Urn Livro sobre
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Samba
Matheus Costa
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Samba
Conteudo compilado de diversos sites.
emmecosta 2016
Copyrighr Š 2016 emmeeosra edirora Lrda. Rua Amaro Rangel 21 20970-006 R io de Janeiro, RJ rel.: (21) 2228 -955 1 / eel.: (21) 99260-4176 email: conraro@emmecosra.com.br sire: emmeeosra.eom.br Todos os direiros reservados. A
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Caraloga~ao-na- fonre
Sindicaro Nacional dos Edirores de Livros, RJ. C osra, Matheus, 1995Urn Livro sabre a Samba / Matheus Costa. Rio de Janeiro: emmecosta ediwra. 20 16. (Amropolagia social) ISBN: 20-1402-019-556 1. Samba - H isroria e uirica. 2. Musica popular - Brasil Historia e uirica. 3. Muska afar-brasileira. I.T imla. COD: 201.402019 C O U: 556.0(2 1)
Matheus Costa
"""" Brasil nao e apenas conhecido pelas belas paisagens, pelos craques fan,
tasticos de futebol, nem muito menos pelas novelas televisivas que fa./ zem sucesso no exterior. Oltando alguem pensa em Brasil, geralmente
a mente salta: mulheres, carnaval e, samba. Isso mesmo, 0 Samba, urn estilo musical que une a diversidade e 0 swing de uma na<;ao inteira. No dia 02 de D ezembro e comemorado 0 dia nacional do sa mba, urn estilo musical que leva a identidade brasileira para 0 exterior, claro, existem uma serie de modalidades deste estilo musical, desde 0 samba raiz ate aqueles que mantem a tradi<;ao viva ate os dias de hoje. I sso mesmo, apesar de toda modernidade que nos cerca, 0 samba ainda pede passage m entre os grandes sucessos de nossos dias. No inicio 0 dia do samba era comemorado apenas em Salvador, mas como o estilo nunca respeirou frontei ras, aos POllCOS foi aumentando ate se tornar uma comemora<;ao nacional. Era algo esperado devido a quantidade de talentos que tornaram 0 samba esse estilo musical que leva a tradi<;ao, amor e a vivacidade de uma na<;ao inteira. Mesmo com tantos estilos musicais completamente diferentes, 0 samba e entre todos 0 mais pitoresco do Brasil, a essencia do povo brasileiro.
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estilo musical que traduz
Urn estilo musical cheio de gingado e melodia que encanta pelas dan<;as e tambem pela execu<;ao que exige harmonia e talento de rodos os musicos envolvidos na roda de samba.
o Dia Nacional do Samba e comemorado em 2 de D ezembro, onde se celebra esse ritmo musical criado no Brasil e que e tido como forma de expressao em diversas regi6es. E conhecido mundialmente como simbolo da musica brasileira.
Introdu~ao
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Apesar de ser extremamente popular em muitas regioes do Brasil, a origem do samba como Bahia e Sao Paulo, este genero de musica esta muito lig ada ao Rio de Janeiro, onde nasceu por volta do final do seculo XIX e comes:o do scculo XX . Era uma dans:a de escravos que misturaram suas dans:as com os ritmos regionais do maxixe, xote, entre outros, cria ndo 0 samba carioca. A data de 2 de D ezembro foi escolhida como 0 dia do Samba pois foi nesse dia que 0 famoso compositor Ary Barroso, urn dos mais famosos compositores de samba da historia, visitou pela primeira vez Salvador na Bahia. 0 entao vereador L uis Monteiro Costa propos entao homenagea-lo, celebrando 0 d ia do Samba nesta data no calendario reg ional, que com 0 passar dos anos acabou se tornando uma comemoras:ao a nivel n acional.
Breve IGjIl1lO,ybe 0 00rb0
o samba c urn genero musical, 0 qual deriva de urn tipo de dans:a, de raizes africanas, surg ido no Brasil e considerado uma das principais manifestas:oes culturais populares brasileiras." D entre suas caracteristicas originais, esta uma forma onde a dans:a c acompanhada por pequenas frases mel6dicas e refroes de crias:ao anonima, alicerces do samba de roda n ascido no Reconcavo Baiano e levado, na segunda metade do , seculo XIX, para a cidade do Rio de Janeiro pelos negros que trazidos da Africa e se instalaram na entao capital do Imperio. Apesar de existir em varias partes do pais - especialmente nos E stados da Bahia,de Pernambuco,do Maranhao, de Minas Gerais e de Sao Paulo - sob a forma de diversos ritmos e d ans:as populares regionais que se originaram do batuque, 0 samba como genero musical e entendido como uma expressao musical urbana do R io de Janeiro, onde esse Formato d e samba nasceu e se desenvolveu entre
fina l do seculo XIX e as primeiras decadas do seculo XX. Foi no Rio de Janeiro, q ue a dans:a praticada pelos escravos libertos entrou
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em contato e incorporou outros generos musicais tocados n a cidade, adquiri ndo urn carater totalmente singular, que se tornou a identidade do povo brasileiro e ganhou propors:ao mundial. D esta forma , aind a que existissem diversas formas regionais de samba em outras partes do pais, 0 samba carioca urbano saiu da categoria local para ser als:ado a condis:ao de simbolo da identidade nacional brasileira. No mundo inteiro 0 nome "Brasil " remete imediatamente ao samba!
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I Introdur,;:ao
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D esde a decada de 1930,0 samba cresceu, modificou-se, atualizou-se sem perder a sua essencia, a sua raiz e, ao longo de todos estes anos, tornando-se patrimonio imaterial do Brasil. A grava~ao da musica "Pelo TeIefone (1917) e considerada como urn marco da historia moderna e urbana do samba, ja que "PeIo TeIefone" e 0 primeiro samba a ser gravado no Brasil (segundo os registros da Biblioreca NacionaI). Reivindicada por Donga (Ernesto Santo), com co-autoria atribuida a Mauro de Almeida, na verdade, era uma criac;ao coletiva de musicos que participavam das festas da casa de Tia Ciata, mas acabou registrada por Dong a e Almeida na Biblioteca Nacional. Foi a primeira composic;ao a alcan~ar sucesso com a marca de samba e contribu iria para a divulgac;ao e popularizac;ao do genero. A partir daquele momento, 0 samba urbano carioca comec;ou a ser difundido peIo pais, adquirindo urn lugar proprio no mercado musical. No final da decada de 20, inovac;6es produzidas por compositores dos bairros do E stacio d e Sa , Osvaldo Cruz e dos morros da cidade, 0 samba comec;ou a ganhar mais originalidade adqu irindo urn Formato "genuino" ou "de raiz" passando a se consolidar no Rio de Janeiro como uma expressao musical urbana e moderna, sendo tocado em larga escala nas radios, espalhando-se desde os morros cariocas ate os bairros da zona suI da cidade. I nicialmente criminalizado e visto com preconceito, por suas origens negras, a forc;a do samba venceu barreiras, superou os preconceitos e conquistou 0 publico de todas as idades e classes sociais. Por sua historia, suas conquistas, sua originalidade e por ser urn ritmo que traduz 0 sentimento, 0 jeito de ser, a essencia do povo brasileiro, 0 sa mba hoj e e uma paixao nacional, que passa de pai para filho e continuara a conquistar geraC;6es.
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ficialmente a bossa nova cometyou num dia de agosto de 1958 quando
chegou nas lojas de discos brasileiras 0 78 rotac;oes de numero 14.360 , .) do se10 Odeon do cantor Joao Gilberto com as musicas Chega de Saudade (Tom Jobim e Vinicius de Moraes) e Bim Born (do proprio cantor). Unanimemente reconhecido como papa do estilo, Joao tinha acompanhado ao violao urn pouco antes a cantora Elizeth Cardoso em duas faixas do tambem inaugural Can{iio do Amor Demais (LP exc1usivamente dedicado as canc;oes da iniciante
dupla Tom & Vinicius) com a celebre batida, sincopada no tempo fraco pelos bateristas. Para desembocar na revoluc;ao harmonica sintetizada na voz & violao do baiano nascido em Juazeiro, muitos acordes dissonantes (ironizados na canC;ao manifesto Desajinado, de Tom e Newton Mendontya) foram disparados. A avassaladora influencia da cultura americana do P6s-Guerra combinada a influencia do impressionismo erudito (D ebussy, Ravel) e urn inconformismo com 0 Formato musical dos d6s de peito acompanhados por regional disseminaram descontentes inovadores como os violonistas Garoto, Valzinho, Laurindo de Almeida, Luis BonEa, 0 (entao) acordeonista Joao Donato e principalmente 0 pianista e compositor Johnny AlE Alguns deles (mais cantoras como Nora Ney e Doris Monteiro) reuniam-se em fa-c1ubes caseiros como os que tributavam Dick Farney & Frank Sinatra, Dick Haymes & Lucio Alves para cultuar seus mitos e ensaiar as mudanc;as. Ao proprio Farney seria atribuido outro marco inaugural, a gravaC;ao cameristica (com arranjo de Radames Gnattali, tambem modernista) do samba
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cans:ao Copacabana (Joao de Barro/ Alberto Ribeiro) em 1946. Seu rival Lucio Alves integrava 0 Namorados d a L ua, urn dos muitos grupos vocais - como os pioneiros O s Cariocas - que sob influencia dos congeneres americanos espalhavam arrojadas combinas:6es harmonicas pela MPB pas-samba cans:ao ja em fase de modernizas:ao por autores como D orival Caymmi (Marina, Nem Eu) e Tito Madi (Cansei de llusoes, Nao Diga Nao). 0 tripe da nova bossa mold ad a por Joao assentava suas bases na densidade musical do compositor Antonio Carlos Jobim (ex-aluno do dodecafonista alem ao Koellreuter), autor em meados dos 50 da inovadora Sinfonia do Rio de Janeiro (arranjos do mesmo Gnattali) e d a provocante Teresa da Praia (am bas com Billy Blanco) e no brilhantismo poetico do experiente diplomata Vinicius de Moraes (parceria iniciada n a pes:a deste, Orftu da Conceirtio, em 1956).
Paralelamente a ascensao d a bossa, escalava as paradas 0 sambalans:o, que sem chegar a constituir-se num movimento, injetou mais teleco-teco (como se dizia na epoca) no velho ritmo gestado na casa das tias baianas no centro do Rio no comes:o do seculo. Alguns fornecedores e expoentes do setor: Elza Soares, Miltinho (egresso do grupo vocal Os Namorados), Ed Lincoln (que tocava n a boate Plaza, outro reduro da inaugural da bossa), Djalma Ferreira, Orlan Divo, Silvio Cesar, Luis Bandeira (autor d e "Apito no samba"), Pedrinho Rodrigues, L uis Reis, H aroldo Barbosa, L uis Antonio, J adir de Castro e Joao Roberto Kelly. Mas a bossa era acima de tudo urn movimento da emergencia urbana do pais na fa se desenvolvimentista da presidencia de Juscelino Kubitschek (195560) e concentrou-se no Rio em apartamentos da zona suI como 0 da futura cantora Nara L eao. Ela sediava em Copacaban a encontros d e jovens autores e musicos como Carlos Lyra, Roberto Menescal, R onaldo Boscoli, Sergio Ricardo e C h ico Feitosa, entre outros. O s shows do g rupo comes:aram no ambito universitario (foi 0 primeiro movimento musical brasileiro a sair das fa culdades) e agregaram inumeros outros inovadores. D e Durval Ferreira (Sambop, Batida D iftrente) a precursora Silvia Telles (a quem alg uns atribuem mais urn marco inaugu ral, F oi a Noite, d e Tom e Newton M endonp, em 1957), L eny Andrade e as primeiras forma s:6es instrumentais da nova tendencia lideradas por gente como O scar Castro Neves (e seus irm aos mu sicos), Sergio Mendes,
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Luis Carlos Vinhas, J.T. M eirelles, a1em do instrumental/vocal T amba Trio (L uis E tya, Bebeto, HeIcio Milito) que ao lado do Bossa 3 (Vinhas, T iao Netto, Edison Machado) d aria inicio a uma feb re de conju ntos de piano, baixo e bateria. Foi urn momento de efervescencia instru mental com 0 aparecimento de mu sicos novos como P aulo Moura, Tenorio Junior, D o m U rn R omao, Milton Banana, Edson M aciel, R aul de Souza e a ascensao de m aestro arranjadores como Moacyr Santos e Eumir D eodato.
o sucesso nos palcos universitarios nao t irou
intimismo do movimento q ue concentraria novas fortyas em p ocket shows nos minusculos bares do chamado 0
Beco das Garrafas (nomeado a partir dos projeteis atirados peIos vizinhos contra o barulho) em Copacabana. D e Ii sairiam , paradoxalmente, artistas de uma fase mais extrovertida da bossa como Elis Regina (coreografada peIo bailarino americano L en nie D ale, que t ambem cantava), Wilson Simona! e Jorge Ben (atualJor).
Chfga df Saudadf - Joao Gilberto Samba df uma Nota Sd - N ara Leao D uajinado - Joao Gilberro Garota df lpanfma - Joao e A str ud Gilberto, Stan Getz & Tom Jobim
o Barquinho -
M aysa
l njluencia do Jazz - C arlos Lyra M anhii df Carnaval - Agosti nho dos Santos, Luis Bonfa e Q!iarteto de O scar Castro Neves Batida D iftrtnlf - T amba T rio M inha Namorada - O s C ariocas B frimbau - Baden Powell L obo Bobo - Wilson Simona! Corcovado - Tom Jobim e Fra nk Sinatra l nsensatez - T om Jobim E la E Carioca - Serg io M endes e Sexteto Bossa R io Nana - M oacyr Santos Balan{o Z ona Sul - Zimbo Trio Sonho de M aria - T amba T rio Samba do A v iiio (Tom Jobim) - Eumir D eodato M as Que Nada Uorge Ben} - Jorge Ben
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Esta no dicionario: templo pagao asiatico. Mas no Brasil, a palavra pagode passou a denominar tambem urn tipo de Festa "com comida e bebida, de carater intimo", na definiC;ao academica do folclorista Camara Cascudo. Em qualquer Festa que se preze, porem, nao pode faltar musica alegre - e ai, naturalmente, entra 0 samba. Foi de que fez do pagode uma das mais forte s tradic;6es dos suburbios do Rio de Janeiro. Urn quintal guarnecido pda sombra das arvores, algumas caixas de cerveja, uns quitutes, um cavaquinho ali, rnesinhas para se batucar... esta formado 0 cenario para que os versadores e instrumentistas mostrem sua categoria, 0 publico sambe animado e a tarde entre pela noite e a noite pela madrugada. Ao longo dos anos 70, quando os emergentes sambistas se viram diante do bloqueio das radios e das proprias escolas de samba (refens de urn Carnaval comercializado), os pagodes se tornaram a mdhor oPC;ao para que suas composic;6es fossem ouvidas e divulgadas. D as mais famo sas cantoras de samba da epoca (junto com Alcione e Clara Nunes), Beth Carvalho certo dia foi investigar 0 pagode do Cacique de Ramos e levou alg uns daqueles compositores ainda desconhecidos para 0 seu disco de 1978, D e Pi no Chilo. Foi a partir dai que 0 Brasil tomou conhecimento de nomes g rupo Fundo de Qyintal dos compositores Arlindo Cruz e Sombrinha (Vou Festejar), os ex-Fundo Jorge Aragao (Coisinha do Pai) e Almir Guineto (que
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tirou terceiro lugar no festival MPB Shell, de 1981, com M ordomia), Z eca Pagodinho (Camariio que D orme a Onda L eva), Jovelina Perola Negra, Luiz Carlos da Vila (de Por um D ia de Grara, gravado mais tarde por Simone), entre outros. A stros desse novo samba, que rumava para 0 futuro com um solido embasamento no passado, des protagonizariam mais tarde, a partir de 1986 urn dos movimentos de melhor resultado comercial da historia da musica brasileira: 0 pagode. l ronicamente, por uma contingencia de marketi ng e midia, a Festa passou a emprestar seu nome a musica que a anima. Coube ao Fundo de Qyintal introduzir as inovac;6es instrumentais e harmonicas do pagode em rdac;ao ao tradicional samba. Para reforc;ar 0 cavaquinho, Almir Guineto trouxe 0 banjo, que soa mais alto no meio da massa sonora. No lugar do pesado surdo, Ubirani pes 0 leve e versatil repique de mao. Jorge Arag ao, por sua vez, trouxe para os sambas as harmonias mais intrincadas, aparentadas da bossa nova (e, grac;as a suas sofisticadas letras, fi caria conhecido como Poeta do Samba). I nicialmente divulgados por Beth Carvalho e outros nomes
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de destaque do samba, esses artistas em pouco tempo conquistaram luz propria.
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Em carreira solo, Guineto foi urn dos sambistas de maior sucesso dos anos 80 com musicas como 0 jongo Caxambu, M el na B oca,jib6ia e Gonselho. Ex-empregada domestica, revelada em 1985 no LP Rara Brasileira (junto com Zeca Pagodinho, Elaine Machado, Mauro Diniz e Pedrinho da Flor), Jovelina Perola Negra estourou Feirinha da Pav una, Brincadeira Tem H ora e 0 Bagaro da Laranja. 0 ex-cantor de coco Bezerra da Silva tambem fez muito sucesso com sambas irreverentes, mas de alto teor de critica social, como D ifunto Gaguete, Malandragem D d Um Tempo, Bicho Feroz, recolhidos entre a sua equipe de compositores do morro. Zeca Pagodinho, por sua vez, ganhou a atens:ao popular com S.PC., Casal Sem Vergonha,judia de Mim e Corariio em D esalinho. No meio da euforia consumi sta do Plano C r uzado, em 1986, os pagodeiros se mostraram excelentes vendedores de discos (sempre mais de 100
mil c6pias por lans:amento) e conqu istaram seu quinhao na g rande m idia: simplesmente nao sairam do rad io e da TV (gravaram videoclipes e participaram ate do program a d e Nat al de Roberto Carlos). D e cu rtis:ao exclusivam ente suburbana, os pagodes (a mu sica e a fe sta, com seus quitute s tipicos) tornaram-se moda tambem nos bairros da elitista Zona SuI ca rioca enos mais diversos recantos Brasil adentro. 0 impeto aos poucos diminuiu , com a consequente queda d e poder aquisitivo do seu maior publico consumidor - as classes menos abast adas. L ogo, uma nova modalidade de sa mba, bern mais comercial e desvi nculada das raizes, passa ria a ser conhecida como pagode. Em Sao Pau lo, no comes:o da d ec ada de 90, uma varias:ao mais pop do samba-rock dos bailes d eu as cara s em musicas d e band as como 0 Ras:a Negra e o Negritude JUnior.
E sse pagode suingado, tambem conhecido como samba maurirola (por causa da ops:ao dos musicos pelos simbolos de status da classe alta - roupas fin as, telefones celulares e n amoradas louras) foi urn dos grandes sucessos ao longo da decada, com musicas de refroes faceis e romantismo deslavado (nao raro encomendadas a hitmakers profissionais), predominancia de instrumentos eletronicos e coreografias de gosto duvidoso. Como se houvesse uma linha de montagem, os g rupos se multiplicaram por todo 0 pais: S6 P ra Contrariar (que teve seu nome tirado do titulo de musica do Fundo de Oltintal e bateu em 1998 a marca
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de tres milhoes de c6pias vendidas de urn unico disco), Cravo e Canda, Ginga Pura, Razao Brasileira, Molejo, Exalta Samba, Soweto, Malicia, O s Morenos, Ki Loucura, Katinguele, Art Popular, Karametade, S6 No Sapatinho, Sensa~ao , Toke Divinal e outros menos votados. Na Bahia, esse pagode foi relido com pitadas de ritmos locais como 0 samba-reggae e samba duro, por bandas como 0 G era Samba (futuro E 0 Tchan) e Terra Samba. Mas 0 chamado samba de raiz, do come~o do fen6meno pagode, viveu alguns bons momentos na segunda metade dos anos 90, com Zeca Pagodinho (que estourou musicas como Samba Pras M oras e Faixa Amare/a), Martinho da Vila, Beth Carvalho e Bezerra da Silva, entao convertido em culto entre as bandas de rock, que regravaram de Ma/andragem Dd um Tempo (Barao Vermelho e Planet H emp) e Candidato Cao Cao (0 Rappa). A trad i~ao do samba foi resguardada com a descoberta (antes tardia do que nunca) de Walter Alfaiate, Wilson das Neves e das Velhas Guardas da Mangueira e da Portela (esta com disco produzido pda cantora Marisa Monte). Novos nomes do velho samba tam bern apareceram: Dudu Nobre (cavaquinista da banda de Zeca Pagodinho, para quem compos 0 sucesso Posso Ate M e Apaixonar), Marquinhos de O swaldo Cruz, Marquinho China e Renatinho da Aboli ~ao.
