Universidade Presbiteriana Mackenzie Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
Lorena de Oliveira Silva
Vidas Invisíveis: uma proposta de pertencimento
Trabalho Final de Graduação apresentado à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como parte das exigências para obtenção do título de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo
Orientadora: Profa. Dra. Débora Sanches São Paulo, 2021
Agradeço Aos meus pais por todo o apoio, suporte e esforço que foi investido na minha educação, durante estes anos de faculdade. Às minhas amigas que estiveram presentes tanto nos momentos mais tensos, quando tínhamos as entregas de trabalhos, quanto nas horas mais divertidas, sempre acompanhadas de um café no bosque do Mackenzie. À Ana, Alana, Bruna, Julia, Larissa, Paula e Sofia por todo o tempo compartilhado nestes anos da graduação e, principalmente, à Patrícia pelas conversas e ideias divididas no decorrer deste trabalho. Aos meus professores e colegas de pesquisa e, em especial, aos meus orientadores, Débora Sanches e Guilherme Motta, que mesmo neste período difícil da pandemia, sempre me aconselharam e compartilharam conhecimentos da melhor forma possível. Às contribuições daqueles que acreditam e entendem a importância de se lutar por uma cidade mais democrática e justa, particularmente ao Sidnei Pita da ULCM, que repartiu sua trajetória ligada ao movimento por moradia e me fez compreender a importância desta luta.
Resumo
IMAGEM 01 Lambe de edifício que faz parte de uma instalação da ONG Fundo FICA para o lançamento do projeto Compartilha de investimento de impacto para aluguel social Fonte: Reprodução instagram.com/_ casadopovo/ (foto por Lauro Rocha)
A cidade de São Paulo enfrenta um grande problema de precariedade habitacional. Por outro lado, a região central do município constitui uma área extremamente adequada para a habitação, pois possui grande oferta de transporte público, equipamentos, comércios, serviços. Entretanto, apesar de ter um alto adensamento construtivo, não abriga quantidade significativa de habitação de interesse social. O que se observa, atualmente, são imóveis vazios e terrenos ociosos de um lado e de outro pessoas em situação de rua, morando em favelas, em cortiços ou em ocupações, evidenciando o mau gerenciamento de políticas públicas. Tendo isto em mente, neste trabalho, buscou-se entender, através de referências que tratam do assunto, maneiras de se pensar políticas públicas que possam mitigar o problema da precariedade habitacional no centro de São Paulo, ao mesmo tempo em que incentivem o desenvolvimento urbano. Como resultado deste trabalho, desenvolveu-se um masterplan para a região dos Campos Elíseos, elaborado em dupla, que teve como premissa o adensamento da área, de modo que os moradores e trabalhadores locais permanecessem no território durante e depois da aplicação do plano. Desenvolvido o masterplan, partiuse para o exercício projetual, que teve como objeto um edifício multiuso com usos culturais, comerciais e habitacionais para diversos arranjos familiares, para poder abrigar mais pessoas no centro da cidade. Conclui-se que para traçar políticas públicas para o centro, assim como para qualquer outra área, exige, antes de tudo, um olhar atento, pois analisar o território apenas de uma visão macro, não nos permite enxergar as vozes daqueles que se utilizam e irão se utilizar do espaço, tornando-os invisíveis. É preciso, portanto, entender a dinâmica do local, compreender os agentes, legislações e pessoas que ali se manifestam para que, desse modo, a formulação das políticas públicas esteja em consonância com as premissas do acesso universal à moradia e à cidade, garantindo a permanência da população local no território.
Palavras-chave: Direíto à moradia. Centro de São Paulo. permanência.
ÍNDICE
I NTROD UÇÃ O | 14
0 1. A RCABOU ÇO LEGA L | 15 1.1. Processo histórico da Reforma Urbana no Brasil 1.2. Planos diretores e instrumentos urbanísticos do município de São Paulo
0 2. TERRITÓRIO | 29 2.1. Processo de ocupação do centro de São Paulo 2.2. O direito de ocupar - a luta dos movimentos por moradia
0 3. D IRETRIZES | 47 3.1. Luz para quem? 3.2. Desenho urbano
0 4. IN TERV EN ÇÃ O | 55 4.1. Análise do entorno 4.2. Masterplan 4.3. Projeto
C ON CLUSÃ O | 143
INTRODUÇÃO
Durante a trajetória da graduação, os trabalhos em equipe sempre foram estimulados pelas componentes, pois a cooperação de duas ou mais pessoas, se bem articulada, pode trazer resultados mais proveitosos. Tendo a consciência de que arquitetura e urbanismo se fazem em conjunto, o seguinte Trabalho Final de Graduação foi realizado, em certos momentos, de maneira conjunta sob a ótica de um mesmo tema: a invisibilidade de vidas na região central de São Paulo pelo poder púbico, com o objetivo de não se limitar apenas ao morar, mas incentivando e valorizando a inclusão e o convívio da comunidade. Assim, o trabalho foi dividido em duas realidades que incidem no território: a falta de moradia, mais explorada nesta monografia, e pessoas que vivem em situação de vulnerabilidade, temática tratada pela aluna e amiga Patrícia Braga. Ambos os trabalhos, em sua metodologia, se pautaram em revisões bibliográficas, na qual foram consultados entrevistas e relatos de outras pesquisas. A fim de potencializar as propostas projetuais, as monografias se convergem em um ponto comum: a construção de um masterplan que tem como pressuposto atender, principalmente, a população que já ocupa e resiste ali, mais especificamente no bairro dos Campos Elíseos. A partir da análise do território, foram selecionados lotes subutilizados e terrenos ociosos que pudessem abrigar novos usos e tipologias. A transformação e remodelação das quadras foram pensadas no grau de ocupação de cada uma delas e de modo que o faseamento considerasse a permanência dos comerciantes e moradores locais. Depois, com as volumetrias definidas, partiu-se para o exercício projetual que cada uma detalhou em seu trabalho. A abordagem deste trabalho em questão focou no processo de luta e resistência de movimentos por moradia na região central de São Paulo, uma área dotada de infraestrutura, emprego e equipamentos, mas com inúmeros terrenos e imóveis vazios que poderiam e deveriam ser destinados à parcela da população mais vulnerável, moradoras de cortiços e ocupações, mas que, diante do processo de especulação imobiliária, tem sido expulsa do centro. IMAGEM 02 Pontos de encontro das propostas projetuais Fonte: Patrícia Braga, 2021
O trabalho estruturou-se em quatro frentes: • Arcabouço legal – no primeiro capítulo, foi feita uma análise histórica das legislações mais relevantes do processo da Reforma Urbana, passando pela promulgação da Constituição Federal de 1988 e criação do Estatuto da Cidade, até a formulação do Plano Diretor do município de São Paulo. • Território – no segundo capítulo, buscou-se compreender em que medida o direito à cidade foi promovido durante o processo de ocupação do centro de São Paulo e como os movimentos por moradia agiram no local a fim de garantir seus direitos. • Diretrizes – no terceiro capítulo, foi feita uma comparação entre dois estudos de caso que incidem na região da Luz para entender como cada um abordou a questão da precariedade habitacional. Além disso, foram lidos autores que estudam o parcelamento das quadras urbanas para entender quais maneiras possíveis de construir no centro de São Paulo, que já é densamente edificado, mas que possuí muitos resquícios com possibilidade de intervenção. • Intervenção – o quarto capítulo subdivide-se em três partes. Na primeira, foi realizada uma aproximação na área do projeto para compreender, através de análises de mapas, o entorno imediato e na segunda desenhouse o masterplan. Estas duas primeiras partes elaborada em dupla. Por fim, na terceira parte, desenvolveu-se um edifício multiuso, com usos culturais e comerciais, no embasamento, e habitação de interesse social nos demais pavimentos. Assim, “Vidas Invisíveis: uma proposta pertencimento” propõe uma forma de se ocupar o centro de São Paulo tendo como questão norteadora a melhoria de políticas públicas voltadas à habitação de interesse social para aqueles que ainda resistem ali em cortiços e ocupações, mas que são negligenciados pelo poder público. Entende-se que este tema não se limita à esta pesquisa, há ainda muito o que ser feito diante deste assunto. Para tanto, neste TFG, empenhou-se em aplicar os conhecimentos estudados e adquiridos ao longo da graduação para mostrar como a arquitetura e o urbanismo podem se tornar um instrumento de transformação social para aqueles que irão usufruir de uma cidade mais justa e equilibrada com espaços dignos e integrados na direção da função social da cidade.
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ARCABOUÇO LEGAL
1.1. Processo histórico da Reforma Urbana no Brasil Lefebvre (1968), em seu livro, disserta sobre o direito à cidade. Segundo o autor, a cidade tem o intuito de criar, a partir do pensamento do usuário, um espaço democrático, que busca o pertencimento da população e a exclusão da discriminação, além da transformação socioespacial de áreas públicas. Em outras produções de Lefebvre, o autor discorre sobre a influência do mercado imobiliário nas construções da cidade, ele cita: O circuito do imobiliário foi, durante muito tempo, um setor subalterno, subsidiário, e, paulatinamente, se foi convertendo em um setor paralelo, destinado a inserir-se no circuito de reprodução capitalista, podendo, inclusive, tornar-se o setor principal se o circuito de reprodução capitalista, baseado na produção-consumo se vê interrompido por algum motivo conjuntural ou mesmo estrutural (Lefebvre, 1976). Segundo o autor, o espaço não pode ser visto como uma mercadoria, mas sim como uma local que compreende as coisas produzidas e suas relações na sua coexistência e simultaneidade. Para isso, os grandes centros urbanos deveriam formular políticas públicas que assegurassem o direito à cidade nestes lugares, porém no munícipio de São Paulo não é isso que está acontecendo. A cidade de São Paulo enfrenta um grande problema de precariedade habitacional, conforme dados do Plano Municipal de Habitação do município de São Paulo de 2016, são identificados 445.112 domicílios em favelas; 385.080 domicílios localizados em loteamentos irregulares; 80.399 domicílios em cortiços; 15.905 pessoas em situação de rua; coabitações são 103.664 domicílios (habitações com mais de uma família); outro sério problema identificado é o ônus excessivo com aluguel, são 187.612 domicílios. Identifica-se mais de 1 milhão de famílias morando de forma precária na cidade de São Paulo (SANCHES e SILVA, 2018, n.p). Por outro lado, a região central constitui atualmente uma área extremamente adequada para a habitação, especialmente para os milhares de pessoas que ali trabalham e utilizam os serviços da região. Possui infraestrutura de saneamento, instalações elétricas adequadas, grande oferta de transporte público, equipamentos coletivos, comércio e serviços (SILVA, 2001, p.1) .
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Entretanto, o centro de São Paulo, administrado pela subprefeitura da Sé e composto pelos distritos da Bela Vista, Bom Retiro, Cambuci, Consolação, Liberdade, República, Sé e Santa Cecília, apesar de possuir um alto adensamento construtivo, não abriga quantidade significativa de habitação de interesse social. O que se observa, atualmente, são imóveis vazios e terrenos ociosos de um lado e de outro, pessoas em situação de rua, favelas, cortiços e ocupações que evidenciam o mau gerenciamento das políticas públicas. Apesar das condições insalubres, as moradias informais tornam-se atrativas para a população de baixa renda por estarem localizados em áreas dotadas de infraestrutura e, principalmente, por estarem próximas do emprego, oferecendo economia com o transporte público bem como com o tempo de deslocamento. Em contrapartida, os terrenos e imóveis subutilizados poderiam ser reconfigurados e destinados à habitação de interesse social por meio de políticas públicas eficientes, uma vez que muitas áreas já estão demarcadas como ZEIS (Zonas Especiais de Interesse Social) segundo o Plano Diretor de 2014, mas tornamse alvos da especulação imobiliária que, nos últimos anos, encontraram no centro uma oportunidade de ampliar seu capital, através de prédios de apartamentos voltados para a classe média ou investidores, não atendendo a população que de fato carece de moradia digna. Parte do incentivo que o mercado recebe vem de políticas de “revitalização e reavivamento” do centro. Entretanto, estas políticas, na verdade, mascaram o real problema que a região enfrenta e favorece o processo de gentrificação e segregação socioespacial. Nesse sentido, entram os movimentos sociais de moradia como forma de resistência, pois, a partir do momento que ocupam terrenos e prédios vazios, denunciam que aquele lugar, por lei, não está cumprindo sua função social. O desafio, portanto, está em garantir que o acesso universal à moradia e à cidade, estabelecido pela Constituição Federal de 1988, através de muita lutas e conquistas advindas da Reforma Urbana, não seja sobreposto pela dimensão financeira dos empreendimentos imobiliários, de modo que o ônus e bônus sejam igualmente distribuídos na sociedade (MARTINS, 2003).
