Vera Lins | Organização
Vera Lins | Organização
Copyright © 2019, Espólio Luiz Norões Copyright © 2019 dos textos, dos autores Todos os direitos reservados. A reprodução não autorizada desta publicação, no todo ou em parte, constitui violação de direitos autorais. (Lei 9.610/98) Grafia atualizada respeitando o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa Coordenação Gráfica, capa e diagramação: Marcos Lins Langenbach Registro fotográfico das obras: Felipe Varanda Organização de arquivo: Noemi Ribeiro Produção Editorial: Letra e Imagem Editora Todos os esforços foram feitos para identificar os detentores dos direitos autorais das imagens aqui reproduzidas. Eventuais falhas ou omissões serão corrigidas em futuras edições. dados internacionais de catalogação -na-publicação (cip) de acordo com isbd
E84 Todos os riscos: a arte de Luiz Norões / organização de Vera Lins. - Rio de Janeiro : Letra e Imagem, 2019. 136 p. ; 20 x 22,5 cm. ISBN: 978-85-5473-025-3 1. Artes plásticas. 2. Pintura brasileira. I. Norões, Luiz. II. Lins, Vera. III. Título. 2018-1387
CDD 028.5
CDU 82-93 Elaborado por Vagner Rodolfo da Silva - CRB-8/9410 Índice para catálogo sistemático: 1. Artes Plásticas 028.5 2. Pintura brasileira 82-93
Sumário
6
Apresentação Vera Lins
10
Impressões sobre um artista Marcos Langenbach
28
Entre céu e chão Armando Freitas Filho
31
Texto de apresentação da exposição de Litografias no MNBA (1992) Frederico Morais
51
Raio divinatório – Texto de apresentação da Mostra “Entre o desenho e a Pintura (MNBA, 2002) Sheila Cabo
65
Velocidade e instante Ronald Polito
99
Obras -– Litografias
118
Obras – Pastéis
120
Obras – Aquarelas
122
Obras – Pinturas a óleo
124
Os anos oitenta com Luiz Norões Vera Lins
128
Cronologia
Apresentação Vera Lins Este livro tenta reunir e colocar à mostra os trabalhos de um artista que teve uma trajetória inusitada nos anos oitenta.
luta e prazer. Vão-se às ruas pela Anistia, Diretas Já, movimento feminista. Luiz Norões entra na Escola de Artes Visuais do Parque Lage em 79, fazendo
O artista plástico Luiz Norões, nos
litogravuras com Antonio Grosso e Su-
seus desenhos em suas pinturas e gra-
san L’Engle. Com estas gravuras, partici-
vuras, arriscava tudo. Assim como na
pou das suas primeiras mostras coleti-
vida. Nascido em 1954, se suicidou
vas, como o segundo e o terceiro Salões
em 1989 e deixou uma obra. Partici-
Nacionais e o quarto e o quinto Salões
pou do movimento conhecido como
Cariocas e de uma exposição de litogra-
Geração 80 e, na exposição do Parque
fias na Sala Cecília Meireles, em 1980.
Lage em 84, pintou uma parede com
Já desenhava há algum tempo,
suas figuras de um neoexpressionis-
mas seu desenho começa a trabalhar
mo singular. Foi professor de desenho
a história da arte, que via na Coleção
e pintura na Escola de Artes Visuais do
da Abril dos Mestres da Pintura. Co-
Parque Lage, de 1984 a 1989, onde par-
meçava a escolher seus pintores pre-
ticipou de várias exposições coletivas.
diletos e interferir, traduzindo-os com
A importância de seu trabalho está liga-
seu traço: Goya, Rembrandt, Delacroix.
da tanto a uma geração quanto a uma
Depois, numa viagem à Europa, encan-
linguagem original e peculiar que é a sua.
tado, descobriu a casa de Delacroix em
Fim dos anos 70 e início dos 80 no
Paris; em Amsterdã, a de Rembrandt;
Rio de Janeiro. Fala-se de desejo, paixão,
e a região de Constable, na Inglaterra.
04 6
Em Veneza, andava com um bloco nas
um desenho, que passava para a pedra.
mãos, desenhando a cidade.
Mas não imprimia mais sozinho. Muito
A escola no Parque Lage, quando
nervoso e com dores nas costas, pedia
Luiz a frequentou, passava por uma
a Daniel Elbon que o ajudasse na im-
transformação em que deixava de ser
pressão. Uma dessas últimas gravuras
IBA, uma comportado Instituto de Be-
foi cartaz para a peça Baal, de Brecht,
las-Artes, e se redesenhava como EAV,
encenada em 1988 por Moacyr Góes,
sob a direção de Rubens Gerchman,
com quem contribuiu na cenografia e
que a transformou num campo de ex-
na elaboração do catálogo.
perimentação. Luiz foi aluno de Ger-
Sempre trabalhou com a figura hu-
chman e Roberto Magalhães. Em 82 faz
mana, com um universo temático ur-
uma exposição de desenhos com pas-
bano, ora lúdico, ora dramático. Suas
téis oleosos e técnica mista na Galeria
imagens insólitas criam um espaço em
Macunaíma da Funarte e o professor
que fantasia, humor e referências auto-
Gerchman, ao ver os trabalhos, diz que
biográficas se combinam e surpreen-
tem que começar a pintar. E é o que co-
dem o espectador. A partir de 1983 co-
meça a fazer, tendo como ateliê a casa
meçou a pintar, sem, no entanto, deixar
de amigos em Botafogo. Começa com
de gravar na pedra suas imagens. Uma
acrílico, depois passa para o óleo, e vai
conjunto de 29 litogravuras suas, do
fazer suas próprias tintas, misturando
período de 1978 a 1989, faz parte do
o pigmento com terebentina.
acervo do Museu Nacional de Belas-
Mas então já está num ateliê coleti- -Artes, onde esteve exposto em 1992, e vo no centro da cidade, rua Uruguaia-
da coleção de George Kornis. Faz parte
na 25. E começa a expor sua pintura.
do acervo do mesmo museu sua pin-
Em 1986, faz uma exposição na galeria
tura a óleo Garrafa e Vassoura, doada
Candido Mendes de Ipanema, que atrai
em 2001, e vinte desenhos em técnica
os olhares dos passantes. Participa de
mista, doados em 2005, depois da ex-
várias coletivas. Quando morreu, pre-
posição “Entre o desenho e a pintura”,
parava uma segunda individual de dez
no MNBA, em 2002.
quadros. Tinha seus quadros fotografados em slides por Ivan Lima.
Sua obra traz de volta uma figuração que não tem por objetivo repre-
Durante esses cinco anos de pintu-
sentar, mas deixar livre a imaginação
ra, continuou fazendo litografias. De
do artista e do espectador para criar
vez em quando escolhia uma imagem,
outros mundos possíveis. Seguia um
7
caminho pouco trilhado, na esteira de
claras e retas do senso comum. Com
Hodler, Kubin, Odilon Redon, De Chi-
teimosia, imaginação e coragem, sua
rico. Leitor da poesia de Baudelaire,
pintura atualiza perguntas eternas e ir-
Novalis, Wallace Stevens e da ficção
respondíveis como as de Gauguin. Di-
de Poe, Borges e Kafka, era um pintor
zia que seu desenho e sua pintura eram
sombrio, que resistia, a partir de uma
prazer e tormento e sua proposta era
subjetividade delirante, às certezas “chegar a ver tudo”.
