Mateus capelo - Portfolio

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oturnos N


Noturno é uma composição musical que evoca ou é inspirada pela noite, executada em piano solo. Geralmente cria-se uma entidade que não desenvolve um dado tema, forma conhecida e nem mesmo um programa literário. Em vez disso, cria-se uma atmosfera que se desenvolve no próprio processo de sua execução.


























O filósofo tcheco e naturalizado brasileiro, Vilém Flusser, dizia que estamos vivendo cada vez mais na ponta dos dedos. Discursos de negação ao corpo que antes provinham do cristianismo, atualmente ganham voz através da ciência: onde o corpo é um rascunho a ser aperfeiçoado, lugar da morte, finitude e doença. A farmacologia, neurociência e tecnologia fundamentam seu olhar, e parte de sua pesquisa volta o corpo não para a saúde, mas sim em modos de remediar sintomas dentro das enfermidades que a sociedade mesma produz. Na religião, o corpo encontra terreno enquanto expulsão, culpa, pecado e dor. O próprio Estado possui domínio do corpo, como hoje vemos as discussões sobre o direito da união de pessoas do mesmo sexo, adoção, suicídio e questões do aborto. São diversos os discursos de normatização: nas mídias, comerciais, instituições e redes sociais, todos possuem a resposta de como o outro deve se portar. E a promessa ao acesso da felicidade ganha maior projeção ao nível das substâncias no mercado: remédios para o humor, comer, crescer músculos, engravidar, dormir, estresse, depressão, disfunção erétil (também entre os jovens), cirurgias plásticas, etc. Preocupa-se mais com o resultado imediato do que com a vivência e processo da experiência. A proposta é que se tente o oposto: ao invés de aumentar a substância (o discurso normativo, aquilo que está fora do ser), que se aposte no desenvolvimento da própria sensibilidade diante do mundo. A série chamada Noturnos baseia-se em projeções de imagem sobre o corpo. Num mundo visual como nosso, sabemos que imagens produzem desejos, e quando se usa a própria imagem no projetor, trata-se de uma referência ao conhece-te a ti mesmo socrático: o desejo de que a verdade pessoal se manifeste, um encontro consigo mesmo. Transmitir o explorar e sentir o próprio corpo na busca da consciência, e não a modificação do mesmo por causa de uma promessa ou discurso externo, se faz como intenção. O “descobrir-se” se relaciona com a nudez e a imagem projetada sobre o corpo, revela um encontro com algo que pode se chamar de desejo genuíno: a descoberta daquilo que fortifica e se encontra ainda puro. Algumas palavras são essenciais para este trabalho: possibilidade, erro (riscos), sensibilidade, verdade e desejo. Olhando atentamente aos desenhos, se percebe traços fugidios, incompletos e espaçados. Riscos que se repetem sem medo de deixar o erro perceptível ou até mesmo gritante. O vazio dá lugar e impõe-se nestas obras principalmente em contraponto ao mundo de hoje, que parece querer preencher a tudo com um sentido qualquer. O corpo é o fio condutor destes trabalhos. O explorar cada parte para fazer emergir seus pontos de beleza em seus vários modos, e ouvi-lo dizer suas verdades é o que interessa. Desmitificar, desvelar e principalmente descobrir-se desses discursos quando punitivos, infligindo pena e mutilação dentro de um processo de negação de si mesmo. Não se trata de destruí-los, e sim desconstruí-los. A proposta pode se resumir a sentença: descobrir-se para se descobrir. O desenvolvimento da sensibilidade através da Arte.


Mateus Capelo mateuscapelo@gmail.com www.mateuscapelo.com

G r a d u a d o e m F i l o s o fi a p e l a Universidade Federal de Santa Catarina, com ênfase em Filosofia da Arte. Formado em técnico em Sistemas de Informação, com ênfase em aplicativos de estúdio virtual e imagem. Artista autodidata, desenvolve seus trabalhos através de d e s e n h o , f o t o g r a fi a , m ú s i c a e performance visual/sonora.



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