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2.3 a zona rural e a cidade de Canindé
a. localização e breve histórico da cidade
Canindé é um município localizado nos sertões do Ceará, mais precisamente na região de planejamento do Sertão de Canindé, formada por 06 municípios ao total (Boa Viagem, Caridade, Canindé, Itatira, Madalena e Paramoti). A 120 quilômetros de distância da capital do estado, Fortaleza, possui 3.218,5 km² de extensão territorial e atualmente conta com uma população estimada de 77.484 habitantes, de acordo com a estimativa feita pelo IBGE no ano de 2021. Seu território é formado por 11 distritos, que são: Canindé, Bonito, Caiçara, Campos, Capitão Pedro Sampaio, Esperança, Iguaçu, Ipueira dos Gomes, Monte Alegre, Salitre e Targinos.
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Além da subdivisão em distritos, integram o território também os assentamentos distribuídos ao longo de toda a zona rural. Antes de sua emancipação municipal, Canindé foi um distrito nomeado como São Francisco das Chagas de Canindé (1817), pertencente ao município de Quixeramobim quando em 1846 passou a ser uma vila formada a partir de desmembramentos de parte dos territórios de Fortaleza e Quixeramobim e assim prosseguiu até o ano de 1914, quando a vila foi elevada à categoria de cidade.
A história da formação territorial do município se confunde com a história das manifestações religiosas na localidade. Algumas bibliografias relatam que o português Francisco Xavier de Medeiros, que chegou em Canindé a partir da doação de sesmarias por parte da Coroa portuguesa, foi o responsável pela construção da primeira capela de devoção à São Francisco ainda no século XVIII. Posteriormente, essa pequena capela deu origem à Basílica Menor de São Francisco da Chagas de Canindé, nome pelo qual é conhecido o santuário atualmente.
A presença da capela em si não foi a única motivadora das migrações populacionais para essa localidade rural, mas sim um acontecimento na época de sua construção. De acordo com documentos diversos e relatos populares, um dos operários que trabalhavam na construção da capela caiu do de uma altura considerável e, ao longo de sua queda, fez uma prece a São Francisco por sua vida e após isso sua queda foi contida por uma trave e ele sobreviveu. A partir de então, grandes contingentes populacionais se deslocam até a cida- de em busca do atendimento de suas preces e para participar dos tradicionais festejos de São Francisco.
Outro fator que contribuiu para o estabelecimento do local enquanto cidade e para o acréscimo de estruturas de suporte (como o hospital) foi a chegada dos frades capuchinhos. Motivada pelo crescimento da religiosidade em torno naquela porção territorial, foi de fundamental importância para o crescimento da cidade. Em sua dissertação, Beserra (2013) afirma que a chegada dos frades teve impacto em duas frentes de ocupação: estabelecimento de infraestruturas e da fé católica no território. Segundo a autora:
“Os frades contribuíram em duas frentes principais: a primeira foi em relação à infraestrutura da Cidade, a exemplo da construção do primeiro grande hospital; já a segunda refere-se às contribuições na disseminação e consolidação do catolicismo naquela região.”
(BESERRA, 2013, p.113)
Apesar da presença da igreja católica ter trazido diversos equipamentos para a cidade, ela representa um fator de apagamento da presença da população indígena no território. Canindé é uma área de origem indígena, ocupada inicialmente pela nação Tapuia Canindé. Pode-se utilizar como a maior prova dessa afirmação a própria nomeação do município. Nome de origem indígena motivado pela presença marcante de araras-azuis de papo amarelo na região (arara-canindé), é responsável até os dias atuais por carregar a missão de não apagamento da presença dos povos indígenas no local. A tomada do território por parte dos portugueses na época das sesmarias trouxe muitos conflitos, lutas e mortes cujo resultado foi “a quase total extinção dos indígenas” (BESERRA 2013, p. 113).
Essa questão do apagamento da importância desses povos para a formação territorial do município se mostra mais grave ao percebermos que há poucos registros históricos sobre essa temática na região, além do fato de que “não há indícios de representação política indígena nas discussões do Território Sertões de Canindé” (BESERRA, 2013, p. 114).
Também é de grande importância para a caracterização do município de Canindé o conflito de terras. Possuindo conflitos que chamaram a atenção no cenário estadual nas décadas de 1960 e 70, o município até hoje é considerado referência nas lutas por reforma agrária. Foi a partir de desapropriações ordenadas pelo Estatuto da Terra (1964) que se iniciaram as lutas no Campo canindeense.
O sertão rural cearense sempre foi marcado pela lógica da “lei do patrão”, em que não havia espaço para as reivindicações por moradia e pelo direito à terra por parte dos trabalhadores camponeses. Foi na Fazenda Japuara que esse quadro começou a se reverter a partir das reivindicações camponesas, agora embasadas pela lei e apoiadas pelo sindicato e pela Igreja, instalando-se assim uma contraposição ao domínio dos grandes produtores rurais e proprietários de terras do sertão.
Por último, cabe ainda ressaltar a presença dos movimentos de mobilização por parte da sociedade civil e do governo. Geralmente as lutas sociais e territoriais que acontecem em Canindé ficam em segundo plano ao falarmos do município, dando destaque apenas para a religiosidade e todos os fluxos relacionados a ela. Entretanto, os movimentos sociais presentes na cidade e no Campo se mostram como grandes constituintes socioculturais do território canindeense. Beserra (2013) sintetiza a questão das características do município ao afirmar:
“De uma maneira geral, Canindé, ao mesmo tempo em que apresenta fortes características religiosas, também apresenta uma sociedade civil que, por hora, é construída com atores políticos de discussão em torno das políticas públicas; sendo os principais mediadores organizativos do Município, de um lado, compondo a sociedade civil: o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais, o Movimento dos Sem Terra, as ONGs, as Associações comunitárias, as Cooperativas, o Fórum dos Assentados e, de outro, compondo grupos tanto da sociedade civil como do governo: os Comitês Setoriais (mulheres e juventude), os CMDS, Conselhos de saúde e educação, Colegiado Territorial, entre outros.”
(BESERRA, 2013, p.119)
Mapa 2: Municípios que compóem a região de planejamento dos Sertões de Canindé.