MARINA BELDI
TRÂNSITO HUMANO: O design de superfície aplicado em calçados.
Trabalho de conclusão da graduação como parte obrigatória para obtenção do grau de Bacharel em Desenho Industrial com Habilitação em Design Gráfico São Paulo - 2011
PROFESSORES DE TCC
Professor Mestre Carlos Eduardo Perrone Professora Mestre Maria CecĂlia Consolo Professor Doutor Miguel de Frias Professor Paulo Sampaio
PROFESSOR ORIENTADOR
Camila Rossi
PALAVRAS-CHAVE
Design Gráfico Design de Superfície Identidade Customização Trânsito humano Etnias Calçado
RESUMO
Design de superficie sobre um calçado (tênis) baseada na ilustração de um tema da antropologia ( trânsito humano) com foco em um grupo étnico peruano.
ABSTRACT
Shoes’s Surface Design based on illustration of an anthropology theme , Human traffic, with focus on one peruvian ethnic group, Uros.
DEDICATÓRIA Dedico este trabalho a minha tia Isa, que acreditou em mim quando eu ainda não acreditava e me mostrou que somos capazes de alcançar nossos ideais mesmo quando as circunstâncias não conspiram a favor.
AGRADECIMENTOS Gostaria de agradecer a algumas pessoas que foram essenciais para a realização deste projeto. Agradeço aos meus avós, pois sem eles não teria chegado até aqui. Agradeço à minha família: à minha tia Isa - peça-chave na realização deste projeto por todo seu suporte, ajuda, incentivo, apoio e criatividade, por me manter sempre de pé e mostrar-me a vida junto com meu tio Salvador. À minha tia Lurdinha, por seus ensinamentos e conversas sobre este tema ao longo da minha infância, adolescência e fase adulta, e pelo auxílio de sua sabedoria no desenvolvimento deste projeto. Ao meu irmão, por toda sua sabedoria e suas críticas, sempre tentando me mostrar o melhor caminho - mas nunca o mais fácil -, e, é claro, à minha mãe, por sua presença e apoio constantes, especialmente nos momentos mais críticos deste trabalho. Também agradeço muito às minhas antigas chefes, Elissa Rocabado, Marina Barbato e Cecília Canassa, que me ensinaram e me motivaram todos os dias, e principalmente a Sophia Longo, que, além de todos os dias me ensinar um pouco de sua profissão, me mostrou o caminho da realização deste trabalho e me auxiliou nos momentos mais delicados. Este trabalho não teria sido o mesmo sem o suporte de todas as amizades ao meu redor. Agradeço aos meus companheiros de viagem de pesquisa de campo, Elliott Small, Jacinta Jeffery e James Souter, e às fundamentais assistências, inspirações, críticas, apoios, sugestões e helpdesks de Silvia Prada, Marina Carbonell, Gabriela Shigihara, Izabel Menezes, Mauricio Suzuki, Camila Vasone, Ana Flávia Patrícia Martins e Svetlana Bianca; e agradeço, principalmente, às amizades de Giovana Parasmo e Mariana Guedes, que durantes estes dois últimos anos suportaram durantes as aulas minhas reclamações e viagens e me incentivaram e ajudaram até o fim. Finalmente, gostaria de agradecer ao Professor Júlio César de Freitas por seus sábios conselhos, Professor Ivan Bismara por me encaminhar à minha orientadora Professora Camila Rossi, que durante todo este projeto me conduziu com sabedoria, paciência e sensatez, e a todos professores de TCC que nos orientaram durante todo esse ano.
“A vontade cria a capacidade.”
Cássio Beldi
SUMÁRIO
Introdução Objeto Objetivo Justificativa Cenário O mercado brasileiro A História do calçado O Design de Superfície Estamparia Design como identidade Tribos Urbanas Objeto de Estudo: Tribo Uros – Puno, Peru Público-Alvo Questão Social e Humanitária Status Quo Proposta de projeto Desenvolvimento 1 Moldes, medidas e planificações do objetos 2 Os estudos 3 Coloração 4 Escolha do material 5 Aplicações no objeto 6 Costuras 7 Montagem do objeto 8 Embalagem 9 Etiqueta Estampas Análise Final Referências Bibliográficas Referências Não-Bibliográficas
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INTRODUÇÃO
Os deslocamentos fazem parte do homem e de seu instinto de sobrevivência. Não há razões e motivos exclusivos para que eles aconteçam: as causas podem ser econômicas, políticas, sociais ou culturais, sendo, porém, sempre significantes na composição do caráter do indivíduo. Ainda que muitas dessas migrações/imigrações acabem esquecidas ao longo da história, podem deixar marcas latentes e profundas nas características do indivíduo ou da sociedade resultantes. Vivenciando pessoalmente esse processo de “recriar meus lugares”, percebi que tinha que me remeter a algo que me identificasse e me localizasse como brasileira e ao mesmo tempo exploradora de lugares que me eram “estrangeiros”. Essa sensação de “estrangeiridade” (TODOROV, I. 2000, Los abusos de la memória. Paidós) tinha de ser domesticada e, necessariamente, eu teria que reconstruir um espaço que se tornasse “o meu lugar”. Junto com o interesse pela hibridização cultural fruto desses processos migratórios, essa necessidade se converteu mais tarde na vontade de expressar visualmente as trajetórias e as transições dos grupos em deslocamento por meio do design gráfico aliado à estamparia, aplicados sobre um objeto que eu acreditasse poder suportar essa simbolização – e que concluí ser o tênis. A história do calçado sempre se desenvolveu em paralelo com a do homem, tendo sido criado em razão da necessidade de proteção e conforto para os deslocamentos humanos. A escolha do tênis nada mais é que um simbolismo a respeito do deslocamento, já que o elemento que mais essencialmente o representa são os pés. O grupo étnico que será apresentado como base para a criação das estampas foi considerado entre vários outros que têm intenso contato com a civilização ocidental e com ela dialogam entre tensões e conflitos: os Uros, do Peru.
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OBJETO A escolha do objeto deste trabalho se originou da preocupação com a temática do deslocamento humano, ou seja, com o percepção de que, em todos os momentos históricos, parte considerável da população mundial se “desloca”, migra ou imigra, impulsionada por razões de toda ordem. Isso me levou a pensar a respeito das circunstâncias e condições em que esses deslocamentos acontecem: o que levam consigo ao partir essas populações, além do próprio corpo e da própria história? E o que simbolizam esses movimentos? Dentre as várias imagens com possibilidade de associação ao tema que me vieram à mente – como roupas, adornos e outros objetos culturais –, sobressaiu-se uma em particular, anterior à própria cultura: os pés, pois estes se associam direta e primordialmente às condições necessárias para o deslocamento humano.
