Mehinaku: Design gráfico de um jogo de tabuleiro

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DESIGN GRÁFICO DE UM JOGO DE TABULEIRO

LUIS FRANCISCO BARONI COUTINHO FAAP – Fundação Armando Alvares Penteado São Paulo - 2009





LUIS FRANCISCO BARONI COUTINHO FAAP – Fundação Armando Alvares Penteado São Paulo - 2009

DESIGN GRÁFICO DE UM JOGO DE TABULEIRO

Trabalho de conclusão da graduação como parte obrigatória para obtenção do grau de Bacharel em DESENHO INDUSTRIAL com Habilitação em DESIGN GRÁFICO



Professores de TCC

Professor Mestre Carlos PERRONE Professora Mestre Maria CecĂ­lia CONSOLO Professor Doutor Miguel DE FRIAS Professor Paulo SAMPAIO

Professor Orientador

Professor Mestre Ivan BISMARA



Dedicat贸ria Aos amigos e amigas. Que tive, tenho e terei.



Agradecimentos

Agradeço primeiramente a Deus pela vida, e também aos meus pais pela criação e construção do meu caráter. Obrigado por terem me dado a oportunidade de cursar esta faculdade. Ao Ivan Bismara, por ter aceito meu pedido de Orientação e por ter sido muito mais que um professor; à Cecília Consolo e ao Carlos Perrone, pela instrução na parte mais crucial do trabalho (a decisão e a pesquisa); aos professores Miguel Farias e Paulo Sampaio, por terem me orientado pelo longo e tortuoso caminho até a realização do produto final. Não posso deixar de agradecer também a todos os outros professores que fizeram parte da minha formação durante todo o curso. Aos amigos e amigas da sala: Ana Sensual, Aninha, Carlinha, Carlão, Carol, Dina, Fuschini, Sano, Fê, Joãozinho, Gabi, Zé, Ney, Ki, Lui, Mana, Mari Gonçalo, Mary, Pedro, Rô Frugoli, Digão e Talita. E a todos os outros, que surgiram no decorrer destes quatro anos de faculdade. Vocês marcaram minha vida e estarão sempre em minha memória. Agradecimentos especiais ao Antonio Marcelo, que foi extremamente importante para a criação da mecânica do jogo; ao Pedro Vergani, pois sem suas ilustrações, este trabalho não teria alcançado tal nível de qualidade; à Aninha, Sano e Zé por ajudarem em um momento difícil do projeto; à Bruna Piovesan, por ter revisto e colaborado na parte textual deste projeto; à Paty Trajano, que se dispôs a “pôr a mão na massa”, pintando centenas de cubinhos e peões com a maior boa vontade e alegria; e à Má Ferreira, sempre muito paciente, e que representa todas as pessoas que, além de terem me suportado neste período de TCC, foram essenciais ao me incentivar nos momentos em que pensei em desistir. Beijos e abraços, amo todos vocês. E que venha o Canadá!



Palavras Chaves

Design GrĂĄfico, Eurogame, IndĂ­gena, Jogo de Tabuleiro, Mehinaku, Xingu

Keywords

Graphic Design, Eurogame, Indigenous, Board Game, Mehinaku, Xingu



RESUMO

“Mehinaku: Design gráfico de um jogo de tabuleiro” é o resultado de uma extensa pesquisa sobre a história, essência, qualidades e as várias categorias de jogos de tabuleiro presentes no mercado atual, visando a criação de um jogo de tabuleiro de acordo com padrões internacionais, porém usufruindo de uma temática nacional. Assim, com o apoio de uma pesquisa sobre o tema escolhido, Xingu, e as expressões artísticas dos índios desta região, foi possível criar um conjunto de referências temáticas, visuais e conceituais para o desenvolvimento gráfico e mecânico do jogo, e de todos os seus componentes aqui apresentados.



ABSTRACT

“Mehinaku: Design gráfico de um jogo de tabuleiro” is the result of an extensive research about the history, essense, qualities and categories of boardgames available in contemporary industry, aiming for the development of a board game in accordance to international standards, but usufructing of a national theme. Thus, with the help of a research about the chosen theme, Xingu, and the artistic expressions of the indians from this region, it was possible to create a group of thematic, visual and conceptual references to the game’s graphic and mechanic development, and all of its components presented here.



O processo criativo deste trabalho estรก divulgado na internet. Visite: http://tcc.lfportfolio.com Caso prefira, utilize o QR CODE acima para ir direto ao site.


mehinaku: 99 das ideias aos layouts

introdução 22 COntexto lúdico 25 TABULeIRO: A permanência de um jogo milenar 35 O que é Jogo? O jogo e a cultura classificando-os Breve história dos jogos de tabuleiro jogos de tabuleiro e suas qualidades O VALOR DO DESIGN E da arte nos jogos de tabuleiro O Retorno do tabuleiro REFERÊNCIAS IMAGÉTICAS

36 42 46 54 60 68 72 76

o Xingu e seu vocabulário visual 79 o Parque Indígena do Xingu 80 VOCABUlário visual indígena 84

Resultado das análises 95

100 102 110 118 128 132 138 142 146 148

criando o jogo elementos textuais e universo cromático elementos simbólicos a embalagem o tabuleiro as cartas dados: do real ao virtual livreto de regras outros componentes produção gráfica

151 considerações finais 155 anexos 156 jogo de tabuleiro se renova, volta à moda e ganha mercado 160 entrevista: reiner knizia

167 bibliografia 168 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 169 REFERÊNCIAS não BIBLIOGRÁFICAS

171 Índice imagético


Sumรกrio


Introdução


INTRODUÇÃO PORQUE REALIZAR ESte trabalho? O objetivo deste trabalho é expandir o conhecimento preexistente sobre jogos de tabuleiro, e adquirir conhecimento a respeito da linguagem visual existente na cultura indígena, tendo em vista o projeto final que deverá ser um jogo de tabuleiro com esta temática. Sempre admirei e desejei fazer meu próprio jogo de tabuleiro. Ao me aprofundar mais no mundo dos Jogos de tabuleiro, descobri os eurogames, também conhecidos como designer games. Buscando estes jogos no mercado nacional, percebi que eles praticamente não existiam aqui no Brasil, e isso me motivou a realizar o meu TCC sobre este tema. Estes jogos possuem algumas características que diferenciam dos demais jogos de tabuleiro, sendo que a maioria é direcionado ao público adulto e grande número dos compradores está na faixa dos 20-25 anos. O mais importante para estes jogos não é o tema e sim outros fatores, como por exemplo, o designer, a estratégia envolvida e seus componentes. Hoje, são raras as leituras disponíveis em português sobre os jogos não eletrônicos. Então muito foi pesquisado em inglês, e o que precisou ser traduzido foi de minha própria autoria. Depois de decidir fazer um jogo de tabuleiro veio a pergunta: Sobre o que será meu jogo?

Então, buscando possibilidades temáticas me deparei com o Xingu. O tema era desconhecido para mim. Mas pesquisando gostei muito do que encontrava, e percebi o potencial gráfico que o tema poderia agregar ao jogo. Então, escolhi o Xingu como tema do jogo. Assim a pesquisa elaborada ficou com duas vertentes. A primeira abordando os jogos, passando brevemente pela história e pesquisando sobre sua interação, particularidades, mercado, categorias e tudo mais de interesse para o projeto. (É importante afirmar que nesta pesquisa foram excluídos os jogos de azar, visto que eles estão numa esfera além da diversão e socialização, buscando outros valores discutíveis.) A segunda é o conhecimento da linguagem visual presente nas tribos indígenas, levantando referências iconográficas que possam ser aproveitadas no trabalho de forma a torná-lo esteticamente integrado ao tema do jogo. Com a pesquisa então busquei coletar e organizar dados para poder realizar meu jogo satisfatoriamente, e com ele trazer e divulgar um estilo de jogo desconhecido pela grande maioria no Brasil. Quem sabe, resgatando uma tradição que um dia existiu e que foi abandonada por muitos: os Jogos de Tabuleiro.

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CONTEXTO lÚDICO


Por que um jogo de tabuleiro se hoje o universo tende ao virtual? Qual o sentido?


CONTEXTO LÚDICO 
“A nossa percepção é a de que games não substituem os jogos. São um complemento. Não houve queda nas vendas, elas ainda são impressionantes. Jogos são os brinquedos que menos sofrem com web e games”, garante Tilkian.

Por que teatro com tantos cinemas? Responder perguntas com outras perguntas pode parecer uma forma de não querer responder ou tentar se esquivar destas, porém neste caso há um histórico que nos remete a uma linha de pensamento errônea que surge sempre que uma mídia ou meio de comunicação é lançado. Assim que as primeiras experiências cinematográficas surgiram, foi dito que o teatro acabaria. Depois, com a televisão, foi a vez do cinema ser alvo de insinuações. Agora, eu pergunto: O teatro acabou? E o cinema? Com os jogos de tabuleiro acontece o mesmo. Mário Seabra costuma falar que aquele que diz e prevê a substituição dos jogos de tabuleiros pelos eletrônicos estará caindo na mesma armadilha ideológica. O mercado de jogos eletrônicos é de fato muito maior que o de jogos de tabuleiro, chegando a vender nos EUA $21 bilhões1 contra $794 milhões2 dos jogos de tabuleiro. Porém, ao fazer uma análise mais aprofundada, é possível observar que os jogos de tabuleiro não só não acabarão como também é possível notar que, nos últimos anos, vem ocorrendo o crescimento deste mercado. Carlos Tilkian, presidente da Brinquedos Estrela, em matéria para a seção diversão do site Abril.com3, afirma que os jogos nunca saíram de moda e que a concorrência com videogames e web parece não abalar o setor. De acordo com ele, jogos de tabuleiro formam a categoria que mais cresceu dentro do segmento de brinquedos em 2008.

1

MSNBC - 15/01/2009 Video game sales top $21 billion in 2008

2

Bloomberg News - 13/02/2009 - 00:01 Monopoly, Candy Land May Offer Refuge to Families in Recession

No caso do mercado estrangeiro de jogos de tabuleiro a resistência ainda vai além. E se tomarmos como exemplo o jogo de tabuleiro “Settlers of Catan” teremos certeza disso. Desde sua introdução no mercado, o jogo se tornou fenômeno, foi traduzido em mais de 30 línguas e vendeu mais de 15 milhões de cópias. Comparando com o jogo de videogame considerado megahit e sucesso mundial “Halo 3”, veremos que este vendeu apenas pouco mais que a metade das vendas do Catan. Jay Tummelson presidente da Rio Grande Games vendeu meio milhão de títulos em 2008.

“Estamos crescendo cerca de 30 a 35 porcento ao ano.” afirma ele em matéria para a revista Wired4. “Nos EUA, a maioria dos meus clientes este ano não eram clientes há dois ou três anos atrás. Eles não sabiam que estes jogos existiam.”

3

Abril.com - 20/01/2009 - 08:25 Jogos de tabuleiro ganham novas versões e viram pretexto para balada diferente em SP

4

Revista Wired - 17.04 | Abril 2009 Monopoly Killer: Perfect German Board Game Redefines Genre

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MÁRIO SEABRA

Nascido em Lisboa em 1931, deixou sua carreira na publicidade em Portugal e se tornou pioneiro na criação de jogos no Brasil. Seu nome é reconhecido e respeitado entre todos criadores de jogos no Brasil. Entre suas publicações destacam-se jogos como War 2, Bot, Ecologia, RPM e Viajando Pelo Mundo

Settlers of Catan

Desenvolvido por Klaus Teuber e publicado em 1995 por Kosmos. Jogo responsável pelo grande recall aos jogos de tabuleiro, sendo considerado a Mona Lisa da renascença dos jogos de tabuleiro. Inaugurou a categoria dos jogos modernos conhecidos como “eurogames”.


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CONTEXTO LÚDICO STEVE MERETZKY

Atualmente Designer Sênior na Blue Fang Games, é considerado uma lenda e coleciona diversos prêmios e títulos, entre eles a nomeação como um dos 25 “deuses” da indústria dos jogos eletrônicos e um BAFTA™ (Britsh Academy of Film and Television Arts) pelo seu trabalho em “O Guia do Mochileiro das Galáxias”

WORLD OF WARCRAFT: THE BOARD GAME

Desenvolvido por Christian T. Petersen e Eric M. Lang e publicado em 2005 pela Fantasy Flight Games

AGE OF EMPIRES III: THE AGE OF DISCOVERY

Desenvolvido por Glenn Drover e publicado em 2007 pela Tropical Games

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Ao analisar também as vantagens dos jogos de tabuleiro sobre os eletrônicos, fortalecem-se as evidências de que não há a possibilidade de substituição, pois os jogos eletrônicos não conseguem ser superiores em todos os aspectos. Hoje, com toda a tecnologia existente é possível jogar com um adversário do outro lado do planeta. Mas a interação é artificial e ainda incapaz de substituir a presença física e a comunicação gerada em uma partida de jogo de tabuleiro. E é exatamente esta comunicação que fortalece um dos pontos mais fortes do tabuleiro: a socialização. O livro “Brinca Comigo!”5 aponta uma característica peculiar desta socialização: jogos de tabuleiros são bem aceitos entre jogadores das mais diversas idades. Desta forma, é comum ver jogos em família misturando várias gerações em uma mesma mesa. Mas quando foi a última vez que você viu um neto jogando videogame com seu avô? Em relação à criatividade envolvida nos jogos de tabuleiro é importante observar que, ao contrário dos jogos eletrônicos, com gráficos e imagens de última geração na tela, no tabuleiro as imagens são criadas no pensamento e na imaginação de cada jogador. Para um apreciador de jogos de tabuleiro, pequenos pinos e peões têm o mesmo valor que os personagens construídos com o maior número possível de polígonos dos videogames. Steve Meretzky realça essa ideia de criatividade nos jogos de tabuleiro quando escreve em seu artigo “What We Could Learn From Board Games”6 que nos jogos de tabuleiro há a possibilidade de viver diversos personagens como um xerife no velho oeste,

Brinca Comigo! Zatz, Silvia; Zatz, André e Halaban, Sérgio. Editora Marco Zero, 1a. Edição 2006. ISBN 852790408

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What We Could Learn From Board Games Artigo publicado por Steve Meretzky no site Gamedaily.com em 20 de Fevereiro de 2007

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um negociante de obras modernas, um magnata das ferrovias... Já nos games, ele é sempre um soldado ou um guerreiro em diferentes contextos, mas na grande maioria das vezes continua sendo um soldado ou guerreiro. Para concluir voltemos à pergunta do título:

Por que um jogo de tabuleiro se hoje o universo tende ao virtual? Qual o sentido? De acordo com a terceira edição da pesquisa “O Futuro da Mídia”7, que ouviu cerca de 9 mil pessoas sendo 1.022 no Brasil, o Brasil apresenta crescimento em termos de consumo de mídia, sendo que os consumidores gastam 82 horas por semana utilizando diversos tipos de mídia e tecnologias de entretenimento. 81% consideram o computador um meio de entretenimento mais importante que a TV, e 58% deles disseram que videogames, jogos no computador e online são importantes fonte de entretenimento. Então os jogos de tabuleiros se apresentam como uma ótima ferramenta para a socialização e integração das pessoas em um momento onde elas estão cada vez mais passando seu tempo em frente a telas e monitores. Desta forma os jogos eletrônicos não substituirão os jogos de tabuleiro. Eles coexistirão e muitas vezes se integrarão. Prova disso são títulos como “World of Warcraft” e “Age of Empires III: The Age of Discovery” que nasceram no meio virtual e posteriormente foram adaptados para o tabuleiro, e títulos de tabuleiro como “Carcassone” e “Settlers of Catan” que receberam suas versões para videogames.

O Futuro da Mídia Pesquisa realizada pela empresa de consultoria Deloitte



Por que existem no exterior e não aqui? Questão econômica ou comportamental?


CONTEXTO LÚDICO O fato de não existirem tantos jogos de tabuleiros adultos no mercado brasileiro não chega a ser uma questão econômica ou comportamental, e sim uma questão da mentalidade formada entre os fabricantes nacionais de que os brinquedos são produtos destinados a crianças. Os jogos de tabuleiro tiveram seu auge no Brasil na década de 80, época que foram lançados uma grande variedade de títulos para todos os públicos, sendo que alguns existem até hoje no mercado. Hoje em dia porém, existem algumas poucas tentativas de explorar a parcela adulta do mercado, mas para não correr o risco de sofrer com grandes prejuízos, opta-se por lançar produtos com acabamento duvidoso demonstrando a falta de compromisso com o este público. Um exemplo é o “Jogo dos Conquistadores” e o “Transport” ambos da Estrela, muito criticado pelos jogadores devido a baixa qualidade das cartas, dados tortos e peças que faltaram. Fato que pode ser confirmado ao lermos os comentários dos clientes insatisfeitos no fórum do site “Ilha do Tabuleiro”, onde devido ao grande número de reclamações o gestor de atendimento da Estrela se cadastrou no fórum para tomar conhecimento das falhas e encaminhar aos seus superiores.

“O Brasil, diferentemente de países europeus, não tem um longo e rígido inverno que obrigue as pessoas a ficar mais tempo em casa”, explica Aires Fernandes, diretor de marketing

8

Veja São Paulo - 06/09/2006 Seguuuura o peão!

da Estrela em matéria para a revista Veja São Paulo8.

