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Marcelo Amorim Primeira leitura
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Marcelo Amorim Primeira leitura
Ateliê397
Zipper Galeria
Direção Marcelo Amorim Thais Rivitti
Direção Fabio Cimino Lucas Cimino
Equipe Rodrigo Grasso Sergio Pinzón
Equipe Lucila Losito Mantovani Camila Schmidt Veiga Andrea Lourenço Rafael Freire Mario Lucas Oliveira Gomes
www.atelie397.com Rua Wisard, 397 - Vila Madalena 05434-080 - São Paulo - SP 55 (11) 3034 2132
www.zippergaleria.com.br Rua Estados Unidos, 1494 01427-001 - São Paulo - SP 55 (11) 4306 4306
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Marcelo Amorim Primeira leitura
S達o Paulo 2014
Copyright 2014
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
M314
Marcelo Amorim: primeira leitura = Marcelo Amorim: first reading / Camila Fialho, et al. ; organização e prefácio Paulo Gallina – São Paulo: Ateliê397/Zipper Galeria, 2014. 132 p.; il., col.; 21 x 15 cm. ISBN 978-85-66065-05-3
1. Arte Contemporânea (Séc. XX) - Brasil. I. Fialho, Camila. II. Zaccagnini,Carla. III. Soares, Carolina. IV. Diniz, Clarissa. V. Castro, Daniela. VI. Siqueira, Henrique. VII. Betts, Nancy. VIII. Braga, Paula. IX. Gallina, Paulo. X. Rivitti, Thais. XI. Título. CDD: 709.8104
Foi feito o depósito legal na Biblioteca Nacional (Lei nº 10.994, de 14 de dezembro de 2004)
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Marcelo Amorim Primeira leitura
S達o Paulo 2014
O prefácio O
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DOCE CONSELHO Como uma música cantada à melodia mais suave, as imagens criadas por Marcelo Amorim são carinhosas com os homens e mulheres que tocam. A cada um deles é dada uma dignidade inesperada e uma vilania ordinária. Como na vida, ninguém é tornado herói ou vilão. Todos são humanos, povoados por defeitos e qualidades que nos fazem amá-los ou simplesmente aceitá-los. Assim, crianças, sempre sorridentes, são recortadas de uma forma estranha, sem contexto, em um conjunto de fotografias; homens feitos são retratados com força e intransigência em uma série de pinturas; e mulheres altivas são transformadas em fantasmagorias elegantes em outro conjunto fotográfico, apropriado pelo artista. São figuras tão reais, talvez por serem parte de todo ser humano. Não é todo dia que nos encontramos com trabalhos ao mesmo tempo ácidos com seus temas e tão carinhosos com suas personagens. Ao aceitar a imagem de cada homem, mulher ou criança, Marcelo nos aproxima deles sem medo de também expor seus piores defeitos. Uma generosidade que pouco se vê atualmente. Num jogo entre forma e conteúdo, o artista apresenta sua cartilha. E desde a capa sabemos que nada estará escondido nas imagens, a menos que as palavras consigam escondê-las. Esta Primeira leitura apresenta uma reunião de imagens e textos em busca de instruir o leitor sobre como críticos e artistas se aproximaram do trabalho de Marcelo. Precisamente como se espera que uma cartilha o faça. Com a vontade de, assim, incentivar o leitor a olhar com o coração aberto este trabalho dúbio e tirar, por si, suas conclusões. Mesmo sabendo que, finda a leitura, essas tantas primeiras leituras continuarão a ser reinterpretadas como partes de nós, de que não queremos abrir mão.
Paulo Gallina
O sumário O
I– II – III – IV – V– VI – VII – VIII – IX – X– XI – XII -
Imagem em transformação por Henrique Siqueira................................ Tempo por Nancy Betts............................................................................. Crítica, elogio, fetichização por Clarissa Diniz....................................... Missing por Carolina Soares..................................................................... Educação para o amor? por Carolina Soares.......................................... Educação para o amor por Carla Zaccagnini......................................... Headshots por Camila Fialho................................................................... O poder do silêncio por Thais Rivitti....................................................... I am ready to sing por Daniela Castro..................................................... Da informação à contrainformação por Paula Braga............................ Primeira leitura por Paulo Gallina.......................................................... English version...........................................................................................
19 27 31 39 47 56 61 67 75 87 95 105
Temos todos duas vidas: A verdadeira que é a que sonhamos na infância, E que continuamos sonhando, adultos num substrato de névoa; A falsa que é a prática, a útil, Aquela em que acabam por nos meter num caixão. Na outra não há caixões, nem mortes, Há só ilustrações de infância. “Datilografia”, Álvaro de Campos, 19 de dezembro de 1933
u IMAGEM EM TRANSFORMAÇÃO u
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por Henrique Siqueira
Fotografia de gaveta, alusão às fotografias amadoras que registram situações domésticas, como festas e viagens, é o nome da exposição que o artista Marcelo Amorim apresenta no Sesc Pompeia. São fotografias marcadas pelo limite extremo de aproximação com as artes gráficas e que põem em dúvida a sua origem tecnológica. Valorizando a ação e a transformação, as fotografias são apropriadas de desconhecidos e, com o auxílio de uma copiadora, são recortadas, ampliadas e posteriormente reconstituídas. Os atos realizados implicam uma operação no território da subjetividade. Ao furtar as fotografias, o artista comete sua primeira transgressão. A ação desse gesto recai menos no conteúdo legal do ato, ingênuo para os padrões éticos e legais da privacidade no nosso século, do que na sua intencionalidade: a apropriação simbólica da história contida naquela imagem. Amorim ainda executará outras intervenções que transformarão essas imagens destituídas de sentido ao olhar alheio em imagens dotadas de sentido transitivo no campo artístico. Sua segunda transgressão consiste no apagamento da sustentação fotográfica. Esse processo se inicia com o retalhamento da fotografia em fatias que conduzirão o olho do observador a realizar um zoom que desvia a atenção da integralidade para um campo macro da imagem. Em seguida, cada fatia é ampliada em copiadora, equipamento que além de promover a deformação cromática degenera a cópia e ressalta as imperfeições não detectáveis no formato original, resultando em uma imagem opaca, suja. São procedimentos intencionais de subtração das características fotográficas e de aproximação com as propriedades da arte gráfica. Ao utilizar recursos como copiagem e recorte Marcelo insere atividades do cotidiano na imagem – recursos de uso rotineiro nos escritórios – e reitera o sentido da apropriação, agora atuando na própria morfologia da imagem.
IMAGEM EM TRANSFORMAÇÃO
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Na sequência, o artista reconstitui as imagens. Tendo como modelo a composição inicial, as folhas são dispostas deixando aparentes as junções entre elas e, em seguida, são fixadas no painel. A escolha pelo método de colagem indica a intenção de deixar aparente a fratura da imagem e, por consequência, o processo de fragmentação. Esse recurso de montagem sinaliza também a aproximação com as propostas de arte e propaganda do espaço público urbano, como o lambe-lambe e o outdoor. Apesar da descaracterização da imagem fotográfica, as três operações de transformação – furto, retalhamento e copiagem – são compreendidas como um gesto expansivo que trata a fotografia nas suas fronteiras. Nesse caso, a imagem fotográfica se afasta das características industrialmente pré-definidas para a câmera, como a captação e seus valores iconográficos, para valorizar as possibilidades de processamento da imagem, as mutações pósprodução e a intervenção do artista. Amorim está reposicionando o universo pessoal da foto-recordação guardada na gaveta do móvel de um quarto de dormir como um símbolo transitivo no território da subjetividade da arte.
Texto publicado em 2007 no catálogo da exposição Tripé-Tempo, realizada no Sesc Pompeia, em São Paulo.
g TEMPO g
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por Nancy Betts
As imagens de Marcelo Amorim trazem para o domínio público os arquivos privados do artista. O artista trabalha com um processo de pesquisa de intertextualidade entre as mídias –transformação e construção de formas autônomas a partir da apropriação de fotografias pré-existentes. Se a fotografia reproduz ao infinito o que só ocorreu uma vez e nunca mais poderá repetir-se, é exatamente o que Marcelo busca mostrar. Noções de permanência, imobilidade, estabilidade e unidade são inadequadas para mostrar que a vida é ritmo, movimento, mudança, efemeridade. Reformular antigos princípios e definir uma linguagem que nos mostre as modificações figurativas e conceituais na imagem é o que o artista propõe tomando por base a desconstrução, a ampliação, a fragmentação, a repetição e a tradução de uma mídia para outros meios. Do ponto imóvel do grão de sal de prata da fotografia à noção de pixelagem produzida pelo uso de etiquetas adesivas na produção da imagem, o artista deixa clara a forma dinâmica de pensar o movimento na imagem. O que Marcelo consegue fazer é indicar a permanente mudança no tempo – somos todos mutantes de nós mesmos.
Texto publicado em 2007 no catálogo da exposição Tripé-Tempo, realizada no Sesc Pompeia, em São Paulo.
B CRÍTICA, ELOGIO E FETICHIZAÇÃO B
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por Clarissa Diniz
A fotografia ininterruptamente expande-se na arte brasileira não só como linguagem, mas como lógica construtiva de obras que não são necessariamente fotografias, mas pinturas, vídeos, instalações, performances etc. Percebe-se também que muitos dos trabalhos calcados na lógica fotográfica referem-se a uma temporalidade anterior à que hoje vivemos. Colocando de lado os modelos estéticos instaurados com a era digital, tais obras filiamse à cultura da tecnologia analógica e, muitas vezes, escolhem lidar com uma estética amadora e caseira, incorporando suas habituais “distorções” de luz, foco e composição como virtudes plásticas e conceituais quase sempre desdobradas em discursos metalinguísticos sobre a própria fotografia ou em reflexões sobre a construção e o apagamento das subjetividades. A produção de Marcelo Amorim, por exemplo, relaciona-se a tais procedimentos. Em seu trabalho, o artista publiciza imagens de acervos fotográficos particulares, reconsiderando seu caráter privativo e suas peculiaridades, ao relocar livremente as identidades que fazem parte desses acervos, descontextualizando-as de seu espaço e tempo de origem. Assim procede Amorim na série Missing, quando recorta rostos infantis de fotografias de festas familiares, retirando-os do relativo anonimato da coletividade para inseri-los na lógica do retrato, onde falam mais alto identidade e solidão. Por meio de seu método “sequestrador”, portanto, o artista faz ver a susceptibilidade da fotografia em sua tentativa de suspensão do espaço-tempo, metaforiza a cambialidade das identidades e, por fim, revela certo “autoritarismo poético” na apropriação da intimidade do outro como forma e conteúdo de sua obra. Por tal “autoritarismo” – que explora a flexibilidade da linguagem fotográfica e apresenta relativo despudor ao lidar com o outro –, a produção de Marcelo Amorim é comumente apontada como transgressora, título que, sob o argumento da criticidade, obscurece um processo de elogio e, talvez, de fetichização do passado que também percebo em seu trabalho. Ao eleger como objeto de sua obra um tempo relativamente distante e, analogamente, trabalhar
CRÍTICA, ELOGIO E FETICHIZAÇÃO
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com uma tecnologia atualmente em desuso, sem dedicar-se a construir discursos acerca deles – tempo e tecnologia – mas, basicamente, apropriando-se de sua estética mormente por um interesse formal pela linguagem fotográfica, Marcelo, acredito, enfatiza menos um posicionamento crítico em relação ao passado que uma sedução, sem pretensões representacionais, por sua visualidade. Abre-se, assim, espaço para a fetichização. O movimento de retorno à cultura e estética analógicas da fotografia – conduzido não só por Amorim, como por outros jovens artistas – talvez se encontre, portanto, no imbricamento entre crítica, elogio e fetichização do passado. Tal interesse, contudo, diz muito acerca da atual juventude brasileira, que, sem desejar esquecer ou combater o passado, problematiza-o com um olhar cúmplice – como o faz Marcelo Amorim ao misturar, aos rostos infantis por ele raptados, também seu semblante de criança, aproximando o outro de si.
