1
Ficha técnica EDITOR CESPU, CRL: COPERATIVA DE ENSINO SUPERIOR POLITÉCNICO E UNIVERSITÁRIO Título: VI Jornadas de Obstétricia – Por uma vida Melhor COORDENAÇÃO DA EDIÇÃO: Albina Sequeira; Catarina Cordeiro; Paula Janeiro & Catarina Amaral COMISSÃO EDITORIAL: Albina Sequeira; Catarina Cordeiro; Paula Janeiro & Catarina Amaral Design: António Sequeira Divulgação: VI Jornadas de Obstétricia Suporte: E-‐book (formato .pdf) ISBN: 978-972-99165-3-3
Nota: todos os artigos publicados são propriedade da CESPU pelo que não podem ser reproduzidos para fins comerciais, sem a devida autorização. A responsabilidade pela idoneidade e conteúdo dos artigos é única e exclusive dos seus autores.
2
ÍNDICE 1.
OBESIDADE INFANTIL: ARTIGO DE REVISÃO ---------------------------------------
4
Ana Maria Martins Morais 2.
COMO SE RELACIONAM OS JOVENS COM O SEU CORPO? -------------------
14
Maria Isabel Barreiro Ribeiro & António José Gonçalves Fernandes 3.
INFERTILIDADE: UMA REALIDADE PRESENTE -------------------------------------
23
Adriana Jorge da Silva Pereira Vaz Machado & Ângela Marisa Vaz Meira 4.
ATITUDES E COMPORTAMENTOS DOS JOVENS RELATIVAMENTE AO DESTINO A DAR AOS RESÍDUOS DE MEDICAMENTOS --------------------------
29
Maria Isabel Barreiro Ribeiro & António José Gonçalves Fernandes 5.
PROCESSO DE AQUISIÇÃO DE COMPETÊNCIAS: PRÁTICAS PARA A PREVENÇÃO DA INFEÇÃO DO COTO UMBILICAL DO RECÉM-NASCIDO – UMA REVISÃO INTEGRATIVA DA LITERATURA ------------------------------------
37
Graziela Mendes 6.
A MULHER NO CLIMATÉRIO, QUE INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM ---
47
Mário Cardoso; Helena Presado; Andrea Carvalho; Dora Carteriro & Tiago Nascimento 7.
SATISFAÇÃO SEXUAL NA MEIA-IDADE ------------------------------------------------
51
Helena Presado; Mário Cardoso; Andrea Carvalho; Dora Carteriro & Tiago Nascimento 8.
COMUNICAÇÃO INTRAUTERINA: PROMOÇÃO E INTERVENÇÃO ------------
56
Adriana Jorge da Silva Pereira Vaz Machado & Ângela Marisa Vaz Meira 9.
ORIENTAÇÕES
DE
ENFERMAGEM
FACE
AO
ABORTAMENTO
ESPONTÂNEO -----------------------------------------------------------------------------------
63
Amandina Borges & Teresa Correia 10.
SABERES E COMPETÊNCIAS DO PAI, COM PREPARAÇÃO PARA O PARTO, DURANTE O TRABALHO DE PARTO E PARTO --------------------------
77
Olga Maria Telo Pousa 11.
MAUS –TRATOS FETAIS ---------------------------------------------------------------------
86
Leandra Cordeiro
3
1.
OBESIDADE INFANTIL: ARTIGO DE REVISÃO Ana Maria Martins Morais1 1)
Doutoranda
em
Enfermagem
pela
Universidade
Católica
Portuguesa
–
Porto/Portugal (UCP). E-mail: ammmorais@gmail.com, enfermeira a exercer funções na USF do Covelo.
RESUMO: Objetivo: Este artigo de revisão teve intenção de apresentar uma revisão da literatura sobre a obesidade infantil. Materiais e Métodos: Estudo descritivo da revisão sistemática em bases de dados, coletadas a partir de artigos publicados em revistas científicas indexadas, livros e teses de pós graduação. A maioria dos artigos foi identificada a partir das bases de dados B-On, RCAAP e Scielo e SI -Web of Knowledge. O período pesquisado foi de 2009 a 2012. Outros artigos foram identificados a partir das referências bibliográficas citadas nos primeiros artigos. Resultados: vários autores chegaram à conclusão que a prevalência do problema se mantem e tem tendência para aumentar, a prevenção é a melhor opção, é necessário implementar estratégias para prevenir a obesidade nas crianças, e é fundamental o envolvimento da família. Conclusão: Os estudos abordados concluíram que a estratégia mais eficaz é a melhoria dos hábitos alimentares, o aumento dos níveis de atividade física e a diminuição das atividades de lazer sedentárias dos alunos, bem como intervenções ao nível das crenças, atitudes e comportamentos dos pais. Palavras-Chave: “Obesidade”; “infantil"; “childhood obesity".
INTRODUÇÃO Segundo a Organização mundial de Saúde (OMS) estima-se que, em 2015, aproximadamente 2,3 biliões de adultos terão excesso de peso e, destes, 700 milhões serão obesos. Dados do Estudo de Prevalência da Obesidade Infantil e do Adolescente em Portugal Continental (EPObIA), finalizado no último trimestre de 2009 pelo Observatório Nacional da Obesidade e do Controlo do Peso (ONOCOP) e pela Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade (SPEO), em que estiveram envolvidas 5.196 crianças e adolescentes, revelaram que a prevalência da obesidade e do excesso de peso nas crianças portuguesas com idades compreendidas entre os dois e os cinco anos é de 35,5% em crianças dos 2 aos 5 anos de idade (23,2% com pré-obesidade e 12,3% com obesidade).
4
Com efeito e segundo a OMS (2005), a obesidade é definida como “uma doença em que o excesso de gordura corporal acumulada pode atingir graus capazes de afetar a saúde. Este excesso de gordura resulta de sucessivos balanços energéticos positivos, ou seja, a quantidade de energia ingerida é superior à quantidade de energia gasta” Existem vários critérios para classificação da obesidade, sendo três os mais utilizados: CDC (US Centers for Disease Control and Prevention) (2002), Cole et al.(2000) (International Obesity Task Force (IOTF) e OMS (Organização Mundial da Saúde (P97; 2006/2007) por serem os mais atuais e por permitirem, de certo modo, a comparação de classificações que foram definidas em momentos diferentes e de forma diferente. Em 2013, durante a revisão do Programa-tipo de Atuação em Saúde Infantil e Juvenil (2013) a DGS reuniu um grupo de peritos para analisar as curvas de crescimento e recomendaram a adoção das curvas da OMS para a utilização em Portugal. Segundo a DGS (2005) a antropometria, que consiste na avaliação das dimensões físicas (peso e estatura) e da composição global do corpo humano pela determinação do Índice de Massa Corporal (IMC), tem-se revelado como o método isolado mais utilizado nos diversos países para o diagnóstico nutricional a nível populacional, pela facilidade de execução, baixo custo e inocuidade. APARÍCIO et al cita DIETZ (2000) e refere que apesar dos determinantes ambientais são reconhecidos
enquanto
determinantes
genéticos
três
períodos
críticos
para
o
desenvolvimento da obesidade e impacto das suas complicações, que incluem o período fetal, a infância precoce no período rebound de depósito de gordura, que ocorre habitualmente entre os 5 e os 7 anos, e o período da adolescência. Como as crianças são mais suscetíveis a desenvolverem precocemente excesso de peso, APARÍCIO et al (2011) refere que é muito importante que os projetos de intervenção devem iniciar-se precocemente, idealmente antes dos 6 anos, incidindo assim antes do início do segundo período de depósito acelerado da gordura corporal (adiposity rebound). Refere ainda APARÍCIO et al que um investimento na saúde materno-infantil, nomeadamente na orientação da grávida para a importância de manter uma alimentação saudável, incentivando e apoiando o aleitamento materno exclusivo até aos seis meses de vida do bebé, seguido de uma introdução equilibrada da alimentação complementar. Este padrão deve manter-se pela adoção de uma dieta equilibrada, rica em micro-nutrientes essenciais, associada a atividade física regular.
5
A OMS (2007) refere que os ambientes obesogénicos das sociedades modernas, criados pelo aumento global da disponibilidade e acessibilidade aos alimentos e consequente transição nutricional, e pela redução no dispêndio de energia, têm influenciado os estilos de vida nos diferentes contextos: família, escola, comunidade e local de trabalho. METODOLOGIA Na pesquisa efetuada na base de dados B-on foi encontrado um total de 138 artigos, sendo selecionados apenas os 4 artigos que estavam vinculados à área em estudo. Na base de dados RCAAP, foram encontrados 41 artigos e selecionados apenas 3 artigos. Na base de dados Scielo, foram encontrados 94 artigos e selecionados apenas 3 artigos. Um dos artigos selecionados da base de dados B-on foi encontrado na base de dados RCAAP e SCIELO. Dois dos artigos selecionados da base de dados RCAAP foram encontrados na base de dados SCIELO. Um dos artigos selecionado da base de dados B-on foi encontrado na base de dados RCAAP. No total foram selecionados 7 artigos.
ANALISE DOS RESULTADOS Cada artigo foi analisado individualmente, e foi elaborado o Quadro I, com o intuito de efetuar um resumo da revisão bibliográfica descrita anteriormente acerca dos estudos sobre a obesidade infantil: Quadro I Síntese dos resultados Autor País Ano
Tipo estudo
de
N
Critério
Principais Resultados
Observação
193prontuári os (93 prontuários pertencentes
O público-alvo foi selecionado a partir de um levantamento dos indivíduos nascidos nos anos de 1983 e 1984 e 2003 e 2004, que estiveram em acompanhame nto no serviço de Pediatria da Unidade Mista de Saúde do município do estudo,
Nas crianças na faixa etária de 24 a 30 meses, nascidos nos diferentes períodos, foram encontrados diferença significativa no peso de crianças nascidas nos anos de 2003 e 2004 (13,83±0,34 kg), comparado ao peso de nascidos
Os resultados obtidos mostram o aumento da obesidade infantil nas últimas décadas
Objetivo MarchiAlves et al (2011)
Estudo retrospetivo, de natureza descritiva
Brasil setembro de 2008 a janeiro de 2009
Objetivo determinar a classificação nutricional infantil e comparar os índices de sobrepeso e obesidade de crianças atendidas
a usuários nascidos em 1983 e 1984 e 100 prontuários de participantes nascidos em 2003 e 2004.)
em 1983 e (11,85±0,34 kg).
1984
Nas crianças na faixa etária de 30 a 36
Segundo estes autores é função do enfermeiro envolver a comunidade nas ações de promoção e recuperação da saúde, através de orientação alimentar saudável, prevenção do ganho de peso, monitoramento de dados
6
num Unidade de Saúde de um município do interior paulista nos anos de 1983/1984 e 2003/2004
FILGUEIR AS et al (2012)
Estudo transversal, quantitativo
durante primeira infância.
Para a determinação da obesidade infantil, foi utilizado o índice peso (kg)/idade (meses) (P/I).
377
Brasil Outubro de 2011.
a
Objetivo de identificar a prevalência de obesidade em crianças de escolas públicas do município de Parnaíba
Crianças com idade de 7 a 11 anos, de ambos os sexos, avaliação antropométrica , por meio da medida do peso (kg) e da altura (cm), sendo calculado posteriormente o índice de massa corporal (IMC), Um questionário, no qual as crianças respondiam a perguntas relacionadas com a atividade física e hábitos sedentários
PAZIN et al (2012)
Estudo transversal
Brasil
Objetivo de avaliar o estado nutricional
2007
571 crianças
Crianças de 2 a 8 anos de idade, matriculadas em três escolas particulares, atendidas por uma empresa
meses, nascidos nos diferentes períodos, foram Encontradas diferenças significativas no peso de crianças nascidas nos anos de 2003 e 2004 (14,87±0,36 kg), comparado ao peso de nascidos em 1983 e 1984 (12,89±0,27 kg).
A maioria (61,27%) das crianças foi classificada com peso normal. Foi verificado que 26,79% das crianças apresentaram sobrepeso e 11,14% obesidade, com prevalência maior no sexo feminino (30,39 e 12,75%, respetivamente), quando comparado ao sexo masculino (22,54 e 9,25%, respetivamente). A quantidade de crianças que não praticam atividade física fora do ambiente escolar (n=235) foi superior às que praticam (n=142). A maioria dos entrevistados (71,88%) afirmou alimentar-se a ver televisão, 59,95% relatam que passam muitas horas do dia em frente à TV e 217 escolares afirmam fazerem uso de jogos virtuais. A relação IMC/I indicou que quase 30% das crianças estavam com risco de sobrepeso, sendo que essa percentagem foi aparentemente maior entre os meninos (31,1%) do que as
antropométricos durante as consultas de enfermagem, avaliação e encaminhamento dos casos de risco, além de participação e coordenação de atividades de educação permanente no âmbito da saúde e nutrição.
A avaliação do estado nutricional é uma estratégia fundamental para prevenção do ganho de peso dos indivíduos, principalmente durante a infância, pois realizar o acompanhamento das alterações nutricionais é bastante importante para a promoção da saúde dos escolares
A avaliação antropométrica é uma importante ferramenta de diagnóstico nutricional e fundamental para traçar políticas de saúde para a
7
de préescolares e escolares de escolas particulares atendidas por uma empresa especializad a em alimentação infantil
COSTA, Ana; SILVA, Cláudia (2009)
Portugal 2007
Estudo transversal
Objetivo foi identificar que conheciment os e comportame nto possuem sobre a obesidade os pais destas crianças, nomeadame nte a nível da prevenção.
40
especializada em alimentação infantil. Foram aferidos peso e altura e a partir disso, foi calculado o Índice de Massa Corporal (IMC). Os dados foram analisados por meio das Curvas de Crescimento da Organização Mundial da Saúde (2007), utilizando os indicadores Peso/Estatura (P/E), Altura/Idade (A/I), Peso/Idade (P/I) e IMC/Idade (IMC/I).
meninas (27,8%)
Pais de Crianças entre os 6 – 10 anos, que frequentavam a escola Básica do 1º Ciclo Quinta e Rêgo (Ovar).
97,5% dos inquiridos reconhece a patologia da obesidade infantil, embora apenas 12,5% tenha conhecimentos acerca das suas causas, 80% apresenta o conhecimento de pelo menos uma das consequências, 85% referem como métodos preventivos desta patologia a alimentação saudável e a pratica de atividade física regular.
A colheita de dados foi realizada através de um questionário auto-aplicado, estruturado que abordava aspetos sociodemograficos, conhecimento s e comportament os face á obesidade
população, e o uso de diferentes indicadores propicia diagnósticos mais seguros não só em relação ao estado nutricional, mas também ao grau de desenvolvimento dos mesmos. Promoção da alimentação adequada em casa dever ser também um dos objetivos da educação nutricional nas escolas visto que os hábitos alimentares das famílias podem comprometer o estado nutricional deste grupo etário.
Os enfermeiros em conjunto com uma equipa multidisciplinar podem contribuir para a obtenção de mudanças positivas nos estilos de vida das crianças, sendo a educação fundamental para a prevenção desta patologia.
60% consideraram importante o papel do enfermeiro na prevenção da Obesidade infantil A principal causa da Obesidade infantil referida foi a alimentação
8
Estudo transversal
793
JESUS et al (2010)
Brasil Julho de 2004 e março de 2005
Objetivo de descrever a prevalência e os fatores determinante s do sobrepeso de crianças menores de 4 anos de idade
infantil
desequilibrada (30%), e atividade física insuficiente (45%).
Crianças menores de 4 anos de idade de Feira de Santana.
Neste estudo, o peso adequado ao nascer, primiparidade e trabalho materno aos 4 meses de vida da criança associaram-se com o sobrepeso infantil.
As variáveis independentes foram relacionadas às características das crianças, aos fatores sociodemográf icos e reprodutivos maternos e à alimentação da criança aos 4 meses.
As crianças filhas de mães primíparas, a ocorrência de sobrepeso foi 1,6 vezes maior (p = 0,014), e entre aquelas filhas de mães que já trabalhavam aos 4 meses, foi 1,7 vezes maior (p = 0,008)
A variável dependente foi o sobrepeso avaliado pelo índice peso/estatura, comparado ao padrão do Multicentre Growth Reference Study de 2006.
MACEDO et al (2012)
Portugal
Ano letivo 2008/2009
Estudo descritivocorrelacional .
Objetivo de avaliar as perceções parentais sobre estado nutricional, imagem corporal e saúde nas crianças que frequentam o 1º ciclo do
532
Crianças com uma idade média de 8 anos e um desvio-padrão de 1 ano, das quais 270 (51%) eram do sexo feminino e 262 (49%) do masculino
Utilizaram-se os seguintes instrumentos: Um questionário
59% das crianças estudadas (n=313) apresentavam um percentil de IMC adequado, 3% (n=17) subpeso e 38% (n=202) sobrepeso; destas metade (19%) situavase no percentil 85-95 e igual número acima do percentil 95. No que diz respeito às perceções parentais sobre o estado nutricional das suas crianças, verificouse que 74% dos pais (n=396) percecionaram que a sua criança apresentava um
Estes autores referem que apesar de ter sido observada maior tendência ao sobrepeso entre as crianças filhas de mães com maiores níveis de escolaridade, é necessário instituir políticas de educação em saúde que permeiem os diferentes grupos sociais e, sobretudo, as mulheres primíparas e que se ausentam do lar para trabalhar, alertando sobre os riscos desta doença, bem como as medidas de prevenção.
Estes autores alertam os profissionais para a necessidade de uma intervenção mais efetiva na educação para a saúde para prevenir e detetar precocemente casos de crianças em risco de se tornarem obesas Os enfermeiros, como são detentores de confiança por parte dos pais pela proximidade dos vários contextos
9
ensino básico.
Avaliação antropométrica das crianças avaliação do peso e da altura, determinou-se o respetivo percentil do IMC Avaliação da perceção parental relativamente ao estado nutricional da criança
percentil de IMC adequado, 14% (n=74) percecionaram excesso de peso e 12% (n=62) subpeso. Verificou-se que em 49.9% dos casos a perceção parental encontrava-se distorcida.
sociais (em contexto comunitário, na consulta de saúde infantil e em contexto escolar), particularmente nos primeiros anos de vida, têm um papel significativo nas intervenções preventivas na obesidade infantil
No RS, o excesso de peso foi de 14,4% (IC 95% = 13,1-15,8%) e, em SC, de 7,5% (IC 95% = 6,5-8,7%).
Os resultados do presente estudo indicam que as variáveis sociais junto às de nascimento (peso de nascimento e idade gestacional) foram os determinantes mais expressivos para a maior prevalência do excesso de peso, sendo mais significativo para o estado do RS.
Instrumento de avaliação da perceção da imagem corporal. SCHUCH et al
Estudo transversal
Brasil 2007.
Objetivo de estudar a prevalência e os fatores associados ao excesso de peso em crianças matriculadas em escolas públicas
4.914 Crianças (sendo 2.578 no Rio Grande do Sul (RS), e 2.336 em Santa Catarina (SC).
Crianças com idade entre quatro e seis anos, matriculados no ano de 2007.
As variáveis que apresentaram associação com o excesso de peso foram: número de moradores no domicílio; escolaridade materna; situação conjugal; número de filhos; idade materna ao nascimento do primeiro filho; idade gestacional; e o peso ao nascer
DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Os estudos analisados chegaram à conclusão que o enfermeiro é fundamental para a avaliação antropométrica no diagnóstico nutricional infantil para a identificação acurada das anormalidades e definição de estratégias de atuação eficazes (MARCHI-ALVES et al, 2011). Os estudos revisados destacam que cabe ao enfermeiro envolver a população em todas as ações de promoção e recuperação da saúde, através de medidas como a orientação de 10
uma alimentação saudável (MARCHI-ALVES et al, 2011; PAZIN et al, 2012; COSTA et al, 2009), prevenção de ganho de peso (MARCHI-ALVES et al, 2011; FILGUEIRAS et al, 2012), monitorização de dados antropométricos durante as consultas de enfermagem, avaliação e encaminhamento dos casos de risco (MARCHI-ALVES et al, 2011; FILGUEIRAS et al, 2012, PAZIN et al, 2012 ), e o enfermeiro participar
e coordenar
atividades de educação permanente no âmbito da saúde e nutrição (MARCHI-ALVES et al, 2011; JESUS et al, 2010; MACEDO et al, 2012). Vários estudos referem que a avaliação e o diagnóstico nutricional de uma população é uma estratégia fundamental para o estudo das condições de saúde, especialmente em préescolares e escolares, pois estes dados podem nos ajudar a modificar o estado de saúde das mesmas (MARCHI-ALVES et al, 2011; FILGUEIRAS et al, 2012, PAZIN et al, 2012;) Os estudos revisados sugerem também referem que além de uma alimentação saudável, a prática de exercício físico, principalmente na escola (COSTA et al, 2009, FILGUEIRAS et al, 2012;), a confeção de maior número de refeições de forma saudável, a ingestão de bebidas saudáveis, o hábito de ingestão de sopa, o consumo de fruta á sobremesa, a realização de quatro a seis refeições por dia e o equilíbrio de refeições de carne e peixe (COSTA et al, 2009,) contribuem para a prevenção da obesidade infantil. Vários fatores de risco foram identificados pelos autores como predisponentes para a obesidade infantil: as crianças alimentar-se a ver televisão, várias horas do dia em frente à televisão (FILGUEIRAS et al, 2012; COSTA et al, 2009), uso de jogos virtuais (FILGUEIRAS et al, 2012) alimentação desequilibrada (COSTA et al, 2009), falta de atividade física (FILGUEIRAS et al, 2012; COSTA et al, 2009) número de moradores no domicílio; escolaridade materna; situação conjugal; número de filhos; idade materna ao nascimento do primeiro filho; idade gestacional; e o peso ao nascer (SCHUCH et al, 2013). CONCLUSÃO: Os estudos abordados concluíram que a estratégia mais eficaz é a melhoria dos hábitos alimentares na infância desde o nascimento, o aumento dos níveis de atividade física e a diminuição das atividades de lazer sedentárias. Investigadores referem que se deve estudar mais acerca de programas de educação que possam ser aplicados ou que estejam a ser implementados ao nível dos cuidados de saúde primários e nas escolas.
11
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA: APARÍCIO, Graça et al (2011).- Obesidade infantil: contextualização no mundo e em Portugal, in: PIMENTEL Adelma; FRANCO, Vítor (Coordenadores), Diálogos 160 dentro da Psicologia, contributos da investigação luso-brasileira em psicologia social, clínica e educacional, Edições aloendro (Portugal) (1ª edição) universidade de Évora, COLE TJ, Bellizzi MC, Flegal KM, Dietz WH (2000) - Establishing a standard definition for child overweight and obesity worldwide: international survey. BMJ; 320:1-6. Disponível in: http://www.bmj.com/content/320/7244/1240.pdf%2Bhtml COSTA,
Ana;
SILVA,
Cláudia
(2009)
–
Obesidade
infantil,
conhecimentos
e
comportamentos dos pais de crianças entre os 6-10 anos. Revista da faculdade de ciências de saúde, Porto: edições Universidade Fernando Pessoa. ISSN 1645-0480.6, 208-217. Direção Geral da Saúde, (2005). Divisão de Doenças Genéticas Crónicas e Geriátricas. Programa Nacional de Combate à Obesidade. Lisboa. FILGUEIRAS, Marcelo et al (2012) - Prevalência de obesidade em crianças de escolas públicas, Revista Ciência & Saúde, Porto Alegre, v. 5, n. 1, p. 41-47. JESUS, Gilmar M. de et al (2010) - Fatores determinantes do sobrepeso em crianças menores de 4 anos de idade, Jornal de Pediatria, Rio Janeiro. 86(4):311-316. KUCZMARSKI RJ, Ogden CL, Guo SS, et al. (2000) - CDC growth charts for the United States: Methods and development. National Center for Health Statistics. Vital Health Stat 2002; 11(246). MACEDO, Lúcia; FESTAS, Constança; VIEIRA, Margarida (2012) - Perceções parentais sobre estado nutricional, imagem corporal e saúde em crianças com idade escolar, Revista de Enfermagem Referência, III Série - n° 6, Março. MARCHI-ALVES LM, et al (2011).-Obesidade infantil ontem e hoje: importância da avaliação antropométrica pelo enfermeiro, Revista Escola Anna Nery (impr.), Abril - Junho; 15 (2):238-244. OLIVEIRA, A., ALBUQUERQUE, C., CARVALHO, G., SENDIN, P., SILVA, M. (2009) Determinantes da Obesidade na Adolescência, Atas do V Seminário Internacional/ II Iberoamericano de Educação Física, Lazer e Saúde, 13-16. PAZIN, Jéssica Raguza; DONADON, Vanessa Saito; ABREU, Edeli Simioni de; SIMONY, Rosana Farah (2012) - Prevalência de sobrepeso e obesidade em pré-escolares e escolares de escolas particulares, Revista Ciência & Saúde, Porto Alegre, v. 5, n. 2, p. 8791. 12
PORTUGAL, Direção geral de saúde (2013) - Programa Nacional de Saúde Infantil e Juvenil (PNSIJ), Norma nº 010/2013 de 31/05/2013, junho. ROCHA, Andreia; CASTRO, Conceição; SANTIAGO, Luiz Miguel (2007) - Obesidade Infantil: que consequências? Revista Referência, II.ª Série, n.°5, Dezembro. SCHUCH, Ilaine; et al (2013) - Excesso de peso em crianças de pré-escolas: prevalência e fatores associados, Jornal de Pediatria (Rio J).;89(2):179−188. SOUSA, J.; LOUREIRO I.; do CARMO, I (20089.- A Obesidade Infantil: um problema emergente, Artigo de Revisão. Saúde & Tecnologia, , 5-15. ISSN: 1646-9704. TELES, A. Galvão (Coordenador do Projeto) (2009) - Estudo de Prevalência da Obesidade Infantil e dos Adolescentes em Portugal Continental, no contexto da plataforma contra a obesidade. TROIANO, R.P.; FLEGAL, K.M. (1998) – Overweight children and adolescents: description, epidemiology and demographics. Pediatrics. 101 497-504. World Health Organization. (2006) - WHO Child Growth Standards: Length/height-for-age, weight-for-age, weight-for-length, weight-for-height and body mass index-for-age: Methods and development. Geneva.
13
2.
