Folha do Estudante 1

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FOLHA DO ESTUDANTE R$ 5,00

AGOStO / 2008

N01

O G U i A D E F i N i t i v O PA R A E S t U DA N t E S E E D U C A D O R E S

Uma arma inovadora para estudantes e educadores Com debates aprofundados, orientações profissionais e informações atualizadas, a FOlHA DO EStUDANtE é o novo guia para aqueles que pensam a educação em todo país

A escola do século XXi já existe; confira aqui! vestIbulaR

CaPa

medICIna - como ser aprovado nas melhores universidades?

PÁGS. 9,10,11,16

ENADE

"O Enade sozinho não avalia nada" PÁG. 3

PáG. 8

CUbA

Entrevista com o Professor Carlos D'incao

A história da ilha que vai cair no seu vestibular PÁG.14

e maIs

Questão ambiental: o desafio do século XXi

Saiba tudo sobre a carreira de direito pág 4

pág12

Por que o sistema - cultura pág 6 - música pág 6 apostilado não - teatro pág 7 funciona? - literatura pág 7 pág 5


2  folha do estudante

2008

Editorial Rigor e seriedade no desafio de educar A Folha do Estudante é uma publicação voltada a toda comunidade educacional. Entendemos que um veículo de comunicação desta natureza deve atuar fundamentalmente em três frentes: orientação, formação e informação em benefício de nossos leitores. Orientação As outras publicações que se propõem a atuar como um guia para os estudantes em idade universitária se reduzem à elaboração de um simples ranking classificatório de faculdades e cursos, valendose única e exclusivamente das notas divulgadas pelo ENADE, o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes. Como bem salienta a reportagem desta edição (pág. 3), trata-se de uma forma equivocada de orientação. A Folha do Estudante acredita que outros critérios devem ser considerados no momento da escolha do curso e da instituição que irão traçar o futuro intelectual e profissional de nossos leitores. A tradição, a pesquisa, os recursos e o corpo docente que compõem uma universidade são os requisitos básicos a serem avaliados. Do contrário, criam-se brechas para o nascimento de “modismos” entre os estudantes, que são desorientados por guias que deveriam, na verdade, orientar seus leitores. Além disso, vale notar que a credibilidade desses rankings classificatórios é no mínimo questionável, pois não raramente privilegiam faculdades privadas que são clientes assinantes desses guias. É importante frisar que a Folha do Estudante reconhece pontos de excelência na educação privada de nível superior. Mas, fundamentalmente, orientamos nossos leitores a buscar e a lutar por uma universidade pública, gratuita e de qualidade, não apenas como aluno, mas também como cidadão. Formação Para atingir um bom nível de conhecimento, a Folha do Estudante acredita que o aluno deve ter o máximo de recursos à sua disposição. São, pois, de suma importância a publicação de artigos, debates, desafios na forma de exercícios e matérias que coloquem o estudante em contato constante com os principais assuntos em voga na nossa sociedade. Essas ferramentas permitirão aos educadores melhor orientar seus alunos para que estes vençam o difícil caminho até uma universidade de qualidade. Informação A aquisição e a troca de informações por parte dos estudantes, professores e pedagogos deve passar pela pesquisa, divulgação de novos cursos e de calendários que orientem o jovem com clareza e critério, para que ele esteja sempre por dentro de tudo o que ocorre no universo dos vestibulares. São com esses três pilares fundamentais (orientação, formação e informação) que pretendemos nos tornar uma ferramenta valiosa nas mãos da comunidade escolar. Trabalhar com educação é sempre um desafio que tem como requisito básico possuir grandeza de espírito. Assim sendo, sabemos do tamanho deste desafio e compreendemos que podemos oferecer sempre vantagens para nossos leitores. Estamos certos, enfim, que aqueles que percorrerem as páginas desta folha até a sua última linha sempre sairão com algo a mais, com uma melhor formação e mais conscientes do mundo em que vivem.

ARTIGOS

A Polêmica da Educação

Só se sabe que nada se sabe; nosso triste destino? Sócrates, num primeiro momento, afirmava: “Só sei que nada sei.” Era o início da aquisição do conhecimento... O desenvolvimento de uma nação depende necessariamente de como a educação é aí empreendida. Não há registro histórico que nos mostre um povo que tenha alcançado um elevado nível de progresso e que não o tenha obtido através de um investimento maciço na educação. Embora tenhamos, no Brasil, “ilhas” de excelência no que se refere ao estudo e à pesquisa universitária, que se equiparam, quando não superam, às melhores universidades da Europa e dos Estados Unidos, não podemos nos iludir com o desempenho da educação em nosso país. Ao governo cabe reconhecer que não mais podemos continuar com uma crise educacional que já comemora décadas de indiferença, desserviço, desprezo e produção de políticas que não têm como objetivo oferecer ao seu povo o que ele merece: o desenvolvimento da razão, aqui, significando capacidade não somente de raciocinar, mas de raciocinar criticamente, possibilitando ao homem fazer escolhas livres, decidir seu destino, desenvolver sua inteligência, sensibilidade, respeito e dignidade. Tudo isso é negado a milhares e milhares de crianças, jovens e adultos. Os que estão no poder não desconhecem esta realidade. Sabem da importância do ensino fundamental de qualidade, sabem que não basta simplesmente o acesso, o ingresso à escola de milhares de crianças - o simples acesso não conseguirá compensar os anos em que, tendo vivido num ambiente de pobreza, não foram estimuladas cognitivamente, como as crianças das classes mais privilegia-

das. Além disso, o governo sabe muito bem que esse fator ocasiona dois grandes obstáculos: o primeiro faz com que elas já entrem em desvantagem perante o padrão intelectual exigido pelos programas que terão de enfrentar na escola; o segundo é a causa de um número vergonhoso de evasão escolar. Lembremos aos mais céticos, aos que duvidam desses dados, o que ocorreu no governo Fernando Henrique Cardoso, que, juntamente com seu ministro Paulo Renato de Souza, tanto alardeou o programa ESCOLA PARA TODOS, através do qual milhares de crianças antes abandonadas, sem escola, a ela teriam acesso. Seria, como ambos afirmavam, um estrondoso sucesso. Mas... estranhamente, não foi necessário construir mais prédios para tantas crianças: todas entraram e poucas ficaram. Analisemos agora o que ocorre com a faixa etária que vai dos 15 aos 18 anos: apenas 17% desses jovens estão na escola. Trata-se de um dado realmente desanimador. Se a maioria está fora do raio das escolas (fazendo o quê?), os heróis que sobreviveram devem estar bem melhor, pois se beneficiaram da educação. É um raciocínio dedutivo elementar. E novamente temos que contrariar expectativas entusiastas. O raciocínio não é válido, pois parte de uma afirmação falsa: a de que a escola beneficia, quando na realidade ela comete uma imperdoável traição para com a maior parte dos adolescentes. A escola não ensinou ( e desde muito cedo) a gostar de aprender, a crescer como ser humano. Ensina-se o desamor à leitura, a automação da aprendizagem sem ter de raciocinar, a ausência de espírito crítico, o desinteresse pela prática cidadã, a indife-

rença em relação à política e ao mundo que nos cerca, a evasão da atenção (os DDAs- Distúrbio Deficitário de Atenção- que a confirmem). E tudo isso numa idade em que a curiosidade e a capacidade cognitiva estão em tremenda ebulição. Restou disso tudo a apatia, muitas vezes a agressividade, o desinteresse por valores mais humanos - como o respeito ao outro - e...a preguiça. De uma educação de qualidade estamos muito, muito distantes. A escola pública encontra-se sucateada e mesmo algumas particulares privam-se da obrigação de retribuir uma boa formação aos que lhes pagam. Há milhares de jovens que mal sabem ler, escrever ou compreender textos simples. O grande educador Renato Alberto Di Rio, já em 1979, dizia que por mais paradoxal que possa parecer, a solução dos problemas fundamentais do ensino deve ser buscada, em grande parte, fora da educação. A solução deve ser encontrada no campo bio-sócio-econômico, pois as pesquisas concluem que crianças carentes podem se deteriorar intelectualmente, quando expostas por muito tempo à carência ambiental. Outro aspecto que deve ser salientado é o de que, com exceção do Paraguai, o Brasil é o país que dá menor número de horas de aula por dia e cujo ano letivo é o mais curto, detendo o triste primado de ser a nação em que menos se estuda. E é assim que o Brasil nem nos dá o direito filosófico (que não deixa de ser elegante, embora simbolize a ignorância) de se saber que nada se sabe. Tristemente, nem isso se sabe. Denise D'Incao é Professora de Filosofia do D'Incao Instituto de Ensino.

Folha do Estudante CNPJ 09028502/0001-03 Editor Chefe:

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Paulo Neves /MTB: 10.253/SP Luís Paulo Domingues/MTB: 42.489/SP

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CAPA

ENADE: um guia pobre para o vestibulando O Enade é um instrumento eficaz de avaliação? Com a palavra, os educadores Luís Paulo Domingues

A

avaliação de alunos e dos cursos universitários é uma prática importante para que o governo, os próprios alunos e os cursos conheçam a realidade sobre seu desempenho e detectem as possíveis deficiências a serem sanadas. As avaliações também costumam servir como um instrumento de fiscalização popular e governamental diante de instituições que não oferecem instalações, equipamentos, corpo docente, projetos pedagógicos e nível de ensino adequados a cada carreira, ludibriando o aluno que busca sua formação profissional. Para os universitários, desde 2004, o ENADE (Exame Nacional de Desempenho de Estudantes) é o instrumento principal de avaliação do Governo Federal no que diz respeito ao aluno. Criado para substituir o Provão (ENC: Exame Nacional de Cursos), que era o sistema usado pelo governo anterior (Fernando Henrique Cardoso), os resultados aferidos pelo ENADE causam controvérsia, principalmente porque muitos alunos, sobretudo de instituições públicas, o boicotam. O ENADE, porém, faz parte de um sistema muito maior e mais com-

plexo (SINAES: Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior), que foge ao conhecimento do grande público, pois o Ministério da Educação ainda não deixou claro os parâmetros e os critérios desse processo de avaliação para todos. Por enquanto, podemos apenas recorrer aos pedagogos e educadores, especialistas no assunto. Alguns componentes que suscitam esse debate são: 1- Como e com que finalidade foi construído esse processo de avaliação? 2- O problema da existência de instituições particulares que se credenciaram nos últimos anos (em alguns casos, décadas) sem obedecer a um mínimo de critérios que deveria ser fiscalizado pelos órgãos competentes do governo. A maioria dessas instituições tem o respaldo político de empresários e líderes regionais e de uma poderosa bancada no Congresso Nacional, liderada por um Senador da República (ele próprio, dono de várias faculdades). 3- A falta de uma fiscalização presente e contínua do Ministério da Educação nas Universidades.

