Encontros - Thaís Forte e Lucas Dilacerda

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encontros


30 DE AGOSTO DE 2017 // LUCAS DILACERDA

série cicatriz rosângela rennó (1996)

neste trabalho, rosângela se apropria de imagens de arquivo engavetadas nos porões da polícia. fotografias tiradas por policiais com o intuito de identificar os corpos dos presidiários pelas suas marcas, suas tatuagens. o que me chama atenção neste trabalho da rosângela? 1. as próprias imagens em si já são incríveis. elas sozinhas já tem muita potência. um pedaço de fotografia de um pedaço de corpo com uma tatuagem escrita "AMOR". é forte, me emociona; 2. ela torna visível o olhar subjetivo e invisível da polícia. como se olha um corpo? de que maneiras pode se olhar o mesmo corpo? como a polícia olha para o corpo do presidiário? as fotografias revelam este olhar policial, e ao mesmo tempo que ela nos empresta o olho do policial pra ver a imagem que ele viu (as fotografias dos corpos tatuados), ela cria uma nova tensão, porque ao mesmo tempo que é forte, triste, melancólico, também é bonito, frágil e delicado;


3. ela me faz pensar em uma diferença ontológica entre o olho e o olhar. qual a diferença entre o olho e olhar? eu poderia dizer que um olho de um peixe não é o mesmo olho de um ser humano, nem o mesmo olho de uma coruja. o olho da câmera do teu celular não é igual ao olho da lente da minha câmera analógica. poderia ser mais radical a tal ponto de dizer até que meu olho não é igual ao teu. parece que cada olho tem suas regras, suas limitações, sua "moral". mas cada olhar a sua "ética". todo olhar é subjetivo, por mais limitantes seja a objetividade do olho; 4. qual o olho da polícia? qual o olhar da polícia? como se olhar para um corpo de um presidiário? com que olho? com que olhar?; 5. as instituições (a prisão, a escola, o manicômio, etc.) possuem olhos e olhares; 6. fico com vontade de fazer uma série que torne visível o olhar e o olhar da psicologia, da psiquiatria, dos profissionais de saúde mental. como eles olham para um corpo do presidiário? com que olhar? onde se produzem estas imagens? fico com vontade de vasculhar as fotografias antigas da época do hospital psiquiátrico mira y lópes, como foram produzidas? que parte do corpo interessavam à eles fotografar? como eram essas fotografias? qual a função dessas imagens?; enfim, tenho muitas outras questões, mas o texto já tá muito grande, depois conversamos melhor ao vivo.


26 DE SETEMBRO DE 2017 // THAÍS FORTE

lucax, essa série da rosângela e o privilégio dos seus comentários a acompanhando ayyy c'est l'amour! eu era muito tomada, inicialmente quando criança mas isso ainda me acompanha em outros moldes, no questionamento de ''será que o azul que eu vejo é o azul que você vê? como podemos saber?''. coincidentemente, ontem igor me mandou um poema de laura liuzzi('autorretrato') que trazia o seguinte trecho ''Conservo a interrogação quando de frente ao espelho: como pode ser tão diferente o frontal do perfil? E me pergunto, desde lá se todos enxergamos as mesmas coisas se a língua não é tão só um mesmo código para coisas distintas se entre mim e você não há um abismo sem solução.'' e acho que isso comunica e mantém em movimento essa turbulência do olho-olhar,


sigamos produzindo com isso. muito me interessa também. em relação às imagens institucionais que tratam da milaspas doença mental fechamilaspas, o didi tem um livro né, 'invenção da histeria' que talvez seja de boas pistas pra esse nosso caminhar, não tenho o livro mas muito interesse nessa aquisição. enfine, vamas pensanda <..3


04 DE OUTUBRO DE 2017 // LUCAS DILACERDA

TROCA DE CARTAS OU UMA ESCRITA A DOIS

ay miga <3 tu tocou em muitos pontos, vou tentar comentar cada um deles.

eu amei esse poema da laura liuzzi, não a conhecia. dei uma googleada rápida aqui e encontrei o poema completo na revista piauí. que inclusive, aliás, já tinha visto você compartilhar coisinhas muy interessantes de lá. depois me explica essa revista, também não a conhecia. adoro conhecer coisas novas. ~*

"Basta um olhar à fotografia – o bebê no colo o papel envelhecido. Ao mesmo tempo que um avança somando anos o outro recua, mais antigo."


k@®@Lh* -- que poema foda! quantos sentidos de tempo possuem uma fotografia? flechas pro futuro e flechas pro passado. <3

alguns trechinhos que me matam de palpitação <3

"quando tatuagens não eram para sempre."

"Eu fechava os olhos para ver as cores no escuro."

<3

o poema dela é muito fregeano, e tem tudo a ver com o teu questionamento de infância, que não é passado, mas que é presente em outros modos porque "A infância ainda gravita em mim" (LIUZZI, Laura).


