Revista Anajur - Março 2015

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ano VI • jan/fev/mar 2015



leia nesta edição

foto: wesley mcallister / ascom agu

foto: julia mass

Ano VI • jan/fev/mar 2015

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carta ao leitor

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anajur em ação

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conquista

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igualdade de gênero

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entrevista

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artigo

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cooperativa

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saúde

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coletânea

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publicações

foto capa: cadu gomes

Prioridades para a advocacia pública

2015, o ano da consolidação das lutas

Honorários para o advogado público: direito garantido no novo CPC

Março, época de repensar nos direitos da mulher que trabalha

Exemplo de dedicação à advocacia pública

Reflexões sobre a previdência complementar do servidor

A união que faz a força

Dor nos ombros, uma das campeãs de reclamações nos consultórios

O caso da provocação para uma intervenção federal em Goiás, em 1905

Administração pública e segurança jurídica


ana jur Associação Nacional dos Membros das Carreiras da Advocacia Geral da União

Pioneira na defesa da Advocacia Pública Federal Visão

“Consolidar-se como referência na defesa das prerrogativas e interesses de seus associados, firmando-se como pilar da categoria na promoção do conhecimento, valorização e integração da advocacia pública federal junto ao estado e à sociedade brasileira”.

Missão

Diretoria Executiva Presidência Joana d’Arc Alves Barbosa Vaz de Mello Secretaria Geral Titular: Nicóla Barbosa de Azevedo da Motta Adjunto: Thaís Helena Ferrinho Pássaro Diretoria Financeira Titular: Geneide Palmeira Machado Adjunto: cargo vago Diretoria Jurídica Titular: Márcia Regina Vicente Barbosa Adjunto: Ruth Jehá Miller Diretoria de Administração e Convênios Titular: Lúcia Helena Pigossi Neves Adjunto: Laura Maria Costa Silva Souza Diretoria de Recreação e Esporte Titular: Sérgio Ernesto Kopp
 Adjunto: Cláudia Maria Vilela Von Sperling Diretoria de Relações Associativas Titular: Luiz Fabrício Thaumaturgo Vergueiro Adjunto: Ulisses Fernandes Silva Diretoria de Eventos Titular: Luciana Villela de Souza Adjunto: Vânia Rons Lamor Pinheiro Diretoria de Comunicação Social Titular: Maura Campos Domiciana Adjunto: Merly Garcia Lopes da Rocha

“Representar e assegurar, com a expertise de seu pioneirismo e excelência de atuação, os interesses dos seus associados e da Advocacia Pública Federal perante os poderes constituídos e em benefício da sociedade brasileira”.

Diretoria de Assuntos Legislativos Titular: Maria Madalena Carneiro Lopes Adjunto: Luciano Brochado Adjuto

Valores

Diretoria de Relações com o Congresso Nacional Titular: Maria Lucila Ribeiro Prudente de Carvalho Adjunto: Maristela de Souza Ferraz Calandra

Ética, respeito, credibilidade, profissionalismo, integridade, transparência, união e democracia. Setor de Autarquias Sul – Quadra 03 – Lote 02 Bloco C Sala 705 – Edifício Business Point – Cep 70070-934 PABX: (61) 3322-9054 – Fax: (61) 3322-6527

Diretoria Cultural Titular: Leslei Lester dos Anjos Magalhães Adjunto: Luiz Edmar Lima Diretoria de Assuntos de Aposentados e Pensionistas Titular: Braz Sampaio
 Adjunto: Tânia Maria Carneiro Santos

Conselho Consultivo Efetivos

revista anajur

Jurema Santos Rozsanyi Nunes Nílson Pinto Correa Maria da Glória Tuxi F. dos Santos Nicóla Barbosa de Azevedo da Motta Maria Anália José Pereira Manoel Teixeira de Carvalho Neto José Silvino da Silva Filho Annamaria Mundim Guimarães Borges Messin Merly Garcia Lopes da Rocha Jacyra Medeiros

Assessoria de Comunicação: Decifra Gestão e Conteúdo

Suplentes

www.anajur.org.br

Regina Maria Fleury Curado Felinto César Sampaio Neto Maria Olgaciné de Moraes Macedo Conselho Fiscal

Jornalistas responsáveis: Flávia Soledade e Cidinha Matos Edição: Glória Maria Varela Reportagens: Flávia Metzker e Matheus Feitoza Revisão: Corina Barra Soares Projeto e edição gráfica: GDG – Cláudia Barcellos Impressão: Gráfica Ipanema Tiragem: 2 mil exemplares

Efetivos Álvaro Alberto de Araújo Sampaio Maria Socorro Braga Gilberto Silva Suplentes Norma Maria Arrais Bandeira Tavares Leite Lídio Carlos da Silva Conceição das Graças Amoras Mira


CARTA AO LEITOR

Prioridades para a advocacia pública Destacam-se ainda nesta edição: esclarecimentos do ortopedista Marco Antônio Martins Balduíno sobre as principais causas de dores nos ombros, reclamação muito comum entre as pessoas que trabalham por longo tempo com computadores; artigo da associada da Anajur Maria Lucila Ribeiro Prudente de Carvalho, sobre as últimas conquistas feitas pela mulher no mercado de trabalho e o papel das advogadas públicas na luta pela valorização da mulher brasileira; e a análise da adesão à Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal do Poder Executivo (Funpresp), feita por Antônio Augusto de Queiroz. Na série sobre a História do Brasil aos olhos da advocacia consultiva, Arnaldo Godoy recorda o impasse político que gerou “O caso da provocação para uma intervenção federal em Goiás, em 1905”. Por fim, nesta edição, a Revista Anajur destaca o livro Administração pública e segurança jurídica, de autoria do advogado público Flávio Hiroshi Kubota, que trata dos limites da competência de um juiz constitucional. Uma proveitosa leitura! foto: bernardo rebello

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o primeiro trimestre de 2015, a Anajur e demais entidades associativas promoveram, no Congresso Nacional, um grande ato em favor da aprovação da PEC 82/2007. Foi uma intensa e bemsucedida mobilização que mostrou a capacidade de persuasão da classe. A PEC confere à AGU a necessária autonomia da qual já dispõem todas as demais funções essenciais à Justiça. Outro movimento de suma importância foi o ato em defesa da PEC 555/2006, cujo objetivo é pôr fim à contribuição previdenciária dos aposentados.Convém ressaltar que a PEC 443, que estabelece, entre outras coisas, paridade de salários na Advocacia Pública, continua na pauta de prioridades da Anajur. Na matéria especial sobre cooperativismo, a Revista Anajur apresenta as vantagens de se tornar um cooperado e as razões para escolher as cooperativas de crédito como parceiras nas finanças. Depois de muitas discussões nas duas casas legislativas, finalmente o novo Código de Processo Civil foi sancionado pela Presidência da República. E ele veio com a garantia dos honorários sucumbenciais para a Advocacia Pública. Uma vitória para a classe! A Anajur continuará a trabalhar incessantemente para garantir a lei específica que disciplinará as condições e a forma de pagamento desses honorários. A revista traz ainda uma entrevista com Maria Jovita Wolney Valente, que fala sobre a criação da AGU e o início de suas atividades em 1993, as mudanças e os avanços dessa instituição ao longo do tempo e os próximos desafios apresentados à Justiça brasileira.

Joana d’Arc Alves Barbosa Vaz de Mello Presidente da Anajur

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ana jur em ação

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O ano da consolidação das lutas A aprovação, no final de 2014, do relatório da PEC 443, que vincula o subsídio das carreiras da Advocacia-Geral da União (AGU) ao subsídio dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), serviu como um belo presente de Natal para todos os advogados públicos. Depois de aprovado pela comissão especial criada para discutir o tema na Câmara dos Deputados, o projeto precisa passar ainda pelos plenários das duas casas legislativas. Porém, não se pode deixar de considerar a importância de mais esse passo rumo ao reconhecimento da remuneração da classe.

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aprovação do texto final do novo Código de Processo Civil no Senado foi outra conquista importante para a carreira. A previsão dos honorários sucumbenciais para os advogados públicos era uma luta antiga. Mas ainda faltava a sanção da Presidência, com a possibilidade de veto em diversos temas, inclusive na própria previsão dos honorários. (Leia mais na página 10) Muita coisa estava prevista para 2015! Mas o que esperar? O que viria a seguir? Uma única certeza movia a Anajur e as demais entidades do Movimento Nacional pela Advocacia Pública: o ano começaria com mobilização e lutas! Afinal de contas, novos deputados estavam chegando ao Congresso, e muitos ainda não conheciam os pleitos da Advocacia Pública e a importância desses temas para toda a sociedade. E assim foi feito. Todas as entidades que representam os advogados públicos reuniram-se, no dia 3 de março deste ano, no hall da Taquigrafia da Câmara dos

Joana Mello participa de ato em defesa da PEC 82 na Câmara dos Deputados. Parlamentares declaram apoio à proposta 6

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Deputados, para um grande ato público em favor da aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 82/2007, a PEC da Probidade. Durante o evento, a presidente da Anajur, Joana Mello, e os demais presidentes das entidades coirmãs discutiram a importância da autonomia da Advocacia-Geral da União. “Estamos agora retomando a nossa luta em defesa da PEC 82, que vai fortalecer a carreira que defende o que é do povo brasileiro. Quem dá as costas para a PEC 82, está dando as costas para o povo brasileiro”, explicou Joana Mello. Não foram, porém, apenas os advogados públicos que tiveram voz no encontro. Parlamentares se revezaram no microfone, prestando apoio ao pleito. O primeiro a falar foi o deputado federal Lelo Coimbra (PMDB-ES), relator da PEC 82 na Comissão Especial. Ele apontou o desafio que será a aprovação do texto nas duas casas legislativas. “É preciso o convencimento. É preciso o embate. É preciso a articulação política para que possamos dar o passo para tornar autônomo o exercício da advocacia pública brasileira, no que se refere à funcionalidade e à questão administrativa”. Já o deputado Rodrigo Pacheco (PMDB-MG) enfatizou o apoio à proposta dos advogados públicos. “Eu não poderia seguir outro caminho senão o do apoio irrestrito e incondicional à PEC 82, porque sou advogado há 15 anos e atualmente sou conselheiro da OAB. [...] Vocês têm aqui um soldado para levar essa bandeira aos quatro cantos da Câmara dos Deputados.”

O ato no Congresso Nacional serviu para sensibilizar os políticos e a sociedade sobre a importância da aprovação dessa PEC. E o movimento deu resultados. No dia 13 de março, a Secretaria-Geral da Mesa da Câmara dos Deputados elencou a PEC 82/2007 entre os itens a serem discutidos no plenário da Câmara. A matéria estava prevista no item 18 da pré-pauta, mas a discussão do Orçamento impediu que a PEC fosse votada. A Anajur e as demais entidades que representam os advogados públicos continuam atuando no Congresso Nacional a fim de garantir a aprovação do texto.

Combate à corrupção Entre as razões da luta pela aprovação da PEC 82/2007 está a certeza de que, para se ter um trabalho efetivo de combate à corrupção, é preciso contar com a atuação de instituições fortes e autônomas. A aprovação da proposta garantirá, para a Advocacia-Geral da União, mais eficiência nos seus serviços e melhores resultados no trabalho para o qual a instituição é vocacionada: a proteção do Erário brasileiro. Tal certeza não é adstrita apenas aos membros da classe. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) lançou, no dia 5 de março deste ano, a Campanha Nacional de Combate à Corrupção, com o objetivo de fomentar a discussão sobre o Plano de Combate à Corrupção, lançado no final de 2014. O texto apresenta uma série de medidas

Advogados públicos mobilizados pela autonomia da AGU. A proposta precisa ser aprovada na Câmara e no Senado REVISTA

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foto: roberto stuckert filho / pr

Presidente Dilma Rousseff lança medidas de combate à corrupção e à impunidade no Palácio do Planalto, em Brasília

que contribuiriam para combater, de forma mais efetiva, esses atos nocivos à sociedade e ao Estado brasileiro. Entre os pontos destacados como fundamentais para o combate à corrupção, a OAB aponta: a valorização da Advocacia Pública, como instituição de Estado e não de governo, notadamente nas áreas de assessoria e consultoria jurídicas, constituindo um importantíssimo e efetivo instrumento de controle preventivo de desvios e ilícitos das mais variadas naturezas no âmbito da Administração Pública, conferindo-lhe autonomia administrativa e financeira para o regular exercício de suas funções. Além disso, a presidente da Anajur, Joana Mello, atendendo a convite, compareceu à cerimônia de lançamento das Medidas de Combate à Corrupção e à Impunidade, no Palácio do Planalto, em Brasília. Durante o evento, a presidente da República, Dilma Rousseff, anunciou um pacote de propostas referentes a mecanismos de combate à corrupção, que foi enviado ao Congresso Nacional. Destacam-se, entre as medidas anunciadas, a criminalização do “caixa dois” eleitoral e a extensão dos critérios da Lei Ficha Limpa a todos os servidores públicos federais e ocupantes de cargos comissionados. O advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, chamou a atenção sobre a medida que facilita a recuperação de ativos caso os bens sejam frutos de atividade criminosa, 8

