CADERNOS
Aids, tratamento e ativismo
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Maio de 2009
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Ano 18 - Nº 47 - www.aids.org.br
Vinte anos depois Em 2009, o Grupo Pela Vidda/SP completa duas décadas de atuação na luta contra a aids e reforça seu compromisso de informar e debater avanços, dilemas e desafios da epidemia. Ainda que não existam respostas definitivas, nossa vocação é manter questionamentos. Quando deve ter início o tratamento? A medicação pode ser interrompida? Quem toma antirretrovirais transmite o HIV? Infectar outra pessoa é crime intencional? O Papa deve interferir na prevenção da aids? Essas são algumas das perguntas que fazemos nesta edição de Cadernos Pela Vidda.
sumário
CADERNOS PELA VIDDA Nº 47 Maio de 2009
■ editorial pela vidda, 20 anos 3 Coordenadora: Concília Ortona Vicentini
■ polêmica pessoas em tratamento transmitem o HIV? 4 ■ notícias e evidências interrupção de tratamento; risco de morte; redução de danos 6 quando deve ser iniciado o tratamento antirretroviral 7
Editor: Mário Scheffer Arte: José Humberto de Sousa Santos Tradutores voluntários: Ana Honda, Aline Violini, Dinaura Jules, Richard Steurer e Violette Nagib Amary Consultoria médica: Caio Rosenthal Conselho editorial: Ezio Távora, Jorge Beloqui, José Araújo e Pedro de Souza Impressão: Stampato
antirretrovirais no Brasil; homossexuais e sexo oral 8
Tiragem: 18.000 exemplares
colesterol; doença hepática; doença cardíaca; crack 9
(Pela Valorização, Integração e Dignidade
não-progressores; homossexuais e clamídia; terapia gênica 10
não-governamental, sem fins lucrativos,
lipodistrofia; efeitos adversos; aterosclerose; tireóide 11 interleucina; perda de gordura; cálcio; novo teste; camisinha 12 virulência; papilomavírus; soja transgênica; mercado 13 ■ sua saúde sífilis 14 câncer anal 16 anemia 17
O Grupo Pela Vidda/SP do Doente de Aids) é uma organização composta por pessoas vivendo com HIV e aids, seus amigos, familiares, companheiros e demais interessados. Diretoria do Grupo Pela Vidda/SP Presidente: Norberto Bossolani Vice-presidente: José Carlos Ferreira 1º Secretário: Luis Francisco dos Santos 2º Secretário: Maurício Prado 1º Tesoureiro: Vicente Roberto Alves Hortega 2º Tesoureiro: Rogerio de Jesus Ribeiro
■ manuais promoção da adesão 18 abordagem consentida 19
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■ opinião criminalização da infecção pelo HIV 21
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■ ativismo petição dirigida ao papa 24 por mudanças na prevenção 25 acesso à justiça e direito à saúde 26 responsabilidade do setor privado 27 irregularidade na Internet 28
Colaboradores desta edição Claudio Pereira, Fernando Fulanetti, Irina Bacci, Jaime de Souza, Jorge Beloqui, Maria Hiroko Watinaga, Marina Morena A. Barbosa e Sérgio Ribas. Parceria Esta edição foi financiada pelo Programa Nacional de DST/Aids do Ministério da Saúde em convênio com a Unesco Doações Grupo Pela Vidda/SP, banco Bradesco,
■ pela vidda um ano do centro de referência da diversidade 29 viaje bem com camisinha; chá positivo 31
agência 3130-5, conta 47.630-7
Arte da capa: Marcelo Pitel
editorial
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O Grupo Pela Vidda São Paulo completa 20 anos de existência em 2009. Surgiu como uma das respostas originais da sociedade civil à chegada e à rápida propagação de uma doença incurável, e, na época, sem tratamento. Uma doença que trazia à deriva outra “epidemia”, que combinava preconceito e desinformação. Fundado em 1989, no Rio de Janeiro, pelo escritor Herbert Daniel, e alguns meses depois em São Paulo, o Grupo Pela Vidda (Valorização, Integração e Dignidade do Doente de Aids) nasceu com a bandeira em punho de afirmação dos direitos civis, para dar voz às pessoas que vivem com HIV e aids, combatendo o estigma e a discriminação. Em duas décadas de participação ativa na luta contra aids, o Grupo Pela Vidda/SP tem realizado diferentes ações integradas: prestação de serviços e reuniões de convivência e apoio, nas quais abre espaço para a discussão sobre viver com HIV e aids; atuação ao lado de outras ONGs no acompanhamento crítico das políticas públicas e no desenvolvimento de respostas coletivas; execução de ações de prevenção, dirigidas sobretudo aos homossexuais e a outras populações vulneráveis. Outra marca do Pela Vidda/SP tem sido a tentativa de expandir a luta contra aids para além dos muros da saúde, atuando na área cultural, com a mostra de filmes Cinema Mostra Aids e na área da assistência e da proteção social, com a manutenção do Centro de Referência da Diversidade. Nesses 20 anos de história, o Pela Vidda/SP também assumiu como prioridade a divulgação de informações sobre a escalada e as agruras do tratamento do HIV e da aids. Este Cadernos Pela Vidda, assim como a página do grupo na Internet
(www.aids.org.br), materializam a importância da comunicação como instrumento de melhoria das condições de saúde e de vida das pessoas que vivem com HIV e aids. A vocação do Pela Vidda para “tradução” do conhecimento médico e científico sobre aids surgiu na esteira dos acontecimentos da década de 1980, marcada pela descoberta do primeiro caso de aids, pela identificação do HIV, pelo desenvolvimento do primeiro teste para detectar o vírus, pela aprovação do primeiro antirretroviral – o AZT. Foi assim que assistimos ao fim da modesta monoterapia com o AZT e, em seguida, a combinação de dois medicamentos que ofereciam aos pacientes benefícios passageiros. Comemoramos o progresso da terapêutica, após a introdução, em 1995, dos inibidores da protease, tornando mais potentes e eficazes as combinações de medicamentos, também conhecidas como “coquetéis”. Sempre a serviço do ativismo pela garantia do acesso e da qualidade da assistência, não deixamos de acompanhar a atuação da indústria farmacêutica, as mudanças nas condutas médicas, a adesão ao tratamento, os efeitos colaterais, entre outros problemas de saúde e, ainda, a evolução no terreno da epidemiologia, da prevenção e da busca por uma vacina. Esta edição de Cadernos Pela Vidda mais uma vez mostra que o saber humano é tão dinâmico quanto a epidemia da aids. A cada evidência, um novo desafio; a cada passo à frente, uma nova preocupação. Mas fica a certeza de que mesmo a ciência e os programas governamentais não teriam chegado até aqui sem essa extraordinária rede comunitária e solidária, à qual o Pela Vidda/SP tem o maior orgulho de pertencer.
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Pela Vidda, 20 anos
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polêmica
Pessoas em tratamento transmitem o HIV? Quatro renomados pesquisadores suíços deixaram em polvorosa o meio médico e científico ao divulgarem documento afirmando que as pessoas soropositivas que estão em tratamento antirretroviral eficaz e que não têm outras doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) não transmitem o HIV por via sexual
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Publicada no Bulletin of Swiss Medicine (Boletim Médico Suíço), em 2008, a declaração afirma que “após a revisão da literatura médica e extensiva discussão, a Comissão Federal Suíça para a infecção pelo HIV/aids conclui que uma pessoa soropositiva sob tratamento antirretroviral (ARV), com completa supressão viral (terapêutica eficaz) não é sexualmente infecciosa, ou seja, não transmite sexualmente o HIV.” Segundo o documento, a constatação se aplica apenas se a pessoa segue corretamente o tratamento, com a adesão avaliada regularmente pelo médico; se for constatada a supressão da carga viral (menor que 40 cópias/ml), pelo menos por um período seguido de seis meses; e se não co-existirem outras infecções de transmissão sexual. Mas logo no início o artigo adverte que os dados médicos e biológicos disponíveis não permitem provar que é impossível a infecção pelo HIV sob tratamento antirretroviral. Se, por exemplo, a transmissão não ocorreu em cem casais observados durante dois anos, isso não quer dizer que se 10 mil casais fossem observados durante dez anos, isso não viesse a acontecer. Segundo os autores, a situação é análoga ao que aconteceu em 1986, quando se declarou que “o HIV não
se transmite pelo beijo”. Esta conclusão não foi provada, mas após mais de 20 anos de experiência é plausível que a afirmação seja verdadeira.
Evidências São citados pelos autores dois estudos já realizados com casais sorodiscordantes, um que demonstrou que o risco de transmissão depende da carga viral do parceiro soropositivo e outro que não verificou infecções nos parceiros de soropositivos sob medicação antirretroviral, em comparação com uma transmissão de 8,6% entre parceiros de pessoas não tratadas. Dois outros estudos conduzidos em países africanos e apresentados na CROI 2009 (confêrencia sobre retrovírus e doenças oportunistas) corroboram da tese dos estudos citados pelos suíços, de que existe um risco reduzido de transmissão do HIV em casais heterossexuais sorodiscordantes, quando o parceiro soropositivo para o HIV se encontra sob tratamento. Outra evidência citada é que a transmissão do HIV da mãe para o bebê depende da carga viral da mulher, infecção que pode ser evitada tratando-a com antirretrovirais. Também há provas, segundo os autores, de que o tratamento efi-
caz elimina o HIV nas secreções genitais. A carga viral do HIV, medida no esperma, cai para níveis indetectáveis na presença de antirretroviral, da mesma forma que a carga viral também é indetectável nas secreções genitais das mulheres sob essa medicação. Embora existam células associadas ao genoma viral nas secreções genitais, mesmo com os medicamentos ARVs, isso não se traduz em infecciosidade, uma vez que estas células não têm marcadores de proliferação viral. A concentração do RNA do HIV no esperma está relacionada com o risco de transmissão. Portanto, o risco de transmissão chega a zero, quando não existe carga viral no esperma. O documento suíço enfatiza exceções e limitações das conclusões. Algum tempo após a interrupção do tratamento a carga viral no sangue aumenta rapidamente. Existe, pelo menos, um caso reportado de transmissão durante este período. Nos pacientes que não estão sob tratamento com ARVs, algumas doenças sexualmente transmissíveis fazem aumentar a carga viral nas secreções genitais. A contagem da carga viral cai apenas após o tratamento da infecção. Por fim, a comissão suíça não recomenda o início do tratamento
Críticas e contrapontos A declaração suíça passou a ser bastante criticada. Entre suas supostas limitações estaria o fato de que ela se aplica somente para o intercurso vaginal; não aborda o sexo entre homens, que constitui um modo significativo de transmissão em muitas regiões do mundo, ou o sexo anal entre homens e mulheres. Após a publicação dos suíços, um artigo de autoria de médicos alemães publicado na revista Antiviral Therapy, afirmou que um homem transmitiu o HIV ao seu parceiro regular apesar de estar sob terapêutica antirretroviral e de ter carga viral indetectável no sangue. Os autores acreditam que este é o primeiro caso documentado de transmissão sexual a partir de uma pessoa com carga viral indetectável.
Já investigadores franceses publicaram na revista AIDS um artigo que afirma que 5% de 145 homens sob terapêutica antirretroviral com carga viral indetectável no sangue, tinham HIV detectável no esperma. Nenhum destes homens tinha uma doença sexualmente transmissível (DST). O HIV é transmitido principalmente pelo sexo anal e vaginal desprotegido. Sabe-se que o vírus está presente no sangue e nos fluídos genitais. A infecção pelo HIV depende da exposição de células suscetíveis a uma quantidade infecciosa de HIV. Os níveis de carga viral no sangue e sêmen estão relacionados, mas não são iguais. Não é possível determinar quão infeccioso é um indivíduo HIV-positivo a partir de sua carga viral no sangue a menos que seja determinada a extensão da associação entre a carga viral no sangue e no sêmen. Entender a relação entre a carga viral no sangue e no sêmen é essencial para estimar o risco potencial da terapia antirretroviral na redução do risco da transmissão do HIV. Numa comparação entre 19 estudos, publicada no Sexually Transmitted Diseases, percebeu-se grande variedade de resultados sobre a relação entre o ní-
vel de carga viral do HIV no sangue e no sêmen. Foram identificados quatro fatores que podiam influenciar potencialmente a relação entre as cargas virais no sangue e no sêmen: doenças sexualmente transmissíveis, adesão à terapia anti-HIV, resistência aos medicamentos e o estágio da infecção pelo HIV.
Opinião de Cadernos Pela Vidda Enquanto permanece a polêmica, sem evidências científicas definitivas, as mensagens sobre prevenção devem continuar ressaltando a importância do uso do preservativo e outras estratégias de redução de riscos, mesmo se a pessoa estiver tomando medicamentos antirretrovirais, com carga viral indetectável.
Fontes: NAM (www.aidsmap.com) e Grupo de Incentivo à Vida (www.giv.org.br). Principal artigo consultado: Vernazza P et al. Les personnes séropositives ne souffrant d’aucune autre MST et suivant un traitment antirétroviral efficace ne transmettent pas le VIH par voie sexuelle. Bulletin des médecins suisses 89 (5), 2008.
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antirretroviral puramente por razões preventivas. Além dos custos envolvidos, argumenta-se que não é certo que as pessoas soropositivas para o HIV possam estar suficientemente motivadas para aderir ao tratamento a longo prazo. Reforçam que as falhas de adesão ao tratamento facilitam o desenvolvimento de resistências e que, por isso, uma medida preventiva baseada nos antirretrovirais só estaria indicada em “circunstâncias excepcionais para pacientes altamente motivados”. A Deutsche AIDS-Hilfe, a maior organização não-governamental de luta contra a aids da Alemanha, divulgou em abril de 2009 um posicionamento apoiando a declaração suíça. Mas a ONG defende que se estiverem reunidas diversas condições (carga viral indetectável, adesão total e ausência de lesões nas mucosas) a abordagem do tratamento é tão eficaz quanto o uso do preservativo.
