TFG | RIO E CIDADE: REQUALIFICAÇÃO DA PAISAGEM EM IGARAÇU DO TIETÊ

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RIO E CIDADE



Luana Ripke da Costa

RIO E CIDADE Requalificação da paisagem em Igaraçu do Tietê



Ilimitadas e imortais as águas são princípio e fim de todas as coisas. São a fonte da vida. (Secretaria do Meio Ambiente, 2000, p. 60)




Luana Ripke da Costa Orientadora: Prof. Dra. Norma Regina Truppel Constantino Trabalho Final de Graduação apresentado à Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação como requisito para a conclusão do curso de Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Bauru, 2018


AGRADECIMENTOS A Deus, a razão de tudo que sou. Aquele que me fez trilhar caminhos indescritíveis, dentre eles esse árduo e prazeroso processo de me tornar uma arquiteta, urbanista e paisagista. Pelo seu amor, força diária e por colocar pessoas tão especiais no meu caminho. À minha mãe Rosangela Ripke, pelo seu amor incondicional, cuidado e paciência. Por ter me introduzido à arquitetura e por acreditar em mim desde os primeiros passos de minha carreira, estando comigo em todos os momentos. Que apesar do sofrimento em me ter longe dos seus braços, não mediu esforços em me apoiar e incentivar. À minha irmã Juliana Ripke, companheira, confidente e amiga. Por ser o meu exemplo de vida, por sempre cuidar de mim e me aconselhar. Ao meu companheiro e amigo Renan Barbosa, pela paciência, amor, conversas e contribuições. Por estar ao meu lado em todos os momentos, mesmo há quilômetros de distância. Aos meus segundos pais, Mara e Alexandre Tognoli, por terem me adotado como filha em Bauru, cuidado de mim e terem sido meu suporte diário, não me deixando sozinha. A todos os meus amigos que tive a oportunidade de conhecer em Bauru, pelos momentos que passamos juntos, pelas risadas, lágrimas e experiências compartilhadas. Foi um privilégio conhecer e estar ao lado de cada um. Hoje posso dizer que os considero minha segunda família. À minha orientadora, Prof. Dra. Norma Regina Truppel Constantino, pela sempre presença, pelas cuidadosas orientações e reflexões, paciência, convívio e pela confiança depositada em mim e neste trabalho. À minha coorientadora Prof. Dra. Marta Enokibara, por ter acompanhado o processo de desenvolvimento deste trabalho com valiosas sugestões e contribuições. À toda a equipe do Estúdio BG pela convivência e ensinamentos.



RESUMO A água é a fonte da vida. Os recursos hídricos estão presentes no cotidiano de cada um, quer seja nas grandes metrópoles, cidades pequenas ou no meio rural. Eles fazem parte da paisagem natural ou construída pelo homem. A paisagem, por sua vez, reflete e traduz o espaço e todas as relações e ações dos elementos do ambiente. Grande parte das cidades brasileiras possui os rios poluídos, canalizados, moldados para construção de grandes avenidas e sua população de costas para seu curso. O Oeste Paulista entra nesse contexto brasileiro, porém apresenta muitas cidades localizadas próximas às margens de grandes rios que ainda possuem uma aproximação forte com eles. A questão que conduz esse Trabalho Final de Graduação é abordar a relação que as cidades localizadas ao longo do Tietê possuem com suas águas, sendo a área escolhida para estudo a cidade de Igaraçu do Tietê, localizada na margem esquerda do rio. O objetivo do trabalho é analisar a paisagem existente nas margens do Tietê e qual o tipo de conexão que os cidadãos têm com suas águas. Para atender o objetivo foi realizada a continuação de um estudo iniciado na pesquisa de Iniciação Científica intitulada “Cidades e Rios no Oeste Paulista – Rio Tietê e as cidades de Ibitinga e Igaraçu do Tietê” que aborda a memória da cidade, os usos e a realidade urbana atual ali encontrada, realizando um levantamento que proporcionou sustentação teórica para a proposição de diretrizes que visassem à implantação de uma infraestrutura verde na cidade e, por último, a realização de um projeto de requalificação de um trecho das margens do Rio Tietê com o intuito de aproximar a população do rio, fortalecendo sua relação com ele e gerando um sentimento de apropriação e pertencimento.

Palavras chave I rios urbanos, oeste paulista, paisagismo, sustentabilidade.


1I

Introdução

2.1 RIOS E CIDADES 2.2 SUSTENTABILIDADE URBANA 2.3 A ÁGUA EM SÃO PAULO

2I

Embasamento Teórico

3I

Igaraçu do Tietê Memória

2.4 O RIO TIETÊ

4.1 POPULAÇÃO 4.2 GEOMORFOLOGIA 4.3 AGRICULTURA

4I

Igaraçu do Tietê Dados

4.4 ACESSOS 4.5 SANEAMENTO


Igaraçu do Tietê Água e Paisagem

I5

Igaraçu do Tietê Requalificação

I6

Considerações Finais

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Referências Bibliográficas

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6.1 INFRAESTRUTURA VERDE 6.2 ESCOLHA DA ÁREA 6.3 PROPOSTA DE PROJETO 6.4 RECORTE

8.1 GERAIS 8.2 LEGISLAÇÃO FEDERAL 8.3 LEGISLAÇÃO ESTADUAL 8.4 LEGISLAÇÃO MUNICIPAL 8.5 SITES E JORNAIS



1 I INTRODUÇÃO



No Brasil, a relação entre cidades e água é conflitante. Durante o século XX, com a consolidação das indústrias e a crescente demanda por mão de obra houve uma grande migração do campo para as cidades, ocasionada pela crescente oferta de trabalho. Essas cidades foram inchando até que no final do século o país possuía uma população essencialmente urbana. A rápida urbanização, o pensamento exploratório herdado da nossa colonização, uma gestão pública imatura e legislações ambientais inexistentes ou insatisfatórias fizeram com que os recursos naturais presentes nesses centros urbanos fossem amplamente explorados durante sua consolidação, transformando a paisagem natural e construindo uma na qual os automóveis e os grandes edifícios predominam. O vínculo entre população e água ainda é nebuloso e variado, existindo cidades nas quais os cidadãos perderam completamente sua relação com os recursos naturais e outras que ainda o possuem. O Estado de São Paulo apresenta uma dualidade de relações entre seus habitantes e seus recursos hídricos. O Tietê é o principal rio e através dele e de seus afluentes é possível notar essa dupla relação entre pessoas e água. Na região do Alto Tietê a ligação antes existente da população com os rios, foi perdida. A urbanização na região foi rápida, intensa e exploratória. As mais rápidas e fáceis soluções adotadas para sanar os problemas gerados pelo boom populacional, como mobilidade e moradia, envolveram a exploração dos rios da região por estarem em locais ainda vazios, desvalorizados pelo mercado imobiliário e de topografia desejável. O resultado foi uma rápida poluição das águas, deposição de resíduos nas margens e canalização para a construção de grandes avenidas. Tais aspectos afastaram o olhar da população para as águas e hoje, mesmo com as legislações ambientais criadas a partir do final do século XX e as recentes tentativas de requalificação dos fundos de vale, as cidades localizadas na grande região metropolitana de São Paulo estão de costas para o rio (MACEDO, 2012).

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No Oeste Paulista, região do baixo Tietê, apesar de existirem centros urbanos com as mesmas características citadas acima, muitas cidades ainda possuem uma forte relação com suas águas. Corrêa, Alvim e Keating (2000) ressaltam que o Tietê e seus afluentes estiveram presentes e foram essenciais para o direcionamento, locomoção, abastecimento e desenvolvimento do interior do Estado. Através da pesca esportiva, das “prainhas”, de esportes náuticos, de parques e de casas de veraneios ou lazer presentes em muitas cidades é possível notar que há ainda uma forte relação de apropriação e valorização dos recursos hídricos por parte da população. A partir desse contraste, mostra-se necessário o estudo direcionado a essas cidades do interior paulista que ainda tem seu vínculo estruturado nos recursos hídricos. É necessário entender qual o tipo de memórias, paisagem, usos e planos existentes que são responsáveis por estabelecer esse elo e, a partir disso, discutir quais ações projetuais nos âmbitos urbano, arquitetônico e paisagístico devem ser tomadas para que essa relação não se perca com o decorrer dos anos, visando estruturar um território onde população e natureza consigam desenvolver-se em consonância. Esse Trabalho Final de Graduação é a continuação de um estudo iniciado dentro de um grupo de pesquisa que visa mapear as cidades acima descritas e estudá-las na escala local para gerar uma análise ampla sobre a relação das cidades do Oeste Paulista e seus fundos de vale. Nesse sentido, foi escolhida a cidade de Igaraçu do Tietê, localizada na margem esquerda do rio Tietê, na região central do Estado, como estudo de caso para o desenvolvimento desse Trabalho. Será analisada a paisagem existente atualmente às margens do rio Tietê e de seus afluentes, qual sua ligação com as fontes hídricas ali presentes, como acontece seu uso e como o poder público municipal têm tratado as questões ambientais envolvendo as águas dentro do seu território. Como resultado da análise foi desenvolvido um projeto de requalificação das margens do rio Tietê com o intuito de melhorar a relação dos cidadãos com o rio, almejando a consolidação de um sentimento sólido de apropriação e de pertencimento. Para alcançar o objetivo proposto, este trabalho foi estruturado em cinco partes. A primeira consiste no embasamento teórico composto pela revisão bibliográfica estudada nos doze meses da pesquisa de Iniciação Científica intitulada “Cidades e Rios no Oeste Paulista – Rio Tietê e as cidades de Ibitinga e Igaraçu do Tietê”, realizada pela autora, e durante o período de realização deste trabalho. Essa revisão foi elaborada através das escalas de conexão entre cidades e cursos d’água, na qual primeiramente é abordada a relação histórica entre rios e desenvolvimento humano atrelado ao seu estabelecimento em um determinado território e como esta relação tem afetado as cidades atuais. Em seguida, é tratado o tema da sustentabilidade urbana pela instalação de infraestruturas verdes que têm sido adotadas

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no meio urbano como solução para reestabelecer o elo entre cidades e recursos naturais, através da preservação e recuperação ambiental. Depois é levantado o vínculo histórico que as cidades localizadas no Oeste Paulista, próximas ao Tietê, tiveram com o rio, assim como sua situação atual, expondo também quais legislações federais e estaduais tratam sobre os recursos hídricos e os fundos de vale. Por último, é apresentado o rio Tietê através de um panorama paisagístico e geomorfológico que percorre desde sua nascente até a região onde se localiza a cidade escolhida. Da segunda à quinta parte é abordada a cidade de Igaraçu do Tietê. A segunda parte trata da história do município, na qual é analisada como se deu a relação entre a formação e desenvolvimento da cidade com o rio Tietê, estabelecendo quais memórias permanecem no território e quais estão atreladas à sua população relacionadas às fontes hídricas. Na terceira parte são expostos os dados gerais da cidade, referentes à população, área urbana, geomorfologia, clima, vegetação, mobilidade e saneamento. Em seguida, na quarta parte, é analisada a hidrografia e a paisagem municipal, estudando quais os elementos paisagísticos estão presentes atualmente na cidade, as áreas verdes livres urbanas, os rios e córregos que a cruzam e qual sua situação quanto à poluição e canalização, além de analisar quais legislações, planos e projetos municipais abordam os recursos hídricos municipais. A quinta e última etapa é referente à proposta projetual deste trabalho. Primeiramente são elaboradas diretrizes para instalação de uma infraestrutura verde, baseada no diagnóstico gerado pelas etapas anteriores. Depois, justifica-se a escolha da área e por último é apresentado o projeto de requalificação das margens do rio Tietê. O levantamento dos dados foi executado através de visitas à cidade quando foram realizadas reuniões e entrevistas com os funcionários de órgãos públicos e com a população. Elas serviram de subsídio para o conhecimento do território e estruturação da análise sobre a cidade. Para melhor visualização dos resultados, foram elaborados mapas, tabelas e levantamento fotográfico dos espaços analisados, dispostos ao longo do trabalho, buscando o reconhecimento dos elementos estruturantes e da história do lugar, que permaneceram na relação entre o município e o Rio Tietê.

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2 I EMBASAMENTO TEÓRICO



2.1 I RIOS E CIDADES A água é a fonte essencial da vida humana. A relação entre ela e o homem é antiga e perdura até os dias atuais de formas diferentes e variadas de acordo com o percorrer da história. As cidades e aglomerações humanas formadas ao longo do tempo tiveram influência da água em sua fundação e desenvolvimento, seja para o abastecimento, irrigação ou meio de transporte de pessoas e mercadorias (COY, 2013). Por causa disso, os recursos hídricos estiveram e estão presentes no cotidiano de cada um, de forma direta ou indireta, sendo parte constituinte de uma paisagem natural ou construída dentro das cidades. Para Coy (2013) a história dos rios está diretamente ligada à história das suas cidades. A influência da água no estabelecimento territorial humano ocorre desde a Antiguidade. Quando os povos antigos deixaram sua característica nômade para se fixarem em regiões para o plantio de alimentos, os recursos hídricos foram um fator chave na escolha do lugar. Normalmente estabeleciam-se à beira de rios que eram utilizados para o próprio sustento e para a irrigação de suas plantações. O Nilo, na África, o Tibre, o Reno, o Sena, o Tâmisa, o Danúbio e o Volga, na Europa, são exemplos disso, e junto deles as sociedades tiveram seu crescimento, desenvolvimento e memória estabelecidos (O CORREIO, 1983 apud GRATÃO, 2006). Os rios, a partir dai, tornaram-se palco da evolução humana que vem marcando e alterando a paisagem através de suas formas de utilização pessoal e aproveitamento (SARAIVA, 2006). Saraiva (2005) analisa o papel da água na paisagem, estabelecendo um percurso tanto no meio natural como nas representações culturais. A autora define a paisagem como o “quadro territorial e referencial das vivências da sociedade, onde se cruzam testemunhos

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naturais e culturais que representam a síntese espacial e temporal das inter-relações entre o homem e a natureza.” (SARAIVA, 2005 p. 20). A paisagem reflete o espaço e todas as ações biológicas, físicas, químicas e antrópicas sobre o ambiente. A água é parte do meio ambiente e consequentemente parte da paisagem. As cidades hoje estabelecidas, antigas ou novas, são marcadas pelos cursos hídricos e pela forma como eles foram utilizados. Os rios, córregos ou lagos e seus aspectos naturais, como as cheias, afetam a sociedade que ali vive e trazem uma dinâmica paisagística que é influenciada pela forma como o homem se relaciona com o ambiente em que está inserido, tornando a relação entre rio e cidade um processo não estático e nem estável (COY, 2013). As águas, devido ao valor histórico que lhes foi atribuído nas formações territoriais urbanas e a maneira como foram utilizadas e manipuladas, possuem diferentes valores que contribuem de forma positiva ou negativa para a identidade local. A água nas cidades é também frescura, o contraponto a condições climáticas mais extremas, podendo ser assegurada pela presença de elementos e plano de água, ou através da vegetação, que a lança para o ar sob a forma de vapor, através da transpiração, contribuindo para um microclima mais ameno. A água nas cidades pode também ser o elemento estético e decorativo que, pelo movimento, pela reflexão, pelo som, pela luz e pela imagem, introduz variedade, diversidade e beleza, contribuindo para a identidade e carácter do espaço urbano. (SARAIVA, 2006, p. 24)

O desenvolvimento do ser humano e da sua forma de organização espacial e consumo alterou a relação do homem com a água. A partir da revolução industrial iniciada na Inglaterra e repercutida para o mundo no final do século XIX e durante século XX, houve um adensamento populacional nas cidades, criando sociedades essencialmente urbanas que trouxeram consigo problemas habitacionais, sociais e ambientais que repercutem até hoje no mundo contemporâneo. Os recursos hídricos presentes nas cidades começam então a ser domados visando à valorização econômica, pagando o preço dessa industrialização em crescimento, recebendo poluição e tornando-se fontes de sujeira e doenças, mudando a percepção da população com relação às águas (COY, 2013). O processo de urbanização e o desenvolvimento tecnológico exploraram os recursos naturais na maioria dos países do mundo, transformando-os em mercadorias. “Nessa perspectiva, as mesmas águas que atraíram o surgimento das cidades, são as mesmas que amedrontam as suas populações.” (GRATÃO, 2006, p.6) Os rios agora são vistos tanto pela população como pelos órgão públicos como empecilhos e barreiras para o desenvolvimento dentro das aglomerações urbanas atuais.

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As consequências que a degradação dos recursos naturais gera ao meio ambiente começaram a ser debatidas mundialmente na segunda metade do século XX em busca de soluções para geração de uma sociedade sustentável. A questão é: como tornar-se uma sociedade sustentável que valoriza os recursos naturais em um momento em que o consumo excessivo desses recursos é essencial para manutenção da economia mundial vigente? Segundo Saraiva (2006), os caminhos para o desenvolvimento sustentável abrangem diversas áreas e esferas de ação. Um manejo adequado das águas e do meio ambiente requer a mudança de comportamentos, processos e procedimentos realizados atualmente em prol de ações que visem um menor consumo e maior conservação dos recursos naturais, mudando a forma de conceber e gerir as cidades. Aspectos como dar uma maior atenção aos sistemas hídricos no planejamento e ordenamento territorial, à proteção da biodiversidade, à minimização de riscos de cheias e secas, de riscos de poluição e degradação da qualidade da água, ao incremento dos processos de infiltração e retenção hídricas, à recuperação e renaturalização de rios e cursos de água, à requalificação de zonas ribeirinhas, ao planeamento de sistemas de tratamento e restituição de águas tratadas, entre outros, são temas que requerem uma visão integrada e transdisciplinar do planeamento territorial e dos recursos naturais. (SARAIVA, 2006, p. 28)

Na escala da cidade, a questão da sustentabilidade voltada aos recursos hídricos abrange soluções mais específicas tentando resgatar a relação entre homem e água. Segundo Costa e Monteiro (2002), é necessária a criação de meios que gerem a visualização e valorização dos recursos naturais e da água por parte da população através da alteração da paisagem urbana atual. A “[...] visibilidade é uma importante atitude projetual na direção de um comportamento ambiental responsável”. (COSTA; MONTEIRO, 2002, p. 291). A paisagem urbana precisa ser pensada e reprojetada para direcionar o olhar do cidadão para a água. “A visibilidade dos processos naturais é um dos princípios de projeto defendidos por Hough (1995) como estratégia para promover consciência e responsabilidade ambientais.” (COSTA; MONTEIRO, 2002, p. 297) A questão dos cursos hídricos no meio urbano é complexa e deve ser tratada visando à cultura da água, na qual os valores simbólicos e culturais que ela gera devem ser retomados. (SARAIVA, 2006)

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A valorização da água no meio urbano pode, assim, assumir um caráter identitário e referencial, e expressar também a formalização de outras valências e atributos inerentes ao conceito de sustentabilidade, como a adequação ecológica e ambiental, o interesse social, cultural e econômico e à resposta a requisitos funcionais e de usos. A valorização estética deve, assim, estar associada ao ciclo urbano da água, enfatizando e tornando visíveis processos biofísicos e técnicos essenciais, como a drenagem de águas pluviais, a autodepuração das águas, o funcionamento dos sistemas de abastecimento e tratamento. (SARAIVA, 2006, p.30 e 31)

Cabe ao planejamento urbano e a uma gama de profissionais interdisciplinares como arquitetos, paisagistas, urbanistas, engenheiros, biólogos, entre outros, trabalharem juntos em busca de intervenções necessárias para reviver as águas dentro das cidades. “A dinâmica das paisagens ribeirinhas deve ser fortemente considerada em seu processo de projeto e manejo, principalmente quando se tratar de área urbanizada.” (COSTA; MONTEIRO, 2002, p. 297). Segundo Saraiva (2006), as intervenções necessárias precisam visar o ciclo da água como um todo “contribuindo para o entendimento público do valor da água e da funcionalidade dos seus usos na cidade.” (SARAIVA, 2006 p. 31). Em um mundo que busca a sustentabilidade, a relação entre cidade e água precisa ser restabelecida.

