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ELEGIA A FERNANDO BRAGA

ELEGIA PARA FERNANDO BRAGA

Estou entre o silêncio e o soluço umedecido, como um rio sem margens buscando os mares. Desaguar a angústia não mais será possível. Quem ontem me ouvia, hoje tornou-se cinzas.

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Com a cremação do corpo a alma se purifica para a grande jornada em busca do desconhecido. O batismo foi concluído com a plenitude do fogo. Não mais a sede existe provocada pelo calor.

Morreu o Fernando, sabendo imortalizado o poeta, depois de tanta luta na face deste mundo conturbado. Deixaste a tua Terra para o aprimoramento do amor por esta Ilha que te recebeu quando criança.

Não foram poucas as tuas vitórias além Província: a tua ajuda aos mendigos, hóspedes das palafitas. A escolha de um poeta como padrinho de casamento. Logo estaremos juntos pelos vales da eternidade.

José Maria Nascimento.

São Luís, 13.03.2022.

A Fernando Braga,Minha lágrima.

Fernando,Fernando! Um grito eclode no meio da tarde. É o clamor desta tua ilha naufragada. Fernando!Fernando! Fernando, agora livre como os pássaros, os sabiás de teu mundo, asas abertas navegando infinitos. Fernando, irmão, teu canto expõe ao sol calcinadas vísceras em meio a abismos imersos em saudades. Fernando, Não voltaste... ...ficou um canto-angústia de um sonho no teu "Exílio de Viandante". Fernando, irmão, "as biqueiras dos telhados choram" e os mirantes clamam por teus versos que não mais ouvirão. "nunca mais,nunca mais ". Fernando, companheiro de versos e rumos, aínda ouço teu canto- luz, profecia do último instante. Certamente tens agora teu "corpo nu coberto com as santas túnicas da claridade e das auroras". Fernando,Fernando, Upaon-Açu chora: ..."Nunca mais.Nunca mais"...

Mario Luna Filho.

A vida é mais lírica em um cais porque ele é feito de saudades e esperas

Estou só, no tombadilho do meu barco, que rasga as franjas das águas em rumo do puro longe.

Nada há ao meu redor, a não ser um rondó de expectativas...

O puro longe para onde vou, não é apenas Um poema marítimo, mas uma ode silenciosa.

Oh peso imenso! Ó mar sem fundo e sem margens, onde nada acho de mim, senão nada em tudo.

Fernando Braga. O puro longe, 2012.

EXERCÍCIO DO AVESSO

Quero apenas estar-me longe, do ser-me que me quer tão perto e ser levado como folha ao vento dos fastios que de meu recendem.

Bem longe, onde estarei por certo, sentir-me salvo dum outro quando e reinventar-me n' outro ser humano, n' outro poeta, e n outro Fernando.

E voltar mais breve e inconsútil, sem querer-me mais-que-perfeito, do que fizera, quisera, fora e era...

E repensar no que já me passara a soltar-me do que já me prendera e viver mais do que já vivera!

Fernando Braga. O puro longe, 2012.

Meus olhos emigraram para São Luís minha cidade pavorosamente triste, onde um meio de céu esconde o rosto de Deus das vidraças da planície.

Vim aqui tornar-me em arbusto onde sou o argonauta deste verde.

Morto pão esquecido sobre a mesa foi minha ceia incrivelmente tarda.

Noturno vinho em resto abandonado ferve-me o corpo hipertencialmente reto, nesta noite sem data dalguma safra onde me disponho não mais sentir-me.

(Fernando Braga. Ofício do Medo/1977)

O HOMEM EM CÍRCULO

A roda gira a gerar o giro do círculo, que prende o grito no giz do risco.

Gestos causais do nexo, pedras de sal-gema e sexo.

Mordaças a morderem as máscaras, por trás dos muros, no varal do tempo, para que a palavra ou o grito se liberte, túrgido e trêfego, era assim que entendia o poeta de A Terra Devastada, porque enquanto gira, o mundo se transforma.

Há qualquer coisa em mim a dizer-me o que sou...