Texto publicado em 2008 no fôlder da exposição individual realizada no Centro Cultural São Paulo.
v MISSING v
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por Carolina Soares
E se pudéssemos reter na memória toda a nossa vida? Por certo, essa pergunta resulta inócua enquanto uma tentativa vã de restituir em absoluto a faculdade de conservar e de lembrar estados de consciência passados. E parece ser a constatação dessa impossibilidade humana, de carregar consigo todos os momentos vividos, que transfere à imagem fotográfica a importância simbólica de amparar nossa memória lacunar. As coleções de álbuns de família tornam-se, então, lugares por excelência das reminiscências. E é a partir desses artefatos que o trabalho de Marcelo Amorim se inicia. À medida que abre armários e gavetas, o artista vai se deparando com álbuns que ali se encontram há anos a cumprirem o papel de resguardar cada momento vivenciado pela família: casamento, nascimento dos filhos, festas de aniversários etc. Nesse redescobrir a que Amorim se propõe, cada fotografia parece reter em sua superfície até mesmo aqueles instantes já imemoráveis. Pois, além de acúmulo de imagens, o álbum é também a constatação de um tempo que se esvai e que se perde. “Tudo em mim é de um príncipe de cromo colado no álbum velho de uma criancinha que morreu sempre há muito tempo”, como descreve Fernando Pessoa.1 Se não é possível retermos na memória toda a nossa vida, de que modo podemos retomar as lembranças dos eventos recortados pelas imagens fotográficas? Tudo no álbum de família parece remeter, assim, a uma ausência, a uma memória que não mais reconhece as identidades dos sujeitos ali colecionadas. Daí Mario Costa definir a fotografia como uma “memória de máquina”, em que o sujeito retratado não deixa marcas de sua presença. Ao contrário, o eu que comparece nesse tipo de imagem nada mais é do que a memória fotoquímica dos sais de prata. Não sou eu que conservo minha presença nas marcas que deixo, é a tecnologia que me assimila como conteúdo indiferente de sua memória e evoca minha presença somente no interior de seu funcionamento.2
MISSING
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Seguindo esse raciocínio, Marcelo Amorim monta a estratégia de seu trabalho tornando evidentes as impossibilidades de serem restabelecidas, em sua integridade, as relações entre o sujeito retratado e a fotografia. Em Missing, o artista apropriase dos álbuns de sua própria família. Tenta ali redescobrir a si mesmo em imagens que supostamente deveriam funcionar como mantenedoras de histórias familiares como aquelas que descrevem as festas dos aniversários. Pela narrativa dos pais, sabe ser ele a criança que apaga as velas do bolo, mas, quem serão todos que estão ao redor? Nesse não reconhecimento, o sentido daquela imagem parece perder-se. Daí o significado de Missing, que, em português, remete à ideia de algo ou alguém “desaparecido”. Para Amorim, parece não haver mais razão para manter aqueles “desaparecidos” no álbum de família guardado no inteiro das gavetas domésticas. Decide, então, selecionar algumas fotografias, recortar cada personagem, em sua maioria crianças, criando, assim, novos retratos que se aproximam da ideia de um 3x4, mas agora ampliados em uma escala bem maior. Com esse procedimento, os indivíduos, alguns já totalmente anônimos, ganham autonomia. Não se trata mais de um grupo reunido em torno da mesa para o apagar das velas, mas, sim, de pessoas individualizadas e “desaparecidas” em busca de serem identificadas. A montagem do trabalho resulta em uma instalação que figura um jogo com dois momentos distintos, porém complementares. Primeiro: na parede externa da sala, trinta e dois retratos, 20x30 cm, são distribuídos, de modo simétrico, entre quatro fileiras, formando um espaço retangular que, visto a distância, remete à unidade de um papel fotográfico bastante ampliado. Ao aproximarse, o que se percebe, no entanto, é uma série de retratos distintos que fazem referência, de maneira quase inequívoca, às imagens divulgadas em jornais de pessoas desaparecidas e procuradas por seus familiares.
MISSING
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Por não serem originalmente 3x4 cm, mas retratos criados pelo recorte das fotografias de álbuns, elas não seguem um padrão de pose. Também não há uma regra estrita para a seleção das imagens. Esta se dá de maneira aleatória, algumas se repetem, mostram os mesmos rostos em diferentes momentos, o que reforça ainda mais a dificuldade em perceber a imagem fotográfica como autossuficiência do eu. São superfícies envelhecidas que trazem em si a dimensão da transformação e do envelhecimento. Segundo: no interior da sala, quatro fotografias, 120x70 cm, ganham o espaço. Agora a estratégia muda. Alguns dos retratos, 20x30 cm, montados na parede externa da sala, o artista fixa ao seu próprio rosto e se fotografa novamente em uma pose fixa, usando a mesma camisa branca, como se o objetivo agora fosse de fato a obtenção de um retrato 3x4. Com isso, cria uma espécie de máscara, simulando em cada fotografia uma identidade que por vezes é a sua própria de quando criança. Essa sobreposição de imagens faz da aparência uma ilusão, um disfarce, uma simulação. Reitera a ideia de que nenhum indivíduo terá uma identidade estanque, mas marcada por alterações que vão se aproximando de uma marca distintiva de cada um. Os retratos em grande formato fogem por completo de uma escala próxima ao real. Com isso causam estranhamento, desconforto ao exacerbarem noções de identidade completamente construídas. O trabalho, portanto, parecer evidenciar a falta de equivalência absoluta entre fotografia e semelhança física e psicológica. Nessa trama identitária, a instalação Missing coloca em questão uma série de representações simbólicas que recaem sobre o indivíduo sem, no entanto, negar a importância que a fotografia assume para as construções de todas essas identidades. PESSOA, Fernando. “A minha imagem” in Quando fui outro – Fernando Pessoa, Rio de Janeiro: Objetiva, 2006, p. 91. 2 COSTA, Mario in FABRIS, Annateresa. As identidades virtuais – uma leitura do retrato fotográfico, Belo Horizonte: Editora UFMG, 2004. 1
v EDUCAÇÃO PARA O AMOR? v
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por Carolina Soares
De imediato, o estranhamento. Afinal, o que levaria alguém a recorrer à aplicação de um método para assegurar o ensino sobre algo que pressupõe uma atração, natural, afetiva ou física entre pessoas? Já no século XXI, a proposta soa no mínimo retrógrada, quando não, datada. Se a pergunta supõe atiçar um debate de caráter conservador e um tanto autoritário de tempos passados, é precisamente na recolocação de um enunciado já vazio de significados e repleto de ambiguidades que repousa o interesse de Marcelo Amorim. Outro dia, enquanto visitava alguns sebos, o artista deteve-se diante de um título curioso, Educação para o amor – Introdução à psicologia da afetividade, de autor desconhecido. Não se tratava, porém, de um livro, mas sim de uma série de slides que acompanhava a publicação original. Uma vez que houve esse desmembramento, a aquisição de Amorim centrou-se nessa multiplicidade de imagens que – divididas em vários volumes – sintetizam uma espécie de representação das mais diversas maneiras de se demonstrar “amor”, seja entre mãe e filho ou entre homem e mulher. Mantendo-se desconhecido o conteúdo propriamente do livro, saltam aos olhos o aparente instrumentalismo sugerido pelo título e o papel ilustrativo ao qual as imagens parecem estar sujeitas. Ao serem projetados, os slides evidenciam encenações de uma felicidade estereotipada e quase sempre forçosa. Casais enamorados que passeiam pela areia da praia, que se beijam, trocam olhares e sorrisos. Mães que brincam com seus filhos, que os abraçam e os acariciam. Não obstante a notória presença feminina na constituição dos pares, o esquema ao qual essas imagens parecem aludir assemelha-se àquele contestado por Simone de Beauvoir, em 1949, quando escreve O segundo sexo. Ou seja, no seio da família a mulher apresenta-se à criança e ao jovem revestida da mesma dignidade social dos adultos masculinos; mais tarde ele sente no desejo e no amor a resistência, a independência da mulher desejada e amada; casado, ele respeita na mulher a esposa, a mãe, e na experiência concreta da vida conjugal ela se afirma em face dele
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como uma liberdade. Mas, logo que entra em conflito com a mulher a situação se inverte e, então, esbraveja: “serias totalmente incapaz de ganhar tua vida sem mim”. Mas, se, de início, as cenas idílicas assumiam o papel de dar suporte visual a um texto didático-pedagógico sobre como educar para o amor, agora a elas é atribuída uma nova consciência. Elas deixam de deflagrar um possível mecanismo esquemático – com apelo sexista ainda de cunho moralista – para retornar a sua condição de meras imagens. Do desprendimento em relação ao texto original, tornam-se resíduos dessecados de um sentido primeiro. E é dessa nova condição assumida por essas imagens que Marcelo Amorim tira proveito para então propor a série homônima Educação para o amor. O artista – que desde 2008 vem realizando desenhos a partir de imagens de slides – revela uma pintura. Exatamente. Escolhe os diapositivos e decide pela tinta a óleo para transpor, sem interditos, a imagem projetada para uma tela. O resultado desse processo de transposição é uma pintura sem textura, sem densidade, pouco contrastada. Em alguns momentos a opacidade alcançada faz com que a tinta a óleo ganhe aspectos de guache. Não há espaço para detalhes. Tudo se dilui; tudo se esvai pelo predomínio de uma transparência que parece carregar consigo a imaterialidade daquela imagem primeira formada apenas de fótons luminosos. Sem o rigor de um pintor que se empenha em preciosismos técnicos, Amorim apresenta uma pintura que não se pretende pintura, mas imagem decantada que abre mão de todo o peso dos estereótipos para confundir-se entre cenas quaisquer de um cotidiano amoroso banal. Se Gerhard Richter tivesse tido contato com o mesmo material de Educação para o amor, entre as décadas de 196070, a aparência geral seria bem semelhante àquela proposta por Amorim. Mas, ao transpor para tela imagens fotográficas vulgares de periódicos – mesmo aquelas de cenas amorosas –,
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Richter depositava ali não somente uma atenção ao procedimento técnico como também a intenção de um gesto crítico que se atinha a um posicionamento político de um alemão diante das atrocidades da Segunda Guerra Mundial. Não que Marcelo Amorim tivesse em mente as pinturas do artista alemão, afinal seu trabalho surge despido até mesmo de qualquer resquício de um “debate de caráter conservador e um tanto autoritário de tempos passados”, resguarda apenas algo que lhe confere uma condição de uma ironia falaciosa. Talvez essa dubiedade caia por terra quando a transposição passa a ser feita por meio de um lápis sobre papel. Embora os desenhos se liguem às pinturas por uma mesma desilusão diante das representações, neles o artista parece tentar restituir um certo ânimo em torno da natureza dos meios e das possibilidades que apresentam. Retoma um fazer bem similar àquele dos transfers ou do papel carbono. O procedimento está em posicionar um papel branco sobre uma fotografia qualquer e, com a pressão dos riscos feitos a lápis, a imagem é transferida. Ou, se quisermos uma aproximação ao universo fotográfico, torna-se também similar à realização dos fotogramas, em que as fotografias são obtidas pelo posicionamento dos objetos diretamente sobre o papel sensibilizado. Essa impregnação por contato resulta em uma imagem quase gravura formada por traços leves, mas preenchidos de densidade. A série Educação para o amor se esquiva tanto da suposta verdade de um realismo fotográfico quanto da grande eloquência do fazer pictórico. Em seu procedimento, tudo surge impregnado de desencanto. A cópia é uma mera cópia. Não se trata mais de revisitar a História da Arte aludindo ao modo como os grandes mestres eram copiados enaltecendo o próprio ensinamento da prática artística. Nem tampouco de rever as propostas educacionais nas quais se espelha Educação para o amor, em que a cópia (ou a repetição em excesso) tornava-se um ato mecanicista de assimilação dos enunciados. Se é possível falar de um teor crítico, ele surge pela intensidade de negação de uma crítica. E é precisamente nesse ponto que reside a força do trabalho.