8
9
Impressões sobre um artista Marcos Langenbach Luiz andava com suas pernas lar-
Nas telas os traços fortes e densos
gas e finas, seu tronco redondo, barba,
descortinam mistérios e a sensação su-
óculos e cigarro. Seus dois maços diá-
focante desse circo-espetáculo que não
rios, Hollywood, exalavam sua ansieda-
pode parar. O fogão de cabeça para
de. Um sujeito simpático, alegre, boa-
baixo, o homem plantando bananeira,
-praça, que vivia em constante tensão.
a cadeira com espinhos. Uma fuga na
A arte de Luiz Norões evidencia sua
escada para o “céu”, na memória da
vida, sua angústia e sensibilidade. Sua
criança com seu trenzinho ou nas flo-
obra figurativa nos convida ao exercí-
restas sombrias.
cio e ao desafio de sentir e entendê-lo.
A fragilidade de Norões se esconde
Suas litografias flertam com o psicodé-
nas suas pinceladas fortes e com textu-
lico e com o surrealismo, cenas grotes-
ra, nos seus quadros grandes, na cora-
cas e, ao mesmo tempo, cômicas, seu
gem de dizer ao pai que seria pintor, o
traço inacabado evidencia suas incerte-
que lhe rendeu três dias pintando pare-
zas perante o porvir.
des na firma de engenharia da família.
Nos pastéis e aquarelas, sua obra ga- A vida é feita de tensão, e Luiz colocava nha cor e alegria, em um limiar de tris-
essas tensões em seus quadros equili-
teza e angústia. Um circo de palhaços,
brando sua própria condição humana.
malabaristas, domadores de feras. Luiz
As pessoas que tiram suas vidas vi-
– assim como nós – se sentia um pouco
vem esse paradoxo – medo e coragem,
de todos esses personagens nesse tres-
o desafio e o medo de enfrentar a vida
loucado circo humano que é a vida.
e a coragem de se jogar do quinto an-
10
dar, “nada fácil de entender”. Esse ato
e superficialidade, nos mostra quão
de loucura é também um ato de esque-
imprevisível é a vida e nos impulsio-
cimento. O esquecimento das pessoas
na a enfrentar, com coragem e medo,
que ficam e são marcadas pela sua au-
essa viagem misteriosa que é o viver.
sência. Não só pela ausência, mas pela
Sua obra nos convida a refletir sobre o
culpa de não terem percebido, de não
simbolismo da própria vida e desperta
terem feito mais alguma coisa para fa-
uma diversidade de sentimentos. Que
zê-lo mudar de ideia.
ela nos inspire a mergulhar em um ou-
Luiz era um segundo pai para mim.
tro mundo para que possamos emergir
Aprendi com ele a jogar botão, dese-
desse, criando um ambiente com mais
nhávamos juntos em sua prancheta,
leveza, paz e alegria.
íamos à praia, curti aquela figura até os meus 11 anos. Uma pessoa sempre alegre, que escondia sua tristeza e angústia em seus quadros. Sua morte, aos 35 anos, quando estava chegando ao seu auge, alcançando uma excelência nos traços de óleo sobre a tela, nos tirou não só um grande artista que alcançava outro patamar, mas nos marca profundamente como seres humanos. Vivemos o trágico como se fosse um grande circo que precisa se reinventar para que a alegria possa transformar ou mascarar nossa dor. Esse livro simboliza o resgate e o registro de sua obra. Os casos de “Luízes”, de artistas, de pessoas sensíveis que não aguentam esse mundo concreto e pesado em que vivemos, são também uma reflexão sobre a vida. A nossa dualidade, a experiência de tragédia e de prazer, de choro e de riso, de presença e de ausência, de intensidade
11
Entre céu e chão Armando Freitas Filho Luiz Norões tinha pressa, mas disfarçava. Visto de longe era alto, calmo, sem relógio. Próximo, se passava a limpo no desenho ou na pintura, e o mar de dentro, não ameaçado por ondas, da Urca, ficava ao fundo, em rascunho. Depois, o que vinha à tona era no mar de fora: o mergulho de cabeça, a mão de afogado do homem ao vento que se agarra ao mastro no topo do edifício, a curta vida da rua que encontra na esquina uma parede a solidão dos últimos andares nos domingos.
Poema do livro Fio Terra, em Máquina de Escrever, poesia reunida e revista. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2003, p.590
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Exposição de litografias no MNBA (1992) Frederico Morais Estou diante de uma aquarela de Norões e me vem à memória uma frase que li num pequeno cartaz de um grupo teatral, colado num muro escondido de Olinda pós-carnaval, ainda fedendo à urina: se cobrir vira circo, se cercar vira hospício. Esta aquarela, que tenho diante de mim, como muitos desenhos e litografias, que virão a seguir, mostram temas circenses: equilibristas, malabaristas, domadores, mágicos, trapezistas etc. Tudo nesses trabalhos se passa rapidamente e de forma desordenada: é um estilhaçar de situações, entre cômicas e grotescas, entre memória e denúncia, entre autobiografia e reflexão, entre cotidiano e história da arte. E corresponde ao seu modo de expressar o mundo (em sua fase inicial, gráfica, e Norões é um desenhista notável): anotações, croquis, rabiscos, grafitos, um mundo apenas esboçado, gênese permanente, sempre inconcluso, aberto e, nele, o homem é, por enquanto, mero espectador.
14
Mas há também a contraface disso: o mundo que se esvai, que se desfaz, carcomido, erodido, apodrecendo, no qual o homem, agora ator, convive com ratos, jacarés, sapos, lixo. Pouco a pouco, entretanto, percebemos que este circo não tem picadeiro nem plateia estável, nem está coberto por uma lona estropiada. O que vemos, então, é um céu de cores sombrias, dominando a urbe solitária, assustadora. Da mesma maneira, esta cidade-mundo-circo não tem ainda cercas visíveis ou palpáveis, mas, a todo momento, o artista revela indícios de objetos-situações que dificultam qualquer gesto de libertação: um muro isolado, a escada que não ajuda a escalar este muro e não leva a lugar nenhum, a massa de edifícios vista do alto e de longe, um edifício tragado pelas águas, um monte de lixo expondo como troféu a vassoura inútil. E se por acaso conseguimos penetrar nesses interiores domésticos da ci-
dade-prisão, o que vamos encontrar é a mais profunda solitude, a cadeira vazia que poderia ter sido de Van Gogh, uma outra escada, a roupa fantasmagórica, um trenzinho de ferro saindo do túnel do tempo – ou da infância. Parece o cenário de um teatro absurdo, o homem miniaturizado no sofá gigante, ou quase afogado, sem ar, sob o enorme colchão de plumas, um enorme cubo amassando o que poderia ser o pincel do artista. Norões teve experiência como cenógrafo, mas esta dimensão cenográfica de sua obra gráfica e pictórica pode ser apenas uma fachada para encobrir seu desconforto, sua dor, assim como o humor de sua fase gráfica pode ser apenas uma forma de escapismo, um modo de enfrentar o medo, a timidez e a solidão. Mas, quando mergulhamos fundo em sua obra (e, aliás, esta imagem do mergulhador é recorrente no artista), o que sentimos é a fragilidade do homem face ao mundo, sua incapacidade de mudá-lo, de superar as barreiras metafísicas do ser, dar um sentido às coisas, encontrar algum porto temporário, abrir uma clareira na floresta. Pois a sensação que temos diante destes interiores vazios, com seus objetos abandonados, é que eles são a autobiografia do autor. O artista esteve ali sentado naquela cadeira, naquele banco, até bem pouco ele estava contemplando o trem fantasma, assim como percorreu os claro-escuros de
Rembrandt e até promoveu um encontro entre seus personagens e a mulher de Manet que se lava na bacia. Enquanto o papel ou a tela serviram como refúgio, enquanto o humor era uma saída e ele podia até dizer, sem arrogância, que não tinha medo do papel, nem dele mesmo, enquanto, enfim, pôde equilibrar-se no mastro situado no topo do edifício, como o malabarista no picadeiro, ele sobreviveu e nos deixou, como testemunho, obras pungentes. Mas, quando esse sentimento de insegurança que queria pôr no papel foi ficando cada vez mais nítido, denso, pesado, e ele não pôde resistir à força do vento ao cansaço da vida, então, soltou os braços e mergulhou no abismo. Eu deveria falar das litos de Luiz Antonio Norões, de sua arte. No entanto, divaguei. Ele soube, com muita competência, distinguir, em sua obra, o gráfico e o pictórico, dando autonomia a cada campo expressivo. Mas, da mesma maneira como, vendo suas litos, me lembro de suas pinturas, eu vi em cada detalhe de sua obra o prenúncio da morte. Isto não é boa crítica, eu sei, porque a obra sobrevive ao artista, mas o que me emociona agora, escrevendo esta apresentação, é a tristeza que as obras estampavam no rosto do artista. Rio, março de 1992 Texto de apresentação da exposição de Litografias no MNBA de abril a maio de 1992
15
Raio divinatório Sheila Cabo Luiz Antônio Norões esteve boa
de brinquedo, seja o que é dependu-
parte de sua curta vida ligado a uma ge-
rado num mastro, funcionando como
ração que reclamou o direito de pintar
uma bandeira de resistência ao vento,
e que se costumou chamar de “geração
ou mesmo aquele que “planta bana-
oitenta”. Desenhista contumaz, enchia
neira” no centro de um desértico cam-
cadernos e blocos com anotações que
po amarelo, são imagens que, no seu
posteriormente poderiam, ou não, ser
aparecer, borram fantasiosa e ironica-
desdobradas em outros desenhos e
mente essa distinção entre o artista e o
pinturas. Seus trabalhos aqui expostos
mundo, como Luiz intuíra.
