•11\15 • Cartas e outras rel1exoes sabre as raizes da musica popular brasileira
"Cordiais
sa uda~Ocs,
Como vai. Agcnor? I~c~o- I he l ice n~a
se
parc~o
inconvcnienlc
de t..'Screvcr-Ihc cssa carta chamando-o pelo nome de batismo. J<i busquei lanlO sobre a sua vida, que talvez me sima nesse dircilo. Sci que nao sou a primeira que Ihe escrc ve uma carta, nao Ihe rcmetc eo faz a oUlras pessoas, que igualmenlc possam Ihe admirnr. Eu nem mesmo sei a que
endcre~o
dcspachar. Mas nao me
queixo. Soube pelas suas mllSicas da sua ercnya. Urna
crcn~a
tao pum que me lcz
acredilar que, de algurna fomla. em algull1 lugar ondc csla agora e onde nilo ha
ender~o.
vtl i saber dessa hornentlgem.
A fi rml. como diria sua musica "quem tem
fe nao se eansa. nunca perde a espernnya.'¡
Ca.rta.s e outras reflexoes sobre as raizes da mlisica popular brasileira
Lutra.LIIZ
Ca.rta.s e outras reflexoes sobre 80S
raizes da mlisica popular brasileira
I'
e di ~Ao
• Feven iro de 2014
Capa Daniela Luz Diag rallla~1lo
Joiio Paulo Monteiro Infografia Nando Araujo Re visllo Rodrigo Naves
HENRI QUES, Laur!! Lnz Pe ssallha. C ordiai s San· da~Oes: cru1as e outras refl e:o;:oes sobre as raizes da lIlilSi· ca p opnlru' b.-asileira. 2014 . Tl1Ibalho de conc1l1siio de CIII"80 (g rad\la ~Ao em COllllllli c a ~Ao Social- JomalislIlo) - FAAC - UNESP, sob a oriellla~Ao do Prof Dr. Jmu'ez Taden de Panla Xav ier. 8alll1l , 20 14 .
FAAC Fliculdade deAI'quitetul'lII, Artes e Comunica{l'io Av Eng Luiz Edmundo Crurijo Conbe. 11° 14-01 Bain'o : VlIIsem Limpa.. 17033-360. Ballm/SP PABX: (14) 3103-6000
Aqradecimentos
A vida
e feita
de professores. De professores de
sabedoria, de felicidade, de humildade. E
ell SOli
fe, de
aIllor, de
grata a cada um desses
mestr es. Obrigada pOI', diretamente ou indiretamente, contribuirem para
este trabaUlO e para 0 que ell me tomei ao final desse cicio.
Assim, dedico meus mail; leais agmdecimentos <lOS ll1etlS profess(J1!S da vida: Aos mells pais, Gilena e Pessanha, por nada menos que tudo. Peia enl1"ega, pela confianp, pelo orgulho, pelo apoio em qualquer decisao e
pelo amor sem tim que distribuem em cada palavra e cada sorriso; A minha innit Luisa, pelo cuidado e pelo exemp lo, que sempre me motiva a fazer
0
melhor possive! em cada momento;
Aos meus avos, mestres da sabedoria, aos que eu ainda tenho a hoora da presew;a e aos que me protegem e me guimn espiritmlimente: VO Yara, vo Acac io, vo Pessanha e vo Lia; Ao meu namorado e melhor amigo, Desma, por me amarpor inteiro; Aos meus melhores amigos da vida por serem minha familia em Baum e no mundo inteiro, meu pmmo e meus lares fora de casa. Cirs, lu, Le, Giu, Mari, Luci, Teco, Dark, Lipe, Siri, Yas, Roots, Lili, Penny, Tere, Zaz, Baca, Amanda, Chanti, lason, Pinguim, Luquinhas, Lennon, Terd, Xuxu, Zezis, Luci Fraga, Ma e aos adjacentes e mascotes das
repllb licas Maria da Penha, CV e X ilindr o; Aos meus amigos de Cajun! e Brasilinha por supOitarem a distiincia e a fal ta de contato com muito cOinpanh eili smo e amor;
A tia Dane, pelo auxilio estetico e afetivo deste proj eto: Ao Rodrigo Naves, pela sabedmia dedicada na revisao te,,-'tua l e conceitual deste traba lho;
A amiga, v iz inha e colega de sala Van, pelas recomendaltoes e pelas UlspiraltiSes dadas ao longo de todo
0
processo de crialtao deste livro;
Ao meu ilmilo de alma e novo talento do planejamento grafico, MoJa, pela ajuda na confeqilo de varios elementos esteticos deste projeto;
A minh a amiga e colega Amanda Pioli e ao meu amigo e roommate , Cica, pel a ajuda na confecltilo deste relatOrio; Ao professor Juarez, que lmmildemente aceitou e, por vezes hom o· sas, agradeceu fazer palte dessa ideia, p or m e renovar de confi an\a em cada orienta\1I0 e pm' acreditar na minim competenc ia;
A Unesp e a todos os professc:('es do ClD'SO de Jomalismo que me ensiluu·· run de maJleira particular a respeitar 0 meu ClU"S O e runar a minha profissllo; Aos artistas que redescobri e aos que conheci, que dedicaram suas vidas ao ritm o e a hannonia emllome do aln or a mllsica; A voces, meus professores de alma e bondade, eu agradeJto pelos mOinentos felizes que me motivaram na confeqao deste trabalho. Afi· nal, cOin o ja disse Guimari'ies Rosa, a " felic idade se aella e em hor inhas de descuido" e
e descuidada que ell vivo os metlS melhores momentos
com voces.
-@ . h t, ~~""iJ-? @"''''' •.ao. i"'?- e.v..J4? t F t, iJ- v!.>tUJ. ..wh (tA
(tA ?
t, iJGratissima, Laura
..w.;..~ t.nt.. ~tUJ. .
Sumario
Prologo
17
I - canto das Tres R.aQaS
20
Multiculturallsmo, transcultursQii.o e a produQB,o cultural 23 o Brasil e sua gestaQ8,o como povo 26 As raizes da musics popular brasileira 31 A musics popular brasileira 35 II - Cordiais BaudaQoes, Ch iquinha
III - Cordiais BaudaQoes, C8rtola
44
64
IV - Cordiais BaudaQoes, Noel 94 V - Cordiais BaudaQoes, Assis 118 VI - Cordiais Bauda90es, Gonzagao 142 VII - Guia dos Ritmos VIII - HoI's do Adeus
168 192
Repert6rio do CD Coletanea 196 Referencias 202 Referencias fotograficas 204
Pr61ogo
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t.- I>Uo<F'
o Brasil e 0 povo, o Brasil
0
povo do Bnlsil t mmticultul'al,
e cultun, a (ultUni do Brasil e todo mundo
HOllve uma vez, quando ell tinha UIlS 14 anos, em que eu e uma amiga estavamos conversando sobre os nossos gostos musicais. "Que banda voce gosta mais?", ela me perguntou, " ah, Killers, Beaties, Arctic
â&#x20AC;˘ Trecho da musicil do gfmero sam ba, Rece o seame nto, composi~ao de Assis Valente, ilnD de 1940
17
Monkeys, Green day .. .", foi a minha resposta, que se seguiu pela mesma
Nada os impediu.
perglmta. A resposta dela nilo variou mllito e seguimos pensando no as-
Cordiai.s SalJdar;6es tem esse designo. Aproximar brasileiros de suas
sunto. " E mllsica brasileira, voce gosta de alguma coisa?", rebateu ela,
raizes e da uniao das cululras do nosso povo, e assim tenta extinguir
"nossa, pergunta dificil, so to ouvindo umas bandas assim mesmo, n ao,
qualquer tipo de replldio ao que e nosso na atualidade e que nos rep re-
pera, eu gosto de Los Hennanos!", respondi emp olgada. " Ah, verdade!
SeIlta de algUllla maneira, seja ca~ypso, arrocha, pagode, jimk, carillloo,
Eu tambem CUltO!", ela ultimoll, e foi assim que tenninoll um dos dia-
brega. Quem mostrar que tudo isso telll seu valor.
Para isso, decidi escrevel' a historia da mllsica de uma fOlllla dife-
logos mais vazios da minim adolescencia. Como duas meninas brasileiras podiam pensar dessa maneira? 0 que de "brasileiro" estava nos sendo oferec ido de para tamanha
pmdu~ao
musical
de sconsidera~ao?
de cartas pessoais e entrevistas ficticia s com
declara~oes
verdadeiras.
AI61l disso, elaborei Ulll gllia de ritmos, no qual e possive! descobrir
Acredito que minha "sa lva~ao" - mesmo antes da re d en~ao na faClildade - foi ser influ en ciada pela minim mae que, enquanto cosurrava pOl' di stra~ao
rente, tratando diretamente com os milsicos de quem falo , e11l fOlllla
nos fins de semana, colocava como trilha sonora mllsicas do
as caracteristicas, a origem geografica , a raiz etnica e as areas de maior ocon'encia de cada item relatado. ÂŁSpero que assim um bom apreciador da llllisica brasileira possa
Chico e, mesmo nao declaradamente, m e incitava a ouvi-Io. 0 caminho
descobrir novas fOllllaS de considerar
para a descobelta da mllsica popular brasileira estava aberto, so preci-
como eu aos 14 - possa passar a se interessar pelo teIlla e, qUelll sabe,
sava desbravar.
se lance profundameIlte n esse mundo de expressiio qlle niio lew pm:J,
Hoje, posso dizel' que SOli uma consideravel adm iradora da music a composi~oes
do m eu pais, dessas que ouveln
0
assunto, e Ulll desinfonnado -
nesse nnmdo da mllsica popular brasileira
feitas ha quase celn anos
por puro prazer. Eu, inclusive, consigo ver importfinc ia e, princ ipalmellte, idelltidade, ate e1ll bandas consideradas esteticamente vulgares e tecnicamellte pobres, afinal eu descobri que
0
Laura Luz Ballm, janeiro de dois mil e quatorze
que temos de mais origina l musical-
mellte, no Bras il, foi feito em larga escala pOI' artistas m arginalizados e com poucas opOltlinidades . Assis Valente, Caltola, Chiquinha Gonzaga, Luiz Gonzaga, Noel Rosa, todos e11frentaram Ulll mar de dificuldades para conseguirelll proval'
0
seu talento. E provaram. Pobre, negro, mulher, nordestino, feio. IS
'Trecho da musica do gen ero samba-exalta~lio, Brasil Pandeiro, composi~lio de Assis Vale nte, an o de 1940
19
Canto das tres ragas
Can/o das Ires rat;as MIll/ro Dllarte e Pcmlo Cesar Pi"Jreiro (1976)
l1v~~ 1tm. 44-~ .:k k1l.
4
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M~ J'~
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21
dJIL.4,
:j"'NL <L w:,;... k-4 J,t.c.<O,~tlL..i, J"<.iA -rt~ ~ =~ n~ a.Atv~
o estudo da mllsica popular no Brasil - ou em qualquer outro pais - precisa procurar a coesao entre a realidade soc ial e a historia de cada
EdL:r-~M
cultura. E antes de aprofundar tal estudo, um indicativo deve estar claro :
t9!- N- un.. ~ J"M ". r'" ~ tu.Jw.. ~"'" f"dL ~ CIUti:A.
Multiculturalismo, transculturag5es e a produgao cultural
em uma sociedade diversificada como a brasileira, cultura acaba sendo
0
0
que chamamos de
agrupamento de varias delas , que correspondem
a realidade de origens etnicas, camadas sociais e refert!llcias historicas.
t:lL rUn.
o resultado desse conjunto, passaremos a chamaI' de multiculturalismo. o multiculturalismo e, pOltanto, 0 resultado da diferen~a das identidades cultmais, da plmalidade eUlica e da divers idade racial de um detenninado
espa~o.
Se ciassificalmos as culturas como produto de mn contexto social, uma cultura posta em contato com outra fora do sell nllcleo social acaba tendo que fazer
c.
adapta~oes
para nao sucumbir e, assim, sobreviver
numa sociedade. Esse fenomeno de
~,~!- h
adequa~ao
pode ser classificado
E~n. Y't I"I"La..4 ~ "ir"l.(.t\. @~J..~
como transcultura~ao.
c..d4L
moldes a paltir de elementos extemos, envolvendo diferentes etnias e
ctUti.<1-.-
.0u.. wn..
ctUU:n. t:lL
tnlll scultura ~ ao
esta relacionada a u路ansfonnac;ao dos modelos
culturais loca is a partir da
ado~ao
de novos padroes, vindos de encon-
u路os interculturais e migrac;oes u路ansnacionais. E a u路mlsfommc;ao de
~ d..oM..
xf.~~
G,mn-
A
elementos culturais.
a.h.-~
Todos esses conceitos servem para que
0
estudo da mllsica popu-
lar brasileira esteja sintetizado em fenomenos que, basicamente, justi-
"m.. ~ t:lL rUn.
fiquem os acontecimentos gerais da sua hist6ria e ajudem na proposta 22
23
de discussoes muito mais profundas que as pmamente altisticas sobre
Pllblicos que ascende acreditando que
a mlIsica, trazendo a tona a influencia do poder politico- economico na
gosto das elites e na produ~ao intemacional.
produ~ao
cultmal e na
manuten~ao
de uma cultura de classes pouco
dos pensamentos do pesquisador brasileiro Jose Ramos Ti-
Entretanto, graps a intemet e as redes sociais, e possivel que muitas foram feitas e possam ser consumidas nos mais diferentes divulga~ao
nhorao em seu livro " Historia Social da Musica Popular Brasileira"
para uma
(1998), chegamos a refl exao de que
tradicionais e preciso um
pitalista detenuina
0
modo de
maior valor cultural esta no
das produ~oes culturais loca is escapem da comunidade ou nicho em que
respeitosa com a diversidade etnica.
A luz
0
0
fato de
produ~ao
0
Brasil ser lUll pais ca-
cultural dividido em diferentes
camadas da sociedade, e a diversidade cultural, que e tao vasta, acaba
mais pesada e uma conquista de esfor~o
espa~os,
espa~o
mas,
nas midias
sobre-humano e lUn desembolso eco-
nomico gigantesco para que a consagra~ao ou mesmo 0 reconhecimento sejam efetivados.
da cultura das elites deten-
o povo dependente da domina~ao economica e, consequentemente,
toras do poder politico-economico, a chamada cultma do dominador,
cultural e envolvido por uma ideia de univers alidade - que, segundo
e a cultura do dominado, aquela das classes mais baixas. AI6n disso,
Tinhorao (1998, p. 13), aquilo que se diz universal e, na realidade, 0 re-
domina~ao
gional de alguem imposto para todo mundo - que leva ao desprezo pela
intemacional, em que a capacidade de decisao nao depende somente
mllsica do seu proprio pais e, mais diretamente, a repulsa pela cultura de
dos detentores politicos do poder, mas tamb6n dos controladores in-
regiues distintas denlro da pr6pria na~ao ,julgada ultrapassada, pobre ou
temacionais da nossa economia, a propria cultma dominante revela-se
" brega" justamente por ser feita pelas camadas mais baixas da socieda-
uma cultura dominada, trata-se de um colonialismo cultural.
de e por refletir a realidade do seu "subdesenvolvimento".
sendo simplificada em apenas dois pianos:
0
como no Brasil ainda sofremos com a experialcia de uma
Ou sej a, a cultura das camadas mais baixas acaba sofrendo lUna dudomina~ao,
rela ~ao
Um bom exemplo disso e
0
desprezo por grande palte da regiao su-
a cultma das
deste pela cultura do norte e nordeste do pais, como se a ideia de supe-
elites e porque a cultura dominante fi-equentemente nem sequer e a na-
rioridade cultural imposta para um contexto intemacional e economico
cional.
fos se manifestado em menor
pia
pois se situa em desvantagem em
situa~ao
propor~ao
dentro do proprio pais. A lan
desfavorecida em que a cultura
disso, pode-se notar lUn contexto ainda mais segmentado dentro de uma
popular do pais foi colocada, ja que a cultura rea lmente representativa,
mesma cidade, como a repulsa das camadas mais altas de metropoles
Nesse contexto, e nitida a que traduz a realidade da a
imposi~ao
popu la~a o,
e a regional, que alem de enfrentar
das altas camadas socia is, tem tamb6n que lidar com lUila
nova classe media fonnada por ex-escravos, openirios e funcionari os 24
e megalopoles, como Sao Paulo e Rio de Janeiro, pelas
manifesta~oes
culturais feitas nas favelas enos mOiTOS. E por isso que se tem a impressao de que ate mesmo as camadas
25
populares e, principalmente, a classe media em ascensao, que tem lUll
dao vez a um povo novo.
carater de " comp lexo de atraso", parecem abandonar a sua identidade
N ovo pOi· diversos motivos : porque e um inedito genero hlUnano
cultural ou, ate mesmo, desconhecer a produ~ao musical local e aquilo
diferente dos outros, porque fonna um novo modelo de estmtura socia l
0 esfor~o
continuo
e economic a, com rec6n-adquiridos modelos de escravismo e de selVi-
da cultura popular e pelo orglilho da sua
dao ao mercado mundial e pOl·que aparece como uma etnia nacional e
cultura, estes, pOitanto, escapam do mal de se tomar lUll estrangeiro no
diferenciada de suas matrizes instituidoras, principalmente modificada
seu proprio pais.
culturalmente.
que faz palte da sua cultura. Cabe a alguns poucos s alva~ao
por lUn resgate e pela
A soc iedade e a cultura brasileiras foram, pOitanto, estabelecidas de caracter isticas proprias, com matrizes eillicas que se miscigenaram
o Brasil e
sua qestagao como povo
e nao se diferenciaram em minorias raciais, mas sim, fonnam uma unidade eUlica. Isso nao quer dizer que essa unidade seja unifonn e, ja que, n a~ao
al6n das diferencia~oes ecol6gicas e economicas de cada regiao, 0 Bra-
sao ellsinadas a todo brasileiro desde sua tellra imanc ia e passam a ser
sil recebeu, ao longo dos anos, outros varios novos contingentes Illun a-
verdades ab solutas e incontestaveis sobre a identidade do pais. Mas a
nos, sobretudo europeus, arabes ejaponeses.
As sequenc ias histOricas sobre
0
naSCimeilto do Brasil como
conclusao a que se chega depois de viajar por esses grandes fluxos da hist6ria e que os acontecimelltos sao inexplicaveis e
0
que realmellte
Dessa maneira, 0 " ser brasileiro" se diversificou em varios modos, que hoje selVem como nossa
clas s ifica~ao .
Os italo-brasileiros, os ni-
foi adquirido sao gellel·a liza~oes validas e suficientes para iluminar al-
po-brasileiros , os ca ipiras, os crioulos, os caboclos, os seltanejos e
glUnas passagells hist6ricas. A I6 n disso, como ja diria Darcy Ribeiro
outra infinidade de categorias e divel·sas
(1995 , p. 269), " nenillull povo v ive seln uma teoria de si mesmo. Se tem
~oes
uma antropologia que a proveja, improvisa-a e difunde-a no folclore" .
dllVida quanto a verdadeira " brasilidade".
Ele tamb6n explica a
fonna~ao
do povo brasileiro dizelldo que " surgi-
d ifel·ell~a S
regionais que, apesar de assiduas, elll nenhum momenta causam
N o plano cultural, algo que contribui para a
lmifonniza~ao
e para
diferell~aS ,
e a ur-
mos da confiuencia, do enu·echoque e do caldeamento do i.nvasor POltll-
difusao do modo brasilei.ro Selll, contudo, apagar as
gues com indios silvicolas e campi.neiros e com negros afi·icanos, uns e
baniza~ao ,
auxiliada pela
outros aliciados como escravos" (1995 , p. 19). Ou seja, desse encontro,
munica~ao
de massa.
eln que
0
europeu manteve-se no papel de regellte,
tradi~oes
culturais
diversas, fonna~ oes soc iais descompassadas e matrizes raciais distintas
26
vindas das adapta-
industrializa~ao
e pelas novas fonna s de co-
o processo de fonna~ao do povo brasileiro com sua unidade nacional Hao deve, pOl·6n, excluir todas as
27
contradi~oes
que existiram nessa
a~ao.
Essa unidade, alias, so foi consolidada de fato depois da indepen-
dencia, e nilo veio de fonna pacifica, mas sim, atraves de um processo violento de
unifica~ao
politica de repressao de toda tendencia separa-
Por essas razoes, e tao impOltante a consci&lcia historica do povo brasileiro quanto a sua tes pode transmitir
fonna~ao.
motiva~ao
A revolta a violencia dos dominan-
para que a
reordena~ao
social se fap
tista, inclusive de movimentos que, na verdade, eram apenas contra a
de alguma maneira, seja pOI" uma refonna politica, seja pOI" cOllvulsoes
oligarquia ou pro- republicanos.
sociais, como as vistas emjulho de 2013 nas mas brasileiras.
Alan disso, apesar de toda a beleza cultural e do resultado de lUn processo de
fonna~ao
sil criou e alimentou que as
diferen~as
de um povo invejavel por sua coragem, diferen~as
0
Bra-
sociais que sao mais insuperaveis do
etnicas, criadas pelo tipo de
processos violentos de repressao,
concentra~ao
estratifica~ao
feito por
de trabalho escravo e
genocidio, como explica Ribeiro:
°
espantoso e que os brasileiros. OrgUUIOSOS de sua tao proclam ada, como fal sa, ' dem OCl"llCia racial ', raramente percebem os profundos abismos que aqui separalll os estratos sociais. (... ) Os priv ilegiados simplesmente se isolal.ll numa balTeira de indiferenrra para com a sina dos pobres. cuja miseria repllgnante procuralll ignorar 011 ocultar numa especie de miopia social, que perpetua a altemidade. (RIBEIRO , 1995, p.24)
Esse qlladro de
indiferen~a
teve que ser abandOllado quando os po-
vos que foram desfavorecidos pela
estratifica~ao
seus direitos e sua liberdade, como foi
0
social Ilitavam pelos
caso dos indios e negros contra
a escravidao ou no episodio da GuelTa de Canudos. As classes dominantes, pOI' sua vez, sempre demonstraram medo diante de novos episodios que
amea~as s em
ten~ao ja
a ordem estabelecida, por isso tantas medidas de COlI-
foram feitas , desde a apatia ate as ditaduras.
28
29
As raizes da musica popular brasileira Mario de Andrade ja havia dito que "a mllsica popular brasileira e a mais comp leta, mais totalmente nacional, mais fOlte ra~a"
cria~1Io
da nossa
e n1l0 ha 0 que discordar. Por mais que se debata 0 resultado da
jun~1Io
de diversas influencias culturais, das diferentes etnias que for-
maram 0 chmnado povo brasileiro, nao ha platafomla mais representativa da cultura que a mllsica. Claro que, nesse casa, essa e uma
avalia~ao
pessoal de impOltan-
cia, mas se analisallllOs a quantidade de generos e ritmos propagados e quase CeIto que 0 elemento musica l da cultura e lUn dos mais vastos e populares eIltre os brasileiros. Para uma analise mais aprofundada sobre 0 asslmto, alem do debate critico da indllstria cultmal e do estudo da
fOllna~ao
do povo brasileiro
feitos neste capitulo, e impOltante analisar a cultma de cada povo que deu origem it etnia brasileira.
o primeiro povo a ocupar 0 territorio que hoje abriga 0 Brasil foi 0 indigena e eles ja apresentavam uma cultura totalmeIlte palticular e livre de influencias extemas, se diferenciando apenas llas peculiaridades de cada tribo. 0 livro Raizes da Mllsica Popular Brasileira (VASCONCELOS , 1991 ) traz lUll estudo profundo sobre a cultma musica l indigeIIa, apresentando desde os instnuneIltos ate os ritua is nos quais esses ritmos eram exibidos e difundidos. Como a proposta deste livro e 0 foco nos geJleros e ritmos resultantes do povo brasileiro que se fonnou da miscigena~1Io ,
n1l0 cabe voltar eIn todos os detalhes de cada etnia, mas e
impOltante que esteja claro que a cultura resultante e tanto do dominado 31
quanto do dominador, tendo maior valor a do dominado, que lutou pela sobrevivencia da sua cultura mesmo com a
imposi~ao
dos colonizado-
res por um novo modelo cultural, como teOliza Vasconcelos:
comum das pessoas lem sempre aiguUla razao para prolestar. (HOBSBAWM, 1990, p. 36)
A influencia da cultura negra no Brasil tem tanto valor quanto em
o rel ogio da mil sica popular brasileira dispara, teoricamenle,
paises como os Estados Vnidos, mas difere da que exerceu nos paises
nUUla le~ a- feim, dia 21 de abril de 1500. Mas se isso sera verdade para dllas das tres gran des contriblli~ oes iniciais - a do pOl1ugues e a do negro - e preciso nao esquecer que 0 Brasil j a possu!a a slIa propria milsica que era, nalural!nente, ados seus aborig enes. (VASCO NCELOS, 199 1, p. 14 )
vizinhos, das Americas do Sui e Central, que tem a i.nfluencia dos indigenas originais do telTitorio muito mais acentuada. 0 livro Sobrados e Mucambos (FREYRE, 2003) apresenta detaUladamente essa i.nfluencia negra no Brasil e os mais abomimiveis deboches e etnia, fato que, claramente, i.nfluenciou na
Os registros escritos da historia do Brasil, como ja deve estar claro, come~aram
a pmtir do periodo de
coloniza~ao
e por muitos anos apre-
Vma boa analogia que pode ser feita sobre 0
0
estudo da historia social do Jazz
e que, assim como a musica do Brasil, nasceu com grande influencia pela origem etnica africana. 0 livro Historia Social do Jazz, de Eric 1. dera~ao
0
preconceituosa e no
sentimento de superioridade que ate hoje existe nas classes dominantes, mesmo que de fonna menos escancarada. Freyre cOinenta no trecho
estudo da mllsica po-
nos Estados Unidos, que nao deixa de ser mllsica popular americana
Hobsbawm (1990) apresenta
da
abaixo a influencia africana na cultura do Brasil :
sentaram so a visao do dominador. pular brasileira e compani-la com
heran~a
desvaloriza~oes
nascimento do Jazz levando em consi-
as circunstiincias historicas que
0
fizeram e mostrando que lUn
genero !lascido em um telTitrn-io com varias inflllencias cliiturais nao sai totalmente puro de lUna so vertente, sendo essa a maior caracteristica da
Mas as tradi~oe s religiosas, como outras fonnas de cultllra, ou de cuitllras negras, para ca transp0l1adas ( ... ) e que vem resist indo mais profundamente, no Brasil, iI de safricaniza~ ao . Muito mais que 0 sang ue, a cor e a fonna dos hom ens. AEuropa nao as vencera A intelpenetra~ ao e que lhes dara fonn as novas, atraves de novas c ombina~oe s dos seus valores COlli os valores europeus e indigenas. 0 Brasil parece que nunca seni, como aArgenlilla, pais quase europeu; nem como 0 Mexico, ou 0 Paraguai, qllase amerindio. A substflllcia da cllltllra africalla penllaneceni em nos atraves de loda nossa fonna~ao e con s olida~ ao em na~ao. (FREYRE, 2003, p. 797)
origem da milsica popular, como Hobsbawm comenta : Temos de nos lembrar disso (das origens), pois 0 fen omeno da cullura poplllar, mesllIo hoje, lIao pode ser entelldido se nao livennos sempre em mente sua contraditoriedade. ( ... ) A alie popllial' e milo e sOllho, mas Ialubem e prolesto, pois 0
32
33
A mUsica popular brasileira Apresentadas as mais predominantes origens etnicas e culturais do Brasil, e chegada a hora de falar sobre 0 nascimento da mllsica tipicamente brasileira. 0 cemtrio era
0
do Brasil Imperio, escravocrata e
recem-independente da seglUlda metade do seculo XIX. 0 Imperador Dom Pedro II fazia os primeiros ensaios para a quanto garantia as riquezas do pais pOI' meio da
industria li za~1Io, expOlta~1Io
en-
de cafe.