“Como a procura não é tão grande, lançamos apenas de dois a quatro jogos desse gênero por ano.” Ao fazer um comparativo com a Europa, principal pólo de jogos de tabuleiro, pode-se notar que a situação é totalmente contrária, pois a maioria dos produtos é direcionado ao público mais adulto e grande número dos compradores está na faixa acima de 25 anos. São os famosos “Eurogames”, e ao contrário do Brasil, o mais importante para estes jogos não é o tema e sim outros fatores, como por exemplo, o designer. Daí o outro nome pelo qual são conhecidos: “Designer Games”. Na Alemanha, grande produtora destes jogos e tida como a “Meca” dos jogos de tabuleiro, acontecem premiações que são consideradas os “óscares” do tabuleiro: “Spiel des Jahres” e “Deutscher Spiele Preis”, e também um evento que já chegou a reunir mais de 150.000 participantes, o “Internationalen Spieltage SPIEL”. Apesar de tudo, estamos entrando numa época bastante oportuna para o lançamento de jogos de tabuleiro adultos no Brasil, pois começa a existir uma demanda por estes. Segundo o criador do site “Ilha do Tabuleiro”, já são mais de 4500 usuários cadastrados em 2 anos, milhares de visitas diárias, 18.984.081 visitas em 2008 e média de 20 novos usuários por dia. Por falta de oferta, algumas pessoas importam os jogos do exterior. Outros

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ILHA DO TABULEIRO

Maior portal nacional sobre jogos de tabuleiro, com acervo no formato contributivo com a finalidade de compartilhar conhecimento, cultura, notícias, curiosidades, novidades e lançamentos

EUROGAMES

Jogos de tabuleiro modernos baseados na estratégia. Dependem minimamente da sorte, têm poucas regras porém desenvolvidas e propiciam bastante interação


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CONTEXTO LÚDICO RPG

Role Playing Games - Jogo colaborativo onde cada jogador assume e interpreta o papel de seus personagens de acordo com regras de um sistema predeterminado. Não há ganhadores ou perdedores e este é o grande diferencial deste jogo

ARTE MODERNA

Desenvolvido por Reiner Knizia e publicado em 1992 por Hans im Glück. A versão nacional de Arte Moderna produzida pela Odysseia foi ilustrada pelo designer Myke Doyle, sendo considerada internacionalmente como a edição mais bela do jogo.

porém, por não terem acesso, fazem algo que nos remete à época em que apreciadores de RPG tiravam fotocópias de livros importados reproduzindo os jogos de maneira quase artesanal e recorrendo a recursos de editoração, gráficas rápidas, tornearia de peças, etc. São os chamados “Homemades” ou “Jogos Caseiros”. Portanto, se analisarmos os fatos, estes jogos não existem aqui pela falta de investimento e de iniciativas por parte das grandes empresas ainda sujeitas a uma visão míope e pouco empreendedora. Hoje, o pouco que é investido em projetos adultos está na mão de pequenas empresas que estão trazendo jogos de qualidade europeia como uma tentativa de expandir este mercado.

Quem publicaria O projeto? Por que? No Brasil, três empresas poderiam vir a publicar o projeto: Devir, Ceilikan e Odysseia. Dentre essas, a Devir é a mais antiga e presente no mercado de jogos adultos. A expansão deste mercado começou em 1987 com o aumento da demanda de histórias em quadrinhos e logo a empresa resolveu importar também revistas e livros sobre arte, desenho e principalmente RPG. O RPG tornou-se responsável pelo sucesso da empresa, e a empresa responsável pelo sucesso e expansão do RPG no Brasil, sendo que a partir

de 1990 já traduzia e publicava seus livros. Recentemente a empresa começou a importar alguns poucos jogos de tabuleiro, mas suspendeu o serviço temporariamente devido aos altos custos de impostos que chegavam a 70% do valor. Segundo relatos no site “Ilha do Tabuleiro”, muitos admiradores continuam perguntando o que ocorreu e pedindo para que voltem com a importação. Isso evidencia que há uma busca por jogos de tabuleiro na empresa, justificando a produção nacional que teria custos mais baixos e atenderia a demanda, quem sabe até repetindo a história que aconteceu com os RPG’s nos anos 90, agora com os jogos de tabuleiro. Já Ceilikan e Odysseia são as únicas empresas nacionais que se dedicam a produzir eurogames, porém a opção de jogos é mínima visto que seus produtos são versões nacionais de jogos consagrados na Europa - o que envolve o pagamento de licenças e direitos autorais para a execução dos mesmos. Em seu site, a Odysseia Jogos Adultos diz se empenhar em suprir a lacuna existente nos jogos de tabuleiro no Brasil, porém até o momento apenas o jogo “Arte Moderna” de Reiner Knizia está a venda. Pensando no mercado exterior, há diversas empresas publicando jogos deste gênero. Entre as mais famosas podemos citar: Days of Wonder, Fantasy Flight Games, Mayfair Games, Rio Grande Games, Z-Man Games. Todas essas empresas publicam jogos de excelente qualidade e são referência no mercado, da mesma maneira seus jogos foram referências para este trabalho.


Por que existem no exterior e não aqui? Questão econômica ou comportamental?

QUAL SERIA O PERFIL DO USUÁRIO? Um aspecto muito importante dos jogos de tabuleiro é a democracia em relação aos usuários. Não é raro ver, em uma mesa de jogo, diversas gerações interagindo juntas. Hoje é mais comum esses jogos serem destinados aos jovens e adultos, porem mesmo aqueles que são criados para as crianças muitas vezes fazem a diversão dos adultos. Os Eurogames, por exemplo, costumam ter explicitado em suas embalagens uma faixa etária de 12 ou mais anos de idade, porém o público efetivo costuma ser mais adulto, visto que esses jogos envolvem muito raciocínio e estratégia. Desse modo, o perfil do usuário pode ser definido como: adultos na faixa acima de 20 anos, apreciadores de jogos de tabuleiros modernos, de bom poder aquisitivo e sem distinção de sexo. π

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tabuleiro: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR


O QUE É JOGO?


TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR A forma mais simplória de explicar o que é um jogo, é dizer que este é uma atividade estruturada, normalmente utilizado para diversão e às vezes como uma ferramenta educativa. Possuem elementos chave como objetivos, regras, desafios e interação. E envolvem estimulação mental ou física, ou às vezes ambas. Mas seria o jogo algo tão simples assim? É comum prontamente associarmos jogos como sendo coisa de criança. Tal fato, porém, nos faz perder toda a riqueza e profundidade existente no jogo. Para muitos pesquisadores do assunto, o jogo vai muito além de uma mera atividade com a finalidade de diversão, sendo algo primordial na existência humana. Johan Huizinga seria talvez o nome mais influente no estudo dos jogos. Para ele, existe no jogo algo “em jogo” que transcende as necessidades imediatas da vida e confere um sentido à ação. Ele define o jogo como uma categoria absolutamente primária da vida, tão essencial quando o raciocínio (Homo sapiens) e a fabricação de objetos (Homo faber), assim a denominação Homo ludens, quer dizer que o elemento lúdico está na base do surgimento e desenvolvimento da civilização. Huizinga nos descreve ainda algumas características fundamentais do jogo. A primeira é que o jogo é uma atividade voluntária. É possível em qualquer momento adiar ou suspender um jogo. A segunda característica é que o jogo trata-se de uma evasão da vida real para uma esfera temporária de atividade com orientação própria. Dentro do jogo somos diferente e realizamos coisas diferentes. O jogo acontece dentro

de certos limites temporais e espaciais, sendo que, a limitação espacial é muito mais evidente. Esse espaço, ou círculo magico como ele mesmo descreve, é um campo previamente delimitado seja de maneira material ou imaginária onde determinadas regras são respeitadas. Outra característica fundamental ao jogo seria a ordem. A partir do momento em que a ordem é desobedecida, o jogo é estragado e perde o seu valor. Assim todo jogo tem regras que determinam o que é válido dentro do mesmo, e aquele que desrespeita priva o jogo da ilusão - palavra que significa literalmente “em jogo” (inlusio, illudere ou inludere). Além de tudo isso, Huizinga afirma que no jogo há uma tendência de ser belo. Prova disso seria que as mesmas palavras que empregamos pra descrever um jogo são utilizadas para se referir aos efeitos da beleza: tensão, equilíbrio, compensação, contraste, variação, solução, união e desunião. Assim, o jogo possui duas das qualidades mais nobres presentes no mundo: o ritmo e harmonia. Mas de certa forma, o elemento mais fundamental para um jogo seria a tensão. Quanto mais presente é a tensão no jogo mais competitivo este será e provavelmente mais apaixonante para quem joga. Essa tensão quando chega ao extremo tem como resultado os jogos de azar, no qual tudo está entregue a sorte e a aleatoriedade. Portanto, com as próprias palavras de Johan Huizinga:

JOHAN HUIZINGA

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Professor e historiador holandês nascido em Groningen, Países Baixos, especialista holandês em línguas e literaturas hindus e estudioso das transformações culturais. Conhecido por seus trabalhos sobre a última etapa da Idade Média, a Reforma e o Renascimento, durante sua atividade como intelectual construiu uma reputação por toda a Europa.


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TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR “O jogo é uma atividade voluntária exercida dentro de certos e determinados limites de tempo e espaço, segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e alegria e de uma consciência de ser diferente de vida cotidiana.”

Comparando algumas definições: David Parlett
 David Parlett é um historiador de jogos que escreveu extensamente sobre jogos de cartas e de tabuleiro. Parlett possuía um ceticismo a respeito da habilidade para se definir jogo. 
Porém, arrisca defini-los começando por distinguir jogos formais dos informais.

• Fins: O fato de o jogo forma ser uma disputa com um ponto final e um objetivo.

• Meios: O aceite à regras e aos materiais com os quais se ganha a disputa.

Clark C. Abt
 Em seu livro “Serious Games”9, Clark C. Abt propõe a seguinte definição: 
“Reduzido para sua essência formal, um jogo é uma atividade entre duas ou mais pessoas que tomam decisões tentando alcançar seus objetivos em um contexto limitador.” A definição de Abt nos dá um entendimento de jogo que enfatiza a o papel dos jogadores no jogo. Quatro termos chaves que ele destaca são: • Atividade: o jogo é uma atividade, processo ou evento. • Tomam decisões: jogos requerem que os jogadores tomem decisões constantemente. • Objetivos: Jogos possuem objetivos.

“Um jogo informal é um jogo indireto, ou simplesmente brincar, como quando as crianças ou filhotes brincam na grama de cair.” Ele contrasta esse tipo de atividade com o o jogo formal, que seria uma estrutura dupla baseada em fins e meios:

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Serious Games Clark C. Abt. Viking Press, 1a Edição - 1970. ISBN 0670634905

• Contexto limitador: Há regras que limitam e estruturam a atividade do jogo.

Johan Huizinga Em 1938, O historiador Johan Huizinga publicava “Homo Ludens”10, hoje considerada uma das obras de filosofia


O QUE É JOGO? mais importantes do séc. XX. Até hoje, é um dos estudos mais completos sobre jogos, no qual Huizinga afirma que o jogo:

• Isolado: circunscrito em limites de tempo e espaço, previamente definidos e fixados. • Incerto: o curso de tal não pode ser determinado, nem o resultado alcançado de antemão, e alguma latitude para inovações são deixadas para iniciativa do jogador.

• Está fora da vida real. • Não é sério. • Totalmente envolvente. • Não está associado com interesse material ou ganhos. • Acontece dentro de limites temporais e espaciais.

• Improdutivo: não cria bens, nem riqueza, nem novos elementos do tipo; exceto pela troca de propriedades entre os jogadores, o que termina com uma situação idêntica à que prevalecia no começo do jogo.

• Cria grupos sociais que os separam do mundo exterior.

• Governado por regras: sob as convenções que suspendem leis ordinárias, e no momento estabelece nova legislação, que contam sozinhas.

Roger Caillois

• Que faz acreditar: acompanhado de uma consciência especial de uma segunda realidade ou de uma irrealidade livre, em contraste com a vida.

• Procede de acordo com regras.

Na década de sessenta, expandindo o trabalho de Huizinga, o sociólogo francês Roger Caillois publicou “Man, Play, and Games” 11, um livro que em vários aspectos é uma resposta direta ao Homo Ludens de Johan Huizinga. Caillois apresenta a sua definição de jogo como algo:

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• Livre: no qual o jogo não é obrigatório; se fosse, perderia toda a atração e sua qualidade de divertimento.

Homo Ludens Huizinga, Johan. Editora Perspectiva, 1a Edição - 2007. ISBN 8527300753

11

Man, Play and Games Caillois, Roger. Free Press, 1a Edição - 1961. ISBN 025207033X

Analisando estas quatro definições, podemos perceber que, apesar de cada um ter sua visão própria sobre o que é um jogo, todos concordam no aspecto que para existir um jogo é inevitável que existam regras. Parlett e Abt concordam também, ao contrário de Huizinga e Caillois, que existirá no jogo um objetivo e/ou resultado a ser alcançado. Porém quem está certo e quem está errado? Se prestarmos atenção, perceberemos que as definições não se contradizem. Seria então mais apropriado afirmar

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TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR que todos, de certa forma apontam características reais, e que suas respostas se completam devido à complexidade oculta por trás de um jogo. Juntando então estas afirmações, temos algo como: uma atividade, processo ou evento representativo, despretensioso, incerto, irreal, e envolvente, no qual pessoas voluntariamente tomam decisões orientadas à resoluções de um conflito de acordo com regras que os limitam para alcançar um objetivo, sem criar bens ou recursos. π

PARLETT Procede de acordo com regras que limitam os jogadores Conflito ou competição Orientado à objetivo / Orientado à resultados Atividade, processo ou evento Envolve tomada de decisões Despretensioso, e envolvente Nunca associado com ganho material Artificial / Seguro / Fora da vida real Cria grupos sociais especiais Voluntário Incerto Faz acreditar / Representação

ABT

HUIZINGA

CAILLOIS



O JOGO E A CULTURA


TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR “É no jogo e pelo jogo que a civilização surge e se desenvolve” - Johan Huizinga Para Johan Huizinga, o jogo é mais antigo do que a cultura, pois quando falamos em cultura sempre pressupomos a sociedade humana. Porém, os animais não precisaram que os homens os iniciassem na atividade lúdica. Assim, o jogo marca e acompanha a cultura desde suas origens até a civilização em que nos encontramos, e o espírito de competição lúdica enquanto impulso social, é mais antigo que a cultura. O ritual é originário do jogo sagrado, a poesia nasce do jogo e nele se nutre, a música e a dança é puro jogo, e em todos os processos culturais o jogo está ativamente presente. Então, Huizinga nos diz que a cultura não nasce do jogo como um recém nascido que se separa do corpo da mãe. A cultura surge no jogo e enquanto jogo, para nunca mais perder este caráter. Apesar das várias justificativas para considerar jogos como cultura, necessitamos ir além das barreiras do “círculo mágico” para observar como os jogos interagem com os contextos que se encontram fora das regras e da jogabilidade do jogo em si. Huizinga chama de “círculo mágico” o ambiente do jogo, o espaço onde existem as regras e elas são respeitadas. Este “círculo mágico” porém está inserido dentro de um ambiente maior. Uma esfera cultural. Os Jogos sempre são jogados em algum lugar, por alguém, por alguma razão ou por outra. Eles existem em outras palavras em um ambiente cultural. Existem

muitas definições para cultura, e a maioria envolvem diretamente, ou indiretamente, o que as pessoas pensam, fazem e produzem. No caso dos jogos, cultura é tudo que existe exterior ao contexto onde ocorre o jogo. Quando finalmente entendemos o jogo como uma representação cultural, estamos considerando-o um texto cultural. O que significa que podemos interpretar o jogo da mesma forma que podemos fazer uma análise cultural e antropológica. Então como os jogos e a cultura se relacionam? Talvez uma das primeiras pessoas a relacionar os jogos com a cultura foi o rei Afonso X, de Leão e Castela, também conhecido como Afonso X, o Sábio. Afonso se preocupava com tudo relacionado à cultura. Promoveu uma grande troca de informações entre oriente e ocidente, juntando conhecimentos cristão, muçulmanos e judaicos, e viu os jogos como uma importante forma de manifestação cultural. Entre 1251 e 1283 concebeu o “Libro de los Juegos” que possuía 98 páginas ilustradas e coloridas sobre jogos de tabuleiro, e que hoje é considerado um dos mais importantes documentos históricos para pesquisas sobre jogos de tabuleiro. Ainda durante o Século XIII, em plena idade média, Afonso legou à posterioridade um testemunho de que os jogos são um patrimônio cultural de toda a humanidade, uma manifestação universal do gênio criador do homem, independentemente de fronteiras políticas ou culturais.

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REI AFONSO X, DE LEÃO DE CASTELA

Afonso X, o Sábio ou o Astrólogo , foi rei de Leão e Castela de 1252 a 1284, e ainda imperador eleito do trono do Sacro Império Romano-Germânico, ainda que nunca tenha exercido o cargo. Durante seu reinado, fortaleceu as atividades culturais a diversos níveis.

LIBRO DE LOS JUEGOS

Libro de los Juegos, ou Libro de acedrex, dados e tablas, foi encomendado pelo rei Afonso X, durante o século XIII sendo completado em 1283. O livro contém as primeiras descrições conhecidas de alguns jogos, incluindo muitos jogos importados dos reinos árabes.


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TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR WAR ON TERROR

Criado por Andrew Sheerin e Andrew Tompkins, War on Terror tem como objetivo de jogo livrar o mundo do medo e terrorismo para sempre. Naturalmente, apenas os maiores e mais fortes estão à altura da tarefa e então uma certa quantidade de poder precisa ser provado. Alternativamente, você pode jogar como os terroristas, lutando contra um mundo sem impérios.