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Para, então, olhar para os casais enamorados daquelas pinturas e torcer por um final feliz! O seu amor ame-o e deixe-o livre para amar, livre para amar, livre para amar. O seu amor ame-o e deixe-o ir aonde quiser, ir aonde quiser, ir aonde quiser. […] O seu amor ame-o e deixe-o ser o que ele é, ser o que ele é, ser o que ele é. Doces Bárbaros, 1976
Texto publicado em 2010 no fôlder da mostra individual Iniciação, realizada na Galeria Oscar Cruz, em São Paulo.
Carla Zaccagnini
Intervenção da artista Carla Zaccagnini sobre texto original que acompanhava os slides, os quais deram origem à série de pinturas. Publicado em 2009 no fôlder da mostra individual Educação para o amor, realizada no Ateliê397, em São Paulo.
v HEADSHOTS v
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por Camila Fialho
Em dimensões reduzidas e de mesmo tamanho, cabeças de papel se projetam no espaço expositivo na forma de esculturas fotográficas. Na parede, o mapa aberto de uma cabeça indica trajetórias possíveis de um jogo minucioso de dobraduras. A estranheza fixa a primeira impressão do olhar ao se deparar com as pequenas peças esculpidas por Marcelo Amorim. Em meio à proliferação das mais diversas identidades virtuais das redes sociais do contemporâneo, o artista brinca na construção de um avatar múltiplo. Em seu trabalho, a foto 3x4, estampada cotidianamente em documentos de identidade, perde sua bidimensionalidade para ganhar textura e profundidade na modelagem virtual de uma cabeça. Esta, por sua vez, volta a ter duas dimensões quando aberta em um diagrama de polígonos, formando uma espécie de quebra-cabeças em tons de pele. E, da tela do computador, a cabeça volta a existir na superfície de um papel fotográfico para então ser reconstituída materialmente através de delicadas dobras, como um origami de feições humanas. Em sua nova versão espacial, já não conseguimos mais identificar os traços do rosto que estava à origem da pequena escultura. Trata-se de um ser-objeto outro que, materializado, adquire um ar robótico. A substância humana identificável se apaga, e o que agora temos são cabeças cibernéticas volantes, cabeças quase suspensas, quase sem peso, cabeças ocas, despidas de uma identidade orgânica. O bruto do objeto multifacetado, alinhado com a sutileza dos tons de pele, nos incita a buscar os traços humanos dissipados nas camadas de manipulação da imagem. Por mais que seja possível identificar feições de seu criador, o que vemos ali é um ser hesitante em suas definições. As dimensões do real suposto pela fotografia diluem-se nas mãos do artista, dando uma nova roupagem a sua identidade. Talvez pudéssemos pensar em um autorretrato, mas as cabeças-objetos acabam por se explicar outras figuras, semelhantes, não iguais.
HEADSHOTS
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Headshot constitui-se no limiar de universos híbridos. Híbrido em seu processo que transita por diferentes mídias: da captação fotográfica, passando pela customização computacional, ao gesto físico e fino que devolve ao ser fotografado a materialidade de um rosto cibernético. Híbrido enquanto obra fotográfica e escultural. Híbrido ainda naquilo que nos evoca do identitário de nós mesmos que se desvanece na construção de novas realidades aparentes, onde o real e o virtual, o natural e o artificial se confundem, onde a identidade se torna criação.
Texto publicado em 2012 no catálogo da coletiva Abre Alas 8, realizada na galeria A Gentil Carioca, no Rio de Janeiro.
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v O PODER DO SILÊNCIO v
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por Thais Rivitti
O artista Marcelo Amorim vem construindo há anos uma obra que retira do silêncio sua potência perturbadora. Frente à espetacularização da vida, o artista prefere manter uma produção em baixo tom, solapando pouco a pouco a ideia de que, em um trabalho de arte, a comunicação pode ser feita de modo imediato. Chamando a atenção de forma discreta, mas nem por isso menos aguda, para aquilo que ficou para trás, perdido no tempo, não contabilizado pela História, sua produção tem o poder de resgatar coisas – pessoas, hábitos, formas de sociabilidade e comportamentos – esquecidas ou deliberadamente apagadas da memória social coletiva. A técnica empregada em seus trabalhos desempenha papel fundamental nessa construção. O artista frequentemente utiliza materiais antigos como fonte primária de sua pesquisa. Na serigrafia sem título (2012), especialmente elaborada para o projeto Múltiplos397, ele parte de uma fotografia encontrada na internet. Trata-se de uma foto dentre as inúmeras postadas na rede diariamente cuja origem e referentes permanecem não revelados. Utilizar um material que está à disposição de qualquer um e, ao mesmo tempo, inevitavelmente perdido na quantidade de imagens que a rede nos oferece é um ponto de partida instigante. Revela desde o início que a disponibilização de conteúdos em larga escala traz consigo seu inverso: uma espécie de condenação de todos eles a um esquecimento, a viverem escondidos e sobrepujados por uma avalanche de “fotos do momento”. Na imagem em questão, vemos um retrato do que podemos supor ser um time masculino de basquete, com os homens vestidos com um uniforme onde se lê: “normal”. A foto é um retrato bastante tradicional, com os jogadores postados diante da câmera e uma figura, vestida de terno, que podemos supor ser o técnico ou o árbitro da partida. Curiosamente, o que se vê não são atletas animados com a partida, mas pessoas sérias e bastante constrangidas. A afirmação de normalidade, estampada nos uniformes, mais nos faz desconfiar de que estejamos diante de pessoas “normais” do que atestam verdadeiramente sua
O PODER DO SILÊNCIO
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normalidade. O nome parece funcionar como um rótulo, que antes nos faria desconfiar de sua veracidade, como quando lemos em um produto “livre de gordura trans”. O tratamento das pessoas como objetos desprovidos de subjetividade, quase como mercadorias nesse caso em que um rótulo se interpõe entre o sujeito e sua imagem, também nos remete inevitavelmente aos retratos de cunho policial, aos presos fichados pela polícia, aos doentes catalogados em livros médicos. Classificados, identificados e rotulados como “normais” os homens retratados mostram-se desconfortáveis em representarem o papel sugerido. Afinal, ser normal pode ser um alívio ou um fracasso, a depender do ponto de vista e das regulamentações sociais que determinam o uso da palavra.
Texto publicado em 2012 no fôlder do projeto Múltiplos397, realizado no Ateliê397, em São Paulo.
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v I AM READY TO SING v por Daniela Castro
Análise Tão abstrata é a ideia do teu ser Que me vem de te olhar, que, ao entreter Os meus olhos nos teus, perco-os de vista, E nada fica em meu olhar, e dista Teu corpo do meu ver tão longemente, E a ideia do teu ser fica tão rente Ao meu pensar olhar-te, e ao saber-me Sabendo que tu és, que, só por ter-me Consciente de ti, nem a mim sinto. E assim, neste ignorar-me a ver-te, minto A ilusão da sensação, e sonho, Não te vendo, nem vendo, nem sabendo Que te vejo, ou sequer que sou, risonho Do interior crepúsculo tristonho Em que sinto que sonho o que me sinto sendo. Fernando Pessoa, 1911
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I AM READY TO SING
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Que dificuldade decidir se o poema de Fernando Pessoa seria a epígrafe do texto ou o seu primeiro parágrafo, apropriado e tornado anônimo, em forma de poema, iniciando um escrito em forma de ensaio. Optei mesmo pela epígrafe, pois jamais conseguiria apropriar-me de uma primeira pessoa assinada por tão imenso autor – sou pequena –, mesmo que a abstração máxima do “eu” perante o ver o “tu” se desdobre com tamanha violência num nada que convide uma outra autora a fazê-lo. O corte da decisão se deu pelo fato de esta publicação ser impressa em páginas A4 dobradas ao meio e sem grampos.* Imaginei ser pertinente aqui descolar a primeira parte do resto, como se desloca o refrão de suas estrofes quando de repente uma canção cola na mente, destituída de autoria e de lugar. Um zumbido, longe, desautorizado e retido na voz de quem murmura ou canta em silêncio, que canta como que para ninguém. A exposição Intervalo, de Marcelo Amorim, retrata uma constelação de ninguéns, que inclui o artista. Em seu método de colecionar imagens antigas, tanto pessoais como anônimas, adquiridas em sebos, para depois transportá-las para outros suportes, mantém uma oscilação curta entre pessoalizar o anônimo e anonimizar o pessoal. Nesse caso, não se trata de avaliar a natureza do suporte para o qual são transportadas as imagens – da fotografia à pintura, ao lambe, ao vídeo e ao desenho –, mas de como essa passagem de imagens existentes no mundo para sua recolocação de volta para o mundo, e o intervalo entre elas, politiza o coletivo. A fotografia desautorizada, tão anônima em sua autoria quanto quem ela grava, “traduzida” e trazida para outros suportes e lugares, nega seu estado original e inaugura uma outra dimensão estética de suas narrativas. Em nenhum momento a estética figura como um julgamento de valor dualista, mas sim como uma recuperação desinstitucionalizada do aisthitikos, a raiz etimológica da palavra, que se refere ao ato de perceber – e saber? – a partir da experiência sensorial subjetiva. E aqui vem outro corte. Essa experiência subjetiva é descolada da esfera da identidade. O princípio identitário pressupõe uma lógica “vetorializada”, na medida em
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que eu me defino a partir do que me difere do que me assemelha ao outro. O sujeito, nesse caso, é predicado pelo que lhe é externo. O fôlego do exercício identitário é sempre maior do que o que indivíduo consegue suportar, e assim é necessário inflar o ego para ali caber a identidade. Egos com estrias. O subjetivo, aqui, não é o individuado, mas o largo, liso, o da humildade de apequenar-se e se dissolver no mundo: “E se eu digo ‘eu’ é porque não ouso dizer ‘tu’, ou ‘nós’, ou ‘uma pessoa’; sou obrigada à humildade de me personalizar me apequenando, mas sou o és-tu”.1 É do intervalo incomensurável desse hífen que trata Intervalo. As imagens apropriadas, dotadas de uma carga familiar comum a todos, não se tornam componentes de um arquivo de experiências individuais do artista, mas sim um índex da necessidade humana da fabricação de símbolos para tornar o caos da vida um pouco mais manejável. As imagens de família, do grupo escolar, do esporte atlético masculino, uma vez perdidas em seu próprio circuito e destituídas de sua condição original, revelam, e ao mesmo tempo dissolvem, os mecanismos de institucionalização da vida para fazer sentido dela; revelam e dissolvem a institucionalização do “eu”, que, caminhando pelo espaço expositivo, sentindo que sonha o que se sente sendo, torna-se “tu”, “nós” e “outra pessoa”. 1
Clarice Lispector, Água viva (Rio de Janeiro: Editora Rocco, 2010), p. 14.