MAPA 01 Região Central de São Paulo Fonte: Geosampa, 2021 (elaborado por Lorena Silva, 2021)
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A Reforma Urbana é um processo ainda vigente no Brasil, que vem desde as primeiras iniciativas de controle de aluguel, na Era Vargas, momentos de discussões e mobilizações em 1963, com o Seminário de Habitação e Reforma Urbana (SHRU), até as experiências mais recentes com a implementação do Estatuto da Cidade e planos diretores do Século XXI (BONDUKI, 2017). Segundo Bonduki (2017, p. 16), A Lei do Inquilinato de 1942, medida tomada por Vargas no momento em que o país entrou na 2ª Guerra Mundial, determinou o congelamento dos valores dos aluguéis e a proibição dos despejos, rompendo a tradição liberal que rejeitava qualquer interferência do Estado no mercado de locação. A forma de saída encontrada pelos rentistas foi investir na indústria nacional, ao invés de promover a construção de moradias. A Lei do Inquilinato buscou reduzir o custo de reprodução da força de trabalho e desestimular o investimento em casas de aluguel, de modo a concentrar a aplicação de capitais nos setores considerados mais estratégicos para o projeto desenvolvimentista, em especial na indústria (BONDUKI, 2017, p.16-17).
lazer, tratamento paisagístico e consequentemente gerando espaços vazios. [...] As consequências desta política pública apresentam o cenário da segregação social da população (SANCHES, 2015, p.164-165). Além de investir nas industrias, para poder lucrar com os alugueis, alguns rentistas, ainda que a Lei não permitisse, despejavam os moradores que ali moravam e alugavam para outras pessoas para, dessa maneira, aumentar o preço do aluguel para os novos locatários. Assim, aqueles que foram despejados também acabavam migrando para as periferias em casas autoconstruídas ou em loteamentos irregulares, agravando ainda mais a crise habitacional. Durante a Era Vargas (1930-1945), pode-se dizer que a Lei do Inquilinato, em teoria, foi um instrumento que tinha como fundamento garantir a função social, no sentido de limitar o direito de propriedade e criar condições mais favoráveis para os desprovidos de moradias. Entretanto, na prática, foram beneficiados apenas aqueles que já estavam alojados e resistiram aos despejos (BONDUKI, 2017).
Ainda segundo o autor, embora a Lei do Inquilinato pudesse ser vista como uma medida progressista, reformista ou até mesmo socialista, como os mais conservadores defendiam, ou excessivamente intervencionista, como os liberais acusavam, ela servia excepcionalmente ao projeto de desenvolvimento nacional e ao pacto de classes que marcaram o governo Vargas (BONDUKI, 2017, p.18). Por conta da diminuição das construções de casas de aluguel, a locação deixou de ser alternativa de moradia para a população mais pobre. Acentuado pelo fluxo migratório, que recebiam as grandes cidades brasileiras, a população que não conseguia encontrar oferta nos centros urbanos deslocou-se para a periferia. A expansão das áreas mais periféricas - em função do custo da terra, criam-se os anéis periféricos, desvinculados da malha urbana e da vida urbana da cidade - apresenta um grande crescimento populacional e construtivos de baixa qualidade; implantações sem preocupação com o espaço resultante, sem área de
IMAGEM 03 Comício da Central do Brasil em 13 de março de 1964, quando o presidente João Goulart apresentou várias propostas para enfrentar a crise urbana e habitacional do início daquela década. Fonte: Bonduki, 2017
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Quanto aos mecanismos para a produção de moradias, neste período, surgiram dois deles. O primeiro foi a criação das carteiras prediais dos Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAP), em 1937, que apesar de não ter a produção habitacional como foco, possibilitava mais fluxo de recursos. O outro mecanismo foi a criação da Fundação Casa Popular (FCP), em 1946, no governo Dutra, destinada à construção de moradias, porém sem muitos recursos e, por isso, não obteve tanto êxito. (BONDUKI, 1994). Mesmo assim, estima-se que entre 1945 e 1950, mais de 140 mil unidades tenham sido criadas nesse período. Além disso, diferente das habitações que viriam a ser produzidas pelo Banco Nacional da habitação (BNH), as construções financiadas pelo IAP se consolidaram em áreas centrais. Ao contrário da Fundação da Casa Popular, que não deixou nenhuma marca na capital de São Paulo, onde nada construiu, a produção dos IAPs é bastante significativa do ponto de vista da qualidade da intervenção. [...] Diferentemente dos conjuntos do período do BNH, boa parte dos núcleos habitacionais dos IAPs estavam localizados em zona de urbanização já consolidada na época, [...] tinham dimensões compatíveis com as necessidades de uma família trabalhadora e renovaram do ponto de vista arquitetônico e urbanístico, aplicando vários pressupostos de racionalismo e introduzindo o conceito de habitação econômica nos seus projetos (BONDUKI, 1994, p.726-727). Também na Era Vargas, outra medida, ainda que mais simples, facilitou o acesso à terra para uma grande quantidade de trabalhadores urbanos. O Decreto-Lei 58 de 1938, garantiu segurança jurídica para o comprador do lote em prestações, assegurando seu direito a terra mesmo se o vendedor desistisse da venda antes da quitação final do saldo devedor (BONDUKI, 2017, p.21). Bonduki (2017) explica que apenas em 1963, no governo João Goulart, eventos mais relevantes foram promovidos, porém, com o golpe militar de 1964, grande parte de seus resultados foram anulados. Este evento, denominado Seminário de Habitação e Reforma Urbana (SHRU), foi organizado pelo Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) e pelo Instituto de Previdência e Aposentadoria dos Servidores do Estado (Ipase). As propostas do SHRU foram resultadas de um processo de debate realizado nas instituições e
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segmentos progressistas da sociedade, com destaque para a pauta dos arquitetos e de alguns setores governamentais no período do pós-guerra (BONDUKI, 2017, p. 23). No âmbito do SHRU, o acesso à terra estava no centro das discussões, e as propostas estabeleciam medidas para a aquisição de terras para combater a especulação imobiliária e conseguir concretizar políticas públicas, principalmente de habitação (SANCHES, 2015, p. 122). Dentre as principais medidas estavam: •
Produção em massa de moradia financiadas por planos nacionais seguros para o retorno de capital.
•
Fiscalização do Estado, normatização e padronização dos componentes e materiais construtivos, a partir de pesquisas em laboratórios e institutos especializados, orientado pelo processo de pré-fabricação e industrialização da construção.
•
Equacionamento da distribuição de terras por meio de áreas de interesse social para a produção de habitação.
•
Enfrentamento da conurbação urbana através de legislação que resolvesse o processo de expansão periférico das cidades – mais tarde desenvolvido no âmbito de regiões metropolitanas.
A proposta institucional foi transformada em um anteprojeto de lei de Reforma Urbana [...] que propunha a formulação do Plano Nacional de Habitação (PNH), a criação do Conselho Nacional de Habitação (CNH) e a instituição do Fundo Nacional de Habitação (FNH), reformulando a legislação relativa à Fundação da Casa Popular (FCP) e centralizando os recursos disponíveis para o setor (BONDUKI, 2017, p.24). Mesmo que algumas propostas da SHRU fossem consideradas progressistas por setores mais conservadores, parte do documento ia de encontro com as pautas capitalistas. Ainda assim, parte do projeto não foi incorporado no Regime Militar. Segundo Bonduki (2017), somente as recomendações que não colidiam com o caráter conservador do período foram adotadas na agenda do setor habitacional, dando origem, em 1964, ao Banco Nacional da Habitação (BNH) e ao Serviço Federal de Habitação e Urbanismo (Serfhau). Mesmo assim, o SHRU foi de extrema importância para a formulação de políticas públicas que mais tarde surgiriam.
Embora nada tenha de revolucionário, salta aos olhos a atualidade do documento final, cujas propostas não diferem muito da agenda voltada à habitação que orientou, quarenta anos depois, a criação do Ministério das Cidades. [...] A concepção geral que orientou o SHRU, no entanto, não pôde prosperar integralmente no novo regime e se tornou uma referência no período da redemocratização. [...] E sua influência também esteve presente na lógica da estruturação do sistema de habitação de interesse social proposto pela Lei Federal 11.127 de 2005, cujos pilares eram o plano de habitação, fundo e conselho no âmbito federal e para cada ente federado que aderisse ao sistema (BONDUKI, 2017, p.29). No âmbito das políticas urbanas, as autoras Lucchesse e Rossetto (2017) dividem o período da ditadura militar em três períodos. O primeiro período (1964 a 1966) é o da criação do BNH, Serfhau e do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço). O segundo período (1966 a 1974) caracteriza-se pelo agravamento da crise urbana e crescimento exponencial desordenado dos centros urbanos. Já o terceiro período (1974 a 1985) atenta-se para o planejamento territorial das regiões metropolitanas. É também o momento em que os movimentos sociais se fortalecem e o regime ditatorial começa a ruir (LUCCHESSE e ROSSETTO, 2017).
IMAGEM 04 Conjunto Habitacional José Bonifácio financiado pelo BNH, zona leste, São Paulo Fonte: Sanches, 2015 (foto por Henrique Derenze, 2013)
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Apesar de ser um órgão público, o BNH não deixava de ser um banco, por isso, a sua produção habitacional, que deveria ser destinada para a classe mais pobre da população, voltou-se à classe média (MARICATO, 2011). Cerca de 1,2 milhão de unidades foram destinadas à população de até 5 salários mínimos relativizando, portanto, os resultados e o alcance da política habitacional desse período (BONDUKI, 2017, p.46). Além dos problemas citados, Sanches (2015) afirma que as tipologias do BNH eram de péssima qualidade arquitetônica e urbanística, resultando em uma paisagem homogênea e monótona. Outro problema, relacionado ao espaço urbano, foi o espraiamento das cidades. A construção de grandes conjuntos habitacionais massificados para a classe pobre, nas áreas periféricas sem infraestrutura, atraíram formas de morar como assentamentos precários, autoconstrução, loteamentos irregulares, favelas (MARICATO, 2011). O BNH começou a entrar em decadência com a crise econômica e política do regime militar dos anos de 1980, que gerou recessão, altos índices inflacionários e redução dos salários, [...] reduzindo a capacidade de investimentos do SFH e gerando uma forte inadimplência (BONDUKI, 2017, p. 83). Em decorrência disso, surgiu o Movimento Nacional dos Mutuários que reivindicaram reajustes mais favoráveis das prestações e redução dos saldos devedores. Por proposta da equipe econômica do governo e conveniência política do presidente, em vez de “reformulação”, resolveu-se extinguir o BNH, transferindo a gestão do SFH à Caixa Econômica Federal (ARAGÃO, 1999 apud BONDUKI, 2017 p.86). A questão habitacional e urbana se agravou em um cenário de empobrecimento, houve crescimento da violência urbana e dificuldade de acesso à terra urbana. Não haviam recursos para a produção habitacional e nem iniciativas em relação à política urbana, o que gerou um quadro de insatisfação popular.
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Foi assim, portanto, em 1985, com o final da ditadura militar e com a redemocratização, que as ideias da Reforma Urbana voltaram a ser retomadas. Diversos atores se articularam, incluindo a sociedade civil organizada e entidades para apresentar ao Congresso Nacional, em 1987, uma emenda com propostas de políticas urbanas e fundiárias, incorporadas na Constituição Federal (C.F.) de 1988 (SANCHES, 2015, p.37). Segundo Sanches (2015), dentre as inovações da Constituição Federal, destacam-se o artigo 23, que estabelece a responsabilidade de competência comum da União, dos Estados e dos Municípios para promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico, e os artigos 182 e 183, que definem os princípios da política urbana, o plano diretor como o principal instrumento de desenvolvimento urbano e a função social da propriedade e da cidade. O Fórum Nacional da Reforma Urbana (FRNU) formase após a C.F. de 1988 para regulamentar o principal Capítulo da Política Urbana, no entanto somente treze anos depois é aprovada a Lei Federal nº 10.257 de 10 de julho de 2001, conhecida como Estatuto da Cidade, que viabiliza instrumentos urbanísticos aos municípios para implementação dos princípios da política urbana (SANCHES, 2015, p.38). Por meio de muita persistência, mobilização e negociação, o Estatuto da Cidade reconheceu a moradia não só como um teto, mas também como um “lugar na cidade”. A lei também determinou que os municípios com mais de 20 mil habitantes ou que fazem parte de uma região metropolitana e aglomerações urbanas devessem obrigatoriamente formular seu Plano Diretor (Art. 41 do Estatuto da Cidade – Lei Nº 10.257/2001).
Segundo Villaça (1999), o Plano Diretor é um instrumento que, a partir de um diagnóstico científico da realidade física, social, econômica, política e administrativa da cidade, do município e de sua região, apresenta um conjunto de propostas para o futuro desenvolvimento socioeconômico e futura organização espacial dos usos do solo urbano, das redes de infraestrutura e de elementos fundamentais da estrutura urbana, para a cidade e para o município, propostas estas definidas para curto, médio e longo prazos, e aprovadas por lei municipal. O objetivo fundamental do Plano Diretor é estabelecer como a propriedade cumprirá sua função social, de forma a garantir o acesso à terra urbanizada e regularizada, reconhecer a todos os cidadãos o direito à moradia e aos serviços urbanos (ROLNIK, PINHEIRO, 2005). O Município é o ente federativo de maior relevância, pois é onde primordialmente pode se expressar o Direito à Cidade. Com a C.F. de 1988, os Municípios passaram a ter mais autonomia, tendo competência para promover planejamento e controle do uso e parcelamento do solo. Se antes, cada Estado tinha uma única Lei Orgânica1 para todos os municípios, agora são os Municípios que tem a atribuição e responsabilidade por sua Lei Orgânica.
1. Normas que regulam a vida política na cidade para que o município possa atuar com mais autonomia, podendo alterar leis que o afete diretamente, desde que seja de interesse público.