Da mesma forma que existem semelhanças entre os ritos, cultos e mitos das diversas religiões existentes, os jogos antigos também possuem muitos pontos em comum, o que torna possível considerá-los uma criação coletiva de todos os homens em diferentes épocas. Muitos desses jogos são nada mais são do que reminiscências de rituais mágicos e religiosos. Os dados como elemento dos jogos, por exemplo, são descendentes dos astrálagos, búzios e outros objetos que adivinhos jogavam para prever o futuro. Da mesma forma, as cartas eram muito utilizadas como instrumento para predição do futuro. Essas são algumas das evidências que os jogos sempre estiveram ligados à vida social assim como a religião, artes e outras manifestação cultural. Portanto é correto afirmar que todos os jogos refletem a cultura, reproduzindo aspectos de seus contextos culturais. Podendo ser considerado verdadeiros espelhos de uma cultura ou sociedade. Embora a estrutura de um jogo tende a permanecer imutável, suas regras, peças, figuras o outros símbolos podem sofrer mudanças que são determinados pelos acontecimentos de uma determinada época. Durante a era Napoleônica, por exemplo, o rei branco do xadrez foi substituído por uma miniatura do próprio imperador francês. Há também uma lenda de que um rei croata preso em Veneza adquiriu a liberdade jogando três partidas de xadrez com o seu carcereiro, e por isso a bandeira e o brasão de armas da Croácia seria o tradicional xadrez vermelho e branco. Atualmente muitos jogos refletem em sua temática os acontecimentos do mundo como, por

exemplo, a crise da bolsa, sustentabilidade e ecologia, e até mesmo terrorismo, à exemplo do jogo “War on Terror”, no qual jogadores tentam combater o terrorismo enquanto outro faz o papel dos terroristas. π



Classificando-os


TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR No livro “Recreação para Todos”12, Mauro Soares Teixeira e Jarbas Sales de Figueiredo dividem os jogos, segundo as funções humanas que se desenvolvem com cada jogo. Jogos sensoriais: ação dos aparelhos do sentido (cheirar, provar, escutar, tocar...) • Jogos psíquicos: exercícios das capacidades mais elevadas (jogar sério, conter o riso, brincar de estátua...) • Jogos motores: é ação dos músculos e coordenação dos movimentos (engatinhar, saltar, jogo de bola…) • Jogos afetivos: desenvolvimento dos sentimentos ou experiências (desenho, escultura, música…) • Jogos intelectuais: jogos de damas, rimas de palavras, charadas, adivinhações, xadrez...) Porém, a divisão dos jogos mais conhecida é aquela que excluem os jogos sensoriais e afetivos, separando os jogos psíquicos, motores e intelectuais.

Jogos de Adivinhação Um jogo de adivinhação tem em seu núcleo uma informação conhecida por um jogador, e o objetivo é forçar outro a adivinhar esta informação sem realmente divulgá-la na forma de texto ou palavra falada. As charadas e as mímicas são os jogos mais conhecidos deste tipo, e geraram um grande número de jogos

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Recreação para Todos Teixeira, Mauro S.; Figueiredo, Jarbas Editora Obelisco, 2a Edição - 1970.

comerciais como Imagem&Ação, Master, Perfil. Nesta categoria também entram shows de TV que utilizam da adivinhação.

Jogos de papel e lápis São jogos simples, como o jogo da velha, que requerem pouco ou nenhum equipamento especial além de algo que escreva, embora alguns desses jogos tenham sido comercializados como jogos de tabuleiro (Scrabble, por exemplo, é baseado na ideia das palavras cruzadas). Esses jogos variam muito, como jogos centrados em desenhos, jogos de conectar pontos, jogos de letras e palavras, ou jogos solitários de lógica como Sudoku e palavras cruzadas.

Jogos de Destreza / Coordenação Esse tipo de jogo inclui os jogos nos quais necessitam de destreza manual ou coordenação. Jogos como Jenga requerem equipamento portátil ou improvisado que podem ser jogados em qualquer superfície plana, enquanto outros exemplos, como Pinball, Bilhar, e Pebolim necessitam de mesas especializadas nas quais os jogos são jogados. Os video games substituíram boa partes destes jogos. Como esses jogos precisam de bons reflexos e coordenação, são geralmente jogados de forma inferior por pessoas sob efeitos de drogas como o álcool.

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TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR Jogos de cartas

Role-playing games

Jogos de cartas usam baralhos como ferramenta central. Essas cartas podem ser um baralho tradicional Angloamericano (52 cartas) de cartas, baralhos regionais usando 32, 36 ou 40 cartas com diferentes naipes, baralhos de Tarot com 78 cartas, ou um baralho específico de um jogo individual. Uno e Rook são exemplos de jogos que a princípio eram jogados com um baralho comum e passaram a ser comercializado com baralhos customizados. Alguns jogos de cartas colecionáveis como Magic: The Gathering são jogados com uma seleção de cartas que são coletadas e compradas individualmente ou em várias edições. Alguns jogos de tabuleiro utilizam cartas como elemento de sua jogabilidade, normalmente para adicionar aleatoriedade ou controlar o progresso do jogo.

Role-playing games, conhecidos como RPGs, são um tipo de jogo no qual os participantes costumam assumir o papel de personagens em um cenário fictício. Os RPGs tradicionais são jogados com vários participantes geralmente face a face tomando nota de seu desenvolvimento com papel e lápis. São jogos colaborativos envolvendo os personagens; criando, desenvolvendo e explorando o cenário.

Jogos de Dados Como o nome diz, jogos como Yahtzee e Liar’s usam dados como elemento central do jogo. Alguns jogos de tabuleiro possuem dados para adicionar aleatoriedade, porém o que diferencia os jogos de dados são que estes não determinam o sucesso ou falha de outro elemento do jogo, ao contrário, eles definem a posição do jogador no jogo. Pelo fato destes jogos necessitarem de um alto fator sorte são considerado jogos de azar.

Jogos de Videogames Através de dispositivos como os joysticks, mouse e teclado, o jogador interage com interfaces gráficas geradas por um console que cria mundos virtuais exibidos em um monitor. Desde os primeiros jogos, vários gêneros de jogo foram criados, e conforme a tecnologia evolui, os jogos tendem a criar com maior perfeição esta realidade alternativa através de recursos gráficos cada vez mais realistas. Hoje, ainda existe a possibilidade de unir sensores de movimento a esses controles, para que esta experiência seja mais próxima da realidade. Assim os videogames estão cada vez mais modernos e mais caros. Mas apesar disso é o mercado de jogos mais influente, sendo a segunda indústria de entretenimento, à frente do cinema e atrás apenas da música.


CLASSIFICANDO-OS Jogos de Tabuleiro São jogos que na sua maioria usam como ferramenta central um tabuleiro no qual são utilizados peças como marcadores de progresso, recursos e status do jogador. Muitos envolvem cartas e/ou dados. Geralmente possuem um tema e uma mecânica específica de jogo. Hoje os jogos o mercado de jogos de tabuleiro podem ser divididos em quatro categorias: Jogos de Mercado de Massa, Jogos de Hobby, Jogos de estilo Americano (Ameritrashes) e Jogos de estilo Europeu (Eurogames). Alguns jogos podem não se encaixar em alguma categoria ou compreender mais de uma. Os jogos de Mercado de Massa são aqueles jogos mais conhecidos pela população que são lançados pelas grandes companhias e presentes em lojas no mundo todo. “Monopoly”, “Risk”, “Scrabble”, “Uno” são alguns dos jogos mais conhecidos desta categoria. Aqui também entram os Party Games e os Family Games. Já os Jogos de Hobby se dividem em três grandes categorias: RPGs, Jogos de Miniaturas e Jogos de Cartas Colecionáveis. Geralmente são jogos complexos no qual é comum fãs gastarem muito dinheiro comprando suplementos, cartas, miniaturas ou livro de regras pra um mesmo jogo. Jogos como “Axis & Allies”, “Talisman”, e “Twilight Imperium” são os chamados Jogos de estilo Americano ou “Ameritrashes”. O termo Ameritrash provavelmente teve a intenção original de designar jogos Americanos ruins em comparação ao nível dos jogos na Alemanha. Há quem diga que foi uma forma de vingança ao termo

“Eurotrash” utilizado pra se referir a alguns aspectos da música e cultura europeia, porém este termo logo passou a ter um sentido mais amplo e fãs destes jogos passaram a adotar o termo como um símbolo de honra. Em geral estes jogos dão maior importância a um tema bem elaborado do que as regras, possuem conflito direto entre jogadores, e fator sorte médio a alto através de distribuição de cartas ou uso de dados. Nem todos os Jogos de Estilo Europeu, ou Eurogames como são conhecidos, são Europeus. Não importa de onde o jogo vem, mas sim as características associadas a ele como a baixa utilização de fatores aleatórios, conflitos indiretos geralmente envolvendo pontos de vitória e regras balanceadas para que os jogadores tenham chances de ganhar até o ultimo momento. Nunca um jogador será eliminado de uma partida. Como nos Ameritrashes há um tema, porém ele é mais sugestivo do que simulação, sendo que dois jogos com o mesmo tema podem ter mecânicas totalmente distintas. O foco está na estratégia e jogabilidade, e menos no efeito dramático. Muita atenção é dada para a qualidade gráfica do jogo, desde a arte até os componentes. O reconhecimento ao designer do jogo através de seu nome na capa da caixa é fundamental. Este é um dos motivos pelo qual muita gente chama estes jogos de Designer Games. São exemplos destes jogos: “The Settlers of Catan”, “Carcassonne” e “Puerto Rico”.

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TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR

http://1.bp.blogspot.com/_zBQEkhxV-7c/RdxUH45fP2I/AAAAAAAAAUQ/_7EOMIHjTGc/s1600-h/theme+centered.jpg Traduzido para o o português Acesso em 24 mai. 2009


CLASSIFICANDO-OS

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TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR Se quisermos aprofundar ainda mais na classificação dos jogos de tabuleiros, podemos levar em conta a mecânica do jogo. A mecânica (ou mecanismo) é uma metáfora para o aspecto funcional do jogo. É preciso ser compreendido que da mesma maneira que uma máquina, quando um jogo compreende vários mecanismos, ele é mais complicado de ser analisado e entendido. Como resultado provavelmente temos um jogo que após várias partidas tenderá a satisfazer muito mais aos adultos do que várias partidas de um jogo com um único mecanismo. Por outro lado, jogos com poucos mecanismos será mais fácil para novos jogadores ou crianças, entenderem. Se um jogo possuir mais mecanismos do que um jogador pode lidar, provavelmente o resultado do jogo será frustração e desinteresse por parte do jogador. Listando alfabeticamente os vários mecanismos existentes, temos: • Ação simultânea • Administração de cartas • Apanhar e entregar • Apostas • Blefe • Cantar • Cerco de área • Colecionar componentes • Colocação de peças • Combate gerenciado por cartas

• Comércio • Construção a partir de modelo • Controle de área • Cooperação • Desenhar • Distribuição de pontos de ação • Escolha de cartas • Especulação financeira • Habilidade manual • Identificação do modelo • Jogadores com diferentes habilidades • Leilão e licitação • Marcadores e hexágonos • Memória • Mercado de ações • Movimento de área • Movimento ponto a ponto • Narração de histórias • Negociação • Ordem de turnos variável • Papel e caneta • Papel • Tesoura e pedra • Parceria • Personificação


CLASSIFICANDO-OS • Posicionamento secreto de unidades • R.P.G. • Rolagem de dados • Rolar & mover • Seleção de papel • Sistema por impulsos • Sorteio de marcadores • Tabuleiro modular • Tempo real • Trilhos a lápis • Vazas • Votação Mas o que diferencia jogos, brinquedos e quebra-cabeças? Como já foi dito, um jogo acontece em um universo artificial governado por regras. As regras definem as ações que os jogadores podem, ou não, realizar. Outra forma de entretenimento interativo não pode ser definido como jogo. Um brinquedo, por exemplo, é um objeto que você brinca ou joga sem regras. Você pode jogar um jogo com o brinquedo se você criar estas regras, mas ordinariamente um brinquedo não vem com regras. Já um quebra-cabeça possui uma regra definida: Ele tem uma solução correta que deve ser encontrada. São jogados normalmente apenas por uma pessoa, e requerem habilidades em soluções de problemas mas não envolvem nenhuma representação por parte do jogador nem é estabelecido em um universo artificial. π

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BREVE HIST贸ria dos jogos de tabuleiro


TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR Ainda hoje existem escavações arqueológicas descobrindo novos indícios a respeito da história dos jogos de tabuleiro. Foram muitos os jogos criados pela humanidade, e aqui estão citados os mais relevantes. Começando pelos jogos antigos, o que sabemos até então é que o jogo mais velho já encontrado foi “Senet”, que significa “Rito de Passagem”. Este teve seus restos desenterrados de tumbas que datam cerca de 3500a.C. no Egito predinástico e também foram encontradas algumas representações deste jogo pintadas em tumbas como a de Merknera, Hesy e Nerfertari. A princípio o jogo tinha apenas característica lúdica, mas por volta de 1500 a.C. o jogo começou a receber influência da religião egípcia e desta maneira pra a total e melhor compreensão do jogo é necessário conhecer algumas divindades egípcias. ▼

Acredita-se que o “Jogo Real de Ur”, encontrado junto aos tesouros da realeza por volta de 1926-1927 nas criptas de Ur no lugar em que hoje seria o Iraque, seja o precursor do gamão e tenha dado origem a uma extensa família de jogos. O jogo data de 3000 a.C. na Primeira Dinastia de Ur, e era exclusivo para a alta sociedade

sumeriana, daí seu nome. Até hoje não se conhece as regras que eram utilizadas na Mesopotâmia, e sua jogabilidade foi reconstruída baseada em uma versão cuneiforme do tabuleiro babilônico que data 177-176 a.C.. Junto ao jogo foram encontrados seis dados de forma piramidal utilizados no jogo. Um conjunto de um jogo muito similar ao “Gamão”, foi encontrado em Shahr-e Sukhte no Irã e supostamente seria um exemplar de 3000 a.C.. Considerado o rei dos jogos, o gamão que conhecemos sofreu varias alterações e influência por diversos povos como fenícios, egípcios e gregos, sendo que o jogo que mais se assemelha ao de hoje seria a versão romana de 600 a.C. que possuía grande número de aficcionados contando inclusive com grandes imperadores como Calígula e Nero. Introduzido na Europa durante o século I a.C. com o nome de “Tábula”, o gamão tornou-se o jogo mais popular no Velho Mundo, principalmente entre os nobres feudais. Com o passar dos anos teve momentos de glória e de esquecimentos mas nunca deixou de ser um dos jogos mais jogados em todo o mundo. ▼

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SENET

Seu principal objetivo era tirar todas as peças do tabuleiro.

JOGO REAL DE UR

Outro jogo onde o jogador deve retirar todas as peças do tabuleiro.

GAMÃO

Vence quem consegue tirar todas as suas peças do tabuleiro, sendo que para mover as peças são jogados dois dados de seis faces.


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TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR MANCALA

Aquele que conseguisse tirar o maior número de sementes dos buracos era o vencedor.

GO

Basicamente o jogo consiste em conquistar territórios e impedir que seu oponente expanda o seu, vencendo aquele que possuir mais peças no tabuleiro.

XADREZ

O vencedor é aquele que consegue deixar o rei adversário sem escapatória da morte.

Já a “Mancala” nasceu por volta de 2000 a.C. e é conhecido como o jogo nacional da África. Mancala é uma família que compreende aproximadamente 200 jogos distintos porém com regras semelhantes também chamados de jogos de semeadura e colheita. A palavra Mancala é derivada do árabe “naqaala” que significa mover. Sua origem mais provável seria no Egito, e a partir do vale do Nilo ele teria se espalhado por todo o restante do continente africano. A princípio o jogo era jogado na terra, e seu tabuleiro consistia de buracos no solo em fileiras e algumas sementes. Tempos depois o jogo era encontrado em diversos materiais, sendo que os marajás da Índia chegavam a jogar Mancala utilizando rubis e safiras em lugar de sementes. Portanto, era um jogo que podia ser barato e jogado por todas as classes sociais. ▼

Lendas dizem que “Go”, ou “Wei-qi” na China e “Baduk” na Coreia, existe desde o império de Yao em 2337-2258 a.C., porém a referência escrita mais velha já encontrada seria de 548 a.C. por Zuo Zhuan, que descrevia a si mesmo como um homem que gostava do jogo. No ocidente chegou no século 19 através da Alemanha. Este é o jogo que manteve suas regras por mais tempo, sendo que estas não mudaram muito desde sua criação. ▼

Talvez o mais clássico e tático de todos estes jogos é o “Xadrez”, cuja origem não é conhecida. Este provavelmente provém da Índia, e uma das evidências para tal seria que os nomes árabe, persa, grego, português e espanhol para xadrez, são todos derivados do Sânscrito, “Chaturanga”. O Xadrez passou pelos persas e se espalhou pelo oeste europeu entre 1000 e 1100 d.C.. A princípio as peças eram diferentes. Cada jogador possuía oito peças: um Vizir (hoje Dama),


BREVE HISTória dos jogos de tabuleiro um Cavalo, um Elefante (hoje Bispo), um Navio (mais tarde uma Carruagem e hoje a Torre) e quatro Soldados (atualmente os Peões), e seus movimentos eram mais limitados para as peças. As regras que conhecemos hoje, foram definidas por volta de 1475, e a configuração atual foi baseada na estrutura de classes do feudalismo. Benjamin Franklin era um grande jogador de xadrez e chegou a escrever e publicar em 1779 o ensaio “The Morals of Chess”, no qual afirmou:

pela Milton Bradley Company. No fim do primeiro ano de vendas o jogo já tinha a incrível marca de 45000 cópias vendidas. O jogo tinha um grande apelo moral e apresentava uma caricatura interessante do “American lifestyle” e uma mentalidade consumista. O jogo não possuía dados, pois eram assimilados à jogos de azar. Para comemorar os 100 anos do lançamento do jogo, Reuben Klamer mudou o nome do jogo para “The Game of Life” (Jogo da Vida), rescreveu suas regras e desde então é um enorme sucesso de vendas. ▼

“O xadrez pode ensinar a previsão, que olha um pouco para o futuro; (…) a circunspecção, que cobre todo o tabuleiro; (…) a cautela em não se precipitar nos movimentos; (…) e, finalmente, o hábito de não desanimar frente a um estado de coisas aparentemente adverso e de ter esperança em relação a mudanças favoráveis”. O Xadrez é considerado esporte desde 1886 quando ocorreu nos Estados Unidos o primeiro Campeonato Mundial de Xadrez. Após a revolução industrial, houve a possibilidade de produzir em massa e comercializar os jogos de tabuleiro. Surgiram as editoras de jogos de tabuleiro e assim muitos jogos que conhecemos, jogamos e compramos até hoje, foram originados nesse período tornando-os jogos clássicos. Um dos primeiros grandes clássicos a serem publicados foi o “The Checkered Game of Life” em 1860

Após Carles Darrow ter seu jogo recusado duas vezes, “Monopoly” (Banco Imobiliário) foi finalmente publicado em 1935 pela Parker Brothers. O jogo foi baseado em “The Landlord’s Game” de Elizabeth J. Magie Phillips de 1904, que surgiu com a proposta de criar uma “ferramenta” para ensinar a teoria do economista Henry George sobre taxa simples. Monopoly é de longe o jogo mais conhecido e jogado, tendo mais de 250 milhões

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THE GAME OF LIFE

Em um tabuleiro quadriculado com 64 espaços, o jogador começava num quadrado escrito infância e terminava, geralmente mas não sempre, na terceira idade feliz.

