Luana Sousa Farias Orientadora Priscila Farias
CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES Trabalho de Conclusão de Curso Curso de Design Universidade de São Paulo São Paulo 2016
AGRADECIMENTOS:
À minha mãe e irmãs, que são as primeiras e maiores mulheres da minha vida À cada uma das feministas citadas neste relatório À família e às amigas em geral, pelo apoio constante e irrestrito Às/aos Donat@s, porque amig@s não seria suficiente Às meninas da OhRepiDays, por não só me aguentarem, mas me ajudarem a ultrapassar essa fase A cada like em posts sobre o TCC, a cada “nossa, que tema legal” Ao Yann Tiersen, por ter criado a trilha sonora de Amélie Poulain, que tantas vezes me inspirou À orientação da Priscila e companhia da Maki À Socorro e ao Pedro, pela revisão relâmpago À FAU, por ser “A” FAU A seja lá qual for a energia, vibe, luz, cor, SOMETHING que faz com que nossa existência.. exista A mim, porque eu consegui! YEI! À Valentina, um amor à primeira lambida e uma companheira de passeio, soneca e brincadeira.
QUE O MUNDO SEJA FEMINISTA.
SUMÁRIO 6 1. INTRODUÇÃO 7 7 7 7 8 8
1.1. Proposta de projeto 1.2. Objetivos 1.3. Justificativa 1.4. Métodos e procedimentos 1.5. Resultado 1.6. Resumo dos capítulos
12 2. FEMINISMO E LINGUAGEM GRÁFICA FEMINISTA 12 15 17 19 24 29 31 31 33 33 34 35 36 36 37 37
2.1. Movimento feminista 2.2. Comunicação, cultura e a mistificação de imagens 2.3. Ideologia de gênero 2.4. Representações das mulheres 2.5. O movimento feminista na arte segundo o documentário Women’s art Revolution 2.6. Linguagem gráfica feminista 2.6.1. Judy Chicago 2.6.2. Barbara Kruger 2.6.3. Sheila Levrant de Bretteville 2.6.4. Linder Sterling 2.6.5. Elisa Riemer 2.6.6. Kaol Porfírio 2.6.7. Carol Rosseti 2.6.8. FCKH8.com 2.6.9. Who needs feminism 2.6.10. Jinan Younis
38 3. COLETIVOS FEMINISTAS 38 38 39 42 48 48 48 48 50 50 51
3.1. Pesquisa com coletivos feministas 3.2 Entrevistas pessoais 3.3. Questionário online 3.4. Resultados dos questionários e entrevistas 3.5. Artefatos gráficos produzidos por coletivos, ONGs e projetos feministas 3.5.1. Coletivo Feminista Inversas 3.5.2. Feminiciantes 3.5.3. Coletivo Feminista Rosa Lilás - Sorocaba 3.5.4. Coletivo Feminista Madame Satã 3.5.5. Marcha Das Vadias 3.5.6. Coletivo Feminista Yabá
52 4. DIRETRIZES PARA O TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO 52 52
4.1. Requisitos de projeto 4.2. Ferramentas de projeto
54 5. FEMINISMO NA ADOLESCÊNCIA E NAS ESCOLAS 54 58 59 60 63 64
5.1. Manifestações de gênero durante a adolescência na periferia 5.2. Adolescência e feminismo na escola 5.2.1. Proposta de oficina 1 5.2.2. Resultado da oficina 1 na Escola Estadual Emygdio de Barros 5.2.3. Painel da oficina 1 na Escola Estadual Emygdio de Barros 5.3. Conclusões sobre adolescência na escola relacionada ao feminismo
66 6. FANZINES 66 68 70 73 74 77 77 77 79 79 81 81 82 82 82
6.1. O que são fanzines 6.2. Como surgiram os fanzines 6.3. Linguagem gráfica dos fanzines 6.4. Fanzines, internet, cenário atual 6.5. Primeiros fanzines no movimento feminista 6.6. Fanzines no movimento feminista atual 6.6.1. Artemis 6.6.2. Alarme Feminista 6.6.3. Xereca 6.6.4. Zine XXX 6.6.5. Kólica Social 6.6.6. Clit Zine 6.6.7. Capitolina 6.6.8. Zine das Zinas 6.6.9. Arminina
84 DESENVOLVIMENTO DE PROJETO DE FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES 84 84 87 87 89 90 90 91 91 93 93
7.1. Matriz de marca 7.1.1. Matriz de marca das referências visuais/projetuais coletadas 7.2. Mapas mentais 7.2.1. Mapa mental do movimento feminista 7.2.2. Mapa mental da adolescência relacionada ao feminismo 7.3. Grupo focal 7.3.1. Debate com feministas 7.4. Decks 7.4.1. Deck de borboletas 7.4.2. Deck de luminárias 7.4.3. Deck de flores
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7.4.4. Deck de sensações 7.4.5. Resultado final dos decks 7.5. Brainstorming 7.5.1. Brainstorming de seções para o fanzine 7.5.2. Brainstorming de nomes para o fanzine 7.6. Questionário online 7.6.1. Questionário online para decisão do nome do fanzine 7.7. Braindumping visual 7.8. Estudos da personagem 7.9. Estudos de layout e de elementos da identidade visual 7.10. Elaboração da história em quadrinhos
106 8. CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES 106 106 106 108 109 109 109 109
8.1. Papel, formato e cor 8.2. Capa 8.3. História em quadrinhos 8.4. Relatos 8.5. Conteúdo 8.6. Página da convidada 8.7. Glossário 8.8. Cruzadinhas
118 9. CONCLUSÕES 120 10. REFERÊNCIAS
1. INTRODUÇÃO As origens do movimento feminista e sua explosão durante as décadas de 1960 e 1970 não deveria causar espanto algum a uma estudante de sétimo ano da universidade. Entretanto, foi sim com espanto (e muita emoção) que percebi meu enorme déficit de informação sobre o tema. Por um lado havia uma notícia ótima: um enorme caminho já foi trilhado, temos base histórica, teórica, prática, há muito que se estudar e aprender, não estamos sozinhas. Por outro lado: onde essa informação foi parar, se não em algum lugar de destaque no meio da quantidade exaustiva de informações que recebemos da escola, da publicidade, da arte, de nossos pais? Em um pequeno aprofundamento nos temas comunicação e feminismo detectei algumas causas desta aparente falta do tema. A cultura de massa, que se estabelecia pouco antes da explosão do movimento, colaborou muito para que os mesmos ideais defendidos fossem distorcidos, no que “meu corpo, minhas regras” se traduziu (numa tradução muito mal feita) em publicidade machista, mais uma vez reduzindo a mulher ao próprio corpo. “We can do it” se transformou em jornada dupla para as mulheres, sem que fosse estimulado um peso equivalente ao sexo oposto. Numa sociedade patriarcal capitalista não é de se esperar que repensassem as formas de comunicação para finalmente igualar o valor percebido dos gêneros, ou é? A Revolução começou, e começou muito bem. Mas ainda há muito que ser feito. Foi a partir do meu feed do Facebook (e de uma amiga em especial) que as questões do movimento feminista passaram a fazer parte, conscientemente, do meu dia-a-dia. A seleção de conteúdo conforme meus likes funcionou a meu
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favor (obrigada), então fui incapaz de escolher outro tema para meu trabalho de conclusão de curso: era estudar feminismo ou ficar maluca, acredite. Minha forma de contato com o tema destacou esta (ainda) nova forma de comunicação: internet. Um novo formato de ativismo para um novo formato de sociedade. Apesar de nem tudo ter mudado, nossa geração colheu frutos (saborosíssimos) das conquistas em prol da igualdade de gênero. Meninas e mulheres mais esclarecidas e livres, novos formatos de relacionamentos, novas relações com a sexualidade, novos direitos. Não vai ser tão fácil nos enganar. Imagine as próximas. A pesquisa revelou um universo inteiro de ativismo online, com ou sem conexões com o mundo do lado de fora das telas. Além disso, um grande número de coletivos formados há no máximo três anos revela uma tendência nova: seria o começo de uma nova explosão? Além da militância com seu formato e temas mais tradicionais, novos temas são alcançados, dos quais se destacam a representatividade nos filmes, novelas e na publicidade, que pipocam dia sim, dia não, em grandes debates, estes sim, transbordando para o mundo real. Qual o papel do design neste cenário? O que pode ser feito para colaborar com este movimento? São estas as questões que me proponho a estudar. Não na perspectiva de um resultado final e completo, mas com a consciência de que qualquer pequeno passo neste sentido é positivo para minha evolução e de outras tantas meninas e mulheres.
INTRODUÇÃO CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES
1.1. PROPOSTA DE PROJETO A proposta de projeto elaborada consiste na criação de fanzine, com extensão para o meio virtual, visando a conscientização sobre algum tema do movimento feminista para garotas adolescentes.
comunicação e, consequentemente, disseminação, reforço e transformação da cultura, faz parte deste processo que mantém a ideologia machista na normalidade. A relevância da proposta consiste na necessidade de alterar este cenário.
1.4. MÉTODOS E PROCEDIMENTOS 1.2. OBJETIVOS O objetivo geral desta proposta é auxiliar na promoção dos ideais feministas para meninas adolescentes, simplificando o primeiro contato destas meninas com o tema e também facilitando a passagem para a vida adulta, visto que os temas do feminismo são recorrentes durante a fase da adolescência e a falta deste ponto de vista, julgo eu, complica esta fase, que já não é muito simples. Os objetivos específicos consistem em compreender as origens e história do movimento feminista, promover a conscientização sobre os ideais feministas, apoiar grupos feministas em suas ações e colaborar para a libertação pessoal das mulheres e/ou meninas atingidas, através da apropriação dos conceitos apresentados, autoconhecimento e questionamento de sua postura, bem como daqueles com quem se relaciona. 1.3. JUSTIFICATIVA A justificativa para desenvolvimento de projeto focado no movimento feminista está na tomada de consciência de que a nossa sociedade é, ainda, machista. O design, enquanto ferramenta de
Acerca dos métodos e procedimentos adotados, a primeira parte do estudo consistiu na realização de pesquisa bibliográfica e de campo, envolvendo revisão bibliográfica, entrevistas com representantes de coletivos feministas e aplicação de questionário online para membros de coletivos feministas. A revisão bibliográfica abordou temas que relacionam a comunicação e o movimento feminista, a fim de fundamentar a proposta. Foram destacados alguns tópicos, são eles: o histórico do movimento feminista, as relações entre comunicação e cultura, a ideologia de gênero, as representações das mulheres, o movimento feminista na arte (segundo o documentário Women’s Art Revolution) e a linguagem gráfica feminista. As entrevistas a coletivos foram importantes para melhor imersão no contexto. Foram feitas duas entrevistas, ambas com representantes de coletivos universitários, um deles ativo há cinco anos e outro recém-formado. Com elas foi possível entender melhor a realidade destes coletivos, suas formas de atuação, desafios, o que há ou não em comum entre eles e também com os demais coletivos, universitários ou não. Finalizando a primeira etapa do Trabalho de Conclusão de Curso, foi feito um questionário online para definir a demanda do projeto. O
CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES INTRODUÇÃO
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questionário foi enviado via Facebook para os perfis e páginas de coletivos, projetos e ONGs feministas. A importância deste recorte de respondentes é que sejam pessoas já iniciadas no tema, configurando algo como especialistas. Foram recebidas 89 respostas, das quais 78 respondentes fazem parte de pelo menos um coletivo, 4 fazem parte de algum projeto relacionado ao feminismo, 6 fazem parte de frentes do movimento feminista, 1 participa de um grupo de estudos e 1 não participa de nenhum coletivo, ONG ou projeto feminista. Iniciando a segunda etapa do Trabalho de Conclusão de Curso, foi definida a proposta de projeto, assim como os requisitos e as ferramentas a serem empregadas no processo. Para melhor embasar o projeto, uma nova pesquisa foi realizada. A pesquisa foi focada em dois temas principais: os fanzines e a adolescência, relacionada ao feminismo e ao ambiente da escola. Buscando conhecimentos sobre estes temas, foi realizada revisão bibliográfica de artigos e livros sobre a adolescência e feminismo na periferia e sobre fanzines, além de pesquisa de campo com oficina, realizada na Escola Estadual Emygdio de Barros, e de um levantamento de fanzines feministas atuais. Por fim, o desenvolvimento do projeto de fanzine envolveu o uso dos métodos e ferramentas: matriz de marca das referências visuais e projetuais coletadas; mapa mental do movimento feminista e da adolescência relacionada ao feminismo; grupo focal com feministas; decks de imagens; brainstorming de seções para o fanzine e de nomes para o fanzine; questionário online para escolha do nome do fanzine; braindumping visual, estudos da personagem e estudos de layout e de elementos da identidade visual.
1.5. RESULTADO O resultado da realização desta proposta de Trabalho de Conclusão de Curso consiste, não apenas neste volume, que oferece um resumo de uma
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série de tópicos relacionados ao movimento feminista e ao universo da publicação independente e de militância feminista, mas também na proposta de um fanzine que, acreditamos, contribui para o entendimento do feminismo por adolescentes na medida em que apresenta conteúdos relevantes, organizados e resumidos de forma a gerar interesse e empatia pelo tema. O fanzine apresentado faz parte de uma sequência que será desenvolvida independentemente do Trabalho de Conclusão de Curso, pelo interesse da autora em seguir os estudos sobre o tema e continuar contribuindo para o movimento feminista. A sequência de fanzines deverá seguir os mesmos conceitos ideológicos e de identidade visual que serão apresentados no capítulo referente deste volume. Além disso espera-se que pela estética do material e pela abordagem próxima ao público, combinadas à futura realização de mais oficinas em escolas, aconteça uma aproximação de meninas ao universo de publicações independentes, tanto como leitoras quanto como autoras e produtoras, por tomarem consciência de que é possível produzir o próprio fanzine e consumir esta cultura, livre dos padrões de mercado e mais próxima do consumidor, e do quanto este processo é enriquecedor.
1.6. RESUMO DOS CAPÍTULOS O capítulo Feminismo e linguagem gráfica feminista apresenta o embasamento teórico para a proposta de projeto, assim como conteúdos que foram aproveitados no projeto final. Primeiramente, é apresentado um resumo sobre o histórico do movimento feminista, baseado nos livros O que é feminismo, de Alves e Pitanguy, (1985) e Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado, organizado por Godinho e Venturi (2009). Em seguida, são apresentados os conceitos de cultura e comunicação que dão base para uma visão do design como possível forma
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de construção, reforço e transformação da cultura. Para isso foram estudados os livros Cultura de massas no século XX, de Morin (1967), e A criação de mitos na publicidade,de Randazzo (1993), além do texto Ways of seeing, de John Berger (1972). O estudo levou a uma argumentação a respeito das formas como a comunicação constrói a cultura e como isso pode, infelizmente, acontecer de forma negativa, quando a comunicação ajuda a sustentar a homogeinização de padrões culturais e a dominação de um grupo sobre outro. Partindo desta assimetria construída, entre outros fatores, pela comunicação massiva e machista, é apresentado o conceito de ideologia de gênero, para o qual foi estudado, entre outros, o livro Gênero: uma categoria útil para análise histórica, de Joan Scott (1989). Tanto a ideia de que o gênero é construído socialmente quanto os conceitos da comunicação massificada, como meio desta construção, levaram a um estudo das representações das mulheres. Nesse momento foram apontadas características das representações nos livros didáticos e publicidade, de acordo com Neide Moura (2014) e Patrícia Lessa (2005), estudos complementados pela pesquisa de Godinho e Venturi já citada. Por fim, esta etapa da pesquisa foi concluída com um estudo sobre o movimento feminista na arte, segundo o documentário Women’s Art Revolution (2010), além de um levantamento de algumas artistas, designers e projetos que utilizam a comunicação visual como meio de expandir o movimento feminista. O capítulo Coletivos feministas reúne as informações coletadas em entrevistas, realizadas com representantes de coletivos feministas, e questionário online, transmitido para coletivos feministas. Os resultados são apresentados em gráficos e citações, tanto das entrevistas quanto das respostas obtidas no questionário online, e analisados, gerando conclusões sobre a demanda do projeto realizado. Também são apresentados exemplos de artefatos gráficos produzidos por
alguns coletivos, ONGs e projetos que responderam ao questionário. Em Diretrizes para o Trabalho de Conclusão de Curso são apresentados os requisitos de projeto, que foram definidos de acordo com a pesquisa descrita anteriormente. Além disso, o capítulo apresenta sumariamente as ferramentas que foram selecionadas para serem utilizadas no desenvolvimento do projeto, com base no livro de Ellen Lupton, Intuição, Ação, Criação - Graphic Design Thinking. Os capítulos seguintes registram a pesquisa e o desenvolvimento da proposta de projeto: criação de fanzine, com extensão para o meio virtual, visando a conscientização sobre algum tema do movimento feminista para garotas adolescentes. Primeiramente, em Feminismo e Adolescência nas escolas, foi realizada uma pesquisa sobre as manifestações de gênero no cotidiano de crianças e adolescentes de diversas regiões do Brasil, todas em situação de pobreza. Foram relacionados os artigos O cotidiano sexuado de meninos e meninas em situação de pobreza, de Laura Susana Duque-Arrazola (1997), O traçado da vida: gênero e idade em dois bairros populares do Rio de Janeiro, de Maria Luiza Heilborn (1997), Socialização de gênero e adolescência, de Martha A. Traverso-Yépez e Verônica de Souza Pinheiro (2005), Como é ser adolescente do sexo feminino na periferia?, de Ada Cristina Guimarães de Sousa e Shyrlene Nunes Brandão (2008), e o artigo de Lena Lavinas (1997) com conteúdos introdutórios para leitura do livro Quem mandou nascer mulher?. Ainda no mesmo capítulo, foi apresentada uma proposta de oficina para ser realizada em escolas, com o objetivo de aferir sobre os conhecimentos dos alunos e alunas sobre o feminismo, bem como de gerar o interesse destes sobre o tema e romper com possíveis preconceitos. O resultado desta oficina, realizada na Escola Estadual Emygdio de Barros, é apresentado na sequência do capítulo e, enfim, são apresentadas conclusões que colaboram para o desenvolvimento do projeto.
CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES INTRODUÇÃO
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Tendo em vista a proposta de criação de fanzine, decidimos que seria importante estudar um pouco mais sobre os fanzines. O resultado deste estudo, baseado no livro Fanzines the DIY revolution (2010), e nos artigos Sem futuro: the graphic language of São Paulo city punk (2011), e Livros, fanzines e outras publicações independentes. Um percurso pela ‘cena’ do Porto (2011), foi apresentado no capítulo Fanzines. Em Desenvolvimento de Projeto de Fanzine Feminista para Adolescentes foram apresentadas as etapas do projeto de fanzine, além de breves explicações das ferramentas utilizadas, com base no livro Intuição, Ação, Criação - Graphic Design Thinking, de Ellen Lupton. Por fim, em Casula, um fanzine feminista e Conclusões foi apresentado o resultado final do projeto de fanzine, destacando elementos gráficos que compõem a identidade do projeto, motivações que guiaram as escolhas estéticas e ideológicas, e as conclusões da autora sobre o desenvolvimento do projeto como um todo.
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INTRODUÇÃO CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES
2. FEMINISMO E LINGUAGEM GRÁFICA FEMINISTA 2.1. MOVIMENTO FEMINISTA O livro O que é feminismo, de Alves e Pitanguy (1985), apresenta um resumo do histórico do movimento feminista e de suas principais frentes. Segundo as autoras, uma das primeiras manifestações do movimento feminista aconteceu em Roma, em 195 D.C., quando mulheres dirigiram-se ao Senado Romano protestando pelo uso feminino dos transportes públicos (ALVES e PITANGUY, 1985, p.14). Na ocasião, os transportes eram de uso exclusivo dos homens e as mulheres tinham que andar a pé. As autoras apontam que durante a Idade Média as mulheres realizaram muitos tipos de atividade além da esfera doméstica, exerciam quase qualquer tipo de profissão, ainda que com salários menores, tinham o direito à propriedade e à sucessão (ALVES e PITANGUY, 1985, p.16). A atividade feminina na esfera pública estava ligada ao afastamento dos homens por motivo de guerra. A Caça às bruxas, que se iniciou na Idade Média e terminou no século XVI, foi um verdadeiro genocídio contra o sexo feminino na Europa e na América e se justificava em uma suposta inferioridade biológica do sexo feminino, assim como em uma “desordem moral” (ALVES e PITANGUY, 1985, p.22). Tudo baseado em teorias não comprovadas sobre o funcionamento do corpo humano, além de teorias religiosas, como a de que Eva levou
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Adão ao pecado. Além disso, as autoras apontam uma disputa pelo espaço da medicina, que estava se definindo como um espaço masculino (ALVES e PITANGUY, 1985, pp.20-25). Portanto, seria preciso tirar esta função das parteiras e curandeiras. Segundo as autoras, o Renascimento significou mais um regresso para a posição feminina na sociedade (ALVES e PITANGUY, 1985, p.26). A reintrodução da legislação romana, no século XVIII, reduziu os direitos da mulher, restringindo seu direito à herança, reger seus próprios bens e representar-se na justiça. No campo profissional, a valorização do trabalho como forma de transformação do mundo, decorrente da ideologia do período, fez com que as mulheres fossem ainda mais afastadas da esfera pública e determinadas atividades (como a fabricação de cerveja, velas, ofícios de serralheria e fundição) foram gradativamente tornado-se do domínio masculino (ALVES e PITANGUY, 1985, p.26). As Corporações de Ofício se fecharam à participação feminina. Junto à mão de obra infantil, a mão de obra feminina foi explorada principalmente em determinados ramos de produção, como a indústria têxtil, como parte do mecanismo de acumulação de capital (ALVES e PITANGUY, 1985, p.27). É também neste período, a partir do século XVII e XVIII, que mulheres passam a ser contratadas a domicílio, como uma forma de geração de renda alternativa. A valorização do conhecimento decorrente do Renascimento deu nova perspectiva à instrução masculina, mas a educação feminina
FEMINISMO E LINGUAGEM GRÁFICA FEMINISTA CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES
sofreu revezes tanto no preparo educacional quanto na formação intelectual (ALVES e PITANGUY, 1985, p.28). Enquanto o ensino público se expandia na Europa, a defasagem entre o número de escolas femininas e masculinas é imensa “em 1790, na Diocese de Rouen, por exemplo, a relação de escolas para meninos e para meninas é de 4 para 1” (ALVES e PINTAGUY, 1985, p.28). As autoras apontam ainda que o currículo feminino era focado no aprendizado de atividades domésticas e que não as preparava para o ensino superior, ao qual as mulheres sequer tinham direito. Foram os primórdios do Capitalismo que inspiraram maiores manifestações pelos direitos femininos na América (ALVES e PITANGUY, 1985, p.29). No século XVIII, marcado por intensa participação das massas na política, a luta em defesa da igualdade na América não estendia suas conquistas para o lado das mulheres. Na França, neste mesmo século, as mulheres que lutavam ao lado dos homens tampouco foram consideradas nas conquistas políticas. É neste momento que o feminismo adquire características de uma prática de ação política organizada, pelo contato das mulheres com o processo revolucionário e também com a consciência de seu atual lugar na sociedade. Entretanto, em 1795 a Aliança Nacional Francesa passou um Decreto que circunscreveu a mulher ao ambiente doméstico, ou seja, reprimiu sua participação na vida pública (ALVES e PITANGUY, 1985, pp.32-35). No século XIX, com o avanço do sistema
Capitalista, mudanças no processo produtivo e organização do trabalho, a mão-de-obra feminina passou a ser requisitada em fábricas, mas com salários menores e tarefas menos qualificadas. Os movimentos operários repudiavam o ingresso das mulheres por considerá-las como concorrentes, uma ameaça. Destacaram-se líderes operárias como Jeanne Deroin e Flora Tristan. Ainda no século XIX a recém-formada teoria Socialista considerava a condição feminina como parte das relações de exploração da sociedade de classes, dando uma nova leitura ao movimento (ALVES e PITANGUY, 1985, pp.36-40). As autoras comentam também sobre o movimento sufragista nos Estados Unidos, Inglaterra e Brasil. Isto é, quando fora proclamado o Sufrágio Universal nestes países, as mulheres não estavam incluídas no “universo”. Passaram-se mais 70 anos até que as mulheres conquistassem o direito ao voto nos Estados Unidos (1920) e na Inglaterra (1928). No Brasil o direito ao voto para as mulheres só foi conquistado em 1932. O movimento sufragista mobilizou até 2 milhões de mulheres, constituindo “um dos movimentos políticos de massa de maior significação no século XX” (ALVES e PITANGUY, 1985, p.44). Mas, conforme apontam as autoras, o movimento é muito pouco destacado nos livros de história. Com a conquista do sufrágio feminino, de forma geral, o movimento sofreu uma desmobilização. Além disso há de se considerar que foi entre as décadas de 30 e 40 do século XX que os regimes
CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES FEMINISMO E LINGUAGEM GRÁFICA FEMINISTA
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nazista e fascista ascenderam e aconteceu a 2ª Guerra Mundial. Neste contexto destacam-se as teóricas do movimento feminista Simone de Beauvoir, Betty Friedan, Kate Millet, Juliet Mitchell e, no Brasil, Heleieth Saffioti. A partir de 1960 o feminismo incorporou novas frentes, passando a questionar as raízes culturais das desigualdades existentes. Para além das esferas do trabalho e educação, o feminismo buscou a criação de uma identidade própria das mulheres, que superasse as hierarquias (ALVES e PITANGUY, 1985, pp. 49-54). Nos anos 1960 o movimento lutou contra o colonialismo e a discriminação racial, pelos direitos das minorias e pelas reivindações estudantis. Nos anos 1970 o movimento ressurgiu como movimento de massas, adquirindo nova força política e sendo visto como potencial de transformação social. Neste momento surgiram os grupos de reflexão como forma de romper com o isolamento. Os grupos constituíram “um espaço próprio para expressar-se sem a interferência masculina, para compreender-se através de sua voz e de suas companheiras” (ALVES e PITANGUY, 1985, p. 67). No Brasil também ocorreu uma desmobilização após a conquista do sufrágio para as mulheres. A ascenção do Estado Novo, em 1937, também foi decisiva na desmobilização do movimento feminista assim como de outros movimentos reivindicatórios. Em 1945, com a democratização, houve um crescimento da participação feminina na política, entretanto sem cunho necessariamente feminista. Com o golpe militar, em 1964, algumas mulheres se envolveram nos movimentos de oposição ao regime, atos e manifestações, mas a mobilização só ganhou nova visibilidade em 1975, quando aconteceu a semana de debates sobre a condição feminina. No mesmo ano foi fundado o Centro da Mulher Brasileira, e surgiram os jornais Brasil-Mulher e Nós Mulheres. Até o final de 70 foram formados novos núcleos e grupos de reflexão. Em 1980 e 81 o jornal Mulherio preencheu a lacuna deixada
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pela suspensão dos outros dois. Surgiu no Brasil toda uma corrente teórica disposta a investigar os avanços do movimento feminista (ALVES e PITANGUY, 1985, pp.70-72). Em 2003 o Governo Federal brasileiro criou a Secretaria de Políticas para as Mulheres e em 2006 foi aprovada a Lei Maria da Penha, configurando novas conquistas para o movimento. A pesquisa Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado revelou uma série de estatísticas de 2009, comparadas às anteriormente coletadas (2001), para definir os avanços na mentalidade e práticas da população em relação às mulheres, tendo como possíveis catalisadores estas duas últimas conquistas (GODINHO e VENTURI, 2013). Em relação à 2001 os resultados são positivos, com a redução de 8 para 5 mulheres espancadas a cada dois minutos, a percepção geral das entrevistadas de que “é melhor ser mulher hoje do que há 20 ou 30 anos” (GODINHO e VENTURI, 2013, p.39), e uma porcentagem maior de mulheres que se declaram feministas (de 21% em 2001 para 31% em 2009). Mas ainda é espantoso que a cada dois minutos 5 mulheres sejam espancadas. Assim como, apesar de uma mudança da percepção de quem deve fazer os trabalhos domésticos - 84% dos homens e 94% das mulheres concordaram que “homens e mulheres deveriam dividir por igual o trabalho doméstico” (GODINHO e VENTURI, 2013, p.42) - a grande maioria do trabalho doméstico continua sendo feito pelas mulheres (a jornada semanal feminina de trabalho doméstico é de 29 horas e 21 minutos, contra 8 horas e 46 minutos gastos pelos homens) assim como o cuidado de crianças e idosos (GODINHO e VENTURI, 2013). Com base nas taxas contraditórias de opiniões masculinas de que o machismo existe (90%) e de homens que se declaram machistas (26%), apresentadas por Godinho e Venturi (2013, p.43) concluo que existe ainda a necessidade de que os conceitos sejam “digeridos” e traduzidos da esfera geral de “machismo” para as atitudes cotidianas
FEMINISMO E LINGUAGEM GRÁFICA FEMINISTA CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES
que constituem ações machistas. Enfim, ainda há muito que ser feito para conscientizar a sociedade sobre o movimento feminista de forma mais aprofundada, refletindo em mudanças no cotidiano das pessoas e não só na aceitação do discurso, assim como há muito que ser feito para conhecimento geral e cumprimento das leis já aprovadas, bem como para mais avanços da luta feminista.
