EXCLUSIVO: A PRISÃO DE LULA
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14 FEV/2018 – ANO 40 – Nº 2512
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0104-394 3 ISSN
R$ 16,00
ISTOÉ VISITOU A GALERIA 6 DO COMPLEXO PENAL, EM CURITIBA, ONDE O PETISTA DEVE FICAR SE FOR PRESO
CARNAVAL DO PROTESTO
Os principais protagonistas do circo em que se transformou a política nacional são os alvos preferenciais de foliões e das escolas de samba este ano
Sumário Nº 2512 – 14 de fevereiro 2018 ISTOE.COM.BR
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30 POLÍTICA As articulações do PT para tentar livrar Lula da prisão iminente
CAPA Os brasileiros aproveitam o carnaval
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BRASIL O que Marina Silva está fazendo para deixar de ser a eterna herdeira de votos alheios – e sempre perdedora
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ECONOMIA Taxas cobradas pelos bancos continuam extorsivas, mesmo com os juros básicos no patamar mais baixo da história
para protestar – nas marchinhas, blocos e sambas-enredos – contra os principais personagens que fizeram um circo da política nacional Entrevista
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Cartas
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Semana
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Brasil Confidencial
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Coluna do Boechat
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Brasil
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Comportamento
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Medicina & Bem-estar
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Internacional
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Em Cartaz
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Última Palavra
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EXCLUSIVO
As mortes suspeitas ligadas ao edifício do tríplex de Lula
CAMPUS PARTY
Um mergulho no circo tecnológico que reúne 100 mil jovens
FORTALEZA DO CRIME
Como o Ceará foi tomado por facções e entrou numa rotina de violência e pânico
Você também pode ler ISTOÉ baixando a edição em seu Smartphone e tablet Liderado pela presidente Cármen Lúcia, o Supremo não se dobra às pressões, descarta rever prisão após condenação em 2ª instância e indica um novo padrão no Judiciário, em que alterações na lei para se ajustar às conveniências de quem quer que seja não serão mais toleradas
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enTReVisTa
Carlos alberto dos santos Cruz O general de divisão Carlos Alberto dos Santos Cruz, 65 anos, deixou a farda, mas não a batalha. Secretário Nacional de Segurança Pública desde abril do ano passado, ele tem a missão de criar estratégias para combater o crime e integrar as ações de todas as forças de segurança do País de modo a deter a criminalidade desenfreada. Mesmo diante desse desafio, ele acredita que com inteligência, investimento, treinamento e mudanças nas leis será possível reduzir a violência que mata mais de 60 mil pessoas por ano, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Designado comandante das tropas da ONU na República Democrática do Congo, o general Cruz já enfrentou e venceu rebeldes em um cenário hostil. Para ele, porém, nem mesmo todo o planejamento e recursos do mundo trarão segurança aos brasileiros se não houver “liderança política para erguer essa bandeira”, como ele afirma na entrevista a seguir. Por André Vargas
“A políciA pAgA pelA deteriorAção de todAs As áreAs” consequência O general e secretário Nacional de Segurança Pública em seu gabinete: Forças Armadas no papel de polícia apenas em caráter emergencial ou excepcional
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ISTOÉ 2512 14/2/2018
fotos: Givaldo BarBosa/aGência o GloBo; rodolfo Buhrer/la imaGem/fotoarena/aGência o GloBo
Qual a razão da letalidade fora de controle no Brasil? É uma deterioração social. O crime vulgarizou a violência. É algo que vem de longo tempo e que piorou com as organizações criminosas. As disputas de facções por controle do comércio de drogas e outras atividades nos leva ao nível da barbárie. Tudo isso é resultado da ausência e do atraso do poder do Estado em se adaptar a essa nova situação.
O ex-governador Sérgio Cabral está preso por que havia corrupção e crime organizado em nível governamental para pegar dinheiro de dentro das instituições públicas.
A criação de uma força nacional de intervenção permanente no Rio de Janeiro traria vantagens no combate ao crime e à entrada de armas ilegais na cidade? Não acho que solução seja essa. Temos é que estruturar os órgãos existentes. Temos que aperfeiçoar, treinar, equipar e prover de tecnologia [as polícias], assim como acertar a legislação. É preciso uma cruzada das instituições, com Judiciário e ministérios públicos. Essas instituições também precisam tomar medidas abertas contra o crime. Junto com tudo isso é preciso lideranças em nível político que ergam essa bandeira. O senhor defende que os estados adotem políticas segurança de acordo com suas realidades locais. No que diferem os problemas, por exemplo, de São Paulo e do Rio? Ou do Amazonas e do Rio Grande do Norte? Cada estado tem suas particularidades, seja pelo tipo de crime ou pela capacidade das polícias. O investimento em São Paulo é grande e muitos índices estão caindo. No Amazonas, que é um estado fronteiriço, o transporte fluvial e o controle de fronteiras e espaço aéreo exige outras soluções. O importante é que junto exista uma política de coordenação nacional e que todos os órgãos estejam integrados. São Paulo conseguiu reduzir os índices de homicídios. Pernambuco também, entre 2006 e 2013, mas depois os assassinatos voltaram com força. O que ocorreu? É uma situação alarmante não só em Pernambuco, mas no Nordeste todo. Esses estados não estavam preparados para a expansão do crime organizado, que migrou para lá a fim de explorar as fragilidades existentes por meio de alianças com facções locais. O Nordeste precisa passar por esta fase de adaptação, o que exige uma política nacional. Hoje os estados não conseguem sozinhos fazer todo o financiamento da segurança pública.
O senhor afirma que os estados não aplicam parte dos recursos que recebem. Como evitar esse erro? Algumas vezes existe retardo na aplicação de recursos. Acredito que isso se deve a diferentes razões. Algumas vezes troca-se o governo ou o secretário, outras vezes, falta conhecimento técnico para aplicar o recurso. Alguns projetos estão parados. Na área penitenciária, entre 2016 e 2017, cerca de R$ 1,2 bilhão ficaram sem uso.
Onde os recursos devem ser investidos? Construir mais presídios não é uma medida ineficaz, já que as facções dominam as prisões? Se os presídios estivessem funcionando bem, até concordaria com essa ideia. Mas não estamos em uma situação aceitável. Precisamos de um sistema penitenciário que funcione dentro dos padrões aceitos pela dignidade humana. Nesse momento temos grandes deficiências, começando pelas delegacias e casas de detenção, onde temos pouca coisa funcionando bem. Uma política de segurança pública deve combinar inteligência, tecnologia, treinamento e equipamentos. O que é mais urgente no Brasil atual? Alguns pontos são fundamentais. Em primeiro lugar é preciso atuar ao mesmo tempo em prevenção e repressão. Outro item é integração, não só em caráter financeiro. Integração significa participação de União, estados e municípios, coordenação, pois os limites do crime hoje são interestaduais e internacionais, além de inteligência e tecnologia. Hoje a integração da base de dados criminais é fundamental para identificação. Senão, o criminoso cruza uma divisa e o outro estado não tem acesso [aos dados]. A tecnologia também passa pelo banco de perfis genéticos, o que facilitaria em muito a identificação criminal. A palavra integração é fundamental. Hoje, dezesseis estados estão colocando seus dados no Sinesp, que é o Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública. Com isso, será possível descobrir se um indivíduo pego numa blitz é procurado pela polícia de outro estado. O mesmo precisa ser feito com uma arma apreendida. Às vezes, ela foi usada em outros crimes. Tudo isso precisa ser centralizado. Nosso nível ainda é muito deficiente. Tem que melhorar. O aumento da população carcerária não serve apenas para alimentar as facções criminosas? 5
ENTREVISTA/Carlos Alberto dos Santos Cruz O problema não é prender muito ou não. O problema é prender quem precisa ser preso. E que o criminoso de fato cumpra a pena. Temos um problema sério de execução penal, com condenados que integram o crime organizado ficando pouco tempo na cadeia. Há o caso da pessoa [Suzane Richthoffen] que matou os pais e foi liberada no Dia dos Pais. Pode ser legal, mas agride a sociedade pela sensação de impunidade que gera.
Precisamos de um sistema penitenciário que funcione dentro dos padrões aceitos pela dignidade humana
A corrupção em presídios e nas polícias não seria o maior obstáculo? Alguns dos grandes líderes das facções seguem presos e comandando seus negócios. É o problema da execução penal. O sistema carcerário deveria funcionar. A corrupção não afeta só as prisões. Ela atinge a sociedade em geral, como um câncer. Um ex-governador está preso [Sérgio Cabral]. Qual a razão da prisão? Havia corrupção e crime organizado em nível governamental para pegar dinheiro de dentro das instituições públicas. A penalização precisa começar por cima. O Brasil precisa de exemplos.
Em Natal, a presença da Força Nacional durante a greve das polícias não afetou a média de homicídios do período anterior. O que houve? A Força Nacional tem em torno de 2,1 mil homens. Desse efetivo, temos 600 homens no Rio de Janeiro e 500 no Pará. Enviamos entre 170 e 200 homens para Natal. Com esse efetivo, só reforçamos alguns pontos críticos e de grandes concentrações naquela capital, como zonas comerciais e rodoviária. Foi uma situação de emergência. Existe alguma forma de minimizar a morte de PMs? Os números são inaceitáveis para qualquer sociedade civilizada. O policial representa a legislação que estrutura a sociedade. O policial [fora de serviço], quando identificado, é morto. Para resolver, só com autoridades e instituições fortes. A legislação precisa ser alterada, o judiciário precisa se envolver na execução e na aplicação das leis. A polícia paga o preço de uma deterioração de todas as demais áreas. Controlar a entrada de armas e drogas pelas fronteiras é uma missão impossível? O que é necessário para amenizar o problema? Não. Estamos fazendo muita coisa. Em junho, quando começamos a implementar algumas medidas no Rio de Janei6
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ro, ao mesmo tempo fizemos ações ao longo de nossas fronteiras terrestres, por onde passam grande parte das drogas e armas. Também atuamos nos eixos que vêm dos estados do Sul e do Mato Grosso do Sul, chegando ao Rio por quatro grandes rodovias federais. É possível vigiar as fronteiras sim. Para tanto é preciso integração. Fizemos levantamentos em dezesseis pontos. A Polícia Rodoviária Federal, junto com a PF, Força Nacional e as polícias estaduais, tem a Operação Égide, que apoia as ações no Rio. Desde 10 de julho foram detidas 11,2 mil pessoas, 4 toneladas de cocaína e crack foram apreendidas, junto com 775 armas de fogo e 126 mil cartuchos de munição, além da recuperação de 2,5 mil veículos roubados. Mesmo assim, há necessidade de fechar mais as nossas fronteiras. O que falta para essas ações serem mais eficientes? Precisamos melhorar a tecnologia básica. Mais estrutura física, veículos, embarcações, treinamento, armamentos, munições. Também é preciso alguma estrutura mais avançada, como a parte de instrumentos óticos, scanners e integração da base de dados. Por exemplo: tivemos um mesmo veículo passando sete vezes pela fronteira só no percurso de vinda, sem fazer o de volta. Com tecnologia conseguimos capturar o sujeito, que fazia um grande transporte de armamentos e munições. Ele entrava no país com o carro e voltava por um caminho diferente usando outra placa. Para detectar esse movimento foi preciso investir em um sistema de vigilância, pois são milhares de veículos todos os dias nas fronteiras. Felizmente nós temos isso e estamos obtendo bons resultados. As Forças Armadas devem invadir áreas controladas pela criminalidade e enfrentá-la? Não se faz segurança pública com Forças Armadas. Só em caráter emergencial ou excepcional. Elas estão completamente aptas a fazer esse trabalho quando o confronto é de alta intensidade. Essa é a minha experiência internacional. Porém, a geografia do Rio de Janeiro e a maneira descuidada, quase irresponsável, como deixaram a cidade, sem planejamento urbano em algumas comunidades, aumenta em muito as chances de danos paralelos sobre uma população inocente, que sofre privações de toda ordem, principalmente na mão de bandidos. Isso tem que ser levado em consideração. Um confronto sempre será vencido pelas Forças Armadas. Não há grupo criminoso que vá impedir. O problema é proteger a população. foto: aleX silva/ae
Cartas EXCLUSIVO
As mortes suspeitas ligadas ao edifício do tríplex de Lula
CAMPUS PARTY
Um mergulho no circo tecnológico que reúne 100 mil jovens
FORTALEZA DO CRIME
Como o Ceará foi tomado por facções e entrou numa rotina de violência e pânico
>> Capa
Que o Supremo Tribunal Federal cumpra de fato o seu papel. Se nele tem ministro que solta aqueles que roubaram o povo, tem também juízes sérios. A ministra Cármen Lúcia não pode decepcionar os brasileiros que estão cansados desses políticos corruptos. Lula tem de ser preso como qualquer outro criminoso. “Suprema responsabilidade” (ISTOÉ 2511) Ana Maria de Andrada São Paulo – SP R$ 16,00
FUNDADOR DOMINGO ALZUGARAY (1932-2017) EDITORA Catia Alzugaray PRESIDENTE EXECUTIVO Caco Alzugaray
DIRETOR EDITORIAL Carlos José Marques DIRETOR DE NÚCLEO Mário Simas Filho REDATORES-CHEFE: Celso Masson e Sérgio Pardellas EDITOR EXECUTIVO: Antonio Carlos Prado EDITORES: Cilene Pereira , Germano Oliveira, Luís Antônio Giron e Vicente Vilardaga REPORTAGEM: André Sollitto, André Vargas, Camila Brandalise e Giorgia Cavicchioli COLUNISTAS E COLABORADORES: Bolívar Lamounier, Elvira Cançada, Leonardo Attuch, Marco Antonio Villa, Mario Vitor Rodrigues, Mentor Neto, Murillo de Aragão, Paula Alzugaray, Ricardo Amorim, Ricardo Boechat, Rodrigo Constantino e Ronaldo Herdy SUCURSAIS BRASÍLIA: Diretor: Octávio Costa Reportagem: Ary Filgueira, Tábata Viapiana Administrativo: Dionys Santos e Suely Melo RIO: Chefe: Eliane Lobato Repórter: Ronaldo Herdy Secretária: Sheila Marques Assistente de produção: Fernando C. Fonseca ARTE DIRETOR DE ARTE: Marcos Marques EDITOR DE ARTE: Christian Toledo Cecilio DESIGNERS: Gerson Nascimento, Nilton Spindola de Souza e Wagner Rodrigues ILUSTRADOR: Leonardo Bussadori PROJETO GRÁFICO: Marcos Marques ISTOÉ ONLINE: Diretor: Hélio Gomes Editora executiva: Gabriela Dobner Editor: André Cardozo Apresentadora de vídeo: Camila Srougi Reportagem: Alan Rodrigues, Elaine Ortiz, Mariana Rosa e Priscila Carvalho AGÊNCIA ISTOÉ: Editor: Frederic Jean Pesquisa: Marili Tiemi Hirota Arquivo: Eduardo A. Conceição Cruz APOIO ADMINISTRATIVO Gerente: Maria Amélia Scarcello Secretária: Terezinha Scarparo Assistente: Cláudio Monteiro Auxiliar: Douglas dos Santos MERCADO LEITOR E LOGÍSTICA Diretor: Edgardo A. Zabala Diretor de Vendas Pessoais: Wanderlei Quirino Gerente OnLine e Projetos Especiais: Solange Chiarioni Gerente de Venda Avulsa e Logística: Luciano Sinhorini Gerente Geral de Planejamento: Reginaldo Marques Central de Atendimento ao Assinante: (11) 3618-4566 de 2ª a 6ª feira das 9h às 20h30. Outras capitais: 4002-7334 Outras localidades: 0800-8882111 (exceto ligações de celulares) Assine: www.assine3.com.br Exemplar avulso: www.shopping3.com.br PUBLICIDADE Diretor nacional: Maurício Arbex Secretária da diretoria de publicidade: Regina Oliveira Diretoras de Publicidade: Ana Diniz e Tida Cunha Assistente: Valéria Esbano Gerentes executivos: Batista Foloni Neto, Eduardo Nogueira, João Fernandes, Luiz Sérgio Siqueira e Tânia Macena. Executivos de Publicidade: Andréa Pezzuto, Elizangela Simões e Luciano Tomaz Coordenador: Gilberto di Santo Filho Assistente Adm. de Publicidade: Ederson do Amaral Contato: publicidade@ editora3.com.br RIO DE JANEIRO – RJ: Gerente executivo: Felipe Drummond Coordenadora de publicidade: Dilse Dumar. Tel.: (21) 2107-6667. Fax: (21) 2107-6669 BRASÍLIA – DF: Gerente: Marcelo Strufaldi. Tel.: (61) 3223-1205 / 3223–1207. Fax: (61) 3223-7732. ARACAJU – SE: Pedro Amarante • Gabinete de Mídia • Tel.: (79) 3246-4139 / 99978-8962 – BELÉM – PA: Glícia Diocesano • Dandara Representações • Tel.: (91) 3242-3367 / 98125-2751 – BELO HORIZONTE – MG: Célia Maria de Oliveira • 1a Página Publicidade Ltda. Tel./fax: (31) 3291-6751 / 99983-1783 – CURITIBA – PR: Maria Marta Craco • M 2C Representações • Tel./fax: (41) 3223-0060 / 99962-9554 – FORTALEZA – CE: Leonardo Holanda – Nordeste MKT Empresarial – Tel.: (85) 98832-2367 / 3038-2038 – GOIÂNIA–GO: Paula Centini de Faria – Centini Comunicação – Tel. (62) 3624-5570/ (62) 99221-5575 – PORTO ALEGRE – RS: Roberto Gianoni, Lucas Pontes • RR Gianoni Comércio & Representações Ltda • Tel./fax: (51) 3388-7712 / 99309-1626 – RECIFE – PE: Abérides Nicéas • Nova Representações Ltda • Tel./fax: (81) 3227-3433 / 99164-7948 – INTERNACIONAL: Gilmar de Souza Faria • GSF Representações de Veículos de Comunicações Ltda • Tel.: 55 (11) 99163-3062 Marketing e Projetos – Diretora: Isabel Povineli – Gerente: Regiane Valente Marketing Publicitário – Gerente: Maria Bernadete Machado. Assistentes: Marília Gambaro. Criação - Redator: Bruno Modolo. Diretor de Arte: Pedro Roberto de Oliveira ISTOÉ (ISSN 0104 - 3943) é uma publicação semanal da Três Editorial Ltda. Redação e Administração: Rua William Speers, 1.088, São Paulo – SP, CEP: 05065-011. Tel.: (11) 3618-4200 – Fax da Redação: (11) 3618-4324. São Paulo – SP. Sucursal no Rio de Janeiro: Av. Almirante Barroso, 63, sala 1510 Tel.: (21) 2107-6650 – Fax: (21) 2107-6661. Sucursal em Brasília: SCS, Quadra 2, Bloco D, Edifício Oscar Niemeyer, sala 201 a 203. Tel.: (61) 3321-1212 – Fax: (61) 3225-4062. Istoé não se responsabiliza por conceitos emitidos nos artigos assinados. Comercialização: Três Comércio de Publicações Ltda, Rua William Speers, 1212, São Paulo – SP. Distribuição exclusiva em bancas para todo o Brasil: Dinap Ltda. – Distribuidora Nacional de Publicações, Rua Dr. Kenkiti Shimomoto, nº 1678, CEP 06045-390 – São Paulo – SP Impressão: OCEANO INDÚSTRIA GRÁFICA LTDA. Rodovia Anhanguera, Km 33, Rua Osasco, nº 644 – Parque Empresarial – 07750-000 – Cajamar – SP
Liderado pela presidente Cármen Lúcia, o Supremo não se dobra às pressões, descarta rever prisão após condenação em 2ª instância e indica um novo padrão no Judiciário, em que alterações na lei para se ajustar às conveniências de quem quer que seja não serão mais toleradas
Vamos ver, em pouco tempo, se o STF ganhou um novo tom. O ex-presidente Lula foi condenado em segunda instância. Se o Supremo Tribunal Federal não mantiver o que já decidiu, estará desrespeitando todos os demais brasileiros. Josué Campos Rodrigues São Paulo – SP
>> Política
Para quem está há tão pouco tempo na Presidência da República, ele merece os parabéns. A bagunça que o PT deixou no Brasil não é qualquer um que põe em ordem. “Temer enfrenta os adversários” (ISTOÉ 2511) Alex Alexandre Teresina - PI
>> Brasil
Não é partido político e, sim, organização criminosa! Até quando vão ficar impunes? Essas mortes certamente não foram as primeiras e nem serão as últimas. “As mortes que rondam o edifício do tríplex de Lula” (ISTOÉ 2511) Sabrina Coelho Navegantes - SC Roteiro de filme. Mas, como sabemos, a vida imita a arte. Zaira Fagundes Araujo Balneário Camburiú - SC
>> Sociedade
O publicitário Marcos Valério é um dos poucos do mensalão que ainda cumprem pena. Os políticos continuam roubando e debochando da sociedade. Livres, leves e soltos. “Matrimônio atrás das grades” (ISTOÉ 2511) Thiago Barbosa Belo Horizonte - MG Cartas para esta seção, com endereço, número do RG e telefone, devem ser remetidas para: Diretor de Redação, ISTOÉ, Rua William Speers, 1.088, Lapa, São Paulo, CEP 05067–900. FAX: (11) 3618–4324. As cartas poderão ser editadas em razão do seu tamanho ou para facilitar a compreensão. CORREIO ELETRÔNICO: cartas@istoe.com.br
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ISTOÉ 2512 14/2/2018
Editorial
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FUGA PROVIDENCIAL
assou a circular com maior frequência em rodas de políticos e conversas do poder a ideia de asilo diplomático do hepta réu Lula da Silva. Uma alternativa, digamos, tanto crível de ocorrer como amplamente apoiada por cabeças coroadas da base petista. O próprio Lula nega. Tratou de dissuadir de imediato as especulações a respeito alegando questão de princípios. “A palavra fugir não existe na minha vida”, disse. Seria decerto uma surpresa qualquer pretenso foragido assumir antecipadamente que planeja o intento. Afinal, o êxito de uma operação dessa natureza depende diretamente do sigilo. Lula buscar abrigo em algumas das embaixadas ou mesmo nos países que lhe são ideologicamente simpáticos e que já manifestaram claro apoio a sua causa não é, de fato, algo a ser descartado. Ao contrário. A intenção já foi por vezes ventilada e abertamente manifestada por aliados. Intramuros do Partido há quem diga que essa passou a ser a única opção que resta. Lula viu apertar o cerco da Justiça em torno dele. Sabe que novas condenações, ainda mais robustas, estão a caminho. Não encontrou, como imaginava, uma resposta ruidosa das ruas a seu favor. Está aos poucos caindo em si. Revoltado e ao mesmo tempo irascível, disparando palavrões a torto e a direito, tem dado sinais de que não aceita o sombrio destino que os tribunais lhe reservam. Segundo interlocutores, a experiência passada na cadeia décadas atrás deixaram nele marcas profundas e um temor de passar novamente pela mesma experiência. Tudo isso junto, somada a perspectiva de encontrar lá fora eco maior a sua pretensa causa de se apresentar como perseguido e vítima de golpe, traz muito atrativo para a saída de um exílio voluntário. Informalmente, várias autoridades de nações vizinhas têm mandado sinais ao ex-presidente de que o receberão de braços abertos, se assim for seu desejo. O leque de opções nesse sentido é 12
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Carlos José Marques, diretor editorial
grande: além das previsíveis Venezuela, Cuba e Bolívia, surgiu no horizonte a chance de Lula vir a fixar residência, temporária ou não, no continente africano, em localidades como Argélia e Etiópia. Nesse último caso, o líder petista tinha até viagem pré-marcada, recentemente, para lá aonde daria uma palestra sobre o momentoso tema da “corrupção”. Como especialista na matéria, a fala do ex-presidente era aguardada com grande expectativa. A Justiça resolveu cassar o seu passaporte e ele teve de cancelar o compromisso. Gravou um vídeo falando novamente em perseguição e angariou a simpatia do mandatário local. A tal ponto que dias depois chegou a alguns de seus assessores a informação de que a Etiópia não hesitaria em lhe dar guarida. Pelo sim ou pela não, o surpreendente é a polícia e a Justiça brasileira ainda não terem tomado precauções para evitar essa potencial fuga. Não há qualquer esquema preventivo, salvo alguma orientação que tenha sido tratada reservadamente. De maneira oficial, Lula mantém por enquanto seu direito de ir e vir. Recebeu de volta o passaporte apreendido e sem um mandado oficial de juízes para conduzi-lo ao cumprimento de pena, conta com o beneplácito da dúvida pró-réu. É torcer para que ele não receba alerta prévio e privilegiado de deliberação de sua sentença – como já ocorreu anteriormente quando ficou sabendo um dia antes que seria conduzido de forma coercitiva à delegacia. No País dos poderosos, as chances dadas aos integrantes da patota para escaparem de condenações são grandes. Lamentavelmente. Autoridades fazem de conta que acreditam piamente na postura de vestal injustiçada encarnada por Lula quando ele diz que jamais fugirá. Enquanto isso, ninguém com um mínimo de discernimento aposta um vintém furado nas aleivosias costumeiramente lançadas por esse chefão da quadrilha. Suprema ironia.
