Revista Anajur - Setembro 2015

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ano VI • jul/ago/set 2015

Honorários

Direito legítimo da Advocacia Pública Novo Código de Ética da OAB destaca ação dos advogados públicos

Unificação de carreiras: por uma nova estrutura orgânica da AGU


A ANAJUR conclama todos a se mobilizarem em prol da aprovação da PEC 443/2009 na Câmara dos Deputados. A proposta busca corrigir a disparidade remuneratória existente entre os membros das carreiras da Advocacia-Geral da União (AGU) e as carreiras que compõem o Judiciário e as demais Funções Essenciais à Justiça. A PEC foi aprovada pelos deputados, em 10 turno, no dia 11 de agosto. Agora, precisa passar pelo 20 turno na Câmara, e por dois turnos no Senado. Segundo a proposta, o subsídio do nível mais alto dos membros da AGU equivalerá a 90,25% do subsídio mensal dos ministros do Supremo. O autor da proposta, deputado Bonifácio de Andrada (PSDB/MG), explica a urgente necessidade de tal correção. “Enquanto o Poder Judiciário e o Ministério Público dos Estados alcançaram a maturidade por meio de leis nacionais que concederam remuneração semelhante em todos os Estados da Federação, o mesmo não foi feito para as procuradorias dos Estados e do Distrito Federal, e o que se vê é uma grande disparidade no tratamento remuneratório dos procuradores, o que não é conveniente para a Federação Brasileira. A eficiência da Advocacia da União e dos Estados é de responsabilidade desta Casa e não pode haver prejuízo ao interesse público”, afirmou Bonifácio de Andrada (PSDB/MG). Vale lembrar que a aprovação da PEC 443/09 não trará impacto orçamentário imediato. A implementação do aumento se dará em até dois exercícios financeiros, não comprometendo o Ajuste Fiscal. A ANAJUR considera que a valorização da Advocacia Pública é medida fundamental para a prevenção e o combate à corrupção, considerando que são os Advogados Públicos os responsáveis pela defesa da União. São os guardiões do erário e lutam, diariamente, para evitar as perdas do Estado Brasileiro. A valorização das carreiras passa, dentre outras atitudes, por um tratamento remuneratório adequado aos profissionais que a integram. A luta continua!


leia nesta edição Ano VI • jul/ago/set 2015

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carta ao leitor

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anajur em ação

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conquista

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unificação das carreiras

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história

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direito internacional

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coluna carlos mota

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saúde

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artigo

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novas tecnologias

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coletânea

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pec 443 em segundo turno: a luta é nas bases

A luta da Advocacia Pública toma conta do País

Advocacia Pública ganha capítulo especial no Código de Ética da OAB

Por uma nova estrutura orgânica da AGU

A campanha dos advogados públicos por honorários

Os tratados das Nações Unidas sobre a exploração do espaço

Esse filme eu já vi!

Hipertensão: um em cada quatro brasileiros sofre da doença

Escolheram o serviço público e o servidor como alvos do ajuste

Estamos dependentes das redes sociais?

O hasteamento das bandeiras da monarquia portuguesa em 1911 publicaçõeS E EVENTOs

90 Fórum Brasileiro de Combate à Corrupção na Administração Pública


ana jur Associação Nacional dos Membros das Carreiras da Advocacia Geral da União

Pioneira na defesa da Advocacia Pública Federal Visão

“Consolidar-se como referência na defesa das prerrogativas e interesses de seus associados, firmando-se como pilar da categoria na promoção do conhecimento, valorização e integração da advocacia pública federal junto ao estado e à sociedade brasileira”.

Missão

Diretoria Executiva Presidência Joana d’Arc Alves Barbosa Vaz de Mello Secretaria Geral Titular: Nicóla Barbosa de Azevedo da Motta Adjunto: Thaís Helena Ferrinho Pássaro Diretoria Financeira Titular: Geneide Palmeira Machado Adjunto: cargo vago Diretoria Jurídica Titular: Márcia Regina Vicente Barbosa Adjunto: Ruth Jehá Miller Diretoria de Administração e Convênios Titular: Lúcia Helena Pigossi Neves Adjunto: Laura Maria Costa Silva Souza Diretoria de Recreação e Esporte Titular: Sérgio Ernesto Kopp
 Adjunto: Cláudia Maria Vilela Von Sperling Diretoria de Relações Associativas Titular: Luiz Fabrício Thaumaturgo Vergueiro Adjunto: Ulisses Fernandes Silva Diretoria de Eventos Titular: Luciana Villela de Souza Adjunto: Vânia Rons Lamor Pinheiro Diretoria de Comunicação Social Titular: Maura Campos Domiciana Adjunto: Merly Garcia Lopes da Rocha

“Representar e assegurar, com a expertise de seu pioneirismo e excelência de atuação, os interesses dos seus associados e da Advocacia Pública Federal perante os poderes constituídos e em benefício da sociedade brasileira”.

Diretoria de Assuntos Legislativos Titular: Maria Madalena Carneiro Lopes Adjunto: Luciano Brochado Adjuto

Valores

Diretoria de Relações com o Congresso Nacional Titular: Maria Lucila Ribeiro Prudente de Carvalho Adjunto: Maristela de Souza Ferraz Calandra

Ética, respeito, credibilidade, profissionalismo, integridade, transparência, união e democracia. Setor de Autarquias Sul – Quadra 03 – Lote 02 Bloco C Sala 705 – Edifício Business Point – Cep 70070-934 PABX: (61) 3322-9054 – Fax: (61) 3322-6527

Diretoria Cultural Titular: Leslei Lester dos Anjos Magalhães Adjunto: Luiz Edmar Lima Diretoria de Assuntos de Aposentados e Pensionistas Titular: Braz Sampaio
 Adjunto: Tânia Maria Carneiro Santos

Conselho Consultivo Efetivos

revista anajur

Jurema Santos Rozsanyi Nunes Nílson Pinto Correa Maria da Glória Tuxi F. dos Santos Nicóla Barbosa de Azevedo da Motta Maria Anália José Pereira Manoel Teixeira de Carvalho Neto José Silvino da Silva Filho Annamaria Mundim Guimarães Borges Messin Merly Garcia Lopes da Rocha Jacyra Medeiros

Assessoria de Comunicação: Decifra Gestão e Conteúdo

Suplentes

www.anajur.org.br

Regina Maria Fleury Curado Felinto César Sampaio Neto Maria Olgaciné de Moraes Macedo Conselho Fiscal

Jornalistas responsáveis: Flávia Soledade e Cidinha Matos Edição: Glória Maria Varela Reportagens: Flávia Metzker e Matheus Feitoza Revisão: Corina Barra Soares Projeto e edição gráfica: GDG – Cláudia Barcellos Impressão: Gráfica Ipanema Tiragem: 2 mil exemplares

Efetivos Álvaro Alberto de Araújo Sampaio Maria Socorro Braga Gilberto Silva Suplentes Norma Maria Arrais Bandeira Tavares Leite Lídio Carlos da Silva Conceição das Graças Amoras Mira


CARTA AO LEITOR

PEC 443/2009 em segundo turno: a luta é nas bases videnciária. E não havia pessoa melhor para falar sobre o tema do que o autor da proposta que pretende pôr fim a essa questão, de uma vez por todas, no nosso sistema previdenciário: o Dr. Carlos Mota. Entre os artigos da Revista, dois temas curiosos se destacaram: “Os tratados das Nações Unidas sobre a exploração do espaço”, de autoria do nosso associado Álvaro Fabrício dos Santos, e “Estamos dependentes das redes sociais?”, da escritora e palestrante Adriana Albuquerque. Temas atuais e muito interessantes, que trazem novas perspectivas para o Direito, no primeiro caso, e para as Ciências Sociais e a Cultura, no segundo. Como em todas as edições, contamos mais uma vez com a contribuição do consultor da União, Arnaldo Godoy, que nos brinda com mais um episódio histórico tratado pela Advocacia Consultiva. Desta vez, sobre o hasteamento da bandeira da Monarquia Portuguesa, em terras brasileiras, em 1911. Outro importante colaborador da nossa Revista, o assessor parlamentar da Anajur, Antonio Queiroz, o “Toninho do Diap”, discute os reflexos do ajuste fiscal sobre o dia a dia do servidor público. Na seção Saúde, a Revista Anajur divulga uma entrevista com o cardiologista Daniel França, doutor pela UnB, que nos alerta sobre os riscos e nos instrui sobre os cuidados a tomar com a hipertensão. Por fim, na seção Publicações, dicas de livros e de um seminário vão engrandecer nossa cultura jurídica. Boa leitura!

foto: bernardo rebello

A

o longo deste ano, trilhando incansavelmente os corredores do Congresso Nacional, ora acompanhando comissões, ora participando de reuniões com parlamentares, procurando apoio em quem, de alguma forma, poderia nos ajudar na aprovação da PEC 443/2009 no Plenário da Câmara, ouvimos um conselho recorrente: “É nas bases que vocês devem buscar o apoio dos deputados!” E assim foi feito. Contando com o inestimável empenho dos advogados públicos em todo o País, diversos eventos foram realizados nos estados, a fim de estreitar o contato entre membros da AGU e parlamentares. E o resultado não poderia ter sido melhor: a PEC 443/2009 finalmente foi aprovada em primeiro turno. Começou, então, o trabalho para a aprovação da proposta em segundo turno. O caminho era, mais uma vez, renovar o contato com deputados e senadores em suas bases eleitorais. Nesta edição, a Revista Anajur reservou o espaço Anajur em Ação – seção onde são apresentados os trabalhos da Associação na atuação política diária – para homenagear nossos associados nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Paraíba, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Distrito Federal. Essas são apenas algumas das unidades federadas que realizaram eventos em favor dos pleitos da Advocacia Pública. Um tema candente, do máximo interesse da AGU, também é discutido: a unificação das carreiras da AGU, uma demanda antiga da maioria dos advogados públicos. Além disso, é analisado todo o percurso da luta da classe por honorários sucumbenciais, até chegar à positivação do direito no novo Código de Processo Civil. Afinal de contas, relembrar essa luta é uma forma de consolidar nossa história. E, na esteira das novas conquistas da Advocacia Pública, está a previsão de um artigo especial sobre a Advocacia Pública no novo Código de Ética da OAB. A Revista Anajur explica o que essa previsão acrescenta no âmbito das prerrogativas dos advogados públicos. Outro importante tema explorado nesta edição é a injusta submissão dos aposentados à contribuição pre-

Joana d’Arc Alves Barbosa Vaz de Mello Presidente da Anajur

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anajur em ação

A luta da Advocacia Pública toma conta do País O empenho dos advogados públicos na luta pela consolidação dos pleitos da classe tem atraído a atenção dos parlamentares e de diversas categorias profissionais, que enxergam, no trabalho elegante e assertivo dos membros da Advocacia-Geral da União (AGU), um modelo de atuação na busca de apoio parlamentar. Nos corredores do Congresso, os membros da AGU são reconhecidos e cumprimentados, provando que o caminho trilhado é o correto.

