Outubro de 2005 Número 21
Cadernos de Viagem
Pinceladas do Japão
Nesta edição: Tóquio
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Nikko
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Himeji
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Hiroshima
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Quioto
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Nara
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Aichi e a Expo 2005
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Kanazawa
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Nagoia
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Como nos devemos comportar? • Descalce sempre os sapatos antes de entrar num santuário, num templo ou numa casa particular. Também o tem de fazer nos ryokans, nos castelos, nalguns museus e nalguns hotéis. • Não se assoe em público ou durante uma refeição. • Não espete os pauzinhos na taça do arroz. É assim que se fazem os donativos para os mortos nos altares domésticos budistas • Não abuse do molho de soja – é um insulto para o cozinheiro. • Antes de ir a um banho comum japonês, deverá tomar um duche.
Os mitos que vão passando boca a boca acerca do Japão são inúmeros e fazem-nos ficar algo ansiosos no advento duma viagem ao Japão. O país e os seus habitante não são propriamente um bicho de sete cabeças, mas… Há que desfazer esses mitos e fazer com que os estrangeiros vejam o país como ele é. Em lugar cimeiro no ranking dos mitos vêm os preços. A quem quer que se diga que se esteve no Japão, o primeiro comentário que se ouve é “Lá é tudo caríssimo, não é?”. Toda a gente conhece alguém que já lá esteve e que pagou balúrdios por uma bica, mal comeu porque os restaurantes eram impraticáveis, etc. Estivemos no Japão quinze dias com toda a família, quer dizer, cinco pessoas. E, para lá dos hotéis que são bastante mais caros do que na Europa ou E.U.A., o nível geral de preços é muito idêntico ao nosso. Que poderei dizer dos restaurantes? Durante a
Utentes do metro a dormir nossa viagem jantámos sempre em restaurantes onde pagámos, pelos cinco, entre 35 e 40 euros. E comemos sempre muito bem. Caro? Cá, na nossa terra, pagamos muitas vezes mais. Museus e transportes têm um preço igualmente idêntico ao nosso. Comprámos uma espécie de passe Interrail japonês e viajámos de comboio por onde quisemos as vezes que quisemos – incluindo a ida do aeroporto de Tóquio para o centro da cidade e o barco para a ilha de My. Tóquio tem um aeroporto moderno, a que eu chamo de “despachado”. Tudo funciona, aliás, no Japão a fiabilidade dos serviços é grande. Despachámo-nos rapida-
mente da burocracia da emigração e fomos apanhar o comboio para o centro da cidade. Íamos com a cabeça cheia dos mitos das viagens de metro e comboio em Tóquio: mas, para de comprovarmos a eficácia do sistema de transportes, nada mais pudemos ver. As avalanches de pessoas, a falta de ar, etc. nada disso vimos. E andámos muitas vezes de metro em hora de ponta, até com as nossas grandes mochilas… Havia realmente muita gente (mas em Lisboa também…), mas muito ordeira e bem comportada. As estações têm marcações no chão para as pessoas se porem em fila para entrar e a fila é respeitada. Comprovámos, sim, a utilização dos meios de transporte para.. pôr o sono em dia. 80% dos passageiros do metro e dos comboios suburbanos fazem as viagens a dormir. Entrar no metro, sentar, baixar a cabeça e … começar a dormir.
