la.
Quase em câmera lenta, levou as mãos ao cabelo dela, soltando os pentes de ouro que o mantinham no lugar e observando-o cascatear em glorioso desalinho pelos ombros. Correu os dedos pelas mechas sedosas, soltando as joias aninhadas entre os cachos antes de mover as mãos trêmulas para lhe remover o colar e os brincos. Houve uma breve pausa enquanto ele se levantou para admirá-la em sua beleza erótica antes de, enfim, inclinar-se para beijá-la, dizendo adeus a todo racionalismo. Lentamente a princípio, Zayed provou-lhe a maciez dos lábios. Com mais firmeza, então, tocando e saboreando, passou a língua entre eles até fazer com que se abrissem para explorar a maciez da boca de Nadia. A euforia corria por suas veias. Não havia volta, apenas a emoção do que estava por vir. Abraçando-o pelo pescoço, Nadia ouviu-o gemer dentro da sua boca. Era a sensação mais incrível que já tivera; todas as suas emoções eram tomadas de assalto ao mesmo tempo. O toque dele, o gosto, o calor, a fragrância masculina almiscarada, a barba de um dia por fazer – tudo se combinava para dominar todos os seus sentidos e a deixar ciente do anseio que pulsava em seu íntimo. Zayed moveu-se para alterar o ângulo da cabeça e voltou a tomar os lábios de Nadia. Aumentou a pressão, enquanto lhe acariciava os ombros, a parte detrás do corpete e as nádega na calcinha minúscula. Agora foi a vez de Nadia de gemer enquanto arqueou as costas, pressionando a virilha de encontro ao corpo dele para convidá-lo a tocar partes mais íntimas de seu corpo. Mas o gemido transformou-se numa exclamação abafada ao sentir a ereção dele de encontro a seu abdome, com um efeito tão poderoso que lhe produziu uma série de contrações. Suas pernas ficaram bambas. Abraçando-o pelo pescoço, colocou-se na ponta dos pés, tentando inconscientemente mover a ereção dele mais para baixo, onde queria senti-la. – Quero tanto você. – Ela não teve certeza de quem disso aquilo, ou se palavras foram ditas em voz alta, mas com um gesto rápido Zayed a ergueu no colo e deitou-a com firmeza na cama. Ele começou a se livrar das próprias roupas com rapidez. Deitada no meio da cama, Nadia observou enquanto ele despiu o colete e a calça, questionando-se se deveria remover suas roupas de baixo. Finalmente, ele retirou a cueca boxer e ficou gloriosamente nu diante dela. Nadia olhou-o fixamente. E depois olhou-o um pouco mais. Ela já o vira virtualmente nu: os bíceps esculturais, a cintura estreita, os pelos negros nas virilhas. Até lhe sentira a ereção pressionada de encontro a si. E havia lido sobre sexo; achara que soubera o que esperar. Mas nada a preparara para aquilo... o tamanho, o comprimento. Era possível que seu corpo o comportasse? A ideia lhe causava euforia e apreensão ao mesmo tempo. Eventualmente, deu-se conta de que Zayed não se movera, de que a olhava enquanto o observava. Desviou os olhos para o rosto dele. – Você mudou de ideia? – Ele se matinha orgulhoso, totalmente confiante de sua nudez, mas a dúvida permeou sua indagação. – Não. – Nadia forçou a palavra pela garganta seca. – Não é isso. – Você nunca viu um homem nu? – Não. – Num terreno mais seguro, Nadia confessou: – A menos que você conte os filmes. Zayed soltou um riso.
– E na vida real, não é o que você pensou? – Não. Eu não sei. Acontece apenas que... – Não vou negar. Quero você demais. Mas se você mudou de ideia, basta dizer e… – Não, eu não mudei de ideia. – Mais corajosa agora com a maior confirmação de que ele a queria, Nadia recostou-se nos travesseiros, movendo-se num convite inconsciente. – Acho que eu não havia me dado conta de que você era tão... hã... tão grande. – Elogios, elogios. – Os olhos de Zayed brilharam com humor, mas sua voz adquirira um tom gutural de um homem que precisava de alívio. Sem demora, adiantou-se até a cama e deitou-se acima dela. Ladeou-lhe a cabeça com os braços para poder observar-lhe o rosto. – Vou ser o mais gentil que puder. – Lentamente, ele baixou o corpo sobre o dela e tomou-lhe os lábios com os seus mais uma vez, pressionando-lhe os seios no corpete com o peito e a ereção contra o abdome. Nadia sentiu os músculos internos se contraindo em resposta e umidade entre as pernas. – Acho que devemos nos livrar disto. – Separando os corpos de ambos o bastante para levar a mão até os quadris de Nadia, Zayed despiu-lhe a calcinha. Em seguida, afagou-lhe a coxa trêmula sob a cinta-liga antes de tocá-la com intimidade. Com um dedo hábil, massageou uma parte dela que Nadia nem sequer soubera que existia e proporcionou o mais incrível prazer. Logo deu-se conta das sensações envolvendo-a num crescendo, conduzindo-a ao que sabia que devia ser um orgasmo, seu primeiro orgasmo. Afundando as unhas nas costas de Zayed, estava prestes a gemer, a sucumbir às deliciosas sensações quando ele lhe sussurrou ao ouvido: – Ainda não, doçura, guarde-o para mim. Removendo o dedo, ele substituiu-o pela ponta de sua ereção, massageando-a com firmeza, dando apenas uma mostra a Nadia do que seria o êxtase. Então, mudando de posição, começou a penetrá-la, lentamente a princípio, experimentando, firme mas gentilmente. Vendo-lhe o sexo úmido e escorregadio como uma confirmação, ele emitiu um som rouco e acentuou a penetração. Nadia afundou mais as unhas nas costas de Zayed e segurou-se a ele com força enquanto sensações extraordinárias a tomavam. – Nadia? – A voz dele soou seca, rouca, como se estivesse vindo de um lugar distante. – Sim! – Ela mal podia encontrar a voz e, portanto, deixou o corpo falar movendo a pélvis para a frente e produzindo-lhe outro som gutural. – Deus do Céu, Nadia, é tão bom ter você. Zayed começara a se mover agora, dando uma arremetida mais intensa do que a outra, mais prazerosa. – Acho que não posso aguentar mais. Quando ele terminou de falar, Nadia sentiu um tremor intenso começando onde seus corpos estavam unidos, mas se espalhando rapidamente a cada parte de seu ser, fazendo seu corpo estremecer com um êxtase incrível e totalmente desconhecido. Com um som primitivo de puro prazer, ela se deu conta de que Zayed se reuniu a ela e ambos foram arrebatados pelo clímax sublime. Por vários minutos permaneceram daquela maneira, com Zayed deitado sobre ela com o coração disparado e transpiração banhando seus corpos. Enfim, ele virou-se para o lado, mantendo-a em
seus braços. – Você está bem? – Afastou uma mecha de cabelo do rosto dela. – Não fui brusco demais? – Não, foi incrível! – Ao vê-la com as faces coradas e os olhos brilhando, ele sentiu-se tocado. – Você foi incrível. – Ora, obrigado. – Zayed correu um dedo pelos lábios dela. – Você também foi. De repente, deu-se conta de que aquela mulher, sua esposa sobre quem sabia tão pouco, lhe dera uma experiência sexual como nenhuma outra que tivera. E já tivera sua cota. A inocência dela combinada com a superioridade que possuía e o corpo incrível eram de tirar o fôlego. – Sei que tenho muito a aprender. – E acredite, terei grande prazer em lhe ensinar. – Rindo, Zayed beijou-lhe os lábios para afastar as palavras sérias. Estreitando-a mais nos seus braços, sentiu o desejo despertar de novo. Era o corpete, assegurou a si mesmo, correndo as mãos pelas cintas-ligas e pelas nádegas nuas dela. Que homem poderia resistir? Tocando algo nas nádegas dela, viu que eram pétalas de rosas e afastou-as. Ambos se entreolharam. – Não me olhe desse jeito, mocinha. Não se quiser dormir esta noite. – Não sei se quero dormir. – Acho que dormir está fora de cogitação. Zayed estudou-a e lhe ocorreu que talvez tivesse subestimado aquela notável mulher. NADIA OLHOU para o homem bonito que dormia tão placidamente a seu lado agora. A luz do início da manhã adentrava pelas janelas, formando desenhos hexagonais no chão salpicado de roupas despidas e pétalas de rosas murchas. Tomando o cuidado de não acordá-lo, ela subiu um pouco no travesseiro para observá-lo. A noite anterior fora incrível. O poder de quando faziam amor a elevara de uma maneira que não julgara possível. Agora observava as pálpebras dele se moverem, emolduradas por cílios espessos. O que estaria sonhando? – perguntou-se. Aquele homem sobre o qual sabia tão pouco, mas com quem tinha laços para a vida toda. Se a noite anterior provara uma coisa era que Zayed não era o homem cruel, insensível que o pai dela descrevera. Estava longe de ser o bruto que ela esperara. Fizera amor de uma maneira terna e passional, ardente, mas íntima, usando suas consideráveis habilidades para garantir que tudo que fizesse desse tanto prazer a ela quanto a ele. E fora o que acontecera. Ela não tivera ideia de que o mero sexo podia levar uma pessoa a um grau tão elevado de euforia. Sentiu o desejo se renovar só em olhá-lo. Levando tais sentimentos em consideração, aquele era o dia em que teria de confessar quem era. Além da terrível verdade de que não era de Gazbiyaa, havia o fato de que não era uma garota comum fugindo de um casamento arranjado. Era a princesa Nadia de Harith, filha única do sheik de Harith, um homem que via o reino de Gazbiyaa como seu grande inimigo. Tudo que ela fizera fora com a melhor das intenções. Fugira do casamento com um homem que apenas teria encorajado a guerra entre Harith e Gazbiyaa. Casara com o sheik Zayed Al Afzal na esperança de poder impedir a guerra. Mas agora se preocupava em ter de revelar a verdade.
Deixando a cama o mais silenciosamente que pôde, foi até o banheiro e voltou usando um roupão. – Bom dia. – Acordado agora, Zayed curvou os lábios num sorriso sensual e deu um tapinha na cama a seu lado. – Como você está nesta manhã? Nadia sentou-se ao lado dele e, imediatamente, Zayed a puxou, beijando-a com firmeza nos lábios e insinuando a mão sob o roupão dela para lhe tocar o quadril. – Estou muito bem, obrigada. – Nadia tentou sorrir, mas seu sorriso saiu forçado. Moveu-se junto à cabeceira, longe do toque dele. – Acho que devemos levantar. Deve haver tantas coisas que temos de fazer. Zayed franziu o cenho e apoiou-se num cotovelo. Tirando a mão de baixo do roupão dela, passou-a pela barba por fazer. – Acho que podemos ser desculpados dos nossos deveres na primeira manhã da nossa lua de mel. – Sim, é claro. – Ela soltou um riso que soou tão falso quanto era. – Qual é o problema? – Zayed a estudava com um olhar intenso agora. Deus do Céu, chegara o momento. Teria de lhe contar. Nadia olhou para ele, para os pelos escuros e escassos que lhe cobriam o torso musculoso e para os bíceps do braço em que se apoiava. O corpo dele era tão magnífico. – Nadia? – Há algo que... que preciso lhe contar. – Aquilo era tão mais difícil que ela havia imaginado. O sangue causava um zunido em seus ouvidos, abafando as palavras, ameaçando anuviar-lhe a visão. – Vá em frente. – Áspero agora, Zayed ergueu-se junto à cabeceira para poder estudá-la melhor. Nadia ajeitou a gola do roupão em torno do pescoço enquanto lutava para encontrar a voz. – A questão é que não fui inteiramente verdadeira sobre quem sou. – As palavras saíam numa onda de pânico agora. – Sobre o lugar de onde venho. – E você quer dizer o que exatamente? – Quero dizer que não sou de Gazbiyaa. – E de onde você é? Nadia engoliu em seco e baixou os olhos. – Harith. – O nome ficou atravessado como uma farpa na garganta dela. – Eu sou do reino de Harith. O silêncio que se seguiu foi glacial. – Diga-me que não é verdade. A força de suas palavras sibilantes a fez erguer os olhos, mas o que viu levou-a a se encolher com apreensão. O rosto dele transformou-se numa máscara de raiva, os olhos ficaram desprovidos de qualquer compaixão. Ela respirou fundo, e sua voz saiu na forma de um sussurro. – É verdade. Eu sou a princesa Nadia de Harith.
CAPÍTULO 6
PRINCESA
NADIA Amani. Filha única do sheik de Harith. O maior inimigo do seu país. A constatação do que havia feito atingiu Zayed em cheio. Acabara de cometer o maior erro de sua vida. Afastando as cobertas bruscamente, apanhou a calça do chão e vestiu-a. – Levante-se! – Ouça, Zayed, não é o que você está pensando... – Eu mandei você se levantar! Ele se virou, sem querer olhá-la, sem saber como a raiva que o consumia iria fazê-lo se comportar. Mas era uma raiva que dirigia mais a si mesmo. Ele que se orgulhava de sua capacidade de fazer julgamentos acertados, de seus instintos. Bem, havia errado daquela vez. E numa ocasião em que o que estava jogo era alto. Porque sua decisão desastrosa não significava apenas que ficaria embaraçado e que perderia alguns milhões de dólares. Sua idiotice colocara as vidas de jovens em risco, os jovens de Gazbiyaa e Harith. – Zayed. – Ela estava diante dele, parada ali no roupão macio com os cachos caindo em torno dos ombros, os olhos violeta faiscando. – Se você me deixar explicar... – Explicar o quê? Que você é manipuladora, calculista, mentirosa e que se infiltrou na minha vida para transformá-la num caos? Isso eu já entendi, obrigado. – As coisas não são assim... – O seu plano funcionou perfeitamente. O novo sheik tolo se deixou encantar por você imediatamente, se deixou convencer pela sua história de que estava escapando de um casamento arranjado, procurando um novo tipo de vida. Entendi isso também. Ele não sabia quando já havia sido tão tomado pela fúria na vida. Era uma emoção que percorria seu corpo e o mantinha no lugar, cerrando os punhos ao longo do corpo. E o fato de Nadia permanecer plantada diante dele, recusando-se a recuar e dar algum espaço à sua raiva só piorava as coisas.
– Você pode ter me enganado para eu me casar com você, Nadia, mas é onde a mentira termina. Eu quero você fora da minha vida. Agora. – Não! – Chocada, Nadia levou as mãos ao rosto afogueado. – Não pode estar falando sério. – Ou você sai por vontade própria, ou chamo a segurança. O que vai ser? – Zayed olhou ao redor à procura do paletó que havia descartado e pegou o celular de um bolso interno. – Mas somos casados. Eu sou a sua esposa. – Ela se recusou a se afastar, mantendo os pés descalços plantados no chão, os braços cruzados e a cabeça erguida. – Não pode me atirar para fora. – Fique me observando. O casamento será anulado imediatamente. – Mas, enquanto ele dizia as palavras, sabia que legalmente seria quase impossível. A união havia sido consumada. Nadia certificara-se daquilo, não fora? Não podia acreditar em como havia sido idiota, em como se deixara enganar por ela. – Mas e ontem... Não significou nada para você? Bem, Nadia certamente não o enganaria mais. De maneira alguma ele se deixaria levar pela mágoa que ela conseguiu apresentar em seus olhos violáceos. Ou pelo tremor nos lábios. Ela poderia ganhar um prêmio de atuação. – Bah! – Toda a raiva impotente e o desdém por si mesmo foram contidos naquela palavra. Ele a viu estremecer. – Foi apenas sexo – prosseguiu. – Apenas uma noite de sexo. Não se dê importância demais achando que isso exerce algum tipo de poder sobre mim. Que pode acrescentar chantagem emocional à sua lista de traições. Ela virou-se, sem dúvida planejando o passo seguinte. – Nosso casamento terminou. Você vai embora. – Mas de repente Zayed deu-se conta de que expulsá-la não seria o suficiente. Sozinha nas ruas de Gazbiyaa ela seria capaz de criar todo tipo de confusão. – Você será levada de volta a Harith. – Harith? Não, isso não! – Nadia virou-se de volta. O ar de desafio se fora, dando lugar ao pânico e à palidez no rosto. – E, se tiver alguma ideia de escapar, fique sabendo que será escoltada por dois guardas da mais alta confiança que sabem a punição que os aguardará se não cumprirem minhas ordens à risca. Não! Nadia sentiu o terror oprimir-lhe o peito. Seria expulsa do palácio, levada de volta a Harith para encontrar seu destino terrível sem sequer ter uma chance de se explicar? Olhou para o homem à sua frente. Seu marido. Ele fervilhava de raiva. A cintura da calça estava baixa, em torno dos quadris, o abdome era musculoso, firme sob o tórax largo. Flexionava os bíceps de um dos braços enquanto segurava o celular. Em meio à nevoa do pânico, ela constatou que Zayed, aquele homem com quem se casara com tanto otimismo, com tanta esperança, de fato não era melhor que seu pai ou irmão. Ele a estava tratando da mesma maneira que os homens que tinham feito parte de sua vida, como um objeto a ser usado ou descartado conforme as circunstâncias. E foi isso que lhe deu forças para enfrentá-lo. Ateve-se à indignação para não sucumbir ao terror. Recusava-se a se deixar intimidar. E recusava-se a implorar. Ignorando a expressão de ódio nos olhos de Zayed, concentrou-se em controlar cada músculo facial para tentar esconder o sofrimento que ele estava lhe causando. O terror que estava enfrentando.