Sendo esta a imagem mais forte suscitada, nada mais natural que, consequentemente, fossem os calçados o tema deste trabalho ligado ao design. Dentre eles, um tipo e uma marca em particular se elegeram como objeto de estudo: o tênis da marca All Star. A razão da escolha é que, mesmo não sendo o mais vendido e usado no mundo, é, sem dúvida, há algumas gerações, um ícone de moda, estilo e comportamento que já não conhece fronteiras no Ocidente.
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Este estudo se propõe a pesquisar o design gráfico, mais especificamente o design de superfície, aplicado sobre um objeto de moda – como já dito, o tênis. O resultado pretendido é a criação de uma coleção de estampas sobre o calçado All-Star, hoje o tênis de uso casual mais reconhecido1 mundialmente e com mais de 100 anos de história e tradição.
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Dados extraídos do site www.converse.com
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OBJETIVO O objetivo é demonstrar que o tênis, como qualquer objeto cultural, pode carregar consigo a história de quem por qualquer razão precisa se deslocar, e que esse acessório tem a capacidade de simbolizar pessoas em trânsito ou deslocamento.
Este trabalho se inspirará em especial naqueles que precisam ou precisaram migrar por razões políticas e/ou econômicas. Para tal fim, nos deteremos em um grupo étnico: os Uros, que se encontram em ilhas flutuantes no lago Titikaka, 7km da costa da cidade peruana Puno.
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JUSTIFICATIVA
A escolha do tema foi consequência do “desejo” de representar, expor e expressar visual e graficamente a história e a trajetória de grupos e etnias entre os quais o deslocamento geográfico foi e ainda é significante. Representados por vários elementos culturais que os identificam, esses grupos e etnias passam a incorporar elementos de outras culturas. Meu objetivo é mostrar como esses “novos” símbolos culturais vão sendo incorporados pelo processo de diálogo, no qual entram em negociação vários símbolos e se promove um processo de hibridização. Assim, novas identidades vão sendo forjadas, marcando a dinâmica cultural de cada povo e/ou etnia. A hibridização fruto desse processo será traduzida em elementos gráficos com a criação de estampas sobre a superfície de tênis. O grupo apresentado acima como base para a criação dessas estampas é considerado, dentre os grupos étnicos, o que mais têm contato com a civilização ocidental, com a qual, embora com tensões e conflitos, dialogam.
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CENÁRIO O mercado de tênis pode ser considerado um mercado global, podendo seu crescimento ser verificado dia após dia. O tênis passou a ser parte do vestuário de praticamente todos os jovens do mundo, ao representar um comportamento identitário como no caso das chamadas “tribos urbanas”.
A internacionalização das marcas – principalmente americanas e europeias – nos primeiros anos do século XXI, foi consequência de dois grandes movimentos: o baixo custo gerado pelo fato de a produção ter sido transferida para os países asiáticos e a ampla divulgação dos produtos, lançados quase diariamente, que invadiram novos mercados e se tornaram cada vez mais acessíveis para novos públicos. Em relação ao consumo, houve uma conjunção de baixa de preços com a melhoria da qualidade de vida nos últimos quinze anos nos países emergentes; e a conseqüência disso foi o crescimento de 2% ao ano no mercado calçadista global, devido à transferência das fábricas de calçados para países de terceiro mundo, onde a mão de obra é mais barata em relação aos países mais desenvolvidos. Algum tempo atrás, o mercado de calçados manufaturados parecia sem chances de crescimento devido à sua produção mais individualizada, ao custo da mão de obra e aos materiais caros – fatores que resultavam em preços quase inacessíveis –, enquanto os calçados industriais combinavam
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mão de obra barata, custos muito baixos e processos de otimização do tempo que viabilizavam a produção em grande escala.
Porém, o crescimento acelerado do mercado do calçados industriais trouxe consigo a padronização visual, o que gerou o movimento do consumidor de busca de individualização e customização e fez o mercado de calçados manufaturados, capaz de oferecer essa diferenciação entre os produtos, voltar a ter uma previsão de crescimento futuro.
O tênis, hoje, não é mais usado só como acessório necessário para a prática de esportes; além de hábito diário, seu uso tornou-se objeto de desejo e parte indispensável do vestuário, bem como ícone de identificação entre as pessoas, especialmente as jovens, que a cada dia mais buscam combinar variedade com identidade/exclusividade entre os mesmos produtos/marcas. A Converse, marca americana, está no mercado calçadista há mais 100 anos e é mundialmente2 reconhecida e consagrada. O seu primeiro e principal produto é o fenômeno All-Star – criado originalmente para a prática do basquete –, que ao longo de sua história foi tomando novo vulto e criando novos modelos, para os quais agora existe a opção de customização pessoal. Marcas produtoras de tênis e concorrentes, como 2
Dados extraídos do site www.converse.com
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Adidas, Nike, Keds, Vans, DC, entre outras, estão cada dia mais voltadas ao mercado de personalização, criando áreas para a customização de seus produtos e permitindo a seus consumidores personalizar o seu par de tênis e criar seu próprio estilo.
A maioria dessas marcas têm um setor em seus websites dirigido à customização; porém, muitos dos layouts já são pré-definidos, ou seja, as opções para o consumidor são limitadas e não lhes permitem criar de maneira completamente livre.
Isso posto, me proponho a criar modelos com os quais diferentes grupos humanos que estão em deslocamento possam se identificar, criando um lugar de pertencimento que possa ser deslocado: o tênis.
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O MERCADO BRASILEIRO O Brasil assumiu, desde dos anos 2000, a melhor posição econômica em relação ao mercado calçadista na América do Sul3 , já que é o maior produtor; porém 87% da produção é voltada à exportação para Europa e Estados Unidos, já que estes, com grande frequência, têm aqui a linha de montagem de seu design.
No entanto, o consumo de calçados no mercado interno representa, hoje, mais de 43% das vendas do mercado de vestuários, e 17% são representadas pelos tênis. Esse cenário apresenta uma grande oportunidade de desenvolver produtos personalizados e personalizáveis e de explorar o farto material cultural brasileiro, abrindo espaço de atuação e expressão para designers gráficos nacionais.
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Dados extraídos do site www.sebrae.com.br
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A HISTÓRIA DO CALÇADO
Segundo o livro “Shoes”, de Sthephen Pedersen (2005), os primeiros calçados egípcios apareceram por volta de 3.000 anos atrás, quando não existia design nem moda para tal criação: eram simples talos de árvores, fibras de plantas e restos de pele animal.
Essas sandálias foram criadas pela necessidade de proteção para os pés, pois os tempos e o clima eram outros. O homem tinha a necessidade de se locomover e se deslocar muito em função da caça, de modo que os pés estavam sempre em contato com superfícies de todos os tipos, ásperas, quentes, frias, cortantes, etc.