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Tóquio
Em Tóquio, reinam as "gyaru" (do inglês girl), com as suas roupas algo extravagantes e combinações
Tóquio é uma cidade enorme, diria antes, um aglomerado de cidades - 23 bairros, 26 cidades primárias, 5 cidades secundárias e oito vilas diferentes, cada uma com um governo que opera a nível regional. 31.2 milhões de habitantes na sua A ponte mais fotografada do Japão, área metropolino Palácio Imperial tana o que a torna a maior área urbana ocidentais, quem mais do mundo. chama a atenção são as japonesas, de todas as É a cidade da moda. Aqui idades, que vestem quireinam as "gyaru" (do monos e os homens com inglês girl), com as suas as suas yukatas, os quiroupas algo extravagantes monos de algodão. e combinações estranhas aos olhos dos europeus e fora do contexto climático, a sua mania pela maquilhagem e penteado perfeito e seus telemóveis coloridos cheios de berlicoques e enfeites. Realçam entre os homens cinzentos, de fato e gravata (no Verão, a pedido do governo, somente de calça e camisa, sem gravata, para baixar os custos com o ar condicio-
Entrada dum templo nado) e malinha de executivo na mão. Mas, para nós em Ueno
A cidade foi fundada em 1457 a partir duma localidade chamada Edo, mas só em 1868, após a guerra civil e o final do regime feudal dos samurais, se tornou capital do império. Esta época trouxe não só mais liberdade e igualdade aos japoneses mas também os jardins públicos. O primeiro a ser construído foi de Ueno, aproveitando o terreno que pertencia a um convento. E como espelho dos tempos, o parque Ueno é o “lar” de centenas de sem-abrigos japoneses e estrangeiros, que nada fazem aos passeantes e que desaparecem como que por encanto quando a família imperial lá se desloca… No Parque Ueno pode visitar dois museus, admirar um pagode de cinco andares e o templo Tosho-gu, fun-
dado em 1627, uma cópia do templo do mesmo nome em Nikko... Pontos altos dum passeio por Tóquio são sem dúvida o Palácio Imperial do qual só se vêem os seus espessíssimos muros de protecção, os jardins exteriores e a famosa ponte de dois arcos, um dos motivos mais fotografados dos Japão – aliás, não há japonês em excursão a Tóquio que não tire uma fotografia com a ponte atrás. Não muito longe, temos o bairro de Ginza, o coração comercial de Tóquio, onde se pode m ver as novidades tecnológicas no Sony Center, um edifício de cinco andares promovido a museu da tecnologia… Mas como “não só de pão vive o Homem”, há também que visitar alguns templos em Tóquio (não faltam, porém, templos no Japão. Há-de chegar o momento da viagem em que se sonha por um dia sem templos…). Vamos para o bairro de Asakusa, um centro comercial e de entretenimento gigante, a 1ª zona de Tóquio criada para a diversão com “casas de prazer” muito procuradas desde o início do século XIX até ao final da 2ª Grande Guerra, mas também local de reflexão, no templo de Senso-Ji ou Asakusa Kannon, um dos templos budistas mais antigos da região.
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Nikko e Kamakura Nikko, grande centro religioso, tanto para os xintoístas como para os budistas. È famosa pelo Tosho-gu, o complexo religioso mais decorado do Japão e mausoléu de Tokugawa Ieyasum o fundador do shogunato Tokugawa, que reinou o país durante mais de 250 anos. É aqui que se encontra a famosa estátua de madeira dos três macacos: “não vejo nada, não digo nada, não oiço nada” - que nós não vimos porque chegámos tarde.. Fora do vulgar é a colecção de estátuas de pedra, conhecidas pelos nomes de “Bake-jizou", "Narabijizou (Jizous em linha)," ou "Hyaku-jizou (100Jizou).Trata-se dum grupo de aproximadamente 70 jizous , alinhados. Cada um destes Jizou – originalmente com 100 estátuas - foi feito pelo bispo Tenkai, tendo sido algumas delas levadas na enxurrada das inundações de 1902.