Esses recursos deram poderio suficiente a Sua Majestade para fazer uma grande refollna urbana na capital do imperio, a cidade do Rio de Janeiro. 0 resultado dessas melhorias na cidade trouxe lUna serie de novidades, como 0 telegrafo em 1852, 0 gasometr o para
ilumina~1Io
da
cidade em 1860, 0 primeiro censo geral em 1872, 0 telefone em 1877 e a luz eletrica, em 1879. Com todos esses investimentos, a sociedade tambem acabaria mudando, transfonnando a simp licidade do quadro social da colonia e do primeiro reinado, industrial e aos novos cargos de
gra ~as
servi~o
as novas figura s do opentrio
pllblico, muitos deles ocupados
por ex-escravos. Nascia uma nova classe no Brasil e era preciso erial' novas fonna s de
participa~1Io
e entretenimento social para essa camada da soc iedade.
Os que podiam, seguiam a pequena burguesia europeia, os que n1l0 podiam, passavam a fazer reunioes familia res e pequenos bailes em suas casas. Essas pessoas ouviam mllsicas de origem europeia, que antes nao estava ao seu alcance: polca, m(lZlIrca, ,"a/sa, schollisches. Esses bailes modestos logo foram apel idados de fonna depreciativa de " fOlTObod6", " maxixe" e " chinfrim". Dessas reunioes simples nasceria a mllsica po35
pular brasileira.
por esses motivos, supostamente, 11ao havia preconceito de cor entre os
Os primeiros generos da mllsica popular brasileira foram a modinha, de origem dnica europeia, e tomou um genero de uma
dan~a
can~ao
0
dan~a
IIIUdll, lima
afro-brasileira que se
popular de origem etllica africaIIa. Apolca,
origimtria do leste em opeu, chegou ao Brasil e caill no gos-
to dos pianistas brasileiros, que a adaptaram, introduzindo infillenc ias pOituguesas e africanas e acrescentando da modinha com nasceu
0
0
ritmo e
0
0
sentimentalismo exacerbado
suingue malicioso do IlIndl/. Dessa mescla
choro.
" choroes" , apesar de se constituirem em sua maioria por mutatos clams e brancos. Os negros fonuavam ate 1888, quando houve a
0
grosso das camadas mais baixas e
aboli~ao
da escravahrra, eram na sua maioria
escnwos.
o sucesso dos milsicos de choro se estendeu ate os teatros de revista, o radio e os discos aparecer em, no inicio do seculo XX, acrescentando mais diversao para a classe media brasileira. Com
0
impacto da primei-
ra gueITa mundial, a chegada do cinema e a visao de um novo mundo
o choro no sell inie io nao constituia um genero, mas lUna maneira
mais indusu·ializado no inieio da decada de 1920, os " choroes" ja nao
de tocar abrasileirada da polca, e recebell esse nome pela fonna " cho-
tinham muito espa~o. Apolca e a mazllrca teriam sido sub stituidas pelo
rosa" da sua
execu~ao .
Os milsicos eram chamados de " choroes" e os
instrumentos mais comllns para toca-Io eram a fiauta , 0 violao e 0 cavaquinho e, por vezes,
0
ojiclide, lim instnunento de sopro.
mmi..le ,
0
jazz americano atraia a
passaria a ser
0
a ten~ao
da c1asse media e
0
samba
principal representante da milsica das camadas mais
baixas do Brasil. (Chiquinha Gonzaga, foi lima das p.·incipais npre-
A fama dos milsicos era fe ita no boca a boca pelas pessoas que fre-
sentantes do choro e lUna mulher qlle viveu inteiramente para a sua
quentavam 0 " pagode" - nome dado as festas em casas simples - ja que
miIsira. Ela participoll ativamente de toda a histo.·ia desse ritmo e
nao havia nenhum recurso de
divu lga~ao
na epoca, como discos e radio,
como continua Tinhorao neste u·echo :
por isso foi uma das minhas escolhidas pal"a compor a configul"a-;:ao desse liVl·oJ. Em 1889, 0 Brasil passava de monarquia para repilblica. Nessa epo-
Em IlIIi tempo em que ainda nao aparecera, nem 0 disco nem o radio, os conjuntos de tocadores de fiallta, violao e cavaquinllo constituiam , pois, as orquestras dos pobres que podiam contar com IlIIi minim o de disponibilidade finan ceira para encarar as despesas das festas. (TINHo RAo , 1998, p. 200)
ca, os ritmos europeus divlligados no Brasil continuavam a ser a l'alsa,
apolca , a mazllrca, as ql/ai/rill/as e a schotlish, e os ritmos nOite-americanos comepvam a aparecer por aqui, desde one step e ojazz, ate
0
rock '11 roll, mt decada de 1950. As classes sociais no Brasil voltavam a fi car mais delimitadas e a lU"baniza~ao de varias cidades acontecia rap i-
Essa nova c1asse que aparecia e tinha diversao era feila de uma gente
mesti~a
36
0
choro como a sua principal
e com igllaldade economica,
damente, Tinhorao explica nesse trecho como essa sociedade brasileira conslUnia culhrra : 37
sando 0 conhecimento nacional de sua obra. N esses espetaculos, 0 braPois serialll as expectativas de lais classes, assilll estmluradas, que irialll explicar, a pru1ir do lim da monarquia e pe las va.-ias repilblicas que a sucederrull , 0 gosto por esle ou aquele genero de Illilsica popular, que agora cOllle~aria a ser produzida COlli carater de rutigo deslinado ao consumo cultural da sociedade urbrula (TINHORAO, 1998, p. 208)
sileiro comepva a ser retratado tal qual era mt realidade e em todos os seus segmentos , e os ritmos adotados eram 0 hmrill, 0 lIuui.xe e o samba.
o teatro de revista foi um sucesso absoluto entre os brasileiros que estaYam afoitos pOl' novidades, mas decaiu drasticamente com a chegada do cinema no Brasil, um conCOll"ente direto no lazer da classe media. Ape-
Era cOinum entre as classes mais altas brasileiras se voltar para a cultura da Europa, a consnmindo e, pOI' vezes, a imitando. Afinal, 0 Brasil era um pais que havia conquistado a indepetldencia politica de POI'hlgal , mas que era extretllametlte dependente soc ioeconomicametlte e culturalmetlte nao s6 do seu pais colonizador, mas tambem da Inglatena e da
Fran~a.
altas, da
Exetn p lo disso e a
can~oneta ,
populariza~ao ,
etltre as classes mais
que, seglUldo Tinhorao (1998, p. 213) "nao chegaria
a constituir genero musical detenninado, mas tet'ia 0 nome usado como r6hlio para qualquet¡ cantiga
engra~ada
ou maliciosa pelo dup lo senti-
do" , nos cafes-concerto e cafes-cantante de modelo frances, lUn grande sucesso etltre os brasileiros. Enquanto isso, as classes mais baixas, de ex- escravos, subetnpregados e mlilatos se etltregavam as IllIIbigadas nacionais e as III1/sicas de barbeiro. o Rio de Janeiro era 0 lugar onde a maior palte da culhlra brasileira et'a rep roduzida e divulgada. Desde a segunda metade do seculo XIX, um grande pilblico de outras cidades et'a atra ido para a sede do gOVetllO.
o teatro de revista, lUlla modalidade de pep
trazida da Franp que nao
et'a tao longa como as Operas, nem tao seria quanto 0 teatro, passou a ser a principal atra ~ao nesse periodo e pOI' isso muitos altistas buscavmn inclui.r suas milsicas etn nilmeros feitos nos slioll's dos rerislograjos , vi-
38
sar disso, 0 teatro de revista nao desapareceria completamente, e contiIlUaria promovendo a r epres enta~ao do popular pelo palco, por meio de compositores populares COl110 Sinho, Donga e Ismael Silva. Segundo Tinhorao, foi em 1917 que 0 primeiro samba foi lanpdo em disco e esse fato mudou drasticamente a Brasil. Ate 0 in icio do seculo
xx, as
produ~ao
musical no
milsicas eram comercializadas
apenas em fOlllla de partituras para piano e para ouvi-Ias era preciso que alguetn as tocasse. 0 aparecimento das
grava~ oes
foi primeiro em
gramofones de cilindro e rolos de piano, depois em fOlllla de disco, dessa forum um ciclo de
produ~ao
a ser desenvolvido, pOI' meio da
de carater mercadologico
especializa~ao
come~aria
de milsicos, do apare-
cimento de novos profissionais do meio (como 0 diretor mtistico) e do surgimento de fabricas . A principio, todas essas novidades nao atingiam a contento as camadas baixas. Ap6s a Primeira GUetTa Mundial, a economia brasileira mostrava
avan~os ,
decOiTentes principalmente da parceria economica
com os Estados Unidos, que passavam a infiuetlC iar culturaiJnetlte 0 gosto dos brasileiros, principalmente da classe media, que passava a Set¡ ainda mais miscigenada devido a chegada de grupos asiaticos e europells no Brasil, como Tinhorao COilletlta neste trecho:
39
blocos canlffi'mescos, um tipo de cortejo pouco organizado, umano, No Brasil, onde a popllla~ao local crescia rapidalllente ( .. . ), se junlavalll agora no centro-snl-slldeste as frullilias dos illligra1lles europens e asialicos - principailllente pOituglleses, esprulh6is, italirulOS, poloneses, alelllaes e japoneses -, essa penelra~ao das novidades runencanas iria ser facililada pela ausencia de idenlidade nacional das 1lOvas crulladas de classe media, que se fOllllru'ruU ao illflllxo das lllodemas condi~oes econolllicas. (TINHoRAo, 1998, p. 2~ I )
acompanhado pelos SOIlS de percussao e de apitos pOI' folioes mascarados ou fantasiados. Estes folioes eram, na sua maioria, membros das classes baixas, negros, e migrantes nordestinos que tinham nessas festas a oportunidade de manifestar e interagir as cultmas populares tanto na mllsica, quanto na vestimenta, na relig iao e na dan'ta. 0 rancho era uma especie de cordllo mais organizado, com um acompanhamento instrumental mais rico. Muitos dos elementos dos ranchos estarimn presentes
Essa amel'icaniza'tao introduziu fortell1e11te 0 jazz no gosto da classe media e
nos desfiles das escolas de samba iniciadas no come'to do seculo
xx.
Cinell1a nmsicado passava a Sel' ind ispensavel para esse setor
A populariza'tao dos desfiles camavalescos e a incorpora'tao dessa
da popula'tao. Enquanto isso, as classes baixas, impossibilitadas de COll-
festa pelas classes media e alta fez cOIn que muito da produ'tao musi-
sumir os bellS de consumo e comp Olt ameiltais dos americanos, viviam a
cal e cultural populares fossem vistas como " curiosas" aos olhos dos
sua propria cria'tao musical.
estrangeiros e dos proprios brasileiros das classes mais altas e a paltir
0
A cidade do Rio de Janei.ro receb ia frequellteillente m igrantes do nordeste do Brasil, princ ipalmente de Salvador, para contribuir nos subell1pregos enos lrabalhos bra'tais da sede do imperio e, posteriOl'-
disso, come'tou a surgir a produ'tao de mllsica popular destinada a venda e nao mais a gratuidade altistica.
o gmpo musical 8 Batutas e 1lI11 bom exemplo disso. 0
conjunto fo i
mellte, sede da repllb lica. Isso trouxe tamb6n, como consequetlc ia, a
fonnado em 1919 na cidade do Rio de Janeiro e tinha como membros
mistma de culturas brasileiras de duas regioes fOltell1ente infiuellciadas
os consagrados mllsicos Pixinguinha e DOIlga, que tocavam pOI' prazer
pela cultura negra.
e amor a mllsica. Descoberto 0 seu va lor pelas classes media e alta, e1es
A migra'tao desses contingelltes vindos do nnmdo mra l estabelecia
apostaram na profissionaliza'tao enos espetaculos
0
que Ihes rendetl
uma mistura com os habitos mbanos e fonnava novas manifesta'toes
fama intemacional e ate algmllas m odifica'toes instnnllenta is, e de re-
cultmais da mllsica, selldo a mais fOite delas
peltorio, para agradar
mites de ter
0
0
Camaval carioca, que
s(ullba como principal trilha, tinha a cIUlla.
Para conciuir,
0
0
novo pllblico.
final do seculo XIX e inleio do seculo XX foi um
Camaval no Brasil, alguns
pel'iodo decisivo para a cultma do povo brasileiro e nao so musical-
teilnOS e concei.tos precisam Sel' explanados. Os desfiles camavalescos
mellte falando. A " materia- prima" que daria inicio a todos os getlel'OS
nome de cordoes e
musicais da mllsica popular da atualidade ja estava fonnada. 0 samba,
Para exp licar melhor como se originou
0
brasileiros come'taram de fonna espontanea com 40
0
41
o bailia, a bossa 110m, ajol'em g71arda, a fropiclllia, Ofilllk, 0 pagode, 0 sertallejo, 0 rock lIaciollm, todos esses generos e movimentos musieais
t&11 uma importancia palticular e um poueo dessas raizes, mesmo que se mostrem discrepantes em questoes de influ&leias , pilblieo-alvo, classe soc ial e, principalmente, mesmo que n1l0 saibam das suas verdadeiras .
ongens.
42
Lila Branca ( 1912)
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45
Fnncisca Edwiges Neves Gonzaga, Compositon, pianista, alTanjadOl'a e ngente Nascimento: Rio de Janeil'o, capital, 17 de outubl'o de 1847 MOIte: Rio de Janeiro, capital, 28 de feveniro de 1935
Se eu tivesse que definir Chiquinha Gonzaga em uma palaYra eu diria pioneira. E niio digo isso so pOl' sua calTeira como mllsica, ela tambem pode ser considerada uma mulher precursora em varios aspectos da sua vida pessoaL Primeira compositora de mllsica popular brasileira, primeira maestrina do pais, compositora da primeira canc;ao camavalesca do Brasil, primeira pianista lou "pianeira", lUna expressiio originaimente pejol'lltiva
liS ada
pan pianistas de music a populal'] de
chom e flmdadora da primeira sociedade protetora dos direitos alltorais. Isso tudo sendo mulher, mulata, nascida em
lUn
Brasil escravocrata e
recem-indep endente. Sua educac;ao era voltada para conseguir um bom casamento e apenas isso. Tanto que se casou aos 16 anos sem poder escoUler 0 marido e nem conhecer 0 amor. Buscando a felicidade desconhecida, abandonou seu marido pOI' outro homem e foi condenada pOI' adulterio e abandono de lar, passando pela impagavel pena de ficar longe dos filhos . Foi responsavel pOl' seu proprio sustento dando aulas e fazendo sua mlisica, mesmo sendo julgada pOI' toda uma sociedade machista. Al6n disso, llltou pOI' causas mais amp las, como as abolicionistas e republicanas. Deixou para nos, os brasileiros, uma vasta obra de pec;as teatrais e mllsicas dos generos mais diversos, tanto de origem europeia quanto africana.
47
Na calta a seguir, historias da vida e da obra desta, que e uma das ba-
Bauru, dezessete de dezembro de dois mil e treze
ses principais da mtlsica popular brasileira, sao escritas de fonna leve, estimada e com tamanho v igor que receber lUna correspondencia de resposta ate pode parecer possivel.
Cordiais saudaQoesl Como vai voce, Francisca?
E a primeira vez que trato com uma pessoa. nascida n o seculo XIX e e uma h onra que essa pessoa. sejEL voce. Nem mesmo sei qual seria a pronome de tratamento usado para me referir ao seu n ome, mas procurei saber muito a seu respeito e descobri um gosto pelo novo, pelo moderno, que nao combinaria com uma usenhora" au uma Udona", por mais correto que possa parecer. Alias, 0 correto e alga tao relativo e tao temporal que nao caoo aqui conceituar. Estava, inclusive, pensando como seria sua vida se tivesse nascido na minha gera¢o. Por um lado, seria muito vantajoso, mio acha? Beus namoros poderiam ser descomprometidos, sua liOOrdade estetica seria aceita e sua alma boemia seria corriqueira entre outros da sua idade. Mas por outro ... nao sei se faQo um julgamento precipitado, mas ta.lvez voce nao tomasse aulas de piano e a nulsica nao tivesse entao ch egado ate voce. mgo isso porque estudei piano durante a minha inrancia e comevo da adolescencia e posso afirmar com con vic¢o que nao era algo comum . 0 fiz par infiuencia da minha avo e pela admira¢o rara que sentia e ainda sinto pelo instrumento. Acho que nao tenho talento, saOO? Ou talvez tenha e m e faltara a de48
dicaQ8o. Mas nao importa agora. Venda as suas partituras vejo nao s6 uma perita, mas tamOOm. uma apaixonada. As notas parecem completar-se em simetria na clave de sol. E bonito de veri E muito comum que pessoas da minha idade estudem instrumentos menos eruditos: guitarra, baixo, bateria. Piano 8 raridade. Violino tamOOm.. 0 pensamento do ~se" seria eterno nesse caso. Pois seria 0 talento que prop6e a aprendizado au a aprendizado que desperta a talento? Jamais saberiamos. Falando em piano, esse instrumento era 0 quenao faltava no Rio de Janeiro em meados do seculo XVIII, nao 8? ~Cida de dos pianos~, foi assim que a poeta gaucho Araujo Porto -Alegre apelidou a cidade. 0 piano havia se tornado um simbolo de prestigio entre as cariocas, desde que a instrumento chegou ao Brasil em 1808 junto com a familia Real. Talvez par isso fosse tao comum aprender a toea-Io. Fato 8 que, mesmo com as dificuldades de ser mulata, fiIba de uma uniao indesejada socialmente e mulher no secu10 XIX, voce con seguiu exito. 0 custo foi ser renegada pela familia, perder 0 carinho dos fiIbos e ser vitima da critica social, mas serviu de exemplo para muitas mulheres que vieram depois, artistas ou nao, de como 8 importante lutar pelo que se acredita e pelo amor. Que grande feminista 8 voce, Francisca I Eu, no meu tempo ern que, aparenternente, as coisas ficaram mais fa ceis
para 0 nosso gener a, luto constantemente e a. minha maneira contra qualquer manifestaQ80 de machismo e sexismo. Quase um seculo depois isso ainda acontece, voce acredita? Bei que e run absurdo, mas e verdadel Ha, inclusive, mulheres que aceitam ser destratadas e diminuidas e contribuem para a propagaQ8o desse mal, sao as vitimas de seu pr6prio preconceito e das doutrinas in stituidas. Mas ha outras, sim, ha muitas outras como voce e com o eu tento ser, que nao deixam isso acontecer. Hoje ternos uma lei no Brasil que ampara as mulheres vitimas de viol en cia domestica e familiar. E a lei Maria da Penha, que tern esse n ome porque faz referencia a Maria da Penha Maia Fernandes, mulher que, vitima de seguidas agress6es e tentativas de homicidio pelo marido . que, inclusive, a levaram a ficar parapl8gica-, lutou par vinte anos pela sua puniQ8o. Essa hist6ria faz pouquissimos anos, cerca de sete. Alias, faz apenas oito anos tamoom que 0 adulterio deixou de ser crime no Brasil e, finalm ente, a abandono de lar nao e vista mais com o um delito. Voce, infelizmente. foi condenada par ambos as crimes em 1875 e nao teve a chance de se retratar. Essa seria mais uma vantagem de tel' nascido na minha geraQ80 e eu sinto muito pela sua situaQ8.o. Vou Ihe contar uma coisa, no meu periodo de escola, eu estudei muito sobre a sua epoca. 0 segundo Reinado foi um periodo curto e controverso, mas marcou muitas mudanQas n o Brasil. Nao sei se voce, na sua inrancia, con seguia notal' as
mudanQas que ocorriam no pais, ainda mais morando n o ftio de Janeiro, a sede do ImpeIio, onde as transformaQbes aconteciam primeiro. A classe meilla que hoje e maioIia n o pais [somos 53 por oento cia populaql.o do Bl"pfi segundo dedos cia Seoreta.r1a de Assuntos Bstrat6g1oos do Governo l'ederal e, 81m, au me inoluo neIa] com eQava a aparecer. 0 lampiao a gas, a bonde puxado a burro, a telefone, a fotografia, a selo postal, 0 tel8grafo, 0 desenvolvimento da astronomia, foram todas n ovidades tecnol6gicas que deslumbravam a Brasil da sua epoca. Hoje em illa, a tecnologia avanQa de forma igualmente veloz, mas infinitamente supeIior em recursos, 0 que acelera 0 processo de cIiaQ80 e illminui a tempo de duraQ80 de um deslumbrament o de anos para minutos. Se eu contar as apetrechos que usamos n o seculo XXI podeIia ate assusta-la. Temos perten ces e meios que nem a sua imaginaQ80 con seguiria con ceber. Voltando ao seu tempo, acho que as maiores novidades do Segundo fteinado nao eram as materiais. Novas cabeQ8s vanguardistas, com o a sua, vinham surgindo e sugerindo um n ovo modo de pensar sabr e illversos assuntos . As providenciais e tardias ideias abolicionistas e republicanas eram discutidas destemidamente par voces, novas intelectuais, e causavam r eboliQo na socied.ade e na politica . Posso illzer que a Brasil que temos h Oje, m estiQo e livre - independent e, par vezes, s6 na teoria - com8Qou nesse periodo em que despertava a sua vida.
Aproveito para agradecer a voce e as outras mentes que souberam se destoar de um todo racists e pouco humano e comeQaram uma luta de igualdade que ate hoje persiste e vigora . Obrigadal Nao conh8Qo muito do seu pai e sua mae, ha. pouco sobre eles em registro alem do que se refere a voce, mas acima de qualquer cir cun st8.ncia, a uniao deles soba desaprovaQB,o m oral e r eligiosa pela diferenQa de cor foi run ato r espeitAvel, mas nao corajoso, jl que nao era algo exposto. Acredito e espero que voce concorde comigo, e s6 uma opiniao. Sabre a Rio de J aneiro ... Ah, ele con tinua linda assim como voce presenciou. Mas essa beleza nao imped.iu em nada a desenvolviment o de mais problemas sociais, econ6micos e politicos . Ha. muita violencia, contraste socia l, depred.aQB,o urbana e natural, mas quase nada, se comparada a sua epoca, em que metade da populaQB,o ( na epoca, 250 mil habitantes) era de escravos. Aquila sim era violencia e, claramente, foi dessa h eran Qa hist6Iica que vieram muitos dos males que assolam a cidade. HOje, a Rio tem ceres de seis milhbes de habitantes, nao e mais a sede do governo, mas, apesar dos problemas, continua sendo 0 pIin cipal destino turistico de lazer do Brasil. No fim do seculo XIX, apesar de ser uma cidade aindajovem, que lutava contra as doenQas e a insalu bIidade resultantes do crescimento repentino, a ftio jl apresentsva um estilo cosmopolita.
Nao sei se voce sabe, mas estou me formando na faculdade para ser jornalista. Estudei a vida toda num mesmo colSgio e me mudei de cidade para fazer faculdade e acredito ter sido nesses dois lugares que eu fiz a maior parte dos meus amigos. Fiquei pensando em como esse processo foi para voce. As coisas deviam ser mais dificeis sendo educada em casa, ainda mais quando as materias oosicas ensinadas eram catecismo, calculo, leitura e escrita, doutrinas pouco tecnicas para a vida real. Alias, nao teria motivo. 0 sentido pratico de se educar uma menina na sua epoca era 0 de arranjar-Iheum bom casamento e nao uma boa profissao. E assim foi feito com voce, que, inclusive, teve essa empreitada adiantada por um "agravante": 0 seu jeito. Seu pai Jose nao via outra solU(;ao para 0 seu comportamento namoradeiro, inquieto e sua forte personalidade. E voce era tii.o jovem quando se casou, Francisca I Com 16 anos eu ainda nao tinha ideia do que fazer da minha vida. Lembra-se do que eu havia dito sobre ter nascido na epoca errada? Eu realmente acho que se voce tivesse nascido nos dias de hoje, dificilmente seria obrigada a se casar tii.o cedo, ainda mais com um rapaz que sequer gostava. Nada contra Jacinto, ele ate me lembra meu namorado nos traQos fisicos - J080 tamMm e alourado e de olhos claros -, mas eu nao sinto seu casamento como um acontecimento digIlO de comemoraQ8o, me desculpe pela sinceridade, mas essa uniao soa ate como um abuso.