O ENADE tornou-se uma espécia de ranking para as instituições privadas de ensino

ENADE ameaça autonomia das Universidades Para Ana Maria Daibém, Doutora em pedagogia pela Unesp, o ENADE, por si só, não funciona. “-O país é muito grande e diverso para ser avaliado em um tipo apenas de prova. Também não há dados para verificarmos se os alunos responderam ou não à prova. Então, o resultado do exame acaba se tornando só uma ação punitiva para os estudantes. Tanto para

os que foram mal, quanto para os que boicotaram”, explica. Segundo a pedagoga, cada instituição tem que ter um projeto pedagógico próprio, além de seguir os critérios do MEC. “-Eu acho que no ENADE só tem nota alta a instituição que segue totalmente as diretrizes do MEC. O ideal, no entanto, é que elas sigam essas diretrizes, mas que cada uma adote sua autonomia de proposta. Do contrário, teremos uma avaliação que apenas afere quem se aproxima mais do MEC.

O Enade sozinho não avalia nada A professora Ana Maria Freire é graduada em psicologia pela FEB (hoje UNESP), tem mestrado em ciência pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, doutorado em psicologia da educação pela UNICAMP e é Livre Docente pela UNESP, desde 2005. Ao contrário da maioria das pessoas abordadas para a elaboração desta matéria, ela defende a aplicação do ENADE e

dos outros exames que compõem o SINAES (já mencionado acima). Ela integra a Comissão Assessora do ENADE em pedagogia (INEPMEC), é Multiplicadora junto ao programa de capacitação do BASis (INEP) - que forma e avalia o pessoal que trabalha nos processos avaliativos e sua experiência é dirigida à área de avaliação e aprendizagem da educação superior.

“-Primeiro ponto: o ENADE faz parte de um sistema muito maior, que é o SINAES (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior). O ENADE corresponde apenas a 20% do processo de avaliação que compõe o SINAES”, esclarece. “-O ENADE sozinho não avalia nada. Além dele, que avalia o estudante, existe a avaliação das IES, que são as instituições de ensino superior,

O próprio MEC estimula essa mescla, na Lei de Diretriz de Base 9394/96, de 1996, onde diz que é preciso seguir as determinações do Ministério, mas cada instituição deve ter sua autonomia.” Ana Maria ressalta que não é contra avaliações. Pelo contrário. “-Toda avaliação é boa, seja ela externa ou interna, mas ela tem que servir realmente para avaliar”, diz. “-A avaliação não deve se prestar a fazer ranking ou marketing para as escolas, como acontece muito atualmente.

e a avaliação dos cursos ou um curso, por exemde graduação. plo, a nota do ENADE nunca vai ser suficienSINAES te. A avaliação do curso e da instituição é que 1- AVALIAÇÃO DAS INSTITUI- vai contar muito mais”, ÇÕES DE ENSINO SUPERIOR define Ana Maria. “- É por isso que as pessoas 2-AVALIAÇÃO DOS CURSOS fazem essa confusão, diDE GRADUAÇÃO zendo que um curso ou uma faculdade foi mal 3-ENADE - AVALIAÇÃO DO no ENADE, mas a nota DESEMPENHO DOS ESTU- do ENADE não é a nota DANTES (20% do total) definitiva do curso e nem da instituição”, conclui. “-Portanto, o ENADE não define tudo. Para se fechar uma faculdade


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CaPa - enade

Por que não avaliar as políticas públicas?

Para o Professor Fernando Bastos, Doutor em didática da Unesp de Bauru, os critérios que são aplicados no ENADE não estão claros. “-Isso tudo está inserido em um contexto muito questionável. Tem um grupo da medicina da Unesp de Botucatu, por exemplo, que trabalha em cima de um processo de aprendizado totalmente novo”, explica. “-Chama-se PBL ( sigla em inglês para “Aprendizado Baseado em Problemas”) e só funciona com juntas médicas, dentro da clínica, em um ambiente totalmente clínico, em que o

aluno aprende lá no hospital e tudo é baseado na prática. Como é que eles podem ser avaliados por uma prova que foi feita para todos?”, inquiri Bastos. “-Para mim, é um exame que reflete a política educacional do governo (deste e dos outros). O governo dá o mínimo, o suficiente para o sistema não entrar em colapso e formar pessoas medianas que podem sair para um mercado mediano de trabalho. Então, a prova é direcionada para que as faculdades se formatem para passar na prova”, argumenta.

“-E aí o governo pode exibir os números de um pretenso avanço, mas um avanço “confortável”, que não levou as pessoas a pensar, a se desenvolver e a questionar o próprio governo”, diz Fernando. Para Bastos, quem melhor pode avaliar o aluno é o próprio professor, que convive com ele todo o dia. Apesar disso, ele diz que seria a favor de um exame nacional que tivesse propósitos sérios e não servisse apenas para justificar os investimentos que o Banco Mundial faz em educação no Brasil. E completa:

Boa parte dos estudantes protestam contra a avaliação “-Por que o governo e as Porque não interessa ao goreitorias não são objeto de verno mexer nessa superesavaliação? Por que as políticas trutura.” públicas não são avaliadas?

Folha do estudante não utilizará critérios do enade Para melhor orientar nossos leitores sobre as instituições de nível superior, a Folha do Estudante não vai adotar as notas do ENADE para indicar ou não um cur-

so. Entendemos que é mais vantajoso para os jovens ter um conhecimento mais aprofundado das Universidades e de seus cursos, o que passa necessariamente pela análi-

se do corpo docente, pelos recursos ali existentes e pela produção científica. Segundo Carlos D’Incao, Diretor da Folha do Estudante, este jornal caminhará

no sentido oposto dos tradi- mam, prestando um grande cionais guias de estudantes desserviço a milhares de jopublicados no país. “-Esses vens”, conclui o Diretor. guias, ao se valerem apenas Envie comentários para das notas do ENADE, mais folhaestudante@gmail.com desinformam do que infor-

PRofIssÕes

Direito: uma opção que exige reflexão

A palavra de um profissional de sucesso sobre a escolha da carreira jurídica Luís Paulo Domingues

o

Direito sempre foi uma carreira admirada e valorizada pelo mundo ocidental. Até há algum tempo, o status de um profissional de direito só rivalizava com o reconhecimento conferido aos médicos e aos engenheiros. Nas últimas décadas, apesar de continuar sendo uma carreira importante e concorrida, novas profissões surgiram para responder às exigências do mundo moderno e global. Aliado a isso, o número excessivo de instituições que oferecem o curso de direito tem provocado debates importantes sobre os critérios adotados e o conteúdo que são oferecidos nesses cursos. Para o jovem que opta pela carreira jurídica, portanto, exige-se agora diversas reflexões sobre seu papel profissional e a sua efetiva função na sociedade. Participando do projeto Profissões, do D’Incao Instituto de Ensino, em Bauru, o advogado e professor de direito Moacyr Caram Júnior discorre sobre a complexidade que envolve as carreiras que compõem o Direito e aconselha os jovens sobre como se portar no di-

fícil momento de escolher o um monte de papéis”, sugere ressalta que as profissões, moda é o direito tributário e o futuro. Moacyr. principalmente hoje em dia, direito internacional”, afirma. Para o Dr. Moacyr Caram, Outro ponto importante são muito complexas e di- “-Mas você tem que achar o é muito comum a pessoa es- definido pelo advogado é a vididas em diversas áreas de que mais combina com você, colher a profissão por “achar preocupação excessiva (mes- atuação. “-Não existe a pro- independente da tendência e legal”. mo que plausível) que as pes- fissão direito, existe o estudo do que está pagando mais”. “-Até mesmo por causa da soas têm dado ao fator finan- do direito”, afirma. “-Dentro idade - geralmente quem opta ceiro. do direito, o bacharel pode Moacyr Caram Junior é advogado, por uma profissão ainda está “-Isso não pode ser o escolher o Ministério Público, Mestre e Doutor em direito civil e na adolescência -, é comum primordial no momento da a Magistratura, a área fiscal, professor universitário. que o jovem escolha a carreira escolha. Todas as profissões policial e a advocacia, com sem ter uma noção do que ele são rentáveis se você se des- suas diversas especializações”, Envie comentários para vai encarar no dia-a-dia”, ex- tacar. E todas darão prejuízo complementa. folhaestudante@gmail.com plica Caram. se você não servir para ela”, “-Eu, por exemplo, escolhi “- Eu escolhi o Direito afirma. a área cível ( direito civil e didepois de pensar muito em Além disso, Dr. Moacyr reito processual civil). Hoje, a outras opções. Achava biologia, O CASO iSAbEllA - POlÊMiCA FAbRiCADA? Como advogado, Dr. Mo- descobriu que os acusados eram se estabeleçam indenizações pepor exemplo, “o acyr comentou a polêmica ge- inocentes”, afirma o advogado. sadíssimas. Não adianta pagar máximo”. Mas rada pelo caso do assassinato da 100 mil para os donos da escola, por causa de migarota Isabella. Caram cita o episódio da Es- tem que pagar 10 milhões, até nha família, que cola Base, em São Paulo, em que como uma medida pedagógica já contava com “-Para mim, parece que toda os proprietários foram acusados para o jornal”, defende Caram. advogados, eu a imprensa está andando na pela imprensa, condenados pela “-No caso específico do asacabei conhecencontra-mão. Fica patente que as população, mas a justiça apurou sassinato de Isabella, na minha do os ritos e o emissoras e os veículos de comu- a inocência deles. opinião, os pais não podem ser cotidiano da pronicação estão apenas correndo presos. Não há nada na lei que fissão e vi que era atrás da audiência e do dinheiro “-É necessário que a im- recomende a prisão dos dois. o que eu queria. que a exploração dessa história prensa pague pelo que faz. E Eles não estão ameaçando tesVeja bem, muita vai proporcionar”, explica. “-A pague pesado. No caso da escola temunhas ou atrapalhando as gente pode achar imprensa está assumindo o papel de São Paulo, o valor da indeni- investigações, não foram prelegal ser um advode juiz, de delegado, de advoga- zação que A Folha de São Paulo sos em flagrante, têm residência gado, mas não é do e de promotor, e isso é muito pagou para os proprietários foi fixa... o que está falando mais qualquer um que perigoso. Nós já tivemos inú- irrisório, perto das vidas que alto, portanto, é o alarde da imgosta de passar o meros casos em que as pessoas foram completamente destru- prensa e a repercussão pública”, dia inteiro dentro foram condenadas previamente ídas pela irresponsabilidade de conclui. de um escritório, pela imprensa e depois a justiça alguns”, afirma. “-É preciso que lendo e relendo