Ainda nos arredores de Tóquio, há que dar um pulinho a Kamakura, que foi o centro político do Japão durante um século quando Minamoto Yoritomo escolheu a cidade para a sede do seu novo governo militar em 1192. No século XIV, o governo foi mudado para Quioto e Kamakura perdeu influência. Hoje é muito popular entre turistas por causa dos seus inúmeros santuários e templos, entre os quais destacamos o templo de Kotokuin com a estátua gigante de Buda (daibustu), feita em bronze. Tem 13.35 metros de altura e é a segunda maior do Japão. Foi construída em bronze em 1252 e foi colocada dentro dum edifício que ficou totalmente destruído durante um maremoto no final do século XV. No entanto, a estátua não sofreu danos e está ao ar livre desde então. Entre os muitos templos de Kamakura, aconselha-
mos também a visita a Engaku-ji, construído no século XII para as almas de todos os que morreram durante a tentativa de invasão Junto ao buda giganmongol, te de Kamakura rebatida pelos japoneses. Trata-se dum complexo de templos e santuários zen. No cimo do monte, está o maior sino do Japão com de 2,5 metros de altura, mandado construído em 1301 por Sadatoki Hojo pela bem estar do Japão. O som do sino, diz-se, guia as almas que A estátua do foram poupadas pelo rei Buda tem 13.35 do inferno no caminho de regresso à terra e ao metros de altura mundo dos vivos. e é a segunda O passeio por esta região maior do Japão. deve continuar relaxadamente pelo Parque NacioFoi construída nal Fuji-Hakone, que em bronze em deverá incluir uma esca1252. lada do monte sagrado.
Como se perderam dois filhos... Era a primeira vez que usávamos um shinkansen. Entrámos e sentámo-nos nuns lugares que vimos vazios. Na estação seguinte, entraram passageiros que tinham reservado precisamente os lugares do HansJürgen, da Joana e do Sebastian. Eles foram à procura dum lugar e a Joana e o Sebastian ficaram longe do Hans-Jürgen. Quando chegámos a Utsunimya deixá-
mos a Joana e o Sebastian no comboio-bala.... Estavam sentados duas carruagens mais a frente. Um stress! Pedir na estação que telefonassem para o comboio e procurassem dois estrangeiros. Só que na estação ninguém falava inglês.... felizmente a Joana tinha o telemóvel do Hans-Jürgen... Mas como o comboio passa por muitos túneis e não conseguíamos ligar. Finalmente
apareceu uma empregada dum café que falava inglês e lá conseguimos explicar a nossa aflição. A empregada deu as descrições etc. entretanto três estações mais adiante um empregado foi ter com o Sebastian e começou a falar com ele... em japonês. Paralelamente metemos a Lena ao barulho para tentar enviar um sms. duas horas depois estávamos todos reunidos.
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Himeji Deixemos Tóquio e vamos até Hiroshima num shinkansen, o comboio de alta velocidade. A meio caminho, uma paragem em Himeji para visi-
tar o seu magnífico castelo, considerado o castelo feudal mais belo do Japão. É o único que se mantém na construção original. Construído no século XVI, no local dum forte do século XIV, nunca foi destruído por nenhum terramoto, incêndio ou guerra. O castelo foi planeado para poder sobreviver a ataques bélicos que nunca vieram a acontecer,
com os andares superiores escondidos para enganar o atacante e com diversos esconderijos dentro do edifício para surpreender os possíveis invasores. Tem uma série de poços e armazéns de cereais que permitiria fazer face a um cerco de 5 anos!
Hiroshima Hiroshima tornou-se a capital da promoção da paz.
Hiroshima é mundialmente famosa por ter sido o alvo da 1ª bomba atómica, atirada pelos americanos a 6 de Agosto de 1945. Depois do ataque, a cidade tornou-se a capital da promoção da paz. Símbolo da destruição e do mal que o Homem, voluntária e conscientemente, pode infligir ao Homem é a ruína do Pavilhão Industrial, que
O torii flutuante do Santuário Itsukushima
derreteu com-
pletamente, excepto a fachada, com o calor da bomba que rebentou 400 metros acima. Ao lado, na pequena ilha entre os dois canais do rio Ota (Ota-gawa), a começar na famosa Ponte em T, o alvo dos americanos para lançar a As ruínas do Pavilhão Industrial bomba, nasceu o Parque Memorial da Paz, onde placas, fotofamosa pelo seu torii, porgrafias, textos, imagens ta de entrada de templo, nos fazem recordar os flutuante do Santuário horrores da bomba atómiItsukushima; o torii, de ca – “O horror não pode madeira, fica sobre o ser repetido”, como está oceano durante a maré inscrito no cenotáfio. cheia, dando a sensação Para descansar um pouóptica de estar a flutuar. co a alma após tantos Um pormenor engraçado horrores, vá até à Miyajida ilha é a sua população ma tradução literal, “ilha de veados, domesticados do santuário”), a ilha em que se aproximam das frente de Hiroshima, conpessoas para que estas siderada sagrada e onde lhe façam festinhas ou antigamente era proibido lhes dêem de comer. nascer ou morrer. A ilha é
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Quioto Foram muitas as capitais imperiais nipónicas, entre elas Quioto e Nara.
uma casa de samurai e o terceiro como um templo zen.