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notícias e evidências
A informação ainda é o melhor remédio Pesquisadores, médicos e cientistas do mundo inteiro apresentam cada vez mais novidades, avanços e preocupações no campo do HIV e da aids. Confira a seguir as principais notícias divulgadas em congressos internacionais, publicações especializadas e outros meios de comunicação
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Interrupção de tratamento
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Passaram-se mais de dois anos do estudo SMART, a maior pesquisa já feita sobre interrupção de tratamento com antirretrovirais (ARVs). O estudo não foi adiante devido à constatação de que havia um risco maior de progressão da aids e de mortalidade entre as pessoas que interrompiam o tratamento. O SMART foi um estudo internacional – feito também no Brasil – de grandes dimensões, que estudou a interrupção estruturada e programada do tratamento versus o tratamento continuado com ARV. Participaram do SMART pessoas em tratamento com ARV e com contagem de CD4 superiores a 350 células/mm3. Elas foram divididas em dois grupos: aquelas que continuavam o tratamento e as que interrompiam até a queda do CD4, com o teto de 250 células/mm3. Como consequência dos resultados do SMART, as interrupções de tratamento, antes populares, passaram a ser fortemente desaconselhadas e até mesmo descartadas. Resultados de um outro estudo, realizado na Itália e chamado LOTTI, agora sugerem a ausência de ris-
co elevado de doença ou morte após uma interrupção terapêutica. O estudo, que tem despertado polêmica na comunidade médica, mostra que o tratamento interrompido, em pessoas com CD4 acima de 350 células mm3, apresentava resultados equivalentes ao tratamento continuado. O LOTTI é um estudo longo (quatro anos de
Fatores de risco de morte Uma grande pesquisa sobre a segurança do tratamento anti-HIV concluiu que fatores de risco que, pelo menos parcialmente, podem ser controlados pelos pacientes, aumentaram a probabilidade de morte dos participantes do estudo. Desde 1999 o estudo D.A.D vem reunindo informações sobre a segurança do tratamento antirretroviral, bem como sobre as doenças e as mortes ocorridas entre as cerca de 33 mil pessoas observadas. Foram registradas quase 2,2 mil mortes desde o início do estudo. Os pesquisadores constataram que a taxa anual de mortes caiu de 1,6% (valor inicial) para 1%. As do-
seguimento, ainda em andamento), no qual 329 pacientes são divididos em dois grupos: aqueles que recebem o tratamento contínuo e aqueles que interrompem o tratamento quando a contagem de CD4 atinge mais de 700 células/mm3, retomando o tratamento quando o CD4 cai para menos de 350 células/mm3.
enças relacionadas com o HIV continuaram a constituir a causa de morte mais comum (32%), seguida de doença hepática (14%), cânceres não relacionados com o HIV (12%) e doenças cardiovasculares (11%). Alguns fatores, como idade e sexo, também foram associados a um aumento do risco de morte. Mas os pesquisadores concluíram que alguns fatores passíveis de ser controlados também aumentaram a probabilidade de morte dos participantes do estudo: perda de peso, o hábito de fumar, diabetes, hipertensão, e co-infecção pelo vírus da hepatite C. A baixa contagem de CD4 e a carga viral elevada foram igualmente identificadas como fatores de risco.
Redução de danos Ativistas de direitos humanos alertam que a nova declaração das Nações Unidas sobre o combate às drogas no mundo poderá comprometer a política de redução de danos e a prevenção da transmissão do HIV. A declaração omite qualquer menção às medidas de redução de danos, incluindo a troca de agulhas e seringas e programas de substituição de opiáceos, o que a maioria dos especialistas em saúde pública considera essencial para o sucesso da prevenção e do tratamento do HIV entre usuários de drogas. A declaração restritiva foi resultado da articulação internacional de países que se opõem à redução de danos, incluindo a Suécia, os Estados Unidos e a Rússia. Estes países são a favor da continuidade da abordagem internacional de controle de drogas estabelecida em 1998, centrada exclusivamente na repressão da produção, comércio e consumo de drogas. O Brasil parece manter sua posição favorável à política de redução de danos. O Ministério da Saúde anunciou que, em 2009, vai destinar R$ 1,4 milhão para financiar projetos a serem executados por instituições governamentais, não governamentais e universidades.
Pesquisadores identificaram um novo padrão para iniciar o tratamento com medicamentos contra a aids, de acordo com um relatório publicado na versão online do jornal The Lancet. A decisão de quando começar o tratamento tem sido um “pêndulo”, diz o editorial que acompanha o estudo. O marcador em questão é a contagem de CD4, que representa quantas células de defesa atacadas pelo vírus da aids são encontradas em um milímitro cúbico de sangue. A Organização Mundial de Saúde (OMS) e os consensos de vários países, inclusive a diretriz brasileira mais recente, recomendam iniciar o tratamento antiHIV quando a contagem de CD4 estiver entre 200 e 350. A nova análise, que examinou 18 estudos com 45 mil pacientes americanos e europeus, concluiu que, até hoje, a decisão de começar mais cedo salvou mais vidas. Por isso, concluem os pesquisadores, o tratamento deveria começar logo quando a contagem cai para 350. Se é verdade que um tratamento prematuro agressivo pode evitar a explosão do HIV, também é certo que medicamentos antirretrovirais podem causar redistribuição de gorduras, hepatite, falência dos rins e elevação do risco de doenças cardíacas, dentre ou-
tros efeitos adversos. Ainda que sejam menos tóxicos, os novos medicamentos nem sempre estão disponíveis, principalmente para países pobres e em desenvolvimento. Longo prazo A tese de antecipar ao máximo o início do tratamento é reforçada por pesquisadores norte-americanos e australianos que identificaram, em dois estudos independentes, um grupo de pessoas que, apesar de apresentarem uma redução bem sucedida da carga viral (a níveis indetectáveis), não assistiram as células CD4 atingirem níveis normais. Em alguns casos isso não aconteceu mesmo depois de dez anos de tratamento antirretroviral. Assim, crescem novamente as evidências de uma relação entre as baixas contagens de CD4 pré-tratamento e a recuperação incompleta no decorrer do tratamento. Aumentam, com isso, os argumentos a favor da tese que prega o início mais precoce do tratamento antirretroviral. A contagem de CD4 continua sendo frequentemente utilizada para determinar quando começar o tratamento. Em 2008, as principais diretrizes mundiais passaram a considerar que o adiamento do início do tratamento (até que os níveis de CD4 caiam para valores inferiores a 200 células/mm3) pode trazer resultados desfavoráveis para os pacientes. O atual consenso brasileiro adotou
a recomendação de iniciar o tratamento para as pessoas assintomáticas com contagem de CD4 entre 200 e 350 células/mm3 . A contagem de células CD4 sobe rapidamente nos primeiros seis meses após o início do tratamento. Depois, cai a velocidade da recuperação, mas os valores de CD4 continuam a subir, até atingir contagem superior a 500 células/mm3, um valor considerado dentro dos limites normais das pessoas que não estão infectadas pelo HIV. Alguns estudos sobre a recuperação do sistema imunitário notaram a existência do chamado efeito plateau, no qual os valores das células CD4 estabilizam depois de um período de aumento inicial. A maioria das pessoas com HIV em tratamento atinge a recuperação completa do sistema imunitário, mas alguns pacientes não alcançam essa meta de 500 células, apesar de conseguirem manter a carga viral controlada. Outros estudos têm relacionado a ausência de recuperação com resultados clínicos menos favoráveis, incluindo um maior risco de doenças não exatamente relacionadas com a aids, como doenças cardíacas e câncer. Mais estudos Dois outros estudos apresentados na CROI 2009 (a conferência anual internacional sobre retrovírus e infecções oportunistas) também pesquisaram o valor do tratamento precoce para o HIV, mas apresentaram re-
sultados contraditórios. Um estudo realizado nos Estados Unidos incluiu mais de 9 mil pacientes que iniciaram tratamento com contagem de células CD4 por volta das 500 células/mm3. Mostrou que essas pessoas apresentaram uma probabilidade 60% inferior de progressão da aids e morte em comparação com as pessoas que esperaram que a sua contagem de CD4 caísse antes de iniciarem o tratamento. No entanto, o desenho do estudo era incapaz de responder a uma questão chave – se existe uma diferença com significado estatístico entre iniciar o tratamento no intervalo entre 350-500 células células/mm3 em comparação com o início do tratamento acima das 500 células/mm3 . Um segundo estudo que incluiu mais de 20 mil pacientes mostrou que iniciar o tratamento com uma contagem de células CD4 acima de 450 células/mm3 não reduziu o risco de progressão para aids ou de morte. A pesquisa mostrou, no entanto, que havia um claro benefício em iniciar o tratamento com a contagem de células CD4 entre 350 e 450 células/mm 3 quando comparado com o início do tratamento no momento em que a contagem de células está entre 250 e 350 células/mm3. Diante dos resultados aparentemente contraditórios entre vários estudos, uma resposta definitiva só deverá ser obtida com a realização de mais e maiores ensaios sobre quando iniciar o tratamento.
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A polêmica continua: quando iniciar o tratamento?
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notícias e evidências
Antirretrovirais no Brasil Já está disponível no Sistema Único de Saúde (SUS) o medicamento raltegravir, que integra uma nova classe de antirretrovirais, chamada inibidores da integrase. Ele impede a inserção do DNA do HIV no DNA da célula humana, inibindo uma enzima do vírus chamada integrase. Tratase de um novo mecanismo, que reduz a capacidade do vírus da aids de se replicar e infectar novas células. Os pacientes que podem se beneficiar são aqueles que já desenvolveram resistências a outros antirretrovirais e, por isso, estão em falência imunológica. Outro medicamento que pode vir a ser liberado pelo Ministério da Saúde para tra-
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Homossexuais e sexo oral
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Segundo pesquisadores suecos, em artigo publicado na edição online da revista AIDS, alguns homens soronegativos em relações de longo prazo com homens soropositivos, apresentam na saliva anticorpos que podem inibir a infecção pelo HIV. Esta é a primeira vez que essa possível inibição do HIV é descrita na saliva, o que pode ajudar a explicar o motivo pelo qual a infecção por meio de sexo oral é notificada com baixa frequência, mesmo em casais sorodiscordantes – quando um é positivo e
tamento da aids é a etravirina, um inibidor da transcriptase reversa não-análogo de nucleosídeo, indicado para pessoas com resistência anterior à medicação antirretroviral. Vem juntarse a outros dois da mesma classe, já disponíveis no Brasil, o efavirenz e a nevirapina. Também deverá ser motivo de análise em 2009, por parte do comitê de especialistas que assessora o Programa Nacional de DSTAids na definição do consenso terapêutico brasileiro, a inclusão ou não do maraviroque, um antirretroviral que inaugura uma nova classe de medicamentos chamada antagonistas do co-receptor CCR5. O medicamento é indicado para pacientes que passaram por falências com tratamentos anteriores. Para saber se o pacien-
te tem afinidade com o CCR5, condição para tomar o raltegravir, é preciso realizar um exame chamado teste de tropismo. Tanto a etravirina quanto o maraviroque já foram aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Mesmo antes da incorporação no consenso terapêutico, vários pacientes já usam esses medicamentos no Brasil, seja porque participam de um ensaio clínico ou porque obtiveram via ação judicial. E, ainda, por via administrativa, isso no caso do programa de aids de São Paulo, que analisa as prescrições individualmente e, se a recomendação estiver correta, adquire o antirretroviral antes mesmo de o medicamento estar incorporado na diretriz nacional.
outro negativo para o HIV. Atualmente está bem estabelecido que a infecção pelo HIV pode ocorrer durante a prática de sexo oral desprotegido. Por outro lado, o número de infecções que pode ser atribuído ao sexo oral é relativamente pequeno, se levado em conta o número de vezes em que esse tipo de atividade sexual é praticado sem proteção. Uma razão pela qual isso acontece seria então o fato de que a saliva contém enzimas que inibem parcialmente a infecção. Alguns estudos, como a famosa pesquisa envolven-
do prostitutas no Quênia, identificaram algumas pessoas que não se infectaram, apesar de praticarem sexo vaginal desprotegido, com exposição continuada ao HIV. Acredita-se que essas mulheres adquiriram uma resposta imunitária mais forte, o que diminuía a probabilidade de se infectarem pelo HIV. Muitos pesquisadores analisaram vários dos marcadores dessa resposta imunitária, como a presença de anticorpos específicos (IgA1) que podem neutralizar o HIV; ou a presença de respostas por parte de células CD4 específicas.
Genéricos Em fevereiro de 2009 foi entregue o primeiro lote do efavirenz genérico nacional, que passou a ser produzido pelo laboratório estatal Farmanguinhos. Atualmente, 85 mil pacientes usam o efavirenz no Brasil. O medicamento teve seu licenciamento compulsório decretado pelo governo federal em 2007. Devido ao atraso de Farmanguinhos na produção, o Brasil ainda deve, até 2010, continuar importando da Índia parte do efavirenz distribuído pelo SUS. Já o tenofovir, que teve sua patente rejeitada no Brasil, deverá ser o próximo medicamento anti-HIV a ser produzido no País, por meio de parcerias entre laboratórios nacionais públicos e privados.
No estudo da Suécia também acredita-se que a exposição repetida ao HIV durante o sexo oral produz na saliva essa mesma resposta imunitária específica. Assim, é provável que o efeito inibidor de IgA1 contribua significativamente para a neutralização do vírus. A conclusão do estudo é que “o sexo oral não protegido evoca uma resposta salivar IgA1-mediada, neutralizadora do HIV, que persiste no tempo durante a exposição continuada, em homens não infectados, parceiros de homens infectados”.
Os níveis de colesterol e triglicérides podem sofrer alterações nas pessoas soropositivas, tanto naquelas que ainda não iniciaram o tratamento quanto nas que sofrem os efeitos colaterais de alguns medicamentos antirretrovirais, em particular os inibidores da protease. Mas as pessoas que vivem com HIV também podem apresentar outros fatores de risco para doenças cardiovasculares, incluindo a idade avançada e o hábito de fumar. Para reduzir o risco de doenças do coração os médicos geralmente recomendam mudanças do estilo de vida, tais como uma dieta mais saudável e a prática regular de exercícios físicos. Se essas medidas não forem capazes de baixar os níveis de colesterol e de triglicérides, podem
Doença hepática O tratamento antirretroviral pode não ser o causador de certas doenças hepáticas. Estudo de um grupo de pesquisadores ingleses, divulgado na edição de abril de 2009 da Journal of Acquired Immune Deficiency Syndromes, contradiz, assim, um estudo anterior que sugeria uma associação entre o tratamento prolongado com ddI (didadosina) e o desenvolvimento de doença no fígado. Doenças he-
ser receitados medicamentos, geralmente as estatinas, para tratar o colesterol alto; e os fibratos, para baixar os níveis elevados dos triglicérides. De acordo com um estudo financiado pela Fundação Kaiser, da Califórnia, EUA, as pessoas que vivem com HIV, se comparadas às pessoas soronegativas, podem não ter a mesma resposta ao tratamento para baixar os lipídios no sangue. Além disso, as respostas nas pessoas soropositivas variavam de acordo com o esquema antirretroviral e com o medicamento usado para baixar os níveis dos lipídios. Os resultados foram publicados nos Annals of Internal Medicine. Assim, para tratar de modo mais agressivo o colesterol elevado nas pessoas com HIV, é também importante otimizar o estilo de vida, combatendo a obesidade e a hipertensão.
páticas em geral (hepatite B, hepatite C e aquelas causadas pelo consumo excessivo de álcool ou pelos efeitos tóxicos dos medicamentos) são uma causa importante de adoecimento e morte entre as pessoas com HIV. Os soropositivos podem apresentar elevações das enzimas hepáticas e, em alguns casos, lesão hepática grave, sem qualquer motivo aparente. Esta situação é chamada de doença hepática criptogênica (de origem desconhecida).
