luiz carvalho 2010_contratos de autonomia, o presente e a agenda na educação

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Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas Universidade Técnica de Lisboa

Teoria e Processos de Políticas Públicas Prof(a). Engrácia Cardim

Contratos de Autonomia O presente e a agenda na Educação Autor – Luís Miguel Martins Crespo de Carvalho Lisboa, 12 de Fevereiro de 2010

Mestrado MPA – Administração Pública, especialização em Administração da Educação Edição de 2009 - 2011


Contratos de Autonomia – o presente e a agenda na Educação

Prolegómeno

O presente estudo pretende abordar o estado da arte relativo aos contratos de autonomia numa perspectiva de conhecimento e transparência públicas do universo de que estamos a falar, estabelecimentos de ensino básico e secundário públicos, considerando que as unidades de gestão hoje estão caracterizadas como agrupamentos de escolas ou escolas secundárias. Outra perspectiva de abordagem centra-se na agenda sobre autonomia das escolas na Educação que culmina com a publicação da Portaria nº 1260/2007, de 26 de Setembro, onde se estatuí a matriz do contrato de autonomia e se dá início ao processo de assinatura de vários contratos de autonomia a homologar em sede do Ministro da Educação. A metodologia de trabalho focou-se na análise temporal das leis que foram sendo produzidas exclusivamente sobre o tema, deixando um pouco de lado toda uma panóplia de legislação que concorre para o esclarecimento e a implementação no terreno do conceito de autonomia aplicado à escola, nomeadamente aquela que respeita à gestão e administração da escola pública mas a que se faz referência, a espaços. Não se deixa de fazer comentário quando se entende oportuno, pois o autor é parte interessada nesta observação porquanto é professor do quadro de um, agora, agrupamento de escolas. Deve ater-se que os comentários proferidos devem levar em conta que os mesmos o são como reflexo de uma pessoa que está no terreno, onde a implementação e implantação de medidas ocorre, bastas vezes, às catadupas e em condições que não as mais adequadas, nomeadamente as dos últimos anos.

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Desenvolvimento

A Lei 5/73, de 25 de Julho, conhecida como a reforma de Veiga Simão é o prenúncio de uma abertura do ensino visando a sua democratização, como estratégia de desenvolvimento económico e cultural, um aporte que o Estado toma em suas mãos e que implica uma evidente necessidade de democratização da sociedade, efeito não amplamente desejado pelo sistema político vigente. Acontece o 25 de Abril de 1974 e as coisas começam a mudar. “O «Estado dual» (Santos, 1984:17) que se segue à «revolução dos cravos» também se sente na escola, ainda dependente da administração central, mas agora tolhida na sua acção, ao mesmo tempo que, pela legitimidade revolucionária, se ensaia o poder popular ou, pelo menos, se expande a sociedade civil, numa participação política e social sem precedentes, paradoxalmente aliada a transformações políticas predominantemente operadas dos diversos centros de decisão (e de combate político) para as periferias.” 1 Estamos perante uma auto-organização da gestão escolar, a modos de «ensaio autogestionário» (Lima, 1992:232) o que leva a administração a agir por arrastamento, embora aceite a colegialidade das comissões de gestão determina a escolha de um dos docentes para presidente de modo a exercer as funções de representação e controlo das decisões colectivas, por via do DecretoLei 221/74, de 27 de Maio. O conceito de autonomia, nomeadamente a gestionária, é neste período levado ao extremo. O clima nas escolas é de agitação e quase se encontram paralisadas na sua acção instrutiva. Uma nova iniciativa legislativa de normalização da vida nas escolas toma forma no Decreto-Lei 735-A/74, de 21 de Dezembro mas é de imediato contestada pelos sectores mais interventores e radicais das assembleias nas escolas e, até, pelos partidos políticos da esquerda radical. Tenta-se re-deslocar o controlo das decisões e deliberações que está na escola para a tutela do Ministério da Educação. Esta é uma tentativa de normalização democrática da vida das escolas que parece votada ao insucesso, apesar da nova morfologia organizativa e de no seu art. 32º impor aos conselhos directivos a obrigatoriedade de informar os serviços centrais do ministério sobre o conteúdo dos pareceres e propostas das assembleias consultivas que não sejam executados e das razões da sua não execução.

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segundo João Formosinho e Joaquim Machado Mestrado MPA – Administração Pública, especialização em Administração da Educação Edição de 2009 - 2011

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No entanto é de referir que a partir da sua publicação aumenta significativamente o número de escolas preparatórias e secundárias com Conselhos Directivos eleitos segundo os processos da democracia representativa. Agora que é promulgada a Constituição da República Portuguesa (1976)

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a normalização da

educação é tida como uma prioridade pelo I Governo Constitucional, através do Decreto-Lei 769A/76, de 23 de Outubro e aí se mantêm como órgãos de topo da escola o Conselho Directivo, o Conselho Pedagógico e o Conselho Administrativo, definindo-se claramente as regras de constituição e processos eleitorais, sem esquecer as respectivas competências. A regulação do funcionamento dos dois primeiros órgãos é alvo de publicação de duas portarias, a 677/77, de 4 de Novembro para o Conselho directivo e a 679/77, de 8 de Novembro para o Conselho Pedagógico. A este período regulador fica indelevelmente ligado o nome de Sottomayor Cardia. Este também é tido como um atentado à considerada gestão democrática, sempre mobilizando os professores em torno desta causa, instituída pelo diploma de 74,

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com a agravante de o

presidente do Conselho Pedagógico ser, por inerência, o presidente do Conselho Directivo, de ora em diante e de ser limitado o peso relativo da representação dos alunos na vida da escola. 4 Há uma nova dinâmica de gestão burocrática centralizada da educação e isto não é bom sinal. Novas competências chegam às escolas por causa da profissionalização em serviço pelo que é reformulado o normativo respeitante ao Conselho Pedagógico, com implicações nas atribuições e competências do delegado e subdelegado de grupo, subgrupo ou disciplina, por via do Decreto-Lei 579-TI/79, de 29 de Dezembro, do Decreto-Lei 376/80, de 12 de Setembro e do Despacho 333/80, de 22 de Setembro. A abertura da escola às associações de pais, que já haviam visto consagrado o reconhecimento do direito à cooperação com o Estado na educação dos filhos na Lei 7/77, de 1 de Fevereiro, ainda que de forma algo insípida mas já reveladora da potencialidade dessa cooperação com a comunidade escolar. A autonomia ganha novos contornos, para além dos aspectos relativos à gestão administrativa e financeira de uma escola, pois o seu governo educativo tem parceiros com que deve contar para a definição clara de um Projecto Educativo e o estabelecimento de objectivos educativos na comunidade em que se insere. Percorreu-se um longo caminho até que a Lei de Bases do Sistema Educativo 5 foi publicada a 14 de Outubro de 1986, corporizada na Lei 46/86.

