Habitação flexível à transição da vida Intervenção na Manutenção Militar no Beato, Lisboa
Maria Neves Liberato 20121020 MIAIRE (Licenciada)
Projeto Final de Mestrado para a obtenção do Grau de Mestre em Arquitetura, especialização em Arquitetura de Interiores e Reabilitação do Edificado
Orientação Científica Professor Doutor José Afonso Professora Doutora Maria Manuela Mendes Júri: Presidente: Professora Doutora Dulce Loução Vogal: Professora Doutora Bárbara Massapina
Documento definitivo Lisboa, Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa Julho de 2017
Índice Resumo............................................................................................................................. VI Abstract ............................................................................................................................ VII Agradecimentos............................................................................................................. VIII Introdução.......................................................................................................................... 1 Objetivos ........................................................................................................................ 3 Questões de partida..................................................................................................... 4 Hipóteses ....................................................................................................................... 5 Metodologia ................................................................................................................... 6 Capítulo 1 – Habitação e Sociedade............................................................................. 9 1.1
Habitação e transitoriedade ............................................................................ 9
1.2. Evolução da habitação como resposta à mudança social ........................... 13 Capítulo 2. Lisboa Industrial ......................................................................................... 23 2.1. Industrialização em Lisboa ............................................................................... 23 2.2. Arquitetura Industrial .......................................................................................... 35 2.3 Desvalorização do Património Industrial.......................................................... 39 Capítulo 3- Contexto de intervenção: a freguesia do Beato.................................... 45 3.1 Freguesia do Beato: breve panorâmica histórica ........................................... 45 Caracterização da população e do edificado ..................................................... 52 3.2 Manutenção Militar em Lisboa........................................................................... 56 Caracterização Construtiva .................................................................................. 64 3.3 Cronologia Histórica ................................................................................................ 66 Capítulo 4 - Proposta de projeto .................................................................................. 69 4.1 Premissas de partida .......................................................................................... 69 4.2. Referências de projeto....................................................................................... 74 1.
The Grow Home ............................................................................................. 74
2.
Adaptable House ............................................................................................ 77
3.
Quinta Monroy ................................................................................................ 78
4.GNRation.............................................................................................................. 80 4.3. Desenho Urbano................................................................................................. 81 Acessibilidades ....................................................................................................... 84 Programa ................................................................................................................. 85 4.4 Desenho Arquitetónico ....................................................................................... 87 Integração da parte museológica ........................................................................ 87 Desenho do co-working e oficinas....................................................................... 88 Desenho dos módulos habitacionais .................................................................. 90 II
Notas conclusivas........................................................................................................... 95 Referências Bibliográficas ............................................................................................. 98 Webgrafia................................................................................................................... 100 Anexos ........................................................................................................................... 102 Anexo I – Caracterização ........................................................................................ 102 Anexo II – Maquetas ................................................................................................ 108 Anexo III – Caracterização construtiva dos edifícios .......................................... 112 Anexo IV – Desenhos de levantamento................................................................ 120 Anexo V – Desenhos Finais.................................................................................... 127 Anexo VI – Painéis de Apresentação ................................................................... 139
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Índice de figuras Figura 1 Modalidades de progressividade na habitação .................................................. 11 Figura 2 Estação de Santa Apolónia 1865 ......................................................................... 25 Figura 3 Santa Apolónia 1950 ........................................................................................... 26 Figura 4 Vila Maria Luísa 1970 .......................................................................................... 29 Figura 5 Vila Flamiano 1960 .............................................................................................. 29 Figura 6 Vila Dias 1900 ...................................................................................................... 30 Figura 7 Convento de Xabregas anterior a 1895 .............................................................. 31 Figura 8 Plano Diretor de Urbanização de Lisboa 1948 .................................................... 33 Figura 9 Palácio de Cristal Porto ....................................................................................... 38 Figura 10 Crystal Palace Londres ...................................................................................... 38 Figura 11 Galerias das Máquinas, Exposição Universal de Paris 1881 . Erro! Marcador não definido. Figura 12 Sistema Domino, Le Corbusier .......................................................................... 38 Figura 13 Praia de Xabregas 1938 ..................................................................................... 45 Figura 14 Praia de Xabregas Planta de Filippe Folque 1856-58 ........................................ 46 Figura 15 Viaduto de Xabregas 1968 ................................................................................ 48 Figura 16 Sobreposição Planta Filipe Folque 1856-58 e Planta Atual, convento das Grilas .......................................................................................................................................... 48 Figura 17 Vista Aérea do Bairro Madre Deus 1955........................................................... 50 Figura 18 Fábrica da Bolacha 1955 .................................................................................. 60 Figura 19 Fábrica das Bolachas 1980 ................................................................................ 60 Figura 20 Fornos do pão ....................................................... Erro! Marcador não definido. Figura 21 Fábrica do pão ................................................................................................... 60 Figura 22 Fábrica do pão ................................................................................................... 60 Figura 23 Refeitório 1933 ................................................................................................. 61 Figura 24 Central Elétrica 1917 ......................................................................................... 61 Figura 25 Laboratório ........................................................................................................ 62 Figura 26 Silos e Transportador ........................................................................................ 62 Figura 27 Central Elétrica 1917 ......................................................................................... 63 Figura 28 Aspirador Pneumático e Passerelas de Trigo 1930 ........................................... 63 Figura 29 Entrada para as Escadinhas pela Rua do Grilo 1939 ......................................... 72 Figura 30 Planta Topográfica 1931 (Escadinhas) .............................................................. 72 Figura 31 Praia da Marabana 1938 ................................................................................... 72 Figura 32 Imagem Aérea ................................................................................................... 73 Figura 33 Adaptação do interior da The Grow Home por um dono de casa durante um período de 11 anos ........................................................................................................... 75 Figura 34 Desenhos alternativos da Grow Home ............................................................. 76 Figura 35 Interior da Casa, painéis que separam os espaços ........................................... 77 Figura 36 The Adaptable House ........................................................................................ 77 Figura 37 Apropriação das habitações pelos proprietários .............................................. 79 Figura 38 Planta das habitações ....................................................................................... 79 IV
Figura 39 A casa dada às pessoas e a apropriação da casa por elas ................................. 79 Figura 40 Interior da GNRation ......................................................................................... 80 Figura 41 Entrada para a GNRation................................................................................... 80 Figura 42 Ortofotomapa de localização ............................................................................ 83 Figura 43 Programa e Intervenção Urbana ....................................................................... 86 Figura 44 Núcleo Museológico: Museu e Museu Interativo ............................................. 87 Figura 45 Espaço de Co-Working ...................................................................................... 89 Figura 46 Necessidades Espaciais mediante quantidade de habitantes e relação com Habitações nas Oficinas .................................................................................................... 91 Figura 48 Desenho do armário .......................................................................................... 92 Figura 47 Planta de estudo................................................................................................ 92 Figura 49 Desenho de partes do Armário ......................................................................... 93 Figura 50 População Residente em Lisboa (Nº em quadrículas de 1km x 1km) ............. 106 Figura 51 População Residente no Beato (Nº em quadrícula de 1km x 1km) ................ 106
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Resumo Este Trabalho Final de Mestrado aborda a questão da flexibilidade da habitação e como esta pode responder aos processos de transição que marcam o ciclo de vida do ser humano. Tendo em linha de consideração as dinâmicas e a volatilidade das mudanças que marcam a sociedade portuguesa, nomeadamente no domínio das transições de vida dos indivíduos, surge desde logo a necessidade de criação de uma habitação mais flexível e adaptável. Em vez de ser o indivíduo a mudar de casa sempre que necessita de novos compartimentos, são estes que podem ser transformados compartimentos consoante as necessidades dos indivíduos. Se atendermos às evidências empíricas, as famílias não são tradicionalmente nucleares e são cada vez mais pequenas, sendo oportuno a criação de habitações adaptáveis e flexíveis face a uma multiplicidade de eventos e diversidade de necessidades. Aplicando esta premissa à área de intervenção deste Projeto Final de Mestrado, a parte sul da Manutenção Militar no Beato, em Lisboa, o desafio consiste em projetar estas habitações flexíveis em edifícios préexistentes, conciliando os materiais que já existem com novas propostas em termos de materiais, de modo a responder à flexibilidade desejada. Para além disso, são caracterizadas pelo princípio da acessibilidade socioeconómica, sendo acessíveis a todos os que quiserem lá habitar. Para além da habitação propõe-se a implementação de espaços de coworking e de oficinas que, juntamente com a habitação, se inscrevem num novo conceito em termos de estilo de vida, algo ainda com pouca oferta naquela zona de Lisboa. Pretendemos então uma arquitetura que responda a uma sociedade em constante mudança, em que a imprevisibilidade da vida contemporânea possa ser respondida por via da flexibilidade e plasticidade dos espaços habitados. Palavras-chave: habitação flexível, ciclo de vida, património industrial Beato, Manutenção Militar
VI
Abstract The current project addresses the question of the flexibility of the house and how this could respond to the transition processes that mark the human life cycle. When evaluating the changes in the Portuguese society and the transitions that occur in the life of the individuals, one is faced with the necessity of creating a house that changes the compartments as the dwellers need, rather than being the individuals to change houses whenever their necessity for new compartments increases. Taking into account the dynamics and volatility of the changes that mark the Portuguese society, in the domain of individuals' life transitions, the need to create a more flexible and adaptable housing arises. Instead of being the individual moving home whenever he needs new compartments, there are these that can be transformed compartments depending on the needs of individuals. If one looks at the empirical evidence, families are not traditionally nuclear and are becoming smaller, and it is opportune to create adaptable and flexible housing in the face of a multiplicity of events and diversity of needs. Applying this premise to the intervention area of this Final Master Project, the southern part of Manutenção Militar in Beato, Lisbon, the challenge is to design these flexible dwellings in pre-existing buildings, reconciling materials, that already exist, with new proposals in terms of materials. This will allow the achievement of the desired flexibility. In addition, these buildings are characterized by the principle of socioeconomic accessibility and are accessible to all who wish to live there. In addition to housing, it is proposed the implementation of co-working spaces and workshops that, together with housing, they are, will be part of a new concept in terms of lifestyle, something with little offer in that area of Lisbon. The goal is to have an architecture that responds to a society in constant change, in which the unpredictability of contemporary life can be answered through the flexibility and plasticity of the inhabited spaces. Keyword:
flexible
housing,
lifecycle,
Manutenção Militar VII
industrial
heritage,
Beato,
Agradecimentos Chegar ao fim do percurso académico é ter a certeza que muito aprendi até agora, mas também muito ficou para aprender, é saber que esta é a fase inicial de uma vida de eterna aprendizagem como arquiteta e, principalmente, como pessoa, sabendo que estes anos foram essenciais para a aprendizagem da academia. Agradeço à minha família, em especial aos meus pais e ao António por tudo, e à minha madrinha. Agradeço aos meus orientadores José Afonso e Maria Manuela Mendes por me orientarem nesta fase final que no fundo é o reflexo de 5 anos de um trabalho de aprendizagem enorme, por todas as conversas e pela sinceridade relativamente ao meu trabalho. Agradeço a todos os professores que passaram por este percurso, e que sempre me ensinaram que a arquitetura é um mundo infinito de possibilidades e de caminhos. Agradeço a todos os meus amigos por estarem sempre lá em inúmeras situações, Marisa, Maria Ana, Maria Polónia, Sofia Fonseca, Vieira, Tati, Bruna, Ana Luísa, Jovana, Mária, Mafalda e Mariana. Em especial ao Faísca e à Sofia Caetano por estarmos ao mesmo ritmo nesta fase final em que tantos medos e inseguranças se levantaram. Agradeço à Biblioteca de Marvila pela oportunidade de participar no projeto Vidas e Memórias de Bairro e pela participação animada de todas as pessoas com todos os seus testemunhos deliciosos e que me fizeram confirmar que a maior sabedoria está nas pessoas e não em livros. Agradeço a todas as pessoas que de uma maneira ou de outra, a criticar ou a elogiar, a rir ou a chorar, conseguiram me fazer acreditar que desistir nunca é uma opção. Obrigado
VIII
Introdução Nas últimas décadas temos assistido a grandes mudanças na sociedade portuguesa, tanto a nível dos tipos e das dinâmicas familiares - sendo cada vez mais comuns as famílias monoparentais, os isolados, os casamentos entre pessoas do mesmo sexo, as famílias biculturais, as famílias recompostas, a divorcialidade, o envelhecimento - o que vai a par de transições rápidas entre fases da vida marcadas pela crescente instabilidade e volatilidade do mundo do trabalho. Neste Trabalho Final de Mestrado pretende-se analisar estas mudanças que marcam o ciclo de vida das pessoas, sendo nosso objetivo criar habitações compostas por módulos habitacionais de diversas dimensões e com características de flexibilidade e que correspondam de forma adequada às necessidades, singularidades e à posição que as pessoas ocupam no seu ciclo de vida. É nossa intenção, ainda, proporcionar habitações cujos preços sejam compatíveis com a sua situação socioeconómica. Partindo deste princípio em que se torna necessário responder à rapidez das mudanças que marcam o ciclo de vida das pessoas que vivem na contemporaneidade, queremos projetar uma habitação-tipo que responda a fases distintas das vidas das pessoas, e que seja adaptável à evolução destas enquanto família ou indivíduo. A par destas habitações também iremos desenvolver espaços distintos de trabalho, co-working e oficinas que poderão estabelecer relações de interdependência entre si e que também poderão complementar as habitações. Este projeto tem como zona de intervenção um terreno denominado Manutenção Militar no Beato, que apesar de se localizar na cidade de Lisboa ficou esquecido entre Santa Apolónia e a “nova” centralidade, o Oriente e que tem potencialidade para ser uma extensão do centro Lisboeta. O local da intervenção apresenta uma forte matriz industrial, tanto os edifícios em si como toda a envolvente, sendo por isso muito interessante explorar a escala da habitação reintegrada em edifícios com uma escala
1
industrial. Para além disso, constitui um desafio desafiante projetar várias habitações numa antiga fábrica sem que as pessoas se sintam desconfortáveis pela diferença de escalas e ao mesmo tempo não perdendo a identidade do espaço. Este trabalho requer uma compreensão ponderada e reflexiva em torno do património industrial e da sua importância nas cidades de hoje, uma vez que esta intervenção procura valorizar este património atribuindo usos mais apropriados à contemporaneidade, sendo passíveis de serem reversíveis permitindo a apropriação deste espaço por imperativos associados a mudanças sociais, económicas, políticas e culturais.
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Objetivos Neste trabalho, os objetivos foram sofrendo pequenas alterações ao longo do tempo, tentando-se articular a componente teórica com a componente prática do Trabalho Final de Mestrado. Assim os objetivos são os seguintes: a) Integrar e articular a malha urbana da cidade industrial na zona da Manutenção Militar com a malha urbana da cidade de Lisboa. b) Preservar o património industrial da Manutenção Militar préexistente e ao mesmo tempo responder às necessidades dos dias de hoje. c) Auscultar a população residente sobre necessidades mais prementes em termos de equipamentos e serviços de apoio e de proximidade. d) Colmatar a falta de tipos habitacionais que respondam às fases transitórias das vidas das pessoas. e) Criar módulos habitacionais flexíveis e evolutivos que respondam à instabilidade e incerteza que marca a vida familiar e laboral da contemporaneidade e que têm reflexos na habitação. f) Criar espaços de trabalho com configurações diversificadas de modo a responder às necessidades laborais dos dias de hoje. g) Aplicar materiais na construção destes módulos que sejam acessíveis
economicamente,
mas
que
ao
mesmo
tempo
mantenham um bom desempenho, térmico e acústico, e que sejam reversíveis.
3
Questões de partida A questão principal à qual vamos procurar dar resposta com o desenvolvimento deste trabalho final de mestrado é a seguinte: Como
reabilitar
um
edifício
industrial
para
usos
habitacionais,
caraterizados pela flexibilidade e por um sistema modular e evolutivo que consiga responder às mudanças e transições que marcam o ciclo de vida do ser humano? Emergem, também, outras questões que assumem um caráter de complementaridade face à primeira. Deste modo e no plano urbano, procuraremos responder a duas perguntas: 1.1. De que modo através de desenho dos espaços públicos é possível fomentar uma maior vivência no bairro durante o dia? 1.2. Como integrar a malha urbana da cidade industrial na zona da Manutenção Militar com a malha urbana da cidade de Lisboa? No plano habitacional, surgem mais duas questões: 1.3. Como projetar habitação acessível economicamente com qualidade arquitetónica, havendo a possibilidade de se tornar numa habitação de longa estadia/vivência ou de permanência? 1.4. Como acomodar populações com perfis e modos de vida distintos e simultaneamente promover relações intergeracionais?
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Hipóteses Mediante as questões acima propostas elaboramos como respostas provisórias as seguintes hipóteses: A reabilitação passará por integrar habitação flexível, evolutiva e modular, de modo a responder de forma eficaz a situações de mudança temporária ou definitiva na vida dos residentes. A identificação de edifícios considerados património industrial e os que não o são, permitirá criar espaços públicos de qualidade para que a Manutenção Militar tenha uma permeabilidade face à freguesia do Beato. A habitação será também economicamente acessível face às várias etapas e fases em que as pessoas se encontrem em termos do seu ciclo de vida, para isso passará pelo estudo de materiais que tenham um bom desempenho em termos de custo-manutenção para a função de habitação. A habitação-tipo recorre a sistemas modulares e estruturas flexíveis, o que permitirá albergar uma diversidade de pessoas e modos de vida.
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Metodologia Relativamente à metodologia a mobilizar durante a elaboração do projeto final de mestrado, esta é distinta nas duas componentes: a parte teórica e a parte prática. Na parte teórica recolheu-se e analisou-se bibliografia sobre zonas ribeirinhas industriais e reabilitação de edifícios industriais, habitação e transições do ciclo de vida, mudanças na sociedade portuguesa, modos de vida, habitação flexível e habitação económica, assim como documentação diversa sobre o local de estudo - Freguesia do Beato. Depois procedeu-se à caraterização e análise da população e do edificado, nomeadamente das suas caraterísticas sociais e demográficas, qualidade dos alojamentos, oferta de equipamentos, serviços à população e dinâmicas espaciais. Esta análise teve por base os Censos de 2011 (INE) e algumas conversas informais com moradores da freguesia. Esta informação afigurou-se como relevante para a caraterização do local e para a elaboração do plano urbano. Ainda na parte teórica selecionou-se e fez-se uma análise de alguns casos de referência referentes, quer à reabilitação de espaços industriais, quer à habitação flexível e económica. Na parte prática do Projeto Final de Mestrado e tendo em conta a componente anterior, iniciou-se o processo de trabalho através do estudo de soluções de projeto para o plano urbano, tendo em atenção por um lado, a permeabilidade da Manutenção Militar face ao Beato e por outro, as necessidades dos atuais e futuros residentes, definindo assim o programa para todo o conjunto industrial. Depois focalizou-se a nossa atenção no projeto propriamente dito, selecionando-se um conjunto de edifícios e tentou-se perceber de que modo a tipologia industrial pode albergar tipologias habitacionais, com diferentes escalas entre eles. Posteriormente, passou-se para a fase do desenho do pormenor de interiores e reabilitação, o que fez toda a diferença, quer na caracterização e distinção dos módulos habitacionais, quer nas suas posteriores vivências. Esta fase será trabalhada em simultâneo por desenho e modelos tridimensionais. 6
Este documento está organizado em quatro capítulos, para além da introdução e das conclusões, e que tratam temáticas distintas: Habitação, Lisboa Industrial, Zona de Intervenção e Proposta de Projeto. No primeiro capítulo aborda-se o tema da habitação e como esta é ainda hoje uma necessidade premente na cidade de Lisboa; para além disso, procura-se analisar de que modo as novas dinâmicas de vida podem ser respondidas através da resposta habitacional. O capítulo dois versa a evolução da cidade de Lisboa no contexto industrial e como a cidade se comporta perante o crescimento demográfico associado à industrialização. No terceiro capítulo analisa-se a zona de intervenção, procurando-se perceber a sua evolução e dinâmica de desenvolvimento em termos temporais dentro da cidade, fazendo-se ainda uma caraterização da população e do edificado; também se analisa de forma particular a Manutenção Militar, nomeadamente o seu passado, o presente e as perspetivas futuras para esta zona da cidade.
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Capítulo 1 – Habitação e Sociedade “Quanto à família, parece evidente que qualquer reflexão sobre a casa que não a tenha em linha de conta é insatisfatória: a família e o indivíduo são os principais protagonistas do espaço doméstico.”(Pereira, 2012, p. 2) O presente capítulo centra-se sobre a habitação, nomeadamente sobre a maneira
como os habitantes se apropriam das habitações,
da
transitoriedade da vida e como isso se reflete no espaço doméstico e de como a evolução da habitação pode responder às mudanças sociais ao longo dos tempos e, nomeadamente, no tempo presente.