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1.2. Planos diretores e instrumentos urbanísticos do município de São Paulo O Plano Diretor Estratégico (PDE) de São Paulo, Lei nº 16.050 de 2014 (SÃO PAULO, 2014), atualmente em revisão2 , é a lei mais atual que aponta as diretrizes sobre o território. O documento determina um conjunto de regras, parâmetros, incentivos e instrumentos para a cidade. Sua primeira versão foi escrita em 2002, logo após o início de vigência do Estatuto da Cidade, tendo incorporado todos os novos instrumentos por ele introduzidos, e revisão em 2014 (BONDUKI, 2017, p.181). A revisão do PDE em 2014, manteve os objetivos e estratégias do PDE de 2002, garantindo sua continuidade e aperfeiçoando os instrumentos urbanísticos, assim como sua aplicação, que muitas vezes fica apenas no papel. Ainda que de forma lenta e com dificuldade de continuidade entre as gestões administrativas municipais, a experiencia do PDE de São Paulo pode ser considerada um exemplo onde se notam avanços e resistências, mas, principalmente, a implementação de uma agenda que dialoga com os ideários da Reforma Urbana (BONDUKI e ROSSETTO, 2017). O PDE pode ser dividido em duas frentes: os instrumentos e as ações urbanísticas. Instrumentos são normas legais que regulamentam o uso e a ocupação do solo urbano, regendo a maneira como o setor privado (mas também o público) constrói na cidade. Já as ações são intervenções diretas do poder público – programas, projetos, obras e intervenções – que devem ser implementadas em áreas como mobilidade, habitação social, meio ambiente e urbanismo, entre outras. Segundo Bonduki e Rossetto (2017) pode-se elencar os seguintes instrumentos urbanísticos que fazem valer a função social da propriedade:
•
Parcelamento, Edificação ou Utilização Compulsórios (PEUC) e IPTU progressivo no tempo que visam conter a especulação com imóveis ociosos bem localizados, cumprindo um papel estrutural de aproveitar os terrenos bem situados na cidade para absorver o crescimento urbano.
•
Macroárea de Restruturação e Requalificação e Macroárea de Estruturação Metropolitana que, em suma, buscam estimular adensamento (estabelecendo uma área máxima média para os apartamentos e o máximo de uma vaga de garagem por unidade), o uso do transporte coletivo e da mobilidade ativa, para promover qualificação urbanística nesses eixos já dotados de infraestrutura urbana.
•
Cota de solidariedade que visa obter dos empreendimentos de grande dimensão uma contrapartida social para ampliar a oferta de moradias populares.
•
Outorga Onerosa e Fundurb que passaram a ter um papel crucial na viabilização dos objetivos estratégicos do PDE, pois frente à baixa capacidade de investimento da prefeitura, a outorga onerosa tornou-se uma importante forma de financiamento do desenvolvimento urbano ao definir que 30% dos recursos do Fundurb (fundo que recebe a outorga onerosa) deveriam ser destinados à aquisição de terrenos bem localizados para moradia, e outros 30% para transporte coletivo e mobilidade ativa.
•
ZEIS (Zonas Especiais de Interesse Social), instrumento para facilitar a regularização de favelas e loteamentos irregulares e estimular e baratear a promoção da habitação social nas áreas centrais e dotadas de infraestrutura.
2. Por conta da epidemia do COVID-19, a revisão tem sido feita de através de conferências on-line, limitando a participação popular, pois não são todos que possuem acesso à internet. O resultado tem sido o favorecimento do mercado imobiliário e o esquecimento de políticas públicas voltadas à população de baixa renda.
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MAPA 02 Perímetro da OU e do PIU Fonte: Geosampa, 2021 (elaborado por Lorena Silva, 2021)
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Em contrapartida, outros instrumentos urbanísticos, como a Operação Urbana Centro (OUC), instituída com a Lei Municipal nº 12.349, de 06 de junho de 1997, e o Perímetro de Intervenção Urbana (PIU), disciplinado pelo Decreto nº 56.901 de 29 de março de 2016, são questionáveis quanto a aplicação da função social da propriedade.
Para a OUC a revisão do PDE de 2014, também trouxe novas diretrizes, em relação à questão da moradia, espera-se regulamentar a questão dos imóveis ociosos e a aplicação do Parcelamento Edificação e Utilização Compulsórios (PEUC), e definir mais claramente o programa de investimentos em Habitação de Interesse Social (HIS) (SANCHS e SILVA, 2018 n.p)
A Operação Urbana não é um instrumento exclusivamente do centro, outras operações urbanas foram criadas para diferentes trechos da cidade. Segundo Bonduki e Rossetto (2017) em 2001, quando o estatuto foi aprovado, a operação urbana não era um instrumento novo, pois já havia sido utilizada em São Paulo desde 1991, quando o governo Erundina (alinhado com a agenda reforma urbana) lançou a OU Anhangabaú. Nos anos 1990, mais três operações foram aprovadas durante as gestões Maluf/Pitta: Faria Lima (1995), Água Branca (1995) e Centro (1997).
Bonduki e Rossetto (2017) citam que a revisão do PDE manteve a Macroárea de Restruturação e Requalificação do PDE de 2002, renomeada de Estruturação Metropolitana (MEM), como território estratégico de transformação urbana e o único passível de receber novas operações urbanas. Mas trouxe uma alteração relevante, ao estabelecer que elas deveriam ser definidas a partir de Projetos de Intervenção Urbana (PIU), que propusessem as novas regras de uso e ocupação do solo e as intervenções propostas, articuladas com a estratégia urbana prevista no PDE. Anteriormente, era exigido apenas um programa de investimentos.
Com a revisão do PDE de 2014, as Operações Urbanas precisaram ser compatibilizadas e atualizadas. Desde que foram criadas, as OUs receberam muitas críticas da academia e de meios técnicos por destinarem maior parte de seus recursos para obras viárias e setores do mercado imobiliário. As alterações visaram transformálas em um instrumento efetivamente distributivo, além de manter seu caráter de promover alterações na estrutura urbana da metrópole (BONDUKI e ROSSETTO, 2017, p.240). A área de abrangência da Operação Urbana Centro corresponde aos chamados Centro Velho e Centro Novo, como também parte de bairros históricos do entorno desse núcleo, como é o caso do Glicério, Brás, Bexiga, Vila Buarque e Santa Ifigênia. Enquanto o PIU Setor Central inclui o perímetro da OUC mais trechos limítrofes dos distritos da Consolação, Liberdade, Belém e Mooca. A OUC criada com o objetivo de promover melhorias e revalorização da área central do município e, assim, atrair investimentos imobiliários, turísticos e culturais, foi uma das primeiras tentativas de revitalização do Centro. Segundo Sanches e Silva (2018), o termo “revitalização” não é coerente com o a situação do centro de São Paulo, pois não há falta de vida no local. O que acontece é que a vulnerabilidade social presente, que deveria ser resolvida com um olhar mais atento, acaba por ser descartada das principais políticas públicas, favorecendo o mercado imobiliário.
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No PIU são definidos conteúdos de sucessivas etapas do desenvolvimento de determinada região, a partir de consultas e audiências públicas com participação de agentes diversas camadas da sociedade civil. Sanches e Silva (2018) apresentam seis linhas de ação em que o PIU Setor Central atua para garantir a moradia digna, são elas: •
Manutenção dos vetores em atividade (isto é, a continuidade da tendência atual de adensamento dos distritos de Sé e República);
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Incentivos ao retrofit de edifícios;
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Integração dos perímetros de ZEIS 3 e a concepção de um “anel habitacional popular qualificado” em torno dos distritos centrais;
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Aproveitamento de imóveis públicos;
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Diversificação das tipologias habitacionais e das modalidades de atendimento;
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Subsídio a programas públicos de atendimento à população moradora de rua.
As ações de planejamento e implementação da política habitacional passariam a ser realizadas gradualmente por empresas privadas e organizações
sociais, por meio das Parcerias Público Privadas (PPP), além da articulação com as esferas estadual e federal (SANCHES e SILVA, 2018) A modelagem da PPP foi elaborada pelo Instituto de Urbanismo e Estudos para a Metrópole (URBEM). A intenção desta política seria criar um ambiente favorável para o mercado adquirir terrenos, aprovar, construir e comercializar projetos de forma mais rápida e o Estado seria responsável pelo subsídio públicos e garantias financeiras. Entretanto, no modelo desenvolvido, as faixas de renda atendidas pelas unidades habitacionais alcançaram o limite de 16 salários mínimos, sendo que à faixa de renda de 1 a 3 salários mínimos (que soma quase 80% do déficit habitacional metropolitano), corresponderia um total de 32% das unidades habitacionais produzidas, ao passo que os beneficiários com renda mensal de 5 a 16 salários mínimos acessariam mais de 35% das unidades (SOMBINI, 2016, p. 8-9 apud SANCHES E SILVA, 2018, n.p). Os autores ainda citam:
A produção governamental de habitação social na região do Centro de São Paulo tem sido inconsistente e sujeita às flutuações do panorama político-eleitoral. [...] é notável que a alternância entre gestões progressistas e outras mais alinhadas aos ditames do “livre mercado” e às práticas do urbanismo neoliberal tem causado a constante desaceleração de ações diretas de provisão da moradia, em favor de projetos e programas mais favoráveis à iniciativa privada. Enquanto isso, no âmbito estadual, onde a continuidade administrativa tem sido muito maior, a opção pelo favorecimento aos agentes privados é ainda mais nítida (SANCHES E SILVA, 2018, n.p). O PIU, assim como a OUC, tem se mostrando alheios às necessidades da população residente das áreas centrais. Ainda assim, se estes instrumentos forem regulamentados e, principalmente, geridos poderiam ser ferramentas eficientes para alavancar recursos e promover a melhoria de ações relacionadas à produção de habitação de interesse social, promovendo a função social da propriedade, tão determinante na formulação do Estatuto da Cidade.
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02
TERRITÓRIO
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2.1. O processo de ocupação do centro de São Paulo A configuração socioespacial do centro da cidade de São Paulo passou por várias mudanças até se chegar no que se conhece hoje e para compreender esse processo, é preciso investigar sua origem. Segundo Caldeira (2011), as regras de organização do espaço urbano variam cultural e historicamente, revelando os princípios que estruturam a vida pública e indicam como os grupos sociais se inter-relacionam no espaço da cidade. No espaço urbano de São Paulo, ao longo do século XX, a segregação social passou por pelo menos três formas de expressão (CALDEIRA, 2011). A primeira, que se estendeu do final do século XIX até os anos 1940, marcou uma cidade concentrada em diferentes grupos sociais segregados por tipos de moradias e comprimidos numa área urbana pequena. A segunda forma urbana aconteceu entre os anos 40 e 80 e foi denominada centro-periferia, ou seja, as classes mais altas viviam em áreas centrais dotadas de infraestrutura, enquanto os pobres moravam em regiões precárias e distantes.
Já a terceira fase, que compreende o período dos anos 80 até 2011, mudou consideravelmente as cidades. Nela, os diferentes grupos sociais estão muitas vezes próximos, mas separados por muros e tecnologias de segurança e tendem a não circular ou interagir em áreas comuns, justificados pelo medo do crime e violência. No processo de industrialização, principalmente no final do século XIX, a cidade de São Paulo transformouse na maior e mais importante metrópole brasileira. As construções de fábricas traziam consigo uma onda de novos trabalhadores e imigrantes, com isso, residências precisavam ser erguidas para abrigar os novos moradores, normalmente nas áreas mais baixas da cidade, ladeando as margens dos rios Tamanduateí e Tietê, ou próximo ao sistema ferroviário em bairros como Brás, Mooca, Bom Retiro, Bexiga (CALDEIRA, 2011). A elite enxergava o cortiço como um problema, pois estavam localizados em áreas de grande valor imobiliário e próximos às moradias da elite e, logo, foi considerado ameaça à saúde pública (SANCHES, 2015).
MAPA 03 Esquema da evolução da mancha Urbana no município de São Paulo Fonte: Meyer, Grostein, Biderman, 2004 (adaptado e elaborado por Lorena Silva, 2021)
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Questões sobre como abrigar os pobres e como organizar o espaço urbano numa sociedade que se industrializava estavam ligadas ao saneamento. Em conjunto, elas se tornaram o tema central das preocupações da elite e das políticas públicas durante as primeiras décadas do século XX. A elite paulista diagnosticou as desordens sociais da cidade em termos de doença, sujeira e promiscuidade, ideias logo associadas ao crime (CALDEIRA, 2011, p.214). Assim, surgiram politicas higienistas e a elite, temendo por epidemias, mudou-se das áreas densamente povoadas da cidade para regiões um pouco afastadas e com empreendimentos imobiliários exclusivos, nos bairros de Higienópolis, Campos Elísios e a Avenida Paulista. O padrão centro-periferia da segunda era urbana, segundo Caldeira (2011), foi influenciado, sobretudo, pelo Plano de Avenidas, elaborado por Prestes Maia, em 1930, que reformulou o sistema de circulação da cidade através de uma série de avenidas que partiam do centro até os subúrbios. O centro de São Paulo também passou por mudanças, e foi marcado pela divisão entre o centro “novo” (República) e o centro “velho” (Sé), o primeiro para a elite e o segundo popular (VILLAÇA, 2001 apud SANCHES, 2015). O Plano de Avenidas incentivou o lançamento do sistema de ônibus, que associado à progressiva abertura de novas vias, possibilitou a expansão da cidade em direção à periferia, assim os bondes encerraram suas operações em 1968. O principal agente da expansão dos serviços de ônibus não foi o governo, mas empresários particulares, a maioria dos quais também eram especuladores imobiliários (CALDEIRA, 2011).
