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África-Brasil Em comemoração ao Ano Internacional dos Povos Afrodescendentes, a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, através da Secretaria Municipal de Cultura, promoveu, em julho passado, o África Diversa: I encontro de cultura afro-brasileira. O evento, realizado no Centro de Artes Calouste Gulbenkian, buscou apresentar à população do Rio de Janeiro um grande painel da diversidade cultural africana, em um encontro de povos e culturas que visou a celebrar e enfatizar a importância decisiva das diferentes tradições africanas na formação e no desenvolvimento da identidade cultural brasileira. Palestras, oficinas, minicursos, contação de histórias e manifestações artísticas das mais variadas integraram uma ampla programação, que, dentre outras atrações, contou com a presença do escritor, historiador e africanólogo Alberto da Costa e Silva, do diretor e curador do Museu Afro Brasil, Emanoel Araújo, e do escritor e compositor Nei Lopes, assim como de educadores e convidados muito especiais, como o percussionista Naná Vasconcelos, o contador de histórias François Moïse Bamba, de Burkina Faso, e o grupo de dança Raiz di Polon, de Cabo Verde. Celebrar a diversidade africana é celebrar também a pluralidade cultural brasileira e, em especial, a multiplicidade de manifestações artísticas de origem africana que marcam a vida cultural e artística da cidade do Rio de Janeiro. Apoiando encontros como o África Diversa, a Secretaria Municipal de Cultura assegura o prosseguimento de um diálogo de enorme relevância para nossos povos, dos dois lados do Atlântico. Emilio Kalil Secretário Municipal de Cultura





Nos mares da diversidade O Brasil recebeu - e recebe - uma grande influência da África na formação de sua identidade. A riqueza e a diversidade de manifestações culturais, grupos, artistas e pesquisadores de nosso território que dialogam com a cultura de países do continente africano nos comprovam a veracidade desta afirmação. O projeto África Diversa: I encontro de cultura afro-brasileira trouxe ao Rio de Janeiro, de 17 a 22 de julho de 2011, uma programação que privilegiou em sua abordagem a formação das identidades da cultura afro-brasileira, sua diversidade cultural, a relação entre tradição e contemporaneidade, o diálogo África-Brasil e a importância da transmissão oral nestas sociedades. O encontro aconteceu no Centro de Municipal de Artes Calouste Gulbenkian e no Centro Municipal de Arte Hélio Oiticica. Convidamos para o África Diversa pesquisadores, escritores, grupos e artistas como Naná Vasconcelos, Alberto da Costa e Silva, Nei Lopes, Rogério Andrade Barbosa, Heloísa Pires Lima, Jongo de Pinheiral e João das Neves - entre outros - e exposições do Museu Afro-Brasil. Para a abertura, trouxemos a Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário e a Guarda de Congo de Nossa Senhora das Mercês, da cidade de Oliveira, Minas Gerais. Esses grupos cantam e dançam a tradição do Congado afro-mineiro, iniciada antes de 1888 e que ainda hoje se encontra viva e em constante movimento. O Congado realizou dois cortejos em nossa cidade: na orla do mar de Copacabana e na Praça XV. Em Copacabana, os congadeiros avistaram o mar pela primeira vez, ao mesmo tempo em que reviviam o mito da Nossa Senhora do Rosário surgida das águas, abençoavam a Cidade Maravilhosa. Já no Paço Imperial eles mostraram a força de seus cantos, tambores, patangomes e gungas, rememorando a libertação dos escravos. Convidamos também a participar do África Diversa o contador de histórias sénoufo François Moïse Bamba, de Burkina Faso, que trouxe ao encontro a tradição oral dos ferreiros, senhores do ferro e do fogo, aprendida em sua família de origem, e a palavra dos griots, recebida de Sotigui Koyaté, cuja família originou os primeiros griots na África Ocidental. A Revista África Diversa quer levar a outras águas as palavras de nossos convidados. Nesta publicação, pesquisadores e artistas contemporâneos trazem novas questões e olhares às temáticas afro-brasileira e africana. Eles expressam o seu tempo com reflexões que podem colaborar para criação de uma sociedade mais justa e respeitosa à diversidade humana. Com isto, rememoram a nós, brasileiros, quem somos, assim como os diversos caminhos, as experiências e as realidades que vivenciamos do lado de lá e de cá do Atlântico. Daniele Ramalho Curadora do África Diversa/Editora da Revista África Diversa




:sumário 13} África Diversa

Alberto da Costa e Silva

18} entrevista: Emanoel Araújo

por Táia Rocha

28} Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos

Festa do Congo

Capitã Pedrina de Lourdes Santos

36} Da tradição oral para o teatro popular

João das Neves

40} Congado na Praia de Copacabana

ensaio fotográfico de Flávia Correia


46} A palavra ancestral

François Moïse Bamba

56} Sementes que vieram da África para o coração da educação

Heloísa Pires Lima

62} O continuum iorubano na religiosidade afro-brasileira

Nei Lopes

68} Nos rastro das diversidades

Haroldo Costa

72} entrevista: Naná Vasconcelos

por Táia Rocha



Alberto da Costa e Silva

África Diversa

N

ão há uma África, mas várias Áfricas, pois é tão diversificada a sua paisagem física quanto a sua paisagem humana. Nessa África múltipla, en-

contramos montanhas com picos eternamente nevados, desertos que parecem sem fim, florestas enormes, savanas imensas, cerrados, carrascais e campinas úmidas e semi-áridas, onde vivem povos inteiramente distintos uns dos outros, tão diferentes entre si quanto um português de um russo.


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Na África, cada povo possui cultura própria. E esta pode apresentar-se com traços conflitantes até mes-

perdida, criaram obras de arte admiráveis, como as de Ifé e do Benin.

mo em relação à de grupos próximos. E não só as culturas

Antes de achar-se ouro na América, era da África

se apresentam distintas de povo para povo, como foram

que se originava o ouro com que se cunhava moeda na Eu-

se modificando ao longo dos séculos, por força de desa-

ropa e nos países árabes. Os habitantes das regiões auríferas

fios como os que lhe impuseram, em certas regiões, o islã,

sabiam cavar minas subterrâneas, batear o ouro, fundi-lo e

em outras, o cristianismo e, por toda parte, os europeus.

transformá-lo em joias. E, por quase toda a parte, os africa-

Há, contudo, certos valores que são comuns a todas elas, de

nos eram hábeis tecelões.

modo que se pode falar de uma cultura africana como nos referimos a uma cultura europeia, embora sejam tão distintas a Itália e a Finlândia. Alguns povos africanos, como os pigmeus e os sãs ou bosquímanos, vivem da caça e da coleta de raízes, frutas e mel. Outros, da criação de gado. A maioria retira o sustento da agricultura. Mas os pastores, ao conduzir o gado, consomem o mel das colmeias e os frutos das árvores, e suas mulheres podem manter pequenos roçados. E os lavradores pescam, caçam e podem possuir cabras, ovelhas e bois. Onde os solos são pobres e as chuvas mal distribuídas, os africanos desenvolveram práticas agrícolas complexas. Não lhes eram estranhas a irrigação, a rotação de plantios, a adubagem com esterco e restos de cozinha, a mistura na mesma gleba de diferentes vegetais, e a construção de socalcos nas encostas das montanhas. Pelo menos desde 600 a. C. a África conhecia a metalurgia do ferro, e alguns de seus povos produziam aço de alta qualidade, com uma única desvantagem em relação à Europa: só fundiam peças pequenas, porque seus fornos eram pequenos. Outros eram mestres em trabalhar o cobre e o ouro. De bronze e latão, usando o método da cera


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Havia no continente distintos tipos de organização

ter atravessado o Saara e começado a se difundir ao sul do

política. Alguns estados estendiam-se por amplos territó-

grande deserto 100 anos mais tarde. A maioria dos africa-

rios e, formados por várias nações, são tidos por impérios.

nos hoje integra o Islã ou a Cristandade.

Outros eram pequenos e de uma só nação. E outros, ainda

A família é formada por seu chefe, suas mulheres,

menores, semelhantes às cidades-estado da antiga Grécia.

seus filhos e noras, seus netos, seus agregados e, no passado,

Compunham-se de uma ou várias famílias reais, da nobre-

seus escravos. Esse grupo faz parte de outro, muito maior, a

za, de homens comuns e de escravos. Mas a África conhecia

linhagem, ou seja, o conjunto de famílias que descendem do

também sociedades sem reis. Nessas, a unidade social era a

mesmo bisavô ou trisavô, e que é comandada pelo mais ve-

aldeia, onde as decisões, tomadas pelos chefes das famílias,

lho dos patriarcas ou pelo chefe da mais antiga das famílias.

podiam ser impostas por associações de mascarados.

As linhagens, por sua vez, compõem o clã, que reúne todas

São numerosas as religiões africanas. Cada povo tem a sua, com seus deuses, suas crenças e seus rituais próprios.

aquelas que reconhecem um antepassado comum, histórico ou mitológico.