[pausa pra momentinho acadêmics]

sobre as palavras e as cores:

sobre o poema ser fregeano, esse texto do gottlob frege é clássico nos estudos da linguagem, e sendo incorporado aos estudos de esquizofrenia aos pouquinhos. o frege é matemático, mas estudado pela filosofia. o texto fala da relação da palavra (sentido) e as coisas (referência), é longo, mas não tão difícil, posso comentar ele pra ti depois: http://www.revistafundamento.ufop.br/Volume1/n3/vol1n 3-2.pdf

pro frege, teu questionamento de infância não seria estético-epistemológico (em relação às experiências sensíveis advindas pelos nossos sentidos, no caso, o olhar vindo tanto do olho, mas também da pele, do ouvido, da boca, do cu, do pé, da nuca -- o corpo também tem olhar, e nem precisa devir-olho). o problema seria um problema de linguagem. [acredito que não ficou claro, mas podemos conversar mais sobre isso depois]


em 2015, meu curso organizou o [colóquio internacional de cores], não sei se você ficou sabendo, eu tava no 1º semestre, entendia nada, as palestra quase tudo inglês, mas ó, depois vale a pena dar uma pesquisada sobre [qualia]. é um termo utilizado na filosofia da mente e na neurociência contemporânea, provavelmente tu já conheça, mas ó:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Qualia

[fim do momentinho chatis acadêmics]

meudeuuusss esse livrinho do didi <3 tu acertou em cheio no ponto, apesar de eu nunca ter lido, tenho muito interesse em ler real. na real real, quero começar a estudar [de verdade] didi nesse semestre. se tu tiver interesse podíamos ler / estudar algo juntinhes. tenho vontade de ler quase tudo dele, mas queria começar por alguma obra mais tranquila. pode ser essa, ou outra (vamos escolher?).

tu sabia que esse livro foi o 1º que ele publicou? comentário do próprio didi:


"Este livro, o primeiro que publiquei, já com seus trinta e poucos anos, o que dizer dele hoje? Nunca o reli. Poderia até dizer que nunca o li. Certamente o abordei, construí, escrevi, e depois o discuti asperamente com Jean Clay, o mago das Éditions Macula. Por fim, deixei-o entregue a seu destino. Mas, bem depressa, seu estilo tornou-se insuportável para mim: estranho demais e familiar demais, ao mesmo tempo. Reconheci nele, de modo muito imediato e claro, a voz inquieta do homem moço que procura e procura um estilo, estilo que, por sua vez, procura uma resposta – um 'responso', melhor dizendo – para seu objeto intimidante, esse 'feminino terrível' da histeria na Salpêtrière. Busca penosa e muito dramatizada. Sucedeu-me ouvir, no presente de minha pesquisa, os gritos de dor dos pacientes femininos e masculinos internados nos pavilhões que cercavam a Biblioteca Charcot, onde eu estava explorando o arquivo de todas essas dores passadas. Foi bem perto dali, em 1984, que morreu Michel Foucault, a quem este livro deve o apoio recebido para sua publicação, em 1982. Insuportáveis os gritos ouvidos no presente, imaginados no passado, insuportável a debilidade da minha voz diante deles. Ao pousar os olhos apenas nas primeiras frases do livro, fui tomado pelo mesmo sentimento doloroso que me traria ouvir numa gravação minha voz de adolescente, às voltas com a dificuldade de entrar no mundo de uma fala adulta. Primeiro livro, livro de fase da muda. Audácias e inabilidades. Assim, de modo algum eu poderia julgar este livro – ou sequer


relê-lo – hoje em dia, a partir de certa altura improvável adquirida nesse meio-tempo. Sei apenas que foi a partir dele que todo o meu trabalho seguiu seu rumo, sua bifurcação inicial, sua decisão que conduziu todo o resto."

consegui o livro em .pdf (só que em inglês), dá pra ir lendo com aquelaaaaa paciência triplicada, mas pelo menos já da pra ver as fotografias das pacientes histéricas. gradecido pela referência miga, tu ahaza muy mais que demais! <3


07 DE DEZEMBRO DE 2017 // THAÍS FORTE

lucaxx, me matas com essas esmiuçadas e atenções lindas <..3 issoquétroca!

começando pela vontade de ler didi, já que ela existe pulsante por aqui também, acho que seria increible começarmos com 'a invenção da histeria'. achei lindo esse trecho que cê trouxe dele comentando o livro, sendo um ponto que me encontro muito esse de se sentir imatura/ingênua nesses começos de aventuras pelas artes e pela academia também; assim, instiguei muito de começarmos errôneos como didi diz ter começado. esse é um livro que venho paquerando a uns tempos, junto com gabriel até, então poderíamos pensar (os 3, quem sabe, no aguardo desse retorno do boy rs) num grupinhe amado.