Este capitulo foi baseado nos livros: Shoes, de Sthephen Pedersen, 2005 Where this shoes Will take you, de Lauries Lawlor, 1996 A century of shoes, de Ângela Pattison e Nigel Cawthome, 1997
Logo, esses modelos de calçados começaram a evoluir e a ser feitos para diferentes princípios, tal como aconteceu com os romanos, que tiveram seus primeiros calçados – que hoje chamamos de caliga sandal, isto é, a tradicional sandália de gladiador, de solado muito rígido, porém pouco eficaz para tempos úmidos –, para o uso militar. Já os Chineses criaram seus primeiros calçados para o trabalhador do campo. Antigamente os calçados eram unissex e por muitos séculos, os calçados representaram sensibilidade, estilo, profissāo. Desse modo, qualquer calçado usado por uma pessoa definia sua classe e posiçāo social.
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Em algumas culturas, os pés e os calçados usados tinham grande importância, inclusive nos arranjos matrimoniais, e podiam alcançar o status de símbolo de sorte, saúde ou até determinação da morte.
Apesar de sua patente importância cultural e social, não se sabe de fato quando foi o surgimento exato do primeiro calçado; considera-se porém que deve ter sido há mais ou menos 14.000-17.000 anos, pois nos desenhos das cavernas paleolíticas espanholas foram encontrados homens e mulheres caçando e usando botas de pele animal (PEDERSEN, 2005). A primeira sandália encontrada foi em uma caverna em Oregon, enterrada debaixo de restos vulcânicos, e era feita de sagebrush-bark. Já o calçado designado para uso esportivo tem sua história muito recente. Os primeiros sapatos esportivos apareceram por volta de 1830, para a prática do tênis ou uso praiano. No começo do século XX, começaram a surgir as grandes marcas conhecidas atualmente, tais como Adidas, Puma, Reebok, Nike e inclusive a All-Star, marca utilizada neste projeto – que teve seu primeiro tênis criado para a prática de basquete e ao longo do tempo desenvolveu modelos derivados do original para diferentes usos. Como cita o livro “Where will this shoes take you” (LAWLOR, 1996), no começo do século XIX, o empresário
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Goodyear pensou que talvez o uso de borracha fosse uma inovadora técnica para a produção de calçados. Por tempos e tempos fez experimentos com ela até que, por volta de 1830, lançou o primeiro calçado com solado de borracha. Porém sua invenção não foi perfeitamente funcional, porque o solado do calçado era suscetível ao clima, endurecendo no inverno e derretendo no verão - época em que chegava a grudar no chão. Com sua invenção fora do mercado, Goodyear começou a pesquisar novamente a história dessa borracha extraída da Índia, mesclada com outras substâncias. Porém o investimento foi de tal envergadura que seu empreendimento faliu em meio a vultosa dívida. Anos após sua morte, sua invenção foi roubada, patenteada por outra pessoa e usada para a prática do críquete, ficando conhecida como sneakers. Essas sandálias eram vendidas por um preço acessível apenas a pessoas muito ricas, mas, pouco tempo depois, com a Guerra Mundial, a produção em grande escala de borracha sintética veio à tona. Por volta dos anos 70, começava a febre por calçados esportivos, ocasião em que o técnico da Universidade de Oregon precisou de um tênis para corrida que fosse leve e tivesse absorção de impactos. O técnico Bowerman começou a fazer experimentos com borracha e uma máquina de waffles para conseguir alcançar seu objetivo, e disso surgiu a reconhecida marca Nike. Em 1984, essa febre estourou. O uso do calçado
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esportivo tinha chegado ao auge das vendas, estava no topo da moda, e a Nike começou a patrocinar o renomado jogador de basquete Michael Jordan. Essa febre continuou por mais de uma década, quando a maioria das pessoas preferia comprar tênis esportivos para o uso casual e, a partir daí, além do lado funcional, passou a importar ao consumidor também o lado fashion.
Já a marca All-Star teve seu primeiro modelo criado em 1903 para a prática do basquete; porém esse modelo sofreu ainda aperfeiçoamentos para, depois de 15 anos, começar a ser reconhecido pelo mercado. A empresa All-Star, ao notar que precisava ganhar posição no mercado americano, tornou-se patrocinadora de uma equipe de basquete, da qual um dos jogadores se transformou, tempos depois, em ídolo: o renomado jogador Taylor Chuck.
Ao notar que os resultados de vendas começaram a melhorar, pois Taylor Chuck também havia virado ícone da moda, a All-Star resolveu fazer com que ele virasse símbolo da marca, levando consigo a imagem do tênis. Dessa união com Taylor Chuck, não só os tênis começaram a ter sua assinatura junto à marca, como também Taylor fez uma turnê pelos Estados Unidos para apresentar o produto.
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Anos depois, aproximadamente 200 modelos já tinham sido criados, e a marca já era reconhecida internacionalmente. Mas a febre All-Star realmente veio quando James Dean, não só em seus filmes, mas em seu cotidiano, adotou um dos modelos da marca para seu figurino diário. Isso é um claro exemplo de como os ícones públicos e de mídia desde sempre tiveram grande influência nas tendências no mundo da moda e de consumo. Desse modo, a marca All-Star se expandiu pelo mundo.
Desde então, o hábito do uso de tênis esportivo em situações casuais cresceu e as marcas continuaram fabricando seus produtos esportivos com cada dia mais tecnologia; cada vez mais cuidadosas, porém, com o aspecto fashion dos produtos e sempre levando em conta as tendências sazonais de consumo e design, o público-alvo, etc.
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O DESIGN DE SUPERFÍCIE
Segundo Ruthschilling (2008), em seu livro “Design de Superfície”, o termo design de superfície veio da tradução literal de Surface Design; porém essa nomenclatura era empregada somente para designar a superfície têxtil (estamparia, tecelagem, jacquard, malharia, tapeçaria).
“Design de superfície abrange coloração, padronagem e estrutura de fibras e tecidos. Isso envolve exploração criativa de processos como tingimento, pintura, estamparia, bordado, embelezamento, quilting, tecelagem, tricô, feltro e confecção de papéis” (apud RUTHSCHILLING, 2008 e SDA, 2008). Quando Rubim trouxe para o Brasil, no final dos anos 80, essa nomenclatura, ela se ampliou e hoje abrange não só o design de superfície têxtil, mas também design de cerâmica, de estamparia, de azulejaria, entre outros. Desde sua existência, o homem “usa” o design de superfície para se expressar e “registrar” fatos de sua história, como por exemplo, os grafismos encontrados nas cavernas da pré-história ou o usado para cobrir os corpos, até os dias de hoje, de integrantes de certas tribos indígenas. Todos esses grafismos são registros de uma história, de ocorrências, e são portadores de significado. Esses elementos visuais servem também para representar um modo de vida, uma época, uma identidade cultural e até mesmo uma classe social.
