Cadernos de Viagem, # 88

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Março de 2013 Número 89

Cadernos de Viagem

Texas, terra de cowboys Nunca tinha ouvido falar em Fort Worth até a Joana ter ido morar para lá — e apesar da Lufthansa voar para um aeroporto que se chama Dallas Fort Worth…… Mas de repente, Fort Worth tornou-se para mim (para nós?) muito familiar, “tropeçando” constantemente em pessoas que já lá estiveram.

@ M. Margarida Pereira-Müller infobus Tel.: 00351-214351054 Email: guidapereiramuller@yahoo.com

Após 11 horas de voo (!) de Madrid para Dallas Fort Worth na American Airlines, chegámos ao Texas às 17.30 — 23.30 em Portugal. Mas apesar do avançado da hora, não nos fizemos rogados à proposta da Joana e da Lola para irmos até ao bairro Stockyards de Fort Worth comer uns deliciosos bifes no restaurante H3, Hunter Brothers' H3 Ranch, um dos melhores restaurantes de bifes da

área de DFW, e ter um primeiro cheirinho da cidade dos cowboys. O início de Fort Worth foi um acampamento militar, estabelecido em 1849 pelo general William Jenkins Worth, no final da Guerra MéxicoAmericana, como forte para proteção dos ataques dos índios. O grande salto na expansão de

Fort Worth deu-se no âmbito do Trilho Chisholm, o caminho terrestre para o gado bovino entre o México e Kansas usado no final do século XIX, marcado por Jesse Chisholm. Em Kansas o gado era vendido e envia-


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Stockyards

No bairro Stockyards, os cowboys passeiam-se de botas com esporas e largos chapéus á… cowboy….

do para o leste. Jesse Chisholm estabeleceu diversos centros de comércio, trading posts , na parte ocidental de Oklahoma antes da Guerra Civil. Imediatamente a seguir à guerra, uniu-se a Lenape Black Beaver e juntos recolheram todo o gado que andava à solta pelo Texas, tendo levado milhares de cabeças de gado até Kansas onde as enviaram por caminho de ferro para Leste para alimentar as populações, que estavam a pagar preços muito mais elevados pela carne de vaca do que no Oeste. Com o tempo Fort Worth transformouse num dos maiores centros da movimentação de gado e, mais tarde, em centro industrial pecuário. Durante o dia as movimentações do gado agitavam a cidade, à noite os seus saloons animavam os cowboys – e ainda hoje no bairro

do comércio de gado, os Stockyards, a vida se mantém igual: de manhã o gado atravessa a cidade para ir para o leilão, regressando ao final da tarde. Os bares,

os restaurantes e os saloons, muitos dos quais com música country ao vivo, estão sempre cheios de

cowboys com as suas botas com esporas e os seus típicos chapéus que nunca tiram, nem quando estão à mesa... . Interessante a decoração destes locais de restauração que se mantém fiel às suas origens: os bancos são selas e as paredes exibem muitas cabeças de gado embalsamadas. Para se conhecer bem a história do transporte do gado, há que visitar o Cattle Raisers Museum , agora integrado no Museu de Fort Worth da Ciência e da História, que abriu as suas portas em 2009, num edifício assinado por Legoretta + Legoretta e que exigiu um investimento de $80 milhões de dólares.


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Baixa e bairro cultural

Sentados no restaurante Reata, um dos mais que mais preserva a lendária cozinha da região num ambiente bem texano (aconselho os tamales, os testículos de bisonte e o bife de búfalo—só para não mencionar o melhor da refeição, a tarde de nozes pecã!), Jessica Dowdy do centro de Turismo contounos a história de Fort Worth. Como outras cidades americanas, Fort Worth espraia-se por 901 km2 . É uma cidade jovem; dos seus quase 800 mil habitantes, 28% têm menos de 18 anos. É uma cidade tipicamente texana, mais de metade da população é de raça

branca e muito conservadora. Fort Worth está no chamado Bible Belt, com fortes raízes protestantes—e extremamente conservadoras. O restaurante fica mesmo em frente da Praça Sundance, uma referência ao pistoleiro Harry Longabaugh, aliás Sundance Kid; a praça é um exemplo a nível nacional da revitalização urbana, no centro duma área comercial, de negócios e de entretenimento. Para ficarmos a conhecer a pintura do Velho Oeste, há que parar no Museu Sid Richardson, que apresenta obras de Frederic Remington, Charles M. Russell e outros artistas da coleção pessoal de Sid Richardson, o milionário e filantropo que fez a sua fortuna com o petróleo texano. Nesta zona, mais dois pontos de interesse: o Tributo a J F Kennedy, junto ao local onde, a 22 de novembro de 1963, o presidente americano fez o último discurso antes de partir

