Padrões Morfológicos dos Ecossistemas Urbanos: a dimensão da sustentabilidade ambiental da infraestrutura ecológica na ocupação Dorothy Stang Mateus Rangel, Fernanda Soares, Liza Andrade, Natália Lemos, Sandra Andrade, Sacha Pereira e Vânia Loureiro Universidade de Brasília Quadra 23, Casa 76, Setor Leste – Gama DF; (61) 9 9804-1295 fernandacampos95@gmail.com, lizamsa@gmail.com, marqueszmateus@gmail.com, lemos.natalia@gmail.com, sacha.qpereira@gmail.com, vania.teles.loureiro@gmail.com
Resumo O objetivo deste artigo é apresentar o processo de projeto urbanístico participativo emergente para a Ocupação Dorothy Stang, localizada no Distrito Federal, com ênfase na dimensão da sustentabilidade ambiental, quanto à forma urbana e os padrões morfológicos dos ecossistemas urbanos de infraestrutura ecológica, desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa e Extensão “Periférico, trabalhos emergentes” no âmbito da extensão urniversitária, do edital nº 1/2017 (DEX-DPI) em parceria com o Escritório Modelo CASAS da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UnB visando contribuir para o processo de regularização fundiária. Trata-se de uma comunidade de 606 famílias de baixa renda assentadas em habitações provisórias. Pretende-se demonstrar os resultados da primeira fase do projeto de Extensão, o questionário de envolvimento baseado nas dimensões da sustentabilidade ambiental, foco deste artigo e os mapas afetivos e colaborativos sobre a situação existente para entendimento da apropriação do espaço pela comunidade e os impactos ambientais. O processo de projeto foi desenvolvido partindo-se das demandas e vocações levantadas: análise do problema e da identidade local, os saberes existentes, os padrões espaciais e de acontecimentos de acordo com as dimensões da sustentabilidade, social, cultural e emocional, econômica e ambiental (ANDRADE E LEMOS, 2015). As dimensões apresentadas se relacionam à escala do desenho urbano e seus impactos na sociedade, responsáveis pela garantia do direito à cidade efetivo, viabilizado por um tipo de desenho que veicule a complexidade desejada que promova a regularização fundiária efetiva, e não apenas o cumprimento da demanda habitacional. Foram criadas quatro subdivisões no questionário, garantindo a amplitude dos assuntos. Buscou-se a adequação das perguntas a cada dimensão de modo reconhecer, na opinião dos moradores, o impacto de cada princípio na ocupação. Além do questionário, foi feita uma oficina com mapas afetivos baseados igualmente nas dimensões de análise e nos princípios de sustentabilidade. Os padrões foram sistematizados para estabelecer uma linguagem com a comunidade, aumentando a sua participação no processo, na forma de “códigos geradores” de soluções para o processo de desenvolvimento dos projetos (ALEXANDER et al., 1977) e padrões dos ecossistemas urbanos (ANDRADE, 2014). Os resultados da forma urbana da dimensão da sustentabilidade ambiental apresentado, por um dos grupos de trabalho, considerando o “saber fazer popular”, tiveram como principal preocupação o desenho urbano sensível à água com padrões de infraestrutura ecológica. O traçado urbano foi ajustado para acompanhar as curvas de nível e as águas, bem como a configuração das quadras, com uma área verde comunitária ao centro, espaços livres públicos e ruas, servidos com canais de infiltração, jardins de chuva e pracinhas de infilltração. 1
Palavras-chave: Sustentabilidade; Processo participativo; Dorothy Stang; Sustentabilidade Ambiental; Linguagem de padrões.
1. Introdução O conceito de ecossistemas urbanos aplicado à forma urbana é utilizado aqui em duas vertentes: uma adotada por pesquisadores do Cary Institute of Ecosystems Study dos EUA, abrange os componentes do ambiente construído, sociais, biológicos e físicos, sistematizados por Andrade (2014) como padrões dos ecossistemas urbanas, e a outra, utilizada por pesquisadores espanhóis, como “desenho social urbano”, trabalha o desenho de espaços ambientais e dinâmicos na busca pela melhoria da auto-organização dos cidadãos, interação comunitária e suas relações com o meio ambiente. Assim, entende-se que o processo participativo no planejamento urbano e regional permite reforçar que os cidadãos se reconheçam em seu bairro e em sua cidade bem como tenham uma noção melhor dos processos ambientais e da paisagem. O objetivo deste artigo é apresentar o processo de projeto urbanístico participativo emergente para a Ocupação Dorothy Stang, localizada no Distrito Federal, com ênfase na dimensão da sustentabilidade ambiental1, quanto à forma urbana e os padrões morfológicos dos ecossistemas urbanos de infraestrutura ecológica, desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa e Extensão “Periférico, trabalhos emergentes” e o Escritório Modelo CASAS da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília no âmbito da extensão urniversitária, visando contribuir para o processo de regularização fundiária. A forma urbana auto-organizada pela ocupação de 606 famílias, foi sendo autoconstruída em barracos de madeirite com lotes de 120m2. Mesmo com a informalidade, houve a preocupação em causar menos impactos no meio ambiente, com normas pré-estabelecidas quanto aos materiais de construção, o tratamento de esgoto com fossas-bananeiras e a manutenção da vegetação nativa. Entretanto, ainda requer cuidados quanto ao manejo de resíduos e de águas pluviais. As prinicpais ruas são intransitáveis devido às erosões promovidas pelas chuvas, alguns pontos apresentam entulho, sendo o mais crítico na mina d’água localizada no centro do assentamento. O processo de projeto foi desenvolvido partindo-se das demandas e vocações levantadas: análise do problema e da identidade local, os saberes existentes, os padrões espaciais e de acontecimentos de acordo com as dimensões da sustentabilidade, social, cultural e emocional, econômica e ambiental (ANDRADE E LEMOS, 2015). Os padrões foram sistematizados para estabelecer uma linguagem com a comunidade, aumentando a sua participação no processo, na forma de “códigos geradores” de soluções para o processo de desenvolvimento dos projetos os padrões (ALEXANDER et al., 1977) e padrões dos ecossistemas urbanos (ANDRADE, 2014). Desta maneira, foram realizadas algumas oficinas para estabelecer uma comunicação mais direta com a população local: (1) identificação de