1.1 Habitação e transitoriedade No artigo “Grupos sociais, formas de habitat e estrutura do modo de vida”, Isabel Guerra define a habitação como “um bem heterogéneo, durável e essencial à sobrevivência quotidiana e um indicador direto das desigualdades sociais na cidade. É também um elemento essencial à estruturação urbana e uma fonte de conflito e de negociação entre instituições e agentes envolvidos na sua produção, consumo e apropriação” (Guerra, 1998, pp. 118). Na perspetiva da autora a habitação é um bem durável, contudo como temos fases transitórias das nossas vidas em que não temos garantido o trabalho, a estrutura familiar, a autonomia física e financeira, entre outras, precisamos de habitações mais flexíveis e evolutivas por oposição à tradicional rigidez que carateriza as habitações. Avi Friedman (2011) acredita que “Housing is about people”, a partir desta premissa devemos pensar nas pessoas e nas suas necessidades para criar habitação. A instabilidade e a velocidade do ritmo de vida nos dias de hoje fazem com que a habitação seja cada vez mais transitória, mesmo que o mercado não esteja preparado para o ser.
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O facto de ser transitória em parte é consequência da falta de flexibilidade que as habitações tradicionais têm. A flexibilidade é cada vez mais uma premissa essencial para as soluções de projeto, nomeadamente em edifícios de serviços em que é importante que haja uma certa flexibilidade relativamente aos espaços de trabalho, contudo ainda falta levar essa flexibilidade para os edifícios habitacionais. Pode-se afirmar que “La vivienda debería favorecer la adaptabilidad de sus espacios y funciones en el tiempo en correspondencia con la evolución dinámica natural de la familia por disímiles factores: variabilidad en el número de sus miembros, composición variable del núcleo familiar, desarrollo tecnológico en ascenso, posición económica y social de la familia, entre los más comunes. Esto permitiría evitar la obsolescencia de las soluciones, garantizando su validez en el tiempo y la calidad de vida de sus moradores.”1 (Couret citado por Abreu, 2013, p.18) Importa que a habitação possa acompanhar e acomodar a evolução dinâmica da família. Dayra Gelabert Abreu e Dania González Couret também referem que há quatro tipos de habitações progressivas a desenvolver: semente, concha, suporte e melhorável. A casa semente caracteriza-se por ser uma habitação que parte de um núcleo inicial e que se pode expandir adicionando módulos no exterior da habitação, sendo que a expansão vai atingir uma maior área em termos quantitativos. A casa concha é uma habitação em que o exterior fica intacto com a sua progressividade mas que no interior os espaços se subdividem, tanto horizontalmente como verticalmente, permitindo quer uma maior área, quer uma maior qualidade de espaços. A casa suporte começa por ser uma estrutura portante que depois se pode ir completando com módulos podendo fechar espaços que eram exteriores em interiores, permitindo uma maior quantidade e qualidade de espaços. Por fim a casa melhorável parte do princípio de ter o essencial para a habitabilidade, com 1
A casa deveria favorecer a adaptabilidade dos seus espaços e funções no tempo, em correspondência com a evolução dinâmica natural das famílias, por diferentes fatores: variável em número dos seus membros, variável na composição do núcleo familiar, crescente desenvolvimento tecnológico, de posição económica e social da família, entre os mais comuns. Isto evitaria soluções de obsolescência, garantindo a sua validade no tempo e a qualidade de vida de seus habitantes. (Tradução livre)
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acabamentos mínimos, podendo posteriormente os acabamentos serem melhorados, esta habitação responde a uma necessidade de maior qualidade de espaços, mas não a uma maior quantidade. A partir destas quatro tipologias de habitação flexível é possível reajustálas às pessoas que irão habitar um edifício, e conjuga-los entre si, respondendo a diversas necessidades. Figura 1 Modalidades de progressividade na habitação
Fonte: Abreu, D.G., Couret, D.G. (2013). Vivienda progresiva y flexible Aprendiendo del reportorio. Arquitectura y Urbanismo, vol. XXXIV, nº2, 48-63. p.51
Apesar da mobilidade normal nas mudanças de casa ser ascendente ao longo da vida do indivíduo, no caso dos eventos disruptivos a mobilidade passa quase sempre a ser descendente, no sentido de uma habitação mais flexível e de menor custo. Por esta necessidade ser oportuna e muito atual, é importante prever uma certa flexibilidade em dois domínios: i) na sua construção, pois daqui a alguns anos ou décadas, as necessidades de habitação podem ser outras
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e assim criar habitações reversíveis, que permitem ao edifício em questão, neste caso um edifício industrial, voltar à sua pré-existência quando, posteriormente, se possa proceder à remoção da intervenção; e ii) uma flexibilidade dos módulos que permita a adição e remoção de módulos
consoante
a
necessidade
espacial
que
os
residentes
necessitem. A acessibilidade económica, em inglês affordable, das habitações é tão importante como o seu contexto, como Avi Friedman (2011) defende “we should spend less than 30% of our salary in the house”, pois a realidade das pessoas para as quais estão destinadas pode ser uma realidade instável a muitos níveis, incluindo e como consequência das outras instabilidades, a económica, familiar, etc. As mudanças de casa, como refere Myers (1999), são, em geral, causadas pela combinação de mais do que um acontecimento na vida das pessoas, seja ao nível da educação, emprego, estado civil, habitação ou características e mudanças no seio do agregado familiar. Contudo, sabemos
que
há
mudanças
de
casa
voluntárias,
geralmente
premeditadas em que durante algum tempo a pessoa/família sabe exatamente para onde quer ir morar ou a tipologia da habitação desejável, e involuntárias, geralmente associadas a uma certa imprevisibilidade da vida, seja laboral, familiar ou mesmo monetária. Estas mudanças de casa involuntárias muitas vezes têm como principal característica a rapidez com que é necessário operar a mudança, sem qualquer tipo de premeditação ou escolha do local, apenas o estritamente necessário. Estas mudanças involuntárias representam cerca de 9% do total das mudanças de habitação (Nico, 2014). Apesar de a maioria das mudanças habitacionais ser voluntária e premeditada, é pertinente focarmo-nos também nas mudanças involuntárias, por não haver muita oferta relativamente a estas mudanças, e por, quer queiramos quer não, passamos sempre por fases transitórias e instáveis nas nossas vidas. A diversidade de soluções previstas na proposta projetual está diretamente associada com o público-alvo das unidades habitacionais, 12
que pode ir de um indivíduo que viva sozinho a um agregado familiar de quatro ou mais pessoas.
1.2. Evolução da habitação como resposta à mudança social
A evolução da arquitetura sempre acompanhou a evolução da sociedade e vice-versa o que faz com que haja uma relação estreita entre o espaço arquitetónico e os modos de vida. Esta relação é importante para a compreensão das relações sociais que as pessoas manifestam no espaço. Apesar de todos os espaços influenciarem o modo de viver, a relação entre o espaço habitacional e os modos de vida das famílias e dos indivíduos é o eixo central de análise no nosso estudo e no nosso projeto. Falar das necessidades habitacionais, implica abordar as dinâmicas familiares e a evolução destas. A individualização foi uma tendência da modernização, tanto dos núcleos familiares (pais e filhos) como dentro destes núcleos, os próprios indivíduos, tendo um impacto decisivo na forma como hoje percebermos a habitação. A individualização em contexto familiar traduz-se na diversificação das estruturas familiares, da família tradicional nuclear composta por casal com filhos, que ainda se mantém dominante em Portugal. Contudo aparecem novas estruturas familiares: famílias recompostas, monoparentais,
casais
sem
filhos,
indivíduos
sós
etc,
que,
consequentemente, fazendo emergir novas necessidades habitacionais e formas diferentes de habitar.
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A nível do tipo de agregados domésticos, uma família pode dividir-se em cinco tipos: um indivíduo, casal sem filhos, casal com filhos, família monoparental
e
outros(http://www.pordata.pt/Portugal/Agregados+dom%C3%A9sticos+pri vados+total+e+por+tipo+de+composi%C3%A7%C3%A3o+-19 Acedido a 9.05.2017). No primeiro caso, a ausência de coabitantes faz com que não hajam interações intra-agregado, toda a componente relacional nestes casos foca-se no exterior da habitação - família, amigos, vizinhos ou colegas de trabalho. No restantes tipos, os coabitantes têm uma forte interação intra-agregado ou pelo menos têm essa possibilidade. Analisando as famílias a partir das dinâmicas familiares e dos seus efeitos nas habitações, surgem duas dinâmicas familiares distintas que são reflexo da evolução da família na sociedade moderna: a família instituição e a família companheirismo. A família instituição associa-se a um modelo mais tradicional, anterior à sociedade moderna, caracteriza-se principalmente pela subordinação à sobrevivência e à instituição matrimonial, valorizando o matrimónio mais que o indivíduo em si. A família companheirismo remete para um modelo mais contemporâneo, nesta é promovido o bem-estar da família sem que este colida com a autonomia individual e com os projetos de realização pessoal. A felicidade do todo é uma soma da felicidade de cada uma das partes, este é o modelo de referência no contexto da individualização. Independentemente do tipo de família ou dinâmica familiar a casa é quase sempre vista como uma “âncora existencial e afetiva portadora de um sentimento de familiaridade indispensável a uma vida normal” (Pereira, 2012, p.23). Assume um caráter fundamental na análise das vivências domésticas, contudo a importância da casa tem graus distintos nas diversas situações familiares. O estudo das habitações com famílias monoparentais no início era uma novidade, estes números eram residuais, contudo dada a taxa de
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divorcialidade
atual,
2,2%
em
2013
(http://www.pordata.pt/Portugal/Taxa+bruta+de+divorcialidade-651 Acedido a 9.05.2017), uma parte significativa das famílias passam por esse processo e depois voltam eventualmente a recompor-se com formatos e dinâmicas variáveis. Importa esclarecer que no estudo das situações particulares, anormais, a história mostra-nos que estas exceções tendem a transformar-se na norma, daí a importância de se estudar as transições de vida como uma parte recorrente da vida das pessoas, pois esta é a realidade neste momento, o que indica que pode aumentar substancialmente no futuro. Dado isto é importante focarmo-nos nas mudanças sociais para projetar as habitações. Como Sandra Marques Pereira (2012) afirma que a casa do futuro vai evoluir mais consoante as mudanças sociais atuais e futuras do que propriamente segundo uma evolução tecnológica, científica ou criativa, apesar destes domínios poderem também responder às necessidades sociais. A habitação em Lisboa do século XX e XXI concretiza-se maioritariamente em edifícios de habitação unifamiliar, ao estudarmos estes fenómenos questionamo-nos que importância tem o edifício, o fogo, e as divisões para o indivíduo e a família. O fogo continua a ser o mais focado na família, “sendo a família e o indivíduo «os reis e senhores do espaço doméstico»” (Pereira, 2012, p.16). Por isso a morfologia deste espaço doméstico, o fogo, relaciona-se diretamente com as ideologias da vida privada e familiar. Com a generalização da casa moderna, a aproximação entre a casa burguesa e popular acaba por se atenuar, mas não eliminando as distâncias. A variável classe social mantém a sua relevância sociológica na análise da casa. Após esta generalização da casa moderna, passamos, nos anos 70, à participação dos utilizadores na fase de projeto introduzido em Portugal por Nuno Portas no programa SAAL (Serviço de Apoio Ambulatório Local)
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de 1974. Entre meados dos anos 80 e finais dos anos 90 é significativo o número de estudos sociológicos sobre o habitar em Portugal. As habitações têm sempre um centro e periferia, mais evidente nas habitações familiares do que nas habitadas só por um indivíduo ou casal. Este centro e periferia estruturam-se em função do valor social, mas também da distância público/privado, dois conceitos que foram variando na história das habitações, mas também dependente do tipo de família. Estas diferenças também estão ligadas à disposição do quarto de casal, se na fachada principal junto das zonas sociais ou no enfiamento dos outros quartos nas traseiras do edifício. A relação que o indivíduo ou a família estabelecem com a sua casa é funcional mas também, e principalmente, simbólica, remetendo sempre para questões subjetivas e pessoais, ligados à dimensão de como se vive o domínio privado. A sua dimensão simbólica está na forma como a usam e como a decoram, esta dimensão simbólica é crucial para o entendimento das formas de habitar. Para Marcus “The key seems to be in the personalization of space: More and more, I found in the stories I heard that it is the movable objects in the home, rather than the physical fabric itself, that are the symbols of self.” 2( 2006, p. 8). Desde tenra idade que começamos a construir e a descobrir locais escondidos, construir casas na árvore, locais onde podemos estar sozinhos, com os nossos amigos, fazer o que quisermos sem a aprovação dos adultos. “This is the beginning of the act of dwelling, or claiming one’s place in the world3.” (Marcus, 2006, p. 25). Apropriamo-nos do espaço para termos um espaço só nosso, esse desejo começa desde novos e prolonga-se até ao fim das nossas vidas, daí em alguns lares os idosos levarem consigo alguns objetos de decoração. A par do lado físico da casa, está o lado vivido e sentido, completando assim o entendimento 2
A chave parece estar na personalização do espaço: cada vez mais encontrei nas histórias que oiço que são os objetos móveis na casa, em vez do tecido físico em si, que são os símbolos do próprio. (Tradução livre) 3 É o começo do ato de habitar, ou de reivindicar o seu lugar no mundo. (Tradução livre)
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da casa como uma expressão cultural e social, uma experiência social e de um valor experimentado inegável que faz com que as pessoas invistam na casa. Como refere Sandra Pereira “Convém ainda relembrar o enorme investimento realizado pela generalidade das pessoas na casa, tanto financeiro, como emocional, identitário e social.” (2012, p.127) As tipologias habitacionais estão divididas pelas classes sociais mais que pelos países da sua origem, exemplo disso é a burguesia urbana portuguesa sentir maior estranheza relativamente à casa do camponês, seu contemporâneo e compatriota, do que face aos seus homólogos sociais de outras cidades europeias. Eles identificavam-se mais facilmente com a burguesia de outros países do que com os camponeses do seu próprio país. A
habitação
influenciada
pelo
Movimento
Moderno
segue
uma
apropriação da habitação própria de uma sociedade industrial, também óbvia nas habitações operárias. Apesar de nas habitações operárias ser uma necessidade, após as guerras, de viver com o mínimo, explorandose as dimensões habitacionais ao limite. Começou-se a ver todos os edifícios, bairros e cidades como máquinas, definindo-se como um conjunto articulado de modelos normativos de organização do espaço, e também as casas. Como o problema neste pós-guerra era o alojamento das massas, esta foi a dimensão eleita como matriz deste “tudo-máquina”. Também relacionada com esta habitação máquina está a defesa da habitação coletiva, neste caso por razões de ordem económica, urbanística e ideológica-moral, otimizando assim o espaço edificável, e promovendo assim a solidariedade e a supremacia do social sobre o indivíduo. A modernidade, indissociável da Bauhaus centra-se no estabelecimento de algumas premissas fundamentais nas casas de hoje em dia, nomeadamente três de maior relevância: o entendimento do habitat como existência mínima – existenzminimum – justificado como sendo uma opção ética e estética, o precedente do minimalismo; o conceito de casa máquina, sendo essencial o estudo científico das práticas realizáveis no 17
foro doméstico de modo a padronizar estas standardizando os movimentos humanos; a cozinha laboratório que sendo o conceito moderno de cozinha está presente até aos nossos dias por ser equipada e tem um desempenho quase autónomo (Pereira, 2012, p.68). Também foi nesta altura como consequência das guerras mundiais e da urgência de habitação que a habitação mínima foi posta em prática, apesar de anteriormente já ter sido pelo modelo habitacional operário, um modelo bipartizado dividido entre a zona social e a zona íntima. Esta habitação mínima tem influência na própria instituição familiar, indiciando e refletindo as necessidades associadas à passagem da família instituição para a família companheirismo. O conteúdo desse projeto social protagonizado pelo Movimento Moderno traduz-se num padrão espacial doméstico que indicia a passagem da família instituição para a família companheirismo e, dentro desta, consubstancia-se na criação das condições espaciais à afirmação do modelo familiar da funcionalidade, o qual prefigura uma adesão aos valores democráticos numa ótica mais congregacional do que individual. Segundo Sandra Pereira (2012) são quatro, os aspetos que justificam esta assunção: i) a concentração da área habitável, que faz com que os distanciamentos entre os indivíduos sejam reduzidos ou praticamente inexistentes; ii) a eleição da sala como espaço funcional para todas as classes sociais e não apenas para a burguesia, sendo a fusão entre as salas de estar e jantar da burguesia, neste espaço congregam-se as atividades coletivas dos vários membros das famílias, unificando o todo (família) sobre as partes (indivíduo); iii) a simplificação dos serviços eliminando o quarto da criada e instalação sanitária, proximidade da zona de servir com a zona social, apontando para uma diminuição da divisão sexual dos espaços e dos papéis conjugais (família companheirismo), praticamente realizada através de uma abertura da zona de cozinha para a zona de estar; iv) a divisão por igual da zona dos quartos que indica alguma separação do sector privado, nesta zona também se irá encontrar a casa de banho, muitas vezes evidente na tipologia duplex.
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Perante estes aspetos surgem novas tipologias e outras já existentes tornam-se mais comuns. A tipologia duplex torna-se comum por facilitar os 4 passos acima descritos, nomeadamente o último de divisão do espaço privado e social numa casa. O processo de aproximação e de abertura entre as várias divisões das habitações, nomeadamente de aproximação da zona social, apesar de ser mais conhecido a partir no movimento moderno, foi já iniciado na casa burguesa de finais de oitocentos. “Aliás, o exemplo do português suave apresentado tem já claramente incorporada essa mesma lógica.” (Pereira, 2012, p.83) A Segunda Modernidade é representada nas dinâmicas familiares pelo ideal de família companheirismo, “caracterizado pela procura da realização pessoal das partes em detrimento da realização fusional do todo” (Pereira, 2012, p.95) Ao longo do século XX denota-se a evolução da ideia de privatização, enquanto na primeira metade deste século a ideia de privatização se foca na família enquanto grupo, agora foca-se mais no casal e no indivíduo, reforçando assim a privatização da zona íntima da casa, a zona dos quartos, como já referido anteriormente. Partindo da individualização da casa e ao mesmo tempo da autonomia, cada vez maior, laboral, e individual, surgem soluções habitacionais diversas, duas delas são o loft e os studio residences. Os lofts baseiamse no princípio da realização pessoal pela arte, enquanto os studio residences focam-se mais na amplitude do espaço e no open space. Apesar dos grupos para os quais estão destinados estes dois exemplos de maneiras contemporâneas de habitar, existe uma grande diversidade de formas de os viver e de se apropriarem deles. Contudo a linha que unifica todos, ou quase todos, estes habitantes é o facto de não terem dependentes a viver com eles. Como há um crescimento dos agregados de 1 e 2 pessoas em detrimento dos maiores, esta solução é, sem dúvida uma solução muito procurada e que questiona a necessidade da
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habitação, não no sentido de mais habitações, mas no maior rendimento de habitações existentes transformando-as em habitações mais pequenas que respondam a estes agregados familiares de 1 ou 2 pessoas, ou seja, ao crescimento do fenómeno da monoresidencialidade no Portugal contemporâneo (Pereira, 2012, p.27). Nos lofts acaba por se repetir a bipartição funcional do espaço, uma lógica de organização do espaço que caracterizou a habitação operária, para além de ser um espaço aberto. O loft tem toda uma celebração do industrialismo, nomeadamente na apropriação por artistas, que podem trabalhar e viver no mesmo espaço, uma espécie de casa-atelier em que é possível viver e criar. Constrói-se a partir da híper-simbolização do industrialismo, ou da imagem que a contemporaneidade tem desse, representado nalguns elementos como nos materiais de construção, nos pormenores decorativos e arquitetónicos em geral. Os
lofts
surgem
como
uma
forma
de
ajustar
as
novas
contemporaneidades do trabalho em casa. Surge em resposta da cada vez menos separação entre o trabalho e o lazer, consequência do trabalho ser parte de uma realização pessoal e não de uma obrigação, o trabalho também é lazer, é um gosto, há uma interpenetração entre trabalho e lazer. Por esta ser uma realidade cada vez mais recorrente, os lofts têm sucesso e muita procura. Apesar de ser visto mais como uma habitação temporária em fases de transição de vida, pelas dimensões reduzidas destes e em que é espacialmente impossível construir família. Sobre os lofts e os studio residences na cidade de Lisboa afirma que as “perceções destas mini-casas localizadas na cidade central que têm como principal fator genérico de diferenciação a sua vocação para a transitoriedade.” (Pereira, 2012, p.239). Um dos fatores que Pereira analisa no seu livro são as trajetórias residenciais dos habitantes destes dois tipos de habitação e chega à conclusão que a ideia de transitoriedade está muito presente em quase
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todos os habitantes. Tal é consequência da sua “«des-linearização», afigura-se-nos que a transitoriedade, em si mesma, passa a ser um “dado”, uma experiência ou um sentimento com o qual os indivíduos terão de conviver uma ou mais vezes na sua vida: é pois a própria redefinição de sentidos – prático, emocional, social e cultural – deste termo o que está
em
causa,
provavelmente
na
direção
da
sua
tendencial
“normalização” ou, pelo menos, da sua desdramatização relativamente ao seu entendimento em contexto biográfico marcado por uma maior linearidade, afetiva, laboral e (até) habitacional.” (Pereira, 2012, p.241) No caso dos estúdios o que os caracteriza é o open space, simbolizando a individualização radicalizada. Por outro lado também faz com que não haja privacidade relativamente a coabitantes ou visitas no caso de indivíduos que habitam sozinhos. Tanto os lofts como os estúdios se caracterizam por uma radicalização da individualização, tanto pelas suas tipologias como pelo open space. Apesar de nestes dois casos ser valorizado a individualização e o open space ao mesmo tempo, acaba por ser uma antítese, pois o open space é uma negação da privatização. Em síntese e “Retomando a questão morfológica, percebe-se que admitir qualquer tipo de privatização dentro do espaço doméstico é subverter a lógica do open-space, a permeabilidade do espaço doméstico, enquanto assinatura morfológica de uma identidade pessoal que diferencia, também, pela adesão ao valor da liberdade individual, o que, para alguns, (con)fundir-se-á com uma orientação libertária (ou pretensamente libertária) da própria vida privada.” (Pereira, 2012, p.206) O problema habitacional em Portugal é muito antigo. Ao longo do tempo o Estado foi dando algumas respostas que pouco fizeram para o problema se resolver, à medida que não se resolvia foram surgindo bairros de génese ilegal, bairros de lata por todas as periferias das zonas metropolitanas.