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IMAGEM 05 Foto aérea da região central de São Paulo, 1958 Fonte: Geoportal, 2021
IMAGEM 06 Foto aérea da região central de São Paulo, 2017 Fonte: Geosampa, 2021
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IMAGEM 07 Centro de São Paulo Fonte: Baratto, 2021 (foto por Nelson Kon)
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Com o aumento do preço dos aluguéis, os trabalhadores foram expulsos da região central e a alternativa foi a autoconstrução nas periferias, que apesar de mais acessíveis por meio dos ônibus, tornaram a jornada trabalhista ainda mais cansativa já que o deslocamento entre o trabalho e a moradia se tornou mais demorado. Bonduki (1998) destaca que o governo fomenta o acesso à casa própria ou aquisição da propriedade e passa a ser encarada como a melhor solução e forma-se então a cultura da compra da moradia, incorporada pela população, não importando a localização. Os lotes periféricos não possuíam nenhum planejamento prévio e as regiões ocupadas eram aquelas nas quais os especuladores tinham decidido investir. Consequentemente, criou-se uma malha urbana irregular e aleatória, projetada para servir os interesses imobiliários. Tornou-se possível vender lotes localizados “no meio do mato”, ajudando a criar um tipo peculiar de espaço urbano no qual áreas ocupadas e vazias intercalavam-se aleatoriamente por vastas áreas (CALDEIRA, 2011). Esse tipo de ocupação não somente evidencia o descaso de políticas públicas habitacionais como acelera o processo de degradação de áreas ambientalmente protegidas. A autoras Alvim e Kato (2011) explicam:
IMAGEM 08 Assentamentos na beira da represa Billings, São Paulo Fonte: Archdaily Brasil, 2013 (foto por Fabio Knoll)
[...] as dificuldades de acesso à habitação em áreas urbanizadas da cidade e a ausência de políticas públicas, particularmente urbanas, habitacionais e de infraestrutura de saneamento, voltadas para a população mais pobre, acabam por induzir a ocupação de áreas impróprias para urbanização, contribuindo para acirrar os conflitos entre a preservação ambiental e o direito à moradia. (ALVIM; KATO, 2011, n.p.). O processo de expansão da cidade foi caótico, a própria legislação garantia a excepcionalidade da periferia, pois, enquanto regulamentava detalhadamente o que definia como perímetro urbano, deixava as zonas suburbana e rural quase sem regulamentação e, portanto, abertas às mais diversas formas de exploração (CALDEIRA, 2011). Algumas políticas públicas voltadas para a habitação de moradia popular reforçavam o padrão periferiacentro. Com o Golpe Militar, o Governo Federal, em 1964, cria a política habitacional nacional, por meio do Sistema Nacional de Habitação e do BNH (Banco Nacional de Habitação), visto no capítulo anterior. A partir desta política, a prefeitura construiu conjuntos habitacionais nas áreas periféricas. Como resultado, a expansão da periferia criou sérios problemas de saúde e saneamento, Caldeira (2011) mostra que as taxas de mortalidade, especialmente a de mortalidade infantil, aumentaram de 1960 até meados da década de 70, bem como a expectativa de vida. O cenário da época era, de um lado, os pobres nas periferias, em bairros precários e casas autoconstruídas e, de outro, as classes média e alta morando em bairros bem-equipados e centrais, uma porção significativa delas em prédios de apartamentos. Este padrão de segregação socioespacial dependia do sistema viário, automóveis e ônibus e sua consolidação ocorreu ao mesmo tempo em que São Paulo e a região metropolitana tornaram-se o principal centro econômico do país. As indústrias localizavamse na periferia e nos municípios circundantes, como a
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região do ABC. O comércio e os serviços, no entanto, permaneceram nas regiões centrais, não apenas no velho centro, mas também próximo às novas áreas de residência das classes média e alta em direção à zona sul da cidade (CALDEIRA, 2011). Além dos fatores já enumerados até aqui que explicam o processo de transformação do centro, Sanches (2015), apresenta outros motivos: as indústrias são transferidas para cidades instaladas no percurso das linhas férreas, onde os impostos são menores, os escritórios migram para lugares de maior prestígio como a região da avenida Paulista, a elite paulistana afasta-se progressivamente do centro e passa a ter suas residências nas avenidas Brigadeiro Luís Antônio, Rebouças, Nove de Julho, Brasil e Faria Lima que contribuíram para a criação de novas centralidades se deslocando em direção dos Jardins e rio Pinheiros, em função da mobilidade espacial a partir do automóvel, região sudoeste da cidade (SANCHES, 2015, p.160). Apesar do processo histórico demonstrar o esvaziamento do centro pela população abastada em função das necessidades de garagens e adequações das instalações, também pelas camadas mais pobres, devido o preço alto da terra e dos alugueis, uma parcela da população resiste morando em cortiços com condições precárias e insalubres em quase todos os bairros centrais, pois a proximidade do local de trabalho é a grande vantagem de se morar no centro (SANCHES, 2015).
Kohara (2016), que também pesquisou as condições em que vive a população encortiçada, aponta para a dificuldade de aprendizado das crianças que moram nos cortiços. A falta de um espaço próprio para os estudos e noites mal dormidas mostraram que, em 2007, 45% das crianças que moravam em cortiços foram avaliadas com desempenho não satisfatório. Ainda segundo o autor, os cortiços tem um dos preços de alugueis relativos mais altos na região central, ou seja, tem um dos metros quadrados mais caros se comparados com outras tipologias residenciais e até mesmo com escritórios. Mesmo com as desvantagens apontadas, muitos aceitam os alugueis abusivos por não possuírem documentações legalizadas, principalmente os imigrantes, ou por conta da falta de oferta de moradia digna nas regiões centrais que, como já foi dito, são áreas vantajosas devido à proximidade do trabalho e pelo menor tempo de deslocamento em transportes públicos. Instrumentos urbanísticos como o a OUC e o PIU tem tentando reverter este quadro e trazer mais moradias para o centro, o que, de certo modo, tem promovido um adensamento na região. Segundo o documento Diagnóstico Sócio Territorial (2017), publicado pela prefeitura de São Paulo e pela SP-Urbanismo foram produzidas 48.585 unidades no período de 1997 e 2015, o equivalente a 9% da produção habitacional vertical privada do município. Dos distritos centrais, os que mais receberam essas unidades habitacionais foram: Santa Cecília, Liberdade, República e Consolação.
Em sua pesquisa, Kowarick (2016) mostra as difíceis condições em que a população encortiçada vive. Segundo dados e relatos colhidos pelo autor, as pessoas vivem em cômodos minúsculos, sem divisão entre ambientes e que, muitas vezes, não possuem janelas. Além disso, a maioria dos cortiços possuem banheiros que são compartilhados, em média, entre 5 e 6 pessoas. Não há salubridade e nem privacidade, por conta disso, muitos se enxergam em condições de humilhação e subalternidade. Os relatos de Kowarick (2016) também demonstram, que apesar de estarem em regiões centrais, dificilmente os moradores de cortiços usufruem dos equipamentos públicos disponíveis. Mesmo com inúmeras opções de lazer, muitos não se sentem pertencentes do espaço.
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IMAGEM 09 Cômodo de cortiço em condições insalubres Fonte: HABI- Superintendência de Habitação Popular, 2010 (foto por Fabio Knoll)
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A facilitação ao crédito imobiliário para os per¬fis de renda média e média baixa fez com que os empreendedores vissem esse nicho como uma oportunidade de negócio, tanto para investimento em reforma de edifícios subutilizados como para a construção de novos empreendimentos. Em 10 anos (de 1997 a 2007) ocorreu uma mudança geral na renda familiar na região central: diminuição da população com renda superior a 15 salários mínimos e aumento da população de rendas média e média baixa, o que gerou um cenário propício ao investimento do mercado (Diagnóstico Sócio-Territorial, 2017, p.97). Entretanto, grande parte dos lançamentos imobiliários não são destinados para a população mais vulnerável, quem se beneficia desses imóveis são investidores e camadas economicamente mais elevadas, até mesmo os empreendimentos das PPPs não atendem prioritariamente as pessoas que recebem de 1 a 3 salários mínimos e, na maior parte dos casos, acabam por expulsar quem já estava ali devido ao processo de gentrificação. Segundo o documento Caminhos para o Centro (2004), em comparação à outras regiões da cidade, a regiõ central de São Paulo ainda é densamente ocupada tanto economicamente, quando residencialmente, além de ser um importante ponto de passagem comercial e de trabalho. O que se verificou nas últimas décadas foi uma mudança de perfil desta ocupação, com efeitos, na maior parte dos casos, de queda de qualidade de vida e relativo ao empobrecimento. A imagem que se tem hoje, por grande parte da população, é de um espaço inseguro, sujo e violento, que mascara a realidade do espaço e invisibiliza as vidas dos que estão em situação de vulnerabilidade, ou seja, os comerciantes ambulantes, moradores de assentamentos precários e as pessoas em situação de rua que necessitam urgentemente de políticas públicas efetivas para viverem em condições de vida melhores.
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TABELA 01 Unidades Residenciais Construídas entre 1997-2015 Fonte: Embraesp, 1997-2015 (elaborado por SP-Urbanismo)
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2.2. O direito de ocupar - a luta dos movimentos por moradia O entendimento do que vem a ser moradia digna passa pelo entendimento do direto à cidade, definido por Lefreve (1968). Tal direito está na base das principais reivindicações dos movimentos sociais de moradia que atuam de forma coletiva (SANCHES, 2015, p. 176). Junto com o processo de redemocratização, os movimentos por moradia começam a se unir e se articular e formam a União de Movimento de Moradia (UMM), em 1987. Na cidade de São Paulo, o Movimento Sem Teto promove um amplo processo de ocupações, com o objetivo de encontrar uma solução de moradia para as famílias ocupantes como para denunciar o problema habitacional e o abandono de edifícios públicos e privados no centro (SILVA, 2001, p.24). Mais de 300 mil pessoas promovem ocupações em cantos da cidade de forma desorganizada ou organizada, já que a Pastoral da Moradia, Setores da Universidade, alguns Parlamentares e Centros de Direitos Humanos ajudavam e apoiavam a organização do Movimento (BARBOSA e PITA, 2006, n.p.).
pode ser caracterizada como um periodo de transição, quando os artigos 182 e 183 da Constituição Federal ainda não estavam regulamentados, nem formulada uma nova política habitacional pós-BNH, mas já se construía uma nova agenda para as cidades. Em dezembro de 1988, a prefeita Luiza Erundina é eleita para governar a cidade de São Paulo, reorganizando a política habitacional, sendo a Secretária de Habitação a professora da FAUUSP Ermínia Maricato com o Superintendente de Habitação o professor Nabil Bonduki também da FAUUSP. A conjuntura política dos responsáveis pelo setor habitacional estava ligada à Reforma Urbana e comprometida com processos participativos (SANCHES, 2015, p.179). Uma das primeiras ações da então gestão municipal é a reunião com a UMM que apresenta reivindicações de propostas para os moradores de cortiços. O governo municipal assume os compromissos para a população encortiçada, com atuação de controle em relação aos intermediários, tarifa mínima de água e energia, fiscalização das condições de salubridade. Esse comprometimento vem a estimular maior organização dos movimentos (SANCHES, 2015, p.179).
Segundo Barbosa e Pita (2006, n.p.), em 15 de junho de 1991 a Arquidiocese de São Paulo organizou o primeiro encontro de Cortiços da Pastoral da Moradia, deste encontro surge o MUC (Movimento Unificado de Cortiços), com apoio do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos, que posteriormente se transforma na ULC (Unificação das Lutas de Cortiços) matriz de todos os Movimentos de Moradia da região Central. A ação destes Movimentos a partir de 1995 alterou a agenda do centro e demonstrou que os sem voz e sem vez não ficariam mais calados, diante do escândalo do esvaziamento deste espaço, do abandono e da parceria do setor imobiliário com o setor público, que tenta transformar o centro num território exclusivo da classe média e rica da cidade (BARBOSA e PITA, 2006, n.p.). Concomitantemente com o periodo de fortalecimento dos movimentos por moradia e enquanto o Estatuto da Cidade era formulado, os municipios tiveram que enfrentar o problema habitacional. Segundo Bonduki (2017, p.110), essa fase
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IMAGEM 10 Incêndio no Edifício Wilson Paes de Almeida, 2018 Fonte: G1, 2019 (divulgação/Corpo de Bombeiros)
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Segundo Bonduki (2017, p.113), na gestão Luiza Erundina, o município de São Paulo se destacou como um laboratório de experiências alternativas, colocando em prática e qualificando o ideário da reforma urbana. Essa nova concepção se materializou em 250 projetos agregados em programas alternativos, como o mutirão autogerido, a urbanização de favelas, a intervenção em cortiços e áreas centrais, e a assistência jurídica (BONDUKI, 1991 e 1992; MARICATO, 1991 apud BONDUKI, 2017, p.113). Os anos 90 foram promissores no âmbito da política habitacional dentro do municipio de São Paulo, porém não sanou o problema, ainda há muito o que ser feito e por isso, os movimentos por moradia seguem atuando até hoje denunciando e lutando por um espaço na região central. Um dos mais tristes acontecimentos que evidenciam o descaso ainda existente foi incêndio e desabamento do edifício Wilson Paes de Almeida, no largo do Paissandú em 2018, deixando mais de 7 mortos, 2 desaparecidos e inúmeras famílias sem ter onde morar (G1, 2018). Esta tragédia por outro lado criminalizou os movimentos sociais de moradia organizados, para entender seus objetivos e ações, Barbosa e Pita (2006) explicam que as ações dos Sem Teto acontecem a partir de 5 frentes:
IMAGEM 11 Edifício conquistado pelo Movimento de Moradia através do PAC, Santa Cecília, São Paulo Fonte: Sanches, 2015 (foto por Ambiente Arquitetura)
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A primeira frente é a denúncia, ou seja, mostrar ao país que esta situação não tem sido uma tarefa fácil, pois as ameaças, as perseguições, a criminalização, a cooptação, a desqualificação das demandas e reivindicações, são constantes;
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A segunda frente são as mobilizações em massa (ocupar, resistir e construir). É nesta frente onde o movimento ocupa prédios de propriedade pública e privada que se encontram vazios e/ou com impostos atrasados;
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A terceira frente é o cadastramento das famílias nos cortiços e a resistência contra os despejos;
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A quarta frente de ação é articulação entre as Pastorais, as Entidades de Direitos Humanos e as Universidades, parcerias que fortalecem a atuação dos movimentos tanto nas ocupações como nos cortiços;
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A quinta frente de ação é articulação com as lutas gerais, em âmbito local, e nacional.