Quioto, com 1600 templos budistas, 400 santuários xintoístas e centenas de jardins, foi capital entre 794 e 1868, continuando ainda a ser a capital cultural do Japão. 17 dos edifícios antigos e jardins da cidade foram reconhecidos pela Unesco como Património da Humanidade. De realçar o templo Kinkaku-ji, ou Pavilhão Dourado, situada em frente dum lado, onde reflecte. É uma réplica construída em 1955 duma estrutura do século XV, revestida a folha de ouro em 1987. O primeiro andar, foi construído como se fosse um palácio, o segundo como
Também a ver os templos de Sanjusangen-do, de 1266, com um pavilhão de 33 alcovas (sanju-san) entre 33 pilares debaixo dum tecto de 60 metros de comprimento, e de Higashi Hongan-Ji, construído em 1603 para o primeiro shogun Tokugawa, e cuja reconstrução em 1895 depois dum grande incêndio só foi possível graças à doação feita pelas mulheres de Quioto dos seus longos cabelos, com os quais se fizeram as cordas. Quando ficar cansado de ver templos, visite o castelo Nijo-jo, de 1569, onde poderá experimentar ao vivo os famosos
chãos de rouxinol, por onde só passavam silenciosamente os ninja.
AS maiko de Quioto
No final do dia, vá até ao bairro de Gion, o centro das geishas, que aqui têm o nome de maiko ou geiko. Antigamente, em Quioto, a palvara geisha referia-se a actores masculinos, vestidos de mulher; no entanto, em Tóquio e Osaca, a palavra geisha sempre foi usada para mulheres. Muitas foram as capitais do Japão, entre elas Quioto e
Nara Em 710, estabeleceu-se a primeira capital imperial permanente em Heijo, a cidade conhecida actualmente como Nara. Quando as ambições políticas dos poderosos mosteiros budistas da cidade se tornaram uma verdadeira ameaça para o governo, a capital foi mudada para Nagaoka em 784. Graças ao este seu passado, Nara tem inúmeros tesouros históricos, incluindo alguns dos templos budistas mais antigos do país. Dentre eles, destacamos Todai-ji (tradução literal, o “Grande Templo Oriental), fundado em 743 e
Nara. construído em 752 como templo principal dos budistas , e que alberga a maior estátua de Buda do Japão (daibutsu). A estátua de bronze, de 16 metros de altura e com 500 toneladas de peso, está dentro do maior edifício de madeira do mundo, actualmente somente dois terços do edifício original destruído por um incêndio no século XVII. Também a ver dois templos que ficam no cimo do monte, o Sangatsu-do (Pasvilhão de Março) e o Nigatsu-do (Pavilhão de Fevereiro), onde se feste-
ja o início da Primavera, e o santuário Kasuga Taisha, primeiramente construído em 710, e reconstruído diversas vezes. A maioria dos templos de Nara, fica dentro do Narakoen (Parque de Nara), um aprazível bosque onde se passeiam veados domesticados. Por causa dos seus templos e santuários, o bosque está apinhado de lanternas de pedra.