Coisinha do Pai - Berh Carvalho Caxambu - Almir Guinero
S6 Pra Contrariar - Fundo de O!Iinral Feirinha da Pavuna - Jovelina Perola Negra
S.P.C. - Zeca Pagodinho Malandragt'm Dd um Tt'mpo - Bezerra da Silva E Ha Tal Liberdade - S6 Pra Conrrariar POHo AItf MeApaixonar- Zeca Pagodinho
o Samba Batido e uma variante do samba existente na Bahia.
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D erivado do picote ritmico do samba choro, 0 samba de breque foi popularizado pelo cantor (Antonio) M oreira d a Silva, urn carioca da Tijuca nascido em 1902, nu m episodio que se tornou lend ario. Moreira, que cometyou com voz empostada candidatando-se a urn lugar no podio ocupado pelos grandes (Chico Alves, Orlando Silva, Silvio Caldas), foi cantar 0 sambaJogo P roibido (de T ancredo Silva, Davi Silva e Ribeiro d a Cunha) no Cine-Teatro Meier, numa noite de abril de 1936 e inseriu versos improvisados nos intervalos. A iniciativa fez sucesso e Moreira cometyou a ampliar seus apartes a ponto de 0 violonista Frazao, que atu ava em seu grupo, reclamar: "E stou acostumado a acompanhar musica e nao conversa". A radicalidade do corte introduzido por Moreira - que chega a parar a melod ia para inserir urn discurso, como no caso de Na Sub ida do M orro - foi , sem duvida, urn marco divisorio do genero e acabou transformando 0 interprete em seu leone, completado pela imagem de malandro a antiga, envergando urn terno de linho S-120, chapeu de palhinha e ginga constante. Mas na verdade a inclusao de urn breque (do ingles break, freio), ainda que embutido no samba , vern de antes, como lembra 0 proprio biografo de Moreira , Alexandre Augusto em 0 Ultimo dos Ma/andros (Editora Record, 1996). Em 1929, 0 compositor Sinh6, que se auto-intitulava "0 rei do samba", inseriu tres redond ilhas menores constituindo urn verso de quinze silabas em Cansei ("pois Ii ouvi de D eus/ a Sua voz dizer/ que eu nao vim ao mundo/ sornente com 0 fito de eterno sofrer"), interpretada por M ario Reis. Tambem composity6es como Minha Pa/hora (" Ia tern tro<;a/ se faz bossa"), de J. Cascata, e ate 0 Orvalho Vem Caindo ("...guarda civil/ que 0 salario ainda nao viu") de Noel Rosa e Kid Pepe, ambas de 1933, tinham suas freiadas, ainda que fossem apenas uma "arruma<;ao do carro" d a melodia para ond e todos retornavam. Algo que desembocaria em sambas sincopados de Geraldo Pereira, craque em acoplar fra ses ao recorte mel6dico como em E scurinho ("ja foi no Morro do Pinto/ acabar com 0 samba"), onde 0 espa<;o aberto parece a conta de urn comentario de trombone.
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caso do original cantor Luis Barbosa (1910-1938), que morreu cedo e deixou raras g rava<;6es, e diferente. Ele, que ficou t ambem conhecido por marcar o ritmo batucando num chapeu de palha, de fato introduziu 0 intervalo que caracterizaria 0 samba de breque, mas sua curta rrajet6ria impediu maior proje<;ao da inven<;ao. Numa entrevista do proprio Moreira reproduzida em 0 Ultimo Ma-
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/andro, de reconhece ter "'prolongado os breques" introduzidos no samba por Luis
Barbosa. Foi aperfeic;oando a f6rmula aliado a varios compositores ate embarcar na serie "-cinematografica" com Miguel Gustavo aberta por 0 Rei do Gatilho (e mais: Moringueira contra 007, 0 Ultimo dos Mohieanos, Os 1ntoedveis, etc). Outros cantores tambem gravaram sambas de breque como 0 rival de Moreira, Jorge Veiga, 0 paulista Germano Mathias e ate 0 baiano Gilberto Gil. E specialista em todas as modalidades de samba, Nei Lopes nao deixaria de colocar sua marca de artifice numa parceria com Joao Nogueira (Baile no Elite) alem de dedicar urn CD abrangendo 0 tema em Sineopando 0 Breque. Moreira da Silva ainda dividiu shows com 0 tropicalista Macale, a quem chegaria a chamar de herdeiro - e que descreve em Tira os Ow/os e Reeolhe 0 H omem as confusoes em que ambos se meteram numa excursao. Com alguma boa vontade pode-se ouvir ecos do genero ate mesmo em Voce Niio Soube Me Amar, megasucesso da Blitz que inauguraria 0 BRock dos anos 80.
Cansfi - Mario Reis M inha Palho{a - Silvio C aldas Na Suhida do M orro - M oreira da Silva Fmommo - Jorge Veiga Amigo Urso - M oreira da Silva Baiif da Piedade - Jorge Veiga A certfi no M ilhar - Gilbeno Gil
o R ei do Gatilho -
Moreira da Silva
Senhor Deltgado - G ermano Marhias Baile no E lite - Joao Nogueira T im Of Oculos e R uolhe () H omem - M oreira da Silva e Macale Samha na M edida - Nei Lopes
o marco inaugural deste samba ralentado, sentimental, com menos batuque, predominio melodico e maior parentesco com a modinha e a seresta (e depois 0 bolero) e nitido: a composic;ao Ai, 10io (Linda F/or) que leva tres assinaturas, a do compositor H enrique Vogeler e dos letristas Marques Porto e Luiz
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Peixoto. A musica tinha side lans:ada em duas ocasi6es anteriores com outras letras &letristas e os titulos de Linda Flor (gravada por Vicente Celestino) e Meiga Flor (por Francisco Alves). Mas s6 na ultima versao, reescrita por exigencia da diva do teatro de revista Araci Cortes (que a g ravaria com sucesso em 1929), ela faria enorme sucesso, contribuindo para a fixa C;ao do genero. Praticado por autores tao diversificados quanto Ary Barroso (que 0 tratava com desprezo apesar de ter composto duas obras-primas no ramo, Risque e Folha Morta) teria seu apogeu nas decadas de 40 e 50. Seu conteudo melanc6lico (que mais tarde incorporaria a palavra fossa) serviria ao romantismo descabelado do sambolero (de expoentes como 0 avatar brega Adelino Moreira) como 0 Molambo (de Jaime Florence, 0 Meira, professor de violao de Baden Powell e Augusto Mesquita) cujo interprere, Roberto Luna, literalmente descabelava-se ao cantar. Separado, 0 casal H erivelto Martins e Dalva de Oliveira trocou acusas:6es atraves de sambascans:6es doloridos na decada de 40. 0 clima era tao pesado que a lenda diz que Vingan{a, do mestre da materia Lupicinio Rodrigues, provocou suicidio na voz tragica de Linda Batista. Nelson Gonc;alves angariou urn milhao de ouvintes no incipiente mercado brasileiro de 1957 para a pungente hist6ria de A Volta do B oemio.
Paradoxalmente,
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mesmo estilo daria base para os altos voos harmonicos
da bossa nova, tendo side utilizado nas primeiras composic;6es de Tom Jobim como Incertew, Faz uma Semana, Pensando em Voce e Tereza da Praia. Precursores do movimento como os cantores Dick Farney (Marina, Copacahana), Doris Monteiro (Se Vod Se Importasse), Nora Ney (Ninguim Me Ama, D e Cigarro em Cigarro, M enino Grande) e compositores como Garoto (D uas Contas) , Valzinho (D oce Veneno), Dolores Duran (Castigo, Fim de Caso, A Noite do Meu B em, Por Causa de Voce, esta em parceria com Tom Jobim) e Tito Madi (Nao Diga Nao, Cansei de llusoes) adotaram
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estilo como plataforma intimista para desvincular-
se da eIoquencia ritmica do samba tradicional. Em dec1inio depois da reformulac;ao estetica da bossa nova,
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samba-can-
c;ao que tambcm perdeu terreno para a balada, e ganhou ironias por seu sentimentalismo na regravac;ao punk de Negue (Adelino Moreira/ Enzo de Almeida Passos) peIo grupo Camisa de Venus, mantem seu vasto e rico acervo de obras em permanente processo de regravaC;6es.
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Ai, Joil; - Araci Cortes Saia do Caminho - A racy de Almeida Segredo - D alva de Oliveira Nervos de As:o - Jamelao Cans:ao de A mor - Elizerh Cardoso Folha M orta - Jamelao D uas C omas - Sergio R icardo Nao D iga Nao - T iro Madi M arina - D ick Farney Ninguem Me Ama - Nora Ney Molambo - Roberro Luna D oce Veneno - Z eze G onzaga Vingans:a - Li nda Barisra C onceis:ao - C auby Peixoro Oup - M aysa Born D ia, T risreza - Isaura Garcia Se Alguem Telefonar - L ana Binencourt A Noire do Meu Bem - Dolores D uran A Volra do Boemio - Nelson Gonplves Chuvas de Verno - Caetano Veloso Ronda - Maria Bethania M e D eixa em Paz - M ilton Nascimemo e A laide Costa M atriz ou F ilial - Simone
No samba de roda, existem muitas variac;6es das cantigas, que recebem nomes diferentes a depender do local. Na Ilha, em Salvador e municipios proximos predomina 0 samba corrido e as influencias urbanas. 0 samba chula caracteristico, tambem chamado samba de viola e samba amarrado, se encontra na antiga regiao da cana que abrange Maracangalha, Sao Francisco do C onde, Terra Nova, Teodoro Sampaio, Saubara, Santiago do 19uape e principalmente Santo Amaro. U ma dupla de cantadores canta a chula e a outra dupla reforc;ada pelo coro das mulheres responde com
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relativo - urn verso menor que "arremata" a chula. Nessa hora,
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ninguem entra na roda para sambar, esperando os homens terminarem de can tar e comes:ar a parte instrumental com solos de viola e da percussao. A sambadeira agora samba com passos miudinhos, "peneirando" e percorrendo aroda toda ate dar a umbigada noutra sambadeira, que espera a proxima chula cantada. As chulas sao miniaturas poeticas que tratam dos assuntos da vida, contando pequenas hist6rias, relatando conflitos e as complicas:6es da paixao, retratando aspectos do cotidiano e dando conselhos, alertas e "sotaques" para quem precisa ouvir. Os g randes temas cantados sao ligados ao universo amoroso, ressaltando a visao do homem sobre a mulher, assim como sobre 0 proprio samba; os acontecimentos na roda; e 0 papel da viola, por estabelecer uma ligas:ao forte entre os homens rocando e as mulheres sambando. Muitas chulas retratam a vida do trabalho na ros:a, no canavial, no mar e no mangue, as vezes com uma conotas:ao do sofrimento, do "penar" que remete aos tempos da escravatura. Em contraste com 0 lado pesado da vida, estao as chulas ludicas e eroticas, contando piadas e conselhos ironicos, pequenas parabolas, satirizando situas:6es sensuais e tragicomicas da vida. Outro aspecto e a vida religiosa que se revela nas chulas que cantam os santos catolicos e mais os orixas e os cabodos nas religi6es afro-brasileiras, muitas vezes falando em metaforas. Na outra margem do Rio Paraguas:u , nos municipios de Antonio Cardoso, Santo Estevao e RafaelJambeiro, a chula e chamada de coco e 0 corrido chamado de chula. samba nessa regiao se caracteriza por ser urn samba de desafio, cheio de riquezas poeticas que retratam 0 universo regional com sutileza , humor
a
e variedade literaria. Entre os sambadores antigos, samba e coisa seria, assunto de homens brabos que se desafiam com palavras afiadas e bern ritmadas, levando noites inteiras nessas disputas que renderam muitas lendas em toda regiao.
o samba-enredo, tambem chamado de samba de enredo, e urn sub-gcnero do samba modemo, surgido no Rio de Janeiro na decada de 1950, feito especificamente para 0 desfile de uma escola de samba. Anualmente, as escolas de samba costumam promover concursos internos, onde varias musicas sao apresentadas ao publico em suas quadras, onde ao final, normal mente entre os meses de setembro e outubro, uma delas e escolhida como samba-enredo oficial para 0 Carnaval do ano segu inte. Algumas
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vezes, opta-se por fundir dois ou mais sambas-enredo que sejam do agrado dos membros da escola. 0 samba ca mpeao embala a escola durante a fa se de preparas:ao, ensaios tecnicos ate ser apresentado no desfi le de carnaval. P ara que urn samba sej a considerado samba-enredo, 0 m es mo deve retratar 0 enredo escolh ido pela comissao de carnaval da escola (nao confundi r enredo com tema). sa mba-e nredo e urn dos quesiros utilizados no julgamento dos d esfiles das escolas. A evolus:ao da escola em muito d epende do andamento do samba e seu
o
dese nrolar na avenida: Alg umas escolas preferem 0 samba mais calmo, outras muito agitado, ou ainda mais romant icos! Tudo depende d e seu estilo de desfile que pode mudar de carnaval para carnaval. E scolas de Samba que tradicionalmente se apresentam com uma quantidade muito grande de componentes, em geral usam uma batida rna is ripida para acelerar 0 movimento dos folio es na avenida e manter a harmonia do conj unto. A aICl<XlO
do
Considera-se como primeiro samba-enredo, urn samba da Unidos da Tijuca cantado no desfile de 1933, embora haja controversias sobre 0 assunto. Ate 1947 as escolas de samba cantavam durante 0 d esfile, dois ou tfC!S sambas que n ao faziam alu sao ao enredo. Composto de urn refrao pronto anteriormente e, durante 0 desfile, eram feitas improvisas:oes. Em 1946, a instituis:ao que, a epoca, organizava os desfiles d as escolas de samba, proibiu a improvisas:ao, exigindo que todas usassem 0 samba-enredo, que ja h avia surgido, sendo cantado eventualmente por alg umas escolas. Ficou famoso neste ano 0 caso da escola de samba Prazer da Serrinha, que ensaiou 0 samba-enredo "Conferencia de Sao Francisco" (de autoria de Silas de oliveira e Mano D ecio da Viola), mas no momento do desfile acabou por apresentar urn samba de terreiro, 0 que levou a escola a uma rna colocas:ao e precipitou 0 surgimento da dissidencia Imperio Serrano, no ana segui nte.
o primeiro samba-enredo gravado foi "Exaltas:ao a Tiradentes", de Fernando Barbosa JUnior e Mano D ecio d a Viola, E stanislau Silva e Penteado, pelo cantor Roberto Silva, com 0 titulo reduzido para simplesmente "Tiradentes", para 0 Carnaval de 1955, mas obteve pouca repercussao. 0 samba tinha sido apresentado pela Imperio Serrano, originalmente em 1949.
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Em 1967, 0 samba-enredo da Mangueira "0 Mundo Encantado de Monteiro L obato" fez sucesso por todo 0 Brasil, em g ravas:ao de Eliana Pittman, estimulando 0 la n<;amento do primeiro album de sambas-enredo, que reunia todos os sambas do ano, em 1968, intitulado "Festival do Samba".
A musica esta diretamente ligada a historia do Rio de Janeiro. Nessa liga, alguns generos musicais tern urn vinculo ainda mais forte. Urn deles e 0 samba e seus subgeneros, como 0 exaltas:ao, tao presente nos desfiles de carnaval. H a quem defenda que 0 momento mais emocionante de urn desfile de uma escola de samba e 0 "esquenta". Opini6es e exageros a parte e nessa hora que normalmente os sambas exalta<;ao das agremia<;oes sao entoados e de fato e ali que a comunidade mostra sua for<;a antes de pisar d efinitivamente na avenida. Qyando, no fi nal dos anos 1920, as escolas de samba se organizaram como agremia<;oes, 0 sentimento de rivalidade e paixao que ja existia nas dispu tas anteriores de blocos, ranchos e cordoes se avolumou. Com isso, letras que exaltavam 0 amor as escolas de samba passara m a fazer urn sentido maior para as pessoas que estavam envolvidas nesses ambientes. E ssa ideia se esticou â&#x20AC;˘
pelas decadas e se man tern fi rme ate hoj e em d ia. E comum notar nas quadras e barracoes, torcedores das agremia<;oes do Carnaval cantando seus hinos (os sambas de exalta<;ao) como se estivessem em urn estadio de fu tebol assistindo a uma fi nal diante do maior rival.
A nomenclatura "samba-exalta<;ao" surgiu em 1939. No enta nto, a ideia de sambas que faziam men<;6es honrosas a algo ja existia desde 0 inicio d a decada de 1930, quando Getulio Vargas se tornou presidente da Republica. Nesse periodo, os compositores passaram a escrever letras que exaltavam 0 Brasil e 0 governo. Tambem em 1939, Vargas criou 0 Departamento de Imprensa e Propaganda
(DIP). Ate entao, 0 samba era voltado a malandragem. A partir da!, 0 governo investiu no usa d a musica como veiculo de sua ideologia, principalmente de entusiasmo ao t rabalho, chegando a distribu ir verba para as escolas de samba para que abordassem tem as de cunho patriotico em seus desfiles. Urn dos maiores representa ntes desse genero foi 0 compositor
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Ary Barroso, que fez, em 1939, "Aquarela do Brasil", considerado 0 primeiro samba-exaltar;ao da hist6ria. A ry chegou a ser acusado de ter aceitado uma encomenda de Getulio Vargas, devido a grande coincidencia do conteudo da musica com 0 contexto vivido no momento. Barroso, que em meados dos anos 1940 chegou a ser eleito vereador do Rio de Janeiro pela UD N (Uniao D emocratica Nacional), que na epoca era oposir;ao ao PTB de Vargas, se defendia dessa arg umentar;ao alegando que foi pura coincidencia, que nao escreveu nada a mando de ninguem. D e todos os sambas e marchinhas ufanistas, um a canr;ao se destacou. A escola de samba Deixa Falar, conhecida como a primeira do Brasil, desfilou em 1932 - ano que marcou 0 inicio do Carnaval com d isputa de titulo entre as agremiar;6es - com 0 enredo "A Primavera e a Revoluf:lO de Outubro", uma clara homenagem a chegada de Vargas ao poder dois anos antes. D o samba que exaltava 0 pais para 0 samba que exalta as escolas foi urn caminho reto. historiador Claudio Russo, urn dos pesquisadores da Comissao de Car-
o
naval da Beija-F lor, diz como se deu esse processo: "P recisar exatamente a epoca e qual escola de samba comefou i uma tarefo um tanto quanto diftcil, mas podemos dizer que por muito tempo
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samba-exaltafao fli uma pratica extremamente utilizada pelos
compositores das escolas. Temos para posteridade grandes sambas como as composifoes de Candeia , Chico Santana e Paulinho da Viola, na Portela; Silas de Oliv eira e Mano Dicio, na Imperio Serrano, que nos deixaram tantas obras magnijicos. Na A cademia do Salgueiro, Geraldo Bahtio e Djalma cantarolavam seus sambas com a beleza de um Sabia - desculpe 0 trocadilho. Na Esta ftio Primeira, Cartola ajirmava: 'Muito velho, pobre velho vem subindo a ladeira com bengala na mao eo velho, velho Estacio. Vem visitar a Mangueira'. . . I sto nas quatro grandes escolas do passado.