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aRtIGos

Ascensão e queda do sistema apostilado de ensino Apostilas: subprodutos das relações fordistas Ulisses Antonio de Andreis

h

á muito tempo o ensino médio brasileiro convive com os sistemas apostilados. Na sua origem e para a finalidade a que se destinavam treinamento para concursos -, exerceram um importante papel. Junto com as apostilas, surgiram “aulas inovadoras”, aplicadas por professores jovens, que muitas vezes tinham a idade dos alunos. Não podemos deixar de mencionar que o movimento dos cursos apostilados (para concursos e vestibulares) existiu no Brasil durante quase todo século XX, mas ganhou enorme força em fins dos anos 1960, coincidindo com o endurecimento da ditadura militar. Os cursos pré-vestibulares e seus materiais, por não fazerem parte da rede oficial de ensino, não eram tão controlados quanto aqueles que estavam sob responsabilidade direta do Estado. De certa forma, o ambiente dos “cursinhos” era também um espaço para discussão sobre questões sociais e políticas da época, motivando por vezes a visita de representantes dos órgãos de repressão. Felizmente, esse tempo já passou e vive-se hoje um clima de maior liberdade. Algumas estratégias de “sucesso” dos anos 60 atravessaram décadas e continuam entre nós. O uso de apostilas certamente é uma delas. Se no passado chegou até a ser uma forma de resistência política, elas impõem, hoje, ironicamente, um novo tipo de ditadura: a padronização. Como herdeira do ensino auto-instrutivo, baseado em metodologias comportamentais, a padronização do material didático trata a educação como um produto e as escolas que trabalham desse modo produzem materiais em escala e com métodos industriais que se assemelham ao fordismo. De forma similar à alta costura, que para continuar existindo foi obrigada a desenvolver o estilo “prêt-à-porter”, os proprietários dos sistemas apostilados de ensino, buscando melhores e maiores alternativas comerciais, julgaram-se no direito de desenvolver uma educação “pronta para usar”. A década de 1970 foi um período fértil para o ensino

A padronização do ensino, retratada de uma forma fascista, foi um dos temas de "THE WALL", sucesso do cinema técnico e profissionalizante. Os materiais de ensino precisavam ser diretos, objetivos, precisavam capacitar mão-deobra rapidamente de acordo com as demandas das indústrias. Quando o interesse na preparação para trabalhar no “chão da fábrica” diminuiu, já existia uma quantidade enorme de material escrito que poderia ser aplicado ao treinamento para os exames vestibulares em grande escala. O interesse do país em formar rapidamente profissionais de nível superior aliado à vontade do jovem de ascender socialmente por meio de bons salários vindo de empregos qualificados convergem para a busca de alternativas capazes de realizar uma preparação rápida, com pouco esforço, para que mais bancos universitários possam ser ocupados. Estudar pouco, só o que “interessa”. A meta é obter sucesso numa prova e nada mais. O ensino de ciências, em particular, foi bastante influenciado pelas metodologias dos materiais apostilados. Em vez de discussões conceituais mais profundas, que exigem muito tempo e professores muito bem formados, a indústria da educação optou por trabalhar com aulas pré-preparadas para as quais os professores, muitas vezes iniciantes, e até estudantes da graduação, poderiam treinar e aprender como aplicá-las. Quanto mais

simples a aula fosse, quanto mais atômico o conceito discutido, melhor. Assim, bastava apresentar a definição, a fórmula, exemplos e muitos exercícios para um bom treinamento da fórmula e aquele assunto estaria encerrado. É provável que isso explique, pelo menos em parte, o senso comum de que saber química e física significa memorizar uma grande quantidade de fórmulas prontas. A matematização excessiva e descabida do ensino de ciências esconde o real significado dos conceitos, empobrece a aplicação da ciência ao diaa-dia das pessoas e a exclui como parte da cultura criada pela humanidade numa determinada época dentro de um contexto histórico. Portanto, a opção pelo uso de livros didáticos leva em conta a ruptura com esta pobre tradição de um ensino pronto para usar baseado em esquemas, diagramas, fórmulas, frases mnemônicas, “musiquinhas” e outros recursos “facilitadores” do processo de aprendizado que extinguem a dúvida do aluno. Inúmeras vezes ela é legítima e precisa ter espaço para aflorar e deve ser discutida, debatida, não como erro, mas como parte de um processo efetivo de aprendizagem. É importantíssimo que o aluno “exorcize” suas dúvidas

Fordismo Idealizado pelo empresário estadunidense Henry Ford (1863-1947), fundador da Ford Motor Company, o Fordismo é um modelo de produção em massa que revolucionou a indústria automobilística na primeira metade do século XX. Ford utilizou à risca os princípios de padronização e simplificação. Ford criou o mercado de massa para os automóveis. Sua obsessão foi atingida: tornar o automóvel tão barato que todos poderiam comprá-lo. Uma das principais por meio de uma discussão conceitual e que a matemática sirva como apoio à formalização dos conceitos científicos e não como uma máquina para receber vários números na entrada e devolver apenas um número na saída. Usando um material apostilado, criado por um sistema de ensino, não há qualquer espaço para esse tipo de discussão. Qualquer caminho nesse sentido é considerado como perda de tempo e dinheiro. Um gasto inútil

características do Fordismo foi o aperfeiçoamen-

to da linha de montagem. Os veículos eram montados em esteiras rolantes que movimentavam-se enquanto o operário ficava praticamente parado, realizando uma pequena etapa da produção. Dessa forma não era necessária quase nenhuma qualificação dos trabalhadores. de energia. Como resultado, temos um sistemático fracasso desse sistema na aprovação dos alunos nos vestibulares das melhores universidades do país. Ulisses Antonio de Andreis é Coordenador de Física do Colegio Rio Branco e Professor do D’Incao Instituto de Ensino. Envie comentários para folhaestudante@gmail.com


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TEATRO | música | cinema | LITERATURA

As gravadoras com os dias contados?

Efeito Radiohead: gravadoras e lojas de CD vivem tempos difíceis com a internet Luís Paulo Domingues

P

arece meio absurdo, mas o investimento em tecnologia avançada, que garantiu imensos poderes às gravadoras multinacionais ao longo da história da indústria fonográfica, pode ser a desgraça dos executivos da música. Um exemplo disso é o que você encontra quando digita a palavra Radiohead, no Google. Logo o internauta se depara com centenas ou milhares de sites em que é possível baixar as músicas do conjunto inglês gratuitamente. O Radiohead é uma banda de rock alternativo, formada em 1988, em Oxford (mas que só lançou o seu primeiro disco - Pablo Honey - em 1993). Durante seus anos de estrada, a banda produziu verdadeiras obras primas da música contemporânea e conseguiu galgar os exclusivos e desejados caminhos da fama mundial. Depois do lançamento do seu sexto CD, “Hail to the thief ”, os integrantes deixaram a gravadora EMI (gigante do ramo) e grava-

Radiohead em vinil Além de relançar seus CD’s em vinil, o Radiohead prepara uma caixa especial, para colecionadores, com o seu último disco, “In Rainbow”. A caixa vem com livreto, dois CD’s e dois LP’s de 45 rotações. Nos LP’s, estão divididas as músicas do “In Rainbow”, e nos CD’s, o “In Rainbow” original e um outro só com extras. Nada mais vintage.

ram “In Rainbow” (2007), o sétimo trabalho, de forma independente. Além disso, disponibilizaram o CD na Internet, para que as pessoas pudessem comprá-lo pelo preço que achassem justo. Isso, é claro, deixou os executivos das principais gravadoras internacionais

de cabelo em pé. Se já não bastasse o público ter acesso a tudo o que quer via WEB, sem precisar pagar a indústria fonográfica vem computando sucessivas perdas em sua receita desde que a internet se popularizou -, agora a própria banda está querendo se virar sozinha, sem a distribuição,

antes usual, e a venda dos CD’s nas lojas. A ironia é que foram esses mesmos executivos que patrocinaram e incentivaram a evolução tecnológica no mundo da música, pois pensavam estar sempre abrindo mercados e produtos que se expandiriam indefinidamente. Só que com

a internet, o MP3 e os sites de compartilhamento de arquivos, a indústria fonográfica tomou um tombo nunca antes visto, vitimada pela própria voracidade diante dos lucros e por sua própria criação.

Para muitos especialistas prognóstico ainda pior. “-A A redescoberta Jaime Gustavo Bresolin com aquela caixinha que é um dos entusiastas do não tem brilho, não tem no mercado fonográfico, probabilidade é que essa do vinil vinil e já conta com 4 glamour nenhum. Você o advento da internet - crise feche todas as lojas. A incrementação incessante da tecnologia voltada ao mercado musical, que está levando os executivos das gravadoras à loucura (ou à bancarrota), acabou ressuscitando o antigo vinil. Sim, aqueles bolachões, que fizeram parte da vida de muitas gerações passadas estão voltando com força total. Grupos famosos como Artic Monkeys e Franz Ferdinand estão gravando seus novos trabalhos também em vinil, como alternativa à pirataria. O público, por sua vez, está voltando a exigir o original. O vinil é importante nesse processo, pois há toda uma fantasia, uma relação mística entre o espectador e o LP. O fã gosta de ter o Lp em casa, com a capa e os encartes grandes. O colecionador e DJ

mil exemplares em sua coleção, adquirida através de contatos com sites e lojas especializadas de todo o país. “-No meu caso, eu sou colecionador. Compro, principalmente, discos das décadas passadas, alguns baratos e outros muito caros, por causa da sua raridade”, explica. “-Mas já existe um mercado comum aparecendo, ou seja, um mercado com lançamentos de LP’s novos, de conjuntos atuais, que podem abastecer até essas lojas de vinil que estão falindo. Acredito que isso vai dar um novo gás para as distribuidoras, as gravadoras e as lojas”, explica Jaime. O colecionador discorre também sobre a segurança do vinil. “-Uma coisa é você piratear um CD, aquela coisinha pequena,

grava o CD original em outro CD, mas como é que você vai gravar um vinil em vinil?”, questiona. “-Com o CD, você puxa até a capinha no site e ele fica quase igual ao original, mas com um LP, a pirataria se torna impossível e as pessoas vão começar a valorizar isso, vão querer ter a obra original. É como comprar um livro de um escritor que você gosta e tirar um xérox do livro dele. Tem muita diferença”, argumenta Bresolin.

principalmente a partir do compartilhamento de arquivos - vai acabar extinguindo o CD, pelo menos da forma como ele é comercializado hoje. “-Nos últimos 10 anos, as vendahs de CDs vêm caindo expressivamente. Há quatro anos, essa tendência de queda vem aumentando mais ainda, a ponto de, no ano passado, a indústria fonográfica registrar 30% a menos de lucro em relação ao ano anterior”, diz Paulo César Garnica, representante da "A indústria fono- EMI music. gráfica criou seu FrankensQuanto à sobrevivência tein" das lojas, Paulo faz um

Mesmo com a indústria tentando inventar novos produtos mais baratos, como o CD que vem com a capinha simples, sem encartes, não vejo como ele pode competir com as músicas gratuitas”, garante Garnica. “-O mais incrível é que os próprios executivos da música criaram esta situação. A mesma empresa que lança CDs também faz gravadores de CD que vão piratear as obras comercializadas e acabar com seu mercado”, explica Paulo César.

