CADERNOS DE VIAGEM, nº 123 - IX Raid Kwanza Sul

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Julho de 2016 Número 123

IX Raid do Kwanza Sul

Texto: Margarida Alves Pereira infobus, Comunicação e Serviços, Lda Tel.: +351-214351054 Email: guidapereiramuller@gmail.com

Dia -1 Nas véspera

vezes na vida, teoria

se incluem 12 t-

da partida

e prática nem sem-

shirts e um polo

Mochila feita. Não foi

pre coincidem. É

(uma para cada

fácil. Que levar para

certo que não

dia) do IX RAID do

este raid em Angola?

necessitamos de

Kwanza Sul. O

Teoricamente nem é

muita roupa, mas

problemático, se

precisa muita roupa.

há um mínimo a

assim o quisermos

Mas como muitas

transportar - onde

designar, são as


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C a d e r n o s

d e

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noites

Decididamente, não

hipopótamos, leões,

nas

há espaço para

hienas, onças, paca-

Terras

tudo.

ças, etc. – e à grande

do

Mas agora já está.

variedade de aves

Fim

Mochila feita. Check-

que atraem os ornitó-

do

in feito. A viagem

logos de todo o mun-

Mun-

pode começar.

do.

do

Terras do Fim do

Os rios com as suas

onde

Mundo. A adminis-

águas límpidas são

não

tração colonial portu-

bons para a prática

guesa assim chamou

da piscicultura. As

nada.

à maior província de

terras férteis e as óti-

Ou

Angola, no sudeste

mas condições climá-

seja,

do país. Bem longe

ticas favorecem o

dos centros de deci-

desenvolvimento da

que

são, ninguém queria

agricultura. Atual-

levar

ir para lá. Faltava

mente as culturas

saco-cama, colchone-

infraestruturas. Era

exploradas são

te e roupa para o

mesmo o fim do

essencialmente ali-

frio. É que as tempe-

mundo.

mentares (milho, fei-

raturas variam den-

O governo do novo

jão, mandioca, batata

tro de um leque mui-

país quis mudar o

doce), mas a região

to alargado: dias

destino dessa provín-

tem potencial para o

muitos quentes e

cia. Começou por lhe

café e a cana do açú-

noite que podem

alterar o nome para

car.

andar pelo 8-10 ºC.

Terras de Progresso

Em 13 etapas, num

E sem equipamentos

devido ao seu poten-

total de 4 000 km,

hoteleiros, pode ser

cial económico. São

fomos de Luanda ao

que a noite seja, não

192 mil

km2

ao relento, mas qua-

dos por muitos rios

no que faz fronteira

se.

com clima tropical a

com a Namíbia, Bots-

Como temos limite de

semidesértico. A

wana e um pouco

bagagem, o outro

região tem boas pers-

mais a norte com a

problema que surge

petivas turísticas

Zâmbia.

ao fazermos a mala é

graças à sua fauna

Pela 9ª vez, a Câma-

onde arrumar roupa

de grandes e peque-

ra de Almada organi-

e brinquedos que

nos animais africa-

zou um raid por ter-

queremos distribuir

nos - palancas, ele-

ras angolanas no

pelas populações.

fantes, rinocerontes,

âmbito do acordo de

A preparação das mochilas

cruza-

Bico, o canto angola-


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va completo, distri-

gens a Angola já não

buíram-se pelas

têm stress: para se

várias pessoas as

tirar o visto já não há

peças de bagagem

multidões que nos

em excesso da orga-

faziam perder quase

nização. A CMA levou

um dia inteiro,

muito material para

os voos andam meio

distribuir em Angola:

cheios. Antigamente

t-shirts e livros para

a classe de viagem

bibliotecas escola-

que enchia em pri-

res. Esse é também

meiro lugar era a

um ponto essencial

Executiva. Hoje a

geminação com Porto

do acordo de gemina-

parte da frente do

Amboim, na provín-

ção entre Almada e

avião vai praticamen-

cia angolana do

Porto Amboim.

te vazia. E a Econó-

Kwanza Sul "com o

Mesmo distribuindo

mica vai com muitos

objetivo de divulgar o

as malas, sobraram

lugares vazios.

turismo ecológico e o

três que foram consi-

O voo foi muito agra-

intercâmbio cultural

deradas "excesso de

dável. A classe eco-

com a comunidade

bagagem". Felizmente

nómica da TAAG é

angolana".

como a TAAG patro-

muito confortável. E

cinou o RAID tudo

como não ia cheio

pôde seguir sem pro-

ficámos com espa-

blema.

ço. O almoço foi bom

O embarque foi mui-

e o serviço rápi-

to cedo porque o

do. As 6h45 do voo

avião não estava

passaram rapida-

estacionado numa

mente.

porta com manga. O

A chegada a Luanda

Boeing 777-300ER

foi... uma chegada a

da TAAG era novo,

Luanda. Alguns do

espaçoso, com muita

grupo foram parados

claridade. Para lá

na fronteira porque

estão os tempos em

tinham muitas t-

que Angola era um El

shirts... Mas tudo se

Dourado para os Por-

resolveu.

tugueses e os voos

À saída do terminal

para Luanda anda-

do aeroporto fomos

vam cheios que nem

“atacados” por um

um ovo. Agora as via-

grupo de jovens que

Check in

Dia 0 - Viagem 6h45. O balcão de check-in da TAAG só abria às 7h mas a essa hora já eram muitas as pessoas esperavam para entregar as suas malas. Quando o Sílvia e eu

d e

grupo esta-


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nos queriam "ajudar" a levar a bagagem até à carrinha. Apesar de lhes dizermos que não necessitávamos de ajuda, não largavam. A viagem até à ilha, onde pernoitámos

Saída de Luanda

hoje, foi rápida. Luanda está totalmente diferente - de

chegámos à Robert

e vendedores tentam

todas as vezes que cá

Hudson onde nos

vender aos conduto-

venho, encontro uma

esperavam 13 jipes,

res fruta, lenços de

nova Luanda.

novinhos, com

papel, sims para tele-

Em frente do Banco

somente com 94 km

móveis, enfim, tudo o

da Angola, estão a

no conta-

que faz falta - ou

ser construídas as

não.

torres Kianda. No

Passámos pelo está-

morro da fortaleza

dio 11 de Novem-

foram feitas constru-

bro construído para o

ções... que escondem

CAN 2010, Campeo-

a fortaleza. A bela

nato Africano das

fortaleza de Luanda

Nações de 2010 e

só se consegue ver

com uma capacidade

agora de esguelha!

de cinquenta mil pes-

A Ilha está mais

soas, pelo pavilhão

bonita com a frente

quilómetros.

multiusos construído

de praia mais arran-

Às 8h22 saímos do

para o Campeonato

jada e muitos equi-

concessionário da

Mundial de Hóquei

pamentos desporti-

Ford. O RAID come-

em Patins em 2011

vos.

çara. A estrada de

com capacidade para

saída de Luanda tem

11.454 espectadores

Dia 1 - De Luanda a

IMENSO tráfego. Até

- tudo equipado com

Libolo

está em boas condi-

tecnologia de ponta

Despertar às 5h30.

ções mas o fluxo de

da Siemens.

Às 7h30 após uma

trânsito continua

De repente, na

viagem rápida e sem

compacto. À beira da

“Chinatown” surgem

trânsito até Talatona

estrada, quitandeiras

quatro letras amare-


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e pedregulhos. O almoço foi na Fazenda de Santa Maria que produz um delicioso vinho branco, Serras da Xxila, feito de trempanillo, Pavilhão Multiusos de Luanda

verdelho e da casta angolana Muzondo

las em fundo azul:

condução tem de ser

Menga. Do restau-

IKEA. IKEA em

feita com cuidados

rante, no cimo de um

Angola? Sim, uma

redobrados por cau-

monte, tem-se uma

IKEA... chinesa...

sa dos buracões e do

espetacular vista de

Entrámos então na

trânsito em sentido

360 graus sobre a

estrada de Catete

contrário.

vasta planície entre-

que está a ser alarga-

Fizemos a 1a para-

cortada por pequenos

da pois é a estrada

gem às 11.30 no Alto

montes, alguns dos

de ligação ao novo

do Dondo. Até Calu-

quais parecem diluir-

aeroporto. No entan-

lo, uma vila que nos

se no véu que cobre

to, a partir daí até ao

tempos coloniais

ao longe a paisagem.