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Apesar dos programas levados a efeito em Portugal, destacamos aqui, O SAAL (Serviço de Apoio Ambulatório Local) foi um programa que surgiu em 1974 por iniciativa de Nuno Portas, em que o objetivo dele era inverter a lógica do relacionamento entre o social e o espacial: “A casa deve ser um terreno de apropriação muito menos prescritivo do que aquele a que se está habituado. O que não quer dizer que se possa passar sem o conhecimento sociológico do habitar mas que, pelo contrário, se devem ter em conta, ao nível do “design” arquitetónico, toda a ambiguidade e diversidade dos comportamentos reais.” (Portas, citado por Pereira, 2012, p.19). Neste programa estava explícito o direito à diversidade cultural e social, em forma de casa e a recusa da imposição pelos arquitetos modernos de ensinar às massas a maneira correta de viver o espaço doméstico. O SAAL foi dividido em SAAL/Norte, SAAL/Centro-Sul e SAAL/Algarve. No Porto teve especial intervenção nos vazios urbanos no centro histórico da cidade, nomeadamente nas ilhas enquanto em Lisboa concentrou-se mais nas periferias. Apesar do SAAL ter durado apenas 2 anos, foi importantíssimo para a reabilitação das cidades, a valorização destas e especialmente para o arranque dos projetos participados. Apesar de ser essencial a resposta às problemáticas da habitação pela parte pública fazendo com que a habitação seja acessível a todos e que haja respostas habitacionais face às transitoriedades das vidas, convém não esquecer que apesar disso, a casa é um abrigo, é o nosso lugar. “(…) se nos perguntassem qual o benefício mais precioso da casa, diríamos: a casa abriga o devaneio, a casa protege o sonhador, a casa permite sonhar em paz.” (Bachelard, 1978, p. 201)
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Capítulo 2. Lisboa Industrial
“As cartas topográficas de Lisboa, a partir de meados do seculo XIX, mostram esta gradual conquista do Tejo, que fez desaparecer praias, cais, docas, caldeiras de moinhos de maré, quintas e até fenómenos geográficos de significado fluvial, como o cabo Ruivo.” (Custódio & Folgado, 1999, p.17)
Este capítulo versa sobre a cidade industrial que Lisboa foi e o que restou dela até aos nossos dias, dos bairros operários e das diversas unidades industriais da cidade, da arquitetura industrial e como chegou até Portugal pelos olhos dos arquitetos que faziam viagens ao estrangeiro e imitavam o que observavam em outros contextos. Apresenta-se ainda uma reflexão sobre o património industrial e como ele é visto pela população.
2.1. Industrialização em Lisboa A industrialização foi um processo através do qual a indústria se tornou o sector dominante da economia, substituindo assim os tradicionais instrumentos, técnicas e processos de produção por outros mais mecanizados, aumentando assim a produtividade e a seriação e consequente homogeneidade dos produtos. Antes da industrialização o sector que dominava a economia era a agricultura, a pequena produção artesanal, manual, e o pequeno comércio, um sistema de produção disperso nas cidades e agora, com a industrialização, passou a ser concentrado nestas. Juntamente
com
a
industrialização
entramos
num
processo
de
modernização, em que a evolução tecnológica promoveu um maior desenvolvimento das indústrias. 23
A industrialização começa sobretudo por causa da divisão do trabalho e da manufatura centralizada. O que anteriormente se fazia nas pequenas indústrias em partes de lojas, passa-se a fazer em grandes indústrias, começa assim a arquitetura industrial, tanto em Portugal como no estrangeiro. A industrialização, apesar de ter enormes vantagens na medida do maior rendimento dos trabalhadores, veio também racionalizar a população e a sociedade, tornando-a mais racional, mais fria e calculista fazendo assim com que os indivíduos mudem de atitude relativamente ao seu semelhante. A primeira revolução industrial começa no século XVIII em Inglaterra. Surge com um surgimento da máquina a vapor cuja fonte de energia é o carvão e consequentemente surgem os caminhos-de-ferro. Com esta revolução ocorreram profundas alterações nos espaços da cidade. As cidades, nomeadamente as periferias, começaram a crescer de forma acelerada devido à grande oferta de trabalho e da mecanização do trabalho. A principal indústria a desenvolver-se consequente desta revolução foi a indústria têxtil. A
segunda
revolução
industrial
ocorre
já
no
século
XIX
(http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/geografia/a-industrializacaomundo.htm Acedido a 3.03.2017), em que o petróleo se torna a principal fonte de energia. A mão-de-obra passa a ser mais qualificada e as formas de produção mais complexas. As máquinas passam a mover-se a energia elétrica o que permite uma maior complexidade do mecanismo. O modelo de produção Fordista é característico desta revolução em que o trabalho é repetitivo nas fábricas e a produção em grande quantidade. Nesta etapa há uma grande expansão das indústrias metalúrgica, siderúrgica, automobilística e petrolífera. A terceira revolução industrial, também conhecida por revolução digital, surge na segunda metade do século XX e decorre até aos dias de hoje. É responsável pela informatização das sociedades e pelo desenvolvimento dos transportes, comunicação, biotecnologia e informação. A energia 24
mais importante utilizada é a energia renovável: eólica, solar, nuclear, etc. Surgem novos materiais como as ligas metálicas, fibras óticas etc. Contudo, em Portugal e tomando como enfoque Lisboa, a Industrialização começa lentamente desde o início do século XIX. Esta industrialização teve vários fatores que a ajudaram a desenvolver-se. Contudo houve dois acontecimentos que foram cruciais para o seu desenvolvimento, em 1865 com a construção da linha ferroviária Leste/Norte com estação terminal em Santa Apolónia (1856-1864), em 1890 a construção da cintura ferroviária Alcântara/ Xabregas, tendo como estação terminal a Estação do Rossio, e em 1883 com o melhoramento do Porto de Lisboa (ao fim de vários planos estudados decidiram-se por um). Em 1854 também já tinha sido construído o Viaduto de Xabregas (Abel, Consiglieri, Vargas, 1993).
Figura 2 Estação de Santa Apolónia 1865
Fonte: http://aps-ruasdelisboacomhistria.blogspot.pt/search?q=santa+apol%C3%B3nia , acedido a 22.03.2017
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Figura 3 Santa Apolónia 1950
Fonte: http://apsruasdelisboacomhistria.blogspot.pt/search?q =santa+apol%C3%B3nia , acedido a 22.03.2017
As indústrias conhecem, no final do século XIX um grande impulso devido às melhores condições para receberem as matérias-primas e exportarem os produtos, tanto para o resto do país por terra, mar e rio, como para o estrangeiro, por mar (Custódio e Folgado, 1999). Com estas novas acessibilidades o Rio Tejo começa a ter ótimas condições para o movimento marítimo em grande escala. A construção de fábricas na frente ribeirinha e as facilidades ferroviárias e fluviais, na segunda metade do século XIX, fizeram com que a industrialização arrancasse verdadeiramente, tanto na zona oriental da cidade com na zona ocidental. Uma das consequências mais óbvias da industrialização de Lisboa foi o crescimento da população, as fábricas que se instalaram nas então periferias de Lisboa fizeram com que o êxodo rural acontecesse muito
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rapidamente, dadas as permanentes necessidades de mão-de-obra. Este movimento migratório de população do campo para a cidade faz com que a população de Lisboa cresça a um ritmo acelerado, passando a haver graves carências de habitação. A falta de habitação e a escassa resposta por parte do Estado a esta realidade levou ao crescimento da habitação precária, muitas vezes ocupando antigos palácios e conventos livres, sobretudo após a expulsão das
ordens
religiosas
em
1834,
esta
apropriação
deveu-se
maioritariamente por pessoas que vinham trabalhar para as fábricas do interior do país, estando assim a expansão industrial diretamente ligada ao problema da falta de habitação a nível oficial. Esta extinção fez com que os 65 conventos desabitados em Lisboa adquirissem novas funções, como hospitais, asilos, tribunais, colégios, bibliotecas, academias e quartéis, alterando a fisionomia dos sítios. Esta postura de apropriação dos espaços para outros fins também é aplicada a outros imóveis como palácios que são vendidos em hasta pública e passam a servir de habitação popular (Pereira, 2007, p.62). Alguns particulares, empresas industriais, começam a criar os pátios e vilas operárias como resposta a esta falta de habitação, mas ao mesmo tempo faz com que tenham os operários no seu controlo, na medida em que lhes proporcionam trabalho e habitação. Face à sociedade industrial subsistia uma certa esperança por uma vida melhor, dado que proporcionaria condições de trabalho e de vida mais condignas. Uma nova classe social emergiu no nosso país, constituindo o Beato em Lisboa um espaço de concentração de atividades industriais e respetivos trabalhadores. Este crescimento industrial e populacional fez com que houvesse mudanças suficientes para provocar reflexos no alargamento do perímetro da cidade de Lisboa ampliando o seu território, e com impactos no desenvolvimento socioeconómico do país. A escala da cidade muda, sobretudo por nestes locais começarem a surgir bairros e vilas operárias, começando assim a introduzir-se a habitação nas periferias de Lisboa. 27
A sua localização está sempre relacionada com as grandes zonas fabris, na zona ocidental da cidade, Alcântara, Belém, Pedrouços, e na zona oriental, Chelas, Xabregas e Beato. Na área de intervenção, zona ribeirinha do Beato, existem algumas Vilas operárias que, ainda hoje, mantém a sua configuração original. Exemplo disso são as Vilas Maria Luísa, ainda com características de outros tempos, a Vila Flamiano e a Vila Dias (Ferreira, Figueiredo, Sanchez, 1995). A Vila Zenha (mais tarde Vila Maria Luísa) recebe posteriormente a instalação de uma escola pública e de um colégio privado que descaracterizam por completo os interiores das antigas casas nobres mas que mantêm os interiores das habitações precárias. A Vila Flamiano, construída em 1888 (Pereira, 2007, p.92) por parte da Companhia de Fabrico de Algodões foi um exemplo de dignificação dos trabalhadores,
contudo esta apenas era
para alojar mestres
e
contramestres. Surge da necessidade de garantir e estabilizar mão-deobra abundante e barata por parte desta empresa em 1888 tornando assim mais apetecível aos futuros trabalhadores mudarem-se para irem para lá trabalhar. A Vila Dias é um exemplo que não se localiza na proximidade do patronato, a sua localização fora dos principais eixos de circulação contribui para o isolamento destes operários face a outras Vilas e Pátios, daí a Vila desenvolver-se com um sistema autossuficiente, dispondo de lojas, cafés e de um chafariz. Esta encontra-se no alto dos Toucinheiros, a organização do espaço é em função de uma pequena comunidade.
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Figura 4 Vila Maria LuĂsa 1970
Fonte: http://apsruasdelisboacomhistria.blogspot.pt/search?q=vila+zenha, acedido a 22.03.2017
Figura 5 Vila Flamiano 1960
Fonte: http://aps-ruasdelisboacomhistria.blogspot.pt/search?q=vila+flamiano, acedido a 22.03.2017
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Figura 6 Vila Dias 1900
Fonte: http://www.agendalx.pt/evento/freguesias-de-lisboapassado-e-futuro#.WNKgKvnyjIU, acedida a 22.03.2017
Segundo o Roteiro de Lisboa do Anuário Geral de Portugal, edição de 1979, constavam a esta data 350 vilas operárias (Pereira, 1995) prova da dimensão e da quantidade de pessoas que estas vilas e pátios tinham, e sem condições de salubridade. Em 2017, 61 são propriedade municipal, 33
dos
quais
têm
potencial
para
serem
requalificados
(http://24.sapo.pt/atualidade/artigos/patios-e-vilas-de-lisboa-vao-ter-umanova-cara Acedido a 9.06.2017). As vilas operárias são espaços restritos e comunitários, muitas vezes independentes do resto da cidade, pois muitos moradores ainda conservam a memória do espírito de aldeia que tinham antes de migrarem para a cidade. A industrialização (re) caracterizou a frente de rio, deixou de ser uma zona privilegiada com palácios e conventos, passando a ser uma zona fabril. Contudo, muitos dos palácios e conventos não desapareceram por completo, o que se sucedeu foi um reaproveitamento destes, que abandonados serviram para habitação dos operários e fábricas. Caso disso é o Convento de Xabregas que em 1838-42 passou a ser Companhia de Fiação e Tecidos Lisbonenses, primeira fábrica que se 30
sabe na zona, posteriormente Companhia dos Tabacos e hoje Teatro Ibérico e Instituto de Emprego e Formação Profissional. “No entanto, a maior parte dos empresários, ciosos de montarem os seus negócios rendosos, para qual não dispunham inicialmente de capital suficiente para investir, quer nos edifícios, quer em infraestruturas, foramse aproveitando dos conventos extintos, para se instalarem. A estrutura e o tipo de organização conventual “plurifuncional” prestavam-se a servir de abrigo às manufaturas. O caso mais flagrante foi o Convento de S. Francisco de Xabregas, transformado em fábrica de fiação de tecidos de algodão, entre 1840-44, e de tabacos, em 1846.” (Custódio & Folgado, 1999, p.31) Figura 7 Convento de Xabregas anterior a 1895
Fonte: http://apsruasdelisboacomhistria.blogspot.pt/search?q =convento+de+xabregas, acedido a 22.03.2017
Apesar da industrialização ter acontecido um pouco por toda a Lisboa, na zona oriental encontram-se evidências e marcas mais específicos da industrialização, muito em virtude de esta zona ter uma grande 31
homogeneidade geomorfológica do Terreiro do Paço ao Rio Trancão (estrada de circunvalação), com o avanço das obras do Porto de Lisboa e por estar próxima do caminho-de-ferro e do rio, permitindo uma circulação mais fluída de matérias-primas, trabalhadores e produtos. Se esta zona evoluiu por um lado a nível de tecnologias e de acessibilidades, acabou por regredir na qualidade do contacto com o rio que aquela população estava habituada. Devido aos aterros que se fizeram entre a praia de Xabregas e a doca dos Olivais a população viu o rio cada vez mais longe, criando-se um novo conceito de Lisboa Ribeirinha mais distante, para lá da linha de comboio e do porto de Lisboa ficando apenas pela vista deste, e, às vezes, nem isso. No final do século XVIII e no século XIX a indústria deu um grande salto com a descoberta do gás, produzido através da destilação da madeira e do carvão, permitindo assim a iluminação. Contudo só no final do século XIX, em 1891, houve o início da iluminação pública com utilização da luz elétrica em Lisboa. Apesar da industrialização começar no século XIX, nessa altura ainda havia quintas nesta zona da cidade com o seu cais próprio. Há uma transformação lenta da paisagem agrícola de Lisboa em paisagem industrial. Um dos marcos em que também teve consequências na zona oriental da cidade foi a Exposição do Mundo Português na zona industrial de BelémPedrouços, em 1940, que levou a uma reorganização do território, passando algumas indústrias para a zona oriental da cidade. Esta reorganização consta do Plano de Urbanização de Lisboa, de 1938-48 de Etienne de Groer, em que uma das linhas mais fortes passava por “Criar uma zona industrial na zona oriental da cidade, associada ao porto”. (http://www.cm-lisboa.pt/viver/urbanismo/planeamento-urbano/planodiretor-municipal/enquadramento-do-pdm Acedido em 9.03.2017)
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Figura 8 Plano Diretor de Urbanização de Lisboa 1948
Fonte: http://www.cm-lisboa.pt/viver/urbanismo/planeamento-urbano/planodiretor-municipal/enquadramento-do-pdm, acedido a 30.04.2017
Nesta altura Belém passou a ser entendida como uma zona de qualidade da cidade, como é entendida até hoje, valorizada pelas grandes construções públicas que resultaram da Exposição do Mundo Português, semelhante ao que, passados cerca de 50 anos se veio a repetir com a Expo 1998, em que uma parte da cidade que estava esquecida de todos passa a ter um valor tal que hoje em dia é uma das zonas mais caras da cidade de Lisboa. A Exposição do Mundo Português em 1940 deu a Lisboa, como normalmente as exposições e os grandes eventos dão, novas acessibilidades como as gares marítima de Alcântara (por Pardal Monteiro) e fluvial de Sul e Sueste (por Cottinelli Telmo), a ampliação do Porto de Lisboa, o Aeroporto de Lisboa, a autoestrada, viaduto e a marginal para o Estoril e Estádio Nacional. Em particular, três sítios que então eram considerados periferia da cidade começaram a ser testemunho do crescimento de uma burguesia industrial: Beato/Xabregas, Calvário/Alcântara e Boavista. Pereira refere
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que “Enquadrado nas remodelações urbanísticas dos anos 40 – nomeadamente no PDCL – o DL de 19-10-1942 cria a «Zona Industrial do Porto de Lisboa», facto que tem duas consequências – imediatas e diretas – para a zona Oriental de Lisboa. Em primeiro lugar, soluciona vários problemas relacionados com a requalificação da zona Ocidental da cidade – entre Alcântara e Pedrouços – transferindo para Oriente diversas indústrias (como a fábrica de Gás de Belém; vários depósitos de gasolina; algumas fábricas poluentes; armazéns e umas tantas indústrias a precisar de espaço). De igual modo, a instalação de equipamentos industriais na zona Braço de Prata / Moscavide (como a Fábrica de Gás da Matinha; o Matadouro de Lisboa; a Moagem Lisbonense; a nova Fábrica de Material de Guerra de Moscavide e os Depósitos de Beirolas) segue essa nova tendência industrial.” (2007, p.127) Com o choque petrolífero nos anos 70 e com a emergência da sociedade do conhecimento que é a passagem da segunda revolução industrial para a terceira revolução industrial e que se prolonga até aos dias de hoje e para o futuro, aquando desta passagem, na década de 80 do século XX começa a desindustrialização lentamente em Portugal, nesta zona da cidade começando a fechar algumas indústrias aos poucos. As indústrias relacionadas com o setor militar deixam de fazer sentido num país pósguerra, tanto a Fábrica de Braço de Prata como a Manutenção Militar deixam de ser pertinentes e acabam por ir fechando portas. No caso da Fábrica do Braço de Prata transformou-se num espaço de arte com cafetaria e espetáculos, no caso da Manutenção Militar foi fechando as portas aos poucos só fechando totalmente em 2011, neste momento muitos projetos estão pensados para lá.