Última fábrica de discos de vinil Localizada em Belford Roxo, no Rio de Janeiro, a última fábrica de vinil que ainda funciona no Brasil (pertencente a Polygram, que quer fechá-la) pode ser tombada pelo patrimônio histórico. O Ministério da Cultura, está analisando um pleito para a preservação da fábrica, feito pelo grupo de RAP Racionais MC’s.


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TEATRO | música | cinema | LITERATURA

Mauro Rasi e suas “tias”

Professora de literatura do interior paulista é uma das “tias” do famoso diretor de teatro Luís Paulo Domingues

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á cinco anos, morria o escritor e diretor de teatro Mauro Rasi. Nascido em Bauru-SP, Rasi vivia há muitos anos no Rio de Janeiro, mas nunca deixou de ter um “pezinho” na chamada “Cidade Sem Limites”. De fato, Bauru e suas personagens sempre foram presença marcante na obra do autor. Professora de Literatura do D’Incao Instituto de Ensino, Juscemy Monteiro Aguiar conheceu Mauro Rasi ainda adolescente, quando dava aulas de cultura da música para ele, no conservatório do Colégio São José. A admiração e a amizade com a professora foram se estreitando, até que em 1996, no lançamento de “As Tias”, numa aparente brincadeira, Mauro Rasi lhe conferiu o título de tia. “-Ele convidou duas amigas minhas, a Deise Ribeiro e a Maisa Bianconcini, e eu para irmos a São Paulo assistir à peça”, explica Juscemy. “-Então, quando chegamos lá, em frente ao teatro, havia uma porção de jornalistas, vários atores famosos e muita gente ligada ao PT, inclusive o Lula e o José Genoíno. Os fotógrafos começaram a nos fotografar e toda a atenção foi voltada a nós”, conta. “-Eu fiquei ressabiada e perguntei o que estava acontecendo. Aí o Mauro explicou que tinha feito a peça e precisava apresentar alguém para a imprensa. Como suas tias verdadeiras já eram muito velhinhas, ele resolveu apresentar a gente. As fotos fizeram suces-

so, por causa da peça e dos artigos de O Globo, onde ele sempre citava as tias de Bauru, e eu tive meus quinze minutos de fama”, lembra Juscemy. “-Saí até na Caras”. A professora conta que aquilo foi uma jogada de marketing do autor, que era um grande expert em se promover. “-Deu tão certo, que depois ele nos convidou para irmos à estréia no Rio”, conta. No fundo, tanto Juscemy quanto a Deise Ribeiro, que foi professora de piano do autor, acabaram incorporando o apelido de tia naquela época do conservatório, pois era assim que os alunos costumavam chamar os professores. “-Eu nunca gostei desse negócio de tia, mas ele me chamava assim, então eu respondia”, relembra. “-Depois ele chamou a Maisa Bianconcini, que não tinha sido sua professora, mas como a peça pedia três tias... Mais tarde entrou ainda a Olga Coube, que aparece na capa do livro (“Eu, minha tia, meus gatos e meu cachorro”, livro de crônicas escrito por Rasi, publicado em 2003, logo após a sua morte) conosco e tinha financiado uma peça dele”, comenta a professora. Juscemy conta que as tias que aparecem nas crônicas do jornal não são elas. “-Na verdade, ele faz uma mistura de personalidades quando fala das tias e quando fala das pessoas e dos acontecimentos de Bauru, de modo que parece que tem um pouquinho de cada um nos fatos que ele relata”, esclarece. “-Só para dar um exem-

Mauro Rasi entre suas tias: as da família e as do coração

plo, quando ele nos convi- nos despertar a máxima de pano de fundo a construdou para o lançamento no Schoppenhauer: “Um ho- ção de uma piscina no funRio, nós fomos, ficamos no mem é todos os homens”. do de sua casa, ao lado do Copacabana Palace e lá es- Adaptando a máxima, afir- barzinho de seu pai. tava de novo a imprensa”, mamos que “Bauru, nesse Em Bauru, segundo paladiz Juscemy. “-Só que nós fomos de ônibus. Principais obras de Mauro Rasi Não é que ele escreveu uma crônica, - A Cerimônia do Adeus (1987) dizendo que as tias - A Estrela do Lar (1989) de Bauru chegaram - Baile de Máscaras (1992) à rodoviária, pega- Viagem a Forli (1993) ram um táxi errado, - Pérola (1994) foram assaltadas, e - As Tias (1996) aquela caipirice toda - A Dama do Cerrado (1996) que se atribui a Bau- Alta Sociedade (2000) ru?” A professora - Batalha de Arroz Num Ringue Pra Dois (2003) enfatiza ainda que Mauro Rasi já era uma pessoa especial desde cedo. Antes de fazer retrato, é todas as cidades”. vras do próprio Rasi, a peça 15 anos, Rasi já havia venciMauro Rasi também foi uma catarse, causando do um concurso de peças, marcou em seus trabalhos comoção na sociedade. Secom a obra “Deus do cais na televisão. Levado para a gundo Rasi, quando Pérola morto”. Globo por seu colega e ami- foi encenada em Bauru, as Sua principal obra, imor- go Miguel Falabella, partici- pessoas iam assistir e se entalizada no teatro, ainda pou de vários quadros no xergavam nas personagens, é “Pérola”. Aclamada de Fantástico, um deles como ou enxergavam pessoas coforma unânime pela crítica, apresentador. nhecidas da cidade envolviRasi não fala apenas de seu Voltando a “Pérola”, a das na trama. passado em Bauru. Com peça lhe rendeu mais de 20 Envie comentários para rara sensibilidade, conse- prêmios dentro e fora do gue transcender o ambiente Brasil. Contava passagens folhaestudante@gmail.com de sua cidade natal. Pou- do cotidiano de sua famícas vezes uma obra pode lia em Bauru, tendo como

Lavoura Arcaica

A obra prima de Raduan Nassar ganha as telas Há anos que Raduan Nassar parou de escrever, repentinamente, para a surpresa dos seus leitores. Mas se analisarmos “Lavoura Arcaica” (Companhia das Letras, 196 páginas), veremos que sua narrativa ainda se apresenta de modo surpreendente e perturbador. Com um texto primorosamente

construído, o mito da tradição rural e familiar de fincar raízes contra a modernidade urbana do partir desenrola-se através da dúvida dramática do filho pródigo apaixonado pela irmã. André, o protagonista, é convencido pelo irmão a voltar para casa, mas já é tarde. Ele entrou num círculo vicioso e destruidor, onde o

questionamento amargurado de seus valores ancestrais não permite mais encontrar a paz. O autor de “Um Copo de Cólera” tece cuidadosamente cada palavra, com uma perfeição ímpar na literatura brasileira, fazendo com que sua prosa (muitas vezes rimando), se assemelhe à poesia.

No cinema, Lavoura Arcaica foi sucesso de crítica


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vestibular

Como garantir uma vaga em medicina? Alguns conselhos que devem ser levados a sério por quem quer passar Luís Paulo Domingues

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medicina é uma área como o direito e a engenharia - que sempre esteve ligada à imagem da conquista pessoal. E não é por acaso. Trata-se de uma profissão que exige, em sua formação, um esforço incomum, pois são anos de estudo e dedicação até conseguir o diploma, e depois, toda uma carreira de cursos e atualizações que irão levar o profissional ao sucesso. O professor Carlos D’Incao, diretor do D’Incao Instituto de Ensino, possui quinze anos de experiência no ensino e nos fala sobre os problemas e as atitudes que devem ser tomadas por aqueles que desejam ingressar em medicina este ano. “-Primeiro passo: o estudante que deseja ingressar no curso de medicina tem que ter espírito empreendedor. Tratase de um dos concursos mais competitivos do Brasil, por isso o aluno deve estar ciente de que deverá abrir mão de uma série de hábitos em sua vida para obter sucesso. Isso acaba sendo, muitas vezes, um grande desafio, pois exige muita maturidade do adolescente. Porém, é extremamente importante que o candidato perceba que o ano do vestibular é um ano especial, em que ele vai traçar uma jornada única, e que esse esforço empreendido valerá à pena para o resto de sua vida. -Segundo passo: o aluno tem que colocar na cabeça que vai (obrigatoriamente) passar os sábados, os domingos, os feriados e as férias de julho estudando. Não é exagero estudar tanto assim, mesmo porque na universidade de medicina ele vai fazer isso e muito mais para acompanhar o curso. -O Terceiro passo é o apoio institucional, ou seja, o papel da escola ou do cursinho. É muito difícil alguém conseguir passar em um bom vestibular para medicina se não tiver freqüentando um bom curso. Existem autodidatas que conseguem ser aprovados, mas geralmente são pessoas de mais idade, que optaram pelo curso em uma época de maior maturidade. A regra, portanto, é que os aprovados são aqueles que

frequentaram as melhores escolas. Por isso, é importante que o candidato ou os pais saibam avaliar as instituições que preparam para o vestibular, observando itens como: a) Carga horária: o estudo em tempo integral é o mais indicado. b) Material didático adotado: os livros são melhores que as apostilas. Na elaboração de um livro didático, você tem o nome de uma editora, uma equipe, autores e outros fatores envolvidos que sempre têm uma reputação a zelar. Nas apostilas, os critérios de

hipótese alguma, “sentir dó” do filho. Ninguém morre de tanto estudar! Mas é claro e perfeitamente natural que em algum momento o aluno vai estar cansado e esse é um momento crítico. Nessa hora os pais têm que estar presente para dar mais força, se possível colocar o filho de volta ao ritmo de estudo, mas nunca deixá-lo desistir ou relaxar. Quinto passo: o progresso do aluno que está se preparando para um vestibular concorrido, como o de medicina, não pode ser visto como uma progressão analítica, e sim como uma progressão geométrica. Geralmente, é no mês de outubro ou n ove m b r o que o aluno dá um salto qualitativo na absorção de conhecimento. Portanto, nunca desista, e tenha sempre muita paciência e resista à frustração. -Sexto passo: nunca subesCarlos D'Incao é especialista em vestibular time uma elaboração nunca são transpa- disciplina. Há muitos casos rentes. Mesmo assim, é preci- de candidatos a medicina que so ficar atento, pois também acreditavam dominar a bioloexistem livros didáticos ruins. gia, deixaram a matéria meio c) Quadro de professores: de lado para se aplicar a outras é preciso que os professores disciplinas, acabaram gabariestejam sempre atualizados e tando essas outras disciplinas sejam experientes. Ao contrá- e foram reprovados justamenrio da grande maioria das áre- te por causa de biologia. as profissionais, geralmente -Sétimo passo: aluno alieos professores com mais ida- nado não passa! Nos melhode são os mais capacitados. res vestibulares de medicina, d) Ambiente adequado: só ingressam candidatos que existem cursinhos que não estão por dentro dos aconteministram aulas e sim pales- cimentos e dos problemas do tras, devido ao grande núme- mundo e do Brasil. É preciso, ro alunos nas classes - que na portanto, que o aluno leia jorverdade parecem mais anfi- nais diariamente, acompanhe teatros. O limite para que o os noticiários televisivos, os aluno consiga aprender, parti- livros e as revistas que trazem cipar, perguntar e dirimir suas assuntos importantes e atuais, dúvidas é de 45 alunos por além de acompanhar as notíclasse. O ideal, entretanto, é cias pela internet. de 30 alunos no máximo. Além disso, é necessário -Quarto passo: boa rela- entender que o português é ção com a família. Nesse mo- essencial. Em alguns dos memento crucial na vida de um lhores cursos de medicina, o jovem, é importantíssimo que português tem peso maior os pais estejam sempre pre- do que biologia. Ler sempre sentes e apoiando. e estar atualizado é, portanto, Os pais não devem, em outro diferencial.”