2.2 I SUSTENTABILIDADE URBANA A preservação e a revitalização dos recursos hídricos no meio urbano estão ligadas à promoção de cidades sustentáveis que integrem o meio ambiente como parte essencial da dinâmica e da gestão local. É contraditório almejar uma sociedade que valorize os recursos naturais e que zele por eles se ela habita em cidades que promovem a degradação ambiental em busca de um desenvolvimento econômico baseado na exploração. A partir disso, é essencial criar meios dentro das aglomerações urbanas atuais que façam com que o desenvolvimento econômico e municipal caminhe junto com o meio ambiente, diminuindo o consumo exacerbado e irracional e estabelecendo um elo entre cidadão e natureza. A relação entre espaços verdes e cidades foi drasticamente transformada a partir do século XIX com a explosão da Revolução Industrial. Antes as cidades eram pequenas e o campo abastecia a área urbana e estabelecia com elas uma relação de dependência e complementaridade, na qual a população urbana se conectava com a natureza. Essa relação foi alterada com a revolução industrial que criou uma divisão clara entre campo e cidade e

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introduziu o conceito de espaços verdes dentro da própria zona urbana. Segundo Madureira (2012), esse conceito foi inserido por duas questões: primeiro a melhora na qualidade de vida que estava em péssimas condições devido aos problemas ambientais gerados pela industrialização descontrolada e pelo alto crescimento da população urbana que agora vinha trabalhar nas cidades, em contraponto ao baixo investimento em infraestrutura; segundo, a necessidade de criação de hábitos de lazer no intuito de melhorar a péssima qualidade de trabalho. Haussmann, na França, e depois Olmsted, nos Estados Unidos, foram os pioneiros a projetarem espaços verdes nas cidades industriais, sendo Olmsted considerado o fundador da arquitetura paisagística (HERZOG, 2010). A partir da segunda metade do século XX, com as diversas crises hídricas, baixa qualidade de vida urbana, principalmente nas megacidades, o crescente aumento da temperatura terrestre e os diversos problemas ambientais que a exploração excessiva dos recursos naturais tem causado, começou-se a discutir mundialmente a questão da introdução da sustentabilidade como forma de amenizar os problemas já causados e prevenir que outros ocorram. No Brasil, novas leis ambientais (Federais, estaduais e municipais) surgiram visando uma gestão pública mais consciente e estabelecendo diversos limites ao desenvolvimento urbano que prezassem a natureza. Nessa mesma época foi retomado o estudo iniciado por Haussmann e Olmsted a respeito da introdução de uma rede de espaços verdes como infraestrutura para gerar cidades mais salubres e conectadas à natureza. Para tais estudos, foi empregado o termo infraestrutura verde presente nos discursos contemporâneos como solução para se alcançar cidades sustentáveis e resilientes. A palavra resiliência guarda diversos significados dependendo do campo no qual é utilizada. As mais recentes interpretações remetem à capacidade adaptativa de reorganização e recuperação que os sistemas ecológicos têm de manter sua estrutura básica em face às transformações que são submetidos (SCHLEE, 2015). Conforme Farias (2017) a resiliência urbana concerne diretamente a objetivos ecológicos como reduzir, reutilizar e reciclar, sugerindo ainda outras interações como reparar, re-conceber e repensar. Segundo o mesmo autor, a resiliência pode contribuir em três aspectos fundamentais para um avanço das práticas urbanísticas. Primeiro de caráter metodológico no qual reitera a coerência da abordagem global e transversal, sob o crivo de uma avaliação sistemática. Segundo, como impulso que oferece um desempenho mais equitativo do projeto urbano, pois ela efetua alterações heurísticas no modo de pensar a cidade, os riscos que ela gera e os desafios para o seu enfrentamento. Terceiro, como indutora ao planejamento e gestão participativos, porque lança luz sobre novos processos de mobilização e negociação contínuas. “A interação entre a resiliência das paisagens e a sua sustentabilidade tem sido sublinhada por diversos autores,

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em especial em contextos urbanos”. (SCHLEE, 2015, p.27). A autora ainda comenta que a resiliência é um dos pré-requisitos para a sustentabilidade, afirmando que o modelo de sustentabilidade é apoiado sobre três pilares: meio-ambiente, equidade social e economia, sendo que a resiliência deveria ser o quarto pilar. O termo Infraestrutura verde entra no contexto atual como uma designação nova, mas não um novo conceito. É o aprimoramento das discussões que foram implantadas na Europa no século XIX e trazidas para as cidades atuais através de novas discussões ambientais e novas estratégias de criação desses espaços locais. Ela consiste em tornar a paisagem uma infraestrutura, dando a ela funções estruturais diversas, não somente a de espaços verdes urbanos, mas de incorporar a mobilidade, a drenagem, os recursos hídricos, a produção, o abastecimento, o saneamento, a biodiversidade, o consumo, usos sociais diversos, entre outros (PELLEGRINO; MOURA, 2017). Essa infraestrutura constitui-se em uma rede de fragmentos de espaços verdes e culturais urbanos conectados, formando um mosaico composto pela paisagem ecológica local e estabelecendo a conexão da cidade com os processos naturais. Ela não se baseia em um único uso, mas em um sistema multifuncional de avenidas, parques, espaços abertos, florestas, reservas, entre outros. (HERZOG, 2010) A infra-estrutura verde deverá ser o suporte dos ecossistemas autóctones e da paisagem, deverá ter funções de corredor ecológico ao providenciar habitats para fauna e flora, constituir um filtro de ar e água, funções sociais e culturais ao promover um equilíbrio estético e paisagístico, propiciando à população espaços livres de recreio, lazer e educação ambiental. Trata-se assim de uma infraestrutura promotora de biodiversidade em ambiente urbano e indutora de uma sustentabilidade territorial, essencial para preservar os recursos naturais que sustentam o ambiente e as sociedades humanas. (FERREIRA; MACHADO, 2010 p. 72)

O planejamento de uma infraestrutura verde deve basear-se em uma ampla análise que possibilite conhecer profundamente o município sobre diversos aspectos, além de se aproximar dos órgãos públicos locais e da população. A infraestrutura verde insere-se nas cidades em contraponto à infraestrutura cinza que bloqueia as dinâmicas naturais e que causa os problemas conhecidos atualmente nas cidades contemporâneas como inundações, erosão, poluição e degradação ambiental (HERZOG, 2010). Para sua aplicação é necessário um projeto que alie a natureza e seus processos em favor de uma nova dinâmica urbana, porém dentro do tecido existente, fazendo com que a paisagem torne-se um jardim no qual a cidade insere-se e que garanta uma urbanização mais duradoura (PELLEGRINO; MOURA, 2017).

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Madureira (2012) defende os conceitos de continuidade, conectividade e multifuncionalidade para a consolidação da infraestrutura verde nas cidades contemporâneas. A autora discorre sobre a continuidade espacial defendendo que a fragmentação de espaços verdes dentro das cidades atuais é um problema para a promoção da biodiversidade que encontram somente alguns pontos do território para se desenvolver. Além disso, as áreas verdes contínuas intensificam a percepção e fruição por parte do usuário, tornando-se atrativas e de mais fácil acesso do que locais separados. Essa continuidade gera conectividade entre as áreas verdes, já tradicionalmente valorizadas pela população, sendo que esses dois conceitos complementam-se. A partir disso, é comumente associado à infraestrutura verde nas cidades metropolitanas atuais o uso de estruturas lineares preexistentes da paisagem, como os sistemas fluviais ou as infraestruturas viárias e ferroviárias, para conectar os espaços verdes e de lazer, gerando continuidade. É ai que os cursos d´águas presentes nas áreas urbanas contemporâneas assumem um papel chave dentro das estratégias para a implantação de infraestruturas verdes nessas áreas geradoras de continuidade e conexão. Nesse sentido, ao inserirmos o rio na paisagem urbana, possibilitando “a diversidade, a permeabilidade e a integração entre os componentes de um sistema paisagístico urbano, tanto espacialmente quanto socialmente” (SCHLEE, 2015, p.27) estaremos contribuindo para garantir e fortalecer a resiliência da paisagem. O terceiro e último conceito, multifuncionalidade, deriva das diversas funções que as áreas verdes podem e devem ter ao serem implantadas (MADUREIRA, 2012). A cidade contemporânea tem sofrido uma diluição das fronteiras para uma nova relação entre rural e urbano; tal dinâmica é conhecida como Cidade Alargada. Se antes da Revolução Industrial o desenvolvimento acontecia na zona rural e ainda existia uma forte relação entre cidade e campo, com a Revolução o crescimento das cidades foi acelerado, separando a população urbana do campo. Hoje o contexto novamente modifica-se e essa relação se reintegra, diluindo limites e gerando espaços verdes fragmentados, abrindo oportunidades para que a multifuncionalidade se torne mais complexa, na qual os valores do campo agora podem ser atribuídos a espaços verdes urbanos e vice-versa. O desafio da paisagem urbana contemporânea na promoção desses sistemas verdes estruturados é a articulação funcional e bem sucedida dos elementos.

CONTINUIDADE

CONECTIVIDADE

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MULTIFUNCIONALIDADE


Existem atualmente diversas tipologias multifuncionais que podem ser empregadas para a promoção da infraestrutura verde nas cidades. Alguns exemplos são os jardins de chuva, as biovaletas, lagoas de infiltração (bacias de detenção) e pluviais (bacias de retenção), tetos e muros verdes, alagados construídos, bioengenharia em taludes e encostas e pisos drenantes. Essas tipologias podem ser combinadas entre si e utilizadas em projetos maiores como parques lineares, ruas verdes, requalificação de corpos d’águas e projetos de drenagem urbana que atendam os três elementos acima citados. Tais soluções não devem fazer parte de um projeto unificado. Apesar de a infraestrutura verde ser um conceito único, sua aplicação é e deve ser diversificada, levando em conta os aspectos de cada região quanto à memória, sociedade, localização, aspectos econômicos e geomorfológicos, entre outros. As cidades atuais são muito diferentes entre si, tiveram história e desenvolvimento único e sua população possui uma demanda para cada localidade. É essencial avaliar cada território em específico e identificar tais elementos para que a aplicação dessa infraestrutura verde seja de fato efetiva, mudando os paradigmas modernos de uma cidade ideal e focando em projetos que tornem cidades suscetíveis às mudanças no decorrer dos anos, mas que apesar disso, tenham sua identidade bem estruturada com a natureza.

2.3 I A ÁGUA EM SÃO PAULO A relação dos recursos hídricos com a formação e consolidação das cidades do estado de São Paulo é grande. Desde a formação da cidade de São Paulo, acima da Serra do Mar, e o posterior avanço em direção ao Planalto Central na exploração do Oeste, o Tietê e seus afluentes estiveram presentes e foram essenciais para o direcionamento, locomoção, abastecimento e desenvolvimento do Estado. Aos poucos, a opção dos paulistas pelas monoculturas, indústrias, exploração, produção de energia e urbanização não planejada vem alterando a paisagem dos cursos d’água, modificando suas características e interferindo na relação das cidades localizadas ao longo dos rios com suas águas, resultando em um Estado no qual seus municípios apresentam relações distintas de separação total ou de apropriação dos recursos hídricos dependendo do trato que essas águas receberam ao longo dos anos. Nesse tópico será abordada a relação da consolidação do Estado de São Paulo com os rios, principalmente o Tietê, a situação atual das águas e como têm sido tratadas as questões referentes aos recursos hídricos nas últimas décadas.

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2.3.1 I OS RIOS NA HISTÓRIA A maior parte do território que compreende o Estado de São Paulo está inserida em um planalto que, a leste, é conectado ao mar através da Serra do Mar. No início da colonização do Brasil, nos séculos XVI e XVII, as primeiras cidades paulistas estavam estabelecidas em sua maioria no litoral e a serra representava uma barreira, dificultando que os colonos que residiam nos seus pontos mais altos, principalmente no planalto de Piratininga, conseguissem escoar sua produção para o porto, pois os caminhos eram íngremes e úmidos. Esses caminhos perigosos dificultavam também a chegada de escravos africanos, fazendo dos indígenas o principal meio para a escravidão nas regiões de planalto (CORRÊA; ALVIM; KEATING, 2000). O oeste paulista até essa época não havia sido explorado pelos colonos e era composto por vegetação ainda nativa e ocupado por indígenas. A exploração do sertão paulista começou a partir do século XVI, com as expedições dos bandeirantes. O tempo de cada expedição variava de meses até anos, saindo normalmente de São Vicente ou São Paulo. Sob ordem do poder local, que afirmava o intuito de achar ouro, os bandeirantes adentraram o estado através de caminhos já existentes feitos pelos indígenas. Ao longo de suas expedições, montavam sítios a beira dos rios, não se fixando ali, pois seu intuito sobre o território paulista era de exploração, sem intenções de estabelecerem moradia. Posteriormente, por volta do século XIX, alguns desses sítios deixados para trás, foram palco da formação de pequenos povoados e posteriores cidades (CORRÊA; ALVIM; KEATING, 2000). Os rios, nessas expedições, serviram como direção e caminho. Côrrea (2002) baseando-se em Capistrano de Abreu, Afonso de Taunay, Alfredo Ellis Júnior, Paulo Prado, Cassiano Ricardo e Sérgio Buarque de Holanda descreve a paisagem e a exploração do interior brasileiro, com enfoque no oeste paulista. O autor relata que os rios eram parte de um relevo no qual os Bandeirantes utilizavam-se para desbravar o sertão brasileiro, incluindo o paulista. Apesar de utilizados como direção, os rios não tiverem uma relação importante com os bandeirantes como tiverem com as monções, logo em seguida. Por serem largos, sinuosos e com fortes corredeiras, eram considerados perigosos, além de vistos como forma de propagação de pestes e doenças. No final do século XVII e início do século XVIII, as expedições dos bandeirantes em direção ao sertão paulista começam a decair. Grande parte dos paulistas migrou para outros estados, em razão da mineração, e os que ficaram em São Paulo, quando não trabalhavam em lavouras, ocupavam-se de uma nova atividade destinada ao comércio de alimentos e outros

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SEC. XVI

1 BANDEIRANTES

SEC. XVII

2 MONÇÕES SEC. XVIII

3 4

SEC. XX

INDÚSTRIA HIDRELÉTRICA URBANIZAÇÃO

SEC. XXI

CAFÉ


bens nos novos povoados que estavam se formando devido à mineração. Essas expedições não tinham intuito de descobrimento ou povoamento no interior do estado, tinham como objetivo procurar os melhores caminhos, e mais seguros, para transportar mercadorias e pessoas às novas cidades do Mato Grosso e Minas Gerais (CORRÊA; ALVIM; KEATING, 2000). Diferentemente dos bandeirantes que desbravaram o sertão paulista por terra em caminhos utilizados pelos índios e utilizavam o rio como direção, as monções usaram o próprio rio como forma de se locomoverem. O Tietê foi o principal rio paulista escolhido para cruzar o interior do Estado. As expedições partiam do porto de Nossa Senhora Mãe dos Homens de Araritaquaba, conhecido hoje como Porto Feliz e duravam em torno de cinco meses. As viagens e percursos eram difíceis e a tripulação muitas vezes tinha que andar a pé nos trechos mais rasos do rio. “As monções inauguraram a navegação fluvial a longa distância e o exame, ainda que de forma assistemática e empírica, das possibilidades de aproveitamento de alguns de nossos principais rios como vias de comunicação” (Secretaria do Meio Ambiente, 2000, p. 35) As monções interferiram de forma significativa nas várzeas dos rios através do desmatamento para extração de madeira para construção de barcos. As monções interferiram de forma significativa nas várzeas dos rios através do desmatamento para extração de madeira para construção de barcos e possibilitaram o povoamento em outras regiões do país, assim como no próprio sertão paulista. Alguns povoados no oeste paulista foram criados e outros se fortaleceram com o comércio. [...] ainda que de forma limitada, as monções sustentaram o aparecimento de pequenos núcleos no interior do território, como a fazenda Camapuã e o povoado de Albuquerque, atual Corumbá, fundado em 1778, permitindo maior atividade nas vilas ribeirinhas como Porto Feliz e Piracicaba, assim como o estabelecimento de fazendas nas margens do São Lourenço e do rio Paraguai em fins do século XVIII, quando diminuiu a hostilidade dos Paiguá e Gauicuru. (CORRÊA; ALVIM; KEATING, 2000, p. 35)

O decaimento das monções começou na segunda metade do século XVIII. Decai com elas a locomoção através da utilização dos rios, ficando essa restrita aos menores deslocamentos entre regiões. No século seguinte, mesmo com a criação da Comissão Geográfica e Geológica-CGG de São Paulo, que voltou a investigar e estudar os rios paulistas, o transporte hidroviário só vai ser retomado quase cem anos depois com a criação da hidrovia Tietê-Paraná. Desde quando houve a decadência das monções até o final do século XIX, nenhuma economia de grande importância para o Brasil apoderou-se do sertão paulista. Parte de suas

EMBASAMENTO TEÓRICO I 17


terras já havia sido mapeada, porém poucos as conheciam de verdade. No final do século XIX a economia cafeeira começa a ganhar força no estado. Apesar da grande valorização das terras devolutas do interior e da crescente demanda de consumo, plantar café nas terras do sertão paulista ainda era um grande empecilho. Segundo Corrêa; Alvim e Keating (2000) existiam duas barreiras principais que impediam o avanço do café: a dificuldade de acesso e o real conhecimento das terras do interior paulista. Por isso, segundo Moi (2005), nessa época considerava-se necessário o conhecimento científico do sertão paulista e de seus recursos naturais para que a elite paulista emergente composta pelos grandes cafeicultores conseguisse explorar mais rapidamente as terras do oeste do estado. Por essas circunstâncias em 1886 é criada pelo governo imperial brasileiro a Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo (CGG). Segundo Moi (2005), a CGG contou com duas administrações, uma de 1887 a 1904, sob direção do geólogo Orville Derby, e a outra de 1905 a 1931 com gestão de João Pedro Cardoso. Para Monbeig (1984, p. 41). A Comissão, no final do século XIX, teve o encargo de explorar os rios para o melhor conhecimento do interior do estado desbravando as terras e levantando dados específicos da vegetação, geologia, topografia, hidrografia, indústrias, núcleos populacionais e vias de comunicação, elaborando mapas, acervo fotográfico e relatórios científicos com finalidade de colonizar o sertão paulista com a imigração de europeus e promover o crescimento da cafeicultura. A primeira administração da CGG, a cargo do geólogo Orville Derby, não alcançou o objetivo principal da comissão que era desbravar os terrenos do sertão paulista. Segundo Moi (2005) essa comissão somente trabalhou em áreas já conhecidas do estado. Em 1905 a CGG sofreu uma reestruturação na qual assumiu a administração João Pedro Cardoso. Essa nova configuração propiciou ainda no mesmo ano, três expedições rumo ao oeste do Estado que partiram da capital. “A primeira em direção aos rios Feio e Aguapei, a outra subiu o rio Peixe; a terceira partiu do Tietê na altura do rio Jacaré Grande[...]” (MOI, 2005, p. 42). Já em 1907 e 1910 houve mais duas expedições rumo ao oeste para levantamento cartográfico dos rios Ribeirão do Iguape, Juquiá, Juqueriquerê e Rio Grande. Ao término de ambas as viagens foram elaborados e publicados relatórios e mapas com os dados coletados. (MOI, 2005) As expedições científicas da CGG têm um alcance inegável. Primeiro, por terem realizado estudos sistemáticos em geografia de São Paulo e, em segundo lugar, pela captura das paisagens e de imagens de um interior paulista que virá a se modificar com a colonização e a exploração capitalista dos recursos naturais. (MOI, 2005, p. 81)