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2.2. Arquitetura Industrial “Así como el fervor religioso de la Edad Media había espoleado a los arquitectos medievales a punzar los cielos de la Europa occidental com sus agujas góticas, llevando al límite las estructuras de piedra, la demanda de enormes naves industriales para albergar los procesos mecanizados de fabricación y las grandes máquinas del comercio hizo que arquitectos e inginieros investigaran y desarrollaran las técnicas del hierro, acero y vidrio, los únicos materiales que podían satisfacer las exigencias estructurales que les planteaban4.” (Phillips, 1993, p.6) É no contexto da revolução industrial que surge e se desenvolve a arquitetura
industrial,
ambos
os
fenómenos
estão
intimamente
interligados. A evolução dos sistemas de transporte, nomeadamente dos caminhos-deferro, levou a que o princípio do século XIX ficasse marcado como a época do ferro e do engenheiro, as pontes, as estações de caminhos-deferro e os armazéns constituíram parte da paisagem da sociedade industrial. No fundo, o que permitiu a Revolução Industrial também propiciou a Arquitetura industrial, a nível de materiais e da sua utilização como por exemplo a maquinaria de ferro permitiu o uso de grandes maquinismos e ao mesmo tempo de estruturas de ferro que possibilitaram a construção de grandes vãos em edifícios que muitas vezes eram feitos consoante o tamanho das máquinas de produção, que por vezes ocupavam algumas centenas de metros. O aparecimento do ferro na arquitetura resolveu alguns problemas como o de vencer grandes vãos e a diminuição da dimensão dos suportes, o 4
Assim como o fervor religioso da Idade Média estimulou os arquitetos medievais a perfurar os céus da Europa Ocidental com as suas torres gótica, levando ao limite as estruturas de pedra, a exigência das enormes naves industriais para albergar os processos mecanizados de fabricação e as grandes máquinas do comércio fez com que arquitetos e engenheiros investigassem e desenvolvessem as técnicas do ferro, do aço e do vidro, os únicos materiais que podiam satisfazer as exigências estruturais que estes levantavam. (tradução livre)
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que levou a que as indústrias se implantassem em espaços muito mais amplos. Foi a produção industrial do ferro que permitiu a continuação da industrialização. A introdução do ferro em Portugal deu-se no final do século XIX com a construção da linha ferroviária do Leste, em Xabregas (1857-58). Continuando para o Porto, já que em 1861-65 T.Dillen Jones e Sheilds construíram no Porto o Palácio de Cristal no Porto, um homólogo do Crystal Palace de Londres (1851), evoluindo assim para a utilização do ferro com a junção do vidro (Philips, 1993). Até aqui as estruturas que se faziam eram de caminhos-de-ferro, portos marítimos ou grandes espaços destinado a mostruários, destinados a grandes eventos e exposições. O Crystal Palace na Grande Exposição em Londres de 1851, no Hyde Park, (Philips, 1993) foi o primeiro edifício que levou aos limites os materiais de última tecnologia da altura, o ferro e o vidro. Por este feito, sendo notável as suas dimensões, foi considerado um símbolo da revolução industrial. Este projeto de Sir Joseph Pexton teve tal importância que influenciou uma geração de edifícios como os diversos “Palácios de Cristal” que foram construídos posteriormente pelo mundo, como no Porto, Madrid, Curitiba e Petrópolis. No caso do Porto é percetível que, no início, a arquitetura industrial chega a Portugal através de revistas ou de deslocações/visitas ao local, o que é evidente sobretudo no caso do Palácio de Cristal. O Palácio de Cristal foi construído em 1865 e demolido em 1951 com muito descontentamento da população, foi projetado pelo arquiteto inglês Thomas Dillen Jones. Apesar de já não existir este edifício foi uma forte marca para Portugal no que toca à Arquitetura Industrial e também à internacionalização da arquitetura e das suas evoluções. A Exposição Universal de Paris de 1889 foi um avanço importante na técnica de trabalhar os novos materiais, o aço, o vidro e o ferro. O aço e o vidro foram trabalhados com as Galerias de Máquinas projetadas pelos arquitetos Victor Contamin e Ferdirand Dure. Este projeto foi um ícone para a arquitetura francesa do século XIX. Enquanto o ferro foi trabalhado 36
com a Torre Eiffel, do projetista Gustavo Eiffel, e que ainda subsiste como um dos equipamentos mais imponentes da capital francesa. A imagem da Lisboa Industrial materializa-se através do ferro nas diversas linguagens arquitetónicas industriais. Vieillard & Touzet, construtores e projetistas, eram conhecidos pela construção de centrais elétricas como a I Central Tejo conhecida como Central da Junqueira. No entanto, também executaram em Lisboa edifícios como “A Napolitana – Antiga Unidade Industrial” em Alcântara, assim como o Colégio Roussel nas Avenidas Novas e a Garagem Auto Palace também nas Avenidas Novas, que foi considerada uma das 100 Obras de Engenharia mais relevantes do século passado pela Ordem dos Engenheiros no livro “100 Obras
de
Engenharia
Civil
no
século
XX.
(http://www.cm-
lisboa.pt/equipamentos/equipamento/info/a-napolitana-antiga-unidadeindustrial Acedido a 9.03.2017) À medida que as tecnologias e as técnicas avançam tenta-se aliar à engenharia a parte estética, desenvolvendo se assim uma arquitetura que harmoniza as duas. No início do século XX aparece o betão armado, que é usado em diversos elementos estruturais. É usado por grandes arquitetos como Le Corbusier que elabora o sistema Domino, entre 1914 e 1917, que é constituído por lajes planas, pilares e fundações em betão armado. Deste modo, o sistema permite uma liberdade conceptual muito grande, assim como economia e rapidez em obra. Em Portugal é a partir da década de 20 do século passado que uma geração de arquitetos influenciados por nomes como Le Corbusier e Oscar Niemeyer
passam a assumir o betão com todas as suas
possibilidades, arquitetos como Pardal Monteiro, Cristino da Silva, Cottinelli Telmo e Cassiano Branco, entre outros. Apesar de grandes nomes começarem a usar o betão armado, só depois da Segunda Guerra Mundial, com a necessidade de construção rápida, barata e seriada o betão armado afirma-se como material estrutural.
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A construção do edifício do Laboratório de Engenharia Civil em 1949 por Pardal Monteiro assim como o Instituto Superior Técnico em 1927 pelo mesmo arquiteto foram duas das obras que assumiram o betão armado como um novo material permitindo a construção em altura e a concretização de grandes vãos. Também o Pavilhão Rosa Mota no Porto, de 1952, projeto de José Carlos Loureiro foi um dos que levou o betão armado ao limite. Figura 9 Palácio de Cristal Porto
Figura 10 Crystal Palace Londres
Fonte: http://thecitytailors.com/en/palacio-decristal-porto-city-parks/ Acedido a 22.03.2017
Figura 11 Galerias das Máquinas, Exposição Universal de Paris 1881
Fonte: http://www.ecole.co/fr/classics/paxton/crystalpalace-london-england/image-711/, acedido a 22.03.2017
Figura 12 Sistema Domino, Le Corbusier
Fonte: http://www.alamy.com/stockphoto/paris-photo-fair.html acedida a 22.03.2017
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Fonte: https://www.dezeen.com/2014/03/20/opinon-justinmcguirk-le-corbusier-symbol-for-era-obsessed-withcustomisation/ acedido a 22.03.2017
2.3 Desvalorização do Património Industrial
“(…) já que o património se deve entender na sua dimensão mais vasta, como retrato vivo de uma história real” (Prefácio por José Sarmento de Matos in Custódio & Folgado, 1999, p.5) Neste ponto do capítulo 2 vamos abordar o património, nomeadamente como o património industrial é visto ou não como património, e como este é desvalorizado por ser uma parte da cidade normalmente nas periferias e muitas vezes sem grande parte estética associada. Segundo Françoise Choay a expressão Património Histórico “designa um fundo destinado ao usufruo de uma comunidade alargada a dimensões planetárias e constituído pela acumulação contínua de uma diversidade de objetos que congregam a sua presença comum ao passado” (Choay, 2006, p.11). O termo património vem de pátria e remete para a relação entre a sociedade, o tempo, a história e a memória, sendo “bens reconhecidos pela
sua
importância
cultural”
(https://www.priberam.pt/dlpo/patrim%C3%B3nio Acedido a 9.03.2017). Transportando este conceito para o local de intervenção de projeto podemos considerar que a indústria ao ter uma forte presença em algumas cidades, sendo um elemento da paisagem e imagem urbanas, é dotada de um valor patrimonial pela sua evolução e pelo desenvolvimento que proporcionou a algumas cidades. Até ao final da Segunda Guerra Mundial a ideia de património estava associada à arqueologia e à história erudita da arquitetura, e, a partir daí, “todas as formas de arte de edificar, eruditas e populares, urbanas e rurais e todas as categorias de edifícios, públicos e privados, sumptuários e utilitários, foram anexadas sob novas denominações” (Choay, 2006, p.12), o que permitiu distinguir os edifícios abrangendo um maior número destes serem reconhecidos como património.
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A ideia de património não é uma ideia estável, constante, altera-se “em conformidade com as diferenças de cultura, políticas, sociais e económicas que separam épocas, países e regiões, e que se sucedem inerentes ao desenvolvimento dos processos históricos.” (Choay, 2005, p.9). Assim o património, hoje em dia, abrange tanto os bens materiais como os de suporte inatingível, como é o caso do fado que se configura como património imaterial mundial. O elo de ligação entre tudo o que é património é definitivamente o reconhecimento da sua capacidade de representar valores e reavivar memórias nas pessoas. Partindo do suposto que o património é uma categoria aberta e multidimensional, este pode estar associada à arquitetura, ao artesanato, à cidade, às tradições orais, entre outros aspetos. Reconhecer a indústria como património é reconhecer a importância que uma época e que uma sociedade e modo de produção tiveram na vida das pessoas e na vida das cidades. A ausência e/ou escassez de medidas cautelares em relação a este património faz com que haja uma negação desta parte da cidade, essa rejeição é óbvia quando pensamos que há muitos complexos industriais em ruínas e que as pessoas não percebem o valor simbólico e evolutivo que estes complexos têm. Enquanto se fosse um palácio, uma habitação ou uma igreja oitocentista a população reconheceria perfeitamente o seu valor. Há uma linha óbvia que separa o edificado e património arqueológico anterior à industrialização oitocentista de um presente, desde a industrialização até aos dias de hoje, aparentemente sem patrimónios de valor. “Esta dicotomia é acompanhada pela desvalorização das realidades fabris, industriais e técnicas, algo estranhas à cultura, e sua negação por razões económicas, sociais ou ambientais.” (Custódio & Folgado, 1999, p.11). O facto de ser considerado património não quer, de todo, dizer que permaneçam intocáveis, pelo contrário, é importante assumir os edifícios como património e valorizar o que há de melhor neles, neste caso dos
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edifícios industriais - as naves -, e tirar o máximo proveito deles com o melhor uso, dando-lhes novas funções, dando um futuro ao passado. Neste tema do património e das intervenções que devem ou não serem realizadas, temos importa aflorar duas perspetivas distintas sobre esta questão e bem representadas por dois homens: a intervencionista, com Viollet-le-Duc (predomina no conjunto dos países europeus) e a antiintervencionista com Ruskin (característica de Inglaterra). Viollet-le-Duc (1814-1879) defende a prática do restauro sendo para ele restabelecer um edifício num estado que poderia nunca ter existido. Foi um dos primeiros teóricos da preservação do património histórico, dá muito relevo à utilização do património, restaurando-o e mantendo uma fidelidade estilística absoluta, sem criatividade ou opiniões pessoais. Em contraposição, Ruskin (1819-1900) defende afincadamente o anti intervencionismo, consequência da sua conceção de monumento histórico, defendendo que restaurar um edifício é ferir a autenticidade que constitui o seu próprio sentido. E, para ele, restauro é uma destruição inigualável numa construção, pondo em causa o legado do carácter sagrado que as gerações passadas nos deixaram. Em alternativa sustenta a conservação estrita como método de preservação patrimonial. (Ruskin, 1989) Há diversas maneiras de intervir nas pré-existências, sendo de salientar a conservação, o restauro e a reabilitação. A conservação, em inglês preservacion, consiste em apensas conservar a pré-existência, não se altera, apenas preservação das estruturas construídas. A conservação é um ato de prevenção de degradações futuras, se a conservação for bem feita posteriormente não será preciso o restauro. No restauro, em inglês restauracion, implica uma retoma obrigatória ao estado original da obra antes da degradação, reparando os danos sofridos. O objetivo do restauro é preservar as mensagens históricas e culturais para o futuro.
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Reabilitação já se inscreve no campo interventivo ao nível da recuperação dos edifícios. A reabilitação é uma adequação da estrutura pré-existentes a novos usos. Esta intervenção pretende proporcionar um desempenho compatível com as exigências dos atuais usos, para tal pode ser necessário demolir ou alterar alguma parte da pré-existência. A reabilitação pressupõe o aproveitamento de construções, logo evita a sua demolição total e substituição por novos edificados. Além destas três disciplinas importantes que devemos ter em conta sempre que intervimos em pré-existências, e com maior cuidado quando intervimos em património, há uma outra que é pertinente na nossa proposta de intervenção. Reversibilidade, que tem a possibilidade de voltar ao seu estado original, é uma qualidade, a meu ver, espelho da humildade do arquiteto e da intervenção. Ao percebermos que as necessidades dos dias de hoje podem não ser as mesmas daqui a alguns anos, temos de ter consciência que será sempre mais útil a reversibilidade da arquitetura, permitindo, sempre que assim o desejarem, remover a intervenção sem causar danos aos restantes materiais, ou seja, sem afetar a autenticidade da obra. Este conceito está diretamente ligado à durabilidade da sua utilização e dos materiais. Das 4 estratégias, esta é aquela que aposta em novos usos, tentando tirar o máximo partido das pré-existências. Perante estes conceitos definidos, temos de ter o bom senso de saber o que aplicar em cada objeto de intervenção, tal chama-se teoria de valor. Temos de compreender o que tem valor arquitetónico, estrutural ou sentimental e perceber a hierarquia que teremos de aplicar a cada parte do edificado e o que fará sentido no contexto do objeto em estudo. A teoria de valor é uma teoria complexa que, como disse anteriormente, vai de encontro à sensibilidade do arquiteto que a aplica. Concluímos deste capítulo que a indústria é uma parte essencial da nossa história enquanto país, cidade e humanidade, revelando um valor histórico e patrimonial associado a uma etapa específica do desenvolvimento 42
português e que constitui uma herança que não deve desaparecer completamente da nossa paisagem urbana.
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Capítulo 3- Contexto de intervenção: a freguesia do Beato Neste capítulo faz-se uma contextualização da Freguesia do Beato, da sua história, demografia e edificado. Também se aflora a história da Manutenção Militar e a sua caracterização construtiva.
3.1 Freguesia do Beato: breve panorâmica histórica A freguesia do Beato, que se situa na zona oriental da cidade de Lisboa, entre Xabregas e Marvila, começou por ser Paróquia de São Bartolomeu do Beato, em 1756 quando foi desanexada de Santa Maria dos Olivais, depois mudou para Paróquia do Beato António e em 1910, quando as Paróquias passaram a ser freguesias passou a ser Freguesia do Beato (Ferreira, Figueiredo, Sanchez, 1995). A partir de meados do século XVI vão-se instalando progressivamente famílias nobres com ligações à corte na zona ribeirinha de Xabregas e Beato. A abertura da praia ao longo da Rua Direita de Xabregas e Rua Direita do Grilo, bem como, a abertura das vias perpendiculares a estas contribuíram para a definição orgânica da toda esta zona, que permanece inalterada até hoje, apesar do aterro ter roubado rio, a forma é a mesma. Figura 9 Praia de Xabregas 1938
Fonte: http://apsruasdelisboacomhistria.blogspot.pt/search?q=praia+de+xabreg as, acedida a 22.03.2017 45
Figura 10 Praia de Xabregas Planta de Filippe Folque 185658
Fonte: http://apsruasdelisboacomhistria.blogspot.pt/search?q=praia+de+xa bregas, acedida a 22.03.2017
Juntamente com os palácios e casas nobres que se instalavam nesta zona é de evidenciar a presença de alguns Conventos que também se instalaram. O Convento das Carmelitas (conhecido como das “Grillas”) foi fundado pela Rainha D. Luísa de Gusmão em 1660 que nele permaneceu até à sua morte, em 1666. Erguia-se entre a praia e a via pública com a cerca em frente do outro lado da Rua Direita do Grilo, estando ligada a esta através de um arco sobre a estrada. Estava disposto em 3 alas formando um claustro quadrado no seu interior, a Sul era delimitado pelo Rio Tejo e a Nascente pelo Cais do Duque de Lafões. O terramoto destrói parte do convento que depois é reestruturado, tendo a igreja sido totalmente reconstruída. Com a morte da última freira em 1888 a
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propriedade é entregue ao Ministério da Guerra que ali procede à instalação da Manutenção Militar. Dois foram os momentos de maior importância para as transformações nesta zona da cidade, um deles foi o terramoto de 1755 que destrui e danificou grande parte dos palácios e conventos da paróquia, e o outro foi a Revolução Liberal de 1832 que profanou alguns templos cristãos, logo a seguir à expulsão das ordens religiosas, fez com que a industrialização tivesse oportunidades de se desenvolver nesta zona. (Ferreira & all, 1995). Esta “Foi a época de trocar a paisagem serena e límpida do rio e das paisagens campestres, pelo toque das sirenes das fábricas e pelas torres de tijolo, algumas delas ainda hoje existentes.” (Ferreira & all, 1995, p.15) Segundo, Ferreira, Figueiredo e Sanchez, autores do livro A Freguesia do Beato na História (1995, p.49), o Beato passou por três fases de industrialização distintas. A primeira verificou-se na década de 1840, a segunda na de 1870 e a terceira de 1890. A primeira foi uma entrada sublime na indústria com as unidades manufatureiras de têxteis, de facto, com o surgimento da máquina a vapor as indústrias reciclaram-se e alargaram. O expansionismo industrial deuse na segunda fase desta industrialização com a formação das indústrias de maiores dimensões dispondo já de outras tecnologias relacionadas com a primeira revolução industrial. A terceira fase foi a relacionada com a indústria alimentar que começou a desenvolver-se no Beato em 1889 com a primeira moagem a ser instalada pelo industrial João de Brito, “Portugal e Colónias” que viria a ser “A Nacional” que ainda hoje funciona. Paralelamente à evolução industrial no Beato, em Lisboa, com a introdução dos primeiros transportes públicos em 1873, a perceção dos espaços e das distâncias muda, conferindo uma outra dimensão ao crescimento urbano (Ferreira, Figueiredo & Sanchez, 1995).
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A população de Lisboa passa de 197 000 habitantes em 1864 para 243 000 em 1886; em em 1920, no final da Primeira República, esse valor rondava os 484 649. Em 1854 foi construída a Ponte de Xabregas (ou viaduto da linha férrea) em ferro (projeto do engenheiro Valentine); mais tarde em 1856 o caminho-de-ferro passou a usar essa ponte para chegar a Santa Apolónia. Figura 11 Viaduto de Xabregas 1968
Fonte: http://lisboahojeeontem.blogspot.pt/2015/05/de-marvilaxabregas.html , acedido a 22.03.2017
Figura 12 Sobreposição Planta Filipe Folque 1856-58 e Planta Atual, convento das Grilas
Fonte: http://lxi2.cm-lisboa.pt/lxi/ acedido a 22.03.2017
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Em 1897 o Rei D.Carlos funda a Manutenção Militar com o objetivo de fabricar produtos alimentares para abastecer o exército, a armada e a população em crise se assim fosse necessário. O convento é reedificado para corresponder à construção então de uma padaria, e depois de fábricas, destruindo-se a igreja. O projeto é do Engenheiro Joaquim Renato
Baptista.
(http://restosdecoleccao.blogspot.pt/2013/10/manutencao-militar.html Acedido a 9.3.2017) Em finais do século XIX abre no Beato a primeira escola industrial portuguesa denominada Afonso Domingues que funciona num edifício da Calçada do Grilo de 1884 a 1897. A sua abertura visou colmatar a necessidade de formar trabalhadores que não tinham qualquer formação industrial. Depois com a instauração do Estado Novo o mais importante passa a ser a oferta de mão-de-obra muito barata, deste modo a educação
dos
funcionários
deixa
de
ser
uma
prioridade.