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enriquecimento ilícito e atos de improbidade: “A recuperação de ativos é um dos elementos fortes nesse pacote, já que fortalece o sistema de apropriação de patrimônio e a imediata conversão disso em recurso financeiro. Hoje, esse patrimônio é apreendido, retido, muitas vezes desviado de sua finalidade e, usualmente, acaba se deteriorando no pátio de um órgão público”. Para a presidente da Anajur, Joana Mello, as estratégias de combate à corrupção anunciadas pelo governo federal deveriam contemplar o fortalecimento da Advocacia-Geral da União. “Só com a autonomia da AGU, órgão responsável pela proteção do Erário e do Estado brasileiro, conseguiremos maior efetividade nas políticas de combate à dilapidação do patrimônio público gerada pelos atos de corrupção”, reforçou Joana Mello. O Movimento Nacional pela Advocacia Pública, do qual a Anajur faz parte, também se manifestou sobre o pacote anunciado pela presidente da República. Por meio de uma nota aberta, as entidades cobraram que fosse reconhecida a importância da Advocacia Pública nos mesmos moldes do Plano Nacional de Combate à Corrupção da OAB: “As medidas propostas pelo governo federal, ainda que aprovadas no âmbito do Congresso Nacional, se desacompanhadas de um verdadeiro fortalecimento institucional da Advocacia Pública, como instituição essencial à Justiça, responsável pelo repatriamento e pela recuperação de bens públicos desviados, não ganharão


Dr. Carlos Mota, autor da PEC 555, discursa para os servidores e deputados no Congresso Nacional

efetividade e frustrarão as legítimas expectativas da sociedade brasileira na luta contra a corrupção. A PEC 82 é libertadora por dotar uma função essencial àJustiça de condições de atuar em toda a sua plenitude. Ela traz no seu núcleo a possibilidade de resolver carências institucionais graves. Se a presidente da República reitera que a virtude só prevalece por meio de instituições públicas fortes e sólidas, resta incluir no discurso do governo sinais concretos do interesse em inserir a Advocacia Pública, fortalecida e estruturada, no cenário do combate à corrupção”.

Pelo fim da contribuição previdenciária dos servidores públicos aposentados Outro importante evento no Congresso Nacional neste primeiro trimestre de 2015 foi o grande ato pela aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 555/2006 e pela rejeição das Medidas Provisórias nº 664/2014 e nº 665/2014. Promovido pelas entidades de classe que representam os servidores públicos em todas as esferas, o ato pedia o fim da contribuição previdenciária de servidores públicos aposentados (PEC 555) e a rejeição da mudança das regras de concessão de bene-

f ícios, como pensão por morte, auxílio-doença, abono salarial, seguro-desemprego e seguro-defeso (MPs nº 664/2014 e nº 665/2014). Diversos deputados que compareceram ao evento manifestaram apoio às causas dos servidores públicos. O primeiro a falar foi o deputado Chico Lopes (PCdoB/ CE). Ele destacou a necessidade de um trabalho de mobilização dos parlamentares. “Vamos ter que visitar os deputados. Vamos ter que convencer o presidente da Casa, deputado Eduardo Cunha, a colocar em votação, pois não podemos ficar nessa ansiedade”, afirmou Chico Lopes. O deputado Leonardo Quintão (PMDB/MG) referiu-se à situação econômica atual do País: “O Brasil passa por uma crise institucional, e o governo declara que precisa recompor o seu caixa. Eu concordo com isso, mas não prejudicando os trabalhadores, os servidores públicos e os aposentados. Isso nós não vamos aceitar aqui no Congresso Nacional”. Carlos Mota, autor da PEC 555/2006, quando era deputado federal pelo PSB/MG, lembrou a dificuldade enfrentada por ocasião da propositura. “Quando apresentei a PEC, eu sofri retaliação, porque o governo de então já pressentia perda de receita, que a meu ver não era grande coisa, considerando o volume e a pujança de nosso orçamento.” Carlos Mota defendeu, também, uma maior participação dos servidores públicos na política.

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conquista

Honorários para o advogado público: direito garantido no novo Cpc No dia 16 de março de 2015, dois meses após a aprovação do texto pelo Congresso Nacional, a presidente da República, Dilma Rousseff, sancionou o novo Código de Processo Civil (CPC). Vocacionado a ser um diploma legal que garantirá mais celeridade e eficiência à Justiça brasileira, o novo CPC era aguardado com ansiedade pelos advogados públicos e por todos os operadores do Direito.

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ruto do trabalho de uma comissão de juristas presidida por Luiz Fux, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), o novo código reduz o elevado número de recursos, sem prejuízo à garantia da ampla defesa. “Os processos têm de ter uma duração razoável. Essa demora na prestação de justiça acaba, na verdade, consagrando uma verdadeira injustiça”, ponderou o ministro. Ele aproveitou a ocasião para recordar o intenso diálogo mantido com a sociedade durante a elaboração do CPC: “Nesse processo, a sociedade falou e foi ouvida, pois promovemos mais de 100 audiências públicas e recebemos mais de 80 mil e-mails com sugestões”. Durante a cerimônia de sanção do texto, a presidente Dilma Rousseff destacou as garantias de acesso à Justiça, que serão aperfeiçoadas pelo diploma legal: “[O novo CPC] democratiza ainda mais o acesso à Justiça, ao ampliar e facilitar a gratuidade ou o parcelamento das despesas judiciais”. Aproveitando o ensejo, a presidente da República parabenizou José Sarney, ex-presidente do Senado, por ter instalado, na sua gestão, a comissão de juristas responsável pela elaboração do anteprojeto que deu origem ao novo CPC. Já José Eduardo Cardozo, ministro da Justiça, preferiu destacar os institutos que garantirão maior eficiência às

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soluções de conflitos: “Novas realidades, como o Processo Judicial Eletrônico e a Conciliação, exigiam mudanças no CPC. Esse texto é um monumento jurídico que será venerado no futuro, pois é um código equilibrado e que coloca em bom termo o devido processo legal e a celeridade, uma afirmação da cidadania e da democracia”. Para a Advocacia Pública, um dos temas de maior importância é a previsão da percepção dos honorários sucumbenciais para os advogados públicos. Apesar de já contemplado no projeto aprovado no Congresso, corria o risco de ser vetado pela Presidência, o que não ocorreu. Assim, o direito foi positivado no art. 85, § 19, do novo código, nos seguintes termos: “Os advogados públicos perceberão honorários de sucumbência, nos termos da lei”. Essa vitória dos advogados públicos é fruto de um intenso trabalho de convencimento das autoridades envolvidas na aprovação do texto e de uma mudança de paradigmas dentro da própria Advocacia-Geral da União, processo capitaneado pelo Forvm Nacional da Advocacia Pública Federal. Tal mudança se deu após a revisão de um parecer da Consultoria-Geral da União (GQ/1994) que rejeitava a percepção dos honorários pelos advogados públicos. O trabalho do Forvm, por meio do GT Receitas e Honorários de Sucumbência, foi determinante para a produção de um novo parecer, formulado por Otávio Luiz Rodrigues Junior, advogado da União, que recebeu a aprovação de Arnaldo Godoy, consultor-geral da União, e posterior aval do ministro Luís Inácio Adams. O parecer, aprovado em março de 2013, reconheceu que os advogados públicos tinham direito aos honorários sucumbenciais. “A titulação desses valores, seja pelos membros de carreira, seja pela União e seus entes, neste último caso, com repasses ou retribuições, por meio de fundos ou mecanismos afins, é a


foto: sérgio moraes / ascom agu foto: eugenio novaes / cfoab

Texto do novo CPC, produzido por comissão de juristas, é entregue ao então presidente do Senado, José Sarney, em junho de 2010

Presidente do Conselho Federal da OAB discute honorários sucumbenciais com representantes dos advogados públicos REVISTA

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Vice-presidente da República, Michel Temer, recebe a Advocacia Pública e declara apoio aos honorários hipótese adequada em termos jurídicos, o que ocorrerá exclusivamente por lei”. Curiosamente, embora 22 estados da Federação já possuam leis que permitem a percepção dos honorários sucumbenciais pelos advogados públicos, tal previsão não se estendia ao âmbito federal. Empenhada na consolidação do direito da classe, no fim de janeiro de 2015, a presidente da Anajur, Joana Mello, participou de uma reunião com o vice-presidente da República Michel Temer para discutir o tema. Do encontro também participaram representantes de entidades associativas de todas as esferas da Federação, além do presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinicius Furtado Coêlho. Para o presidente da Ordem, a aprovação dos honorários era fundamental para a valorização da profissão. “Nós entendemos que esta é uma causa coletiva, de todos os advogados, porque a subsistência do profissional é fundamental para que sejam respeitados o devido processo legal, o direito de defesa e a Constituição da República”, pontuou o presidente da OAB, no encontro. Na ocasião, o vice-presidente, Michel Temer, demonstrou apoio ao pleito das entidades e mostrou-se aberto ao diálogo. Além disso, informou que levaria a discussão do tema ao Governo Federal. O titular da Advocacia-Geral da União, Luís Inácio Adams, também recomendou à presidente da República que sancionasse o código, mantendo a previsão dos honorários sucumbenciais, em consonância com o parecer da AGU mencionado anteriormente. A Advocacia-Geral da União (AGU) manifestou-se pelo veto dos arts. 35 e 333 do novo diploma, além do inciso XII do art. 1.015. O art. 35 referia-se a pedidos de cooperação 12

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a órgãos jurisdicionais estrangeiros, que deveriam ser feitos exclusivamente por meio de carta rogatória. A AGU, assim como o Ministério da Justiça, considerou que a disposição afetaria a celeridade e a efetividade da cooperação jurídica internacional, uma vez que tal pedido poderia ser processado por via do auxílio direto. Já o art. 333 e o inciso XII do art. 1.015 tratavam das possibilidades de conversão de ação individual em ação coletiva. A AGU, juntamente com a OAB, manifestou-se pelo veto desse artigo por entender que, do modo como o texto foi escrito, tais conversões poderiam ser feitas de maneira pouco criteriosa. Ao todo, a presidente da República apresentou sete vetos. Outro ponto de interesse dos advogados públicos foram os prazos processuais. O código sancionado mantém a previsão de prazos em dobro para manifestações da União, das autarquias e das fundações, como era esperado. O novo CPC entrará em vigor um ano após a sanção, ou seja, em março de 2016. Entrementes, a luta pela consolidação dos direitos dos advogados públicos continua. Como expresso no texto, os honorários serão percebidos “nos termos da lei”, ou seja, será necessária uma lei específica para disciplinar as condições e a forma de pagamento dos honorários. Em muitos estados, o montante adquirido é encaminhado para um fundo de investimento da Advocacia Pública. No âmbito nacional, o modelo ainda não foi definido. No entanto, a Anajur e as demais entidades que representam a Advocacia Pública já estão mobilizadas e atuando junto ao Congresso Nacional para garantir que tal lei seja discutida e aprovada pela Casa, consolidando, de uma vez por todas, esse direito.


igualdade de gênero

Março, época de repensar nos direitos da mulher que trabalha Maria Lucila Ribeiro Prudente de Carvalho*

No dia 8 de março é celebrado o Dia Internacional da Mulher, data em que, há mais de cem anos, são comemoradas as conquistas feitas pela mulher. É também uma oportunidade para protestar contra os resquícios de uma estrutura social ultrapassada, que tenta manter a mulher em segundo plano, tanto no ambiente doméstico quanto no profissional, sem considerar a diversidade educacional e cultural da sociedade moderna.

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ragédias decorrentes das más condições de trabalho enfrentadas pela mulher, no início do século XX, sedimentaram março como o mês historicamente dedicado à luta pela igualdade de gênero. Greves e manifestações mobilizaram as operárias que ingressavam então na cadeia produtiva de alguns países, como Estados Unidos, Rússia, Alemanha, Inglaterra e Áustria. Elas defenderam pleitos pioneiros e legítimos, que ainda hoje precisam ser adequados à realidade, garantidos e consolidados. Pesquisa divulgada pelo Fórum Econômico Mundial deste ano colocou o Brasil em 84º lugar no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), em um ranking do qual participaram 187 países. Entre os elementos


Persiste na sociedade a conservadora divisão do trabalho doméstico, que praticamente desobriga o homem das tarefas do lar, sobrecarregando, consequentemente, a mulher.

avaliados destacou-se a desigualdade de tratamento dado aos gêneros, sempre em prejuízo da mulher, no campo da sua participação na vida econômica, social e política de um país. É triste saber que, apesar de ter aumentado a participação da mulher no mercado de trabalho, a mulher trabalhadora recebe 27% a menos do que o homem pelo exercício da mesma atividade. Além disso, persiste na sociedade a conservadora divisão do trabalho doméstico, que praticamente desobriga o homem das tarefas do lar, sobrecarregando, consequentemente, a mulher, que geralmente assume como sua responsabilidade as atividades de cuidar do lar e da família, ainda que haja uma pequena participação do homem. Essa distribuição desigual das tarefas domésticas certamente se reflete na limitação de oportunidades profissionais para a mulher. Nesse cenário, é louvável toda decisão inovadora e efetiva, por parte do Estado ou da sociedade, de valorização e proteção da mulher. A Lei Maria da Penha, de 2006, é um exemplo concreto de atuação da autoridade no sentido de inibir a violência doméstica imposta à

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mulher, por meio de penas mais severas ao agressor da integridade f ísica e psicológica da mulher. Nós, que tivemos o privilégio de estudar e de pertencer à advocacia pública federal, temos, por conta disso, um compromisso com a defesa e o esclarecimento dos direitos da mulher. Devemos trabalhar para monitorar e conscientizar a coletividade sobre a necessidade do respeito ao princípio da igualdade de gênero, por meio da nossa participação em programas de informação e de prestação de serviços para a mulher, seja na realização de palestras, artigos e debates, seja na efetivação de outros recursos que visem assegurar os direitos femininos. Cabe lembrar também que a redução das assimetrias e das discriminações depende tanto da aplicação de normas eficazes, quanto de mudanças em nossas matrizes ideológicas, muitas vezes simplistas, cujas raízes estão vinculadas a uma cultura tradicional e conservadora. Nesse sentido, acreditamos que nós, advogadas públicas, podemos e devemos contribuir, de uma forma edificante, com atos sólidos que promovam a valorização da mulher brasileira.