Sei que essa vida de mulher dedicada e depois mae de muitos filhos nao era atraente para voce. Mas voce conseguiu realmente ser uma mulher forte. Pensando sobre as suas experiencias, me lembro do seu contato com 0 confiito sangrento e assombroso que foi a Guerra do Paragllai. Mae de filhos pequenos, recem-casada e longe de qualquer possibilidade de contato com a musica. Voce tinha ramo ao nao se submeter as convenQoes sociais. Sua coragem einspiradora, muitasmulheres suportaram e ainda suportam seus casamentos infelizes e se privam do que realmente as faz felizes. Voce nao se submeteu a isso e, mesmo com as reclamaQoes do seu marido, continuou se dedicando a musica . Alias, sou uma grande admiradora da musica popular no Brasil. Esse, alias, eo motivo pelo quallhe escrevo essa carta. Voce e uma das pessoas que eu sei que me ajudaria a encontrar as raizes da nossa musica popular, na verdade, nao s6 auxiliaria na descoberta, mas tamMm poderia mostrar como contribuiu nesse processo. Na SeguIlda metade do seculo XIX, quando voce comeQava a sua carreira de compositora, os ritmos populares encontrados no Brasil eram apenas dois: 0 lundu e a modinha. o choro, 0 ritmo que a consagrou, nasceu dessa mistura. Nem sei dizer quantos ritmos populares existem no Brasil exatamente, hoje, mas posso dizer que todos eles nasceram de alguma das origens etnicas que formam 0 nosso povo,
sejEI. indigena, europeia au africana . Voce pode nao tel' inventado a choro, mas foi a primeira mulher no gener a e quando se fala desse ritmo voce e a primeira pessoa que vem na cabeQa de todos os brasileiros. E acredite, diferentemente da sua epoca, voce e lembrada apenas pela sua llnlsica, dificilmente, se lembram das desavencas familiares que voce teve de passar, com o quando voce se entregou a uma nova paixao, e foi viver com Garvalhinho. Juro que nao julgo a sua atitude, nao vejo impedimento quando se trata de buscar a felicidade. Pena que Jacinto nao aceitou a situaca.o e the acusou par aqueles crim es descabidos . Imagino que a pior parte r esultante dessa fase nao tenha sido a desilusao amorosa que se seguiu tamoom com Garvalhinho, mas sim, a proibiQ8o de conviver com seus fiIhos. A soluQ8o era mesmo se concentrar na vida profi ssional. ~Atra ente ~, uma das minhas musicas favoritas de sua composiQ8o, ch egou como uma benQ80 para acalmar os animas na vida particular, nao foi? Era a musica se tornando profissao e acred.ito ( m e corrijEI. se estiver errada ) tel' sido esse a marco da sua independencia financeira. Bobre as suas financa s, alias, descobri algo interessant e. Alem deganhar a vida tocando piano em festas e dando a ulas de piano em domicilio, canto, hist6ria, frances, voce tamoom vendia partituras. Bei que era aIgo comum para voce, mas h oje em dia e possivel con seguir cifra s e in clusive ou-
vir musicas g ratuitamente, atraves de um aparelho incrivel chamado computador. Juro que e verdadel Chiquinha (sepreferir que te chame de Francisca, meavise depois), lembrei-me de Ihe contar uma coisa. Tenho uma irma estilista, au modista como voce deve dizer. Canto iSso, porque ouvi muito a respeit o da maneira pouco conven cional com que voce se vestia . Dizem que voce mesma inventava as seus vestidos e seu s arranjos de cabelo, bem diferentes dos que se vendiam no Rio, que eram sempre capias deslavadas da moda francesa. Tamoom tenho verdadeira paixao par moda e teria tido a maior prazer de trocar umas roupas com voce. Voltando a sua vida pr ofissional, voce sempr e se mostrou atenta as novidades, nao e? Esteve atenta aos ch or oes, ao teatro de revista, as operetas, ao usa do maxixe n o final dos espeUi.culos. Quase sempr e era a primeira mulher nesses 00tares e conquistava a publico pela identidade brasileira que imprimia em cada obra. Era como se 0 brasileiro se visse, finalm ente, pertencente e vivo na sua pr 6pria cultura. Dessa vez, a sociedade nao teve como Ihe julgar, voce era um sucesso, uma profissional de extrema competencia e nada queacontecesse na sua vida pessoal tiraria esse merito. Era o nosso ~Offenba.ch de saias~ (refedinot& ao compos1tor que inventou a opereta, bRAe de vt.r1os gAneros de teatro must-
cado] .
Mas nao era s6 0 julgamento da sociedade que Ihe afiigia,
certo? Viver longe dos seus quatro filhos, n8.o ser perdoada pelo pai e conviver com 0 desprezo da familia deve ter sido uma dor que nunea cessou, mesmo com os constantes sucessos . Voltando ao assunto profissional, acho que um dos feitos artisticos mais importantoo que voce deixou foi a primeira composiQ8.o para 0 earnaval brasileiro. 0 valor russo e incomensuravell 0 Garnaval no Brasil j8. era muito importante na sua epoea, mas hoje e simplesmente a manifestaQ8.o cultural mais forte do nosso pais, e muito disso se deve aos esforc;:os de pioneiros da musica popular brasileira como voce. Duvido que tenha algum brasileiro que n8.o conhec;a essoo versos:
6 abrealas - Chiquinha Gonzaga (1889) 6 abrealas Que eu quero passar Eu sou da lira N8.o posso negar 6 abrealas Que eu quero passar Rosa deOuro E quem vai ganhar Foi dessa marcha-rancho leve que surgiu uma das maio-
res tradiQooo culturais do Brasil. Mais uma vez voce prova ser uma visionarial Voce se lembra do Ernooto de Bouza, 0 teatr6logo e farmaceutico responsavel por saraus e oopeta.culos de teatro amador animadissimos num galpao no Andarai? Acho que voce n8.o se esqueceIia. Afinal, foi em run dessoo saraus em que voce tocava piano, acompanhada por ootudantes e musicos amadoroo, que voce conheceu 0 jovem J 030 Batista. Be n8.o me engano, sua idade j8. era proxima aos 50 anos e a dele era 16. Assim como da outra vez, j8. deixo claro que n8.o lhejulgo. A paix8.o de voces parece ter sido arrebatadora e eu me entIisteQo de pensar que tenha sido escondida. Entendo seus motivos, imagino 0 qU8.0 ealejada voce ootava de sofrer julgamentos por parte da sociedade caIioca. E doosa vez, imagine, a critiea seria ai.nda maior, porque alem de voce ser ruvorciada, ele era mais novo que seus pr6pIios tilhos. A sua histoIia de amor parece coisa de tilIne. Que ideia maluea apresentar seu namorado como seu tilho, Chi quinhal Moomo assim, j8. me desculpe, mas acho que ninguem conseguiu engolir oosa hist6ria. Um filho surgido de repente eainda com sotaque portugues nao fazia muito sentido para ninguem, mas, como eu russe, n8.o YOU reprimir sua atitude. No final das contas, esse relacionamento e 0 amor que Joao Batista the dedieava foi uma das melhoroo coisas acontecidas na sua vida pessoal.
Bei que 0 seu relacionamento com Ulll portuglles contribuiu muito para a sua aproximaQ8,o com a Europa. Ha. dois anos, eu morei em Madrid por seis meses e posso dizer que me encantei com alguns lugares por onde passei em terras europeias. Um deles, com certeza, foi Portugal. Voce tamoom se apaixonou por essa terra, nao e? E eu estou certa que nao foi apenas por influen cia do seu amado e das visitas que voces faziam a. familia dele, mas tamoom pelo acolhimento que sua musica recebeu entre os portugueses. Buas partituras j8. eram sucesso nas 10)1s de Lisboa e os lisboetas, por algum motivo, tinham imensa curiosidade de conhecer a cultura do pais que colonizaram e tanto exploraram. No final da decada de 1910 , quando voce decidiu voltar ao Brasil de vez, voce deixou duvidas quanto aos motivos da sua ida e da sua volta r epentina, mas (espero nao ser precipitada) me parece que sua partida teve relaQ8,o com runa tentativa de rea.proximaQ8,o por parte dos seus filhos e familiares, desconfio que foi por causa do dinheiro que eles a chayam que voce vinha ganhando com a fama. A volta, especulo tamoom, que foi justamente por nao ter dinheiro suficiente para se sust entar em Portugal e, n o Brasil, suas oportunidades de trabalho eram sempre maiores . Mas isso s6 voce poderia me r esponder. Nessa epoca do seu retorno, a cidade do Rio de Janeiro sofria uma grande transforma¢o, passando a ser mais ur-
bana e remodelada . Estava cheia de a utom 6veis e recebia seus primeiros cinemas . Alias, voce, com o artista da musica do tea.tro de r evista, deve tel' ficado a ssustada com a ameava de um n ovo modo de entretenimento tao poderoso. Pelo men os, 0 tea.tro teve um bom prop6sito para se r einventar e se adaptar para nao perder publico, faz endo com que os espeUi.culos fossem mais curtos, com um s6 ato e com prec;o equivalente ao do cinema . Voce fez bem em retornar depressa aos palcos, assim que ch egou da Europa, e era impressionante sua capacidade de ficar sintonizada com 0 gosto dos cariocas de forma ligeira, mesmo tendo passado tanto tempo fora. Buas partituras, como sempre, continuavam sendo as mais elogiadas dos espetaculos e sua consagrac;ao era tanta que sua musica j8. havia virado Ulll adjetivo, ~ estilo Chiquinha Gonzaga". Acred.ito que tenha sido pelo seu grande prestigio que voce con seguiu convencer a tradicional companhia de teatro Bao J ose a montar ~Forr6bodo: um choro na cidade n ova" e eles, provavelmente, nao se arrependeram. Foi Ulll sucesso, ou melhor, foi 0 maior dos seus sucessos n o teatro de r evista. Li a s letras originais das canc;Oes do espetil.culo e juro ter achado tudo muito apimentado, ate para os dias de h oje. Deve ser por isso que virou run sucesso popular imediato. Pena que 0 cinema logo caiu no gosto do publico e fez 0 teatro de r evista sucumbir. E rea.lmente uma pena. Hoje em dia, e muito comum que a s mulheres sejam res-
ponsaveis pelo seu pr6prio sustento au ate mesmo par manter toda a familia. Voce, como semprepioneira,ji.lutava para garantir seu pr6prio dinheiro e, par esse motivo, ajudou a fundar a Bociedade Brasileira de Autores Teatrais em 1917 e, anos depois, venda 0 baixo rendimento das grava<;:6es de disco, voce e Joao Batista, providencialmente, abriram run fabrica de discos nos fundos da sua casa. E como se na.o bastasse ter tido essa grande ideia, voce ainda teve a chance de lan<;:ar grandes artistas da musica popular brasileira, admirados ate hoje, como Francisco Alves e Sinha. Sua carreira e de dar inveja a qualquer musico, mas seu poder de iniciativa e ainda mais admiravel. Sei que ji. me estendi muito, poderia escrever durante dias para voce sem me cansar, tamanha a cumplicidade que ji. sinto. Quero deixar claro que, mais que aIguem que se interessa par musica, eu me interesso por musicos. A sua h ist6ria me inspira de diversas formas e se fosse possivel eu teria 0 maior prazer de receber uma carta sua de resposta. Sempre que puder, the escrevo. Espero que esteja bem e em harmonia. Com admira<;8.o.
Entrevista ficticia Cordiais
Sallda~oes
- a la, Chiquinha. Como vai? Tenho algmnas per-
guntas para voce. Qual foi sua resposta diante do ultimato do seu ex -marido Jacinto sobre a sua escolha entre ele ou a mllsica? Chiqllillha- "Pois, senhor meu marido, eu nao entendo a vida sem har-
monia". Cordiais Sauda~oes - Otima, Chiquinha, bem pensado! Agora me diga, quais sao as
emo~oes
que mais te repelem?
Chiqllillha - Tenho horror ao luto e a hipocrisia.
Cordiais Sallda~oes - Chiquinha, voce sofrell muito por ter abrido mao de seu casamento e por ser jlligada e abandonada pela sua familia. a que voce sente quando pensa nisso? Chiqllillha- Tive muito amor a todos os meus e os levono cora~ao. Que
pepm por mim a Deus 0 perdito D'Ele por terem feito tantas Cordiais
Sauda~oes
injusti~as.
- Bom, Chiquinha, e so isso. Muito obrigada e
parabens pelo seu trabalho.
63
AII/ollomin (J 977)
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AngenOl' de Oliveira, Compositor e cantor Nascimento: Rio de Janeil'o, capital, 11 de outubl'o de 1908 MOI'le: Rio de Janeiro, capital, 30 de novembro de 1980
Vma vida inteira habitada lado a lado iI mllsica e a bOelnia, foi tardiamellte reconhecida e registrada eln fonna de discos, Foram apellaS quatro gravados em estlldio e todos na velhice, apos os 65 anos de idade. 0 reconhecimento merecido veio no fun da trajetoria, mas tamban foram feitos no minimo 10 discos e CDs postlUnos exclusivamellte com suas mllsicas, Atualmente, seu prestigio e tao amplo que existeln mais de 600 composi~oes difundidas eln Cel'Ca de 300 discos gravados pelos mais variados e renomados inteillretes da mllsica brasileira, que vao desde Elis Regina e Tom Jobim a Ney Matogrosso e Chico Buarque, alan de Paulinho da Viola, que foi eleito pOl' parte da critica musical como seu principal discipulo, Este, pOI' sua vez, nao se sente merecedor de tamanha responsabilidade: "Cartola nao teln sucessor, que ele me pel'doe Iii eln cima, Seu trabalho e unico", Neste capitulo, a vida de Caltola vai representar a historia de varios outros mllsicos negros dos motTOS cariocas que difundiram e recriaram o samba brasileiro no seculo
xx. Sua capacidade melodica e sua se!lsi-
bilidade musical foram as caracteristicas que 0 nomearam repreSelltante desse grup o. Caltola foi
0
enviado para a difusao do samba do nosso pais como
genero simb olo da musicalidade brasileira e musicou nao so a realidade da sua epoca, mas tamban a sua escola de samba de 67
cora~ao,
a Man-
glleira, slIa propria vida e sells alllores de fomla poeticalllente ilumina-
Bauru, vinte e seis de n ovembro de dois mil e treze
d,. Se eu pudesse dizer para ele tudo
° que penso e ° quanto Ihe estimo,
seria assim que ° faria :
Cordiais saudaQoesl Como va i, Agenor? PeQo-lhe licenQ8 se pareQo in conveniente de escrever-lhe essa carta chamando-o pelo nome de batismo. Ja busquei tanto sobre a sua vida, que talvez me sinta nesse direito. Bei que n80 sou a plimeira que Ihe escreve uma carta, n80 lhe remete e 0 faz a outras pessoas, que igualmente possam lhe acimirar. Ana Malia fez 0 mesmo em 1978, escreveu uma carta para 0 ~mestre" e ao inves de enviar, publicou-a n o jornal. [Artigo do Uvl'O ·Nena sera como antes" (2006), da esor1tora Ana l4ar1a. Babjana, ortginaJmente pubUoado no jomaJ ·0 Globo". em 1978]. Ela telia mais chance do que eu de receber uma carta de resposta. Eu nem mesmo sei a que endereQo despachar. Mas nao me queixo. Boube pelas suas musicas da sua. crenQ8. Uma crenQ8 tao pura que me fez acreditar que, de aIguma forma , em algum lugar onde estB. agora e onde n80 ha endereQo, vai saber dessa h omenagem. Afinal, como diria sua musica u quem tem fe n80 se cansa, nunca perde a esperanQ8" : Deus te OUQ8 - Gartola
68
Me contrariei (Par que razao?) So eu mesmo sei (Diga entao) Eu que sempre fui leal A quem so me quis a mal Devo ser feliz (Tu seras) o bem que eu fiz (Ninguem faz) ConfianQa em Deus rapaz Nas maos do Mestre, 0 Bem teras. Apesar de ser tao pobre Tive urn coracao tao nobre Ai meu Deus, tenha reo Quem tem re nao cansa Nunca perde a esperanQa Ai meu Deus, tenha
reo
Quem tem re nao cansa Nunca perde a esperanQa
Venda suas musicas, chego a uma conclus8.o: ha. uma vantagem em nao se tel' ed.ucaQ8.0 musical formal. A liberdade da tecnica, do regramento, aproxima a con struQ8.o musical da ed.ificaQ8.0 da emoQ8.o em forma ritmica. Essa e a principal vantagem da sua obra, Agenor. Voce se baseou mais na
poesia do que nas musicas para criar urn nucleo de criaQ8.o. Guerra Junqueiro, GonQalves Dias, castro Alves e Olavo Bilac foram alguns dos seus mestres na in spiraQ8.o e con tribuiram na gran deza da emoca.o de suas letras. Mas como voce, urna pessoa sem instruQ8.0 musical, foi capaz de criar linhas melodicas tao caracteristicas e in dividuais? Eis a magia do talentol Voce nasceu em bam berc;:o, Agenor. GraQas ao trabalho de seu avo Luis Cipriano. Foi a terceiro e, claramente, 0 preferido no total de treze filhos. Nao gostaria de ser invasiva, mas pelas minhas contas, Dona Aida eo carpinteiro Sebastiao a conceberam, nao pOl' acaso, no periodo de carnaval, fato que, para mim, faz 0 maior sentido, nao faz? Acred.ita que nunca estive n o Rio de Janeiro? Parece estranho especialmente para mim, que jB. estive em outros muitos lugares que nem se comparam A beleza da ~Cidade Maravilhosa" . E nao digo isso para megabar, eque, realmente, nesses illtimos a n os eu tive a oportunidade de conhecer UllS 14 paises e isso me fez pensar a qUaD pouco eu conhec;o o meu proprio pais. Voce, ao contrario, nasceu e morreu no Rio, soube amar a cidade e soube musica.-la como poucos a fizeram. E se fizeram nao deixaram a ~marca d'agua" que tem suas musicas e letras, tao puras que, dificilmente, alguem com as Yicios de uma formacao musical conseguiria fazeI'. Sua vida com~ou quando a republica no Brasil ainda era urna jovem prestesa completar 19 anos e quando a carnaval
como conhecemos hoje ainda era uma crianQa mal criada. Nao sei se tem consciencia disso, mas em fevereiro de 1908, alguns meses antes de seu nascimento, acontecia a estreia do desfile do rancho Ameno ResedA, trazendo Ulna novidade para 0 carnaval, 0 cortejo com tema, que nesse caso era ~Corte Egipciana". Uma outra inovaQi.i,o, au melhor, um novo absurdo foi a proibiQi.i,o pela policia do usa deapitos, instrumento que, simplesmente, servia para marcar a ritmo dos passos de danQa. Beu nascimento ate parecia uma suplica, para que alguem aparecesse para botar ordem nesse carnaval. Mestre (a carta de Ana Maria me inspirou a chama-Io assim), sua vida nao podia ser nada menos que Ulna grande comemoraQ8o. No dia do seuaniversario, e celebradaa Festa da Penha, a mais popular e importante da sua epoca. Acredita que comemoram ate hoje? Bim, de forma mais modesta, mas ainda com muita devoQ8o. carioca e tricolor, combinaQ8o bonita. 0 est8.dio do Fluminense cresceujunto com voce e hoje e 0 campo de um dos maiores clubes do estado do Rio de Janeiro. Bua ida para a rua das Laranjeiras com a familia, felizmente, trouxe essa paixao para a seu convivio. E nao s6 pelo est8.dio, a mudanQa trouxe tamoom a proximidade da Fabrica de Tecidos AllanQa e dos operarios boemios que viviam na sua vila, por isso outra paixao 0 arrebatou: 0 samba I o Rancho dos Arrepiados era 0 preferido da sua familia,
nao era? Pois eu acredito que ele era um premincio singelo do que seria a sua Mangueira. Verde e rosa j8. comecaram a se combinar nessa epoca . Que inlancia gostosa a sua, Agenorl Mas nao invejo, me permita the contar da minha, foi uma inrancia de verdade, com chao, correria, rua e bagUI1Qa . Que saudadesl Be nao se incomoda, tamoom you the escrever um pouco sabre Ulna fase triste. Bei que voce era 0 xod6 do seu avo. Tamoom perdi um dos meus e sei como e doido. Ainda mais quando se tem apenas 11 anos e esse avo e simplesmente a prumo da familia, como aconteceu com voce. Mas de tudo se tira um aprendizado au uma nova possibilidade. Imagine se voce e sua familia nao tivessem se mudado para 0 Morro da Mangueira? HOje, as identidades da comunidade e da sua escola de samba j8. nao se dissociam, sao uma s6. Voce nao faz ideia de como a seu morro cresceu, Agenorl Bei que quando sua familia se mudou para la nao havia muito mais de 50 barracos e tamoom a primeira estaQ80 da Estrada de Ferro Dam Pedro II, mas saiba que hoje existem quase 80 mil pessoas vivendo na Mangueira, e quase uma outra cidade dentro do Rio de Janeiro. Be tem uma coisa que ainda nao tenho experiencia e em trabalho, ainda mais desses braQais que voce teve que encarar tao ced.o. E nao foi pOI' preguiQa minha, foi oacaso, nao fui incumbida disso, nao sei . Beu pai, diferentemente do meu, a
forc;ou bem cedo a contribuir com as despesas da familia e eu imagino como deve ter sido dificil, sendo ainda uma crianc;a. Estudo jornalismo, j8. lhe contei? Por isso achei tao interessante que seu primeiro trabalho fosse numa tipografia, j8. que para mim a escrita e, consequentemente, as letras sao tao importantes. Alias, acho que esse trabalho e mais importante para mim do que foi para voce. Dizem as mas linguas que, j8. nessa epoca voce nao era ligado ao batente e j8. estava se enturmando com as malandros da redondezs . Vide carlos cachac;a. Esse sim, que amigaol Voces estiveram juntos n os altos e baixos da vida, e fizeram da musica um bonito elol Ouvi num depoimento seu, que a seu segundo emprego, a de pedreiro, teve uma motivac;ao especial: fazer sucesso com as mulheres. Nao sei se isso e uma heranc;a sua, mas nunca vi profissao para gostar tanto de um galanteio como essa, tanto que a expressao ~cantada de pedreiro" j8. foi adotada no linguajar popular. Nesse mesmo depoimento voce tamoom conta a porque do seu apelido pelo qual e nacionalmente conhecido. Acredlto, entao, ser nesse pedac;o da carta que eu deva comec;ar a tratA-Io pela sua identidade mais conhecida, nao e? Agenor, posso lhe chamaI' de cartola? Acho que ji. criamos essa intimidade ... Tamoom me informei sabre sua vida de estudante no Liceu de Artes e Oficios no Rio e achei bonito 0 fato de voce estudar junto do seu pai, apesar das suas constantes faltas e vadiac;oes feitas As escondidas. Nem a morte de sua mae
- me desculpe par falar disso -, uma das maiores tragOOias de sua vida, fez com que seu pai suportasse sua lassidB.o e a expulsao de casa fez-se inevitAvel para ele. Eu achei um absurdol Com 18 anos incompletos voce perdeu alem da sua mae, a aura de protec;ao que a amparava e teve que fazer sua vida sozinho. Sei que a diferenc;a e gritante, mas foi tamoom com 17 anos que eu sai de casa. Nao fui expulsa e nem deixei de contar com 0 apoio financeiro dos meus pais, mas tive que aprender a me virar sozinha, a cuidar das minhas coisas, da minha alimentac;ao e das minhas responsabilidades como universitAria, porisso, mesmo que vagamente eu entendo a que voce estava sentindo nessa fase. D tempo em que voce passou perambulando pel0 morro, dormindo no trem, frequentando a zona da prostituic;ao, causou uma deteriorac;ao precoce em quem voce era e, dessa vez, nao foi uma escolha sua estar nessa situac;ao, nao e? Mas, como eu havia dito antes, de tudo se tira uma nova possibilidade e se voce nao estivesse nessa situac;ao de fame e doenc;a, sozinho no seu barraco, talvez sua, entao vizinha, Deolinda nao tivesse se aproximado de voce. Que generosa essa mulherl Deu-Ihe banho, comida, remedio e, principalmente, 0 afeto que the faltava. Seu estado era lamentoso e ela fez tudo iSso, com apenas 25 anos, j{l tendo marido e filhos para cuidar. Ah Gartola, mas 0 amor e alga que nao tem ramal A coitada foi abandonada pelo marido
pOl' sua causa e nem assim voce pegava firme no trabalho de pedreirol Acho que me exaltei um pouco agora, mas em rela¢o a oosas quootooo, meu feminismo se manifesta de maneira pouco educada. Mas, acima de tudo, posso dizer que Deolin da fez um bom trabalho. Voce estava tao recuperado que junto a run punhado de amigos montou a BIoco dos Arregueiros, causou a farra, a boemia e a intera¢o do morro com as bairros vizinhos. Logo a coisa ficou seria e a Mangueira pediu para nascer. 0 hino de ootreia nao negava: Chega de demanda Chegal Com esse time temos que ganhar Somos da Esta¢o Primeira Salve 0 morro da Mangueiral Seu cargo na Escola podia ser de diretor de harmonia, mas, muito alem de ser responsavel pelo entrosamento entre 0 ritmo e 0 canto, voce foi 0 principal encarregado, pOI' anos, pela composiQ8o de todos os sambas que a Mangueira desfilava. Com todo 0 seu talento, era mesmo inevitavel que 0 poosoal do asfalto prestasse aten¢o no morro e seus sambas se tornassem famosos e disputados. Lembra-se de Mario Reis? Apesar de jl ser famoso n o Rio de Janeiro, ele foi logo querendo um samba seu e acabou sen do a primeiro a comprar run (pOl' uma mixaria, diga-se de passagem).
Soube que no seu tempo era comum que as compositores vendessem as direitos autorais de suas nulsicas e nao a autoria. A parte ruim 13 que nao existia um sistema bem ootruturado de valores e de recolhimento nessa transa¢o e esse acordo acabava sendo malfeito e 0 preQo ficava muito aquem do que realmente valia a trabalho . Comeyava, enta~, discreto seu momenta de fama . Imagino a quao satisfeito voce devia ficar ouvindo seus sambas nas vozoo de interpretoo tao importantes, como Francisco Alves, Mario fteis, Silvio Galdas, Garmem Miranda e Arnaldo Amaral. Nao demoraria muito para que outros mestres do samba se aproximassem de voce. Poi assim com Noel Rosa, musico que eu tanto gosto. Pelo que eu sei, Noel era quase um morador da sua casa, chegava a comer e dormir pOl' 18. depois das noitoo de samba. Nessoo dias, Deolinda tinha que cuidar da bebedeira dos dais . Confoose, ela chegava a tira-Ios do bar quando a situa¢o estava ficando feia . ~Qual foi a mal que te fiz" demostra bem essa cumplicidade dos dOis, tanto que Noel abriu mao da coautoria, dizendo que a samba era seu: Qual foi 0 mal que te fiz? - Gartola e Noel Rosa (1932) Diz qual foi 0 mal que eu te fiz?