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adiante designada de constituição o já citado Decreto-Lei 735-A/74 4 da experiência tida nunca esta solução foi a melhor em termos de funcionamento e equidistância dos órgãos, nomeadamente em termos de agenda educativa, na escola 5 adiante designada de lei de bases 3

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Esta reflecte a necessidade premente de termos um sistema educativo enquadrado pela novel constituição, assim como para «clarificar a actual estrutura do sistema escolar e evitar a tomada de medidas avulsas,.., bem como proporcionar um quadro estável e que viabilizasse uma reforma global e articulada do sistema educativo». 6 O Ministério da Educação vai reformulando a sua orgânica e desconcentrando serviços, energizando debates em torno de questões como centralização e descentralização, democraticidade da direcção dos estabelecimentos de ensino e da profissionalidade da sua gestão. A lei de bases nos artigos 43º (Princípios gerais) e 45º (Administração e gestão dos estabelecimentos de educação e ensino) avançam-se os primeiros elementos que ajudarão a definir em concreto o conceito de autonomia da escola (aplicado à escola), sendo de realçar:  Respeito pelas regras de democraticidade e de participação;  Prossecução de objectivos pedagógicos e educativos;  Interligação com a comunidade;  Formas de descentralização e desconcentração de serviços com garantia da necessária eficácia e unidade de acção;  Favorecimento da fixação local dos professores;  Administração e gestão orientam-se pela democraticidade e participação dos implicados no processo educativo;  Prevalência dos critérios de natureza pedagógica e científica sobre critérios de natureza administrativa;  Órgãos de direcção para os quais são democraticamente eleitos os representantes dos professores, alunos e pessoal não docente;  Órgãos consultivos de apoio e serviços especializados. Como o próprio nome da lei indica estamos perante um quadro de orientações para o sistema educativo que precisa de ser regulado e regulamentado para a prossecução dos seus princípios gerais e organizativos. É de realçar a preocupação com o primado da pedagogia sobre a burocracia, pois este é [e vai tornar-se ainda mais] um dos calcanhares de Aquiles do sistema educativo. A Comissão de Reforma do Sistema Educativo elabora um Projecto Global de Actividades tendo em vista o que pretendia ser «uma reforma global e coerente das estruturas, métodos e conteúdos do sistema». 7 O debate de ideias da reforma sobre administração das escolas extrapola dois vectores que distingue, um de direcção, que se pretende democrática, e o outro de gestão, que se pretende profissional.

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Bártolo Paiva Campos citado por João Formosinho Resolução do Conselho de Ministros 8/86, de 22 de Janeiro Mestrado MPA – Administração Pública, especialização em Administração da Educação Edição de 2009 - 2011

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Esta situação aporta ao mercado novos perfis de formação e oferta educativa na área da Administração Escolar, com várias tipologias

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chegando também à formação contínua dos

professores. O Despacho 301/ME/92, de 11 de Novembro já dava conta desta preocupação formativa quando o programa PRODEP-FORGEST estabelecia que se pretendia «desenvolver uma formação profissional que permita aos docentes a aquisição de conhecimentos e competências teóricas e práticas para: o desempenho de cargos de direcção, administração e gestão das escolas e dos centros de formação contínua dos professores; a participação e animação da vida organizativa da escola». Em questões de autonomia isto parece dar mais margem de manobra aos professores para se integrarem amplamente nos problemas de administração e gestão da escola pública, a par de uma cada vez maior multiplicidade de papéis que começam a ser desempenhados por estes em meio educativo. A consagração da autonomia é feita a partir do Decreto-Lei 43/89, de 3 de Fevereiro o qual estabelece o regime jurídico da autonomia dos estabelecimentos de ensino público, escolas com 2º e 3º ciclos do ensino básico e escolas secundárias, cada uma com as suas especificidades, e em conformidade com a lei de bases. Não será por acaso que o 1º ciclo e o ensino pré-escolar ficam de fora deste regime jurídico. Os avanços nas práticas de autonomia e seu aprofundamento estão dependentes das lideranças das escolas e verificou-se a possibilidade de as escolas ensaiarem «formas de gestão flexível do currículo; definir algumas políticas de alocação de alunos e professores e gestão dos tempos lectivos e de ocupação de espaços; organizar e oferecer actividades de complemento curricular, de animação socioeducativa, de ocupação dos tempos livres ou de desporto escolar; gerir o crédito horário disponível para o exercício de cargos de gestão intermédia e de desenvolvimento de projectos pedagógicos; proceder ao recrutamento de pessoal auxiliar de acção educativa em regime de tarefa ou de contrato a tempo certo; conseguir auto-financiamento e gerir as receitas geradas pela prestação de serviços na escola; adquirir bens e serviços e proceder à execução de certo tipo de obras; estabelecer parcerias entre escolas, nomeadamente para a criação de centros de recursos educativos e centros de formação». 9 A autonomia da escola é corporizada num Projecto Educativo, instrumento de desenvolvimento que deve ser construído com as parcerias de todos os intervenientes no processo educativo. Pode-se considerar que os instrumentos de desenvolvimento da autonomia da escola são o citado Projecto Educativo, que formaliza um plano de desenvolvimento pedagógico, o Plano Anual de Actividades e, principalmente, o Regulamento Interno que deve normativizar as relações entre os diversos intervenientes no processo educativo. 8 9

disciplinas específicas, cursos superiores especializados, cursos pós-licenciatura e mestrados segundo João Formosinho Mestrado MPA – Administração Pública, especialização em Administração da Educação Edição de 2009 - 2011

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Este regime jurídico estabelece que a autonomia se desenvolve nos planos cultural, pedagógico e administrativo, fazendo uma esparsa alusão à gestão financeira. O que é pouco, na perspectiva de uma gestão orçamental muito condicionadora, da gestão de recursos humanos que não praticamente não existe e da pouco flexível gestão da oferta educativa, apesar e por causa da rede escolar. Entretanto é publicada a revisão curricular na forma de Decreto-Lei 286/89, de 29 de Agosto e novas movimentações se produzem nas escolas, no âmbito da nova autonomia, com propostas concretas sobre os currículos e novas disciplinas a introduzir como oferta de escola. A publicação do Decreto-Lei 172/91, de 10 de Maio, vem alargar o ordenamento do novo modelo de administração, direcção e gestão das escolas a todas as escolas dos vários níveis de ensino, com uma concepção mais multifacetada da escola que tende a assegurar, à luz da lei de bases, uma intervenção voltada para a comunidade local contextualizada na definição de políticas educativas próprias, assentes nos princípios da democraticidade, da participação, da integração comunitária e da autonomia da escola. Em regime experimental ainda vê saírem diplomas regulamentadores que permitiram às escola uma certa autonomia na gestão do crédito global de horas de redução da componente lectiva a distribuir pelos órgãos e estruturas pedagógicas de gestão intermédia ou na possibilidade de alterarem a composição do Conselho Pedagógico, optando pela organização dos departamentos curriculares. Aparecem diversos programas de intervenção e de sistemas de incentivos à qualidade da educação como o Projecto de Escolas Isoladas, o Programa Educação para todos, vulgo PEPT, o Programa de Educação Intercultural, os Territórios Educativos de Intervenção Prioritária, os Centros de recursos e os Centros de Formação de Associação de Escolas. Temos portanto um amplo leque de opções que vão permitir às escolas adoptarem políticas educativas mais integradoras da comunidade local, à medida que se verifica um alargamento da presença dos pais e encarregados de educação em outros órgãos e níveis de ensino. Nesta conjuntura de alterações múltiplas, o Ministério da Educação procura ajustar o seu modelo organizacional às exigências da lei de bases até porque em sede da Comissão de Reforma do Sistema Educativo se centra o debate em torno de questões como a desburocratização da Administração Pública, a aproximação dos serviços às populações e a participação de todos os interessados na gestão. Começou pela desconcentração criando as delegações distritais da Direcção-Geral de Pessoal e, mais tarde, pela criação das Direcções Regionais de Educação, tendo por base um princípio de delegação de competências e descongestionamento dos serviços centrais. «As Direcções Regionais de Educação são serviços desconcentrados que prosseguem, a nível regional, as atribuições do Ministério da Educação em matéria de orientação, coordenação e apoio