18 I EMBASAMENTO TEÓRICO


Com os levantamentos realizados pela CGG o café teve um impulso para expandir-se em direção ao interior paulista. A monocultura cafeeira começou a partir da segunda metade do século XIX na região do Vale do Parnaíba e teve sua importância singular na economia paulista até a primeira metade do século XX. Ele atraiu novos povoados para o oeste, constituídos de trabalhadores, imigrantes e nordestinos, que aos poucos vão transformando-se nas novas cidades marcadas fortemente por essa monocultura. Foi por causa do seu escoamento que as ferrovias foram construídas e expandidas, ligando o porto, no litoral, passando por São Paulo e conectando-se com as fazendas cafeeiras e as novas cidades, no oeste (CORRÊA; ALVIM; KEATING, 2000). As monoculturas cafeeiras alteraram significativamente a paisagem do sertão paulista, desmatando terras e implantando ferrovias nos fundos de vale. Os fazendeiros não adentraram o sertão para implantação do café perto de rios com o intuito de agredi-los, mas “os rios serviam apenas como pontos de referência para avançarem pelo interior da densa mata e, principalmente, para uma segura demarcação de suas propriedades.” (CORRÊA; ALVIM; KEATING, 2000 p. 71). As ferrovias construídas alteraram a paisagem dos rios dentro dos novos povoados e alteraram a relação do cidadão com a água. “É com o café que se completa o processo de aniquilamento das formas indígenas de ver, utilizar e representar as águas e os rios.” (CORRÊA, ALVIM, KEATING, 2000 p.71). Assim como o café, a partir da segunda metade do século XIX, principalmente no final desse mesmo século, a indústria começou a desenvolver-se no Estado de São Paulo. No início, utilizava-se a energia hidráulica para seu funcionamento, o que acarretou no estabelecimento ao longo dos rios para utilizarem suas águas, gerando uma relação de dependência que desmatava as matas ciliares e trazia poluição. A partir da implantação das indústrias, os rios deixaram de ser vistos como fontes de lazer e pesca, passando a ser vistos como mercadoria. A indústria desenvolveu-se no Estado de São Paulo ao longo do século XX. A troca de energia hidráulica por energia a vapor não obrigava mais a sua instalação ao longo dos rios, porém a posterior troca por energia elétrica fez com que os cursos d’água voltassem a ser utilizados em larga escala, para impulsionar o seu desenvolvimento. As indústrias, mesmo com a energia elétrica, permaneceram às margens dos córregos e rios, alterando sua paisagem, trazendo poluição e atraindo a população de baixa renda que, na maior parte das vezes, ocupava a área de forma desordenada e ilegal (CORRÊA; ALVIM; KEATING, 2000). A partir do começo do século XX foram construídas barragens e novas usinas hidrelétricas, principalmente no rio Tietê, com o intuito de gerar energia para o novo estado industrial

EMBASAMENTO TEÓRICO I 19


que estava se formando. A instalação de multinacionais foi um dos grandes motivos que impulsionou o desenvolvimento desse tipo de energia. Foram formadas vinte e nove empresas particulares, estaduais e municipais responsáveis pela construção e gerenciamento dessas usinas e também pela distribuição de energia, das quais as mais importantes foram a holding Brazilian Traction, Light &Power Company Ltd. e a Cia. Paulista de Força e Luz. Em 1966, com o intuito de racionalizar o serviço de fornecimento de energia no Estado, foi criado pelo governo, no decreto nº 47.322 de dezembro de 1966, as Centrais Elétricas de São Paulo S.A. (CESP), através da fusão das empresas de energia elétrica já existentes, tornando-se a mais importante geradora de energia de São Paulo .As hidrelétricas construídas em várias áreas do estado modificaram os rios, inundando diversos pontos através de suas barragens, alterando a flora e a faunas locais. “Barragens atrás de barragens foram construídas, descaracterizando os rios e praticamente os transformando em ‘lagos’”. (CORRÊA; ALVIM; KEATING, 2000 p.137) Aliado ao desenvolvimento do estado baseado no café e na indústria, as cidades paulistas começaram a sofrer um processo intenso de urbanização. São Paulo foi o grande exemplo disso, mas, em menor escala, as cidades do oeste paulista também sofrem desse efeito que, sem um planejamento urbano adequado, acarretou em grandes danos para a natureza. Em geral, na segunda metade do século XX, as cidades sofrem um boom populacional e junto com ele surgem os grandes problemas ambientais existentes nos centros urbanos. A água continua a ser vista como fonte de exploração sendo que, nesse processo de urbanização, a degradação dos cursos d’água é intensificada e a relação entre águas e cidade é quebrada na maioria das vezes, uma vez que os rios e córregos que ali correm passam a ser rejeitados. “Anuncia o século XX como um tempo em que o homem procura, através da ciência e da tecnologia que avançam incessantemente, dominar as águas, seus ritmos, sua composição, seu fluxo, sua direção, submetendo-as por completo aos interesses do desenvolvimento econômico, do crescimento populacional e da urbanização”. (CORRÊA, ALVIM, KEATING, 2000 p. 116)

2.3.1 I OS RIOS NO PRESENTE O crescimento urbano acelerado no século XX associado à exploração desenfreada dos recursos naturais geraram centros urbanos deficientes e problemas ambientais graves em diferentes escalas. A cultura de exploração desenvolvida no Brasil desde seu descobrimento

20 I EMBASAMENTO TEÓRICO


e herdada até os dias atuais inibiu a criação de uma cultura ambiental durante praticamente toda sua história, pois a alta exploração de recursos naturais era e ainda é de suma importância para a economia do país. Os rios no estado de São Paulo, como parte do meio ambiente, experimentaram igualmente os efeitos desse desenvolvimento exploratório, sofrendo consequências gerais e pontuais em cada município, vinculadas à poluição, canalização, afastamento da população, deposição de lixo, ocupação desenfreada e ilegal, desvalorização e não apropriação, que alteraram a paisagem natural das cidades, algumas em maior escala que outras. Uma nova paisagem foi construída para se adequar aos preceitos econômicos, na qual os automóveis e as construções predominam. Por anos, a degradação e até a morte de rios e riachos no contexto urbano nacional não foi considerada socialmente como um fato tão importante, pois, na medida em que um rio estivesse muito degradado, este era canalizado e transformado em via pública, portanto, uma benesse que melhoraria a circulação urbana de todos. (MACEDO, 2012, p. 97)

Surgem então, a partir de 1980, as principais e mais significativas legislações federais e estaduais preocupadas em preservar e ordenar a ocupação nos fundos de vale, assim como preservar suas águas e vegetação (Tabela 1). Essa legislação ambiental marcou o começo de um pensamento novo por parte dos órgãos públicos, iniciando uma série de discussões a respeito do papel da preservação dos recursos naturais no meio urbano. A partir de 1990, com a formulação dos primeiros planos diretores, é introduzido o conceito dos parques lineares nos fundos de vale, implantados em algumas cidades do território nacional, que funcionaram como uma espécie de respiro para esses cursos d’água, assim como um estoque de terras destinado à conservação de áreas ribeirinhas. Outro conceito importante que foi consolidado principalmente no começo do século XXI, diz respeito às Áreas de Preservação Permanente (APP) que acabaram solucionando problemas ambientais decorrentes de novos empreendimentos, não tocando no montante de edifícios e estruturas viárias construídas antes de sua implementação.(MACEDO, 2012)). Apesar do surgimento dessa nova legislação ambiental nota-se que ainda há um grande abismo entre teoria e prática. A falta de mão de obra qualificada, de fiscalização e a dificuldade de gestão vinculada ao fracionamento da administração das áreas de preservação dividido em várias entidades que acabam não possuindo contato entre si, resultam em impasses que inibem uma efetiva gestão pública ambiental e dos cursos d’água promovendo ações que são mais preventivas e paliativas.

EMBASAMENTO TEÓRICO I 21


Tabela 1 I Leis Federais e Estaduais com enfoque nos recursos hídricos. FEDERAL Legislação Decreto nº 24.643, de 10 de julho de 1934 Resolução CONAMA nº 20, de 18 de junho de 1986

Nome

Resumo Primeira política de controle e utilização dos recursos hídricos no

Código de Águas

Brasil.

Resolução CONAMA nº 20

Classifica as águas doces, salobras e salinas dentro do território Brasileiro em nove classes diferentes determinando o destino de cada uma. Cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e estipula, fundamentos, objetivos e diretrizes para a implementação

Lei nº 9.433, de 8 de Política Nacional de Rejaneiro de 1997

cursos Hídricos

da Política Nacional de Recursos Hídricos. Além disso, estabelece seis instrumentos: Planos de Recursos Hídricos, enquadramento dos corpos de água em classes, outorga dos direitos de uso de recursos hídricos, cobrança pelo uso de recursos hídricos, compensação a municípios e o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos. Estabelece as Áreas de Preservação Permanente (APP) para cursos d’água naturais, reservatórios de água artificiais destinados à geração

Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012

de energia e nascentes de rios e córregos. Estabelece as áreas mí-

Código Florestal

nimas de proteção a ser seguidas dependendo da largura de cada curso d’água. Além disso, discorre sobre como ocorrerá essa proteção da vegetação existente e quem será responsável por protegê-la.

ESTADUAL Legislação

Nome

Resumo Diretrizes para a gestão das águas no estado de São Paulo através da criação do Plano Estadual de Recursos Hídricos (PERH) e do Pla-

Lei Nº 7.663, de 30 de

Política Estadual de Re-

dezembro de 1991

cursos Hídricos

no de Bacias Hidrográficas. Para o gerenciamento das águas cria o Sistema Integrado de Gerenciamento (SIRGH) e para a coordenação e integração participativa cria o Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CHR), com atuação a nível estadual e os Comitês de Bacias Hidrográficas com atuação a nível regional. Estabelece objetivos e diretrizes para o Plano Estadual de Recursos

Lei nº 16.333, de 14

Plano Estadual de Re-

de dezembro de 2016

cursos Hídricos

Hídricos elaborado no mandato do atual Governador do Estado Geraldo Alkmin e determina a divisão do Estado de São Paulo em 22 Unidades de Gerenciamento de Recursos Hídricos (UGRHs) estabelecendo um Comitê de Bacia Hidrográfica para cada uma.

Fonte I Elaboração Pessoal.


Atualmente, nesses quase vinte primeiros anos do século XXI, nota-se uma contradição clara em relação à situação dos rios dentro das cidades do estado. Em geral, quanto mais desenvolvidas forem as cidades e maior população possuírem, menor será sua relação com os recursos naturais, ou seja, megacidades que já perderam seu vinculo total, cidades médias com um processo de separação muito intenso e acentuado e cidades pequenas que já começam a apresentar indícios de perdas. Através de um percurso iniciado na cidade de São Paulo em direção ao oeste do Estado, as diferenças da paisagem e da presença da natureza dentro das cidades são evidentes, assim como a mudança dos rios, principalmente o Tietê. Na cidade de São Paulo e em toda sua região metropolitana, por causa da urbanização rápida, intensa e exploratória que ocorreu, os rios sofreram grandes mudanças no seu curso, nas suas águas e na sua dinâmica, ocasionadas por retificação e impermeabilização das margens, ocupações ilegais e construções de avenidas ao longo do seu curso. O resultado disso foi a canalização, poluição e deposição de lixo que resultam em alagamentos, mau cheiro, paisagens não atrativas que geram afastamento e repúdio da população com as águas, fazendo com que, nessa região, as cidades estejam de costas para o rio (MACEDO, 2012). Saindo de São Paulo e indo em direção ao oeste do Estado, o cenário modifica-se. Nessa região, apesar de existir uma quantidade significativa de cidades médias com problemas muito parecidos com a cidade de São Paulo, a maior parte dos municípios localizados próximos aos maiores rios, como o Tietê, ainda possuem uma significativa relação com as águas. Isso porque ali ainda existe um valor histórico municipal relacionado com os cursos d’água e atualmente são realizadas atividades que vinculam a população com o rio, como esportes náuticos, navegação, pesca e atividades de lazer, em geral geradas por praias fluviais ou orlas bem desenvolvidas com presença de restaurantes, lanchonetes e infraestrutura. No aspecto econômico os rios no oeste também são importantes, especialmente o rio Tietê, pelo seu tamanho e por cruzar e conectar todo o Estado. Através dele é retirada a areia para a produção de telhas e tijolos nas poucas olarias que ainda restaram, é produzida energia elétrica pelas hidrelétricas que foram construídas ao longo do seu curso, é realizada a pesca e são transportados insumos através da Hidrovia Tietê Paraná. Nos últimos anos têm sido estudadas diversas formas de inserir e valorizar a natureza dentro das cidades brasileiras. Os mais significativos estudos e propostas estão vinculados às grandes cidades, como São Paulo, sendo os municípios menores e menos conhecidos, como os do oeste do Estado, ainda pouco vistos e analisados. A evolução tecnológica que vem ocorrendo nos últimos anos e os novos estudos envolvendo as questões ambientais ligadas à preservação ambiental e à sustentabilidade nos centros urbanos, direcionam como devem

EMBASAMENTO TEÓRICO I 23


ser tratados os rios e córregos ali presentes, estudando sua paisagem para restabelecer ou fixar a relação entre homem e água. A apropriação está ligada à conscientização de que o bem natural pertence a todos e deve ser igualmente preservado sob os olhares e cuidados dos poderes públicos. O grande desafio é quebrar a distância que existe entre teoria e prática, unindo as academias e suas diversas áreas de atuação, o poder público e a população, visando abranger todas as cidades, em diferentes escalas, remediando os problemas das grandes metrópoles e prevenindo e estruturando o vínculo com os recursos naturais nas cidades menores que ainda não o perderam.

2.4 I O RIO TIETÊ O rio Tietê até as primeiras décadas do século XVIII era conhecido por Anhembi. Esse nome foi registrado pelo Governador do Paraguai D. Luiz de Céspedes Xeria. É de origem indígena e passível de vários significados relacionados aos animais descobertos ao longo do rio. Para Sérgio B. de Holanda, o termo Anhembi significa “rio das Anhumas ou das Anhimas” e para Teodoro Sampaio significa “Perdiz”, ambas diferentes espécies de aves encontradas nas viagens realizadas ao rio Tietê. Em 1748 foi registrado pela primeira vez o nome Tietê para designar a parte do rio entre sua nascente até o trecho do Salto de Itu e, posteriormente, todo o curso d’água ficou conhecido pelo mesmo nome. (OHTAKE, 1991) O rio corta o Estado de São Paulo de leste para oeste e suas águas correm para o interior, em direção oposta ao mar. Em seu percurso, o Tietê percorre quatro partes da geomorfologia do Estado. Ele nasce no Planalto Atlântico e permanece ali até Salto (de 1 a 2 na Figura 1). De Salto até sua foz o rio atravessa a Bacia Sedimentar do Paraná, na qual primeiro percorre até a região de Barra Bonita a Depressão Periférica, depois corre por um pequeno trecho de Cuestas Basálticas (de 2 a 3 na Figura 1) e, por último, desse ponto até sua foz percorre o maior trecho sob o Planalto Ocidental (4 na Figura 1). O Tietê nasce na Serra do Mar, no Planalto Atlântico, na cidade de Salesópolis em uma altitude de 1.030 metros, sendo que “a paisagem inicial é caracterizada por vales entalhados em encostas abruptas e por corredeiras e cachoeiras que, antes do rio acalmar-se nas imediações de Moji das Cruzes, marcam sua luta com as resistentes rochas da região.” (OHTAKE, 1991, p. 16). A presença de corredeiras e cachoeiras ocorre devido às grandes altitudes, compostas por morros e serras formadas por rochas do Embasamento Cristalino com características muito duras como o granito, os gnaisses e os quartzitos.

24 I EMBASAMENTO TEÓRICO


Figura 1 I Situação das águas do rio Tietê no estado de São Paulo.

4

3 2 1

FonteFonte I Elaboração Pessoal. I Elaboração Pessoal. Fonte I Elaboração Pessoal.

“O Tietê deu a São Paulo tudo quanto possuía: o ouro das areias, a força das águas, a fertilidade das terras, a madeira das matas, os mitos do sertão. Despiu-se de todo encanto e de todo mistério: despoetizou-se e empobreceu por São Paulo e pelo Brasil”

(Alcântara Machado)


Quando chega em Moji das Cruzes o rio forma meandros com grandes várzeas que no período das chuvas inundam e dificultam a ocupação da área. Esse desenho é resultado de diversos fenômenos que provocaram modificações nas rochas iniciais formando deformações do tipo falhas, dobras e fraturas há 500 milhões e 3,5 bilhões de anos. Com isso, “ao encontrar facilidades ou dificuldades na escavação do terreno, o leito do Tietê se acomodou em vales entalhados em encostas abruptas, corredeiras e cachoeiras.” (OHTAKE, 1991, p. 34). Depois desse trecho, um pouco antes de entrar na cidade de São Paulo, o rio corre em direção noroeste e passa pelo Parque Ecológico do Tietê, inaugurado em 1982, que proporciona um afastamento do curso d’água com a urbanização já muito presente, trazendo a população da cidade próxima ao rio e à natureza através de atrações de lazer, esporte e cultura1 (Área 1 na Figura 1). Ao chegar à metrópole o rio muda radicalmente seu desenho. Ali avança pela Bacia Sedimentar de São Paulo, composta por colinas baixas e áreas planas. O que antes se caracterizava por grandes curvas e por uma paisagem rica pela fauna e flora, hoje o que pode ser visto é um rio morto, retificado, primeiramente explorado em busca de areia e barro, depois marcado pelo mercado imobiliário que impermeabilizou o solo da cidade aumentando o escoamento superficial e mudando sua dinâmica de cheias, provocando sérios alagamentos na cidade e, por último, pela construção de grandes avenidas em suas marginais fazendo parte de um complexo viário de alto porte onde o carro e o progresso sempre foram prioritários, ao invés do meio ambiente (OHTAKE, 1991). Ao sair da cidade de São Paulo, o rio corre em direção ao oeste do Estado. Dali até Salto, percorrendo ainda uma área de rochas duras do Embasamento Cristalino, “o Tietê lança-se nessa região topograficamente mais deprimida, através de gargantas estreitas, corredeiras, saltos e cachoeiras que hoje são elementos de atração turística de Itu e cidades vizinhas” (OHTAKE, 1991, p. 39). Nesse ponto o rio começa seu processo natural de despoluição, no qual, aos poucos, deixa as impurezas, lixos e águas turvas adquiridas na região metropolitana de São Paulo, para tornar-se novamente um curso extenso em largura, limpo e saudável (Área 2 na Figura 1). A partir de Salto, o rio percorre dois trechos antes de chegar ao Planalto Ocidental: a Depressão Periférica e as Cuestas Basálticas. A Depressão Periférica é composta por altitudes que variam entre 600 a 400 metros, mais baixas em relação às áreas ao seu redor, com relevo composto por colinas e pequenas serras. As Cuestas Basálticas abrangem quase 1

Disponível em: <http://www.saopaulo.sp.gov.br/conhecasp/parques-e-reservas-naturais/parque-ecologico-do-tiete/> Acesso em 12 de junho de 2017.