Alto do Dondo a

abrigava a grande

Pertença do general

estrada está péssima.

colónia alemã, o per-

Higino Carneiro,

Apesar de ter sido

curso fez-se linda-

general do exército

alcatroada de novo

mente. Pouco tempo

angolano, antigo

há apenas quatro

depois começou uma

governador da pro-

picada de 42 km até

víncia do Cuando

à Fazenda de Santa

Cubango e atual

Maria - saímos de

governador de Luan-

Calulo às 13.30 e só

da, a Fazenda tem

chegámos à Fazenda

um projeto vinoturis-

às 16h! O caminho

tico. A Fazenda de

era pior que navegar

Santa Maria tem 17

no mar alto. As chu-

mil hectares, dos

meses está uma lás-

vadas fizeram pro-

quais 50 hectares

tima com grandes

fundos veios na pica-

são para vinhos e

crateras nas bordas e

da. A paisagem era

uva de mesa, e 10

no meio e com a

porém lindíssima

hectares de produção

vegetação a tentar

com pequenos mon-

de tomate. Para o

tomar conta da via. A

tes no cimo dos quais

vinho a área anda

se amontoam pedras

entre os 17 e 22 hec-


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Vista do restaurante da fazenda Xxila

tares, com possibili-

Montes. Da vindima

forte.

dade de aumentar,

de 2014 foram pro-

Era altura de ir dis-

estando a fazer-se

duzidos 60 mil litros

tribuir os quartos. A

nova replantação,

de vinho que só é

fazenda tem 37 con-

com a casta angolana

vendido em Angola.

tentores que lem-

e com novas castas.

Dessa colheita ainda

bram uma aldeia de

As 1as vinhas firam

estão em armazém

operários de uma

plantadas em 2009,

17850 garrafas.

fábrica. As condições

tendo sido o 1º vinho

A fazenda também

são péssimas! A

feito dois anos

produz uvas de mesa

cama é pequena. A

depois. No entanto, o

(colheita de 2014: 43

tampa da sanita, de

lançamento comer-

mil kg), diversos lico-

muito má qualidade,

cial foi só feito 2013.

res e uma aguarden-

estava partida. Só

O enólogo é Paulo

te de grande qualida-

havia uma toalha. Os

Mesquita de Trás os

de (2014: 3000 l).

geradores de eletrici-

No final da visita à

dade estão mesmo

adega fomos sur-

juntos aos contento-

preendidos com um

res que fez com a

fantástico espetáculo

noite fosse algo rui-

de cores no céu. O

dosa.

sol tornou-se uma

No caminho entre o

bola de fogo que rapi-

restaurante e os con-

damente mergulhou

tentores perdemo-

no horizonte. Ao

nos! Metemo-nos por

mesmo tempo, o céu

uma picada onde só

ficou cor de laranja

havia capim alto. E

Adega


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e juntos fomos para

Cela, situado na

os contentores.

atual cidade de Waku Kungo, antiga

Dia 2 – Libolo -

Santa Comba Dão,

Menongue

uma zona pantanosa.

Uma noite siberiana.

O nome da cidade

As temperaturas des-

vem do nome da

ceram imenso e a

pedra que domina o

madrugada foi de

horizonte, Kungo, e

ranger dentes.

de Waku, o nome do

Às 5h45 deixámos os

monte. Em 1951 foi

contentores e dirigi-

desenvolvido um

mo-nos ao restau-

grande projeto de

rante no cimo do

secagem dos pânta-

monte para tomar-

nos para a agricultu-

mos o pequeno-

ra e para pecuária.

almoço no restauran-

A igreja matriz que é

te. Pusemo-nos em

uma réplica da igreja

marcha às 7h05.

matriz de Santa

Esperavam-nos 700

Comba Dão, tendo

no céu milhares de

km!

sido construída em

estrelas. Andávamos,

No caminho passá-

1959/60. A igreja foi

andávamos e só vía-

mos por Quibala com

recuperada há uns 4-

mos capim. Nada de

o seu grande roche-

5 anos com o apoio

contentores. Ao fim

do, no cimo do qual

logístico da CMA que

de quase 10 km de

os Portugueses cons-

também apresentou

voltas, pedimos aju-

truíram uma fortale-

um projeto para a

da pelo rádio dos

za.

sua reabilitação pro-

jipes. Nem sabíamos

Seguimos para o

funda que nunca

se ainda alguém

antigo Colonato da

avançou por falta de

Dois raidistas a admirar o pôr-do-sol

estaria nos jipes. Felizmente ainda estavam pessoas a regressar. Todos os carros desligaram as luzes para assim ser mais fácil localizarem -nos. E por fim encontrámos o grupo A fortaleza de Quibala


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No Alto Hama encon-

se instalou na Emba-

trámos ainda uma

la Moma para prati-

sinalização colonial

car a caça. À medida

para Silva Porto...

que iam caçando,

A estrada até aqui é

foram procurando

alcatroada... Só que

lugares favoráveis

com enormes bura-

para se fixarem, até

cões, verdadeiras

chegarem aqui. O

crateras. A condução

kimbo ficou com o

torna-se muito difícil

nome do seu soba,

e cansativa. No enan-

Nguali.

financiamento.

to, entre Cachiumbo

A partir de 1810, o

No âmbito do progra-

e Chinguar a estrada

município do Chin-

ma de cooperação a

está ótima. Almoçá-

arquiteta Fatima

mos em Chinguar,

Bulcão da Câmara

que ascendeu à cate-

de Almada concebeu

goria de vila a 8 de

o projeto para um

setembro de 1971,

centro escolar para

no Restaurante

1200 crianças na

Cheia.

Aldeia Nova, perto de

Chinguar, anterior-

Waku Kungo, que foi

mente denominado

apresentado publica-

Nguali (que significa

mente há dois anos.

perdiz), nome de um

O projeto está atual-

antigo soba e caçador

mente parado por

da área, foi fundada

falta de financiamen-

em 1810, quando

to

aqui chegaram os

Vendedora em Chinguar

primeiros portugueses. A região é habitada por vários grupos etnolinguísticos, sendo mais representativo o umbundo e o menos numeroso o nganguela. Reza a história que a população bantu quando Restaurante Cheia em Chinguar

veio para esta região

guar foi ganhando melhorias, principalmente no domínio socioeconómico, graças ao Caminho de Ferro de Benguela (CFB), bem como da estrada internacional que liga Angola, Zâmbia e República Democrática do Congo. As primeiras casas construída aqui eram de pau-a-pique. A população transportava os bens em ocharrua, carroças atreladas a bois, que ainda hoje são usadas sobretudo nas localidades mais longínquas. A guerra destruiu grande parte das infraestruturas


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sociais e económicas

sério"! A cadeia Ritz,

“fim do mundo” sem

que estão agora aos

que nada tem a ver

unidades hoteleiras...

poucos a ser recupe-

com a portuguesa,

Também pensei nas

radas.

tem em Menongue, a

populações locais.

Chegámos a Menon-

Serpa Pinto do tempo

Como devem passar

gue já estava escuro.

colonial, um "lodge"

frio nas palhotas fei-

Fomos diretamente

com bungalows espa-

tas de terracota!

para a universidade

çosos, limitados com

Às 11h00 ainda não

onde decorreu a ceri-

cercas de rosas. A

tínhamos saído do

mónia de lançamento

cama tem um bom

hotel. Estamos em

do livro sobre o

colchão que permitiu

compasso de espera.

Cuando Cubando.

descansar da longa

Não podemos sair de

Ficámos muito bem

etapa de ontem. E o

Menongue. Em Caíla,

instalados no Laúca

bom duche de água

na fronteira com a

Lodge, das Organiza-

bem quentinha aju-

Namíbia, não há

ções Ritz, pertença

dou a retemperar as

combustível. A falta

do general Higino

forças. Só faltou um

de combustível é

Carneiro.