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aos estabelecimentos de ensino não superior, de gestão dos respectivos recursos humanos, financeiros e materiais e, ainda, de apoio social escolar e apoio à infância». 10 E a descentralização onde pára? Não existem organizações e órgãos locais que não dependam hierarquicamente da administração central e só veremos aparecer os Conselhos Municipais de Educação em 2003 com a publicação do Decreto-Lei 7/2003, de 15 de Janeiro e a elaboração das respectivas Cartas Educativas 11. A Fundação Manuel Leão através do Programa Aves, em 2000, inicia uma colaboração com as escolas, em parceria com a Fundação Calouste Gulbenkian, no sentido de desenvolver um modelo de avaliação externa das organizações e criar condições de reflexão interna sobre os respectivos resultados. São poucos os exemplos que orientem as escolas no sentido de uma autonomia mais efectiva nas decisões e deliberações que toma e ela é muito relativa. Não há efectivamente descentralização. O Conselho de Acompanhamento e Avaliação

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do novo regime de administração escolar

produz em 1996 um documento crítico e o Ministério da Educação, em coerência com o Programa de Governo e com o Pacto Educativo para o Futuro, pretende a execução de um programa de reforço da autonomia das escolas, não sem antes solicitar um estudo prévio a João Barroso

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com base no

Despacho 130/ME/96. Preparava-se o terreno para uma nova lei de gestão e administração das escolas públicas. O Conselho Nacional de Educação, como habitualmente, foi solicitado a emitir parecer sobre o assunto e ele é publicado em forma de Parecer 5/97, onde se realça a necessidade de haver uma distinção clara entre órgãos de direcção e de gestão das escolas, embora ambos devam compor a administração das mesmas. Ao órgão de direcção deverá caber, predominantemente, a formulação de políticas e estratégias ou a sua opção, ao passo que ao órgão de gestão competirá, sobretudo, a implementação dessas políticas e estratégias. A composição do órgão de direcção deve, nos quadros dos princípios de democraticidade e legalidade, ser equilibrada, representativa e legitimada em termos de participação da comunidade educativa e dos representantes da comunidade local. Quanto ao órgão executivo deve ser essencialmente funcional, executivo e orientado por critérios de eficácia e eficiência, com limites de acção claramente definidos, por um lado para que 10

Decreto-Lei 133/93, de 26 de Abril é de notar que para o Concelho de Cascais a respectiva carta educativa tem por base um trabalho realizado em sede do Instituto Superior de Serviço Social, no Centro de Estudos e Investigação Aplicada, datado de Outubro de 2002, portanto anterior à legislação que a regula…não há sinal de actualização do documento no sítio da Câmara Municipal de Cascais 12 Avaliação do Novo Regime de Administração Escolar (Decreto-Lei nº 172/91 13 Autonomia e Gestão das Escolas, publicado com a chancela do Ministério da Educação 11

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não conduzam à confusão entre tarefas de direcção e de gestão e, mais grave ainda, para que não conduzam ao conflito entre órgãos e legitimidades. Apesar de o Governo afirmar o primado dos critérios pedagógicos e científicos, corre-se o risco, afirma-se com preocupação, de o referido primado ser subalternizado por critérios financeiros estreitos e cita-se, de um seu parecer posterior

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, «as escolas portuguesas precisam de ser mais

livres e de poder respirar maior autonomia, num quadro de crescente responsabilização dos seus vários intervenientes». É neste contexto que é publicado o Decreto-Lei 115-A/98, de 4 de Maio, o novo regime de autonomia, administração e gestão da escola pública, que menos de um ano volvido foi objecto de alterações substantivas pela Lei 24/99, de 22 de Abril. A implementação deste novo regime vem pôr a nu algumas questões de partilha e conflitos de poder, choques de perfis de liderança e, mais grave ainda, conflitos entre os órgãos de topo, pois parece que o Conselho Pedagógico passou a ter um papel mais subalterno e consultivo. As escolas são geridas com base em programas apresentados pelas listas candidatas ao Conselho Executivo, ou Direcção, e não com base em políticas e estratégias definidas em sede de Assembleia de Escola e legitimadas em outras estruturas intermédias, como nos departamentos Curriculares. Está já prevista a figura de contrato de autonomia, «acordo pelo qual a administração educativa aprova» o que lhe é proposto «pelos órgãos de administração e gestão de uma escola ou de um agrupamento de escolas»

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, mas não parece que se tenha como suficiente para cortar com a lógica

da eficácia administrativa que este sistema centralizado desconcentrado procura face àquilo que deveria ser uma política educativa descentralizada e de maior autonomia, onde teriam uma palavra a dizer organizações e órgãos locais não dependentes da administração central e do Estado. Joga-se aqui com o conceito de territorialização das políticas educativas. Não se encontra disponível qualquer informação sobre eventuais contratos de autonomia realizados pelas escolas, excepto o caso da Escola da Ponte que é, de per si, muito sui generis no espaço e no tempo. Mas aquilo que parece ser ganho em autonomia é, também pelas práticas das escolas, uma maior dependência dos serviços centrais do Ministério da Educação. Qualquer questão de somenos pode levar a escola através dos seus órgãos, nomeadamente o órgão executivo, a questionar a tutela sobre o andamento a dar a um determinado assunto. As escolas trabalham muita vezes sem rede e sem apoio jurídico dos serviços centrais do Ministério da Educação, havendo múltiplas situações, caricatas diga-se, em que do mesmo serviço as respostas a um mesmo assunto colocado em ocasiões diferentes são também elas diferentes quando não antagónicas. 14 15

Parecer 2/2004 do Conselho Nacional de Educação no ponto 1 do art. 46º do novo regime de administração e gestão da escola pública Mestrado MPA – Administração Pública, especialização em Administração da Educação Edição de 2009 - 2011

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Deste tipo de situações haveria relatos na primeira pessoa que poderiam ilustrar o modus vivendi o modus faciendi do órgão executivo ou do órgão pedagógico e deixa-se aqui o relato de uma ocorrência que poderia ter um desfecho complicado em sede de tribunal administrativo e, porventura, criminal e cível. Está-se no final do ano lectivo, estão agendadas as reuniões de avaliação e há um professor que está sob a alçada de um processo disciplinar, mantendo este algumas relações de conflitualidade com colegas do grupo disciplinar e com alunos. A presidente do Conselho Executivo convoca uma reunião extraordinária do Conselho Pedagógico, via telefone, para a manhã do dia em que se iniciam as reuniões de avaliação (começam pelas 14.30 horas e numa delas estará o professor visado envolvido), tendo a ordem de trabalhos um único ponto – deliberação sobre a atribuição ou não de notas do 3º período na disciplina do professor citado. Convém notar que a deliberação visa tão-somente apoiar a decisão do órgão executivo. Foram discutidas várias opções em torno da questão de atribuição ou não de classificações assim como da possibilidade de não permitir ao professor que desse as respectivas propostas de notas. Foi feita uma pergunta pelo autor – o professor está suspenso das suas funções? A resposta foi – não! O conselho votou pela não atribuição das classificações propostas pelo professor, pelo que os alunos ficariam com as tinham sido atribuídas no 2º período de avaliação. O autor votou contra e produziu a respectiva declaração de voto, no que foi secundado por outro conselheiro, tendo na altura comentado que a questão poderia tomar contornos de acção de impugnação administrativa desta deliberação e, se essa fosse a intenção do professor, seguir pela via cível e até criminal. A presidente do órgão executivo, após a deliberação deste conselho, passou parte da tarde ao telefone com pelo menos um interlocutor da Direcção Regional de Educação de Lisboa para esclarecer a situação da conformidade legal da deliberação tomada e da sua decisão, obtendo como resposta nada de muito substantivo. O professor não foi impedido de atribuir as suas classificações no primeiro conselho de turma e as coisas foram andando pelo passa a palavra nos outros conselhos de turma. E as coisas ficaram por aqui. Mas como teria sido se tivesse havido impedimento? Ninguém sabe! Estas más práticas reiteradas têm tendência a agravar-se com o passar do tempo, para mal da autonomia como para a boa gestão organizacional e o exemplo citado é anterior à entrada em vigor do novo regime de administração e gestão.