– Está certo. Se é como quer as coisas, vou voltar para Harith. Vou enfrentar o meu pai e as consequências que isso trará. Se seu orgulho é mais importante do que o seu reino, espero que fique satisfeito. – Não ouse tentar me dizer como me sinto em relação ao meu reino. – Zayed estava com tanta raiva que parecia prestes a explodir. – Sacrifiquei tudo para estar aqui, para me tornar sheik de Gazbiyaa. Estou totalmente comprometido com o meu país. – Sacrifício? Você não sabe o significado da palavra! – Posso lhe garantir que sei. Mas não será sacrifício algum remover você da minha vida. O comentário ferino magoou-a, mas Nadia recusou-se a deixar transparecer a dor. – E esse compromisso com seu país inclui levá-lo à guerra? Ter o sangue de duas nações em suas mãos? Porque é o que vai acontecer quando meu pai souber que somos casados, que o casamento foi consumado, que fui devolvida a Harith maculada pelas mãos de seu maior inimigo. – Talvez você devesse ter pensado nisso antes de ter subido na minha cama, antes de ter começado esta farsa para me enganar. – Ele cruzou os braços sobre o peito forte. – Você causou isso a si mesma. – É claro que pensei. Mas eu não tive alternativa. Quando ouvi que você se tornaria sheik em vez do seu irmão guerreador, eu soube que tinha de aproveitar a oportunidade. Que essa seria a única chance que eu teria de fazer a diferença, de que minha voz fosse ouvida. Tive de fazer o que fiz. Não importando o perigo, o sacrifício. – Muito nobre, tenho certeza. E essa voz que queria que fosse ouvida, o que exatamente diria? Transmitiria a seu pai qualquer coisa que lhe fosse útil para ajudar a incitar a guerra que Harith deseja travar contra Gazbiyaa? – Não! – Pretendia usar informações internas, confidências para alimentar-lhes o desejo insaciável de conflito? – Não. Você não sabe o que está falando. Não sou uma espiã do meu país. Meu pai não faz ideia de que estou aqui. Se fizesse, acredite, nossos países já estariam em guerra. – O que houve, então? Está me dizendo que casar comigo, o sheik recém-coroado de um dos mais ricos estados árabes foi um prêmio pelo qual valeu o risco? Que valeu a pena despertar a ira de sua própria nação para se tornar sheika de Gazbiyaa com a vida de privilégios inerentes ao título? Uma forte aversão tomou conta de Nadia, obstruindo-lhe a garganta, deixando-a com os olhos marejados. Como pudera achar que tinha sentimentos por aquele homem? – Você acha que é um prêmio tão grande que eu arriscaria não apenas a minha vida, mas as vidas dos cidadãos do meu país só para estar com você? – Com as mãos cerradas ao longo do corpo e as unhas ferindo as palmas, ela dirigiu-lhe um olhar de completo desprezo. – Talvez um dia você tente espiar por cima do seu ego do tamanho de uma montanha para ver o mundo além. Você não faz ideia, não é, sobre as maneiras dos países, sobre como governar um reino como Gazbiyaa, como prevenir uma guerra catastrófica? – E você sabe, eu suponho? – Sim, eu sei. Pelo menos, estou preparada para fazer qualquer coisa para tentar encontrar a paz. É o que estou fazendo aqui. Foi por isso que invadi seu quatro, que queria me tornar sheika de
Gazbiyaa. Porque, estando no centro deste reino, achei que podia influenciar as decisões feitas sobre o futuro. Nadia fez uma pausa, ofegante. – Assim, como vê, não tenho interesse em sua riqueza, nem em seu estilo de vida extravagante. Na verdade, eu os desprezo. Porque vejo o homem que o tornaram. Fútil e egoísta, um homem cujo orgulho lhe é mais importante que seu povo. – Basta! – Zayed ergueu a mão para silenciá-la e sua voz reverberou pelo quarto. – Não vou permitir que fale comigo desse jeito. – Vou falar com você do jeito que eu quiser. – Nadia ainda não acabara de lhe dizer umas boas verdades. – Não pode me infligir castigo maior do que me fazer voltar a Harith. Meu crime será punido com a morte. Você terá o meu sangue nas suas mãos, mas, pior do que isso, também terá o sangue das nossas duas nações. Houve um longo silêncio. Zayed encarou Nadia, alterada em sua paixão, fúria e moralidade equivocada. A defesa acalorada que fez aborreceu-o, mas era autêntica, direta do coração. A de que fizera tudo aquilo devido a alguma ideia maluca de que podia impedir uma guerra entre dois países. E o medo no rosto dela quando lhe comunicara que voltaria a Harith... Fora inconfundível. A maneira como empalidecera, o terror em seus olhos, o jeito como os joelhos tinham dobrado, fazendo-o querer segurá-la antes que ela tivesse se recobrado. Podia ter fingido tudo aquilo? E depois fingido toda a retórica de defesa? Os instintos diziam a ele que não, que fora tudo autêntico. Mas, afinal, tinham sido os instintos que o colocaram naquela confusão. Tinham-no feito casar com a mulher mais perigosamente inadequada do planeta. Ele precisava de tempo para pensar. Refletir sobre o que havia feito e chegar a uma solução, o mais depressa possível. Mas primeiro precisava tirar Nadia da sua frente. Porque, apesar de tudo, apesar da amargura, da sensação de ter sido traído e da fúria consigo mesmo por ter sido tão tolo, o fato de vê-la tão perto ainda o excitava. Em algum momento durante a discussão de ambos, o cinto do roupão dela se soltara, revelando-lhe parte da coxa e os seios arredondados – seios que ele sabia que se moldavam perfeitamente às palmas de suas mãos, que tinham um gosto tão doce, cujos mamilos se intumesciam com a excitação. Ele só precisaria dar um passo à frente, baixar-lhe o roupão pelos ombros e inclinar a cabeça... E, então, estaria com mais problemas ainda. Droga! Quando fora que se tornara tão fraco? Praguejando por entre dentes, ergueu o celular e, com um toque, ligou para a segurança. – Sim... O quarto nupcial... Rani e Ahmed... Agora mesmo. Zayed virou-se para olhar para uma silenciosa Nadia e viu o medo em seus olhos antes de ela endireitar os ombros e mascarar o temor com rebeldia e desafio. E sustentou-lhe o olhar, determinada, recusando-se a piscar. Foi um longo olhar que impregnou o ar entre ambos. – Vossa Majestade? – Os guardas chegaram, entrando no quarto ao comando de Zayed, músculos flexionados, prontos para a ação. Olharam ao redor, perplexos enquanto observavam a cena: a cama desarrumada pela paixão, a nova sheika em desalinho, segurando o roupão contra si. E o sheik, com o torso nu, rígido pela tensão, mal controlando a raiva. – Vocês vão acompanhar a sheika até os aposentos dela.
– Majestade. – E uma vez lá, vocês vão montar guarda na porta dela até receberem outras instruções. Vocês entenderam? – Sim, Majestade. Apesar da aceitação inabalável deles, houve um instante de constrangimento quando os guardas olharam para Nadia, incertos sobre como proceder. Ela os olhou de volta com ar de desafio. – Levem-na – ordenou Zayed zangado, e eles agiram de imediato, ladeando Nadia para erguê-la e virando-a na direção da porta. – Não se preocupe, já estou indo. – Desafiadora, Nadia bateu os pés furiosamente no ar. – Acredite, nada me persuadiria a ficar aqui agora. – Enquanto os guardas abriam a porta, ela aproveitou a oportunidade para lançar um último olhar hostil a Zayed. – Porque agora sei o homem que realmente é, sheik Zayed Al Afzal. Apesar de sua postura, de suas palavras inteligentes, você não é melhor do que o meu pai ou que o meu irmão. Não passa de um lobo com roupas sofisticadas. E, com aquele insulto final, ela se foi. NADIA ANDOU de lá para cá pelos aposentos que tinham sido seus desde que chegara ao palácio de Gazbiyaa. Desde que se vira miraculosamente noiva do sheik e tivera a esperança de que seu plano desse certo, de que poderia fazer a diferença. Agora, aquele plano estava despedaçado, junto com o resto de sua vida. Não exagerara quando confessara a Zayed qual era a punição que a esperaria em Harith. Se fugir de um casamento arranjado não fora ruim o bastante, casara-se com o governante da nação inimiga e ele lhe tirara a virgindade e a rejeitara. Se tivesse decidido desgraçar sua família deliberadamente, não poderia ter sido mais eficaz do que aquilo. E embora soubesse que sua pobre mãe suplicaria com o marido e o filho para pouparem a vida de sua filha, ninguém a ouviria. Porque as mulheres de Harith não tinham o privilégio de uma opinião própria. Afundando na beirada da cama, cobriu o rosto com as mãos. Do outro lado da porta maciça, estavam os dois guardas, à espera de que lhes informassem o que fazer com ela. Não havia nada que pudesse fazer a não ser aguardar o seu destino. Sua mente febril discorrera sobre todas as possibilidades que pudera para escapar: desde subornar os guardas com promessas de riquezas que não tinha ou favores sexuais que jamais daria até pular de uma grande altura da janela e torcer pelo melhor. Talvez acabar esparramada na rua abaixo fosse a solução menos dura. Ouvindo os guardas se moverem do lado de fora da porta e a chave na fechadura, ela respirou fundo para controlar o terror. Aquilo era o fim, então. Se havia algo a que estava determinada era a ir com a cabeça erguida. ELA PARECIA bastante pequena, ladeada pelos guardas que a tinham levado até ele. Mas o que faltava em Nadia em estatura, sobrava em coragem. Mantinha a postura reta, o queixo erguido, os olhos sustentavam os dele com inconfundível raiva.
Dispensando os guardas, Zayed fez um gesto para que Nadia se sentasse numa das almofadas dispostas em torno de uma mesa baixa na varanda sombreada. Ele precisara de um pouco de ar fresco depois da enormidade do que havia feito. E a vista calma também ajudara. Escolhera um local longe do cenário das celebrações da noite anterior, onde as tendas estavam sendo desmanchadas agora, desejando que aquele casamento pudesse ser desmanchado tão facilmente. Olhava para seu reino, através dos gramados bem-cuidados, para além das fontes, estátuas e palmeiras, para os contornos largos das Montanhas Sarawat no horizonte, para além da vastidão do deserto. Havia tomado sua decisão. Não confiava em Nadia. Jamais poderia confiar nela. Agora sabia que estava casado com uma mulher capaz de enganá-lo, capaz de qualquer coisa para alcançar seu objetivo, não importando qual fosse. Havia repassado o confronto entre ambos repetidamente na mente, tentando entendê-lo. A sua primeira teoria de que ela teria invadido sua vida só para criar problemas, de que estava determinada a causar uma guerra entre os dois reinos não fazia sentido. Era possível que ela tivesse sido usada como um peão. Forçada pela família a se infiltrar no palácio de Gazbiyaa com a ameaça de qualquer punição bárbara que um país como Harith era capaz de ministrar se ela não obedecesse. Mas por que ela teria confessado quem era? Além do mais, estava claro que era corajosa. Ele se recusava a acreditar que teria sido marionete de seja lá quem fosse. Só restava uma opção. A de que ela estivera dizendo a verdade. A de que realmente arriscara tudo para ter ido até ali sem o conhecimento da família para impedir a guerra entre os dois reinos. Aquilo certamente explicaria a expressão de terror no rosto dela diante da ideia de ser devolvida a seu país. Mas mesmo que aquele fosse o caso, seria algo tão perigoso quanto as outras possibilidades. Porque a atitude impensada dela aumentara dramaticamente a probabilidade de guerra. E havia algo mais. Algo que ele mal podia admitir. Por mais que tentasse negar, aquela mulher chegara de uma maneira inexplicável até ele, penetrara sua barreira de indiferença emocional até um ponto no seu íntimo que nunca fora tocado antes. Algum ponto sensível e novo, sobre o qual nem queria pensar. O que a tornava extremamente perigosa para ele. Tinha de resolver aquilo. NADIA SENTOU-SE elegantemente numa almofada, o mais longe de Zayed que conseguiu. Não sabia o que estava fazendo ali. Se ele esperava um pedido de desculpas, iria ficar amargamente desapontado. Se queria que ela suplicasse para ter permissão para ficar, não teria sorte naquilo também. Porque ela não queria ter mais nada a ver com aquele homem. A fé que depositara nele ruíra cruelmente. Agora que ele lhe mostrara como era, ela só queria se afastar dele, de Gazbiyaa. Preferiria enfrentar o seu destino a passar mais tempo na companhia de Zayed. Bem, era o que o orgulho lhe dizia, ao menos. Ergueu os olhos para observá-lo, determinada a não demonstrar nenhuma fraqueza agora. Mas era uma fraqueza de um tipo diferente que tomava seu corpo mentalmente torturado. Porque ao
ver Zayed agora, servindo café calmamente do bule de latão na mesa, algo indefinido e primitivo se manifestou dentro dela. Havia poucas horas que tinham passado a noite juntos, que haviam partilhado de tão incrível intimidade. O corpo musculoso de Zayed enroscado no dela, faminto por ela, parecendo querê-la cada vez mais. Nadia ainda podia sentir o peso do corpo dele sobre o seu, ouvir-lhe a respiração ofegante, o grunhido de prazer no momento do clímax. E havia o próprio corpo sensível, lembrando-a do que haviam feito. Mas agora era como se fossem estranhos. Frio e distante, Zayed entregou-lhe uma xícara de café. A raiva se fora, substituída por uma postura rígida, autoritária. – E então? – Nadia depositou a sua xícara na mesa. – Por que quer me ver? Porque se isto é algum gesto de despedida, não precisava ter se preocupado. Você pode achar que consegue abrandar sua consciência, justificar suas atitudes com palavras macias para fazê-lo sentir-se melhor, mas deixe-me dizer que não vai fazer diferença... – Nadia! – ... porque no final você vai responder à sua própria consciência. O protesto dela perdeu força diante do olhar intenso de Zayed. – Já terminou? Nadia entreabriu os lábios, mas fechou-os. Zayed ergueu uma mão, deixando claro que não queria ouvir uma resposta. – Trouxe você aqui para dizer que vou deixá-la ficar. – Ficar? – Sim, ficar aqui em Gazbiyaa. Ao menos por enquanto. Você não vai retornar a Harith. – Oh. – Nadia sentiu uma onda de alívio envolvendo-a. Mas o orgulho a impediu de demonstrálo. – E suponhamos que eu não queira ficar? Foi um pequeno gesto, mas a maneira como Zayed se inclinou para a frente e estreitou os olhos deixou-a alarmada. Havia atiçado um tigre zangado que parecia prestes a atacar. – Vamos esclarecer uma coisa. Não tenho o menor interesse no que você quer. Eu teria o maior prazer em retirar você de Gazbiyaa, de tirar você da minha vida de uma vez por todas. Mas as suas atitudes colocaram os dois países em grande perigo. Se a notícia se espalhar de que o sheik de Gazbiyaa se casou com uma princesa de Harith, com certeza haverá guerra. Minha prioridade é encontrar um meio de minimizar os danos. – Mas nunca foi a minha intenção... A raiva nos olhos dele impediu-a de continuar. – Preciso ganhar tempo para tentar estabelecer relações diplomáticas com Harith. Eis o que vai acontecer agora. Ouça atentamente. Nadia meneou a cabeça. – Em primeiro lugar, ninguém deve saber que você é de Harith. Nunca. Estou sendo claro? Ela tornou a menear a cabeça. – Temos de manter a sua identidade oculta o máximo de tempo que pudermos. Ordenei que as fotografias oficiais de casamento fossem destruídas “por engano” e fotos pessoais foram banidas. Assim, com sorte, podemos impedir que imagens cheguem à mídia. Ninguém parece saber quem você é ainda, mas é um segredo que temos de guardar com as nossas vidas.
– É claro, eu entendo. – Sob a hostilidade dele, ela viu a preocupação diante da enormidade do problema em questão. Um problema que só havia exacerbado. Mas tinha certeza de que podia ajudar. – Não direi uma palavra a ninguém sobre quem realmente sou. – É melhor não. Pelo seu próprio bem e o do seu país. – Sei disso. Nem precisa me dizer. – Bem, há algumas coisas que preciso lhe dizer. – Zayed puniu-a com o olhar. – De agora em diante, você e eu vamos representar o papel do casal perfeito. Para o mundo externo, o sheik e sua nova esposa estão perdidamente apaixonados, são totalmente devotados um ao outro, demonstrando publicamente o tipo de felicidade que logo trará um herdeiro real e a estabilidade de que este país tanto precisa. – Sim, é claro. Algo na postura dele sugeriu que havia mais por vir. – Em privacidade, entretanto... – A voz de Zayed adquiriu um tom de autoridade glacial. – Em privacidade, as coisas serão bem diferentes. Este será um casamento apenas de aparências. Um casamento que será encerrado tão logo for seguro fazê-lo. Por trás de portas fechadas não haverá relacionamento entre nós. Fui claro? Nadia jogou a cabeça para trás, e os cachos lustrosos lhe cascatearam pelas costas enquanto levou um instante para banir qualquer emoção do rosto. – Sim, Zayed. – Sua voz soou fria e estável. – Perfeitamente claro.
CAPÍTULO 7
– AQUI ESTÁ você. Nadia ergueu os olhos enquanto Zayed entrou na biblioteca, sua presença dominando imediatamente o lugar. Ele usava jeans de cintura baixa e uma camiseta branca que lhe destacava o peito musculoso e os bíceps. – Você não esqueceu que vamos jantar com o ministro do exterior de uma nação amiga vizinha e com a esposa esta noite? – Não, não esqueci. – Nadia fechou o manuscrito ricamente ilustrado em seu colo. Podia passar horas na biblioteca, examinando cuidadosamente as inestimáveis páginas. E estava ótimo porque havia pouco mais a fazer naquela gaiola de ouro em que se encontrava. – É informal, mas você obviamente vai precisar de tempo para se trocar – comentou ele, referindo-se ao vestido simples azul que ela usava. – Obviamente. – Colocando o livro com reverência numa mesa a seu lado, Nadia levantou-se, olhando-o com seus olhos vigilantes outra vez. – E você também. Zayed deu um passo na direção dela, mas deteve-se. – Ouça, Nadia. Não adianta ficar assim. – Assim como? – Tirando o cabelo de trás das orelhas, ela fez questão de não lhe sustentar o olhar. – Não me dei conta de que estivesse me comportando de alguma maneira diferente. – Sabe exatamente o que quero dizer. – Zayed estava na frente dela agora, estudando-a. Alto, atlético e sexy deixou-a com as pernas fracas como sempre acontecia quando estavam próximos, uma sensação que ela lutava para controlar desde que o acordo entre ambos começara. Três semanas haviam se passado desde então, três longas e torturantes semanas, cada uma pior do que a anterior. Longe de se adaptar ao papel de esposa apaixonada, Nadia achava mais e mais frustrante, mais impossível lidar com a situação. Seu relacionamento com Zayed chegava ao ponto de ruptura. Como, afinal, conseguiria levar aquela farsa ridícula adiante até que ele decidisse que resolvera o problema de Harith? E o que aconteceria com ela em seguida? O desespero de sua situação a mantinha acordada à noite, revirando-se na cama.
E sua sensação de isolamento crescia a cada dia também. Sem contato algum com seu país e ignorada por seu marido, levava uma existência entediante, andando pelos corredores do vasto palácio ou fechando-se na biblioteca. Qualquer esperança de que pudesse ajudar, influenciar as decisões de Zayed, desempenhar um papel no processo de paz foi liquidada logo de início. O sheik deixou bem claro que suas opiniões não o interessavam, que seu papel era manter-se quieta e como uma figura decorativa quando a ocasião exigia. Era um papel, na verdade, que sempre fora designado para ela pelo pai. Uma grande ironia. Mas junto com essa enorme frustração, havia outra coisa, a coisa que Nadia se empenhara tanto para ignorar, mas era impossível. Zayed. Pura e simplesmente. A noite que haviam passado juntos, as coisas que haviam feito assombravam-na com suas imagens vívidas invadindo sua consciência a qualquer hora do dia ou noite, não importando quanto proibisse a si mesma de relembrar. Dividirem o mesmo quarto era agonia. Apenas o som da voz dele era o bastante para fazer o coração disparar, a pele formigar. E quando ele a abraçava pela cintura apenas para simular afeição para quem estivesse por perto, as pernas dela ficavam bambas, um calor a percorria. Mesmo sabendo que o gesto era falso. Que, na realidade, Zayed gostaria de poder vê-la longe. E estava acontecendo agora mesmo, aquele anseio enquanto olhava para o peito musculoso dele, os ombros largos. Odiava a si mesma por aquilo, por sua fraqueza em relação a ele, um homem que não sentia nada além de desprezo por ela. E aquilo a deixava irritadiça, o que era provavelmente o que ele queria dizer. – Sabe de uma coisa, Nadia? O seu jeito me surpreende. Levando em conta que foi você que nos meteu nesta confusão, não vejo por que estou sendo tratado como o vilão. Francamente, em sua posição achei que você estaria fazendo tudo que pudesse para este acordo dar certo. – Faço o que me dizem. É o que você quer, não é? – Quero que perca essa atitude desafiadora. – Então, talvez você deva tentar mudar a sua atitude. – Imediatamente na defensiva, Nadia levantou-se para desafiá-lo, mas deu-se conta de que estavam próximos demais. Recuou para trás o máximo que a cadeira lhe permitiu. – Se você ouvisse o que tenho a dizer em vez de me tratar como uma espécie de pária, se me deixasse... – Pare aí mesmo. – Zayed franziu o cenho e ergueu a palma da mão, aproximando-se mais. – Quanto antes você entender que está aqui nos meus termos, melhor para todos os envolvidos. Enquanto você está vivendo sob o meu teto em Gazbiyaa, fará o que eu ordenar. Você não tem direitos, nem poder de barganha e suas opiniões não valem de nada. Assim, pode guardá-las até estar de volta ao seu precioso Harith onde é o seu lugar... As palavras austeras silenciaram Nadia momentaneamente. Engolindo em seco, desviou o olhar enquanto esperava que a mágoa que lhe causaram se dissipasse. Nesse meio-tempo, ouviu Zayed pigarrear. – Pelo que entendo, você não recebeu nenhum contato da sua família, certo? – Não – respondeu Nadia petulante, dando mais um passo atrás até encostar as pernas na cadeira. – Como poderiam? Eles não têm nenhum meio de entrar em contato comigo. – Mas devem estar à sua procura, não?