para Dallas, onde foi assassinado. Não muito longe, estão os Jardins da Água, um oásis junto ao Centro de Convenções de Fort Worth. Desenhado por Phillip Johnson em 1974, os Jardins da Água é uma maravilha da arquitetura e da engenharia. Dos três lagos, o que mais me agradou foi o ativo e o que mais me desinquietou foi o …. lago calmo. O lago ativo é na realidade um conjunto de quedas de água com 11 metros. Do fundo, podemos ficar a ouvir a água e a vê-la cair pelos socalcos. O lago calmo foi construído abaixo do nível do jardim. Dos muros escorre água. O lago em si está ladeado de um chão de pedra com donde brotam as raízes das árvores.


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A fábrica dos dólares

Até se fica com os olhos em bico com tantas notas de dólar a nossos pés...

Sabia que o papel das notas americanas é feito a partir de uma mistura de linho e algodão? E que vai 5 vezes à impressora? E que qualquer pessoa pode visitar a fábrica dos dólares? E que pode comprar sacos com dinheiro cortado? Pois é. . Fica em Fort Worth o Bureau of Engraving and Printing (BEP), a Oficina de Gravação e Impressão dos Estados Unidos, a fábrica encarregada de imprimir milhões e milhões de dólares em notas de alta tecnologia, com dezenas, centenas?, de elementos de segurança para evitar falsificações. A outra fábrica de dólares é em Washington DC, que

funcionou sozinha até 1991, quando abriu a fábrica em Fort Worth. Reconhecemos as notas impressas em Fort Wort pelas duas letrinhas FW num dos cantos das notas. Os dólares impressos em Fort Worth representam 60% das notas que circulam nos Estados Unidos. Esta “gráfica”, a Bureau of Engraving and Printing , tem um único cliente: o Federal Reserve System, ou seja, o banco central norte-americano. No início de cada ano, o Federal Reserve System informa o Bureau of Engraving and Printing de quanto dinheiro vai precisar. Pode também dar-lhe a missão de desenhar novas notas. Todas as notas que saem do BEP tem de ser perfeitas. Se é descoberta alguma anomalia durante o processo, destrói-se toda a série. Aqui trabalham tam-

bém designers que vão criando novas notas. Uma nota chega a levar até três anos até estar desenhado, incluindo todas as marcas de segurança. A entrada para esta gráfica, porque sim, é duma gráfica que estamos a falar, é feita com medidas de segurança muito discretas. Não se pode porém entrar com máquinas fotográficas, telemóveis e… armas... Como qualquer museu americano, também o Bureau of Engraving and Printing tem uma “gift shop” onde se podem comprar sacos com dólares…. cortados na máquina de destruição de papéis e toda uma panóplia de souvenirs com notas de dólar.


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O Museu Texano da Guerra Civil Não há melhor maneira de ficar a conhecer um museu do que seguindo um quis para crianças. À entrada descobrimos umas folhas de papel com perguntas para as crianças fazerem uma espécie de pedipaper. A Joana, o Sebastian e eu aderimos à ideia e percorremos o museu, estudando atentamente todas as vitrines, É aqui no Museu Texano da Guerra Civil, aberto ao público em 2006, alberga a maior coleção de objetos da Guerra Civil , a oeste do Rio Mississippi . Mesmo tendo estudao Americanística, pouco sabia da participação do Texas na Guerra Civil. Ficámos a saber que 29 condados receberema o nome de veteranos da Confederação. Inúmeras localidades, escolas, institutções, edifícios,

ruas, etc. têm igualmente o nome de veteranos da Guerra Civil—não esqueçamos que 90 000 texanos estiveram diretamente envolvidos na guerra, dez dos quais foram mais tarde governadores do estado. Entre os 3000 objetos expostos encontram-se mais de 60 bandeiras — a maior coleção de bandeirss no estado de Texas, a maioria das quais de batalhões texanos que lutaram pela Confederação. Outra coleção interessante é formada