Outras particularidades sobre a medicina

Nas últimas décadas, os salários, nas diversas áreas médicas, entraram em um processo de desequilíbrio. No passado, um diploma de medicina garantia uma vida farta e altas compensações financeiras. Hoje, em muitas regiões do país, o salário que o médico recebe não está valendo o esforço que foi feito durante os anos de estudos. Para o professor Carlos D’Incao, no entanto, essa é uma questão muito delicada. “-Eu penso que aquele que procura um curso de medicina por causa do aspecto financeiro vai se dar mal”, diz Carlos. “-Mesmo que ele ingressar em uma faculdade e se formar, será um profissional medíocre, pois para ele, a medicina é um meio e não um fim - o fim é o aspecto financeiro. Nenhum profissional é de fato bom quando sua finalidade é apenas o dinheiro”, garante. “-É sempre bom lembrar que para o bom profissional o mercado nunca está saturado.”

Especializações

Segundo o professor D’Incao, é difícil opinar sobre uma especialização mais vantajosa que outra. “-O estudante pode até ingressar no curso já com um sonho de se especializar nisto ou naquilo, mas eu acredito que ele só vai se decidir durante sua vida acadêmica, conforme for tomando contado com as práticas de cada especialização”, afirma o professor.

Cursos de medicina indicados

Segundo Carlos D’Incao, o ideal é procurar os cursos de medicina das universidades públicas do Estado de São Paulo. “-São esses os melhores cursos. Em outros Estados, eu destacaria a Universidade Federal de Pernambuco, a UEL (Universidade Estadual de Londrina), a Universidade Federal do Paraná (UFPR), a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e a Universidade Federal de Santa Maria (também no Rio Grande do Sul)”, declara D’Incao. “-Há também ótimos cursos no Rio de Janeiro, como

o da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), o da UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) e o da Universidade Federal Fluminense. Porém, o problema do Rio é que os alunos de outros Estados estão com receio de morar na “cidade maravilhosa” por causa da violência”, explica. “-Outros cursos públicos são bons, mas eu não destacaria tanto quanto os anteriores, como o da UEM (Universidade Estadual de Maringá), o da UFU (Universidade Federal de Uberlândia) e o da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina)”, diz Carlos. “-Mesmo assim, eu sempre indico os cursos paulistas, pois são os melhores. Se você quer morar no Sul, ou no Nordeste, faça a faculdade em São Paulo e depois vá trabalhar em outro Estado”, garante Carlos. “-Do contrário, você corre o risco de fazer o curso em outra região do país, trabalhar lá, mas sempre ter como seu superior alguém que se formou em uma instituição paulista. Já no caso das instituições privadas, o professor D’Incao recomenda cautela. “-Existem alguns cursos bons, mas é difícil arriscar. Eu destacaria a FAMECA e a Faculdade de Medicina de Jundiaí”, diz Carlos. “-A Santa Casa também é muito boa, mas eu repito, as particulares são preocupantes. Veja só o caso da PUC de Campinas: eles trocaram boa parte do corpo docente, justamente porque eram professores experientes, e por isso mais caros. Então eles optaram por outros, menos experientes e mais baratos, para sanar seus problemas financeiros”, conta D’Incao. “-É muito melhor que os pais do candidato, mesmo que tenham a oportunidade de pagar uma universidade particular, insistam para que seu filho estude mais - ainda que demore alguns anos para ingressar -, e passe em uma universidade pública. Uma vez que um curso em uma universidade particular custa, no mínimo, 250 mil Reais, o dinheiro que se pode poupar pagará uma ótima especialização, a construção de uma clínica, ou outras vantagens que serão muito mais importantes depois”, conclui.


2008  FOLHA DO ESTUDANTE  9

extra

Células tronco: juventude vai às urnas

Alunos do Ensino Médio opinam sobre o polêmico assunto em simulação de plebiscito Luís Paulo Domingues

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ando continuidade às suas atividades extra curriculares, que já se tornaram marca registrada de uma nova proposta de ensino, a direção do D’Incao Instituto de Ensino, de Bauru, interior de São Paulo, realizou um debate profundo sobre a questão das células tronco. Através de um plebiscito, os alunos do 2o Grau foram convidados a opinar entre sim (a favor da utilização das células tronco em pesquisas científicas e no tratamento de doenças graves) e não (contra a utilização). O resultado foi uma vitória indiscutível do sim. 126 alunos acham que as células tronco devem ser usadas pela ciência e pela medicina na tentativa de cura de doenças graves. Apenas 7 alunos votaram contra o uso das células tronco e houve 1 voto nulo. A participação maciça dos alunos reflete todo o trabalho anterior da Instituição. Desde o início deste ano, quando o 2o grau foi inaugurado, professores de várias disciplinas vêm introduzindo a questão das células tronco na realidade cotidiana dos jovens.

Mas o debate continua, com a presença de profissionais de diversas áreas integrando os bate papos e palestras promovidos pelo Instituto, e contribuindo para que os estudantes formem sua opinião fundamentada em argumentos claros.

O que eles acham?

Guilherme Kasai, do 1oA2, por exemplo, diz ter votado sim para que as pessoas que estão à beira da morte tenham uma oportunidade de continuar vivendo. “-Somente os embriões que seriam descartados podem ser usados nas pesquisas”, explica Kasai. “-Então, nem os argumentos religiosos de que vidas estariam sendo desperdiçadas podem ser usados”, completa. Marina Rays, do 1oA3, também concorda com Guilherme: “-A igreja tem que pensar que já tomou posturas erradas no passado e que pode estar atrapalhando um grande avanço para a medicina tomando mais uma dessas posturas agora”, reflete. O aluno Bruno Gomes, do 1oA2, destaca a questão da consciência: “-Essas células não têm consciência. Quero dizer, o zigoto for-

Sim ou Não? Os estudantes do D'Incao demonstraram interesse pelo assunto

mado por elas não possui consciência. Já a pessoa que está sofrendo, sabendo que vai morrer, tem”, defende Bruno. Seu colega Gustavo Stephano, do 1oA1, avalizou sua opinião. Diferente da maioria, as alunas Laura Zanella e Sofia Zequi, ambas do 1oA3, são contra o uso das células. Elas declararam ser evangélicas, mas dizem que a Igreja não é a única causa desse ponto de vista: “-Não é só a Igreja Evangélica que é contra.

Acho que a maioria é”, explica Zanella. “-Para mim e para a minha religião, a vida começa no momento em que há a fecundação e então os embriões não podem ser descartados”, complementa. “-Eu acho que vai acabar acontecendo o que já ocorre no Brasil”, diz Sofia. “-Só os ricos vão ter acesso a essa tecnologia, pois o sistema de saúde público não vai pagar esse tratamento para quem está morrendo em um hospital do Esta-

do”, completa. Laura e Sofia ressaltam que também são contra a fertilização in vitro, de onde vêm os embriões que fornecem as células tronco, pois acreditam que essa prática faz parte de interesses econômicos maiores: “-Eles estimulam esse grande número de fertilizações para que fiquem sobrando embriões e células para serem utilizadas no tratamento daqueles que irão pagar”, defendem ambas.

Células Tronco: aluna escreve sobre a polêmica Matar para curar? Um dos assuntos polêmicos mais discutidos na atualidade diz respeito à utilização de células-tronco embrionárias humanas como material de estudo. A questão se resume em dois pólos: o primeiro deles é o do grupo a favor, que apresenta argumentos em sua defesa, demonstrando o quão benéfico possivelmente seria o avanço, e o outro é o do ponto de vista contrário a tal, que de igual modo, reúne suas justificativas. As pessoas, atualmente, classificam esses dois lados respectivamente como a Ciência e a Igreja, divisão a meu ver errônea. Creio que há muita gente que, como

eu, concorda com alguns aspectos “da igreja” e, simultaneamente, com outros “da Ciência”. De qualquer modo, minha opinião, em particular, é essencialmente contra. Penso que desde a fecundação há vida, e todos têm o direito a ela; sendo assim, não é certo usar as células de um embrião para determinado fim. Mesmo consciente dos frutos que poderiam ser gerados a partir do desenvolvimento do nosso conhecimento acerca das propriedades, capacidades e utilidades das célulastronco, minha escala de valores não me permite aceitar as exigências implicadas. Acredito que se um embrião tem chances de se desenvolver, não pode sequer

ser cogitada a possibilidae de envolver suas células em estudos científicos de qualquer caráter. Mas há também aqueles que são resultantes de fertilização in vitro que são inviáveis, ou seja, não podem crescer. Estes sim, considero como possíveis fontes de material de pesquisa, assim como o cordão umbilical, que tem em sua composição as tão almejadas estruturas. Contudo, ainda que haja a liberação para trabalhos apenas com células dessa origem, tenho um certo receio em relação à fiscalização que seria atribuída a esse fator, já que certamente haveria tentativas de burlar essa regra. Além de tudo isso, fico a pensar: por ser uma tec-

nologia nova e cara, a que pacientes ela seria direcionada? Haveria igualdade quanto ao acesso das diversas classes sociais a esse tipo de tratamento? Creio que não. Imagino que todo o processo teria um alto custo, por exemplo, com remédios para a manutenção do mesmo. Assim sendo, seria preferível investir num paciente que tivesse condições financeiras mais elevadas do que em um que morreria pouco tempo depois por não possuir recursos financeiros para seguir com tantos gastos. E a elite seria, novamente, a única privilegiada. Vale salientar, também, a existência das célulastronco adultas, que não são tão eficazes como as em-

brionárias, mas não deixam de ser uma alternativa. E, finalmente, se depois de tantos investimentos em experiências e anos de esforço, nao houver a descoberta de nada muito relevante? É certo que o aprendizado não é em vão e nunca será perdido, mas e quanto a todos os recursos e tempo gastos? O homem quer alcançar a imortalidade e dominar coisas que só serão determinadas por outras circunstâncias, faça ele o que fizer. Laura Melo Zanella, aluna do 1A3 do D'Incao Instituto de Ensino


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extra EXTRA

Arquitetura da Destruição A terrível estética nazista da arte em debate Em mais uma etapa do projeto de cinema do D’Incao Instituto de Ensino (Bauru-SP), os alunos assistiram ao documentário Arquitetura da Destruição, lançado em 1992. O filme foi apresentado e debatido pelo professor Paulo Neves. Considerado um dos maiores documentários da história do cinema, Arquitetura da Destruição (Suécia, 1992) desnuda o universo estético que habitou a mente de Adolf Hitler e de grande parte do povo alemão. A busca pela beleza clássica e asséptica da antigüidade grega suplantou qualquer dimensão política do nacional socialismo (a ideologia nazista) e foi o verdadeiro germe do terror implantado pelos alemães na Europa. Tudo (inclusive as pessoas) o que não fosse belo, limpo e perfeito

deveria ser eliminado como condição primeira para a evolução da humanidade e do mundo. Uma das conseqüência dessa postura exclusivista em relação à arte e à estética do mundo foi a fuga ou a eliminação de grande parte dos artistas importantes que viviam no raio de ação dos nazistas. O modernismo, com suas inúmeras variações, foi alvo de campanhas de desmoralização que comparavam suas imagens à dos doentes mentais e à das pessoas deformadas, retrato de tudo o que era sujo e decadente para a Europa. Foi literalmente banido das galerias e dos museus alemães. Curiosamente, o documentário é narrado pelo artista Bruno Ganz, que fez o papel de Hitler no também magistral filme “A Queda” (Untergang), que narra os

Hitler em frente ao conceito de beleza que tentou impor ao mundo como único

últimos dias da vida do ditador. O cineasta Peter Cohen passou quinze anos garimpando o material - geralmente documentos raríssimos - para realizar o filme. Arquitetura da Destruição é um relato definitivo sobre a mente e o gosto estético de Hitler e dos altos

oficiais nazistas.

