Vila do Arvoredo - Dignidade Dentro da Cidade

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vila do arvoredo dignidade dentro da cidade



Universidade Federal de Santa Catarina Departamento de Arquitetura e Urbanismo Trabalho de Conclusão de Curso I Acadêmico: Lucas Affonso Passold Orientadora: Maria Inês Sugai 2014

vila do arvoredo dignidade dentro da cidade





índice Introdução 02

PARTE 01 - O DISTRITO INGLESES DO RIO VERMELHO

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Caracterização atual do bairro

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O Plano Diretor no Distrito dos Ingleses

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PARTE 02 - AS DUNAS MOÇAMBIQUE-INGLESES

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Caracterização das dunas

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As dunas dos Ingleses

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A ação antrópica

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Variáveis ambientais

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A preservação da praia dos Ingleses

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O avanço das dunas

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PARTE 03 - O CASO DA VILA DO ARVOREDO

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O histórico da ocupação

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A relação da comunidade com as dunas

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Dados atuais sobre a comunidade

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As relações da Prefeitura com a região da Rua do Siri e a Vila do Arvoredo

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Ações reais sobre a cidade real

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PARTE 04 - DIRETRIZES DE PROJETO

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Bibliografia


introdução

O Brasil é marcado historicamente pela desigualdade e, embora venha diminuindo o nível de pobreza nos últimos anos, ainda produz cidades baseadas em expressivas diferenças sociais. O papel do arquiteto e urbanista é imprescindível para a conformação de iniciativas que ampliem a discussão sobre esses problemas. Nossas cidades estão sendo construídas socialmente através de uma correlação de forças em que na maioria das vezes é uma minoria que prevalece, com o desejo de crescer e reproduzir o seu capital, conduzindo o Estado e os próprios investimentos da cidade ao seu favor. São os empresários do capital imobiliário. Em contrapartida, a maioria, a classe trabalhadora, as pessoas que mais precisam dos investimentos para a melhoria de suas casas (e todos os fatores que fazem com que essa casa seja digna de se morar) e a sua inserção social, por falta de opção acabam injustiçadas. São obrigadas a morar em favelas e subúrbios onde, com o seu mísero salário, tentam a cada dia sobreviver contando as moedas para pagar o aluguel ou para comprar comida para suas famílias.

O que está em grande jogo aqui é a apropriação da terra e o seu uso como uma mercadoria. Os capitalistas – empresários do setor imobiliário - usam a terra para construir e ampliar os seus grandes empreendimentos e ali reproduzem o seu capital, gerando lucro. Muitos desses empreendimentos são habitações. Para que o capitalista consiga gerar uma renda, precisa achar uma terra que lhe dê lucro. Essa terra deverá proporcionar a seus usuários – aqueles que possuem dinheiro para comprá-la – uma boa localização, serviços, comércio próximos e uma boa vizinhança. São fatores que fazem com que sua terra valorize conforme o tempo e os investimentos aplicados pela cidade. Assim, torna-se possível ao empresário vender a alto preço o seu produto e alcançar o seu objetivo. Embora recentemente o governo tenha investido com ênfase na construção de habitações de interesse social, nem todo cidadão – ou a maioria dos cidadãos - é atendido pelos programas sociais e consegue comprar uma casa ou apartamento conforme esses aspectos, pois eles se tornam caros. Aliás, a faixa mais baixa de renda (de zero a três salários mínimos) é a que menos tem sido atendida. Assim, para os que mais precisam de moradia adequada sobram os terrenos que não possuem a mínima condição de moradia, como encostas de morros, áreas de risco de desmoronamento ou avanço de dunas, e áreas que estão afastadas da cidade. Assim, os pobres se veem em uma situação de injustiça social e urbana, pois, como todo cidadão, deveriam ter o direito de acesso a uma habitação adequada, que assegurasse sua qualidade de vida e saúde. Consequentemente, o seu afastamento da cidade e da vida urbana traz uma série de conflitos como a distância até o local de trabalho, o acesso à educação de qualidade, espaços de lazer e cultura. Esse conflito de interesses é chamado de segregação socioespacial. Mesmo assim, o empresário lança artifícios para que possa investir nessa alta demanda, através de articulações políticas com o Estado e trocas de favores. Logo, ele e o Estado preparam iniciativas que, apesar de apresentarem uma intenção aparente de apoio às classes menos favorecidas, na prática são apenas medidas para reafirmar a força política do Estado e para gerar mais lucro ainda para os empresários. Flávio Villaça¹ comenta em seu livro “O que todo cidadão deve saber sobre habitação”, como exemplo, sobre a relação dos subsídios do BNH na década de 70, como fatores que ativavam ainda mais a indústria da construção civil, gerando mais vendas e lucros para os empresários desse setor. Assim, apesar de esse argumento demonstrar uma situação passada, ele ajuda a compreender que o discurso de que a economia brasileira está crescendo, de que há cada vez mais subsídio do Estado para habitação e de que as classes baixas estão subindo para a classe média, não justifica a enorme desigualdade que também cresce, não resolve a injustiça urbana e nem amplia o acesso dos mais pobres à cidade. O objetivo geral deste trabalho é colocar em discussão o problema habitacional e do direito à cidade, através de um estudo de caso, interpretando as relações socioespaciais da comunidade Vila do Arvoredo, a fim de problematizar a sua atual situação e relação com a cidade de Florianópolis; e assim elaborar um projeto de habitação que atinja o padrão que a comunidade espera conquistar e que insira essa comunidade em um contexto digno e democrático, garantindo o seu direito de acesso a terra (com infraestrutura, serviços e espaços de lazer e cultura adequados), de maneira participativa. _______________________________________________ ¹ VILLAÇA, F. O que todo cidadão precisa saber sobre habitação. São Paulo: Global, 1986.


A comunidade Vila do Arvoredo foi escolhida em função da urgência e da necessidade da procura de uma solução habitacional e urbana para os seus moradores, lidando com uma série de complexidades atualmente. Localizada em uma extensa área de dunas, cujo zoneamento é colocado como Área de Preservação Permanente, a comunidade compartilha com outras casas vizinhas de classe média uma situação de perigo. As dunas, que anteriormente foram aterradas para a criação dos lotes, estão voltando para o seu local de origem através da ação dos ventos. Assim, muitas das casas da comunidade foram soterradas pela areia e continuam sendo até hoje, fazendo com que de tempos em tempos alguns moradores da Vila tenham que realocar as suas habitações em local mais longíquo das dunas. Porém, apesar da maioria das famílias não morarem tão próximas das dunas que estão avançando e soterrando, a areia está presente em todos os momentos do dia desses moradores. Não há atividade que se faça onde a areia não esteja incorporada, tornando a situação mais complicada, e influenciando na saúde dos habitantes. Está aí um ponto conflituoso. A comunidade não possui recursos para se proteger dessas calamidades, não recebe nenhum apoio social, é barrada pela fiscalização quando muda a posição das casas em perigo; enquanto os seus vizinhos de classe média conseguem proteger-se das dunas e morar confortavelmente também em uma zona de APP, sem problemas de fiscalização. O conflito vai além quando a prefeitura realiza um projeto para a realocação de todas as famílias da Vila do Arvoredo, com a justificativa de que todas estão em área de risco, porém permite que os mesmos vizinhos continuem morando no local de igual risco. Em função dos problemas avistados e de entrevistas com alguns dos moradores, veio a possibilidade de trabalhar com o tema da questão habitacional, aproximando-se da realidade dessas pessoas, investigando os seus processos de desenvolvimento afim de propor uma solução adequada e justa; adquirindo assim um melhor conhecimento sobre a política de Habitações de Interesse Social, normatizações de órgão de financiamento e exigências sociais, arquitetônicas e urbanísticas. Como estudante de arquitetura e urbanismo, há a possibilidade de contribuir com a comunidade sobre a questão da desigualdade social em que ela está passando; com estudos técnicos sobre ocupações em áreas de risco (o avanço das dunas) e a possibilidade de afirmação de pelo menos uma parte da comunidade, tentando sanar os problemas de saúde, infraestrutura; e culminando em um projeto de habitação de interesse social em que a comunidade possa usar como referência na hora de reivindicar os seus direitos, tornando-os cada vez mais possíveis de se concretizar. Além disso, essa proposta foi vista como uma oportunidade de se trabalhar e aprender sobre uma área muito importante da profissão, a que mais necessita de conhecimento dos arquitetos, e que ainda assim é pouco explorada durante o curso de arquitetura e urbanismo da Universidade.



parte 1 o distrito ingleses do rio vermelho

Foto aérea do Distrito Ingleses do Rio Vermelho em direção ao Sul. Nota-se a urbanização da área e o extenso campo de dunas Moçambique-Ingleses. Fotógrafo desconhecido. Fonte: FERREIRA (1999).


O norte da ilha de Santa Catarina é conhecido pelas suas belas praias, dunas e paisagens. O Distrito dos Ingleses do Rio Vermelho, mais precisamente, está localizado na parte nordeste da ilha e abrange as praias do Santinho e Ingleses, Sítio do Capivari e Aranhas dos Ingleses, ocupando uma área total de 20,47 km². A ocupação do bairro segue como a maioria das ocupações de balneários: ao longo de sua orla. As vias locais, em sua maioria, surgem da via principal do bairro, que margeia a orla marítima e conecta com a rodovia que mais tarde leva para o sul da ilha, em direção ao Centro - a aproximadamente 36 km de distância. Até a década de 1960 este local havia sido pouco explorado, devido a dificuldade de acesso e a grande distância do Centro da cidade. No entanto, será visto através deste estudo - com base na análise de fotografias históricas -, que de lá para cá o local passou por uma intensa transformação, principalmente comparada ao crescimento da cidade e de outras praias da região, gerando uma série de complexidades para a área. Logo, foi possível contextualizar o surgimento da comunidade Vila do Arvoredo, mais um fruto do descontrolado processo de urbanização, cuja localidade está inserida neste bairro e é o foco deste trabalho.

O DISTRITO INGLESES DO RIO VERMELHO

A praia dos Ingleses, ou simplesmente Ingleses, como também é conhecido, surgiu do desmembramento de outro Distrito, chamado de São João do Rio Vermelho, no ano de 1962. Algumas bibliografias indicam que o nome deste local deve-se ao fato de que uma embarcação inglesa tenha naufragado nas proximidades da praia, no fim do século XVIII¹. Diz-se que os primeiros ocupantes dessas terras foram os índios carijós², ocupando as terras a partir do século XIV, até a chegada dos açorianos que vieram povoar e prosperar a Ilha de Santa Catarina a partir da metade do século XVIII. Esses povoadores faziam uso da agricultura e da pesca de subsistência para conseguir conviver com a distância do centro. O povoado, assim como em outras freguesias da ilha, reunia-se em torno da Igreja Nossa Senhora dos Navegantes, local de encontro e convívio social. Com o estabelecimento de Florianópolis como capital do Estado e sede administrativa do Governo, começam os processos de migração interna, ocupando regiões que vão além do distrito Sede (Centro). No caso dos Ingleses o aumento populacional entre os períodos de 1954 a 1960 estaria relacionado à fartura da pesca na região e às primeiras casas de veraneio. Nopes² afirma através de entrevistas com moradores que na década de 50 existiam cerca de quarenta redes de pesca artesanal que eram de propriedade de Gentil Mathias da Silva e José Fernandes da Silva - os proprietários mais ricos da região -, e que a maioria e restante da população era considerada pobre. Na década de 70 uma série de fatores fizeram com que Florianópolis começasse a investir na ideia de uma cidade turística, aproveitando suas belas paisagens para receber visitantes e alavancar sua economia. Assim, é concluída em 1973 a construção da rodovia SC 401, que liga o centro da cidade ao Norte, e a SC 403 que deriva da primeira em direção à Praia dos Ingleses. Como qualquer abertura de vias rápidas, o acesso ao bairro foi facilitado e uma série de infraestruturas e equipamentos puderam ser instalados, gerando mais interesse pela área. É também desse período a primeira fotografia aérea que permite verificar com clareza a ocupação agrícola das terras e a formação das primeiras estradas, internas ao bairro e rente à orla marítima. Era comum na época que esses extensos campos agrícolas fossem passados de geração em geração, sofrendo partições em função dos filhos que herdavam as terras de seus pais. Mais adiante será visto como essas áreas esparsas e de posse configuraram uma malha urbana limitadora ao longo do desenvolvimento do bairro. _______________________________________________ ¹ VÁRZEA, Virgílio. Santa Catarina – a Ilha. Florianópolis: Lunardelli, 1985. p 98. ² NOPES, Adriane. Praia dos Ingleses: Um espaço em transformação a partir dos anos 1960. Universidade do Estado de Santa Catarina, 2006.

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Localização geográfica do bairro Ingleses do Rio Vermelho, fazendo limites com os distritos Cachoeira do Bom Jesus, São João do Rio Vemelho e o Oceano Atlântico. Fotomontagem do autor com base no mapa do Google Earth.



Assim, o pequeno núcleo de pescadores que ocupavam o entorno da capela Nossa Senhora dos Navegantes e que contabilizavam cerca de 284 habitantes no ano de 1954 cresceu para o número de 2.994 habitantes em 1960, e chegou a 2.016 no ano de 1970. Esses números acabaram diminuindo pois no ano de 1962 a Lei número 531 decretou o desmembramento do Distrito de São João do Rio Vermelho, e assim o censo passou a considerar apenas a parte que abrange o Distrito Ingleses do Rio Vermelho. Em 1980 o censo do IBGE contabilizou um total de 2.695 habitantes, e em 1991 cerca de 5.809 pessoas residindo no local; o que gera um aumento de 34,08% entre 1970 e 1980, e de 40,5% entre 1980 e 1990. Nota-se também o número de residências levantado, contando com 689 permanentes e 171 residências de uso ocasional em 1980, e com 2312 domicílios permanentes e 2050 ocasionais no ano de 1991. Esses dados confirmam de maneira efetiva a utilização de muitas casas dessa região com uma ocupação temporária, apenas no período do Verão. Como se pode ver na fotografia aérea do ano de 1977, a região era marcada por seus grandes campos de agricultura, áreas verdes, montanhas, dunas e o oceano, configurando uma paisagem de extraordinária beleza. Nota-se que as primeiras vias conectam de maneira direta os distritos adjacentes e seguem paralelamente a orla marítima. Os caminhos eram marcados entre as terras ocupadas e abriam caminho entre as partes em que a topografia não era tão acidentada. Curiosamente, é possível observar que quando a Estrada Dom João Becker encontra-se com as dunas, ela realiza uma espécie de contorno, evitando o seu corte. Chegando ao ano de 1998, o aspecto da região muda completamente de configuração. A migração de um contingente que objetivava o uso deste local como lazer acaba por modificar a característica da comunidade nativa local, ocorrendo deslocamentos "locacionais" e funcionais. As terras que antes eram repassadas dentro das famílias, deixam de ser rurais e passam a ser urbanas, fato que provoca grandes modificações sociais, econômicas e ambientais para os Ingleses. Apesar do uso ocasional de algumas moradias, muitas pessoas acabam procurando o local como residência permanente, criando condições favoráveis para o surgimento de comércios e serviços. Consequentemente começam a ser criadas oportunidades de trabalho nas proximidades e, em função da alta procura, a população continua a crescer chegando a 7.741 habitantes em 1996, e 16.514 residentes no ano 2000. A fotografia de 1998 ilustra esse processo de crescimento, onde se observa que os lotes vão ser desmembrados, chegando a ter pequenas dimensões para dar lugar a novas casas. Glebas que abrangiam vários hectares se transformaram, em menos de 50 anos, em pequenas propriedades de cerca de 360 m² de área cada. Com o distanciamento físico e participativo do poder público, muitas dessas áreas não foram legalizadas. Sem projetos, alvarás ou títulos de propriedade, os terrenos começaram a ser loteados e comercializados por valores irrisórios devido a grande oferta de terras e a falta de fiscalização junto aos órgãos públicos competentes. Essa região, que fica praticamente toda ao sul da SC-406 e das margens da Estrada Dom João Becker foi ocupada principalmente por residências, sem fins turísticos. Os limites dos antigos terrenos transformam-se em pequenas ruelas, mal conservadas até hoje, que acabam por formar quadras extensas e uma malha viária conhecida como espinha de peixe. Das ruas mais antigas e principais surgem perpendicularmente essas vias estreitas, dando acesso às casas. As vias principais, por absorverem um maior fluxo, dão oportunidades para o surgimento de diversos comércios e serviços ao longo desses eixos. Porém, a configuração dessas grandes quadras produz um tipo de acesso limitado que não permite a permeabilidade e o fácil deslocamento, concentrando o todo o fluxo 05

Fotografia aérea do Distrito dos Ingleses, do ano de 1977. Coloração da foto realizada pelo autor, evidenciando as áreas verdes e de dunas que serão alteradas conforme o crescimento urbano do local. Fonte da imagem: site Geoprocessamento de Florianópolis.

ANO 1954 1960 1970 1980 1991 1996 2000 2010

NÚMERO DE HABITANTES 284 2994 2016 2378 5862 7741 16514 29814

Evolução da população residente em Ingleses do Rio Vermelho. Dados até 1960 comportavam também o Distrito São João do Rio Vermelho. Fonte: IBGE.

Fotografia aérea do Distrito dos Ingleses, do ano de 1998. Foi utilizada a técnica de fotomontagem, sobrepondo a fotografia de 1998 com a de 1977. Em função da dimensão da foto de 98 ser menor, o trecho ao sul pertence ao aonde de 1977. A coloração da foto foi realizada pelo autor, evidenciando as áreas verdes e de dunas que serão alteradas conforme o crescimento urbano do local. Fonte da imagem: site Geoprocessamento de Florianópolis.


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nas vias principais. É importante lembrar que a via que antes fazia a costura ao redor das dunas mantém-se no mesmo local, porém, a via da SC-406 finalmente é conectada a Estrada Dom João Becker. Será visto que tal atitude acontece em virtude tanto da expansão urbana descontrolada e mal planejada, quanto da incapacidade de respeitar o meio ambiente e criar relações harmônicas com o mesmo. Tal fato também é comprovado quando nossos olhos percorrem as áreas coloridas das fotografias, de uma para a outra. As áreas naturais, que abrigam as dunas fixas e móveis, bem como as áreas verdes do entorno e a própria orla marítima são profundamente alteradas e desrespeitadas, causando um conflito entre a ação antrópica e a natureza, e também com a capacidade do poder público de gerenciar o crescimento da cidade.