Consumo de crack Segundo estudo publicado na revista Journal of Acquired Immune Deficiency Syndromes, o uso de crack acelera a progressão da infecção pelo HIV. Conduzida em Miami, EUA, a pesquisa mostrou que os usuários de crack, além de terem baixa adesão aos tratamentos antirretrovirais – não tomam os medicamentos nos horários e nas dosagens adequadas –, apresentavam uma diminuição mais rápida na contagem de CD4 e um aumento mais acelerado da carga viral. O estudo, que durou 30 meses e envolveu 222 usuários da droga, mostrou uma aceleração significati-
Antirretrovirais e doença cardíaca É importante a discussão sobre a possível ligação entre o tratamento antirretroviral para o HIV e um aumento do risco de doenças cardíacas. Estudos apresentados na CROI 2009 indicam que o abacavir, bem como alguns inibidores da protease, estão relacionados com um aumento do risco de doenças cardiovasculares. Há cerca de dez anos o estudo D.A.D tem conseguido reunir informações sobre os efeitos secundários dos medicamentos antirretrovirais. Dados recentes demonstraram que o tratamento com abacavir aumentava em
va do declínio das células CD4 para um nível de sintomas já considerado diagnóstico de aids , além de uma elevação rápida da carga viral, independentemente do uso de antirretrovirais. A conclusão foi que o uso do crack apresenta um mecanismo de ação que pode contribuir para a progressão da doença. Em países como Brasil, onde o consumo de crack tornouse uma verdadeira epidemia em centros urbanos, esses dados constituem mais uma prova importante da necessidade de intervenções dirigidas à diminuição do consumo de crack, sobretudo entre as pessoas infectadas pelo HIV.
dobro o risco de um ataque cardíaco e que a utilização de ddI (didadosina) eleva este risco em 50%. Os resultados mostram também que esse risco não aumenta quando se utiliza o tenofovir. A investigação demonstra igualmente que os inibidores da protease indinavir e lopinavir/ritonavir também podem aumentar o risco. Os resultados de um estudo francês realizado separadamente e também apresentado na CROI 2009 demonstram que o tratamento recente com o abacavir duplicava o risco de doença cardíaca bem como a utilização do lopinavir/ritonavir e do fosamprenavir.
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A importância da redução do colesterol
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notícias e evidências
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Não-progressores
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Os não-progressores a longo prazo são pessoas HIVpositivas que não precisam iniciar tratamento com antirretrovirais, pois não apresentam sintomas da aids e suas contagens de CD4 são superiores a 500 células/mm3 pelo menos oito anos após a infecção pelo vírus. Por isso, pesquisadores acreditam que alguns fatores precoces de prognóstico podem ser associados a uma não-progressão a longo prazo da infecção. De acordo com um grupo de estudiosos franceses, em estudo publicado no Journal of Acquired Immune Deficiency Syndromes, essas pessoas apresentam níveis muito baixos de DNA do HIV logo após a infecção, bem como aumentos mais lentos desse marcador ao longo do tempo. Grande parte da investigação sobre esse pequeno grupo de pacientes – que representa apenas entre 1% e 5% de todas as pessoas infectadas – é centrada na evolução futura, a partir do momento em que são identificados como não-progressores. Assim, sabe-se pouco sobre os primeiros anos da infecção pelo HIV nessas pessoas. O que os pesquisadores franceses se propuseram foi justamente descrever o curso da infecção num grupo de 664 pacientes infectados há muitos anos e que apresentavam uma contagem de CD4 acima das 500 células/mm3. Descobriram que 60 desses pacientes ainda se mantinham assin-
tomáticos e apresentavam um valor de CD4 superior a 500, sem tratamento, oito anos após o diagnóstico. Eram, portanto, não-progressores a longo prazo. Ao estudar esses pacientes, os resultados mostraram que as pessoas com carga viral de base (inicial) e DNA do HIV de base abaixo dos limites de detecção, têm 60% de possibilidade de tornarem-se não-progressores a longo prazo. O estudo mostrou que o estado de não-progressor pode ser estabelecido no início da infecção.
Terapia gênica A terapia gênica no tratamento da aids é promissora, mas na prática ainda está longe de poder substituir o uso de antirretrovirais. É o que mostram os resultados do primeiro teste clínico para avaliar a eficácia da terapia gênica no combate ao HIV, publicados em artigo de Ronald Mitsuyasu, da Universidade da Califórnia (EUA), e colegas na revista científica Nature Medicine. Houve uma pequena melhora nos níveis de linfócitos CD4 nos indivíduos tratados. Porém, não houve redução da carga viral nos pacientes. O teste foi feito com 74 pacientes. Eles receberam ou placebo ou células-tronco de sangue (glóbulos brancos em estágios iniciais de desenvolvimento) contendo
Homossexuais e clamídia Os homens homossexuais deveriam testar a presença da clamídia no reto, como parte dos cuidados de saúde, segundo recomendação de investigadores num artigo publicado na edição online da Sexually Transmitted Infections. De acordo com estudo conduzido no Reino Unido entre 2005 e 2006, que incluiu 3.076 homens, 8% dos participantes tinham clamídia retal e 5% clamídia uretral. A prevalência da clamídia foi
uma sequência de RNA. Essa sequência, chamada pelos pesquisadores de OZ1, atua como uma enzima que ataca o RNA do HIV, impedindo-o de produzir duas proteínaschave. A OZ1 se mostrou segura e não causou efeitos adversos durante o tratamento _ao contrário dos antirretrovirais, que costumam provocar efeitos colaterais nos pacientes. Segundo o artigo, o estudo indica que a terapia gênica é segura para tratar pessoas com HIV e pode ser desenvolvida como uma terapia convencional para aids. Os autores do trabalho afirmam que o estudo é um “grande avanço na área”. A terapia gênica é mais uma esperança para curar a aids, uma vez que a criação de uma vacina não foi bem sucedida até o momento.
mais alta do que qualquer outra infecção, sendo que os testes mostraram que 4% dos homens tinham gonorréia retal, 5% tinham gonorréia uretral e 3% sífilis. Os investigadores debruçaram-se, então, sobre os casos de clamídia. Dos 397 homens diagnosticados com clamídia, 62% (247) tinham infecção retal, 42% (164) tinham infecção uretral e 4% (15) tinham a infecção nas duas regiões. A infecção retal por clamídia era assintomática em 69% (171) dos homens e, portanto, não teria sido diagnosticada sem a testagem. Outra descoberta revelou que mais de um terço dos homens com clamídia retal são soropositivos para o HIV. A clamídia é uma infecção bacteriana sexualmente transmissível. No Reino Unido, por exemplo, o teste para a clamídia uretral é aconselhado como teste de rotina a todos os homens que recorrem a serviços de saúde que tratam de DSTs. No entanto, o teste retal para a infecção não é normalmente disponibilizado. Recentemente foram observados em homossexuais de vários países da Europa surtos de infecção sexualmente transmissível por linfogranuloma venéreo (LGV). Esta infecção é causada por alguns tipos de clamídia e a maioria dos casos envolvia infecção retal. No Brasil, não há informações precisas sobre a prevalência de clamídia entre os homossexuais, o que dificulta a adoção de políticas e ações específicas.
Crianças e jovens com idades entre 7 e 24 anos, que vivem com HIV desde o nascimento e estão em tratamento antirretroviral, têm níveis inferiores de gordura corporal, sobretudo nos braços e pernas, quando comparados àqueles de mesma idade nãoinfectados pelo HIV. Esse é o resultado de um estudo americano publicado na revista AIDS, em março de 2009. Além disso, o estudo concluiu que o tratamento pode aumentar nes-
Kaletra x raltegravir Estudos apresentados na CROI 2009 sugerem que os pacientes com uma carga viral indetectável que mudam de lopinavir/ritonavir (Kaletra®) para o inibidor da integrase raltegravir têm melhorias significativas nos níveis de lipídeos no sangue, mas correm o risco de aumentar a carga viral. Dois estudos apresentados na conferência envolveram pacientes em tratamento com lopinavir/ritonavir que foram divididos em dois grupos de estudo: aqueles que mantiveram o tratamento e aqueles que mudaram para raltegravir. Após seis meses, 94% dos pacientes que permaneceram com lopinavir/ritonavir tinham uma carga viral indetectável, comparados com
88% dos que mudaram para raltegravir. Os estudos foram interrompidos devido ao risco aumentado de falha virológica entre aqueles que mudaram para raltegravir. Os pesquisadores estão agora tentando compreender porque motivo a mudança da associação para raltegravir gera risco de aumento da carga viral , que passa a ser detectável. As razões podem estar relacionadas com o histórico do tratamento ou com outros medicamentos antirretrovirais que o paciente esteja tomando. Mas ocorreram melhorias significativas no colesterol total, na redução do colesterol ruim e dos triglicérides entre os pacientes que mudaram para o raltegravir. As taxas de outros efeitos secundários foram semelhantes entre os dois grupos de pacientes.
Endurecimento das artérias De acordo com um estudo apresentado na CROI 2009, a infecção pelo HIV por si só aumenta a gravidade da aterosclerose tanto quanto os fatores de risco cardiovasculares tradicionais, como o tabagismo ou a diabetes. Vários estudos já demonstraram que as pessoas com HIV têm maior probabilidade de desenvolver doença cardíaca. Os mecanismos envolvidos nesse processo não são, porém, completamente co-
Avaliação da tireóide Embora a maioria das pessoas que vivem com HIV não tenha problemas na tireóide, aumentam as evidências de que um número crescente de pacientes em tratamento antirretroviral apresenta alterações nesta glândula, localizada no pescoço. Um grupo de médicos britânicos recomenda a avaliação regular da função da tireóide nas pessoas que recebem tratamento antirretroviral. A recomendação surgiu após terem descoberto uma incidência maior do que o esperado
nhecidos. A aterosclerose – o “endurecimento das artérias” provocado por um processo inflamatório local e o desenvolvimento de uma placa –, pode ser responsável por acidentes vasculares cerebrais (AVC) e ataques cardíacos (enfarte do miocárdio). O mecanismo responsável por este processo é motivo de controvérsia. A discussão é se a aterosclerose resulta da ação do próprio HIV ou se seria consequência da ação dos medicamentos antirretrovirais sobre os níveis dos lipídios no sangue.
de hipotiroidismo (quando a tireóide passa a funcionar abaixo do normal, ocasionando sintomas como ganho de peso e cansaço) entre 2437 pacientes do Hospital de Chelsea, em Londres, acompanhados desde 1999. O problema, segundo os pesquisadores, estava associado ao uso de um inibidor da protease. Também foram constatados pacientes com hipertiroidismo (situação em que a tireóide funciona acima da atividade normal, causando hiperatividade, nervosismo e irritabilidade), nestes casos associado a outro medicamento, o efavirenz.
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Lipodistrofia em crianças e jovens
ses jovens o risco de doença cardiovascular, realçando a necessidade de promover alterações no estilo de vida: parar de fumar, melhorar a alimentação, praticar exercício físico e diminuir o tempo que os jovens dedicam à televisão, jogos de computador e internet. Assim como nos adultos, o tratamento antiaids tem efeitos efeitos secundários nos jovens. Alguns medicamentos, particularmente o d4T (estavudina) e o AZT (zidovudina,), têm sido relacionados com essas alterações corporais.
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notícias e evidências
Tamanho do pênis Os homens com pênis de pequenas ou grandes dimensões (em comprimento ou perímetro) tem mais probabilidades de ter uma atitude negativa em relação ao uso do preservativo, de acordo com um artigo publicado na edição online da revista Sexually Transmitted Infections. Alguns estudos já comprovaram que existe uma melhoria da performance quando os preservativos se ajustam bem ao tamanho do pênis. Algumas dessas descobertas inclusive levaram os fabricantes a diversificar tamanhos e formas das camisinhas. O atual estudo, conduzido pelo Centro de Promoção da Saúde Sexual da Universidade de Indiana, EUA, explorou a relação entre a dimensão do pênis e as percepções dos homens quanto ao conforto e ao tamanho do preservativo. O estudo foi con-
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Interleucina
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Dois estudos internacionais de grande dimensão concluíram que a interleucina2 (IL-2), um medicamento que estimula o sistema imunológico, não tem quaisquer benefícios no tratamento da aids e pode causar efeitos colaterais graves. Dois ensaios, chamados ESPRIT e SILCAAT, demonstraram que pessoas com HIV em tratamento com injeções de IL-2 apresentavam contagens de células CD4 mais elevadas do que aqueles que toma-
duzido entre 1661 participantes maiores de 18 anos, de sete estados. Os participantes foram agrupados em três categorias segundo o tamanho do pênis: pequeno (de 4 a 12 cm), médio (de 13 a 15 cm) e grande (16 a 26 cm). Os homens da categoria “grande” tinham mais probabilidade de classificar os preservativos como muito curtos, pois não desenrolavam, eram muito apertados ao longo do pênis e em volta da glande (cabeça do pênis). Os homens na categoria “pequeno” declararam que o preservativo era largo e se enrolava na base do pênis. Diante das queixas dos homens em relação ao conforto ou tamanho do preservativo, além da ampliação da oferta no mercado, programas de saúde pública deveriam disponibilizar preservativos indicados para pênis pequenos ou grandes.
ram apenas antirretrovirais. Isso, no entanto, não se traduziu em benefícios clínicos, pois os indicadores que definem a progressão da aids e a mortalidade eram semelhantes entre os pacientes tratados com IL-2 e aqueles que apenas tomavam os medicamentos. Já as taxas de efeitos colaterais graves eram 23% mais elevadas entre as pessoas que tomavam IL-2. Acredita-se que não há qualquer benefício na continuação de estudos com IL-2.
