B A R U L H O D 'ÁG UA M Ú S I CA
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1133 – Utopia, novo álbum de Sidnei de Oliveira (RS/SP), traz músicas inspiradas por influências vividas em Cazuza Ferreira e Berlim Disco de 12 faixas instrumentais utiliza quatro afinações diferentes e busca refletir como o músico absorve e compartilha sua imersão em duas culturas distintas e com várias peculiaridades, mas complementares
C O M EC E A Q U I
A Viola Caipira como estandarte (Sidnei de Oliveira)* Contato Dia do Violeiro (18 de maio) Parceiros e colaboradores
FO T O S D O F L I C K R
A audição matinal de todos os sábados aqui na redação do Barulho d’água Música , em São Roque, Interior de São Paulo, começou neste dia 8/12 com Utopia , álbum instrumental ainda cheirando à tinta fresca, posto que recém-lançado, com 12 faixas autorais do compositor, pesquisador e arranjador Sidnei de Oliveira , gaúcho de São Francisco de Paula (RS) radicado na cidade de São Paulo. Segundo álbum da carreira do músico, Utopia vem mostrar conforme as palavras do próprio autor o “outro lado” dele, não apenas o musical, mas também o do perfil artístico que envolve a obra do compositor. Parte das músicas foi composta na capital da Alemanha, a cidade de Berlim , durante o período de doutorado dele pela Universität Leipzig : são composições imersas por leituras filosóficas e vivência de uma nova cultura, ligada principalmente às artes locais, e que dialogam com as demais composições, desenvolvidas no Brasil . O álbum ainda traz informações no encarte em Português, em Alemão e em Espanhol. Em Berlim, Sidnei de Oliveira cursou Filosofia da Música em grau de Mestrado e tinha como principal tema de dissertação o drama wagneriano Tristan und Isolde e a filosofia de Arthur Schopenhauer . Como o primeiro álbum de Sidnei de Oliveira, Prólogo , é um trabalho de composição sob várias influências — principalmente do meio da viola caipira–, Utopia explorou outra vertente: não tem nenhuma composição relacionada ao universo do disco anterior, tanto é que a única composição deste segundo disco
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baseada em algum gênero musical ou ritmo possível de classificação é a faixa #9: trata-se de uma Chacarera, ritmo
E S T A T Í S T I C A S D O B LO G
característico de Santiago del Estero – Argentina e muito tocado no Rio Grande do Sul.
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Em Prólogo Sidnei de Oliveira gravou com cinco afinações diferentes. Já em Utopia , como o objetivo não era repercutir apenas e isoladamente a beleza da Viola Caipira, mas sim a composição musical, optou por quatro afinações de Viola Caipira em 6 obras arranjadas para o instrumento, enquanto para segunda parte — ou seja, mais 6 –, o preferido foi o Violão – sendo 5 com Violão de 12 Cordas, buscando uma sonoridade ímpar e mais próxima da Viola, e 1 com Violão de Nylon . Sidnei de Oliveira também gravou os efeitos percussivos como o Bombo Leguero, instrumento escolhido para reaproximá-lo ao máximo das próprias origens: “Desta forma eu não me distanciaria da minha essência enquanto um gaúcho nascido de Cazuza Ferreira¹ ”, observou o autor. Sidnei também apresentou comentários sobre algumas das composições de Utopia . Atmosphäre , que abre o disco, foi
a primeira música nascida em terras germânicas, com a intenção de apresentar as primeiras impressões de como ele recebia a mudança cultural em curso, em vários aspectos. Sublimar busca a conexão com o sublime e como esta qualidade é percebida no mar, no sentido metafísico da Filosofia da Música e também da metafísica do belo em Schopenhauer. Em Afluência Sidnei revela ter pensado em um processo inverso do que a academia tende a realizar quando discorre sobre Filosofia da Música, a saber, analisar a música a partir de determinada abordagem filosófica. O elemento água retorna em Afluência , que vai às fontes bebidas por Heráclito de Éfeso e dialoga, principalmente, com o devir heraclitiano — mais especificamente com o exemplo que o filósofo utiliza sobre o rio: desta forma a música está em constante mudança e não tem repetições.