situações positivas ou negativas por meio de ícones (2) elaboração de padrões que respondessem aos problemas apontados. Posteriormente, foi elaborado um estudo preliminar levando-se em consideração os príncípios da dimensão ambiental: proteção ecológica e agricultura urbana; infraestrutura verde, gestão d’água,drenagem natural e tratamento de esgoto alternativo; conforto ambiental; promoção dos sistemas alternativos de energia e diminuição da pegada ecológica; saúde; e, redução, reutilização e reciclagem de resíduos. As analises das Dimensões da Sustentabilidade Social, Cultural, Econômica e Ambiental podem ser vistas no artigo publicado por ANDRADE, Liza Maria Souza de: LEMOS, Natália; LOUREIRO, Vânia e COSTA, Ártemis. URBANISMO PARTICIPATIVO NA PRODUÇÃO DO ESPAÇO EM BRASÍLIA COMO FORMA DE RESISTÊNCIA: o caso do processo de regularização fundiária da Ocupação Dorothy Stang. In: II Seminário Internacional Ubanismo Biopolítico, Belo Horizonte, 2018. 1
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1.1 O contexto da Ocupação Doroty Stang em Brasília no Distrito Federal do Brasil Brasília, desde antes do início de sua construção, já agregava núcleos urbanos que davam suporte à construção da capital, processo resultante de um grande fluxo migratório iniciado na década de 1950, que posteriormente ocasionou um inchaço urbano tamanho que, culminaria na formação de novos núcleos urbanos informais (PAVIANI, 1991). Ao longo da história de Brasília, esses núcleos urbanos foram paulatinamente sendo reconhecidos e transformados nas atuais cidades-satélites, responsáveis por abrigar a maioria da população. A necessidade de fixar-se no território, aliada à ineficiência dos programas habitacionais do governo federal faz com que uma parcela significativa da população necessite autoconstruir a cidade e as suas casas. Brasil (2009, apud. NASCIMENTO et al. 2016) aponta que cerca de 70% das habitações construídas no país são auto produzidas, geralmente assentadas em terrenos irregulares e sem nenhum respaldo técnico. Tendo em vista a gravidade da situação exposta, acredita-se que é preciso problematizar a implementação de programas sociais de habitações padronizadas como os do PMCMV pelo governo federal, que não foram concebidos em conjunto com a população, muitas vezes excluindo o contexto urbano e o saber local. A Ocupação Dorothy Stang teve início em 2015 e está localizada na Região Administrativa de Sobradinho no Setor Habitacional Nova Colina em Área de Relevante Interesse Social – ARIS do PDOT. Consolidou-se inicialmente por meio do movimento social da “Frente Nacional de Luta” - FNL com aproximadamente 544 famílias, compostas por moradores das regiões periféricas do Distrito Federal, próximas ao campo, que não conseguem pagar aluguel. Como forma de fortalecer a união dentro da ocupação e a distribuição de tarefas “comuns” formaram a “Associação de Moradores, Lutadores e Apoiadores do Residencial Dorothy Stang”- AMLARDS. A demanda de um projeto urbanístico que valorizasse a “produção do comum” por meio de abordagens colaborativas e inclusivas fez com que membros da associação buscassem assessoria técnica da Universidade de Brasília. Por solicitação da própria comunidade do Dorothy Stang, o envolvimento da Extensão da Universidade de Brasília se deu por meio dos Projetos de Extensão de Ação Contínua - PEACs do Grupo de Pesquisa “Periférico, trabalhos emergentes” e do Escritório Modelo CASAS da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. No edital Nº 01/2017 – DEX/DPI foi então aprovado o projeto “O Cantinho de Todos: o desenho urbano socioecológico do Dorothy Stang à mão de seus ocupantes”. Neste contexto, pretende-se demonstrar uma parte da sistematização do processo participativo para a concepção do espaço urbano da ocupação Dorothy Stang, com ênfase da dimensão ambiental. A contínua expansão de Sobradinho deu origem aos setores Nova Colina I e II, uma região que, de acordo com o Plano de Ordenamento Territorial (PDOT), é classificada como Área de Regularização de Interesse Social (ARIS), que compreende “áreas ocupadas predominantemente por população de baixa renda, até cinco salários mínimos, sendo consideradas como Zona Especial de Interesse Social – ZEIS, para os fins previstos no Estatuto da Cidde.” (TERRACAP, 2018).
Figura 1 - Poligonal de Sobradinho Fonte: Arquivo pessoal dos autores.
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Figura 2 - Localização do Assentamento Dorothy Stang Fonte: Arquivo pessoal dos autores.
2. Metodologia A metodologia das dimensões provém de estudos realizados por Andrade (2005) sobre a visão ecossistêmica para à aplicação de princípios de sustentabilidade ambiental, que poderiam ser adaptados e adotados para o desenho de cidades brasileiras, formais ou informais (ANDRADE E LEMOS, 2015). A metodologia de Andrade e Lemos (2015) pode servir como uma estrutura de análise local e das respectivas propostas, com a capacidade de se tornar instrumento de diagnóstico da situação atual, de criação de diretrizes e de avaliação propositiva (verificar figura 4). 2.1. Dimensões da Sustentabilidade A metodologia avaliativa “Sustentabilidade e Qualidade da Forma Urbana” é parte do trabalho do grupo de pesquisadores da FAU/UnB, no âmbito da Chamada Pública MCTI/CNPq/MCIDADES N° 11/2012, para monitoramento, avaliação, e aprimoramento do Programa Minha Casa Minha Vida. A metodologia de avaliação da sustentabilidade ambiental urbana desenvolvida por Andrade e Lemos (2015) se baseou na integração das agendas Verde e Marrom (Planejamento de Cidades Sustentáveis da ONU-Habitat - Informa Global, 2009), em referenciais teóricos e metodológicos brasileiros (Andrade, 2005 e Selo Azul da Caixa, 2010), nos critérios certificação de empreendimentos verdes ajustados a realidade brasileira (AQUA para Bairro da Fundação Vazolini, 2011) para que possa ser disseminada no PMCMV. A partir desse entendimento, o trabalho prosseguiu com a visão da sustentabilidade ampliada, incorporando 4 dimensões da sustentabilidade, contemplando, além dos aspectos ambientais, os aspectos sociais, econômicos e, culturais e emocionais. Para tal, somou-se ao trabalho o referencial teórico das Dimensões Morfológicas do Processo de Urbanização (DIMPU) e abordagens presentes nas normalizações determinadas para as questões envolvidas na Legislação urbanística.