MONOPOLY

O objetivo principal do jogo é comprar terrenos e alugá-los, tentando comprar todos os terrenos de certos bairros e por fim, manter o monopólio imobiliário. O movimento dos jogadores era baseado no lance de dois dados de seis faces.


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TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR CLUE

Uma carta de assassino, local e arma são escondidas em um envelope. O resto das cartas são distribuídas para os jogadores. Quem dá um palpite errado perde e abandona o jogo, quem acerta o palpite é o ganhador.

Die Siedler von Catan

Os jogadores devem coletar recursos, construir estradas, aldeias, cidades juntando pontos de vitória para ser o vencedor.

de cópias vendidas no mundo, em 27 línguas e sendo licenciado em 81 países. Uma fato interessante é que Monopoly já teve um papel muito importante. Mapas de fuga, bússolas e documentos foram contrabandeados dentro de caixas de Monopoly para prisioneiros de guerra na Alemanha durante a Segunda Guerra Mundial, bem como dinheiro de verdade, escondido no meio das cédulas de brincadeira. Em 1949 chegava as lojas o “Clue” (Detetive). O diretor da Waddingtons Games jogou o jogo e imediatamente decidiu publicá-lo no Reino Unido. Clue é um jogo de mistério sobre assassinato no qual os jogadores tentam descobrir um assassino, o local e a arma do crime. ▼

Após 1960, surgiram várias empresas dedicadas a produção de jogos de tabuleiro e o mercado expandia rapidamente. Porém, nos década de oitenta com o surgimento dos jogos eletrônicos o mercado começou a

retrair, os jogos de cartas colecionáveis tomavam lugar, e os jogos de tabuleiro só foram se recuperar por volta de 1995 com a entrada dos jogos europeus no mercado norte-americano. Começa a era dos jogos modernos. “Die Siedler von Catan” (Settlers of Catan) criado por Klaus Teuber e publicado em 1995 foi o primeiro jogo europeu a conseguir notoriedade e sucesso em vendas nos Estados Unidos e o grande responsável pela retomada dos jogos de tabuleiro, criando a classe dos chamados “Eurogames”. Publicado na Alemanha pela editora Kosmos, levou grandes prêmios como: o Spiel des Jahres em 1995, o 10 lugar do Deutscher SpielePreis também em 1995, e o Origins Award em 1996. O jogo tornou-se popular devido à simplicidade em sua mecânica, seu dinamismo e a possibilidade de sempre se ter um jogo diferente graças ao seu tabuleiro modular composto por hexágonos. ▼


BREVE HISTória dos jogos de tabuleiro No ano 2000, “Carcassone”, desenvolvido por Klaus-Jürgen Wrede e publicado por Hans im Glück e Rio Grande Games, entrava no mercado pra se tornar mais um sucesso de vendas. O jogo é em si é muito simples e chega a lembrar o Dominó devido a sua mecânica de posicionamento de blocos ao invés de se usar uma base como tabuleiro. Nele surge a figura do “Meeple”, que viria a se tornar um ícone dos Eurogames. Em 2001 ganhou o Spiel des Jahres. “Puerto Rico” foi criado por Andreas Seyfarth, e publicado em 2002 pela Alea. É talvez o Eurogame mais respeitado desde Settlers of Catan, sendo que muitos jogadores atualmente o consideram o melhor jogo do mundo devido a sua alta jogabilidade. Os jogadores assumem diversos papéis na ilha de Puerto Rico durante o jogo, o que permite um enorme grau de gerenciamento de recursos e economia. ▼

Em 2008, Z-man Games publicava um jogo de Matt Leacock que viria a ser um dos melhores jogos cooperativos já publicado: “Pandemic”. O jogo se diferencia dos demais já que sua jogabilidade é cooperativa ao invés de competitiva. Desta forma todos jogam “contra o tabuleiro” ao invés de se enfrentarem. Baseado na premissa de que o mundo foi afetado por quatro doenças, os jogadores desempenham papéis de até cinco especialistas: expedidor, médico, cientista, pesquisador e perito, tentando curar e evitar que uma pandemia se espalhe no mundo. Pandemic foi indicado ao prêmio Spiele des Jahres. π

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CARCASSONE

O objetivo do jogo é a construção de cidades medievais fortificadas, fazendas, estradas e monastérios, com o uso de blocos que formam o “tabuleiro” para somar o maior número de pontos de vitória e ganhar o jogo.

PUERTO RICO

São plantados até 5 tipos diferentes de produtos: Indigo, Café, Açúcar, Tabaco e milho, e os jogadores devem desenvolver seus negócios mais rapidamente que seus oponentes. Os jogadores podem escolher a ordem das fases em cada turno, e a habilidade de empregar isso mais eficientemente fará com que o jogador ganhe o jogo.

PANDEMIC

Com o esforço combinado de todos os jogadores, o objetivo é descobrir todas as quatro curas antes que algumas das diversas circunstâncias que levam ao fim do jogo sejam alcançadas.


jogos de tabuleiro E SUAS QUALIDADES


TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR No prefácio de seu livro, o rei Afonso X, de Leão e Castela, escreveu:

“Deus quis que os homens se divertissem com muitos e muitos jogos, pois eles trazem conforto e dissipam as preocupações.” Porém são várias as qualidades presentes nos jogos de tabuleiro. André Zatz e Sergio Halaban em seu site, resumem estas qualidades e nos dão cinco razões para jogá-los: • Jogos proporcionam bons momentos em família. • Jogar estimula a socialização. • Jogar estimula a inteligência. • Jogar contribui para se aprender a respeitar regras. • Esses momentos ficarão marcados na lembrança das pessoas. Uma das maiores qualidades dos jogos de tabuleiros, é que estes em sua maioria são educativos e sendo uma atividade intelectual, exercitam o cérebro. Seja na questão motora, intelectual, ou social sempre há algo a se aprender com os jogos de tabuleiro. Em sua maioria estes jogos exigem paciência, honestidade, sociabilidade, negociação, planejamento, noção

espacial, entre outras tantas características de seus jogadores. É justamente através destas exigências que surge o aprendizado no jogo. Para Yehuda Beringer, em seu artigo para o site Discover Games, os jogos nos trazem ainda quatro desafios pelos quais obtemos o aprendizado: Você X Você mesmo. Você X Seu oponente. Você X As regras. Você X A sorte. O primeiro desafio é crescer. Crescer em concentração, na manipulação de informações, na perseverança, entre outros. As sinapses no cérebro ao abordarem determinado tipo de desafios, reforçam os caminhos que facilitarão futuramente a resolução destes mesmos desafios. O segundo desafio é prever e ganhar de seu oponente. Supondo que você tenha as ferramentas intelectuais necessárias para dominar o jogo contra seu oponente, ganhar dependerá da previsão de certos movimentos que seu oponente fará, de quais são seus pontos fracos e fortes, e do que irá tirá-lo de jogo. O terceiro desafio é dominar as regras. Com as peças e regras que lhe foram dadas, como você irá proceder para transformá-las em vitória? E o quarto desafio é superar os momentos que dependem da sorte.

ANDRÉ ZATZ E SeRGIO HALABAN

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Sergio Halaban e André Zatz são autores de jogos de tabuleiro e juntos fundaram a SB Jogos. A SB Jogos cria e desenvolve jogos não apenas para crianças de todas as idades, mas também para adultos. Muitos desses jogos têm como único objetivo divertir. Outros têm finalidades educativas ou de capacitação profissional. Desde que começaram com essa atividade, ainda na década de 90, já tiveram mais de 30 jogos publicados, no Brasil e no exterior.


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TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR De um modo geral isto significa controlar ao máximo as chances de vitória, para que depois, superar o desafio signifique ter sorte. Ter qualquer controle não quer dizer que não há um desafio a se vencer, apenas significa que você não tem nenhum controle sobre o que você deve superar. Quando vamos jogar um jogo, o primeiro passo que devemos tomar é ler e entender as suas regras. Após a compreensão das regras, devemos aceitálas e aprender a conviver com estas limitações. O não comprimento destas regras é mal visto entre os jogadores, e muita vezes acaba sendo o fim do jogo. Este é então o primeiro grande ensinamento: a ética. A ética inerente ao jogo é essencial para que este aconteça corretamente e seja satisfatório para todos. Assim o jogo ajuda na construção do caráter do jogador. Ao decorrer do jogo, ainda serão ensinadas habilidades relacionadas ao comportamento e sociabilidade do jogador. Com o jogo aprendemos a pensar estrategicamente e a reconhecer padrões. Questões como diplomacia e concentração são frequentemente requisitadas nos jogos de tabuleiro. É importante, principalmente nos jogos que oferecem a oportunidade de trocas entre os jogadores, que estes conversem e discutam de forma diplomática suas ações. Muitas de suas atitudes devem ser muito bem pensadas em relação a si e aos outros jogadores envolvidos. Assim, o jogador deve se concentrar em seus oponentes, observando suas jogadas, para que em seguida exerça a sua de acordo com o movimento anterior de seu oponente. A perseverança é outro fator que é testado nos

jogadores. O jogador deve desenvolver a perseverança para atingir o objetivo do jogo, superando obstáculos como a sorte e o acaso, que pode vir facilitar ou dificultar esta tarefa. Os jogadores percebem rapidamente os resultados de sua ação, e através delas, tirarão lições. A derrota, por exemplo, não é algo preocupante nestes jogos. Por serem jogos que duram poucas horas, os jogadores possuem a possibilidade de jogar diversas vezes e assim desenvolver outra habilidade. A habilidade de aceitar e aprender a lidar com a vitória ou derrota. Aliada a perseverança vem a paciência. Paciência de esperar sua vez de jogar ou mesma paciência de sair aquela carta ou número específico no dado. Ainda há o aprendizado direto ao tema do jogo. Assim aprendemos geografia, biologia, religião, literatura e muito mais de acordo com a temática do jogo. Jogos de palavras, por exemplo, ampliam o vocabulário dos jogadores. Em jogos de mistério o jogador desenvolve sua capacidade de dedução, percepção e lógica. Jogos de destreza colocam os reflexos e coordenação do jogador à prova, e assim por diante. Deixando um pouco de lado a questão educativa que os jogos de tabuleiros agregam, temos as duas principais qualidades, que serão abordadas em detalhe no próximo capítulo, e que fazem estes jogos serem o que são: a socialização e a diversão.


jogos de tabuleiro E SUAS QUALIDADES

Socialização e diversão nos jogos de tabuleiro

Hoje em dia, por exemplo, é raro termos momentos em família, e os jogos de tabuleiro possuem uma característica que vem sendo ignorada: o poder de agregar a família. Jogos de tabuleiro atingem diversas faixas etárias o que permite que estes sejam jogados pelos diversos membros de uma mesma família. Sid Sackson, em entrevista pra revista GAMES14, afirmou que na Alemanha, é considerado um dever os pais jogarem jogos de tabuleiro com seus filhos. No Brasil de fato não temos acesso ao mesmo número de jogos que são disponíveis na Alemanha, nem temos um inverno forte que faça as pessoas permanecerem juntas em casa, mas não é raro vermos pessoas jogando jogos de mercado de massa como “Monopoly” e “Scrabble” quando começa a chover durante longos dias.

A SOCIALIZAÇÃO Os jogos de tabuleiros sempre foram uma experiência social. Bruno Faidutti afirma em um de seus artigos13 que seu argumento é sempre o mesmo, jogos que ele joga e projeta são jogos sociais, prova disso é como eles são chamado em francês: “Jeux de Société”. O espaço que hoje pertence a televisão e ao videogame, antes era dos jogos de tabuleiro. Estes no entanto, até hoje possuem uma característica que não foi completamente substituída pelos jogos eletrônicos: a interação com os demais jogadores. Os jogos de tabuleiro nos levam à algumas horas de diversão, risos, amizade, geração de conhecimento. Lidar com pessoas é uma necessidade do ser humano, e devido ao tempo que as pessoas tem passado na frente de computadores, videogames e outros aparelhos eletrônicos, a relação interpessoal é cada vez mais valorizada. Em um jogo de tabuleiro boa parte da diversão está nessa interação. Além das conversas e brincadeiras que surgem durante a partida, ainda temos momentos onde um jogador ataca o outro, comemora a vitória momentânea sobre o adversário, gera conflitos, faz alianças, etc. Tudo isso colaborando na socialização dos jogadores.

13

Faidutti.com - 04/2004 Social games ?

14

GAMES Magazine - Feb/Mar 1987 The Guru Of Games

A DIVERSÃO “Vinte e três séculos atrás Aristóteles concluiu que, mais do que nada, homens e mulheres buscam a felicidade...”
Mihaly Csikszentmihalyi Jogar é divertido. Para que haja essa diversão, no entanto, o jogo deve trazer uma experiência satisfatória aos jogadores. Mihaly Csikszentmihalyi, psicólogo e professor, publicou em 1975 o livro “Beyond Boredom and Anxiety”15 no qual propôs o estado mental conhecido como “FLOW” que vem sendo aplicada à diversas áreas, inclusive nos jogos. O estudo do FLOW, também conhecido como Teoria dos Fluxos, basicamente visa

15

Beyond Boredom and Anxiety Csikszentmihalyi, Mihaly Jossey-Bass Publishers, 1a. Edição - 1975. ISBN 875892612

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Bruno Faidutti

Nascido em 23 de Outubro de 1961, Bruno Faidutti é um historiador e sociólogo, que é mais conhecido como autor de jogos de tabuleiro. Seus jogos mais populares incluem Knightmare Chess, Mystery of the Abbey e Citadels.

SID SACKSON

Foi um dos maiores autores de jogos de tabuleiros, colecionador e escritor. Embora seja o criador de jogos de maior importância nos Estados Unidos, é na Europa que ele se tornou realmente conhecido. Alguns de seus jogos são Bazaar, Monad, Sleuth, Can’t Stop e Acquire. Sid Sackson faleceu em 2002.

Mihaly Csikszentmihalyi

Csikszentmihalyi é uma das autoridades mundiais na pesquisa da “psicologia positiva”, a qual ensina na Claremont Graduate University, focando nas forças humanas como otimismo, motivação e responsabilidade. Além de ministrar aulas hoje ele é diretor do “Quality of Life Research Center” na universidade, e são vários os seus livros e artigos escritos sobre a busca da alegria e realização.


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TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR JENOVA CHEN

Jenova Chen estudou design de jogos na USC School of Cinematic Arts, e é criador de dois jogos muito premiados na categoria estudante: Cloud e flOw. Cofundador da thatgamecompany e diretor criativo de Flower. Jenova se dedica à expandir o espectro emocional dos videogames e torná-los acessíveis a uma audiência maior.

entender no aspecto psicológico o que seria uma ótima experiência para o ser humano. Csikszentmihalyi desenvolveu uma série de teorias para ajudar as pessoas a alcançarem o estado do FLOW. Em entrevista para a revista Wired16, Csikszentmihalyi descreve FLOW como: “Estar completamente envolvido em uma atividade para seu próprio bem. O ego cai fora. O tempo voa. Cada ação, movimento, e pensamento segue inevitavelmente o anterior. como tocar jazz. Você está inteiramente envolvido, e está usando suas habilidades ao máximo.” O FLOW, de acordo com Csikszentmihalyi, possui os seguintes componentes (não necessariamente todos): • Objetivos claros (expectativas e regras são distinguíveis). • Concentração e foco (um alto grau de concentração em um campo de atenção limitado). • Perda do sentimento de auto-consciência. • Sensação de tempo distorcida. • Retorno direto e imediato (acertos e falhas ao decorrer da atividade são aparentes, podendo ser corrigidos caso necessário).