Se for
me estender um pouco mais, em verde e branco ecoa a Rainha de Ramos, a M ocidade! Mas tmho certeza que a Beija-Flor estd muito bem representada com :Ii Deusa da Passarela: do Neguinho".
C laudio ainda pontu a que e preciso que haja uma mobilizar;ao para que diversos subgeneros do samba nao se tornem apenas uma saudosa lembranr;a. "Acredito que a escola de samba deve ter muito mais que apenas 0 concurso de samba-enredo. Poderiamos semear este solo tao forti! de valores e talentos com ftstivais de sambas de quadra, de terreiro e principalmente sambas de exaltafao nas tardes de sabado ou domingo, para que assim possamos flrtijicar e preservar as rafus do samba, pavilhdo e a histaria para as novas gerafoes", disse
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historiador.
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amor ao
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o Monarco, urn dos maiores nomes d a historia do samba e d o carn aval, afi rm a com veemcncia a importancia que 0 samba-exaltar;ao tern para uma escola: "ÂŁ mais importante que 0 samba-enredo. E um samba que sai do corartio. 0 samba enredo i encomendando, vem de fora. 0 samba-exaltariio vem de dentro. Obvio que os dois siio importantes,
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de enredo e 0 de exaltarao. Mas
esse algo a mais, essa coisa de reforrar
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de exaltarao tem
amor ii escola de samba. 0 samba-exaltarao
i uma coisa que nao deve morrer" eonta ele, que est a n a ala dos compositores da
Portela desd e 1950. Outro baluarte do carnaval, Nelson Sargento, depois de frisar que os sambas exaltar;ao sao extremamente necessarios para a manutenr;ao d a alma da festa, apontou seus prediletos: "Costo dos que 0 Silas de Oliveira ftz para a I mperio. Os do Salgueiro sao otimos. A Beija-Flor tem uns muito bonitos tambim".
o
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refIoo qJe 00iI0
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bIoco
a samba exaltar;ao e 0
refrao que levanta 0 bloco. Anizio Abeao David, presidente de honra d a Beija-Flor, uma agremiar;ao oriunda de uma comunid ade que praticamente respira carnaval, sabe bern do peso d essas composir;6es: "A gente nota que quando esses sambas sao tocados, as pessoas se sentem ainda mais proximas da
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-
escola. E algo que emociona todo mundo. E o corartio da fista".
Rira Puxador, urn dos mais antigos interpretes da Beija-Flor, era conhecido por saber eant ar todos os sambas da eseola de N il6polis. Certa vez, ele, que falece u anos atras, declarou que lamentava 0 fato de os sambas exaltar;ao n ao terem mais tanta forr;a qu anto ja tiveram em out ros carnavais e apontou suas letras favorit as desse estilo: "A D eusa da Passarela", de Neguinho da Beija-Flor e "Eu sou de N i1opolis", escrita por Osorio Lima, urn ac1amado compositor. Q uand o se fa la em sa mba-exaltar;ao e em Beija-F lor, inevitavel mente
a
se p en s a em Neguinho e "A D eusa d a P assarela". inter prete e com positor d a A zu l e Branco de N i16polis lembra como foi faze r essa canr;ao: "E u estava esperando uma ligariio na casa da dona I olanda, onde o Joaozinho Trinta tambim morava. Era um domingo, em 1979. Ai oJoaozinho me perguntou 0 que eu achava de ele jazer um concurso para que criassem sambas que exaltassem a Beija-Flor. E u elogiei a ideia. L ogo em seguida, ele saiu, fli na rua resolver algum assunto rdpido. E isso [icou na minha cabera. Na mesma hora escrevi a letra de:A Deusa da Passarela'. Quando ele voltou, mostrei para ele. E le [icou emocionado demais
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e muito surpreso por eu ter ftito a letra tlio depressa . Entlio, ele me disse que niio precisava mais de concurso nenhum, que
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que ele queria era exatamente
0
que eu
havia acabado de escrever".
o
eolrodo~
o assessor ju ridico da Liesa, Ubiratan Guedes , tambem e urn entusiasta dessa modalidade de samba. Ele refon;a a at mosfera que cerca essas composis:oes: "0 samba-exalta{iio i aquilo que para a escola i 0 equivalente ao hino do time â&#x20AC;˘ delutebol. E um hino que funciona como urn charnado geral, que desperta a emo{iio da comunidade, que busca no interior de cada cornponente a for{a para se fozer urn grande carnaval, ultrapassando, rnuitas vezes, limita{oes da agremia{oo.
0 'esquenta', que
realmente esquenta a emo{iio das pessoas, i fundamental. Se eu pudesse escolher entre um samba de anos anteriores ou um samba de exalta{iio, eu sempre escolheria
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sam-
ba-exalta{iio, de esquenta, porque esse mexe com a sensibilidade rnesmo. Todo mundo canta, todo mundo participa e a comunidade se inspira,jica mais energizada para desjilar" enfatiza
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advogado.
Com a palavra, alguem que entendia do assunto: "Estao todos cantando samba menor e dizendo que e partido-alto e eu sou urn dos errados porque nao quero ficar isolado". Aos 65 anos, em 1977, Aniceto M enezes, 0 Aniceto do Imperio (urn dos fundadore s da escola da Imperio Serrano) admitia no lans:amento de seu primeiro d isco (dividido com outro partideiro, N ilton Campolino) que 0 genero ja nao era 0 mesmo iniciado por seus ancestrais. Gerado nas festas religiosas do jongo de procedencia rural, batido em tam bores chamados de candongueiro, angumavita e caxa mbu, 0 partido virou chula raiada, como na exemplar e remota Patrao, prenda seu gado, da trinca fundadora Pixinguinha, D onga e Joao da Bahiana, registrada pelo cantor e estudioso Almirante. Mas Aniceto, fiel ao tradicionalismo, ditava algumas regras que via desrespeitadas. "0 partido tern hora para comes:ar, mas n ao para acabar, ja que os versos sao livres, feitos na hora. E precisa da presens:a do coro", situ ava. Para ele, a adaptas:ao pedida pelo mercado teve urn divisor de aguas. "0 samba menor foi urn recurso que surgiu na epoca em que Paulo da Portela ficou em evidencia, para adaptar
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samba aos coristas", g arantia. Mal saberia, ele que
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morreu pobre e esquecido em 1993 aos 80 anos, que 0 partido-alto ainda sofreria outras modificar;6es ate servir de combustivel para 0 movimento conhecido por pagode de fundo de quintal, movido a banjo e ranta. E que are acabaria desvirtuado num samba-pop de duvidosa consistencia.
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termo pagode
A propria denominar;ao partido-alto, ja insinua alg um tipo de superioridade para seus praticantes (turumhamhas, no tempo do jongo, segundo Aniceto, dai a encurtada expressao bamba), que deviam desenvolver longas estrofes de seis ou mais versos e voltar ao estribilho. Enfim, 0 correspondente no universo do samba ao repentelcantoria nordestina. partido permeia a historia da MPB. Pode ser encontrado na assinatura do andarilho dos morros e rodas de malandragem
a
Noel Rosa com 0 lendario Joao Mina em D e Bahado, de 1936, gravado em dupla com Marilia Baptista. Anteriores ainda sao Fa/em de Mim,de Rufino, de 1928, com Alcides Malandro H istorico e Alvaiade ambos da Portela e Quitandeiro (de Paulo da Portela, de 1933, antes da segunda parte escrira depois por Monarco) tambem por Alvaiade, faixas posteriormente gravadas na serie das escolas de samba do selo M arcus Pereira, em 1974. E 0 partido tambem pontifica nas batucadas da Baixada e adjacencias e nas novas favelas violentas e miseriveis, capturado pelo pernambucano Bezerra da Silva. A s rodas de partido moldaram muito compositor, como testemunha Elton Medeiros comentando na gravar;ao de Niio Vem (Assim Niio Do), de 1977, que conheceu C andeia numa delas, na fe sta da Penha. Junto com os dois entram na roda ilu stre Nelson Cavaquinho e Gu ilherme de Brito. Partideiros como C lementina de Jesus (dialog ando com outra fig ura lendaria, 0 portelense Joao da Genre) e Xango da Mang ueira alem de Aniceto, arestam que esse tipo de samba de melodia curta governado pelo ritmo, mesmo distante das origens e urn dos m ais evidentes elos entre
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genero urbanizado e sua nascente africana.
Patriio, prenda stU gada - Almirante D e Bahado - Noel Rosa e Maritia Batista Fa/am de Mim - Alcides Lopes "Malandro
H ist6r i co~
e Alvaiade
Quitandeiro - Alvaiade Barraciio i Seu - Clemenrina de Jesus e )oao da Genre
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Partido Alto - Aniceto do Imperio
o Samha t
Bom AHim - Jamelao
Na Agua do Rio - Silas de Oliveira Mormd, Morrnou - Paulinho da Viola Qurm Samha Fica - Jamelao Vivo Isolado do MUlldo/ Amor lIno i hrinqurdo - Candeia Tit - Ivone Lara Prga Eu - Bezerra da Silva Partido Alto - MPB-4 Goiabada Cascdo - Wilson Moreira Vou Bolar Tru Nomr lIa Maeumha - Z eca Pagodinho
00rb0 de roda
o samba de roda e uma forma de preservac;ao da cultura dos neg ros africanos escravizados no Brasil. A influencia portuguesa fica por conta da introduc;ao da viola e do pandeiro. Acompanhado por atabaques, ganza, reco-reco, viola e viotio, 0 solista entoa cantigas, seguido em coro pdo grupo a danc;ar. Ligado ao culto de orixas e cabocIos, a capoeira e as comidas a base de dende, 0 samba de roda tcve inicio por volta de 1860, como forma de preservac;ao da cultura dos negros africanos escravizados no Brasil. A influencia portuguesa, alem da lingua falada e cantada, fica por conta da introduc;ao da viola e do pandeiro. Tradic;ao milenar no Rec6ncavo Baiano, a manifestac;ao concorre, inclusive, ao titulo de Obra-Prima do Patrim6nio Oral e Imaterial da Humanidade. Presente no trabalho de renomados compositores baianos - Dorival Caymmi, Joao Gilberto, Caetano Veloso -, esse misto de musica, danc;a, poesia e fe sta se revela de duas formas caracteristicas: 0 samba chula e 0 samba corrido. A chula, uma forma de poesia, e decIamada pelo solista, enquanto 0 grupo escuta atento, s6 se rendendo aos encantos da danc;a ap6s 0 termino do pronunciamento, quando urn participante por vez adentra 0 mcio da roda ao som da batucada regida por palmas. Ja no corrido, 0 samba toma conta da roda ao mesmo tempo em que dois solistas e 0 coral se alternam no canto. T ambem conhecida como Umhigada - porque cada participante, ao sair da roda, convida urn novo para a danc;a dando-Ihe uma "umbigada" -, a manifestac;ao
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tipica do Rec6ncavo tern destaque nas cidades de Cip6, Candeias e Cachoeira durante os festejos juninos e da Boa Morte. Em Sao Felix, Muritiba, Conceis:ao do Almeida e Santo Amaro, 0 samba de roda e destaque na Festa de Nossa Senhora da Purificas:ao. Sao Francisco do Conde, Feira de Santana, Itacare e, novamente, Conceis:ao do Almeida ce1ebram
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samba de raiz na Festa de Dois de Julho.
6aTtJa de terrero
o samba-de-terreiro (tambem conhecido como samba-de-quadra) e urn sub-genero do samba , surg ido na decada de 1930 nos terreiros (atuais quadras) das primeiras escolas de samba do Rio de Janeiro. Durante a decada de 1930, era costume em urn desfile de carnaval que uma escola de samba apresentasse 0 samba-enredo na primeira parte e, na segunda parte, os me1hores versadores improvisassem com outros sambas-de-terreiro. E stes sambas ficaram conhecidos assim, porque e1es eram produzidos durante todo o ano nos espas:os que se tornariam as futuras quadras. Antes de ser cimentado, o chao do terreiro era feito de terra batida. Geralmente, urn samba-de-terreiro retratava 0 cotidiano dentro das comunidades onde se localizava m as escolas de sa mba cariocas. Comum ate
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inicio da decada de 1970, este s sambas d eixariam de ser tocados nos desfiles em urn longo processo d e mercantilizas:ao do carnaval. Ao deixar de ser cantado nos d esfi les, 0 sa mba-de-terreiro ficou re1egado as quadras das escolas de samba, servindo inicialmente para ani mar festas ate se restringir a temporada se1etiva de samba-enredo. Por iniciativa de Noca da Portela, entao secretario estadual de Cultura do Rio de Janeiro, e com apoio da LIESA, foi realizado em 2006 0 primeiro concurso de samba deste genero. Com 0 objetivo de reve1ar obras ineditas em cada agremias:ao, 0 concurso movimentou as quadras das escolas de samba cariocas. Em 2007, 0 IPHAN conferiu registro oficial as matrizes do samba do Rio de Janeiro: samba de terreiro, partido-altoe samba-enredo. D entre algumas composip5es famosas saidas dos terreiros/quadras, estao "Foi um Rio que passou em minha vida" (de Paulinho da Viola, "P ortela naA venida" (de Mauro Duarte e Paulo Cesar Pinheiro), "Azul, Vermelho e Branco"(de Aroldo Melodia), "Salve a Mocidade" (de Luiz Abdengo dos Reis), "Tem capoeira" (de Batista da Mangueira), "A D eusa da Passarela" (de Neguinho da Beija-Flor).
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s escolas de samba surgiram no final da decada de 1920, inventadas e organizad as pelos g rupos mais pobres da cidade do Rio de Janeiro, que sairam de seus suburbios, bairros e favelas para conquistar a grande festa da capital do pais e se tornar, ao final da Segunda Guerra Mundial, 0 simbolo mais original e conhecido da representas:ao nacional brasileira. A s interpretas:6es mais tradicionais desqualificam essas g randes conquistas, acusam correntes nacionalistas, politicos populistas e a ditadura de G etulio Vargas (1937-1945) de terem manipulado e controlado ideologicamente as escolas de samba , impondo 0 desenvolvimento de enredos em prol de urn discurso ofi cial, nacionalista e patriotico que convinha a dominac;ao. Neste artigo nos opomos radicalmente a essas interpretac;oes, mostrando que tal dominio foi bastante relativo, que 0 desenvolvimento dos temas nacionais no carnaval carioca e urn assunto bern mais complexo e, finalmente, que a transformas:ao do samba e da escola de samba em representac;ao nacion al foi uma estrategia para conquistar e se impor ao carnaval, a cidade e a sociedade. Narramos uma rara e bela vitoria dos vencidos. A rapidez com que 0 samba passou de manifestas:ao perseguida pela policia, durante as primeiras decadas do seculo XX, a simbolo da identidade nacional brasileira, na decada de 1930, foi chamada por intelectuais brasileiros de "misterio do samba". Em livro homonimo, H ermano Vianna desvendou parte desse "misterio" e destacou 0 papel de intelectuais e politicos, como 0 sociologo Gilberto Freyre e 0 medico e prefeito do Rio de Janeiro, Pedro Ernesto, cujas opinioes e ac;6es "pavimentaram" 0 caminho que trouxe para 0 centro da cidade e da nas:ao uma expressao cultural que vinha dos morros, dos suburbios e das favelas cariocas. D e fato, a veloz ascensao do samba como representac;ao nacional deve muito
Escolas de Samha. Idcnticlacle Nacional e
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a busca
dircito :i. cicladc
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(e disputa) das elites politicas e culturais pelas "coisas nacionais". Como mostrou Hobsbawn, em toda parte as nap")es e 0 nacionalismo sao projetos politicos das elites de urn E stado e de uma sociedade; e 0 E stado que cria a na<;ao, e nao 0 contrario. A adesao de parte da cultura das classes superiores ao samba e a escola de samba explica uma g rande parte do tal "misterio do samba" no Brasil. Outra grande parte dessa explica<;ao, que nao estava entre os objetivos de Hermano Vianna, foi 0 modo como as escolas de samba aderiram a questao nacional e se colocaram como a principal manifesta<;ao da cultura brasileira. Seguimos a hipotese geral de Fernandes d e que os sambistas tam bern construiram esse projeto cultural brasileiro. Nosso objetivo e apresentar tres fases desse processo nas decadas de 1930 e 1940, em que as escolas de samba vao transformando o Brasil, isto e, os temas nacionais e parrios - herois, povo, natureza, historia, geografia e cultura - em enredos de seus desfile s, ao mesmo tempo que disputam e conquistam 0 lugar de grande espetaculo carnavalesco, sintese e simbolo da cultura e da identidade nacional brasileira. marco de analise e da periodiza<;ao assumida e 0 modo como as escolas de samba se relacionaram com os chamados "temas nacionais", ignorando-os, afirmando-os ou negando-os em seus enredos e desfiles. Entendemos tais ati-
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tudes como parte de uma estrategia dos sambistas para a reprodu<;ao e ascensao de suas escolas no espa<;o fe stivo, politico e cultural de uma metropole moderna como Rio de Janeiro. Segundo esse principio, mostramos que, entre 1932, quando 0 primeiro campeonato samba foi organizado na Pra<;a Onze, e 1935, quando ocorreu 0 primeiro desfile oficialmente reconhecido pela prefeitura municipal, os cortejos sambistas foram muiro pouco nacionalistas. 0 samba, a comunidade e a cidade foram os temas mais exaltados, assim como escassas foram as rcferencias ao pais e as suas grandezas historicas ou naturais. Esse periodo tern como titulo "Do direito de sambar ao reconhecimento oficial (1928-1935)".
o samba moderno (genero musical) e, principalmente, a primeira escola de samba (institui<;ao festiva) sao produtos da decada 1920 e do bairro do E stacio de Sa, uma parte da zona de obsolescencia em torno do centro do Rio de Janeiro, habitado por imigrantes, negros, opecirios, estivadores, prostitutas e malandros, moradores de corti<;os, morros c favelas circundantes, cujos habitos, costumes e festividades eram desdenhados pela elite e reprimidas pela policia. Os sambistas do E stacio que criaram 0 samba moderno e fu ndaram a primeira escola de samba, a lendaria Deixa Falar, declararam que seus objetivos eram apenas desfilar sem apanhar da policia.