(*) Advogada da União, Diretora de Relações com o Congresso Nacional da Anajur.


entrevista

foto: wsley mcallister / ascom agu

Nascida na pequena cidade de Dianópolis, município pertencente ao Estado do Tocantins, Maria Jovita Wolney Valente preserva na memória a história de uma instituição. De sua sala, instalada no décimo quarto andar do edifício-sede da Advocacia-Geral da União (AGU), além de atuar nas funções que competem a uma procuradora federal, ela acompanha com atenção o desenvolvimento da AGU.

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Exemplo de dedicação à advocacia pública

ilha de um produtor rural e de uma tabeliã, a dra. Jovita cursou todo o ensino básico na sua cidade natal, tendo se mudado para Goiânia para concluir o segundo grau. Seguindo o conselho do avô, que dizia que a família precisava de um advogado, Jovita seguiu rumo à capital federal para cursar Direito na Universidade de Brasília (UnB). Ali, descobriu ter certa familiaridade com os temas discutidos em sala de aula e se apaixonou definitivamente pela carreira que seguiria por toda a vida. A atuação firme, ao longo dos 22 anos de existência da AGU, garantiu a ela destaque aos olhos dos pares. Em um evento realizado no Congresso Nacional para celebrar o

aniversário da AGU, o advogado-geral da União, Luis Inácio Adams, fez questão de destacar o trabalho da dra. Jovita. “É uma homenagem que tem de ser feita, como a tantos outros que também contribuíram e que veem, na presença da dra. Jovita nesta sessão, um exemplo de pessoa pública dedicada à realização dessa função da Advocacia”. Jovita Wolney Valente é a autora do texto A História e a Evolução da Advocacia-Geral da União, no qual apresenta uma visão técnico-jurídica detalhada da instituição ao longo do tempo. Ela discorre sobre a divisão de competências e sobre todo o processo de consolidação da AdvocaciaGeral da União. REVISTA

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Vamos começar com uma contextualização histórica. Como a senhora ingressou na Advocacia Pública? – A minha vida não tem nada assim preestabelecido. As coisas vão acontecendo naturalmente. Quando terminei o meu curso de Direito na Universidade de Brasília (UnB), eu quis fazer um concurso. Aí, surgiu um concurso para o Incra, eu fiz a prova, passei e fui trabalhar nessa área agrária. Tratava-se de Direito, cartório e trabalho com a terra, tudo o que eu já trazia de casa. Sempre digo que eu era muito feliz trabalhando no Incra. No entanto, houve um período no qual o Incra saiu do Ministério da Agricultura e ficou vinculado à Secretaria-Geral do Conselho de Segurança Nacional, cujo secretário-geral era o ministro extraordinário para Assuntos Fundiários, o general Venturini1. E lá fui eu trabalhar ali, isso em 1982. Em 1985, adveio o governo Sarney, e o ministro-chefe do Gabinete Militar passou a ser o secretário-geral do Conselho de Segurança Nacional, o general Bayma Denys. Nesse período, fui convidada para ser a titular da Subchefia de Assuntos da Faixa de Fronteira e da Amazônia Legal, que cuidava de mineração, comunicações e da parte fundiária também. Foi a primeira vez que um civil assumiu um cargo daqueles no Conselho, e eu, a única mulher. Depois, em 1988, recebi um novo convite, desta vez para ser consultora jurídica do Ministério da Reforma Agrária. Voltei para o Ministério, mas, dois meses depois, ele foi extinto, voltando o Incra a vincular-se ao Ministério da Agricultura. Nessa época, em 1991, recebi o convite para vir para a Consultoria-Geral da República. A senhora acompanhou, então, toda a criação da AGU? – Eu não tinha acompanhado, na Constituinte, todo o nascimento da Advocacia-Geral da União. Quando cheguei à Consultoria, estavam às voltas com o projeto de lei da AGU. Foi a primeira vez que tive contato com o assunto. Eu sabia que tinha sido encaminhado um projeto sobre esse tema no governo Sarney, quando, então, o dr. Saulo Ramos era consultor-geral da República. O dr. Saulo tinha começado a elaborar um projeto de lei complementar para a Advocacia-Geral da União, mas não o tinha concluído porque o governo não chegou a um consenso. Quando ele se tornou ministro da Justiça, apresentou o projeto, que foi encaminhado ao Congresso Nacional. Na mudança para o governo Collor, o projeto do dr. Saulo foi retirado, e o novo presidente encaminhou outro projeto. Porém, foram apresentadas tantas emendas ao texto – reputadas como importantíssimas pelos parlamentares –, que o relator do 16

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O início da AGU foi um desafio. Não tinha orçamento, não tinha quadro de pessoal, porque tudo que tinha ido como anexo não seguira o projeto até o Senado.

foto: sérgio moraes / ascom agu

Nesta entrevista, a dra. Jovita fala sobre a criação da AGU, as mudanças e os avanços da instituição, além de certos desafios enfrentados pelo Judiciário e pela sociedade em geral.

Dra. Jovita recebe cumprimentos do advogado geral da União, Luiz Adams

projeto de lei, deputado José Luis Clerot, pediu apoio ao consultor-geral da República, o dr. Célio Silva, para viabilizar algumas daquelas emendas, já que muitas delas diziam respeito a matérias privativas do Poder Executivo, e que, então, não poderiam ter sido de iniciativa do Legislativo. Nessa época, eu já estava lá na Consultoria e passei a integrar o grupo encarregado de examinar essas emendas constitucionais para analisar e indicar quais seriam as aceitas. Feito esse trabalho, o segundo passo seria apresentar um substitutivo do Poder Executivo para o projeto anterior. Foi aviado o substitutivo, que continha um anexo no qual se organizava toda a AGU: todos os órgãos, todos os cargos, tudo! E quando o substitutivo chegou à Câmara, alguns grupos que ali atuavam na época conseguiram que o substitutivo relatado pelo deputado Clerot fosse totalmente alterado, com ênfase para a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), e, daquela forma, seguiu para o Senado. Nesse ponto, o anexo já tinha ficado para trás. Eu, pessoalmente, não acreditava mais que esse projeto fosse aprovado. Então, mais uma vez as associações se organizaram, destacando-se, entre elas, a Anajur, para recuperar o projeto anterior, que trazia a organização estrutural da AGU. Elas conseguiram fazer essa recuperação, embora não integralmente; mas conseguiram uma boa parte. Adveio, então, o governo Itamar Franco e, contrariando as expectativas, o projeto de lei foi aprovado no Senado. Nós fomos pegos de surpresa, pois não acreditávamos que sairia naquele momento.


E como foram os primeiros passos da AGU? Como essa instituição embrionária tomou forma? – No início foi um desafio. Sancionada a Lei Complementar nº 73, de 1993, tínhamos de fazer essa instituição funcionar. Mas como? A AGU não tinha orçamento, não tinha quadro de pessoal, porque tudo aquilo que tinha ido como anexo não seguira o projeto até o Senado. Era necessário fazer um concurso público para prover os recém-criados cargos de advogado da União. Uma das soluções encontradas à época para viabilizar a aprovação da lei complementar e evitar embates judiciais foi criar três carreiras: 1) a de advogado da União, para encarregar-se da representação judicial, antes a cargo do Ministério Público; 2) a de assistente jurídico, para cuidar das atividades de consultoria e assessoramento; e 3) a de procurador da Fazenda Nacional, responsável pela execução da dívida ativa da União e das ações tributárias. Na época, foi inviável a criação de carreira única. Era tudo muito difícil! A Constituição era nova e, assim, poderiam surgir demandas judiciais sobre temas ainda não devidamente amadurecidos. Por causa desses receios, criaram-se as três carreiras. A nova, a ser preenchida por concurso público; e as outras duas traziam os servidores já titulares dos respectivos cargos. A Constituição dizia também que, enquanto não fossem aprovadas as leis da Advocacia-Geral e do Ministério Público, os órgãos jurídicos então existentes continuariam funcionando como já vinham fazendo. Esses órgãos eram: consultorias jurídicas, PGFN, procuradorias de autarquias e de fundações2. O que significava isso? Que, assim que se aprovasse a lei, todo aquele universo seria abrangido. E o termo era “aprovada”, e não “sancionada” ou “vigente”. Aprovada a lei complementar, cessaria toda a atuação do Ministério Público, que era quem fazia a representação judicial da União. Mas, como ficaríamos sem ter ninguém para representar a União? Tínhamos de contar com as pessoas que estavam atuando, que eram os assistentes jurídicos e os procuradores da Fazenda. E assim foi feito. Antes da sanção da lei complementar da AGU, existia a Consultoria-Geral da República, integrada pelo consultorgeral, o secretário-geral, 10 consultores da República, algumas pessoas detentoras de cargo em comissão e 16 servidores efetivos da CGR. E só! No que dizia respeito à parte consultiva, não tinha problema, pois as consultorias jurídicas continuaram com o seu funcionamento normal. Mas, no que concerne à representação judicial, a lei dava apenas 30 dias para a AGU representar a União em juízo. E quem faria essa representação? A lei nos dava 60 dias para lançar o concurso para preencher os cargos de advogado da União. E agora? Uma situação realmente muito difícil, não? – Com efeito, nós tínhamos esse panorama, e a lei dizia que os prazos processuais ficavam interrompidos por 30

dias. O primeiro advogado-geral da União foi também o primeiro consultor-geral da República, o dr. José de Castro Ferreira. Naquela época, as medidas provisórias eram editadas a cada 30 dias, caso não tivessem sido aprovadas pelo Congresso. Assim, quando se esgotavam os 30 dias, prorrogava-se por mais 30. O primeiro advogado-geral da União foi sucedido pelo dr. Alexandre Dupeyrat Martins. E os prazos continuaram interrompidos até que o dr. Geraldo Quintão foi nomeado advogado-geral da União. O presidente Itamar Franco indicou o dr. Quintão porque ele tinha uma vasta experiência como consultor jurídico do Banco do Brasil, onde fazia consultoria e contencioso. No passado, em muitos casos, o Banco do Brasil era a autoridade monetária. Posteriormente, isso foi transferido ao Banco Central. A vasta experiência do dr. Quintão tornou possível instalar a AGU. Quando ele chegou, a medida provisória que interrompia os prazos em favor da União foi convertida em lei, a qual, por sua vez, concedia apenas um mês para fazer a AGU funcionar integralmente. Com isso, fomos buscar os assistentes jurídicos e os procuradores da Fazenda, a fim de designá-los representantes judiciais da União para atuarem nos processos que estavam chegando. E eram milhares de processos. Muita gente não tinha nenhuma experiência. Antes da Constituição de 1988, os procuradores da Fazenda só faziam a parte de consultoria e da inscrição da dívida ativa da União. Os créditos da União eram executados pelo Ministério Público. Foi com a promulgação da nova Carta que os procuradores da Fazenda passaram a fazer a execução fiscal da União. Portanto, em 1993, já tinham adquirido, naqueles cinco anos da Constituição de 1988, uma pequena experiência com execução fiscal. À exceção de alguns que já advogavam por conta própria (isso não era proibido naquela época), os assistentes jurídicos não tinham experiência judicial. Foi com a dedicação e a garra desses representantes judiciais que a AGU começou a funcionar. Naquele período, o procurador-geral da República transferiu para o advogado-geral da União as ações diretas de inconstitucionalidade que estavam esperando a defesa prevista no art. 103 da Constituição3. O advogado-geral da União é o curador de todas as ADIs. Muitas delas estavam sem andamento. Como não havia advogado-geral da União, o procurador-geral da República designava um subprocurador-geral da República para fazer a defesa das leis atacadas. Assim que foi nomeado o advogado-geral da União, a PGR enviou aqueles processos para a AGU. Esses prazos também estavam suspensos porque todos os prazos contra a União estavam suspensos. Em 2011, a AGU prestou homenagem ao dr. Saulo Ramos. Naquela ocasião, a senhora destacou a importância de ele ter capitaneado uma luta que nem seria de sua alçada, pois ele era um advogado privado. Como foi a sua relação com ele? REVISTA