COMO SE RELACIONAM OS JOVENS COM O SEU CORPO? Maria Isabel Barreiro Ribeiro 1 & António José Gonçalves Fernandes 2
1) Professora Adjunta do Instituto Politécnico de Bragança, Investigadora do Centro de Estudos Transdisciplinares para o Desenvolvimento, Colaboradora da Unidade de Investigação para o Desenvolvimento do Interior, xilote@ipb.pt) 2) Professor Adjunto do Instituto Politécnico de Bragança, Investigador do Centro de Estudos Transdisciplinares para o Desenvolvimento, toze@ipb.pt)
RESUMO: Estudar a perceção que os jovens têm do seu corpo e verificar se existem diferenças de perceção segundo o género são os objetivos deste estudo. Para o efeito, foi conduzido um estudo quantitativo, transversal, analítico e observacional. A recolha de dados foi feita com recurso a um questionário autoadministrado a 1169 estudantes do ensino superior público. Participaram nesta investigação jovens com idades compreendidas entre os 17 e os 29 anos, sendo a maioria do sexo feminino (64,5%). O tratamento dos dados envolveu o uso de estatística descritiva e do teste do Qui-quadrado. A esmagadora maioria dos jovens considera ter a altura (69,1%) e o peso (55,2%) ideais. No entanto, uma parte significativa não gosta do seu corpo (39%). Quanto se tem em conta o género, verifica-se que são as mulheres que gostariam de ser mais leves (p-value=0,000) e mais altas (p-value=0,000) e os homens os que se sentem mais favorecidos com o seu corpo (p-value=0,000). Por outro lado, os resultados mostraram que, 36,3% dos jovens têm uma imagem positiva do seu corpo, 12,4% consideram ser demasiado magros e 51,2% consideram ter excesso de peso ou obesidade. A imagem negativa em relação ao corpo relaciona-se, nos homens, com o facto de estes considerarem ter pouca massa muscular e nas mulheres com o excesso de peso ou obesidade (p-value=0,000). A maioria dos jovens estudados estão insatisfeitos com o seu corpo, a adoção de hábitos e comportamentos saudáveis, nomeadamente, uma alimentação cuidada e a prática de exercício físico regular, pode melhorar esta relação. Palavras-Chave:Jovens, Corpo, Imagem corporal, Ensino superior.
14
INTRODUÇÃO A imagem corporal tem sido conceitualizada como um constructo multidimensional composto de representações sobre o tamanho e aparência do corpo, além de respostas emocionais associadas ao grau de satisfação suscitado por essas perceções (Ferreira, 2002). Neste sentido, as perceções subjetivas existentes entre o corpo real, percebido e desejado estão intrinsecamente ligadas a processos fisiológicos, psicológicos e sociais (Barros, 2005). As exigências da vida atual contribuem para a diminuição dos níveis de atividade física (Matsudo, Matsudo, Araújo, Andrade, Andrade, Oliveira & Braggion, 2002) e para o aumento do consumo de alimentos hipercalóricos e industrializados (Andrade, 2003). Esta realidade traduz-se na busca constante pelo corpo perfeito, jovem, esquelético ou musculoso, divulgado constantemente pelos media e apresentado em revistas, cinema e centros comerciais, influenciando a crescente insatisfação das pessoas com a própria aparência (Bosi, Raggio, Morgado, Costa & Carvalho, 2006). Na gravidez, as mulheres também são afetadas na sua autoimagem e na sua autoestima, em decorrência das mudanças corporais que se refletem no pós-parto. Sendo o ganho de peso corporal o principal fator causador da deformação da imagem da mulher. Contudo, apesar de ser um único corpo, as mulheres demonstram uma divisão entre o corpo enquanto mãe (durante a gravidez) que pode ser gordo, sendo aceito naturalmente pela sociedade, e a idealização de um corpo de mulher depois do nascimento, devendo ser magro, compatível com os padrões estéticos atuais (Araújo, Salim, Gualda, & Silva, 2013). Conhecer como é percebida a relação dos jovens com o seu corpo e verificar se existem diferenças de perceção segundo o género são os objetivos deste estudo.
METODOLOGIA Nesta secção descreve-se a metodologia usada no estudo, nomeadamente, no que concerne a participantes, instrumentos e procedimentos. Participantes Participaram nesta investigação, de natureza quantitativa e transversal, 1169 jovens de um total de 5200 alunos. Foi recolhida, uma amostra probabilística aleatória estratificada por unidade científica do curso académico frequentado pelos jovens. Os jovens tinham idades compreendidas entre os 17 e os 29 anos, sendo a maioria do sexo feminino (64,5%). 15
Relativamente ao IMC a prevalência de excesso de peso e obesidade foi de 14,9% e 2,9%, respetivamente (tabela 1).
Tabela 1 - Frequências (Género, IMC, Área científica do curso e Ano académico) e medidas de tendência central e de dispersão (idade) Variáveis
Grupos
Frequências (n=1169)
Género
Masculino Feminino
% 64,5 35,5
n 754 415
5,2 77 14,9 2,9 21,6 21,5 20,4 22,1 14,5 34,6 36 27,5 1,9
61 900 174 34 252 251 238 258 170 405 421 321 22
IMC
Baixo peso Normal peso Excesso peso Obesidade Área científica do curso Tecnologias e Turismo Educação Agricultura Saúde Tecnologias Ano académico 1º ano 2º ano 3º ano 4º ano Medidas de tendência central e de dispersão relativas à idade
Média = 20,9 DP ± 2,1 Moda= 20 Mediana = 21 Mínimo = 17 Máximo = 29
Os jovens frequentavam um curso superior do 1º ciclo e estavam distribuídos por área científica da forma que se segue: 22,1% Saúde, 21,6% Tecnologias e Turismo, 21,5% Educação, 20,4% Agricultura e 14,5% Tecnologias.
Instrumentos Na recolha de dados foi utilizado um questionário que foi autoadministrado a jovens estudantes que frequentavam um curso superior numa instituição pública localizada no Nordeste Transmontano. Na recolha de dados, efetuada em contexto de sala de aula, entre os meses de maio e junho de 2011, foi utilizado como instrumento um questionário que continha questões fechadas sobre as características de natureza pessoal (género, idade), antropométrica (peso e altura reais), académica (área do curso e ano frequentado). Para avaliar a perceção da imagem corporal atual e ideal foi utilizada a Escala de Silhuetas proposta por Stunkard, Sorenson & Schlusinger (1983) a qual representa um continuum desde a magreza (silhueta 1) até à obesidade severa (silhueta 7). Nesta escala, cada respondente escolheu o número da silhueta que considerava mais semelhante à sua imagem atual e a que percecionava como ideal. Deste modo a insatisfação com a imagem
16
corporal foi determinada pela diferença entre a auto perceção da imagem ideal e da imagem atual. Para classificar o estado nutricional foram utilizados os valores do Índice de Massa Corporal classificado de acordo com critério da Organização Mundial de Saúde (1998).
Procedimentos Os dados foram editados e tratados com recurso ao software estatístico SPSS (Statistical Package for Social Sciences) versão 21.0. O tratamento de dados envolveu o cálculo de frequências absolutas e relativas; medidas tendência central (média, moda e mediana) e medidas de dispersão (mínimo, máximo e desvio padrão). Para estudar a relação entre duas variáveis nominais foi utilizado o teste do Qui-Quadrado (Maroco, 2003).O nível de significância utilizado no teste foi de 5%.
ANÁLISE DOS RESULTADOS Como pode ver-se na figura 1, a esmagadora maioria dos jovens considera ter a altura ideal (69,1%), registando-se uma satisfação ligeiramente superior no género masculino (77,3%) comparativamente ao género feminino (66,8%).
Sinto-‐me baixo
23,4% 16,9% 27,0%
Total Masculino Feminino 69,1% 73,3% 66,8%
Tenho a altura ideal
Sinto-‐me alto
7,5% 9,9% 6,2%
Figura 1- Perceção dos jovens em relação à sua altura
17
Tendo em conta o peso real, a maioria considera ter o peso ideal (55,2%). São as mulheres que em maior proporção consideram ter mais peso do que o deveriam ou gostariam de ter (40,7%) (figura 2). Total Sinto-‐me magra
10,1% 13,1% 8,4%
Masculino Feminino
55,2% 63,2% 50,9%
Tenho o peso ideal
34,7% Sinto-‐me gordo
23,7% 40,7%
Figura 2- Perceção dos jovens em relação ao seu peso No que diz respeito ao corpo, uma parte significativa não gosta do seu corpo (39%). Destes, 41% não gosta mas tolera e 7,3% gostaria mesmo de ter um corpo diferente (figura 3).
Sinto-‐me favorecido
Total Masculino Feminino
3,4% 4,3% 2,9%
41,1%
Sa_sfeito
36,5% 16,5%
Indiferente
12,5%
Não gosto mas tolero
Não gosto nada, desejaria que fosse diferente
49,9%
23,9%
19,5%
33,4% 41,0%
5,6% 2,4% 7,3%
Figura 3 - Perceção dos jovens em relação ao seu corpo Comparando a proporção de inquiridos do género masculino com a proporção de inquiridos do género feminino quanto à sua relação com o peso, altura e corpo, os resultados mostram 18
que são as mulheres que gostariam de ser mais leves (p-value=0,000) e mais altas (pvalue=0,000) enquanto que os homens são os que se sentem mais favorecidos com o seu corpo (p-value=0,000). Por fim, os resultados mostraram que, 36,3% dos jovens têm uma imagem positiva do seu corpo, 12,4% consideram ser demasiado magros e 51,2% consideram ter excesso de peso ou obesidade (figura 4). A imagem negativa em relação ao corpo relaciona-se, nos homens, com o facto de estes considerarem ter pouca massa muscular e nas mulheres com o excesso de peso ou obesidade (p-value=0,000). Total Insa_sfeito por considerar ter peso a menos
Masculino
12,4%
Feminino
19,5% 8,5%
36,3% Sa_sfeito
42,4% 32,9%
Insa_sfeito por considerar ter excesso peso
55,2% 38,4% 58,5%
Figura 4 -Grau de (in)satisfação dos jovens com a sua imagem corporal
DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Nesta investigação observou-se que a maioria dos jovens considera ter a altura (69,1%) e o peso (55,2%) ideais e uma parte significativa não gosta do seu corpo (39%). Por outro lado, 36,3% dos jovens têm uma imagem positiva do seu corpo, 12,4% consideram ser demasiado magros e 51,2% consideram ter excesso de peso ou obesidade. Também se verificou, na presente investigação, que a relação com o corpo e com a imagem corporal estava associada ao género, normalmente, são os indivíduos do género masculino que, em maior proporção, mantêm uma relação positiva com o seu corpo e com a sua imagem corporal. De acordo com Bittencourt, Aerts, Denise, Alves, Palazzo, Monteiro, Vieira & Freddo (2009), os jovens, especialmente, os do sexo feminino, apresentam, em maior proporção insatisfação com a sua imagem corporal. O anseio de perder peso e de alterar a 19
sua imagem corporal faz com que muitos dos jovens insatisfeitos adotem comportamentos de risco, nomeadamente, hábitos alimentares anormais, automedicação e outras práticas inadequadas. Segundo Rodrigues (2013), os distúrbios alimentares apresentam-se como um dos fatores de risco para o desenvolvimento e manutenção de perturbações alimentares. A prática de exercício físico regular está associado à imagem corporal. Na opinião de Gonçalves, Campana & Tavares (2012), deverão ser desenvolvidas intervenções que poderão ser projetadas de maneira mais eficaz e cuidadosa para que o exercício ajude a conseguir e a manter uma relação mais satisfatória dos jovens com o seu corpo. A escala de silhuetas constitui um instrumento bastante eficaz para avaliar o grau de insatisfação com o peso e as dimensões corporais na avaliação da componente perceptiva da imagem corporal (Gardner, Friedman & Jackson, 1998; Gardner, Stark, Jackson & Friedman, 1999). Durante a gravidez a prática de atividade física regular ou de modalidades de exercício de baixo rendimento, nomeadamente, a natação, hidroginástica, caminhada e bicicleta ergométrica aumentam o conforto e o bem-estar da gestante e do bebé em formação (Ninfa, Moreira, Oliveira & Teodoro (2013) uma vez que a prática de atividade física e de modalidades desportivas apresentam um efeito protetor sobre a saúde mental e emocional da mulher durante e depois da gravidez (Lima & Oliveira, 2005). Para além disso, a atividade física pode ajudar na formação de uma imagem corporal, com objetivo de melhorar a autoestima e na qualidade de vida (Oliveira, Lopes, Longo & Pereira & Zubab, 2007). E, porque as mudanças durante a gravidez não são somente corporais, são também sociais e psicológicas, compreender as experiências das mulheres torna-se de extrema importância para o desenvolvimento de ações em saúde e ensino da enfermagem e obstetrícia (Araújo, Salim, Gualda, & Silva, 2013.
CONCLUSÕES A satisfação e insatisfação com a imagem corporal estão associadas ao género. A imagem negativa em relação ao corpo relaciona-se nos homens com o facto de estes considerarem ter pouca massa muscular e nas mulheres com o excesso de peso ou obesidade. Uma parte significativa dos jovens estudados estão insatisfeitos com o seu corpo, a adoção de hábitos e comportamentos saudáveis, nomeadamente, uma alimentação cuidada e a prática de exercício físico regular, pode melhorar esta relação.
20
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Andrade A. & Bosi M. (2003). Mídia e subjetividade: impacto no comportamento alimentar feminino. Revista de Nutrição. 16 (1), 117-125. Araújo, N., Salim, N., Gualda, D. & Silva, L. (2013). Corpo e sexualidade na gravidez. Revista da Escola de Enfermagem da USP. 46 (3), 552-558. Barros, D. (2005). Imagem corporal: a descoberta de si mesmo. História, Ciências, Saúde. 12: (2), 547-54. Bittencourt, A.; Aerts, Denise R.; Alves, G.; Palazzo, L.; Monteiro, L.;, Vieira, P.; & Freddo, S. (2009). Sentimento de discriminação em estudantes: prevalência e fatores associados. Revista de Saúde Pública, 43(2): 236-245. Bosi, M., Raggio, R., Morgado, C.,Costa, M.& Carvalho, R. (2006). Autopercepção da imagem corporal entre estudantes de nutrição: um estudo no município do Rio de Janeiro. Jornal Brasileiro de Psiquiatria. 55 (2), 108-113. Ferreira, M. & Leite, N.(2002). Adaptação e validação de um instrumento de avaliação da satisfação com a imagem corporal. Avaliação psicológica. 1 (2), 141-149. Gardner, R. M., Friedman, B. N., & Jackson, N. T. (1998). Methodological concerns whenusing silhouettes to measure body image. Perceptual and Motor skills, 86, 387−395. Gardner, R. M., Friedman, B. N., Stark, K., & Jackson, N. A. (1999). Body-size estimations in children six through fourteen: a longitudinal study. Perceptual and Motor Skills, 88(2), 541−555. Gonçalves, C.; Campana, A. & Tavares., M.(2012). Influência da atividade física na imagem corporal: Uma revisão bibliográfica. Motricidade, 8 (2): 70-82. Lima, F. & Oliveira, N. (2005). Gravidez e Exercício. Revista Brasileira de Reumatologia. 45 (3), 188-90. Maroco, J. (2003). Análise Estatística com utilização do SPSS. Lisboa: Edições Sílabo. Matsudo, S., Matsudo, V., Araújo, T., Andrade, D., Andrade, E., Oliveira, L.&Braggion, G. (2002). Nível de actividade física da população do Estado de São Paulo: análise de acordo com o género, idade, nível socioeconómico, distribuição geográfica ca e de conhecimento. Revista Brasileira Ciência e Movimento Humano. 10 (4), 41-50. 21
Ninfa, N., Moreira, O., Oliveira, C. & Teodoro, B. (2013). A importância dos exercícios físicos para gestantes. Revista eletrónica das faculdades Sudamérica. Acedido dezembro 9, 2013, em http://www.sudamerica.edu.br/revista/?p=67 Oliveira, C., Lopes, M., Longo, E., Pereira, L. &Zubab, M. (2007). Efeitos da cinesioterapia no assoalho pélvico durante a gravidez. Clinics. 62 (4), 439-46. Rodrigues, A. (2013). “Um eu que não quero!” Imagem corporal, bulimia nervosa e ACT: uma abordagem funcional. Psicologia. Portal dos psicólogos. ISSN: 1546-6977.
Stunkard A., Sorenson, T., Schlusinger, F. (1983).Use of the Danish Adoption register for the study of obesity and thinness. In: S. Kety, L. Rowland, R.Sidman&S. Mathysse(Eds.).The genetics of neurologic and psychiatric disorders. (115-120). New York
22
3
INFERTILIDADE: UMA REALIDADE PRESENTE Adriana Jorge da Silva Pereira Vaz Machado1 & Ângela Marisa Vaz Meira 2 (1) Enfermeira a exercer funções no Centro Hospitalar do Baixo Vouga; Pós-Graduada em
Saúde
Familiar,
Mestranda
em
Enfermagem
Comunitária
aadri.machado@gmail.com (2) Enfermeira a exercer funções no Centro de Saúde de Lousada – ACES Tâmega III – Vale do Sousa Norte, Pós-Graduada em Saúde Familiar, Mestranda em Enfermagem Comunitária (dinah_meira@hotmail.com) RESUMO: Desde criança, a mulher é estimulada a no futuro exercer o papel de mãe. Ser mãe é para muitas mulheres um sonho e um desejo que é encarado com naturalidade, como algo que faz parte da vida. No entanto, quando o casal se depara com a infertilidade, tem que ser preparado para um período muito difícil, causador de stress e sofrimento para ambos enquanto seres individuais e casal (Marçal, 2009). Em Portugal, a informação sobre a prevalência de infertilidade é escassa, e segundo Brandão & Ramos (2011) é difícil determinar a incidência da infertilidade. Em todo o caso, surge a unanimidade que, a nível mundial, 10 a 15% dos casais em idade fértil são afetados pelo problema da infertilidade, ou seja, cerca de 1 em 10 casais tem dificuldade em conseguir ter um filho. Neste contexto, é determinante que os enfermeiros estejam preparados para atuar nestas situações e prestar o devido apoio aos casais que vivenciam a infertilidade. Palavras-chave: Infertilidade; casal; enfermeiro. Abstract: Since childhood, women are encouraged to one day become a mother. Being a mother is a dream for many women and a desire that is naturally seen as something that is part of life. However, when infertility is faced, the couple need to be prepared to a very difficult stressful and suffering period for both, as an individual and as a couple (Marcal, 2009). In Portugal, the information on the prevalence of infertility is scarce, and according to Brandão & Ramos (2011) is difficult to determine the incidence of infertility. In any case, it is unanimous that worldwide, 10 to 15% of couples of reproductive age are affected by infertility problems, which means that, about 1 in 10 couples have difficulty in getting a child. So, it is crucial that nurses are prepared to act and to provide appropriate support to couples experiencing infertility. Keywords: Infertility; couple; nurse. 23
INTRODUÇÃO: A infertilidade é um acontecimento não normativo na vida dos indivíduos e das famílias. Para além de inesperado, constitui um obstáculo à prossecução de um objetivo de vida fundamental para muitos casais: a parentalidade. É um acontecimento de vida perturbador, com implicações nocivas na vida destes casais/indivíduos a vários níveis, nomeadamente ao nível pessoal, relacional e social. Trata-se de uma condição clinica que merece toda a atenção por parte dos enfermeiros (Brandão & Ramos, 2011) A infertilidade Desde sempre que a maternidade ocupou um papel central, pois ao longo da história da humanidade e em todas as civilizações, são encontradas inúmeras referências à fecundidade/infecundidade e aos rituais mágico-religiosos de procriação, que visavam favorecer a fecundidade. Na maioria das sociedades, a mulher infértil era vista como estando amaldiçoada pelos deuses, sendo muitas vezes maltratada e punida, isto porque a infertilidade era apenas atribuída à mulher (Delgado, 2007). Durante séculos considerou-se a infertilidade exclusivamente feminina, sendo que apenas nos últimos cinquenta anos surgiu a perceção do envolvimento masculino na infertilidade (Speroff, Glass e Kase, 1999). Atualmente, o termo infértil é aplicado caracteristicamente ao casal e não a um único indivíduo. A World Health Organization (2002) tem considerado a infertilidade como um problema de saúde pública e um casal é considerado infértil quando não ocorre uma gravidez, após um ano de relações sexuais regulares não protegidas. Segundo a American Society for Reprodutive Medicine (2006) infertilidade é sinónimo de falha conceptiva, devendo apenas proceder-se à sua investigação quando a mesma se arrasta há doze meses ou mais, a não ser que exista historia clinica ou aspetos físicos que ditem a sua avaliação ou tratamento mais precoce. É de fato, considerada uma doença, uma vez que existe um desvio na função estrutural normal de qualquer parte, órgão ou sistema do corpo, que se manifesta através de um característico conjunto de sintomas ou sinais, cuja etiologia, patologia ou prognóstico podem ser ou não conhecidos. Relativamente a cada casal, diz-se que a infertilidade é primária quando não houve conceção anterior, isto é, incapacidade de conceber uma criança ou a impossibilidade de conduzir uma gravidez até ao fim. A infertilidade secundária é considerada nos casos em
24
que houve a conceção prévia de uma criança, e define-se como a incapacidade de conceber uma criança depois de já se ter concebido uma (Dorland, 2000). Independentemente da causa, a infertilidade é sempre motivo de grande sofrimento, razão pela qual os indivíduos inférteis são colocados num panorama de grande fragilidade (Faria, 2001). Daniluk & Tench (2007) defendem que a infertilidade pode resultar em tristeza, depressão, isolamento, baixa autoestima de relacionamento, angústia e insatisfação sexual. Segundo a DGS (2008) as causas de infertilidade são múltiplas e podem, ou não, estar associadas a anomalias do sistema reprodutor masculino ou feminino. A investigação deve incluir simultaneamente os dois elementos do casal, uma vez que em 30% dos casos, ambos contribuem para o problema. A DGS (2008, p. 7) refere que as percentagens relativas dos fatores de infertilidade presentes não são universais, mas globalmente, é possível identificar um fator masculino em 30%-40% dos casos. Na mulher, a patologia ginecológica está presente em 30%-40% das situações (endometriose 5%, doença tubária 15%, entre outras) e a disovulação em 14%-15%, podendo, segundo outros autores, ultrapassar os 20%. Em aproximadamente 10% dos casais não é possível estabelecer uma causa. Refere ainda que a fertilidade é influenciada por fatores como: •
idade da mulher, de forma mais significativa acima dos 35 anos
•
tipo e frequência das relações sexuais
•
consumo de tabaco, de álcool ou drogas ilícita
•
medicamentos utilizados
•
hábitos alimentares e estilos de vida
•
determinados tipos de trabalho e/ou lazer
•
alterações significativas do peso (IMC <19 e >29)
Como já foi referido as implicações da infertilidade manifestam-se a um nível multidimensional: físico, psicológico, emocional, conjugal e social, conduzindo ao stress e, consequentemente à utilização de estratégias de coping, por parte dos indivíduos inférteis. Segundo Reed (2001) para alguns casais, a infertilidade torna-se na maior obsessão das suas vidas. No que diz respeito aos cuidados de saúde relativamente à infertilidade, estes atuam não só a nível de tratamentos mas a um nível de prevenção, relativo às causas conhecidas e 25
evitáveis da infertilidade, através de programas de educação em saúde e para uma sexualidade responsável, a implementação de serviços de aconselhamento e a investigação relativa a outras causas não conhecidas. (Delgado, 2007) O mesmo autor refere que estes casais são também sujeitos a opções sociais como a adoção ou mesmo o assumir uma vida sem filhos, que constituem uma alternativa ou a única possibilidade para superar a ausência de filhos, e que devem ser apresentadas aos casais através de serviços de aconselhamento, de modo que estes se tornem conhecedores e conscientes de todas possibilidades. Surgem também as opções médicas, que incluem os tratamentos dos problemas médicos diagnosticados como causadores de infertilidade e as técnicas de procriação medicamente assistida. É fundamental que os profissionais de saúde procurem um entendimento aprofundado das implicações e da importância da sua intervenção para o bem-estar dos indivíduos inférteis. Sabe-se que uma intervenção adequada por parte dos profissionais de saúde facilita a vivência desta situação pelo casal, sendo crucial uma relação entre o profissional e o casal com base na comunicação e confiança. Assim, segundo a DGS (2008), o profissional de saúde devem preparar para uma maternidade e paternidade responsáveis, identificar, apoiar e orientar os casais com dificuldade em obter uma gravidez e contribuir para o bem-estar do casal e para a sua realização parental e familiar. Assim, é fundamental (DGS, 2008, p.8) prestar cuidados antecipatórios e preventivos, nomeadamente: •
Prevenção, diagnóstico e tratamento das infeções de transmissão sexual;
•
Rastreio do cancro do colo do útero quando não realizado em programas específicos;
•
Identificação dos fatores existentes que possam concorrer negativamente para obter uma gravidez;
•
Identificação e referência das situações de risco reprodutivo (genético, doença crónica, por exemplo)
•
Apoiar e orientar os casais com infertilidade primária ou secundária;
•
Reavaliar a situação clínica confirmando a não existência de fator contributivo;
•
Efetuar o estudo complementar básico adequado à abordagem do casal infértil;
26
•
Facultar informação completa, isenta e científica sobre as etapas a percorrer para a resolução das situações de infertilidade;
•
Referenciar as situações que necessitam de estudos ou tratamentos diferenciados.
CONCLUSÃO A incapacidade em procriar é, para muitos casais, dramática. A frustração de expectativas pessoais, sociais e mesmo religiosas pode ser geradora de fortes sentimentos de perda, falha e exclusão. Assim, as situações de infertilidade estão frequentemente associadas a alterações emocionais, como ansiedade, depressão, raiva, discórdia e desvalorização pessoal, que por sua vez podem potenciar fatores de subfertilidade pré-existentes (DGS, 2008). Cabe aos profissionais de saúde a responsabilidade de prestar cuidados antecipatórios e preventivos e apoiar e orientar os casais com infertilidade.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS •
American Society for Reprodutive medicine (2006). Aging and infertility in women. Fertility and Sterility.
•
Brandão, M. & Ramos, M. (2011). Adaptação psicossocial de casais portugueses à infertilidade e à reprodução medicamente assistida. Tese de Doutoramento concedida pela Fundação para a Ciência e Tecnologia do Ministério da Ciência e do Ensino Superior.
•
Daniluk, J. C., & Tench, E. (2007). Long-Term Adjustment of Infertile Couples Following
Unsuccessful
Medical
Intervention.
Journal
of
Counseling
&
Development,85, 89-100. •
Delgado, M. (2007). O desejo de ter um filho…As vivências do casal infértil. Dissertação de mestrado em comunicação em Saúde apresentada á Universidade Aberta de Lisboa.
•
DGS (2008). Programa Nacional de Saúde Reprodutiva: Direcção Geral de Saúde: Saúde Reprodutiva Infertilidade.
•
Dorland, W. A. N. (2000). Dorland’s Illustrated Medical Dictionary (29th Edition). Philadelphia: W. B. Saunders Company.
•
Faria, C. (2001). Aspectos Psicológicos da Infertilidade. In M. C. Canavarro (Ed.) Psicologia da Gravidez e da Maternidade (pp. 189-209). Coimbra: Quarteto.