Figura 3 - Síntese das Dimensões da Sustentabilidade de Andrade e Lemos (2015) Fonte: Arquivo pessoal dos autores. 4
Apesar de serem didaticamente separadas em Sustentabilidade Social, Ambiental, Econômica e Cultural-Afetiva, são integradas e têm a capacidade de analisar um mesmo aspecto sob diferentes perspectivas. Cada uma das dimensões da sustentabilidade está dividida em princípios, critérios, indicadores e verificadores: parâmetros que indicam o desempenho do objeto de estudo em cada dimensão, devendo ser consultados a qualquer momento durante as fases de diagnóstico do local e das respectivas propostas. O produto em questão foi desenvolvido por meio da disciplina Prática de Escritório Modelo de Arquitetura e Urbanismo (PEMAU) ofertada pelo Escritório Modelo de Arquitetura e Urbanismo (CASAS) da FAU/UnB (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo), ministrada pelas professoras Liza Andrade, Vânia Loureiro e Natália Lemos, em parceria com o Grupo Periférico. No âmbito da disciplina, os alunos foram divididos em 4 grupos de trabalho, no qual cada grupo ficou responsável por analisar uma dimensão da sustentabilidade. No caso específico deste artigo, direcionou-se para os resultados da análise da dimensão da Sustentabilidade Ambiental, bem como para a apresentação dos cenários propostos para o mesmo. Cada princípio apontado na figura anterior está subdividido em critérios. Os critérios do princípio “Proteção ecológica e agricultura urbana” são: cumprimento da legislação ambiental, compatibilização dos zoneamentos e proposição de respeito à corredores ecológicos, provimento de áreas para agricultura urbana e paisagismo produtivo. No princípio “Infraestrutura verde: gestão d’água, drenagem natural e tratamento de esgoto alternativo” estão: desempenho eficiente do ciclo da água no solo urbano, equilíbrio entre vazões de cheias, altas e vazões de seca; desenho urbano adequado ao terreno natural, provimento da ecoeficiência e biodiversidade. No princípio “Conforto ambiental” está o critério de conforto térmico, luminoso e acústico. O princípio “Promoção de sistemas alternativos de energia e diminuição da pegada ecológica” contém os critérios: redução do uso de energia, aplicação de sistemas alternativos, integração da água e energia: sistemas integrados para distribuição da energia e água. O princípio “Saúde” aborda o critério vulnerabilidade ambiental. Por fim, o princípio “Redução, reutilização e reciclagem de resíduos” aborda: promoção da redução da pegada ecológica e destinação adequada e reaproveitamento de resíduos. 2.2. Participação: Questionário, Mapa Afetivo e Padrões Espaciais O questionário foi elaborado como um primeiro contato com a comunidade, a fim de compreender na prática como os princípios de sustentabilidade de Andrade e Lemos se aplicariam à realidade da comunidade, portanto, as perguntas de cada dimensão foram elaboradas a partir da síntese dos critérios de sustentabilidade, bem como aspectos observados durante uma primeira visita à comunidade, onde alguns aspectos foram observados, mas se tornou necessário compreender suas extensões. A metodologia do mapa afetivo consiste no uso de ícones elaborados de acordo com os princípios de sustentabilidade abordados por Andrade e Lemos no livro Avaliação da qualidade da habitação de interesse social. Uma vez elaborados, os ícones são apresentados para a comunidade, que deve identificar em um mapa os pontos de ocorrência dos eventos representados pelos ícones. Posteriormente, o mapa gerado através da oficina com a comunidade é utilizado para diagnosticar pontos positivos e negativos da relação da comunidade entre si, com o espaço construído, com os espaços comuns e com o meio ambiente. A metodologia dos padrões é utilizada pelo grupo “Periférico, trabalhos emergentes” e baseada em Alexander et al. (1977) e consiste numa rede de conceitos e parâmetros, expressos na forma de símbolos gráficos, que podem ser aplicados em diversos projetos e em diferentes escalas, privilegiando a escala humana e a vivacidade urbana, de maneira que não podem ser interpretados isoladamente, mas como um conjunto de características que devem ser inter-relacionadas com o contexto local (BARROS, 2011). Acredita-se que essa linguagem de códigos facilita a comunicação entre os saberes técnico e local, apropriando-se de uma linguagem universal - o desenho - para discutir e propor soluções que 5
estejam de acordo com o contexto urbano e a cultura locais, sem deixar de observar as preocupações ambientais, como por exemplo, adotar soluções sustentáveis de baixo custo. No caso do assentamento em questão, a linguagem de padrões foi utilizada em dois momentos diferentes: na fase de diagnóstico - em que foram identificados os problemas e potencialidades do local por meio da análise documental disponível e no processo participativo junto à comunidade, que resultou no conhecimento da situação do terreno e na formulação das diretrizes básicas de projeto -; e na fase de construção dos cenários sustentáveis - em que os padrões construídos, juntamente com o processo participativo e as diretrizes, foram agregados na proposta da dimensão ambiental, resultando em uma proposta única de projeto, apresentada posteriormente para os moradores. Portanto, conclui-se que a linguagem de padrões adotada permitiu criar com a comunidade uma linguagem menos complexa se comparada aos códigos de representação técnica comumente utilizados na arquitetura, facilitando a exposição das ideias propostas e a comunicação com a comunidade. 3. Avaliação de desempenho segundo os princípios da Dimensão Ambiental 3.1. Proteção Ecológica e Agricultura Urbana 3.1.1. Legislação ambiental Segundo o Plano Diretor Local de Sobradinho, para a concessão de aprovação de projetos e alvarás de construção faz-se necessário obter a anuência de órgãos de licenciamento ambiental, porém, através dos estudos direcionados ao Dorothy, é possível perceber que legislações ambientais não são cumpridas adequadamente, principalmente por não existir licença ambiental para o local e por estar tão próximo de uma região de conectores ambientais. O assentamento localiza-se na APA (Área de Proteção Ambiental) de São Bartolomeu. Está caracterizada como Zona de Ocupação Especial de Qualificação - ZOEQ e próxima a uma Zona de Conservação da Vida Silvestre, inserida sobre as margens do córrego Capão Comprido. A lei nº 5344/2014, que “dispõe sobre o Rezoneamento Ambiental e o Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental da Bacia do Rio São Bartolomeu” (BRASIL, 2014), determina que para a ZOEQ: I – é permitido o uso predominantemente habitacional de baixa e média densidade demográfica, com comércio, prestação de serviços, atividades institucionais e equipamentos públicos e comunitários inerentes à ocupação urbana; II – as áreas degradadas ocupadas por assentamentos informais devem ser qualificadas e recuperadas de modo a minimizar danos ambientais; III – devem ser adotadas medidas de: a) controle ambiental voltado para o entorno imediato das unidades de conservação, visando à manutenção de sua integridade ecológica; b) controle da propagação de doenças de veiculação por fatores ambientais; IV – para o licenciamento ambiental de empreendimentos, deve ser avaliada a solicitação de exigências adicionais de mitigação e monitoramento de impactos compatíveis com as fragilidades específicas da área de interesse; V – os parcelamentos urbanos devem adotar medidas de proteção do solo, de modo a impedir processos erosivos e assoreamento de nascentes e cursos d’água (BRASIL, 2014).
