Lugares / Representações

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GPS São Paulo

As Cidades e o Desejo

es

O mundo (até o fim) Eclipses

Horizontes Simulados

Cidades Azuis

61.

Palácio das Esferas

Some Air in Between

al Vibrations. Bridget Riley, 1961.

The End




Andrei Thomaz

Lugares/ Representações lugares / representações

Daniel Escobar

Marina Camargo

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Prêmio Funarte de Arte Contemporânea 2010 Criado pela Fundação Nacional de Artes – Funarte para fomentar a produção e a difusão das artes visuais brasileiras, o Prêmio de Arte Contemporânea contemplou 15 proponentes em 2010. As propostas de trabalho escolhidas, que tinham em comum apenas seu caráter experimental e inovador, foram concretizadas e expostas em espaços culturais da Fundação no Rio de Janeiro, em São Paulo, em Brasília e em Belo Horizonte. Desenvolvidas para dialogar com as arquiteturas locais, as obras propuseram novos debates sobre a multiplicidade de estéticas e linguagens artísticas do século 21. Agora, registradas em catálogos, elas alcançam outros públicos e podem inspirar futuros criadores. Lançado por meio de edital, o processo seletivo do Prêmio de Arte Contemporânea esteve aberto em todo o Brasil, de forma ampla, transparente e democrática. A Funarte recebeu inscrições de 446 proponentes. A análise das propostas coube a uma comissão formada por cinco especialistas da área, um de cada região do país, que avaliaram a qualidade do projeto e a qualificação dos profissionais envolvidos. Ao viabilizar ações como esta, a Funarte cumpre a missão de promover a excelência artística e a diversidade cultural brasileira. Antonio Grassi Presidente da Funarte


4 Uma ordem oculta das cidades A hidden order of cities

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O mapa como matéria–prima The map as raw material

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18 Transparências da comunicação Transparencies in communication

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Interview with Andrei Thomaz

30 Entrevista com Daniel Escobar Interview with Daniel Escobar

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38 Entrevista com Marina Camargo Interview with Marina Camargo

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Entrevista com Andrei Thomaz


Guilherme Wisnik

Uma ordem oculta das cidades

1. Na passagem dos anos 1960 para os 70, o artista norte-americano Robert Smithson realizou importantes trabalhos em que criava uma relação dialética entre “lugar” (site) e “não-lugar” (non-site), relativizando a importância do trabalho enquanto objeto, em favor da ideia mais abstrata de trajeto, absolutamente nova naquele momento. Com isso, adentrou o instrumental técnico e ideativo mais comum a profissionais como arquitetos, topógrafos ou geólogos, entre outros, realizando croquis, mapas de localização, fotografias e filmagens de suas viagens de exploração, de modo a registrar o seu deslocamento como um contraponto à noção mais fixa e essencialista de lugar, sem, no entanto, recair numa representação mimética. Construindo os seus Earthworks em meio à paisagem como ação física (site), ele transportava elementos recolhidos ali, como pedras e porções de terra, junto com mapas e desenhos, para o interior de museus ou galerias (non-sites), numa atitude de caráter cultural, complementar à primeira – e deixando a ausência desses elementos no lugar de origem como rastro negativo da ação, esta também documentada e presente no non-site. Com isso, definia seu trabalho como um perpétuo ir e vir dialético entre essas instâncias tanto materiais (site e non-site) quanto simbólicas (as instâncias física e cultural). Daí que possamos, de fato, caracterizar esses trabalhos como trajetos de mediação entre lugares e representações, em direção a uma terceira coisa. Nesse trânsito, o site (natureza) se torna coextensivo à galeria, já que o trabalho não possui um centro hierárquico. Na sua famosa expedição de reconhecimento da sua terra natal (Passaic, Nova Jersey), em 30 de setembro de 1967, Smithson encontra um cenário industrial abandonado, ao qual atribui, no entanto, uma grande carga simbólica. Dessa maneira, tratores, pontes,

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bombas d’água e tubulações, por exemplo, são considerados por ele “monumentos” da paisagem, como se fossem fósseis de animais pré-históricos cuja existência independesse da ação humana. Segundo o seu relato, o primeiro monumento encontrado na viagem foi uma ponte sobre o rio, que conectava o condado de Passaic ao de Bergen. Assim, diz ele: “O sol do meio dia dava um caráter cinematográfico ao lugar, convertendo a ponte e o rio em uma imagem super exposta. Fotografá-los com a minha Instamatic 400 foi como fotografar uma fotografia. O sol se converteu em uma monstruosa lâmpada que projetava um série de ‘fotogramas’ nos meus olhos através de minha Instamatic. Quando atravessei a ponte, era como se caminhasse sobre uma fotografia enorme, feita de madeira e aço, e debaixo, o rio existia como um enorme filme que não mostrava mais que uma imagem contínua em branco.”1 A volta a Passaic, naquele caso, é uma viagem tanto no espaço quanto no tempo, com um poder evocativo que parece desrealizar o lugar enquanto materialidade, criando um inusitado sistema de equivalência simbólica no qual mapa e lugar se confundem, na extraordinária imagem de alguém que caminha sobre uma enorme fotografia, que é um mapa. Uma posição simetricamente oposta a essa aparece, ao meu ver, em alguns trabalhos e textos de Hélio Oiticica, como, por exemplo, no Penetrável Tropicália (1967), que descreve da seguinte maneira: “Antes de fazer estas novas cabines, eu tive a ideia de me ‘apropriar’ de lugares que eu gostava, lugares reais, onde eu me senti vivo. De fato, o Penetrável Tropicália, com sua multidão de imagens tropicais, é uma espécie de condensação de lugares reais. Tropicália é um tipo de mapa. É um mapa do Rio, e é um mapa da minha imaginação. É um mapa no qual você entra.”2 Hélio, como se vê, também opera com o trânsito entre site e non-site, digamos assim, mas sempre no sentido de promover a experiência física do trabalho, trazendo o resultado do seu “delírio ambulatório” pela cidade e pela imaginação, com seu mapeamento subjetivo, para instalações espaciais, nas quais aquela cidade-mapa pode ser experimentada de uma outra forma: “um mapa no qual você entra”. Um outro exemplo interessante dessa mesma situação aparece no seu trabalho “Manhattan brutalista”, de 1978. Naquele ano, em que Hélio voltou de Nova York para o Rio de Janeiro, as obras de construção do metrô sob a Avenida Presidente Vargas geraram uma enorme quantidade de entulho na região. Ali, Oiticica encontrou um pedaço de asfalto com a forma da ilha de Manhattan, um objeto “semi-trouvé” do qual se apropriou, e depois usou como parte da instalação “Kyoto-Gaudí”, feita no banheiro da sua casa – evitando mais uma vez a abstração cartográfica em favor da materialidade. Nesse caso, a arbitrariedade da associação formal entre o pedaço de asfalto carioca e o contorno de Manhattan ampara uma reflexão sobre a arqueologia urbana, investindo esse dejeto arrancado do subsolo – a cota da antiga avenida onde passavam os desfiles das primeiras escolas de samba do Rio – de um significado metafórico sobre a arte errática do deambular, por oposição à “internação do museu”, ou à “fixidez do mapa”. Isto é, tomando-o como um elogio

1 Robert Smithson, “A tour of the monuments of Passaic, New Jersey”, in Jack Flam (ed.), Robert Smthson: the collected writings. Berkeley: University of Califórnia Press, 1996, p. 70.

2 Hélio Oiticica, “Sobre a retrospectiva na Whitechapel Gallery – Entrevista a Guy Brett, 1960”, in César Oiticica Filho et alii (org.), Encontros | Hélio Oiticica. Rio de Janeiro: Azougue Editorial, 2009, p. 60.

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da experiência urbana soterrada, por oposição ao olhar abarcador e dominador da vista aérea, do controle panóptico da visão e da representação em “vôo de pássaro”. Como bem pergunta Paula Braga, a propósito desse trabalho, “Manhattan brutalista é afinal um mapa da ilha de Manhattan ou do Rio de Janeiro? Ou é possível sobrepor todos os mapas formando uma geografia própria?”3 No Brasil, ao meu ver, uma discussão por essa via vem sendo atualizada desde os anos 1990 por artistas como Nelson Félix, que criou trabalhos fortemente alheios ao conceito de site-specific, baseados em novas maneiras de representar o lugar, dilatando o tempo de ocorrência da obra. Me refiro sobretudo a um trabalho como “Cruz na América”, feito por um sistema de ações artísticas no continente (Uruguaiana, deserto do Atacama, floresta no Acre e cidade do Rio de Janeiro) criado a partir de uma lógica arbitrária, dada por coordenadas geográficas em forma de cruz. O que faz com que a totalidade conceitual do trabalho exista apenas como fato mental não passível de experiência. Nesse caso, a linguagem “pública” e objetiva do sistema de coordenadas gráficas é tomada pelo artista como uma lei arbitrária que vem, de fora, organizar formalmente o trabalho, e dar sentido a ele. Mais do que representados, os lugares são, nesse caso, significados pela representação. Em certo sentido, Nelson Félix parece de fato pisar um grande mapa, que é, também, uma espécie de imagem super exposta. 2. Desde o seu título (“lugares/representações”), a presente exposição já demonstra uma filiação evidente a essa linhagem de trabalhos artísticos, ainda que não necessariamente aos artistas citados aqui. Andrei Thomaz, Daniel Escobar e Marina Camargo pertencem a uma geração para a qual o Google Earth e o GPS se tornaram instrumentos corriqueiros de intelecção do espaço, aproximando de maneira inédita, na história humana, os lugares reais e as suas representações gráficas. Pois através desses incríveis Alephs contemporâneos, todas as pessoas se tornaram, de certa forma, arquitetos, topógrafos ou geólogos, incorporando com intimidade operativa um conhecimento antes considerado específico e abstrato. Tendo atrás de si um quadro de progressiva “desrealização do mundo” enquanto experiência física inalienável – dado tanto pela sensibilidade cultural pós-moderna, primeiro, quanto pela disseminação das tecnologias de virtualização do espaço, em seguida –, os três artistas se lançam a um mapeamento da sua (nossa) relação com o ambiente envoltório, em geral urbano. Porém, não seriam jamais “poetas” da vida nas ruas, como o flanêur baudelairiano foi um dia, e Hélio Oiticica também – talvez como último representante daquela linhagem. Suas relações com as cidades são umbilicalmente mediadas por uma nuvem de códigos, sejam eles cartográficos, publicitários, turísticos, ou até artísticos, em um contexto onde as noções de original, referente, fonte primária ou legitimidade já desapareceram há tempos. Seria a paisagem urbana um símbolo inconteste de ordem e de verdade, relativos à confiança extrema que depositamos no

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3 Paula Braga, A trama da terra que treme: multiplicidade em Hélio Oiticica, Tese de Doutorado. São Paulo: FFLCHUSP, 2007, p. 140.

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sentido da visão, e na sociedade enquanto forma de organização coletiva? Não haveriam, por trás dessa aparência, infinitos universos possíveis, recalcados ou latentes, passíveis de serem entrevistos por uma perturbação qualquer, mesmo que arbitrária, dessa ordem visível? Partindo de indagações como estas, Andrei, Daniel e Marina realizam distintas formas de mapeamento urbano – de seu tecido formal e de seu imaginário –, produzindo trabalhos que não reproduzem os lugares reais, mas “inventam” novos lugares. Abandonando a ideia de obra como “objeto”, os jovens artistas trabalham com teias de informação, criando non-sites especulares que já não possuem sites como origem, em termos de uma experiência concreta do lugar. Para eles o planeta é inteiramente manipulável, como em um jogo, e o embaralhamento de suas teias, tal como acontece em “Eclipses” (Andrei Thomaz e Marina Camargo), demonstra esse processo de emancipação do código em relação à coisa em si, sugerindo a possibilidade de se entrever uma espécie de ordem oculta na organização das coisas (cidades), que a experiência imediata da pessoa, através do olhar e do caminhar, nunca é capaz de apreender. Tal concepção de arte e de espaço se espelha na própria prática dos artistas. Trabalhando sobre vários suportes e à partir de diversas mídias (fotografia, papel de outdoor ou lambe-lambe, livros, madeira recortada, chapas de acrílico, caixas de luz, sacolas plásticas, projeção em vídeo, imagens de computador), eles problematizam a noção de autoria, realizando trabalhos algumas vezes em dupla, e em certos casos voltados para a criação participativa aberta na internet. Nesse sentido, Andrei Thomaz é o elo da cadeia. Trabalhando preferencialmente no campo virtual, seja na web, seja com monitores e projeções, realizou parcerias com Daniel Escobar e Marina Camargo, atentando para a convergência de preocupações dos três artistas. Em seus trabalhos, individuais ou em parceria, Andrei aborda a questão da dialética entre padrão (abstrato e genérico) e lugar real. O que aparece tanto no mar que se transforma em código de barras (“Horizontal vibrations. Bridget Riley, 1961”), quanto nas paisagens banais de “Changing landscapes” (com Daniel Escobar), onde a sobreposição de fotos de lugares com outdoors gera um trama vibrante de linhas verticais que fratura e reconstrói a imagem daqueles lugares, como que numa montagem pós-cubista-construtivista. Se, por um lado, o brilho das ondas pode ser catalogado como item de uma série, produto de consumo, as paisagens comerciais de outdoors, por outro, podem sair provisoriamente do campo do consumo e adentrar a esfera estética, dada a reorganização aleatória de suas imagens através do padrão geométrico, que esconde a baixa qualidade das fotos originais e do próprio cenário. Dentre os três artistas, Daniel Escobar é quem traz uma reflexão mais próxima à Pop Art, via a corrente chamada “neo-dadá”, também americana, de apropriação de objetos e símbolos ordinários e cotidianos, próprios ao mundo urbano. Daniel trabalha com as paisagens do desejo criadas pelo consumo e pelo entretenimento. Nesse sentido, a cidade ganha ares de sonho, de campo imaterial

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construído pela fantasia, seja pelas dobras de monumentos-ícone de guias turísticos, seja pela criação de caminhos labirínticos através de pequenos mapas impressos em sacolas plásticas de supermercado. Talvez pudéssemos associar os seus trabalhos, em vista disso, à uma certa poesia da rua própria à linhagem BaudelaireOiticica, de que falamos anteriormente. Ocorre que, ao contrário daqueles, os trabalhos de Daniel justamente não buscam a autenticidade da experiência irredutível. Eles se emaranham nas malhas tautológicas do código: uma coisa leva a outra coisa, que leva a outra coisa, e assim sucessivamente. Mas não são solipsistas. Como que a escavar infinitas camadas por debaixo da imagem publicitária, seus trabalhos parecem estar na iminência de desaprisionar fantasmas adormecidos nas cidades, isto é, fantasias latentes sob a face fria do anonimato. Mais próxima da fotografia, Marina Camargo realiza trabalhos cuja limpeza de acabamento revela uma maior proximidade com a tradição minimalista, e com a produção de artistas brasileiros como Iran do Espírito Santo. Em muitos dos seus trabalhos, incluindo-se alguns que não estão presentes na exposição, como “Atlas do céu azul” e “Horizonte”, a artista confronta, ou sobrepõe, diferentes formas de organização espacial: mapa mundi, tecido urbano, cartografia celeste, trama tipográfica etc. O desenho é linguagem, e a alternância entre elementos naturais e culturais, nos trabalhos de Marina, cria um campo comum de coisas significantes, que trata, sempre, de dissolver a noção de limite: continentes que derretem, edifícios que se perdem na bruma, céus e mares intercambiáveis, e cidade que ilumina as estrelas, até chegar a literalmente suprimir a linha do horizonte – limite por excelência –, numa fresta de luz impossível, que revela a artificialidade da operação, e a comutabilidade das coisas. Com isso, a artista coloca em questão a moderna (e hoje anacrônica) oposição entre natureza e civilização como instâncias puras. Através da linguagem artística, seus trabalhos dão tangibilidade àquilo que teóricos como Bruno Latour chamam de um campo híbrido natureza-cultura�, e que é o palco da experiência contemporânea pós-industrial, o nosso verdadeiro “lugar” hoje. Em resumo, manipulando através de diferentes mídias e suportes um conjunto de elementos conhecidos da vivência urbana (mapas, outdoors, guias turísticos, postais, informações de GPS, códigos de barras), Andrei Thomaz, Daniel Escobar e Marina Camargo embaralham essa teia complexa e banal de informações, aludindo a uma espécie de ordem oculta das cidades, frágil e desejante. Sua poética se constrói na fenda aberta entre realidade e representação – uma falsa linha do horizonte, vibrando como um halo mágico entre céu e terra? –, o que quer dizer também, em última análise, na dialética entre paisagem e desenho, universalismo e particularidade, já que tudo é linguagem.

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English Version

sive to the gallery, as the work no longer has a hierarchical centre. On his famous exploratory expedition of the land of his birth (Passaic, New Jersey) on September 30, 1967, Smithson encounters an abandoned industrial scene to which he nevertheless Guilherme Wisnik attaches considerable symbolic weight. He therefore considers tractors, bridges, water pumps and pipes, for example, as “monuments” of the landscape, like fossils of prehistoric animals that existed independent of human actions. He says that the first monument he found on the trip was a bridge across a river, connecting Passaic to Bergen: “Noon-day sunshine cinema-ized the site, turning the bridge and the river into an over-exposed picture. Photographing it with my Instamatic 400 was like photographing a photograph. The sun became a monstrous light-bulb that projected a series of “stills” through my Instamatic into my eye. When I walked on the bridge, it was as though I was walking on an enormous photograph that was made of wood and steel, and underneath the river existed as an enormous movie film that showed 1. 1 The North American artist Robert Smith- nothing but a continuous blank.” The return to Passaic is in that case son made some important works in the a voyage in both space and in time, with late 1960s and early 70s which created a an evocative power that seems to deredialectical relationship between “site” alize the site as materiality, to create a and “non-site”, relativizing the work’s strange system of symbolic equivalence importance as object in favour of the in which map and site mingle together more abstract idea of a path, which was in the extraordinary image of someone a completely new approach at that time. walking over a huge photograph, which is He was thus entering the ideational and a map. A symmetrically opposite position technical mechanism more common to such professionals as architects, topogra- to this appears, as I see it, in some of the phers or geologists, making sketches, lo- works and texts by Hélio Oiticica, such as the Penetrável Tropicália (1967), which calisation maps, photographs and films he describes as follows: “Before making of his exploratory journeys, to be able to these new cabins, I had the idea of ‘aprecord his movement as a counterpoint to the more fixed and essentialist notion propriating’ places that I liked, real placof place, yet without resorting to mimetic es where I felt alive. The Penetrável Tropicália, with its mass of tropical images, representation. Constructing his Earthis actually a kind of condensation of real works in the landscape as a physical acplaces. Tropicália is a kind of map. It’s a tion (site), he transported elements he had collected, such as stones and piles of map of Rio and it’s a map of my imagina2 earth, together with maps and drawings, tion. It’s a map that you can enter.” As we can see, Hélio was also operating with into galleries or museums (non-sites) as the transition between site and non-site, a cultural position complementary to the we might say, but always in the sense initial action – and leaving the absence of those elements in their place of origin of favouring the physical experience of the work, bringing the results of his “deas a negative trace of the action, also lirious wandering“ through the city and documented and displayed at the nonimagination, with its subjective mapping, site. In this way he defined his work as a into spatial installations in which that perpetual dialectical coming and going city-map can be experienced in another between the instances that were both material (site and non-site) and symbolic way: “a map that you can enter”. Another interesting example of (physical and cultural). Hence we can in the same thing appears in his 1978 work fact characterise these works as routes “Manhattan brutalista”. It was the year towards a third thing mediated between places and representations. Along such a when Hélio returned from New York to route, the site (nature) becomes coexten- Rio de Janeiro, and construction works

A hidden order of cities 1 Robert Smithson, “A tour of the monuments of Passaic, New Jersey”, in Jack Flam (ed.), Robert Smthson: the collected writings. Berkeley: University of Califórnia Press, 1996, p. 70.

2 Hélio Oiticica, “Sobre a retrospectiva na Whitechapel Gallery – Entrevista a Guy Brett, 1960”, in César Oiticica Filho et alii (org.), Encontros | Hélio Oiticica. Rio de Janeiro: Azougue Editorial, 2009, p. 60.