•
Marçal, T. (2009). Temas sobre infertilidade feminina em revistas direcionadas ao público feminino. Trabalho de conclusão de curso de curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Rio Sul. 27
•
Reed, S. A. (2001). Medical and psychological aspects of infertility and assisted reproductive technology for the primary care provider. Military Medicine. (Vol. 166, November, pp. 1018-1022).
•
Speroff, L.; Glass. R.; Kase, N. (1999). Clinical Gyneacologic Endocrinology and Infertility. Portland: Book News, Inc.
•
World Health Organization (2002). Current Practices and Controversies in Assisted Reproduction. Geneva: WHO.
28
4
ATITUDES E COMPORTAMENTOS DOS JOVENS RELATIVAMENTE AO DESTINO A DAR AOS RESÍDUOS DE MEDICAMENTOS Maria Isabel Barreiro Ribeiro1 & António José Gonçalves Fernandes2
1) Professora Adjunta do Instituto Politécnico de Bragança, Investigadora do Centro de Estudos Transdisciplinares para o Desenvolvimento, Colaboradora da Unidade de Investigação para o Desenvolvimento do Interior, xilote@ipb.pt 2) Professor Adjunto do Instituto Politécnico de Bragança, Investigador do Centro de Estudos Transdisciplinares para o Desenvolvimento, toze@ipb.pt)
RESUMO: Conhecer as atitudes e os comportamentos adotados pelos jovens relativamente aos medicamentos fora da validade é o objetivo deste estudo. Os dados foram recolhidos com recurso a um questionário autoadministrado a jovens estudantes que frequentavam uma instituição pública do Interior Norte de Portugal. Nesta investigação, de natureza quantitativa, observacional, transversal e descritiva, participaram 372 estudantes, sendo a maioria do sexo feminino (63,2%). Os estudantes tinham idades entre os 17 e os 37 anos e frequentavam um curso do 1º ciclo. A esmagadora maioria dos estudantes tem o hábito de manter medicamentos em casa (92,7%) e considera que os fármacos têm efeitos nocivos para o ambiente e para o ser humano quando não são depositados no local e da forma adequados (84%). Quanto ao destino a dar aos medicamentos fora de validade, 47% entregam-nos na farmácia, 36,8% depositam-nos no lixo normal, 14,6% mantêm-nos guardados, no mesmo local onde estão armazenados os restantes medicamentos, enquanto 1,6% dos estudantes opta por outros destinos, nomeadamente, a sua reutilização (consumo animal e humano) ou entrega em outros locais que não a Farmácia (ex: Centros de Saúde e Hospitais). A maioria considera que o destino que dá aos resíduos dos medicamentos não é o correto (42,3%) ou não sabe se é o mais adequado (9,7%). Apesar de 82,8% dos estudantes terem o hábito de ler o folheto informativo dos medicamentos, apenas 34,1% garante ter recebido informação através deste, sobre o destino adequado a dar aos medicamentos após o término do seu prazo de validade. Palavras-Chave: Medicamentos. Resíduos, Ensino superior, Jovens, Atitude.
29
INTRODUÇÃO Os medicamentos são, na nossa sociedade, um produto de consumo em grande escala, acessível a todos os extractos sociais e utilizados por qualquer classe etária (Proença, 2011). Medicamentos para as dores, febres, gripes, entre outros, encontram-se presentes na maioria das residências. Os medicamentos, como a generalidade dos produtos, possuem uma vida útil, prazo que é determinado pelos seus fabricantes. Durante este prazo, impresso na embalagem do medicamento, o fabricante assegura a sua qualidade e, se utilizado de forma correta, garante o efeito desejado. Os medicamentos pela ação do tempo perdem a sua eficácia assinalando-se a decomposição do princípio ativo e excipientes, devem por isso, findo o prazo de validade, ser devidamente depositados, por forma a evitar os efeitos prejudiciais, quer para o ser humano, quer para o ambiente (Manfio, Maso, Pugens, Liberato & Steppe, 2007; Ferreira, Silva, Paula & Resende, 2005). Os medicamentos fora da validade são uma preocupação relevante para a saúde pública, pois são considerados resíduos tóxicos de acordo com sua composição. Dependendo do grau de toxidade, podem causar contaminação no meio ambiente. Por isso, não podem ter o mesmo destino dos resíduos comuns (Vaz, Freitas & Cirqueira, 2011). O Decreto-Lei n.º 366-A/97, de 20 de Dezembro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 162/2000, de 27 de Julho, e pelo Decreto-Lei n.º 92/2006, de 25 de Maio, define os princípios e as normas aplicáveis ao sistema de gestão de embalagens e resíduos de embalagens, a nível nacional e comunitário, no qual se incluem as embalagens e os resíduos de medicamentos. Por razões de saúde pública e devido à especificidade do medicamento foi criado, em Portugal, o Sistema Integrado de Gestão de Resíduos de Embalagens e Medicamentos (SIGREM) para a gestão deste tipo de resíduos (embalagens e medicamentos). A deposição e recolha dos resíduos de medicamentos e suas embalagens assentam fundamentalmente na participação dos consumidores. Estes são incentivados a entregarem nas farmácias os medicamentos fora de uso e/ou com prazo de validade expirado, sendo estas que assumem a responsabilidade pela recepção de resíduos nos próprios estabelecimentos bem como grande parte do esclarecimento do público (Proença, 2011). O objetivo deste trabalho de investigação consiste em conhecer as atitudes e os comportamentos adotados pelos jovens relativamente aos medicamentos fora da validade.
30
METODOLOGIA Nesta investigação, de natureza quantitativa, observacional, transversal e descritiva, participaram 372 estudantes de um total de 5200 estudantes inscritos e a frequentar o 1º ciclo numa instituição pública localizada no Nordeste Transmontano.
Participantes (população e amostra) Conforme pode ver-se na figura 1, a amostra era, maioritariamente, constituída por alunos do género feminino (63,2%). Os estudantes tinham idade compreendida entre os 17 e os 37 anos, embora a maioria tenha entre 17 a 20 anos de idade (figura 1). Escalões etários Não respondeu 1,9%
17 a 20 anos 51,1%
Género Masculino 36,8%
> 20 anos 47,0%
Feminino 63,2%
Figura 1 – Distribuição da amostra por género e por escalão de idade
31
Todos frequentavam um curso do 1º ciclo e estavam distribuídos por área científica da forma que se segue: 18,8% frequentavam um curso das ciências agrárias, 28,5% da área das ciências da educação, 35,8% da área das tecnologias e 16,9% da área da saúde (figura 2). Ciências agrárias 18,8%
Ciências da educação 28,5%
Ciências da saúde 16,8%
Ciências das Tecnologias 35,8%
Figura 2 – Distribuição da amostra por área científica
Instrumentos Os dados foram recolhidos com recurso a um questionário autoadministrado a jovens estudantes que frequentavam uma instituição pública do Interior Norte de Portugal. A aplicação do questionário foi efetuada em contexto de sala de aula, entre os meses de maio e junho de 2011. O questionário continha questões fechadas sobre as características de natureza pessoal (género, idade), académica (área do curso) e questões sobre o hábito de manter medicamentos em casa, o destino a dar aos medicamentos fora de validade, o hábito de ler os folhetos informativos e o conhecimento do impacto dos medicamentos no ambiente quando não lhes é dado o destino adequado.
Procedimentos Os dados foram editados e tratados com recurso ao software estatístico SPSS (Statistical Package for Social Sciences) versão 21.0. O tratamento de dados envolveu o cálculo de frequências absolutas e relativas uma vez que as variáveis analisadas eram de natureza qualitativa medidas numa escala nominal (Maroco, 2003).
32
ANÁLISE DOS RESULTADOS Como pode ver-se na figura 3, a esmagadora maioria dos estudantes tem o hábito de manter medicamentos em casa (92,7%); e, considera que os fármacos têm efeitos nocivos para o ambiente e para o ser humano, se não depositados no local e forma adequados (84,0%). Tem o hábito de manter medicamentos em casa?
Considera que os fármacos têm efeitos nocivos?
Não 7,3%
Sim 92,7%
Não 16%
Sim 84%
Figura 3 – Hábitos e opiniões dos alunos sobre fármacos
Conforme pode ver-se na figura 4, quanto ao destino a dar aos medicamentos, 47,0% entregam-nos na farmácia, 36,8% depositam-nos no lixo normal, 14,6% mantêm-nos guardados, no mesmo local onde estão armazenados os restantes medicamentos, optando, 1,6% dos estudantes por outros destinos, nomeadamente, a sua reutilização (consumo animal e humano) ou entrega em outros locais que não a Farmácia, designadamente, Centros de Saúde e Hospitais. A mesma figura mostra que a maioria dos alunos considera que o destino que dá aos resíduos dos medicamentos é o correto (48,0%), 42,3% considera que o destino não é adequado e 9,7% não sabe se é o mais adequado.
33
Que destino dá aos resíduos de medicamentos?
O destino é adequado?
Guardado com os outros 14,6%
Farmácia 47,0%
Lixo normal 36,8%
Outros des_no 1,6%
Não sabe 9,7%
Sim 48,0%
Não 42,3%
Figura 4 – Destino a dar aos medicamentos Apesar de 82,8% dos estudantes terem o hábito de ler o folheto informativo dos medicamentos, apenas 34,1% garante ter recebido informação através deste, sobre o destino adequado a dar aos medicamentos após o término do seu prazo de validade (figura 5). Tem o hábito de ler o folheto informativo?
Obteve a informação, sobre o destino a dar aos resíduos de medicamentos, no folheto informativo?
Não 17,2%
Sim 34,1%
Sim 82,8%
Não 65,9%
Figura 5 – Hábitos de leitura do folheto informativo
DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Através da análise dos resultados pode conclui-se que a esmagadora maioria dos inquiridos tem o hábito de manter medicamentos em casa (92,7%). Resultados semelhantes foram obtidos por Ferreira, Silva, Paula & Resende (2005) num estudo que incluiu utentes atendidos mensalmente, por profissionais de saúde, no Município de Divinópolis no Brasil. Nesse estudo, os medicamentos estavam presentes em 96,6% das residências.
34
No presente estudo, dos inquiridos que guardam medicamentos em casa, só 47% apontou como destino adequado a dar aos medicamentos fora de validade, a Farmácia. Resultados semelhantes foram obtidos por Vaz, Freitas & Cirqueira (2011) e Ferreira, Silva, Paula & Resende (2005). De acordo com estes investigadores, os destinos mais comuns dos medicamentos, fora de validade, foram o lixo normal e a sanita. No aterro sanitário municipal, os medicamentos ficam expostos ao tempo e podem gerar riscos de diversas maneiras. Na opinião de Hoppe & Araújo (2012), a falta de informação faz com que as pessoas descartem os medicamentos no lixo comum ou em vasos sanitários. De acordo com as recomendações do INFARMED (Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde), os medicamentos cujo prazo de validade caducou, bem como aqueles cujo aspeto se encontre alterado, por exemplo, mudança de cor, consistência ou cheiro, devem ser entregues na farmácia. Verificou-se que uma parte significativa dos inquiridos guarda os medicamentos em casa no mesmo local dos restantes medicamentos. Segundo Ferreira, Silva, Paula & Resende (2005), manter medicamentos nas residências não consumidos é um fator de risco para a saúde pela possibilidade de intoxicações provocadas por ingestão acidental ou pela automedicação. Além disso, pode ocorrer diminuição da eficácia do medicamento após a abertura da embalagem mesmo no caso do prazo do medicamento não ter terminado. Mais de 80% dos estudantes tinham o hábito de ler o folheto informativo dos medicamentos. Um estudo desenvolvido por Silva (2005), no Brasil, mostrou que a leitura dos folhetos informativos era uma prática comum efetuada, por apenas, 63% dos inquiridos. Por fim, verificou-se que os respondentes estão conscientes e têm conhecimento que os fármacos têm efeitos nocivos para o ambiente e para o ser humano, se não depositados no local e forma adequados (84,0%). Contudo, a maioria não dá um destino adequado aos medicamentos. Os medicamentos são químicos que contêm componentes resistentes que têm, necessariamente, de receber tratamento. Quando colocados no lixo normal ou em vasos sanitários essas componentes infiltram-se nas águas que consumimos em casa.
CONCLUSÕES A maioria dos respondentes não tem conhecimento do destino a dar aos medicamentos fora de validade. Deste modo, torna-se fundamental insistir na informação da comunidade escolar acerca do destino adequado. Os resíduos dos medicamentos são um problema de saúde pública e ambiental, sendo importante sensibilizar os jovens e a população em geral para as boas práticas ambientais. 35
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Decreto-Lei 92/2006 de 25 de maio. Diário da Républica I série-A. Ministério Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional. Decreto-Lei n.º 162/2000 de 27 de julho. Diário da República I série-A. Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território. Decreto-Lei n.º 366-A/97 de 20 de dezembro. Diário da República I série-A. Ministério do Ambiente. Ferreira, W.; Silva, M.; Paula, A. & Resende, C. (2005). Avaliação de farmácia caseira no município de Divinópolis (MG) por estudantes do curso de farmácia da UNIFENAS. Infarma, 17 (7/9): 84-86. Hoppe, T. & Araújo, L. (2012). Contaminação do meio ambiente pelo descarte inadequado de medicamentos vencidos ou não utilizados, Monografias Ambientais, 6 (6): 1248-1262. eISSN: 2236-1308. Manfio, J., Maso, A., Pugens, A., Liberato, B. & Steppe, M. (2007). Determinação do prazo de validade do medicamento carbocisteína xarope através do método de Arrhenius. Revista Brasileira de Ciências Farmacêuticas, 43 (4): 565-570. Maroco, J. (2003). Análise Estatística com utilização do SPSS. Lisboa: Edições Sílabo. Proença, P. (2011). Resíduos de medicamentos: estudo de caso sobre comportamentos, atitudes e conhecimento. Dissertação de Mestrado em Cidadania Ambiental e Participação. Lisboa: Universidade Aberta. Silva, E. (2005). Problematizando o Descarte de Medicamentos Vencidos: para onde destinar? Monografia como requisito de conclusão do Curso Técnico de Nível Médio em Vigilância Sanitária e Saúde Ambiental. Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio. Rio de Janeiro. Vaz, K.; Freitas, M.; & Cirqueira, J. (2011). Investigação sobre a forma de descarte de medicamentos vencidos. Cenarium Pharmacêutico, 4 (4): 1-26. ISSN: 1984-3380.
36
5
PROCESSO
DE
AQUISIÇÃO
DE
COMPETÊNCIAS:
PRÁTICAS
PARA
A
PREVENÇÃO DA INFEÇÃO DO COTO UMBILICAL DO RECÉM-NASCIDO – UMA REVISÃO INTEGRATIVA DA LITERATURA
Graziela Mendes (1) Enfermeira Especialista em Saúde Materna e Obstetrícia
RESUMO: O enfermeiro especialista em saúde materna e obstétrica é confrontado diariamente, com a necessidade de prestar cuidados ao coto umbilical do recém-nascido. A constatação da inexistência de uniformização nos cuidados a prestar, ao coto umbilical, e a permanência de dúvidas sobre qual é o melhor tratamento para esse efeito, tornou pertinente a realização de uma revisão integrativa da literatura, com o intuito de responder à questão de investigação: Que cuidados devem ser realizados ao coto umbilical do recémnascido para prevenir a infeção? O objetivo desta revisão integrativa da literatura consiste em sintetizar o conhecimento científico; contribuir para a aplicabilidade dos recentes e significativos estudos na prática de enfermagem e facultar aos cuidadores profissionais, uma forma de validar a sua prática. Palavras-chave: Enfermeiro Especialista em Saúde Materna e Obstetrícia; Cuidados ao cordão/coto umbilical. INTRODUÇÃO AO PROBLEMA: Todos os anos, em média, quatro milhões de mortes neonatais ocorrem em todo o mundo. Mais de 99% destas mortes, ocorrem nos países subdesenvolvidos, e quase metade destas crianças morrem de infeção. As infeções do coto umbilical estão entre as principais causas de mortalidade neonatal. A Organização Mundial de Saúde informa que, anualmente, 460.000 das mortes neonatais estão associadas a infeções do coto umbilical, e que ocorrem nos países subdesenvolvidos (WHO, 1998 e Mullany [et al.], 2006). Esta realidade justifica que se continue a estudar esta temática, com vista, não só a descrever as práticas existentes no cuidado ao coto umbilical do recémnascido, como também para expor a prática mais eficaz. O diagnóstico de infeção umbilical apresenta, muitas vezes, algumas dificuldades, já que a colonização do coto umbilical nem sempre sugere infeções (Florentino e Gualda, 1998). Os sinais da sua presença em fase inicial são pouco visíveis (um terço dos recémnascidos com sépsis de origem umbilical não apresentam sinais locais), e facilmente confundíveis com outras complicações.
37
De facto identifica-se a existência de dois contextos muito diferentes: o dos países desenvolvidos e o dos países subdesenvolvidos. Nos primeiros a maioria dos nascimentos ocorre em ambientes limpos (hospitais e maternidades), pelo que o risco de infeção está relativamente controlado. Já nos segundos, a maior parte dos nascimentos dão-se nos domicílios, onde é muito mais difícil eliminar as fontes de infeção. Daí que o propósito deste estudo seja fazer uma revisão integrativa da literatura, com o intuito de discutir as principais práticas para cuidar o coto umbilical do recém-nascido no sentido de contribuir para a prevenção das infeções, com enfoque nas evidências atuais. MÉTODO: A revisão integrativa da literatura é um método que, em virtude da sua abordagem metodológica, permite a inclusão de métodos diversos, na identificação de artigos, o que favorece a compreensão mais completa do fenómeno analisado. A pergunta de pesquisa desta revisão integrativa da literatura é a seguinte: quais são as evidências científicas disponíveis, relativas aos cuidados do coto umbilical do recémnascido para a prevenção de infeções? Pela sua representatividade na área da saúde, selecionaram-se as seguintes bases de dados: MEDLINE with full text, CINAHL Plus with full text, e Cochrane Database of Systematic Reviews, através da plataforma EBSCO host. Além destas, também se recorreu a dois serviços de pesquisa: a SCIELO (Scientific Eletronic Library Online), e o Google Académico (Google Scholar). Os critérios de inclusão definidos para a seleção dos artigos foram: artigos publicados em português, inglês e espanhol; artigos na íntegra que retratassem a problemática referente à revisão integrativa e artigos publicados e indexados nas referidas bases de dados nos últimos dez anos, de janeiro de 2003 a dezembro de 2012. A partir da pergunta de pesquisa elaboraram-se os seguintes descritores: “umbilical” AND “cord” AND “care”; “cordão” OR “coto” AND “umbilical” AND “cuidado” OR “tratamento”; e“cordón” AND “umbilical” AND “cuidado” OR “tratamiento". RESULTADOS: Como resultado final da pesquisa efetuada, obtiveram-se 7 artigos para análise detalhada, 6 deles relatando os resultados de ensaios clínicos randomizados. Segundo a Duke University Medical Library (2005,) cit.por Levin [et al.], (2007) o nível mais alto de evidência (nível I) está no topo da pirâmide, e é caracterizado pela mais forte relevância das provas, para a situação clínica em estudo. O nível mais baixo de evidência (nível VI) está na base da pirâmide, e caracteriza-se por estudos descritivos simples, onde se enquadra o estudo de Alam [et al.] (2008). Já o nível II deriva de ensaios clínicos, que no caso desta revisão integrativa são os ensaios clínicos randomizados conduzidos por: Mullany [et al.] (2006, 2009), Covas [et al.] (2011), Suliman [et al.] (2010), Aghamohammadi [et al.] (2012), e Erenel [et al.] (2010). 38
DISCUSSÃO: O cuidado ao coto umbilical na prática dos profissionais de saúde é um procedimento que se reveste de caráter preventivo, contra potenciais infeções. Segundo a WHO (1998), em décadas anteriores e nos países ocidentais (os atuais países desenvolvidos), milhares de crianças morriam por ano, em decorrência de infeções umbilicais, inclusivé de tétano neonatal, e de infeção sistémica relacionada com a colonização/infeção bacteriana do umbigo. Os índices de infeções mantinham-se elevados, o que fez com que a comunidade científica se movesse no sentido de estabelecer técnicas que prevenissem tais ocorrências. As infeções bacterianas do coto umbilical tornaram-se raras a partir do início do século XX (nos países desenvolvidos). Mas apesar disso, na década de 40, assistiu-se a um retrocesso, pois estas infeções foram a causa primária de morte neonatal nesses mesmos países (Pezzati [et al.], 2002). Tal facto esteve relacionado com a mudança das rotinas nas maternidades que conduziu a um aumento acentuado de infeções nosocomiais e infeções cruzadas entre os lactentes, acentuando novamente, as infeções neonatais, nomeadamente, a onfalite e sépsis (WHO, 1998). Este facto impulsionou a utilização profilática de antissépticos/antimicrobianos tópicos, aplicados ao coto umbilical, na tentativa de “esterilizar” o umbigo, e dessa forma, prevenir infeções. Essa prática preventiva acabou por se perpetuar até aos dias de hoje (Pezzati [et al.], 2002) orientando os profissionais de saúde,
principalmente
no
mundo
ocidental,
para
a
utilização
indiscriminada
de
antissépticos/antimicrobianos tópicos profiláticos, com a intenção de reduzir a taxa de colonização, e consequentemente, o risco de infeções. Todavia, há opiniões que contestam esta conduta, ao afirmarem que no atual contexto dos cuidados obstétricos, dos países ocidentais, a necessidade de aplicar antissépticos/antimicrobianos no tratamento ao coto não está legitimada (Zupan e Aahmnan, 2005). A WHO (1998) refere que não há ainda uma resposta cabal para a questão de quais são os melhores cuidados para o coto umbilical. Se a isso juntarmos que a aplicação de antissépticos modifica a flora da pele do recém-nascido, podendo conduzir à emergência de estirpes resistentes (Overturf e Marcy, 1995), (WHO,1998), (Perapoch [et al.], 1993), fica então a questão: será que a utilização de antissépticos, por rotina, é mesmo necessária ou eficaz? (Walker, 1999). A leitura dos vários artigos encontrados na revisão integrativa, permitiu identificar um outro contexto a nível mundial, com uma realidade bem distinta da que foi suprarreferida. Estamos a falar dos países em desenvolvimento, como é o caso do Nepal, Bangladesh, Turquia, Irão e Argentina. O progresso que marcou as últimas décadas dos países desenvolvidos, não foi extensível a estes países, ou seja, estes últimos não tiveram muitos progressos na redução de mortes neonatais nos últimos 10 a 15 anos. Da revisão 39
integrativa efetuada constatou-se isso mesmo: que a maior parte dos ensaios de intervenções neonatais, neste início de século, concentram-se em dirigir os esforços para a redução das mortes de recém-nascidos, nos países onde se registam as maiores taxas de mortalidade neonatal. A investigação científica que se faz no mundo ocidental tem alguma dificuldade de aplicação em realidades sociais diferentes, como é o caso dos países em desenvolvimento. O artigo de Aghamohammadi [et al] (2012) e o artigo de Erenel [et al.] (2010) são ambos relativos a investigações que incidem em cuidados ao coto umbilical baseados nas tradições locais, do Irão e da Turquia, respetivamente. No Irão é prática comum a aplicação de leite humano no coto umbilical. Os autores chegaram à conclusão de que a aplicação de leite humano reduz o tempo de demora na queda do coto umbilical, comparativamente com a secagem natural (manter o coto umbilical limpo e seco). O artigo desenvolvido a partir de uma investigação na Turquia testa uma prática muito comum de tratamento do coto umbilical, que é a aplicação de azeite nos cuidados ao coto umbilical. Os seus autores procuraram saber se esta técnica favorecia a proliferação de micro-organismos no coto umbilical, comparativamente com a técnica da lavagem com a água e sabão e, posterior secagem natural. Os autores chegaram à conclusão que não houve diferenças no crescimento de bactérias no coto umbilical, entre os dois grupos, ou seja, a aplicação do azeite não acarreta nenhum risco de infeção para o recém-nascido. Os restantes artigos analisados abordam a aplicação de produtos químicos para a realização dos cuidados ao coto umbilical. O álcool a 70%, a Clorexidina a 4% e o Corante triplo, são apenas alguns dos muitos antissépticos/antimicrobianos que ao longo dos anos têm sido referenciados pela Organização Mundial de Saúde. A partir da década de 1990, começaram então a surgir opiniões afirmando não existir necessidade de aplicar nenhum tratamento ao coto umbilical - basta lavá-lo com água e sabão, mantendo-o limpo e seco de seguida (idealmente ao ar, o máximo de tempo possível). Uma revisão sistemática de estudos científicos, realizada por Zupan e Garner (2000), na Cochrane, permitiu concluir que a opinião comum dos autores destes estudos é que com este tratamento de secagem natural do coto umbilical se reduz o risco de infeção e se facilita a sua queda. Um estudo realizado na comunidade do Nepal por Mullany [et al.] (2006), envolvendo 15.033 recém-nascidos, mostrou que a aplicação de clorexidina a 4%, no coto umbilical, foi benéfica. Ao grupo de recém-nascidos a quem foi aplicada a clorexidina a 4% no coto umbilical, pelo menos, 7 vezes em 10 dias, comparativamente com o grupo da secagem natural (sem cuidados ao coto umbilical), verificou-se uma diminuição de 75% na frequência de onfalite, e de 24% na mortalidade. Os autores deste artigo do Nepal acabaram por decidir realizar um outro estudo mais abrangente, com uma outra amostra 40
maior (25000 recém-nascidos), desta vez no Bangladesh (Mullany [et al.], 2009), para testar uma nova hipótese, que consistia em verificar a eficácia da aplicação da clorexidina a 4%, uma única vez, tão cedo quanto possível após o nascimento. As autores concluíram que as crianças que receberam uma única limpeza com clorexidina a 4% após a secção do cordão umbilical tiveram menos 20% de mortalidade, em comparação com os recém-nascidos que receberam os cuidados com o coto umbilical padrão (secagem natural). Ainda em relação ao artigo anterior, convém referir que os autores tiveram necessidade de fazer um ponto de situação prévio (entre setembro e novembro de 2006), para descobrir as práticas de cuidados ao coto umbilical, realizadas pelas mulheres da região estudada no Bangladesh. Assim, Alam [et al.] (2008) conduziram entrevistas e questionários a 410 mulheres, tendo concluído que a grande parte dos cuidados ao recém-nascido, nesta região rural do Bangladesh, não se realizavam através de práticas limpas (incluindo os cuidados ao coto umbilical). Com este inquérito transversal, os autores provaram que seria necessário fazer intervenções educativas nesta comunidade, como pré-requisito à introdução dessas práticas limpas, como seja a limpeza do coto umbilical com clorexidina a 4%. Na SCIELO encontram-se artigos mais próximos da realidade portuguesa. A partir dessa base de dados chegou-se a um estudo realizado na Argentina, que comparou a eficácia de secagem natural do coto umbilical, com a prática habitual do uso do álcool a 70%, utilizando dois padrões avaliativos: redução de tempo na queda do coto umbilical, e a incidência na taxa de infeções (Covas [et al.], 2011). Terminada a experiência, os autores concluíram que a limpeza do coto umbilical, com álcool a 70%, reduziu a taxa de colonização bacteriana intra-hospitalar, em relação à limpeza com água e sabão e secagem natural do coto umbilical, mas atrasou ligeiramente o processo de queda do coto umbilical. No entanto, ambas as práticas tiveram o mesmo nível de eficácia na prevenção de infeções do coto umbilical. Assim é natural que tenha havido esta semelhança na eficácia de ambos os cuidados, pois o estudo foi conduzido num ambiente hospitalar, ou seja, um ambiente limpo. Um estudo desenvolvido nos EUA, comparou a utilização do corante triplo com e sem a adição de álcool (Suliman [et al.], 2010). O objetivo deste estudo consistiu em avaliar o tempo de queda do coto umbilical e a frequência de complicações no recém-nascido, consoante o tipo de tratamento efetuado ao coto umbilical. Os autores concluíram não haver vantagem nenhuma na adição do álcool ao corante triplo, ou seja, como a adição do álcool ao corante triplo não traz benefícios terapêuticos ao tratamento do coto umbilical, e até atrasa ligeiramente a queda do mesmo (além de encarecer os cuidados pela adição desse mesmo álcool), os profissionais de saúde devem deixar de incentivar a sua utilização, por parte dos cuidadores informais, após a alta hospitalar.