2.2. COMUNICAÇÃO, CULTURA E A MISTIFICAÇÃO DE IMAGENS O raciocínio apresentado a seguir expõe as conexões entre a esfera da cultura e da comunicação visual, ou seja, de que maneiras a comunicação visual opera e como pode contribuir para a transformação da cultura. Compreender estas relações é importante para o desenvolvimento de um projeto de design gráfico que promova a conscientização sobre o feminismo já que o design gráfico é uma forma de comunicação visual. Partindo do princípio de que a comunicação está inserida na cultura de tal forma que a constrói, reforça e modifica, é preciso definir o termo cultura e entender de que forma a comunicação tem agido sobre ela.
os deuses). Uma cultura fornece pontos de apoio imaginários à vida prática, pontos de apoio práticos à vida imaginária; ela alimenta o ser semi-real, semi-imaginário, que cada um secreta no interior de si (sua alma), o ser semi-real, semi-imaginário que cada um secreta no exterior de si e no qual se envolve (sua personalidade) (MORIN, 1967, p.17).
A definição de Morin aponta as ações de projeção e identificação, fundamentais para que a comunicação aconteça e construa a cultura. A projeção consiste no desejo de encarnar de alguma forma o símbolo comunicado. Isto é, vejo isto e quero ser, ter, parecer com isso. Já a identificação consiste na percepção de uma condição igual ou parecida com a própria, vejo isso e sou, tenho, pareço com isso. De forma análoga, Paulo Freire (1980) descreve a comunicação como um diálogo. Neste sentido, uma série de diálogos são capazes de formar um discurso, uma cultura. Os diálogos não são impostos ou controlados, eles simplesmente acontecem, dialogar faz parte da natureza humana. Apesar de a descrição de Paulo Freire não se referir à comunicação no sentido midiático, é perfeitamente aplicável também nesse contexto. Comunicação [é] a coparticipação dos sujeitos no ato de pensar... implica numa reciprocidade que não pode ser rompida. O que caracteriza a comunicação enquanto este comunicar comunicando-se, é que ela é diálogo, assim como o diálogo é comunicativo. A educação é comunicação,
Podemos adiantar que uma cultura constitui
é diálogo, na medida em que não é transferência
um corpo complexo de normas, símbolos, mitos
de saber, mas um encontro de sujeitos interlocu-
e imagens que penetram o indivíduo em sua in-
tores que buscam a significação dos significados
timidade, estruturam os instintos, orientam as
(FREIRE, 1980, pp.70-73).
emoções. Esta penetração se efetua segundo trocas mentais de projeção e de identificação polarizadas nos símbolos, mitos e imagens da cultura como nas personalidades míticas ou reais que encarnam os valores (os ancestrais, os heróis,
Tais ideias transmitem uma fluidez encantadora, mas o território da comunicação é, na realidade, bastante perigoso. Perigoso porque não envolve apenas diálogos, mas também os interesses
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implícitos, e interesses nem sempre estão preocupados com a justiça. Além disso, diferente do diálogo entre duas pessoas, definido por Freire, o diálogo promovido por mídias é, em geral, unidirecional, dando pouca ou nenhuma possibilidade de resposta, na mesma proporção da emissão, ao receptor. John Berger apresenta o conceito de mistificação de imagens, responsável por significar de maneira falsa um conteúdo, para justificar o privilégio de uma classe sobre outra. A mistificação, segundo Berger, prejudica o processo comunicativo verdadeiro, impedindo que os sujeitos se situem na história através das representações, projetando-se ou identificando-se. Quando “vemos” uma paisagem, nos situamos nela. Se “víssemos” a arte do passado, nos situaríamos na história. Quando somos impedidos de vê-lo, somos privados da história que nos pertence. A quem beneficia esta privação? No fim, a arte do passado está sendo mistificada por que uma minoria privilegiada se esforça por inventar uma história que justifique retrospectivamente o papel das classes dirigentes, quando tal justificativa já não tem sentido atualmente. E assim é inevitável a mistificação. [...] É como o feixe de um farol, mas ao invés de luz emitida para fora, aparências têm se movido para dentro. As convenções chamaram estas aparências de realidade (BERGER, 1972, pp.11,16).1
Em seu livro, Berger discorre sobre o papel da arte enquanto representação da realidade para aquele que a observa. Segundo o autor, ao retratar uma situação, a arte como que criaria uma 1 When we ‘see’ a landscape, we situate ourselves in it. If we ‘saw’ the art of the past, we would situate ourselves in history. When we are prevented from seeing it, we are being deprived of the history which belongs to us. Who benefits from this deprivation? In the end, the art of the past s being mystified because a privileged minory is striving to invent a history which can retrospectively justify the role of the ruling classes, and such a justification can no longer make sense in modern terms. And so, inevitably, it mystifies. [...] It is like a beam from a lighthouse - only instead the of light travelling outwards, appearences travel in. The conventions called those appearences reality.
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realidade, na medida em que induz a identificação do leitor com a situação retratada e a repetição desta. Neste caso é possível traçar um paralelo entre arte e a comunicação visual como um todo, inclusive o design, já que ao criar representações as diferentes formas de comunicação visual participam da construção da cultura. Assim, concluo que toda forma de representação é responsável pelo discurso que defende, sendo possível que esta representação seja utilizada de forma verdadeira, realmente embasada na realidade, ou falsa, criando a chamada mistificação. Morin (1967) aponta na cultura de massa uma tendência ao sincretismo. Isto é, a tendência a homogeneizar sob um denominador comum a diversidade dos conteúdos. Na tentativa de servir ao mercado, ela busca pelo público universal e logo destrói sua possibilidade de constituir uma cultura plena. Resta saber o resultado da homogeneização. Mas, se considerarmos os fatores mercado, classe dominante e capitalismo, não fica difícil traçar um paralelo com o conceito de mistificação de Berger, isto é, uma sociedade baseada na competição pelo acúmulo de capital e que, para alcançá-lo, utiliza-se, entre outros meios, de padrões homogeneizados de representações, acaba por criar representações mistificadas. Randazzo, por sua vez, descreve as formas como a publicidade pode se apropriar da mitologia de uma cultura. Descreve a mitologia como “qualquer coisa que de alguma forma mitifica ou ‘enfeita a realidade’” (RANDAZZO, 1993, p.58) ou, na definição de James Heisig, “todas as formas de ficção narrativa simbólica mostrando padrões recorrentes universais e coletivos de resposta psíquica às experiências da vida” (RANDAZZO, 1993, p.58). Ou seja, a mitologia surge da cultura, destacando padrões e, por vezes, exagerando-os. Tais padrões são os arquétipos, essências absolutas que se manifestam nas coisas e pessoas. Sendo assim, proponho o esquema apresentado na figura 1. Não haveria problemas na transmissão
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CULTURA
REPETIÇÃO DOS ARQUÉTIPOS
PROJEÇÃO OU IDENTIFICAÇÃO
MITOLOGIA
ARQUÉTIPOS
REPRESENTAÇÃO DE ARQUÉTIPOS NAS DIVERSAS FORMAS DE COMUNICAÇÃO
de arquétipos se não vivêssemos em uma sociedade desigual. Do ponto de vista do movimento feminista, há muito que se discutir e transformar sobre as formas de representação do universo feminino pela comunicação em geral. É preciso combater a mistificação e a homogeneização nas representações que, combinadas à ideia de arquétipos, reproduzem ideias muitas vezes preconceituosas e limitadas da realidade. Ideias estas que colaboram para reforçar e manter hierarquias baseadas em classe, raça e gênero. Ora, se concordarmos que chegamos a um ponto no qual literatura, cinema, design, publicidade entre outras formas de comunicação, transmitem valores mistificados, que colaboram para opressão de um grupo e dominação por outro, então a reação óbvia é a apropriação destes e de tantos meios quanto forem necessários para desmistificar valores como a hierarquia de gênero, classe e raça.
Figura 1: Esquema do ciclo cultura-mitologia-representação, Luana Farias.
2.3. IDEOLOGIA DE GÊNERO O fundamento básico da teoria feminista consiste na ideologia de gênero, “primeiramente interessada nas maneiras como as formas simbólicas se entrecruzam com relações de poder, isto é, como o sentido serve para estabelecer e sustentar relações de dominação” (THOMPSON, 1995 apud MOURA, 2014, p.3). Neide Cardoso de Moura (2014) aponta que a ideologia de gênero considera as formas simbólicas e seu sentido como constitutivos da realidade social, ativamente envolvidos tanto em criar como em manter relações entre indivíduos e grupos. Compara ainda as ideias de Thompson (1995) e de Scott (1986), uma vez que ambos ocuparam-se de explicar como relações assimétricas são apenas construções sociais, embora sejam apresentadas como naturais. Da consciência desta assimetria, materializada em salários, direitos trabalhistas (ou melhor, na falta deles), normas de convívio, enfim, em uma série de injustiças contra as mulheres, é que o movimento feminista se fundamenta.
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Conscientizando-se do fato de que as relações
constatavam nos comportamentos de homens
interpessoais contém também um componente
e de mulheres não eram dependentes do “sexo”
de poder e de hierarquia (homens versus mu-
como questão biológica, mas sim eram definidos
lheres, pais versus filhos, brancos versus negros,
pelo “gênero” e, portanto, ligadas à cultura. (PE-
patrões versus operários, hetero versus homosse-
DRO, 2005, p.78)
xuais, etc) o feminismo procurou em sua prática enquanto movimento superar as formas de organização tradicionais, permeadas pela assimetria e pelo autoritarismo. Assim, o movimento feminista não se organiza de uma forma centralizada, e recusa uma disciplina única, imposta a todas as militantes. Caracteriza-se pela auto-organização das mulheres em suas múltiplas frentes, assim como em grupos pequenos onde expressam as vivências próprias de cada mulher e onde se fortalece a solidariedade. Os pontos de vista e as iniciativas são válidos não porque se originam de uma ordenação central, detentora de um “monopólio da verdade”, mas porque são fruto da experiência específica e comum das mulheres. (ALVES e PITANGUY, 1985, p.9)
Para testar o quanto as reivindicações do movimento feminista são embasadas, basta pensar nas diferenças apontadas, diariamente e ao longo de nossas vidas, entre “coisas de menina” e “coisas de menino”. Basta entrar em uma loja de brinquedos onde, desde a infância, já começa a segmentação entre “Ben-10” e “Barbie”. Basta perceber como a maioria das piadas e desvalorizações cotidianas apelam para o lado feminino do alvo, ainda que não se trate de uma figura do sexo feminino. A partir da tomada de consciência desta segmentação construída, o movimento feminista tratou de inserir o conceito de gênero em suas discussões. E era justamente pelo fato de que as palavras, na maioria das línguas têm gênero, mas não tem sexo, que os movimentos feministas e de mulheres, nos anos 80, passaram a usar esta palavra “gênero” no lugar de “sexo”. Buscavam, desta forma, reforçar a ideia, de que as diferenças que
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A intenção por trás desta atitude é dar liberdade aos indivíduos para que se expressem além dos estereótipos impostos socialmente, tanto para mulheres quanto para homens. Isto porque o resultado da naturalização destes estereótipos é que alguns perfis são valorizados a despeito de outros, formando grandes preconceitos e terminando por naturalizar práticas machistas, homofóbicas e racistas. Acontece que tais ideias foram tão interiorizadas que nem se trata mais de evitar estas consequências, mas de revertê-las. O formato machista da sociedade renegou as características tidas como femininas (embora dependa substancialmente do seu exercício) e excluiu as mulheres da vida pública e política. Ou seja, as decisões políticas não envolveram um fórum feminino durante séculos, como já foi apontado anteriormente. De acordo com Michele Perrot, historicamente, dois estereótipos foram criados: os homens racionais e as mulheres emocionais, como se fossem duas espécies humanas. Essa premissa contribuiu para que se desenvolvesse a ideia de que as mulheres não poderiam estar à frente da política porque não agiriam de acordo com as necessidades da coletividade e sim pelos caprichos de sua emocionalidade. (LOSE e MATOS, 2013, p.390)
Joan Scott defende a definição de gênero baseada na conexão entre duas proposições: “gênero é um elemento constitutivo de relações sociais baseado nas diferenças percebidas entre os sexos, e o gênero é uma forma primeira de significar as relações de poder” (SCOTT, 1986, p.21). Aponta ainda, quatro elementos relacionados entre si: “símbolos culturalmente disponíveis que evocam representações múltiplas”; “conceitos normativos
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que colocam em evidência interpretações do sentido dos símbolos que tentam limitar e conter as suas possibilidades metafóricas”; “construção do gênero nos campos político, social e parental” e “identidade subjetiva” (SCOTT, 1986, p.21). A definição dos conceitos normativos em muito se aproxima do conceito de mistificação de imagens apresentado anteriormente, pois a autora aponta uma afirmação binária do sentido do masculino e feminino, e sobretudo a rejeição de outras possibilidades para que tais conceitos façam sentido. Isto é, apesar das contradições, a ideia dominante é afirmada, historicamente, como a única, assim “a história posterior é escrita como se essas posições normativas fossem o produto de um consenso social e não de um conflito” (SCOTT, 1986, p.21). O design, inserido no processo de comunicação, conforme apresentado anteriormente, é responsável pela veiculação dos símbolos, contribuindo com a manutenção dos conceitos vigentes bem como com a possível transformação e criação de novos conceitos. Acredito que é neste ponto que o design pode contribuir com o movimento feminista, na medida que represente visualmente seu objetivo de reestabelecer o espaço do imaginário feminino na sociedade, libertando os indivíduos para que expressem seus gêneros, sem que haja dominação de um sobre outro.
2.4. REPRESENTAÇÕES DAS MULHERES Randazzo (1993, pp.102-120) destaca dois arquétipos principais associados à feminilidade: um estático, a Grande Mãe; e um dinâmico, a virgem/donzela. Tanto os arquétipos femininos quanto os masculinos formam a personalidade de uma mulher mas as representações, como já foi
dito, tendem a homogeneizar os contrastes. Desta forma, conforme aponta Randazzo, mulheres e homens são empurrados para um padrão pré-definido. Apesar de termos grandes exemplos de mulheres guerreiras, este arquétipo é muito pouco direcionado às mulheres. Randazzo destaca ainda uma tendência para que surjam novos arquétipos femininos, uma nova mitologia feminina, tendência esta que se justifica pelo movimento feminista e pela mudança de hábitos das mulheres (1993, pp.131-135). Se esta tendência já se manifesta culturalmente, será que se manifesta também nas representações? A seguir apresento exemplos de estudos sobre a representação das mulheres em livros didáticos, na publicidade e na mídia, por considerar que tais exemplos constituem um bom recorte do universo de comunicação visual em que as pessoas estão inseridas, o qual influencia na construção da imagem pessoal e da cultura. Os estudos abordam os reflexos da mudança cultural da figura da mulher nas representações. Segundo Bittencourt “o livro didático é um importante veículo portador de um sistema de valores, de ideologia, de cultura. Várias pesquisas demonstram como textos e ilustrações de obras didáticas transmitem estereótipos e valores dos grupos dominantes, generalizando tema, como família, criança, etnia, de acordo com os preceitos da sociedade branca burguesa” (BITTENCOURT, 2004, p.73). Tendo isso em vista tal poder de veiculação de valores e ideologias, assim como o sexismo presente em nossa sociedade, a autora Neide Cardoso de Moura atualizou o estudo Relações de gênero em livros didáticos de Língua Portuguesa: permanências e mudanças (2007), para constatar o reflexo, ou não, das mudanças ocorridas nos materiais didáticos durante este período. O estudo abordou catorze livros didáticos de Língua Portuguesa destinados aos alunos do 5° ano do Ensino Fundamental, publicados entre 2006 e 2011, aprovados pelo Programa Nacional do
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Livro Didático. Os livros foram emprestados por escolas municipais no Rio Grande do Sul mas a autora ressalta que foram editados nas regiões sul e sudeste, regiões que detêm a supremacia editorial, ou seja, estes mesmos livros devem ser também utilizados em outras regiões do Brasil. O resultado não foi positivo. Os resultados encontrados nas teses e dissertações da CAPES, os quais tiveram como objeto de pesquisa e análise livros didáticos de diferentes disciplinas e níveis de ensino, denunciam que os mesmos não refletem e nem viabilizam as mudanças ocorridas na sociedade atual, mas as mantém invisíveis. Esse fato se comprova pela manutenção e perpetuação de modelos tradicionais e sexistas que direcionam homens à produção, ao espaço público, ao mercado de trabalho e
(atreladas à natureza, à intuição, à emoção), a razão tomada como novo termômetro social, cultural e histórico, das ditas sociedades civilizadas e, por outro lado, as mulheres objetos de desejo, tornadas objeto de consumo”. (LESSA, 2005, p.1). Tais perfis podem ser comparados aos arquétipos apresentados por Randazzo: a mulher atrelada à natureza é o arquétipo da Grande Mãe, o que define sua existência é sua natureza reprodutora, intuitiva, emotiva; a mulher objeto de desejo é a Donzela, o que define sua existência é o ponto de vista do homem que a ama, deseja e socorre. Ocorre ainda uma desvalorização destes arquétipos, pois entende-se que estão submetidos à figura do homem. Fica evidente a subordinação do lado feminino ao masculino. Lessa destaca ainda uma relação de consumo e reprodução dos símbolos consumidos:
mulheres à reprodução, à educação e ao cuidado com crianças. Essas constatações podem ser ex-
O primeiro pressuposto que será aqui defendido é
plicadas e compreendidas tanto pela estratégia
o de que a publicidade tem vendido a ideia das mu-
da eternalização da ideologia de gênero proposta
lheres como objeto de consumo, via produção e apro-
por Thompson (1995) como pela concepção de
priação dos papéis sexuais destinados a estas. O
Scott (1995), ao advertir que as formas hierár-
segundo pressuposto, a “Mulher” padrão ou as mu-
quicas de gênero são construídas e mantidas his-
lheres como sujeitos unificados, presas ao modelo,
tórica e socialmente. (MOURA, 2014, p.6)
ao padrão, tornam-se consumidoras desse modelo. Ou seja, ela é construída e constrói o modelo, num
A autora chega a resultados numéricos que revelam que até mesmo a quantidade de ilustrações de meninos/homens é maior do que a de meninas/mulheres: são 2.202 ilustrações masculinas contra 1.448 ilustrações femininas; revelando a “axiologia subjacente aos manuais escolares” (MOURA, 2014, p.10), isto é, uma hierarquia de valores implícita. Tal axiologia colabora com a noção de que o sexo masculino é o normal, enquanto que o feminino constitui uma exceção à regra. Patrícia Lessa, em Mulheres à venda (LESSA 2005), discute as representações da mulher na publicidade, revelando que dois perfis de mulher, antes defendidos nos discursos filosóficos e científicos, continuaram se perpetuando por meio da publicidade. São eles: “as mulheres inferiorizadas
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constante ir e vir. (LESSA, 2005, p.5)
Tal relação travada entre as consumidoras e a publicidade é extremamente perigosa se levarmos em conta o papel de constituição da identidade que a comunicação desempenha. A publicidade, comunicação empenhada primeiramente no lucro, “educa” as mulheres contra si mesmas, colaborando para que se submetam, por “vontade própria”, a um papel secundário na sociedade, que se vejam através dos olhos masculinos e que reduzam sua existência à imagem. Isso não é exclusivo à publicidade, como já afirmamos no presente estudo, mas talvez seja nela que as aparições mais medonhas deste sistema tomem forma. Também vale lembrar que este papel feminino não foi inventado pela
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publicidade, mas que, empenhados no lucro e tendo em vista as “preferências” do consumidor, a publicidade não só repete mas fortalece este ideário, mais uma vez reduzindo as mulheres a um espaço subordinado na sociedade. A primeira hipótese defende que a publicidade trabalha via desejo, via falta, e é demarcada por aquilo que não possuímos, porém desejamos possuir, sendo, portanto, um desejo produzido. Em decorrência, a segunda hipótese retrata que esses discursos pautam-se no ideário da essência feminina e da anatomia como destino, estando atrelada ao feminino a ideia de uma essência, geralmente vinculadas à natureza, à intuição, à emoção e à beleza. As mulheres estando, então, vinculadas ao conceito de beleza devem
produzir-se enquanto tal, ou seja, devem apropriar-se das técnicas e dos produtos necessários para tornarem-se belas. (LESSA, 2005, p.7)
A pesquisa de Lessa aborda ainda uma série de outdoors nas quais há fotos femininas. Para cada uma das imagens analisada é visível a construção da imagem da mulher cujas atitudes revelam seu interesse e preocupação em conquistar o sexo oposto, em primeiro (e talvez único) lugar. Em relação à publicidade que revela uma visão machista da sociedade, uma iniciativa em particular chama atenção. Durante o carnaval de 2015, a publicitária e ilustradora Pri Ferreira e a jornalista Mila Alves resolveram expressar nas redes sociais sua indignação diante de uma propaganda da Skol (figura 2).
Figura 2 (ao lado): Intervenção de Pri Ferreira e Mila Alves. Figura 3 (acima): Nova campanha da Skol, feita após a intervenção.
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A imagem rapidamente viralizou no Facebook e a Skol retirou a propaganda, refazendo o conceito da campanha de carnaval (figura 3). Ações como esta servem para lembrar que, se a publicidade deve vender para consumidores, é direito dos consumidores reivindicar pelos valores que esta publicidade transmite. Para isso é preciso conscientizar-se do seu poder e, antes ainda, conscientizar-se da sua posição neste jogo de hierarquias. Venturi e Godinho, organizadores de Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado (2010), apresentam uma série de estatísticas sobre o papel da mulher na sociedade brasileira. A pesquisa foi realizada com 2.365 mulheres e 1.181 homens, de 15 anos ou mais, de escolaridade variada, moradores de 25 UFs (unidades da federação) das
cinco macrorregiões do Brasil (N, S, SE, NE e CO). Dois gráficos apresentados na pesquisa são interessantes para o ponto de vista da representação feminina (figuras 4 e 5). O primeiro deles apresenta os resultados sobre “a opinião sobre a exposição do corpo da mulher na tv” (VENTURI e GODINHO, 2010: Quadro 30 do Anexo). 77% das mulheres entrevistadas responderam que esta exposição é ruim, sendo 21% das respostas “É ruim para as mulheres que se exibem assim, mas isso é problema delas” e 56% “é ruim porque dá muita atenção só para o corpo e desvaloriza todas as mulheres” (VENTURI e GODINHO, 2010: Quadro 30 do Anexo). O segundo gráfico (figura 5) é referente ao “controle da programação e da publicidade na
OPINIÃO SOBRE A EXPOSIÇÃO DO CORPO DA MULHER NA TV P17M. NA TELEVISÃO SEMPRE TEM SHOWS E PROGRAMAS COM MULHERES DANÇANDO COM ROUPAS CURTAS, MOSTRANDO BASTANTE O CORPO. QUAL DESTAS FRASES SE APROXIMA MAIS DO QUE VOCÊ PENSA SOBRE ISSO?