– Presumo que sim. – Acha que podem ter alguma ideia de onde você esteja? – Bem, não enviei nenhum cartão postal a ninguém. – A resposta antagônica dela foi um mero mecanismo de defesa, uma tentativa de dissipar o assustador pensamento de que a família estava vasculhando Harith e além à sua procura. Ou, mais surpreendente, o vazio de que não estivesse procurando-a. Mas ao observar o maxilar rígido de Zayed, recuou rapidamente. – Não, não acho que têm nenhuma ideia. Se a minha família tivesse descoberto onde estou, saberíamos a esta altura. Gazbiyaa é o último lugar onde me procurariam. – Bem, suponho que sim. Mas é só uma questão de tempo antes que eles descubram. Você tem de se certificar de que a notícia do seu paradeiro não se espalhe antes que eu encontre uma solução para esse fiasco. – Sei disso. Não precisa ficar me lembrando. – Talvez eu não precisasse se você começasse a demonstrar um pouco mais de gratidão. – O quê? – Você ouviu. – Gratidão? – Nadia repetiu a palavra, desgostosa. – É isso que você quer de mim, Zayed? – Talvez. Sim. Por que não? Não acho que seja algo pouco razoável considerando as circunstâncias. Deve ser bastante grata por ter permissão de ficar aqui no palácio onde tem a segurança de vinte e quatro horas de proteção, sem mencionar todos os confortos. Especialmente quando se considera qual teria sido a alternativa. Eu diria que a tenho tratado com notável tolerância. – Bem, muito obrigada por isso – declarou Nadia sarcástica. – Perdoe-me por não ter percebido que eu devia demonstrar uma gratidão servil. Presume-se que suas outras mulheres ficavam de joelhos por seus favores. Ela hesitou. De onde viera aquilo? A última coisa que queria era que ele pensasse que se importava com seus relacionamentos passados. E que ela se importava com ele, na verdade. – Minhas “outras mulheres”, como você diz, nunca mentiram e me enganaram a ponto de me prenderem num casamento com consequências desastrosas para todos os envolvidos. Acho que isso a coloca numa classificação diferente, não é? Nadia franziu a testa. Estava cansada de ser lembrada do que havia feito, de ser acusada de vilã, mas recusava qualquer oportunidade de justificar suas ações. Além do mais, odiou a maneira que ele disse “outras mulheres”, embora ela tenha começado. Dito pelos lábios dele o passado parecia mais real, e era um passado que ela tentava bloquear. O que era difícil quando imaginava outra mulher nos braços dele. Precisava se concentrar. – Talvez se você passasse mais tempo pensando em como eu poderia ajudá-lo com a situação e menos tempo me culpando, poderíamos fazer algum progresso. – Muito bem. Se está tão disposta a ajudar, pode começar desempenhando o papel de anfitriã perfeita esta noite e agindo como a esposa dedicada. Não importando quanto isso lhe seja doloroso. – Zayed a olhou de maneira significativa. – Hassan Rouhani é uma figura política importante no
cenário mundial. Será um aliado útil, mas apenas se eu puder lhe provar que Gazbiyaa está seguro nas minhas mãos. Que tenho a situação com Harith sob controle. Nadia emitiu um pequeno som na garganta, mas o brilho de aviso nos olhos de Zayed o conteve. – A sua tarefa é entreter... Fatima. – Salema. O nome da esposa dele é Salema. – Como for. Você precisa se certificar de que ela pense que nosso casamento é sólido, que o futuro da linhagem real está assegurado. – Certamente, Majestade. Talvez queira que eu coloque uma almofada debaixo do vestido. – Não será necessário. Zayed virou-se, mordendo o lábio inferior para impedir que o sorriso se formasse. Como sequer podia achar a situação engraçada? Nadia era a mulher mais exasperante que tivera o azar de encontrar. E vivia voltando para se submeter a mais provocações. Ali estava, tentando convencer dignitários do alto escalão de que tinha tudo sob controle quando, na verdade, não conseguia nem sequer controlar sua esposa. – BEM, DEVO dizer que faz bem ao meu coração ver um casal tão apaixonado. – Salema Rouhani recostou-se na cadeira e olhou os companheiros à mesa. – Não acha, Hassan? Não formam um casal adorável? – Com certeza, querida. – Hassan Rouhani era de baixa estatura, mas tinha uma mente aguçada, perspicaz. Nadia soube que teria de desempenhar o papel de recém-casada feliz com todo o esforço para convencê-lo. – E, sem dúvida, o povo de Gazbiyaa está feliz em ver o sheik casado. Especialmente agora durante um período de tanta instabilidade. Hassan virou-se para Zayed. – Isso me faz lembrar. Ouvi um rumor de que Azeed está em Harith. Ele entrou em contato com você? Diante do nome Harith, Nadia quase se engasgou com a água, mas conseguiu se recobrar a tempo. – Não, não ouvi nada de Azeed. Ele ignorou por completo as minhas tentativas de fazer paz, de obter algum diálogo entre nós. Decidi que se essa é a decisão final dele, vou ter de respeitá-la. – Bem, se ele está em Harith isso pode tornar as coisas muito difíceis para você. Quanto mais munição Harith tiver para usar contra Gazbiyaa, mais difícil a situação se torna. Meu conselho seria encontrarmos uma solução diplomática o mais depressa possível. – Venha, querida. – Salema estendeu o braço para Nadia. – Deixemos os homens com os seus negócios. Vamos tomar nosso chá no salão. – Na verdade, eu gostaria de ouvir esta conversa. – Nadia tossiu de leve, ignorando o olhar de aviso de Zayed. – Como se pode chegar a uma solução diplomática quando os dois países se recusam a se comunicar um com o outro? – De fato – concordou Hassan. – E como você sugere que o problema seja resolvido? – Tenho certeza de que ela não faz ideia, não é, Nadia? – Zayed pronunciou o nome dela por entre dentes.
– Eu tenho uma ideia, na verdade. Acho que a solução seria que os dois lados se sentassem a uma mesa e decidissem encerrar o conflito. Os problemas e desentendimentos precisam ser discutidos verbalmente, conversados de maneira lógica e sensata. Precisaria haver um mediador para garantir justiça, porém, mais importante, os melhores conselheiros deveriam ser utilizados para ajudar a encontrar meios de se alcançar uma paz duradoura. E não me refiro a burocratas. – Prossiga – encorajou-a Hassan. – Que tipos de conselheiros você tem em mente? – Pessoas que conheçam a situação, de preferência de ambos os lados, pessoas que realmente entendam os corações e mentes dos dois reinos e que estejam comprometidas com a paz. Que possam persuadir ambas as nações a deixar o orgulho de lado e canalizar essa energia para construir um relacionamento positivo entre Gazbiyaa e Harith, tanto agora como no futuro. Com o discurso feito, Nadia recostou-se na cadeira com as faces afogueadas e o coração disparado. A mesa ficou muito quieta, e o silêncio foi enfim quebrado por um aplauso lento de Hassan. – Argumentou muito bem, minha jovem. – Virou-se para Zayed, que estava aturdido. – É uma esposa e tanto a que encontrou, Zayed. Bonita, inteligente e demonstra força de vontade. Você é um homem de sorte. – Não sou? – Zayed a olhou com uma hostilidade que apenas Nadia percebeu. – Ela é cheia de surpresas. COM UMA forte batida à porta, Zayed adentrou no quarto de Nadia, que era posicionado na extremidade da suíte de ambos, ficando o mais longe possível do próprio quarto dele. – Eu não lhe deixei claro que, sob circunstância alguma, você deveria falar sobre Harith? – A fúria o levou até o meio do quarto, onde parou com as mãos nos quadris, ofegante. Nadia estava sentada à penteadeira, usando um pijama curto de seda, a escova de cabelo no ar. O fato de vê-la daquele jeito não contribuiu em nada para abrandar a respiração dele. – Você sabe que, graças ao seu pequeno discurso, Rouhani vai descobrir quem você é e de onde é? Tinha de nos sujeitar às suas opiniões óbvias sobre como resolver os problemas de Harith? Por que não segurou uma placa, com uma grande seta, dizendo “Olhe para mim, sou de Harith”. – Posso dizer algo finalmente? – A escova foi apontada para ele como uma arma enquanto ela se virou na banqueta de madeira, levantando as nádegas para soltar o tecido do short do pijama. Zayed engoliu em seco. – Por que eu não podia falar, discorrer sobre algumas ideias? Alguém precisa fazer alguma coisa. – Eu estou lidando com o problema. Você “discorrendo sobre algumas ideias”, como diz, só está aumentando a pressão, aumentando o perigo, tornando o meu trabalho mais difícil. Por que não pode enxergar isso? – Então, você está lidando com o problema, não é? Que progresso está fazendo? – Não lhe devo satisfações, mocinha. A raiva de Zayed se alastrava. Com que direito ela ousava lhe fazer exigências quando era a culpada por ter aumentado a crise, quando parecia determinada a colocá-los em maior perigo? E como ousava se vestir daquele jeito com o pijama de seda moldando-lhe o corpo e o short aprisionado entre as pernas cruzadas, desaparecendo entre as coxas?
– A sua parte do acordo, uma vez que parece ter esquecido, é ser a sheika devotada, manter a discrição e, mais importante, ficar quieta. – A última palavra foi dita por entre dentes. – Quanto mais quieta eu fico, mais elevado posso ver o sabre sendo empunhado de ambos os lados. Algo tem de ser feito logo, antes que o sangue dos nossos jovens seja derramado. – Acha que eu não sei dessas coisas? – A raiva fizera Zayed aproximar-se com largas passadas. – Não acha que estou fazendo tudo ao meu alcance para impedir isso, para me certificar de que não aconteça? – Não, não acho. – O quê? Nadia depositou a escova com força na penteadeira. Levantando-se, jogou os ombros para trás. – Falei que não acho que você está fazendo tudo que pode para promover a paz. – A voz dela soou calma e controlada, mas continha um tremor. Não havia dúvida de quanto aquilo lhe significava. – Está tão ocupado fazendo reuniões com os grandes que não consegue enxergar o que está diante de você. Zayed podia enxergar exatamente o que estava diante dele. Esforçou-se para lutar contra as ondas de desejo que o envolveram. À sua frente, estava a mulher mais bonita que já conhecera. O cabelo lustroso cascateava-lhe em ondas até os ombros, os olhos de um tom raro de azul brilhavam, as maçãs do rosto estavam coradas, os lábios cheios, desejáveis. Uma alça da parte de cima do pijama deslizara pelo ombro, e ele não pôde desviar os olhos dos seios dela, dos mamilos se comprimindo contra o tecido. Por mais que tentasse, não pôde conter a ereção sob a calça ao admirá-la. – Sou a melhor conselheira que você poderá encontrar! – Se Nadia notou o efeito que estava lhe exercendo, não demonstrou, absorta demais pela convicção de suas crenças. – Sei mais sobre Harith do que qualquer um desses chamados especialistas com os quais você está perdendo tempo para falar. Se você parar de se comportar como um chauvinista, parar de me culpar por tudo e começar a ouvir o que tenho a dizer, juntos podemos encontrar uma solução. – Basta! Esta conversa terminou. – Zayed deu um passo atrás, precisando encontrar espaço e controle para lutar contra as duas batalhas que Nadia travava: uma testando sua paciência, a outra mexendo com sua libido. Era a libido que lhe gritava para pegar aquela mulher arrogante, insubordinada, deitá-la na cama e fazer amor com ela. E uma vez que essa ideia se formou na sua cabeça espalhou-se para regiões mais sensíveis de seu corpo, recusando-se a ir embora. Mentalmente, estava sobre ela, olhando para seu corpo escultural, insinuando a mão sob o short de seda e retirando-o pelos quadris. Ou talvez deixando-o e afastando a perna do short para o lado para ter acesso à parte mais íntima do corpo dela com os dedos. Depois, substituiria os dedos pelo membro que latejava agora contra sua calça, posicionando-se para poder penetrá-la, dando arremetidas e sentindo-lhe o sexo quente e úmido contraindo-se em torno dele. Droga! Furioso consigo mesmo, Zayed deu longas passadas na direção da porta. O que havia de errado com ele? Aquela mulher estava totalmente fora dos seus limites e, ainda assim, ele se comportava como um adolescente movido pelos hormônios. – Não ouse me deixar falando sozinha.
A voz imperiosa de Nadia o fez parar, e ele olhou por sobre o ombro. – Você é uma princesa – afirmou com frieza. – Batendo o pé e me dizendo o que fazer. Você não está em Harith agora. Não sou um dos súditos a quem possa dar ordens. Quando tomou a decisão de vir até aqui para se casar comigo, abriu mão desse privilégio. Talvez eu deva lembrá-la de que você é minha esposa, no papel ao menos e, como tal, vai fazer o que eu mandar, não o contrário. Desde o momento em que assinou aquela certidão de casamento, você se tornou minha... – O quê? – Nadia contornou o quarto bloqueando-lhe a passagem. Tinha o rosto afogueado, os olhos faiscavam. – Vá em frente, diga. Eu me tornei sua propriedade. Era o que você estava prestes a dizer, não era? Que eu pertenço a você. Sou apenas mais uma das suas posses, da mesma maneira que mulheres têm sido tratadas por gerações, tanto pela sua família quanto pela minha. Como pude me iludir achando que você seria diferente? – Na verdade, eu ia dizer que você se tornou minha responsabilidade. Nadia piscou, surpresa. – Mas, se estamos lidando com verdades, talvez eu deva escolher uma palavra melhor. Você se tornou um risco, é isso. Um risco perigoso. Ele observou-a morder o lábio inferior enquanto lutava para controlar o tremor que suas palavras causaram. E de repente vê-la tão vulnerável e sexy, atormentando-o sem saber naquela roupa de dormir tão sedutora, foi demais para ele. Tinha de sair dali. Agora. Antes que fizesse algo de que pudesse se arrepender. Passando por ela, chegou à segurança da porta, obrigando-se a prosseguir. Nunca antes sentira uma tentação como aquela.
CAPÍTULO 8
– RECEBI UM e-mail de Hassan Rouhani esta manhã. Zayed esperara que os dois criados que serviam a comida deles saíssem antes de falar. Ele e Nadia estavam sentados à pequena mesa redonda na sala de jantar informal, algo que faziam na maior parte das noites num esforço de manter a farsa de casal feliz. Nessa noite tal esforço foi difícil levando em conta o confronto da noite anterior. Nadia não vira Zayed o dia todo. Com nada para fazer a não ser refletir sobre a noite anterior, perguntara-se se ele estaria certo, se acabara piorando as coisas falando o que pensava. Parecia que estava prestes a descobrir. – O que ele falou? – Ela deixou os talheres de lado. O apetite pelo sayadieh samak, o delicioso peixe assado com arroz, subitamente desapareceu. – Oh, são só elogios. – Ele fitou-a com olhos sérios. – Para você. Está me dando os parabéns por eu ter conseguido encontrar uma esposa bonita e inteligente. – Isso é bom. – Nadia teria adorado saborear aquela pequena vitória, mas o ar sisudo de Zayed a impediu. – É bom que alguém goste de mim. – É mesmo, não? – Ele proferiu algo mais? – Se quer dizer se ele sabe quem você é, não. Mas não pense que isso vai livrá-la. Rouhani é um homem inteligente. Talvez faça uma investigação. De qualquer modo, o que você comentou ontem à noite foi totalmente irresponsável. Nadia suspirou. O homem não parava de censurá-la? – Hassan mencionou mais alguma coisa sobre Azeed? Acha mesmo que ele está em Harith? – Quem sabe? – Zayed concentrou-se em sua refeição. – Deve ser difícil para você, que seu irmão o tenha tirado de sua vida sem que seja culpa sua. Ele se manteve em silêncio, mas ela persistiu. – Vocês eram próximos? Enquanto cresceram, quero dizer? – Não especialmente. – Finalmente Zayed a olhou. Parecia que ela não desistiria, que estava determinada a expor-lhe as fraquezas e falhas. Endureceu a voz. – Nossa criação foi bastante
diferente. Azeed foi educado aqui em Gazbiyaa, preparado a vida toda para o papel de sheik, enquanto eu fui enviado para um internato na Inglaterra. Como o segundo filho, tive muito mais liberdade. Pude ir em busca da minha própria carreira, controlar meu destino. Isto é, até agora. – Mas agora você é o sheik de Gazbiyaa – declarou Nadia, aceitando o desafio no tom dele. – Com certeza, não pode haver maior honra do que ser o governante do seu reino. – Mas essa honra vem com um preço. – Você se refere ao seu relacionamento com o seu irmão? – Bem, em parte a isso. Com ar culpado, Zayed se dava conta de que começava a reconhecer como aquilo doía. Descobria-se sentindo cada vez mais falta de Azeed, tanto o irmão que nunca conhecera realmente quanto o irmão que o cortara de sua vida. Estava ciente demais de que não fora capaz de cumprir o desejo de sua mãe no leito de morte e que isso pesava em seu coração. Mas como podia fazer as pazes com Azeed se o irmão se recusava a ter qualquer relacionamento com ele? – Mas eu me refiro ao preço de abrir mão da vida que criei para mim mesmo. De desistir de tudo pelo que trabalhei. – Não é um sacrifício pequeno? – Não, não é pequeno. Construí um negócio de bilhões de dólares no ramo de aquisições ao longo dos anos. Não é algo que simplesmente acontece. Exige trabalho árduo e determinação. Pede investimento e, com isso, quero dizer compromisso e energia. Estou bastante orgulhoso do que conquistei. – Tenho certeza. – As poucas palavras de Nadia aliadas à maneira como arqueou brevemente as sobrancelhas transmitiram o que pensava das realizações dele. O que só serviu para esquentar o sangue de Zayed ainda mais. De algum jeito ela sempre conseguia fazer aquilo, vencer as defesas dele para fazê-lo justificar-se. Para fazê-lo se importar. – Mas agora você tem o maior orgulho de ser o sheik de Gazbiyaa. – Sim. – Zayed deixou os talheres de lado e levou o guardanapo aos lábios. – Sim, tenho. – Com um suspiro de frustração, deu-se conta de que jamais convenceria Nadia de que sua vida anterior tinha valor. Era melhor desistir. Na verdade, não sabia por que persistia no assunto. Com certeza, não iria lhe contar que orgulho fora a última coisa que sentira quando descobrira que seria coroado sheik de Gazbiyaa. Choque, incredulidade e horror, inclusive, tinham estado no alto da sua lista de emoções. Se fosse franco, sabia que ainda estava lutando para se adaptar à enorme mudança em sua vida, ao peso da coroa. Seu dever para com seu país era absoluto, não havia dúvida quanto ao seu comprometimento, mas eram coisas que ameaçavam esgotar-lhe o espírito. E seu casamento com Nadia só tinha tornado as coisas cem vezes piores, transformando uma situação difícil em quase intolerável. Diante de sua própria fúria, ele tinha de admitir que não era apenas o casamento de ambos e suas possíveis repercussões que o instigavam, embora isso fosse ruim o bastante. Mais preocupante era a presença da própria Nadia. A pessoa que ela era, a maneira como o afetava, as reações conflitantes que provocava. Havia amargura pela maneira como o enganara; raiva também por ter bancado o tolo. Havia também o enorme senso de responsabilidade que tinha por ela e, embora
isso o chocasse, não era nada comparado a reação mais chocante de todas. Desejo. Ele achava cada vez mais difícil escondê-lo dela e negá-lo a si mesmo. Mas não significava que pararia de tentar. Sua voz endureceu: – Mas junto com o orgulho de ser coroado sheik vem a perda da liberdade. – Liberdade? Você tem sorte em tê-la para poder perdê-la. A razão pela qual ele não conseguia fazer Nadia entender sua frustração era porque liberdade era algo que nunca experimentara? A dedução apanhou-o de surpresa. – Pelo que entendo, crescer em Harith foi bastante restritivo, não? – Olhou-a com ar especulativo. – Você não imagina quanto! – Conte-me a respeito, então. – Zayed recostou-se na cadeira e estudou-a. – Conte-me como era. – Era sufocante, ofensivo. Minha vida nunca foi minha. Eu era um ornamento, algo a ser vestido e exibido como um objeto. Como mulher, nunca pude ter opinião própria e, como única filha do sheik de Harith, eu tinha de fazer o que me diziam, obedecer às ordens sem questionar. – E quanto ao seu irmão? Não formou um relacionamento com ele? – Imran? Não, absolutamente não. Ele é fraco demais para ter opinião própria ou estúpido demais para se dar conta de que precisa de uma. Quando se tornar sheik de Harith, temo ainda mais pelo povo do reino. – E você tinha que receber ordens dele também? – Sim, é claro que sim. E ele tinha grande prazer em pensar em punições. Mas quanto mais apertavam o cerco, mais determinada eu ficava a me libertar. Eu não queria causar problemas, mas eu sabia que não ficaria igual a minha mãe, por mais que eu a ame, com a força de vontade destituída dela pelos homens autoritários em sua vida. Zayed olhou para o rosto corado e os olhos brilhantes de Nadia no lado oposto da mesa. Viu que ela deixara a comida de lado, como se as lembranças da vida passada tivessem lhe tirado o apetite. De repente, deu-se conta de que estivera concentrado na própria vida, tão furioso pela maneira como Nadia o enganara que mal pensara nos sentimentos dela, na vida da qual estivera tão desesperada para escapar e na vida em que estava aprisionada agora. Era daquela maneira que o via, como mais um homem autoritário em sua vida? Observou-lhe as mãos delicadas na mesa e a aliança. Sentira aquelas mãos acariciando seu corpo e tocando seu membro com hesitação. Ela lhe proporcionara tanto prazer com suas carícias que ele se concentrara em seu rosto bonito e se contivera para adiar o clímax. – Então… – Ele se moveu na cadeira, determinado a não pensar no volume em sua calça –... quando lhe arranjaram um pretendente foi que você soube que tinha de partir. – Sim. Do contrário, eu teria ficado presa para sempre. – Você fugiu da opressão de sua vida em Harith para parar bem no coração do maior inimigo do seu país. Não foi uma decisão nada sensata, se não se importa que eu diga, se estava procurando sua liberdade. – Eu não estava procurando liberdade. – Os olhos dela faiscaram. – Eu queria fazer a diferença. É o que venho tentando lhe dizer. Eu estava em busca de uma maneira de impedir que o meu país entrasse em guerra. Foi por isso que vim para Gazbiyaa.