2º cobertor. A tempe-

uma realidade em

ratura baixou aos 9

Angola. Poderíamos

graus e a noite foi

ir atestar os jipes à

Dia 3 – Menongue -

fresca – que nos dei-

Namíbia mas aqui o

Caíla

xou preocupados

problema é a falta de

Que bem dormimos

com as duas noites

divisas. A organiza-

hoje num hotel "a

que vamos passar no

ção do RAID tinha um grande quebracabeças para resolver. Aproveitámos o compasso de espera para um passeio à volta do hotel. Fomos até ao "mercado": três bancas com uma mão cheia de tomate e outra de peixe seco. Ah, e uns montinhos de dentes de alho. Nada mais.

Pouca oferta no mercado de Menongue

No caminho cruzámo


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-nos com rapazinhos a brincar com o que têm à mão: uma vassoura a fazer de volante de carro, outro a puxar um carrinho de madeira sem rodas, outro a empurrar um aro. As meninas que encontrámos esta-

Koisans

vam a trabalhar: na banca do mercado,

bebés às costas e

Em Caiundo passá-

outras estavam a

uma catrefada de

mos pela ponte numa

lavar a louça num

outros pela mão.

curva do rio Cuban-

alguidar com água de

Partimos às 12h00.

do onde só cabe um

natureza duvidosa,

Os primeiros 130 km

carro de cada vez.

outras vinham com

até Caiundo foram

Pouco depois da pon-

as mães com baldes

numa fantástica

te entrámos numa

de água à cabeça e

estrada que nos fez

picada terraplanada

nas mãos. Igualdade

suspeitar que essa

mas cheia de ravina-

de género é algo des-

estrada não terá sido

mentos e rilheiras

conhecido aqui. As

feita por empresas

bem deformados que

mulheres são verda-

chinesas...

tornam a condução

deiras heroínas. Tra-

No caminho vimos,

perigosa mas com

tam dos filhos e da

tal como ontem, car-

paisagens encanta-

casa, vão buscar

caças de tanques –

doras, montes de tér-

água, tratam da hor-

uma imagem que

mitas muito grandes,

ta, recolhem lenha -

fomos sempre vendo

lindas aldeias de tri-

tudo isto com os

ao longo de todas as

bos koisans, o povo

etapas. Não nos

mais antigo do mun-

podemos esquecer

do, que falam aquela

que esta província

fantástica língua dos

do Cuando Cubando

estalidos. Designam-

foi fortemente casti-

se por Koisans dois

gada durante a guer-

grupos étnicos do

ra civil, tendo sido

sudoeste de África:

palco de sangrentas

os san, também

batalhas.

conhecidos por bosquímanos, caçadores


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-coletores, e os khoikhoi, hotentotes para os colonizadores europeus, pastores. Estes dois grupos, que vivem principalmente no deserto do Kalahari, na Namíbia, no Botswana e em Angola, partilham algumas características físicas

Koisans

e linguísticas distintas da maioria banta

nas; seu cromossoma

colonos europeus

que vive no sul de

Y sugere que, do

denominavam os

África: fisicamente

ponto de vista evolu-

khoikhoi hotentotes,

são mais baixos e

cionário, estes povos

que significa "gagos"

esguios que os res-

se encontram muito

em neerlandês por

tantes povos africa-

perto da "raiz"

causa dos estalidos

nos, possuindo uma

da espécie humana.

fazem ao falar. Na

coloração de pele

Pensa-se que a sua

Namíbia a popula-

amarelada e prega

população terá vindo

ção san é numerosa;

epicântica nos olhos,

a ser reduzida devido

a sua língua tem um

como os asiáticos. Às

ao desaparecimento

estatuto oficial, sen-

mulheres sobressai o

da caça, quando os

do utilizada no ensi-

grande desenvolvi-

bantos, agricultores,

no até ao nível uni-

mento posterior das

se instalaram. Os

nádegas, que levou a que uma mulher tivesse sido levada para a Europa no século XIX e usada para exibição em feiras - a famosa Vénus Hotentote. Os koisan possuem o mais elevado grau de diversidade do ADN mitocondrial de todas as populações huma-

Um kimbo (aldeia)


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versitário. Esta picada é na realidade a estrada nacional que liga Caiundo a Savate e depois a Caíla, encontrando-se em construção, ou

Cuvango Lodge

melhor, uma obra praticamente parada

ser feitos às escuras.

mais.

há já largos meses.

Chegámos a Caíla

Amanhã esperam-

Almoçámos umas

onde está a Cuvango

nos 300 km de pica-

sandes nas margens

Lodge, que também

da... arenosa até

do rio Cubango onde

pertence à cadeia

Dirico.

havia uma linda

Ritz. Pensara que

canoa que fez lem-

hoje iria voltar a ficar

brar "Rosinha, minha

em contentores mas

Dia 4 – Caíla - Diri-

canoa" do Erico

esta unidade hotelei-

co

Veríssimo.

ra é lindíssima, che-

Noite bem dormida

gamo-nos a sentir

numa cama king size

já na Namíbia, que

com lençóis muito

está somente a 12

alvos e um edredão

km daqui.

muito quentinho.

Os bungalows são

Ao acordarmos uma

enormes, simples

surpresa pouco sim-

mas decorados com

pática: das torneiras

muito gosto (só a

não saía água! Quan-

casa de banho é que

do já tinha a mala

é feia). E a cama tem

fechada, oiço a água

um edredão muito

a chegar no autoclis-

quentinho, ideal para

mo. Rapidamente me

a noite fria que faz.

despi, meti-me debai-

O sol pôs-se depois

A sala de jantar é

xo do chuveiro e

de se ter transforma-

pouco acolhedora e

tomei um belo

do numa bola de fogo

com luzes néon frias

duche.

bem encarnada.

mas o jantar foi deli-

O trajeto continuou

Estávamos ainda a

cioso: guisado de

na mesma estrada

70 km do destino do

galinha do campo

nacional, ou seja, na

dia que tiveram de

com funge que era de

mesma picada, geral-

comer e chorar por

mente arenosa, mui-

Abastecimento manual dos jipes


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to sinuosa, com formação de combro central, e esburacada – e constantemente atravessada por gado e habitantes das aldeias que a ladeiam. A primeira paragem do dia foi em Cuangar onde houve um

Alemão, uma colónia

homens da polícia

grande massacre de

do Império Alemão:

indígena e numero-

20 homens sob o

sos guerreiros do ex-

comando do capitão

soba Ananga.

de cavalaria de reser-

A operação represen-

va Wilhelm Leh-

tava uma retaliação

mann, um fazendeiro

pela morte de um

da região de Groot-

grupo de alemães em

fontein que fora

Naulila, duas sema-

mobilizado para a

nas antes, e foi o pre-

"Schutztruppe" e era

lúdio para o chama-

o comandante militar

do “Desastre de Nau-

Portugueses perpe-

de Grootfontein,

lila” (18 de dezembro

trado pelos Alemães

coadjuvado por um

de 1914) revés portu-

do Sudoeste Asiático

grupo de 10 soldados

guês que demandaria

que atacaram o terri-

alemães do posto de

o envio de uma força

tório. O território

Kuring-Kuru (hoje

expedicionária portu-

Nkurenkuru), frontei-

guesa sob o comando

ro ao posto portu-

do general António

guês do Cuangar,

Júlio da Costa Perei-

português estava sob o comando do Tenente Ferreira Durão que foi abatido como todos os outros. Na madrugada de 31 de Outubro de 1914 o forte de Cuangar foi atacado por forças da "Schutztruppe” (tropa de proteção) do Sudoeste Africano


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d e

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ra d'Eça para o con-

Cuangar, as forças

trolo da região.

alemãs atacaram as

Surpreendida, mor-

fracas guarnições

reu a maioria da

dos postos portugue-

guarnição portugue-

ses de Bun-

sa do forte de Cuan-

ya, Shambyu, Dirico

gar: dois oficiais (um

e Mucusso. Este

deles o capitão-mor

massacre desenca-

do Baixo-Cubango,

deou uma onda de

tenente Joaquim Fer-

patriotismo no país e

reira Durão), um sar-

a um reforço das

gento, cinco praças europeias e algumas

posições do quadran- Família a regressar da te político que defenmissa

indígenas, e o nego-

diam a entrada de

ciante Nogueira

Portugal na Primeira

reunidas debaixo de

Machado – o famoso

Guerra Mundial.

uma grande árvore,

massacre de Cuan-

Esta zona também

cantando e dançan-

gar. O resto da guar-

sofreu muito mais

do. Era uma missa

nição debandou pelo

tarde a pós a inde-

muito animada. Ao

mato, alcançando,

pendência com a

aproximarmo-nos

após alguns dias, o

invasão das forças

fomos ligo bem rece-

posto de Caiundo.

sul-africanas e

bidos e integrais nas

Não se registaram

durante a guerra

danças.

baixas pelo lado ale-

civil.