revelam esse seu processo diário de elaboração de imagens.
A fantasia, que para os poetas românticos só seria possível na natureza
Em meio à intensa discussão so-
antes da queda, aparece aqui na forma
bre a “volta à pintura”, em que também
de um “achado” que, na sua imprevi-
se discutiu a pertinência de uma figu-
sibilidade, lançaria o desejo de recons-
ração na pintura contemporânea, Luiz
trução da unidade perdida. Mas, como
dizia: “Faço imagens: nem sei se estas
os próprios desenhos e pinturas de
imagens que construo estão em mim
Luiz deixam ver – no que se repetem
ou no mundo”.
e se acumulam sem finalização – no
De fato, as imagens que aparecem
mundo das aparências, como apontou
em seus desenhos, seja um homem
o poeta Novalis, a fantasia só se mos-
que se abaixa grotescamente para
tra como “genialidade fragmentar”. As-
acompanhar um minúsculo trenzinho
sim é que se pode ver esta exposição:
16
uma coletânea de fragmentos em que
a duras penas se mantém no mastro,
cada um aponta para o “raio divinató-
relança as preocupações de trans-
rio”, ao mesmo tempo que reconhece,
cendência que, paradoxalmente, vêm
ironicamente, seus limites.
acompanhadas da dúvida sobre a pró-
Não é à toa que Luiz tinha admi-
pria transcendência. Afinal, a força
ração por Goeldi. O homem-bandeira,
do vento que o mantém bandeira é a
que aparece em mais de um de seus
mesma que o quer homem: levanta-o,
trabalhos, tem a genialidade e a ironia
mas só para fazê-lo entender que não
do desenhista e gravador suíço-brasi-
o sustentará, a não ser sob o signo da
leiro. Atualiza entre os muitos pintores
perdição. Paroxismos de uma época
de ocasião, gerados no ardor de uma
em que, sabendo-se da impossibilida-
época, a pintura-reflexão, nos moldes
de da retomada da expressão utópica,
da ironia romântica, assim como em
propõe-se a volta à pintura e ao hedo-
Goeldi. É assim que este homem, que
nismo da cor.
17
Velocidade e instante (registros sobre algumas litografias de Luiz Norões) Ronald Polito Luiz Norões realizou, na segunda
tória da arte e a mitologia compondo
metade dos anos 1970 e durante a dé-
seus campos de relações com liberda-
cada seguinte, um conjunto de litogra-
de crítica, concentra-se ou dispersa-se
fias. Esse conjunto de 29 trabalhos,
espontaneamente, mantém a perspec-
provavelmente incompleto, é singular
tiva de estudo, de ensaio, de anotação
no tempo e no espaço de sua ocorrên-
ao lado de impressões mais finalizadas,
cia e por suas propriedades, ou algu-
mistura universos culturais de níveis
mas de suas realizações. Não sendo
distintos ou depura um de seus cam-
possível datar a execução das gravuras,
pos, enfim, nessa multiplicidade reside
algumas percepções ficam perdidas,
boa parte da permanência de seu in-
mas é possível que elas não impeçam,
teresse no horizonte. Talvez outra, no
em última análise, considerações ou
registro inusitado que alcançou em al-
questões que as imagens suscitam.
gumas peças.
11
Elas são de ordens diferentes por-
Por outro lado, não se trata de 29
que o próprio conjunto não possui
peças incomunicáveis entre si. Elas
homogeneidade, o trabalho dirige-se
podem ser aproximadas ou ordenadas
para muitos lados, lança mão de pro-
conforme recortes que possibilitem
cedimentos variados, cita ou usa a his-
definir alguns grupos, ou indicam re-
1 Ao todo, conheço 29 gravuras: 26 estão on-line no site do artista em: www.luiznoroes.com.br/obra03.htm. A 27a está reproduzida em: GRAVURA moderna brasileira: acervo Museu Nacional de Belas Artes. Rio de Janeiro: MNBA, 1999. p. 67. A gravura se intitula “A parada” e é de 1979. Outras duas são localizáveis na internet nos endereços: www.levyleiloeiro.com.br/peca.asp?ID=157698 (com data de 1979) e www.levyleiloeiro.com. br/peca.asp?ID=39259&ctd=143 (sem data).
18
corrências que conformam outro nível
embalagens, ilustrações em periódicos,
de relação que podem guardar, o que
mapas, convites etc.) do que para tra-
minimiza e ao mesmo tempo flexibiliza
balhos no campo das artes plásticas.
o que a ideia de conjunto possa indi-
Mais ainda, a litografia foi praticada por
car. Há mesmo traços recorrentes em
bem poucos, as dominâncias incon-
todas, que correspondem a opções no
testes são a xilogravura e as diversas
campo: o trabalho com a figuração e a
modalidades de gravura em metal. E
limitação ao preto e branco.
os trabalhos litográficos de nossos gra-
No caso de Norões, não apenas
vadores, alguns eventualmente, outros
nas gravuras, como também nos de-
de modo mais sistemático, como Lasar
senhos e nas pinturas, ele sempre foi
Segall, Santa Rosa, Burle Marx, Fayga
figurativo, escolheu frequentar aulas
Ostrower, Arcângelo Ianelli, Poty, Darel
de professores que privilegiavam certo
Valença, Renina Katz, Abelardo Zaluar,
campo de figurações, nadando meio
Glauco Rodrigues, Vera Chaves Barcel-
que diagonalmente no contexto da arte
los, Antonio Grosso, Maria Tomaselli,
dos anos 1970. E a opção pelo preto
Lotus Lobo, João Câmara, Thais Helt,
e branco pode valer como oposição ou
em ordem cronológica, correspondem
contraste com o colorista que se mani-
a projetos estéticos distintos entre si
festa particularmente nos pastéis, mas
e ao mesmo tempo estão todos dis-
ainda por uma linhagem em nossa
tantes dos trabalhos de Norões. Além
gravura. Isso porque ele “soube, com
disso, ele foi um caso raro: os artistas
muita competência, distinguir, em sua
de sua geração geralmente não se inte-
obra, o gráfico e o pictórico, dando au-
ressaram pela litografia; ele se ocupou
tonomia a cada campo expressivo”.
com ela durante um bom tempo.