Se Zayed tivera alguma dúvida quanto à verdade das afirmações de Nadia, se afastou agora. Sua paixão e convicção brilhavam em torno dela como uma aura. Não havia dúvida de que era autêntica, de que fora até ali para fazer o que achava certo. Talvez não fosse de surpreender que fosse tão hostil em relação a ele, que revidasse a cada oportunidade que tinha. Embora não gostasse de admitir, Zayed podia ver por que a irritava tanto. Nadia arriscara tudo para estar ali – arriscara sua vida, na verdade. Ao passo que ele lamentava a vida que deixara para trás. Ambos tinham parado no mesmo lugar com os mesmos objetivos, mas um lutara para estar ali e o outro se ressentia disso. De repente, ele se sentiu tocado. Talvez devesse aceitar o papel que tinha agora, o título de sheik de Gazbiyaa, com mais graça, mais gratidão. Talvez devesse dar as boas-vindas a Nadia, ao menos dar-lhe uma chance. – Nesse caso, só posso parabenizá-la por seu altruísmo e coragem. Ele pretendeu elogiá-la. Nadia era a pessoa mais corajosa que já conhecera. Seu espírito de luta a tornava ainda mais atraente. Mas parecia que ela não aceitava elogios dele, nem de ninguém. Em vez de se abrandar com as palavras, jogou os ombros para trás, pronta para discutir. – Não sou altruísta, nem corajosa. Vejo como um privilégio poder ajudar meu país. Ao contrário de você. Ao contrário de você. E lá ia ela novamente. Um músculo se retesou no maxilar de Zayed. Se começara a enfraquecer, a ver as coisas do ponto de vista dela, a atitude desdenhosa de Nadia o fez recobrar o bom senso mais uma vez. Em vez de corajosa e altruísta, devia chamá-la de teimosa ao extremo. O lado racional lhe advertiu para deixar para lá, que não importava o que a exasperante mulher pensava dele. Mas o lado irracional queria fazê-la provar do próprio veneno. – Ao contrário de você, não acho necessário bancar o mártir. Todos sabemos que o seu sacrifício é louvável. Não precisa ficar gritando isso do telhado. Mas talvez eu precise apontar que você não é a única fazendo sacrifícios. E, antes que comece, não estou falando sobre o sacrifício da minha vida anterior. Estou falando em estar casado com você. Francamente esse parece o maior sacrifício de todos. Algo que pareceu mágoa passou pelos olhos de Nadia antes de desviá-los. – Bem, para mim também é – retrucou desdenhosa. – Acredite, esse é o maior sacrifício para mim também. – Ótimo. Fico contente que concordemos em algo. SENTADA, NADIA colocou o pé abaixo de si e olhou ao redor. Fora até um de seus esconderijos favoritos no palácio. Era um pátio relativamente pequeno com fileiras de colunas apoiando arcos ornamentais dos quatro lados e bancos almofadados ao redor. Ajeitou melhor o xale em torno dos ombros. A temperatura estava caindo depressa. O que era mais do que podia dizer sobre a sua própria temperatura. A sua não sairia do ponto de ebulição no que dizia respeito a Zayed. A conversa durante o jantar daquela noite era prova o bastante. Parecia que não conseguiam passar tempo juntos sem discutir, sem ver quem conseguia magoar mais o outro. Bem, Zayed vencera com seu comentário de que aquele casamento era o maior sacrifício de todos. Ela respondera à altura não o deixando ver que as palavras tinham atravessado seu coração como um punhal. Ou pior, a fraqueza que tinha por ele.
Odiava a si mesma por aquela fraqueza. Era algo que a inquietava, que a fazia indagar tudo que estava tentando fazer ali. Por que as palavras cruéis dele a magoavam tanto? Por que faziam como que ficasse sensível e exposta e sentindo-se uma farsa por se importar tanto? Nenhum dos dois entrara naquele casamento por algo que não fosse razões práticas. Como Zayed se sentia a seu respeito não devia importar. Mas importava. Nadia passou os braços em torno de si. Por alguma razão, importava muito. Baixando a cabeça para poder observar além do arco, olhou para o retângulo de profundo azul salpicado pelas primeiras estrelas, esperando tirar consolo do universo. Mas foi Zayed que lhe chamou a atenção de repente, alto e atlético, aproximando-se com o que parecia um laptop debaixo do braço. – Espero não estar incomodando – disse ele, sentando-se no banco. – É que tive uma ideia, algo em que você pode me ajudar. Ajudá-lo? Aquilo era novidade. Apesar das palavras amargas de antes, Nadia sentiu a esperança se elevar. Será que ele a ouviria finalmente, a deixaria explicar suas ideias para conversas entre Harith e Gazbiyaa? – Você sabe que farei o que puder para ajudar. Zayed ligou o laptop e venceu a distância entre ambos no banco. Ela pôde sentir-lhe o contato da perna junto à sua. – Não sei se mencionei isto a você, mas sou um dos membros fundadores de uma obra de caridade, os Cavaleiros de Columbia. Fazemos parte eu, Christian, Stefan e... – Rocco. Sim, eu sei. – Não sei qual de nós lhe deu este nome, mas, de qualquer modo, este é o site. – Ela percebeulhe o orgulho. Sentiu-lhe o calor e força do corpo agora que estava tão próximo. Por um instante, permitiu-se saborear a intimidade do momento. Os dois lado a lado no isolamento acolhedor do pátio. – O sucesso da obra de caridade excedeu nossos sonhos mais idealistas, mas, por outro lado, há a pressão de manter tudo funcionando. Nenhum de nós tem tido muito tempo para se dedicar à obra recentemente e o fato é que precisamos ir em busca de doações. – E do que se trata essa obra? Zayed mostrou-lhe o site. – Basicamente ajudamos garotos carentes que merecem uma boa educação, mas não têm dinheiro para pagar. Como falei, tem tido muito êxito. Nadia não duvidou, a julgar pelas imagens de adolescentes sorridentes na tela do laptop. – O que precisamos é de alguém que mantenha contato com os benfeitores lembrando-os da importância do trabalho que estão apoiando, certificando-se de que espalhem a notícia, esse tipo de coisa. Temos uma pequena equipe contratada, mas basicamente esses filantropos apreciam o toque pessoal. O contato direto de um dos Cavaleiros parece ser a maneira mais rápida de contribuírem. – Mas sou só a esposa de um Cavaleiro. Isso conta? – Hum, provavelmente não. – Se ela esperara confirmação da importância de seu papel, Zayed liquidou-a. – Acho que será melhor se você enviar os e-mails no meu nome. Depois que eu os tiver verificado, é claro.
– É claro. – Nadia se esforçou para conter o sarcasmo. Suas esperanças tinham ruído depois que ele lhe explicara sobre o tipo de ajuda que precisava, mas ao menos a estava deixando entrar numa pequena parte de sua vida e aquilo era melhor do que nada. Se pudesse lhe conquistar a confiança, talvez pudesse lhe penetrar a armadura. – O que você acha? – Sim, ficarei contente em fazer isso. – Obrigado. Será de grande ajuda. – Zayed entregou-lhe o laptop. – É melhor entrarmos. Está ficando frio. – Ele estendeu-lhe a mão, não lhe dando escolha a não ser aceitá-la. Ela ajeitou o xale e pegou-a, colocando o laptop debaixo do braço. No interior do palácio, sob as luzes do amplo vestíbulo, os dois se separaram. – É melhor eu voltar ao trabalho então – pronunciou Zayed. – Eu também. – Nadia indicou o laptop debaixo do braço. – Obrigado de novo por isso. NADIA OLHOU para o horário na tela do laptop. Eram onze e meia da noite. Estivera trabalhando há horas na cama com um travesseiro apoiado nas costas. Como nunca tivera um computador, a falta de habilidade a atrasara um pouco, mas agora sua pesquisa estava feita. Tinha sua lista de contatos pronta para mandar por e-mail, mas isso era uma tarefa para o dia seguinte. Estava prestes a fechar o laptop quando decidiu verificar a situação dos e-mails. Precisaria acessar o e-mail de Zayed a fim de poder contatar os benfeitores no nome dele. Ela clicou num ícone de envelope. Foi fácil. Entrou diretamente sem que uma senha fosse necessária. Havia várias mensagens na caixa de entrada. Certamente, não as olharia. Não era certo. Moveu o cursor tentando entender como enviar mensagens e acabou clicando inadvertidamente em e-mails enviados. Um nome lhe chamou a atenção. Azeed Al Afzal. Ela hesitou. Não deveria olhar. Mas e se desse apenas uma rápida espiada? A tentação a fez abrir o e-mail antes que os escrúpulos pudessem detê-la e se viu olhando para uma sequência de mensagens de Zayed para o irmão, cada uma mais fria e direta do que a outra. Começavam com Zayed encorajando Azeed a contatá-lo. Finalmente, terminavam de maneira tensa: “Quando você estiver pronto para conversar comigo, estarei aqui”. Nenhuma mensagem recebera resposta. Nadia olhou para as mensagens. Sabia que não deveria tê-las lido, mas agora que o fizera talvez pudesse ajudar. Tinha certeza de que podia ser mais persuasiva do que aquilo. Se conseguisse fazer com que Azeed contatasse Zayed e se Azeed estivesse mesmo em Harith, como Hassan Rouhani comentara, talvez ele pudesse facilitar algum tipo de reunião com o pai e o irmão dela. Valia a pena tentar. Com os dedos pairando acima do teclado, mordeu o lábio inferior, concentrando-se em como devia escrever aquilo. Caro Azeed, Apelo a você hoje como meu único irmão...
CAPÍTULO 9
FOI O falcão voando acima que eventualmente acabou indicando a localização de Zayed, enquanto a ave atravessou majestosamente o céu claro de início de manhã para pousar no braço de seu mestre. Quando Nadia os alcançou, estavam no pátio dos fundos, local onde aquelas aves eram treinadas. Elas já a deixavam nervosa, mas ao ver Zayed com o falcão no braço seu coração disparou. Usando jeans e um grosso suéter cinza, parecia ainda mais bonito do que o costume naquele ambiente rural com o falcão pousado na luva usada em seu braço. Ambos se viraram em sua direção enquanto se aproximou cuidadosamente. Nenhum pareceu satisfeito em vê-la. Nadia se preparou. A excitação de sua tarefa estava mesclada à ansiedade de como Zayed a receberia. Acordara cedo naquela manhã, e a lembrança do que fizera na noite anterior, enviando rapidamente aquele e-mail a Azeed, a fizera pegar o laptop na mesinha de cabeceira. Supusera que Azeed não responderia. Ela apagaria a mensagem, e Zayed nunca saberia o que fizera. Mas, respirando fundo, dera-se conta de que se enganara. Pois ali estava, uma resposta de Azeed Al Afzal. Com a mão trêmula, ela abrira o e-mail e verificara rapidamente a mensagem. O que vira era positivo. Agora, vinha contar a boa notícia a Zayed. – Olá. – O que está fazendo aqui? – Não foi uma das saudações mais descontraídas. Zayed não estava disposto a amenidades. – Pensei em vir encontrar você. – Nadia parou diante de Zayed com o falcão no braço dele e engoliu em seco, embora agora a ave tivesse a cabeça coberta. – Para lhe dizer que você tem uma mensagem. – Uma mensagem? – Sim. – Ela se obrigou a olhar nos olhos dele. – Um e-mail. De Azeed. – Azeed? – Uma mistura de choque e esperança passou pelo rosto dele.
– Eu estava verificando os e-mails esta manhã para a obra de caridade e acabei notando-o – afirmou ela, apelando para a desculpa que havia ensaiado. – Achei que quisesse vê-lo logo. – Sim, obrigado. – Os olhos dele pareceram cautelosos agora, desconfiados. Nadia preparou-se para o interrogatório. – Quando esse e-mail chegou? – No início desta manhã, creio eu. Ele estudou-a atentamente. – Quer dizer que o e-mail chegou justamente quando você estava em poder do meu laptop? – Sim. – A resposta casual de Nadia não enganou a nenhum dos dois, conforme a maneira como Zayed estreitava os olhos indicava. – Que fortuito. – Bem, na verdade... – Esqueça por enquanto – declarou ele num tom áspero, adiantando-se para transferir o falcão para um dos poleiros. – Vejo você no palácio dentro de dez minutos. Nadia assentiu. Teria de lhe contar o que havia feito, mas, de fato, era melhor entrarem. – QUAL É o significado disto? Estavam no escritório de Zayed com o laptop aberto na mesa diante de ambos e a tela exibindo o e-mail de Azeed. Nadia entrara segurando o laptop como de fosse algum tipo de prêmio, ostentando seu perfume floral e alheia a seus gestos sexy. Usava um jeans justo, sem uma jaqueta agora, com uma blusa rosa sem mangas. De algum modo, em Nadia aquela era uma das roupas mais sensuais que ele já vira. Estivera treinando Kali, seu falcão favorito, quando a avistara a distância, caminhando em sua direção. Seu coração disparara inexplicavelmente ao vê-la, emoção que canalizara para irritação. Afinal, fora até lá para espairecer e esquecer dos fardos da vida e, exceto pela guerra iminente, Nadia era o maior de todos. Apesar de todos os seus esforços, não estava mais perto de resolver o problema de Harith. A ameaça de guerra não dava sinais de se abater e todas as habilidades de negociação de que se orgulhava, que haviam tornado sua empresa tão bem-sucedida, não valiam de nada para se lidar com um país inflexível como Harith. Parecia que a guerra era a única linguagem que entendiam. Também não estava próximo de resolver o problema com Nadia. Ou mais especificamente a atração exasperante que sentia por ela. Ficara tão determinado a manter a mulher que o enganara como esposa apenas no papel que de maneira alguma se permitiria ficar tentado a levá-la para a cama. Naquele primeiro dia, quando ela lhe contara quem realmente era, ele tivera certeza de que seria fácil. A raiva o dominara por completo, bloqueando até a forte atração entre ambos junto com as lembranças febris da noite que haviam passado juntos. Mas a raiva se abrandara. Continuava no íntimo dele se manifestando a cada vez que pensava na maneira que ela mentira. Mas as suas defesas não continuavam mais tão firmes. A cada dia que passava, seu anseio por aquela mulher impossível crescia. Ao ponto em que bastava que ela entrasse numa sala para que seu coração disparasse.
Havia o risco de que ele ficasse completamente louco. Em especial quando ela insistia em interferir nos seus assuntos. Como enviar um e-mail para o seu irmão pelas suas costas. – Bem, se você me deixar explicar... – Por favor. – Zayed recostou-se na cadeira, afastando-se da mesa e dela, usando uma calma indiferente que não enganava a nenhum dos dois. Estava conseguindo controlar sua raiva, mas continuava ali, fervendo abaixo da superfície. – Eu estava trabalhando no computador e acabei me deparando com e-mails seus para o seu irmão. Vi que você não conseguiu persuadi-lo a responder e... – Então, você leu meus e-mails pessoais? – Não todos. Apenas os que você enviou para seu irmão. – Oh, está certo, então. – De qualquer modo, quando vi o que havia escrito não fiquei surpresa que Azeed não tenha se sentido persuadido a responder... – Pare aí mesmo. Não apenas você lê meus e-mails particulares como têm a audácia de me dizer o que há de errado com eles? – Bem, alguém tinha de fazê-lo. Estavam todos errados. Não continham nenhuma emoção, nada que soasse como se viesse do coração. Você entrou em contato com o seu irmão como se ele fosse um acordo de negócios que você queria fechar, como se o desaparecimento dele fosse um mistério levemente irritante em vez de algo que realmente significa para você. – Não fiz isso. Não é verdade. Como você ousa me dizer como falar com o meu irmão sendo que nem sequer o conhece? Você não sabe absolutamente nada sobre ele. – E nem você, ao que parece. Zayed encarou-a zangado, aturdido. Ela tinha razão? Ele não conhecia seu irmão em absoluto? – De qualquer modo, eu soube que podia fazer um serviço melhor. – É mesmo? Então, você decidiu que enviaria um e-mail ao meu irmão? – Zayed virou-se para o laptop procurando a mensagem de Nadia. – No meu nome, sem me dizer? – Sim, eu fiz isso. Porque se tivesse lhe indagado, você jamais teria me deixado. – Pode apostar que não. Você não tinha direito algum de fazer isso. – A questão é que deu certo. Você pode achar que isso foi interferência, mas Azeed viu o e-mail pelo que era. Uma mensagem do coração. – Do seu coração, não do meu. – Talvez seja porque você não sabe onde encontrar o seu. Zayed sabia exatamente onde estava seu coração. Estava tomado pelo ultraje pelo que Nadia fizera, raiva por desafiá-lo daquela maneira. O pior era que aquelas emoções vinham acompanhadas da sensação de que talvez ela tivesse um ponto válido. – Veja. – Ela se aproximou mais, apontando para a tela do laptop, deixando-o ciente do perfume de seu cabelo. – Pode não aprovar os meus métodos, mas graças à minha mensagem, não apenas você está em contato com seu irmão outra vez, mas ele está concordando em ajudar a providenciar um encontro com a minha família. E aquele era o foco de Nadia. Ele podia lhe ver o rosto cheio de entusiasmo, ouvir a esperança e o otimismo em sua voz. Aquele fora o objetivo da farsa do casamento, tentar encontrar a paz.