À tarde fomos visitar

mão.

Hoje, domingo, foi

a Rainha Mutando

Após o saque e

engraçado ver que as

que nos recebeu com

incêndio do posto do

pessoas andam todas

todas as honras. À

muito bem vestidas,

entrada da sua resi-

verdadeiramente

dência um grupo

"para ver a Deus".

etnográfico cantou e

Cruzávamo-nos com

dançou para nós.

elas, a caminho da

Entrámos para o

igreja. Tal como as

pátio onde havia uma

crianças quando vão

série de cadeiras.

para a escola, tam-

Quando a rainha

bém os adultos leva-

saiu de casa, o grupo

vam as cadeiras à

acompanhou-a can-

cabeça para a igreja.

tando e dançando.

Missa celebrada debaixo de um embondei- Numa aldeia vimos um grupo de pessoas ro

Seguiu-se o beijamão real: todos os


Página 15

C a d e r n o s

miúdos de cabrito, frango guisado, kizaba e, claro, kissângua. Os Nganguela dedicamse à agricultura, à pecuária, à pesca lacusChegada da rainha com a sua corte tre e à apicultura, só foram dominados presentes passaram pelos portugueses a à frente dela, ajoepartir dos anos de lharam-se e deram1920. Divididos em lhe a mão. Depois subgrupos, não têm dos discursos oficiais autoridade centralizada, formando cone da entrega das tudo importantes reiprendas (2 sacos de nos, caracterizados farinha, cadeiras de por serem ginecocraplástico, uma panetas. A ginecocracia la), a Rainha agraderepresenta uma reaceu a visita. E como

Rainha. A picada para Dirico foi sempre paralela ao rio e com progressão em mata com arvoredo ligeiramente

para o Dirico

porque a

Lodge... Que nem

viagem foi

trilhos tinha. E Dança de boas vindas

visitante

da, cabrito guisado,

saímos da embala da

da foi a picada

visitante

funge, abóbora cozi-

Já foi tarde quando

noite. E pior ain-

água ao

çar. Para nós fizeram

"A tartaruga não morde a pata do leopardo" (dito Nganguela, a propósito da necessidade de respeito para com o chefe)

quando caiu a

ção oferecer

dou-nos para almo-

mulheres e ser transmitido por filiação de mulher para mulher. Na literatura oral dos Nganguela, destaca-se o nome da rainha Danda Candundo e a existência de uma organização social ginecocrática.

bonito! O pior foi

nossa tradi-

vem com sede" convi-

V i a g e m

fechado. Muito

“manda a

longa e o

d e

que era a subir durante 4 km em

leza matriarcal ou governo exercido por mulheres, em que o trono ou o poder deve teoricamente pertencer apenas às

areia! O lodge era... um conjunto de grandes tendas militares montadas junto ao


Página 16

C a d e r n o s

d e

V i a g e m

nas margens do rio

meio da manhã está-

Cuíto. Ainda bem

vamos em Mucusso,

que não havia elefan-

na fronteira com a

tes aqui pois estaría-

Namíbia. As picadas

mos com problemas:

fizeram-se bem,

o chão estava coberto

tinham areais de

de frutos a fermentar

quando em quando

e os elefantes são

mas muito estradão.

doidos por esta fruta

A passagem da fron-

fermentada.

teira foi demorada

Acordámos bem cedo

apesar de o Governo

e vimos o sol a nas-

Provincial ter prome-

rio Cuíto - com muito

cer sobre o rio Cuíto.

tido publicamente

crocodilo - com uma

Um momento mági-

toda a ajuda. Na

cama de campanha

co. O céu

feita a rigor com len-

começa a

çóis alvos é um edre-

ficar ala-

dão muito quentinho.

ranjado,

De resto nada mais

sobre o rio

havia na tenda.

levanta-se

Um contentor com

um leve

uma sanita e um

véu de

poliban eram as ins-

nevoeiro e

talações sanitárias.

aos pou-

Alguns entre dos rai-

cos a luz vai surgin-

fronteira angolana a

distas tiveram medo

do. Sentimos uma

morosidade foi devi-

dos jacarés e preferi-

forte ligação a todo o

da ao tratamento

ram dormir no carro.

universo.

manual de todos os

Saímos às 7h00 e a

documentos - não

Dirico Lodge

Nascer do sol no rio Cuíto

esquecer que somos Dia 5 –

uma caravana com-

Dirico -

posta por 18 portu-

Kongola

gueses, 13 angola-

Dormimos

nos, 4 luso-

numa ten-

angolanos e 1 ale-

da debai-

mão - e da emissão

xo de uma

de 3 salvo-condutos

árvore de

para os angolanos

amarula

que não tinham pasFronteira do Mucusso

saporte consigo.


Página 17

C a d e r n o s

d e

V i a g e m

bia seria simples.

Angola se diz proble-

Qual quê! Começa-

ma.

ram por exigir o

Os primeiros 25 km

carimbo de saída de

em território nami-

Angola, que por

biano são de estra-

razões práticas e pre-

dão mas depois entra

viamente combina-

-se numa estrada

das com o Governo

asfaltada em ótimas

Provincial, não tinha

condições. Uma fron-

sido apostado.

teira é uma linha

Para os habitantes

Depois quiseram que

imaginária e no

da zona fronteiriça

os passaportes fos-

entanto nota-se logo

não há problemas

sem apresentados

que estamos noutro

burocráticos. A dada

pessoalmente. Lá

país com um nível de

altura chegou, vinda

fomos um a um ao

desenvolvimento

do lado namibiano,

guichet mostrarmo-

totalmente diferente.

uma carroça puxada

nos. Depois exigiram

Pernoita no Mazabala

por uma parelha de

que a nossa saída

Lodge, uma unidade

bois. O homem sim-

daqui a dois dias fos-

hoteleira lindíssima.

plesmente abriu o

se feito por este mes-

O começo foi logo

portão e a família

mo posto fronteiriço.

mágico. Deixámos os

passou tranquila-

Ora, o nosso plano é

jipes no parque de

mente sem apresen-

reentrarmos em

estacionamento e um

tar documentos

Angola por Kongola.

barco trouxe-nos ao

nenhuns. Interessan-

Felizmente está con-

aldeamento por

te ver que todos

nosco na caravana o

canais do rio Cuan-

tinham um candjaui-

Dr. Gime, represen-

do. Ao longo do per-

ti, um porrinho com

tante do Governo

curso fomo-nos cru-

machado, útil para

Provincial, e que está

zando com crocodi-

se defenderem dos

a tentar resolver essa

los, lindos pássaros

animais selvagens

maka, como em

que sobrevoam a

com que eventualmente se cruzem e para cortar a lenha, essencial para cozinharem e para se aquecerem. Pensávamos nós que a entrada na Namí-


Página 18

C a d e r n o s

d e

V i a g e m

uma casa grande,

pessoal, multifun-

totalmente aberta e

ções, parecem ser

ligada a uma torre de

estudantes universi-

observação de 360

tários em férias:

graus. À sua volta

todos novos, simpáti-

estão dispostos os

cos e irradiação posi-

bungalows, casinhas

tiva.

muito simples mas

O jantar foi servido

muito bem integra-

na casa grande e foi

das na paisagem. A

delicioso: creme ave-

parte lateral é toda

ludado de cogumelos,

rasgada mas sem

bife estrogonofe com

superfície da água e

vidros, somente com

espinafre, abóbora

grupos de hipopóta-

rede e cortinas do

com canela e arroz e,

Pôr-do-sol a caminho de Mazambala

lado de

à sobremesa, bolo

dentro. O

ensopado em calda

teto é de

com pêssego. E para

colmo. Sen-

terminar a noite uma

timo-nos

chávena de chá roi-

bem na

boos.