Em Cazuza Ferreira, o pai e um primo de Sidnei caminham defronte à propriedade onde o músico cresceu
Cenas cotidianas de Cazuza Ferreira, onde um homem lê, e Berlim, na praça do portal de Brandenburgo, dois lugares que inspiraram o novo trabalho do gaúcho Sidnei de Oliveira
Já a influência árabe em nossa cultura surge retratada em Misturança ; À margem denota situações em que todos nós nos encontramos em determinados momentos, isto é, à margem de algo. Em Na direção dos trilhos , composta a partir do cotidiano em Berlim e na utilização de todos os espaços da cidade sobre os trilhos que a transpassam. O voz no início da música é a do locutor que informa as estações do S-Bahn (Ring) –trem cujas linhas formam um anel em Berlim; já o som que finaliza a música foi captado em um vagão dos trens da Companhia Paulista de Trens
Metropolitanos (CPTM) , em São Paulo. Aire de Chacarer a (Origem distorcida) , composta no Violão de Nylon, teve como inspiração show instrumental do gaitista Renato Borghetti e do violonista Arthur Bonilha que Sidnei de Oliveira assistiu pelo computador. “Depois de assistir ao show por completo, peguei o violão e compus um ritmo tradicional da Argentina, mas que dialoga com a cultura gauchesca”, recordou. “Origem distorcida faz parte do nome por não ser uma Chacarera² exatamente dentro das formas e compassos que caracterizam o ritmo argentino, pois utilizei a ‘liberdade poética’ para compor uma chacarera em Berlim .” A música que fecha o disco, Clamor Silenciado , não estava planejada para Utopia . Sidnei de Oliveira a compôs consternado após trágica ocorrência que abalou a cidade de São Paulo e o Brasil em 1° de maio deste ano: o incêndio, seguido de desabamento dos 24 andares, do antigo Edifício Wilton Paes de Almeida , localizado na esquina da Avenida Rio Branco com a Rua Antônio de Godói, próximo ao largo do Paiçandu. O prédio abrigava várias famílias de sem-teto e ao encerramento das buscas, em 13 de maio, o Corpo de Bombeiros contabilizou entre corpos resgatados dos escombros e outros que jamais foram localizados ao menos 9 mortos, incluindo dois garotos, gêmeos de 10 anos. Sidnei dedica o tema — durante o qual canta em tom de lamento – “a todos os moradores de rua, uma vez que são considerados invisíveis perante a sociedade” e o encerra com um poema autoral também em Português, em Alemão e em Espanhol: “‘Não adianta gritar’” “Gritar por direito silencia Silencia a voz do outro Outro… excluído como eu.” Desta forma, Sidnei de Oliveira frisa que Utopia marca um trabalho de independência composicional, pois não se rende a influências musicais, somente influências vividas, mas sem o afastamento de sua origem mesmo que metade do disco tenha sido composta do outro lado do Oceano Atlântico. Utopia , ele reforça, “não é um CD apenas de Viola Caipira, uma vez que sonoramente, muitos ouvintes não irão reconhecer as músicas que foram compostas com Viola e Violão de 12 Cordas, pois a sonoridade de cada instrumento é o que importa para o compositor ”. Sobre o encarte, vale a pena destacar: foi pensado como obra artística da qual o conteúdo musical é apenas uma parte, valorizando desde os desenhos elaborados que o próprio Sidnei assina, até as fotos de Vinícius Ribeiro Pontello — mesmo fotógrafo de Prólogo . Lenara Abreu ficou encarregada pela direção musical.
Dois blocos
Imagem da capa do álbum novo de Sidnei de Oliveira
Há, ainda, outra peculiaridade em Utopia : a foto do verso do encarte, desdobrada, tem, exatamente, o tamanho de uma capa de LP; a imagem captura uma paisagem de em Gonçalves (MG ) e é de autoria de Pontello, que fez também o instantâneo em que o violeiro toca sentado com os pés mergulhados em um rio. Sidnei de Oliveira buscou, de fato, resgatar elementos gráficos presentes em bolachões, tanto que a face de Utopia , impressa em preto, simula a de um vinil. com direito, inclusive, aos sulcos. E não é só nestes detalhes que se revelam a semelhança com os 33 rpm. Utopia tem dois lados, como um disco antigo, que Sidnei batizou de “Cazuza Ferreira” [A] e de Berlin [B], ambos representados pelos mapas dos dois lugares e que separam as músicas compostas no Brasil daquelas que produziu na Alemanha. A disposição das faixas em duas bandas representariam, portanto, os lados A e B do álbum. Mas, para além de uma divisão física e geográfica, os dois blocos revelam outra dimensão: um compositor que tem uma raiz (o RS) e a ela pertence, responsável pela formação de seus valores mais absolutos, incluindo a face caipira adquirida no distrito rural de Cazuza Ferreira e as influências culturais deste berço que, onde quer que ele vá, carregará consigo enquanto viver; e aquela que apesar de todos pertencermos a uma origem , torna o homem universal a partir da inserção em uma nova cultura, com tendências mais globalizantes, mas também impregnada de manifestações típicas e locais; no caso de Sidnei de Oliveira, entretanto nenhum destes dois lados, ambos fortes e repletos de particularidades, predomina sobre o outro, ao contrário: acabam se complementando para formar o músico que, mais do que um artista, passa a ser um cidadão do mundo, capaz de dialogar, de se expressar e de ser entendido pelo público, seja qual for o local
do planeta onde sua música for ouvida. Atualmente Sidnei de Oliveira é pós-doutorando em música pelo polo Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP) ; sua pesquisa em questão é sobre a Viola Caipira, o Violeiro, o Caipira, a indústria da cultura e o estereótipo do caipira. Sidnei discorre, principalmente, sobre o pensamento hegemônico da academia, assim como a forma romantizada do caipira que é desenvolvida em artigos e livros, sejam estes do início do século XX ou ainda nos dias de hoje.