Querer salvar seu país dos horrores de ir para a guerra com Gazbiyaa era a mais nobre das ambições dela. Era o que Zayed queria também, mais do que tudo. Por que a situação o irritava ao extremo? Por que o magoava? – Suponho que ache que foi muito esperta – comentou zombeteiro. – Não, não esperta. Quis apenas encontrar um caminho. Da mesma maneira que você faz. – Está certo. – Ele se levantou abruptamente, fechando o laptop com mais força do que o necessário. – Aceito que sua intervenção foi bem-sucedida neste caso. Apenas não espere que eu a agradeça por isso. – Já sei que seu orgulho não deixaria. Zayed dirigiu-lhe um olhar atravessado. Ela era irritante. Gostaria de deitá-la sobre seus joelhos, baixar-lhe o jeans e... talvez acariciar-lhe as nádegas perfeitas, causar-lhe arrepios na pele antes de escorregar os dedos até... – Você vai mandar um e-mail de volta para o seu irmão, não vai? – O tom autoritário de Nadia o fez se recobrar. – Agora mesmo, quero dizer. Vai se certificar de que ele saiba que você quer esse encontro o mais breve possível, não é? – Vou lhe dizer uma coisa... – Uma nova onda de amargura entorpeceu temporariamente o desejo que dominava o corpo dele. – Por que não faz isso por mim? Tenho certeza de que realizaria um melhor trabalho. Nadia hesitou, incerta. – Bem, se quer que eu faça isso, terei prazer em... – Não! – exclamou Zayed reprimindo a raiva mal contida. – Não quero que você faça isso. Eu vou enviar um e-mail ao meu irmão dizendo o que eu quero quando eu quiser. – Sim, é claro. Mas eu o faria agora. E se quiser que eu dê uma olhada no e-mail antes que o envie... Zayed cruzou os braços sobre o peito e encarou-a com um olhar zangado que, enfim, a fez retirar-se do escritório. Tornou a abrir o laptop, determinado a ler o e-mail de Azeed com mais calma, sem a raiva anuviando-lhe os pensamentos. Caro irmão, Eu lhe agradeço por ter reservado tempo para entrar em contato comigo durante o que deve ser um período de grande turbulência e ansiedade para você. Ele estava certo quanto àquilo. Zayed continuou lendo. Meu coração chega até você agora que sei que o seu vem até mim. Sinto-me agradecido por suas palavras conciliadoras e suplico o seu perdão pelo meu silêncio. Fui movido por uma raiva que nunca deveria ter abrangido você, uma raiva dirigida ao meu pai e à mudança nas minhas circunstâncias. Inútil, é claro, mas espero que você entenda.
Mas agora a sua generosidade me fez ver que é tempo de seguir adiante. Farei tudo que puder para ajudar a facilitar um encontro entre você e o sheik, como solicitou. Será um alívio poder usar o recém-descoberto sangue de Harith nas minhas veias para fazer algum bem. Com amor, seu irmão Azeed. Zayed desviou os olhos da tela enquanto uma onda de culpa e vergonha o dominava. Sentia culpa por nunca ter valorizado o irmão pelo homem que era, por nunca tentar conhecê-lo melhor. E vergonha por ter estado ocupado demais com sua própria vida, ganhando o primeiro milhão, indo atrás do negócio seguinte e saindo com mulheres bonitas para sequer ter se dado conta daquilo. Não era que não valorizasse a amizade. Teria dado a vida por seus três irmãos que não eram de sangue, Stefan, Christian e Rocco. O Quarteto da Columbia. Mas e quanto ao seu verdadeiro irmão, seu verdadeiro irmão de sangue? Ao menos por parte de pai. O que já fizera por ele? Sinto-me agradecido por suas palavras conciliadoras. Se alguém agradecia era ele. A Nadia. Ela estivera certa. Ele se aproximara do irmão da maneira totalmente errada antes. E quanto à situação complicada com Harith? Teria usado uma abordagem errada também? Nadia estava certa naquele aspecto também? Zayed levantou-se da cadeira e foi olhar pela janela para a cidade escaldante, para as pessoas andando de lá para cá. Seu povo. Sua cidade. Seu reino. Aquela podia ser sua chance de acertar as coisas. De fazer as pazes com o irmão e talvez até de encontrar a paz para o seu país. Uma coisa era certa: iria tentar com todo empenho. De repente, soube o que tinha de fazer. Tinha de confiar em Azeed, contar-lhe sobre Nadia, explicar que sua esposa era a filha do sheik de Harith. Era algo que não contara a ninguém, nem mesmo aos três melhores amigos. Se Azeed iria contatar o sheik Amani para ele, merecia saber a verdade. Seu irmão fora submetido a muitas mentiras. Sua vida inteira fora uma mentira. Mas ainda havia algo que esconderia. O fato de que o casamento era uma farsa. Contaria ao irmão que Nadia era uma princesa de Harith, mas não que o enganara para casar. Seu orgulho não permitiria. Além do mais, quando as relações entre Gazbiyaa e Harith estivessem estáveis, ele e Nadia se divorciariam e seria o fim daquele terrível impasse. Não havia razão para que a verdade fosse revelada. Os pensamentos deviam tê-lo animado, mas o deixaram com um vazio por dentro. Porque Nadia, que o enganara, que testava os limites de sua paciência e autocontrole, conseguira, de algum modo, afetá-lo como ninguém jamais pudera e de tal maneira que sabia que jamais conseguiria se livrar dela. Jamais se livraria do anseio por ela; era seu companheiro constante. Não era apenas desejo sexual, embora fosse inegável. Seu corpo estava sempre a postos com uma urgência que o assustava. Mas havia mais do que isso, algo mais complexo, mais perigoso. Algo que era apenas ela, a essência de Nadia. Ela o desafiava, confrontava-o e o fazia questionar tudo sobre si mesmo. Mas a
questรฃo maior era: como conseguiria deixรก-la ir?
CAPÍTULO 10
DEPOIS DE horas com nada além da beleza do deserto como companhia, Nadia ficou aliviada ao avistar as tendas de um pequeno acampamento surgindo no raio de visão enquanto o crepúsculo se aproximava. A jornada fora longa e desconfortável, mas finalmente parecia que haviam chegado ao destino. Tinham viajado a maior parte do dia, com Zayed dirigindo seu veículo utilitário a considerável velocidade por antigos leitos secos de rios, seguindo trilhas em torno da base de penhascos de arenito ou encontrando rotas pelas dunas. A conversa fora escassa e Nadia ficara desapontada. Ansiara por conversar com ele, discutir tudo que se passava na sua mente, mas ele permanecera fechado, concentrado no volante. Ela ainda não podia acreditar no que estavam fazendo. Fiel à sua palavra, Azeed conseguira marcar um encontro no palácio de Harith, mas era com o irmão dela, Imran, em vez do pai. Imran deixara bastante claro que o sheik, que estava viajando a negócios, não deveria saber nada a respeito. Argumentara que ele jamais teria concordado em deixá-los entrar no país, e muito menos participar de um encontro com eles. Agora, estavam ali no reino de Harith, ainda que a várias horas de carro do palácio onde ela crescera. Iriam passar a noite com Azeed em seu acampamento antes de partirem para irem ao encontro do irmão dela no dia seguinte. As emoções de Nadia haviam oscilado desde que Zayed lhe contara sobre seus planos. Inicialmente eufórica por seu subterfúgio ter dado certo, temera, então, uma briga, convencida de que Zayed lhe diria que iria sozinho. Mas, para sua empolgação e surpresa, ele a informou de que ela o acompanharia. E se sentaria no encontro como esposa dele, a sheika de Gazbiyaa. Porque ele pretendia contar a verdade à família dela. Secretamente a ideia a apavorava. Mas algo na calma autoridade de Zayed aquietava-lhe os nervos, fazia com que depositasse sua confiança nele. Estava claro que ele tomara sua decisão, que nada o faria mudar de ideia. Assim, Nadia acatou-a sem discutir, escondendo seu medo detrás do genuíno entusiasmo. Finalmente, estavam naquilo juntos.
Espirrando um jato de areia, o carro parou em frente às tendas e Zayed desceu, endireitando os ombros e olhando ao redor. Um homem alto saiu da tenda maior. Nadia conteve a respiração, fascinada enquanto espiava pela janela salpicada de areia do carro o encontro dos dois bonitos irmãos. Por um instante se entreolharam, ambos altos e orgulhosos, com poucos passos separando-os na distância, mas um oceano de desconfiança e incerteza proveniente dos erros do pai deles ainda separando-os. Com um nó na garganta, Nadia observou enquanto Zayed estendeu a mão para o irmão. Uma onda inexplicável de orgulho a dominou diante do gesto nobre. Silenciosamente apanhou-se rezando para que Azeed aceitasse o aperto de mão da reconciliação. Mas ela não precisava ter se preocupado. Pois não apenas Azeed pegou a mão do irmão nas suas, mas lhe deu um abraço apertado. Nadia enxugou rapidamente uma lágrima que escorreu por seu rosto. Os dois irmãos se soltaram do abraço e olharam na sua direção. Zayed adiantou-se para abrir a porta e ajudar Nadia a sair. – Azeed, deixe-me apresentar-lhe a minha esposa, Nadia. Nadia, meu irmão, Azeed. A apresentação formal pareceu se encaixar, enquanto os três estavam solenemente sob o brilho alaranjado do pôr do sol no deserto. Minha esposa. Por um segundo, Nadia ateve essas palavras ao seu coração. Ali, longe do palácio, não era uma sheika protegida, paparicada. Era apenas a esposa de Zayed. Mas era esposa apenas no papel, de qualquer modo. Não podia esquecer. Para ser dispensada tão logo fosse seguro fazê-lo. – É um prazer conhecê-la. – Azeed pegou-lhe a mão e curvou a cabeça. Usando o turbante tradicional, parecia à vontade no deserto. – Bem-vinda à minha humilde morada. – Conforme ele ergueu os olhos, Nadia ficou aturdida com a semelhança entre os dois irmãos, mas os traços de Azeed eram mais acentuados, mais duros. – Tenho certeza de que deve estar bastante cansada e com fome após a sua longa jornada. Se quiser usar as instalações para se lavar, uma refeição vai estar pronta para você logo. Apesar de humilde, o pequeno acampamento tinha tudo que era necessário para uma vida confortável no deserto. Nadia podia entender por que Azeed abrira mão de sua vida complicada em favor daquela. Zayed e Azeed estavam sentados em tapetes diante da tenda principal com velas acesas, conversando mansamente, mas conforme ela se aproximou, ambos se levantaram. – Venha se reunir a nós. – Azeed moveu-se para o lado para que Nadia pudesse se sentar numa das almofadas entre os dois. – Vamos comer. – Ele fez um gesto para a disposição de pratos no tapete em frente e começou a passá-los. – Temos muito a conversar, mas primeiro vocês precisam se alimentar. Aceitando a mão de Zayed, Nadia sentou-se, empenhando-se ao máximo para ignorar a corrente eletrizante que o toque lhe provocou. Mas, sentada nos tapetes tribais entre os dois homens fortes, começou a relaxar. Não soubera que Azeed a aceitaria. Entrara em pânico quando Zayed lhe informara que partilhara o segredo com o irmão, o de que ela era formalmente a princesa Nadia de Harith. Mas Azeed parecia não lhe querer nenhum mal, e ela ficou aliviada em não ter de fingir que era outra pessoa.
Conforme a noite avançou, a conversa fluiu surpreendentemente bem. A comida era deliciosa, e comer da maneira tradicional com as mãos a tornou ainda melhor. Percebendo que havia muitos assuntos a resolver entre os dois irmãos, Nadia deixou-os conversar sem interrupção. Era tão bom vê-los se comunicando, se conhecendo melhor, descobrindo as pessoas diferentes que haviam se tornado. Especialmente porque fora a causadora daquele encontro. Ela ficou surpresa e contente em ver como Azeed estava disposto a confiar no irmão. E quando Zayed lhe disse sobre o desejo da mãe no leito de morte, pedindo que explicasse a Azeed por que havia falado e que lhe assegurasse que sempre o amara como um filho, ele ficou visivelmente tocado. Azeed admitiu que não era mais o homem de antes. O herdeiro impiedoso, que não teria parado diante de nada para ver a expansão de seu reino que se fora, junto com o filho amargurado que quisera se vingar do pai que o enganara. E ele enfatizou que não sentia nenhum ressentimento pelo irmão que “roubara” sua coroa. – Acredita em mim quando digo isso, Zayed? – Ele observou o irmão com um olhar penetrante. – Quero que saiba que não lhe desejo nenhum mal. – É claro que acredito em você – respondeu Zayed solenemente. – E obrigado por sua sinceridade e por sua tolerância. – Sou eu que devo agradecê-lo. Tive muito tempo para pensar recentemente e agora vejo que nunca fui a pessoa certa para governar Gazbiyaa. Você está bem mais preparado para esse papel. Eu estava tão determinado a transformar o reino numa superpotência mundial que corri o risco de ameaçar sua estabilidade, de até levar os homens à guerra. Acredite ou não, sou grato por esse fardo ter sido tirado dos meus ombros. E estou bastante grato pelo fato do futuro de Gazbiyaa estar agora nas suas mãos capazes. – Então, por que não volta, Azeed? Você pode não ser o sheik, mas sua ajuda será inestimável para mim. – Não. Tenho minha liberdade agora, algo que nunca tive antes. A liberdade que havia sido sua foi entregue a mim. Vejo isso agora e pretendo usá-la com sabedoria. – Então, certifique-se de fazê-lo. – Zayed pousou a mão no ombro do irmão. – Como meus amigos e eu costumamos dizer, memento vivere... lembrar de viver! – Memento vivere – repetiu Azeed. – Vou abraçar o seu lema! Com a refeição terminada, ele virou-se para Nadia. – E quanto a você, Nadia, espero que me perdoe por não ter ido ao seu casamento. Eu estava ressentido. – É claro. – Nadia usou o pretexto de lavar as mãos na tigela para evitar o olhar direto de Azeed. – Não precisa se desculpar. Você teve de lidar com tanta coisa. – Todos tivemos. – Ele olhou para Zayed. – Mas agora estou contente que estejamos olhando para o futuro. Acho que devemos fazer um brinde. Batendo palmas, chamou dois criados que recolheram a comida e retornaram com uma bandeja de drinques. – Ao futuro e à paz. – Os três brindaram animadamente. – E a Nadia e Zayed – tornou a brindar Azeed. – A um casamento longo e feliz.
Dessa vez, quando Nadia e Zayed se entreolharam, algo se passou entre ambos, algo significativo, triste. Ele virou-se para o irmão: – Quanto tempo levaremos para chegar ao palácio Amani amanhã? – Se saírem ao amanhecer, estarão lá ao meio-dia. Especialmente num veículo como o seu. E tem certeza de que não quer que eu vá com vocês? Se bem que eu não teria como lhes oferecer proteção. Meu nascimento duvidoso e o fato de que vivo aqui em Harith foram o bastante para arranjar um encontro com Imran Amani, mas não vão garantir a sua segurança. – Eu entendo. E sou grato por tudo que fez por mim. Mas posso me arranjar daqui em diante. – Mas vai ter uma equipe de segurança com você? Para o caso de algo dar errado. – Sim. Já tenho uma equipe de segurança disfarçada trabalhando lá, verificando as coisas, além de alguns guarda-costas, se precisarmos deles. Mas espero que não precisemos. Eu tenho de proteger Nadia obviamente, mas o objetivo é mostrarmos que estamos buscando uma solução pacífica em vez de demonstração de força. Azeed meneou a cabeça, mas manteve o cenho franzido. – Não se esqueça de que o sheik não sabe nada sobre esse encontro. De acordo com o filho, de maneira alguma ele teria permitido que você pisasse no solo de Harith, quanto mais concordar em se encontrar com você. – Então, terei de fazer com que Imran Amani enxergue o bom senso e espero que ele possa transmitir a mensagem ao pai. – E tem certeza de que quer dizer a Amani que está casado com a irmã dele? É uma estratégia de alto risco. Não seria melhor esperar até ter feito algum progresso com as negociações de paz antes de revelar isso? – Não pode haver mais mentiras, Azeed. As mentiras do nosso pai nos levaram até perto da guerra, e, ao encobrir meu casamento com Nadia, eu só aumentei as ameaças. Vejo isso agora. Quanto mais tempo nosso segredo for guardado, pior será quando as coisas ficarem às claras. É tempo da verdade. – Então, eu lhe desejo sorte, meu irmão, e faço um brinde à sua coragem. Sua e de Nadia. Zayed olhou para ela, assentindo. Ela era a pessoa mais corajosa que ele já conhecera. Quando ele lhe comunicara que o acompanharia a Harith, que contariam a verdade ao irmão dela, nem sequer pestanejara. FICOU SURPRESO, portanto, no escuro da tenda de casal quando ela começou a manifestar seus temores. Havia apenas um colchão coberto com tapetes e cobertores, e Zayed teve de se empenhar para manter a libido sob controle. Especialmente quando ela deitou a cabeça em seu peito e se aninhou junto a seu corpo. – Estou com medo, Zayed – confessou. – Com medo do que possa acontecer, de que algo possa dar terrivelmente errado. Ele massageou-lhe o cabelo para afastar a tensão. – Nada vai dar errado. – Apesar do óbvio estresse dela, teve uma sensação de triunfo. O fato de Nadia se abrir, de deixá-lo ver a vulnerabilidade por trás do ar altivo e desafiador incitou-lhe uma
reação primitiva. – Posso lidar com o seu irmão. Não tem de se preocupar com nada. Faremos o que tiver de ser feito amanhã e sairemos de lá, diretamente de volta para Gazbiyaa. – Mas suponhamos... – Nadia ergueu a cabeça e seus olhos brilharam ansiosamente no escuro da tenda. – Suponhamos que meu irmão não me deixe voltar com você. – O que quer dizer? Ela engoliu em seco. – Meu irmão pode decidir que tenho de ficar em Harith para enfrentar a punição pelo que fiz. – E você acha que eu deixaria isso acontecer? – Eu não sei. Uma vez que o nosso segredo for revelado e a minha família souber a verdade, você não vai mais ser responsável por mim. – É o que você acha realmente? – A incredulidade endureceu a voz de Zayed. – Que eu entregaria você ao seu irmão e iria embora, que a deixaria enfrentar qualquer punição bárbara que ele julgasse adequada? – Possivelmente, sim. – Ora, obrigado pelo voto de confiança. – A raiva se evidenciou na voz dele. – Sei que sempre me teve em baixo conceito, mas agora você exagerou. Estou perplexo que ache que eu a trataria de tal maneira. – Bem, pode me culpar? – Desafiadora, Nadia arqueou as costas para tentar se desvencilhar dos braços dele. – Você nunca fez segredo do fato de que deseja se livrar de mim. – Não seja ridícula. – Esta poderia ser a sua chance. – Nadia, pare! – gritou Zayed segurou-lhe o rosto nas mãos e um forte anseio-o tomou-o de assalto. – Eu jamais deixaria que algo acontecesse a você. Jamais. Fui claro? Por um segundo, Nadia não se moveu, obviamente avaliando se as palavras podiam ser verdadeiras. Enfim, assentiu. – Sim, obrigada. Acho que apenas estou sendo tola. Mas estar de volta aqui, no solo de Harith... Eu não sei... Acho que isso me afetou mais do que pensei. – Posso ver. Mas não precisa ter medo. Nenhum mal vai lhe acontecer. Eu prometo. – Obrigada. – E não precisa ficar me agradecendo. Você é minha esposa, afinal. – Sim. Sou, não sou? – Nadia inclinou a cabeça para trás e o medo em seus olhos deu lugar a uma reação mais perigosa. – Sua esposa. Era deliberada a maneira que ela curvava os lábios provocando-o? Sabia o que aquilo fazia com ele? O que ela fazia com ele? Fosse como fosse, ele tinha de lutar contra aquelas emoções. – E uma vez que você é minha esposa, é o meu dever protegê-la. – Seu dever. Sim, é claro. Ambos se entreolharam. – Eu tenho de ir. – Ele começou a se levantar para se afastar da tentação. – Ir? – Sim. Você precisa dormir. – A voz dele soou como um grunhido distante. – Faltam algumas horas até o amanhecer.