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A prestação de contas pelas unidades de gestão escolar à tutela passam pela formalização da avaliação externa conduzida sob a égide da Inspecção-Geral de Educação

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, enquadrada pela Lei

31/2002, de 20 de Dezembro e que dá início a um período experimental que hoje está no final de um ciclo a rodar por todas as unidades de gestão do universo da escola pública. A intenção está em linha com as políticas

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desenvolvidas em sede da administração central,

com uma perspectiva de as organizações serem mais transparentes e prestarem contas públicas da sua actividade. No entanto nota-se, pelas práticas, um certo pendor de controlo burocrático centralizado por parte do Ministério da Educação, via IGE que parece vendo o seu papel diminuído quanto ao acompanhamento das escolas para passar a cumprir uma agenda da tutela, ou seja deixar de estar ao serviço da escola para o estar ao sabor da implementação de políticas do ministro, muitas delas de cariz orçamental e financeiro para a conjuntura económica e não estritamente socioeducativas, como para efeitos de classificação das escolas de que começam a resultar os publicados e publicitados rankings das escolas básicas e secundárias. Atente-se na opinião de um ex-inspector da IGE sobre as avaliações externas das escolas, muito formatadas e da qual se exige um relatório devidamente fundamentado, para o facto de os painéis serem uma farsa de participação dos interessados no processo « estamos a falar de painéis que – tendo em conta a sua duração global, o número de questões e o número de participantes que potencialmente implicam – concedem uma média de 33 (trinta e três!) segundos a cada participante/questão/painel, e estamos a partir do princípio absurdo de que a equipa inspectiva não abre a boca, isto é: 33 (trinta e três!) segundos para, apenas ouvindo, “dialogar” e “recolher informação”» 18. Não é de estranhar que grande parte dos relatórios de avaliação externa, subscritos pelas equipas do IGE, revelem altas qualificações para a dimensão Liderança já que compete (?) ao órgão de gestão a organização do processo de visita à escola, isto sem outras considerações à parte, e que seja nas dimensões Resultados e Prestação do Serviço Educativo que aparecem as piores qualificações. Bastas vezes a imagem é tudo! O pretenso avanço em prol da autonomia efectiva da escola, para além da transferência de competências para os municípios ao nível da gestão dos estabelecimentos do ensino pré-escolar e do 1º ciclo, passa agora pela criação de um órgão local, o Conselho Municipal de Educação e de um instrumento de desenvolvimento do parque escolar com base na Carta Educativa com a publicação do Decreto-Lei 7/2003, de 15 de Janeiro.

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adiante designada de IGE new public management a consultar em anexo o texto integral Mestrado MPA – Administração Pública, especialização em Administração da Educação Edição de 2009 - 2011

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Localmente pouco ou nada se sabe deste conselho e está-se a considerar a área de influência do Concelho de Cascais, que tem a sua carta educativa homologada pelo Ministério da Educação. Será assim nos outros concelhos? Qual a influência do conselho municipal de educação nas decisões de política educativa da Câmara Municipal de Cascais e na formulação de propostas dos seus representantes nos órgãos de direcção das escolas? Pessoalmente vi muito pouca visibilidade e influência enquanto presidente do órgão de direcção

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do agrupamento onde trabalho e vi mais uma perspectiva do pelouro de educação

enquanto participante num órgão daquela escola específica. Não sem razão o debate em torno destas questões da autonomia aponta para um certo sentido de desresponsabilização do Estado pelo sistema público de ensino, apesar de reiteradas afirmações em contrário dos seus responsáveis. Encontramos vários factores que condicionam a capacidade de mobilização das escolas, das autarquias e de outros parceiros locais em torno duma pretensa e pretendida territorialização das políticas educativas, não deixando de colocar sobre a mesa questões de actualidade sociopolítica que se prendem com interferências externas ao desenvolvimento da profissionalidade docente como sejam o modelo e processo de avaliação do desempenho docente

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, a escola-armazém

de gestão e administração dos estabelecimentos públicos de ensino

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, o modelo

e o Estatuto da Carreira

Docente 23. A saber:  Desinvestimento continuado na escola pública 24;  O crescente predomínio do “modus de reprodução normativa”

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nas escolas por via da

legislação profusamente emanada pelo Ministério da Educação;  A inexistência de um corpus ético e deontológico na profissão docente, a coberto de uma Ordem ou de qualquer outra organização nacional de índole não sindical;  A heterogeneidade da força de trabalho docente, esmagadoramente feminina;  A multiplicidade de papéis atribuídos aos professores, muito para além dos que são inerentes aos processos educativo e de ensino/aprendizagem na área disciplinar própria;  A perda relevante de autonomia e de prestígio social da profissão docente 26;

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no período de 2002 a 2007 Decreto Regulamentar nº 2/2008, de 10 de Janeiro 21 Proposta de abertura das escolas 12 horas diárias, subscrita pela CONFAP (Confederação das Associações de Pais) e, genericamente, aceite pelo Ministério da Educação 22 Decreto-Lei nº 75/2008, de 22 de Janeiro 23 Decreto-Lei nº 15/2007, de 19 de Janeiro 24 atente-se na evolução da percentagem do PIB investido em educação, nos últimos 10 anos (fonte INE) 25 adaptado de Licínio Lima (1992) quanto a perspectivas de análise organizacional em meio escolar, quando propõe o locus de reprodução normativa versus o locus de produção 26 um pouco ao contrário da percepção do público que coloca a profissão docente como uma das que mais confiança lhe merece 20

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 A multiplicidade étnica, social e cultural na escola pública, por via da massificação do ensino e da escolarização obrigatória;  O aumento das ocorrências graves em meio escolar relacionadas com a indisciplina e actos contra a liberdade e integridade física das pessoas 27;  A complexidade de contextos de sala de aula, para o que concorrem ritmos de aprendizagens, dificuldades de aprendizagem, necessidades educativas especiais, a socialização e interacções do grupo-turma e as expectativas dos alunos. Estas são palavras adaptadas de Nóvoa (2001): hoje há um excesso de missões dos professores, pede-se demais às escolas [por isso] as escolas valem o que vale a sociedade; Cada vez que a sociedade tem menos capacidade para fazer certas coisas mais sobem as exigências sobre a escola e isto é um paradoxo absolutamente intolerável e tem criado para os professores uma situação insustentável do ponto de vista profissional, submetendo-os a uma crítica pública, submetendo-os a uma violência simbólica nos jornais, sociedade, etc. O momento certo para reler Roldão (2002): as experiências dos professores são pródigas em mudanças ao nível do discurso, das terminologias, daquilo que ironicamente alguns acabam por chamar de “modas”. Isto acontece por três factores: 

Um certo défice de aprofundamento de conceitos que caracteriza a prática dos profissionais e instituições de ensino;

A legitimação que novas terminologias parecem emprestar a velhas práticas;

A lamentável tradição de que, novos ou velhos, os conceitos teóricos com que se trabalha nesta profissão cheguem à praxis quotidiana e sejam apropriados predominantemente através da referência que lhes é feita em normativos legais e não mediante a produção de conhecimento sobre eles, no seio da comunidade profissional docente.