* Texto publicado em 2012 no fôlder da mostra individual Intervalo, realizada na Galeria Jaqueline Martins, em São Paulo.
v DA INFORMAÇÃO À CONTRAINFORMAÇÃO v
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por Paula Braga
Arte não comunica. Se quisesse comunicar, seria informação e não arte. E informação, já nos advertiu Deleuze, é um conjunto de palavras de ordem: “Quando nos informam, nos dizem o que julgam que devemos crer. Em outros termos, informar é fazer circular uma palavra de ordem”.* A obra de Marcelo Amorim recruta a informação para as fileiras do combate ao controle, ou em registro deleuziano, transforma a informação em contrainformação. Como o artista convence a informação a abandonar o tom autoritário? Repetindo-a com a voz leve. Amorim não faz novas imagens, mas liberta aquelas que já existem do papel de conformadoras de comportamentos. Deixam de ser ditadoras ao serem transferidas para o contexto da arte e, surpresa, tornam-se transgressoras. Como o soldado que se junta aos rebeldes, a página do manual de brincadeiras – e desde quando brincar exige algum roteiro? – é recopiada para um papel enorme, e a legenda da imagem arremata a conversão: “aquele que está no centro da roda, se conseguir pegar a bola, deixará de ser o bobo.” A brincadeira aqui é então pegar a bola, evitar que as imagens nos façam correr de lá para cá como bobos. A maior parte das imagens apropriadas por Marcelo Amorim é de livros didáticos dos anos 1970, especificamente de disciplinas que tentam domar o corpo, como educação sexual ou educação física. Do manual audiovisual Educação para o amor, que sincroniza imagens de adolescentes com uma locução sobre os mistérios da atração física, Amorim selecionou imagens dos casais se olhando, dos passeios de motocicleta, da alegria da vida em família, e simplesmente repetiu-as em tinta a óleo sobre tela, construindo em veladuras aguadas a mesma imagem em tons de cinza. Obteve a palavra de controle esmaecida, como se estivesse pintando uma lembrança, como se o referente fosse aquela imagem coberta por um véu branco, pescada no lago leitoso dos anos de formação dos padrões de comportamento. Trazendo essa imagem à tona, pegou a bola, deixou de ser o bobo.
DA INFORMAÇÃO À CONTRAINFORMAÇÃO
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As imagens apropriadas de manuais de educação física, mostrando fotos de grupos de homens atléticos ou meninos da escola primária se exercitando, também reproduzidas em tela com as veladuras esbranquiçadas, delineiam rostos e corpos apenas o suficiente para sugeri-los, e em sua baixa resolução cromática, que abole as cores para permanecer no cinza, lançam um campo dúbio, em que a informação moralizante pode justamente transformar-se em mensagem erótica. O duplo sentido é a resistência à palavra de ordem. Amorim transcreve para sua obra o ensinamento do livro O mundo da criança: brincando e aprendendo: quem conseguir dar o pulo mais alto deu o pulo do gato e é o vencedor. * Gilles Deleuze, “O ato de criação”, 1987.
Texto publicado em 2013 no website da Zipper Galeria, em São Paulo.
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v PRIMEIRA LEITURA v
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por Paulo Gallina
É como se eu estivesse lendo um livro. E é um livro que eu amo profundamente. Mas eu o estou lendo mais lentamente agora, então as palavras estão muito distantes entre si e os espaços entre as palavras são quase infinitos. Eu ainda posso sentir você e as palavras da nossa história. Mas é no espaço infinito entre as palavras que me encontro agora. Este é um lugar que não pertence ao mundo físico. Este é o lugar onde todo o resto está e eu nem sabia que ele existia. Spike Jonze
Existem coisas que não pertencem ao mundo material. São pensamentos, sensações e intuições que existem dentro de cada ser humano e não conseguem ser transformadas em linguagem. Exatamente por não conseguirem se definir em uma única forma, não é possível delimitar-lhes um signo. Tome-se, por exemplo, o conceito de amor ou de ódio, não é possível definir em palavras a extensão desses sentimentos. A comunicação, no entanto, se realiza quando usamos essas palavras-conceitos porque, em maior ou menor grau, todo ser humano já sentiu um ou outro. A palavra então atua como um gatilho para a memória, que, agindo junto ao universo sensível, recria o entendimento desejado. Assim são os homens, vivendo em um mundo material e mental simultaneamente, eles conseguem compor as necessidades do corpo material ao acessar seu universo sensível. O trabalho do goiano Marcelo Amorim, no entanto, comenta os limites culturais (auto)impostos aos sentidos por trás dos signos. Quase avisando ao seu observador de que certas imposições podem levar à não aceitação do que se é em detrimento do que é esperado que se seja. As pinturas da série Primeira leitura (2013-14) comentam certo adestramento do animal humano em seus primeiros anos. Como se, para criar um adulto normal, um ser culturalmente adaptado, fosse necessário carregá-lo de compreensões predefinidas sobre o mundo. Atuando de forma perversa, a educação poda a liberdade infantil, desprovida de preconceitos, com o intento de produzir adultos dispostos a aceitar a sociedade como ela é, evitando a transformação.
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As pinturas sobre papel de Primeira leitura têm seus temas extraídos de livros e cartilhas moralizantes da primeira metade do século XX. Em sua pesquisa, o artista se deparou com frases e imagens de efeito, potentes por explicitarem modelos hoje considerados falidos. O exemplo masculino, as relações humanas e o que se esperar de uma família estão expostos nesses livros de maneira simplista, machista e preconceituosa, em suma, como era típico em seu tempo. Provavelmente em cem anos as cartilhas que nos formaram também estarão desatualizadas e serão avaliadas negativamente. A questão levantada por Marcelo Amorim nesta série de pinturas, então, não é a simples avaliação de conceitos passados. Pelo contrário, ao reunir imagem e texto, o artista fala mais do presente do que do contexto em que esses elementos foram produzidos. Pois se trata de retratos culturais de outro tempo, mas, transferidas e reorganizadas no presente, essas imagens se tornam um raio-X do presente. E, numa afirmação definitiva sobre a realidade das frases presentes na série, Marcelo ainda confunde o observador. Afinal, O guloso é mau companheiro (2014), O mariquinhas (2014) e Não creias em tolices (2013) são pinturas onde julgamentos fáceis estão metaforicamente apresentados, pré-elaborações fornecidas através da composição entre texto e imagem. Entrementes, A neve é branca (2014) simplesmente constata um dado do mundo material em nosso entorno. Sempre entre se revelar e desaparecer, as imagens desta série atuam como a dúvida que as define. As duas camadas de tinta, uma diluída e outra aplicada diretamente, indiciam esse movimento. A primeira camada, diluída, torna o preto em cinza e indica sombra ou apagamento; a segunda, depositada diretamente do tubo de tinta, é clara e age como uma linha que revela a imagem. A própria maneira de pintar de Marcelo Amorim então indica discursos escondidos em discursos. Seguindo por essa vereda em que as imagens revelam enquanto os discursos escondem, a série Educação para o amor (2007), aparentemente, destaca o machismo social disfarçado como carência feminina. Nestas telas, retiradas de um conjunto de
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imagens produzidas na metade do século, mulheres emancipadas sexual e economicamente são apresentadas como frustradas quando carentes de uma presença masculina em suas vidas. Pintadas em tons claros, tendendo ao apagamento, as imagens ganham formas com a distância, mas enquanto quando o observador está perto seu olhar consegue perceber bem os contrastes que constroem as figuras. Por seu apagamento na proximidade e sua figuração à distância, as pinturas de Educação para o amor são precisas em nos fazer pensar, por imagens, sobre como são desiguais as forças operando dentro da relação social entre homens e mulheres. Uma construção que acaba por empoderar as mulheres do contexto social presente, desde que percebida. O procedimento de denúncia e renovação das propostas sobre a mulher da série de pinturas Educação... é o oposto do construído com a série Esposas e filhas (2014). Este conjunto de fotografias encontrado pelo artista num acervo estatal transforma essas senhoras de renome em fantasmas. Com cuidado, o artista reimprimiu estas imagens, enquadrou-as e deu destaque à somatória de imagem e texto, recurso pertencente ao seu repertório. Ao permitir que os nomes das esposas e filhas de barões, brigadeiros, generais etc. permanecessem apagados, o artista reitera a perda da identidade, guardada apenas pela função social desempenhada dentro de casa e em relação ao marido. O cuidado com o tratamento das imagens e a construção deste conjunto revelam um dado até agora negligenciado sobre a obra de Marcelo Amorim: o carinho com os temas tratados e as figuras representadas. No encontro entre a crítica ácida à sociedade em que está imerso e o cuidado em representar com dignidade mesmo o mais excluído personagem, revela-se uma vontade de explicitar relações que não cabem em palavras. Ao lado do julgamento sobre a exclusão e o doutrinamento social, o artista revela também a força invisível que mantém essas imagens unidas, esses corpos coesos. Mesmo contraditoriamente. Marcelo Amorim parece trazer em sua obra uma vontade de reapresentar o mundo por uma lógica que
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não é a matemática. Assumindo a desigualdade dos elementos postos numa mesma equação, o artista sabe que o resultado, se avaliado por si, será um erro. Porém, se avaliado por suas partes, o resultado dessas disputas de poder não conformará uma forma una. E assim suas imagens se transformam momento a momento diante de nossos olhos, por comunicarem muito mais do que cabe em palavras.
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❋ SWEET ADVICE ❋ foreword by Paulo Gallina
Like a song sung in the softest tone, the images created by Marcelo Amorim are very kind to the men and women who play it. Each of them is given unexpected dignity and ordinary villainy. As in life, no one is turned into a hero or a villain. They are all humans, with flaws and qualities that make us love them or simply accept them. Thus, ever-smiling children are cut in an awkward way, without a context, in a set of photographs; grown-up men are portrayed with strength and uncompromisingly in a set of paintings; and proud women are transformed into elegant phantasmagoria in another set of photographs, which have been appropriated by the artist. Perhaps they are so real because they are part of every human being. We don’t often come across works that are at the same time pungent towards their themes and so loving towards their characters. By accepting the image of each man, woman or child, Marcelo brings us closer to them with no fear of exposing their worst flaws. Generosity that is rarely seen today. In a game between form and content, the artist shows us his primer. And from the cover we learn that nothing will be hidden in the images, unless words can hide them. First reading presents a set of images and texts seeking to instruct the reader on how critics and artists approached Marcelo’s works. Exactly what a primer is supposed to do; thus wishing to encourage the readers to look at this dubious work with an open heart and draw their own conclusions. Even in the knowledge that once the reading has come to an end, these many first readings will continue to be reinterpreted as part of us, which we are not willing to give up.