Sumário Nº 2512 – 14 de fevereiro 2018 ISTOE.COM.BR
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ECONOMIA Taxas cobradas pelos bancos continuam extorsivas, mesmo com os juros básicos no patamar mais baixo da história
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Artigos por Mario
por Antonio Carlos Prado
A seguir: Sérgio Pardellas, Mário Simas Filho, Celso Masson
É tempo de WeBer, voltaire e roUsseaU A expressão legitimidade passou a frequentar o vocabulário de Lula após a sua condenação em duplo grau de jurisdição pelo TRF-4. Diz Lula que as eleições desse ano, sem o seu nome nas urnas, não seriam legítimas. É um argumento torto. Trata-se, portanto, de colocarmos as ideias no lugar. Se Lula prega que eleição sem ele é ilegítima, cabe a pergunta: ilegítimo não é um candidato concorrer à Presidência da República com condenação, por unanimidade, em segunda instância? Max Weber ensina que a legitimidade do poder não deve se originar em vantagens ou interesses pessoais, não deve se basear no costume, não deve se sustentar em relações de empatia. Tudo isso corre solto na nossa República, mas é justamente por tal motivo — ou seja, pela irracionalidade, conforme o conceito sociológico weberiano — que nossos frutos e floretas sociais estão apodrecidos. A legitimidade somente se consolida na racionalidade da ordem jurídica. Não é nada difícil, assim, deduzir que Lula está à margem desse ordenamento: condenado em duplo grau de jurisdição, ele é o idealtipo da não legitimidade. Lula é justamente a quebra dessa legitimidade e, ao berrar que não aceita a decisão da Justiça, se torna ainda mais ilegítimo. O duplo grau de jurisdição tem origem na Revolução Francesa que, sob as ideias de Voltaire e Rousseau, entendeu que um único juiz, o de
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primeira instância, pode errar. Assim, toda sentença tem de ser reavaliada por um colegiado de juízes (eis o TRF-4). É basilar o princípio de que a discussão de provas se esgota nessa fase. Uma vez condenado, está condenado. Lula ilude ao dizer que vai tentar provar a sua inocência no STJ e no STF. Bobagem. Essas duas Cortes superiores não discutem provas, somente examinam eventuais erros processuais ou constitucionais — o que não ocorreu nesse caso porque seguiu-se o devido processo legal. Exauridos os recursos no segundo grau de jurisdição, Lula irá preso, quer grite ou não. Mais: Lula planta confusão ao discursar que baterá às portas do STJ e do STF para assegurar a condição de elegibilidade. É outra bobagem. Em nosso direito, vale a tese: quod non est in actis non est in mundo (aquilo que não está no processo não está no mundo). Pois bem, se Lula não sabe, é bom avisá-lo: o processo no qual se extinguiu a sua presunção de não culpabilidade, com sentença condenatória em duplo grau de jurisdição, trata de um tríplex que o envolve em corrupção e lavagem de dinheiro. As eleições não constam do processo, logo elas não constam do mundo, logo a questão da inelegibilidade não poderá ser julgada pelo STJ e STF. A sua candidatura é plenamente ilegítima. Por que? Simplesmente porque está fora da racionalidade do ordenamento legal do Brasil.
A seguir:
Um deslize im N
ão deu outra, bastou que o juiz federal Bruno Apolinário decidisse pela devolução do passaporte a Luiz Inácio e logo o alarido tomou conta das redes sociais: “Lula pretende fugir!”, denunciaram alguns. “Ele vai usar uma embaixada como refúgio”, sapecaram outros. Houve até quem garantisse a existência de um acordo envolvendo FHC para livrar o líder petista da cadeia. Pois, anotem aí, levando-se em conta apenas o aspecto político, seria ótimo que o primeiro expresidente condenando por crime de corrupção decidisse peitar a Justiça para escapar do xilindró. Entretanto, ainda que Luiz Inácio faça jus a toda sorte de imputações, ninguém pode acusá-lo de ser um mau estrategista. Extrapola as raias do improvável que, após uma vida inteira cultivando o personagem do líder popular capaz de enfrentar as elites para defender os menos favorecidos, Lula recuse a chance de se eternizar na figura do mártir condenado injustamente pelos inimigos do povo.
Não foi por meio de atitudes intempestivas que o PT se agigantou a ponto de institucionalizar a bandalheira financeira, ética e política
Vitor Rodrigues
por Murillo de Aragão
A seguir: Marco Antonio Villa
Elvira Cançada, Ricardo Amorim, Bolívar Lamounier
mprovável Especialmente se levarmos em conta que terá motivos para festejar em ambas as hipóteses: se tiver de cumprir pena pelos crimes cometidos e devidamente julgados até aqui, reforçará a narrativa da perseguição política tão reverberada pela esquerda. Já se acontecer uma revisão do STF sobre as execuções de condenações após a segunda instância, aumentam as suas chances de não ser preso e ele poderá influenciar a eleição livremente. No fundo, fugir do País, ou qualquer alternativa em igual sentido, configuraria o único cenário sem pontos positivos para Lula, o Partido dos Trabalhadores e a própria esquerda. Eles jamais deixariam de contar com o apoio irrestrito dos militantes mais ferrenhos, isso é certo, entretanto, desconectariam-se de vez do eleitor médio, atento ao assunto corrupção e disposto a festejar sempre que um político graúdo sucumbir por suas falcatruas. O mesmo eleitor, em suma, que possibilitou a dinastia petista por quase duas décadas. A verdade é que não foi por meio de atitudes intempestivas que o PT se agigantou a ponto de conseguir institucionalizar a bandalheira financeira, ética e política. Bem ao contrário, o partido sempre primou pelo pragmatismo, até quando isso significou atropelar aliados e o próprio povo. Seria ótimo que mudassem de estratégia agora, mas não estou confiante.
GUerra de narrativas S air do País por um tempo, ainda que breve, sempre é bom. Em especial para nos desintoxicarmos das narrativas que circulam intensamente no Brasil. O Brasil de hoje vive uma guerra de narrativas. Membros do Ministério Público anunciam, a cada instante, que a Operação Lava Jato pode acabar por isso e por aquilo. Outros dizem que as eleições presidenciais só serão legítimas com a participação do ex-presidente Lula na disputa. Ou que a democracia brasileira caminha para o abismo porque o 4º Tribunal Regional Federal confirmou a condenação de Lula e ainda aumentou a pena estipulada na primeira instância. Pelo seu lado, o juiz Sérgio Moro justifica receber auxíliomoradia dizendo que o benefício compensa a falta de reajuste salarial entre a classe, mesmo sendo dono de apartamento na cidade em que vive. Adversários da Reforma da Previdência afirmam que não existem privilégios a serem combatidos no sistema previdenciário brasileiro. Outros apregoam a impossibilidade de votá-la, embora o tema esteja na pauta. O que será que vai acontecer? Apesar do alarmismo de alguns, a Lava-Jato não morreu nem vai morrer sem antes causar mais estragos na política nacional. Lula será ficha-suja e nem por isso a democracia brasileira irá para o abismo. Com ou sem Lula, as eleições serão legítimas. Aliás, mais legítimas do que as últimas, turbinadas pelo doping ilegal e imoral das doações por dentro e
As opiniões dos colunistas não necessariamente refletem a posição da revista
por fora (via caixa dois). A reforma da Previdência, apesar de ir contra os interesses das corporações, será aprovada, nem que seja aos poucos e em fatias. Moro e os demais juízes continuarão a receber auxílios diversificados mesmo obtendo reajustes salariais. A guerra de narrativas sempre fez parte da realidade humana. A questão atual é a sua intensidade, por conta dos avanços tecnológicos. Qualquer um pode se inserir no mundo midiático com suas narrativas pessoais. Daí surgirem, do nada, blogueiros e youtubers a caminho da consagração. Em sendo uma guerra, quem é a vítima? Basicamente, a verdade. O que fazer? Ter uma postura cética acerca de tudo o que é dito é uma boa decisão. Sabemos que a verdade está contaminada. Aliás, sempre esteve. É preciso filtrar o que é dito. Devemos também desenvolver mecanismos de validação sobre quem diz o quê e como. Afinal, não podemos duvidar de tudo e de todos a todo o momento. Paradoxalmente, duvidar e ter confiança são os melhores caminhos para bem viver no mundo de hoje. A questão é saber como. A saída é a reflexão. Como disse Virginia Wolf, o único conselho que uma pessoa pode dar para outra sobre ler notícias “é não seguir conselho de ninguém, seguir seus instintos, usar sua razão e chegar às suas próprias conclusões”. Vale para a guerra de narrativas dos tempos atuais. 15
Semana
por Antonio Carlos Prado
DINHEIRO 1 O casal de marqueteiros João Santana e Mônica Moura: novo depoimento a Sergio Moro revela transação ilícita de R$ 10 milhões
LAVA JATO
O PT segue a sua rotina. Mais repasse ilegal de dinheiro e mais caixa dois
T
udo dentro da rotina petista: nada que preste, como sempre, envolveu o partido na semana passada. Luiz Marinho é um dos correligionários mais próximos de Lula, já foi prefeito de São Bernardo e hoje é presidente do PT em São Paulo. Tenta ser candidato ao governo paulista mas pode ir tratando de sublimar o desejo porque em breve vai virar ficha-suja. Motivo: o depoimento de um exexecutivo da Odebrecht envolve Marinho em repasse ilícito de R$ 300 mil ao terceiro secretário da Assembleia Legislativa, o também petista Luiz Fernando Teixeira Ferreira, na eleição de 2014. O dinheiro teria circulado via caixa dois. “Luiz Marinho esteve em meu escritório e fez a solicitação. Pedido de Luiz Marinho tinha de ser levado em consideração”, declarou o ex-funcionário da empreiteira Luiz Antonio Bueno Junior. * Mais PT e mais lama. Os marqueteiros João Santana e sua mulher, Mônica Moura (andaram 16
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sumidos, agora reapareceram) prestaram mais um depoimento ao juiz Sergio Moro – trata-se do processo em que Lula é acusado de ter sido beneficiado por empreiteiras por meio de reformas num sítio na cidade paulista de Atibaia. Mônica foi clara e direta: declarou que R$ 10 milhões, de um total de R$ 18 milhões referentes à campanha de 2006, foram pagos em caixa dois - tudo orquestrado pelo ex-ministro Antonio Palocci. “Era o PT que determinava a forma de pagamento. Para mim, o caminho oficial era melhor porque não tinha de ficar andando com mala de dinheiro”, disse ela. O publicitário João Santana confirmou a Moro que fez em 2009, a pedido de Lula, a campanha de Maurício Funes à presidência de El Salvador. E, juntamente com o ex-presidente, mais uma vez foi Palocci quem tratou do esquema ilegal de financiamento. Como escreveu-se logo no início desse texto, nada de novo envolvendo o PT. Tudo segue a rotina da falcatrua.
DINHEIRO 2 O presidente do PT em São Paulo, Luiz Marinho, pessoa próxima a Lula: ele terá de sublimar o desejo de ser governador
75
deputados federais, e vergonhosamente não mais que 75 deputados federais, estiveram presentes na abertura do ano legislativo, na segunda-feira 5, em Brasília. A Câmara tem ao todo 513 parlamentares. A solenidade foi completamente ignorada. No Senado, a preguiça de voltar ao trabalho foi igual: só 12 senadores, de um toral de 81, bateram ponto no plenário.
Fotos: Edilson dantas / agEncia o globo; sErgEi KarpuKhin/ rEutErs
CLIMA
Moscou branca A quantidade de neve prevista para cair em Moscou ao longo de fevereiro despencou no final da semana passada em apenas trinta e seis horas de nevasca, num fenômeno climático que não ocorria desde 1957. A Praça Vermelha, que é o coração político do país, ficou totalmente encoberta (foto). O prefeito de Moscou, Sergei Sobyanin,
ECONOMIA
O Brasil e o susto da Bolsa de Nova York declarou que se trata da “nevasca do século” e pediu auxílio das forças armadas no trabalho de recolhimento de árvores tombadas e de limpeza das vias públicas para que as pessoas chegassem aos locais de trabalho. Com a temperatura na casa dos doze graus negativos, as aulas foram suspensas.
REFUGIADOS
O BOM ACOLHIMENTO DOs BRAsILEIROs A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, anunciou uma importante medida na questão dos refugiados, que deveria servir de exemplo aos países intolerantes. Trata-se do decreto que institui o Documento Provisório de Registro Nacional Migratório. Os refugiados ganharam segurança jurídica e maior chance de inclusão social.
ELEIÇÕES
Nome social para candidato transgênero Está quasE cErto quE mulhErEs E homEns transgênEros quE forEm candidatos nas próximas ElEiçõEs podErão rEgistrarsE no tsE com sEus nomEs sociais – o nomE civil ficará rEstrito aos trâmitEs intErnos do tribunal. o ministério público ElEitoral Encaminhou à Justiça, na sEmana passada, parEcEr favorávEl nEssE sEntido.
A Bolsa de Nova York sofreu, na segunda-feira 5, a maior queda em pontos de toda a sua história: 24.345,75. Em porcentagem, caiu 4,6%. Arrastou as Bolsas da Europa, Ásia e América Latina, ganhou fôlego no dia seguinte, mas o susto persistiu. No Brasil, analistas fizeram coro: é urgente que se melhore a situação fiscal, caso contrário estaremos extremamente vulneráveis quando a economia mundial passar por forte ajuste - e tal ajuste foi sinalizado justamente com o pesadelo da Bolsa de Nova York. Por que despencou? Temese que haja pressão inflacionária nos EUA e que o Federal Reserve acelere a subida da taxa de juros. Se isso ocorrer, também para o Brasil o cenário será sombrio.