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Identiclade NadonJ! e 0 clircito II cidaclc
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Em nosso entender 0 nome "escola" era uma mensagem, dava urn sentido de ordem e comportamento respeitavel tanto para os de baixo quanto para os de cima.
o segundo periodo a ser analisado situa-se entre 1938 e 1945. Nesses anos m arcados pela guerra, pela ditadura do E stado Novo e que terminaram com a vitoria aliada e a redemocratizar;ao, as escolas d e samba aderiram aos temas nacionais de uma for ma nao mecanica. Por exemplo, 0 desfile de 1938 ficou celebre pela desclassificar;ao de uma escola de samba que apresentou urn enredo estrangeiro, "Branca de Neve e os sete anoes", 0 que foi entendido como negativa aos temas nacionais. Embora essa penalidade fo sse prevista nos estatutos da Vniao d as E scolas de Samba desde 1934, criticos e estudiosos do carnaval carioca sustentaram que a punir;ao a E scola Vizinha Faladeira foi ordem do regime, versao que perdurou ate a decad a de 1990 e e ainda muito aceita . Afinal de contas, proibir;6es e imposir;6es caracterizam as ditaduras; mas nao foi isso 0 que aconteceu. Em 1939, em outro celebre desfile. 0 enredo da escola campea nao foi nenhum figurao da patria, grande batalha ou a pujante natureza nacional. Apresentado pela Portela, 0 enredo "'Teste ao samba" foi uma homenagem ao proprio samba anunciada em uma de suas alegorias, urn grande quadro-negro onde se lia: "Prestigiar 0 samba, musica tipica e original do Brasil, e incentivar 0 povo". A grande irnporrancia de "Teste ao samba" foi 0 modo inedito e revolucionario com que conseguiu harmonizar as diferentes expressoes esreticas do espetaculo, no qual a musica, 0 samba-enredo, as fantasias e as alegorias concorreram para urn conjunto altamente equilibrado, claro, expressivo e didarico, que veio a ser 0 modelo ideal dos desfiles de escolas de samba nas decadas seguintes. Julgamos que ai esta 0 segredo de sua grande forr;a de comunicar;ao com 0 povo, as massas urbanas, a propria elite e 0 estrangeiro. Nos anos da guerra, a escola de samba e 0 sambista foram cada vez mais assumidos como representar;ao nacional. Em 1941, Walt Disney se inspirou em Paulo da Portela, famoso sambista , para criar 0 Ze Carioca, personagem brasileiro que contracena com 0 Pato Donald em urn filme da propaganda da "politica de boa vizinhanr;a" EVA-Brasil. Vma visao convencional aponta a instrumentalizar;ao dos sambistas pelo imperialismo, 0 que nao esta completamente errado. Mas 0 fato e que os sambistas tambem soub eram instrumentalizar essa situ ar;ao em favor de mais legit imidade e prestigio junto a elite e ao proprio povo. Nao foi por acaso, ou simplesmente por imposir;ao, que os enredos se tornaram , durante a g uerra, cada vez mais patrioticos e nacionalistas, apoiando a democracia e a participar;ao do Brasil no esforr;o aliado.
Escolas de Samha. Idcntidade Nacinnal e
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Samba
o terceiro periodo analisado corresponde aos anos entre 1946 e 1949, durante o qual as escolas de samba assumiram definitivamente 0 papel de exaltar e valorizar os temas nacionais, ao mesmo tempo que conseguiram urn nivel geral de harmoniza<;ao equilibrada entre os elementos rituais, a musica, as fantasias e as alegorias a servi<;o do desenvolvimento de uma narrativa altamente elaborada, merecendo os elogios dos contemporaneos que nelas viam "verdadeiras operas ambulantes". Urn dos pontos principais dessa transforma<;ao ocorreu justo com as letras dos sambas, que a partir de entao passaram a se dedicar realmente a contar 0 enredo, fato que surpreendentemente, e por diversas razoes, foi raro ate entao. Por outro lado, a maior afluencia de recursos no p6s-guerra permitiu 0 investimento na produ<;ao de fantasias e alegorias voltadas para 0 tema do enredo e, consequentemente, uma expressao visual mais apurada do espetaculo. Em conclusao observamos que 0 papel ativo dos sambistas foi decisivo para que 0 samba e as escolas de samba viessem a ocupar 0 lugar de principal representa<;ao nacional brasileira. Eles nao foram simplesmente "escolhidos" pela elite para ocupar tallugar. Insistimos na hip6tese de que 0 processo relatado foi tambem uma bela e rara vitoria dos vencidos.
Embora 0 Brasil seja especialmente reconhecido como 0 pais do samba e do futebol, esses elementos so passaram a ocupar tal posi<;ao dentro da representa<;ao nacional brasileira ap6s os anos 1940. Antes da escola de samba, que surgiu pela primeira vez em 1928, 0 samba era perseguido sistematicamente pela policia. Qyanto ao futebol, s6 depois do bicampeonato mundial de 1962, com Pele, Garrincha e tantos outros her6is dos gramados, e que os brasileiros se tornaram os reis do esporre bretao. Como duramente sabemos, a derrota para 0 Uruguai em 1950, assistida por incredulas 200 mil pessoas, em pleno Maracana, adiou por uma decada a tao almejada posi<;ao. Nao temos noticias de que 0 futebol tenha sofrido persegui<;oes. 0 patronato muito cedo incentivou e fundou clubes de futebol para os seus operarios, muitos dos quais se tornaram clubes profissionais, como no caso do Bangu Arletic Club, fundado em 1904 pela Companhia Progresso Industrial Bang u. Muito ao contrario aconteceu com 0 samba moderno e seus desfiles. Pelo menos ate a inven<;ao das escolas de samba, no final da decada de 1920, os sambistas e a pratica do samba eram reprimidos em seus lugares de reuniao, em suas rodas de samba, nos terrei-
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Identiclade NadonJl e 0 clircito II cidaclc
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ros de macumba, e em grandes festas, como no Carnaval e ate na Festa da Igreja da Penha. Mesmo em pequenos grupos, em suas casas ou sozinhos nas ruas, os sambistas podiam ser coagidos e ter seus instrumentos musicais apreendidos pela policia. Por incrivel que pare'Ya, 0 direito de sambar nas ruas do Rio de Janeiro foi durante muito tempo apenas tolerado, sendo rotineira e arbitrariamente reprimido e proibido. Apesar de tudo, 0 samba e as escolas de samba conquistaram, antes do futebol, 0 consenso dominante de principal expressao brasileira, ascensao vertiginosa que, por isso, foi descrita como "0 misterio do samba". Antes das escolas de samba, as manifesta'Yoes que dominavam
0
carnaval
carioca cram protagonizadas pelas elites e por setores medios. Organizados em tres diferentes gcneros de desfile s processionais - as grandes sociedades, 0 corso e os ranchos carnavalescos -, esses grupos brincavam e competiam no asfalto da A venida Rio Branco, boulevard inaug urado em 1906 pelo prefeito Pereira Passos - "0 Haussmann carioca" -, por muito tempo 0 palco do carnaval oficializado e "civilizado" da cidade. A riqueza dos carros alegoricos das grandes sociedades, a novidades do desfile de autom6veis do corso e a encena'Yao de operas cla.ssicas pelos ranchos carnavalescos atraiam multidoes. 0 Rio de Janeiro nao precisou esperar pelo samba para organizar urn grande carnaval, e as classes superiores souberam dominar a cena e 0 territorio da festa carioca no periodo entre a reforrna urbana do Prefeito Pereira Passos e a Segunda Guerra MundiaL D epois disso, grandes sociedades, 0 corso e os ranchos carnavalescos entraram em declinio, nao resistindo a guerra e ao crescimento das escolas de samba. Mas na decada de 1930, quando surgiram as escolas de samba, mais que a persegui'Yao policial, elas tiveram que enfrentar grandes competidores na concorridissima disputa da cena carnavalesca carioca, que mais do que hoje, era urn meio pelo qual os g rupos sociais difundiam suas ideias, seus valores e projetos politicos e culturais. Na realidade, 0 carnaval carioca de entao era ainda maior, e nao se resumia ao polo da Avenida Rio Branco, pois havia, na Pra'Ya Onze 0 epicentro do carnaval popular. Situ ada proximo a esta'Yao da E strada d e Ferro Central do Brasil e dentro de urn cinturao de bairros populares - Cidade Nova, E stacio, Catumbi, Morro de Sao Carlos, Morro do Pinto, Morro da Favela, Gamboa, Santo Cristo, Saude -, para Ia se deslocava a pe, de trem ou de bonde, uma torrente de blocos e cord6es dos bairros, suburbios e favelas cariocas, entre eles, 0 D eixa Falar, do bairro do E stacio. Ha urn consenso muito solido entre os sambistas e os estudiosos de que a escola de samba nasceu entre os bairros do E stacio e da Pra'Ya Onze,
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Samba
pois em suas ruas desfilou em 1929 urn bloco que se autodenominava "escola de samba" D eixa Falar. A partir de Fernandes podemos resumir que a D eixa Falar inventou a escola de samba quando criou esse nome e privilegiou uma orquestra baseada em instrumentos de percussao, formada por tamborins, latas de manteiga encouradas (0 surdo), pandeiros e reco-recos que marcavam 0 ritmo da dans:a dos sambas cantados durante os desfiles. A f6rmula do bloco do E stacio ganhou tal consistencia entre seus pares e visibilidade nos carnavais de 1930 e 1931 que, em 1932, lideres de blocos carnavalescos e jornalistas organizaram, sob peri6dico 0 Mundo E sportivo, divulga-Io,
0
0
0
patrocinio do
primeiro concurso entre escolas de samba. Para
jornal exibiu os trofeus que seriam dados as escolas ganhadoras dos
t res primeiros lug ares na vitrine da loja A Capital, uma das mais tradicionais da cidade. P ublicou e fez publicar em outros jornais, como 0 Globo, materias e notas que descreviam
0
even to. Cabral recolheu trechos nas edi<;6es desse jornal de 4 e
5 de fevereiro d e 1932, nos quais 0 que mais se destacava era a absoluta novidade do evento, seus aspectos ex6ticos, descon hecidos, incitando a curiosidade de urn lei tor que nada sabia sobre escolas de samba. Vejamos trechos do que foi previsto em 0 Globo do dia 4 de fevere iro: Domingo, na
Pra~ a
Onze,
0
publico assistini a urn torneio
que promete grande brilho, tal
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encanto de sua originalida-
de. O1teremos aludir ao campeonato de samba que
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Mundo
Sportivo promoveni. 0 acontecimento e inedito; ate agora,
niio se realizara entre nos uma competi<;ao que reunisse tantos elementos para urn exira sem igual. 0 campeonato tern como concorrentes as melhores "escolas" de melodias da metropole. Os sambas que se candidataram aos grandes premios sao os rna is lindos dos morros, das ladeiras, dos lugares sonoros do Rio (...). Na competi~ao entrado instrumenras que nem todos conhecem. A "cuica", por exemplo, ainda niio foi ouvida por nos com a devida
aten~iio
tam mais de 100 figuras.
(...). "Escolas" existem que apresen-
It facilmente imagimivel 0
que seriio
rna is de 100 bocas cantando com a sinceridade que os cantores poem na voz para maior repercussao das palavras.
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I E ~colas de Samoo..
Iclent icladc Nacional e
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direito
acidade
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Foi tamanho 0 sueesso desse primeiro eampeonato de desfiles de escolas de samba, do qual partieiparam 19 agremias:6es dos mais diversos lugares da eidade, que em 1933 os jornais 0 Clobo e Correio de Manhti se enfrentaram pelo seu patrocinio e organizas:ao, disputa vencida pelo primeiro. Nem por isso 0 Correio da Manha deixou de promover e apoiar as eseolas de samba, afinal de eontas elas
eram realmente uma novidade, e a sua originalidade em termos da execuC;ao de urn novo samba, baseado exclusivamente em instrumentos de percussao, uma grande sensaC;ao e experieneia estetiea. Com origem nas eamadas mais pobres da cidade, fortemente negra, a eseola de samba converg ia para a busea de expressoes de uma sensibilidade naeionalista e popu lar que entao agitava 0 pais e eobria 0 mundo. L ogo encontrou seus defensores e promotores na imprensa. Urn leque de inteleetuais e politicos importantes the prestou apoio e legitimidade ereseente ao longo do tempo, 0 que nao significa dizer que 0 costume de as autoridades promoverem perseguic;6es e arbitrariedades tenha sido totalmente abandonado.
o entusiasmo com que os bloeos eamavaleseos aderiram ao campeonato das eseolas de samba fi eou patente em 1933, quando 0 numero de participantes quase dobrou, passando de 19 do ano anterior para 35 grupos, sendo que desse total, apenas 25 estavam ofieialmente inseritos no eertame. Nao havia tempo e espac;o para 0 desfile de tantas eseolas! Cabral[8] observou que alg umas eseolas nao apresentaram enredos "ou os jornalistas nao eonsegu iram reeonheee-los", e fomeee uma preciosa lista mais ou menos eompleta com as escolas, seu bairros de origem e enredos que foram apresentados naquele ano (Oyadro I ), do qual nos valemos para especular que ate aquele momento suas preocupas:6es eram ainda bern poueo nacionalistas e mais voltadas a defesa do proprio samba, de referencias geognifieas importantes para a sua propria eultura. como a Bahia. Escolas de Samba e os enredos no desfile de 1933 E.scolas d~ Samba
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Escola~ de Samba. Idcntidadc Nacional e 0 dircitO;l cidadc
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Um Livro mhrc
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E A .. im quo N60 Vi.""",
EOQu.S.Vi
F'om.: Cab,.,.1(1996), p. 80-83.
PeIo exposto na tabeIa, OS enredos apresentados pelas escolas no carnaval de 1933 formaram urn ecletico leque de temas, que ia desde 0 Sistema Solar a Terra e a America, do mundo do samba a Adao e Eva e a tentas:ao da carne. Entretanto, notamos que nao se falou de Brasil; 0 tema dominante foi a Bahia, com cinco casos. E 0 samba fo i 0 enredo de quatro escolas, a exemplo da Unidos da Tijuca, que em seu desfile apresentou pela primeira vez sambas-enredos, urn genero de samba composto para 0 d ia do desfile, tendo em sua letra urn dos elementos mais importantes para 0 desenvolvimento e a comunicas:ao do enredo apresentado pe-
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las escolas. Apesar de ser urn elemento ritual dos mais tradicionais da escola de samba e de ter sido inventado muito cedo, somente d epois da Segunda Guerra se desenvolveu plenamente, 0 que significa, entre outras coisas, que necessitou de muita elaborat;ao para atingir a sua formalizat;ao mais clissica, como nas obras de Silas d e Oliveira, cujas extensas letras dissertavam temas nacionais e brasileiros. Mas os primeiros samba-enredos da historia, apresentados pela Unidos da Tijuca em 1933, eram curtos e cantavam a bandeira de que "0 samba e a cant;ao brasileira", como naquela composit;ao de Leandro Chagas. Eu tenho prazer em falar ~e 0 samba esta em primeiro lugar Vern para 0 samba, cabrocha faceira Diz nas cadeiras o samba ea can\3.o brasileira
o C labo comemorou 0
sucesso da segunda edit;ao do desfile das escolas de samba em 1933, ao qual compareceram 40 mil pessoas, com uma declarat;ao de perplexidade. "E stamos satisfeito s por termos proporcionado a cidade 0 espetaculo mais estranho do carnaval deste ano",palavras que refletiram urn sentimento generalizado de que escolas de samba ainda nao eram coisa intima da cidade mas mereciam a sua adesao. D e fato, vemos que, ao lange de 1933, outros jornais, 0 Touring Club e a prefeitura demonstraram cada vez mais seu interesse sobre as escolas de samba. O s jornalistas foram as sedes das escolas nos morros e suburbios, entrevistaram suas liderant;as e publicaram materias entusiasmadas em seus jornais. Por outro lado, as liderant;as do samba comet;aram as reuni6es para institucionalizar sua organizat;ao, atraves da criat;ao da Uniao das E scolas de Samba (UES), fundada em 1934. Em seus estatutos foi firmado que a principal finalidade da UES era "organizar os desfiles de fe stejos carnavalescos e exibit;6es publicas, entender-se diretamente com as autoridades federias e municipais para obtent;ao de favore s e outros intcresses (. ..) de suas filiadas", bern como estabelecer as normas dos desfile s e os elementos rituais que caracterizam uma escola de samba, a exemplo da obrigatoriedade de urn grupo de baianas, da proibit;ao do usa de instrumentos de sopro e de enredos que nao fossem baseados em temas nacionais. D evemos salientar que a decisao de desenvolver enredos nacionais pelos sambistas nao era novidade para as ag remiat;6es carnavalescas do Rio de Ja neiro
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e, especialmente, que sua execw;ao nao era coisa tao faeil como pode parecer a primeira vista. Sem exito foi tentado pelos ranchos na decada de 1920, estimulados pelo escritor Coelho Neto. E os ranchos carnavalescos tinham muitas competencias, faziam parte do g rande carnaval oficializado e "civilizado" da Avenida Rio Bra nco, contavam com recursos financeiros, tecnicos e artisticos e se d estacavam por tomar operas classicas como enredos de seus desfiles. E ssa tentativa frustrada dos ranchos mostra dois problemas importantes sobre 0 carnaval carioca e suas rela<;oes com as representa<;6es nacionais. Primeiro, esse proj eto nao partiu da ditadura do E stado Novo (1937), a qual a maioria dos estudiosos tradicionalmente creditou a imposi<;ao dos temas nacionais as escolas d e samba, urn equfvoco que so veio a ser corrigido por Cabral em 1996. 0 segundo problema a ser notado foi a dificuldade d e se desenvolver os temas nacionais no carnaval, ja que os ranchos fracassaram em seu intento e as escolas de samba demoraram urn longo tempo para alcan<;ar a sua formaliza<;ao estetica nos d esfile s, somente atingida apos 0 fim da Segunda Guerra Mundial. A funda<;ao da Uniao das E scolas de Samba, a obrigatoriedade dos temas nacionais e a oficializa<;ao dos seus d esfiles em 1935 foi 0 resultado de negocia<;oes que envolveram seus lideres e 0 prefeito Pedro Ernesto, que entao gozava de amplo prestigio entre as camadas populares da cidade. Tudo isso fez com que a UES e 0 jornal A NaJao estabelecessem que, no desfile de 1935, as 25 escolas inscritas desenvolvessem urn unico enredo: "A vitoria do samba". A ssim , se em 1933 quatro escolas adotaram 0 samba como enredo, em
1935, no primeiro ana da obrigatoriedade dos tema s nacionais e de oficializa<;ao, ficou combinado que 0 enredo para todas as 25 escolas inscritas no campeonato se ria 0 samba. Segundo nossa aprec ia<;ao, 0 enredo geral d e 1935, alem de expressar a conquista do direito de sambar na s rua s do Rio de Janeiro , incluiu a Pra<;a Onze na geografi a do carnaval oficial e, particu larmente, elevou 0 samba ao lugar de tema nacional. A o contrario do que concluiram Q!1 eiroz e Aug ras, esse processo nao foi uma simples imposi<;ao do E stado ou urn estratagema para dominar a massa suburbana. Ao nosso ver, a ado<;ao dos tern as nacionais nao foi cega nem desprovid a de estrategia, e nao sig nifi cou acolher os tern as patrios e nacionalistas qu e as elites tinham em mente. Em 1935, por exe mplo, nao tiveram nenhuma dificuldade para comemorar a sua propria vitoria , em vez de urn dos g randes fato s da historia oficial , como acontecera numa fase posterior.
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Qyem venceu 0 desfile de 1935 foi a E scola de Samba Portela, que na epoca tinha 0 nome de "Vai como pode". Urn de seus belos sambas apresentados no desfile, "Guanabara", de Paulo da Portela , mostra como naquela epoca ainda nao era normal que as musicas descrevessem 0 enredo, isto e, exercessem a funyao de samba-enredo. Como podemos ver abaixo, em sua letra nao h i nada que se refira ao samba, sendo uma bela homenagem a baia de Guanabara, beryo de sua cidade: Como e linda a nossa Guanabara! Joia ram! O!te beleza, quando 0 nosso Ceo esta todo azul Anoitece e
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ceo se resplandece
Em seu bordado de estrelas Ye-se 0 Cruzeiro do SuI Pao de At;-ucar,
0
gigante
Fiel vigilante de nossa bafa Poderoso, sente-se orgulhoso Por ter em seu poder joia tao ram Corcovado poderoso! Fiel cornpanheiro de nossa baia Vigilante, nao dorme urn instante Guardando as riquezas que a natureza cria
D entro dos limites deste trabalho, as evidencias apontadas indicam que a ripida ascensao das escolas de samba, naquele momenta marcada pelo reconhecimento ofi cial, nao foi conduzid a pelo E stado ou por elites nacionalistas, ji que apesar de haver nacionalizado seus enredos, como ambas certamente queriam , os sambistas 0 fizeram ao seu modo, tomando 0 samba 0 gra nde tema nacionaL Ou as vezes nem isso, pois com g rande liberdade frente ao enredo geral estabelecido pela UES , Paulo da Por tela aproveitou-se de "A vit6ria do samba" para homenagear a bela natureza e os serviyos prestados ao Rio de Janeiro pela baia de Guanabara e sua singular geomorfologia.
