Incide ou não imposto de renda

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Orientação Jurídica

(A lei n º 4.886/65 alterada pela lei 8.420/92 determina o pagamento de uma indenização ao Representante Comercial na rescisão de seu contrato, seja escrito ou não. Art. 27. Do contrato de representação comercial, além dos elementos comuns e outros a juízo dos interessados, constarão obrigatoriamente: (...) omissis j) indenização devida ao representante pela rescisão do contrato fora dos casos previstos no art. 35, cujo montante não poderá ser inferior a 1/12 (um doze avos) do total da retribuição auferida durante o tempo em que exerceu a representação. Preliminarmente, cumpre analisar a natureza jurídica da referida indenização, para ulterior análise da incidência do IR. O Professor de direito comercial, Fábio Ulhoa Coelho, no seminário especial IOB – 27 de março de 2001, editado pela revista Esmape Recife – V.6 nº13, pg141-152, ensina: “Entre os direitos do representante, vale a pena destacar, para os fins da presente reflexão, o de ser indenizado ao término do contrato de representação pela perda da oportunidade de explorar o mercado que ajudou a criar ou consolidar” (g.n) De acordo com Rubens Requião, “A indenização, com efeito, tem caráter de compensação pelas perdas e danos decorrentes de ato ilícito, consistente na ruptura sem causa do contrato, ato que o representado deve reparar pela indenização. É, pois, a indenização, um ressarcimento pelos prejuízos causados à atividade profissional do representante comercial”. Ainda para o mesmo autor, “O legislador adotou a técnica de tarifar a indenização por rompimento injusto do contrato em razão de política legislativa. Preferiu-se a indenização estabelecida por percentual prefixado, em valor provavelmente menor que o que decorreria das perdas e danos efetivas, para que se evitassem as dificuldades e as delongas para compor estas mesmas perdas e danos nos termos do Direito comum” Nessa esteira parece-nos claro que a indenização prevista ao Representante Comercial tem natureza de perda e danos. A lei geral tributária dispõe sobre o Imposto de Renda, da seguinte forma: Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica: I – omissis II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior Diante do dispositivo tributário, a incidência recai ao acréscimo patrimonial do contribuinte. Na indenização não existe o referido acréscimo, tal fato se deve pela própria natureza de perdas e danos, supracitada, ou seja, o Representante Comercial sofre uma perda resultante da captação da clientela, o fomento e expansão do mercado de determinada empresa; a perda de continuar explorando

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tal mercado que consolidou e, por conseguinte, a perda de futuros rendimentos. De fato, o que houve foi um decréscimo patrimonial reflexo da perda do direito de explorar o mercado consolidado pela prestação de seu serviço, que deve ser ressarcido, logo entendemos que não houve o fato gerador do imposto. Requião explora o tema e esclarece: “Nota-se, além disso, que o representante comercial não age em seu nome, mas em nome e por conta do representado. A clientela dos produtos que representa, e que em função da sua atividade se forma ou se expande, não acresce ao seu patrimônio, mas reverte em proveito do representado”. De acordo com De Plácido e Silva, “No sentido jurídico, seja civil ou comercial, ou mesmo no sentido do Direito Público, patrimônio entende-se o conjunto de bens, de direitos e obrigações, apreciáveis economicamente, isto é, em dinheiro, pertencentes a uma pessoa, natural ou jurídica, e constituindo uma universalidade”. O art. 681, § 5º do Decreto 3.000/99 traduz o juízo dispensado: Art. 681. Estão sujeitas ao imposto na fonte, à alíquota de quinze por cento, as multas ou quaisquer outras vantagens pagas ou creditadas por pessoa jurídica, ainda que a título de indenização, a beneficiária pessoa física ou jurídica, inclusive isenta, em virtude de rescisão de contrato. § 5º O disposto neste artigo não se aplica às indenizações pagas ou creditadas em conformidade com a legislação trabalhista e àquelas destinadas a reparar danos patrimoniais. Em conseqüência do entendimento pacífico da natureza da indenização prevista ao representante comercial, concomitantemente com a determinação de interpretação literal das regras tributárias, a retenção de 15% de I.R nos apresenta como abuso de direito. Outro ponto que não se olvida, se refere a nítida equivalência existente entre representantes autônomos com empregados na execução da prestação de seus serviços, estando tão somente ausente o aspecto da subordinação. Sendo assim, dispõe o regulamento: Art. 39. Não entrarão no cômputo do rendimento bruto: XX - a indenização e o aviso prévio pagos por despedida ou rescisão de contrato de trabalho, até o limite garantido pela lei trabalhista ou por dissídio coletivo e convenções trabalhistas homologados pela Justiça do Trabalho, bem como o montante recebido pelos empregados e diretores e seus dependentes ou sucessores, referente aos depósitos, juros e correção monetária creditados em contas vinculadas, nos termos da legislação do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS (Lei nº 7.713, de 1988, art. 6º, inciso V, e Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990, art. 28); O dispositivo indenizatório determinado na lei do Representante Comercial tem caráter imperativo, por se tratar de lei social, que visa garantias mínimas ao representante em exercício da ativida-