ANTROPOLOGIA
Os ancestrais dos britânicos Os primeiros habitantes da região da atual Grã-Bretanha, que lá viveram há cerca de dez mil anos, tinham a pele negra, olhos azuis e cabelos escuros e cacheados. É isso o que apontam os exames de DNA, divulgados na semana passada (foto), feitos no fóssil conhecido como Homem de Cheddar, descoberto em 1903 na caverna de Gough, em Somerset. Os estudos, realizados pelo Museu de História Natural do Reino Unido, mostram que a mudança na tonalidade da pele aconteceu depois que o Homo sapiens descobriu a agricultura. Fóssil mais completo já encontrado do Homo sapiens, o Homem de Cheddar era caçador e coletor. Aproximadamente 10% dos habitantes da Grã-Bretanha, com ascendência britânica, descendem dessa antiga população. 17
Semana
por Rudolfo Lago Colaboraram ary Filgueira e Tábata Viapiana
Brasil Confidencial Rápidas
pROpOsTas Temer vai para o debate: o que concretamente os candidatos vão propor como solução para o País?
* Em toda a região Sul do País, apenas dez juízes federais não recebem auxílio-moradia de R$ 4.377,73 por mês. Dos 420 magistrados e desembargadores que atuam no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, o benefício pago a 410 vai gerar em 2018 um custo total de R$ 1.838.646,60.
Haverá cobrança
Caso o governo não consiga votar ou saia derrotado na reforma da Previdência pela ação dos candidatos nas eleições de outubro, haverá fortes cobranças. O Planalto acredita fortemente que os brasileiros irão às urnas num país diferente, com crescimento e recuperação econômica. E que poderia ter sinais ainda melhores com a aprovação das reformas. Assim, o governo prepara-se para cobrar claramente nas eleições que soluções concretas cada candidato propõe. A estratégia é desmascarar ao máximo posicionamentos que forem meramente demagógicos e eleitoreiros. Lembrando que na eleição passada, o País já pagou um preço alto pelo discurso da expresidente Dilma Rousseff negando na ocasião a necessidade de um ajuste fiscal, que se viu obrigada a tentar fazer logo depois.
Manada
Eleições
Para o Palácio do Planalto, a definição das possibilidades da reforma da Previdência vai se dar dentro de um fenômeno que chamam de “efeito manada”. Se os deputados perceberem que a tendência é favorável, os votos aumentam. Se for contrária, diminuem. Por isso, o momento de colocar a reforma em votação será avaliado com muita cautela.
Na verdade, já se avalia que a reforma da Previdência dificilmente será votada antes das eleições. Com o resultado das urnas, sabedores de que teriam mais quatro anos de mandato na mão, os deputados até admitem aprovar o projeto no apagar das luzes de 2018, porque daria para diluir no próximo mandato a impopularidade que o gesto causaria.
Malas prontas Principal articulador da pré-campanha de Jair Bolsonaro, o deputado Delegado Francischini (Pr) pode deixar o solidariedade caso o partido não embarque na campanha do ex-capitão do Exército. a indefinição do partido quanto à candidatura tem sido a principal queixa do parlamentar a interlocutores da Câmara. O destino de Francischini pode ser o mesmo do presidenciável: o Psl.
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* Foi prorrogado por 90 dias o inquérito policial conduzido pela Polícia Federal do Paraná contra o ex-deputado do PT Cândido Vaccarezza. Ele é acusado de receber propina de uma empresa que fornecia asfalto para a Petrobras. * Analistas políticos acreditam que as eleições de outubro, com as novas regras, custarão algo em torno de 30% a menos do que custou o pleito de 2014. Deverá ser também uma campanha curta, definindo-se as candidaturas apenas em julho. * Ganha, nessa lógica, quem tem possibilidade de colocar dinheiro próprio: empresários, milionários e celebridades. Quem tem capacidade de orientar votos: igrejas. Perdem força os sindicatos, com o fim do Imposto Sindical.
fotos: Marcos corrêa/Pr; divulgação; Moacyr loPes junior/folhaPress; Marcos oliveira/agência senado; reuters/ueslei Marcelino; Mateus BonoMi/agif
“Eu acho muito pouco. Coloca lá: ‘o desembargador disse que é muito pouco’”
retrato falado
Em meio à polêmica do pagamento de auxílio-moradia a juízes que possuem imóveis próprios, o novo presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, desembargador Manoel de Queiroz Pereira Calças, usou de ironia para defender o benefício. Ele disse que considera “muito baixo” o valor do auxílio, de cerca de R$ 4,3 mil, e admitiu recebê-lo, mesmo tendo mais de um imóvel em São Paulo. Calças afirmou ainda que os juízes não são antiéticos, pois o benefício está previsto em lei.
Líderes estudantis A ala mais moderada do PT trabalha para consertar o estrago provocado pelo discurso de desobediência civil capitaneado pela presidente do partido, senadora Gleisi Hoffmann (PR), e pelo líder da bancada, Lindbergh Faria (RJ). “Se comportaram como líderes estudantis”, diz um integrante dessa ala. Para esse grupo, eles erraram
completamente o tom. Seria válido questionar, avaliam os moderados, a decisão da Justiça, mas não pregar a desobediência da ordem da forma como os dois pregaram. Essa é uma postura que o cidadão brasileiro não costuma aceitar bem. E que acaba, consideram, beneficiando Jair Bolsonaro, que prega em seu discurso a obediência à lei e à ordem.
Sinais...
O ministro Napoleão Nunes Maia aproveitou a cerimônia de posse do presidente do Tribunal Superior Eleitoral Luiz Fux para elogiar Sepúlveda Pertence, egresso da Corte Eleitoral. O mimo não passou despercebido por um deputado da Rede, que achou estranha a mensagem ter sido feita no dia em que Sepúlveda se integrou à defesa do ex-presidente Lula.
toma lá dá cá
ROBERTO REQUIÃO, SENADOR (PMDB-PR) Por que um projeto que desobriga o uso de “excelência” e outros pronomes de tratamento para as autoridades? Há um uso exacerbado de retórica no tratamento que decorre do período da monarquia portuguesa, em quem se conferiam títulos nobiliárquicos aos bajuladores do rei, e ao povo era ordenado tratar esses detentores com extrema distância. Títulos revelam um distanciamento entre seres humanos, reforçando a tese de que existem alguns que têm mais direitos que outros.
Isso não acirra ainda mais os ânimos com o Judiciário? Não sou eu, mas são a declaração universal dos direitos do homem e a nossa Constituição Federal que propõem a igualdade de todos.
De barriga cheia Os moderados comentam que Gandhi, quando defendeu a desobediência civil na Índia, pregava uma forma de resistência pacífica, sem violência e sem confronto. E saía à frente para dar os exemplos. Fez greve de fome na defesa de suas posições. Aqui, Lula, tão logo soube da sua condenação, foi jantar num restaurante.
...trocados
Napoleão Nunes foi nomeado para uma cadeira do TSE justamente pelo pré-candidato petista. Se sua mensagem deixou dúvida, o mesmo não se pode dizer do discurso de Luiz Fux: “A Justiça Eleitoral será irredutível na aplicação da ficha limpa. A pessoa corrupta não conduz o país para um futuro. Ficha suja está fora do jogo democrático”.
De marido para mulher
Diz o presiDente Michel teMer que sua Mulher, Marcela, preferia que ele não Disputasse a reeleição eM outubro. Mas ele ainDa teM teMpo para convencê-la Do contrário. Dos possíveis personagens na corriDa, é queM teM Mais teMpo para se DeciDir. ele e o presiDente Da câMara, roDrigo Maia (DeM), não precisaM Deixar os cargos. 19
Semana
coluna do Boechat
por Ricardo Boechat Com Ronaldo Herdy
Brasil
Toma lá, dá cá
A última do Palácio do Planalto em cima de deputados para forçar a vitória na reforma da Previdência: me deem 308 votos e os partidos aliados serão lembrados no trocatroca ministerial. Ou seja, a legenda que votar pela mudança segue com a Pasta que ocupa, caso contrário Michel Temer se vê livre para nomear quem quiser. Aliás, depois de muito oba-oba, contados 260 votos a favor da reforma na quarta-feira 7, a nomeação do falastrão Carlos Marun para a Secretaria de Governo, em novembro, não fez tanta diferença assim. Pelo menos por ora.
BB
ajuste interno
Chama-se Programa de Adequação de Quadros — e não PDV, como a Coluna informou na semana passada — o novo processo deflagrado pelo Banco do Brasil, esse ano, entre seus funcionários. “Demissões não são o objetivo, pois há vagas para todos”, diz um executivo, mas quem não aceitar as transferências de área ou mesmo de cidade, determinadas por cada diretoria, receberá incentivos para deixar a instituição. Só em janeiro, 747 preferiram ir embora. O número vai subir, mas ignora-se quanto. História
Quem quiser...
força de Paz
Terreno minado
É grande, no Itamaraty e mesmo no Exército, a resistência ao envio de 750 soldados brasileiros à República Centro Africana. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, prometeu ao secretáriogeral da ONU, António Guterres, em janeiro, empenhar-se para que o Congresso aprove a Missão de Paz. Diplomatas e altos oficiais contrários ao projeto consideram loucura colocar tropas brasileiras em terreno onde cresce a ação de fundamentalistas islâmicos, como os do grupo 3R. Um confronto direto, mesmo que vitorioso, colocaria o Brasil na lista de países onde o terrorismo alega ter faturas a cobrar. Gente fina
Eles & e os outros Congresso, STF e STJ gastaram mais de R$ 1 milhão com o uso de salas VIPs no Aeroporto de Brasília. Em troca de R$ 120 por cliente, o espaço lhes oferece “deixar para trás o barulho, o caos e a multidão” — essa última, aliás, paga a conta dos coroados. 20
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saúde
aliás... ... Ricardo Barros quer fazer titular da Saúde o seu secretário-executivo, Antonio Nardi. Ele era secretário municipal da Saúde em Maringá (PR), quando o ministro foi prefeito da cidade. Presidiu ainda o Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde. Em 2015, Dilma Rousseff o nomeou secretário de Vigilância em Saúde do MS, para agradar o PP. Há tempos no setor, em recente coletiva surpreendeu negar um surto de febre amarela no País. Qualquer estudante no primeiro ano de Medicina sabe que epidemia é quando há alta inesperada ou acima do normal na incidência de uma doença.
fotos: fábio Pozzebom/Abr; divulgAção; dAve jenkins; Pedro frAnçA/AgênciA senAdo; vAnderlei AlmeidA/AfP/getty imAges
criminalista e autor de tese sobre a defesa de presos políticos no País, o advogado Fernando Fernandes tem em mãos raro documento histórico. Do Superior Tribunal Militar recebeu cerca de 10 mil horas de áudios, com gravações de sessões secretas e não secretas da corte, entre 1975 e 2004. a direção da casa consultou envolvidos ou familiares antes de tornar público os registros. como ninguém foi contra, todo o acervo do STM, com cerca de 20 milhões de páginas de processos, de 1808 a 1989, está franqueado ao público.
doPinG
Bola quadrada Vinculado ao Ministério do Esporte, o Tribunal de Justiça Desportiva antidopagem fará chamada pública até o fim do mês para cadastrar médicos peritos e bioquímicos. Tal como fez com advogados, ninguém receberá salário. Mas contribuirá para o “esporte sem drogas”. os selecionados atuarão nos processos que correm na côrte sendo que, até o momento, 61 atletas testaram positivo para algumas substâncias proibidas. a maioria é jogador de futebol.
Gastos
Vaso de guerra A Marinha conclui ainda em fevereiro, com a assinatura formal do contrato, a compra do porta-helicópteros “HMS Ocean”, aposentado pela Inglaterra após 23 anos de uso. O Ministério da Defesa britânico receberá quase 85 milhões de libras. Agora patrimônio de um País com as contas públicas em colapso, o vaso de guerra cumprirá o mesmo papel irrelevante de seus antecessores “Minas Gerais” e “São Paulo”. MPf
nas ruas Em 2017, o Exército participou de 507 operações diversas, com a utilização de mais de 130 mil militares. No momento, o Exército emprega cerca de 3.100 homens em 58 operações das mais diversas naturezas – proteção ambiental, serviços em áreas indígenas, apoio à saúde pública etc. As seguidas convocações esse ano para que a Força atue na segurança pública, notadamente no Rio de Janeiro, vai elevar bastante a estatística.
Política
eleições 2018
Face jovem
Fora do páreo
O DEM quer exibir cara nova. Prefeito de Salvador, ACM Neto assumirá a presidência do partido, no lugar do senador José Agripino Maia (RN), acusado de corrupção e lavagem de dinheiro pela Procuradoria Geral da República e réu na Lava Jato. Já Rodrigo Maia oscila entre duas opções: candidato à sucessão de Temer ou a disputa da reeleição, de olho em novo mandato à frente da Câmara, a partir de 2019.
Eliseu Padilha não disputará vaga de deputado federal pelo Rio Grande do Sul, em outubro. Citado na delação da Odebrecht na Lava Jato e sem a blindagem que um cargo de ministro oferece, ele ficará a mercê da primeira instância da Justiça Federal do DF.
fGts
Pauta quente
Será agitada a primeira reunião do ano, dia 27, do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador. As seis centrais sindicais que formam a bancada dos trabalhadores no colegiado querem garantias de aporte de R$ 18,3 bilhões do Tesouro no fundo. Com as novas regras da
DRU (Desvinculação das Receitas da União), foi aberto caminho para o governo reter até 30% da arrecadação do PIS/Pasep. O BNDES reluta em cobrir esse valor e as centrais veem na perda uma ameaça ao pagamento de benefícios sociais, como o abono salarial e o seguro-desemprego, em 2018.
esPortes
novos craques? Antes dA bolA rolAr nA rússiA, em junho, no mundiAl dA FiFA, o Futuro do Futebol estArá em cAmpo, em ApArecidA de GoiâniA (Go). cercA de 3,5 mil criAnçAs, de 7 A 12 Anos, em 240 equipes de 13 pAíses dAs AméricAs do sul e do norte, europA e ásiA, disputArão o Go cup, considerAdo um dos mAiores torneios de Futebol inFAntil do plAnetA. será de 24 A 31 de mArço, com seis times brAsileiros.
Frases
por Antonio Carlos Prado
Faço uma prostituta do Brasil proFundo. uma prostituta muito distante da avenida atlântica” Mayana neiva, atriz e ex-miss Paraíba, sobre a sua personagem na novela da Rede Globo “O outro lado do paraíso”
“É uma festa tão bonita. O povo passa trezentos e sessenta e cinco dias mergulhado em desengano, mas quando chega o carnaval pode esquercer da tristeza da vida” Monarco, 84 anos, um dos principais compositores do Brasil e símbolo da Escola de Samba Portela e do carnaval do Rio de Janeiro
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fotos: Raquel Cunha/Globo; MaRCos Mello/DivulGação; MaRCelo CoRRêa/eDitoRa Globo; WenDeRson aRaujo; afP Photo/Daniel leal-olivas
“Brasília É uma Cidade de COnCretO e uma Cidade que está envelheCendO”
rodrigo rolleMberg, governador do Distrito Federal, tentando justificar a queda do trecho de um viaduto do Eixo Rodoviário de Brasília - deve ser a única cidade do Brasil e do mundo com essas características. Só rindo!
“As mulheres estão lado a lado com os homens. Dá para perceber que isso tornou a sociedade melhor” luPiTa nyong’o, atriz
“Político ficha-suja é irregistrável” luiz Fux, novo presidente do Tribunal Superior Eleitoral e ministro do STF, defendendo a tese de que condenados em segunda instância não poderão se candidatar em hipótese alguma
“Chegamos ao momento decisivo. O Congresso dirá se vai acabar com privilégios ou se vai capitular diante do lobby do serviço público” arThur Maia, deputado federal, relator da reforma da Previdência
“não saBia que Harvey Weinstein aBusava de pessoas. ele nunca pediu para me encontar em um quarto de Hotel” Meryl STreeP, atriz
“É bom ter gente como o Luciano Huck porque precisa arejar, botar em perigo a poLítica tradicionaL (...). É preciso que eLa seja desafiada. acHo que para o brasiL seria bom, gosto deLe (...), mas não sei o que eLe vai fazer” Fernando henrique cardoSo, ex-presidente do Brasil
“O Barack OBama é aquele hOmem que vOcê Olha e Fala: meu Deus, eu querO casar cOm ele e cOm a ex-primeira-Dama michelle. querO ter Os DOis na minha cama” MaiTê Proença, atriz
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LuLa / e x e c u ç ã o
Prisão esPecial O Complexo Médico Penal de Pinhais, na região metropolitana de Curitiba, abriga hoje 697 presos, entre os quais os 11 condenados na Operação Lava Jato. Lula deve ser o próximo
da
pe n a
à espera de l u l a ISTOÉ esteve no Complexo Médico Penal de Pinhais, que se apronta para receber o expresidente Lula, tão logo sua prisão seja decretada. Já foram definidos o local em que o petista irá dormir, – uma cela de 12 m2, com capacidade para três presos –, o esquema de segurança para o dia da prisão e até sua rotina na penitenciária Germano Oliveira
duas estrelas As celas em Pinhais possuem 12 m2, para três presos. Camas com colchões densidade 28, vaso no chão (boi), pia com água potável e televisão de 20 polegadas
Q
uando o sol se descortina no horizonte, o ar cortante e álgido da manhã dá lugar a uma atmosfera densa de expectativa. É inegável para quem por lá atravessa: o Complexo Médico Penal de Pinhais, a 40 minutos do centro de Curitiba, já respira diferente. O presídio, com 8,406 metros quadrados de área construída e que hoje abriga 697 presos, entre os quais 11 da Operação Lava Jato, será o provável destino do ex-presidente Lula, tão logo os desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) decretem sua prisão. Na última semana, a reportagem de ISTOÉ visitou a penitenciária – em fase final de preparação para receber o petista. Já foram definidos os esquemas de segurança, o local em que o líder do PT irá ficar e até sua rotina no cárcere – incluindo o que ele poderá ou não fazer no futuro lar. Por decisão do Departamento Penitenciário do Paraná (Depen), foi reservada a Lula uma das dez celas da galeria 6 do Complexo, situada no segundo piso. Lá estão acomodados exclusivamente presos da Lava Jato e outros condenados pelo crime de colarinho branco. Os mais ilustres são o ex-governador Sérgio Cabral, o ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e o ex-tesoureiro do PT, João Vaccari Neto. Cada cela da galeria 6, como a que já está separada para Lula, tem 12 metros quadrados, e é destinada a 3 presos. A unidade é composta por três camas de solteiro, construídas em alvenaria, com direito a um colchão de densidade 28. Se o petista precisar de colchão especial, um médico deverá atestar que ele sofre da coluna, por exemplo. Nesse caso, caberá à família providenciar outro 25
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da
colchão, nas medidas fornecidas pela direção do presídio. A cela, com uma janela e porta em aço, conta com um vaso sanitário no chão (o chamado boi), com pouca privacidade, e um tanque com torneira. Os agentes penitenciários asseguram que é possível bebê-la sem sobressaltos – a água, fornecida pela Sanepar, esclarecem, é potável. Mas se Lula exagerar no consumo, não tem conversa: a água será cortada. O tanque também servirá para o futuro detento lavar as quatro cuecas e quatro pares de meias, autorizados a carregar para a cela. Toalhas e roupas de cama são fornecidas pela prisão, incluindo um cobertor. Como o inverno de Curitiba é gelado, alcançando até temperaturas negativas, a família poderá mandar cobertores mais quentes. Detalhe: a movimentação de familiares no presídio é restrita. Só podem entrar dois parentes por vez, devidamente cadastrados. E não são permitidas visitas íntimas. Já os advogados podem falar com os presos a qualquer hora e dia, mas através de um parlatório, por meio de interfone, protegido por resistente vidro de policarbonato.