(http://restosdecoleccao.blogspot.pt/2011/12/escola-industrial-afonsodomingues.html Acedido a 9.3.2017) Neste período as políticas que afetam a cidade de Lisboa são objetivas e técnicas, descurando o conteúdo social e as reais necessidades da população promovendo uma crescente segregação socio-espacial. Deste modo se produziu a cidade burguesa dos palácios e a cidade operária dos pátios e bairros de lata, resultando a primeira de um desenho urbano planeado e a segunda da não existência de qualquer tipo de desenho urbano. Este crescimento desordenado nas zonas de residência do operariado contribuiu para o decréscimo da qualidade de vida das populações e para uma acentuada degradação ambiental. Territórios como o Vale de Alcântara, Chelas, o Areeiro e os Olivais são, então, escolhidos para a proliferação das construções de génese ilegal na capital. A diferenciação das funções essenciais em Lisboa corresponde à diferenciação do estatuto social das populações residentes nesses lugares. A fragmentação funcional da cidade implica também uma
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fragmentação social. O Beato assume-se como um território de gente operária, pobre, analfabeta, com fraca mobilidade e qualidade de vida, paralelamente e em contraste com o cosmopolitismo do centro da capital. Na primeira metade do século XX há um forte crescimento demográfico e urbanístico, deve-se a dois fatores, como referimos anteriormente, o êxodo rural e o sucesso das políticas urbanas higienistas que controlaram a propagação das epidemias na cidade de Lisboa, reduzindo o número de mortes por doença. Em finais dos anos 20 o município inicia o planeamento para esta zona da cidade. No Plano Diretor de Urbanização de Lisboa de 1938 consta projetado o Bairro de Madre Deus como um bairro económico, ocupando uma área de 13,6 hectares de terrenos livre, em que a Calçada do Grilo faz a ligação deste com o rio. Figura 13 Vista Aérea do Bairro Madre Deus 1955
Fonte: http://biclaranja.blogs.sapo.pt/702260.html acedido a 22.03.2017
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Um dos aspetos associados à precária situação económica da população residente na frente ribeirinha Oriental diz respeito o apoio social que foi desde sempre proporcionado nesta área. No início da industrialização por haver muita gente do proletariado nesta zona começaram por emergir os sindicatos, as greves e as manifestações. Mais tarde, em 1929, surgiram a “Cozinha Económica” e os “Lactários de primeira infância” (Ferreira e all, 1995). No decorrer da primeira metade do século XX o Beato é sujeito a uma violenta urbanização de carácter ilegal e espontâneo. Estas construções de génese ilegal têm lugar sobretudo em terrenos públicos dando origem a inúmeros bairros de lata como o famoso Bairro Chinês em Marvila na Quinta do Marquês de Abrantes. Estes bairros de lata concentram mãode-obra fabril colonial a partir dos anos 70, mas com piores condições que os pátios oitocentistas. Em 1966 a inauguração da ponte sobre o Tejo permite que Lisboa comece a crescer para Sul, o que permite que a cidade cresça para o outro lado do rio Tejo, sendo esta zona encarada como periferia da cidade de Lisboa. Neste contexto, freguesias de Lisboa como o Beato passam a assumir uma localização central na cidade. A população de Lisboa cresce na década de 70 com o regresso dos retornados das ex-colónias, contudo na década seguinte decresce de imediato. Este decrescimento de população no concelho de Lisboa é fruto da área metropolitana de Lisboa crescer e de existir cada vez mais habitação social nestas zonas periféricas do concelho de Lisboa. Como os locais são mais baratos as pessoas acabam por mudar-se do concelho de Lisboa para a periferia. Com o decrescimento populacional em Lisboa na década de 80, juntamse fatores como o aumento do nível de desemprego e o envelhecimento da
população.
Com
a
desindustrialização
os
operários
ficam
desempregados, por seu lado, o centro de Lisboa passa a ser um centro aglutinador se serviços.
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Face à cada vez maior desindustrialização e sucessivos aterros portuários, a população local perceciona o rio como estando cada vez mais distante, sentindo uma desconexão física face a este. Em 1948 com o Plano de Groer, foi construída a Avenida Infante D. Henrique que separou ainda mais a cidade do seu rio.
Caracterização da população e do edificado Para proceder à caracterização da área de intervenção começou-se por estudar de forma geral a população da freguesia, os núcleos familiares, os
alojamentos
entre
2001
e
2011,
estabelecendo-se
algumas
comparações com o concelho de Lisboa. O Beato ocupa uma área de 1,69km2, detendo uma população de 12.737 pessoas e um total de 7.793 alojamentos, segundo os Censos 2011 (INE, 2011). Trata-se de uma freguesia “De cariz predominantemente residencial (90%), o edificado data, na sua maioria, do período 1926-1970 (50%), tem baixa altura (65% 1 a 2 pisos) e poucos alojamentos por edifício (54%, 1 a 2). Os alojamentos têm dimensão média a pequena (54% 50 a 100m2; 30% até 50m2), mas têm várias divisões (3 a 4 62%; 5 ou mais 31%). A população decresce 13% entre 2001 e 2011. Esta diminuição afeta sobretudo o grupo etário dos 15 aos 24 anos (-35%), mas também os adultos (25 a 64 -15%). A população tem um grau de instrução
baixo.
Revela
um
índice
de
envelhecimento
elevado,
relativamente à cidade, embora seja superior a 50% o número de famílias sem pessoas com mais de 65 anos, por oposição ao que as integra.” (http://www.cmlisboa.pt/fileadmin/MUNICIPIO/Reforma_Administrativa/Jun tas_de_Freguesia/JF_Beato.pdf consultado em 1.12.2016) A população residente nesta freguesia sofreu processos de recomposição desde a sua origem, no começo por ser a periferia da cidade, logo rural, habitavam pessoas ligadas às atividades agrícolas, depois as ordens religiosas apropriaram-se de alguns terrenos, o que fez com que um
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segmento importante desta população fosse composto por freiras e frades, mais tarde, com a industrialização, o operariado passou a compor grande parte da população residente. Nos dias de hoje grande parte da população é idosa como consequência do envelhecimento e marginalização dos bairros operários típicos das zonas industriais. Do tempo que o Beato era campestre apenas restam as hortas do Vale de Chelas. No final do século XVIII a freguesia do Beato tinha 380 fogos e 1500 habitantes. Foi no século XIX que houve o “boom” de vilas operárias nesta freguesia (tópico desenvolvido no capítulo 2 Lisboa Industrial no ponto Industrialização em Lisboa, pág. 28). No ano de 1900 a freguesia do Beato tinha 2215 fogos e 10 398 habitantes. (http://www.jfbeato.pt/beato/historia/ consultado a 11.12.2016) Ao analisar as tabelas no Anexo I, é percetível uma clara diminuição do número de famílias, tanto clássicas como institucionais, assim como, um aumento dos alojamentos familiares totais, e uma diminuição ligeira do número de edifícios. A partir desta análise conclui-se que, na freguesia do Beato, a população diminuiu significativamente havendo uma variação total de -12,72% entre 2001 e 2011, apesar desta variação ser significativa; na faixa etária dos 0 aos 14 anos aumentou ligeiramente o número de pessoas, talvez por um ligeiro crescimento da taxa de natalidade em Portugal e consequente também nesta freguesia. Um valor preocupante é o da variação entre os 15 e 24 anos ser negativo, 15,38%, o que significa que esta faixa etária está a abandonar o Beato e a mudar a residência para outro local. Comparando a população residente da freguesia com a do concelho de Lisboa e apesar das percentagens na variação serem diferentes, há um certo paralelismo, verificando-se em Lisboa também um maior decréscimo da população entre os 15 e os 24 anos e um acréscimo apenas na faixa etária dos 0 aos 14 anos; contudo, em termos de variação geral a freguesia do Beato está a perder muito mais população ou está a perder população do que o concelho de Lisboa.
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As imagens no Anexo I mostram numa escala mais alargada e graficamente a diferença populacional na cidade de Lisboa, mostrando que o Beato não destoa ao nível de densidade populacional, do que se acontece em Lisboa. Mediante a análise das tabelas relativas ao alojamento, houve uma melhoria
significativa
no
tipo
de
alojamentos
entre
2001/2011,
nomeadamente nos alojamentos não clássicos que passaram de 345, entre barracas, casas rudimentares em madeira, improvisadas e outras para apenas 9 em 2011, todas elas improvisadas. A maioria dos alojamentos foram edificados nesta freguesia entre os anos de 1946 e 1970, cerca de 43% dos existentes em 2011. A construção de habitação tem vindo a diminuir, em virtude de a população também estar a diminuir na freguesia, mas também pelo facto de grande parte do solo se encontrar ocupado, nomeadamente pelo Bairro Madre Deus. Entre 2001 e 2011 os alojamentos clássicos diminuíram, assim como as famílias clássicas e as pessoas residentes, contudo as divisões aumentaram, o que significa que os alojamentos que permaneceram foram os que tinham mais divisões por alojamento, a média deste aumentou 0,1 em 10 anos. Em complementaridade a esta pesquisa, analisaram-se o número de edifícios na freguesia do Beato e na cidade de Lisboa, apenas como partida para estudar o seu estado de conservação. Neste parâmetro, mais uma vez o Beato se equipara ao centro de Lisboa, não havendo uma descontinuidade de densidade edificada entre a Baixa de Lisboa, por exemplo, e a Freguesia do Beato. Esta descontinuidade começa após a freguesia do Beato e pela frente ribeirinha até ao Parque das Nações, pressupondo que esta menor densidade a partir daqui para Oriente se deva ao facto de haver muitos edifícios industriais e armazéns, muitos deles devolutos e abandonados. Foi possível constatar que uma das maiores carências detetadas foi a falta de equipamentos e serviços que respondam às necessidades de um
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público jovem, principalmente com idades entre os 15 e os 25 anos, daí a variação decrescente de população residente com esta idade de 2001 para 2011 ter sido tão grande, maior que nas outras faixas etárias. De entre destes equipamentos e serviços, emergem as instituições de ensino superior, bem como, os espaços de trabalho e de lazer. Uma das potencialidades desta freguesia é o facto de fazer parte da cidade de Lisboa, ter alguma centralidade que permite um acesso rápido a partir da Baixa Pombalina, por exemplo, ou de Alfama, ou mesmo da parte mais nova da cidade, o Parque das Nações. Assim sendo, qualquer intervenção nesta zona para além de responder à população jovem da freguesia também pode vir a responder às necessidades da população dos arredores ou mesmo atrair nova população que poderá vir habitar esta zona da cidade. As acessibilidades são um ponto fraco porque, por exemplo, a maioria dos autocarros passa apenas na Avenida Infante Dom Henrique e não dentro da freguesia. As pessoas têm dificuldade em circular de transportes públicos dentro da freguesia. Já de carro é mais fácil a circulação, o que falta, principalmente na zona ribeirinha são os estacionamentos, que são escassos e improvisados, em cima de passeios, por exemplo. A nível de espaços de estar e lazer há alguns movimentos associativos e a norte do Bairro Madre Deus há um jardim muito frequentado pelos idosos, contudo todos os espaços são para um público mais envelhecido e não para um público jovem. Há um desajustamento da população residente nesta freguesia, nomeadamente na parte mais junto ao rio, a zona ribeirinha desta freguesia por ter um passado industrial que ainda está bem presente, residindo aí uma população dominantemente envelhecida.
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3.2 Manutenção Militar em Lisboa
Da Lisboa pós-industrial foram deixadas pequenas cidades industriais enquanto reminiscências do que em tempos foi a periferia de Lisboa com carácter fabril. A nossa zona de intervenção é reflexo disso mesmo, de uma indústria, neste caso uma indústria que durou tanto como as guerras (Primeira Guerra Mundial, Segunda Guerra Mundial e Guerra Colonial), dado que a Manutenção Militar era onde se fabricavam as alimentações de combate para os militares em guerra. Apesar do cariz industrial que está presente no Beato, esta zona tem uma história muito anterior notável como já foi referido ( Ponto 3.1 Freguesia do Beato: breve panorâmica histórica). O Beato, neste momento é uma zona esquecida entre dois locais da cidade de Lisboa – Santa Apolónia e o Parque das Nações; mas, há alguns séculos atrás era periferia da cidade, ainda hoje subsistem aqui alguns campos e quintas, embora já escassas e sobretudo no Vale de Chelas. A freguesia do Beato é uma das mais antigas freguesias de Lisboa, tendo no seu interior espaços muito distintos como antigos conventos e bairros de cariz económico edificados durante o Estado Novo, com alguma dinâmica social e de serviços, concedendo à cidade uma frente ribeirinha. Na sua origem era lugar de antigas quintas e palacetes que se converteram em conventos, posteriormente com a extinção das ordens religiosas em Portugal e consequente venda em hasta pública, foram reapropriados para usos diversos, nomeadamente para unidades industriais. Apesar de antes desta extinção das ordens monásticas em 1832-34 já haver três fábricas no Vale de Chelas, apenas depois desta data se operou uma viragem do Beato rural e religioso para industrial. As primeiras fábricas estabeleceram-se em edifícios religiosos ou em palácios. Apesar da rápida mutação que esta zona estava a experimentar, esta continuou a ser um espaço de passeios de domingo do povo lisboeta. 56
A industrialização alterou os hábitos e costumes da população desta freguesia, os campos abertos e antigos conventos deram lugar a fábricas e à construção de bairros habitacionais para alojarem a população que vinha do campo trabalhar para estas fábricas; neste período a população da freguesia mudou bastante, sendo grande parte constituída por operários e militares. A população residente nesta freguesia sofreu processos de recomposição desde a sua origem, no começo por ser uma mera periferia da cidade, eminentemente rural, aqui habitavam sobretudo pessoas ligadas às atividades agrícolas, depois as ordens religiosas apropriaram-se de alguns terrenos, o que fez com que um segmento importante desta população fosse composto por freiras e frades e posteriormente os operários das fábricas vieram constituir grande parte da população residente. A Manutenção Militar situa-se mais junto ao rio da Freguesia do Beato estendendo-se até um pouco acima da linha de comboio. Surge em 1862 com o começo da padaria militar e só encerra totalmente em 2011 (http://restosdecoleccao.blogspot.pt/2013/10/manutencao-militar.html Acedido a 9.3.2017). Apesar do encerramento ter sido recente, desde o fim da guerra do ultramar (1974) tem ocorrido o fechamento gradual de algumas partes, dado que a produção diminuiu drasticamente. Antes do seu encerramento algumas fábricas só funcionavam alguns dias por semana, e só um turno de 8 horas, em comparação com 24/24h como era habitual durante a Guerra Colonial, que foi o seu máximo de funcionamento. A Parte Sul da Manutenção Militar ocupa o Antigo Convento das Grilas, também conhecido como Convento das Carmelitas, que data de 1660, o convento sofreu alterações, foram demolidas duas partes e restando apenas, até aos dias de hoje, o corpo principal que tem frente para a Rua do Grilo. Foi neste corpo principal que se instalou a Padaria Militar em 1888, sendo transferida da Rocha Conde de Óbidos, entre Alcântara e Santos, por 57
aqui, pertencente ao convento tinham também a cerca conventual com muito espaço para futuros alargamentos, que acabou por acontecer mais tarde e por esta ter o Rio Tejo e o caminho-de-ferro muito perto. O plano para adaptação do convento para fins militares foi efetuado pelo capitão Renato Baptista, engenheiro e professor da escola do exército e em 11 de junho de 1897 foi criada a Manutenção Militar. Nesta data a Manutenção Militar era composta pela fábrica de farinha e pão. Entre a sua abertura e 1910 instalam-se outros equipamentos como laboratórios, oficinas, cozinhas, refeitório e fábrica de massas tendo com estas novas fábricas redimensionado a sua estrutura de produção; a partir de 1907, passa a fornecer todos os géneros de alimentos às tropas. Também foi neste ano que adquiriu parte da Quinta Duque de Lafões, na parte de trás do Palácio Duque de Lafões, para assim alargar a sua produção, agora, com terrenos para criação de animais. Daí que em 1916 se deu a abertura do matadouro, talho e salsicharia. Em 1921 construiuse a Central Elétrica. Em 1950-59 a MM tem uma importância social, inserindo-se na política social desenvolvida pelo Estado Novo, quando constrói o bloco social com creche, pré-primária e escola primária, refeitório com cozinha e salão de instrução e recreio com 800 lugares e assistência médica. Estes anos marcam um período de expansão produtiva por causa da Guerra do Ultramar e consequente saída diária de alimentos para alimentar os militares que estavam a combater. Trabalham cada vez mais pessoas nas diversas fábricas e oficinas da MM. Em 1960 instala-se o supermercado militar e em 1970 instala-se a fábrica de pastelaria, confeitaria e fritos. Em termos funcionais a MM era composta por: fábrica de moagem de cereais, padaria; oficina para o fabrico de massas alimentares; oficina para bolacharia e produtos similares; depósito de materiais de padarias de campanha; armazéns para trigos, farinhas, massas e outros produtos; oficina de reparação de material; laboratório químico e tecnológico destinado ao estudo de cereais, farinhas e fermentos; secretaria, alojamento de pessoal, enfermaria, cocheiras e cavalaria; central elétrica;
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serviços administrativos (a norte); edifícios sociais (a norte); habitação social (a norte). (Carta Militar com funções no anexo IV). O complexo da Manutenção Militar é composto sensivelmente por três partes, a sul da Rua do Grilo, que é local da nossa intervenção; a norte desta e até à linha férrea e onde se encontram as escolas, cinema, refeitório e armazéns de bens alimentícios; e a parte a norte da linha de ferro, que no início era onde se encontravam os animais e algumas residências de militares, e que ainda hoje permanecem algumas residências, contudo a maioria do terreno está desocupado. A Manutenção Militar no Beato tinha como principal função alimentar os soldados em combate, daí o fabrico de conservas, mas também as famílias destes que cá ficavam, daí haver um supermercado neste complexo da Manutenção Militar. A comida que era produzida era transportada para os minimercados militares disseminados pelo país. Por dia saíam 8 toneladas de pão só para a região de Lisboa, para o resto do país saía a farinha para depois produzirem o pão localmente. Os edifícios mais antigos são os armazéns do trigo, depois dessa altura e até 1970 são adicionados edifícios e maquinaria. Apesar de nesta zona da cidade haver muitas unidades fabris e complexos industriais, o da Manutenção Militar é dos mais significativos por ter a melhor tecnologia para a altura, para a vasta área ocupada e pela dimensão das unidades, o que faz de si património industrial, com um grande valor patrimonial. Em 1974 com a Revolução dos Cravos a MM adapta-se a uma nova realidade, a Guerra colonial acaba e cessa assim a necessidade de abastecer as tropas, apenas ficam a abastecer os que regressaram e as suas famílias, a partir desta data a MM começa a produzir cada vez menos mas o processo de encerramento que demorou quase 40 anos até fechar totalmente. Sendo assim durante a década de 90 a instituição desempenha novas funções ligadas ao apoio às famílias dos militares distribuindo comida pelos diversos supermercados militares do país.
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Figura 14 Fábrica da Bolacha 1955
Figura 15 Fábrica das Bolachas 1980
Fonte: http://restosdecoleccao.blogspot.pt/search?q=Manuten%C3%A7%C3%A3o+Militar acedida a 22.03.2017
Figura 16 Fábrica do pão
Figura 17 Fábrica do pão
Fonte: http://restosdecoleccao.blogspot.pt/search?q=manuten%c3%a7%c3%a3o+militar acedida a 22.03.2017
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Figura 18 RefeitĂłrio 1933
Fonte: http://restosdecoleccao.blogspot.pt/search?q=manuten%c 3%a7%c3%a3o+militar acedida a 22.03.2017
Figura 19 Central ElĂŠtrica 1917
Fonte: http://restosdecoleccao.blogspot.pt/search?q=manuten%c3%a7 %c3%a3o+militar acedida a 22.03.2017
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Figura 20 Laboratório
Fonte: http://restosdecoleccao.blogspot.pt/search?q=manuten%c3%a7% c3%a3o+militar acedida a 22.03.2017
Figura 21 Silos e Transportador
Fonte: Ferreira, P. C., Figueiredo, S., Sanchez, P. (1995). A freguesia do Beato na história. Lisboa: Edição da Junta de Freguesia do Beato
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Figura 22 Central Elétrica 1917
Fonte: http://www.cinemateca.pt/CinematecaDigital/Ficha.aspx?obraid=25517&type=Video Acedida a 22.03.2017
Figura 23 Aspirador Pneumático e Passerelas de Trigo 1930
Fonte: http://www.cinemateca.pt/CinematecaDigital/Ficha.aspx?obraid=25515&type=Video Acedida a 22.03.2017
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Caracterização Construtiva Neste ponto caracterizamos construtivamente os três edifícios em que vamos intervir numa escala mais pormenorizada, a central elétrica, as oficinas e o edifício das carnes, para isso fizemos tabelas de caracterização construtiva que estão no Anexo III e fazemos uma pequena reflexão do que está programado para o Hub Creativo do Beato. O que está programado para o nosso local de intervenção deste PFM é um Hub Creativo, um polo de inovação que pretende fazer regenerar a zona oriental da cidade a partir dali, de uma área de 30 mil metros quadrados que será arrendada por um período máximo de 50 anos (https://www.dinheirovivo.pt/fazedores/galeria/aqui-vai-nascer-o-maiorhub-criativo-e-empreendedor-nacional/ Acedido a 9.03.2017), será o maior projeto de regeneração urbana desde a Expo 98. A nosso ver tal projeto pretende operar uma mudança brusca e profunda nesta parte da cidade, apesar de supostamente trazer milhares de pessoas para aqui trabalhar em setores ditos inovadores, criativos e empreendedores, tal estratégia não tem em conta os residentes e as suas memórias, esquecidas neste planeamento grandioso para jovens criativos e qualificados. Nesta proposta que aqui se apresenta, pretende-se projetar um espaço em que possam coabitar autóctones e novos residentes, não se pretende criar de forma artificiosa um novo espaço exclusivo para criativos, empreendedores e outros que nada têm a ver com este local, mas a intenção é projetar para um público-alvo mais diversificado, sem esquecer os residentes atuais da freguesia, as suas memórias, a história e a identidade deste lugar. Estes aspetos devem ser incorporados na estratégia de intervenção para este local. Admitimos que faz sentido criar espaços de coexistência e de convivência propiciadores de uma troca de conhecimentos/memórias e experiências entre a população existente e os novos residentes e trabalhadores desta zona. Diferentemente do que sucedeu na Expo 98, a zona ribeirinha do Beato tem residentes com
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necessidades e aspirações e que devem ser auscultados face ao projeto em curso – Hub Criativo.