Perda de gordura Segundo estudo apresentado na CROI 2009 (a conferência anual internacional sobre retrovírus e infecções oportunistas), o tratamento com o medicamento rosiglitazona para a diabetes aumentou a gordura localizada nos membros dos pacientes submetidos aos antirretrovirais e que sofrem de lipodistrofia (perda de gordura). Ajudou também a reduzir a resistência à insulina,
Teste do cabelo Em estudo publicado em fevereiro de 2009 pela revista AIDS, pesquisadores dos EUA afirmaram que os níveis de alguns medicamentos antirretrovirais em amostras de cabelo são um forte indicador do sucesso do tratamento anti-HIV. Os investigadores sugerem que as amostras de cabelo poderiam
Deficiência em cálcio A osteopenia – diminuição da densidade mineral dos ossos, precursora da osteoporose – perda de cálcio nos ossos – tem sido diagnosticada nas pessoas que vivem com HIV, estejam ou não sob tratamento. O tenofovir, um dos medicamentos mais utilizados atualmente, foi associado em alguns estudos a níveis mais elevados de perda mineral nos ossos. A razão, no entanto, ainda não é clara, e há dúvidas se o tenofovir
um fator de risco para a diabetes. No entanto, o medicamento não teve qualquer efeito na perda de gordura da face. O tratamento com d4T (estavudina) e com AZT (zidovudina) foi associado à perda de gordura na face, membros e nádegas. O uso destes medicamentos é agora evitado em vários países, devido ao fato desses efeitos secundários serem potencialmente angustiantes para os pacientes.
fornecer um método simples para monitorar o sucesso do tratamento, particularmente em locais com recursos de saúde limitados. O estudo visou medir , em amostras de cabelo de mulheres infectadas pelo HIV, a concentração dos inibidores de protease mais comumente usados, o lopinavir/ritonavir, o atazanavir e o ritonavir.
seria mesmo a causa direta da osteopenia. Um estudo conjunto realizado em Londres e Nova York concluiu que administrar suplementos de vitamina D às pessoas em tratamento com tenofovir pode ajuda a reduzir os níveis do hormônio que provoca a diminuição de cálcio nos ossos. A vitamina D é essencial para o metabolismo dos ossos e estudos demonstram que a deficiência em cálcio é bastante comum entre as pessoas infectados pelo HIV.
HIV mais virulento O Centro Médico Naval de San Diego, nos Estados Unidos, realizou um estudo que demonstra que o HIV pode estar se adaptando ao ser humano e se tornando mais virulento. Os pesquisadores avaliaram a taxa de células CD4 de pacientes soropositivos entre 1985 e 2007. Foram analisados dados de 2.174 pessoas com HIV que ainda não haviam iniciado o tratamento com medicamentos antirretrovirais. A contagem de CD4 havia sido
Soja transgênica Novas variedades de soja transgênica produzem e armazenam nos grãos substâncias capazes de neutralizar o HIV. As plantas, desenvolvidas pela Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, poderão servir como “fábricas vivas” do princípio ativo de um gel anti-HIV, produto promissor para prevenir a infecção entre mulheres. O trabalho é fruto da cooperação da Agência Nacional de Saúde (NIH, na sigla em inglês) dos Estados Unidos
feita seis meses após o diagnóstico do HIV. A média de CD4 caiu de 632 células/ mm3 1985 a 1990 para 514 células/mm3 entre 2002 e 2007, indicando que as infecções estavam se tornando mais virulentas. No mesmo período, o índice de pacientes com contagem de CD4 inferior a 350 células/mm3 passou de 12% para 25%. Pacientes com baixa contagem de CD4 podem ter que iniciar o tratamento mais cedo do que aqueles com taxas mais altas.
com a Embrapa. O instituto americano tem realizado um grande inventário de potenciais microbicidas naturais. Duas proteínas mostraram particular eficácia no combate ao HIV: a cianovirina-N – extraída da alga azul Nostoc ellipsosporum – e a griffithsina – obtida de algas vermelhas do gênero Griffithsia. Elas aderem à cápsula do HIV e impedem que o vírus invada as células. O NIH patenteou os genes que produzem as duas substâncias.
Um novo teste para o papilomavírus humano (HPV) foi aprovado nos Estados Unidos pelo Food and Drug Administration (FDA). O teste, Cervista HPV 16/18 (Hologic Inc), é o primeiro baseado na identificação de sequências de DNA específicas dos dois tipos de HPV de alto risco, responsáveis pela maioria dos casos de câncer cervical. Infecções persistentes pelo HPV, algumas permanecendo por muitos anos com ou sem sintomas detectáveis, são a principal causa de câncer cervical. Os novos testes são recomendados para mulheres com 30 anos de idade ou mais, ou aquelas com resultado citológico questionável, para obter uma melhor percepção do risco de câncer cervical. Dessa forma, exames de
De olho no mercado A GlaxoSmithKline e a Pfizer, dois dos maiores grupos farmacêuticos mundiais que atuam na área de pesquisa de medicamentos contra a aids, juntaram suas operações. As empresas vão unir as áreas de pesquisa sobre a doença em uma nova companhia, que controlará quase 20% do mercado de tratamentos para o vírus HIV.
Papanicolaou, identificando células anormais ao exame microscópico de amostras de células cervicais, poderiam ser acompanhados por estes testes para detectar o DNA viral, informando ao médico sobre a presença de tipos de alto risco de HPV e o risco da paciente desenvolver câncer de colo uterino. Entre os mais de 100 tipos de HPV, muitos são de baixo risco e causam verrugas ou tumores benignos. Outros são considerados de alto risco, pois a infecção leva mais frequentemente ao câncer. Mais de 12 tipos dos HPV de alto risco sexualmente transmitidos causam lesões planas, tumores difíceis de serem visualizados no colo do útero, mas a maioria destas infecções se resolve espontaneamente sem causar câncer.
Segundo analistas, as companhias decidiram se unir pois estão enfrentando alguns problemas na área do HIV. O maraviroque, da Pfizer, não estaria se se saindo tão bem e a Glaxo está sofrendo concorrência direta da Gilead e da Bristol. Um dos objetivos será desenvolver terapias combinadas de dose fixa, utilizando drogas novas e já existentes.
Fontes: CROI 2009 (16th Conference on Retroviruses and Opportunistic Infections); Kaiser Foundation; The Lancet; Clinical Care Options HIV/ AIDS; Annals of Internal Medicine; AIDS (International Aids Society); Journal of Acquired Immune Deficiency Syndromes; Sexually Transmitted Infections; BETA (The San Francisco AIDS Foundation); Remaides (Aides); Programa Nacional de DST-Aids e UOL Ciência.
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Papilomavírus
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sua saúde
Sífilis e HIV Com aumento de casos registrados em diversos países entre pessoas que vivem com HIV, a sífilis pode causar sérios danos e até levar à morte se não for tratada corretamente. Saiba como diagnosticá-la o mais cedo possível para definir um tratamento eficiente e adequado
A
A sífilis é uma infecção transmitida sexualmente que existe há mais de um século. Nos últimos anos, diversos países têm registrado um aumento dramático de novos casos de sífilis entre as pessoas que vivem com HIV e aids, sobretudo entre homossexuais masculinos. No Brasil, a notificação da sífilis, assim como das demais doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) é falha e, por isso, não se sabe a exata extensão do problema. Mas não são poucos os médicos, serviços de saúde e ONGs que trabalham com pacientes com HIV que têm relatado um suposto aumento dos casos de sífilis no país.
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Transmissão
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Causada por uma bactéria, a Treponema pallidum, a sífilis não é uma infecção simples. A doença tem três estágios: sífilis primária, secundária e terciária, sendo que durante o primeiro e o segundo estágios, a doença é extremamente infecciosa. A sífilis pode ser contraída pelo sexo sem proteção, seja anal, vaginal ou oral. Pode também ser transmitida pelo contato direto com o sangue ou com as lesões e erupções na pele, que podem surgir em diversas partes do corpo. Uma pessoa com sífilis e HIV terá maior probabilidade de infectar outras pessoas com o vírus da aids, caso não trate a sífilis no estágio primário e secundário. Se uma pessoa HIV-negativa estiver com sífilis, ela terá maiores chances de se infectar com HIV em
caso de exposição ao vírus. A sífilis pode, ainda, ser transmitida da mãe para o bebê. No Brasil, a doença é quatro vezes mais frequente nas gestantes do que a infecção pelo HIV. Estima-se que, a cada ano, 48 mil gestantes estejam infectadas pela sífilis no País. Desse total, aproximadamente 12 mil crianças adquirem sífilis congênita.
Prevenção O uso de preservativo durante o sexo oral, anal ou vaginal, oferece proteção contra a infecção por sífilis e evita a sua transmissão para as outras pessoas. Mas esta proteção não é total, pois as lesões e erupções cutâneas não ocorrem necessariamente nos genitais. É recomendado que as pessoas sexualmente ativas façam uma avaliação de sua saúde sexual regularmente, desta forma poderão realizar exames para sífilis e outras doenças sexualmente transmissíveis. Os centros de testagem e aconselhamento (CTAs), além do teste anti-HIV, realizam o exame VDRL, que pode diagnosticar a sífilis. Nestes serviços da rede pública também é feito o aconselhamento antes e depois do exame.
Sintomas A sífilis pode provocar uma série de sintomas, embora uma pessoa infectada nem sempre os apresente. Nos primeiros estágios da doença, os sintomas poderão facilmente pas-
sar despercebidos. Nas pessoas que vivem com HIV, a sífilis pode progredir rapidamente e se tornar mais grave, além de apresentar sintomas ligeiramente diferentes. Logo após a infecção com sífilis (sífilis primária), uma pequena ferida, erupção cutânea ou úlcera (chamada cancro) pode surgir no local da infecção. No homem, as lesões aparecem com mais freqüência no pênis na região do freio ou frênulo do prepúcio. Nas mulheres, na região da fúrcula, isto é, no encontro dos pequenos lábios. Isso porque nas relações sexuais, esses são o primeiro ponto dos genitais em que há atrito e os microtraumas permitem a passagem da bactéria da sífilis do genital infectado para o não infectado. Assim que a bactéria penetra, começa a multiplicar-se no organismo. A úlcera representa sua presença no local de inoculação. Quando ela agride o tecido dos genitais, em torno dessa agressão desenvolve-se um processo inflamatório, cujas células, os linfócitos, são as mesmas que o HIV tem predileção por infectar. Esse é o principal ponto de cruzamento entre a sífilis e a aids. Já que ambas são doenças sexualmente transmissíveis, o fato de existir uma lesão sifilítica ulcerada que acarreta um processo inflamatório composto por linfócitos – as células-alvo do HIV – faz com que a lesão seja, ao mesmo tempo, uma porta de entrada para o HIV e um reservatório disseminador da bactéria da sífilis.
Segundo estágio A sífilis em seu estágio secundário pode causar infecção cutânea, inchaço nas glândulas, febre, dores musculares, dor de cabeça, zumbido nos ouvidos e, em alguns casos mais raros, meningite. Também feridas marrom-escuras do tamanho de uma moedinha podem aparecer nas mãos e nos pés. Estas feridas e erupções cutâneas são altamente infecciosas. A sífilis secundária normalmente se desenvolve em seis meses após a infecção. Nas pessoas com HIV, a reação cutânea característica da sífilis secundária nem sempre é a típica erupção que surge nas mãos e plantas dos pés. Outra questão ainda muito importante é que a neurosífilis é mais comum e mais difícil de diagnosticar e tratar em pessoas infectadas pelo HIV.
Terceiro estágio No estágio terciário, a sífilis pode provocar lesões cutâneas muito características. São lesões em relevo que lembram uma ferradura ou um semicírculo. Quando são mais agressivas e há comprometimento do tecido gorduroso, elas recebem o nome de goma. Na verdade, a agressão começa no tecido gorduroso e vai rompendo os outros tecidos até exteriorizar-se na pele. O mais relevante, porém, na sífilis terciária, é que essa goma pode manifestar-se na massa encefálica e levar as pessoas à demência, à paralisia ou à morte. A sífilis atinge seu terceiro estágio dez anos após a infecção e pode causar danos a quase todos os órgãos internos e ao cérebro (neurosífilis). O organismo pode levar até três meses para produzir anticorpos contra a bactéria causadora da sífilis. Por isso, um exame realizado logo após o contato com a bactéria poderá não detectá-la. Existem evidências de que exames tradicionais para sífilis realizados nas pessoas com HIV-positivas podem não ser eficientes. Se houver suspeita de infecção no cérebro, uma punção lombar poderá ser necessária para verificar a extensão da doença.
Diagnóstico e tratamento A sífilis é geralmente tratada com uma série de injeções de penicilina. As pessoas alérgicas à penicilina são tratadas com antibióticos em comprimidos ou, como alternativa, recorre-se à dessensibilização desses pacientes, quando as doses são gradualmente administradas em um curto período de tempo. Pessoas HIV-positivas geralmente receberão doses maiores e por um tempo prolongado. Para garantir que a sífilis seja completamente curada é fundamental
tomar todas as injeções ou todos os medicamentos prescritos. Para não infectar outras pessoas e evitar a reinfecção com a bactéria, é importante evitar qualquer prática sexual até que o tratamento tenha terminado e a pessoa esteja completamente curada. Exames de sangue para acompanhamento médico serão realizados em intervalos de um, dois, três, seis, 12 e 24 meses para garantir que a infecção desapareceu. Há uma máxima que afirma que “aquele que conhece a sífilis conhece medicina”. Mas infelizmente a sífilis não é reconhecida e tratada pelos médicos em muitos casos, particularmente em pacientes infectados pelo HIV. O período de incubação dura aproximadamente de três a quatro semanas. A primeira manifestação da doença (estágio de sífilis primária) é a presença do cancro duro, que na maioria das vezes é uma lesão única, com borda bem definida, semelhante a uma moldura, sem pus no fundo e com base endurecida. Nas pessoas com HIV, as lesões deixam de ser únicas e passam a ser múltiplas. São lesões que sangram com facilidade, e, mesmo utilizando medicação específica, o tempo de cicatrização é muito superior ao dos pacientes com sistema de defesa normal. As diretrizes do CDC (Centers for Disease Control and Prevention) dos Estados Unidos para o tratamento das doenças sexualmente transmissíveis, enfatizam que, para as pessoas infectadas pelo HIV com quadros clínicos compatíveis com a sífilis (sinais clínicos ou sorologia confirmada), os médicos devem avaliar cuidadosamente os sinais e sintomas indicativos de possível invasão do sistema nervoso central, incluindo um minucioso exame neurológico e revisão dos sintomas mais relevantes,
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Após o período de multiplicação, a bactéria entra na circulação, tanto sanguínea quanto linfática, e vai disseminar-se nos diversos órgãos. Mesmo sem tratamento, as feridinhas da sífilis podem desaparecer, pois as defesas do organismo podem fabricar a resposta necessária para a cicatrização espontânea. A pessoa acha que está curada, mas a bactéria continua se disseminando e ataca vários órgãos. É importante saber que, se ela entrar em contato novamente com um genital infectado, pode passar diretamente para o estágio secundário, no qual a doença é mais infectante e atinge outros órgãos, inclusive o sistema nervoso central. Em se tratando de mulheres grávidas, é nesse estágio que pode ocorrer comprometimento do feto. Nas pessoas com HIV, o comprometimento do sistema nervoso pode ocorrer ainda na fase primária, o que não acontece quando o sistema de defesa está integro.