uNiForme oBrigatÓrio
Como todos os demais presos, Lula será obrigado a usar uniforme – calça de moleton cinza e camisa branca, com detalhe em azul, as cores da bandeira do Depen –, mas não precisará mexer no bolso para receber o novo figurino. A indumentária será fornecida pelo presídio. Os uniformes são lavados uma vez por semana na lavanderia da cadeia, onde trabalham dois detentos, devidamente remunerados. Se o ex-presidente necessitar de remédios, a penitenciária fornece genéricos de graça. Médicos e enfermeiros também prestam atendimento gratuitamente. São eles que controlam a ingestão de eventuais medicamentos, que não ficam nas celas em hipótese alguma para evitar que algum deles se intoxique. Desde que alcançou o Planalto, Lula acostumou-se ao conforto e salamaleques que só o poder é capaz de proporcionar. No Complexo dos Pinhais a vida será bem mais dura, por óbvio. Por exemplo, o petista, assim como seus pares, será obrigado a despertar às 5h. O café da manhã, servido na cela, PrecauÇão O diretor do Depen, Cartaxo vai até às 6h. Limita-se a dois Moura, já montou um pães com manteiga e café esquema de segurança para com leite. Depois, é chegada receber Lula 26
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a PrisÃO da LaVa jatO Por dentro do presídio para onde irá Lula: O Complexo Médico Penal do Paraná fica na cidade de Pinhais, a 21,2 Kms do centro de Curitiba. Um total de 40 minutos de carro. Está construído numa área rural e tem 8.406m2 de área edificada galerias 1 e 2 Possui seis galerias (duas em cada edifício). As galerias 1 e 2, com 300 vagas, são destinadas a presos “por medida de segurança”, como inimputáveis e doentes mentais
BiBlioteca Os detentos podem pegar livros na biblioteca, com 3 mil exemplares. A leitura é na cela
sala de visitas Visitas de familiares cadastrados só são permitidas às sextas-feiras. O banho de sol no pátio vai das 9h às 11h. Encontros íntimos são proibidos, assim como o uso de álcool e fumo no interior da penitenciária iLustraÇÃo: gerson nascimento
reFeiÇÕes O almoço é servido às 11h e o jantar às 17h na cela. O marmitex conta com 60% de carboidratos (arroz, feijão/macarrão) e 40% de proteínas (carne/ frango) galerias 3 e 4 Possui 300 vagas, destinadas a doentes com enfermidades graves, como AIDS, sífilis, câncer e até gestantes
galerias 5 e 6 Lula deverá ficar na galeria 6, localizada no segundo piso. No térreo, fica a galeria 5. No espaço, ainda há dez celas vazias. Hoje, abriga 64 presos, 11 dos quais condenados pela Lava Jato
Os ViZinhOs de XiLindrÓ andré vargas Ex-deputado (PTPR), preso desde abril de 2015 eduardo cunha Ex-presidente da Câmara, no presídio desde outubro de 2016 aldemir Bendine Ex-presidente da Petrobras, desde julho de 2017 no local João augusto rezende Henriques Chegou no Complexo em setembro de 2015 João vaccari Neto Ex-tesoureiro do PT, detento desde abril de 2015 gim argello Ex-senador do PTBDF, encarcerado em abril de 2016 Jorge luiz Zelada Ex-diretor da Petrobras, em Pinhais desde 2015
a cela de lula A cela que já preparada para receber o ex-presidente tem 12m2, três camas, grade e porta de aço
marcio de a. Ferreira Ex-gerente da Petrobras, detido em maio de 2017 Pedro Xavier Bastos Ex-gerente da Petrobras, no local desde maio de 2017
corredor de acesso Ao ingressar no presídio, presos, advogados e familiares passam por um amplo corredor que dá acesso às galerias e áreas comuns do local fotos: guiLherme pupo
roberto gonçalves Ex-gerente da Petrobras, preso em março de 2017 sérgio cabral Ex-governador do Rio está em Curitiba há 15 dias
ParlatÓrio O preso pode falar com advogados a qualquer hora, por interfone. São separados por uma tela de policarbonato
lula Deverá ter prisão decretada em março
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pe n a Novos PersoNageNs O jurista Sepúlveda Pertence (à esq.) foi contratado a peso de ouro por Lula, enquanto o ministro Alexandre de Moraes (à dir.) mandou para cadeia deputado condenado em segunda instância. Um recado para Lula
a hora o banho. Há um conjunto de chuveiros para cada galeria. Com água quente, inclusive. Mas cada banho só pode durar no máximo quatro minutos. A escala no chuveiro é regida pela lei da vida, que deveria valer para todos: quem chega por último, vai para o final da fila. Para o asseio do preso, os parentes poderão levar shampoos e sabonetes. Das 9h às 11h, Lula poderá tomar banho de sol no pátio. E até jogar futebol. Mas não será como nas famosas pelejas na Granja do Torto com os ministros. A bola é improvisada, em algumas ocasiões feitas de meia, e a trave foge da tradicional: em geral é pintada nos dois lados do muro. À atividade física segue-se uma nova refeição. O almoço do petista será entregue às 11h. A comida vem em formato de marmitex, fornecida pela Risotolândia, empresa contratada pelo Depen em processo licitatório. Cada marmita, na temperatura de 42º, é devidamente balanceada por nutricionistas: 60% de carboidratos (arroz, feijão ou ma-
O caminhO até O cárcere Expedida a prisão, o mandado vai para a Polícia Federal para o cumprimento da ordem. Serão os policiais federais que executarão a decisão. Eles devem negociar com os advogados de Lula como será o cumprimento do despacho judicial
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PassO a PassO jurídicO O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) publicou nesta terça-feira 6 o acórdão da sentença dos três desembargadores (Gebran Neto, Leandro Paulsen e Victor Laus) que condenaram Lula a 12 anos e 1 mês de reclusão. Decisão de segunda instância que prevê prisão após a sentença, conforme decisão do STF em 2016. Os advogados de Lula têm 12 dias úteis para apresentarem o embargo declaratório para esclarecer detalhes da sentença. Esse embargo não pode modificar o resultado da sentença, que foi por 3 a 0. Prazo vence no próximo dia 20. Os desembargadores do TRF-4 terão até dois meses para analisar esse recurso. A decisão pode sair até o final de março. Devem decretar a prisão de Lula, conforme prevê o STF, e encaminhar a ordem de prisão para a 13ª Vara Federal do Paraná, do juiz Sergio Moro
carrão) e 40% de proteínas (carne todos os dias), acompanhados de verduras ou legumes. Sobremesa, no entanto, é luxo: só é permitida uma vez por semana. O jantar, com o mesmo cardápio, está programado para ser servido às 17h. Nesse intervalo, é possível circular pelos corredores, ir à biblioteca, ou mesmo ficar vendo TV nas celas – cada unidade é equipada com um aparelho de TV de 20 polegadas e um rádio AM/FM, sem entrada de USB. O uso de outros equipamentos eletrônicos são expressamente proibidos. Celular nem pensar. Por volta das 22h, as luzes se apagam. “A vida não é das piores, mas também não chega a ser um hotel duas estrelas”, disse Luiz Alberto Cartaxo Moura, diretor do Depen, à ISTOÉ. O diretor do presídio que abrigará Lula, Jefferson Medeiros Walkiu, carrega a fama de durão. Medeiros não admite, por exemplo, que o detento beba ou fume. Portanto, nada de cachacinha ou charutos cubanos. Se flagrado fumando ou bebendo, o petista estará sujeito a sofrer medidas restritivas de liberdade. “Não vai para a solitária, como se fala, mas fica numa área confinada por quinze dias”, alerta Cartaxo. E também pode vir a amargar o acréscimo na pena. Tudo é anotado na ficha do preso, analisada posteriormente pelo juiz de Execuções Penais.
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Da PF, ele será levado de avião a Curitiba
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Lula pode decidir se entregar ou negociar o processo da prisão. Ele pode se ir para uma unidade da PF em SP, Curitiba ou Brasília
Se o cronograma previsto for cumprido pela Justiça, Lula dará partida para a nova rotina no final de março, conforme já antecipou ISTOÉ. No dia da prisão, por temer que militantes do MST e do PT invadam o Complexo Médico Penal dos Pinhais, localizado numa aprazível área rural, a PM promoverá um em longe do aconchego desfrutado durante a vida grande cerco em torno da unidade, com o fechamento do esfora do cárcere, não raro regada a luxos inacessíveis paço aéreo, uso de helicópteros e tropas fortemente armadas, ao cidadão comum, os poderosos presos da Lava Jato num esquema muito semelhante ao que a Brigada Militar tiveram de se adaptar, cada um a seu jeito, à insólita rotina montou em Porto Alegre para o julgamento de Lula no TRF-4. no Complexo Médico-Penal dos Pinhais, em Curitiba. Vidrado em musculação e “O Complexo de Pinhais fica num lugar acostumado a uma rotina de ermo e pode ser alvo. Tememos uma invaexercícios físicos, o empreiteisão. Se o presídio se mostrar inseguro, Lula ro Marcelo Odebrecht, que terá que ir para um quartel da PM em Curideixou o presídio no dia 23 de tiba e só depois, quando as coisas se acaldezembro, tinha de improvisar marem, será trazido para Pinhais”, esclarepara manter a saúde em dia: ceu Cartaxo Moura. A despeito das preocuutilizava como peso duas garpações, o presídio é considerado modelo rafas pet de dois litros d’água. O ex-ministro José Dirceu, por em segurança, se comparado às demais sua vez, preferia cuidar dos carceragens do Paraná. Nunca foi registrada três mil livros da biblioteca. uma rebelião ou fuga. No local, reina a Trabalhava como auxiliar do tranqüilidade. Ao chegar ao Complexo, bibliotecário. Dessa forma, pode-se cruzar com cachorrinhos no meio conseguiu abater alguns dias das pacatas ruas de acesso. Como o presídio da pena imposta a ele de 30 fica incrustrado no meio de numa área anos de detenção. Já o expresidente da Câmara, Eduarrural, pode-se ouvir em alto e bom som os do Cunha (PMDB-RJ), um dos passarinhos cantando. Para garantir que prováveis futuros vizinhos de nada fuja do controle, a penitenciária posLula na galeria 6 da penitencio dia a dia Nos PiNHais Cada detento se sui muralhas, com PMs fortemente armaária, tem optado por atividaocupa de uma forma. Os da Lava Jato fazem dos, como em qualquer cadeia. De qualquer ginástica com garrafa pet e pintam paredes des mais frugais. Diariamente, forma, a fim de evitar sustos, uma equipe desde que chegou aos Pida PF já está sendo treinada para a condução do ex-presidennhais, se ocupa pintando grades de celas. É como uma terapia, justifica. Para o serviço de limpeza se apresentam te até a penitenciária. A orientação é para que não exponham como voluntários dois ex-companheiros de Lula: o ex-teo preso, não o algemem, não o levem de camburão e, de presoureiro do PT, João Vaccari Neto e o ex-deputado André ferência, negociem com seus advogados uma forma dele se Vargas (PT-PR). Só o ex-governador do Rio Sérgio Cabral entregar numa unidade da PF em São Paulo, Curitiba ou até é quem ainda permanece no ócio. Nos últimos 15 dias, fimesmo em Brasília. Afinal, um consenso se impôs de maneira cou enfurnado numa solitária. Na segunda-feira 5, foi insofismável: embora preso comum, e não político, como quer transferido para uma cela comum. Está sozinho. fazer crer o PT, ali não é aguardado um preso qualquer.
o cotidiaNo de quem está (ou esteve) lá
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Em Curitiba, Lula vai ser submetido a exames no IML. Eles são feitos para constatar que o preso não sofreu violência no ato da prisão
Enfim, o petista é encaminhado por meio de uma viatura da PF ao Complexo de Pinhais, a 40 minutos de Curitiba, para cumprimento em regime fechado. Se Lula trabalhar na cadeia, pode amortizar a pena. Três dias trabalhados, como faxineiro, pintor, bibliotecário ou na lavanderia, abatem um dia. Se cometer alguma infração, como beber ou fumar, a pena imposta ao petista pode sofrer acréscimo
fotos: sergio Lima/foLhapress; fabio rodrigues pozzebom/agência brasiL;
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prendA-me As articulações do PT e de Lula para escapar do desfecho trágico da prisão incluem (seriamente) o asilo diplomático em países camaradas. Por que a manobra – mais uma afronta à Justiça – pode constituir um tiro no pé
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íderes políticos, poderosos ou não, em decadência ou não, costumam ser rodeados por dois grupos distintos de auxiliares: os que lhe falam verdades difíceis de serem ditas e aqueles que, de suas bocas, só escapam sinfonias para os ouvidos do interlocutor – ou seja, os que só pronunciam palavras aveludadas, aquelas que seu líder mais gostaria de ouvir. O senador Jorge Viana (AC) se enquadra nesse segundo time. Viana virou uma espécie de grilo falante de Lula para assuntos de desacato à Justiça e tentativas de driblar a lei. Há dois anos, foi dele a sugestão, registrada em escuta telefônica com autorização judicial, para que Lula afrontasse publicamente o juiz Sergio Moro de modo a virar um “preso político”. Como o diálogo se tornou público, Lula não levou a ideia adiante, nem Moro caiu nessa. Agora, é da lavra de Viana outra indecente manobra que, nos últimos dias, ganhou fôlego no seio do PT. É semelhante à primeira na essência: para escapar da prisão, hoje iminente, Lula buscaria o asilo diplomático em países camaradas. De lá, discursaria ao seu séquito como “exilado político”, até retornar ao Brasil em momento de mais calmaria
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Ary Filgueira e Rudolfo Lago
– ou depois de costurar um acordão político-jurídico que o livrasse definitivamente da cadeia. Embora tenha dito, recentemente, que “a palavra fugir não existe” em sua vida, Lula gostou do que ouviu – como não. E passou a considerar seriamente a hipótese. A proposta de Viana foi recepcionada no partido como cafezinho quente e açucarado em sala de espera. Tanto que logo ganhou adeptos no petismo: o ex-ministro José Dirceu, também condenado em segunda instância, mas que ainda segue livre, foi um dos que endossaram a “saída pelo asilo”, à
as eMBaiXadas caMaradas Os países “amigos” do PT que estariam dispostos a abrigar o condenado Lula são, pela ordem: Bolívia, Equador, Etiópia, Venezuela e Argélia
Bolívia O refúgio na Bolívia é o sonho de consumo. Evo Morales estenderia tapete vermelho para Lula
“A prÓpriA declArAção de lulA, que AcusA o Judiciário de golpe, militA no sentido de que ele não se esquivA de umA tentAtivA de fixAr domicílio em outro pAís” Ricardo Augusto Soares Leite, da 10ª Vara Federal de Brasília
se for cApAz revelia da lei. Na última semana, passou a propagar a tese, que se espalhou no PT como rastilho de pólvora. Entre as nações dispostas a receber Lula, estariam a Venezuela, Bolívia, Equador e Cuba, além de países do continente africano onde o petista poderia fixar residência como Argélia e Etiópia. Este último, destino para onde o ex-presidente tinha até viagem marcada. Lá daria uma palestra sobre corrupção, tema que, a julgar pelas recentes decisões judiciais, ele domina como poucos. Mas capitulou, depois que o juiz Ricardo
Leite cassou-lhe o passaporte – já devolvido. Face à impossibilidade de se dirigir aos etíopes pessoalmente, Lula gravou um vídeo em que dourou a narrativa persecutória – o suficiente para angariar apoios e receber convites de hospitalidade. Em sua argumentação em favor da idéia do asilo, Viana lapida a articulação. Argumenta que, se um país aceitar conceder refúgio ao ex-presidente, não há possibilidade de extradição, pois reconheceria que a situação não é somente jurídica, mas política. A vantagem para Lula seria a possibilidade de, solto,
equador O Equador é boa opção. O jornalista Assange está refugiado na embaixada do País em Londres
etiópia Lula ia para a Etiópia depois do julgamento. Como teve o passaporte retido, cancelou a viagem
Fotos: sÉrgio lima/istoÉ
venezuela A Venezuela está se esfacelando, mas se optar pelo asilo no País, Lula teria recepção de gala
argélia A Argélia não tem tratado de extradição com o Brasil. Por isso, esse País está bem cotado como refúgio 31
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os articuladores
“A gente vAi lá, sequestrA o lulA e entregA numA embAixAdA. isso eu topo fAzer”
O mentor da tese de que Lula deve driblar a lei para escapar da prisão e buscar asilo diplomático numa embaixada amiga é o senador Jorge Viana (PT-AC), mas a hipótese já havia sido aventada pelo ex-ministro Ciro Gomes, candidato a presidente pelo PDT. O ex-ministro José Dirceu também endossa a ideia
Ciro Gomes, ex-ministro de Lula
seguir na toada de entrevistas e de alguma forma se manifestando sobre o processo. Se decidisse partir para Venezuela, Bolívia ou Equador, Lula não precisaria ir de avião nem muito menos de passaporte. Bastaria pegar um carro que chegaria ao destino livremente, beneficiado pela longa área de fronteira que circunda o território brasileiro. Para convencer a chancelaria vizinha a lhe conceder o asilo, Lula teria de justificar sua fuga. Um bom argumento, na visão dos petistas entusiastas da tese, seria declarar ser vítima de perseguição política, discurso que o partido vem usando desde que se ventilou o nome dele em denúncias de corrupção. Apesar de a maioria dos nossos vizinhos ter acordo de extradição com as autoridades brasileiras, o processo que o levaria ao caminho de volta não seria rápido, o que daria para ele continuar dando as cartas e capitaneando a militância, mesmo que de longe.
pArA Jorge viAnA, se um pAís AceitAr conceder refúgio A lulA, não há possibilidAde de extrAdição, “pois reconheceriA que A situAção é políticA”
as embaixadas desses países negaram peremptoriamente que tenha recebido qualquer contato, muito menos nesses termos. Os embaixadores se negaram a tecer qualquer comentário adicional. O estratagema, por ousado e ilegal, pode realmente constituir um tirambaço no pé, caso seja levado adiante por Lula e o PT. ISTOÉ apurou com a alta cúpula da Polícia Federal que, desde a decisão do TRF-4, agentes federais já monitoram os passos de Lula. Especialmente depois que seu passaporte foi devolvido na semana passada, por decisão da Justiça. PassaPorte devolvido Embora a saída apontada pelo senador Jorge Viana também Por enquanto, não há registro de que o ex-presidente tenha tenha sido sugerida por Ciro Gomes em 2016, qual seja, um feito um movimento mais brusco nesse sentido. Segundo o plano de fuga, a medida desesperada ganhou força com a Itamaraty, não existe, por ora, nenhum comunicado dessas atual situação de Lula, que ficou muito longe do cenário que nações sobre um pedido de asilo a Lula. O Itamaraty é categó- o PT previa. Primeiro, esperava que o julgamento no TRF-4 rico: apesar de não ser obrigatório, os países da América do Sul acontecesse em março, o que daria mais tempo a Lula para costumam manter uma relação diplomática entre si. Para uma consolidar seu discurso de candidato. Em vez disso, houve fonte ouvida pela ISTOÉ, uma omissão dessa natureza pode precipitação do julgamento para janeiro. Depois, o partido e a abalar a diplomacia com o Brasil. Dependendo do desfecho, até defesa dele acreditavam que haveria uma divergência entre mesmo suspender acordos entre as duas nações, por um gesto os desembargadores, o que daria maior possibilidade de recurunilateral do governo brasileiro. Procuradas pela reportagem, so. Mas foi uma derrota acachapante por 3 a 0. As condições jurídicas estão colocadas. Resta, agora, apenas o cumprimento da lei. Se Lula optar pela fuga – ou Uma das estratégias de Lula e dos petistas asilo, que seja – com o beneplácito das autoridades entusiastas da tese do asilo seria ele se brasileiras, ao País não haverá mais como descer declarar vítima de perseguição na escala da degradação institucional. 32
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Fotos: omar de oliveira/Fotoarena/agência o globo; Fátima meira/Futura Press; ueslei marcelino/Photo agência
Brasil/Eleições
Quando ela deixará de ser a eterna herdeira? Marina Silva herdou o espólio social de Chico Mendes quando o ambientalista foi assassinado. E não capitalizou. Em seguida recebeu o legado político de Eduardo Campos e, mesmo assim, não conseguiu levar adiante a sua candidatura. Desta vez, assumirá os votos da esquerda que iriam para Lula. Ela irá desperdiçar novamente esse precioso trunfo? Tábata Viapiana
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ue a ex-senadora Marina Silva possui luz própria é inegável. A intensidade do brilho é que poderia ter sido mais vigorosa, se a presidenciável da Rede não fosse pródiga em desperdiçar as oportunidades que, não raro, desabam em seu colo. Mais precisamente, os espólios políticos herdados quase que de bandeja, ao longo de sua trajetória política. Cavalo encilhado não passa duas vezes, reza o provérbio popular. Marina já extrapolou a cota. Recebeu a visita da sorte duas vezes. Foi assim na década de 80, quando despontou como liderança no vácuo da popularidade do ex-líder seringueiro Chico Mendes e, em 2014, quando deslanchou na corrida presidencial a partir do trágico acidente aéreo envolvendo o ex-governador Eduardo Campos. Nas duas ocasiões, frustrou aliados e apoiadores que apostavam todas as fichas em vôo mais altos da política acreana. Agora, como numa reprise, Marina morena se pinta para a guerra eleitoral com importante vantagem sobre seus oponentes. Desponta como a principal beneficiária da saída de Lula da disputa pelo Planalto nas eleições de outubro. Sem o ex-presidente na disputa, ela alcança 16% das intenções de voto e fica muito perto de uma vaga no segundo turno. Apesar do cenário favorável, nem a Rede, sua legenda, e nem a própria Marina traçaram estratégias para fidelizar o eleitorado órfão a partir da saída do petista do páreo. “O voto não está em uma cesta do Lula ou da Marina. O eleitor 34
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dá seu voto e depois recolhe para si próprio. Ele tem que votar em quem acredita”, desdenha a própria pré-candidata. O deputado Aliel Machado (Rede-PR) vê com naturalidade a transferência de votos de Lula para Marina Silva, por terem histórias de vida parecidas. Mas reconhece que é preciso consolidar essa herança para construir uma candidatura forte. “Apesar de a Marina ser uma candidata conhecida, hoje ela é maior que a Rede. O partido é pequeno, mas ela tem muito potencial e força política. Precisa consolidar isso”, afirmou.