41
CONCLUSÃO DA REVISÃO INTEGRATIVA: A constatação a que se chegou com esta revisão integrativa foi que, em pleno século XXI, existem duas realidades bem distintas, ao nível dos cuidados prestados ao coto umbilical do recém-nascido. Os países em vias de desenvolvimento apresentam um nível educacional e social onde impera uma cultura intergeracional, onde as práticas de cuidados ao coto umbilical se transmitem de geração em geração. Ou seja, a maior parte dos nascimentos ocorre em domicílio, são realizados por cuidadores informais, que não só desconhecem a evidência científica, como valorizam muito os conhecimentos das gerações precedentes. Ao contrário, no mundo ocidental e por norma, os partos são assistidos por profissionais de saúde, com formação específica para o efeito, e habituados a valorizar a prática baseada na evidência. Esta diferença de referências faz com que existam nos países subdesenvolvidos elevados índices de infeções no coto umbilical que têm como causa principal, as práticas tradicionais nos cuidados que se prestam ao mesmo. No entanto, foi curioso constatar, através dos artigos incluídos nesta revisão integrativa, que começa a haver um interesse, ainda que discreto, por parte dos investigadores, em avaliar a eficácia de algumas práticas tradicionais, utilizadas pelas comunidades dos países em vias de desenvolvimento. Foi o caso da aplicação do azeite e do leite humano na limpeza do coto umbilical, em regiões da Turquia e do Irão, respetivamente (Erenal [et al.], 2010; Aghamohammadi [et al], 2012). Esses dois artigos chegaram a conclusões interessantes, pois tanto uma técnica, como a outra não se mostraram nocivas para a viabilidade cicatricial do coto umbilical, antes pelo contrário. Se ponderarmos sobre os resultados obtidos com estas duas práticas, concluímos que uma posição radical e impositiva não se justifica, pois estamos perante saberes que podem ser aproveitados e melhorados (ex.: prática de uma técnica limpa na sua execução). Além disso, são cuidados com um custo muito baixo, e sem a implicação do desgaste humano na mudança de práticas e crenças muito enraizadas e de difícil eliminação. Baseado no exposto pela revisão integrativa, conclui-se que a melhor recomendação de cuidado ao coto umbilical, tanto nos países desenvolvidos, como nos subdesenvolvidos, consiste em fazer a sua higiene com uma substância bacteriostática. O objetivo é o de diminuir a colonização por germes patogénicos e, consequentemente evitar a infeção do coto umbilical. Aliás, no seguimento do que refere a WHO (1998), o risco de contaminação e posterior infeção diminui com o passar do tempo, devido ao processo de mumificação e cicatrização do coto umbilical. Este facto foi confirmado por um estudo realizado no Bangladesh, que quanto mais cedo for aplicado o agente, mais eficaz é o seu efeito (Mullany [et al.], 2009) Nos países desenvolvidos as opiniões divergem sobre o melhor tratamento no cuidado do coto umbilical (WHO, 1998). Por isso coexistem atualmente uma variedade de 42
cuidados ao coto umbilical, na forma de antissépticos, com a finalidade de garantir a boa viabilidade cicatricial do mesmo. No entanto, não há indicação precisa sobre qual é o mais eficaz, quanto ao objetivo principal - ser profilático no controlo dos agentes patogénicos, e facilitador da secagem, da desidratação e da queda (WHO, 1998). Alguns antissépticos são amplamente utilizados, como o álcool por exemplo. Contudo, não existe unanimidade sobre a sua utilização indiscriminada. O álcool é efetivo na diminuição do crescimento bacteriano, mas retarda a secagem e a queda do coto umbilical (WHO, 1998). Devido às desvantagens referidas, a WHO (1998) optou por desaconselhar a utilização de antissépticos, defendendo que o método da secagem natural (manter o cordão limpo e seco) parece ser tão efetivo e seguro como usar antibióticos ou antissépticos. No entanto, e apesar destas orientações reunirem algum consenso nos profissionais de saúde, a cessação dos cuidados do cordão com antibacterianos tópicos, deve ser acompanhada por uma atenção aos sinais e sintomas iniciais de onfalite (Janss [et al.], 2003). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: •
FLORENTINO, L. C.; GUALDA, D. M. R. - Cuidado de coto umbilical: estudo comparativo do uso de três tipos de soluções. Revista paulista de enfermagem. 1/3, 1998, Vol. 17, p. 4659.
•
LEVIN, R.; SINGLETON, J.; JACOBS, S. - Developing and evaluating clinal practice guidelines: a systematic appoach. [ed.] Spriger Publihing Company. Evidence-based geriatric nursing protocols for best practice, 2007.
•
MENDES, K. D. S; SILVEIRA, R. C. C; GALVÃO, C. M - Revisão integrativa: método de pesquisa para a incorporação de evidências na saúde e na enfermagem. Texto Contexto Enfermagem. Vol. 17, nº 4, Out-Dez de 2008, pp. 758-764.
•
OVERTURF, G.; MARCY, S. - Focal Bacterial Infections. In Remington & Klein eds. Infectious Disease of the Fetus & Newborn Infant Remington. Philadelphia: W B Saunders Company, 1995, pp. 935-79.
•
PERAPOCH J., [et al.]. Umbilical colonization in normal newborns. A comparative study of 4 methods for umbilical antisepsis. An Esp Pediatr. Vol.39, 1993; pp. 195-8.
•
PEZZATI, M. [et al.] - Umbilical cord care: The effect of eight different cord-care regimens on cord separation time and other outcomes. Biology of the Neonate. 1, 2002, Vol. 81, pp. 38-44.
•
SOUZA, M. T; SILVA, M. D; CARVALHO, R. - Revisão Integrativa: o que é e como fazer. Einstein. Vol. 1, nº 8, 2010, pp. 1026.
•
WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO) - Care of the umbilical cord: a review of the evidence. Genéve, WHO, 1998. 43
•
WHITTEMORE, R.; KNAFL, K. - The integrative review: updated methodology. Journal of Adv Nurs. Vol. 52, nº 5, Dez de 2005, pp. 546-553.
•
ZUPAN, J.; AAHMNAN, E. - Perinatal mortality for the year 2000: estimates developed by WHO. World Health Organization. 2005.
•
ZUPAN, J.; GARNER, P. – Topical umbilical cord care at birth. The Cochrane Database of Syst Rev. 2000.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
DOS
ARTIGOS
INCLUÍDOS
NA
REVISÃO
INTEGRATIVA •
AGHAMOHAMMADI, A.; ZAFARII, M.; MOSLEMI, L.. Comparing the Effect of Topical Application of Human Milk and Dry Cord Care on Umbilical Cord Separation Time in Healthy Newborn Infants. Iranian Journal of Pediatrics. Vol. 22, nº 2, 2012, , pp. 155-162.
•
ALAM, M. A. [et al.]. Newborn umbilical cord and skin care in Sylhet District, Bangladesh: implications for the promotion of umbilical cord cleansing with topical chlorhexidine. Journal of Perinatology. Vol. 28, 2008, pp. 61-68.
•
COVAS, María del Carmen. [et al.]. Higiene del cordón umbilical con alcohol comparado con secado natural y baño antes de su caída, en recién nacidos de término: ensayo clínico controlado aleatorizado. Arch Argent Pediatr. Vol. 109, nº 4, 2011, pp. 305-313 / 305.
•
ERENEL, A. S. [et al.]. Comparison of Olive Oil and Dry-Clean Keeping Methods in Umbilical Cord Care as Microbiologica. Maternal & Child Health Journal. Vol. 14, 2010,.
•
MULLANY, L. C. [et al.]. Topical applications of chlorhexidine to the umbilical cord for prevention of omphalitis and neonatal mortality in southern Nepal: a community-based, cluster-randomised trial. BMC Pediatrics. Vol. 367, 18 de March de 2006, pp. 919-918.
•
MULLANY, L. C. [et al.]. Impact of 4.0% chlorhexidine cleansing of the umbilical cord on mortality and omphalitis among newborns of Sylhet, Bangladesh: design of a communitybased cluster randomized trial. BMC Pediatrics. 21 de October de 2009, pp. 1-9.
•
SULIMAN, A. K. [et al.]. Triple Dye Plus Rubbing Alcohol Versus Triple Dye Alone for Umbilical Cord Care. Clinical Pediatrics. Vol. 49, nº 1, 2010, pp. 45-48.
44
6
A MULHER NO CLIMATÉRIO, QUE INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM Mário Cardoso1; Helena Presado 2; Andrea Carvalho3; Dora Carteriro4 & Tiago Nascimento5 1) EESMO, Escola Superior de Enfermagem de Lisboa, mmcardoso@esel.pt 2) EESMO, Escola Superior de Enfermagem de Lisboa, mhpresado@esel.pt 3)
EESMO,
Centro
Hospitalar
do
Oeste
-
Unidade
de
Torres
Vedras,
aiscarvalho@sapo.pt 4) EESMO, Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados – Charneca – CS Lumiar, doracarteiro@gmail.com 5) Tiago
Nascimento,
Enfermeiro,
Santa
Casa
da
Misericórdia
de
Lisboa,
tiago.filipedonascimento@gmail.com RESUMO: Objetivo: Reflectir sobre as intervenções de enfermagem que podem ser prestadas às mulheres no período do climatério. Metodologia: Análise das competências de enfermagem e intervenções facilitadoras do processo de transição à menopausa. Revisão sistemática da literatura. Utilizadas as bases de dados Nursing & Allied Health Collection, CINAHL e MEDLINE integradas na EBSCO. Resultados: As intervenções de enfermagem em mulheres no climatério estão centradas na Educação para a saúde pela explicação das transformações que irão ocorrer nesta fase da vida e em dotar as mulheres de capacidade para realizar a sua autogestão (exercício físico, a intervenção dietética, a redução / eliminação de hábitos nocivos) a abordagem fenomenológica são importantes ferramentas para a compreensão da problemática e ajudar a facilitar a transição para a menopausa. Conclusões: O climatério é assumido como uma fase de extrema importância na vida das mulheres, ajudar as mulheres a vivenciar este período de forma positiva e com qualidade de vida é um papel fundamental da equipa de enfermagem que deve estar sensível às problemáticas e exigências inerentes a esta etapa de vida. As intervenções devem ser adaptadas e ter em conta o contexto e a história de cada pessoa. Evidencia-se a falta de informação e evidência científica relacionada com o climatério, ao contrário da menopausa em que existem estudos essencialmente centrados no modelo biomédico. É, fundamental uma maior formação dos enfermeiros no âmbito do climatério bem como, uma maior evidência científica para permitir a prestação de cuidados baseados na evidência. Palavras-Chave: Climatério; Menopausa; Enfermagem; Cuidar
45
INTRODUÇÃO O climatério assume-se como uma fase de grande importância na vida da mulher. Este período pode ser definido como “o período da vida da mulher em que ocorre um declínio progressivo da função ovárica. Está associado a um conjunto de sinais e/ou sintomas (irregularidades menstruais, calores, afrontamentos, transpiração noturna, alterações do humor e do sono, entre outros) que no seu conjunto caracterizam o «síndrome do climatério».” (SPG, 2004) O climatério não pode ser assim confundido com a menopausa pois esta inclui-se como uma fase do climatério em si mesmo, a menopausa pode ser caracterizada como “um acontecimento natural da vida da mulher, que resulta dum decréscimo da produção de hormonas sexuais pelos ovários – estrogénio, progesterona e testosterona.” (Sousa, 2006) O climatério é assim todo o processo que se inicia com as mudanças hormonais da mulher, num período anterior ao diagnóstico da menopausa e que se prolonga para além da menopausa. O climatério carece assim de intervenções que possam facilitar a transição para a menopausa, não só no contexto da mulher, mas também no contexto da família e da própria comunidade, envolventes que podem ser facilitadoras ou inibidoras do processo de transição. Para que estas intervenções possam ter a evidência naquilo que são os ganhos em saúde, é necessário que estas intervenções tenham um carácter autónomo, representativo das intervenções em enfermagem pois “consideram-se autónomas as ações realizadas pelos enfermeiros, sob sua única e exclusiva iniciativa e responsabilidade, de acordo com as respetivas qualificações profissionais, seja na prestação de cuidados, na gestão, no ensino, na formação ou na assessoria, com os contributos na investigação em enfermagem.” (REPE, 1996). Numa perspetiva da prestação de cuidados de enfermagem, e sendo as intervenções no climatério de caráter preventivo, são assim enquadradas como intervenções de promoção na saúde, descritas também como competência do enfermeiro de cuidados gerais, no domínio da prestação de cuidados (capítulo B.1.1.1 – A promoção da saúde) e ainda mais concretamente descritas no Regulamento das Competências Específicas do Enfermeiro ESMOG em que este "assume a responsabilidade pelo exercício da área de intervenção: 5. Climatério – Cuidados de Saúde para as mulheres que experienciam a saúde/doença durante o período da perimenopausa" (OE, 2010) e "olha pela mulher que integra a família e a comunidade, no período do climatério, a fim de melhorar a saúde apoiando o processo de transição e adaptação à menopausa." (OE, 2010) Desta forma, compete aos enfermeiros, de cuidados gerais e especialistas, identificar e promover as melhores intervenções de enfermagem na promoção da saúde da mulher no climatério.
46
METODOLOGIA Para a formulação da questão de investigação “quais as intervenções dos enfermeiros, à mulher no período do climatério, para uma saudável transição para a menopausa” e consequentemente para a composição da amostra, utilizou-se o método PI[C]O: Participantes (e situação clínica), intervenção e outcomes, para a realização da Revisão Sistemática da Literatura. A pesquisa foi realizada em bases de dados on-line Nursing & Allied Health Collection, CINAHL e MEDLINE, tendo como limitação temporal 10 anos, ou seja, de 2002-2012, foram também critérios de seleção artigos completos e artigos com peer-review. Após a aplicação dos descritores e dos critérios obtiveram-se 11 artigos com base na leitura dos abstracts. Foram relidos os artigos e feita uma análise de conteúdo com vista à comparação e respetiva adequação científica face à questão de investigação. ANÁLISE e DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Após a análise dos resultados e respetivo conteúdo do mesmo, surgiram 3 grandes categorias de intervenção do enfermeiro que, na nossa perspetiva, representam 3 eixos estratégicos que se revestem de grande importância no processo de transição. Estes eixos aglutinam e sistematizam as intervenções que a literatura refere como facilitadoras do climatério e da consequente transição para a menopausa. São eles: a. Eixo 1 – Diagnóstico de Enfermagem b. Eixo 2 – Promoção de Estilos de Vida Saudáveis c. Eixo 3 – Informação Em cada eixo serão então discriminadas as intervenções associadas, sendo que no eixo “Diagnóstico de Enfermagem” é dado ênfase a um correto diagnóstico do enfermeiro tendo em conta o seu âmbito de intervenção. O “Diagnóstico de Enfermagem” assenta assim em 3 intervenções chave: a.
História familiar (n=7) [3] [4] [5] [9] [10] [11] [13]
b. Legitimação dos sintomas (n=2)[3] [4] c. Fatores de risco (n=4)[3] [4] [10] [11] A história familiar engloba assim uma profunda e discriminada avaliação dos antecedentes e de que forma estes podem influenciar esta transição. Esta história familiar não tem que ter haver apenas com as patologias familiares anteriores, mas também com a forma como o climatério e a menopausa foram vividas no seio da família ao longo dos anos. A legitimação dos sintomas é também um momento importante para a realização de diagnósticos de enfermagem pois o enfermeiro deve valorizar as preocupações da mulher, 47
reforçando e validando a importância das mesmas. Os fatores de risco são forçosamente uma fonte de diagnósticos de enfermagem, tendo o enfermeiro que ter uma perspetiva preventiva e que, após a sua análise, constituem base passe para as informações e intervenções de promoção da saúde. A “Promoção de Estilos de Vida Saudáveis” tem por base as seguintes intervenções: a. Cessação tabágica (n=4) [3] [10] [11] [13] b. Diminuição da ingestão de cafeína e álcool (n=2) [8] [10] [13] c. Dieta/perda de peso (n=5) [3] [8] [10] [11] [13] d. Exercício (n=5) [3] [8] [10] [11] [13] e. Roupas leves (n=2) [8] [13] Estas intervenções, por pertencerem a um domínio bem conhecido por parte dos enfermeiros, não serão aprofundadas pois caberá a cada díade enfermeiro-mulher, realizar a respetiva intervenção, a mais personalizada possível. No que concerne ao terceiro e último eixo estratégico “Informação”, são também três as tipologias de intervenção de enfermagem: a. Informação personalizada (n=7) [2] [3] [4] [6] [11] [12] [13] b. Abordagem fenomenológica (n=2) [5] [9] c. Terapias complementares (n=1) [10] A primeira intervenção e que diz respeito à informação personalizada, sendo a mais citada pela bibliografia, é também aquela que é, por si só, o culminar de todas as intervenções anteriores pois tem em conta os conhecimentos prévios da mulher, as suas questões e as suas vivências. É assim importante promover a desmistificação de mitos que possam existir bem como tranquilizar a mulher para a melhor vivência do climatério e da menopausa. A abordagem fenomenológica, tal como o nome indica, diz respeito à abordagem dos fenómenos enquanto vivências e experiências, ou seja, compreender a mulher de um ponto de vista do “ser” e a forma como esta se posiciona face ao climatério e à menopausa. Finalmente, mas não menos importante, é abordada, embora só uma vez, a questão das terapias complementares. Cada vez mais as mulheres têm dúvidas acerca deste tipo de terapias que também vão sofrendo um grande desenvolvimento e aceitação por parte da sociedade atual. É assim necessário que o enfermeiro possa esclarecer devidamente a mulher que queira enveredar por terapias complementares, de forma a conseguir minorar alguma sintomatologia. Aliado a estes eixos é também importante de relevar que a prevenção e a transição saudável para a menopausa significa, embora que empiricamente, um menor recurso a terapêutica e a cuidados de saúde diferenciados levando a uma redução de custos, não só 48
para a mulher e família, mas também para o Serviço Nacional de Saúde. É necessário assim traduzir cada uma destas intervenções do enfermeiro em indicadores sensíveis aos cuidados de enfermagem. CONCLUSÕES O climatério reveste-se de grande importância no ciclo vital da mulher, é importante que os enfermeiros desenvolvam competências, quer pessoalmente quer no seio da equipa, que permitam facilitar ao máximo esta transição. Estas competências devem ter em vista o desenvolvimento de intervenções autónomas de enfermagem, intervenções estas que se centram nos três eixos anteriormente descritos, que se baseiam também na evidência científica existente levando a que seja também um desafio para os profissionais, o recurso a prática baseada na evidência. É evidente a falta de informação por parte das mulheres, no entanto já existe bastante evidência científica o que nos permite concluir que esta tem que ser transposta para a prática diária de enfermagem. Uma mulher que seja saudável neste período é também uma mulher com impacto positivo na sua família, comunidade e sociedade o que representa não só ganhos na vertente social, mas também na vertente económica pelo não recurso a cuidados de saúde diferenciados. Deverá assim o enfermeiro apoiar a mulher a encontrar o seu caminho, com recurso à promoção de estilos de vida saudáveis e à informação, elementos centrais e estruturantes daquele que é o desígnio da profissão de enfermagem. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1)
Baird, D. (2004). Negotiating the maze: the meaning of perimenopause. New Jersey Nurse, 34(4), 17-18
2)
Berg, J., Larson, C., & Pasvogel, A. (2008). Menopausal symptom perception and severity: results from a screening questionnaire. Journal Of Clinical Nursing, 17(7), 940-948. doi:10.1111/j.1365-2702.2007.02112.x
3)
Berterö, C. (2003). What do women think about menopause? A qualitative study of women's
expectations,
apprehensions
and
knowledge
about
the
climacteric
period. International Nursing Review, 50(2), 109-118 4)
Chichester, M., & Ciranni, P. (2011). Approaching menopause (but not there yet!): caring for women in midlife. Nursing For Women's Health, 15(4), 320-324. doi: 10.1111/j.1751-486X.2011.01652.x
5)
Mackey, S. (2007). Women's experience of being well during peri-menopause: a phenomenological study. Contemporary Nurse, 25(1-2), 39-49.
49
6)
Moloney, M., Dietrich, A., Strickland, O., & Myerburg, S. (2003). Using Internet discussion boards as virtual focus groups. Advances In Nursing Science, 26(4), 274286.
7)
Ordem dos Enfermeiros (2010). Regulamento das Competências Específicas do Enfermeiro Especialista em Saúde Materna, Obstétrica e Ginecológica. Lisboa: Ordem dos Enfermeiros
8)
Pace, D. T. (2006). Menopause: studying the research. The Nurse Practitioner, 31(8), 17-23
9)
Seibold, C. (2006). Discourse analysis: integrating theoretical and methodological approaches. Nurse Researcher, 14(1), 18-33
10) Smith, P. E. (2005). Menopause assessment, treatment, and patient education. The Nurse Practitioner, 30(2), 32-43 11) Sociedade Portuguesa de Ginecologia. (2004). Consenso & estratégia para a saúde da
mulher
para
a
pós-menopausa.
1-
80. Retrieved fromhttp://spginecologia.pt/uploads/menopausa.pdf 12) Sousa, Mário (2009). Comunicação pessoal. XI Reunião Científica da Sociedade Portuguesa de Menopausa. Chaves, 17 Outubro 13) Triviño, Z., Stiepovich, J., & Merino, J. M. (2007). Factores predictores de conductas promotoras de salud en mujeres peri- post-menopáusicas de Cali, Colombia. (Spanish). Colombia Medica, 38(4), 395-407 14) Tsao, L., Chang, W., Hung, L., Chang, S., & Chou, P. (2004). Perimenopausal knowledge of mid-life women in northern Taiwan. Journal Of Clinical Nursing, 13(5), 627-635. 15) Twiss, J. J., Wegner, J., Hunter, M., Kelsay, M., Rathe-Hart, M., & Salado, W. (2007). Perimenopausal symptoms, quality of life, and health behaviors in users and nonusers of hormone therapy. Journal Of The American Academy Of Nurse Practitioners, 19(11), 602-613.
50
7
SATISFAÇÃO SEXUAL NA MEIA-IDADE Helena Presado1; Mário Cardoso2; Andrea Carvalho3; Dora Carteriro4 & Tiago Nascimento5 1) EESMO, Escola Superior de Enfermagem de Lisboa, mhpresado@esel.pt 2) EESMO, Escola Superior de Enfermagem de Lisboa, mmcardoso@esel.pt 3) EESMO,
Centro
Hospitalar
do
Oeste
-
Unidade
de
Torres
Vedras,
aiscarvalho@sapo.pt 4) EESMO, Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados – Charneca – CS Lumiar, doracarteiro@gmail.com 5) Tiago
Nascimento,
Enfermeiro,
Santa
Casa
da
Misericórdia
de
Lisboa,
tiago.filipedonascimento@gmail.com
RESUMO: Objetivo: Identificar a satisfação sexual em homens e mulheres na meia-idade. Metodologia: Realizou-se um estudo quantitativo, utilizando a Escala de ISS (Índice de Satisfação Sexual) validado para a população portuguesa por Pechorro em 2009. Foi aplicado um questionário, preenchido por casais, homens (n=66) e mulheres (n= 60) entre as idades de 45 e 60 anos (total n=126). Os dados recolhidos foram analisados com recurso ao SPSS 19.0®. Resultados: Obteve-se um maior número de participantes entre os 45 e os 50 anos. Relativamente ao estado marital, 124 dos participantes eram casados. No que diz respeito à escolaridade existe uma grande heterogeneidade existindo no entanto uma maior incidência de participantes com licenciatura. O grupo profissional também apresenta heterogeneidade mas com uma maior frequência de participantes a desempenhar funções mais qualificadas. Conclusões: Verificou-se menor satisfação sexual entre participantes com profissões menos qualificadas e baixo nível de escolaridade, desempregados e participantes do sexo feminino e nos grupos etários de 45-50 anos e 56-60 anos, que pode ser explicada por Pechorro (2009) pelas atividades relacionadas com a vida familiar e a carreira podem diminuir a satisfação sexual no primeiro grupo e, no segundo grupo etário referenciado (idade avançada), pela ocorrência da andropausa e menopausa, onde a eventual diminuição da libido, pode levar a uma diminuição da satisfação sexual. Obtivemos uma correlação estatisticamente significativa entre o ISS e o grau de estudos em que quanto maior o grau, maior a satisfação sexual. Palavras-Chave: Sexualidade, Satisfação Sexual; Meia-Idade
51
INTRODUÇÃO O envelhecimento pode trazer mudanças na sexualidade quer da mulher quer do homem que, em diversas ocasiões, têm associados problemas de saúde. Não há nada na menopausa que diminua inevitavelmente quer o interesse sexual, quer a frequência e intensidade com que se pode ter um orgasmo. A sexualidade é um processo de desenvolvimento e aprendizagem que requer a capacidade de reconhecer e compartilhar sentimentos que envolvem a comunicação e a negociação aliadas à componente física e que vai para além do sexo genital, a experiência sexual é um acontecimento específico inigualável, fonte e expressão de uma energia vital que todos os indivíduos têm, mas que não aparece de repente nas suas vidas. A capacidade de viver a sexualidade não se esgota com a idade, mas qualifica-se de acordo com a experiência de vida pois “a sexualidade é um dos pilares da qualidade de vida e reflete as experiências evolutivas ao longo do ciclo vital, na medida em que, a sexualidade dá às pessoas intimidade, afeição, amor, admiração e cumplicidade.” (Badran et al., 2007) Pechorro, Diniz & Vieira, (2010) ao avaliarem o funcionamento sexual, a satisfação sexual e os comportamentos sexuais em mulheres portuguesas em função do ciclo de vida, concluem
que
na
generalidade
dos
comportamentos
sexuais
(beijar,
fantasias,
masturbação, carícias e preliminares) há um decrescimento na transição para a meia-idade. A menopausa está associada ao declínio no funcionamento sexual sendo que, a satisfação sexual diminuiu em função da idade, no entanto, não foram controladas as variáveis da relação com o companheiro. A sexualidade é uma matéria complexa, delicada e exigente, mais ainda nesta fase de transição da vida da mulher, pelas contradições e eventuais inibições na vivência da sexualidade aliadas às inerentes alterações hormonais. Os profissionais de saúde, nomeadamente os enfermeiros devem estar despertos e instruir as mulheres
para
falarem
sobre
o
assunto
e
assim
ajudar
a
ultrapassar
esta
dificuldade/necessidade. METODOLOGIA Estudo quantitativo com recurso à Escala do ISS (Índice de Satisfação Sexual) validada para a população portuguesa por Pechorro em 2009, que é uma escala de 25 itens com resposta do tipo Likert. Os resultados do ISS foram calculados utilizando uma fórmula com uma pontuação entre 0 e 100. Quando a pontuação é alta, a satisfação sexual é baixa. Foi aplicado um questionário de autopreenchimento a homens (n = 66) e mulheres (n = 60) entre dos 45 e 60 anos de idade (total n = 126). Os dados recolhidos foram analisados utilizando o SPSS 19.0 ®.
