Siderlei
Marinete
Sônia
Mães Especiais Neste Dia das Mães, o Linha Popular conta a história de mulheres que dedicam suas vidas a cuidar de seus filhos, portadores de deficiências
Sílvia
Cristiane
Caderno Especial Jornal Linha Popular - Maio de 2012
Mabel
2
Jornal Linha Popular - Camboriú, 11 de maio de 2012
Mães Especiais
“Eu esperava uma filha dançando balé, não fazendo capoeira”
Essa é a frustração de Marinete do Nascimento. Não lamenta ter uma filha em uma cadeira de rodas, com dificuldades de locomoção e comunicação, deficiente cerebral. Isso tudo são detalhes. O que decepciona foi Amanda não ter escolhido o balé. “Ela se encontrou na capoeira”, conta a mãe. Apesar de não ter gostado da dança, Marinete apoia a escolha da filha. Na Apae de Camboriú, Amanda, que tem 16 anos, participa de várias atividades. Capoeira é a preferida. “É impressionante quando a gente vê ela se apresentando, ela sempre nos surpreende”, diz a mãe orgulhosa. A Marinete de hoje é diferente daquela de 16 anos atrás. Agora, tem que ter pulso firme para educar a filha adolescente. “A personalidade dela é difícil, é muito brava”, conta. Com o tempo, ela aprendeu que mais que mãe especial de uma filha especial, ela tinha que agir como uma mãe normal de uma pessoa com comportamentos normais. Não foi assim quando Amanda nasceu. “Ela passou da
hora de nascer e teve paralisia. Só soube oito meses depois”, diz Marinete. Ela explica que o teste do pezinho não detectou
a doença, que só foi descoberta quando Amanda passou mal e voltou ao médico. “Até então era um bebê saudável, comia
um deficiente, a mãe que, em uma cadeira de rodas, criou um menino deficiente mental e as mães que encaram as limitações com naturalidade. Elas são um exemplo de vida por mostrarem que seu sonho não foi frustrado é que é possível ser feliz e completa sendo uma mãe especial. Estas seis mulheres resumem o sentimento materno em cada um de seus relatos. E através deles queremos parabenizar todas as mães, donas de histórias sempre particulares, dignas de respeito e admiração. Abrimos um espaço para agradecer também à Escola Especial Alegria de Viver, a Associação de Pais e Amigos
Marinete cita pontos específicos, como seu temperamento forte e a paixão pela capoeira. “A gente se entende. Eu sei quando ela quer comer, quer dormir. Ela faz sinais que com a rotina eu entendo”, explica. Este amor permite que Marinete sonhe. “Queria que a Amanda aprendesse pelo menos a escrever, nem que fosse só o nome dela”, conta a mãe, que acredita que isso é possível. Lamenta o fato de Amanda ter chegado a frequentar a escola regular, mas desistido. “Quando ela iniciou, eu me escondia na escola para ver como iam aceitar. Percebi que o preconceito não vem da criança, vem do adulto”, opina Marinete, que completa: “Esse ano foi mais difícil. Ela entrou em uma turma de adolescentes e não se acostumou, tive que tirar. É uma pena, porque ela tinha um aprendizado muito bom”. Amanda continua frequentando a Apae diariamente e se desenvolvendo, com a ajuda da mãe. “Ela depende de mim 24 horas por dia, mas me sinto realizada como mãe, porque tudo ela me mostra, cada passo da vida dela passa por mim”.