Apesar de árdua, a luta dos movimentos por moradia no centro já gerou resultados e conquistas. Além dos instrumentos jurídicos e legais, de proteção, regulação de uso do solo, alguns programas foram criados com foco na promoção de habitação de interesse social. Barbosa e Pita (2006, n.p.) citam dois deles. O PAR (Programa de Arrendamento Residência) sua versão original tinha como objetivo a produção nova de habitação social, porém, foi adaptado para promover a reforma de prédios vazios para moradia popular sendo a Caixa Econômica Federal o agente operador para atender famílias com renda mensal de três e meio a seis salários mínimos. Já o Programa Bolsa Aluguel da prefeitura municipal visava atender famílias com 1 até 10 salários mínimos, oferecendo por trinta meses um recurso de 300 reais por família. O Programa Morar no Centro, da gestão municipal de 2001 a 2004 e idealizado pela SEHAB, tinha como diretrizes priorizar a reforma de prédios vazios, perímetros de reabilitação integrada do habitat, combinar soluções habitacionais com iniciativas de geração de renda e buscar a diversidade social nos distritos centrais (SANCHES, 2015, p. 189).
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O programa tinha como mobilidade de atendimento habitacional a locação social, bolsa aluguel, moradia transitória e programa de intervenção em cortiços. Os movimentos sociais por moradia foram primordiais na implementação desta política e, nesse período, houve uma grande articulação entre os diferentes níveis de governo (municipal, estadual e federal) para a viabilização de empreendimentos de habitação social (SANCHES, 2015). Mais do que na quantidade de unidades produzidas, essa modalidade se destaca pela qualidade apresentada no âmbito arquitetônico e urbanístico, além de seu importante papel na solidificação do tecido social. São Paulo tem longa tradição nesse sentido, tendo sido uma das cidades pioneiras a incorporar, no Brasil, os mutirões autogeridos como parte da política habitacional da cidade, ainda na década de 1980 (Plano Municipal de Habitação de São Paulo, 2016) Segundo Bonduki (2017, p.172), o Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV) buscou combater a crise econômica de 2008 e as dificuldades do setor imobiliário e da construção civil. Apesar do impacto social gerado com a produção em grande escala de moradias, os problemas urbanos se agravaram por falta de planejamento territorial e os objetivos foram incapazes de dar uma resposta adequada à questão habitacional. O único avanço relevante foi a inclusão de novas normas para facilitar a regularização fundiária de assentamentos precários, contemplando famílias mais pobres (Faixa 1)3 , devido à pressão dos movimentos sociais de moradia, o que resultou no desdobramento do programa o MCMV-Entidades (BONDUKI, 2017, p. 172). O MCMV-Entidades, uma produção habitacional em parceria com associações, cooperativas e outras entidades do terceiro setor, possibilitava a compra antecipada da terra, que deu às entidades a possibilidade de adquirir terrenos em condições mais vantajosas (BONDUKI, 2017, p.174).
Sanches (2015, p.149) detalha o faseamento de viabilização de empreendimentos do MCMVEntidades. Primeiro, por meio de apoio jurídico e social, há um auxílio para a formação de uma associação de moradores. Depois, com a realização de um estudo preliminar de arquitetura participativo, fazse a viabilização técnica e financeira para a compra antecipada do terreno pela associação. Em seguida, o projeto final é construído com a atuação e cooperação da associação. Finalmente, no pós-obra, há um trabalho de inserção dessa população, os moradores são preparados para gerir o empreendimento e estabelecer normas de convívio entre eles. Em 2020, o PMCMV foi substituído pelo Programa Casa Verde e Amarela, subsidiado pelo FGTS e tendo a Caixa Econômica Federal como agente financiador. Esta medida, na verdade, foi mais uma tentativa de descontinuar com os programas da gestão presidencial anterior do que efetivamente resolver o problema da habitação. Sanches e Silva (2018, n.p.) citam que o Plano Municipal de Habitação, formulado em 2016, foi um marco para as políticas de moradia. Tendo como principais inovações a incorporação de políticas de “aluguel social” e introdução do Serviço Social de Moradia, opção de apoio à população em situação de vulnerabilidade e emergência extrema. Como visto, a luta gerou resultados e tem comovido diversos setores da sociedade a apoiar o movimento, mas há muito o que ser feito ainda, principalmente pelo poder público. Bonduki (2017) cita: Dos imóveis notificados para a aplicação do IPTU progressivo, 221 (ou 16%) correspondem a subutilizados, 448 (ou 32%) a não edificados e 711 (ou 52%) a não utilizados. Considerando que 88 notificações foram canceladas (impugnações e recursos deferidos), dos 1.380 imóveis notificados, 1.292 precisam cumprir as obrigações impostas pelo PEUC. Em resultado desses três anos de aplicação do instrumento, desses 1.292
3. A Faixa 1 do PMCMV contempla famílias que recebem até 3 SM e as Faixas 2 e 3 compreendem aquelas que recebem acima de 3 SM até 10 SM.
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imóveis apenas 94 (7%) cumpriram definitivamente a obrigação estabelecida pela lei, com a realização do parcelamento, edificação ou utilização dos imóveis. Dos que cumpriram parcialmente 100 imóveis (8%) exclusivamente não edificados ou subutilizados solicitaram alvará de aprovação e execução de nova edificação ou estão em obras. Restam 1.098 imóveis (85%) que não cumpriram as obrigações (BONDUKI, 2017, p.228). Os dados acima mostram que o centro tem muito potencial para abrigar moradias e São Paulo, uma cidade que se expande cada vez mais para as pereferias em áreas ambientalmente protegidas, deveria medir esforços para garantir que mais habitações de interesse social fossem construídas numa região que já possui insfraestrtura e oferta de emprego. Portanto, investir em políticas de repovoamento dos bairros centrais e de controle da expansão urbana, torna-se uma medida eficiente e sustentável para o gerencimento da cidade, garantindo que parcela mais vulnerável da populção possa, por direito, ter um lugar na cidade e se sentir pertencente ao território. Como formular essas políticas também é um processo que requer muito empenho dos governos. É preciso sempre estar atento ao que a população solicita e propor medidas que realemente funcionem para sanar tais reivindicações, pois, como visto, anteriormente, quem acaba se beneficiando nesses processos são setores economicamentes mais fortes. Levando isso em consideração, a seguir apresenta-se diretrizes de projetos urbanos para a região central para estudo de caso.
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DIRETRIZES
3.1. Luz para quem? Nesta etapa do trabalho foram analisados dois projetos que desenharam propostas e diretrizes para a região da Luz e Santa Efigênia, no município de São Paulo. O primeiro deles, intitulado “Nova Luz”, foi um instrumento urbanístico anunciado, em 2005, pela prefeitura de São Paulo, no mandato do prefeito José Serra, mas que acabou sendo arquivado em 2013, na gestão Haddad. Em um primeiro momento, o Nova Luz aparenta apresentar propostas interessantes às quadras que compreendem o perímetro do projeto, localizadas entre as avenidas São João, Duque de Caixas, Mauá, Casper Líbero e Ipiranga. São perspectivas, mapas e diagramas que mostram diretrizes urbanas conceituadas, como fachadas ativas, incorporação de praças e princípios de uma cidade compacta. Porém, ao se deparar com o projeto de remoções, chamado de “renovações”, numa tentativa de mascarar o caráter separatista do instrumento, percebe-se que as condutas do projeto se voltaram aos desejos do mercado imobiliário, por meio das PPPs e concessões. As autoras Feldman e Leme (2009) citam: Através de licitação, delega a pessoa jurídica ou a consórcio de empresas a desapropriação, o pagamento da desapropriação e a execução de obras urbanísticas. A recuperação do investimento da empresa concessionária ocorre através da comercialização dos imóveis desapropriados e construídos, pela exploração de áreas públicas, pela receita de projetos associados, etc. Além disso, abre-se a possibilidade de incluir a contrapartida financeira da Operação Urbana Centro nas obras a serem realizadas pela concessionária. Não há limites para os ganhos do setor privado (FELDMAN e LEME, 2009). O processo especulativo acontece porque o bairro de Santa Ifigênia vem sendo estigmatizado ao ser associado ao consumo de crack que, não por acaso, ocorre em determinadas quadras e ruas, há décadas subutilizadas, abandonadas e, consequentemente, deterioradas (FELDMAN e LEME, 2009). Assim, o mercado imobiliário se apropria desse pensamento para vender a ideia de que o bairro precisa de uma “revitalização” e “requalificação”, justificando a demolição de imóveis.
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Neste processo, os proprietários de imóveis que estão vazios e subutilizados, não cumprindo sua função social, e que acumulam dívidas relacionadas ao não pagamento do IPTU, veem uma oportunidade de vender suas propriedades. Desse modo, são construídas novas moradias no local, mas que não iriam ser destinadas àqueles que ali já estavam. Em função disso, as pessoas que ali estavam temiam por perder seu território. Surgiu assim, o Conselho Gestor das ZEIS 3, um dos únicos canais de interação entre sociedade civil e poder público existente no Projeto Nova Luz, teve como objetivo minimizar os seus impactos do projeto e fazer valer a inclusão social e os direitos dos que vivem e trabalham no perímetro do projeto. O Conselho contou com respaldo técnico para a elaboração de propostas e para a articulação na defesa dos interesses da comunidade, o que permitiu que a sociedade civil se colocasse em pé de igualdade para o debate num espaço a priori hierarquicamente desigual (GATTI, 2013). Como observado, o projeto traria adensamento para a região, mas não consideraria aspectos já existentes do local, como o tecido social diversificado, moradores e comerciantes locais, além dos imóveis de caráter histórico. Como consequência, a implementação desse projeto acarretaria um processo de gentrificação, afastando os comerciantes e moradores que vivem lá para áreas mais distantes do centro. Entretanto, em 2013, o projeto foi engavetado pelo prefeito Fernando Haddad, principalmente, por conta das pressões socais do Conselho Gestor da ZEIS 3 e das diversas críticas que sofreu durante o tempo em que esteve em tramitação.
IMAGEM 12 Perspectiva do Nova Luz
Projeto
Fonte: Projeto Nova Luz
IMAGEM 13 Remoções do Projeto Nova Luz, correspondente às áreas em bege Fonte: Projeto Nova Luz
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IMAGEM 14 Diretrizes do Projeto Campos Elíseos Vivo Fonte: Campos Elíseos Vivo
IMAGEM 15 Proposta de intervenção do Projeto Campos Elíseos Vivo Fonte: Campos Elíseos Vivo
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Em contrapartida, o projeto Campos Elíseos Vivo, elaborado em conjunto com o Fórum Mundaréu da Luz e diversas instituições e profissionais de variadas disciplinas, apresenta uma proposta de intervenção urbanística e social inclusiva e participativa, resultado de uma série de debates com população local. O projeto foi uma reação às ações violentas e autoritárias que aconteceram (e ainda acontecem) na região para expulsar a população usuária de droga, que acabam rebatendo também em outras pessoas que ali vivem. O objetivo do projeto foi criar diretrizes que possibilitassem viver e trabalhar no centro, sem a violência de remoções e demolições, vistas no Nova Luz. Segundo os autores Cotrim-Ferreira e Castro (2019), o projeto propõe primeiramente uma imersão no território, por meio de um estudo do patrimônio material e imaterial da região, e a compreensão da situação habitacional precária e das vulnerabilidades sociais das populações residentes. A partir dessa análise, foi possível desenvolver um plano reconhecendo tanto a arquitetura como a população local, tendo em vista a necessidade do desenvolvimento urbano da cidade. O levantamento feito nas quadras 36, 37 e 38 do bairro Campos Elísios, situadas no quadrilátero entre a Avenida Rio Branco, a Rua Helvétia, a Alameda Cleveland e a Alameda Glete, demonstrou que há diversos tipos de arranjos familiares e maneiras de morar, existem pessoas que se instalam em pensões ou hotéis sociais por pouco tempo ou até mesmo por uma noite, como famílias que vivem há anos em situação de subalternidade nos cortiços. O estudo apontou que todas famílias tinham um rendimento mensal de no máximo 3 salários mínimos, e algumas dessas não possuíam rendimentos fixos, o que dificultava o pagamento de despesas permanentes. Os aluguéis variavam entre R$ 400 e R$ 700, ou seja, entre 45% e 75% de um salário mínimo (COTRIM-FERREIRA e CASTRO, 2019, p.103). Quanto a oferta de emprego, Cotrim-Ferreira e Castro (2019) citam que existem muitos estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços e grande parte das atividades realizadas nesses estabelecimentos são as fontes de trabalho e renda de quem mora na região.