*TRANSFORMING IMAGES * by Henrique Siqueira
Drawer photography, alluding to the amateur photographs that record domestic situations, such as parties and trips, is the name of the exhibition that artist Marcelo Amorim is holding at Sesc Pompeia. The photographs are closely related to the graphic arts and cast doubt on their technological origin. Valuing action and transformation, the photographs are
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borrowed from unknown people and cut, enlarged and reconstructed later with the aid of a copier. The acts performed involve an operation in subjective land. By stealing the photographs, the artist commits his first transgression. The action of this gesture lies less in the legal content of the act – naive to the ethical and legal standards of privacy in this century – than in its intentionality: a symbolic appropriation of the history contained in that picture. Amorim also makes other interventions to transform these images, which are meaningless to others, into images featuring transitive sense in the artistic field. His second transgression consists in eliminating the photographic support. This process begins by cutting the photo into slices, which will cause the viewer to zoom in on the image, thus diverting attention away from the whole towards and enlarged field of the image. Then, each slice is enlarged in a copier – in addition to promoting chromatic distortion, that device degrades the copy and highlights flaws that cannot be seen in the original format, resulting in an opaque, dirty image. These are intentional procedures for subtracting photographic features and approaching the characteristics of graphic art. By using copying and cutting tools, Marcelo inserts daily activities into the image – tools that are regularly used at the offices – and reiterates the sense of appropriation, working on the actual morphology of the image. Then, the artist recreates the images. Based on the initial composition, the sheets are arranged in a way that the intersections among them become evident, and then they are attached to the panel. The choice of the collage technique shows the intention of revealing the image fracture and accordingly the fragmentation process. This composition method also points to a connection with the proposed art and advertising in urban public spaces, such as street posters and billboards. Despite the distortion of the photographic image, the three transformation steps – stealing, cutting and copying – are understood as an expansive gesture that deals with photography on its borders. In this case, the photographic image departs from the ordinary, usual features of the camera, such as capturing images and its iconographic values, to value the possibilities of image processing, post-production changes and the artist’s intervention. Amorim is reshaping the personal universe of the photographs and albums we keep in the drawer of a chest in the bedroom, as a transitive symbol in the subjective field of the arts. Text published in 2007 in the catalog of the exhibition, Tripé-Tempo, held at Sesc Pompeia, São Paulo.
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v time v by Nancy Betts
Marcelo Amorim’s images bring to the public his private archives. The research process of the artist involves intertextuality between the media processing and construction of autonomous forms from the appropriation of preexisting photographs. If photography reproduces to infinity what has occurred just once and will never happen again, this is precisely what Marcelo aims to make evident. Notions of permanency, immobility, stability and unity are inadequate to show that life is rhythm, movement, change, ephemerality. Redesigning old principles and defining a language that shows us the figurative and conceptual changes in the image is what the artist proposes, based on deconstruction, expansion, fragmentation, repetition and translation from a medium to other media. From the static photographic grain of silver salt to the notion of pixelation produced by the use of adhesive labels in the production of an image, the artist makes clear the dynamic way of thinking about motion in the picture. What Marcelo can do is indicate a permanent change in time – we are all mutants of ourselves. Text published in 2007 in the catalog of the exhibition Tripé-Tempo, held at Sesc Pompeia, São Paulo.
g CRITICISM, COMPLIMENT AND FETISHISM g by Clarissa Diniz Photography is continuously expanding in the Brazilian art not only as language, but also as the logic that produces works of art that are not necessarily photographs, but paintings, videos, installations, performances etc. Also, various works based on photographic logic relate to past temporality, not the one we live today. Setting aside aesthetic models introduced by the digital era, these works are linked to the analog technology culture and often choose to deal with an amateur, home-made aesthetics by incorporating their usual “distortions” of light, focus and composition as plastic and conceptual virtues often unfolded to form metalinguistic discourses about photography itself or reflections on the construction and destruction of subjectivities. The work by Marcelo Amorim, for instance, relates to such procedures. In his work, the artist publicizes images from private collections, reconsidering their private nature and particular aspects by freely reallocating the identities that are part
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of these collections and taking them out of their original space and time. This is how Amorim produced the Missing series: he cuts children’s faces from family celebration photographs, calling them out of relative collective anonymity to insert them in the logic of the portrait, where identity and loneliness speak louder. Using his “sequestering” method, the artist therefore shows the photograph’s susceptibility in his attempt to suspend space/time, creates a metaphor for exchanging identities, and finally reveals some “poetic authoritarianism” by appropriating the intimacy of someone else as the form and content of his work. Through such “authoritarianism” – which explores the flexibility of photographic language and is somewhat shameless when dealing with the other – the work of Marcelo Amorim is usually considered transgressive, a title that under the argument of criticism clouds the process of complimenting and, maybe, fetishizing the past that I also notice in his work. By choosing a relatively distant past as the object of his work and analogously using technology that is no longer used, not attempting to build statements about them – time and technology – but basically appropriating its aesthetics purely out of formal interest in the photographic language, I believe that Marcelo focuses less on a critical stand about the past and more on seduction with no representation intentions, because of its visual aspect. So, he creates room for fetishism. Perhaps, the movement of returning to the analog culture and aesthetics of photography – conducted not only by Amorim, but also other young artists – may be found in overlapping criticism, compliment and fetishizing of the past. Such interest, however, says a lot about the current Brazilian youth, who, with no intention to forget or fight the past, see it as a problem with an accomplice point of view – which Marcelo Amorim actually does by mingling the children’s faces kidnapped by him with his child’s countenance, thus bringing the other close to himself. Text published in 2008 in the folder of the solo exhibition Missing, held at Centro Cultural São Paulo, São Paulo.
M missing M
by Carolina Soares
What if we could retain in our memories our whole lives? This question is certainly as innocuous as a vain attempt to restore completely the ability to keep and remember past states of consciousness. And it seems to be the realization of this human impossibility – carrying with it all the moments lived – which transfers to the photographic image the symbolic importance of supporting our incomplete memory. Thus, the
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collections of family albums become the places of reminiscences par excellence. And those pieces are the starting point for Marcelo Amorim’s work. As he opens cupboards and drawers, the artist is faced with albums that have been there for years to fulfill the role of protecting every moment experienced by the family: weddings, births, birthday parties etc. In rediscovering this, as Amorim proposes, each photo appears to retain on its surface even those already immemorial moments. Besides the accumulation of images, the album is also the realization of a time that is gone and lost. “Everything in me is a prince of chromium pasted into an old album of a child who died a long time ago, always”, as described by Fernando Pessoa.1 If memorizing our whole lives is not possible, then how can we bring back our memories of the events cut by photographic images? Everything about the family album appears to refer, thus, to an absence, a memory that no longer recognizes the identities of the individuals who are portrayed there. Hence, Mario Costa defines photography as a “memory machine,” in which the individual portrayed leaves no trace of his or her presence. Instead, the ‘self ’ that appears in this type of image is nothing but the photochemical memory of silver salts. It’s not me who keeps my presence in the marks that I leave, it is technology that assimilates me as content regardless of its memory and evokes my presence within its operation only.2 Along the same lines, Marcelo Amorim plans his strategy by making evident the impossibilities of restoring, in its integrity, the relations between the subject portrayed and photography. In Missing, the artist borrows albums from his own family. He tries to rediscover himself in images that should supposedly serve as guardians of family stories like those of birthday parties. Based on his parents’ accounts, he knows he is the child who blows out the candles on the cake, but who are all the others around? In this nonrecognition, the sense of that image seems to be lost. Hence the meaning of Missing, which in Portuguese refers to the idea of something or someone who has gone “missing.” For Amorim, there seems to be no reason to keep those “missing” in the family album stored in the drawers at home. Then, he decides to select some pictures, cut each character (mostly children), thus creating new pictures approaching the idea of a 3x4 cm, but now in a much larger scale. Through this procedure, some already completely anonymous individuals gain autonomy. It is no longer about a group gathered around the table to blow out candles, but rather individualized and “missing” people seeking to be identified. 1 2
PESSOA, Fernando. “A minha imagem” in Quando fui outro – Fernando Pessoa, Rio de Janeiro: Objetiva, 2006, p. 91.
COSTA, Mario in FABRIS, Annateresa. As identidades virtuais – uma leitura do retrato fotográfico, Belo Horizonte: Editora UFMG, 2004.
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The arrangement of the work results in an installation featuring a game with two distinct but complementary moments. First, on the external wall of the room, thirty-two 20x30cm portraits are symmetrically arranged in four rows, forming a rectangular space that, seen from a distance, refers to the unity of very enlarged photographic paper. As one approaches, what is seen, however, is a series of portraits referring, almost unequivocally, to missing people on newspapers ads who are being sought by their families. Because they are not originally 3x4cm, but portraits created out of cut-out photographs, they do not follow a pose standard. There is no strict rule for selecting the images neither. It happens at random, some of them repeated, showing the same faces at different times, which makes it harder to perceive the photographic image as a self-sufficiency of the self. They are aged surfaces carrying the dimension of transformation and aging. Second: inside the room, four 120x70cm photographs take over the space. Now the strategy changes. Some of the 20x30cm portraits on the external wall of the room are printed in adhesive paper. The artist sets the adhesives on his own face and shoots pictures of himself, wearing the same white shirt and holding a static pose, as if the goal now was actually to get a 3x4cm picture. This creates a kind of mask, simulating in each picture an identity that is sometimes his own as a child. These overlapping images turn the appearance into an illusion, a disguise, a simulation. It reiterates the idea that no individual has a fixed identity; it is rather marked by changes that will be approaching a distinctive mark of each one. The large format portraits flee completely from a scale close to reality. Therefore, they convey strangeness and discomfort in exacerbating notions of totally constructed identities. The work, therefore, seems to show a lack of absolute equivalence between photography and physical and psychological similarity. In this identity plot, the Missing installation brings into question a number of symbolic representations that fall on the individual without, however, denying the importance photography has for the construction of all these identities.
W EDUCATION FOR LOVE? W by Carolina Soares At first, strangeness. After all, what would lead anyone to use methods to teach something that assumes natural, affective or physical attraction between people? In the 21st century this proposal sounds at least retrograde, if not dated. If the question assumes provoking a conservative and somewhat authoritarian discussion about the past, the interest of Marcelo Amorim lies precisely in restoring a statement lacking meaning and full of ambiguities.
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One day, just browsing some second-hand bookstores, the artist found himself looking at a curious work, Education for Love – Introduction to the Psychology of Affection, by an unknown author. However, this was not a book, but rather a series of slides that was part of the original work. Since it had been broken down, Amorim’s bought only the multiple images which – split into many volumes – summarized some kind of representation of the various ways to show “love,” either between a mother and her child or between a man and a woman. As the actual contents of the book are unknown, one can see only the apparent instrumentalism suggested by the title and the illustrative role which the images seem to be subject to. When projected, the slides show a stereotypical portrayal of happiness that in most cases is fabricated. Couples in love strolling along the beach, kissing, and looking and smiling at each other. Mothers playing, embracing and caressing their children. Despite the obvious presence of women to form the couples, the arrangement of the images seems to imply the one opposed by Simone de Beauvoir in 1949, when she wrote The Second Sex. That is, in the heart of the family the woman is introduced to her child or young son with the same social dignity as male adults; later, he feels in the desire and love a resistance to the independence of the desired and loved woman; married, he respects the woman as his wife, a mother; and in the concrete experience of marital life she asserts herself as free from him. But, as he is brought into conflict with his wife, the situation turns about, and then he shouts: “you could not make a living without me.” However, if in the beginning the idyllic scenes served to visually support a didactic and pedagogic text on how to educate for love, now women raise awareness. They no longer resort to a possible scheme – with a sexist and yet moralist appeal – in order to regain their statuses as mere images. Detached from the original text, they become dried residues of a first sense. Marcelo Amorim uses the new status achieved by these images to later create a namesake series, Education for Love. The artist – who has been making drawings from slide images since 2008 – reveals a painting. Exactly. He selects the diapositives and uses oil paint in order to transfer, with no taboos, the projected image to a canvas. The result of this transfer process is a painting with no texture, no density, and little contrast. Sometimes the opaqueness obtained causes the oil paint to look like gouache. There is no room for details. Everything is diluted; everything fades away because of a prevailing transparency that seems to carry with it the immateriality of the original image formed only by luminous photons. Without the strict rules of a painter who resorts to over-refinement, Amorim presents a painting not intended to be painting, but rather a decanted image deprived of heavy stereotypes that mingles with scenes of the everyday loving life.