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– Quando o dr. Saulo Ramos era consultor-geral da República, eu estava fazendo aquele trabalho na SecretariaGeral do Conselho de Segurança à qual o Incra estava vinculado. Tínhamos algum contato, principalmente sobre assuntos dos quais eu tratava. Mas tive a vantagem de estar no mesmo prédio, no mesmo espaço que ele. Nessa área jurídica, ele foi de uma importância extraordinária porque dois decretos foram fundamentais para organizar a Consultoria-Geral da República: um deles organizou a própria Consultoria, enquanto o outro organizou a Advocacia-Consultiva da União. Já que não contávamos com uma Advocacia-Geral, onde todos os órgãos estivessem dentro da mesma instituição, o que ele fez? Apresentou esse decreto que organizava a Advocacia-Consultiva. Era como um sistema: na cabeça, estava a Consultoria-Geral da República; nos ministérios, as consultorias jurídicas; no Ministério da Fazenda, a PGFN; e nas autarquias e fundações, suas procuradorias. Essa organização deu mais ou menos um norte aos órgãos jurídicos, porque antes todos ficavam soltos. Os termos desse decreto, que veio dar a orientação, foram praticamente copiados no artigo que trata das atribuições do advogado-geral da União. Quase tudo foi tirado desse decreto. Isso nos anos 1986 ou 1987. Além disso, ele criou gratificações para a área jurídica que elevaram os salários, que até então eram muito baixos. Eu me lembro de um dia ele ter dito que, a partir do momento em que fosse criado o sistema Advocacia Consultiva da União, os cofres da União passariam a ter guardiões: o cofre será aberto se o advogado disser que está correto. A ideia da Advocacia-Geral também foi dele, que a apresentou à Constituinte. O dr. Saulo foi fundamental porque, como advogado, ele veio para organizar uma advocacia que atuaria contra a advocacia privada, da qual ele profissionalmente fazia parte. Esse homem chegou aqui, viu uma causa que era nobre, que era boa, e a abraçou. Em todo esse processo de organização da Advocacia-Consultiva da União, da proposta de criar a AGU, o dr. Saulo Ramos não poupava menções à Anajur, à parceria que se estabelecera entre eles. Ainda durante aquela homenagem, o dr. Saulo Ramos lembrou que, 25 anos atrás, fazer uma menção a “advogado da União” geraria até espanto. Agora, que a AGU completou 22 anos, quais os principais avanços percebidos ao longo desse tempo? – É difícil falar de tudo que mudou. Talvez essa mudança de conceito tenha se feito graças à atuação da própria AGU. Lá no começo, as coisas eram muito difíceis. Justiça seja feita ao Ministério Público: os procuradores eram em um número reduzidíssimo e, embora não estivessem presentes no país inteiro, tinham de atuar no país inteiro, e não só como fiscal da lei. Esse trabalho do MP sempre foi feito em parceria com as consultorias jurídicas e a PGFN. 18

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Quando aparecia uma ação contra a União, eles pediam subsídios às consultorias jurídicas, e só depois de receber esses subsídios eles faziam a defesa. Sempre houve essa participação das consultorias jurídicas nos mandados de segurança e em todas as ações que apareciam. Sucedia do mesmo jeito com as autarquias e as fundações. Eles pediam subsídios quando as ações envolviam essas entidades. Por exemplo: quando tinha uma questão agrária, eles buscavam subsídios no Incra. Nos problemas indígenas, era a Funai que fornecia os elementos necessários à defesa. Esse trabalho era em conjunto. Quando foi feita a separação, o que não se tinha aqui era a prática processual. Mas essa prática foi acontecendo aos poucos, e muitos juízes e advogados estranhavam que a União estivesse aparecendo nas audiências. Lembro-me bem de que, no Supremo, quando destacamos dois advogados para acompanhar os casos lá, perguntaram: “o que vocês estão fazendo aqui?” Ao que eles responderam: “estamos acompanhando os processos da AGU”. O número de procuradores da República era muito pequeno. Quando a AGU passou a estar presente em todas as instâncias, e os processos passaram a contar com a atuação dos advogados que acompanhavam os processos administrativos, isso tudo foi recebido com grande admiração. O começo da atuação da AGU coincidiu com a avalanche de processos judiciais referentes aos planos econômicos. Havia um número razoável de ações contra a União, mas os planos econômicos dos anos 1986/1991 multiplicaram o número de processos. A AGU foi se destacando. Ela se fez mais visível nessa parte de representação judicial. Até então, fazia-se a parte consultiva e fazia-se bem, embora não tivesse um comando único do ponto de vista institucional. Nós tínhamos a Consultoria-Geral da República na cabeça do sistema, mas o reduzido quadro da CGR não permitia o permanente acompanhamento das questões. Os temas chegavam à CGR quando havia controvérsia entre ministérios. Hoje há uma busca constante de orientação, de discussão de temas. O mesmo aconteceu com a Procuradoria-Geral Federal. Depois da criação da AGU, foi dado um destaque maior à parte da representação judicial. A senhora acredita que seja dispensado um tratamento à Advocacia Pública diferente do que é dado às demais funções essenciais à Justiça e ao próprio Judiciário? Em caso positivo, o que fazer para mudar? – Cada um tem um papel a ser exercido. A prestação jurisdicional não é feita apenas pelos juízes. Você nunca vai obter um acórdão ou uma sentença sem a participação do Ministério Público e dos advogados. O juiz não vai atrás do caso para julgar. Alguém vai levar aquele caso a juízo: o advogado das partes e o Ministério Público. Além de levar os casos a juízo, são eles que apresentam as suas razões, e o Judiciário, à vista desses elementos, julga. É por isso que


as funções são essenciais à Justiça. Cada um, dentro do seu papel, é indispensável. Não posso comparar as coisas porque elas são incomparáveis. É indispensável cada um no seu mister! Na Advocacia, indispensável mesmo para a prestação jurisdicional é o advogado, seja público, seja privado. Talvez por isso a OAB ganhe destaque em relação às outras entidades que fiscalizam o exercício profissional. Os advogados fazem parte desse tripé da distribuição da Justiça. Evidentemente que a atividade-fim de distribuir a Justiça é do Judiciário. Mas ele conta com as outras funções que lhe são essenciais, e eu diria indispensáveis. Durante o tempo que a senhora participou da AGU, alguns advogados-gerais da União que passaram por aqui chegaram ao STF, a exemplo dos ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes. Qual a importância de ministros provenientes da Advocacia Pública passarem a integrar tribunais superiores? – Antes isso acontecia com os procuradores-gerais da República também. O último deles foi o ministro Sepúlveda Pertence4. Era um caminho natural o procurador-geral da República chegar a ministro do Supremo, assim como também era natural que os consultores-gerais da República chegassem ao Supremo. Se compararmos a lista de consultores-gerais da República com a lista dos ministros do STF,

Quando a AGU passou a estar presente em todas as instâncias, e os processos passaram a contar com a atuação dos advogados que acompanhavam os processos administrativos, isso tudo foi recebido com grande admiração.

vamos encontrar vários nomes nas duas relações, desde Rodrigo Octávio a Celso de Mello5. Portanto, não é novidade que os advogados-gerais da União sejam nomeados ministros do STF, como ocorreu com os ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli. É natural, porque, quando alguém passa por um cargo como o de advogado-geral da União, ganha uma visibilidade muito grande e tem um leque de assuntos para atuar que o torna muito preparado para a função. Essa pessoa acaba se inteirando de tudo o que se passa no País. O fato da passagem pela Advocacia-Geral da União credenciar a pessoa a assumir aqueles cargos só aumenta a nossa responsabilidade. A AGU tem hoje uma visibilidade muito grande por essa atuação cotidiana, que é uma atuação também para evitar prejuízos. A AGU evita grandes perdas à União porque hoje temos um aparato de advogados e contadores que ajudam muito nisso tudo. Com o tempo, a AGU foi crescendo, não só aos olhos do Judiciário, mas também aos da sociedade. Todos sabem que seus servidores não são mais aqueles iniciantes que, lá em 1993, começaram uma atividade nova. A AGU vai, a cada dia, se organizando mais e melhor. É também o que acontece com as carreiras da Casa. Antes tínhamos muitas divergências de carreiras que, depois, foram se harmonizando. Hoje vivemos um momento importante de agregação. Hoje está plenamente estabelecido que o papel da AGU é de uma Advocacia de Estado, e não de Governo. Porém, ainda é preciso que as entidades continuem reforçando esse ponto. Por que a senhora acha que a sociedade ainda confunde esses conceitos? – A Advocacia Pública, embora esteja fora dos três poderes no texto constitucional, foi incumbida de prestar consultoria e assessoramento ao Poder Executivo. Para esse fim, auxilia o Poder Executivo. A instituição não está no Poder Executivo, mas a própria lei complementar e a lei de organização da Presidência da República colocam a AGU como o mais elevado órgão de assessoramento ao Poder Executivo. Essa função de assessoramento ao Executivo é que provoca esses mal entendidos. Na atuação contenciosa, na representação judicial, não há dúvida que ele agirá como advogado de Estado. O advogado público age como advogado de Estado ao defender o bem público da União e das autarquias e fundações. Como assessor do Poder Executivo é que entra essa questão. O advogado-geral e as consultorias jurídicas, para prestarem assessoramento ao presidente da República e aos ministérios, acabam tendo uma convivência próxima às autoridades do Executivo. São eles que fiscalizam juridicamente a legalidade dos contratos, dos convênios e dos demais atos praticados pelos administradores. É uma função importantíssima. Talvez falte a nós, sociedade, entendermos que, quando elegemos um presidente, governador ou prefeito, nós o fazemos para que ele implante as políticas que anunciou. Quando esse REVISTA

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administrador entra no governo, ele vai executar aquelas políticas com as quais ele se comprometeu e que foram referendadas pelo voto popular. Por isso, há um programa de governo. Qual o papel da Advocacia Pública? Cabe a ela viabilizar a execução dessas políticas com o oportuno e competente assessoramento jurídico. Isso, contudo, não pode ir contra a lei, nem contra a Constituição. O governante diz o que pretende realizar, cabendo ao advogado público orientá-lo juridicamente sobre como fazê-lo. É esse o nosso papel. O governo precisa de assessoramento jurídico, que é dado pela Advocacia-Geral da União, de acordo com as políticas que esse governo traçou. Há um plano plurianual, há todo um arcabouço de projetos que eles precisam viabilizar. Quando há uma decisão política de construir uma hidrelétrica, por exemplo, o advogado não entra no mérito da construção da hidrelétrica, desde que os órgãos responsáveis pelos estudos, projetos, conveniência, oportunidade etc., tenham se manifestado a favor. O advogado cuida é dos aspectos jurídicos dessa construção. Analisar se ela é necessária, se está no local apropriado, isso cabe ao Ministério do Planejamento, ao das Minas e Energia, ao do Meio Ambiente, ao Ministério Público, ao Tribunal de Contas da União, entre outros, verificar. Cada um dentro da sua atribuição. Os governantes precisam de assessoramento, e a Constituição confiou esse assessoramento aos advogados públicos. O que não se pode é confundir esse assessoramento com a representação judicial da União. Quais os próximos desafios a serem enfrentados pela Advocacia Pública ao longo dos próximos anos? – Eu acho que tanto a sociedade em geral quanto o Poder Judiciário estão envolvidos nessa mesma bandeira, que é a da diminuição de conflitos. Vamos diminuir as brigas! Vamos resolver amigavelmente as divergências! Se nós levarmos para o Poder Judiciário qualquer desentendimento, o Poder Judiciário ficará resolvendo pequeninas questões, enquanto as grandes vão ficando para trás. A própria sociedade já está chegando ao entendimento de que é preciso conciliar. É preciso mediar os conflitos. Eu acho que essas atividades de mediação, conciliação e arbitragem vão ajudar muito. Inclusive na convivência social. Quando as pessoas entram com um processo judicial, elas levam anos para ver o seu conflito resolvido. E isso acontece não só porque o processo é moroso, mas porque o volume de processos no Judiciário é muito grande. Muitas vezes uma pessoa briga com a outra e só precisa de um intermediário para que se chegue a um acordo. Eu acho que é por meio das conciliações – e não destaco só aquelas que a AGU vem fazendo – que a sociedade chega a um consenso. Que sejam deixadas para o Judiciário as questões mais relevantes, para que ele tenha condições de resolver. Acho que esse é o grande caminho. 20