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Como no caso desta pesquisa, que tem por objetivo expressar o deslocamento de um grupo étnico por meio do design de superfície, da estamparia.
Entre os séculos XVII e XVIII, os produtos que eram produzidos em oficinas passaram a ser feitos em processo industrializado e seriado, atendendo às demandas de consumo em escala até então inédita. Segundo Ruthschilling (2008), as superfícies dos objetos cujo comprimento e largura são medidas significativamente superiores à espessura “[...] as civilizações antigas desenvolveram o gosto pela decoração de superfícies em geral [...]”
O Peru é identificado como o pioneiro do design têxtil, onde se encontra maior variedade de técnicas têxteis e de tecelagem, provavelmente devido à abundância de fibras naturais e vegetais.
Ruthschilling (2008) também cita outras civilizações pioneiras em outros campos de design de superfície, tais como a grega, egípcia, celta, africana, holandesa e portuguesa. O design de superfície tem ampliado progressivamente os limites do seu campo de atuação, devido ao
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desenvolvimento tecnológico acelerado e já é considerado um campo de atuação autônomo. “O design de superfície não se limita à intersecção de desenhos, cores e textura sobre o substrato, cuja função principal seria apenas conferir qualidade às superfícies por meio de projetos de revestimentos” (Ruthschilling, 2008)
A superfície pode ser considerada como estrutura gráfica espacial a partir de uma noção biodimensional. Segundo Zoravia Bettiol, o design de superfície sempre existiu devido às superfícies bidimensionais ou tridimensionais e está presente em praticamente todas as áreas do design. No mundo têxtil há diferentes áreas onde o design de superfície pode ser aplicado, tais como jacquard, tecelagem, malharia, estamparia.
Atualmente, o design de superfície têxtil, devido aos avanços tecnológicos, está muito mais acessível, aumentando assim a demanda por produtos estampados, pois antigamente a falta de maquinário e os preços elevados faziam com que produtos estampados não estivessem ao alcance de todos.
A UFRGS, sob a coordenação de Ruthschlling, realizou uma pesquisa de taxionomia para o design de estampas, devido
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à grande variedade de temas e combinações que dificultavam sua identificação. Tais classificações são:
- Desenho Livre (desenhos feitos a mão ou por computador) Simulação (materiais digitalizadas que criam aspectos reais) - Apropriação (estampas feitas a partir de referências) - Tradução de gêneros artísticos (gravura, fotografia e pinturas, que são trabalhadas para criação de novos desenhos) - Colagem (elementos diversificados e organizados de maneiras diferentes) - Técnicas artesanais (técnicas artesanais que são passadas para o computador e permanecem com o mesmo aspecto) Existem também duas maneiras de estampagem. Uma é a estampa corrida, cujos desenhos são elaborados em módulos e assim repetidos na superfície contínua. Há necessidade imperativa de que esses módulos se encaixem simetricamente nas extremidades para que a repetição seja perfeita; isto é chamado de rapport, palavra da língua francesa, cuja tradução é repetição. Outra maneira é a estampa localizada, cuja arte ou desenho é feito sobre a área da superfície onde a repetição não é obrigatoriamente necessária.
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A criação de uma estampa é um processo que exige um projeto que envolva estudo, não só da temática, como do
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conceito e da metodologia para a realização dessa superfície estampada.
“ [..] superfície é constituída por uma estrutura intrínseca que confere a sua autossustentação, determinando a existência independente de qualquer outro suporte” (RUTHSCHILLING, 2008).
“Os adornos possibilitam enriquecer nossos atrativos físicos, afirmar nossa criatividade e individualismo ou sinalizar nossa associação ou posição dentro de um grupo cultural ou social” (JONES, 2005). Pode-se identificar o design de superfície em função de como os elementos visuais se manifestam, como afirma Ruthschilling (2008). Algumas definições gerais são: • • •
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Figuras ou motivos Elementos de preenchimento Elementos de ritmo
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ESTAMPARIA A estamparia é a técnica utilizada para a realização deste projeto. Por ser este um projeto com foco diferenciado, o produto final será confeccionado em pequena quantidade, compondo uma coleção limitada e apresentando caráter mais personalizado. Isso restringirá seu alcance a um grupo de consumidores mais reduzido, o que pode acarretar um custo mais alto, mas, em compensação, reverter um valor mais importante para a organização RED. (mais informações na página 75)
Para conseguir trabalhar com determinadas gamas de cores e aproximar o estilo étnico ao urbano, a técnica de impressão adequada pareceu-me a digital, cujo custo um pouco mais elevado determinou a redução da quantidade das peças a ser produzidas. Segundo o livro Estampagem, 2008, a história da estampagem vem desde a origem humana. A ação de estampar baseia-se em transferir um símbolo para um suporte escolhido, como ocorreu desde a pré-história. Um exemplo disso eram os anéis e selos de imperadores e cônsules romanos, cujas patentes eram gravadas de acordo com o poder que exerciam.
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Nos séculos XVI, XVII e XVIII, quando os novos territórios descobertos pelos europeus foram repartidos e o contato com novas matérias primas e produtos manufaturados fizeram com que os costumes autóctones fossem se misturando com costumes do Velho Mundo, outras técnicas para
estampagem comeรงaram ser aplicadas. Hoje em dia existem diversas maneiras de estampagem como xilografia, litografia, serigrafia, dentre outras.
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DESIGN COMO IDENTIDADE
CUSTOMIZAÇÃO E PERSONALIZAÇÃO Segundo a matéria da Marketing VOX, customização ou personalização vem da língua inglesa custom, customization, que de acordo com o dicionário significa: “Adj. 1. customized made according to the specifications of an individual”. Trata-se de algo ou de algum objeto que foi feito especificamente para um indivíduo, isto é, foi elaborado e desenvolvido com base e “na medida” para essa pessoa, moldado com características próprias. O objeto possui significado e destino.
Este capitulo foi uma análise de informações baseadas em HTTP://emarketingvox.blogspot.com outros sites de marcas onde existe um espaço designado com informações sobre customização para o consumidor.
A busca pelo personal, isto é, algo que é único, se faz cada dia mais intensa atualmente, pois a produção em massa deixou de ser opção para muitas pessoas. Quando um produto customizado entra em contato com o “customizador”, a sensação impactante de único e de identificação atinge o indivíduo, fazendo com que aquele objeto se torne especial e relevante e criando uma relação entre ele e objeto. Antigamente, os produtos eram praticamente personalizados, pois não eram feitos em massa; eram, na maioria dos casos, feitos manualmente e sob medida para o cliente. Porém, após a Revolução Industrial e o surgimento das fábricas, os produtos manufaturados já não eram os
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mais viáveis, devido ao seu alto custo em comparação ao dos produtos fabricados em série, cujo preço se pôde reduzir sensivelmente devido à otimização da produção.