Nesse sentido, as ocupações urbanas devem respeitar as APA’s, para tanto é importante que o projeto de regularização leve em consideração o planejamento de risco dessas áreas, respeitando sempre a integridade ambiental dos sistemas. 3.1.2. Compatibilização dos zoneamentos e proposição de respeito à corredores ecológicos A situação ambiental da região do Nova Colina é crítica quando se leva em consideração que o povoamento da área foi dado de maneira incontrolada e abstendo-se de parâmetros de proteção ambiental. A ocupação dada dessa forma muitas vezes ultrapassa os limites ambientalmente sensíveis, o
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que gera problemáticas que são bastante complexas de lidar posteriormente à habitação. Isso fez com que o Zoneamento Ecológico-Econômico do Distrito Federal (ZEE-DF) precisasse de mais atenção e obtivesse uma maior área de estudo. O ZEE-DF preza pela manutenção da recarga de aquífero, preservação dos corredores ecológicos e promoção de práticas sustentáveis que tenha baixo impacto ambiental e baixa emissão de carbono, sendo colocado como prioridade máxima a fiscalização dos parcelamentos irregulares do solo nas áreas de nascentes do Rio São Bartolomeu e tendo em vista um futuro potencial de abastecimento público (GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL, 2009). Sendo assim, a área deve ser alvo de um olhar mais cuidadoso e com atenção ao crescimento e parcelamento de área rural. A disposição dos corredores existentes no local interliga as áreas rurais e urbanas e conecta áreas de grande diversidade ambiental, o que pode proporcionar a dispersão de espécies animais e a possível perda da unidade de determinados ecossistemas e áreas verdes. Os projetos de regularização e parcelamento deveriam atender minuciosamente a essas questões, possibilitando a conectividade da população com esses fatores ambientais de maneira simbiótica e inteligente, porém a realidade encontrada no assentamento vem de encontro a essa questão de maneira bastante negativa, sendo que as práticas são contrárias à adequação. 3.1.3. Provimento de áreas para agricultura urbana e paisagismo produtivo A prática da agricultura urbana já é uma iniciativa realizada pela comunidade, não a nível de comercialização e fonte de renda familiar, mas em pequena escala no interior dos lotes para consumo próprio. De forma que o conceito pode ser facilmente expandido a aplicado a um maior número de lotes e a nível comunitário. Abaixo estão apresentadas algumas fotos tiradas das hortas da comunidade no dia da visita de reconhecimento ao local. 3.2. Infraestrutura verde 3.2.1. Desenho urbano adequado ao terreno natural A partir da análise das curvas de nível é possível observar como a implantação do assentamento não levou em consideração tais condicionantes. Nota-se que as ruas principais do assentamento estão perpendiculares às mesmas, em razão disso, há uma forte ocorrência de erosões nessas ruas, no período de chuva, o que prejudica não apenas a mobilidade das pessoas no interior do Dorothy, mas garante perigo para as crianças e contradiz as diretrizes propostas pelo PDOT para áreas de maior sensibilidade ambiental (verificar tabela 1). Uma solução convencional para os problemas de erosão existentes, ou seja, grandes obras de drenagem, elevaria muito os custos de urbanização da área, o que não seria viável. De maneira que a estratégia mais adequada seria a implantação de pequenos dispositivos de drenagem ao longo das quadras e vias, assim a água poderia ser freada aos poucos, trazendo não só os mesmos benefícios a comunidade como um menor custo e uma solução ambientalmente mais sustentável.
3.2.2. Tratamento Ecológico e reaproveitamento das águas negras e águas cinzas Atualmente dentro do Dorothy não são reproduzidos sistemas de reaproveitamento de águas negras ou cinzas para usos não potáveis, mas o começo de uma tentativa de tratamento ecológico do esgoto produzido no local. Em razão do assentamento ainda estar em processo de regularização, as residências ainda não possuem acesso a coleta e tratamento de esgoto proporcionado pela CAESB (Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal), dessa maneira, a alternativa encontrada pela comunidade é a fossa de bananeira.