52
ANÁLISE e DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Relativamente à análise dos resultados, no que respeita à idade, 61 dos participantes tinham idades compreendidas entre os 45 e os 50 anos, 45 dos participantes entre os 51 e os 55 anos e os restantes 20 participantes entre os 56 e os 60 anos de idade. Dos 126 participantes, 114 têm como tipo de relacionamento o casamento enquanto 12 mantêm
uma
união
de
facto.
No
que
respeita
à
escolaridade
existe
alguma
heterogeneidade pelo que 14 (11%) dos participantes concluíram o 1º ciclo, 24 (19%) o 2º ciclo, 30 (24%) o ensino secundário, 43 (34%), são detentores de uma licenciatura e finalmente os restantes 15 (15%) participantes concluíram formação superior de 2º e 3º ciclos (MBA, PhD, etc.). O grupo profissional apresenta também elevada heterogeneidade tendo como maior expressão de participantes nos “especialistas das profissões intelectuais e científicas” (n=23), “pessoal administrativo e similares” (n=26), “pessoal dos serviços e vendedores” (n=22) “técnicos e profissionais de nível intermédio” (n=14) e “trabalhadores não qualificados” (n=15). Os restantes participantes distribuem-se pelas categorias “quadros superiores da administração pública/empresa”, “desempregados”, “operários, artífices e trabalhadores similares”, “operadores de máquinas/trabalhadores de montagem” e “reformados”. Os resultados obtidos através da análise estatística permitiram validar que o Índice de Satisfação Sexual apresentou uma média de 30 pontos, desvio padrão de 15,85 pontos, mínimo de 2,67 e máximo de 62 pontos. Podemos assim entender que, de uma forma geral, parece existir satisfação sexual nestes participantes. No que respeita à idade, é o grupo etário dos 51 aos 55 anos que apresentam maior índice de satisfação sexual (média = 28,18). Os grupos etários dos 45-50 anos e dos 56-60 anos apresentam respetivamente uma média de 32,68 e 31,93. È de referir que, por um lado, a vida familiar e as atividades relacionadas com a carreira profissional podem interferir na vivência e na satisfação sexual e por outro, com o evoluir na idade e decorrente do processo de envelhecimento ocorre a andropausa e menopausa, onde a eventual diminuição da libido proveniente pela inerente diminuição dos níveis hormonais, pode levar a uma diminuição da satisfação sexual (Pechorro, 2009). No que concerne ao tipo de relacionamento, os participantes casados têm um índice de satisfação sexual superior (média = 30,68) ao contrário dos participantes em união de facto (média = 33,56). De relevar que a amostra de participantes casados é claramente superior pelo que extrapolações não são aconselhadas. No que diz respeito à escolaridade, os resultados são diretamente proporcionais à evolução do grau académico, ou seja, quanto maior o grau de escolaridade, maior a perceção da satisfação sexual. Os participantes com o 1º ciclo apresentam uma média de 38,14 no ISS e os participantes com formação de 2º e 53
3ºs ciclos do ensino superior apresentam uma média de ISS de 17,51. Estes dados explicam-se pela diferente conceção e entendimento da vivencia da sexualidade, induzindo a que, quanto maior o conhecimento, maior a satisfação sexual. Relativamente ao grupo profissional, observou-se que os desempregados são o grupo com maior (in)satisfação sexual, o desemprego poderá ser um factor de stress e contribuir assim para esta insatisfação sexual, contrariamente aos grupos de maior diferenciação técnico-científica que provavelmente terão também rendimentos superiores que apresentam maior satisfação sexual. Salientamos que os participantes reformados apresentam um elevado valor de satisfação sexual, próximo aos grupos com maior satisfação sexual. A análise da ISS tendo em conta o sexo é bastante similar não existindo diferença estatisticamente significativa. CONCLUSÕES Neste estudo verificou-se menor satisfação sexual entre os desempregados, nos profissionais menos qualificadas, nos participantes com menor escolaridade e nas mulheres. Estes dados podem ser explicados, no caso dos desempregados, com o stress inerente à falta de trabalho e, no caso das profissões de menor qualificação, com o facto de que pertencem a uma geração mais velha, cuja sexualidade tinha a vertente puramente reprodutiva. Em relação à idade, há uma menor incidência de satisfação na faixa etária dos 45-50 e 56-60, que pode ser explicada por Pechorro (2009) que indica que na primeira faixa etária, as atividades relacionadas com a vida familiar e a carreira podem diminuir a satisfação sexual. No segundo grupo referenciado, em idade mais avançada, a incidência da menopausa e da andropausa bem como uma diminuição da libido, podem muito bem levar a uma diminuição da satisfação sexual. A maioria da população em estudo situa-se numa pontuação abaixo de 30, o que significa que temos uma população sexualmente satisfeita no entanto é preocupante um valor de ISS de 62 porque pode ser um indicador de stress sexual que poderá evoluir para uma situação de violência sexual. Embora fraca, obtivemos uma correlação estatisticamente significativa entre o ISS e o grau de estudos em que quanto maior a escolaridade maior a satisfação sexual. Parece imprescindível um maior investimento no sentido de aumentar a literacia em saúde para que a sexualidade na meia-idade seja vivenciada de forma positiva e segura. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Araya Gutierrez, Alejandra, Urrutia Soto, Maria Teresa & Cabieses Valdes, Baltica. Climaterio Y Postmenopausia: Aspectos Educativos A Considerar Segun La Etapa Del Periodo. Cienc. enferm. [online]. 2006, vol.12, n.1 [citado 2012-03-11], pp. 1954
27. Disponível em: <http://www.scielo.cl/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S071795532006000100003&lng=es&nrm=iso>. ISSN 0717-9553.
doi: 10.4067/S0717-
95532006000100003. 2. Badran, A. V., Araújo, A. L. L., Nagae, D. K. I., Takahashi, L. R., Formícola, N. R., Miyamoto, W. R., Prado, R. A. A. (2007). Aspectos da sexualidade na menopausa. Arquivos médicos dos Hospitais e da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, 52(2), 39-43. 3. Pechorro, P., Diniz, A., Almeida, S., & Vieira, R. (2009). Validação de uma versão feminina do Índice de Satisfação Sexual (ISS). (Italian). [Article]. Laboratório de Psicologia, 7(1), 45-56. 4. Pechorro, P., Diniz, A., & Vieira, R. (2010). Funcionamento sexual e ciclo de vida em mulheres portuguesas. Análise Psicológica, 28(4), 665-681.
55
8
COMUNICAÇÃO INTRAUTERINA: PROMOÇÃO E INTERVENÇÃO Adriana Jorge da Silva Pereira Vaz Machado1 & Ângela Marisa Vaz Meira2 1) Enfermeira a exercer funções no Centro Hospitalar do Baixo Vouga; Pós-Graduada em
Saúde
Familiar;
Mestranda
em
Enfermagem
Comunitária
aadri.machado@gmail.com 2) Enfermeira a exercer funções no Centro de Saúde de Lousada – ACES Tâmega III – Vale do Sousa Norte;
Pós-Graduada em Saúde Familiar; Mestranda em
Enfermagem Comunitária, dinah_meira@hotmail.com RESUMO A gravidez constitui um momento único na vida de um casal, sendo um processo complexo que se edifica com o decorrer da mesma e que contribui para a transição de papéis através da construção de laços que perduram para a vida (Silva & Lopes, 2008). Deste modo, e por o feto, antes do nascimento, já ser considerado um ser dotado de sentimentos, recordações e de consciência, Lemos e Silva (2012) salientam que é de extrema importância que os pais sejam estimulados pelos enfermeiros a exercer a comunicação intrauterina como um exercício de construção da parentalidade para obter a sintonia e equilíbrio familiar. Esta é concretizada através de técnicas simples de efetuar e que devem ser encaradas como um hábito do casal a partir das 22 semanas de gestação (Silva & Lopes, 2008), e que englobam a musicoterapia, as conversas com o bebé, a haptonomia e os pensamentos positivos. Palavras-Chave: Comunicação Intrauterina, Enfermeiro INTRODUÇÃO Os laços emocionais devem ser criados ao longo da gravidez, passando por uma adaptação e reorganização, de modo a que cada membro se adapte à nova estrutura familiar. Silva e Lopes (2008) descrevem que este processo ocorre “como se as capacidades motoras e sensoriais do bebé e as fantasias poderosas dos pais se encontrassem e procurassem um equilíbrio.” Lemos e Silva (2012) defendem que a maternidade e o nascimento de um bebé são acontecimentos únicos na vida de um casal e que apesar de geradores de dúvidas, angústias, inquietações, receios e medos, devem ser vividos em plenitude por ambos os 56
progenitores e restante família, sendo que os enfermeiros têm um papel preponderante na minimização destes problemas, orientando o casal para estratégias eficazes. Os autores supramencionados declaram que até meados do século passado, estas estratégias eram limitadas, pois “o útero era considerado, uma fortaleza, ambiente seguro e privilegiado que encerrava o feto no seu interior, sem que a luz, o ruído ou o toque pudessem ser por ele percebidos”, afirmando-se mesmo que não existia qualquer tipo de estimulação interna ou externa durante a gravidez. No entanto, Pastrana (2013) cita diversos estudos que demonstram que o feto evidencia um conjunto de competências, designadas de competências fetais, e que é ainda no útero materno que este começa a desenvolver as capacidades sensoriais como a audição, a visão, o gosto e o tato. Delassus (2002) afirma que “o feto vive, o feto existe, o feto é uma pessoa, desde logo pelo facto de a mãe o poder sentir a viver no seu interior. O feto é objecto de uma intensa comunicação que não necessita de palavras”. Deste modo, Pastrana (2013) consente que a história de vida “começa, portanto, antes do seu nascimento e pode ser estruturada de forma mais saudável e harmoniosa, se desde a concepção o bebé for entendido como um ser em formação, com sentimentos e emoções, e que sabe expressar as suas necessidades se houver alguém que possa e consiga captarlhes o sentido para satisfazê-las.” Comunicação Intrauterina Para que esta vida seja então estruturada de forma harmoniosa e saudável, os enfermeiros podem e devem fomentar o estabelecimento e o fortalecimento da vinculação da tríade (mãe/pai/filho) através da comunicação intrauterina, pois esta é rica em interações e estímulos (Lemos & Silva, 2012), que proporcionam um maior conhecimento das características de cada elemento da nova família em construção, pois para além de desenvolverem capacidades de comunicação, todos aprendem a conhecer os seus ritmos e as suas estratégias para partilhar sentimentos e situações do dia-a-dia, iniciando-se assim as trocas que vão cimentar a aliança familiar numa relação de vida e para a vida (Silva & Lopes, 2008). Para Lemos e Silva (2012) a comunicação intrauterina, deve ser iniciada a partir das 22 semanas de gestação, e é um exercício de construção da parentalidade, tornando os pais conscientes de que “o feto nasce num plano mental muito antes de nascer no plano obstétrico” (Sá, 2001), que existe um ser em formação e que necessita desta comunicação para se sentir amado, desejado, compreendido e respeitado e que ao estimularem a
57
comunicação, estão a aprofundar a relação afetiva com o feto, já que o meio intrauterino não é inócuo a sons e ao toque. Pastrana (2013) refere que por forma a tornar este exercício eficaz o enfermeiro deverá estimular o casal a, através do pensamento e do toque, convidar o bebé a realizar determinados movimentos e a observarem as suas respostas, explicando que quanto mais aprofundarem a sintonia familiar, mais forte se tornará o vinculo afetivo. A mesma autora reforça a ideia que de “mais do que pensar no diálogo com o bebé neste momento, o que importa é sentir que a comunicação efectivamente se estabelece.” O sucesso da comunicação/interação com o feto depende de uma estimulação mantida e repetida ao longo do seu crescimento, uma vez que é através da interpretação das suas experiências intrauterinas de comunicação, que se vai promover o início da construção dos laços emocionais (Silva & Lopes, 2008). No entanto, Silva e Lopes (2008) realçam que não há só uma forma de comunicar, e que a comunicação intrauterina, é estabelecida de forma fisiológica, comportamental e/ou empática:
•
Fisiológica: na qual o cordão umbilical e a placenta, na troca de nutrientes e oxigénio, atuam como suporte à comunicação,
•
Comportamental: face às reações que a mãe, o pai e o bebé desenvolvem perante os estímulos. São reações únicas pois são inerentes a cada indivíduo e à sua forma de sentir e expressar emoções,
•
Empática: relativa à sensação física e emocional que afeta o bebé durante a gravidez, contendo por este motivo aspetos característicos das anteriores.
Os mesmos autores afirmam que existem técnicas específicas de comunicação intrauterina e estas devem ser realizadas num momento de tranquilidade propício à convivência da família, para que mãe, pai e bebé desfrutem da troca de sentimentos positivos e para que estes laços se perpetuem após o nascimento. Importa também referir que, o enfermeiro ao elucidar o casal sobre as técnicas, deve ter em conta que estas se constituem como linhas condutoras, adaptáveis de acordo com a forma como o casal se relaciona e com as suas necessidades no processo de evolução de casal a pais. Porém, é pertinente informar/relembrar o casal de que o momento escolhido para qualquer uma das técnicas (Musicoterapia, as Conversas com o Bebé, a Haptonomia e os
58
Pensamentos Positivos) deverá ser dedicado exclusivamente para a comunicação intrauterina pois as técnicas têm como fundamento obrigar a família a parar, a refletir, a estar uns com os outros, a partilhar os bons e maus momentos, o afeto (Lemos & Silva, 2012). Musicoterapia Silva e Lopes (2008) defendem que a música constitui uma ponte facilitadora da criação do vínculo entre o casal e o feto, pois permite consciente e inconscientemente a construção de um momento agradável de partilha de sentimentos e afetos. Referem ainda que nesta técnica, o mais importante é a semelhança da sonoridade e do ritmo da música escolhida; assim como a alternância entre períodos de tranquilidade e períodos musicais, por forma a que haja um desenvolvimento gradual da audição e por consequência a associação de períodos de relaxamento ao estímulo musical, com vista à sua reação após o nascimento, pois “o bebé, ao sentir-se envolvido num momento de carinho, e de disponibilidade dos pais para consigo, poderá desenvolver um sentimento positivo quando ouve a música utilizada durante a gravidez”. Conversas com o Bebé As conversas com o bebé constituem-se como uma fonte de estímulos externos relacionados com os diálogos dos pais. A voz da mãe é a ouvida mais vezes pelo bebé no decorrer da gravidez, mesmo que o discurso não seja direcionado para ele. No entanto, sempre que as conversas forem direcionadas para o bebé, os laços emocionais estão a ser fortalecidos, daí que mais tarde seja evidente o reconhecimento e preferência do bebé pelas vozes mais significativas. A serenidade sentida ao efetuar esta técnica é outra mais-valia, pois propicia uma maior disponibilidade e motivação do casal para a comunicação (Silva & Lopes, 2008).
59
Haptonomia Pacheco et al (2007) classificam o toque como “uma das primeiras terapias descobertas pelo ser humano, e a estimulação pelo toque é necessária para o bem-estar físico e emocional”, pois “toda a vivência humana está associada ao toque como forma de comunicação”. Desta forma, o toque da Haptonomia é um toque comunicativo. A aprendizagem e uso deste toque durante a gravidez, pode ser muito benéfica para o casal, pois ainda in utero, preparam-se para o nascimento do seu filho, criando um vínculo afetivo e transmitindo ternura e segurança ao bebé (Pastrana, 2013). É de extrema importância pois o toque é uma das vias de transmissão que permite o desenvolvimento e aprofundamento das relações de confiança. Todas as pressões, texturas, temperaturas e sensações expressas ao tocar, são apreendidas pelo sistema sensorial do ser que é tocado (Silva & Lopes, 2008). A Haptonomia tem ainda a vantagem de permitir reduzir a diferença entre a vivência do pai em relação àquela que a mãe possui com o bebé (Panier cit in. Pastrana, 2013). Para que o toque seja executado com sucesso, Pastrana (2013) declara que a mãe deverá estar deitada numa posição confortável, e o pai posicionado também de forma confortável, coloca as suas mãos à volta da barriga da grávida, expressando ternura, presença e contacto afetivo. Lima (2012) afirma também que “quando o contacto está estabelecido entre os três, os pais são convidados progressivamente a partilhar com o bebé toques: intencionais, doces, lentos e globais. O tom é de partilha: os pais “brincam” com o seu bebé e este responde”. Pensamentos Positivos Contrariamente à haptonomia, os pensamentos positivos são a técnica de comunicação intrauterina que privilegia a mãe, pois só ela pode estabelecer este tipo de pensamentos com o seu bebé. Silva e Lopes (2008) afirmam que é fundamental a existência de uma disponibilidade afetiva por parte da mãe e que esta se concentre no seu bebé e nos benefícios que o momento de partilha e de estimulação representam para a vida intrauterina, pois a nível fisiológico gerase uma resposta hormonal associada ao relaxamento e à tranquilidade.
60
A realização desta forma de comunicação contribui para a saúde emocional e física do bebé, pois ocorre uma troca de sentimentos positivos caracterizada pelo carinho e ternura entre a mãe e o bebé. CONCLUSÃO A comunicação intrauterina é vital no fortalecimento da aliança familiar e na preparação para a chegada do novo elemento à família. As técnicas devem por este motivo integrar a rotina diária do casal, e serem transformadas em momentos tranquilos de reflexão, diálogo e partilha de sentimentos e amor entre o meio exterior e o meio intrauterino. O Enfermeiro deve incentivar esta prática salientando que esta irá influenciar o modo como o bebé se relacionará com o mundo, e que a devem encarar como o ponto de partida para a busca da sintonia e equilíbrio familiar. Como tal, é importante que o profissional de saúde desenvolva a capacidade de escuta ativa, e descubra as convicções sobre a saúde daquele casal de forma a criar uma relação terapêutica, ajudando o casal a desenvolver as suas próprias capacidades de comunicação. (Pastrana, 2013).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Delassus, J. (2002). O Génio do Feto: Vida Pré-Natal e Origem do Homem. Lisboa: Instituto Piaget Lemos, M. & Silva, M. (2012). Falando com o Bebé… Consultado em 10 de Novembro de 2013;
Disponível
em
http://www.ordemenfermeiros.pt/sites/madeira/informacao/Documents/Artigos%20Enfermeir os/FALANDO%20COM%20O%20BEBE%E2%80%A6%20pelas%20%20Enfermeiras%20Es pecialistas%20em%20ESMO%20%20M%C2%AA%20Ligia%20Lemos%20e%20M%C2%A A%20Jos%C3%A9%20Silva.pdf. Lima, G. (2012). Comunicação: O papel da Enfermagem Clínica em Obstetrícia. Equipa Multiprofissional – Abordagem Perinatal. Escola Superior de Saúde de Santarém Pacheco, S.; Viegas, S.; Rosa, Z. (2007). Toque Terapêutico – fundamentação e aplicabilidade em enfermagem. Nursing nº 224 Pastrana, M. (2013). Comunicar com o Bebé antes de Ele nascer através da Haptonomia. Consultado em 10 de Novembro de 2013; Disponível em http://www.chbalgarvio.min-
61
saude.pt/NR/rdonlyres/B85D81E0-0C79-426E-99306CED2DFD0F7E/25522/Haptonomia.pdf. Sá, E. (2001). Psicologia do Feto e da Gravidez. (3ª ed.). Lisboa: Fim de Século Edições Silva, M. & Lopes, N. (2008). Comunicação Intra-Uterina. Amadora: Instituto de Formação em Enfermagem
62
9
ORIENTAÇÕES DE ENFERMAGEM FACE AO ABORTAMENTO ESPONTÂNEO
Amandina Borges¹ & Teresa Correia²
¹Unidade Local de Saúde do Nordeste, E.P.E, Unidade de Bragança - Enfermeira Especialista no serviço de obstetrícia, mestranda do mestrado em Saúde Materna e Obstetrícia. E-mail: enfnina79@gmail.com ²Instituto Politécnico de Bragança - Escola Superior de Saúde/Centro de Investigação em Desporto, Saúde e Desenvolvimento Humano. E-mail: teresaicorreia@ipb.pt. RESUMO: Introdução: A educação em saúde constitui-se como parte integrante na assistência à mulher que vivencia uma situação de abortamento espontâneo. Objetivo: Identificar as orientações de Enfermagem fornecidas às mulheres hospitalizadas por abortamento espontâneo, numa Unidade de Saúde do Norte de Portugal. Metodologia: Realizou-se estudo observacional analítico retrospetivo, no período de 2010 a 2012, com amostra inicial de 165 mulheres resultando para análise final 122, após aplicação de critérios de inclusão, conseguida na base de dados do Sistema Informático Hospitalar. A informação foi obtida pela análise dos processos clínicos, feita compilação dos dados para um guião, sustentado na colheita de dados e registos contidos nas notas de enfermagem, depois foram informatizados e tratados no programa SPSS. Foi obtido parecer favorável da Comissão de Ética. Resultados: A prevalência dos abortamentos espontâneos, segundo o ano de análise, sofreu variação, com maior predomínio para o ano de 2011 (43,4%), aumentou com a idade das mulheres, recaiu nas urbanas (64,8%), casadas (75,4%), com escolaridade até ao 12º ano (68,9%), profissão remunerada (61,5%), com filhos (53,3%), sem abortamentos anteriores (75,4%), apresentou-se na forma incompleta (73,8%), com permanência hospitalar de um dia (86,1%) e com ausência de orientações de Enfermagem (83%). Verificou-se associação estatisticamente significativa entre o tempo de permanência hospitalar e as orientações de Enfermagem, sendo que as mulheres que permanecerem mais de um dia internadas receberam mais orientações de Enfermagem. Conclusão: O acesso à educação em saúde sexual e reprodutiva, sobretudo, para mulheres mais velhas, com menor escolaridade e com mais de um filho, torna-se premente. 63
O tempo de permanência hospitalar parece ser insuficiente para a realização de orientações de Enfermagem, podendo comprometer a qualidade de atenção às mulheres. DESCRITORES: Abortamento espontâneo; Educação em saúde; Hospitalização; Mulheres.
Abstrat Introduction: Health education was established as part of the care for women who experience a miscarriage situation. Objective: Identify the guidelines of Nursing provided to women hospitalized for miscarriage, a Health Unit North of Portugal. Methods: We conducted an observational analytical retrospective study, in the period 20102012, with an initial sample of 165 women resulting 122 for final analysis after application of inclusion criteria , obtained in the database of the Hospital Information System. . The information was obtained by analysis of clinical processes, taken compiling the data to a script, supported the collection of data and records contained in the notes nursing, then were computerized and processed using SPSS. Assent was obtained from the Ethics Committee. Results: The prevalence of spontaneous abortions, according to the year of analysis, has undergone change, with predominance for the year 2011 (43,4%), increases with the age of women, lies in urban (64,8%), married (75,4%), with education up to 12th grade (68,9%), paid profession (61,5%), with children (53,3%), without prior abortions (75,4%) presented in the incompletely (73,8%) remained on a day -hospital (86,1%) and absence of guidance of Nursing (83%). A statistically significant association between length of hospital stay and the guidelines of Nursing, and the women who stay more than one day in hospital receive more guidance Nursing. Conclusion: Access to education on sexual and reproductive health, especially for older women with less education and with more than one child, it is urgent. The length of hospital stay seems to be adequate to meet guidelines of Nursing, compromising the quality of care for women. DESCRIPTORS: Spontaneous abortion; Health education; Hospitalization; Women.
64
INTRODUÇÃO Apesar dos avanços que têm sido apresentados na área de Obstetrícia e da Genética nas últimas décadas, o abortamento continua a ter proporções preocupantes na gestação, tornando-se
um
verdadeiro
desafio
para
os
profissionais
destas
áreas
e,
concomitantemente, angustiante para as mulheres que vivenciam esta perda 1. Os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres devem ser garantidos, e perante um processo de abortamento, espontâneo ou induzido, estas devem ser acolhidas, atendidas e tratadas com dignidade. Contudo, só a partir da década de 90, com a III Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento ocorrida no Cairo, em 1994, e a 4.ª Conferência Mundial sobre a Mulher, ocorrida em Beijing em 1995, o tema abortamento passou a ser tratado como problema de Saúde Pública, afirmando-se os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres como direitos humanos 2. Uma perda involuntária da gravidez pode gerar na mulher inúmeros sentimentos e perceções,
quer
físicos
quer
psicossociais,
variando
com
as
caraterísticas
individuais/familiares e culturais de cada uma destas, exigindo que adaptações sejam desenvolvidas 3. O enfermeiro perante este tipo de situação exerce um papel crucial, gerenciando de modo construtivo, a perda e agindo com responsabilidade e ética, tornando-se essencial ajudar a mulher/família a enfrentar a dor e a elaborar o luto, como resposta normal e saudável a uma perda, assim como, partilhar saberes e encaminhar as situações a outros profissionais sempre que necessário 4,5. Há necessidade de proporcionar qualidade na atenção à mulher, dando espaço à criação de momentos de intensa aprendizagem, onde a educação em saúde assume uma dimensão no processo de cuidar. Deste modo, os profissionais de saúde, sobretudo, os enfermeiros, devem assumir a postura de educadores que compartilham saberes, procurando a manutenção ou recuperação do estado de saúde da mulher e incentivar o planeamento
familiar
para
prevenção
de
gestação
indesejada,
ajudando-a
e
proporcionando-lhe orientações, tornando-a ativa no seu processo de saúde 6. A profissão de Enfermagem tem ao longo do tempo contestado por maior autonomia no exercício das suas funções, pelo que salienta-se a importância da execução de registos de Enfermagem como parte integrante dos cuidados no sentido dessa mesma autonomia. A documentação dos cuidados torna-se sinónimo dos próprios cuidados, pelo que um cuidado não registado é considerado não realizado 7,8. De ressaltar que, são os registos de Enfermagem o testemunho que perdura no tempo, são uma forma de comunicar em equipa, são um meio de individualização dos cuidados prestados às utentes, mas são também eles que facultam proteção legal 9. 65
Por conseguinte, após o abortamento espontâneo há que considerar que a mulher tem direito a opção de ter um filho algum tempo após o abortamento, por essa e por várias razões clínicas, psicológicas e fisiológicas, é necessário que a mulher receba orientação adequada, cabendo ao profissional que as atende orientá-las, esclarecê-las sobre o que de fato ocorreu proporcionando-lhes maior qualidade de vida 10. Deste modo, no sentido da produção de evidência científica, torna-se urgente registar toda a assistência prestada, permitindo assim uma apreciação crítica de cada momento de Enfermagem, desde a admissão até à alta 9. Em face do exposto definiu-se como objetivo para este estudo identificar as orientações de Enfermagem fornecidas às mulheres hospitalizadas por abortamento espontâneo, numa Unidade de Saúde do Norte de Portugal.