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Durante o aniversário de 20 anos da AGU, o ministro Adams se referiu à senhora como mentora, planejadora e lutadora no que respeita à AGU: “É uma homenagem que tem de ser feita, como a tantos outros que também contribuíram, e que veem, na presença da dra. Jovita nesta sessão, um exemplo de pessoa pública dedicada à realização dessa função da Advocacia”. Como a senhora recebe este reconhecimento? – Acho que eu sou, nesta parte aqui da área jurídica da Consultoria-Geral da República, a única remanescente. Eu fico muito envaidecida e muito agradecida às pessoas que reconhecem esse trabalho. Não foi, porém, um trabalho feito para ser elogiado. A necessidade de fazê-lo chegou, e eu tive a coragem de dar continuidade a ele, e, aliás, não tenho vontade nenhuma de sair. Mas eu sou muito grata a essas pessoas que reconhecem o trabalho dos outros, enquanto estão vivos. Como se diz popularmente, “é bom que a gente seja homenageada em vida”! São homenagens que recebo com grande alegria porque estou vendo florescer esta instituição que foi fruto de muita luta. Essa não foi uma luta da sociedade. Foi uma luta dos próprios integrantes desta instituição, que precisavam de uma organização para que pudessem fazer bem o seu trabalho. Hoje, vejo com muito bons olhos mais essa luta de conquista da autonomia, para, assim, continuarem a fazer melhor o seu trabalho. Fico muito feliz de estar vivendo este momento. Lamento que pessoas que também começaram essa luta não tenham visto o que vi, o que vejo. O dr. Saulo Ramos ainda viveu para ver que a ideia dele havia florescido. Esse trabalho feito aqui, desde o começo, meio anônimo, foi válido. Fazíamos tudo, num trabalho de formiguinhas. Nós fomos atrás de orçamento, atrás de concurso, atrás de tudo. Hoje vejo que a Casa está construída, abrigando as pessoas, e que essas pessoas lutam pela Casa. Acho que essas novas conquistas, esses novos desafios – pela autonomia, pela conquista de uma remuneração compatível – farão com que esta Casa esteja em igualdade de condições com as outras funções essenciais à Justiça. NOTAS 1. Danilo Venturini foi ministro extraordinário para Assuntos Fundiários do Brasil entre os anos de 1982 e 1985. 2. Art. 29 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias: Enquanto não aprovadas as leis complementares relativas ao Ministério Público e à Advocacia-Geral da União, o Ministério Público Federal, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, as Consultorias Jurídicas dos Ministérios, as Procuradorias e Departamentos Jurídicos de autarquias federais com representação própria e os membros das Procuradorias das Universidades fundacionais públicas continuarão a exercer suas atividades na área das respectivas atribuições. 3. Art. 103, § 3º da Constituição Federal: Quando o Supremo Tribunal Federal apreciar a inconstitucionalidade, em tese, de norma legal ou ato normativo, citará, previamente, o Advogado-Geral da União, que defenderá o ato ou texto impugnado. 4. José Paulo Sepúlveda Pertence foi ministro do Supremo Tribunal Federal entre os anos de 1989 e 2007. 5. Consultores-gerais da República que foram nomeados ministros do STF: Rodrigo Octavio, Aníbal Freire, Hahnnemann Guimarães, Themístocles Cavalcanti, Costa Manso, Carlos Medeiros Silva, Gonçalves de Oliveira, Victor Nunes Leal, Luiz Rafael Mayer, Clóvis Ramalhete, Paulo Brossard e Celso de Mello (interino).


foto: Arquivo pessoal

artigo

Reflexões sobre a previdência complementar do servidor Antônio Augusto de Queiroz *

A Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal (Funpresp) – o fundo de pensão dos servidores públicos do Poder Executivo – completou, em 4 de fevereiro de 2015, dois anos de existência. Os representantes dos participantes nos conselhos Deliberativo e Fiscal já foram eleitos, porém ainda não empossados. A Diretoria-Executiva é escolhida pelo Conselho Deliberativo.

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Funpresp.Exe, que desde 4/2/2013 recebe adesões e administra o plano de benef ícios dos servidores do Poder Executivo, a partir de 7/5/2013, por meio de convênio, passou a administrar também o plano de benef ícios do Poder Legislativo e dos membros e servidores do Tribunal de Contas da União (TCU), que desistiram de criar o próprio fundo. O Poder Judiciário e o Ministério Público criaram um fundo próprio, a Funpresp.Jud.

SERVIDORES ANTIGOS – Nesses dois anos, que coincidem com o prazo dado pela Lei nº 12.618, de 2012, para a migração dos servidores que ingressaram no serviço púbico antes de 4 de fevereiro de 2013 para a previdência complementar, poucos aderiram ao fundo de pensão ou renunciaram à aposentadoria a que tinham direito pelas regras anteriores. As regras anteriores alcançam dois grupos de servidores: 1) os que têm direito à aposentadoria integral, por terem ingressado no serviço público antes de 31 de dezembro de 2003, data da vigência da Emenda à Constituição nº 41, que trata da Reforma da Previdência; e 2) os que ingressaram no serviço público entre 1º de janeiro de 2004 e 3 de fevereiro de 2013, os quais, embora já contribuam com 11% sobre a totalidade de sua remuneração, terão sua aposentadoria calculada com base na média das 80% maiores contribuições, além da regra condicionada à fórmula 95. Os servidores que atendem às condições acima e que aderiram ao fundo de pensão até 4 de fevereiro de

2015 terão sua aposentadoria condicionada a três formas de pagamento: 1) pagamento feito pelo Tesouro, tendo como teto o valor pago pela Previdência do Regime Geral, atualmente (fevereiro de 2015) fixado em R$ 4.663,75; 2) benef ício diferido (ou “especial”), pago pelo Tesouro, proporcional ao período em que o servidor contribuiu acima do teto; e 3) pagamento feito pela Funpresp, com base no montante acumulado no fundo de pensão. Com a adesão à previdência complementar, esses servidores passaram a contribuir com 11% somente até o valor do teto do INSS para o regime próprio, e com 8,5% para o fundo de pensão, com igual contrapartida do patrocinador, no caso, a União. Se o servidor quiser contribuir com menos, como 8% ou 7,5%, o governo o acompanhará nesse percentual; mas, se desejar ou puder contribuir com mais de 8,5%, o governo só acompanhará até esse limite. Para os servidores desses dois grupos que não aderiram à previdência complementar até 4 de fevereiro de 2015, não é mais possível aderir à previdência complementar ou renunciar à aposentadoria a que têm direito com base nas regras vigentes quando de sua admissão no serviço público, exceto se o governo reabrir o prazo de adesão ou se o servidor ingressar com mandado de segurança para assegurar o direito de opção, já que nem a Lei nº 12.618, de 30 de abril de 2012, nem a Constituição Federal fixam prazo para a adesão. O único vínculo possível desses servidores com a Funpresp – exceto, como já foi dito, se o governo reabrir o prazo de adesão ou se o servidor ingressar com mandado de segurança para que seja aceito como Participante Ativo Normal do fundo de pensão – será mediante a adesão como Participante Ativo Alternativo, ou seja, na hipótese em que o servidor faz uma “previdência-poupança”, sem prejuízo da aposentadoria a que tem direito no regime próprio (pela integralidade ou pela média), mas sem a contrapartida patronal. Nesse caso, o servidor define quanto quer “poupar” para complementar sua aposentadoria. NOVOS SERVIDORES – Para os novos servidores – entendidos como aqueles que ingressaram no serviço público a partir de 4 de fevereiro de 2013 ou os REVISTA

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que vierem a ingressar no futuro –, não há prazo para adesão à Funpresp. Assim, o servidor nomeado ou que vier a ser nomeado para cargo efetivo após o início de funcionamento da Funpresp poderá aderir ao fundo ou à previdência complementar a qualquer tempo, embora seja recomendável que o faça o quanto antes, já que está perdendo a contrapartida patronal. Há dois tipos de novos servidores: 1) os com renda acima do teto do regime geral, que poderão ser admitidos como Participante Ativo Normal, bastando, para tanto, preencher o formulário de adesão à previdência complementar do servidor; e 2) aqueles com remuneração igual ou inferior ao teto do INSS, os quais poderão aderir à Funpresp apenas na condição de Participante Ativo Alternativo, desde que a contribuição mensal não seja inferior a R$ 78,71, mas sem contrapartida patronal. A pergunta que se impõe: compensa ingressar na previdência complementar como Participante Ativo Normal ou como Participante Ativo Alternativo? A resposta é sim; afinal, guardar uma reserva para complementar a aposentadoria no futuro é sempre uma atitude prudente. No primeiro caso, além de fazer uma reserva para complementar sua aposentadoria no futuro, o servidor ainda terá a contrapartida patronal ou governamental, que poderá ser de 7,5%, 8% ou 8,5%, dependendo do quanto, em valor pecuniário, esteja disposto a contribuir para o fundo de pensão. Ou seja, trata-se de um percentual sobre sua remuneração que só será vertido para o fundo de pensão em nome do servidor se ele optar pela previdência complementar. No segundo caso, mesmo o servidor não tendo a contrapartida patronal, ainda assim será vantajoso aderir à Funpresp. Em primeiro lugar, porque ele fará uma poupança para complementar sua aposentadoria; e em segundo, porque a taxa de administração e de carregamento da Funpresp é menor do que a praticada por qualquer banco ou seguradora privada. Além disso, quando a remuneração desse servidor ultrapassar o teto do INSS, ele poderá incrementar sua aposentadoria, passando à condição de Participante Ativo Normal, com direito à contrapartida patronal. A instituição da previdência complementar em substituição à aposentadoria integral ou pela média das contribuições, a depender da data de ingresso no serviço público, foi fortemente contestada pelos servidores públicos e suas entidades de classe, mas, com a implementação da Funpresp, exceto por uma provável extinção do fundo, o novo servidor precisa entender que não terá outra opção para complementar sua aposentadoria, na parcela que ultrapassar o teto do INSS, senão pela adesão à Funpresp. Muitos servidores – por razões ideológicas, por não acreditarem na previdência privada ou por se sentirem 22

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inseguros em relação ao futuro dos fundos de pensão em geral – rejeitam a Funpresp. Alguns invocam a desastrada experiência das Capemis e dos Montepios, que frustraram quem acreditou naqueles fundos. Mas a realidade hoje é outra, principalmente porque o marco regulatório da previdência complementar mudou, e para melhor. A Lei Complementar nº 109/2001, que traz as regras gerais da previdência complementar, e a de nº 108/2001, voltada especificamente para servidores públicos e empregados de empresas públicas e sociedades de economia mista, dão razoável proteção aos participantes do fundo e evitam riscos de perda do patrimônio deles, ao diversificarem as aplicações, ao obrigarem a contratação de seguro e resseguro, ao garantirem transparência, além de assegurarem a eleição, entre seus participantes, aos conselhos Deliberativo e Fiscal. O marco regulatório do Brasil não deixa nada a dever em relação àqueles de países com forte tradição na previdência complementar. Também não pode servir de exemplo o que aconteceu com a Varig, cujo fundo de pensão, com a quebra da empresa, deixou ao relento milhares de idosos que contribuíram ao longo de décadas. O risco de o Estado quebrar inexiste, logo a saúde financeira do fundo dependerá da governança e da participação ativa dos participantes e dos patrocinadores, respectivamente, os servidores e os órgãos e instituições dos poderes Executivo e Legislativo e do Tribunal de Contas da União. Os riscos de ingerência política sempre existirão, mas o regramento legal reduz substantivamente essa possibilidade no que se refere aos novos fundos de pensão, especialmente se os participantes exercerem, efetivamente, o papel de fiscalização, como é de se esperar dos servidores públicos. As regras que obrigam a profissionalização da gestão da Funpresp, combinadas com o controle que os participantes exercem sobre o Conselho Fiscal, e com a participação paritária no Conselho Deliberativo, minimizam os riscos de perdas. Essas reflexões resultaram de conversas com pessoas que, tomadas pela dúvida ou pela insegurança, ou, ainda, por razões ideológicas, deixaram de aderir à previdência complementar nas empresas estatais onde trabalham, e hoje estão completamente arrependidas por não terem feito uma reserva para complementar a aposentadoria paga pelo INSS. Enquanto seus colegas que aderiram à previdência complementar estão aposentados e no usufruto de uma velhice com dignidade, os que não aderiram, apesar da idade adiantada, continuam trabalhando, por absoluta necessidade de complementação de renda. (*) Jornalista, analista político e diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Apoio Parlamentar (Diap).


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Desde 2013 a Asacred opera garantindo crédito, produtos e serviços para seus associados, com taxas mais baixas do que as do mercado

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ma viagem... a compra de um imóvel... pagamento de dívidas. Os motivos para buscar um empréstimo são os mais variados, assim como as oportunidades de conseguir crédito. Mas é preciso tomar cuidado com as ofertas do mercado financeiro e avaliar a própria capacidade de assumir compromissos! Fazer as contas direitinho para evitar que a busca pelo crédito, para suprir uma necessidade ou realizar um sonho, não se transforme em um pesadelo. Dados da Serasa mostram que 54 milhões de brasileiros estão endividados, o que equivale a 40% dos adultos com mais de 18 anos. As dívidas somadas chegam a 218 bilhões de reais. As cooperativas surgem como uma possibilidade de obter crédito a juros mais baixos do que os praticados pelas instituições bancárias, além de oferecerem tratamento personalizado ao associado, com vantagens na oferta de produtos e serviços. Formadas por uma associação de pessoas que buscam ajuda mútua, sem fins lucrativos, as cooperativas são equiparadas no Brasil a instituições financeiras. O funcionamento deve ser autorizado e regulado pelo Banco Central do Brasil, conforme explica João Luiz Faustino Marques, chefe-adjunto do Departamento de Organização do Sistema Financeiro do Banco Central: Como envolve captação de recursos financeiros do público e a atividade é privativa de instituições financeiras, a cooperativa de crédito deve ser autorizada e supervisionada pelo Banco Central do Brasil. Para ser autorizada, é necessária a aprovação do plano de

negócios, englobando estudo de viabilidade no horizonte de três anos, além da publicidade da declaração de propósito e a inexistência de restrições em relação aos administradores. Esses requisitos visam minimizar os riscos associados à capacidade operacional e à reputação dos interessados.