Mas há grandes ideias que participam de todas ou quase

Venera-se o velho. Um jovem não se aproxima de

todas as religiões africanas. Crê-se em um ente supremo,

um idoso sem se ajoelhar ou se curvar. Mas também se

que está em toda parte, mas ao qual não se tem acesso. Os

acarinha a criança. Num continente de forte mortalidade

homens recorrem então a divindades intermediárias, aos

infantil, a mãe vive em função da criança até esta completar

deuses da natureza e aos ancestrais, que, no universo in-

dois ou três anos de idade.

visível, permanecem ligados ao mundo dos homens e por

Predomina entre os que não são zelosamente cris-

eles zelam. O culto aos mortos é generalizado, bem como a

tãos a poligamia. Mas somente naquelas partes da África

crença na possessão, ou seja, que os deuses e os antepassa-

que adotaram o islamismo ela se apresenta na forma do

dos podem descer no corpo dos fiéis.

harém. Nas demais sociedades, se o homem pode ter muitas

Os africanos, ao longo da história, adotaram tam-

mulheres, essas nem sempre lhe estão subordinadas. Dentro

bém religiões surgidas em outros continentes. O cristianis-

do conjunto habitacional familiar, cada mulher mora em

mo chegou à Etiópia por volta do século IV e continua até

sua casa. Possui também patrimônio próprio. E, sendo a

hoje, na forma monofisita copta, como a principal religião

mulher que controla, em muitos lugares, o comércio a vare-

do país. Foi amplamente adotado no antigo reino do Con-

jo, não é incomum que disponha de recursos consideráveis.

go, no Quinhentos, mas, tanto na vertente católica roma-

Num palácio real ou nas áreas islâmicas estritas, podia viver

na quanto nas protestantes, só começaria a fincar raízes na

reclusa. Mas, em outros lugares, exercia posições de mando

África no fim do século XIX. Já o islamismo desembarcou

e era chefe, regente, sacerdotisa ou alta funcionária. No rei-

nos litorais do Índico antes de terminar o século VII, e deve

no de Daomé, para cada cargo importante havia uma cor-


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respondente feminina: o ministro das finanças era vigiado por uma ministra das finanças. O casamento pressupõe, quase sempre, um pagamento à família da moça. A noiva tem um preço, que corresponde a uma compensação por sair de uma família, que, com isso, se empobrece, para outra, que se torna mais rica. Não é, portanto, um costume que desmereça a mulher; ao contrário, ele a valoriza. A África não foi e não é um continente estático; está em permanente mudança, não só por evolução interna, mas também pelas influências externas, como as que exerceram os europeus, sobretudo a partir da metade do século XIX. Se o domínio colonial europeu sobre a maior parte da África desarticulou estruturas políticas e sociais, introduziu novos costumes e reprimiu e modificou antigos modos de vida, também criou desafios, aos quais os africanos continuam a dar resposta. Alberto da Costa e Silva é poeta, ensaísta, memorialista e historiador brasileiro. Ocupa

a cadeira número 9 da Academia Brasileira de Letras. Diplomata pelo Instituto Rio Branco. Doutor Honoris Causa em Letras pela Universidade Obafemi Awlowo, na Nigéria, em 1986 e em História pela Universidade Federal Fluminense, em 2009. Tem participado de atividades diplomáticas como Presidente da Banca Examinadora dos Altos Estudos do Instituto Rio Branco, membro do Comitê Científico do Programa Rota do Escravo, da UNESCO, Secretário na Embaixada do Brasil em Lisboa. Representou o Brasil em numerosas reuniões internacionais, tendo sido delegado do Brasil na reunião da Comissão Econômica das Nações Unidas para a África em 1961.Recebeu inúmeras condecorações em países como Brasil, Portugal, Peru, Espanha, Itália, Egito, Gabão, Togo, Costa do Marfim, Camarões. No projeto África Diversa participou da mesa de abertura, que teve como tema: “Diversidade Cultural/As muitas Áfricas do lado de lá do Atlântico”.



entrevista: Emanoel Araujo trabalhava na gráfica da Imprensa Oficial de Santo Amaro da Purificação (BA) quando teve seu primeiro contato com a linotipia e a composição gráfica. Dali aos estudos de Belas Artes na UFBA não tardou muito e, hoje, o artista é curador-diretor do Museu Afro Brasil, em São Paulo. Convidado para o África Diversa, Araujo curou as exposições “África ancestral e contemporânea – As artes do Benin” e “As várias Áfricas do lado de lá do Atlântico” e participou da mesa redonda “Diversidade Cultural Afro-brasileira” na abertura do evento, dia 18. Em entrevista a Táia Rocha, o curador contou mais sobre sua participação e disse o que pensa sobre a relação do povo brasileiro com a cultura afro-brasileira.


{por Táia Rocha/SMC}

Emanoel Araújo Como estudioso da cultura afro-brasileira, quais foram suas conquistas ao longo da vida? Eu diria que foram muitas ações. As conquistas não sei se verdadeiramente as são, mas as ações foram e são muitas, intermináveis, eu diria, num país em que um grande contingente de africanos foi trazido a pulso nos porões dos navios negreiros e cujos milhões de descendentes ainda hoje lutam por conquistas básicas como educação, saúde, moradia, dignidade, enfim. Meu trabalho está em não deixar morrer a memória, a história, a arte de brasileiros afrodescendentes que, a despeito de todos os senões, continuam insistindo em ser artistas, poetas, escritores, pensadores, guardiões de uma ancestralidade religiosa e histórica de um povo que só produziu riqueza e luxo para as oligarquias que sempre dominaram este enorme país. Quem poderia se esquecer das chibatadas, dos castigos a um povo que só derramou sangue para produzir açúcar, tabaco, ouro, pedras preciosas, café – que historiadores costumam chamar de períodos de riqueza do Brasil? Quem poderia esquecer homens ilustres como João Cândido, o Almirante Negro das chibatas; Francisco de Paula Brito, o primeiro editor brasileiro; Juliano Moreira, o primeiro psiquiatra brasileiro; Teodoro Sampaio, engenheiro, geógrafo, historiador; José do Patrocínio, o líder da Abolição, os Rebouças, Antonio, grande voz do império, e seus filhos André e Antonio, engenheiros e abolicionistas; Cruz e Souza, com sua


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invejável poesia simbolista, além de Machado de Assis, Mestre Valentim, Aleijadinho... Com tantos ícones, pergunto: quem de fato fez o Brasil? Foi a nobreza oligárquica ou foram esses homens que pulsaram o verdadeiro sangue verde e amarelo e que tiveram força para fazer a brasilidade e o Brasil? Estou aqui para fazer lembrar, cobrar essa lembrança. Perpetuar as conquistas desses homens, meus irmãos afrodescendentes. Os brasileiros valorizam o legado cultural afro-brasileiro? O que poderia ser feito para uma maior compreensão da herança cultural afro-brasileira? Os brasileiros vivem perdidos no emaranhado dessa história política que começa todo dia. Esse recomeçar quer dizer a busca do que o país ainda lhes nega como compreensão de sua verdadeira história. O Museu Afro Brasil foi criado numa grande cidade que, a despeito de se dizer “italiana”, é mesmo afro-brasileira e, por isso, é nesses 12.000m² que se conta, que se defende e que se perpetua a memória afro-brasileira. Temos fé, uma enorme fé em que as milhares de crianças que nos visitam e são guiadas pelos nossos educadores possam levar o que aqui viram, o que aqui veem como espelho para sua autoestima.


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Como aconteceu o convite para participar do I Encontro de Cultura Afro-brasileira África Diversa? O secretário Emilio Kalil, velho amigo, conhecedor dessas e de muitas outras histórias – como a mostra “O negro de corpo e alma”, na exposição dos 500 anos do Brasil e as muitas exposições realizadas na Pinacoteca de São Paulo, como “Herdeiro da noite” e “Vozes da Diáspora” e “Os pintores negros dos oitocentos”, e o próprio Museu Afro Brasil – considerou esses trabalhos para fazer o convite. Como foi sua participação no evento? Na mesa de abertura, falei sobre a experiência do Museu Afro Brasil, que começou em 1976 no 1º Festival de Arte Negra, na Nigéria, pelas minhas viagens à África. Em 1988, com a publicação do livro “A mão afrobrasileira – Significado da contribuição artística e histórica”, culminando em 2004, com a instalação e consolidação do Museu Afro Brasil. Também assinei a curadoria das exposições “África ancestral e contemporânea – As artes do Benin”, no Centro Municipal de Arte Hélio Oiticica e a exposição “As várias Áfricas do lado de lá do Atlântico” no Centro Municipal de Artes Calouste Gulbenkian.


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Em relação à exposição “As várias Áfricas do lado de lá do Atlântico”, a que “Áfricas” o senhor se refere? A exposição mostrou diferentes facetas da África através de grandes fotografias distribuídas pela galeria do centro municipal de artes e duas vitrines nas quais foram expostas esculturas de diferentes povos africanos. Na entrada, cinco grandes ráfias tecidas na África Central nos deram a visão da magnífica construção geométrica dessa obras e de seu refinado aspecto colorístico. Houve também uma sala dedicada aos povos Bijagós, do Arquipélago Bijagó, na Guiné-Bissau, suas esculturas relativas a diferentes ritos, as chamadas “Vaca Bruto” e seus adornos de cabeça e de costas com elementos da fauna marinha, que envolve o arquipélago dos bijagós. É um povo de importantes plantadores de arroz que também vieram para o Maranhão no começo do século XIX como mão de obra escrava. Nas paredes, viram-se desenhos alusivos ao uso desses artefatos, verdadeiras obras de arte, cuja estética se aproxima de muitos de nossos artistas populares do Brasil. O Centro Municipal de Arte Hélio Oiticica recebeu a exposição “África, ancestral e contemporânea – As artes do Benin”. Quais são os pontos fortes da exposição?


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Vislumbramos a possibilidade de mostrar o Benin com suas manifestações ancestrais e contemporâneas e vasculhar uma história extraordinária entre o personagem brasileiro Xaxá de Souza [poderoso negreiro que viveu mais de 40 anos no Daomé, atual Benin] e o grande tráfico criado por ele entre aquela costa e a Bahia. Os povos Fon [do sul do Benin] e Iorubá nos legaram a história religiosa afro-brasileira, com os deuses e seus mitos. Muitos negros brasileiros, depois da abolição, voltaram para sua terra de origem e construíram casas e palacetes de arquitetura portuguesa, levaram nomes como Oliveira, Souza e Rêgo e as tradições religiosas cristãs, tornando-se os agudás, um povo descendente de brasileiros que construiu mesquitas como igrejas e marcou esses dois lados do Atlântico. Pierre Verger os viu e fotografou na década de 40 as semelhanças religiosas entre o antigo Daomé e a Bahia. Deuses de lá e de cá dançando, orando, festejando com as mesmas cantigas, com os mesmos orikis [versos usados para saudar orixás], com uma só ação. Mas o Benin ainda hoje significa uma pujante nação de criadores de uma estética com profundos laços ancestrais e com jovens artistas contemporâneos, grandes pintores, escultores, instaladores. Um povo que fala lindamente através de simples tabuletas pintadas como reclames de cortes de cabelo, de publicidades diversas. Quantas peças foram expostas na exposição? O público carioca pôde vivenciar nessas duas mostras cerca de 300 obras como os apliqué (tapeçarias feitas com recorte de tecidos que mostram os símbolos reais do Benin do século XV ao século XIX), produzidos por Alphonse Yémadjé; as obras de Cyprien