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WIRED - 4.09 | Setembro 1996 Go With The Flow

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FLOW in Games Jenova Chen MFA Thesis

• Equilíbrio entre o nível de habilidade e de desafio (a atividade nunca é demasiadamente simples ou complicada). • A sensação de controle pessoal sobre a situação ou a atividade. • A atividade é intrinsecamente recompensadora, então há uma ação sem esforço. • Quando se encontram em estado de fluxo, as pessoas praticamente “se tornam parte da atividade” (fusão da ação e da consciência). Essa teoria está muito baseada na questão da concentração. Porém esta concentração nos casos do jogos está muito ligada à diversão. Os jogadores quando estão se divertindo, se concentram e imergem nos jogos de tal forma que esquecem do tempo e do mundo exterior ao jogo. Se analisarmos, esta situação alcançada através do FLOW vai de encontro com o conceito do “circulo mágico” de Johan Huizinga. Jenova Chen usou o texto de Csikszentmihalyi como base para escrever sua tese “FLOW in Games”17, na qual procura entender o que deve ser feito para se obter um jogo que transmita uma experiência mais satisfatória possível. Segundo ele devemos prestar atenção em três condições fundamentais para alcançar o FLOW nos jogos.


jogos de tabuleiro E SUAS QUALIDADES • Como premissa, o jogo é intrínsecamente recompensador, e o jogador está apto para jogar o jogo. • O jogo oferece uma quantidade de desafios para combinar com a habilidade do jogador, que o leva a investigar profundamente dentro do jogo. • O jogador necessita do sentimento de controle pessoal em relação à atividade do jogo. “Para se manter a experiência do FLOW em uma pessoa, a atividade deve alcançar um equilíbrio entre os desafios da atividade e as habilidades do participante. Se o desafio é maior do que a habilidade, a atividade se torna opressiva e gera ansiedade. Se o desafio é menor do que a habilidade, teremos tédio. Por sorte, seres humanos possuem tolerância, há uma zona segurança um tanto distorcida onde a atividade não é demasiada desafiante ou demasiada entediante, e entropias psíquicas como ansiedade e tédio não ocorrerão.” - Mihaly Csikszentmihalyi No gráfico ao lado, a curva vermelha representa a experiência de um jogador ao decorrer de um jogo. As vezes o jogador pode sentir uma certa dificuldade, mas ele ainda tolera e se mantém na Zona de FLOW. Se a experiência se afasta da Zona de FLOW, o sentimento negativo de ansiedade ou tédio surge e quebra o estado de FLOW.

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TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR No entanto, cada pessoa possui diferentes habilidades e Zonas de FLOW. Um jogo bem projetado pode manter jogadores normais em FLOW, mas não será tão efetivo para jogadores assíduos ou novatos.

Para que ainda haja o sentimento de controle do jogo, podemos oferecer para os jogadores escolhas que regulam o estado do FLOW ativamente de acordo com a necessidade de cada jogador. Assim, se quisermos atingir um público amplo, devemos então pensar e expandir a Zona de FLOW, incluindo um maior espectro de jogabilidade com diversas dificuldades e gêneros no jogo. Assim, aplicando estas teorias no jogo, ele será mais dinâmico e flexível, permitindo que mais pessoas se possam se divertir com o jogo. π



O Valor do Design e da Arte nos Jogos de Tabuleiro


TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR Devido ao reconhecimento dos jogos de tabuleiro como elementos culturais, e à competição no mercado, as editoras estão cada vez mais valorizando e reconhecendo que o design gráfico e arte agregam valores aos seus jogos. As empresas já perceberam que jogos desenvolvidos graficamente vendem mais, e assim investem cada vez mais nesses profissionais. Hoje os artistas como Michael Menzel, Mike Doyle, Doris Matthäus são tão conhecidos no meio dos jogos de tabuleiro, quanto aqueles que criaram os jogos. Em 2007 durante a Internationalen Spieltage SPIEL, por exemplo, era o ilustrador Pierre Lechevalier que autografava o jogo “Mr. Jack”, ao invés de seus autores Bruno Cathala e Ludovic Maublanc. Bruno Faidutti nos diz que nas histórias em quadrinhos o prazer da leitura existe pela combinação da história e ilustração(qualidade visual), e do mesmo modo nos jogos de tabuleiro o prazer vem primeiro a partir da mecânica e da história por trás do jogo, e depois a arte nos faz sentir e entrar no tema. Para Mike Doyle, um dos designers e ilustradores mais admirados e reconhecidos no nicho dos jogos de tabuleiro, a função da arte nos jogos é muito simples: “A arte do jogo funciona para realçar o esforço do jogo.”

para que o jogo flua a arte deve ser funcional, atendendo equilibradamente a necessidade de design de informação, a temática, a linguagem gráfica e a identidade do jogo. Para entender o papel da arte nos jogos devemos considerar as funções de cada uma dessas necessidades:

Design de Informação • Design de Informação fornece confiança para os novatos aprenderem o jogo e a confiança, para quem for ensinar o jogo, de que esta será uma experiência bem sucedida. • Ajuda no reconhecimento de padrões, o que pode tornar um jogo mais fácil de ser jogado. • Faz os jogadores se sentirem “mestres” no jogo mais rapidamente. • Algumas convenções podem ser reforçadas para facilitar o aprendizado de uma jogabilidade nova ou não usual.

LingUAGEM GRáfica A arte aqui não é expressa no sentido amplo da palavra, mas sim no caráter de ilustração do jogo. Portanto, ela está no jogo de tabuleiro como forma de realçar a simulação que o jogo propõe. Entretanto,

• A estética atrai pessoas para o jogo. • Pode facilitar um título a sair do armário para mesa.

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Internationalen Spieltage SPIEL

Também conhecida como Essen SPIEL, devido ao nome cidade onde é sediado, é o maior evento dedicado aos jogos de tabuleiro e ocorre anualmente durante quatro dias no mês de Outubro no Messe Essen Exhibition Centre. Diferentemente da maioria dos eventos desta área, este é aberto ao público em geral.

Mike DOYLE

Artista, designer gráfico e entusiasta em jogos de tabuleiro, Mike Doyle trabalha em uma empresa de branding há dez anos. Fez trabalhos de identidade corporativa e embalagem para empresas como, Pepsi, Masterfoods, Davidoff Cigars, Lipton, entre outras. Depois de conhecer os Eurogames, ele reencontrou sua paixão pelos jogos de tabuleiro e começou a realizar trabalhos pessoais e profissionais nessa área.


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TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR Agrega uma atmosfera.

Identidade

• Pode aumentar as vendas.

• Soma de características que individualiza o jogo aos demais.

• Pode gerar notícias ou mídia. • Alcança potencialmente novos consumidores (não jogadores) previamente inconscientes, mas atraídos pela caixa. • Gera um impacto positivo no hobby como um todo. • Gera um impacto positivo no portifólio da editora. • Ajuda as editoras a abrir canais de distribuição. (Especialmente com seus primeiros jogos) • Aumenta a coletibilidade do jogo e a admiração de um colecionador.

Temática • Nos faz entrar no espírito do jogo. • Faz o jogo parecer acreditável ao máximo possível. • Pode facilitar o entendimento do jogo. (Temas familiares são apoios para a mecânica do jogo)

• Permite que o jogo seja percebido como um objeto único. http://mdoyle.blogspot.com/2009/04/supplemental-notes-on-functions-of.html

Portanto, o design de informação está relacionado com a clareza e a compreensão. A estética gera atração e ambientação ao jogo. A temática realça a história nos levando pra dentro dela. E a identidade faz com que o jogo tenha um visual próprio e diferenciado. A valorização da temática e da estética vai nos levar a redução do design de informação, sendo que quanto mais o olho for atraído pela parte estética, maior é a probabilidade do jogador se distrair no jogo. Por outro lado, se temos um jogo muito funcional na questão do design de informação, mas que não é visualmente bonito, algo estará faltando. O apelo estético, por exemplo, pode reduzir o cansaço durante a espera por sua jogada, já que se há algo para se olhar, o jogador provavelmente ficará menos entediado com a espera. Assim, tudo dever ser observado, pensado e balanceado para que a arte do jogo funcione como catalisadora de um bom desenvolvimento do jogo. π



O RETORNO DO tabuleiro


TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR A boa parte dos jogos de mercado de massa que conhecemos hoje, à exemplo do Monopoly, foram publicados durante a Grande Depressão. Durante esse tempos difíceis na economia, jogos de tabuleiros voltam a figurar nas escolhas de entretenimento das pessoas. Hoje, graças a este período difícil na economia, que está sendo chamado de Grande Recessão, a história está repetindo e os jogos de tabuleiros estão voltando com tudo. ”Quando os tempos são difíceis, as pessoas tendem à nostalgia e lembram os bons velhos tempos. Nós atualmente estamos felizes com a recessão, porque quando o mundo está se partindo, todos relembram as memórias de infância e compram bolas de gude” diz Sarah Campbell, gerente de vendas da the House of Marbles 18. Esse retorno ocorre, em parte, devido ao aumento no preço dos videogames. Os jogos de tabuleiro são um entretenimento relativamente barato pelo que proporcionam. Dependendo do jogo ele pode custar mais de R$150,00, mas se formos considerar que o jogo vai ser jogado inúmeras vezes, que vai ser levado em viagens, que não precisam de eletricidade, que irá criar diversão e possuem uma experiência social muito intensa, ele se torna um entretenimento barato. “É incrível o que alguns pedaços de papel, um tabuleiro e alguns dados podem criar numa noite inteira, ao contrário dos fios e cabos e talvez uma TV” diz John Bell,

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REUTERS - 30/01/2009 Board games helping bottom line

gerente de design de produto da Buffalo Games. “Quando você tem todos esses equipamentos, o foco está na tela, ou tem um foco dividido. Mas quando você vai pela baixa tecnologia e joga esses jogos de tabuleiro, o foco volta para os amigos e a familia. É o que os jogadores trazem para o jogo que o faz excitante e divertido.” Fora o fator econômico, os jogos de tabuleiro continuaram a prosperar porque independentemente se são para adultos e crianças, eles são como o futebol de domingo, as noites de pôquer, etc. São no fundo uma desculpa interagir com os amigos ou com a família. Assim o interesse renovado nesses jogos também se deve na ênfase das atividades familiares. Hoje, são poucos os momentos familiares, muitas vezes sobrando apenas a hora da janta. Por isso, algumas famílias já estipulam dias de jogatina para fazer essa interação familiar mais frequentemente. Jesper Juul, um ludologista, ou especialista em jogos, explica que eles criam uma experiência comunal que faz as pessoas se unirem. Quem ganhou a última vez e como, uma jogada de sorte marcante produzem uma memória compartilhada. Outro aspecto que passou a agradar e atrair mais jogadores, é que desde o lançamento de Settlers of Catan em 1995, os jogos mais atuais possuem uma outra visão em relação a jogabilidade.

JESPER JUUL

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Pesquisador na área de videogame no Singapore-MIT Game Lab em Cambridge, Massachusetts. Possui diversos artigos sobre jogos e um blog chamado “The Ludologist” no qual publica textos e variedades relacionadas aos jogos.


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TABULEIRO: A PERMANÊNCIA DE UM JOGO MILENAR BOARDGAMEGEEK.COM

BoardGameGeek é a maior comunidade online sobre jogos de tabuleiro do mundo, possuindo mais de 250,000 usuários em Abril de 2009. Além de um banco de dados bastante completo, há fóruns nos quais os membros discutem variados assuntos relacionados aos jogos e também um mercado interno de vendas e trocas.

Jogos como o próprio Monopoly, atualmente são vistos como mal planejados. Derk Solko, cofundador do site BoardGameGeek.com, em entrevista para revista WIRED19 explica da seguinte maneira: “Monopoly é você deixando seus oponentes na poeira. É uma experiência muito negativa. O jogo todo é você quebrando seus oponentes quando eles caem no seu território, tentando conseguir tomar todo o dinheiro deles.” Hoje, os jogos de sucesso se baseam na premissa do confronto indireto. Os jogadores devem ganhar o jogo sem ter que destruir os outros, fazendo o seu próprio jogo prosperar. Eles são balanceados para prevenir que alguém se sobressaia muito no jogo e os outros tenham que ficar apenas esperando a partida acabar. Portanto, mesmo quem ficou pra trás ainda se diverte e possui alguma chance de se reerguer e alcançar a vitória. π

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WIRED - 17.04 | Abril 2009 Monopoly Killer: Perfect German Board Game Redefines Genre



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CONTEXTO LÚDICO


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CONTEXTO LÚDICO



O Xingu E Seu vocabulรกrio visual


o PARQUE INDÍGENA DO XINGU


O XINGU E SEU VOCABULÁRIO VISUAL Localizado no nordeste do Mato Grosso ao sul da Amazônia brasileira, o Parque Indígena do Xingu, ou simplesmente PIX, possui 2,8 milhões de hectares20. É visível uma grande biodiversidade passando pelos mais diversos tipos de vegetação ao decorrer da região. Seu clima varia de novembro a abril com chuvas, quando ocorre a cheia dos rios e a falta de peixes, e seca nos meses restantes, quando ocorre as cêrimonias locais. Além do aspecto visual do parque, hoje centros de estudo, inclusive a UNESCO, consideram essa área como sendo o mais belo mosaico linguístico puro do país. Podemos dividir o Parque Indígena do Xingu em três regiões: Baixo, Médio e Alto Xingu. Cada uma localizada em uma porção do Rio Xingu, o Baixo junto a nascente ao norte, Médio na região central e Alto ao sul pela foz. No Alto Xingu temos os povos muito semelhantes culturalmente, cujas etnias são atendidas pelo Posto Indígena Leonardo Villas Bôas. No Médio Xingu ficam os Trumai, os Ikpeng e os Kaiabi, atendidos pelo Posto Pavuru. No Baixo Xingu estão os Suyá, Yudjá e Kaiabi, atendidos pelo Posto Diauarum. Os índios habitantes do Parque, diferentemente dos indígenas do resto do país, não tiveram contato com bandeirantes, fazendeiros, garimpeiros ou missionários, mas sim com um etnólogo. Karl Von den Steinen em 1884 foi o responsável por estes primeiros contatos com a população indígena da região.

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Instituto Socioambiental (ISA)

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Funasa/ DSEI-Xingu (2006)

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KARL VON DEN STEINEN

Karl von den Steinen foi um explorador e antropólogo alemão. Em 1884, com alguns auxiliares, partiu de Cuiabá, desceu pelo Rio Xingu da nascente até a foz, indo até o Pará. Estudou os índios e retornou ao Brasil em 1887, para estudar os afluentes do rio Xingu.

Onde está: Mato Grosso Quantos são: 14 povos indígenas, somando 5.020 indivíduos21 Línguas: Kamaiurá e Kaiabi (família Tupi-Guarani); Juruna (tronco Tupi); Aweti (tronco Tupi); Mehinako, Wauja e Yawalapiti (família Aruak); Kalapalo, Ikpeng, Kuikuro, Matipu e Nahukwá (família Karib); Suyá (família Jê); Trumaium


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O XINGU E SEU VOCABULÁRIO VISUAL

MARCHA PARA O OESTE

A Marcha para o Oeste foi criada pelo governo de Getúlio Vargas, para incentivar o progresso e a ocupação do Centro-Oeste, que organizou um plano para que as pessoas migrassem para o centro do Brasil, onde havia muitas terras desocupadas.

ORLANDO VILLAS BÔAS

Foi o maior dos humanistas e indigenistas do Brasil. Ao lado dos irmãos, foram os únicos brasileiros indicados duas vezes ao Prêmio Nobel da Paz. Orlando e seus irmãos ajudaram a consolidar o Parque Indígena do Xingu com o apoio do marechal Rondon, de Darci Ribeiro e do sanitarista Noel Nutels. Orlando chegou, em 1961, a administrar o parque e morreu aos 88 anos, em 2002

Porém antes desse contato, os índios lá presentes já haviam desenvolvido sistema diplomático interétnico de rituais e trocas, que ajudou a esses índios constituírem uma cultura forte que dificultou a invasão do universo cultural dos brancos. Assim, os indígenas do Xingu possuíam ainda uma cultura livre de influências dos brancos e estes deveriam ser preservados da alta exploração que vinha sendo desenvolvida na região. Foi em 1946 que os irmãos Villas Bôas ( Cláudio, Leonardo e Orlando Villas Bôas ) como fruto da “Marcha para Oeste”, se instalaram na região e começaram a campanha para a demarcação das terras indígenas. A ideia de se criar um parque surgiu em 1952 com um anteprojeto, no entanto apenas em 1961 que a demarcação do Parque Indígena do Xingu viria a ser homologado. No início, os irmãos Villas Bôas tinham a filosofia de preservação e proteção do índio ao contato com a cultura dos grandes centros urbanos. Orlando Villas Bôas disse que a intenção era conservar os povos a natureza local: “O governo brasileiro, ao criar o Parque, procurou cumprir dois importantes objetivos: constituir uma reserva natural para a fauna, flora e, sobretudo, fazer chegar diretamente às tribos sua ação protetora.” Desde a criação, Orlando Villas Bôas tomou uma série de medidas que procuraram impedir ao máximo o contato dos habitantes do Parque com o exterior. No entanto apesar das facilidades que vinham sendo criadas, como o convênio com a Universidade Federal de São Paulo

(Unifesp), em 1954 um surto de sarampo afetou todas as aldeias do Alto Xingu, e causou a morte de diversas pessoas, nessa época a população chega a um de seus pontos mais baixos: 574 pessoas. Já nos anos 80, começaram as primeiras invasões. No final dos anos 90, as queimadas em fazendas pecuárias e o avanço das madeireiras começaram a ameaçar os limites físicos do parque. Outra preocupação que surgiu foi quanto ocupação do entorno, que começava a poluir as nascentes dos rios que abastecem o Parque, e que ficaram fora da área demarcada. Hoje, para manter a preservação, as comunidades buscam a fundação de sociedades indígenas e Organizações Não Governamentais como a Associação Terra Indígena Xingu (Atix), permitindo uma autogestão da comunidade. π



Vocabulário visual indígena


O XINGU E SEU VOCABULÁRIO VISUAL Desde a descoberta de nosso território, a pintura e as manifestações gráficas dos grupos indígenas brasileiros vem sendo registrado e admirado. Seja na arte rupestre, na cerâmica, ou no corpo, a variedade de formas e símbolos existente na arte indígena é fascinante. Hoje, cada vez mais é dado um valor para esses trabalhos, apesar de ser pouco conhecido de um modo geral. O índio desde é um artista nato, e em certas tribos a arte pode possuir um virtuosismo exagerado. Para ele, a ornamentação é parte integrante do objeto onde é aplicada. Do contrário, ou o objeto ou a decoração ficam incompletos. Boa tinta, boa pintura, bom desenho garantem boa sorte na caça, na guerra, na pesca, na viagem. Assim, um índio pode levar dois dias decorando uma peça de cerâmica de um metro de diâmetro, mesmo sabendo que ao colocar no fogo a pintura desaparecerá em na primeira meia hora. Desconhecendo o uso de metais, muitas das matérias primas estão associadas a materiais de origem vegetal, à exceção da cerâmica e plumas. Uma curiosidade é que na maioria das tribos, tudo que diz respeito à mata é tarefa masculina; ou seja, os trabalhos em madeira, concha, penas e palhas. Enquanto que o barro é moldado pelas mulheres, que também fiam e tecem o algodão. Cada grupo indígena possui ainda uma singulariedade em relação a sua arte que reflete seu modo de ser e sua motivações. Porém, muito do “design indígena” possui a sua forma relacionada à fauna e flora local.