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lugares

for the metro under Avenida Presidente Vargas were producing a huge amount of rubble in the district. Oiticica came across a piece of asphalt shaped like Manhattan island, an object “semitrouvé”, which he appropriated and then used as part of the installation “Kyoto Gaudí”, made in the bathroom of his house – once again avoiding cartographic abstraction in favour of materiality. In this case, the arbitrary formal association between a piece of Rio asphalt and the outline of Manhattan is the basis for a reflection on urban archaeology, investing this piece of rubble pulled from the earth – part of the old avenue that had witnessed the parades of Rio’s first samba schools – with a metaphorical significance about the erratic art of wandering, in contrast to the “internment of the museum” or the “fixity of the map”. That is, taking it in praise of underground urban existence, in contrast to the all-seeing and dominant aerial view, the panoptic control of vision and representation of the “bird’s eye”. As Paula Braga asks of this work, “Is Manhattan brutalista a map of Manhattan Island or Rio de Janeiro, after all? Or is it possible to overlap all the maps to form a unique geography?”3 As I see it, discussions along these lines have been updated since the 1990s by artists like Nelson Felix, in works strongly alien to the concept of site-specific, based on new ways of representing the site, extending the time and occurrence of the work. I am referring in particular to a work like “Cruz na América”, produced through a system of art actions on the South American continent (Uruguaiana, the Atacama desert, the Acre jungle and the city of Rio de Janeiro, created based on an arbitrary logic given by geographical coordinates in the shape of a cross, making the conceptual totality of the work only exist as a mental fact that cannot be experienced. In this case, the “public” and objective language of the system of graphic coordinates is taken by the artist as an arbitrary law that will formally organise the work from the outside and give it meaning. Rather than being represented, the places are in this case signified through representation. In a sense, Nelson Félix seems in fact to be stepping on a large map, which is also a kind of over-exposed image. 2. Right from its title (“lugares/representações” [places/representations]), this exhibition demonstrates a clear relationship to this lineage of art works, although not necessarily to those artists mentioned here. Andrei Thomaz, Daniel Escobar and Marina Camargo belong to a genera-

tion for whom Google Earth and the GPS have become commonplace instruments in the intellection of space, bringing real places and their graphic representations closer to each other than ever before in human history. Through these amazing contemporary Alephs, everyone has in a way become architect, topographer or geologist, intimately incorporating knowledge previously considered specific and abstract. Backed by a framework of progressive “unrealization of the world” as an inalienable physical experience – both through postmodern cultural sensibility and through the dissemination of technologies for virtualising space – the three artists are engaged in a mapping of their (our) relationship with the surrounding environment, usually urban. Yet they would never be “poets” of the life of the street, as the Baudelairian flanêur once was, and Hélio Oiticica as well – perhaps as the final representative of that lineage . Their relationships with the city are umbilically mediated through a cloud of codes, whether from cartography, advertising, tourism or even from art, in a context in which notions of original, referent, primary source or authenticity have long since disappeared. Could the urban landscape be an uncontested symbol of order and truth, relating to the extreme trust we place in the sense of sight, and in society as a form of collective organisation? Might there not be, behind this appearance, an infinite number of repressed or latent possible universes that could be glimpsed through any kind of disturbance, even arbitrary, of this visible order? Starting from questions such as these, Andrei, Daniel and Marina have engaged in different forms of mapping urban conditions – their formal fabric and their imagery qualities – , to produce works that do not reproduce real places but “invent” new places. Rejecting the idea of the work as an “object”, these young artists work with webs of information, creating speculative nonsites that are not based on sites in terms of a concrete experience of place. The planet for them is entirely manipulable, like a game, and the entanglement of these webs, such as occurs in “Eclipses” (Andrei Thomaz and Marina Camargo), reveals this process of emancipation of the code in relation to the thing in itself, to suggest the possibility of glimpsing a kind of hidden order of things (cities), which the immediate experience of the individual can never discern through looking and walking. This conception of art and space is mirrored in the artists’ practice itself. Working on different supports and with

3 Paula Braga, A trama da terra que treme: multiplicidade em Hélio Oiticica, Tese de Doutorado. São Paulo: FFLCH-USP, 2007, p. 140.

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different media (photography, billboard paper, books, cut wood, acrylic sheet, light boxes, plastic bags, video projection, computer images), they problematize the notion of authorship, sometimes making works in pairs, and in some cases focused on open creative participation via the internet. In this sense, Andrei Thomaz is the link in the chain. Preferring to operate in the realm of the virtual, whether on the web or with monitors and projections, he has worked in partnership with Daniel Escobar and Marina Camargo, conscious of the convergence of the three artists’ concerns. In his individual works or those made in partnership with others, Andrei addresses the issue of the dialectic between pattern (abstract and generic) and real place. This appears both in the sea that is transformed into barcode (“Horizontal vibrations. Bridget Riley, 1961”) and in the banal landscapes of “Changing landscapes” (with Daniel Escobar), where overlapped billboard photos of places create a vibrant weave of vertical lines that breaks up and reconstructs the image of those places like a post-cubist-constructivist montage. If on the one hand the dazzle of the waves can be catalogued as an item from a series, a consumer product, on the other hand the commercial billboard landscapes can temporarily leave the world of consumption and enter the realm of aesthetics, through the random reorganisation of their images as geometric pattern, which hides the poor quality of the original photos and the scene itself. Of the three, Daniel Escobar is the artist who reflects more closely on Pop Art, through the American practice, known as “neo-dada”, of appropriating commonplace everyday objects and symbols from the urban surroundings. Daniel works with the landscapes of desire created by consumption and entertainment. The city thus takes on a dreamlike air of immateriality constructed by fantasy, through the folds of iconic monuments from tourist guides or the creation of labyrinthine paths from tiny maps printed on supermarket plastic bags. We might therefore be able to associate his works with a kind of poetry of the street itself along the lines of Baudelaire-Oiticica, whom we spoke of earlier. Daniel’s works, however, specifically do not seek the authenticity of irreducible experience. They become entangled in the tautological mesh of code: one thing leads to another, which leads to something else, and so on. But they are not solipsistic. As they dig beneath infinite layers of advertising imagery, his works seem to be on the verge of releasing the sleeping

ghosts of the cities, latent fantasies in the cold face of anonymity. Closer to photography, the clean finish of Marina Camargo’s works displays greater proximity to the tradition of minimalism and the work of Brazilian artists like Iran do Espírito Santo. In many of her works, including some that are not present in this exhibition, such as “Atlas do céu azul” and “Horizonte”, the artist contrasts or overlays different forms of spatial organisation: the map of the world, urban fabric, celestial chart, typography, etc. Drawing is a language and the interchange between natural and cultural elements in Marina’s works creates a common ground of significant things, always concerned with dissolving the idea of boundary: continents that shift, buildings fading in the mist, interchangeable seas and skies, and the city that lights up the stars until literally supressing the horizon line – that quintessential boundary – into an impossible crack of light that reveals the artificial nature of the operation, and the commutability of things. In this way, the artist addresses the modern (and nowadays anachronistic) contrast between nature and civilisation as pure states. Her works use the language of art to bring tangibility to what theorists like Bruno Latour call a hybrid field of nature-culture4, which is the setting for contemporary post-industrial experience, our real “place” today. In conclusion, Andrei Thomaz, Daniel Escobar and Marina Camargo use different media and supports to manipulate a set of familiar elements from urban experience (maps, billboards, tourist guides, postcards, GPS information, barcodes) to shuffle the complex and banal web of information in allusion to a kind of hidden order of cities, fragile and aspiring. The poetics is formed in the gap between reality and representation – a false horizon vibrating like a magic halo between heaven and earth? ­–, which also means, in the final analysis, in the dialectic between landscape and drawing, universalism and particularity, since it is all language.

4 See Bruno Latour, Jamais fomos modernos: ensaio de antropologia simétrica. São Paulo: Editora 34, 2005.

Translated by Nick Rands

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Gabriel Menotti

O mapa como matéria–prima

1. As fractais imagens de satélite, alinhadas por GPS com a própria circunferência da Terra, parecem ter tornado supérfluo tudo o que até então constituía a arte e ciência dos mapas. Pode ser que o Google logo provoque na cartografia um efeito semelhante ao que a popularização da foto, ao final do século XIX, causou na pintura. Isenta da tarefa de representar territórios e percursos, a cartografia poderia atingir sua fase impressionista, tornando-se sobretudo um exercício formal. Depois, passaria a um segundo estágio, em que o mapa voltaria a ser um instrumento, mas agora dedicado à critica da lógica figurativa a que por tanto tempo se prestou. Uma coisa levaria a outra e, logo adiante, certamente teríamos os defensores do mapa-pelomapa, nos arrastando de volta ao ponto de partida. Talvez essa metamorfose seja questão de tempo. Talvez já tenha acontecido mas, dada a sua natureza cíclica, seja impossível perceber. Ou talvez nunca aconteça porque, pós-modernos que somos, entendemos de antemão que nenhuma tecnologia é idônea – quanto mais de representação, quanto mais automatizada. Não esperamos do GPS, com os seus erros pré-programados, uma revelação semelhante à dos primeiros daguerreótipos. Esse instrumento parte de pressupostos: já sabemos que a América está lá; só precisamos confirmar a melhor forma de atravessá-la na hora do rush. Enquanto isso, o Google Maps serve de pretexto tanto para o marketing1 quanto para erros militares.2 Não seria errado dizer que a cartografia também segue sua vocação secular, como um campo de especulações econômicas e políticas. Em larga medida, o mapa nunca representou território algum. O mapa produziu o território, colocando o norte por cima, a Europa no centro e a Inglaterra proporcionalmente maior do que ela realmente é. Logo, a verdadeira

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1 http:// googlesightseeing. com/2007/11/worldslargest-kfc-logo/

2 http://www. wired.com/ dangerroom/2010/11/ google-mapserror-blamed-fornicaraguan-invasion/

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diferença entre novas e velhas tecnologias de mapeamento – a cartografia antes e depois do GPS – não está tanto na precisão técnica nem nos preceitos semióticos, mas no seu ritmo de uso e informação. A cartografia vive uma Era da Abundância e Desperdício. Houve uma época em que fazer um mapa era um ofício laborioso, que custava anos de pesquisa, cálculo e artesanato – e, mesmo assim, não produzia mais do que uma aproximação do percurso, destinada a sucessivas revisões. Já hoje, basta sair com um celular no bolso e, graças às discretas triangulações de sinal, o mapeamento se faz rigoroso e inevitável. Mas se os continentes já foram todos descobertos e não há lugares novos a conhecer, que fim podemos dar a esse superávit de representação? 2. Há trabalhos de Daniel Escobar que reduzem o mapa – e a foto de divulgação turística – a uma mera substância. O artista parece ir à ephemera publicitária como quem vai a um fosso de argila, e de lá retira esse material. Enquanto o clichê se dilui (como barro), seus sinais característicos se acumulam (como ruído), mas sem jamais atingir um estado plenamente maleável, de papier-mâché. O que sobressai de obras como Plano Diretor e Cidades Azuis, por exemplo, não são seus contornos particulares ­– que, colaterais ao processo constitutivo, arrisco dizer que poderiam ser outros. Mais do que formas próprias, o que reconhecemos nessas obras são vestígios de formas alheias, que inusitadamente resistem à homogeneização, do mesmo modo que o design industrial resiste nas Acumulações de Arman. No par que As Cidades e o Desejo faz com Palácio das Esferas, fica ainda mais claro como a obra se torna um fundo contra o qual o clichê cartográfico, cirurgicamente mutilado, reassume o papel de figura. As fachadas de papel, enraizadas nas páginas de guias turísticos, revelam-nos como pedestais: são condições de existência de uma Belo Horizonte impossivelmente única. Já Perto Demais resulta de um procedimento de superimposição semelhante aos de Idris Khan, e nos leva a perguntar se o esforço de homogeneizar ícones não termina por depurá-los de sua iconicidade. Portanto: destilada a vaga impressão do lugar, o que resta no mapa além de uma certa ordem que se impõe aos elementos da legenda? 3. Um mapa também pode ser encarado como um diagrama ou um esquema retórico. Logo, outra forma de se apropriar da representação do lugar é como um método de organização. Por essa via, Marina Camargo produz seus Horizontes Simulados e cria bases para o colaborativo Open Horizons Project. Nesse sentido, seu trabalho é o perfeito contrário do de Daniel: enquanto ele produz uma Belo Horizonte transcendental a partir de clichês cartográficos, ela extrai de sua sintaxe o próprio Horizonte platônico. As obras de Marina também sugerem que a cartografia, senão natural, é pelo menos um sintoma de estar-no-mundo. O alinhamento entre o céu e a terra não é dado por nenhuma ciência,

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mas pelo mero olhar. A projeção calculada do território (no plano) decorre da inevitável projeção do olhar (no território), ressaltando pontos de referência e marcos de orientação. Antes que pudesse desenhar os oceanos, o homem precisou estabelecer coordenadas celestes. Como em Some Air in Between, as constelações são metáforas projetadas a partir dos contornos da civilização. É por isso que as que nos acompanham desde a Idade Antiga têm nomes de deuses e bichos, enquanto as que apareceram no século XVIII foram batizadas em homenagem ao microscópio e ao relógio.3 O jogo de camadas de Universo Paralelo ilustra o mesmo paradoxo: ­que o céu seja na verdade iluminado por baixo, pela imaginação ou pela técnica das cidades que encoberta. Mas esse outro trabalho também sugere o seguinte resultado: que, se tornando referência, a metáfora obstrua os contornos do lugar – criada pelo olhar e para o percurso, a cartografia se torne um entrave para ambos. Como em The End, a orientação da imagem substitui sutilmente a do mundo e não parece haver trapaça, porque não esperamos do mapa nenhuma lógica, somente um prumo. 4. O que a evocação do espaço sobre a terra deveria nos lembrar é que, finalmente, o mapa é uma perspectiva, mas que nunca é somente nossa, por mais que coincida com a nossa exata posição. Assim, todo mapa representa pelo menos dois lugares: o primeiro como imagem, a que ele se refere; e o segundo como negativo, de que ele resulta. Esse outro lugar pode ser do alto de um platô, onde todo o território se dá a ver sem embaraços, ou de dentro de um computador, que calcula com precisão a distância daqui até a fronteira. Da mesma forma que esses outros lugares estão contidos no mapa, também estão os processos de mapeamento e suas ferramentas, como vestígios. É através deles que se desdobra o trabalho de Daniel e Marina, em suas parcerias com Andrei Thomaz, como se entrassem em loop. Em Changing Landscapes, a imagem-informação, que normalmente serve como atestado de uma presença específica, é ela própria apresentada como um clichê, num amálgama semelhante ao de Perto Demais. Eclipses, por sua vez, parece desenvolver o tema de Universo Paralelo – mas aqui, estabelecido o ponto de referência, é uma cidade que recorta outra e mais outra, até produzir o céu de nenhuma delas. Nos trabalhos em que Andrei atua sozinho, o mapa atinge um nível ainda mais arbitrário de manipulação. Enquanto Marina se apropria das sintaxes cartográficas como um gabarito, Andrei as expõe como um sistema de jogo. Em GPS São Paulo, os parâmetros de orientação que pareciam inevitáveis contingências novamente se revelam circunstanciais, visto que mesmo origem e destino são decididos ao acaso, e o jogador-viajante pode interromper sua partidapercurso quando bem entender. Esse abuso é levado às últimas consequências no par Horizontal Vibrations e Movement in Squares, em que os padrões de clás-

lugares / representações

3 http://www.astro. wisc.edu/~dolan/ constellations/extra/ Lacaille.html

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sicos da op art são aplicados a vídeos comprados em bancos de imagem. O diagrama mais icônico esquadrinha o clichê mais genérico; aí, parece que finalmente sucumbem tanto a regra quanto a figura, trazendo à tona a forma particular das próprias obras. Paradoxalmente, são formas que parecem escavadas de algures, de algum sítio arqueológico da web vernacular;4 são formas que parecem guardar o aviso de que nessa Era também a historiografia é excessiva, mas ainda não conseguiu nos levar além do tempo –­ e os mapas, por vários que sejam, jamais esgotarão o espaço.

4 http://art. teleportacia. org/observation/ vernacular/

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English Version

north at the top, Europe in the middle and England proportionally bigger than it really is. Therefore, the true difference between new and old mapping technologies – cartography before and after the GPS – lies neither in technical accuracy nor in semiotic precepts, but in its Gabriel Menotti rhythm of use and information. Cartography is living through an Era of Abundance and Waste. There was a time when map making was a laborious craft, involving years of research, calculation and skill – and even so, it produced no more than an approximation of route, subject to successive revisions. Nowadays, though, it is enough to go out with a cell phone in one’s pocket and, thanks to discrete triangulations of signal, mapping is firm and inevitable. But if the continents have already been discovered and there are no new places to explore, what purpose must we give to this surplus of representation? 1. 2. Fractal satellite images, aligned to the circumference of the earth by GPS, seem There are works by Daniel Escobar that reduce the map – and the tourism-marto make everything that has hitherto keting photo – to mere matter. The artist formed the art and science of maps seems to go to advertising ephemera like superfluous. Perhaps Google will soon someone going to a clay pit and extracthave the same effect on cartography as the photo had on painting in the late 19th ing material from it. While the cliché is century. Freed from the task of represent- diluted (like mud) its characteristic signs accumulate (like noise), but never reach ing routes and territories, cartography could move into its impressionist phase, a fully malleable state of papier-mâché. The thing that stands out from becoming above all a formal exercise. works like Plano Diretor and Cidades Then it would move into a second stage, in which the map would go back to being Azuis, for example, is not their particular outlines – which, as a result of the conan instrument, but now concerned with structive process, I would suggest could criticism of the figurative reasoning for be different. Rather than their own forms, which it was employed for so long. One what we recognise in these works are thing would lead to another and, sooner or later, we would soon have defenders of vestiges of other forms, which unusually resist homogenisation, in the same way the map for its own sake, taking us back that industrial design persists in Arman’s to where we started. Perhaps that metamorphosis is just Accumulations. As Cidades e o Desejo and Palácio a matter of time. Maybe it has already das Esferas, make it even clearer how happened, but given its cyclical nature, the work becomes a background for the it is impossible to notice. Or perhaps it cartographic cliché, surgically mutilated, will never happen, because postmodern as we are, we already understand that no to take the role of figure. The facades of paper, with their roots in the pages of technology is perfect – no matter how representational or automated it may be. tourist guides, reveal them as pedestals: they are the conditions of existence of an We do not expect the GPS, with its builtimpossibly unique Belo Horizonte. in errors, to offer a revelation similar Perto Demais results from a proceto that of the first daguerreotypes. The instrument starts from suppositions: we dure of superimposition, similar to those of Idris Khan, leading us to ask whether already know that America is there; we the effort of homogenising those icons just need to check the best way of crossdoes not end up denuding them of their ing it during rush hour. In these terms, Google Maps serves very nature as icons. Therefore: when distilled to a vague impression of place, both as a pretext for marketing1 and for military errors2. It would not be wrong to what remains of the map other than a certain order imposed on the elements of say that cartography maintains its secuthe legend? lar vocation, as a field of economic and 3. political speculation. To a great extent, A map can also be seen as a diagram or a the map never represented any territory. rhetorical schema, and thus another way The map produced territory, placing

The map as raw material

1 http:// googlesightseeing. com/2007/11/worldslargest-kfc-logo/

2 http://www. wired.com/ dangerroom/2010/11/ google-mapserror-blamed-fornicaraguan-invasion/

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representações

of making use of the representation of space is as a method of organisation. Marina Camargo produces her Horizontes Simulados along such lines, creating the underpinnings for the collaborative Open Horizons Project. Her work is therefore the perfect opposite of Daniel Escobar’s: while he produces a transcendental Belo Horizonte from cartographic clichés, she extracts the platonic Horizonte itself from its syntax. Marina Camargo’s works also suggest that cartography, if not natural, is at least a symptom of being in the world. The alignment of heaven and earth does not come from any science, but merely from looking. The calculated projection of the territory (on the plane) results from the inevitable projection of the gaze (over the territory), highlighting reference points and orientation marks. Before being able to chart the oceans, mankind needed to establish celestial coordinates. As in Some Air in Between, the constellations are metaphors projected from the outlines of civilisation. Which is why the ones that have been with us since the Middle Ages have the names of gods and animals, while those that appeared in the 18th century where christened in homage to the clock and the microscope3. The interplay of layers in Universo Paralelo illustrates the same paradox: that the sky is in reality illuminated from below, by the imagination, or by the devices of the cities it covers. But this other work also suggests that, taken as reference, the metaphor obstructs the outlines of place – created by the gaze and for the movement, cartography becomes an obstacle for both. As in The End, the orientation of the world is subtly replaced by that of the image, which is not a deceit because we were not expecting any logic from the map anyway, just guidance. 4. The evocation of the sky over the earth should remind us that the map is, after all, a perspective, but that is never just ours, no matter how much it coincides with our exact position. Every map therefore represents at least two places: the first as an image, which it refers to; and the second as a negative, what it results from. That other place can be from the top of a plateau, where the whole territory can be seen without interruption, or inside a computer, which can accurately calculate the distance from here to the border. Just as those other places are contained in the map, so are the processes of mapping and their tools, as traces. In their partnerships with Andrei Thomaz,

the work of Daniel and Marina unfolds through those processes, as if going into a loop. In Changing Landscapes the image-information, which normally serves as evidence of a specific presence, is itself presented as a cliché, in an amalgamation similar to the one in Perto Demais. Eclipses seems in turn to develop the theme of Universo Paralelo – but here, once the reference point is established, it is one city that cuts across another and then another until the sky of none of them is produced. In the works in which Andrei operates alone, the map reaches an even more arbitrary level of manipulation. While Marina appropriates cartographic syntax as templates, Andrei reveals them as a game system. In GPS São Paulo, the parameters of orientation that seem to be inevitable contingencies are once again shown to be circumstantial, since even origin and destination are decided at random, and the player-traveller can interrupt the sessions-route at will. This excess is taken to its ultimate conclusion in the pair of works entitled Horizontal Vibrations and Movement in Squares in which classic patterns of op art are applied to videos purchased from image banks. The most iconic diagram frames the most generic cliché; it seems that now both the rule and the figure have finally succumbed, revealing the particular form of the works themselves. Here are forms that paradoxically seem to have been excavated from somewhere else, from some archaeological site of the vernacular web;4 they are forms that seem to contain the warning that historiography is also excessive in this Era, but has still not managed to take us beyond time – and maps, however varied they may be, will never cover every space.