A Cooperativa de Crédito das Carreias Jurídicas (Asacred) reúne várias entidades de classe, representativas dos advogados públicos federais, dos defensores públicos da União e dos delegados federais, como Anpprev, Anpaf, Anajur, Siprofaz, Fórum Nacional da Advocacia Pública, ADPU e ADPF. Ela surgiu como uma forma de contribuir para a autonomia dos profissionais dessas carreiras e para a saúde financeira de seus associados. Em 2012, a Asacred obteve autorização de funcionamento pelo Banco Central do Brasil, mas só começaria a operar efetivamente em 2013. Em pouco tempo, a cooperativa cresceu muito, contando, atualmente, com quase 500 associados. Sua carteira de crédito já supera o volume de 5 milhões de reais. A Asacred integra o Sistema de Cooperativas de Crédito do Brasil (Sicoob), que possui mais de 2,9 milhões de cooperados em todo o País e está presente em 25 estados brasileiros e no Distrito Federal, ocupando a sexta posição em pontos de atendimento entre as instituições financeiras nacionais. A carteira de crédito do Sicoob teve uma evolução de 22,3%, tendo chegado a 31,7 bilhões de reais em 2014, enquanto o mercado financeiro nacional cresceu, no mesmo ano, 11,3%. As cooperativas têm conquistado um espaço cada vez maior no atual cenário econômico e social brasileiro. Dados do Banco Central mostram que, em fevereiro de 2015, havia 1.116 cooperativas de crédito, perfazendo aproximadamente 142 bilhões de reais de ativos (dado de setembro de 2014). Para João Luiz Faustino Marques, os números mostram a importância que as cooperativas estão assumindo no mercado:

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As cooperativas de crédito oferecem os mesmos produtos e serviços de um banco, mas é melhor do que qualquer banco porque o atendimento que dispensa não é para cliente; é para dono.

Sandro Rosa de Lima Gestor sênior do Sicoob Uni Asacred

Nos últimos anos, houve significativos avanços no cooperativismo de crédito. De 2003 a 2014, o número de associados passou de 1,6 milhão para aproximadamente 6 milhões; e o número de postos de atendimento cresceu de 1,6 mil para 4,2 mil em dezembro de 2014. Atualmente, o número de associados representa 5% da população economicamente ativa do Brasil, e a participação do segmento cooperativista nas operações de crédito do sistema financeiro equivale a 2%.

A pergunta que se impõe é “por que optar por se associar a uma cooperativa?” E quem responde, com propriedade, é Sandro Rosa de Lima, gestor sênior do Sicoob Uni Asacred: As cooperativas de crédito oferecem os mesmos produtos e serviços bancários, mas não é como um banco. É melhor porque o atendimento não é para cliente, mas para dono. Nas cooperativas, os resultados financeiros são compartilhados entre os cooperados ao final de cada exercício, e os recursos são administrados e mantidos na comunidade onde a cooperativa atua. Além disso, os cooperados participam das decisões das cooperativas.

Outra vantagem é que alguns impostos não incidem sobre certas operações das cooperativas; por isso, elas se tornam mais atrativas: ”Os custos internos administrativos são menores do que os de um banco, o que resulta na oferta de produtos e serviços com taxas de juros e tarifas reduzidas” – complementa Sandro Lima.

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Da mesma forma que as instituições financeiras, as cooperativas oferecem diversos serviços. Todas as operações da Asacred são autorizadas pelo Banco Central e seguradas pelo Fundo Garantidor das Cooperativas (FGCoop), até R$ 250.000,00. O associado conta com uma gama de produtos, como conta corrente, crédito, investimentos, cartões, previdência privada, consórcio, seguros e cobrança bancária. Para se associar, é necessário preencher alguns requisitos definidos pelo estatuto da cooperativa, que é estabelecido por instituição. Assim como em toda sociedade, é exigido do interessado o depósito de uma cota capital, além de contribuições voluntárias, que podem ser feitas a qualquer tempo e serão resgatadas quando o associado se desligar da cooperativa. O montante de crédito oferecido ao associado varia conforme a renda, pois é calculado com base na sua capacidade de quitação de parcelas. O comprometimento máximo para pagamento de parcelas em operações de crédito feitas com a cooperativa não pode ultrapassar 30% da renda líquida do associado. Os prazos e as taxas


variam de acordo com o tipo de operação solicitada. Mas, como imprevistos acontecem, o cooperado pode renegociar a dívida com a Asacred, conforme explica Sandro Lima: O Sicoob Uni Asacred colabora com a boa saúde financeira de seu cooperado. Portanto, caso haja necessidade de rever o contrato, e isso seja comprovado por meio de uma nova análise da situação econômicofinanceira do associado, a cooperativa oferecerá essa oportunidade de renegociação do crédito.

E ele complementa com dados que mostram que a inadimplência é baixa: “No âmbito nacional, a taxa de inadimplência da carteira de crédito encerrou o ano de 2014 em 1,66% (saldo devedor em atraso em até 90 dias). Esse percentual é 1,3% menor do que a média dos bancos no País”. Para quem ainda tem dúvidas quanto à confiabilidade da instituição, é bom ressaltar que as cooperativas seguem regras rígidas que garantem sua solidez. Segundo explica Sandro Lima, uma cooperativa precisa ter um estatuto bem ajustado e definido, pois isso vai contribuir na governança. Além disso, a cooperativa deve ter um Plano de Negócio ou um Plano Estratégico que garanta a sustentabilidade econômica da instituição. Ressalte-se ainda que, para

Produtos oferecidos pela Asacred: 1. Cartão de crédito com bandeira Mastercard e taxa diferenciada. 2. Cheque especial com taxa diferenciada de 4,90% ao mês. 3. Empréstimo pessoal com taxas menores do que as oferecidas por outras instituições. 4. Empréstimo consignado com taxas diferenciadas. 5. Financiamento de veículos. 6. Seguro automotivo, empresarial, de vida, residencial e para viagens, entre outros. 7. Investimentos com garantia de liquidez diária e remuneração de 90% a 102% do CDI. 8. Plano de Previdência Privada Complementar administrado pela Fundação Sicoob de Previdência Privada (Sicoob Previ). 9. Câmbio em parceria com a cotação DTVM (Empresa do Grupo Rendimento).

atuar, é necessário que a cooperativa obtenha autorização do Banco Central do Brasil.

Uma vez autorizada a funcionar, a cooperativa de crédito está sujeita à supervisão e à regulação pelo Banco Central do Brasil. Informações contábeis e operacionais são enviadas regularmente, sem prejuízo das ações de fiscalização direta.

João Luiz Faustino Marques Chefe-adjunto do Departamento de Organização do Sistema Financeiro do Banco Central

Fique por dentro da legislação: Lei nº 4.595/1964 Lei nº 5.764/1971 Lei Complementar nº 130/2009 Lei dos Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, nº 7.492 Resolução CMN nº 3.859/2010 Circular nº 3.502/2010

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SAÚDE

Dor nos ombros, uma das campeãs de reclamações nos consultórios Nas mais diversas atividades, seja no trabalho, seja no lazer, a tensão sobre os ombros é bastante acentuada. Essa parte tão importante, e ao mesmo tempo tão delicada, do corpo humano acaba sobrecarregada. O primeiro sinal de que alguma coisa não vai bem é a dor, às vezes nos próprios ombros, às vezes no pescoço. Dependendo do caso, o movimento dos braços pode ficar comprometido. A solução pode estar no tratamento terapêutico ou na cirurgia. Sobre isso, a revista Anajur conversou com o ortopedista e traumatologista Marco Antônio Martins Balduino*.

Quais são as ocorrências mais comuns relacionadas a problemas nos ombros? – Problemas nos ombros é a segunda maior queixa das pessoas quando chegam ao consultório de um ortopedista. Essa reclamação só perde para dor nas costas. É, então, bastante comum. Dores relacionadas aos ombros são principalmente consequência de lesão do manguito rotador, um conjunto de quatro tendões, quatro músculos que ajudam a estabilizar os ombros. Os ombros conectam os braços ao tronco e possibilitam que as mãos alcancem uma grande área à sua volta. O manguito favorece os movimentos de elevação e de rotação do braço, para fora e para dentro. O manguito tem de estar funcionando bem para podermos fazer esses movimentos. O que costuma causar lesões nos ombros? – As lesões podem ser traumáticas ou degenerativas, mas a maioria é degenerativa. Pessoas com mais de 40 anos começam a sofrer algumas alterações nas fibras dos tendões. Essas fibras vão se desgastando com o uso repetitivo e, um dia, elas podem se romper. Isso pode acontecer até espontaneamente, por conta dessa degeneração. Associase a isso o esforço repetitivo, o uso dos braços até certa elevação, a exemplo da prática de esportes de arremesso, como vôlei, basquete e tênis. Também colabora com isso a própria anatomia humana; algumas pessoas têm alterações que levam a um maior desgaste desse tendão. As lesões também podem estar relacionadas com a má postura. Quais são os sintomas dessa lesão? – O principal sintoma é a dor, nos braços e nos ombros, que irradia para a lateral do braço e para a escápula, an26

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tes conhecida como omoplata. Pode ainda irradiar para a região do pescoço. A pessoa sente dor principalmente nos movimentos de elevação dos braços, e, por vezes, não consegue sequer levantá-los. Há um sintoma bem importante que é a dor noturna. A pessoa acorda no meio da madrugada sentindo dor nos braços. A explicação para essa dor se manifestar à noite é que, durante o dia, quando a pessoa está de pé, acordada, a gravidade puxa o braço para baixo. Mas, quando ela se deita, a tendência é a de os braços subirem e comprimirem o tendão, o que provoca a dor. O senhor falou em má postura. No ambiente de trabalho, as pessoas passam muitas horas sentadas e, ademais, muitas vezes os equipamentos com os quais trabalham não são adequados à anatomia humana. O que pensa sobre isso? – Tem muito a ver com ergonomia. Poucas pessoas têm um posto de trabalho suficientemente adequado ao seu corpo. O que tem a dizer sobre postura humana e mobiliário no ambiente de trabalho? – O ideal é que a pessoa apoie totalmente as costas no encosto da cadeira. A cadeira tem de ter apoio para os braços, e o apoio tem de estar no mesmo nível da mesa em que fica o computador e o teclado. Porque assim é possível digitar sem ficar com os braços suspensos, evitando tensionar desde a musculatura cervical até ombros, braços, antebraços, cotovelos e punhos. Tem a questão também da altura em que está posicionado o monitor. Ele tem de estar na altura dos olhos da pessoa, para que ela não precise flexionar o pescoço. Problemas no pescoço podem resultar em problemas nos ombros? – Sim. A musculatura funciona em conjunto: a musculatura cervical trabalha em conjunto com a musculatura do trapézio, que, por sua vez, faz a estabilização da escápula. A dor muscular do pescoço pode irradiar para os ombros. Há certas doenças do disco, como a hérnia, que podem comprimir uma raiz nervosa, resultando em dormência ou perda de força nos braços. Então, na hora da avaliação do paciente no consultório, o ortopedista deve detalhar a investigação, de forma a saber diferenciar a dor dos ombros da dor no pescoço, porque, às vezes, elas se misturam muito. São dores parecidas e muito comuns em pessoas


talecimento na fase excêntrica do exercício, quando você faz os movimentos de volta, faz força, mas já estendendo o tendão. Esses estudos dizem que essa fase é importante para ajudar na recuperação. Então prescrevemos, com o fisioterapeuta, esse tipo de exercício. E assim se acaba também trabalhando e fortalecendo os outros músculos que estão em volta, o que ajuda na sustentação da escápula, dos músculos das costas. No manguito, que é composto de quatro tendões, às vezes um ou dois ficam danificados. Trabalham-se os músculos atingidos e também se trabalha para restabelecer o equilíbrio da articulação. Antes, a comunidade médica não tinha a noção de que pudesse acontecer tanta coisa dentro de uma articulação. Englobava-se tudo em um único diagnóstico: bursite. Hoje se sabe que a bursite é secundária, ou seja, raramente ela vem sozinha. É uma inflamação de uma estrutura chamada bursa, que fica sobre os tendões; ela os envolve e os ajuda a deslizar com menos atrito.

Marco Antônio: Uma dor constante, que se estenda por vários dias, e que limite as atividades da pessoa, indica que é hora de procurar o médico

E o que acha da acupuntura? – É uma terapia muito boa para o controle da dor e, assim, auxilia no tratamento. Dá mais conforto ao paciente. Diminuir a dor é muito importante.

que trabalham prolongadamente com computador, ficando sentadas durante muitas horas.