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trabalho não está, porém, restrito ao espaço do Parlamento. Mais efetivo do que abordar os deputados nos corredores e gabinetes da Câmara é encontrá-los no seu local de origem, ou seja, na sua base política. A atuação nas bases é um recurso eficiente para convencer os deputados. Ao ter contato com os seus eleitores, o parlamentar sente o apoio deles e o compromisso que deve assumir com aqueles que lhe delegaram a função de representá-los. Por isso, é ali que se desenvolve a relação de empatia, de adesão a uma causa e de compromisso com a classe. Nesse propósito, os advogados públicos de todo o País resolveram, em conjunto, organizar visitas e eventos de agradecimento aos deputados que apoiaram a PEC 443/2009.

São Paulo Na capital paulista, os advogados públicos promoveram um café da manhã para agradecer o empenho dos parlamentares na aprovação da PEC 443/2009 em primeiro turno e pedir o apoio deles para a aprovação do texto em segundo turno, na Câmara dos Deputados. 6

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Rio de Janeiro

Paraíba

Os advogados públicos se reuniram com o líder do PMDB na Câmara dos Deputados, Leonardo Picciani. O deputado estadual Paulo Ramos (PSOL-RJ) também participou do encontro. Picciani é próximo ao presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), responsável por conduzir a reunião de líderes partidários e decidir quais matérias entrarão na pauta de votação no plenário da Câmara dos Deputados. O líder do PMDB afirmou que apoia a PEC 443/2009 e que defenderá a proposta na sua bancada.

Em João Pessoa (PB), associados da Anajur e das demais entidades que representam os advogados públicos promoveram um café da manhã com os deputados paraibanos, em forma de agradecimento pelo apoio à aprovação da PEC 443/2009. Do encontro participaram os deputados federais Hugo Motta (PMDB-PB) e Efraim Filho (DEM/PB), além do deputado estadual Nabor Wanderley.

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Rio Grande do Norte Em mais um ato em favor dos pleitos, os membros da Advocacia-Geral da União no estado do Rio Grande do Norte realizaram, no dia 31 de agosto, um café da manhã com gestores e parlamentares. O objetivo era sensibilizar os deputados sobre a importância da aprovação da PEC 443/2009. Ao evento acorreram 53 advogados públicos federais e mais 27 convidados, estando entre eles quatro deputados federais e dois senadores da República. Além disso, os gestores públicos também foram convidados a participar do evento e dialogar com os representantes do Rio Grande do Norte no parlamento nacional.

Distrito Federal Em mais uma ação de fortalecimento das carreiras da Advocacia-Geral da União, os advogados públicos federais em Brasília promoveram um café da tarde com os deputados federais do Distrito Federal. O encontro se deu no dia 14 de setembro, no Hotel Cullinan, na capital federal. A ele compareceram os deputados Rogério Rosso (PSD-DF), Erika Kokay (PT-DF) e Roney Nemer (PMDB-DF), além do presidente do Conselho Federal da Ordem dos

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Pernambuco Os advogados públicos federais que atuam em Recife (PE) também promoveram um café da manhã com os deputados federais do estado. Mais de cem pessoas participaram do evento. Os deputados Tadeu Alencar (PSB), Pastor Eurico (PSB), Augusto Coutinho (SD), Daniel Coelho (PSDB) e Betinho Gomes (PSDB) compareceram ao café da manhã.

Advogados do Brasil, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, e do presidente da OAB-DF, Ibaneis Rocha. A Diretoria da Anajur agradeceu o apoio concedido pelos deputados à aprovação da proposta legislativa em primeiro turno. A presidente da Anajur, Joana Mello, comentou, efusivamente, os resultados do encontro: “É em eventos como este que os parlamentares se encontram com seus eleitores e enxergam a força e a união das classes. A Advocacia Pública está, mais uma vez, fazendo a sua parte”.

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conquista

Advocacia Pública ganha capítulo especial no Código de Ética da OAB Após um longo período de discussão, na noite do dia 17 de agosto de 2015, os conselheiros federais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) finalizaram a votação do texto do novo Código de Ética e Disciplina da Advocacia e da OAB. O novo Código atualiza e revisa o texto de 1995, além de estabelecer novos parâmetros para os advogados públicos e privados.

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a esteira do que sempre destaca o presidente da Ordem, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, de que a OAB é a Ordem dos advogados privados e também dos advogados públicos, o novo texto dá um tratamento especial à Advocacia Pública. O art. 8º do novo diploma fica assim disposto: Art. 8º. As disposições deste Código obrigam igualmente os órgãos de advocacia pública, e advogados públicos, inclusive aqueles que ocupem posição de chefia e direção jurídica. § 1º O advogado público exercerá suas funções com independência técnica, contribuindo para a solução ou redução de litigiosidade, sempre que possível. § 2º O advogado público, inclusive o que exerce cargo de chefia ou direção, observará nas relações com os colegas, autoridades, servidores e público em geral, o dever de urbanidade, tratando a todos com respeito e consideração, ao mesmo tempo em que preservará suas prerrogativas e o direito de receber igual tratamento das pessoas com as quais se relacione. Da leitura desses dispositivos fica claro o interesse e o cuidado da OAB em ser o ponto de apoio dos advogados públicos na garantia de suas prerrogativas. E esse não foi um fato isolado. Em ato realizado em julho deste ano con-

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tra a ADI, que questiona a obrigatoriedade de inscrição dos advogados públicos na Ordem, o vice-presidente do CFOAB, Cláudio Lamachia, posicionou-se contra a ação do MPF: “Qualquer ataque às prerrogativas profissionais dos advogados, públicos e privados, é, na verdade, um ataque à cidadania. E não podemos permitir isso”. O Código de Ética da OAB é o guardião das prerrogativas dos advogados. É por meio do disposto no diploma que os profissionais têm garantidos os requisitos para a atuação diária em órgãos jurisdicionais e na sociedade. Ao dispor, ainda, que o advogado público exercerá as suas funções com independência técnica, o estatuto reitera a vocação constitucional de os advogados públicos exercerem uma advocacia de Estado. Embora atuando na concretização do programa de políticas públicas aprovado nas eleições, os advogados públicos devem executar sua missão de forma técnica, em busca da melhoria do Estado. Não se pode, então, estar sujeito à ingerência dos governantes de plantão. Essa independência citada no parágrafo primeiro se estende à relação com as demais instâncias judiciais. O papel do advogado público deve ser visto como técnicoprofissional, não podendo o procurador ser responsabilizado por eventuais irregularidades ou improbidades praticadas pelo gestor público. O advogado deve ter a garantia e a segurança de que a sua atuação será respeitada e adstrita ao rigor tecnicista do processo. Durante a sessão que aprovou o texto final do novo Código de Ética, o presidente nacional da Ordem, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, classificou o momento como histórico: “Quero agradecer em nome dos 875 mil advogados do Brasil e dos 81 conselheiros federais que se dedicaram à nobre tarefa de aprovar este Código. Este momento entra para a história da classe, somente possível com a dedicação com afinco para a concepção desta importante luta”.


Presidente da OAB anuncia artigo especial para a Advocacia Pública no novo Código de Ética

Mudanças do novo diploma Além do artigo especial para a Advocacia Pública, o novo Código de Ética da OAB traz algumas inovações na redação, adaptando, por exemplo, o diploma à atual realidade social do Brasil e do mundo. O primeiro ponto que a própria Ordem destaca é a aprovação e a regulamentação da advocacia pro bono no Brasil. Ela consiste no serviço exercido gratuitamente pelos advogados em favor de instituições sociais sem fins lucrativos ou pessoas naturais que não têm recursos para contratar os serviços advocatícios. Embora seja praticado em nossa sociedade, esse modelo nunca passou por uma regulamentação no País. O tema é tratado no Capítulo V do novo diploma: Art. 30. No exercício da advocacia pro bono, e ao atuar como defensor nomeado, conveniado ou dativo, o advogado empregará o zelo e a dedicação habituais, de forma que a parte por ele assistida se sinta amparada e confie no seu patrocínio. § 1º Considera-se advocacia pro bono a prestação gratuita, eventual e voluntária de serviços jurídicos em favor de instituições sociais sem fins econômicos e aos seus assistidos, sempre que os beneficiários não dispuserem de recursos para a contratação de profissional. § 2º A advocacia pro bono pode ser exercida em favor de pessoas naturais que, igualmente, não dispuserem de recursos para, sem prejuízo do próprio sustento, contratar advogado. § 3º A advocacia pro bono não pode ser utilizada para fins político-partidários ou eleitorais, nem beneficiar instituições que visem a tais objetivos, ou como instrumento de publicidade para captação de clientela.

atividades advocatícias. No novo diploma não é diferente. No entanto, ciente do enorme poder de comunicação das redes sociais, a OAB prescreve que a utilização das redes sociais pelos advogados e escritórios de advocacia tenha caráter meramente informativo e prime pela discrição e sobriedade, não podendo configurar captação de clientela ou mercantilização da profissão. Segue vedada, por exemplo, a publicidade em rádio, cinema e televisão, outdoors e painéis luminosos, muros, paredes, veículos e elevadores. Outra questão de interesse da OAB, tratada no novo marco legal, é a observância dos valores da tabela de honorários por parte dos advogados. A Ordem visa coibir a cobrança de valores inferiores aos previstos na tabela a fim de evitar a precarização da profissão. Dessa forma, será considerada infração ética esse tipo de cobrança. Assim dispõe o texto: Art. 29. O advogado que se valer do concurso de colegas na prestação de serviços advocatícios, seja em caráter individual, seja no âmbito de sociedade de advogados ou de empresa ou entidade em que trabalhe, dispensar-lhes-á tratamento condigno, que não os torne subalternos seus nem lhes avilte os serviços prestados mediante remuneração incompatível com a natureza do trabalho profissional ou inferior ao mínimo fixado pela Tabela de Honorários que for aplicável. Parágrafo único. Quando o aviltamento de honorários for praticado por empresas ou entidades públicas ou privadas, os advogados responsáveis pelo respectivo Departamento ou Gerência Jurídica serão instados a corrigir o abuso, inclusive intervindo junto aos demais órgãos competentes e com poder de decisão da pessoa jurídica de que se trate, sem prejuízo das providências que a Ordem dos Advogados do Brasil possa adotar com o mesmo objetivo.

Outro ponto destacado pela OAB são as novas regras para a publicidade da Advocacia. Concorde com a importância que a Constituição atribui ao trabalho dos advogados, o Código de Ética costuma vetar a mera propaganda e restringir as possibilidades de publicidade das

Essas são apenas algumas contribuições que o novo Código de Ética trará para a advocacia brasileira. O texto estabelece um período de 180 dias para sua entrada em vigor, para que as seccionais tenham tempo de adaptarem-se ao novo diploma legal. REVISTA

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unificação das carreiras

Por uma nova estrutura orgânica da agu Joana Mello*

Há exatos dois anos, no dia 30 de setembro de 2013, no site Consultor Jurídico, foi publicado um artigo de minha autoria, referente à unificação das carreiras da Advocacia-Geral da União (AGU). Naquela ocasião, o artigo foi reproduzido em diversos sites, blogs e portais, tamanha a repercussão do tema nos meios jurídico e administrativo.