sobre as cores; não conhecia o 'qualia' então muy recente para me deter em comentários mas a reverberar. curiosíssima por esse frege pois matemática-esquizo são contatos até então imprevisíveis pra mim. texto aqui aberto, rolará quando rolar ; )


sobre a piauí; é uma revista criada pelo muso joão moreira salles que versa centralmente sobre política e cultura. o que é massa é que eles têm os colaboradores mais cool rs e convidam pessoas bacanas pra publicar, como é o caso da laura! sobre sua foto de perfil/frontal é total sua visão alien maravilhosa �

deixo, por fim, o ‘‘atravessar a dor em dias azuis’‘, da néle azevedo, trabalho que conheci a poucas semanas e ficou grudadinho comigo. o azurrrrl


06 DE JANEIRO DE 2018 // LUCAS DILACERDA

outro trabalhinho da rosângela rennó. só que dessa vez em vez de tatuagens, são cicatrizes e marcas nas cabeças. fotografias criadas pelo poder policial para controlar os presos. repito todas minhas considerações que tinha feito no meu comentário anterior acerca do olho e olhar das instituições. e acredito que isso tem tudo a ver com os tempos contemporâneos em que vivemos com intervenção militar no rio de janeiro e com a tua ideia das imagens de arquivo (assim como também são as da rosângela) só que de buracos de fuga, e não buracos de cabeça rsrsrs. mas buracos. novamente fotos tiradas por policiais, este mesmo sujeito-fotógrafo, um mesmo olho, um olhar. registrando buracos de tentativas de fuga. "o buraco é mais em baixo"


22 DE FEVEREIRO DE 2018 // THAÍS FORTE

oburacoémaisembaixo 1. fuga como tradução, transposição de afetos. ideia de expulsão de um espaço inviável, rígido que continuamente empurra os que lá estão para fora. os impele a sair. eles se projetam para fora e esbarram numa estrutura de, supostamente, ultra proteção e monitoramento, 2. há uma ‘’tensa coreografia de controle’’(v. pinho) pelos policiais e pela instituição, 3. fuga enquanto quebra e ruptura com uma linearidade, 4. pensar a ideia de liberdade que se põe nesse contexto, já que a ela é associado o motivo central das pessoas quererem sair dessa prisão (arquitetônica e afetiva), 5. fiquei pensando se nos concerne aqui querer tratar das outras prisões, as metafóricas, no sentido de sairmos de uma prisão- cadeia- para voltarmos a outras estruturas mais sutis de controle. uma certa circularidade dos regimes de controle e uma repetição na produção da figura do delinquente; quem já cometeu um crime passa a ser visto de uma outra forma pelo sociedade, além das altas taxas de ‘’reinserção’’ nesse suposto regime de delinquência,


6. quando alguém foge da prisão, ao invés de cumprir sua penalidade e não ter mais dívidas com a sociedade, passa a acumular ainda mais penas. a que custo? pensar também o nível de repúdio que se tem à instituição prisão, tudo nela expulsa para fora? 7. arte e crime como fugas à coerção e à rigidez (adorno), 8. ‘’alegoria da fuga’’ como contraponto ao sentimento de encarceramento 9. ideia de fuga para algo melhor 10. a noção de coreografia, a partir de coreopolítica, coreopolícia(andré lepecki) tem se aproximado do que me interessa construir nesse projeto. pensar o movimento desses corpos, corpos que penetram superfícies de terra, úmidas, que repetem um movimento de abrir caminhos- estar de quatro, a força nos braços e nos joelhos, o momento de saída como aquele em que o corpo se ergue novamente- assim como a postura dos humanos das cavernas e a nossa. como podemos criar uma instalação que possibilite um nível de imersão corporal? 11. as imagens que usaremos; ‘’fotos tiradas por policiais, este mesmo sujeito-fotógrafo, um mesmo olho, um olhar’’(dila). o olhar é dos policiais, mas queremos formar um olhar? qual olhar? se o olhar é dos policiais, o corpo tem de ser nos apenados inquietações.


04 DE MARÇO DE 2018 // LUCAS DILACERDA

oburacoémaisembaixo 12. pegar 2 (duas) salas do museu. fechar uma das duas salas, fechar com 4 paredes, trancafiar. fazer um buraco na parede comum entre as duas salas como passagem. fazer com que o expectador atravesse esse buraco para chegar a outra sala. 13. fazer buracos para ver a paisagem / desejo de ver o infinito: https://jardimdohermes.com/2017/10/10/junior-pimenta-c e/ 14. brincar com objetos de ver / desejos de ver: lupa, óculos, binóculos, telescópio, luneta, câmera, lanterna etc. (usaremos só os materiais de que os apenados têm acesso?) 15. o que resta das pessoas que fogem? o que ficou delas nas celas? roupas? memórias? para além do que vai embora pela fuga, o que permanece? o que restou? o que não fugiu? 16. primeira fuga: https://www.healthnutnews.com/wp-content/uploads/201 7/10/bigstock-C-section-birth-7501051.jpg


buracos


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