3 http://www.astro. wisc.edu/~dolan/ constellations/extra/ Lacaille.html

4 http://art. teleportacia. org/observation/ vernacular/

Translated by Nick Rands

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lugares

Eduardo Veras

Entrevistas

Transparências da comunicação

O advento da arte moderna na segunda metade do século XIX está atado a uma expansão dos discursos em torno da arte. A crescente oferta de textos e falas – críticas, ensaios, biografias, manifestos – inclui também as entrevistas com artistas. Pouco a pouco, ao longo do século XX, sobretudo a partir dos anos 1950, precisamente quando começam a rarear os textos mais programáticos, aqueles em que os artistas anunciavam seus projetos de ação, ganha mais e mais força a prática da entrevista. Nas duas décadas seguintes, na guinada do moderno para o contemporâneo, as entrevistas passam a ser pensadas como fontes mais diretas de contato com o pensamento dos artistas. É como se a conversa parecesse, quando não uma alternativa, ao menos um complemento aos textos de críticos, historiadores e até mesmo teóricos. Na expressão de Gabrielle Detterer, as entrevistas expressam “o desejo de uma comunicação transparente”. Anota a crítica e entrevistadora italiana: “Declarações e entrevistas (...) não oferecem soluções e interpretações definitivas; são documentos que auxiliam a pessoa interessada em arte a fazer uma abordagem metódica do

processo de criação, e são fontes a serem exploradas na busca por respostas às perguntas sobre a origem e os determinantes das obras de arte” . Nas entrevistas a seguir, três jovens artistas – Andrei Rubina Thomaz, Daniel Escobar e Marina Camargo – apresentam não leituras exclusivistas e irrefutáveis sobre seus próprios trabalhos. Ao contrário. No diálogo com outro, eles partilham dúvidas, discutem as origens possíveis de suas obras e seus interesses, revisam os percursos de formação e invenção artística. As distâncias (estava cada um em uma cidade diferente: Andrei em São Paulo, Daniel em Belo Horizonte, Marina em distintos pontos da Alemanha, o entrevistador em Porto Alegre) levaram à escolha pelo formato do e-mail. O ritmo é diverso daquele da conversa presencial, as respostas podem ser mais refletidas, mais pensadas, mas, de qualquer jeito, não se perde o tom espontâneo, nem o sabor do encontro. Na comparação entre uma entrevista e outra, emergem as grandes diferenças mas também as aproximações entre os três artistas. Mais do que tudo, consolida-se o desejo de uma comunicação transparente. Verão de 2011

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representações

Interviews

Transparencies in communication

The advent of modern art in the mid 19th century is tied to an expansion of discourse about art. The growing availability of texts and statements – criticism, essays, biographies and manifestos – also includes interviews with artists. Throughout the 20th century and particularly from the 1950s, precisely when more programmatic texts in which artists announced their plans of action begin to become rarer, the practice of the interview gradually becomes stronger. In the next two next decades, during the shift from the modern to the contemporary, interviews begin to be considered as more direct sources of contact with artists’ thinking, as if discussion seems, if not an alternative, at least a complement to the texts of critics, historians and even theorists. As the Italian critic and interviewer Gabrielle Detterer puts it, interviews foster “a desire for transparent communicating”, noting that, “statements and interviews (...) offer no final solutions or interpretations; they are working papers that assist the person interested in art in a methodical approach to the process of making art; and they are sources to be

explored in search for answers to questions about the origins and determinants of artworks.” In the following interviews, three young artists – Andrei Rubina Thomaz, Daniel Escobar and Marina Camargo – do not offer exclusive and irrefutable readings of their own works, but rather, in discussion with the other, share doubts, discuss the possible sources of their works and interests and review the paths of artistic invention and education. Choice of the email format was determined by distance (each was in a different city: Andrei in Porto Alegre, Daniel in Belo Horizonte, Marina in different parts of Germany, the interviewer in Porto Alegre). The rhythm is different from that of physical conversation, responses can be more reflective and considered, but they in no way lose a sense of spontaneity or the flavour of a meeting. Comparison of one interview with another reveals great differences, but also proximities between the three artists. More than anything, the desire for transparent communicating is reinforced. Summer 2011

Translated by Mariana Bandarra

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lugares

Entrevista realizada por Eduardo Veras

comecei a ver nas artes um desafio ainda maior do que na informática. Isso porque a maior parte dos problemas computacionais é, em sua essência, uma questão de tempo e dinheiro. Tendo tempo e dinheiro, você resolve quase tudo. Na arte não ocorre o mesmo. Podes falar mais um pouco a respeito desse percurso – do computador em direção às artes visuais? Como se deu a opção pelo Instituto de Artes? É um pouco curioso. Eu e meus irmãos ganhamos um computador ainda adolescentes, e eu fiz alguns cursos de informática. Continuei a estudar sozinho e passei a ter uma noção razoável de programação. Tudo se encaminhava para uma opção por Computação quando alguns softwares de computação gráfica despertaram meu interesse pela área visual. Além disso, já havia uma intuição de que para atuar na área de informática não é necessário ter uma graduação específica. Aliás, o mesmo se dá nas Artes. Em relação ao Instituto de Artes em si, não havia maiores questionamentos na época. Isto é, em Porto Alegre, não havia e não há, até onde eu sei, outro curso de graduação em Gostaria de saber da tua infância. O que teus pais faziam? Como foi a apro- Artes Plásticas que não seja limitado à licenciatura. O único curso que eu ximação com as artes visuais? conheço, além do IA é o da Feevale. Mas Passei minha infância em Grauma faculdade particular não era uma vataí, onde residi até me mudar para São Paulo. Fiz o Ensino Médio em Porto opção. E desconfio que naquela época eles não ofereciam o bacharelado em Alegre (Escola Estadual Dom João Becker) e, depois, a graduação em Artes Artes Plásticas. O que no IA foi mais decisivo em Plásticas. tua formação? Quais as referências Meu pai é engenheiro mecânico importantes? e minha mãe deixou de trabalhar fora Acho que os momentos mais imquando chegou ao Brasil, dedicando-se portantes foram dois. Primeiro, os pria nós quatro (tenho três irmãos). Na meiros semestres, quando eu possuía infância, não tive muito contato com uma curiosidade enorme em relação à artes visuais, mas, em compensação, arte contemporânea. Foi uma época em tive bastante contato com literatura. que estudei muito sobre movimentos Além disso, desde cedo tinha acesso como a Arte Conceitual e o Minimalisa publicações de divulgação científica (mais voltadas para leigos). Lembro que mo. Esse momento ainda se faz presente na minha produção, mas de uma meus pais assinavam a SuperInteressante, e eu adorava. Também me lembro forma mais sutil. Acho que muitos dos meus trabalhos são econômicos na sua de alguns livros de Astronomia para linguagem, procurando ser bastante crianças. precisos. Apesar de eu ter um domínio Assim, minha aproximação com de programação razoável (a ponto de as artes visuais foi um tanto tardia. Acho que o primeiro contato foi através viver disso, atuando no mercado publicitário de São Paulo), o high tech não me de meu tio, que é professor e artista plástico. Apesar de eu não acompanhar deslumbra (pelo menos, eu espero que não). Desconfio que isso se dá muito o trabalho dele na época, foi o primeiro em função desse período e da produção artista em “carne e osso” que conheci. Na adolescência, eu tinha um interesse artística sobre a qual me debrucei. O segundo momento, que já se muito maior por computadores e deu na forma de um deslocamento do informática, apesar de naquela época Instituto de Artes, foi quando a profesainda não termos Internet. Comecei a sora Eny Schuch me convidou para ser me interessar pelo universo das artes visuais em função do meu contato com seu bolsista em um projeto de pesquisa softwares gráficos. E, já naquela época, na área de Informática da Educação. A

Entrevista com Andrei Thomaz

PacMan e o Minotauro Andrei Tomaz

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representações

Para desenhar com os olhos. Para percorrer com os olhos Andrei Tomaz

pesquisa era realizada na Faculdade de Educação, não no IA. Aceitei o convite e em seguida me propus pesquisar o que estava sendo feito na área de net art e novas mídias. Foi quando todo o meu interesse por programação voltou, e eu passei a fazer os meus primeiros trabalhos na área. Hoje não consigo me lembrar se, em algum momento, percebi que não haveria mais retorno ao que eu vinha fazendo nas disciplinas do IA. Mas é claro que ter me dedicado alguns anos a fazer trabalhos “concretos” foi uma experiência importante, e que se faz presente até hoje, principalmente quando me proponho o problema de expor um trabalho em uma galeria, e não apenas na web. Você aborda a questão de um ponto de vista diferente do de quem já começou com mídias tecnológicas. Mencionaste que as artes visuais te pareceram um desafio maior do que a informática. Quais os problemas que te ocupam, hoje, no campo das artes visuais? Existe uma questão que me interessa particularmente, que é a de atuar entre os campos das artes visuais e da arte e novas mídias. Por motivos que, para mim, estão longe de serem de ordem artística e/ou intelectual, esses campos se desenvolvem de forma cada vez mais separada e isso me incomoda. Não vejo como as artes visuais podem prescindir do uso de novas mídias – afinal, elas transformam o mundo e a nossa maneira de percebê-lo – assim como a exploração dessas mídias não pode dar-se de forma desinformada, deixando-se levar por uma espécie de sedução tecnológica. São poucos os artistas que atuam entre os dois campos, mas eles me interessam muito. Como exemplos, poderia citar a dupla JODI e o artista americano Cory Arcangel. Entre os brasileiros, a dupla Detanico e Lain é uma das que eu mais admiro. Conta um pouco mais sobre essa ideia de que o campo das artes visuais e o campo das artes e das novas mídias se desenvolvem de forma cada vez mais separada. Isso ocorre, de fato, de forma cada vez mais separada? Acho que isso ocorre no sentido pragmático, em termos de circuitos que se desenvolvem de formas distintas. Com algumas intersecções, é verdade, mas ainda permanece a sensação de que a arte e novas mídias é um campo à parte. Pelo menos em São Paulo essa sensação é muito forte. Tenho a impressão de que os fatores que causam essa situação são, de certa forma, extra-artísticos. Por exemplo, o mercado de arte é algo que

ajuda nessa separação, já que qualquer coisa envolvendo recursos tecnológicos é mais difícil de vender (e caro de expor). Os acadêmicos contribuem para essa separação com seu hábito de delimitarem novos feudos (campos de pesquisa), os quais eles possam dominar. Artistas e outros produtores ligados à arte e novas mídias veem na ligação com a tecnologia uma forma de assegurar patrocínios e verbas que seriam mais difíceis de obter com projetos mais ligados às artes visuais. Isto é, há forças reforçando esta separação dos dois lados. Por outro lado, todos estão no Facebook e ignoram que ele e outras redes sociais podem ser uma plataforma para experimentações artísticas. É maluco. Como se articulam a tua prática artística e a tua prática profissional na área de informática? Como já foi comentado aqui, são campos distintos, mas imbricados. Em que medida estão separados e em que medida se embaralham? Para responder a essa pergunta, me parece importante voltar ao momento em que comecei a trabalhar com mídias digitais, a explorá-las artisticamente. Eu estava no meio do curso de graduação em Artes Plásticas, quando a professora Eny Schuch convidou-me para trabalhar com ela como bolsista de iniciação científica. Seu projeto de pesquisa estava sendo desenvolvido não no IA, mas na Faculdade de Educação, onde já havia um forte interesse pelo uso de tecnologias na educação, assim como pela educação à distância, e a bolsa era para trabalhar nessa área. Nessa bolsa eu comecei a estudar ferramentas para a criação de sites, HTML, 3D para Internet, etc. Bom, era a época do Flash 5, o que dá uma ideia de quanto tempo faz isso... Depois de um tempo, comecei a fazer trabalhos para conhecidos e, após a bolsa, a trabalhar com algumas agências e empresas de Porto Alegre. Aí acho que as práticas artística e profissional já haviam se articulado para a forma como, de certa maneira, estão até hoje. Voltei a estudar programação em função dos trabalhos artísticos que queria fazer, mas, em seguida, as coisas se misturaram. Há tecnologias que estudei para dar conta de projetos desenvolvidos para clientes, e que depois foram úteis em projetos artísticos. O contrário também ocorre: a pesquisa feita para um trabalho artístico pode me ajudar a resolver um projeto comercial. E isso se dá em outros níveis também. Alguns clientes, em função da

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lugares

Labirintos Invisíveis Andrei Tomaz

Dédalo e Ariadne Andrei Tomaz

minha prática artística, me procuram quando precisam de algo “fora do padrão”, algo que exija uma tecnologia que não seja muito utilizada, algo que fuja do dia a dia das peças publicitárias digitais. Ao mesmo tempo, o meu trabalho como desenvolvedor comercial me permite levar a minha prática artística adiante. Por outro lado, minha prática como desenvolvedor também me desestimula a ver a prática artística como sendo, antes de mais nada, a exploração das possibilidades das novas tecnologias. Isto é, muitos artistas que trabalham nessa área veem o seu trabalho dessa forma, mas não é o meu caso. Isso porque o mercado publicitário gosta tanto de utilizar a palavra inovação, está todo dia buscando utilizar os últimos lançamentos em novas campanhas, etc., que isso não funciona como um estímulo para mim, em termos artísticos. É óbvio que eu trabalho, principalmente, com mídias digitais, mas o meu foco nunca está nas tecnologias mais recentes, por si sós. No geral, os meus projetos comerciais são bem mais complexos do que a maior parte dos projetos artísticos, em termos técnicos, e não me sinto atraído a inverter essa situação. Como viabilizas tua produção artística, já que dificilmente ela pode ser comercializada? Ainda vejo os trabalhos que utilizam mídias digitais como algo que circula com dificuldade no mercado de arte. Li o depoimento de um galerista, no livro da Sara Thornton, em que ele dizia que “os colecionadores não gostam de nada que seja necessário ligar”. Claro que isso pode mudar, e que há exceções, mas no geral é esse o cenário. Assim, os artistas que trabalham com novas mídias precisam buscar outras estratégias. Alguns vão para a universidade ou outras instituições que podem apoiá-los. Outros desenvolvem algum tipo de trabalho relacionado à tecnologia, o que lhes permite continuar com as suas práticas artísticas. Esse trabalho pode ser alguma prestação de serviço, ou algum projeto ligado à inclusão digital, etc. Eu optei pelo caminho da prestação de serviços, apesar de ainda manter alguma ligação com a academia (no momento, dou aula em dois cursos diferentes em São Paulo). Parece-me um caminho interessante, no sentido de que isso me permite não me afastar das atividades mais práticas, do “meter a mão na massa”. A academia me assusta nesse aspecto, com seu excesso de burocracia e com o tempo que exige

que seus professores dediquem a atividades que, infelizmente, são mais administrativas do que qualquer outra coisa. Tenho a intuição de que continuar com “a mão na massa” é fundamental para a minha prática artística. O meu conhecimento da linguagem, a maneira como eu penso e como articulo os meus trabalhos, deve muito ao fato de que, o tempo todo, eu preciso reavaliar o que é possível fazer com determinados meios, e como utilizá-los para uma determinada tarefa. A minha relação com alguns softwares é de extrema familiaridade; acho que não é muito diferente da forma como outros artistas se relacionam com seus meios de trabalho, mesmo que esses sejam os mais tradicionais possíveis. Mas voltemos à questão da viabilização. Trabalhar como desenvolvedor comercial me permite manter o equipamento necessário para o desenvolvimento dos meus trabalhos. Além disso, na maioria das exposições das quais participei, onde fui responsável pela montagem dos meus trabalhos, incluindo aí os dispositivos necessários para exibi-los, eu utilizei equipamentos que já haviam sido meus instrumentos de trabalho e que rumavam para a aposentadoria. Isso porque não posso trabalhar com um computador que tenha 1 giga de RAM, mas ele é o suficiente para rodar a maior parte dos meus trabalhos numa exposição. Também posso precipitar uma troca de equipamento, a fim de liberar um computador nem tão velho assim, para utilizá-lo numa exposição, pois ele já terá se pagado com alguns projetos comerciais. Por fim, também posso adquirir um equipamento especialmente para expor um trabalho, se ver nele uma possibilidade de reutilização posterior, no meu dia a dia. Também é importante citar a questão do know-how. Muitos amigos meus encontram dificuldades ao tentar executar um trabalho que exija recursos digitais. Precisam recorrer a amigos ou a prestadores de serviços, o que, muitas vezes, atravanca o processo e implica em custos extras. Esse problema simplesmente não existe para mim, de modo que eu posso me concentrar no trabalho em si, e não preocupar-me tanto em “como vou realizar isso?”. O mercado me obriga a manter o meu conhecimento tecnológico atualizado, e isso tem o seu lado positivo. Acredito que teu trabalho, mesmo quando funciona como um jogo de computador, tem uma referência forte no desenho. Não se trata apenas de percorrer os labirintos, um dos teus

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representações

Cubos de Cor Andrei Tomaz

temas mais frequentes, mas também de desenhá-los. Pode ser? Sim, essa ideia de que é possível ser um arquiteto de labirintos (e não apenas um transeunte ou um prisioneiro) é importante em muitos trabalhos. Para alguns, talvez chegue a ser fundamental. Existe sempre a preocupação de tentar jogar com a forma como o espectador mapeia os espaços e os seus percursos. Jorge Luis Borges, muito claramente, é referência importante para ti. Lembro que ele dizia (não lembro bem onde) que o curioso nos labirintos é que eles são configurações arquitetônicas concebidas para que as pessoas se percam, e não para que se encontrem. Nesse sentido, parece que os teus jogos (ao menos para um jogador inábil como eu) são tramados para que a gente de fato nunca se encontre. Tua motivação na criação deles tem a ver com isso? Pensando no caso dos trabalhos que possuem uma relação mais forte com o jogo, diria que sim. Em alguns, gostaria que o espectador percebesse a intensidade dos seus esforços em mapear algo que está se desmanchando, como no caso dos Labirintos invisíveis. Ou, então, como ele consegue mapear algo que nunca lhe é dado de forma mais representativa, visual. Penso aqui nos Cubos de cor, onde o espaço nunca é representado através de um desenho em perspectiva; ele é apenas descrito e, no final, resumido com uma animação de retângulos sobrepostos. Retângulos apenas, que criam profundidade apenas pelo contraste das suas cores, tal como na série de Albers, Homenagem ao quadrado. Consegues determinar o que exatamente te mobiliza na ideia de labirinto? Pelo que eu consigo lembrar, me interesso por labirintos desde o início da minha graduação. Ou seja, é um interesse longevo. Muitos aspectos do labirinto já me atraíram ao longo do tempo: imagem da complexidade, sua relação com o hipertexto e as mídias digitais, o labirinto como um desafio ao jogador, as metáforas associadas a ele, o próprio processo de desenhá-los e resolvê-los... Em cada trabalho meu que envolve labirintos, podemos perceber quais os aspectos que predominaram naquele momento. Mas eles não são constantes, vão mudando. O que eu acho interessante é que a imagem ainda me instiga, é rica o suficiente para que, após todo este tempo, continue sendo passível de ser revisitada e me oferecer possibilidades ainda não explorei.

Ainda sobre o labirinto: a maneira como tu tratas essa arquitetura me faz pensar por vezes na noção de fracasso. São frequentemente labirintos insuperáveis, cuja saída, cuja solução do enigma, a gente nunca alcança. Pergunto: um dos tantos fascínios do labirinto não é justamente esse de ser um espaço destinado ao fracasso? (Como era mesmo a frase do Beckett? “Tente de novo. Fracasse melhor”). Sim, existe algo de inapreensível neles, algo que nos escapa, de modo que a percepção entra em xeque. Acho que Borges comentou que o infinito era próprio da divindade, por ser inapreensível ao homem, e de certa forma o labirinto é um espaço que sugere o infinito. Nesse sentido, é possível falar em um tipo de fracasso, que seria do nosso esforço em mapeá-lo e apreendê-lo. Mas, por outro lado, ele também é um símbolo de cerimônias e rituais de inicialização. O seu centro – a sua solução – estaria reservado apenas àqueles que o merecessem. A noção de fracasso continua presente, mas, em sua grande maioria, as narrativas simplesmente não se interessam por aqueles que fracassam. É um pouco cruel, mas, na maior parte dos mitos que eu pude estudar ao longo desses anos, simplesmente não há referência aos fracassados. Apenas Ícaro possui relevância entre eles. Sou fascinado por esse personagem; ele pode ser facilmente entendido como uma alegoria da ousadia juvenil (que, de acordo com o mito, por si só não é capaz de chegar a algum resultado), mas há algo de belo no seu fracasso. Alguns dos teus trabalhos trazem referências mais ou menos diretas a trabalhos de outros artistas: Josef Albers, Bridget Riley. Como funciona isso? Em alguma medida, trata-se de imaginar como eles tentariam responder àquelas mesmas questões se pudessem se valer de um meio eletrônico? É um exercício teu de experimentação? Eu nunca pensei no que um artista faria caso estivesse vivo hoje (no caso do Albers) e/ou se estivesse explorando os meios eletrônicos (situação da Bridget Riley, que, até onde eu sei, nunca desenvolveu nenhum trabalho com novas mídias). É um exercício meu, no sentido de que são artistas cujo trabalho sempre me interessou e pelo qual eu sou influenciado. Mas esta influencia se dá de uma forma peculiar, e de maneiras diferentes. Há artistas dos quais eu gosto muito e cujo trabalho eu estudei bastante, mas que não me despertam

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Movement in Squares. Bridget Riley, 1961 Andrei Tomaz