METODOLOGIA: Trata-se de um estudo observacional analítico retrospetivo, referente ao período compreendido entre janeiro de 2010 a novembro de 2012, realizado numa Unidade de Saúde do Norte de Portugal. A população foi constituída por 165 mulheres registadas com diagnóstico de abortamento espontâneo, internadas, num serviço de obstetrícia do Norte de Portugal, no período em questão. Foi definido como critério de inclusão as mulheres com o diagnóstico de abortamento espontâneo até 22 semanas, diagnosticado pelo médico, sendo considerado abortamento precoce (Idade gestacional <12 semanas) e tardio (Idade gestacional ≥12 semanas). Foram definidos como critérios de exclusão o registo incompleto de dados relativos às variáveis a analisar, a nível de registos de Enfermagem contidos na colheita de dados e nas notas de evolução das utentes; motivo de internamento no serviço devido a outras formas de interrupção da gravidez e/ou suas consequentes complicações, que não tenham sido resultantes do abortamento espontâneo; ausência de processo clínico. Verificou-se que 10,3% (18) das mulheres apresentavam registos incompletos, 14,5% (23) tinham outro diagnóstico e 0,60% (1) sem acesso ao processo clinico, sendo por isso excluídas, resultando uma amostra final constituída por 122 mulheres. No que respeita, às caraterísticas da amostra, verificamos que a média de idades das mulheres em estudo foi de 31,4 anos, com limite inferior situado nos 17 anos e superior nos 45 anos de idade, a maioria das mulheres vive em área urbana, cerca de 65%, são casadas (75,4%), com escolaridade até ao 12.º ano em cerca de 69% e com profissão remunerada (61,5%). 66
Para a colheita de dados foi elaborado um guião construído a partir do levantamento prévio de variáveis disponíveis nos artigos científicos pesquisados e relacionadas com a temática. O guião foi constituído por 5 grupos de questões fechadas, sendo que o primeiro dizia respeito às caraterísticas sociais e demográficas, nomeadamente, idade, zona de proveniência, estado civil, escolaridade, profissão; o segundo referia-se às variáveis reprodutivas, como número (nº) de gestações, nº de filhos, nº de abortamentos anteriores, idade gestacional, aceitação da gravidez atual, antecedentes pessoais, o terceiro reportavase ao episódio atual de abortamento, no que respeita a problemas de saúde decorrentes da gravidez atual, formas clínicas de abortamento, procedimentos adotados, complicações do abortamento, estudo anatomopatológico, tempo de permanência hospitalar, o quarto relativo ao consumo de tabaco e de drogas ilícitas e o quinto relativo às orientações fornecidas às mulheres, contempladas nos registos de Enfermagem. A recolha de dados foi, então, realizada pela consulta dos registos dos processos clínicos das mulheres que sofreram abortamento espontâneo tendo como suporte o guião. A informação foi recolhida pelas investigadoras, em colaboração com a médica responsável pela sua recolha, realizada nos dias úteis, entre 9 e 17 horas, durante o mês de janeiro e fevereiro de 2013, no serviço de arquivo da Unidade de Saúde. Para a concretização deste estudo foram respeitados os requisitos éticos tanto a nível administrativo como a nível individual. A informação foi analisada com a metodologia estatística usual, após a sua informatização, com recurso ao programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS®), versão 19.0. Foi usada a estatística descritiva e inferencial. Para verificar a associação entre as variáveis independentes e a dependente, utilizou-se o teste não paramétrico x2, para o qual foi adotado o valor de 10% como nível de significância. Também foi utilizado o teste de Fisher, onde se fixou o nível de significância de 5%, de modo a verificar a ocorrência de diferenças estatisticamente significantes em relação à associação entre as variáveis. Foi obtido parecer favorável da Comissão de Ética e autorização da instituição para desenvolvimento da investigação. Não foram incluídas informações de identificação pessoal, pois todo o processo que envolveu a colheita de dados foi realizado com total anonimato das mulheres, apenas foram utilizados números, tendo sido garantida a confidencialidade e proteção das informações pessoais e observadas as regras de conduta da Declaração de Helsínquia, bem como, a legislação nacional em vigor.
67
RESULTADOS A distribuição das mulheres internadas por abortamento espontâneo, nos três anos considerados, foi a seguinte: 49 (40,2%) no ano de 2010, 53 (43,4%) no ano 2011 e 20 (16,4%) no ano de 2012. Quanto às caraterísticas sociais e demográficas, verificou-se que com o aumento de idade registou-se um aumento do número de mulheres que abortaram, incidindo a sua prevalência nas residentes em área urbana (cerca de 65%), casadas (75%), que têm até 12 anos de escolaridade (cerca de 69%), com percentagem semelhante para as mulheres com profissão remunerada. No que respeita às caraterísticas reprodutivas, verificou-se que 53,3% tinham filhos, aproximadamente metade (42%) eram primigestas e 75% não tinham antecedente de abortamento. Para mais de metade das mulheres (cerca de 66%) o abortamento foi precoce, ocorrendo na forma clínica incompleta, em cerca de 74% das mulheres, destacando-se como procedimentos adotados a curetagem e Misoprostol + curetagem que totalizaram mais de metade (50%) destes. No que respeita ao tempo de permanência hospitalar este diz respeito aos dias em que as mulheres se encontraram internadas no serviço de obstetrícia, verificou-se que a permanência prevaleceu para um dia de internamento (86,1%). Constatou-se maior prevalência nas mulheres que não receberam orientações durante o internamento (Figura 1).
17% Realizados 83%
Não Realizados
Figura 1- Distribuição da amostra de acordo com as orientações de Enfermagem. Norte, Portugal, 2010-2012.
68
Através da observação da Tabela 1, verificou-se que as variáveis que se associaram de modo estatisticamente significativo com o maior número de abortamentos foram: idade igual ou superior a 35 anos (OR=4,5, IC:1,886 – 10,737; p=0,001); número de filhos superior a um (OR=4,9 IC:1,859 – 13,318; p=0,001) e procedimento medicamentoso (OR=5,4, IC:1,582 – 18,242; p=0,007), apresentando um risco cerca de 5 vezes superior de ter mais de um abortamento em relação às que não apresentaram estas caraterísticas. Tabela 1- Distribuição da amostra de acordo com as variáveis relacionadas com o risco de ocorrência do número de abortamentos. Norte, Portugal, 2010-2012.
Variável
N
%
1 Abortamento (%)
>1 Abortamento (%)
OR
p
IC (95%)
Idade < 35 anos
81
≥ 35 anos
41
6 6 3 4
85,2 56,1
14,8
1†
43,9
4,5
30,2
1,580
21,5
1†
26,1
1,142
20,0
1†
26,2
1,331
21,1
1†
29,3
2,024
17,0
1†
10,5
1†
36,9
4,976
27,2
1,538
19,5
1†
0,001*
1,886-10,737
Zona de proveniência Rural
43
Urbana
79
3 5 6 5
69,8 78,5
0,288
0,680-3,674
Estado civil Casada
92
Não casada
30
7 5 2 5
73,9 80
0,503
0,515-3,870
Escolaridade ≤ 12º ano
84
> 12º ano
38
6 9 3 1
73,8 78,9
0,542
0,531-3,336
Profissão Remunerada
75
Não remunerada
47
Número filhos
6 1 3 9
70,7 83
0,128
0,816-5,021
de
<1
57
≥1
65
4 7 5 3
89,5 63,1
1,859-13,318 0,001*
Idade gestacional < 12 semanas
81
≥12 semanas
41
Aceitação
6 6 3 4
72,8 80,5
0,356
0,616-3,838
da
69
Gravidez Não
7
Sim
115
6 9 4
71,4 75,7
28,6
1,243
24,3
1†
0,801
Problemas de saúde decorrentes da gravidez atual
0,228-6,764
0,564-5,779
Não
24
Sim
98
2 0 8 0
83,3 73,5
16,7
1†
26,5
1,806
21,4
1†
42,1
2,678
31,2
1,591
22,2
1†
13,0
1†
44,4
5,371
24,8
1,070
23,5
1†
22,9
1†
30,8
1,495
28,6
1,283
23,8
1†
0,320
Antecedentes pessoais Não
103
Sim
19
8 4 1 6
78,6 57,9
0,960-7,466 0,060
Forma Clínica de abortamento Completo
32
Incompleto
90
2 6 7 4
68,8 77,8
0,311
0,648-3,904
Procedimentos Cirúrgico
54
Medicamentoso
12
8 2 1 8
87 55,6
1,582-18,242 0,007*
Tempo de permanência ≤ 1 dia
105
> 1 dia
17
8 6 1 4
75,2 76,5
0,913
0,321-3,569
0,411
0,573-3,901
0,642
0,448-3,674
Fumadora Não
96
Sim
26
7 9 2 1
77,1 69,2
Orientações de Enfermagem Realizados
21
Não Realizados
101
1 7 8 3
71,4 76,2
*-Valor estatisticamente significativo; †- Classe de referência
Através da Tabela 2 verificou-se que houve associação estatisticamente significativa entre a realização das orientações de Enfermagem e o tempo de permanência hospitalar (p=0,011), já o mesmo não se constatou para a realização das orientações e a aceitação da gravidez. 70
Tabela 2- Associação entre as orientações de Enfermagem e o tempo de permanência hospitalar e a aceitação da gravidez (teste de Fisher). Norte, Portugal, 2010-2012. Orientações de Enfermagem Variável
Realizadas N
Tempo permanência hospitalar
de
Aceitação gravidez
da Não Sim
≤ 1 dia > 1 dia
Não realizadas N
p
14 7
91 10
0,011*
1 20
6 95
0,999
*-Valor estatisticamente significativo
DISCUSSÃO
Na amostra em estudo verificou-se uma variação da prevalência de abortamentos entre os anos de 2010, 2011 e de 2012, tal fato pode ter sido influenciado pela existência de subregisto a nível dos registos. Aquando da análise dos processos clínicos 10,3%, foram excluídos por não apresentarem registos completos e 14,5% por atribuição de outro diagnóstico, evidência igualmente constatada por outro estudo
11
. Contudo, esta situação
diminuiu a amostra, mas não influenciou os resultados, uma vez que, a amostra final ficou constituída por cerca de 75% dos processos das mulheres. De realçar que, o número de mulheres que sofreram abortamento espontâneo corresponde às que necessitaram de hospitalização, existindo limitações para uma real estimativa da prevalência dos abortamentos espontâneos subclínicos, visto não carecerem de cuidados hospitalares, assim como, ser possível supor que na amostra estudada, parte das mulheres internadas possam ter ocultado o aborto induzido, ou alegar o término da gravidez como perda espontânea, evitando a sua declaração. Esta questão pode ter influenciado os resultados obtidos, sobretudo, no ano de 2011 onde se evidenciou maior frequência, de salientar que, foi nesse ano que em Portugal se assistiu a grave e profunda crise social e económica, onde o número de abortamentos cresceram12. O perfil sociodemográfico permite verificar que as mulheres são mais velhas aquando do primeiro filho (31,4 anos), corroborando com os dados nacionais
12
que indicam a idade
média da mulher para os 31 anos, em 2012, evidenciando-se assim maior tendência para
71
adiar o nascimento do primeiro filho, constituindo uma preocupação, pois a idade avançada compromete a reposição de gerações pela sua exposição a efeitos nefastos. Estas mulheres são maioritariamente casadas, correspondendo este estado civil à maioria das mães em Portugal
12
, se bem que esta prevalência é mais baixa do que a da nossa
amostra. As mulheres da zona urbana tiveram um predomínio de abortamento espontâneo, contrariamente ao relato de um estudo13, no qual se destacam as da zona rural. Para esta situação poderá ter influência as modificações ocorridas na sociedade atual portuguesa, verificando-se a inserção das mulheres no mercado de trabalho, com necessidade de residir em área urbana, local onde existem mais oportunidades. Dependendo do tipo de atividade este fator pode também contribuir para uma maior frequência de abortamentos espontâneos14. Salienta-se que 68,9% das mulheres tinha escolaridade até 12 anos, e 62% com profissão remunerada, indo de encontro às evidências de outros estudos13,15. A menor escolaridade das mulheres supõe a necessidade de adotarem novos papéis no mercado de trabalho, decorrente da sua emancipação e da difícil situação socioeconómica que o país tem atravessado nas últimas décadas, levando assim à não continuidade de estudos a nível superior. No que respeita às caraterísticas reprodutivas, cerca de metade eram primigestas em condições de abortamento espontâneo, constatação igualmente presente noutro estudo 3. Esta experiência é muitas vezes frustrante e determinante na vida dessas mulheres, havendo necessidade de uma atenção integral para amenizar esse sofrimento, carecendo de um olhar especial no cuidado por profissionais de saúde, sobretudo, dos enfermeiros, pois uma atitude profissional inadequada pode influenciar negativamente a evolução correta do luto. Quanto ao número de filhos, os resultados mostraram preponderância nas mulheres com filhos, em consonância com outro estudo13, onde se observou que o abortamento espontâneo foi mais frequentemente mencionado pelas mulheres com mais de um filho vivo. Por conseguinte, no nosso estudo o número de abortamentos variou entre 0 e 6 sendo mais frequente 0 em 75,4%, corroborando com os estudos
16,17
, nos quais para 72,5% e 100%
das mulheres, respetivamente, não se observou abortamento anterior. Estes dados podem ser explicados pelo maior período de exposição à gravidez no início da vida reprodutiva, considerando cada vez mais tardio, indo de encontro aos dados nacionais12. Contudo, a prevenção da repetição do abortamento pressupõe orientação contracetiva adequada, ressaltando aqui a necessidade urgente de sensibilização dos profissionais, para
72
melhorar a assistência às mulheres, assim como, melhorar os registos de dados, de modo a, garantir uma recuperação integral da mulher13. Uma constatação marcante verifica-se em relação à maior prevalência do abortamento precoce, como evidência em outros estudos3,16. A não-aceitação da gravidez nestas mulheres com abortamento espontâneo esteve evidente em 6% destas, corroborando com outro estudo3. É essencial o aprimoramento e ampliação do acesso aos serviços de planeamento familiar para evitar gravidezes indesejadas e diminuir a incidência de abortamentos espontâneos ou provocados. O predomínio do abortamento espontâneo incompleto foi evidente, corroborando com outro estudo18. De salientar que, no que respeita aos procedimentos adotados, destaca-se a curetagem e Misoprostol associado a esta, sendo a curetagem o procedimento mais realizado, resultados corroborados com outros estudos 6,18,19. O tempo de internamento da mulher foi maioritariamente de 1 dia, evidência relatada em outros estudos 6,18, fato que pode comprometer a qualidade de atenção dada às mulheres, isto porque 83% destas não obteve orientações de Enfermagem no internamento. Tal constatação fica reforçada com o destaque de outros estudos11,18,20 vindo a fortalecer esta evidência, verificando-se que o tempo de permanência hospitalar e as orientações de Enfermagem apresentaram uma associação estatisticamente significativamente sendo que as mulheres que permaneceram mais de um dia internadas receberam mais orientações. Assim, o tratamento humanizado pelo profissional de saúde é imprescindível, considerando o período de internamento como uma oportunidade de escuta e promoção de conhecimento, com base na troca de saberes. Deste modo, para os cuidados não existe tempo, nem espaço, iniciando-se antes da interação entre o cuidador e o ser cuidado estendendo-se até após o seu término, produzindo efeitos e mudanças21. Verificou-se que as mulheres com 35 anos ou mais, com mais de um filho e submetidas a procedimento medicamentoso têm um risco superior de ter mais de um abortamento, estes dados podem refletir os efeitos adversos para gestantes que apresentem estas caraterísticas, onde o risco para complicações maternas, fetais e obstétricas se torna acrescido, tal como é evidenciado noutros estudos13,14. CONCLUSÃO
Os resultados desta investigação demonstram que o tempo de permanência hospitalar destas mulheres foi de apenas um dia, parecendo ser insuficiente para a realização de orientações de Enfermagem, mas sabemos que estas devem iniciar logo após o primeiro contato com a mulher, nomeadamente, no acolhimento, tornando-se premente a evolução a nível da documentação da assistência de enfermagem face às mulheres hospitalizadas por 73
abortamento espontâneo. A elaboração de um protocolo de acolhimento e orientação para estas mulheres pode potenciar a sua saúde durante o processo de abortamento e pósabortamento. De salientar que a qualidade de vida destas mulheres, presente e futura, depende, em grande medida dos registos de enfermagem, os quais não devem ser banalizados e o acesso à educação em saúde sexual e reprodutiva torna-se premente, sobretudo para mulheres mais velhas, com menor escolaridade, com mais de um filho e submetidas a procedimento medicamentoso. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: 1- Rolnik DL, Carvalho MHB, Catelani ALPM, Pinto APAR, Lira JBG, Kusagari NK et al. Análise citogenética em material de abortamento espontâneo. Rev. Assoc. Med. Bras. 2010; 56(6): 681-683. 2- Portugal. Ministério da Saúde. Direção Geral de Saúde. Interrupção da Gravidez por Opção da Mulher: Guia informativo. Lisboa: DGS, 2007;32p. 3- Koch C, Santos C, Santos MR. Tradução portuguesa, adaptação e validação da Perinatal Bereavement Grief Scale (PBGS) em mulheres com perda de gravidez. Rev. Enf. Ref. 2012;3(6):123-130. 4- França A, Faundes A, Rosas CF, Aquino E, Soares G, Menezes G et al. Atenção Humanizada ao Abortamento: norma técnica/Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. 1ª Ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2005. 5- Mariano MR, Pinheiro AKB, Aquino PS, Ximenes LB, Pagliuca LMF. Jogo educativo na promoção da saúde de adolescentes: revisão integrativa. Rev. Eletr. Enf. [Internet]. 2013 jan/mar;15(1):265-273. 6- Souza VB, Roecker S, Marcon SS. Ações educativas durante a assistência pré-natal: perceção de gestantes atendidas na rede básica de Maringá-PR. Rev. Eletr. Enf. [Internet]. 2011 abr/jun;13(2):199-210. 7- Martins A, Pinto AA, Lourenço CM, Pimentel E, Fonseca I, André MJ et al. Qual o Lugar da Escrita Sensível nos Registos de Enfermagem? Pensar Enfermagem 2008; 12(2):52-61. 8- Azevedo PMDS, Sousa PAF. Partilha de informação de enfermagem: dimensão do papel de prestador de cuidados. Revista de Enfermagem Referência. III série. Julho 2012;(7):113122. 9- Gonçalves R. REPE e estatuto da ordem dos enfermeiros- Estatuto da Ordem dos Enfermeiros aprovado pelo Decreto-lei nº 104/98, de 21 de Abril, alterado e republicado em Anexo à Lei nº 111/2009, de 16 de Setembro. Lisboa: Ordem dos Enfermeiros; 2012.p.92. 74
10- Bertolani GBM, Oliveira EM. Mulheres em situação de abortamento: estudo de caso. Saúde e Sociedade 2010;19(2):286-301. 11- Carvalho MLO, Aparecida A, Cardelli M, Cestari MEW, Sodré TM. Os registros em prontuário de mulheres atendidas por aborto em Hospital Universitário de cidade da região Sul do Brasil de 2001 a 2005. Fazendo Gênero 8 - Corpo, Violência e Poder. Florianópolis 2008. 12- PORDATA. População residente segundo os Censos: total e por estado civil. Fundação Francisco Manuel dos Santos. Lisboa - Portugal, 2013. 13- Cecatti JG, Guerra GVQL, Sousa MH, Menezes GMS. Aborto no Brasil: um enfoque demográfico. Rev. Bras. Ginecol. Obstet. 2010;32(3):105-111. 14-Noguez PT, Baisch ALM, Vaz MRC, Soares MCF. Aborto espontâneo em mulheres residentes nas proximidades do parque industrial do município do Rio Grande - RS. Texto contexto – Enferm. 2008;17(3):435-446. 15- Silva RS, Carneiro MCMO, Drezett J, Andreoni S. Prevalência e características de mulheres com aborto entre mulheres com histórico de gestação. Journal of Human Growth and Development. 2012;22(1):1-7. 16- Ramos KS, Ferreira ALCG, Souza AIS. Mulheres Hospitalizadas por abortamento em uma Maternidade Escola na Cidade do Recife, Brasil. Rev. Esc. Enferm. USP. 2010; 44(3):605-610. 17- Chaves JHB, Pessini L, Bezerra AFS, Rego G, Nunes R. A interrupção da gravidez na adolescência: aspetos epidemiológicos numa maternidade pública no nordeste do Brasil. Saúde SOC. São Paulo.2012; (21):246-256. 18- Vieira LM, Goldberg TBL, Saes SO, Dória AAB. Abortamento na adolescência: um estudo epidemiológico. Ciênc. Saúde Coletiva. 2007;12(5):1201-1208. 19- Saciloto MP, Konopka CK, Velho MTC, Jobim FC, Resener EV, Muradás RR et al. Aspiração manual intrauterina no tratamento do abortamento incompleto até 12 semanas gestacionais: uma alternativa à curetagem uterina. Rev. Bras Ginecol. Obstet. 2011;33 (10):292-296. 20- Santos AG, Nery IS, Furtado EZL, Moura FMJSP. Perfil de mulheres em situação de abortamento atendidas em uma maternidade pública de Teresinha-Pi. Rev. Rene, Fortaleza. 2011;12(3):494-501. 21- Bazotti KDV, Stumm EMF, Kirchner RM. Ser cuidada por profissionais da saúde: percepções e sentimentos de mulheres que sofreram abortamento. Texto & Contexto – Enferm. 2009;18(1):147-154.
75
76
10 - SABERES E COMPETÊNCIAS DO PAI, COM PREPARAÇÃO PARA O PARTO, DURANTE O TRABALHO DE PARTO E PARTO Olga Maria Telo Pousa Enfermeira Especialista em Saúde Materna e Obstétrica, Mestre em Enfermagem de Saúde Materna e Obstétrica na ESEP, ACES Porto Ocidental – USF Garcia de Orta, email: opousa@gmail.com
RESUMO: A preparação para o parto oferece ao casal momentos de partilha de experiências e a possibilidade de um maior envolvimento do pai no nascimento. Neste estudo foi utilizada uma metodologia qualitativa de cariz exploratório e a amostra, selecionada por conveniência, é constituída por 10 pais que participaram nas aulas de preparação para o parto. O objectivo é perceber quais são os Saberes e Competências do Pai com Preparação para o Parto durante o Trabalho de Parto e Parto. Para tal foram aplicadas entrevistas semiestruturadas e para a sua interpretação recorreu-se à análise de conteúdo, tendo por base de referência Bardin (2009). Os resultados obtidos revelam que os pais procuraram obter informação e apoio por parte dos profissionais de saúde e que consideraram as sessões de preparação para o parto muito importantes, tendo nelas obtido saberes e competências que lhes permitiram ajudar as suas mulheres. Em alguns casos referiram sentir-se melhor preparados e menos ansiosos para o momento do trabalho de parto e parto. Este estudo revelou também que os profissionais de saúde estão cada vez mais despertos para a participação do pai e que estes consideraram que o local que lhes foi destinado é o ideal, não se tendo sentindo limitados para ajudar as suas mulheres. Palavras chave: pai, preparação para o parto, saberes, competências.
INTRODUÇÃO: Nos dias de hoje, a gravidez não é vivida apenas pela mulher, é um período do casal, de vivência conjunta de muitas emoções e expectativas, e que será recordado, por estes, como um momento único nas suas vidas.
77
Mas esta nova visão de englobar o pai e atribuir-lhe um papel cada vez mais ativo em todo o processo de gravidez, trabalho de parto e nascimento, não é inovadora. Como refere Couto (p. 45, 2002), “em certas culturas, como as africanas, o pai tem um papel tanto ou mais importante que a própria parturiente, no entanto, noutras, o pai não tem qualquer função no nascimento do seu filho.” O mesmo autor refere, ainda, que em Portugal se verificam as duas situações, devendo-se este facto às infra-estruturas das nossas unidades hospitalares. No entanto, tem-se comprovado um melhoramento significativo dessas infraestruturas com o intuito de proporcionar um ambiente mais acolhedor e uma prestação de cuidados mais adequada aos casais. Por outro lado, Frydman (cit. por Camus, 2002) refere que nunca se deve obrigar o futuro pai a estar presente ao lado da sua companheira, este deve poder entrar na sala de partos, sair e regressar com toda a flexibilidade. Refere, ainda, que, caso tenha participado nas sessões de preparação para a parentalidade, e se for esse o seu desejo, deve poder acompanhar a mulher/companheira nos períodos de esforço e de descanso, participar nos ritmos de respiração, assegurando assim um papel de apoio ativo e tornando este um momento de cumplicidade e reconforto insubstituíveis. Para o homem, a sua participação no trabalho de parto será o culminar de todo o seu investimento emocional ao longo da gravidez, absorvendo todos os sentimentos descritos pela companheira, observando o feto em crescimento pelas ecografias, ouvindo-o pela auscultação dos ruídos cardíacos fetais e sentindo-o quando toca no ventre materno. A Organização Mundial de Saúde refere que os cuidados pré-natais e no pós-parto devem ser dirigidos à família e centrados nas necessidades da mulher, filho e companheiro. Nesse sentido, as aulas de preparação para o parto não podem nem devem ser dirigidas apenas à mulher. É uma prioridade envolver os pais, que assim o queiram, e permitir que estes adquiram competências para que a sua presença na sala de partos seja cada vez mais ativa e gratificante. Assim, é muito importante conhecer as opiniões, expectativas e competências do pai durante o trabalho de parto e parto para que os profissionais de saúde possam direcionar da melhor forma a sua intervenção, procurando sempre o bem-estar do casal num momento tão importante das suas vidas. Deste modo surge a presente investigação, cujo objeto de estudo se centra nos “Saberes e Competências do Pai com Preparação para o Parto durante o Trabalho de Parto e Nascimento”. Com esta investigação pretende-se saber como é que os pais que realizam sessões educativas de preparação para o parto junto com as suas mulheres/companheiras 78
mobilizam posteriormente os saberes adquiridos para as ajudar durante o trabalho de parto e nascimento. Pretende-se, também, aferir se os saberes adquiridos correspondem não só às suas expectativas anteriores como também à experiência vivida no momento do trabalho de parto e se as sessões formativas de preparação para o parto se adequam às suas reais necessidades.