Quais são os casos de indicação cirúrgica? – Em casos de artroses graves, por exemplo, temos de colocar prótese de ombros. Em casos de lesão do manguito, se for uma ruptura total que esteja provocando muita dor ou incapacitando a pessoa, ou, então, levando à perda de força e a dificuldades para realizar as tarefas do dia a dia, é feito o reparo do tendão. O tendão é reinserido na lateral do osso do braço, o úmero. O cirurgião pega esse tendão que está rompido e faz a sutura do tendão de volta ao osso, para ele cicatrizar ali.

Quais são os exames indicados para diagnosticar lesões nos ombros? – Antes de tudo, se faz uma boa entrevista com o paciente. Fazemos alguns testes para ampliar o raciocínio e, assim, abrir um leque de diagnósticos possíveis. Depois desse exame físico detalhado, vêm os exames complementares. No caso dos ombros, o raio X é muito importante. Além de ser simples e barato, é muito bom para se ver a parte óssea, a articulação, algum desgaste. Através do raio X podemos ver se há algum impacto, uma ponta de osso que possa estar resvalando no tendão, alguma calcificação. E o raio X mostra bem as calcificações e o desgaste da articulação. Além do raio X, alguns exames permitem ver as partes moles, que são o tendão, o músculo e outras estruturas que compõem a anatomia dos ombros. A ecografia mostra bem o tendão e a parte muscular, só que ela não é tão fidedigna quanto a ressonância magnética, que é mais elaborada e detalha bem a anatomia, possibilitando ver as prováveis lesões. Só assim para chegar a uma avaliação melhor. Que tratamentos são indicados? – Afora o tratamento com medicamentos – que são indicados quando a lesão não chega a ser uma ruptura, mas uma doença do tendão, uma tendinopatia, quando as fibras estão meio desgastadas –, é preciso recorrer ao tratamento fisioterápico. Estudos recentes sugerem o for-

Qual é o grau de complexidade dessa cirurgia? – O nível de complexidade na verdade é saber dominar a técnica. É uma cirurgia feita por vídeo. É considerada pouco invasiva, o que melhora o tempo de recuperação, que passa a ser mais curto do que quando usado outro procedimento. Ou seja, o paciente recupera mais rapidamente os movimentos do braço. Mas, como é por vídeo, requer muito treinamento. Até o profissional conseguir realizar satisfatoriamente essa cirurgia, ele terá de passar por uma longa curva de aprendizado. Adquirir a desenvoltura é relativamente difícil. Mas o procedimento, em si, não é tão complicado. A técnica é que é difícil. O que de mais grave pode acontecer com os ombros? – Cada lesão tem seu nível de gravidade. No manguito, a lesão pode ser muito grande; ela pode atingir todos os músculos e levar ao desequilíbrio total da articulação, REVISTA

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uso em posição inadequada, principalmente no ambiente de trabalho, o que leva a uma tensão excessiva nos tendões – é o esforço repetitivo.

impedindo, por exemplo, a pessoa de levantar os braços. Pode até provocar um desgaste da cartilagem, uma artrose dos ombros, que causa muita dor, incomoda bastante. A artrose também pode ser a consequência final dessa instabilidade recorrente dos ombros, por conta dessa lesão do lábio glenoidal. Cada vez que o ombro se desloca, é uma lesão a mais. E a cartilagem sofre com isso. A cada vez que o ombro sai do lugar, ele sofre um novo traumatismo, e isso pode evoluir para artrose. Outra situação bastante debilitante dos ombros é a necrose da cabeça do úmero, o osso do braço. Também leva a uma dor intensa e à limitação de movimentos. Nesse caso, com a deterioração da anatomia, da articulação, o tratamento é colocar uma prótese no ombro. No que concerne aos cotovelos, quais são as ocorrências mais frequentes? – Para quem trabalha muito com computador, a lesão mais comum é a alteração nos tendões que saem do cotovelo e vão para os punhos e para as mãos, responsáveis por fazer tanto o movimento de levantar como o de flexionar os punhos – são as epicondilites. Por isso, problemas nos cotovelos podem se refletir nos punhos e nas mãos. A dor da epicondilite concentra-se mais na região lateral dos cotovelos, mas a postura inadequada dos braços pode irradiar e ir para os antebraços. Comparando lesões nos ombros e nos cotovelos, a área que apresenta mais problemas relacionados ao trabalho são os cotovelos? – A epicondilite, esse problema nos tendões do cotovelo, no tendão conjunto extensor do cotovelo, é bastante frequente. Não costuma ser um problema inflamatório; é parecido com a lesão dos tendões do manguito, de desgaste, degenerativa. Também tem a ver com o seu 28

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Que cuidados as pessoas devem tomar para preservar as articulações dos ombros e dos cotovelos? Além dos cuidados com a postura, há alguma atividade que possa ser executada durante o trabalho para minimizar a tensão? – Uma boa orientação é fazer pausas frequentes. A cada 50 minutos de trabalho, fazer uma pausa de 10 minutos, para quebrar aquela tensão, aquela postura que, às vezes, está inadequada. Esse simples procedimento diminui um pouco a tensão da musculatura. Para proteger as articulações, é importante fortalecer a musculatura que envolve aquela articulação. A pessoa tem de fazer tanto os exercícios para fortalecer a musculatura, quanto os chamados exercícios cardiovasculares, que melhoram a circulação local, estimulam o coração a funcionar melhor, oxigenam o músculo e evitam a fadiga. Deve-se também treinar a flexibilidade. Fazer alongamento também é importante? – Muita gente negligencia o alongamento, mas ele faz parte do exercício, e, assim, tem de ser feito. A medicina do esporte praticada nos Estados Unidos preconiza três pilares do exercício físico: treino de força, treino cardiovascular e flexibilidade. O ideal é praticar os três para formar um conjunto que, a par de melhorar o bem-estar, vai evitar doenças articulares e até mesmo as cardiovasculares. A falta de uso da musculatura pode atrofiar os músculos? – Sim. Sem exercícios eles atrofiam, encurtam e perdem o tônus. No dia a dia, a gente acaba usando alguns grupamentos mais do que outros, o que gera um desbalanço muscular e atrapalha a articulação. Então, não adianta fugir: para se manter saudável, a gente tem mesmo de fazer exercícios? – Tem de fazer, sim. Não é só por questão estética, mas para preservar a funcionalidade da pessoa. Tem a ver com desempenhar as atividades do dia a dia sem sentir incômodo. Tem a ver também com a disposição, pois quem faz atividade física, por treinar o sistema cardiovascular, tem mais disposição. Mas tem de se ter muito cuidado. O exercício malfeito pode provocar lesões, por isso, indica-se fazer exercícios com orientação profissional. (*) Marco Antônio Martins Balduino é médico ortopedista e traumatologista, cirurgião de ombro e cotovelo, membro das Sociedades Brasileiras de Ortopedia e Traumatologia e de Cirurgia do Ombro e do Cotovelo. Atua nos hospitais Santa Lúcia e Santa Helena, em Brasília (DF).


coletânea

História do Brasil contada pela Advocacia Consultiva

O caso da provocação para uma intervenção federal em Goiás, em 1905 Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy*

Em 1905, as eleições gerais do estado de Goiás redundaram num impasse. À época, uma Comissão Verificadora dos Poderes aferia os eleitos, as condições da eleição e, em seguida, diplomava os ungidos pelas urnas. A comissão era, assim, uma fórmula institucional que antecedeu a Justiça Eleitoral. O modelo político era centrado no predomínio de estados exportadores de café e produtores de leite, nomeadamente São Paulo e Minas Gerais, de onde vinha a identificação do País à época, como a República do Café com Leite.

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modelo era suplementado por redes políticas existentes nas várias unidades da Federação, que garantiam o apoio dos chefes do Poder Executivo de cada estado ao governo central, circunstância conhecida como Política dos Governadores. Em âmbito municipal, vingava uma política de cabresto, o chamado “coronelismo”, tema do importantíssimo estudo de Vítor Nunes Leal, Coronelismo, enxada e voto, clássico da nossa ciência política. O ministro Nunes Leal explorou o municipalismo brasileiro no contexto do coronelismo, que qualificava o mandonismo patrimonialista da República Velha.

No caso das eleições de Goiás de 1905, uma duplicata na representação dos poderes sugeria a intervenção federal. Foi essa a questão levada ao consultor-geral da República, que sustentou que a intervenção federal, naquele momento, demandava situação fática que ainda não fora demonstrada. Havia, na verdade, uma participação ostensiva do governador de Goiás em favor de um dos grupos, o que, naturalmente, exigia cautela da parte do Governo Federal. Do ponto de vista prático, o problema estava na verificação dos poderes de eleitos ligados ao governo. Denunciou-se que as juntas de apuração expediam diplomas ilegais. A oposição se retirou e passou a instalar, em outros locais, duplicatas dos poderes então constituídos. À época, havia também uma Câmara do Senado Estadual, uma permissão do modelo constitucional de 1891. Assim, havia conflitos na Câmara dos Deputados e na Câmara do Senado. E mais: as duas Casas é que iriam, reunidas, reconhecer o novo governador eleito. As novas Casas conseguiram realizar duas sessões, amparadas por decisões da Justiça Federal. A Consultoria-Geral da República fora, assim, instada a opinar se era hipótese de intervenção federal. O consultor-geral observou que o problema não se colocava nos exatos termos da previsão constitucional que se aplicava ao caso. Não havia invasão estrangeira, não havia – objetivamente – perturbação da ordem, não havia descumprimento de lei ou de sentença federal. Nem se observava, objetivamente, ameaça à forma federativa REVISTA

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de Estado. Argumentava o consultor-geral que o governo até poderia ser ilegal, e ainda assim não seria contrário à forma federativa de Estado. O parecer fez amplo uso da doutrina e da pragmática norte-americanas, ambiente que fixou as linhas gerais do federalismo. Concluiu Araripe Júnior que a ordem constitucional permitia intervenção para o restabelecimento da ordem, e não para a prevenção. Isto é, cristalizou-se a doutrina de que a intervenção federal no estado, se possível, seria repressiva, e não preventiva. Especialmente porque, naquele contexto, o governo de Goiás não estava acéfalo. Segue o parecer.

Gabinete do Consultor-Geral da República. Rio de Janeiro, 29 de junho de 1905. Examinei os papéis juntos, relativos à situação em que se acha o Estado de Goiás, com uma duplicata de poderes, Legislativo e Executivo; e, se bem entendi a exposição que os acompanha, subscrita pelos senadores e deputados de uma das facções políticas que disputam a posse do governo naquele Estado, o que está em causa é a legalidade de reconhecimento dos respectivos poderes, que se realizou tumultuariamente, depois de uma eleição também tumultuária, dando cabimento à dualidade anômala de que se trata. Não me cabe entrar na apreciação das violências e ilegalidades praticadas pelo atual governador de Goiás, intervindo ostensivamente nas eleições. O que interessa à solução do caso é o modo por que se tornaram efetivas as duas apurações. De como chegaram os fatos a tomar esse caráter na aludida exposição pode-se avaliar pelo seguinte: Chegada a época da verificação de poderes dos membros do Congresso e cujo início a lei fixa para 5 de maio, contava o Governo maioria de deputados e diplomados, em grande parte portadores de diplomas ilegais, por terem sido expedidos por juntas apuradoras incompetentes, quais as instituídas pelo ilegal decreto de 7 de junho (ilegal porque da autorização legislativa para a divisão dos círculos, quatro anos antes, já tinha usado o Executivo e a divisão feita em virtude dessa autorização estava incorporada à lei). Considerando os candidatos diplomados oposicionistas que seria baldado pleitear os direitos da oposição perante um poder verificador assim, constituído dos próprios espoliadores de tais direitos, e que de antemão sabiam apurar todas as eleições favoráveis 30

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ao governo, por mais escandalosamente fraudulentas que fossem, firmados no art. 2º do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, reuniram-se em edif ício a parte e, constituindo a mesa e as comissões regimentais, encetaram os seus trabalhos. No Senado, continua o mesmo documento, estava a oposição em condições superiores à do Governo, pois, devendo se constituir o poder verificador dos senadores de mandato em vigor (o Senado pela Constituição do Estado compõe-se de doze senadores, renovando-se, por metade, de 4 em 4 anos), destes contava com três e o Governo com dois, dos quais um presidente e sem voto. Dispõe o regimento do Senado, art. 6º, que para os atos de reconhecimento de poderes é necessária a presença de cinco senadores. No primeiro dia de sessões preparatórias, só comparecendo três senadores, o presidente do Senado, coronel Rocha Lima, candidato oficial à presidência do Estado, convidou a tomarem assento os candidatos diplomados, e cujos diplomas tinham sido protestados, e constituiu com eles uma mesa ilegal, que tomou o compromisso do senador Ricardo Paranhos e o empossou. À vista de procedimento tão tumultuário, violador dos preceitos regimentais, retirou-se o senador Fulgêncio Nunes da Silva, o único oposicionista presente, e com o primeiro secretário, Souza Moraes, que assumiu a presidência, constituiu Senado à parte. E sob esta base foram verificados os poderes dos deputados e senadores da oposição, constituídos em Câmara e Senado à parte. Instalaram-se e realizaram as duas sessões sob a garantia de um habeas-corpus concedido pelo Juiz Federal; em sessões de 2 e 3 de junho corrente procederam, como Congresso, nos termos do art. 89 da Constituição respectiva, a apuração da eleição do presidente e dos vice-presidentes do Estado, que deverão servir no período de 14 de julho de 1905 a 14 de julho de 1909 e proclamaram presidente o Dr. José Joaquim de Souza e vice-presidentes os coronéis Francisco Ferreira Lemos, José Vaz e Manoel do Carmo Lima. O Congresso, que, segundo afirma a exposição, o governo organizou, procedeu também à apuração da eleição presidencial, proclamando: presidente, Miguel da Rocha Lima, vice-presidentes, José Balduino de Souza, Francisco Bertolo de Souza e José da Silva Baptista. Nestas condições, prevendo que no próximo dia 14 de julho, data fixada pela Constituição estadual para inauguração do novo período governamental, dois presidentes disputarão o governo do Estado, pensam os signatários da exposição que semelhante crise só pode