2
3
Não é simples pensar a inserção de
Há diversos modos de abordar al-
suas litografias no contexto artístico do
guns desses trabalhos, aqui não se pre-
país, até por sua escassa tradição nes-
tende a consideração de todas as pe-
se campo. A litografia foi muito mais
ças. Um deles seria observar as obras
utilizada entre nós para fins comerciais
que se dirigem diretamente à tradição
ou particulares (geralmente, rótulos,
iconográfica. Em alguns casos, Norões
2 Sobre a figuração e a posição de Norões a esse respeito, ver crítica de Sheila Cabo. Texto publicado neste livro. 3 MORAIS, Francisco. Texto de apresentação do catálogo da exposição Luis Antônio Norões: litografias. Rio de Janeiro: Museu Nacional de Belas Artes, abr./maio 1992. Texto publicado neste livro.
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escolhe telas a óleo para suas impres-
Norões foi Les joueurs de cartes (1892-
sões, o que, de imediato, remete ao
1895), de Cézanne. Como no caso ante-
problema da hierarquia entre os gêne-
rior, foi escolhido um detalhe, o jogador
ros, aqui subvertida.
à direita do quadro. O tratamento da
Comecemos por sua “glosa” de
figura é diverso, não há traços de man-
uma pintura famosa. O motivo cen-
chas geometrizadas na gravura que já
tral de A Escola de Atenas, de Rafael,
se insinuam, na tela, na toalha da mesa
as figuras de Platão e Aristóteles, que
e no chapéu do personagem escolhido.
sintetizam o quadro, adquire em uma
Esses elementos geométricos foram
gravura de Norões um sentido bem di-
como que sintetizados no cubo solto
verso do original. Com algo que lembra
no ar. Também como na gravura ante-
certos trabalhos de José Luis Cuevas,
rior, nesta o detalhe selecionado e seu
os dois homens sombrios de sobretu-
ambiente têm como fundo algo que
do e gravata têm possivelmente idades
reordena os sentidos que ela possa ter,
bem próximas (Aristóteles envelheceu),
mas aqui talvez mais drasticamente.
pertencem aparentemente ao mesmo
Para além do contraste das linguagens,
estrato social (Platão não está descal-
os olhos fechados, os bigodes e a vesti-
ço e se protege de tanta luz com óculos
menta de ambas as figuras os enlaçam,
escuros), já não precisam se olhar com
como se o prisioneiro (eco de George
firmeza ao expressarem certa ironia
Grosz, a quem Norões admirava?) do
em sua insistente manutenção de um
cubo gradeado fosse a realidade da
ponto de vista, a ser lida nas posições
qual o jogador faz o papel de aparência.
das mãos. Lembram, a um só tempo,
Entre as duas representações imóveis,
executivos, burgueses, políticos, ma-
um pequeno animal (talvez um cão)
gistrados ou gângsteres, ostentando
correndo dinamiza o trabalho com
poder com seu vestuário. Sobretudo,
sugestões e inquietações. Seu mero
formam uma unidade indissolúvel pela
esboço, uma terceira linguagem con-
semelhança, no que se distanciam
trastante, próxima à dos cartuns e das
também e em definitivo da pintura de
histórias em quadrinhos, amplia a in-
Rafael, e são mais efetivamente peripa-
determinação. Ele foge ou ataca? Está
téticos fora de uma academia, andando
feroz ou feliz?
numa rua, o que o fundo perspectiva.
Em outra gravura vemos claramen-
Outra tela a servir como um dos
te o processo de contrastar referências
pontos de partida para uma gravura de
pictóricas, como é o caso da Lição de
20
21
anatomia do Dr. Tulp, de Rembrandt, e
diretamente ao homem deitado em
a litografia com os personagens come-
primeiro plano da tela de Manet, De-
morando algo à volta de uma mesa. A
jeuner sur l’herbe, com posição corpo-
preleção sobre o braço do cadáver na
ral semelhante. 4 Assim, superpõe-se a
Lição é substituída por uma comilança
Lição de Rembrandt ao piquenique de
de carnes, uma festa. O personagem
Manet, transformado em um banquete
de calção e descalço no primeiro pla-
de aves, peixes e, por que não?, huma-
no, completamente à vontade, é a mais
nos, com o crânio e os ossos sobre a
clara expressão da farra. Ele remete
mesa. Mas o realmente inusitado é a
4
Agradeço a Jardel Dias Cavalcanti, que me chamou a atenção para a tela de Manet.
22
23
forma picassiana à direita, de cócoras
um procedimento inesperado como os
como em vários trabalhos de Picasso,
de Escher, mas sem privilegiar pers-
que não causa nenhum estranhamento
pectivações impossíveis, motos-con-
aos presentes. Uma mistura de nonsen-
tínuos ou metamorfoses, a imagem
se com “humor negro”.
atinge também um efeito paroxístico,
Outras vezes, a relação com o pas-
tanto mais por resultar em imobilidade.
sado pode ocorrer dentro do próprio
E o aspecto surreal que ela manifesta
campo da litografia. É em parte uma
igualmente se verifica em outras gra-
menção a Reptiles de Escher a gravura
vuras, sendo um traço bem recorrente
que reúne as filas aparentemente inter-
em todo o conjunto (ver, por exemplo,
mináveis de enormes ratos e pequenos
a gravura Nada de novo, muita galinha
crocodilos, pois são de inusitado mes-
e pouco ovo, de 1979).
mo tamanho, que acabam de se encon-
Norões também pode se valer de
trar ao subirem pelos lados opostos
menções genéricas às representações
de uma espécie de pirâmide/ponte no
de uma mulher deitada em uma cama,
meio do caminho. Deduz-se que a fila
mas para extrair um sentido completa-
dos crocodilos também é extensa a
mente diverso do que usualmente se
partir de sua engenhosa ocultação. Por
atribui a esse tipo de imagem. Uma mu-
24
lher dormindo sendo observada por um
O que importa registrar são os ti-
homem é um tema recorrente na arte
pos de procedimentos adotados nas
ocidental, na Antiguidade e de novo a
menções às artes plásticas do passado.
partir do Renascimento. Em contraste
Sua utilização se dá por recorte, ampli-
com a jovem adormecida e não comple-
ficação ou diminuição, mudança para
tamente nua, apenas delineada, as três
um sentido contrário ou diverso, inser-
parcas em vigília carregadas de negro,
ção em outro contexto, complemento
com expressões e gestos duros, ampli-
ou suplemento de referências, choque
ficados pelo tracejado rápido inferior,
ou contraste acentuado entre lingua-
antecipando seu evidente futuro.
gens, crítica de conteúdos previsíveis
25
atribuíveis a certos padrões de ima-
aos traços do tridente e que, ainda por
gens, discussão da hierarquia de “gê-
cima, parecem se mover. Em contra-
neros” (pintura, desenho, gravura). Há
ponto, há algo de burlesco e de grotes-
outras menções a artistas (como Goya)
co no conjunto, algo talvez mefistofé-
e obras do passado além das que citei,
lico, o que denuncia também a deca-
mas essas são as mais expressivas e
dência de toda a circunstância, com o
evidentes, até para concebermos o tipo “dispiroqueta” escrito ao contrário, em de pertencimento a essa mesma tradi-
meio a outras garatujas desse mundo
ção que ele almejava.
pichado e rasurado.