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assados dois anos, o tema volta à tona com mais força. A aprovação da PEC 443/2009 demonstrou aos parlamentares e à sociedade a união dos advogados públicos. Em uníssono, esses membros, além de se posicionarem em prol da PEC, manifestaram-se contra o modelo estrutural vigente da AGU. O modelo atual é reflexo da adequação dos cargos existentes antes da estruturação da Advocacia-Geral da União. Pode-se até imaginar que, naquela época, essa tenha sido a melhor forma de atender à demanda emergente. No entanto, passadas mais de duas décadas da criação da AGU, chegou o momento de repensar a estrutura dessa instituição e lhe atribuir a merecida importância para o Estado brasileiro. Decidi revisitar o texto que escrevi nos idos de 2013, mas fazendo as atualizações condizentes com o contexto atual.

Unificação de carreiras na AGU contempla o princípio da eficiência Transcorridos 27 anos da promulgação da Carta Cidadã de 1988 e 22 anos da implementação da AdvocaciaGeral da União, instituição que tem o relevante papel de 12

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contribuir para a consolidação do Estado Democrático de Direito, percebe-se, diante da grandeza da responsabilidade assumida ao longo desses anos, a necessidade de reavaliar conceitos, principalmente no que se refere à unificação de carreiras, com o propósito de tornar mais eficiente a defesa judicial e extrajudicial da União. Hoje, a AGU é composta pelas carreiras de advogado da União, de procurador da Fazenda Nacional e de procurador federal, esta última, na qualidade de vinculada, na forma dos arts. 20 da LC nº 73/1993 e 9º da Lei nº 10.480/2002. Encontram-se todas subor­ dinadas administrativa e/ou tecnicamente ao advogado-geral da União, percebem subsídio e tratamento legislativo idênticos. O Projeto de Lei Complementar nº 205/201291, que altera a Lei Orgânica da AGU (LC 73/1993), contempla a inserção na instituição das carreiras de procurador federal e procurador do Banco Central. São carreiras, vale lembrar, que defendem os interesses da União, judicial e extrajudicialmente. Não é plausível o argumento de que esta ou aquela carreira tenham especificidades de atuação como fator impeditivo à unificação. Afinal, todos os advogados públicos federais têm como único cliente a União. Nesse contexto, observada a devida compatibilidade remuneratória, de atribuições e do processo de ingresso na carreira, tendo como prioridade atender às diretrizes de racionalização e economicidade, o melhor caminho para a Advocacia Pública Federal, no estágio em que se encontra, será a unificação de todas as carreiras que a integram. Os membros da AGU são advogados públicos federais e, portanto, todos a serviço de um único cliente, a União. Inegavelmente a unificação de carreiras ensejaria uma melhor compreensão política e social do verdadeiro papel desses operadores do direito, classificados com variadas denominações. Essa quantidade de rótulos decorreu, possivelmente, dos inúmeros obstáculos enfrentados para a inserção


da AGU no texto constitucional, e sua posterior implementação, que se deu tardiamente, cinco anos após a promulgação da Carta Cidadã de 1988. A vigente lei orgânica nasceu de forma tímida, acompanhando o que o momento histórico permitia à época. Atualmente, se revela, porém, insatisfatória, incapaz de atender às prerrogativas da instituição, considerando a importância conquistada pela atuação dos seus membros ao longo de todos esses anos, independentemente de especificidade. Deve-se entender que o termo “especialização” se aplica tão somente ao órgão ou ente, e não à carreira. Vale dizer que as atribuições da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e das demais procuradorias especializadas permaneceriam intocáveis sob o aspecto da unificação. Nessa linha de raciocínio, cumpre destacar, como reforço a essa posição, o entendimento manifestado no julgamento das ADIs 1.591-EI/RS e 2.713-ED/ DF, reconhecendo a constitucionalidade da unificação de carreiras pertencentes à mesma classe e com afinidade de atribuições, que é exatamente o caso concreto dos advogados públicos federais. Senão vejamos: Com a exatidão de sempre, o eminente relator, Ministro Octávio Galotti, caracterizou o caso como uma reestruturação, por confluência, por carreiras similares. Não tenho dúvida de que, na origem, eram elas inconfundíveis. Mas ocorreu – e não nos cabe indagar dos motivos disso – um processo de gradativa simbiose dessas carreiras que a lei questionada veio apenas racionalizar. (STF, ADI 1591-EI/RS, Min. Rel. Sepúlveda Pertence, publicado no DJ de 12/9/2003, pág. 29). Tal como neste precedente, o acórdão recorrido expôs os vários pontos de identidade entre as carreiras de Assistente Jurídico e de Advogado da União, como os vencimentos, os critérios exigidos nos concursos realizados e, ainda, o exercício de fato das mesmas atividades pelos ocupantes dos cargos dessas duas carreiras da Advocacia-Geral da União. (STF, ADI 2713-ED/DF, Min. Rel. Ellen Gracie, publicado no DJ de 7/5/2004, pág. 7). Com efeito, manter a situação vigente implica reforçar e eternizar a inútil disputa interna, desestimulando, consequentemente, o bom desempenho das atribuições desses profissionais e maculando a imagem da instituição perante a sociedade, que muito pouco conhece sobre o papel daquela instituição na defesa dos interesses públicos.

A título de exemplo, tome-se o caso do Poder Judiciário, onde o ingresso na magistratura não se faz por especialização; essa somente ocorre após a titularização. No âmbito da Justiça Federal, onde os advogados públicos atuam, o ingresso no cargo de juiz federal não importa em nenhum tipo de especialização. Isso não significa, porém, que o Judiciário não tenha órgãos especializados. Se assim não fosse, aqueles magistrados estariam, por exemplo, impedidos de optar pela remoção de vara ou de turma. Nesse diapasão, a AGU poderia conviver, internamente, com procuradorias particularizadas – a exemplo da PGFN, da Pgbacen, da PGF –, mas todas integradas por uma única carreira.

Por tudo isso, defende-se a criação da carreira única de procurador da União, com níveis de atuação bem definidos, em homenagem a um dos princípios que rege a administração pública, qual seja, o da eficiência2.

A fusão de carreiras, processo que poderia ser feito gradualmente, daria oportunidade aos procuradores da União de se realocarem de acordo com a sua expertise e a conveniência da administração. Dessa reestruturação adviriam ganhos, como: i) corte de gastos com a realização de diversos concursos dentro da mesma estrutura; ii) otimização e racionalização do trabalho em diversas localidades; iii) redução do volume de trabalho de inúmeros colegas, graças a uma distribuição mais racional da defesa da União; e iv) melhoria da imagem dos advogados públicos federais perante a sociedade, por exemplo, ao se viabilizarem, juridicamente, políticas públicas. notas

1. O projeto se encontra sob a batuta do deputado Benjamim Maranhão (SD/PB), relator do texto na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público (CTASP), na Câmara dos Deputados. No entanto, desde 2013, não há movimentação relevante no Congresso. Apesar da aprovação de requerimentos para a realização de uma audiência pública para debater o tema, e da convocação do advogado-geral da União, Luís Inácio Lucena Adams, para se posicionarem sobre o texto, nenhuma das duas reuniões se concretizou. 2. Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência [...].

* Presidente da Anajur. REVISTA

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história

A campanha dos advogados públicos por honorários O atual Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (Lei nº 8.906/1994), em seu art. 22, dispõe que “a prestação do serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência”. O texto é bem claro ao afirmar que os honorários pertencem realmente aos advogados, devendo eles se beneficiarem com a remuneração.

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o âmbito privado, tal preceito não encontra objeções. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por meio da Campanha Nacional pela Dignidade dos Honorários, luta, nas 27 seccionais do País, pelo pagamento justo e moral das verbas honorárias aos profissionais do ramo. Não há questionamento acerca da legitimidade do recebimento.

No âmbito da Advocacia Pública, porém, nem sempre foi esse o entendimento. A inclusão da previsão dos honorários sucumbenciais no texto do novo Código de Processo Civil foi um grande avanço para os advogados públicos. Positivado no §19 do art. 85, tem a seguinte redação: “Os advogados públicos perceberão honorários de sucumbência, nos termos da lei”. Na ocasião, ao tratar da inclusão da possibilidade de percepção da verba honorária pelos advogados públicos no novo Código de Processo Civil, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, afirmou que isso representava uma enorme conquista para os advogados públicos brasileiros, e reafirmava o compromisso da OAB com a advocacia pública, em igual medida com a advocacia privada. Apesar de a percepção desses honorários remeter a uma lei regulamentadora, em discussão neste momento no Poder Executivo, não há mais o que questionar sobre

Entidades se reúnem com Sérgio Mendonça, no MPOG, para discutir honorários para todos os advogados públicos 14

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A legitimidade dos honorários não pode ser questionada, segundo as entidades que representam os advogados públicos

a legitimidade da Advocacia Pública em relação a esse direito. Mas, como dito antes, esse direito, que parece ser tão óbvio, nem sempre foi reconhecido. O caminho para essa consolidação foi longo.

Honorários para a advocacia pública O empenho dos advogados públicos na execução da função de defensores do erário certamente trouxe à tona a importância da valorização desses profissionais. Os advogados recebem, por meio de suas verbas honorárias, o reconhecimento dos serviços prestados. A verba honorária é, para todos os advogados, o símbolo do merecimento pela prestação de serviços aos seus clientes. Esse direito não era, porém, conferido aos advogados públicos. Desde o ano de 1994, vigorava, dentro da Advocacia-Geral da União, o Parecer nº AGU/WM-08/94, que dispunha: A disciplina do horário de trabalho e da remuneração ínsita à Lei n. 8.906, de 4 de julho de 1994 (Estatuto da Advocacia e da OAB1), é específica do advogado, na condição de profissional liberal e empregado, sem incidência na situação funcional dos

servidores públicos federais, exercentes de cargos a que sejam pertinentes atribuições jurídicas. Tal posicionamento demonstra a posição institucional contrária à percepção dos honorários sucumbenciais pela advocacia pública, naquela ocasião. O parecer dispunha que “o direito aos honorários não seria compatível com a isonomia de vencimentos prevista no art. 39, §1º, e no art. 135 da Constituição Federal”. Ou seja, não deixava espaço para se falar em honorários para a Advocacia Pública. A fim de modificar esse entendimento, numa iniciativa do Forvm Nacional da Advocacia Pública, por meio de um trabalho árduo e persistente, o assunto passou a ser discutido em diversas instâncias da República. Em 2009, por exemplo, o então presidente do Forvm, João Carlos Souto, reuniu-se com a Frente Parlamentar dos Advogados da Câmara dos Deputados para falar sobre o tema. Na ocasião, Souto destacou a importância de levar a discussão ao Parlamento: A casa dos deputados é a ressonância da sociedade brasileira, e os honorários advocatícios são direitos antigos dos advogados, porém, no que diz respeito aos advogados públicos federais, o governo até o presente momento ainda não acordou para a importância dessa questão e para a necessidade do pagamento dos honorários. REVISTA

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Na mesma época, o então presidente nacional da OAB, Cezar Britto, com as seguintes palavras manifestou seu apoio à luta dos advogados públicos: Os honorários advocatícios são o fruto da atividade de um profissional e, sendo fruto de um trabalho profissional, quem deve aferir a vantagem desse trabalho é o próprio profissional. A tarefa da campanha é de conscientização para demonstrar que não é recurso público que estamos debatendo, mas o fruto do trabalho de um profissional, e esse profissional tem que ser beneficiado. Por sua vez, o presidente da Frente Parlamentar dos Advogados, deputado Marcelo Ortiz, colocou-se à disposição dos membros da AGU, ao reiterar que: A Frente Parlamentar sempre tem o objetivo de fazer o seu trabalho em prol daqueles que os advogados atendem, sejam os advogados públicos, sejam os privados. Nós queremos estabelecer primordialmente o entendimento entre todos eles e uma compreensão de toda a sociedade de qual é o papel do advogado público e qual é o resultado que ele deve obter no trabalho que desenvolve. Naquele mesmo ano, foi lançada a campanha “Honorários para Todos – Direito de advogados públicos e privados” em parceria do Forvm com a OAB. Iniciou-se, assim, um movimento forte e bem coordenado, em defesa da percepção dos honorários para a advocacia pública. Estava lançada a semente da qual os advogados públicos precisavam para garantir a conquista.