Desta questão é exemplar o que respeita à construção dos Projectos Educativos e Curriculares de Escola, como o que se vem fazendo na Área de Projecto, nomeadamente no ensino básico. As áreas de responsabilidade dos professores são agora mais vastas: do acompanhamento e aconselhamento dos alunos, do ensino em termos multiculturais, ao desenvolvimento de competências cívicas e sociais, integração de alunos com necessidades educativas especiais, aconselhamento profissional dos pais, gestão e liderança partilhada, etc. Apreende-se que a evolução da administração das escolas depende, em muito, da mobilização e do posicionamento que venham a tomar os vários parceiros educativos, nomeadamente os professores. «Logo tem que se criar um conjunto de condições, um conjunto de regras, um conjunto de lógicas de trabalho e criar lógicas de trabalho colectivo dentro das escolas, pois apesar de a 27

Ministério da Educação e Ministério da Administração Interna, Escola Segura – Relatório Anual, Ano Lectivo 2007-2008 Mestrado MPA – Administração Pública, especialização em Administração da Educação Edição de 2009 - 2011

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experiência ser importante e de a experiência de cada um só se transformar em conhecimento quando se produz uma análise sistemática das práticas » 28. «As situações pedagógicas são como os momentos da vida: são únicas e não se repetem, logo para elas não há receitas que possam ser guardadas como solução para futuras situações, diz Bento (1989). Este é o novo paradigma de professor. Não só a qualificação para o exercício de funções em administração e gestão, por via de formação especializada ou pelo desempenho de cargos nas escolas, pode não ser suficiente para romper com a lógica burocrático-administrativa se não for possível construir uma agenda do tipo descentralizador e autonómico. «Daí que o programa de reforço da autonomia das escolas, agora abrangendo também a educação pré-escolar e o 1º ciclo do ensino básico, só pode ser coerente com a retórica da territorialização das políticas educativas se, porventura, se fizer acompanhar de mecanismos indispensáveis para a sua concretização, como a alocação de professores a um determinado território, considerado como uma unidade organizacional com órgãos próprios, capaz de formular uma vontade colectiva e projectos consistentes e dotada de um suporte material e administrativo para a sua implementação. Só assim estarão criadas condições essenciais para a criação local de redes e parcerias educativas com vista à diversificação e contextualização das respostas educativas da escola» 29. Falta neste puzzle regulamentar os contratos de autonomia e isso é feito com a publicação da Portaria 1260/2007, de 26 de Setembro onde se anexa uma matriz do contrato-tipo. Não aparenta que a escola tenha grande margem de manobra na negociação deste tipo de contrato

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, nomeadamente na gestão de recursos humanos, ou seja, na contratação dos docentes

para além das necessidades residuais e pós colocações cíclicas do concurso nacional, a decorrer até ao final do 1º período lectivo e na vertente de gestão financeira, para além de uma maior flexibilidade de gestão orçamental de um orçamento que é incapaz de negociar de igual para igual. Nota-se, uma vez mais, um cariz controlador do Ministério da Educação através da composição da comissão de acompanhamento nacional a qual arbitra questões de litígio na aplicação do contrato de autonomia e é significativo que em ano de publicação da lei se avance com a notícia de assinatura de 22 contratos de autonomia, datada de 10 de Setembro de 2007, coincidente com o início de mais uma ano lectivo, e que só se encontre referência a 6 desses contratos nas várias Direcções Regionais de Educação

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, considerando-se a excepção que é a Escola da Ponte, já

referenciada. 28

Nóvoa (2001) op. citada segundo João Formosinho 30 esta questão poderia ser objecto de uma análise de conteúdo aos contratos já homologados pelo Ministério da Educação, portanto de um estudo específico 31 2 na região do Alentejo, 2 na região de Lisboa e Vale do Tejo e 2 na região do Algarve 29

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Os últimos anos na educação são conturbados, são alterações ao Estatuto da Carreira Docente e as novas categorias de professores que dividem a carreira única, a «nova»

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Avaliação

de Desempenho dos professores com os múltiplos episódios, alguns caricatos, que se desenrolam em várias instâncias, nomeadamente as sindicais, é o novo Estatuto do Aluno e a crescente desautorização da autoridade do professor e, também, um cercear da sua liberdade educativa agora mais voltada para o controlo burocrático do processo ensino/aprendizagem, em prol dos resultados estatísticos que são largamente apregoados como vitórias da novel política educativa. As escolas são inundadas de leis, recomendações, decisões que mal têm tempo para digerir quanto mais apreender e contextualizá-las em cada ambiente escolar. O tempo está nublado. Com a população, que serve, mesmo que contra os professores. Este é o lema. Assim se compreende uma nova revisão do regime de autonomia, administração e gestão da escola pública consagrada no Decreto-Lei 75/2008, de 22 de Abril, onde a figura do Director joga um papel central. A favor de uma liderança personalizada na escola e de um interlocutor mais directo com a tutela. Mas será isto mais autonomia? Ou será uma perda da democraticidade e participação dos interessados na vida e administração e gestão da escola? Várias são as opiniões e pareceres emitidos sobre este novo regime e valerá a pena perceber o que o Conselho Nacional de Educação pensa sobre a questão lendo o seu Parecer 3/2008, de 28 de Fevereiro ou o que Licínio Lima pensa sobre a figura do director ou o reforço da participação das famílias e comunidades na gestão das escolas 33. Do parecer do Conselho Nacional de Educação citam-se somente estes excertos: «Com base na avaliação e na experiência recolhida na aplicação do modelo de direcção e gestão previsto no DL 172/ 91, o CNE não concorda com a articulação que se propõe entre o papel do Conselho Geral na selecção e eleição do seu director e o «procedimento concursal, prévio à eleição», ambos previstos no projecto de diploma. E considera que devem ser evitadas as limitações à actuação do Conselho Geral no processo eleitoral. O texto deveria ser mais claro, antes de remeter a elaboração de regras próprias para portaria do membro do Governo». «Está prevista a tomada de posse do(a) Director(a) «perante o director regional» e não perante o órgão que o elege, o Conselho Geral. Tal perspectiva indicia a desvalorização do órgão de direcção ou a redução da autonomia das escolas e o aumento da sua dependência face aos órgãos da administração regional e central».

32 33

a anterior não foi sequer regulamentada em diversos pontos e, muito menos, objecto de séria avaliação entrevista integral em anexo, via a página da educação Mestrado MPA – Administração Pública, especialização em Administração da Educação Edição de 2009 - 2011

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«Do mesmo modo, não se concorda com a possibilidade de cessação do mandato do(a) Director(a) “por despacho fundamentado do membro do Governo responsável pela área da educação...”, uma vez que a proposta de normativo já prevê mecanismos bastantes e suficientes para o Conselho Geral fazer cessar a actividade do(a) Director(a), seja na sequência de uma avaliação externa, seja de uma acção inspectiva e de um consequente processo disciplinar. A assunção de que o Conselho Geral é o «órgão de direcção estratégica» não é coerente com estas duas disposições, que contrariam a sua consolidação como órgão responsável e de efectiva «direcção estratégica», responsável aliás pela eleição do(a) Director(a). Além disso, o CNE recomenda que se evitem, a todo o custo, todos os riscos de politização e partidarização dos órgãos de direcção e gestão das escolas». Registe-se uma nota sobre a perspectiva que vem sendo transportada para as escolas em termos de prestação de contas que é a de se correr o risco de estar a avaliar as unidades de gestão escolar tal como se faz numa qualquer organização privada com fins lucrativos, quando a escola pública presta um serviço que não tem como objectivo o ganho financeiro mas a qualidade do processo ensino/aprendizagem e os sucesso escolar e educativo, cujos possíveis indicadores não podem ser estritamente aqueles que reproduzem por via burocrática o sucesso escolar e as classificações em exames externos. Estranhamente é pouco visível a reacção dos sindicatos a esta evolução, para além das considerações gerais sobre o atentado que representa para a gestão democrática das escolas. Registe-se que com a entrada em vigor deste novo regime de autonomia, administração e gestão da escola pública e até à presente data ainda não celebrado qualquer contrato de autonomia o que diz bem da intenção da tutela em ter o controlo apertado nos processos de descentralização e delegação de competências aos órgãos de direcção e gestão de gestão. Sem pretender fazer-se uma análise de conteúdo a um contrato específico de autonomia, o da Escola Secundária da Quinta do Marquês