Por certo, outro dos traços mais re-
Essa percepção crítica pode se di-
correntes nesse conjunto de gravuras
rigir para realidades mais palpáveis,
é sua insistência em causar alguma in-
como a da nossa história. É o caso da
quietação, produzir um espaço em que
gravura A parada, já indicada em nota,
se instala algo insólito, um desconforto
que mistura símbolos nacionais, como
diante das coisas, da realidade. Perce-
um índio, um homem sentado de cos-
be-se certa ameaça sugerida em algu-
tas sobre um porco e... uma ninhada de
mas, ou crueldade e violência. Em uma
ratos, mais uma vez presentes, corren-
delas, como num anticonto de fadas,
do a partir da esquerda.
um coelho vivo está empalado em pri-
Em outra direção, ao menos seis
meiro plano já indo para a fogueira. Há
gravuras podem ser agrupadas sob o
ratos espalhados aqui e ali interagindo
tema do erotismo. Uma já foi mostra-
com outros bichos, como crocodilos,
da, enlaçando vida e morte. Outras po-
mas também homens e mulheres, por
dem ser delicadas, suaves e sensuais,
vezes em conjunção com demônios,
apostando no registro rápido a partir
que também aparecem mais de uma
de modelo vivo, com poucos traços,
vez no conjunto, como na imagem da-
para capturar a atmosfera da situação.
quele bem fornido senhor de chapéu
Mas elas também podem ser bizar-
destoando da roupa, que poderia inclu-
ras, quase escatológicas, como a do
sive estar negociando sua alma com o
personagem priápico num desenho
diabo.
rude, amplificado por contraste pelo
E a atmosfera se torna mais infernal pela sugestão de quase suásticas
tratamento acadêmico e sensual do corpo feminino.
(ou labirintos de forma inacabada) no
Sendo tão variados os interesses de
canto superior direito, que remetem
Norões, até o cômico ou mesmo tra-
26
27
gicômico se apresenta, mesclado com
parece certo que nenhum dos dois per-
certo humor ridículo, como na gravura
sonagens está falando. E, na situação
com uma mulher gorda e de maiô, pas-
festiva à volta da mesa, talvez incomo-
sada da meia idade, com uma pequena
de tanto quanto os ossos o silêncio
ampulheta na mão, tudo assistido ou
dos circundantes, quando seria natu-
tramado pela bruxa que cruza o céu
ralmente óbvio que ao menos alguns
com sua vassoura, lembrando que o
deles falassem. Outro aspecto geral é
mundo das fadas pode ser um terror.
que quase todos são representados pa-
Beleza, envelhecimento e morte nova-
rados, ainda que numa pose, como na
mente tematizados, mas aqui de forma
imagem anterior, de quase teatralidade.
burlesca. Só um cão para fazer compa-
No máximo, andando. Os movimentos
nhia à melancolia.
corporais também são escassos. O que
A divisão das litografias em alguns
há de mais móvel nessas gravuras são
escaninhos não pode perder de vista
alguns bichos e até entre eles há os
outros modos de aproximação entre
imóveis ou os que são registrados no
elas que transcendem os agrupamen-
instante de sua imobilização. O silên-
tos a partir, por exemplo, de um ele-
cio e a imobilidade potencializam o que
mento ou enfoque, o que aqui já se
há de estranho nesses trabalhos, de
indicou em mais de um ponto. Ou, ain-
aparentemente incongruente entre as
da, traços mais gerais, presentes em
imagens. Há mais solidão que sociabi-
quase todas, como certa teatralidade,
lidade nesse “teatro dos mundos”.
em consonância com os trabalhos de
Mas foi sobretudo em três litogra-
Norões no campo das artes cênicas.
fias entre as últimas realizadas que
Uma constante é particularmente notá-
Norões atingiu seus melhores resulta-
vel: a mudez, o silêncio dos persona-
dos. Não apenas em relação a diversos
gens. Mesmos quando os lábios estão
dos traços sugeridos anteriormente,
minimamente entreabertos, como na
mas porque nelas ele alcançou uma
gravura a partir do quadro de Rubens,
síntese particular, um campo de cria-
5
5 Sobre a dimensão cenográfica no trabalho do artista e sua intensa relação com o teatro, ver LINS, Vera. Entre o palco e a tela, imagens cenográficas de um pintor. O Percevejo: revista de teatro, crítica e estética, Rio de Janeiro, a. 9-10, n. 11-12, p. 217-224, 2001/2002. Também disponível em: http://www. luiznoroes.com.br/artista02_imagem_cenografica.htm. “O teatro [...] lhe oferece a possibilidade de interferir na encenação de imagens que adquirem movimento e carnalidade, ganhando corpo concretamente no mundo”. Ver também PINTURAS cênicas de Luís Norões. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 12 set. 1989. Caderno B, p. 2. A matéria foi publicada no dia de abertura da exposição no Parque Lage em homenagem ao autor 12 dias após sua morte. Texto publicado neste livro.
28
29
ção mais autônomo, tanto do ponto
e telas mais notáveis de Norões, pois
de vista da resolução das figurações
há claros pontos de contato.
como de seu tratamento técnico. O alto
Um motivo recorrente no artista é o
nível de finalização, de unidade, afas-
do homem de ponta-cabeça, como po-
ta qualquer ideia de estudo ou esboço.
demos ver em uma aquarela, em uma
Elas se distanciam, assim, tanto da
tela a óleo e em uma das três gravuras.
citação de obras anteriores como do
Mas os contextos são completamente
uso de modelos; elas são produto mais
diversos. Naquelas, realizadas prova-
estrito da imaginação do artista. Há,
velmente depois da gravura, as linhas
ainda, outros traços em comum entre
gerais são as mesmas, funcionando
elas, como o contraste e a aproximação
a aquarela diretamente como estudo
entre as posições corporais dos perso-
para a tela, a palmeira servindo como
nagens, ou certo modo de abordagem
contraponto ascendente em relação ao
que aproxima esses trabalhos das lin-
homem de ponta-cabeça paralisado na
guagens das ilustrações, dos cartuns,
vertical no ar um instante antes de tocar
das histórias em quadrinhos (ela tam-
o chão, ou apenas plantando bananeira.
bém ocorre em outras gravuras, a que
A gravura propõe outra apresentação do
se somam elementos que podem lem-
motivo. Nela, o homem parece afundar
brar o pop), mas sem que essa presen-
diagonalmente com certa velocidade,
ça se imponha em nenhum momento.
acentuada pela “coincidência” do raio
E isso é inusitado, se pensarmos no
seco em diagonal contrária, que cai no
universo imagético da litografia no
exato momento em que ele tocou o
Brasil, geralmente bem distante do
solo, podendo valer como um pressá-
que se desenvolveu naqueles campos.