Criação do GT Honorários Essa semente precisava, porém, de cuidados e adubo para crescer e sobreviver. E essa força adicional nasceu com a criação do Grupo de Trabalho na Advocacia-Geral da União – o GT Honorários – para analisar o tema. A primeira reunião oficial do grupo ocorreu em outubro de 2012, estando a ela presentes o vice da AGU, Fernando Faria, a coordenadora do grupo e adjunta da AGU, Rosângela de Oliveira, a secretária-geral de Administração, Gildenora Dantas, a presidente da Anajur, Joana Mello, e dirigentes das demais entidades que representam os advogados públicos. No encontro, foram estabelecidas as diretrizes que guiariam o trabalho dos membros na produção do estudo acerca das receitas referentes aos honorários advocatícios. O trabalho prosseguiu até março de 2013, quando, 16

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Os honorários pertencem a todos os advogados públicos, ativos e aposentados. Não há, então, motivo plausível que justifique a exclusão desse direito dos aposentados.

finalmente, foi entregue o relatório do GT Honorários, com as deliberações do grupo. O parecer trouxe uma síntese explícita sobre as questões jurisprudenciais concernentes à percepção dos honorários. No texto, os membros destacaram que: “Os honorários são susceptíveis de aquisição pelos membros das procuradorias de Estado, desde que haja mecanismo jurídico assecuratório, in casu e inapelavelmente, a lei”. Além disso, acrescentava: Os honorários são computáveis para fins de teto constitucional. E essa é uma perspectiva ainda mais nítida quando os honorários são atribuídos de maneira universal, sem correlação com a carga individual de trabalho e com caráter impessoal. Os argumentos desenvolvidos pelo grupo eram tão convincentes – todos eles embasados doutrinariamente –, que levaram o consultor-geral da União à época, Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy, a expedir um despacho ao chefe da AGU, sugerindo a aprovação do novo parecer e a criação de um grupo com a finalidade de elaborar e propor medidas legislativas necessárias para a garantia daquele direito No dia 18 de março de 2013, o advogado-geral da União, Luís Inácio Lucena Adams, encaminhou à Presidência da República um documento no qual submetia o entendimento à presidente da República, Dilma Rousseff. Estava feita a modificação. A partir de então, a percepção dos honorários passou a ser um posicionamento institucional da Advocacia-Geral da União. O próximo passo era buscar o apoio do Parlamento para garantir a formulação de uma lei que determinasse, de forma incontestável, que o direito pertencia àqueles que lutam em defesa do Estado. E o marco legal veio com a aprovação do novo Código de Processo Civil.


Em reunião, Forvm Nacional rejeita qualquer proposta que exclua os aposentados da percepção de honorários

Inclusão dos aposentados Uma vez consolidado o direito, a atuação das entidades que representam os advogados públicos neste momento consiste em garantir a justa distribuição dos honorários entre os membros ativos e inativos da Advocacia-Geral da União. Em reunião no Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, no dia 2 de setembro deste ano, o secretário de Relações do Trabalho do MPOG, Sérgio Mendonça, apresentou uma proposta que previa a distribuição de 100% da verba honorária e mais percentual dos encargos legais a todos os membros ativos da AGU. A proposta apresentava, porém, uma séria lacuna. Ela não contemplava os aposentados, o que, evidentemente, desagradou os representantes das entidades presentes. A presidente da Anajur, Joana Mello, foi enfática ao afirmar: “Caso os advogados aposentados não sejam contemplados nesta proposta, a Anajur não pode aceitar qualquer aceno do governo”. Como é largamente sabido, a verba honorária não traz despesas para o Executivo, pois que a fonte desse recurso provém do pagamento do valor por quem não obteve êxito na demanda judicial. Ou seja, os honorários seriam pagos por aqueles que, ao litigar com a União, foram derrotados pela atuação firme dos membros da Advocacia-Geral da União. Portanto, não haveria motivo plausível para não contemplar os aposentados na distribuição dos honorários de sucumbência. A secretária-geral adjunta da Anajur, Thaís Pássaro, que acompanhou a reunião, também se posicionou com firmeza: “Os aposentados são também merecedores dos honorários. Alguns processos levam anos

até serem concluídos. Não seria justo que o servidor que se aposentasse não pudesse usufruir do resultado de seu trabalho”. O fruto dessa reunião foi uma nota expedida pelas entidades que representam os advogados públicos, nos seguintes termos: Com relação à proposta do Governo, a percepção dos Honorários Advocatícios pelos advogados públicos não contemplaria os aposentados, situação que foi, de plano, rechaçada pelas entidades presentes. O secretário Sérgio Mendonça se comprometeu a reexaminar, com brevidade, as ponderações das entidades, e apresentar a proposta definitiva do Governo para as Carreiras da Advocacia-Geral da União. O Forvm Nacional da Advocacia Pública Federal também se manifestou com as seguintes palavras: Ficou determinado que a posição do Forvm é de rejeição a qualquer discriminação dos servidores aposentados na distribuição dos honorários sucumbenciais. Em respeito a todo o trabalho desempenhado por esta entidade na discussão e consolidação dos honorários para a Advocacia Pública, não haveria como ser outra a posição do Forvm. Os honorários pertencem a todos os advogados públicos, ativos e aposentados. Não há, então, motivo plausível que justifique a exclusão desse direito dos aposentados. Todas as entidades representativas mantêm-se coerentes com este discurso: os honorários são de todos. A Anajur segue na luta para garantir esse direito. 1. Nota da Anajur. REVISTA

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direito internacional

Os tratados das Nações Unidas sobre a exploração do espaço Álvaro Fabricio dos Santos*

A chamada Era Espacial foi inaugurada em 4 de outubro de 1957, com o lançamento do primeiro satélite artificial da Terra, o Sputnik I, da então União Soviética. Desde o começo dessa era, os Estados nacionais, reunidos na Organização das Nações Unidas (ONU), entenderam que as atividades espaciais deveriam ser regulamentadas juridicamente, quer seja pelo potencial de produzirem benefícios a todos os países, quer seja para evitar que o espaço se tornasse um campo de batalhas.

A criação do Copuos O lançamento do Sputnik I, como parte das comemorações do Ano Geof ísico Internacional, foi o marco inicial para a utilização de satélites tecnológicos para o progresso da ciência e, simultaneamente, a origem dos esforços da comunidade internacional para assegurar o uso pacífico do espaço exterior. Na década de 1960, a exploração espacial teve um crescimento vertiginoso, que começou em abril de 1961, quando o cosmonauta Yuri Gagarin se tornou o primeiro ser humano a viajar pela órbita terrestre; e culminou com a chegada do homem à Lua, em julho de 1969. A exploração do espaço coincidiu com o período da Guerra Fria, o que gerava uma crescente preocupação da comunidade internacional com a possibilidade de o espaço vir a ser utilizado como campo de batalhas pelas duas grandes superpotências da época: os Estados Unidos e a União Soviética. Em 1958, logo após o lançamento do Sputnik I, a Assembleia Geral das Nações Unidas, por meio da Resolução 1348 (XIII), estabeleceu um Comitê ad hoc para os Usos Pacíficos do Espaço Exterior, composto por 18 18

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Estados-membros, o qual deveria propor medidas para facilitar a cooperação espacial entre os países, bem como analisar os problemas jurídicos que poderiam advir da exploração do espaço exterior. Em 1959, a Assembleia Geral das Nações Unidas estabeleceu o Copuos1 como um comitê permanente, que contava, à época, com 24 Estados-membros, bem como reafirmou seu mandato por meio da Resolução 1472 (XIV). Desde a sua criação, o Copuos tem servido como o foro para a discussão de temas afetos à exploração do espaço exterior para fins exclusivamente pacíficos. Referido comitê mantém estreito contato com organizações governamentais e não governamentais atuantes no segmento espacial e viabiliza o intercâmbio de informações relativas às atividades espaciais e ao estudo de medidas para a promoção da cooperação internacional no âmbito de mencionadas atividades. O Copuos possui dois subcomitês: o técnico-científico e o jurídico. Desde sua criação, as decisões são tomadas por consenso, e não por votação, ou seja, uma matéria somente é aprovada se houver concordância de todos os Estados-membros. O Copuos é composto atualmente por 77 países, sendo que o Brasil o integra desde a sua criação. O Escritório das Nações Unidas para o Espaço Exterior (Oosa)2 fornece o suporte de serviços de secretariado ao Copuos e aos seus dois subcomitês. Tanto o Copuos quanto o Oosa funcionam nas dependências da ONU, em Viena, Áustria3.

O Direito Espacial O Direito Espacial é um ramo do Direito Internacional Público que regula as atividades dos Estados, suas empresas públicas e privadas, bem como das organizações internacionais, na exploração e no uso do espaço exterior, e estabelece o regime jurídico do espaço exterior e dos corpos celestes. Portanto, esse novo ramo do Direito abrange o conjunto de princípios e normas


internacionais destinados a ordenar um tipo específico de atividade – a espacial – em um meio também específico – o espaço. Os sujeitos do Direito Espacial são os Estados e as organizações internacionais, quais sejam: a União Internacional de Telecomunicações (ITU); a Organização Internacional de Satélites de Telecomunicações (ITSO); a Organização e o Sistema Internacional de Comunicações Espaciais (Intersputnik); a Agência Espacial Europeia (ESA); a Corporação Árabe para as Comunicações Espaciais (Arabsat); a Organização Internacional de Satélites Móveis (IMSO); a Organização Europeia de Satélites de Comunicações (Eutelsat); a Organização Europeia de Satélites Meteorológicos (Eumetsat); e o Programa Espacial Soviético de Cooperação Espacial (Intercosmos). As empresas privadas não são formalmente sujeitos de Direto Espacial, porque elas atuam sob a responsabilidade, o controle e a vigilância do respectivo Estado. Apesar disso, as empresas privadas exercem considerável influência sobre a posição jurídica dos Estados. As fontes do Direito Espacial são: a) os princípios gerais do Direito Internacional, incluindo as declarações da ONU; b) os costumes; c) os princípios fixados nos cinco tratados da ONU sobre o uso do espaço exterior; e d) as normas especiais, adotadas em convenções e acordos universais, regionais ou bilaterais.