Tokoudagba, um artista que também trabalha sob o ponto de vista da história clássica e simbólica das divindades Fon; as fotografias de Charles Placide retratando o Festival de Vodu anual nas praias de Uidá; as pinturas e as esculturas de Dominique Zinkpé; as largas pinturas cromáticas e matéricas de Tchif; as esculturas e pinturas de Gérad Quenun; a grande instalação de Aston, que representa a grande embarcação que une o torrão africano levado por barcos carregados de gentes para o lado de cá do Atlântico; as pinturas e escultura de Edwige Aplogan; os personagens da vida cotidiana e religiosa do Benin esculpidos e pintados minuciosamente pela mão de Euloge Glégle e, por fim, o jovem escultor Kifouli, que simboliza os deuses por meio de suas histórias mitológicas que acompanham as sociedades secretas dos Geledés e das grandes máscaras para os deuses do Vodu. Acrescente-se a tudo isso a arte ancestral em madeira e bronze, a indumentária dos Eguns de Porto Novo e muitas outras manifestações estéticas: o resultado foi um todo que fez dessa exposição um alentado conhecimento dos nossos irmãos do lado de lá do Atlântico. Qual é a importância de encontros como o África Diversa para debater a herança dos povos afrodescendentes? Só assim fixaremos definitivamente em nossa memória o significado daquilo que foi uma sangria no território africano, com mais de 10 milhões de pessoas que atravessaram o Atlântico e com outras tantas que ficaram pela travessia, com essa memorável história oral que, por mais de 400 anos permeia nosso imaginário, nosso instinto, nossa estética, nossa comida, nossa vida, enfim. Encontros com


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esse tema só nos fazem mais fortes, mais corajosos para defender nossa identidade, reivindicar as ações afirmativas como as cotas nas universidades, as cotas no mercado de trabalho, a vida mais digna de um povo que, a despeito de escravizado, tornou verdadeiramente o Brasil mais merecedor de todos nós brasileiros. Encontros como esse livram o estigma que ainda pesa sobre milhões de brasileiros que não têm a oportunidade de se indagarem “quem somos”, “por quem somos” e “o que seremos”.


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Irmandade de Nossa Senhora do Rosรกrio dos Homens Pretos


Capitã Pedrina de Lourdes Santos

Festa do Congo

Festa sincrética do catolicismo com as religiões africanas brasileiras.

A

Festa de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, mais conhecida como Congado, pode ser entendida como uma festa sincrética do catolicismo com o

candombe, vocábulo quimbundo (bantu), e as tradições culturais dos escravos africanos trazidos para o Brasil. A lenda, geradora da tradição dos festejos de Congado, fala da aparição da imagem de Nossa Senhora do Rosário. No período colonial, uma imagem da santa foi vista no mar por escravos que informaram ao seu senhor. Logo o senhor de escravos também levou este fato ao conhecimento da Igreja Católica, que organizou procissões com banda de música para buscar a Santa. Houve três tentativas sem êxito, porque eles a levavam para a Igreja e no outro dia, quando iam ver, a Santa tinha saído da Igreja e voltado para o mar. Diante disto, alguns escravos resolveram pedir ao seu senhor para irem buscar a Santa, com seu jeito simples, descalços, com seus tambores e sua dança. O senhor de escravos ameaçou com chicotes levá-los ao tronco, lugar de castigos, dizendo que eles queriam fugir da lida, do trabalho. Os escravos disseram ao seu senhor que, se não desse certo, aceitariam o castigo. Então o senhor de escravos consentiu e este terno (grupo) de escravos, composto por sete homens e uma mulher, que fossem dançando, cantando, tocando seus tambores. A Santa aceitou a companhia deles, acompanhando-os até a Igreja, onde finalmente ficou. Desde então Nossa Senhora do Rosário passou a ser considerada padroeira e protetora dos negros.


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Segundo o entendimento do antropólogo e folcloris-

O Rosário.

ta Prof. Saul Martins, o congado é uma família de 7 irmãos,

Símbolo máximo da devoção de Nossa Senhora é

onde o pai é o Candombe e a mãe Nossa Senhora do Rosário.

comumente usado em torno do corpo, como proteção. Ser-

Os 7 irmãos são: o Congo, irmão mais velho, que usa espadas e/ou tamborins, vestimentas coloridas e muitos apetrechos, com integrantes que fazem muitas coreografias. Dentro da perspectiva mítica do congado os congos vão à frente, limpando o mal do caminho com seus tambores e com suas espadas e ou tamborins para a passagem dos grupos seguintes. O segundo irmão é o Moçambique, menos enfeitado e que guarnece as coroas. Seus capitães andam portando bastões, dançam com pisadas fortes e com o corpo encurvado para frente, representando os pretos velhos das tradições africanas. Na lenda de origem do Congado, este foi o terno de negros que conseguiu atrair a imagem de Nossa Senhora do Rosário e levá-la para a Igreja. Completam os 7 irmãos da família de congadeiros: os catopés, os caboclos, os marujos, os cavalheiros de São Jorge e o vilão, irmão mais novo do contexto. Cada um tem sua função dentro do cortejo, usando instrumentos, adereços e vestimentas diferenciadas.

ve também para identificar os fiéis devotos.


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Os tambores.

Bastões, espadas e tamborins.

São considerados instrumentos sagrados e são bati-

Os grupos do Congado são chamados de Terno,

zados para utilização nos rituais da Festa de Nossa Senhora

Guarda, Banda ou Cortes. Os capitães portam instrumen-

do Rosário. Cada capitão, ao batizar, dá-lhe o nome que

tos de comando e de proteção como: bastões, espadas e/ou

quiser. Entre os nomes antigos escolhidos, podemos citar

tamborins.

Treme-Treme, Cachoeira e Mata Virgem.


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O trono coroado na Festa de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos é composto por reis, rainhas, príncipes e princesas. Os Reis Congos e os Reis Perpétuos são indivíduos de grande respeito na comunidade, representando as autoridades máximas nos festejos. O reinado é hereditário, assim como os postos de capitão-mor, capitão-regente, capitão-fiscal, alferes de bandeira e meirinhos, termos estes, remanescentes do Brasil Colonial. O trono coroado é guarnecido pelo Moçambique. Na ausência deste, pode ser substituído pelos demais irmãos da família do Rosário, quais sejam congos, catopés, marujos, caboclos, vilão. Há várias Irmandades do Rosário dos Homens Pretos, com inúmeros ternos ou guardas, cujas festas são centenárias nas Minas Gerais. Festa tradicional e muito significativa para aqueles que a praticam, como forma de identidade desses indivíduos na comunidade onde estão inseridos. O congado é uma festa que representa a religiosidade popular das comunidades negras de Minas Gerais, demonstrando a fé e a resistência deste povo. Capitã Pedrina de Lourdes Santos, da Guarda de Moçambique de Nossa Senhora das Mercês. Participa das festividades de Congado na região de Oliveira, MG há 39 anos onde, além de ser importante liderança, foi a primeira mulher a ser capitã de Moçambique. Vem realizando projetos de seminários, oficinas e consultoria sobre este universo cultural. Trabalhou na concepção do projeto A Santinha e os Congadeiros com João das Neves. No projeto África Diversa realizou uma oficina e participou da palestra na mesa sobre “Oralidade e transmissão de saber”. Realizou ainda, no projeto, duas apresentações com a Guarda de Moçambique Nossa Senhora do Rosário e a Guarda de Congo de Nossa Senhora das Mercês.




“Licença, ô licença licença eu vim pedir foi Senhora do Rosário foi quem me trouxe aqui a água do mar é boa, eu vi, eu vi, eu vi”


Da tradição oral para o


João das Neves

teatro popular

S

ob os olhares curiosos dos transeuntes e banhistas da Praia de Copacabana, ao lado do ônibus de que acabavam de desembarcar, os integrantes da Guarda

de Moçambique de Nossa Senhora das Mercês e da Guarda de Congos de Nossa Senhora do Rosário da cidade de Oliveira (MG) terminavam seus preparativos para a realização de um sonho há muito acalentado: o seu encontro com o mar. A viagem até ali fora longa e cansativa, mas ninguém se queixava. Apesar de terem passado quase vinte e quatro horas no ônibus que os trouxera desde a região mineira do Campo das Vertentes até a chegada ao Rio de Janeiro, os olhares de todos brilhavam e nos lábios de cada um brincava um sorriso. Diante eles, o mar. Com seus mistérios, imensidão, com as águas em que haviam navegado os navios negreiros, em cujo bojo vieram seus ancestrais como escravos, na mais tenebrosa página da história da colonização portuguesa no Brasil. “ Sereia, sereia,

Saia do mar, sereia E venha brincar Na areia.”

E, ao som do canto, entoado pela Capitã Pedrina, e seguido em coro pelos membros das guardas, as ondas do mar não se fizeram de rogadas: vieram molhar os pés dos congadeiros trazendo – quem sabe? – em suas espumas a sereia do mar pra vir “brincar na areia”.


38 } ÁFRICADIVERSA:revista

Para nós e para os congadeiros fechava-se ali um ci-

Pedro Aponísio, o Tio Pedro, nos colocava diante de pro-

clo. Iniciado quando, pela primeira vez, ouvíramos a história

blemas delicados. O primeiro deles era o da transposição da

do mítico encontro de Nossa Senhora do Rosário com eles,

tradição oral para a cena representada. Como fazê-la sem

seus devotos. Devoção forjada no cadinho da escravidão,

que isso representasse, ao mesmo tempo, uma traição às

devoção que, longe de representar a submissão a uma reli-

matrizes congadeiras e uma ruptura com aquela tradição ?

gião imposta pelos seus opressores, significava, ao contrário,

Qual versão do encontro escolher? Havia muitas, a

a sua apropriação, transformando-a em arma de resistência

de Tio Pedro era apenas uma delas. Mas assim é a tradição

contra a escravidão. História que havia sido contada a mim

oral. Ali não há mentiras, mas a verdade profunda de cada

e à cantora Titane por Tio Pedro, como carinhosamente o

um. Que transcende quaisquer conceitos redutores das pa-

chamávamos. Tio Pedro, que no melhor estilo da tradição

lavras “mentira” e “verdade”.

oral em que se havia formado, nos transmitia essa e outras

Dois outros aspectos nos preocupavam. O primeiro

histórias. Muitas histórias, contadas por seus antepassados

se referia à questão da apropriação. Até que ponto teríamos

de pai para filho desde tempos imemoriais. E fôra ele que,

o direito de simplesmente nos apropriarmos daquela(s)

no dia mesmo em que relatou aquele encontro, nos sugeriu

história(s), levando-a(s) ao palco? O segundo, e ainda com

com um largo sorriso: “vocês bem que podiam fazer um teatro

estreita ligação com o anterior, era com relação ao elenco.

com essa história.”