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em particular alterações visuais e de audição; devem considerar a necessidade de realização da punção lombar; devem saber que o teste VDRL no líquido céfalo-raquidiano é pouco sensível (~50%) para a previsão de invasão do sistema nervoso pela sífilis. Neste caso, qualquer valor anormal, incluindo pleocitose (definida com um número de linfócitos superior a 20 nos indivíduos HIV-positivos) ou valores elevados de proteína, são definidores de diagnóstico de sífilis. Apesar da ceftriaxona ser uma
alternativa terapêutica razoável para a neurosífilis, a penicilina administrada de forma parentérica ( o que às vezes requer internação do paciente) constitui o tratamento de eleição em todas as fases da sífilis. As esperanças depositadas na azitromicina oral como alternativa aceitável em casos de sífilis sem invasão do sistema nervoso central foram diminuídas por relatos de criação rápida de resistências ao medicamento. A administração de antibióticos, apesar de importante na prevenção
do aparecimento de sequelas no doente com sífilis, é apenas um dos aspectos do tratamento. Os médicos e profissionais de saúde devem atuar no sentido de sugerir a mudança dos comportamentos que tornam as pessoas com HIV mais susceptíveis às DSTs, o que também facilita a transmissão do HIV aos parceiros sexuais. As pessoas com sífilis e outras DSTs não estarão completamente tratadas até que os seus parceiros, sempre que possível, tenham também recebido o tratamento.
Fontes: NAM – Informativo 59 (www.aidsmap.com); CDC (www.cdc.gov/std/treatment); Tratamento da Sífilis em Doentes Infectados pelo HIV, por Jeanne Marrazzo, Professor Associado de Medicina da University of Washington School of Medicine; Sociedade Brasileira de Doenças Sexualmente Transmissíveis -SBDST (www.dstbrasil.org.br); Programa Nacional de DSTAids; Dr. Luiz Jorge Fagundes, coordenador do Laboratório de Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) da Faculdade de Saúde Pública da Universidade São Paulo em entrevista ao Dr. Drauzio Varela: (http://drauziovarella.ig.com.br).
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Crescem os casos de câncer anal
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Alguns estudos têm demonstrado crescimento do número de casos de câncer anal entre as pessoas que vivem com HIV e aids. Mais de dois terços desses casos ocorrem em homens gays ou bissexuais Os investigadores acreditam que o aumento do câncer anal, desde a introdução da terapia potente com antirretrovirais, se deve à infecção das pessoas por alguns tipos de HPV (papilomavírus humano) de alto risco. Por isso, é importante que os pacientes HIV-positivos sejam examinados nas consultas médicas de rotina para checar se há sinais de câncer anal. Tumores no canal anal (parte interna do ânus) são mais freqüentes no sexo feminino e tumores na margem anal (parte externa do ânus) são mais frequentes no sexo masculino.
A presença do HPV e do próprio HIV pode estar relacionada com o desenvolvimento do câncer anal. São outros fatores de risco uma dieta pobre em fibras, a prática de sexo anal desprotegido, o hábito de fumar, e a fístula anal crônica (doença caracterizada pela presença de um trajeto entre o canal anal e a margem do ânus com secreção purulenta). Quando detectado em estágio inicial, o câncer anal possui grandes possibilidades de cura. É importante consultar um médico sempre que sintomas como dor, prurido e sangramento anal estejam presentes, principalmente nas pessoas infectadas pelo HIV. O câncer anal apresenta como sintomas mais comuns: coceira, dor ou ardor no ânus; sangra-
mento nas evacuações; secreções incomuns no ânus; feridas na região anal e incontinência fecal (“intestino solto”, impossibilidade para controlar a saída das fezes). Inicialmente realiza-se um exame de toque e, se necessário, uma proctoscopia. O diagnóstico será realizado através de biópsia de uma amostra do tecido. Outros exames, como ultrassonografia e ressonância magnética, podem ser solicitados pelo médico para detectar a extensão do tumor. A escolha do tratamento depende do estágio do câncer anal. Em estágios iniciais, o tratamento cirúrgico normalmente é eficiente para remover a parte da região afetada (lesão). O tratamento mais utilizado é uma combinação de quimioterapia e radioterapia.
Fonte: Inca – Instituto Nacional do Câncer/ Conferência Internacional de Aids, México, 2008
sua saúde
Como combater a anemia A anemia pode estar associada à progressão da infecção pelo HIV, independentemente da contagem de células CD4 e da carga viral
Causas Muitos fatores podem levar a uma diminuição da hemoglobina ou a níveis baixos de glóbulos vermelhos. A causa mais comum nas pessoas que não têm o HIV é o sangramento, o que também pode ocorrer nas pessoas soropositivas. Mas nas pessoas que vivem com HIV e aids as causas mais comuns de anemia incluem infecções, problemas da medula óssea (onde os góbulos vermelhos são produzidos), ou efeitos colaterais de medicamentos, principalmente os que interferem na medula. A supressão da medula pode ser
causada, por exemplo, pelo AZT (zidovudina), pelo ganciclovir e por medicamentos de quimioterapia para tratar o câncer. Uma anemia preexistente pode piorar com o uso de alguns desses medicamentos. Existem doenças genéticas, tal como a anemia de hemácias (glóbulos vermelhos) falciformes. A deficiência de ferro, vitamina B12, B6 ou ácido fólico na dieta alimentar também pode causar anemia. As infecções por histoplamose, pneumocistose, leishmaniose e tuberculose são associadas à anemia em indivíduos HIV-positivos. A anemia não tratada nas pessoas com HIV está associada a um risco maior de morte, que independe da causa da anemia. É mais provável em pessoas com contagens de CD4 abaixo das 200 células/ mm³, especialmente se houver diagnóstico de infecção oportunista. A anemia é mais rara em pessoas com contagens de CD4 acima das 200 células/mm³. Não está claro se a terapia antirretroviral está associada a um risco acrescido de anemia. Um estudo em mais de 750 pessoas com HIV, na Flórida, descobriu que 30% tinham anemia. Estudo conduzido em Seattle revelou que a prevalência de anemia em 2.000 pessoas com HIV caiu de 22% em 1996 para 8% em 2001. Já um estudo europeu cons-
tatou queda na prevalência da anemia desde a introdução dos coquetéis de medicamentos.
O que fazer O tratamento mais importante para a anemia começa na descoberta da causa para que ela seja eliminada. Se a anemia for causada por medicamentos, por exemplo, o melhor tratamento é reduzir a dosagem ou interromper o tratamento, de acordo com a avaliação do médico. Se deficiências de vitaminas ou de minerais são o problema existem suplementos alimentares que serão utéis, mas a solução mais simples é o aumento de consumo de alimentos adequados (a exemplo da carne vermelha, devido ao ferro). O médico pedirá exames de sangue para investigar essas deficiências. A anemia grave às vezes exige tratamento com transfusão de sangue, dependendo do nível individual de sintomas. Um nível normal de hemoglobina está acima dos 13g/ dl. Os médicos poderão recomendar transfusões às pessoas com níveis abaixo de 8g/dl. Em pessoas com níveis baixos menos graves, os médicos podem preferir não usar a transfusão, porque o próprio organismo consegue corrigir o problema. Outros tratamentos possíveis incluem o uso de suplementos de ferro, vitaminas B ou ácido fólico.
Fonte: NAM (www.aidsmap.com). Tradução: Antonio Guarita. Adaptação: Cadernos Pela Vidda
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A anemia é um problema de saúde ligado à falta de glóbulos vermelhos no sangue. Os glóbulos vermelhos transportam o oxigênio para uma proteína chamada hemoglobina. Quando existe déficit de glóbulos vermelhos ou de hemoglobina, há falta de oxigênio, o que significa que os músculos não conseguem produzir energia suficiente. Por isso, se você estiver com anemia vai sentirse cansado e fraco. O exercício físico, por exemplo, pode fazer com que você se sinta ofegante e com palpitações cardíacas. A anemia grave pode causar dores de cabeça, tonturas, vertigens e até insuficiência cardíaca. As mulheres anêmicas quase sempre sangram mais durante o período menstrual.
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manuais
É preciso melhorar a adesão Para promover as ações de adesão ao tratamento, o Programa Nacional de DST/Aids (Ministério da Saúde) lançou o Manual de adesão ao tratamento para pessoas vivendo com HIV e Aids. Com objetivo semelhante, a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) preparou o Manual de boas práticas de adesão no HIV/Aids
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Em sua segunda edição, o manual da SBI pretende auxiliar os profissionais de saúde que prestam assistência direta às pessoas que vivem com HIV e aids a compreenderem as variáveis que estão envolvidas no processo de adesão ao tratamento, assim como ajudá-los a encontrar a melhor alternativa de superação das eventuais barreiras para a adesão do paciente. O tratamento com medicamentos antirretrovirais comprovadamente representa melhoria na qualidade de vida dos pacientes. Desde que o diagnóstico não seja tardio, o tratamento faz com que a infecção pelo HIV passe a ser vista como uma doença de caráter crônico. Porém, para garantir o sucesso da terapia antirretroviral, é necessário que haja uma adesão total às recomendações e ao regime desse tipo de tratamento, com constante orientação médica. A baixa adesão traz como consequência a diminuição da eficácia dos medicamentos, a piora clínica do paciente, além da disseminação de cepas (variantes do vírus modificado) resistentes do vírus, o que reduz
futuras opções de tratamento tanto para os pacientes não aderentes como para os indivíduos que venham a se infectar pelas cepas resistentes. Essa realidade impõe a todas as pessoas envolvidas a busca por uma melhor estratégia que permita a introdução dos medicamentos na rotina do paciente, ajudando-o a superar as dificuldades e minimizando os prejuízos possíveis. O manual com boas práticas discute os aspectos envolvidos no uso dos antirretrovirais e apresenta diferentes enfoques e possibilidades de intervenção.
Maior adesão, melhor tratamento O primeiro tópico abordado no manual da SBI se refere à adesão, sua importância e estratégias de ação para facilitá-la e entendê-la como eixo fundamental do sucesso na terapia. A compreensão do paciente sobre sua doença; a interação do HIV com o sistema imunológico e os medicamentos; os conhecimentos sobre exames e procedimentos para acom-
panhamento da terapia; o cenário clínico e a manifestação da aids no organismo; e a complexidade do tratamento são aspectos que devem ser relevados no momento de adesão. Algumas situações especiais interferem diretamente nos rumos do tratamento das pessoas portadoras do HIV. O início ou troca da terapia antirretroviral, o histórico de abandono do tratamento, o esquecimento das doses, as co-infecções (como a hepatite C) e os grupos de indivíduos diferenciados (como crianças, idosos, gestantes) são condições que precisam de outro olhar e direcionamento para a adoção e continuidade da terapia. Em crianças, por exemplo, o sabor dos medicamentos é um fator que dificulta sua aceitação.
Efeitos adversos Outro ponto-chave que interfere no tratamento são os efeitos colaterais provocados pelos antirretrovirais. Eles são muitos e variam de acordo com o paciente, que pode apresentar, por exemplo, reações na pele, no fígado, no metabolismo e sintomas gastrointestinais. A terapia contra a aids também tem sido associada ao aumento dos riscos de problemas no coração, quadros de obe-
sidade central como a lipodistrofia (acúmulo de gordura em certas regiões do corpo), resistência à insulina e diabetes, além de alterações do metabolismo ósseo (como a osteoporose), entre outras. Essas alterações precisam ser consideradas visto que abalam não só a estrutura física como também a autoestima dos pacientes e ameaçam o uso regular dos medicamentos. O número de comprimidos envolvidos, os diferentes horários de ingestão, as restrições na alimentação são outros obstáculos na terapia. Porém, a necessidade de controle e rigidez na prescrição médica é extremamente importante para o êxito da terapia. No período de adaptação, cui-
dados especiais devem ser dados aos pacientes que possuem outras doenças associadas. Muitas vezes, os soropositivos são acometidos por outras doenças, caracterizando a co-infecção e um novo desafio no tratamento. A publicação reúne também estratégias específicas para facilitar o tratamento da aids em grupos especiais como, por exemplo, no caso de gestantes, idosos, crianças e populações vulneráveis. O manual da SBI de boas práticas indica algumas ferramentas que contribuem para a adesão ao tratamento: ■ Caixas para remédios – de preferência as que tenham divisórias internas para os dias e subdivisórias para as doses;
■ Dispositivos eletrônicos: bips, alarmes e relógios de pulso; ■ Quadros com demonstrativos de comprimidos e horários; ■ Calendários ou agendas que ajudam o paciente a desenvolver bons hábitos em relação à sua medicação, mas também serve para a organização de encontros e outros compromissos; ■ Materiais adaptados para atender às necessidades de adesão de cada paciente (por exemplo, embalagens coloridas para diferenciar cada medicamento); ■ Diário da medicação para registrar quando tomou ou não os medicamentos e registrar os efeitos colaterais.
O Manual de adesão ao tratamento para pessoas vivendo com HIV e AIDS, lançado pelo Ministério da Saúde, faz parte das ações da campanha Prevenção PositHIVa e aborda questões como atenção integral e adesão em HIV e aids, eventos adversos e interações, manejo e prevenção, ações e estratégias em adesão, além das fases do tratamento: início, manutenção, troca e abandono da terapia antirretroviral. Além desses pontos, o manual apresenta situações que merecem especial atenção, ligadas ao maior risco de não aderir ao tratamento, exemplificando atividades que podem minimizar possíveis dificuldades.
Um dos destaques do manual do Ministério da Saúde é a abordagem consentida em casos de abandono do tratamento ou de não retorno ao serviço de saúde para consulta e exames. Trata-se do contato que o serviço de saúde faz com o paciente, mediante sua autorização prévia, por meio da assinatura de um Termo Consentimento Livre e Esclarecido (veja modelo à página 20). No termo, o usuário deve dizer se aceita um eventual contato e de que forma prefere ser contatado: por telefone, carta, meio eletrônico (email), visita domiciliar ou qualquer outra forma de comunicação. O termo deve ser assinado em duas vias, ficando uma com o paciente (ou
com seu responsável) e a outra na unidade de saúde, anexada ao prontuário médico. É muito importante que o paciente mantenha os seus dados pessoais atualizados – endereço e telefone – e registre sempre informações sobre mudanças de domicílio ou de unidade de saúde onde faz o tratamento. Por sua vez, os profissionais do serviço devem tentar verificar na lista mensal da farmácia de dispensação dos medicamentos as pessoas que não retiraram seus medicamentos do mês. Outra providência é identificar no prontuário do paciente a última data da consulta médica. Confrontando as duas informações (da farmácia e do prontuário), se caracterizado abandono do tratamento, o paciente deve ser contato, desde que ele tenha previamente autorizado.