As empresas privadas não são formalmente sujeitos de Direto Espacial, porque elas atuam sob a responsabilidade, o controle e a vigilância do respectivo Estado.

Como exemplos de costume, no âmbito das atividades espaciais, pode-se citar a transferência de propriedade de satélites em órbita e o sensoreamento remoto da Terra por satélites, sem autorização prévia dos países sensoreados. Os principais instrumentos do Direito Espacial são cinco, a saber: 1)Tratado sobre os Princípios Reguladores das Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Exterior, inclusive a Lua e Demais Corpos Celestes; 2) Acordo sobre Salvamento de Astronautas e Restituição de Astronautas e Objetos Lançados ao Espaço Cósmico; 3) Convenção sobre Responsabilidade Internacional por Danos Causados por Objetos Espaciais; 4) Convenção sobre Registro de Objetos Lançados ao Espaço Cósmico; e 5) Acordo sobre as Atividades dos REVISTA

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Estados na Lua e nos Corpos Celestes. Esses são os chamados “cinco tratados da ONU” sobre o uso do espaço exterior e formam o arcabouço jurídico para a solução das controvérsias na área espacial.

O Tratado do Espaço de 1967 O Tratado sobre os Princípios Reguladores das Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Exterior, inclusive a Lua e Demais Corpos Celestes, foi aprovado pela Assembleia Geral da ONU, em 19 de dezembro de 1966, por meio da Resolução 2222 (XXI), e aberto à assinatura em 27 de janeiro de 1967, estando em vigor desde 10 de outubro de 1967. Possui 103 ratificações (inclusive a do Brasil) e 25 assinaturas4. Para facilitar nosso estudo vamos adotar a abreviatura utilizada pela ONU para esse tratado, a saber OST5. O OST é o mais importante instrumento do Direito Espacial, e seus princípios básicos são os seguintes: a) o espaço exterior, inclusive da Lua e demais corpos celestes, são bens comuns da humanidade e estão abertos à exploração no interesse de qualquer país, seja qual for o estágio de seu desenvolvimento econômico e científico (art. 1º); b) não apropriação do espaço cósmico e dos corpos celestes por proclamação de soberania, por uso ou ocupação, ou por qualquer outro meio (art. 2º); c) exploração e uso do espaço de acordo com os princípios fundamentais do Direito Internacional e da Carta das Nações Unidas (art. 3º); d) proibição de colocar em órbita armas nucleares e de destruição em massa (art. 4º); e) entendimento de que astronautas são enviados da humanidade e, por isso, prover-lhes todo o suporte em caso de acidentes (art. 5º); e f ) responsabilidade dos Estados pelas atividades espaciais exercidas por organismos governamentais ou entidades não governamentais (art. 6º).

O Acordo sobre Salvamento e Restituição de Astronautas e Devolução de Objetos Espaciais, de 1968 O Acordo sobre Salvamento e Restituição de Astronautas e Devolução de Objetos Espaciais foi aprovado pela Assembleia Geral da ONU, em 19 de dezembro de 20

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1967, pela Resolução 2345 (XXII), aberto à assinatura em 22 de abril de 1968, e está em vigor desde 3 de dezembro de 1968. Possui 94 ratificações (inclusive a do Brasil), 24 assinaturas e duas declarações de aceitação de direitos e deveres6. Para facilitar nosso estudo vamos adotar a abreviatura utilizada pela ONU para esse acordo, a saber Arra7. Os Estados têm a obrigação de informar ao Estado lançador8 e ao secretário-geral da ONU, ou divulgar por todos os meios possíveis, qualquer caso de acidente, situação de perigo ou aterrissagem forçada ou involuntária de um objeto espacial tripulado. Se um objeto espacial de um Estado aterrissar no território de outro Estado, este tem a obrigação de prestar aos tripulantes toda assistência necessária, dando ciência de suas providências ao Estado lançador e ao secretáriogeral da ONU. Em caso de acidente em alto mar ou em lugar fora da jurisdição de qualquer Estado, o Estado que souber do caso tem a obrigação de prestar assistência aos tripulantes, a fim de assegurar seu rápido salvamento. Os tripulantes que sofreram um acidente devem ser restituídos, pronta e seguramente, ao Estado lançador, sendo que este arcará com as despesas havidas para socorrê-los, bem como com aquelas relativas à devolução do objeto espacial e seus componentes.

A Convenção sobre Responsabilidade Internacional por Danos Causados por Objetos Espaciais, de 1972 A Convenção sobre Responsabilidade Internacional por Danos Causados por Objetos Espaciais foi aprovada pela Assembleia Geral da ONU, em 29 de novembro de 1971, pela Resolução 2777 (XXVI), e foi aberta à assinatura em 29 de março de 1972, e está em vigor desde 1º de setembro de 1972. Possui 92 ratificações (inclusive a do Brasil), 21 assinaturas e 3 declarações de aceitação de direitos e deveres9. Também nesse caso vamos adotar a abreviatura utilizada pela ONU para essa convenção, a saber Liab10. A palavra “dano” significa perda de vida, ferimentos pessoais ou prejuízo à saúde; prejuízos e perdas de propriedades do Estado ou de pessoas f ísicas ou jurídicas, ou mesmo de organizações intergovernamentais internacionais.


Segundo o Moon, a Lua e demais corpos celestes são patrimônios de toda a humanidade. Certamente, reside aí o motivo pelo qual este é o instrumento que possui menos adesão entre os chamados “cinco tratados”.

O pedido de indenização por dano deve ser apresentado a um Estado lançador por via diplomática, o mais tardar um ano após a data da ocorrência do dano ou da identificação do Estado lançador responsável.

foto: Arquivo pessoal

Álvaro Fabrício dos Santos: Satélites passaram a ser equipamentos essenciais ao nosso dia a dia

Provavelmente por ter sido concebida no início da década de 1970, quando ainda não existia preocupação com o desenvolvimento sustentável e a preservação dos recursos naturais, a Liab não trata de danos ao meio ambiente. O Estado lançador é responsável absoluto pelo pagamento de indenização por danos causados por objetos espaciais na superf ície da Terra. Dois ou mais Estados que lancem, juntos, um objeto espacial, são responsáveis solidários por quaisquer danos causados.

A Convenção sobre Registro de Objetos Lançados ao Espaço Cósmico, de 1975 A Convenção sobre Registro de Objetos Lançados ao Espaço Cósmico foi aprovada pela Assembleia Geral da ONU, em 12 de novembro de 1974, pela Resolução 3235 (XXIX), foi aberta à assinatura em 14 de janeiro de 1975, e está em vigor desde 15 de setembro de 1976. Possui 62 ratificações (inclusive do Brasil), 4 assinaturas e 3 declarações de aceitação de direitos e deveres11. Novamente, adotaremos a abreviatura utilizada pela ONU para essa convenção, a saber REG12. O Estado de registro é o Estado em cujo registro inscreve-se um objeto espacial. Ao lançar um objeto espacial, o Estado lançador deve inscrevê-lo num registro que ele próprio deve manter. Havendo dois ou mais Estados lançadores, eles devem decidir qual deles registrará o objeto. Cada Estado de registro deve fornecer ao secretáriogeral da ONU os seguintes dados sobre o objeto lançado ao espaço: 1) nome do Estado ou Estados lançadores; 2) designação apropriada do objeto espacial ou seu número de registro; 3) data e território ou local de lançamento; 4) parâmetros orbitais, incluindo período nodal, inclinação, apogeu, perigeu e função do objeto espacial.

O Acordo sobre as Atividades dos Estados na Lua e Outros Corpos Celestes, de 1979 O Acordo sobre as Atividades dos Estados na Lua e Outros Corpos Celestes foi aprovado pela Assembleia Geral da ONU, em 5 de dezembro de 1979, pela Resolução 34/68, foi aberto à assinatura em 18 de dezembro de 1979, e está em vigor desde 11 de julho de 1984. Possui apenas 16 ratificações e 4 assinaturas13. Adotaremos, uma vez mais, a abreviatura utilizada pela ONU para esse acordo, a saber Moon14. REVISTA

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Se aderir ao Acordo da Lua, o Brasil terá melhores condições para, nas reuniões anuais do Copuos e de seus subcomitês, insurgir-se contra a exploração da Lua e de outros corpos celestes para fins meramente comerciais.

Segundo o Moon, a Lua e demais corpos celestes são patrimônios de toda a humanidade. Certamente, reside aí o motivo pelo qual este é o instrumento que possui menos adesão entre os chamados “cinco tratados”. Na verdade, os países desenvolvidos não querem correr o risco de ter de repartir tudo aquilo que, porventura, venham a edificar em solo lunar, ou mesmo em outros corpos celestes, conforme previsto no art. 11 do Moon. De acordo com o Moon, os Estados devem estabelecer um regime internacional para regulamentar a exploração dos recursos naturais da Lua. Mencione-se que esse é o único dos cinco tratados da ONU sobre o uso do espaço exterior que ainda não foi assinado pelo Brasil, pois, até então, enfatizava-se que os objetivos do programa espacial brasileiro não contemplavam a exploração da Lua ou de outros corpos celestes. Entretanto, atualmente, o governo brasileiro tem considerado a possibilidade de aderir ao Moon, em especial pelo fato de os países desenvolvidos, por intermédio de suas empresas privadas, estarem cogitando da possibilidade de realização de atividades de exploração mineral na Lua ou em outros corpos celestes para fins comerciais. Se aderir ao Acordo da Lua, o Brasil terá melhores condições para, nas reuniões anuais do Copuos e de seus subcomitês, insurgir-se contra a exploração da Lua e de outros corpos celestes para fins meramente comerciais.

Cenário atual Quando os cinco tratados da ONU sobre o uso do espaço exterior foram concebidos, nas décadas de 1960 e 1970, as atividades espaciais eram desenvolvidas apenas por organismos governamentais. 22

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Atualmente, entretanto, as empresas privadas se tornaram os novos atores do Direito Espacial, e os satélites passaram a ser equipamentos essenciais ao nosso dia a dia. Nesse cenário, os países desenvolvidos têm sistematicamente se recusado a proceder a qualquer atualização dos cinco tratados, pois receiam que essas discussões possam, de algum modo, interferir nos lucros auferidos por suas empresas. Esse é o motivo pelo qual nenhum outro tratado foi emitido nos últimos anos, a despeito do crescimento acentuado das atividades espaciais. Mencione-se que, nos dias atuais, o papel do Copuos foi substancialmente diminuído; porém, os países em desenvolvimento, entre os quais o Brasil, continuam se esforçando para manter aquele comitê como o foro legítimo e exclusivo para a discussão das matérias afetas à exploração do espaço exterior.