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o <.'lffiI:xJ erredo e q:) iern<:t'l IlOCI<JOCt> droIte 0 bfodo Nolo e
o 6ecJocJo cmro ~
A desclassificas:ao da E scola de Samba Vizinha Faladeira no desfile de 1938, por rer apresenrado
0
enredo "Branca de neve e os sere anDes", romou esse ano urn
marco na hisroria das escolas de samba. Foi a primeira e ralvez (mica vez que 0 desrespeiro a obrigatoriedade dos temas nacionais foi punido exemplarmente pela UES. Na verdade, essa postura foi uma reas:ao ao uso em 1937 de uma serie de elementos - cavalos, automoveis, instrumentos de sopro e enredos estrangeiros - considerados alheios e prejudiciais
a autenticidade das escolas de samba. Contudo, como ja co-
m entamos, a versao que ficou para a historia foi que a punis:ao sofrida pela Vizinha Faladeira foi uma ordem da ditadura do E stado Novo - para certos autores, essa seria uma das grandes provas da manipulas:ao das massas pelas autoridades populistas. Segundo essa versao, essa teria sido uma atitude subsenriente e inconsciente no cumprimento da ordem de uma ditadura. Para nos, no entanto, isso representou a adesao soberana e estrategica aos temas nacionais pelas escolas de samba. Na realidade, 0 desenvolvimento das escolas de samba entre 1938 e 1945 ocorreu de forma bastante independente da ditadura, de tal modo que, ao final desse periodo,
0
partido comunista tera grande parte de seu eleitorado entre os bairros po-
pulares e nas favela s, cujos moradores eram tambem membms das escolas de samba. Em 1939 a E scola de Samba Portela fez urn desfile revolucionario, pois pela primeira vez foi notada uma apresentas:ao em que tanto a parte visual da escola, as fantasias e alegorias, quanto a parte musical,
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samba-enredo, se harmonizavam na
composis:ao do enredo "'Teste ao samba", que foi representada na Pras:a Onze por urn professor e uma turma de alunos ensinando e estudando 0 samba diante da comissao julgadora do desfile, conforme se Ie na letra abaixo do samba de Paulo da Portela. Vou come'rar a aula Perante a Comissao: Muita aten\ao, Eu quem ver se diploma-los posso. Salve
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"fessor"
Da a mao pra e1e, senhor, Catone com dais sao doze Noves fora, tudo
e nosso!
Cern divididos par mil
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dircito cidade
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Cada urn com quanto fica? Nao pergunte a caixa surda Nao pe~ a cola a cufca Nos Ii no morro Vamos vivendo de amor Estudando com carinho o que nos passa 0 professor. Na parte visual a Portela consegu iu desenvolver plenamente
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enredo,
apresentando entre suas alegorias urn grande quadro negro onde estava inscrita a mensagem: "Prestigiar 0 samba, musica tipica e original do Brasil, e incentivar o povo". Com relas:ao as fantasias, a escola de samba foi quase toda vestida com uniformes escolares, a exces:ao do grupo de baianas, do mestre-sala, da porta -bandeira e de Paulo da Portela, que representou 0 professor que ministrava os ensinamentos ao grupo de alunos. Com urn born samba-enredo que dialogava e se integrava com fantasias e alegorias que representavam 0 enredo, a mensagem de "Teste ao samba" alcans:ou urn grau de clareza e inteligibilidade publica ate enta~ desconhecido. Neste semido, como observou Cabral, uma importante medida foi retirar urn grupo de "neg ros fantasiados de nobres" - elemento ritual que existia em antigas manifestap")es carnavalescas, como 0 congo, cordoes e blocos -, que permaneceu nas escolas de samba, independente de sua conveniencia para a composis:ao do enredo. Apesar do sucesso, esse novo principio de organizas:ao do conjumo visual e musical das escolas de samba que a Portela trouxe em 1939 s6 veio a se generalizar ap6s a guerra, quando as condis:6es economicas melhoraram e foi possivel investir em alegorias e fantasias. E preciso que nao se esques:a de que, nas suas primeiras decadas, as escolas de samba pertenciam aos grupos pauperrimos da cidade, nos quais eram numerosos os analfabetos. Suas exibipSes eram essencialmente de canto e dans:a, acompanhadas de uma orquestra de instrumentos feitos de latas, madeira. arame, pregos e couro. Nao havia recursos para fantasias e alegorias. "Teste ao samba" foi a exces:ao que depois virou regra, e s6 foi possivel pelas seguintes razoes: primeiro, foi realizada por uma das mais "ricas" e bem-organizadas escolas da epoca, dirigida por Paulo da Portela, grande artista e lider popular; segundo, a solus:ao de usar uma unica fantasia - algo quase impossivel em qualquer enredo - para uma escola inteira teve urn custo muito baixo e possivel.
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E ssas limitac;6es dificultavam urn born desempenho na apresentac;ao dos temas historicos nacionais, cujas fantasias e alegorias eram necessariamente mais caras e exigiam maior apuro estetico e material. E sse aspecto precisa ser valorizado, pois a precariedade material influiu para retardar 0 desenvolvimento dos enredos mais caracteristicamente nacionalistas. D e qualquer forma, "Teste ao samba" demonstra que ainda em 1939 as escolas de samba podiam ser inovadoras e campeas tendo por enredo 0 proprio samba e seu povo. Nao precisavam, necessariamente, tomar os martires, os herois, as batalhas da historia oficial como enredo - 0 que se sup6e estar mais ao gosto de uma ditadura - para ganhar 0 primeiro lugar. E, na realidade, as relac;6es entre as escolas de samba e a ditadura de Vargas foram tensas e nao podem, como muitos insistem, ser reduzidas a submissao ingenua e acritica, a logica do "pao e circo". Em 1940, por exemplo, a Portela apresentou 0 enredo "H omenagem ajustic;a". Ao que tudo indica, repetindo a formula de "Teste ao samba", fez urn samba-enredo baseado em valores como justic;a e liberdade. Segundo Silva e Santos, no samba havia 0 refrao "Salve aJustic;a!", mas na hora do desfile foi cantado "Pau naJustic;a", 0 que nao agradou aos ouvidos dos jurados e principalmente do regime. No concurso de 1940 a escola ficou em 50 lugar, mas nao se sabe se houve interferencia politica no resultado. Porem, 0 certo e que a Portela, em 1941, inventou urn enredo que comemorava os 10 anos de seus desfiles na cidade, 0 que, numa feliz coincidencia , eram os mesmo 10 anos do govemo de Getulio Vargas. A ssim, mesc1ando os seus feitos com os do presidente Vargas desd e 1930, a Portela ganhou 0 primeiro dos sete campeonatos consecutivos alcanc;ados entre 1941 e 1947, feito nao repetido ate hoje. Nao estamos insinuando que a Portela se tomou governista ou necessariamente passou a adotar enredos nacionalistas e de interesse do govemo. Em 1942 ela foi bicampea com urn velho enredo, 0 samba, assim narrado no samba-enredo "A vida no samba". A Vida no Samba Samba foi uma festa de indios
Nos
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aperfeir;oamos mais
It uma realidade Q1ando ele desce do morro Para viver na cidade Samba t u es muito conhecido
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No mundo inteiro Samba, orgulho dos brasileiros Foste no estrangeiro E alcan<;aste grande sucesso Muito nos orgulha 0 teu progresso. Segundo nossa leitura, a letra acima reivindica: uma ancestralidade indigena do samba, logo brasileira; 0 seu aperfeis:oamento pelos moradores dos morros da cidade; sua realizas:ao c conquistas na cidade; e, finalmente, 0 inicio de seu rcconhecimento internacional como represcntas:ao da identidade nacional brasileira. E uma narrativa totalmente voltada para a hist6ria presente daquela geras:ao de sambistas e suas escolas de samba que g anhavam cada vez maior projcs:ao nas escalas nacional e internacional . 0 registro do jornalA Manhii apoiando a vit6ria da Portela em 1942 dizia que 0 "enredo foi defendido com muita oportunidade. Todos os detalhcs do samba foram focalizados, finalizando com a sua aceitas:ao em H ollywood". Mas, alem disso, podemos observar com ajuda de Tupy e de Candcia e Isnard que a ancestralidade indigena do samba, reivindicada no primeiro verso do samba-enredo, permitiu que a Portela Fosse vestida de ind io, reproduzindo com fantasias mais baratas ainda os principios estabelecidos por Paulo da Portela em "Teste ao samba". A referencia a H ollywood observada pela Folha da ManNi rem como base a ida de Walt Disney a sede da Portela, em 1941, no suburbio de O svaldo Cruz, ocasiao em que assistiu com sua equipe urn espetaculo de samba comandado por Paulo da Portela. Disney estava a trabalho, interessado em colher subsidios para a composis:ao do personagem brasileiro que iria protagonizar, ao lade do Pato D onald, a pe1icula "Alo, amigos", urn produto que foi encomendado pela "Office of the Cordinator of I nter-American Affairs" (OCIAA), que desde 1940 estava a frente da "politica de boa vizinhans:a" entre os EUA e 0 Brasil. A visita de Disney que tanto orgulho tfOuxe aos portelenses e aos sambistas de uma forma geral, resultou na crias:ao do personagem Z e Carioca, urn simpatico papagaio falante, verde e amare1o, mulato e sambista, cuja silhueta logo foi associada a Paulo da Portela. Ze Carioca foi 0 cicerone de urn norte-americano em visita ao Brasil, 0 Pato D onald.
a modo como as escolas de samba se apropriaram dos temas nacionais nos sugere que elas 0 fizeram d e forma estrategica, principalmente quando utilizaram o proprio samba como enredo, valorizando-o, promovendo-o e relacionando-o
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com problemas do presente. A E scola de Samba Mangueira, segunda colocada no desfile de 1942, apresentou 0 enredo "A vit6ria do samba nas Americas", que tambem dialogava com a "'politica de boa vizinhans:a" e a difusao do samba nos EVA. E nao devemos esquecer que foi vestida de baiana e cantando sambas que em 1939 a cantora Carmem Miranda se tornou urn estrondoso sucesso nos EVA agravamento da guerra durante 1942, que atingiu diretamente 0 pais com 0 ataque de submarinos alemaes a navios mercantes na costa brasileira e
o
o acordo militar Brasil-EVA, criou urn clima em que a imprensa e a policia se mobilizaram e praticamente proibiram 0 carnaval em 1943. A imprensa dizia que em tempos de g uerra as energ ias deviam se concentrar nas exigencias do conflito, e n ao dispersas em Festa; a policia entendia que os animos acirrados podiam alimentar confus6es e por em risco a segurans:a publica. Por seu lado, a prefeitura cancelou 0 baile do Teatro Municipal e as subvens:6es a todos os g rupos carnavalescos que desistiram de rcalizar seus desfiles, a exces:ao de 13 escolas de samba. A gindo assim, as escolas mostraram que nao dependiam do apoio ofi cial e da imprensa, mas n ao d eixaram de buscar 0 apoio de importantes organizas:6es politicas, como a V niao dos E studantes e a Liga de D efe sa N acional, que acabaram por se responsabilizar peIos desfiles, que, por sinal, pela primeira vez pode ser realizado na Avenida Rio Branco, ate entao palco tradicional e exclusivo do carnaval das classes respeitaveis. Capturando 0 grave clima politico do momento, a Portela novamente atingiu 0 tricampeonato em 1943, vencendo com urn enrcdo realmente patri6tico e que falava a todos os coras:6es e incentivava a ida dos brasileiros a g uerra. Contudo, em plena ditadura, d efendia tambem a democracia e tinha fe na vit6ria dos Aliados contra as potencias do Eixo. Pelo menos essa e a impressao que d a a letra do samba-enredo apresentado. Democracia P alavra que nos rraz felicid ade Pois lutaremos Para honrar a nossa liberdade Brasil oh! Meu Brasil Unidas na~oes aliadas Para 0 front eu vou de cora~ao Abaixo 0 Eixo
so I E~colas de SambJ. IdcntidJde Nacional e 0 direito II cidadc
Matheus Costa
Eles amolecem 0 queixo A vitoria esti em nossa mao. A s escolas de samba estavam logrando mais uma g rande vitoria, con tornando as proibi~6es e crfticas generalizadas, ocupando sozinhas a Avenida Rio Branco e, sobretudo, se apropriando de urn enredo como a guerra para legitimar e mobilizar as aten~6es para 0 seu desfile. Mas e tam bern importante ter em conta que, para os grupos pobres do Rio de Janeiro, a g uerra nao era urn assunto distante, pois deIes sairam expressivos contingentes de marinheiros e militares que estiveram na linha de frente do conflito. Silas de Oliveira, que anos depois se tomaria 0 maior compositor de samba-enredo da historia, era entao urn dos sold ados do exercito que sobreviveu ao naufragio do navio Itagiba, torpedeado peIos alemaes nas costas da Bahia em 1942. Por meio dessa leitura, podemos ver que mesmo nos enredos patrioticos as escolas continuaram a problematizar e a desenvolver temas que falavam deles mesmos, de suas vidas reais e de urn mundo reaL Podemos concluir esta segunda parte resumindo que os camavais de 1944 e 1945 reproduziram 1943, limitando-se unicamente aos valentes e solitarios desfiles das escolas de samba, com mais vitorias da Portela com enredos explicitamente patri6ticos. Em 1944 foi exatamente "Motivos Patrioticos" e, em 1945, "Brasil Glorioso". D o primeiro pouco se sabe, porque, segundo Cabral, os jornais nao cobriram 0 evento. Entretanto, Tupy con seguiu apurar que a Portela venceu com o samba "Motivos patri6ticos", de Jose Barriga Dura. Motivos patrioticos Somos todos brasileiros E par ti queremos seguir
o clarim ji tocou reunir Adeus minha querida eu vou partir Em defesa do nosso pais E verde e amarelo, branco e azul Cor de anil e a meu Brasil Oh meu torrao aben~oado Pelos seus filhos adorado Seguiremos para a frontei ra
Escola~ de Samba. Idcntidade Nacional e 0 <lircito it cidadc
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Um Livro mhrc
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Samba
Para defender a vida inteira Nossa querida bandeira. Embora no inicio de 1945 a vit6ria aliada ja pudesse ser vista no horizonte, as opinioes favoravei s a festejos se reduziram mais ainda. Mesmo assim as escolas desfilaram outra vez sozinhas no carnaval, mas nao tiveram
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direito de se exibir
na Avenida Rio Branco novamente, sendo deslocadas para 0 E stadio do Vasco da Gama, onde a Portela alcancyou
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pentacampeonato com
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samba-enredo Brasil
Glorioso, de autoria de Jair Silva. Brasil Glorioso Brasil terra adorada Brasil dos brasileiros Conhecido no mundo inteiro Como um pais hospitaleiro Com uma s6 bandeira Acolhe
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mundo inteiro
o Brasil e um pais diverso Esta sempre com os bra'ros abertos No Brasil sempre existiu humanidade
o Brasil eum pais sincero No Brasil se encontra a liberdade.
Conforme assinalamos no inicio,
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periodo que corresponde aos anos 1946-
1949, embora muito curto, foi muito intenso em termos politicos e esreticos. Nesses anos as escolas de samba assumiram com grande desenvoltura valorizar os temas nacionais, seguindo
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papel de exaltar e
modelo que a Portela vinha colocando em
pritica com indiscutivel sucesso. Assim, rapidamente conseguiram alcancyar um nivel geral de harmonizacyao equilibrada entre os elementos rituais, colocando a musica, as fantasias e as alegorias a servicyo do desenvolvimento de uma narrativa altamente elaborada, merecendo os elogios dos contemporaneos que nelas viam "verdadeiras operas ambulantes", superiores aos ranchos que antes detinham tal titulo.
S2 r E~cola~ de Samba. ldcntidade Nacional e
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dircito ~ cidadc
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o fim da guerra e da ditadura do E stado Novo em 1945 trouxe urn clima festivo renovado para 1946; os dias de momo daquele ano foram batizados de "Carnaval da Vitoria", e as escolas de samba resolveram que 0 enredo deveria ser dedicado
a vitoria aliada e a participac;ao dos brasileiros no confuto mundial. Com 0
enredo
"Alvorada do Novo Mundo" a Portela chegou ao hexacampeonato, mas isso de modo algum significava a domesticac;ao das escolas, pois, durante
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mesmo ano, vieram
a
luz as relac;6cs que mantinham com 0 Partido Comunista Brasileiro (PCB). Nao e possivel entrar em detalhes aqui sobre essas relac;oes, que ja apreciamos, mas, para que se tenha uma ideia do que estamos Wando, em 15 de novembro de
1946, a Tribuna Popular, orgao do PCB , a pretexto de comemorar 0 dia da Republica, promoveu no Campo de Sao Cristovao urn desfile de escolas de samba que, na verdade, serviu para homenagear Luis Carlos Prestes, lider dos comunistas no Brasil. Sem a presenc;a da Portela e da Mangueira, 22 escolas compareceram ao desfile, e os sambas cantados tinham Prestes como enredo, 0 enalteciam como "0 cavaleiro da esperanc;a", 0 defensor do povo etc. Oltem venceu 0 desfile foi a E scola Prazer da Serrinha, situada em Madureira, com urn samba-enredo de Mano D ecio da Viola chamado "Pelo bern da humanidade", cuja letra e a seguinte: Sempre lutando Pe1a nossa liberdade Sofrestes 6 grande nome Cavaleiro da Esperanr;a Fieads para sempre Na nossa lembranr;a As relac;oes com as escolas de samba renderam para de suas lideranc;as. Luis Carlos Prestes foi
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PCB forte apoio
segundo senador mais votado para
a Assembleia Constituinte, em d ezembro de 1945. Nas eleic;oes de janeiro de
1947 para a camara de vereadores do Distrito Federal, os votos vindos dos meios sambistas ajudaram 0 partido a ocupar 18 das 50 cadeiras em disputa, alcanc;ar a maioria parlamentar e assustar gravemente a igreja e os anticomunistas. Mas isso nao durou nada, porque, em maio do mesmo ano, 0 Presidente Dutra colocara o PCB na ilegalidade. Para as escolas de samba, 0 envolvimento com 0 PCB trouxe pela primeira vez a intervenc;ao do E stado em suas atividades. A prefei-
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direito :i. eidadc
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Um Livro mhre
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tura cancelou a participac;ao da Uniao Geral das Escolas de Samba (UGES) na organizac;ao do desfile oficial, e a entidade foi uma das organizac;oes que tiveram suas atividades encerradas e suas portas lacradas pela policia, sob a acusac;ao de abrigarem comu nistas, siruac;ao que foi revertida por meio de liminar obtida na justic;a por ac;ao de sua direroria. Nao conseguindo fecha r a UGE S, a prefeitu ra, vereadores e 0 chefe da policia politica estimularam a criac;ao de uma entidade paralela, a Federac;ao Brasileira de E scolas de Samba, atraves d a qual procuraram dividir e aliciar as escolas de samba entao filiad as a UGES, que, por sinal, foi ape1idada por seus inimigos de "Uniao Geral d as Escolas Sovieticas".
o resultado de tal intervenc;ao foi a divisao politica entre diferentes grupos de escolas de samba. Muitas d as mais importantes resistiram e acabaram organizando nos anos seguintes seus pr6prios campeonatos, se recusando a participar do desfile oficial, problema que so veio a ser resolvido no inicio dos anos 1950, com 0 segundo governo de Get ulio Vargas. Apesar do tu multuado ambiente politico, 0 final dos anos 1940 assistiu a consolid ac;ao dos temas nacionais tradicionais - herois, baralhas, poetas, regioes, natureza brasileira - como enredos para os desfiles das escolas de samba. 0 marco defi nitivo desse processo aconteceu com "Exaltac;ao a Tiradentes", apresentado em 1949 pe1a E scola de Samba I mperio Serrano, com 0 samba-enredo de Mano D ecio d a Viola, E stanislau Silva e Penteado, cuja letra segue abaixo. Joaquim Jose da Silva Xavier Morreu a 21 de abril Pela l ndependencia do Brasil Foi traido, mas nao traiu jamais A l nconfldencia de Minas Gerais Joaquim Jose da Silva Xavier Eo nome de Tiradentes Foi sacriflcado Pela nossa liberd ade Esse grande her6i para sempre ha de ser Lembrado.