gio. O movimento inverso de possível
Igualmente, é importante notar que as
ascendência do prédio (em vez de uma
três gravuras funcionam como instan-
palmeira) é anulado pela percepção de
tâneos de cenas-limite que estão ocor-
que ele está afundando como que em
rendo velozmente, de situações decisi-
um mato movediço. A própria atmosfe-
vas de vida e morte, e veremos como
ra alucinada pouco tem a ver com aque-
os modos de operar com o movimento
la do fundo da aquarela e da tela. Aqui,
são fundamentais para os sentidos que
o ambiente é carregado, soturno e de-
possam ter. Ainda, é preciso no míni-
vastado, apenas uma superfície extensa,
mo registrar as relações entre essas
vazia e imóvel. E, com seus movimen-
três gravuras e algumas das aquarelas
tos verticais e diagonais, toda a imagem
30
31
pressiona para baixo. Só a fumaça sobe
Seus significados são rarefeitos, não
aos céus... A gravura conjuga com eficá-
é simples constituir um entendimento
cia o contraste entre a paralisia da pai-
sobre a figuração, já que ela nada en-
sagem, o homem e o raio descendendo
trega. Temos um homem, ou rapaz, ou
em alta velocidade e a fumaça subindo
guri, é difícil determinar a idade, talvez
lenta; movimentos com padrões extre-
se movimentando “naturalmente” en-
mos e inércia a reatualizam em contí-
quanto ocorre a explosão, na qual ele
nuo, sendo praticamente automático
não parece ou ainda não teve tempo
imaginar a temporalidade anterior e
de prestar atenção. O local, desabitado,
posterior ao instantâneo.
apresenta apenas um monólito pesado
Outra recorrência nas posturas
no centro. No ar, uma provável valise,
escolhidas pelo autor é a do homem
ou um improvável peso de ferro com
engatinhando, como em um desenho
argola, é difícil determinar o que seja
(estudo) e em uma tela a óleo com um
o objeto, sobre um fogareiro de ferro
homem em um quarto vendo seu tren-
sobre o monólito. E esses elementos
zinho de ferro passar. A gravura tecni-
estranhos ou quase incongruentes, a
camente mais elaborada de Norões
que se somam ambiguidades como,
traz um homem na mesma posição.
em primeiro plano, o traço grosso que
Sem título, 43 x 60 cm, 1986. 32
pode ser uma garatuja de movimento
nagens. Norões não imprimiu nenhum
ou um fio ou cabo elétrico, ou qualquer
deles de bruços, o que é uma terceira
coisa assemelhada, parecem recuar
posição importante em seu trabalho,
momentaneamente diante de outras
recorrente em aquarelas e telas, bem
possibilidades que a gravura oferece.
como fazer “bandeira” em um mastro
Uma das principais é sua profundi-
é outra “constante”. A última litografia
dade e volume. Atendo-se à imagem,
a comentar não foge a esse padrão. Ela
em algum momento passamos a nos
se intitula Baal e foi usada como car-
situar dentro dela, em frente à pedra.
taz para a peça homônima, de Bertold
A composição como que forma um ca-
Brecht, em montagem de Moacyr Góes
sulo que vasculhamos de dentro, esta-
em 1988, para a qual Norões também
mos em um rebuliço, a nuvem de detri-
desenhou o programa. A imagem me-
tos e partículas ainda não ocupou todo
taforiza de modo indireto e peculiar a
o proscênio e podemos penetrar pelo
multidão de experiências do persona-
espaço. Toda a superfície de lombadas
gem de Brecht, que o conduzem à sua
assimétricas, que segue até o horizon-
miserável aniquilação. Há uma aquarela
te, é revolta como se o chão tivesse se
em que vemos um homem na mesma
transformado em alto-mar. Esse movi-
posição deitada dessa gravura, voltado
mento incessante, essa explosão que
para cima e de corpo inteiro. Na gravura,
não para é obtida por uma sutil osci-
só do peito para cima, mas a posição, o
lação temporal da tela, uma vibração
travesseiro ou volume sob a cabeça e o
de algo em crescendo ou algo que já
modo de estar guardam alguma seme-
reflui, ou o ponto zero entre esses dois
lhança com a aquarela referida. Como
segmentos, quando o instantâneo foi
nas duas anteriores, trata-se de um ins-
registrado. Os diversos tipos de tra-
tante crucial. Nossa posição, no caso, é
cejado que indicam a direção do mo-
de quem será o próximo a ser atrope-
vimento oscilam pontualmente entre
lado pelo mundo, que está vindo com
direções opostas, criando sensações
um volume, um peso e uma velocidade
diversas de temporalidade. Não ape-
ameaçadores, aterrando o personagem.
nas um instantâneo, mas também uma
É do canto superior esquerdo que vêm
oscilação, uma inconstância.
todas essas intensidades; não apenas
As posições corporais e os instantes
é algo rápido como tem densidade e
de seu registro formam um pequeno
massa. Se na gravura anterior somos
elenco de performances para os perso-
convidados a entrar, nesta, a figura-
33
Sem tĂtulo, 43,5 x 46 cm. 1986 34
Baal, 55 x 55 cm, 1987. 35
ção sai da gravura vindo em nossa di-
distintos: uma queda (intencional ou
reção. Ainda que a posição não facilite
não), uma explosão e um atropelamen-
a observação da face do personagem,
to. Na primeira fica mais evidente a hi-
é evidente sua “tranquilidade”, e esse
pótese de autodestruição, nas outras,
me parece o ponto central. Esse tipo
ainda que não impossível, parece me-
de Atlas que não suportou o peso do
nos objetivada. As posições corporais
mundo e, de qualquer forma, a ele se
dos personagens, momentaneamente
entrega no mais completo silêncio em
fragilizados, também indicam algo em
radical contraste com seu enorme bur-
comum entre eles. Além disso, as três
burinho, sem nenhuma manifestação
gravuras exploram de formas diferentes
de medo ou raiva, dor ou horror. Ele se
o movimento, mais precisamente a alta
deixa levar de roldão. O espaço ilumina-
velocidade, em contraste com as outras
do em torno de sua cabeça, lembrando
gravuras comentadas, com seus perso-
um travesseiro ou uma almofada, tan-
nagens em geral inertes. Elas também
to permitiria pensar estarmos diante
sugerem, para além do instantâneo que
de um sonho, ou melhor, pesadelo vi-
configuram, as sensações de antes e
sualmente materializado, como numa
depois da ocorrência registrada, elas
metáfora de alguém a quem o mundo
se dão no tempo, com a particular vi-
acordou com todo o peso do dia a dia.
bração temporal da segunda. Lembram
Um mundo encarquilhado cujas inci-
muito mais fotogramas do que foto-
sões e traçados lembram rachaduras
grafias, como as tirinhas das histórias
ou cicatrizes, que parecem formar algo
em quadrinho, de onde as três retiram
como um enorme continente que lem-
elementos para sua configuração (o
bra um coração de cabeça para baixo,
raio na primeira, os traços grossos da
esmagando o corpo nessa substância.
explosão na segunda, os indicadores
E, como na primeira das três gravuras
da velocidade do planeta na terceira,
comentadas, também rebobinamos os
como exemplos). E nelas a economia
momentos anterior e posterior ao ins-
de meios é total: superfícies vazias,
tante de registro escolhido.
desertas, onde se veem poucos ele-
São diversas e significativas as se-
mentos, um prédio, um monólito, um
melhanças entre as três gravuras. Elas
planeta, com seus personagens em si-
compõem uma série homogênea no
tuações-limite. Também comum a elas
conjunto, a melhor. E elas se unem por
a falta de dramaticidade com que se en-
representarem três instantes terminais
frentam as circunstâncias apresentadas,
36
há certa altivez nisso, ou alheamento,
que também predomina nos trabalhos
transcendência. E agora estamos bem
feitos por Norões, como visto. Nas três
longe do humor, da sensualidade e dos
litografias, no entanto, o resultado é
padrões de crítica das gravuras aborda-
diverso, ele pôde imprimir na pedra a
das anteriormente; aqui só há a estupe-
mesma velocidade que eventualmente
fação e a dimensão trágica das coisas.
pode ser encontrada em uma litografia
Por fim, principalmente dois pon-
abstrata. E tornar vivos seus persona-
tos possibilitam algumas reflexões: o
gens por registrá-los como que em um
movimento (velocidade) e o instante.
fotograma, não inertes ou posando
No amplo universo da gravura no Bra-
para a cena, mas figurados sem que
sil, não apenas da litografia, a recor-
disso pareçam ter consciência. Esses
rência quase sem exceções no campo
dois elementos são inesperados e
da figuração é a de situações e corpos
constituem contribuições interessan-
sem movimento, é a do mundo inerte
tes para a prática da litografia figurativa
e dos personagens parados em pose, o
entre nós.