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3.3 Cronologia Histórica dos principais acontecimentos que marcaram a Freguesia 1772 – O Estado torna-se responsável pelo abastecimento alimentar do exército português 1820-1921- Foi introduzida em Portugal a máquina a vapor aplicada à indústria, coincide com o aparecimento da revolução portuguesa de 1820. 1820- Revolução Liberal 1834 – Expulsão das Ordens Religiosas 1838 – Primeira Exposição Industrial Portuguesa 1841 – Já existiam 3 fábricas de estamparia no vale de Chelas 1851 – Exposição Universal de Londres, “Crystal Palace” por Joseph Paxton 1854 – Construção do Viaduto de Xabregas 1855 – Participação de Portugal na Exposição Universal de Paris, evento muito significativo da civilização industrial de meados de oitocentos. 1856 e 1861 – Cartas de Filippe Folque 1861 – Exposição Industrial Portuguesa, realizada no Porto 1862 – Inauguração da primeira Padaria Militar 1865 – Inauguração do Palácio de Cristal com a exposição internacional do Porto, por T.Dilen Jones e Sheilds – Estação de Caminhos de Ferro do Norte e Leste – “Estação Ferroviária de Santa Apolónia” (1.Maio.1865), também ela um antigo convento de freiras 1883 – Melhoramento do Porto de Lisboa 1888- Exposição Industrial Portuguesa
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1890 – Inquérito Industrial (156 ramos industriais no I Bairro da cidade) 1897 – Fundação da MM: fábrica de farinha, pão e outros 1890 – 1910 – Instalam-se outros equipamentos e estruturas como laboratórios, oficinas, cozinhas, refeitório, fábrica das massas etc. 1900 – Participação de Portugal na exposição universal de paris 1907 – MM redimensionou a sua estrutura de produção 1914-18 – Primeira Guerra Mundial 1916 – Matadouro, talho, salsicharia 1917 – Inquérito Industrial 1921 – Central Elétrica 1922 – Suprimidas definitivamente as barreiras fiscais à entrada da cidade 1925 – 3ª fase de construção do Porto de Lisboa compreendido entre as zonas de Santa Apolónia e Cabo Ruivo 1930 – Inauguração do Aspirador Pneumático 1938-1948 – Plano de Urbanização de Lisboa por E.De Groer 1939 -45– Segunda Guerra Mundial 1941 – Inaugurada a Exposição do Mundo Português, em Belém, concretizada no âmbito das comemorações do “Duplo Centenário” 1950-1959 – Construção do bloco social com creche, guarda infantes, escola primária, refeitório com cozinha e salão de instrução e recreio com 800 lugares Instalação de novos equipamentos (como resposta a guerra colonial) 1960 – Supermercado militar 1966 – Ponte sobre o Tejo 67
1970 – Fábrica de pastelaria, confeitaria e fritos 1972 – Inquérito Industrial 1974 – Guerra do Ultramar
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Capítulo 4 - Proposta de projeto 4.1 Premissas de partida A nosso ver após a análise e diagnóstico da zona de intervenção, os principais domínios que carecem de intervenção prioritária são 3: i) a forte migração de população jovem para o exterior da freguesia, neste aspeto a solução será criar pontos de atração como espaços de cultura e lazer que respondam a uma população jovem e promotores de relações inter geracionais, dada a forte presença de idosos nesta freguesia. Penso que uma resposta inter geracional é a resposta a este desajuste existente em termos de diversidade de grupos etários. A criação destes espaços de cultura e lazer deverão ser disseminados por toda a freguesia, mas o enfoque desta proposta seria sobretudo na zona ribeirinha e junto da Mata da Madre Deus, muito frequentada pela população mais idosa. Os edifícios do complexo da Manutenção Militar serão uma boa localização para dinamizar a parte mais a sul da freguesia. Pensamos que é importante também uma intervenção ii) a nível de alojamento, de reabilitação do já existente e criação de novos como resposta à transitoriedade da vida humana e com implicações ao nível das necessidades habitacionais. Como resposta a esta falta de uma residência flexível será pertinente criá-la em alguns dos edifícios da manutenção Miliar, dado ser uma zona de fácil acesso de uma das principais artérias da cidade, a Avenida Infante Dom Henrique, mas muito central em Lisboa. iii) A necessidade de estacionamento já é uma prioridade na atualidade, o que será intensificado com a criação de mais habitação, sendo então proposta a criação de Estacionamento na parte norte da Manutenção Militar que tem entrada pela Estrada de Marvila, sendo que neste momento não tem qualquer função. Estas estratégias de intervenção serão exploradas mais à frente no capítulo da Proposta de Projeto em que tentarei responder a parte delas,
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principalmente no que se refere à área de intervenção do presente Projeto. Tendo em conta o que está programado para usos futuros da MM, deparamo-nos com uma Hub Criativa, que a CML vai colocar nos edifícios sem uso desde 2011, começando então a desenvolver uma parte da cidade neste local. Trata-se de uma opção supostamente viável e economicamente sustentável, embora seja necessário mobilizar um montante importante de recursos financeiros para conseguir colocar as infraestruturas necessárias a uma hub criativa em edifícios que não estão preparados para isso. Contudo, pensamos que nesta proposta ficou de lado a envolvência e participação da população local neste novo equipamento, tanto quanto se sabe não está previsto nenhum equipamento para população mais envelhecida ou de serviço à comunidade. Penso que seria pertinente auscultar os residentes, nomeadamente os exoperários, apreender e registar a memória que transportam sobre este local. Durante o trabalho de campo deste PFM, tivemos oportunidade de participar nas sessões “Vidas e Memórias de Bairro” organizadas pela Biblioteca de Marvila em que numa das sessões tivemos o privilégio de ouvir as memórias que as pessoas ainda conservam sobre este território. Apresentamos agora alguns extratos das conversas recolhidas e que remetem para área de intervenção deste projeto. Trata-se de extratos ilustrativos sobre o passado e vivências neste território. Nesta sessão, um dos participantes recordou saudosamente o passado vivido entre Marvila e o Beato: “Agente quando eramos miúdos, ali era a nossa praia, a tal Praia da Marabana/ do Beato/ de Xabregas/ do Cais Preto (tinha vários nomes), era para ali que agente íamos jogar à bola, lembro-me do chupador da Manutenção Militar. Esta praia ia desde Santa Apolónia até ao Poço de Bispo. (…). Uma grande parte da praia era lodo. (…). Púnhamos a roupa
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na areia, íamos ao banho todos nus, atravessávamos o lodo para tomarmos banho. (…). Aquelas escadinhas iam dar à Rua da Manutenção da parte de trás, tinha os terrenos à frente e depois a Avenida, quando fizeram a Avenida. Agente andávamos ao banho ao pé da praia dos chupadores da Manutenção Militar, depois vinha o polícia “Vem o polícia!” e agente pegava na roupa, nos calções e camisolas, e para não irmos dar a volta por Xabregas, onde é a marítima (refere-se ao hoje Restaurante Marítima de Xabregas), subíamos esta escada aqui que vem parar mesmo em frente à Igreja do Beato. (…). Era proibido ir ao banho, era proibido jogar à bola na rua, era proibido estar parado na rua.” José Fonseca, 76 anos. A propósito da Manutenção Militar, um dos intervenientes disse que: “Sabe o que é que a Manutenção tinha assim que eu me lembro, quando era mais pequeno agente comia o pão da padaria, agente só podia chegar aquele pão mais negro, era o mais barato, era o pão 17, carcaça 17, porque custava 17 tostões. O pão era ao quilo, se só tivesse dinheiro para ¼ de pão partia ¼ de pão, eles partiam e só se comia um quarto, era o pão mais bera. E a Manutenção fabricava já um pão branco, quando agente comia desse pão branquinho era uma maravilha.” Manuel Antunes, 83 anos. Ainda sobre a industrialização, um dos participantes afirmou: “Cada fábrica tinha um toque específico e agente já sabia qual era qual e quando tocava o dos nossos pais íamos a correr para casa.” José Fonseca, 76 anos. Perante estes testemunhos recolhidos e a análise feita à freguesia, procuramos reavivar algumas das memórias em torno do local de intervenção. Decidimos criar um espaço em que pudessem coabitar pessoas de todas as idades, fazendo assim sentido atrair jovens para o Beato, mas com o intuito de fomentar sempre uma troca de conhecimentos e permitir o uso
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dos mesmos espaços por parte da população nova e da já existente, sendo que nesta zona da freguesia a população é maioritariamente idosa. Deparando-nos com todas estas frentes de trabalho e de informações cruzadas, desde ouvir os idosos da freguesia a perceber o que a CML está a programar para o local, deparamo-nos com a tarefa de tentar perceber o que poderemos propor respondendo a todos os intervenientes.
Figura 25 Planta Topográfica 1931 (Escadinhas)
Figura 24 Entrada para as Escadinhas pela Rua do Grilo 1939
Fonte: Arquivo Municipal de Lisboa Fonte: http://apsruasdelisboacomhistria.blogspot.pt/2014/01/rua-do-griloi.html Acedida a 9.03.2017 Figura 26 Praia da Marabana 1938
Fonte: http://aps-ruasdelisboacomhistria.blogspot.pt/2010/02/ Acedida a 9.03.2017
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Figura 27 Imagem Aérea
Fonte: Núcleo Museológico da Manutenção Militar
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4.2. Referências de projeto Neste ponto optei por analisar alguns projetos que tive como referência para a minha proposta de projeto. Como critério optei por escolher casos em que se houvesse algum tipo de flexibilidade nas habitações, tanto interior como exterior, tentando variar o tipo de flexibilidade com os três casos escolhidos, e também analisei a reconversão de um edifício num espaço cultural artístico. Os casos das habitações são internacionais e o último caso de referência projetual é nacional.
1. The Grow Home Arquitetos: Avi Friedman e Witold Rybczynski Localização: Montreal, Canada Área: 100 m2 Ano de projeto:1990 (a primeira versão da casa) Os arquitetos começaram por estudar a realidade da compra de casa no Canadá e aperceberam-se dos preços exorbitantes que as imobiliárias praticavam, para além disso, muitas vezes as famílias apenas usavam parte da habitação, nomeadamente antes de constituir família e depois dos filhos saírem de casa. Este projeto foi desenvolvido na McGill University. Tendo em conta esta realidade projetaram uma casa que cresce conforme a família assim o desejar sempre tendo em conta a reversibilidade dos materiais e o custo desta habitação. Os princípios deste projeto incluem flexibilidade, por permitir a flexibilidade da habitação conforme o poder económico dos proprietários e o número de elementos do agregado familiar; esboçar a mudança prevista pois no seu desenho original já está pensado como irá crescer a casa; permitir a participação do proprietário, pois, Avi Friedman verificou que era
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do agrado da maioria dos proprietários fazer alguns tipos de acabamentos à casa, vendo isso como uma mais-valia e uma personificação da sua habitação, e também reduzia os custos; e a continuidade que acaba por estar ligada à mudança prevista por ter sido construída com materiais que são fáceis de manusear não sendo necessário demolir/destruir como aconteceria se fosse feita de betão armado ou outro material sem ser com juntas secas. Com estes princípios começaram por fazer quatro protótipos diferentes que depois originou apenas num protótipo com várias variantes da disposição interior dos compartimentos. Sendo a flexibilidade neste projeto é aplicada maioritariamente no interior da habitação, tal, teve grande importância para o desenvolvimento da nossa proposta projetual, dado que a flexibilidade em parte é tratada da mesma maneira. Avi Friedman defende que uma casa com vários níveis, disposta na vertical tem vantagens na independência dos indivíduos que moram na mesma casa, isto também se aplica ao projeto que concebemos para o Beato, sendo assim mais fácil a divisão dentro da casa e mesmo em duas casas distintas. “I believe that the grow home design has only just begun its life and that many more chapters remain it be added in the future.” (Friedman, 2001, p. XVI) Figura 28 Adaptação do interior da The Grow Home por um dono de casa durante um período de 11 anos
Fonte: Friedman, A. (2001). The grow home. Canada: McGill-Queen’s University Press. p.X. 75
Figura 29 Desenhos alternativos da Grow Home
Fonte: Friedman, A. (2001). The grow home. Canada: McGill-Queen’s University Press. p. 43.
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2. Adaptable House Arquitetos: Henning Larsen Architects, GXN Localização: 5800 Nyborg, Dinamarca Área: 146 m2 Ano de projeto: 2013 Ao analisar a mobilidade residencial, o arquiteto constatou que a maioria das mudanças residenciais eram na mesma zona, logo a mudança não era por desgostarem da zona em que viviam mas sim por a casa não responder às mudanças que a família exigia. Partindo desse pressuposto, procura projetar uma habitação que tem uma certa adaptabilidade no seu interior permitindo fechar e abrir os espaços com painéis, e com isto também possibilita uma maior sustentabilidade para além da função de adaptabilidade que dá o nome à casa. Este projeto teve relevância para a proposta que aqui apresento porque alia a adaptabilidade à sustentabilidade, apesar da sustentabilidade não ser a base do nosso projeto, contudo, qualquer edifício que contenha em si uma componente de adaptabilidade e de flexibilidade acaba por ser muito mais sustentável. Figura 30 Interior da Casa, painéis que separam os espaços
Figura 31 The Adaptable House
Fonte: Fonte: http://www.archdaily.com.br/br/757936/residencia- http://www.archdaily.com.br/br/757936/residenciaadaptavel-henning-larsen-architects-plus-gxn adaptavel-henning-larsen-architects-plus-gxn Acedida a 9.03.2017 Acedida a 9.03.2017
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3. Quinta Monroy Arquitetos: Elemental Localização: Sold Pedro Prado, Iquique, Tarapacá, Chile Área: 5 000 m2 Ano de projeto: 2003 A Quinta Moroy do atelier Elemental no Chile tinha como principal objetivo continuar a integrar as pessoas de habitação social no centro da cidade não as deslocando para as periferias, este fator é muito importante para possibilitar a integração social e espacial dos residentes. Com isto consegue-se realojar as pessoas no mesmo local onde estavam, não as deslocar da cidade para as periferias o que acontece muitas vezes em projetos de habitação social por os terrenos serem mais baratos. Por outro lado, com o facto de darem uma meia casa mas condigna, com todas as infraestruturas essenciais à vivência das pessoas, faz com que estas possam construir as outras meias casas conforme as suas possibilidades económicas e a seu gosto, deixando assim de ser habitação social homogénea e desinteressante para passar a ter a identidade de cada um, tanto no exterior como no interior. Com o objetivo de realojar 97 famílias e com um orçamento muito pequeno, este é sem dúvida um projeto de referência no contexto da proposta que aqui apresentamos, pretendemos que os espaços propostos sejam acessíveis economicamente a qualquer pessoa que queira aqui habitar, contudo, não vamos propor habitação social mas
habitação
consciente e responsável face à conjuntura socioeconómica atual e às dificuldades de acesso a uma habitação no mercado privado por parte da maioria das famílias portuguesas.
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Figura 33 Planta das habitações
Figura 32 Apropriação das habitações pelos proprietários
Fonte: http://www.archdaily.com/10775/quintamonroy-elemental Acedida a 9.03.2017
Fonte: http://www.disenoarquitectura.cl/quintamonroy-alejandro-aravena/ Acedida 9.03.2017
Figura 34 A casa dada às pessoas e a apropriação da casa por elas
Fonte: http://www.archdaily.com/10775/quinta-monroy-elemental Acedida a 9.03.2017
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a
4.GNRation
Arquitetos: Carvalho Araújo Localização: Braga, Portugal Ano de projeto: 2013 Este projeto caracteriza-se pela intervenção no antigo edifício da GNR, daí o nome do projeto. O conceito do projeto é a ocupação como motivo, significa que é importante ocupar os espaços de maneira a não ficarem devolutos e degradados. Um dos objetivos era potenciar o edifício como um promotor de regeneração urbana e um espaço de pensamento criativo, de liberdade criativa e em certa parte de ocupação criativa. Deste modo os passos são alugados e os ocupantes dos espaços têm a seu encargo o uso que querem dar ao espaço e o mobiliário que querem pôr no espaço. Para a nossa proposta projetual foi essencial perceber como é que este projeto conseguiu regenerar parte da cidade de Braga, conseguindo com que as artes tivessem expressão nesta cidade. Acreditamos que o projeto a propor para o Beato estará na origem de um processo de revitalização da zona oriental de Lisboa, prevendo-se valências possibilitadoras de uma ocupação de cariz criativo.
Figura 36 Entrada para a GNRation
Figura 35 Interior da GNRation
Fonte: http://www.archdaily.com.br/br/01-130227/gnration-slash-atelier-carvalhoaraujo Acedida a 9.03.2017
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4.3. Desenho Urbano
Neste ponto falo da intervenção urbana que abrange principalmente a parte sul do complexo miliar, falando também um pouco da parte norte e das suas valências. O complexo militar da Manutenção Militar tem cerca de 80 000 m2, dividido em duas partes, a parte Sul com cerca de 30 000 m2 e a parte Norte com cerca de 50 000 m2. O local de intervenção é a Parte Sul da Manutenção Militar, e o projeto que propomos é unicamente para os edifícios constituintes desta parte, concentrando-nos em três edifícios: a antiga central elétrica, as antigas oficinas e o antigo armazém de carnes. Partindo da escala urbana começamos por analisar a zona envolvente da MM, tanto a parte sul como a norte e as únicas alterações que propomos para a parte norte, ou seja, a norte da Rua do Grilo, é um arruamento de ligação à Estrada de Marvila e o realojamento do Quartel dos Bombeiros, por este se encontrar no poder do exército. Este arruamento tem como função ligar a zona ribeirinha do Beato ao Bairro Madre Deus que neste momento não tem uma ligação imponente e de fácil acesso que possibilite a mobilidade das pessoas que vivem neste bairro, nomeadamente se quiserem se deslocar à zona mais a sul da freguesia. O realojamento do Quartel do Corpo de Bombeiros Voluntários do Beato deve-se ao facto de neste momento se localizar na Rua do Grilo, confrontando-se com falta de espaço para estacionar as viaturas, este aspeto foi mencionado também por diversas pessoas com que conversamos informalmente na freguesia do Beato. Na parte sul o que propomos é a permeabilidade do tecido urbano da MM relativamente ao tecido urbano citadino, abrindo assim diversas entradas ao longo de todo o perímetro deste complexo industrial. A uma escala mais pormenorizada intervimos em três edifícios como referi anteriormente.