¹ C a zuza F erreira é um distrito pertenc ente a o munic ípio de Sã o F ra nc isc o de P a ula , no esta do do R io Gra nde do Sul . A sede deste distrito fic a a 122 quilômetros da sede do munic ípio, via estra da s loc a is, R ota do Sol e R S- 0 20 . C a zuza F erreira é um dos únic os loc a is do R io Gra nde do Sul onde oc orrem a s c a va lha da s , espetá c ulo c om ma is de 120 a nos de existênc ia nesta loc a lida de e ‘torrã o na ta l’ de B a tista B ossle, a utor do Dic ioná rio Ga úc ho B ra sileiro, c onsidera da “A ma is c ompleta obra de referênc ia lexic og rá fic a do ‘idioma ’ dos g a úc hos.” (Artes e Ofíc ios Editora ). E ntre a s déc a da s de 19 7 0 a 19 80 , fic ou ma rc a do pela g ra nde explora ç ã o de ma deira : a á rvore símbolo, a ra uc á ria , foi dizima da qua se que por c ompleto na reg iã o.
2 C ha c a rera é uma da nç a e músic a popula r orig iná ria do noroeste da Arg entina [1] desde o séc ulo XIX . A músic a toc a - se g era lmente c om violã o , violino , a c ordeã o e bombo leg uero . A c ha c a rera já era da nç a da na s fa zenda s de Sa ntia g o del Estero no iníc io do séc ulo XVIII dura nte a c onquista da C oroa Espa nhola , na époc a c olonia l. A c ha c a rera pertenc e a o g rupo de da nç a s pic a resc a s , de ritmo á g il e c a rá ter muito a leg re e festivo. No c a so da c ha c a rera bolivia na a vestimenta da mulher a presenta flores esta mpa da s e sã o de c ores c á lida s, ba ba dos , a venta l e sa pa tos de sa lto ba ixo. Em nenhum c a so existem fita s de c or no c a belo, e o pentea do é uma tra nç a . J á O homem c a lç a bota s , bomba c ha s , ra stra s , c a misa , lenç o , c ha péu e, na s époc a s de frio, ponc ho . Na B olívia a c ha c a rera é ba sta nte difundida na provínc ia Gra n C ha c o e no depa rta mento de Ta rija e ma is a tua lmente tem se difundido ba sta nte na s entra da s (desfiles) folc lóric a s em L a P a z , Oruro e C oc ha ba mba .
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de Oliveira para mais um batepapo da série Retratos do Brasil – Prosa e Música, na BMA
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2 respostas para “1133 – Utopia, novo álbum de Sidnei de Oliveira (RS/SP), traz músicas inspiradas por influências vividas em Cazuza Ferreira e Berlim”
Ilidio balan 9 D E D E Z E M BRO D E 2 018 À S 09 : 10
Sempre acreditei em seu trabalho, o amor à arte e a total entrega vencendo todos os desafios , restrições e gosto musical em nosso País, nunca desviou seu foco, provando que a missão que recebeste não fora abandonada. Parabéns meu amigo.ilidio@ Res p ond er
barulhomarcel 9 D E D E Z E M BRO D E 2 018 À S 12 : 5 2
Ilidio Balan: o que apreciamos na obra de Sidnei de Oliveira é o denodo dele em ir além de alguns preceitos que regem o mercado da música, da arte, e do mundo do entretenimento já que ambos os álbuns que ele gravou são mais do que apenas discos, são complementos de um trabalho de estudos e de pesquisas universitárias, ou seja, não foram produzidos como mera mercadoria e como “mais um álbum de carreira”. Sidnei de Oliveira não faz concessões, aliás, nem mesmo à Academia, já que suas composições, observações e textos costumam questionar valores postos como pétreos e em torno dos quais já se formou consenso muitas vezes apoiados em definições e conceitos duvidosos. Res p ond er
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