“O motivo animal domina todo o seu mundo ideal em qualquer arte e ciência, sem exceção - e para isso não pode haver outra explicação que não seja a sua vida de caçadores” - Karl von den Steinen

Os padrões e representações estilizadas dos índios podem parecer apenas formas geométricas ou abstratas à primeira vista, mas também são na verdade, representações icônicas de espécies da flora e da fauna. Podemos neles identificar fiurações como a pele, as escamas, cascos e rastros de animais, cascas de árvores e elementos naturais, como estrelas ou nuvens. A forma do peixe, por exemplo, é insinuada pelo seu contorno losangular, a cobra pela seu ziguezague sinuoso, a tartaruga pelas formas quadriculares do seu casco, a onça pelas manchas no couro, e assim por diante.

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O XINGU E SEU VOCABULÁRIO VISUAL

http://oiapoque.museudoindio.gov.br/exposicao/objetos/ Acesso em 02 Jun. 2009


vocabulário visual indígena A escultura, a cerâmica, a cestaria e a pintura corporal são os principais expoentes artísticos indígenas, e estes serão as fontes de referência para a execução do trabalho.

A ESCULTURA Para Roberto Rugiero, diretor da Galeria Brasiliana, os Bancos Autorais e as Gamelas Zoomórficas do Xingu situam-se entre os mais notáveis do Novo Mundo e poderiam estar em qualquer grande museu. “São marcantes por suas qualidades escultóricas: proporção, expressão, movimento e ritmo. Será uma arte muito valiosa no futuro, pois é uma das expressões mais importantes do Brasil e já colecionadas por muitas pessoas”, afirma Rugiero. Essas esculturas são em sua maioria funcionais, e representações figurativas de animais. Além dos bancos e utensílios, como espátulas, cuia, raladores, entre outros, podemos citar as máscaras, que além de se de sua montagem possuem um grande cuidado em relação a sua ornamentação gráfica.

Ralador Tribo: Mehinaku
 Localização: Xingu

Pás de Beiju Tribo: Mehinaku
 Localização: Xingu

Máscara Tribo: Mehinaku
 Localização: Xingu

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O XINGU E SEU VOCABULÁRIO VISUAL A CERÂMICA O desenvolvimento da cerâmica está relacionado com a agricultura. Várias comunidades utilizam o barro para guardar água e preparar comidal. Nas maioria das tribos indígenas, a cerâmica é uma atividade quase que exclusiva das mulheres, que envolve certos cuidados e rituais no seu preparo. A cerâmica é elaborada a partir de argilas extraídas de depósitos, localizados próximos às margens do rio Xingu. Os vasilhames são confeccionados a partir da técnica do acordelado, ou seja, da sobreposição de roletes. A forma da vasilha vai sendo dada a partir da união dos roletes e com o auxílio de uma espátula de cabaça. É com ela, também, que vai sendo dado o alisamento inicial da peça que, por sua vez, será complementado durante a secagem da mesma.

Depois de seca, a vasilha passa por uma queima inicial, sendo colocada junto ao fogo até apresentar sua superfície bem escurecida. Depois, é queimada em atmosfera oxidante com cascas de diferentes tipos de árvores. Para pintar as peças são utilizadas matérias primas minerais. Pequenas pedras são esfregadas em outras maiores com um pouco de água, obtendo-se a tinta. O preto e o vermelho são usados na elaboração de desenhos geométricos que são pintados com a utilização de pincéis naturais como de pequenos pedaços de madeira encapados de algodão, haste de plantas etc. Depois de completa a pintura, deixa-se secar. Em seguida, passa-se uma camada de resina da árvore de jatobá sobre a superfície para dar brilho e fixar a tinta.

Panela Antropomorfa Tribo: Mehinaku
 Localização: Xingu

Tigela Decorada Tribo:Yudjá Localização: Xingu

Panela para Ritual Tribo: Waurá Localização: Alto Xingu


vocabulário visual indígena A CESTARIA Todas as etnias indígenas diferentes do Brasil fazem peças trançadas, cada uma com sua própria técnica e identidade. Sendo que na maioria das tribos, é um trabalho exclusivo dos homens apesar de sua utilização ser feminina. São utilizadas dezenas de plantas, formas, tamanhos, técnicas e principalmente desenhos diferentes. As peças podem ser cestos-recipientes, cestos-coadores, cestos-cargueiros, armadilhas de pesca entre outros . Os padrões dos trançados são todos geométricos devido a limitação que o suporte oferece, porém a composição das formas geométrica levam a figuração de diversos motivos animais e divinos.

Peneira Tribo: Mehinaku
 Localização: Xingu

Cesto com Tampa Tribo: Ye’kuana Localização: Roraima

Cesto com desenho de caranguejo Tribo: Wayana-Apalay Localização: Pará

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O XINGU E SEU VOCABULÁRIO VISUAL A PINTURA CORPORAL “É a história de Sini Kapukuia, o rei das lagartas que trouxe as pinturas. Uma moça, de resguardo, estava na roça. De tarde, Sini Kapukuia apareceu à sua frente, transformado em homem muito bonito. Ela quis saber como eram feitas as belíssimas pinturas de seu corpo. Ele respondeu que lá na tribo dele, eles só andavam com essa roupa e que iria lhe ensinar. Ficaram namorando. Um dia levou-a no mato, mas ao subir na árvore de jenipapo, foi se transformando em lagarta. A moça levou um susto ao perceber que ele não era um homem verdadeiro e foi chamar seus irmãos, que flecharam e mataram Sini Kapukuia. Ele morreu como pessoa, se transformou e partiu, mas a capa do corpo dele ficou no chão e o povo ficou admirando e copiando aqueles lindos desenhos e belas cores. Foi assim que começaram a pintar”. 22 Para o índio, a pintura corporal e seus ornamentos não são meros enfeites. O significado dessa manifestação artística está relacionado à uma imposição de seus símbolos míticos, e à categorização social dos indivíduos. Os motivos de pintura são comuns a ambos os sexos. Porém, a divisão do corpo, como critério de distribuição dos desenhos, difere segundo o sexo. Em muitas tribos, a pintura corporal confere ao homem a sua dignidade humana, significado espiritual e identidade. Assim, para eles, o a decoração é feita no corpo, mas o corpo só existe através dela.

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http://oiapoque.museudoindio.gov.br/exposicao/pintura/ Acesso em 02 Jun. 2009


vocabulário visual indígena Talvez seja por isso que é justamente na pintura corporal onde os índios desenvolveram a sua maior expressão gráfica, alcançando os mais diversos tipos de padrões. É possivel assim se observar desenhos totalmente geométricos, padrões sinuosos e curvilíneos e também alguns padrões executados através de pontilhismo. Novamente aqui, cada padrão possui um significado relacionado à natureza ou a divindades indígenas.

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O XINGU E SEU VOCABULÁRIO VISUAL AS CORES

As cores é outro item da cultura indígena que deve ser levado em conta. Os índios possuem uma variedade cromática em sua cultura diretamente ligada à natureza e o terreno habitado. Sendo a própria natureza a fonte de seus pigmentos. Estes pigmentos naturais estão presentes no barro, frutos e sementes. Pelo barro obtemse os diversos tons de marrom, do pequi o amarelo, no calcário ou tabatinga o branco. Porém, são duas as cores mais evidentes nas tribos: o preto e o vermelho. O preto é obtido da seiva do fruto do jenipapo. 
O nome jenipapo em tupi guarani significa exatamente “fruta que serve para pintar”. Para obter a tinta, elas ralam o fruto do jenipapo e, em seguida, a massa ralada é espremida. Dela desprende-se um líquido que é colocado em uma vasilha e deixado ao sol. A princípio o pigmento é um tanto incolor mas logo em contato com a pele começa a escurecer passando por um azul muito escuro e finalmente chegando ao preto. Sua tinta, dependendo de seu preparo, pode demorar dez dias para sair completamente da pele.

Através da semente do urucum se obtem um vermelho intenso. As sementes são raladas e fervidas em água para se formar uma pasta. Urucum em tupi-guarani significa “vermelho. A pintura na pele com urucum não resiste tanto tempo quanto a do jenipapo. Sua duração é de um dia, às vezes, dois, porém ao passar urucum na pele ele penetra nos poros, e, ao longo do tempo, a pele passa a ter uma tonalidade avermelhada constante e definitiva. Isso acontece pois os poros se entopem de urucum e não conseguem mais eliminá-lo. Por causa disso, os índios também ficaram conhecidos como peles vermelhas. π

PANTONE 532C a.k.a jenipapo

PANTONE 186C a.k.a urucum




Resultado das anรกlises


Conceitos desenvolvidos


RESULTADO DAS ANÁLISES Através da pesquisa foi alcançado o seguinte conceito de jogo: Uma atividade, processo ou evento representativo, despretensioso, incerto, irreal, e envolvente, no qual pessoas voluntariamente tomam decisões orientadas à resoluções de um conflito de acordo com regras que os limitam para alcançar um objetivo, sem criar bens ou recursos. Juntando este conceito, ao entedimento do que é necessário para que ele ocorra satisfatoriamente, e ao conhecimento sobre o universo atual dos jogos, decidi que o jogo a ser realizado será cooperativo. Refletindo assim, a cultura e a vida de uma tribo indígena. Sua identidade visual será baseada nos elementos da arte indígena buscando aproveitar os grafismos e padrões realizados na escultura, cerâmica, cestaria e a pintura corporal. A paleta de cores será baseada no universo cromático indígena e as ilustrações do jogo serão realizadas através de referências fotográficas do xingu.

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mehinaku: da ideia aos layouts


Criando o jogo


MEHINAKU: DA IDEIA AOS LAYOUTS Após a pesquisa, o próximo passo era definir o conceito de jogo, conceito visual e as mecânicas. Analisando o que foi pesquisado e tendo em mente que o jogo seria baseado de alguma maneira no Xingu, foi feito uma busca de tribos que poderiam ser escolhidas e que agregasse algum valor não só ao jogo como também à parte gráfica deste. Por fim, a tribo escolhida foi a “Mehinaku” devido a menor dificuldade de encontrar materiais disponíveis sobre esta e pelo potencial gráfico que a tribo possui.

CONCEITO DE JOGO Com a tribo escolhida ainda faltava definir o conceito de jogo, e para isso foi escolhido a essência da comunidade indígena: a cooperação entre os indígenas na sociedade. Com essa essência foi pensado também em como se desenvolveria o jogo. Os jogadores começariam com uma oca e teriam que fazer a aldeia crescer e prosperar, sempre agradando e mantendo a ira divina estável. Este conceito foi resumido, e passou a se tornar parte integrante da embalagem, pela seguinte frase:

“Coopere e prospere. O destino de sua aldeia está em jogo!”

CONCEITO VISUAL Já com este conceito definido, era preciso ainda escolher e imaginar um conceito visual para tudo. Aqui voltamos

para a pesquisa, onde é estudado sobre Johan Huizinga e suas definições para o jogo. Huizinga nos descreve o jogo como um “círculo mágico”, e que quando estamos jogando entramos neste círculo e passamos a fazer parte de seu universo, portanto o jogador pertence e assiste ao jogo. Tendo isso em mente, ficou definido de que o jogo teria duas vertentes gráficas: a arte indígena e a ilustração. Assim quando estamos diante de uma visão exterior no jogo é adotada a ilustração, e quando a visão é interior ao círculo o que visualizamos é a arte indígena. Era desejado que esta relação ficasse clara logo no momento em que a embalagem fosse aberta e desta maneira elementos como a caixa, cartas e dados foram cuidadosamente pensados para passar esta ideia.

MECÂNICAS Depois de definidos os conceitos o último passo para a criação do jogo era selecionar as mecânicas que poderiam ser utilizadas para melhor expressar o conceito de jogo e transmitir a sensação de comunidade indígena. Ao analisar a lista presente na pesquisa foram escolhidas as seguintes mecânicas: • Administração de cartas • Colocação de peças • Cooperação • Rolagem de dados

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MEHINAKU

O povo Mehinaku sempre viveu na região do Alto Xingu. Eram milhares, mas o contato com os brancos trouxe doenças e mortes. Hoje eles são aproximadamente 200, que vivem às margens do Rio Curusevo, no Parque Nacional do Xingu, segundo as tradições de seus ancestrais. Seu idioma é o Mehinaku, do tronco Aruak. Os Mehinakus contam que seu ancestral criou três mulheres com toras pintadas e enfeitadas de urucum. De uma destas mulheres nasceram os gêmeos Sol e Lua. E estes astros, disparando flechas do céu fizeram surgir sua tribo.


ELEMENTOS TEXTUAIS e UNIVERSO CROMรกTICO


MEHINAKU: DA IDEIA AOS LAYOUTS Os primeiros elementos do projeto gráfico a serem definidos foram a tipografia, o logotipo e o universo cromático.

TIPOGRAFIA Com a tipografia surgiram os primeiros problemas. Ao pesquisar sobre a cultura indígena ficou claro que os índios não possuíam um alfabeto ou caligrafia própria, sendo que muitas vezes utilizavam de desenhos pra contar histórias. Assim,optou-se por tipografias que remetessem visualmente à algo indígena, mesmo não tendo esta natureza. Para o logotipo foi escolhida a tipografia Brolga pelo seu formato rústico que se assemelha ao artesanato feito pelos índios e que transmite uma atmosfera misteriosa e intrigante.

OBS: A tipografia original precisou ser editada, pois esta não possuía o caractere “Ç”.

ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUVWXYZ abcdefghijklmnopqrstuvwxyz 1234567890 Como tipografia auxiliar para textos longos, a família tipográfica Book Antiqua foi utilizada com todas suas variações dando uma melhor hierarquia visual e facilitando a legibilidade e leiturabilidade dos textos. ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUVWXYZ abcdefghijklmnopqrstuvwxyz 1234567890 ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUVWXYZ abcdefghijklmnopqrstuvwxyz 1234567890 ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUVWXYZ abcdefghijklmnopqrstuvwxyz

Para os títulos das cartas, manual e alguns outros elementos, optou-se pela tipografia Orion. Esta se integrou perfeitamente com a Brolga e também conseguiu transmitir a sensação desejada de escrita indígena .

1234567890 ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUVWXYZ abcdefghijklmnopqrstuvwxyz 1234567890

BROLGA

Ethan Paul Dunham Fonthead Design 1995

ORION

Ethan Paul Dunham Fonthead Design 1996

BOOK ANTIQUA

Monotype Type Drawing Office Agfa Monotype Corporation 1991

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MEHINAKU: DA IDEIA AOS LAYOUTS LOGOTIPO A partir da tipografia escolhida foi ficou decidido aplicar uma textura natural e adicionar uma tridimensionalidade para que esta se destacasse e fosse facilmente percebida na embalagem, também reforçando o caráter rústico da tipografia.


ELEMENTOS TEXTUAIS E UNIVERSO CROMÁTICO UNIVERSO CROMÁTICO Para se criar o universo cromático do jogo, buscou-se imagens relevantes e ricas nas cores mais presentes entre os índios da tribo e da região do Xingu. A partir destas imagens foi gerada uma paleta de cores para ser utilizada como referência.

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ELEMENTOS TEXTUAIS E UNIVERSO CROMÁTICO

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ELEMENTOS TEXTUAIS E UNIVERSO CROMÁTICO

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ELEMENTOS SIMBÓLICOS


MEHINAKU: DA IDEIA AOS LAYOUTS Além da tipografia e do universo cromático ainda existem diversos outros elementos que juntos compõem o design, agregando significado ao produto. Aqui podemos destacar os padrões, texturas, pictogramas e as ilustrações utilizadas no projeto.

PADRÕES A partir do que foi pesquisado, percebeu-se a importância da representação gráfica indígena através de padrões. Pensando nisso, diversos padrões foram utilizados na embalagem como apoio gráfico.

TEXTURAS A textura entra no projeto para passar a ideia do natural. Através dela busca-se expressar e trazer o jogador para o ambiente indígena. A textura está presente em todos os elementos do jogo, seja discretamente no fundo das cartas e do manual, representando o suporte da pintura indígena, ou bem visíveis como a cestaria, folhas e o casco de tronco nas laterais da embalagem.