– Mas e quanto a você? Por que não se deita de volta aqui? Ele hesitou, e ela percebeu que sono era a última coisa em sua mente. – Acho que não seria uma boa ideia. Nadia se levantou e ajeitou melhor o seu lado no colchão. – Eu gostaria que você se juntasse a mim novamente. – Nadia... – Por favor. Antes que Zayed tivesse chance de se desviar do apelo da sedução, ela correu a mão pela face dele e passou os dedos eroticamente por seus lábios. – Por favor – repetiu Nadia no escuro entre ambos. – Eu quero você. Como Zayed poderia resistir àquilo? As barreiras de suas defesas não suportavam mais. Pegandolhe a mão delicada, pressionou-a de encontro a sua boca aberta, passando o lábio inferior contra a palma dela. Encontrando-lhe o olhar com o seu, tomou-lhe um dos dedos e sugou-o. Nadia soltou um gemido satisfeito. Realmente o queria. Caso ele precisasse de alguma confirmação, ela se inclinou para a frente passando o braço pelo ombro dele e puxando-o para si, até que ambos caíram no colchão. Zayed estava desesperado para sentir-lhe os lábios nos seus. Aquela boca sensual que o estivera provocando durante semanas com sua curva deliciosa que ele já sabia que se encaixava tão perfeitamente na sua. E que se encaixaria muito bem em outras partes de seu corpo também. Zayed deitou-se sobre ela, tomando-lhe os lábios cheios com os seus, enquanto sua ereção a pressionava em meio ao emaranhado de roupas e cobertores. Invadiu-lhe a maciez da boca com a língua cálida, sentindo que Nadia se rendia ao poder do desejo de ambos. Ela o abraçou pelo pescoço, arqueando o corpo como uma prova de que se sentia tomada por um furor sexual. O corpo dele inteiro latejava, tinha de ser satisfeito, mas aquelas roupas estavam no caminho. Ele se levantou, tirando o jeans e a cueca boxer, despindo a camisa por cima da cabeça, tudo numa questão de segundos. Nadia estava ajoelhada agora, lutando para abrir os botões da camisa, ainda usando a calça de sarja com que viajara. Ela o olhou boquiaberta, os olhos brilhando ao lhe ver o corpo completamente despido e excitado. Sim, ele podia lhe fazer aquilo. Podia fazê-la tremer de desejo. Tinham de se livrar das roupas. Ele se juntou a Nadia e ambos se ocuparam com os botões juntos, puxando a calça dela até que saiu com a calcinha dentro e atirando-a de lado. Conforme o ar frio tocou a pele dela, uma sequência de arrepios percorreu-a. Seus mamilos endureceram quando ele lhe abriu o fecho do sutiã e lhe libertou os seios cheios. Puxa, ela era linda. Deitando-se sobre ela, Zayed tomou-lhe um dos mamilos com os lábios demoradamente, sugando-o, mordiscando-o, até fazê-la gemer deliciada. Arqueando as costas, ela afundou as mãos no cabelo dele, puxando-o mais para perto. Zayed ergueu a cabeça. Podia subir agora, beijar-lhe os lábios. Ou descer... Nadia jogou a cabeça para trás, entregando-se com abandono àquele homem, ao jeito maravilhoso como a fazia sentir, a tudo que podia lhe fazer. Com a língua, ele desceu pelo abdome firme dela até se posicionar entre suas pernas abertas e insinuar-se entre suas dobras úmidas. Ela soltou uma exclamação surpresa quando ele encontrou seu clitóris e virou-lhe a pélvis para si,
desesperada para que ele não parasse aquela carícia ritmada. Percebendo-lhe a necessidade, Zayed acariciou-lhe o ponto latejante sem parar com a língua, aumentando a pressão até que ela soube que não podia mais suportar. De repente, foi tomada por deliciosos espasmos que a levaram a um clímax sublime. Zayed olhou para o rosto de Nadia. Ela nunca lhe parecera mais bonita. As faces estavam afogueadas por causa do orgasmo, o cabelo estava em desalinho, os olhos brilhavam de desejo. Seu anseio por ela ardia como nada que já tivesse sentido antes. Cobrindo-lhe os lábios com os seus, posicionou-se entre as pernas de Nadia, mas sentiu que ela se virou abaixo de si. Então, ela queria ficar por cima. Eles se viraram, Nadia ficando com as pernas abertas em cima dele, o cabelo cascateando-lhe pelas costas, as mãos tocando o peito dele. Estava magnífica. Incapaz de esperar mais um momento, ele ajeitou-a acima de si e penetrou-a com uma poderosa arremetida. Nadia respirou fundo, seu corpo ficou rígido, mas então se moveu, acentuando ainda mais o contato de seus corpos, fazendo-o soltar um som gutural de desejo. No controle agora, ela ergueu os quadris, apoiando-se no abdome dele enquanto Zayed começou a dar arremetidas, ansiando por satisfazer seu membro escorregadio. Com Nadia se movendo sensualmente acima dele, Zayed soube que não podia se conter por muito mais tempo. Quando Nadia se arqueou para trás com um gemido de prazer e, então, desabou sobre o peito dele saciada, Zayed segurou-lhe as nádegas e, com uma arremetida final, explodiu dentro dela. O clímax foi intenso, uma liberação do controle de tudo que havia no mundo.
CAPÍTULO 11
VÁRIAS HORAS se passaram desde que Zayed e Nadia tinham deixado o acampamento de Azeed para viajar ao palácio de Harith. Nadia sabia que deviam estar perto do destino. Fora mais uma jornada de conversa limitada. Ela olhara para as planícies áridas do deserto, repassando na mente o que haviam feito na noite anterior. Não deveria ter tentado Zayed a fazer amor com ela, soubera disso mesmo antes de ele ter saído dos seus braços na primeira luz do amanhecer. Mas ela ansiara por ele mais do que nunca naquela noite solitária, cheia de incertezas. Fora uma força à qual não pudera resistir. Agora, se via revivendo aquela incrível intimidade, minuto a minuto, em todo seu erótico prazer. Estava se lembrando de quando Zayed a fizera ter aquele primeiro orgasmo quando o veículo utilitário passou por uma grande pedra no caminho e ela teve de conter a onda de desejo que a percorreu. Olhou para Zayed com nervosismo para ver se ele notou. Mas não precisava ter se preocupado. Zayed continuava a olhar para frente, perdido em pensamentos, segurando o volante com força. E Nadia não tinha ilusões de que esses pensamentos a incluíam. Pois enquanto tudo relacionado às lembranças da noite anterior ainda a envolvia, desde os primeiros instantes até o contato dos cobertores em seus corpos entrelaçados ao adormecerem, para Zayed era como se aquilo tivesse sido esquecido. Com a luz do dia, ele voltou a ser frio e formal e os vestígios da paixão e da ternura se dissiparam. O que serviu a Nadia para lembrar-se de sua tolice. O que Zayed declarara após a noite de núpcias de ambos? É apenas sexo. As palavras a haviam magoado e agora lhe pesavam com sua punitiva verdade. Porque, para ela, era muito mais do que apenas sexo. Agora, dava-se conta de que não fora apenas a virgindade que entregara àquele homem. Entregara seu coração. O palácio de Harith elevava-se diante de ambos, frio e intimidante, apesar do calor do meio-dia. Zayed lançou um olhar a Nadia enquanto entravam pela passagem em arco e os portões de segurança se fechavam atrás do veículo. Parecia pálida e segurava-se com força ao assento.
– Você está bem? – Sim, é só o fato de estar aqui... Zayed quis confortá-la, mas sabia que ela não deixaria. Tinham parado num café nas imediações da cidade para que ele pudesse verificar a situação com a equipe de segurança e ambos tivessem a chance de trocar as roupas poeirentas. Agora, ele usava um terno com gravata e Nadia vestia uma túnica e véu tradicionais. Parecia bonita, delicada, frágil. – Você sabe que não há nada a temer – comentou ele, prosseguindo com o carro, percebendo que ela temia o irmão tanto quanto ao pai. – Você precisa tomar cuidado com Imran. Ele pode ser mau, ardiloso. – Não me importo com o jeito que ele é. – O fato era que Zayed já odiava o sujeito pela maneira como tratara Nadia. Pela maneira como a fazia se sentir. – Mas se esta é a minha chance de fazê-lo enxergar o bom senso, não vou perdê-la. – Sim, é claro. Mas você vai precisar tomar cuidado. Imran não é um homem honrado. Não é como seu irmão. Honrado. Aquela era palavra para descrever Azeed, Zayed dava-se conta agora. A conversa de ambos na noite anterior abrira-lhe os olhos para o homem mudado que seu irmão se tornara, o irmão que nunca conhecera realmente. E era grato pelo elo que tinham agora. Enquanto dirigia entre as dunas altas, avançando cada vez mais pelo território do inimigo, ele havia esperado que a honra fosse a qualidade que teriam em comum. – Nadia, você confia em mim? Ele queria uma resposta verdadeira. Havia perigos naquele plano. Sabia disso. Mas também sabia que protegeria Nadia com sua vida. – Sim, Zayed, eu confio em você. – Obrigado. Era tudo que ele precisava saber. O palácio parecia bastante quieto. Um criado os conduzira até o vestíbulo e, diante do firme anúncio de Zayed de que estavam ali para ver o príncipe Imran, indicara que os seguisse. Guiou-os por um labirinto de corredores até o coração do palácio e deixou-os diante de uma porta antiga trabalhada. – Pronta? – perguntou Zayed preparado para bater à porta. Nadia assentiu, mantendo-se imóvel. Ele bateu à porta. Imran Amani estava sentado a uma mesa de madeira numa sala escassamente decorada de teto abobadado. Assim que os viu, afastou a cadeira para trás e se levantou. – O que significa isso? – Os traços morenos e aquilinos alternaram-se entre os dois e ele ficou chocado em ver a irmã. – O que ela está fazendo aqui? – Príncipe Imran – pronunciou Zayed devagar, deliberadamente. – Obrigado por concordar em me receber. – Onde você a encontrou? – O irmão apontou para Nadia com o dedo trêmulo. – Que espécie de truque é esse? – Não é truque algum, Alteza. Não precisa ficar alarmado.
– Não estou alarmado. É você que deveria estar alarmado. Você e essa criatura que trouxe consigo. Zayed observou o outro homem. Com cerca da mesma idade que ele, era vários centímetros mais baixo e com o tipo de corpo que precisava de exercícios físicos. Aquele era realmente o homem que Nadia temia? Uma coisa era certa, não falaria com ela daquele jeito. – Antes de prosseguirmos, eu lhe peço que demonstre respeito à sua irmã. – Respeito? Você traz essa mulher aqui e pede respeito? – Imran Amani tentou adquirir uma expressão desdenhosa, mas, sob o olhar direto de Zayed, seus traços congelaram. – De qualquer modo, ela não é minha irmã. Ela trouxe vergonha para nossa família e desgraça para nosso reino. – Imran, por favor, ouça o que temos a dizer... – Nadia deu um passo na direção do irmão, mas Zayed estendeu o braço para lhe bloquear o caminho. Não a queria perto do homem vil. – Isso mesmo, proteja a sua presa. Você pode tê-la trazido até aqui para atirá-la aos meus pés como um rato, mas, com certeza, não vai ganhar recompensa. A sala ficou subitamente silenciosa. Zayed não olhou para Nadia, pois sabia que, se visse mágoa em seus olhos, não seria responsável por seus atos. – Príncipe Imran. Tenho certeza de que sua irmã deve estar cansada após a longa jornada. Talvez você possa fazer a gentileza de lhe oferecer uma cadeira. Sem esperar uma resposta, Zayed pegou uma cadeira para Nadia e outra para si mesmo. Com relutância, Imran Amani reconheceu que todos deviam se sentar. – Agora – falou Zayed com calma letal. – Vamos continuar. Pedi ao meu irmão que arranjasse este encontro porque... – Sim, o seu irmão. Ele me implorou para que eu me encontrasse com você e é assim que você retribui a minha generosidade. – Pedi a Azeed que arranjasse este encontro porque há coisas que precisamos conversar. – Não tenho nada a dizer a você. Nem a ela. – Então, talvez queira ouvir. – Zayed arriscou um olhar a Nadia agora, sentada em silêncio a seu lado. Torcia as mãos no colo, enrugando o tecido da túnica. Mas mantinha a cabeça erguida. – A primeira coisa que Nadia e eu temos a lhe dizer é que estamos casados. Outro silêncio tenso preencheu a sala. Imran Amani estava boquiaberto. – Casados? Um com o outro? – Exatamente. – É verdade, Imran – confirmou Nadia. – Zayed Al Afzal é o meu marido. Zayed sentiu o coração disparar. Era a primeira vez que a ouvia se referir a ele como seu marido. – Não! – Imran estava de pé, movendo-se detrás da mesa e voltando a sentar-se. Um prazer maléfico passou por seu rosto. – Mal posso esperar para contar as boas novas ao meu pai. Sabe que ele vai mandar matar vocês dois? – Ele não fará uma coisa dessas. – Zayed levantou-se devagar. – Então, você não conhece o nosso pai como nós conhecemos, não é mesmo, Nadia? – Imran se dirigiu à irmã pela primeira vez, revertendo ao estilo de intimidação da infância. – Você cometeu um erro voltando a Harith com essa notícia. Ao dividir a cama com o governante do nosso inimigo jurado, Nadia provocou a guerra.
– Acho que vai descobrir que o inverso é verdadeiro. Com sua atitude, Nadia salvou seu país. Porque essa é a única razão que nos trouxe aqui, príncipe Imran. Promover a paz entre nossas duas nações. – Paz! Bah! Você tem uma maneira estranha de lidar com isso. Você se ausentou do seu país por tempo demais, sheik Zayed. Sua mente está focalizada em maneiras ocidentais. Talvez deva buscar os conselhos do seu irmão Azeed. Ele tem coragem e determinação, coisas sobre as quais você não sabe nada. Ele não teme a guerra como você. – Você tem razão. Eu temo a guerra. Eu odiaria ver o sangue dos meus conterrâneos sendo derramado por causa de um conflito. Mas, principalmente, eu temo a guerra pelo seu reino. – O reino de Harith é forte e nobre. Nunca nos encolheremos de medo. – O reino de Harith está no ponto do colapso econômico. Se vocês entrassem em guerra com Gazbiyaa, uma guerra que jamais poderiam vencer, isso não significaria apenas perdas de vidas, mas ruína financeira. – Que mentiras são essas que está dizendo? – O príncipe Imran se levantara e andava de um lado ao outro atrás da mesa com gotas de transpiração na fronte. – Ah, agora eu vejo. – Dirigiu os olhos cheios de ódio para a irmã. – A víbora no ninho está bem ao seu lado. Zayed flexionou os músculos. Aquele homem odioso estava pedindo uma lição. Sentiu a mão de Nadia em seu braço contendo-o. – Minha especialidade é finanças. Conheço um país com sérias dificuldades financeiras quando vejo um. Imran Amani passou a mão trêmula pela fronte. – Podemos não ter riquezas, mas temos coragem e valor. Algo que você desconhece. – Há mais coragem do que em se bater no peito numa vã tentativa de mostrar seu poder. O autêntico teste de coragem é enfrentar a verdade da situação e aprender com ela. – Bah! Você vem se arrastando até aqui, se escondendo atrás da sua esposa, sem dúvida para fazer o que ela quer, e ousa vir me falar de coragem. Que homem de verdade faria uma coisa dessas? – Minha esposa é de Harith. É por isso que estamos aqui. Mas mais do que isso, trato Nadia como igual e respeito sua opinião. Sugiro que faça o mesmo. Aliás, ela tem mais coragem num dedo do que você tem no seu corpo patético, flácido, inteiro. – Sua esposa não passa de uma prostituta comum. Ali estava! Numa fração de segundo, Zayed avançou para Imran Amani e ergueu-o no ar pelo pescoço. – Zayed! Não! Zayed olhou para os olhos arregalados da vítima à sua frente, ansioso por lhe dar uma lição. Mas Nadia estava a seu lado agora, puxando-lhe a manga do paletó. – Não ouse nunca mais falar da minha esposa desse jeito. – Com uma voz feroz, Zayed teve de se contentar em apenas sacudir Imran. – Fui bem claro? O príncipe meneou a cabeça com ar aterrorizado. – Ótimo. – Contornando a mesa, ele soltou o pescoço do cunhado e o depositou sem cerimônia na cadeira. – Desde que possamos entender um ao outro. Agora é hora de você ouvir direito.
Nadia soltou um suspiro de alívio. Ao menos estavam todos sentados de novo. Conhecia Zayed bem o bastante para saber que estava contendo a raiva a custo. Conhecia o irmão bem o bastante para saber que estava derrotado. Embora Zayed não fosse realmente violento e soubera usar seu controle quando fora preciso, ela sentira uma onda de entusiasmo quando ele saíra em sua defesa. Protegendo-a do irmão que fizera dos anos de sua adolescência um tormento, a quem tivera de respeitar, honrar, obedecer. De repente, todos os anos de opressão se dissiparam. Agora, dava-se conta de que não tinha de gostar dele, muito menos amá-lo. Ele não significava nada para ela e não tinha de se sentir culpada por isso. Zayed falava com o irmão dela numa voz baixa e autoritária, dizendo a Imran de maneira bem calma o que tinha de fazer. – Assim, quando seu pai voltar da viagem de negócios com as mãos abanando... – Ele fez uma pausa enquanto Imran escrevia furiosamente num bloco de anotações. – Sim, entendo tudo sobre isso também. Acredite, não há ninguém no mundo que vai querer investir dinheiro neste lugar. Quando ele retornar, sugiro que você lhe apresente as minhas propostas generosas. E é melhor torná-las convincentes. Porque um dia você será o sheik de Harith. Quer ser governante de um reino que cresça com riqueza e prosperidade? Ou que seja dizimado pela guerra? A maneira como você apresentar esses fatos ao seu pai vai selar o destino. Imran lançou um olhar à irmã. Arqueando as sobrancelhas, Nadia o olhou de volta. Foi uma troca de olhares silenciosa, mas disse tudo. Pela primeira vez, Nadia era a vencedora.