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If Gerhard Richter had had access to the Education for Love material in the 1960’s and 70’s, his work would generally look like the one proposed by Amorim. However, by transferring to the canvas vulgar photographic images of journals – including love scenes – Richter not only paid attention to the technical procedure, but also intended to send a critical signal based on the political bias of a German individual facing all the horrors of World War II. It’s not that Marcelo Amorim had the paintings of the German artist in mind; after all, his work is deprived of any trace of a “conservative and somewhat authoritarian discussion about the past,” but it has something that renders it a fallacious irony. Maybe this doubt will cease to exist when the transfer is made by pencil on paper. Although the drawings are connected to the paintings by the same disillusion with representations, it seems that the artist attempts to restore the life around the nature of the existing means and possibilities. He restores a way that is similar to the transfers or carbon paper. The procedure consists in placing a white sheet on any given photograph, and the image is transferred by pressing the lines with a pencil. Or, if we want to compare it with photography, it is similar to the making of photograms, in which the photographs are obtained by placing objects directly onto the surface of light-sensitive paper. Such an impregnation by contact results in an almost-engraving image that is formed by fine but filled-with-density lines. The Education for Love series is detached both from the supposed truth of photographic realism and the great eloquence of pictorial art. Its procedure is filled with disenchantment. The copy is merely a copy. This is no longer about revisiting the History of Art by mentioning how the Old Masters would be copied to exalt the teaching of art, or about reviewing education proposals reflected by Education for Love in which copying (or excess repetition) would become a mechanical act of assimilating statements. Critical content, if any, arises from intense denial of criticism. The power of the work lies precisely in this issue. And then look at the couples in love in those paintings and hope for a happy ending! Your love, love it and let it free to love, free to love, free to love. Your love, love it and let it go anywhere, anywhere, anywhere.[…] Your love, love it and let it be what it is, be what is, be what it is.
Doces Bárbaros, 1976 [free translation] Text published in 2010 in the folder of the solo exhibition Iniciação, held at Oscar Cruz Gallery, São Paulo.
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W HEADSHOTS W by Camila Fialho
Smaller or same-sized paper heads are displayed in the exhibition room in the form of photographic sculptures. On the wall, the open map of a head shows possible trajectories of a detailed folding game. The first impression one gets by looking at the small pieces sculpted by Marcelo Amorim is strangeness. Amongst the various different online identities of the social media of our time, the artist plays in building a multiple avatar. In his work, our 3x4 identity card photos are no longer two-dimensional, but rather provided with texture and depth to form a computer-modeled head, which becomes two-dimensional again when unfolded as a diagram of polygons, thus forming some kind of puzzle of skin shades. And, on the computer screen, the head reappears on the surface of photographic paper and is then materially reproduced by delicate folding, as an origami with human features. In its new spatial version, we no longer recognize the traces of the original small sculpture face. Materialized, this object/being becomes robotic-like. Identifiable human characteristics fade away, and all that is left are hollow, almost weightless cyber heads deprived of organic identity moving overhead. The gross multifaceted object aligned with subtle skin shades makes us look for human traces faded away in the image’s handled layers. While it is possible to identify the features of its creator, what we actually see is a hesitating being in its definitions. The dimensions of what is real assumed by the photograph fade away in the artist’s hands and give its identity a new look. We might think of a self-portrait, but the object heads eventually define themselves as other figures, similar, not equal. Headshot is the threshold of hybrid universes. Hybrid, because its process develops across different media: from the photo taking, through computer customization, to finally reach the fine physical aspect that gives back the photographed being the materiality of a cyber face. Hybrid as a photographic and sculptural work. Also hybrid, because it evokes in us the identity of ourselves that dispels when new apparent realities are built, where real and online, natural and artificial mingle, and where identity becomes creation. Text published in 2012 in the catalog of the exhibition Abre Alas 8, held at A Gentil Carioca, in Rio de Janeiro
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✳ THE POWER OF SILENCE ✳ by Thais Rivitti
Artist Marcelo Amorim has been building for years a work that draws its disturbing power from the silence. As life becomes a spectacle, the artist prefers to keep his production in a low tone, gradually undermining the notion that, in a work of art, communication can be done immediately. Drawing attention in a discreet yet sharp manner to what was left behind, lost in time, unrecorded by History, his production has the power to rescue things – people, habits, forms of sociability and behavior – forgotten or deliberately erased from the collective social memory. The technique employed in his work plays a key role in this construction. The artist often uses old materials as the primary source of his research. In the untitled (2012) silkscreen, especially developed for the Multiples397 project, he uses a photo found on the Internet. This is a picture among the many posted daily on the web and whose origin and references remain unrevealed. using material that is available to anyone and at the same time inevitably lost in the huge number of images the web offers us is a provocative starting point. It reveals from the outset that the availability of content on a large scale also has an opposite effect: they will eventually fall into oblivion, live in hiding and be overshadowed by an avalanche of “latest photos.” The image in question is a portrait of what we assume to be a men’s basketball team, and men wearing a uniform that reads: “normal”. The photo is a quite traditional portrait, with players standing before the camera and a figure, wearing a suit, who may be the coach or the match referee. Interestingly, what we see are not athletes excited about the match, but rather serious and very embarrassed people. The statement of normality, printed on the uniforms, makes us more suspicious that we are faced with “normal” people rather than truly attesting to their normality. The name seems to work as a label, which at first would make us suspicious (wondering whether it is true), like when we read “trans-fat-free” on a product packaging. treating people as objects devoid of subjectivity, almost as commodities in this case, where a label stands between the subject and its image, also inevitably leads us to police pictures, police records, and patients listed on medical books. Classified, identified and labeled as “normal,” these portrayed men look uncomfortable representing the suggested role. After all, being normal may be a relief or a failure, depending on the point of view and the social rules that govern the use of the word. Text published in 2012 in the folder of the Multiples397 project, held at Ateliê397, in São Paulo.
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v i am ready to sing v by Daniela Castro
Análise Tão abstrata é a ideia do teu ser Que me vem de te olhar, que, ao entreter Os meus olhos nos teus, perco-os de vista, E nada fica em meu olhar, e dista Teu corpo do meu ver tão longemente, E a ideia do teu ser fica tão rente Ao meu pensar olhar-te, e ao saber-me Sabendo que tu és, que, só por ter-me Consciente de ti, nem a mim sinto. E assim, neste ignorar-me a ver-te, minto A ilusão da sensação, e sonho, Não te vendo, nem vendo, nem sabendo Que te vejo, ou sequer que sou, risonho Do interior crepúsculo tristonho Em que sinto que sonho o que me sinto sendo. Fernando Pessoa, 19111
How hard was it to decide if the poem by Fernando Pessoa would be the epigraph of this text or simply its first paragraph, appropriated and made anonymous; a first paragraph in a poem form, initiating this writing which is in the format of an essay; in Portuguese, introducing its translated version in English. I have chosen the epigraph, though, as I would have never been able to appropriate the voice of such an enormous author – I am small –, even if the most severe erasure of the “I” before the “you” given in the poem invites another author to do so. The decision’s breaking point was the fact that this publication is printed in four loose and folded together A4 sheets. I take it to be pertinent the fact that one could detach the first part from the others in the same fashion that one may detach the chorus of a song when it suddenly sticks to one’s mind. This appropriation becomes a distant, unauthorized buzz – with no authorship or a place – hummed in the voice of who sings in silence, as if singing for no one.
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C first reading C
The exhibition Intervalo [Interval] by Marcelo Amorim shows a constellation of no ones that includes the artist himself. In his method of collecting old images – personal and anonymous, often acquired in second hand bookshops – to later transport them to other kinds of media, shows an oscillation between personifying the anonymous and anonymizing the personal. In this case, it’s not about evaluating the nature of the media to which the images are transported – from photography to painting, wet&paste, video and drawing – but as to how this movement of images that are existent in the world to their relocation back into the world, and the gap between them, politicize the collective. The unauthorized photographs, so anonymous in their authorship as in who they capture, when “translated” to other genres and brought to other places deny their origin and inaugurate a new aesthetic dimension to their narratives. Not in one moment do aesthetics appear here as a judgment of dualistic values, but as a non-institutionalized recovering of aisthitikos, its ethimological root, which refers to the act of perceiving– and knowing? – by feeling through a subjective sensorial experience. And here comes another breaking point. This subjective sensorial experience is detached from the realm of the identity. The principle of identity is based on the premise of a vectorial logic, since the “I” is defined by what differs or is similar to itself. The subject, in this case, is predicated by what is external to it. The exercising of one’s identity always demand a breath that is larger than one is able to bear, in which case the ego is inflated in order to make room for the identity to fit in it. Egos with stretch marks. The idea of the “subjective” erases the “individualist” and, belittled, dissolves itself smoothly into the world: “And if I say ‘I’ its’ because I dare not say ‘you’ or ‘we’ or ‘a person.’ I’m forced into the humility of personalizing myself belittling myself but I am the are-you.”2 It is the immeasurable interval of this hyphen that Intervalo is about. When imbued with such a collective familiarity, the appropriated images do not become components of the artist’s individual archive of experiences, but rather an index of the human necessity of construing symbols in an effort to make the chaos of life a little more manageable. Images of childhood, school groups, athletic sports are lost from their own circuit and are bereft of their original condition only to reveal and dissolve the mechanisms of institutionalization of life in an effort to make sense out of life; they reveal and dissolve the institutionalization of the “I”, which, when walking through the exhibition space, becomes the “you”, the “we” and the “a person.” 1 Dear English reader, this poem has not been translated to English and there is not one single soul in this world who could do it unofficially. Some parts of the text are directly related to it, in which case you will just have to move to the groove. [Author’s note.] 2
LISPECTOR, Clarice, Água viva (Rio de Janeiro: Editora Rocco, 2010), p. 14. Author’s free translation
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[from information to counter-information[ by Paula Braga
Art does not communicate. If it were intended to communicate, then it would be information, not art. Deleuze warned us: information is a set of order-words: “When they inform us, they say what they think we should believe in. To put it another way, informing means spreading an order-word.”* The work of Marcelo Amorim recruits the information to join the army against control or, according to the Deleuzian concept, it transforms information into counter information. How does the artist convince information to abandon its authoritarian bias? By repeating it with a soft voice. Amorim does not create any new image, but frees the existing ones from behavior conformity. They are no longer dictators when transferred to the art context and, surprisingly, become wrongdoers. Like the solider who joins the rebels, the page of a children’s game book – and since when playing requires any script? – is recopied on a huge piece of paper, and the image caption says: “if the player in the middle of the circle can grab the ball, then he or she will no longer be the piggy.” Then, the purpose is to grab the ball, preventing the images from making us running around like fools. Most images borrowed by Marcelo Amorim have been taken from didactic books from the 1970’s, specifically subjects designed to train the body, such as sexual or physical education. From audiovisual manual Education for Love, which synchronizes images of adolescents with a statement about the mysteries of physical attraction, Amorim has selected images of couples looking at each other, riding motorcycles, living the happy family life, and simply reproduced them with oil paint on canvas, building on watery glazes the same image in shades of gray. He came to a dim control word, as if he were painting a recollection, as if the reference were that image covered by a white veil, hooked from the milky lake of the years during which behavior patterns developed. By surfacing this image, he grabbed the ball, he is no longer the piggy. Images taken from physical education manuals showing photos of athletic men or elementary school boys working out – also reproduced on canvas with whitish glazes – outline faces and bodies just enough to suggest them, and in a low color resolution that blends the colors to remain gray, they create a dubious field in which moralizing information may precisely become an erotic message.
