Carlos Dolezel
O gato Rodrigo ilustrado porLux
Este livro pertence a:
O gato Rodrigo Carlos Dolezel ilustrado porLux
1a. Edição Rio de Janeiro Estudio PV 2018
todos os direitos de texto para Carlos Dolezel todos os direitos de ilustração para Lucia Helena Ramos Texto: Carlos Dolezel Ilustração: Lucia Helena Ramos (Lux) Projeto editorial gráfico: Estudio PV Design Fotografia: acervo do autor
C284l
Dolezel, Carlos O gato Rodrigo / Carlos Dolezel; ilustrações de Lux. - Rio de Janeiro: Estudio PV, 2018. 32p : il.color ; 21 cm ISBN 978-85-69192-01-5 1. Literatura Infanto-juvenil. I. Título. CDD: 028.5
Estúdio PV - Rio de Janeiro Telefones: (21) 2265-2103 contato@estudiopv.com - www.estudiopv.com Impresso no Brasil
CDU: 087-5
Para Alice. Com amor, dos bisavós Conceição e Carlos
e como toda história, essa também começa assim...
Era uma vez...
...uma senhora baixinha de cabelos branquinhos como a neve que usava uns grandes óculos de lente redonda e que chamada Maria. Ou melhor, vovó Maria - que era como todos a chamavam. Os netos, bisnetos e até os vizinhos com seus filhinhos, que gostavam muito da senhorinha, a chamavam assim: Vovó Maria. 5
Vovó Maria vivia sozinha em sua casinha em um bairro modesto, mas muito amigável. Sua casa tinha paredes brancas, janelas azuis e telhado vermelho. Era uma casinha simples, mas muito bonitinha e bem cuidada, com um grande terreno cheio de árvores frutíferas e flores que embelezavam os dias da vovó Maria. Vovó Maria tinha filhos, netos e até uma bisnetinha, mas vivia só, porque embora todos a amassem muito, todos tinham suas vidas para viver e suas famílias para sustentar. Assim sempre que podiam ia visitar a vovó, que morava afastada do centro da cidade. Desta forma vovó Maria vivia sozinha, mas alegre com as sua plantas e com a alegria das crianças que viviam pedindo para catar frutas no seu enorme quintal que tinha de tudo. Goiabeiras, uma grande mangueira, fruta de conde, caju, acerola, limão e uma jabuticabeira que vivia carregadinha de bolotinhas pretas muito doce e fazia a alegria da garotada.
Certo dia, um dos filhos da vovó Maria, resolveu dar um gatinho de presente para lhe servir de companhia. Era um gato muito bonito com um enorme rabo felpudo, branquinho como os cabelos da vovó. Vovó Maria deu-lhe o nome de Rodrigo, por causa de um Certo Capitão Rodrigo, personagem de um linda historia de amor que ela tinha lido quando ainda era moça. Vovó Maria gostava tanto do Capitão Rodrigo que até tinha dado esse nome ao seu primeiro filho homem: Rodrigo. Rapidamente o gatinho Rodrigo e vovó Maria apegaram-se um ao outro. O gatinho Rodrigo era tratado com todo carinho. Ele tinha uma caminha na cozinha porque gostava de ficar perto do fogão à lenha onde vovó cozinhava, e porque ali era sempre quentinho. Ele também tinha uma caminha no quarto da vovó onde costumava passar as noites fazendo companhia um ao outro. 8
Vovó Maria não deixava faltar nada ao gatinho, sempre tinha uma tigela com ração preferida à disposição. Diariamente, ela escovava o pelo do gatinho Rodrigo que exibia orgulhoso o seu grande rabo felpudo. O gato por sua vez, vivia ronronando ao redor da vovó, lhe fazendo carinho, E ele adorava ficar deitadinho ao seu lado enquanto ela fazia tricô. Muitas vezes quando o rolo de lã caia no chão e gatinho Rodrigo corria para brincar com ele. E era um custo para vovó Maria conseguir tirar a bolota de lã das patas do bichano, que era muito ágil e imaginava que a vovó estava brincando com ele. Muitas vezes, vovó Maria desistia de correr atrás do bichinho e acabava deixando o restinho de lã para que ele brincasse, pois ela também se alegrava com as travessuras do gatinho.
