SALVADOR, SÁBADO, 23 DE JUNHO DE 2012
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ANO 06
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Nº 351
EDITORA-COORDENADORA: NADJA VLADI / ATARDINHA@GRUPOATARDE.COM.BR
FESTA PARA O VÔ LUA Luiz Gonzaga, o rei do baião, faria 100 anos. Mas um dia ele também foi criança, e é isso o que nós e seus sobrinhos-netos contamos neste São João págs 4 e 5
Bruno Aziz
SUPLEMENTO INFANTIL DE A TARDE. NÃO PODE SER VENDIDO SEPARADAMENTE
SALVADOR, SÁBADO, 23 DE JUNHO DE 2012
4 e5
Quando Gonzagão era Gonzaguinha
CAPA
A formidável família a musical dos Gonzag
O forró existe porque um menino que aprendeu a tocar sanfona um dia inventou o baião
MARCEL BANE
Luiz Gonzaga do Nascimento veio ao mundo no dia 13 de dezembro de 1912. Como todo menino sertanejo, criou-se ao ar livre, em uma fazenda, na cidade de Exu, Pernambuco. Luiz, que todos chamavam de Lua, aprontava. “Ele inventada as brincadeiras, fazia os brinquedos e se divertia com outras crianças. Tinha cantigas de roda, pega-pega e cabra-cega”, contou Arievaldo Viana, que escreveu dois livros sobre o Rei do Baião. “Ele também jogava pião, matava passarinho, pescava traíra nos açudes e corria atrás de preá. Eram as brincadeiras da década de 20”, contou o sobrinho de Gonzagão, Joquinha Gonzaga. Podia ser divertido na época, mas hoje não tem graça matar bichos. Como ele gostava de montar a cavalo, era sempre chamado para corridas apostadas. Aos 7 anos, Lua ajudava o pai nos sambas, no roçado e, com a mãe, vendia cordas de caroá, planta típica do Nordeste, na feira do sertão do Araripe, que ficava perto da sua cidade. Naquela época não era proibido criança trabalhar.
a Humor, trabalho e primeira sanfona
ino quando passou Luiz ainda era men ronel Manuel Aires a acompanhar o co ô Aires, como de Alencar. O Sinh zendeiro rico e era chamado um fa na região. Ele também advogado oleque inteligente precisava de um m bagagem e dos para tomar conta da tinha cerca de 7 ou seus animais. “Luiz seu patrão, na 8 anos e Aires era onte Belo. Ele cidade vizinha de M a, to e a sentar à mes aprendeu o alfabe , as filhas do patrão usar talheres, com m as traquinagens que se divertiam co bá, ou Roniwaldo Jato do ajudante”, cont livro sobre a que é autor de um o agão. Mesmo tend juventude de Gonz s, eis na casa de Aire aprendido coisas út car crianças para não está certo colo a de Luiz, isso era trabalhar. Na époc . é crime e dá cadeia comum. Mas hoje foi comprada com A primeira sanfona o 125 mil réis tomad um empréstimo de teria de devolver com o patrão. Ele a merecia mesmo er trabalhando. Mas ente! ter ganhado de pres
foi comprada na A primeira sanfona na Vila de Ouricuri, loja de seu Adolfo, Exu. A família de a 60 quilômetros de s u pai, Januário do Luiz era musical. Se oneiro conhecido e Santos, era um sanf . e afinava sanfonas também consertava ana, era tiradora A mãe, Ana de Sant uma oração de novenas, que é dias. A tiradora é repetida por nove dre nessa função. quem substitui o pa gostava de cantar Dona Ana também da zona rural, músicas religiosas itos, em maio, mês chamadas de bend como os irmãos, das noivas. Assim eu uinha, Luiz aprend iq Ch e Zé o, rin ve Se strumento, sozinho a tocar o in imando os sambas observando o pai an . Era assim que se de matuto no sertão s daquela época. chamavam os baile do. Dois tocadores Mas tocavam de tu ovisando e faziam a festa, impr já outro. Mais tarde, desafiando um ao e os sons das famoso, Luiz diria qu sambas deram violas usados nos mo do qual virou origem ao baião, rit te ritmo bem dançan rei. O baião é um ó rr o e sanfona. O fo e mistura percussã r causa dele. de hoje só existe po
Luiz Januário Maciel, 6, é sobrinho-neto de Gonzagão e já acompanha o pai tocando sanfona
O dia em que Gonz agã não encontrou Lam o pião
Lampião, um fora da lei famoso chamado Virgulino, e seu bando de cangaceiros, como eram chamados, fascinavam Lua de sde pequeno. Eles assustavam, assalta ndo fazendas e cometendo crimes Nordeste afora. Eram as roupas e os chapéus de couro que usavam, cheios de medalhas e enfeites, que mais mexiam com a imaginação dele. Em 1922 ou 1924, não se sabe ao cert o, Lampião passou pela Serra do Arar ipe, rumo ao Ceará. Luiz quis, do fundo do coração, conhecer o bandid o e, quem sabe, tocar algumas mús icas para o bando dançar. O velho Ja nuário, pai de Luiz, tinha se refugiado no mato com a família para se prot eger. Outras famílias também. Acamparam sob pé s de oiticica, uma ár vore da caatinga, at é as coisas se acalm arem. Luiz quis ir ao povoado ver como tudo estava. O pai admirou a coragem e deu permissão. Mas tinha de volta r logo. Lampião já tinha partido, mas Luiz voltou gritand o: “Corre, que lá vem Lampião!”. Pelo susto, ganhou um castigo. Já adulto, quando cantava, Lu iz Gonzaga só se vestia de cangacei ro.
Sara Maciel, 13, é irmã de Luiz Januário e gosta de ouvir músicas e histórias do tio-avô famoso
Arquivo pessoal
As sementes do baiã o ainda germinam
Luiz Januário Macie l, 6, e a irmã Sara Luiza, 13, são sobrin hos-netos de Gonzagão e ainda moram na cidade natal dele. São cin co gerações desde Januário, pai de Go nzagão. E a família já deu à nossa mús ica outros nomes importantes, como Gonzaguinha, filho de Luiz Gonzaga, e Daniel Gonzaga, filho de Gonzaguinh a. Luiz explora os primeiros sons saíd os das teclas de su a sanfona. “Por enqu anto, só faz fon”, disse. Ele acompanh a o pai Joquinha Gonzaga, que é so brinho de Gonzagão e tocou sanfona co m ele por 13 anos, até sua morte em 1989. E Sara já pega na zabumba para tentar acompanhar o ritmo. “Quando eles escutam algumas histórias ou música s, me perguntam logo: “Pai, essa m úsica é de tio Gonzaga?” ou “pai eu vi um retrato de tio Gonzaga na tele visão”, contou o músico. E o São Jo ão para eles é com o para nós. “É para da nçar quadrilha, soltar fogos, acende r fogueira, comer milho assado”, diss e Luiza. Mas não é todo mundo que po de ouvir Asa Branca ou o Xote das Men inas, músicas do re i, na noite do Nordes te e dizer: “Ei, essa música é do meu tio ”.