Hoje em dia, o mundo fashion está cada vez mais voltado e focado na oferta de produtos customizados, para que o consumidor possa se identificar com o produto que à venda e crie uma relação com a marca produtora. Existem diversos maneiras de customização, realizada tanto individual como coletivamente, conforme citado no capítulo sobre Tribos Urbanas, ou, em outras palavras, uma coleção ou linha se pode lançar por marcas designadas para certos tipos de indivíduos ou grupos urbanos.
Algumas marcas, desde aquelas do meio eletrônico e eletrodoméstico, automobilístico, de decoração de interiores, vestuário, já estão disponibilizando departamentos específicos para a personalização de seus produtos, deixando, assim, o cliente criar uma relação com a marca por meio desse objeto. Além dessas razões, o objeto customizado é também um meio de identificação e posicionamento social. Exemplificando isso em conexão com o projeto, podem-se ver diversas marcas de calçados que permitem essa personalização ou até negócios especializados em
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customização de produtos, como por exemplo, o site Zazzle, onde se podem encontrar diversos produtos personalizáveis, proporcionando assim ao cliente a sensação de criador do objeto comprado.
As grandes marcas de calçados, como Nike, Converse, DC, Vans, Keds, entre outras, oferecem ao consumidor a opção de customizar o produto que está disponível para compra; ainda que sejam opções padronizadas de customização, permitem a ele fazer combinações de acordo com seu gosto pessoal, criando seu produto.
Portanto, a ideia de customização e personalização terá um papel importante neste projeto, no qual busco criar um vínculo entre o objeto de desejo e o futuro consumidor. O vínculo pretendido é tanto de caráter emocional, privilegiando a identificação história/objeto/comprador, quanto de caráter prático, contemplando a possibilidade de o consumidor personalizar seu próprio tênis com as opções de cadarços inclusas no produto final. Por isso, uma coleção limitada, com foco no diferencial.
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TRIBOS URBANAS
Sendo o design gráfico uma das formas de expressão mais marcantes dos grupos e indivíduos ao longo da história, ele é visível na cultura humana desde tempos primitivos, que deixaram os grafismos nas paredes das cavernas, aos dias de hoje, em que proliferam os grafismos nos muros das cidades.
A conexão das tribos urbanas com este projeto não é somente pelo fato de o público-alvo ser uma delas; é, também, pela possibilidade de comparação entre certos grupos urbanos e nativos pelo fato de ambos se deslocarem ao longo de tempo e criarem outros novos. Ressalte-se que as sociedades urbanas criam subgrupos ou tribos, onde, assim como nas tribos primitivas, a linguagem visual e corporal tem grande importância como expressão e afirmação da identidade pessoal e de pertencimento ao grupo. Este capítulo foi uma análise de informações baseadas: No livro de Michel Maffesoli, Le temps des tribus: Le déclin de índividualisme dans lês sociétés postmodernes, 2000; The location of culture de Homi Bhabha, 1994 e no site http://tribosurbanas.no.comunidades.net
A fim de confeccionar um produto contemporâneo, irei tratar elementos das tribos pré-existentes, adotando a linguagem das manifestações visuais das tribos metropolitanas.
Com base no autor Michel Maffesoli, pode-se dizer que tribos urbanas nascem e se constituem com o intuito de reunir pessoas com objetivos, interesses, hábitos, modos de vestir e costumes em comum, formando um vínculo e uma rede social – criando não um laço familiar no sentido estrito, mas uma
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espécie de “família” ligada por princípios e gostos em comum.
“A preocupação com a vida marcada pelo qualitativo, o desejo de quebrar enclausuramentos e o compromisso de residência próprios da modernidade são como momentos de uma nova busca do Graal, representando outra vez a dinâmica do exílio e da reintegração” (MAFFESOLLI, 1994) As tribos metropolitanas, assim também chamadas, são informais, não são como as organizações ou clãs. Não se constituem necessariamente em torno a um programa formal de afirmação ou negação política, especialmente a partidária, nem costumam filiar-se a instituições. Mas podem expressar ideais comuns os mais diversos, como o pacifismo, a salvação do meio ambiente e a sustentablidade, o apoio a uma religião, crença ou estética, ou, ainda, anseios que podem ir dos mais empáticos socialmente aos mais intolerantes, racistas, violentos, obsessivos, etc. São rodeadas de códigos, sinais e normas atualmente muito estudados por psicólogos e sociólogos.
Normalmente, as tribos metropolitanas são tão instáveis quanto abertas, pois qualquer um pode se tornar parte de uma delas ou deixá-la a qualquer momento, sem punições ou regras. Esse paradoxo é comparável à adolescência, que é representada por sua instabilidade emocional e racional e
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cuja variação de gostos e opiniões é grande, até a formação de padrões comportamentais próprios ou a chegada à fase adulto. Destaca-se cada vez mais o interesse de psicólogos e sociólogos pelo estudo dessas tribos urbanas, já que o surgimento da adolescência é muito recente. Foi no tardar dos anos 50 quando a sociedade não estava acostumada com a rebeldia e a “libertação” da personalidade dos jovens, que começavam a ocupar esse espaço até os meados dos anos 70. Até hoje a juventude e suas reivindicações se fazem socialmente significativas e presentes, fenômeno cada vez mais visível. “O desejo de quebrar enclausuramentos e o compromisso de residência próprios da modernidade são como momentos de uma nova busca do Graal, representando outra vez a dinâmica do exílio e da reintegração” (MAFFESOLLI, 1994) Exemplificando e especificando algumas dessas tribos:
DRAG QUEEN
Surgiu nos Estados Unidos e, para caracterizar uma Drag Queen, homens se vestem de mulher com roupas extremamente exageradas e estilizadas, chamando a atenção o estilo por remeter a uma androginia cômica e irreverente. Essa prática passou de diversão a profissão, já que muitos são contratados para animar festas e eventos
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EMO
A tribo urbana dos Emos se origina do cenário punk, e o nome vem de uma abreviação do inglês “emotional”, já que se caracterizam por manifestar visualmente a emoção em seu estilo, usando roupas pretas, fazendo maquiagens escuras, desenhos de lágrimas nos olhos, etc. Alguns chegam ao extremo de se cortar. Estas tribos se formaram nos subúrbios de Washington, nos Estados Unidos.
GEEKS
Os Geeks são, na maioria das vezes, reconhecidos por sua aparência extremamente conservadora ou fora de moda e é comum vê-los usando óculos grandes para demonstrar intelectualidade. Frequentemente carregam calculadoras, livros e portáteis, pois, ao contrário de grande parte dos grupos sociais contemporâneos, a busca de conhecimentos para eles – especialmente tecnológicos – consiste em, mais que instrumento de consecução do que quer que seja, um fim obsessivo que inclusive se mistura com o lazer e rege a socialização do grupo.