"nossa" casa dos próximos

Dia 6 – Kongola

dois dias.

Dormimos lindamen-

O aldea-

te e sem frio, apesar

mento per-

de a nossa casinha

mos, que mergulha-

tence a um america-

não ter vidros nas

vam quando o barco

no de Washington e o

janelas.

passava para voltar à superfície assim que passávamos - todas estas bucólicas cenas envoltas na luz encarniçada do sol poente. O aldeamento tem no centro


Página 19

C a d e r n o s

d e

V i a g e m

O dia foi de descan-

tinham comido.

as três riscas no

so. Acordámos ao

Como no dia seguinte

rabo), leches, kudus,

que pensávamos ser

iríamos sair muito

babuínos, águias

8h30. Só que na rea-

cedo, fomos a Kongo-

africanas e cegonhas

lidade já eram 9h30.

la atestar os carros,

pretas. Até que des-

O telemóvel tinha a

limpar os filtros do

cobrimos nas mar-

hora angolana e não

motor e do ar condi-

gens do rio um jacaré

mudou para a hora

cionado. O pobre

enorme, gozando o

namibiana que é a

Mateus, o mecânico

sol. E na água mui-

centro-

da Robert Hudson,

tos hipopótamos.

africana. Corremos

limpou 13 x 2 filtros

Continuámos e de

para o pequeno-

e ficou branco,

repente vimos ao lon-

almoço onde já quase

coberto de pó!

ge, junto à água uma

não havia ninguém.

Depois de almoço

manada de elefantes.

Um grupo tinha logo

fomos para as prada-

Fomos para lá mas já

de manhã fazer um

rias ver animais.

tinham saído. Esta-

passeio no rio. E os

Começámos por ver

vam entre as árvores

que ficaram já

muitas impalas (com

e mal se viam. Conti-


Página 20

C a d e r n o s

nuámos caminho e

pelos arbus-

descobrimos nova

tos. Vai ser

manada brincando

uma jornada

na areia, levantando

difícil.

d e

V i a g e m

areia com a tromba. Lentamente dirigiram -se para o lago onde

Dia 7 – Kon-

foram beber água - e

gola -

nós estávamos no

Rivungo

areal a 100 metros!

Hoje previa-

Regressámos ao

se uma eta-

aldeamento, com um

pa dura.

céu totalmente ala-

Despertar às

ranjado que parecia

4. Pequeno-

estar em fogo.

almoço às

Ao jantar, o pessoal

4.30. Partida

da cozinha chegou à

às 5 - escol-

sala de jantar com

tado pela

um bolo e a cantar os

polícia nami-

parabéns a uma

biana.

turista alemã. E

Chegámos à

depois de dar o bolo

fronteira às

ali ficou a cantar e a

5.50. A

dançar músicas afri-

guarda fron-

canas - jantar com

teiriça nami-

animação.

biana ainda dormia.

A polícia angolana

Amanhã o despertar

Seguimos e chegá-

sugeriu acompanhar-

é às 4h. Teremos de

mos ao Bico, a fron-

nos pois poderia ser

sair muito cedo por-

teira angolana – don-

que as picadas esti-

que vamos perder

de só saímos três

vessem intransitáveis

muito tempo na pas-

horas depois, pois

- mas para isso tería-

sagem das fronteiras.

fomos infirmados de

mos de encher o

E teremos 270 km de

que afinal não havia

depósito do jipe que

picada muito fechada

combustível em

não tinha combustí-

com areia e "tree sto-

Rivungo. Dois carros

vel já há alguns

nes", árvores corta-

voltaram a Kongola,

dias...

das dos quais só res-

na Namíbia, a 30 km

Tínhamos ainda a

tam os tocos, escon-

da fronteira, para

percorrer 261 km da

didos pela areia e

encher 26 jerricans

fronteira ao Rivungo

com gasóleo.

- em picadas areno-

Fronteira de Bico


Página 21

C a d e r n o s

d e

V i a g e m

guarda florestal

da consta, estava

decorado com crâ-

enterrado um con-

nios de elefante, de

tentor que servia de

búfalo, de olongue.

bunker.

Os trilhos eram mui-

Seguimos viagem e

to apertados. Demo-

em breve o sol come-

rámos 50 minutos para fazer 17 km. A paisagem era porém de grande beleza. Chegámos à Jamba (a 87 km da fronteira) às 13h00. Tanto ouvimos falar da Jamba durante a guerra civil de Ango-

çou a ficar uma bola

la! Foi aqui, no nada,

de fogo. A noite rapi-

que Jonas Savimbi

damente caiu e os

se refugiou à volta de

problemas começa-

quem se foi formando

ram. No mufito

sas no meio de matas

a população. Aqui

(trilho pela mata/

muito fechadas, que

recebia as delegações

floresta) a picada era

alternam com gran-

de políticos pró-

muito fechada e

des e amplas chanas

UNITA e a comunica-

cheia de "tree sto-

(pradarias).

ção social estrangeira

nes" (tocos de árvores

Alguns quilómetros

e fazia a sua propa-

aguaçados). Apesar

depois da fronteira

ganda política.

de irmos a uma velo-

passámos por um

Demos uma volta

cidade muito baixa

posto de controlo da

pela casa verde onde

(15-20 km/ hora) e

Savimbi viveu, da

com muita atenção

qual só restam agora

ao trilho batemos

Mulher a preparar o lume para fazer funge

as paredes, vimos a locomotiva que ele mandou fazer e colocar na rotunda em homenagem ao pai. Ao lado da casa havia um grande Casa de Jonas Savimbi na Jamba

buraco onde, segun-

Locomotiva Homenagem ao pai de Savimbi


Página 22

C a d e r n o s

d e

V i a g e m

guincho a que se

dão só com as nossas

ligaram duas cintas

lanternas de cabeça.

que novamente o fan-

Depois de arranjar-

tástico mecânico

mos a ponte conse-

prendeu ao nosso

guimos passar o rio.

jipe e nos puxou.

Chegámos ao Rivun-

Mas esta não foi o

go à 1.30 da manhã.

último obstáculo do

Apesar de quase não

dia. Mais tarde para

terem meios, as

atravessarmos um

autoridades munici-

rio havia uma ponte

pais disponibilizam-

num toco que nos fez

em condições muito

nos colchões que

derrapar ligeiramen-

precárias: umas

espalharam por dois

te. A parte lateral

vigas paralelas em

edifícios municipais.

direita superior do

cima das quais havia

jipe ficou rasgada, a

uns troncos perpen-

jante toda torta e o

diculares. Mais uma

Dia 8 – Rivungo –

pneu furado. Fomos

vez, passaram dez

Mavinga

os primeiros a furar

jipes sem problemas.

Se ontem a etapa foi

um pneu! Mas não

Quando foi a nossa

dura, a de hoje não

nos voltou a aconte-

vez de entrar na pon-

foi menos.

cer. Rapidamente o

te, os troncos per-

A noite foi curta mas

mecânico da Robert

pendiculares já

compensada por um

Hudson mudou o

tinham perdido as

duche de água fria

pneu.

cunhas que os segu-

que nos revigorou.

