IV Jornadas de Cultura Popular Viana do Castelo 19 de maio de 2012 por Margarida Pereira-M端ller
A Ronda Típica da Meadela organiza há já quatro anos umas Jornadas de Cultura Popular em Viana do Castelo, cuja finalidade é recuperar e preservar o legado histórico-cultural. Num dia frio e chuvoso, lá partimos de Lisboa ainda com sol. O céu foi enegrecendo ao longo do caminho. Muitas chuvadas se abateram na autoestrada entre Lisboa e Viana, mas mesmo assim o percurso fez-se em quatro horas. Chegadas a Viana, já as ruas estavam desertas. Realmente, o tempo não convidava a passeios, nem o cão se mandava para a rua… Encontrámos mais ou menos facilmente a Residencial Laranjeira. Localizada na zona histórica de Viana do Castelo, esta residencial é uma das mais antigas unidades hoteleiras na cidade, tendo sido totalmente remodelada em 2009. Cada um dos seus 26 quartos foi decorado individualmente. Eu fiquei no quarto Eiffel, onde havia uma reprodução da ponte Eiffel , rodo-ferroviária metálica , sobre o rio Lima, próximo à sua foz, e que liga a freguesia de Santa Maria Maior, a Darque. Foi inaugurada em 30 de junho de 1878 por Fontes Pereira de Melo. Tem 562 metros de comprimento, em dois pisos, o inferior ferroviário e o superior rodoviário. A recente intervenção aumentou a largura do tabuleiro de 6,88 metros para oito metros, seis dos quais para as faixas de rodagem e os restantes para dois passeios de um metro de largura cada.
Não tivemos tempo para jantar, mas ainda conseguimos ir à Pastelaria Zé Natário, a melhor da cidade, fundada pelo empresário vianense José Natário em 31 de Janeiro de 1970 e sempre na posse da família ao longo destas mais de quatro décadas . Famosas são as bolas de Berlim… e não só: os sidónios (pastéis de feijão em honra de Sidónio Pais, natural de Caminha), as aleluias, as clarinhas. Os manjericos de doce de ovos, já esgotados quando lá chegámos, as bolachas de massapão, e muitos mais. O pão de ló, apesar de ter muito bom aspeto, era um pouco caro - € 11!
Bolas Berlim
Clarinhas
Sid贸nios
Já passava das 22h, quando começaram as palestras. Em primeiro lugar, falou uma senhora sobre o linho e o seu cultivo. E depois fui eu divagar sobre ervas e fragâncias. Mais duas palestras e seguiu-se o esconjuro: uma bela queimada feita pelo Padre Fontes. A queimada é elaborada com aguardente queimado, açúcar, vinho tinto, água, maçã e grãos de café. Na obscuridade da noite (que é um bom momento para realizá-la) – sim, já passava da 1h da manhã!!! - , as pessoas reuniram-se ao redor do pote no qual se elaborou. O Padre Fontes misturou os ingredientes, fez o esconjuro e deu-lhe o toque final, erguendo com uma concha o líquido em chamas e deixando-o cair pouco a pouco no recipiente pronunciando o esconjuro, o qual, segundo a lenda, protege contra feitiços – entre eles o da Troika - e mantém afastados, de quem a bebe, os espíritos e demais seres do mal. A queimada tem origem na época medieval, embora também seja atribuída uma origem celta.
O esconjuro da queimada foi escrito por Mariano Marcos Abalo em 1967 e revisto em 1974. Recitando o conjuro. Queimada a arder Pequena queimada Mochos, corujas, sapos e bruxas. Demónios, trasgos e diabos, espíritos das enevoadas veigas. Corvos, píntigas e meigas: feitiços das mezinheiras. Podres canhotas furadas, lar dos vermes e alimárias. Fogo das Santas Companhas, mau-olhado, negros feitiços, cheiro dos mortos, trovões e raios. Uivar do cão, pregão da morte; focinho do sátiro e pé do coelho. Pecadora língua da má mulher casada com um homem velho. Averno de Satã e Belzebu, fogo dos cadáveres ardentes, corpos mutilados dos indecentes, peidos dos infernais cus,
mugido do mar embravecido. Barriga inútil da mulher solteira, falar dos gatos que andam à janeira, guedelha porca da cabra mal parida. Com este fole levantarei as chamas deste fogo que assemelha o do Inferno, e fugirão as bruxas a cavalo das suas vassoiras, indo se banhar na praia das areias gordas. Ouvi, ouvi! os rugidos que dão as que não podem deixar de se queimar na aguardente ficando assim purificadas. E quando esta beberagem baixe pelas nossas goelas, ficaremos livres dos males da nossa alma e de feitiço todo. Forças do ar, terra, mar e fogo, a vós faço esta chamada: se é verdade que tendes mais poder que a humanas pessoas, aqui e agora, fazei que os espíritos dos amigos que estão fora, participem connosco desta Queimada.