O projeto dividiu-se em três diferentes eixos: o eixo morar e trabalhar, o eixo amar e cuidar e o eixo estar na rua e conviver, que propuseram diferentes diretrizes para lidar com a heterogeneidade do local, sempre a partir da necessidade e falas daqueles que ali já estavam. As propostas incluem um programa articulado de uso habitacional, com variedades de tipos, acessos e aquisições, formas mais humanizadas de lidar com população usuária de drogas, de modo a realizar um processo de desintoxicação gradativo de redução de danos e maneiras de subsidiar o comércio local, incluindo também diretrizes de melhoria do espaço público. Para isso, o projeto utilizou apenas os terrenos e imóveis vazios ou subutilizados que já foram notificados pelo poder público e, lançando mão de instrumentos que constam no próprio Plano Diretor Estratégico de São Paulo, foi possível construir moradia para mais de 3.000 famílias (ROLNIK, 2018). Além disso, nas propostas de faseamento, foram pensadas maneiras de manter a população local na área durante todo o processo, as famílias só sairiam de suas casas apenas quando a nova moradia estivesse pronta. Segundo Rolnik (2018), o projeto Campos Elíseos Vivo é um exemplo de como transformar respeitando as pessoas e o patrimônio material e imaterial de um dos bairros mais antigos da cidade de São Paulo e que não merece ser destruído em nome de uma guerra às drogas. Diferente do Nova Luz, o Campos Elíseos Vivo demonstra que, através de um processo participativo e multidisciplinar, que inclui diversos setores da sociedade civil, é possível construir políticas públicas com soluções urbanísticas e arquitetônicas criativas e inovadoras, que de fato contribuem para o melhor gerenciamento da cidade e, sobretudo, deem o devido cuidado que as pessoas em situação de subalternidade necessitam. Durante o processo de formulação dessas políticas públicas, o desenho urbano é um elemento fundamental. É por meio dele que as propostas e diretrizes ganham forma e é nesta etapa que passa a ser possível visualizar e viabilizar o projeto. Tendo isso em vista, a próximo item desta pesquisa buscou enteder as maneiras e arranjos possíveis de se intervir no território.
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3.2. Desenho Urbano O centro de São Paulo é altamente construído, porém não de maneira uniforme, as formas e volumes são os mais variados possíveis devido às diferentes épocas que contam a história do lugar. Em decorrência disso, a malha urbana do centro possui resquícios e vazios, muitas vezes de difícil intervenção, por conta da irregularidade das formas. Entretanto, estas áreas podem ser de enorme potencial construtivo ainda mais se associados aos vazios de galpões subutilizados ou estacionamentos. A quadra aberta, portanto, torna-se uma solução contemporânea para os grandes aglomerados urbanos, como a região central de São Paulo, e seria uma conciliação entre as qualidades de rua-corredor da cidade tradicional e dos edifícios autônomos da cidade moderna, pois, apesar das diferentes flagrantes entre as arquiteturas, a permeabilidade do solo é o elemento articulador que possibilita a integração das edificações privadas com o espaço público, sendo possível, assim, desenhar edifícios que se abram para a cidade. (GUERRA, 2011). Guatelli (2008) traz uma reflexão da intertextualidade e o “entre” aplicado à arquitetura, ou seja, como a dife-rentes projetos de diferentes épocas articulam entre si e formam o espaço. Falando especificamente do espaço urbano, poderíamos discutir sobre o espaço de intermediação entre diferentes ações (a partir de diferentes vozes) com intenções conflitantes que poderiam engendrar novas possibilidades, possibilidades de desterritorializações e reterritorializações (GUATELLI, 2008). Segundo o autor, rever e repensar relações do homem com a paisagem edificada e do homem com seu produto maior, a cidade, potencializam o fazer coletivo, espontâneo, criativo, interpretando a qualidade do vazio enquanto extensão do objeto, não aprisionado ao pragmatismo da forma e do domínio. Guerra (2011) faz um comparativo de projetos, feitos entre os anos de 1960 a 2000, que adotaram o conceito de quadra aberta. O Centro Comercial do Bom Retiro, projeto de 1959 e inaugurado durante os anos 1960, de autoria de Lucjan Korngold, é um desses exemplos. O autor explica que o arquiteto, aproveitando o miolo de quadra, que pode ser acessado por dois lotes em ruas distintas, projetou uma edificação contínua, com quatro pisos, que se encosta nos muros dos fundos dos
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lotes lindeiros, conformando uma clareira, no centro da qual dispôs uma pequena torre com dez andares (GUERRA, 2011). Dentro do âmbito da habitação de interesse social, a Cohab Pedro Facchini, projetado pelo escritório Bacco Arquitetos, em 2002, é um exemplar significativo, apesar de estar no Ipiranga, bairro não central da cidade de São Paulo, a construção foi feita em uma área degradada e habitada por cortiços, características também encontradas em bairros centrais. Trata-se de um projeto em um lote de 320 m², onde existiam 8 barracos, que passou a abrigar 12 unidades habitacionais dispostas em 3 andares. Segundo os arquitetos, o conjunto assume um cárter de vila, quando encosta na empena cega do vizinho e se abre para a face nordeste criando um corredor ajardinado que serve de acesso e área comum. O diferencial do empreendimento está no método de contratação, que possibilitou maior participação dos moradores e autonomia dos arquitetos durante o processo projetual, além da viabilidade econômica, por se tratar de um projeto de menor escala. Os exemplos apresentados, apesar de diferentes, demonstram, que o processo projetual começa antes mesmo do desenho, é preciso uma análise cuidadosa do território, tanto a nível urbano, levantando características físicas do local, como, e principalmente, a nível do pedestre, prestando atenção aos agentes que ali vivem e escutando o que eles tem a dizer. Só assim é possível determinar um traçado para as políticas públicas que vão de encontro ao desejo da população local. O próximo capitulo, portanto, inicia-se com a análise territorial da área de intervenção para então formulação do masterplan e do objeto de projeto.
IMAGEM 17 Fachada da Cohab Pedro Facchini, Ipiranga, São Paulo Fonte: Bacco Arquitetos, 2012 (foto por Nelson Kon)
IMAGEM 16 Centro Comercial do Bom Retiro, acesso à varanda superior, São Paulo Fonte: Guerra, 2011 (foto por Abilio Guerra)
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PROJETO
4.1. ANÁLISE DO ENTORNO Como já citado, alguns pontos deste trabalho foram feitos em conjunto e esse capítulo é um desses momentos. Para a construção do masterplan, julgamos ser importante, primeiramente, pensar o território de intervenção de maneira colaborativa, analisando o entorno com base em informações extraídas de mapas. Consideramos também ser relevante para as propostas haver um panorama geral a respeito da Cracolândia, a fim de compreender a complexidade do local. Por fim, partimos para a elaboração do masterplan de fato, expondo diretrizes e critérios para realizar um projeto que não ignorasse as pessoas da região. MAPA 04 Localização, no município de São Paulo, da área de intervenção Fonte: Geosampa, 2021 (elaborado por Lorena Silva, 2021)
A área escolhida para a intervenção projetual localiza-se no bairro dos Campos Elíseos, distrito de Santa Cecília, zona central do município de São Paulo e também se insere na Operação Urbana Centro e no Perímetro de Intervenção Urbana Setor Central.
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O mapa da PERMEABILIDADE VERTICAL, mostra que a área já é densamente construída, entretanto, algumas quadras possuem vazios que evidenciam os resquícios que a formação do bairro deixou.
MAPA 05 Permeabilidade Vertical Fonte: Geosampa, 2021 (elaborado por Lorena Silva, 2021)
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Já o mapa da PERMEABILIDADE HORIZONTAL mostra como a região é carente de espaços públicos de qualidade. Tendo como parâmetro a dimensão do território, pode-se considerar que existem poucas áreas verdes. A Praça Princesa Isabel e a Júlio Prestes, além do Parque da Luz, mais próximas da área de intervenção, não são tão usadas pela população como local de lazer, tendo uso apenas como espaço de passagem. Pode-se inferir que fatores como a falta de cuidados por parte do poder público e o atual cenário em que se encontram, com muitas pessoas desabrigadas em situação de rua e usuários de drogas, sem políticas públicas adequadas, refletem o abandono e a desumanização de parte da sociedade.
MAPA 06 Permeabilidade horizontal Fonte: Geosampa, 2021 (elaborado por Lorena Silva, 2021)
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Conforme Neuza Carvalho (2011), Campos Elíseos foi o primeiro bairro planejado da cidade, loteado pelos empresários suíços Frederico Glete e Victor Nothmann, no final do século XIX, em 1878. A escolha do local foi estratégica para a produção cafeeira, próxima das estações Sorocabana (hoje estação Júlio Prestes) e Luz e também do triângulo histórico. O bairro logo abrigou as mansões e casarões da elite cafeeira e instituições como o Liceu Coração de Jesus, a Irmandade de Santa Casa de Misericórdia de São Paulo e o Palácio dos Campos Elíseos, residência oficial do governador do Estado na época. Hoje, muitos desses edifícios que ainda restaram foram tombados por órgãos ligados ao patrimônio, indicado no mapa da FORMAÇÃO HISTÓRICA. A crise do café, em 1930, levou ao esvaziamento do bairro por parte da elite, e os casarões foram demolidos, dando espaço a prédios de apartamentos e galpões industriais, ou em algumas situações transformados em cortiços.
MAPA 07 Formação histórica Fonte: IPTU, 2020 e Geosampa, 2021 (elaborado por Lorena Silva, 2021)
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Atualmente, por conta de programas como as Parcerias Público Privadas e incentivos ao mercado imobiliário, a região está atraindo parcelas da classe média. Entretanto, camadas sociais mais vulneráveis, como ambulantes, pessoas em situação de rua ou que moram assentamentos precários, não recebem a mesma atenção do poder público. Por conta das atuais políticas que atendem setores economicamente mais abastados, famílias que moram no território estão sendo expulsas, mesmo com a implementação de instrumentos como as ZEIS, desde o plano diretor de 2002.
Hoje, a área é disputada pela União federal e por moradores, que exigem o direito à posse por usucapião por estarem estabelecidos no local há mais de 30 anos, o que fora concedido em 2008 provisoriamente até o julgamento final, que não tem data prevista. A favela do Moinho também sofreu com incêndios, ações policiais violentas e medidas que controlassem a expansão da favela, como a construção de um muro de concreto de 55 metros de comprimento (CABETTE, 2017 apud Silveira, 2020).
O mapa da PRECARIEDADE HABITACIONAL mostra bem essa situação. Além dos cortiços, instalados nos casarões, como também em sobrados e que abrigam inúmeras pessoas em espaços minúsculos e mal arejados, a favela também é uma realidade no território. Conhecida como “Favela do Moinho”, este assentamento, localizado entre os trilhos de trem, é território de catadores de papel que resistem na luta pela permanência no local (SANCHES, 2015).
MAPA 08 Precariedade habitacional Fonte: Sanches, 2015 e Geosampa, 2021 (elaborado por Lorena Silva, 2021)
IMAGEM 18 Cortiço na região central de São Paulo Fonte: HABI - Superintendência de Habitação Popular, 2010 (foto por Fabio Knoll)
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As ocupações também se evidenciam no território, sendo a mais emblemática delas a ocupação Prestes Maia, localizada na avenida de mesmo nome, no nº 911, próxima à estação da Luz. Desde quando foi ocupado, em 2002, o Prestes Maia foi palco de disputas e conflitos entre a atuação do poder público, o mercado imobiliário e os movimentos de moradia, transformando-se num símbolo dessa luta (MURAD, 2019). Os imóveis ocupados pelos movimentos de moradia podem ser tanto de domínio público, revelando a má gestão desses edifícios, ou de domínio privado, a maioria deles com arrecadação do IPTU atrasada. Através do mapa dos IMÓVEIS NOTIFICADOS, é possível compreender melhor esta situação, são desde imóveis subutilizados ou não utilizados, como terrenos não edificados. O vazio vai além dos resquícios de quadras, existe também nas edificações, e se multiplica dependendo do gabarito da edificação, enquanto inúmeras pessoas não têm onde morar dignamente.