Eunao te farei essa in gratidi.i.o Foi um palco contra nossa amizade Nao creias, nao pode ser verdade Nao creias nestas mentiras Que roubam nossa alegria Os invejosos se vingam Armados de hipocrisia A mentira infelizmente o mais forte amor destr6i Mas se eu nao tenho remorso o meu coraQi.i,o nao d6i Diz qual foi a mal que eu te fiz ? Eunao te farei essa in gratidi.i.o Foi um palco contra nossa amizade Nao creias, nao pode ser verdade Disseste que te enganei Nao sou tao fingido assim Talvez queiras um pretexto Para viver longe de mim Disseram que eu traia A nossa grande amizade E tao criminosa a culpa Que nao pode ser verdade
Tive noticia, inclusive, da admiraQi.i.o do maestro Villa -Lobos por voce. 0 mais surpreendente e que ele era um Ilulsico com extrema educaQi.i,o musical formal e demostrou humildade ao reconhecer a seu trabalho legitimamente. Acho tamoom que voce conseguiu demostrar sua gratidi.i.o pela admiraQi.i.o do maestro na primeira visita dele a. Mangueira, quando voce providenciou uma recepQi.i,o linda, com a Ala dos Periquitos acompanhando-o na subida do morro, enquanto a Ala das Cozinheiras descia cantando. Tudo aquilo deve ter sido incrivel e muito novo aos olhos de Villa -Lobos, e, com toda certeza, ajudou na divulgaQi.i.o do seu talento entre os musicos eruditos. Nao sei se vivendo na epoca dava para perceber a quanta foi rapida a consolidaQi.i.o das escolas de samba. Cronologicamente, em dez anos j8. havia muitas mais atem da Mangueira, eo Garnaval passou a tel' mais competiQi.i,o. Os concursos patrocinados por jornais, como 0 Mundo Sportivo e 0 Globa, eram prova disso. A concorrencia era tamanha que de 1941 a 1947, a escola de samba Portela foi campea e a Mangueira quase sempre conquistava 0 segundo lugar, mesmo com 0 esforQo sobre-humano da equipe verde e rosa . Era 0 premlncio da competitividade que hoje se ve nos desfiles do Rio de Janeiro e de sao Paulo, transformaQ6es que estavam comec;ando a se estabelecer naquela epoca.
Voceviu essa hist6ria atea decada de 1980, mas permita-me fazer uma critiea. As Escolas de Samba. que antes eram movidas, claramente, por amor a musiea e a farra, agora eausam certa duvida quan do as suas intenQoes. Muitas pessoas famosas sao disputadas para aparecerem nos desfiles e acaba.m tirando a destaque das pessoas que realmente sao das comunidades das escolas, alem de ser um espetaculo muito elitizado, j8. que a pre<Jo de um ingresso para assistir aos desfiles na passarela do samba. tem pre<Jos absurdos. Chega a dar desgostol Bem, tenh o uma verdadeira simpatia pela vida boemia, gosto da nOite, das possibilidades que a euforia pode trazer, mas tenho consciencia que se 0 limite nao e respeitado, 0 COI-pO desfalece. Eo seu corpo pediu arrego da vida na farra muitas vezes. Depois do epis6dio da morte da sua mae, acred.ito que voce s6 se mostrou tao fragilizado em 1946, quando teve meningite. Deolinda, como sempre, esteve presente como sua cuidadora e passou um ana completo lutando pela sua vida. Consigo sentir sua angllstia e seu agradecimento quando oUQo "Grande Deus", uma amostra clara de gratid.8o pela sua recuperaQfLo e, logo, uma musica de grande sucesso: Grande Deus - Gartola (1947) Deus,
Grande Deus Meu destino bern sei Poi traryado pelos ded.os teus Grande Deus De joelhos aqui eu voltei para te implorar Perdoai-me Sei que errei um dia Ohl Perdoai-me pelo nome de Maria Que nunca mais direi a que nao devia Eu errei, grande Deus Mas quem e que nao erra Quando ve seu castelo cair sabre a terra Julguei Senhor, daquele sonho Eu jamais despertaria Se errei, perdoai-me Pelo amor de Maria A recuperaQfLo, infelizmente, nao pode ser seguida por muito tempo de comemoraQfLo. Deolinda, sua grande companheira, faleceu sem sobreaviso, vitima do coraQfLo . Como, entao, se recuperar e se reerguer mais unla vez de tao grandiosa perda? Ate a Mangueira, escola de samba. que com tanto esforQo voce construiu, demonstrava autossuficiencia e desprezo . Imagino quanta dar esse peri ado deve ter Ihe eausado e
quanta tristeza sentiu ao perceber-se sozinho. Mas eu sei, esse nao e 0 fim da hist6lia e depois de muito tempo surnido (acredito que cerca de seis anos), sem cantar, sem compor, voce ressurgiu. R.essurgiu com Donaria, urna das mulheres de sua vida e a menos quelida entre os seus. Talvez porque ela nao cuidasse de voce como Deolinda fizera ou, talvez, porque nao merecesse mesmo seu amor. Quem sabelia responder e Carlos CachaQa eagradeQa a ele pOI' mais essal Foi ele que the tirou dessa encrenca e de Nil6polis, para onde voce havia se mudado, nao e? Alem de seu amigo, dessa vez, ele foi seu cupido, 0 responsavel pOI' colocar Zica na sua vida. Quem diria que urn dia voce se casaria com a irma da Menina, mulher do seu melhor amigo? Zica, assim como Deolinda, merece 0 meu respeito. Conseguiu faze-lo ressuscitar de uma situaQ80 dificil de imaginal'. Fraco fisicamente, abalado emocionalmente, sem dentes, consurnindo litros de cachaQa pOI' dia e ainda com urn problema gravissimo no nariz, a rrnofima, que chegava a deformar 0 seu rosto. Acredito muito na influencia e na energia do ambiente em que se esta., e nao podia tel' melhor passo para a sua recuperaQ80 do que 0 seu retorno a. MangTIeira. Deve tel' sido urn susto para a rapaziada ve-lo ressurgir, j8. que muitos 0 julgavam morto. Aos poucos, amigos e admiradores foram aparecendo para reve-lo e sua vida foi tomando 0 eixo com seu n ovo emprego de lavador de carros
em Ipanema. Olha, achana bem estranho se ninguem. fizesse nada sabendo que voce tinha urn grande talento como nnlsico e urna obra primorosa j8. construida, e estava traba.lhando para sobreviver em urna garagem. Nao desmerecendo seu trabalho, mas voce precisava ser redescoberto. Grayas ao meu colega de profissao e tambem. companhei1'0 na admiraQ80 pOI' voce, Sergio Porto, que escreveu urna coluna saudando a sua red.escoberta, e fazendo urna critica ao desinteresse do mercado musical e das fablicas de disco, voce voltou a entrar na cena musical. Era esse 0 empurraozinho que the faltava para recomeyar sua carreira. Primei1'0 na radio Maylink Veiga e depois mais diversas outras ofertas de emprego pOI' politicos, musicos e admiradores. Dali para 0 periodo mais feliz da sua vida selia run pulo . S6 de pensar na deli cia que deve tel' sido a casa de samba. Zicartola, eu j8. me encho de vontade de tel' vivido nessa epoca da decada de 1960. Selia runa houra ba.tucar ao lado de Nelson Cavaquinho, Elton Medeiros, Carlos Lira. Voce e Zica deviam estar radiantes. Acredito ser pOI' isso que resolveram, enfim, se casar, mesmo morando juntos ha muito tempo e ambos sendo viuvos. Se nao me falha a mem6lia, foi quando voce recolhia papfus para 0 seu casamento que descobliu que seu nome na certidB.o de nascimento estava esclito errado, nao e uAngenor". Essa hist6ria j8. rendeu muitas lisadas.
Voce com 56, Zica com 51. Nunca e tarde para declarar a amor. Na vespera do casamento ela ganhou de presente um samba com uma das declaraQoes mais sinceras de amor que ji. vi: Nos dais - Gartola (1964) Esta chegando a momenta De irmos pro altar Nos dois Mas antes da cerimonia Devemos pensar em depois Terminam nossas aventuras Chega de tanta procm'a Nenhum de n6s deve ter Mais aJguma ilus8.o Devemos trocar idfuas E mudarmos de idfuas Nos dois Ese assim procedermos Beremos felizes depois Nada mais nos interessa Bejamos indiferentes B6 nos dOis, apenas dOis,
Eternamente Pena que a insucesso do negocio mio acompanhou a felicidade crescente de voces dais. A fama da casa de samba Zicartola nao durou muito e as dividas comeQ8ram a assombrar novamente a sua vida . Mas como eu sempre digo, nos temos que ver a lado bam eo aprendizado de cada decepQii,o. Nesse caso, tenho aOOoluta certeza de que a mudanQa para casa do seu pai fez com que voces finalmente se reconciliassem, depois de anos brigados. Vi recentemente um video em que seu pai 0 acompanha enquanto voce canta a divina "0 mundo e mn moinho", minha musica favorita da sua obra: o Mundo e um moinho - Gartola (1976) Ainda e cedo, amor Mal comeQaste a conhecer a vida Ja anuncias a hora de partida Bem saber mesmo 0 rumo que iras tomar Preste atenQii,o, querida Embora eu saiba que estas resolvida Em cada esquina cai um pouco a tua vida Em pouco tempo nao seras mais 0 que es OUQa-me bem, amor
Preste atell(;:ao, 0 mundo e um moinho Vai triturar teus sonhos, tao mesqllinho Vai reduzir as ilusoes a p6 Preste atenQB,o, querida De cada amor tu herdaras s6 0 cinismo Quando notares estAs a beira do abismo Abismo que cavaste com os teus pes Bobre essa letra, ha uma lenda que voce a teria feito para a sua entee.cIa, filha de dona Zica que queria sair decasa com 0 intllito de se prostituir. Nao soube de nenhuma confirmaQB,o sua sobre iSSO, mas se for roolmente verdade, selia umlindoapelo. Outra coisa boa que lhe aconteceu foi receber cia prefeitura um terreno no morro cia Mangueira. Estava claro 0 reconhecimento da sua import8.ncia para aquele lugar. Alem disso, voce pode usar suas habilidades como pedreiro e assim constrllir sua propria casa, mesmo que j{l na velhice. Fico feliz que voce tenha visto a sua consagraQ8.o ainda em vida. Voce passou quase 50 anos fazendo musica e s6 em 1974 teve a oportunidade de gravar um disco so com musicas suas e sendo 0 linico interprete. Mllitos criticosjulgaram esse traba.lho como 0 disco do ano e quem sou eu para discordaro E um disco lindol Alem de musicas, ele reuniu anos de vontade, a nata dos instrumentistas de samba. e os seus maiores sucessos de todos os tempos . Ate Jose Ramos Tinho-
rao, um critico historiador da musica brasileira, profetizou na epoca que s 6 a perspectiva historica permitira compreender sua verdadeira import8.ncia", mas nao foi necessario mllito tempo para que 0 reconhecimento e 0 sucesso do disco fossem alcancados e esse traba.lho fosse seguido de um segundo disco solo, dois anos depois. Ate trilha sonora de novela suas musicas se tornaram nessa fase. Fiquei sinceramente raivosa quando tive noticia que 0 cantor Roberto Carlos se recusou a gravar uma das suas musicas mais aclamadas, "As rosas nao falam", sabendo que esse era um grande sonho seu, e ainda fazendo deboche. Disse que nao s6 as rosas falavam, mas outros varios vegetais na sua cobertura na Urca dialogavam com ele. N
As rosas nao falam - Gartola (1976)
Bate outra vez Com esperancas 0 meu coraQ8.o Pois jl vai terminando 0 verso Enfim Volto ao jardim Com a certeza que devo chorar Pois bem sei que nao queres voltar Paramim Queixo-me as rosas Mas que bobagem
As rosas nao falam
Simplesmente as rosas exalam o perfume que roubam de ti, ai Devias vir Para ver as meus olhos tristonhos E, quem sabe, sonhavas meus sonhos Par fim Olha, nao sou de guardar rancor, mas acredito que pessoas assim nao mereciam tel' a quantidade de fii.s que tem. Mas esse foi so um desabafo. Voce jL nao precisava mais tel' inseguranca quanta ao seu talento, com 70 anos recem- completados voce estava no auge da carreira e ganhando mais dinheiro que em toda a vida de trabalho como tip6grafo, pedreiro, lavador de carras, funcionario publico e dono de bar. Voce se lembra de quando eu disse que voce nao gostava do batente? Nessa epoca de que falamos eu jL nao diria isso. Beu profissionalismo, na divulgaQB,o de seus discos e nas suas apresentaQoes, era exemplar e sua serenidade jL anunciava que voce estava se preparando para a .tim. Mesmo com a espirito renovado e as recompensas de toda uma vida de talento, sua saude nao pode aproveitar dessa reconstrwyao . Os anos de descaso com a proprio corpo um dia mostraram seus efeitos. Voce tinha a direito de nao querer tratamento. Acredito que faz parte do tratamento a
desejo de ser curado e sea cura nao podia vir de forma natural que nao fosse feita. No seu Ultimo aniversario em 1980, aos 72 anos, voce sabia que esse seria a seu Ultimo festejo. Bua sabedoria esteve presente ate n o Ultimo momenta da sua vida. Mestre, a desejo de me despedir com um pedido de resposta e inegAvel, mas eu me contentaria em saber que voce esteve comigo em forma de cancao durante toda a escrita dessa carta. Obrigada pOl' passar um pouco da sua inspiracao na inscrita e pOl' me in spirar na vida. Binto sua falta. Com carinh o. Ps.: Nao sei se voce teve tempo de ler a cr6nica wMoinho do mundo" que a poeta Garlos Drummond de Andrade escreveu para voce no Jornal do Brasil dias antes da sua partida, par isso deixo aqui registrado um pequeno trecho para a seu deleite postumo e para meu prazer saudoso. "0 n obre, a simples, nao direi a divino, mas a humano Gartola, que seapaixonou pelo samba e fez do samba a mensageiro de sua alma delicada. 0 sam calou- 00, e 'fui a vida', com o ele gosta de dizer, isto e, a obligaQB,O daquele dia. Mas levava uma companhia, uma amizade de espirito, a jeito de Gartola batar em lirismo sua vida, as seus amores, a seu oontimento do mundo, esse moinho, e da poesia, essa iluminacao."
Entrevista ficticia Cordiais Cordiais
Sauda~oes
- Bom dia, Cartola, como va i? Queria Ihe fazer
Sauda~oes
- Ai, Caltola ! Voce nao existe! Me conte como
foi que surgiu esse sell apelido?
algumas perguntas. Bom, seu avo era um verdadeiro pai para voce e conseguia sustentar toda a familia cozinhando na casa do deputado
Cartola - Esse apelido " Caltola" e pOl¡que eu usava um chapeuzinho
Nilo Pepnha. Voce se sentia especial nessa epoca?
coco, eu trabalhava em obra e comepram a me chamar de Caltola. Porqlle
0
chapeu era pra nao apanhar cimento no cabelo, ne? Entao,
Cartola - Antes de meu avo mon¡er, nao havia pretinho mais bem ves-
eu usava aquela cartolinha. Era nm chapeu coco.
tido do que eu em todo 0 baino das Laranjeiras.
chamar de Cmtola, Cartola e pegou
Cordiais
Sauda~oes
- Eu imagino! Pena que ele foi embora cedo. Mas
acredito que a dor da perda de um avo ja e algo que nos preparamos para sentir durante a vida, diferente da morte de lUIla mae, lUna
afli~ao
que mmca se espera. No seu caso, deve ter sido ainda pior, sabendo que foi uma
cOl11p li ca~ao
no parto que podia ter sido contomada se
nao houvesse omissao medica. 0 que voce sentiu quando a perdeu?
Cordiais
Sauda~oes
0
Come~aram
a me
apelido.
- Entendi. Agora me conte um pouco sobre a sua
mllsica. Sei que ate os sells 65 anos voce nao tinha lUn disco gravado so com a sua voz, mas muitas pessoas tiveram a opOltunidade de gravar suas mllsicas. Quem foram os seus principais intapretes? Cartola - 0 primeiro intaprete que gravou minhas milsicas foi
0
Chico
Alves, depois Mario Reis, Cannem Miranda, Gilberto Alves, Silvio Caldas, Elizete Cardoso e por ai eu vim pegando todo mundo. Quem
Cartola - Um tro~o no peito, mais pesado que eu. E que eu nao expli-
entrava no caminho ia gravando.
. . cava pra mnguem.
Cordiais Cordiais
Sauda~oes
- Depois da 11100te da sua mae, inclusive, voce se
Sauda~oes
- COIllO voce fazia para oferecer essas mllsicas?
Voce vendia?
entregou aos mais diversos habitos mundanos, mas quais voce consi-
Cartola - Quem e que ja nao vendeu music a? Qua l 0 compositor do
derava ser seus maiores vieios?
nosso tempo que nao vendia I11llsica?
Cartola - Meus vieios sempre foram fumar, beber, tocar violao e eOlTer atras de mulher.
Cordiais 90
Sauda~oes
- Mas voce vendia a parceria? 91
Cartola - Eu vendia
0
direito de disco so, nao, parceria nao. Eu vendia
a milsica, porque naquela epoca, era a epoca que comer;:ou a aparecer essas vitrolas portateis, isso vendia muito disco. Entao eles comprayam
0
samba nosso, pOl¡que ganhava muito dinheiro com disco, vendia
muito disco. Entao eu vendia mel! samba, mas queria que saisse meu nome. Samba de Agenor de Oliveira. Cordiais
Sauda~oes
- Mas sell nome nao e Angenor?
Cartola - Naquele tempo, ell chamava Agenor de Oliveira, hoje me chamo Angenor, porque quando eu fui casar e que eu vi isso, ue. FlIi tirar a papelada pro casamento, e que eu vi que meteram lUn " n" no meio do " a" e
0
"g", entao ficou Angenor. Pra nao mexer naquela pa-
pelada toda ell deixei ficar como estava, Angenor de Oliveira. Cordiais
Sauda~oes
- Pois muito obrigada, Angenor.
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COlli qlle rollJXl (1930)
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Norl dr Mrdril'os Rosa,
e b06nios da historia da mllsica popular do Brasil.
CompositOl', violonista r cantor Nascimrnto: Rio de Janeiro, capital, 11 dr drzrmbl'o dr 1910 Morlr: Rio dr Janriro, capital, 4 de maio dr 1937
Como bom mulherengo que era, imagino que ele fosse adorar receber uma carta minha e eu nao hesitaria em comec;ar essa conversa.