Passado algum tem-

ravam e nós resvalá-

Depois de um peque-

po, a caravana che-

mos. Recuámos e

no-almoço frugal de

gou a um charco.

começámos a procu-

pão, muito fofinho,

Dez jipes passaram

rar paus na escuri-

"com dentes" e uma

Tree stone

sem problemas mas

chávena de leite em

foram revolvendo o

pó Nido com Nescafé

fundo. Quando está-

fomos apreciar a

vamos precisamente

grande obra munici-

no meio da água,

pal do canal do rio

atascámos a aproxi-

Cuando que vai per-

madamente 30 m de

mitir chegar-se à

cada uma das mar-

Zâmbia de barco em

gens. Felizmente o

15 minutos em vez

jipe de trás tinha um

Colchões para os raidistas

das atuais 3 horas por estrada.


Página 23

C a d e r n o s

d e

V i a g e m

são Católica “Santa

agricultura, aumen-

Cruz” em 1940; face

tando assim a fome

à dificuldade de pro-

das populações.

nunciar Muvungu-

Até 2002 este muni-

vungu o termo foi

cípio não tinha

aportuguesado e pas-

nenhuma estrutura

sou para Rivungo.

representante do

Este município fica

estado central. Desde

no extremo leste da

então foram cons-

província, a 600 km

truídas escolas, rede

da capital da provín-

de águas, um parque

cia, Menongue. 400

infantil, terraplana-

km de picadas areno-

gens, melhoria das

sas são as únicas

vias terrestres, ante-

vias terrestres para

nas da RNA, emitin-

A passagem do RAID

aqui se chegar - esta-

do em FM que che-

por um município

mos mesmo no fim

gam a 90% da popu-

que fica no fim do

do mundo.

lação.

mundo e aonde nun-

A população do

O município tem par-

ca vem ninguém

município é consti-

ticipado ativamente

merece um ato sole-

tuída essencialmente

no projeto KaZa, no

ne. No salão reuniões

pela etnia bantu. A

futuro o maior polo

do município o Admi-

etnia umbundu que

de atrações turísticas

nistrador municipal

também se encontra

do mundo. Há porém

adjunto deu-nos as

aqui não é

boas vindas e, resu-

autóctone, ten-

midamente, apresen-

do vindo com a

tou-nos a realidade

guerra.

local.

O clima é

Explicou-nos a topo-

quente e as

nímia da cidade.

terras são boas

Rivungo vem do

para a agricul-

nome de uma árvore,

tura. No entan-

muvunguvungo, que

to, as altera-

só existe nesta

ções climáticas

região. Os colonos

têm sentido

portugueses chega-

aqui: a falta de

ram em 1934 e os

chuva tem pre-

missionários da Mis-

judicado a

Entrega de ratos da Lufthansa na escola

Canal do rio em Rivungo


Página 24

C a d e r n o s

d e

V i a g e m

camente. Na prática

jipes se ouve um

não foi bem assim. A

pedido de socorro.

dada altura, o guia

Uma senhora tinha

adormeceu e deixou

desmaiado. Uma rai-

passar o desvio que

dista médica entrou

deveríamos ter toma-

no carro e, como a

do…

picada estava toma-

A 150 km de Mavin-

da pelos jipes, meteu

ga, ou seja, a somen-

-se a corte mato, não

te 60 km de Rivungo,

viu uma vala e caiu

já tínhamos conduzi-

lá dentro. Seguiu a

muitas dificuldades

do 10 horas. A noite

correr pelo capim

como pior exemplo, a

caiu e ainda foi mais

fora para acorrer

matança indiscrimi-

difícil encontrar a

quem estava doente.

nada de animais por

picada certa. A dada

Rapidamente fez o

caçadores furtivos.

altura o guia levou-

diagnóstico: gas-

No que respeita a flo-

nos pelo meio do

troenterite, o mal dos

ra, o município tem

mato e em direção a

viajantes.

um grande leque de

norte, quando Mavin-

Enquanto tentava

plantas medicinais,

ga estava a Oeste.

estabilizar a doente,

em especial no par-

A caravana partiu-se

o mecânico tirava o

que natural do Luia-

havendo alguns jipes

jipe da vala com o

na.

perdidos.

guincho.

A etapa de hoje

A partir de aí foi uma

Estávamos a 30 km

teria menos quiló-

sucessão de proble-

de Mavinga e era 1

metros do que a de

mas. Um jipe furou

hora da manhã. Era

ontem mas por mui-

um pneu. Este esta-

preciso avisar o

tas picadas estarem

va a ser mudado

Administrador que

diferentes e como

quando de um dos

fosse preparado um

Mufito

ontem o diretor do RAID andou por muitas picadas erradas, o Administrador Adjunto do Rivungo disponibilizou-nos um guia que teoricamente conheceria bem o caminho para Mavinga. Sim, teori-


Página 25

C a d e r n o s

d e

V i a g e m

mirmos. Deitámo-nos

delas pretendem lim-

tarde e a más horas.

par os terrenos de cultivo ou criar pastos para os animais, mas

Dia 9 – Mavinga -

atualmente sabe-se

Menongue

que estas queimadas

Deitámo-nos às 4 e o

são más para o meio

despertador tocou às

ambiente e que retar-

5.45. Às 6h deveria

dam o desenvolvi-

chegar o camião do

mento das culturas

combustível que só

semeadas, prejudi-

chegou às 7h.

cando os resultados

quarto com um míni-

O pequeno-almoço

das colheitas.

mo de condições, i.e.,

foi um verdadeiro

O vice-decano da

casa de banho, para

mata-bicho: sopa de

Faculdade de Ciên-

a doente. Só que ali

feijão com carne e

cias Agrárias do

não havia rede!

couves! Deliciosa!

Huambo (FCA),

Chegámos às 2h a

Saímos às 8.20! Meia

Manuel Ginhas, refe-

Mavinga. Mortos. O

hora depois, já na

riu que as desvanta-

Administrador estava

picada, o 1º furo. Um

gens das queimadas

à nossa espera e todo

jipe passou por uma

são superiores em

o programa planeado

“tree stone” e rasgou-

relação às vantagens,

foi cumprido: discur-

lhe o pneu. Todos

tendo em conta que

sos, jantar. O Muni-

ajudaram a mudar e

no solo existem

cípio disponibilizou-

20 minutos depois

microrganismos que

nos uma série de

estávamos a rolar de

morrem com o fog,

contentores para dor-

novo.

além de diminuírem a

Grande parte da eta-

humidade do solo e a

pa da manhã foi feita

matéria orgânica.

rodeando uma bela

Além de diminuir os

chana, uma planície

processos de oxida-

a perder de vista.

ção e transformação

Aqui e além, queima-

dos nutrientes nor-

das mesmo junto à

mais, pela diminuição

picada. A queimada é

da vida microbiana, o

uma prática comum

fogo também destrói

entre os agricultores

sementes, plantas

africanos na época do

jovens, raízes, elimi-

cacimbo, que através

na vegetais, que

Chegada a Mavinga às 2 h da manhã

Abastecimento manual de combustível


Página 26

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d e

V i a g e m

água, levando os

africanos (a infeliz-

nutrientes consigo e

mente famosa bata-

enfraquece o solo.

lha do Cuíto Cuana-

Até mesmo as autori-

vale) e depois em

dades tradicionais já

1994 quando as tro-

se aperceberam quão

pas do MPLA quise-

nociva é esta prática

ram obrigar a UNITA

milenar. Em declara-

para se sentarem em

ções à ANGOP, o

Bicesse, à mesa das

soba António Fran-

conversações, como

cisco, do bairro da

nos resumiu a situa-

geralmente não têm

Mucasa de Cima,

ção o General

possibilidade de

lamentou essa práti-

“Lanucha”, que aqui

sobrevivência na

ca realizada, nalguns

combateu e que hoje

área, a não ser por

casos, na calada da

é um grande apoian-

reintrodução poste-

noite, é provavelmen-

te do RAID do Kwan-

rior, através do ser

te destinada a facili-

za Sul.

humano, animais ou

tar a caça furtiva de

A progressão da nos-

agentes físicos.

animais.

sa caravana era mui-

Queimada

Com sucessivas queimadas, a matéria orgânica é destruída; a microfauna, fundamental para a decomposição de substâncias (detritos) orgânicas, que posteriormente são transformados em adubos naturais, e a microflora são eliminadas no local onde a queima-