26 I EMBASAMENTO TEÓRICO


todo o oeste da Depressão Periférica e são caracterizadas por uma região que possui muitas corredeiras e cachoeiras, apresentando rochas duras conhecidas como basaltos (Área 3 na Figura 1). O último e maior trecho percorrido pelo Tietê é o Planalto Ocidental onde se encontra a maior parte do conhecido Sertão Paulista. A região é conhecida como Formação Bauru e é caracterizada por locais “onde a superfície é suavemente ondulada e constituída por rochas levemente inclinadas para o interior da Bacia”. (OHTAKE, 1991, p. 45). As rochas principais desse trecho são os argilitos, siltitos, arenitos e conglomerados com espessura média de 200 metros. Antes de o sertão paulista ser explorado, o rio Tietê era o principal acesso ao rio Paraná e ao Centro Oeste do país e sua paisagem na época era composta por “canyons e corredeiras, formando ilhas e cachoeiras num percurso acidentado” (OHTAKE, 1991, p. 23) (Área 4 na Figura 1). Com a exploração do oeste, o rio Tietê foi aos poucos se modificando e sua paisagem sendo transformada. O café, depois a exploração do barro para as olarias, as monoculturas de cana-de-açúcar, a industrialização, as barragens para construção de hidrelétricas e a urbanização alteraram o curso do rio e sua dinâmica, também poluindo suas águas e aumentando expressivamente sua largura em pontos onde o barramento foi realizado (OHTAKE, 1991). Apesar disso, nesse trecho do Estado nota-se ainda uma relação bem presente entre cidades e águas. Tal fato, aliado à presença de cidades recentes localizadas nas margens do Tietê ou próximas a ela que ainda tem um desenvolvimento urbano inicial e um adensamento populacional pequeno, resulta em municípios que apesar de estarem caminhando para um futuro de exploração dos recursos naturais em prol do desenvolvimento econômico ainda possuem um elo forte com os rios. Tal razão guiou a escolha do tema deste trabalho no qual foi escolhida a cidade de Igaraçu do Tietê como estudo de caso. A cidade tem sua malha urbana bem próxima ao rio e está localizada em uma região na qual o Tietê sofreu modificações significativas vinculadas principalmente à construção da hidrelétrica, mas que apesar disso ainda possui praia fluvial, passeios de barco e lazer vinculados a ele. No decorrer deste trabalho será exposto quais os aspectos históricos, atuais, urbanos e paisagísticos a cidade possui e quais deles tiverem ou tem os recursos hídricos, em especial o rio Tietê, como aspecto importante na sua constituição para assim entender qual tipo de relação e vinculo a população possui com suas águas.

EMBASAMENTO TEÓRICO I 27



RIO TIETÊ



3 I IGARAÇU DO TIETÊ - MEMÓRIA



A região hoje conhecida pela cidade de Igaraçu do Tietê foi povoada e teve seu desenvolvimento urbano em pouco mais de cem anos. Segundo Baeninger (2004), o município foi fundado durante a segunda expansão da cultura cafeeira no Estado de São Paulo, antes do “boom” ferroviário. No final do século XIX, um grande latifundiário conhecido como Coronel Joaquim Ribeiro detinha a posse das terras onde hoje compreende o município de Igaraçu do Tietê. A região era conhecida como São Joaquim e sua vegetação nativa foi desmatada por volta de 1883 por mão de obra escrava para produção de café. Em 1900, o Coronel loteou uma parte de suas terras em elevado terreno próximo ao rio Tietê fazendo o arruamento da região e doando esses lotes. As ruas foram dispostas paralelamente formando uma malha composta por quadras em formato quadrado medindo 88 x 88 metros ou meias quadras, em formato retangular de 44 x 88 metros (ambas em preto na Figura 2). Na meia quadra central (em marrom na Figura 2), em 1926, foi construída a capela São Joaquim no estilo colonial em homenagem ao padroeiro de mesmo nome2. Essa capela atualmente não existe mais, foi substituída por outra em 1995 no mesmo local que se encontra ali até hoje, sendo a igreja matriz da cidade. Em geral, o loteamento realizado seguiu o mesmo modelo de muitas cidades paulistas, criadas na mesma época, no qual as quadras possuíam formatos quadrados e faziam parte de uma malha ortogonal, que em seu centro era localizada uma igreja e uma praça onde ocorriam celebrações e o lazer da nova cidade. Nessa época, a escravatura havia sido abolida e a imigração de povos vindos principalmente da Europa aumentou significativamente, substituindo a mão de obra escrava nas lavouras. 2

Arquidiocese de Sant’Ana de Botucatu. Disponível em: <http://arquidiocesebotucatu.org.br/local/paroquia-sao-joaquim-igaracu-do-tiete> Acesso em: 31 de maio de 2017.

IGARAÇU DO TIETÊ - MEMÓRIA I 33


Figura 2 I Primeiro loteamento da cidade de Igaraçu do Tietê sobre a malha atual. Escala 1:20000.

Fonte I Elaboração Pessoal.


O loteamento criado começou então a ser ocupado principalmente por italianos que trabalhavam nas fazendas de café da região e ficou conhecido como povoado de São Joaquim (MELLO, 2006). Na margem oposta do rio Tietê já havia sido formado e desenvolvia-se o distrito de Barra Bonita, mas a dificuldade de travessia entre o novo núcleo e Barra retardou o desenvolvimento dos lotes recém-criados. Logo após o arruamento, através da Lei nº 882, de 19 de outubro de 1903, foi instituído oficialmente o distrito de paz da Comarca de São Manoel do Paraízo, no local do povoado de São Joaquim sendo denominado Igaraçu e seus limites, segundo a lei, deram-se a partir das fazendas da região. O novo distrito começou a desenvolver-se e a demanda por travessia entre as margens do rio Tietê aumentava. Até esse momento o único meio de transporte de Igaraçu para Barra Bonita acontecia através de balsas e barcos que transportavam passageiros e mercadorias. Por causa das cheias e de inúmeras falhas mecânicas essas travessias tornaram-se insuficientes para atender a demanda da população, portanto foi necessária a construção de uma ponte que ligasse os dois distritos. Em outubro de 1911 o Secretário da Agricultura de Barra Bonita, Dr. Pádua Salles, assina o contrato com a empresa alemã Maschien Frabik Angsburg Nurnberg responsável pela fabricação e instalação da ponte que deveria ser de aço com estrutura em pilares de concreto. A obra começou em 03 de julho de 1912 e teve sua inauguração em 05 de março de 1915 ficando conhecida como ponte Campos Salles em homenagem ao Senador e Presidente da República Campos Salles (SAFFI, BOMBONATI, BOLLA, STANGHERLIN, 1999). A ponte atualmente permanece como um marco histórico e territorial do munícipio, sendo parte importante na paisagem e na identidade local (Figura 3). Em 1938, através do Decreto de Lei nº 9975, de 30 de novembro desse mesmo ano, Igaraçu deixou de ser distrito de São Manoel e passou a ser a 2ª Zona Industrial de Barra Bonita. Cinco anos depois, a Lei nº 24364, de 30 de dezembro de 1943, transformou a região no 2º Subdistrito de Barra. Em 1953, também em 30 de dezembro, através da Lei nº 2456, Igaraçu alcançou sua emancipação político administrativa, tornando-se oficialmente um município e recebendo o nome de Igaraçu do Tietê3. Na década de 1950 a ocupação das margens do Rio Tietê ainda era baixa. Apesar disso, o desmatamento ali já era significativo, sendo que as construções destinadas à ocupação dessas áreas começaram a se estabelecer e voltaram-se para exploração do Tietê através da extração do barro para fabricação de tijolos e telhas cerâmicas (Figura 4). As olarias foram 3

Prefeitura da Estância Turística de Igaraçu do Tietê. Disponível em: <http://www.igaracudotiete.sp.gov. br/> Acesso em: 31 de maio de 2017.

IGARAÇU DO TIETÊ - MEMÓRIA I 35


responsáveis, portanto, pelo segundo desenvolvimento econômico da cidade, instalandose em diversos pontos do município, inclusive nas margens do rio, devido à facilidade de acesso à matéria prima.No total foram construídas entre dez a doze olarias na cidade, das quais atualmente somente duas ainda permanecem em funcionamento, a cerâmica Santa Cruz, ao norte da cidade nas margens do rio Tietê, e a Vista Alegre, a leste da Rodovia Dep. João Lázaro de Almeida Prado. Ao percorrer a cidade, nota-se a presença dessas olarias, algumas em funcionamento e outras que foram desativadas ao longo dos anos, permanecendo hoje somente suas edificações, umas em bom estado de conservação e outras onde só restaram resquícios de estruturas e chaminés. Na paisagem urbana essas cerâmicas, em especial suas chaminés, são pontos focais, tornando-se atrativas visualmente para o olhar do observador, contendo e determinando uma memória importante da história do município. A figura 5 mostra a localização das cerâmicas existentes, as desativadas e os locais onde só restaram as chaminés. É possível notar que a maioria delas está inserida ao longo do córrego do Monjolinho e nos bairros centrais da cidade. Das olarias construídas às margens do Tietê, atualmente só resta a cerâmica Santa Cruz, ao lado da ponte Campo Salles. Na década seguinte, em 25 de janeiro de 1963 foi inaugurada a Usina Hidrelétrica (UHE) de Barra Bonita(Figura 6). A UHE foi o primeiro aproveitamento hidroelétrico da Companhia Energética de São Paulo (CESP) localizada no trecho do rio Tietê entre as cidades de Barra Bonita e Igaraçu do Tietê. A construção durou seis anos tendo suas obras iniciadas em 25 de janeiro de 1957. A barragem foi construída em concreto armado com comprimento de 480 metros e altura de 32 metros, inundando uma área de 34.000 ha (SAFFI, BOMBONATI, BOLLA, STANGHERLIN, 1999). A Usina apresenta um reservatório de 310 km² e volume de 3.622 x 106 m³, com vertedouro de 4.530 m²/s e cota mínima útil de 439,5 metros e máxima de 451,5 metros4. Com a construção da hidrelétrica os usos e atividades foram alterados na região devido à inundação. Foi iniciada então uma discussão sobre como se realizaria a extração a partir daquele momento e como os proprietários das olarias que dependiam da retirada da argila seriam indenizados pela CHERP (Centrais Hidroelétricas do Rio Pardo) (MASSEI, 2007). Apesar disso, juntamente com as restrições legais e ambientais que foram surgindo no final do século XIX, a retirada do barro do rio foi ficando casa vez mais difícil e a desativação da maior parte dessas olarias foi inevitável, sendo que em 1990 as olarias deixaram de ser uma fonte importante na economia local.

4

AES Tietê. Usinas e Eclusas – Barra Bonita. Disponível em: <http://www.aestiete.com.br/geracao/Paginas/nossas-usinas.aspx#conteudo> Acesso em: 04 de junho de 2017.

36 I IGARAÇU DO TIETÊ - MEMÓRIA


Figura 3 e 4 I Ponte Campo Salles e margens do rio Tietê em 1915 e 1957, respectivamente.

Fontes I SAFFI, BOMBONATI, BOLLA, STANGHERLIN, 1999; Instituto Geográfico e Cartográfico (IGC). Disponível em <http://www.igc.sp.gov.br/produtos/galeria_aerofotos.aspx> Acesso em 31 de maio de 2017, respectivamente.


Figura 5 I Localização Cerâmicas. Escala 1:20000.

Ativas Desativadas Chaminés

Fonte I Elaboração Pessoal.


Com a hidrelétrica e o consequente barramento do rio aliado à emancipação e formação oficial do município surgem novos usos em suas margens. Segundo entrevista com o Secretário de Turismo de Igaraçu do Tietê (em fevereiro e junho de 2017), começou a se estabelecer na cidade a partir de 1960, próximo à barragem, uma praia fluvial, acompanhada de um inicio de infraestrutura na área que veio a ser construída com o intuito de atrair novos turistas em busca de lazer fluvial. Apesar do início do estabelecimento da prainha e sua infraestrutura, as margens do rio em Igaraçu na década de 1970 ainda possuíam uma paisagem que caracterizava a exploração das águas, com a presença de áreas alagadas e vegetação quase inexistente (Figura 7). É possível notar na figura 12 a presença de olarias nas margens do rio, que atualmente já não existem. Em 1973 foi construída uma eclusa na barragem da hidrelétrica. Ela foi inaugurada no final da construção de um trecho navegável de 250 km entre a região de Igaraçu do Tietê e Piracicaba. Sua construção foi importante para a implantação da Hidrovia do Álcool inaugurada em 1980. Essa hidrovia, juntamente com a eclusa, permitiu que embarcações de grande porte começassem a navegar no trecho do rio Tietê onde se localiza Barra Bonita e Igaraçu, fazendo com que o vão da Ponte Campos Salles não mais fosse suficiente para dar passagem a esses novos barcos. A partir disso, em 1989, na margem esquerda do rio Tietê foi aberto um canal e sobre ele construiu-se uma nova ponte de concreto, com altura suficiente para dar passagem a essas embarcações: a Ponte Victorio Maniero. Com a construção do canal formou-se uma ilha que atualmente abriga o armazenamento de areia e brita que são retirados do Tietê por uma empresa instalada no mesmo local. O terceiro desenvolvimento econômico de Igaraçu foi marcado pela produção de canade-açúcar. A cidade começou a ser cercada por grandes monoculturas açucareiras que geram uma grande quantidade de cana que é levada às indústrias de Barra Bonita para a produção de açúcar. No início da década de 1970 o tráfego pesado de açúcar precisava ser desviado da ponte Campos Salles, única ligação entre Igaraçu do Tietê e Barra Bonita, para garantir sua preservação. Também por esse motivo, em 19 de setembro de 1970 foi inaugurada a segunda ponte de ligação entre as duas cidades, conectando-se com a rodovia SP-255 e que ficou conhecida como “Ponte do Açúcar”. (SAFFI, BOMBONATI, BOLLA, STANGHERLIN, 1999) Em 1994, Igaraçu do Tietê tornou-se estância turística. A cidade possui pontos de atrações como a prainha, o parque “Igaraçu Park” às margens do rio Tietê, as pontes Campos Salles e Ponte do Açúcar, hotéis, além de eventos como o os feriados no final do ano e o carnaval em fevereiro. Diferente de Barra Bonita que possui uma maior infraestrutura para turistas,

IGARAÇU DO TIETÊ - MEMÓRIA I 39


Figura 6 e 7 I Construção da Usina Hidrelétrica em 1961 e Vista aérea das margens do rio Tietê, respectivamente.

Fontes I Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT). Disponível em: <http://www.ipt.br/institucional/campanhas/ 14-personalidades_ipt___ernesto_pichler.htm> Acesso em 04 de junho de 2017; Acervo Municipal de Barra Bonita.


Igaraçu ainda está se desenvolvendo no setor, investindo em melhorias nos equipamentos já existentes na prainha e no parque municipal e criando estratégias para atração de maior quantidade de turistas. Como visto acima, a história de Igaraçu do Tietê está pautada em seis pontos: o café, as pontes, as olarias, a usina hidrelétrica, o lazer vinculado ao Rio Tietê e a cana de açúcar. Destes somente alguns permanecem ainda presentes na memória da cidade e de sua população: as pontes, as cerâmicas, a usina e o lazer fluvial. Tal fato é explicado por esses pontos serem parte integrante da paisagem, que permite com que os habitantes e quem ali transita observe-os e guarde-os como parte da paisagem e de sua história, sendo pontos focais de significativa importância para a cidade.

1

2

PONTES

CERÂMICAS

3

4

USINA HIDRELÉTRICA

LAZER FLUVIAL

IGARAÇU DO TIETÊ - MEMÓRIA I 41



PONTE CAMPOS SALLES



4 I IGARAÇU DO TIETÊ - DADOS



4.1 I POPULAÇÃO A cidade de Igaraçu do Tietê está localizada no centro do estado de São Paulo e inserida na microrregião de Jaú, na margem esquerda do rio Tietê. Possui área de 97.747 km² e população de 23.362 habitantes com estimativa de 24.525 no ano de 2016 (IBGE, 2010). A expansão urbana municipal teve seu maior desenvolvimento a partir de 1970. Segundo Cordeiro et al (2000) o crescimento de Igaraçu pode ser agrupado por décadas, dividindose em quatro grupos (Figura 8). No início de 1970 a área urbana ocupada era de aproximadamente 1 km², o que equivalia a 0,96% da área total do município. No início de 1980 os loteamentos urbanos já ocupavam 1,5 km² (1,46% da área total) do município, um aumento de 50% em relação ao período anterior. Nessa mesma década foram aprovados nove loteamentos na cidade, sendo boa parte deles habitações de interesse social, como o Conjunto Habitacional Igaraçu I, II e III, Conjunto Habitacional Alfredo Fernandes (Igaraçu “C”), Conjunto Habitacional Elvira Ortega Lemos (Igaraçu “D), Residencial Nossa Gente I e II (Igaraçu “E”), além dos Distritos Industriais e Comercial. Esses loteamentos fizeram com que a área urbanizada, no início da década de 1990, equivalesse a 2,2 km² do município (2,08% da área total). No final de 1990, o crescimento foi muito parecido com a década anterior aumentando cerca de 29%, chegando a ocupar 2,8 km² no ano de 2000 (2,67% da área da cidade). Atualmente a área urbana do município compreende 18.848.230 m², uma área pequena que representa cerca de 18% do total do município, possuindo 99,42% de sua população residindo ali, fazendo com que Igaraçu caracterize-se como uma cidade essencialmente urbana (SÃO PAULO; FEHIDRO; CBH-TJ, 2016).

IGARAÇU DO TIETÊ - DADOS I 47


Figura 8 I Evolução urbana de Igaraçu do Tietê. Escala 1:20000.

Até 1970 1970 1980 1990

Fonte I Elaboração Pessoal.