NOTAS 1. Acrônimo do inglês Committee on the Peaceful Uses of Outer Space. 2. Acrônimo do inglês Office of Outer Space Affairs. 3. Dados extraídos do site http://www.unoosa.org/oosa/en/ ourwork/copuos/history.html 4. Dados atualizados até o dia 1º de janeiro de 2015. 5. Acrônimo do inglês Outer Space Treaty. 6. Dados atualizados até o dia 1º de janeiro de 2015. 7. “Arra” é a abreviatura da expressão, em inglês, Agreement on the Rescue of Astronauts, the Return of Astronauts and the Return of Objects Launched into Outer Space. 8. O Estado lançador, segundo o art. 8º do OST, é aquele que procede ao lançamento de um objeto espacial, que manda lançar, ou de cujo território o objeto espacial tenha sido lançado. 9. Dados atualizados até o dia 1º de janeiro de 2015. 10. “Liab” é a abreviatura da expressão, em inglês, Convention on International Liability for Damage Caused by Space Objects. 11. Dados atualizados até o dia 1º de janeiro de 2015. 12. “REG” é a abreviatura da expressão, em inglês, Convention on Registration Launched into Outer Space. 13. Dados atualizados até o dia 1º de janeiro de 2015. 14. “Moon” é a abreviatura da expressão, em inglês, Agreement Governing the Activities of States on the Moon and Other Celestial Bodies.

* Advogado da União, lotado na Consultoria Jurídica da União, no município de São José dos Campos (CJU-SJC). Membro do Instituto Internacional de Direito Espacial (IISL) e da Associação Brasileira de Direito Aeronáutico e Espacial (SBDA).


foto: Arquivo pessoal

coluna carlos mota

Esse filme eu já vi! Carlos Domingos Mota Coelho*

O conterrâneo João Guimarães Rosa, em uma de suas frases geniais, disse que “A guerra civil, em casa alheia, sempre tem qualquer coisa de anacrônico; em nossa casa, de prematuro”. A frase carrega em si uma verdade inconteste, pois sempre fiamos que um revés sofrido por alguém jamais se abaterá sobre nós.

Q

uando grande parte do mundo, sobretudo a Europa, viu a crise pela greta, o presidente Lula afirmou que ela chegaria aqui como uma reles marolinha. Certo é que, todavia, a maldita se instalou entre nós, trazida lá de fora e/ou urdida aqui mesmo pela ganância do deus mercado, pela incompetência, pelos malfeitos, pela impatriótica e rasteira disputa política, pelo “lacerdismo” dos jornalões e revistonas e por um emaranhado de outras teias. Meses atrás, o rico Rio Grande do Sul se declarou quebrado e deu de parcelar a remuneração de seus servidores. Logo depois, o próprio Distrito Federal, também rico e detentor da maior renda per capita do Brasil, deu sinais de quebradeira, também elegendo os servidores como alvo de suas vassouradas e tesouradas. Agora, chega a notícia de que centenas de municípios pelo Brasil afora estão indo para o mesmo caminho. “Bobagem, Carlos Mota, isso não vai acontecer conosco... Somos federais!”, me diz um colega. Tomara que ele esteja certo e que eu, contrariando o

meu jeito otimista de ser, esteja enxergando coisas que jamais acontecerão conosco, servidores públicos federais! Como autor da PEC 555/2006 – a que acaba com a injusta contribuição previdenciária dos aposentados e pensionistas –, senti que ela, por representar a redução de insignificantes caraminguás em nossos contracheques, foi posta em segundo plano por PECs mais suculentas, que torço, do fundo do meu coração e do meu bolso, sejam aprovadas, não obstante a recente reviravolta do presidente Eduardo Cunha e da maioria dos deputados. Outro conterrâneo, Tancredo Neves, no mesmo diapasão de Rosa, dizia que a “Esperteza, quando é muita, come o dono, pois corremos o risco de ficar ‘sem mel nem cabaça”’, como dizem os sábios nordestinos. Sou de uma geração assolada por muitas crises, diferente da geração Y, presente em expressiva quantidade em nossos quadros, que até agora não soube o que é arrocho salarial e coisas parecidas. Conheço, portanto, esse filme e sei que nós, servidores, somos os que mais morrem no fim. A Anajur, por agregar em seus quadros a sofrida velha guarda do serviço público, seguirá, obviamente, na senda da isonomia das carreiras jurídicas e na autonomia da AGU, além da luta pela aprovação da PEC 555, mas está cada vez mais atenta às nuvens sombrias que pairam, sobretudo, sobre a cabeça do funcionalismo público. Tomara que eu esteja errado! * Procurador Federal e autor de diversas obras literárias. Foi deputado federal pelo PSB/MG (2003/2007). REVISTA

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saúde

Hipertensão:

um em cada quatro brasileiros sofre da doença “Pressão alta” é uma questão de saúde recorrente entre os brasileiros. De acordo com dados do Ministério da Saúde, a doença atinge 24,3% da população adulta brasileira. O Estado busca uma forma de lidar com esse mal, que ataca quase um quarto da nossa população.

A

s mulheres são as mais afetadas – 26,9% delas sofrem de hipertensão, enquanto, entre os homens, o índice cai para 21,3%. A hipertensão também varia com a idade. À medida que envelhecemos, aumenta o risco de incidência da doença. Entre os brasileiros com mais de 65 anos de idade, 59,2% se declaram hipertensos, contra apenas 3,8% na faixa de 18 a 24 anos e 8,8% entre 25 e 34 anos. Se não é tratada adequadamente, a pressão alta pode ocasionar derrame cerebral, doenças do coração – como infarto, insuficiência cardíaca (aumento do coração) e angina (dor no peito) –, insuficiência renal e paralisação dos rins, além de alterações na visão, que podem levar à cegueira. Ou seja, não há como deixar de se tratar a qualquer indício da doença. Para falar sobre os riscos da hipertensão e as formas de diminuir a incidência da doença, a Revista Anajur entrevista, nesta edição, o cardiologista Daniel França, mestre e doutor pela Universidade de Brasília (UnB), responsável atualmente pela linha cardiovascular do Hospital Universitário da UnB.

Dr. Daniel, a partir de que idade a pessoa deve começar a fazer exames periódicos com um cardiologista? 24

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Alguns anos atrás, essa era uma preocupação de pessoas com mais de 35, 40 anos de idade. Com a mudança de hábitos alimentares entre a população e a obesidade ganhando proporção quase endêmica, essa inquietação começou a aparecer mais cedo. Em tese, se o indivíduo é obeso, se não tem uma vida saudável, se é sedentário, se não cuida da alimentação, ele deve, pelo menos até os 30 anos, verificar sua pressão arterial. Hoje, nas escolas de ensino fundamental e médio, já há políticas públicas em ação, alertando e prevenindo os estudantes sobre a questão da obesidade e da hipertensão. É surpreendente como, atualmente, já percebemos que a hipertensão é uma doença bastante prevalente, responsável por muitos problemas cardiovasculares. Na sua experiência, houve um aumento no número de pessoas com problemas cardíacos por conta de um tipo de vida mais corrido, de uma alimentação inadequada? O senhor acha que esses problemas têm relação com a baixa qualidade de vida? Há várias perspectivas em relação a isso. No passado, não se tinha noção dessa epidemiologia. Com o advento da Revolução Industrial, houve muita mudança no comportamento da população, que se tornou sedentária quando trocou o campo pela cidade. Além disso, com o surgimento dos antibióticos, as pessoas já não morriam mais de infecção e, assim, passaram a viver mais. Com o aumento do tempo de vida, as doenças chamadas crônico-degenerativas começaram a tomar conta do perfil epidemiológico da saúde, no mundo inteiro. Então, surgiu mais fortemente o câncer, a hipertensão, as doenças cardiovasculares etc. Identificaram-se, então, os chamados fatores de risco. O que representaria um risco à indução de doenças cardiovasculares? A resposta é a hipertensão,


foto: Arquivo pessoal

Dr. Daniel França: São tantos os fatores da hipertensão que o tratamento se desenvolve em várias frentes o cigarro. As pessoas fumavam. Atores de novela fumavam. Hoje esse quadro mudou. Graças a pressões de todo tipo, a vida do fumante tornou-se um inferno. Mas, no passado, fumar era uma coisa charmosa, dava status. Com os novos tempos, a obesidade, o diabetes, as alterações no colesterol, tudo isso foi se incorporando à rotina, ao dia a dia. E especulou-se: o que poderia ser feito para mudar esse perfil? Ao longo destes últimos 50 anos, a abordagem de tratamento de infarto e de AVC evoluiu muito, a ponto de conseguirmos reduzir a mortalidade sem reduzir a prevalência das doenças. Quer dizer, elas continuam sendo prevalentes. A mortalidade diminuiu um pouco em virtude das medidas de prevenção, que passaram a ser feitas ao longo desses anos, mas a prevalência e a taxa de mortalidade ainda são preocupantes. Hereditariedade em relação às doenças cardíacas conta muito? Conta, sim, elas dependem muito da carga genética. Mas o que vale destacar é que as doenças cardiovasculares são multifatoriais. Além dos fatores que já citei – cigarro, hipertensão, obesidade –, é preciso observar a carga genética, um fator que a gente não consegue

alterar. O que é, então, que dá para mudar? Podemos mudar os hábitos, como o sedentarismo e o tabagismo, podemos evitar a obesidade, controlar o diabetes e a hipertensão. O que provoca a hipertensão? São múltiplos fatores. Tem a questão genética, que não muda. Mas há outros. O estresse, por exemplo, é um ponto importante. O consumo excessivo de sal também. E outros, como: vida sedentária, distúrbios do sono, noites maldormidas, tudo isso pode aumentar a pressão. Por exemplo, sabemos que o sono de má qualidade pode elevar a pressão. Se você trata, então, a apneia, consegue reduzir, de certa forma, o comportamento da pressão, pelo menos diminuir à metade. São tantos os fatores, que o tratamento não foca em um único ponto. Normalmente, o tratamento se desenvolve em várias frentes. Você vai ter de comer menos sal, vai ter de fazer mais exercícios, vai ter de tomar um remédio específico que aumenta a eliminação do sal, vai ter de tomar mais um outro, que diminui a força contrátil do coração. Controlar todos os elementos que possam elevar a pressão arterial. Então, o espectro de atuação é bem vasto. Quais são os sintomas da hipertensão? Muitas pessoas que têm hipertensão não apresentam sintoma nenhum, mas os que habitualmente chamam a atenção é uma dor de cabeça que normalmente começa na nuca e depois vem para a frente. Faíscas... O indivíduo vê pequenas faíscas. Tontura, barulho no ouvido e, eventualmente, uma dor de cabeça diferente. Esses são os sintomas clássicos. O que esta doença pode provocar? Quais as consequências da pressão alta? A consequência da pressão alta é o aumento de eventos cardiovasculares. Nesses eventos arrolamos o infarto e o AVC. A hipertensão é fator de risco também para doenças renais, pois ela destrói a função do rim. Se você for a clínicas de hemodiálise, vai perceber que uma grande parte daqueles pacientes que estão lá fazendo hemodiálise já tinha pressão alta, mas eles não a controlaram de maneira adequada. A hipertensão também pode resultar em alteração da composição da parede dos vasos arteriais, em alteração no fundo de olho, aneurisma, entre outros.

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Falamos que a máxima é até 14 e a mínima até 9. Qualquer valor acima disso já passamos a considerar como pressão alta.