34

, tida como uma escola de referência na Área

Pedagógica 10 e bem colocada no ranking das escolas secundárias, vamos deixar algumas pistas sobre os limites de negociação da autonomia que está em causa na celebração do contrato. Quanto aos objectivos gerais eles são aquilo que a tutela já prescrevera em termos de lei, nem mais nem menos, com um realce para a aplicação do princípio da eficiência. Os seus objectivos operacionais decorrem do Projecto Educativo que estabelece metas e que aqui são formalizadas. As competências reconhecidas à escola demonstram tão só um extrapolar da lei, com pequenas excepções como a que regista a possibilidade de a escola poder recolher apoios financeiros para a concretização de visitas de estudo e outras actividades ou a prestação de

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o referido contrato pode ser lido em anexo Mestrado MPA – Administração Pública, especialização em Administração da Educação Edição de 2009 - 2011

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pequenos serviços realizados no âmbito dos clubes, ateliês e oficinas em funcionamento e arrecadar receitas a inscrever no Orçamento de Compensação em Receita 35. O limite de 26 como número máximo de alunos por turma é uma pequena cedência do Ministério da Educação, se tivermos em conta que o máximo contemplado em lei como sendo de 28 alunos, e se consigna a excepção «salvo situações de ruptura na rede escolar», obviamente uma imposição da tutela. E receber o patrocínio de empresas e outras entidades a troco de publicidade, nos termos da legislação em vigor. Não se vislumbram grandes cometimentos para além do enquadramento legal e daquilo que têm sido as práticas continuadas das escolas na gestão destes processos. Os compromissos que a escola assume vão um pouco mais longe quando se assume que a construção de um pavilhão gimnodesportivo, por ser a única escola do Concelho de Oeiras sem espaço específico para a prática da Educação Física, curricular, e outras actividades de índole desportiva, para além de pequenas obras de remodelação e reconversão de espaços, nomeadamente a de uma sala de aula para um pequeno anfiteatro com condições para ser uma sala de audiovisuais. Quanto aos compromissos do Ministério da Educação passam por colocar a escola em lista de prioridade no Programa de Modernização das Escolas Secundárias e transferir o montante de 60% da poupança produzida com a racionalização e reorganização dos recursos humanos para a escola, tendo em vista o melhorar o rácio aluno/professor e o custo por aluno. Também mostra a intenção de tomar as medidas necessárias para a disponibilização por parte do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas de terrenos contíguos à escola, para a construção do pavilhão multiusos. A conversão em equivalente financeiro de créditos horários remanescentes é, talvez, uma má utilização da autonomia pois tem implicações na organização do trabalho, nomeadamente o docente e está em linha com a pretensão de receber 60% da poupança em recursos humanos. Não se vê grande arrojo e inovação neste contrato de autonomia e que ele implique, para a escola, para além das responsabilidades do Ministério da Educação em manter, preservar e requalificar o seu património edificado ou a edificar, grandes alterações de modelo organizativo e de gestão financeira, pois que da orçamental não se fala. Será este o tipo de contrato possível? Como já se disse seria preciso um estudo

36

sobre a repercussão destes contratos de

autonomia na vida das escolas e não é disto que aqui se trata. 35

fundos próprios da escola este tipo de estudo pode revelar-se complicado pois a matriz que enquadra estes contratos é anterior ao regime estabelecido pelo Decreto-Lei 75/2008 e os novos gestores, o Director, podem não estar na disposição de disponibilizar informação que permitirá estabelecer quadros comparativos sobre a realidade da escola, em tempos diferentes 36

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E quanto ao clima na classe dos professores face a estas mudanças em catadupa e “atentados” à sua profissionalidade e independência? Nóvoa (2001) resumiu muito bem a questão: os professores podem e devem exigir duas coisas absolutamente essenciais, uma é calma e tranquilidade para o exercício do seu trabalho, outra, é essencial ter condições de dignidade profissional. À medida que as discrepâncias entre a ordem normativa e jurídica e as ordens das realidades concretas se vão ampliando, coloca-se o problema de se compreender as lógicas de acção que quotidianamente se desenvolvem nas escolas portuguesas 37. Entre a estrutura e a acção devemos encarar a cultura organizacional da escola como um processo de construção. Não nos parece estarem reunidas estas condições para que não se fale de mal-estar generalizado na classe profissional dos professores. Será que a satisfação profissional dos professores é relevante, até para as decisões de carácter político ou económico? «A relevância e o interesse acerca da satisfação profissional dos professores surge pelo facto de a ela aparecerem associadas variáveis tão importantes como a auto-estima, o bem-estar físico e mental, a motivação, o empenho o envolvimento, o stress, a realização profissional dos professores» 38

. «Sabemos de igual modo que sentimentos de insatisfação e mal-estar afectam não só os

professores mas também os alunos, pois o desinvestimento e a falta de motivação dos professores contribui directamente para o desinteresse dos alunos na sala de aula e, consequentemente, para uma menor qualidade do processo ensino-aprendizagem». Este estudo revelou que «os professores apresentam baixos níveis de satisfação profissional, sendo esta justificada predominantemente por factores sociopolíticos» e quem revela maiores índices de satisfação são os professores a meio da carreira e os das áreas de Educação Artística e FísicoMotora. «Quanto maior a satisfação profissional maior a auto-estima dos professores mas também quanto menor a auto-estima menor a satisfação profissional». «A dimensão Alunos, ou seja a Dimensão de desenvolvimento do ensino e da aprendizagem, é aquela que maior impacto tem na variabilidade de registos da auto-estima dos professores». «Ao contrário do que acontece nos EUA onde os professores que sofrem de desgaste tendem a deixar a profissão, em Portugal é grande a probabilidade de esse grupo permanecer nas escolas a leccionar dia-a-dia, anos a fio, desgastadas, desmotivadas, desgastando e desmotivando». «Este desgaste surge como um perigo para as instituições escolares, no sentido em que é um fenómeno dotado de características epidémicas, que tende a acontecer por contágio». 37 38

Lima op. citada Pedro e Peixoto op. citada Mestrado MPA – Administração Pública, especialização em Administração da Educação Edição de 2009 - 2011

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O mal-estar da classe docente aporta vastas consequências não só para a sua prática educativa mas igualmente no que respeita à sua saúde e estão aí sinais desta evidência: alienação perante o ensino, desinvestimento no trabalho, absentismo, esgotamento, ansiedade permanente, auto-desvalorização, pedido de aposentação antecipada, exercício da docência a meio tempo, doenças psicossomáticas, recurso a um estilo de docente mais rígido e conservador, neuroses reactivas e depressões. Este o quadro em 2006. Agora a situação tende a agravar-se e veja-se a quantidade de professores que estão a solicitar a reforma mesmo com antecipações ao tempo expectável e com prejuízos financeiros consideráveis, havendo casos de penalizações a rondar os 30 ou mais por cento. Isto não é bom para o sistema educativo e para a qualidade do mesmo, pois os professores mais novos deixam de ser enquadrados e acompanhados pelos mais experientes e há mexidas acentuadas nos quadros das escolas onde se verifica haver quase 50% de professores contratados, após o último concurso nacional. E não é bom para o envolvimento em processos autonómicos e de modelação organizacional.