Todai-ji
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Aichi—Expo 2005 Este ano foi o Japão, que recebeu o mundo como convidado. Sob o lema “A Sabedoria da Natureza”, 121 nações estiveram preQuimono de cortiça sentes na 58ª edição da EXPO, que no dia 25 de Setembro fechou as suas portas na cidade nipónica de Aichi. Mais de 22 milhões de pessoas visitaram a Expo em Aichi! A estrela da Expo foi o mamute da Sibéria, um “A Sabedoria da animal que se encontra Natureza” foi o extinto há 7,000 - 8,000 tema escolhido da anos, e que foi exposto num pavilhão gelado. Expo 2005 de Aichi O pavilhão de Portugal foi um dos objectivos da nossa visita. Pobrezinho mas
honrado, sendo no entanto desnecessário terem exposto um sobreiro… de plástico! Tirando esse pormenor, Portugal mostrava muito bem as aplicações da cortiça, expondo inclusive um quimono feito da casca do sobreiro. Pela primeira vez na história das exposições mundiais, dois estados soberanos, a Alemanha e a França, decidiram marcar presença no mesmo edifício—e foi por aqui que iniciámos a nossa visita. No pavilhão alemão que tinha por tema “Bionis” (“biónica”: “a ciência que transforma os princípios naturais em estratégias de uso industrial), começavase a visita por uma viagem numa gota de água desde o fundo do
mar até às nuvens e acabando numa tempestade na costa alemã. Uma das partes mais interessantes da Expo de Aichi foi a reprodução duma floresta tropical a que deram o nome “A experiência da floresta”, o lugar para redescobrir a humanidade e a natureza.
A família à entrada do Pavilhão de Portugal
Osaca Duas cidades muito importantes do ponto de vista industrial, mas com pouco interesse cultural. Osaca, que acolheu a Expo em 1970, tem
para ver o castelo… reconstruído no século XX! Tem porém um ponto interessante: nos jardins do castelo está a Cápsula do Tempo, uma cápsula enterrada a 15 m de profundidade para a Expo 1970 que contém obejctos correntes á época e que deverá ser aberta daqui a 5.000 anos, ou seja, em 6970.
Enquanto os miúdos foram para os Universal Studios, o Hans-Jürgen e eu fomos a um festival budista de memória às almas dos actores cómicos que já morreram. Ainda em Osaca, há que visitar o Aquaário, o 2º maior do mundo (o maior é em Monterrey, EUA; que visitámos há anos.
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Kanazawa Quem passa mando-a na primeiro por próspera Tóquio ou Kaga- HyaOsaca e chega kumangoku depois a Kana(que signifizawa, no ca "um noroeste da milhão de ilha Honshu, a montes de ilha principal arroz", simdo Japão, senbolizando a te uma enorme prosperidapaz interior. A de da correria típica região – na das grandes realidade, a metrópoles sua riqueA família em frente do torii gigantesco não existe ali, za, medida tudo é harmoem arroz, à entrada da estação nioso. Será era de um que esta paz, diria quase milhão de koku, ou seja, sagrado. Será que este interior, vem do facto da aprox. 1500 milhões de arco pretende avisar os cidade se dedicar às visitantes que a partir litros de arroz). artes? Ou será o contrádaquele ponto, ou seja, Durante o período edo, rio, pelo facto da haver do final da estação, o Kanazawa foi apelidada uma grande tranquilidade, local é sagrado, ou seja, de “Cidade Literária do os habitantes podem a cidade é sagrada? Japão”, tendo sido o berdedicar-se à arte? ço de muitos escritores e O desenvolvimento de Tentar encontrar a resposta é como tentar saber o que apareceu primeiro, se a galinha, se o ovo. O que é certo é que em Kanazawa se vive em grande harmonia. Assim que saímos da estação de comboios, moderna mas muito bem enquadrada no estilo da cidade, temos uma enorme galeria coberta, não comercial, como encontramos noutras cidades japonesas, mas quase um jardim que termina (começa?) numa enorme construção que lembra um torii. Ora um torii é uma espécie de arco que marca o início dum templo, ou seja, um local