MAPA 09 Imóveis notificados Fonte: Geosampa, 2021 (elaborado por Lorena Silva, 2021)
IMAGEM 19 Ocupação Prestes Maia Fonte: OUL, 2018 (foto por Nacho Doce/Reuters)
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O município reconhece essas áreas que poderiam ser destinadas à habitação de interesse popular e para indicar a implementação de medidas que olhem para estas questões classificou algumas áreas em ZEIS 3 e outras em ZEIS 5. Ambas as ZEIS são destinadas para a produção de habitação de interesse social, mas enquanto as ZEIS 3 tem como objetivo recuperar moradias e fixar a população local, aproveitando a estrutura urbanizada existente, as ZEIS 5 visam atender o mercado popular de moradia, que deve entregar unidades habitacionais para famílias que recebem entre 3 e 10 salários mínimos, por meio de programas sociais. Quanto ao ZONEAMENTO da região, além das ZEIS já citadas, o PDE classifica o recorte majoritariamente como ZEM (Zona Eixo de Estruturação e Transformação Metropolitana) e ZC (Zona de Centralidade). De modo geral, estas zonas têm como diretriz promover usos diversificados com densidades demográficas e construtivas mais altas, podendo ter um Coeficiente de Aproveitamento igual a 4, bem como a qualificação da paisagem urbana de modo articulado com os sistemas de transporte locais e metropolitanos.
MAPA 10 Zoneamento Fonte: Geosampa, 2021 (elaborado por Lorena Silva, 2021)
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Os USOS da região são dos mais diversos possíveis, vão desde o comercial, residencial, hotéis, institucionais a prédios de serviços. Entretanto alguns dos imóveis classificados como comerciais, quando analisados de perto por meio de fotos, possuem uma tipologia mais de galpão do que de lojas e assim como os estacionamentos, armazéns e terrenos vazios, poderiam ter usos mais diversificados, desde que os comerciantes ali inseridos fossem realocados para uma área no próprio local e concordassem com as eventuais propostas apresentadas.
MAPA 11 Usos Fonte: IPTU, 2020 e Geosampa, 2021 (elaborado por Lorena Silva, 2021)
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Assim como os usos, o GABARITO também é variado. Porém é possível perceber que a região próxima à estação Júlio Prestes é mais baixa e vai ficando mais alta à medida que se aproxima da República, que faz parte do chamado Centro Novo e abriga edifícios icônicos como o Copan e o Edifício Martinelli, primeiro arranhacéu de São Paulo. Por outro lado, devido aos incentivos imobiliários, esse cenário pode vir a mudar, induzindo ainda mais a verticalização, que em áreas centrais são incentivadas pelos instrumentos urbanísticos.
MAPA 12 Gabarito Fonte: IPTU, 2020 e Geosampa, 2021 (elaborado por Lorena Silva, 2021)
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Conforme indicado no mapa da MOBILIDADE, a região localiza-se próximo a eixos de transporte público apresentando variedade nesse sentido com o transporte sobre trilhos e sobre rodas. Formando um importante ponto nodal, nos arredores encontram-se as estações da CPTM, Luz e Júlio Prestes, linha 7 – Rubi e 8 – Diamante, respectivamente, que possibilitam conexão com as cidades de Jundiaí e Itapevi, além das estações de metrô da linha 1- Azul, Tiradentes, São Bento e Luz (integrando a linha 4 – Amarela) e linha 3 - Vermelha, Santa Cecília e República (que também compõe a linha 4). No território, notamos ainda a existência de dois terminais de ônibus, o Terminal Princesa Isabel, mais próximo à área de intervenção, e o Amaral Gurgel, além de corredores nas Avenidas Rio Branco e São João. Apesar de haver ciclovias, elas não apresentam segurança para os ciclistas que as usam e não se articulam bem entre si.
MAPA 13 Mobilidade Fonte: Geosampa, 2021 (elaborado por Lorena Silva, 2021)
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Observa-se que os EQUIPAMENTOS existentes na região são espalhados pelo entorno, englobando educação, cultura, assistência e saúde além de serviços, com maior concentração próximo às estações e terminais de ônibus. Nota-se uma grande variedade dentre os equipamentos de cultura e lazer como a Pinacoteca do Estado de São Paulo, Theatro São Pedro, Museu de Arte Sacra, Sala São Paulo, Museu da Língua Portuguesa, Sesc Bom Retiro, Oficina Cultural Oswald de Andrade, entre outros, que se mostram como opções de entretenimento na cidade. Os equipamentos da área educacional incluem exemplares tanto públicos quanto particulares, com predominância de escolas de ensino fundamental e médio. Entre eles encontram-se a Escola Estadual João Kopke, Etec de São Paulo e Etec Dra. Maria Augusta Saraiva, que oferecem ensino técnico, e a FATEC São Paulo, que oferta ensino superior gratuito.
MAPA 14 Equipamentos Fonte: Geosampa, 2021 (elaborado por Lorena Silva, 2021)
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Além dos problemas citados, uma das situações mais alarmantes desta região é a questão da “Cracolândia”, como é conhecida a área na qual se reúnem usuários e traficantes, indicada no mapa 11. A forma de se referir a esse território é controvérsia, enquanto alguns pesquisadores e ativistas reivindicam que não se use essa nomenclatura, ou se use entre aspas, por reconhecer que o termo é pejorativo e estigmatizante, outros entendem que evitá-lo pode fortalecer interesses higienistas que desejam essas pessoas fora do bairro (COSTA, 2017).
Na pesquisa do Ibope, encomendada pela Rede Nossa São Paulo em 2018, foi apontado que para 23% dos paulistanos entrevistados é necessário haver incentivo à instalação de empresas, comércios e centros culturais no local. Esse tipo de ação combinada às políticas intersetoriais, resultaria em maior segurança e uso do espaço público na região.
Muitas pessoas passam a ter medo de andar pela cidade, evitando regiões e horários, e por consequência essas áreas vão sendo “abandonadas” pelo poder público, gerando um ciclo de insegurança. Roberta Amanajás e Letícia Klug (2018), apontam que a utilização do espaço público gera equidade de acesso e permite o usufruto de direitos coletivos, algo que deixa de acontecer na área estudada.
MAPA 15 Síntese Fonte: Geosampa, 2021 (elaborado por Lorena Silva, 2021)
IMAGEM 20 Operação policial na “Cracolândia” Fonte: G1, 2017 (foto reprodução/GloboNews)
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O programa “De braços abertos” (DBA), da gestão Haddad, seguia essa lógica. Tinha como meta a construção de uma rede de serviços destinada ao atendimento social aos usuários de crack, mediante a oferta de moradia, emprego e serviços de atenção integral à saúde, substituindo a atuação repressiva e terapêutica das políticas anteriores. O DBA foi encerrado em maio de 2017 por João Dória, prefeito na época, levando ao fim uma política pública focada na redução de danos, podendo ser considerada como uma das mais ousadas no país (ALVES;PEREIRA;PERES, 2020). Apesar de Dória ter anunciado em 2017 que “a Cracolândia acabou”, após uma operação da polícia que dissipou o “fluxo”, local de maior concentração e onde ocorre a venda e consumo da droga, na realidade, ela só se espalhou pelas ruas da região. Centenas de dependentes químicos continuam a usar drogas nas chamadas “mini Cracolândias”. Roberta Marcondes (2017), ativista do coletivo A Craco Resiste, afirma que a “Cracolândia” é conhecida como um território itinerante e que isolar a área, além de não resolver a questão cria outros focos problemáticos. Estando em uma porção do território de grande interesse por parte do mercado imobiliário, sempre foi alvo de ações do poder público para tentar amenizar os problemas. Programas como o “Recomeço”, do Estado de São Paulo, e “Redenção”, da atual gestão municipal, mostram que há iniciativas para tratar a questão, mas ao mesmo tempo, a força policial atua de modo truculento e desumano, evidenciando a contradição existente. Na operação citada acima, tratores destruíram barracas onde ficavam os usuários e policiais realizaram varredura pela região os expulsando e buscando por traficantes.
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Segundo o Estatuto da Cidade, o direito a cidades sustentáveis é compreendido como “o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações”. Desse modo, a ideia de direito à cidade expressa na lei sintetiza um amplo rol de direitos (AMANAJÁS; KLUG, 2018), que acabam por não serem cumpridos na prática visto a realidade de muitas cidades, incluindo São Paulo. Pode-se considerar que a questão social é essencial quando tratamos do fenômeno da “Cracolândia”. Os usuários em situação de rua criam estratégias de defesa, como não dormir à noite, a fim de não ficarem ainda mais expostos e vulneráveis. Para aplacar a fome, frio, solidão, dor e outros desdobramentos da desproteção social, nesse contexto acontece o consumo de drogas, propiciando a base para resistir e sobreviver (ARRUDA,2014). Nota-se assim, que é uma questão complexa, muitas vezes consequência de ações (ou falta de) por parte do poder público. São necessários esforços de muitas esferas e trabalho em conjunto, a fim de minimizar esses acontecimentos.
IMAGEM 21 Pessoas em situação de rua na Rua Guaianazes Fonte: Patrícia Braga, 2021
IMAGEM 22 Tratores destruindo barracas dos usuários na “Cracolândia” Fonte: Folha de São Paulo, 2017 (foto: Mister Shadow/ASI/Estadão Conteúdo, 2017)
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4.2. MASTERPLAN Com base nas análises do território e das referências lidas, como o “Campos Elísios Vivo” realizado pelo Fórum Mundaréu da Luz, foram estabelecidas diretrizes para a construção do masterplan que abrange além da quadra de projeto, 5 quadras ao redor, sinalizadas na imagem X. Partiu-se do desejo de criar um eixo principal, estruturando uma extensão da Praça Princesa Isabel para o lote em questão, pois a quadra de projeto possui muitos imóveis subutilizados e, com isso, além de trazer habitações e novos usos, seria possível ter uma quadra mais aberta, aumentado a área do espaço público. As diretrizes projetuais incluem 4 itens:
IMAGEM 23 Foto aérea da área de intervenção com indicação de diretrizes Fonte: Lorena Silva, 2021
Adensamento: Por ser uma área central, julgou-se necessário aumentar o adensamento da região com a construção de novos edifícios de gabaritos escalonados e embasamentos sem recuos para criar uma relação com os prédios locais. Quanto as unidades habitacionais, é importante haver variedades de tipos para abrigar os diferentes arranjos familiares. Além disso, usos compartilhados, como hortas, serão incentivados. Conexão: Levou-se em consideração os equipamentos já existentes para a inclusão de novos, estabelecendo uma rede, com equipamentos de serviços e de caráter social. Permanência: A intenção não é a remoção dos comerciantes e população local, desse modo, a partir de um faseamento pré-estabelecido, foi pensado uma maneira de realocar essas pessoas para edifícios da própria área, apenas quando estes estivessem prontos.
IMAGEM 24 Diretrizes da área de intervenção Fonte: Lorena Silva, 2021
Fluidez: Pensando em um espaço público de maior qualidade considerou-se a abertura de quadras e implantação de áreas verde nos miolos, além da melhoria das calçadas, inserção de jardins de chuvas e mobiliário urbano, a fim de melhorar a caminhabilidade e drenagem no bairro e proporcionar mais espaços de convívio.
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IMAGEM 25 Diagrama de remoção 1 Fonte: Lorena Silva, 2021
IMAGEM 26 Diagrama de remoção 2 Fonte: Lorena Silva, 2021
IMAGEM 27 Diagrama de remoção 3 Fonte: Lorena Silva, 2021
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Quanto as remoções e restaurações, primeiramente foram removidos os imóveis ociosos, ou seja, lotes subutilizados, como os estacionamentos, edifícios abandonados e em mau estado de conservação, como galpões e armazéns, para a produção de novos prédios nesses locais. Nas imagem 28, 29 e 30 são indicados exemplos desses terrenos.
As construções com valor arquitetônico, mas em mau estado de conservação, mostrados nas imagens 34, 35 e 36, serão restauradas a fim de não se apagar a história do bairro e trazer usos compatíveis com o edifício. Com as diretrizes projetuais e critérios de remoção estabelecidos, parte-se para o faseamento do projeto:
Nas áreas com potencial de adensamento serão removidos os edifícios não ociosos de baixo gabarito que se assemelham à galpões ou à armazéns, exemplificados nas imagens 31, 32 e 33, dando lugar a novos prédios e possibilitando moradia para mais pessoas no centro da cidade. A maioria deles estão degradados ou abrigam comércios do tipo oficinas que podem ser facilmente transferidos para os novos prédios que serão construídos na área.
Na fase 1, constrói-se prédios com usos diversificados em terrenos vazios ou nos lotes com imóveis subutilizados pensando na necessidade de proporcionar habitação e áreas comerciais para as pessoas antes de removê-las, desse modo, a pessoa só é remanejada quando já tem local para ir. Na fase 2, as realocações continuam enquanto novos prédios são construídos nas quadras. Assim como
IMAGEM 28 Rua dos Guaianazes Fonte: Google Earth, 2021
IMAGEM 29 Rua dos Guaianazes Fonte: Google Earth, 2021
IMAGEM 30 Rua General Rondon Fonte: Google Earth, 2021
IMAGEM 31 Rua dos Guaianazes Fonte: Google Earth, 2021
IMAGEM 32 Alameda Glete Fonte: Google Earth, 2021
IMAGEM 33 Rua Helvétia Fonte: Google Earth, 2021
IMAGEM 34 Alameda Barão de Limeira Fonte: Google Earth, 2021
IMAGEM 35 Alameda Glete Fonte: Google Earth, 2021
IMAGEM 36 Alameda Barão de Limeira Fonte: Google Earth, 2021
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TABELA 2 Faseamento do masterplan Fonte: Lorena Silva, 2021
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IMAGEM 37 Diagrama de faseamento 1 Fonte: Lorena Silva, 2021
IMAGEM 38 Diagrama de faseamento 2 Fonte: Lorena Silva, 2021
IMAGEM 39 Diagrama de faseamento 3 Fonte: Lorena Silva, 2021
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na fase 3. Os equipamentos e habitações são inseridos na área a medida que os prédios ficam prontos . Priorizou-se começar com a inserção de equipamentos de assistência social e saúde, por conta da urgência em se criar uma rede de apoio para as pessoas em vulnerabilidade social . A melhoria da calçadas e abertura de miolos de quadra, quando possível, também ocorreu no decorrer do tempo, junto com as construções dos edifícios. Diferente do que ocorre atualmente na região, a criação desse masterplan não tem caráter higienista nem intuito de “reavivar” a área, considerando que já existe vida no local. Com as diretrizes projetuais e critérios de remoção estabelecidos, parte-se para o faseamento do projeto: Na fase 1, constrói-se prédios com usos diversificados em terrenos vazios ou nos lotes com imóveis subutilizados pensando na necessidade de proporcionar habitação e áreas comerciais para as pessoas antes de removê-las, desse modo, a pessoa só é remanejada quando já tem local para ir. Na fase 2, as realocações continuam enquanto novos prédios são construídos nas quadras. Assim como na fase 3. Os equipamentos e habitações são inseridos na área a medida que os prédios ficam prontos . Priorizou-se começar com a inserção de equipamentos de assistência social e saúde, por conta da urgência em se criar uma rede de apoio para as pessoas em vulnerabilidade social . A melhoria da calçadas e abertura de miolos de quadra, quando possível, também ocorreu no decorrer do tempo, junto com as construções dos edifícios.