Incide ou não Imposto de Renda sobre

a indenização prevista no art. 27, j, da lei 4.866/65 alterada pela lei 8.420/92? de. Com o escopo de produzir avigoramento na presente sustentação, ad argumentadum, deve-se registrar o que preconiza o art. 44 da lei em comento. “Art. 44. No caso de falência do representado as importâncias por ele devidas ao representante comercial, relacionadas com a representação, inclusive comissões vencidas e vincendas, indenização e aviso prévio, serão considerados créditos da mesma natureza dos créditos trabalhistas.” Se analisarmos teleologicamente tal dispositivo, vislumbra-se a concepção que o legislador teve a preocupação de invocar o caráter social da lei, utilizando analogicamente a natureza das verbas devidas ao trabalhador empregado. Em tempo, basta um passar d’olhos na lei do representante comercial para identificarmos as semelhanças com a lei trabalhista (CLT), ilustrativamente, a concessão de aviso prévio (art. 34), a obrigação de emissão de relatórios quando solicitado pela representada (art. 28), caracterizando, até mesmo certo poder de fiscalização da produtividade do representante, entre outros. Outro fato que merece as devidas considerações são as situações ocorridas para o dever de indenizar, quais sejam, nas rescisões unilaterais pela representada e nos casos de denuncia do contrato pelo representante por justa causa da representada (art. 36) idênticas às estabelecidas pela CLT. A indenização (multa fundiária) é devida ao empregado, nos termos do art. 18, § 1º da lei 8.036/90, verbis: “Art. 18. Ocorrendo rescisão do contrato de trabalho, por parte do empregador, ficará este obrigado a depositar na conta vinculada do trabalhador no FGTS os valores relativos aos depósitos referentes ao mês da rescisão e ao imediatamente anterior, que ainda não houver sido recolhido, sem prejuízo das cominações legais. § 1º Na hipótese de despedida pelo empregador sem justa causa, depositará este, na conta vinculada do trabalhador no FGTS, importância igual a quarenta por cento do montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros”. Desta forma, verifica-se a extrema semelhança das indenizações em comento e, é perfeitamente aceitável a analogia para fins de incidência de I.R, sendo até mesmo equivalentes os valores previstos nas indenizações. Portanto, entendemos também ser flagrante a violação ao princípio da igualdade ou isonomia tributária, estampado no art. 150, II, da carta da república de 1988. Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...)

II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos; O princípio da igualdade tributária proíbe distinções arbitrárias, entre contribuintes que se encontrem em situações semelhantes. Diante das situações explanadas e o entendimento da não incidência do imposto de renda no pagamento da indenização devida ao representante comercial, nos assistimos, outrossim, das lições de ROQUE ANTONIO CARRAZZA, eminente e respeitado tributarista, que tem sustentado, com razão, que: “Realmente, as indenizações não são rendimentos. Elas apenas recompõem o patrimônio das pessoas. Nelas não há geração de rendas ou acréscimos patrimoniais (proventos) de qualquer espécie. Não há riquezas novas disponíveis, mas reparações, em pecúnia, por perdas de direitos.” “Nas indenizações, como é pacífico, há compensação, em pecúnia, por dano sofrido. Noutros termos, o direito ferido é transformado numa quantia de dinheiro. O patrimônio da pessoa lesada não aumenta de valor, mas simplesmente é reposto no estado em que se encontrava antes do advento do gravame.” “Portanto, nas indenizações há simples reparações, em pecúnia, por perdas de direitos. Quem indeniza desfaz o dano que causou a terceiro. Recompõe a situação primitiva, anulando os efeitos da lesão jurídica que praticou.” Partindo-se do pressuposto de que todas as indenizações requerem como elemento integrante da responsabilização civil (objetiva ou subjetiva) um dano, sem dano não há o dever de indenizar. Ou seja: não há de se falar em indenização – material ou moral – sem dano (REsp 279.422/CE). Ocorrendo indenização, haverá o dano. Havendo dano há o prejuízo correspondente que deverá ser recomposto pelo agente causador. Havendo prejuízo recomposto financeiramente, não há de se falar em saldo positivo configurador do acréscimo patrimonial para fins de incidência de imposto de renda. Em se admitindo o contrário, estar-se-ia diante da possibilidade de acréscimo patrimonial do representante sem a realização de um prejuízo, o que ensejaria o enriquecimento sem causa, e a indenização teria outra finalidade, ou seja, outra natureza. Para se ter indenização, de qualquer natureza, é imperativa a causa da recomposição patrimonial, sob pena de ilegalidade da própria verba indenizatória. Renato Salomão Romano Assessor Jurídico - SIRCESP

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