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MEHINAKU: DA IDEIA AOS LAYOUTS PICTOGRAMAS Existem dois tipos de pictogramas no jogo: os de recursos e os das cartas. Os pictogramas de recursos foram pensados de modo que parecessem com um desenho indígena. Porém, ao se tentar fazê-los muito semelhantes à estes desenhos, ficava confuso o entendimento dele. Assim, o escolhido foi fazer um desenho um pouco mais figurativo porem com um traço gestual que lembrasse os desenhos feitos pelos índios. Já os pictogramas das cartas são bem simplificados para que não haja conflito com a tipografia que os acompanha.

+ 99 + 55 22 + 66 + 666 + 2 34 333 6 7

=6 =7 =9 =11 =13 888


ELEMENTOS SIMBÓLICOS ILUSTRAÇÕES A ilustração tem um papel fundamental: cativar os jogadores e convidá-los à entrar no mundo do jogo. Para todas elas foi desenvolvido um briefing e, juntamente a este, foram entregues referências visuais e esboços para que o ilustrador Pedro Vergani pudesse entender a atmosfera e os elementos que deveriam estar presentes nas ilustrações.

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ELEMENTOS SIMBÓLICOS

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ELEMENTOS SIMBÓLICOS

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A EMBALAGEM


MEHINAKU: DA IDEIA AOS LAYOUTS Além de toda a parte visual, houve também uma preocupação especial com o processo de produção, custo, montagem e armazenamento de componentes da embalagem. Foi escolhido explorar o máximo de possibilidades para a parte externa, mas principalmente para a interna, até que se encontrasse uma solução bastante satisfatória.

ARTE Devido ao conceito visual e as conclusões obtidas na pesquisa sobre jogos, a embalagem de “Mehinaku” vai além da simples função de armazenar e transportar os componentes. Ela representa a entrada do jogador ao “círculo mágico” do jogo. É quando o jogador deixa sua visão exterior e entra no contexto do jogo e passa a visualizar os elementos como um indígena. A caixa foi desenvolvida de modo a passar essa ideia de maneira subliminar. Sua tampa possui ilustração frontal de índios ofertando à seus deuses e o tronco do Kuarup, e na lateral quatro dos cinco personagens existentes no jogo. Já a base é desenhada com uma textura de cestaria para dar a ideia de algo feito pelos índios, pois ela representa justamente o momento em que o jogador entra no “circulo mágico”. No verso está presente as especificações necessárias, uma representação em 3D de todo o jogo, e um texto que passa o conceito e a atmosfera do mesmo.

KUARUP

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É um ritual de homenagem aos mortos ilustres celebrado pelos povos indígenas da região do Xingu. O rito é centrado na figura de Mawutzinin, o demiurgo e primeiro homem do mundo da sua mitologia. Kuarup também é o nome de uma madeira da qual é feito o tronco utilizado no ritual.


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A EMBALAGEM

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MEHINAKU: DA IDEIA AOS LAYOUTS CARD SLEEVES

Card Sleeves são bolsas plásticas utilizadas para evitarem que cartas sejam danificadas, especialmente as cartas colecionáveis, evitando assim perda de valor no mercado.

Estrutura Toda a estrutura da embalagem foi pensada de forma a ser produzida sem cola, tornando seu custo de produção mais barato e facilitando sua montagem. Para a parte externa foi utilizado um dos tamanhos padrões de mercado: 29,7 x 29,7 x 7cm. Já para a parte interna, foram desenvolvidas estruturas especiais e exclusivas para um melhor armazenamento dos componentes do jogo. Os dois tipos de baralhos ficam em espaços separados e com uma altura que permite que os jogadores coloquem card sleeves em suas cartas, armazenando-as de volta sem nenhum problema. Os cinco dados ficam em destaque na embalagem em um compartimento especial, existe uma área para os recursos e player aids, e um local para fixar o tabuleiro em cima de tudo, impedindo que os componentes se espalhem e misturem com a movimentação da caixa.


A EMBALAGEM

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A EMBALAGEM

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FOTOGRAFIA Da embalagem pronta


O tabuleiro


MEHINAKU: DA IDEIA AOS LAYOUTS Sem dúvida a parte mais importante do jogo é o tabuleiro. Todas as informações dispostas no tabuleiro devem ser compreendidas pelo jogador, por isso é necessário um cuidado especial para criar a relação Jogador x Tabuleiro. Pensando nisso, o processo de criação do tabuleiro foi o mais elaborado. Assim, recortando e remontando todas as peças que deveriam constar no tabuleiro, foi possível chegar no rough do layout final. O tamanho escolhido para o tabuleiro foi 42 x 59,4 cm quando aberto e 21 x 19,8 cm quando fechado. Essa escolha se deu pelo fato deste ser um tamanho padrão no mercado que já visa um melhor aproveitamento de papel. Sua produção exige manuseio e deve ser observado a forma correta de dobra e corte.

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FOTOGRAFIA DO TABULEIRO PRONTO


AS cartas


MEHINAKU: DA IDEIA AOS LAYOUTS Existem três categorias de cartas no jogo: Cartas de Personagem, Cartas de Demandas Divinas e Cartas Indígenas. Cada categoria possui um verso específico, sendo que as cartas de personagem apresentam em seu verso apenas o logotipo do jogo e as outras duas desenhos índigenas.

Devido ao conceito visual, as cartas de personagens são ilustrativas pois trata-se de uma visão externa dos jogadores, enquanto as outras expressam um caráter interno do jogo. Porém, em certos momentos, as Cartas de Demandas Divinas e as Cartas Indígenas também retratam elementos externos aos índios, portanto algumas dessas cartas também apresentam ilustrações.

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MEHINAKU: DA IDEIA AOS LAYOUTS POLÍPTICO

Os polípticos são pinturas divididas em multiplas seções ou painéis. Foram comuns entre os pintores da renascença, e a maioria eram desenhados para serem peças de altar em igrejas e catedrais.

CARTAS DE PERSONAGENS Na ilustração das cartas de personagem se optou por utilizar da técnica do políptico para representar todos os personagens como parte de uma mesma aldeia e reforçar a ideia de comunidade e o conceito do jogo. Abaixo da ilustração vem a descrição do personagem escrita com a tipografia Book Antiqua, e logo abaixo a descrição, o título da carta utilizando a tipografia Orion.


AS CARTAS CARTAS DE DEMANDAS DIVINAS O desenho do demônio sentado irá na parte superior com seu respectivo valor de ira. No centro estará a demanda divina e a maneira que a mesma deve ser paga através das cartas indígenas. Na parte inferior da carta

estarão os quatro pictogramas, cada um acompanhado do valor que deve ser oferecido, caso o jogador resolva pagar através de recursos. Seu verso é a representação da máscara de uma divindade.

VALOR DE IRA

DEMANDA EM CARTAS

DEMANDA EM RECURSOS

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MEHINAKU: DA IDEIA AOS LAYOUTS CARTAS INDÍGENAS As cartas possuem seu número em destaque, pictograma e o nome do recurso que ela representa centralizados. Seu verso é a representação gráfica e figurativa de um peixe.

NÚMERO DA CARTA

PICTOGRAMA

NOME DO RECURSO


FOTOGRAFIA DAS CARTAS PRONTAS


dados: real e virtual


MEHINAKU: DA IDEIA AOS LAYOUTS Os dados foram desenvolvidos especialmente para o jogo. Com base em desenho indígena representando um demônio sentado, foi feita uma simplificação para que esta pudesse ser reproduzida de maneira satisfatória, através de um processo de gravação a laser, em uma escala de 14mm na face do dado preservando os detalhes. As cores e textura dos cincos dados refletem a atmosfera mística e misteriosa das divindades indígenas, visto que é justamente através do dado que são gerados os recursos do jogo para serem ofertados mais tarde.

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CONTEXTO LÚDICO


DADOS: REAL E VIRTUAL Também foi criada uma versão digital dos dados para iPhone. Através de templates fornecidos pela empresa MotionX foi possível gerar uma versão digital dos dados customizados do jogo que podem ser baixados da internet por qualquer jogador e utilizados no aplicativo Dice Plus em seu iPhone.

DICE PLUS

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Simulador de dados para iPhone. Para jogá-los, você sacode fisicamente o aparelho. Os dados se misturam e o telefone vibra, dando um efeito mais realista.


Livreto de regras


MEHINAKU: DA IDEIA AOS LAYOUTS Para o livreto de regras foi elaborado um grid simples de duas colunas e páginas no formato a5, pensando em um bom aproveitamento de papel. A capa vem de um novo enquadramento da arte da embalagem, e várias ilustrações derivadas do jogo são utilizadas ao longo das páginas do manual. A tipografia dos títulos, como já dito, é a Orion e todo o corpo do texto é escrito utilizando as variações da Book Antiqua. O fundo possui uma textura suave e natural, para não interferir na leitura, grafismo na parte inferior e numeração das páginas dentro da imagem das folhas, compondo uma identidade com o restos dos elementos do jogo.

15 mm

4 mm

15 mm 15 mm

20 mm

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MEHINAKU: DA IDEIA AOS LAYOUTS



OUTROS COMPONENTES


MEHINAKU: DA IDEIA AOS LAYOUTS Além de tudo que foi descrito, o jogo possui ainda alguns outros componentes: peões, peças de recursos, marcadores de ira e população, bases para as cartas de personagem e as peças das ocas a serem construídas. Todos estes foram feitos levando em consideração os componentes existentes no mercado e o conceito visual do jogo.

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Produção gráfica


MEHINAKU: DA IDEIA AOS LAYOUTS Embalagem Externa Cartão Duplex 420g/m2² Laminação BOPP Fosca Faca de Corte/Vinco Especial Manuseio

Cartas

Papel Couché Fosco 240g/m2² Laminação BOPP Fosca Faca de Corte

Livreto de Regras

Papel Couché Fosco 120g/m2² Interna Cartão Colorplus Los Angeles 420g/m2 Faca de Corte/Vinco Especial Manuseio

Tabuleiro

Papel Offset 120g/m2² Laminação BOPP Fosca Gofragem Tela Fina Empastamento em Cartão Paraná Faca de Corte/Vinco Especial Manuseio

Tokens

Papel Offset 120g/m2² Laminação BOPP Fosca Gofragem Tela Fina Empastamento em Cartão Paraná Faca de Corte/Vinco Especial

Player Aids

Papel Couché Fosco 120g/m2²

DADOS Termoplástico de Estireno-Acrilonitrila (SAN) Gravação a Laser

PEÕES e marcadores Madeira de Reflorestamento

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CONTEXTO LÚDICO MÁRIO SEABRA

Nascido em Lisboa em 1931, deixou sua carreira na publicidade em Portugal e se tornou pioneiro na criação de jogos no Brasil. Seu nome é reconhecido e respeitado entre todos criadores de jogos no Brasil. Entre suas publicações destacam-se jogos como War 2, Bot, Ecologia, RPM e Viajando Pelo Mundo

Settlers of Catan

Desenvolvido por Klaus Teuber e publicado em 1995 por Kosmos. Jogo responsável pelo grande recall aos jogos de tabuleiro, sendo considerado a Mona Lisa da renascença dos jogos de tabuleiro. Inaugurou a categoria dos jogos modernos conhecidos como “eurogames”.

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Por que teatro com tantos cinemas? Responder perguntas com outras perguntas pode parecer uma forma de não querer responder ou tentar se esquivar destas, porém neste caso há um histórico que nos remete a uma linha de pensamento errônea que surge sempre que uma mídia ou meio de comunicação é lançado. Assim que as primeiras experiências cinematográficas surgiram, foi dito que o teatro acabaria. Depois, com a televisão, foi a vez do cinema ser alvo de insinuações. Agora, eu pergunto: O teatro acabou? E o cinema? Com os jogos de tabuleiro acontece o mesmo. Mário Seabra1 costuma falar que aquele que diz e prevê a substituição dos jogos de tabuleiros pelos eletrônicos estará caindo na mesma armadilha ideológica. O mercado de jogos eletrônicos é de fato muito maior que o de jogos de tabuleiro, chegando a vender nos EUA $21 bilhões2 contra $794 milhões3 dos jogos de tabuleiro. Porém, ao fazer uma análise mais aprofundada, é possível observar que os jogos de tabuleiro não só não acabarão como também é possível notar que, nos últimos anos, vem ocorrendo o crescimento deste mercado. Carlos Tilkian, presidente da Brinquedos Estrela, em matéria para a seção diversão do site Abril.com4, afirma que os jogos nunca saíram de moda e que a concorrência com videogames e web parece não abalar o setor. De acordo com ele, jogos de tabuleiro formam a categoria que mais cresceu dentro do segmento de brinquedos em 2008.

MSNBC - 15/01/2009 Video game sales top $21 billion in 2008 Bloomberg News - 13/02/2009 - 00:01

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Monopoly, Candy Land May Offer Refuge to Families in Recession Abril.com - 20/01/2009 - 08:25

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“A nossa percepção é a de que games não substituem os jogos. São um complemento. Não houve queda nas vendas, elas ainda são impressionantes. Jogos são os brinquedos que menos sofrem com web e games”

No caso do mercado estrangeiro de jogos de tabuleiro a resistência ainda vai além. E se tomarmos como exemplo o jogo de tabuleiro “Settlers of Catan”5 teremos certeza disso. Desde sua introdução no mercado, o jogo se tornou fenômeno, foi traduzido em mais de 30 línguas e vendeu mais de 15 milhões de cópias. Comparando com o jogo de videogame considerado megahit e sucesso mundial “Halo 3”, veremos que este vendeu apenas pouco mais que a metade das vendas do Catan. Jay Tummelson presidente da Rio Grande Games vendeu meio milhão de títulos em 2008. “Estamos crescendo cerca de 30 a 35 porcento ao ano.” afirma ele em matéria para a revista Wired6. “Nos EUA, a maioria dos meus clientes este ano não eram clientes há dois ou três anos atrás. Eles não sabiam que estes jogos existiam.”

Jogos de tabuleiro ganham novas versões e viram pretexto para balada diferente em SP Revista Wired - 17.04 | Abril 2009

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Monopoly Killer: Perfect German Board Game Redefines Genre


Considerações Finais


qual foi o resultado?


considerações finais A princípio realizar a pesquisa foi uma tarefa um tanto quanto complexa, pois os livros eram escassos, e o pouco que se encontrava era em outros idiomas. Apesar dessas dificuldades, a pesquisa foi concluída com sucesso e neste trabalho foi possível perceber o real valor de uma pesquisa bem elaborada para todo o projeto. Talvez a parte mais valiosa da pesquisa foi a oportunidade de descobrir, aprender e utilizar a cultura indígena de nosso país aplicada ao design gráfico. Cultura esta que muitos brasileiros desconhecem e nem tentam conhecer. Não se pode deixar de afirmar também que o processo criativo foi a parte mais prazerosa de ser realizada, talvez pelo tema, ou talvez pela oportunidade de explorar as mais diversas áreas do design gráfico em um único projeto. O trabalho alcançou, quem sabe até superou, o nivel de qualidade que era esperado. Tanto que, somando o resultado final à ideia de divulgar o processo de criação na internet através de um blog, foi possível alcançar algo inesperado: com essa divulgação, este trabalho rendeu um contato internacional requisitando o redesign de um jogo a ser lançado comercialmente nos Estados Unidos.

Assim, após a conclusão ficou o desejo de explorar mais esse tema, e quem sabe seguir, mesmo que em paralelo à minha carreira no design, para essa área de design gráfico de jogos de tabuleiro. Para isso, surgiu (e aqui deixo em testemunho) a ideia de aproveitar novamente esta pesquisa e realizar um novo projeto. Desta vez, percebendo e se aproveitando do nicho no mercado, a criação de um livro sobre design gráfico de jogos de tabuleiro.

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ANEXOS


Jogo de tabuleiro se renova, volta Ă moda e ganha mercado


ANEXOS

São Paulo, domingo, 22 de novembro de 2009

Forma de entretenimento, antes ameaçada pelos videogames, amplia presença no setor de brinquedos no Brasil e no exterior “Nova onda” começa na Alemanha, a terra dos jogos em família, com produto de regras mais simples e menor duração, mas com estratégia

ERNANE GUIMARÃES NETO

DA REDAÇÃO

Uma renovação nos jogos de mesa está salvando esse mercado e aumentando sua participação no segmento de brinquedos e jogos. Essa forma de entretenimento, até então ameaçada de extinção pelos jogos eletrônicos, ganha espaço no Brasil e já ostenta lançamentos da “nova onda” -chamada de “era dos jogos alemães”. Há 14 anos, foi lançado na Alemanha “Die Siedler von Catan” (Os Colonos de Catan). Propunha regras simples, mas com estratégia, e menor duração da partida. Outros sucessos, como “Carcassonne”, serviram para renovar noitadas familiares e alterar o catálogo de produtos nas lojas de brinquedos europeias e, nesta década, norteamericanas. Neste ano, as empresas esperam vender 500 milhões, ante 450 milhões em 2008. Nos EUA, onde a nova onda

de jogos de sociedade é mais recente e fez reagirem marcas estabelecidas (como a Hasbro, de “Monopoly”), calcula-se em mais de 20% o crescimento das vendas no ano passado. No Brasil, os jogos de sociedade representaram 7,8% do mercado de brinquedos em 2008, ante 7,1% em 2007, segundo a Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos. Mas criações inovadoras chegam às lojas sem alarde (e com problemas de direitos autorais -leia texto nesta página). Sociabilidade O argumento básico de todo entusiasta dos jogos de sociedade é justamente que têm a vantagem de reunir pessoas numa ocasião de sociabilidade, algo que o entretenimento on-line não permite com a mesma intensidade. Os jogos eletrônicos, em geral, também não conseguem, já que apostam na habilidade manual e quase sempre são concebidos para apenas dois jogadores simultâneos. Mais do que restabelecer as vendas de um segmento, a nova onda conseguiu fazer diversos profissionais migrarem dos computadores para os dados, as cartas e os peões. O americano Mark Kaufmann trabalhava com computação até fundar, há sete anos, a Days of Wonder, uma das responsáveis por levar “diversão para toda a família” -mas ao estilo europeu- para os EUA. Reiner Knizia, a maior celebridade mundial entre os

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ANEXOS criadores de jogos, tem produtos adaptados para versão eletrônica, mas insiste num caminho oposto: na feira de Essen (leia texto ao lado) deste ano, um de seus mais badalados lançamentos é uma adaptação “social” de “Tetris”, o onipresente jogo eletrônico russo. Seu nome valoriza ainda a embalagem de um novo produto da Lego -a marca investe em tabuleiros formados por suas peças de encaixe. À Folha Knizia repete o mote de que “os jogos sociais sempre existirão”, mas ressalva que a cultura lúdica de cada país é determinante para o mercado. A Alemanha é a terra dos jogos em família: a participação dos jogos de sociedade, de 13% no mercado de brinquedos e jogos, é a maior do mundo. A fama de jogadores não é nova: a “Enciclopédia” francesa do século 18 citava Tácito (século 1º), segundo quem os germanos apostavam a própria vida em jogos de azar, para explicar: “Se hoje consideramos a dívida do jogo uma das mais sagradas, é talvez uma herança da antiga exatidão dos germanos em cumprir esses compromissos”. Bernd Dietrich, empresário alemão que está lançando a versão europeia do brasileiro “Riquezas do Sultão”, cita motivos econômicos para explicar o sucesso dos jogos no seu país. Para ele, jogar “requer tempo livre; e, para isso, é preciso já estarem resolvidas as questões de comer e beber. Os alemães tiveram melhores condições na industrialização, que se refletem nesse comportamento”.