Tanque abandonado

da é feita. Esta situação faz com que o

Toda esta região foi

to lenta a 10 km/

solo fique descoberto

muito castigada após

hora por causa dos

e provoca erosão, que

a independência, pri-

tocos nos trilhos dos

facilita a lavagem dos

meiro logo em

mufitos ou por causa

solos através da velo-

novembro/dezembro

da muita areia nos

cidade da corrente da

de 1975 com a inva-

trilhos da chana.

são das tropas sul-

Ao km 103, furaram-


Página 27

C a d e r n o s

d e

V i a g e m

Mufito

se/ rasgaram-se 4

Acabaram-se os

À 00.45 quando está-

pneus. Grande perda

pneus! Estávamos no

vamos quase a che-

de tempo para os

meio do nada com

gar a Cuíto Cuanava-

mudar. Eram 16h15

pneus furados e sem

le, furou um pneu a

e ainda só tínhamos

pneus sobressalen-

um dos jipes! Já não

feito 1/3 da etapa do

tes! O mecânico con-

havia pneus sobres-

dia! Mais uma noite

seguiu reparar um

salentes. Será que

que prometia longa

dos pneus furados e

estes raidistas teriam

com um problema

pô-lo a rodar.

de passar a noite no

adicional: a falta de

Às 19h decidiu-se

meio do nada? Mais

pneus. Só tínhamos

partir a coluna em

uma vez o mecânico

mais três pneus

dois: uma parte que

mostrou a sua habili-

sobressalentes sem

seguiria rapidamente

dade, tendo conse-

furos!

para Cuíto Cuanava-

guido pôr o pneu uti-

Assim que a coluna

le e Menongue e

lizável com um

se pôs em marcha,

outra que seguiria no

“chourição” a tapar o

mais um jipe furou

seu passo de caracol.

buraco e ajeitando a

um pneu. E 2 km

Estávamos a 165 km

jante à martelada.

adiante outro furo. E

de Menongue. Ainda

Faltava-nos ainda (!)

1 km depois mais

teríamos umas 8 h

150 km de estradão

dois furos.

de caminho!

até Menongue. Feliz-


Página 28

C a d e r n o s

d e

V i a g e m

mente até lá já não

buracões de quando

cereais, sendo tam-

havia picada difícil,

em quando - e chegá-

bém conhecida pelos

só estradão. O cami-

mos à antiga Nova

seus jardins, parques

nho fez-se silenciosa-

Lisboa à hora de jan-

e cultivo de flores,

mente, somente

tar.

das quais se desta-

acompanhados por

cam mais de 200

uma enorme lua

Dia 11 – Huambo -

variedades de dálias.

cheia, que brilhava

Conda

A praça Agostinho

com todo o seu

Depois do pequeno-

Neto está linda, bem

esplendor para dar

almoço fizemos uma

recuperada e muito

ânimo aos que esta-

breve visita à cidade

arranja. Ao centro a

vam agora ao volan-

de Huambo, passan-

estátua do grande

te. Às 5 h da manhã

do pelos principais

obreiro da cidade,

chegámos finalmente

bairros do tempo

Norton de Matos, foi

ao hotel. 21 horas

colonial. Huambo

substituída por uma

para 365 km!

esteve quase para ser

estátua de Agostinho

a capital da província

Neto sentado a escre-

portuguesa de Ango-

ver. Não consegui-

Dia 10 – Menongue -

la. Estando situada

mos ir ver a estátua

Huambo

num planalto com

do general porque a

Com a chegada tar-

um clima muito sua-

rua de acesso ao

dia a Menongue e

ve, foi em tempos

local atual estava

com todos os partici-

chamada “o celeiro

vedada por causa de

pantes mais do que

de Angola” devido às

uma corrida de

exaustos, o programa

grandes culturas de

karts.

da etapa 10 teve de

milho, arroz e outros

Perto do hotel, no

ser alterado. Decidiu-se partir somente depois de almoço e ir diretamente para Huambo, sem passarmos pela nascente do rio Kwanza. Saímos às 14h30 de Menongue. A estrada para o Huambo está boa, toda alcatroada - claro com buracos e

Correios do Huambo


Página 29

C a d e r n o s

Antigo cinema Ruacaná

d e

V i a g e m

Casa bombardeada durante a guerra, ainda não recuperada

quarteirão da Avenida da Independência

nacional (claro com

guês. A curto prazo,

com a Rua da Gan-

os seus buracos de

prevê-se que talvez

da, estão os edifícios

quando em quando),

as águas venham a

Ruacaná

tendo passado pelo

ser exploradas para a

York. O Ruacaná, o

grandioso

produção

antigo cinema, reflete

Lubiri,

a

monólito

e

Nova

arquitetura

da

morro

um enorme bastante

de

água

mineral e para a prática do termalismo.

primeira

peculiar e localmente

metade do século XX

conhecido localmente

e que se caracteriza

por

pelo rigor e singeleza

leão". Junto ao morro

onde entrámos numa

da sua geometria. A

localizam-se as nas-

picada, em muito

loja Nova York é um

centes de água quen-

mau estado

bom exemplo de uma

te

que

A província do Kwan-

corrente com origens

eram termas no tem-

za Sul é extraordina-

no

po

riamente bela com

cidade

da

Brutalismo

(movimento no,

entre

"unha

do

do

Hama,

colonial

portu-

Rapidamente chegámos ao cruzamento de Cassongue

moder1950

e

1960) e evidencia-se pela

estrutura

em

betão, utilizada como elemento

formal

e

decorativo. Seguimos viagem por uma ótima estrada

Morros do Kwanza Sul


Página 30

C a d e r n o s

d e

V i a g e m

passarmos o rio Iúri,

fazenda após a inde-

aproximámo-nos da

pendência.

Fazenda Rio Iúri que se dedica à agricultura e ao turismo. A base da exploração

Dia 12 – Conda –

económica é o café

Porto Amboim

que é vendido à Agro-

Logo de manhã

nabeiro. Por causa

começaram a chegar

do café foram impor-

à fazenda mulheres

tadas para este terre-

com as filhas, com

no gravílias, árvores

cestos de milho bran-

uma vegetação verde,

que servem para

co já descascado à

muito luxuriante,

fazer sombra aos

cabeça. O milho é

com paisagens des-

cafeeiros que de

lavado em tanques e

lumbrantes em

outra maneira não

depois posto a secar

vários tons de verde,

sobreviveriam ao sol

ao sol.

é uma profusão de

intenso.

O pequeno-almoço

morros de basalto

A caravana foi recebi-

foi de reis e rainhas.

enormes com forma-

da calorosamente na

Muita fruta tropical,

ções muito interes-

Fazenda Rio Iúri pelo

bolo de cenoura e de

santes. Por estarmos

seu proprietário, o Sr

chocolate, tudo pre-

na época da cacimba,

Mario Santos, e pela

parado com muito

estes morros estavam

sua mulher, a Sra.

amor e carinho. O

envoltos num véu de

D. Odete. No tempo

chá de caxina, ou de

nevoeiro que lhes

colonial, a fazenda

príncipe, era delicio-

davam uma grande

pertencia ao tio do

so.

magia.

Sr. Santos que vivia

Antes de partirmos a

Entrada da fazenda

Ao

da moagem de fuba. O tio saiu da

Tratando do milho


Página 31

C a d e r n o s

Um banho nas fontes de águas quentes

d e

V i a g e m

Segundo os locais, a

bidos por Maria Mon-

água tem proprieda-

teiro José, adminis-

des benéficas para a

tradora do municí-

pele deixando-a mui-

pio, no largo princi-

to suave.

pal onde se encontra

Seguimos caminho

o edifício da adminis-

para a Gabela, uma

tração, a igreja cató-

pequena cidade jar-

lica construída possi-

dim no tempo colo-

velmente nos anos

nial. Tem ainda mui-

1970 e um parque

tas casas coloniais. A

infantil, ainda do

praça central com o

tempo dos Portugue-

Sra. D. Odete distri-

ses.

buiu pelas senhoras

Segundo os dados

uma rosa de porcela-

existentes, os atuais

na. Realmente uma

habitantes vieram de

simpatia.