Como seria formado? Por atores profissionais sem que ti-

Estava posto o desafio. Mas a sugestão do Capitão

vessem, necessariamente, algum vínculo com o Congado?


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Ou por congadeiros que, assim, estariam contando sua pró-

mitida por gerações de pais para filhos e que arrancou de

pria história?

uma senhora bem velhinha esta frase:

Havia ainda a percepção de que estávamos vivendo um momento de transição. Aquele em que um ritual religioso, cioso de seus fundamentos, se traslada para uma manifestação artística, a ela emprestando parte de sua história. E todos os envolvidos nesse processo, artistas e congadeiros, deveriam ter plena consciência da importância, da delicadeza e dos riscos desse momento. A generosa contribuição da socióloga e rainha Conga Leda Maria Martins, da comunidade do Jatobá (BH), da Capitã Pedrina dos Leonídios (Oliveira-MG) e do capitão, Sr. Antoniozinho dos Ciriacos (Contagem-MG), foram fundamentais para que, todos juntos, vencêssemos os desafios que tínhamos pela frente, construindo um espetáculo certamente inesquecível. Um espetáculo que, em sua aparente simplicidade, tem a força narrativa das diversas versões de uma história trans-

- “Meus filhos, vocês deveriam marcar uma data para

apresentarem essa peça. Todos os anos. No mesmo dia.” Frase que bem poderia ter vindo nas ondas do mar, como a sereia que se deitou, naquele dia ensolarado nas areias de Copacabana, aos pés dos congadeiros, seduzida por seus cantos e ritmos de suas caixas, gungas e patangomes. João das Neves é dramaturgo, diretor, ator e escritor. O carioca João das Neves tem um currículo eclético com prêmios como Mambembe, Molière (vários), Bienal Internacional de São Paulo, Golfinho de Ouro e Quadrienal de Praga. Dirigiu o teatro de rua do CPC da UNE até sua extinção pelo golpe de 1964, ano em que foi um dos fundadores do Grupo Opinião, que ficaria em atividade por 16 anos, onde trabalhou em parceria com autores como Vianinha e Ferreira Gullar. Em 1988 volta ao Rio de Janeiro onde encena, durante as comemorações pelo centenário da Abolição da Escravatura, A Missa dos Quilombos, de Milton Nascimento, Pedro Tierra e D. Pedro Casaldáliga. Dirigiu em 2007 o espetáculo Besouro, Cordão de Ouro no Centro Cultural Banco do Brasil e em 2009 o espetáculo A Santinha e os Congadeiros, com participação de comunidades afrodescendentes da tradição do Congado de Minas Gerais.


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A palavra ancestral


François Moïse Bamba

Q

ue grande paradoxo me pedirem para escrever

importante ou senão mais importante do que aquele que

um texto sobre a oralidade, mas bom...

porta a palavra. Isto porque quem escuta é que dá valor e importância àquele que fala. Os antigos, em minha terra,

Uma sociedade é considerada oral quando o essen-

dizem que uma pessoa que sabe escutar, sabe falar; e ainda

cial da sua cultura, suas crenças e sua educação se passa

que aquele que fala, se revela; enquanto aquele que escuta

através da transmissão verbal.

se fortalece daquilo que diz o falante – usando a palavra

As sociedades orais se caracterizam pelo fato de que, para experimentá-las, é preciso haver dois: aquele que tem a palavra e aquele que a escuta. E aquele que a escuta é tão

recebida para o bem ou para o mal. A oralidade se divide em grupos que sabemos ser divisíveis em subgrupos.


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Podemos citar, entre outros: a palavra, o conto, as lendas, os mitos, os provérbios, as charadas, os cantos e as cantigas. Existem muitos outros, mas vou parar por aqui. A base de todas as coisas na Terra é a palavra. Dizemos que tudo começou pela palavra e tudo termina por ela. No momento em que uma criança nasce, escutamos seu choro e entendemos que ela nasceu, mas este nascimento só passa a ser celebrado quando uma voz acompanha este choro, pronunciando em voz alta: “Ele nasceu”. O mesmo acontece com a morte. Não começamos a preparar um funeral enquanto a morte não for anunciada pela palavra. Na sociedade de onde eu venho, a palavra tem um lugar muito importante, nada é colocado antes da palavra. Você é julgado a partir do compromisso com a palavra dada e respeitado pelo cumprimento dela. Ela nos constrói e nos desconstrói. O maior bem, a maior força que nossos pais podem nos dar são suas bênçãos, sobretudo aquelas dadas pela mãe. Acreditamos firmemente que estas bênçãos são palavras que propiciam nosso sucesso, honra, bravura e esperança... Esta fato coloca nossos pais numa dimensão onde eles terão sempre alguma coisa de muito importante para nós: “suas bênçãos”. A maior desgraça que pode nos atingir e destruir é a maldição de nossos pais. Quando você é banido, são apenas palavras, mas que te tocam a tal ponto que tudo se torna sombrio - e perdemos a consideração dos nossos e dos outros, não importa quem você é e o que possui. Toda nossa educação é baseada no valor desta palavra e a peça-chave desta palavra é a escuta.


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Desde a nossa tenra idade somos educados a cultivar a escuta. Do ventre de nossa mãe, passando pelo nosso nascimento, até a idade adulta, a palavra nos acompanha sob formas diferentes. No ventre de nossas mães até suas costas, somos embalados por cantigas. Depois, nos momentos de banho e de refeições nos contam pequenas estórias cantadas até que adormeçamos. E é assim que todas as etapas de nossa vida são acompanhadas por contos e relatos de diferentes formas até a idade adulta. Até mesmo nas cerimônias de casamento

restre e sua fauna, e do Bozo, pescador profissional, que sabe

são ocasiões de compartilharmos a palavra.

domar a fauna de natureza aquática ? O que seria deste rei

De uma maneira geral, as pessoas que não são deste

ou chefe sem o conhecimento do Tecelão, que tece as ves-

continente tendem a reduzir a África a um país, o país Áfri-

timentas a altura de sua posição? E principalmente, o que

ca, e a fazer um amálgama de seu povo; melhor seria dizer,

seria deste rei, deste chefe, se não houvesse o Djeli/Griot

de seus povos...

para cantar seus louvores, para contar sobre suas bravuras,

No máximo, eu aceitaria uma divisão da África em zonas geográficas, a África do Oeste, que me concerne, tem

combates, vitórias e conquistas e, sobretudo, contar a história da sua linhagem e de seu povo?

uma cultura muito forte de tradição oral. Os povos desta

Se existe uma coisa que é única para cada um e que

zona têm uma organização social que aceita um sistema de

toca da mesma maneira o rei, chefe, Nounou, Dosso, Bozo, Dje-

classes na sociedade: a dos nobres e as outras castas.

li, Cultivador, é o impacto da palavra sobre a pessoa a quem

Longe de estabelecer uma classificação hierárquica,

ela é destinada, e sobretudo o impacto da palavra da mulher.

este é um sistema de organização onde cada um tem seu

Dizemos em minha terra que o pai pode lançar

lugar. Na verdade, se o rei ou chefe e sua descendência são

maldições, mas se a mãe profere maldições, elas nos se-

chamados de nobres, o que seria do poder deste rei, chefe,

guirão toda a vida. Na tradição de minha terra nos foi

sem o saber do Nounou - o ferreiro que transforma o metal

ensinado que a maior maldição que pode nos atingir é

em ferramentas tão úteis para a sociedade e seu saber de

aquela lançada pela mãe. Nos ensinam também que todas

criar a ligação entre o mundo visível e o invisível? Que seria

as pessoas que têm a idade de seus pais são como seus

do poder de um rei, de um chefe sem o poder do Dosso,

pais; e, em minha terra, eles têm valores semelhantes e são

caçador profissional, pessoa que sabe domar a natureza ter-

respeitados como tal.


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Cada uma destas classes sociais tem um conjunto de

A palavra-palavra (Kouma na on ka i fo)

palavras que lhe é própria, masco personagem central desta

É a palavra que todos usamos, a palavra em todos os sentidos,

sociedade oral é o Djeli, o Griot. Ele é o mestre da palavra.

aquela que diz “bom dia”, “como vai”, aquela que fala mal e

Ele é a testemunha privilegiada da evolução da sociedade,

critica. É também esta palavra que é conhecida, entendida e

pois está no início e no final de todas as cerimônias. Todas

dita por todo mundo nas ruas, no mercado e em todo lugar.

as informações que tem são transmitidas de pai para filho, de mãe para filha e de geração em geração. Ele é historiador

A palavra-provérbio (Taléén)

e geógrafo, pois é a memória viva do povo, das mudanças

A palavra que nasce de uma outra palavra e que não deve

climáticas. Ele é dançarino, cantor, músico pois assim enfeita

ser tomada no seu primeiro sentido. Esta palavra é dita e

seus discursos e suas apresentações.

ouvida por todos os ouvidos iniciados e ela pode ser dita e

Os Griots dizem que existem quatro tipos de palavras:

ouvida por todo mundo.


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A palavra antiga (Kouma Korô) A palavra que nos fala de nossas origens, de nossos ancestrais, de quem somos, de onde viemos e como chegamos aqui. Esta palavra está ao alcance de todo mundo com a condição de se pedir a permissão de seu uso àqueles que a detêm. A palavra sagrada (Landa Kouma ou Kôrôlélénkow) A palavra que faz a ligação entre o mundo visível e invisível, a palavra que cria a ligação entre o mundo dos mortos e o mundo dos vivos. A palavra que é dita nas iniciações. Esta não é conhecida por todos e não pode ser dita por qualquer pessoa a qualquer momento. Apenas nos baseando nestes quatro elementos podemos nos dar conta que a palavra pode ter várias cores e graduações e que ela se adapta. Apesar da diversidade da palavra, dizemos sempre “a palavra” e não as palavras; isto mostra bem o lado fiel da palavra. Quando nos comprometemos pela palavra, pronunciamos vários termos, várias frases que engajam a nossa palavra. Mas esta palavra é única, assim como deveria ser nosso comprometimento com a palavra dada. Isto caracteriza tantas sociedades de tradição oral que alguns de seus saberes e costumes são incompreensíveis por aqueles que não são desta cultura. No meu vilarejo, nenhum papel determina os limites das várias terras que existem. Entretanto, cada habitante sabe dizer onde começa e termina as terras desta ou daquela família, desta ou daquela pessoa. Muito raramente surgem conflitos ligados à terra, salvo no seio da própria família ou nem mesmo aí.