81
O edifício da central elétrica que marca o aparecimento da eletricidade data de 1921, e foi de extrema importância para o bom funcionamento de todas aquelas fábricas em períodos de 24h/dia e durante 7dias/semana. O edifício das oficinas e administração data de 1910 e tinha como principal função a manutenção dos veículos militares e civis dos militares. O edifício do depósito de carnes data de 1916, funcionava como matadouro, talho e salsicharia. Na nossa perspetiva, o essencial neste projeto mais do que a reabilitação de parte da cidade, é a integração de uma cidade (industrial) que antes funcionava plenamente só por si, numa outra cidade que também funcionava
só
por
si,
operando-se
esta
ligação,
quer
por
complementaridade ou por diferenciação. Este é o desafio: perceber como conseguimos que outras pessoas cheguem e se fixem no Beato, e conheçam todas as suas potencialidades, mas também as pessoas que habitam este território na atualidade e que poderão aproveitar todos os novos usos que vamos criar. Na elaboração do projeto urbano partimos do princípio de que há um desconhecimento da zona oriental da cidade entre Santa Apolónia e o Oriente, assumindo-se com uma zona não conhecida por muitas das pessoas que residem em Lisboa. Esta zona, referida anteriormente no capítulo 3, Contexto e intervenção: a Freguesia do Beato, tem uma centralidade notória em Lisboa, tem tudo o que é necessário para o bom funcionamento de qualquer zona urbana. Com estas valias e partindo do complexo da Manutenção Militar como um núcleo para dinamizar a zona e para responder às carência e necessidades diagnosticadas, optamos por abrir a Manutenção Militar à cidade, integrando um complexo que sempre foi fechado ao exterior, ou seja, de acesso restrito aos trabalhadores passará a ser um complexo que fará parte da cidade. A parte Sul, é a zona por excelência sobre a qual incide esta proposta e face à qual se apresenta um programa para todos os edifícios, aqui surgirá um complexo que fará parte do Beato, não havendo restrições de entradas e saídas no complexo nem barreiras físicas como muros, que já existem. 82
Figura 37 Ortofotomapa de localização
Fonte: Arquivo Militar
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Acessibilidades A nível de acessibilidades e de acesso ao interior do complexo decidimos criar uma entrada de automóveis, sendo a continuação da Rua da Manutenção, que anteriormente era a entrada dos veículos da MM de transporte de mantimentos para o resto de Lisboa e do país. Sendo a saída dos veículos pela Travessa do Grilo, esta circulação automóvel não será usada como uma alternativa às restantes ruas, mas apenas como um acesso ao estacionamento da MM ou para deixar passageiros dentro da MM. Os estacionamentos da MM serão subterrâneos, vão ser concebidos debaixo do edifício da Fábrica de bolachas e centro de informática, aproveitando um acesso já existente, e debaixo do terreno ao lado do antigo supermercado. A nível pedonal criamos 6 entradas/saídas onde os peões poderão aceder sempre que o desejarem, neste sentido tentamos criar o máximo de ligações possíveis para permitir uma maior permeabilidade face à cidade, não havendo barreiras físicas para além dos edifícios em si. A nível pedonal também se propõe uma passagem para a zona a Sul da Avenida Infante Dom Henrique, uma ponte por cima desta avenida permitindo assim um acesso mais fácil. Para além das entradas e saídas vão aparecer espaços amplos o suficiente para serem considerados espaços de estadia, como praças, onde as pessoas poderão aproveitar o espaço e permanecer lá.
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Programa O complexo é constituído por, sensivelmente, 12 edifícios: (de poente para
nascente)
Supermercado;
Residências
dos
Oficiais
(Antigo
Convento); dois Armazéns do supermercado; Silos de trigo; Fábrica de Moagem; Fábrica de pão e de bolos secos; Fábrica de bolachas, de massas, centro de informática e tipografia; Central Elétrica; Depósito de Água; Oficinas automóveis e Administração; Depósito de Carnes. Estes edifícios, em geral, vão ser mantidos tal como estão e apenas vamos proceder à limpeza dos espaços, pretendendo-se remover um dos armazéns do supermercado e uma parte do supermercado adicionada posteriormente. Abaixo refiro os futuros usos que sugiro para cada um dos espaços. Supermercado: Mercado com zona de restauração, para tal é necessário criar nova entrada pela Rua do Grilo. Debaixo da rampa deixar acesso para os túneis. Residências dos Oficiais (Antigo Convento): Centro de dia/Lar de idosos. Armazém do supermercado: Espaço amplo que possibilita exposições temporárias. Silos de trigo: Residência de estudantes. Fábrica de Moagem: Museu. Fábrica de pão e de bolos secos: Museu interativo, fazer pão e bolos secos. Fábrica de bolachas e centro de informática, fábrica de massas e tipografia: Biblioteca e Cafetaria; Habitações Temporárias. Central Elétrica: Habitações flexíveis e co-working. Depósito de Água: Cafetaria com wc e espaço informal de trabalho. Oficinas automóveis e Administração: Habitações flexíveis; Administração de todo o complexo.
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Depósito de Carnes: Oficinas de trabalho: carpintaria, metalúrgica e marcenaria, espaço de impressões e prototipagem
Figura 38 Programa e Intervenção Urbana
Fonte: Elaboração própria, 2017
86
4.4 Desenho Arquitetónico Integração da parte museológica Uma das situações que não nos podemos esquecer relativamente a esta intervenção é que este complexo tem um património industrial que temos de ter em conta e de tirar o maior proveito. Posto isto reservamos dois dos edifícios para um núcleo museológico, já existe um núcleo museológico mas está localizado nas antigas residências, o que não se justifica tendo nós tanto espaço com equipamentos industriais que podem ser mostrados à população. Para isso criamos dois tipos de museu distintos, sendo um deles um museu dito tradicional que, em parte, será a continuação do núcleo museológico já existente, mas noutro local, na Fábrica de bolos secos. O outro museu será um museu participativo em que vai permitir aos visitantes ver ou ajudar a fazer o tão falado pão e comprá-lo, tentando assim reconstituir parte da memória que as pessoas têm da MM e que possam realmente interagir com os equipamentos industriais existentes que possam voltar a funcionar. Figura 39 Núcleo Museológico: Museu e Museu Interativo
Fonte: Elaboração Própria, 2017
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Desenho do co-working e oficinas Sendo um dos nossos objetivos o de responder às necessidades habitacionais de hoje em dia, também faz todo o sentido, durante este processo de trabalho, responder às necessidades laborais, estando umas diretamente ligadas com as outras em certos tipos habitacionais. Posto isto optamos por criar espaços de trabalho distintos que, de alguma maneira, complementassem as habitações e que também pudesse haver uma troca de experiências entre utilizadores do espaço de co-working e oficinas e residentes das habitações ou mesmo até residentes do Beato. Exploramos um pouco o conceito de co-working tão falado nos dias de hoje, tendo alguma notoriedade no tipo de ocupação realizado em edifícios industriais como no caso do LXFactory. Como consequência da terceira revolução industrial (ver na própria tese, capítulo 2, p. 23), o avançar da informatização e das tecnologias permite cada vez mais as pessoas poderem trabalhar de onde quiserem desde que estejam ligadas à internet. Começando nessa liberdade de escolha do sítio onde trabalhar, surgem novos conceitos de habitar, lofts, e de espaços de trabalho, co-working. Co-working consiste num espaço que pode ser considerado um escritório, mas que não é de nenhuma empresa, é de quem quiser trabalhar lá e pagar o aluguer do seu espaço. No início esta libertação que os trabalhadores sentiam por poderem trabalhar em casa, depressa se tornou em algo solitário, daí procurarem por melhores opções e surgir o co-working a partir daí. (Godinho, 2015, disponível
em
https://comum.rcaap.pt/bitstream/10400.26/11172/1/Tania%20Godinho%2 0-%20Habitar%20vs%20Trabalhar%20%20Tese%20Projecto%20.docx.pdf, acedido a 9.03.2017)
88
O co-working acaba por criar um ambiente familiar no espaço permitindo trocas de saberes entre pessoas de áreas distintas que estão a dividir o mesmo espaço de trabalho. Figura 40 Espaço de Co-Working
Fonte: Elaboração própria, 2017
Para além do espaço de co-working que criamos no último piso da central elétrica, também optámos por desenhar um espaço de oficinas complementar a este no antigo edifício das carnes. Este espaço de oficinas tem uma oficina de carpintaria, de metalúrgica e de marcenaria, e também um espaço de impressões e prototipagem que poderá ser complementar às outras oficinas se assim o desejarem, estes espaços caracterizam-se por espaços amplos que podem ser adaptados ao tipo de oficinas que as pessoas necessitarem, têm algumas infraestruturas que permitiram adaptar vários tipos de oficinas, não apenas aqueles que irei desenvolver.
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Desenho dos módulos habitacionais Partindo de dois edifícios pré-existentes desenhamos dois módulos habitacionais diferentes para a antiga central elétrica e para as antigas oficinas. Apesar de serem dois módulos diferentes com propósitos um pouco distintos, os dois pretendem maximizar o espaço proporcionando habitações que, tendo sempre a mesma dimensão, possam dividir-se interiormente criando mais compartimentos ou que possam dividir-se em habitações independentes (no caso do antigo edifício das oficinas), respondendo assim à premissa da flexibilidade, do aproveitamento dos espaços e consequente acessibilidade económica associada a este projeto. Dado que partimos de dois edifícios pré-existentes, a malha dos dois módulos estava pré-definida pela estrutura destes edifícios industriais, tendo a nossa solução partindo dessa métrica para projetar as habitações.
Habitação na Antiga Central Elétrica Na central elétrica optamos por conceber as habitações nos pisos 0 e 1 com duas entradas independentes da entrada de co-working para criar mais privacidade às zonas de entrada privada, apesar de nestas entradas também haver acessos verticais para o co-working para usos técnicos, para pessoas com mobilidade reduzida e para situações de urgência. As habitações são compostas por duplex’s em que o módulo foi criado a partir da estrutura do edifício, sendo que num módulo de 7,5 x x 14,4m estão desenhadas duas habitações. Cada habitação tem 85 m2 e tem capacidade para duas pessoas, enquanto se procedermos à sua extensão ficamos com uma habitação de 97m2 com capacidade para até 5 pessoas.
90
Habitação nas Antigas Oficinas As habitações nas antigas oficinas são compostas por triplex’s, respondendo ao módulo de 3,9m x 9m, dando o total por habitação de 88 m2 úteis. Esta divisão por três pisos permite que se possa autonomizar o piso de baixo dos dois pisos de cima permitindo assim que uma habitação idealmente para 4 pessoas possa passar a duas habitações, uma para 1/2 pessoas e outra para 2/3 pessoas. A resposta dada à necessidade de flexibilidade destes módulos habitacionais é o de autonomia de dois dos três pisos que compõem as habitações, permitindo assim uma habitação, se necessário puder dividirse em duas habitações. Figura 41 Necessidades Espaciais mediante quantidade de habitantes e relação com Habitações nas Oficinas
Fonte: Elaboração própria, 2017
Neste módulo habitacional existem duas variantes, uma que está desenhada para 4 pessoas e outras duas que vêm da divisão da primeira em duas, uma desenhada para apenas 1 pessoa e outra autónoma desta desenhada para 2/3 pessoas. Para além destes módulos, nos dois extremos do edifício os módulos são ligeiramente diferentes como consequência da estrutura existente do telhado a norte e a sul da ligação deste edifício com a parte de administração.
91
Neste módulo habitacional surgiu a necessidade de criar uma peça de mobiliário que seja o comprimento de todo o edifício e a altura de cada pisa e que responda às diversas necessidades que surgem ao longo da habitação. Esta peça é constituída por diversos módulos que têm a altura de 2m e que podem ser deslocados conforme as necessidades. Dos 2m Figura 42 Desenho do armário
aos 2,5m surge uma peça corrida de mobiliário, de arrumação, que faz a ligação entre os vários pisos da habitação.
Figura 43 Planta de estudo
Fonte: Elaboração própria, 2017
92
Figura 44 Desenho de partes do Armário
Fonte: Elaboração Própria, 2017
Fonte: Elaboração Própria, 2017
93
Solução Estrutural dos módulos habitacionais A estrutura que uso no projeto, tanto nos módulos habitacionais na antiga central elétrica como nos módulos habitacionais na antiga oficina é constituída por perfis metálicos IPN 20, por barrotes de madeira e por paredes de gesso cartonado (pladur). A escolha deste sistema deve-se ao facto de permitir uma reversibilidade do edifício e na flexibilidade das habitações.
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Notas conclusivas O Projeto Final de Mestrado intitulado “Habitação flexível à transição da vida: Intervenção na Manutenção Militar no Beato, Lisboa” pretendeu dar resposta ao problema identificado na componente investigativa e que respeita à carência de habitação adaptável às mudanças no ciclo de vida e do estilo de vida das pessoas. Procurou-se, assim, responder a esta falta de habitação e ao mesmo tempo procurou-se reabilitar edifícios industriais para este fim. O capítulo da Proposta de Projeto é o culminar das várias etapas que foram sendo desenvolvidas em termos de trabalho de investigação e em termos de trabalho prático na construção da proposta de intervenção. Ao longo deste trabalho fica clara a importância da habitação e como a sociedade e a habitação estão correlacionadas, sendo que a mudança de/na habitação resulta quase sempre de mudanças de caráter social. Foi possível, ainda, perceber algumas das respostas públicas face à falta de habitação em Lisboa, principalmente depois da industrialização. Procuramos, ainda, entender o contexto em que o nosso conjunto de edifícios foi construído e quais as perspetivas concetuais e de intervenção em torno do património industrial. Este trabalho tem em conta a história e a situação presente que marca, quer a freguesia do Beato, quer a Manutenção Militar. Na proposta projetual que elaboramos, tentamos aplicar todos os conhecimentos adquiridos nas várias fases do trabalho. Fizemos a reabilitação de três edifícios industriais dando-lhes novos usos, dois deles têm módulos habitacionais, um deles apresenta na parte superior dos módulos habitacionais um espaço de co-working; enquanto o outro edifício é provido de um espaço de oficinas como apoio ao espaço de coworking. Com esta proposta que abrange três edifícios pretende- se introduzir uma novas dinâmicas e vivências nesta zona da cidade, permitindo que o Beato seja frequentado por população mais jovem, não
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descurando a possibilidade de uso e a ambivalência que estes espaços têm para pessoas que já habitam no Beato, maioritariamente idosas. Os dados obtidos na componente de investigação estão em consonância com as hipóteses propostas no início deste trabalho, confirmando-se. Deste modo, faz sentido e é oportuno criar habitações flexíveis e evolutivas que acompanhem a evolução em termos de dimensão e composição do agregado familiar, e num dos casos propostos, as habitações têm a ambivalência de se dividirem em duas habitações distintas. Através de incursões no terreno, por via de observações e de conversas informais que estabelecemos com moradores do Beato e de Marvila foi possível apreender a existência de algumas carências em termos de espaços de convivência, serviços e equipamentos mais específicos, o que se mostrou de elevada relevância para se conseguir perceber que programa desenvolver em a alguns dos edifícios deste complexo industrial. Foi possível compreender a importância da memória dos residentes, e nesse sentido, reabrimos uma entrada que estava fechada há muitos anos, denominada Escadinhas do Chafariz; para além disso, optamos por fazer essa passagem com rampa em vez de escadas, exatamente no mesmo sítio onde anteriormente estavam. Também tentamos operar uma permeabilidade do Beato para o interior da Manutenção Militar, e nesse âmbito, abriram-se várias passagens pedonais. A intervenção aqui apresentada no trabalho é pertinente e oportuna, respondendo às questões iniciais, nomeadamente como reabilitar um edifício industrial para usos habitacionais, caraterizados pela flexibilidade e por um sistema modular e evolutivo que consiga responder às mudanças e transições que marcam o ciclo de vida do ser humano. Em resposta projetamos reversibilidade das intervenções, sendo quase tudo com junta seca, o que permite a remoção dos espaços criados sem danos de maior no edifício. A única parte que não permite a remoção,
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mas que pode ser utilizada para usos posteriores são os ductos e as saídas de fumo e os acessos verticais na central elétrica que, apesar de não serem reversíveis facilmente, permitem ser usados para qualquer outro tipo de função que seja desejado no edifício. Com este trabalho foi possível entender a dimensão e relevância da habitação e do realojamento, nomeadamente a enorme influência que a industrialização teve, por um lado na falta de habitação, mas por outro, contribuiu também para a parcial resolução desta carência, que ainda hoje subsiste mas com outros contornos e especificidades. Com este projeto, o património industrial, poderá no presente e no futuro contribuir novamente para o realojamento das pessoas que procuram residir em Lisboa, sendo uma evidência que continua a haver imensos espaços industriais fechados na cidade de Lisboa. Esperamos que este trabalho possa ser encarado como uma tentativa muito pragmática de se conseguir perceber as necessidades atuais e futuras da população em geral, sem esquecer as que residem naquela zona. Acreditamos na arquitetura para e com as pessoas, seria assim imprescindível que os projetos para aquela zona conseguissem conciliar as dinâmicas ligadas a lógicas económicas e imobiliárias ligadas a um certo neoliberalismo e as necessidades das pessoas, nomeadamente das que têm mais dificuldades em aceder e permanecer no centro da cidade de Lisboa. Em termos de limites e dificuldades, reconhecemos que não é fácil desenvolver um trabalho íntegro, consciente e coeso num semestre apenas e numa área tão extensa, sendo que o programa proposto pretende responder às diversas necessidades locais.
97
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101
Anexos Anexo I – Caracterização Tabela 1 População residente, população presente, famílias, núcleos familiares, alojamentos e edifícios (Freguesia do Beato)
População Residente
População Presente
Total
H
M
Total
H
M
2001
14241
6620
7621
13564
6234
2011
12429
5763
6666
12047
5567
Famílias
Núcleos Familiares
Clássicas
Institucionais
7330
5990
7
6480
5757
1
Alojamentos Familiares
Alojamentos Coletivos
Edifícios
Total
Clássicos
Outros
4222
7219
7096
123
8
1867
3652
7636
7631
5
4
1832
Tabela 2 População residente por grupos etários e variação (Freguesia do Beato e Concelho de Lisboa) População residente Total HM
Beato
Lisboa
Grupos etários H
0-14
15-24
25-64
65 ou mais
2001
14241
6620
1482
1770
7691
3298
2011
12429
5763
1507
1143
6508
3271
2001 564657 257987 65548 71634 294171
133304
2011 547733 250874 70494 53507 292772
130960
102
População residente -Variação entre 2001 e 2011 (%) Var. Grupos etários Total 0-14 15-24 25-64 65 ou mais
-12,72 1,69
-35,42
-15,38
-0,82
-3,00 7,55
-25,31
-0,48
-1,76
Tabela 3 Alojamentos, Famílias, Pessoas residentes e pessoas presentes segundo o tipo de alojamento (2001 – Freguesia do Beato)
Total
Alojamentos Familiares
Alojamentos Famílias Pessoas
Clássicos
Alojamentos Não Clássicos Total
Barracas
Casas rudimentares de madeira
Móveis
Improvisados
Outros
Alojamentos
7227
7096
123
46
6
-
15
56
Famílias clássicas
5990
5851
127
46
7
-
17
57
Famílias institucionais
7
-
-
-
-
-
-
-
Pessoas residentes
14241
13775
345
133
25
-
39
148
Pessoas presentes
13564
13048
329
129
20
-
38
142
Alojamentos Coletivos Hotéis e similares
Convivências Total
Apoio Social
Educação
Militar
Prisional
Religiosa
Saúde
Trabalho
Outras
Alojamentos
-
8
4
-
1
-
-
2
1
-
Famílias clássicas
-
12
-
-
12
-
-
-
-
-
Famílias institucionais
-
7
4
-
1
-
-
2
-
-
Pessoas residentes
-
121
53
-
44
-
-
24
-
-
Pessoas presentes
-
187
109
-
45
-
-
24
9
-
103
Tabela 4 Alojamentos, Famílias, Pessoas residentes e pessoas presentes segundo o tipo de Alojamentos clássicos, segundo a forma de ocupação
Ocupados Época de construção
Total
Total
1919 - 1945
6330 5541 Total de Alojamentos 860 599 536 alojamento clássicos 951 733 626 s
Residência Total Para Para secundáriaAlojamentosvenda arrendamento familiares
Para demolição
Alojamentos não clássicos 1301 122 181 Total Barracas e 63 261 17 19 casas Móvei Improvisado 107rudimentares 218 15 30 s s de madeira 789
Outros
44
954
5665
12293
7 Outros 19
218
554
1142
154
649
1359
Alojamentos
7640
7631
5
0
0
5
0
Familias Clássicas
5757
5665
5
0
0
5
0
12427
12293
9
0
0
9
0
12045
11829
9
0
0
9
0
Familias Institucionais Pessoas Residentes Pessoas Presentes
Pessoas residente s
Vagos Residência habitual
7631 Até 1919
Famílias clássicas
1
Alojamentos colectivos Hotéis e similares
Alojamentos de convivência Total
Alojamentos
0
4
Apoio social 3
Familias Clássicas
0
87
Familias Institucionais Pessoas Residentes Pessoas Presentes
0
Educação 0
0
0
1
Prisiona l 0
73
0
0
0
14
0
0
0
1
1
0
0
0
0
0
0
0
0
125
91
0
0
0
34
0
0
0
0
207
161
0
0
0
46
0
0
0
alojamento (2011 – Freguesia do Beato)
104
Saúde
Religiosa
Militar
Trabalho 0
Outra s 0
1946 - 1960
1578
1302
1120
182
276
26
46
14
190
1148
2435
1961 - 1970
1715
1528
1314
214
187
26
40
3
118
1337
2754
1971 - 1980
976
875
759
116
101
7
12
1
81
773
1738
1981 - 1990
391
340
323
17
51
0
25
0
26
332
827
1991 - 1995
269
221
207
14
48
2
3
0
43
212
384
1996 - 2000
272
237
222
15
35
2
2
0
31
224
670
2001 - 2005
425
391
334
57
34
1
4
0
29
336
804
2006 - 2011
194
104
100
4
90
26
0
0
64
100
180
Tabela 5 Alojamentos Clássicos segundo a forma de ocupação, famílias clássicas e pessoas residentes, por época de construção (Freguesia do Beato)
105
Figura 45 População Residente em Lisboa (Nº em quadrículas de 1km x 1km)
Figura 46 População Residente no Beato (Nº em quadrícula de 1km x 1km)
106
Tabela 6 Edifícios segundo a época de construção e estado de conservação Estado de conservação
Época de construção Total
Beato Sem necessidade de reparação Com necessidade de reparação Pequenas reparações Reparações médias Grandes reparações Muito degradado Lisboa Sem necessidade de reparação Com necessidade de reparação Pequenas reparações Reparações médias Grandes reparações Muito degradado
Total (%)
1832
100
antes de 1919 433
19191945
19461960
19611970
19711980
19811990
19911995
1996 2000
20012005
20062011
257
490
415
100
62
11
26
30
8
689
38
42
47
226
228
31
59
7
13
29
7
1053
57
328
196
256
185
66
3
4
13
1
1
591
32
90
98
201
144
39
3
4
11
0
1
312
17
139
71
44
33
22
0
0
2
1
0
150
8
99
27
11
8
5
0
0
0
0
0
90
5
63
14
8
2
3
0
0
0
0
0
52496
100
10279
9747
13149
6965
4335
2136
1171
1751
1700
1263
28408
54
3600
4212
7352
4087
2641
1552
913
1369
1472
1210
22502
43
5785
5174
5618
2818
1653
568
256
365
226
39
14180
28
2858
2978
4032
2028
1138
466
222
275
155
28
6016
11
1888
1513
1286
668
405
87
27
70
65
7
2306
4
1039
683
300
122
110
15
7
20
6
4
1586
3
894
361
179
60
41
16
2
17
2
14
107
Anexos II – Maquetas (1:2000; 1:500; 1:100; 1:20 )
108
109
110
111
Anexo III – Caracterização construtiva dos edifícios
Edifício da Central Elétrica Edifício das Oficinas e Administração
112
NOME
DATA DE CONSTRUÇÃO
INTERVENÇÕES RELEVANTES
FUNÇÕES
ESTADO GERAL DE CONSERVAÇÃO
Central Elétrica
1921
-
Central Elétrica
2
MAPA DE LOCALIZAÇÃO
PLANTA
ESCADAS
COBERTURA
ESTADO DE CONSERVAÇÃO (escala) | 1 –bom; 2 – razoável; 3 – mau.