Fotografia aérea do Distrito dos Ingleses, do ano de 2002. A coloração da foto foi realizada pelo autor, evidenciando as áreas verdes e de dunas que foram alteradas conforme o crescimento urbano do local. Fonte da imagem: site Geoprocessamento de Florianópolis.

Esse processo de adensamento foi permitido, possibilitado e incentivado pelo Plano Diretor dos Balneários de Florianópolis de 1985, delimitando o zoneamento, usos e ocupações de solo do Balneário de Ingleses como Área Especial de Interesse Turístico. O trecho em questão refere-se principalmente à orla, nas margens da Estrada Dom João Becker, em que as áreas passaram a ser registradas e as propriedades existiram de fato. Cenário que é oposto às áreas de posse ao sul do bairro, pois elas começaram a ser adquiridas por investidores, regularizadas, e grandes empreendimentos voltados para o turismo foram erguidos³. No final da década de 80 a praia dos Ingleses já era considerada o segundo local preferido dos turistas provenientes da Argentina, com a praia de Canasvieiras - próxima de Ingleses - sendo a mais visitada4. Nesse período a entrada de turistas foi massiva e os residentes locais foram presenciando a mudança constante do bairro ao longo dos anos. Suas terras passaram a ser mais valorizadas em função dos investimentos em infraestrutura e o florescimento de comércios e serviços próximos, aumentando ainda mais a procura por residências fixas e temporárias. Com a valorização dos seus imóveis, os proprietários começaram a preferir vender suas casas - principalmente as próximas da praia e das vias principais -, mudando-se para localidades próximas como o Sítio do Capivari e a Praia do Santinho4. A consequência é evidenciada nas fotografias aéreas mais recentes, onde o número de vias aumenta com o passar dos anos, e a ocupação das pequenas casas e terrenos baldios vai dando lugar a grandes empreendimentos imobiliários como hotéis, “resorts” e conjuntos residenciais. Assim a população foi se espalhando pelas áreas próximas e o seu número foi ascendendo. Comparando-se o crescimento do Distrito Ingleses com o crescimento da cidade de Florianópolis e também os demais Distritos, é mais perceptível analisar o quanto esse bairro cresce ao longo dos anos, torna-se uma parte independente da cidade - deixando de depender do Centro da Capital -, e passa a ser uma das principais preferências de local de moradia fora do Centro da cidade. Enquanto a população de Florianópolis cresceu um total de 25,99% de 1996 para 2000, e 23,25% de 2000 para 2010, o Distrito Ingleses do Rio Vermelho cresceu 112,36% e 81,36% respectivamente5. No ano de 2010 ele passa a ser o terceiro Distrito mais procurado para moradia em Florianópolis, estando atrás apenas do Distrito Sede (Centro da cidade) e do Campeche, situado ao sul da ilha. Esse crescimento, apesar de previsto e incentivado pelo município através de medidas como o Plano Diretor dos Balneários e a construção e duplicação das vias de melhor _______________________________________________ ³ COUTO, Marcelo Machado. Ingleses do Rio Vermelho (Florianópolis/SC): Um Distrito, duas realidades. Questões históricas e outros determinantes acerca do desenvolvimento urbano da região nos últismo vinte anos (1991-2010). Monografia, Departamento de Ciências Econômicas, Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2011. 4 FERREIRA, Tânia M. Machri. Distrito de Ingleses do Rio Vermelho - Florianópolis. Um espaço costeiro sob a ação antrópica. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 1999. 5 Fonte: IBGE

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Fotografia aérea do Distrito dos Ingleses, do ano de 2013. A coloração da foto foi realizada pelo autor, evidenciando as áreas verdes e de dunas que foram alteradas conforme o crescimento urbano do local. Fonte da imagem: site Geoprocessamento de Florianópolis.


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acesso, não é um crescimento em que o Município preocupa-se com os reflexos dele na cidade e na qualidade de vida de seus habitantes, e sim interessa ao incremento da economia e da pseudo boa aparência do Estado como grande responsável pelo desenvolvimento daquele lugar. Junto ao Estado, os únicos que realmente usufrutam desses investimentos são os empresários que investem nas áreas urbanas de interesse, a procura de terras que lhes garantem maior renda. Terras que inclusive no caso de Ingleses, mesmo não regularizadas, foram tributadas com a ajuda do Munícipio e providenciados água e luz para esses locais, acabando por incentivar a consolidação desses empreendimentos. Juntam-se a eles também os turistas que possuem dinheiro suficiente para aproveitar as belezas que o local oferece e fazem com que Florianópolis receba quase 1 milhão de turistas todo verão, praticamente dobrando a sua população. Esse adensamento significativo deve-se aos investimentos que o município realizava especialmente na parte insular da cidade, dirigindo-os às camadas de classe média/alta e atraindo mais moradores e turistas. Assim se vendia a ideia de uma perfeita cidade através do falso marketing que se fazia por parte da prefeitura de Florianópolis como a “Ilha da Magia”, local de belas paisagens e qualidade de vida, escondendo a real situação de enorme pobreza que se instaurava principalmente na porção continental da área conurbada, no centro da capital e em alguns pontos de periferização também dentro da ilha6 como no Distrito dos Ingleses. 1996 POPULAÇÃO NOME DO DISTRITO Distrito Sede* 189.132 Barra da Lagoa ** 7.423 Cachoeira do Bom Jesus ** Campeche 6.650 Canasvieiras Ingleses do Rio Vermelho 7.741 Lagoa da Conceição 19.316 Pântano do Sul 4.796 Ratones 1.320 Ribeirão da Ilha 18.034 Santo Antônio de Lisboa 14.483 São João do Rio Vermelho 2.386 TOTAL 271.281

2000 % POPULAÇÃO 69,72% 228.741 4.323 2,74% 12.771 18.565 2,45% 9.953 2,85% 16.439 7,12% 9.826 1,77% 5.805 0,49% 2.866 6,65% 20.358 5,34% 5.338 0,88% 6.796 100% 341.781

2010 % 66,93% 1,26% 3,74% 5,43% 2,91% 4,81% 2,87% 1,70% 0,84% 5,96% 1,56% 1,99% 100%

POPULAÇÃO 249.477 5.674 18.427 30.028 18.091 29.814 11.811 7.397 3.671 26.994 6.343 13.513 421.240

% 59,22% 1,35% 4,37% 7,13% 4,29% 7,08% 2,80% 1,76% 0,87% 6,41% 1,51% 3,21% 100%

Mas a cidade real, daqueles que precisam trabalhar arduamente para garantir a sobrevivência, dependendo do transporte público, da permeabilidade do bairro, do acesso a serviços de qualidade, da educação capacitada, de centros de saúde, enfim, do direito à cidade, acaba por ser a última a ser ouvida e acudida. Em função dos investimentos prioritários ao turismo, o preço da terra na ilha é caro e as terras que não interessam ao mercado imobiliário sobram para os pobres. Os governantes, empresários e turistas estão sempre a frente, e seus esforços vão em direção ao seu próprio interesse. Não bastasse isso, essa urbanização despreocupada, além de provocar a desestruturação da comunidade tradicional e afastar cada vez mais quem realmente precisa das benesses da cidade, acaba por afetar diretamente a preservação dos recursos naturais. Toda a ocupação da orla marítima da Praia dos Ingleses não respeita os limites de afastamento de 33 metros a partir da preamar7, estabelecidos desde o Plano Diretor _______________________________________________ 6 SUGAI, Maria Inês. Segregação silenciosa: investimentos públicos e distribuição sócio-espacial na área conurbada de Florianópolis. São Paulo (SP), 2002. 2 v. Tese (Doutorado). 7 FERREIRA, Tânia M. Machri. Distrito de Ingleses do Rio Vermelho - Florianópolis. Um espaço costeiro sob a ação antrópica. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 1999.

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Composição da população residente em Florianópolis por Distrito, de 1996 a 2010. Fonte: IBGE * No Distrito Sede estão incluídas as populações dos quatro subdistritos da Capital: Centro, Estreito, Saco dos Limões e Trindade. ** Na contagem de 1996 o Distrito foi considerado parte do território do Distrito da Lagoa da Conceição


dos Balneários. A vegetação de restinga que ali havia foi destruída, para dar lugar a construções de casas, muros e edifícios sobre e rente a praia - impedindo a dinâmica da natureza, impedindo a passagem de usuários para a praia, destruindo o visual paisagístico da orla e prejudicando as próprias edificações com os riscos das marés e ressacas8. Segundo Ferreira8, “a balneabilidade da praia está comprometida devido aos esgotos domésticos ligados à rede pluvial, que embora não exista em todo o Distrito, ela é encontrada nas ruas principais e às perpendiculares à elas, principalmente naquelas próximas à praia, na qual vão desaguar”. A agressão a natureza vai além, quando nota-se claramente pelas fotografias que a farta área de dunas - considerada Área de Preservação Permanente pelo atual Plano Diretor -, central ao bairro e importante patrimônio da natureza, também é ocupada ilegalmente, sofrendo sucessivas escavações e aterros e a retirada da areia. Fato que prejudica o ciclo natural dessas areias e também põe em risco as residências instaladas ali e o seus moradores. Isso ocorreu principalmente na Rua do Siri e Adão dos Reis, ruas próximas da comunidade Vila do Arvoredo e que dão acesso à ela. É importante ressaltar que a comunidade Vila do Arvoredo não é o fator determinante da ocupação irregular desse local, e sim, uma consequência do sistema capitalista onde as ações do Estado e os empreendedores do mercado imobiliário não recebem fiscalização adequada, resultando em uma má gestão da cidade e do bairro. Como veremos adiante, a Vila do Arvoredo é a que mais sofre injustiças no Distrito dos Ingleses: injustiças sociais por parte do Município que permite a consolidação das residências vizinhas e não dispõe dos mesmos direitos ao moradores da comunidade e também, por estar inserida em uma localidade de alto risco natural.

CARACTERIZAÇÃO ATUAL DO BAIRRO

Atualmente, pode-se perceber a urbanização intensa do bairro Ingleses observando os mapas de cheios e vazios e de lotes (pg. 11). Apesar da extensa área de vazios, a ocupação urbana praticamente ocupa toda a área possível de se construir (e também algumas não possíveis). Observa-se a quantidade de edificações de pequeno porte na parte centro sul do mapa, e de manchas maiores que representam as edificações maiores ocupando a orla da Praia dos Ingleses. Essas configurações de cheios e vazios confirmam a análise da evolução histórica do bairro, em que as áreas de posse foram sendo subdivididas e vendidas em pequenos lotes, dando origem a pequenas casas; e na ocupação preferencial turística de grandes empreendimentos ao longo da praia. Os enormes vazios comportam a orla marítima, as dunas e os morros que circundam o bairro. O desmembramento dos lotes é mais evidente quando é analisado o mapa de lotes do bairro (pg. 12). Vê-se que as áreas das extensas quadras são parceladas de maneira a adensar o máximo possível de espaço, com edificações de pequeno porte, que dão origem em sua maioria a residências unifamiliares. Nota-se alguns vazios urbanos, vítimas da especulação imobiliária, a espera de um novo loteamento. Como exemplo, é possível observar um ao sul do mapa, similar aos condomínios fechados americanos, traçando ruas orgânicas com espaços verdes e casas fechadas e sem comunicação com o bairro. Esses espaços são conectados com duas vias principais: a SC-403 e a SC-406. Essas vias têm como função a conexão do bairro com o restante da cidade. A SC-403 abre caminho através dos morros em direção às outras prais do norte da Ilha e ao Centro da cidade, saindo dos Ingleses em indo em direção ao oeste. A SC-406 faz a conexão principal com _______________________________________________ 8 FERREIRA, Tânia M. Machri. Distrito de Ingleses do Rio Vermelho - Florianópolis. Um espaço costeiro sob a ação antrópica. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 1999.

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Mapa de Cheios e Vazios Mapa em que os blocos em cinza representam os volumes construídos (edificações), destacando as áreas vazias em função de não ocupações, áreas verdes, etc. Elaboração do autor. Fonte: IPUF/PMF, 2013. Mapa de lotes Demarcação dos lotes do bairro Ingleses, evidenciando a extensa malha urbana e pequenos lotes residenciais em contrapartida com grandes lotes de empreendimentos ao longo da orla. Elaboração do autor. Fonte: IPUF/PMF, 2013.



via principal via secundária via local via que dá acesso à Vila do Arvoredo Mapa de Vias Destacam-se as vias principais do bairro, que o conectam com o restante da cidade; as secundárias que ligam às principais para dentro do bairro; e as locais que dão acesso à maioria das edificações residenciais. Elaboração do autor. Fonte: Google Earth. Mapa de linhas de ônibus

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Rua Arvoredo SC 406

Rua do Siri

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Rua Intendente João Nunes Vieira

Estrada V e

SC 403

As linhas de ônibus que passam pelo bairro Ingleses. A maioria do transporte coletivo passa pelas vias principais e secundárias. Nota-se que poucas linhas passam pela Estrada Dom João Becker. Elaboração do autor. Fonte: Google Earth e site da empresa Canasvieiras Transportes.


canasvieiras-lagoa / rio vermelho / rio vermelho via muquem capivari costa do moçambique gaivotas ingleses / interpraias / madrugadão norte santinho escolar sítio de baixo travessão via r. alzira rosa aguiar / travessão via r. da intendência via que dá acesso à Vila do Arvoredo Vila do Arvoredo

SC 406

Rua do Siri

Rua Arvoredo

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Rua Intendente João Nunes Vieira

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SC 403


o bairro Rio Vermelho, ao sul dos Ingleses. Esse bairro se assemelha muito aos loteamentos dos Ingleses e mais ao sul conecta com outras praias, chegando até a Lagoa da Conceição. As vias secundárias são as ruas que, a partir das vias principais, conectam-se às ruas locais, dando um acesso rápido às edificações. A via secundária mais importante é a Estrada Dom João Becker, rua que margeia a orla da Praia dos Ingleses, conecta-se à SC-403 e SC-406, e percorre o bairro de leste à oeste. Inclusive, é dessa rua que nasce a rua do Siri: via que leva até a comunidade Vila do Arvoredo. As ruas locais são as vias que fazem as divisas com a maioria das edificações residenciais, normalmente ruas mais calmas por não abrigarem tantos serviços e comércios. A via local que mais irá interessar nesse estudo é a Rua Arvoredo, que delimita o início da comunidade Vila do Arvoredo. O transporte público de Florianópolis já é conhecido pelos seus moradores como de péssima qualidade, em função dos poucos horários de linhas de ônibus, da qualidade dos veículos e da falta de prioridade do transporte público sobre os meios de transporte individual. No distrito dos Ingleses essa situação não é diferente. Em conjunto, a distância do bairro em relação ao restante da cidade, de equipamentos de maior porte, do Centro, e também em função da topografia circundante, o acesso ao bairro torna-se complicado. Apesar do Mapa de Linhas de Ônibus apresentar esquematicamente uma quantidade de trajetos aparentemente suficiente para atender a população que reside nesse bairro, são poucos os veículos que fazem os trajetos em relação à demanda de usuários. Isso faz com que o número de ônibus lotados, filas imensas, trânsito e estresse predominem para os usuários do transporte público. Além disso, não há faixas preferenciais para as linhas de ônibus, o que ocasiona perda tempo no trânsito, já que Florianópolis é uma das cidades que mais contém usuários de automóvel do Brasil. É importante ressaltar que no verão essa quantidade aumenta consideravelmente, e a dinâmica do bairro se altera, com mais trânsito e caos. A Estrada Dom João Becker, que conecta o bairro de leste à oeste, recebe apenas duas linhas de ônibus, o que não é suficiente para os moradores da parte leste do bairro, inclusive a Vila do Arvoredo. Outro fator que prejudica o acesso ao bairro é a topografia do seu entorno, fazendo que o principal acesso ao bairro seja pela SC-403, via que corta os morros à Oeste, abrindo caminho até o bairro. Ou seja, apenas uma via garante o acesso facilitado, o que acaba por limitar tanto o fluxo de veículos individuais, quanto do transporte coletivo. São essas vias rápidas e largas, que conectam o bairro com o restante da cidade, que atraem investidores para abrir os seus negócios em um local com uma poderosa atração turística. Sendo assim, acabam por contribuir na construção da independência desse bairro, e no estabelecimento dele como um “outro centro” que oferece comércios e serviços suficientes para seus moradores próximos. Tal fato atrai ainda mais turistas, mas também cria relações de permanência, polarizando e incentivando novos moradores fixos ao longo de suas extensas quadras e vias locais. Como vemos nos mapas ao lado, ainda há espaço para novas construções, e é principalmente das rodovias SC-403, SC-406 e da rua Dom João Becker, que surgem as casas de comércio, supermercado, oficinas, escritórios, igrejas e hotéis da região. A concentração de comércios e serviços em apenas uma ou duas vias causa uma dependência forte do morador do bairro ao deslocamento até esses estabelecimentos. Isso acaba por gerar um tráfego intenso de veículos nessas ruas, enquanto as outras vias tornam-se abandonadas, sem vida. Para o morador que não possui carro, ele está fadado a percorrer longas distâncias a pé em função da extensão das quadras ou então a esperar um longo tempo pelo ônibus lotado. Infelizmente uma configuração acaba por influenciar a outra e o bairro, apesar de já ser independente em função da quanti 15

Localização do trecho do bairro Ingleses exibido nos mapas ao lado.

Mapa de Ocupação do bairro Ingleses Demonstração mais próxima da ocupação do bairro, destacando as construções em andamento. Elaboração do autor. Fonte: Geoprocessamento Florianópolis, 2014.

Mapa de utilização Mostram-se os usos de cada edificação, destacando as ruas principais como recebedoras e incentivadoras dos comércios e serviços da região. Elaboração do autor. Fonte: Geoprocessamento Florianópolis, 2014.