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54 } ÁFRICADIVERSA:revista

O que sei da oralidade é que não se para de apren-

vida não seria suficiente para falar das sociedades orais e

der. Por mais única que seja a palavra, a palavra verdadeira,

de seus povos. Este texto é o desejo do início do início do

nunca existe uma só verdade.

início de um começo...

Os anciãos dizem que metade da palavra pertence àquele que a disse e a outra metade àquele que a escutou. Eles dizem que um erro admitido já é meio perdoado e

François Moïse Bamba é contador de histórias da tradição Sénoufo, de Burkina Faso. Seus contos traduzem a tradição oral burkinabé e suas apresentações são construídas com repertórios diversos, que trazem sempre a filosofia da vida da sociedade

que a melhor maneira de nunca se enganar é admitir que

em que se formou. François é um dos responsáveis pela Maison de la Parole, em

podemos nos enganar. Dizem ainda que devemos guardar

radores na África, que faz ações na área de educação e cultura,com construção de

Burkina Faso, que realiza anualmente o YELEEN, importante festival de nar-

as palavras e os nomes nascidos em outras culturas em sua

bibliotecas e acervos literários. É ainda o presidente da Associação AFRIFOGO,

língua de origem.

tucionais do conto na África do Oeste Francófona. No projeto África Diversa

As sociedades de tradição oral são sociedades de encontro, partilha, troca e fidelidade à origem das coisas. Uma

criada visando a fortalecer as capacidades individuais, organizacionais e instiministrou uma oficina, integrou a mesa com tema: “Oralidade e Transmissão de Saber” e realizou uma residência artística com a contadora de histórias Daniele Ramalho, com quem fez apresentações.


“Existe a minha verdade, a sua verdade e a verdade.�


Sementes que vieram da África para o coração da educação


Heloisa Pires Lima

P

or que nos sentimos tão atraídos para conhecer

meio de algum material ou mesmo comentários a respeito

um pouco mais, ver de perto algo a mais, vivenciar

de pessoas ou sobre o continente foram levando à tona lem-

encontros, cada qual com um saber a mais, sob a

branças arraigadas à cada biografia.

bandeira flamejante com a inscrição África Diversa? Afi-

Por sua vez, descobrimos um modo ágil para fazer

nal, compartilhamos a sensação de estar na Calouste Gul-

notar a nós mesmos meninos e meninas a lidar com as re-

benkian criando uma vibração na cidade. Vimos corredores

presentações de Áfricas e noções correlatas construídas e

entrelaçando sentidos e cores pautados nessa origem africa-

preservadas em nossas percepções. Percebendo o processo

na. Salas que resguardaram tons singulares do dinamismo

da criança de cada um tínhamos uma via rápida para sen-

nessa descendência. Sabores, vitrines especulares, perfumes

sibilizar o olhar sobre a infância à nossa frente, ou seja, a

de luzes no palco, balaio de vime com filmes, gente bonita

geração que estamos formando.

bailarina, alguns santos e tantos pecadores de um imenso tear de mesclar contadores de diversas histórias.

A educação definida como tarimba para chamar a atenção de um ou outro detalhe do mundo necessita o

Aqueles que chegaram para a oficina A semente

tempo todo quebrar automatismos, superar clichês e estar

que veio da África ficaram expostos ao desafio: como um

pronta para pesquisa promotora do conhecimento. A vi-

evento não ser apenas um evento? Como não deixar a ex-

vência a partir de conteúdos profundos pode vir a sinalizar

periência densa se perder no vento? Primeiramente loca-

caminhos inovadores para o crescimento com a questão.

lizando que África é esta que nos atraiu? Se o conteúdo

Para tanto, podemos revisitar um período mais dis-

simbólico motivador se relaciona com uma materialidade

tanciado da sociedade brasileira do mesmo modo como

buscada na vida real, então, coube investigar que espécie de

observamos nossos conteúdos pessoais. Examinar o reper-

ponte cada qual construía na comunicação tão desejada?

tório específico nos espaços educativos do passado, isto é, o

Potencializando o momento precioso, o foco sugeriu

acervo de simbologias e as formas de abordar a referência já

a busca por africanidades resguardadas dentro de nós. O

possibilitaram detectar tratamentos relacionados ou à invi-

esforço de remexer a cabaça da memória afetiva atentando

sibilidade da questão ou o destaque com associações muito

para os contatos remotos relacionados ao tópico foi dan-

reduzidas recorrentes em torno do assunto escravidão. Tan-

do voz e face à ideia nos apresentada desde a infância. Por

to que, no século XXI, o debate pedagógico maior precisou


58 } ÁFRICADIVERSA:revista

de lei para integrar e ampliar a produção de conhecimen-

Todavia, argumentos culturais pesados em racismos

to a respeito. E com respeito, pois, o dimensionamento do

de muitas ordens desse tempo distante podem ainda fre-

passado forneceu inúmeros alertas para não haver a repro-

qüentar a atualidade em brinquedos, brincadeiras, fantasias

dução de antigos erros para a aproximação. O século XIX

de carnaval, textos piadísticos, enfim, como camadas assenta-

e boa parte do século XX ofereceram materiais envoltos na

das no imaginário a exigir alertas do setor educacional. Em-

prática de bestializar os africanos, ou seja, retirando deles o

bora algumas teorias racistas tenham sido banidas do mundo

status de humanidade. Ou de ressaltar exotismos e selva-

adulto e refutadas por acadêmicos maduros, veja que podem

gerias a partir da lógica de contrapor o continente negro à

adquirir, nos aparentemente ingênuos formatos, canais para

civilização “ocidental” em contextos colonialistas e imperia-

fixar preconceitos, estimular estereotipias e evocar atitudes

listas. A postura corporal, a expressão da face, a cor da pele

discriminatórias. O modelo de humanidade presente nas

resultando figuras grotescas foram bases de apoio ao repre-

idéias de África são simbolismos a agir sobre a qualidade da

sentar as diferentes sociedades materializadas nos enredos,

vida real. E o que dizer da desqualificação da origem africana

sobretudo os disponibilizados aos jovenzinhos.

tão presente na identidade de Brasil e de ser brasileiro?


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Ao refletirmos acerca da aproximação que queremos intensificar com as diversas Áfricas em nossos inquéritos pessoais, expomos o compromisso de ultrapassar antigas ignorâncias. As Leis 10639/03 e 11.645/08 que, ao preverem uma educação de excelência, chamam a responsabilidade dos educadores em não contribuir para a estereotipia, o preconceito ou o racismo do ambiente educacional, são um convite a nossas visões de futuro. É legal, portanto, há incentivo para o trabalho de superar um desequilíbrio histórico quanto à presença da matriz africana e a indígena na formação com respaldo oficial. Se a origem europeia esteve sempre presente e valorizada em pluralidade, a equidade para o tratamento de demais origens é a harmonia a ser alcançada. E é esta exata percepção que vem promovendo a inversão cultural tão necessária e disposta a abrir o coração para conhecimento. E aí surgem as descobertas. Se existe uma África insistentemente marcada como perdedora social, associada à dor e ao sofrimento, nos perguntamos por que ser esta tão somente a única referência? Ou, ao menos, por que não reportar aos fatos com novas leituras, pontos de vista, ângulos capazes de conduzir re-significações. A população brasileira tem muito a contribuir nas concepções que passam pela experiência existencial afrodescendente historicamente apartada do acesso à produção de bens culturais. Alianças pontuais com os africanos são bem-vindas. Assim, as Áfricas que podem entrar pelo coração são diversas para o aprendizado. Temos o vício de imaginar o continente africano como um país de um único povo com uma só religião e modo de conceber a existência. Esta África homogênea arraigada em nossas percepções pode


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ser enriquecida com aproximações efetivas e reveladoras

Se o que nos atrai faz bater forte o coração, podemos

de complexidades culturais. Estreitamentos que permitam

educar esse amor como o plantar de sementes que projetem

notar de imediato seu dinamismo no tempo. Não buscamos

o futuro. E como bem cantou a sensibilidade da educadora

mais uma África estática e envelhecida em traduções cultu-

encerrando o dia: É o Grande Baobá ObaObaObaOba!

rais nem sempre respeitosas. A ideia de uma África Diversa explode em facetas e possibilidades. É o caminho que oferece a perspectiva de construções efetivas a reunir circuitos de aprendizagem entre o cá e o lá, de valorizações infinitas baseadas em saberes daqui e dali, de exibições inéditas desse universo particular que tornarão conhecidas suas inúmeras singularidades que permitam a admiração.

Heloisa Pires Lima é antropóloga titulada pela Universidade de São Paulo até o Doutorado com bacharelado em Psicologia pela PUC-SP. Autora de literatura infanto juvenil, entre outros, Histórias da Preta (1998, Cia das Letrinhas) e Toques do Griô (2011, Melhoramentos). Atual consultora para a série Livros Animados - TV Futura - projeto A cor da cultura/MEC/ Fundação Roberto Marinho.


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O continuum iorubano na religiosidade afro-brasileira e afro-cubana

Ibara-go-o/ Mojubara/ Ibaragô –ô/ Ago mojubara/ O-Omode koni koxi barabô – ô/ Ago mojubara/ Eleguá Exu Lona

(transcrição fonética de um cântico ritual do orixá Elegbara, conhecido e entoado no Brasil e no Caribe)

s formas religiosas de origem iorubana praticadas

A

Tradicionalmente reconhecida como a capital reli-

no Brasil e em Cuba chegaram organizadas às

giosa dos iorubás, Ifé é o lugar mítico da criação do mundo,

Américas, certamente na passagem para o século

a partir da ação de Odudua, personagem efetivamente his-

XIX, e até hoje conservam evidências indicadoras de sua

tórico e não apenas mitológico, herói fundador e tido como

origem comum.

pai de todos os iorubás. Já Oió é a capital política, de onde

Entre essas evidências destacam-se os cânticos ritu-

emanou o poder dos alafins, grandes reis conquistadores,

ais e as evocações dos nomes dos ancestrais fundadores de

como Oraniã, filho de Odudua, e Xangô – ambos também

suas linhagens religiosas no exílio, pronunciadas no início

afirmados como heróis de carne e osso.

de cada rito.

