Cadernos de Viagem, nº 105, Britiande

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Dezembro de 2014 Número 105

Britiande Britiande? O que é isso? A 6 km de Lamego encontra-se a pequena localidade (vila? Aldeia?) de Britiande.

@ M. Margarida Pereira-Müller Texto: M. Margarida Pereira-Müller Fotos: Hans-Jürgen Müller infobus, Comunicação e Serviços, Lda Tel.: 00351-214351054 Email: guidapereiramuller@yahoo.com

Diz-se que foi para este lugar que vieram os habitantes da (agora) Queimada quando Trajano mandou queimar e destruir a aldeia. Diz -se igualmente que foi aqui nestas duas localidades que terá tido origem a atual cidade de Lamego. Reza também a lenda que, quando D. Afonso Henriques ali passou com os seus soldados, havia nozes pelo chão. Vinha com pressa, mas os soldados arregalaram o olho.

Queriam comer as nozes. Então D. Afonso Henriques disse: “Brite e Ande”. E assim nasceu o nome da aldeia: Britiande. No entanto, o que nos interessa não é Lamego mas Britiande. Nesta aldeia com pouco mais do que 900 almas está a Casa de Santo António que pertence a Ana Maria Pinto Ribeiro e ao seu marido, um engenheiro mecânico de formação mas lavrador do Douro de paixão. Esta casa quinhentista caiu nas mão dos Pinto Ribeiro como que vindo do céu. A quinta e a respetiva casa pertenciam a um tio do avô, padre, e que não tendo descendentes diretos, a doou ao seu sobrinho. O Eng. Pinto Ribeiro

nunca lá morara mas lembra-se de lá ir em pequeno. Na altura a casa era um casarão pouco acolhedor com a habitação no 1ºandar e as “lojas” no r/ch. Não pensem os nossos leitores citadinos que as lojas eram locais onde se faziam trocas comerciais. Não. As lojas eram os armazéns agrícolas onde se armazenavam durante todo o ano de fruta e legumes da quinta. No final dos anos 80, os Pinto Ribeiro sentiram o chamamento da terra. Tinham começado o programa do Turismo de Habitação e decidiram arranjar a casa e transformá-la não só no seu próprio


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lar como num oásis acolhedor na inóspita região que se encontrava longe de tudo. As estradas eram um amontado de serpentinas que faziam que uma viagem até Britiande fosse uma tortura. “Se pensarmos que naquele tempo se demorava seis horas par ir de Lisboa a Nova Iorque e oito horas para se chegar a Britiande, entendese bem o estado das nossas vias de comunicações”, recordanos Ana Maria Pinto Ribeiro.

Em 1989, iniciaram as obras. Foi construída uma bela escadaria interior, de madeira, que liga os dois pisos da habitação. No 1º andar, nasceram cinco quartos com as respetivas casas de banho, decorados com todo o amor e carinho. Um dos quartos ficou para os proprietários. No r/ch, fizeram duas belas e espaçosas salas de estar, uma sala de jantar com uma acolhedora lareira e uma fantástica vista para o jardim, e uma cozinha. As obras ficaram concluídas no final de 1990. O Natal desse ano já aí foi passado. Os empregos de então foram largados e o casal começou a dedicar-se a receber hóspedes de todo o mundo e a tratar das vinhas donde sai vinho maduro e vinho do Porto. Nós chegámos à noite a Britiande, vindos do Porto. A passagem da serra do Marão não tem comparação com as viagens de antigamente. As

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várias autoestradas e IP que ligam a região ao resto do país fizeram com que o desenvolvimento fosse possível. O frio era de rachar, mas a casa estava acolhedoramente quente. Subimos ao nosso quarto com duas camas twins juntas que nos deu logo uma sensação de espaço e bem-estar. O quarto estava virado para o Largo São Sebastião no meio do qual se eleva o pelourinho. Da janela de guilhotina do quarto víamos também a pequena igreja homónima. Dois pequenos bancos de pedra no quarto junto à janela convidam a que se ali fique de olhar perdido a olhar a tranquilidade do lugar ou de mente perdida a ler um bom livro – se se esqueceu do seu não


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há problema porque há livros no quarto e nas diversas salas de estar. Descemos então para o r/ch para um jantar de petiscos e vinho junto à lareira. A mesa estava coberta por uma bela toalha alva adamascada. À nossa espera o jantar ideal para uma noite gélida: uma travessa de enchidos e outra de queijo, várias qualidades de pão e uma garrafa de vinho dos Urgais, um delicioso vinho da região de Távora-Varosa, onde estávamos. À sobremesa, maçãs autóctones que desconhecíamos: focinho de porco, uma maça

muito aromática e de sabor suave, e pardo lindo, uma maçã “feiosa”, que lembra a reineta mas de sabor menos ácido. Depois de jantar, por ali ficámos a gozar a lareira e a bebericar um vinho do Porto

caseiro, ainda feito pelo avô dos donos. No dia seguinte, o pequeno-almoço foi servido com o mesmo

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carinho que o jantar da véspera. Numa pequena mesa virada para o jardim, pães variados, compotas e iogurtes caseiros, queijo e fiambre deram-nos força para um dia de passeios. Britiande está ligada ao nascimento da nação. Egas Moniz ali tinha uma casa. A igreja matriz, pequenina mas lindíssima, tem as paredes cobertas com frescos do século XVIII. O altar-mor de talha dourada tem as paredes cobertas por belos azulejos. O adro da igreja tem-se uma fantástica vista sobre a região. E com os olhos maravilhados pelos montes e vales envoltos na neblina matinal seguimos viagem para Lamego com a certeza de voltarmos.


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