ELEMENTOS
FUNDAÇÕES
PAREDES RESISTENTES
ELEMENTOS ESTRUTURAIS PAVIMENTOS ELEVADOS |Pódio / Escada|
ELEMENTOS CONSTRUTIVOS
Vigas e tabuado Alvenaria de Pedra
Alvenaria de Pedra
em madeira
PAVIMENTOS ELEVADOS |Cave| Perfil metálico e abobadilha em tijoleira cerâmica
Asnas metálicas
sobre suporte de alvenaria
em
de pedra
treliça / madres Varas e ripado Telha ceramica
Reboco
REVESTIMENTO N.A.
Mosaico Hidráulico
Mosaico Hidráulico
exterior / superior
de
REVESTIMENTO
RebocoscaldeHidráulica cal hidráulica
Reboco
Reboco
e Lambrim em azulejo
de
de
cal Hidráulica N.A.
cal Hidráulica N.A.
N.A. interior / inferior ACABAMENTO
Degrau em Pedra
N.A.
exterior / superior
Tinta plástica Branca, amarela e cinzenta
N.A.
Lambrim em azulejo
em madeira tipo marselha
Esteira em madeira
(lateral) N.A.
N.A. Asnas metálicas:
ACABAMENTO N.A. interior / inferior
ESTADO DE CONSERVAÇÃO
Tinta Plástica
Tinta plástica Branca
N.A
pintadas Madeira:
N.A.
Desprendimento de tinta
IMAGENS
tinta acrilica Branco e esmalte (perfil metálico)
-
113
-
-
Tratamento plástico antifungico Desgaste dos acabamentos
ELEMENTOS PRIMÁRIOS (NÃO ESTRUTURAIS)
ELEMENTOS ELEMENTOS CONSTRUTIVOS REVESTIMENTO exterior / superior REVESTIMENTO interior / inferior ACABAMENTO
PAREDES DE COMPARTIMENTAÇÃO Paredes em alvenaria
PAVIMENTO TÉRREO Formigão
de pedra Lambrim em azulejo Reboco
Mosaico Hidráulico
N.A.
de cal hidráulica Tinta plástica Branca
N.A.
Desprendimento de tinta
Alguns mosaicos partidos
interior / inferior ESTADO DE CONSERVAÇÃO IMAGENS
114
ELEMENTOS SECUNDÁRIOS
ELEMENTOS
VÃOS EXTERIORES
ELEMENTOS EM
PORTAS EXTERIORES
SISTEMA DE ROLDANAS ELEMENTOS CONSTRUTIVOS REVESTIMENTO
Caixilharia em ferro e vidro simples
PORTAS INTERIORES
VITRAIS
Caixilharia em ferro
| Pódio / escada | Caixilharia em ferro
Caixilharia em ferro
e vidro simples fosco pintado
e vidro simples fosco
e vidro simples
N.A.
N.A.
N.A.
N.A.
N.A.
fosco vermelho N.A.
N.A.
N.A.
N.A.
N.A.
N.A.
Tinta de Esmalte Verde
Tinta de Esmalte
Tinta de Esmalte Verde
Tinta de Esmalte Cinza
Tinta de Esmalte
exterior / superior REVESTIMENTO interior / inferior ACABAMENTO exterior / superior ACABAMENTO
Verde Tinta de Esmalte Verde
Tinta de Esmalte
Tinta de Esmalte Verde
Tinta de Esmalte Cinza
interior / inferior
ESTADO DE CONSERVAÇÃO
Tinta de Esmalte Verde
Pontos de Ferrugem
Ferrugem
e desprendimento de Tinta
IMAGENS
115
Pontos de Ferrugem
Pontos de Ferrugem
e desprendimento de Tinta
e desprendimento de Tinta
-
NOME
DATA
INTERVENÇÕES RELEVANTES
FUNÇÕES
OFICINAS
1930
LAGE COM ESTRUTURA METÁLICA SOB COBERTURA E PAVIMENTO DE MADEIRA PARA ARRUMAÇÃO
OFICINA AUTOMÓVEL
PLANTA
MAPA DE LOCALIZAÇÃO
ELEMENTOS ESTRUTURAIS ELEMENTOS
FUNDAÇÕES
PAREDES RESISTENTES
PILARES
VIGAS
BETÃO ARMADO
LAGES
ESCADAS
ESTRUTURA METÁLICA COM ELEMENTOS LONGIDUTUDINAIS EM AÇO FIXADOS À ESCADAS DE MADEIRA COM DEGRAU PAREDE E ELEMENTOS TRANSVERSAIS VAZADO SIMPLES E GUARDA DE MADEIRA ASSENTES SOBRE ESTES COM PAVIMENTO EM MADEIRA
COBERTURA
ESTRUTURA EM ASNA METÁLICA (CONSTITUIDA POR PERNAS, LINHA, ESCORAS, TIRANTES)
ELEMENTO CONSTRUTIVO
FUNDAÇÃO EM PEDRA
N.A
ALVENARIA DE TIJOLO POSSIVELMENTE MAÇIÇO
REVESTIMENTO
N.A.
N.A
EXTERIOR: REBOCO DE CAL HIDRÁULICA INTERIOR : REBOCO DE CAL HIDRÁULICA E LAMBRIM DE AZULEJO
REBOCO
N.A
N.A.
EXTERIOR: TELHA MARSELHA PLANA INTERIOR: FORRO DE MADEIRA
ACABAMENTO
N.A.
N.A
EXTERIOR: PINTURA TINTA PLÁSTICA DE TOM CINZA INTERIOR: PINTURA TINTA PLÁSTICA BRANCA E LAMBRIM CERÂMICO BRANCO POLIDO E ENVERNIZADO
EXTERIOR: TINTA PLÁSTICA CINZA INTERIOR: TINTA PLÁSTICA BRANCA
ENVERNIZADO
TINTA PLÁSTICA DE MADEIRA VERDE
INTERIOR: MADEIRA ENVERNIZADA
ESTADO DE CONSERVAÇÃO
INDEFINIDO
N.A
DESCOLAMENTO PARCIAL E DESGASTE DOS AZULEJOS E DO REBOCO
REDE METÁLICA EXPOSTA NO EXTERIOR COM OXIDAÇÃO E EFLORESCÊNCIAS APARENTES NA VIGA
RAZOÁVEL
ALGUM DESGASTE NA ESTRUTURA
BOM ESTADO APARENTE PELO INTERIOR, TELHAS ENVELHECIDAS
IMAGENS
---
---
ELEMENTOS PRIMÁRIOS (NÃO ESTRUTURAIS)
ELEMENTOS SECUNDÁRIOS
VÃOS EXTERIORES ELEMENTOS
PAVIMENTO TÉRREO JANELAS
PORTAS
SISTEMA CONSTRUTIVO
ARGAMASSA DE CAL HIDRÁULICA COM SUPORTE DE REDE SOBRE GRAVILHA
JANELA FIXA COM CAIXILHARIA EM AÇO E COM BANDEIRA BASCULANTE COM DUAS FOLHAS DE VIDRO FOSCO/ IMPRESSO
PORTA DE CORRER EM PERFIL E CHAPA DE AÇO
REVESTIMENTO
ARGAMASSA DE CAL HIDRÁULICA
GALVANIZADA
GALVANIZADA
ACABAMENTO
AFAGADO
TINTA PRIMÁRIA E ESMALTE EXTERIOR: BRANCO INTERIOR:VERDE
TINTA PRIMÁRIA E ESMALTE VERDE
ESTADO DE CONSERVAÇÃO
LIGEIRAS FISSURAÇÕES NO PAVIMENTO CAUSADO PELO DESGASTE E POSSIVEL EXCESSO DE CARGA
OXIDAÇÃO E DESAGREGAÇÃO DA PINTURA, VIDROS PARCIALMENTE DESTRUIDOS
OXIDAÇÃO NAS ESTRUTURAS METÁLICAS E DESAGREGAÇÃO DA PINTURA
IMAGENS
NOME
DATA
INTERVENÇÕES RELEVANTES
FUNÇÕES
ADMINISTRAÇÃO
1930
PISO INTERMÉDIO ADAPTADO À ESTRUTURA ORIGINAL DE 2 PISOS
ADMINISTRAÇÃO DE SERVIÇOS INDUSTRIAIS
MAPA DE LOCALIZAÇÃO
PLANTA
ELEMENTOS ESTRUTURAIS ELEMENTOS
FUNDAÇÕES
PAREDES RESISTENTES
PILARES
VIGAS
LAGES E PAVIMENTO
ESCADAS
COBERTURA
ELEMENTO CONSTRUTIVO
FUNDAÇÃO CONTINUA EM BETÃO ARMADO: BETONILHA ARMADA COM REDE METÁLICA ELETROSOLDADA DO TIPO MALHASOL
N.A
BETÃO ARMADO
BETÃO ARMADO
N.A.
ESCADAS DE MADEIRA COM LANCES DE DEGRAUS FORMADOS POR PERNAS INCLINADAS, QUE SE APOIAM NOS PATINS EM CADEIAS COM GUARDA METÁLICA
POSSÍVEL ESTRUTURA COM MADRES E ASNAS (NÃO VISÍVEL)
REVESTIMENTO
ARGAMASSA DE REGULARIZAÇÃO
N.A
EXTERIOR: ALVENARIA DE TIJOLO REBOCADA COM ARGAMASSA DE REGULARIZAÇÃO INTERIOR: REBOCO CIMENTO E LAMBRIM DE AZULEJO
REBOCO
N.A.
REVÉS DA ESCADA EM ESTUQUE
ACABAMENTO
N.A.
N.A
EXTERIOR: PINTURA TINTA PLÁSTICA DE TOM EXTERIOR: TINTA PLÁSTICA BRANCA BRANCO N.A. INTERIOR: TINTA PLÁSTICA BRANCA INTERIOR: PINTURA TINTA PLÁSTICA BRANCA
ESTADO DE CONSERVAÇÃO
INDEFINIDO
N.A
IMAGENS
---
---
CORROSÃO DAS ARMADURAS
ARMADURA EXPOSTA NO EXTERIOR E EFERVESCÊNCIAS APARENTES
N.A.
---
EXTERIOR: TELHA MARSELHA PLANA INTERIOR: INDEFINIDO
DEGRAUS: MADEIRA ENVERNIZADA REVÉS DA ESCADA: ESTUQUE PINTADO TINTA PLÁSTICA GUARDA: PINTURA TINTA PLÁSTICA
DESGASTE DA MADEIRA CONSEQUÊNCIA DE USO
INDEFINIDO
INDEFINIDO
---
ELEMENTOS SECUNDÁRIOS
ELEMENTOS PRIMÁRIOS (NÃO ESTRUTURAIS)
PAVIMENTO (NÃO ESTRUTURAL): PAVIMENTO TÉRREO | SOBRE ELEVADO
ELEMENTOS
VÃOS EXTERIORES
SISTEMA CONSTRUTIVO
JANELAS: JANELA COM CAIXILHARIA PORTAS: PORTA COM CAIXILHARIA EM EM ALUMÍNIO DE BATENTE COM ALUMÍNIO DE BATENTE COM DUAS DUAS FOLHAS DE VIDRO SIMPLES FOLHAS DE VIDRO SIMPLES COM COM BANDEIRA FIXA COM UMA BANDEIRA FIXA COM UMA FOLHA DE FOLHA DE VIDRO SIMPLES. VIDRO SIMPLES.
REVESTIMENTO
N.A.
N.A.
ACABAMENTO
LACADO
LACADO
ESTADO DE CONSERVAÇÃO
RAZOÁVEL
RAZOÁVEL
IMAGENS
PISO TÉRREO: MOSAICO HIDRÁULICO
PISO ADAPTADO À ESTUTURA ORIGINAL: ESTRUTURA METÁLICA
TIPO 1: MOSAICO HIDRÁULICO HEXAGONAL VERMELHO MOSAICO DE AGLOMERADO DE CORTIÇA TIPO 2: MOSAICO DE AGLOMERADO DE CORTIÇA
TIPO 1: ENVERNIZADA TIPO 2: ENVERNIZADA
DESGASTE EM CONSEQUÊNCIA DO USO
TECTOS FALSOS
N.A.
N.A.
ENVERNIZADO
N.A.
RAZOÁVEL
N.A.
---
Anexos IV – Desenhos de levantamento Desenhos cedidos pelo Arquivo Militar: Alçados da Central Elétrica Corte e Planta da Central Elétrica Planta de Cobertura da Central Elétrica Alçado das Oficinas Planta e Alçado do Edifício das Carnes Planta Depósito para Água e Óleo Desenhos cedidos pela Manutenção Militar Planta com funções da Manutenção Militar antes do encerramento
120
121
122
123
124
125
126
Anexos V – Desenhos Finais Lista de desenhos 1 – Planta Urbana, Programa, Perfil Rua do Grilo 2 - Planta Amarelos e Encarnados 3 – Central Elétrica (A) 4 – Central Elétrica (B) 5 – Central Elétrica (C) 6 – Central Elétrica (D) 7 – Central Elétrica (E) 8 – Oficinas (A) 9 – Oficinas (B) 10 - Oficinas (C) 11 – Oficinas (D)
127
11
3 +3.49 +3.30 +4.34
4
25
Habitação Flexível à transição de vida Intervenção na Manutenção Militar no Beato, Lisboa Maria Neves Liberato | nº 20121020 | FAUL | Mestrado Integrado em Interiores e Reabilitação do Edificado | Projeto Final de Mestrado
Planta Amarelos e Encarnados
50
75
2
A 1.40 1.48
0.00 1.48
B
B'
0.00
0.00
5.85
1.40
A'
A 4.325
2.80
1.48
B
3.67
0.00
3.67
B'
2.80 5.85
4.325
5
10
15
A'
Habitação Flexível à transição de vida Intervenção na Manutenção Militar no Beato, Lisboa Maria Neves Liberato | nº 20121020 | FAUL | Mestrado Integrado em Interiores e Reabilitação do Edificado | Projeto Final de Mestrado
Central Elétrica Planta piso 0 Cota 1.5 m Planta piso 1 Cota 4.3 m Corte AA'
3
A 4.325
5.85 1.48
B
3.67
0.00
B'
3.67
5.85 5.85
5.85
4.325
A' A 4.325
5.85 1.48
B
3.67
0.00
3.67
B'
5.85 5.85
5.85
4.325
5
15
10
A'
Habitação Flexível à transição de vida Intervenção na Manutenção Militar no Beato, Lisboa Maria Neves Liberato | nº 20121020 | FAUL | Mestrado Integrado em Interiores e Reabilitação do Edificado | Projeto Final de Mestrado
Central Elétrica Planta piso 2 Cota 7.35 m Planta piso 2 Cota 8.85 m
4
A
B'
B
A'
5.90
2.80
5
Habitação Flexível à transição de vida Intervenção na Manutenção Militar no Beato, Lisboa Maria Neves Liberato | nº 20121020 | FAUL | Mestrado Integrado em Interiores e Reabilitação do Edificado | Projeto Final de Mestrado
Central Elétrica Planta cobertura Corte BB'
10
15
5
5
Habitação Flexível à transição de vida Intervenção na Manutenção Militar no Beato, Lisboa Maria Neves Liberato | nº 20121020 | FAUL | Mestrado Integrado em Interiores e Reabilitação do Edificado | Projeto Final de Mestrado
Central Elétrica Alçados
10
15
6
2
Habitação Flexível à transição de vida Intervenção na Manutenção Militar no Beato, Lisboa Maria Neves Liberato | nº 20121020 | FAUL | Mestrado Integrado em Interiores e Reabilitação do Edificado | Projeto Final de Mestrado
Central Elétrica Planta piso 0 Planta piso 1
4
6
7
D C'
C
D'
D C'
C
D D'
C'
C
5
10
15
D'
Habitação Flexível à transição de vida Intervenção na Manutenção Militar no Beato, Lisboa Maria Neves Liberato | nº 20121020 | FAUL | Mestrado Integrado em Interiores e Reabilitação do Edificado | Projeto Final de Mestrado
Oficinas Planta piso 0 Cota 1,5m Planta piso 1 Cota 4,2m Planta piso 2 Cota 7,04
8
D
C'
C
D'
5
Habitação Flexível à transição de vida Intervenção na Manutenção Militar no Beato, Lisboa Maria Neves Liberato | nº 20121020 | FAUL | Mestrado Integrado em Interiores e Reabilitação do Edificado | Projeto Final de Mestrado
Oficinas
Planta piso 2 Cota xxm Planta cobertura
10
15
9
5
10
15
Maria Neves Liberato | nº 20121020 | FAUL | Mestrado Integrado em Interiores e Reabilitação do Edificado | Projeto Final de Mestrado
Habitação Flexível à transição de vida Intervenção na Manutenção Militar no Beato, Lisboa Maria Neves Liberato | nº 20121020 | FAUL | Mestrado Integrado em Interiores e Reabilitação do Edificado | Projeto Final de Mestrado
Oficinas Alçados
10
4
D'
D D'
D
D'
D
2
6
Habitação Flexível à transição de vida Intervenção na Manutenção Militar no Beato, Lisboa Maria Neves Liberato | nº 20121020 | FAUL | Mestrado Integrado em Interiores e Reabilitação do Edificado | Projeto Final de Mestrado
Oficinas
Planta piso 0 Planta piso 1 Planta piso 2
Corte DD'
11
Anexos VI – Painéis de Apresentação
139