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Como relatado pelos moradores, o descarte do esgoto produzido no âmbito da maioria das residências é feito dentro de um buraco de aproximadamente 1,5 metro de profundidade, de forma que uma bananeira seja plantada próximo a ele, não necessariamente em cima, e assim a bananeira exerça a função de filtragem dos dejetos. Entretanto, convencionalmente, a fossa de bananeira deve apresentar um tratamento de impermeabilização para que o esgoto não contamine o solo ao seu redor, o que, nesse caso, não acontece (verificar tabela 1). 3.3. Conforto Ambiental A parte 3 da NBR 15220 aborda recomendações referentes ao desempenho térmico de edificações para habitação social unifamiliar em fase de projeto. Essas recomendações partem da divisão do território brasileiro em zonas bioclimática referentes às características climáticas de cada região (verificar tabela 1). Para elaboração das diretrizes de cada zona bioclimática foram considerados meios para se obter o condicionamento térmico passivo do ambiente através dos seguintes critérios: • • • •
Tamanho das aberturas para ventilação; A proteção das aberturas; As vedações externas (paredes e coberturas); Estratégias de condicionamento térmico passivo.
O Distrito Federal encontra-se na zona bioclimática 4, dessa forma, a norma recomenda que as aberturas tenham tamanho médio e possuam estruturas de sombreamento, quanto às vedações externas, fica definido que as paredes devem ser pesadas e a cobertura do tipo leve isolada. Já as estratégias de condicionamento térmico passivo recomendadas para o verão são o resfriamento evaporativo a partir da utilização de água e vegetação como alternativas para melhorar a sensação térmica, além disso, a orientação das aberturas para os ventos dominantes, de forma a proporcionar ventilação cruzadas nos ambientes. No inverno, a execução de paredes internas com maior massa térmica, assim o calor poderá ser armazenado nas mesmas durante o dia e será dispersado a noite, e a atenção a forma, a implantação, a orientação das superfícies envidraçadas e a cor das superfícies externas de maneira a obter o aproveitamento mais adequado da radiação solar. No que se refere especialmente ao assentamento, percebeu-se que a maioria das residências empregam materiais, como vedação de madeirite e cobertura de telha de fibrocimento, que possuem pouca capacidade de isolamento térmico seja para o frio ou para o calor. Durante a primeira visita realizada ao assentamento, no período da manhã, a equipe teve a oportunidade de entrar em uma das residências que ainda estava em fase de construção, onde foi possível presenciar as altas temperaturas presentes no local. A razão dos tipos de materiais empregados provavelmente deve-se a baixa faixa de renda dos moradores e da rápida necessidade de se assentar no terreno somado a insegurança associada a falta de posse da terra. 3.4. Saúde No que diz respeito ao princípio da saúde, foram analisados riscos de poluição e contaminação por materiais tóxicos no âmbito do assentamento, como base apenas nas atividades e nos hábitos dos moradores.No fator poluição atmosférica, não se observou existência de nenhum indício dado a baixa densidade de ocupação e o pouco uso do carro para atividades cotidianas. Entretanto, notou-se possíveis riscos de poluição a nível do solo e da água em razão da falta de tratamento de esgoto ou do tratamento incorreto nos lotes, como apresentado no item 3.2.3 (tratamento Ecológico e reaproveitamento das águas negras e águas cinzas) a não impermeabilização da fossa poderia representar um vetor de contaminação local no solo.
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Além disso, a forte erosão causa no período de chuva nas ruas principais, somado a grande quantidade de lixo carregado pela mesma podem levar a contaminação do córrego Capão Comprido, distante aproximadamente 500 metros do assentamento. Há também a mina d’água dentro do terreno do Dorothy que esteve por algum tempo contaminado com a presença de lixo doméstico, entretanto, no momento, os moradores têm buscado a preservação desse recurso. 3.5. Redução, reutilização e reciclagem de residues No que diz respeito ao princípio dos 3R’s, foram analisadas características de redução da pegada ecológica, destinação adequada e reaproveitamento de residues (verificar tabela 1). Com relação a presença de usinas de reciclagem e compostagem, segundo o Relatório Anual de Atividades do SLU de 2017, há duas usinas de tratamento mecânico biológico no Distrito Federal alocadas no P Sul, Ceilândia, e na L4 Sul, Asa Sul. Segundo o mesmo relatório, cerca de 829,3 mil toneladas de resíduos sólidos foram coletados de fonte domiciliar e comercial, sendo que apenas 233,6 mil toneladas foram processados em unidades de tratamento e 29,9 mil toneladas foram oriundas da coleta seletiva. Tais dados revelam que as instalações existentes no DF ainda não apresentam capacidade de suporte suficiente para prover a destinação desses resíduos de forma mais sustentável, o que reforça a necessidade da promoção de pequenas cooperativas e de iniciativas particulares na redução da pegada ecológica. RESUMO DOS PRINCÍPIOS E CRITÉRIOS PRINCÍPIO Proteção Ecològica e Agricultura Urbana
CRITÉRIO Legislação ambiental
DESCRIÇÃO E CONCLUSÕES Legislações ambientais não são cumpridas adequadamente, principalmente por não existir licença ambiental para o local e por estar tão próximo de uma região de conectores ambientais.
Compatibilização dos zoneamentos e proposição de respeito à corredores ecológicos
Fonte: SEGETH (2017). Provimento de áreas para agricultura urbana e paisagismo produtivo
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Desenho urbano adequado ao terreno natural
Infraestrutura verde
Conforto Ambiental
Saúde
Redução, reutilização e reciclagem de resíduos
Fonte: GEOPORTAL (2019)
Tratamento Ecológico e reaproveitamento das águas negras e águas cinzas.
(1) Tamanho das aberturas para ventilação; (2) A proteção das aberturas; (3) as vedações externas (paredes e coberturas); (4) Estratégias de condicionamento térmico passivo.
(1) Riscos de poluição; (2) Contaminação por materiais tóxicos
Fonte: Ecoeficientes (2017)
Percebeu-se que a maioria das residências empregam materiais, como vedação de madeirite e cobertura de telha de fibrocimento, que possuem pouca capacidade de isolamento térmico seja para o frio ou para o calor.
No fator poluição atmosférica, notou-se possíveis riscos de poluição a nível do solo e da água em razão da falta de tratamento de esgoto ou do tratamento incorreto nos lotes. a forte erosão causa no período de chuva nas ruas principais, somado a grande quantidade de lixo carregado pela mesma podem levar a contaminação do córrego Capão Comprido, distante aproximadamente 500 metros do assentamento.