Somewhere in Time Andrei Tomaz

a sensação de que “há algo aqui a ser explorado”. Já a op art, por exemplo, sempre me deixou essa impressão. Há ali não apenas um repertório formal, mas estratégias e procedimentos que estão longe de terem sido esgotados. É desta forma que a referência à Bridget Riley funciona. O seu universo é muito rico, e envolve algumas soluções que estão longe de terem sido alcançadas pela produção em novas mídias. Uma das características do seu trabalho que mais me interessa é a sua abordagem ao espectador, que se dá de uma forma muito direta; é algo difícil de obter quando se tem todo um aparato técnico envolvendo o espectador. Já o Albers me influenciou de uma maneira diferente. No caso dele, foram as suas pesquisas sobre cor e percepção de profundidade causadas pelo contraste entre as cores (sem uso de perspectiva) que ajudaram a, vou colocar desta forma, moldar o meu pensamento e a maneira como eu pude refletir sobre a construção do espaço por parte de alguém a partir de descrições puramente verbais. De certa forma, proceder desse modo pode ser visto como algo absolutamente “normal”. Isto é, a nossa percepção e a nossa forma de pensar são marcadas pelas nossas experiências. Ingenuidade seria considerar que iremos perceber de forma diferente apenas porque estamos lidando com um dispositivo diferente. Aliás, para esse processo, em que um meio novo é abordado inicialmente a partir da experiência com os meios anteriores, e onde ele passa, num segundo momento, a provocar uma reavaliação dos antigos meios, Jay Bolter e Richard Grusin cunharam o termo “remediação”. É interessante ver o processo como sendo algo de influência mútua (novos meios e meios já existentes), e não como algo onde cada dispositivo atua como uma “tabula rasa”. Sobre Horizontal vibrations e Movement in squares: há algo bacana nesses trabalhos que é um certo alinhamento entre as questões mais formais e o conteúdo. Não é à toa, me parece, que escolheste o movimento das nuvens e o movimento das ondas no mar. Mesmo que o Movement preveja alguma interação, os temas de ambos – nuvens, mar, movimento – convidam à contemplação. Eles são, de fato, bonitos. Nisso, eles se distanciam ao menos um pouco da maioria dos teus outros trabalhos? No sentido de não exigirem uma interação mais direta, sim, concordo. Eles realmente são mais contem-

plativos. No caso deles, me pareceu totalmente desnecessário um grau de interação maior. É preciso ter uma justificativa muito grande para exigir que o espectador assuma essa postura. No caso dos jogos, a interação se justifica totalmente, e dificilmente o esforço é percebido como algo cansativo. Para mim, é preciso ter este cuidado quando estamos lidando com meios digitais. Uma característica importante desses trabalhos é que o jogo está ausente deles. Pelo menos, não está presente de uma forma tão intensa quanto nos outros. E, a partir do momento em que o jogo não é mais a estratégia de envolver o espectador, a interação dá lugar a outros elementos (como o convite à contemplação). Se não sabemos do mecanismo de construção do trabalho Somewhere in time, ele pode sugerir algo diferente. Digo isso porque, antes de conhecer o trabalho em sua versão eletrônica, eu o vi primeiro na forma dos cartões. Parecia ali que se tratava de frases (excertos de uma narrativa) e o horário em que elas haviam sido proferidas. O clima era meio de “suspense”, como se fosse um fragmento de uma história de horror ou algo similar (talvez o fundo negro e a ausência de imagens provoquem isso). Como soa para o autor esse tipo de leitura? O que eu mais gosto no trabalho Somewhere in time é que, em suas diferentes encarnações, nós temos micronarrativas sendo sugeridas ao espectador. Como os trechos das legendas de filmes presentes em cada tela ou cartão são muito curtos (uma ou duas frases), eles são, em sua absoluta maioria, banais. Isto é, frases soltas, com pouco sentido, que podem ser facilmente recombinadas. Acho que é por isso que micronarrativas sempre são sugeridas. O material parece conter sentido, mas este não está claro. Ao mesmo tempo, as sequências de textos (presentes nos cartões ou apresentadas na tela) não sugerem o aleatório. Se eu utilizasse trechos maiores, digamos quatro ou cinco frases, aí não teríamos essa sugestão de narrativas. Imagino que ficaria mais claro que os textos são de contextos diferentes; teríamos uma sensação ou de colagem, ou de narrativas paralelas. Tenho a impressão de que, nesse trabalho, o tamanho dos excertos foi uma decisão crucial. Quanto ao suspense: essa colocação me fez lembrar de um texto que foi muito importante para mim, que é o A idade neobarroca, de Omar Calabrese. Ele foi importante por me ajudar a

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Sonocromática Andrei Thomaz Francisco Serpa Lilian Campesato Vitor Kisil

Quando uma página torna-se um labirinto Andrei Thomaz Martin Heuser

entender a forma como o labirinto é percebido. Um dos capítulos trata da diferença entre o detalhe e o fragmento. No detalhe, o espectador tem a imagem do todo em sua mente. Já no fragmento, ela está ausente, e o espectador precisa reconstituí-la. O autor observa que esse é o procedimento, por excelência, dos romances policiais. E é a situação em que o espectador é colocado por Somewhere in time: ele recebe fragmentos narrativos e há poucos indícios de que eles não farão sentido. Por uma questão de hábito cultural e da forma como o trabalho é apresentado, é muito mais fácil pensar que aqueles fragmentos devem fazer sentido, e que há uma narrativa a descobrir. E esta situação está muito próxima daquele que percorre um labirinto sem conhecer o seu traçado. Como começaram os trabalhos em parceria? O que muda no processo de criação? Acho que meus primeiros trabalhos em parceria foram realizados com um amigo compositor. Na ocasião, eu já tinha consciência de que nunca teria domínio da linguagem musical. Isto é, o meu domínio sempre seria primário, no sentido pejorativo da palavra. E trabalhar com um amigo compositor abria um novo conjunto de possibilidades que me interessam até hoje, tanto que mantenho as minhas parcerias com amigos músicos. Considerando-se as parcerias com artistas visuais e outros profissionais cujas linguagens, em tese, eu estou mais próximo de dominar, é possível perceber, entretanto, que as parcerias oferecem muito mais do que simplesmente um complemento à minha formação. Parcerias são sempre um deslocamento do nosso ponto de vista, e um desvio de percurso. De certa forma, elas mostram como ser autocentrado pode ser tedioso (e/ou resultar em um trabalho que anda em círculos, sem maiores perturbações e surpresas). Esse descentramento é o que mais me interessa.

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Interview by Eduardo Veras and translated by Mariana Bandarra

English Version

Interview with Andrei Thomaz Tell me about your childhood. What did your parents do? How did you come in contact with the visual arts? I spent my childhood in Gravataí, where I lived until I moved to São Paulo. I went to high school in Porto Alegre, at a public school called Dom João Becker, and then I went on to get my degree in Fine Arts. My father is a mechanical engineer and my mother left her job when she arrived in Brazil, to take care of the four of us (I have three siblings). In childhood, I didn’t have much contact with the visual arts, but on the other hand I had intense contact with literature. Furthermore, very early in life I had access to popular science publications (targeted at the laymen). I remember my parents had a subscription to Superinteressante, and I loved it. I also remember some children’s books about astronomy. So, my awakening to the visual arts was somewhat delayed. I think my first contact with it was through my uncle who is a professor and an artist. Although I did not follow his work at the time, he was the first artist I met “in the flesh”. As a teenager, I was much more interested in computers and computer science, although we had no Internet back then. I became interested in the universe of visual arts because of my contact with graphic software. And even then, I began to see in the arts even greater challenge than computer science could be. Because most computational problems are, in essence, a matter of time and money. If you have the time and money, you can solve almost anything. This is not true for art. Can you talk a bit more about this path – from computers to the visual arts? How did you come to choose Instituto de Artes?

That’s actually a little curious. My siblings and I got a computer when we were still teenagers, and I took some computer classes. I continued to study alone and gained a reasonable grasp of programming. Everything was pointing to Computer Science, and then some computer graphics software awakened my interest in the visual area. Other than that, I already had a gut feeling that you didn’t need a specific degree to work in computer science. Actually, the same applies to the Arts. In relation to Instituto de Artes itself, there was no question at the time. I mean, in Porto Alegre, there was no other undergraduate program in Fine Arts that wasn’t limited to a teaching degree. The only program I know, besides IA is the one at Feevale. But a private school was not an option. And I suspect they didn’t offer a BA in Fine Arts back then. What about IA was most crucial for your training? What are the important landmarks? I think the most important moments were two. First, the first couple of semesters, when I had this huge curiosity regarding contemporary art. It was a time I studied a lot about movements such as Minimalism and Conceptual Art. This moment still echoes in my production, but in a more subtle way. I think many of my works are economical in their language, and they seek maximum accuracy. Though I have a reasonable mastery of programming (to the point of making a living out of it, working in the São Paulo advertising market), I am not dazzled by high tech (at least I hope not). I suspect this is mostly because of that time and because of the artistic production I have dedicated myself to. The second landmark, which was, in a way, a step away from Instituto de Artes, was when professor Eny Schuch offered me a fellowship in a research project in the area of Educational technology. The research was conducted at the School of Education rather than in the Institute of Arts. I accepted her offer and set out to research what was being done in the area of net art and new media. That’s when my interest in programming kicked in again, and I started to do my first works in this area. Today I can’t remember if, at some point, I realized that there would be no going back to what I had been doing in the course at IA. But of course having devoted several years to doing “concrete” work was a valuable experience, which echoes to this day, especially when I pose the challenge to myself to show at a gallery, and not simply on the web. You approach the issue from a different point of view than that of someone who has already started with technological media. You mentioned that the visual arts seemed like a bigger challenge to you than computer science. What are the problems you are currently working with in the field of visual arts? I am particularly interested in working in between the fields of visual arts and new media art. For reasons that, to me, are far from an artistic and / or intellectual nature, these fields are developing in an increas-

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ingly separate manner, and that bothers me. I don’t see how the visual arts can refrain from using new media — after all, new media transform the world and the way we perceive it. Another issue is the fact that new media should not be explored without information and background; experiences shouldn’t be overtaken by some sort of technology seduction. Few are the artists who work in between both fields, but I am very interested in them. As examples of that, I could mention the duo JODI and American artist Cory Arcangel. In Brazil, the duo Detanico and Lain is one of my favorites. Tell us a bit more about this idea that the field of the visual arts and the field of new media art are developing in an increasingly separate manner. Are they actually growing apart? I think this is true in a more pragmatic sense, in terms of circuits that develop differently. There is some overlap, true, but the impression remains that new media art is a separate field. At least in São Paulo there is a very strong feeling that this is the case. I have the impression that the factors causing this situation are somehow extra-artistic. The art market, for instance, is something that fuels this separation, since anything involving technological resources is harder to sell (and more expensive to show). Academics contribute to this separation with their habit of delimiting new feuds (research fields) they can rule over. Artists and other producers involved in new media art see the connection to technology as a way of securing sponsorship and funding that would harder to obtain with projects primarily linked to the visual arts. In other words, this separation is strengthened by forces from both sides. On the other hand, everyone is on Facebook, ignoring that it (and other social networks) can be a platform for artistic experimentation. It’s crazy. How do your artistic practice and your professional practice in IT work together? As it’s been mentioned before, the two are separate, but interwoven areas. How much are they separate and how much do they merge? In order to answer this question, I should go back to the point when first I started working with digital media and to explore them artistically. I was halfway through my undergraduate course in Fine Arts, when professor Eny Schuch offered me an undergraduate research scholarship. Her research project was developed not at IA, but rather in the School of Education, where they were already very interested in the use of technology in education and in e-learning, and this was the area of my scholarship. During that scholarship, I began to study tools for creating websites, HTML, Internet, 3D, etc. Well, that was the age of Flash 5, which gives an idea of how long it has been ... After a while I started doing jobs for people I knew and, after the scholarship, also working with some ad agencies and companies in Porto Alegre, Brazil. At that point I think my artistic and professional practices had already begun to work together, in a way, as they do today. I went back

to studying programming for the artistic work I wanted to do produce, but then things started mixing. There are technologies I studied in order to apply in projects developed for clients, and which later were useful in art projects. The opposite also happens: research I’ve done for a work of art can help me find a solution for a commercial project. And this happens at other levels too. Because of my artistic practice, some clients come to me when they need something “outside the box”, something that requires technology that is not commonly used, or something that steers away from the clichés of digital advertisement. At the same time, my work as a commercial developer allows me to take my art practice forward. On the other hand, my practice as a developer also causes me to not view my artistic practice as being, first and foremost, an exploration of the possibilities of new technologies. This is how many artists working in this area view their work, but this is not the case for me. That’s because of the advertising industry’s obsession with the word innovation; they are constantly trying to use the latest developments in new campaigns, etc., and so this is not a motivation for me, in terms of art. Obviously, I work mainly with digital media, but my focus is never on the latest technologies, per se. In general, my commercial projects are more complex than most of my artistic projects, in technical terms, and I’m not looking to reverse this situation. How do you make your artistic output viable, once it is hard to market? I still see the digital media works as something difficult to introduce in the art market. I’ve read an account of a gallery owner in Sara Thornton’s book, who said, “collectors do not like anything you need to plug in.” Of course this could change, and there are exceptions, but this is the overall scenario. So, artists working with new media need to look for other strategies. Some go to university or other institutions that can support them. Others develop some kind of work related to technology, which allows them to carry on their artistic practices. This work may be providing services, or some project related to digital inclusion, etc. I chose the path of providing services, although I still have some connections with academia (I currently teach at two different programs in São Paulo). For me, this seems to be an interesting path, in the sense that it allows me to not steer away from more practical activities, from “getting my hands dirty.” Academia scares me in that sense, because of its excessive bureaucracy and because of the time it requires professors to engage in activities that are, unfortunately, more administrative than anything else. My instincts tell me that continuing to do “hands-on” work is vital to my artistic practice. My knowledge of the language, the way I think and the way I articulate my works owes much to the fact that I constantly need to reassess what can be done with certain methods and how they can be used for a particular task. I am extremely familiar with some software; I think this relationship is not unlike what other artists have with their

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media, even if when they are as traditional as can be. But going back to the issue of feasibility. Working as a commercial developer allows me to maintain the equipment necessary for developing my artwork. Moreover, most of the exhibitions I have shown in, in which I was in charge of setting up my works, which included the devices required showing them, I used equipment that I had used as a working tool and that was nearly obsolete. Because I can’t work with a computer that has 1 GB RAM, but it is enough to run most of my works at an exhibition. I can also anticipate an upgrade in order to free up a computer that is not so old, to use it at an exhibition, since it will have paid for itself with a few commercial projects. Finally, I can also purchase equipment to show a particular work, if I see an opportunity to reuse it later in my working routine. The issue of know-how should also be noted. Many of my friends have difficulties when trying to execute a work that requires digital resources. They have to turn to friends or service providers, which often hinders the process and increases costs. This problem simply does not exist for me, so I can concentrate on the work itself, and not worry so much about “how do I execute this?” The market forces me to keep my technological skills up-to-date, and this has an upside. I believe that your work, even when it works like a computer game, has a strong reference in drawing. It is not just about going through the mazes, which is one of your most frequent themes, but also about drawing them. Is that right? Yes, this idea that you can be an architect of mazes (not just a passer-by or a prisoner) is important in many works. To some, it may even be essential. There is always a concern with trying to play with how the viewer maps the spaces and their routes. Jorge Luis Borges is very clearly an important reference for you. I remember he said (I can’t quite remember where) that the curious thing about mazes is that they are designed for architectural configurations so that people get lost, rather than found. In that sense, it seems that your games (at least for an inept gamer such as myself) are weaved so that we never actually find our way. Does your motivation in creating them have anything to do with this? Thinking about works that have a stronger relationship with gaming, I would say yes. In some, I would like viewers to realize the intensity of their efforts to map something that is falling apart; this is the case of Labirintos invisíveis (Invisible mazes). Or else, I’d like them to realize how they are able to map something that is never presented to them in a representational, visual form. Here, I am thinking about Cubos de cor (Color Cubes), where space is never represented by a perspective drawing; it’s simply described and, in the end, summarized by an animation with overlapping rectangles. Rectangles only, which create depth by the sheer contrast of their colors, like in Albers’ series Homage to the Square. Can you pinpoint what it is about the idea of a maze that drives you?

As far as I can remember, I’ve been interested in mazes since my early days in university. I mean, it is a long-standing interest for me. Many aspects of mazes have attracted me over time: the image of complexity, their relationship with hypertext and digital media, the maze as a challenge to players and the metaphors associated with it, the very process of designing them and solving them ... In every work of mine that involves mazes, it is possible to see which aspects prevailed at the time. But these are not constant; they are constantly changing. What I find interesting is that the image still entices me, it is rich enough that, after all this time, it remains capable of being revisited and offering me opportunities I have not yet explored. Still on the maze: the way you approach their architecture sometimes makes me wonder about the concept of failure. They are often unbeatable mazes, of which the way out, the solution to the puzzle, is never found. So, my question is: isn’t the fact that mazes are spaces designed for failure part of their allure? (How did that Beckett quote go, again? “Try again. Fail better “). Yes, there is something ungraspable about them, something that eludes us, so that our perception comes into question. I think Borges said that infinity was characteristic of divinity, because it was incomprehensible to man, and in a way the maze is a space that suggests infinity. So this elicits a kind of failure, that of our efforts to map it and grasp it. But on the other hand, a maze is also a symbol of initiation ceremonies and rituals. Their center — their solution — would be reserved only to those who we deserving of it. The notion of failure is still present, but mostly the narratives are just not interested in those who fail. It’s a bit cruel, yes, but in most myths I studied over the years, there is simply no reference of those who have failed. The only relevant one among them is Icarus. This character fascinates me; it can easily be understood as an allegory of youthful audacity (which, according to the myth, can not accomplish anything, by itself), but there’s something beautiful about his failure. Some of your works contain more or less direct references to works by other artists: Josef Albers, Bridget Riley. How does that work? To some extent, is it about imagining how they would attempt to answer those same questions if they could resort to electronic media? It is an experimentation exercise? I never thought about what an artist would do if they were alive today (in the case of Albers) and/or if they were exploring electronic media (which is the case of Bridget Riley, who as far as I know, never developed any work with new media). It is an exercise of mine, in the sense that they are artists whose work has always interested me, and by whom I am influenced. But this influence takes place in a peculiar manner, and in different ways. There are artists I really liked and whose work I have studied extensively, but who I do not awaken that feeling of “there’s something here to be explored.” On the other

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hand, Op art, for example, always gave me that impression. Not only is there a formal repertoire to it, but also strategies and procedures that are far from being exhausted. This is how the reference to Bridget Riley works. Her universe is very rich, and some of the solutions involved in it are far from having been achieved by the new media art output. One of the characteristics of her work that interests me most is its approach to the viewer, which takes place in a very direct way; this is hard to get when you have the whole technical apparatus engaging the viewer. Albers, in turn, has influenced me in a different way. In his case, his research on color and depth perception caused by the contrast between colors (without the use of perspective) were what helped to, let’s say, shape my thinking and the way I could reflect on someone building space from purely verbal descriptions. In a way, proceeding in that manner could be seen as absolutely “normal.” That is, our perception and our way of thinking are branded by our experiences. It would be naive to assume we would perceive differently just because we are dealing with a different device. Incidentally, Jay Bolter and Richard Grusin coined the term “remediation “ to describe for this process, in which a new medium is approached initially from our experience with the previous media, and then, in the next moment, it triggers a reassessment of the old media. It is interesting to view the process as one of mutual influence (new medias and existing medias), rather than one in which each device works as a “tabula rasa”. About Horizontal vibrations and Movement in squares: it seems there is something cool about these works, which is a certain alignment between more formal issues and content. It comes as no surprise, I think, that you would choose the movement of clouds and the movement of waves in the ocean. Although Movement does predict some interaction, the themes of both — clouds, sea, moving — invites contemplation. They are actually beautiful. Does this set them apart, at least a little bit, from most of your other works? In the sense that they do not require a more direct interaction, yes, I agree. They really are more contemplative. In their case, a higher degree of interaction seemed totally unnecessary. Asking the viewer to take this stance requires a strong justification. In the case of games, the interaction is entirely justified, and the effort is hardly perceived as tiresome. I think, when dealing with digital media, it is important to acknowledge this concern. An important feature of these works is that there is no game aspect. At least, not as intensely as in other works. And when the game is no longer the strategy for engaging the viewer, interaction gives rise to other elements (such as an invitation to contemplation). If we don’t know the construction mechanism of the work Somewhere in time it may suggest something different. I say this because, before experiencing the electronic version of the work, I had seen it first

in the form of cards. It seemed that they were sentences (excerpts from a narrative) and the time at which that they had been uttered. There was a sort of “suspense” mood, as if a fragment of a horror story or something similar (maybe it was the black background and the absence of pictures that caused this impression). How does this kind of reading sound, to the author? What I like best about the work Somewhere in time is that, over its various incarnations, these micronarratives are being suggested to the viewer. Once the excerpts of film subtitles present in each screen or card are very short (one or two sentences), they are, in their absolute majority, dull. That is, loose sentences, with little meaning, which can be easily recombined. I think that is why micronarratives always suggested. The material appears to have meaning, but the meaning is unclear. At the same time, the text sequences (on cards or on screen) do not suggest randomness. If I used longer excerpts, say four or five sentences, then we would not have this suggestion of narratives. I imagine it would become clearer that the texts have different contexts; we would get a sense or collage or parallel narratives. I am under the impression that, in this particular piece of work, the size of the excerpts was a crucial decision. As for the suspense: this remark reminds me of a text that was very important to me, which is Omar Calabrese’s The neobaroque age. It was important to me because it helped me understand how the maze is perceived. One chapter deals with the difference between detail and fragment. In the detail, the viewer has the image of the whole in mind. In the fragment, the image of the whole is absent, and the viewer must reconstruct it. The author notes that this is, par excellence, the procedure of detective stories. And this is the situation in which the viewers find themselves in Somewhere in time: they are presented with narrative fragments and there is little evidence that they will make no sense. Because of a matter of cultural habit and the way the work is presented, it is much easier to think that those fragments should make sense, and that there is a narrative to be discovered. And this situation is very similar to that of someone who is passing through a maze without knowing their way around. How did your collaboration works come about? What changes in the creative process? I think my first collaboration works were with a friend who is a composer. At the time, I was aware I would never fully grasp the language of music. I mean, my grasp would always be elementary, in the pejorative sense of the word. And working with a composer friend opened a new set of possibilities that interest me to this day, so I kept collaborating with musician friends. In terms of partnerships with visual artists and other professionals whose languages, in theory, I’m closer to mastering, however, I realize that collaborations can offer much more than merely an addition to my training. Collaborations are always a shift from our point of view, and a detour. In a way,

they show you how being self-centered can be tedious (and/or result in work that goes around in circles, without any major disruptions and surprises). This decentralization is what interests me most.