Expediente
Todas são especiais Seis mulheres que pudessem representar a força de uma mãe. Este foi o objetivo do Linha Popular ao idealizar este caderno. As histórias contadas têm como personagens mulheres especiais que, como todas as mães, vivem por seus filhos. Há, porém, uma peculiaridade: seus filhos são portadores de necessidades especiais. Ao ouvir os relatos das reações de cada uma das mulheres no momento em que souberam das deficiências de seus filhos, entendemos que mães são capazes de esquecer sua dor para viver pelo outro. É isso que elas fazem. Há a mulher que sempre sonhou ser mãe, aquela que adotou oito filhos, entre eles
bem, dormia bem, sempre foi gordinha”, lembra a mãe. A reação de Marinete ainda hoje muda quando recorda o momento em que soube que a filha tinha paralisia cerebral. “Quando eu soube, foi um tombo. Foi difícil e até hoje é”, diz. Começou a mudar seu modo de ver a doença quando Amanda passou a frequentar a Apae. “A gente vai conhecendo outros casos e se acostumando com isso. Mas até hoje, 16 anos depois, é difícil enfrentar”, fala. Para passar pelas dificuldades, Marinete procura ter uma rotina normal com a filha. “De manhã ela está na escola e eu trabalhando, depois ficamos juntas”, diz a mulher que se descreve como “tranquila”. “Eu até que lido bem com as dificuldades do dia a dia”, completa. Segundo a mãe, a vida de Amanda é boa, dentro das possibilidades. “Ela tem a vidinha dela tranquila, tem os primos que brincam com ela, costumo levar ela para passear. É até mimada demais”, diz Marinete. A relação de cumplicidade entre as duas é evidente. Enquanto a mãe fala, Amanda observa atenta. Sorri quando
dos Excepcionais – Apae de Camboriú. A instituição foi citada por todas as mulheres que participaram deste especial, que enalteceram a melhora que seus filhos tiveram depois que passaram a frequentar o local. Além disso, a Apae abriu suas portas para a equipe do Linha Popular, cedeu seu espaço e mostrou aquilo que faz parte de sua essência: os deficientes devem ter o mesmo espaço que as pessoas ditas “normais”, e merecem ter sua história contada como todas as outras. Foi isso que tentamos fazer: contar histórias de pessoas especiais e como suas vidas são protegidas por mulheres excepcionais.
Editora
Contato
Naiza Comel - Mtb/SC 2899 JP
Tel.: 3365-4893 Cel.: 9983-0763
Redação Gustavo Zonta - Mtb/SC 3428 JP Fernando Assanti - Mtb/SC 3424 JP Stefani Ceolla
Tiragem 2 mil exemplares
Capa e fotografias: Gustavo Zonta
Redação redacao@linhapopular.com.br linhapopular@gmail.com
Site
Comercial: comercial@linhapopular.com.br
Blog
Impresso na Gráfica Rio Sul
www.linhapopular.com.br
www.linhapopular.com.br/blog
Sede Rua Maria da Glória Pereira, nº 149 - sala 102 - 2º piso Centro - Camboriú CEP 88340-000
Este jornal integra o CCJ Cadastro Catarinense de Jornais
Jornal Linha Popular - Camboriú, 11 de maio de 2012
Mães Especiais
3
“A doença dele me ajudou a superar a minha”
Foi quando se viu em uma situação semelhante a que o filho já havia vivido que Siderlei Airoso entendeu Renan. Há oito anos, ela sofreu um derrame. Ficou de cama, com parte do corpo paralisado. Não conseguia se alimentar nem fazer nada sozinha. Na cama, compreendeu: “Se meu filho conseguiu, eu posso conseguir”. O exemplo seguido foi o de Renan, hoje com 18 anos, deficiente mental. “Ele não conseguia caminhar, falar, nada. E conseguiu fazer tudo sozinho. Eu precisava e podia melhorar, ele precisava de mim”, diz a mãe. Hoje, Siderlei se considera uma mãe especial, de um filho especial. Ambos têm limitações, e nem por isso deixam de cumprir suas tarefas e evoluir dia após dia. Ela resume a deficiência de Renan como “inocência”. “Eu tenho três filhos, então fica fácil perceber a dificuldade dele. Ele não vê maldade em nada”, explica. Já a limitação dela é física: “Eu não consigo andar sozinha, dentro de casa vou me
segurando, mas sair sozinha eu não saio, só com alguém e de cadeira de rodas”. Assim, Siderlei e Renan se completam. “Por isso que todo mundo que me vê se admira, porque muitas mães desanimam por bem menos. Eu resisti por causa deles, superei porque o Renan dependia de mim”, afirma. Apesar das dificuldades, ela conseguiu criar os três filhos e vê o progresso de Renan. Ele frequenta a escola regular e a Apae, além das atividades da igreja. “Ficou mais fácil depois que ele começou a ir para a Apae porque gasta a energia fora de casa e eu fico tranquila. Em casa ele só fica sossegado se eu ligo o vídeo game”, conta Siderlei. A descrição é a de um jovem normal, mas a mãe não ignora as limitações. “Eu sei que a doença influencia. Eu tenho dó, porque ele tem 18 anos, mas é como uma criança”, diz. As dificuldades, porém, nunca mudaram o que uma mãe sente por um filho. “O Renan não é como a Gisele e o Ricardo, ele é depen-
dente. Mas não pensem que eu não tenho orgulho do meu filho, porque eu tenho”, salienta. Ninguém duvida. Siderlei descreve as atividades que Renan exerce, a evolução e a boa vontade do menino. Se orgulha também das características da personalidade do filho e ressalta coisas que só uma mãe percebe. “Quem olha para ele, pensa que ele não tem nada. Mas eu, como mãe, sei que tem dificuldades. Sei que tem a medicação, os horários, como ele se acalmar”, diz. Aliás, age assim em relação aos três filhos, que criou da mesma forma e para quem tem os mesmos planos. “Eu tenho o mesmo sonho para os três. Que estudem bastante, que cada um faça sua faculdade, que lutem pelos estudos. Porque hoje eu estou aqui, mas amanhã não sei”, fala, com a entonação de quem sabe que a realidade poderia ter sido diferente. “Se Deus me deixou aqui, é pelo Renan. Eu peço muito a Deus que não me leve até eu ver o Renan vivendo a vida dele”.