"E xaltac;ao a T iradentes" e urn marco para historia das escolas de samba porque fo i 0 primeiro samba-enredo a ser gravado em disco, 0 que s6 veio a ocorrer
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I E~eol as de Samba.
IdentidJde Nacional e 0 di reito II cidadc
Mathcus Costa
em 1955. Por que os cantores e as empresas fonograficas levaram mais de 20 anos para explorar 0 samba-enredo? Isto nao e surpreendente, se considerarmos que o primeiro samba foi gravado em 1917 e 0 primeiro samba-enredo apareceu em 1933? Por que tamanho desinteresse? Por que ao menos 0 E stado Novo nao gravou os sambas patrioticos da Portela? Vma importante parte da resposta a essas questoes esti relacionada a nossa h ipOtese de que a fixac;ao desse tipo de samba enredo significou a eulminancia de urn longo processo de formalizac;ao estetica que so se concluiu depois da Segunda Guerra, quando melhores condic;6es economicas permitiram as escolas de samba arear com os custos do desenvolvimento da parte visual de seus desfiles por meio do aumento e da diversidade de fantasias e alegorias. Com esses reeursos foi possivel apresentar os enredos com maior caracterizac;ao de grupos humanos, personagens e cenarios dos eventos historicos. apuro visual do
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enredo reforc;ou mais ainda a importancia do samba-enredo para a comunicac;ao publica, modelo que a Portela trouxe a luz em 1939 com "Teste ao samba". Talvez esteja no monopolio desse modelo 0 grande segredo de a Portela haver alcanc;ado 0 primeiro lugar em sete camavais consecutivos. Mas h i urn depoimento do jom alista Irenio Delgado - importante dirigente do Imperio Serrano; na epoca raro exemplo de urn representante dos setores medios em uma escola de samba - , em que ele afirma que ate 1948 raramente eram eumpridos os regulamentos de fa ntasias e samba-enredo. "Era muito comum a mamae vir a paisana com a filhinha vestida de baiana. A bateria nao era uniformizada, e a escola entrava no desfile com urn sambinha de terreiro; parava em frente acomissao julgadora e so ai cantava 0 samba de enredo". De fato, as proprias escolas de samba demoraram a valorizar 0 samba-enredo. S6 a partir desses anos elas puderam e passaram a dar mais atenc;ao ao conjunto samba-enredo, alegorias e fa ntasias, ao mesmo tempo que 0 julgamento dos desfiles passou a exigir com mais rigor esses itens (quesitos) do regulamento. Com esses reeursos as escolas de samba puderam, apos 20 anos de lutas e desenvolvimento, se transformar em "grandes operas ambulantes nacionais", promovendo 0 admiravel espetaculo de que todos tern noticia, tomando 0 samba e a escola de samba a representac;ao nacional brasileira por exeelencia. E representar uma nac;ao, urn pais gigante como e 0 Brasil, pela arre, pela poesia, pela musica, encantar multidoes, nunea, em parte alguma, foi pouea eoisa . â&#x20AC;˘ E por isso que a nossa narrativa da historia e da geografia das escolas de samba tern sido a de uma rara, real e bela vit6ria dos vencidos que aconteceu nas mas do Rio de Janeiro, nossa cidade, principalmente naquelas mas de suas favelas e suburbios.
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Da mesma forma que
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Samba
jazz nos E stados Unidos e a salsa (derivada do
mambo e da rumba) em muitos dos paises caribenhos, 0 samba e indiscutiveImente 0 genero musical que confere identidade ao Brasil. Nascido da influencia de ritmos africanos para d transplantados, sincretizados e adaptados, foi sofrendo inumeras modificaC;6es por contingencias das mais diversas - econ6micas, sociais, culturais e musicais - ate chegar ao ritmo que conhecemos. E a historia t mais ou menos a me sma para os similares caribenho e americano. Simbolizando primeiramente a danc;a para anos mais tarde se transformar em composic;ao musical, 0 samba - antes denominado "semba" - foi tambem chamado de umbigada, batuque, danc;a d e roda, lundu, chula, maxixe, batucada e partido alto, entre outros, muitos deles convivendo simultaneamentel D o ritual coletivo de heranc;a africana, aparecido principalmente na Bahia, ao genero musical urbano, surgido no Rio de Janeiro no in fcio do seculo XX, muitos foram os caminhos percorridos peIo samba, que esteve em gestac;ao durante peIo menos meio seculo. Rio de Janeiro, eotao capital federal: a transferencia da mao-de-obra escrava da Bahia (onde se cultivava a cana, 0 algodao e 0 fumo) para 0 Vale do Paraiba (onde se plantava 0 cafe), a abolic;ao da escravatura C 0 posterior declinio do caft acabaram liberando grande leva de trabalhadores brac;ais em direc;ao a Corte; alem disso, a volta dos soldados em campanha na Guerra de Canudos tambem elevou 0 numero de trabalhadores na capital federal. Muitos desses soldados trouxeram consigo as mulheres baianas, com as quais haviam se casado. E ssa comunidade baiana - formada por negros e mestic;os em sua maioria - fixou residencia em bairros proximos azona portuaria (Saude, Cidade Nova, Morro da Providencia, Pedra do Sal), onde havia justa mente a demanda do trabalho brac;al e por conseqiiencia, a possibilidade de emprego. Nao demorou muito para que no quintal dessas casas as festas, as danc;as e as tradic;6es musicais fo ssem retomadas, incentivadas sobretudo pelas mu lheres. D e acordo com Jose Ramos Tinhorao, "mais importante do que os homens foram essas mulheres" - quituteiras em sua maioria e versadas no ritual do candomb1e - as grandes responsaveis pda manutenc;ao dos festejos africanos cultivados naquela redondeza, onde predominavam lundus, chulas, improvisos e estribilhos. Entre essas doceiras estavam tia Amelia (mae de D onga), tia Prisciliana (mae de Joao de Baiana), tia Veridiana (mae d e C hico da Baiana), tia Monica
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(mae de Pendengo e Carmen do Xibuca) e a mais famosa de todas, ria Ciata, pois justamente de sua casa, a Rua Visconde de ltauna 117 (Cidade Nova), e que "vida a ganhar forma 0 samba destinado a tornar-se, quase simultaneamente urn genero de musica popular do morro e da cidade".
TKl Oa/a Se por urn lado 0 samba como danr;a e Festa coletiva explodiam nos quintais, tomava as ruas e se exibia nos desfiles de cord6es, por outro, 0 samba como musica e composir;ao autoral dava os seus primeiros passos em casa de tia Ciata. 0 elemento comum era os estribilhos, cantados e danr;ados tanto num lugar como no outro . â&#x20AC;˘ "Assim nasceu 0 samba carioca, ap6s longa gestar;ao, da Africa a Bahia, de onde veio para ser batucado nos terreiros da Saude e finalmente, tomando nova forma ritmica a fim de adaptar-se ao compasso do desfile de urn bloco carnavalesco". D e fato, nos quintais da casa de tia Ciata reuniam-se bons ritmistas, compositores e verdadeiros mestres da musica popular, muitos deles profissionais como Sinh6, Pixingu inha, D onga, Caninha, Joao da Baiana, H eitor dos Prazeres, Hilario Jovino Ferreira e outros. Nao foi a toa que de la saiu 0 "primeiro" samba da musica popular brasileira. Assim se pronuncia Jose Ramos Tinhorao: "Ao contrario do que se imagina. 0 samba nasceu no asfalto; foi galgando os morros n a medida em que as classes pobres do Rio de Janeiro foram empurradas do Centro em direr;ao as favelas, vitimas do processo de reurbanizar;ao provocado pela invasao da classe media em seus antigos redutos".
Foi na gestao de Roberto Paulino, bienio 60 / 62, na Mangueira, que foi criada a Ala das Baianas com as caracteristicas atuais. Em 125 baianas coordenadas por D. Neuma. Foi no desfile das campeas em 1970, quando 0 Presidente era Juvenal Lopes que a mais famosa baiana da Mangueira Nair Pequena. morreu em plena avenida, quando a escola cantava 0 samba de enredo "Urn Cantico a Natureza".
A ala de baianas na decada de 30 era formada, quase exclusivamente, por homens que saiam nas laterais, das Escolas, portando navalhas presas as pernas para defenderem as agremiar;6es em caso de brigas.
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Foi urn cantor, compositor e violonista brasileiro. Considerado por diversos musicos e criticos como o maior sambista da historia da musica brasileira. Principais composi<;6es: "0 mundo e urn moinho", "As rosas nao falam", "Alvorada".
Sambista, cantor, compositor, bandolinista, violonista brasileiro e urn dos maiores e mais importantes artistas da musica no BrasiL Teve contribui<;ao fundamental na legitima<;ao do samba de morro e no "asfalto", ou seja, entre a classe media e 0 radio, principal meio de comunica<;ao em sua epoca - fato de grande importancia, n ao so 0 samba , mas a historia da musica popular brasileira. Principais composi<;6es: "Com que roupa?", "Palpite infeliz".
Os del. mclhore~ samhi~tas
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Samba
Coo:Jeio !V/~ - i6IIVI976) Foi um importante sambista, cantor e compositor brasileiro. Dono de uma personalidade rica e forte, Candeia foi lider carismatico, afinado com as amarguras e aspiras:oes de seu povo. Fiel a sua vocac;ao de sambista, cantou sua luta em musicas como "'Dia de Grac;a" e "Minha Gente do Morro".
Foi urn importante musico brasileiro. Sambista carioca, compositor e cavaquinista na juventude, na maturidade optou pelo violao, desenvolvendo urn estilo inimitavel de toea-Io, utilizando apenas dois dedos da mao direita. Deixou mais de quatrocentas composic;6es, entre elas cHssicos como "A Flor e 0 E spinho" e "'Folhas Secas", ambas em parceria com Guilherme de Brito, seu parceiro mais frequente. Suas cans:oes eram feitas com extrema simplicidade e letras quase sempre remetendo a questoes como o violao, mulheres, botequins e, principalmente, a morte, como em "Rugas", "'Oltando Eu me Chamar Saudade", "Luto", "Eu e as Flores" e "Juizo Final".
Talvez tenha sido urn dos sambista a exibir a mais alta originalidade no cenario da boemia carioca. Suas composic;6es mais conhecidas sao: "Me faz carinhos", "Se voce jurar", "Antonico", "Para me livrar do mal", "Novo amor", "Ao romper da aurora", "Tristezas nao pagam dividas".
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I o~ dcz mclhorcs sJmhbtJ~
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Palr/Jo do \ioIa IV11!1G4lJ â&#x20AC;˘
E urn cantor, compositor e violonista brasileiro, filho do violonista Cesar Faria (do conj unto de choro Epoca de Ouro). No inicio de carreira , Paulinho foi parceiro de nomes ilustres do samba carioca, como Cartola, Elton Medeiros e Candeia, entre outros. Destaca-se como cantor e compositor de samba, mas tambem com poe choros e e tido como urn dos mais talentosos representantes da chamada Mu sica Popular Brasileira.
J.J
Foi urn compositor e cantor de samba brasileiro, urn dos sete filho s de urn violeiro, acordeonista e repentista da Zona da Mata chamado "Capitao" Severino. Sua musicografia ultrapassa 320 cans:oes, sendo uma das maiores da musica popular brasileira, tendo como intcrpretes importantes que fizeram versoes de suas musicas C lara Nunes e os g rupos Qyarteto em Cy e MPB -4.
Foi urn advogado, poeta, rad ialista , letrista e ator brasileiro. Autor de sambas populares como "Ai, que saudades da Amelia" e "Atire a primeira pedra", ambos em parceria com Ataulfo Alves, fezse popular entre as decadasde 40 e 50.
Os dez mclhores sambi~tas
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Foi urn compositor, cantor, humorista e ator brasileiro. Ficou conhecido nacionalmente como do samba paulista.
Aos 15 anos compos seu primeiro samba, "Piquenique", que foi cantado no terreiro do G.R.E.S. Aprendizes da Boca do Mato. Por essa epoca, existiam as musicas de ala, para a qual tambem ja compunha. A carreira artistica surgiu para 0 grande publico no III Festival da Record, em 1967, quando concorreu com a musica "Menina Mos:a". 0 sucesso veio no ano seguinte, na quarta edic;ao do mesmo festival, lanc;ando a canc;ao "Casa de Bamba", urn dos classicos de Martinho. 0 primeiro album, 1ans:ado em 1969, intitulado Martinho da Vila, ja demonstrava a extensao de seu talento como compositor e musico, inclu indo, alem de "Casa de Bamba", obras -primas como "0 Pequeno Burgues", "0gem e D o Mar Nao Enjoa" e "Pri 0ge Dinheiro" entre outras menos populares como "Brasil Mulato", ''Amor Pra que Nasceu" e "Tom Maior". L ogo tornou-se urn dos mais respeitados artistas brasileiros alem de urn dos maiores vendedores de disco no Brasil, sendo 0 segundo sambista a ultrapassar a marca de urn miIhao de c6pias com 0 CD Ta Delicia, Ta Gostoso 1ans:ado em 1995.
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I Os dcz mclhorcs ~ambbtas
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pai
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samba e urn genero musical que se consolidou no Brasil, portanto, e rasileiro de benyo. Sofreu influencias de muitas culturas em seu entorno, e a mais evidente e a africana (considerando todos os povos africanos que foram trazidos no processo de escravidao). Tanto e que [oram os escravos que disseminaram as variantes do ritmo que mais tarde tomaria forma, se consag rando como 0 samba.
Como O~ â&#x201A;Źl<pIIl'e a
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o legado qu e 0
samba transitou ate se configurar na cena musical hoje e de muita luta, re sistencia e hibridaty6es assim como tudo que advem da cultura negra. samba como herantya dessa cultura presente em todo
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pais, exprime
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potencial da re1ig iosidade que esse povo congrega e isso e evidenciado em diversos aspectos. Em estudo publicado pe1a Revista Brasileira de Estudos da Canf:lo, [oi pontuado sobre isso, "seriam as demais rodas e ftstejos negros tambem
elementos de culto? Para uma comunidade onde 0 sentido religioso estti em torno da energia que toma homens e seres inanimados em regozijo, asftstas e rodas, com ou sem a comunhiio sagrada entre os deuses e seusjilhos, transjOrmam-se em engrenagens de tmca de axe, verdadeiros momentos de solidariedade e uniiio dos corpos, espfritos e sorrisos." No trabalho 0 autor tambem destaca as diferentyas entre 0 que e classificado como profano e sag rado. D esde os primordios ate 0 que se constitui a musicalidade afro-brasileira hoje, muitas vertentes re1igiosas influenciaram 0 ritmo que se tornou 0 simbolo nacional.
Dos tamoorcs da Macumha ao Samba
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D entro disso a re1igiosidade e afirmada tambem nas letras de musicas embaladas por esse genero, nos enredos das escolas de samba e nos instrumentos musicais encontrados tanto nos terreiros como nas rodas de samba ate hoje. C omo dito, uma das manifesta¢es da musicalidade africana que culminou no samba presentes na religiao, e a presen<;a de instrumentos em comum. Na Umbanda e no Candomble 0 atabaque caracteriza esse vinculo. Nestes locais, d es sao sagrados eo Oga e 0 membro da casa encarregado de conduzir a gira ao ritmo dos atabaques.
o seu papd e tao importante dentro do terreiro que
na hierarquia des
sucedem a M ae ou Pai da casa. M esmo nao entrando em transe espiritual sua conexao se da pe1a musica que embala as a<;6es do medium incorporado.
oXre O s orixas agora tinham seus cavalos, podiam retornar com seguran)-a ao Aie, podiam cavalgar
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corpo das devotas. O s
hu manos faziam oferenda s aos orixas. Convidando-os a Terra, aos corpos das iaos. Entao os Orixas vinham e tomavam seus cavalos. E, enquanto os homens tocava m seus tambores, vibrando os batas e agogos, soando os xe que n~s e adjas, enquanto os homens cantavam e davam vivas e aplaudiam, convid ando todos os humanos iniciados para a roda do xire, os orixas dan\avam, dan\avam e dan\ avam. O s orixas podiam de novo conviver com os mortais. O s orixas estavam felizes. Na roda das feitas, no corpo das ia6s, eles dan<;avam, dan)-avam e danpyam. Estava inventado 0 candomble. (PRANDI, 200S, p.52S) Em urn universo de luzes e cores, ao som de tam bores magicos, deuses e deusas ancestrais unem-se aos seus filho s humanos em festejo. 0 candomble, tal como outras manifesta<;5es rdigiosas de ascendencia africana radicadas no BrasiP, nos revda urn mundo complexo, onde coexistem homens e orixas em urn
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1. A Jem das diversas na,,6es da candambJe, somam-se Tambor de Min a, 0 T ambor de Caboclo, X ango, T erec,), Catimoo d a Jurem a, Batuque, M acumba e Umbanda. Inte ressante o bservar que varias das deno mina,,6es eyocam ritmos e instrumentas musicais, evidencianda intima enlace.
°
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I Dos tamborcs dOl
Macumba 010 Samha
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universo que nao se restringe ao que os olhos podem enxerg ar. A s festas, 0 apice do culto, revelam tras:os caracteristicos da cultura negra no Brasil, e aroda e urn deles: roda de candomble, roda de samba , roda de jongo, roda de capoeira, x iri. Aroda pressupoe ig ualdade, mesmo que haja hierarquias, e e atraves da roda que os Orixas concedem 0 ax? Em roda velhos e jovens, das mais distintas classes e cores, se juntam, compartilhando 0 mesmo espas:o sagrado, fe stejando a chegada do orixa na Terra: urn dos exemplos de comunicas:ao do Ayi com 0 O rum. No conrexto da resistencia africana no Brasil, 0 vies relig ioso negro config urou-se como elemento-ch ave das permanencias e hibridas:oes culturais ocorridas em tantos seculos de historia, entre 0 desembarque e exp1oras:ao dos pretos ainda escravos na America Portuguesa, quanto os nossos tempos de democracia na contemporaneidade. Muito do que concebemos hoje como arte afrobrasileiraJ, ou compreendemos como influencias negras na culrura nacional, advem das org anizas:oes comunitarias relig iosas, onde aspectos culturais tradicionais das etnias africanas poderiam ser cultivados sem a coas:ao branca. Isso nao pressupoe, contudo, que nao existiram e existam hibridas:oes dos dois lados, do bordado de richelieu usado pelas m aes pretas, aos santos gemeos Cosme e Damiao, que no Brasil tiveram sua iconog rafia infantilizada4 . A s trocas entre negros e brancos se deram de forma conflituosa, config urando diversos aspectos d a cultura que hoje intitulamos brasileira. Nesse processo de troca e resistencia, aroda permaneceu em contraste com a estrutura verticalmente hierarquizada presente ate hoje na config uras:ao espacial de ig rejas e salas de aulas. 2. "0 axe pode ser ddinido como for<;:a viral, invisivd, magica, sagrada, que todo
ser, coisa viva e principalmente 0 ori xa possui. Axe e energia e, sendo assim, as for<;:as da natureza sao axr (A l\1A RA L , 2005, p.b8); "Axe e a for<;:a magico -sagrada, a energi a que tlui entre wdos os seres, todos os componentes da natu reza C..) Os riws objetivam adquirir, manter, rransferir e aumentar a for<;:a. Pode-se dizer que a essencia dos rituais e precisamente a fixa<;:ao e desenvolvimento do axr (AUG R AS, 2008, p.64); 0 axe e "uma for<;:a vir al e permanentemente perpassada, seja nos exemplos da cultura material, na musica, na dan<;:a, no canto, no gesto, na prepara<;:ao dos alimentos. A produ<;:ao cultural realiza um a eficaz alian<;:a entre os pianos sagrado e humano" (L O D Y,198 7, p. 9). 0
3. T itulo do livro de Roberto C o nduru (2007), "Arte afrobrasileira" e conceituada por esse autor segundo escri tos de Mari a H dena L euba Salum como: '~alquer manifesra<;:ao pUstica e visual que retome, de urn lado, a estetica e a rdigiosidade africanas rradicionais e, de outro, os cemirios socioculturais do negro no Brasil" (S AL UM apud CONDU RU, 2007, p.ll). Es te autor dedica urn capitulo do seu livro para tratar da estetica afrordigiosa e suas interferenci as no que de denomina ane afrobrasileira.