ENQUADRAMENTO TEÓRICO: O envolvimento paterno pode variar muito ao longo da gestação, seja pelas diferentes fases de desenvolvimento do bebé ou pelas características de cada pai. Relativamente às diferenças ao longo da gravidez, May (cit. por Piccinini et al., 2004) sugere um padrão de mudanças sequenciais no envolvimento emocional dos pais, constituído por três fases. A primeira compreende o período desde a suspeita de gravidez, acompanhada de um grande impacto inicial, até à sua confirmação. Nesta fase os pais podem experimentar reações de desconforto, stress e ambivalência. Na segunda, os pais ainda não sentem a gestação como uma realidade, uma vez que os sinais físicos ainda não são evidentes. Como consequência disso, a distância emocional é a característica mais marcante deste período. Na última fase, os homens vivenciam a gestação como real e importante nas suas vidas, conseguindo, assim, definir-se como pais. Normalmente, e ainda segundo a mesma autora, este último estágio ocorre no terceiro trimestre da gestação, quando o nascimento do bebé está mais próximo e os pais se tornam mais participativos nos preparativos para a sua chegada. May (cit. por Lis et al., 2004), nas suas diversas pesquisas, identificou, também, três estilos paternos de distanciamento e/ou envolvimento durante a gravidez: observador, expressivo e instrumental. No estilo observador, os pais veem-se em grande parte como observadores, relatam pouco envolvimento emocional na gravidez e indicam que esta não é uma parte importante da sua vida, embora se sintam felizes estão ausentes de todo o processo gravídico. No estilo expressivo, os pais estão mais envolvidos com a gravidez e, muitas vezes, ficam preocupados com seu próprio envolvimento emocional. Neste, os pais pretendem ser parceiros ativos na parentalidade precoce e fazer uma preparação mais consciente. No estilo instrumental, os pais concentram-se nas tarefas que têm que ser realizadas, enfatizando a sua própria responsabilidade de proteção e apoio à companheira.
79
O papel do homem como acompanhante e fonte de apoio da parturiente é relativamente recente na nossa sociedade, no entanto, a sua importância é reconhecida por todos os profissionais da área da saúde materna e obstétrica (Carvalho, 2003). A preparação para o parto é um momento privilegiado de educação para a saúde que permite ao casal a aquisição dos saberes e competências necessários para o parto. Segundo Lowdermilk e Perry (2008), com exceção das aulas de preparação para o parto, o pai tem poucas oportunidades para aprender a tornar-se um parceiro envolvido e ativo neste ritual de passagem para a parentalidade. As tensões e apreensões do pai, que não tem apoio e não está preparado, são facilmente transmitidas e podem aumentar os receios da mãe. Assim, o enfermeiro pode e deve ter um papel de partilha do saber que permita a promoção da gravidez e do parto como uma experiência familiar gratificante. Segundo Dellman (2004), as aulas de preparação para o parto devem encorajar os casais a clarificar as expectativas que têm um no outro, de acordo com as suas crenças, motivações e desejos. Devem fazer uma avaliação honesta dos seus sentimentos e habilidades no sentido de satisfazerem as suas necessidades. Só assim conseguirão fazer uma escolha livre e informada para participar no trabalho de parto. Esta escolha deve ser por razões positivas e não porque o pai se sente pressionado para fazer algo que lhe é desconfortável. Relativamente aos saberes, Maglaive (1995) distingue três tipos de saberes: saberes teóricos, saberes processuais e saberes práticos. De um modo geral, os saberes teóricos permitem conhecer o objeto e as suas modalidades de transformação; os saberes processuais correspondem aos modos de fazer, às modalidades de organização dos procedimentos e às formas como funcionam; os saberes práticos estão diretamente ligados à ação e ao seu desenvolvimento e os saberes-fazer são relativos à manifestação dos atos humanos. Os saberes práticos e os saberes-fazer são muito mais do domínio da ação do que da palavra, no entanto, estes podem adquirir a sua gíria própria e uma autonomia específica. Nas suas pesquisas, Chapman (cit. por Bobak et al., 1999) referiu três possíveis papéis que o homem pode adotar durante o trabalho de parto e parto: o de orientador, como membro da equipa e o de observador. Como orientador, o pai mostra uma grande necessidade de se controlar e de controlar o trabalho de parto; neste, a mulher mostra um grande desejo de que o pai esteja fisicamente envolvido no trabalho de parto. Como membro da equipa, o pai ajuda a mulher durante o trabalho de parto e parto através do apoio físico e emocional de ambos; neste, a mulher exprime um grande desejo de ter o pai presente a ajudá-la de qualquer maneira. No papel de observador este atua como companheiro fornecendo apoio emocional e moral; no entanto, não tem qualquer outro tipo de participação mais ativa, 80
podendo até se ausentar por longos períodos; neste tipo de papel o pai acha que tem pouco para fazer, observando apenas o que está a acontecer e as mulheres também não esperam mais do que a sua presença.
METODOLOGIA: Para a realização deste estudo foi utilizada uma metodologia qualitativa, de cariz exploratório. A amostragem selecionada por conveniência é constituída por 10 pais que participaram nas aulas de preparação para o parto, na USF Garcia de Orta e no Centro Português de Preparação para o Parto – In Útero, e que posteriormente assistiram ao trabalho de parto e parto das suas companheiras. Os dados foram obtidos através da aplicação de entrevistas semiestruturadas e para a sua interpretação recorreu-se à análise de conteúdo, tendo por base de referência Bardin (2009).
RESULTADOS: Da análise dos dados, emergiram seis categorias principais: expectativas, valorização da preparação para o parto, sentimentos vivenciados durante o trabalho de parto e parto, saberes adquiridos, ambiente e atitude do pai. Nas entrevistas realizadas, relativamente à importância atribuída pelos pais à preparação para o parto, foram identificadas duas categorias, designadas por: expectativas e valorização da preparação para o parto. A estas foram ainda atribuídas subcategorias que estão descritas na tabela abaixo citada. Tabela 1: Importância da preparação para o parto Categoria
Subcategoria
Expectativas
Informação Conhecimento Apoio
Valorização da Preparação para o Parto
Vontade em participar Importância das sessões formativas
Da análise dos depoimentos constatou-se que as principais expectativas que os pais têm relativamente
às
aulas
de
preparação
para
o
parto
é
a
obtenção
de 81
informação/conhecimento e o apoio dos profissionais no sentido de os ajudarem a perceber qual a sua função e de como poderiam ajudar a mulher durante o trabalho de parto e parto. Assim, as principais subcategorias que emergem são: informação, conhecimento e apoio. Relativamente à categoria valorização da preparação para o parto emergem como subcategorias “vontade em participar” e “importância das sessões informativas”. Através da análise dos depoimentos, podemos verificar que, tal como nos refere May (cit. por Lis et al., 2004), temos três estilos paternos, relativamente ao seu envolvimento na gravidez: o pai observador, que frequenta as aulas mas um pouco contrariado e achando que é mais direcionado para a mulher. O pai expressivo que, embora seja a mulher a procurar informações sobre o curso revela vontade em participar. E o pai instrumental que revela uma vontade e responsabilidade em participar e acompanhar a mulher em tudo que se relacione com a gravidez e a preparação para o parto. Apesar das diferenças de estilo parental, já referidas, todos os participantes mencionaram que tinha sido bastante importante terem participado nas aulas de preparação para o parto, tendo-se revelado fundamental para o seu desempenho na altura do trabalho de parto e parto. Os pais têm grandes expectativas e curiosidade em relação ao trabalho de parto e parto. No entanto, este acontecimento único nas suas vidas causa uma complexidade de sentimentos, tanto positivos como negativos tal como podemos constatar no nosso estudo. Neste sentido surgem as subcategorias a seguir descritas.
Tabela 2: Pai durante o trabalho de parto e nascimento Categoria
Subcategoria
Sentimentos vivenciados
Ambivalência Dificuldade em expressar o vivenciado Tranquilidade Motivação Ansiedade Medo
Em alguns depoimentos podemos verificar, tal como nos referem Lowdermilk e Perry (2008), que os sentimentos de um homem que é pai pela primeira vez vão-se alterando ao longo do trabalho de parto. Apesar de no início aparentar estar calmo, sentimentos de medo e impotência começam a dominá-lo à medida que o trabalho de parto se torna mais ativo e, por vezes, acontecem coisas que não imaginava ou não estava à espera. 82
Tendo por base os saberes de Malglaive (1995) emergiram as subcategorias abaixo descritas. Tabela 3: Saberes e competências do pai com preparação para o parto Categoria
Subcategoria
Saberes adquiridos
Teórico Processual Prático
Através dos depoimentos recolhidos verificamos que a aquisição dos saberes teóricos foi unânime, considerando-se estes como os conhecimentos necessários para ajudarem a mulher No entanto, alguns dos entrevistados, para além de terem adquirido os saberes teóricos, conseguiram colocar esses conhecimentos em prática, passando a demonstrar a aquisição de saberes processuais e no desenvolvimento das ações revelaram também terem conseguido adquirir os saberes práticos. Para que os pais consigam colocar em prática os conhecimentos adquiridos é necessário que as instituições estejam preparadas e os profissionais despertos e motivados para os englobar nos cuidados prestados. Assim, com o intuito de percebermos como é que os pais se sentiram, tanto a nível de espaço físico como a nível de apoio profissional, surgiram as categorias e subcategorias descritas na tabela abaixo citada. Tabela 4: Mobilização dos saberes e competências adquiridos nas aulas de preparação para o parto Categoria
Subcategoria
Ambiente
Condições físicas do serviço Atitude dos profissionais
Atitude do pai
Orientador Membro da Equipa Observador
83
Relativamente à estrutura física do serviço, os entrevistados referem que o local existente para o pai, no bloco de partos, era o mais adequado. No entanto, em alguns depoimentos, verificamos que os pais consideraram importante serem questionados acerca do seu bemestar. Na subcategoria “atitude os profissionais”, alguns depoimentos revelaram uma grande abertura por parte dos profissionais, procurando envolver o pai nos cuidados, favorecendo a liberdade de movimentos e mostrando uma atitude de empatia com os casais. Relativamente à subcategoria “atitude do pai”, foi, também, possível verificar os diferentes papéis desempenhados pelos pais, ao longo do trabalho de parto, referidos por Chapman (cit. por Bobak et al., 1999). Temos então três papéis que o homem pode adotar durante o trabalho de parto e parto: o de orientador, como membro da equipa e de observador. Como orientador, mostra uma grande necessidade de se controlar e de controlar o trabalho de parto; neste a mulher mostra um grande desejo de que o pai esteja fisicamente envolvido no trabalho de parto. Como membro da equipa o pai ajuda a mulher durante o trabalho de parto e parto através do apoio físico e emocional de ambos; neste a mulher exprime um grande desejo de ter o pai presente a ajudá-la de qualquer maneira. No papel de observador este atua como companheiro fornecendo apoio emocional e moral; no entanto, não tem qualquer outro tipo de participação mais ativa, podendo até se ausentar por longos períodos. Neste tipo de papel o pai acha que tem pouco para fazer, observando apenas o que está a acontecer e as mulheres também não esperam mais do que a sua presença.
CONCLUSÃO: Através desta investigação foi possível concluir que a preparação para o parto surge como forma de adquirir saberes e competências e embora os pais revelem diferentes formas de envolvimento na gravidez, na sua maioria, consideraram muito importante a participação nas aulas. Durante o trabalho de parto e parto houve uma grande variedade de sentimentos. Revelaram a aquisição de saberes teóricos, revelando na prática a aquisição de saberes processuais e consideraram o local adequado para colocar em prática os conhecimentos adquiridos ao longo das aulas.
84
Sentiram necessidade de apoio por parte dos profissionais, o qual nem sempre foi o mais adequado e através das suas formas de atuação no bloco de partos foi possível identificar os diferentes tipos de papéis referidos por Chapman.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: BARDIN, L. – Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2009. BOBAK, I. [et al.] – Enfermagem na Maternidade. Quarta edição. Loures: Lusociência, 1999. BRANDÃO, S. – Envolvimento Emocional do Pai com o Bebé: Impacto da Experiência de Parto. Porto: Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, 2009. Dissertação de Mestrado em Ciências de Enfermagem. CAMUS, J. – O Verdadeiro Papel do Pai. Porto: Ambar, 2002. CARVALHO, M. – Participação dos pais no nascimento em maternidade pública: dificuldades institucionais e motivações dos casais. Caderno de Saúde Pública, vol. 19, nº 2, p. 389-398, 2003. COUTO, G. – Preparação para o Parto, Representações Mentais de um Grupo de Grávidas de uma Área Urbana e de uma Área Rural. Porto: Universidade do Porto, 2002. Dissertação de Mestrado. DELLMAN, T. – “The best moment of my life”: A literature review of Fathers’ experience of childbirth. Australian Midwifery, vol. 17, nº 3, p. 20-26, 2004. LIS, A. [et al.] – Parental styles in prospective fathers: A research carried out using a semistructured interview during pregnancy. Infant Mental Health Journal, vol. 25, nº 2, p. 149-162, 2004. LOWDERMILK, D. e PERRY, L. – Enfermagem na Maternidade. 7ª edição. Loures: Lusodidacta, 2008. MALGLAIVE, G. – Ensinar Adultos 16: Coleção Ciências da Educação. Porto: Porto Editora, 1995. PICCININI, C. [et al.] – O Envolvimento Paterno durante a Gestação. Psicologia: Reflexão e Crítica, vol. 17, nº 3, p. 303-314, 2004. PIRES, A. – Aprendizagem de adultos: contextos e processos de desenvolvimento e reconhecimento de competências. Seminário Novos Públicos no IPS. 21 Maio Escola Superior de Educação, Instituto Politécnico de Setúbal, 2008.
85
11 - Maus –Tratos Fetais Leandra Cordeiro Docente na Escola Superior de Educação de Viseu e no Instituto Superior Miguel Torga; Exerce Clínica Privada no Centro Pediátrico e Juvenil de Coimbra cordeiro.leandra@gmail.com INTRODUÇÃO P e n s a r-s e n o m a ltra to fe ta l, é p e n s a r e m m a té ria s tã o im p o rta n te s c o m o a v id a h u m a n a , n o s s e u s d ire ito s fu n d a m e n ta is e n a le g itim id a d e c o m q u e é c o lo c a d a e m ris c o p o r c o n d u ta s , c o n s id e ra d a s d e ris c o , p o r p a rte d e q u e m à p a rtid a , d e v e ria p ro te g ê -la : a m ã e . D u ra n te m u ito te m p o a c re d ita v a -s e q u e o fe to v iv ia n u m m u n d o is o la d o , im p e n e trá v e l e in a c e s s ív e l. D e s m is tific a d a e s ta id e ia , s a b e -s e h o je , q u e ta n to o fu m o , c o m o o á lc o o l o u a s d ro g a s e q u a lq u e r o u tro tip o d e s u b s tâ n c ia s in g e rid a s p e la m ã e , a tin g e m o fe to . P o r o u tro la d o , e e m b o ra m e n o s v is ív e l, a v e rd a d e é q u e a s e m o ç õ e s v iv id a s d u ra n te a g ra v id e z p o d e m ta m b é m in te rfe rir c o m o d e se n v o lv im e n to d o p ré -n a to , s e n d o a q u i ta m b é m , o b je c to d e a n á lis e . N o s e u c o n ju n to , re p re s e n ta m u m a g re g a d o d e s itu a ç õ e s q u e v ê m a lte ra r o a m b ie n te in tra -u te rin o , n o q u a l o b e b é s e e s tá a d e s e n v o lv e r e a fo rm a r, c o m im p lic a ç õ e s , q u e r fís ic a s c o m o p s ic o ló g ic a s , c o n s titu in d o -s e a s s im , c o m o m a u s -tra to s fe ta is .
I.
ENQUADRAMENTO CONCEPTUAL
O m a u - tra to b e m c o m o a n e g lig ê n c ia s ã o c o n s tru c to s a m p lo s q u e c o n tin u a m a n ã o e n c o n tra r c o n s e n s o , q u e r e n tre o s té c n ic o s , q u e r e n tre o s in v e s tig a d o re s , o q u e te m d ific u lta d o a fo rm u la ç ã o e e x e c u ç ã o d o tra b a lh o n e s ta á re a . S ó a p a rtir d a d é c a d a d e 8 0 , e m b o ra a in v e s tig a ç ã o d o s m a u s -tra to s fís ic o s p re v a le ç a re la tiv a m e n te a o u tra s fo rm a s d e a b u s o , é q u e a p a re c e m a s p rim e ira s
d e fin iç õ e s
de
m a u-tra to
p s ic o ló g ic o ,
in te n s ific a n d o -s e
a
in v e s tig a ç ã o . A s c o n tro v é rs ia s a s s e n ta m n o fa c to d e a s d e fin iç õ e s té c n ic a s , q u e r s e ja m le g a is , s o c ia is o u m é d ic a s , s e re m v a g a s , n ã o s ó a n ív e l d a s c a te g o ria s q u e a s c o m p õ e m e d a s fro n te ira s q u e a s lim ita m , c o m o n a a v a lia ç ã o d a s u a in te n c io n a lid a d e , e a in d a n o s c rité rio s e s p e c ífic o s re la tiv a m e n te a o q u e 86
c o n s titu i o s v á rio s g ra u s o u tip o s d e p e rig o (G io v a n n o n i, 1 9 8 9 ; K n u ts o n , 1 9 9 5 c it in C a lh e iro s & M o n te iro , 2 0 0 0 ). N e s te s e n tid o , p re v a le c e a n o ç ã o d e q u e o m a u -tra to é u m c o n c e ito m a is re la tiv o d o q u e a b s o lu to , n a m e d id a e m q u e d e riv a d o fa c to d e q u e o e d u c a r e o s c u id a d o s n e c e s s á rio s a te r, re fle c te m a titu d e s p ú b lic a s e p a d rõ e s in s titu c io n a is , a s s u m in d o -s e d ife re n te s p e rs p e c tiv a s n o q u e c o n c e rn e a o q u e é e s s e n c ia l p a ra c a d a c ria n ç a e o q u e p re ju d ic a o s e u b e m -e s ta r e fu tu ro d e s e n v o lv im e n to . D e s ta fo rm a , a d e fin iç ã o e id e n tific a ç ã o d o m a u -tra to e d a n e g lig ê n c ia in s c re v e m -s e n u m a á re a p o u c o d e fin id a c u ja s fro n te ira s s ã o m u ito té n u e s e v a ria m e m fu n ç ã o d o s v a lo re s q u e re g e m o s d ife re n te s c o n te x to s o n d e o p ro b le m a é a b o rd a d o . P e la p e rs p e c tiv a m é d ic a , o m a u -tra to d e fin e -s e p e la n e c e s s id a d e d e s e fa z e r u m d ia g n ó s tic o , m a n te n d o -s e c e n tra l a id e ia d e q u e e s te é o s in to m a d e u m a p a to lo g ia d o s p a is . A s s im , é c o m u m in c lu ir-s e n a d e fin iç ã o , a s c o n s e q u ê n c ia s q u e o s c o m p o rta m e n to s p a re n ta is d irig id o s à c ria n ç a tê m p a ra e s ta . O a s p e c to c e n tra l d a p e rs p e c t iv a s o c io ló g ic a é a n o ç ã o d e q u e o m a u -tra to e a n e g lig ê n c ia im p lic a m u m c o n te x to e u m ju lg a m e n to s o c ia l e p o r is s o a d e fin iç ã o in c lu i o s a c to s p a re n ta is q u e s ã o c o n s id e ra d o s in a p ro p ria d o s p e la s p rá tic a s e p a d rõ e s d a c o m u n id a d e . A n ív e l ju ríd ic o , a d e fin iç ã o a b ra n g e a s s itu a ç õ e s q u e p o s s a m c a u s a r p e rig o p a ra
a
c ria n ç a
(in te g ra n d o
a c to s
p a re n ta is
e /o u
s itu a ç õ e s
de
v id a ),
in c lu in d o , p o r c o n s e g u in te , o s p o s s ív e is d a n o s já o b s e rv a d o s n a c ria n ç a . A s c o n c e p tu a liz a ç õ e s d a á re a d a p s ic o lo g ia tê m d e fin id o o s c o n s tru c to s d e m a u -tra to e n e g lig ê n c ia , q u e r a tra v é s d o ju lg a m e n to d o s c o m p o rta m e n to s p a re n ta is — a c to s e o m is s õ e s — re s p e c tiv a m e n te (B a ily e B a ily , 1 9 8 6 ; M c G e e e W o lfe , 1 9 9 1 ; W o lfe e M c G e e , 1 9 9 4 c it in C a lh e iro s & M o n te iro , 2 0 0 0 ),
quer
a
p a rtir
das
c o n s e q u ê n cia s
re s u lta n te s
desses
mesmos
c o m p o rta m e n to s e o m is s õ e s p a ra a c ria n ç a , in te g ra n d o d a n o s p s ic o ló g ic o s e /o u fís ic o s , o q u e v a i d e e n c o n tro à d e fin iç ã o d e v io lê n c ia a p re s e n ta d a n a R e c o m e n d a ç ã o n .º R (8 5 ) 4 , d o C o n s e lh o d a E u ro p a q u e a d e s ig n a c o m o “q u a lq u e r a c to o u o m is s ã o q u e p o n h a e m p e rig o a v id a , a in te g rid a d e c o rp o ra l o u p s íq u ic a o u a lib e rd a d e d e u m a p e s s o a o u q u e c o m p ro m e ta g ra v e m e n te
o
d e s e n v o lv im e n to
da
sua
p e rs o n a lid a d e ”.
São
ta m b é m
c o n s id e ra d o s o s e fe ito s d e c o rre n te s d a in te ra c ç ã o e n tre a c ria n ç a , o s p a is e a
c o m u n id a d e ,
in c lu in d o -s e
as
d im e n s õ e s
em
que
se
o rg a n iz a m
as 87
d ife re n te s fo rm a s d e m a u -tra to ; o s c rité rio s a q u e s e re c o rre q u a n d o a s d e fin im o s
e
os
o b je c tiv o s
que
s e rv e m
as
p ró p ria s
d e fin iç õ e s
numa
in te rv e n ç ã o c lín ic a , d e c is iv o s ta m b é m n a d e c is ã o ju d ic ia l. N o e n ta n to , n a s s itu a ç õ e s d e m a u s -tra to s , a d m ite -s e a e x is tê n c ia d e u m s u je ito e m c o n d iç õ e s s u p e rio re s (id a d e , fo rç a , a u to rid a d e ) q u e c o m e te u m d a n o fís ic o , p s ic o ló g ic o o u s e x u a l, d e fo rm a in te n c io n a l e v o lu n tá ria , c o n tra ria m e n te à v o n ta d e d a v ítim a . A c e ita -s e
que
o
b e m -e s ta r
do
fe to
se
tra d u z
p e la
h a rm o n ia
do
seu
c re s c im e n to e d e s e n v o lv im e n to , a rtic u la n d o a n o rm a l a c tiv id a d e d e to d o s o s ó rg ã o s e s is te m a s c o m a p ro g re s s iv a a q u is iç ã o d e n o v a s c a p a c id a d e s q u e v ã o g a ra n tir u m a tra n s iç ã o tra n q u ila p a ra o a m b ie n te e x tra -u te rin o . C o n tu d o , e s te s a u d á v e l d e s e n v o lv im e n to p o d e rá s e r c o m p ro m e tid o p o r d e te rm in a d a s c o n d u ta s d e ris c o d a m ã e , q u e a c a b a m p o r m a ltra ta r o fe to . T a lv e z p o r is s o s e ja le g ítim o fa la r d e m a u -tra to fe ta l o u m a u tra to in tra -u te rin o . É n e s ta ó p tic a q u e s ã o a n a lis a d o s o s m a u s -tra to s o c o rrid o s e d e fin i -lo s te n d o p o r lin h a d e b a s e a v id a in tra -u te rin a e to d a s a s c o n s e q u ê n c ia s fu tu ra s q u e p o d e rã o d a í a d v ir.
II.
C O N D U T A S D E R IS C O
2 .1 .