OS OBSTÁCULOS
Com estilo discreto, muito criticado por opositores que a acusam de só aparecer em ano eleitoral, Marina terá que superar pelo menos três barreiras para se firmar como legatária dos votos de Lula: pouco tempo de propaganda no rádio e na televisão, estrutura partidária frágil e menos recursos para financiar a campanha – a Rede deve receber cerca de R$ 10,7 milhões do fundo eleitoral, o 22º maior valor entre os 35 partidos registrados no TSE. Para isso, nas últimas semanas, os articuladores de sua candidatura entabularam conversas na tentativa de ampliar o leque de alianças. Se não lançarem candidatos próprios, o PPS
A Rede, de Marina, ainda não traçou estratégias para fidelizar o eleitorado lulista. Ideia, agora, é ampliar alianças
A trAjetóriA de MArinA InfânCIa dIfíCIL Nascida em um seringal próximo a Rio Branco, no Acre, em 1958, Maria Osmarina Marina da Silva Vaz de Lima é filha de um seringueiro e uma dona de casa. Vivendo em meio à precária produção de borracha, sobreviveu a doenças como hepatite, leishmaniose e malária. Aos 16 anos, mudou-se para a capital acreana onde foi alfabetizada pelo Mobral
e o PSB são alvos em potencial. Setores do partido defendem a união com legendas com as quais ela se coligou em 2014: PHS, PSL e PRP. O problema é que o PSL já está de casamento marcado com Jair Bolsonaro, que hoje margeia os 20% nas pesquisas, restando apenas o papel passado. “É cedo para afirmar, mas não vejo a Marina como favorita nesta eleição”, cravou Murilo Hidalgo, do Instituto Paraná Pesquisas. O maior obstáculo, no entanto, reside no próprio comportamento da ex-ministra do Meio Ambiente. “É uma pessoa maravilhosa, séria e encantadora. Mas não é fácil lidar com ela, politicamente falando. A postura, muitas vezes, é de anti-candidata”, reclama um conhecido apoiador. Ela pouco viaja pelo País, aparece de vez em quando em programas de televisão e se comunica mal com o eleitorado. Quando demonstra desenvoltura, o faz pelas redes sociais. É naquele ambiente que Marina se sente mais confortável para disparar ataques aos partidos tradicionais. “PT, PSDB, PMDB e DEM precisam de quatro anos sabáticos para reler seus programas. São partidos que deram suas contribuições, mas se perderam no apego ao poder”, escreveu. Foto: Marcelo chello/cJPress/FolhaPress
A vocação de herdeira de Marina começou no Acre, na década de 80, quando ela conheceu o líder seringueiro Chico Mendes, então presidente do Sindicato dos Seringueiros de Xapu. Foram muito amigos e companheiros de luta por anos. Juntos, fundaram CUT do Acre, em 1985. No ano seguinte, Marina se filiou ao PT e compôs chapa com Mendes: ela se candidatou à deputada federal e ele a deputado estadual. Ambos foram derrotados. E o movimento dos seringais desidratou. Na eleição de 1988, Marina se elegeu vereadora por Rio Branco. No mesmo ano, Chico Mendes foi assassinado. Em 2014, Marina era a vice na chapa do ex-governador de Pernambuco, Eduardo Campos. Um acidente aéreo levou à morte de Campos ainda no início da campanha. Marina, então filiada ao PSB, assumiu o posto e concorreu à Presidência. Cresceu nas pesquisas e, em alguns cenários, apareceu em segundo lugar, à frente de Aécio Neves (PSDB-MG). Apesar de conquistar 22 milhões de votos, não chegou ao segundo turno. Mudar a história é possível, mas exigirá da candidata mais do que apenas gerir um legado que ela sempre deixou escapar por entre os dedos.
EnTrada na pOLíTICa Professora de ensino médio, Marina debutou no movimento sindical e fundou a CUT no seu estado ao lado do ativista Chico Mendes. Filiouse ao PT na década de 1980. Na primeira eleição da qual participou, em 1986, foi derrotada na disputa por uma vaga na Câmara Federal. Dois anos depois, elegeu-se vereadora de Rio Branco SEnadOra prECOCE Depois de um mandato como deputada estadual, Marina foi eleita ao Senado Federal. Com apenas 36 anos, tornou-se a senadora mais jovem da história da República ELEIçõES 2010 E 2014 Lançou-se candidata à Presidência da República pelo PV. Apesar da pouca estrutura, conquistou o coração de quase 20 milhões de eleitores. Em 2013, tentou registrar no TSE a Rede Sustentabilidade, mas não conseguiu a aprovação. Filiou-se, então, ao PSB, sendo incorporada à chapa de Eduardo Campos como candidata a vice. Após a morte do pernambucano, em trágico acidente aéreo, assumiu a cabeça de chapa. Chegou a liderar as pesquisas, mas despencou na reta final e não chegou nem ao segundo turno
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Brasil/Distrito Federal DESMORONOU Junto do viaduto que caiu em Brasília, desabou a credibilidade das autoridades
Um descaso monumental
Uma combinação de negligência e omissão das autoridades leva ao desabamento de um viaduto numa das principais vias de Brasília. Se nada for feito, o pior ainda pode estar por vir: outras áreas da capital federal estão condenadas
Tábata Viapiana
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queda de um viaduto na Galeria dos Estados, numa das áreas mais movimentadas de Brasília, seguiu o roteiro perfeito de uma tragédia anunciada. Foram pelo menos sete alertas de especialistas, desde 2009, sobre a necessidade de reparos urgentes na estrutura do viaduto que cedeu na terçafeira 6. Um relatório concluído em 2012 pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal (TC-DF) apontou os riscos da estrutura precária do viaduto. O alarme, no entanto, foi sucessivamente ignorado pelas autoridades do DF. Nada foi feito. Infiltrações, vibrações e rachaduras visíveis - tudo passou incólume pelo governo, como se fossem problemas triviais incapazes de afetar alguém. A tragédia só não foi maior por um capricho do destino: apesar dos quatro carros esmagados, além de um restaurante atingido pelo asfalto que cedeu, o desabamento não fez vítimas – os 20 minutos que faltavam para o horário do almoço, em geral de pico, foram suficientes para deixar completamente vazio o local destroçado, como se uma força superior tivesse 36
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afastado os transeuntes com a mão. Um verdadeiro milagre. O inconcebível é viver numa capital condenada a ficar a mercê de milagres por omissão e negligência do poder público, comandado por servidores públicos sustentados com dinheiro público. A Defesa Civil não descarta novos desabamentos, e por isso, o local foi completamente isolado. Parte do Eixão Sul, principal via da cidade que liga as regiões norte e sul, ficará interditado pelo menos até o próximo dia 19. Para tentar correr atrás do prejuízo, que só não foi maior por obra e graça do acaso, os órgãos responsáveis estão elaborando um plano emer-
“A barragem do Lago Paranoá corre o risco de desabar em breve” Luiz Carlos Botelho, presidente do Sindicato da Construção Civil
Foto: Pedro Ladeira/FoLhaPress
gencial para a recuperação da estrutura danificada. “O DER, a Novacap e a Secretaria de Infraestrutura vão atuar juntos. Vamos fazer um escoramento desse viaduto e uma análise criteriosa da estrutura”, informou o diretor-geral do DER, Henrique Luduvice. Como em casos dessa natureza, as autoridades correm atrás do próprio rabo, na vã tentativa de remediar o desastre.
O cONcREtO RachOU
Muito vaiado pelo público que acompanhava o atendimento à ocorrência, o governador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) admitiu sem corar a face que o viaduto não tinha passado por manutenção. Rollemberg, que está no último ano do mandato e vai concorrer à reeleição em outubro, chegou ao cúmulo de mencionar a idade de Brasília para justificar a tragédia. “Brasília é uma cidade feita de concreto e que está envelhecendo”, disse. Não convenceu a população. Até porque Brasília é a segunda capital mais nova do País e vai completar 58 anos no dia 21 de abril. Só perde para Palmas, no Tocantins, fundada em 20 de maio de 1989. Pode piorar. Auditorias do Tribunal de Contas do Distrito Federal constataram a precariedade de edificações públicas de Brasília. Um relatório mostrou que 13 de 15 lugares visitados não dispunham de “nenhum plano de manutenção”. Foram observadas rachaduras e infiltrações em estruturas como pontes e viadutos. No fim da semana, o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil, Luiz Carlos Botelho, fez um vaticínio ainda mais dramático. Segundo ele, a barragem do Lago Paranoá, o principal lago que corta cidade, também corre o risco de desabar em breve. “A barragem foi feita para conter e formar o lago, não é uma estrada para circularem as cargas verticais da mobilidade urbana. Há questões estruturais fortes.” Sim, será preciso corações fortes. Na cidade dos monumentos, o descaso é monumental.
por Rodrigo Constantino
Carnaval do setor públiCo
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vida é dura, especialmente para o brasileiro, e o leitor tem total direito de relaxar um pouco no clima carnavalesco. Mas o assunto aqui é muito sério, e se trata do carnaval do setor público. Os privilégios da casta superior que ocupa os cargos de governo são simplesmente insustentáveis, e sem uma reforma liberal nossa economia estará fadada ao abismo. Existe algo muito perto de uma luta de classes no Brasil, mas os capitalistas não são os exploradores, como queria Marx, e sim os explorados, ao lado dos trabalhadores. São eles que precisam ralar dobrado para sustentar um Estado inchado, com muitos marajás. Não há onde essa discrepância seja maior do que nas aposentadorias. O rombo da Previdência dos servidores públicos está chegando a incríveis R$ 300 bilhões! Em todas as esferas de poder há déficits crescentes, e a aposentadoria consome parcelas significativas da arrecadação fiscal. A conta não fecha. Ou algo é feito agora, ou será catastrófico nosso amanhã. Os privilégios da casta que O governo Temer parece ter desistido da reforma previdenocupa o governo são ciária. A Prefeitura de São insustentáveis. Sem uma Paulo, por sua vez, ainda insiste na batalha, apesar de forte reforma liberal, nossa economia estará fadada ao abismo resistência dos grupos de interesse. O déficit do Regime Próprio de Previdência Social do Município de São Paulo foi de quase R$ 5 bilhões em 2017 (mais de 10% da receita municipal), e a gestão de João Doria apresentou um projeto de lei na Câmara de Vereadores para reformular o sistema e trazer os servidores públicos para um regime autossustentável, sem privilégios. A reação, claro, não tardou. Os sindicatos de servidores, especialmente da educação, já estão anunciando greve e mobilizando seus vereadores para o confronto inevitável. Mas para bancar essa farra dos servidores, a sociedade paga o pato. O valor que sobrou para investimento na cidade foi de apenas R$ 1,1 bilhão. Faltam obras, políticas públicas do interesse de todos, pois os funcionários aposentados consomem o grosso do orçamento. A solução não pode vir do aumento de arrecadação, pois o Brasil já tem imposto demais, e isso representa um fardo enorme nas costas de quem produz riqueza. Além disso, as despesas com os aposentados crescem em ritmo bem maior do que as despesas com os servidores ativos. Há um problema estrutural, que simplesmente não pode ser solucionado com mais receita. Trocando em miúdos, ou o Brasil enfrenta o problema dos gastos públicos com coragem e transparência, ou teremos problemas econômicos ainda mais graves em breve. O carnaval pode estar animado, mas depois vem a realidade. E a dura realidade é que o carnaval do setor público impede o povo trabalhador de ser feliz durante o resto do ano. Passou da hora de declarar guerra aos privilégios do setor público. A opinião do colunista não necessariamente reflete a posição da revista
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Comportamento/Capa
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A FOLIA POLITIZADA PROTESTOS PARA TODOS OS GOSTOS
Brasileiro sai às ruas no Carnaval para se manifestar contra a situação política, brincar com a polarização ideológica e, principalmente, se indignar com a corrupção desenfreada
Denúncias contra a miséria, a corrupção e a crise política e moral entram no enredo das escolas de samba e dão o tom da maior festa popular do Brasil neste ano
A
Elaine Lobato e Giorgia Cavicchioli
realidade se impôs sobre a imaginação no carnaval deste ano. Desde 1989, quando a Beija-Flor de Nilópolis desfilou, no Rio, com seus “Ratos e urubus: larguem a minha fantasia” e um Cristo censurado, não se anunciava uma festa como essa, tão orientada para denunciar as grandes mazelas nacionais, como a miséria e a corrupção e para avançar, no ritmo do samba, nas referências ao atribulado momento político. O que se verifica neste ano é que a crítica social se aprofundou, assim como a consciência da crise moral que assola o país. A folia se politizou. No Rio de Janeiro, os protestos sociais aparecem em pelo menos três escolas de samba, que se sobressaem por apresentar enredos com questionamentos ao difícil momento nacional: Beija-Flor, Estação Primeira da Mangueira e Paraíso do Tuiuti. Em São Paulo, a Império da Casa Verde, com seu enredo baseado em “Os Miseráveis”, livro de Victor Hugo, destaca a luta contra a corrupção e os privilégios restritos a uma pequena parcela da população. Também os blocos enchem as ruas cariocas e paulistanas de gritos de guerra contra o cerceamento da liberdade, a volta da febre amarela, os auxílios dados aos juízes, a intolerância religiosa e de gênero e o preconceito racial. Fundada há 90 anos, a Estação Primeira de Mangueira, estréia, em 2018, no quesito samba politizado com o enredo “Com dinheiro ou sem 39
Comportamento/Capa
FESTA NOS BLOCOS Gritos de guerra contra o cerceamento da liberdade, a volta da febre amarela, o preconceito racial e os políticos
dinheiro, eu brinco” — e o alvo principal é o prefeito do Rio, Marcelo Crivella. “O momento político que o Brasil vive é muito delicado. Há uma influência da onda conservadora que extrapola a cultura da sociedade”, afirma o carnavalesco Leandro Vieira. “A chegada do prefeito Crivella ao Rio de Janeiro é isso. Ele representa o avanço da mistura explosiva entre política e religião, é o prefeito de uma cidade que tem uma festa libertária que ele não gosta.” O pomo da discórdia entre a Mangueira e Crivella é o corte das verbas destinadas às escolas de samba do Rio no carnaval deste ano. Segundo Vieira, o prefeito tentou justificar a medida com o argumento de que o dinheiro seria destinado para as creches municipais, o que revela uma visão errada do carnaval, que além de representar a cultura popular é uma enorme fonte de receitas para a cidade do Rio. “O enredo da Mangueira é um tributo à cidade, à sua essência festiva, seu caráter plural, mundano e livre. A Mangueira veio dizer que a rua é do povo e nosso enredo é um tributo à liberdade — tudo o que o prefeito não quer”, diz Vieira. O tom mais politizado e crítico dos desfiles deste ano, na avaliação dos próprios carnavalescos, tem relação com a renovação do público da festa, que busca uma maior conexão com o mundo real. Com seu enredo “Monstro é aquele que não sabe amar. Os filhos abandonados da pátria que os pariu”, 40
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a Beija-Flor pretende claramente atingir uma plateia mais jovem, que vai para o Sambódromo mas mal assiste aos desfiles porque não se interessa pelos temas apresentado pelas escolas. “Houve uma pasteurização do espetáculo que não gera atração”, afirma o coreógrafo Marcelo Missailidis, responsável pela concepção cênica da Beija-Flor. ”A preocupação de nosso enredo não foi só com o potencial cênico, mas também com um conteúdo que interesse. Falamos das preocupações de hoje: medo de viver em cidade grande, falta de confiança nos representantes políticos, abandono, angústia da população em todas as camadas sociais.” Em outras palavras, o desfile da escola poderia ser considerado uma grande manifestação política com invólucro artístico. E qual o significado do rato gigante que aparece em um dos carros alegóricos? “É o maior símbolo de corrupção do Estado do Rio. O rato representa toda a imundície, a sujeira da política hoje em dia. Aquilo que corrói a ética. Percebemos hoje que as decisões políticas sempre foram rodeadas por corrupção e ganância”, afirma Missailidis.