Kanazawa, a capital da prefeitura de Ishikawa, começou em 1488, quando aqui se instalou a escola budista Ikkô, transformando, em 1546, o castelo no seu templo principal. Em 1583, o controlo da cidade e das áreas adjacentes de Kaga e Noto passou para as mãos do senhor feudal Toshiie Maeda, cujo poder foi confirmado em 1603 pelo shogun Tokugawa Ieyasu. Estes territórios eram dos mais ricos do Japão, logo a seguir às áreas de Tokugawa. A família Maeda investiu esta riqueza no desenvolvimento cultural da cidade, transfor-
artistas. Os túmulos dos membros da família Maeda estão na parte sul da cidade e podem ser visitados. Do castelo original, pouco ou mesmo nada resta, pois foi destruído por diversos incêndios. Na reconstrução de 1788, os telhados brancos foram feitos de chumbo que se tornou branco com o tempo. A razão da escolha desta material para os telhados é puramente belicista: em caso de guerra, poderiam ser derretidos e transformados em balas! Escolha estranha numa cidade mecenas…
Kanazawa vive a arte no seu dia a dia
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O jardim perfeito de Kanazawa
“No Jardim das Seis Coisas Sublimes, podemos ver
O jardim anexo ao castelo, Kenrokuen, é considerado um dos mais belos jardins paisagísticos do Japão. Começado a construir em 1819 pela família Maeda, tem hoje em dia uma superfície de 100.000 m², tendo sido aberto ao público em 1871. O nome Kenroku, que significa “jardim das seis coisas sublimes”, faz referência aos seis atributos que um jardim deve ter segundo a teoria chinesa: espaço, linhas de água, paisagens panorâmicas, força de criação, antiguidade e modéstia. Neste jardim, podemos ver pontes, ribeiros, quedas de água, lagos, diversas casas de chá, além da Seisonkaku, a casa construída em estilo shoin no século XIX para a mãe do 13º senhor da família
pontes, ribeiros, quedas de água, lagos, diversas casas de chá.
Maeda. A água para os diversos lagos e ribeiros é trazida para o parque dum rio distante por um sistema muito sofisticado de transporte de água, construído em 1632. É um prazer passearmo-nos pelo jardim e deixar a mente descansar, apreciando o simples e o belo. Na parte sul do jardim, encontram-se diversos museus, entre os quais o Museu para a Arte Tradicional. Kanazawa é a cidade da cultura e das artes tradicionais, baseadas essencialmente no cultivo do arroz. Muito conhecidas são as porcelanas kutani, muito coloridas, os objectos de laca, muito elegantes, e a arte de
trabalhar a folha de ouro, haku. Também bem representada na cidade está yuzen, a arte de colorir quimonos de seda.
O parque Kenrokuen
O bairro das geishas e o bairro dos samurai
Tal como o bairro Gion em Quioto, o bairro Kuruwa, junto ao rio Asanogawa, é famoso pelo seu ambiente especial. Em tempos, era o local onde viviam as geishas, acompanhantes profissionais de banquetes que dominam as artes tradicionais japonesas. As raparigas que pretendiam tornar-se geishas eram submetidas a uma aprendizagem muiCanal no bairro to dura e rígida dos samurai
durante a qual aprendiam a tocar diversos instrumentos, a cantar, a dançar e a manter conversas sociais. A sua aparência era típica: vestiam quimonos e pintavam a face de branco. Outros bairros há que ainda mantêm a traça tradicional, como o de Nagamachi, que está muito bem conservado, mantendo uma atmosfera medieval, com muros de terracota e canais pitorescos. Neste bairro ainda existe uma série de casas dos samurais, os guerreiros ao serviço do impera-
dor ou de grandes senhores feudais, entre as quais se destaca a casa da família Nomura. Grande novidade desta casa é a utilização de janelas de vidro (o usual eram janelas de papel de arroz) que reflectia o ribeiro que passa no jardim, junto à sala.