Calulo (atual municí-

A poucos quilómetros

pio do Libolo) de um

da fazenda fizemos

grupo de emigrantes

um desvio para as

chefiados pelos sobas

nascentes de água

Kinhama Ya Vunge e

quente da Tocota. As

Kilenda Ya Vunge

águas saem do solo a

que atravessaram o Gabela

uma temperatura alta. Pode mergu-

rio Nhia, fixando-se nas montanhas do

lhar-se no tanque

seu jardim está rela-

território que já era

para onde a água cai

tivamente recupera-

habitado.

- sentimo-nos num

da.

Viviam da agricultu-

jacuzzi sem bolinhas.

O município vizinho

ra, da caça, da pesca

da Kilenda fica

e da criação de ami-

somente a 30 km

mais de pequeno por-

mas são precisas

te.

duas horas para lá

Kilenda foi elevada a

chegar. Não há estra-

concelho em 1965. O

da nem alcatroada

município tem atual-

nem estradão somen-

mente 94197 habi-

te uma picada cheia

tantes. O esforço na

de veios largos e pro-

educação tem sido

fundos. Fomos rece-

grande e o município

Vendedora de amendoins cozidos


Página 32

C a d e r n o s

Igreja católica da Kilenda

d e

V i a g e m

educação social.

no município) e das

Segundo um res-

autoridades tradicio-

ponsável pelo

nais locais.

município, o

A nível de saúde o

absentismo esco-

município tem 1 hos-

lar é ainda um

pital e 12 centros de

problema. As

saúde com um enfer-

crianças ajudam

meiro por posto. Não

muito em casa.

é suficiente, mas é o

Por exemplo, no

possível, segundo

tempo das quei-

informou a adminis-

tem atualmente 42

madas, as crianças

tradora.

escolas, das quais

ficam encarregues de

Já há água potável

são 20 definitivas e

apanhar os ratos que

na maioria das locali-

as restantes provisó-

fogem do fogo (receita

dades - só que, com

rias, construídas em

no final do texto).

a escassez de com-

colaboração com os

Noutras épocas, as

bustível os geradores

encarregados de edu-

crianças são envia-

não funcionam há

cação: os pais cons-

das para o mato para

quase dois anos. E se

troem a cubata com

apanhar caracóis e

os geradores não

adobe e o município

outros animais. Para

produzem energia,

fornece as carteiras.

efetuar estas ativida-

as bombas da água

Problemas com as

des, as crianças têm

não trabalham. Há

crianças que ficam

de faltar à escola. O

alguns anos foi cons-

sozinhas quando as

município tenta edu-

truída uma potente

mães vão trabalhar.

car os pais para dei-

central de bombagem

Foi pedida ajuda ao

xarem as crianças ir

e tratamento de

município de Alma-

à escola, contando

água, mas que está

da. Projeto prévio

para tal com o apoio

parada por falta de

(arquitetura e orga-

das igrejas (há

energia.

nograma) para uma

18 confissões cristãs

Há grandes proble-

creche e jardim infantil é uma sala de reuniões separada) para 200-250 crianças. O projeto vai agora ser posto à consideração do conselho

Parque infantil da Kilenda


Página 33

C a d e r n o s

mas de acesso, sendo

kizaba, banana e

as estradas muito

batata doce cozidas.

más. De Gabela a

Foi a cozinheira do

Kilenda são somente

Centro Turístico que

30 km mas que

me deu a receita de

demoraram 2 horas a

rato assado: passa-se

ser percorridos devi-

o rato rapidamente

do aos longos e pro-

pelas brasas para

fundos veios na pica-

sair o pelo. Abre-se

da. O executivo cen-

ao meio, retiram-se

d e

V i a g e m

tral pro-

as vísceras

meteu a

e lava-se

asfalta-

bem. Ao

20-30 minutos.

gem ain-

lume

À tarde passámos

da este

temos uma

ainda pelas cachoei-

ano - a

panela

ras do Binga, onde o

ver se

com água

rio Keve se despenha

aconte-

a ferver.

alguns metros. Este

ce.

Deitamos

rio acompanhou-nos

A crise

dentro o

ao longo do dia.

fez diver-

rato e dei-

Entre Conda e Gabe-

sificar a

xamos

la, passámos pelas

economia

cozer

antigas Seis Pontes

do país, e o município está a apostar

alguns minutos. Retira-se, escorre-se

sobre o rio Keve que foram destruídas em

muito na agricultura

e leva-se ao grelha-

novembro de 1975

e no turismo, tendo

dor. Grelhe durante

para travar o avanço

já incentivado a fun-

das forças sul-

dação do Centro

africanas quando

Turístico do Mugige

estas invadiram

junto ao rio homóni-

Angola.

mo, onde almoçá-

Ao início da noite

mos.

chegámos a Porto

O almoço foi ofereci-

Amboim onde jantá-

do pela Administra-

mos ao som do

dora do Município:

marulhar da rebenta-

caldeirada de cabrito,

ção, no restaurante

carapau grelhado e

O Farol, mesmo em

galinha de cabidela,

cima da praia. Foi


Página 34

C a d e r n o s

d e

V i a g e m

Foz do Kwanza.

tória de Angola e de

Em Luanda ainda

exemplares da fauna

demos uma volta

e flora nativos.

pela cidade. A forta-

Em 1961 o acervo do

leza está totalmente

museu foi retirado

diferente com uma

por completo e a for-

grande instalação

taleza voltou a assu-

(estrela e murais) em

mir funções milita-

frente. Erguida por

res, nela tendo ficado

determinação do pri-

sediado o Comando

meiro governador,

das Forças Militares

Paulo Dias de Novais,

Portuguesas. Após a

servida muamba de

em 1575, é a primei-

Independência, em

ginguba, muito idên-

ra estrutura defensi-

1978 as dependên-

tica ao caril de amen-

va construída em

cias da fortaleza pas-

doim moçambicano,

Angola.

saram a albergar o

e calulu. Muito bom.

No século XX, com a

Museu das Forças

extinção do Depósito

Armadas.

de Degredados, a for-

Seguimos para o

taleza foi classificada

Palácio de Ferro

Dia 13 – Porto

como Monumento

Palácio de Ferro, pro-

Amboim – Luanda –

Nacional por Decreto

jetado pelo arquiteto

Lisboa

Provincial de 2 de

Gustav Eiffel, cujo

Último dia. De

Dezembro do mesmo

trabalho também se

manhã passeio por

ano. Nela veio a ins-

apresenta em outras

Porto Amboim.

talar-se, no ano

cidades africanas. A

Depois saída para

seguinte, o Museu de

história do edifício

Luanda, com para-

Angola, criado pela

está envolta em mis-

gem para almoço na

portaria nº 6, tendo

tério, já que não exis-

Porto Amboim

Entrada da fortaleza

sido feitas as

tem registos da sua

necessárias

origem. Acredita-se

obras de

que a estrutura em

adaptação,

ferro forjado tenha

como a colo-

sido construída na

cação de pai-

década de 1880 ou

néis de azule-

90 em França, como

jos numa

pavilhão para uma

casamata com

exposição, e poste-

cenas da his-

riormente desmonta-


Página 35

C a d e r n o s

d e

V i a g e m

do e transportado de

mo acabou

barco com destino

por ser

provável a Madagás-

desembarca-

car.

do em Luan-

Existe alguma espe-

da e vendido

culação sob a forma

em hasta

como chegou a Ango-

pública, ten-

la. Segundo algumas

do sido arre-

fontes, o navio que o

matado pela

transportava acabou

Companhia

por ser desviado da

Comercial de

sua rota pela Corren-

Angola que,

te de Benguela, nau-

de facto,

fragando perto da

adquiriu o

Costa dos Esqueletos

Palácio de ferro nos

rido por Sindika

em território angola-

finais do século XIX,

Dokolo, o marido de

no. Outras fontes

princípios do século

Isabel dos Santos.

indicam que o mes-

XX. Foi agora adqui-

Pôr-do-sol visto da fortaleza

Monumento aos que morreram

Palácio de Ferro emindependência Luanda pela liberdade e pela


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