O PODER DO RISO
“O riso é uma arma muito poderosa”, diz o pesquisador do carnaval e professor de marketing de massa da Universidade Mackenzie José Maurício Conrado, para ele, o carnaval já traz embutida uma crítica social. “O desfile da Beija-Flor em 1989
FOTOS: LUIZ ACKERMANN / AGENCIA O GLOBO; LUIZ GOMES/FOTOARENA/AGÊNCIA O GLOBO; CRIS FAGA / FOX PRESS PHOTO; STEFANO MARTINI
BEIJA-FLOR Rato gigante faz menção às ratazanas políticas que saquearam os cofres públicos
PÁTRIA AMADA foi emblemático por conta do período histórico em que o País se encontrava”, afirma, relembrando a expectativa nacional pela redemocratização com as eleições diretas para presidente, que ocorreram no mesmo ano. Em 2018, ano eleitoral e de polarizações ideológicas, o ambiente social e político se tornaram perfeitos para esse tipo de abordagem. “O carnaval tem essa veia de crítica social. É normal que isso aconteça. Mas parece que este ano ele está mais sintonizado com essas questões”, afirma. “Elas apareceram com muita força porque há mudanças em curso.” O escritor e sambista Haroldo Costa, outro especialista em carnaval, afirma que temas políticos em sambas enredo
são frequentes: “Em diversas oportunidades as escolas realizaram enredos com alusões ou fatos políticos”, afirma. A lista remonta à década de 1950, com “O Grande Presidente”, da Mangueira, em 1956, e segue com “Heróis da Liberdade”, da Império Serrano, em 1969, “Kizomba, Festa e Raça”, da Vila Isabel, de 1988 e “Prestes, o Cavaleiro da Esperança”, da Grande Rio, em 1998. Costa faz questão de afirmar que as escolas de samba não são alienadas, como alguns insistem. Durante a Segunda Guerra Mundial, muitos enredos focaram na presença do Brasil no combate ao nazismo, lembrou. Segundo ele, “não há a menor dúvida de que as escolas têm contribuído de modo efetivo para realçar
“Monstro é aquele que não sabe amar. Os filhos abandonados da pátria que os pariu” BEIJA-FLOR DE NILÓPOLIS Vejo a liberdade aprisionada Teu livro eu não sei ler, Brasil! Mas o samba faz essa dor dentro do peito ir embora Feito um arrastão de alegria e emoção o pranto rola Meu canto é resistência No ecoar de um tambor Vêm ver brilhar Mais um menino que você abandonou Oh pátria amada, por onde andarás? Seus filhos já não aguentam mais! Você que não soube cuidar Você que negou o amor Vem aprender na Beija-Flor
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Comportamento/Capa
A HORA DA MUDANÇA “Com dinheiro ou sem dinheiro, eu brinco!” ESTAÇÃO PRIMEIRA DA MANGUEIRA
episódios e personagens que os livros escolares pouco ou nada registram.” A questão racial e o imperativo da liberdade do homem entrará em discussão no samba da Paraíso do Tuiuti. O enredo “Meu Deus, Meu Deus, Está Extinta a Escravidão?” tem como pano de fundo a Lei Áurea e trata da exploração do homem pelo homem no decorrer das civilizações. “Mostra que o negro que era açoitado ficou preso na favela e é marginalizado. Acorda às 3h da madrugada para pegar o ônibus às 5h e ir trabalhar por menos de um salário mínimo, diz Thiago Monteiro, diretor de carnaval da escola. “As críticas não são personificadas em um governo, mas sim em um sistema no qual as grandes corporações exploram o ser humano pagando salários indignos. Nosso enredo é, na verdade, um grande tratado da exploração humana”, afirma.
REFERÊNCIA AO PANELAÇO
Em São Paulo, a escola de samba Império de Casa Verde ocupará a avenida com o propósito de fazer o público se divertir e pensar. O tema do enredo é “O povo: a nobreza real” e trata da revolução francesa. Mas é impossível ouvir a composição e não relacionar com o cenário 42
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Chegou a hora de mudar Erguer a bandeira do samba Vem a luz à consciência Que ilumina a resistência dessa gente bamba Pergunte aos seus ancestrais Dos antigos carnavais, nossa raça costumeira *Outrora marginalizado já usei cetim barato* MANGUEIRA Crítica ao prefeito *Pra desfilar na mangueira* Crivella: mistura explosiva A minha escola de vida é um entre política e religião botequim Com garfo e prato eu faço que se vê no Brasil. O meu tamborim tema é histórico e atuFirmo na palma da mão, cantando laiálaiá al: muitos com pouco Sou mestre-sala na arte de e poucos com muito. improvisar As diferenças sociais Ôôôô somos a voz do povo são bem destacadas no embarque nesse cordão enredo, nos carros alePra ser feliz de novo góricos e nas fantasias. O samba canta as regalias das classes dominantes e a pobreza do povo, que se revolta contra essa situação e provoca uma revolução. No desfile, a ideia da escola é mostrar que o povo venceu os desafios e terminou comemorando em uma grande festa: o carnaval, é claro. De acordo com o carnavalesco Jorge Freitas, a relação com o período histórico e a atual situação do Brasil foi proposital, mas ele afirma que a escola não quer tomar nenhum partido. Segundo ele, a intenção é mostrar que o povo unido é forte. “Só mudou o tempo. O povo, no boca a boca, tem força. Se ele se unir, no nosso reino há justiça”, afirma. Em um dos carros, inclusive, a escola irá trazer o que ficou conhecido como “panelaço”: “Quem estiver assistindo, vai estar se vendo. É histórico e contemporâneo”, afirma. Freitas também explica que uma das ALEGORIAS DA CRISE Enredo da Paraíso do Tuiuti tem como pano de fundo a Lei Áurea e trata da exploração do homem pelo homem
obrigações da arte é trazer uma reflexão para a sociedade e que a intenção dele não é ser nem “coxinha” nem “petralha”, mas mostrar que muitos anos se passaram e pouca coisa mudou em relação à liberdade, igualdade e fraternidade, que é o lema da revolução francesa. “O povo se manifesta através da alegria. Quem dera que eu não precisasse falar disso em um enredo”. Um dos onze compositores do samba da Império, Luciano Godoi, explica a intenção da letra: “A gente queria passar, de alguma forma, essa mensagem de que isso aconteceu lá atrás, mas está acontecendo hoje”. VEM PRA RUA Em determinado momento, “O povo: a nobreza real” a música convoca: “Vem pra IMPÉRIO DA CASA VERDE rua”, slogan que ficou conhecido nas manifestações de “Quem sou eu na ‘selva de poder’? 2013. De acordo com Godoi, Mais um ‘bobo da corte’ a padecer “não é que a gente quis exalSem desfrutar da riqueza tar um grupo, mas é para Que a realeza tem pra oferecer mostrar que quando o povo No ‘Reino das Regalias’ vai para a rua, ele consegue A poesia é nossa arma pra lutar tomar as rédeas.” Contra o carrasco da injustiça No pré-carnaval de São Na monarquia impera a corrupção Paulo, o bloco Acadêmicos E nos banquetes, toda a fidalguia do Baixo Augusta, um dos Desperta a insatisfação maiores e mais disputados
É chegado o momento, surge um movimento A batalha acabou de começar Na alma da gente a esperança continua Vem pra rua
IMPÉRIO DA CASA VERDE Muitos com pouco e poucos com muito: destaque para a desigualdade
FOTOS: CUSTODIO COIMBRA; MARCO ANKOSQUI
da capital, trouxe a mensagem “É proibido proibir”, referência aos movimentos de contestação de 1968. Em vários momentos era possível ouvir os foliões cantando músicas de protesto como “Para não dizer que não falei das flores”, de Geraldo Vandré, e “Apesar de você”, de Chico Buarque. As canções ficaram famosas durante o período da ditadura militar, quando a censura atingia também o carnaval. Cheios de artistas, os trios elétricos do bloco passaram pela Rua Consolação, no centro de São Paulo, com discursos poderosos sobre liberdade de expressão. Em um dos carros, artistas de grupos de teatro da região central fizeram uma performance em que apareciam nus. A cantora Maria Rita cantou “Como nossos pais”, música de Belchior que se tornou clássica ao ser interpretada pela mãe dela, Elis Regina. Em vários momentos, os foliões também participaram das manifestações e gritavam “Fora Temer” e “Volta Lula”.
CARNA TRÍPLEX
O ex-presidente condenado a 12 anos e 1 mês de detenção também é mote da folia. Foi marcado para o terça-feira 13, às 14h, o “Carna Tríplex”. Organizado pelo grupo Mobilização Brasil, o evento acontecerá em frente ao Edifício Solaris, no Guarujá, onde fica o apartamento que Lula recebeu indevidamente da OAS. Não será a primeira vez que o condomínio vira palco de uma manifestação de foliões. No sábado 3, jovens simpatizantes de Lula realizaram um churrasco em frente ao condomínio para homenagear o ex-presidente. O evento foi batizado de “Churras no Tríplex do Lula” teve carne, farofa e camisetas vermelhas. Além das escolas de samba e dos blocos, outra forma de politizar a folia apareceu nos centros de comércio popular, caso da região da Rua 25 de março, em São Paulo. Como em anos anteriores, máscaras de políticos estavam à venda junto às tradicionais fantasias para os foliões. As figuras que mais aparecem são os ex-presidentes Lula e Dilma, o juiz Sergio Moro, o “japonês da Federal” e o ministro do STF Gilmar Mendes. Ainda que as vendas não estejam tão em alta, as máscaras, que custam a partir de R$ 4, continuam funcionando como alegoria pessoal para os foliões que querem brincar e protestar ao mesmo tempo. 43
Comportamento/Violência no Rio
Jeremias Moraes † 13 anos
Emily Sofia † 3 anos
Baleado quando jogava bola no dia 6/02, durante um confronto na comunidade Nova Holanda
Morreu em 6/02 baleada em uma tentativa de assalto em Anchieta, na Zona Norte do Rio
Morreu atingido por uma bala em 3/12, no Morro do Juramento
Caíque Lucas † 13 anos Baleado na cabeça ao lado do pai quando voltava de uma festa em Duque de Caxias, em 10/9
Renan Macedo † 8 anos Baleado na noite de 3/9 quando seu pai tentou fugir de um arrastão em Duque de Caxias
Morto em 30/7, um mês após ter sido baleado ainda na barriga da mãe, em Duque de Caxias
Paulo Henrique † 13 anos
Maria Eduarda Alves da Conceição † 13 anos
Fernanda Adriana Caparica Pinheiro † 7 anos
Morta dentro do Colégio Daniel Piza, em Acari, durante confronto
Brincava em casa, na favela da Maré, quando foi baleada
Baleado na barriga dentro de cada em casa durante um tiroteio no Complexo do Alemão em 25/4
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Eduardo Henrique de Carvalho † 10 anos
Bebê Arthur
Fotos: reProdUção
iNOcENtES
Vítor Gabriel Leite Matheus † 3 anos Atingido por uma bala quando brincava na sala de casa
ASSASSiNAdOS Mortes de duas crianças em menos de 13 horas no Rio de Janeiro se soma a outros dez casos semelhantes em 2017, expõem o descontrole da segurança pública e revela a negligência das autoridades na tarefa de proteger os cidadãos Eliane Lobato e Luisa Purchio
Vanessa dos Santos † 11 anos Atingida por uma bala perdida durante confronto em Lins de Vasconcelos, Zona Norte do Rio
Sofia Lara Braga † 2 anos Vítima de bala perdida quando brincava na companhia do pai, policial militar do 16º Batalhão
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mily Sofia Neves Marriel, de 3 anos, morreu após ser baleada em uma tentativa de assalto em Anchieta, Zona Norte do Rio de Janeiro, por volta das 2h30 da terça-feira 6. Ela estava dentro do carro da família, que saía de uma lanchonete em um posto de gasolina quando foi surpreendida por bandidos da comunidade da Pedreira. Segundo a Polícia Civil, o carro foi atingido por doze disparos. Poucas horas depois, Jeremias Moraes da Silva, 13 anos, jogava bola quando foi baleado no peito durante um confronto entre traficantes e policiais no Complexo da Maré, também na Zona Norte do Rio. Um dia após a comoção pela morte trágica de Emily e Jeremias, João Pedro Soares da Costa, de 4 anos, levou um tiro nas costas quando andava, de mãos dadas com o pai, em São Gonçalo, Região Metropolitana do Rio. Os dois estavam a caminho da igreja. Traficantes que controlam a área atiraram contra um veículo e uma das balas atingiu o menino, que teve parada cardíaca. Seu estado era grave até o fechamento desta edição. As mortes de crianças às vésperas do carnaval se somam a outras dez registradas em 2017 nas mesmas circunstâncias – incluindo a do bebê Arthur, morto ainda no útero da mãe. Elas escancaram o descalabro da segurança pública no Rio de Janeiro, refém de uma violência crescente e contra a qual o poder público se mostra incapaz de dar uma resposta minimamente digna. Emily e Jeremias compõem o retrato mais cruel de uma inocência assassinada. Palco da maior festa popular do planeta, que reúne centenas de milhares de turistas no Sambódromo para assistir aos desfiles das escolas de samba, a Cidade 45
Comportamento/Violência no Rio
cenas de guerra Bandidos circulam armados em meio à população na Cidade de Deus, onde uma operação integrada das Forças Armadas e da polícia mobilizou 3 mil homens na quarta-feira 7 (abaixo). Uma semana antes, tiroteio levou pânico à Linha Amarela
Maravilhosa sucumbe a uma falência que não é apenas financeira, mas moral e política. Em outubro, diante de uma onda de violência incontida que vitima também policiais – foram 137 PMs mortos em 2017 – o secretário do Estado de Segurança, Roberto Sá, anunciou: “Nós vamos virar esse jogo. O Rio de Janeiro, o Brasil, precisam entender que segurança pública é prioridade, que é uma atividade que precisa de investimento, precisa de estratégia. E esses criminosos, verdadeiros inimigos da sociedade, não vão ter descanso”. O secretário deveria convencer primeiro seu superior imediato, o governador do Estado do Rio, Luiz Fernando Pezão, para quem a segurança pública não parece ser prioridade. Questionado sobre a aplicação do plano do Governo Federal que define ações e responsabilidades para enfrentar a criminalidade, Pezão disse não ter tido tempo de ler o documento elaborado pelo general Sérgio Westphalen Etchegoyen, ministro-Chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência. “O general Etchegoyen me passou o documento ontem. Mas eu tive uma reunião ontem em Brasília com outros governadores e com o presidente [da Câmara] Rodrigo Maia para tratar de diversos assuntos que beneficiam os estados. Então, eu não pude, ontem, analisar esse documento”, afirmou Pezão. O desinteresse pelo assunto já seria um descaso com os cidadãos. Para piorar, o secretário de segurança afirmou que o plano do Governo Federal não trará nenhuma novidade. “O que vai ser anunciado pelo governador e pelos 46
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90# falso MTat alit lan ut wis nit, quamet alit, quipit, veliquis adigna aliquat. Ut
90# falso MTat alit lan ut wis nit, quamet alit, quipit, veliquis adigna aliquat. Ut
AS vítimAS
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crianças mortas por balas perdidas OS REFORÇOS
600 homens da Força Nacional de Segurança
137
policiais mortos em confrontos
mil 1,5 policiais civis e
militares em regime de horas extras
Fotos: Zilmar sebastião de melo; Fabio motta/estadao; WiltoN JUNior/estadão CoNteúdo; Fabio GoNçalves/FotoareNa
ministros é a formalização do que já vem sendo feito”, disse Roberto Sá. Uma semana antes, o ministro da Defesa, Raul Jungmann, tentou minimizar a violência no Rio, afirmando que há “um certo sadismo” da mídia ao noticiar o assunto. Como se as mortes de crianças não falassem por si. Depois dos confrontos que fecharam avenidas da cidade nas últimas semanas e das mortes de Emily e Jeremias, Pezão decidiu reagir. Ele anunciou que o Regime Adicional de Serviço (RAS), que permite o pagamento de horas extras a policiais militares e civis, seria retomado na sexta-feira 9. O objetivo é colocar entre 1,5 e 2 mil policiais a mais nas ruas durante o carnaval para garantir a segurança. As medidas são paliativas. Servem apenas para arrefecer uma população que em breve irá às urnas. Na prática, a mãe que tiver a sorte de não ter o filho baleado continuará contando apenas com a fé após a quarta-feira de cinzas. “Existe uma associação entre políticos e criminosos com troca de benesses que permite que eles atuem desse modo”, diz o tenente-coronel Adilson Paes de Souza, que trabalhou durante trinta anos na Polícia Militar do Estado de São Paulo. Para o coronel José Vicente da Silva Filho, ex-secretário nacional de Segurança Pública, “é preciso refazer o planejamento de segurança do estado. Quando há muita força tática, é porque não há planejamento”. Ele entende que a prioridade é controlar a corrupção na polícia, além de um trabalho de inteligência que combata a logística do crime organizado.
esTado BIPolar
A culpA é dA mídiA?
“A cidade do Rio não é a mais violenta do país. mas se a gente vir os nossos noticiários, os nossos jornais, parece que é” Luiz Fernando Pezão, governador do Rio de Janeiro
“Há um certo masoquismo na divulgação da violência no Rio” Raul Jungmann, ministro da Defesa
Enquanto a solução parece distante, a população vive acuada. “O carioca está em estado bipolar”, diz o advogado João Francisco Xavier Pires, 36 anos. E explica: “Vivemos, alternadamente, a euforia, a alegria do carnaval e, também, a tristeza, o pânico e a insegurança devido a violência.” Sem uma saída que traga de volta a segurança, muitos pensam em sair da cidade. Segundo levantamento feito pelo instituto DataFolha em outubro, sete em cada dez moradores do Rio desejam se mudar para um lugar menos violento. Os causadores dessa tragédia, na opinião dos ouvidos, são a péssima gestão do governo e, claro, a bandidagem. Vânia Moraes, mãe de Jeremias, não se conforma com a tragédia: “Era um menino de ouro, abençoado. Que vocês nunca sintam o que estou sentindo. Agora, infelizmente, meu menino será apenas mais um nessa estatística.” Devastado, o pai de Emily, Cristian da Silva Neves, 21 anos, reuniu forças e deu uma declaração ontem, após o fechamento do caixão: “Nada vai trazer ela de volta. Então, só me resta pedir justiça.” Nenhum plano de segurança poderá operar o milagre de trazer de volta as vidas dos inocentes assassinados na guerra do Rio. Mas seria um alívio e tanto para os cidadãos ao menos imaginar que podem sair de uma lanchonete, jogar futebol ou ir para a escola sem temer que uma bala interrompa suas vidas. 47
Comportamento/Crime
Condenação do médico Larry Nassar, nos Estados Unidos, a 360 anos de reclusão por abuso sexual de atletas serve de exemplo para o esporte brasileiro e acende sinais de alerta sobre o que ocorre nas categorias de base do futebol e de outras modalidades Vicente Vilardaga
Assédio no espor
S
e existe um esporte no Brasil no qual poderia acontecer algo semelhante ao que se vê agora nos Estados Unidos, onde o médico Larry Nassar, condenado a 360 anos de prisão, assediou centenas de jovens ginastas, inclusive campeãs olímpicas, é o futebol. Suas categorias de base e as escolinhas são ambientes de risco para crianças e adolescentes por serem lugares que ainda estão longe de serem bem controlados. Pelo menos é nisso que acredita o ex-goleiro Alexandre Montrimas, de 36 anos, que atuou na Portuguesa, no Bragantino e em times de Portugal e do Chipre. Ele teve de lidar com tentativas de abuso ao longo da carreira, além de ter presenciado vários casos desse tipo em seus tempos de formação. Autor do livro “Futebol: sonho ou ilusão”, Montrimas encabeça hoje uma campanha permanente do Sindicato dos Atletas Profissionais do Estado de São Paulo contra o assédio e diz que, apesar de grave, o problema ainda é enfrentado com frouxidão. No final do mês, a campanha de esclarecimento será reforçada por um vídeo com depoimentos de mais de uma dezena de jogadores consagrados. “Em todos os clubes de futebol no Brasil existe o assédio sexual”, diz. “Não há um jogador que não saiba, não viu ou não tenha passado por uma experiência dessas.” O assédio sexual é uma praga do esporte brasileiro e mundial que só agora começa a ser combatida com mais energia. Montrimas já fez palestras para jogadores de todas as idades em mais 48
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monstro Larry Nassar é condenado por abusar de centenas de jovens ginastas
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de 40 clubes. Seu objetivo é prevenir o desvio. Grandes times, como Grêmio e Corinthians, já tiveram suas imagens arranhadas em tempos recentes por causa de problemas em suas bases. O último caso de pedofilia no esporte aconteceu no interior de São Paulo, no município de Ribeirão Branco, em setembro do ano passado, quando o treinador de futebol infantil Altamir Pontes de Matos, de 34 anos, foi acusado de estuprar 18 meninos com idades entre 8 e 11 anos. Exames feitos pelo Instituto Médico Legal confirmaram que as crianças foram vítimas de assédio, atos libidinosos e violência. Matos trabalhava como voluntário em um projeto social e ensinava futebol para 60 crianças.