Já sob influência do tráfico atlântico de escravos,

Pois esses cânticos e evocações constituem a prova

no final do século XVII, Oió trava guerra com o Daomé,

cabal da existência de um continuum iorubano na Diáspo-

numa contenda que se estende por cerca de duzentos anos.

ra, representado pelo “candomblé” e pela santería, nos seus

E por quase todo o século XIX, seu Estado se enfraquece

respectivos papéis de instâncias preservadoras do culto aos

em guerras internas, que põem em confronto diferentes et-

orixás iorubanos e jeje-iorubanos nas Américas.

nias como ijexás, ijebus, efãs, egbás etc., cujos nomes ainda ecoam no ambiente das religiões afro no Brasil e no Caribe.

Guerras

No cenário dessas guerras foi que, segundo algumas

A história do conjunto de povos falantes do iorubá é

interpretações, altos sacerdotes teriam tomado a si uma ta-

contada a partir das antigas cidades-Estado de Oió e Ifé e de

refa: manter vivas suas tradições religiosas, recriando-as nos

várias outras unidades políticas, localizadas na porção sudoes-

países para onde o escravismo os levava.

te da atual Nigéria. Entre elas, conta-se também o importan-

Nesse momento e nesse espaço, em 1789, a vitória

te reino de Queto, na fronteira com o Benin, antigo Daomé.

arrasadora do exército jeje do Daomé sobre o reino nagô de


Nei Lopes

Queto (Nagó ou Anagó é o termo jeje que designava o país

delo de candomblé até hoje vigente, concentrando vários

Iorubá), determinou a vinda em massa de nagôs escraviza-

cultos a divindades de procedências diversas. Entretanto,

dos para a Bahia. É certamente nesse quadro histórico que

por volta de 1807, o grupo integrante da linhagem real

se formam os primeiros candomblés baianos, tendo como

mudou-se para Matatu de Brotas, no subúrbio, deixando

matriz o “Candomblé da Barroquinha”

na Barroquinha os antigos aliados. Aí, o terreiro suburbano deu origem ao Candomblé do Alaqueto e o do centro à

Brasil e Cuba

atual Casa Branca do Engenho Velho.

A saga da fundação dessa comunidade seminal é des-

Já em Cuba, a história da religião lucumí (ioruba-

crita no livro O candomblé da Barroquinha, de Renato Silvei-

na) registra, na primeira metade do século XIX, a presença

ra, lançado em 2006. Nele, aprendemos que sua fundação, no

de diversos sacerdotes e sacerdotisas procedentes de Oió,

centro da capital baiana, se dá logo após a invasão de Queto.

como Filomeno García (Atandá), Monserrat González

Os fundadores teriam sido membros de uma linhagem

(Ápoto) e Remígio Herrera (Adeshina). Chegado à Ilha

real de Queto e aliados, os quais instituíram, ali, um culto do-

provavelmente no início da década de 1820, ainda menino,

méstico ao orixá caçador Odé Oni Popô e, logo depois, tam-

esse último, cujo nome é até hoje saudado, como os outros

bém a Airá Intilê, um dos avatares ou manifestações de Xangô.

mencionados, nas evocações rituais de sua descendência re-

Firmou-se, então, uma aliança que fez surgir o mo-

ligiosa, participou de eventos históricos fundamentais. Na


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década de 1860, ele é mencionado, em Regla, cidade marí-

Continuidade

tima próxima a Havana, juntamente com Atandá e Añabí,

Por força da queda das cidades-Estado de Queto e

na fundação de uma pioneira comunidade dedicada ao cul-

Oió foi que a religião dos orixás jeje-iorubanos se estrutu-

to de Iemanjá.

rou na Diáspora e se disseminou, principalmente no Brasil

Observe-se que algumas fontes mencionam, tam-

e no Caribe. Prova disso é a afinidade maior de algumas

bém como “Adeshina” e com história de vida semelhante,

tradições cubanas com as de Pernambuco, provavelmente

outro africano, Eulógio Gutierrez, que teria sido o intro-

advindas de Oió, em relação às da Bahia, certamente ori-

dutor do Culto de Ifá (o orixá do saber e da adivinhação)

ginárias de Queto; e a existência de culto a orixás como

em terra cubana. Polêmicas à parte, o importante é que, na

Xangô, Ogum e Iemanjá, por exemplo, em diversas regiões

África, a época da provável chegada de Remígio Herrera a

das Américas.

Cuba coincide com a destruição de Oió e a vinda de mi-

Passados, então, quase duzentos anos, a religião de

lhares de seus habitantes para as Américas como escravos.

matriz jeje-iorubana, permanece e se recria na Diáspora,


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sempre por força da oralidade e principalmente através do

convencional, é dever do bom intérprete de Ifá, ter na me-

saber emanado do sistema oracular ou divinatório de Ifá.

mória o maior número possível de itãs ou parábolas mito-

Esse sistema consubstancia-se nos odus, símbolos através

lógicas para com eles interpretar os desígnios do oráculo.

dos quais o orixá Orumilá ou Ifá transmite seus ensinamentos, através de parábolas. Os odus são, em princípio, 16, os quais matematicamente combinados completam um conjunto de 256, que, novamente combinados, vão perfazer um total de 4096, cada um contendo as diversas mensagens em parábolas, interpretadas pelos babalaôs. No mesmo caminho dos sábios antigos, que tudo memorizavam naturalmente, pois não dominavam a escrita

Essa tradição, viva e operante no Brasil e fora dele, é um dos maiores exemplos do valor e da força da oralidade na transmissão do saber. Nei Lopes é sambista, compositor e escritor. Possui mais de 300 músicas gravadas. Desde

os anos 90 vem esforçando-se pelo rompimento das fronteiras discriminatórias que separam o samba da chamada MPB, em parcerias com músicos como Guinga, Zé Renato e Fátima Guedes. Em 2004 lança, pela Fina Flor, o CD Partido Ao Cubo contemplado com o Prêmio TIM 2005 de melhor CD de samba e indicado ao Grammy Latino. Como escritor possui vasta obra toda centrada na temática afro-brasileira, compreendendo ensaios como Logunedé, santo menino que velho respeita (2000), além de um Dicionário Banto do Brasil (1996), entre outras publicações. Participou do África Diversa como mediador da mesa sobre “Oralidade e Transmissão de Saber”.


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No rastro das diversidades


Haroldo Costa

É

tão imprópria a denominação de cultura africana

um ser que realiza sua obra tendo em vista a representação

quanto a de cultura brasileira. Isto porque são mui-

lúdica ou factual de sua comunidade. Por isso a arte afri-

tas as Áfricas, tal como são inúmeros os Brasis. No

cana, aí no seu sentido continental, revela um sentimento

caso africano, não é só a imposta demarcação geográfica

que não é pessoal ou exclusivo, mas, sim, que interpreta os

dos países que faz a diferença, esta é apenas física: o que se

outros. Por isso é fascinante e rica, imprevista e impactante,

estabelece como identidade são os valores, as heranças, o

social e espiritual. Pode-se mesmo dizer, creio, que não se

comprometimento com o exercício da vocação para a con-

trata de uma representação, mas, sim, uma transposição.

tinuidade do que vem sendo forjado desde o passado. São

O Rio de Janeiro foi palco de um dos mais belos

muitos os caminhos que as diversas etnias desenvolvem, e

acontecimentos dos últimos tempos. Por iniciativa da Se-

estas não consideram que a sua história se esgota nas tais

cretaria Municipal de Cultura, foi realizado o I Encontro

fronteiras. A riqueza das várias culturas africanas reside

de Cultura Afro-brasileira, dentro da perspectiva da África

exatamente na representação artística das suas vivências

Diversa. Inesquecível para quem teve a oportunidade de

presentes e passadas. Quando nos defrontamos com uma

assistir ou participar, foram dias de convivência com notá-

pintura ou uma escultura, a sensação não é apenas de uma

veis personalidades que vêm dedicando sua vida ao estudo

observação estética movida pela admiração das soluções

e à propagação da influência da contribuição africana na

encontradas, seja na forma ou na textura. Vai tudo mui-

formação da cultura brasileira e às diversidades de ambas.

to mais além, contempla-se a inspiração do artista que diz

Foram momentos de raro prazer e aprendizado ou-

muito mais do que se vê, e reflete um coletivo que alicerça

vir o embaixador Alberto da Costa e Silva e o multiartista

o seu trabalho.

Emanoel Araújo discorrerem sobre estes assuntos com a

Na sua multiplicidade e diferença, a arte dos iorubás,

tranquilidade e a competência de quem os conhece muito

haussás, ebos, senufos, baulés, dans e de tantos outros grupos

bem. O embaixador fez revelações e considerações impor-

étnicos nos ensina que o artista africano é, por excelência,

tantes sobre a diferença de comportamento, criação artísti-


70 } ÁFRICADIVERSA:revista

ca e práticas religiosas das diversas etnias que compõem o

tas memórias na vida carioca, e no Centro de Artes Hélio

mapa humano do continente africano. Estudioso perspicaz

Oiticica. Ambas tiveram a curadoria de Emanoel, realiza-

e permanente, com diversas obras publicadas, e palestran-

dor imbatível de espaços culturais e artista que o mundo

te que sabe dosar a informação com o humor, Alberto da

reconhece. Se não tivesse feito nada, bastaria ter o crédito

Costa e Silva é o pioneiro na observação de vários aspectos

da reabilitação da Pinacoteca do Estado de São Paulo e a

das culturas africanas e sua aclimatação em nosso país. Ele

criação do Museu AfroBrasil, que tornou-se uma referência

faz parte da estirpe à qual pertenceram Pierre Verger e An-

internacional pelo seu rico acervo, iniciado com doações do

tonio Olinto, para citar apenas dois, cuja particularidade

próprio Emanoel, e pelas exposições constantes que realiza.