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Conclusões

Passando um pouco por cima do período revolucionário que colocou as escolas em autogestão e desde que a lei de bases foi publicada que a agenda política da educação no que concerne à autonomia da escola foi sendo gradual no tempo e no enquadramento de um quadro referencial do regime jurídico da autonomia, administração e gestão da escola pública. Num primeiro passo estabelece-se o quadro normativo da autonomia, nas suas vertentes cultural, pedagógica e administrativa que vai ser regulado por lei que modela a estrutura organizacional da escola assente num órgão de direcção colegial, a Assembleia de Escola, aberta à participação dos vários intervenientes no processo educativo, à comunidade local, à autarquia e aos pais e encarregados de educação; num órgão de gestão, colegial ou unipessoal, conforme a escolha da escola em momento certo

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, que elege o seu presidente, a representar a gestão da escola

perante a comunidade e a tutela; um órgão pedagógico cada vez mais consultivo do que efectivamente deliberador das orientações pedagógico-educativas; e finalmente um conselho administrativo. Os contratos de autonomia celebrados ao abrigo deste regime resumem-se a 22. Muito pouco, diga-se. A agenda mudou radicalmente a ponto de, com este modelo ainda não completamente estável no terreno e de não ter sido objecto de uma qualquer avaliação, já se estar a avançar para uma gestão tendencialmente mais profissionalizada (?) e unipessoal, em que a figura do Director assume contornos de retrocesso na democraticidade da administração e gestão da escola, apesar do reforço à participação dos interessados no órgão de direcção, que agora se designa de Conselho Geral. Para além das alterações de designação o cerne coloca-se no poder discricionário atribuído ao Director, que além de ver ratificado em sede de órgão de direcção o seu plano de acção e intervenção na escola, menorizando o carácter directivo do referido órgão, passa a nomear para as estruturas intermédias quem achar por bem, para além de ter em mãos todo o processo de avaliação de desempenho, quer de docentes quer de pessoal não docente, acabando por ser o presidente do Conselho Pedagógico por inerência do cargo. Ainda se está em período de ressaca para com todas estas transformações e já há nota de descontentamentos nas escolas e denúncias, mais ou menos públicas, de abusos de poder. Apesar de mudanças na condução política no Ministério da Educação não se vislumbra grande abertura para acondicionar equilibradamente este descontentamento, até porque grande parte das questões em aberto como o Estatuto da Carreira Docente, a organização dos horários dos professores e as horas de componente lectiva e não lectiva, uma reformulação da novel gestão, têm implicações no Orçamento de Estado.

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esta escolha deverá estar contemplada no respectivo regulamento interno Mestrado MPA – Administração Pública, especialização em Administração da Educação Edição de 2009 - 2011

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E mais uma vez se nota a cada vez maior preocupação em reduzir custos, controlar centralizadamente a maior burocracia do processo ensino/aprendizagem, reduzindo a independência pedagógico-didáctica dos professores. Talvez essa a razão que explique, em parte, a falta de iniciativa em celebrar novos e mais contratos de autonomia, apesar das negociações em curso para a transferência de competências para as autarquias locais às quais só acederam por protocolos assinados 45 autarquias, num universo de mais de 300 40. Outra razão que pode explicar este atraso tem a ver com o desenvolvimento do programa de modernização dos estabelecimentos de ensino onde através de projectos e empreitadas se estão a investir milhões de euro, deixando pouca margem de manobra para negociar mais e maiores autonomias.

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notícia de 28 de Julho de 2008, in http://www.min-edu.pt/np3/1693.html Mestrado MPA – Administração Pública, especialização em Administração da Educação Edição de 2009 - 2011

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Anexos Contrato de autonomia da Escola Secundária Quinta do Marquês Uma opinião de um inspector da educação (aposentado) Entrevista a Licínio Lima

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UMA OPINIÃO DE UM INSPECTOR DA EDUCAÇÃO (aposentado) A pretexto do caso-de-Fafe (lembram-se dele?), da avaliação e da classificação das Escolas e dos docentes, da(s) autonomia(s), da acção disciplinar – e do mais que adiante se verá, ou Das vantagens da memória 1. Perante o então chamado caso-de-Fafe – lembram-se dele? –, estivemos confrontados com uma questão de fundo, que se prende com a filosofia que subjaz ao tipo de trabalho que a Inspecção-Geral da Educação (IGE) desenvolve: ao contrário da ideia que por vezes se pretende fazer passar, os Inspectores deslocam-se às escolas exclusivamente em consequência das encomendas das suas tutelas, sejam a IGE ou o Ministério! Está-lhes vedado, na prática – e nem sempre assim foi – responder às solicitações das escolas ou poder acompanhá-las em função dessas solicitações; em consequência, não possuem os Inspectores qualquer margem de autonomia para, fundamentadamente, escolher as escolas onde têm necessidade de ir; assim sendo, não está garantida uma presença sistemática dos Inspectores nas escolas, num permanente acompanhamento dialogante, trabalhando com elas e não contra elas, e tão natural quanto a dos alunos, dos docentes ou dos funcionários. É neste sentido que nós afirmamos que as escolas estão abandonadas pela Inspecção! Não defendemos, porque isso não teria qualquer sentido, que os Inspectores trabalhem em roda livre, sem prestar contas a ninguém e sem integração num plano geral de actividades que responda aos objectivos gerais da IGE. Mas, numa altura em que tanto se enche a boca com a “autonomia”, bem gostariam os Inspectores de poder reservar uma parcela do seu tempo (1/4?…1/3?…) para responder ao que as escolas directamente lhes solicitassem. Gostariam, afinal, de ser tratados como sujeitos do seu próprio trabalho e não como meros instrumentos-de-trabalho! Não temos a certeza – porque ninguém pode tê-la – de que, se esta fosse a filosofia de acção da IGE, o caso-de-Fafe não teria pura e simplesmente existido na sua vertente disciplinar interna, mas haveria certamente uma elevada probabilidade de que tal tivesse sucedido: porque a falar é que a gente se entende, certamente teria sido possível matar-a-serpenteno-ovo. (Não falo d’os-ovos-da-Senhora-ex-Ministra, porque essa é eventualmente uma área de actuação do Ministério Público). E não nos venham dizer que esta função de acompanhamento está agora a ser desempenhada por equipas de apoio das DREs, porque o sentido de humor tem limites… O que se passa é que a IGE está a sofrer do sindroma da “new public management”, com as perversões que lhe estão associadas e que hoje até os seus paladinos originais denunciam. 2. Exemplar é o caso das “Avaliações Externas” – sendo desde logo necessário afirmar que elas apenas são possíveis pela imposição aos Inspectores de ritmos e de horários de trabalho chocantes, dignos da revolução industrial do século XIX (bem como pela utilização abusiva dos automóveis dos Inspectores, dos telemóveis dos Inspectores, da internet paga pelos Inspectores, dos seguros da viatura pagos pelos Inspectores e da ausência de um Seguro Profissional de Responsabilidade Civil). Mas não podemos deixar de denunciar a IGE quando esta dá a entender que este trabalho não se enquadra numa encomenda da tutela, antes é consequência de uma solicitação voluntária das escolas, como se todos não soubéssemos que esta solicitação voluntária é, ela sim, consequência do Despacho nº 20131/2008, dos Ministérios das Finanças e da Educação, sobre as implicações da Avaliação Externa na avaliação/classificação dos docentes (implicações que o próprio Conselho Nacional da Educação considera como uma das fragilidades originais do Mestrado MPA – Administração Pública, especialização em Administração da Educação Edição de 2009 - 2011