Noel R osa era um apaixonado. Amou tanto a vida que a deixou escapar. Nasceu e passou todos os seus poucos anos em Vila Isabel , bailTo do Rio de Janeiro imOitalizado pelos seus sambas de homenagem, os mesmos que Ihe renderam tambe.n 0 titulo de " Poeta da Vila". Foi intenso e em apenas 26 anos de vida conseguiu transfonnar 0 camaval carioca e
0
samba brasileiro, mesclando 0 som do mOiTO com
o do asfalto e miscigenando a produC;ao musical. E uma lUmnimidade no que se refere a sua alta qualidade como mllsico e, a cada ano, sua obra parece ganhar mais vida e mais inteq)retac;oes, como uma prova que a milsica pode ser tao enigmatica quanto bela. o alto valor dado aos sambas de N oel nao impede que suas letras de parodia e humor sejam aceitas com leveza pelos idolos e pela critica. Afinal Noel mmca chegou a ser " adulto" e pm'ece que ate hoje e tun menino que brinca com as cOinposic;oes. Noel e indefinivel, 0 jomalista Paulo Mendes Campos ja pronunciava esse fato em 1954 em lUna declarac;ao a revista "Manchete": "Noel Rosa, na mllsica popular brasileira, pode ser ou nao hannonioso, 0 mais romantico, 0 mais realista,
0
0
mais
mais ritmado, etc. ;
indiscutivelmente, ele e apenas 0 maiOl' compositor popular brasileiro". Depois de uma declarac;ao dessas, Noel nao poderia ficar de fora deste livro, como representante de toda uma classe de milsicos geniais
98
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Bauru, doze de novembro de dois mil e treze Cordiais sauda<;:6es! Como vai, Noel? Estou certa que essa carta vai lhe agradar. Bou mulher, de vinte e poucos anos, e conhe<;:o a sua fama. Ah, conhe<;:o bem! Ouvindo as suas musicas compreendo que e possivel maliciar 0 mais corriqueiro dos dialogos e, nao me leve a mal, eu gosto disso . Gosto de quem tem esperteza e brilho nos afetos . Deve ser por isso que pessoas como voce vao-se jovens. Voces nao podem perder 0 brilho. Bem querer ser, masj8. sendo precipitada, voceteve med.o de m orrer ? AB vezes me pego imaginando 0 quao eterna e ao mesmo tempo provisoria e a vida de um jovem. Todos os excessos, os prazeres fisicos, os mergulhos profundos, tudo isso ao mesmo tempo em que nos passa a sensaQii.o de imortalidade, n os leva mais proximos ao fim. Mas que fim e esse que se quer evitar? Be foi de prazer, se foi de amor que se quis viver, que se viva plenamente, que se acabe. Muitos anos depois de voce, outr os muitos idolos da musica mostraram 0 quanto pode ser fragil a vida de quem se entrega A uma juventude profunda e A descoberta radical dos prazeres e desprazeres. 0 NClube dos 27 " foi assim, run grupo de musicos do rock e do blues que foram int en sos ate o fim . Janis Joplin, Kurt Cobain, Amy Winehouse, Brian Jo-
nes, Jimi Hendrix, Jim Mor rison sao alguns dos rmlsicos que partiram com 27 anos. Musicos - nao sei se igualmente a voce - mas absolutamente talentosos, que faleceram por algum de seus excessos e fi zeram historia nao so pela musica, mas por t oda a transgressao que seu comportamento inspirava. Alem desses, muitos outros artistas morreram depois dos 27, mas igualmente jovens demais, e marcaram nas mem orias de seus admiradores a ideia de juventude eterna. cazuza, R.enato Russo, cassia Eller, Elis Regina, Maysa, Ian Curts sao exempIos disso. Desculpe se jogo muitos nomes desconhecidos n essa carta, mas na minha geraQii.o todos estB.o vivos nas memorias mais profundas de afeto e in spiraQii.o, tanto quanto voce estA nas minhas. Na vespera do dia 11 de dezembro de 1910, a Revolta dos Marinheiros trazia balas de canhao e r ebuliQo para a cidade do Rio de Janeiro. Nesse dia, seu nascimento tamoom nao poderia ser con siderado um acontecimento calmo. Nao se ofenda, mas sua mae nao era considerada uma boa Nparideira~ . Sua bacia estr eita seria um motivo mais que justo para uma cesariana se fosse alguns anos mais tarde. Sem essa opQii.o, 0 jeito era fazer nascer. 0 medico ainda em formaQii.o deu provas da sua inexperien cia e, mesmo com a ajuda do principal clinico do bairro, fraturou sua mandibula com as laminas do for ceps. Esse erro fez com que 0 desenvol-
vimento do osso fosse prejudicado a cada ano, mesmo com diversas cirurgias reconstitutivas na adolescencia, mas essa historia voce deve estar cansado de oUvil'. Tenho orguIho de saber que esse ocorrido nunca a inibiu. Nao faz muito tempo que eu deixei a escola e me lembro bem o quao prejudiciais podiam ser certas zombarias. Babe Noel, 0 seu queixo defeituoso - que lhe marca de forma singular - trouxe ainda mais con sequencias: um corpo esguio e fraco pela dificuldade de mastigar, e, por incrivel que pare{:8, ajudou tamoom a formar um adulto bem resolvida e seguro sobre os inconvenientes da sua aparencia. No GinAsio de sao Bento voce fOi, inclusive, zombado por essa condiQii,o, era, segundo declaraQoes suas, chamado de ~queixinho" [atitude que seria faMlmente dtegnost1oada de bul1y1ngno8 dtes de hojel , mas voce nao permitiu que isso se tornasse run trauma . Alias, desconfio muito que eles te chamassem assim. Essa mania de par apelido nas pessoas era coisa sua, fale a verdade. Um jeito descontraido que definitivamente nao fazia parte dos seus m omentos de silencio que se entregava em casa, externando a angUstia tipica dos genios. Era mau alrulo na escola e sempre andava na ~contra mao". Beu comportamento critico, inconformado e desajustado nao permitia que a doutrina beneditina de preconceito e moralismos lhe afetasse. Be nascesse nos anos dois mil, com certeza, ainda selia a moderno entre as colegas e esta-
ria conosco na luta pelo tim das doutrinas aparteadoras. Ate sair do colegio, pelo que percebo sua criatividade nao era ainda usada para a musica, a nao ser para as parodias, em sua grande parte, obscenas, que voce fazia para divertir os amigos. Nesses tempos de sao Bento, voce era praticamente um lider infra tor dos ~bons costumes" entre os colegas e uma ameaQa para os seus supeliores. Ao mesmo tempo em que nao contlibuia para a revista oticial do ginasio, A Alvorada, voce escrevia 0 Mamao, um jornal manuscrito que passava ardilosamente entre os colegas, despontando seu humor muito pessoal. Tai, isso e algo que eugostalia de ter feito. Apesar de sempre m e interessar par jornalismo e estar prestes a me formar nesse curso, eu nunca fiz um jornalzinho ou um folhetim que seja na escola. Bom, mas enfim, nao preciso lhe relembrar de tudo iSso, ninguem e mais apropriado que voce para saber das suas pelipecias de inrancia, au melhor, talvez uma pessoa saiba mais que voce, a sua mae, Marta de Medeiros Rosa, uma dona de casa dedicada ao lar, aos filhos e ao mali do, 0 seu pai, a inventor Manuel Garcia de Medeiros Rosa . Alias, que protiss8o incrivell Hoje em dia, acho que nao temos mais uma protiss8o com esse nome, talvez seja porque as coisas imaginaveisj!. estejam quase todasinventadas, pretensiosamente falando. Enfim, voce fez parte de uma nova classe media baixa,
branca e mulata, que se formava n o Brasil desde 0 segundo Reinado, e isso marcava a sua diferenQa em rela¢o aos seus contemporaneos e parceiros na genialidade musical, os negros do m orr o, aqueles com quem voce dividia a mesa e 0 samba no botequim. Noel, ji. disse isso para autros musicos que eu admiro, mas me deixe contar outra vez . Sou de uma gera¢o pr ofundamente exposta a informa¢o, de qualquer tipo e muito acessivel, mas sou tamoom deuma geraQ80 que nao conhece o antigo, que se limita. Voce e suas musicas, infelizment e, fazem parte do que eu digo ser Uantigo" e culpo-me por nao ter sabido antes dos seus feitos. 0 m eu desejo e que todas as pessoas de vinte e alguns anos, au melhor, todos os brasileiros em geral saibam valorizar a sua musica. Isso foi s6 run desabafo. Vamos voltar a falar de voce. A sua paixao pela musics com8Qou de uma forma muito distante da minha realidade . Imaginar um adolescente fazendo serenatas e saraus de rua com musicas r ebuscadas e romanticss, com o as de candido Neves e Gatulo Paixao Cearense e in con cebivel nos dias de hoje. 0 seu segundo passo na musica foi tamoom surpr eendente. Surpreendente para mim, clar o. Grupos de musicas n ordestinas com o 0 que voce fez parte, 0 Bando do Tangaras, eram moda no Rio n o fim da decada de 1920, tanto que quando 0 rei do Baiao, Luiz Gonzaga, ch egou la ele ji. achou run campo pronto para agir. No seu grupo, todos cantavam e tocavam, mas seu foco era ser
o violonista e, por iSso, nao precisava interpretar 0 sotaque do nordeste que muitos musicos faziam de forma caricatural e feia. Que sorte a sual Comparando com os dias de h oje, os estudios de gravaQ80 de antigamente eram muito limitados, tanto que se 0 Bando do Tangaras tivesse mais de cinco musicos ji. nao teria espaQO para todos. Alias, existem tantas possiblidades e manipulaQoes nas gravaQoes que 0 talento ji. parece ser dispensavel em muitos casos, infelizment e. CorrijEl.-me se eu estiver errada, mas voce nao parecia r ealizado nesse grupo. Desconfio que sejEI. pela falta de oportunidade de tocar 0 que voce realmente gostava e 0 que lhe fazia bem, mas, apesar disso, os quatro anos do grupo foram um grande saIto rumo ao seu sucesso e con sagra¢o. Talvez o lam;am ento bem sucedido da musica ~ Com que Roupa?" [mUsica que t'ez1a uma pa.r6d1a. ao r1tmO do bino Deoional] , tenha sido 0 fato necessario para que voce se encontrasse de vez n o samba. E nao qualquer samba, mas sim aquele nascido nos morros do Rio de Janeiro, espalhado pelas classes baixas e de onde surgiram as escolas de samba. Essa sua preferencia ch ega a ser curiosa, ji. que normaimente quem era da Cidade Nova, 0 seu berQo, gostava de outra modalidade. LA 0 samba tinha versos improvisados e muito danQantes, origem baiana, dos n egros ioruban os que foram para 0 Rio nos fins do seculo XIX, tinha influ encia tamoom de ritm os europeus e mais se parecia com maxixe. 0 seu samba,
entretanto, nao era bam de dancar, mas sim gostoso de ficar em roda, cantando, era vindo dos m orros, onde viviam os negros bantos alforriados vindos do Vale do Paraiba. 0 seu samba escolhido era mais lento, nost81gico, com frases melodicas longa s e de musicos autodidatas. Como eu j8. havia lembrado, e dessa sua modalidade que nasceram as escolas de samba, sendoa ~Deixa Falar" da Est8cio de sa a primeira. Saindo do Bando do Tangaras voce teve a oportunidade nao so de abracar um ritmo, mas tamoom de renova-lo, fazendo parcerias com sambistas n egr os do morro . Essas parcerias inter-raciais eram incon cebiveis na sua epoca e voce mostrou nobremente que nao se afetaria com babagens como essas. Alias, 0 racismo era algo muito mais declarado no com eQo do secuJo XX do que hoje em dia. Claro, ha muito, e por uma pesada h eranca h istorica, ainda existe muita desigualdade social entre negros e bran cos aqui. Pelo men os, ha 25 anos temos uma lei no Brasil que define os crimes resultantes de preconceito racial. Sei que 0 natural seria que as pessoas nao se discriminassem, mas a punic;:a.o pode ser um processo paliativo para esse fun . Diferentemente do que as suas vizinhas em Vila Isabel falavam, voce nao estava se metendo com ugentinha" e sim com genios da musica, com o Gartola e Ismael Silva, musicos esses apresentados por Francisco Alves, um verdadeiro visionario de sucessos. Pena que voce nao teve tempo de apreciar 0 auge das carreiras desses seus amigos em vida , Noel,
euma pena. Pelo que 0 conhrn;:o imagino que as suas composiQoes sempre comecavam na mesa de bar e dealguma maneira se estabeleciam com uma sintonia perfeita entre voce e 0 parceir o da composiQii,o. Exemplo disso e a ~Para me livrar do mal", feita junto com Ismael Silva: Para me livrar do mal - Noel Rosa e Ismael Silva (1932) Estou vivendo com voce Num martirio sem igual Vou largar voce de mao Com ramo Para me livrar do mal Supliquei humildemente Pra voce se endireitar Mas agora, francamente Nosso amor vai se acabar Vou embora afinal Voce vai saber porque E pra me livrar do mal Que eu fujo de voce Vou lhe confessar uma coisa, antes de pesquisar a fundo sabre a sua vida, achava que voce tinha sido m edico, nao sei por que. Foi recentemente que soube que 0 seu contato com a
medicina nao passou deuma brevepassagem de um semestre pela faculdade e tamOOm porter irmao eav6 medicos. 8ei que nao adiantava lutar, seu talento estava na musica e voce conseguiu ser um dos poucos, senao 0 Unico que viveu s6 desse oficio durante toda a vida . A forma mais comum que voce encontrou para ganhar seu sustento na musica foi como cantor de radio, nao foi? E mesmo nao tendo um cache tao alto como a de Garmem Miranda e Francisco Alves, suas constantes participaQOes Ihe rendiam aIgum dinheiro. Sei que era impossivel viver s6 de venda de discos e direitos autorais na sua epoca e, apesar de voce tel' nascido em uma familia de classe media, nao contava com luxo nenhum e pOI' vezes, vivia a beira da pobrezs. Voltando a falar das suas parcerias, os musicos do morro nao foram seus Unicos companheiros musicais, alem deles voce tamoom compos musicas com nomes j\ consagrados da canQiLo popular, como Ary Barroso e Silvio Galdas. Nao cabe a mim, dizer em qual desses dois nucleos voce foi mais bem sucedido, talvez nem haja. uma resposta para iSso, mas 0 que eu posso afirmar e que tanto fazia para voce que alguns musicos fossem mais afamados que outros, suas composiQoes mostravam qualidade impecavel em qualquer parceria. Em m:imeros, sua coautoria mais fiel, alem de lsmael, era com 0 pauIista Vadico. Com ele, voce fez samMS e marchas de qualidade insuperavel. 0 seu lado intllitivo e 0 lado tecnico de Vadico se completavam harmonicamente em varias composiQOes, como
a consagrada UFeitio de oraQiLo", com a melodia do pauIista e a sua letra, tudo se completando maravilhosamente: Feitio de ora¢o - Noel Rosa e Vadico (1933) Quem acha vive se perdendo POI' isso agora eu vou me defendendo Da dol' tao cruel desta saudade Que, pOI' infelicidade. Meu pobre peito invade Batuque e um privilt3gio Ninguem aprende samba no colt3gio SambaI' e choral' de alegria E sorrir de n ostalgia Dentro da melodia Par isso agora la na Penha Vou mandaI' minha morena Fra cantsI' com satisfa¢o E com harmonia Esta triste melodia Que e meu samba em feito de ora¢o o samba na realidade nao vem do morro Nem la da cidade E quem suportar uma paixao Sentira que a samM enta~ Nasce do cora¢o.
Noel, tenho 22 anos, sou um pouco mais nova que voce quando descobriu que tinha os pulmoes tuberculosos . Tento muito, mas nao consigo imaginar 0 que voce sentiu quando recebeu essa noticia, a inda mais sendo voce um rapaz que sempre se mostrou tao animado e apaixonado pela vida. Alem disso, foi nessa mesma epoca que voce perdeu tamoom muito da sua liberdade. 0 casamento forQado com Lindaura pode ter sido bam em muitos aspectos, principalmente pela sua saude, mas nao vejo cuidado tao efetivo quanto 0 amor e isso eu sei que nao era por ela que voce sentia. A doenQa, 0 casamento indesejado, 0 suicidio do seu pai, as dividas da casa na Vila Isabel e as parcerias desfeitas com Francisco Alves e com Ismael Silva, tudo ao mesmo tempo e voce tao novo e talentoso suportando tudo. Alem. disso, Ceci, ah Ceci, seu grande amor tamoom a abandonara depois de seu casamento e foi ficar com a multitalentos Mario Lago. Eu ji. teria procurado ajuda espiritual em uma hora dessas, falo serio Noel, que momento carregado! Falando em Ceci, tem uma musica que voce compos para ela que eu gosto muito, em que voce conta como voces se conheceram, vou escrever aqui para relembrar: Dama do Gabare - Noel Rosa (1934) Foi num cabare na Lapa Que eu conheci voce
Fumando cigarro, Entornando champanhe no seu soiree Dancamos run samba, Trocamos um tango par uma palestra S6 saimos de lil meia hora Depois de descer a orquestra Em frente a porta unl bom carro nos esperava Mas voce se despediu e foi pra casa a pe No outro dia la nos Arcos eu andava A procura da Dama do Gabare Eu nao sei bem se chorei no momenta em que lia A carta que recebi, nao me lembro de quem Voce nela me dizia que quem e da boemia Usa e abusa da diplomacia Mas nao gosta de ninguem Poi num cabare na Lapa ... Bom, a situaca.o nao estava facil e disso nos dois sabemos, nao e? Ainda bem que sua temporada em Belo Horizonte com Lindaura foi positiva para a sua recuperaQ8o, tanto que ate conseguiu um emprego como contrarregra na RAdio Clube do Brasil. Esse periodo foi fervoroso na sua produca.o musical, compos para filmes, fez parodias, cantou nas radios e continuou produzindo canQoes de sucesso para 0 Garnaval. Par mais boemia que fosse sua vida, nao se pode negar que voce sabe ser muito profissional, ji. que foi nos seus mom en-
tos de maior tristeza e saude debilitada que voce produziu suas melhores musicas, inclusive algumas com mensagens de otimismo e de humor. Talvez mais que a doenQa, 0 motivo maior da sua tristeza fosse estar longe de Ceci. Foram tantas musicas dedicadas a ela, em m omentos de abandono, raiva, tristeza, cilimes que posso dizer que conh8Qo a fundo 0 relacionamento de voces e me emociono profundament e com a musica de despedida dedicada a ela ~M eu Ultimo desejo~:
Be voce me quer ou na.o Diga que voce m e adora Que voce lamenta e chora A n ossa separa¢o As pessoas que eu detesto Diga sempre que eu nao presto Que meu lar e 0 botequim Que eu arruinei sua vida Que eu nao mer8Qo a comida Qu e voce pagou pra mim
l'htimoDesejo - Noel Rosa ( 1937)
E incrivel como ouvir eSM musica me enche os olhos de Nosso amor que eu nao esqu8Qo E que teve 0 seu com8Qo Numa festa de sao J 030 Morre hoje sem foguete Bem r etrato e sem bilhete Sem luar, sem violao Perto de voce m e calo Tudo penso e nada falo Tenho medo de chorar Nunca mais quero 0 seu beijo Mas meu Ultimo desejo Voce nao pode n egar Be alguma pessoa amiga Pedir que voce the ruga
emo¢o. Voce tem esse poder, Noel, voce nos faz sentir profundam ente as suas emoQoes transmitidas pelas suas canQbes. E notavel tamOOm. a quantidade de musicas com teor critico e politico feitas por voce, todas na primeira metade da Nova Republica e antes do Estado Novo de GetUlio Vargas. NotAvel, sim, porque foram feitas por um jovem que poderia muito bem nao ligar para questbes como essas. Entendo que morar e viver na capital da Republica e onde os acontecimentos sao mais marcantes delega traQos politicos mais atentos as pessoas, ainda mais a voce, que raramente saia da cidade do Rio de Janeiro. Gostaria de the contar sobre a musica brasileira que seguiu 0 seu legado. Depois de voce, muitos continuaram n o samba. e desse ritmo nasceram varios outros criados por ru-
ferentes classes sociais e com harmoniza<;:oes das mais diversas. A Bossa Nova e um gener a musical que nasceu na decada de 1950 e que foi muito importante para 0 r econhecimento da musica brasileira, principalmente internacional. o carioca Tom Jobim foi um dos principais representantes desse ritmo e e uma pena que voces nao tenham se conhecido. Jobim, inclusive, declarou que ninguem cantou a Rio melhor do que voce e olhe que muitosjEL tentaram apresentar a sua cidade em forma de can<;:ao. Eo interessante e que voce nao so cantou a Vila Isabel, mas tamoom a Penha e muitos outros ba.irros da cidade, mostrando assim que a sua paixao era bem maior que um ba.irrismo, era uma paixao in crivel pelos subUrbios e pelos personagens curiosos desses lugares, como a mulata, 0 malan<iro e 0 jo8o-ninguem. Noel, estamos a quase 80 anos da sua partida e 0 seu traba.lho a inda e e, acredito que sempre, sera. uma unanimidade quanto a. qualidade. Alga que nao e de concord8ncia geral sao a s suas inten<;:oes e suas visoes politicas, que voce deixou por vezes muito pouco explicitas e nao t eve tempo de explica.-las. Mas JEL vou lhe avisando, os pesquisadores de hoje em dia sao muito minuciosos, ligados excessivamente ao pOliticamente correto e n essa carta eu nao vou fazer 0 papel de um deles e te julgar par alguma palavra que pare<;:a preconceitu osa, racista ou ate moralista, porque sei que voce nao tera. com o se defender e acredito que seu modelo de vida rodeado das minorias, que supostamente eram viti-
mas dos seus versos, JEL prova que tudo nao passa de um mal entendido. Curiosa que todo esse volume de estudos, criticas e discussbes nao se seguiu logo apos a sua morte. Inclusive, durante mais de 10 anos nada foi discutido a seu r espeit o, um destino m uito comum dos artistas populares brasileiros, infelizm ente. Ainda bem que 0 limbo em que lhe colocaram nao durou muito tempo, e j{l na decada de 1950 voce voltou a ter a sua devida valoriza<;:ao musical, passou a ser gravado por artistas in criveis e virou praticamente uma lenda brasileira . Como sua grande la, sou suspeita para dizer que 0 elejo 0 melhor compositor au 0 mais importante da sua epoca, mas posso afirmar que voce foi 0 responsavel por fundir a musica doasfalto com 0 melhor samba. carioca, a do morro, e assim criou nao um novo gen era musical, mas um novo som que parece estar mais vivo a cada dia. Nao m e resta outra alternativa, se nao lhe agradecer por esse legado. Espero que voce aprecie a minha carta. Esperaria ansiosa pela sua r esposta, mesmo que fosse naquele m odelo jocoso da musica uCordiais sauda<;:oes". "Responde que eu pago a selo?" 3 Com afeto. â&#x20AC;˘ Trecho da musica do genero sam ba, [nvio [ SSiiS Mal Tra~adas linhas, de Noel Rosa, ano de 1935
composi~ao
Entrevista ficticia Cordiais
Sauda~oes
mllsico no
come~o
- 01<i, Noel! Tudo bem? 0 que voce acha que lUn
de caiTeira deve prezar mais, pelo
esfor~o
ou pelo
talento?
Noel - A voca~ao e necessaria ate para se dar 0
la ~o
na gravata.
Cordiais Sauda~oes - Voce tem razao. E quando voce decidiu abandonar a canoeira de medico e se dedicar exclusivamente a Illllsica, voce fez uma
declara~ao
curiosa ao seu entao colega e futuro medico Lauro de
Abreu Coutinho, 0 que voce disse a ele?
Noel- " Como medico, eujamais ser ei um Miguel Couto (medico, professor e politico brasileiro/1865 -1934). Mas quem sabe eu nao poderei ser 0 Miguel Couto do samba?" Cordiais
Sallda~oes
- E pode ter ceJteza que voce como Miguel Cou-
to, fo i 0 melhor no que se propos a fazero Parabens pelo seu traba Ulo e obrigada pela eJltrevista, Noel.
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Alegria (1938)
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Jose Assis Valente,
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CompositOl' Nascimento: SalvadOl', Bahia, 19 de maq:o de 1911 Morle: Rio de Janeiro, capital, 11 de maq:o de 1958 Assis Valente pode ser 0 menos conhecido dos cinco mllsicos retra-
te" . Ell e Assis ainda temos muito qlle nos conhecer enos falar, e se eu pudesse mandar lima primeira carta para estrear essa amizade, e1a seria muito parecida com essa:
tados neste livro, mas n1l0 tem nada que 0 facta menos talentoso. Avenhlrou-se na composiC;ao dos mais diversos ritmos festivos brasileiros e foi 0 principalletrista de muitos int6pretes afamados. Cannan Miranda (1909 - 1955) era a principal delas e 0 grupo Novos Baianos (desde 1969) foi 0 respons3vel pela popularidade mais contempontnea do sucesso " Brasil Pandeiro" (1940). Baiano de nascenc;a e carioca de corac;ao, Assis sempre foi misterioso quanto ao sell passado no nordeste. Era sempre muito dedicado a hldo que fazia e alem da mllsica ganhou fama com a sua atuac;1Io como protetico e desenhista. Cantou 0 prazer, mas vivia tendo sel.ls momentos de profunda angllstia e fmstrac;ao, variando entre causas economicas, amorosas e lembranps do passado, tanto que tentou tirar a propria vida tres vezes. Cortando os PlitSOS e sa ltando do Corcovado nao alcanc;ou seu objetivo. A mishJra de fonnicida com guarana fez-se fatal e junto do corpo, um bilhete angustiado, mas que ainda assim demonstrava seu jeito com as palavras: "VOli parar de escrever, pois estou chorando de saudade de todos, e de hJdo." Fac;o minhas as palavras do jomalista e critico musical carioca AIY Vasconcelos (1926 - 2003): " A obra de Assis e toda ela lUlla grande liC;ao de originalidade. Pela disposic;ao das notas e tonalidades, bem 122
123
Bauru, tres de dezembro de dais mil e treze Cordiais sauda<;:6es! Como vai, Assis?! Gosto do seu nome, Assis, me lembra genialidade, dom com as verbos. Talvez eu seja. suspeita para dizer, sou uma grande admiradora das escritas de Machado, mas nao saberia dizer se ele as faria tao hem se tivesse que dar notas as palavras. Quanto a voce, nao ha. essa duvida. Seu dam com as versos mio conseguia permanecer em prosa. Gada palavra precisava de um tom, run ritmo e tudo se encaixava com precisao. POI' esse motivo, como admiradora. envio-lhe esta carta para que, relembrando a sua hist6ria, eu possa lhe contar a historia do meu tempo. Assis, seu sangue baiano pode nao tel' sido muito valorizado par voce, mas eu consigo enxergar em cada trabalho seu um pouco de ubaianidade", mesmo que escondida sob a alma de carioca. Voce j\ ouviu falar de Gilberto Gil? Lembro-me dele quando penso no seu talento. Ele e seu conterraneo e, nao par acaso, um mU:sico extremamente talentoso. Quando voce deixou de viver ele era apenas um jovem de 16 anos que se interessava pOI' musica, par isso talvez nao 0 conhec;a. Esse
nulsico e multi-instrumentista se destaca pela valoriza<ji.o das raizes da musica do nosso pais e ao mesmo tempo pela inovaQ8o musical, em seus shows apresenta quase uma aula de multiculturalismo aos expectadores e posso dize-Io com convic<ji.o, j8. que, recentemente, tive 0 prazer de me enriquecer em um desses espetaculos, que, inclusive, aconteceu numa feira de livros, tamanho seu interesse par cultura. Contei-Ihe isso tudo porque acredito que 0 dom de inoval' na musica nao nasceu par acaso em duas (e mais outras muitas) pessoas da mesma terra, e que Salvador, ou melhor, a Bahia tenha, sun, um je ne sais pas para artistas. Mas decididamente, seus sambas, par mais que tenham sido afetados pelo seu sangue baiano, eram cariocas em sua forma, ritmo, linguagem e, acima de tudo, na tema.tica, apresentando costumes dos angulos mais interessantes e, quase sempre com run toque ludico. Assim como suas marchinhas, que contavam com a irreverencia, mas tamoom com a malicia que lhe faziam peculiares e necessluias ao Garnaval e as festas juninas. E ao pensar nas suas musicas com~o a me perguntar. Quem era Assis Valente? Quem era a homem que ao mesmo tempo escrevia hUlaS do prazer e odes a tristeza? Euf6rico ou deprimido? Solitario au abrangente? Nao que eu queira revirar um passado, que voce sempre deixou claro mio ser dos mais aflweis, mas como apreciadora eu sinto necessidade de the conhecer. Tarefa dificil, j8. que
nao posso contar com r espostas suas dadas a inda em vida e nem com uma resposta para essa carta. o local do seu nascimento estr eia a lista de infuneras duvidas. Belia mesmo em Salvador, n o campo da P6lvora ou no caminho de Bom Jardim a Pateoba? Documentos como certidii.o de nascimento e de casamento ao inves de esclarecerem, escurecem ainda mais 0 seu passado, t razendo informaQoes dubias e datas distintas. Bobre seus pais, sei que eram Malia Esteves Valente e Jose de Assis Valente, de quem voce h erdou 0 n ome exatamente igual. Ela, negra, ele descendente de portugues e voce, assim como a sua musica, 0 frut o da mestiQagem de etnias e culturas. Em Alagoinhas, ainda cliam;:a, aprendeu 0 que era exploraQii.o e trabalho pesado, 0 que fez com que voce quisesse se afastar de seus tutores ou upadrinhos", os quais 0 cliavam e o que fez, posteliormente, querer se afastar do seu passado. A mudanQa para Salvador serviu para con seguir run trabalho na limpeza de run h ospital, podendo assim estudar desenho e escultura n o Liceu de Artes e Oficio, e faz er um curso de pr6tese denta.lia [uma proftssio muito oomum na pr1m.e1ra met&d.e do s6oulo J& que era muito comum perder os dentes pela falt& de htglene buoal] . Fico admirada pelo fato de voce ter con seguido ser exceIencia em tudo 0 que se propos a faz er. Com o protetico, fez fama pelo trabalho e como desenhista chegou a ganhar um premio pelas maos do go-
xx.