por um conjunto de mais de 200 vestidos vitorianos, que exigiam cinturinhas de vespa, para as quais as mulheres começavam cedo, muitas vezes a partir logo dos três anos, a formar—com grande prejuízo para a saúde. Muito interessante é a apresentação dos chapéus e decoração da cabeça com pássaros...reais, embalsamados, uma moda—macabra, diria eu— da década de 1890. O filme Our Homes – Our Rights, Texas in the Civil War, que se pode ver no museu, mostra o envolvimento do Texas na Guerra Civil. No final da visita, entregámos os nossos inquéritos preenchidos e recebemos uma guloseima como recompensa :-)

Mais de 3000 objetos reais usados durante a Guerra Civil


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Dallas

. Dallas mistura com harmonia a arquitetura moderna e antiga.

Dallas. Associo a Dallas imediatamente o assassinato do presidente de J.F. Kennedy. E parece que não sou a única, pois este acontecimento de novembro de 1963 marcou não só a história americana como a da cidade. O Depósito de Livros Escolares donde saíram os tiros mortais é agora um museu

dedicado ao assassínio de Kennedy. À

porta do museu diversos autores tentam vender os seus livros com a sua versão dos factos. Na rua estão assinaladas com duas cruzes os locais onde o presidente foi atingido. Depois de vermos o museu, fomos passear pela cida-

de. Numa esquina, junto à estação de elétricos encontrámos Rosa Parks, sentada num banco de jardim. A estátua de bronze, criada por Erik Blome, foi ali colocada em fevereiro de 2009. Terminámos o dia com um belíssimo jantar no restaurante Trulucks no bairro boémio de Dallas, onde se festejaram os três aniversários de fevereiro..


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Denton

Denton, nos arredores de Dallas, pouco tem de interesse, a não ser as suas duas universidades. A cidade nasceu da junção de duas localidades em 1866, ambas batizadas em honra do pioneiro

John Denton. Dois marcos do seu desenvolvimento foram a chegada dos caminhos de ferro em 1881 e o estabelecimento da Universidade do Norte de Texas — UNT — em 1890 e da Universi-

dade Feminina do Texas em 1901. A Universidade do Norte de Texas tem dez faculdades, duas escolas e uma academia para estudantes do liceu superdotados. A base da investigação são os 50 programas de doutoramento . Em 2011– 2012, o orçamento da UNT foi de $872.3 milhões de dólares, dos quais $25.4 milhões foram para a investigação.

O nosso interesse por Denton foi… conhecermos a universidade onde a Joana estuda.


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Rodeo

O que há de mais americano do que um rodeo? É claro que, numa cidade de cowboys, tínhamos de ir ver um. A americanice foi grande. O espetáculo no Cowtown Coliseum, construído em 1918, começou com uma cowgirl percorrendo a galope a arena com uma bandeira americana. Depois parou ao centro e toda a gente se levantou, menos nós que não sabíamos o que se estava a passar, para se ouviu– e cantar “God Bless the U.S.A.” por Lee Greenwood (http:// www.youtube.com/ watch? v=Q65KZIqay4E), uma canção muito, mesmo muito americana … Seguiu-se uma oração e um pai

-nosso e depois todos cantaram patrioticamente o hino nacional. O rodeo pôde então começar. O espetáculo dividiu-se por uns seis momentos: o rodeo propriamente dito, durante o qual um cowboy (também há cowgirls mas nesse dia não apareceu nenhuma) monta um touro. Para ser considerado, tem de se aguentar durante pelo menos 8 segundos em cima do tou-

ro. Segue-se o tiedown roping: no máximo de 15 segundos, um cowboy tem de lançar o laço sobre um vitelo, saltar do cavalo e amarrar-lhe as patas. Esta prova pode também ser feita em equipas de dois, o chamado team roping; um cowboy lança o laço para os cornos e o outro cowboy lança o laço para prender as patas. A prova que porém exige mais destreza é a barrel racing, que consiste dar a volta a três barris colocados na arena com o cavalo a agalope. Esta disciplina é quase sempre só praticada por mulheres.

A meio do rodeo chamaram as crianças para a arena e foi-lhes pedido que arrancassem uma fitinha colorida presa a um vitelinho, que cheio de medo corria a grande velocidade.


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