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modelo). E é pelo menos estranho que nos “Objectivos da avaliação externa” não apareça esta ligação umbilical ao Despacho atrás referido – quando sabemos que, por força dele, da avaliação externa resulta uma classificação! É também significativo que esta classificaçãopara-o-SIADAP nunca apareça explícita nos objectivos da avaliação externa assinalados no n.º 14 do “Boletim dos Professores”, da responsabilidade do Ministério da Educação. Como todos sabemos desde pelo menos os finais dos anos cinquenta do passado século – há quem o saiba desde Comenius –, pode existir avaliação sem classificação, mas nunca esta sem aquela. Deve estar cometido à IGE desenvolver prioritariamente a primeira – e de modo ainda mais intensivo, e com sequencialidade, ao serviço da melhoria das escolas –, mas não exclusivamente a segunda –, ao serviço da ex-Ministra da Educação e do SIADAP para docentes. (Aliás, e porque qualquer avaliação tem de ser assumida sem ligeireza e sem pressões, lembramos que o Sindicato dos Inspectores da Educação e do Ensino/SIEE, numa “Conferência de Imprensa” realizada em 30 de Outubro de 2007, denunciou a nãoexistência de condições que permitissem aos Inspectores integrar o processo de avaliação do desempenho dos docentes coordenadores – como a tutela pretendia; e que o mesmo Sindicato dirigiu em 11 de Novembro de 2008 uma “Carta Aberta” sobre idêntica matéria ao então Secretário de Estado Adjunto e da Educação). No caso em apreço, porque desagua numa classificação instrumental, a avaliação externa transforma-se num exercício muito arriscado! O duo Maria-de-Lurdes-Rodrigues-&-Sócrates, interessado numa classificação a todo o custo, estava pouco preocupado com o risco do exercício e com a pesada responsabilidade a que submeteu os Inspectores. “A entrevista em painel é o método essencial usado pela equipa de avaliação externa para dialogar com a comunidade educativa e para recolher informação”, diz o documento oficial da IGE sobre a matéria. Mas estamos a falar de painéis que – tendo em conta a sua duração global, o número de questões e o número de participantes que potencialmente implicam – concedem uma média de 33 (trinta e três!) segundos a cada participante/questão/painel, e estamos a partir do princípio absurdo de que a equipa inspectiva não abre a boca, isto é: 33 (trinta e três!) segundos para, apenas ouvindo, “dialogar” e “recolher informação”. É querer meter o Rossio na Betesga! Isto não é um painel – isto é um contra-relógio. No plano científico, painéis deste tipo não podem senão ser classificados, na melhor das hipóteses, como “etnográficos” ou “impressionistas” – mas, em contrapartida, exige-se aos Inspectores que desses painéis resultem relatórios objectivos e afirmativos, com todas as ponderosas consequências que atrás enunciámos. A verdade é que, há alguns anos atrás, a IGE desenvolveu um programa de avaliação integrada das escolas que, pesem embora alguns deméritos, possuía a extraordinária virtude de as não pretender classificar – nem directamente, nem por arrastamento. Aliás, estamos convictos de que foi a sensatez de assumir esta virtude que levou ao seu cancelamento, incapaz como foi de agradar a tutelas amantes de rankings… Na avaliação externa – na classificação das escolas, porque é disso que se trata –, esta lufa-lufa obreirista da Inspecção assenta numa base única: a ex-Senhora Ministra possuía uma agenda política para um ciclo eleitoral de quatro anos e, porque o tempo não é condicionável, condicionou o trabalho da Inspecção não às necessidades das escolas, o que seria excelente, mas à sua agenda própria! Eis o pecado original das avaliações externas, consequência da instrumentalização da IGE pela ex-Senhora Ministra! Vai a nova Ministra permanecer no erro – mesmo após o histórico acordo assinado com os Professores?… Se a ex-Senhora já é “ex” – por que é que a avaliação externa já não é “ex” também?…

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3. Falta claramente sentido de equilíbrio à filosofia da IGE. Estamos perante uma InspecçãoGeral da Educação ou uma Inspecção-Geral do Ministério da Educação? (esta pergunta, como é óbvio, não possui idêntica pertinência no que se refere à IGMCTES, dado o particular estatuto de autonomia consagrado para o ensino superior); queremos uma Inspecção do Estado ou uma Inspecção do Governo de turno?; queremos uma Inspecção ao serviço das tutelas ou ao serviço dos estabelecimentos de educação e ensino?; queremos uma Inspecção sob tutela do Governo, ou da Assembleia da República, ou de ambos? Devemos dizer que, numa instituição equilibrada, gozando de autonomia, estas perguntas não fazem qualquer sentido – porque deveria ser possível responder decididamente “sim” a todas, abandonando visões dicotómicas e simplistas sob a capa do “ou (…) ou (…)”. Estas perguntas apenas reforçam a ideia de que, independentemente dos exemplos de circunstância assinalados neste texto, não são de natureza técnica as grandes questões da IGE – antes relevam da filosofia da instituição e das opções de política educativa que a enquadram. 4. Quanto à bondosa tese de que a acção disciplinar da IGE – esse lobo mau que obrigaria as criancinhas a comer a sopa –sofreu um virtuoso decréscimo, bem sabemos que isso pouco tem a ver com a IGE e se deve antes de tudo à transferência legal da competência da instrução para as escolas. Trata-se, aliás, de um autêntico presente envenenado para as escolas e para os docentes, presente embrulhado pelo Ministério em papel de lustro da marca “autonomia”– como o caso-de-Fafe veio demonstrar bem a propósito, logo seguido pelo caso-da-Senhora-Professora-de-uma-Escola-de-Espinho… Tal como nós mesmos havíamos oportunamente previsto, a instrução da acção disciplinar, particularmente da mais relevante, seria naturalmente reencaminhada para a IGE pelas escolas, por força não apenas da ausência nestas de condições que permitam esse exercício, mas também como resultado das novas disposições, cruzadas, assumidas em sede do novo “Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores Que Exercem Funções Públicas”, por um lado, e, por outro, da lei que “Aprova o Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas” – e o reencaminhamento foi exactamente o que sucedeu no caso-deFafe, e no caso de Espinho, ambos exemplares a este título. E, embora a sua existência seja louvável, não é com o apoio do site da IGE, nem com um apoio esforçado e de retaguarda de alguns Inspectores, que se dá um contributo estruturado para a resolução de questões tão complexas e com tão graves implicações. E não vale a pena virem acusar os Inspectores de terem saudades do exercício da acção disciplinar: o SIEE foi o único que, publicamente, na “Carta Aberta” atrás referida, se opôs à tentação da tutela de resolver pela via disciplinar, com ameaça e chantagem nem sequer disfarçadas, problemas ligados ao atribulado processo de avaliação dos docentes! 5. Parece-nos que fica agora mais claro por que devemos ter presentes alguns ensinamentos a pretexto do caso-de-Fafe. O Dr. Almeida Costa, que foi o primeiro InspectorGeral do Ensino – era assim que então se chamava –, dizia que a Inspecção era “a consciência crítica do sistema” educativo, e ainda que, no terreno, devido ao isolamento e às pequeníssimas equipas em que naturalmente somos forçados a trabalhar, “cada Inspector é a Inspecção”. Assim, e ao mesmo tempo que não podemos deixar de usufruir de grande autonomia, recai sobre cada um de nós uma proporcional responsabilidade. Não vivemos de saudades, excepto, como o poeta nos ensina, das “do futuro”. Isto é, saudades de um passado em que um-futuro-começado-a-ser-construído foi interrompido (apenas interrompido…) pelo pensamento único consagrado na desumanização da “new public management” e do SIADAP. Dito de outro modo, aparentemente simplista: continuo com o vício de defender os Inspectores. Seria mais fácil continuar calado, mas não me peçam que Mestrado MPA – Administração Pública, especialização em Administração da Educação Edição de 2009 - 2011

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adquira um hábito novo aos 63 anos de idade, nem me argumentem que não podemos “dar tiros nos próprios pés” – quando a pior alienação passa por convencerem-nos que são nossos os pés que afinal são de outros. Preparados para um outro caminhar e para um outro caminho – um caminhar e um caminho que não são os nossos. José Calçada (Docente do ensino liceal/secundário de 1970 a 1982; Inspector da IGE de 1982 a 2009; aposentado há três meses e meio)

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