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residencial comercial serviço público prestação de serviços misto religioso

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centro de saĂşde creche municipal escola estadual escola privada Vila do Arvoredo


Mapa de educação e saúde Localização dos estabelecimentos educacionais e centros de saúde públicos. Destaca-se a boa quantidade de creches e dois centros de saúde que conseguem atender o bairro. Elaboração do autor. Fonte: Geoprocessamento Florianópolis, 2014.

dade de estabelecimentos comerciais construídos, sofre com os problemas de mobilidade. É necessário que esses serviços estejam uniformemente distribuídos, diminuindo as distâncias de deslocamento e aproximando as pessoas que moram nas proximidades. Nota-se uma boa quantidade de escolas e dois centros de saúde públicos. Infelizmente a maioria das escolas são privadas, com apenas um colégio público que abrange até o ensino fundamental. Isso faz com que os adolescentes tenham que se deslocar até o próximo bairro para estudar. Assim, a criança que antes ocupava as creches próximas tem que viver uma nova realidade, deslocando-se até a sala de aula por espaços públicos sem critérios e atrativos para que uma criança possa crescer de uma maneira saudável. É importante ressaltar que no Mapa de Utilização (página anterior) não está representada nenhum tipo de área verde destinada ao lazer dos moradores. Isso comprova que a prefeitura está mais preocupada com o bairro dos Ingleses como um atrativo turístico, considerando a sua praia como local de lazer para seus turistas - que a visitam apenas em feriados e no verão. Esse tipo de pensamento causa sérios danos aos moradores do local, tanto pelo acesso prejudicado da praia, em função as edificações que ficam na sua frente, dando as costas para a cidade, quanto da impossibilidade de se usar a praia em dias de frio, chuva e ventos fortes. Os espaços de lazer, assim como os comércios e serviços devem estar espalhados em configurações mistas ao longo das vias do bairro. Criam-se eixos de visualização, marcos e visuais que dão identidade ao lugar em função da sua gama de de diversidades. Diversidades que se unem à paisagem e que dão vida a um lugar que pode ser único.

Mapa de Saneamento Na cor marrom estão demonstradas as ruas do bairro que possuem saneamento. Elaboração do autor. Fonte: Geoprocessamento Florianópolis, 2014.

Em sua maior parte, talvez com exceção apenas de um trecho da comunidade Vila do Arvoredo, todo o bairro possui energia elétrica e abastecimento de água tratada. O abastecimento público de água provém do aquífero subterrâneo local. Porém, apenas alguma parte possui sistema de esgotos sanitários, na área restante são utilizadas fossas sépticas e sumidouros, sendo comum a utilização da drenagem pluvial. Grande parte dos efluentes é jogada diretamente ao mar, através da Praia dos Ingleses. Esse é mais um fator que não condiz com a ação da prefeitura e o atraso em obras de infraestrutura básicas para o funcionamento saudável do bairro. Segundo o IPUF, a

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200 - 500m

0.1 - 0.5m


coleta de lixo é realizada diariamente na alta temporada e três vezes por semana no resto do ano, e em muitos locais é dificultada pelo sistema viário precário. Em termos de telefonia a região está sendo atendida de maneira satisfatória. Tratando-se de relevo, predomina uma extensa área plana, onde exatamente estão a maior parte das construções e, observando o Modelo Digital das cotas de superfície vê-se que a delimitação do bairro é concebida através de uma série de morros que separam Ingleses dos demais distritos a Oeste. Destaca-se o morro na ponta Leste, que separa a Praia dos Ingleses da Praia do Santinho. Também chama a atenção o conjunto de pequenas elevações no centro do bairro: são as dunas Moçambique-Ingleses, importantes para este estudo e que serão vistas com mais detalhe a seguir. Grande parte do aquífero que abastece o bairro está abaixo dessas dunas. O município de Florianópolis aprovou um Plano Diretor em 2013, porém, em função de um série de questões que não foram contempladas, está atualmente sob judice. Não entrando no mérito de uma análise geral das aplicações do Plano, iremos analisar suas interferências no desenvolvimento urbano do Distrito dos Ingleses, considerando este como o Plano Diretor mais recente. Como previamente analisado, historicamente o município vinha investindo no bairro em função principalmente do meio turístico e econômico, deixando um pouco de lado os problemas urbanos essenciais, que afetam diretamente a vida dos moradores. No contexto intraurbano, temos praticamente todo o norte da ilha de Santa Catarina como uma região segregada pela alta renda. No caso de Ingleses há uma grande valorização imobiliária, com a construção de empreendimentos luxuosos como o Costão do Santinho, gerando conflitos de interesses de uso e ocupação do solo nesse distrito. O Plano Diretor atual agora regulamenta esse processo e o evidencia ainda mais, com algumas pequenas iniciativas que podem tornar a dinâmica desse setor da cidade um pouco mais interessante. É possível perceber que ainda não há uma preocupação com a preservação da orla da Praia dos Ingleses, de modo que a proximidade das edificações com a praia, e os seus fundos virados para a rua de maneira conjunta, fazem com que o acesso dos pedestres seja prejudicado, e consequentemente privilegiando os setores turísticos, moradores temporários e visitantes. Assim, ao longo da orla existe uma faixa de Área Turística Residencial, ainda desrespeitando o afastamento de 33 metros da praia. As rodovias SC-403 e SC-406 continuam comportando e recebendo usos de serviços e comércios, ampliando o seu fluxo e tornando-as vias de importante ligação. Logo, o zoneamento ao longo dessas ruas é colocado como Área Mista Central, de alta densidade, complexidade e miscigenação, destinada a usos residenciais, comerciais e de serviços. De maneira similar, as vias secundárias recebem a Área Mista de Serviço, focada mais para serviços urbanos. As antigas áreas de posse continuam com o foco residencial, colocadas como Área Residencial Predominante. Desta vez, em mudança ao Plano Diretor de 1985, as áreas residenciais predominantes permitem a criação de pequenos serviços e comércios vicinais. Esse tipo de ação diversifica os espaços da cidade e cria novos tipos de relações e interações, mudando a dinâmica e fluxos do espaço público. Ainda sim esses usos continuam limitados pela malha viária rígida e as quadras extensas, dependendo ainda das vias principais que acabam tornando-se distantes das residências. Tratando-se ainda de vias, a Prefeitura propõe 3 novas vias, duas delas que possuem um intuito claro de conter a expansão urbana sobre as áreas de preservação e 21

O PLANO DIRETOR NO DISTRITO DOS INGLESES

Modelo Digital do Terreno (página anterior) Este mapa exibe de maneira detalhada as cotas de superfície do relevo do bairro Ingleses. As cores mais claras representam as cotas mais baixas, próximas do nível do mar, e as mais escuras as cotas mais altas, normalmente formando morros e encostas. Fonte: Geoprocessamento Florianópolis, 2014. Cores alteradas pelo autor. Mapa de Zoneamento do Plano Diretor de Florianópolis de 2013 O mapa de zonemanetos, em conjunto com o plano diretor, tem a função de organizar o desenvolvimento da cidade, estabelecendo limites, controles e indicativos que tentam guiar a expansão da cidade. Esses princípios são estudados pelo munícipio e são delineados em função de um objetivo. Chamam atenção no zoneamento do bairro Ingleses os zoneamentos próximos das rodovias, da orla marítima e das zonas de preservação; bem como a proposta de abertura de novas vias. Fonte do mapa: Site Prefeitura Municipal de Florianópolis, acesso em Abril de 2014.


APP - Área de Preservação Permanente ACL - Área Comunitária Institucional APL P - Área de Preservação com uso Limitado (Planície) APL E - Área de Preservação com uso Limitado (Encosta) AVL - Área Verde de Lazer AMC - Área Mista Central AMS - Área Mista Serviços ARM - Área Residencial Mista ARP - Área Residencial Predominante ARR - Área Residencial Rural ZEIS - Zona Especial de Interesse Social ATL - Área Turística de Lazer ATR - Área Turística Residencial Vila do Arvoredo


uma terceira, que aparentemente corta a zona de dunas no centro do bairro, indo em direção ao "resort" Costão do Santinho. Mais uma vez, percebe-se como as ações do município vão de acordo com o interesse preferencial do capital, estabelecendo laços com empresários que acabam por ter um poder muito maior sobre a cidade do que qualquer outro cidadão que possui os mesmos direitos. Não é possível identificar nenhum outro critério plausível para a abertura dessa terceira via, além do motivo de garantir o acesso rápido saindo da SC-403 diretamente até o hotel em frente à praia para visitantes e turistas. Pode-se notar que essa via liga a uma grande Área Turística Residencial, que vai além das áreas já consolidadas por hotéis, "resorts", etc. Assim, conclui-se que não há nada que impeça o município e os empresários que o influenciam, de se beneficiarem dos elementos que a cidade oferece e constrói, deixando a cidade real de lado, como a última a ser pensada e investida. Não há casa, morador, duna ou área de preservação que segure os interesses dos maiores controladores da cidade. Quando se fala em área de preservação, a imensa disposição de paisagens, áreas verdes, dunas, mares e morros que abrangem a região dos Ingleses merecem um destaque e cuidado especial. Foi visto, através das análises de evolução da ocupação urbana do bairro, que boa parte das áreas verdes e da orla marítima foram sendo ocupadas, algumas com proximidades com a praia, rios e mangues. Agora que a ocupação está mais consolidada, onde ficam claras as áreas que podem e devem ser preservadas, é imprescindível que o Plano Diretor planeje e controle as ocupações. Mais que isso, é importante que a paisagem seja preservada, que a praia seja cuidada - tanto pela sua beleza quanto pela sua importância como ferramenta turística -, e que as Áreas de Preservação Permanente não sofram com a ação antrópica. Deve-se aliar a ação do homem com a preservação da natureza. Na região da comunidade Vila do Arvoredo, assim como nas ruas e casas vizinhas, o Plano Diretor zoneia a região como Área de Preservação Permanente. Ou seja, uma área que contém uma riqueza natural exuberante e que deve ser preservada de toda maneira. Logo, a Prefeitura assume que aquela região tem importância e destaca pelo mapa que houve uma ação antrópica, com construções de casas de classe média/alta, assim como a comunidade Vila do Arvoredo. Mesmo com a locação dessas casas a Prefeitura mantém grande parte da área como APP, o que acaba por levantar uma série de questões. Se a prefeitura regularizou a grande parte das casas de renda média e alta, porque ainda mantém o zoneamento como APP? Que tipos de ações estão sendo feitas para a preservação das dunas daquele local? A Prefeitura planeja fazer ajuste e transformar a área em zona residencial? Essas são questões que tocam o objeto principal deste estudo e serão avaliadas nas páginas seguintes. Será visto que não há ação alguma por parte da prefeitura para preservar aquela área, que não há sinais de remoção das casas que invadiram a área de dunas - as casas de renda média/alta -, e que há sim um projeto de remoção apenas da comunidade Vila do Arvoredo. Fato que declara uma distinção direta entre os pobres e os ricos, que decide por manter as casas que primeiramente invadiram a região e por tirar sem piedade as casas que nasceram como fruto de uma sociedade desigual. É necessário compreender que essa é uma questão tanto social quanto ambiental, gerando uma complexidade sobre a área e tomando o tema com extrema sensibilidade. Por isso, antes de analisar especificamente a comunidade Vila do Arvoredo e o seu processo de formação, juntamente com as ações contraditórias da prefeitura e a sua relação com a área de preservação de dunas, será feita uma análise sobre esse ecossistema de dunas e sobre a importância dele para a região dos Ingleses e da cidade. 23

Foto aérea do Distrito Ingleses do Rio Vermelho em direção ao Nordeste. Nota-se a urbanização da área, a praia do Santinho e dos Ingleses, o extenso campo de dunas Moçambique-Ingleses e também as dunas Santinho-Ingleses. Foto: Zé Paiva/Vista Imagens.




parte 2 as dunas moรงambique-ingleses


As dunas são constituídas, do ponto de vista sedimentar, por acumulações de areia fina dominante. Esses sedimentos têm como origem principal o mar, que através de marés, ondas, correntes e pela ação eólica, transporta esse aporte para a zona costeira. Essa área de comunicação do mar com a terra também está associada a determinados processos que são determinantes na hora de formar distintos tipos de costa, como movimentos tectônicos, oscilações do nível do mar e a própria dinâmica erosiva deposicional local9. Muitos desses processos já atuam há muito tempo em zonas costeiras e variam de acordo com as alterações meteorológicas, totalizando um clico natural e dinâmico que busca um equilíbrio. Assim, dependendo do clima de ondas, pode haver um processo de retirada ou acúmulo de sedimentos nas costas arenosas através da energia das correntes geradas pelas ondas¹0. A esse acúmulo de sedimentos na costa (areias) pode-se dar o nome de dunas. De acordo com Klijn¹¹, o estoque de areia é controlado pelo mar, onde as ondas e correntes carregam a areia em direção à costa, podendo adicionar sedimentos e a subsequente construção de dunas através da ação do vento. Durante períodos em que o nível do mar se eleva, grandes quantidades de sedimentos são liberados pela erosão costeira, alguns dos quais são transportados ao longo da praia e acumulam-se como dunas. Se a taxa de contribuição sedimentar para as dunas for alta e as dunas não estiverem fixadas pela vegetação, irão formar-se extensos lençóis de areias móveis. Se as dunas estiverem estabilizadas e o material for constantemente retrabalhado, o resultado é uma grande crista de duna frontal, que migra vagarosamente em direção à terra assim que o nível do mar aumenta¹². Essas dunas frontais normalmente têm como característica o formato de um cordão paralelo à costa, situado na retaguarda da linha de maré alta na porção superior do pós praia (ver imagem abaixo). As dunas que vão sendo acobertadas por vegetações que, com o crescimento das raízes, impedem o seu movimento através dos ventos, são chamadas de dunas fixas; enquanto que as dunas que não possuem essa proteção e são transportadas com o evento de tempos em tempos são chamadas de dunas móveis.

CARACTERIZAÇÃO DAS DUNAS (página anterior) VIsta de uma das cristas do campo de dunas Moçambique-Ingleses. Foto: do autor, 2014.

Exemplo de duna frontal. Fonte: MIOT DA SILVA, 2006. Foto: P. Hesp. Tipos de dunas quanto a sua morfologia. De cima para baixo, respectivamente: barcanas, transversas, parabólicas e longitudinais. As flechas indicam a direção do vento. Fonte: McKee, 1979. Zonação hidrodinâmica e morfológica de praias arenosas. Fonte: MIOT DA SILVA, 2006.

Sistema praia-duna, exemplificando como ocorre a troca sedimentar entre os dois sistemas. Fonte: MIOT DA SILVA, 2006. _______________________________________________ 9 SILVA, C. G.; PATCHINEELAM, S. M.; BAPTISTA NETO, J. A.; PONZI, V. R. A. Ambientes de Sedimentação Costeira e Processos Morfodinâmicos Atuantes na Linha de Costa. Em: BAPTISTA NETO, J. A; PONZI, V. R. A.; SICHEL, S. E. Introdução à Geologia Marinha. Rio de Janeiro: Interciência, pp. 175-218. 2004. ¹0 MULER, Mariela. Avaliação da Vulnerabilidade de Praias da Ilha de Santa Catarina a Perigos Costeiros Através da Aplicação de um Índice Multicritério. Dissertação submetida ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Santa Catarina, 2012. ¹¹ KLIJN, J.A. Dune Forming Factors in a Geographical Context. In: Dunes of the European Coasts. Catena Supplement 18, p. 113. Cremlingen, Germany. 1990. ¹² CARTER, R. G. W. & Wilson, P. The geomorphological, ecological and pedological development of coastal foredunes at Magilligan Point, Northern Ireland. In Coastal Dunes: Form and Processes., K. F. Nordstrom, N.P. Psuty and Carter, R. G. W. (eds). John Wiley, Chichester, pp. 217-250. 1990.

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As dunas costeiras constituem-se de areias e fragmentos de rochas, produtos da ação mecânica principalmente das ondas e correntes que os trazem para a praia¹³. Assim, as dunas irão depender diretamente do sistema praial, com a sua dinâmica de marés, correntes e ventos. Esse sistema irá influenciar no tamanho das dunas frontais e continentais, dependendo de três variáveis ambientais, segundo Short & Hesp¹4, que se alteram de acordo com as regiões e lugares: velocidade regional dos ventos, tamanho de grão e orientação da linha de costa. Esse processo de depósito e reposição de sedimentos entre a praia e a duna é chamado de Interações Praia-Duna. Miot da Silva¹5 também afirma que apesar da exposição da praia às intempéries seja um fator importante, a morfologia, a declividade e a largura da praia são mais importantes na determinação de quantidade de areia que está sendo transportada pelos ventos em direção à costa. O excesso de sedimentos na zona de praia gera um desequilíbrio possibilitando a instabilidade das dunas frontais que vão dar origem à outras formas de dunas¹6. No caso de dunas móveis, será a intensidade, frequência e velocidade do vento que irão determinar a quantidade de areia que será transportada. Segundo Bagnold¹7, em média, quando os ventos atingem de 4 a 5 m/s de velocidade, os grãos começam a ser transportados (isso irá depender conjuntamente do tamanho dos grãos e outros fatores). Segundo Ferreira¹8, os tipos básicos ou simples de dunas estão fundamentados parcialmente sobre a forma geral e parcialmente no número de faces de escorregamento, refletindo a energia, a força e direção do vento, o suprimento de areia, a vegetação, as barreiras físicas como corpos de água e afloramentos de rocha, e a distância da fonte fornecedora de areia. A classificação de dunas é feita então em função da sua morfologia, e a sua morfologia depende da ação dos ventos. Sendo assim, através da análise das formas das dunas é possível, na maioria das vezes, identificar que tipo de ação eólica está ocorrendo no local e qual é a tendência de movimentação dos sedimentos em questão. Como não é o foco principal deste estudo enumerar os diversos tipos de dunas, será visto com maior detalhe as morfologias que ocorrem no caso da duna Moçambique-Ingleses. Mas, tratando-se de nomes, pode-se citar os tipos de dunas: barcanas, transversas, domo, longitudinais, parabólicas, estrela, reversa, "nebka" e "blow out".