Cá bem por dentro de mím, a roer-me, uma fantástica coisa que não tem nome diz-me que é isso o que fui.

E me vejo numa multidão, de azul desesperadamente entre pessoas que nunca vi...

Não me sei, talvez, ou poeta, ou a dormir sem acordar nunca.

Fernando Braga. Magma, 2014

Passei a caminhar um pouco de banda por carregar do lado esquerdo meus mortos, uma escoliose, e a declinação da rosa.

Juntei tudo de um só tanto para um lado.

Fiquei penso!

Só não disse que, deste mesmo lado esquerdo, guardava ainda escondido, mas que bobagem, manifestos e teorias, credos de arroubos e utopias, e ainda, virginalmente puro, o meu coração mas em muitos pedaços dividido.

Fernando Braga. Poemas do tempo comum, SECMA, 2009.

PEDRO TEIXEIRA, O “CURIUA-CATU” QUE DESBRAVOU A AMAZÓNIA

MIGUEL LOURO

Nascido em Cantanhede em ano desconhecido, por volta de 1585, Pedro Teixeira participaria, com Jerónimo de Albuquerque, na campanha para expulsar os franceses de São Luís do Maranhão, no litoral nordeste do Brasil.

Após o sucesso na expulsão destes, no final de 1615, foi integrado numa expedição à foz do rio Amazonas, composta por três embarcações e comandada por Francisco Caldeira Castelo Branco, com vista a consolidar o domínio português sobre esta região. A 12 de janeiro de 1616, as embarcações ancorariam na baía de Guajará onde foi fundado o Forte do Presépio, núcleo da atual cidade de Belém. No ano de 1625, Pedro Teixeira comandaria a luta contra os holandeses e ingleses que se tentavam apoderar da região, sendo a sua atuação destacada pelo frei Vicente do Salvador, na sua obra “Historia do Brazil”. A 25 de Julho de 1637, Teixeira chefiaria uma expedição que partira de Belém, com 45 canoas, setenta soldados e mil e duzentos flecheiros e remadores indígenas com o objetivo de subir o curso do rio Amazonas e expandir as possessões portuguesas na região face aos avanços espanhóis, apesar dos dois Reinos estarem na altura unidos pela mesma Coroa. O destino final da expedição seria Quito, no Equador. A grande dificuldade da viagem exigiu que os homens, sob o comando de Pedro Teixeira, desenvolvessem ao máximo as suas habilidades de caça e pesca e estabelecessem relações de troca e amizade com os índios nativos.

Depois de oito meses de viagem, a expedição alcançou a primeira povoação espanhola, nas margens do Rio Quijos. Após este ponto, devido à grande intensidade das correntes, a maioria da restante jornada teve de ser realizada a pé. Após quase um ano, em 1638, a expedição alcançaria o seu destino, fazendo com que os portugueses conseguissem obter mais território do que aquele que ficara garantido com o Tratado de Tordesilhas, em 1494.

Apesar de nunca terem ocorrido conflitos de maior importância, as autoridades espanholas revelar-se-iam preocupadas com o avanço da expedição portuguesa em terras que consideravam suas, pelo que deteriam Pedro Teixeira em Quito por várias semanas, acabando por autorizar o seu regresso, desde que

acompanhado por um conjunto de padres jesuítas, liderados por Cristóbal de Acuña, que reportaria tudo às autoridades castelhanas. O primeiro relatório de Acuña seria publicado como livro em 1641. Com o retorno à costa atlântica, a expedição de Pedro Teixeira tornar-se-ia a primeira a simultaneamente subir e descer o rio Amazonas. Teixeira ganharia entre os índios a alcunha de “Curiua-Catu”, “o bom e amigável homem branco”. Após o fim da expedição, Pedro Teixeira retornaria a S. Luís do Maranhão, sendo nomeado Capitão-Mor do Grão-Pará a 28 de fevereiro de 1640, cargo que abandonaria após apenas três meses por motivo de doença. Acabaria por falecer no dia 4 de julho de 1641.

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