é abordar o assunto não com o olhar de quem está fora,

Uma teve o mesmo titulo da mesa e a outra nos trouxe O

com lupa de cientista, mas vivendo cada momento como

Benim: ancestralidade e contemporaneidade.

qualquer participante do habitat, vivenciando as lembran-

O impacto causado pelos trabalhos mostrados em

ças ancestrais e atento às perspectivas que o presente traz,

ambas exposições foi avassalador. É como se tivessem ras-

para se tornar futuro.

gado o nosso peito para mostrar quem realmente somos.

Sem dúvida, um dos tópicos mais apreciados pelo

Um novo conceito de África certamente foi revelado para

publico presente foi sobre a presença forte da mulher nas

todos que tiveram a oportunidade de apreciar as obras de

sociedades africanas. Descortinou um novo olhar para a

artistas maravilhosos, donos de uma técnica surpreendente

compreensão da nossa própria realidade, onde, apesar da

e de uma visão humanística que muitos jamais perceberam.

situação em muitos casos humilhantes das mulheres negras

A política cultural da nossa cidade sem dúvida deu

no Brasil, tem que ser realçada a sua posição de inegável

um salto de qualidade e de comprometimento com a causa

liderança nas casas religiosas, nos folguedos folclóricos, no

do reconhecimento da arte produzida nos lados do Atlântico.

ambiente do samba e, na raras vezes, em sua própria casa. Sob o título Há Muitas Áfricas do Lado de Lá do Atlântico, a mesa inaugural do Encontro, ao juntar Alberto

Haroldo Costa é ator e escritor. Começou a atuar no Teatro Experimental do Negro, na peça O Filho Pródigo, de Lucio Cardoso. De volta ao Brasil, depois da viagem

de cinco anos pelo mundo com a companhia de danças Brasiliana, da qual foi um

Costa e Silva e Emanoel Araújo, criou um grande mosaico

dos fundadores, diretor artístico e bailarino, foi convidado por Vinicius de Mo-

que construiu um painel de informações que acrescentou

é autor dos livros Catulo da Paixão, Fala Crioulo, Na Cadência do Samba e

conhecimento e orgulho na plateia. Numa atitude original e ousada, os dirigentes do Encontro inauguraram duas maravilhosas exposições, no Centro de Artes Calouste Gulbenkian, situado na mesma área da Praça Onze de tan-

raes para protagonizar a peça Orfeu da Conceição. Atuou em diversos filmes e 100 anos do Carnaval do Rio de Janeiro. Foi mediador da mesa de abertura do projeto África Diversa.


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entrevista: Nascido no Recife, Naná Vasconcelos começou a tocar percussão ainda adolescente, em uma banda marcial, e não parou. Mudou-se para o Rio de Janeiro no fim dos anos 60, quando, destacando-se pelo domínio do berimbau, gravou com Milton Nascimento e Geraldo Azevedo, passou por São Paulo e logo em seguida ganhou o mundo, morando em Paris (5 anos) e Nova York (27 anos). Hoje, aos 66 anos, é um dos mais aclamados e conceituados percussionistas no mundo, com a tranquilidade de quem sabe que foi um dos responsáveis pela inclusão da categoria “percussionista” na revista norteamericana DownBeat (bíblia dos instrumentistas) e influenciou grupos como o incensado Stomp. Rindo do termo “local”, Naná, que se apresentou no África Diversa, explica porque não é preciso se prender ao passado para respeitar suas origens africanas e pernambucanas.


{por Táia Rocha/SMC}

Naná Vasconcelos Você é percussionista há décadas e já tocou com nomes de peso no Brasil e no mundo, de Egberto Gismonti ao Talking Heads, já morou na França e nos Estados Unidos. Depois de tantas voltas por aí, tantas experiências musicais diferentes, como você vê a colaboração brasileira à percussão? A percussão é o Brasil. Porque só nós temos uma variedade tão diferente de instrumentos, que muitas vezes nós criamos. É diferente do que se vê na Índia, na Europa, no mundo inteiro. Para você entender, a revista americana DownBeat, que sempre elegeu os melhores instrumentistas, precisou criar a categoria “melhor percussionista” por causa dos percussionistas brasileiros pioneiros. Até então, só havia latinos que tocavam bongôs e maracas, mas os brasileiros chegaram com todo tipo de objetos transformados em instrumento de percussão: penico, caçarola, etc. Então a contribuição brasileira na percussão universal é enorme, porque, em todo estilo musical, pop, jazz, bossa-nova, todos querem ter um brasileiro. Faz uma grande diferença. Hermeto Paschoal pega uma chaleira e toca, eu toco um penico. O Sting quer, o Peter Gabriel quer. O que existe de Pernambuco na sua música? Como você sente essa presença no seu tocar? O que existe é mais o conhecimento que eu tenho da minha cultura, porque não sou um músico regional. Vivi 27 anos em Nova York, cinco em Paris. Eu não “penso local”. Tenho essa estrutura muito forte, como um ponto de referência: a riqueza do folclore brasileiro, que está de maneira mais forte no Nordeste. Isso foi o


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que fez com que eu não perdesse minha identidade, que fez com que eu sentisse que tenho uma coisa diferente do que eles têm. A intuição me disse que eu tinha um adicional que eles não tinham. O maracatu e o coco já existem, então pego isso como base, mas minha ideia de música é muito mais universal. Agora, eu rejo todo Carnaval de Recife, 500, 600 músicos tocando maracatu. Você participou do África Diversa: I Encontro de Cultura Afro-Brasileira. O que achou do convite para participar? Adorei, porque foi a primeira vez que fiz uma aula-espetáculo. Achei maravilhoso porque isso é tão importante nos dias de hoje, da tecnologia e da distância, e ali tinha toda uma geração que talvez nunca tivesse ouvido um fandango, um tambor de Minas. Então acho esse contato de extrema importância, não para que aquele espectador queira ser um fandango, mas para refletir sobre sua cultura. Essa é a importância que vejo em conhecer a música tradicional: renová-la. Nos movimentos musicais, a gente tem o mangue beat, em que o Chico Science deu uma injeção eletrônica aos ritmos tradicionais. Ele se aproveitou da cultura local mas criou uma coisa nova: a rítmica e percussão são autênticas, originais dele. No seu show no Centro Municipal de Artes Calouste Gulbenkian, você exibiu imagens do projeto Língua Mãe, que realizou em 2010 unindo crianças brasileiras, portuguesas e africanas lusófonas no aniversário de Brasília. Como foi o projeto? É a ampliação de um projeto que tenho no Brasil desde 1994, o ABC Musical. Idealizei esse projeto por causa da minha paixão por Villa-Lobos, porque antigamente todas as escolas tinham [aulas de] música. Agora isso está voltando, mas eu sempre bati nessa tecla, do ensino musical, porque é o ensino mais efetivo, já que mexe com os sentimentos. Por muito tempo, houve um hiato no ensino


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musical em escolas, então achei que seria importante mantê-lo. O projeto consistia em unir escolas públicas e orquestras sinfônicas, que todo estado brasileiro tem. As orquestras ensinariam às crianças, mas quase não houve interesse oficial. Agora, com o ensino oficial, estou feliz que vá voltar a haver música nas escolas. O projeto Língua Mãe ensina a cada criança a ver a África e a Europa de maneira diferente. Muito da nossa música que veio da África não existe mais lá, idem com a Europa. A música africana de diferentes áreas de lá se encontrou aqui pela primeira vez. Um ótimo exemplo disso é que o berimbau e a capoeira eram de lugares diferentes na África. Uniram-se aqui. O pandeiro é árabe, e foi parar no samba. Esse projeto meu é com crianças de 7 a 10 anos, que é uma idade de transição, de amadurecimento. Normalmente chego à cidade, visito escolas públicas e faço workshops e daí escolho 120 crianças que venham dos quatro cantos da cidade e depois ensino música folclórica às crianças. Ensino se a música é africana, e isso vai do início ao fim do dia. E você ainda reúne crianças de diferentes áreas da cidade, que talvez não se conheceriam. A ideia não é necessariamente despertar o interesse pela música, o que importa é esse encontro. Isso motiva as crianças a pesquisarem e desenvolverem o interesse pela cultura local. No caso específico do projeto Língua Mãe de 2010, no aniversário de Brasília fui para Luanda, Portugal e Ceilândia (DF), reunindo 30 crianças de Portugal, 30 da África e 60 do Brasil, com o apoio do Ministério da Cultura e da Petrobras. Foi maravilhoso. Havia previsão de que o espetáculo e o projeto Língua Mãe resultassem em um DVD e um documentário, já estão disponíveis? Foram feitos sim. O documentário sou eu conversando com as crianças, mas ainda não foi selado. A direção é do Léo Falcão,


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cineasta de Recife, irmão do João Falcão, e que viajou comigo. O DVD vai ser distribuído às escolas públicas em breve pelo MinC. No África Diversa você ministrou oficina de percussão para adolescentes... Foi mais um encontro do que uma oficina. Foi intitulado “O entendimento dos ritmos através do corpo”, porque acredito que todos os ritmos estão entre um passo e outro. O workshop é para artistas e pessoas leigas, usando pé, mão e voz. Quem faz isso é o grupo inglês Stomp... Agora tem muita gente fazendo isso, o Stomp, o Barbatuque, de São Paulo, mas antes eles fizeram workshop comigo na Universidade Livre de Música (ULM). A partir desse workshop nasceu o grupo. Atualmente tenho uma porção de “filhotes”. Ninguém vai criar mais nada de novo, há ideias, e vale o “faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço” (risos). Você foi autodidata... Totalmente. Eu fui criança pobre aqui, em Recife, mas “pobre mas limpo”, não tinha criança pobre dormindo na rua. Era uma pobreza mais digna. Nunca fiz escola de música, minha cultura foi a vivência, hoje vou às universidades dar oficinas.