GÓTICO
Originou-se na Inglaterra na década de 1970, com manifesto contra a manipulação do homem por aquilo que lhe é
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apresentado pelo mundo como obrigatoriamente desejável e em defesa do lado mais obscuro do ser humano como fonte de liberação da sociedade. O uso de roupas pretas é um sinal de luto pela sociedade, simboliza a morte ideológica do homem e exalta novas formas de ver o aparentemente assustador para a sociedade.
HIPPIES
Em busca pela paz, uma manifestação surge na Califórnia em 1966, contra a violência e a favor do amor livre. Cabelos compridos, roupas rasgadas e feitas em casa, cores vibrantes são características de um hippie para representar um manifesto contra o consumismo. Como a liberação mental era um modo de viver, o uso de drogas e o livre prazer sexual eram excessivos. Repúdio à ganância e à falsidade.
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TRÂNSITO HUMANO
A necessidade de poder entender como as diferentes culturas se comunicam fez com que eu tomasse como ponto de partida os deslocamentos humanos.
Como essas populações que, muitas vezes, saem de seus países, passam a “recriar“ seus lugares de pertencimento? Como elas passam a se sentir “em casa” em outros lugares? O que as remete às suas origens?
Este capitulo foi baseado nos livros: Deslocamentos, de Maria de Lourdes de Alcântara, 2008 Los abusos de La memória. Paidós, de Tzvetan Todorov, 2000 The location of Culture, de Homi Bhabha, 1994 The indigenous world, da organização Iwgia, 2009 Culturas hibridas, de Nestor Cancline, 2002 COP15 – Native land, stop eject, da foundation Cartier, 2009
Trânsito ou deslocamento humano, ou ainda migração e imigração, são termos que nos apresentam as mudanças populacionais do mundo. Esses tipos de deslocamentos têm como principais razões as crises econômicas, guerras e catástrofe naturais. O fato de se deslocarem traz ao homens a necessidade de levar consigo algo que os remeta as suas origens, suas raízes culturais. Mesmo que estejam em trânsito, precisam da constante rememoração de seus lugares. Constatamos isso, muito claramente, quando as grandes imigrações italianas e japonesas levam consigo suas tradições alimentares e reconstroem jardins e hortas que possam (re)criar seus hábitos alimentares, para poderem se sentir em casa.
Essa necessidade de “sentir-se como se” é extremamente importante para que as populações possam (re) inventar “lugares” de pertencimento.
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Esse trabalho baseia-se no conceito de hibridação postulado por H. Bhabha (1994, The Location of Culture. Routledge) e N. Cancline (2002, Culturas híbridas. Companhia das Letras), e nos remete ao processo do diálogo cultural entre símbolos de diferentes culturas que necessariamente precisam se comunicar. O resultado é a criação de um símbolo que carrega elementos culturais e que obrigatoriamente é hibrido, pois é a síntese desse diálogo. No nosso caso, os “deslocamentos humanos” tornamse um paradigma desse processo. Como eles carregam suas identidades, que a todo momento estarão sendo negociadas com as culturas com que entram em diálogo?
Quais seriam os suportes de representação dessas manifestações dialógicas? Esse trabalho apresenta um suporte que, ao mesmo tempo em que representa ipsis literis movimento, ele é pleno de identidade cultural, razão por que o chamamos de um suporte “híbrido” .
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OBJETO DE ESTUDO TRIBO UROS – PUNO, PERU A escolha deste grupo étnico se deu no decorrer deste projeto durante uma viagem para pesquisa de campo ao Peru, onde pude conhecer, vivenciar e ter contato com essa tribo, apreendendo, conhecendo e entendendo melhor sua história.
Ao longo de sua história, os Uros foram perdendo parte de sua força, espaço cultural e territorial. O contato com a civilização trouxe trocas econômicas e de interesses assimétricas e, embora não tenha dizimado suas tradições e seu modo de vida ancestral, a sociedade urbana lhes usurpou espaço vital sem oferecer-lhes em troca possibilidade de real e plena integração à nova ordem. Em vez de “em”, os Uros passaram a viver “entre”, criando o hibridismo necessário à sobrevivência das novas gerações; porém, esse hibridismo têm consequências que afetam as novas gerações, resultando em uma quase extinção cultural do grupo por não encontrar sua posição na sociedade. Durante a visita pude conversar e aprender um pouco de suas histórias, que depois pude aprimorar com dados, estudos e pesquisa existentes.
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A civilização Uro vem de longa data: eles são considerados pré-incaicos. Vivem em ilhas flutuantes no lado peruano do Lago Titikaka, que são suportadas por densas raízes de uma planta chamada totora; esta cresce dentro do lago e é misturada a camadas de totoras reutilizadas, tornando impermeável a superfície das ilhas e fazendo-as flutuar. Estas camadas são trocadas mensalmente.
Dentro desta comunidade, existem algumas ilhas principais, onde ficam localizados os principais centros como o pronto-socorro, a escola, o sindicato responsável pelas ilhas e o centro de turismo. As ilhas menores podem suportar até dez famílias e cada uma têm seu próprio líder. A língua falada é o Aymara, que tem difusão e continuidade somente orais pelo fato de a única escola, suportada pelo governo peruano, empregar o castelhano. Ao mesmo tempo em que, por esse motivo, deixa de oferecer aos Uros apoio à preservação de seu patrimônio linguístico-cultural, essa escola tampouco garante a inserção da comunidade no mundo urbano, pois seu ensino só vai até o primeiro grau. Para o acesso a estágios superiores de instrução, a população tem que se locomover até o continente diariamente, o que para a maioria inviabiliza a continuidade dos estudos.
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Mas o principal problema ainda é a falta de suporte à saúde, já que grande parte da população sofre de artrites e edemas pulmonares devido ao contato permanente com o frio e a umidade. A economia se baseia na pesca, em algum comércio entre as ilhas e o continente, no artesanato, na plantação de totora e batata na temporada de baixa do rio e, sobretudo, no turismo entre as ilhas e o continente.