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Abordagem consentida do paciente
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Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) Eu, ______________________________________________________ , fui devidamente esclarecido da importância de saber dos resultados dos meus exames e do benefício de iniciar ou dar continuidade ao tratamento prescrito. Declaro que se eu não comparecer para buscar os resultados dos exames abaixo discriminados: _________________________________________________________ . Ou, por algum motivo, deixar de comparecer ao tratamento nas datas agendadas: ( ) Não autorizo que este serviço de saúde entre em contato comigo; ( ) Autorizo e permito que este serviço de saúde entre em contato comigo, por meio de: Telefone: ( ) ______________________________________________ Correio. Endereço: _________________________________________ E-mail: ___________________________________________________ Visita domiciliar. Endereço: __________________________________
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Outro meio de contato determinado pelo usuário: _______________ Desde que respeitados os meus direitos à privacidade e sigilo das informações. Assino esse termo em duas vias, ficando uma cópia retida no serviço e outra comigo. (Local) __________________________ , (data) / _____ / _______ Nome do usuário (letra de forma): ____________________________
Conheça os manuais que estão disponíveis nos sites da SBI (www.infectologia. org.br) e do Programa Nacional de DST/ Aids (www.aids.gov.br) Fontes: SBI e PN DST/Aids
opinião
A criminalização da transmissão do HIV Por Jorge A. Beloqui e Cláudio Pereira*
vacidade. E estaremos deixando de incluir uma grande peça neste quebra-cabeça se ignorarmos a responsabilidade individual inserida nos contextos social, estrutural e cultural. Pessoas com ou sem HIV não realizam suas escolhas sobre o sexo mais seguro somente em termos de máxima segurança. A combinação de pensamentos, fantasias, necessidades de relações sexuais e afetivas , em contextos culturais diversos, é que fornece a base do comportamento. Para as pessoas que vivem com HIV e aids existem fatores adicionais como altruísmo, responsabilidade, solidariedade, redução de riscos, sem contar o medo da revelação e as experiências prévias de rejeição, discriminação e exposição pública da sorologia e da sexualidade. Voltando à responsabilidade, podemos indagar: qual é a responsabilidade da sociedade que tolera ou propicia mensagens de discriminação que podem impedir a revelação? Por exemplo, a oposição religiosa ao uso de preservativos, oposição aos programas de troca de seringas, oposição à legalização da prostituição, repressão das atividades homossexuais ou a oposição política e religiosa à união civil gay. As pessoas com HIV têm a responsabilidade de proteger os outros, mas não estamos diante de uma obrigação que existe por si só, no vácuo. Em um casal sorodiscordante, em que a pessoa com HIV revelou sua sorologia, qual é a responsabilidade do parceiro sorone-
gativo? Diante do abandono pelo parceiro, em conseqüência da revelação, qual é a responsabilidade do profissional de saúde que insistiu na informação da sorologia? Todos partilhamos, com todos os nossos esforços, da responsabilidade de evitar a expansão do HIV e de obter um impacto significativo no curso futuro da epidemia.
Boa intenção, política ruim Em Dallas, Texas, uma pessoa com HIV foi sentenciada a 35 anos de prisão por cuspir em um policial. Sua saliva foi considerada uma “arma mortal”. Em Bermuda, outro portador de HIV foi sentenciado a dez anos de prisão por fazer sexo sem proteção com sua namorada, ainda que ela não tenha sido infectada. Já um suíço, que nem sequer sabia que era portador do HIV, foi condenado à prisão recentemente, acusado de infectar sua namorada. Na África, que abriga cerca de dois terços das pessoas que vivem com HIV no planeta, um estatuto “modelo” financiado pelos Estados Unidos, e que criminaliza a transmissão e a exposição ao HIV, já foi adotado em onze países. A lei dispõe que aqueles que sabem ser portadores do HIV devem informar com antecedência sua condição em “qualquer contato sexual”. Como o texto não define o que é “contato sexual”, um beijo, por exemplo, pode vir a ser interpretado como um crime. A versão da lei adotada em Serra Leoa
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Determinadas legislações e condutas profissionais consideram ser uma responsabilidade pessoal de quem vive com HIV a revelação da sorologia positiva aos parceiros. Tal obrigação não parece emergir de razões médicas ou de saúde pública. De um lado, estão a necessidade e a ética de praticar o sexo seguro e, de outro, a ética da revelação da sorologia positiva. Vamos aqui chamá-las de a “ética do fazer” e a “ética do dizer”. A primeira tem claramente apoio na saúde pública, mas a segunda talvez não o tenha. Trata-se, sem dúvida, de um tema complexo. Afinal, ainda é incipiente a pesquisa que busca responder a pergunta: a revelação da soropositividade aos parceiros íntimos realmente reduz riscos e promove comportamentos mais seguros? Uma revisão da literatura feita nos Estados Unidos não encontrou associação entre tal revelação e o sexo mais seguro. Estudos apontam que muitas pessoas com HIV evitam, com boas razões, revelar essa condição em contextos que consideram estigmatizantes. Assim, não é apenas a atitude de não revelar que leva à prática do sexo sem proteção, o que reforça a necessidade de intervenções estruturais contra a discrimação e o estigma. A revelação como “ferramenta” para a prevenção tem muitos prós e contras, sobretudo quando assumimos a necessidade de conciliar a demanda de saúde com o direito à pri-
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inclui especificamente as mulheres grávidas. Elas podem ser detidas caso “não tomem todas as medidas e precauções razoáveis para impedir que seus bebês sejam infectados”. O que justifica, afinal, esse esforço para lidar com o HIV por meio de leis criminais? Mesmo que as intenções – deter a expansão do HIV e proteger os mais vulneráveis – sejam boas, a política é ruim. Mais de duas décadas de experiência demonstram que transformar a exposição e a transmissão acidental em crime não alteram o comportamento sexual ou não detém a difusão do HIV. Tratar o problema como crime é um substituto ineficaz para medidas que realmente protegem as pessoas em risco de contrair o HIV: prevenção efetiva, proteção contra a discriminação, esforços para reduzir o estigma da aids, maior acesso a testes e, acima de tudo, tratamento para as pessoas que estão morrendo por causa da doença. E há um dado concreto para encorajar a tomada de decisões políticas: se as pessoas com HIV não receberem o diagnóstico e o tratamento em tempo, a transmissão do HIV pode ser maior. Com efeito, o tratamento para o HIV com antirretrovirais tem benefícios para conter a transmissão. Segundo conclusões da Comissão Suíça de HIV/Aids, de janeiro de 2008, a pessoa com HIV não transmite o HIV por via sexual se: aplica o tratamento antirretroviral ao pé da letra e é acompanhado por um médico; se a carga viral está situada abaixo do nível de detecção há pelo menos seis meses; se a pessoa não tem nenhuma outra doença sexualmente transmissível. Além disso, a criminalização é muitas vezes aplicada de maneira injusta e seletiva. Processos e leis tomam por alvo grupos já vulneráveis,
como prostitutas, homens que fazem sexo com homens e, em países europeus, homens negros. A criminalização reforça o estigma e desestimula o diagnóstico, o tratamento e a assistência. A criminalização também culpa uma pessoa ao invés de responsabilizar duas. Em termos realistas, o risco de contrair o HIV – ou qualquer doença sexualmente transmitida – deve ser considerado como um fato inescapável do sexo. Não podemos fingir que o risco seja introduzido em um encontro, que de outra forma seria seguro, só porque uma pessoa sabe ou deveria saber que está infectada pelo HIV. Os conceitos legais de negligência ou descuido são incoerentes no campo do comportamento sexual. A responsabilidade por práticas sexuais mais seguras cabe a todos.
O que acontece no Brasil No Brasil não existe lei específica que pune a transmissão do HIV. Mas há um Projeto de Lei que tramita no Congresso Nacional e pretende transformar a transmissão do HIV em um crime hediondo. A Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV e aids (RNP+), em seu congresso em Florianópolis, em 2009, manifestouse contra este projeto. Mas algo muito mais perigoso, até mesmo reacionário, está ocorrendo no Brasil: a condenação de pessoas com HIV imputando a elas simplesmente “intencionalidade”. Em 1995 uma mulher foi condenada, com base no Código Penal, a um ano de prisão porque ela não informou a seus parceiros que era portadora do HIV. Em 2005, um homem com HIV, condenado por tentativa de homicídio, recorreu da sentença e teve seu recurso negado. Um ano antes, em 2004, um júri de São Paulo sentenciou um ho-
mem a oito anos de prisão em regime fechado alegando que ele praticou “tentativa de homicídio qualificado por meio insidioso”. Casado, 47 anos, portador do HIV, motorista de ônibus, salário de R$ 650,00, usava preservativos com sua esposa mas mantinha uma amante com quem fazia sexo sem proteção. Alegando ter sido infectada pelo HIV, a amante o processou . Em 2007, após o acusado ter perdido o recurso ao Tribunal de Justiça, a denunciante manifestou arrependimento de tê-lo processado, voltou a ter relacionamento com ele, mas não era mais possível desistir do processo penal. No argumento de negação do recurso o desembargador, autor da sentença, alegou que a aids é uma doença fatal. Em dezembro de 2008, o Tribunal de Justiça acatou pedido da Defensoria Pública, anulou a decisão e solicitou a formação de novo júri. A Denfensoria, numa atuação coerente, argumentou a não-intencionalidade do acusado, demonstrou que a suposta vítima estava em tratamento com antirretrovirais e gozava de boa saúde e que “embora a transmissão da doença seja controlável pelo agente, a ocorrência do resultado morte escapa ao domínio do indivíduo transmissor”. Segundo dados epidemiológicos disponíveis, é possível afirmar que uma pessoa no Brasil vai ter uma sobrevida mediana, desde a infecção, maior ou igual a 14 anos, e que a probabilidade de transmissão para um casal heterossexual é de 0,7 casos por mil, sendo de 2,8 casos por mil quando o parceiro infectado tem aids. Assim, é mesmo impossível sustentar que o fato de não usar preservativos durante uma relação sexual constitui uma tentativa de homicídio.
Responsabilidade partilhada A criminalização da transmissão não intencional do vírus da aids joga uma sombra sobre todas as pessoas que vivem com HIV, que passam a ser tratadas como criminosos em potencial. Se uma pessoa com HIV,
que conhece mas não revela sua sorologia, tem sexo não seguro, mutuamente consentido, constitui isso uma tentativa de homicídio? No mesmo caso, este comportamento sempre envolve a intenção de infectar o parceiro? Trata-se de um comportamento negligente? Se o comportamento negligente ocorre sem a transmissão do HIV, deveria ser aplicada alguma pena? O que deveria prevalecer é a responsabilidade partilhada, também aplicada em outros casos. Quando uma mulher fica grávida, é aceitável que ela peça na Justiça que o pai da criança contribua nas despesas do parto, alimentação, exames, remédios etc. Não se coloca em discussão se o pai queria usar camisinha, mas a mãe não o quis; se a mãe deveria ou não dizer que estava em período fértil ou que fazia ou não uso de anticoncepcional; se a mãe desejava ou não ficar grávida desse parceiro.
Um caminho proposto No Reino Unido a jurisprudência vai na direção de que, para condenar uma pessoa pela transmissão do HIV, é necessário comprovar que o acusado sabia que tinha HIV e que podia infectar outras pessoas; que as relações realmente ofereciam riscos de transmissão, com base científica; que o acusador está infectado pelo HIV; que o acusador não tinha HIV antes do relacionamento; que o acusador não teve relações sexuais com outras pessoas, nem outra forma de exposição, que ofereça risco de infecção; que são compatíveis as variedades do vírus HIV da vítima e do acusado.
Defendemos que, no Brasil, essas diretrizes sejam adotadas para os casos de processos que envolvam transmissão do HIV. Um passo já foi dado neste sentido: o Fórum de ONGs/AIDS do Estado de São Paulo solicitou, em dezembro de 2008, que o Coordenador da Frente Parlamentar contra a Aids da Assembléia Legislativa, deputado estadual Bruno Covas, facilitasse um contato com o Ministério Público Estadual e com a Defensoria Pública do Estado. Segundo Veriano Terto (Abia) , a prevenção e os cuidados devem ser integrados para garantir uma assistência mais completa, que vise o bem estar individual e coletivo. Em todos os grupos populacionais, e particularmente entre os socialmente excluídos, a prevenção não deve estar orientada para a imposição de normas disciplinares sobre o que é correto ou incorreto. Precisamos, sim, de ações que promovam os direitos humanos no campo da saúde. A partir deste ponto de vista, devemos usar as estratégias de redução de riscos para a prevenção positiva. A prevenção do HIV não é só um desafio técnico de saúde pública, mas um desafio para toda a humanidade. O que devemos buscar é um mundo no qual o comportamento seguro seja viável para ambos os parceiros sexuais. Estamos também diante da oportunidade de praticar a solidariedade e de superar a estigmatização. Em qualquer política a ser adotada, as pessoas que vivem com HIV e aids e os grupos vulneráveis devem ser entendidos não como um problema, mas como parte da solução.
Jorge A. Beloqui é doutor em Matemática, membro do Grupo de Incentivo à Vida (GIV), da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Abia) e da RNP+. Cláudio Pereira é advogado e membro do Grupo de Incentivo à Vida (GIV) Obs: Este texto, editado por Cadernos Pela Vidda, é a versão simplificada de um artigo inédito dos autores sobre o mesmo tema. Devido à limitação do espaço também foram excluídas referências bibliográficas.
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E, ainda, vale citar outro exemplo recente. Em abril de 2009 um homem HIV-positivo, açougueiro de profissão, após ter sido denunciado por três tentativas de homicídio, duas delas de homicídio qualificado, ajuizou habeas corpus junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), para que fosse dada nova classificação aos supostos crimes cometidos por ele. Segundo a defesa, infectado por sua ex-mulher (que havia falecido vítima da infecção pelo HIV por transfusão de sangue), ciente de sua condição sorológica, o acusado manteve, sem revelar que era portador do vírus, relações com duas namoradas sem uso de preservativo. Já num terceiro relacionamento, após revelar a sorologia, tentou fazer sexo com a parceira sem proteção, mas a relação não se consumou. Embora discordasse da aplicação da tipificação penal mais severa, a tentativa de homicídio, o mais impressionante é que a defesa aceitou a tese da intencionalidade. Ao STF, a defesa solicitou que o acusado tivesse a prisão preventiva revogada , mas concordava que ele fosse enquadrado em outro artigo (o 131) do Código penal: “praticar, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de que está contaminado, ato capaz de produzir o contágio”.