É RUIM
Para as mulheres que se exibem assim, mas isso é problema delas Porque dá muita atenção só para o corpo e isso desvaloriza todas as mulheres É BOM
Para as mulheres que aparecem, sorte delas que têm idade e corpo para se mostrar Para todas as mulheres porque isso valoriza a mulher brasileira NÃO SABE
5ª a 8ª série
Médio
Superior ou +
19%
14% 24%
21%
38%
16%
até a 4ª série
19%
60 ou mais
45 a 59 anos
100% 26% 22%
ESCOLARIDADE
35 a 44 anos
PESO 100%
2010
25 a 34 anos
2001
FAIXA ETÁRIA 15 a 24 anos
EVOLUÇÃO
77
80
81
80
82
74
86
81
72
81
88
21
29
33
29
29
25
27
30
30
28
31
56
51
48
51
53
49
59
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42
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18
18
19
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13
16
27
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14
12
12
11
11
18
8
10
20
12
9
7
6
5
7
5
5
5
6
7
6
1
1
2
1
1
1
3
1
3
1
2
2
Figura 4: Opinião sobre a exposição do corpo da mulher na TV. 2010 por idade e escolaridade [estimulada e única, em %] Base: Total amostra M2. Comparativo 2001/2010. Fonte: GODINHO e VENTURI. Reprodução da autora.
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TV” (VENTURI e GODINHO, 2010: Quadro 31 do Anexo), de cujos resultados se destacam: 42% “totalmente a favor”, 32% “em parte a favor”, 9% “contra”, 11% “em parte contra”. Rachel Moreno (2013) comenta sobre o histórico de luta pela mudança da representação das mulheres na televisão, que exemplifica com o endosso, por mais de 500 feministas, de um manifesto, dirigido ao Ministério Público Federal (MPF) em 2007, criticando as representações femininas nos meios de comunicação e, em especial, na TV. Tal episódio rendeu a formação de um grupo móvel que se reuniu durante um mês com responsáveis com poder de decisão de cada emissora (um responsável pela programação, um representante do jurídico e um representante da
presidência, entre outros). As discussões do grupo foram positivas, entretanto, ao término do mês, as emissoras se recusaram a dar espaço de crítica para o grupo sobre a programação. Os grandes meios se apressavam em classificar de ‘censura’ e ‘atentado à liberdade de expressão’ qualquer demanda efetiva de implementação do direito constitucional e universal à comunicação, assim como a necessidade de estabelecimento de consensos e mecanismos de controle social da mídia – a exemplo do que ocorre nas democracias mais consolidadas – e que temos no caso da saúde pública (SUS), no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) etc. Aqui cunharam algumas expressões autóctones, como ‘o direito à liberdade de
CONTROLE DA PROGRAMAÇÃO E DA PUBLICIDADE NA TV P18M. VOCÊ É A FAVOR OU CONTRA UM MAIOR CONTROLE DA PROGRAMAÇÃO E DA PUBLICIDADE NA TV? TOTALMENTE OU EM PARTE?
Deveria ter controle Totalmente a favor
42 74
Em parte a favor
32
Totalmente contra
9 20
Em parte contra Outras respostas Não sabe
11 2 3
Figura 5: Controle da programação e da publicidade na TV. [estimulada e única, em %] Base: Total amostra M2. Mulheres. Fonte: GODINHO e VENTURI. Reprodução da autora.
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comunicação... comercial’ (!) (sic) e ‘o melhor controle da TV é o controle remoto’. ‘O público tem o que pede, é só ver os índices da audiência dos programas’, insistem. (MORENO, 2013, p.98)
Conta também que um tempo antes, em 2005, a Campanha pela Ética na TV encaminhou um ranking de reclamações dos/as telespectadores/as ao MPF, do qual o campeão era João Kleber, então apresentador do programa Tardes Quentes, na RedeTV!. Pela recusa da emissora e demora para responder, o MPF suspendeu o programa por um mês (entre dezembro de 2005 e janeiro de 2006) e concedeu o horário para a programação feita pela “Campanha”. Neste período foram expostos os pontos de vista de segmentos desrespeitados, como movimento de mulheres, movimento negro e LGBT, e a audiência dobrou, provando que tais assuntos são sim de interesse do público (MORENO, 2013). Os exemplos citados por Moreno demonstram a possibilidade de que se concretize algum controle sobre a programação da TV, assim como a maioria das mulheres entrevistadas apóia. O controle se faz necessário pelo próprio papel da TV na cultura, papel este comentado por Heloísa Buarque de Almeida: Minha abordagem em termos de gênero é que a mídia é parte da construção de sentidos simbólicos – ou seja, a mídia é uma tecnologia do gênero, nos termos de Teresa Lauretis (1994). Os bens culturais industrializados e distribuídos pela
seja, exibem estereótipos limitados das mulheres que não condizem com o que as mulheres vivem no dia-a-dia, pelo que elas se interessam, como elas são física e psicologicamente); as representações contribuem para a manutenção de valores machistas em nossa sociedade e o público feminino está cada vez mais consciente, senão dos dois fatores, pelo menos do primeiro. O público feminino está insatisfeito. São necessárias novas representações que abarquem a diversidade feminina e que ajudem a redefinir o lugar das mulheres na sociedade. Mas, uma vez que o acesso à mídia se faz tão dificultado, talvez seja preferível uma ação primária rumo à conscientização do público sobre a situação a que está sujeito todos os dias e sobre o poder de que ele detém. Consciente de seu poder o público poderá exigir uma mídia mais coerente com a realidade e com as suas aspirações, especialmente o público que é, de alguma forma, oprimido ou desvalorizado pelas representações da mídia, como as mulheres.
2.5. O MOVIMENTO FEMINISTA NA ARTE SEGUNDO O DOCUMENTÁRIO WOMEN’S ART REVOLUTION
mídia eletrônica têm a capacidade de produzir certas construções simbólicas, apropriando-se de elementos que já circulam na cultura que produz tais bens, mas os reforçam e normalizam, constituindo representações hegemônicas sobre gênero. (BUARQUE DE ALMEIDA, 2013, p.114)
Ainda que sumariamente, podemos concluir que: as representações femininas, em sua maioria, não estão de acordo com a realidade (ou
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O documentário Women’s art Revolution (LEESON, 2010) conta um pouco sobre o histórico de lutas nos Estados Unidos pela integração da arte feminina no mundo da arte. Começa destacando as décadas de 60 e 70, que foram decisivas neste processo. O documentário mostra que, inspiradas pelo movimento dos Panteras Negras, entre outros que aconteciam por volta de 1968, as mulheres artistas iniciaram uma série de atos
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Figura 6: Ovo pintado de preto por Faith Ringgold, em reivindicação para que as obras expostas no Whitney Museum fossem 50% de mulheres e 50% de não-brancos. Fonte: Captura de tela do documentário Women’s art Revolution (LEESON, 2010).
que definiriam o futuro das mulheres na arte. Há de se destacar que a condição feminina no mundo da arte naquela época era lamentável, conforme Judy Chicago relembra “estamos voltando para o final dos anos 60, certo? Não havia quase nenhuma mulher artista com visibilidade”2 (LEESON, 2010), ao que Lynn Leeson, autora do documentário completa “todas pensávamos que estávamos sozinhas”3 (LEESON, 2010). Segundo Leeson (2010), os anos 70 foram marcados por uma intensa atividade do movimento feminista na arte. Quando, em protesto contra a invasão do Camboja, Robert Morris, Robert Rauschenberg e Carl Andre se uniram para montar a Bienal-in-Exile, foi produzida uma carta em repúdio à ausência de mulheres na exposição. A carta foi assinada por WSABAL (Women Student and Artists for Black Art Liberation) que, apesar do volume aparente, era um grupo 2 We’re going back into the end of the sixties, ok? There were almost no woman artist who were visible, at all. 3 We all thought we were alone.
constituído por apenas duas mulheres (Faith Ringgold e sua filha, Michelle Wallace). Outro exemplo citado por Leeson (2010) foi o New York Whitney Protest, no qual as artistas pediram participação em exposição no Whitney Museum mas tiveram o pedido negado. Organizaram então uma série de projeções de obras de arte femininas e expuseram-nas na parede externa do museu, na data da inauguração da exposição. Além disso, um comunicado de imprensa foi produzido, na papelaria do Whitney, segundo o qual o museu estava satisfeito por ser o primeiro a mostrar que mulheres artistas haviam sido negligenciadas e a ter uma exposição com 50% de mulheres e 50% de não-brancos. As artistas ainda distribuíram ovos no espaço da exposição, sendo que alguns deles foram pintados de preto, por Ringgold, e exibiam uma chamada: “50%” (figura 6). No documentário de Leeson (2010) são citados mais exemplos que, como estes, demonstram a necessidade de ações subversivas para conquistar um espaço que obviamente deveria
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Figura 7 (acima): Da esquerda para direita - Arlene Raven, Judy Chicago e Sheila Levrant de Bretteville. Figura 8 (acima e à direita): Recorte da capa da publicação Chrysalis, n.1. Figura 9 (ao lado): Recorte de capas do jornal Heresies.
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pertencer também às mulheres e negros. Por outro lado, o documentário mostra um movimento na academia e na formação de novos espaços de arte, específicos para a recuperação e criação da história da arte feminina. Em fevereiro de 1970 Judy Chicago começa o primeiro programa de arte feminista, Fresno Women’s Art Program, na Universidade Estadual de Fresno. Sobre a experiência, Judy comenta:
Everywoman e Heresies (figura 9), expandindo ainda mais o alcance do trabalho das artistas. Sobre os avanços deste período, Harmony Hammond, entrevistada em 2008, comenta: O que nós descobrimos foi todo um novo jeito de falar sobre o trabalho. E eu descobri muito rapidamente que não era o jeito que os meninos falavam sobre arte. Que falávamos sobre coisas como conteúdo, quanto do movimento feminista era sobre
Nós não estudávamos nada dos homens, por
nos dar permissão, nos deixar ser quem nós acha-
pensar que todo mundo já havia estudado o bas-
mos que somos. Simples assim. (HAMMOND,
tante sobre eles. Dedicava-mo-nos a uma educa-
2008, em depoimento a LEESON, 2010)5
ção remediadora, aprendendo a nossa própria história, nossa própria herança. Encontrávamos imagens, fotografávamos, criávamos biblioteca de slides. Eu me lembro de perguntar para as minhas alunas quantas delas já haviam sido estupradas e de ficar em choque quando, algo como um quarto delas levantou a mão. Era tudo uma descoberta do que nossas experiências verídicas tinham sido. Eu estava bem assustada. Sabe, eu não tinha ideia de onde estava me metendo, mas me sentia impelida a fazê-lo. (CHICAGO, 1990, em depoimento a LEESON, 2010)4
Outros exemplos, como a NY A.I.R. Gallery, primeira cooperativa de mulheres, a conferência organizada por Judy Chicago e Mimi Schapero no Cal Arts e o Feminist Studio Workshop, de Judy Chicago, Arlene Raven e Sheila Levrant de Bretteville (figura 7), são apontados por Leeson (2010) como parte da construção de um grande movimento para encontrar e reunir as artistas mulheres. Foi também na década de 1970 que surgiram as publicações Chrysalis (figura 8), 4 We didn’t study men at all, figuring everybody had studied man already. We were all into remedial-education, learning our own history, our own heritage. We found pictures, we photographed, we made slide libraries. I remember asking my students how many of them had been raped, and being just totally chocked when, like, a quarter or half of them raised their hands. That was all discoveries of what our truth experiences had been. I was really scared. You know, I was no ideia what I was getting myself into but I was impelled to do it.
Leeson (2010) mostra que o movimento então cresceu para fora dos museus e universidades, com atos, performances, projetos que integravam os ideais feministas na sociedade. O potencial da arte como forma de transformar a sociedade estava se fortalecendo e sendo aproveitado pelo movimento feminista. Entretanto, Leeson (2010) mostra também que nos anos 1980, o movimento sofreu graves quedas. Foi no início da década que foram reportados os primeiros casos de Aids, a emenda constitucional de direitos igualitários foi derrotada no Senado americano e o Feminist Studio Workshop fechou. Em 1984 o Museum of Modern Art preparou uma exposição intitulada International Survey of Painting and Sculpture, na qual estavam expostos 151 trabalhos de artistas homens e apenas 14 de artistas mulheres. Neste cenário, Leeson (2010) destaca o surgimento do Guerrilla Girls (figura 10), um grupo anônimo de mulheres que promoviam, com arte e humor, denúncias minuciosas da condição feminina no mundo da arte. Segundo depoimento de integrantes do grupo a Leeson, foram produzidos diversos boletins que comparavam não apenas a 5 What we found was a hole different way to talk about our work and I discovered very quickly it wasn’t the way boys talk about art. That we talked about things like content. How much of the feminist movement period was about giving us permission to let us be who we think we are. That simple.
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Figura 10 (ao lado): Guerrilla Girls. Figura 11(abaixo): Cartaz, Guerrila Girls. Figura 12 (abaixo e à esquerda): Detalhe de The Dinner Party, Judy Chicago. Figura 13 (abaixo e à direita): The Dinner Party, Judy Chicago.
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quantidade de obras, mas até mesmo o valor entre obras de autoria feminina e masculina. As integrante apresentaram ainda a controversa estatística de que menos de 3% das mulheres no Met. Museum eram mulheres, mas 83% dos nus exibidos nas obras do museu eram femininos, questionando: “As mulheres precisam estar peladas para entrarem no Met. Museum?” (figura 11). O documentário (LEESON, 2010) mostra que em 1990 a obra de Judy Chicago, The Dinner Party (figuras 11 e 12), chegou a ser discutida no Congresso americano, por configurar “pornografia”. A obra, formada por uma mesa triangular de 39 lugares, cada qual com o nome de uma mulher importante na história ou mitologia, continha em cada um dos lugares a escultura de uma vagina. É intrigante, em oposição, que a nudez feminina em tantos quadros, filmes, novelas, propagandas não incomodasse. Um projeto de lei contra a exibição da obra The Dinner Party em museus foi proposto, mas Leeson (2010) mostra que o Hollywood Women’s Political Committe usou de sua influência, enquanto apoio para muitos dos senadores, e o projeto não foi adiante. Leeson (2010) mostra também que em 1996 a exposição Sexual Politics: Judy Chicago’s Dinner Party and Feminist Art History recebeu críticas severas, tendo sido marcante na imagem negativa que se deu ao movimento feminista na época. Neste ponto do documentário, as artistas que participaram nas décadas de 1960, 1970 e 1980 comentam como essa história foi aparentemente esquecida pelas próximas gerações e destacam a preocupação de que este movimento continue. Leeson (2010) mostra ainda que em 2006, Connie Butler estreou, no Museu de Arte Contemporânea de Los Angeles, a exposição WACK! Art and the Feminist Revolution. Diferente da exposição de 1996, esta viajou por diversas cidades e inspirou outras tantas exposições e reuniões. O documentário termina anunciando a abertura do Sackler Center for Feminist Art no Brookling Museum of Art e do Projeto de Arte Feminista na
Rutgers University, além de algumas falas pela continuidade do movimento na arte, bem como da necessidade de reconhecimento do histórico de luta que possibilitou um cenário melhor para as próximas gerações.
2.6. LINGUAGEM GRÁFICA FEMINISTA Conforme dito anteriormente, encontramos exemplos de mulheres que tomaram o movimento como tema de seus trabalhos de arte como forma de denúncia e de reflexão. De maneira complementar, Patrícia Pelta apresenta uma visão sobre a contribuição do feminismo também ao design gráfico. Em relação às perspectivas feministas no campo do design gráfico, deve-se notar que o feminismo sempre teve consciência de que as imagens, signos, estilos e símbolos etc, são parte de sistemas de comunicação complexos e sofisticados. Por este motivo os movimentos feministas sempre recorreram ao design gráfico como ferramenta de denúncia, critíca ou mobilização e deram ênfase especial à análise dos sistemas de representação. Para o feminismo, a gráfica tem sido crucial. Como notou Liz McQuiston, toda batalha precisa de arautos e uniformes e toda campanha publicitária necessita de apoio visual. Tudo isso deu lugar a um imaginário próprio e também a linhas de trabalho que manifestam certa unidade entre si (PELTA, 2012: sem paginação).6 6 Respecto a las perspectivas feministas en el campo del diseño gráfico, hay que señalar que el feminismo desde siempre ha sido consciente de que las imágenes, signos, estilos y símbolos, etc., forman parte de sistemas de comunicación complejos y sofisticados. De ahí que los movimientos feministas pronto recurrieran al diseño gráfico como una herramienta de denuncia, crítica o movilización y que hayan puesto especial énfasis en el análisis de los sistemas de representación. Para el feminismo, la gráfica ha sido crucial. Como ha señalado Liz McQuiston, toda batalla necesita sus heraldos y uniformes y cada campaña de propaganda necesita de apoyo visual. Todo ello ha dado lugar a una imaginería propia y también a unas líneas de trabajo que manifiestan
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Da mesma forma como as definições sociais, trabalhistas e morais foram questionadas pelo movimento feminista, Pelta mostra como a linguagem moderna e associada à academia passa pelo questionamento das artistas e designers feministas, por ser limitada, fria e excludente. Assim como é mostrado no documentário Women’s Art Revolution, Pelta comenta sobre uma oposição do movimento feminista ao minimalismo. As designers gráficas feministas têm insistido em que boa parte das definições feitas sobre o design não serviam por serem exclusivas e excludentes. E essas definições davam lugar, sem dúvida, a um determinado tipo de soluções formais, e por isso consideraram necessário, também, discutir sobre peso da estética do design como consequência, além disso, de uma reflexão sobre a ordem estabelecida, sobre as noções de qualidade e sobre os princípios estéticos de elegância, simplicidade e pureza que surgiram na Bauhaus, uma série de valores criados a partir da masculinidade. [...] Em oposição a essa ideia do moderno, as feministas propuseram uma série de valores baseados na conectividade, na interação, e uma tendência para estruturas não hierárquicas. Estes valores têm ganhado terreno à medida em que as mulheres começaram a usar as novas tecnologias, muitas das quais permitiram colocá-los em prática (PELTA, 2012: sem paginação).7
Segundo Pelta, o design gráfico feminista
cierta unidad entre ellas. 7 Las diseñadoras gráficas feministas han insistido en que una buena parte de las definiciones que se han hecho del diseño no servían porque eran exclusivas y excluyentes. Y esas definiciones daban lugar, sin duda, a un determinado tipo de desarrollos formales, de ahí que se haya considerado necesario, también, discutir sobre el peso de la estética del diseño como consecuencia, además, de una reflexión sobre el orden establecido, las nociones de calidad y los principios estilísticos de elegancia, simplicidad y pureza que habían surgido de la Bauhaus, una serie de valores que se habían generado desde la masculinidad.[...] Frente a esa idea de lo moderno, las feministas han propuesto una serie de valores basados en la conectividad, la interacción y una orientación hacia estructuras no jerárquicas. Éstos han ganado terreno a medida que las mujeres han empezado a utilizar las nuevas tecnologías, muchas de las cuales han permitido la puesta en práctica de los mismos. 30
exibe uma variedade de linguagens e temas que refletem a individualidade das autoras perante as causas coletivas do movimento. Entre as técnicas utilizadas destacam-se aquelas ligadas ao artesanato, como os trabalhos de Judy Chicago, numa forma de valorização deste universo associado ao trabalho feminino. Ao mesmo tempo, a linguagem de ruptura e improviso aproxima diversos trabalhos à estética punk, como é o caso dos trabalhos de Linder Sterling. Outra característica destacada por Pelta é “a apropriação da linguagem dos meios de comunicação e o recurso à paródia e à ironia, utilizadas com fins transgressores” (PELTA, 2012: sem paginação). Nesta observa-se o uso de imagens tipicamente publicitárias e de textos irônicos e/ou reflexivos e destaca-se o trabalho de Barbara Kruger. Por fim, a autora destaca o uso da cor como questão política (PELTA, 2012: sem paginação), como faz Sheila de Bretteville em Pink. Recontextualizando e valorizando o universo feminino de acordo com sua própria concepção dele, artistas e designers têm criado um imaginário onde luta, solidariedade, conectividade, ruptura, política, força e poder fazem parte do vocabulário associado à imagem do feminino. Se, conforme apontado por Pelta, a expressão gráfica tem adquirido papel imprescindível no combate diário ao patriarcado, seu potencial se torna ainda maior quando se considera o uso da internet. Não só pelo poder comunicativo do meio ou da linguagem, mas pelo conteúdo que transportam. Acredito que trata-se de uma identificação verdadeira, espontânea, do público com o conteúdo, uma demanda social que passa finalmente a ser cumprida. A seguir apresento alguns exemplos de artistas e designers feministas, além de projetos que de alguma forma utilizam a linguagem gráfica como forma de colaborar com o movimento feminista. A seleção dos exemplos foi feita buscando a maior diversidade possível de linguagens, temas e abordagens, para que servissem de inspiração para a próxima etapa do Trabalho de Conclusão de Curso.
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Figura 14 (ao lado): Retrato de Judy Chicago. Figura 15 (abaixo): Earth Birth, Judy Chicago, 1983. Figura 16 (mais abaixo): The Creation, Judy Chicago, 1984.
2.6.1. JUDY CHICAGO
2.6.2. BARBARA KRUGER
Judy Chicago (figura 14: artista, escritora e educadora, nascida em 1939, em Chicago, Illinois) destaca-se pela temática e pelas técnicas que utiliza. As temáticas de suas obras voltam-se para o corpo feminino em toda sua complexidade, muitas vezes extrapolando para o papel do feminino no universo (como nas figuras 15 e 16). Além disso, na obra The Dinner Party, apresentada anteriormente, Judy valorizou a história das mulheres, como já foi dito, destacando 39 principais nomes femininos na mitologia e história e também valorizando as técnicas tradicionalmente associadas ao feminino, como artesanato, bordado e pintura em cerâmica.
Uma das características mais presentes nas obras de Barbara Kruger (figura 17: artista, nascida em 1945, em Newark, New Jersey) é a apropriação da linguagem da publicidade para criar obras intensamente críticas. Kruger utiliza frases curtas e impactantes, que convocam o público a fazer parte da transformação da sociedade (figuras 18 e 19). Existe ainda um jogo de subversão das imagens que utiliza, geralmente retiradas de revistas, e o texto que enunciam, como é o caso em “your body is a battlegroud” (figura 20). Outras obras se destacam por um caráter de denúncia (imagens aborto e violência). Resta destacar que, com este tipo de linguagem (e de suportes que possibilita) a obra de Kruger tem um caráter mais massivo e acessível.
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Figura 17 (acima): Retrato de Barbara Kruger. Figura 18 (acima e à direita): Cartaz We don’t need another hero, Barbara Kruger, 1985. Figura 19 (ao lado): Cartaz, Barbara Kruger. Figura 20 (ao lado e à direita): Cartaz Your body is a battleground, Barbara Kruger, 1989.
Figura 21 (acima): Retrato de Sheila Levrant de Bretteville. Figura 22 (acima e no centro): Recorte de cartaz para conferência Women in Design, Sheila Levrant de Bretteville, 1975. Figura 23 (ao lado): Fotografia da obra Biddy Mason: Time & Place, Sheila Levrant de Bretteville, 1990 . Figura 24 (mais à direita): Pink, Sheila Levrant de Bretteville, 1973.
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2.6.3. SHEILA LEVRANT DE BRETTEVILLE Sheila Levrant de Bretteville (figura 21: artista, nascida em 1940, em Nova Iorque) se destaca por trabalhos de design gráfico (figura 22) e por obras de arte urbanas (figura 23), que destacam o papel das pessoas “comuns” na construção da história e até mesmo do seu trabalho. Em Pink (figura 24), de Bretteville responde a um convite feito pelo American Institute of Graphics para criar um trabalho sobre uma cor. Ela escolheu o rosa, para demonstrar que existem muitas denominações da cor para além do frágil e delicado, e convidou pessoas para que escrevessem suas opiniões e experiências com a cor. Em Biddy Mason: Time & Place (figura 23) Sheila de Bretteville registrou na cidade a sua história, destacando o papel de Biddy Mason, uma mulher negra e escrava que, após a conquista de sua liberdade, se dedicou à filantropia e ajudou
a fundar um centro de apoio aos estrangeiros e uma escola para crianças negras, entre outras ações memoráveis.
2.6.4. LINDER STERLING A obra de Linder Sterling (figura 25: artista e música, nascida em 1954, em Liverpool) se caracteriza principalmente pelo uso da linguagem punk. A artista faz recortes com imagens corpos femininos (retirados de filmes ou revistas pornográficas) e objetos de consumo, alimentos, imagens de propaganda (figuras 26 e 28). A temática de suas obra é a crítica à objetificação do corpo feminino (figura 27), a forma como a indústria cultural vende o corpo feminino como um produto e define seus padrões, colocando-a na mesma prateleira do batom, do ferro de passar, do alimento.
Figura 25 (ao lado e à esquerda): Retrato de Linder Sterling. Figura 26 (ao lado): Fotomontagem, Sem título, Linder Sterling, 1978. Figura 27 (abaixo e à esquerda): Painel da exposição “Femme/Object”, Linder Sterling, 2003. Figura 28 (abaixo): Fotomontagem, Sem título, Linder Sterling, 1977.
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2.6.5. ELISA RIEMER Das referências mais atuais, Elisa Riemer (figura 29: artista gráfica e ilustradora) é aquela que transmite os valores do feminismo de forma mais abstrata. Sua linguagem é híbrida, utiliza recortes, tratamento digital, fotografia, ilustração, para transmitir conceitos como sororidade e contemporaneidade (figura 30), afinal, o que significa ser uma mulher hoje? Riemer também é autora de uma série de cartazes (figura31) sobre mulheres que se
destacaram na história do movimento feminista, a série apresenta Marie Curie (Varsóvia, 1867 - França, 1934, cientista, primeira mulher a ganhar um prêmio Nobel), Emma Goldman (Kaunas, 1869 - Toronto, 1940, anarquista, ativista e escritora), Simone de Beauvoir (Paris, 1908 - Paris, 1986, escritora, filósofa existencialista e feminista), Angela Davis (Alabama, 1944, professora, filósofa socialista e militante), Rosa Luxemburgo (Polônia, 1871 - Berlim, 1919, filósofa, economista marxista e militante) e Patrícia Galvão (São João da Boa Vista, 1910 - Santos, 1962, escritora, poeta, jornalista, militante).