_______________________________________________ ¹³ MEDEIROS, R.A., SCHALLER, H. & FRIEDMAN, G.M. Fácies Sedimentares: análise e critérios para o reconhecimento de ambientes deposicionais. Ciência Técnica - Petróleo, Publicação n°5. Rio de Janeiro. 1971.123p. ¹4 SHORT, A.D. & HESP, P.A. Wave, beach and dune interactions in southeastern Australia. Marine Geology, 48: 259-284. 1982. ¹5 MIOT DA SILVA, G. Orientação da linha de costa e dinâmica dos sistemas praia e duna: praia de Moçambique, Florianópolis, SC. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Geociências, UFRGS. 293p. 2006. ¹6 GIANNINI, P.C.F. & SANTOS, E.R. Padrões de Variação Espacial e Temporal na Morfologia de Dunas de Orla Costeira no Centro-Sul Catarinense. Boletim Paranaense de Geociências, n°42. Editora UFPR, p.73-95. 1994. ¹7 BAGNOLD, R.A. The Physics of Blown Sand and Desert Dunes. Methuen & Co. Ltd., London. 1941.265p. ¹8 FERREIRA, M.T. Distrito de Ingleses do Rio Vermelho – Florianópolis. Um espaço costeiro sob a ação antrópica. Dissertação de Mestrado, UFSC. Florianópolis. 151p. 1999.

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A duna que será também objeto deste estudo por estar próxima e fazer parte da realidade da comunidade Vila do Arvoredo, é chamada de Dunas Moçambique-Ingleses. Esse nome é atribuído em função das areias dessa duna serem depositadas pela Praia do Moçambique, ao sul dos Ingleses, e pelo seu avanço na direção norte, seguindo até a Praia dos Ingleses. Será importante entender e compreender o processo de formação dessa duna, bem como a sua contribuição para o ciclo da natureza e o sistema de praias do Distrito dos Ingleses, e também da sua relação com a ação antrópica. Assim, poderá ser feita uma análise da interferência do homem com as dunas, prevendo possibilidades de preservação do ecossistema aliado com a vivência urbana. O distrito Ingleses do Rio Vermelho possui dois sistemas de dunas, as dunas Moçambique-Ingleses e as dunas Santinho-Ingleses. Essas dunas estão rodeadas pelas praias Ingleses, Santinho e Moçambique. As dunas do Moçambique são em maior parte dunas móveis, porém, possuem em suas laterais um trecho extenso de dunas fixas, cobertas por vegetação. Com uma área de aproximadamente 953,3 ha, este campo de dunas ativas é abastecido por areias provenientes diretamente da praia do Moçambique e avança em direção ao norte (Praia dos Ingleses) seguindo a direção do vento mais efetivo N-S, isto é, ventos do quadrante sul. Apresenta-se mais largo no local de origem (aproximadamente 1.5 m) afunilando-se (menos de 600 m de largura) em direção à Praia dos Ingleses¹9. Este campo de dunas, na sua parte central, onde o vento não encontra barreiras, forma-se um “corredor de vento” provocando um avanço ainda maior da duna no sentido norte. Através das medições realizadas durante dois anos, percebe-se que nesta área central a duna chega a avançar até 9,30 m. Segundo Miot²0, as dunas do Moçambique são do tipo transgressivas: Campos de dunas transgressivas, também conhecidas como dunas móveis ou migratórias, são depósitos eólicos de sedimentos de grande extensão (entre centenas de metros e alguns quilômetros), formados pelo movimento ou transgressão dos sedimentos sobre um terreno vegetado ou semi-vegetado. Podem ser vegetados (relíquias) ou não. São formados em resposta à um aumento do nível do mar, em regiões com alto aporte sedimentar e ventos soprando em direção à costa, ou em costas erosivas²0.

Por volta de 1990 o IPUF (Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis) solicitou ao geógrafo e professor João José Bigarella²¹ - o maior especialista em dunas do Brasil -, um parecer sobre a situação das dunas do Moçambique. Bigarella, nascido em Curitiba em 1923, formou-se em três cursos voltados para engenharia química e no ensino superior voltou-se para a geologia, tornando-se Catedrático de Mineralogia e Geologia Econômica da Universidade Federal do Paraná em 1956. Realizou pesquisas geológicas e geográficas em vários países da América do Sul e da África, interessado principalmente nos problemas relacionados com a deriva continental. Seus trabalhos publicados mais renomados e sua especialidade tratam-se de dunas. No parecer de Bigarella, é constatado que toda a planície arenosa é de origem eólica e que muitas das dunas antigas foram dissipadas e a vegetação arbórea de pequeno porte (acredita-se que ele esteja falando do trecho de dunas do extremo norte por volta dos anos 1940 e 1950) passou a fixar as dunas. Verificou-se também no estudo que as dunas tem a sua atividade diminuída antes de atingir a praia, transformando-se de dunas transversais em parabólicas, tentando estabilizar-se de forma natural; e que quanto menor a duna, maior será a sua velocidade de deslocamento. _______________________________________________ ¹9 FERREIRA, Tânia M. Machri. Distrito de Ingleses do Rio Vermelho - Florianópolis. Um espaço costeiro sob a ação antrópica. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 1999. ²0 MIOT DA SILVA, G. Orientação da linha de costa e dinâmica dos sistemas praia e duna: praia de Moçambique, Florianópolis, SC. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Geociências, UFRGS. 293p. 2006. ²¹ BIGARELLA, João José. Parecer Técnico a propósito das dunas da rua do Siri e adjacências, 1990. Depto. Minerologia e Geologia Econômica - UFPR, 2005.

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AS DUNAS DOS INGLESES

Praia dos Ingleses

Morro dos Ingleses

Dunas SantinhoIngleses Dunas Praia Moçambique- do Santinho Ingleses Morro das Aranhas

Praia do Moçambique Localização das praias do Distrito Ingleses do Rio Vermelho, dos morros adjacentes e do sistema de dunas. As dunas Moçambique-Ingleses são foco deste estudo por estarem próximas da comunidade Vila do Arvoredo. Fonte: Google Earth.


Fotografias antigas mostram as vegetações que estabilizavam as dunas naturalmente em frente a praia e o seu processo de desmatamento e ocupação por campos agrícolas e posteriormente pela urbanização, citados no parecer de Bigarella. Fonte: Geoprocessamento de Florianópolis.

1938

1957

1977

1994

Todos esses sistemas de dunas são importantes para a preservação do ecossistema e constituem-se numa área de recarga para o aquífero que ali se encontra e que abastece toda a rede de água do norte da Ilha de Santa Catarina.

A AÇÃO ANTRÓPICA

Através da análise de fotografias antigas em conjunto com o parecer de Bigarella feito em 1990, constatou-se que a ocupação do solo foi realizada de maneira irregular, ondea atividade agrícola ao norte e a posterior urbanização criaram uma reativação do campo de dunas que antes era estabilizado. Essa ocupação, além de não respeitar o Código Florestal Brasileiro de 1934, criou condições para desestabilizar o sistema e acentuar a mobilização das areias eólicas; e o geógrafo credita a culpa exclusivamente a_______________________________________________ ação antrópica na orla, rente à praia dos Ingleses, e posteriormente a região da Rua ²² BIGARELLA, João José. Parecer Técnico a propósito das dunas da rua do Siri e adjacências, 1990. Depto. Minerologia e Geologia Econômica - UFPR, 2005.

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Mapa de uso do solo, com ênfase nos sistemas de dunas móveis e fixas, no ano de 1994. Fonte: FERREIRA, 1999. mata atlântica área agrícola areias móveis (dunas) vegetação de dunas fixas praias solo exposto área urbana reflorestamento áreas de deflação com vegetação rasteira

do Siri (proximidades da Vila do Arvoredo). Bigarella²² cita que a remoção de mais dunas pode ocasionar na transição de mais areias nas áreas de decréscimo de atividade eólica e que certamente o restante das dunas tenderá a mover-se mais rapidamente aumentando os problemas já existentes. Além disso, o contínuo desmatamento e pisoteamento das dunas fixadas irão agravar a situação. As massas de ar que atuam em Santa Catarina e em Florianópolis são formadas no Atlântico Sul e an Antártida, correspondendo a massa de ar Tropical Atlântica e a massa de ar Polar Atlântica, respectivamente²³. A massa de ar Tropical Atlântica tem a característica de ser quente e úmida, predominando durante o ano em cerca de 80% do tempo. Ela está relacionada às temperaturas quentes e de tempo estável. É dessa massa de ar que originam-se os ventos norte e nordeste, predominantes na região. Já a massa Polar Atlântica atua em menor frequência, predominando mais no inverno (20% do tempo) e possuindo pouca umidade e baixa temperatura. Ela se movimenta em pulsos e em direção ao norte, dando origem ao tradicional e conhecido vento sul da ilha de Santa Catarina. _______________________________________________ ²³ MIOT DA SILVA, G. Orientação da linha de costa e dinâmica dos sistemas praia e duna: praia de Moçambique, Florianópolis, SC. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Geociências, UFRGS. 293p. 2006. ²4 J. Boeyinga a, D.W. Dusseljee a, A.D. Pool a, P. Schoutens a, F. Verduin a, B.N.M. van Zwicht a, A.H.F. Klein. The effects of a bypass dunefield on the stability of a headland bay beach: A case study. Delft University of Technology, Faculty of Civil Engineering and Geosciences, Department of Hydraulic Engineering, Stevinweg 1. 2009.

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VARIÁVEIS AMBIENTAIS


Apesar de muitos autores definirem que o vento Nordeste é o vento predominante na região de Santa Catarina e o vento sul o de menor frequência, porém mais forte; alguns autores como Miot²³ e J. Boeyinga et al.²4 afirmam que os ventos provenientes do sul são os mais fortes e mais frequentes. Miot por exemplo afirma que os ventos que sopram nas regiões costeiras variam de acordo com o local e que no caso de Florianópolis, em algumas adjacências o que prevalece é o vento sul.

VENTOS NORDESTE

Esse tipo de acontecimento pode estar relacionado diretamente a topografia circundante e a orientação da linha da costa. Para o caso das dunas Moçambique-Ingleses, nota-se que as dunas são orientadas pelos ventos sul, o que pode responder a afirmação que nesse local o vento sul é o mais forte e mais frequente. Isso pode se dar em função da proximidade do Morro dos Ingleses e do Morro das Aranhas, que bloqueiam o vento Nordeste. Curiosamente, em alguns trechos das dunas nota-se um embaiamento das cristas, que pode estar relacionado ao vento que vem do nordeste, no trecho em que o Morro dos Ingleses não é mais um bloqueio. VENTOS SUL Ventos atuantes na região de praias e dunas do Moçambique e Ingleses. Observa-se que os ventos nordeste e sul influenciam o movimento das dunas e podem juntos estabilizar ou não o avanço das areias na sua porção norte. Os morros próximos também atuam como barreiras da passagem de vento. Elaboração: do autor. Foto: Google Earth, 2014.

O estudo desses ventos e a sua relação com a movimentação das dunas permite de maneira rápida observar o percurso que as dunas estão tomando e antever qual a possibilidade futura de posicionamento desses sedimentos, já que em direção ao norte existe uma área urbanizada. Segundo relato de Bigarella²5, as dunas antigamente estabilizavam naturalmente ao se aproximarem da praia. Isso estava relacionado a vegetação (que hoje foi desmatada) e talvez esteja relacionada a ação do vento

velocidade do vento em m/s acima de 50 25-50 21-25 17-21 14-17 11-14 9-11 7-9 6-7 3-6 1-3 menor que 1 Rosa dos ventos para a região dos Ingleses. Embora seja comum encontrar relatos de que o ventos nordeste são os mais frequentes, nesse gráfico o vento Sul aparece um pouco a frente e também com mais intensidade. Indiferentemente, deve-se considerar com ventos nos dois sentidos estão atuando e que o vento sul é o que impulsiona as duans para o norte. Fonte: J. Boeyinga et al.

_______________________________________________ ²5 BIGARELLA, João José. Parecer Técnico a propósito das dunas da rua do Siri e adjacências, 1990. Depto. Minerologia e Geologia Econômica - UFPR, 2005.

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nordeste naquele trecho. Isso gera uma possibilidade que o movimento norte das dunas possa estabilizar em algum momento se forem feitas contínuas medições, monitoramentos e precauções por parte do município. Quanto a vegetação, ao longo da orla da praia de Moçambique foi feito o plantio de espécies exóticas como Pinus e Eucaliptos, cobrindo boa parte da retaguarda da praia e das dunas frontais. De todo modo, a vegetação de restinga, normalmente encontrada na região onde se formam as dunas frontais, vem crescendo e se consolidando na parte nordeste da praia do Moçambique. É exatamente nesse trecho que as dunas entram no “corredor” e chegam até a praia dos Ingleses. É muito possível que o crescimento dessa vegetação ao longo dos anos tenha fixado melhor as areias, diminuindo o transporte eólico desses sedimento - como citado em algumas bibliografias.

A PRESERVAÇÃO DA PRAIA DOS INGLESES Mapa esquemático demonstrando a evolução e o crescimento da vegetação de restinga na praia do Moçambique e nas dunas Moçambique-Ingleses ao longo dos anos. É possível que esse crescimento seja responsável pela diminuição do transporte eólico de areias em direção ao norte. Elaboração: do autor. Fonte da imagem: Geoprocessamento de Florianópolis.

Ao longo do estudo percebeu-se que a relação entre a Praia do Moçambique, a Praia do Santinho e a Praia dos Ingleses é uma relação de complementação, onde as praias mais ao sul - em função do seu grande aporte de sedimentos - disponibilizam esses materiais para a reposição e o equilíbrio da praia que fica ao norte. A duna atua como um meio de transporte das areias que saem de uma praia para a outra. Assim, é preciso compreender por quê esse processo acontece, quais são as características dessas praias e como será o futuro desses ecossistemas. A praia dos Ingleses tem aproximadamente 5080 metros de extensão e é delimitada por dois costões rochosos: o Morro dos Ingleses a sudeste e o Morro das Feiticeiras a noroeste. Dois sistemas de dunas chegam até essa praia, as dunas Moçambique-Ingleses (pela ação do vento apenas) e as dunas Santinho-Ingleses (contato direto) que estão mais a leste da praia. Sabe-se que a urbanização da orla desta praia foi intensa nos últimos 30 anos e praticamente todo o seu trecho foi ocupado por edificações construídas muito próximas e em cima da areia da praia. Os muros das casas estão barrando e fazendo divisa com a areia da praia, e em muitos casos foram feitas tentativas de posicionamento de pedras para barrar a erosão. Praticamente toda a duna frontal dessa praia foi destruída e, segundo pesquisas realizadas na área, os avanços das marés

Fotografias mostram a tentativa da população de conter as ressacas com o posicionamento de rochas e construções de grandes muros em frente as edificações na Praia dos Ingleses. Fotos: Candido Bordeaux Rego Neto, 2003.

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não possuem mais essa barreira e acabam por destruir muros, casas e ruas. A Praia do Moçambique possui 12km de extensão e é a maior praia de Florianópolis. Seu trecho sul é urbanizado enquanto o restante da praia possui um aspecto bucólico e desértico. A largura da praia altera-se ao longo de seu percurso, bem como seus tipos de grãos e dunas. A proximidade com os morros adjacentes e a orientação de linha de Fotografia da praia do Moçambique, com vistas para o Morro das Aranhas. Na foto é possível perceber a frente de dunas frontais cobertas por vegetação e ao fundo, no canto esquerdo o início da formação das dunas Moçambique-Ingleses. Fonte da imagem: http://guedesfloripa.blogspot.com.br/2009/11/praia-do-mocambique-floripa-sc.html. Autor da foto desconhecido.

costa faz com que essa praia esteja exposta à energia das ondas dominantes e à intensidade dos ventos mais intensos do quadrante sul. Assim, essa praia deposita um grande aporte de sedimentos que vão formando as dunas frontais e que desenvolveu o longo campo de dunas Moçambique-Ingleses em função desse local receber rajadas de vento transversais à costa. Em contrapartida, a Praia dos Ingleses, devido a sua morfologia, não recebe sedimentos suficientes para a manutenção e o equilíbrio das trocas desse sistema de duna e praia. A urbanização e a destruição das dunas dessa praia é um outro fator que prejudicou a dinâmica dessa praia. Segundo estudos de Ferreira²6, a plantação de Pinus na praia de Moçambique e o crescimento da vegetação que fixa as dunas Santinho-Ingleses também estão diminuindo a chegada de areia até a Praia dos Ingleses. Todos esses fatores estão contribuindo para um problema futuro nessa praia que, ao longo dos anos, sofrerá uma grande erosão em alguns dos seus trechos. Ou seja, os sedimentos que nascem das praias do Moçambique e Santinho, são fundamentais para a preservação da Praia dos Ingleses. _______________________________________________

²6 FERREIRA, Tânia M. Machri. Distrito de Ingleses do Rio Vermelho - Florianópolis. Um espaço costeiro sob a ação antrópica. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 1999. ²7 MULER, Mariela. Avaliação da Vulnerabilidade de Praias da Ilha de Santa Catarina a Perigos Costeiros Através da Aplicação de um Índice Multicritério. Dissertação submetida ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Santa Catarina, 2012. ²8 J. Boeyinga a, D.W. Dusseljee a, A.D. Pool a, P. Schoutens a, F. Verduin a, B.N.M. van Zwicht a, A.H.F. Klein. The effects of a bypass dunefield on the stability of a headland bay beach: A case study. Delft University of Technology, Faculty of Civil Engineering and Geosciences, Department of Hydraulic Engineering, Stevinweg 1. 2009.

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Estudos de Muler¹4 verificaram que a Praia dos Ingleses apresenta um condição de vulnerabilidade considerada alta e muito alta, com aproximadamente 96% da sua linha de costa incluída nessa classe. O estudo tinha como foco a intensidade de processos contínuos como ventos, ondas e marés sobre a zona costeira. Já J. Boeyinga et al.²8, concluem que o trecho leste da Praia dos Ingleses pode sofrer uma erosão de 34 m nos próximos 9 anos em função do recebimento ínfimo de sedimentos nessa praia e, caso não sejam tomadas medidas de prevenção, as casas e as infraestruturas próximas poderão estar em grande perigo. Os mesmos autores citam que se as dunas SantinhoIngleses forem fixadas ou deixarem de transportar sedimentos até a Praia dos Ingleses, esta praia estará mais sujeita a erosão. Atual Estudos realizados porSC-403 J. Boeyinga, et al. (2009), em que aAtual simulação SC-406por meio de softwares avaliam o transporte de sedimentos, força dos ventos, etc., e que desenha a previsão da linha da costa para os próximos 9 anos da Praia dos Ingleses. Fonte: adaptado de J. Boeyinga, et al. (2009).