Os usos foram dispostos de maneira variada no território para criar um rede intersetorial ente eles e com os equipamentos existentes no entorno. Para isso, foi usado como referência o documento “Campos Elíseos Vivo“, produzido pelo Fórum Mundaréu da Luz. Assim estabeleceu-se 5 eixos, divididos em três frentes cada um: Assistência social e saúde é o eixo dedicado ao cuidado e tratamento humanizado das pessoas em situação de vulnerabilidade social, suas frentes compreendem: •
Moradias transitórias/terapêuticas: habitação para pessoas que estão no processo de recuperação da autonomia, eles já têm alguma renda mas não suficiente para aluguel ou financiamento.
•
Rede de Atenção Psicossocial: tem como objetivo incluir socialmente as pessoas com transtornos mentais severos e/ou que fazem uso problemático de drogas.
•
Núcleo de acolhimento infantojuvenil: abrigo para cuidar e proteger menores de idade por tempo determinado ou indeterminado, reivindicando, mediante iniciativas judiciais, a volta às famílias de origem ou encaminhamento para processos de adoção.
O eixo de Comércio tem como premissa manter os comerciantes que ali já estavam e promover espaços de trabalho compartilhado. Suas frentes são divididas da seguinte maneira: •
Comércio social local: além das politicas de remoção que acontecem apenas quando os comerciantes tem um lugar pré-estabelecido para se realocarem, haverá uma porcentagem de comércio social para aluguel nos edifícios novos que será subsidiado parcialmente e destinado aos comerciantes locais.
•
Oficinas compartilhadas: espaços com maquinários e ferramentas que serão compartilhados pela comunidade local a fim de gerar encontros e trocas de conhecimentos. Haverá também espaço para guardar o material de catadores e ambulantes, além de nichos para a exposição de produtos próximos as fachadas dos edifícios.
Diferente do que ocorre atualmente na região, a criação desse masterplan não tem caráter higienista nem intuito de “reavivar” a área, considerando que já existe vida no local.
IMAGEM 40 Diagrama de usos e implantação finalizada com os eixos de uso Fonte: Lorena Silva, 2021
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•
Restaurante popular/ cozinha compartilhada: iniciativa para assegurar a alimentação adequada e saudável a preço acessível, promovendo também um espaço de trabalho mais adequado aos profissionais que trabalham nas cozinhas improvisadas dos cortiços e ocupações próximos.
Dentro do eixo de Habitação foram pensados meios de subsídios às famílias que morarão ali, de modo a trazer opções que funcionem economicamente melhor para cada uma delas. A inserção dessa população, necessitará de um processo participativo entre moradores e assistentes sociais. •
Locação Social: unidades habitacionais com aluguel subsidiado integral ou parcialmente pelo Fundurb, de modo a não comprometer mais do que 30% da renda familiar dos moradores.
•
Hotel Social: unidades habitacionais de estadia temporária que podem abrigar desde um pernoite até o estadias mais longas e que poderão ser geridas pelos atuais gerentes dos hotéis e pensões, desde que sejam formalizados e garantam boas condições de moradia.
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Casa Própria: famílias ou pessoas com renda superior a um salário mínimo que queiram comprar um imóvel financiado à longo prazo.
No eixo Cultural serão oferecidas atividades de recreação, lazer e oficinas. Ele foi dividido nas seguintes temáticas:
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•
Arte: exposições rotativas que possibilitem aos artistas da região um local para divulgar sua arte.
•
Representatividade: exposições fixas que contem a trajetórias e conquistas do Movimentos por Moradia para que a população, não só local, entenda a importância dessa luta como um meio de garantir uma cidade mais democrática e justa principalmente para as pessoas em situação de vulnerabilidade social. Será oferecidos também espaços como acervos e bibliotecas para registrar e catalogar os documentos referentes à conquistas do Movimento.
•
Criatividade: áreas dentro dos centros culturais que ofereçam oficinas de dança, artísticas e de tecnologia para a população em geral e, sobretudo, para as crianças da região, no período extracurricular.
O eixo de Aprendizagem é destinado à todas às idades e dividiu-se do seguinte modo: •
Creche: construção de creches próximas às moradias para facilitar o percurso dos pais que saem para trabalhar.
•
Escolas: construção de escolas de ensino fundamental e médio. Apesar da área ser bem atendida por equipamentos educacionais, entende-se que com o adensamento populacional, será necessário mais escolas.
•
Centro de apoio ao Trabalho e Empreendedorismo (CATE): cursos de capacitação e profissionalização voltados à população em geral.
As imagens a seguir retratam atividades que já acontecem nas ocupações e cortiços do centro que poderiam ser incorporados nos usos propostos neste trabalho.
IMAGEM 41 Oficina com crianças na Ocupação 9 de Julho Fonte: Reprodução Instagram.com/ movimentomstc/
IMAGEM 42 contratadas para confecção de máscaras em oficinas de costuras das ETECs
Costureiras
Fonte: Reprodução Instagram.com/ casaverbo/, 2020
IMAGEMNS 43 E 44 Horta e almoço de domingo na Ocupação 9 de Julho Fonte: Reprodução Instagram.com/ movimentomstc/, 2021
IMAGEM 45 Galeria de arte na Ocupação 9 de Julho Fonte: Reprodução Instagram.com/ galeria_reocupa/
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4.3. PROJETO Definidos as volumetrias do masterplan partiu-se para o exercício projetual. O objeto desenvolvido nesta fase foi uma habitação de interesse social multifamiliar com programas culturais e comerciais nos andares térreos. O terreno escolhido está dentro de uma área de ZEIS 3 e a Cohab, através do Chamamento 002/15, destinou a área para a ULCM (Unificação das Lutas de Cortiços e Moradia) por meio do programa Minha Casa Minha Vida Entidades. No total, deverão ser produzidas 131 unidades de aproximadamente 55m² cada em 17 andares. O terreno está indicado na imagem 47 ao lado. Certamente, este projeto é uma grande conquista dos Movimentos por Moradia, porém analisando a quadra em que ele está inserido, percebeu-se que a área poderia ter uma melhor ocupação, pois os imóveis ali são em sua maioria galpões que estão sem uso. Neste sentido foi pensando uma nova ocupação da quadra que, além dos usos habitacionais, pudesse abrigar usos culturais e comerciais. Na imagem 48 é possivel compreender os novos usos, em laranja foi proposto um CATE, em azul um centro cultural com torre de habitações mais um centro de acolhimento, desenvolvidos pela aluna Patrícia Braga, e em salmão um edifício multisuo descrito a seguir. O térreo do projeto foi destinado para as áreas comerciais e entradas do centro cultural e do prédio residencial. Os 3 andares seguintes fazem parte do centro cultural, enquanto os outros pavimentos fazem parte da habitação, totalizando 25 pavimentos, para aumentar o potencial de adensamento populacional. A verticalização foi feita de modo escalonado, para
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que assim pudesse ter um melhor diálogo com as construções do entorno. O sistema estrutural é composto por pilares, vigas e lajes de concreto. Por conta da altura da edificação, os pilares precisaram ser mais robustos. Para os acabamentos, buscou-se soluções mais convencionais e baratas para viabilizar a obra, como alvenarias de cerâmica rebocadas e pintadas, além de cobogós e vidro nas janelas. Os elementos de destaque foram os painéis cerâmicos instalados na fachada ventilada do centro cultural e na empena cega do residencial para o criar uma ligação entre as duas partes da construção. Os comércios abrigarão as lojas que precisaram ser remanejadas na primeira fase do masterplan ou os novos comerciantes locais, dependendo da necessidade e disponibilidade. Haverá também um restaurante popular que servirá as três principais refeições do dia. O centro cultural conta com uma recepção no térreo que se localiza no espaço de transição entre a rua e o miolo da quadra, gerando um ponto de encontro neste local. Através de rampas, que tornam o percurso entre a rua e o edifício mais fluído e promovem certo desaceleramento no usuário, chega-se à praça elevada que se abre, por meio de janelas pivotantes, ao miolo da quadra, criando, assim, uma conexão entre esses dois espaços de descompressão. O primeiro andar do centro cultural conta também com um café, auditório e áreas de funcionários. No segunda andar, localiza-se a biblioteca que abrigará livros, pesquisas e documentos catalogados referentes aos Movimentos de Moradia. Este andar também possui salas multiusos para as oficinas.
IMAGEM 46 Esquema da quadra antes da intervenção. Fonte: Lorena Silva, 2021
IMAGEM 47 Esquema da quadra depois da intervenção Fonte: Lorena Silva, 2021
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O terceiro pavimento também possui salas para as atividades culturais e, dando continuidade à rampa, um circuito expositivo com exposições fixas, que contam a história e conquistas do Movimento, e exposições temporárias para mostrar as obras do aristas locais. O volume residencial possui apartamentos de áreas de uso comum, como playgrounds, solários, cozinhas comunitárias, oficinas, salas de estudos, ambientes de descompressão e uma horta.
Este estudo não se limita a esta pesquisa, tampouco a estas propostas urbanísticas e projetuais aqui apresentadas, espera-se, porém, que o material produzido até aqui possa servir como uma maneira de se pensar a situação dos imóveis ociosos no centro de São Paulo versus a falta de moradia digna para a população mais vulnerável, problema que atinge milhares de pessoas invisibilidades pela sociedade e pelo poder público, mas que seguem lutando pelo direito morar e pertencer à cidade.
Para os apartamentos foram pensados três tipos de tamanhos diferentes, pois a padronização das unidades habitacionais não contempla todos os tipos de arranjos familiares. Desse modo, foram produzidos 152 unidades que se dividiram da seguinte maneira: IMAGEM 48 Visão área do projeto
54 unidades de 1 quarto – 27,50m2 79 unidades de 2 quartos – 56,50m2 19 unidades de 3 quartos – 71,30m2 Em relação ao projeto original, foram construídas 21 unidades habitacionais a mais, gerando uma volumetria verticalizada, ainda que não tão aparente por conta do escalonamento. Optou-se por essa volumetria, pois entende-se que as pessoas que conquistaram este terreno, ali devem permanece.
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Fonte: Lorena Silva
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CONCLUSÃO
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Garantir o acesso à moradia, na região central de São Paulo, para a população que se encontra em situação de vulnerabilidade social requer do poder público e de setores da sociedade um processo de entendimento do território, tendo em vista as falas e reivindicações daqueles que ali permanecem, para assim promover um ambiente que fomente o direito à moradia e à cidade. As políticas públicas, por sua vez, são decisivas para o desenvolvimento do território. Quando desenhadas para as pessoas que já usufruem do espaço, e não para os setores economicamente influentes, a cidade estará mais perto de produzir um lugar mais justo e democrático. Conclui-se que traçar políticas públicas exige, antes de tudo, um olhar atento, pois analisar o território apenas de uma visão macro, não nos permite enxergar as vozes daqueles que se utilizam e irão se utilizar do espaço, tornando-os invisíveis. Neste trabalho, portanto, buscou-se maneiras de construir um espaço urbano para o centro de São Paulo que atendessem as demandas da população local, através de uma leitura atenta do território e de modo a entender a dinâmica do local, compreender os agentes, legislações e pessoas que ali se manifestam. Em alguns momentos desta monografia, a pesquisa foi feita em dupla, pois entende-se que desenhar políticas urbanas não é feito de maneira individual, mas sim por meio de um processo coletivo. Vale ressaltar que este ensaio não se limita a esta pesquisa, espera-se, porém, que o material produzido até aqui possa servir como um modo de se pensar a situação do centro de São Paulo, região que possui contrastes nítidos, mas nem sempre vistos pelo poder público, entre uma área com inúmeras pessoas em situação de subalternidade e, ao mesmo tempo, com grande potencial de abrigar habitações para a população mais pobre. Acredita-se que a luta por moradias, aliada a um processo participativo da sociedade, possa gerar espaços onde diversos setores consigam conviver e coexistir, de modo que o ônus e bônus sejam igualmente e proporcionalmente distribuídos, garantindo, assim, o acesso à moradia e à cidade.
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