C first reading C
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Here, double entendre means resistance to the order-word. Amorim brought to his work the teachings of the book, O mundo da criança: brincando e aprendendo: quem conseguir dar o pulo mais alto deu o pulo do gato e é o vencedor [The child’s world: playing and learning: the one who jumps as high as a cat wins]. * Gilles Deleuze, “What is the Creative Act?”, 1987.
❇ fIRST READING ❇ by Paulo Gallina
It’s like I’m reading a book and it’s a book I deeply love, but I’m reading it slowly now. So the words are really far apart and the spaces between the words are almost infinite. I can still feel you and the words of our story, but it’s in this endless space between the words that I’m finding myself now. It’s a place that’s not of the physical world; it’s where everything else is that I didn’t even know existed. Spike Jonze Some things do not belong to the material world; they are thoughts, feelings and intuitions that exist in every human being and cannot be transformed into language. Precisely because they cannot be defined in just one way, it is impossible to give them a sign. Let us consider, for instance, the concept of love or hate – there are no words to define the extent of those feelings. However, communication takes place when we use those concept-words, because to a smaller or a greater extent, every human being has already felt either one or the other. Then, the word works as a trigger of memories, which recreate the intended understanding by acting on the sensitive universe. So are people, living at the same time in a material and a mental world, they are able to meet the needs of the material body by accessing their sensitive universes. The work of artist Marcelo Amorim from Goiás, however, addresses the cultural limits (self-)imposed on the senses behind the signs. Almost warning viewers that certain impositions may cause them not to accept what they are to the detriment of what they are expected to be. The paintings from the First Reading series (2013-14) address this kind of training of the human animal in the early years of its life. As if to create normal adults, individuals who fit into society, children should be overwhelmed with biased views about the world. Acting perversely, education restricts a child’s right to freedom and a childhood free from prejudice to produce adults who are willing to accept society as it is, thus preventing transformation.
english version
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The paintings on paper from First Reading have their themes taken from moralizing primers and books from the first half of the 20th century. In his research the artist was faced with catchphrases and powerful images representing models that are currently considered failed. The male model, human relations and what was expected from a family are all shown on those books in a simplistic, sexist and prejudiced manner, as it was typical of his time. In one hundred years the primers we use today will probably be dated and assessed negatively. The question posed by Marcelo Amorim in this series of paintings is not, therefore, merely an assessment of past concepts. On the contrary, by joining image and text together the artist speaks more about the present than the context in which those elements were produced; as cultural portraits of a different time, but transferred and reorganized at the present time, the images become an x-ray of the present. And in a definitive statement about the reality of the phrases found in the series, Marcelo also bewilders the viewer. After all, The Greedy Is a Bad Fellow (2014), The Sissy (2014) and Don’t Believe in Nonsense (2013) are paintings where easy judgments are metaphorically presented, previously devised plans provided through a composition between text and image. Meanwhile, The Snow is White (2014) just attests to a fact from the material world around us. Revealing and fading away at all times, the images from this series act like the doubt that defines them. The two layers of paint – one of them diluted and the other applied directly – indicate this movement. The first diluted layer turns black into grey and indicates a shadow or blurring; the second one, which is applied directly from the paint tube, is light and works as a line that reveals the image. Thus, the way in which Marcelo Amorim paints indicates discourses hidden in discourses. By following this path, where images reveal and discourses hide, the Education for Love series (2007) apparently points to male chauvinism disguised as a woman in need of affection. Those works – taken from a set of images produced in the midcentury – show sexually and economically independent women as frustrated when they don’t enjoy the company of a man in their lives. Painted in light colors tending to fade away, the images take shape from a distance, but when the viewer gets closer he or she will be able to clearly notice the contrasts that form the figures. As they fade away in proximity and take shape at a distance, the paintings from Education for Love are precise in making us think how unequal the forces that operate in the social relations between men and women are. A construction that ends up empowering women of today’s society as long as it is perceived. The procedure of denouncing and renewing the proposals concerning women from the Education for Love series is the opposite to that developed in the Wives and Daughters series (2014). This set of photographs found by the artist in public archives transforms those reputed ladies into ghosts. The artist has carefully re-printed and framed those
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english version
images, and put a spotlight on the combination of image and text, a resource belonging to his repertoire. In allowing the names of the wives and daughters of barons, brigadiers, generals etc. to remain concealed, the artist reiterates the loss of identity, which is maintained only by the social role fulfilled at home and in relation to the husband. The care with which images are treated and this set is created shows something that had been ignored about Marcelo Amorim’s work so far: the affection towards the issues addressed and the figures portrayed. On the border of sharp criticism against the society he is part of and the care in representing even the most marginalized individual with dignity, his wish to show relations that words cannot define stands out. In addition to a judgment on social exclusion and indoctrination, the artist also reveals the invisible force that keeps those images together, the bodies united, contradictorily though. Marcelo Amorim seems to be willing to represent the world according to a logic that is not mathematical. By assuming the inequality of the elements placed in the same equation, the artist knows that the outcome – if considered on its own – will be a mistake. However, if its parts are considered, then the outcome of these power struggles will not have a single form. And thus the images are transformed every minute before our eyes as they convey much more than words can say.
currículo / resumé
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Marcelo Amorim Goiânia, 1977. Vive e trabalha em [Lives and works in] São Paulo
em 1993 inicia estudos sobre fotografia na universidade Católica de Goiás com Rosary estevez. Integrou o grupo de acompanhamento de processos artísticos com Juliana Monachesi e Guy Amado entre 2007 e 2008. Participou do Ateliê Fidalga, grupo de pesquisa coordenado por Albano Afonso e Sandra Cinto entre 2009 e 2010. Dirige desde 2009 o Ateliê397, espaço independente de arte contemporânea.
In 1993, he started studying photography at the Catholic University of Goiás with Rosary Estevez. He was a member of an artistic process follow-up group along with Juliana Monachesi and Guy Amado from 2007 to 2008. He was part of Ateliê Fidalga, a research group coordinated by Albano Afonso and Sandra Cinto from 2009 to 2010. Since 2009, he has been director of Ateliê397, an independent contemporary art organization.
O artista faz da apropriação e da prática de colecionar imagens a estrutura de sua poética. Suas obras estão caracterizadas pela intertextualidade entre as mídias – transformação e construção de imagens pré-existentes, levantando questões sobre as possibilidades de processamento e significação. Amparado na apropriação de imagens coletadas em sebos, ilustrações e imagens de cinema e publicidade, entre outros, recupera retalhos de memórias afetivas que simbolizam o passado de modo inexorável. As imagens, que antes pertenciam a um objetivo, podem se transformar em pinturas, desenhos, vídeo, fotografias e gravuras, colocando em pauta as questões da originalidade, da autenticidade e da autoria da obra de arte, além de questionar a natureza da arte e sua definição. Amorim reinterpreta essas imagens, reiterando sentidos ou conferindo a elas novas apresentações, contextos e significados, associando-as.
The artist’s poetic structure is based on appropriation and collection of images. His works are characterized by intertextuality between media – transformation and construction of preexisting images, raising questions on processing and signification possibilities. By appropriating images obtained from second-hand bookstores, such as cinema and advertising illustrations and images, among others, he restores fragments of affective memories inexorably symbolizing the past. Images that used to have a purpose may now become paintings, drawings, videos, photographs and engravings; and not only is he interested in the originality, authenticity and authorship of the work of art, he also questions the nature of art and its definition. Amorim reinterprets these images by confirming senses or giving them new presentations, contexts and meanings, making associations among them.