vernador da Bahia na epoca, Jose Joaquim Beabra (voce se lembra?) e essenem e 0 motivo maior da sua fama . Ah, Assisl Com o e dificil t e conhecer por inteirol Diversas proposiQOes e hip6teses sao feitas por estudiosos e pouco se esclarece. Sua vida no circo na infilncia, seus estudos nas artes e como protetico e a possivel revista de que era dono, "A Cigana", todos esses fatos carregam detalhes de duvida . o seu amigo, 0 composit or Geraldo Queir oz, foi responsa.vel por uma declaraQii.o que esclarece um pouco 0 m otivo de tantos mistelios: "Assis nunea falava das coisas da Bahia, do tempo antes de vir para 0 Rio; dizia que nao se lembrava". Voce sovilia falar da Bahia em uma musiea de lado B, que ficou mareada por ser estreia da orquestra Diabos do GEm, de Pixinguinha, 0 samba .. Etc ... .. , que, dificilmente, se acha em gravaQaes nos dias de h Oje:
Etc ... - Assis Valente (1932) Bahia, que e terra do meu samba Quem nasce na Bahia e bamba, e bamba Bahia, terra do poeta Terra do doutor e Uetecetra" Bahia, que e terra do meu samba Quem nasce na Bahia e bamba, e bamba Bahia, terra do poeta
Terra do doutor e ~etecetra~ Eu tenho tamoom 0 meu valor (ora se tenho) E vivo com muita alegria o Samba e 0 meu ava, Macumba e a minha tia Sou prima do grande violao Sou bamba no batuque e no pandeiro Meu pai e 0 homem das muambas o grande e conhecido Gandomble (Bahia) Eu gosto muito da viola A mOQa feita s6 de pinho Parenta do grande interventor o bamba e respeitado cavaquinho o delegado TambOlim, com jeito e com diplomacia Na batucada diz assim: Que 0 Samba tamoom tem delegacia (Bahia) Entao, vamos comeQar a falar da vida que voce ~ se lembra" e quegosta. Em 1927, voce renasceu. Essa nao foi Ulna declara<;i.i.o sua, tamoom nao foi um amigo seu que me disse, mas de tudo que eu soube sobre voce, e essa conclusao que tiro. Sua ida para 0 Rio de Janeiro fez sUl'giruma novapessoa eum artista da musica popular do Brasil. Antes de entrar na composi<;i.i.o voce j8. era artista do lapis, mas era desenhando que voce se expressava e publican-
do suas ilustraQoes em revistas como a ~Fon-Fon", ~O Cruzeiro" e ~Skimmy" . Ao mesmo tempo, continuava fazendo seu nome como protetico eacabou conquistando uma reputa<;i.i.o Unica nessa profissao. Como j8. havia dito, e impressionante como voce faz bem todas as suas atividades. Impressionantel
Sobre ser protetico, inclusive, diziam que essa era uma arte para voce, 0 que nao me espanta, j8. que um artista faz arte pOI' onde passa. Como eu pude me esquecerl Meu avo tamb8m. era protetico, nao cheguei a ve-Io exercendo a profissao e nao sei dizer se essa era uma arte para ele tamb8m., mas posso falar que, se nao fosse pOI' ele, eu nem saberia a existencia dessa profissao, confesso. o comeQo da sua carreira como musico veio com 0 incentivo e 0 aval do seu amigo Heitor dos Prazeres que, como voce, era artista de mais de uma arte: da pintura e do samba. 0 incentivo serviu para que logo voce fizesse sua primeira composi<;i.i.o de sucesso, a triste ~Boas Festas": Boas Festas - Assis Valente (1941) Anoiteceu, 0 sino gemeu E a gente ficou feliz a rezar Papai Noel, ve se voce tem A feli cidade pra voce me dar Eu pensei que todo mundo
Posse filho de Papai Noel E assim feli cidade Eu pensei que fosse Ulna Brincadeira de papel Ja faz t empo que eu pedi Mas a meu Papai Noel mio vem Com certeza j{l morreu Ou enta~ feli cidade :E brinquedo que mio t em A letra nao deixa de ser a utobiografica, mio e? Ja que foi feita em um de seus Natais de solidB.o em Niter6i, in spirado em um quadro de artista an6nimo na sua parede. Essa canQ8o, que ate h oje e obrigat6ria nas n oites de festas e foi declarada oficialmente hino de Natal carioca, foi gravada em outubro de 1933 por Garlos Galhardo e a Orquestra DiaOOs do CEm, com arranjo e regencia do genial instrumentista PixingUinha, e foi decisiva para 0 seu sucesso e para a consagraQ80 de seu talento. Acr edito que voce se lembre disso tudo, mas eu me sinto bem mostrando a voce 0 quanto sei sobre voce e admiro sua oulsica. Mas vamos com calma, sua composiQ8o, apesar de celebre, nao a fez conhecido pelo grande publico e algo decisivo faltava para voce ser famoso de vez. Garmem Miranda. A bela, de sor riso largo e traQos fortes, se apaixonou pelo seu talento assim como voce se apaixonou pela mulher e ela 00-
tau sua voz em infuneras de suas composiQoes. Mas antes de Garmem, Aracy Cort es ch egou junto com a sua maioridade para interpretar a musica NTem francesa no morro", cuja tematica satirica aos estrangeirism os foi experimentada tambem par Noel Rosa com NNao Tem TraduQ8.o", musica que, inclusive, e uma das minhas favoritas dele. Par toda a decada de 1930, Garmem Miranda usou eabusou das suas letras, somando 25 canQoes, t odasantes da cantara embarcar em sua longa temporada de sucesso n os Estados Unidos e como voce bem sabe, a canQ8.o que se tornou simOOlo dessa dupla foi 0 samba- choro NGamisa Listrada", oulsica que para alguns especialistas exemplifica perfeitam ente a caracteristica de suas musicas, alegria nos versos e m elodia entristecida: Gamisa Listrada - Assis Valente (1937) Vestiu uma camisa listrada e saiu por ai Em vez de tomar cha com torrada ele bebeu parati Levava um canivete n o cinto e um pandeiro na mao E sorria quando 0 povo dizia: sossega leao, sossega leao Tirou a anel de doutor para nao dar a que falar E saiu dizendo eu quero mamar Mamae eu quero mamar, mamae eu quero mamar Levava um canivete n o cinto e um pandeiro na mao E sorria quando 0 povo dizia: sossega leao, sossega leao
Levou meu saco de a.gua quente pra fazer chupeta Rompeu minha cortina de veludo pra fazer uma saia Abriu 0 guarda-roupa e arrancou minha combina¢o E ate do cabo de vassoura ele fez um estandarte Para seu cordi.i.o Agora a l:6tucada j\ vai COIlleQ8ndo nao deixo e n8.0 consinto o meu querido debochar de mim Porque ele pega as minhas coisas vai dar 0 que falar Be fantasia de Antonieta e vai danQar no Bola Preta Ate 0 sol raiar Tenho Ulna grande cuIiosidade de saber se essa disparidade nas suas musicss era intencional, pena que e bem dificil conseguir uma resposta sua. "E 0 mUlldo na.o acabou" foi outro samba-choro que ao mesmo tempo em que alegrou a popula¢o em um periodo onde outra guerra mundial era iminente, foi a trilha para um dos momentos de grande abatimento seu, em que voce declarou teria vontade de deixar a musics e se dedicsr somente as suas pr6teses. Voce realmente tinha essa inten¢o, Assis? Be eu pudesse e estivesse Ill. nessa epoca, impediria, com todo certeza. Voce sabe que era bom em tel' admiradores, nao sabe? Era visivel a maneira meticulosa como voce construia sua imagem . 0 escritor Fernando Babino [autor da epfgrafe deste 11vw] era um desses seus admiradores e em uma declara¢o
enviada a um jornal em forma de cr6nica em Belo Horizonte, nao me deixa mentir sobre esse seu jeito: "Deixemos em paz 0 bigodinho, 0 cabelo a principe Danilo [em refero8noia ao oebalo do jog&d.or oar1oc& contemporAneo, Denno Alv1m] e os dentes, ah, os dentes de Assis Valente, que pareciam tao perfeitos quanto as dentaduras que ele faz. 0 queimporta e 0 talento ." Viu s6? E nao s6 da sua aparencia cuidada sefazia sua fama. Beu truque malar era de trazer os balsos cheios de fotos de estudio e a canets pronta para autOgrafo, pensa que euna.o sei? Voltando a Garmem Miranda, 0 Ultimo trunfo que voce deu a ela antes da bela partir para seu sonho americano, foi o samba- revista "Uva de csminhao", que, espertamente, foi composta com a inten¢o de parecer Ulna musics de carnaval comum, mas que tratava sorrateiramente de gravidez e aborto na sua letra. Depois da "americaniza¢o" da cantora, mas Uln sucesso seu fecharia essa incrivel parceria: 0 samba "Recenciamento", que descrevia com r iqueza de detalhes Uln epis6dio do cotidiano dos morros do Rio de Janeiro, demostrando 0 poder sutil e ufanista que 0 samba tinha de transcrever a realidade. Esse poderia nao tel' sido 0 desfecho dessa liga¢o tao prov eitosa entre voces dOiS, se Garmem nao tivesse - sabese Ill. pOI' quel - recusado gravar 0 samba "Brasil Pandeiro" que, em minha opiniao, e a sua mais arrebatadora composi¢o. Garmem Miranda tinha um faro para 0 sucesso fora do
comum e esse fato fazia dessa sua decisao algo ainda mais estranho. Eu imagino 0 quanto voce deve ter ficado tIiste com essa renuncia, Assis, sei tamoom a quanta idolatrava essa mulher. Mas, se for lhe animal', Ruy Gastro, 0 bi6grafa oficial de Garmem, afirma que ~Brasil Pandeiro" teria run conteudo de exaltac;8o e de referencias diretas a ela, e a recusa foi levada por um sentimento pr6x:imo a. modestia. Be acreditarmos nessa versao, acho que esse passara. a ser run fato menos penoso para n6s dois. Mas a recusa tamoom contIibuiu de forma indireta para a sua popularidade entre as jovens, da decada de 1970 e ate as de hoje. 0 grupo Novas Baianos composto primordialmente pOl' Morais Moreira, Pepeu Gomes e Baby Consuela, apadrinhou essa musica e hoje ji. e dificil imagina-Ia sendo cantada em outra versao, mesmo que a primeira (e outras muitas que se seguiram) gravada pelos conjunto Anjos do Inferno tenha sido pIimorosa. Alias, sua parceria com grupos de conjuntos vocais foi tao proveitosa quanto a parceria com Garmern Miranda. Foram cerca de 40 musicas gravadas dessa maneira, estou certa? Alem do Anjos do Inferno, 0 Bando da Lua teve a missao de gravar vaIios sucessos seus. Um muito interessante e ~Man gueira", composto junto de Zequinha Reis em 1935. Era run tributo ao morro e a. escola de samba, fundada e abenQoada par Gartola, auto genio do samba: Mangueira - Assis Valente e Zequinha Reis
Nao ha nem pode haver Como a Mangueira nao hA o samba vem de Ill. Alegria tamoom Morena faceira s6 Mangueira tem Mangueira estB. sempre em primeiro lugar Aonde a cadencia do samba rompeu Deixa sao carlos falar Deixa a Balgueiro dizer Morena que ate nem e bom se falar Na qualidade ela e superior E caIinhosa no amar Filha do samba e do amor Nao ha nem pode haver Como Mangueira nao hA Tern algumas horas em que eu gostaria de voltar no tempo para sentir a emoQ8.o de alguns momentos importantes dessas musicas, sabia? Um deles e quando voce foi convidado a subir no m orro, depois de compoI' ~Mangueira". Garlos GachaQa, sambista e fiel escudeiro de Gartola, revelou sabre esse momenta: ~ele nao aguentou vel' toda a escola cantando
a samba dele e ch orou demoradamente" . Eu tamoom choraria, com certezs. Sentir a gratidii.o e a reconhecimento de quem se gosta e comovente e espero que essa homenagem tenha sido reconfortante para um coraca.o sempre tao confuso e angustiado como a seu. Ate 0 escritor Mario de Andrade, sendo um professor de piano, mestre de conservat6rio, acabou se rendendo aos seus sambas. Mario acreditava que a samba rural paulista era mais importante, sob a ponto de vista folc1 6rico, etnol6gico e sociol6gico, que 0 urbano e deturpado samba carioca, mas segundo a amigo de Mario, a critico Lucio Rangel, em um artigo de 1957, quando eles tomavam alguns chopes 0 que cantavam era 0 samba carioca uMangueira". Isso e que e revelaca.o l No dia 23 de dezembro de 1939, voce pegou todos de surpresa quando declarou que iria se casar. Nadyle da Siva Bantos, a sua escolhida, era uma datil6grafa ainda menina, 15 anos mais jovem. Como era de se esperar, voce promoveu uma grande festa. Poram morar juntos na Tijuca e a vida passou a ser de casa para a trabalho. A situaca.o financeira piorou e foi preciso ir para a casa do seu sogro, de favor. La nasceu sua filha Nara Nadyle, em 31 de janeiro del941 e j8. um ana depois se separou da mulher. Ouvi dizer que voce mandou tatuar 0 n ome da sua filha no corpo. Que coisa m oderna! Nao tatuaria nomes n o meu COI-PO, mas adoro tatuagens. Tenho uma que homenageia a
minha familia em forma de ilustraca.o gravada na costela, fiz junto da minha irma . Meu pai nos h omenageou tamoom em forma de tatuagem. Escreveu ~Luz" no braQo, a sobrenome da minha mae, que nos tres temos e, segundo ele, ele tamoom queria ter. Par essa coincidencia, acabo transmitindo um pouco um sentimento de paternidade para voce. Esse com8Qo de grande felicidade na vida conjugal teve vida curta, e logo depois do nascimento de Nara voce alugou um quartinho e foi-se em bora da casa do sogro. Na vida profissional tamoom ficou um pouco sozinho, nao foi? 0 Bando da Lua e a Anjos do Inferno tomaram 0 mesmo rumo que Garmem Miranda e foram tentar a sorte no exterior, onde a figura do brasileiro estava em alta . Mas voce, como sempre, um artista conhecido pela espontaneidade e par ser extremamente intuitivo, nao poderia cair n o esquecimento. Apesar de alguns sinais de inveja ou ressentimento de cantoras que se queixavam com o se fossem segundas 0PQoes ua. que Garmem Miranda estava em dedica¢o exclusiva a sua carreira n o exterior) voce con seguiu novas interpretes,. Aracy de Almeida foi uma das interpretes que se rendeu as suas belas composiQoes. 0 samba de lamento, ~Fez bobagem" em sua voz fi cou absolutamente visceral. As musicas interpretadas pelas cantoras eram lindas, mas eu entendo que sua preferencia fossepelos conjuntos vocais. Muitas mulheres e conjuntos experimentaram suas musicas. mas voce
dava clara preferencia a alguns interpretes, como 0 conjunto de cearenses Quatro Ases e um Coring-a, que voce acabou fixando parceria e consequentementeagregando valor a sua carr eira que estava esmorecida. A musica uBoneca de pano" foi urna das parcerias com 0 Quatro Ases de maior su cesso e posso dizer que foi 0 derradeiro, nao e? Boneca de Pan o - Assis Valente ( 1950) Boneca de pano Gingando num cabare Poderia ser boneca de 10uQa Tao mOQa mas nao e Poderia ser boneca de 10uQa Tao mOQa mas nao e Um dia aIguem a cham ou de bon eca E ela sendo mulher, acred.itou o tempo foi passando E ela se desmanchando E h oje quem olha pra ela nao diz quem e Em vez de boneca de 10uQa Hoje e boneca de pano De um sombrio cabare Nao sei ao certo a hist6ria da mOQa que 0 in spirou a fazer
essa musica, mas sei que era uma menina de cabare, muito bonita, assim com o Ceci, a musa de Noel Rosa, e voce nao chegou a entregar a ela 0 samba porque ela havia falecido. Que h ist6ria trist el A era dos discos tardou, mas ch egou e, em 1956, voce teve a h oura de ver suas musicas gravadas em urn disco. A magnifica cantora de ra.dio Marlene gra vou 10 musicas suas como forma de h omenagem pelo seu trabalho e mesmo sem inten Qii.o fez urn belo Ultimo tributo ao seu talento. Nao cabe a mim, procurar uma razao para as seus constantes r ecolhimentos e as tentativas de fuga da sua vida. Ninguem. con segue saber exatamente 0 que se passa em urna cabeQa aflita e esta carta nao pretende em n enhum mom ento ser repreensiva. 8ei que voce nao nos deixou em paz, mas espero que com estas palavras voce possa ter conscien cia da quantidade de mem6rias boas que deixou para os seus admiradores e que a sua obra grandiosa esta sendo reinventada a cada ano. Fique em paz, Assis. Com sentimento.
Entrevista ficticia
se muito Olegario Mariano, muito Menotti del Picchia, as senhoras em soirees e os almofadinhas trocavam muitos bye- byes. Achei aquilo
Cordiais
Sauda~oes
- Ola, Assis ! Tudo bem? 0 seu local de nasci-
mento sempre foi lUn misterio para todos nos jomalistas e para sells
tudo engrar;:ado e senti petla. Na volta para casa, tinha llma marchinha esbor;:ada.
fa s. Voce nasceu mesmo no Campo da Polvora? Cor diais
Assis - Por isso e qlle ell tenho a pele queimada.
Sauda~oes
- Teria achado hilario tambem, Assis. Mas agora
you ter que tocar em um asslmto delicado. 0 que te motivou a tentar sll icidio em uma epoca de tanto sllcesso?
Cordiais
Sauda~oes
-Ah Assis, setnpre misterioso! Agora me diga, 0
que voce setltiu naquele show de Cann em Miranda, em 1932, em que
Assis - Glorias nao resgatam letras.
ela cantou pela primeira vez ao pilbtico a sua milsica " Good Bye"? Cor diais
Assis - Senti que tinha surgido. Cordiais
Sauda~oes
Sauda~oes
desculpe se
0
- Bom, muito obrigada pela atetlr;:ao, Assis , e me
entristeci, nao foi a minha intenr;:ao
- Mesmo? Mas, como assim? Essa nao foi a
primeira mllsica sua cantada em pllblico. 0 que esse episodio teve de tao especial?
Assis - Foi um sucesso tao grande, que me Cllrancou lagrimas dos OUlOS. Ela me v iu e gritou para
0
povo: " Vou apresentar voces ao dono
da mllsica". Houve his, todos ja cantaram em coro. Cordiais
Sauda~oes
- Deve tet¡ sido belissimo! E de onde ti.rou inspi-
rar;:ao para fazer a composir;:ao dessa leln ?
Assis - Encontrei motivo quando fui a uma festa em Vila Isabel onde as expressoes em ingles era usadas sem SetlSO de ridiculo. Declamava140
141
A dmlfa da lIIoda (J950)
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de mllsicos nordestinos da decada de 1970.
Bauru, dezessete de novembro de dois mil e treze
Se eu pudesse trocar alglUnas palavras com ete, seriam as dessa carta as que eu diria, mas ficaria ainda na vontade de, ao menos lUll pouquinho, ouvir frente a frente algumas nolas da sua genialidade musical.
Cordiais saudaQoesl Como va i, seu Luiz? Nao eosturno chamaI' meus idolos de ~seu", mas 0 senhor me lembra muito 0 meu avo materno, urn homem desses raros, que igual eu nunca vi. Assim como 0 senhor, ele nasceu e morreu no sertao, mas nurna terra menos ca.stigada que a sua, 0 sertao rosiano, no norte de Minas, que Guimaraes R.osa retratou tao bern em neologismos e definiQoes. Ele era seu Ze Acacio para toda Brasilia de Minas, cidade vizinha do rio Sao Francisco, onde passei e passo pOl' bons momentos, todos os anos, desde meu nascimento. POI' poueo nao tive 0 prazer de nascer no mesmo mundo em que 0 senhor. Em 1991, ano do meu nascimento, do lado de ca j8. se passavam dois anos de saudade desde a sua partida. EngraQ8do e que a sensaeao que tenho e que por nenhurn momenta suas musicas faleceram junto do senhor. o seu nome e, imediata.mente, lembrado em qualquer festa. da ~roQ8 ~, qualquer casa de danQ8 de salao, qualquer concerto de acordeom. Todos os brasileiros sabem as suas letras, mesmo que muitos desconheQ8,m a autoria e nem se lembrem de como aprenderam. Sua terra, Pernambuco, parece ser linda e de extremos, onde sertao e moral se completa.m. Na primeira oportuni-
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dade que eu tiver, vou conhecer Recife e, por que mio, sua Exu. Distancias nao me assustam e os 630 quilometros ate a capital representam uma bela oportun idade de apreciar a paisagem n ordestina. No seu nascimento, a cidade tinha apenas cinco anos. HOje, a Nterra do rei do Baiao", como passou a ser conhecida pela sua fama , tem por volta de 32 mil habitantes e 106 anos, dados muito parecidos com a minha NBrasilinha", que tem 31 mil habitantes, 119 anos e mais de 500 quilOmetros de separaQ8,o da capital, Belo Horizonte. Por esses motivos, jl m e sint o uma cfunplice sua, seu Luiz, e achegada agrad8Qo por toda a cultura que deixou para mim e para 0 n osso pais. Ao que m e parece, seus pais tiveram muitas inspiraQoes para comporem seu n om e, nao e? Deixe-me ver se acerto as origens dessa criayao. Luiz Gonzaga do Nascimento. Luiz, porque aquele era 0 dia de Santa Luzia. Gonzaga, pois esse era 0 complemento do nome de sao Luiz. Nascimento pelo mes que Jesus nasceu. Acertei? C8beQa chata, cara r edonda, pele escura, dificil nao r econhecer 0 fen otipo do "norte ~ nos seus traQos e na sua fibra, seu Luiz. Seu nascimento na Fazenda C8icara na en costa da Serra do Araripeapontava a largada deuma vida de lutador, em que as suasdificuldades ea pouca comida eram divididas com n ove irmaos. Sendo filho de Januario dos Santos, sanfoneiro e con cer-
tador de in strumentos, 0 contato com a musica vir ia (e veio) logo cooo e sem muitoalarde, nao so para 0 senhor, mas tambem para cinco dos seus irmaos que se tornaram sanfoneir os de pr ofissao. Sua mae Ana Batista, a Santana, apesar de ser de origem n egra, era da familia Alencar, de bran cos e latifundiarios e isso dava certas regalias a sua familia, nao dava? Regalias como a de poder viajar em seu burrinho como ajudante do advogado uSinho~ Aires, membro da familia dos proprietarios da fazenda. Dutro exemplo dessas "mordomias" foi quando 0 senhor aprendeu a ler e ganhou uma sanfona do patrao, parecida com a de Lampiao, seu grande idolo, nao e? GraQas ao seu psi, 0 senhor seprofissionalizou n o instrumento muito n ovo, aos 14 anos, e jl mocinho e musico comeQou a atrair as meninas da regiao. Nazarena foi seu primeiro en cant o,lembra-se dela? Branca, de familia importante e pai bravo. Com a opoSiQB,o dele ao namorinho, 0 senh or nao deixou por menos. Foi atras dele com ugol e " na cabeQa e faca no balso. A briga nao aconteceu, felizmente, mas Santana, a sua mae, ficou possessa e deu-Ihe uma surra. Nao sei se posso the chamar de orguIhoso ou se the falto ao respeito, mas se nao fosse pelo seu jeito, digamos, altivo, talvez sua historia nao tivesse mudado de ru m o tao drasticamente e talvez, h Oje, 0 senhor nao fosse 0 que e para t odos
os brasileir os . Sua ida a Fortaleza, ap6s a humilhante sova de sua mae, fez com que 0 senh or vendesse sua sanfona e se alistasse como voluntll.lio no exercito, com 18 anos incompletos. A musica jL nao era coisa faci! de sair da sua vida e, pOl' iSso, no exercito era corneteir o de pIimeira cla sse e ate foi apelidado de Bico de AQo. Nao sei mesmo s e era 0 orguIho que 0 impedia de voltar para casa, mas seu periodo no exercito foi muito duradouro, o tempo maxim o permitido, 10 anos, e n o tim dessa temporada, commuito esforQo, 0 senhor ja havia conseguido comprar uma n ova sanfona. o destino 0 levava ao Rio de Janeiro, a terra prometida do Brasil da sua epoca, e a sua amizade com 0 casal Xavier Pinheiro eDina, foi 0 acesso para run novo lar, no Morro de sao carlos, e uma nova vida dedicada amusica. A principio, 0 senh or s e limitava em ampliar seu r epert6rio de ritmos que eram su cesso n o "suI" do Brasil: ch or os, valsas, foxtrote. A preocupaQ8o em m ostrar a musica tipicamente nordestina veio depois, com a matuIidade musical e pessoal, nao foi? Soube que 0 senhor est eve numa precursora escola aberta n o bairro do Flamengo atras do mineiro Anten6genes Silva, 0 mais famoso a cordeonista da epoca. Imagino 0 quao n ervoso 0 senhor deve tel' ticado para esse en contro. Depois dessa fase, outra mu danQa acometeu a sua vida e
posso dizer que foi 0 comeQo da sua carreira musical com o conhecemos hoje. Foi quando aquele grupo de estudantes cearenses 0 estim ulou a tocar musicas do nordeste, algo que eu tamoom sugeIiIia se pudesse. Pelo que eu sei, 0 senhor, que estava acostumado a tocar os sucessos da radio, estranhou a ideia, mas n o final, para a nossa feli cidade, aceitou. A primeira musica composta para essa nova fase foi a instrumental "Vira e Mexe", musica que eu adoro e com a qual 0 senhor ganhou 0 programa de calouros do compositor Ary Barroso e iniciou a sua fama. Um belissimo com e(Jol Acred.ito que a sua veia n ordestina comeyava a pulsar mais rapida n esse m omento e a ajuda de Ze do Norte foi um catalizador dessa urecuperaQi.i.o de identidade". Ze sabia 0 que fazel', era paraibano, n ordest ino como 0 senh or, e trabalhava na rAdio Transmissora [que mats tarde saria a rAdto Globol n o programa "Hora Sertaneja". 0 convite para ser seu colega de trabalho foi r epentino e foi seguido de mais um convit e da dupla Genesio Arruda e Januario FranQa, que precisava de um sanfoneiro dos bons, e para isso 0 senhor se garantia, nao e, seu Luiz? Com essa parceria 0 senhor gravou as suas primeiras musicas e mesmo que dessa vez seu n ome nao estivesse r egistrado no r 6tulo disco jL era um pIimeiro passo para 0 reconhecimento, con corda? Hoje em dia, e dificil achar pessoas que toquem baiao a nivel nacional. Depois do senhor Dominguinhos foi outr o que se destacou, mas ele tamoom nos deixou ha pouquissi-
mo tempo. Hoje em dia, considero Elba Ramalho a principal expoente dos ritmos nordestinos a nivel nacional e sou Ulna grande ra. do trabalho dela desde pequena. 0 senhor j8. teve trabalhos com ambos, nao e? Claro que regionalmente ha muitos outros que vivem dessa musica, mas a popularidade no Brasil inteiro e conseguida por poucos e 0 senhor sabe como e dificil conseguir. Depois da parceria com a dupla e do trabalho no radio mio demoraria muito para que 0 senhor conseguisse gravar um disco s6 seu. Acho que 0 senhor sabe disso, mas 0 intuito da sua gravadora RCA era bem comercial: rivalizar com seu ex- professor, Ant6genes Silva, que era contratado pela gravadora con corrente, a Odeon. Gravou quatro musicas acompanhado pelo grande violonista Garoto, sendo tres da sua autoria: a j8. famosa NVira e Mexe", a mazurca NVespera de sao Joao~ e a valsa NNuma Berenata". Ah, como e bom rememorar uma carreira como a sual E dessas que dao inveja a quem est8. comeyando, uma sensaQii,o de trabalho reconhecido que poucos musicos em com~o de carreira tern. 0 prazer de sentir. Depois disso, 0 senhor tem consciencia de como 0 acordeom se popularizou? Muitas escolas de musica, inclusive, passaram a oferecer aulas do instrumento. No com~o da decada de 50, a escola de Mario Mascarena, inclusive, fazia grandiosos shows de fim de ana com os alunos. Ate enta~, sua bela voz "chorada" era desconhecida e as
demais gravaQoes que se seguiam eram s6 como instrumentista. Mas c8. entre n6s, esse neg6cio de nao cantar era um desperdicio, ainda bem que 0 senhor e Narretado" e nao ia deixar que ninguem te impedisse disso. A falta de permissao das radios para que a sua voz fosse gravada, e assim 0 confinamento ao instrumental, com8Q8ram a nao Ille agradar, estou certa? o comeQo dessa libertaQii,o nao foi facil, mas com calma e esperteza 0 senhor sempre conseguia 0 que queria e, dessa vez, seu maior desejo era soltar a voz. Havia a ideia de que outras vozes executassem as suas musicas, assim a fama pOI' meio das suas letras seria atingida pOI' meio dos interpretes e com 0 sucesso das suas composiQoes a gravadora nao poderia mais negar. E foi 0 que 0 senhor fez de forma certeira. AnleaQou 0 diretor da RCA dizendo que se nao cantasse, iria para a concorrente, Odeon e usaria 0 nome do seu pai, Januario, para se livrar de possiveis proibiQoes. Uma jogada de mestre. o sucesso nao foi estrondoso de cara, 0 senhor sabe, mas foi eficiente. Nos tres anos iniciais de sua carreira seu trabalho atingiu alguns principais niveis: 0 de sanfoneiro solista, capaz de tocar ate Noel Rosa e 0 de compositor a procUl'a de parcelros, exemplo disso foi a parceria com 0 baiano (e meu idolo) Assis Valente, na marchinha NPao Duro~. A primeira unlsica que finalmente foi gravada com a sua voz foi a mazurca uDan<;a Mariquinha" e ela e Ulna delicia de
se ouvir: DanQa Mariquinha - Luiz Gonzaga e Miguel Lima ( 1945) DanQa, danQa, Mariquinha Para 0 povo apreciar Essa boa mazurquinha Que pra voce YOU cantar OUQa, meu bem, A sanfona tocar Quitiribom, quitiribom, Toca no baixo desse acordeom Quitiribom, quitiribom, Que mazurquinha Que compasso bom Quando pego na sanfona A turma se levanta E pede uma mazurca Quando bato a mao no fole Bei que a turma toda Vai ficar maluca Todo mundo se admira Do fraseada que a sanfona diz Quando acaba a contradanQa o povo admirado ainda pede bis
Beu Luiz, ate certo ponto da sua vida, 0 senhor s6 conseguiu exito com estilos regionais do sudeste, como a mazurca e 0 calango e, deixe- me fazer um desabafo, e assim que as coisas ainda funcionam no Brasil. Os regionalismos sao muito abafados pela ~cultura modelo~ do sudeste, que por sua vez e completamente influen ciada pelos estrangeirismos. OU seja, n 6s do sudeste acabamos nao valorizando a diversidade cultural do nosso pais, justamente porque fomos ensinados a cultuar 0 que vern de paises mais desenvolvidos economicamente e incorporam os esse m odelo aos nossos habitos e gostos. Isso e absurdo, seu Luizl Uma totallavagem cerebral, 0 senhor me entende? Por que e preciso se entregar aos modelos pre-estabelecidos para se conseguir 0 sucesso? E por que s6 depois do exito a liberdade artistica e conquistada? Acho que nao vou chegar a lugar nenhum com essa com ocao, masacredito quea18m de relembrar sua vida nessa carta, seja bam lembrar 0 contexto em que ela foi con struida e mostrar para 0 senhor que as coisas mudam de forma, mas e dificil mudar de essencia. Mas Sim, 0 n ordeste j8. marcava uma certa presenQa n o cenario da musica nacional, mas era ainda esparsa. a Bando do Tangaras, grupo que iniciou a carreira de Noel Rosa na decada de 1930, por exernplo, era unl exemplo de grupo que semeava a ~nordestinidade" para 0 pessoal do wsul", mas sempre de forma caricatural e exacerbada, assim como o grupo 4 Ases e 1 Coringa.