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Como você analisa a herança cultural africana no Brasil: qual é a importância desse pilar nas nossas artes? A importância é aprender sobre ela para refletir, tomar consciência dessa riqueza, dessa base. Não dá para imitar, ser um “músico africano”, é muito importante como referência. Isso vale para a música, a dança, tudo. Somos de outra cultura. Mesmo que eu beba na África, sou brasileiro. A cultura africana chega a ser até chocante para nós. No África Diversa mesmo tinha um corredor de fotografias que, depois de passar por ele, eu me benzi (risos). É outra cultura. Então acho que a importância está como ponto de referência de nossa cultura. O brasileiro sabe valorizar esse legado? O brasileiro conhece muito pouco da cultura africana, mas acredito que é porque o Brasil seja uma imensidão e tenha uma variedade enorme de manifestações culturais, de origem africana ou não. Veja, no Haiti só tem o Vodu, mas o Brasil absorveu muita coisa, a África é a espinha dorsal da nossa cultura. Da cultura contemporânea africana, o que chama sua atenção, o que você indicaria para os brasileiros ouvirem? A sede de mudar dos africanos fez com que nascesse o “panafricano”, a música pop africana. A influência pop e eletrônica contagiou o Salif Keita, o Fela Kuti... o Fela Kuti é um popstar! As cantoras do Cabo Verde... todos têm uma sonoridade bem orgânica, bem alternativa, conserva essa origem, essa raiz, mas estão altamente modernizados, cheios de influência pop europeia. Vale a pena conhecê-los.


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legendas: Todas as fotografias utilizadas em África Diversa: revista são de Flávia Correia exceto as que citam o crédito de outro fotógrafo.

22______ Rei Béhanzin, tecido com apliques de tecido e bordado,

de Alphonse Yémadjé, Benin, 2007. Foto: João Liberato.

Tecido Kuba, fibra vegetal com apliques, Povo Kuba, República Democrática do Congo. Foto: João Liberato.

CAPA___ Guarda de Moçambique Nossa Senhora das Mercês na

23______ Paraquedista, plástico, tecido e metal de Gérard Que-

4 e 5____ Mãos de Flávia Correia e François Moïse Bamba.

24______ Máscara, madeira pintada, fibra vegetal e tecido com

num, Benin. Foto: João Liberato.

Praia de Copacabana. Abertura do África Diversa 2011.

6_______ Estandarte feito durante a oficina Criação de Estandartes, ministrada por Clélia Lemos no África Diversa 2011.

8 e 9____ Detalhe de apresentação do espetáculo Não existe pequena briga, da contadora de histórias e produtora cultural Daniele Ramalho, curadora do África Diversa 2011.

12______ Vendedora de amendoim na cidade de Pâ, Burkina Faso, 2010. Foto: Daniele Ramalho.

13______ Le monde nouveau, acrílica e pigmentos naturais sobre tela de Tchif, Benin, 2007. Acervo Museu Afro-Brasil. Foto: João Liberato.

14______ Asen, peça em ferro do povo fon, Benin, séc. XIX.

apliques, Povo Igbo, Nigéria. Foto: João Liberato.

Máscara Elefante, tecido e miçangas, Povo Bamileke, Camarões. Foto: João Liberato.

25______ Figura de Vodum, cerâmica pintada de Cyprien

Tokoudagba, Benin, séc. XX. Foto: João Liberato.

Stupides et inutiles, plástico, madeira e metal de Aston, Benin, 2007. Foto: Aston.

26______ Detalhe do Bastão e Rosário, da Guarda de Mo-

çambique Nossa Senhora das Mercês, da Cidade de Oliveria, MG, durante apresentação em Copacabana.

27______ Detalhe da Bandeira da Guarda de Moçambique

Nossa Senhora das Mercês, da Cidade de Oliveria, MG, durante apresentação em Copacabana.

Acervo Museu Afro-Brasil. Foto: João Liberato.

16______ Habitantes da cidade de Pâ, Burkina Faso, 2010.

17______ Impressão fine art de fotografia de Charles Placide,

28 e 29_ Detalhe do Rosário da Capitã Pedrina e Tambor, da

18______ Emanoel Araújo, curador do Museu Afro-Brasil e das

30______ Detalhe da Espada do Capitão Carlos, da Guarda de

Foto: Daniele Ramalho.

Benin, África. Acervo Museu Afro-Brasil.

exposições que integraram o projeto África Diversa. Foto: Adenor Gondim.

20______ Acrílica sobre tela de Dominique Zinkpè, Benin,

2004. Acervo Museu Afro-Brasil. Foto: João Liberato.

21______ Dan Sivi - La fille de l’arc-en-ciel, técnica mista sobre tela de Ladis, Benin, 2007. Foto: João Liberato.

Detalhe do Cortejo de Abertura do África Diversa no Centro Municipal de Artes Calouste Gulbenkian. Guarda de Moçambique Nossa Senhora das Mercês.

Congo de Nossa Senhora do Rosário e do Rosário e Gunga da Capitã Pedrina, da Guarda de Moçambique Nossa Senhora das Mercês.

31______ Detalhes de Bastão, Patangome, Rosário e Tambores das Guardas de Congado.

32______ Detalhe da Bandeira da Guarda de Moçambique

Nossa Senhora das Mercês, da Cidade de Oliveria, MG, durante apresentação na Praia de Copacabana e no Centro Municipal de Artes Calouste Gulbenkian.


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33______ Detalhes de Tambores, Corôas e Rosário das Guardas de Congado, durante apresentações e oficina do África Diversa 2011.

34______ Detalhe de integrante do Reinado na Praia de Copacabana.

Tambores durante apresentação no Centro Municipal de Artes Calouste Gulbenkian.

34 a 35_ Capitão Antônio Eustáquio e Capitã Pedrina, da

Guarda de Moçambique Nossa Senhora das Mercês durante apresentação no Centro Municipal de Artes Calouste Gulbenkian.

36 e 37__ Detalhe dos integrantes do Reinado na Praia de Copacabana no momento do primeiro encontro com o mar.

38______ Detalhe dos integrantes do Reinado no calçadão da Praia de Copacabana.

39______ Detalhe de Gungas do Congo de Nossa Senhora das Mercês, durante cortejo na Praia de Copacabana.

40 a 45_Ensaio sobre Cortejo do Congado, na Praia de Copa-

57______ Detalhe de aluna na oficina Bebê Abayomi, ministrada por Lena Martins no África Diversa 2011;

58 e 59_ Alunos do minicurso Benguelê, ministrada pelo Instituto TEAR no África Diversa 2011;

60______ Alunos da oficina de François Moïse Bamba; 61______ Alunos do minicurso Barangandãs e Berenguendês mi-

nistrada pelo Instituto TEAR no África Diversa 2011.

Detalhe da produção da oficina Criação de Estandartes, ministrada por Clélia Lemos no África Diversa 2011.

63 a 67_ Detalhes dos integrantes do Jongo de Pinheiral. 68______ Mesa Diversidade Cultural na abertura do África

Diversa com os palestrantes Alberto da Costa e Silva, Emanoel Araújo e o mediador Haroldo Costa.

Platéia da Mesa de Abertura Diversidade Cultural.

71______ Não existe pequena briga, espetáculo de Daniele Ra-

malho com participação especial de François Moïse Bamba.

Sete Ventos, aula-espetáculo de Débora Almeida.

46______ Detalhe d’O Ferreiro que conta Histórias, apresentação

Sílvia Carvalho, do grupo Karingana Ua Karingana.

Apresentação do grupo Raíz de Polón, do Cabo Verde.

47______ Detalhe do Ñogoni na apresentação d’O Ferreiro que

72 e 73_ Instrumentos de Naná Vasconcelos.

cabana, durante o África Diversa 2011.

de François Moïse Bamba no África Diversa 2011.

conta Histórias.

48 e 49_Detalhe de Balafon, na oficina A Palavra dos Ancestrais de François Moïse Bamba, no África Diversa 2011.

50______ François Moïse Bamba e seu Balafon, na apresentação d’O Ferreiro que conta Histórias.

51______ Detalhe do Ñogoni na apresentação d’O Ferreiro que conta Histórias.

52 e 53_François Moïse Bamba e seu Ñogoni, na apresentação d’O Ferreiro que conta Histórias.

53______ Detalhe de François Moïse Bamba tocando um

tambor de Congado durante Cortejo no Centro Municipal de Artes Calouste Gulbenkian.

55 e 56_ Apresentação dos contadores de histórias François

Moïse Bamba e Daniele Ramalho, curadora do África Diversa.

74______ Encontro de Naná Vasconcelos e integrantes do Congado, na Praia de Copacabana.

75______ Espetáculo de Naná Vasconcelos, no Centro Municipal de Artes Calouste Gulbenkian, durante o África Diversa 2011.

76 a 79_ Aula-espetáculo de Naná Vasconcelos com alunos

do projeto Segundo Turno Cultural, da Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro no Centro Municipal de Artes Calouste Gulbenkian, durante o África Diversa 2011.


Prefeito da Cidade do Rio de Janeiro

Editoria

Vice-prefeito

Consultoria Editorial

Eduardo Paes

Carlos Alberto Vieira Muniz

Secretário Municipal de Cultura Emilio Kalil

Subsecretário de Cultura Walter Santos Filho

Chefe de Gabinete

Rita de Cassia Samarques Gonçalves Assessor de Projetos Especiais Robson Bento Outeiro

Assessor Técnico de Assuntos Estratégicos Pedro Igor Alcântara Coordenadora de Arte-Educação, Livro e Leitura Lêda Maria da Fonseca

Gerente de Livro e Leitura Gisele Mota Lopes

Coordenador de Artes Visuais e de Museus Franklin Espath Pedroso

Gerente dos Centros Culturais Sônia Candida Gentile Gerente de Museus

Andréa Rizzoto Falcão

O encontro África Diversa foi realizado nos seguintes espaços:

Centro Municipal de Artes Calouste Gulbenkian

Rua Benedito Hipólito, 125. Praça Onze. Rio de Janeiro. RJ. Centro Municipal de Arte Hélio Oiticica

Rua Luís de Camões, 68. Centro. Rio de Janeiro. RJ.

Daniele Ramalho Mariana Warth Artigos

Alberto da Costa e Silva

Pedrina Lourdes dos Santos João das Neves

François Moïse Bamba Heloísa Pires Lima Nei Lopes

Haroldo Costa Entrevistas

Emanoel Araújo e Naná Vasconcelos {por Táia Rocha} Tradução do artigo de François Moïse Bamba Maria José Sarposki Revisão

Cristiano Mota Fotografias

Flávia Correia

Edição de Imagens

Daniele Ramalho e Marcos Corrêa

Projeto Gráfico e Direção de Arte Marcos Corrêa




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