Figura 29 (ao lado): Auto-retrato de Elisa Riemer. Figura 30 (à direita): Fotomontagem, Sem título, Elisa Riemer. Figura 31 (abaxo): Cartaz Marie Curie, Elisa Riemer.
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2.6.6. KAOL PORFÍRIO Kaol Porírio (figura 32: desenvolvedora de games e ilustradora) trata do tema de representação. Seu projeto Fight like a girl pretende desconstruir a imagem negativa que se tem sobre o sexo feminino, através das ilustrações de mulheres que se diferenciam desta imagem, tanto mulheres reais quanto fictícias (figuras 33 e 34), ressaltando a importância de personagens diversos na formação dos indíviduos e de seus valores na sociedade.
Figura 32 (mais acima): Retrato de Kaol Porfírio. Figura 33(acima): Cartaz Fight Like a Girl - Korra, Kaol Porfirio, 2015. Figura 34 (à direita): Cartaz Fight Like a Girl - Michonne, Kaol Porfirio, 2015.
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2.6.7. CAROL ROSSETI
Figura 35 (acima e à direita): Retrato de Carol Rosseti. Figura 36 (acima): Cartaz, Carol Rosseti, 2015.
Carol Rosseti (figura 35: nascida em 1989, no Brasil. Designer, ilustradora e artista) aborda temas diversos do feminismo, como o controle da imagem feminina (figura 36), controle do corpo e reprodução, racismo, gordofobia, etc. Seus cartazes falam diretamente com “a mulher” que se identificar com eles, passando apoio à liberdade feminina. Assim como Kaol Porfirio, seus trabalhos abordam o tema da representatividade.
2.6.8. FCKH8.COM
Figura 37: Captura de tela do vídeo Potty-Mouthed Princesses Drop F-Bombs for Feminism, FCKH8.com, 2014.
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FCKH8.com é um site que comercializa camisetas que se diferencia pelas mensagens anti sexismo, pró igualdade LGBT e anti racismo. O site descreve as camisetas como “mini-outdoors para a mudança”. Em especial, se destaca a campanha veiculada em 2014/2015 sobre o feminismo, na qual meninas vestidas de princesa utilizam uma linguagem “suja” e colocam a questão: “o que é mais ofensivo? Meninas falando palavrões ou o machismo da sociedade?”. O vídeo ganhou uma segunda edição que trata especificamente da violência doméstica contra mulheres.
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2.6.9. WHO NEEDS FEMINISM O projeto foi criado por 16 mulheres do curso de Mulheres na esfera pública da Universidade Duke, nos Estados Unidos. A proposta do projeto consiste em demonstrar a diversidade do feminismo e combater o tabu que se formou sobre o termo. A ação consiste em campanhas virais de fotos (figura 38) que expõem situações cotidianas nas quais o feminismo é necessário. O site oferece um manual para download gratuito que contém uma série de dicas sobre como começar a campanha.
Figura 38: Imagem do projeto Who needs feminism.
2.6.10. JINAN YOUNIS Jinan Younis (figura 39: nascida em 1996, estudante de Teologia) ficou famosa na internet por ter começado um coletivo feminista na sua escola, Altrincham Grammar school, depois de ter passado por algumas situações machistas cotidianas. O coletivo, que resolveu realizar a campanha do projeto Who needs feminism?, não foi bem aceito pela escola e colegas e Younis publicou um post no seu blog a respeito destas dificuldades. Seu post teve grande visibilidade e retorno nas redes, o que mostrou ainda mais a triste realidade, com comentários machistas e agressivos, mas também fortaleceu a ação do grupo. O coletivo começou uma ação (figura 40) parecida com a anterior mas específica para escolas, com a frase feminism belongs in schools because.... As imagens são postadas no tumblr da campanha “feminismbelongs”. Younis também produziu, junto com a agência Brave de Design, o cartaz Are you a feminist? (figura 41). A forma como o conteúdo é disposto convida o leitor a um diálogo, dando argumentos que devem levar ao convencimento de que “sim, sou feminista”. Figura 39 (acima e à esquerda): Retrato de Jinan Younis. Figura 40 (acima e à direita): Imagem do projeto feminism belongs in schools because. Figura 41 (ao lado): Cartaz Are you a feminist?, Jinan Younis e Brave Design.
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3. COLETIVOS FEMINISTAS 3.1. PESQUISA COM COLETIVOS FEMINISTAS A pesquisa com coletivos feministas foi organizadas em duas frentes: entrevistas pessoais e questionário online. Os coletivos foram convidados a responder o questionário pelo Facebook, foram abordados mais de 70 possíveis respondentes, entre páginas e perfis de coletivos, ONGs ou projetos feministas de todo o Brasil. O questionário ficou aberto de 20 de maio a 1 de junho de 2015 e recebeu 89 respostas, mais detalhadas a seguir. Da mesma forma, as entrevistas foram marcadas via Facebook. Foram abordados mais de 10 coletivos, dos quais 2 aceitaram e marcaram uma data para entrevista. A seleção destes 10 coletivos foi pelos critérios proximidade e variedade, ou seja, lugares próximos mas com perfis variados de coletivos. As representantes do coletivo Olga Benário foram entrevistadas no dia 14 de maio de 2015, a representante do coletivo Yabá foi entrevistada no dia 22 de maio de 2015. A seguir detalho melhor as duas etapas e apresento seus resultados.
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3.2. ENTREVISTAS PESSOAIS Foram realizadas duas entrevistas com representantes de coletivos feministas: o Coletivo Feminista Olga Benário, da GV (Faculdade Getúlio Vargas), e o Coletivo Yabá, do curso de Direito da PUC (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo). As entrevistas foram semi estruturadas, seguindo a ordem: •
Apresentação - resumo sobre o TCC e pesquisa.
•
Como você se envolveu com o tema feminismo e com o coletivo?
•
Há quanto tempo o coletivo existe? Como foi formado?
•
Como o coletivo funciona? Qual a dinâmica?
•
Como vocês têm contato com os temas?
•
Vocês já fizeram algum tipo de campanha? Algum material gráfico?
•
Como é a comunicação de vocês com outros coletivos? Vocês têm uma ideia do “universo” atual dos coletivos em São Paulo?
•
Pensando na produção de um material gráfico/ visual voltado para o movimento feminista, o que vocês imaginam?
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3.3. QUESTIONÁRIO ONLINE O questionário online foi repassado para coletivos, projetos e ONGs que foram encontrados via Facebook. Foram recebidas 89 respostas, das quais 78 respondentes fazem parte de pelo menos um coletivo, 4 fazem parte de algum projeto relacionado ao feminismo, 6 fazem parte de frentes do movimento feminista, 1 participa de um grupo de estudos e 1 não participa de nenhum coletivo, ONG ou projeto feminista. Ao todo foram alcançados 33 coletivos feministas, 5 frentes do movimento feminista, 4 projetos e 1 grupo de estudos. São apresentados abaixo os coletivos/frentes/projetos e a quantidade de respondentes de cada um deles.
COLETIVOS (33 COLETIVOS/ 78 RESPONDENTES)
•
Coletivo Marie Curie (13)
•
Cunhã Coletivo Feminista (1)
•
Coletivo Feminista Somos Pagu (1)
•
Bravas Coletivo Feminista (2)
•
Coletivo Feminista Carmen Portinho (Escola da Cidade) (1)
•
Coletivo Feminista Rosa Lilás (7)
•
Coletivo Feminista do IA - UNESP (1)
•
Coletivo Feminsta Plenu (1)
•
Coletivo Feminista Rosa e Lilás (1)
•
Coletivo Feminista da Psicologia-USP (4)
•
Coletivo Feminista Madame Satã (2)
•
Coletivo Feminsita Marias de luta (1)
•
Coletivo Feminista Candaces (5)
•
Coletivo Feminista Yabá (2)
•
Coletivo Feminista FGV (2)
•
Coletivo Feminista Geóloga Dinalva (1)
•
Coletivo Feminista L.I.S (4)
•
Coletivo Atena da Cidade (1)
•
Coletivo Feminista Atena (4)
•
EVA Coletivo Feminista (1)
•
Coletivo Feminista Inversas (2)
•
Coletivo Feminista Claudia Maria (1)
•
Coletivo Feminista Anayde (1)
•
Coletivo Feminista casa da mãe Joana -
•
Coletivo Feminista Helenira Rezende (2)
•
Coletivo Feminista Margaridas (2)
•
LivraElas Coletivo (1)
•
Coletivo Feminista Lilás (3)
•
Coletivo Feminista da ECA-USP (7)
•
Coletivo Feminista “Só Fridas” (1)
•
Marcha Mundial das Mulheres (2)
•
Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde (1)
•
Ala Feminista da Marcha da Maconha (1)
•
Coletivo Feminista Maria Maria (1)
•
Marcha das Vadias - Recife (1)
•
Coletivo Feminista do IESP Virgínia Leone
•
Núcleo Terena-Gênero e Diversidade Sexual (1)
Bicudo (1)
•
Movimento Mulheres em Luta - MML (1)
Blumenau (1)
FRENTES (5 FRENTES/ 6 RESPONDENTES)
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GRUPO DE ESTUDOS (1 GRUPO/RESPONDENTE) •
Grupo de estudos Poéticas Feministas: um estudo sobre gênero e arte (1)
PROJETOS (4 PROJETOS/ 4 RESPONDENTES)
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•
Revista Capitolina (1)
•
Xereca (1)
•
Feminiciantes (1)
•
Imprensa Feminista (1)
O roteiro do questionário foi pensado para apurar um pouco da realidade dos coletivos (há quanto tempo existem, se produzem materiais gráficos e campanhas) e também para obter a opinião das respondentes, enquanto especialistas, sobre uma demanda principal por materiais gráficos/visuais sobre o tema. Abaixo apresentamos o roteiro do questionário (figura 42).
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Figura 42: Captura de tela do questionรกrio online.
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3.4. RESULTADOS DOS QUESTIONÁRIOS E ENTREVISTAS Os gráficos apresentados a seguir foram elaborados pela autora a partir dos resultados do Google Form. Apenas as figuras 44, 45 e 47 (porcentagem de coletivos, ano de formação e forma de envolvimento) foram produzidos a partir da leitura das respostas espontâneas. A figura 43 revela que a grande maioria das mulheres envolvidas em Coletivos Feministas (da amostra) tem entre 18 e 22 anos e o restante se concentra nas idades de 13 a 17 anos ou de 23 a 27 anos. A pesquisa também revelou uma grande porcentagem de coletivos formados no ambiente acadêmico/ escolar (figura 44). Aproximadamente metade dos coletivos que responderam à pesquisa foram formados neste contexto. A maioria dos coletivos se formou entre 2012 e 2015 (figura 45), característica que pode revelar uma nova visibilidade e prática do movimento feminista na sociedade. Além dos coletivos, projetos e frentes que responderam ao questionário, esta tendência também se manifestou nos demais grupos encontrados na pesquisa online. Na entrevista, a representante do Coletivo Yabá comentou um pouco sobre essa tendência. De coletivos universitários, nos últimos dois anos, eu sei que surgiram muitos. E a gente tem tentado se comunicar. Por ser um coletivo que se formou em 2010, 2011, em muitos aspectos as pessoas se baseiam no coletivo que veio um pouco antes. Então a gente já conversou muito com a meninas da GV, da Cásper Líbero, da USP mesmo. Enfim, alguns coletivos da USP e alguns coletivos de universidades particulares que vem se formando. E é uma coisa interessante assim, ver que nas universidades particulares onde, em tese, é mais difícil você ter essa troca de ideias de uma forma mais 42
ampla, tá rolando, entendeu. Por que as minas, elas tão se organizando e elas tão vendo que tá foda, tão sentindo opressão, tão sentindo a necessidade de se juntar. As meninas da Casper Líbero, as meninas da GV, as meninas da Anhembi Morumbi, todas elas acabaram de surgir com o coletivo, então elas tão iniciando nesse processo de formação interna, de trabalhar como um coletivo mesmo (Transcrição de entrevista).
A grande maioria dos coletivos investe na divulgação através de imagens na internet (77,8%), seguida pela divulgação por cartazes (58,9%) (figura 46). Outras opções citadas foram lambe lambe, faixa, jornal, catálogos, vídeos, podcast, adesivo, cartão postal, botom, playlists, livro, camiseta, kraft, bandeira. Alguns exemplos destes materiais são apresentados no próximo tópico, “Artefatos gráficos produzidos por coletivos, ONGs e projetos feministas”. A questão sobre a forma de envolvimento com o feminismo era aberta. Os temas apontados no gráfico (figura 47) são aqueles que se repetiram nas respostas. Desta forma, todas as respostas foram lidas e classificadas segundo os temas. A grande maioria das respondentes se envolveu com o tema do feminismo a partir de “situações cotidianas”. Este tema envolve tanto situações nas quais vivenciou alguma forma de machismo quanto situações em que conversou sobre o assunto com outra pessoa e descobriu o feminismo (figura 47). Em seguida destaca-se uma maioria que teve contato com o tema pela internet, na faculdade ou por um coletivo. Outras respostas que se destacam são aquelas que tiveram contato com o tema a partir de um trauma, ou na escola (em aulas e palestras) ou ainda pelo movimento estudantil. A seguir apresentamos alguns exemplos citados nas entrevistas. Eu estudei numa escola que era bem quadrada, eu não gostava da minha escola, eu não me
COLETIVOS FEMINISTAS CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES
QUAL A SUA IDADE?
52,2% - 18-22 anos 20% - 13-17 anos 2,2% - 33 ou mais 8,9% - 28-32 anos 16,7% - 23-27 anos
Figura 43: Gráfico. Idade das respondentes.
PORCENTAGEM DE COLETIVOS FORMADOS EM AMBIENTE ACADÊMICO/ ESCOLAR
Coletivos formados em ambiente academico/ escolar Coletivos formados fora de ambiente academico/ escolar Figura 44: Gráfico. Porcentagem de coletivos formados em ambiente acadêmico/ escolar.
ANO DE FORMAÇÃO DOS COLETIVOS, PROJETOS E FRENTES
EXISTEM MATERIAIS PRODUZIDOS PELO COLETIVO? QUE TIPO DE MATERIAIS?
Folheto Fanzine
38,9% 10%
Cartaz
58,9%
Revista
4,4%
Jornal
4,4%
Imagens para divulgação na internet Nenhum Outros 26% - 2013 21% - 2014 21% - 2015 16% - 2012 3% - 1990
3% - 1981 2% - 2010 2% - 2008 2% - 2007 2% - 2000
77% 3,3% 20,2%
Figura 46: Gráfico. Tipos de materiais produzidos pelos coletivos dos quais participam as respondentes.
Figura 45: Gráfico. Ano de formação dos coletivos. projetos e frentes dos quais participam as respondentes.
CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES COLETIVOS FEMINISTAS
43
FORMA DE ENVOLVIMENTO COM O TEMA FEMINISMO
encaixava, mas como eu nunca aprendi nada disso eu não sabia nem porque que eu não me encaixava. Não tinha contato com política, não tinha contato com nada além daquela bolha lá. Eu só
Faculdade
15
sentia que algumas coisas me incomodavam, na
Coletivo
16
época eu não sabia que era machismo. Os meni-
Movimento estudantil
nos chamando as meninas de gorda, chegando
5
Internet
nas meninas à força, todo mundo queria chegar
23
Movimentos sociais
2
em uma porque era fácil, mas depois falava que
Zine
1
era fácil.. era claramente um ambiente muito
Trauma
machista [...] E eu entrei na faculdade, eu faço
7
Situações cotidianas Maternidade
35
pra política, tem pessoas que por estudarem em
1
Escola Campanha
curso de Administração Pública, que é voltado escola diferente, tem gente mais velha também,
5
já tinha tido esse contato prévio. Conversando
3
com as meninas que eu conheci na faculdade mesmo eu vi que era isso, que eu não sabia o que Figura 47: Gráfico. Forma de envolvimento das respondentes com o tema feminismo.
era, mas que tava faltando na minha vida, e aí eu comecei a me interessar e ir cada vez mais atrás (Transcrição de entrevista). Quando eu tava no colegial eu já me enturmava
DE QUE FORMA VOCÊ TEVE/TEM CONTATO COM O TEMA FEMINISMO?
um pouco com o movimento estudantil, porque eu estudava numa ETEc e lá já tinha um movimento forte, secundarista e tal. Aí como já tinha eu acabei entrando, acabei conhecendo um
Experiência própria e reflexão
75
Conversas informais
68
Aulas na escola
13
Aulas na faculdade Leituras sobre o tema
71
Discussão em grupo
72 68
Produção de artigo/ tese/ projeto Outro
mais cedo da pauta e do debate feminista. [...] Mas tem muitas meninas no Yabá que nunca tiveram contato com o feminismo ou pouco tive-
20
Participação em coletivo feminista
pouco mais o ME e necessariamente aproximei
ram. Muito na internet tal, porque hoje em dia muitas pessoas se aproximam do feminismo, dos conceitos e tal, pela internet né. E aí a maioria das meninas costuma ter esse trajeto. Tem meninas que já se aproximaram antes e tem meninas
19
que se aproximaram pela internet, mas nunca
8
participaram de um coletivo, uma atuação real assim (Transcrição de entrevista).
Figura 48: Gráfico. Forma de contato das respondentes com o tema feminismo.
44
A maioria das respondentes se informa sobre o tema por experiências próprias e reflexões, conversas informais, leituras sobre o tema, discussão em grupo e participação no coletivo
COLETIVOS FEMINISTAS CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES
feminista (figura 48). Sobre a idade de maior sensibilidade ao tema, as respostas se concentraram entre 15 a 18 anos e 10 a 14 anos (figura 49). A quantidade de respostas “outro” explica-se pelo fato de que as respondentes inseriram a justificativa de suas respostas neste campo, conforme foi solicitado. A justificativa que se repete é a de que na adolescência a menina passa por uma série de transformações para as quais pode faltar apoio, além de ser um momento em que a menina fortifica o senso crítico, criando uma opinião própria. Abaixo, uma resposta que resume bem as demais: Eu acredito que o feminismo é para todas as mu-
EM QUE MOMENTO VOCÊ ACHA QUE MULHERES/ MENINAS ESTÃO MAIS SENSÍVEIS PARA SE ENVOLVER COM O TEMA? POR FAVOR, JUSTIFIQUE SUA RESPOSTA NO CAMPO “OUTRO”.
10-14 anos
36
15-18 anos
48
19-25 anos Mais de 26 anos
29 13
Outro
62
lheres e meninas em qualquer momento, mas acho que na adolescência começam a aparecer questões que acabam sensibilizando mais as meninas para o tema. É nessa fase que nosso corpo começa a
Figura 49: Gráfico. Idade em que mulheres e meninas estão mais sensíveis ao tema feminismo, na opinião das respondentes.
ser objetificado e somos mais pressionadas pelos padrões de beleza, nessa fase que somos mais incentivadas a competir com as outras mulheres pela atenção masculina... O feminismo pode ser de grande ajuda nesse momento. Eu percebo que pra muitas meninas é na faixa dos 19-25 anos que isso começa a ser problematizado, mas acredito que isso é muito relacionado com contingências muito atuais. Assim que o feminismo ocupar mais espaços, existirem mais discussões sobre gênero e
ALÉM DO RECORTE POR IDADE, VOCÊ ACHA QUE EM ALGUNS DESSES CONTEXTOS SERIA ESPECIFICAMENTE IMPORTANTE RECEBER INFORMAÇÕES SOBRE O TEMA? POR FAVOR, JUSTIFIQUE SUA RESPOSTA NO CAMPO “OUTRO”.
sobre o movimento feminista (sem um tabu com o termo “feminismo”) fora do ambiente universitário, acho que as meninas podem se entender como feministas muito mais cedo (Resposta obtida no questionário online).
Sobre um contexto específico destacou-se a opção “escola”, como um ambiente onde deveria ser colocado o tema feminismo (figura 50). Novamente a quantidade de respostas “outro” explica-se pelo fato de que as respondentes inseriram a justificativa de suas respostas neste campo, conforme foi solicitado. Nesta justificativa foi possível aferir maior contraste entre as respostas, pois a
Escola
85
Faculdade
59
Trabalho
50
Local onde mora
51
Outro
58
Figura 50: Gráfico. Contexto no qual é mais importante que que mulheres/meninas tenham contato com o tema feminismo, na opinião das respondentes.
CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES COLETIVOS FEMINISTAS
45
maioria deu ênfase para o contexto escolar. Destacamos uma resposta que sintetiza a opinião geral:
muito básica. A gente não tá falando de uma coisa complexa, tipo aborto, sei lá, é uma coisa que é muito básica, que é o conceito feminismo.
Considerando que boa parte da população passa
A pessoa vira e fala, ah não, não sou machista
ao menos pelos anos iniciais de formação escolar,
nem feminista. Sabe? Tipo, machismo e feminis-
acredito que esse ambiente coletivo é o mais impor-
mo não são opostos (Transcrição de entrevista).
tante para incutir esse tipo de debate em meninas e também meninos. É um espaço privilegiado para
As pessoas têm muita resistência ao feminismo,
enfrentar, desconstruir e desnaturalizar compor-
ou são as pessoas que não conhecem e não procu-
tamentos machistas e opressores de toda forma
ram ter contato, ou é gente que acha é uma bes-
(Resposta obtida no questionário online).
teira. Que feminismo e machismo são opostos. Então uma pessoa tem que escolher entre ser fe-
Na entrevista com a representante do Coletivo Yabá a representante destacou que não costumam ter um público específico, mas que aproveitam o conteúdo adquirido na universidade para colaborar com a informação para as mulheres.
minista ou ser machista, ela escolhe ser machista
Então, a gente sempre fez materiais direciona-
As entrevistadas também atentaram para a linguagem comumente associada ao movimento feminista, que é acadêmica e acaba impedindo a aproximação de mais pessoas. O design exerce papel importante neste sentido, traduzindo os conceitos de forma mais simplificada e clara.
dos para a sociedade, na verdade. Não com um foco, para os universitários, então a maioria dos materiais que a gente faz são gerais, são para as mulheres. Então tem algumas questões pontuais que a gente aproveita o fato da gente estudar o
e não vê nenhum problema em reproduzir o machismo aqui dentro.. eles acham que o feminismo é o oposto, que tem o mesmo nível de opressão do machismo, só que pro outro lado (Transcrição de entrevista).
direito pra levar o conhecimento pras pessoas (Transcrição de entrevista).
Uma crítica ao feminismo que fazem é que as vezes a linguagem é muito acadêmica. Até em blog,
Sobre os temas (figura 51), houve maior incidência de resposta para os temas “cantadas na rua”, “assédio em transporte público”, “estupro”, “violência doméstica”, “sexualidade”, “leis de proteção às mulheres” e “conceitos-chave”. Na entrevista com o Coletivo Olga Benário as representantes destacaram a importância de transmitir conceitos básicos do feminismo, para aproximar as pessoas ao tema. As entrevistadas afirmaram que muitas vezes a distância das pessoas em relação ao tema se dá por desconhecimento ou noções distorcidas do movimento feminista.
tem sempre conceitos. Eu queria muito trazer pessoas que não estão nesse meio, fazer essas pessoas se sensibilizarem. Ontem eu tava numa ONG de Direito que chama Instituto Pró-Abono, e eles fizeram uma cartilha, muito legal sobre vários benefícios, entre eles o bolsa família. E é realmente um folder, com as informações, super básico, e tinha uns quadrinhos assim, um cara perguntando pro outro carinha, desenho, colorido. E eu falei nossa, putz, muito bom. Você entrega pra uma pessoa ela olha.. E acho que uma coisa que também sempre chama muita atenção é dado (Transcrição de entrevista).
Uma coisa que a gente vê muito, uma pessoa que não tem ideia do que é feminismo. Uma coisa
46
Quanto aos formatos de materiais (figura
COLETIVOS FEMINISTAS CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES
QUAIS TEMAS VOCÊ CONSIDERA MAIS APROPRIADOS?
Cantadas na rua
72
Assédio em transporte público
75
Estupro
79
Violência doméstica
78
Mercado de trabalho
68
Bullying
39
Sexualidade
70
Violência obstétrica
58
Histórico do movimento feminista
53
Leis de proteção às mulheres
70
Nomes femininos na política
50
Nomes femininos na arte e no design
37
Representação nos games
37
Representação em filmes
46
Representação na TV
50
Representação na publicidade
54
Representação nos livros didáticos
53
Conceitos-chave (sexo e gênero, patriarcado, sororidade, empoderamento, etc)
70
Coletivos feministas em SP e instituições/ONGs
37
Grandes nomes da teoria feminista
37
Outros
20
Figura 51: Gráfico. Temas considerados mais apropriados pelas respondentes.
QUAIS FORMATOS VOCÊ CONSIDERA MAIS APROPRIADOS?
Folder
40
Fanzine
38
Cartaz
55
Revista
52
Jornal
38
Imagens para divulgação na internet Outros
75 14
Figura 52: Gráfico. Formatos considerados mais apropriados pelas respondentes.
CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES COLETIVOS FEMINISTAS
47
52), destacou-se a opção “imagens para divulgação na internet”, seguida pelas opções “cartaz” e “revista”. Na entrevista com o coletivo Yabá a representante destacou ainda a importância da articulação entre o meio digital e a realidade, além de apontar a importância dos trabalhos autorais, como zines, para aproximar o público dos temas. Uma coisa, que eu tenho uma experiência muito legal com zine, é uma coisa que tá se perdendo mas agora eu acho que tá voltando um pouco mais, porque eu ouvi já alguns eventos de encon-
3.5.1. COLETIVO FEMINISTA INVERSAS O Coletivo Feminista Inversas se formou em janeiro de 2015 por alunas da Faculdade de Direito Damásio de Jesus, em São Paulo. Os materiais produzidos pelo coletivo são focados na página do Facebook, como imagem de perfil (figura 53), imagem de capa e posts (figura 54). Recentemente o coletivo lançou a campanha Empodere-se. Seu corpo suas regras na qual apresentou, como descrição da imagem (figura 54), relatos de empoderamento de mulheres.
tros, de apresentação de zines. [...] A internet também eu acho que ela tem seu lado bom mas também tem seu lado ruim. Ao mesmo tempo
3.5.2. FEMINICIANTES
que você tem mais acesso às informações, são tantas informações e de tantas que às vezes as pessoas se perdem e não conseguem se aprofundar. Eu não acho que a internet em si seja um espaço de aprofundamento. Tem a sua vantagem, óbvio, mas é importante que as pessoas tenham esse contato pessoal com as coisas. Aí eu acho que isso falha um pouco, tentar congruir essa comunicação virtual com a comunicação no plano
A página do Facebook Feminiciantes, criada em 2014 por um casal, visa transmitir os princípios do feminismo para quem está começando. A página publica imagens (figuras 55 e 56) com uma chamada para o texto, que vai na descrição da imagem. Conta, hoje, com 22.380 curtidas de usuários do Facebook. O projeto também tem um blog com o mesmo nome, com 46 seguidores.
real (Transcrição de entrevista).
3.5.3. COLETIVO FEMINISTA ROSA LILÁS - SOROCABA
3.5. ARTEFATOS GRÁFICOS PRODUZIDOS POR COLETIVOS, ONGS E PROJETOS FEMINISTAS A partir das respostas dos coletivos sobre materiais gráficos produzidos, entrei em contato por e-mail solicitando alguma imagem dos materiais. A seguir apresento alguns exemplos que resumem o geral.
48
O Coletivo Rosa Lilás foi inspirado em um coletivo de Campinas, com o mesmo nome. O Coletivo de Campinas foi formado por alunas da UNICAMP, após uma onde de estupros. Em 2014 um grupo de mulheres decidiu expandir a ação e criaram o Coletivo Rosa Lilás em Sorocaba. Alguns exemplos de materiais criados pelo Coletivo são os lambe lambes (figuras 57) distribuídos na cidade. O Coletivo também fez uma exposição, na ETEC Fernando Prestes (figura 58) e no espaço do Cine Fest Votorantim, sobre a história de Carolina Maria de Jesus (Minas Gerais, 1914 - São Paulo, 1977, escritora e poetisa). O coletivo também cria imagens para divulgação de eventos no Facebook.
COLETIVOS FEMINISTAS CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES
Figura 53 (ao lado): Imagem de perfil, Inversas. Figura 54 (acima): Imagem para divulgação online, Inversas.
Figuraa 55 e 56: Imagens para divulgação online, Feminiciantes.
Figura 57 (acima): Lambe lambe, Rosa Lilás - Sorocaba. Figura 58 (ao lado): Exposição sobre a história de Carolina Maria de Jesus, Rosa Lilás - Sorocaba.
CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES COLETIVOS FEMINISTAS
49
3.5.4. COLETIVO FEMINISTA MADAME SATÃ O Coletivo Madame Satã foi criado em 2015 por alunas da Universidade Federal de Goiás. Dos materiais produzidos pelo coletivo se destaca uma campanha na qual frases feministas foram escritas em absorventes (figuras 59 e 60) e espalhadas pela universidade. Figuras 59 e 60 (acima e ao lado): Cartazes-intervenção, Madame Satã.
3.5.5. MARCHA DAS VADIAS A Marcha das vadias é um movimento que começou em 2011, no Canadá. Ainda em 2011 aconteceram as primeiras Marchas no Brasil, em São Paulo, Brasília, Belo Horizonte e Bahia. O movimento aconteceu também em Los Angeles, Chicago, Buenos Aires e Amsterdã, entre outros. O material gráfico que se destaca são os cartazes de divulgação das marchas, divulgados via internet (figuras 61, 62, 63 e 64). Figura 61 (acima e à esquerda): Cartaz de divulgação, Marcha das vadias, 2014. Figura 62 (à esquerda): Cartaz de divulgação, Marcha das vadias, 2013. Figura 63 (à direita): Cartaz de divulgação, Marcha das vadias, 2012.
50
COLETIVOS FEMINISTAS CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES
Figura 64: Cartaz de divulgação, Marcha das vadias, 2012.
Feminism
Mobilizações, qual o papel das feministas?
3.5.6. COLETIVO FEMINISTA YABÁ O coletivo Yabá, formado em 2012 por alunas do curso de Direito da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), se destaca pela produção de apostilas que reúnem o conteúdo estudado e debatido pelo coletivo a cada ano (figuras 65 e 66). Figuras 65 (mais à direita): Detalhe interno de folder para o 34° ENED, Yabá. Figura 66 (ao lado): Capa de cartilha para FENED, Yabá e FENED, 2012.
Cartilha Feminista
Em meio à tantas mobilizações, recorrente é a seguinte pergunta: afinal, o que os brasileiros querem? Podemos pressupor pelos cartazes e faixas presentes nos atos, como: “fora PEC 37”; “fora corrupção”; “redução da tarifa”; “contra o ato médico”; “contra a Copa”. E, junto com estas bandeiras, a bandeira do Brasil. O que isto significa? Significa que o povo na rua, autodenominado “gigante”, já entendeu quais são uns dos problemas do país e já percebeu que se unindo pode conseguir o que precisa. Mas como se dará essa união? Será que pela bandeira do Brasil? Até quando sermos brasileiros será a única forma de nos unirmos? Temos que entender que ainda existem desigualdades entre os brasileiros. Desigualdades sociais, de gênero e de raça. Por exemplo: as mulheres brasileiras não estão inseridas na sociedade igual aos homens brasileiros. Desta forma, os direitos que reivindicamos talvez não sejam os mesmos que os dos homens. Isto porque passam despercebidos aos homens direitos que nunca lhe foram necessários. Importante ressaltar as desigualdades, para que as reivindicações sejam melhores localizadas. Desta forma, estranho nos é um ato em que todos se envolvem pela mesma bandeira. A bandeira que as mulheres carregam, e isto devemos deixar claro, não é a mesma que a que os homens carregam. Quando falamos de acesso a cidade, por exemplo, além de reivindicarmos tarifa zero, todos nós reivindicamos também ônibus e metrôs disponíveis 24 horas por dia. Porque sabemos que quando a disponibilidade se restringe ao horário comercial, nossa vida se restringe a apenas ao tempo em que trabalhamos. Porém, ao mesmo tempo, sabemos que para nós mulheres, para termos o acesso a cidade, não basta termos disponibilidade de transporte público por tempo integral se ao mesmo tempo temos que ficar em casa para cuidar dos filhos e tratar dos afazeres domésticos (por falta de assistência estatal) ou se deixamos de sair por medo de sermos estupradas na rua por falta de segurança e políticas públicas. Portanto, acesso a cidade, para nós, não se restringe a mobilidade urbana. Também tem a ver com políticas públicas como lavanderias públicas e creches, assim como segurança . Por isto nossa bandeira sempre vai além da que a sociedade patriarcal exige. Assim como as mulheres são as mais atingidas pelos efeitos dos megaeventos, já que despejadas de suas casas junto com seus filhos, assim como serão seus corpos explorados pelos turistas e pelo Estado. Desta maneira, o “Fora Copa!” também vai para muito além do desvio de verba para saúde e educação. Para nós, mulheres, a Copa nos atinge diretamente. Por isto é necessário irmos à rua, para dizer em alto e bom som que nem todos os brasileiros são iguais. O que a sociedade nos oferece é muito pouco pelo tanto que precisamos. Temos que ir além, termos que mostrar nossas caras. Temos que fazer o recorte de gênero nos movimentos e afirmar: sem feminismo, só haverá mudança para uma parcela da população. Que exijamos nossos direitos enquanto mulheres, antes do que brasileiras.
2012
CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES COLETIVOS FEMINISTAS
51
A diversidad vidas. Quando e esquecemo-nos mesma luta. Para compre gênero, orientaç biológico, ou se “Gênero” é defi “Orientação afet (heterossexual, h Gênero” é em re Quando exis podemos identif entende-se que o “homem ou mul Vale ressalta de estereótipos estereótipos nad (além dos tão be Em uma soc muito mais além identidade de gê
Feminism
As mulheres trabalho mais pr assegurados. A m ao mesmo tempo mínimo. Segund homens brancos negros. No contexto serem negras; e se enquadram no que não condiz c A construção na questão sexu sexual, dotadas Além disso, públicas para as de moradia, de aborto e de inves diretamente essa A luta pela perspectiva de compreendendo e da exploração.
4. DIRETRIZES PARA O TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO Conforme apresentado anteriormente, a pesquisa realizada com os coletivos feministas gerou alguns resultados que ajudaram a definir a proposta de projeto, são eles: •
• •
Faixa etária: 10 a 18 anos (com maior concentração na faixa etária de 15 a 18 anos); Ambiente propício para divulgação do(s) material(is): Escola; Formatos mais apropriado para divulgação: Imagens para divulgação na internet, revista e cartaz.
A respeito do tema, consideramos mais adequado realizar uma pesquisa maior sobre a faixa etária em questão para depois definir um tema, visto que muitos temas tiveram alto percentual de votos e que a definição de tema é um ponto muito decisivo no projeto. Tendo isso em vista, a proposta de projeto consiste na criação de fanzine, com extensão para o meio virtual, visando a conscientização sobre algum tema do movimento feminista para garotas adolescentes. A escolha pelo fanzine se deve a diversas características deste tipo de publicação, como o fato de serem publicações independentes, de baixo custo e que podem levar mais conteúdo do que um folder, por exemplo, mas que não chegam a ser tão complexos quanto um livro, que não seria possível de ser produzido no período de um semestre. 52
4.1. REQUISITOS DE PROJETO A fim de refinar melhor a proposta, foram criados alguns requisitos de projeto: 1. Ter linguagem (verbal e visual) apropriada e atrativa para o público feminino adolescente; 2. Possibilitar impressão de baixo custo; 3. Ter possível extensão online; 4. Apresentar tema que seja condizente com o público; 5. Possivelmente fazer parte de uma campanha que envolva as leitoras; 6. Ser de fácil manuseio; 7. Transmitir valores, conceitos e/ou histórico do movimento feminista.
DIRETRIZES PARA O TCC CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES
4.2. FERRAMENTAS DE PROJETO Tendo como base a criação de fanzine, com extensão para o meio virtual, visando a conscientização sobre algum tema do movimento feminista para garotas adolescentes, foi feita uma breve pesquisa para instrumentar a realização do projeto. A fonte desta pesquisa, foi o livro Intuição, Ação, Criação - Graphic Design Thinking, de Ellen Lupton. O livro de Ellen Lupton foi escolhido porque apresenta ferramentas do design thinking para o design gráfico, destacando o componente visual durante este processo. Isto é, durante o processo criativo importa pensar em como as ideias são visualizadas ou organizadas, traduzindo conceitos e inspirando o projeto. Dentre as ferramentas apresentadas no livro, foram escolhidas aquelas que mais se adequam à proposta de projeto. São elas:
• • • • •
Brainstorming; Mapas mentais; Grupos focais; Matriz de marca; Brain dumping visual.
Além das ferramentas do livro, foram utilizadas outras ferramentas adquiridas ao longo do curso de Design da FAU USP, e também em minha prática pessoal no campo do design, são elas: • •
Decks; Questionário online.
Na descrição do desenvolvimento de projeto cada uma das ferramentas empregadas será melhor explicada.
CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES DIRETRIZES PARA O TCC
53
5. FEMINISMO NA ADOLESCÊNCIA E NAS ESCOLAS 5.1. MANIFESTAÇÕES DE GÊNERO DURANTE A ADOLESCÊNCIA NA PERIFERIA Uma vez que foi decidido o foco no público adolescente, realizei uma pesquisa bibliográfica sobre as relações de gênero neste público, para melhor situar o projeto. A pesquisa abrangeu cinco artigos que tratam desta temática especificamente em regiões periféricas, uma vez que a proposta do presente Trabalho de Conclusão de Curso é se relacionar com escolas públicas de São Paulo, que atendem a este público. Primeiramente, os artigos estudados apontam uma questão anterior ao recorte por gênero: o recorte de classe. Heilborn (1997) discorre sobre o tema apresentando os diferentes papéis que as crianças exercem em famílias de classe média e em famílias de classe baixa. Enquanto que, desde a modernidade, na classe média a família funciona em torno da criança, valorizando sua individualização, criatividade e formação completa, nas famílias de classe baixa a criança está numa hierarquia de idade e, principalmente, de sexo. As condições adversas fazem com que as crianças tenham obrigações desde cedo, relacionadas às 54
tarefas domésticas e à geração de renda, muitas delas abandonando a escola por optarem pela geração de renda e, no caso de meninas, em decorrência de gravidez (HEILBORN, 1997, pp. 296-297). Sobre o recorte específico da adolescência para estudo de manifestação de gênero, Traverso-Yépez e Pinheiro (2005) destacam esta fase como formadora da identidade do indivíduo, portanto bastante relevante nas definições deste perante à sociedade e em relação a si mesmo. Sendo assim as relações de poder decorrentes destas manifestações devem reprimir ou expandir as expectativas e possibilidades do indivíduo adolescente na vida adulta, da mesma maneira que definem vantagens ou desvantagens na própria adolescência: Destaca-se, assim, o fato de que as relações de gênero e de classe social exprimem relações de poder, as quais nem sempre são vivenciadas de modo reflexivo, apesar das contradições e hierarquias que geram. Acredita-se relevante considerar, portanto, a infância e a adolescência não apenas como construções sociais mediadas sempre pela dimensão sócio-cultural, mas uma etapa-chave de definição do habitus social entendido como o universo simbólico que gera o estilo peculiar de pensar e agir individual. (TRAVERSO-YÉPEZ; PINHEIRO, 2005, p. 150)
Partindo para a análise da socialização do
FEMINISMO NA ADOLESCÊNCIA E NAS ESCOLAS CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES
gênero, os estudos também apontam uma diferenciação clara entre os conceitos de feminino e masculino. Heilborn apresenta uma boa definição desta relação de natureza assimétrica entre gêneros:
do que nos colégios de classe média alta, onde o nível mais ativo e “agressivo” de participação intelectual das alunas dentro e fora da sala de aula (através de atividades paralelas, clubes da escola, eventos musicais etc.) parecia ser um meio de
Exprime-se no nexo simbólico do masculino com
afirmação naquele contexto social. Isso denota, ao
um elenco de propriedades de marcação/ des-
nosso ver, como a classe modela os atributos de gê-
continuidade/ diferenciação/ deslocamento que
nero e como eles possuem especialidades e tempo-
demarcam a identidade social masculina. O gê-
ralidades próprias, que não podem ser ignoradas.
nero feminino está balizado por associações com
(LAVINAS, 1997, p.26)
atributos como não-marcação/ continuidade/ indiferenciação/ permanência, considerada a relação de complementaridade que mantém com sua contraparte (HEILBORN, 1997, p. 298).
Tal demarcação do que é feminino e masculino também está relacionada à classe. Os autores estudados argumentam que em situações de maior pobreza se mantém uma cultura mais limitadora dos gêneros, enquanto que em classes sociais mais elevadas este limite é mais tênue, conquanto ainda existente.
O artigo de Duque-Arrazola (1997), assim como o de Heilborn (1997), cita a falta de estudos sobre crianças e adolescentes relacionados à questão de gênero, o que prejudica as pesquisas já que o gênero é um fator importante constituinte da realidade das crianças e adolescentes. A maioria dos estudos encontrados, segundo a autora, foca nas situações extremas, como os garotos de rua, as prostitutas ou os casos de gravidez na adolescência. Resulta muito precário, portanto, o conhecimento sistematizado da especificidade do existir
Ao comparar escolas de níveis socio-econômicos
gênero de crianças e adolescentes de ambos os
distintos, observou-se que a forma como as me-
sexos em situação de pobreza, desvinculado das
ninas geralmente de empenhavam para conseguir
condições extremas da trangressão. (DUQUE-
algo ou para se destacarem era distinta. Na escola
-ARRAZOLA, 1997, p.349)
da classe trabalhadora, o exagero da feminilidade utilizado pelas meninas como expediente da afirmação no meio social fora muito mais recorrente
Portanto, para além das situações extremas, a pesquisa apresentada por Duque-Arrazola
CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES FEMINISMO NA ADOLESCÊNCIA E NAS ESCOLAS
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tem a proposta de “responder até que ponto o cotidiano de meninos e meninas em situação de pobreza é vivenciado como processo diferenciado de aprendizados e experiências de vida e de reprodução de relações sociais de gênero, as quais são vividas como direitos, permissões, proibições e responsabilidades desiguais por serem, tais crianças e adolescentes, homens ou mulheres” (DUQUE-ARRAZOLA, 1997, p.350). Da mesma forma, cada um dos artigos estudados busca estudar as manifestações de gênero no cotidiano de crianças e adolescentes de diversas regiões do Brasil, todas em situação de pobreza. O artigo O cotidiano sexuado de meninos e meninas em situação de pobreza, de Laura Susana Duque-Arrazola (1997), apresenta pesquisa realizada sobre os ambientes de vivência cotidiana de crianças e adolescentes em Recife; o artigo O traçado da vida: gênero e idade em dois bairros populares do Rio de Janeiro, de Maria Luiza Heilborn (1997), apresenta resultados da pesquisa com crianças e adolescentes moradores de duas comunidades do Rio de Janeiro, Chapéu Mangueira e Nova Holanda; o artigo Socialização de gênero e adolescência, de Martha A. Traverso-Yépez e Verônica de Souza Pinheiro (2005), apresenta pesquisa com adolescentes de periferia de Natal, do bairro Felipe Camarão; o artigo Como é ser adolescente do sexo feminino na periferia?, de Ada Cristina Guimarães de Sousa e Shyrlene Nunes Brandão (2008), aborda uma pesquisa qualitativa com três adolescentes de Santa Maria, região administrativa do Distrito Federal, Brasília. Apenas o artigo de Lena Lavinas (1997) se diferencia, por apresentar uma série de conteúdos introdutórios para leitura da sequência de artigos do livro Quem mandou nascer mulher?, dos quais dois foram estudados nesta revisão bibliográfica. Como foi dito anteriormente, os artigos são centrados no estudo do cotidiano das crianças e adolescentes, destacando os tempos gastos na escola, na rua, em casa, no lazer e nas tarefas diversas, pois considera-se que é nestas ocasiões
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que as meninas e meninos acabam por internalizar seus gêneros, de acordo com as exigências da sociedade (DUQUE-ARRAZOLA, 1997, p.351). Embora os estudos tenham sido feitos em regiões diferentes do Brasil, seus resultados coincidem e revelam que neste recorte de adolescentes e crianças em situação de pobreza as diferenças de gênero são bastante evidentes, desde as brincadeiras permitidas e/ou aceitas por meninos e meninas até as expectativas de futuro e vida adulta, refletindo numa nítida divisão de espaço público como masculino e privado como feminino, que vai se consolidando alheia à vontade destas pessoas. O artigo de Duque-Arrazola (1997) apresenta falas das entrevistas que demonstram a oposição entre a liberdade que é concedida e estimulada nos garotos – que desde pequenos brincam na rua, começam a trabalhar fora cedo, assim como seus empregos, quando adultos, são vistos como produtivos – e o controle das garotas, através do ensino da passividade e da determinação de diversas restrições – brincadeiras que envolvem o cuidar de casa, as proibições de brincar com garotos, pois eles podem se aproveitar delas, as tarefas domésticas que são colocadas como naturais para meninas e mulheres, o frequente abandono pelos pais e parceiros, que acaba sendo naturalizado. Enquanto que para os garotos o tempo livre é subentendido, indiscutível, para as garotas é tempo de lazer negociado (ARRAZOLA, 1997, pp.364-371). “Ele não tem limite de horário, e a gente [ela e a irmã] só pode ficar até o final do baile, só se ficar com o irmão mais velho. Pra que é qu’eu fui nascer mulher?!” (HEILBORN, 1997, p.324) “Ah! Homem, a partir dos 14 anos, tem sua própria liberdade, pode sair. Fala: ‘mãe vou sair’; ele não fala: ‘mãe, posso sair?’ Já com a menina: ‘Não pode sair por causa disso e disso’. Menino: ‘mãe, vou sair’, e já saiu, pronto, chega na hora
FEMINISMO NA ADOLESCÊNCIA E NAS ESCOLAS CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES
que quiser, faz o que quiser, não pode reclamar, porque menino tem aquela coisa assim: ‘Ah eu sou homem, você é mulher, posso fazer, você não pode’. Às vezes dá vontade de ser menino, por causa disso.” (Luana). (SOUSA; BRANDÃO, 2008, p.89)
É constante nas pesquisas a conclusão de que às mulheres está reservado o espaço privado, sob vigilância e autoridade do(s) homem(ns) da casa e de que, de maneira complementar, aos homens está reservado o espaço público e o “provir”. Enquanto que nas meninas é estimulado o desempenho das tarefas domésticas e o cuidado com irmãos, nos meninos é estimulado o espaço fora de casa, das brincadeiras aos trabalhos informais, que começam cedo, acompanhado de uma cobrança muito menor em relação às tarefas domésticas, vistas como “coisa de mulher” (ARRAZOLA, 1997, pp.368-375). De maneira análoga, Heilborn coloca as categorias de obrigação e ajuda:
obrigações e cobranças pesa mais para meninas do que para meninos, fato que se converte numa visão mais negativa da adolescência para as meninas, que se sentem presas, oprimidas, segundo a pesquisa de Traverso-Yépez e Pinheiro (TRAVERSO-YÉPEZ; PINHEIRO, 2005, pp.152-153). [Faço] tudo que uma dona de casa faz (16 anos, sem filhos). É uma fase boa... mmm... Não é muito boa, é péssima, passo muito tempo dentro de casa fazendo as coisas (18 anos, sem filhos). (TRAVERSO-YÉPEZ; PINHEIRO, 2005, p.155) “Você tem um irmão; aí minha mãe diz: ‘Vai lavar louça’, e eu pergunto: ‘Por que ele não vai?’ Minha mãe diz: ‘Ele não pode, ele é homem’. Eu falei: ‘É homem, mas tem mão’. A mesma coisa com meu pai: ‘Ele trabalhou o dia todo’, e eu digo: ‘Eu estudei’ (risos). Mulher tem que ficar no fogão e esfriar no tanque...” (SOUSA; BRANDÃO, 2008, p.91)
Obrigação encarna os elos e os deveres que soldam os membros de um grupo doméstico, dando conta do princípio que a ele subjaz: a reciprocidade – troca engendrada pela interqualificação de gênero, idade e papel social de seus elementos. Tal noção engloba a de ajuda, que deve ser compreendida em termos dos contextos situacionais em que é acionada. Assim, em razão da maneira diferencial como se articulam os papéis sociais para meninos e meninas, o trabalho doméstico reveste-se de um conteúdo de “obrigação” para as meninas e para os meninos como ajuda condicionada à vontade
Além das diferenças já citadas, a reputação é assunto recorrente na fala das garotas ou sobre as garotas, enquanto que para os garotos não existe essa preocupação. Até mesmo a idade em que “se permite” começar a namorar é menor para os garotos. Entre as meninas, existe ainda a preocupação em manter a virgindade, fator valorizado pela sociedade e que é também defendido pelos membros familiares, até mesmo pelos irmãos mais novos, demonstrando as relações de poder entre gêneros independente da idade (ARRAZOLA, 1997, pp.376-382).
deles. (HEILBORN, 1997, p.312) Dentro da tradição antropológica (cf. Pitt-Rivers,
Disso resulta que as meninas adolescentes têm a obrigação de fazer as tarefas domésticas e podem ajudar na renda familiar, enquanto que os garotos podem ajudar nas tarefas e, geralmente, têm a obrigação de gerar renda desde os 14 anos. Em decorrência desta cultura, a carga de
1977; Peristiany, 1971 e DaMatta, 1985), tem-se refletido sobre os padrões culturais que ordenam a família e, por conseguinte, as relações entre os sexos na sociedade brasileira, a partir do que se denomina de “cultura mediterrânea”. Tal expressão refere-se a certos traços da organização do
CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES FEMINISMO NA ADOLESCÊNCIA E NAS ESCOLAS
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parentesco e da moral comuns a certas regiões da
agravado pelo abuso de álcool. Segundo dados da
Europa e do Norte africano, remetendo à existên-
pesquisa, 74,6% das unidades familiares têm al-
cia de um complexo simbólico ordenado em torno
gum membro da família que bebe regularmente.
dos valores de honra e vergonha. Em termos sim-
(TRAVERSO-YÉPEZ; PINHEIRO, 2005, p.156)
plificados, essa configuração cultural diz respeito ao que se define usualmente como machismo latino. A categoria machismo registra a ideia de prestígio e extremado poder masculinos, cujo exercício está no controle da moral feminina. A plenitude da masculidade deriva da capacidade de cada sujeito em manter sua honra, o que é relacionalmente dependente da conduta do grupo de mulheres ao qual esse homem está vinculado. (HEILBORN, 1997, p.327)
Por fim, há a questão da violência doméstica, da qual muitas crianças, adolescentes e mães entrevistadas comentam. Segundo Duque-Arrazola (1997), é comum entre os pais o alcoolismo, que também agrava as situações de abuso. O artigo de Traverso-Yépez e Pinheiro (2005) também destaca a presença da violência na vivência dos adolescentes, diferenciando-a entre violência na rua e violência doméstica, mais uma vez demonstrando a circunscrição da mulher ao privado e a dominação do público pelos homens. Além disso, a pesquisa relatada neste artigo também revelou abuso de álcool. Aproximadamente 70% dos adolescentes participantes da pesquisa afirmaram já haver presenciado algum tipo de violência (60% entre o sexo feminino e quase 80% entre o sexo masculino) e 25% disseram já terem sido vítimas de alguma forma de violência (16% das meninas contra 32% dos meninos). A violência, tanto presenciada quanto sofrida, reflete as especificidades desse cotidiano: os meninos declaram-se mais expostos à violência na rua, enquanto que as meninas são testemunhas e vítimas da violência doméstica. A forte hierarquização nas relações de gênero e entre gerações resulta em freqüentes episódios de violência intrafamiliar, problema provavelmente
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Em todos os estudos apresentados as meninas, embora conscientes das diferenças existentes, não se mostram muito conscientes de que estas diferenças são reflexos de uma sociedade patriarcal. A única pesquisa na qual se registrou o uso do termo “machismo” ou “machista” é a mais atual, de Sousa e Brandão (2008). Mesmo sem conhecer a “fonte” da discriminação de que são vítimas, muitas meninas expressam sua insatisfação com tal fato em todas as pesquisas. Apesar do fato de três dos estudos apresentados serem de 1997, é possível aferir semelhanças entre o contexto destes e dos demais, de 2005 e 2008, assim como com o contexto atual, quase vinte anos depois, conforme será percebido no decorrer deste capítulo. Além disso, os recortes de tema escolhidos pelas pesquisadoras servem como exemplo para que se forme uma ideia do contexto estudado aqui, neste Trabalho de Conclusão de Curso.