Fico impressionada com a sua maneira de ter conseguido introduzir a cultura do nordeste para os brasileir os que estavam distantes dessa realidade. 0 senhor conseguiu nao s6 mostrar 0 ritmo do n ordeste, como tamoom urbaniza-lo. Foi capaz tamOOm de instituir a ritmo do baHia, que fOi, finalmente, sacramentado com a emocionante "Asa Branca": ABa Branca - Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira ( 1947)
Quando olhei a terra ardendo Qual a fogueira de sao J 030 Eu perguntei a Deus do CEm, ai Par que tamanha judiaQi.i,o Eu perguntei a Deus do CEm, ai Par que tamanha judiaQi.i,o Que braseiro, que fornalha Nem run pe de prantaQi.i,o Par falta d'agua perdi meu gado Morreu de sed.e meu alazao POI' farta d'agua perdi meu gado Morreu de sed.e meu alazao Inte mesmo a asa branca Bateu asas do serti.i.o Enti.i.o eu disse, adeus Rosinha Guarda contigo meu coraQi.i,o Enti.i.o eu disse, adeus Rosinha
Guarda contigo meu cora¢o Hoje longe, muitas 18g"uaS Numa triste solidii.o Espero a chuva cair de novo Pra mim voltar pr o meu serti.i.o Espero a chuva cair de novo Pra mim voltar pr o meu serti.i.o Quando a verde dos teus olhos Be espalhar na pranta¢o Eu te asseguro nao ch ore nao, viu Que eu voltarei, viu Meucora¢o Eu te asseguro nao ch ore nao, viu Que eu voltarei, viu Meucora¢o Alias, sua parceria com HumbertoTeixeira renderia muito outros sucessos. Era a combina¢o perfeita, 0 "doutor do baiao ~ e a "rei do baiao", quenao s6imprimiram novos rumos a musica nacional, mas tamOOm criaram hinos e t endencias musicais. Exemplo disso, e que na musica "Respeita Januario" ha um trecho que parece um rap. estilo muito comum n os dias de h oje no Brasil e um neologismo - acredito que involunt8.rio - para 0 universo h omossexual em "Paraiba": Paraiba - Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira (1950)
Quando a lama viTou pedra E Mandacaru secou Quando 0 RibaQ80 de sede Bateu asa e voou Foi ai que eu vim me embora Garregando a minha dol' Hoje eu mando um abraQo Fra ti pequenina Paraiba masculina, Mille macho, sim sinho Eita pau pereira Que em princesa j8. roncou Eita Paraiba Mille macho sim sinho Eita pau pereira Meu bodoque mio quebrou Hoje eu mando Um abraQo pra ti pequenina Paraiba masculina, Mille macho, sim sinho Quando a lama viTou pedra E Mandacaru secou Quando arribaQ80 de sede Bateu asa e voou Foi ai que eu vim me embora
Garregando a minha dol' Hoje eu mando um abraQo Fra ti pequenina Paraiba masculina, Mille macho, sim sinho Eita, eita A fase era das boas, nao e seu Luiz? Milltos discos vendidos, sucesso nas radios e int erpr etes de r en ome disputando Ilulsicas suas . Alem disso, 0 baiao passou a ser simbolo de cultura brasileira ate internacionalm ente, a ssim como tinha acontecido com 0 ch or o e 0 samba anos antes. 8empre achei inter essante sua relaQB,o de parceria musical . Assim como Humberto Teixeira, Ze Dantas era tamoom nordestino e doutor letrado e esse contrast e com a sua simplicidade formava musicas singelamente int eligentes e apaixonantemente astutas. Quando penso na quantidade de sucessos desse periodo de 1940 e 1950, nem con sigo imaginal' uma vida social ativa do senhor, mas foi em m eio a esse turbilhao de trabalhos que nasceu seu filho Gonzaguinha, em 1945. 8ei que ele nasceu de um relacionamento pouco duradouro, que ele nao foi criado pelo senhor, mas siIn pelos seus amigos do Morro de sao Paulo, que 0 senhor se casou com outra mulher logo em segillda e de milltos problemas de relacionamento entre os dois. 8ei disso tudo, mas nao quero tomar partido sem saber
das duas versoes, principalmente pOl' ser uma grande fii. de ambos musicalmente, mas acredito que ha. muito que podemas conversar sobre isso em outras cartas. Sobre a sua vida pessoal, queria ainda fazer um adendo. Acho muito bonito quando run filho reconhece 0 esforQo dos pais e os gratifica quando pode. 0 senhor fez isso com sua familia e as trouxe de Exu para a Rio de Janeiro para morarem com a senhor, Helena e sua filha adotiva Rosinha, assim que se tornou um homem rico e isso e deuma nobreza impar. A decada de 1960 chegou como uma bomba para a musica brasileira e isso acabou lhe afetando diretamente. A Bossa Nova com seus banquinhos e violOes tomou toda a atenQii.o do seu acordeom e entendo a sua tristeza pOI' esse fato, e uma reaQii.o normal para quem jl estava acostumado com a sucesso, e suas musicas de despedlda e partida apresentayam claramente esse sentimento. Mas, talvez 0 senhor na.o saiba, havia uma parte dos musicos de Bossa Nova que tambem. se engajava na regionalizaQii.o dos ritmos e tentava incluir musics nordestina no seu repert6rio. o com~o da Jovem Guarda tamoom deu uma reviravolta na musics brasileira, trouxe a som estridente do rock e dessa vez inovou sem buscsr pHares no regionalismo. 86 depois, quando as tropicalistas iniciaram uma abertura estetics da musics sem precedentes que a seu estilo musical voltaria a ser valorizada a contento. Nao sei se 0 senhor can corda, mas
acho que os Mutantes, Gaetano, Gil, Betha.nia, fizeram um bom trabalho pelo bem da nossa musica popular, principalmente porque souberam dar valor a trabalhos importantes e campi etas da musica como 0 do senhor. A decada de 70 foi mais amena. 0 seu show de retorno "De volta para curtir" deve tel' sido 6timo, eu adoraria tel' ida, principalmente porque ele era como uma apresentaQii.o (au melhor, reapresentaQii.o) do senhor para a juventude carioca que cresceu na decada de 60 sem ouvir as suas musicss e uma coletanea de csusos da sua vida narrados pelo senhor e musicados pela banda de instrumentos nordestinos. AH'~m dlsso, essa epoca foi marcada pOI' reencontros emocionantes como a volta da parceria com Humberto Teixeira e do comeQO da colaboraQii.o autoral do seu filho, com musicss com tom critico e politizado. Alia.s, sabre suas posiQoes politicss posso dlzer que sempre me pareceram muito controversas. Perdoe-me se lhe ofendo, mas As vezes me soavam como bajulaQii.o. Talvez seja. pOI' isso que seu relacionamento com Gonzaguinha fosse tao dlficil, 0 senhor escrevendo musicss de apoio aos politicos e ele compondo csnQoes de protesto constantemente censuradas pelo governo. Ainda bem que ele e a senhor tiveram tempo de selar a paz e ate trabalharem juntos, nao tem nada mais triste que 0 desprezo de run filho pOI' um pai. Como eujl havia dlto, 0 senhor sabe ser artista, seu Luiz . Tanto que ate na velh ice insistia em se atualizar para se
aproximar das n ovas geraQoes e dos n ovos m ovim entos musicais. Acho notavel, inclusive, a maneira satiIica que 0 senhor r etratou 0 descompasso com ajovem guarda na musica ~Xot e dos C8beludos: Xote dos Gabeludos - Luiz Gonzaga e Jose Clementino Atem;:ao senhor es cabeludos Aqui vai 0 desabafo de um quadradi.i.o Gabra do cabelo grande Cinturinha de pilao GalQa justa bem cintada Costeleta bem fechada SaIto alto, fivelao C8bra que usa pulseira No pescoQo medalhao Gabra com esse jeitinho No sertao de meu pad.Ii.nho Gabra assim nao t em vez nao Nao t em vez nao Nao t em vez nao No sertao de cabra macho Que bIigou com Lampiao Brigou com Antonio Silvino Que enfrenta UJ.ll batalhao Amansa burro brabo
pega cobra com a mao Trabalha sol a sol De n oite vai pro sermao Rezar pra Padre CiQo Falar com Frei Damiao No sertao de gente assim No sertao de gente assim C8beludo tem vez nao C8beludo tem vez nao C8beludo tem vez nao Apesar de a char que a letra estimula UJ.ll certo preconceito de genero, eu entendo que isso nao era tao discutido como e h oje e as preocupaQoes morais eram diferentes das que temos atualmente. E foi assim, sua vida teve muitos altos e baixos, compassos e descompassos, mas ate 0 Ultimo momento, na derradeira decada de 1980, 0 senhor con seguiu encontrar seu espaQo. disco ~Danado de bom ~ fechou run cicIo de muitos sucessos e a sua queIida musica nordestina continuava sendo sucesso, mesmo que sendo geneIicamente chamada de forr6 . Em 1989, 0 senhor ainda trabalhava firme quando a doenQa 0 acometeu, mas olhe, 0 senhor teve seu momento e muitas geraQoes pu deram Ihe conhecer e admirar. Inclusive a minha que nem sequ er nasceu no m esmo mundo que 0 senhor. Por iSso, em meu n ome e de t odas as pessoas que se
°
alegram ao sam da sanfona nas festas do m es de jl.1nho eu gostaria de agradece-Io e sauda-Io. Seu Luiz, fi comuito feliz de poder !he escrever essa carta, era um grande desejo m eu conversar com 0 senhor que tanto lembra 0 meu avo. Sinto par mio ter podido envia.-Ia antes da sua partida, mas espero que de algUllla maneira 0 senhor possa saber 0 que tem nela e quem sabe me responder.
Entrevista ficticia COl"diais
Sauda ~ ot s
vista Ihe perguntando
- Ola, seu Luiz, com o vai? VOli 0
a entre-
porque do senhor nao querer tocar acordeom
quando, incentivado pelo grupo de estudantes cearenses, resolveu apresentar mllsicas do sert/io no Rio de J aneiro? Gollzagiio - La no sertao e so fole e
Com respeito .
come~ar
0
fole esta para
0
acordeom como
o pifano para a flauta. COl"diais
Sauda ~ ot s
se mudar para
0
- E
0
senhor ja compunha no nordeste antes de
Rio?
Gollzagiio - Eu so fu i tomar conhecimento que quando voce canta uma
mllsica no fole ela e SlIa, aqui no Rio. COl"diais te para
0
Sauda ~ ot s
- Alias,
0
senhor foi a personificar;:/io do nordes-
popular;:iio do sudeste e do sui do Brasil por muito tempo.
Que tipo de contribuir;: oes
0
senhor aella que deixou para
0
imaginario
popular dos "sulistas"? Gollzagiio - Fui eu quem lan~ou
0
Naquela epoca, quando aparecia
lUn
chapeu de couro no Rio de Janeiro. film e de cangaceiro, mllita gente
via minha cara no filme . COl"diais
Sauda ~ ot s
- Tambem soube que 165
0
compositor e prodlltor
Carlos Imperial (1935 - 1992) espaUlOu um boato que os Beatles teriam gravado a sua mllsica "Asa Branca", no aclamado " Albmll Branco". 0 que 0 senhor acha disso? Gollzagiio - Agora eu quem ver se estes Beatles vendem mesmo. A
minha gravar;:ao vendeu mais de dois milhoes de capias. Cordiais
Sauda~oes
- Eo que
0
senhor acha da milsica deles?
Gollzagiio - Os meninos tem muito sentimento e nao avacalham a
milsica. A toada deles parece bastante com as coisas do nordeste, ate as gaitas de fole lembram nossa samona. Cordiais Sauda~oes - E verdade, realmente existem semelhanr;:as, mas eu mUlca havia pensando dessa malleira. Mas, voltando a fa lar da sua milsica, como
0
senhor gosta de se apresentar? Quais sao suas
exig61cias? Gollzagiio - Quando me convidam para cantar lluma festa , a primeira
coisa que digo e: vao cobraI' ingresso para me ver? Se dizem vamos, eu nao you. Eu gosto de cantar para Cordiais
Sauda~oes
0
povo pobre.
- Que bonito, seu Lu iz' Acho que muitos milsi-
cos deveriam se inspirar nessa sua atitude. Bom, muito obrigada pela entrevista. Foi um prazer!
166
Guia dos ritmos
Umbigada Lil/col" Alllonio (201 J)
19~ yvntwu&, ~
.Jv~,~
4pM-l,~
19(V~ <\. ~ un. ~IJ.. ~ C. . .t.U1L ~t, CAtu!.d.o... ~ ~
C\SutM
1;1,6
169
A mllsica e a hmmonia dos sons, e essencia da
Indi ~ao.
0
barulho do sentimento, e a
E pOl' essas callsas, descobrir e catalogar as raizes
dos ritmos se tOl11a lUIla tarefa intensa.
o Brasil e lim pais musical, onde cada cultma pode ser definida pela m elodia que exala, mas qual e a origem de tantos ritmos? Quais foram as infiuencias que fonIlaram a nossa cultma musical? Vma das maneiras de encontrar essas respostas e buscando a ascendencia do povo bra-
C~HM_ dJ.4 ~ k- C-O.ÂŁA.!.L
.0.l.M ~
J..
,, 4.4 t ... h
m.= un. u...11.1Ul- ~
sileiro e assim encontrar a configurar;:ao de nascimento de cada batida. Nesse capitulo, ha uma !ista de ritmos brasileiros e suas especificidades, como as origens etn icas, geograficas, as areas de ocoll"encia e os instrumentos mais lIsados por cada um, amparando a compreensao de todo materia l do livro. Angola Ritmo lento e imp onente, feito de entrada no ritual religioso. Sua
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C4J
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origem etnica e ruricana, a origem geografica e brasileira e as suas areas
VUulh
de maior ocorrencia no Brasil estao espalhadas. Os instnllIlentos mais
/5~~ ~ /w.k yuxft
lIsados para toca-Io sao atabaque e berimbau.
.0unk
Arnbate Ritmo cadenciado, executado no Candomb le, geralmente associado ao comer;:o das sessoes. Sua origem etnica e africana, mais especificamente em Angola, a origem geografica e brasileira e as sllas areas de maior ocorrencia no Brasil estao espalhadas. Os instnllIlentos mais lIsados para toca-Io sao gan (ou ga), Le, Rum e Rum Pi.
170
171
Arrocha
por todo
Ritmo e dan'ta sensual infl uenc iado pela seresta e pelos generos bre-
e sanfona de oito baixos e, posteriomlente, acrescentou-se triangulo,
ga e romal/lico. Seus subgeneros sao
0
arrocha romal/lico e
0
arrocha
0
pais. Os instrumentos mais usados para tOc<t-lo sao bumbo
zabumba e "bacalhau" (vareta que percute a parte de baixo do tambor).
IlIIirersilario. Sua origem elnica e brasileira, a origem geogratica e do
estado da Bahia, mais especificmnente da cidade de Candeias e as suas
Banguela
areas de maior ocorrencia no Brasil sao os estados do nordeste. Os ins-
Ritmo mais alTastado e cadencia mais amena, usada para um jogo
trumentos mais usados para toca-Io sao teclado, guitarra e saxofone.
mais proximo no ritual religioso. Sua origem etnica e africana, a origem geogratica e brasileira e suas areas de maior oCOlTencia no Brasil estao espalhadas. 0 instrumento usado para toca-Io e berimbau.
Ax. Ritmo smgido na decada de 1980 durante as
m anifesta~oes
popu-
lares de Camava l de Salvador, combinando ritmos afro-brasileiros e
Banavento
afro-latinos, reggae , lIIerel/glle,jorro, maracalll efrem. Seu nome e
Ritmo quente, talvez
0
mais quente dos rilmos executados no Can-
originado de uma sauda'tao religiosa do candomble e da umbanda. Sua
dombJe. Sua origem e africana, mais espec ificamente de Angola, a ori-
origem etnica e brasileira, a origem geografica e do estado da Bahia e
gem geogntfica e brasileira e suas areas de maior ocolTencia no Brasil
as suas areas de maior ocolTt! ncia no Brasil sao os estados da Bahia,
estao espa Uladas. Os instnunentos mais usados para toca-Io sao Gam
Sergipe e Minas Gerais. Os i.nslnnnentos mais usados para toca-Io sao
(ou Ga), Rum, RlIIn Pi, Le, agogo e tres tambores que entremeiam a
os de percussao e as guitarras e1clricas.
batida.
Bailio
Batuqlle
Ritmo dos mais caracteristicos do Brasil, cujo nom e associa " baia-
Ritmo que consiste na mais antiga referencia a lIIna danp brasileira.
no" e " rojao", pequenos trechos musicais executados por viola no in-
E realizado em circulo e dele palticipam nao apenas os d an~ar in os , mas
tervalo dos desafios entre os cantadores de improviso. Era dan'tado ja
tambem os mllsicos e os espectadores. Sua origem elnica e geografica
nas fe stas do imperio e ganhou stahls de genero musical em 1946 com
e africana, mais especificamente de Angola e do Congo e as areas de
Luiz Gonzaga. Sua origem etnica e europeia indetenn inada, a origem
maior ocolTenc ia no Brasil estao espalhadas. Os instnlmentos mais usa-
geografica e do nordeste do pais e a suas areas de maior ocolTenc ia no
dos para toca-Io sao tambor, berimbau, adufe (pandeiro) e agogos.
Brasil ate
0
seculo
xx
era a regiao nordeste e, atualmente, e tocado 172
173
BlIInba- Meu- Boi Ritmo de
dan~a
Knlanga, que significa
dramatica, que nalTa um episodio envolvendo
0
preven~ao.
dan~a
A
res, que bailmn de maneira parecida com as
e lIIn tipo mral, feita em padan~a s
de salao. Sua origem
escravo Pai Francisco, que rouba e mata um boi para que sua nmlher
etnica e indetenninada, a origem geografica esta no Vale do Cafe (RJ)
gravida, com desejo, possa comer sua lingua. Tambem conhecido como
e no Vale do Pm¡aiba (SP e RJ) e as suas areas de maior ocorrenc ia no
hoi-bumbit (FA) e boi-de-I/Iamiio (SC), entre outros. Sua origem et.nica
Brasil sao M inas Gerais, Rio de Janeiro, Sao Paulo, Goias, Mato Gros-
e brasileira, a origem geogratica e do nordeste do pais e as suas areas
so, Espirito Santo, Vale do Cafe (RJ) e Vale do Paraiba (SP e RJ). Os
de maior ocolTt!ncia no Brasil sao as regioes nOlte e nordeste. Os ins-
instrumentos mais usados para toca-Io sao os de percussao, acordeom,
trumentos mais usados para toca-Io sao maraca, matraca, tambores e
sanfona, timba, pandeiro, viola ou
violao, cavaquinho e sanfona.
0
zabumba.
Cana Verde (Caninha- verde) Cabula
Ritmo que trata de uma
Ritmos executado no Candomble. 0 sell campo de ritmos de santo e riquissimo e tem diversos toques em diferentes
na~oes.
Sua origem
dan~a
cantada, com coreografia fonnada
com duas rodas, lIIna de homens, outra de muUleres, que cantam e dan~am
em sentido contrario e, sem se tocarem, trocam de lugar. fOlmando
et.nica africana, mais especificamente de Angola, a origem geografica
novos pares. 0 rilmo muda de fOlma e de passos confonne a regiao,
e brasileira e as suas areas de maior ocolTencia no Brasil estiio espa-
pode ter tambem pequenas representa~oes com trechos em prosa e pode
Ihadas. Os i.nstrumentos mais usados para toca-Io sao Gan (ou Ga), Le,
tamhem integrar
Rum e RlIIn Pi.
origem geografica e da Espanha e POItugal e suas areas de oCOlTencia
0
haile dofalldallgo. Sua origem etnica e europeia, a
no Brasil estao espalhaodas. Os instrumentos mais usados para toca-Ia
Calango Mineiro
e a viola e
0
pandeiro.