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Os anos oitenta com Luiz Norões Vera Lins
O Luiz que eu conheci e com quem
dignidade iluminadora. Como Franz Bi-
vivi era fascinante, contraditório, inten-
berkopf, do romance de Doblin e do fil-
so, tanto na urgência de vida e obses-
me de Fassbinder, que ousam pensar e
são pela arte quanto na preocupação
pautar suas ações por seus princípios.
com a morte. Luiz amava o jazz, e o
Heróis de um tempo que cria rebanhos,
que arrancava de suas pinturas e da
parece que não cabem nos estreitos li-
vida se parecia com as notas de um pis-
mites do cotidiano, da cidade, do país e
ton – vinham arranhando com sangue
do tempo em que são forçados a viver.
a superfície, abrindo sulcos e inundan-
As imagens que estão nos dese-
do a tela com sons de dor, com a força
nhos, nas gravuras, aquarelas e pintu-
de alguma coisa selvagem e elementar,
ras de Luiz mostram essa estranheza
junto com o desejo atormentado de
e lembram Baudelaire, Kafka e Poe.
transcender o imediato, de buscar o
Escritores que lia e relia e que suas
que a vida não tem.
imagens evocam, numa afinidade de
Também a Luiz um anjo ao nascer
imaginação. E é essa imaginação livre
lhe disse “vai ser gauche na vida”. Des-
e sem freios, que ele mesmo num cer-
tino que partilhou com outros artistas,
to momento não conseguiu dominar, o
poetas e homens comuns que insisti-
que confere estranheza e força a suas
ram em manter uma postura na vida,
imagens. Com essa imaginação, que
que lhes trazia conflitos e tormentos.
ousa soltar e com ela refletir sobre a
Personagens trágicos, porque de uma
história da pintura e do desenho, Luiz
126
se colocava dentro de uma tradição
de História Natural, presente da madri-
artística universal. Acompanhava os
nha, com litografias do século XIX de
traços e o pensamento de um Chuh-
bichos, que lhe ajudavam a precisar os
-tah, de Delacroix, dos expressionistas
traços que imaginava. Luiz insistia, re-
alemães. Buscava afinidades como al-
começava sempre, com a força que o
guém que se perde na cidade para se
manteve pintando.
buscar, como diz Benjamin em Rua
Luiz vivia, apesar de muita coisa e,
de mão única. O que pensava, Luiz vi-
especialmente apesar da dor, na con-
via literalmente. Na Europa, queria se
tramão do que lhe acontecia. Porque
perder, em Amsterdã, em Veneza, em
tudo lhe acontecia, por uma disponi-
Paris. Abominava mapas, porque talvez
bilidade e uma porosidade às pessoas
fosse criando sua própria cidade, nos
e ao mundo. Ele fazia as coisas acon-
seus caminhos pelo ainda não nomea-
tecerem à sua volta e não precisava
do. A cidade desconhecida lhe dava a
ir longe. Sabia viver intensamente
metáfora da construção de possíveis
também o prazer – um corpo de mu-
caminhos contra um destino implacá-
lher, um dia de sol, uma conversa, um
vel que o perseguia, mas contra o qual
bom prato. Gostava de cozinhar, de
insistia em lutar. E como tinha força.
provar o que fazia. Passamos em to-
Conseguia sair de incêndios devasta-
dos os restaurantes do Rio, gastando
dores. Literalmente, nosso ateliê na rua
nossos últimos cruzeiros de cada mês.
Uruguaiana pegou fogo – em 86. Parte
Às vezes empenhávamos uma jóia de
de seus trabalhos, que iam para uma
família para viver esses momentos.
exposição, foram destruídos.
Aprendi com ele, que se desfazia com
Suas memórias incluíam imagens
a maior facilidade de jóias, de qual-
terríveis, que o assaltavam nos mo-
quer coisa, para viver com prazer, a
mentos de depressão. Mas, contra
me extasiar com esses instantes que
esses momentos, ele lutava, como en-
ele iluminava.
frentava o mar. Gostava de nadar, mer-
Porque tinha esperança, teve até
gulhando longe e voltando à praia com
certo momento. Esperança, que era
as ondas.
nostalgia de um lugar, de alguma coisa
Com essa força se mudou para
ainda não vivida e que o impelia para a
minha casa, trazendo sua prancheta,
vida, para ultrapassá-la. O que lhe dava
pincéis e tinta, e seus livros. Com essa
desprendimento para tentar tudo, ou-
mesma força, vendeu sua Enciclopédia
sar viver e pintar como um equilibris-
127
ta, no fio tensionado entre memória e
atenção. E, em Paris, se encantou com
futuro.
uma exposição de Claes Oldenburg,
Talvez por isso tivesse tanta consciência de que não ia viver muito. Era o que me respondia, quando lhe dizia que estava fumando demais.
cujos trabalhos lhe pareciam ter afinidades com os seus. Luiz precisava de certezas. Apesar da corporeidade que emprestava à sua
Devo a ele oito anos de momen-
pintura, trabalhava com sentidos, atua-
tos tensos e intensos, iluminados, que
lizando as perguntas irrespondíveis de
vivemos juntos, com a sensação de
Gauguin. Estava sempre além da pura
cúmplices, numa ação que tendia ao
imediaticidade e, talvez por isso, numa
fracasso, como um roubo a um destino
cena cultural em que domina um neo-
injusto, mas implacável.
positivismo, suas imagens parecem es-
Luiz gostava do cheiro da tinta a
tranhas, incomodam e fascinam.
óleo e dizia que queria morrer de cigar-
Foi Luiz que me apresentou aos de-
ro e terebentina. Dizia que sua pintura
senhos de Blake e Kubin e, ainda, a Ho-
e seu desenho eram prazer e tormen-
dler, que via e revia, como Turner, De
to, e sua proposta: “chegar a ver tudo”.
Chirico, Odilon Redon. Do Brasil, olha-
Gostava de ficar sentado, olhando a
va todos, mas insistia em Goeldi e seus
fumaça do cigarro, e de conversar, so-
ex-professores Roberto Magalhães e
bre a vida e sobre arte. Era apaixonado
Gerchman. Era leitor apaixonado de
pela história da pintura e, em particular,
poesia, mas preferia reler a procurar
pelo século XIX. Quando, em 87, fomos
um novo autor. Tinha suas escolhas –
à Europa, fizemos a rota dos museus
Baudelaire e os metafísicos, poemas
e vasculhamos tudo. Luiz se extasiava
de Nietzsche, Goethe, os fragmentos
diante das telas que, até ali, conhece-
de Novalis e, recentemente, Wallace
ra apenas de reproduções. Num clima
Stevens. Convivia com a ficção de Poe,
de reencontro, descobriu a casa de De-
Kafka e Borges.
lacroix, em Paris; em Amsterdã, a de
Luiz era um pintor sombrio, que de-
Rembrandt e, na Inglaterra, a região
testava a linha reta e o senso comum.
que Constable pintou. Luiz gostava de
Tentava resistir a partir de uma subje-
se perder nas ruas das cidades e ficá-
tividade irredutível e uma imaginação
vamos horas rodando nos labirintos de
delirante. Sua intuição lhe dava uma
Veneza: ele, armado de um bloco em
lucidez espantosa no cotidiano e um
que desenhava tudo que lhe chamava a
humor inesperado.