CAPÍTULO 12
SENTADA À penteadeira, Nadia fechou o bracelete de ouro em torno do pulso e, erguendo o olhar, viu seu reflexo no espelho. Eram os mesmos olhos de sua mãe olhando de volta para ela. Tinham o mesmo formato, a mesma cor violácea e, agora, continham a mesma ansiedade. Anos vivendo com o pai dela tinham deixado a mãe com aquela expressão. Zayed fizera o mesmo com Nadia em questão de meses. Havia três semanas que tinham retornado de Harith, quando ela se sentira tão tomada por esperança e otimismo. O alívio com a retirada da ameaça de guerra era imenso. Mais do que isso, contudo, ela conseguira se convencer de algum modo de que o relacionamento de ambos poderia mudar agora, de que o maldito contrato de casamento não mais se aplicava. De que poderia ser o começo de um verdadeiro relacionamento entre ambos. Que tola havia sido. Porque a cada semana que se passara, Zayed se tornara mais frio em relação a ela, mais distante, mais retraído, fazendo com que seu otimismo esmorecesse. Pensou em como a mãe ficara orgulhosa dela quando a vira brevemente em Harith. E em como ficara orgulhosa em lhe apresentar Zayed e ouvi-lo explicar os planos que havia encaminhado para garantir a paz entre os dois reinos. Agora, sentia-se culpada por ter enganado a mãe, no tocante ao relacionamento ao menos. Podia imaginar a mágoa nos olhos dela quando descobrisse que o casamento não passava de uma farsa. O pai de Zayed também havia sido informado sobre a situação, tanto sobre as negociações com o príncipe Imran quanto sobre o fato de que Nadia era, na verdade, filha do sheik de Harith. Com Nadia apreensiva a seu lado, Zayed dera a informação educada, mas firmemente e, com certeza, sem pedidos de desculpas. O sogro não ficara feliz, mas ao menos aceitara a notícia. Mais do que isso, aceitava que era o filho que estava no absoluto controle de tudo. E foi quando Nadia reconheceu a mudança em Zayed. Ele era um governante totalmente poderoso agora. Qualquer ressentimento que tivera, qualquer anseio pela vida que deixara no ocidente tinham se dissipado. Era agora o verdadeiro sheik de Gazbiyaa. Um papel para o qual nascera e era perfeito, um papel que finalmente aceitara.
Mas isso acarretava uma tristeza própria. Porque, não importando quanto o mundo à volta de ambos melhorasse, o relacionamento deles não poderia ter estado pior. O que tornava o que Nadia tinha a dizer a Zayed naquela noite bastante difícil. OUVINDO NADIA entrar na sala de jantar, Zayed parou de andar para lá e para cá e virou-se para olhá-la. A familiar onda de desejo tomou-o de assalto. Ela usava um vestido de seda verde sem mangas, que apanhava os efeitos da luz, e tinha as pernas bem-torneadas expostas e o cabelo cascateando pelos ombros. Parecia solene e linda. O fato de vê-la simplesmente confirmava todas as convicções de Zayed. Não podiam continuar daquele jeito. Ele não podia. Porque estar perto de Nadia o enlouquecia por completo. Tudo relacionado a ela testava sua resistência, tirava-lhe o autocontrole, atormentava-o. Sua aparência, a maneira como se movia, seu perfume. Pensava nela e em seus gestos até quando não estavam juntos. E aqueles olhos... Aqueles olhos o fitavam agora, mantendo-o no lugar, exercendo-lhe um poder letal. Ele tinha que pôr um fim naquela loucura. E o faria. Naquela noite. – Imran esteve ao telefone mais uma vez. – Ele citou o nome do irmão dela para iniciar a conversa. – Oh, lamento. – Enquanto se sentavam, Nadia abriu o guardanapo em seu colo. – O que ele queria desta vez? – Estava com uma ideia de negócios absurda em torno da criação de cavalos árabes. Pode acreditar. Tive de ser bastante claro outra vez de que o dinheiro que Gazbiyaa está investindo em Harith é para ser usado em infraestrutura, saúde, educação. Não é para ele esbanjá-lo nas corridas. – E você pode controlar isso? – Com certeza, sim. Aquele era ao menos um aspecto da vida que ele podia controlar. Sua conversa com o príncipe Imran resolvera a situação e as hostilidades entre os dois reinos haviam cessado. Imran Amani contara a notícia a seu pai do casamento de Nadia com o sheik Zayed, eventualmente fazendo-o ver que, longe de ser uma causa de guerra, era um motivo de otimismo, se não de celebração. Porque Harith seria salvo da ruína financeira. Para as delicadas negociações, Imran Amani precisara contatar Zayed constantemente na busca de conselhos, algo que ele tivera de tolerar. Uma coisa era certa: as negociações iam bem, mas os dois jamais seriam grandes amigos. Imran não era um dos melhores sujeitos. – Meus advogados repassaram todo o contrato com Harith. Não há meio de Amani colocar as mãos nesse dinheiro para ganho pessoal. – Zayed... – Eu sei. É seu irmão e eu não deveria falar dele desse jeito. – Não é isso. Há algo que preciso conversar com você. Zayed ergueu os olhos da refeição em que estava se concentrando, embora sem apetite. A voz dela soou um tanto embargada, o que a fez olhá-la. Parecia cansada, notou, pálida e tinha sombras escuras sob os olhos.
Aquilo não era fácil para ela também, era? Estava tão ocupado pensando em si mesmo, em como se sentia que acabara de lhe ocorrer somente agora como Nadia estivera atipicamente quieta ao longo dos dias anteriores. Ou talvez tivesse se recusado a notar. Talvez aquela quietude fosse o meio dela de se livrar dele. Afinal, ela alcançara seu objetivo, tudo que se importava: encontrar paz e segurança para Harith. Por que desejaria continuar ali? Havia a questão do casamento de ambos, naturalmente, mas isso seria resolvido a seu devido tempo. Nesse ínterim, ele podia lhe oferecer uma saída. Uma que talvez salvasse a sanidade dele. – Sei o que você vai dizer. E eu concordo. Não há razão para você ter de ficar no palácio agora. – Como? – Até podermos prosseguir com o divórcio, há várias propriedades que você pode usar. Ou talvez prefira passar algum tempo em Harith. – Harith? Por que ela estava fazendo aquilo? Fingindo surpresa, olhando-o como se fosse o vilão? A situação já não era difícil o bastante? – Sim. Você poderia ajudar na parte administrativa. Eu não sei, o que achar melhor – mencionou ele com impaciência. – Quer que eu vá embora para viver em Harith? – Estou dizendo que você pagou sua punição. Não há mais necessidade de ficar aqui no palácio comigo. Os portões da prisão estão abertos. Você é livre para ir aonde quiser. – Entendo – falou ela num fio de voz. – E se eu não quiser ir? O que ela estava tentando fazer com ele? Era óbvia a maneira como não gostava dele. Era evidente no jeito como franzia a testa, como apertava os lábios contendo algumas verdades que queria lhe despejar. – Acho que não estou sendo claro. A partir de agora, Nadia, nosso contrato de casamento está encerrado. Quero você fora do palácio e da minha vida. O rubor subiu pelo pescoço e as faces de Nadia, as mãos ficaram trêmulas. – Está certo. – Levantou-se, endireitando as costas. – Mas, antes que me atire nas ruas, há uma coisa que devo lhe dizer. Zayed franziu o cenho, algo na expressão dela roubando-lhe o fôlego. – Estou grávida. O tempo parou. Nadia olhou para o homem à sua frente. Cada medo enraizado, cada temor que a estivera consumindo agora se materializou nos olhos de Zayed. Ele estava horrorizado. Abismado. Tão arrasado que nem sequer conseguia falar. Todas as coisas que ela soubera que ele ficaria quando o teste de gravidez dera positivo. – Grávida? – Sim. – Tem certeza? – Absoluta. – Ela já soubera antes mesmo de ter feito o teste, percebendo as mudanças em seu corpo quando seu período atrasara. – Droga! – Zayed saltou da cadeira com um ar de amargo desespero. – Aquela noite no deserto?
Tensa, Nadia meneou a cabeça. – Como pude ser tão idiota? Ela olhou para a figura atormentada à sua frente e seu corpo ficou trêmulo. Viu-se diante da terrível verdade. Ela não significava nada para ele. Apesar de tudo, até agora ainda tivera esperança. Uma pequena fração de otimismo a levara à crença de que talvez aquela notícia não tivesse de ser desastrosa. Talvez Zayed abraçasse a ideia, talvez até a abraçasse e lhe afirmasse que tudo ficaria bem. Mas “desastrosa” era pouco para descrever a reação dele. Quanto a si mesma, o sofrimento era imenso, enquanto se dava conta de como se sentia por ele. Havia uma dor lancinante no seu coração da qual sabia que não teria alívio. Amava Zayed. Amava-o de corpo e alma. Como respirar, era um amor tão fundamental, tão básico que, a princípio, ela mal o notara; fazia apenas parte de quem era. Mas estivera presente desde que entrara na sala usando aquele traje de dançarina e ambos tinham se entreolhado. Era, no entanto, um amor que se recusara a reconhecer porque soubera que jamais seria recíproco. Pôde sentir a força daqueles olhos nela agora, ainda estudando-a, mas, daquela vez, estavam frios e duros, procurando uma saída para aquela confusão. Porque era obviamente assim que ele via as coisas – o casamento e o bebê de ambos. Mais um grande problema com que tinha de lidar. Bem, ela se recusava a continuar sendo um problema dele. Tinha de buscar determinação em seu íntimo para enfrentar aquilo. Seu espírito de luta era sua única arma, mas estava bem-afiada. Anos sofrendo injustiças e preconceitos nas mãos do pai e do irmão a tinham preparado. Recusara-se a se curvar à vontade deles e vencera. Agora, tinha outra batalha para travar, a batalha mais dura de sua vida. Não haveria vitoriosos, com certeza. Mas tinha de proteger a si mesma daquela dor terrível. Proteger a si mesma e o bebê, o bebê de ambos que já amava. O bebê era seu futuro. Seria sua força. – Ambos somos igualmente responsáveis pelo que aconteceu. – Nadia sentou-se de volta, lutando para controlar o tremor em seu corpo, para impedi-lo de ver a agonia que sentia. – Mas, por favor, não se sinta como se tivesse de ser responsável por algo. Se a minha punição está paga, a sua também está. Farei como você quiser. Voltarei a Harith e terei o bebê lá. Não precisa ter mais nada a ver comigo. Com nenhum de nós. – Não seja absurda. – Zayed cerrou os punhos ao longo do corpo, com uma raiva impotente dominando-o. – Eu não sabia que estava grávida quando sugeri que você voltasse a Harith. Obviamente isso muda tudo. Agora, estamos amarrados juntos para sempre. Amarrados juntos para sempre. Como se estivessem presos a uma bola de ferro com correntes. Uma sentença de prisão perpétua. – Não, você está enganado. Assumo total responsabilidade pelo bebê. Você ainda pode ter a sua liberdade. Ainda pode ter o seu divórcio. – E você acha que conseguiria fazer isso? – Sim, sim, acho. O bebê e eu ficaremos bem. Podemos nos arranjar perfeitamente bem sem você. – Ela tinha de se ater à sua falsa coragem. Zayed sentou-se diante dela, inclinando-se para a frente, com os ângulos do seu rosto duros. – O que eu quis dizer é: você acha que eu a deixaria fazer isso?
Era evidente. Como podia ter achado que ele estaria vendo a situação através de seus olhos? Respirando fundo, esforçou-se para não gritar. Era uma batalhadora. Não desabaria diante dele. – Não cabe a você me dizer o que posso fazer ou aonde posso ir. – Vai descobrir que cabe, sim – declarou Zayed num tom glacial. – Você é minha esposa, a sheika de Gazbiyaa. E está esperando o meu filho. Fará o que eu ordenar. Ambos se entreolharam em absoluto silêncio. Nadia deu-se conta do círculo vicioso. Tendo escapado de uma família tirana acabara parando em outra. Uma família. Era a primeira vez que pensava neles como uma família: ela, Zayed e o bebê. Agora aquela palavra, aquela imagem partiram seu o coração. Ela afastou o olhar do dele, da tristeza de tudo. Quis gemer ou bater-lhe com os punhos para mostrar o que ele havia lhe feito. Mas não faria nenhuma daquelas coisas. Porque ainda tinha seu orgulho. Atendo-se a ele, levantou-se da cadeira. – Não estou preparada para falar mais sobre isto. – Jogando os ombros para trás, manteve uma expressão altiva antes de girar nos calcanhares. – Oh, não faça isso. – Zayed estava atrás dela num momento, segurando-lhe o braço. – Não pense que pode fugir de mim. Nadia virou-se para o peito sólido dele, inalando-lhe a fragrância máscula. – Nunca fugi de nada na minha vida. – Ao virar-se para olhá-lo, sentiu as pernas trêmulas. Tinha de sair dali antes que caísse literalmente aos pés dele. – Mas agora preciso ficar sozinha. E, com isso, virou-se e deixou a sala.
CAPÍTULO 13
ZAYED OBSERVOU Nadia se afastar e, de tão desesperada para sair da presença dele, tropeçar e se apoiar no batente da porta quando passou. Grávida. Como, afinal, aquilo podia ter acontecido? Como podia ter sido tão descuidado? Ele que se orgulhava de seu autocontrole o tempo todo, da mente calculista. Junto aos amigos, sempre fora o prático Zayed muitas vezes ao longo dos anos. Mas a confusão em que se metera agora era digna do mais tolo dos homens, e a raiva diante de sua estupidez era imensa. Fervia dentro dele feito lava. O que, afinal, acontecera com a sua vida? Nadia. Era o que acontecera. Desde o segundo em que ela aparecera à sua frente com aquele traje sensual sua vida descarrilara. E todos os seus esforços para parar o trem desgovernado tinham sido em vão. Grávida. A notícia chocante atingira-o em cheio. Iria ser pai. Era algo que jurara que nunca deixaria acontecer, tendo decidido muito tempo antes que não queria a responsabilidade de trazer uma criança ao mundo. Nunca quisera se casar também, aliás. O casamento infeliz dos pais tinha sido mais do que o bastante para dissuadi-lo e o relacionamento conturbado que acabara acarretando com seu irmão só confirmara que casamento e filhos não eram para ele. E agora estava ali, de volta a Gazbiyaa, casado e prestes a ser pai. As três coisas que até alguns meses antes ele teria jurado que não aconteceriam. Como se apaixonar. As palavras povoaram sua mente, persistentes. Era o que havia lhe acontecido? Era por aquela razão que perdera o controle de sua vida, de sua cabeça, de cada parte flamejante de seu corpo? Ele estava apaixonado por Nadia. A surpreendente constatação apanhou-o em cheio. Entre todas as mulheres pelas quais poderia ter se apaixonado, entre todas as mulheres bonitas, sem complicações que poderia ter escolhido, a única que havia conquistado seu coração teimoso, intocado, fora Nadia. Ninguém nunca o desafiara igual a ela; ninguém nunca o fizera sentir-se igual a ela. E ali estava a ironia. Pois Nadia era a única mulher que ele podia garantir que não corresponderia ao seu amor.
Olhou para a porta aberta, lembrando-se da expressão no rosto dela quando saíra. Não deveria tê-la deixado ir, não daquele jeito. Quando ela lhe informara que estava grávida, a reação dele fora cruel, insensível. Não parara para pensar no modo que ela estaria se sentindo. Ficara chocado, mas aquilo não era desculpa para seu comportamento desprezível. Deveria ter lidado melhor com a situação. E não ter lhe falado que ela faria o que ele mandasse. Era o mesmo que garantir que ela faria o oposto. Um frio inquietante percorreu suas veias de repente. E se Nadia estivesse planejando ir embora? Naquela noite? Tinha de encontrá-la, agora mesmo. Tinha de tentar consertar as coisas, impedi-la de cometer uma estupidez. Podia não ser capaz de fazer com que ela o amasse, mas podia parar de se comportar como um cretino. Com longas passadas ecoando pelos corredores, rumou para o pátio do palácio, o refúgio favorito de Nadia. Uma onda de alívio dominou-o quando viu que acertara: ela estava ali. Estava de costas para ele, sentada num dos bancos debaixo de um arco, encolhida e abraçando os joelhos. O alívio deu lugar à dor. Ela parecia tão pequena. Tão sozinha. Ele quis tomá-la em seus braços e tentar fazer com que tudo ficasse certo. Se ao menos pudesse. Zayed se aproximou silenciosamente sem que Nadia se desse conta e tocou-lhe o ombro. Ela sobressaltou-se e dirigiu-lhe um olhar hostil antes de desviar os olhos. Mas Zayed percebeu que ela estivera chorando. – Nadia? – Vá embora. – Nadia. – Ele contornou o banco e sentou-se, tentando ver-lhe o rosto. Nadia tentou virar-se, mas ele segurou-lhe os ombros com firmeza. – Precisamos conversar. – Não tenho nada a lhe dizer. – As palavras foram ditas entre soluços. – Vá embora e me deixe em paz. – Não. Não vou a lugar algum até que você ouça o que eu tenho a dizer. Zayed observou enquanto uma grossa lágrima rolou pelo rosto dela. Sentiu um aperto no peito. Estendendo a mão, parou seu progresso com um dedo. A lágrima de Nadia. Nunca a vira chorando antes, não importando quanto a situação tivesse sido perigosa ou assustadora. Mas agora, enquanto lhe segurava o maxilar e ela encontrava seu olhar, as lágrimas começaram a fluir livre e silenciosamente. Segurando-lhe o rosto, Zayed sentiu-lhe as lágrimas se acumulando nas palmas de suas mãos, como se nunca mais fossem parar. Sentiu-se tocado por dentro. – Nadia. – O que fizera a ela? Abraçou-a, estreitando-a junto a seu peito. Os soluços de Nadia ecoaram entre ambos, cada um torturando-o mais que o outro enquanto a dimensão do sofrimento dela ficava mais clara. – Lamento muito – sussurrou-lhe de encontro ao cabelo, inalando sua fragrância. Zayed sentiu que ela se moveu no interior de seu abraço, lutando para se libertar, mas não teve intenção de soltá-la. Finalmente, ela ficou quieta e, quando ergueu o rosto, ainda estava molhado pelas lágrimas. Mas continuava desafiador. E bonito. – Não quero seus pedidos de desculpas, Zayed. – O espírito de luta estava de volta na maneira que ela endireitou a espinha. – Não quero nada de você. Mas eu quero este bebê, e eu vou criá-lo
sozinha se for preciso. Na verdade, preferiria criá-lo sozinha a sujeitá-lo a uma vida com um pai que não o quer, que se ressente dele, que não pode encontrar em seu coração... Baixando a cabeça, Zayed cobriu-lhe a boca com a sua, detendo-lhe as palavras com seus lábios, absorvendo-lhe a raiva e a angústia, afastando-as da única maneira que sabia. Com um beijo terno. O corpo de Nadia, tenso e rígido nos braços dele, relaxou devagar e recostou-se no dele, e foi todo o encorajamento que Zayed precisou para acentuar o beijo, para senti-la mais intensamente. Com um leve gemido, Nadia começou a corresponder, a entregar-se a ele, à poderosa ligação entre ambos. Ao fogo e à paixão que nunca se dissipavam não importando quanto brigassem ou tentassem negá-los. A paixão que criara um bebê, uma nova vida, que começava a crescer dentro de Nadia agora. De repente, Zayed deu-se conta de como aquilo era incrível. Mas o pensamento foi curto, interrompido pelo movimento súbito de Nadia, que se esforçou para se desvencilhar. – Solte-me! – Arfando e com os cachos em desalinho, empurrou-o pelo peito. Segurando-a com força junto a si, Zayed estudou-lhe o rosto afogueado e marcado pelas lágrimas. Observou-lhe os lábios, avermelhados pela intensidade de seu beijo, e os cílios ainda úmidos emoldurando-lhe os belos olhos. – Não vou soltá-la enquanto você não prometer que vai me ouvir. – Bem, vamos ficar aqui um longo tempo, então. – Desafiadora, Nadia lutou nos braços dele com esforço renovado. – Porque não quero ouvir nada do que você tem a dizer. – Ora, é uma pena porque vai ouvir de qualquer jeito. – Está certo. Mas eu lhe aviso. Não vai fazer a menor diferença. Já sei exatamente como se sente ao meu respeito e agora em relação ao bebê também, portanto nem tente... – Eu amo você, Nadia. O silêncio absoluto foi preenchido pelo estrondo de um trovão acima, como se as palavras dele tivessem acordado os deuses nos céus. – Não. – Libertando-se, Nadia levantou-se, dando vários passos além. Zayed se pôs de pé para encará-la, alto, rígido com tensão. A chuva caía forte agora, uma torrente vertical de água, espirrando no piso de mosaicos do pátio. Sob o arco, Nadia e Zayed se entreolhavam. – Não. – Nadia repetiu a palavra, sacudindo a cabeça. Pronunciou algo mais, mas o barulho da chuva encobriu sua voz. Zayed aproximou-se mais, lutando contra o temor em seu coração. Sabia que aquilo seria extremamente difícil, mas já se comprometera agora. Abrira seu coração. E apesar da dor, da certeza de que sua declaração não lhe daria nada a não ser sofrimento, era um alívio tirá-la do seu peito. Ter dito as palavras em voz alta. – Você está enganado. – Ela gritava agora acima da chuva torrencial, desesperada para fazê-lo ouvir, entender. – Você não me ama. Vencendo a pequena distância entre ambos, Zayed segurou-lhe o rosto entre as mãos. – Eu amo você, Nadia – disse as palavras com clareza para que não houvesse engano. Afastandolhe, então, o cabelo para trás, levou os lábios até a orelha dela. – Eu amo você. – Dessa vez sussurrou-lhe até a alma.