Essa alteração no fundo de olho pode provocar a perda da visão? Pode haver sangramento. Da mesma forma como no cérebro, o olho também pode sangrar.

ter de tomar medicamento a vida toda. Não adianta dizer: “Tomei o remédio e a pressão baixou. Então, vou suspender o tratamento”. Não pode! Se parar de tomar o remédio, a pressão vai voltar a subir.

E qual o tratamento para a hipertensão? Antes de tudo, a prevenção, é feita com mudanças de hábitos. Um trabalho governamental, que envolve a atuação conjunta do Ministério da Saúde e do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, propunha-se a diminuir a quantidade de sal nos alimentos industrializados. Consistia na redução progressiva de sal nesses alimentos, preparando o paladar do consumidor. Isso teria um impacto forte na prevenção da hipertensão. Mas aí defrontamos com outro problema. Se fosse retirado o sódio do refrigerante, por exemplo, seu sabor ia mudar e, então, as pessoas deixariam de comprá-lo. Se fosse diminuído o sal da batata frita, também os consumidores não voltariam a comprá-la. Então, o impacto econômico seria muito grande sobre a indústria alimentícia. Daí a resistência... Outra forma de prevenção é praticar uma atividade física regularmente e manter uma alimentação saudável, constituída de verduras, frutas e legumes, da ingestão de baixa quantidade de carne e da redução do consumo de queijos. Bom, detectada a hipertensão e garantida uma alimentação saudável, chega, então, o momento de entrar com o tratamento medicamentoso. Mas o que o hipertenso não pode esquecer nunca é que o problema o acompanhará a vida inteira.

Há casos de pressão alta em crianças? Sim. Ainda bem que são casos raros, mas não há como negar sua existência. As causas de hipertensão em crianças são várias. Hoje a gente vê que crianças obesas têm, geralmente, pressão mais alta do que a esperada.

Então, não tem cura? Em 95% dos casos, não tem cura. O paciente vai 26

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Qual é a gradação ideal para a pressão? Falamos que a máxima é até 14 e a mínima até 9. Qualquer valor acima disso já passamos a considerar como pressão alta. É lógico que, para algumas pessoas, isso já é muito e temos de reduzir um pouco mais. São aquelas pessoas que a gente considera de alto risco ou que já têm uma hipertensão com algum grau de comprometimento de algum órgão, como o rim, o coração. Com essas pessoas, a gente tem de ter menor tolerância com os níveis da pressão. Afora isso, o ponto de corte é mesmo 14/9. É lógico que, às vezes, a pressão sobe em virtude de diversas circunstâncias. Até mesmo durante uma atividade física a pressão sobe, para, depois, voltar ao normal. Isso é normal. A hipertensão se manifesta em várias situações, como quando a pessoa está submetida a estresse. Ademais, alguns remédios, como anti-inflamatórios, descongestionantes nasais e antidepressivos, também aumentam a pressão. Se não estiver nesse contexto, o paciente vai ter de tomar remédio durante toda a vida. Vida saudável e prevenção são essenciais.


foto: Arquivo pessoal

artigo

Escolheram o serviço público e o servidor como alvos do ajuste Antônio Augusto de Queiroz*

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o cardápio de soluções para a crise, encontrei três fontes coincidentes no propósito de eleger o serviço público e o servidor como alvos do ajuste: a Agenda Brasil; um artigo de Armínio Fraga com proposta para superar a crise; e as medidas anunciadas pelos ministros Nelson Barbosa e Joaquim Levy. Citarei apenas três exemplos de cada fonte. Na Agenda Brasil, da lavra do senador Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado, propõe-se: o retorno do modelo de administração pública gerencial, da era FHC; a reforma da Previdência, com ampliação da idade mínima; e o reajuste planejado dos servidores públicos – leia-se “congelamento da despesa com pessoal”. No artigo do ex-presidente do Banco Central na gestão FHC, o economista Armínio Fraga, publicado em O Globo, em 13/9/20015, são apresentadas as seguintes medidas: a discussão sobre o tamanho e as prioridades do Estado; o fim da estabilidade do servidor; e a adoção da idade mínima de 65 anos, para homens e mulheres, para efeito de aposentadoria. Do pacto apresentado pelos ministros Levy e Barbosa constariam as seguintes propostas: adiar o reajuste dos servidores, que passaria de janeiro para agosto, como previsto no orçamento para 2016; cancelar o abono de permanência que é devido ao servidor com tempo de serviço para requerer aposentadoria; suspender os concursos públicos; e promover a reforma da Previdência, proposta que já estaria em elaboração por uma comissão interna do governo, que, ao ensejo, ia sugerir também a ampliação da idade mínima para a aposentadoria. Os três pontos em comum – reduzir o tamanho e o papel do Estado; limitar ou reduzir a despesa com pessoal; e promover a nova reforma da Previdência, tanto do regime próprio quanto do regime geral – são um péssimo sinal do que poderá vir em termos de perda de qualidade e precarização das relações de trabalho no serviço público. A suspensão dos concursos públicos e o anúncio do fim do abono sinalizam um mau presságio em relação à paridade. Isso significa que, para manter em atividade as pessoas em condições de requerer aposentadoria,

vão criar bônus, indenizações e outras formas de burla à paridade, arrochando ainda mais os aposentados, que já pagam contribuição de forma indevida. As propostas, como se vê, atingem o serviço e o servidor público e, em quase todas as hipóteses, diretamente. É sempre assim: para honrar compromissos com os rentistas, desmontam o Estado e cortam direitos dos servidores públicos. Foi assim com Collor. Foi assim com FHC e está sendo assim com Dilma. Como, porém, a implementação das propostas demanda mudança legal – seja em nível de lei ordinária, seja em âmbito constitucional –, resta, aos servidores e suas entidades, resistir, protestando contra o governo e pressionando o Congresso a rejeitá-las. Muitas entidades já fazem essa abordagem de pressão no Parlamento, mas agora é preciso mais, já que há uma mudança substantiva na relação com o Congresso. Se, na última década, a briga era por mais direitos, agora a batalha é para evitar retrocessos, como aconteceu na penúltima década. Se não houver resistência – e significativa – ao governo, nem uma forte pressão sobre o Congresso, novas medidas serão anunciadas, considerando que os custos são baixos ou difusos. Os governos, de um modo geral, trabalham com a régua do custo-benef ício. Se uma medida tiver alto benef ício e baixo custo, será priorizada em relação a outra, com alto custo e baixo benef ício. Por isso, os servidores e suas entidades devem combinar a pressão de rua, na forma de greves e manifestações populares, com o trabalho institucional de pressão sobre os poderes, para evitar retrocesso em suas conquistas sociais. A luta pela regulamentação da Convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), por exemplo, assim como a liberação com ônus de dirigentes sindicais ganham importância nesse cenário. No primeiro caso, porque obriga o governo a sentar e negociar. No segundo, porque as entidades poderiam contar com líderes sindicais com dedicação exclusiva à defesa de sua base. * Jornalista, analista político e diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Apoio Parlamentar (Diap); assessor parlamentar da Anajur.. REVISTA

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novas tecnologias

Estamos dependentes das redes sociais? Adriana Albuquerque*

Segundo especialistas, o excesso de uso das redes sociais causa sérios prejuízos aos seus usuários, entre eles o afastamento do convívio com amigos e a família, além de trazer um forte impacto à vida profissional.

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foto: Arquivo pessoal

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esses nossos tempos do auge das redes sociais, se diz, em tom de brincadeira, que o ser humano é composto de cabeça, tronco, membros e… smartphone! Já há alguns anos que o celular se tornou uma extensão do corpo humano. Com efeito, está presente em todos os momentos e em todos lugares, na mão de qualquer pessoa, independentemente de sexo, idade e escolaridade. É um fenômeno inegável da vida moderna. Mas que fenômeno é esse, que tomou conta da nossa vida de tal forma, a ponto de substituir o convívio pessoal, isto é, a necessidade de conviver frente a frente com o nosso interlocutor? E tem mais: hoje muitos preferem recorrer ao whatsApp a fazer uma simples ligação telefônica. A escolha não é motivada só por questões econômicas, mas simplesmente por fazer o usuário se sentir mais à vontade para trocar ideias. Esse comportamento, já generalizado, é muito interessante como foco de estudo, mas deveras preocupante como fator social. Vamos entender melhor esse fenômeno e o que ele tem a ver com a vida de cada um de nós. Uma pesquisa

Adriana Albuquerque: Para tudo tem hora


conduzida recentemente pelo Ibope mostra que os brasileiros são os que ficam mais tempo conectados à internet, e que 10% desses usuários desenvolvem dependência. Alguns especialistas entendem que, em virtude das dificuldades de suportar as angústias do dia a dia, as pessoas, de uma maneira geral, vão atrás de uma solução mágica. As redes sociais se apresentam, então, como uma alternativa muito atraente, já que são capazes de disfarçar a timidez, as angústias, a solidão e as dificuldades de relacionamento, sensações tão comuns em nossos dias! O problema é quando essas ferramentas tecnológicas, tão úteis em nossa vida pessoal e profissional, trazem prejuízo às relações interpessoais. Sabemos que o conhecimento nunca foi tão acessível como é hoje. Isso é devido à internet, que, tão logo entrou em nossas vidas, mudou radicalmente a nossa forma de ser e de viver. O ser humano é social por natureza, e a internet potencializa essa característica de forma excepcional. Mas, à medida que a pessoa fica presa à vida virtual, permitindo que ela substitua a vida real, acaba se alienando e sendo aprisionada nas malhas da rede. Esse comportamento é identificado por alguns sinais, principalmente o afastamento progressivo de relacionamentos reais e da vida social. Mesmo em bares e restaurantes, a visão de dezenas de pessoas inclinadas sobre um smartphone é muito comum. Num grupo de amigos reunidos numa mesa de um bar, percebe-se, a todo o tempo, que cada um deles se isola sistematicamente em seu smartphone, mantendo-se, por alguns minutos, totalmente alheio ao que acontece à sua volta. E ninguém consegue resistir! É como se o ato de desconectar representasse uma ameaça, uma evasão do ato de existir. Esse é um dos sinais de que a dependência está se instalando aos poucos, sem que o indivíduo se dê conta dela. E é aí que mora o perigo! Isoladas no mundo do seu smartphone, as pessoas deixam de curtir o momento real, contentando-se em

Vivemos num mundo de ilusões, em uma sociedade focada principalmente na posse, no ter. Nessa sociedade a necessidade de ser visto e reconhecido é alimentada continuamente, e, como produto que é, jamais é saciada.