Dúvida recorrente Hitler tinha mesmo o gosto estético (muitas vezes duvidoso) retratado no filme? Ou apenas se valia desse discurso para facilitar o domínio sobre os alemães e os outros povos? (Esta foi a pergunta mais requisitada

durante o debate) R. Há muitas especulações sobre esta questão, mas é certo que ele acreditava nessa estética clássica grega. É certo também que ela contribuía muito para que ele atingisse seus objetivos, pois era uma visão exclusivista do mundo, que não admitia a diversidade.

Astronomia: teoria e prática Durante todo o mês de Maio, os alunos do D’Incao Instituto de Ensino puderam conhecer e entender o universo da astronomia mais de perto. Ministrada pelo físico Pedro D’Incao, especialista em astrofísica, as aulas teóricas foram repletas de imagens explicativas, projetadas pelo Datashow. Depois, os alunos acompanhavam o professor até a quadra e podiam observar, em um telescópio de última geração, diversos

planetas, constelações e a lua. Os assuntos abordados na astronomia são muito variados. Na aula sobre evolução estelar, por exemplo, o nascimento, a vida e a morte de uma estrela, as contribuições de Newton e do padre Angelo Secchi para a astronomia foram algumas das pautas apresentadas. Conferir o tema das aulas na prática: compromisso do D'Incao Instituto de Ensino

Kosovo: debate sobre o novo país O professor Paulo Neves, do D’Incao Instituto de Ensino, aproveitou os últimos acontecimentos internacionais divulgados pela mídia e vem realizando palestras de esclarecimento em sua aula de atualidades no período noturno. U m a das aulas mais concorridas foi sobre a história da exrepública da Iugoslávia, que despertou tanto interesse entre os jovens estudantes por causa da recente proclamação de independência de Kosovo diante da Sérvia. A Sérvia é uma das exrepúblicas que compunham a Iugoslávia e se nega a re-

conhecer a independência, pois Kosovo é uma província autônoma que, historicamente, pertence a eles. Bem, isso é o que dizem os sérvios. Completando a aula, foi exibido um documentário sobre a guerra que envolveu praticamente todos os países que compunham a ex-república. O filme mostra um jornalista que tenta ir de Zagreb, capital da Croácia, a Belgrado, capital da Sérvia, pela estrada que antes unia a Iugoslávia. As contradições de uma guerra entre vizinhos, muitas vezes irmãos, e o ódio entre

dois povos que se digladiam historicamente saltam aos olhos do espectador e contribuem para que os alunos entendam por que aquela região é uma das mais problemáticas do mundo atual.

Habitantes de Pristina, a capital Kosovar, festejam a independência


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A Física na Prática

trabalho em campo fez da Avenida Getúlio vargas um grande laboratório. Normalmente, os alunos acreditam que a Física não passa de um amontoado de fórmulas . Para destruir essa equivocada concepção, nada melhor do que o trabalho experimental. No início do trabalho em cinemática no D’Incao Instituto de Ensino, um experimento realizado na Avenida Getúlio Vargas (Bauru-SP) fez com que os alunos pudessem vivenciar questões como velocidade média, velocidade instantânea e aceleração. Ainda no laboratório da Escola, os alunos desenvolveram e testaram um modelo experimental antes de realizar as medidas na rua (figura1). Ao saírem, todos já sabiam o que deveria ser medido e estavam preparados para enfrentar os problemas que pudessem ocorrer

figura 1

durante a situação prática. O objetivo do experimento era determinar a velocidade dos carros que passavam pela avenida Getúlio Vargas (figura 2). Para isso foram utilizados sensores laser (figura 2) acoplados aos laptops dos alunos (figura 3). Os estudantes, organizados em grupos menores, deveriam reconhecer cada carro que estava passando e em seguida registrar_o intervalo de tempo gasto pelo

carro para passar o seu próprio comprimento. De acordo com a aluna Rafaella Baracat Negrato (figura 3, no centro), do 2º ano do Ensino Médio, “... foi muito legal colocar em prática aquilo que a gente estava vendo na teoria. Eu nunca tinha estudado física dessa maneira.” Rafaella disse ainda que “neste ano eu não precisei de professor particular, como nos outros anos. Hoje consigo fazer exercícios em sala, que antes eu não conseguia.

figura 2

figura 3

Trabalhando na prática, vejo que as fórmulas da física têm muitas aplicações”. Uma vez que todos realizaram seus registros, foi hora de retornar ao laboratório para analisar os figura 4 dados coletados (figura 4). Como resultado prático da análise, pode-se concluir de 30% dos motoristas desque naquele ponto da ave- respeitam esse limite. nida, cujo limite de velocidade é de 50 km/h, cerca

Muito além do cidadão Kane

O poder da Rede Globo e sua influência na política brasileira Outra atividade extracurricular apresentada aos alunos do D’Incao Instituto de Ensino foi o polêmico e controvertido documentário “Muito além do cidadão Kane”. “Beyond the citzen Kane” (título original) foi produzido e lançado pela lendária BBC de Londres, a TV aberta estatal dos ingleses. O documentário mostra como o poder da TV Globo (e de seu dono, Roberto Marinho) foi determinante para a eleição de Fernando Collor para a presidência do Brasil em 1989. P a r a isso, a obra aborda toda a história da TV brasileira, desde sua introdução por Assis Chateaubriand, sua

disseminação como maior aparelho ideológico popular, até a eleição de Collor em 89. Lançado em meados da década de 1990, “Muito além do cidadão Kane” trouxe de volta a prática lamentável da censura. Alguns governadores estaduais, entre eles o então governador de São Paulo, Antonio Fleury Filho, mostraram-se solidários à Rede Globo e aos Marinho, proibindo sua exibição pública. Um documentário fundamental para compreendermos o papel crucial da TV na formação da mentalidade do povo brasileiro.

A influência da Rede Globo na eleição de Collor é um dos temas do documentario

Desafios de Física Aqui a "bitola" não funciona 1) Um objeto pequeno está em repouso na borda de uma mesa horizontal. É empurrado de tal maneira que cai do outro lado da mesa, que tem 1m de largura, depois de 2 s. O objeto possui rodas?

2) Qual é o ângulo máximo com a horizontal no qual uma bola pode ser jogada para sempre se mover para longe do arremessador?

3) Duas bolas elásticas de massa m1 e m2 são colocadas uma sobre a outra (com um pequeno espaço entre elas) e então soltas em queda livre em direção ao solo. Qual é a razão m1/m2, pela qual

a bola superior receba a maior fração possível de energia total? Que razão das massas é necessária para que a bola superior atinja a maior altura possivel?

m1 m2 Resolução dos problemas estarão disponíveis no site www.dincao.com.br


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ESPECIAL

Brasil: Desafios Ambientais do Século XXI Washington Novaes

Por qualquer ângulo que se aproxime do tema, qualquer que seja o nó que se tente desfazer, constata-se que, para vencer os grandes desafios que terá no século XXI, o Brasil deverá mudar radicalmente sua postura – colocar a questão ambiental no início e no centro de todas as políticas, para que ela perpasse todas as concepções e todas as ações. Se não for assim, caminhará de precariedade em precariedade, retornará sempre a um ponto de partida cada vez mais complexo e grave. Vejamos um dos principais desafios contemporâneos: Em boa parte do agrobusiness, um dos custos do modelo é uma taxa brutal de erosão, que pode chegar a 10 quilos de solo perdidos por quilo de grão produzido e a uma perda anual de um bilhão de toneladas de solo por ano, segundo documentos governamentais. Solo cuja fertilidade terá de ser reposta por insumos químicos, de alto custo, mas que não melhorarão o preço das commodities exportadas. O modelo de desmatamento intensivo – para que haja mecanização intensiva –, aliado à aração e revolvimento da terra na entressafra, deixa o solo exposto à erosão pelas chuvas, pelos ventos e pelo sol. O solo carreado para os cursos d’água desprotegidos vai assorear os leitos e degradar os recursos hídricos, inclusive pela carga de agrotóxicos. O custo pode ser estratosférico, como demonstra o caso do Oeste catarinense. Mas há mais ainda. O mesmo modelo de mecanização intensiva é causa determinante do êxodo rural, uma das razões para o aumento brutal da população urbana no país, com toda a seqüela de acontecimentos que determinou e determina. Nos 40 anos que vão do Censo de 1960 à contagem populacional de 2000, a população urba-