4.2 I GEOMORFOLOGIA Segundo o mapa Geomorfológico do Estado de São Paulo, elaborado por Jurandyr L. S. Ross e Isabel Cristina Moroz em 1996, o município de Igaraçu do Tietê está inserido na unidade Morfoescultural do Planalto Ocidental Paulista que se encontra na unidade Morfoestrutural da Bacia Sedimentar do Paraná com relevo suave que varia entre 520 a 430 metros. A maior parte da sua malha urbana encontra-se nas elevadas altitudes entre as cotas 520 e 490m sofrendo desníveis acentuados próximos ao córrego do monjolinho e do rio Tietê. O arruamento localizado na cidade acompanha a topografia formando uma malha composta por ruas paralelas às curvas de nível e outras perpendiculares. Tal fator resulta numa significativa impermeabilização do solo que aumenta o escoamento superficial do local direcionando as águas de chuva em maior velocidade até os cursos d’água, sobrecarregando suas margens, dificultando sua drenagem e gerando pontos de alagamentos sérios na região onde há canalização e adensamento urbano. A presença de vegetação em parte das margens do córrego do monjolinho devido à instalação das APP juntamente com pontos de baixo adensamento urbano e terrenos vazios em seu curso e ao longo das margens do rio Tietê ali localizadas retarda o escoamento superficial, principalmente próximo ao rio Tietê e a sul da cidade (Figura 9). O mapa Pedológico do Estado de São Paulo elaborado pelo Instituto Agronômico (IAC) mostra a localização e os tipos de solo do Estado de São Paulo. Segundo o mapa, Igaraçu do Tietê possui dois tipos de solos: Nitossolos e Latossolos. Os Nitossolos são encontrados em toda área urbana, a leste margeando o rio Tietê e em uma grande área a oeste. O Latossolo está presente a sul e sudeste do município. Esse tipo de solo pode ser dividido em três grupos separados através de suas cores e texturas: o primeiro constitui os Vermelhos com textura argilosa ou muito argilosa, o segundo Vermelho-Amarelo de textura argilosa e o terceiro Vermelho-Amarelo apresentando textura média. (IAC, 2014) Segundo a classificação climática de Koeppen, Igaraçu do Tietê possui o clima Aw, tropical chuvoso, com temperatura e pluviosidade média anual respectivamente de 22.3 ºC e 1277.8 mm. As temperaturas mais quentes e a maior incidência de chuvas ocorrem no final da primavera e durante todo o verão entre os meses de outubro a março. Fevereiro apresenta a maior temperatura média anual de 25.1 ºC e janeiro a maior média pluviométrica de 204.7. Julho possui a menor temperatura média anual de 18.6 ºC e também o menor índice pluviométrico de 28.3 mm. (CEPAGRI, 2016)

IGARAÇU DO TIETÊ - DADOS I 49


Figura 9 I Topografia de Igaraçu do Tietê. Escala 1:20000.

Foco de Alagamento

Fonte I Elaboração Pessoal.


4.3 I VEGETAÇÃO A agropecuária em Igaraçu do Tietê representa uma parte significativa da economia do município. A zona urbana é cercada por monoculturas de cana-de-açúcar que formam um cinturão ao redor da cidade fazendo com que as plantações estajeam muito presentes na paisagem da cidade, principalmente nas rodovias que dão acesso a ela. A maior parte dessa cana é cultivada em Igaraçu e levada à Barra Bonita para as indústrias de refinamento ali localizadas. A produção em 2016 ocupou uma área de 7.250,00 ha do município produzindo 485.750,00 t, uma produção relativamente baixa se comparada aos anos de 2015 e 2013 onde atingiu um valor de mais de 600.000,00t5. A indústria e os serviços não representam uma parte forte da econômica do município6.

4.4 I ACESSOS O acesso à cidade de Igaraçu do Tietê para quem vem de outras cidades ocorre através da Rodovia SP – 251 Dep. João Lázaro de Almeida Prado (número 1 da figura 10) que corta a parte oeste da área urbana no sentido norte sul e cruza o rio Tietê ou pela IGT – 416 no sentido leste oeste que margeia o rio Tietê até o limite com o município de Macatiba. Outra via importante é a Avenida Roberto Costa de Abreu Sodré, conhecida pela população como Transtobal (número 2 da figura 10), ainda não finalizada, que margeia todo o rio Tietê no trecho dos loteamentos urbanos, ligando a Prainha ao parque municipal Igaraçu Park e à Ponte Campos Salles, principal via de acesso à Barra Bonita, nesse trecho ela conecta-se à rodovia IGT-416. O principal trecho de cruzamento (número 3 da figura 10) que atravessa a cidade de leste a oeste, passando principalmene pelo centro, é formado pela Avenida Regina Mioto Périco, Rua Joaquim Medeiros, depois Rua Arnaldo Simões e por último a Avenida Profa. Zita de March que se interliga também ao parque municipal e à Ponte Campos Salles.

5

IEA – Instituto de Economia Agrícola. Disponível em: <http://ciagri.iea.sp.gov.br/bancoiea_teste/ca-

6

SÃO PAULO (Estado). Caracterização socioeconômica das regiões do Estado de São Paulo – Região

deia/cadeiaCana.aspx> Acesso em: 09 de junho de 2017. Administrativa de Bauru -. 2013

IGARAÇU DO TIETÊ - DADOS I 51


Figura 10 I Acessos. Escala 1:20000.

2

3

1

Fonte I Elaboração Pessoal.

1

SP - 251

2

Transtobal

3

Trecho Cruzamento


4.5 I SANEAMENTO A empresa responsável pelo abastecimento de água em Igaraçu do Tietê é a SAAE - IT (Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Igaraçu do Tietê). De acordo com o SAAE-IT, 100% da cidade é abastecida por águas oriundas de captação subterrânea através de nove poços semi-artesianos presentes no município que abastecem em torno de 7500 imóveis. A área urbana tem quase todo o seu esgoto coletado e tratado na ETE localizada na cidade. De acordo com entrevista realizada com o químico responsável pela Estação de Tratamento de Esgoto de Igaraçu do Tietê (ETE Igaraçu), do total de esgoto produzido na cidade, 90% é coletado e 80% é coletado e tratado. A construção da ETE durou dois anos e foi realizada pelo Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE), sendo inaugurada em 02 de junho de 2009 e projetada para tratar 100% do esgoto municipal7. A Estação localiza-se na Avenida Roberto Costa de Abreu Sodré, às margens do rio Tietê. O processo de tratamento acontece através de reatores biológicos. O esgoto coletado é passado por peneiras onde ocorre a separação do líquido e dos sólidos. Após esse processo, o esgoto líquido é levado aos reatores onde é tratado por bactérias anaeróbias e aeróbicas. O processo libera gás e produz lodo, que pode ser usado como adubo. A água tratada apresenta 95% de pureza e é lançada no rio Tietê um pouco abaixo da ETE. Segundo estudo elaborado por Oliveira, Graciani e Garcia (2016) com o objetivo de verificar a poluição das margens do rio Tietê nas cidades de Igaraçu do Tietê e Barra Bonita, a construção da ETE em Igaraçu e seu processo de tratamento de esgoto da cidade, reduziu a carga de poluição descartada no rio, resultando em índices menores de poluição nas margens próximas à cidade. Mesmo com a realização de coletas em curto prazo, pode-se evidenciar que o tratamento de efluentes tem demonstrado eficiência na diminuição do índice de carga orgânica do esgoto na cidade de Igaracú do Tietê, minimizando a sobrecarga de autodepuração do corpo de água, evitando a falta de oxigênio e, consequentemente, diminuindo modificações estéticas e organolépticas e também a morte de animais e plantas aquáticas. (OLIVEIRA, L. A.; GRACIANI, F. S.; GARCIA R. F, 2016, p. 142 e 143)

7

Disponível em: <http://www.saopaulo.sp.gov.br/spnoticias/ultimas-noticias/estacao-de-igaracu-do-tiete-vai-gerar-biogas/> Acesso em: 21 de junho de 2017.

IGARAÇU DO TIETÊ - DADOS I 53


Atualmente a ETE ainda não trata o esgoto dos bairros localizados a leste da Rodovia SP – 251 Dep. João Lázaro de Almeida Prado, pois, segundo informações obtidas na visita realizada à estação, os responsáveis pela rodovia ainda não autorizaram a transposição do encanamento necessário para conduzir o esgoto dessa parte da cidade até a ETE, para seu devido tratamento. O esgoto resultando dessa região é coletado e lançado no rio Tietê, um pouco depois da Prainha. Em Igaraçu do Tietê, 100% do lixo produzido na área urbana é coletado e transportado para dois aterros no município. Segundo o Plano Municipal de Gestão de Resíduos Sólidos do município (2012) a coleta ocorre de forma manual e cada tipo de resíduo - sólido (RS), de construção (RC) e de saúde (RSS) - recebe um devido destino. Na cidade, são geradas, em média, 25 toneladas por dia de resíduos sólidos que são coletados de forma manual através de três caminhões responsáveis por retirar os resíduos provenientes de residências, escolas, entidades, comércio, supermercados e lixeiras públicas que levam o RS até os Aterros Sanitários Municipais, sendo um de inertes localizado a oeste da cidade na Avenida Regina Mioto Périco e um sanitário, licenciado desde 2014, a sudoeste na fazenda São Miguel. Os resíduos de construção civil e de serviços de saúde são coletados à parte dos RS convencionais. Os de construção civil são recolhidos por equipes da prefeitura e por serviços de caçambas particulares, sendo levados ao Aterro Sanitário de Inertes. Já os resíduos de serviços de saúde são coletados na área urbana pela empresa contratada pela prefeitura Cheiro Verde Ambiental Ltda, que recolhe o lixo dos hospitais públicos e privados do município. O destino desse lixo é o Aterro Sanitário de Assis. Já em relação à coleta seletiva, ela é prevista pelo Plano Municipal de Gestão de Resíduos Sólidos mas ainda não foi implantada na cidade (IGARAÇU DO TIETÊ, 2012).

54 I IGARAÇU DO TIETÊ - DADOS


IGARAÇU DO TIETÊ - DADOS I 55



PONTE SOBRE O RIO TIETÊ



5 I IGARAÇU DO TIETÊ - ÁGUA E PAISAGEM



A cidade de Igaraçu do Tietê, de acordo com a Divisão Estadual de Unidades de Gestão de Recursos Hídricos (UGRHIS), está inserida na Bacia Hidrográfica do Tietê - Jacaré tendo como principal rio o Tietê, que passa pelo limite da cidade ao norte com uma largura em torno de 200 metros, conformando a divisa entre o município e a cidade de Barra Bonita, e como curso d’água secundário o Córrego do Monjolinho, que corta a área urbana no sentido norte/sul, desaguando no rio Tietê (Figura 11). De acordo com o Relatório de Situação dos Recursos Hídricos elaborado pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Tietê – Jacaré em 2016, Igaraçu pertence à Sub-Bacia 4 do Rio Lençóis, Ribeirão dos Patos e afluentes diretos do Rio Tietê. As atividades que atraem a maior quantidade de turistas na cidade estão ligadas ao Tietê. Segundo entrevista realizada com o secretário de turismo municipal em 2017, a prainha localizada na parte Oeste atrai boa parte dos turistas que a cidade recebe semanalmente, especialmente nos finais de semana, sendo frequentada por aproximadamente 3000 pessoas no verão. Além disso, o município possui dois hotéis de destaque - o Panorama Park Hotel e o Igaraçu Palace Hotel - o primeiro localizado na Prainha e o segundo próximo a ela, com boa infraestrutura para turistas, principalmente oriundos de cidades mais distantes e maiores, como São Paulo, que procuram esses estabelecimentos em busca de refúgio. Os hotéis, em datas especiais e feriados, programam uma série de atividades em sua própria infraestrutura. A cidade ainda vem realizando investimentos em eventos anuais como o as festividades de final de ano e o Carnaval de rua no mês de fevereiro. Nesses eventos são organizados shows, desfiles e festas no parque municipal Igaraçu Park. Através do estudo das leis municipais e das entrevistas realizadas aos órgãos públicos, em especial às secretarias do meio ambiente, de obras e serviços públicos e de turismo e cultura, pode-se perceber que a legislação municipal que trata sobre os recursos hídricos

IGARAÇU DO TIETÊ - ÁGUA E PAISAGEM I 61


Figura 11 I Cursos d’água. Escala 1:20000.

Rio Tietê

Córrego do Monjolinho

Fonte I Elaboração Pessoal.


locais ainda é ineficiente e que a cidade e suas instâncias públicas não possuem planejamento significativo quando se trata dos cursos d’água e dos fundos de vale presentes em seu território. O Plano Municipal de Saneamento Básico ainda não foi elaborado e o Plano de Macrodrenagem ou Drenagem Urbana foi cancelado. As principais leis que tratam sobre questões ambientais, de saneamento básico e do tratamento dos rios e córregos na cidade são: a Lei Orgânica do Município de Igaraçu do Tietê, a Lei de Uso e Ocupação do Solo Urbano, o Plano Diretor e o Plano Municipal de Gestão de Resídulos Sólidos. A Lei Orgânica foi criada em 5 de abril de 1990. No artigo 3º ela prevê que é dever do município criar condições de preservação do meio ambiente, envolvendo as florestas, a fauna e a flora do território. No artigo 160 é estabelecida a criação de uma administração própria visando à qualidade e a proteção ambiental que coordene e integre as ações públicas diretas ou indiretas nesse sentido com auxilio da participação da população. As atribuições e finalidades desse sistema administrativo são definidas no artigo 161. Destaca-se o item I desse artigo que estabelece a elaboração de um Plano Municipal de Meio Ambiente e Recursos Naturais, o item V que torna de responsabilidade dessa administração a fiscalização de obras e empreendimentos que possam causar degradação ao meio ambiente, o item VII que trata sobre a promoção da recuperação das margens dos cursos d’água, lagoas e nascentes e o item XII que atribui a essa administração a definição do uso e ocupação do solo, subsolo e águas que elabore estudos e diagnósticos e defina diretrizes de gestão juntamente com a participação da população, visando à conservação e qualidade ambiental. Por último, merece destaque o artigo 180 da Lei que diz respeito à proteção e conservação das águas do município estabelecendo quais medidas devem ser adotadas para tais fins. A Lei nº 2.671, de 20 de setembro de 2006, dispõe sobre o uso e ocupação do solo urbano de Igaraçu do Tietê. Ela também está presente no Plano Diretor Municipal. Seu objetivo é estabelecer os limites das zonas e regular a ocupação e o parcelamento do solo como um instrumento para auxiliar a gestão urbana. Os títulos II e III discorrem sobre o parcelamento do solo e arruamento, já o título III trata do zoneamento municipal. No artigo 48, a lei divide o município em quatro áreas: área urbana, área de expansão urbana, área de interesse urbano e área rural. As áreas estão delimitadas no mapa de zoneamento e são devidamente explicadas na própria lei. No artigo 53 observa-se a divisão do território de Igaraçu do Tietê em dez zonas. As Zonas Especiais (ZE) abrangem as áreas dos córregos e do rio Tietê. O Plano Diretor (PD) do Município de Igaraçu do Tietê foi estabelecido pela Lei nº 2.697 em 26 de setembro de 2007. Seu objetivo é ordenar e organizar o crescimento da cidade a curto médio e longo prazo. O artigo 2º estabelece metas para o PD, dentre elas, o item II diz

IGARAÇU DO TIETÊ - ÁGUA E PAISAGEM I 63


respeito ao desenvolvimento econômico merecendo destaque as letras a e b que tratam das áreas ribeirinhas respectivamente como pontos relevantes para implantação do transporte de cargas e passageiros e de atividades nas margens, ambos visando o turismo. O artigo 234 diz respeito à exploração de areia e cascalho em qualquer curso d’água, proibindo a exploração à jusante do local em que recebem contribuições de esgotos, quando modificarem as margens e o leito dos cursos, quando possibilitem locais que causem estagnação de águas e quando oferecem perigo a qualquer obra construída nas margens ou sobre os leitos dos rios. O capítulo XIV da Lei discorre sobre as questões ambientais. Ele estabelece que a Política Ambiental Municipal deve articular e englobar as outras políticas públicas que envolvem a preservação ambiental, como a de áreas verdes, recursos hídricos, saneamento básico, drenagem urbana e de gerenciamento de resíduos sólidos. Os artigos 482 e o 483 estabelecem, respectivamente, os objetivos e diretrizes da Política Ambiental Municipal. O Título II desse mesmo capítulo aborda os recursos hídricos municipais, estabelecendo objetivos, diretrizes e ações referentes a esse tema. Já a Drenagem Urbana é tratada nos Títulos IV e V. O Plano Municipal de Gestão de Resíduos Sólidos, proposto no Plano Diretor Municipal, foi criado em julho de 2012 pela Prefeitura Igaraçu do Tietê. Nele é estabelecido um diagnóstico sobre o lixo produzido na área urbana, determinando quais os tipos de resíduos, do que são compostos, se são recolhidos e por quem, para onde são levados e depositados. Esse Plano merece destaque, pois prevê a criação do Programa Municipal de Coleta Seletiva, que consiste em na coleta de materiais recicláveis que seria realizada semanalmente. É uma das poucas legislações que prevê a implantação de ações que visam à sustentabilidade no município. O Programa ainda não foi implantado sendo que todos os resíduos são coletados juntos e levados ao aterro municipal. No Plano, são determinados metas e objetivos que devem ser cumpridos no prazo de 48 meses. Apesar de Igaraçu do Tietê ser rica em recursos hídricos, suas áreas verdes, vegetação nativa e áreas permeáveis são atualmente precárias e insuficientes. De acordo com o Inventário Florestal do Estado de São Paulo8, as únicas manchas de florestas encontradas no município estão localizadas fora da zona urbana, ao sul desta, e são relativamente pequenas se comparadas à totalidade do território, uma composta por reflorestamento com área de 9,97ha (0,11%) e outra por capoeira com 20,22ha (0,22%). Dentro da zona urbana a maior concentração de áreas verdes e permeáveis contínuas es8

Mapa Florestal dos Municípios do Estado de São Paulo – Igaraçu do Tietê. Disponível em: <http://s.

ambiente.sp.gov.br/sifesp/igaracudotiete.pdf> Acesso em: 16 de maio de 2018.

64 I IGARAÇU DO TIETÊ - ÁGUA E PAISAGEM


tão localizadas nos fundos de vale, podendo ser agrupadas em duas áreas maiores e mais significativas: uma ao longo do rio Tietê e outra em um trecho do córrego do Monjolinho (Figura 12). A primeira encontra-se ao norte e margeia o Tietê em todo trecho que o rio passa pela cidade (área 1 da figura 12). A faixa permeável ali encontrada varia de acordo com o tanto que a expansão urbana avançou, permanecendo algumas áreas com uma largura grande e outras bem próximas ao leito do rio com uma largura menor. Assim como a faixa permeável, a densidade arbórea também varia, alguns trechos possuem manchas vegetais maiores e mais bem consolidadas do que outros. Em relação aos tipos de árvores presentes, o que pode ser notado nas visitas realizadas à cidade é que nos trechos em que a intervenção humana foi menor ainda existem alguns resquícios de árvores nativas e nos trechos mais explorados e utilizados a maior parte da vegetação é invasora, principalmente pela espécie Leucena (Leucaena leucocephala). A outra área verde contínua encontrada corta a malha urbana de sul a norte margeando o córrego do Monjolinho (área 2 da figura 12). Ela é composta pela APP e por terrenos vazios que juntos formam uma área que apresenta uma largura que varia em torno de 250 metros e apresenta uma vegetação densa que forma uma parede vegetal entre um lado e outro das margens, com exceção do trecho próximo ao rio Tietê onde o córrego torna-se canalizado e a vegetação ali presente diminui drasticamente, permanecendo somente alguns resquícios arbóreos (área 3 da figura 12). No meio da malha urbana existem poucas áreas verdes e permeáveis. Elas estão espalhadas não possuindo conexão entre si e são compostas por praças ou locais destinados ao lazer, na maioria dos casos quadras de esportes. A vegetação ali é quase inexistente, permanecendo somente gramados que acabam não sendo suficientes para drenagem do município uma vez que a quantidade de áreas impermeáveis ao longo da malha urbana é bem maior do que as permeáveis, o que diminui a capacidade de infiltração local e aumenta o escoamento superficial, sobrecarregando as áreas verdes marginais e os cursos d’água. Outro aspecto a ser levado em conta em relação às áreas permeáveis de Igaraçu do Tietê são as plantações de cana-de-açúcar. Elas se localizam prioritariamente ao redor da malha urbana, expandindo-se e ocupando todo o restante do território municipal e em alguns casos até mesmo dentro do adensamento urbano, em lotes vazios próximos ao rio Tietê e ao córrego do Monjolinho. Apesar de serem áreas verdes e auxiliarem na drenagem, elas não contribuem para a diversidade biológica local, bloqueando a propagação e impedindo a circulação de espécies e a existência de maciços vegetais que componham um malha verde municipal.