128
Em nossa viagem Ă Alemanha, fi-
leves. Foi a partir dessa imagem que
cou impressionado com os cobertores
trabalhou a gravura usada para o car-
de penas, que, embora agasalhassem
taz de Baal. Mas o mundo, como um
e fizessem um volume enorme, eram
cobertor de penas, nĂŁo lhe era leve.
129
Cronologia resumida LUIZ Antônio Rubano NORÕES Nasce no Rio de Janeiro em 15 de abril de 1954 Morre no Rio de Janeiro em 1o de setembro de 1989
1978/1981 – Estudos de desenho com Roberto Magalhães e Rubens Gerchman e de litogravura com Antônio Grosso na Escola de Artes Visuais do Parque Lage. 1978 – Expõe na coletiva Cotidiano e Expressão, na Escola de Artes Visuais do Parque Lage. 1979 – Expõe no 3o Salão Carioca de Arte e no 2o Salão Nacional de Artes Plásticas. 1980 – Expõe no Salão Comunitário de Artes Plásticas da UFF.
Expõe no 4o Salão Carioca de Arte.
Expõe Litografias, Sala Cecília Meireles.
Expõe no 3o. Salão Nacional de Artes Plásticas.
Exposição A Nova Geração, Galeria Funarte. 1981 – Faz sua primeira exposição individual na Galeria Andréia Sigaud.
Participa do 5o Salão Carioca de Arte.
1982 – Participa do Arteboi, II Salão de Montes Claros, MG. 1983 – Faz sua segunda exposição individual de desenhos na Galeria Macunaíma, Funarte, Rio de Janeiro.
Participa de Intervenção direta, artistas plásticos pelas diretas, Comitê Zona Sul, Ipanema, Rio.
130
1984 – Participa da exposição Como vai você, Geração 80?, na Escola de Artes visuais, Parque Lage.
Começa a dar aulas de desenho na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, atividade que exerce até sua morte, em 89.
É eleito membro da diretoria da ABAPP-Rio (Associação Brasileira de Artistas Plásticos Profissionais), para a gestão de 1984-1986.
1985 – Começa a pintar no ateliê coletivo Centro Rio, à rua Uruguaiana 25.
Participa da coletiva Velha Mania, na Escola de Artes Visuais, Parque Lage.
Participa da coletiva Por la liberacion, Palácio do Ingá.
Participa da Arte nos muros, Parque Lage.
1986 - Participa do 9o Salão de Artes Plásticas – Sudeste, Palácio das Artes, Belo Horizonte.
É premiado na 7o Mostra do Desenho Brasileiro, Museu de Arte Contemporânea do Paraná, Curitiba.
1987 – Viaja à Europa, às cidades de Munique, Veneza, Amsterdã, Paris e Londres e visita a Dokumenta de Kassel.
Participa da coletiva Território Ocupado, na Escola de Artes Visuais do Parque Lage.
Participa da coletiva Petrópolis Urgente, Petrópolis.
Começa um trabalho com a Escola de Teatro Martins Pena, realizando programação visual e cenografia da peça Luz nas trevas e Tambores na Noite, de Brecht, dirigidas por Luiz Fernando Lobo.
1988 – Faz sua primeira individual de pintura na galeria do Centro Cultural Candido Mendes de Ipanema, Rio de Janeiro.
Faz cenografia das peças Germania e Hamletmachine, de Heiner Müller, dirigidas por Gerard Dressel na Escola de Teatro Martins Pena.
1989 – Participa da coletiva O Mestre à mostra, Escola de Artes Visuais do Parque Lage.
Prepara uma série de quadros para exposição em galeria comercial.
Trabalho na cenografia, no cartaz e programa para a peça Baal, de Brecht, encenada pela Companhia de Encenação Teatral, sob a direção de Moacyr Góes.
Produz cartaz e programa para as peças Fausto e Os cegos, sob a direção de Moacyr Góes.
Suicida-se em setembro.
131
Póstumas 1989 – Mostra na Escola de Artes Visuais do Parque Lage em sua homenagem (setembro). 1991 – Exposição de quadros na mostra Dez anos da Galeria Candido Mendes, MAM.
Exposição de quadros na mostra Escola de Artes Visuais, Processo No 738765-2, MNBA.
1992 – Exposição individual de litogravuras na sala Carlos Oswald do Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro. 1999 – Exposição de litogravura no MNBA na Mostra Rio Gravura. 2002 - Exposição individual Entre o desenho e a pintura, de desenhos e pinturas no Museu Nacional de Belas-Artes, sala Chaves Pinheiro. Possui trabalhos nos seguintes acervos: Biblioteca Nacional (desenhos e litogravuras) Museu Nacional de Belas-Artes (quadro a óleo e litogravuras) Coleção George Kornis de litogravuras
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Revista Manchete, foto AntĂ´nio Ribeiro
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Texto de Reynaldo Roels Jr. Jornal do Brasil, 12/09/1989
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SOBRE AS OBRAS Gravuras – 50x70 cm Cristal, 1987, técnica mista sobre papel, 40x31cm, página 101. Homem e palmeira, 1989, óleo sobre tela, 100x110cm, página 122. Floresta, óleo sobre tela, 148x112cm, páginas 118-119. Floresta, óleo sobre tela, 102x93cm, página 116. Homem-bandeira, técnica mista sobre papel, 28x24cm, página 76. Floresta, 1989, óleo sobre tela, 100x90cm, página 117. Quarto, 1989, técnica mista sobre papel, 40x31cm, página 103 Sem título, óleo sobre tela, 149x143cm, página 115. Sem título, óleo sobre tela, 132x127cm, página 113. Sem título, óleo sobre tela, 123x116cm, página 112. Sem título, óleo sobre tela, 123x93cm, páginas 124-125. Sem título, óleo sobre tela, 125x120cm, página 110. Fogão, óleo sobre tela, 102x112cm, página 123. Mágico, óleo sobre tela, 102x100cm, página 109. Sem título, óleo sobre tela, 141x138cm, página 114. Violão, óleo sobre tela, 97x112cm, página 120. Sem título, técnica mista sobre papel, 40x31cm, página 98. Palhaço, óleo sobre tela, 102x103cm, página 108. Trem, 1987, óleo sobre tela, 144x141cm, página 111.
Um mundo construído sobre desproporções, onde tudo parece muito maior do que o homem. Temos a impressão de que os sentimentos escorregam pelas cores em pinceladas, como se houvesse o receio de perdê-los, irresistivelmente atraídos pelos tons escuros e, mesmo, pelas trevas. Como resistir? – perguntam essas telas. O cinza das brumas e das tardes em declínio arrasta-se ao negro, à interioridade absoluta, terrível, insuportável. Houve, no entanto, paixão, e força, enquanto possível. Fechamos os olhos e as pinturas de Luiz Norões permanecem em nós, parte de nós, existindo, traduzindo-nos. ISBN 978-85-5473-021-5 ISBN
978-85-5473-021-5
9 788554 730215
Ronaldo Lima Lins