(1) Redução da As instalações existentes no DF ainda não apresentam pegada ecológica; (2) capacidade de suporte suficiente para prover a destinação Destinação adequada desses resíduos de forma mais sustentável, o que reforça a e reaproveitamento de necessidade da promoção de pequenas cooperativas e de resíduos; iniciativas particulares na redução da pegada ecológica.
Tabela 1 – Resumo dos Princípios e Critérios. Fonte: Arquivo pessoal dos autores.
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4. Questionário e mapas afetivos Uma vez estudados os critérios avaliativos da dimensão ambiental, bem como a legislação que se aplica ao local onde o assentamento está localizado, foi elaborado questionário para melhor entender a relação da comunidade com o local em que está inserida, o modo como lidam com seus resíduos, como a inserção do desenho urbano na topografia impacta o espaço, a percepção do conforto ambiental dos espaços. Os resultados do questionário estão apresentados a seguir: RESULTADO DO QUESTIONÁRIO APLICADO PERGUNTA
RESULTADO
Você faz a separação, reutilização e/ou reciclagem do seu lixo? Como é feito o tratamento de esgoto na sua residência?
Como você avaliaria o conforto térmico (ventilação e temparatura) da sua casa? Você identifica pontos de erosão dentro do assentamento?
Dentro do assentamento existem pontos de acúmulo de lixo? A preservação das áreas de cerrado – aonde tem água – são importantes para você? A preservação das áreas de cerrado – aonde tem água – são importantes para você? Você participaria ou gostaria que seus filhos participassem de oficinas de orientação sobre meio ambiente, preservação e/ou reciclagem?
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Você conhece formas alternativas de tratamento de esgoto, lixo e/ou drenagem de água? Essas formas poderiam ser aplicadas no Dorothy? Tabela 2 - Resultado ilustrado dos questionários Fonte: Arquivo pessoal dos autores.
Observado o resultado do questionário e com base nos indicadores da metodologia de Andrade e Lemos (2015) foram desenvolvidos ícones para a construção da dinâmica de mapas afetivos, onde os próprios moradores do assentamento apresentaram questões como: • •
• • • • • •
As ruas que ocorrem no sentido do caimento do terreno são as mais erodidas pelas águas da chuva, sendo mais afetadas as de maior extensão e mais afastadas das massas verdes; De modo geral, há boa ventilação e insolação, entretanto, como as casas foram construídas em madeirite, não há bom isolamento térmico. Muitos moradores reclamaram do frio durante as noites e do calor nos dias de sol, outra questão levantada pelos moradores foi à quantidade de poeira; Não foram diagnosticadas grandes fontes de ruído, a única apontada foi a via por onde é feita a coleta de lixo; Há quatro pontos por onde é feita a coleta de lixo do assentamento que estão localizados nas vias adjacentes ao Dorothy; A existência de vários pontos onde há acúmulo de lixo, como já evidenciado a partir do questionário; A maioria dos lotes apresenta fossa com sumidouro, entretanto nas condições já acima citadas; Todos os lotes têm acesso à água encanada obtida de maneira informal. A maioria dos lotes apresenta árvores nativas preservadas, hortas e/ou pomares.
Figura 4 - Resultado mapa afetivo de ícones Fonte: Arquivo pessoal dos autores.
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Figura 5 - Dinâmica de mapas afetivos. Fonte: Arquivo pessoal dos autores.
5. Padrões Os pontos levantados pelos assentados foram de grande importância para a construção de padrões que pudessem ser aplicados no local ou mesmo expandidos, dado a já existência das inúmeras iniciativas por parte dos moradores, valorizando assim a cultura local (verificar tabela 3).
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Tabela 3 - Padrões associados aos critérios e indicadores da sustentabilidade ambiental. Fonte: Arquivo pessoal dos autores.
6. Proposta de projeto urbanístico A proposta de projeto urbanístico inicial elaborada pela equipe que abordou a dimensão ambiental, além de respeitar as contribuições dadas pela comunidade, procurou dar ênfase aos critérios de proteção ecológica e instalação de mecanismos de agricultura urbana e infraestrutura verde. Assim, a orientação do loteamento buscou seguir o caimento das curvas de nível e propor mecanismos de drenagem no interior de cada quadra e juntamente aos espaços de lazer estrategicamente alocados, de forma a minimizar a erosão presente nas vias principais. Em consideração aos critérios da dimensão ambiental, principalmente no que diz respeito à promoção de soluções alternativas, foram propostos bulevares arborizados nas vias principais do terreno em conjunto com jardins de chuva e outros sistemas de drenagem e captação de água, de maneira que favoreçam o potencial de infiltração do solo e, ao mesmo tempo, possam criar passeios agradáveis em que os pedestres tenham a preferência de circulação. O esquema de circulação de vias, por sua vez, buscou considerar o traçado existente, pois acredita-se que este foi resultado da leitura da própria comunidade sobre o espaço. Porém, foi necessário realizar algumas alterações para melhorar, principalmente, a circulação dos pedestres. A primeira consistiu em estabelecer diálogo com as curvas de nível por meio da criação de curvaturas específicas para cada via de modo a seguirem as curvas de nível mais próximas. Também foi necessária a criação de uma estrutura de eixos perpendiculares, em que as quadras resultantes não tivessem comprimentos maiores do que 150 metros, facilitando o deslocamento das pessoas a pé. Em relação ao uso e ocupação do solo, optou-se por alocar os lotes de uso misto ao longo dos bulevares, localizados nas vias longitudinais do terreno, para concentrar a atividade comercial e oferecer um passeio confortável. Acredita-se que a junção dessas soluções pode aumentar a rotatividade das pessoas no local e contribuir para a dinamização da economia. O gabarito dos edifícios tem limite de três 15
pavimentos para edifícios de uso misto e residencial. As áreas de lazer estão dispostas em pontos diversos para proporcionar pequenas centralidades, como recomenda Alexander et al. (1977); e dessa maneira, distribuir os fluxos ao longo do terreno e descentralizar os usos. Estão previstos nas áreas de lazer equipamentos como Pontos de Encontro Comunitários (PEC’s), praças, parques de preservação ambiental e mobiliário infantil; todos estes arborizados. O desenho das microparcelas varia de acordo com o tamanho e tipologia de uso do lote (residencial unifamiliar, residencial multifamiliar, uso misto, uso institucional, uso recreativo e preservação ambiental). Nos lotes de uso residencial unifamiliar, foi priorizada a infiltração do solo por meio dos afastamentos e a questão da privacidade das famílias em relação aos lotes vizinhos. No uso residencial multifamiliar, buscou-se a criação e o compartilhamento dos espaços convexos públicos, de maneira a não estabelecer barreiras físicas entre as edificações e, assim, fortalecer o senso de vida comunitária. A principal característica dos lotes de uso misto são a integração total com a calçada, sem afastamentos para criar fachadas ativas, para atrair maior fluxo de pessoas para o local e fazer com que permaneçam circulando o maior tempo possível. Os usos recreativo e de preservação ambiental ainda não têm parâmetros físicos, como os afastamentos, definidos, pois acredita-se que a demanda para tais espaços deve surgir da comunidade e, deste modo, a multiplicidade de usos e necessidades necessita ser avaliada individualmente, dificultando para esta fase inicial, o estabelecimento de critérios generalistas para casos específicos.