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Entrevista realizada por Eduardo Veras

Tinha algo de muito estranho porque tudo ali era muito real, pesado, denso, e ao mesmo tempo completamente frágil, delicado. Depois veio a descoberta de que a imagem tão difundida daquela igreja parcialmente destruída e belissimamente iluminada, não se tratava de um monumento no meio de uma cidade qualquer. Acho que o grande impacto foi perceber que aquele lugar tinha a estrutura de uma cidade e eu conseguia andar por ele de muro a muro. Lembro que fiquei pensando naquele lugar como uma cidade, e só algum tempo depois, quando retornei ao local, fui entender que existia uma cidade chamada São Miguel das Missões e que aquele lugar em ruínas não era a cidade em si, mas um sítio arqueológico. Isso foi uma coisa que ficou muito marcada, sempre que me lembro daquele lugar a primeira imagem que surge é essa, de uma cidade dentro de outra. O que da experiência da infância teria te conduzido na adolescência à opção pelo curso de Artes Visuais? Eu sempre tive muita facilidade para desenvolver habilidades do tipo desenhar, pintar, recortar... Mas não acho que tenha sido esse o gancho em Pensando na tua infância em Santo si. A verdade é que eu sempre fui muito Ângelo, é inevitável, pela proximidade geográfica, lembrar do sítio arqueoló- fascinado pela possibilidade de experigico de São Miguel das Missões. Aquilo mentar, inventar coisas. Eu sempre gostei de desenhar, extrapola o fato de ser um potente mas lembro que a folha em branco exemplar do barroco brasileiro. Representa, sem dúvida, o mais parecido sempre foi algo muito assustador para mim. Durante a infância, minha fasque temos, no Sul do Brasil, com uma cinação pelo desenho sempre esteve ruína (coisa que a gente vê em tudo relacionada às formas que eu descobria quanto é cidade da Europa, mas que por aqui tem algo de muito raro). As ru- para duplicar imagens, para “roubar” ínas são um indício de um passado que imagens já existentes, refazê-las com meus próprios meios. A minha primeinos dá alguma amarra com o mundo. Isso pode ter sido, em algum momento, ra técnica foi o papel de seda sobre imagens, eu copiava um pouco de cada uma referência para ti? figura, misturava as partes. Depois veio Incrível você ter iniciado as pera coisa de utilizar sistemas quadricuguntas fazendo essa associação! Sem lados para ampliar ou reduzir imagens dúvida, o contato com aquele lugar foi quadro a quadro. Lembro de um kit uma das coisas mais impactantes da que foi vendido na escola, acho que eu minha infância. tinha oito ou nove anos. Era uma série No sul, as imagens das ruínas de de desenhos educativos tipo mapas São Miguel são muito difundidas atraou atlas do corpo humano, que vinham vés de pequenos souvenires e cartões postais. Quase todo mundo tem algo em acompanhadas por um vidro espelhado, que permitia copiar estas imagens com casa que remeta a esse lugar, então eu alta precisão. Fiquei louco com aquilo, lembro bem de já ter essa referência copiei tudo o que consegui. Acho que eu antes mesmo de ir pela primeira vez. andei com aquele “espelho mágico” pelo Lembro que as imagens eram muito menos uns dois anos, eu basicamente cenográficas, quase sempre feitas à me ocupava de copiar desenhos. noite, com muitas luzes direcionadas A experiência de criação mais inpara aquela arquitetura em ruínas. É crível da minha infância foi um trabalho estranho dizer, mas para uma criança que eu fiz para a feira de ciências da que pouco sabia sobre o significado da escola, quando tinha 11 anos. Eu tinha palavra ruína, as imagens que eu via em visto numa revista que era possível nada traduziam a sensação que eu tive fazer máquinas de fotografia com latas ao andar por aquele lugar. e estava muito decidido a fazer uma. Fiz

Entrevista com Daniel Escobar

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uma lista das coisas que eram necessárias e pedi que minha mãe comprasse. Lembro inclusive que foi muito difícil conseguir tudo e que meus pais estavam muito preocupados porque viram que os materiais eram tóxicos, perigosos… Nem meus pais, nem a professora de ciências sabiam exatamente do que se tratava, eles só acompanhavam aquela produção toda, mas ninguém sabia muito bem quais seriam os resultados do processo. Construí tudo sozinho, a máquina e um mini-laboratório com caixa de papelão e tampa de papel celofane vermelho. Eu acreditava muito que ia dar tudo certo, mas até hoje eu não consigo explicar a sensação de ter tirado aquela primeira foto de dentro da caixa e ver a silhueta borrada da cadeira que eu havia fotografado. Foi incrível! Aos 11 anos de idade eu conseguia compreender os princípios básicos da fotografia, e eu tinha descoberto tudo praticamente sozinho. Acho que foram experiências desse tipo, que se prolongaram durante minha adolescência e acabaram me levando a optar pelo curso de artes visuais. Quem ou quais influências foram decisivas na tua passagem pelo Instituto de Artes e na tua formação como artista? Eu sempre tive uma perspectiva muito prática, o que me levou a fazer um caminho pela instituição que foi muito marcado por intersecções que eu estabelecia através da própria universidade. Neste sentido, a Bienal do MERCOSUL, por exemplo, foi uma das minhas maiores influências. A alguns meses de iniciar a primeira Bienal após minha entrada no Instituto de Artes, li um anúncio de que estariam selecionando mediadores. Informei-me com alguns veteranos que já haviam participado de edições anteriores e entendi que se tratava de uma extensa pesquisa sobre as obras dos artistas, com a possibilidade de, na maioria dos casos, ter um contato com o artista e com o processo de produção ou montagem das obras. Eu não tive dúvida: era lá que eu precisava estar. E a cada edição da Bienal eu acabava tendo um envolvimento maior com a instituição, o que consequentemente me garantia um maior contato com os artistas e uma noção mais clara das formas de funcionamento dos sistemas de arte. Outra referência foi o Laboratório de Linguagem Tridimensional, disciplina ministrada pela professora Maria Ivone dos Santos, onde eu dei início a um processo de trabalho muito pautado no olhar para a cidade. Até ali, eu vinha desenvolvendo uma pesquisa bastante

gráfica, onde as imagens procuravam já por uma forma de se relacionar com o entorno, com a cidade. Essa disciplina e as voltas que dei ao redor da quadra do Instituto de Artes durante aquele semestre foram decisivos para o delineamento de alguns procedimentos presentes no meu trabalho. Paralelamente a isso, eu li o artigo Art after philosophy, de Joseph Kosuth, durante a disciplina de Teoria e Crítica da Arte, com a professora Mônica Zielinsky. Sempre gostei das obras de Kosuth, mas a leitura do artigo foi algo muito revelador, vinha ao encontro a uma concepção de arte na qual eu acreditava, e acho que a melhor coisa de tudo foi ter conseguido capturar a alma daquele texto para além das polaridades do contexto em que foi escrito. Sem dúvidas, essa leitura é um divisor de águas na minha produção. O outro marco foi o contato com Maria Helena Bernardes, que teve início durante as falas que ela realizou dentro do programa de algumas disciplinas e dos lançamentos de alguns livros do Documento Areal (projeto de publicações concebido por ela e André Severo). Quanto mais eu me envolvia com as histórias contadas por ela, mais certeza eu tinha que havia muito a ser aprendido. Fiz um longo período de complementação da minha formação histórica através de aulas com a Maria Helena Bernardes, ela me deu suporte para pintar muitos cenários para os quais eu só conhecia os personagens, e esse foi outro momento importante da minha formação. Há no teu trabalho um notório interesse pelo convívio do homem com o espaço urbano. Dá para relacionar isso com o teu deslocamento por essas cidades: o interior, a capital, o percurso por Belo Horizonte, que é uma cidade muito mais planejada do que, por exemplo, Porto Alegre? Sim, perfeitamente. Hoje já consigo identificar esses deslocamentos como algo essencial para o meu trabalho. Morei até os 17 anos na mesma cidade, então a mudança para Porto Alegre coincide com o momento em que eu inicio o curso de artes. Nesse momento, eu procurava me reposicionar a partir de uma nova concepção de espaço, de cidade e de coletividade. Nada disso era claro assim como vejo agora, mas essa necessidade despertava meu olhar para elementos muito triviais da cidade e me fazia perceber coisas que talvez fossem muito invisíveis ou imperceptíveis para pessoas tão habituadas a conviver com aquele lugar. Em 2008, quando fui morar em BH, por ocasião do programa Bolsa Pampulha,

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Cidades Enigmas Daniel Escobar

Perto demais Daniel Escobar

esse processo foi ativado novamente, com a diferença de que essas questões já estavam um pouco mais claras para mim. Nessa situação, havia também uma questão curatorial do projeto que colocava a cidade de Belo Horizonte como objeto de pesquisa para os artistas. Sem dúvida, foi quando comecei realmente a entender a necessidades desses deslocamentos e como o trabalho passava a ganhar corpo a partir dessas situações. Mais do que perseguir uma representação possível de cidade (como ocorre talvez no trabalho de Marina Camargo), o que o teu trabalho evidencia é, antes, uma percepção do espaço urbano em si, naquilo que ele tem de coletivo, de compartilhado. Pode ser? Certamente. Acho que você foi direto ao ponto. Embora essa ideia de representação de cidade esteja presente no meu trabalho, há algo incontestável que já evidencia um pouco do que você colocou, que é o fato de sempre existir, por exemplo, uma apropriação da cidade. Há sempre um elemento, um material ou um procedimento presente na cidade, sendo utilizado na construção do trabalho. O que estou querendo dizer é que dá para pensar nas crostas de outdoors perfurados como uma espécie de representação possível para o espaço urbano, mas não é algo que venha de uma idealização. Muito pelo contrário, o ponto de partida para o trabalho é o tipo de relação que estabelecemos com as imagens em seus mais diferentes âmbitos e a forma como os espaços passam a ser transformados por essa sucessão de sonhos de consumo ou desejos que vão sendo sobrepostos. Nos últimos trabalhos, acho que isso começa a ficar mais claro para mim quando começo a usar mapas, por exemplo. Nesses trabalhos, consigo visualizar super bem isso que você fala, porque ali temos essas duas situações se relacionando. De um lado, essa representação idealizada de cidade, baseada em uma limpeza formal e em princípios convencionais de representação de cidade; de outro, uma representação do caos urbano, da descartabilidade, do duelo das imagens, das relações de mercado e poder. No final, os trabalhos acabam misturando essas situações, fazendo o público explorar essas novas cidades, tal qual exploramos os espaços reais. Eu queria saber mais sobre o teu processo de criação. Como foi, por exemplo, que chegaste aos outdoors perfurados? A ideia de utilizar os outdoors me perseguiu durante muito tempo. No meu caminho de casa para o Instituto

de Artes, em Porto Alegre, eu passava por vários daqueles corredores cercados de outdoors e ficava bem perplexo com a coisa de que era um lugar completamente sem graça, mas que sempre tinha algo de diferente que ganhava minha atenção. Algumas vezes eu passava bem no horário das trocas de cartazes, com muitas pessoas trabalhando, escadas, baldes... enfim, toda uma estrutura. Mas um desses dias eu esperava um ônibus e lembro que fiquei olhando bem disperso, quando de repente fui pego pela aflição de uma imagem que sumia para dar lugar a outra que eu não conseguia identificar o que era. Fiquei ali naquela expectativa até que terminaram de colar o cartaz. Fiquei pensando que era exatamente aquele momento que eu vinha buscando, era isso que me fascinava naquilo tudo, a ideia de um desejo muito volátil, dos sonhos de consumo que mudam a cada 15 dias. Foi aí que me dei conta de que eu não precisava redesenhar as imagens, pintar sobre os cartazes (ou várias outras ideias descartadas antes de serem iniciadas). A palavra era deslocamento. Eu precisava criar um enfrentamento do público com aquela situação. Foi quando apresentei esse projeto para o Goethe – Institut e pude realizar essa intervenção e também minha primeira exposição (Perto demais, 2005). Eu utilizei material excedente das empresas de colagem de outdoor em Porto Alegre e, durante todo o período da mostra, eu ficava colando cartaz sobre cartaz até gerar uma grande crosta. Durante a abertura, a parede que estava completamente branca passou a ser ocupada pelos grandes cartazes e, após a finalização de uma camada, a outra já se iniciava imediatamente. Depois dessa experiência, eu fiquei ainda com muito material não utilizado. Ficava olhando para o material e pensando naquele sistema de camadas, pensando até mesmo algumas questões históricas da pintura, da construção da imagem e do procedimento de camadas. Ficava pensando que nesse caso não era diferente, mas que as camadas de materiais neutros passavam a ser substituídas por camadas de imagem, ao mesmo passo que a imagem passava a ser cada vez mais o reflexo de um mundo da descartabilidade. Eu queria evidenciar mais essa relação pictórica que estava vislumbrando, mas queria que fosse algo muito relacionado com o próprio sistema, queria uma interferência mínima, algo que se confundisse com a própria natureza do material. Aí veio a ideia de perfurar, porque eu poderia “escavar” as imagens, evidenciar a presença de

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Permeável VII (Série Perto Demais) Daniel Escobar

A Verdade das Coisas Daniel Escobar

inúmeras camadas e o furo, de certa forma, se fundia com as imagens devido aos grandes pontos de impressão. É como se fosse possível “des-imprimir” as imagens da mesma forma que ela são impressas, através de pontos. Legal você ter solicitado uma descrição de como cheguei aos perfurados, porque acho que a partir desse relato é possível identificar alguns dos meus procedimentos, algumas etapas que compreendem meu processo de trabalho. Há sempre algo que vem de uma experiência muito particular, cotidiana, corriqueira, ao mesmo passo que há sempre um assunto ou uma questão que fica me prendendo durante um determinado período. No meio desse processo, há sempre um embate com algum material ou procedimento, que acaba sendo decisivo na construção do trabalho. O trabalho das letras recortadas que viram almofadas guarda certo humor ou ironia que não estava tão evidente em obras anteriores. O humor é uma questão para ti? Sabe que nunca tinha pensado nisso? Nunca tinha pensado meu trabalho a partir dessa perspectiva, o que já me permite de antemão afirmar que o humor não tem sido em si uma questão. Mas quando você fala em humor e acrescenta a palavra ironia, aí eu fico pensando em vários aspectos de determinados trabalhos que muitas vezes não chegam a ser destacados pela maioria do público. E acho interessantíssimo você destacar isso! Na verdade, às vezes o princípio de alguns trabalhos é bastante irônico, como no caso dos trabalhos onde cidades fantásticas são extraídas de guias turísticos de cidades reais. Eu poderia fazer isso de diferentes formas, mas eu acho incrível quando essa ironia consegue ser absorvida como um novo objeto de desejo. Acho que essa situação é bem maximizada no trabalho da letras recortadas que você citou. É importante também destacar que esse trabalho, apesar de estar diretamente relacionado com outras proposições, foi um trabalho pensado sob outra perspectiva. Inicialmente ele aconteceu na rua. A verdade das coisas foi o projeto que realizei como finalização do Bolsa Pampulha, para o qual os 10 artistas residentes daquela edição deveriam produzir obras para o espaço público de Belo Horizonte. Então foi um trabalho pensado de modo a interagir com o público da cidade e, nesse sentido, seria equivocado pensar esse trabalho de acordo com os mesmos princípios que penso um trabalho para estar em uma galeria

ou museu. Novamente me apropriei de coisas muito particulares desse meio – as faixas são de tecido e as letras são pintadas a mão. Tem algo de artesanal nesse veículo de comunicação que eu achava interessante de ser explorado. Foi aí que veio a coisa do recorte e da costura como procedimentos. Na versão para o espaço público, um conjunto de aproximadamente 100 faixas extraídas das ruas de Belo Horizonte têm suas mensagens recortadas. Uma empresa de sinalização é contratada para fazer a recolocação das faixas vazadas no espaço urbano de acordo com as mesmas diretrizes que utilizam convencionalmente para esse serviço. Tudo é feito na mesma ilegalidade típica desse sistema de comunicação. Em um ponto da cidade, próximo ao local onde a maioria das faixas foi encontrada, um caminhão estaciona e dois homens uniformizados começam a descarregar um grande volume de caixas. À medida que essas caixas são abertas e esvaziadas, uma grande pilha é formada por aproximadamente 3.000 letras e números extraídos das faixas, que passaram por um processo de enchimento. A possibilidade de interação do público com a obra é apenas mais uma das muitas etapas de interlocução criadas pelo trabalho, que envolveu ainda a subtração dos anúncios, as negociações com as empresas que veiculam esse tipo de publicidade, as conversas com o serviço de limpeza urbana responsável pelo recolhimento desse material publicitário ilegal, a mobilização de um grupo de pessoas durante o processo de costura e enchimento das letras. Uma das coisas que me chama atenção no teu trabalho é que, mesmo quando ele se ergue a partir de uma questão conceitual bastante forte, a forma também conta. Me parece que, do ponto de vista formal, as obras são muito bem resolvidas. Essa é uma questão para ti? Sem dúvida. O aspecto formal das obras é algo que considero de suma importância no meu trabalho. E é talvez a parte do processo que exija maior tempo, cuidado e atenção. A ideia vem sempre antes da forma, de modo que é muito raro um trabalho ser originado de uma simples experimentação de material. Eu vou criando os trabalhos conceitualmente, vou fazendo pequenas experimentações, e só dou início propriamente ao trabalho depois de já ter certeza daquilo que desejo fazer. Claro que às vezes durante a fatura surgem coisas que você não tinha pensado, mas de modo geral trata-se de um processo bem objetivo. Acho que

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isso explica um pouco o fato das obras serem muito bem resolvidas do ponto de vista formal, porque primeiro eu defino o que eu quero fazer e depois fico perseguindo essa ideia até encontrar os materiais ou procedimentos mais adequados para cada proposta. Acho que um pouco desse “polimento” a que você se refere está também relacionado a algumas concepções que tenho sobre arte. Para mim, é inevitável pensar todos os elementos que estão envolvidos no processo de produção de uma obra, porque do ponto de vista conceitual eu acredito que realmente faça a diferença. Por exemplo, se eu utilizo um perfurador de escritório para produzir o sequenciamento de furos nos cartazes publicitários, isso é bem diferente de eu construir uma arte gráfica e mandar produzir esses recortes em laser, embora o resultado visual possa ser muito similar (entende?). Para mim, uma das coisas interessantes do trabalho é justamente este jogo entre uma imagem completamente volátil e este tempo dos gestos lentos, então é imprescindível que isso seja produzido manualmente. No fim, essas preocupações conceituais que se estendem desde a seleção dos materiais até a escolha dos procedimentos ou instrumentos que serão utilizados durante o processo acabam por gerar este ar “bem resolvido” das obras. Nas tuas representações e recriações de paisagens urbanas, me parece que há fortes componentes utópicos, pela idealização do que seriam cidades possíveis, mas, sobretudo, por certa torção que fazes, te apropriando de uma linguagem comum, cotidiana (a foto, o cartão postal, o guia de viagem, o Pequeno Engenheiro), e torcendo essa linguagem para produzir outra coisa. Pode ser? Acho muito legal quando você fala dessa torção, desse jogo de linguagem. Normalmente os materiais que utilizo são muito decodificados pelas pessoas e quase sempre são submetidos a algum processo que altera a forma inicial e acaba gerando essa torção. No entanto, a natureza primeira desses materiais continua sendo de suma importância mesmo no novo contexto. É curioso, mas a forma final dos trabalhos, normalmente, também faz alusão a objetos bastante decodificados. E aí é como se o trabalho ficasse suspenso entre essas situações. Só para exemplificar, no caso da maquete criada com os guias turísticos, inicialmente o espectador é pego pela linguagem de maquete e, à medida que percorre esse projeto de lugar, vai

percebendo que se trata de guias turísticos, uma vez que a natureza desse material também pode ser identificada. E é nesse cruzamento que acontece o trabalho.