Ritmo com lIIlla levada agradavel, que tem pouco a vel' com 0 Calango tradicional e e considerado uma
celeb ra~a o
de cunho social. Possui
Candombe
o momenta do "desafio", a vel"sao rural do repente nordestino e do par-
Ritmo originario do COl/gada, que homenageia Nossa Senhora do
tido alto carioca. Seu nome deriva de (Uublllldo kalal/ga ou rikaianga,
Rosario. E a princ ipal manifes ta~ao das Oito Guardas do Congado, sen-
que significa lagartixa em tull dialeto africano. Esta hipotese sugere que
do as demais
a dan~a seria originalmente imitativa, cOIn
Sao Jorge, ViHio e Caboclinhos. Na apresenta~ao , um mllsico puxa uma
do Calango. Oulra hip6tese e de que
0
174
dan~arinos
copiando 0 passo
tenllO venha do verba Kill/bulldo
0
Congo,
Mo~ambique,
toada, pedindo penllissao para cantal", 175
Catapes, Mamjos, Cavaleiros de
0
Pllblico presente entoa cantigas
de improviso e homens, mulheres e criant;:as caminham para
0
centro do
ocom~ncia
no Brasil sao Brasilia e Rio de Janeiro. Os instnunentos mais
telTeiro onde estlio os milsicos, dant;:am e cantam, de modo geral, tiradas
usados para toca-Io sao bandolim, cavaquinho, flauta , pandeiro, viollio
bem-hmnoradas ou pedem a bent;:ao de Deus. E llm ritmo reservado e
e viollio sete cordas.
pouco divulgado. Sua origem etnica
e brasileira, a origem geognHka
e de Minas Gerais e Goias e as suas areas de maior
ocom~nc ia
no pais
Ciranda
slio tamb6n Minas Gerais e Goias. Os instnunentos mais usados para
Ritmo feito pelos chamados " cirandeiros", que se modifica ao longo
toca-Io slio tres "tambils" (tambil, tambil do meio e tambuzinho) e caixa
do Brasil. A ciranda nordestina e mais lenta e cadenciada e a feita no li-
batuqueira, feitos de tronco de madeira de Saboeiro, afinados na foguei-
toral norte de Sao Paulo tem como palte os fandangos sapateados e val-
ra de modo que seja possivel esticar 0 som do couro do boi da tampa.
sados. Sua origem ettlica e europeia, as origens geograficas sao Espanha e POitugal (l1erant;:a dos mouros) e as suas areas de maior oCOITencia no
Catinl
Brasil slio nas cidades de Tarituba em Parati (RJ) e Sertao do Pumba em
Ritmo cativante e envolvente de danp sapateada, que remete ao
Ubatuba (SP). Os i.nstt1.lme!ltos mais usados para toca-Io slio pandeiro,
dant;:ar da peninsula iberica, como as dant;:as espanholas. Sua origem
timba, bumbo, viola, rabeca, bandola e adufo (pandeiro altesanal).
clnica e enigmatica, llllS dizem ser em¡opeia, outros dizem ser indigena ou ate da Oceania, a origem geografica e de Minas Gerais e Slio Paulo
Coco
e suas areas de maior ocolTencia no Brasil sao Minas Gerais, Goias e
Rittno de ge!lte humilde com fOima musical cantada, que se da em
Mato Grosso. 0 inslnunento mais usado para toca-Io e a viola, com
0
uma roda de danpdores e tocadores, que giram e batem palmas e pes para marcar a cade!lcia. E conhecido tamb6n como samba, pagode ou
auxilio de palmas e sapateado para marcar 0 ritmo.
zambe. Sua orige!n clnica e e!ligmatica, uns dizem ser africana, vinda Choro
junto aos escravos, outros dize!n ser 0 e!lcontro e!ltre a cultura negra e a
Rittno que pode ser avaliado como mn filho da polca e, ahmlmente,
cultura indigena, a origem geografica e da regiao do estado do Alagoas,
e cOilside!¡ado um primo do samba, alem de ser como uma adaptat;:ao de
mais especificame!lte no Quilombo de Palmares (0 rittno foi inventa-
outros rittnos, como a valsa, a habanera, a mazurca e
schottisch. Tem
do baseado nos bamlhos dos cocos sendo quebrados para a retirada da
como principais expoentes em Joaquim Callado, Emesto Nazarelh, Pi-
amendoa) e suas areas de maior ocon¡encia no Brasil slio as regioes lilo-
xinguinha, Jacob do Bandolim e Chiquinha Gonzaga. Sua orige!n ettlica
dineas. Os instnunentos mais usados para toca-Io sao ganza, pandeiro,
e europeia, a origem
geogn~fica
0
e francesa e a as suas areas de maior 176
bombo, caixa e timbrel. 177
Ritmo nascido de lUlla
varia~ao
um POllCO mais rapida do Congo,
Congada
executada no Candomble. Sua origem etnica e africana, mais especifi-
Ritmo forte, muito presente na base da milsica brasileira atual. Tem
camente de Angola, a origem
como elemento de
fOllna~aO
a coroa~ao dos reis do congo e cOl1ejo em
homenagem aos reis negros africanos, al6n de
inspira~ao
nas lutas en-
geogn~fica
e brasileira e a area de maior
ocon·encia no Brasil e a cidade do Rio de Janeiro. a s instnnIlentos mais usados para toca-Io sao
0
gan (ou ga), Ie, nUll e lum pi.
tre cristaos e momos. E executado atualmente em fOllnas de dan~as dramaticas ou folguedos (festas populares de espirito lildico) para celebrar
Fandango
as festas de N atal, de Reis, da Nossa Senhora do Rosario, Sao Benedito
Ritmo bem especifico e marc ado com um cicio de aCOl·des caracte-
e do Divino Espirito Santo. Sua origem etnica e africana, mas mescla
ristico (la menor, sol maior, fa maioI', mi menor), tem llm conjunto de
bailados e
repres enta~oes
origem geogratica e
0
populares pOituguesas e espanholas. A sua
pais do Congo, na Africa e suas areas de maior
dan~as
bailadas e sapateadas em pares com Celto ar de exibicionismo
conhecida desde
0
periodo balToco. Ganha nomes difel·elltes ao longo
ocorrencia no Brasil sao regiao centro e do sui, e na cidade de Mogi
da costa brasileira : Anu, Passeado, Tonta, Tontinha, ChammTita de oito,
das Cmzes (SP). a s instrumentos mais usados para toca-Io sao tambor,
de 12, etc. Sua origelll etnica e europeia, mais especificamente elll Es-
caixa, pandeiro, viola, bastoes, chocalho, dobradeira (repinique), surdo
panha e POltugal, a origelll geografica e na regiao sui do Brasil e as suas
e tarol.
areas de maior ocolTencia no Brasil sao no litoralnOite de Sao Paulo, como na cidade de Ubatuba e no estado do Parana, como, pol' eXelnplo,
Congo
nas cidades de Morretes e Paranagua. a s instrumentos mais usados para
Ritmo variante do antigo batuque execlltado no Candomble com
toca-Io sao castanholas, adufo (pandeiro artesanal), tamanco e viola.
campo de ritmos de santo riquissimo. N asceu para celebrar lutas dos povos africanos e sua
parlamenta~ao
de paz. Sua OI·igem etnica e africa-
Folia de Reis
na, mais especificamente em Angola, a origem geografica e brasileira e
Ritmo e festejo popular em que se danp de fOlllla acelerado aCOln-
sua area de maior ocorrencia no Brasil e na regiao NOlte e N ordeste, no
panhado de cantos, enquanto se perCOlTem as mas pedindo esmolas para
estado do Espirito Santo e na cidade do Rio de Janeiro. as instrumentos
as festas do Divino Espirito Santo ou dos Santos Reis Magos. Os fes-
mais usados para toca-Io sao tambores pequenos e gJ·andes, com pele
tejos sao realizados entre os dias 24 de dezembro e seis de janeiro. Sua
em uma ou ambas as extremidades, casacas, chocalhos e cuica.
origelll clnica e europeia, a origelIl geogJ·afica e na Espanha e elll Portugal e as sllas areas de maiOl· ocolTI!ncia no Brasil sao no Sertao de Pu-
Congo de Duro 178
179
mba em Ubatuba (SP). 0 instl1.lmento mais usado para toca-Io e a viola.
e sua area de maior OCOJT6lCia no Brasil e espalhada. Os instl1.lmentos musicais mais utilizados para toca-Io sao sanfona, acordeao, triangulo
Folia do Divino
e zabumba.
Ritmo e festejo popular no qual gmpos cantantes e annados com instl1.lmentos, tendo a fi·ente a bandeira do Divino Espirito Santo saem
Ijexil
pelas ruas pedindo esmolas para a comemora~ao da festa do dia do San-
Rit.lllo malicioso e etlVolvetlte executado no Candomb le. Sua ori-
cel ebra~ao
profano e imp lora
getll etnica e africana, mais especificamente etll Angola, a origetn geo-
divina. 0 cOltej o da proc issao e fonnado pelo rei, pajem, al-
gratlea e brasileira e as suas areas de maior ocolTt!nc ia no Brasil sao na
feres, mOl·domos e fidalgos . Sua origem etnica e europeia, a origem
cidade do Rio de Janeiro. Os instl1.lmentos usados para toca-Io sao gan
geogntfica e em Minas Gerais e em Sao Paulo e as suas areas de m aior
(ou ga), Ie, nun e nun pi.
to, numa prote~ao
que contempla
0
sagrado e
0
ocolTt!nc ia tambe.n sao M inas Gerais e Sao Paulo, como no Sett ao de Pumba em Ubatuba. Os instl1.lmentos mais usados para toca- Io sao a
lima
viola, pandeiro e adufe (pandeiro altesanal).
Rit.lllo belissimo e lido como fimebre, tocado na Capoeira e na apresenta~ao
Fono Ritmo que engloba van os generos musica is nOl·destinos como
dos mais graduados para alunos. Sua origetn etnica e africana,
a origem geografica e brasileira e a sua area de maior ocon·en cia no Bra0
baiao, 0 xote e 0 xaxado. Era na sua origem lUn baile animado por esses
sil e a cidade do Rio de Janeiro. 0 instl1.lmento mais usado para toca-Io eo bet·imbau.
varios getlerOs musicais, por isso et·a tambem conhec ido como "aJTastape ou bate-chinela". 0 tetlllO talvez venha da prommcia abrasileirada
Jongo (Oll C axambu)
da expressao em ingles " for all"' , que costlUnava se escrever em caltazes
Rit.lllo quente e etlVolvetlte, que ainda conselVa a punga (toque de
nos canteiros de obras chefiados pOI· etlgenheiros ingleses da estrada de
umbigo), trazido ao Brasil junto com os escravos Bantos. Para a dan~a ,
felTo Great \Vestenl, nos estados de Penlambuco, Alagoas e Paraiba no
e feita lUna roda e lUll casal dan~a no intet·ior desta. E acompanhado
nordeste dos anos 30, indicando que a festa era para todos. Outra possi-
de ciinticos COlIStituidos, em sua maioria, de versos emparelhados, que
bilidade para a origem do nome e que VetIl do tenno " fOlTObod6", que
uma pessoa canta e outra responde. Sua origetn etnica e africana, assim
quer dizer " divertimento pagodeiro". Sua origetn etnica e brasileira, a
como sua origem geografica e as suas areas de maiOl· ocolTenc ia no
origem geografica e nordeste do Brasil, mas especificmnente no sertao
Brasil sao a regiao sudeste, principalmente Rio de Janeiro e Sao Paulo.
180
lSI
Os instrumentos mais usados para toca-Io sao dois tambores: e
0
0
Tambll
ta de Call1aval, conservando elementos praprios como
0
rei e a rainha,
os principes , os embaixadores a fi"ente do cordao camavalesco. Sua ori-
Candongueiro.
gem etnica e africana, a origem geognHka e 0 estado de Pernambuco e a sua areas de maior ocone-Icia no Brasil e a regiao nordeste. Vem sendo Lundu Ritmo considerado
executado tamb6n em outros lugares e ate na mllsica pop , como nos 0
primeiro genero afro-brasileiro de can'tao po-
pular. Come'tou sendo uma dan'ta sensual de por negros e mulatos em
trabalhos de Chico Science. Os instrumentos mais usados para toca-Io sao caixa, alfaia e agogo.
rodas de batuqlle, e passou a ser considerada can'tao apenas no final do seculo XVIII e chegou a ser tocado nos saloes das elites cariocas no
Pal"tido Alto
seculo seguinte. 0 ritmo desapareceu no inieio do seculo XX, misturan-
RitJno variante do samba carioca, criado nos morros da cidade do
do-se ao tango e a polca e dando origem ao maxixe. Sua origem et.nica
Rio de Janeiro E feito para
e brasileira, a origem geogntfica e do estado da Bahia e as suas areas
ou quatJ¡o estrofes, sempre rep etindo
de maior ocorrencia no Brasil sao. Os instmmentos mais usados para
palte dos cantadores, pois mllitos de seus versos sao feitos na hora, de
toca-Io sao atabaques.
fonna criativa e, de celta fonna , de desafio, pois os pmticipantes da
0
roda sao convidados a cantar
Macule
povo cantar, pode
0
0
Sel"
dividido em dllas
mesmo refrao. Exige pericia da
verso de acordo com
0
refrao da roda.
Temos Zeca Pagodinho como 0 grande expoente desse ritmo, passando
Riuno intenso de dan'ta que simula um combate com
jogo de bas-
pOI' Bezerra da Silva, Elton Medeiros, entre OlitroS. Sua origem eUlica
toes e facoes. Sua origem et.nica e africana, a origem geografica e do
e geografica e brasileira e as suas areas de ocorrencia se estendem pOI'
estado da Bahia e as suas areas de maior oCOITencia no Brasil sao. Os
varias areas brasileiras. Os instrumentos mais lIsados para toca-Io sao
instrumentos mais usados para toca-Io sao atabaques.
caixa, miea, sUl'do, tamborim e palmas.
0
Maracatu
Quebrado
Riuno quente e intenso de origem religiosa em que grupos acompa-
RitJno variante do Barravento, um POliCO mais lento, tocado no Can-
nhavam os reis do Congo, eleitos pelos escravos e se seguia pOI' uma
domble Na'tao Angola. Sua origem eUlica e africmta, a origem geogra-
homenagem a Nossa Senhora do Rosario, padroeira dos homens negros.
fica e brasileira e areas de ocorrencia sao espalhadas pelo Brasil. Os
Depois de perdida a u'adi'tao religiosa
instrumentos mais usados para toca-Io sao gan (Oll ga), Ie, rum e nun pi.
182
0
riuno passou a sertip ico da fes-
183
e africana, em Angola e as area de maior OCol1"&lc ia no Brasil e a regiao Samba
slldeste. Os instrumentos mais usados para toca-Io sao bumbo (surdo),
Um dos ritmos mais fmnosos e rep resentativos do Brasil, origimirio
caixas, pandeiro, zablUuba e chocalho, na maioria das vezes artesanais
da mistura de varias
heran~a s:
jongo, batuque, maxixe, lundu, polka e
feitos de madeira e pete de animal.
xote. Sell nome vem da patavra "semba", que quer dizer " umb igada" na lingua de Angola. Ao longo do seculo XX, nhou varias fonna s, como 0
samba-can~ao , 0
enredo e, mais recentemente,
0
0
samba evoluiu e ga-
samba de breque, 0 samba
pagode, sua maior expressao se da no
Samba de Roda Ritmo binario, etlvolvetlte, forte e anebatador, deSCetldetlte direto das danps de umbigada. Origina lmente e
dan~ado dan~a.
numa roda grande
camaval, em especial do Rio de Janeiro e, mais recentemente, tambem
aOilde, um a um, os palticipantes mostram sua
em Sao Paulo. Sua origem etnica e africana, a origem geogratica e suas
e afhcana, a origem geogratica e a Bahia e a area de maior oCOl1"alcia
areas de maior ocolTalcia sao variaveis, dependendo da modalidade do
no Brasil e tambem
samba. Os instrumentos mais usados para toca-Io sao bandolim, ban-
para toca-Io sao os atabaques.
0
Sua origem etnica
estado da Bahia. Os instrumentos mais usados
jo, caixa de guet1"a, cavaquinho, chocalho, repinique, surdo, tamborim, v iolao e viola sete.
Sao Bento Gl"ande Ritmo mais forte utilizado na capoeira de Mestre Bimba. Sua ori-
Samba de Lenro
gem etnica e africana, a origem geografica e brasileira e as areas de
Esse ritmo e lUna manifesta'tao do samba, mais letlta. Caractet¡iza-se
ocom~ncia
no Brasil estao espalhadas. 0 instrumento mais lIsado para
toca-Io e
berimball.
pelo let1'tO usado como enfeite por hOmetlS e muUleres , na devo'tao a
0
Sao Benedito. Na dan'ta, os hOmetlS enfileiram-se de um lado, as nmlheres de Olltro, passando 0 let1'tO para escolher seu par. 0 enredo das mll-
Sao Bento Pequeno
sicas baseia-se em pequenas cronicas de acontecimentos locais. As suas
Ritmo cadenciado e intenso tocado durante mais tempo no ritual da
melodias sao de facil execu~ao.
etltOna~ao
e se rep etem varias vezes durante sua
capoeira brasileira. Foi introduzido pOI' Mestre Bimba no Brasil. Sua
As roupas sao saias e blusas destinadas as mulheres e cal'tas e
origetu etnica e africana, a origem geogratica e brasileira e as areas de
camisas aos hOmetlS, sendo a cor predOluinante 0 venuelho e 0 branco.
ocom~ncia
no Brasil estao espalhadas. 0 instrumento mais lIsado para
Tipo rarissimo de manifesta~ao popular, quase extinto. Slia origem etni-
toca-Io e
berimball.
ca e afh cana, mais especificamente do povo Banto, a origem geografica 184
0
Sao Gonraio 185
Ritmo estimulante e belo tocado em festa s feitas no intuito de pagar
dos rifles no chao.
uma promessa ou em devo~ao, no dia do santo. E tuna dan~a cansativa, ja que nao se pode parar numa
dan~a
que dura mais de quatro horas.
Sua origem dnica e europeia, a origem geogratica e da Espanha e de
Xiba (ou Chiba) Ritmo que sustenta uma
dan~a
movimenta~ao
sapateada e canto popular e mral ao
POitugal e as suas areas de maior ocorrenc ia no Brasil sao nas regioes
ar livre, tem uma
pesada. Sua origem et.nica e europeia,
Nordeste e Sudeste. Os instrumentos mais usados para toca-Io sao pan-
a origem geografica e da Espanha e de Portugal e as suas areas de maior
deiro, rabeca e viola.
ocon¡encia no Brasil sao nas regioes sudeste e suI. Os instnunentos mais usados para toca-Io sao pandeiro, violao, viola, pratos , cavaquinho e
Sa1:6
rabeca.
Ritmo mais lento, pouco diftmdido no Candomble
Na~ao
Angola,
mas existente. Sua origem etnica e afhcana, mais especificamente de
Xol:e
angolana, a origem geografica e brasileira e as areas de ocorrencia no
Ritmo lento para se
dan~ar
a dois, com mishu¡as de passo da valsa
Brasil estao espalhadas. Os instrumentos mais usados para toca-Ia sao:
e da polca. Originalmente era uma
gam (ou ga) , mm, nun pi, Ie, agogo e tres tambores que unificam
dan~ada
0
dan~a
exclusivamente masculina,
pelos cangaceiros sem acompanhamento de instnunentos, so
com 0 canto e marca~ao de ritmo com 0 rifle batidono chao. Sua origem
toque.
etnica e europeia, pois especula-se quetem origem de uma dan~a de oriXaxado Ritmo de
gem alana, 0 schottisch, muito difundida na Inglatell"a e na dan~a
cangaceiros para
celebra~ao
Fran~a ,
tra-
das suas vitorias, es-
zida para 0 Brasil em 1951. A origem geografica e do nordeste brasileiro
ja conhecida no agreste e sertao de Per-
e as suas areas de maior ocoll¡encia no Brasil sao na regiao nordeste,
nambuco desde a decada de 20, diftmdida pOI" Lampiao e seu bando e,
principalmente na cidade de Recife. Os instnunentos mais usados para
a principio, estritamente masculina. Especula-se que
toca-Io sao tri<ingulo, sanfona e zabtuuba.
tritamente vocal, com
dan~a
0
nome seja tuua
onomatopeia do " xa- xa - xa" que faziam as alpercatas de como ao se alTastarem no chao. Sua origem dnica e brasileira, e a origem geografica e do nordeste e as suas areas de maior ocolTt! ncia no Brasil sao tambe.u na regiao nordeste. Os instrumentos mais usados para toca-Io sao pifano, zabumba, tri<ingulo, sanfona, alem do bater das coronhas 186
187
G
ORI 188
F 189
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190
Hera de adeus
Hora do Adem
OllildoAlmeit/a e Llliz Qlleiroga (1 967)
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Foi alTebatadora. Puxoll-me pela mao, me fez sOlTir,
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e, por fun , me p& a chOl¡ar. Ela tinha
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~Jw.. ~11.<L nwtlw.. v""}- ".. m.L<h C..dL m.L<h ~ de- ~ r.- 1:.a.JrtÂŁun. ".. m.L<h ~ O'u.cv.. t...k- rkvt. de- ~tU., O.D- ~ C <L 1.A-M.. .& ~
y__
i9L ~, ""
M
eaw.
cora~Oes
0
dan~ou
cOlnigo
dom. Sabia cOln o amolecer os
mais dmos e conseguia renovar a
esperan~a
ate de um poore
coitado. Ah, como e dific il conhece-Ia por inteiro! Ela sempre me smpreende. Lanp mao de todos sells mtificios e quando eu
p are~o
distante,
consegue me trazer de volta. Imagine voce, que eu estava andando por ai e, de repente, tive vontade de fazer lUna surpresa para ela. QlIeria inventar algo que pudesse mostrar para todo mundo
0
seu valor, mas nao sab ia
0
As mais mirabolantes fantasias me passaram pela
que fazer. cabe~a ,
ate quan-
do uma ideia, que (quem sabe) jamais ninguem pensoll em fazer, me acometeu. Passei meses buscando sua historia, passado, suas caracteristicas, peculiaridades,
restr i~oes.
Elaborei pianos, fiz e refiz homenagens.
Quando tudo estava pronto, a tmica coisa que pensava era : " sera que ela vai gostar?". Hoje e
0
grande dia e os proximos que virao serao ainda maiores. 0
meu tr ibuto nao envelhece, nao desgasta, por isso a paltir desse momento 0 que esta feito, esta feito. Como ela, a minha musa, mmca responde objetivamente, talvez eu nunca va saber se fiz lim bom trabaUlo, se consegui mostrar a todos a grande impOltancia dessa preciosa e ate mesmo se ela aprova. Seja como for, aqui estou ell, entregue, apaixonada e satisfeita. Obrigada por tudo e me descllip e por qualquer coisa. Essa foi para voce, minha mtlsica brasileira. 194
195
Repert6rio do CD Coletanea 7.6 Abre Alas Alllor: Chiql/iulln Gonzaga (J899) - /Ilterprete : Marlellf!,
EII/ilil/lln e Allgela Maria ( 1999) J.Cordiais Sm~ao
SAtratllfe
Alllor: Noel Rosa - Inle/prete: Noel Rosa (1931)
AI/tor: ChilJl/iulin Goumga (J977) - //lterprete : Pi.ti1lKllillha e Belledifo Lncenla ( 1947)
Mal Trat;adas Lill/las Alllor: Noel Rosa - illterprete: Nt1 Ozzefti ( /935)
Alltor: Carto/a - /IIJirprete : Carto/a (l977)
3. RecellSeamelllo
10. DellS Ie Oll{(l
Alllor: Atsis Va/ellIe (J 940) - IIlJerprele: Cam/eIII Mranda (J 940)
Alllor: Cartola e P(Dlio da Porlela - //lterpre/e: Velha GI/arria cia Portela
4.Brasi/ Promiro Alltor: Ass;s Valenfe (1940) - ]IIJerprete: Carmem Miranda (1972)
11.QllalJo; 0 lIIal que le./iz Alllor: Cartola e Noel Rosa - Illterpre/e : FrallciscoA/ws (1932)
5. Callto dar 'Ires Raf;as
12.GNU/de DeliS
All/or: Ahtro DIme e Pallo Cisfr Pillil!ilO - hterprete: Ckm MIIEJ (1976)
Allror: Cartola - IIIJerprete: Cm¡tola (1958)
6. Lila Bral/ca
i3.Nas Dois
Alllor: C/iirpulIhn Gollzaga (1911) - llderpretes: Muia Bel/riJun (1995)
Alllor : Carloln (1964) - Jlllerprele: Cnrlola ( J977)
2.Em"io ES.J(u
196
9.Al/laHomia
197
14.0 Mllndo e
1/111
Moil/ito
23.Boas Fesias
Alltor: Carto/a -1nterprete: Belh CmTa/ho (J977)
Alllor: Assis Valente (J933) -1nlerprete: Carlos Galhardo
l5As Rosas Niio Palalll
24.Camisa Lislrada
Alltor: Carlo/a -1nterprete: Cm'lo/a ( 1974)
Alltor: Assis Valente (J937) - /nlerprete: Maria Betlitinia (J968)
16 Depoimenlo de Carto/a do albulII Carlo/a para 1bdos (2008)
25.Manglleira AI/tor: Assis ValenJe e Zeqllinita Reis (J958) -
17. Com qlle ROllpa
1nterprete: Astor Silm e Orqllestra (2002)
Alilor: Noel Rosa - /nterprete: Noel Rosa (1930.) 26Boneco de Pallo 18 Para me Lhrar do Mal
Alltor: Assis Valelile (J95a) - /nterprete: QuatroAses e UIII Coringa
Alitor: Noel Rosa e 1smnel Sifm (J932) - /Ilterprele : PrwlCiscoAI1'es 27.A fullfa da A10da 19. Feitio de Orm;iio
Aulor: Llliz Gonzaga e Ze Danlas (J95a) -1nterprete: Llliz Gonzaga
Alitor: Noel Rosa e Vadico (J933) - /nierprete: Marisa Monle (20.11) 28 Dal/fa Mariquillha 20. Dama do Cabare
Alltor: Llliz Gonzaga (J934) -1nlerprete: LlIiz Gonzaga
Alilor: Noel Rosa (J934) - /Ilterprete : Orlalldo Silm 29.Asa BrallCa 21. UJlillw Desejo
Alllor: LlIiz Gonzaga e HlI11Iberto Thueira (J947) - /nterprete: Llliz
Alltor: Noel Rosa (J937) -1nlerprete: Wilson das Ne1'es (20.06)
GOllzaga COlli Orqllestra Siliftjnica
22.A/egria
30.Paraiba
Alltor: Assis Valente -1nlerprele : Vrmessa da Maia (2002)
Alllor: LlIiz Gonzaga e Hlollberto 7eiwira -1nierprete: Llliz Gol/zaga (J952)
198
199
31.Xole dos Cabeilldos Alllor: LlIiz Gonzaga e Jose ClementillO -inletprele: LlIiz Gonzaga (J967) 32. Umbigada
Alltor: Lincoln Antonio -illterprele: Aletil Aleta (2011) 33.HoradoAdellS AI.dor: LlIiz Qlleiroga e OnildoAlmeida (J967) - bderprele: Llliz GollZaga 34. Preciso /lie ellcolltrar Alltor: Candeia -illterprete: Carlola (J976)
200
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. Paginas ampliadas: 0 livro-repOltagem como exten-
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206
A auton Laun LUl, ~:! anos, e pauhsta de CaJUI'U de sangue e de abm Mmewa do sertlo rosumo de cOl1l ..lo VIVe\.l \7 anos n. sua terra natal. eswdando donnte tod. vida e$Colar no mesmo eoleglo. convwmdo com uns pouCQS colegas e se safando da dlficll tarefa de fazer novos anugos Mudou-se pra Ballnl-SP para fazer faculdade de Jomahsmo na Umversldade Esladual Paullsta (Unesp). mommto que VIU I necessldade de se encontrar As hlstonas das ftguras que mudaram algum. realtdade tortl pOI" meta da eSCflta e a descoberta de que nUlltos lIteratos admtravels ganhavam a vida trabalhando com 0 Jornahsmo foram as razOes do poder da cl neta ler Ihe fasc1flado E daquelas de sonhos grandlosos e de passos cautelosos. dessl maneu-a engmdra SUI vida e pass. nlo-1fllacta 0 pertodo da Juvmtude Conheceu wn bom pedac o do mundo. descobnu 1flumeros prazeres. mudou 0 que pode do desacertado. mas 11flda tern mUlto que conhecer. que descobnr e que mudar Estes versos de Candela. unortahZlldos III VOl de Caltol•. traduzem este deseJo
Laura Luz Livro- reportagem. Produto do traballio de concJusilo de Curso de ConuUlica~li o Socia l - Habilita~ilo em Jomalismo, da Universidade Estadual Paulista " Jillio de Mesquita Filho" (Unesp), da Facu ldade de Arquitetura Altes e Comllnica~ao (FAA C), orielltado pelo Prof. Dr. Juarez Tadeu de Paula Xavier do Depaltam ento de ConuUlica~ao Soc ial (DCSO). Baum. 2014
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M~AI.tv<
_ ~ lC, t, _ ,~ .... , " """ ~w.v.
unesp~
E se voce pudesse enviar cartas aos maiores representantes da music a popular brasileira, mesmo aqueles que ja tivessem partido? o livro
Cormajs Sauda90es faz
tun
panorama das raizes da
musica popular brasile1ra em fOl'l llato experimental de texto, llojndo cartas pessoais, entrevistas ficticias baseadas em declar8,Qoes reais e releituras biograficas de cinco dos musicos
mals Importsntes da hlst6ria do nosso pais: Assls Valente, Cartola, Chlquinha Gonzaga, Luiz Gonzaga e Noel Rosa. Cordiais Saudat;0es tambeID traz lIma vasta pesquisa sobre
as rltmos musicais do Bras1l, apresenta a ID1.lsica como lIma
fundamental plataforma de cultura e designa 0 pavo brasileiro como uma multicultural, colorida e plena m1sceliinea.