Figura 7 - Hierarquia viária da nova proposta de urbanística para o assentamento.
Figura 6 - Nova proposta de urbanismo para o assentamento.
Figura 8 - Corte viário da nova proposta de urbanística para o assentamento. Fonte: Arquivo pessoal dos autores
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Figura 10 - Croqui da proposta para microparcela. Figura 11 - Croqui da proposta de habitação compartilhada.
7. Discussão dos resultados A elaboração dos padrões sustentáveis e do questionário com base nos princípios da sustentabilidade ambiental permitiu perceber que, apesar de o Dorothy Stang estar situado perto de áreas de preservação com corredores ecológicos, o local onde a ocupação está situada, propriamente dito, apresenta poucos vestígios de vegetação nativa, pois a sua implementação precisou ocorrer de forma rápida e, portanto, sem o tempo necessário para criar estratégias que minimizem problemas relativos à questão ambiental sejam. Apesar desses problemas, foi possível identificar que existe grande potencial para a implementação de infraestrutura sustentável, visto que o terreno dispõe de uma área verde considerável e considerando o fato dos próprios moradores exercerem práticas sustentáveis, como o costume de cultivar parte de seus próprios alimentos e de separar o lixo para a coleta seletiva, mesmo que ela ainda não ocorra no local, até o momento desta pesquisa. Outro aspecto destacável é que a implantação das ruas e das residências não ocorreu considerando o caimento natural do terreno, o que pode ter estimulado a ocorrência de erosões em grande parte das vias e, consequentemente no período de chuvas, causa acúmulo de poças d’água e a ocorrência de enchentes, podendo causar danos tanto ao meio ambiente quanto à própria população. A falta de consideração da orientação solar, do caimento do terreno e a escolha de materiais inadequados do ponto de vista do conforto, seja por razões de economia ou por falta de conhecimento técnico, prejudicou a ventilação e provocou aumento de temperatura no interior das residências, causando grande desconforto para os habitantes, segundo o que foi possível inferir do questionário realizado, em que 48% dos participantes responderam que consideram suas casas alcançam temperaturas elevadas e desconfortáveis em determinadas épocas do ano. Os dados obtidos levaram à conclusão de que a população possui certa consciência ambiental, principalmente no que diz respeito à importância da preservação do meio ambiente, da fauna e flora locais, mas no entanto ainda não possuem conhecimento necessário sobre como fazê-lo, principalmente no que diz respeito a questões que causam problemas à longa distância de tempo, como o acúmulo de lixo - que pode contaminar os lençóis freáticos -, e ao modo de implantação das vias e casas - que podem aumentar a ocorrência de erosões e enchentes, agredindo progressivamente as características naturais do terreno. 8. Considerações finais Este artigo tratou de relatar o processo projetual de urbanismo colaborativo no assentamento Dorothy Stang, no Setor Nova Colina, em Sobradinho - DF, baseado nos conceitos da dimensão ambiental de Andrade e Lemos (2015) juntamente com a participação da comunidade. Procurou-se constatar e levantar os problemas e potencialidades da situação atual do local a partir do levantamento 17
técnico de dados já existentes, da criação dos padrões correspondentes e, em seguida, da exposição desses dados à comunidade para discussão conjunta. O conteúdo apresentado à comunidade mostrouse suficiente para o entendimento das prioridades a serem tomadas no momento do projeto, mas ao mesmo tempo, a própria população acrescentou informações que só poderiam ser constatadas por pessoas que convivem no local, demonstrando a importância da participação popular durante o diagnóstico, nas tomadas de decisão e em todas as fases de projeto. A legislação ambiental do Setor Nova Colina visa promover o equilíbrio entre o desenvolvimento socioeconômico e as áreas ambientalmente sensíveis. No entanto, observa-se no local o parcelamento desenfreado de lotes e a formação de condomínios sem um macroplanejamento, causando grande impacto ambiental, principalmente no que tange à questão da infiltração do solo, massivamente prejudicada. Acredita-se que o fato de o setor ainda não apresentar licença ambiental consolidada não impele e, na verdade, incentiva a ação de grileiros, como foi o caso do próprio assentamento Dorothy Stang. Apesar dos problemas ambientais criados, acredita-se que é possível reverter o quadro por meio da adoção de um desenho urbano ambientalmente sensível e que priorize a preservação da vegetação nativa, a infiltração da água da chuva no solo e outras medidas que podem ser facilmente agregadas no planejamento urbano por meio de tecnologias sustentáveis de baixo custo. O processo participativo realizado foi subdividido em etapas e teve o objetivo de construir paulatinamente uma relação afetiva com a comunidade, entender a história da formação do assentamento, os objetivos do movimento, a cultura, os perfis sociais e as expectativas da população. Alexander et al. (1977) acredita ser fundamental construir espaços com os quais as pessoas sejam capazes de identificarem a sua cultura por meio da forma urbana, estreitando os laços de vizinhança e a interação com a natureza, de modo a haver benefício mútuo entre as partes