Conforme as lendas Incas e Uros, a Lua e o Sol nasceram do Lago Titikaka e a civilização Uro já existia antes da criação destes, quando a Terra ainda era escura e fria. Eles creem que foram atingidos por um raio e deixaram de ser impermeáveis ao desobedecer Pachamama, misturar-se aos seres humanos e tornar-se um deles –deixando de ser seres supremos e tornando-se sensíveis ao desprezo. Os Uros acreditam que são constantemente punidos por desobedecer a ordem e por isso, hoje, suas vidas são de pouco valor, sendo eles desprezados pela sociedade dominante. De acordo com a história peruana, os Uros são uma das civilizações mais antigas, tendo sido grandes inovadores na área da arquitetura e nas técnicas de plantação. Habitavam a região de Puno, cidade que beira o Lago Titikaka, quando os espanhóis chegaram ao Peru e o colonizaram com violência
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e brutalidade. Com intenção de fugir da violência espanhola, o povo Uro criou ilhas flutuantes com raízes de Totora – seu principal alimento – no meio do Lago, onde os espanhóis não os encontrariam. Ao longo da história, esses deslocamentos trouxeram inúmeras consequências ao povo Uro, que afetaram sua identidade, cultura, tradição, economia e os tornaram grande exemplo de hibridismo.
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PÚBLICO-ALVO Este objeto será concebido para um grupo social capaz de valorizar e adquirir produtos não apenas por fatores estéticos, mas também pelo conceito e simbolismo embutidos neles. Indivíduos interessados em história, arte e com consciência social, uma vez que a intenção é doar os fundos gerados pelas vendas para ONGs humanitárias. Os usuários prioritariamente visados são os jovens de 15 a 30 anos, independentes e despojados, conectados com os acontecimentos globais e pertencentes a um grupo urbano eclético, de alto nível intelectual e cultural, e oriundos das classes A e B – que não se encaixam completamente nos padrões de seus núcleos sociais.
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QUESTÃO SOCIAL E HUMANITÁRIA
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QUESTÃO SOCIAL E HUMANITÁRIA Este projeto tem como intenção final reverter seus resultados, tanto simbólicos como financeiros, em ajuda humanitária e alertar e conscientizar a sociedade de algo esquecido ou omitido. Para sua viabilização, foi considerada a extensão de aliança já existente entre algumas marcas, que serão citadas nesse trabalho, ao objeto concebido na pesquisa. A Converse mantém aliança com uma organização mundial de combate à AIDS, à tuberculose e à malária, revertendo 10% do valor de seus produtos especiais para este fundo global, chamado join(RED)4. Esta é uma organização global que tem como propósito transformar a força coletiva do consumidor em força financeira para aqueles que necessitam. Trabalha com grandes ícones mundiais – como American Express, Apple, Bugaboo, Converse, Dell, Empório Armani, Gap, Hallmark, Nike, Penfolds, Penguin e Starbucks – criando produtos da marca desta aliança, os (PRODUCT)red, cujos lucros têm 50% diretamente destinados a um fundo global de apoio a portadores de HIV, tuberculose e malária. Desde 2006, a Join(RED) já gerou mais de US$ 160 milhões e ajudou a mais de 5 milhões de pessoas que sofrem dessas doenças, melhorando sua qualidade de vida e beneficiando suas comunidades. Este projeto tem como meta a aliança Converse– join(RED) – para a qual pretende reverter todos os fundos – por ser ela já consolidada e ter alcance e credibilidade mundiais que favorecem sua viabilidade e facilitam o contato do objeto desse trabalho com o consumidor global. 4
Dados extraídos do site www.joinred.com
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STATUS QUO
STATUS QUO No mercado, Já existe alguns casos de coleções designadas para certos grupos ou coleções feitas com inspirações. A marca Converse, anualmente cria uma nova coleção limitada, além de suas coleções padrão.
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PROPOSTA DE PROJETO
Após este período de pesquisa e estudos, pude desenvolver um objeto final no qual pudesse representar todo este projeto.
Serão desenvolvidas três estampas, com três variantes de cores, que serão aplicadas na superfície do tênis Converse. Essas estampas serão aplicadas em três diferentes modelos do calçado, a fim de alcançar todos os gostos e públicos, tendo como possibilidade de interação do consumidor com o produto a customização do cadarço.
No planejamento do projeto, existe a intenção de reverter todos os fundos das vendas deste produtos para organizações humanitárias em prol de ajudar causas como esta discutida neste projeto. Para a viabilização disso, a aliança entre duas companhias já existentes no mercado, como a da marca All-Star Converse de da organização humanitária (RED).
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DESENVOLVIMENTO Foi preciso dividir em algumas etapas a realização deste produto. Sem contar a elaboração dos itens adicionais para que o projeto ficasse completo – tais como embalagens, etiquetas, variações de cores, catálogo, cadarços, entre outros. Primeiramente pesquisei sobre tema e, durante a pesquisa, achei necessária uma pesquisa de campo e uma visita a tribo abordada no trabalho, por isso fui até Puno, Peru; vivenciar um pouco da vida deste grupo e entrar em contato direto para poder criar este produto. Durante a visita pude ver o cotidiano destas pessoas e como seus trabalhos são feitos, por isso a idéia de criar baseada em fotos de objetos (artesanatos), originais, feitos por estas pessoas. Em cima desta ideia criar o produto dividindo este processo em algumas partes: 1 2 3 4 5 6 7
Moldes, medidas e planificações do objetos Os estudos Coloração Escolha do material Aplicações no objeto Costuras Montagem do objeto
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1 MOLDES, MEDIDAS E PLANIFICAÇÕES Para que as estampas fossem desenvolvidas, foi preciso definir a área de trabalho onde elas seriam aplicadas, gerando a necessidade de desenhos planificados e da tirada de medidas dos modelos dos tênis. Para a extração desses números e desenhos, para conseguir tirar o molde exato do tênis, usei a técnica de mumificação, que consiste em envolver todo o calçado - em partes separadas: lingueta, lateral e parte traseira -, com fita crepe para ter as medidas exatas de suas partes e depois planificá-las em desenhos e vetores.
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2 OS ESTUDOS A linha de criação dessas estampas terá como base essencialmente uma antiga bolsa e também fotos de elementos fortemente representativos da cultura do povo Uro, tais como seu habitat, roupas, alimentos, expressões faciais, artesanato, entre outros, e sua conexão se dará pelos significados, cores, expressão e, principalmente, pelo movimento desses desenhos simbolizando o projeto como um todo.
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3 PAINEL DE CORES A escolha das cores utilizadas neste projeto foi baseada em uma grande pesquisa das futuras tendências do mercado têxtil, feita em sites como WGSN e Stylesight e em empresas de tendências como Peclers Paris. Dessas pesquisas derivou a escolha das cores relacionadas com a tribo Uro, extraídas de fotos, tecidos peruanos e elementos da natureza encontrados no entorno, sendo a principal fonte uma bolsa antiga feita por mulheres da tribo e entregue a mim durante a visita.