4. Sobre essas trocas culturais que figuram na estetica e imagens da ane brasileira, vcr CONDURU, Rober" to. Art.. afrobrali"'ira. Bdo H orizonte: C/A ne, 2007.
5. Sabre
0
processo ensino-aprendizagem nos tcrreiros de rdigiao afrobrasi lcira Monique A ugras (2 008,
Dos tambore~ da Macumha an Samba
I 67
Um Livro mhrc
0
Samba
Para alem da roda, soma-se a festa. A festa, sinonimo de candomble e calundu 6 ,sintetiza a alegria unica que e ter 0 Orixa, urn deus, em sua casa, e receber dele a energia cobic;ada. Se 0 axe e a energia vital que erg ue e move ancestrais, homens e natureza, a festa e, portanto, 0 exato momento da colheita de axe, onde a energia primaz transborda os corpos e espac;os, e os deuses podem enta~ tomar em comunhao os corpos dos iniciados, sendo a festa 0 riro que revive 0 mito, diviniza orixas e seus filhos homens. Mas outras coisas ocorrem nessa festa: para alem de todos os sentidos religiosos, ela e a expressao estetica da cultura deste grupo, a vitrine de seu culto a comun idade em volta do terreiro, alem de ser urn espac;o de sociabilidade e lazer. Em resumo, culto, festa e roda se completam em intimo encaixe. Rita Amaral (2005) assim conceitua e discorre sobre a festa no contexto religioso:
E na
festa que os orix:is vern
a terra, no corpo de suas filh as,
com a finalidade de danp r, de brincar no xire, termo que em Ioruba significa exatamente isto: brincar, dan~ar, divertir-se.
E atraves
dos gesros, sutis ou vigorosos, dos ritmos eferves-
centes ou cadenciados, das cantigas que "falam" das a~oes e dos atributos dos orix:is, que
0
mito e revivido, que
0
orix:i e
vivido, como a soma das cores, brilhos, ritmos, cheiros, movimentos, gostos. A vida dos orix:is e 0 principal tema (e a vinda dos orix:is e 0 principal motivo) d a festa. Os deuses incorporam seus eleitos e da n~am majestosamente: usam roupas brilhantes, ricas, coroas e cetros, espadas e espelhos; sao os personagens principais do drama religioso. (AMARAL, 2005, p.4S).
Seriam as demais rodas e festejos negros tambem elementos de culto? Para uma comunidade onde 0 sentido religioso esta em torno da energia que toma homens e seres inanimados em regozijo, as festas e rodas, com ou sem a comunhao p.66) descreve: "A transmissao do saber iniciatico faz-se por meio do camo, dos gestos, da dan~a, da percussao dos instrumemos, do ritmo, da emona~ao de certas palavras, da em~ao que 0 som exprime". 6. Rita Amaral cita a afirma~ao de Nina Rodrigues: 'Chamam-se Candombles as grandes festas publicas do culto iorubano, qualquer que seja sua causa" (RODR IGUES apud AMARA L , 2005, p.29); Sobre 0 calundu, podemos afirmar que seria 0 sinonimo bantu da palavra nago "candomble". Visto que as primeiras comunidades africanas escravizadas na America portuguesa foram as Bantas da Africa Cemro-Ocidemal, este termo designava religiao e festas negras no periodo colonial. Com a maior inse~ao de negros nag6s a partir do seculo X IX na Bahia, come~a-se a presenciar 0 uso do termo CandombIe. Para isso, ver: SILVEIRA, Renato da. ~ Do calundu ao candombIe". In: FIGUE IREDO, L uciano. RaiUf ajri{anm. Rio de Janeiro: Sabin, 2009.
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I Do~ tambores da Macumba ao Samba
Matheus Costa
sagrada entre os deuses e seus filhos, rransformam-se em engrenagens de troca de axe, verdadeiros momentos de solidariedade e uniao dos corpos, espiritos e sorrisos.
Nao e, todavia Exu, 0 unico intermediario entre os homens e os deuses. Os tft!S tambores do candombIe tambem 0 sao: "Rum", que e 0 maior; 0 "Rumpi", de tamanho medio; e
o
o "Le", que e 0 menor. Nao sao tambores comuns ou, como se diz ali, tambores "pagaos"; foram batizados na presen\a de padrinho e madrinha, fo ram aspergidos por a.gua benta trazida da igreja, receberam urn nome, e 0 cirio aceso diante deles consumiu-se ate 0 fim . (...). Compreende-se por que razao os instrumentos apresentam algo de divino, que impede que sejam vendidos ou emprestados sem cerimonias especiais de dessacraliza\ao ou de consagra\ao, interessando-nos saber que somente por meio de musicas fazem baixar os deuses nas carnes dos fieis (BASTIDE. 2001, p.34). No contexto fes tivo das cerim6nias afroreligiosas pressup6e-se a participas:ao essencial do componente musical. Neste sentido, instrumentos, m usicos e as cans:oes sao tambem sacralizados. Cada toque efetivado, cad a ritmo, estara dedicado a uma divindade, ou a urn momento preciso no culto, determinando assim a dans:a, os gestos e os movimentos empregados. Os membros dessas religioes com preendem os codigos musicais, identifica ndo, por exernplo, que Orixa esta. sendo ch arnado e louvado atraves do som que esta. sendo entoado. Os tam bores, nesta perspectiva, sao vistos como seres vivos, sao iniciados no culto como qualquer ser hum ano em nome de algum O rixa, sao alimentados para refors:ar 0 seu axe, e em dias de Festa sao vestidos com urn pano em feitio de ech arpe chamado oji, nas cores do seu orixi patrono. Visitantes, fi lhos de santo e as proprias d ivindades, sernpre saudam primeiro os tambores sagrados. SacraIizados, os atabaques sao os responsaveis por trazer 0 Orixi a terra, ate a cabes:a do iniciado a de dedicado. D esta forma, ao lado de Exu, que e O rixa mensageiro e principio ativo da t ransforrnas:ao, comu nicas:ao e rnovimento, a musica exerce a funs:ao de condutor do axe. A musica sagrada torna-se assim u rn dos inst ru mentos basicos para a
Dos tamborc~ da Macumha an Samba
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Um Livro mhrc
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Samba
realiza<;ao da fe sta , tornando-se mais que trilha sonora do espetaculo ritualistico, pois que determina
0
sucesso desta e m seu objetivo principal.
D e modo geral, sao rocados tres d nticos para que cada Orixi des<;a ao terreiro. Caso nenhum deles se manifeste no espa<;o de rempo a eles designados, executa-se urn toque conhecido por adarrum, sendo este violento e ripido, que faz com que todas as divindades baixem de uma unica vez. L uis Felipe de Lima (2007) completa
0
retrato tra<;ado ate entao sobre a importancia da musicalidade
para a pritica afroreligiosa: Com a musica, a povo de santo invoca e festeja suas divindades, louva as fon;:as da natureza, reza por seus mortos, inicia seus sacerdotes, manipula ervas sagradas, ajuda a curar doentes do corpo e do espirito. E muito mais. A musica, nessa perspectiva religiosa, e elemento-chave na intermedia<;ao com
0
sagrado. A
palavra revestida de som musical ganha 0 que em alguns ramos da tradir.;ao se diz par axe, poder espiritual, principio de ar.;ao e transformar.;ao. Exemplo dessa importancia sao os atabaques, sacralizados em muitas casas de culto por meio de pr:iticas analogas aos rituais de iniciar.;ao (LIMA, 2007, p.35). Cada orixi tambem detern urn ritmo especifico, e durante sica di
0
0
transe a rnu-
tom e a intensidade a dinamiza<;ao do mito refercnte aquela divindade,
proporcionando [a] atmosfera adequada ao carater mais au menos vibrante de cada odxa. Os orixas expressam suas caracteristicas atraves dos dtmos particulares, cdando urn momenta musical em que elas se tornam inteligiveis e plenas de sentido religioso. A sincronia entre danr.;a, cores e dtmo e tao perfeita que e possive! entender o odxa como esse conjunto de cor, dtmo e movimento (AMA-
RAL , 2005, p.54). Para alern,
0
batuque ritual enfatiza a identidade do grupo e expoe as hie-
rarquias presenres no culto: se cada tcrreiro afroreligioso segue uma tradi<;ao diferente, as forma s e maneiras de tocar tambern sao distinras, e os conhecedores
70
I Do~ tamborcs da Macumba ao Samba
Matheus Costa
das tradis:6es religiosas entendem que se 0 terreiro toea os atabaques com aguidav is (ou varetas), canta em ioruba, com 0 ritmo de quetu, esse terreiro pode ser identificado como de candombIe nas:ao Nag6; se os tambores sao tocados a mao, em cantos bantos e ritmo de Angola, este terreiro pode ser reconhecido como de Angola-Congo; e quando urn iniciado bate 0 pa6, ou seja, palmas ritmadas com que se reverenciam as divindades, ou quando se utiliza do mesmo ato para reverenciar aos mais velhos na casa, denotam-se as hierarqu ias da comunidade1. Nao sao apenas os atabaques sagrados os unicos instrumentos utilizados neste contexto. Sao tam bern os agogos, xequeres ou agues, e adjos. E stes ultimos sao sinetas portadas apenas pelos membros mais velhos no terreiro, e quando ha a dificuld ade da tom ada do Orixa no seu filho humane em transe, sao tocados proximos aos ouvidos deste, chamando a divindade ao xire. O s outros dois instrumentos mencionados sao utilizados em toques a determinados deuses, e em ritmos diversos, de acordo com suas especificidades. O s responsaveis pelas musicas sao os alabis, ou seja, ogas8 iniciados para a execus:ao musical. Como a musica e imprescindivel para realizas:ao da cerimonia, eles tambem 0 sao. Urn terreiro recem-fundado, com poucos filhos-de-santo e que nao tenha nenhum a/abe, devera contar com a disposis:ao de urn alabe convidado, ou devera contratar algum. Sem musica nao h a fe sta, e candomble nao e candomble sem esta.
Eo rambor continuava soando seu rirmo irresistivel. (PRANDI , 2008, p.376). A musicalidade afroreligiosa esta presente nao apenas nos cuItos, como na propria rede de mitos africanos conhecidos e repassados aos jovens; esses mitos conservam muito do modo de vida tradicional de determinadas etnias. Reginaldo Prandi (2008), em monumental obra, lista 301 mitos colhidos por ele e demais â&#x20AC;˘ antropologos ao longo de suas carreiras no Brasil, Africa e Caribe. Cito em analise dois destes, onde se salientam os poderes magicos dos instrumentos musicais. 7. Para mais ver: AUGRAS, Monique. 0 duplo ~ a mrtamorjoJr: a identidade mistica em comunidades Nago. Petr6polis: Vozes, 2008. p.73. 8. Oga e urn cargo concedido apenas a nomens, e como transe, atuando como auxiliar durante 0 rito.
0
cargo feminino de Ekede,
0
oga nao entra em
Dos tamborc~ da Macumha an Samba
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Em "Oia toca 0 fole de Ogum para os egunguns dans:arem" (PRANDI, 2008), Oia, Orixa feminino responsavel por tempestades e raios, mais conhecida por !ansa, e sincretizada no Brasil com Santa Barbara, detem 0 governo do mundo dos mortos, os egunguns. Neste mire fica clara a ligas:ao dela com os ancestrais mortos a partir do momento em que ela toca fole s que os enfeitis:am. Enquanto Ogum trabalhava na forja fabricando os utensilios de metal, Oia, sua esposa, 0 auxiliava com 0 fole, soprando as chamas. No dia da fe sta aos antepassados, os egunguns, chamados de volta ao convivio dos seus entes vivos, caminhavam pelas ruas. 0 fole de Oia emitia alto som em batidas ritmicas que conquistaram os egunguns que passavam em frente a oficina do nobre ferreiro. Os egunguns de tudo esqueceram, entregando-se a de Oia. Entao, ela passou a ser conhecida como a " Mulher-que-Domina-o-Egungum-com-o-Som-do-Fole". Ogum, orgulhoso de sua esposa, tira sua coroa da cabes:a e the presenteia com a honraria, e assim Oia pode dans:ar junto aos egunguns.
o segundo mito que trata particularmente do poder magico da musica, tambem trata da morte. Em "Os lbejis enganam a Morte" (PRANDI, 2008), os Orixas gemeos e infantis sincretizados no Brasil a Sao Cosme e Sao Damiao utilizam tambores para enfeitis:ar e vencer leu. leu nao e urn orixa, pois nao detem axe, mas e uma fors:a de vida, porque e a propria morte. E surge diversas vezes, sempre invencivel em mitos dos varios Orixas, sendo apenas neste mito, derrotada justamente pelas divindades infantis, que levavam consigo tambores. Vimos anteriormente que os tambores na tradis:ao afroreligiosa sao portadores de inimaginavcl fors:a no culto, responsaveis pela condus:ao do axe, e por guiar os Orixas a terra. E e este 0 unico poder, recheado de energ ia vital, capaz de enganar l cu, a morte. Filhos de Oxum e Xango, lbejis viviam para se divertir tocando tambores magicos que receberam de lemanja. 09ando leu coloca diversas armadilhas nos caminhos, os humanos que por ali passavam caiam e eram devorados por ela. D esta forma, Icu matava antes do tempo, e ninguem dos que lutaram contra ela conseguiu vence-Ia. Os gemeos esquematizaram urn plano para derrota-Ia: urn seguiria pdo caminho perigoso, onde estavam as armadilhas tocando 0 magico tambor, e outro fi caria escondido atras das arvores. A morte, acompanhando 0 pequeno alabe, ficou maravilhada com a musica e passou a segui-Io, dans:ando sem parar, enfeitis:ada pelo que ouvia. 0 pequeno entao the propoe urn pac to: 0 primeiro que cansasse perderia para
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I Dm tamborcs da Macumba ao Samba
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outro. Deste modo, ambos seguiam , urn
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tocando e outro dans:ando, s6 que como eram gemeos, quando 0 pequeno cansava de tocar, trocava de lugar com 0 irmao sem a morte perceber. leu , mesmo cansada, nao conseguia parar de dans:ar e se surpreendera com a d isposis:ao do menino. A morte, ja esgotada, suplica uma pausa ao garoto, e de lhe diz que a musica cessaria se a morte retirasse todas as armadilhas. l eu se rende , e e derrotada pelas duas crians:as que brincavam de tocar seu instrumento. Nos dois mitos, recheados peIo simbolismo que cerca a musica, os O rixas, Oia e Ibejis, conquistam respectivamente os monos e a propria morte, com aquilo que caracteriza a vida nessa sociedade: a musica. E sses mitos, passados de geras:ao em geras:ao por comunicas:ao oral, exercem profu ndo sentido na caracterizas:ao da importancia da musica no ritual, como eIemento magico, condutor de energias, instrumento de transformas:ao.
Na verdade, tal como 0 exame mais atento das raras informa<;6es sobre essas ruidosas reuni6es de africanos e seus descendentes crioulos deixa antever, 0 que os portugueses chamaram sempre genericamente de batuques nao configurava urn baile ou folguedo, em si, mas uma diversidade de pniticas religiosas, dan<;as rituais e formas de lazer.
C..) E
foi assim que, com
0
paralelo
crescimento da participa<;ao de brancos e mulatos das camadas baixas das cidades e vilas nesses "batuques de negros", come<;aram a surgir adapta<;Oes provocadas pelo casamento da percussao, da coreografia e do canto responsorial africano-crioulo com estilos de dan<;as, formas mel6dicas e novo inst rumental (principalmente a viola), introduzidos pelos herdeiros nativos da cultura europeia. (...) Toda a hist6ria das musicas e dan<;as que comp6e
0
vasto painel de cria<;6es populares sO pode ser estuda-
da a partir da realidade dessa mistura de influencia crioulo-africanas e branco-europeias (TI N H ORAO, 2008, p. 55-56).
Entre relatos e iconografias pouco se sabe do nosso passado musical colonial, muito menos se conhece da participa~ao dos negros na musica desse periodo. Jose Ramos Tinhorao (2008) exp6e-nos alg uns dados a respeito desse longinquo passado. Em teIas holandesas de Franz Post e Zach arias Wagener
Dos tamhorc~ da
Macumha ao Samba I 73
Um Livro mhrc
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Samba
pintadas durante a ocupas:ao neerla ndesa em Pernambuco, os pretos foram retratados em sua atividade musical, fe stiva, religiosa. Outros relatos referiamse sempre aos barulhos e movimentos realizados pelos "preros barbaros", que nas noites reuniam-se em volta de seus calundus9 â&#x20AC;˘ Estes festejos relig iosos negros foram duramente reprimidos pelas autoridades coloniais em varios relatos expressos pelo autor. Em suma, a sociedade colonial, cat6lica, nao via com bons olhos os tradicionais batuques realizados pelos escravos, que passaram a atrair adeptos brancos e mesti<;os a esses fe stejos. D estes batuques caracteristicos e da sua consequente hibrida<;ao com costumes europeus, surgem generos como 0 Lundu, a Fofa, 0 Fado. E stes ultimos, realizados nos sal6es, foram permitidos; os batuques afroreligiosos, tocados as escondidas, repreendidos. No Brasil, a dan<;a que mais se desenvolveu foi 0 lundu. Nesta, conservou-se muito das tradis:6es coreogcificas e musicais africanas, como a umbigada, os versos improvisados em resposta a estribilhos fixos e 0 acompanhamento das palmas. E ste ritmo profano desenvolveu-se entre as camadas pobres da sociedade, em sua maioria negra e mestis:a, onde as tematicas das letras remetiam sempre a sensualidade e ao sadismo existente na rela<;ao afetiva e conflituosa entre a sinha e 0 negro escravo. Neste campo, ordens e valores eram trocados, e as letras revelam muito das rela<;6es sociais entre escravos e suas senhoras nos seculos XVIII e XIXIO. Aos poucos, este ritmo de pretos foi adaptado aos sal6es da aristocracia, ao serem incorporados a ele alguns elementos do fandango, alem da introdu<;ao da viola. Do sag rado e fe stivo calundu, 0 lundu tornou-se expressao de lazer profano aos g rupos negros, e com a constante participas:ao de brancos e mesti<;os, adquirindo ares europeus, tomando sal6es e teatros, e chegando a Portugal com Domingos Caldas Barbosa, no ultimo quartel do seculo XVIII. samba teve trajet6ria semelhante. Relacionado aos batuques de cunho relig ioso, estava vinculado ao passo da umbigada, e despontou com enorme sucesso
o
no seculo XX, tornando-se
0
ritmo representante da nacionalidade brasileira:
9. Segundo an:ilise de T inhorao (2008, p. 42) sobre poemas satfricos de Gregorio de M atos durante 0 setecentos, j:i se admiti a 0 sinonimo Lundus a palavra Calundul. Essas duas palavras referiam-se ao encontro rcligioso e festivo dos Negros na America Portuguesa. 0 Lundu, genero music al que su rge na mesma e poca, nao carrega 0 sentido rdigioso expresso nas palavras aci ma, sendo um estilo pertencente mais aos brancos e mulatos em seus salOes de bailes e teatms, que aos negros, em suas lascivas fes tas noturn as ao ar livre. 10. Para conhecer mais sobre a tem:itica s:idico-sexual do L undu, ver: V I RG IN IA DE A L M EIDA, Tereza. "No balan~o malicioso do L undu". In: FIG U EIREDO, L uciano (Org). Fulm ~ hatu'luu no Bralil. R io de Janeiro: Sabin, 2009.