IGARAÇU DO TIETÊ - ÁGUA E PAISAGEM I 65


Figura 12 I Áreas verdes permeáveis. Escala 1:20000.

Área 1

Área 3

Área 2

Cursos d´água Áreas verdes permeáveis

Fonte I Elaboração Pessoal.


A partir das visitas efetuadas, além das entrevistas aos órgãos públicos e à população e posterior pesquisa em acervos e jornais foi possível identificar os elementos estruturantes da paisagem nos fundos de vale da zona urbana e analisá-los. Ao percorrer a cidade e suas ruas observou-se que determinadas regiões que margeiam os cursos d’água possuem situações parecidas de paisagem, usos, relação com a população, vegetação e situação das águas. A partir disso foi possível dividir as áreas marginais em cinco partes, duas (áreas 1 e 2 da figura 13) localizadas no Córrego do Monjolinho e três (áreas 3, 4 e 5 da figura 13) à beira do rio Tietê. As duas primeiras áreas correspondem ao Córrego do Monjolinho. O córrego forma uma Bacia de Drenagem conhecida pelo mesmo nome que possui perímetro de 11,20 km, com superfície de 6,17 km² que foi altamente adensada pela expansão urbana municipal a partir de 1970, passando de 0,91 km² (14,8% do total) de ocupação na referida década para 4,47% (72,5% do total) até os anos 2000 (CORDEIRO et al, 2000). Esse expressivo adensamento em poucos anos, acarretou problemas à bacia, como o aumento do escoamento superficial, instalação de grandes áreas impermeabilizadas, canalização, desmatamento, ocupação das margens e poluição, alterando a paisagem natural do curso d´água em grande parte da sua extensão e estabelecendo uma relação deficiente entre suas águas e a cidade. A área 1 corresponde ao trecho do Córrego do Monjolinho que passa pelo início do adensamento urbano municipal a sul e percorre em sentido nordeste até a Rua Joaquim Medeiros. Nesse trecho o córrego permanece em suas condições naturais, sem sofrer canalização ou algum tipo de intervenção. A ocupação urbana nessa área ocorreu principalmente na década de 1990 quando já havia legislações federais e estaduais que visavam à preservação das margens dos fundos de vale fazendo com que nesse trecho fosse respeitada uma larga área verde que separou o córrego das primeiras edificações construídas. Essa área de preservação apresenta hoje uma vegetação densa que impede que os moradores dos bairros ali localizados se aproximem ou sequer vejam o córrego, gerando um distanciamento da população para com esse curso. As vias localizadas à beira dessa vegetação possuem baixa qualidade de asfalto, sem calçadas, não apresentando acessibilidade. Além disso, nesse trecho, a única travessia acontece pela Rua Ricieri Zerlin, o que torna o córrego uma separação muito presente entre os bairros localizados a leste daqueles localizados a oeste. Apesar da presença de vegetação e da pouca intervenção humana, a paisagem ali não é atraente e o distanciamento entre a população e o córrego gera um sentimento de não apropriação dos recursos hídricos fazendo com que os moradores virem de costas para as águas, tomando atitudes que degradam o meio ambiente como, por exemplo, o descarte

IGARAÇU DO TIETÊ - ÁGUA E PAISAGEM I 67


Área 5

Área 2

Área 1


Figura 13 I Divisão das áreas de análise. Fonte I Elaboração Pessoal.

Área 4

Área 3

0,25 km

1 km


Figuras 14 e 15 I Ă rea 1.

Fonte I Acervo Pessoal, 2017.


de lixo nas suas margens (Figuras 14 e 15). A área 2 corresponde ao segundo trecho do Córrego do Monjolinho, localizado entre a Rua Joaquim Medeiros até sua foz. Nela o córrego foi canalizado e percorre cerca de 200 metros até seu cruzamento com a Rua Souza Aranha onde continua canalizado, porém passa a ter seção fechada em tubo circular e suas águas já não são mais vistas (CORDEIRO et al, 2000). A canalização do Monjolinho foi concluída em 21 de dezembro de 2000 através de uma parceria entre a Prefeitura Municipal e o Fundo Estadual de Recursos Hídricos (FEHIDRO)9. O córrego recebeu o esgoto proveniente da cidade de Igaraçu do Tietê durante 50 anos, tornando suas águas poluídas no processo de adensamento urbano municipal até o ano de 2009, quando a prefeitura terminou as obras dos emissários e começou a tratar o esgoto municipal na Estação de Tratamento da cidade10. Apesar de não receber mais esgoto, é possível notar nesse trecho a presença de significativo acúmulo de lixo trazido de outras áreas ou despejado nesse mesmo ponto (Figura 16). O adensamento urbano próximo ao córrego é mais intenso nesse trecho do que no anterior. A ocupação nessa área ocorreu de forma desordenada até a década de 1970 e como não havia legislações ou planos que controlassem a construção de moradia na área o resultado foi um grande adensamento nas margens do córrego e, em alguns pontos, até sobre ele (CORDEIRO et al, 2000). Na sua margem esquerda ainda há presença de alguns vazios urbanos de grandes áreas com vegetação rasteira e na direita, as edificações chegam até seu limite (Figura 17). No trecho onde a canalização apresenta-se a céu aberto, foi construída uma via marginal ao córrego, denominada Rua dos Irmãos Natos. Essa via permite a visualização do córrego através de balaústres nas calçadas marginais (Figura 18). Por existirem terrenos vazios na margem esquerda, a paisagem torna-se aberta para o observador que passa pela área, porém o córrego não é um ponto de fixação ou de admiração, principalmente por estar canalizado e localizado a alguns metros de desnível em relação à rua ali presente. Muitos nem notam sua presença, o que torna sua relação com a população precária, gerando um distanciamento, assim como no trecho anterior. Ainda nessa área há ocorrência de enchentes que são bem recorrentes em épocas de chuvas e causam grandes danos à população residente na área. A causa disso, segundo 9

Igaraçu do Tietê. Obras e Ações – Gestão 2007 – 2010. Disponível em: <http://tucano.org.br/wp-

content/uploads/2011/03/5325.pdf> Acesso em: 27 de junho de 2017.

10

Comércio de Jahu. Reportagem de 19 de maio de 2009 “Igaraçu do Tietê finaliza despoluição do córrego”. Disponível em: <http://www.comerciodojahu.com.br/noticia/1227016/Igara%C3%A7u+do+Tiet%C3%AA+finaliza+despolui%C3%A7%C3%A3o+de+c%C3%B3rrego> Acesso em: 27 de junho de 2017.

IGARAÇU DO TIETÊ - ÁGUA E PAISAGEM I 71


Figuras 16, 17 e 18 I Ă rea 2.

Fonte I Acervo Pessoal, 2017.


Cordeiro et al (2000), está ligada à urbanização acelerada, à falta de critérios para ocupação de fundos de vale, à construção de obras sem levar em consideração aspectos técnicos da engenharia, à insuficiência do dimensionamento do canal do córrego do Monjolinho, que somente resiste às tormentas de período de retorno de cinco anos, além de não apresentar seção de canal constante durante todo trecho e à insuficiência das travessias existentes. Segundo os autores, as possíveis soluções para esses problemas possuem caráter não estrutural e estrutural. As medidas não estruturais são: elaboração imediata do Plano Diretor de Drenagem Urbana; criação de legislação específica de uso e ocupação do solo; implantação de atividades de limpeza periódica das bocas-de-lobo implantadas no município; priorização da varrição pública e limpeza de bocas-de-lobo na Bacia do Córrego do Monjolinho; implantação de Fórum Municipal permanente para discutir os problemas relacionados à drenagem das águas superficiais. As medidas estruturais são: construção de galerias de águas pluviais nas avenidas marginais situadas dos dois lados do Córrego do Monjolinho; ampliação da capacidade do canal existente em vários trechos; e a construção de reservatórios para amortecimento da onda de cheia. As áreas 3, 4 e 5 correspondem às margens do rio Tietê que passam pela zona urbana de Igaraçu. Essa divisão foi realizada de acordo com os tipos de uso, infraestruturas e acesso presentes atualmente na área marginal ao rio, observados no levantamento da cidade. A área 3 corresponde à região que possui maior infraestrutura. Nela está localizada a Praia Municipal Maria de Abreu Sodré e um complexo que possui área de 108.652,327 m², composto por diversas edificações. Antes da década de 1960 já existia na área um trecho de areia não aplainado, que, nessa época, ainda não era usado pela população local. Com a construção da barragem realizada em 1963, o prefeito municipal João Perassoli viu um potencial turístico na área e começou a aplainar a areia existente, formando uma prainha no local e construindo também um restaurante, que ficou conhecido como Canoa Grande, implantado ao lado do trecho de areia, em um ponto mais alto do terreno. Pouco tempo depois, foi instalada também na área uma lanchonete dentro de um vagão de trem. Em junho de 2001, a prefeitura iniciou a primeira reforma na praia com o intuito de torná-la o cartão de visitas da cidade. A lanchonete formada no vagão de trem foi demolida, sendo construídas duas novas, além de um calçadão de dez metros de largura por quatrocentos e cinquenta metros de extensão e um palco para shows11. A segunda reforma foi realizada em 2009, quando foi instalado um bar “solarium” e um complexo composto por auditório, 11

Comércio de Jahu. Reportagem de 08 de junho de 2001 “Praia é reformada para virar cartão de visita”. Disponível em: <http://www.comerciodojahu.com.br/noticia/1070548/Praia+%C3%A9+reformada+para++virar+cart%C3%A3o+de+visita+> Acesso em: 27 de junho de 2017.

IGARAÇU DO TIETÊ - ÁGUA E PAISAGEM I 73


teatro, laboratório, quiosques, marina, entre outros12. Em 2014, na área onde se localizava o antigo Canoa Grande, foi construído outro restaurante de mesmo nome. A última reforma ocorreu no ano de 2016, proporcionando benfeitorias no complexo, como reparos, pintura e consertos além da construção do portal de entrada. A infraestrutura presente atualmente no local é grande, contendo além da área de areia, dois restaurantes em funcionamento, um que está construído, mas não ocupado (bar “solarium”), banheiros, calçadão, quiosques, quadras, um edifício composto por teatro, auditório e laboratório, entre outros. Na prainha está localizado outro ponto turístico da cidade: a gruta. Na época da construção da barragem foi necessário implodir diversos pontos em busca de pedras. A gruta foi gerada através de uma dessas explosões, sendo criado um espaço aberto rodeado por pedras, conforme Figura 19. Nesse espaço foi colocada uma imagem de uma santa e a área acabou se tornando, algum tempo depois, um lugar sagrado para a população. Em 1995 a antiga imagem que ali ficava foi substituída por uma nova de Nossa Senhora de Lurdes, colocada no lugar da anterior, mas preservando suas características. Foi decretado pela prefeitura o dia 11 de fevereiro como o feriado municipal “Santa Gruta”, em homenagem à santa. O espaço possui aproximadamente 100 m² e é constituído por um paredão de pedras com 6 metros de altura, cercado por vegetação13. A paisagem da área é atrativa para o visitante e o acesso da população ao rio acontece de forma direta, sem impedimentos naturais ou construídos. O restaurante e as duas lanchonetes estão localizados em cotas mais altas, conformando uma espécie de mirante que possibilita a contemplação do rio e da paisagem, tanto das margens pertencentes à Igaraçu como as que estão do lado de Barra Bonita. A rotatória, localizada no final do complexo da prainha, é um dos pontos mais atrativos para o observador que pode visualizar a Ponte do Açúcar, no lado esquerdo (Figura 20) ou a barragem e a eclusa, no lado direito (Figura 21). Na praça ali formada, existem árvores altas e uma estrutura com cobertura, além disso, no trecho que margeia o rio foram colocados bancos que incentivam a permanência e a contemplação. O rio Tietê nesse ponto, apesar de estar localizado depois da barragem, apresenta uma grande largura, o que torna a paisagem aberta e atrativa. 12

Comércio de Jahu. Reportagem de 06 de abril de 2007 “Vereador de Igaraçu do Tietê quer cobrança por uso da prainha”. Disponível em: <http://www.comerciodojahu.com.br/noticia/1167298/Vereador+de+Igara%C3%A7u+do+Tiet%C3%AA+quer+cobran%C3%A7a+por+uso+de+prainha> Acesso em: 28 de junho de 2017.

13

JCNET. Reportagem de 17 de agosto de 2008 “Em Igaraçu, a Prainha, a gruta e outros lugares atraem visitantes”. Disponível em: <http://www.jcnet.com.br/editorias_noticias.php?codigo=137039&ano=2008> Acesso em: 28 de junho de 2017

74 I IGARAÇU DO TIETÊ - ÁGUA E PAISAGEM


Figuras 19, 20 e 21 I Ă rea 3.

Fonte I Acervo Pessoal, 2017.


Apesar ter sido planejada como polo de atração turística para o Município, a prainha apresenta atualmente alguns problemas que inibem sua plena utilização. Um dos motivos observados é que a área fica relativamente distante dos loteamentos, não existindo transporte público que chegue até lá, restringindo seu acesso somente aos automóveis. Outro ponto a ser levado em consideração é o vandalismo que ocorre nos edifícios ali existentes. Tal ato causa depreciação do patrimônio e falta de interesse de uso por parte da população, além de sensação de insegurança. Esses atos resultam na necessidade de uma constante manutenção, aliada à necessidade de reformas por parte da prefeitura, como ocorreu no ano de 2016. Por último, segundo o Plano de Bacia Hidrográfica Tietê-Jacaré (2016), em análise realizada no ano de 2015, as águas do rio que ali passam não são consideradas apropriadas para o banho, obtendo uma péssima classificação quanto à poluição. A área 4 é constituída por um extenso trecho ao longo do rio Tietê, afastado visualmente e fisicamente da população da cidade. Seus limites compreendem o final do complexo da Prainha a leste e a Ponte Campos Salles a oeste, abrangendo toda a extensão norte dos loteamentos urbanos. A área apresenta vegetação mais densa e é margeada pela Avenida Roberto Costa de Abreu Sodré, conhecida como Transtobal, que possui trechos ainda não finalizados, sem calçamento e acessibilidade (Figuras 22 e 23). Por causa disso, ao percorrer essa avenida foi possível notar que a mobilidade ali fica restrita aos veículos automotivos, tornando-se uma via não atrativa e perigosa. Ao longo dela são encontrados muitos terrenos vazios, alguns com vegetação rasteira e outros com vegetação de alto porte, o que contribui para gerar o afastamento da população. São encontradas também algumas residências ao longo do trecho que são, em sua maioria, precárias, inacabadas e com situação de habitabilidade ruim. Nessa área localizavam-se as cerâmicas nas margens do rio Tietê. Atualmente somente uma ainda existe e encontra-se em funcionamento, localizada próximo à Ponte Campos Salles ao lado do parque municipal e conhecida como Cerâmica Santa Cruz. Nesse trecho também está localizada a Estação de Tratamento de Esgoto municipal. A paisagem desse trecho é fechada e não atrativa devido à presença da vegetação densa que bloqueia visualmente os que passam pela avenida (Figura 22), sendo possível observar o rio em raros pontos onde ela se abre juntamente com a paisagem (Figura 23). Aliado a isso, a falta de infraestrutura que possibilite a permanência da população ali resulta em uma área que é esquecida e utilizada prioritariamente pra o fluxo rápido de veículos. . Já para quem passeia pelos barcos ou está na margem oposta às chaminés da cerâmica existente e das que foram já demolidas tornam-se pontos focais e de atratividade para o observador. (Figura 24).

76 I IGARAÇU DO TIETÊ - ÁGUA E PAISAGEM


Figuras 22, 23 e 24 I Ă rea 4.

Fonte I Acervo Pessoal, 2017.


No final do trecho 4 e início da área 5, está localizado o canal de Igaraçu do Tietê. Ele foi construído em 1989 (SAFFI, BOMBONATI, BOLLA, STANGHERLIN, 1999) e isolou uma pequena parte do território localizado na margem do rio Tietê, próximo à ponte Campos Salles, formando ali uma ilha. No lado direito da ponte é armazenada a areia retirada do rio Tietê no trecho alagado em cima da barragem, e, do lado esquerdo, acontecem alguns eventos coorporativos na infraestrutura que ali foi construída. A empresa responsável pela retirada, armazenamento e venda é a Extração de Areia Alto Tietê que realiza o processo uma vez ao dia. A área 5 é marcada pela reaproximação da população com o rio. Ela se inicia após a Ponte Campos Salles, no parque municipal Igaraçu Park, e estende-se no sentido oeste, até o final do perímetro urbano municipal. É uma área que, ao contrário da anterior, atrai a população para perto do rio. O parque localizado bem ao lado da ponte proporciona uma infraestrutura com quadras, playground e banheiros, além de uma área na margem do rio que possibilita a permanência e contemplação (Figura 25). O parque recebe manutenção frequente, o que resulta em efetivo uso por parte da população. Assim como na área anterior, ao longo desse trecho passa uma via (IGT – 416) que apresenta aspectos bem similares à Avenida Roberto Costa de Abreu Sodré (Figura 26). Na parte próxima ao adensamento urbano, o acesso ao rio ainda é fácil, pois a via localiza-se bem próxima às margens do rio. Ali estão localizados alguns restaurantes e em vários pontos são encontrados pescadores. Depois, a vegetação da margem fica mais densa e a avenida se distancia do rio, resultando em pouca visualização e pouca utilização por parte da população.

78 I IGARAÇU DO TIETÊ - ÁGUA E PAISAGEM


Figuras 25 e 26 I Ă rea 5.

Fonte I Acervo Pessoal, 2017.



PAISAGEM DE IGARAÇU DO TIETÊ



6 I IGARAÇU DO TIETÊ - REQUALIFICAÇÃO



6.1 I INFRAESTRUTURA VERDE A partir da pesquisa realizada sobre o território de Igaraçu do Tietê pautada em três pontos chaves (memória, dados territoriais, água e paisagem), exposta nos tópicos anteriores, foi possível estabelecer um diagnóstico amplo sobre a cidade. Nessa pesquisa foram gerados mapas que quando sobrepostos uns com os outros permitem o agrupamento das análises bases desse trabalho geradas separadamente, sendo possível reanalisá-las, aumentando a amplitude do diagnóstico municipal e entendendo o território não somente por aspectos separados, mas também pela interação entre eles, responsável por gerar a complexidade urbana encontrada não somente em Igaraçu, mas em qualquer outra cidade, independente do tamanho e localidade (Figura 27). Através da pesquisa na legislação municipal e de entrevistas com técnicos dos órgãos públicos de Igaraçu do Tietê foi possível notar que a cidade não possui uma gestão que ordene o crescimento urbano aliado à preservação ambiental. Apesar disso, a população tem vínculos fortes e estruturados com o meio ambiente, especialmente, senão exclusivamente, pela presença do rio Tietê em seu território, que gera fontes econômicas como energia, pesca, extração de pedras e barro, e fontes de lazer como navegação e praias fluviais, que permitem o contato direto com os recursos hídricos municipais, gerando um sentimento de apropriação e valorização, não só de suas águas, mas também dos recursos naturais. Mesmo com esse vínculo existente, o que pode ser notado é que apesar da cidade ser nova e seu crescimento urbano ser relativamente pequeno, os bairros criados mais recentemente estão cada vez mais distantes de suas águas, não só territorialmente, mas afetivamente, seja pela larga faixa de APP que separa visualmente o morador do córrego do Monjolinho, pela

IGARAÇU DO TIETÊ - REQUALIFICAÇÃO I 85


Figura 27 I Sobreposição de mapas.