Numa confederação, fundada em princípios republicanos, é preciso que o Governo Federal tenha o poder de defender o sistema geral contra as inovações da aristocracia ou da monarquia.

constitucionalmente ser resolvida pela intervenção do Governo Federal, nos termos do nº 2º, do art. 6º, da Constituição da República, decidindo entre os dois poderes rivais qual o legitimamente constituído. Questão melindrosa e sem precedentes na República Brasileira, parece-me, à primeira vista, não encontrar solução diretamente indicada na letra de nenhum dos §§ do art. 6º citado. Não se trata, com efeito, de repelir invasão estrangeira ou de um Estado em outro; não consta que a ordem e a tranquilidade do Estado, no momento atual, tenham sido perturbadas materialmente, de modo que a ação legal da autoridade e o gozo pacífico dos direitos do cidadão se vejam embaraçados; não se verifica, tão pouco, a hipótese de violação ou não execução de leis ou sentenças federais, por culpa ou oposição dos poderes estaduais. Tais casos, pois, estão de si mesmos excluídos pela natureza dos fatos que ocorrem no Estado de Goiás. Se a intervenção, solicitada do Governo Federal, firma-se na iminência de um conflito material, que poderá, entretanto, dissipar-se, é intuitivo que só depois de traduzidos em desordem, poderiam os acontecimentos, segundo a sua gravidade, determinar, mediante requisição do respectivo governo, a expedição dos atos e providências defluentes do nº 3º do dito art. 6º. Resta, portanto, saber se os atos dos poderes verificadores, acima descritos, constituem uma derrogação da forma republicana federativa, de maneira a legitimar o exercício da faculdade constitucional.

Os intérpretes da Constituição Americana, da qual foi transportado para a brasileira o dispositivo de que se trata, são quase uniformes na reprodução do pensamento dos autores do Federalista, em cujo capítulo XLII leem-se as seguintes palavras: “Os Estados Unidos afiançam a todos os Estados da União a forma do governo republicano, e se obrigam a defendê-los de qualquer invasão estrangeira, ou mesmo de qualquer violência doméstica, contanto que isto lhes seja requerido pela legislatura respectiva, ou pelo Poder Executivo, se a legislatura se não achar reunida. Numa confederação, fundada em princípios republicanos, é preciso que o Governo Federal tenha o poder de defender o sistema geral contra as inovações da aristocracia ou da monarquia. Quanto mais íntima for a união, tanto mais interesse tem cada membro nas instituições políticas das outras, e tanto mais direito de exigir que a forma de governo existente na época do pacto seja substancialmente mantida... Assim, enquanto os Estados conservarem a forma republicana, qualquer que ela seja, é lhes afiançada pela Constituição Federal; e se quiserem substituir-lhe outra, também têm o direito de o fazer, e podem reclamar, para a que adotarem, a garantia federal. O único poder que não têm é o de adotar uma Constituição que não seja republicana.” A intenção do legislador constituinte, diz Cooley, (Const. Limit., p. 28), foi proteger a união fundada sobre princípios republicanos contra inovações aristocráticas e monárquicas. Pomeroy, (Const. Law, p. 136), acrescenta que justifica-se a intervenção do Congresso para restaurar a forma do governo republicano toda vez que um Estado legisla, pondo o respectivo governo nas mãos de uma oligarquia. Não diverge desse conceito Walker, (Amer. Law, § 67), quando afirma que aos Estados é apenas proibida a admissão de governos despóticos, aristocráticos, monárquicos, não se permitindo a intervenção senão nos casos que em tais governos se caracterizem pela forma antirrepublicana. Gourd, o mais recente comentador da Constituição Americana, observa que a cláusula de garantia não é somente a garantia da forma republicana, neste ou naquele estado particular; ela constitui uma das garantias da forma republicana do próprio governo da União, salvaguarda da paz interior, da diuturnidade da União, da vida da nação; de onde se conclui, com REVISTA

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toda razão, que para proteger num Estado qualquer a forma republicana, os Estados Unidos podem intervir espontaneamente, independente de solicitação ou requisição de autoridades locais... E, todavia, fora dos casos em que o Congresso por mais de uma vez tem fixado as condições a que se deveriam subordinar as Constituições dos Estados novamente admitidos, a garantia da forma republicana parece nunca ter sido posta em execução. [...] De tudo isto se vê que a faculdade consagrada no art. IV, sec. IV, da Constituição Americana, e relativa a inversão ou transformação do Governo em um tipo diferente, resolve-se numa faculdade do poder constituinte; de onde resulta que os atos, que esse poder é obrigado a submeter ao seu exame e censura, devem manifestar-se sob o aspecto de uma organização traduzida em leis evidentemente contrárias ao regime republicano firmado pela Constituição Federal. “Manter a forma republicana federativa” declara-o também o nº 2º do art. 6º da Constituição Brasileira. Ora, não se manifestando a forma de um governo senão pelos aparelhos políticos e institutos criados pelas suas leis orgânicas, é óbvio que só na ordem legislativa pode ser ela atacada. No exercício, portanto, daquela faculdade, o Governo Federal, quando lhe caiba tomar conhecimento da organização inconstitucional de um Estado, tem apenas que verificar se a respectiva Constituição e leis contrariam os princípios políticos da União. Nem a Constituição de Goiás, reconhecida por ambas as facções políticas, cuja luta deu ensejo à exposição junta, nem as suas leis orgânicas, são acusadas de subverter, alterar ou inverter o regime, sob o qual se constituiu aquele estado como membro da União. A intervenção por aquele motivo, na opinião geral dos comentadores, devolver-se-ia ao Poder Legislativo Federal. Em minha opinião essa incompetência é irrecusável, porque depende claramente do exercício de faculdade legislativa, e tal deve-se considerar a de revogar ou declarar não existentes leis que organizam um Estado como estranho à União e determinar por via de uma constituinte a reorganização do Estado, que se tiver excluído do regime constitucional abandonando a forma republicana federativa. Mas não é este o caso. O que se pretende é considerar o Governo da União competente para, em segunda instância, verificar os poderes dos indivíduos que se dizem eleitos presidente, vice-presidentes, senadores e 32

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deputados de Goiás. Que têm os fatos, aliás deploráveis, ocorridos durante o pleito eleitoral e o modo pelo qual se fez ali a verificação de poderes, com a forma republicana federativa? Penso que nada. O governo de um Estado pode ser ilegal sem ser contrário à forma republicana. Assim, pois, no meu parecer, o disposto no nº 2º do art. 6º só por si não justificaria a intervenção, desde já, para validar qualquer das eleições que serviram de base à instalação dos dois congressos e consecutiva apuração da eleição de dois presidentes e vice-presidentes. Sem dissimular, porém, a dificuldade que oferece em perspectiva a dualidade do governo, e a probabilidade de um conflito, logo que o atual presidente termine o período constitucional e seja empossado o seu sucessor, convenho em que a Constituição da República instituiu remédio para os casos de perturbação doméstica, autorizando a intervenção do Governo Federal para restabelecer a ordem e tranquilidade nos Estados, a requisição dos respectivos governos, mas também reconheço que essa mesma Constituição não concedeu essa faculdade para prevenir, mas para agir reprimindo atos já exteriorizados e contrários à ordem no Estado. “Restabelecer”, enuncia o referido parágrafo; e só se restabelece aquilo que deixou de existir. Isto posto, parece que só o fato material da perturbação da ordem no Estado de Goiás poderia autorizar medida de repressão derivadas do nº 3º do art. 7º; enquanto esse fato não aparecer toda e qualquer intervenção seria prematura e, portanto, inconstitucional, ainda que solicitada. Dado, porém, que essa intervenção se torne oportuna, isto é, que as duas facções políticas entrem em ação para empossar o chefe do Executivo e efetivamente surja o conflito material, como agir, e qual dos poderes da União é competente para intervir, à vista de duas requisições, em oposição, subscritas por autoridades que se julgam legítimo governo? Não vejo na jurisprudência solução franca para a dificuldade ocorrente. Os dois casos que pude encontrar na jurisprudência americana relativos a dualidade de governo não me parecem robustecer nenhuma opinião decisiva. O primeiro é o de Rhode Island, em 1849. Nesta emergência a ilegitimidade de um dos governos coincidia com uma insurreição de caráter político e ofensiva do princípio federativo. A Suprema Corte, a quem foi submetido o caso, declarou que ao Congresso cabia


verificar qual o governo estabelecido no Estado, para então decidir sobre se era ou não republicano. O outro exemplo, que é de 1873, refere-se a Luziânia. Ainda este precedente americano varia do que se nos afigura agora. A comissão do Senado norte americano, ao qual foi sujeito o conflito, provocada a dizer se existia um governo civil naquele Estado, opinou que nenhum dos governos pretendentes fora legitimamente eleito, e assim propôs se adotasse a resolução de que “presentemente” não havia governo de Estado no Estado da Luziânia, e nestas condições se devia ordenar uma nova eleição e providenciar para que ela se fizesse sob a autoridade dos Estados Unidos “a fim de que o povo, acrescentava o parecer, eleja um governo ao qual se submeta, ou em caso de sublevação os Estados Unidos possam honestamente sustenta-lo.” (J. Barbalho, Com., p. 25). A conclusão a tirar desse parecer é que a acefalia governamental deve equiparar-se a ausência de constituição para que se sub-rogue o Congresso Federal no direito de, como poder constituinte, exercer a função legislativa que se considera extinta no Estado, e promover o restabelecimento, por atos de soberania, da representação política do mesmo Estado. Se o caso de Goiás fosse igual ao da Luziânia teríamos nesse precedente norte americano amparo para a

opinião dos que pretendem que se justificaria por tais fundamentos a intervenção espontânea. Não é. A questão, na hipótese vertente, é de dualidade de apuração, e o Estado não está acéfalo, porque o atual governador não terminou o seu período governamental e ninguém contesta a sua autoridade. A intervenção, portanto, ter-se-á de subordinar forçosamente à cláusula final do nº 3º do art. 6º da Constituição da República, garantidora da autonomia estadual. Recebida pelo Governo Federal dupla requisição, presumindo que uma delas tenha sido expedida pelo governo legitimamente eleito no Estado, ao Presidente da República compete tomar todas as providências que interessem ao restabelecimento da ordem, mantendo o governo de fato, até que o Congresso Nacional, pronunciando-se sobre a espécie, possa estatuir relativamente ao processo de intervenção definitiva e reconhecimento do governo legal segundo as exigências do caso ocorrente. Saúde e fraternidade. T. A. Araripe Junior (*) Doutor e Mestre em Filosofia do Direito e do Estado pela Pontif ícia Universidade Católica de São Paulo. Consultor-Geral da União.

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PUBLICAÇões

Administração pública e segurança jurídica Em tempos de crise institucional, quando as relações entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário entram em conflito, colocando em questionamento, por exemplo, a independência dos poderes, o advogado público Flávio Hiroshi Kubota lança o livro Competência do juiz constitucional: limites de atuação à luz da separação de poderes e do controle de constitucionalidade. No livro, Flávio Kubota discute situações em que o juiz constitucional ultrapassa os limites de sua competência, ofendendo as previsões das regras de controle de constitucionalidade estabelecidas pela Constituição Federal. O objetivo do trabalho é demonstrar os limites da competência de atuação do juiz constitucional e a necessidade de ele atuar nos limites dessa margem, pelo bem da estabilidade social e política. O autor é mestre em Direito Constitucional e tem larga experiência em atuação junto ao Supremo Tribunal Federal (STF). O livro foi publicado pela Editora Juruá.

Concurso premia artigos sobre a Advocacia Pública A Associação dos Procuradores do Estado do Rio de Janeiro (Aperj) publicou edital do concurso “Prêmio Científico Procurador do Estado Marcos Juruena Villela Souto”, que vai laurear os melhores artigos sobre temas relacionados à Advocacia Pública. Ao certame podem se candidatar tanto estudantes quanto profissionais do Direito. Na categoria Universitária, os participantes deverão desenvolver o tema “O princípio da eficiência na Administração Pública – Um estudo de caso”. Já na categoria Profissional, direcionada para advogados devidamente inscritos nos quadros da OAB, o trabalho, de caráter inédito, deverá ter como tema “A Advocacia Pública Preventiva como instrumento de solução de conflitos”. Os interessados poderão submeter os respectivos trabalhos até 30 de junho de 2015. Para mais informações, basta visitar o site www.aperj.org.br.

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