Consumo de Drogas
E s tã o h o je s o b e ja m e n te p ro v a d o s o s e fe ito s n o c iv o s , q u iç á le ta is , d o c o n s u m o d e d ro g a s o u o u tra s s u b s tâ n c ia s , in c lu in d o o ta b a c o , o á lc o o l o u a té m e s m o a c a fe ín a , s o b re o h a rm o n io s o d e s e n v o lv im e n to d o fe to . P e lo e x tra o rd in á rio
a u m e n to ,
nos
ú ltim o s
anos,
do
consumo
de
d ro g a s ,
n o m e a d a m e n te p o r m u lh e re s g rá v id a s e p e la s c o n s e q u ê n c ia s in e re n te s o u u s o e a b u s o d e s ta s s u b s tâ n c ia s d u ra n te e s te p e río d o , e s ta é u m a te m á tic a q u e d e s p e rta u m p e c u lia r in te re s s e e m e re c e u m a e s p e c ia l a te n ç ã o . A to x ic o d e p e n d ê n c ia , d u ra n te a g ra v id e z , to rn a -s e re s p o n s á v e l e é fa c to r p re p o n d e ra n te n a s c o m p lic a ç õ e s p ré – n a ta is n ã o s ó p a ra a m ã e c o m o ta m b é m p a ra o d e s e n v o lv im e n to d o fe to , s e n d o h o je e m d ia , a p o n ta d a c o m o u m a c a u s a d is tin ta d e m o rb ilid a d e e m o rta lid a d e p ré – n a ta l. S ã o v á ria s a s s u b s tâ n c ia s q u e in te rfe re m d e c is iv a m e n te n o d e s e n v o lv i m e n to n o rm a l d o fe to c a u s a n d o d a n o s q u e p o d e m d e ix a r s e q u e la s q u e s e p o d e rã o p e rp e tu a r n ã o s ó d u ra n te o p e río d o d e g e s ta ç ã o c o m o ta m b é m a p ó s o
88
n a s c im e n to , o q u e p o d e rá a c a rre ta r p ro b le m a s p a ra o c re s c im e n to s a u d á v e l d a c ria n ç a . A u tiliz a ç ã o d e d ro g a s d u ra n te a g ra v id e z tra z d iv e rs a s c o m p lic a ç õ e s p e rin a ta is q u e in c lu e m o a b o rto e s p o n tâ n e o n o p rim e iro trim e s tre , p a rto p re m a tu ro , c o lo ra ç ã o d o m e c ó n io , in fe c ç õ e s m a te rn a s /n e o n a ta is e c a rê n c ia n e o n a ta l (W o o d s , 1 9 9 7 ). O c o n s u m o d e d ro g a s , n e s te â m b ito , m e re c e e s p e c ia l a te n ç ã o a té p o rq u e “o u s o p ré -n a ta l d e d ro g a s e m g e ra l, e o c o n s u m o d e c o c a ín a , e s p e c ific a m e n te , s ã o e n c o n tra d o s , m u ita s v e z e s , e n tre m u lh e re s q u e p ro c u ra m p o u c o o u n e n h u m tra ta m e n to p ré – n a ta l” (W o o d s , 1 9 9 7 ). A g ra v id e z to rn a -s e u m p a lc o p riv ile g ia d o p a ra a s in e re n te s c o m p lic a ç õ e s a o u s o d e d ro g a s , d e s ig n a d a m e n te a c o c a ín a , d e v id o a u m c o n ju n to d e p a rtic u la rid a d e s d e s te p e río d o . “A s c a ra c te rís tic a s c a rd io v a s c u la re s ú n ic a s d a g ra v id e z to rn a ra m -n a u m a lv o p a ra o s e fe ito s d a c o c a ín a . D u ra n te a g ra v id e z , o s v a s o s s a n g u ín e o s u te rin o s d ila ta m -s e p a ra a s s e g u ra r o flu x o s a n g u ín e o a p ro p ria d o n a u n id a d e u te ro p la n c e tá ria e a d is trib u iç ã o d e o x ig é n io p a ra o fe to .” N o s e u e s ta d o já d ila ta d o , o s v a s o s s a n g u ín e o s u te rin o s n ã o s e p o d e m d ila ta r m a is , m a s s o fre m v a s o co n s triç ã o q u a n d o e x p o s to s à n o re p in e frin a . O s a u m e n to s d e n o re p in e frin a in d u z id o s p e la c o c a ín a d e v e m p ro d u z ir a v a s o c o n s triç ã o d o s v a s o s s a n g u ín e o s u te rin o s c o n d u z in d o à re s triç ã o d a d is trib u iç ã o d e o x ig é n io a o fe to (W o o d s , 1 9 9 7 ) , já q u e a d is p o n ib iliz a ç ã o d e o x ig é n io p a ra o fe to d e p e n d e d ire c ta m e n te d a m a n u te n ç ã o d o flu x o s a n g u ín e o u te rin o . 2 .2 .
C o n s u m o d e Á lc o o l
L e fe v e r (1 9 9 9 ), c o n s id e ra q u e a e x p o s iç ã o p ré -n a ta l d a s c h a m a d a s “d ro g a s b o a s ”, c o m o o á lc o o l e a n ic o tin a tê m , a o c o n trá rio d o q u e s e p e n s a , m a is e fe ito s n e g a tiv o s n o fe to d o q u e a s “d ro g a s m á s ”. S ã o p o r d e m a is c o n h e c id o s o s e fe ito s d e le té rio s d o c o n s u m o d o á lc o o l n o fe to . E m 1 9 6 7 e 1 9 6 8 , re s p e c tiv a m e n te , L a m a c h e , L e m o in e e c o la b o ra d o re s , re a liz a ra m
os
p rim e iro s
e s tu d o s
que
d e s c re v e ra m
a
“s ín d ro m e
fe ta l
a lc o ó lic o ”(S F A ). E s ta s ín d ro m e in c lu i o a tra s o d e c re s c im e n to , d is fu n ç ã o d o s is te m a n e rv o s o c e n tra l, m a lfo rm a ç õ e s fís ic a s , e s p e c ia lm e n te n o ro s to , a tra s o
da
m a tu ra ç ã o
p s ic o m o to ra
e
d im in u iç ã o
do
d e s e n v o lv im e n to
in te le c tu a l (e s ta s c ria n ç a s tê m u m Q I s itu a d o e n tre 6 0 e 7 0 ). É a c tu a lm e n te c o n s id e ra d o n o s p a ís e s d e s e n v o lv id o s c o m o a c a u s a a m b ie n ta l m a is c o m u m 89
d e a tra s o m e n ta l s e n d o a fre q u ê n c ia e s tim a d a , s e g u n d o S trö m la n d e H e lls trö m , d e 1 a 2 p o r m il n a d o s -v iv o s . A m a io r d ific u ld a d e re s id e e m s a b e r q u a l é o lim ite s e g u ro a té a o q u a l n ã o h á ris c o s p a ra o fe to , já q u e e s te a in d a n ã o fo i d e te rm in a d o d e u m a fo rm a c o n s is te n te ,
a lé m
de
que,
fre q u e n te m e n te ,
as
g rá v id a s
não
e s tã o
d e v id a m e n te in fo rm a d a s d o s e fe ito s e x e rc id o s p e lo á lc o o l s o b re o fe to , a c u rto e a lo n g o p ra z o . A lé m d a “s ín d ro m e fe ta l a lc o ó lic a ” s e r ra ra e d e d e p e n d e r d a c a p a c id a d e m u ito v a riá v e l d e m u lh e r p a ra m u lh e r, d e m e ta b o liz a r o á lc o o l, te m o s a in d a q u e a c re s c e n ta r a d ific u ld a d e q u e e x is te n a re c o lh a d e d a d o s fiá v e is s o b re o c o n s u m o d o á lc o o l, c o m o re s u lta d o d e in te rd iç õ e s s o c ia is a o s e u c o n s u m o . “A e x p o s iç ã o p ré – n a ta l a o á lc o o l é u m a d a s c a u s a s m a is im p o rta n te e p o te n c ia lm e n te
e v itá v e l
de
d e fe ito s
c o n g é n ito s ,
d é fic e
c o g n itiv o
e
p e rtu rb a ç õ e s d o n e u ro – d e s e n v o lv im e n to ” (B rito e t a l, 2 0 0 6 ).
2 .3 .
C o n s u m o d e P s ic o fá r m a c o s
A m u lh e r g rá v id a v iv e u m p e río d o ú n ic o n a v id a , o n d e s e c ru z a m e m o ç õ e s , a n g ú s tia s e m e d o s . É c o m u m c o a b ita re m a m b iv a lê n c ia s o q u e p o d e rá m a rc a r u m a fa s e d e m a io r in s ta b ilid a d e m e n ta l e e m o c io n a l. O u s o d o s p s ic o fá rm a c o s p o d e s u rg ir, n u m p rim e iro m o m e n to , p a ra a m u lh e r g rá v id a c o m o a fo rm a a p a re n te m e n te fá c il d e tra z e r a e s ta b ilid a d e e m o c io n a l a lm e ja d a . P o r
sua
vez, a
to m a
d e s te s
m e d ic a m e n to s
podem
ta m b é m
d e c o rre r d e p a to lo g ia s a n te rio re s q u e p o d e rã o p e rm a n e c e r o u a té m e s m o a g ra v a r-s e c o m a v iv ê n c ia d a e x p e c ta tiv a d a c h e g a d a d e u m filh o . N ã o o b s ta n te , a to m a d e s te s fá rm a c o s a c a rre ta m ris c o s p a ra a m ã e e p a ra o s a u d á v e l d e s e n v o lv im e n to d o b e b é . O c o n ta c to c o m o s p s ic o fá rm a c o s e x p õ e o fe to a trê s tip o s d e ris c o s : m a lfo rm a ç õ e s c o n g é n ita s (c o m u m ris c o e le v a d o d u ra n te a s p rim e ira s d o z e semanas
da
g e s ta ç ã o ),
n e u ro c o m p o rta m e n ta is
de
s ín d ro m e s
s u rg im e n to
p e rin a ta is
ta rd io .
As
e
s ín d ro m e s
a lte ra ç õ e s p e rin a ta is
d e c o rre m d a e x p o s iç ã o fe ta l a o s p s ic o fá rm a c o s , n o m e a d a m e n te a u tiliz a ç ã o d e a n tid e p re s s iv o s tric íc lic o s q u e n o fin a l d a g e s ta ç ã o o u m e s m o d u ra n te o p a rto ,
podem
causar
no
re c é m -n a s c id o
s in to m a s
de
in to x ic a ç ã o
ou
a b s tin ê n c ia . P o r s u a v e z , a s a lte ra ç õ e s n e u ro c o m p o rta m e n ta is p o d e rã o in c lu ir a tra s o s n o d e s e n v o lv im e n to p s ic o m o to r e d é fic e n o c o e fic ie n te d e in te lig ê n c ia (W a rd , & Z a m o rs k i, 2 0 0 2 ). U m a in v e s tig a ç ã o re a liz a d a c o m o fim 90
d e a v a lia r a s im p lic a ç õ e s d a flu o x e tin a n o d e s e n v o lv im e n to fe ta l, e n c o n tro u a u m e n to d o ris c o d e m a lfo rm a ç õ e s m e n o re s , p re m a tu rid a d e , m e n o r p e s o a o n a s c e r, m e n o r g a n h o d e p e s o m a te rn o n a g e s ta ç ã o e m a io r n e c e s s id a d e d e in te rn a m e n to n e o n a ta l c o m c u id a d o s e s p e c ia is . O s e fe ito s a d v e rs o s p o te n c ia is d a e x p o s iç ã o a o lítio in u te ro e v id e n c ia m c a s o s d e to x ic id a d e n e o n a ta l c o m o d is tú rb io s d o ritm o c a rd ía c o , d ific u ld a d e re s p ira tó ria , c ia n o s e , d ia b e te s in s ip id u s n e fro g ê n ic o , d is fu n ç ã o d a tiró id e , h ip o g lic e m ia , h ip o to n ia , le ta rg ia , h ip e rb ilirru b in e m ia e b e b é s g ra n d e s p a ra id a d e g e s ta c io n a l (Iq b a l e t a l, 2 0 0 1 ). 2 .4 .
C o n s u m o d e T a b a c o e C a fe ín a
R e la tiv a m e n te a o c o n s u m o d o ta b a c o , e m 1 9 5 7 , W J S im p s o n fo i u m d o s p rim e iro s a u to re s a o b s e rv a r q u e a s m u lh e re s q u e fu m a m tê m m a is filh o s c o m m e n o s p e s o , te n d o e n c o n tra d o u m a d im in u iç ã o m é d ia d e 2 0 0 g n o p e s o d o s re c é m -n a s c id o s , c u ja s m ã e s fu m a v a m d e z o u m a is c ig a rro s p o r d ia c o m p a ra tiv a m e n te c o m o s d a s m u lh e re s q u e n ã o fu m a v a m (W ilc o x , 1 9 9 3 ). R e c e n te m e n te , W ilc o x , c o m b a s e n a a n á lis e d e u m a a m o s tra d e p e rto d e 2 6 0 .0 0 0 n a d o s – v iv o s d o e s ta d o d o M is s o u ri no s E .U .A ., d e m o n s tro u q u e h á d o is e fe ito s d o u s o d o ta b a c o n o d e c u rs o d a g ra v id e z (W ilc o x , 1 9 9 3 ). O p rim e iro d iz re s p e ito a o fa c to d e a s m u lh e re s fu m a d o ra s a p re s e n ta re m u m m a io r ris c o d e filh o s p re m a tu ro s c o m o s p ro b le m a s q u e d a í p o d e m re s u lta r, c o n e x ã o , a liá s já d e m o n s tra d a n a d é c a d a d e s e te n ta p o r v á rio s a u to re s ; o s e g u n d o p re n d e -s e c o m e s s e s re c é m -n a s c id o s a p re s e n ta re m u m a m a is e le v a d a m o rta lid a d e p e rin a ta l, q u a lq u e r q u e s e ja o s e u p e s o à n a s c e n ç a . O c o n s u m o d e s u b s tâ n c ia s d ita s ilíc ita s n ã o fa z p a rte d a c o n d u ta d a m a io ria d a s m u lh e re s g rá v id a s , e m b o ra s e a s s u m a c o m o u m n ú m e ro c re s c e n te e p re o c u p a n te . N ã o o b s ta n te , a c a fe ín a a c a rre ta , e a p e s a r d e s e r u m a s u b s tâ n c ia m a is c o m u m m e n te a c e ite e u tiliz a d a p e la m a io ria d a s p e s s o a s , ris c o s . “É u m a s u b s tâ n c ia p o te n c ia lm e n te p re ju d ic ia l p o r s e r ra p id a m e n te a b s o rv id a p e lo tra c to d ig e s tiv o e d ifu n d id a p a ra q u a s e to d o s o s te c id o s . É c a p a z d e a tra v e s s a r a p la c e n ta , p o d e n d o a fe c ta r o o v u m a n te s e d u ra n te a g ra v id e z , b e m c o m o o e m b riã o e o fe to , d u ra n te to d a a g e s ta ç ã o ” (R iv a rd , C . e t a l, 1 9 9 3 c it in W ilc o x , 1 9 9 3 ).
91
2 .5 .
E m o ç õ e s T ó x ic a s
V á rio s e s tu d o s tê m , re c e n te m e n te , s e d e b ru ç a d o s o b re c o m o é q u e a v iv ê n c ia e m o c io n a l d a m ã e in te rfe re c o m o d e s e n v o lv im e n to d o s e u b e b é . V e rn y & K e lly , 1 9 9 3 (c it p o r V o lp i, 2 0 0 4 ), a c re d ita m q u e u m a e x c e s s iv a s e c re ç ã o n e u ro – h o rm o n a l n a m ã e , c o m o rig e m n u m e s ta d o d e a n s ie d a d e , m e d o , in s ta b ilid a d e , n e rv o s is m o , in s e g u ra n ç a , o u q u a lq u e r o u tro fa c to r, p o d e rá c ria r u m a s o b re c a rg a n o s is te m a n e u ro v e g e ta tiv o d a c ria n ç a e o c a s io n a r v á ria s d ific u ld a d e s , m a n ife s ta d a s d e p o is d o n a s c im e n to . R e fe re m a in d a q u e “o fe to te n ta rá c o m p re e n d e r o s ig n ific a d o d e s s a s a lte ra ç õ e s fis io ló g ic a s fa z e n d o c o m q u e , o q u e a p rin c íp io e ra a p e n a s u m a im p re s s ã o c o n fu s a e d e s a g ra d á v e l, c rie u m a re s e rv a d e le m b ra n ç a s , à s q u a is o b e b e p o d e rá re c o rre r m a is ta rd e .” B o a d e lla , 1 9 9 2 a c re s c e n ta , e m c o n tin u id a d e c o m o q u e e s tá a s e r d ito , q u e “s e n s a ç õ e s d e te n s ã o e d e s c o n fo rto d a m ã e p o d e m s e r c o m u n ic a d a s p a ra o fe to , a s s im c o m o s e n tim e n to d e re je iç ã o , c u lp a o u h o s tilid a d e e m re la ç ã o a o b e b é q u e s e e s tá a d e s e n v o lv e r.” N a v a rro (1 9 9 5 ) e R e lie r (1 9 9 8 ) d e fe n d e m q u e o s tre s s , q u a n d o m u ito in te n s o , p o d e rá in te rfe rir c o m o fe to o u e m b riã o , “a c tu a n d o s o b re a s c é lu la s d e s s e b e b é , d e ix a n d o re g is tro s n e g a tiv o s .” N e s te s e n tin d o , e a p a rtir d o q u e o s a u to re s d e fe n d e m p a re c e s e r p o s s ív e l q u e d u ra n te a g ra v id e z , o b e b é , ta l c o m o a m ã e , s e e m o c io n e , fic a n d o a g ita d o c o m a s c ris e s s o frid a s p o r e s ta , “o q u e o fe re c e u m a s u p re s s ã o d o s is te m a im u n o ló g ic o , e u m a m a io r p e rm is s iv id a d e a o o rg a n is m o p a ra q u e m a n ife s te a s d o e n ç a s ” (V o lp i & S o u z a , 2 0 0 4 ). CONCLUSÃO
O m a ltra to fe ta l a b a rc a , d e s ta fo rm a , to d o o c o n ju n to d e c o m p o rta m e n to s d e ris c o q u e d e fo rm a d e lib e ra d a s ã o in flig id o s a o fe to , o q u e é c o rro b o ra d o p e lo s
dados
fo rn e c id o s .
E s ta
fo rm a
d e lib e ra d a
e
in te n c io n a l
p o d e rá
e n c o n tra r fu n d a m e n to n o c ru z a m e n to d o s c o m p o rta m e n to s d e ris c o c o m a v iv ê n c ia d a m a te rn id a d e . “A m a te rn id a d e n ã o p a s s a n e c e s s a ria m e n te p o r u m a g ra v id e z , c o m o ta m b é m d e s e ja r u m filh o n ã o im p lic a fo rç o s a m e n te te r d e s e jo s d e m a te rn id a d e ” (L e a l, 1 9 9 2 c it in B a y le , 2 0 0 6 ). A g ra v id e z e a v iv ê n c ia d a m e s m a im p lic a a a c tu a liz a ç ã o d e a fe c to s e re p re s e n ta ç õ e s , a g e s tã o d e a n g ú s tia s e d e c o n flito s o q u e to rn a e s ta fa s e p a rtic u la r, d e s ig n a d a m e n te n o q u e re s p e ita à o rg a n iz a ç ã o p s ic o ló g ic a . “A m a n ife s ta ç ã o 92
d e d e s e jo s c o n tra d itó rio s n ã o a s s u m id o s p o d e d ific u lta r p o s te rio rm e n te a a c e ita ç ã o d o b e b é ” (B a y le , 2 0 0 6 ). A tra n s iç ã o p a ra a m a te rn id a d e im p lic a q u e a m ã e s e id e n tifiq u e c o m a s u a p ró p ria m ã e , c o m a re la ç ã o p re c o c e q u e te v e c o m e la e a g ra v id e z a c a b a p o r s e r, d e s te m o d o , u m m e io d e id e n tific a ç ã o e p ro je c ç ã o . P o d e rá s e r u m m o m e n to d e “re c o n c ilia ç ã o c o m a m ã e , p ro te g e n d o a c ria n ç a d e fa c to s m a lé fic o s e im p e d in d o q u e e la te n h a s e n tim e n to s n e g a tiv o s c o m o e la p ró p ria te v e q u a n d o c ria n ç a , m a s ta m b é m d a r v id a é p riv a r a s u a m ã e d e fe c u n d id a d e e e m p u rrá -la p a ra o u tra g e ra ç ã o . P o r v e z e s d e s e jo s d e m o rte in c o n s c ie n te s p o d e m m a n ife s ta r -s e , s o b re tu d o s e a riv a lid a d e c o m a m ã e a in d a e x is te ” (B a y le , 2 0 0 6 ). O b e b é a o fu n c io n a r e m e s p e lh o , a c a b a p o r s e r o a lv o d e s ta s p ro je c ç õ e s , d e to d a s a s a n g ú s tia s e a m b iv a lê n c ia s , o q u e p o d e rá ju s tific a r d e a lg u m m o d o o s c o m p o rta m e n to s d e lib e ra d o s d a m ã e e m re la ç ã o a e le . C o m o já fo i d e v id a m e n te e x p o s to , q u a lq u e r fo rm a d e m a ltra to fe ta l irá te r im p lic a ç õ e s g ra v e s fu tu ra s , n ã o s ó n o d e s e n v o lv im e n to s a u d á v e l d o fe to c o m o ta m b é m e m m a n ife s ta ç õ e s d u ra n te a in fâ n c ia . N e s te s e n tid o , p e ra n te as
c o m p e tê n c ia s
d e s e n v o lv im e n to
do
fe to ,
já
a n te rio rm e n te
n e u ro b io ló g ic o ,
p a re c e
d e s c rita s
ser
e
le g ítim o
do
seu
fa la r
em
c o n c e p tu a liz a ç ã o m e n ta l n o fe to . P a ra D a m á s io (2 0 0 0 ), a s re p re s e n ta ç õ e s n e u ra is d is p o s ic io n a is d o g e n o m a e d a e p ig é n e s e fe ta l, g u a rd a d a s e m e s ta d o d e d o rm ê n c ia s ã o u m p a d rã o p o te n c ia l d e a c tiv id a d e s in to n iz á v e l c o m a n e c e s s id a d e d e c o n fig u ra r, n a re la ç ã o , u m e s b o ç o d e im a g e m g u a rd a d o n a m e m ó ria c o m u m a s o lic ita ç ã o q u e o m e io m o b iliz o u . D e s te m o d o , p o d e -s e fa la r d e p e n s a m e n to e m e m ó ria fe ta l n a m e d id a e m q u e e s ta ú ltim a irá p ro lo n g a r n o p ó s-p a rto a q u a lid a d e re la c io n a l d o ú te ro . S e tiv e rm o s e m c o n ta q u e a v in c u la ç ã o c o m e ç a a in d a a n te s d o n a s c im e n to e “a lic e rç a -s e
em
re la ç õ e s
a n te rio re s
com
o
fe to
em
d e s e n v o lv im e n to ”
(B ra z e lto n , 2 0 0 4 ), é c o m p re e n s ív e l q u e o b e b é s e p ro te ja e re a ja a u m c o n ju n to d e a g e n te s a g re s s o re s , m a n ife s ta n d o -s e s o m a tic a m e n te a tra v é s d a in ib iç ã o d e fu n ç õ e s b io ló g ic a s o q u e e s tá d ire c ta m e n te re la c io n a d o c o m a e x p re s s ã o d o s e s ta d o s e m o c io n a is o b s e rv á v e is c o m o n a s c im e n to . N e s te s e n tid o , a c a b a p o r s e v e rific a r u m c o n ju n to d e c o n s e q u ê n c ia s fu tu ra s , o rg â n ic a s e c o m p o rta m e n ta is , q u e c o lo c a m e m c a u s a u m c re s c im e n to h a rm o n io s o . P a ra
fin a liz a r,
e
n e s te
c o n te x to ,
c o n s ta ta -s e
a
im p o rtâ n c ia
de
uma
a b o rd a g e m m u ltid is p lin a r a p a r c o m p o lític a s d e s e n s ib iliz a ç ã o m a is e fic a z e s p a ra o s ris c o s d e d e te rm in a d o s c o m p o rta m e n to s d u ra n te a g ra v id e z . 93
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS A lb e rto , Is a b e l (2 0 0 4 ) M a ltra to e T ra u m a n a In fâ n c ia . C o im b ra A lm e d in a A ra g ã o , M . & S a c a d u ra , R . (1 9 9 0 ) B re v e R e v is ã o s o b re c o c a ín a : s e u s e fe ito s n a m ã e , n o fe to e n o re c é m -n a s c id o . J o rn a l d o M é d ic o , 1 2 9 , 5 3 0 – 533. B a y le , F ilo m e n a (2 0 0 6 ) À v o lta d o n a s c im e n to . C lim e p s i E d ito re s B ra z e lto n , T . & C ra m e r, B . (2 0 0 4 ) A re la ç ã o m a is p re c o c e – o s p a is , o s b e b é s e a in te ra c ç ã o p re c o c e . L is b o a : T e rra m a r. B rito , Is a b e l (2 0 0 1 ) C o n tin u id a d e s n a M a te rn id a d e d a T o x ic o d e p e n d e n te . T o x ic o d e p e n d ê n c ia s , 7 , [3 ], 7 9 – 8 2 . B rito , N á d ia (2 0 0 6 ) O s ín d ro m e fe ta l a lc o ó lic o e e fe ito s fe ta is d o á lc o o l. S a ú d e In fa n til, 2 8 /1 , 1 1 – 1 8 . C a lh e iro s , M a n u e la & M o n te iro , M . B e n e d ic ta (2 0 0 0 ) M a u tra to e n e g lig ê n c ia p a re n ta l: c o n trib u to s p a ra a d e fin iç ã o s o c ia l d o s c o n c e ito s . S o c io lo g ia , 3 4 , 1 4 5 -1 7 6 . D a m á s io , A n tó n io . (2 0 0 0 ) O S e n tim e n to d e S i. E d iç õ e s E u ro p a -A m é ric a Iq b a l M . e t a l. (2 0 0 1 ) T h e e ffe c ts o f lith iu m , v a lp ro ic a c id a n d c a rb a m a z e p in e d u rin g p re g n a n c y a n d la c ta tio n . C lin ic a l T o x ic o lo g y, 3 9 (4 ),3 8 1 -3 9 2 . M e lo , N . (2 0 0 4 ) P ro te c ç ã o d o fe to p e ra n te c o n d u ta s d e p e rig o p o r p a rte d a m ã e o u te rc e iro s . V II C u rs o d e P ó s – G ra d u a ç ã o e m D ire ito d o s M e n o re s . F a c u ld a d e d e D ire ito . U n iv e rs id a d e d e C o im b ra . L e fe v e r, R . (1 9 9 9 ) C h ild re n o f P re n a ta l s u b s ta n c e a b u s e . D ru g s , E d u c a tio n , P rv e n tio n a n d P o lic y , 6 , [1 ], 1 2 5 – 1 2 6 . L ittle , D . R . (1 9 9 4 ) O c o n s u m o d e c o c a ín a d u ra n te a g ra v id e z . M é d ic o – C irú rg ic a , 1 4 , 1 0 4 – 1 0 7 . O rn o y , A . (2 0 0 2 ) T h e E ffe c ts o f A lc o h o l a n d Illic it D ru g s o n th e H u m a n E m b ry o a n d F e tu s . T h e Is ra e l J o u rn a l o f P s y c h ia try a n d R e la te d S c ie n c e s , 3 9 , [2 ],1 2 0 – 1 3 2 . S á , E d u a rd o (2 0 0 1 ) A P s ic o lo g ia d o F e to e d o B e b é . (2 .ª e d .). F im d e S é c u lo . S tro m la n d ,
K.
&
H e lls trö m ,
A.
(1 9 9 6 )
F e ta l
a lc o h o l
s y n d ro m e
–
an
o p h ta lm o lo g ic a l a n d s o c io e d u c a tio n a l p ro s p e c tiv e s tu d y . P e d ia tric s , 9 7 , 8 4 7 . V o lp i, J . H . & S o u z a , C . B . (2 0 0 4 ) E s tre s s e n a g e s ta ç ã o e p rim e iro s a n o s d e v id a
e
cancer
in fa n til.
C u ritib a :
C e n tro
R e ic h ia n o .
D is p o n ív e l
em:
w w w .c e n tro re ic h ia n o .c o m .b r. 94