zonA DE rIsCo Categorias de base do futebol são um campo fértil para os assediadores
ais — ele tinha a reputação de ser o melhor médico para ginastas dos Estados Unidos. Além disso, existe o receio dos jovens de que a resistência ao assédio cause prejuízos para sua carreira de atleta. “Para jogar, o menino muitas vezes está disposto a qualquer coisa. Os pais jogam os filhos aos leões e estão mais preocupados com o fato de ele ser titular ou não do que em saber o que ele está fazendo quando não está no clube ou com A ForÇA DA AUtorIDADE quem está andando”, afirma Martorelli. “O assediador é normalmente alguém que tem auPara o psicólogo João Ricardo Cozac, presidente da toridade sobre o jovem”, afirma o presidente do Sindi- Associação Paulista de Psicologia do Esporte, o caso de cato dos Atletas Profissionais, Rinaldo Martorelli. “E Nassar mostra que os pais devem ter uma maior paressa autoridade, somada à vergonha e ao medo da ticipação na prática esportiva dos filhos e não deixá-los retaliação, faz com que haja o silêncio da vítima.” O apenas sob responsabilidade de treinadores e equipes caso de Nassar mostra que o silêncio é frequente nessas técnicas. “O distanciamento da família é algo que consituações. Primeiro porque jovens atletas muitas vezes tribui para que se criem situações de assédio”, diz. Os não sabem que os toques que estão recebendo são garotos deixam a convivência familiar muito jovens inaceitáveis — Nassar alegava que se tratava de parte para viver em alojamentos sem o acompanhamento do tratamento médico. Há também uma relação de familiar de adultos. “Esse caso dos Estados Unidos tem admiração pela pessoa que está exigindo favores sexu- tudo para ensinar para gente. Ele ilustra bem o que acontece nos bastidores do esporte e porque não há denúncias”, afirma Montrimas. “Aqui no Brasil aconte“Não há um jogador que não ceram casos de garotos irem denunciar e serem mansaiba, não viu ou não tenha dados embora dos clubes. Precisamos mostrar que o passado por uma experiência caminho do assédio é um caminho errado e impedir que esses garotos sejam induzidos ao erro.” Embora o de assédio sexual” Alexandre Montrimas, ex-goleiro de futebol futebol seja um terreno mais fértil para o assédio, o Brasil tem exibido casos recentes em outros esportes. Na própria ginástica houve uma denúncia, em 2016, um mês antes do início das Olimpíadas. O técnico Fernando de Carvalho Lopes, que treinava o ginasta Diego Hypolito, foi acusado de abuso sexual pelos pais de um atleta menor de idade. O processo que investiga o abuso corre em segredo de Justiça. Há também o conhecido caso da nadadora Joanna Maranhão que sofreu abusos sexuais na infância de seu treinador, a pessoa ConFIAnÇA em quem mais confiava. O ataque deixou A nadadora Joanna marcas profundas e atrapalhou sua carreira e Maranhão sofreu assédio de seu treinador seu desenvolvimento psicológico.
Foto: Lucas Lima/uoL/FoLhapress
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Gente
por Eliane Lobato
Saudade pura!
Foi uma década na secura, mas este ano Juliana Paes volta a desfilar na Sapucaí, no Rio. “É saudade pura de desfilar, gente!”, diz a Rainha de Bateria da Grande Rio. “Sou apaixonada por carnaval, o som da bateria é uma orquestra. Me emociona, empolga, fico feliz ali”, disse à GENTE. A atriz e musa nacional só lamenta que os festejos de Momo estejam sem apoio oficial. “Essa festa tem a função de devolver a alegria às pessoas, pena que o nosso prefeito não concorda muito com a gente. Ele acabou com o ensaio técnico, que levava tanta gente à avenida. Carnaval é festa que dá emprego. Todos deviam visitar um barracão de escola de samba para ver a quantidade de pessoas que estão trabalhando, batendo prego, colando paetês, fazendo arte.”
Cinco por cinco
Para comemorar três décadas de carreira, o ator e produtor cultural Maurício Machado fará um monólogo com cinco cenas, cinco personagens diferentes, escritos por cinco autores distintos – entre os quais, Walcyr Carrasco e Heloísa Périssé. Será “Festa – a Comédia”, que estreia em abril, em São Paulo. “Fazer as pessoas rirem neste momento cinzento do país é quase um ato revolucionário. Então vai ser uma celebração.” 50
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FOTOS: SÉRGIO BAIA; LAÉRCIO LUZ; DANILO BORGES
Barbie Black reage A rapper MC Soffia tem 13 anos e acaba de lançar seu novo single, “Barbie Black”. A continuação deste texto poderia ser alegre, já que ela faz sucesso. Mas, infelizmente, a menina entrou para o rol de vítimas de racismo em redes sociais. Um dos comentários maldosos, assinado por “marieechloe”, chama a menina de “cabelo sujo cheio de caspa.” Idolatrada por crianças por cantar músicas contra preconceitos de gênero e cor, Soffia reagiu: foi com a mãe, Kamilah Pimentel, registrar um Boletim de Ocorrência por injúria no Decradi, em São Paulo, semana passada. “Racismo é crime e não pode passar batido”, disse a mãe da menor.
Desfile de lindezas Elas balançaram seus pezinhos de top models, e muitas vão cair no camarote N1, no Sambódromo carioca. Entre elas, Lais Ribeiro, a piauiense que é Angel da Victoria’s Secret; Valentina Sampaio, a primeira top model transgênero capa da revista Vogue, de Paris; Barbara Fialho, namorada do cantor Lenny Kravitz; a americana Jasmine Tookes, que vem conhecer o carnaval brasileiro, e Fernanda Liz,, que agora declara amor à meditação, objeto de estudos da top em Nova York, onde mora. Também no espaço, a atriz, cantora e comediante Samantha Schmutz fará sua estreia na folia: “Estou muito animada com o fato de cantar pela primeira vez no carnaval. Quando eu tinha 9 anos, desfilei ao lado da minha mãe na Mangueira e, agora, 30 anos depois, volto com muita energia e gratidão, ao lado de Preta Gil e Dudu Nobre.”
Missa para Clarice Eduardo Wotzik comemora um ano de apresentações da peça “Missa para Clarice”, que passou por 18 teatros e realizou 200 apresentações para mais de 35 mil pessoas em São Paulo, Brasília, Belo Horizonte e outras capitais. Dia 23, retorna ao Rio, onde estreou. O fundador do grupo TAPA levou 20 anos gestando o espetáculo e explica: “Todos os meus projetos consomem décadas. Ideias que começam a me perseguir, que vão chegando, me chamando, me acordando de madrugada, tomando café comigo. Com a Clarice Lispector não foi, nem podia ser diferente.” 51
Economia/Finanças
DíviDa crescente Dayan precisou recorrer ao cheque especial: pagou várias parcelas e ainda deve mais que o valor do empréstimo
Por que o crédito continua caro? Os juros básicos da economia estão no patamar mais baixo da história: 6,75% ao ano. Apesar disso, as taxas cobradas pelos bancos seguem extorsivas Luisa Purchio
O
Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central reduziu na quarta-feira 7 a taxa de juros básicos da economia brasileira, a Selic, para 6,75% ao ano. Foi o décimo primeiro corte consecutivo, levando a taxa ao menor patamar da história. Há dois anos, estava em 14,25%. A queda constante da Selic é um ótimo indicador da saúde econômica do País: com juros menores, as empresas têm mais condições de financiar os investimentos necessários para crescer. Mas enquanto a taxa de juros básicos caiu pela metade, o mesmo não vem ocorrendo com o custo do crédito ao
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consumidor — pelo contrário. Os valores cobrados pelos bancos para quem usa cheque especial ou parcela a fatura do cartão de crédito continaram crescendo. Em dezembro de 2017 as taxas eram, respectivamente, 323% e 169,2% ao ano. O resultado prático dessas taxas é o aumento das dívidas de quem pega dinheiro emprestado e não consegue honrar os pagamentos. “Eu comecei com uma dívida de R$ 4 mil no cheque especial. Já paguei várias parcelas e ainda devo quase R$ 5 mil”, diz a designer Dayan Rubian, que precisou de um empréstimo bancário ao mudar de casa. A situação é semelhante à do médico Rodrigo Couto, que resolveu empreender e, após esgotar o crédito consignado, recorreu ao cheque especial e ao FOTO: GABRIEL REIS
cartão rotativo. “Peguei R$ 40 mil e, em cinco meses, a dívida subiu para R$ 132 mil. Hoje gasto metade da minha renda com o pagamento dos empréstimos”, diz ele. O custo do crédito é exorbitante no Brasil e suas consequências diretas são reprimir o poder de consumo das famílias e impedir o crescimento da economia. “O mercado nunca se orgulhou e não se orgulha das taxas”, diz Ricardo de Barros Vieira, diretor-executivo da Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs). “A realidade leva a isso porque, em caso de inadimplência, por exemplo, todo o custo recai sobre os bancos”, afirma. O argumento das insti-
com uma resolução do Conselho Monetário Nacional, que caiu o número de clientes enforcados no rotativo do cartão de crédito, modalidade com um dos mais altos juros. Desde abril de 2017, os bancos devem transferir para o cartão parcelado os clientes há mais de 30 dias no rotativo. Agora se espera um posicionamento da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) sobre o cheque especial. “Estamos aguardando uma autorregulação”, diz Fernando Rocha, chefe do Departamento de Estatísticas do Banco Central (BC). “O que se imagina são linhas de educação financeira que levem a não utilização do crédito mais caro, somadas a normas que limitem seu uso”, diz ele. Os bancos, por sua vez, parecem não estar com “Hoje os cinco maiores bancos respondem por pressa. “A Febraban elabora propostas para melhorar o instrumento e as anunciará, neste mais de 80% das operações de crédito do País” ano, quando forem concluídas”, afirmou a insIone Amorim, economista do Instituto de Defesa do Consumidor tituição por meio de nota. A Secretaria de Comunicação da Presidência esclareceu que o tuições financeiras perde força quando os números mostram governo não está preparando mais medidas além das já tomaque a inadimplência está em queda. Mesmo com o consumi- das e que não existe a possibilidade de reduzir os juros dos dor honrando suas dívidas, as instituições financeiras não bancos estatais para influenciar o mercado. abrandam o valor dos juros. A diferença entre o custo do Enquanto os consumidores aguardam as regulações, há dinheiro para o banco e o quanto ele cobra do cliente é co- uma nova opção cada vez mais atraente: as fintechs, instituinhecido como spread bancário – e o Brasil possui um dos ções que oferecem taxas mais baixas por trabalhar com spreads mais altos do mundo. Por último, e esse pode ser o custos menores do que os dos bancos — e também por não fator mais importante, está a concentração do mercado, que deixar que os maus pagadores entrem. “Nosso spread tamimpacta no lucro das instituições. “Hoje os cinco maiores bém é muito menor, de apenas 5%”, diz Marcelo Ciampolini, bancos respondem por mais de 80% das operações de cré- CEO e fundador da Lendico, que oferece empréstimos de R$ dito do País. Eles praticamente determinam as regras do 2,5 mil a R$ 50 mil por uma taxa que varia de 38,78% a 117% mercado”, diz Ione Amorim, economista do Instituto de ao ano. É o momento dos bancos prestarem mais atenção Defesa do Consumidor (Idec). em suas práticas de crédito, eis que novas alternativas estão Para tentar tornar o sistema financeiro mais saudável, os surgindo como opção mais interessante para o consumidor, agentes reguladores estão de olho no setor bancário. Foi assim, já cansado de ser refém do endividamento.
6,75%
JUrOs estratOsFÉricOs
Taxa básica de juros cai, mas ainda não beneficia consumidor
500% 450% 400% 350% 300% 250% 200% 150% 100% 50% 0%
é a taxa Selic anunciada em 7/02
323% Selic dez 2015
Consignado dez 2017
Não-consignado
Cartão parcelado
Cheque especial
Cartão rotativo
foi a taxa anual de juros do cheque especial em 2017
Fonte: Banco Central
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Tecnologia/Espaço EM ÓRBITA O Tesla Roadster de Musk, com o manequim Starman, em órbita a caminho do cinturão de asteróides
GIGANTE O Falcon Heavy é o mais poderoso foguete em atividade; só perde para o Saturn V, aposentado em 1973
Um carro rumo às estrelas
lidado de Starman, em homenagem ao compositor David Bowie (morto em 2017), e a mensagem “Don’t Panic”, referência à obra de Douglas Adams, autor da série “O Mochileiro das Galáxias”. O projeto todo é impressionante, mas seu principal atrativo é o custo baixo. Lançamento do foguete Falcon Heavy com um automóvel O lançamento custou US$ 90 milhões, apenas 20% do previsto para lançar o SLS, a bordo dá início a uma nova era espacial, mais barata e foguete que a Nasa está desenvolvendo com um objetivo ambicioso: levar o homem a Marte para viagens fora da órbita terrestre. Para André Sollitto cortar despesas, Musk reutiliza os propulsores, normalmente descartados a cada e o futuro da vida na Terra parece voo. Os dois laterais usados no Falcon pousaram “É um pouco incerto, é compreensível que o ser suavemente perto da base de Cabo Canaveral, na bobo e humano olhe para as estrelas em Flórida, logo após o lançamento de terça-feira. divertido, mas busca de um novo lar. Depois do coisas bobas e VISIONÁRIO lançamento do Falcon Heavy, na terça-feira 6, o Como uma versão em carne e osso de Tony sonho de chegar a outros planetas pareceu um divertidas são Stark, o bilionário que se transforma no Homem pouco menos distante. O voo de teste mostrou importantes. que a espaçonave criada pela SpaceX, empresa Queremos uma de Ferro nas histórias em quadrinhos, Elon Musk tem dedicado boa parte de sua fortuna, estimada privada do bilionário Elon Musk, dá início a um nova corrida em mais de US$ 20 bilhões, a criações que parenovo capítulo nas viagens ao espaço. espacial.” cem saídas de um filme de ficção científica. PreFoguete mais poderoso em atividade, o Elon Musk, CEO e ocupado com o futuro da humanidade, sua Falcon Heavy perde apenas para o Saturno V, fundador da SpaceX principal missão é estabelecer uma colônia em responsável pelas missões Apollo que levaram Marte. Mas seus outros interesses incluem projeastronautas à Lua, aposentado desde 1973. É tos de energia renovável e até um sistema de uma versão robusta do Falcon 9, usado há altransporte de passageiros e carga de alta velociguns anos para transportar carga ao espaço. Ele dade, o Hyperloop. Se o lançamento do Falcon foi pensado para levar um carro a Marte, o Heavy serve de exemplo, o futuro segundo Elon Tesla Roadster também criado por Musk. O Musk tende a ser bastante interessante. veículo foi equipado com um manequim ape-
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fotos: spaceX via ap; peteR paRKs/afp
Medicina & Bem-estar/Neurologia
Marca-passo contra o Alzheimer Implantado no cérebro, aparelho retarda a evolução da doença e atenua sintomas como falhas de raciocínio e de memória Cilene Pereira
A experiência de Ohio é a primeira a testar sua aplicação clinicamente contra a doença de Alzheimer. Nesse caso, o implante foi feito no lobo frontal. Uma das afetadas pela doença, a região é responsável por funções como julgamento, tomada de decisão e planejamento de ações. Foram apenas três pacientes, entre elas LaVonne Moore, 85 anos. Antes do implante, ela não conseguia mais cozinhar ou se vestir. Hoje, dois anos depois, faz isso sem a ajuda do marido, Tom — além de continuar tocando piano, uma paixão.
EFEITO POTENCIAL
ROTINA LaVonne segue tocando piano, uma de suas atividades preferidas
É
um marca-passo como o colocado no coração. A diferença é que ele foi implantado no cérebro e, pela primeira vez, melhorou a qualidade de vida de pacientes com a doença de Alzheimer. Médicos da Universidade de Ohio, nos Estados Unidos, anunciaram os primeiros resultados de um experimento pioneiro baseado no uso de eletrodos para controlar o avanço da enfermidade. As conclusões apontam uma perspectiva promissora, especialmente no auxílio para a realização de tarefas como se vestir, arrumar a casa, fazer comida, ler ou praticar hobbies cultivados ao longo da vida. Coisas simples para quem não tem a doença, mas desafios para seus portadores. “Estamos otimistas”, disse à ISTOÉ o neurocirurgião Ali Rezai, um dos coordenadores do projeto. “Ficamos surpresos em ver como o método melhorou os sintomas.” Marca-passos são usados para regular a transmissão de sinais elétricos entre uma célula e outra nas áreas onde são implantados. Sem o equilíbrio no fluxo de eletricidade, o funcionamento nessas regiões fica prejudicado. Na neurologia, os dispositivos têm sido utilizados com sucesso no tratamento do Parkinson, atenuando sintomas como tremores e falta de coordenação motora depois de serem colocados em estruturas cerebrais relacionadas a essas funções. 56
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É cedo para avaliar a importância que o recurso ganhará na luta contra o Alzheimer. “São ainda poucos pacientes e é preciso saber, por exemplo, o custo que ele terá”, afirma o neurologista Denis Bichuetti, membro da Academia Brasileira de Neurologia. Apesar das ponderações, o neurocirurgião Murilo Meneses, do Instituto de Neurologia de Curitiba, acredita no potencial do método. “Ele tem um valor enorme. Abre uma nova possibilidade de tratamento”, diz o especialista. Meneses foi um dos primeiros do Brasil a implantar marca-passos contra o Parkinson e acaba de concluir um artigo no qual apresenta as coordenadas para a implantação dos aparelhos na mesma área agora usada como alvo pelos pesquisadores americanos. Nos EUA, o próximo passo é ampliar o número de pacientes estudados.
CHOQUE DO BEM
O aparelho modula a transmissão de sinais elétricos
IMPLANTE O eletrodo é colocado no lobo frontal, área responsável por funções executivas e cognitivas como planejamento, soluções de problemas e tomada de decisões NEUROESTIMULADOR Conectado ao aparelho, é implantado sob a pele. Ele regula a emissão dos estímulos elétricos enviados ao eletrodo FOTO: COURTESY THE OHIO STATE UNIVERSITY WEXNER MEDICAL CENTER
Internacional/Venezuela
PODER Enquanto a população não tem acesso a alimentos e remédios, Maduro luta para continuar no cargo
Uma moeda que nada vale Sem um plano para conter a inflação que atingiu 2000% em 2017, governo venezuelano anuncia fim do controle cambial e desvaloriza o bolívar em 99% André Sollitto
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pós 15 anos de controle de câmbio, o governo da Venezuela anunciou uma nova plataforma cambial que resultará em uma desvalorização de 99,6% do bolívar, a moeda do país. O subsídio estatal foi instituído em 2003 com a promessa de evitar uma crise. O que aconteceu foi justamente o contrário. Nesses anos, criou-se uma distorção entre o câmbio oficial e a realidade. No mercado paralelo, um dólar pode ser trocado por 230 mil bolívares. Durante muito tempo o governo não quis acabar com esse controle cambial para não mostrar como a moeda havia se desvalorizado. A crise econômica e a inflação acumulada, que chegou a 2.000% em 2017, parecem não preocupar o presidente Nicolás Maduro, interessado apenas em manter o poder a qualquer custo. O líder venezuelano antecipou as eleições presidenciais para o final de abril. Inicialmente, o pleito seria realizado no segun-
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do semestre. A antecipação seria uma forma de esvaziar as chances de sucesso da oposição, completamente desorganizada após uma tentativa de boicotar as eleições municipais de dezembro do ano passado. A estratégia de boicote não deu certo e resultou na consolidação do poder de Maduro.