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Fonte I Elaboração Pessoal.


sua canalização que gera alagamentos e mau cheiro, pela frequente deposição de lixo em suas margens, pela falta de transporte público até o Tietê, entre outros. Tais aspectos resultam em um crescimento urbano similar ao que pode ser notado em muitas outras cidades do Estado de São Paulo, principalmente as de médio e grande porte, que já perderam o vínculo com os recursos hídricos e cuja população os repudia e vira suas costas para eles, não os preservando e nem os valorizando. Como solução para sanar tais problemas encontrados nas cidades atualmente os pesquisadores ligados às questões da ecologia urbana, sustentabilidade, preservação ambiental, entre outras, têm defendido a instalação da infraestrutura verde como forma de reestruturar a paisagem urbana, dando lugar à natureza dentro das cidades e reconectando sua população com os recursos naturais. Essas discussões são debatidas e estudadas no âmbito mundial e aplicadas a partir de bases direcionadas às necessidades específicas de cada localidade e população que ali habita. No Brasil, a questão da infraestrutura verde tem sido introduzida nos últimos anos sendo aplicada principalmente às megacidades, como forma de remediação, pois os problemas ambientais ali existentes partem de uma complexidade grande e de uma realidade na qual os recursos naturais estão fortemente degradados e quase inexistem dentro de uma malha urbana já bem desenvolvida e estruturada. Uma remediação que busca frear o avanço desenfreado da cidade pautado somente nos aspectos econômicos em prol de um desenvolvimento urbano que esteja direcionado às questões ambientais e à resiliência. As cidades de pequeno porte, grupo no qual se localiza Igaraçu do Tietê, ainda são pouco estudadas e abordadas nessas novas pesquisas que vêm surgindo no território nacional que visam à questão da infraestrutura verde. Porém essa nova solução quando aplicada a essas cidades pode ter um efeito mais rápido e efetivo se comparado às megacidades, uma vez que seu desenvolvimento urbano não é tão grande, sua população possui vínculos fixados com os recursos naturais e seus problemas ambientais ainda conseguem ser revertidos ao invés de remediados. No caso de Igaraçu, a infraestrutura verde entraria na cidade como forma de fixar o olhar do poder público e da população para o meio ambiente, conscientizando-os e trazendo discussões junto com profissionais multidisciplinares e com os geradores econômicos municipais para estruturar uma cidade que se desenvolva em consonância com seus recursos naturais e biológicos, estabelecendo um vinculo duradouro com quem ali vive e estruturando um sentimento de valorização, preservação e apropriação que ainda podem ser detectado no município, mas que podem perder-se com o tempo se não houver alguma ação nesse sentido.

IGARAÇU DO TIETÊ - REQUALIFICAÇÃO I 87


A partir disso, baseando-se nas análises realizadas viu-se a necessidade de uma proposição que mudasse o cenário atual municipal. Para tal, foram detectados pontos bases subsidiados por toda a pesquisa e posterior compilação dos mapas gerados ao longo do trabalho que levaram à proposta da instalação de uma infraestrutura verde na cidade visando as três temas chaves apontados por Madureira (2012): continuidade, conectividade e multifuncionalidade. Com base nesses pontos foi proposto um plano base de diretrizes para a instalação de uma infraestrutura verde em Igaraçu do Tietê, exposto na figura 28. A cidade possui dois cursos d’água principais: o rio Tietê e o córrego do Monjolinho. O primeiro corta o perímetro norte, de leste a oeste, e o segundo atravessa a malha urbana de sul a norte. Ambos, juntamente com seus fundos de vale, caracterizam-se como trechos lineares propícios para a concretização da continuidade. Todo o trecho do rio Tietê que margeia o município possui áreas permeáveis relativamente largas e em sua maioria subutilizadas, desmatadas ou com vegetação invasora (trecho 1 na Figura 28). Já o córrego do Monjolinho que corre pela malha urbana também possui áreas permeáveis em toda sua extensão, tanto na parte sul através da APP e de plantações de cana-de-açúcar, como em sua parte canalizada, a norte perto de sua foz, onde há a presença de terrenos vazios de grandes áreas com vegetação rasteira (trecho 2 na figura 28). Além desses dois, existem mais quatro trechos que puderam ser percebidos durante a pesquisa. Três deles caracterizam-se por vias já existentes que se conectam ao córrego do Monjolinho. O primeiro (trecho 3 da figura 28) encontra-se na avenida Regina Mioto Périco que corta os bairros a leste do município. O segundo e terceiro (trechos 4 e 5 da figura 28) cortam os novos bairros a sul e localizam-se nas ruas Ricieri Zerlin e Raimundo T. dos Santos. O último trecho (trecho 6 da figura 28) caracteriza-se pela linha de alta tensão que rasga a malha urbana e liga-se à hidrelétrica de Barra Bonita, a leste da cidade. Esses quatro trechos também possuem em sua extensão uma quantidade significativa de áreas vazias e permeáveis que, quando requalificadas, iriam conectar-se aos eixos principais (rio Tietê e córrego do Monjolinho) formando corredores interligados. Os seis trechos, transformados em corredores biológicos com presença de avenidas arborizadas e áreas maiores permeáveis e vegetadas, conectam-se a uma área a leste, abaixo da praia fluvial, (zona de reflorestamento – Z.R.- na figura 28) onde é proposto um trecho maior de reflorestamento e adensamento vegetal, funcionando como uma matriz geradora responsável pela dispersão de espécies. As duas principais áreas verdes e de lazer municipais são o Parque Municipal Igaraçu Park (área 1 na figura 28) e a Praia Maria de Abreu Sodré (área 2 na figura 28). Ambas encontram-se nas margens do Tietê e estão conectadas territorialmente somente pela avenida

88 I IGARAÇU DO TIETÊ - REQUALIFICAÇÃO


Roberto Costa de Abreu Sodré, que corre paralelamente ao rio. Apesar da existência da avenida, a conexão entre as duas áreas enfrenta diversas dificuldades atualmente, tanto em relação à fruição biológica como de acesso da população de uma região a outra, pela falta de transporte público, calçadas e ausência de atrativos paisagísticos, deixando essas áreas isoladas. Constatou-se a partir disso que esse é um ponto relevante para a concretização da conectividade, uma vez que requalificado, juntamente com as margens do rio Tietê que o acompanham, através da instalação de uma via verde com presença de ciclovias, jardins de chuva, canteiros com árvores de alto porte conectadas, melhor iluminação, pavimentação com aumento das calçadas, requalificação paisagística e instalação de um sistema de serviços, promoveria a conexão entre essas duas áreas de lazer principais do município. A junção desse trecho com o eixo gerado pelo córrego do Monjolinho, onde também é proposto um sistema de circulação de ciclovias juntamente com as ruas existentes transformadas em vias verdes conectadas com o estoque de áreas livres ao seu redor,ligaria toda a margem do rio Tietê com o restante da cidade e se distribuiria para os bairros através do trecho 4 e trecho 5. Esses dois trechos, por sua vez, seriam responsáveis pela conexão e propagação biológica para os novos bairros que tendem a surgir na zona de expansão municipal (Z.E.1, Z.E.2, Z.E.3 da figura 28).Os eixos principais de conexão leste-oeste pelo rio Tietê e norte-sul pelo córrego do Monjolinho, conectariam também a maior parte das cerâmicas e chaminés espalhadas pelo município(quadrados pretos na figura 28), valorizando-as no percurso pelo olhar do observador que passaria a considerá-las parte da paisagem, tornando-as pontos focais. Suas estruturas antigas e abandonadas serviriam para a promoção de atividades culturais e de lazer para a população. Como solução para o problema de drenagem e alto escoamento superficial presente no município, principalmente no trecho canalizado do Monjolinho, propõe-se a renaturalização do córrego e diminuição da velocidade com que as águas chegam ao fundo de vale, através da instalação de jardins de chuva nas ruas perpendiculares ao córrego e biovaletas nas vias paralelas, formando um sistema de drenagem sustentável. Aliado a isso, seria necessário a criação de incentivos fiscais para a instalação de telhados verdes e captação de água nas residências. A instalação e articulação de diversos usos, funções atividades propostos para as áreas verdes apontadas, juntamente com a criação de outros equipamentos como hortas comunitárias, centros de cultura e azer, espaços para compostagem e reciclagem, capacitação, descanso ou aquilo que for demandado pela população, resultariam na promoção da multifuncionalidade.

IGARAÇU DO TIETÊ - REQUALIFICAÇÃO I 89


ÁREA 1

TRECHO 1 Z.E.1

TRECHO 6

TRECHO 3

Z.E.2

Z.E.3

TRECHO 4

TRECHO 5

TRECHO 2


Figura 28 I Diretrizes de infraestrutura verde propostas para Igaraçu do Tietê. Fonte I Elaboração Pessoal.

Z.R.

Zona de reflorestamento

Z.E.

Zona de expansão Linha de alta tensão

ÁREA 2

Vias verdes Cerâmicas e chaminés existentes Rematuralização do córrego Áreas verdes permeáveis revitalizadas e conectadas com diferentes usos

Z.R

0,25 km

1 km


6.2 I ESCOLHA DA ÁREA A partir disso fica a questão: como essa infraestrutura verde seria colocada em prática no município? O primeiro ponto a ser levado em conta é a grande distância entre a teoria e a prática encontrada no Brasil, no que diz respeito às questões ambientais urbanas. O desenvolvimento de estudos e propostas que visam esse tema é frequentemente visto, mas entre eles e a sua efetiva realização dentro dos municípios existe um abismo causado pela falta de capacitação do poder público em relação à gestão, aplicação e fiscalização; uma população sem informações sobre o tema; profissionais sem qualificação técnica e cidades sem um orçamento local que propicie o desenvolvimento dessas práticas. O segundo ponto diz respeito àquilo que foi observado no município durante as visitas realizadas e também a partir de conversas com a população que ali reside e com as secretarias da cidade. A maior parte das pessoas que moram em Igaraçu do Tietê trabalha em Barra Bonita e tem seu lazer e serviços ali realizados. Tal fato resulta em uma população que não possui um vinculo econômico forte com o município e que não gera fontes econômicas para o mesmo. Além disso, os secretários apontaram que a cidade sofre com seu baixo orçamento e por isso tem intenções de gerar meios para atrair mais turistas durante todo ano (atualmente só atrai turistas em alguns eventos espaçados como o carnaval e o réveillon), principalmente ocupando e requalificando o trecho das margens do rio Tietê com usos e atividades que assim o façam. Com a junção desses dois pontos é possível estabelecer diretrizes bases que seriam importantes para conseguir a efetiva instalação da infraestrutura na cidade: 1. a conscientização da população e do poder público em relação a esses temas para que ambos consigam identificar a real importância da mudança necessária no local; 2. a criação de meios de atração turística que estejam vinculados a essas práticas ambientais, gerando recursos para que o poder público consiga investir de forma gradativa na instalação dessa infraestrutura; 3. a capacitação da população local através de cursos, ateliês práticos de estratégias sustentáveis e discussões com as instâncias municipais e com profissionais interdisciplinares buscando desenvolver essas estratégias em sua própria residência e trabalhar dentro da cidade na promoção e manutenção dessa infraestrutura verde. Uma vez que os cidadãos trabalhem e participem das discussões, do plano geral e da efetivação do mesmo, eles conseguem visualizar o processo como um todo, valorizando sua instalação e entendendo a importância de ter a natureza como aliada ao desenvolvimento

92 I IGARAÇU DO TIETÊ - REQUALIFICAÇÃO


urbano, fixando e estruturando um vínculo duradouro. Parra isso, seria necessário um local inicial onde fossem praticadas essas estratégias sustentáveis para que a partir dele a infraestrutura verde fosse desenvolvida no município. Nesse sentido, foi escolhida a área de estudo deste trabalho.

CONSCIENTIZAÇÃO

TURISMO

CAPACITAÇÃO

A partir de toda a análise realizada notou-se que o trecho entre as duas áreas de lazer principal do município de Igaraçu do Tietê (Igaraçu Park a leste e praia fluvial municipal a oeste) é o local mais propício para o exercício projetual. Esse trecho das margens do rio Tietê possui a maior proximidade territorial com a ocupação urbana atual, porém apresenta um distanciamento afetivo com a população. A falta de infraestrutura, a presença de vegetação que bloqueia a visão do rio, as ocupações irregulares ao longo da avenida marginal, a existência de assaltos e usuários de drogas que geram uma sensação de insegurança, a avenida marginal ao rio não finalizada e sem acessibilidade, além da falta de planos direcionados para esse trecho, resultam na situação atual, uma paisagem não atrativa. Apesar disso, a área apresenta-se como um ponto estratégico para projetos que transformem o panorama atual, do ponto de vista paisagístico e urbanístico. Em entrevista com o Secretário de Turismo municipal, foi apontado que é de conhecimento da prefeitura os problemas existentes ali e que há intenção de se criar novos planos de ocupação e uso dessa área. Dentro desse trecho, o local escolhido para o projeto é a área localizada ao lado da ponte Campos Salles (entrada principal de veículos da cidade), no início da Avenida Roberto Costa de Abreu Sodré (Figura 29). A escolha justifica-se porque o terreno apresenta uma larga área verde ao lado do Igaraçu Park, onde acontecem os principais eventos da cidade como o carnaval e as festas de final de ano, sendo um local já de grande atenção por parte da população, da prefeitura e de turistas. O local encontra-se próximo ao rio, cerca de 1,5 metros acima da cota da margem. A Avenida Roberto Costa de Abreu Sodré está situada acima da cota do terreno, possuindo um desnível em torno de 12 metros. A vegetação ali é densa, principalmente nas margens do Tietê, porém não é nativa, sendo a Leucena (Leucaenaleucocephala) a espécie vegetal predominante.

IGARAÇU DO TIETÊ - REQUALIFICAÇÃO I 93


Figura 29 I Área do projeto.

ÁREA DO PROJETO

50 m

Fonte I Elaboração Pessoal.

200 m


Outra justificativa para escolha desse local é a presença da cerâmica Santa Cruz, ainda em funcionamento, e uma chaminé de outra cerâmica que já foi demolida. A sua construção data da década de 1960, quando ainda funcionava em uma barraca, sendo que só em 1971 foi construído o edifício que existe hoje. Segundo o atual proprietário, a cerâmica pertence à família Sanchez há mais de 60 anos. A proposição de um projeto para essa área, com a presença da cerâmica, valorizaria o prédio existente através da revitalização de sua estrutura, trazendo novos usos voltados à educação ambiental e à sustentabilidade. Uma vez que o edifício fosse valorizado e começasse a ser visto tanto pela população de Igaraçu como pelos turistas, a memória da cidade, que tem um de seus pontos fixado nas cerâmicas, seria fortalecida. A área possui 105.695,65 m² dos quais 9000 m² são ocupados pelo edifício da cerâmica que é composto por doze galpões, oito paralelos e três perpendiculares ao rio Tietê. A cobertura de dez galpões é em telha cerâmica e dois em telha de fibrocimento, todos com estrutura em madeira (Figuras 30 e 31). O pé direito é de 3m e sua largura e comprimento variam de 10 a 12 metros e 32 a 92 metros, respectivamente. Além disso, são encontradas ali cinco chaminés, das quais somente três estão em funcionamento atualmente e três fornos, para queima das telhas, que se encontram um ao lado do outro, formados por uma estrutura circular em tijolos aparentes, com duas aberturas em arco. (Figura 32). Na visita realizada à cerâmica foi possível notar que os telhados estão bem deteriorados, apresentando em muitos pontos a madeira bem degradada e comprometida. A estrutura do edifício é composta por pilares modulares de concreto armado e, em alguns pontos, de tijolo maciço (Figuras 33 e 34). Uma característica importante do edifício é a presença de cobogós como elementos de vedação externos. A maior ocorrência deles está no último galpão, próximo ao Tietê, aparecendo em toda lateral paralela às margens do rio, permitindo a entrada indireta de luz na parte interna (Figura 35). Além disso, está presente também como vedação de alguns galpões, especialmente na fachada leste.

TELHA CERÂMICA

TIJOLOS APARENTES

MADEIRA

COBOGÓ

IGARAÇU DO TIETÊ - REQUALIFICAÇÃO I 95


Figuras 30, 31 e 32 I Cerâmica Santa Cruz.

Fonte I Acervo Pessoal, 2017.


Figuras 33, 34 e 35 I Cerâmica Santa Cruz.

Fonte I Acervo Pessoal, 2017.


O sistema de produção da cerâmica é composto por diversas etapas. Primeiramente a argila que chega é descarregada dos caminhões e armazenada em uma parte do terreno, próxima à entrada (1 da figura 36). Depois é transportada até outro galpão onde é misturada com outros elementos antes de se iniciar o projeto de fabricação das peças (2 da Figura 36). Em seguida, passa por diversas máquinas, nas quais é compactada, cortada e moldada em formas (3 da Figura 36). Após esse processo, a argila é retirada da forma manualmente e colocada em estruturas metálicas levadas para a secagem (4 da Figura 36). Essas estruturas são movimentadas por trilhos instalados no chão. Depois de secas, as peças são levadas para os fornos, onde são queimadas durante horas (5 da Figura 36). Por último, a telhas e tijolos são embalados e armazenados nos últimos galpões até serem transportados (6 da figura 6). O transporte, tanto da chegada da argila como da saída das telhas e tijolos, ocorre através de caminhões, não sendo utilizado o rio Tietê para tal fim. Além dos galpões, no local encontra-se uma pequena oficina, uma administração (7 e 8, respectivamente, da figura 36), um trecho onde o rio adentra o terreno e está localizada uma oficina de barcos (9 na figura 36)e residências ocupadas pelas famílias da maior parte dos trabalhadores da cerâmica. São casas térreas com telhados de duas águas, também cobertas com telhas cerâmicas, localizadas próximas à Avenida Roberto Costa de Abreu Sodré, ao lado da entrada principal (10 da figura 36). Esses trabalhadores usufruem das margens do rio Tietê sendo possível observar indícios desses usos em determinados locais da área. Alguns pontos apresentam materiais de pesca (11 da figura 36), em outro foi encontrado sofás e cadeiras antigos e uma churrasqueira improvisada, que ainda é utilizada (12 da figura 36), e também um forno e bancos, que segundo um funcionário, são utilizados com bastante frequência para confraternizações (13 da figura 36). Através da visita à área foi possível identificar os locais onde existe maior atratividade visual. Foram levantados três pontos onde o terreno propicia uma paisagem atrativa para o usuário. O primeiro (A.V. 1 da figura 36) localiza-se no final da ponte Campos Salles, na entrada da cidade. Ali, no limite do terreno com a rua, está instalado um gradil onde é possível observar, através da acentuada topografia, toda a área escolhida para o projeto e o rio Tietê. O segundo, (A.V.2 da figura 36) é uma parte da área onde a topografia também é acentuada, sendo possível visualizar toda a cerâmica e as margens do rio. O terceiro é o local onde foram encontrados os sofás antigos e a churrasqueira (A.V.3 da figura 36).Ali a topografia é plana, a margem do Tietê está bem perto do observador, 1,5m abaixo, e a paisagem é composta pela amplitude do rio e sua margem oposta, pertencente ao município de Barra Bonita. Além disso, no local encontra-se uma chaminé abandonada, que se torna um ponto focal para quem ali passa.