4
Jornal Linha Popular - Camboriú, 11 de maio de 2012
Mães Especiais
“Uma mãe não tem preconceito com o filho, independentemente de como ele seja” Sílvia Elaine Aragão tem dificuldades para falar sobre a filha Mariana, de 1 ano e 9 meses. É difícil não chorar. Esperou dez anos para engravidar. Queria que seu primeiro filho viesse no momento que julgasse adequado. E Mariana nasceu. “Ser mãe era meu sonho”, conta. Quando a menina tinha entre 4 e 5 meses de idade, os sintomas de duas graves doenças começaram a aparecer. Mariana tem esclerose tuberosa – que causa tumores no cérebro – e síndrome de West – um tipo de epilepsia infantil. A dor da descoberta das doenças da filha ainda é muito recente e difícil de lidar para Sílvia. “Foi muita angústia, a gente não esperava. Ela nasceu perfeita”, conta a mãe, que chora ao recordar o momento em que descobriu o diagnóstico. “Tive uma sensação de culpa, um sentimento difícil de descrever. Teve aquilo de pensar ‘porque eu?’, mas a gente aprende a tocar”, diz.
As mudanças na vida de Sílvia, que já ocorreriam pelo fato de ser mãe, se tornaram ainda mais profundas. “Parei de trabalhar só para me dedicar a ela”, conta a mãe, que é professora. Desde então, a rotina da família se baseia em seguir as indicações médicas. “O médico falou que ela dependeria muito de estímulos para progredir. Então, eu levo ela na Apae duas vezes por semana, ela faz fisioterapia, hidro, música, tem todos os dias da semana ocupados”, explica. Com estes estímulos, o desenvolvimento de Mariana tem evoluído. “Tenho observado a evolução. Ela começou a caminhar, tem demonstrado bastante progresso, apesar das patologias, que são bem sérias”, diz Sílvia. A evolução da filha é a motivação da mãe. “Os profissionais dizem que o progresso ocorre por conta das atividades, e é por isso que eu continuo”, fala. Há 1 ano e 9 meses, ela aprendeu o que julga ser
mais importante: “Viver um dia de cada vez”. “Com as patologias eu não penso muito no futuro dela, a gente tem que viver cada dia”, diz Sílvia. No entanto, com otimismo aposta na capacidade de Mariana. “Eu acredito na independência dela, porque ela tem demonstrado evolução. Talvez ela encontre dificuldades em alguns aspectos. Ela não fala, não tem comunicação, e agora estamos trabalhando isso. Ela vai progredir”, confia. Descreve a filha como uma menina carinhosa e doce. “A gente não tem preconceito contra o filho da gente, independentemente de como ele seja. Mas eu sei que a sociedade tem. Mesmo assim, a gente não deixa de fazer nada, vai ao shopping, a festas, aniversários. Não é pela dependência que ela vai deixar de ter os contatos sociais”, diz a mãe. Para Sílvia, as barreiras não são sociais. “São sentimentos, angústias pessoais”, explica. Mas com Mariana no colo, parece esquecer tudo isso.