Fotografia aérea da região das Dunas Moçambique-Ingleses, no ano de 1957. Nota-se a chegada das dunas até a praia dos Ingleses onde, aparentemente, as dunas são cobertas por vegetações. Fonte: Geoprocessamento de Florianópolis.

Embora os autores pesquisados não concluam que as dunas Moçambique-Ingleses são fundamentais para o equilíbrio dos sedimentos da Praia dos Ingleses, ao analisar o contexto histórico e a relação dos sistemas de praias do bairro com as dunas que chegam até a Praia dos Ingleses, pode-se dizer que esse sistema de dunas pode ser um fator importante para a manutenção da praia e dos ecossistemas adjacentes. Viu-se que nas fotografias aéreas antigas, as dunas que vinham da praia do Moçambique chegavam até a orla da Praia dos Ingleses. Esse é um fato que mostra que esses sistemas formavam um conjunto que hoje não é mais direto. A atividade agrícola e a posterior urbanização do bairro fizeram com que esse campo de dunas não tivesse mais contato direto com a praia. Inclusive, parte das dunas foram retiradas para a construção de lotes e casas ilegais sobre a área de APP. As casas vizinhas da Vila do Arvoredo, como será visto no próximo capítulo, fazem parte de uma região que retirou boa parte das dunas. 36


Vista na direção norte/nordeste do campo de dunas Moçambique-Ingleses. É possível visualizar em segundo plano a comunidade Vila do Arvoredo e em último plano o mar que margeia a Praia dos Ingleses. Nota-se a altura das dunas que estão avançando nessa direção. Foto: do autor, 2014. Evolução mais recente das cristas das dunas Moçambique-Ingleses ao longo de todo o campo. Foram usadas fotografias aéreas dos anos de 2002, 2007 e 2012. A imagem à direita mostra a posição das dunas antigas sobre a fotografia aérea mais atual (2013). É importante notar que o avanço das dunas de 2002 para 2007 foi maior doque de 2007 para 2012, sugerindo a diminuição do transporte dessas areias. Elaboração: do autor.. Fonte das imagens: Geoprocessamento de Florianópolis.

Outro fator que possibilita compreender que essas dunas poderiam estar chegando até a praia, é a analise da direção do avanço das cristas de dunas. Todas continuam indo em direção ao norte, por forças do vento sul. Bigarella²9, já no começo dos anos 1990, descreve em seu parecer que pela análise de fotografias pode-se notar que as dunas avançam em uma velocidade de 3,7 a 9 metros por ano, sendo que as dunas menores avançam mais rapidamente. Já segundo J. Boeyinga et al³0, as ondas de dunas estão avançando cerca de 2 a 5 metros por ano em direção ao norte. Porém, agora possuem a barreira da urbanização e o transporte das areais diminui a um transporte apenas eólico chamado de over-pass, onde as areias são transportadas pelo vento por cima das edificações e ruas. A barreira física está fazendo que grande parte das areias se acumulem, formando grandes montes desse sedimento que estão avançando em direção às edificações, inclusive da Vila do Arvoredo, causando perigo e risco a esses moradores (esse estudo sobre o avanço das dunas sobre a comunidade será visto em detalhe a seguir).

_______________________________________________

²9 BIGARELLA, João José. Parecer Técnico a propósito das dunas da rua do Siri e adjacências, 1990. Depto. Minerologia e Geologia Econômica - UFPR, 2005. ³0 J. Boeyinga a, D.W. Dusseljee a, A.D. Pool a, P. Schoutens a, F. Verduin a, B.N.M. van Zwicht a, A.H.F. Klein. The effects of a bypass dunefield on the stability of a headland bay beach: A case study. Delft University of Technology, Faculty of Civil Engineering and Geosciences, Department of Hydraulic Engineering, Stevinweg 1. 2009. ³¹ NETO, Candido Bordeaux Rego. A Integração de Geoindicadores e Reparcelamento do Solo na Gestão Ambiental Urbana. Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção da Universidade Federal de Santa Catarina, 2003.

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O AVANÇO DAS DUNAS

Estudo de avanço de uma crista das dunas Moçambique-Ingleses, realizado por J. Boeyinga, et al (2009). Os autores mostam que o avanço das dunas é rápido, em quase 30 anos percorrem até 150 metros de distância. Apesar da montagem feita pelos autores não parecer muito correta e não oferecer muita precisão, é possível perceber o avanço das dunas através de relatos dos moradores da comunidade Vila do Arvoredo, que dizem que muitas casas já foram invadidads pelas areias. Fonte da imagem: J. Boeyinga, et al (2009). Estudo da evolução de uma crista das dunas Moçambique-Ingleses realizado por Neto¹7. O autor do gráfico utilizou fotografias aéreas dos anos 1997, 1976, 1957 e 1938 para identificar a crista e avaliar a sua evolução. Fonte: Neto³¹.


Atual SC-403 Atual SC-406

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Apesar do perigo do avanço desse aporte de sedimentos em direção à urbanização localizada ao norte, alguns estudos podem sugerir que a quantidade de areias transportadas esteja diminuindo. Se forem observadas a maioria das cristas das dunas Moçambique-Ingleses, em toda a sua extensão, em fotografias mais recentes, pode-se notar que a distância do avanço entre os anos de 2002 para 2007, e de 2007 para 2012, diminuiu. Não se sabe ao certo o motivo para essa diminuição. Pode estar relacionado ao fato da diminuição de tempestades no local, da intensidade de ação do vento sul ter reduzido em alguns momentos, ou então da ação mais frequente dos ventos nordeste. A vegetação crescente ao longo da praia e das dunas também pode ser um fator importante para a redução desse transporte eólico. São estudos que dependem das diferentes análises e de diferentes autores que divergem entre si. Fato é que a ação antrópica foi muito danosa para esse ecossistema, e que se não houvesse a retirada de areia e vegetação, principalmente ao norte das dunas antigamente, esse ecossistema provavelmente estaria estável e equilibrado. Porém, esse não foi o ocorrido e é de extrema importância compreender todos esses fatores para contextualizar a situação atual do local. É preciso pensar qual é o próximo passo para a preservação das dunas, mas também qual é a ação que deve ser tomada em relação às pessoas que estão em vulnerabilidade social. Não é possível pensar apenas em um dos lados, há que se fazer um projeto de cidade, de um bairro que viva em harmonia com seus habitantes, com suas infraestruturas, com seus ecossistemas e, enfim, conquistar uma urbanidade relacionada a qualidade de vida e igualdade social. Assim, será de extrema importância para este estudo realinhar as interferências históricas da ação antrópica que foram danosas com os processos dinâmicos da natureza, permitindo que o ser humano e os ecossistemas possam conviver em harmonia e de maneira sustentável. Pela proximidade da comunidade Vila do Arvoredo com o campo de dunas, com a praia, e também com as primeiras casas que ocuparam essas áreas, o tema torna-se complexo e deve ser tratado com a análise de todos esses fatores, e não somente um deles. Será visto a seguir, o caso dessa comunidade e em seguida as formas previstas para garantir a justiça social desses moradores aliado ao equilíbrio dos sistemas que os circundam.

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Vista na direção sul do campo de dunas Moçambique-Ingleses. A extensão do campo e a sua altura são tão grandes que não é possível visualizar a sua chegada até a praia do Moçambique. Foto: do autor, 2014.




parte 3 o caso da vila do arvoredo


A Vila do Arvoredo é uma comunidade que está situada no centro do Distrito Ingleses do Rio Vermelho. O acesso para o local é feito através da Estrada Dom João Becker, entrando pela Rua do Siri e depois pela Rua Floresta, chegando até a Rua do Arvoredo que marca o limite e o início das casas que são consideradas parte da comunidade pela prefeitura. Atualmente com cerca de 170 famílias residindo no local, os moradores dessa comunidade sofrem com uma série de problemas que são resultado da má gestão da cidade e das políticas urbanas aplicadas. Segundo o Diagnóstico das Áreas de Interesse Social realizado em 2006, pela Secretaria Municipal de Habitação e Saneamento Ambiental, a população das áreas de interesse social irregulares de Florianópolis em 2004 era de 61.445 habitantes divididos em 58 áreas. Porém estudos recentes apontam para um total de 63 AIS (COBRAPE). A Vila do Arvoredo ocupa uma dessas áreas, que é inclusive Área de Preservação Permanente, onde além das 170 famílias dessa comunidade, cerca de mais de 500 casas também ocupam esta zona de preservação ambiental. Trata-se de uma região circundada por dunas fixas e móveis, um ecossistema importante para a manutenção das praias próximas e da dinâmica de trocas de sedimentos entre o mar, a praia e a terra. Além das complexidades que a segregação socioespacial causa a essas pessoas, outros problemas relacionados a particularidade do lugar estão intrinsecamente relacionados à atual situação dessa comunidade. Assim, será visto em que contexto a Vila do Arvoredo e o seu entorno surgiu, para que a compreensão da sua atual situação seja melhor fundamentada. Viu-se anteriormente que o Distrito dos Ingleses surgiu com uma comunidade de pescadores e que o seu crescimento começou a se efetivar a partir da década de 1970 e por volta de 1990 esse aumento populacional saltou rapidamente. Pelos mapas antigos (pg. 6) é possível observar que a Rua do Siri já começa a ser aberta por volta do ano 1977, fazendo uma conexão com a Estrada Dom João Becker. Nessa época não havia controle algum do município sobre a ocupação e o uso do solo, e neste trecho, assim como em muitos outros da cidade, começaram a ser marcados e loteados vários terrenos ao longo da Rua do Siri. Pela análise de fotografias aéreas é possível observar que o início da Rua do Siri era ocupado por um trecho de dunas cobertas por vegetação que foram sendo cortadas e aterradas para dar lugar a essas primeiras edificações. Por relatos de moradores, esses terrenos foram sendo abertos e loteados por um empresário chamado Gentil Mathias principalmente, conhecido por ser o dono de várias terras do bairro. Morar na cidade também implica algumas estratégias por parte da população em não pagar aluguel³², sendo a casa própria a solução buscada na Vila do Arvoredo, apesar das suas condições precárias. Os terrenos, mesmo ocupando uma área ilegal e de risco ambiental, foram sendo vendidos a preços baixos (cerca de 1.000 a 2.000 mil reais por terreno) para imigrantes que vinham em busca de trabalho na região que já estava começando a se desenvolver em volta do turismo. Villaça³³ explica que nas condições de desenvolvimento do Brasil, que dilapidou a sua força de trabalho ao longo dos anos, e sobre a questão da habitação, os únicos componentes da cesta de consumo do trabalhador que são oferecidos pelo mercado são: um lote em loteamento ilegal, longíquo e desprovido de melhoramentos públicos, oferecidos para compra a prestações, e o material de construção"; além da mão de obra para realizar a construção das casas ser geralmente dos próprios trabalhadores, com seus amigos e familiares. De acordo com uma entrevista realizada com o morador Sr. Nivaldo, as primeiras casas da comunidade Vila do Arvoredo surgiram no início da década de 1980, quando o aterro da areia e a criação de novos lotes já tinha se expandido, abrindo mais ruas a partir da _______________________________________________

³² PIMENTA, Margareth de C. A.; PIMENTA, Luís Fogazzola. Políticas públicas e segregação sócio-espacial: o caso do

Maciço Central em Florianópolis-SC. In: Seminário Nacional da ABEP - Associação Brasileira de Estudos Populacionais, 2002, Ouro Preto. Violências, o Estado e a Qualidade de Vida da População Brasileira, 2002. v. 1. ³³ VILLAÇA, F. O que todo cidadão precisa saber sobre habitação. São Paulo: Global, 1986.

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O CASO DA VILA DO ARVOREDO Fotografia aérea localizando a comunidade Vila do Arvoredo. O acesso à comunidade se dá pela Estrada Dom João Becker que se conecta à Rua do Siri e posteriormente a Rua Arvoredo. Foto: Google Earth, 2013.

O HISTÓRICO DA OCUPAÇÃO Estra

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Rua do Siri

Fotografia aérea do ano de 1977, demonstrando pela primeira vez o início da ocupação e abertura da Rua do Siri. Foto: Geoprocessamento Florianópolis.


Rua do Siri Rua Arvoredo

Comunidade Vila do Arvoredo


Rua do Siri e inclusive retirando areia das dunas móveis que estão adjacentes a esses terrenos criados. A Rua Arvoredo era a rua que dava acesso às casas da comunidade e estas, por estarem mais longe da Estrada Dom João Becker em direção ao sul, estavam mais próximas das dunas móveis. O morador entrevistado cita que não havia conhecimento por parte dos compradores que aquela área era uma Área de Preservação Permanente e que inclusive alguns terrenos foram vendidos com contrato de compra e venda, mesmo sendo ilegais. A proximidade das casas com as dunas era um fator que seduzia os imigrantes que vinham morar no local pela sua bela paisagem, ocultando o real risco de ocupar aquela área. Ermínia Maricato explica que a ocupação de áreas ambientalmente frágeis é a alternativa que sobra para os excluídos do mercado e dos programas públicos pouco abrangentes³4 Essas áreas protegidas por legislação ambiental não interessam ao mercado imobiliário privado, gerando loteamentos piratas e clandestinos que originam as favelas. Pode-se dizer que essas ocupações são consentidas não oficialmente pelo Estado, que nada faz para cumprir a legislação, flexibilizando suas próprias regras de acordo com as áreas que não são valorizadas pelo mercado imobiliário. Fotografia aérea demarcando a comunidade da Vila do Arvoredo, e demonstrado as casas vizinhas nos arredores da Rua do Siri, no ano de 2005. A fotografia está com vista para a direção sul. Fonte: acervo SMHSA / PMF / 2005.

Em resumo, as casas dos moradores da Vila do Arvoredo ocuparam as áreas de maior vulnerabilidade, enquanto as casas de classe média e alta ocuparam as regiões mais estáveis. Essa distinção entre a qualidade da localização e das próprias moradias se deve, segundo Villaça³5, ao modo de produção capitalista que, através das propriedades privadas de terra, onera violentamente o preço do produto habitação, obrigando as camadas mais pobres a morar nos piores locais das cidades. Pela falta de alternativas dos imigrantes a procura de trabalho, criou-se ali uma separação de classes sociais e funções dentro do espaço urbano, o que pode-se chamar de segregação territorial³6. Como a região da rua do Siri está intimamente relacionada com a comunidade Vila do Arvoredo, trataremos a Vila do Arvoredo como a comunidade que é _______________________________________________

³4 MARICATO, Ermínia. A nova Política Nacional de Habitação. O Valor, São Paulo, 24 nov. 2005. ³5 VILLAÇA, F. O que todo cidadão precisa saber sobre habitação. São Paulo: Global, 1986. ³6 ROLNIK, Raquel. O que é cidade. 2a ed. São Paulo: Brasiliense, 1989. 86p.

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o foco deste estudo, porém trataremos também da região denominada "região da Rua do Siri" que comporta as casas vizinhas a comunidade e fazem parte do contexto de inserção desses moradores. A análise da relação dessas duas áreas será importante para a compreensão do aspecto social tratado com a comunidade, e também da relação das ações da prefeitura com as duas áreas. Na época, a quantidade de construções crescia rapidamente na região Norte de Florianópolis e quase todos os imigrantes que vieram morar na Vila do Arvoredo vieram em busca de trabalho no setor da construção civil, trabalhando como pedreiros, encanadores e serventes. Outros moradores, em maior parte as mulheres, vinham para trabalhar no setor hoteleiro, como camareiras, faxineiras, cozinheiras, etc. Esses imigrantes vieram da região sul do país, grande parte do Oeste de Santa Catarina, do Paraná e também do Rio Grande do Sul. Região da Rua do Siri

Vila do Arvoredo

Até 1995, segundo relatório socioeconômico realizado pela Prefeitura Municipal de Florianópolis, viviam cerca de 30 famílias na Vila do Arvoredo e 10 anos depois, em 2005, já havia 221 famílias morando no local. No mesmo ano a prefeitura indenizou uma parte das famílias e algumas foram morar em outro local de Florianópolis ou em sua cidade de origem. Assim, hoje estima-se que existam cerca de 170 famílias, totalizando cerca de 650 habitantes. Esses números são estimados pois o último levantamento realizado pela prefeitura foi feito em 2005 e os dados do censo do IBGE que foi realizado em 2010 não demarcam a área exata da comunidade, abrangendo outras casas que não estariam na conta das famílias.

Foto aérea localizando as casas vizinhas à comunidade Vila do Arvoredo, nos arredores da Rua do Siri. Fonte: Google Earth, 2013. Fotografia com vista para uma das servidões interiores a comunidade. Observa-se o solo arenoso entre os barracos e a precariedade dos materiais utilizados nas construções. Ao fundo pode-se notar crianças brincando na rua por falta de espaços de lazer, estando em contato com o lixo e sujeira deixados na rua. Fonte: PMF, 2006.

Cidades de origem dos moradores da Vila do Arvoredo. Fonte: Relatório SócioEconômico - Vila do Arvoredo. Secretaria de Habitação e Saneamento Ambiental, 2005.

CIDADES

ABS

grande Florianópolis 29 outras regiões SC 105 78 Paraná Rio Grande do Sul 65 22 outros estados 19 não informou 318 total

% 9,12 33,02 24,53 20,44 6,92 5,97 100

O crescimento intenso da comunidade a partir da década de 90, bem como do Distrito dos Ingleses, aconteceu em função dos investimentos da cidade em prol do turismo nessa região e a consequente oferta de trabalho disponível com os novos empreendimentos que estavam sendo construídos. Os moradores mais antigos começavam a receber familiares de outras cidades, em função da grande oferta de trabalho. Infelizmente esse crescimento não foi ordenado e faltaram legislações e cuidados urbanísticos para que o adensamento da região fosse realizado de maneira adequada. A área que anteriormente era ocupada por um extensa área de areia com dunas fixas, semifixas e fixas foi paulatinamente sendo recortada, retirando aquelas areias do local e as substituindo por residências. Nas figuras a seguir, pode-se observar o processo de desenvolvimento das residências da região da Rua do Siri e posteriormente da comunidade Vila do Arvoredo; assim como é ilustrado o processo de remoção da área de dunas desde o início da primeira ocupação até a situação atual. 46


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EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO URBANA ENTRE 1938 E 2013

Fontes: Geoprocessamento de Florianópolis / Google Earth. Data da imagem maior: 2013.