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“Papa, da prevenção, cuidamos nós!” A caminho da África, o papa Bento 16 declarou, em março de 2009, que a distribuição de preservativos não é a solução para a luta contra o HIV e a aids no continente africano. Segundo o papa, as camisinhas só fazem aumentar o problema da aids. Para o pontífice, a abstinência e a fidelidade são os melhores meios para lidar com a epidemia
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Além de inúmeras manifestações no Brasil e no mundo, uma das publicações médicas com maior prestígio internacional, a The Lancet, acusou o papa Bento 16 de “distorcer a ciência”. Em editorial a revista afirmou que o comentário do papa é errado, escandaloso e pode ter consequências devastadoras. Segundo a The Lancet, o papa “distorceu publicamente provas científicas para promover a doutrina católica nesta questão”. De acordo com a revista, o preservativo masculino é a maneira mais eficiente de reduzir a transmissão sexual do vírus HIV. “Não está claro se o erro do papa se deve à ignorância ou a uma deliberada tentativa de manipular a ciência para apoiar a ideologia católica”, diz o editorial. “Quando qualquer pessoa influente, seja uma figura política ou religiosa, faz uma declaração científica falsa que pode ser devastadora para a saúde de milhões de pessoas, elas devem se retratar ou corrigir o registro público.” A revista afirma que qualquer solução menor que uma retratação “seria um imenso desserviço ao público e defensores da saúde, inclusive milhares de católicos, que trabalham incansavelmente em vários países para tentar evitar que o HIV se espalhe”.
Manifestações Em função do retrocesso que representa a declaração de Bento 16 para a luta contra a aids no mundo, várias organizações não-governa-
mentais nacionais e internacionais tem se manifestado. Uma delas é a Avaaz, que significa “voz” em várias línguas européias e asiáticas. É a autora de uma petição, pedindo para o papa parar de atacar os métodos comprovadamente eficazes de prevenção do HIV. Para a Avaaz “isso não é uma disputa religiosa, e sim uma questão séria de saúde pública”, diz a petição. “Nós não podemos pedir que a Igreja Católica mude sua posição mais ampla neste assunto, mas estamos pedindo que o papa pare de falar abertamente contra os estratégias de prevenção que funcionam. É importante que pessoas de todas as religiões, especialmente os católicos, digam ao papa que é ne-
cessário ter cuidado em relação a este assunto.” Também segundo a Avaaz, a afirmação do Papa contradiz estudos sobre prevenção da aids e significa um enorme retrocesso para décadas de trabalho em educação e conscientização. “O papa tem uma forte influência moral sobre grande parte da população mais pobre do planeta. As suas palavras podem ter um impacto devastador sobre a saúde pública mundial a menos que a sociedade civil global reaja rapidamente, persuadindo o Vaticano a parar de condenar o uso de preservativos. Segundo especialistas, a distribuição de preservativos é ainda o método mais eficaz de controlar a disseminação”, afirma o manifesto.
ASSINE A PETIÇÃO Assine na Internet a petição pedindo para o papa se calar. Ela pode realmente salvar vidas. Mais de 250.000 pessoas já assinaram. Acesse www.avaaz.org/po Para sua Santidade, Papa Bento 16: Apelamos para vossa imensa compaixão pedindo que considere os homens, mulheres e crianças especialmente os pobres - que sofrerão com o alastramento do HIV e da aids. Pedimos que vossa Santidade exerça extremo cuidado nas declarações públicas e que se abstenha de desprezar programas de educação pública e de prevenção da aids que salvam vidas incentivando o uso de preservativos.
Fontes: Avaaz (www.avaaz.org/po); BBC Brasil; Viomundo (www.viomundo.com.br), The Lancet.
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Em encontro realizado na cidade de Sorocaba, no estado de São Paulo, nos dias 23 e 24 de janeiro de 2009, integrantes da Diretoria e da Comissão Política do Fórum das ONGs/Aids do Estado de São Paulo, definiram eixos prioritários para nortear as ações de ativismo político em 2009. No dia 13 de fevereiro, em reunião ordinária, a plenária do Fórum discutiu e aprovou o presente documento (*). A defesa do Sistema Único de Saúde (SUS) será uma das principais lutas do Fórum em 2009. Também foi definida a necessidade de rever a organização interna, o funcionamento e as articulações do movimento de luta contra a aids no Estado. Dentre as conclusões, destaca-se a necessidade de fortalecimento dos espaços próprios do movimento. Deve ser avaliada a qualidade e a pertinência dos inúmeros espaços governamentais que contam com a participação de ONGs e representantes do Fórum. Foram consideradas várias questões que hoje interferem na melhoria e na qualificação das políticas de assistência e prevenção das DST/aids. A seguir, a pauta prioritária e posicionamento do Fórum das ONGs/aids do Estado de São Paulo referente aos principais problemas levantados.
Diagnóstico tardio e mortalidade 1. A Campanha Fique Sabendo do Programa Nacional de DST/Aids, atualmente em execução por estados e municípios, é uma ação importante, mas insuficiente para a diminuição do alto índice de diagnóstico tardio.
2. A oferta do teste rápido deve ser ampliada, com garantia de sua realização em todos os serviços. Devem ser apresentadas metas claras de números de serviços e quantidade de testes disponíveis. O Teste Rápido deve ser sempre acompanhado do devido aconselhamento pré e pós diagnóstico, realizado por profissionais devidamente capacitados para esse fim. 3. Que sejam realizadas campanhas permanentes (durante todo o ano) de incentivo à testagem voluntária e consentida. 4. Devem se tornar claras e públicas as medidas concretas a serem adotadas pelo estado e municípios para a absorção, nos serviços, da demanda de novos resultados positivos. 5. São inaceitáveis os números absolutos de óbitos por aids no Estado. Torna-se imprescindível que nos sejam apresentados, pelos programas governamentais, os motivos e o perfil não só em relação aos óbitos, mas também o perfil das pessoas que vivem com HIV que chegam tardiamente aos serviços. 6. Solicitamos a apresentação e o compromisso público de metas numéricas e prazos definidos para redução significativa de: A. Números de mortes entre as pessoas que vivem com HIV e aids; B. Percentuais de Diagnóstico Tardio; C. Número de novas infecções pelo HIV.
Revisão da política de prevenção 7. As ações de prevenção são responsabilidade constitucional do Estado e não devem ser executadas exclusivamente pelas ONGs. Deve
ser definida claramente a responsabilidade dos municípios na execução de ações de prevenção, principalmente aquelas dirigidas a públicos vulneráveis. 8. Que sejam aprimorados o monitoramento e a avaliação da qualidade e eficácia das ações e projetos de prevenção das ONG e dos governos. 9. Que sejam implantados novos e adequados modelos de prevenção, capazes de superar o binômio “camisinha e folheto”. 10. Discussão de novos conceitos e de novas tecnologias que possam vir a ser usados na prevenção, a exemplo da hierarquização de riscos e da redução de danos (não só no uso de drogas), da circuncisão, da profilaxia pré-exposição, dentre outros. 11. A prevenção deve ser priorizada no campo da saúde; os recursos devem ser usados prioritariamente para intervenções de promoção e prevenção em saúde; as ações que não sejam do âmbito do Sistema Único de Saúde devem ser viabilizadas com parcerias intersetoriais. 12. Definição clara da responsabilidade do estado e municípios na execução dos planos de enfrentamento da epidemia; exigimos respostas práticas e resultados dos planos HSH (homossexuais) e de Feminização (mulheres). 13. Ampliação do acesso e fiscalização, com informes mensais, do quantitativo distribuído de preservativos masculino e feminino e de gel lubrificante. 14. Implementação de políticas e estratégias de prevenção da transmissão do HIV e outras DSTs dirigidas às pessoas que vivem com HIV e aids.
(*) O documento foi encaminhado, posteriormente, aos programas governamentais de combate à aids.
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ONGs pedem mudanças na prevenção
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Acesso à Justiça e direito à Saúde
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O Supremo Tribunal Federal (STF) realizou audiência pública em abril e maio de 2009 para discutir o Sistema Único de Saúde (SUS), com a participação de ministros, convidados e especialistas da área. A convocação, segundo o STF, se deu em razão de diversos pedidos de suspensão de determinações judiciais que ordenam o SUS a fornecer medicamentos, suplementos alimentares, próteses, criação de vagas em UTIs e realização de cirurgias, entre outros pedidos. Os debates servirão para subsidiar o julgamento dessas ações. O resultado da audiência poderá ser a edição de uma Súmula Vinculante sobre o tema, que norteará futuras decisões judiciais no país. Ou seja, a decisão do STF poderá ampliar ou restringir o acesso à justiça e à saúde no país.
O caso da aids O Judiciário sempre foi acionado diante da urgência da necessidade por um novo antirretroviral ainda não disponível no SUS. As ações, baseadas no direito constitucional à saúde, geralmente são movidas pelos advogados das ONGs, pela Defensoria Pública ou pelo Ministério Público.
A prescrição médica, que gera a ação judicial, muitas vezes precede o trâmite necessário até a disponibilização no SUS, que passa pelo registro, introdução no consenso terapêutico, compra e distribuição pelo Programa Nacional de DST/Aids. O Judiciário tende a ser mais acionado quanto maior for o espaço de tempo deste caminho percorrido. Diversos secretários e gestores de saúde passaram a defender a “regulamentação” restritiva dos pedidos judiciais dos chamados medicamentos de alta complexidade e alto custo, inclusive os anti-HIV. A justificativa é que precisam remanejar recursos vultosos para atender pedidos isolados via Justiça Até mesmo os tribunais, que majoritariamente dão ganho de causa aos pleitos dos usuários, passaram a dar decisões contrárias à concessão dos medicamentos.
Sentido oposto Há de fato um movimento, que chegou ao STF, daqueles que desejam coibir o direito de acionar a justiça. O Grupo Pela Vidda/SP e as ONGs de luta contra a aids estão atentas a isso. Ao mesmo tempo é preciso de-
fender maior padronização das condutas médicas, a educação continuada do médico voltada à prescrição responsável, a prevenção e punição de desvios que possam existir e, além disso, a destinação de mais recursos para o Sistema Único de Saúde. Exemplo positivo, que devia ser reproduzido país afora, vem do Programa Estadual de DST/Aids de São Paulo, que tem uma instância administrativa para análise técnica das receitas médicas. Sempre que a prescrição apresentar alguma inadequação o médico é instruído a rever se aquela é mesmo a melhor indicação para o paciente. Se estiver correta, o Estado compra o remédio, mesmo que ainda não esteja incorporado na diretriz nacional. Neste caso, existe solução que não passa pela restrição do direito de os pacientes e suas ONGs representativas recorrerem à justiça. Essa é uma conquista que está ligada à história da luta contra a aids. As ações judiciais foram precursoras da política brasileira de acesso universal aos antirretrovirais que hoje garantem a saúde e a vida de quase 200 mil pessoas. Trata-se de uma conquista constitucional e de cidadania que não pode ser ameaçada.
ativismo
A responsabilidade do setor privado Laboratórios privados de análises clínicas fornecem resultado de exame HIV-positivo diretamente aos pacientes; Grupo Pela Vidda/SP pede mudança de conduta
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O Grupo Pela Vidda/SP enviou, em março de 2009, carta aos principais laboratórios de análises clínicas de São Paulo solicitando mudança de conduta quanto ao fornecimento, diretamente ao paciente, do resultado de exames para a identificação do HIV. É prática comum dos laboratórios que atendem pacientes particulares e usuários de planos de saúde a entrega ou permissão de acesso de resultados de exames reagentes ou não para o HIV, diretamente aos pacientes, pessoalmente, via fax, email ou internet. O resultado é disponibilizado ao paciente antes mesmo do seu retorno ao médico que solicitou o exame. O Grupo Pela Vidda/SP alegou que o diagnóstico positivo para o HIV é um momento peculiar, que pode trazer repercussões emocionais
na vida das pessoas. Por isso, o acesso ao resultado deveria ser sempre acompanhado pelo médico ou por profissional habilitado, com aconselhamento pré e pós-teste. A reivindicação aos laboratórios partiu da experiência do Grupo Pela Vidda/SP de atendimento a pessoas emocionalmente abaladas após diagnóstico positivo para o HIV, recebido de laboratório privado, e que procuraram a ONG antes do retorno ao médico que prescreveu o exame. Além disso, tendo em vista a massificação da campanha Fique Sabendo, do Ministério da Saúde e das secretarias estaduais e municipais de saúde, de incentivo à testagem do HIV na rede pública, o Grupo Pela Vidda/SP acredita que possivelmente também a rede particular receba maior demanda de
pacientes interessados em realizar o teste. No Brasil, estima-se que mais de 250.000 pessoas que vivem com HIV nunca foram testadas e, por isso, não conhecem sua condição sorológica. Embora o tratamento do HIV e da aids, principalmente a distribuição dos antirretrovirais, seja mantido exclusivamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), parcela da população, usuária de planos de saúde, realiza as primeiras consultas e o primeiro exame diagnóstico do HIV na rede particular. Segundo dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), 41 milhões de brasileiros, ou cerca de 20% da população, estão ligados a planos de saúde, mas no estado de São Paulo o índice é maior: 42% da população tem plano de saúde, cobertura que sobe para 59% na capital.
São Paulo, 3 de março de 2009 “O Grupo Pela Vidda/SP, organização não governamental sem fins lucrativos que atua na luta contra a aids há 20 anos na cidade de São Paulo oferece, dentre outras atividades, aconselhamento individual e grupos de convivência para as pessoas que vivem com HIV e aids. Assistimos nos últimos anos grandes avanços no campo do HIV e da aids, como conquista de tratamentos mais eficazes e a execução de políticas públicas exemplares.