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Os dias foram passando e cada vez mais vovó Maria foi se apegando ao gato Rodrigo e ele a ela. Toda vez que precisava chamar o gatinho, ela lembrava do filho com o mesmo nome. Seu filho também chamado de Rodrigo morava em outro país, com seus filhos - os netos de vovó Maria. E embora ele morasse longe, sempre escrevia e queria saber como estavam todos os seus irm„os, sobrinhos e È claro da sua m„e querida. Todo ano, nas férias, vinha com sua família para passar as festas de Natal e Ano Novo com vovó Maria. Era uma alegria.
A vida ia passando, com todos felizes e o gato Rodrigo foi se tornando adulto, e começou a pensar em como deveria ser a vida fora do limites da casa da vovó Maria. Às vezes, outros gatos da rua passavam pelo terreno e ficavam dizendo a Rodrigo que a vida de gato de rua era cheia de aventuras, não era uma vida chata como a que ele vivia ao lado da vovó Maria. Na rua, diziam, eles viviam subindo nos telhados, correndo atrás de outras gatas, às vezes davam um corrida perseguindo um camundongo, só pelo prazer de vê-los correr assustados.
Da forma como os gatos contavam, a vida na rua era muito mais divertida do que ficar ali brincando com a bolota de lã ou ronronando entre as pernas da vovó Maria. A vida era boa na casa em que morava, mas não tinha aventura, tudo que precisava estava sempre a sua disposição. Vovó Maria cuidava de todas as suas necessidades e principalmente lhe dava muito carinho, mas ele queria mais, queria conhecer as aventuras que os outros gatos tanto falavam. E assim ele começou a pensar, que um dia qualquer, ele ia seguir os gatos da rua e viver aquela vida emocionante, cheia de aventuras da qual os gatos da rua falavam. Um dia, em que a vovó Maria estava distraída com os seus afazeres, Rodrigo seguiu uma dupla de gato de rua que estavam sobre o telhado da casa contando estórias sobre a maravilhosa vida lá fora dos limites da casa onde ele morava. Pularam do telhado para o quintal e desapareceram no meio do mato.
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O trio de gatos ia todo feliz pelo caminho em direção a cidade, que nem notaram que um grande cão estava escondido de tocaia na beira do caminho - esperando para atacá-los quando passassem. Inesperadamente, o cão se lançou sobre eles, que rapidamente se esquivaram do bote do cachorro e saíram correndo. Os gatos de rua trataram de fugir, pouco se importando com a sorte do gato Rodrigo, que se viu em grande apuro. Para escapar do cão feroz, ele teve que subir em uma árvore próxima e ali ficou por longas horas até que escureceu e o cão desistiu.
Ao perceber que o seu perseguidor havia desistido o gato Rodrigo desceu da árvore e continuou caminhando na esperança de encontrar os gatos que ele pensava serem seus novos amigos. Caminhou, caminhou, caminhou e nada de encontrar os gatos, que simplesmente haviam desaparecido. Depois de muito caminhar, Rodrigo percebeu que os falsos amigos o haviam abandonado à própria sorte. A esta altura a noite já havia chegado e a fome começava a incomodar, mas Rodrigo não desistiu, afinal os gatos tinham contado maravilhas da vida na rua e ele queria experimentar essas aventuras. Rodrigo continuou caminhando até que encontrou vários outros gatos disputando a carcaça de um rato, para matar a fome. Ele se sentiu enojado com aquilo, afinal ele sempre tinha uma tigela de ração à sua disposição, comer aquela porcaria lhe causava náuseas. Quando os gatos acabaram de comer ele perguntou onde é que ele poderia encontrar outra coisa para comer. Os gatos percebendo sua ingenuidade começaram a rir dele. 18
- “Outra coisa?” Perguntaram entre risadas. - “Aqui, cada um come aquilo que caçar ou encontrar. Ninguém dá nada aos gatos da rua não!” Falou um grande gato preto que parecia ser o líder do bando. Rodrigo ainda tentou saber como faria para comer alguma coisa e o gato preto lhe disse: - “Ora, se quer comer que cace. Ou pode revirar uma lata de lixo para procurar um resto de comida. Mas tome cuidado com os cães que também disputam os restos no lixo e atacam os gatos! Afinal todos nós lutamos para sobreviver!”