CalamiDaDE
Enquanto o presidente destrói a economia de seu país, a empobrecida população venezuelana é castigada de forma inclemente. Os alimentos estão cada vez mais escassos e muitos doentes permanecem sem acesso a medicamentos básicos. A criminalidade aumentou e os sequestros e latrocínios se tornaram comuns. O cenário de desordem provoca uma fuga em massa. Muitos vêm parar no Brasil. Só em Boa Vista, Roraima, já são 40 mil refugiados – número suficiente para que tenha sido decretado estado de emergência. Na falta de uma política eficaz para atender o fluxo de imigrantes, resta aos venezuelanos viver em abrigos, dividir casas como se fossem cortiços Números ou morar nas ruas. da crise A situação é tão grave que os Estados Unidos já ameaçam invadir 2.000% a Venezuela. O presidente americafoi a inflação oficial em 2017 no Donald Trump passou a adotar um comportamento mais agressivo 228 mil contra o governo de Maduro e sibolívares é a nalizou a intenção de levar seu cotação do dólar exército ao país, mas a proposta no mercado negro não foi bem recebida. Agora, o secretário de Estado, Rex Tillerson, 99,6% está viajando pela América Latina foi a desvalorização do bolívar com a nova tentando criar uma frente unificada plataforma cambial para impor ainda mais sanções a Maduro. Até agora, no entanto, 34% essas sanções não têm tido o efeito é a queda do PIB nos esperado pelos EUA. últimos quatro anos
Cultura
livros CiNEMA EM CArtAz
livros
estudantes Em 1961, Dan Edwards e Peter samson jogam spacewar! na tela PDP-1: videogame e minicomputador pioneiros
Como a diversão moldou o mundo Brinquedos e engenhocas aceleraram mudanças históricas e avanços científicos, segundo o historiador steven Johnson Luís Antônio Giron
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progresso, a riqueza e as inovações estão ligadas ao esforço e à luta pela sobrevivência. “A necessidade é a mãe da invenção”, diz o ditado. É o que reforçam as teorias
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biológicas, sociais e econômicas mais influentes ao explicar a história a partir de uma abordaagem utilitária. Mas elas não parecem captar a ilusão e o prazer como ferramentas de mudança
histórica, pois colocam em plano inferior os brinquedos, os jogos, o consumo e a gastronomia. Felizmente, as explicações estão erradas. Pelo menos é o que pensa o historiador de tecnologia
1 americano Steven Johnson, de 49 anos, autor de dez livros, entre eles “Cultura da Interface” (1997), obra pioneira na reflexão sobre a confluência midiática na era digital. No livro mais recente, “O Poder Inovador da Diversão“, lançado pela editora Zahar, Johnson inverte o ditado clássico e demonstra que o prazer pode ser pai da
fotos: computer history museum, kean collection/archive photos/getty images; de agostini picture library/bridgeman images; grey villet/the life picture collection/getty images; ©victoria and albert museum; ©the trustees of the british museum/art resource, ny, divulgação
de aMenIdades a InOVaÇÕes 1. rei otto iv joga xadrez
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inovação. Nesse sentido, a história do entretenimento é tão ou mais decisiva que a do trabalho árduo. “Descobertas aparentemente triviais acabaram por gerar mudanças no domínio da História Séria”, afirma. Johnson chama isso de “efeito beija-flor”, “o processo pelo qual uma inovação em um campo põe em movimento transformações em campos aparentemente não relacionados”.
sonho futuro Assim, o hábito do café virou moda no século 18 e ajudou a dar origem a espaços culturais públicos e às modernas empresas jornalísticas. As primeiras lojas decoradas, instaladas em
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Londres para atrair as damas seduzidas pela chita indiana, deflagraram a Revolução Industrial e os shopping centers. O Escritor, autômato de 1772 que espantava as plateias porque escrevia (era movido a corda), prefigurou a Máquina Diferencial e os primeiros robôs. Jogos como o xadrez forneceram o modelo combinatório às tecnologias atuais. Em 1961, dois estudantes do MIT, Dan Edwards e Peter Samson, apossaram-se das regras do xadrez — e em ficção científica — para construir o PDP-1 e o Spacewar!, minicomputador e videogame pioneiros. Fundaram a linguagem de
com uma dama em miniatura do século 14: regras do jogo forneceram modelos à programação de softwares de computadores e videogames. 2. ilustração da revista “the lady’s Magazine”, 1774: lojas londrinas decoradas atraíram compradoras de tecidos e abriram caminho à revolução industrial. 3. o southdale Center de Minneapolis, 1956, foi o primeiro shopping center, criado pelo vienense victor Gruen como utopia urbana. 4. As projeções das fantasmagorias nos século 18 anteciparam cinema, tv e vídeos pela internet. 5. Gravura de uma “turba de cafeteria” de 1710: os cafés promoveram a transformação cultural e a convivência em espaços públicos.
programação de softwares e aplicativos. Como, então, entender por que a simples recreação dispara motivações inconscientes? Para explicar a razão, Johnson cita o historiador francês Jules Michelet, que dizia que cada época prevê a seguinte sob a forma de sonho. A necessidade de surpresa é quase tão importante como a da sobrevivência. Nos anos 1990, os cientistas concluíram que o instinto de surpresa é regulado por um neurotransmissor — O POdeR de BRInCaR Em seu livro mais recente, o autor americano desvenda o fascínio humano pela diversão
a dopamina — responsável pelo “bônus da novidade”. Os jogos e as diversões, afirma Johnson, não passam de máquinas de produzir novidade e surpresa. As experiências inéditas suscitadas pela diversão não se relacionam aos instintos. “A fome ou a necessidade de ligações sociais podem ser satisfeitas por uma fonte confiável de alimento ou de amigos próximos”, diz Johnson. “Mas a surpresa exige sangue novo: o milagre de uma geração já é notícia velha para a geração seguinte.” O que faz a humanidade avançar é romper os hábitos por meio do prazer, da expectativa e do sonho. 61
cinema
Na pele de um atleta abatido O ator Jake Gyllenhaal conta como assumiu a dor de Jeff Bauman, corredor vitimado pelo atentado na Maratona de Boston de 2013 Elaine Guerini, de Zurique
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ake Gyllenhaal só conhecia Jeff Bauman pela fotografia que fez dele um símbolo de resiliência após o atentado durante a Maratona de Boston, em 2013. A imagem trazia o rapaz resgatado, de cadeira de rodas, após perder as duas pernas nas explosões. “Aquilo chocou o mundo. Quem conseguiu apagar aquela cena da memória?”, pergunta Gyllenhaal. O ator californiano de 37 anos certamente não conseguiu — o que explica ele ter escolhido a história de superação do sobrevivente do ataque terrorista para inaugurar a sua produtora, a Nine Stories. Por ter sido difícil encontrar investidores para “O Que Te Faz Mais Forte” , ele mesmo financiou a produção de US$ 30 milhões, que acabou estrelando. O filme está em cartaz no Brasil. “O que me interessou não foi o evento trágico que Jeff 62
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fato e filme Jake Gyllenhaal contou com o ex-atleta Jack Bauman para recriar o clima do atentado
vivenciou e a mídia repercutiu pelo planeta”, disse Gyllenhaal à ISTOÉ durante a 13a edição do Festival de Cinema de Zurique (ZFF). “Para mim contou aquilo que aconteceu depois, no âmbito doméstico, quando esperavam que ele assumisse a postura de herói, mesmo sendo incapaz de se levantar.”
coragem Com direção de David Gordon Green, o drama resgata a jornada física e emocional de Bauman, que apenas seis semanas após o atentado já deu os primeiros passos usando próteses. “Jeff
costuma dizer que, se ele fez isso, qualquer um pode fazer. Mas não acredito que eu teria sobrevivido a algo tão inimaginável.” Uma das cenas mais fortes do filme mostra o personagem no hospital, no momento em que o enfermeiro remove as suturas da cirurgia que amputou o que tinha sobrado de suas pernas. Como a câmera se posiciona no ombro do ator, o espectador tem a impressão de ter a perspectiva de Bauman, quando ele se deu conta mesmo de que tinha perdido as pernas. “A intenção não era chocar”, diz
o ator. “Apenas queríamos dar ao público a verdadeira dimensão da coragem que ele precisou ter para recomeçar a sua vida daquele ponto em diante.” Filho do cineasta Stephen Gyllenhaal e da produtora e roteirista Naomi Foner, o ator diz que reviver a trajetória de Bauman foi o seu trabalho mais difícil. Nem o caubói homossexual de “O Segredo de Brokeback Mountain” (2005), com o qual foi indicado ao Oscar de melhor coadjuvante, foi tão exaustivo emocionalmente. “Uma das piores coisas que tive de fazer foi perguntar a Jeff que tipo de tênis ele usava no dia do ataque. Nem posso imaginar a dor que a lembrança pode ter causado.” fotos: Chris Pizzello/invision/AP; divulgAção
em cartaz
por Luís Antônio Giron
EDUCAÇÃO Em “Lady Bird”, Christine (Saoirse Ronan) espera o momento de se livrar da casa paterna: atuação natural
STREAMING
Praia levada a sério
3 IndIcados tIpo “IndIe” CINEMA
E o Oscar vai para... as redes sociais A nonagésima premiação de Hollywood se curva à internet e destaca produções e bilheterias modestas porém virais, como o romântico “Lady Bird”
N
estes tempos em que visualizar tem mais influência que ver — e viralizar dá mais popularidade que vender ingressos —, chegou a vez das produções baratas que brilharam na mídia social tomar conta da festa do Oscar, em 30 de março. Filmes independentes e despretensiosos trazem tramas insólitas, híbridas ou delicadas capazes de gerar memes, “likes” e comentários em agregadores de críticas. Eles combinariam no passado com festivais alternativos, como o Sundance, e nada os credenciaria para o tapete vermelho dedicado a superastros. Entre os longas-metragens tipo “indie” que entram em cartaz (além de “A Forma da Água”), destaca-se “Lady Bird”, da diretora e atriz Greta Gerwig. A história de Christine (Saoirse Ronan), uma estudante interiorana de 18 anos que amarga a passagem para a idade adulta, estreou em poucas salas e arrecadou US$ 5 milhões nas primeiras semanas. Mas o sucesso nas redes sociais foi gigante. Além disso, obteve um raro índice de 99 % de aprovação no agregador de críticas Rotten Tomatoes. Acabou indicado em cinco categorias no Oscar. Os influenciadores digitais se tornaram jurados influentes no maior prêmio do cinema. 64
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“CORRA” O terror de Jordan Peele que conjuga terror e racismo teve orçamento de US$ 4,5 milhões. Mas conquistou seguidores no Twitter e quatro indicações ao Oscar .
Em “A Trama” (2017), o diretor francês Laurent Cantet (de “Entre os Muros da Escola”, de 2008) retrata uma oficina literária à beiramar onde ocorrem debates e disputas entre os inscritos, quase todos estudantes. Emergem os temas que preocupam a Europa atual, como migrações, racismo e perda de identidade. Disponível em serviços de streaming.
“MUDBOUND” Com quatro indicações menores, o drama sobre o racismo no Mississipi está gerando “likes” e memes. É produzido pela Netflix, e não por um grande estúdio de Hollywood.
“TRÊS ANÚNCIOS PARA UM CRIME” Mesmo com bilheteria mediana (US$ 41 milhões), o típico suspense do Meio-Oeste arrebatou sete indicações — e gerou uma união internacional de fãs internautas.
DOCUMENTÁRIO
Choque na zona rural
O filme “Paulistas”, de Daniel Nolasco, relata as mudanças e degradações em Catalão, zona rural de Goiás, conhecida hoje como “região dos Paulistas”. Ela passou de uma pacata extensão de fazendas para um ambiente agitado de agronegócios. Os agentes das mudanças são migrantes paulistas, que trocam o cavalo pela moto e o barco pela lancha.
fotos: divulgação; jerome prebois; daniel frota; mariana chama
RÁDIO
Oito capítulos para Jacob do Bandolim
SÉRIE
Uma família multicultural
“Como viver em harmonia em um mundo determinado em enlouquecer?” Este é o mote de Allan Ball, o produtor e idealizador da série “Here and Now”. Em dez episódios, ela conta a história de um casal de americanos progressistas que forma uma família multicultural, adotando crianças na Colômbia, Somália e Vietnã. Quando Greg (Tim Robbins, foto acima) reúne a família para festejar 60 anos, os problemas e as diferenças aparecem. HBO, estreia mundial em 11/2, às 24h.
EXPOSIÇÃO
Planeta às escuras Os artistas estão explorando várias disciplinas para provocar surpresas. Em sua mais recente aventura estética, o carioca Daniel Frota, de 29 anos, somou especulação filosófica, pesquisa histórica e reflexão artística. O resultado é um conjunto de obras — esculturas, vídeos, gravuras e instalações — que forma a exposição “Sol Preto”. Frota inspirou-se na expedição de cientistas britânicos em Sobral, Ceará, em 1919, para documentar um eclipse solar peculiar: por um segundo, o mundo inteiro ficou às escuras. Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, até 8/4.
A série “Vibrações— O Som de Jacob do Bandolim” da rádio Batuta celebra o centenário do músico carioca que morreu em 13 de agosto de 1969 aos 51 anos. Suas facetas serão contadas sob a forma de documentário em oito capítulos, com meia hora cada. O tradicionalista, o pesquisador e o virtuose são lembrados por Déo Rian, Paulinho da Viola e outros. Pedro Paulo Malta assina e apresenta os programas. Site radiobatuta.com.br a partir de 6/2. TEATRO
Peça vasculha a decadência “Baal” (1923), de Bertold Brecht, encena a involução do personagem-títiulo, de poeta a criminoso. A trama dá a deixa para a Cia. Les Commediens Tropicales e o Quarteto à Deriva montar “Baal. Material”, que dissolve o texto original em vários quadros estanques para discutir a decadência atual. Soma vídeo, arte e show em um cenário com 230 caixas baseadas na obra “Brillo”, de Andy Warhol. Galpão do Folias (SP), até 18/2.
aGenda
SÉRIE A sétima temporada de “Homeland”, em 12 episódios, confronta a agente Carrie (Claire Daines, foto) e a presidente dos EUA, vítima de tentativa de assassinato que prende 200 agentes. Carrie pede demissão e promete lutar por seus amigos. Fox Premium, estreia mundial em 11/2, 1h da manhã.
EXPOSIÇÃO Em “Auto”, o paulistano Carlos Nader volta à videoarte depois de uma década dedicando-se ao cinema. São seis obras, três delas em pareceria com o filho, Teo, que é autista. Galeria Lume (SP), até 17/3.
TElEvISÃO “Oscar Pistorius: Assassino Olímpico” é um filme inédito sobre o atleta sul-africano. Da glória na Olimpíada de 2012 à queda, no Dia dos Namorados de 2013, quando matou a namorada, a modelo Reeva Steenkamp (Toni Garm). Lifetime, 14/2, 22h. 65
Última palavra Mentor Neto
O POLIANO S
e tem uma coisa que me tira do sério é mesquinharia e pessimismo. Gente que só vê o lado ruim das coisas, sabe? Tudo tem dois lados, bonitão. Essa crise de otimismo começou com críticas aos nossos funcionários públicos. Gente que por ser tão sofrida, precisa se aposentar antes e em melhores condições. Qualquer um pode entender isso. Menos os pessimistas. Há quem crie caso até com o bônus de desempenho que alguns funcionários públicos recebem depois de aposentados, ô gente encrenqueira. Como se funcionário público não tivesse que desempenhar sua aposentadoria. Outra: não entra na minha cabeça como tem gente que encrenca com funcionários públicos que ganham 30 mil reais, recebem auxílio-pré-escola e auxílio-alimentação. Por acaso o filho de um funcionário público não precisa estudar? Ou o próprio funcionário não precisa se alimentar? Mas essa gente não tem limite. Encasquetam também com os deputados. Criticam o fato de também receberem benefícios considerados “exagerados”. Ah, pronto. Desde quando combustível, passagens aéreas, auxíliorestaurante, auxilio-moradia, auxílio-saúde, auxílio-dentista podem ser considerados benefícios? Olhem para o próprio umbigo, retrógrados. Vejam suas próprias benesses, ao invés de criticar as dos outros. Sobre suas pausas para o cafezinho ou para ir ao banheiro você não se lembra na hora de criticar o auxílio-farmácia, né? Os deputados merecem cada centavo que recebem porque são os pilares que sustentam nossa democracia. São homens dignos e responsáveis. Tanto é que na segunda-feira, dos 513 deputados, apenas 80 e poucos compareceram na Câmara, os outros 400 e tantos estavam em suas bases, escutando seus eleitores para continuar o exemplar trabalho que vêem fazendo. Mas os críticos sempre aparecem com uma nova bobagem. Agora a moda é pegar no pé de juízes famosos e escrutinar seus salários, como se isso fosse da nossa conta só porque são pagos com o nosso dinheiro. 66
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Auxílio-moradia, por exemplo, é o alvo da vez dos encrenqueiros. Dizem que só porque mora na mesma cidade em que trabalha, ou porque sua mulher, que também é juíza já recebe o tal benefício, o sujeito não deveria receber auxílio-moradia. Vão morar embaixo da ponte, nossos magistrados? É isso que querem os críticos? Será que quem critica não percebe a dificuldade que é para um juiz - no Rio de Janeiro, por exemplo — sobreviver com um salário de trinta e poucos mil reais? Será que essa gente sovina acha demais pagar para os juizes auxílio-saúde, auxílio-pré-escola, auxílio-educação, auxílioalimentação e auxílio-transporte? Ora por favor. Essa gente pessimista não se dá conta que o País não precisa mais se preocupar com essas pequenezas. O tempo passou. O Brasil mudou! Graças ao nosso presidente e sua equipe econômica, fechamos o ano passado com um prejuízo de apenas 129 bilhões de reais. Pense nisso, seu baixo-astral dos infernos. Uma economia de mais de 20 bilhões, já que nossa meta era um buraco de 150 bilhões! Mas essas vozes negativas ao invés de verem o copo meio cheio, insistem para os juizes apertarem o cinto, era só o que faltava. Outra coisa que essa raça de traidores da pátria insiste: a reforma da Previdência. Enquanto o presidente Temer luta diuturnamente, até liberando 10 milhões do seu dinheiro para que os deputados possam discutir e aprovar essa importante matéria, vozes dissonantes dizem que, se a reforma ficar para o ano que vem, a Previdência vai dar um prejuízo de 177 bilhões. E dai? E dai? Vejam o PIB, ingratos! Vejam o PIB. Com um PIB crescendo como o nosso, o que são 177 bilhões? Dinheiro de pinga, isso sim. Gente que fica martelando na mesma tecla do desemprego. Olham para os 13 milhões que estão desempregados há dois anos e esquecem de ver os milhões e milhões que continuam empregados. Desculpem o desabafo. Mas paciência tem limite. Tudo tem dois lados. Mentor Neto é escritor e cronista A opinião do colunista não necessariamente reflete a posição da revista