Interview by Eduardo Veras and translated by Mariana Bandarra

English Version

Interview with Daniel Escobar Thinking about your childhood in Santo Ângelo, it is inevitable to think of the São Miguel das Missões archeological site, because of the geographical proximity. That is more than just a powerful example of Brazilian baroque. Without a doubt, it represents the closest thing we have, in southern Brazil, to a ruin (something we see in every small town in Europe, but that is something very rare around here). Ruins are traces of a past that gives us some sense of ties with the world. Could this have been, at some point, a reference to you? It is amazing that you should start the questions by making this association! Without a doubt, my contact with that place was one of the most striking things about my childhood. In the south, images of the São Miguel ruins are widely spread through small souvenirs and postcards. Almost everyone has something at home that evokes the place, so I remember clearly that this reference was there even before the first time I visited the ruins. I remember that the photos being very scenic, almost always taken at night, with lights directed at the architecture in ruins. It is strange to say this, but for a child who knew little about the meaning of the word ruin, the images I saw conveyed nothing of the feeling I had when I actually walked through the place. There was something very strange about it, because everything was very real, heavy, dense, and at the same time completely fragile, delicate. Then came the discovery that the widespread image of that partially destroyed and beautifully lit church was not a monument in the middle of a random town. I think the greatest impact was the realization that the place had the

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Mirante Daniel Escobar

As Cidades e o Desejo Daniel Escobar

structure of a city and I could walk through it from wall to wall. I remember thinking of that place as a city, and it was only later, when I went back there, that I understood that there was a city called São Miguel das Missões and that place in ruins was not the city itself, but an archaeological site. This was something really outstanding; whenever I remember that place the first image that emerges is that of a city within another. What about that experience as a child could have led you to choose the Visual Arts program as a teenager? I was always easy for me to develop skills such as drawing, painting, cutting ... But I don’t think that, in itself, was the trigger. The truth is that I have always been fascinated by the possibility of experimenting, of inventing things. I always liked to draw, but I remember that the blank sheet of paper was always very scary to me. As a child, my fascination for drawing was always related to discovering ways to duplicate images, to “steal” images that already existed, recreating them with my own means. My first technique was tracing over images with tissue paper; I copied a little bit of each image, mixing and matching the parts. Then there was that thing of using grid systems to enlarge or reduce images, square by square. I remember a kit they sold at school; I think I was eight or nine years old at the time. It was a series of educational drawings, like maps or anatomy atlases, which were accompanied by a mirrored glass, which allowed you to copy these images with high accuracy. I went crazy over it; I copied everything I could get my hands on. I think I carried that “magic mirror” around at least for a couple of years; my main occupation was basically copying drawings. The most amazing creative experience of my childhood was a project I made for the science fair at school when I was 11. I had read in a magazine that you could make a camera using cans and I was determined to make one. I made a list of the things I needed and asked my mother to buy them. I actually remember that it was very difficult to get everything on the list and that my parents were worried because they realized the materials were toxic, hazardous... Neither my parents nor the science teacher knew exactly what it was, they only oversaw the production, but nobody actually knew for sure what the outcome of the process would be. I built it all by myself, the camera and a mini-lab with a cardboard box and red cellophane lid. I really believed it would work out, but to this day I cannot explain the feeling of having taken that first picture from inside the box and looking at the blurred silhouette of the chair I had photographed. It was amazing! At 11, I had an understanding of the rudimentary principles of photography, and I had discovered it all practically by myself. I think it was this kind of experience, which extended into my teenage years, that ultimately led me to choose the visual arts program. Who or what were the decisive influences during your time at Instituto de Artes and in your training as an artist? I’ve always had a very practical outlook, which has led me to take a path within the institution that was heavily marked by the intersections I established through the university itself. In that sense, the Mercosur Biennial, for instance, was one of my greatest influences. A few months before the

start of the first Biennial after I had gotten into Instituto de Artes, I read that they’d be recruiting mediators. I asked around to some veterans who had already participated in previous editions and realized that it consisted of extensive survey about the works of artists, with the possibility of, in most cases, having contact with the artist and with the production or assembly process of works. There was no doubt in my mind: that was where I needed to be. And as each Biennial came I was more involved with the institution, which in turn enabled greater contact with the artists and a better understanding of the way the art system works. Another landmark was the Laboratory of Three-Dimensional Language, a course taught by Professor Maria Ivone dos Santos, in which I took the first steps in a work process guided majorly by looking at the city. Until then, I had been developing a very graphic research, in which the images were already looking for a way to reach out to their surroundings, to the city. This discipline and the walks around the block I took during that semester were decisive for outlining some procedures that are present in my work. Parallel to this, I read Joseph Kosuth’s article Art after Philosophy, during the course on Art Theory and Criticism, taught by professor Mônica Zielinski. I always liked Kosuth’s work, but reading that article was very revealing; it coincided with a concept of art in which I believed, and I think the best thing about all that was having been able to capture the soul of the text beyond the polarities of the context in which it had been written. Without a doubt, this reading was a watershed in my production. The other milestone was the contact with Maria Helena Bernardes, which began during the lectures she gave, as part of the syllabus for some courses and at the release of some books for Documento Areal (a publication conceived by her and André Severo). The more I got involved with her classes, the more I was sure I had a lot to learn. For a long period of time, my historical training was enriched by lessons with Maria Helena Bernardes; she gave me support to paint many scenarios for which I only knew the characters, and this was another important moment of my training. Your work is marked by a remarkable interest in the interaction of man with the urban space. Can you connect that to your shift through these cities: the countryside, the capital, the time in Belo Horizonte, which, as a city, is much more planned than, for example, Porto Alegre? Yes, absolutely. Today I am able to identify these shifts as something essential to my work. I lived in the same city for 17 years, and then moving to Porto Alegre coincides with the time when I started Art School. At this point, I tried to reposition myself based on a new concept of space, city and collectiveness. None of this was as clear to me as it is now, but this need awakened my eyes to very trivial elements of the city and it made me realize things that were maybe too invisible or imperceptible to people that were so used to coexisting with that place. In 2008, when I lived in Belo Horizonte, at the occasion of the Pampulha Scholarship program, this process was activated again, except by then these issues were already a little more clear to me. In that situation, there was also a curatorial issue in the project 35


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that proposed the city of Belo Horizonte as a research subject for the artists. Without a doubt, that was when I started to really understand the need for these shifts and how the work was shaping up from these situations. Rather than pursue a possible representation of the city (as is perhaps the case in the work of Marina Camargo), your work shows, first and foremost, the perception of urban space itself, in that which is collective and shared about it. Is that right? Certainly. I think you went straight to the point. Although the idea of a representation of the city is present in my work, there is something incontrovertible that shows some of what you just mentioned, the fact that there is always, for example, an appropriation of the city. There is always an element, a material or a procedure that is present in the city and is used in the construction of the work. What I mean is that you can think about the crusts of punched billboards as a kind of possible representation for urban space, but it is not something that comes from an idealization. On the contrary, the starting point for the work is the kind of relationship we establish with the images in their widely varied scopes, and the way in which spaces are being transformed by this succession of consumer dreams or desires that are progressively overlaid. In recent works, I think this starts to become clearer to me when I start using maps, for example. In these works, I can really see what you are talking about, because they feature the relationship between these two situations. On one hand, this idealized representation of the city, based on a formal cleaning and on conventional principles of city representation; on the other hand, a representation of urban chaos, disposability, duel of images, market and power relationships. Ultimately, the works end up mixing these situations, causing the audience to explore these new cities, just as we explore real spaces. I’d like to know more about your creative process. How was it that you arrived at, for example, the punched billboards? The idea of using billboards haunted me for a long time. On my way from home to Instituto de Artes, in Porto Alegre, I passed many of those corridors surrounded by billboards and I was pretty baffled by the fact that it was a completely dull place, but there was always something different that called my attention. Sometimes I passed right at the time they were changing the billboards, with lots of people working, ladders, buckets... anyway, the whole paraphernalia. But one day I was waiting for the bus and I remember that I was looking at them, very distracted, when I was suddenly caught in the agony of an image that disappeared as another came on, and I could not make out what it was. I stood there, eagerly waiting for them to finish pasting the poster. And I started thinking that was exactly the moment I had been looking for; that was what fascinated me about the whole thing: the idea of a very fleeting desire, of the consumer dreams that change every 15 days. It was then that I realized I did not need to redraw the images, paint over the posters (or several

other ideas that were ruled out before they were even initiated). The word was shifting. I needed to confront the audience with that situation. That was when I presented the project to Goethe – Institut and was able to carry out this intervention, as well as my first exhibition, Perto Demais (Too close), in 2005. I used leftovers from billboard companies in Porto Alegre and, for the duration of the exhibition, I was pasting poster over poster until I created this thick crust. During the opening, the wall that was completely white was overtaken by large posters and, after a layer was completed, I immediately started pasting the next. After this experience, I still had a lot of unused material. I kept looking at the material and thinking about that system of layers, even thinking about some historical issues of painting, image construction and the layering technique. I kept thinking that in this case it was no different, but the layers of neutral materials were replaced by layers of image, as the images increasingly became the reflection of a disposable world. I wanted to make this pictorial relationship I envisioned more evident, but I wanted something that was closely connected to the system itself, I wanted the least possible interference, something that merged with the very nature of the material. Then I had the idea of punching holes, because then I could “dig” into the images, underscore the presence of numerous layers, and the hole somehow merged with the images because of the large printer dots. It’s as if you could “de-print” images in the same way they are printed: in dots. It is a good thing that you asked for a description of how I got into the idea of punching holes, because I think this account is very illustrative of some of my procedures, some stages that are part of my work process. There is always something that comes from a very particular, everyday, unexceptional experience, whereas there is always a topic or an issue that I’m stuck with for a certain period of time. In the midst of this process, there is always a conflict with some material or procedure, which turns out to be decisive in the construction of the work. The work with cutout letters that turn into cushions features a certain sense of humor or irony that was not so evident in your earlier work. Is humor an issue for you? You know I had never thought about that? I’d never thought about my work from this perspective, which, beforehand, allows me to state that humor has not been an issue in itself. But when you talk about sense of humor and add the word irony, then I’m thinking about various aspects of certain works that often are not really highlighted by most of the audience. And I think it is very interesting that you should focus on that! In fact, sometimes the beginning of some works is rather ironic, such as the case of the works in which fantastic cities are extracted from city guides for real cities. I could do that in a variety of ways, but I think it is amazing when irony can be absorbed as a new object of desire. I think this situation is maximized in the work with the cutout letters that you mentioned. It is also important to highlight that this work, despite being directly related

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to other propositions, was conceived from another perspective. Initially it happened on the street. A verdade das coisas (The truth of things) was my final project for the Pampulha scholarship, for which the 10 resident artists of that edition should produce works for the public space of Belo Horizonte. So the work was conceived so as to interact with the city public and, in that sense, it would be wrong to think of that work using the same principles I think about when I conceive a work for a gallery or museum. Again, I borrowed a lot of things that are characteristic of this medium — the streamers are made of fabric and the letters are hand painted. There’s a crafty feel to this communication medium, which I thought was an interesting thing to explore. That was when it came to me, the idea of cutting and sewing as a technique. In the public space version, a set of approximately 100 streamers was taken from the streets of Belo Horizonte and their messages were cutout. A signage company is hired to replace the cutout streamers in the urban space according to the same guidelines conventionally for this service. Everything is done in the same illegal system that is typical of this medium. At one point in the city, close to where most of the streamers were found, a truck parks and two men in uniforms begin to unload a large number of boxes. As these boxes are opened and emptied, a large pile appears, consisting of approximately 3,000 letters and figures from the tracks, which have undergone a stuffing process. The possibility of the public interacting with the work is only one of many instances of dialogue this work initiates, which also involved removing the ads, the negotiations with companies that offer this kind of advertising, conversations with the urban sanitation services in charge of collecting illegal advertising material, the mobilization of a group of people during the process of sewing and filling the letters. One of the things about your work that catches my attention is that, even when it stems from a heavily conceptual issue, form also matters. It seems to me that, from a formal standpoint, your works are very well resolved. Is that an issue for you? There’s no doubt about it. The formal aspect of the works is something I consider to be extremely important in my work. It is perhaps the part of the process that requires the most time, care and attention. The idea always precedes form, so that a work will hardly ever come from simply experimenting with materials. I gradually create the work conceptually, I do these little experiments, and I only start doing actual work after I am sure of what I want to do. Of course, sometimes during the making, things you hadn’t anticipated come up, but it is overall a very objective process. I guess that explains why the works are formally well resolved, because the first thing I do is define what I want to make and then I pursue this idea until I find the most appropriate materials or procedures for each proposal. I think some of that “polishing” you’re referring also has to do with some of my ideas about art. For me, it is inevitable to think about all the elements that are involved in the production of a work, because, from a conceptual standpoint, I

believe that really makes the difference. For example, if I use a hole puncher to produce the sequence of holes on the billboards, this is very different from me building the artwork and having these holes done by a laser cutter, although the visual results may be very similar (you see?). For me, one of the interesting things about the work is exactly this interplay between a completely volatile image and this time of slow gestures, so it must necessarily be produced manually. Ultimately, these conceptual concerns, which range from the selection of materials to the choice of techniques or tools that will be used during the process, account for this “well resolved” vibe in the works. In your representations and recreations of urban landscapes, there seems to be strong utopian components; because of an idealization of what possible cities could look like, but above all, because of the way you twist things, borrowing from the ordinary, everyday language (photos, postcards, travel guides, the ‘Little Engineer’), and twisting that language into something else. Is that right? I really like it when you talk about that twisting, about that language play. The materials I use are usually heavily decoded by people and often undergo some process that changes the original form and ultimately create this twisting. However, the primary nature of these materials continues to be paramount, even in the new context. It is strange, but the final form of the work normally continues to allude to heavily decoded objects. And then it’s as if the work were suspended in between these situations. Just to illustrate, in the case of the model made from travel guides, the viewer is initially caught by the language of the model and, as they look through the design of this place they realize that it consists of travel guides, once the nature of this material can also be identified. And it is precisely within that crossroad that the work takes place.

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Entrevista realizada por Eduardo Veras

Entrevista com Marina Camargo Vamos começar com alguns dados mais biográficos: onde nasceste? O que os teus pais faziam? Então comecemos pelas origens! É curioso começar falando da minha vida, normalmente deixo essas informações de lado e trato das origens do meu trabalho (como origens conceituais, de questões que são importantes para os trabalhos que vim a fazer depois, por exemplo). Nasci em Maceió, Alagoas, e a certa altura da minha infância nos mudamos para Porto Alegre. Essa mudança foi realmente marcante para mim, mas só vim a perceber isso através de outras mudanças que vieram a acontecer. Cada vez que vou morar noutra cidade, mesmo que temporariamente, fica claro para mim que minhas origens não estão apenas em Porto Alegre, mas também noutros lugares, como no nordeste do Brasil. As praias e parques de diversões de cidade de interior (seja no sertão ou em praias como Paripueira), o circo, que era um programa indispensável numa cidade sem muitos atrativos além das praias, e, claro, muito mar, mar, mar. Mesmo hoje, quando chego numa cidade que ainda não conheço, muitas vezes minhas referências acabam se situando lá nas temporadas em Paripueira. Não sou de família de artistas – minha mãe é farmacêutica e meu pai engenheiro agrônomo. Minha mãe tinha família no Sul e por isso nos mudamos para Porto Alegre.

Essas mudanças de cidade acho que acabaram tornando-me meio desterrada, mas num bom sentido. Porto Alegre é a cidade onde tive praticamente toda a minha formação, mas não é exatamente onde está toda a minha história. Há mais de 20 anos, Maceió era uma cidade de interior, com poucos eventos culturais. Quando nos mudamos para Porto Alegre (minha mãe, eu e minha irmã), minha mãe nos levava a todos os espetáculos possíveis, óperas a shows de música popular, peças de teatro, exposições, etc. Porto Alegre era para mim uma cidade extremamente estimulante, tendo sido muito importante para minha formação ter crescido ali. O que teria sido o teu despertar para a arte? Em que momento percebeste que algo era arte e que talvez te interessasse fazer aquilo? Não saberia precisar em que momento comecei a me interessar por arte. Minhas lembranças mais remotas são do jardim de infância, numa escola montsoriana, onde lembro de ter uma grande liberdade e individualidade para fazer as minhas coisas (não diria arte…). A experiência de autonomia e criatividade é certamente marcante. No entanto, não saberia – nem arriscaria – definir o que faz um artista se interessar em ser um artista. Em torno dos 15 anos de idade, voltei a fazer cursos de artes, foi quando comecei a pintar e ler tudo o que podia sobre história da arte. A vontade de cursar o Instituto de Artes da UFRGS veio de uma certeza que eu tinha desde aquela época de que a arte não podia ser apenas uma atividade eventual para mim. Naquele momento, eu não tinha a menor idéia de como poderia sobreviver de arte, mas sabia que era isso o que eu queria fazer. Por fim, acho que a arte era mesmo fundamental para mim, como uma necessidade talvez, algo que é o centro, o eixo mesmo da minha vida – embora eu resista um pouco a dizer isso, por causa do tom um tanto romantizado que evoca… O que foi decisivo na tua passagem pela graduação no Instituto de Artes, em Porto Alegre? O que foi marcante na passagem pelo Instituto de Artes foi essencialmente a consciência em termos de questões próprias da arte. Não a questão histórica (também importante), mas principalmente a questão crítica em relação à arte e ao sistema de arte (não em relação à crítica, mas sim em termos de uma construção de um pensamento crítico voltado para o próprio trabalho do artista).

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Letras Caindo Marina Camargo

Tipografia/Urbanização: NYC Marina Camargo

É esse pensamento crítico em relação ao próprio trabalho que desvia o artista de um fazer-por-fazer? Pergunto isso por que teu trabalho em geral parece cuidadosamente construído e planejado. Se há, ali, alguma potência do acaso em jogo (penso, por exemplo, naquelas fotografias em que recolhes com as mãos as letras que se desprenderam das lâminas de acetato), ela diz respeito mais a um momento inicial do trabalho, e nunca à sua configuração final. Não saberia dizer como o pensamento crítico altera “o fazer” do artista, mas certamente altera a maneira do artista se situar no mundo, na história da arte, num contexto de arte contemporânea. Em meu processo, não percebo essa oposição nítida entre um fazer-por-fazer e um fazer-crítico. E falo isso pensando nos tantos trabalhos que, no momento desse “fazer”, pareciam sem sentido. Esse mesmo sentido se fez claro depois, em relação a outros trabalhos e mesmo a questões críticas ou intrínsecas ao próprio trabalho. Ou seja, esse fazer-por-fazer pode ser muito importante no processo de trabalho do artista e, durante esse processo, surgem as questões mais importantes para o trabalho e para a investigação do artista. Quer dizer, até aqui falei de processo de trabalho. Mas é importante falar também que esse processo se dá entre muitas escolhas, experimentações, algo como ir “tateando” até que, em certo momento, encontra-se uma configuração mais precisa (seja entre formas, imagens, idéias, pensamentos, referências, etc). Concordo com você quando diz que o acaso no meu trabalho parece estar mais nesse momento inicial. Há vários trabalhos que se originaram de situações totalmente imprevisíveis, incontroláveis, e que marcaram muito a minha produção. Essas fotografias das letras caindo da transparência é um ótimo exemplo disto. Foi uma situação que, quando ocorreu, não me levou a pensar em transformar esse acaso em trabalho, mas marcou a minha percepção sobre as letras, sobre a impressão de um texto se desprendendo de uma folha. Apenas anos depois (talvez cerca de cinco anos), retomei este material que era uma documentação de trabalho e então fiz as fotos Letras caindo. É como se o acaso trouxesse questões relevantes para pensar o meu trabalho e, antes disto, para fazer o próprio trabalho. Isso não significa que o acaso seja perceptível, embora ele esteja ali, latente como

uma memória do próprio processo de trabalho. Percebo com entusiasmo o trânsito tranqüilo que tu fazes de um suporte para o outro, de uma linguagem para a outra: fotografias, mapas, colagens, sobreposições, textos. Queria que tu comentasse o gosto e a possibilidade desse trânsito livre. Houve um momento em que percebeste que esse poderia ser um caminho? Essa é uma questão importante para mim. Não foi uma escolha deliberada em transitar de um suporte ao outro, mas a necessidade de resolver cada trabalho em sua questão intrínseca, própria a esse trabalho mesmo. Ou seja, não me preocupa muito se um trabalho vai ter como forma final uma fotografia ou uma tipografia, mas sim que a solução formal esteja de certo modo entranhada na questão conceitual ou no pensamento envolvido no trabalho. Então nunca pensei nisto como um caminho a seguir, foi algo que acabou acontecendo em decorrência do desenvolvimento dos trabalhos que fazia e faço. São escolhas conscientes sim, situadas num contexto de arte específico. Sempre acreditei que, em meio à aparente diversidade de referências e suportes, há um centro ou um eixo de interesse que é o que realmente importa no trabalho do artista. Através de uma produção aparentemente diversa, torna-se mais evidente quais são as questões fundamentais para o artista – é claro que para isso acontecer é necessário conhecer uma série de trabalhos do mesmo. No trabalho de conclusão da faculdade, abordei esta questão de como seria possível falar do processo de trabalho do artista criando uma espécie de genealogia desse processo. A maneira que encontrei para tratar desse assunto foi através de gráficos, de desenhos. E, por fim, a imagem de uma espiral dava conta da idéia de que a produção diversa de um artista faz parecer que ele está circulando em campos variados, mas esse movimento indica sempre uma convergência (ou divergência) de um “centro” (ou seja, dessa mesma idéia de que em algum momento se pode perceber a convergência de questões dos trabalhos que são aparentemente distintas). Na realidade, esse “trânsito entre linguagens” é mais um problema para o mercado do que para o artista. É mais cômodo para o mercado de arte que um artista produza trabalhos semelhantes e facilmente reconhecíveis em sua autoria. Talvez aí ainda resista uma ideia de estilo que é própria da arte moderna.