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EVOLUÇÃO DO PROCESSO DE RETIRADA DAS DUNAS

Fotomontagem elaborada pelo autor. Fontes: Geoprocessamento de Florianópolis / Google Earth. Data da imagem de fundo: 2013.


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EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO SOBRE AS DUNAS

Fotomontagem elaborada pelo autor. Fontes: Geoprocessamento de Florianópolis / Google Earth. Data da imagem de fundo: 2013.


DELIMITAÇÃO ATUAL DA OCUPAÇÃO URBANA SOBRE FOTOGRAFIA DE 1938 Fontes: Geoprocessamento de Florianópolis / Google Earth.


1994

2002

2007

CASAS QUE FORAM INVADIDAS PELAS DUNAS

Fotomontagem elaborada pelo autor. Fontes: Geoprocessamento de Florian贸polis / Google Earth. Data da imagem de fundo: 2013.


Através da análise dessas montagens esquemáticas de fotografias é possível interpretar que a ocupação inicial se deu até 1977 no trecho norte da Rua do Siri, quando se encontra com a Estrada Dom João Becker. O desenvolvimento das casas aconteceu no sentindo sul/sudoeste, onde em 1994 já é possível notar um crescimento expressivo da região da Rua do Siri e também da Vila do Arvoredo no trecho oeste das imagens. Em 2002 a região da Rua do Siri está consolidada e a partir desse ano apenas as casas da Vila do Arvoredo continuam crescendo para o lado oeste e mais próximo das dunas.

A RELAÇÃO DA COMUNIDADE COM AS DUNAS

É importante notar que as primeiras casas da Vila do Arvoredo foram sendo soterradas pelo avanço das dunas no sentido S-N, e casas que existiam nos anos de 1994, 2002 e 2007, hoje não existem mais. A comunidade aos poucos foi percebendo os riscos que as suas moradias estavam sofrendo por conta da proximidade das dunas e mais recentemente vem realocando as casas que ficam ao sul para a parte norte - onde as dunas estão mais estabilizadas e não ameaçam os moradores. Não se sabe ao certo, e não foram achados estudos que indiquem porque as casas da região sul da Rua do Siri não foram invadidas pelas dunas. Porém, é possível perceber que os moradores dessa região provavelmente fizeram o plantio de vegetações na parte sul, de encontro com as dunas, o que pode estar barrando este avanço. Outra possibilidade é de que pela localização, os ventos nordeste estejam atuando com mais força nessa região, fazendo um movimento negativo em relação ao vento sul que movimenta as areias no sentido norte. Assim, pode ser possível que as areias não estejam mais se movimentando neste trecho, fazendo um percurso no sentido noroeste, onde estão mais próximas da Vila do Arvoredo. A própria comunidade Vila do Arvoredo tem-se esforçado para barrar a areia, porém são alternativas provisórias que não são suficientes como o plantio de vegetações de espécies que não são adequadas e possuem porte suficiente para segurar as dunas, e o posicionamento de objetos como geladeiras e entulhos que acabam sendo medidas paliativas. Os moradores da Vila do Arvoredo, por falta de auxílios técnicos por parte da prefeitura, tentam conter o avanço das dunas com a construção de barreiras de entulhos e até geladeiras. Espécies de plantas que também não se adequam são plantadas erroneamente. Fonte: acervo SMHSA / PMF / 2012

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Como visto no capítulo anterior, a tendência do movimento das dunas Moçambique-Ingleses é em direção ao norte, e ao longo dos últimos anos a distância percorrida por esse aporte de sedimentos tem diminuído, o que pode ser uma alternativa para a segurança das edificações que estão no caminho. No entanto o risco da proximidade com as dunas não é apenas em função do soterramento das casas, mas também sobre a questão de salubridade da região. A maioria dos residentes da comunidade cita como é incômodo o convívio com as areias, tornando os afazeres do dia a dia muito mais complicados. Em suas refeições a areia está presente nos alimentos, em seus objetos pessoais há o pó sempre presente (como em cima das camas e sofás), e nem mesmo ao sair do banho é possível manter-se limpo pois a leveza do sedimento rapidamente se adere a pele e as vestimentas. Segundo Grando³7, o maior problema está nas doenças respiratórias causadas pela respiração dos pequenos grãos pelos moradores da região. Em entrevista realizada com a geógrafa Janete Abreu, a professora explica que no momento que as dunas são transportadas os milhões de grãos de areia entram em choque e nesse conflito vão se fragmentando e diminuindo de tamanho. Acabam por se transformar em um pó de sílica não visível a olho nu e que os moradores respiram sem saber, ocasionando em casos extremos problemas pulmonares. Infelizmente trata-se de um caso de ação antrópica com uma resposta direta da natureza.

DADOS ATUAIS SOBRE A COMUNIDADE

FAIXA ETÁRIA

ABS

%

oa6 7 a 14 15 a 24 25 a 59 mais de 60 não informou total

132 164 119 259 29 76 779

17 21 15 34 4 9 100

Faixa etária dos moradores da Vila do Arvoredo. Fonte: Relatório Sócio-Econômico - SMHSA, 2005. População de 0 a 14 anos, segundo freqüência escolar. Fonte: Relatório Sócio-Econômico - SMHSA, 2005.

O último relatório de dados sobre a comunidade Vila do Arvoredo foi realizado no ano de 2005 pela Prefeitura Municipal de Florianópolis. Apesar do último censo do IBGE ter sido realizado em 2010, serão usados os dados colhidos pela prefeitura pois os setores cadastrados pelo IBGE demarcaram áreas que vão além da comunidade e outras que não abrangem a comunidade - misturando os dados com as casas vizinhas. Assim, deve-se considerar que os dados apresentados podem apresentar divergências em relação ao estado atual da comunidade. Sabe-se que atualmente a prefeitura tem atualizado o cadastramento da comunidade e em estudos posteriores esses dados devem ser apresentados. A pesquisa de 2005³8 contou 168 famílias, totalizando 647 pessoas. A população da Vila do Arvoredo está bem dividida entre os sexos, possuindo uma grande quantidade de crianças, cerca de 38% dos moradores possuem idade de 0 a 14 anos. Esse dado mostra a importância da proximidade da comunidade com escolas e creches. Segundo a pesquisa, 97,64% das crianças de 7 a 14 anos frequentam a escola e apenas 21,68% das crianças de 0 a 6 frequentam as creches. Com a recente mudança da escola Gentil Mathias - que fica no início da Rua do Siri -, é muito provável que mais crianças pequenas comecem a frequentar as creches. É importante ressaltar que, quando as crianças não estão na escola, é preciso haver disponibilidade de espaços públicos de lazer e recreação nas proximidades - algo que não existe atualmente. Existem poucos idosos e deficientes físicos, porém, um possível projeto de habitação deve prever a situação desses moradores. FREQUÊNCIA sim não não informou total

0A6 ABS 31 103 9 143

7 A 14 % 21,68 72,03 6,29 100

ABS 165 2 2 169

TOTAL % 97,64 1,18 1,18 100

ABS 196 105 11 312

% 62,82 33,66 3,52 100

_______________________________________________

³7 GRANDO, Silvia Eloisa. A territorialização em saúde como instrumento para a vigilância em saúde na comunidade Vila do Arvoredo - Ingleses. Dissertação de Mestrado Profissional em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Socioambiental. Universidade do Estado de Santa Catarina, Florianópolis, 2011. ³8 PREFEITURA MUNICIPAL DE FLORIANÓPOLIS. Vila do Arvoredo. Relatório Sócio-Econômico. Secretaria Municipal de Habitação e Saneamento Ambiental - SMHSA. Julho, 2005.

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Na vila do Arvoredo não é comum a convivência de mais de uma família por casa, sendo que a porcentagem da composição familiar mais alta é de 3 membros por família, representando 26,24% do total. A média da composição familiar sobre o total de moradores resulta em um índice de 3,85% pessoas por domicílio. Isso pode indicar que as famílias grandes que moram na Vila do Arvoredo, são distribuídas em diferentes casas em vez de todos morarem apenas em uma casa. Das 221 residências levantadas em 2005 (que totalizam 90,04% do tipo de uso dos imóveis), 143 foram compradas pelos moradores, representando 64,70% do total. Muitos preferiram não responder a pergunta e apenas 12,67% dizem ter invadido e ocupado a área. A pesquisa também questionou os moradores sobre a vontade de retornarem a sua cidade de origem, mas apenas 3,47% deles demonstraram esse interesse. Esse dado é muito relevante se considerarmos a precariedade do lugar em que essas pessoas vivem e que, apesar disso, preferem permanecer na cidade e muito provavelmente no mesmo bairro. A maior parte das famílias são formadas por casais e, do total de famílias, 47,3% são homens que as sustentam, seguido de 32,67% em que o homem e a mulher trabalham e 20,23% em que só a mãe sustenta a família. Um fator que prejudica diretamente o desenvolvimento da comunidade, a situação social dos moradores e o direito deles de acesso às benesses da cidade, é o nível de escolaridade dos habitantes e a consequente realização profissional para a sustentação das famílias e a garantia de qualidade de vida. A grande parte da população a partir dos 15 anos possui apenas o Ensino fundamental completo resultando em 76,56% do total de moradores. Esse é um reflexo da falta de políticas de educação do governo brasileiro e da inserção adequada de pessoas com baixa escolaridade dentro da sociedade, provendo-as dos mesmos direitos que o restante da população. Essas pessoas acabam se tornando foco de mão de obra barata e de exploração, um herança de um país marcado pela escravidão e pelas desigualdades sociais. Consequentemente o desemprego é colocado como a maior dificuldade que as famílias da Vila do Arvoredo passam dentro da cidade, com 70,96% dos entrevistados declarando esse fato. Alguns moradores citam que sofrem também de preconceito no momento em que fazem entrevistas para emprego, quando dizem que são moradores da Vila do Arvoredo ou Favela do Siri (antigo nome dado em função da rua de mesmo nome), o que prejudica ainda mais as suas chances de conseguir trabalho. Eles também admitem terem que mentir sobre o local de residência para que tenham mais oportunidades. O nível de escolaridade e as dificuldades para conseguir um emprego decente faz com que a faixa de renda dessas famílias seja muito baixa, onde a maior parte ganha de 1 a 2 salários mínimos (lembrando que os dados da pesquisa são de 2005, quando o salário mínimo no Brasil valia R$300,00). Um total de 82,65% dos moradores possui renda mensal de 0 a 3 salários mínimos, colocando esses moradores dentro da Faixa 1 do programa Minha Casa Minha Vida. Em média, o salário mínimo da comunidade é no valor de 2,21 salários mínimos. Mesmo assim, nas entrevistas, apenas 19,31% disseram estar sendo atendidos por algum tipo de programa social do governo brasileiro. Por fim, a pesquisa trata sobre as doenças mais recorrentes entre os moradores da Vila do Arvoredo. As doenças respiratórias como bronquite e asma são as mais citadas, abrangendo 51,35% dos entrevistados. Não é um fato comprovado cientificamente, porém essa suscetibilidade maior a doenças respiratórias pode estar diretamente relacionada a presença constante da movimentação da areia das dunas próximas através dos ventos. 57

Nº PESSOAS

ABS

%

1 2 3 4 5 6 >6 total

23 31 53 39 25 17 14 202

11,39 15,35 26,24 19,30 12,37 8,42 6,93 100

Família Segundo Composição Familiar. Fonte: Relatório Sócio-Econômico - Vila do Arvoredo SMHSA, 2005.

USO

ABS

%

próprio alugado cedido invasor não informou total

143 14 5 28 31 221

64,70 6,34 2,27 12,67 14,03 100

Imóvel segundo regime de ocupação. Fonte: Relatório Sócio-Econômico - Vila do Arvoredo SMHSA, 2005.

ABS

INTERESSE

%

sim 7 3,47 184 91,08 não 4 1,98 não informou naturais de Florianópolis 7 3,47 202 100 total Famílias quanto interesse de retornar a cidade de origem. Fonte: Relatório Sócio-Econômico - Vila do Arvoredo - SMHSA, 2005.

SEXO

ABS

%

masculino feminino ambos total

95 41 66 202

47,30 20,22 32,67 100

Chefes de famílias segundo Sexo. Fonte: Relatório Sócio-Econômico - Vila do Arvoredo - SMHSA, 2005.


ESCOLARIDADE

ABS

%

não alfabetizado ensino fundamental ensino médio ensino superior não informou total

18 356 60 3 28 465

3,88 76,56 12,90 0,64 6,02 100

Em um outro relatório realizado pela Secretaria de Habitação de Florianópolis no ano de 2010, são caracterizadas algumas medidas prioritárias para além do projeto de habitação de interesse social, como o aumento do nível de escolaridade, a qualificação profissional, a educação socioambiental, a diminuição da criminalidade, criação de áreas de esporte, lazer, cultura e artes, estratégias para diminuição de doenças e melhorias de infraestrutura e serviços para a comunidade. Todavia, poucas dessas medidas têm sido aplicadas até então pela Prefeitura.

População A Partir de 15 Anos Segundo Nível de Escolaridade. Fonte: Relatório Sócio-Econômico - Vila do Arvoredo - SMHSA, 2005.

DIFICULDADES

ABS

%

desemprego rel. familiar drogas/álcool violência doméstica outros total

44 2 8 1 7 62

70,96 3,23 12,90 1,62 11,29 100

1

2

3

4

Famílias quanto às dificuldades familiares. Fonte: Relatório Sócio-Econômico - Vila do Arvoredo SMHSA, 2005.

AS RELAÇÕES DA PREFEITURA COM A REGIÃO DA RUA DO SIRI E A VILA DO ARVOREDO

Apesar de todos esses problemas, a postura da prefeitura em relação ao processo de ocupação dessa área e à Vila do Arvoredo é desigual. Como já citado, o município não fez o uso da legislação para evitar a primeira ocupação sobre a área de preservação permanente, deixando que casas ilegais fossem construídas sobre as dunas. Mais que isso, regularizou essas casas já consolidadas levando o abastecimento de água e as ligações elétricas para a região. Essas infraestruturas, ironicamente, deixam de existir na faixa que vai a partir da primeira linha de casas da rua do Arvoredo até o encontro com as dunas a Oeste. Essa é a região da Vila do Arvoredo, onde as ligações de energia e água, bem como do esgoto, são realizadas de maneira clandestina, sem o apoio da prefeitura. A iluminação pública também está presente em toda a região, menos em algumas ruas da Vila do Arvoredo, onde também são realizadas ligações a partir dos postes de luz. Esse tipo de ação da prefeitura marca sua posição diferenciada sobre o tratamento dos moradores que moram na Vila do Arvoredo e os que não moram. Apesar de todas as casas que se encontram na região estarem em zonas ilegais, sobre APP, a prefeitura permite a consolidação apenas das primeiras casas que ocuparam a região - aquelas em que a maioria hoje é de classe média e alta - e barra a infraestrutura para os moradores da vila do Arvoredo. Comportamento esse de alto valor segregativo e de injustiça social. _______________________________________________

Imagem 1 - Foto tirada em cima da crista da duna mais próxima da comunidade Vila do Arvoredo, em direção ao Norte. Fonte: do autor. Imagem 2 - Servidão sem nome que atualmente grande parte já está coberta por dunas. Está situada na parte extremo sul da comunidade. Fonte: do autor. Imagem 3 e 4 - Fundos das casas situdas a Oeste da comunidade. Fonte: do autor.

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FAIXA DE RENDA

ABS

%

sem renda inferior a 1 sm 1 a 2 sm 2,1 a 3 sm 3,1 a 4 sm 4,1 a 5 sm mais que 5 sm não informou total

8 29 87 43 9 3 5 18 202

3,96 14,35 43,06 21,28 4,46 1,49 2,48 8,92 100

Famílias segundo faixa de renda. Fonte: Relatório Sócio-Econômico - Vila do Arvoredo - SMHSA, 2005.

DOENÇA

ABS

%

gripe bronquite/asma diabetes depressão HIV cardíacos total

9 19 02 02 03 02 37

24,32 51,35 5,41 5,41 8,10 5,41 100

Freqüência das principais doenças que atingem a família. Fonte: Relatório Sócio-Econômico - Vila do Arvoredo SMHSA, 2005.