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A pérola de Kanazawa No entanto, a pérola actual de Kanazawa é, sem dúvida, o Museu do Século XXI para a Arte Contemporânea que abriu as suas portas em Outubro de 2004. O conceito que esteve na base deste museu foi a sua função verdadeiramente pública, segundo as palavras do seu curador e que lembra o conceito da casa da Música no Porto que é um “edifício público, verdadeiramente público”. O seu enfoque é em duas funções: a integração do design do espaço do museu com o programa e o novo conceito de curador. Resultado duma colaboração de quatro anos entre o pessoal do museu e o arquitecto SANAA é algo que “transcende a sua função como espaço
O interior do museu
O Museu do Século XXI museológico, dando informação, programas e um leque de experiências a visitantes, aumentando a sua consciencialização”. Diversas salas interiores à volta dum corredor circular, com um diâmetro de 112.5 metros, de paredes de vidro – um modelo baseado num conceito de cadeias de ilhas ou espaços urbanos, centros que geram valores. Os corredores transparentes oferecem uma visão clara do todo o espaço museológico encorajando a coexistência na qual cada um se mantém autónomo, havendo no entanto partilha com o outro e permitindo que seja explorado de todas e em todas as direcções – o edifício não tem parte da frente nem parte detrás, nem início nem fim. O segundo aspecto orientador deste museu é o do curador. No século XX, o curador punha e dispunha sobre o programa do museu; era ele quem determinava o valor da arte e quem tinha a decisão final
sobre o que coleccionar. Aqui não. Vários programas encorajam o visitante a tornarem-se curadores de arte, a sugerir que artistas deverão expor, que obras deverão ser coleccionadas, baseando-se no conceito de Joseph Beyus para o qual “Cada pessoa é um artista”. O modernismo do século passado baseava-se em individualismo, dinheiro e materialismo, que em inglês se resume à fórmula dos 3 Ms: “Man," "Money" and Materialism". O Museu do Século XXI para a Arte Contemporânea quer substituir esses 3 Ms por 3 Cs: consciencialização, coexistência e inteligência colectiva ("Consciousness," "Collective Intelligence" and "Co-existence"), as novas formas de expressão que agora começam a surgir, a partir duma pequena cidade japonesa.
O modernismo do museu baseia-se nos 3 Cs: Consciencializaç ão, Coexistência
“A piscina de Leandro”
e Inteligência Colectiva.
Nagóia
Um dos clarinetistas– robôs da banda Toyota
Em Nagóia, visitámos o Museu da Indústria e da Tecnologia que não é mais do que o museu da Toyota. Foi muito interessante. Ficámos a saber, por exemplo, que a Toyota começou com o nome de Toyoda no ramo têxtil, só se tendo virado para o ramo automóvel depois da 1ª Grande Guerra. Hoje em dia é um dos exemplos da verdadeira revolução tecnológica. Para a Expo 2005 de Aichi fabricou uma verdadeira banda de clarinetistas que se passea-
vam pela exposição.
O túnel do vento
A época mais bonita para visitar o Japão é, sem dúvida, na Primavera, quando as cerejeiras estão em flor. O Outono também é uma época cheia de cor – as árvores cobrem-se de folhas de todas as cores. O Verão é quente e MUITO húmido. Que comer? Sushi, sashimi, massa, claro, mas também comidas sofisticadas como o kaiseki-ryori , entre outras. A comida no Japão não é cara. Há n-restaurantes com ementas baratas (teishoku) tanto ao almoço como ao jantar e restaurantes de massa (udon e soba). Não é necessário falar japonês para conseguir comer; basta apontar como o dedo. É que nas montras dos restaurantes estão expostos os pratos, plastificados. Nos restaurantes, não se dá gorjeta, que é visto como um insulto. Nas estações de combóios e nos centros das cidades, podem comprar-se caixinhas com sushi e sashimi e outros pratos, prontos a comer, como pauzinhos e tudo. Em terra de tecnologia avançada, até há algumas destas caixinhas que aquecem o conteúdo automaticamente. Se comer é fácil, beber ainda é mais. Em todas as esquinas, há máquinas automáticas de vendas de bebidas – quentes e frias: águas, refrigerantes, chá e café.
O ryokan de Hiroshima
Para dormir o mais típico é ficar-se num ryokan, os albergues japoneses. Os quartos soa minimalistas, bem de acordo com a filosofia zen: em vez de camas, só há futons no chão que se dobram durante o dia. De mobiliário os quartos têm somente uma mesa pequena e almofadas para nos sentarmos no chão. Temos que nos descalçar à entrada, mas os ryokan põem à disposição chinelos, que , no entanto, devem ser trocados por outros quando se vai à casa de banho.