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Horizonte Marina Camargo

Sem Título (Letras na Parede) Marina Camargo

Afinal, o que seria estilo na produção de um artista? A repetição de formas? Ou a persistência de algumas questões? Parece que o teu trabalho mantém sempre (ou quase sempre) uma proximidade com o desenho. O desenho foi algo determinante no teu percurso? Hoje, o desenho afeta o teu jeito de perceber as coisas? Certamente o desenho é fundamental em meu trabalho e especialmente em minha formação. É um tema que sempre me interessa estudar e escrever, mas atualmente prefiro não tentar entender o que faço apenas através do viés do desenho – prefiro pensar que outras possibilidades podem me fazer compreender diferentes aspectos dos meus trabalhos. Quando refiro-me a desenho não estou falando de desenho tradicional de lápis sobre papel. Faço referência a uma noção mais ampla, do desenho ligado à formação de um pensamento visual. Fala-se em “escultura em campo expandido” (referindo a Rosalind Krauss) mas acredito que o desenho tem o potencial de não apenas se expandir como campo, mas de ser entendido como um campo maleável, permeável, poroso. Quando falo em desenho, muitas vezes tenho a impressão de estar falando de pensamento, o que de fato parece pertinente. Enfim, são questões que desenvolvi durante o mestrado e pretendo dar continuidade no estudo do assunto. Tudo isso para comentar que o desenho pode ser uma base do meu trabalho – esse desenho que define o pensamento visual (e viceversa). Isso não quer dizer necessariamente que tudo o que eu faça seja desenho. O desenho está para mim muito próximo do campo das ideias, da formação das ideias e da percepção do mundo, e este processo não é sempre visível ou perceptível no trabalho que é mostrado. Mencionaste que atualmente preferes pensar que outras possibilidades, além do desenho, podem te fazer compreender certos aspectos dos teus trabalhos. Cita um exemplo. A representação das coisas do mundo como uma maneira de apreender o mundo. Penso muito nessas representações que conhecemos e em como alguns deslocamentos de seus significados originais podem alterar (mesmo que minimamente) a percepção do mundo que nos cerca. Falo de representação em seu sentido original (e não necessariamente a questão da representação na história

da arte), no sentido de uma relação de convenção e correspondência entre dois elementos. A linguagem é um exemplo disso: se convenciona que um som corresponde a um objeto, que determinado código gráfico corresponde a esse som, enfim, são representações que formam a linguagem. O mesmo no caso dos mapas, como desenhos que reapresentam o urbanismo das cidades ou as formas geográficas de regiões. Interessa-me pensar na questão da sobreposição ou cruzamento de duas linguagens distintas que podem criar um ruído entre elas ou formar um outro sentido nesse encontro. Disseste: “O desenho está para mim muito próximo do campo das ideias, da formação das ideias e da percepção do mundo, e esse processo não é sempre visível ou perceptível no trabalho que é mostrado”. Há algo curioso aí: a possibilidade de o desenho, no contexto contemporâneo, manter ainda viva aquela característica de esboço, de anotação, de rascunho, que foi tão cara à arte desde os primórdios. Sim, e isso parece ser uma característica própria do desenho. Quando vejo desenhos feitos em qualquer momento da história da arte, tenho a impressão de que eles sempre guardam algo de atemporal, como se os estilos de cada época não “pesassem” sobre os desenhos, como se eles tivessem uma espécie de vida autônoma na história da arte. Enfim, isso é uma impressão minha. Mas o que é fato (e acredito que seja o que me leva a perceber os desenhos dessa forma) é que os desenhos sempre foram ligados ou próximos à ideia, ao pensamento. Isso torna o desenho, de alguma forma, atemporal (quando digo atemporal, não quero dizer que eles não tenham características da época em que foram feitos, mas que eles guardam um certo “frescor”, um caráter de certo modo sempre próximo da contemporaneidade – seja um desenho de Da Vinci, seja um desenho de Ingres, sejam desenhos das cavernas, mesmo que isolados de seus contextos originais, parecem pertinentes aos dias de hoje, e não como uma arte datada em determinada época e lugar). A palavra escrita – ou, ainda antes dela, a letra – seguidamente aparece como um elemento importante na constituição do teu trabalho. Eu queria saber como isso começou. Lembras qual foi o primeiro trabalho que apontou para essa possibilidade? Como aconteceu? Vem da percepção de que a palavra – ou a letra – é também um desenho?

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Caça-nada Marina Camargo

Cidades Apagadas Marina Camargo

Mapa I – Paris Marina Camargo

Os primeiros trabalhos com letras envolviam gelo também, como Caça-nada, que era um caça-palavras onde as letras de borracha estavam congeladas em blocos de gelo e, à medida em que o gelo derretia, as letras se misturavam e as palavras que se encontravam no início se perdiam. Ou um vídeo de uma letra “E” de gelo coberta de querosene que eu tentava colocar fogo, até que a letra aos poucos se derretia. Essas foram algumas das primeiras experiências com letras. Vendo com mais distanciamento, percebo que as questões que me interessam hoje já estavam presentes ali: essa perda de sentido original de elementos conhecidos (como as letras ou palavras), sendo bem importante no trabalho o modo como esse sentido é perdido ou é minimamente deslocado. O gelo dava conta dessa “transformação” de um sentido para outro (ou para nenhum), de uma certa organização que se transformava com o derretimento do gelo. Depois fui buscando outras maneiras de tratar as mesmas questões, nem sempre com o uso das letras. O interesse pelas letras vem sim dessa percepção de que elas são, em sua origem, desenhos. Da percepção de que, quando escrevemos, estamos desenhando. No entanto, são como desenhos esquecidos, pois o hábito faz com que a gente não as perceba mais como desenhos, mas como elementos de uma palavra, formando sentidos e significados, como um código. Houve ainda o caso, já mencionado, das letras caindo da transparência, durante uma apresentação de um trabalho na faculdade. Por um acaso, as letras começaram a se descolar da transparência, escorregando pela folha e grudando, pouco a pouco, em meus dedos. Se naquele momento a situação foi constrangedora, porque perdia o texto ali, com as letras se embaralhando enquanto tinha que falar sobre o barroco mineiro, foi também uma situação marcante na minha percepção das letras como elementos gráficos, de certo modo sólidos (mesmo que a solidez tivesse a espessura de uma mínima camada de tinta impressa sobre o papel). Essa situação de algum modo instaurou, para mim, um pensamento em relação às letras. O mapa, como a palavra, é outro elemento muito caro ao teu trabalho. O mapa é um desenho – um código – que fala da nossa condição no mundo: o que conhecemos, onde estamos, o que nos pertence. O que te levou aos mapas? Foram as viagens que me levaram aos mapas. Os primeiros trabalhos que

fiz com mapas foram durante o período em que estava vivendo em Barcelona (2003-2004). Foi um período em que comecei a buscar nos mapas um sentido de orientação não apenas no espaço, mas como uma maneira de dar conta de algo maior que era a experiência nas cidades, além da sensação de deslocamento que era constante. Neste período comecei a colecionar mapas de cidades e também mapas de céu. Se os mapas urbanos demarcam um espaço, os mapas celestes contam sobre o tempo, marcam a passagem do tempo (já que cada configuração do céu corresponde a um período ou momento do tempo). Ambos os tipos de mapas davam conta, de modo abstrato, deste sentido de deslocamento. Talvez seja como uma maneira de marcar um lugar no mundo, uma maneira de perceber uma posição em determinado lugar e tempo. Nesse período fiz os trabalhos Cidades apagadas (que depois teve um desdobramento em Eclipses, trabalho conjunto com Andrei Thomaz), o Fundo do mundo e os primeiros mapas de cidade desenhados com letras, como Mapa I (Paris). Depois seguiram-se trabalhos como Tipografia/Urbanização: NYC (também relacionado a outra experiência de viagem) e o Atlas do céu azul. Os trabalhos que têm como referência manuais de instruções também se relacionam com os trabalhos de mapas, neste sentido de trazer uma visão objetiva e mesmo linear para falar de outro tipo de experiência ou relação com a realidade (como por exemplo, Sentimentos distraídos e Brancusi no ar). Na medida em que evocam cidades que não existem, ou cidades que foram alteradas, os teus mapas conduzem, por diferentes caminhos, ao tema das utopias – não apenas pela representação de “outros mundos possíveis”, mas talvez, e sobretudo, pelo gosto de se apropriar de um código e dar uma torção nele. Pode ser? Não costumo pensar em utopias em meus trabalhos, embora talvez seja uma ideia por vezes presente. Mas com os mapas não penso nesse sentido utópico de criar um outro mundo possível não. Para mim, é mais presente a apropriação de um código e nesse deslocamento de sentido que pode ser provocado com essa “torção” do mesmo. Entretanto, seria ingenuidade pensar que esse deslocamento da representação aconteça sem consequências. Entre o que proponho e o que realizo, surgem espaços de interpre-

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Open Horizons Project Marina Camargo

Brancusi no ar Marina Camargo

tação ou mesmo de sentidos que não previ inicialmente. Por vezes os meus trabalhos me surpreendem abrindo outros caminhos não pensados ou não esperados. Em trabalhos recentes que tenho feito com mapas, tem sido sim uma questão relevante pensar em um outro urbanismo para as cidades, em possibilidades de jogar com a estrutura das cidades. Ou como no projeto Open horizons. Através do site do projeto, pessoas de diferentes lugares do mundo são convidadas a enviar fotografias onde um horizonte seja visível. As fotos são mostradas no próprio site, alinhadas através dos horizontes, em sequências aleatórias que o são determinas a cada nova visita, ou seja, a cada vez que você visita o site há uma nova configuração de imagens. Esse projeto é, para mim, absolutamente utópico. Na realidade, a própria concepção de o que é um horizonte já guarda algo de utópico: uma linha que se forma na paisagem, mas que não é lugar algum, que não existe de fato como lugar ou espaço, apenas como ponto de vista em relação à própria paisagem. No caso dos trabalhos que têm como referências os manuais de instruções, o que te motivou ali? O que me atrai nos manuais de instruções é a objetividade como as informações são dadas, como ações e significados são simplificados e esquematizados de modo a serem compreendidos com mais rapidez. São desenhos por excelência, que coabitam o campo das ideias – mas num sentido extremamente objetivo, que é o curioso deles. Lições de escultura: Brancusi no ar é uma espécie de manual que ensina a desenhar esculturas de Brancusi com as mãos, mostrando quais seriam os movimentos necessários para representar algumas de suas mais conhecidas esculturas. O formato do Brancusi no ar é como o de um “livro de cordel”, aqueles que são vendidos em feiras no Nordeste, pendurados em um fio. Sentimentos distraídos é um cartaz feito para ser distribuído, onde o desenho de um manual de montagem de um carro de brinquedo é cruzado com um texto de outro manual de instruções, que ensina como montar e limpar um motor de carro. Nesse texto, a palavra “motor” é substituída por “sentimento”, dando um sentido nonsense para o texto ao mesmo tempo que remete a conselhos sentimentais. Gosto muito de pensar nesses trabalhos como algo que as pessoas podem ter perto, levar pra casa, ler ou jogar fora.

Esses trabalhos que funcionam como manuais de instruções não chegam a ser engraçados, divertidos, mas guardam um certo humor, um estranhamento, que vem do fato de aquilo não ser esperado onde está. O humor é uma questão para ti? A pergunta é pertinente sim, mas nunca pensei no humor como um elemento específico do meu trabalho. Acho que questões que são importantes na minha vida acabam transparecendo nos trabalhos, querendo ou não. Seja a relação com os lugares onde vivo ou vivi, livros que li, paisagens que vi. E o mesmo acontece em relação ao humor, ou ironia, como o deslocamento mesmo de se ver algo que não é totalmente esperado em uma situação banal como na leitura de um manual de instruções. De qualquer modo, senso de humor é fundamental em minha vida.

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Interview by Eduardo Veras and translated by Mariana Bandarra

English Version

Interview with Marina Camargo Let’s start with some biographical data: where were you born? What did your parents do? Let us start with the origins, then! It is interesting to begin by talking about my life; I usually leave that information aside and focus on the origins of my work (such as conceptual origins, or issues that were relevant for the work I came to do afterwards, for instance). I was born in Maceió, in the state of Alagoas, and at a certain point in my childhood we moved to Porto Alegre. This change was really striking for me, but I only came to realize that later, when other changes happened. Every time I live in another city, even if temporarily, it becomes clear to me that my origins are not only in Porto Alegre, but also in other places, such as in northeastern Brazil. With the beaches and amusement parks of small towns (whether in the Sertão or on beaches such as Paripueira), the circus, which was an essential activity in a city that had no attractions other than beaches, and of course, a whole lot of sea, sea, sea. Even today when I arrive in a city for the first time, my references are often the ones I had back in the seasons we used to spend in Paripueira. I don’t come from a family of artists — my mother is a pharmacist and my father is an agricultural engineer. My mother had family down South that’s why we moved to Porto Alegre. I think this change of city ultimately made me into a drifter, but in a good way. Porto Alegre is the city where I had almost all my education, but it is not exactly where my whole story is. Over 20 years ago, Maceió was a small town with few cultural events. When we moved to Porto Alegre (my mother, my sister

and I), my mother took us to every performance she could, from operas and popular music concerts to plays and exhibitions, etc. Porto Alegre was, for me, a very exciting city, and was important to my education to be raised there. What could have awakened you to the arts? What was the moment when you realized something was art and that maybe you were interested in doing that? I couldn’t pinpoint the moment I became interested in art. My earliest memories are from kindergarten, a Montessori school where I remember having a great individuality and freedom to do my own thing (I wouldn’t say it was art...). The experience of autonomy and creativity is certainly striking. However, I could not — or dare not — define what makes an artist become interested in becoming an artist. Around the age of 15, I went back to taking art classes, and around that time I started painting and reading everything I could about art history. The desire to attend UFRGS’ Instituto de Artes came from a firm belief that I had, even back then, that art could not be just an occasional activity for me. At that moment, I had no idea how I could make a living on art, but I knew that was what I wanted to do. Finally, I think that art was really essential to me; perhaps it was a necessity, something that is the center/axis of life my life — though I’m a little reluctant to say it, because of the romantic tone it evokes... What was decisive during your time at Instituto de Artes, in Porto Alegre? What was remarkable about my time in Instituto de Artes was essentially awareness in terms of issues regarding art itself. Not the historical aspect (also important), but mainly the critical aspect regarding art and the art system (not in terms of criticism, but in terms of building a critical thinking oriented to an artist’s work). Is this critical thinking in relation to one’s own work what keeps an artist from ‘mindless making’? I ask this because your work in general appears to have been carefully constructed and planned. If there is some power of chance at play there (I am thinking, for example, of those photographs in which you collect the letters that fell out of the acetate sheet with your hands), it is much more oriented to an initial moment of the work, and never to its final outcome. I wouldn’t know how critical thinking changes “the making” of an artist, but it certainly changes the way that artists stand in the world, in art history, in the context of contemporary art. In my working process I don’t see this clear opposition between a ‘mindless making’ and a ‘critical making’. And I say this thinking of the many works that, at their ‘making’, seemed meaningless. But their meaning eventually became clear, in relation to other works and even critical issues or elements that were intrinsic to the work itself. In other words, ‘mindless making’ can be very important in an artist’s working process and, during this process, issues that are more important to the artist’s work and investigation arise. I mean, up until now I have been talk-

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ing about the working process. But it is also important to mention that this process takes place among many choices and experimentation; like “fumbling” your way until a certain point when you find a more accurate configuration (whether of shapes, images, ideas, thoughts, references, etc.). I agree with you when you say that the chance factor in my work seems to be more concentrated at that initial moment. Many of my works have originated from totally unpredictable, uncontrollable situations, and that has had great impact on my production. These photographs of letters falling from the transparency are a good example of this. It was a situation that, when it took place, it didn’t prompt me to think about turning that chance into a work, but it marked my perception about the letters, about a text printing falling off a sheet. It was only years later (maybe about five years) that I started to work on that again, which was documentation for a project, and then I produced the Letras caindo (Falling letters) photos . It’s as if chance contributed with relevant issues for me to think about my work and, before that, for me to actually do the artwork. It does not mean that chance is noticeable, although it is there, latent as a memory of the work process itself. I am enthusiastic to notice how smoothly you move between media, between languages: photographs, maps, collages, overlays, texts. I’d like you to comment on how it feels to have the possibility of this free transit. Was there a point when you realized that this was a possible path? This is an important issue for me. It was not a deliberate choice to move from one medium to another, but rather the need to resolve every project within the question that was intrinsic to the work itself. That is, I really don’t care much whether a work will take the final form of a photograph or a typography, but it matters to me that the formal solution is somehow “embedded” in the conceptual question or thinking involved in the work. So I never thought of it as a path to take; it was something that ultimately just happened because of the development of the works I did and do. They are conscious choices, yes, rooted in a specific context of art. I have always believed that, amidst the apparent diversity of media and references, there is an axis of interest, which is what really matters in an artist’s work. Through a seemingly diverse production, it becomes clearer what are the artist’s key issues — of course, in order for this to happen, one must know a series of works by the same artist. In my final project at university, I approached the issue of how it would be possible to talk about the artist’s working process by creating a sort of process genealogy. The way I found to address this issue was through graphics, drawings. And finally, the image of a spiral contained the idea that an artist’s diverse production makes it seem that they are circulating across various fields, but that movement always shows a convergence (or divergence) of a “center” (in other words, this same idea that at some point we can see the convergence of issues in works that are apparently different).

In reality, this “transit between languages” is more of a problem for the market than for the artist. It is more comfortable for the art market that an artist produces similar works, in which authorship is easily recognizable. Maybe that still shows an idea of style that is characteristic of modern art. After all, what would style be, in an artist’s production? The repetition of shapes? Or the consistency of certain issues? It seems that your work always (or almost always) maintains a close proximity to drawing. Was drawing something crucial in your career path? Does drawing currently affect your way of seeing things? Drawing is certainly very important to my work and especially to my education. It is a subject I am always interested in studying and writing about, but currently I prefer not to try to understand what I do only through the bias of drawing — I prefer to think that other possibilities can make me understand different aspects of my works. When I talk about drawing I’m not talking about the traditional drawing with a pencil on paper. I am talking about a broader notion, about drawing in terms of its connection to the formation of visual thinking. Considering the definition of “sculpture in the expanded field” (referring to Rosalind Krauss), I believe that drawing has not only the potential to expand as a field but also to be understood as a flexible, permeable, porous field. When I talk about drawing, I often have the impression that I’m talking about thinking, which indeed seems appropriate. Finally, these are issues I have elaborated during my Masters and I intend to continue studying the subject. All of this to say that drawing could be a basis for my work — this drawing that defines visual thinking (and vice-versa). This does not necessarily mean that everything I do is drawing. Drawing is, for me, very close to the realm of ideas, the formation of ideas and the perception of the world, and this process is not always visible or noticeable in the work that is shown. You mentioned that you currently prefer to think that other possibilities, beyond drawing, can make you understand certain aspects of your work. Name an example of that. I’m interested in the representation of things in the world as a way of apprehending the world. I think a lot about these representations as we know them, and about how some shifts from their original meanings can change (even if minimally) our perception of the world around us. I am talking about representation in the original sense (and not necessarily about the issue of representation in art history), in the sense of a relationship of correspondence and convention between two elements. Language is an example of that: it is agreed that a sound corresponds to an object, that a graphic code corresponds to that sound, and so on. Language is formed by representations. The same applies to maps, as drawings and that represent the urbanism of cities or the geographic shapes of regions.

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I’m interested in the issue of overlapping or crossing over two different languages that can create a noise between them or create new meaning from this encounter. You said: “Drawing is, for me, very close to the realm of ideas, the formation of ideas and the perception of the world, and this process is not always visible or noticeable in the work that is shown.” There is something odd here: the possibility of drawing keeping alive, in the contemporary context, that characteristic of sketching, mark-making and drafting, which art has held so dear since its beginnings. Yes, and that seems to be a typical characteristic of drawing. When I look at the drawings made at any point in art history, I get the impression that they always contain something timeless, as if the styles of each age don’t affect the drawings; it’s as if they have a sort of autonomous life in the history of art. Anyway, that’s just my impression. But the fact is (and I believe that is what leads me to view drawing in this way) that drawings have always been connected or close to ideas, to thinking. This makes drawing timeless in some way (when I say timeless I don’t mean they don’t have the characteristics of the time in which they were created, but they keep a certain “freshness”, a feature that in a way always keeps them close to what is contemporary — whether it is a drawing by Da Vinci, by Ingres, or cave drawings; even detached from their original contexts, they seem relevant today, and not a dated art form from a certain time and place). The written word — or even before that, the letter — then appears as an important element in the constitution of your work. I wonder how this started. Do you remember what was the first project that pointed to this possibility? How did it happen? Did it come from the realization that the word — or letter — is also a drawing? The first projects with letters also involved ice, such as Caça-nada (Huntnothing), which was a word search puzzle in which rubber letters were frozen into blocks of ice, and as the ice melted, the letters got mixed-up and the words that were initially there were lost. There was also a video with the letter “E” in ice covered with kerosene; I kept trying to set fire to it, until the letter slowly melted. These were a couple of the early experiences with letters. Looking back on it, I can see that the issues that interest me to this day were already present there: the loss of an original meaning of known elements (such as letters or words), and how this meaning is lost or minimally displaced is very important to the work. The ice took care of this “transformation” from one meaning to another (or none), of a certain organization that was transformed by the ice melting. Then I went looking for other ways to treat the same issues, not always using letters. The interest for letters does come from this perception that they are, originally, drawings. From the perception that, when we write, we are drawing. However, they are like forgotten drawings, since habit leads us not to perceive them as drawings anymore, but

rather as elements of a word, creating meaning and signifiers, like a code. There was also the case I already mentioned, of the letters falling from the transparency during a presentation of a project, in college. By chance, the letters began to fall off the transparency, sliding down the sheet and, little by little, sticking to my fingers. Although the situation was embarrassing at the time, because I was losing the text then and there, with the letters shuffling while I had to talk about the baroque from Minas Gerais, it was also a striking situation for my perception of letters as graphic elements, which are in a way solid (even if they were only as solid as the minimum thickness of the layer of ink on paper). That whole situation somehow led me to thought about letters. The map, like the word, is another element that is very important to your work. Maps are drawings — codes — that speak of our condition in the world: what we know, where we are, what belongs to us. What led you to the maps? Trips led me to maps. The first projects I did with maps were during the time I was living in Barcelona (2003-2004). It was a time when I began to look for a sense of orientation in the maps, not only in space but also as a way of realizing something greater, which was the experience in the cities, plus the feeling of displacement, which was constant. During this period I started collecting maps of cities and also maps of the sky. If urban maps delimit a space, sky maps tell us about time, they mark the passage of time (since each configuration of the sky corresponds to a period or to a moment in time). Both types of maps concerned, in an abstract way, this sense of shifting. Maybe it is like a way to mark a place in the world, a way to perceive a position at a given time and place. During this period I did the projects Cidades apagadas (Erased cities) (which later unfolded into Eclipses, a collaboration with Andrei Thomaz), Fundo do mundo (Bottom of the world) and the first city maps drawn with letters such as Mapa I (Paris). Then came projects such as Tipografia/Urbanização: NYC (Typography/Urbanization: NYC) (also related to another travel experience) and Atlas do céu azul (Atlas of the Blue Sky). The works that have references to instruction manuals are also related to the works with maps, in the sense of bringing an objective, and even linear, view to talk about another kind of experience or relationship with reality, such as Sentimentos distraídos (Distracted feelings) and Brancusi no ar (Brancusi in the air). To the extent that they evoke cities that do not exist, or cities that have been changed, your maps lead, through different paths, to the theme of utopias — not just the representation of “other possible worlds,” but perhaps more importantly, the taste for appropriating a code and giving it a twist. Is that right? I do not usually think about utopias in my work, although the idea may sometimes

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be there. But with the maps, I don’t think in this utopian sense of creating another possible world. For me, the code appropriation and that shift of meaning that can be triggered by giving it a “twist” is much more present. However, it would be naive to think that this shift of representation could happen without consequences. Between what I propose and what I accomplish, spaces of interpretation or even of initially unforeseen meanings are created. Sometimes my works surprise me by opening other paths I had not thought of or expected. In my recent work with maps, a relevant issue has been, indeed, thinking about another urbanism for cities, about possibilities to play with the structure of cities. Or like in Open Horizons project: through the project website, people from different places around the world are invited to submit photographs where a horizon is visible; the photos are displayed on the website itself, aligned across the horizons, in random sequences that are determined at each new visit, i.e., every time you visit the website, there is a new configuration of images. For me, this project is utterly utopian. In fact, the very conception of what a horizon is has something utopian about it: a line that forms in the landscape, but isn’t anywhere, that does not actually exist as a place or space, only as a point of view regarding the landscape itself. In the case of works that use instruction manuals as reference, what was your motivation there? What I find attractive about instruction manuals is the objectivity with which information is given; it is the way actions and meanings are simplified and schematized so that people can understand it quicker. They are drawings par excellence, which coexist in the realm of ideas — but in a very objective sense, which is the odd thing about them. Lições de escultura: Brancusi no ar (Sculpture lessons: Brancusi in the air) is a manual that teaches you how to draw Brancusi’s sculptures with your hands, showing what would be the necessary movements to represent some of his most famous sculptures. The format of Brancusi no ar (Brancusi in the air) is like a “cordel book”, the ones that are sold at street fairs in the Brazilian Northeast, hanging from a wire. Sentimentos distraídos (Distracted feelings) is a poster made for distribution, where the drawing of an assembly manual for a toy car is combined with a text from another instruction manual that teaches how to assemble and clean a car engine. In this text, the word “engine” is replaced by “feeling”, which gives a nonsense meaning to the text while evoking sentimental advice. I like to think of these works as something that people can have around, take home, read or throw away. These works that work as instruction manuals are not quite funny or amusing, but they have a certain sense of humor, a strangeness that comes from the fact that they are not expected to be where they are. Is humor an issue for you? The question is relevant, yes, but I have never thought of humor as a specific element in my work. I think the issues that

are important in my life ultimately transpire in my works, whether or not I want them to. Whether it is the relationship with the places where I live or have lived in, books I have read, landscapes I have seen... And the same goes for the sense of humor or irony, even as the shift of seeing something that is not entirely expected in an everyday situation, such as reading an instruction manual. Anyway, sense of humor is indeed essential in my life.