Entretenimento mais barato que o videogame, o jogo de sociedade cresce em momentos de crise econômica. Mas a crise de 2008 já passou. Fica a questão sobre o potencial das novidade contra as velhas marcas. Dados da luderia Ludus -lanchonete com uma vitrine de centenas de jogos e instrutores para explicar as regras-, em São Paulo, apontam crescimento do interesse. Apesar de manter jogos conhecidos, a casa verifica que os importados ganharam a preferência de seu público (cerca de 52% a 48%).



ENTREVISTA: REINER KNIZIA


ANEXOS como você começou sua carreira de game designer e qual foi sua maior motivação? Eu sempre amei jogos. Aos 10 anos de idade, eu desenhava meus próprios joguinhos, para jogar com novas temáticas excitantes que não existiam no mercado ou que eu não podia comprar.

Dentre as centenas de jogos que você criou, tem algum que tem um valor especial na sua vida? Porque? Eu não tenho um jogo favorito. Existem tantas pessoas diferentes com quem se pode jogar, tantas situações de jogo e diferentes estados de espírito, e cada um deles requer um jogo diferente. O segredo é sempre ter o jogo exato para a ocasião certa.

qual é o melhor jeito de definir seu processo criativo? O processo natural vai de uma ideia inicial, passa por uma fase conceitual e depois chega à fase mais longa que são os testes e a sintonia fina, até que finalmente eu tenha um protótipo master. Esse master eu guardo por algumas semanas e depois o jogo uma última vez. Se eu estiver convencido de que o jogo está perfeito, então eu ofereço o protótipo as editoras.

Existe alguma linha, receita ou roteiro que você geralmente segue?

Não! Eu deliberadamente evito seguir qualquer procedimento pré-fixado. Eu aprendi ao longo dos anos que é importante encontrar novos pontos de entrada para os jogos. Design de jogos, na minha opinião, não é uma ciência, é uma arte. Não existe uma lista fixa que você possa ir seguindo para desenhar o jogo perfeito. Muito pelo contrário – se você sempre começar no mesmo ponto e seguir pelo mesmo caminho, você não pode esperar criar algo excepcionalmente original. Eu sei que se começar com algo novo e original, eu tenho melhores chances de que o protótipo final seja bem original.

geralmente, durante o processo de criação, você trabalha sozinho ou tem uma equipe? Eu tenho uma equipe de mais de uma dúzia de jogadores bem experientes e criativos junto a mim. Eu encontro com um grupo diferente quase que diariamente, e nós discutimos e jogamos novos designs. Você encontra nomes de quem contribuiu com cada jogo nos créditos no final de cada manual. Esses amigos contribuem muito com os meus designs e eu sou muito agradecido por essas contribuições.

O quanto é importante o design gráfico para o jogo? Isso depende do tipo de jogo. Um jogo abstrato como Ingenious não requer um tema. Um jogo semi-abstrato como Keltis, precisa de um sabor temático, mas os mecanismos do jogo não estão realmente entrelaçados

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ANEXOS com o tema. Já um jogo temático como Arte Moderna, Amun-Re, devem, claro, embutir as mecânicas de jogo muito mais profundamente no tema.

Algumas pessoas criticam seus jogos por serem muito abstratos, mesmo quando tem um tema inserido. O quão é importante o tema para um jogo? Existem dois aspectos diferentes que eu gostaria de cobrir aqui. Primeiramente, na minha opinião, todo jogo necessita de algo especial para se destacar em meio a todos os jogos novos publicados a cada ano. O tema é frequentemente tal aspecto especial que chama a atenção dos compradores. Mas existem muitas outras maneiras de chamar a atenção também. Uma vez que o jogo se destaca com algo em especial, isso vai acionar as vendas iniciais. Somente após essa vendas iniciais é que os jogadores irão jogar os jogos, e sendo um jogo excelente, os jogadores jogarão mais e mais com outros jogadores, o que gerará mais vendas e sucesso para o jogo. Em segundo lugar, cada autor de jogos tem sua própria escrita. Eu sou um cientista. Eu gosto de basear meus jogos em poucas regras gerais que são facilmente entendidas e que criam um jogabilidade profunda e desafiadora. Outros autores são contadores de histórias, com muitas mecânicas e detalhes associados a regras longas, o que algumas vezes da a impressão de um jogo mais temático. Essas pessoas entretanto são as vezes criticadas por sobrecarregar suas regras com muitos detalhes. Eu acredito que pra qualquer coisa que você

faça, sempre haverão algumas pessoas para criticar sua abordagem...

Ainda sobre o tema, alguns jogadores sentem que a imersão nesse tema é um ponto forte. Qual sua opinião sobre a relevância dessa imersão enquanto desenha seus jogos? Eu acredito que eu já abordei esse aspecto na questão anterior.

hoje, muitas mudanças estão afetando a industria do entretenimento, como você os jogos de tabuleiro competindo com outras mídias como video games, jogos online, etc Eu estou vendo isso sobre uma ótica mais ampla: Jogos estão competindo com outras atividades de lazer como leitura, cinema, TV, esportes e viagens. Sob essa ótica, qualquer mídia que nos ajude a difundir os jogos e o hábito de jogar para as pessoas é mais do que bem vinda. Eu acredito que alguém que esteja jogando um jogo de video game ou online, está muito mais próximo dos jogos de tabuleiro do que outras pessoas que lêem ou viajam no seu tempo livre.

recentemente estamos testemunhando muitos jogos de tabuleiros, como carcassone e catan, migrando para mídias eletrônicas. O contrário também ocorre com games como Halo e Starcraft ganhando suas versões em tabuleiro.


ENTREVISTA: REINER KNIZIA O que você pensa sobre essa migração entre mídias? Com a emersão de jogos eletrônicos que são acessíveis, eu acredito que é muito natural que bons jogos migrem entre diferentes mídias e plataformas. Muitas das minhas mais fortes marcas de jogos de tabuleiro e cartas, já foram transferidas para o universo online. Em algumas ocasiões, como no jogo ganhador do prêmio de Jogo do Ano na Alemanha – Keltis, eu investi tempo adicional para adaptar a jogabilidade básica para a nova mídia. Hoje, Keltis não está disponível somente como um jogo de tabuleiro, mas também como um jogo em CD-ROM, como jogo online, como jogo para celular e em breve como jogo para Nintendo DS. A migração de jogos para diferentes plataformas permite que eles alcancem mais pessoas, o que só traz benefícios para a cultura lúdica.

nessa indústria de board game design, você geralmente se atualiza em relação à lançamentos de outros designers? Quais designers além de ti você apontaria como os melhores no mercado? Como vocês sabem, eu estou sempre trabalhando em diversos projetos novos. Eles requerem muito playtest. Eu estou jogando todos os dias, mas quase nunca há tempo para jogar jogos de outras pessoas. As vezes eu lamento isso, mas isso também tem vantagens – quando estou desenhando um jogo novo, muitas decisões tem que ser tomadas sobre vários aspectos do jogo. O cérebro humano é engraçado, a medida que é muito mais difícil pensar em uma solução original, quando se

sabe uma solução que outro designer já tenha usado. Como eu não conheço as soluções dos outros designers, é muito mais fácil para mim ser inovador.

Keltis foi o seu primeiro jogo a ganhar um prêmio Spiel Des Jahres, e isso veio depois de anos de sucesso e vários outros prêmios. Quão importante foi isso, e qual o impacto deste prêmio para você? Eu fiquei encantado em ganhar o Jogo do Ano da Alemanha com o Keltis, e ganhar o prêmio de Jogo Infantil do Ano da Alemanha com o Wer War’s ao mesmo tempo. Certamente teve um grande impacto. Ganhar prêmios é legal, mas claro que eu tenho consciência que eu não posso ganhar todos os prêmio todo o tempo. Dessa forma eu não baseio minha felicidade em ganhar prêmios. Eu foco minha enrgia em desenhar jogos excelentes, porque é ai que eu posso realmente exercer influência.

quais são as maiores dificuldades para quem quer começar na carreira de board game design? Alguma dica? O fator mais importante para o sucesso de um designer de jogos, é que ele tenha um excelente produto a oferecer aos editores. Para qualquer novato eu recomendo que ele gaste seu tempo e teste, teste e teste mais um pouco com as mais diferentes pessoas até que o design esteja perfeito. Somente então ele deve procurar os editores. v

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ANEXOS o que devemos esperar de Reiner knizia no futuro próximo, pode revelar alguma coisa? Como sempre, podem esperar muitos jogos diferentes com os quais espero que vocês se deleitem. No momento, nós estamos lançando “Samurai - the Card Game” e “RA – the Dice Game”, ambos com a Rio Grande Games. Para Essen, nós estamos planejando um segundo jogo na série do RA, o qual eu estou muito ansioso. Com as premiações de jogo do ano, é natural se esperar que mais oportunidades de jogo para Keltis e Wer War sejam publicadas. Existe muito mais por vir, mas como sempre, eu deixo para os editores os anúncios de novos lançamentos.

uma questão mais pessoal, quando não esta criando jogos o que gosta de fazer? algum hobby? Primeiramente eu gostaria de dizer que desenhar jogos é o meu hobby! Eu amo desenhar e jogar jogos, e eu gasto muito tempo da minha vida focado nessa atividade. Isso não inclui somente o processo de desenvolver e jogar o jogo, mas também a comunicação com os editores, as viagens para feiras e convenções, o acompanhamento do processo produtivo e marketing dos jogos, e algumas vezes dar entrevistas... Mas para responder a pergunta, eu gosto de esportes, ler e passar tempo na natureza e com outras pessoas. Felizmente, através dos jogos, eu tenho a oportunidade de viajar para diversos países e conhecer diferentes pessoas e culturas. Conhecer jogadores pelo mundo é uma das maiores recompensas para mim.




BIBLIOGRAFIA


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BIBLIOGRAFIA

Referências bibliográficas COSTA, Maria Heloisa Fénelon. O mundo dos Mehináku e suas representações visuais Brasília: Ed. Universidade de Brasília, 1988 HUIZINGA, Johan. Homo ludens: O jogo como elemento da cultura. São Paulo: Perspectiva, 2007 KOSTER, Raph. A theory of fun in game design. Arizona: Paraglyph Press, 2005 MICHAEL, David; CHEN, Sande. Serious games: games that educate, train, and inform. Boston: Thomson Course Technology PTR, 2006 RIBEIRO, Berta G.. Arte indígena, linguagem visual / Indigenous art, visual language Belo Horizonte: Itatiaia ; São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo, 1989 SEABRA, Mário, (ed.). Os melhores jogos do mundo. São Paulo: Abril, 1978 TINSMAN, Brian. The game inventor’s guidebook: how to invent and sell board games, card games, role-playing games, & everything in between!. New York: Morgan James Publishing, 2008 VIDAL, Lux, (org.). Grafismo indígena: estudos de antropologia estética. São Paulo : Studio Nobel : Ed. da Universidade de São Paulo. FAPESP, 2007 VILLAS BÔAS, Orlando. A arte dos pajés: impressões sobre o universo espiritual do índio xinguano. São Paulo: Globo, 2000 ZATZ, Silvia; ZATZ, André; HALABAN, Sérgio. Brinca comigo!: tudo sobre brincar e os brinquedos. São Paulo: Marco Zero, 2006


BIBLIOGRAFIA

Referências Não bibliográficas ALVES FILHO, Francisco. Diversão renovada. Istoé, São Paulo: Três, ano 32, n0 2051, p. 63, mar. 2009. CURRY, Andrew. Monopoly killer: perfect german board game redefines genre. WIRED, San Francisco: Condé Nast, ano 17, n0 04, p. 60-72, abr. 2009. DOYLE, Mike, 14 abr. 2004. Supplemental notes on the Function(s) of Board Game Art. Disponível em: < http://mdoyle.blogspot.com/2009/04/supplemental-notes-on-functions-of.html > Acesso em 14 dez. 2008. FALCÃO, Paula, 10 fev. 2008. O jogo de tabuleiro como função cultural. Disponível em: < http://www.ilhadotabuleiro.com.br/?codn=41&pag=colunas&link=home > Acesso em 14 dez. 2008. MARCELO, Antonio, 26 set. 2007. Como podemos incentivar a propagação dos jogos de tabuleiro. Disponível em: < http://www.ilhadotabuleiro.com.br/?codn=28&pag=colunas&link=home > Acesso em 12 dez. 2008. MARCELO, Antonio, 11 set. 2007. O dilema de tostines nos jogos de tabuleiro. Disponível em: < http://www.ilhadotabuleiro.com.br/?codn=24&pag=colunas&link=home > Acesso em 12 dez. 2008. Schwartz, Allison Abell. 13 fev. 2009. Monopoly, Candy Land May Offer Refuge to Families in Recession. Disponível em: < http://rismedia.com/2009-03-28/bonding-over-board-games-family-game-night-is-back/ > Acesso em 01 jun. 2009. STUMPF, Ricardo, 10 dez. 2007. O jogo de tabuleiro como ferramenta. Disponível em: < http://www.ilhadotabuleiro.com.br/?codn=32&pag=colunas&link=home > Acesso em 12 dez. 2008. ZATZ, André; HALABAN, Sérgio. Artigos. Disponível em: < http://www.ludomania.com.br/Variedades/variedades.html > Acesso em 27 maio. 2008. Museu do Índio. Pesquisa Escolar Disponível em: < http://www.museudoindio.org.br/template_01/default.asp?ID_S=33 > Acesso em 05 jun. 2009.

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ÍNDICE IMAGÉTICO


172

índice imagético

© Mayfair Games Pág. 27

© Arizona Board of Regents Pág. 43

© Trustees of the British Museum Pág. 55

© Risa Korris Pág. 56

© Fantasy Flight Games Pág. 28

© Edilán-Ars Libri Pág. 43

© Backgammon Boards Pág. 55

© Center for History and New Media Pág. 57

© Tropical Games Pág. 28

© TerrorBull Games Pág. 44

© Trustees of the British Museum Pág. 56

© Early Monopoly Game Pieces Pág. 57

© Gwangju Folk Museum Pág. 56

© Winning Moves Games Pág. 58

© Odysseia Jogos Pág. 32

© Trustees of the British Museum Pág. 55

© K.E. Mathiasen Group Pág. 58

© Rio Grande Games Pág. 59

© Rio Grande Games Pág. 59

© GatePlay.com Pág. 59


índice imagético

173

Harald Lieske Michael Menzel Mike Doyle Mike Doyle

Joshua Cappel

John Cooper Michael Menzel Claus Stephan

Mike Doyle

Michael Menzel

Pág. 77

Craig Grando

Craig Grando http://www.craiggrando.com/

Harald Lieske http://www.haraldlieske.de/

John Cooper http://www.jrcooper.com/gaming.htm

Michael Menzel http://www.atelier-krapplack.de/

Mike Doyle http://mdoyle2.blogspot.com/


174

índice imagético

© Instituto Socioambiental (ISA) Pág. 81

© Casa das Culturas Indígenas Pág. 87

© Iandé Pág. 89

© G.Leite Pág. 89

© Museu do Índio Pág. 91

© Iandé Pág. 85

© Iandé Pág. 88

© Iandé Pág. 89

© G.Leite Pág. 89

© Terra Virgem Pág. 92

© Casa das Culturas Indígenas Pág. 87

© Iandé Pág. 88

© Iandé Pág. 89

© Casa das Culturas Indígenas Pág. 87

© Iandé Pág. 88

© G.Leite Pág. 89

© Pedro Rezende Pág. 90

© Martin Montenegro Pág. 91

© FUNAI Pág. 97

© Amoa Konoya Pág. 97


índice imagético

OBS:

As fotos sem créditos são © Luis Francisco

© Tiago Queiroz Pág. 105

© Helio Nobre Pág. 107

© Klausdgrio Pág. 105

© Renato Soares Pág. 107

© Diana Figueroa Pág. 106

© Kuyaparé Pág. 139

© Helio Nobre/IDETI Pág. 106

© Strategicon Pág. 164

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