Mesmo assim, o diagnóstico positivo para o HIV ainda é um momento bastante peculiar, íntimo e que traz repercussões e impactos emocionais na vida da maioria das pessoas infectadas. Mais de uma vez identificamos, por meio de pessoas que procuram nossa organização, emocionalmente transtornadas após diagnóstico positivo para o HIV, que é conduta rotineira dos laboratórios privados de análises clínicas, a entrega ou permissão de acesso de resultados de exa-
mes reagentes para o HIV, diretamente aos pacientes via fax, e-mail ou internet. Este resultado é disponibilizado ao paciente antes mesmo do seu retorno ao médico assistente. Assim, vimos solicitar que estudem a possibilidade de mudança de procedimento quanto à entrega de resultados de exames para o HIV. O aconselhamento pós-teste, com a entrega do resultado do exame pelo médico assistente ou profissional e não diretamente ao paciente, é uma
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Íntegra da carta enviada aos laboratórios de análises clínicas
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estratégia imprescindível para a diminuição dos impactos da epidemia da aids. O paciente sozinho, sem a presença física do médico assistente ou outro profissional devidamente capacitado, dificilmente é capaz de lidar com os sentimentos provocados pelo diagnóstico positivo para o HIV. A informação sobre o resultado positivo repassada diretamente do laboratório ao paciente, por exemplo via internet, tem impactos imprevisíveis na saúde física e mental do paciente, podendo acarretar reações negativas e
traumas de difícil cicatrização. Já o anúncio da soropositividade, em primeira mão pelo médico ou profissional, é a oportunidade que o paciente tem de expressar seu possível sofrimento e angústia, de explicitar suas dificuldades de lidar com o diagnóstico, de tirar suas dúvidas sobre relacionamento com parceiros, prevenção de DSTs e HIV e sobre o tratamento futuro. Prática já consolidada nos serviços públicos de saúde que trabalham com HIV e aids, a entrega do resultado por profissional habilitado com acon-
selhamento pós-teste deve ser também uma preocupação e um compromisso da rede privada de saúde. Neste sentido, os laboratórios de análises clínicas que prestam serviços a pacientes particulares e usuários de planos de saúde privados, deveriam adotar uma conduta solidária, em prol do bem estar físico e mental dos pacientes recém diagnosticados, e em prol da saúde pública e da luta contra a aids. Certos da atenção e no aguardo de um posicionamento, Grupo Pela Vidda/SP”
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Denúncia do Pela Vidda/SP tirou do ar site de laboratório que vendia teste de HIV pela Internet
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O Grupo Pela Vidda/SP denunciou publicamente a existência da prática de venda de exame anti-HIV pela internet. Intitulado o primeiro “laboratório on line do Brasil”, o site “EDNA” (www.e-dna.com. br), mantido pelo Laboratório Tommasi, com sede no Espírito Santo, oferecia exames anti-HIV para todo o país no valor de R$ 380,00. Segundo o site “você faz a coleta na sua própria casa, em qualquer lugar do Brasil, e recebe o resultado em até cinco dias úteis, com pagamento online ou com boleto em seis vezes”. Também de acordo com o site, o interessado recebe em casa um kit de coleta composto por “uma caixa de envio, um estojo com dois tubos, um folheto explicativo e um envelo-
pe de retorno”. Além do teste de HIV era anunciada a realização de exames de paternidade e para detecção de doenças sexualmente transmissíveis e hepatites. O Grupo Pela Vidda/SP enviou correspondência ao Núcleo de Vigilância Sanitária da Secretaria de Estado da Saúde do Espírito Santo, uma vez que o laboratório está localizado naquele Estado e ao Conselho Regional de Farmácia do Espírito Santo, uma vez que o site do laboratório (www.tommasi.com. br) trazia o nome dos profissionais farmacêuticos responsáveis. O Grupo Pela Vidda/SP alertou que além dos riscos de receber o resultado sem a presença e o aconselhamento de um profissional, a coleta em
domicílio feita pelo próprio interessado é totalmente inadequada. Na carta em que solicita providências das autoridades, o Grupo Pela Vidda/SP afirma “o site comercializa exames diagnósticos que só deveriam ser prescritos por médicos, bem como deveriam ser acompanhados obrigatoriamente de aconselhamento pré e pós-teste. Tendo em vista a gravidade desta prática, que coloca em risco a saúde da população, solicitamos as providências cabíveis”. A denúncia do Grupo Pela Vidda/SP foi destacada pela Agência de Notícias da Aids do dia 10 de março e pelo jornal O Estado de S. Paulo do dia 17 de março. Foi fundamental também a ação de Hélia Mara, da Casa Servo de Deus, ONG de Vitória (ES). Em
resposta, o chefe do Núcleo da Vigilância Sanitária do Espírito Santo (VISAES), Marcos Alex Silva, afirmou que “foi realizada inspeção e aberto processo administrativo sanitário contra a empresa; foi determinada a retirada do serviço pela internet”. Segundo Marcos Alex, “a equipe da Visa esteve na empresa e orientou quanto a impossibilidade de permanecer com o serviço sendo prestado pelo site. A empresa está regularizada com esta Visa, possuindo licença sanitária vigente e o problema existente é quanto ao serviço executado, pois encontra-se em desacordo com a legislação sanitária: RDC 302, da Anvisa, relativa a biossegurança e ao transporte das amostras sanguíneas”.
pela vidda
Centro de Referência da Diversidade
faz seu primeiro aniversário Irina Bacci*
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UM ANO DE CRD - Da esq. para dir.: Fátima Brito, representante do Projeto Nós do Centro; Angela Tonini, da Comissão de Monitoramento da União Européia; Norberto Bossolani, presidente do Grupo Pela Vidda-SP; Irina Bacci, coordenadora do CRD; e Franco Reinaudo, Diretor da Coordenadoria de Assuntos de Diversidade Sexual – CADS / PMSP
ocupação, do Grupo Pela Vidda/ SP, passou a ser também a relação entre a exclusão social e a aids. Para muitos, pode parecer que não há diferença do que vem primeiro. Pois estamos certos de que a exclusão social é um determinante de incomensuráveis impactos na epidemia da aids. Muitos estudos já relacionaram aids com pobreza, com raça/etnia, com populações mais vulneráveis, com as relações de poder. Mas ainda não existem práticas consolidadas que tenham um olhar inverso: a miséria extrema, a condição de rua e a negação da cidadania como fatores conducentes à aids. Daí, propomos uma visão inovadora para enfrentar a epidemia, pautada na
dimensão ética de incluir os “invisíveis”; uma visão de proteção, capaz de entender que essa população tem necessidades, mas principalmente tem possibilidades e capacidades que podem ser desenvolvidas. No caso das pessoas que integram o que chamamos genericamente de público da diversidade , mas que também estão em condição de rua, sabemos que elas estão multiplamente vulneráveis a violências de toda ordem, dependência química de álcool e drogas, precarização das condições de vida, direitos violados, discriminação explícita, ausência de dignidade, enfim. Assim, as condições de vulnerabilidade se potencializam e muitas perguntas nos per-
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Em março de 2009 o CRD – Centro de Referência da Diversidade completou um ano. É um espaço administrado pelo Grupo Pela Vidda/ SP, que também em 2009 completará 20 anos de luta contra a aids. Viabilizado por meio de concorrência pública e de convênio com a Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS), o serviço inédito integra o Projeto Inclusão Social Urbana – Nós do Centro, uma iniciativa da Prefeitura de São Paulo e da União Européia. O objetivo do Centro de Referência da Diversidade é desenvolver ações que possibilitem a garantia da inclusão social e a geração de renda na região central de São Paulo. É um espaço destinado a atender homens e mulheres profissionais do sexo; gays e lésbicas; travestis; transexuais e pessoas que vivem com HIV e aids em situação de vulnerabilidade e risco social. Neste período, vivenciamos intensamente a exclusão social. Com a porta aberta para a realidade, pudemos observar e sentir de perto as consequências das péssimas condições de vida de tantas pessoas, ao longo do tempo excluídas pela sociedade e negligenciadas pelo poder público. Nós, ativistas, sempre nos preocupamos com a relação entre aids e exclusão social. Mas deste ponto onde estamos, do CRD, a nossa pre-
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seguem no CRD. Como fazer prevenção em DSTs, HIV e aids dentro deste contexto? Como incentivar a testagem do HIV e a busca precoce pelos serviços de saúde? Como promover a adesão daqueles que chegam até o tratamento? Durante anos exportamos aos países africanos expertises para ajudálos a enfrentar a aids. Talvez hoje precisemos importar técnicos e ativistas do continente irmão para nos ajudar a lidar com essa situação ainda menosprezada pelas respostas governamentais e não governamentais no terreno da aids. Neste primeiro ano foram assistidas pelo CRD aproximadamente mil pessoas e o que mais nos chama a atenção, dentre as inúmeras demandas que temos ali, é que aids é mera coadjuvante quando elas não têm o teto, a comida, a possibilidade de aprender, de sonhar com emprego e renda ou de, simplesmente, de serem
atendidas adequadamente por um serviço público, seja de saúde, segurança, assistência ou lazer, pois muitos ainda mantém suas portas fechadas para esses cidadãos e cidadãs. Problema de tal magnitude jamais encontrará solução apenas no campo das políticas públicas de saúde e de HIV e aids. Ao fazer uma aproximação com a política de assistência social, o Grupo Pela Vidda/SP espera contribuir com a discussão sobre a necessidade de parcerias estratégicas para além dos caminhos tradicionais. As ONGs de luta contra a aids e LGBTs historicamente assumiram, diante da incapacidade do Estado, papéis de gestores e executores de ações de prevenção e de garantia de direitos. O que propomos, no Centro de Referência da Diversidade, é uma aliança dos propósitos desses dois movimentos sociais vigorosos em torno também da assistência, da proteção e da inclusão social.
Centro de Referência da Diversidade (CRD) Grupo Pela Vidda/SP Rua Major Sertório, 292/294 República – São Paulo Telefone: 3151-5786 E-mail: crdiversidade@uol.com.br
PRINCIPAIS ATIVIDADES (MAIO DE 2009) Oficina Projeto de Vida: promove resgates pessoais, minimizando os efeitos da precariedade de vida, os riscos e as vulnerabilidades. Oficina Psicossocial: problematiza vivências comuns entre os usuários do CRD. Curso Empreendedor em Pequenos Negócios: realizado em parceria com o SESC, objetiva capacitar novos empreendedores e gestores de pequenos negócios. Oficina de Sabonete Artesanal: ensina a técnica da produção de sabonetes artesanais e introduz técnicas de linha de produção e empreendedorismo. Oficina de Estamparia de Camisetas: ensina a arte da estamparia com tinta, desenvolve habilidades de pintura, promove intervenção lúdica e geração de renda. Oficina de Xilogravura: aperfeiçoamento do curso de estamparia
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Oficina de Marchetaria: ensina a arte ou técnica de ornamentar superfícies, através da aplicação de materiais diversos.
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Oficina de Pelúcia: atividade terapêutica e de geração de renda, porta de entrada para inserção positiva no CRD. Terças Trans: realizada em parceria com a Associação da Parada do Orgulho GLBT, visa desmistificar os estereótipos sobre as pessoas transexuais, travestis e intersexos.
GERAÇÃO DE RENDA – oficina de sabonete artesanal realizada no CRD
*Irina Bacci é formada em fisioterapia e administração de sistemas de saúde. Coordenadora do Centro de Referência da Diversidade, e também presidente do Conselho Municipal de Atenção à Diversidade Sexual de São Paulo.
Grupo de Apoio para lésbicas e mulheres bissexuais: reunião de convivência para lésbicas e mulheres bissexuais. Obs: As atividades têm vagas limitadas. Os dias e horários devem ser conferidos junto ao CRD.
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Voluntários do Pela Vidda participaram da ação “Viaje Bem com Camisinha”
No dia 20 de fevereiro de 2009, véspera de Carnaval, o Grupo Pela Vidda/SP, distribuiu cerca de 70 mil preservativos e material educativo no Terminal Rodoviário Tietê. A atividade, que leva o nome Viaje Bem com Camisinha, é realizada há 14 anos e em 2009 contou com o apoio da empresa Socicam, administradora do terminal Tietê, do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), dos Programas Nacional, Estadual e Municipal de DST/Aids de São Paulo. Além da distribuição de camisinhas e material informativo, uma equipe de 70 voluntários esclareceu dúvidas sobre prevenção, bem como referenciou serviços de saúde que devem ser procurados para testagem, aconselhamento e tratamento das DSTs, HIV e aids.
A intervenção no maior terminal rodoviário do país, num período de intenso fluxo de pessoas, tem o objetivo de chamar a atenção para a importância da prática do sexo seguro e da utilização de preservativo. O Grupo Pela Vidda/SP ressalta que apenas intervenções de massa desse tipo não são suficientes; precisam ser acompanhadas, durante todo o ano, de ações de prevenção dirigidas às populações mais vulneráveis ao risco de infecção pelo HIV e também dirigidas à população em geral.
Estande divulgou o teste rápido Em 2009 a intervenção do Grupo Pela Vidda no terminal Tietê trouxe uma novidade. Técnicos do Programa Estadual de DST/Aids estiveram no local orientando e motivando as pessoas a realizaram
o teste rápido para o HIV. Não foram realizados exames no local, mas as pessoas assistiram à demonstração de como é feito o exame e foram aconselhadas a procurar os centros de testagem e aconselhamento A ampliação do acesso ao teste rápido, que dá o resultado em 15 minutos, é fundamental para a diminuição do alto índice de diagnóstico tardio no Brasil .Cerca 43% das pessoas com HIV chegam aos serviços de saúde já com imunidade debilitada ou sintomas clínicos da doença, perdendo, com isso, a oportunidade de se beneficiarem totalmente do tratamento disponível no SUS. O Ministério da Saúde estima que mais de 250 mil brasileiros têm o vírus HIV e não sabem. Essas pessoas não fizeram um teste que é simples, rápido e gratuito em todo o país.
Chá Positivo Participe da atividade realizada às quintas-feiras, 19h30, na sede do Grupo Pela Vidda/SP, à rua General Jardim, 566. O Chá Positivo é um espaço aberto e “alto astral” de convivência e interação sobre o viver com HIV e aids nos dias de hoje. Telefone: 3258-7729 E-mail: chapositivo@yahoo.com.br
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VIAJE BEM COM CAMISINHA
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www.aids.org.br GRUPOS PELA VIDDA São Paulo - SP Rua General Jardim, 566 - Vila Buarque CEP 01223-010 - São Paulo - SP Tel/Fax: (11) 3258-7729 e-mail: gpvsp@uol.com.br Rio de Janeiro - RJ Av. Rio Branco, 135 - 709 - Centro CEP 20040-006 - Rio de Janeiro - RJ Tel.: (21) 2518-3993 - Fax: (21) 2518-1997 Site: www.pelavidda.org.br e-mail: gpvrj@pelavidda.org.br Niterói - RJ Rua Visconde de Itaboraí, 251 - Ponta da Areia CEP 24030-090 - Niterói - RJ Tel.: (21) 2722-0067 / 2613-0598 e-mail: gpvnit@pelavidda-niteroi.org.br Goiânia - GO Rua 24, nº 224 - Centro CEP 74030-060 - Goiânia - GO Tel.: (62) 3095-5319 / 3212-7178 e-mail: aidsorgpelavida@cultura.com