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representações

Andrei Thomaz Porto Alegre, RS, 1981

Daniel Escobar Santo Ângelo, RS, 1982

Marina Camargo Maceió/Porto Alegre, 1980

Mestre em Artes Visuais pela ECA/USP e professor no Istituto Europeo di Design e na Miami Ad School / ESPM, ambos em São Paulo. Sua produção artística abrange diversas mídias, digitais e analógicas, envolvendo também várias colaborações com outros artistas, entre as quais encontram-se performances sonoras e instalações interativas. Em 2006, foi um dos artistas recebedores do Prêmio FIAT Mostra Brasil. Em 2007, foi um dos ganhadores do Prêmio Atos Visuais 2007, da FUNARTE; e em 2009, foi um dos premiados do 63° Salão Paranaense. Junto com Daniel Escobar e Marina Camargo, foi um dos ganhadores do Prêmio de Ocupação dos Espaços da Funarte 2010, com o projeto Lugares/Representações. Como desenvolvedor, é sócio do escritório de tecnologia asa.tc, auxiliando diversas agências de publicidade e empresas de tecnologia na realização de projetos digitais para clientes como Itaú, Coca-Cola e outros. Vive e trabalha em São Paulo, SP.

Graduado em Artes Visuais pelo Instituto de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Entre suas principais exposições destacam-se as individuais Plano Diretor, na Galeria Mendes Wood (São Paulo, 2010), Verdades Lateriais na Rhys Mendes Gallery (Belo Horizonte, 2009) e Perto Demais no Goethe Institut (Porto Alegre, 2005) e as coletivas The Third Meaning (RH Gallery, New York, 2010), A Rua como Lugar de Convívio (Funarte, Belo Horizonte, 2009), Trânsitos e Irradiações (Arte Pará, 2008) e Associações Livres/Ler é Acreditar (MAC-RS, 2007). Em 2008 participou do programa de residências artísticas Bolsa Pampulha (Museu de Arte da Pampulha, Belo Horizonte, MG) e em 2009 foi indicado ao Prêmio CNI/SESI Marcantônio Vilaça para as Artes Plásticas. Foi premiado no 6º Salão Nacional de Arte de Jataí-GO (2007), 62º Salão Paranaense-PR (2007), Prêmio Fiat Mostra Brasil-SP (2006), 1º Prêmio Açorianos de Artes Plásticas-RS (2006) e 17º Salão da Câmara Municipal de Porto Alegre-RS (2006). Em 2010 recebeu o Prêmio Funarte de Arte Contemporânea pelo projeto Lugares/Representações, juntamente com Marina Camargo e Andrei Thomaz. Vive e trabalha em Belo Horizonte, MG

Em 2010-2011 é artista bolsista do DAAD, na Akademie der Bildenden Künste München (Alemanha). É mestre em artes visuais (Instituto de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Porto Alegre, 2007) e pósgraduada em Cultura Visual (Universidad de Barcelona, Espanha, 2004). Entre as exposições individuais estão: Mundos Paralelos (Galeria Bolsa de Arte, Porto Alegre, 2009); Biblioteca (Centro Cultural São Paulo, 2008); Espaçamento (MAC, Curitiba, 2008); Palavra Perdida (Galeria Virgílio, 2008); Mundo (2005) e Coletas Caligráficas (2003), Centro Cultural Brasil Espanha, Porto Alegre; ou O Gráfico das Letras (Goethe-Institut, Porto Alegre, 2002). Entre as principais exposições coletivas: Percursos Simulados, Paço da Artes (São Paulo, 2011); The South Project, The West Wing art space (Melbourne, Austrália, 2010); Dois Pontos, Museu Murillo la Greca (Recife, 2010); Convivência Espacial (Murillo la Greca / Recife e Fundação Ecarta / Porto Alegre, 2010); 7º Bienal do Mercosul, mostra “Projetáveis” (Porto Alegre, 2009); 15º Salão da Bahia, MAM – Salvador (2008); Palavra Figurada (Espaço Cultural ESPM, Porto Alegre, 2007); Atos Visuais, FUNARTE, Brasília (2006); Usos Rituals – mès enllá del lenguatge, Centre Civic Can Felipa (Barcelona, Espanha, 2005). Recebeu o Prêmio Açorianos (2010), o prêmio aquisição do Centro Cultural São Paulo (2008), Prêmio Brasil Arte Contemporânea (projeto Percursos, com Romy Pocztaruk, 2010). Vive e trabalha em Munique, Alemanha.

http://www.andreithomaz.com

http://www.danielescobar.com.br

http://www.marinacamargo.com

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Eduardo Veras Porto Alegre, RS, 1965

Guilherme Wisnik São Paulo, 1972

Jornalista, professor e pesquisador no campo de Artes Visuais. Doutorando em História, Teoria e Crítica de Arte pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), desenvolve pesquisa sobre enunciados verbais na arte contemporânea (sob orientação de Mônica Zielinsky). É mestre pela mesma instituição, com dissertação sobre o uso da entrevista em estudos sobre o processo de criação artística (sob orientação de Elida Tessler). É bacharel em Jornalismo pela UFRGS. Leciona no Curso de Realização Audiovisual e no Curso de Comunicação Social da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), em São Leopoldo. Assinou a curadoria das exposições Palavra figurada (2007), no Espaço Cultural da ESPM, em Porto Alegre, e Francisco Stockinger – O combate silencioso (2008), no Centro Cultural dos Correios, no Rio de Janeiro. Prepara curadoria sobre o desenho de Iberê Camargo para a fundação que leva o nome do artista, com sede em Porto Alegre. Integra o conselho consultivo da Fundação Vera Chaves Barcellos. Como repórter, editor e crítico de arte, atuou no Segundo Caderno e no caderno Cultura do jornal Zero Hora entre 1993 e 2010.

Arquiteto, crítico e curador. Professor da Escola da Cidade, é formado pela FAU-USP, mestre em História Social pela FFLCH-USP, e doutorando pela FAU-USP. Autor de Lucio Costa (Cosac Naify, 2001), Caetano Veloso(Publifolha, 2005) e Estado crítico: à deriva nas cidades (Publifolha, 2009), e organizador do volume 54 da revista catalã 2G (Gustavo Gili, 2010) sobre a obra de Vilanova Artigas. Suas publicações também incluem o ensaio “Modernidade congênita”, em Arquitetura moderna brasileira (Phaidon, 2004), “Exercícios de liberdade”, em Marcos Acayaba (Cosac Naify, 2007), e “Hipóteses acerca da relação entre a obra de Álvaro Siza e o Brasil”, em Álvaro Siza modern redux (Hatje Cantz, 2008). É colaborador do jornal Folha de S. Paulo, e curador do projeto de Arte Pública Margem, pelo Itaú Cultural.

Gabriel Menotti Brasil, 1983

Vitor Cesar Fortaleza, 1978

Curador e crítico independente, envolvido com formas variadas de cinema. Já organizou exibições de filmes pirata, festivais de cinema remix, campeonatos de videogame, laboratórios de roteiro pornô, instalações com projetores super8, exposições de arte generativa e seminários acadêmicos. Possui mestrado em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP com a tese “Através da Sala Escura – Uma aproximação entre a Sala de cinema e os espaços do VJing,” premiada com no programa Rumos Itaú Cultural Artes Cibernética. Atualmente, é estudante de doutorado tanto na PUC-SP quanto no departamento de Mídia do Goldsmiths College (University of London). Entre os mais recentes eventos com que contribuiu estão o festival Artivistic (Montreal); o atelier Interactivos?! (Madrid); o 16o International Symposium of Electronic Arts (Dortmund); a 29a Bienal de São Paulo; e os Rencontres Internationales Paris/Berlin/Madrid.

Artista, com formação em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal do Ceará (2003), realizou mestrado em Artes Visuais pela Universidade de São Paulo (2009), sob orientação de Ana Maria Tavares, com pesquisa sobre as propriedades críticas da arte na constituição de esferas públicas. Vem desenvolvendo propostas artísticas que procuram constituir seu público por meio de uma dinâmica da vida cotidiana. Entre seus projetos destacam-se “Sobrepostas, Permeáveis e Intercambiáveis”, no Centro Cultural Banco do Nordeste, em Fortaleza (2009) e “Arte e Esfera Pública”, Edital Conexão Artes Visuais, São Paulo (2008). Vem desenvolvendo projetos gráficos com diferentes artistas e instituições como o Centro Cultural São Paulo e Centro Cultural da Espanha em São Paulo. Realizou residência no Capacete / 29º Fundação Bienal de São Paulo, no Rio de Janeiro (2010); no Taller de proyectos com Antoni Muntadas, Fundación Marcelino Botín, em Santander (2008); e no MuseumsQuartier, em Viena (2006).

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Andrei Thomaz

Lugares/ Representaçþes

Daniel Escobar

Imagens

Marina Camargo

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Detalhe de Permeável XII (Série Perto Demais)

Vista da exposição

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Imagem acima Permeável XI (Série Perto Demais) 2011 Cartazes outdoor publicitários perfurados e sobrepostos. 220 x 150cm Daniel Escobar

Permeável XII (Série Perto Demais) 2011 Cartazes outdoor publicitários perfurados e sobrepostos. 220 x 150 cm Daniel Escobar 51


O mundo (atĂŠ o fim) 2009 6 fotografias que registram o derretimento de um gelo em forma de mapa. 45x60cm (cada), 100x200cm (total) Marina Camargo

Vista da exposição

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The end 2010 Fotografia 35x60cm (cada foto) Marina Camargo

Movement in Squares. Bridget Riley, 1961 2010 Web art, loop Andrei Thomaz 54

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Horizontes simulados 2006 Fotografia 20x40cm cada Marina Camargo

Vista da exposição

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Palácio das Esferas 2010 Recortes sobre guias turísticos de Belo Horizonte, metal, acrílico e lâmpadas Dimensões variáveis Daniel Escobar

Vista da exposição

Detalhe de Plano Diretor - Hiperminas Pampulha 2009

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Plano Diretor - Hiperminas Pampulha 2009 Mapas extraídos de sacolas plásticas, pregos e imãs | 165cm x 100cm Daniel Escobar 59


Cidades Azuis 2009 Colagem - Imagens de céus extraídas de guias turísticos. 100 x 30 x 4cm (cada) Coleção particular Daniel Escobar

Vista da exposição

Vista da exposição

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GPS São Paulo 2011 Jogo de tabuleiro – cartas, tabuleiro, folheto de regras, peões. Dimensões variáveis. Andrei Thomaz

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Mapa celeste de fevereiro de 2011, hemisfério sul. Mapa da cidade de São Paulo.

Universos paralelos – SP 2011 Desenho de mapa da cidade de São Paulo em caixa de luz e placa de acrílico com furos que desenham um mapa celeste. 52x72x12cm Marina Camargo

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Some air in between 2011 Placa de madeira com recortes que desenham parques e praças da cidade de São Paulo, lâmpada e mesa. 55x30cm Marina Camargo

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Eclipses 2007 Ruas homônimas em diversas cidades do Brasil são buscadas através de software, que sobrepõem todas as ocorrências encontradas em uma única imagem. Software e projeção Marina Camargo e Andrei Thomaz

Vista da exposição

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Changing Landscapes 2011 Software que gera imagens compostas a partir de fotografias de um mesmo local em diferentes momentos, cedidas por empresas de outdoor Daniel Escobar e Andrei Thomaz

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Andrei Thomaz Trabalhos anteriores

Auto-retrato no labirinto 2008 Web art Andrei Thomaz

Imagens selecionadas de arquivo cedido pela empresa Fator 1 Outdoor - Belo Horizonte MG, utilizadas na obra Changing Landscapes 66

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Para desenhar com os olhos. Para percorrer com os olhos 2007 Animação Andrei Thomaz

A caça e o caçador 2008 Animação para web, loop.

Andrei Thomaz 68

Teia 2008 Performance sonora. Colaboração com Alexandre Fenerich, Alexandre Porres, Francisco Serpa, Giuliano Obici, Lílian Campesato, Patrícia Francisco, Valério Fiel da Costa e Vitor Kisil. Crédito da imagem: Mário Ladeira / Arquivo FILE. Andrei Thomaz

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DĂŠdalo e Ariadne 2004-2006 Software desenvolvido pelo artista Andrei Thomaz

PacMan e o Minotauro 2004 Web art Andrei Thomaz 70

Cubos de Cor 2007 Web art

Andrei Thomaz 71


Sonocromática Performance sonora. Em parceria com Francisco Serpa, Lílian Campesato e Vitor Kisil. Crédito da imagem: Mário Ladeira / Arquivo FILE. Andrei Thomaz

Labirintos Invisíveis 2008 Game art

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Andrei Thomaz 73


Quando uma página torna-se um labirinto 2006 Web art. Em parceria com Martin Heuser Andrei Thomaz

Somewhere in Time 2009 Instalação

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Andrei Thomaz 75


Daniel Escobar Trabalhos anteriores

Zoom I 2011 Cortiรงa, alfinetes para mapas e fragmentos de cartazes outdoor publicitรกrios. 60 x 90cm Daniel Escobar

Detalhe de Zoom I 2011

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Zoom II 2011 Cortiรงa, alfinetes para mapas e fragmentos de cartazes outdoor publicitรกrios. 60 x 90cm Daniel Escobar

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Imagem acima Permeável IX (Série Perto Demais) 2008 Cartazes outdoor publicitários perfurados e sobrepostos. 200 x 200 cm. Coleção particular Daniel Escobar

Imagem acima Permeável VII (Série Perto Demais) 2007 Cartazes outdoor publicitários perfurados e sobrepostos. 200 x 200 cm. Coleção particular Daniel Escobar 78

Horizontes Possíveis I, II, III e IV 2009 Cartazes outdoor publicitários perfurados e sobrepostos. 120 x 80cm (cada) Daniel Escobar 79


A Verdade das Coisas 2009 Faixas publicitárias recolhidas das ruas de Belo Horizonte e fibra de poliéster. Dimensões variáveis Daniel Escobar

Mirante 2010 Compensado, peças de madeira e fragmentos de catálogos de venda de imóveis. Dimensões variáveis Daniel Escobar 80

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Cidades Enigmas I 2008 Recortes de mapas turísticos sobre papel 76 x 53cm Daniel Escobar

Cidades Enigmas II 2008 Recortes de mapas turísticos sobre papel 76 x 53cm. Coleção particular Daniel Escobar 82

Cidades Enigmas III 2009 Recortes de mapas turísticos sobre papel 76 x 53cm Daniel Escobar 83


As Cidades e o Desejo 2009 Recortes sobre guias turísticos de Belo Horizonte e madeira. 110 x 165 x 87cm. Coleção particular Daniel Escobar

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Marina Camargo Trabalhos anteriores

Letras Caindo 2006 Fotografias de letras caindo de transparĂŞncia. 38x50cm Marina Camargo 86

Mapa II (Porto Alegre) 2009 Desenho de mapas de cidades 50x70cm e 70x80cm Marina Camargo

Mapa I (Paris) 2004 Desenho de mapas de cidades 50x70cm e 70x80cm Marina Camargo 87


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Página anterior Atlas do Céu Azul – Africa e Polar Regions 2008 Desenho e fotografia. 75x90cm Marina Camargo

Lições de Escultura – Brancusi no Ar 2002 Impressão sobre papel. 1º edição: 2002 / 2º edição: 2010. 14x10cm Marina Camargo 90

Sentimentos distraído 2006 Impressão sobre papel. 44x35cm

Marina Camargo 91


Open Horizons Project 2010 Detalhes: seleção de fotografias enviadas ao projeto Projeto colaborativo, onde fotos de horizontes são enviadas através do site do projeto, sendo todas as imagens enviadas alinhadas a partir de uma única linha do horizonte. www.horizons-project.com Marina Camargo

Horizonte 2008 50x50cm (cada). Fotografia

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Marina Camargo 93


Tipografia/Urbanização: NYC 2007 Tipografia formada por desenhos de quadras da cidade de Nova Iorque. Marina Camargo

Sem título (letras na parede) 2009 Peças em acrílico na parede. Dimensões variáveis Marina Camargo 94

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Presidente da República

Dilma Rousseff

Ministra de Estado da Cultura

Ana de Hollanda

Fundação Nacional de Artes Presidente Diretora Executiva Diretor do Centro de Artes Visuais Coordenadora do Centro de Artes Visuais Coordenadora do Prêmio Funarte de Arte Contemporânea Coordenador de Comunicação Representação Regional da Funarte São Paulo Coordenador

Antonio Grassi Myriam Lewin Francisco de Assis Chaves Bastos (Xico Chaves) Andréa Luiza Paes Ana Paula Santos Oswaldo Carvalho Roberto Bicelli (substituto)

LUGARES/ REPRESENTAÇÕES Artistas

Andrei Thomaz Daniel Escobar Marina Camargo

Acompanhamento crítico Produção executiva Assessoria de imprensa Website

Guilherme Wisnik Andrei Thomaz Eliane Weizmann Andrei Thomaz Vitor Cesar Guilherme Wisnik Gyorgy Forrai Luciana Ohira Sérgio Bonilha Diogo Cardoso Fred Estrela Mauro Martorelli Ronei Novais

Projeto expográfico Montagem Iluminação

CATÁLOGO-LIVRO Projeto editorial Textos Entrevistas Tradução Revisão Projeto Gráfico Fotografia

Agradecimentos

Distribuição Gratuita proibida a venda

Catálogo-livro Andrei Thomaz Daniel Escobar Marina Camargo Gabriel Menotti Guilherme Wisnik Eduardo Veras Mariana Bandarra Nick Rands Mariana Bandarra Vitor Cesar Alessandro Coelho / p. 32, 33, 35, 51, 76, 77, 78, 79, 80, 81, 82 e 83 Eduardo Jorge / p. 35, 84 e 85 Fernando Iazzetta / p. 69 Flávio Lamenha / p. 50, 53, 56, 58, 59, 60, 61, 62 e 64 Jorge Bueno / p. 32 Marina Camargo / p. 52, 53, 54, 56, 57, 62, 63, 86, 87, 88, 89, 90, 91, 92, 93, 94 e 95 Mário Ladeira / Arquivo FILE / p. 23 e 69 Aderlize Martins Alessandro Coelho Aline Gambim Bruno Vieira Carolina Bueno DAAD – Deutscher Akademischer Austasch Diogo Moraes Egon Kroeff Eliza Albuquerque Fator 1 Outdoor Fernanda Albuquerque FILE Fernando Iazzetta Galeria Bolsa de Arte Galeria Mendes Wood Laíza Cristina Gonçalves Leandro Araújo Matthew Wood Marga Pasquali Museu de Arte da Pampulha Pedro Mendes Roberto Andrés Rodrigo Linhares Tetê Tavares

Lugares/Representações Formato 21 x 30cm, 96 páginas. Composto em Akkurat, Akzidenz Grotesk e Arnhem. Miolo em papel Off-set 120g/m² e couchê fosco 150g/m². Capa em papel Supremo 250g/m². Tiragem 600 exemplares Impresso em São Leopoldo (RS, Brasil), em abril de 2011, pela Impressos Portão.




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