Os lagos formados pelas barragens tornam-se grandes emissores de dióxido de carbono e metano

na brasileira cresceu mais Além do mais, essa áreas permeáveis. Somade 90 milhões de pessoas expansão urbana gerou a se a tudo a progressiva (31,3 milhões para 123 devastação ambiental e a ocupação das margens milhões), enquanto a ru- ocupação de áreas de ris- de rios, áreas de inundaral caía de 38,7 milhões co e/ou de preservação ção natural, por grandes para 33,9 milhões. No permanente. Simultane- vias expressas. E chegaCentro-Oeste, exemplo amente, seguiu o proces- se ao panorama caótico dramático, acompanhan- so de assoreamento dos das temporadas de verão, do a chamada expansão rios, agora pela deposição com as grandes cidades da fronteira agrícola, a de esgotos não tratados, submetidas a inundações população urbana nesse erosão de margens des- freqüentes, não raro siperíodo passou de um protegidas e carreamento multâneas a racionamenmilhão para 8,8 milhões, do lixo não recolhido. to no abastecimento de enquanto a rural decresO quadro periódico água – já que não podem cia de 1,9 para 1,6 milhão. Embora as fortes taxas de natalidade nesse período respondam por uma parte do crescimento populacional urbano, a elas se somaram os índices migratórios. Nas grandes cidades, esse movimento correspondeu à expansão desordenada das periferias, onde a especulação imobiliária transferiu para um poder público exaurido os custos de implantação de todas as Governo ignora os ambientalistas no caso do rio Madeira infra-estruturas – de transportes, energia, abas- de inundações que se tor- ser utilizados os manantecimento e saneamento nou familiar às grandes ciais que cortam o terribásico, educação, saúde, cidades brasileiras no pe- tório urbano, tal sua carga limpeza urbana, lazer etc. ríodo de chuvas é um dos de poluição. A implantação não acon- resultados finais de todo A ocupação inadequateceu, na maior parte dos o processo, fruto ainda da da do solo – rural e urbacasos, gerando o quadro impermeabilização pro- no – é uma das caracterísde difícil abordagem ob- gressiva do solo urbano ticas mais fortes do moservado hoje, que culmi- – e esta, conseqüência do delo brasileiro hoje. Nas na na insegurança ampla descaso na fiscalização áreas urbanas, as matrizes aliada ao desemprego e a dos códigos de obras que de transportes e de eneroutras carências. exigem a manutenção de gia, combinadas, levaram

ao contra-senso de mais de 50% do solo estarem, segundo a Associação Nacional de Transportes Públicos, ocupados por vias de transporte ou instalações auxiliares (estacionamentos, garagens etc.). O que deveria ser meio transforma-se em fim em si mesmo. E gera os transtornos dos congestionamentos, dos rodízios, da lentidão dos deslocamentos. O questionamento de novas barragens não pode ser ignorado, pois o problema não ocorre apenas pelo ângulo das perdas e desperdícios na matriz energética – cuja eliminação deveria ser prioritária. Vem também pelo ângulo ambiental. As 800 mil barragens que hoje existem no mundo têm reservatórios que, juntos, formariam um território maior que o da França. Só de barragens acima de 15 metros são 45 mil (no Brasil, mais de 500). A construção dessas barragens deslocou mais de 10 milhões de pessoas. Tucuruí, com seu reservatório de 2.875 km2, deslocou mais de 40 mil pessoas, sepultou 2,9 milhões de m3 de madeira tropical, inviabilizou a pesca a jusante, disseminou a malária e concentrou mercúrio em níveis cinco vezes acima do máximo permitido legalmente. As barragens, principalmente em áreas de floresta, estão sofren-


2008  FOLHA DO ESTUDANTE  13

ESPECIAL do contestação progressiva. Uma das razões está na liberação, pela matéria orgânica retida pelos reservatórios e em decomposição, de mais dióxido de carbono e metano, este último, 20 vezes mais prejudicial que o outro, em termos de contribuição para o efeito estufa do que uma termelétrica de igual porte. Um dos exemplos que têm sido citados pela Comissão Mundial de Barragens é o da hidrelétrica de Balbina, que libera três milhões de toneladas de CO2 por ano, quase 10 vezes mais que uma termelétrica de igual porte. Argumentos desse tipo reforçam as dúvidas com relação ao programa de implantação de novas e grandes geradoras hidrelétricas na região amazônica. A Amazônia talvez seja, na verdade, o maior dos desafios que o país terá de enfrentar no século XXI. E para o qual parece não haver ainda estratégia definida. A maior parte dos estudos sobre a região aponta a inadequação da quase totalidade dos solos para um modelo agropecuário tradicional. Ainda assim, os programas oficiais brasileiros continuam a pre-

A floresta amazônica é tema e preocupação primordial do ambientalismo mundial destinada essencialmente à exportação e com os inconvenientes já mencionados. Por outro ângulo, só recentemente o Ministério de Assuntos Fundiários proibiu por portaria novos assentamentos de reforma agrária em áreas de floresta primária. Já em 1997, uma Comissão Externa da Câmara dos Deputados apontava, em relatório sobre a atuação de madeireiras estrangeiras na região, que os assentamentos de reforma

estavam na Amazônia. E a razão é simples: trata-se da área com menor resistência política e empresarial às desapropriações, além de a que mais terras públicas contém. O processo é conhecido. Definida uma área para o assentamento, os lotes são demarcados e os assentados para eles encaminhados. Sem recursos, sem crédito e sem assistência técnica, os assentados fazem acordos com madeireiras para que derrubem a floresta

saem em busca de novo lote, onde reproduzirão o procedimento. É o que se chama de “desmatamento itinerante”. Em alguma medida, o processo reproduz-se também nos cerrados, onde a proibição de assentamentos em área de vegetação nativa não vigora. As atuais políticas brasileiras não conseguiram ainda sequer encontrar formatos que levem a um uso sustentável da madeira na região amazônica. Admite-se plenamente que pelo menos 80% da madeira amazônica continuem a ser extraídos ilegalmente e em grande parte exportados. O processo dá forte contribuição às queimadas, no chamado “arco do desmatamento”, por abrir caminho ao fogo com a derrubada e abandono da vegetação de menor porte. Um problema adicional, principalmente nos cerrados, está na degradação e/ ou esgotamento dos recursos hídricos, dadas as mudanças no uso da terra – problema para o qual se dispõe de pouquíssima informação sistematizada \

Na Amazônia, a natureza reage às agressões cada vez com mais força

ver a abertura de novos “eixos” de penetração, na verdade corredores destinados a facilitar a expansão dessa fronteira agropecuária, com produção

agrária eram responsáveis por mais de 50% do desmatamento na Amazônia. Nos últimos 30 anos, 88,15% das terras destinadas à reforma agrária

e abram espaço à casa, às roças de “lavoura branca” e às pastagens. Ao fim de algum tempo, vendem ou alugam o lote para um fazendeiro vizinho e

e que também constituirá enorme desafio para as próximas décadas. Juntamente com políticas de proteção aos biomas, de modo a permitir que eles continuem prestando os serviços naturais (fertilidade do solo, recursos hídricos, conservação da vida nos manguezais, absorção de carbono etc.), de valor estimado pelo Ibama em R$ 4 trilhões, pelo menos cinco vezes o Produto Interno Bruto nacional. Tanto nos cerrados quanto na Amazônia, estão diante de todos os desafios de definir políticas adequadas para a conservação e o uso sustentável da biodiversidade, a mais rica do planeta, fonte dos futuros medicamentos, dos novos alimentos, dos novos materiais que substituirão os que se esgotarem. Da mesma forma, o desafio de definir uma política de conservação e uso sustentável para esses biomas – que substitua o atual vale tudo, onde as migrações constituem um precaríssimo substituto para a ausência de políticas de renda e emprego. Em síntese, o grande desafio brasileiro para o século XXI será definir e executar uma política de desenvolvimento verdadeiramente sustentável. Washington Jornalista

Novaes

é


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2008

ESPECIAL

Cuba: o tema da vez dos vestibulares Estudo aprofundado percorre a história da ilha de Fidel em quatro partes Carlos D’Incao

Parte 1 uba é o país mais ocidental da região do Caribe. A área do arquipélago cubano é aproximadamente a soma da extensão de todo o resto do Caribe insular. Cuba ocupa uma posição singular diante das Américas, sendo uma ligação insular natural que leva à América Central, à América do Sul, além de ser um território contíguo aos Estados Unidos e ao Atlântico Norte. Essa situação geográfica tão estratégica sempre foi uma influência notável em sua história. Foi ocupada e colonizada pela Espanha a partir de 1510. De Cuba partiram as expedições que conquistaram o atual México e outras regiões entre a Flórida e o norte da América do Sul. Os colonialistas fundaram vilas ao longo da ilha e um governo geral. Sua primeira economia, de estâncias, baseou-se em submeter a população a relações de exploração e opressão, basicamente a chamada encomienda (instituição jurídica criada pela Espanha na América, para regulamentar as relações entre espanhóis e indígenas, onde os primeiros submetiam os segundos em troca de uma suposta evangelização), que buscava ouro e meios de subsistência. Os aborígenes foram rapidamente dizimados pelas enfermidades, pelos serviços forçados, matanças e maus-tratos. Em um período não muito extenso, o que restou dessa população praticamente desapareceu, absorvido pela mestiçagem. Dela subsistiu grande parte dos hábitos e um certo número de palavras de uso corrente, alguns traços físicos em determinados grupos da população, influência em forma de religiosidade, moradia e outros traços culturais. Cuba foi estratégica

C

Monumentos a José Martí, o libertador de Cuba, estão presentes por todos os cantos da capital Havana

para o império espanhol e fortalecer seu poder mente a sociedade do como praça militar e de junto às suas colônias. oeste e centro de Cuba. comunicações, durante Ao longo do século No final do século três séculos, e continuou XVIII, o lugar da Espa- XIX, Cuba já era uma das sendo colônia espanho- nha entre as potências colônias mais modernas la até 1898. Local prefe- havia declinado significa- e “ricas” do mundo, líder rido de trânsito entre a tivamente. Dentro dessa em exportação de açúEspanha e a América, logo Havana se tornou a capital do país e se conver teu em uma praça forte de comércio e em um porto muito importante, no qual se reuniam as frotas antes de saírem para o Atlântico, conduzindo à Espanha, à cada ano, as riquezas extraídas do continente. A primeira estrutura social de Arquitetura colonial testemunha a história de Cuba por todos os cantos da ilha Cuba colonial durou quase três sé- conjuntura, porém, uma car de cana, muito bem culos. Na ilha se formou nova época começou na integrada ao capitalismo e predominou uma cultu- ilha a partir da extraor- mundial e na ponta de ra criolla (de descenden- dinária expansão da ex- novas tecnologias. A fertes europeus nascidos na portação de açúcar e café, rovia – que ampliou muiAmérica), vassala de uma núcleo da criação de uma to as terras virgens dispometrópole que tratou de nova formação social que níveis – e posteriormente constantemente renovar transformou profunda- o telégrafo e o telefone

colocaram Cuba na vanguarda tecnológica do Caribe. Extraordinários avanços em técnicas empresariais, consumo sofisticado, pensamento modernos e trato com belas-artes conviveram com a mais selvagem e cruel exploração e aculturação maciça dos escravos negros: um regime opressor que se assumia juridicamente na forma de um racismo oficializado.