5.2. ADOLESCÊNCIA E FEMINISMO NA ESCOLA Tendo em vista que a grande maioria dos coletivos feministas apontou a escola como um ambiente propício para a troca de conhecimentos sobre o movimento, entrei em contato com algumas escolas que atendem a faixa etária visada e com as quais já tive algum contato, facilitando a permissão para realizar projetos. A ideia foi elaborar oficinas nas quais as alunas e alunos pudessem se expressar em relação ao feminismo, servindo como modo de aferir o
FEMINISMO NA ADOLESCÊNCIA E NAS ESCOLAS CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES
quanto eles já sabem e de identificar quais seriam os temas e meios mais interessantes, além de, em um momento mais avançado, capacitar alunas e alunos para produzirem fanzines sobre o tema, motivando-as a possivelmente se unirem enquanto coletivo. Durante o desenvolvimento do Trabalho de Conclusão de Curso foi possível desenvolver a Oficina 1, mas o objetivo é que aconteçam mais oficinas que levarão a um aprofundamento no tema. A primeira escola que respondeu ao pedido de uma sequência de reuniões foi a Escola Estadual Emygdio de Barros, situada na região do Butantã. No momento do contato, a escola estava organizando um congresso sobre diversos temas e a direção me ofereceu a oportunidade de montar uma atividade com duração de 1 hora para trinta alunos do Ensino Fundamental II e Médio. Outras escolas com as quais tentei contato foram EMEF Vila Munck (região da Raposo Tavares), EMEF Desembargador Amorim Lima (Butantã), Escola Democrática Politéia (Água Branca), Escola Estadual Professor Odon Cavalcanti (Ipiranga) e Escola Estadual Professor Daniel Verano (Rio Pequeno). Três destas escolas ainda estão em contato para que possamos realizar as oficinas no próximo semestre, independente do desenvolvimento do Trabalho de Conclusão de Curso.
As seguintes questões são colocadas: 1. 2. 3. 4. •
5. 6. 7. 8. 9.
que é feminismo? O Você se considera feminista? Você tem irmã/irmão do sexo oposto? Você percebe alguma diferença de tratamento entre vocês pelos pais/familiares? Sobre as diferenças percebidas por você entre qualquer garota e garoto, você percebe alguma em relação a: Escolha de roupas/ opinião das pessoas sobre a escolha? Sair de casa/ andar na rua/ sensação de segurança? Fazer tarefas domésticas? Opções de lazer como música, esportes, vídeo-game, cinema? E na escola, vocês percebem alguma diferença no tratamento de meninas e meninos?
Depois de feitas todas as perguntas e coletadas todas as respostas, são lidas as respostas em grupo, debatidas e, para algumas perguntas são apresentados dados e trechos de bibliografia sobre o assunto. Para a pergunta “1. O que é feminismo?”: Feminismo é um movimento social e político que
5.2.1. PROPOSTA DE OFICINA 1 O objetivo da oficina 1 é descobrir o conhecimento que os/as alunos/as têm ou não sobre o feminismo, se têm algum preconceito com o tema, se têm interesse pelo tema. Em segundo lugar, o objetivo é também levar algum conhecimento extra para os participantes, despertando mais interesse e possivelmente fazendo alguns mudarem de ideia. A seguir apresento a proposta desta oficina. Primeiramente, são propostas algumas questões. São distribuídos papeis para que as/os alunas/os respondam sem identificar quem são (cor de rosa para meninas e azul para meninos).
tem como objetivo conquistar o acesso a direitos iguais entre homens e mulheres. Feminismo não é o contrário de machismo? Não. Enquanto o feminismo busca construir condições de igualdade entre os gêneros, o machismo é o comportamento que coloca o homem em posição de superioridade com relação à mulher. (Carta Capital)
Para a pergunta “2. Você se considera feminista?”: Mas como funciona essa questão do protagonismo? Bom, de forma simples, podemos dizer que
CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES FEMINISMO NA ADOLESCÊNCIA E NAS ESCOLAS
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o feminismo é um movimento cujo foco são as
violentada (pesquisa da Secretaria de Políticas
mulheres. Sendo assim, caberia a nós construi-lo
para Mulheres do Governo Federal), a cada 10
e protagonizá-lo, deliberando sobre suas pautas
minutos, uma mulher é estuprada (Mapa da
e estratégias. Afinal, garantir que as mulheres
Violência), e a cada 90 minutos uma mulher é
tenham poder inequívoco de decisão sobre suas
assassinada (IPEA).
próprias lutas é o mínimo que se poderia esperar de um movimento que deseja empoderá-las. O pró-feminista, então, precisaria entender que
Terminadas as reflexões, é feita a última pergunta:
existe uma diferença muito grande entre enxergar o machismo e sofrê-lo na pele. Por isso, não caberia a nenhum homem dizer a uma mulher o que é ou não machismo. Não caberia a ele di-
10. Depois apresentadas todas as questões e as respostas, alguém mudou de ideia sobre ser ou não feminista?
tar o que é ou não relevante, o que deve ou não ser combatido e o que pode ou não incomodar. (www.naomekahlo.com.br)
Para todas as questões referentes às “diferenças percebidas por você entre qualquer garota e garoto”: O homem é definido como ser humano e a mulher é definida como fêmea. Quando ela comporta-se como um ser humano ela é acusada de imitar o macho. (Simone de Beauvoir) No Brasil as mulheres ainda ganham em média 30% a menos do que os homens para exercer a mesma função, de acordo com uma pesquisa do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Mulheres também são maioria no trabalho doméstico, acumulando funções dentro e fora de casa. São as maiores vítimas de assédio sexual no trabalho, normalmente cometido por homens
5.2.2. RESULTADO DA OFICINA 1 NA ESCOLA ESTADUAL PROFESSOR EMYGDIO DE BARROS A oficina foi realizada no dia 23 de março deste ano, durante um congresso organizado pelos professores que coordenaram a ocupação da escola em 2015 (de novembro a dezembro). A atividade dependia da inscrição dos alunos e apenas um menino se inscreveu. Participaram, ao todo, 15 meninas, 1 menino e a professora, que estava lá para monitorar a atividade. As alunas e o aluno tinham entre onze e dezesseis anos. As citações apresentadas a seguir estão na íntegra, com algumas correções de português. Sobre a primeira questão, “o que é o feminismo?”, houve muita confusão sobre o conceito de feminismo e a ideia de feminilidade. Seis respostas demonstraram este tipo de confusão.
em situação de hierarquia superior. Enfim, por vários motivos, ainda há muito o que conquistar
“É um assunto que falamos sobre coisas de
em termos de direitos. (Carta Capital)
meninas” “Feminismo é uma conversa de coisas de menina”
Para a pergunta “6. Sobre as diferenças percebidas por você entre qualquer garota e garoto, você percebe alguma em relação a sair de casa/ andar na rua/ sensação de segurança?”
“Feminismo pra mim são coisas ou pessoas que se sentem ou são femininas, ou seja, têm um jeito feminino” “Um menino ou uma menina que tem um som de feminino e parece”
No Brasil, a cada 12 segundos uma mulher é
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“O feminismo é ter um jeito feminino”
FEMINISMO NA ADOLESCÊNCIA E NAS ESCOLAS CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES
“Feminismo é se vestir como uma mulher. Ou algum homem querer fazer algo que mulher faz e alguém falar que é feminina”
Duas meninas e a professora responderam corretamente. “Feminismo é ser a mulher que ela quiser ser sem ninguém opinar” “Defesa dos direitos e deveres sociais de uma parcela da sociedade” “Feminismo é o ato das mulheres para conseguirem o papel delas no mundo, como por exemplo: usar as roupas que querem, sem nenhum homem jogar piadinhas de mal gosto entre outras coisas. O direito da mulher de fazer o que ela quiser”
Três meninas, eu acredito, se expressaram mal, ao explicar o feminismo como se fosse o machismo, ao invés de colocá-lo como uma reação a isso. Mas pela forma como as próprias alunas debateram, deu para perceber que elas estavam se referindo a uma reação às situações de injustiça.
considera feminista?”, todas as meninas responderam que sim, enquanto que o único menino presente respondeu “nunca”. Ao ser questionado, o aluno afirmou que acredita que os homens devem ter mais direitos que as mulheres e que é preciso tomar cuidado com “estas feministas”, que estão conquistando espaço demais. A terceira e quarta pergunta, “você tem irmã/irmão do sexo oposto? Você percebe alguma diferença de tratamento entre vocês pelos pais/familiares?” foram apenas debatidas. As alunas e o aluno que têm irmã/o do sexo oposto afirmaram que aqueles do sexo masculino têm mais liberdade. Na quinta pergunta, “sobre as diferenças percebidas por você entre qualquer garota e garoto, você percebe alguma em relação a: escolha de roupas/ opinião das pessoas sobre a escolha?” a grande maioria concordou que sim, as meninas são mais “vigiadas” na escolha de roupa e chegam a correr risco de ofensas e abusos em decorrência desta escolha, enquanto que os garotos “podem se vestir como bem entenderem sem serem julgados”: “A diferença é que os homens podem ter o direito
“Feminismo é tipo um homem chega em você e
de andar sem camisa, mostrar a cueca, as mu-
fala ‘lugar de mulher é na cozinha fazendo comi-
lheres não podem andar de shortinhos ou de re-
da’ como se a gente só prestasse pra isso”
gata porque homens não conseguem manter seus
“Feminismo pra mim é mulher que sofre, e é de-
olhares maldosos, que são chamadas de putas,
pendente e trabalhadora”
vadias, de gostosas, elas não têm o respeito que
“Feminismo eu acho que é tipo tem homens que
devia existir, como se fosse uma prioridade que a
têm preconceito com as mulheres tipo no futebol”
mulher não tem” “Sim, por exemplo, se alguma mulher colocar
O único garoto colocou o feminismo como o contrário do machismo:
um vestido ou saia um pouco acima do joelho já xingam ela, mas se um homem usa a calça caída mostrando toda a cueca ninguém liga”
“É o conjunto de mulheres que só pensa nelas,
“É diferente, os meninos podem na rua sem ca-
que acha que só as mulheres têm razão”
misa, já a mulher não” “Sim. Elas opinam mais por causa da roupa das
Depois que todas as respostas foram lidas apresentei a definição de feminismo, além de defender que o feminismo não é o contrário de machismo. As alunas e o aluno pareceram esclarecidos. Sobre a segunda questão, “você se
meninas e a dos meninos elas nem opinam” “Quando eu uso short perto de uma pessoa de igreja ela fica me olhando de cima a baixo” “Sim. As pessoas acham que as meninas têm que vestir a roupa que elas querem e não o que a
CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES FEMINISMO NA ADOLESCÊNCIA E NAS ESCOLAS
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gente se sinta confortável”
tarefas de casa”
“As mulheres têm que usar roupas mais compor-
“Sim, eu acho que a mulher faz muita coisa mais
tadas por que os homens eles estão muito safados,
que o homem, ela cuida da casa e ela cuida dos
e os homens ficam com ousadia com as meninas”
filhos” “Eu acho que tem diferença de homens e mulhe-
Na sexta pergunta, “sobre as diferenças percebidas por você entre qualquer garota e garoto, você percebe alguma em relação a: sair de casa/ andar na rua/ sensação de segurança?” as respostas foram bastante relacionadas com as da pergunta anterior, pois as meninas sentem que a sensação de segurança está também associada à roupa que vestem, embora se sintam inseguras de qualquer forma. “As mulheres se saírem na rua com uma roupa curta ela é assediada já os homens não” “Os homens têm mais segurança” “Mulher quando anda na rua sempre é cantada por homens enquanto os homens acham que têm o direito em mexer por causa do tipo de roupa, homens não, andam bem tranquilos, muito difícil mexerem” “Sim. Os homens andam à vontade na rua já as mulheres não, elas têm medo de ser abusada”
Para sétima questão, “sobre as diferenças percebidas por você entre qualquer garota e garoto, você percebe alguma em relação a: fazer tarefas domésticas?” foi debatido que isso depende da família. Há uma diferença percebida de uma geração para a outra também: enquanto que entre os filhos pode existir uma igualdade de deveres, independente do sexo, entre os pais a maioria afirma que é a mãe que faz as tarefas domésticas ou a grande maioria delas. Ainda assim, a maioria concorda que as mulheres e meninas fazem mais tarefas domésticas.
res nas tarefas de casa. Eu sou a única que ajuda a minha mãe em casa” “Sim porque tem homens que só arrumam a cama e falam que já fizeram tudo” “Sim, eu e minha mãe fazemos mais tarefas que meu pai. Tipo, minha mãe lava o banheiro e eu arrumo as camas, já meu pai fica de boa, ainda manda eu fazer as coisas”
Para a questão oito “sobre as diferenças percebidas por você entre qualquer garota e garoto, você percebe alguma em relação a: opções de lazer como música, esportes, vídeo-game, cinema?” as alunas e o aluno afirmaram que não encontram muita diferença, por isso não estendemos o debate. Para a nona e última questão, “e na escola, vocês percebem alguma diferença no tratamento de meninas e meninos?, as alunas apenas indicaram que uma menina andar com vários garotos pode ser ruim para sua reputação, enquanto que um garoto andar com várias garotas não. Uma aluna indicou que este hábito pode fazer com que pensem que a garota é “machinho” e que o garoto é homossexual. Vale ressaltar que em diversas questões, foram expressadas opiniões que demonstram o anseio por mais igualdade: “Acredito que as tarefas (domésticas) devam ser divididas” “Eu acho que a mulher tem o direito de andar nas ruas do jeito que ela bem entender”
“As mulheres fazem mais tarefas em casa do que
“A mulher pode sair fo jeito que ela quiser, se ela
os homens. Exemplo: um menino que é irmão de
tem o seu estilo de blusa curta, qual o problema?
uma menina faz uma ou duas coisas, já a irmã
Se ela quiser ela anda na rua PELADA”
dez ou quinze coisas domésticas”
“Eu sou contra que as pessoas falam que os ho-
“É verdade, até nos comerciais de limpeza as mu-
mens têm mais liberdade do que as mulheres”
lheres que aparecem. Mas o meu pai também faz
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5.2.3. PAINEL DA OFICINA 1 NA ESCOLA ESTADUAL PROFESSOR EMYGDIO DE BARROS Terminada a oficina, reuni as respostas coletadas e elaborei um painel para ser exposto na escola Emygdio de Barros. O painel foi apresentado na primeira reunião do coletivo feminista da escola, no dia 1° de abril deste ano. Compareceram à reunião 7 meninas, 3 meninos, 2 professoras e a coordenadora, que chegou no final da reunião. As alunas e alunos tinham em média 15 a 16 anos, muitos já estavam no 3° ano do colegial. Na reunião foram discutidos os objetivos do coletivo e algumas formas de se comunicar com a escola, para atrair mais membros para o coletivo e também em futuras ações. O painel foi aprovado pelo coletivo e será colado na escola para que mais alunos possam lê-lo e opinar sobre as questões apresentadas. O coletivo gostou principalmente pelo do fato de o painel ser uma forma de conhecer o nível de conhecimento e questionamento dos alunos e alunas, facilitando a elaboração de propostas pelo coletivo.
Figura 67: Foto do painel produzido com o resultado da oficina realizada na Escola Estadual Emygdio de Barros.
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5.3. CONCLUSÕES SOBRE ADOLESCÊNCIA NA ESCOLA RELACIONADA AO FEMINISMO A respeito dos estudos sobre a adolescência e as manifestações de gênero durante esta fase, foi possível chegar a algumas conclusões, conforme segue: •
•
•
•
•
•
64
O contexto da periferia agrava as manifestações de poder decorrentes do gênero, assim como dificulta acesso à informação sobre o movimento feminista; O cotidiano das adolescentes (tanto as que participaram de oficinas quanto as que foram estudadas nos artigos) é repleto de sexismo, que impede ou dificulta o exercício de suas liberdades; As meninas (que participaram das oficinas) se declaram feministas, ainda que não tenham amplo conhecimento sobre o tema, demonstrando visão positiva e aberta diante do tema; As pesquisas (bibliográfica e de campo) convergem no fato de que aos garotos é reservado um mundo de liberdade, vida pública, segurança e liderança, enquanto que para garotas é reservado o mundo de permissões e proibições, vida privada, insegurança, subordinação e controle, até mesmo (ou principalmente) em relação à sua vida sexual; Existe entre as/os alunas/os opiniões equivocadas sobre o que é o movimento feminista; Foi declarada resistência do garoto (que participou da oficina) ao movimento feminista, o que pode indicar resistência de
•
•
•
•
mais garotos na escola; Escolher a roupa é uma preocupação das garotas que se refere tanto aos valores da sociedade (ser bem ou mal vista) quanto à sensação de segurança das garotas ao andar na rua (ser ou não alvo de assédio e outros abusos). Elas não concordam com tais valores e determinações, mas uma parcela declara que já sofreu mal estar ou se sentiu em perigo por causa da roupa que escolheu vestir; As meninas não se sentem seguras ao andar na rua, estão conscientes dos perigos que correm e muitas já foram vítimas de assédio verbal; As meninas afirmam haver diferença entre gêneros no desempenho das tarefas domésticas, com prejuízo das mulheres e meninas, fato confirmado nos artigos estudados; As meninas se mostram descontentes com o contexto machista, reconhecem as injustiças e estão dispostas a fazer algo a respeito.
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6. FANZINES Tendo em vista os resultados da pesquisa e a proposta de criação de fanzine, com extensão para o meio virtual, visando a conscientização sobre algum tema do movimento feminista para garotas adolescentes, decidimos que seria importante estudar um pouco mais sobre os fanzines e apresentamos a seguir o resultado deste breve estudo. O estudo foi baseado primeiramente no livro Fanzines the DIY revolution, de Teal Triggs (2010), cujo conteúdo foi comparado e complementado com o do artigo Sem futuro: the graphic language of São Paulo city punk, de Priscila Farias (2011), e com o artigo Livros, fanzines e outras publicações independentes. Um percurso pela ‘cena’ do Porto, de Pedro Quintela e Marta Borges (2011). O livro de Teal Triggs apresenta uma vasta coletânea de fanzines internacionais, catalogadas por época, sintetizando o que são fanzines, sua linguagem gráfica, fanzines da subcultura, de protesto, de cultura de consumo, feministas, políticos, e-zines e fanzines contemporâneos. O artigo de Priscila Farias apresenta o movimento punk no Brasil para então analisar alguns exemplos de fanzines punk isoladamente e enquanto categoria de artefato gráfico. O artigo de Quintela e Borges aborda os motivos pelos quais as fanzines existem hoje da forma como existem, discutindo a origem do movimento, a formação dos produtores, o incentivo deles e os lugares onde os fanzines são distribuídos ou vendidos, para então abordar a cena específica do Porto.
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6.1. O QUE SÃO FANZINES Segundo Teal Triggs, fanzines são definidos principalmente como publicações independentes, que fazem parte da cultura alternativa e que são especialmente conectadas com a informação que veiculam, geralmente de cunho político. Embora fornecer uma definição do termo ‘fanzine’ seja um pouco problemático por causa das mudanças no contexto histórico, gêneros e definições de produção que devem ser levadas em conta, nós podemos definir fanzines como publicações não-comerciais, não-oficiais, amadoras, que são politicamente conscientes e que podem formar uma importante rede de comunicação para culturas alternativas. Podem ser xerocadas ou impressas, em formato eletrônico como ‘e-zines’ ou disponíveis para download em sites em arquivo PDF. (TRIGGS, 2010, p.12. Tradução da autora) 1
Triggs destaca também a importância do produtor na definição do fanzine, uma vez que este desempenha tanto o papel de designer quanto de autor, sem passar pela censura da imprensa mainstream, abrindo possibilidades para experimentação. Desta forma, o designer se torna 1 Although providing an exact definition of the term ‘fanzine’ is somewhat problematic as shifts in historical context, genres and producer definitions must be taken into account, we may define fanzines as non-commercial, unofficial, amateur publications that are politically self-conscious and can form an important communication network for alternative cultures. They may be photocopied or printed, or in electronic form as ‘e-zines’ or downloadable from websites as pdf files. They are forums in which their producers articulate their view of the world around them.
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agente da subcultura e colabora para a criação de significado cultural, construindo a cultura popular (TRIGGS, 2010, pp.7-13). Para a autora, os fanzines são exemplo da cultura DIY (Do It Yourself, Faça Você Mesmo) e ampliam a visão do papel do designer. A autenticidade do faça-você-mesmo fomentada pelos primeiros produtores de zines não está necessariamente perdida. Os produtores de zines de hoje mantém o entusiasmo e comprometimento com a forma do fanzine como um meio
Por serem publicações independentes, os fanzines também têm um método de produção e distribuição específico, principalmente nas feiras organizadas de zines, no boca a boca, em lojas independentes de música ou livros e pelo correio (TRIGGS, 2010, p.7). Especificamente sobre a relação com o leitor, tanto Teal Triggs quanto Priscila Farias apontam um diferencial das zines em relação a outras publicações: o leitor é convidado a participar da construção do fanzine e por esta influência, muitas vezes, se torna autor do próprio fanzine.
de expressar suas preocupações individuais, seus discursos políticos, seus amores e ódios,
Fanzines também envolvem um relacionamento
seus desejos e decepções. A autenticidade reside
que se forma entre produtores e leitores, onde os
na voz autoral, onde o pessoal é político e não é
leitores também podem ser produtores e muito
subordinado a corporações globais. Os produto-
provavelmente são fãs compartilhando interesses
res de zines continuam a operar nas margens do
similares. Fanzines podem ser considerados como
mainstream. Eles negligenciam as tradições dos
espaços ‘virtuais’ onde produtores e leitores se re-
estúdios de design e as convenções das editoras
únem em comunidades de interesse e discordân-
literárias. Ao invés de se conformarem, os pro-
cia. (TRIGGS, 2010, p.9. Tradução da autora) 3
dutores de zines estão definindo e ‘manufaturando’ sua própria identidade e representando tudo isso através de seus escritos e da produção de imagens produzidas segundo a lógica do faça-você-mesmo. A referência aos editores de zines enquanto produtores introduz novas formas de pensar o produtor como um ‘autor popular’ e o fanzine como um objeto autobio/gráfico. Através da natureza da produção do DIY, os fanzines ganham um valor maior pela forma como contribuem e refletem de forma mais ampla a experiência cultural de cada dia. (TRIGGS, 2010, p.9. Tradução da autora) 2 2 Yet the do-it-yourself authenticity fostered by early fanzine producers has not necessarily been lost. Zinesters today
maintain an enthusiasm for and commitment to the fanzine form as a way of expressing their individual concerns, their rants on politics, their loves and hates, their desires and disappointments. The authentic resides in the authorial voice, where the personal is political and not beholden to global corporations. Zinesters continue to operate on the margins of the mainstream. They disregard the traditions of professional design studios and the conventions of literary publishing houses. Rather than conforming, zinesters are defining and ‘manufacturing’ their own identity and representing this through their writing and DIY image-making. Referring to fanzine editors as producers or makers introduces new ways of thinking about the producer as a ‘popular author’ and the fanzine as an autobio/graphical object. Through the DIY nature of their production, fanzines take on an enhanced value in how they contribute to and reflect a broader everyday cultural experience. 3 Fanzines are also about a relationship that is formed between producers and readers, where the readers may also be producers but most certainly are fans sharing similar interests. Fanzines may be considered as ‘virtual’ spaces where producers and readers are unite in communities of interest and dissent.
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6.2. COMO SURGIRAM OS FANZINES Segundo Teal Triggs, o termo fanzine é a abreviação da junção de ‘fan’ e ‘magazine’, e foi cunhado pelo americano entusiasta de ficção científica Louis Russel Chauvenet em 1940, no fanzine de sua autoria, Detours. Triggs comenta que os fanzines tiveram origem no século XIX, com publicações amadoras e de cunho político, durante a Revolução Francesa, como o panfleto Common Sense (1776) que focava em críticas sociais, e outras publicações inglesas e americanas, como The Dial (1840-44), mais focadas em poesia, ficção e crítica (TRIGGS, 2010, p.14). Nas décadas de 1920-30 destacaram-se os fanzines de ficção científica, na década de 1960 surgem as publicações da contra-cultura, mas é quando emerge o movimento punk no Reino Unido e Estados Unidos, nos anos de 1970-80, que os fanzines mais se popularizaram. Segundo Priscila Farias, no Brasil, o surgimento de bandas punk e fanzines aconteceu no final dos anos 1970, intensificando-se após o fim do regime militar, na década de 1980, e foi quase totalmente inspirado pela cena britânica e americana, por jovens que viajaram para outros países ou que acompanhavam a cultura destes lugares em revistas como Pop e Manchete (FARIAS, 2011, p.2).
Figura 68 (mais acima): Capa de New Worlds, 1939. Figura 69 (acima): Capa de Space Times, 1953.