Nadia ficou imóvel, atendo-se àquele instante perfeito no tempo. Porque não podia durar. Não era possível. A dura realidade interferiria a qualquer momento. Ainda segurando-lhe o rosto, Zayed lhe fitava os olhos, à espera de que respondesse. – Nadia? – vociferou o nome acima do ruído da chuva, com angústia agora contraindo-lhe o rosto, anuviando-lhe os olhos. Ela soube que precisava dizer algo, qualquer coisa, para afastar aquela dor. Mas, de algum modo, as palavras não saíam. Não conseguia fazê-las passar por sua garganta. Nem sequer sabia quais eram. Sentia-se aturdida, entorpecida, fraca. – Está tudo bem. – Baixando as mãos, ele tocou-lhe os lábios com um dedo e dirigiu-lhe um último olhar intenso. – O seu silêncio falou tudo. Virando-se, ele saiu de debaixo do arco para a torrente de chuva, afastando-se sob a cortina de água. Ficou encharcado numa questão de segundos, com a camisa grudada às costas e o cabelo escorrendo. – Zayed, espere! – O grito aflito dela o deteve e ele se virou para olhá-la, com a água escorrendo por seus olhos e queixo até os músculos de seus braços e peito. – Espere por mim. – Não. – Ele começou a voltar para detê-la. – Fique onde está. Não deve sair para esta... Mas era tarde demais, ela já estava sob a chuva torrencial. O contato da chuva a fez soltar uma exclamação surpresa, enquanto batia com força nos seus ombros e cabeça, quase derrubando-a. Zayed estava diante dela agora, envolvendo-a com seus braços fortes, mantendo-a firme no lugar. – Que diabo você pensa que está fazendo? – Estava tentando protegê-la com seu corpo, em vão, e começou a puxá-la na direção do palácio. – Espere. – Pressionando-se de encontro a ele, Nadia conseguiu deter-lhe o progresso. – Quero que diga aquilo novamente. – O quê? – O que você confessou antes. Diga outra vez. Por favor. Eles se entreolharam, com a chuva escorrendo pelos cabelos e rostos de ambos, as roupas grudando à pele. Zayed hesitou, lutando com seu orgulho. Então, dando um passo atrás, abriu os braços, olhou para o céu e, enchendo os pulmões de ar, declarou para a tempestade: – Eu amo você, Nadia Al Afzal. Nadia abraçou-o pela cintura, repousando a face no peito encharcado de Zayed. – Isso é bom. – Erguendo a cabeça, procurou os olhos dele em meio à chuva torrencial. – Porque eu amo você também. De repente, ele tomou-lhe os lábios com um beijo sôfrego. Sem deixar de beijá-la, ergueu-a nos braços e correu com ela na direção do palácio. Fazendo uma pausa apenas para passar pela porta, seus lábios tornaram a se encontrar. Era um beijo que nenhum dos dois queria terminar. – VOCÊ ESTÁ acordada? – Não.
Zayed puxou o corpo despido de Nadia para mais perto de si, passando a perna por cima da coxa dela, aninhando sua virilha junto a dela. – Mas não deveria estar. – Estendendo o braço, ajeitou as cobertas desarrumadas por cima de ambos, e Nadia se aninhou em seus braços. Várias horas tinham se passado desde que haviam corrido da chuva. As roupas molhadas ainda estavam no chão do banheiro onde haviam despido um ao outro antes de entrarem juntos no calor do chuveiro. Tinham sido as melhores horas da vida de Nadia. Sem dúvida. Sem comparação. E conversando com o homem a seu lado, descobriu que ele sentia o mesmo. Ainda que agora ele estivesse implorando para dormir. Ela correu as mãos pelas nádegas dele sentindo que se retesavam sob seu toque. – Nadia! Então, a verdadeira felicidade era daquele jeito. Sentia-se tomada por ela, empolgada, em especial por saber que era para sempre. Não apenas a felicidade das horas anteriores, composta de deliciosa intimidade sexual, mas o fato de saber que aquilo era o futuro. Nadia e Zayed. E o bebê. Felicidade completa. – Ainda não consigo acreditar que você escondeu os seus sentimentos tão bem. – Ela passou os braços em torno da cintura de Zayed, sussurrando-lhe junto ao peito. – Pensei que você me odiasse. – Jamais. Se bem que odiá-la teria sido fácil. Foi amar você que achei tão difícil. Perder meu coração para a mulher mais exasperante que já conheci. – Obrigada. – Não há de quê. Mas você não facilitou para que eu aceitasse a verdade. Sempre achei que você me odiasse também. – Zayed a abraçou com força. – Acho que fomos igualmente maus um com o outro. Agora, que tal dormirmos um pouco? – Num minuto. Quando você finalmente se deu conta de como se sentia? – Hum... Quando você me contou sobre o bebê é que me fiz encarar a realidade. Eu soube, então, que teria de confessar meus verdadeiros sentimentos a você, não importando quais pudessem ser as consequências para o meu orgulho. Ou para o meu coração. – Oh, Zayed. – Nadia virou-se, beijando-lhe o peito na altura do coração. – Eu não fazia ideia. – Eu sei. Mas a verdade encontrou um meio de vir à tona agora e isso é tudo que importa. – E o bebê? – Erguendo a cabeça, Nadia buscou a segurança nos olhos dele. – Você tem certeza... – Eu não poderia ter mais certeza. Ou estar mais orgulhoso. Seremos ótimos pais, sei disso. – Eu também. E seu pai ficará contente em saber da notícia, especialmente se conseguirmos gerar o futuro sheik de Gazbiyaa. – Sim, ficará. Sua família também, creio eu. Um herdeiro trará elos mais fortes entre os dois reinos agora que o absurdo conflito terminou. Não que eu me importe se este é o futuro sheik ou não. – Zayed deslizou a mão entre os corpos de ambos e colocou-a no ventre de Nadia. – Menino ou menina, este é o começo da nossa família, sua e minha. De agora em diante, isto é em torno de nós.
– Concordo – murmurou ela feliz. – Mas você se importaria se fôssemos a Harith dar a notícia aos meus pais pessoalmente? Eu adoraria estar com a minha mãe quando lhe contar. – É claro. Logo que você quiser. – E talvez minha mãe possa vir para cá conosco, só para uma visita? Sei que ela não deixaria meu pai por muito tempo, mas seria ótimo dar-lhe um descanso, mostrar-lhe Gazbiyaa, a vida que temos aqui. – Você pode trazer o palácio inteiro, se quiser. Até aquele seu irmão. – Imran? Está falando sério? – Sim. Até Imran. É quanto eu amo você. – Então, diga-me mais uma vez. – Eu amo você, Nadia. Sempre amarei. Agora e para sempre, sem fim. O silêncio pairou no quarto. – Nadia? Acho que é a sua vez. Mas Nadia havia adormecido e, com o coração batendo de encontro ao peito dele e os braços dela em torno de sua cintura, Zayed soube que não haveria resposta tão cedo. Virando-se de leve, ouviu-a soltar um suspiro de contentamento. E foi toda a confirmação de que precisou.
FURACÃO DE EMOÇÕES Bella Frances
Rocco ignorou o antigo elevador de gaiola e subiu a escada correndo. Se ela sentisse o mesmo que ele, os dois poderiam ficar no quarto. Ou poderiam dar uma volta e ir a outra festa, voltar à festa de Dante, ir para a estância. Fazia muito tempo que ele não levava uma mulher até lá. Mas pressentia que uma noite com Frankie não seria suficiente. Talvez um fim de semana inteiro? Talvez isso saciasse a sede que sentia por ela. Ele parou diante da porta e bateu. Duas vezes. Rapidamente. Impaciente. Nada. Ela deveria estar se vestindo. Rocco bateu mais uma vez. Nada ainda. Ele abriu a boca para chamá-la, mas a porta abriu. Ali estava ela. Com os olhos vermelhos, cabelo revolto, com a camisola azul escorregando do ombro e o rosto franzido por causa da luz do corredor. Rocco nunca vira algo mais adorável. – Frankie. – Ele deu um passo, ansioso por abraçá-la, mas ela colocou a mão na cabeça, fez uma careta e abriu a boca com incredulidade. – O que... O que você está fazendo aqui? Ele ainda não acreditava como ela estava linda. A maquiagem dos olhos borrada, a pele clara e cremosa, a evidente ausência de algo por baixo da fina camisola de jersey que se colava às suas curvas. Tão atraente quanto ele se lembrava, mas seus seios pareciam estar mais cheios e arredondados... – O que você...? Eu comuniquei ao seu empregado que não iria.
Ele voltou a olhar para o rosto dela. Ouviu um barulho no final do corredor. O recepcionista olhava para os dois com uma cara de quem queria saber se estava tudo bem. Rocco fez um sinal para acalmá-lo. – Deixe-me entrar, Frankie. – Não! – exclamou ela. – Tudo bem. Eu espero aqui... Vá se vestir. – Eu... Não... Vou. Ele se divertiu. Um pouco. Não deixava de perceber a ironia da situação. – Nós já passamos por isso, querida. Só que, naquela ocasião, era você quem estava do lado de fora da porta, lembra? E, ali estava. Aquela selvageria que ele vira há anos. Aquela sensualidade displicente que ela exalava e que ele achava embriagante, excitante. Frankie deu uma olhada para o final do corredor e o encarou. – Não acredito que você tenha vindo até aqui! – Seria melhor que eu entrasse. Se me lembro bem, era isso que você queria fazer na última vez. – Eu tinha 16 anos! Cometi um erro! – exclamou ela retrucando acaloradamente, cruzando os braços. O resultado é que o decote da camisola se abriu, deixando que ele visse a ponta do seu seio. Rocco gentilmente puxou o tecido para cima e colocou-o no lugar, ignorando as tentativas que ela fazia para empurrar o seu braço. – Por que não discutimos isso lá dentro? – Ele recolheu a mão que tremia. Queria tocá-la, mas como bom conhecedor de mulheres, sabia que seria preciso mais do que uma simples conversa para que ela aceitasse a mensagem. – Na última vez em que nos encontramos, você foi perfeitamente claro. Eu não quero mais desperdiçar o meu tempo com você. Eu garanti isso ao seu empregado. Não podia ter sido mais direta. – A última vez que nos encontramos foi há 4 horas. Você estava dentro da minha carreta. Você veio me procurar. Ela estava tão sensual, vestindo quase nada. Ele estava ficando excitado só de olhá-la. Rocco se lembrou de Frankie deitando na sua cama e acordando-o com beijinhos, com o calor do seu corpo. Ele literalmente a empurrara para fora da cama – rejeitando o paraíso. – Eu vim procurar nossos cavalos, não você! Seu arrogante... Sabendo do que ela iria chamá-lo, ele colocou o dedo sobre seus lábios. Ela arregalou os olhos. – Não se rebaixe, querida. – Ele se aproximou e falou mais baixo. – Entre, vista-se, e eu vou levála para a festa e lhe contar tudo a respeito dos seus pôneis. Ela segurou na mão dele e tentou empurrá-la. A manga da camisola escorregou do seu ombro, esticando o tecido e marcando seus seios, seus mamilos. Rocco percebeu e sentiu o calor se concentrar na virilha. – Eu digo o que penso, e acho você um... Ele não aguentou mais. Ela o incendiava. Precisava contê-la e queria beijá-la...
E leia também em Amor & Disputa, edição 266 de Harlequin Jessica, Além do limite, de Anne McAllister.
Próximos lançamentos: JESSICA 266 – AMOR & DISPUTA Furacão de emoções – Bella Frances Rocco Hermida passou pela vida de Francesca Ryan como um furacão. Ao reencontrá-lo, ela percebe que o desejo que sentem ainda é intenso. E foi preciso apenas um beijo para que esta paixão pegasse fogo novamente. Além do limite – Anne McAllister Holly estava prestes a conseguir o tão sonhado recomeço quando reencontra Lukas Antonides. Ela o detestava… Porém, jamais conseguiu tirá-lo da cabeça. E quanto maior é a tensão entre eles, maior é o desejo. Logo ambos percebem que a linha entre o amor e o ódio é bastante tênue. JESSICA TRIPLO 001 – DESTINOS MARCADOS Flerte com o ex – Kimberly Lang A vida de Megan Lowe estava ótima… até a imprensa descobrir que ela é ex-esposa de Devin Kenney. Mesmo relutante, ela sabia que chegara a hora de encará-lo. E este encontro certamente será digno de primeira página. O último desafio – Andie Brock O conde Rafael Revaldi precisa de um herdeiro. Para isso, terá de enfrentar seu maior desafio: reconquistar Lottie, sua ex-esposa. Suave, sensual e escandaloso – Amanda Cinelli Dara Devlin precisa do castelo de Leo Valente para realizar um evento. Por isso, aceita a proposta ultrajante de fingir ser namorada dele. Dara tentará manter o profissionalismo, mas levá-la para a cama está no topo da lista deste playboy sedutor… Lançamento do mês: JESSICA 265 – RUMOS IMPREVISTOS
Desacordo mútuo – Robyn Grady Após um comentário maldoso sobre sua solteirice, Sophie Grubella vai para a cama com Cooper Smith. Era para ser apenas uma noite, contudo, três meses depois, o teste de gravidez dá positivo… Entre o dever e o desejo – Cathy Williams Quando sua assistente pessoal pede demissão, Leandro Perez fica furioso. Emily é indispensável, por isso, fará de tudo para mantê-la. Até mesmo usar todo o seu poder de sedução.
Próximo lançamento: JESSICA MINISSÉRIE 003 – PROPOSTAS OUSADAS 1 DE 2 Sorte inesperada – Joss Wood Willa mal pôde acreditar na sorte quando descobriu que o poderoso Rob Hanson está à procura de um contador. Esse trabalho era a chance que ela estava procurando. Só há um problema: Willa já conhece o novo chefe… intimamente. Amigos com benefício – Avril Tremayne A proposta que Scott Knight fez para Kate Cleary simples: Duas noites por semana durante um mês, confidencialidade garantida. Esse era o acordo perfeito, já que nenhum dos dois estava em busca de um relacionamento sério… Ao menos, era o que pensavam! Último lançamento: JESSICA MINISSÉRIE 001 – CASAMENTOS DA SOCIEDADE 1/2 Acordo nupcial – Jennifer Hayward Para recuperar o controle de seu império, Rocco Mondelli terá de deixar os dias de playboy para trás. E decide chantagear Olivia Fitzgerald para que aceite o papel de esposa amorosa. Contudo, em vez de entrar na igreja ao encontro do noivo sensual… ela foge! Atração proibida – Michelle Smart Christian Markos pode ter tudo o que deseja, exceto Alessandra Mondelli. A irmã de seu amigo sempre fora proibida. Porém, a química entre eles é impossível de resistir. E um encontro apaixonado trará enormes consequências para ambos.
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ P215c Pammi, Tara Casamentos da sociedade 2 de 2 [recurso eletrônico] / Tara Pammi, Andie Brock; tradução Ligia Chabú, Tina TJ Gouveia. 1. ed. - Rio de Janeiro: Harlequin, 2016. recurso digital Tradução de: The Sicilian’s surprise wife + The sheikh’s wedding contract Formato: ePub Requisitos do sistema: Adobe Digital Editions Modo de acesso: World Wide Web ISBN 978-85-398-2109-9 (recurso eletrônico) 1. Romance americano. 2. Livros eletrônicos. I. Brock, Andie. II. Chabú, Ligia. III. Gouveia, Tina TJ. IV. Título. 15-28577
CDD: 813 CDU: 821.111(73)-3
PUBLICADO MEDIANTE ACORDO COM HARLEQUIN BOOKS S.A. Todos os direitos reservados. Proibidos a reprodução, o armazenamento ou a transmissão, no todo ou em parte. Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas é mera coincidência. Título original: THE SICILIAN’S SURPRISE WIFE Copyright © 2015 by Harlequin Books S.A. Originalmente publicado em 2015 por Mills & Boon Modern Romance Título original: THE SHEIKH’S WEDDING CONTRACT Copyright © 2015 by Harlequin Books S.A. Originalmente publicado em 2015 por Mills & Boon Modern Romance Arte-final de capa: Isabelle Paiva Produção do arquivo ePub: Ranna Studio
Editora HR Ltda. Rua Nova JerusalÊm, 345 Bonsucesso, Rio de Janeiro, RJ – 21042-235 Contato: virginia.rivera@harlequinbooks.com.br
Capa Texto de capa Rosto Sumário
MARCA DE SEDUÇÃO Casamentos da sociedade Capítulo 1 Capítulo 2 Capítulo 3 Capítulo 4 Capítulo 5 Capítulo 6 Capítulo 7 Capítulo 8 Capítulo 9 Capítulo 10 Capítulo 11 Capítulo 12 Capítulo 13
VOTOS DE DESEJO Casamentos da sociedade Capítulo 1 Capítulo 2 Capítulo 3 Capítulo 4 Capítulo 5 Capítulo 6 Capítulo 7 Capítulo 8 Capítulo 9 Capítulo 10 Capítulo 11 Capítulo 12
Capítulo 13
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