Além disso, não houve até hoje alguma ação da prefeitura para a contenção das dunas a fim de evitar o soterramento das casas da comunidade Vila do Arvoredo. Os próprios moradores, em mutirões organizados por eles mesmos, tentam conter as areias colocando objetos para obstruir a sua passagem e, quando nem mesmo isso é possível, desmontam as casas para que não fiquem embaixo das dunas, realocando as famílias para um trecho com menos risco de avanço. Para essas novas casas em que as famílias são realocadas, também a prefeitura não prestou auxílio até hoje, ficando a cargo dos moradores a compra dos materiais e a própria construção das residências. Segundo Rogers³9, na ausência de uma distribuição mais justa da riqueza, um modo mais adequado de ajudar ocupações informais é estimular a autoajuda fornecendo liderança técnica, recursos a baixo custo e apoio político. Segundo relatório socioeconômico da Prefeitura40, nos últimos anos a comunidade começou a reivindicar coletivamente os seus direitos de moradia e de acesso à cidade, formando no ano 2000 Associação de Moradores da Vila do Arvoredo (AMOVILAR). Segundo o relatório, foi em Dezembro de 2004 em uma audiência pública, que foram estabelecidos compromissos entre os órgãos públicos e uma agenda preliminar de atividades para iniciar o processo de busca das novas moradias. Em 2005, a prefeitura, sob a gestão do prefeito Dario Berger, indenizou cerca de 60 famílias na tentativa de resolver o "problema da favela do siri" (nome que era dado a comunidade em função da proximidade com a Rua do Siri). As indenizações eram de valores ínfimos e muitas das famílias que voltaram para sua cidade de origem não conseguiram reconstruir sua vida e algumas tiveram que voltar novamente para a Vila do Arvoredo. Conta-se também, através de relatos de moradores e outros conhecedores do processo da comunidade, que o empresário Marcondes de Mattos - dono do resort Costão do Santinho e Costão Golf, empreendimentos de alta classe localizados no bairro Ingleses - ofereceu "ajuda" aos moradores da Vila, na tentativa de indenizar com valores mínimos esses moradores e retirá-los de seu local de moradia o mais rápido possível. Diz-se que o empresário estava incomodado com a presença dessa favela e que pretendia construir um teleférico na região sobre as dunas - conectando os seus dois estabelecimentos - sem ter o empecilho de ter a sua bela vista lá de cima obstruída pela desprezível favela do siri. Coincidentemente, na mesma época a Secretaria de Habitação e Saneamento Ambiental da Prefeitura de Florianópolis lançou um projeto especial de Habitação de Interesse Social para a comunidade Vila do Arvoredo. Foi realizada uma série de levantamentos e cadastros sobre a comunidade a fim de remover todos os moradores dali para um outro terreno. A associação de moradores era muito forte e acompanhava o processo com veemência, exigindo os seus direitos de moradia digna. Ao final dos levantamentos concluiu-se que toda a comunidade deveria ser removida sob o pretexto de que todos estavam em área de risco. Porém, nesse mesmo período a prefeitura trouxe geógrafos especialistas em dunas que citaram o perigo da ação antrópica sobre esse ecossistema mas não disseram que a comunidade precisaria ser removida, sugerindo até alternativas de contenção das dunas. Esse acontecimento vai de encontro com a resolução de prefeitura em retirar todos e apenas os moradores da Vila do Arvoredo, pois se os próprios especialistas disseram que não era necessário remover a comunidade não havia sentido nessa conclusão. Tal fato sugere uma diferenciação no tratamento da prefeitura e da sociedade em relação a essa comunidade, uma vez que as casas vizinhas _______________________________________________

Crianças da comunidade brincando nas dunas, reflexo da falta de espaços de lazer do local. Foto: do autor

³9 ROGERS, Richard. Cidades para um pequeno planeta. Barcelona: Gustavo Gili, 2001. 40 PREFEITURA MUNICIPAL DE FLORIANÓPOLIS. Vila do Arvoredo. Relatório Sócio-Econômico. Secretaria Municipal de Habitação e Saneamento Ambiental - SMHSA. Julho, 2005.

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da região da Rua do Siri também estão em áreas previamente ocupadas por dunas consequentemente sob o mesmo "risco" que os moradores da Vila do Arvoredo -, e portanto também ocupam uma área ilegal para construção de residências: a APP. Sugere também uma relação com a iniciativa privada e a especulação imobiliária, que possuem força o suficiente para influenciar ações como essa. De todo modo, apesar do esforço de alguns interessados sobre a questão da Vila do Arvoredo em tentar fazer com que a prefeitura realizasse o projeto de Habitação de Interesse Social em um terreno adjacente ao local da comunidade, a prefeitura seguiu com o seu plano de remover toda a comunidade para um novo terreno. Foram procurados vários terrenos e, muitas comunidades vizinhas sabendo da possibilidade da vinda dos moradores da Vila do Arvoredo para um local próximo de suas residências, manifestaram-se de maneira contrária, produzindo até abaixo-assinados contra o projeto da prefeitura. Os moradores da Vila do Arvoredo, por falta de força política, moral e social - e apesar do enorme sofrimento de preconceito por parte de seus vizinhos -, não podiam fazer nada a não ser apoiar a ação da prefeitura para tentar melhorar as suas vidas e a maioria queria sair daquele local o quanto antes.

Localização e distância do terreno doado pela CASAN em 2005. Elaboração: do autor. Foto: Google Earth.

O projeto chamado Recanto dos Ingleses previa 168 unidades habitacionais distribuídas em 14 lotes, cada um com 2 prédios de 3 pavimentos, e 2 apartamentos por pavimento; além de duas praças e a implantação de uma creche. O projeto da Secretaria de Habitação já estava pronto e a comunidade já havia sido notificada de que seria realocada para habitações mais adequadas e para um novo terreno doado pela CASAN - empresa que fornece energia elétrica para a cidade de Florianópolis -, situado a 2,4 km de distância da Vila do Arvoredo. Porém, a FATMA - através de seu estudo de viabilidade ambiental do terreno escolhido - relatou que o terreno era alagadiço, necessitando a construção de um aterro para a locação das novas habitações. Em função do alto custo para a realização desse aterro - cerca de 4 milhões de reais -, a CAIXA não aprovou o projeto alegando que com a mesma quantidade de recursos era possível comprar outros terrenos próximos e mais baratos para a construção dessas habitações. Delimitação e entorno do terreno doado pela CASAN em 2005. Relatório da FATMA nota que o terreno é alagadiço e necessita de infraestrutura. Elaboração: do autor. Foto: Google Earth.

Perspectiva do projeto de habitação realizado pela Prefeitura para a comunidade Vila do Arvoredo 2005. Fonte: site Prefeitura.

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Esse acontecimento gerou muito desapontamento por parte de toda a comunidade da Vila do Arvoredo, gerando discórdias e até mesmo a culpa de certos moradores sobre as lideranças comunitárias da época. Tal fato fez com que esses moradores ficassem desunidos e desacreditados até hoje, o que vem aumentando a violência do local, a venda de drogas (que antes não existia) e a falta de controle sobre os assuntos relacionados a comunidade. O ocorrido também prova a falta de comprometimento da prefeitura e estudos bem fundamentados sobre esse processo. Além disso, com o lançamento do novo Plano Diretor em 2013, pode-se tirar algumas conclusões e sugestões sobre os princípios que o município está tomando em relação a essa região. Pelo zoneamento, tanto a região da Rua do Siri, quanto a da Vila do Arvoredo ainda mantém-se como APP. Fato que levanta grandes dúvidas sobre qual ação a prefeitura irá tomar sobre essa região. Não se sabe ao certo se todas as casas serão removidas e/ou indenizadas - tanto as da Vila do Arvoredo quanto as região da rua do Siri -, o que totalizaria cerca de 670 casas. Pela análise da atual gestão é difícil acreditar que a prefeitura teria recursos para indenizar tantas famílias. Isso acaba por sustentar a mesma alternativa que havia ocorrido em 2005, de que a prefeitura provavelmente irá retirar apenas as famílias da comunidade Vila do Arvoredo e realizar algum tipo de ajuste de conduta para os moradores da região da Rua do Siri. Observa-se também que a Prefeitura aproveita a doação de um terreno para a remoção da comunidade, ao invés de considerar mais importante a procura de um terreno bem localizado, inserido em um contexto de usos mistos, para a produção de moradia de baixa renda. É preciso fazer uso dos instrumentos como o Estatuto da Cidade e o Plano Diretor em prol dos programas sociais como o Minha Casa Minha Vida, a fim de ampliar o acesso à terra bem localizada para produção de moradia de baixa renda4¹. Infelizmente, desde 2005 até hoje a prefeitura ainda não apresentou publicamente um novo projeto para a Vila do Arvoredo, estando o processo de construção de Habitações de Interesse Social para essas pessoas atualmente parado. Mesmo assim, o autor compareceu nas últimas reuniões do Conselho de Habitação de Florianópolis e foi citada a informação de que a Secretaria de Habitação continua com a previsão de remoção de toda aquela comunidade. Um documento relatado em 20104², que serve atualmente como base para um novo projeto, pontua diversas justificativas encontradas pela prefeitura para intervir na Vila do Arvoredo. Seguem os pontos descritos abaixo:

Implantação do projeto de habitação realizado pela Prefeitura para a comunidade Vila do Arvoredo 2005. Fonte: site Prefeitura.

"1) De acordo com o Estudo de Hierarquização de Assentamento Subnormais, das 63 AIS, esta comunidade encontra-se na 6ª posição no índice de hierarquização, ou seja, há a necessidade de investimentos, pois se trata de uma comunidade desprovida de infraestrutura de esgotamento sanitário, drenagem, abastecimento de água, coleta de lixo, iluminação pública, energia elétrica, entre outras, determinando condições insalubres do meio e das moradias, por apresentar grande acumulo de lixo e partículas em suspensão; 2) A comunidade localiza-se em Área de Muito Alto Risco (R-4) por apresentar risco de soterramento relacionado a movimentação de dunas de areia, além de estar assentada em uma Área de Preservação Permanente (APP), constituindo-se num ecossistema dunar, sendo dunas móveis, fixas e semifixas, em estado totalmente degradado, influenciando o aqüífero de Ingleses; 3) A ocupação é consolidável, no entanto, é inviável a urbanização e a

_______________________________________________

4¹ ROLNIK, Raquel. (org.) Como produzir moradia bem localizada com recursos do programa minha casa minha vida?: implementando os instrumentos do Estatuto da Cidade. Brasília: Ministério das Cidades, 2010. p. 20. 4² PREFEITURA MUNICIPAL DE FLORIANÓPOLIS. Projeto de Trabalho Técnico Social - Vila do Arvoredo. Prefeitura Municipal de Florianópolis / Secretaria Municipal de Habitação e Saneamento Ambiental. Florianópolis, 2010.

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intervenção de projeto de infraestrutura no local, devido à movimentação das dunas que avançam gradativamente em direção as moradias. Por este motivo é necessário a remoção da comunidade para outra região; 4) Por estar assentada sob as dunas a comunidade Via do Arvoredo vive condições insalubres de moradia, as quais são potencializadas pela ação dos ventos sobre a areia das dunas, que contribuem para o aparecimento de problemas de saúde, sobretudo os respiratórios; 5) A realidade sócioeconômica da região concentrada na faixa entre 0 e 3 salários mínimos, a baixa escolaridade da população e consequentemente, as altas taxas de subemprego, trabalho informal, desemprego, pouca qualificação profissional, reportam para a necessidade de ações de geração de trabalho e renda fundamentados no fortalecimento dos canais de expressão das diversas potencialidades das comunidades e no incremento de novas oportunidades. 6) A relação dos moradores com o meio ambiente, com destaque para as questões ligadas ao destino do lixo doméstico e as doenças de veiculação hídrica, aliado a necessidade de recuperação da área degradada e preservação das dunas, também são motivos de preocupação, assim como, a necessidade da adoção de medidas que visem a eliminação de qualquer forma de ocupação da área, justifica-se a inserção de conteúdos de Educação Sanitária e Ambiental. 7) Devido ao forte vínculo comunitário e de vizinhança estabelecido entre os moradores, e constituição de uma Associação de Moradores, ressalta-se a importância de manter a comunidade unida, como forma de não desestabilizar o movimento social lá estabelecido; Dentro deste contexto, justifica-se a necessidade da intervenção, a fim de garantir as condições de saúde e bem estar da população, respondendo ainda, ao princípio constitucional do direito à moradia digna, segura e regular, através de ações efetivas, preparando os moradores para intervenções físicas na área, destacando a apropriação das benfeitorias e sustentabilidade do empreendimento." Projeto de Trabalho Técnico Social - Vila do Arvoredo. Prefeitura Municipal de Florianópolis / Secretaria Municipal de Habitação e Saneamento Ambiental4³

Embora todas essas justificativas apresentadas pela prefeitura pareçam satisfatórias e adequadas, se olharmos esses pontos através de uma visão global, compreendendo não só a comunidade Vila do Arvoredo mas o bairro e a cidade como um todo, veremos que são justificativas fundadas em uma grave injustiça social que diferencia a Vila do Arvoredo do restante das pessoas. A prefeitura coloca a comunidade como prioridade porque não há infraestrutura adequada para a região, porém, as casas vizinhas, logo do outro lado da Rua Arvoredo, também são casas que ocuparam uma área previamente estabelecida por dunas. E, ironicamente, essas casas possuem infraestrutura e são consideradas pelo registro de imóveis da prefeitura, recebendo água, energia elétrica, recolhimento de lixo, tratamento das calçadas, etc. Apesar da Secretaria de Habitação tratar apenas com situações de cunho social, não houve até hoje uma real ação sobre as casas vizinhas a Vila do Arvoredo por parte da prefeitura, a não ser quando é declarada toda a área como área de APP. Tanto a Vila do Arvoredo quanto as casas vizinhas, por exemplo, sofrem com o transporte eólico de areia. As partículas são praticamente invisíveis e atingem qualquer pessoa, podendo prejudicar sua saúde de alguma forma, não apenas os moradores da Vila. _______________________________________________

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4³ PREFEITURA MUNICIPAL DE FLORIANÓPOLIS. Projeto de Trabalho Técnico Social - Vila do Arvoredo. Prefeitura Municipal de Florianópolis / Secretaria Municipal de Habitação e Saneamento Ambiental. Florianópolis, 2010.

AÇÕES REAIS SOBRE A CIDADE REAL


Determinação do Grau de Risco dos Assentamentos Subnormais. Fonte: Estudos para a Hierarquização de Assentamentos Subnormais. Companhia Brasileira de Projetos e Empreendimentos - Cobrape -; Programa Habitar Brasil/BID, Termos de Referência nº 9 HBB/PMF/02. Florianópolis, 2006.

GRAU DE PROBABILIDADE Rs1 Rs2 Rs3

Critérios para definição de probabilidade de ocorrência de processos de soterramento por movimento de dunas

A distância entre a base do talude de sotavento e a moradia permanece estável há mais de dois anos. A moradia está próxima ao talude de barlavento. A distância entre a base do talude de sotavento e a moradia é superior a 20 metros. Presença de cobertura vegetal entre as dunas e a moradia. A distância entre a base do talude de sotavento e as moradias vem se reduzindo anualmente. A distância entre a base do talude de sotavento e a moradia é inferior a 20 metros. Areias transportadas pelo vento acumulam-se nos terrenos de entorno da moradia. Não há cobertura vegetal na base das dunas; não há barreira vegetal entre as dunas e a moradia. Presença de cobertura vegetal entre as dunas e a moradia. A distância entre a base do talude de sotavento e a moradia vem reduzindo anualmente. A distância entre a base do talude de sotavento e a moradia é inferior a 10 metros. Parte do terreno de entorno da moradia já está soterrado pela duna. Não há cobertura vegetal na base das dunas; não há barreira vegetal entre as dunas e a moradia.

Sabe-se claramente que toda a área, desde a Rua do Siri até a Vila do Arvoredo, abrange um contexto peculiar e sensível, tanto ao bairro quanto ao meio ambiente, mas principalmente toca sobre as questões sociais. É inegável dizer que todos ali ocuparam uma área de preservação e que, de um ponto especificamente e apenas técnico, todos deveriam ser removidos para que a natureza e as áreas de importante preservação ambiental pudessem continuar existindo e contribuindo com a dinâmica desse ecossistema de dunas e praias. Estaríamos falando de remover a Estrada Dom João Becker por exemplo - que está no caminho do avanço das dunas -, ou então de remover todas as cerca de 700 casas que ocupam áreas previamente cobertas pelas areias. Todavia, não foi assim que o município tratou esse trecho de urbanização nos últimos anos. As áreas foram sendo ocupadas e com o passar do tempo a maioria das casas foram consolidadas e registradas pela própria prefeitura. Logo, a realidade hoje é outra. Dificilmente o município terá recursos suficientes para indenizar tantas casas e a especulação imobiliária sobre um local de grande interesse turístico é enorme. Assim, infelizmente a prefeitura se lança de discursos em que a remoção de toda a comunidade da Vila do Arvoredo é essencial para garantir a qualidade de vida e o direito de moradia dessas pessoas sob situação de risco, quando na verdade está diferenciando pessoas que estão na mesma situação (desde início da Rua do Siri) e através desse discurso adentra em uma discussão política. Ao longo do processo de remoção a comunidade já passou por diversas situações de preconceito, injustiça social, insegurança e até hoje corre o risco de ser realocada para um terreno qualquer, longe de suas vivências urbanas, de seus serviços comuns, e de sua realidade. Raquel Rolnik44 demonstra com simplicidade o que os moradores de uma favela passam quando diz que "o planejamento urbano chama (a favela) de subnormal, a polícia chama de marginal e o povo de má vizinhança, que desvaloriza o bairro."

Vista das casas que ficam na parte Oeste da comunidade, mais próximas das dunas móveis. Nessa área as dunas não se movimentam tanto quanto a parte sul. Foto: do autor. _______________________________________________

44 ROLNIK, Raquel. O que é cidade. 2a ed. São Paulo: Brasiliense, 1989. 86p.

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própria prefeitura, vê-se muitas casas em situação considera regular e algumas rente à rua consideradas boas. As casas que vão se afastando da Rua do Arvoredo na direção Oeste, ou seja, em direção mais próxima das dunas, vão tornando-se mais precárias e de situação irregular. Por outro lado, as casas que estão do outro lado da Rua do Arvoredo estão em situação similar a qualidade das casas rentes a mesma rua e que são consideradas parte da comunidade Vila do Arvoredo. Levanta-se então a questão principal: qual é a diferença entre as casas de um e outro lado da rua? Por que a prefeitura decidiu retirar apenas as casas que estão de um lado, se elas apresentam situações praticamente iguais? A falta de infraestrutura, conscientização ambiental e a proximidade com um centro faz com que exista muito lixo a céu aberto em várias partes da comunidade. Foto: do autor.