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Figura 70 (acima e à esquerda): Capa de Sniffin Flowers. Figura 71 (acima): Capa de Red Ink, n°4, 1971. Figura 72 (ao lado): Capa de Alerta Punk, n°3, 1983. Figura 73 (abaixo): Capa de Factor Zero (1980-81).
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6.3. LINGUAGEM GRÁFICA DOS FANZINES
Figura 74 (acima): Capa de Lower Than Dirt, 1996. Figura 75 (abaixo e à esquerda): Capa de Search & Destroy (1978-79). Figura 76 (abaixo e à direita): Capa de Lobster Telephone (1980’s-90).
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Para Triggs, a linguagem gráfica dos fanzines tem suas raízes em duas correntes principais: uma que tem influência das formas, técnicas e contexto do Dadaísmo, Fluxus e Surrealismo; e uma outra baseada primeiramente em atividades políticas e de contra-cultura como o Situacionismo dos anos 1950 e 1960, da imprensa underground radical e do movimento punk nos anos 1970 (TRIGGS, 2010, p.15). Além disso, Triggs comenta que a linguagem dos fanzines é diretamente influenciada pela forma como ele é produzido: o projeto do layout costuma ser visualmente caótico; a escolha de tipografia varia entre fontes manuscritas, datilografas ou caracteres transferíveis; as técnicas de produção visam o baixo custo em tiragens variadas, entre as quais se destacam a mimeografia, xérox ou impressão comum. Fanzines normalmente são dimensionados para caber facilmente nas mãos, costumam ser grampeados e, com os avanços da internet, muitos fanzines passaram a ser disponibilizados também online (TRIGGS, 2010, p.9). Segundo Priscila Farias os fanzines, como expressão gráfica do movimento punk, se diferenciam do restante da produção de design gráfico por terem se desenvolvido à parte da academia ou mesmo sem ressaltar “personagens chave” da categoria. Especialmente no Brasil, a linguagem punk também se diferencia das linguagens vernaculares por ter sido influenciada pelas trocas que aconteciam por correio (FARIAS, 2011, pp.1-2).
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Figura 77 (acima): Capa do fanzine Protest Magazine, n°1 (1990’s). Figura 78 (acima e à direita): Capa do fanzine Punk (1975-79). Figuras 79 e 80 (abaixo): Capas do fanzine In The City (1977-80). Figuras 81 (ao lado): Capa do fanzine Guinea Pig Zero (1996-2001).
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Figura 82 (ao lado): Capa do fanzine Dada (1970’s). Figura 83 e 84 (abaixo): Capas do fanzine Chainsaw (1977-85).
Sobre a linguagem dos fanzines punk, Priscila Farias apresenta uma tabela que relaciona elementos da cultura punk com sua expressão em elementos gráficos:
CONCEITOS DA CULTURA PUNK
ELEMENTOS DE LINGUAGEM VISUAL
PUNK CULTURE CONCEPTS
VISUAL LANGUAGE ELEMENTS
Agressivo / Divertido Aggressive / Fun
Visualmente poluído, pontiagudo, amedrontador, politicamente engajado, rasgado, tempestuoso Noisy, spiky, scary, politically engaged, ripped, torn
Autêntico / Urgente Authentic / Urgent
Imperfeito, não-oficial, feito à mão, improvisado Not perfect, not official, hand-made, improvised
Confiável / Descomprometido Reliable / Not compromised
Escrito à mão, não-profissional, alteração de imagens da mídia de massa Handwritten, not professional, amendment of mass media imagery
Compartilhado / Original Shared / Original
Elementos emprestados de outros artefatos gráficos da cultura punk, fotos e ilustrações produzidas por companheiros punks Elements borrowed from other punk graphic artifacts, photos and illustra-tion produced by fellow punks
Figura 85: Tabela. Conceitos da cultura punk e seus equivalentes em termos de elementos gráficos (FARIAS, 2011, p.6. Tradução da autora)
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6.4. FANZINES, INTERNET, CENÁRIO ATUAL Sobre o surgimento dos e-zines, a partir da popularização da internet, e uma possível “concorrência” com os fanzines impressos, Triggs aponta que, embora o meio digital tenha muitas propriedades, não é capaz de substituir a experiência física tanto do leitor com o fanzine quanto com os meios onde o fanzine é distribuído. Por esta razão, há de se entender os e-zines como uma extensão dos fanzines impressos, colaborando para maior divulgação, mas sem que os primeiros sejam completamente substituídos (TRIGGS, 2010, p.135, 171). Pedro Quintela e Marta Borges (2011) colocam o ressurgimento dos fanzines no início do século XIX como um movimento aparentemente paradoxal, já que a internet estava cada vez mais acessível e, com isso, muitos designers estavam migrando “do papel para a tela”: No dealbar do século XXI, assistiu-se a um ressurgimento dos fanzines, livros de artista e
Figura 86 (acima): Capa do fanzine Doris, n°26. Figura 87(abaixo): Página do Zine-Blog Doris (2007-).
outros objetos editoriais autopublicados (selfpublishing) escritos, desenhados e publicados por designers gráficos e ilustradores, individual ou coletivamente, e que, com crescente frequência, recorrem a ‘velhos’ saberes oficinais ligados às técnicas de tipografia, impressão e encadernação. Trata-se de um movimento que, numa primeira leitura, poderá parecer paradoxal, já que, desde finais da década de 1980, estas áreas têm sofrido profundas transformações que resultam, em larga medida, do crescente ‘peso’ das novas tecnologias que alteraram profundamente quer os processos de trabalho, quer os seus próprios resultados, tornando-os cada vez mais ‘imateriais’. (BORGES, QUINTELA, 2011, p.12)
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Visto desta forma, há de se considerar que os fanzines atuais, além de todas as características físicas e ideológicas que possuem em comum com os antigos fanzines, também destacam um outro aspecto: a valorização do trabalho manual, editorial e impresso e da experiência física em comparação com a existência e experiência virtual do indivíduo. Para Quintela e Borges, a continuidade do cenário dos fanzines, ainda que em face do desenvolvimento da internet, também se relaciona com o ressurgimento do movimento Craft, que visa contestar a produção acelerada e valorizar a produção mais cuidadosa, artesanal que se vê em oficinas (BORGES, QUINTELA, 2011, p.15). Segundo Triggs, o movimento Craft também se relaciona politicamente a outros, como slow food e guerrilla gardening (TRIGGS, 2010, p.205). Sobre os fanzines atuais, Quintela e Borges destacam ainda uma diferença substancial em relação aos antigos, no que diz respeito à formação do produtor do fanzine:
6.5. PRIMEIROS FANZINES NO MOVIMENTO FEMINISTA O início da produção de fanzines para o movimento feminista, segundo Teal Triggs, está principalmente relacionada ao movimento musical ‘Riot grrrl’4 , que revitalizou a imprensa de pequenas publicações independentes nos anos 1990, destacando as mais famosas Bikini Kill, Riot Grrrl e Girl Germs. Depois do auge do punk, os anos 1990 foram um período prolífico para fanzines com motivação politica. O surgimento do movimento musical ‘riot grrrl’ revitalizou a imprenssão de pequenas publicações com uma enorme quantidade de fanzines, incluindo os mais famosos, nos Estados Unidos, Bikini Kill [...], Riot Grrrl [...] e Girl Germs [...]. Estes e outros ajudaram a definir uma nova geração de feministas que continuaram a questio-
Contrariamente aos ‘tradicionais’ produtores de
nar, como suas homólogas haviam feito antes,
fanzines que eram, por definição, amadores au-
as noções de identidade de gênero, sexualidade e
todidatas, sem uma aprendizagem específica no
representação, políticas queer, multiculturalismo
ramo gráfico ou editorial, estamos aqui perante
e igualdade em relação à parcela masculina na
editores e autores com formação específica ao
indústria musical (e em qualquer outro lugar).
nível do desenho e projeto editorial – o que tem
(TRIGGS, 2010, p.131. Tradução da autora)5
despoletado significativas alterações nos modos de abordagem a este tipo de objetos editoriais. Com efeito, o cuidado e arrojo gráfico aplicados à
Os fanzines se tornaram parte integral do movimento Riot grrrl que, diferentemente de
conceção e produção de muitas destas publicações tornam-nas objetos híbridos, algures entre o fanzine, o livro de artista e, por vezes, os chamados big books. (BORGES, QUINTELA, 2011, p.16)
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4 Riot Grrrl é um movimento musical que contesta o quanto a indústria da música é machista e dominada por homens. Além de problematizar principalmente a participação feminina na música, o movimento também abordou outras questões de empoderamento da mulher (TRIGGS, 2010, p.135). 5 After the high point of punk, the 1990s was a prolific period for fanzines that were politically motivated. The rise of the music-inspired riot grrrl movement revitalized small press publishing through a slew of new fanzines, including most famously, in the United States, Bikini Kill [...], Riot Grrrl [...] and Girl Germs [...]. These and others helped to galvanize a new generation of feminist to continue questioning, as their 1970s counterparts had done before them, notions of gender identity, sexuality and representation, queer politics, multiculturalism and equality with their male counterparts in the music industry (and elsewhere).
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outros movimentos de bandas punks femininas, exigia exclusividade feminina. As bandas que participaram deste movimento se tornaram pioneiras de uma ‘Girl Now Revolution’, frequentemente significando a exibição mais agressiva da sexualidade feminina reminiscente da primeira onda feminista. Além da crítica à mídia mainstream e à indústria da música, os fanzines representaram uma arena sem censuras para compartilhar experiências com outras mulheres jovens (TRIGGS, 2010, p.131). Assim como nos demais fanzines, especialmente nos relacionadas ao movimento punk e ao consumismo, os fanzines do Riot Grrrl se relacionam diretamente com a imprensa mainstream, ora reproduzindo seu formato ou utilizando recortes das revistas populares, ora fazendo uma crítica à forma como estas revistas se posicionam em relação à moda, estilo de vida e cultura. Primeiramente, zines do riot grrrl apropriam-se da imagem da mídia mainstream, muitas vezes literalmente recortando jornais e revistas. Em segundo lugar, fanzines do riot grrrl frequentemente replicavam os formatos de conteúdo utilizados nas revistas femininas populares, como coluna de novidades, seção de cartas e matérias principais. Mas, ao contrário das leitoras de revistas femininas populares, as produtoras do
Figura 88 (acima): Capa do fanzine Bikini Kill (1990’s, aproximadamente). Figura 89 (ao longo): Capa do fanzine RockrGrl (1995-2005). Figura 90 (abaixo e à esquerda): Página do fanzine Rebel Grrrl Punk (1997-2003). Figura 91 (abaixo): Capa do fanzine Rebel Grrrl Punk (1997-2003).
riot grrrl estão em posição de empoderamento. Elas operam fora da moda mainstream e do estilo de vida e cultura de consumo, frequentemente na direção oposta. (TRIGGS, 2010, p.132. Tradução da autora)6 6 First, riot grrrls zines draw upon mainstream media imagery, mush of it literally cut up from newspapers and magazines. Secondly, riot grrrls fanzines often replicate the content format used by mainstream girls’ magazines, such as review columns, ‘readers’ pages and feature stories. Yet, unlike the readers of girls’ magazines, the riot grrrl producers are in a proactive position of empowerment. They operate outside mainstream fashion and lifestyle consumer culture, often in direct opposition. […] These fanzines never forgot their second-wave feminist predecessors. Riot grrrls zines form part of an established feminist publishing history with forerunners such as Spare Rib (1972-93) and Shocking Pink (c. 1982, 1987-92) in the United Kingdom and Ms. Magazine (1972-) in the United States that were forums for raising such issues as equal pay, chid care, health care and anti ageism. CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES FANZINES
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Figura 92 (ao lado): Capa do fanzine Radical Cheerleaders Handbook, 2000. Figura 93(abaixo): Pรกgina do fanzine Ladyfest Cheerbook, 2001.
Figura 94: Pรกgina dupla do fanzine Artemis, 2013.
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6.6. FANZINES NO MOVIMENTO FEMINISTA ATUAL Os atuais fanzines feministas podem ou não ser ligados à atividade de um coletivo, conforme pesquisa realizada online. Foram encontrados muitos exemplos de fanzines, que variam em tema, linguagem, quantidade de produtoras e quantidade de edições. A seguir, apresentamos alguns exemplos encontrados.
6.6.1. ARTEMIS (2013, SÃO PAULO) Artemis é um fanzine produzido por diversas colaboradoras que, em cada edição, apresentam interpretações de uma espécie de animal. O fanzine foi criado por participantes da ONG Artemis, de 2013. Além de estimular o trabalho colaborativo e a troca artística entre as participantes, o fanzine pretende “explorar as intersecções e disparidades entre a condição feminina e animal, e discutir as maneiras como concebemos e praticamos as relações interespécies” (ARTEMIS, 2013). A linguagem varia bastante já que cada colaboradora produz sua página simples ou página dupla. A maioria das produções é de ilustração, foto e quadrinhos, com pouco texto. As publicações apresentam cerca de 40 páginas, todas em preto e branco, exceto pela capa colorida.
6.6.2. ALARME FEMINISTA (2014, SÃO PAULO)
Figuras 95, 96 e 97 (todas acima): Páginas do fanzine Artemis.
Alarme feminista é um fanzine de publicação mensal com temas do movimento feminista. Criado sem ligação com algum coletivo específico, é administrado pela artista Júlia ao Leo e aberto para participação do público. A produção do fanzine é simples, todas as páginas em preto e branco, CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES FANZINES
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Figura 98 (ao lado): Capa do fanzine Alarme Feminista, n°16, 2015. Figura 99 (abaixo e à esquerda): Capa do fanzine Alarme Feminista, n°18, 2016. Figura 100 (abaixo e à direita): Página do fanzine Alarme Feminista.
Figura 101 (ao lado): Capa do fanzine Xereca, 2014. Figuras 102, 103 e 104 (acima e ao lado): Páginas do fanzine Xereca, 2014.
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Figura 105 (ao lado): Capa do fanzine Xereca, 2014. Figura 106 (abaixo): Página do fanzine Xereca, 2014. Figura 107 (mais abaixo): Foto de fanzines Xereca, 2014.
muito texto manuscrito, recortes, se aproximando da linguagem punk. O conteúdo é apresentado com bastante texto e ilustrações, em oito páginas de A6, montadas em frente e verso de uma A4. O fanzine está em sua 20ª edição e já abordou os temas: sexualidade; diferença entre identidade de gênero, orientação afetiva-sexual, expressão de gênero e sexo biológico; violência doméstica; misandria e misoginia; visões de beleza feminina; transtornos alimentares; moda; política; religião; liberdade de expressão; liberdade sexual; aborto; gravidez; masturbação; sororidade; entre outros.
6.6.3. XERECA (2014, RIO DE JANEIRO) Xereca é um fanzine e uma página de divulgação no Facebook, ambos criados por ocasião de uma feira de zines, a Feira Plana, da qual uma amiga da autora participaria. A autora, Bárbara Gondar, criou duas edições do fanzine, que abordam temas como masturbação feminina, aceitação do corpo, equidade de gênero, igualidade perante a lei, sexualidades e demandas do movimento feminista. O fanzine tem formato A5, 12 páginas, todas as páginas impressas em preto e branco, em sulfite cor de rosa.
6.6.4. ZINE XXX (2014, RIO DE JANEIRO) Zine XXX é um fanzine, idealizado por Beatriz Lopes, feito por diversas quadrinistas de todo o Brasil (mais de 70 mulheres). Os quadrinhos não precisam falar sobre feminismo, mas colaboram para o movimento na medida em que criam conexões entre as artistas e ajudam a abrir espaço para elas no cenário dos quadrinhos, bastante dominado por artistas e temas masculinos. Figura 108: Foto de fanzines Zine XXX, 2014.
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Figuras 109, 110, 111, 112 (abaixo e ao lado): Páginas do fanzine Zine XXX, 2014.
Figuras 113 (acima): Página do fanzine Kólica Social. Figuras 114 (ao lado): Capa do fanzine Kólica Social. Figuras 115 (mais à direita): Página do fanzine Kólica Social.
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6.6.5. KÓLICA SOCIAL (2010, MINAS GERAIS) Kólica Social é um fanzine feminista feito por um grupo de amigas (Báh, May, Grazi, Raissa e Fran) e que já teve quatro edições. Os temas variam entre saúde feminina, moda, visibilidade da mulher na música, entrevistas, estupro. A linguagem é a que mais se aproxima dos fanzines punks originais, a não ser pelo texto digitado. As imagens são geralmente recortadas de outro material ou são imagens dos próprios programas de edição. Há muito texto e poesias de autoria das editoras.
6.6.6. CLIT ZINE (2012, SÃO PAULO) Clit é um fanzine feminista criado com intuito de levantar as diversas teorias que fazem parte ou se relacionam de alguma forma com o movimento feminista, como veganismo e anarquia. A publicação apresenta mais texto que todas as outras estudadas e poucas imagens, sempre recortadas de outros materiais. Apenas uma edição foi produzida, em 2012, com quinze páginas, todas em preto e branco.
Figura 117 (acima): Capa do fanzine Clit, n°1, 2012. Figura 118 (ao lado): Página do fanzine Clit, n°1, 2012.
Figuras 116 (acima): Capa do fanzine Kólica Social.
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6.6.7. CAPITOLINA (2014, SÃO PAULO)
Figura 119 (acima): Recorte de captura de tela do site da Capitolina. Figura 120 (ao lado): Recorte de captura de tela do site da Capitolina.
Capitolina é uma revista online criada por um grupo de jovens (são mais de 50 colaboradoras de diversos estados do Brasil) para garotas adolescentes. Apesar de não ser um fanzine, foi incluída na pesquisa por ser direcionada especificamente ao público adolescente. Seus temas são variados, “misturando todas as formas de artes e discussões sobre escola, relacionamentos, games, gadgets, moda, e culinária” (CAPITOLINA). A revista apresenta, além dos textos, ilustrações e fotomontagens criadas pelas próprias colaboradoras.
6.6.8. ZINE DAS ZINAS (2014, MINAS GERAIS)
Figura 121 (ao lado): Capa do fanzine Zine das Zinas. Figura 122 (abaixo): Página dupla do fanzine Zine das Zinas.
Zine das Zinas é um fanzine criado pelo coletivo Zinas, formado por sete mulheres artistas, designers, quadrinistas e/ou experimentalistas das artes gráficas (Prisca Paes, Day, Carol, Carolita, Ana, Aline Lemos e Lara Athayde). O foco da produção do fanzine é o feminismo e o coletivo já lançou duas edições, uma sobre sexo e a outra sobre aborto. A linguagem é bastante variada, de desenhos e escritos à mão até ilustrações elaboradas e quadrinhos mais profissionais. Todas as páginas são em preto e branco e a capa é colorida, em ambas edições, que têm em média 26 páginas.
6.6.9. ARMININA (2015, CEARÁ) Arminina é um fanzine de várias colaboradoras (18 na primeira edição, diagramado por Lily Oliveira, também colaboradora) do Ceará que teve até agora uma edição. A linguagem varia bastante e o tema não necessariamente é o feminismo, mas pode ser posicionado como fanzine feminista pelo fato de ser feito exclusivamente por mulheres e incentivar este tipo de produção. A maioria das páginas é colorida e são ao todo 32 páginas.
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Figura 123: Pรกgina dupla do fanzine Zine das Zinas.
Figura 124 (ao lado): Pรกgina do fanzine Arminina, 2015. Figura 125 (acima): Pรกgina dupla do fanzine Arminina, 2015.
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7. DESENVOLVIMENTO DE PROJETO DE FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES 7.1. MATRIZ DE MARCA
7.1.1. MATRIZ DE MARCA DAS REFERÊNCIAS VISUAIS/PROJETUAIS COLETADAS
A matriz de marca é um diagrama que “usa um eixo x/y para atravessar uma escala de valores diferentes, como, por exemplo, racional/emocional e elite/popular”. Ou seja, é um diagrama útil para posicionar diferentes marcas de uma mesma categoria e fazer uma avaliação dos diferentes potenciais destas (LUPTON, 2013, p.42).
A partir de uma observação de todas as referências estudadas foi possível definir dois pares de critérios para melhor organizar e avaliar estes materiais. Desta forma, as referências foram organizadas em um gráfico, a matriz de marca (Lupton, 2013), que as divide entre manuais/artesanais ou digitais, no eixo horizontal, e referências com
Figura 126: Exemplo de matriz de marca.
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DESENVOLVIMENTO DE PROJETO DE FANZINE CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES
maior ou menor quantidade de imagens, no eixo vertical. Estes critérios foram escolhidos por serem características que mais se destacam e/ou se repetem nos materiais estudados. Para a seleção de imagens, repassei todas as referências que foram estudadas ao longo do desenvolvimento do Trabalho de Conclusão de Curso e procurei incluir pelo menos um exemplo de cada artista, coletivo, ONG estudadas. No caso dos fanzines, como haviam muitos, fiz uma seleção buscando a maior variedade possível de linguagem. O quadrante 1 (imagens/manual/artesanal) reúne trabalhos mais artísticos, como o quadro de Judy Chicago e o quadrinho do fanzine Artemis. O quadrante 2 (imagens/digital) reúne trabalhos com uma estética mais punk, que mesclam o trabalho manual (recorte e manuscrito) com o digital (fotografia) como a montagem de Linder Sterling, os fanzines Rockrgrl e Shocking Pink, e também o trabalho artístico de Elisa Riemer, no extremo do digital. No quadrante 3 (digital/texto) se destacam infográficos e estatísticas, como o trabalho de Jinan Younis e Barbara Krueger, além dos textos e cartazes, do fanzine Clit e do material do coletivo feminista Rosa Lilás. No quadrante 4 (manual/artesanal/texto) são apresentadas páginas de fanzines, como Rebel Girl e Alarme Feminista, e trabalhos que se assemelham
a cartazes, como a obra de Sheila Levrant de Bretteville e o cartaz/absorvente do coletivo Madame Satã. Na região central do gráfico são apresentados trabalhos mistos, a maioria se assemelhando a cartazes, com ilustrações ou fotos acompanhadas de textos curtos, além das histórias em quadrinhos. Por meio desta matriz foi possível visualizar um resumo da produção de artefatos voltados para o movimento feminista. O posicionamento das referências nesta matriz e a revisão destas revelou que não existe um material muito similar ao fanzine proposto, o que é bastante positivo. Além disso, observar as referências nesta postura mais analítica possibilitou perceber os potenciais das linguagens aplicadas e inspirou a criação do fanzine. Especificamente pensando no público adolescente, percebeu-se que é preferível o equilíbrio de imagem e texto, ou a predominância de imagens, e o uso de ilustrações ou de mistos entre a linguagem artesanal e digital, destacando-se a região central do gráfico e as regiões mais próximas do centro dos quadrantes 1 (imagens/manual/artesanal) e 2 (imagens/digital).
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Figura 127: Matriz de marca das referências visuais e projetuais coletadas.
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DESENVOLVIMENTO DE PROJETO DE FANZINE CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES
7.2. MAPAS MENTAIS O mapa mental, desenvolvido por Tony Buzan, é uma ferramenta que permite ao designer “explorar rapidamente o escopo de um dado problema, tópico ou assunto. Partindo de um termo ou ideia central, o designer rapidamente mapeia as imagens e propostas associadas” (LUPTON, 2013, p.22). Para o desenvolvimento do projeto foram elaborados dois mapas mentais, um sobre o movimento feminista como um todo e outro sobre a adolescência relacionada ao feminismo, conforme apresentado a seguir.
7.2.1. MAPA MENTAL DO MOVIMENTO FEMINISTA Tendo como base toda a pesquisa realizada sobre o movimento feminista, foi elaborado um mapa mental que resume os tópicos encontrados e as relações entre eles. Foi bastante importante fazer este mapa mental para definir temas possíveis de serem abordados no material de forma organizada e sucinta.
Figura 128: Exemplo de mapa mental.
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Figura 129: Mapa mental do movimento feminista.
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7.2.2. MAPA MENTAL DA ADOLESCÊNCIA RELACIONADA AO FEMINISMO Tendo como base toda a pesquisa realizada sobre a adolescência feminina em relação com o feminismo, foi elaborado um mapa mental que resume os tópicos encontrados e as relações entre eles. Este mapa foi importante para filtrar, dentro dos tópicos do movimento feminista, aqueles que mais se aproximam do universo adolescente e que, logo, serão mais interessantes de serem abordados no projeto.
Figura 130: Mapa mental da adolescência relacionada ao feminismo.
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7.3. GRUPO FOCAL O grupo focal é uma conversa organizada envolvendo uma parcela de indivíduos. Esta conversa pode ser útil para planejar e definir objetivos do projeto ou para avaliar resultados (LUPTON, 2013, p.30).