Jornal Linha Popular - Camboriú, 11 de maio de 2012
Mães Especiais
“Deus colocou na minha vida a melhor coisa que podia colocar”
Ela nunca deu à luz, mas não há quem diga que não é mãe. Sônia Regina Simas, de 57 anos, criou os irmãos e os sobrinhos. Depois, resolveu adotar oito crianças. A mais nova, Amanda, é o que chama de “presente especial”. Portadora de necessidades, a menina de 5 anos é o orgulho da família. E a certeza de Sônia de que suas preces foram atendidas. “Quando eu rezo, peço a Deus que, se for para colocar algo no meu caminho, não seja nada ruim, como uma doença. Peço que seja um filho”, conta. É como uma bênção que a mãe vê Amanda. Sônia chegou até a menina depois de tirar a mãe dela da rua. “Ela foi despejada quando estava grávida de sete meses”, explica. Os problemas de saúde de Amanda começaram logo após o parto. O bebê teve paradas cardíacas, convulsões e ficou 20 dias internado na Unidade de Terapia Intensiva – UTI. Depois de receber alta, foi para a casa de Sônia, que ficou
com a guarda da criança. “Fiquei com ela já sabendo que tinha problemas. Hoje ela está esperta, muito linda, e é minha vida”, diz a mãe, sorrindo. Os problemas de Amanda são de coordenação motora, fala e neurológicos. A evolução depende muito das atividades feitas na Apae e na escola regular. “Até eu conhecer a Apae ela dependia totalmente de mim. Depois, começamos a incentivar ela a ser independente. Ela toma banho sozinha, se alimenta, brinca. É muito inteligente, em alguns pontos até mais capaz que meus outros filhos”, diz Sônia. Para a mãe, a maior dificuldade enfrentada não são as limitações da menina, mas o comportamento da sociedade. “A minha preocupação é daqui para a frente, com as escolas e a discriminação. Eu ensino ela a se defender bem. Mostro o que ela pode e o que ela não pode”, conta. “Na escola, no início, teve dificuldades, queriam
5
que ela ficasse eu casa. Eu disse que não, ela ia se acostumar. Percebi que o preconceito existe mais nos adultos do que nas crianças. Elas são mais inocentes”, reflete a mãe. Para Sônia, o fim do preconceito e a inserção de pessoas com deficiência na sociedade dependem do comportamento de cada um. Se esta mudança de postura ocorrer, deve ver realizado o que sonha para a filha. “Eu sonho uma vida completamente independente para ela”, diz. Se baseia no quanto a menina já evoluiu para pensar no futuro. “Ela ainda tem dificuldades para caminhar, às vezes cai, mas com a fisioterapia ela está melhor. A Amanda fala com dificuldade, mas me chama de mãe”, conta, sem deixar de sorrir. E como se rezasse, descreve o sentimento que tem pela filha: “Eu sinto que Deus colocou na minha vida a melhor coisa que podia colocar. Se Ele achar que eu devo ter mais filhos, eu terei”.
6
Jornal Linha Popular - Camboriú, 11 de maio de 2012
Mães Especiais
“Eu vivo a minha vida e a dela junto” A casa da família de Cristiane Borges Castro da Silva mudou com a chegada de Keli. A vida, também. Na sala, há uma cama de solteiro onde a menina pode ficar. O banheiro também é adaptado para que a mãe possa dar banho e trocar a filha. Keli tem 15 anos e tem paralisia cerebral. Divide espaço no coração de Cristiane com outros três irmãos, mas tem sido o foco das atenções. “Os outros filhos têm ciúme”, conta a mãe. “Meus dois filhos que vieram depois dela eu não vi começar a caminhar, não vi nascer o primeiro dente”, explica. Cristiane conta que tenta orientar as crianças que a doença de Keli exige cuidados especiais. “Eles não dependem de mim, ela sim”, diz. Essa não é a única dificuldade enfrentada pela mãe. A luta começou quando Keli tinha
6 meses de idade. “Antes disso ela era normal. Depois deu uma convulsão nela e levei para o hospital. Ela ficou entre a vida e a morte, e descobrimos que ela tinha a doença”, conta. Não foi fácil para a mãe enfrentar o diagnóstico. “Quando soube chorei muito, entrei em depressão. Rejeitei ela”, confessa. Cristiane conta que muitas pessoas a julgaram e condenaram por isso, mas que, com o tempo, aprendeu a aceitar e a viver o amor que sente pela filha. “Acabei dando mais amor para ela do que para os outros filhos, porque ela precisa de mim. Eu vivo a minha vida e a dela junto”, diz a mãe. Na cadeira de rodas, com membros atrofiados, sem conseguir falar, Keli descobriu maneiras de se comunicar com Cristiane. “Quando ela concorda, ela pisca, quando não quer, faz um som. Fiquei um dia inteiro explicando
para ela que devia fazer isso para a gente se entender”, diz. Outros estímulos vieram da Apae, onde ela se tornou mais ativa, segundo a mãe. Lá encontrou também amigos e “algo mais”. ‘Ela tem um namorado na Apae, quando eu falo dele, ela já se anima”, conta Cristiane. A relação entre mãe e filha é de cumplicidade. Passam muito tempo juntas. “Ela até dorme comigo”, diz. É a maneira que Cristiane encontrou de garantir que Keli fique segura e tenha a melhor vida possível. “Eu não posso esperar nada para o futuro. Se um dia ela chegar a faltar, vou ter uma lembrança boa do que pude fazer por ela”, diz a mãe, que completa: “uns dizem que ela não vai viver muito mais, mas eu acredito e vivo ao máximo os dias com ela. Eu quero que ela viva bem até a hora que Deus quiser levar”.