Atraso e Modernidade Dentro dessa conjuntura observamos, paradoxalmente, a perda progressiva do poder político da tradicional classe dominante criolla diante da tentativa de restabelecimento do despotismo metropolitano - abalado desde as invasões napoleônicas - dirigido a obter boa parte da renda de Cuba. Essa tradicional classe dominante criolla - em parte devido ao seu enfraquecimento político, em parte devido à sua ligação orgânica com os interesses metropolitanos - renunciou a todo compromisso de se converter em classe nacional e emanci-


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ESPECIAL par o país, enquanto quase todo o continente se liberava das metrópoles européias, mantendo essa atitude ao longo de todo o século XIX. Tal elite privilegiou seus lucros e interesses imediatos, explorando a vida de um milhão de escravos africanos e de 125 mil trabalhadores semiescravos chineses, em plena modernidade do século XIX. Associouse a negócios com espanhóis e apoiou, suportou e subornou as autoridades da Espanha em troca de proteção e da defesa de seus interesses de classe, garantindo que Cuba nunca se convertesse em “outro Haiti” - centro de um dos mais dramáticos episódios revolucionários da América, onde os escravos se rebelaram e tomaram o controle do país. No fim do século XIX, a mecanização das fábricas, a conversão dos Estados Unidos em maior comprador e sua exigência de açúcar não refinado, concorreram para mudar as bases do regime econômico. Pressões norte-americanas e internacionais deram o início ao processo de eliminação da escravidão que só terminaria em 1886.

A Cuba do início do século XX Em 1892, já sem escravidão, a exportação de açúcar alcançou um milhão de toneladas métricas. Para sustentar e expandir a produção açucareira, chegaram até a metade do século XX outro milhão de imigrantes europeus e quase meio milhão de caribenhos. Durante cerca de 150 anos, entre 1780 e 1930, esses imigrantes configuraram a composição étnica do país, sendo os principais sujeitos de sua estrutura econômica e de muitos dos aspectos principais da cultura cubana. A política constante de dominação consistiu em explorar os trabalhadores em um nível muito alto, aumentando sem cessar o montante do produto

exportado e fechando o acesso à terra como meio de produção independente - tudo dentro de uma economia internacionalmente liberal, com relações sociais internas autoritárias. Como veremos, tal conjuntura depois de 1930, fará o capitalismo neo colonial cubano passar por transformações dramáticas.

As Lutas Sociais Em paralelo ao desenvolvimento econômico de Cuba, é preciso pautar a presença das constantes lutas armadas de libertação que se sucederam en-

tabeleceu um regime legal em parte semelhante ao de uma província metropolitana. Mais a frente, como é sabido, teve que ceder ao processo de Independência.

José Martí - Herói nacional José Martí (18531895), personalidade que mais se sobressaiu na história cubana, do exílio, confluiu as diversas motivações e conspirações emancipadoras em um órgão político – o Partido Revolucionário Cubano que preparou uma nova guerra com o objetivo de criar uma república inde-

Martí morreu na batalha de Dois Rios em 19 de maio de 1895, aos 42 anos e Antonio Maceo caiu em combate em 7 de dezembro de 1896. Durante o conflito, quase 20% da população pereceu em um holocausto provocado pela política colonialista genocida. Mas, apesar disso e de seu gigantesco esforço de guerra, a causa da Espanha estava perdida quando os Estados Unidos lhe declararam guerra, em abril de 1898, e invadiram a ilha. O incidente que desencadeou a intervenção estadunidense foi o afundamento do navio de

Visão panorâmica de Havana: destaque para "a Casa Grande" dos antigos senhores de Cuba

tre 1868 e 1898. A primeira revolução (1868-1878) propôs a independência e a abolição da escravatura, constituiu uma república em armas e combateu duramente no leste e no centro do país, mas não conseguiu chegar ao oeste, centro da economia da colônia, sendo por isso derrotada . A emancipação dos escravos, por sua vez, ligou-se a uma grande guerra, na qual combateram junto pessoas de todas as etnias e condições – o que fez com que se criasse no seio do povo cubano um forte orgulho de seu movimento - multirracial e nacionalista; a Espanha reconheceu a liberdade dos escravos que combateram contra ela e, depois de 1879-1880, es-

pendente e democrática, liquidar o colonialismo, impedir que os Estados Unidos se apoderassem de Cuba e iniciar uma nova época revolucionária na região, “a segunda independência da América Latina”. A insurreição iniciada em fevereiro de 1895 se converteu em uma imensa guerra popular irregular. Os insurretos invadiram todo o país, dezenas de milhares de combatentes participaram do Exército Libertador e um quarto de milhão de cidadãos viveu nos acampamentos da República em Armas. Os combatentes nacionais perderam precocemente seus dois grandes líderes de guerra:

guerra Maine , em 15 de fevereiro de 1898, como decorrência de uma explosão que matou 260 marinheiros. O barco, ancorado no porto de Havana, tinha sido enviado pelo presidente McKinley, do Partido Republicano, como medida de precaução ante a radicalização que tomava conta dos confrontos entre espanhóis e cubanos.Após uma investigação sobre as causas da explosão, concluiu-se que esta provavelmente ocorreu por causa de uma mina submarina. Os mergulhadores responsáveis pelo exame dos destroços do barco relataram à Comissão de Inquérito a impossibilidade de inspecionar o buraco no casco em razão

da profundidade da lama existente nas águas do porto. Mesmo sem uma confirmação conclusiva, o governo adotou como válida a hipótese de um ato de sabotagem, declarando guerra à Espanha. Anos mais tarde, o legendário e independente Almirante Hyman Rickover preparou um estudo elaborado usando fotografias detalhadas e outros dados obtidos em 1912 e 1913. Ele concluiu que com toda a certeza o Maine foi destruído por um acidente ocorrido dentro do navio, não havendo provas de que uma mina o tenha destruído - com isso é possível afirmar com certa precisão que a intervenção norte-americana se deu muito mais por razões geopolíticas na região do que por razões de autodefesa. O Exército Cubano facilitou a vitória dos Estados Unidos, mas o novo imperialismo vinha para impedir o triunfo revolucionário e estabelecer seu domínio sobre Cuba. As mobilizações e a resistência cívica popular à ocupação estadunidense (1898-1902) completaram o ciclo revolucionário. Em 20 de maio de 1902, foi criado o Estado nacional, a República de Cuba, uma vitória do patriotismo e do sacrifício de um povo que já possuía uma poderosa consciência política nacionalista de caráter predominantemente popular. Carlos D'Incao é Historiador formado pela USP e Mestre em História Social pmela USP. É também Professor e Diretor do ensino médio e curso do D'Incao Instituto de Ensino. Envie comentários para folhaestudante@gmail.com


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2008

OPINIÃO - ARTIGOS

Tecnologia & Educação - Expectativas e Ideais D’Incao Instituto de Ensino realizou uma pesquisa sobre a expectativa dos estudantes com relação à implementação tecnológica e sua incorporação ao cotidiano escolar. Alguns aspectos da pesquisa devem ser destacados - notamos que os alunos têm uma grande expectativa com relação a melhora de seu desempenho acadêmico. Uma escola com recursos tecnológicos deverá ainda, segundo suas expectativas, facilitar o processo educacional, tornando o aprendizado “mais fácil”. Essa concepção da tecnologia como “facilitadora” de processos é muito comum. Geralmente o termo Tecnologia está associado a aplicações da Ciência para o desenvolvimento de soluções de problemas técnicos. Apesar de tal associação ser muitas vezes correta, não podemos reduzí-la a mero produto do desenvolvimento científico. Poderíamos dizer que Tecnologia e Ciência possuem propósitos diferentes; enquanto a Ciência

O problema é que nossos alunos acreditam e esperam que ela simplesmente torne o aprendizado “mais fácil”. Nesse contexto, é imprescindível deixar claro que as ferramentas tecnológicas não devem ser encaradas como uma solução mágica. Não há ferramenta tecnológica no mundo que tornará, por exemplo, o aprendizado de física “instantâneo”. Pode, sim, torná-lo mais eficaz, com maior significado e assim mais atraente ao jovem. Vale salientar também que a internet não substitui a necessidade da leitura de livros e nem é o grande oráculo onde podemos encontrar todas as respostas. Essa visão simplista do uso da tecnologia, infelizmente, é partilhada pela maioria dos alunos e até mesmo por muitos educadores Os computadores e a internet, há tempos, estão presentes no cotidiano de alunos e professores, porém sua aplicação em sala de aula se depara com dificuldades de implementação devido à falta de profissionais capacitados e de metodologias que consigam ir além do

No entanto, após muitos anos de experiências com Tecnologia aplicada à educação, podemos afirmar que apesar de termos evoluído muito

busca a compreensão dos fenômenos e leis da natureza, a Tecnologia é pragmática, busca a manipulação e o controle do mundo físico. Muito se espera da Tecnologia e uma das maiores expectativas é a de que ela torne nossa vida mais confortável, mais fácil. Sendo assim, a expectativa de nossos alunos sobre a Tecnologia aplicada à educação não foge do que comumente pensamos sobre ela.

uso simplista da internet como ferramenta de pesquisa. Sabemos que há pouco mais de uma década, muitas escolas nos Estados Unidos e na Europa deram início a um grande investimento em tecnologia, principalmente em laptops, motivadas por uma demanda dos conselhos escolares e por grupos de pais que acreditavam ser os computadores a solução para a sala de aula do século XXI.

nas questões tecnológicas, a parte educacional parece não ter assimilado o aspecto positivo desse avanço. O uso na maioria das instituições européias e americanas, como na escola Liverpool High em NY, se resume à simples substituição do caderno e livros pelo laptop e por pesquisas e simulações na internet. Há ainda aqueles que acreditam serem as lousas interativas ou shows de realidade virtual com si-

Pedro D’Incao

o

Pouco a pouco, a tecnologia de ponta se integra ao cotidiano da educação

mulações em três dimensões o supra-sumo da implementação tecnológica em educação. Mas se a Tecnologia não se reverter em algo diretamente associado ao aprendizado do aluno, não poderá ser considerada Tecnologia educacional. Desta forma, é possível concluir, com muita certeza, que o uso de Tecnologia, como a informática, sem um propósito ou resultado educacional, está totalmente fora do contexto de Tecnologia aplicada à educação. Não é de hoje que as ferramentas tecnológicas estão disponíveis. Articulá-las e torná-las efetivamente parte integrante do processo educacional é, sem dúvida, um dos maiores desafios enfrentados por educadores e estudantes. Estamos certos de que essas ferramentas tecnológicas devem permitir o desenvolvimento da criatividade e principalmente a possibilidade de produção através da linguagem multimídia, que faz parte

integrante do cotidiano de nossos jovens. Muitas aplicações tecnológicas na educação não são encaradas com seriedade e têm como objetivo apenas o marketing empresarial. Tais implementações acabam, com o tempo, fracassando, pois não possuem como objetivo o desenvolvimento intelectual do aluno. Esse oportunismo empresarial acaba dando voz àqueles que ainda acreditam que a Tecnologia nada tem a acrescentar à educação. Em suma, a absorção da Tecnologia pelas escolas deve ir além das expectativas imediatistas. Vivemos numa sociedade onde muitas vezes o espetáculo é mais atraente que a realidade. E o show tecnológico possui um enorme apelo. Devemos cuidar para que a imagem ou a representação tecnológica não superem nunca o propósito educacional. Pedro D’Incao é Professor de Física e Diretor do D’Incao Instituto de Ensino


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