7.3.1. DEBATE COM FEMINISTAS No dia 16 de abril deste ano, no período da tarde, realizei em minha casa uma reunião com sete amigas feministas para falar sobre a produção do fanzine. Primeiramente, apresentei o trabalho realizado até agora e distribuí post- its para que elas anotassem insights que surgissem durante minha fala e de outras participantes. A discussão começou com os comentários da Rafaela sobre o Crea+ (do espanhol Crea mas, creia mais), um dos locais onde pretendo aplicar a oficina de feminismo no semestre que vem. Segundo ela, neste ambiente, há uma reprodução do comportamento que os alunos vêem em casa, a mulher é vista como ser inferior, a mulher não é vista com igualdade, principalmente em relação à vida sexual. Os meninos dizem que vão sair com várias meninas mas que a namorada deles fica em casa, assim como é a relação do pai e da mãe. Não só as meninas da idade dos meninos são tratadas com menos respeito, mas também professoras e monitoras do Crea+. Os meninos buscam colocar defeito de alguma forma nas meninas, se não um defeito do aspecto físico, um defeito no caráter. Também foi debatido pelas participantes o quanto até mesmo as mulheres reproduzem o machismo, a própria mãe ensina a menina a se “comportar como uma mocinha”, entre outras situações. Em seguida Larissa comentou sobre sua experiência na escola, particular, com alunos de classe média alta, em que a própria diretora normalizava situações machistas, justificando que os meninos passarem a mão na bunda das meninas 90
seria algo justificável “por causa dos hormônios”. Foi debatida a diferença entre classes, concluindo que na periferia o acesso às informações é dificultado, é mais difícil tomar um primeiro partido, mas a mulher da periferia tem muita força pela própria vivência, a batalha diária. Sua reação é proporcional à opressão que sofreu, por isso quando mulheres com este perfil encontram o feminismo se apropriam rapidamente e de forma muito intensa. Nas classes mais altas haveria mais consciência de que certas atitudes são feministas, já na periferia as mulheres tomariam atitude sem saber contextualizar essas ações como parte do movimento feminista. Vivian comentou sobre a libertação sexual relacionada ao funk, twerk, como formas extremas de expressão, que fogem um pouco ao racional e a uma aproximação teórica do tema mas que configuram, também, formas de luta feminista. Sobre esse tema Beatriz comentou a respeito de uma música que diz que se as mulheres tivessem sua liberdade reconhecida não sentiriam essa necessidade de ir aos extremos da demonstração de sexualidade. Rafaela começou um debate sobre o livro Cinquenta tons de cinza, que, por mais que tenha um lado polêmico, machista, se popularizou porque abordava o prazer feminino de forma “permitida” isto é, mulheres poderiam ler esse livro no metrô e não somente escondidas, na internet. Além disso o livro mostraria que a mulher pode ter prazer, coisa que muitas mulheres não vivenciam. Marina apontou que por outro lado o livro romantiza um relacionamento abusivo, o que precisa ser problematizado porque as mulheres, ao ler o romance, poderiam reproduzir o comportamento dos personagens. O debate chegou à conclusão de que, apesar do lado negativo que existe e precisa ser problematizado, o sucesso do livro demonstrou que existe a necessidade de investir na sexualidade das mulheres, isto é, existe interesse do público, curiosidade. Sobre a adolescência, Vivian comentou a
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ideia do príncipe encantado que muitas vezes é colocada para as meninas, idealizando o homem como resolução dos problemas, o “salvador” das meninas, retraindo a ação independente das garotas, como se elas precisassem esperar por esse príncipe para ter felicidade. Além disso, comentou sobre a educação sexual que é dada às meninas, que muitas vezes acaba repreendendo o desejo, passando a ideia de temer o menino e o sexo. Houve um consenso de que o desejo feminino é reprimido de diversas formas na sociedade, que também afirma que os homens têm mais desejo do que as mulheres. Tal pensamento levaria a distorções como a da traição ser mais aceita quando vinda de um homem, por “fazer parte da natureza dele”, ou a naturalização de cantadas masculinas, dirigidas a mulheres, na rua. Sobre filmes pornô, Larissa, Tatiana e Beatriz comentaram que esta é uma indústria que passa a imagem da mulher submissa, sem sentir prazer, muitas vezes fazendo o sexo parecer doloroso. Neste ponto começou uma discussão sobre a corrente do feminismo radical, que segundo Tatiana tem como combustível o ódio. Amanda apontou que, na opinião dela, toda forma de expressão é válida mas que o ódio precisa ser uma fase do feminismo e não compô-lo como um todo, como muitas vezes acontece na corrente mais radical. Na sequência foi debatido o protagonismo e a forma como as próprias mulheres debatem o feminismo com outras pessoas, sobre a necessidade (e não necessariamente obrigação) de serem didáticas para que mais pessoas se tornem feministas ou pró feminismo. As participantes também demonstraram descontentamento com as intrigas que acontecem dentro do próprio movimento ou com um certo “ego feminista” que acontece em alguns eventos, quando parece haver uma competição de “quem é mais feminista”.
7.4. DECKS Para traduzir visual e conceitualmente a ideia de adolescência, foram produzidos quatro decks de imagens. O deck é uma ferramenta projetual derivada do teste psicológico de Rorschach, ou teste projetivo1. A ideia é expor os participantes a uma série de imagens de um mesmo tema (deck de pessoas, lugares, texturas, sensações) escolhidas de acordo com o projeto. A partir das respostas dos participantes é possível aferir sobre as imagens (e ideias) que fazem parte, ou não, do universo pesquisado. O resultado é um painel positivo e outro negativo, que servem como inspiração formal e conceitual para o/a designer. As participantes foram convidadas a escolher até cinco imagens de cada deck que mais se aproximam da ideia que fazem da adolescência e também aquelas que mais se distanciam, justificando suas respostas. A seguir é apresentado o resultado de cada um dos decks e também um resultado final.
7.4.1. DECK DE BORBOLETAS As respostas (figura 132) sobre o deck das borboletas (figura 131) concordam que a adolescência é uma fase de imaturidade, o que a reveste de certa simplicidade e leveza, pela ausência de questões consumadas na personalidade. Por outro lado, por ser uma fase de descoberta, movimento, é também um momento “colorido”, até psicodélico, no qual as meninas buscam sua originalidade. Algumas respostas também apontam para fragilidade e estranhamento, por ser uma fase obscura, de mudanças, que faz com que as meninas se sintam perdidas. Por outro lado, o resultado do deck de 1 Técnica de avaliação psicológica pictórica, desenvolvida pelo psiquiatra e Psicanalista suíço Hermann Rorschach. O teste consiste em dar respostas sobre com o que se parecem as dez pranchas com manchas de tinta simétricas. A partir das respostas, procura-se obter um quadro amplo da dinâmica psicológica do indivíduo.
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Figura 131 (acima): Deck de borboletas. Figura 132 (ao lado): Resultado do deck de borboletas, borboletas que representam a adolescência. Figura 133 (abaixo): Resultado do deck de borboletas, borboletas que não representam a adolescência.
Figura 134 (ao lado): Deck de luminárias. Figura 135 (abaixo): Resultado do deck de luminárias, luminárias que representam a adolescência.
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borboletas que não representam a adolescência (figura 133) indica que ela não é um momento de maturidade, peso, consistência, confiança, sobriedade e seriedade.
Figura 136: Resultado do deck de luminárias, luminárias que não representam a adolescência.
7.4.2. DECK DE LUMINÁRIAS As respostas (figura 135) sobre o deck de luminárias (figura 134) apontam para a descontração. As imagens escolhidas expressam o lado criativo, divertido, carismático, colorido e cheio de curvas. Além disso também se destacam as luminárias que expressam diversidade, excesso de informações e improviso. Sobre o deck de luminárias que não representam a adolescência (figura 136), se destacam os padrões mais geométricos, requintados, clássicos, limpos, sérios e formais.
7.4.3. DECK DE FLORES A respeito do deck das flores que representam de alguma forma a adolescência (figura 138), várias respostas apontaram para as flores que parecem estar em um movimento de abertura, descoberta, assim como as respondentes consideram que seja a adolescência. Também se destacam respostas que apontam para originalidade, complicações, excesso de informações, intensidade. Além disso, assim como no deck das borboletas, algumas imagens foram escolhidas por expressarem certa simplicidade, ingenuidade, típicas da adolescência. No deck negativo das flores (figura 139), foram apontadas aquelas que têm formas muito complexas, rebuscadas, que demonstram maturidade, assim como flores que tenham cores que passam a sensação de serem mais adultas, por terem tons fortes, ou se serem muito sóbrias, com tons muito claros.
Figura 137 (acima): Deck de flores. Figura 138 (ao lado): Resultado do deck de flores, flores que representam a adolescência. Figura 139 (abaixo): Resultado do deck de flores, flores que não representam a adolescência
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7.4.4. DECK DE SENSAÇÕES Sobre as sensações que representam a adolescência (figura 141) destacam-se aquelas relacionadas a movimento, descoberta, mistério, bagunça e conflitos. São imagens com muitas cores vibrantes e que resumem uma fase confusa mas que, de modo geral, é feliz, descontraída, algumas destacando o clima de festa e inconsequência. Das sensações que não representam (figura 142) a adolescência se destacam aquelas imagens mais sóbrias, calmas, monótonas, frias, formais, duras e geométricas.
Figura 140 (acima): Deck de sensações. Figura 141 (ao lado): Resultado do deck de sensações, sensações que representam a adolescência. Figura 142 (abaixo): Resultado do deck de sensações, sensações que não representam a adolescência.
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7.4.5. RESULTADO FINAL DOS DECKS O painel final ilustra uma fase da vida revestida de muitas cores e explosões que, por um lado, rumam para formas curvas, orgânicas, cores alegres, espontaneidade, originalidade, diversão e, por outro, para o mistério, a descoberta e o caos. Dentro deste painel é possível reconhecer ideias até mesmo contraditórias entre si, mas nem todas as referências foram aproveitadas ao mesmo tempo nas propostas desenvolvidas no decorrer do projeto. O painel foi, portanto, uma ferramenta bastante útil para aferir sobre a ideia que as participantes fazem da adolescência e para inspirar possíveis propostas de desenvolvimento do projeto.
Figura 143: Resultado final dos decks.
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7.5. BRAINSTORMING “Brainstorming significa atacar um problema de todas as direções possíveis de uma só vez, bombardeando-o com perguntas rápidas para chegar a soluções viáveis”, ou seja, definido o foco do projeto, o brainstorming é o momento de ter o máximo de ideias possíveis e tentar um desdobramento destas ideias para chegar a outras (LUPTON, 2013, p.16).
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7.5.1. BRAINSTORMING DE SEÇÕES PARA O FANZINE O primeiro brainstorming realizado pela autora foi das seções que seriam produzidas para o fanzine. A partir da pesquisa realizada sobre adolescência, feminismo e também sobre os materiais gráficos produzidos para o movimento feminista, algumas possibilidades de seções foram surgindo, listadas a seguir. •
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Fanzine-campanha colaborativo no qual a leitora é convidada a dar seu relato por escrito e, depois de terminar a leitura, repassar para outra garota; Desdobramento do fanzine para cartazes colaborativos espalhados estrategicamente nos quais as leitoras são convidadas a darem seus relatos; Linha do tempo do movimento feminista; Conceitos-chave traduzidos graficamente acompanhados de textos explicativos; Gráfico representando os coletivos feministas, localização, história; Exercícios que levam à reflexão sobre o feminismo, como cruzadas, caça palavras, jogo dos sete erros, etc; Estatísticas relevantes sobre o movimento feminista já existentes; Novas estatísticas relacionadas ao feminismo com recorte do público em escolas,
ou bairros; Mapa do movimento feminista, apresentando um resumo geral do movimento e ilustrando a conexão entre temas diversos dentro do movimento feminista; Criação da história de uma personagem de HQ que está começando a estudar o feminismo e, através da história da personagem, apresentar conceitos e uma leitura do movimento como ele é hoje; Seção de colaboradoras e convidadas, para fortalecer o relacionamento da proposta com outros projetos existentes e com as meninas das escolas nas quais forem realizadas oficinas.
Dentre estas, a principal ideia que foi escolhida foi a de criar uma personagem, tendo em vista que isso poderia provocar uma identificação do público adolescente, tornando o fanzine mais cativante. A partir do desenvolvimento da história da personagem, seriam produzidas outras seções das listadas acima que abordassem o mesmo tema, permitindo o aprofundamento das leitoras. Além disso, foi decidido sempre incluir uma seção de colaboradoras e convidadas.
7.5.2. BRAINSTORMING DE NOMES PARA O FANZINE O segundo brainstorming realizado pela autora foi de nomes para o fanzine. A partir da pesquisa sobre adolescência e feminismo defini três vertentes e os consequentes nomes, que apresento a seguir. O brainstorming não aconteceu necessariamente em uma sessão, as ideias foram sendo desenvolvidas durante alguns dias, até chegar às ideias apresentadas. •
Descoberta – relacionada tanto à fase da adolescência, a descoberta do próprio corpo e da personalidade, quanto ao
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feminismo, enquanto tema a ser descoberto e estudado aos poucos. À esta ideia também está relacionada a ideia de mistério. Sobre estas ideias foram criados os nomes MERGULHO e MERGULHA. Nestes o feminismo é visto como um universo no qual a adolescente é convidada a mergulhar. Também foi pensado um possível desdobramento do nome do fanzine para a história em quadrinho, que seria composto do nome da personagem acrescido de “mergulha” (Por exemplo, se o nome da personagem for Mari, o nome da história em quadrinhos seria MARI MERGULHA); Acolhimento/imaturidade + transformação/ruptura – ideia relacionada à questão de amadurecimento na adolescência e no movimento feminista. Desta ideia surgiram as propostas de nome CASULA e LAGARTA FEMINISTA. A primeira, neologismo derivado da palavra casulo, sugerido pela orientadora em uma das reuniões de orientação, remete à um lugar seguro onde a garota se protege e se constrói, aos poucos, visando um amadurecimento, a metamorfose. O feminismo aqui é visto como um ambiente acolhedor que protege e fortalece a menina, onde ela se prepara para encarar o mundo. Além disso, foi levado em conta que o formato do casulo lembra o formato de uma vagina, dando mais valor à proposta. A segunda ideia, Lagarta Feminista, é uma forma mais lúdica de remeter às mesmas ideias, focando na personagem da lagarta. Imaginei uma personagem que, em momentos específicos da história, assume o formato de uma lagarta, que também poderia se repetir ao longo do fanzine. A ideia da lagarta também poderia ser aplicada na primeira proposta, Casula; Começo – ideia relacionada aos primeiros contatos da adolescente com o feminismo. Dela surgiu os nomes DESPERTAR
e DESPERTA, que associam o momento de encontro com o tema do feminismo ao despertar da menina para a realidade como ela é, reconhecendo a origem das opressões que sofre e aprendendo a enfrentá-las.
7.6. QUESTIONÁRIO ONLINE O questionário online é uma ferramenta que permite aferir a opinião das futuras leitoras de forma prática e em grande quantidade. Foi utilizado para que desde a decisão do nome as leitoras já tivessem participação, aumentando sua identificação com a publicação. O questionário foi elaborado no Google Docs e foi divulgado pelo Facebook, em algumas páginas de projetos feministas e também na minha página pessoal. Foram obtidas 262 respostas em cerca de uma semana.
7.6.1. QUESTIONÁRIO ONLINE PARA DECISÃO DO NOME DO FANZINE Dentre as propostas de nome, as preferidas foram CASULA, LAGARTA FEMINISTA, MERGULHA e MERGULHO. Para decidir o nome do fanzine foi criado um questionário online, que foi respondido por 262 meninas e mulheres, a partir de 10 anos (figura 144). Com grande maioria de votos (56,9%) o nome escolhido foi Casula (figura 145). Por último, foi oferecido um espaço para justificar a resposta, nas quais é possível perceber as motivações para a escolha do nome: “Acho casula menos literal, mais lúdico. Também a ideia de acolhimento (e também de estar um pouco acomodada até o momento da transformação) também é muito pertinente.”
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QUAL A SUA IDADE?
“Seria legal até criar um verbo a partir da palavra. Por exemplo casular: proteger a si e as suas, em nome da sororidade. Sei lá!” “Casula é um nome simples e tem mais significados próximos da mulher que os outros. É muito fofo!” “Parece até nome de uma mulher, ia ser legal futuramente criar uma personagem com este nome.” “Gosto do Casula, porque a ideia de feminismo
10-14 anos (3,8%) 15-19 anos (22,5%) 20-24 anos (44,3%) 25 ou mais (29,4%)
Figura 144: Gráfico. Idade das respondentes.
para mim está relacionada a desconstruções e transformações. Acho que aborda muitas vertentes do que o feminismo representa em um único nome, e a ideia do formato é bem bacana :)” “Achei a ideia sensacional do nome ser casula, pelo simples fato de representar a transformação e ter absolutamente tudo a ver com a proposta.”
QUAL DESSES NOMES VOCÊ ACHA MAIS LEGAL PRA UM FANZINE (REVISTA INDEPENDENTE) FEMINISTA PARA MENINAS ADOLESCENTES?
“O termo parece um neologismo que confere mais identidade e originalidade à publicação.”
Casula (Pela ideia de transformação, virar borboleta, e também porque o casulo é um lugar seguro, de acolhimento, e tem um formato que lembra uma vagina) (56,9%). Lagarta feminista (Pela mesma ideia de transformação, mas desta vez focada na personagem da lagarta) (6,5%). Mergulho (Pensando na ideia de se aprofundar em um tema, que é o feminismo, parar um tempo para se dedicar a isso) (6,5%). Mergulha (Pensando na ideia de se aprofundar em um tema, que é o feminismo, parar um tempo para se dedicar a isso) (30,2%). Figura 145: Gráfico. Resultado do questionário.
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Figura 146: Exemplo de brain dumping visual.
7.7. BRAIN DUMPING VISUAL O Brain dumping visual é uma técnica de brainstorming que, ao invés de ser uma atividade verbal e geralmente realizada em grupos, é visual e apropriada para fazer individualmente. A técnica é conhecida por ser utilizada pela designer Luba Lukova (LUPTON, 2013, p.62). Tendo como base o resultado dos decks, foram estabelecidos alguns critérios para criação da identidade do fanzine, são eles: •
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Ter elementos com formas não muito complexas, que expressem com simplicidade os valores da adolescência feminina; Ter elementos com formas curvas e autênticas;
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• •
Ter elementos com formas não muito limpas, que expressem certa confusão e improviso; Expressar movimento; Ser cativante para o público adolescente, ter uma identidade simpática, mas sem parecer infantil demais.
A partir destes critérios, primeiramente foi realizado um brain dumping visual apenas com as possíveis tipografias do logotipo, conforme segue. Também foi feito um braindumping visual da personagem central do fanzine, foram feitas versões da personagem em forma de humana e em forma de lagarta.
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Figura 147: Brain dumping visual de tipografias para o logotipo e para serem usadas no fanzine.
Figuras 148 e 149 (ao lado): Brain dumping visual da personagem.
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Figura 150: Brain dumping visual da personagem.
7.8. ESTUDOS DA PERSONAGEM Assim que foi definido o desenho da menina e da lagarta foram feitos estudos da personagem com diferentes expressões.
Figuras 151 e 152 (acima e ao lado): Estudos de expressões da personagem.
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7.9. ESTUDOS DE LAYOUT E DE ELEMENTOS DA IDENTIDADE VISUAL Para criar a identidade visual e o layout do fanzine foram definidos alguns padrões iniciais, considerando que o material seria impresso em preto, para barateá-lo, tendo como finalidade a facilidade em criar o material e a qualidade da impressão. Estes padrões são: • •
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Utilizar fotografia e ilustrações juntas; Utilizar efeito de retícula ou outro tipo de efeito que funcione bem na impressão em preto; Escolher pelo menos duas tipografias padrão, uma para título e outra para textos, que sempre se repetirão no material.
Os primeiros testes foram feitos com a capa e, a partir da escolha da tipografia e dos efeitos a serem usados na capa, foi possível fazer testes de layout de páginas internas do fanzine.
Figuras 153, 154, 155 e 156 (todas abaixo): Estudos da capa.
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Figuras 157, 158 e 159 (todas ao lado: Estudos de pรกgina dupla do fanzine.
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7.10. ELABORAÇÃO DA HISTÓRIA EM QUADRINHOS
Figura 160: Rascunho da história em quadrinhos.
Para elaborar a história em quadrinhos, primeiramente foi feito um roteiro com as falas das personagens e a sequência de acontecimentos. Com base neste roteiro, foi possível fazer um primeiro rascunho da história (figura 160). A partir do roteiro, sabendo dos diferentes desenhos das personagens que seriam necessários, passamos para a elaboração destes desenhos (figuras 161 a 165). Os desenhos foram xerocados e, então, contornei a cópia para manter os desenhos originais editáveis. Para o contorno do desenho foi utilizada caneta Stabilo preta de ponta 0.4. Com o roteiro, o rascunho dos quadrinhos e os desenhos dos personagens prontos, foi possível finalizar a produção da história em quadrinhos (figuras 166), que só passou por mais uma alteração de layout, quando foi definido que o fanzine seria em formato A6.
Figura 161, 162, 163 e 164: Desenhos das personagens para a história em quadrinhos.
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Figura 165: Desenhos das personagens para a histรณria em quadrinhos.
Figura 166: Primeira pรกgina da histรณria em quadrinhos, em formato A4.
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8. CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES Casula é um fanzine feminista para garotas adolescentes, resultado de processo de pesquisa sobre o tema do movimento feminista, das ações voltadas para o seu desenvolvimento e da relação entre tudo isso e o momento da adolescência. A seguir apresentamos o resultado do projeto e as motivações para as escolhas feitas.
uma tiragem muito grande para compensar o gasto, se fosse menor não acolheria o conteúdo de forma satisfatória. Feitos os testes, o formato A6 se mostrou mais interessante porque dividia melhor o conteúdo, principalmente a história em quadrinhos, otimizando a experiência de ler o fanzine.
8.2. CAPA 8.1. PAPEL, FORMATO E COR Um dos principais objetivos do material é que tenha baixo custo, por essa razão foi escolhido trabalhar com a impressão em uma cor (preto) e com um papel barato, o sulfite 75g. Para valorizar mais o projeto, optamos pelo sulfite colorido e por um papel mais refinado para a capa, a princípio utilizamos o Lumipaper 90g, mas também poderia ser utilizado o papel Color Plus 90g. O formato escolhido foi o A6, devido ao conteúdo do material. Foram feitos testes em A5 e em A6, era necessário que fosse um destes dois formatos por causa do custo e do conteúdo. Se fosse em um papel maior, provavelmente exigiria
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A capa traduz a maioria dos elementos da identidade do fanzine e contém uma síntese do tema da edição. Além disso, apresenta o contato da autora e o endereço da página do Facebook do Casula. Para definir a cor da primeira edição foram feitos vários testes de impressão em papeis coloridos.
8.3. HISTÓRIA EM QUADRINHOS A história em quadrinhos é a seção que guia o desenvolvimento das demais, nela a personagem (a adolescente Rebeca) vive experiências relacionadas ao feminismo e se descobre feminista. A evolução
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Figura 167 (acima): Capa da versão teste. Figura 168 (ao lado): Testes de impressão da capa para escolha da cor da primeira edição. Figura 169 (abaixo): Página dupla da história em quadrinhos da versão teste.
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Figura 170 (acima): Página dupla da história em quadrinhos da versão teste. Figura 171 (abaixo): Página dupla dos relatos da versão teste. Figura 172 (mais abaixo): Detalhe do texto da seção de relatos, linguagem direta e uso da figura da lagarta para causar descontração.
da personagem no conhecimento dos temas relacionados ao movimento feminista faz com que a leitora também evolua. As outras seções do fanzine sempre apresentarão conteúdos relacionados aos acontecimentos da história em quadrinhos.
8.4. RELATOS A seção de relatos foi pensada para aproximar ainda mais a leitora e para mostrar que, assim como a personagem da história em quadrinhos, outras mulheres também sofrem no dia-a-dia por causa do machismo e se identificam com os ideais feministas. Embora a versão teste contenha essa página em branco, a ideia é coletar relatos de mulheres e incluir alguns no fanzine, deixando espaço para a participação da leitora também. A linguagem adotada é direta, na medida do possível busca criar um contato informal e confortável com a leitora, além de divertido, pela aparição da lagarta e pelas falas mais descontraídas dela.
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8.5. CONTEÚDO
8.7. GLOSSÁRIO
A seção de conteúdo busca trazer um aprofundamento no tema do fanzine, de uma forma mais direta, o que seria mais difícil de conseguir na história em quadrinhos por ficar longa demais.
Como a teoria feminista envolve uma série de termos que podem não ser do conhecimento das leitoras, incluímos um glossário no qual definimos os termos que consideramos mais específicos e que aparecem naquela edição do fanzine.
8.6. PÁGINA DA CONVIDADA 8.8. CRUZADINHAS Tendo em vista o papel do fanzine como disseminador da cultura alternativa e independente, consideramos importante deixar um espaço para a divulgação do trabalho de outras meninas e mulheres, desde que relacionados ao tema do fanzine. Entramos em contato com algumas possíveis colaboradoras mas estamos aguardando resposta.
Assim como a seção de conteúdo, as cruzadinhas oferecem um aprofundamento no tema, com o diferencial de ser um aprendizado lúdico no qual a leitora deve pesquisar, no próprio fanzine ou fora dele, e anotar as respostas.
Figura 173: Página dupla de conteúdo da versão teste.
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Figura 174 (ao lado): Página dupla do glossário e apresentação da versão teste. Figura 175 (abaixo): Página dupla das cruzadinhas da versão teste.
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Figuras 176 e 177
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Figuras 178 e 179
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Figuras 180 e 181
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Figuras 182 e 183
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Figuras 184 e 185
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Figura 186
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9. CONCLUSÕES
A realização do Trabalho de Conclusão como um todo foi um processo muito enriquecedor tanto do ponto de vista pessoal, no interesse contínuo pelo tema, quanto do ponto de vista acadêmico, na evolução da formulação e realização de pesquisa e na proposição e execução de projeto de fanzine. A escolha de um tema no qual eu tenho tanto interesse foi fundamental para manter o estímulo e chegar a esta etapa final. Os aprendizados sobre elaboração de pesquisa e a elaboração em si me inspiraram a uma possível carreira acadêmica e me fizeram ter uma visão mais completa do Design, relacionado a outras àreas do conhecimento, de profunda relevância social. Pela proposta de projeto ter sido um fanzine foi possível vivenciar todas as etapas da produção, constituindo uma experiência quase única, tanto na graduação quanto na vida profissional, até agora.
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Sobre a orientação e formato da disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso, causaram em mim uma grande evolução em relação aos trabalhos desenvolvidos para as demais matérias da graduação, por exigirem uma outra maturidade e iniciativa. A pesquisa sobre o movimento feminista revelou todo um universo que ainda estou começando a explorar, mas que é promissor e cheio de demandas para o design e a comunicação. Trabalhar para este tema foi, para mim, uma enorme responsabilidade e estou feliz por ter concluído esta etapa, animada para continuar estudando e produzindo materiais, na esperança sincera e otimista de que são essas pequenas coisas, como um fanzine de 105 por 148,5 milímetros, que fazem do mundo um lugar melhor.
CONCLUSÕES CASULA, UM FANZINE FEMINISTA PARA ADOLESCENTES
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