Jornal Linha Popular - Camboriú, 11 de maio de 2012
Mães Especiais
7
“Deus escolhe as mães certas para estas crianças”
Há um ano, Maiara, de 14 anos, aprendeu a amarrar os cadarços. A mãe, Mabel Gavilan, se emocionou. O ato, simples, era difícil para a menina. “Até hoje a gente não sabe qual é a deficiência dela, os médicos definem como atraso mental”, explica a mãe. A doença faz com que pequenas conquistas sejam comemoradas pela família. É a prova da evolução da Maiara e a certeza de que um dia o sonho de Mabel se tornará realidade: a filha terá independência. Uma tarde, Mabel saiu de casa e deixou Maiara sozinha. A roupa lavava na máquina. Quando a mãe chegou em casa, viu a filha estendendo a roupa no varal. “Ela nunca tinha feito aquilo. Perguntei o que ela estava fazendo e ela disse que ouviu que a máquina tinha parado, então era hora de estender a roupa”, conta Mabel. Naquele dia, ela chorou. “Quantos anos eu lavei roupa na frente dela e ela nunca percebeu o que podia fazer? Agora ela sabe”, diz a mãe. Os fatos descritos por Ma-
bel mostram, de forma resumida, a evolução de Maiara. A descoberta da doença ocorreu quando ela tinha 3 meses de idade. A menina não se comportava como o outro filho de Mabel. Foram meses em busca de um diagnóstico, que nunca chegou. “Um médico me disse que ela era especial. Eu perguntei para ele o que eu fazia. Ele me olhou e disse que eu era a mãe, que eu saberia o que fazer”, recorda. O primeiro passo foi procurar a Apae. “Quando eu cheguei me desesperei mais ainda. Foi ali que caiu a ficha, que eu vi a realidade das crianças e de suas mães”, conta. A dificuldade em aceitar foi encarada em conjunto. Mabel participava de um grupo com outras mães que trocavam experiência. “É uma batalha, mas fomos enfrentando”, diz. Uma das principais dificuldades é o preconceito. “Vejo isso com muita ira, porque a mãe não aceita que digam não, que digam que o filho não é capaz”, afirma. Já ouviu não algumas vezes. Maiara frequenta a
escola regular. Começou a adequação em uma escola da rede pública. A experiência não foi boa. “Ela ia na escola pública e um professor não colocou notas dela no boletim. Ela questionou, me disse para cobrar explicações”, conta Mabel. “Ele disse que ela nunca teria nota porque não conseguiria aprender aquela matéria. Ela podia sim. Tirei ela da escola”, completa. Desde então, a menina estuda em uma escola particular, onde a inserção tem sido melhor. Segundo a mãe, Maiara tem consciência de suas limitações, sabe que é especial, mas não incapaz. Aliás, esse modo de enfrentar a doença é bastante semelhante ao jeito com que a própria Mabel vê a filha. Maiara não deixa que ninguém lhe diga que não pode fazer algo. Mabel também não. “Eu acho que filhos especiais têm mães especiais. Tem que ter dom. Deus escolhe as mães certas para estas crianças, porque a luta não é fácil”, diz Mabel, que sem dificuldade, assume: “eu sou especial”.
8
MĂŁes Especiais
Jornal Linha Popular - CamboriĂş, 11 de maio de 2012