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currículo / resumé
Exposições individuais | Solo Exhibitions: 2014 - Ventriloquia - Temporada de Projetos - Paço das Artes, São Paulo 2014 - Primeira Leitura - Zipper Galeria, São Paulo 2012 - Intervalo - Galeria Jaqueline Martins, São Paulo 2010 - Iniciação - Galeria Oscar Cruz, São Paulo 2008 - I Mostra do Programa de Exposições - Centro Cultural São Paulo, São Paulo
Exposições coletivas | Group Exhibitions: 2014 - Primeiro estudo sobre amor. Luciana Caravello Arte Contemporânea, Rio de Janeiro 2014 - Formatos - Centro Cultural UFMG, Belo Horizonte 2013 - Bem-vindos - Zipper Galeria, São Paulo 2013 - As tramas do tempo na arte contemporânea: estética ou poética? - Instituto Figueiredo Ferraz, Ribeirão Preto 2012 - Imagem mi(g)rante - Zipper Galeria, São Paulo 2012 - Imagem-contato - Mostra Sesc de Artes, São Paulo 2012 - Múltiplos397: Raphael Escobar and Marcelo Amorim - Ateliê397, São Paulo 2012 - Cidades contínuas - Condomínio Cultural, São Paulo 2012 - Os melhores venenos - Galeria Alvarez, Porto - Portugal 2012 - Retratos performáticos, SESC Vila Mariana, São Paulo 2012 - Abre alas 8 - A Gentil Carioca, Rio de Janeiro 2011 - Assim sem você - Galeria Oscar Cruz, São Paulo 2011 - 43º Salão de Arte Contemporânea de Piracicaba - Pinacoteca Municipal Miguel Dutra, Piracicaba 2011 - Como o tempo passa quando a gente se diverte - Casa Triângulo, São Paulo 2011 - Sem título #1 – Experiências de pós-morte - Galeria Oscar Cruz, São Paulo 2011 - Jogos de guerra: confrontos e convergências na arte contemporânea brasileira - Caixa Cultural, Rio de Janeiro 2011 - Exquisite Corpse Video Project: Volume 3 - Videoformes - Clermont-Ferrand, França 2011 - Souvenir - Kunst im Kulturflur, Berlin, Alemanha 2010 - Paralela 2010 // A contemplação do mundo - Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo, São Paulo 2010 - Quase casais - Maus Hábitos, Porto, Portugal 2010 - Pequenos formatos 2010 - Atelier Subterrânea, Porto Alegre 2010 - 12º Salão Nacional de Artes de Itajaí: Poéticas pessoais em construção - Fundação Cultural de Itajaí, Itajaí
2010 - Manipulated Image #13: Absence - Presence - Center for Contemporary Arts, Santa Fe, euA 2010 - Ainda desenho - Galeria Deco, São Paulo 2010 - Mostra inaugural - Galeria Oscar Cruz, São Paulo 2010 - Jogos de guerra: confrontos e convergências na arte contemporânea brasileira Memorial da América Latina, São Paulo 2009 - Estranho cotidiano - Galeria Movimento, Rio de Janeiro 2009 - Arte Pará - Museu do estado do Pará, belém 2009 - Tempo <buscar> - SeSC Piracicaba, Piracicaba 2009 - Realidades impossíveis - Ateliê397, São Paulo 2009 - Em torno de: nos limites da arte - Funarte, São Paulo 2009 - Ateliê Fidalga - Galeria Carlos Carvalho, Lisboa, Portugal 2009 - PhotoFidalga - Carpe Diem Arte e Pesquisa, Lisboa, Portugal 2009 - Projeto Portfólio #5 - Aktuell, São Paulo 2009 - Gabinete - Museu Victor Meireles, Florianópolis 2009 - Realidades imprecisas - Sesc Pinheiros, São Paulo 2008 - Corpoinstalação - Sesc Pompeia, São Paulo 2008 - Marcelo Amorim e Sofia Borges - Ateliê397, São Paulo 2008 - 33º Salão de Arte de Ribeirão Preto nacional - Contemporâneo, MARP, Ribeirão Preto 2008 - Realidades impossibles - Fototeca Juan Malpica Mimendi, Veracruz, México 2008 - Intimidade pública - e.D.e.nº343, São Paulo 2007 - 13º Salão dos novos de Joinville - Galeria Municipal de Arte Victor Kursancew, Joinville 2007 - Tripé | Tempo – Sesc Pompeia, São Paulo 2006 - Mostra Verbo - Galeria Vermelho, São Paulo Prêmio | Award: 2010 - Prêmio Aquisitivo [Acquisition Award]: 12º Salão nacional de Artes de Itajaí: Poéticas pessoais em construção - Fundação Cultural de Itajaí, Itajaí
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lista de obras
p. 3 Lindo trabalho!, 2013 - impressão jato de cera s/ papel - 60x42 cm Great work!, 2010 - color print on paper - 60x42 cm p. 6 Não mexas em vespeira (da série Primeira leitura), 2014 - aquarela s/papel - 150x150 cm Don’t stir up a hornet’s nest (from the series First reading), 2014 - watercolor on paper - 150x150 cm p. 10 Iniciação, 2010 - óleo s/ tela - 50x40 cm Initiation, 2010 - oil on canvas - 50x40 cm p. 12 Façam as apostas, 2013 - óleo s/ tela 100x100 cm Make your bets, 2013 - oil on canvas 100x100 cm p. 14 A ciranda (da série Primeira leitura), 2014 - aquarela s/ papel - 150x150 cm Ring around the rosie (from the series First reading), 2014 - watercolor on paper - 150x150 cm p. 18 Como dar um nó, 2013 - aquarela s/papel - 20x30cm cada - conjunto com 6 peças How to tie a knot, 2013 - watercolor on paper - 20x30cm each - set of 6 pieces p. 20 sem título, 2007 - etiquetas adesivas impressas e coladas sobre madeira untitled, 2007 - adhesive labels printed and pasted on wood p. 22 Lua de mel em copa, 2007 - impressão em jato de cera colada em compensado de madeira Honeymoon in Copacabana, 2007 - color print pasted on plywood
p. 24 Véu, 2008 - frame de vídeo Veil, 2008 - video frame p. 26 O ratinho roeu a roupa da Ruth, 2014 aquarela s/ papel - 150x150 cm O ratinho roeu a roupa da Ruth, 2014 watercolor on paper - 150x150 cm [The title of this work is a tongue twister using letter “r”, the literal translation of which is “The mouse nibbled at Ruth’s clothes”] p. 28 Tear/torn, 2008 - vídeo Tear/torn, 2008 - video p. 29 sem título, 2007 - etiquetas adesivas impressas e coladas sobre madeira untitled, 2007 - adhesive labels printed and pasted on wood p. 30 Não inveje os outros, 2014 - aquarela s/ papel - 150x150 cm Do not envy others, 2014 - watercolor on paper - 150x150 cm p. 32 Missing, 2008 - fotografia - 100x70 cm Missing, 2008 - photograph - 100x70 cm p. 34/35 Missing, 2008 - fotografia colada em painel de madeira - 20x30 cm cada Missing, 2008 - photograph pasted on wood panel - 20x30 cm p. 36/37 Missing (detalhe), 2008 - fotografia colada em painel de madeira - 100x70 cm Missing (detail), 2008 - photograph pasted on wood panel - 100x70 cm p. 38 Não creias em tolices (da série Primeira leitura), 2014 - aquarela s/ papel - 150x150 cm
list of works
Don’t believe in nonsense (from the series First reading), 2014 - watercolor on paper - 150x150 cm p. 40/42 Missing, 2008 - fotografia colada em painel de madeira - 100 x 70 cm Missing, 2008 - photograph pasted on wood panel - 100 x 70 cm p. 44/45 Play, 2008 - fotografia colada em painel de madeira - 100 x 70 cm Play, 2008 - photograph pasted on wood panel - 100 x 70 cm p. 46 A neve é branca (da série Primeira leitura), 2014 - aquarela s/ papel - 150x150 cm The snow is white (from the series First reading), 2014 - watercolor on paper 150x150 cm p. 48/50/52/53/54/55 sem título (da série Educação para o amor), 2009 - óleo s/ tela untitled (from the series Education for love), 2009 - oil on canvas p. 60 Não zombes de ninguém (da série Primeira leitura), 2014 - aquarela s/ papel - 150x150cm Don’t make a mockery of anyone (from the series First reading), 2014 - watercolor on paper -150x150cm
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p. 66 Bom rapaz (da série Primeira leitura), 2014 - aquarela s/ papel - 150x150 cm Good guy (from the series First reading), 2014 - watercolor on paper - 150x150 cm p. 68 sem título, 2012 - serigrafia dourada sobre papel White Diamond - 66x42cm untitled, 2012 - golden silkscreen on White Diamond paper - 66x42cm p. 70/71 sem título (da série Big Arms), 2014 - óleo s/ tela untitled (from the series Big Arms), 2014 - oil on canvas p. 72/73 Purple book (detalhe), 2012 - livro de artista - 40 páginas - ed. 10 Purple book (detail), 2012 – artist’s book 40 pages - ed. 10 p. 74 Cada qual com seu igual (da série Primeira leitura), 2014 - aquarela s/ papel - 150x150 cm Birds of a feather flock together (from the series First reading), 2014 - watercolor on paper - 150x150 cm p. 76 Hiato, 2012 - fotografia apropriada 12x12 cm - conjunto com 9 peças Hiatus, 2012 - appropriated photograph 12x12 cm - set of 9 pieces
p. 62/63 Headshot, 2012 - modelo tridimensional em papel fotográfico - 21x15x12 cm Headshot, 2012 - three-dimensional model on photographic paper - 21x15x12 cm
p. 78 Hiato, 2012 - fotografia apropriada 12x12 cm Hiatus, 2012 - appropriated photograph - 12x12 cm
p. 64/65 Headshot (exploded), 2012 - impressão em papel fotográfico - 60x42 cm Headshot (exploded), 2012 - print on photographic paper - 60x42 cm
p. 80 a 85 Hiato (detalhe), 2012 - fotografia apropriada - 12x12 cm - conjunto com 9 peças Hiatus (detail), 2012 - appropriated photograph - 12x12 cm - set of 9 pieces
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lista de obras/ list of works
p.86 O guloso é mau companheiro (da série Primeira leitura), 2014 - aquarela s/ papel - 150x150 cm The greedy is a bad fellow (from the series First reading), 2014 - watercolor on paper -150x150 cm p. 88 Agora comece a movimentar a mão, 2013 aquarela s/ papel - 63x42 cm Now start to move your hand, 2013 - watercolor on paper - 63x42 cm p. 89 De repente a música para, 2013 - aquarela s/ papel - 40x90 cm Suddenly the music stops, 2013 - watercolor on paper - 40x90 cm p. 90 Fantoches são manipulados por baixo, 2013 - aquarela s/ papel - 120x150 cm Puppets are manipulated underneath, 2013 - watercolor on paper - 120x150 cm p. 92 E assim deixará de ser o bobo, 2013 aquarela s/ papel - 120x150 cm And thus you will no longer be the piggy, 2013 - watercolor on paper - 120x150 cm p. 94 O mariquinhas, 2014 - aquarela s/ papel The sissy, 2013 - watercolor on paper p. 96 Esposas e filhas, 2014 - fotografia apropriada - 12x9 cm cada - conjunto com 9 peças Wives and daughters, 2014 - appropriated photograph - 12x9 cm each - set of 9 pieces p. 98 Escola normal, 2014 - fotografia apropriada - 24x35 cm cada - conjunto com 16 peças - cortesia Arquivo Público do Estado de São Paulo.
Normal school, 2014 - appropriated photograph - 24x35 cm each - set of 16 pieces - courtesy Public Archives of the State of São Paulo. p. 100/101 Primeira leitura, 2014 - vista da exposição na Zipper Galeria First reading, 2014 - view of the exhibition at Zipper Gallery p. 102/103 O nó está desfeito, 2014 - aquarela e acrílica sobre papel - 60x40 cm The knot is untied, 2014 - watercolor and acrylic on paper - 60x40 cm p. 104 sem título, 2007 - grafite sobre papel 15x21 cm untitled, 2007 - graphite on paper -15x21 cm p. 121 sem título (da série Big Arms), 2014 - óleo s/ tela untitled (from the series Big Arms), 2014 – oil on canvas p. 129 sem título, 2014 - óleo s/ tela untitled, 2014 – oil on canvas p. 130 sem título, 2009 - caneta hidrográfica sobre papel - 15x21 cm untitled, 2009 - felt-tip pen on paper 15x21 cm
Revisão / Proofreading Érico Melo
Catálogo / Catalog Realização / Realization Ateliê397 Zipper Galeria
Ficha catalográfica / Catalog file Sandra Toledo
Projeto editorial / Publication project Ateliê397 Textos / Texts Camila Fialho Carla Zaccagnini Carolina Soares Clarissa Diniz Daniela Castro Henrique Siqueira Nancy Betts Paula Braga Paulo Gallina Thais Rivitti
Fotografias / Photos Marcelo Amorim Gui Gomes (p. 6, 13, 14, 26, 30, 38, 46, 60, 66, 74, 86, 94) Lucas Cimino (p. 70, 71, 100, 102, 121) Nino Cais (p. 01, 33, 40, 42, 44, 45) Pedro Gallego (p. 62, 63) Impressão / Printing RUSH gráfica Agradecimentos / Acknowledgements Gibi & Mazé - Simone Moraes - Nino Cais Thais Rivitti - Fabio Cimino
Projeto gráfico / Graphic design Marcelo Amorim Produção editorial / Editorial production Renata Nantes Tradução / Translation Daniela Faria Patricia Dominguez (p.107, 108, 114) Ana Elisa Camasmie (p.115)
Realização / Realization
Impressão / Printing
Título Formato Tipografia Miolo Número de páginas Tiragem
Marcelo Amorim - Primeira leitura 15 x 21 cm Minion Pro Polén 90 g/m2 132 1.000
Este livro foi produzido em junho de 2014.