Ao longo desse estudo foi visto que a remoção de toda a comunidade representaria um dano grave às questões sociais, do acesso e direito à cidade desses moradores, mas também de força política, onde as pessoas que mais precisam de auxílio precisam ser removidas para que o problema seja resolvido, enquanto outras pessoas de maior poder aquisitivo são tratadas de outra forma, possuindo mais privilégios que contribuem para a segregação sócioespacial. Observou-se que não se trata apenas de uma questão legal, e sim uma evidência da questão social, em que a prefeitura usa o problema da duna como justificativa para ocultar o real problema da desigualdade. Assim, observando com cuidado a região da rua do Siri, poderá ser visto que há uma grande possibilidade de que ao menos uma parte da comunidade Vila do Arvoredo possa permanecer, continuando a desfrutar da sua boa localização, dos serviços próximos, da infraestrutura, e dos laços históricos que estão arraigados na vivência desses moradores - e o mais importante, de afirmação política daqueles que sofrem com a desigualdade social, garantindo o seu direito e dignidade dentro da cidade. O projeto de habitação social deve ser encarado, assim como em países como a Holanda, como o principal fator de recuperação urbana, sendo pensado com a participação dos moradores, coordenado pelo poder público e integrado com habitações particulares incluindo serviços de contribuam com a vitalidade da comunidade45. Nesse trabalho foi possível verificar que um trecho da comunidade Vila do Arvoredo _______________________________________________

45 ROGERS, Richard. Cidades para um pequeno planeta. Barcelona: Gustavo Gili, 2001.

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A situação das casas mais próximas das dunas é preocupante. A presença da areia entre os barracos é marcante. Foto: do autor.



está tão consolidando quanto as casas vizinhas da região da Rua do Siri. Esse trecho está localizado principalmente ao longo da Rua do Arvoredo, a rua que limita o início da comunidade. Isso foi possível através da análise das edificações do local, das infraestruturas que chegam até ali, dos materiais utilizados nas construções, da densidade habitacional, dos usos e da vulnerabilidade em relação às dunas (ver mapas nas páginas seguintes).

Localização das casas próximas à Rua do Arvoredo. Será visto ao longo das próximas páginas que essas casas, em ambos lados da rua, possuem características parecidas, de aspecto consolidado. Foto: do autor.

Ao observar essas casas, percebe-se que a sua grande maioria é construída em alvenaria, com bons acabamentos e fechamentos, o que garante uma maior qualidade e conforto aos seus moradores. Segundo estudos de avaliação das edificações, realizados pela própria prefeitura, vê-se muitas casas em situação considera regular e algumas rente à rua consideradas boas. As casas que vão se afastando da Rua do Arvoredo na direção Oeste, ou seja, em direção mais próxima das dunas, vão tornando-se mais precárias e de situação irregular. Por outro lado, as casas que estão do outro lado da Rua do Arvoredo estão em situação similar a qualidade das casas rentes a mesma rua e que são consideradas parte da comunidade Vila do Arvoredo. Levanta-se então a questão principal: qual é a diferença entre as casas de um e outro lado da rua? Por que a prefeitura decidiu retirar apenas as casas que estão de um lado, se elas apresentam situações praticamente iguais? A rua do Arvoredo, apesar de ainda não calçada, é uma rua bem consolidada e com iluminação pública. As casas da Vila do Arvoredo que tem acesso direto por essa rua, todas já possuem ligação de água, de energia e titulação do imóvel registrada pela prefeitura. Esses são outros fatores que tornam esse trecho tão consolidável quanto a região da rua do Siri, por exemplo. Agora, tratando-se de risco ambiental e de salubridade, poderemos olhar para algumas questões. Sabe-se que o lençol freático em toda a região dos Ingleses é muito próximo da superfície do solo. Assim, tanto a comunidade Vila do Arvoredo, como o restante do bairro que não possui tratamento de esgoto, correm o risco de contaminar esse aquífero que abastece todo o norte da ilha. Essa é uma questão essencial e específica de investi Muitos barracos são autoconstruídos pelos próprios moradores com seus familiares e amigos. O uso de materiais que “sobram” de entulhos, de pouca qualidade, faz com que existam frestas nas casas, permitindo a entrada de areia, vento e iluminação. Foto: do autor.

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46 BIGARELLA, João José. Parecer Técnico a propósito das dunas da rua do Siri e adjacências, 1990. Depto. Minerologia e Geologia Econômica - UFPR, 2005.

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Rua Arvoredo

Rua do Siri

N


Vistas da Rua Arvoredo, via que delimita o inĂ­cio da comunidade

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Rua Arvoredo

N


Vistas da Rua Arvoredo, via que delimita o inĂ­cio da comunidade

71


Rua Arvo redo

N


DENSIDADE HABITACIONAL

Elaboração: do autor. Fontes: Prefeitura Municipal de Florianópolis, 2011 / Google Earth, 2013.

Alta (até 11 m²/habit.)

Baixa (mais de 25 m²/habit.)

Média (de 10 a 25 m²/habit.)

Sem dados


Sem dados

Regular

Precário

Bom

Ruim

AVALIAÇÃO DAS EDIFICAÇÕES

Elaboração: do autor. Fontes: Prefeitura Municipal de Florianópolis, 2011 / Google Earth, 2013.


RENDA DAS EDIFICAÇÕES

Elaboração: do autor. Fontes: Prefeitura Municipal de Florianópolis, 2011 / Google Earth, 2013.

até R$300

de R$600 a R$900

de R$300 a R$600

mais de R$900

sem dados


Madeira Alvenaria

Misto

MATERIAIS UTILIZADOS

Elaboração: do autor. Fontes: Prefeitura Municipal de Florianópolis, 2011 / Google Earth, 2013.


DENSIDADE HABITACIONAL

Elaboração: do autor. Fontes: Prefeitura Municipal de Florianópolis, 2011 / Google Earth, 2013.

Serviços Misto

Residencial


mento em infraestrutura para todo o bairro. Logo, essa justificativa não compete como uma causa específica para a remoção da Vila do Arvoredo. Talvez o maior risco realmente esteja na proximidade das casas e o seu contato com as dunas. Mas, a própria prefeitura requisitou ao maior geógrafo especialista em dunas do Brasil, João José Bigarella, uma análise das condições da área em 2005. Em seu parecer46 o especialista conclui que deve haver a tentativa de contenção dessas areias, e que se a tentativa não for bem sucedida, aí sim as casas que estariam em risco deveriam ser removidas. Ou seja, do próprio ponto de vista técnico, é recomendado que seja feita a contenção das dunas, prevendo o cuidado com os problemas respiratórios das moradores próximos. Assim, analisando todos esses fatores, conclui-se que uma parte da comunidade, a que está em contato direto com as dunas, e que apresenta sérios riscos de soterramento e de saúde, deve ser removida e realocada para um terreno que apresente boas condições de infraestrutura, acessos, serviços, enfim, de direito à cidade. E outra parte poderá continuar no mesmo local, prevendo um projeto de Habitação de Interesse Social subsidiado pelo programa Minha Casa Minha Vida na faixa 1 (que atende a população que ganha de 0 a 3 salários mínimos), para ambos os locais dos projetos. O objetivo deste trabalho é realizar o anteprojeto das Habitações de Interesse Social da parte da comunidade que deve permanecer no local. Foram feitos estudos sobre qual terreno poderia receber o projeto, levando em consideração o afastamento com as dunas e o processo de contenção, a posição solar, proximidade com a rua e acessos, serviços próximos e sobre o total de área possível para ser construída, influenciando consequentemente na quantidade de famílias que poderiam ser atendidas pelo projeto. É importante que o projeto de habitação compreenda os fatores citados pelo Ministério das Cidades47 como importantes características além da própria edificação, como a qualidade ambiental do meio, a inserção com a cidade através da disponibilidade de infraestrutura urbana e de acessibilidade ao mercado de trabalho e aos equipamentos públicos. Algumas das casas próximas da comunidade Vila do Arvoredo, na região da Rua do Siri. Algumas residências possuem até piscina, e outras encontram-se vazias por serem de veraneio. A prefeitura não se manifesta sobre essa população, ao contrário da Vila do Arvoredo, que também ocupa APP de dunas. Fonte: Google Earth, 2013.

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47 BRASIL. Ministério das Cidades. Urbanização de Favelas: a experiência do PAC - Ministério das Cidades, Secretaria Nacional de Habitação. Brasília, 2010.

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parte 4 diretrizes de projeto


O estudo da Vila do Arvoredo acabou abrangendo uma série de complexidades que foram além do esperado. Trata-se de um tema sensível, a questão da habitação. Mas, ao longo das diversas análises realizadas, percebeu-se que essa questão ultrapassa seus limites, tocando assuntos políticos, sociais, educacionais, históricos e ambientais. Viu-se que a comunidade Vila do Arvoredo sofre com um extremo descaso por parte do município, que vem adiando o processo de construção de duas moradias por mais de 20 anos. Mais que isso, seus moradores sofrem de preconceito e vivem dia após dias com medo de perderem suas casas tanto pela invasão das dunas quanto pela legislação incoerente. Observou-se também que a comunidade é tratada com diferença em relação às casas vizinhas e está em risco de ser completamente realocada com base em um discurso irreal e segregativo. As ações da prefeitura parecem não ter critérios e sugerem uma série de alternativas que na verdade não tem como objetivo principal a melhora da qualidade de vida dos moradores da Vila do Arvoredo, mas sim o interesse político da própria prefeitura, dos vizinhos de alta classe social e dos empresários interessados em aumentar sua renda através do investimentos turísticos no bairro. O almejo do município por ser um polo de turismo e investimentos internacionais acabou por aumentar os espaços de pobreza, sempre mascarando-os de alguma maneira. Segundo Maricato4890, isso faz parte da nossa sociedade, que produz cidades segregativas, já que se formou alicerçada na desigualdade, na autoridade, e nas relações baseadas no privilégio e na arbitrariedade. A Vila do Arvoredo hoje se encontra desunida, iludida e a espera de uma solução que parece não ter futuro. É preciso encontrar a melhor solução para a reivindição desses moradores. São necessidades que todos os seres humanos deveriam ser atendidos, com qualidade e comprometimento, e que hoje muitas de nossas cidades ignoram. Tratando-se dessa comunidade, os acessos aos bons serviços, à infraestrutura, ao lazer, à educação, à qualidade de vida e a dignidade se resumem a um desejo principal: um lar agradável. Assim, aliando as necessidades da comunidade com fatores que melhoram a qualidade dos ambientes da cidade, propõe-se a diretriz principal para a elaboração de um anteprojeto de Habitações de Interesse Social para a comunidade Vila do Arvoredo. Um estudo mais detalhado sobre as características do projeto será realizado durante a segunda etapa do Trabalho de Conclusão de Curso, mas, desde já colocam-se algumas questões que podem ser seguidas para a produção de um projeto adequado a fim de resguardar uma dívida socialmente construída ao longo de toda a formação territorial da cidade49 . A permanência de parte de comunidade deve ser garantida através da sua regularização, transformando o terreno escolhido para o projeto em ZEIS. Isso irá evitar uma possível invasão do mercado imobiliário sobre a área, em função do acréscimo de valor devido aos investimentos que seriam aplicados no local. É fundamental fazer uso do Plano Diretor e do Estatuto da Cidade afim de preservar a dignidade de moradia para esses habitantes. Deve-se prever espaços de lazer para os moradores, em função da grande quantidade de crianças que moram no local, também por falta de lugares que desenpenham esse papel nas proximidades e para desestimular o uso das dunas como áreas de recreação - pois o pisoteamento pode danificar e modificar o ecossistema. A integração e a união da comunidade pode ser revivida com a reconstrução da Associação de moradores, que _______________________________________________

48 MARICATO, E. (org.). Brasil, cidades: alternativas para a crise urbana. Petrópolis: Vozes, 2001. 204p. 49 LEFEBVRE, Henri. O direito à cidade. São Paulo: Moraes, 1991. 145p.

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(página anterior) Criança avistando a comunidade Vila do Arvoredo a partir da duna que está avançando sobre as casas. Fonte: acervo SMHSA / PMF / 2012.


foi soterrada pelas dunas. Nesse local poderão ser feitas as reuniões dos moradores, oficinas e projetos educacionais. O centro de reciclagem poderá ser reformulado, produzindo espaços higiênicos e que não afetem o ecossistema de dunas. O projeto poderia abrigar esse centro, podendo oferecer mais empregos para os moradores da comunidade e relacionando melhor a importância da reciclagem do lixo e da preservação ambiental. Também nesse sentido, a comunidade poderia organizar mutirões de limpeza e de fiscalização das dunas, como se esse espaço fosse o jardim de suas casas, precisando sempre de cuidados. As dunas precisam deixar de ser as inimigas dessa população. No parecer de Bigarella, são colocadas algumas sugestões de contenção das dunas, que serão consideradas no anteprojeto e na definição do local de intervenção. Seguem alguns dos principais pontos colocados por Bigarella50: - Uso de tapetes de acículas de pinus estimulando o crescimento de plantas rasteiras - Plantação de barreiras arbóreas a barlavento de dunas com pelo menos três fileiras de árvores (pinus, eucalipto) - Após estabilização das dunas a área deveria ser convertida em Parque Natural.

Assim, seria interessante a construção de um projeto de Parque Natural, onde nas proximidades poderiam haver eventos de conscientização ambiental, exposições sobre o funcionamento das dunas e a sua contribuição para a manutenção do ecossistema de praias e dunas. O próprio parque serviria como limite entre a ocupação do homem e a natureza, impedindo que houvessem outras construções e criando uma espécie de área de transição entre as casas e as dunas. Outras questões como a melhora do acesso devem ser pensadas no projeto. Pois, apesar da boa localização, a comunidade possui apenas uma rua que dá acesso às casas, o que torna-se um fator limitante e que pode influenciar na insegurança do local. Outra questão seria a amplianção dos comércios e serviços próximos, podendo o próprio projeto propor um local de intervenção. Esse fator poderia dar mais vida a rua, construindo um senso de comunidade também entre as casas vizinhas. Todos esses anseios a serem considerados no projeto não pode ser aplicados sem ao menos houver uma consulta e uma participação dos moradores da comunidade. Isso é válido tanto para as ações da prefeitura quanto para qualquer projeto arquitetônico realizado para uma população em situação de vulnerabilidade social. O autor deseja que, na segunda etapa do trabaho de conclusão de curso, o anteprojeto seja concebido também com a ajuda das opiniões dos moradores, aproximando o fazer arquitetônico da realidade vivida por essas pessoas. Estão listados a seguir os principais pontos e diretrizes a serem seguidos no projeto: Em relação às dunas: - Projeto de contenção das dunas - Plantação de vegetação arbórea sugerida por Bigarella na porção sul do trecho estudado. - Identificação do possível avanço e áreas de risco para os moradores próximos. - Projeto de parque natural que garanta a preservação desse ecossistema. _______________________________________________

50 BIGARELLA, João José. Parecer Técnico a propósito das dunas da rua do Siri e adjacências, 1990. Depto. Minerologia e Geologia Econômica - UFPR, 2005.

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casas em situação de risco que devem ser realocadas para terreno próximo no Distrito dos Ingleses

área de contenção do avanço das dunas

área de terrenos consolidados onde há possibilidade de receber o projeto de HIS, onde parte da comunidade estará inserida


Croqui - Diretriz inicial de implantação da Habitação de Interesse Social e projeto de contenção das dunas. Elaboração: do autor.

plantio de árvores

HIS

plantio de árvores

centro de reciclagem área de transição

plantio de árvores

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Sobre a permanência da comunidade: - Identificação das casas em situação de risco. - Proposição de terreno dentro do Distrito dos Ingleses para a realocação das casas em situação de maior risco. - Identificação de trecho na Rua do Arvoredo onde existam terrenos já consolidados. - Proposição de projeto para HIS que comporte parte da comunidade, de acordo com o limite do terreno a ser proposto na Rua do Arvoredo. Sobre o projeto de Habitação de Interesse Social: - Propor projeto adequado para os moradores da comunidade Vila do Arvoredo, que garanta seu acesso à cidade e o direito de moradia digna, visando a permanência de ao menos uma parte da comunidade no seu local de origem. - Garantir o acesso facilitado, conectando o projeto com o entorno e o contexto do bairro. - Prover de infraestruturas que garantam a salubridade do local, melhorando a qualidade de vida do ambiente, sem prejudicar o meio ambiente. - Propor espaços de lazer e recreação, visando a educação da quantidade expressiva de crianças no local. - Adequar o projeto do Centro de Reciclados ao contexto do entorno. - Construção do edifício da Assossiação de Moradores da Vila do Arvoredo. Em suma, o maior almejo deste trabalho é realizar um projeto que una os interesses da cidade, da comunidade e da natureza. O relatório das Nações Unidas, cujo título é Nosso Futuro Comum (Our Common Future), propõe que o conceito de desenvolvimento sustentável das políticas econômicas tenha como foco atender às nossas necessidades atuais sem comprometer as gerações futuras, dirigindo ativamente o nosso desenvolvimento em favor da maioria do mundo: os mais pobres (ROGERS, 1209I). No caso da Vila da Arvoredo, a proximidade com as dunas torna-se um fator fundamental para a criação de um projeto sustentável, que seja um exemplar da relação do homem com a preservação meio ambiente. É preciso impedir que a ação antrópica continue prejudicando outros meios e demonstrar que é possível a criação de uma relação harmônica. Segundo Richard Rogers5¹ em seu livro "Cidades para um pequeno planeta", não é possível existir harmonia urbana ou melhoria ambiental real sem paz e garantia da aplicação dos direitos humanos básicos. Mais que isso, é preciso inserir as pessoas que necessitam das benesses da cidade no contexto urbano, criando espaços públicos agradáveis e espaços de moradia adequados, possíveis de se chamar de lar, e assim, conquistar o mínimo de justiça social e dignidade dentro da cidade.

_______________________________________________

5¹ ROGERS, Richard. Cidades para um pequeno planeta. Barcelona: Gustavo Gili, 2001.

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bibliografia BAGNOLD, R.A. The Physics of Blown Sand and Desert Dunes. Methuen & Co. Ltd., London. 1941.265p. BIGARELLA, João José. Parecer Técnico a propósito das dunas da rua do Siri e adjacências, 1990. Depto. Minerologia e Geologia Econômica - UFPR, 2005. BRASIL. Ministério das Cidades. Urbanização de Favelas: a experiência do PAC - Ministério das Cidades, Secretaria Nacional de Habitação. Brasília, 2010. CARTER, R. G. W. & Wilson, P. The geomorphological, ecological and pedological development of coastal foredunes at Magilligan Point, Northern Ireland. In Coastal Dunes: Form and Processes., K. F. Nordstrom, N.P. Psuty and Carter, R. G. W. (eds). John Wiley, Chichester, pp. 217-250. 1990. COUTO, Marcelo Machado. Ingleses do Rio Vermelho (Florianópolis/SC): Um Distrito, duas realidades. Questões históricas e outros determinantes acerca do desenvolvimento urbano da região nos últismo vinte anos (1991-2010). 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