Rodrigo estava muito decepcionado. Sua primeira noite na rua não estava sendo nada agradável e as aventuras imaginadas, até agora, tinham sido bem ruins. Os gatos depois de terminada a refeição foram saindo e deixaram o gato Rodrigo sozinho, sem saber o que f a z e r .
Sem alternativa, o gato Rodrigo foi procurar alguma coisa para comer, porque a fome já era grande. Andou, andou e andou, mas nada encontrou. Os lixos que revirou já tinham sido comidos e alguma coisa que encontrou lhe embrulhou o estômago. Rodrigo começava a se arrepender de ter saído de casa em busca de aventuras; de ter se deixado iludir pelas estórias que aqueles gatos vadios contavam.
Mas, agora, atĂŠ para voltar para casa estava difĂcil. Ele tinha andado muito, estava cansado, com muita fome e jĂĄ nem tinha certeza de qual caminho pegar para retornar para casa.
Na casa da vovó Maria era só preocupação. Assim que a velhinha deu falta do gato ela começou a procurar, primeiro pelo quintal, depois na vizinhança, mas ninguém tinha visto o gato Rodrigo. Ele tinha desaparecido sem deixar pistas. Vovó Maria graças a sua experiência de vida sabia muito bem que grandes perigos se escondiam nas ruas, principalmente à noite. Seu gatinho querido havia sido criado com todo carinho e não estava preparado para sobreviver às dificuldades de uma vida na rua. Além dos perigos da rua, existiam também alguns humanos que caçavam animais para comer e um gato gordinho como Rodrigo poderia se transformar em um “pitéu”, como “eles” diziam. Vovó Maria passou a noite em claro, sem conseguir dormir de tão preocupada com o que poderia ter acontecido e chorando a má sorte de seu gatinho querido. 22
O gato Rodrigo estava tendo uma experiência terrível. Não tinha encontrado nada para comer, começou a sentir frio, e ainda teve que escapar algumas vezes de ser apanhado por cachorros, que também disputavam a primazia de serem os donos da rua. Exausto, com fome, cansado e com frio, o gato Rodrigo sentiu mais saudade ainda da sua cama quentinha no quarto da vovó. Mas agora, ele precisava encontrar um lugar seguro para descansar, esperar o dia clarear e encontrar o caminho de volta para sua caminha ao lado do fogão à lenha. O gato teve de andar bastante até que encontrou um cantinho embaixo de uma caixa que lhe pareceu seguro para passar a noite. Como um problema nunca vêm só, a noite foi muito fria e caiu uma chuvinha fina, que acabou molhando a caixa de papelão em que o gato Rodrigo se abrigara. Foi uma noite muito difícil.
Pela manhã vovó Maria, voltou a procurar o gato no quintal na esperança de que ele tivesse voltado, mas nada encontrou, o que a deixou muito triste. Naquele início de dia, a saudade do gato impediu que a vovó tomasse seu café da manhã. Ela se sentia fraca, sem ânimo, sem vontade de fazer nada. O que ela queria era seu gatinho Rodrigo de volta para alegrar seus dias. Seus vizinhos começavam a se preocupar com a vovó Maria que sempre tinha um alegre sorriso para acompanhar o bom dia que ofertava a todos que passavam pela sua porta. Naquele dia não se viu a vovó pelo quintal e quem a viu notou que ela estava muito triste e preocupada com o sumiço do gatinho. O dia passou e vovó Maria não encontrou seu querido amiguinho. Isso a entristeceu mais ainda. Foi então, que uma vizinha resolveu chamar um dos filhos de vovó Maria, que morava próximo, para que ele cuidasse da mãe que estava ficando doente com a falta do bichano. 24
Logo toda família se reuniu para decidir o que fazer. Apenas o filho Rodrigo não pode estar presente, mas participou da reunião por telefone. Ficou então decidido que os filhos fariam um rodízio de forma que sempre tivesse alguém cuidando da vovó Maria. O primeiro dia caberia a esposa do filho João, nora de vovó Maria, que era quem morava mais perto. À noite, o filho João passaria na casa da mãe. E assim a família ia se revezando de forma que todos pudessem cuidar da vovó Maria.