e, consequentemente, construir espaços mais humanizados. Espera-se que este artigo possa contribuir para os processos de assistência técnica de modo a elucidar a importância da participação popular em todas as fases: da caracterização inicial do local ao projeto, desde que as etapas estejam estruturada de acordo com uma metodologia que permita fácil comunicação entre os técnicos e a população leiga e a adaptação dos processos técnicos em função do saber local e do meio ambiente, contribuindo para a criação de espaços urbanos mais humanizados e respiráveis. A discussão do tema mostrou-se relevante por ressaltar o papel do arquiteto no contexto de crise socioeconômica atual do país, visto que 85% da população brasileira não tem acesso aos serviços dos arquitetos (CAU/BR-DATAFOLHA, 2015), o que leva a crer que ainda não há engajamento suficiente da área para atender às demandas, cabendo a este artigo discutir e aplicar metodologias participativas e de projeto que possam contribuir para melhorar a integração entre arquiteto e comunidade. Acredita-se que o envolvimento da população em todas as fases de projeto é importante, pois implementar o saber local nas propostas é fundamental para a identificação da comunidade com a proposta de projeto. Ao mesmo tempo, acredita-se que é dever do arquiteto e urbanista intervir em áreas urbanas que estão em processo de constituição e que, pela sua característica informal, estão causando danos ao meio ambiente. 9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALEXANDER, Christopher; ISHIKAWA Sara; Murray, SILVERSTEIN; JACOBSON, Max; FIKSDAHL-KING, Ingrid; ANGEL, Shlomo. A Pattern Language. New York: Oxford University Press, 1977. ANDRADE, Liza Maria Souza de. Conexão dos padrões espaciais dos ecossistemas urbanos: A construção de um método com enfoque transdisciplinar para o processo de desenho urbano sensível à água no nível da comunidade e da paisagem. 2014. 544 f. Tese (Doutorado) - Curso de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de Brasília, Brasília, 2014. Disponível em: <http://repositorio.unb.br/handle/10482/18042>. Acesso em: 25 maio 2018. ANDRADE, Liza Maria Souza de. O Cantinho de Todos: o desenho urbano socioecológico do Dorothy Stang à mão de seus ocupantes. Brasília: Liza Andrade, 2018. Projeto de Extensão de Ação Contínua. Grupo Periférico, trabalhos emergentes, Edital DEX/DPI, no 1 2017. 18
ANDRADE, Liza Maria Souza de:LEMOS, Natália; LOUREIRO, Vânia e COSTA, Ártemis. URBANISMO PARTICIPATIVO NA PRODUÇÃO DO ESPAÇO EM BRASÍLIA COMO FORMA DE RESISTÊNCIA: o caso do processo de regularização fundiária da Ocupação Dorothy Stang. In: II Seminário Internacional Ubanismo Biopolítico, Belo Horizonte, 2018. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15220: Desempenho térmico de edificações Parte 3: Zoneamento bioclimático brasileiro e diretrizes construtivas para habitações unifamiliares de interesse social. Rio de Janeiro: Abnt, 2003. Disponível em: <http://www.labeee.ufsc.br/sites/default/files/projetos/normalizacao/Termica_parte3_SET2004.pdf>. Acesso em: 17 dez. 2018. BARROS, Raquel. Habitação coletiva: A inclusão de conceitos humanizadores no processo de projeto. São Paulo: Annablume, 2011. BLUMENSCHEIN, Raquel Naves; PEIXOTO, Elane Ribeiro; GUINÂNCIO, Cristiane (Org.). Avaliação da qualidade da habitação de interesse social: Projetos urbanístico e arquitetônico e qualidade construtiva. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2015. BRASÍLIA. Governo de Brasília. Serviço de Limpeza Urbana do Distrito Federal - Slu. Compostagem. 2018. Disponível em: <http://www.slu.df.gov.br/compostagem/>. Acesso em: 25 dez. 2018. BRASÍLIA. Governo do Distrito Federal. Codeplan. RA V - Sobradinho. 2015. Disponível em: <http://www.codeplan.df.gov.br/wp-content/uploads/2018/02/Estudo-Urbano-Ambiental-Sobradinho.pdf>. Acesso em: 5 set. 2018. BRASÍLIA. Governo do Distrito Federal. Secretaria de Estado de Gestão do Território e Habitação do Distrito Federal. Portaria nº 159, de 13 de dezembro de 2017. 2017. Disponível em:<http://www.segeth.df.gov.br/wpconteudo/uploads/2017/11/DIUR_-12_2017_SH_NOVA-COLINA_PROCESSOSEI_00390_00009815_2017_46..pdf>. Acesso em: 8 out. 2018. BRASÍLIA. Governo do Distrito Federal. Diário Oficial do Distrito Federal. Lei nº 5344, de 19 de maio de 2014. 201. Disponível em:<http://www.tc.df.gov.br/SINJ/Norma/76873/Lei_5344_19_05_2014.html>. Acesso em: 8 out. 2018. BRASÍLIA. Governo do Distrito Federal. Serviço de Limpeza Urbana do Distrito Federal - Slu. Um ano de operação do Aterro Sanitário e tudo pronto para fechar o lixão: Relatório de Atividades SLU - 2017. 2017. Disponível em: <http://www.slu.df.gov.br/wp-content/uploads/2018/05/relatorio_anual_de_atividades_slu_2017_final.pdf>. Acesso em: 24 dez. 2018. BRASÍLIA. SECRETARIA DE ESTADO DE DESENVOLVIMENTO URBANO E MEIO AMBIENTE. PDOT - Plano Diretor de Ordenamento Territorial. Brasília: Governo do Distrito Federal, 2009. Disponível em: <http://www.segeth.df.gov.br/plano-diretor-de-ordenamento-territorial/>. Acesso em: 10 abr. 2018. CAU/BR - DATAFOLHA (Brasília). Percepções da sociedade sobre Arquitetura e Urbanismo. 2015. Disponível em: <http://www.caubr.gov.br/pesquisa2015/>. Acesso em: 14 ago. 2018. NASCIMENTO, Denise Morado (Org.). Saberes [auto] construídos. Minas Gerais: Associação Imagem Comunitária, 2016.
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