98 I IGARAÇU DO TIETÊ - REQUALIFICAÇÃO


Figuras 36 I Usos atuais da área.

A.V.1

13

11

6

12

8

1

7 10

A.V.3

10 A.V.2

9 50 m

200 m

2 3

5

4

6

6

1

Fonte I Elaboração Pessoal.


CERÂMICA SANTA CRUZ



6.3 I PROPOSTA DE PROJETO Através do que pode ser observado, das cerâmicas que se instalaram no município somente duas atualmente permanecem em funcionamento, sendo que a maior parte já foi desativada ou demolida, deteriorando-se e transformando suas instalações existentes em espaços precários e ociosos. Essa é uma tendência que tende a se repetir nessas duas cerâmicas restantes ainda em funcionamento. Tendo isso em vista, o projeto proposto visa à instalação de um complexo na área para quando houver uma futura desativação ou mudança de localização da cerâmica Santa Cruz, não deixando que a área fique abandonada e que o edifício perca suas características arquitetônicas, mas atraindo a população e turistas para esse trecho das margens e fazendo com que o edifício seja visto e valorizado. Os usos propostos no projeto estão voltados à sustentabilidade urbana e à atração de turistas (ambos representados por números na implantação). A promoção da sustentabilidade nessa área atuaria como um protótipo no qual os usuários que ali frequentassem pudessem ter um real contato com as novas tipologias urbanas que vêm sendo apresentadas para promover cidades mais sustentáveis, entendendo seu funcionamento e importância. Além disso, o espaço foi pensado para que ali pudessem ser promovidos também ateliês, discussões, aulas e exposições sobre os assuntos, capacitando, assim, a cidade para que ela consiga autogerir-se. Através da análise da topografia, dos edifícios existentes, dos pontos de atratividade visual, da paisagem, das diretrizes de infraestrutura verde propostas, da vegetação e das áreas permeáveis existentes, procurou-se desenvolver um projeto que interferisse pouco no terreno e preservasse as áreas já construídas ou edificadas, dando novos usos a elas. No ponto de atratividade visual I (A.V.I) foi proposto um mirante que acompanha o desenho da própria rua, alargando a calçada ali existente e criando um local de permanência e contemplação, tanto da paisagem como do novo complexo. Seguindo pela Avenida Roberto Costa de Abreu Sodré, no final do gradil, existe um muro de pedras e uma entrada que foram preservados no projeto. A entrada foi utilizada como acesso de pedestres e ciclistas (número 1) à área com maior adensamento vegetal, onde foi proposto reflorestamento e produção de mudas, ambos de espécies nativas, além de trilhas (número 2). As mudas seriam utilizadas no restante da cidade na instalação e manutenção da infraestrutura verde municipal, nas áreas de reflorestamento, recomposição vegetal e nas vias verdes.

102 I IGARAÇU DO TIETÊ - REQUALIFICAÇÃO


Ainda na avenida, no perímetro do muro de pedras existente, foram propostos outros dois acessos ao complexo. O primeiro – acesso II – para automóveis e caminhões (número 3) que leva ao estacionamento I, composto por piso permeável em concregrama, destinado aos automóveis, com vagas convencionais e acessíveis (número 4). Além disso, dá acesso dos automóveis e caminhões às áreas de compostagem e reciclagem (números 5 e 6, respectivamente). O segundo – acesso III –, destinado a pedestres e ciclistas, é o acesso principal do complexo, no qual foi reaproveitada a entrada existente da cerâmica (número 7). Ele se conecta ao bicicletário, à oficina de bicicletas e à administração, previstos para dois edifícios já existentes na área (números 8 e 9, respectivamente). Atrás da administração foi proposto um pomar com árvores frutíferas, em um lugar de fácil acesso aos visitantes (número 10). No final da rampa do acesso III encontra-se uma praça que dá acesso ao Espaço Cerâmica, núcleo principal do projeto (número 11). Ali se encontra a cerâmica Santa Cruz, edifício onde foram propostos diversos usos também voltados à sustentabilidade urbana que enfocam na capacitação da população, nas aulas, ateliês, discussões, estudos e pesquisas voltados a esse tema. É um espaço pensado para integrar os demais usos do complexo. Seguindo na direção leste da área, foram propostos usos voltados ao lazer, contemplação da paisagem e turismo. No local onde se localiza um pequeno píer em processo avançado de deterioração, foi proposto um segundo mirante – mirante II - e área de pesca, com degraus em madeira que dão acesso direto ao rio (número 12). Um pouco depois, no terceiro ponto de atratividade visual detectado na área, foi previsto o mirante III, com degraus largos em madeira que permitem a permanência e contemplação do Tietê (número 13). Aproveitando a entrada natural que o rio faz no terreno e uma oficina de barcos já existente (número 16), foi proposta no local uma marina (número 14) com o intuito de atrair turistas que se locomovem por barcos tanto particulares como de passeio pela região. Essas três áreas de lazer e contemplação (mirantes II, III e marina) estão conectas por uma área pavimentada que prioriza como ponto focal a chaminé, localizada no seu centro, como forma de valorizar visualmente a construção tanto para quem acessa a área pela avenida como pelo rio, além de gerar um espaço aberto livre para feiras, carros de comida, etc (número 15). Abaixo da marina encontra-se o estacionamento II, também em concregrama, destinado aos automóveis e ônibus de passeio (número 17) e seu acesso acontece pela entrada IV do complexo localizada também na avenida Roberto Costa de Abreu Sodré (número 18). Entre o acesso III e IV foram mantidas as residências já existentes (número 19) e propostas cabanas em madeira na região de alta declividade do terreno para acomodação de turistas e visitantes como uma espécie de hotel que funciona como mirante (número 20).

IGARAÇU DO TIETÊ - REQUALIFICAÇÃO I 103


1

Acesso I

2

Recomposição vegetal com vegetação nativa, plantio de mudas e presença de trilhas

3

Acesso II

4

Estacionamento I

5

Compostagem

6

6

Reciclagem

7

Acesso III

8 9 10 11 12 13 14

Bicicletário e oficina de bicicletas

4

Administração

10

Pomar Espaço cerâmica

9

Mirante II e ponto de pesca Mirante III Marina Chaminé existente

16

Oficina de barcos

17

Estacionamento II

18

Acesso IV

20

2 5

15

19

CC

1 3

19 7

Residências existentes mantidas Cabanas hotel 12,5 m

50 m


IMPLANTAÇÃO

BB

11

AA

12

15

13 8

CC

14 17

BB

20

18

AA

16


TOPOGRAFIA

1

Curvas de nível

I II

MIRANTES

III

2

Vegetação

3

FLUXO BIOLÓGICO

Mirantes


ACESSOS

I

ÁREAS PAVIMENTADAS

4

5

II

III

V

Barcos Pedestres e Ciclistas Automóveis

IV

Madeira Concregrama Piso drenante

ESTACIONAMENTOS

I

6

II Estacionamento Carros e caminhões Estacionamento Carros e ônibus


Bicicletário Oficina de bicicleta

Área Permeável Conectividade

Acesso IV Carros, ônibus, foodtrucks e barcos

Estacionamento II

CORTE AA Escala I 1:1000

Residências existentes

Bicicletário Oficina de bicicleta

Administração

Área Permeável Jardim

CORTE BB Escala I 1:1000

Oficina de barcos

CORTE CC Escala I 1:1500

Marina

Mirante III

Acesso IV Carros, ônibus, foodtrucks e barcos

Cabanas Hotel


Área Permeável Jardim

Chaminé revitalizada Ponto focal

Rio Tietê

+739m +734m +729m

Área Permeável Jardim

Espaço Cerâmica

Rio Tietê

+739m +734m +729m

Residências Existentes

Espaço Cerâmica

Acesso III Pedestres e Ciclistas

Acesso II Carros e caminhões

+739m +734m +729m


Oficina de barcos

Marina

PERSPECTIVA GERAL

Estacionamento II

Mirante III

Acesso IV

ChaminĂŠ existente

Cabanas Hotel


Mirante II e ponto de pesca

Bicicletário e Oficina de bicicletas

Administração

Acesso III

Espaço Cerâmica

Acesso II

Estacionameno I

Compostagem

Reciclagem


6.4 I RECORTE Foi escolhido como recorte o edifício da cerâmica, onde foi proposto o Espaço Cerâmica. Seus usos visam complementar àqueles presentes no restante do complexo, tornando-se um espaço dinâmico, direcionado à pesquisa, ensino e promoção de práticas sustentáveis. Como o edifício possui um valor histórico e arquitetônico grande para a cidade, procurou-se preservar suas características e elementos como um todo. As intervenções realizadas buscaram não interferir, mas sim dialogar com as formas, cores e disposições dos galpões existentes. As alterações realizadas no edifício envolveram a retirada das telhas de fibrocimento dos dois galpões da extremidade, deixando somente as coberturas cerâmicas existentes, como forma de valorizá-las visualmente. Nas coberturas de telha cerâmica mantidas, em alguns pontos também foi retirada uma sequência de telhas para gerar conforto térmico, permitindo uma melhor ventilação e insolação para o local. Além disso, no último galpão, perto do rio Tietê, e em pontos onde há caída de telhado e menor circulação, foi retirado o piso existente e proposta a colocação de pedras locais, tornando o local permeável. A última intervenção realizada no edifício foi o rebaixo de 3 metros da entrada principal, criando um pavimento inferior onde foi possível fazer a inclinação necessária para o auditório proposto, tornar o centro de desenvolvimento de cidades verdes um volume de dois andares, onde as salas ficam no pavimento superior e os laboratórios no pavimento inferior, e também locar ali um mercado natural. Em relação aos materiais, foram utilizados: vedação em tijolos cerâmicos como forma de inserir nos novos volumes propostos o material que antes era produzido no local; revestimentos brancos para que as cores do próprio edifício se sobressaiam no ambiente; e, por último, a madeira, utilizada no decks propostos e também em pontos específicos para demarcar a circulação, como no foyer do auditório e em toda a parte interna do café que também atua como um espaço de transição entre a parte externa e interna. O projeto desse recorte procurou transformar o edifício existente em um local auto-sustentável. Para isso foi introduzido painéis solares para aquecimento dos chuveiros; armazenamento da água de chuva para reutilização na lavagem do local e nas descargas dos banheiros; um alagado construído, no último galpão próximo ao rio Tietê, para tratamento das águas advindas dos banheiros, café e copas e também a utilização dos produtos da horta orgânica no café. Ambos os elementos foram inseridos no local de forma que ficassem visíveis para os visitantes e que esses pudessem interagir e entender seu processo.

112 I IGARAÇU DO TIETÊ - REQUALIFICAÇÃO


LOCALIZAÇÃO DO RECORTE

ALTERAÇÕES REALIZADAS NO EDIFÍCIO EXISTENTE

Cobertura mantida

Retirada do piso existente e colocação de pedras locais

Rebaixo de 3m na entrada


ELEMENTOS

COBERTURA Telha Cerâmica existente

ESTRUTURA COBERTURA Madeira treliçada

INTERVENÇÕES E NOVOS ELEMENTOS Vedação em tijolos cerâmicos com acabamento branco Banheiros e vestiários em tijolos aparentes Deck em madeira

PISOS, ÁREAS PERMEÁVEIS E ELEMENTOS EXISTENTES Piso cimentício existente e áreas com pedras locais Chaminé e fornos em tijolo maciço aparente Cobogós de vedação Pilares em concreto


PERSPECTIVA EXPLODIDA


PLANTA PAV. TÉRREO I NÍVEL 729.00 m

1

Praça principal

2

Horta Orgânica

3

Feiras e exposições itinerantes

4 5

Vestiário

Estudo e estar

7

Museu da cerâmica

8

Salas e ateliês

10 11 12 13 14 15

6

Exposições digitais sustentáveis

6

9

14

6

5

Banheiros Auditório

4

Centro de desenvolvimento de cidades verdes Café Alagado Construído Cisternas Mercado natural

2,5 m

10 m

5


5

13

13

12

7

11

9

10 6

5

8

5

3

1 2


PLANTA PAV. INFERIOR I NÍVEL 726.00 m

1

Praça principal

2

Horta Orgânica

3

Feiras e exposições itinerantes

4 5

Vestiário Exposições digitais sustentáveis

6

Estudo e estar

7

Museu da cerâmica

8

Salas e ateliês

9 10 11 12 13 14 15

Banheiros Auditório Centro de desenvolvimento de cidades verdes Café Alagado Construído Cisternas Mercado natural

2,5 m

10 m


10 11

15


HORTA, FEIRAS E EXPOSIÇÕES ITINERANTES




ESTUDO E ESTAR


AUDITÓRIO




7 I CONSIDERAÇÕES FINAIS


O rio Tietê no oeste do Estado é uma fonte econômica importante para as cidades que se estabeleceram perto de suas margens, seja pela produção e fornecimento de energia, transporte de cargas ou pelo turismo. A partir da pesquisa realizada durante a Iniciação Científica intitulada “Cidades e Rios no Oeste Paulista – Rio Tietê a e as cidades de Ibitinga e Igaraçu do Tietê” e no decorrer dos doze meses de realização deste trabalho, foi possível obter um panorama amplo sobre a cidade de Igaraçu do Tietê, estabelecendo qual a relação que a cidade possui com o rio. O município teve seu desenvolvimento territorial próximo ao Tietê, além de possuir uma urbanização recente, se comparada às cidades grandes do Estado, como São Paulo e os municípios ao seu redor. Além disso, possui sua relação com o rio vinculada estritamente à zona urbana através do parque municipal, da praia fluvial e de pescas realizadas nas margens do rio. O vínculo que a população possui atualmente com os recursos hídricos ali presentes está atrelado também a fatores paisagísticos e históricos de formação e estruturação do município. O Tietê foi utilizado para a travessia até Barra Bonita, depois pelas cerâmicas para fabricação de tijolos, para o fornecimento de energia gerada através da construção da barragem, para o transporte fluvial, para a extração de matéria prima, como o barro e a areia, e para o turismo, fatores esses que com o passar do tempo construíram a paisagem encontrada no atualmente no território da cidade. O trecho do rio Tietê que passa pela zona urbana possui três tipos de uso e vínculo com a população. No primeiro localiza-se a praia fluvial, a oeste do município, próximo à barragem, com um uso intenso e uma paisagem atrativa. O segundo, entre a prainha e o parque municipal, é afastado da população pela vegetação e pela falta de atratividade. Por último, partindo do parque até à cidade de Macatuba, o terceiro trecho caracteriza-se pelo intenso uso próximo ao parque municipal, uso este que vai decrescendo à medida que o rio se distancia da malha urbana. A realização deste trabalho foi importante, pois permitiu o entendimento da relação que algumas cidades brasileiras, em especial as localizadas no Estado de São Paulo, ainda possuem com os rios. Essa relação estabelece um vínculo com os recursos naturais que se perpetua mesmo frente aos avanços atuais que tendem a degradar e a eliminar o meio ambiente dentro dos assentamentos urbanos. Diferente do que a maior parte da população enxerga, os recursos hídricos ainda estão presentes no cotidiano de muitos brasileiros. Tal fato é de suma importância para se entender as formações territoriais brasileiras e seu desenvolvimento, estabelecendo diretrizes que guiem projetos que visem cidades sustentáveis e cidadãos que participem desse processo de forma direta e que não sejam meros coadjuvantes de cidades ideais projetadas por poucos.

128 I CONSIDERAÇÕES FINAIS


A paisagem urbana está diretamente ligada aos recursos naturais, inclusive os hídricos, na qual estabelecem uma paisagem construída que pode atrair a população para perto de suas águas ou repelir seu olhar, transformando os rios e córregos em pontos de rejeição e degradação dentro das cidades. Através desse trabalho foi possível notar a importância do estudo direcionado a cada município, analisando os dados históricos e gerais para criar um diagnóstico efetivo das principais ações que devem ser tomadas para atrair novamente a população para perto dos rios e dos recursos naturais, em casos onde a relação já se perdeu, ou intensificar o sentimento de apropriação em situações em que essa conexão ainda permanece viva, construindo cidades nas quais o desenvolvimento vincula-se à preservação da natureza e à sustentabilidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS I 129



8 I REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


8.1 I GERAIS ANTAQ. Transporte de Cargas nas Hidrovias Brasileiras 2010: Hidrovia do Paraná-Tietê. ... Brasília, 2001. (http://www.antaq.gov.br/portal/pdf/EstatisticaNavInterior/ HidroviaParanaTiete.pdf) BAENINGER, R. Regiões e cidades no eixo da Hidrovia Tiête-Paraná. Campinas: Núcleo de Estudos de População/UNICAMP, 2004. 101p. BRONNEBERG, L.; RIBEIRO, G. M. Modelagem Conceitual da Hidrovia Tietê-Paraná para Simulação. In: CONGRESSO NACIONAL DE PESQUISA EM TRANSPORTE DA ANPET, 29, 2015. Ouro Preto. Anais... Rio de Janeiro: Associação Nacional de Pesquisa e Ensino em Transportes (ANPET), 2015. p. 1250 – 1260. COMISSÃO GEOGRAPHICA E GEOLOGICA DO ESTADO DE SÃO PAULO. Exploração do rio Tietê- 1905. São Paulo: TypographiaBrazil de Rothschild, 1930. 3 ed. CONSTANTINO, N. R. T. Rios Urbanos no Oeste Paulista: permanência nas cidades. In: XIII Seminário de História da Cidade e do Urbanismo, 2014, Brasília-DF. SHCU 2014. Brasília: Universidade de Brasília, 2014. CONSTANTINO, N. R. T. Rios Urbanos: permanência e visibilidade no oeste paulista. In: BENINI, S. M.; ROSIN J. A. R. de G. (Orgs). 2 ed. Estudos urbanos: uma abordagem interdisciplinar da cidade contemporânea. Tupã: ANAP, 2016. P. 223-240. CORDEIRO, J. S. et al. Controle de cheias no córrego do Monjolinho – Igaraçu do Tietê – SP. In:Congreso Interamericano de IngenieríaSanitaria y Ambiental, 27. ABES, 2000. p. 1-10 [t. XII]. CORRÊA, D. S.; ALVIM, Z. M.F; KEATING, V. A Água no olhar da História. São Paulo: Secretaria Estadual do Meio Ambiente, Governo do Estado de São Paulo, 1999. CORRÊA, D.S. Os rios na formação territorial do Brasil: considerações sobre a histografia paulista. In: ARRUDA, G. (org.) A natureza dos rios: história memória e territórios. Curitiba: Editora UFPR , 2002. p. 47 – 72. COSTA, L. M. S. A. Rios e paisagens urbanas em cidades brasileiras. Rio de Janeiro: Viana & Mosley / PROURB, 2006.

132 I REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


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O Regional Comércio de Jahu

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Estudar a paisagem Ê entender o espaço em contado com o homem. (ASSUNTO, 2011, p. 129)




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