Rodrigo por sua vez já estava longe de casa e desesperado de fome, há alguns dias, procurando se lembrar do caminho de volta para casa, mais quanto mais fome ele tinha, mais diminuía a sua capacidade de lembrar o caminho de volta. Mas, como Deus é muito bom, um dos vizinhos da vó Maria viu um gato branco, magro, todo sujo, acuado por uns cachorros e resolveu socorrer o pobre gatinho, que deu graças a Deus por ter recebido ajuda, pois já não aguentava mais fugir. Foi então que o vizinho pareceu reconhecer naquele gato sujo, esquelético o antigamente garboso Rodrigo, fez um chamego no gato, que logo se apressou em agradecer ronronando e se enrolado nas pernas do vizinho, que sabendo da fama de dengoso de Rodrigo o reconheceu e tratou de pegá-lo no colo e leva-lo de volta para a casa da vovó Maria.
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Chegando em casa, inicialmente, foi só alegria pelo retorno do “filho pródigo”. Mas vovó Maria logo se entristeceu com o estado lamentável em que seu gatinho se encontrava - magro, era só pele e osso, o pelo imundo, o rabo antes felpudo e vistoso, tinha até falta de pelos. Apesar disso, ela se alegrou com a volta do gatinho ao lar e tratou de colocar ração e água fresquinhas para o bichano, que comeu e bebeu vorazmente. Após encher a barriga, Rodrigo procurou pela sua cama quentinha ao lado do fogão à lenha e dormiu quase que o dia inteiro.
Quando acordou parcialmente restabelecido, vovó Maria o levou para tomar um banho morninho e retirar toda aquela sujeira com que ele tinha chegado em casa,. Depois do banho, secou o animalzinho com todo carinho usando uma toalha bem grossa e quentinha para então escovar seu pelo que voltava a ser branquinho. O gato Rodrigo agradecido pelo carinho que vovó Maria lhe dispensava, pulou em seu colo macio e ali ronronando adormeceu tentando esquecer as agruras que tinha passado. A paz e a alegria voltaram a reinar na casa da senhora. No domingo, todos os filhos se reuniram em um almoço para comemorar a volta do gato Rodrigo e da alegria da vovó Maria. E o gato Rodrigo aprendeu importantes lições de vida: Que devemos evitar as más companhias e nunca nos deixar levar pelas estórias que os outros contam, muitas vezes fantasiosas ou mentirosas. Aprendeu também que nenhum lugar do mundo pode ser melhor do que aquele em que somos verdadeiramente amados e cuidados. 28
E que nenhuma aventura por mais divertida que seja ĂŠ livre de perigos e que nĂŁo vale Ă pena trocar o lar quentinho e acolhedor pela rua fria e perigosa, por mais divertido que isso possa ser. Ah, e foram felizes para sempre.
Fim
fotografia: Ana Prado
a ilustradora LUX é carioca, designer, ilustradora, poeta, contadora de histórias e pedagoga. Desenha desde pequena e ama ler. Gosta de química, ciência e tecnologia, jogos e brincadeiras. Cuida de uma gata Mion, que é neta de outra, Mione, que é filha de outra, a Meg - essa também aventureira como o gato Rodrigo.
o autor
CARLOS DOLEZEL é carioca, pai, avô e bisavô. Advogado e psicólogo. Gosta de ler e escrever. Escreve poesias e contos. Publicou Reflexões, livro de poemas e contos, em 1998. Com a chegada da bisneta Alice, surgiram também muitas histórias. Publicou Lilica: a coelhinha azul, em 2015. E agora, esse gato Rodrigo.
Este livro foi impresso em papel couche 110g com fonte American Typewriter e Honey Script Light, na Grรกfica WalPrint para Estudio PV. Tiiragem: 500 exemplares.
Rodrigo é um gatinho esperto e curioso. Sua cama é quentinha, e comida nunca falta. E tem muito carinho e atenção. Mas os telhados e ruas atraem e chamam para a aventura. E para lá irá Rodrigo com seu rabo felpudo. O que acontecerá? Que aventuras aguardam Rodrigo? Ah, para saber só lendo essa história! Abra o livro, aventure-se!