se mostrar em fotos e em textos postados no facebook. Mesmo que estejam fisicamente expostas a um intenso momento real, as pessoas fogem dele para um mundo virtual, fazendo check-in e esperando “curtidas e comentários”. Só assim se sentem importantes. Só assim provam, para si e para os outros, que estão realmente aproveitando a vida! A necessidade de ser visto é maior do que a de desfrutar o momento. Por isso, a “curtida” é checada a cada minuto, é apreciada como um afago a uma autoestima sempre comprometida. Isso se torna doentio, pois se desenvolve uma espécie de paranoia. “As pessoas estão me vendo? Só assim me sinto importante. E, se não me curtem, é porque estão com inveja, e isso me dá novamente a ilusão de importância!” Infelizmente vivemos num mundo de ilusões, em uma sociedade focada principalmente na posse, no ter. Nessa sociedade, a necessidade de ser visto e reconhecido é alimentada continuamente, e, como produto que é, jamais é saciada. “Se estou em um lugar bonito e comendo bem, é porque sou uma pessoa especial e privilegiada! Mas, para me sentir melhor, preciso me expor aos outros, para ser admirado, para ser invejado!” REVISTA

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Mal sabem essas pessoas que, na realidade, estão desenvolvendo uma personalidade frágil, dependente; estão se mostrando como alguém profundamente insatisfeito com a própria vida. E, com o tempo, vai se instalar um vazio no seu mundo interior. Para que esse processo seja revertido, o indivíduo vai precisar de uma tomada de consciência, para compreender e aceitar que a vida real tem altos e baixos… O pacote é completo: dor e prazer, amor e desamor, alegrias e tristezas, que precisam ser encaradas e elaboradas de uma forma real. Vão ter de entender que é possível aprender a lidar de maneira adequada e saudável com esse fantástico recurso das redes sociais, sem, entretanto, se tornar dependente dele. Basta olhar para dentro de si, tentar se conhecer melhor. “Quem sou eu? Para que existo? O que posso fazer de útil às pessoas e à sociedade? Qual é a minha missão? Qual o meu papel no mundo?” São perguntas filosóficas que precisam ser feitas para que o indivíduo encontre um significado para o ser, e não somente para o ter. Assim, ele quebra esse círculo egoístico e prejudicial. Para tudo tem hora, inclusive para se conectar. Manter-se desconectado por algumas horas, quem sabe até uns dias, é extremamente saudável! Quem consegue essa “proeza” aprende a gozar a vida em sua plenitude e caminha por ela de um jeito mais humanizado, relacionando-se realmente com o seu próximo e encarando as situações cotidianas com maturidade. Desenvolvem a sensibilidade humana! Deixam de se alienar o tempo todo! Para quem não consegue fazer isso sozinho, vai precisar buscar apoio profissional. Há casos de pessoas que tentam recuar, mas já estão completamente dominadas por essa verdadeira droga, que é o vício da compulsão. Depois de fisgadas, não conseguem se afastar do vício. Os sintomas de abstinência começam a aparecer, como a angústia, a irritabilidade, a insônia, para citar alguns. É um processo similar ao experimentado por quem é usuário de drogas ilícitas. É um vício igualmente nefasto e perigoso. Todos nós estamos suscetíveis a isso, mas, principalmente, os tímidos ou os que sofrem alguma dificuldade de relacionamento social. Para evitar que isso ganhe proporções incontroláveis, as pessoas precisam conversar mais, conviver presencialmente, explanar suas angústias, seus medos, sentir o apoio nos amigos, nos familiares. Angústias, quando expressas em palavras, dão início a um processo de cura. Como psicóloga, afirmo que isso, 30

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Para tudo tem hora, inclusive para se conectar. Manter-se desconectado por algumas horas, quem sabe até uns dias, é extremamente saudável! Quem consegue essa “proeza” aprende a gozar a vida em sua plenitude.

sim, é saudável e fundamental para garantir uma saúde integral. Quando a pessoa ouve a si mesma, ela passa a ressignificar as suas dores e se permite crescer, aprender a lidar com as próprias frustrações. Esse é um processo de amadurecimento, de desenvolvimento da sabedoria. Muitas vezes, é importante ficar a sós consigo mesmo. Se isso não está sendo possível, é porque alguma coisa no mundo interno anda mal, e não é no mundo virtual que será resolvida. Se uma pessoa não se dá conta de que está vivendo um processo de isolamento, é papel da família e dos amigos alertá-la o quanto antes para que esse processo não se agrave. Quanto mais cedo essa intervenção acontecer, maior será a possibilidade de evitar danos de grandes proporções. Essa abordagem, porém, deve ser sutil e delicada, ou seja, não pode virar um policiamento. O que se propõe aqui é denunciar os pequenos sinais de que o exagero existe e de que a pessoa está perdendo os limites. As redes sociais podem e devem ser bem utilizadas, mas a forma correta de fazê-lo é aquela que possibilite realizações, conquistas e aprendizado, e não a alienação em um mundo virtual, frio e ilusório. Pessoas saudáveis possuem um objetivo claro para navegar. Pessoas dependentes buscam uma fuga, e muitas vezes esse mecanismo é inconsciente. Relacionar-se virtualmente só faz sentido se não levar à alienação, ao afastamento da convivência no mundo real e ao prejuízo da vida profissional. * Coach, escritora e palestrante internacional nas áreas comportamental e motivacional. www.adrianaalbuquerque.com.br



coletânea

História do Brasil contada pela Advocacia Consultiva

O hasteamento das bandeiras da monarquia portuguesa em 1911 Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy*

A proclamação da República em Portugal, ocorrida em 1910, resultou em algumas ocorrências no Brasil, com certo desdobramento jurídico, que suscitaram interessante provocação por parte do ministro da Justiça, dirigida ao consultor-geral da República.

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oticiou-se que cidadãos portugueses que viviam na Bahia estariam hasteando bandeiras da Monarquia Portuguesa em suas residências. Entendeu-se, num primeiro momento, que teria havido ato inequívoco de não reconhecimento do novo governo português. E, assim, demonstrado o desrespeito para com nação amiga,

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caberia ao governo brasileiro a incumbência de proibir tais comportamentos. No entender do consultor-geral, deveria se avaliar a situação também à luz dos cânones do exercício da liberdade de pensamento, que era garantido pela Constituição. Concluiu-se que, na hipótese de que se tivessem tais bandeiras em prédios públicos, deveria a polícia advertir os proprietários ou, ainda, se necessário, proibir tais práticas, comprovadamente hostis ao governo republicano português, então instaurado. Deve-se ter como pano de fundo o fato de que a República fora proclamada no Brasil em 1889, e que a Família Real fora banida de nosso país. O triunfo da República em Portugal de certa forma aproximava os dois países, agora regidos por regimes políticos idênticos, e alternativos à fórmula monárquica. Segue o parecer.


Bandeira da monarquia portuguesa, em 1910

Gabinete do Consultor Geral da República – Rio de Janeiro, 31 de agosto de 1911. Senhor Ministro de Estado da Justiça e Negócios Interiores. – Em resposta ao vosso Aviso n. 517, de 25 de março último, consultando sobre o fato de alguns cidadãos portugueses, domiciliados na Bahia, hastearem, às vezes, nas casas de duas residências, o pavilhão da extinta Monarquia de Portugal, não obstante a recente transformação política desse país, tenho a honra de comunicar-vos que, em minha opinião, o ato dos aludidos indivíduos, sendo uma manifestação de não reconhecimento da nova forma de governo adotada pela Nação Portuguesa, constitui violação do princípio, consagrado em direito internacional, de estrito respeito à personalidade política dos estados legitimamente

constituídos e reconhecidos, cumprindo ao governo brasileiro não permitir semelhantes práticas, desde que elas tomarem a feição intencional e ofensiva da soberania, sob pena de assumir a responsabilidade desse ato de tolerância. Em todo o caso, convirão verificar a forma precisa dos atos acima aludidos, para que a repressão não se converta numa violação da liberdade de pensamento, nem ultrapasse os limites constitucionais. Incontestavelmente, arvorar a bandeira de um regime extinto em passeatas pelas ruas ou em manifestações ruidosas de caráter popular contra o governo de um país amigo, não pode ser admitido em boa razão, sem agravo desse país; não assim quando figura em casas particulares como simples atestado de coerência daqueles que não aderiram à nova ordem das coisas. Outrossim, é necessário saber se a bandeira de que se trata é levantada nas portas ou janelas de edif ícios que funcionem clubes ou associações destinadas a propaganda restauradora, porque, nesta hipótese, à polícia incumbe o dever de, pelo menos, advertir, se não coibir fatos ostensivamente hostis ao governo dos estados conosco relacionados. T. A. Araripe Junior * Doutor e Mestre em Filosofia do Direito e do Estado pela Pontif ícia Universidade Católica de São Paulo.

ASSOCIADO, ATUALIZE OS SEUS DADOS Com o propósito de estreitarmos o nosso relacionamento, é importante que o associado comunique, de imediato, quaisquer alterações cadastrais, por meio dos telefones PABX: (61) 3322-9054, ramal 4, fax (61) 3322-6527 e/ou e-mail: anajur1986@gmail.com

Contamos com a sua colaboração! REVISTA

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PUBLICAÇões e eventos

Garantias constitucionais e segurança jurídica Em um momento de crise econômica e financeira, com muitos questionamentos sobre o universo político, é preciso que o cidadão tenha a seu favor as garantias de livre exercício de seus direitos. Foi nesse contexto que o presidente nacional da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, lançou o livro “Garantias Constitucionais e Segurança Jurídica”. O prefácio da obra é assinado pelo atual presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, enquanto a apresentação ficou a cargo do professor Arnold Wald. De acordo com o autor, o texto busca lançar luzes sobre os aspectos históricos, conceituais, jurisprudenciais e principiológicos da segurança jurídica, compreendendo-a enquanto uma garantia constitucional, bem como desenvolver a temática geral das garantias constitucionais e a sua importância para a proteção dos direitos no ordenamento jurídico brasileiro.

Contratos da administração pública O trabalho rigoroso e diligente daqueles que lidam com o dinheiro público deve implicar uma série de conhecimentos técnicos para garantir a correta aplicação dos recursos. O instrumento para a realização dos acordos de vontades entre a Administração Pública e o particular é o Contrato Administrativo. É, portanto, de suma im-

9o Fórum Brasileiro de Combate à Corrupção na Administração Pública

portância elaborar, criteriosamente, as cláusulas contratuais, com total atenção às regras legais e regula-

Em Brasília, nos dias 13 e 14 de novembro, terá lugar o 9º Fórum Brasileiro

mentares que, nesses ajus-

de Combate à Corrupção na Administração Pública. No fórum, que é um ótimo

tes, são definidas detalhada-

espaço para dar vazão aos anseios da sociedade, será discutido o fenômeno

mente. No livro “Contratos da

da corrupção, seus malefícios e os remédios mais eficientes para combatê-la.

Administração Pública: oriun-

O evento propõe a realização de um debate plural, com renomados exposito-

dos de licitações e dispensa

res, para a discussão aprofundada de temas jurídicos atuais e essenciais para

de inexigibilidade”, da editora

a agenda do País.

JH Mizuno, o professor Sidney

Entre eminentes doutrinadores e juristas estão os seguintes palestrantes:

Bittencourt elenca as nuances

Carlos Ayres Britto, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, a ministra

desses ajustes, elaborando

do STF Carmem Lúcia e o ministro do Tribunal de Contas da União Benjamin

um verdadeiro manual sobre

Zymler. O evento será realizado no auditório do Conselho Federal da Ordem

o tema.

dos Advogados do Brasil, em Brasília, DF.

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