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4 ESCOLHA DE MATERIAL A escolha dos materiais usados tem como base o estudo e a pesquisa anteriores, bem como a verificação do melhor, mais econômico e eficaz meio de produzir o objeto final. O tecido utilizado para a montagem do tênis será a lona de algodão reciclável revestida, devido ao estudo de produção dos Converse existentes, ao conforto e à durabilidade oferecidos ao consumidor por este material e à possibilidade de reciclagem questão inerente à sustentabilidade e de interesse tanto global quanto desse projeto. Os solados serão feitos de borracha, utilizando os mesmos do Converse All-Star, e alguns deles serão revestido com couro tratado. Já os cadarços usados serão os infantis, pois não são feito de fibras artificiais como os de adultos - feitos de polipropileno, poliéster ou nylon -, e serão produzidos de algodão com uma mínima porcentagem de elastano.
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5 APLICAÇÃO NO OBJETO Os desenhos serão aplicados sobre a superfície do tecido por meio da técnica de estamparia, como dito anteriormente.
Em alguns modelos, a aplicação não será sobre toda a superfície do calçado: haverá apenas algumas intervenções, como, por exemplo, no cadarço, no logotipo da marca ou somente na lingueta. Serão criadas três estampas, aplicadas em três modelos de Converse, com algumas variações de cores. Devido às pequenas proporções da produção, a técnica empregada na impressão será a digital. Serão impressas somente algumas das estampas elaboradas para a produção do tênis, e apenas um boneco do produto final será feito.
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6 COSTURA A costura foi um elemento incorporado à cobertura e à customização da superfície do tênis, já que os Uros a utilizam muito sobre telas e tecidos em seus artesanatos. Sendo desde o início algo essencial e obrigatório para a confecção do produto, pois é necessária para juntar suas partes na montagem, normalmente não tem suas possibidades estéticas aproveitadas, algo que nesse projeto se irá recuperar.
A costura foi feita manualmente com ajuda de um profissional.
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7 MONTAGEM Para a montagem final do objeto, foi necessária a ajuda de um sapateiro profissional, devido ao uso de técnicas e ferramentas especiais. O tênis foi inicialmente desmontado e novamente montado com a inserção de partes modificadas ou novas. Os solados não foram feitos durante este processo: foram comprados prontos e juntados com as novas partes, tecidos e costuras.
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8 EMBALAGEM O produto em si está completo, estando porém o projeto inconcluso. Para sua conclusão, outras etapas precisam se realizar e confluir de modo que produto e embalagem componham um corpo articulado a ser apresentado ao mercado.
A embalagem será feita de madeira e barbante, materiais propícios à representação e à simbolização dessa tribo e seu estilo de vida.
Consistirá em uma caixa feita de madeira e uma sacola de barbante para envolver o tênis – inspirada nas redes de pesca, que é uma das principais atividades econômicas e culturais dos Uros.
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9 ETIQUETA A etiqueta seguirá o padrão da já existente por ser esta uma criação muito eficiente e que segue a identidade de ambas as marca, Join(RED) e Converse.
Na etiqueta haverá breves explicações a respeito do produto, do tema representado e da responsabilidade social apoiada e fomentada pelas marcas
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ESTAMPAS As cores fundamentais serão retiradas da principal palheta, que é a bolsa apresentada acima, emitindo forte identidade e significado cultural. As variações de cores, as tonalidades e as variações quenteXfrio serão fundamentadas nas tendências estudadas.
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1ª estampa:
– Baseada na fotografia ao lado, fiz um skyline, para poder transmitir o habitat do grupo. O desenho é feito sem pequenos detalhes, com a intenção de transmitir a rusticidade da vida destas pessoas .
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2ª estampa:
– Tendo como base a fotografia da mulher Uro executando uma tarefa rotineira, trabalhei com estilização, repetição e escala da imagem, para transmitir, também, movimento. A textura de fundo criada tem como inspiração elementos gráficos encontrados nesta tribo.
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3ª estampa:
– Focalizando o cordão elaborado nesse mesmo objeto, a bolsa, criei um padrão de um pedaço da foto feito dele. Esse padrão transmite movimento, principal tema abordado, e as cores da identidade desta tribo.
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4ª estampa:
– A terceira estampa foi uma espécie de “trocadilho” com a logomarca Converse, usando uma parte da bolsa onde há um remendo feito em um abstrato formato de estrela. Com esta terceira criação, tentei transmitir algo comum ao cotidiano de qualquer consumidor e dos Uros, como um remendo, uma costura feita de maneira displicente e improvisada.
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5ª estampa:
– Tentei misturar a ilustração e a fotografia, usando como plano de fundo um padrão feito com cores extraídas dessa bolsa e uma montagem de um seguimento de uma fotografia formando um trançado, que é uma técnica largamente usado por esse grupo tanto em sua arte como em suas ferramentas, como a rede de pesca, nas moradias, roupas, etc.
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6ª estampa:
– Novamente inspirada no objeto fundamental das criações, e novamente inspirada no cordão, ilustrei o pompom, um artefato muito utilizado pelas mulheres Uros e um acessório crucial no vestuário feminino, que tem por função prender os cabelos no final das tranças típicas e dar aos cabelos balanço ao caminhar – novamente emitindo sentido de movimento e identidade.
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7ª estampa:
– Inspirada novamente na bolsa, fiz um padrão com a sua própria imagem, buscando maior movimento e profundidade.
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8ª estampa:
– A estampa foi criada com base nas imagens do solo Uro – constituído de totoras –, substituindo uma característica orgânica por uma linguagem gráfica.
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9ª estampa:
– Mesmo fundamento da estampa anterior, trabalhando aqui com sobreposição e combinando com tecido liso.
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ANÁLISE FINAL
Concluindo este projeto, pude estudar e entender o meu tema: o calçado, o design gráfico e consecutivamente o design de superfície. Dessa maneira foi possível encontrar, via design gráfico, um meio de relacioná-los para poder levar a cabo a minha proposta: uma coleção de calçados, estampados e customizados sobre o trânsito humano. O mundo da estamparia vem sofrendo grandes mudanças e desenvolvimentos desde sua existência, chegando hoje na impressão digital, o que traz um quase perfeição para a reprodução dos padrões criados. Hoje em dia, a produção digital esta mais acessível, sendo viável para qualquer criar e reproduzir. O mercado de produtos estampados estão sempre tendo altos e baixos, devido as tendências e gostos pessoais. Com este projeto, pude estudar, ver e aprender estes processos de criação, produção e interação da estampa no dia-dia das pessoas, podendo também transformar um desejo pessoal em realidade, encontrando uma solução estética, para um produto de moda que serviu como um comunicador de conceitos e fonte de fundos beneficentes para ajudar causas sociais, juntando o gosto pelo design, antropologia, historia, identidade, arte e causas sociais. Pude, também, por em pratica todo um aprendizado adquirido ao longo da minha vida, tanto educacional, pessoal e profissional, expondo e repercutindo experiências inesquecível que tive ao decorrer deste projeto, tais como a visita ao território Uro.
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