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I Do~ tamborc~ da
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Se a palavra Lundu tern sua origem no calundu, dan<;a ritual afric ana que aportou no Brasil na epoca colonial, estritamente relacionada aos batuques dos negros, a mesmo ocorre com a samba . A palavra samba nao aparece apenas no Brasil , mas em outras regioes da America, sempre relacionada aos rituais negros, e tern como origem a termo umbo, que significaria umbigada, gesto coreogrifico presente nas dan<;as afrobrasileiras . A ssim, Lundu, Coco e Samba apresentam caracteristicas bastante semelhantes: a disposi<;ao em roda dos participantes, que batem palmas enquanto uma pessoa dan<;a no centro ate que escolhe, com a movimento da umbigada, urn par do sexo oposto, que passa a ocupar a centro da roda. Enquanto isso, a dan ~a e acompanhada pelo canto de urn solista, respond ida pelo restante do grupo par meio de urn refrio (VIRGIN IA DE
ALMEIDA, 2009, p.48-49). Porem , os batuques de samba do seculo XIX conservavam uma caracteristica rural distinta da que observamos no samba surg ido com as gravas:oes fonograficas das primeiras decadas do XXll . Enquanto
0
lundu era a expressao
musical urbana, Tinhorao (2008) afirma que as ritmos de samba eram as principais expressoes mu sicais do mundo rural, tao atrasado em conceitos d e civilidade que sua populas:ao s6 encontrava diversao nos batuques e umbigadas africa nas. A ssim,
0
samba conservou algo que 0 lundu h avia p erdido em meio aos teatros e
bailes, simbolos da modernidade na qu al a classe media estava submersa. A capital da Republica atraia mig rantes d e todas as partes do Brasil, inclusive neg ros no p6s-abolis:ao. Baianos, mineiros e flumine nses do interior e ng rossaram
0
caldo da ja fe stiva negra cidade, incluindo diversas manifestas:6es
interioranas, como
0
jongo,
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caxambu e
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samba. Nos hairros mais carentes,
verdadeiras comunidades neg ras surgiram, trazendo consigo tradis:oes relig iosas 11. Vale ressalrar que no perimerro urbano da capiral do Imperio c Republica, 0 principal esrilo musical era 0 lundu, are que c hegassem os sucessos de samba. Comprova-o 0 faro de a primcira grava'tao brasileira rer sido um lundu, ~Isro e bam", de aUforia de Xisro Bahia e imerprerado por Baiano, em 1902. Esse ri rmo, que j:i rinha eJl:ercido grande imporr:incia no T earro de Rcvisra no serulo X IX era, ii epoca da primeira gravar;ao, arra'tao dos circos da capiral, onde arrisras e palha'tos como Eduardo das Neves, 0 ~crioulo Dud u" faziam enonne sucesso. Para ronheccr mais sabre E duardo das Neves, ver: ABREU, Martha. ¡0 crioulo Dudu": participa'tao polirica e idcnridadc negra nas hisr6rias de urn musico camor (1890 -1920)". IN: T OPOL Vol. 11, n. 20.
Dos tambore~ da Macumha an Samba
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que muito influenciaram na vivencia dessses negros em solidaria, mas nao menos conflituosa comunidade. Roberto Moura (1995) e Manica Pimenta Velloso (1990), em dois importantes trabalhos da historiografia carioca, contemplam a figura das Tias Baianas, maes de santo ligadas aos antigos e trad icionais terreiros da Bahia, que no Rio de Janeiro estabeleceram suas casas de culto, e congregavam alem das festas dedicadas as divindades, as manifesta<;6es musicais profanas deste grupo, como era o caso do samba. Os baianos, como aqueles que migraram das antigas zonas de cultivo de cafe no Vale do Paraiba, vao contribuir para a afirma<;ao do candomble na cidade do Rio de Janeiro, atraves da funda<;ao de terreiros de rito Naga. Nestes terreiros, alabis e musicos eram formado s, e neles tambem estavam livres para tocar aquilo que bern quisessem, sem ficar as vistas da sociedade burguesa, que na B elle ÂŁpoque buscava se afrancesar. Do espa<;o do terreiro despontaram artistas como Pixinguinha, Donga, Joao da Baiana, H eiror dos Prazeres, Sinha, entre mu iros outros que, com a ascensao do samba nas decadas de 1920 e 1930, e 0 consequente crescimento das agremia<;oes carnavalescas destes no mesmo periodo, marcaram de preto 0 cenario musical brasileiro.
Ao se tratar das manifesta<;oes africanas no Brasil, a musicalidade com vies religioso explicito merece destaque. Nao apenas ela exerceu influencia no cenario musico-festivo das composi<;6es profanas, como tam bern a cultura negra agiu de forma singular na configu ra<;ao do statu s musical atual. Dos ritmos sincopados trazidos pelos escravos, emergiram diversas manifesta<;oes musicais: 0 Lundu, 0 Afoxe, 0 Samba. Todas elas conservam, na medida do possivel, suas caracteristicas coreograficas e iconograficas. xiri, hoje, nao se contenta com
o
0
terreiro do candomble, mas alcan<;a as
radios, as mfdias digitais. Presente nas musicas e nas letras, 0 legado afroreligioso brasileiro deixou como heran<;a, alem da nobre rraj etoria, muitos grandes artistas que hoje compoem 0 imaginario musical nacional. Carreiras como as de Ernesto Nazareth, Pixinguinha, Sinha, ate os mais recentes Maria Bethania, Gilberto G il, C lara Nunes e Rita Ribeiro, apenas para citar alguns, foram moldadas a partir de fortes influencias negras em suas forma<;6es musicais. E sses composi-
76 r Om tamhorcs da Macumba ao Samba
Matheus Costa
tores, arranjadores e interpretes salientaram em sua obra a fig ura do negro e sua musica, destacad amente a de cunho religioso, criando assim, em resposta , certa identidade entre 0 povo de santo e suas obras. D ecerro, muitos musicos, dentre eles encontram-se os sambistas, com partilham 0 mesmo ethos com membros d as manifes ta~6es relig iosas negras no Brasil (cf. AMARAL, 2005 e AUGRAS, 1998). Podemos enta~ pensar as rodas de samba e candomble como uma sendo a continua~ao da outra, onde os sagrados atabaques foram substituidos por diversos outros instrumentos de percussao: No candombIe, de fata, h:i muita diversao nas festas. AIem das danr;as dos orix:is, verdadeiro "espet:iculo" de muska, dan~ a e figurino, h:i tambem as rodas de samba depois do ajeun, quando sao servidas aos presentes as comidas "de santo" enquanto se conversa, flerta, contam-se piadas, danpm-se sambas, namora-se e mesmo se conseguem favores dos assistentes (AMAR A L , 2005, p.55 ). (...) J:i tive a oportunidade de presenciar, em v:irios terreiros da baixada fluminense, fu ndados por maes de santo baianas, a realizar;ao de rodas animadas: primeiro a obrigar;ao, a festa do orix:i, e depois de urn sono reparador e de uma refeir;ao nao menos restauradora, d ireito a umbigada, e ate
0
samba-de-roda! Com
a participar;ao das
mais antigas d a
em (AUGRAS, 1998, p.I7-18).
Fica clara a tao importante participa~ ao da relig iosidade negra na conform a~ao da identidade musical brasileira, ao mesmo tempo em que esta ultima reflete no convivio religioso momentos de lazer e alegria. Sendo 0 Candomble uma religiao em que 0 individuo bu sca 0 axe, energia de troca em comunidade, 0 samba, como a musica em geral, desenvolve papel central neste jogo de cambio. Sendo aroda sagrada ou profan a, com ou scm a par ticipa~ao d ireta dos Orixas, 0 principio relig ioso se mantem 0 mcsmo, onde a vida flore sce a cada verso, renasce a cada palma e transborda a cada umbigada.
Dos lam bores da Macomba ao Samba
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"""" samba e tocado basicamente por instrumentos de percussao e acompa,
nhado por instru mentos de corda. Em vertentes como 0 samba-exalta./ s:ao e 0 samba-de-gafieira, foram acrescentados instrumentos de sopro.
o cavaquinho (pai de outros modelos como a braguinha, braga, machete, machetinho ou machete-de-braga) e um instrumento da familia dos cordofones orig inario do Minho, norte de Portugal, que mais tarde foi amplamente introduzido na cultura popular de Braga pelos nobres Biscainhos e de onde foi depois levado para outras paragens como Brasil, Cabo Verde, Mos:ambique, H awaii e Madeira. Com 12 trastos na forma original 0 cavaquinho tem uma afin as:ao propria da cidade de Braga que e re-Ia-si-mi. No entanto, as suas quatro cordas de tripa ou de metal, sao tambem afinadas em re-si-sol-sol, mi-do#-Ia-Ia, mi-re-si-sol, no Brasil como re-si-sol-re ou, mais raramente, em mi-si-sol-re conforme 0 pais onde e utilizado e de acordo com os costumes etnograficos de cad a regiao portuguesa. Julio Pereira, um dos musicos portugueses mais renomados da atu alidade, tern ajudado na divulgas:ao do cavaquinho como instrumento pleno de versatilid ade e que tern dado frutos.
In~trumcntos
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Um Livro mhrc
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Samba
As ilhas do Hawaii tern urn instrumento baseado no cavaquinho chamado ukulele, tambem com quatro cord as e um Formato seme1hante ao do cavaquinho, que se julga ser uma alteras:ao do cavaquinho, levado por emigrantes portugue ses em 1879.
A guitarra cla.ssica (conhecida no Brasil como violao e, em Portugal, como viola) e uma guitarra acustica com cordas de nylon ou as:o, concebida inicialmente para a interpretas:ao de pes:as de musica erudita. 0 corpo e oco e chato, em forma de oito, e feito de varias madeiras diferentes. 0 bras:o possui trastes que a tornam um instrumento temperado. As versoes mais comuns possuem seis cordas de nylon, mas ha violoes com outras configuras:oes, como 0 violao de sete cord as e 0 violao baixo, com 4 cordas, afinadas uma oitava abaixo das 4 cordas mais g raves do violao/viola.
Pandeiro e 0 nome dado a alguns instrumentos musicais de percussao que consistem numa pe1e esticada numa armas:ao (aro) estreita, que nao chega a constituir uma caixa de ressonancia. Sao geralmente circulares (por exemplo, na pandeireta), mas podem ter outros formatos (por exemplo, quadrangular no adufe). Enfiadas em intervalos ao redor do aro, podem ex:istir platine1as (soalhas) duplas de metal, ou nao (por exemplo, no tamborim). Pode ser brandido para produzir som continuo de entrechoque, ou percutido com a palma da mao e os dedos. No Brasil, a palavra "pandeiro" veio a designar um pandeiro especifico, de dimensoes que variam de 8 a 12", muito usado no samba e no pagode, mas nao se limitando a esses ritmos, sendo encontrado no baiao, coco, maracatu, entre outros, e por isso, considerado por alg uns 0 instrumento nacional do Brasil.
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o
surdo e urn tambor cilindrico de grandes
dimensoes e som profundamente grave. 0 surdo e tipicamente feito de madeira ou metal e possui peles em ambos os lados. E ste tipo de tambor baixo e tradicionalmente usado em escolas de samba, cada escola tendo em media de 25 a 35 unidades na sua bateria. T ambem e encontrado em torcidas organizadas aonde des ditam 0 ritmo e sao considerados 0 "corac;ao" da torcida. Sua func;ao principal no samba e a marcac;ao do tempo. Surdos tambem podem ser encontrados em bandas marciais ou militares e geralmente sao utilizados para marcar 0 pulso binario da marcha, em conjunto com 0 bumbo e a caixa.
o nome surdo pode designar tambem 0 tom-tom mais grave de uma bateria, 0 floor tom , que geralmente fica apoiado sobre pes pr6prios, ao lado direito do baterista (no caso de bateristas d estros)
TaiOOm Tamborim e urn instrumento de percussao do tipo membranofone, constituido de uma membrana esticada, em uma de suas extremidades, sobre uma armac;ao, sem caixa de ressonancia, normalmente confeccionada em metal, acrilico ou PVC (policloreto de vinila). No Brasil, c comumente utilizado nos ritmos de origem africana, como a batucada, 0 sa mba e 0 cucumbi. 0 instrumentista 0 segura com uma das m aos e 0 percute (golpeia) com uma ou mais baquetas, normalmente de plastico, medindo aproximadamente 15 cm de altura.
TartO
o tanta e urn instrumento de percussao, que consiste de urn tipo de tambor de Formato cilindrico ou afunilado (tipo atabaque), com 0 fuste em madeira ou aluminio. Possui uma pe1e animal ou de policster (sintetica) em apenas uma das suas extremidades. Seu diametro pode variar, os mais usados sao de 12", tambem chamado de rebolo, tanta de
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Samba
corte ou tantanzinho e 0 de 14" que possui urn som mais grave como
do surdo. E ste instrumento e de marcac;ao, e e tocado com as maos para tocar samba e 0
outros ritmos caracteristicos da mesma origem. Foi criado por Sereno, sambista do R io de Ja neiro, integrante e um dos fund adores do g rupo de pagode Fu ndo de O!tintaL Foi introduzido no samba para substitu ir 0 surdo de marcac;ao nas rodas de samba do C acique de Ramos, no tim da decad a de 1970.
Um bandolim e urn instrumento musical da fam ilia dos cordofones. 0 bandolim possu i cordoamento duplo, possuindo assim quatro pares de cord as, atinadas da mesma forma que 0 violino: Sol, Re, La, Mi. 0 bandolim rem forma de pera, podendo ter as costas abauladas ou rectas. A s origens do bandolim remontam a Italia do seculo XVI, e ligam-no ao alaude.
Urn banjo e instrumento de corda da familia do alaude, de corpo circular, com uma abertura fe chada circu lar na parte superior. Consta de uma armac;ao circular, atualmente produzida em PVC, sobre 0 qual se retesa uma pe1e (antigamente pregada, hoje presa por urn mecanisme de cola sintetica), urn brac;o longo e fi no, com trastes e cordas metalicas ou de tripa retorcida. Baseado em varios instrumentos africanos, como chocalho foi desenvolvido no M exico pe10s escravos e adotado por grupos ambulantes de musicos brancos, no seculo XIX . E muito usado na musica folk estadunidense e pe10s g rupos de bluegrass. I ncorporado as rodas d e samba em meados da decada de 70, quando 0 musico e interprete Almir Guineto adotou uma ideia de seu parceiro musical e humorista, Mussum, adaptando 0 corpo do instrumento estadunidense ao brac;o do cavaquinho. A ssim, percebeu que, alcm da qualidade do som , a armac;ao reforc;ada do banjo reduzia os riscos de rompimento de cordas.
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a banjo passou a
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ser utilizado com apenas 4 - utilizando 0 mesmo nlimero de trastes e a afina<;ao do cavaquinho, mas com a peculiaridade da batida diferenciada - ou 6 cordas
o repinique (tambem chamado d e repique) e urn tambor pequeno com peles em ambos os lados, tocado com uma baqueta em uma das maos enquanto a outra mao toca diretamente sobre a pele. Criado pelas escolas de samba para repinicar urn som mais
"deixas" para
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agudo, serve, frequ entemente, como uma especie de condutor musical das escolas de samba, anunciando grupo. Ele e, tambem, destacado como instrumento solista , as
vezes tocando introdu<;6es para sambas ou solando em batucadas. Tambem tocado junto com os tamborins em ritmo galopado.
e
Em alguns generos musicais baianos, ha, ainda, a presen<;a do repinique de 8 polegadas, a bacurinha, idealizada por Carlinhos Brown, que e tocada com duas baquetas de nylon. 0 som da bacurinha e bastante agudo e seu trabalho e limitado, geralmente aparecendo em "rulos", embora tambem possa ser tocado durante toda a mlisica (dependendo do genero - especialmente no samba-duro/pagodao).
â&#x20AC;˘ A cuica ou pUlta (em Angola pwita) e urn
instrumento musical, semelhante a urn tambor, com uma haste de madeira presa no centro da membrana de couro, peIo lado interno. 0 som e obtido friccionando a haste com urn peda<;o de tecido molhado e pressionando a parte externa da cuica com dedo, produzindo urn som de ronco caracteristico. Qyanto mais perro do centro da cuica mais agudo sera 0 som produzido. Seu uso e muito difundido na mlisica popular brasileira. Por volta de 1930, passou a fazer parte das baterias das escolas de samba. D epois de integrada no arsenal percussivo brasileiro, a cuica foi tradicionalmente usada por escolas de samba no carnaval e grupos de congo capixaba,
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mas atualmente e tam bern encontrada no jazz contemporaneo e em estilos de fu nk, disco music e ritmos latinos, como a salsa.
TKJIIIO€!e •
E urn instrumento musical d e sopro, da familia das percuss6es,dos metais (0 trompete e 0 que produz 0 som mais agudo da familia), caracterizado por instrumentos de bocal, geralmente fabricados de metal. E tam bern conhecido como pistao (pistom, por metonimia). Constituido por corpo, chave de agua, bomba de afinaC;ao, pist6es, cotovelos • e bocal, e terminado em pavilhao. E utilizado em diversos generos musicais, muito comumente encontrado na musica classica, no jazz, bandas marciais e nos mariachis.
o agogo, tambem conhecido como ga, e urn instrumento musical formado por urn unico ou multiplos sinos originado da musica tradicional yo• ruba d a Africa O cidental. 0 agogo pode ser 0 instrumento mais antigo do samba.
Atabaque e urn instrumento musical de percussao afro-brasileiro. 0 nome se originou do termo arabe al-Tahaq, que significa "prato". Constitui-se de urn tambor cilindrico ou ligeiramente conico, com uma das bocas coberta de couro de boi, veado ou booe. Podem haver tres sistemas principais d e tensionamento do couro: por cordas e cunhas, por ferra gens (a semelhanc;a das congas cubanas) ou por birro (a semelhanc;a do Sabar senegales, do Kpanlogo ganes, entre outros tipos de tambores africanos) . • E tocado com as maos, com duas baquetas, ou por vezes com uma mao e uma baqueta, dependendo do ritmo e do tambor que esta sendo tocado. Pode ser usado em kits de percussao em ritmos brasileiros, tais como 0 samba e 0 axe music. No Candomble,
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atabaque e considerado objeto sag rado
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â&#x20AC;˘
E
0
nome generico para varios instrumentos
musicais, mais precisamente idiofones de agitamen. . . to, que conslstem nu m reclplente oco que contem pe-
.
quenos objectos no seu interior. E ntre os instrumentos que se podem considerar como chocalhos, temos o chocalho propriamcnte dito, as maracas, 0 ganza, 0 caxixi, 0 xique-xique etc ..
a chocalho propria menre d ito consiste num cilindro comprido oco, geralmente de metal, com objetos no seu interior (conchinhas, missangas, sementes
a
e
som produzido agitando 0 instru mento, de modo que os objectos no etc.). â&#x20AC;˘ seu interior se choquem com as paredes internas. E muito usado no samba e na bossa nova e em festas populares brasileiras, como 0 carnaval brasileiro. A partir d a decada de 1950, come<;ou a ser muito difu nd ido em conjuntos musicais. As m aracassao chocalhos tipicos de alguns povos amerind ios. Os chocalhos pode ser confeccionados tambem ar tesanalmente, com latas e pcdras. No Brasil, a palavra "'chocalho" tambem e utilizada para designar uma soalheira usad a em batucad as de samba.
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