Livro 2006 15 Poetas

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15 POETAS DO RN

1° Lugar Jeanne de A. Silva 2° Lugar Iara Maria 3° Lugar Paulo André Benz Menção Honrosa Roberta Assunção Teixeira Deilson Melo tavares Jean Sartief Kalliane Sibelle Amorim Wescley José da Gama Therlandeson Glay Alves Francisco Júnior D. Paiva Márcio R. Xavier Rodrigues Rachel de Oliveira L. de Souza Cefas Carvalho Gilbamar de Oliveira Bezerra João Batista dos Santos

Catalogação na fonte: Biblioteca Pública Câmara Cascudo C744q Concurso de poesia Luis Carlos Guimarães 15 poetas do RN.---Natal(RN): Fundação José Augusto, 2010. 215p. 1.Poesia brasileira. I.Título. 2010/10 869.1

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CONCURSO DE POESIA LUÍS CARLOS GUIMARÃES

ESTADO DO RIO GRANDE DO

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FICHA TÉCNICA Iberê Ferreira de Souza Governador Joaquim Crispiniano Neto Diretor Presidente da FJA Venâncio Pinheiro Barbosa Coordenador da Gráfica Manimbu Capa e Projeto Gráfico Socorro Soares Diagramação Hugnelma de Almeida Impressão Gilsomar Manoel André Montagem: Maria Rosimar José Guedes Belo Perfilamento: Lúcio de Medeiros Atendimento Márcia Maria Luiz Gonzaga Ana Lúcia Maria Aparecida Fotomontagem: Gilsomar

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Apresentação Luís Carlos Guimarães nasceu em Currais Novos, Rio Grande do Norte, em 1934. Viveu quase toda sua vida em Natal, onde foi jornalista, juiz de Direito e professor universitário. Nos anos 70, fez um curso de extensão universitária na Fundação Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro, e se apaixonou pela cidade, que visitava com muita freqüência. Estreou em poesia em 1961, com “O aprendiz e a canção”. Seguiram-se: “As cores do dia”, “Ponto de fuga”, “O sal da palavra”, “Pauta de passarinho”, “A lua no espelho” e “O fruto maduro”. Sem jamais ter saído da província natal, foi reconhecido como um dos grandes poetas do país, por escritores e poetas como Pedro Nava, Ledo Ivo, Francisco C. Dantas, Ivo Barroso, Affonso Romano de Sant’Anna. Do seu livro “Ponto de fuga”, assim falou: Pedro Nava: “Que poesia terrível e pungente é a sua! Todo o seu livro é uma onda me levando”. Luis Carlos Guimarães também utilizou seu talento de poeta como tradutor. Publicou em 1997 “113 traições bem-intencionadas,”onde traduziu mais de 100 poetas latino-americanos e poemas de Artur Rimbaud. A sua tradução de “O corvo”, de Edgar Allan Poe, é considerada de alta qualidade pelo tradutor e poeta Ivo Barroso. Luis Carlos faleceu em Natal, em 21 de maio 5


de 2001, dois dias antes de completar 67 anos. Morreu de um enfarte que ele previra num poema,”Ode mínima ao enfarte do miocárdio”, escrito em fevereiro de 1982 Nei Leandro de Castro

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Sumário

Jeanne de A. Silva e Araújo (1° Lugar).............15 Cantares I................................................17 II.............................................................18 III............................................................19 IV.............................................................20 V..............................................................21 VI............................................................22 VII...........................................................23 VIII..........................................................24 IX............................................................25 X.............................................................26 Iara Maria Carvalho (2° Lugar)..........................27 Amesa, a mesa........................................29 Herança...................................................30 Migalha....................................................31 Das carícias.............................................32 Outubro, outubro.....................................33 Manemolências.......................................34 Temperaturas..........................................35 Amanh(essências)...................................37 Por 30 dinheiros......................................38 Rito.........................................................39 Paulo André Benz (3° Lugar)............................41 Amanhecer..............................................43 Velas.......................................................46 Caminho difícil.........................................48 Brinde.....................................................49 Rugas......................................................51 Nova velha estação.................................53

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Teorias....................................................54 Paz..........................................................56 Gravatas..................................................57 MENÇÕES HONROSAS.....................................59 Roberta Assunção Teixeira..............................61 Desvanecer..............................................63 Num quarto de hora.................................64 Expiros....................................................65 Poema final ou estática............................66 Poema primeiro ou mudança...................67 Rei de Copas...........................................68 Sereno....................................................69 Deilson de Melo Tavares.................................71 Das Represas..........................................73 Sonéticas de um suspense......................74 Desconstrução e síntese.........................75 O passeio até agora.................................76 Aquela parte por milhão...........................77 Da terra para o ar.....................................78 Águas de levar.........................................79 Modelo matemático.................................80 Poesia estruturante..................................81 O fim dos primeiros dias..........................83 Jean Sartief......................................................85 Mais ou menos eu...................................87 Fio a fio...................................................88 A bailarina...............................................89 Lembrança de nós dois...........................90 Escolhas..................................................91 Inquietação em silêncio...........................92 Primeiro a poesia!....................................93 Ínfimo......................................................94

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Iluminação...............................................95 Despedida...............................................96 Kalliane Sibelli de Amorim...............................97 Poeta.......................................................99 Ausente.................................................100 Invenção...............................................101 Sentença...............................................102 Remissão..............................................104 Colheita.................................................105 Marcha..................................................106 Retrato de minha avó............................107 Álbum...................................................108 Aprendizado..........................................109 Wescley José da Gama..................................111 Poema para um concerto rosa:..............113 Beraldo caminha lasso .........................114 Nasce no tempo uma estirpe ................115 A beleza obscura e gráfica.....................116 Clareira .................................................117 Facho de luz .........................................118 (Primeiro e último ato: roçado, faca, homens, pôr-do-sol...............................119 Eu olhava a tarde sem desespero..........121 No frêmito..............................................122 Therlandeson Glay Alves..............................123 O sexto dia............................................125 Amargo o poema...................................126 Quixote..................................................127 Tigre......................................................128 Rosa de Sarom......................................129 Messias.................................................130 Da infância............................................131 Poema para mulher pecado-

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ra e Jean G e n e t .....................................................132 Da criação.............................................133 À beleza................................................134 Francisco Júnior Damasceno Paiva...............135 Reminiscências.....................................137 Teus olhos............................................138 América Latina......................................139 Redivivo................................................142 Kadidja..................................................143 Antecicuta.............................................144 Estrela da manhã..................................145 Márcio Rodrigo Xavier Sobrinho....................147 I............................................................149 II...........................................................151 III..........................................................153 IV...........................................................156 V............................................................157 Rachel Gomes de Oliveira Lúcio de Sousa....161 Sânie.....................................................163 A vaca e o boi........................................164 Fatural...................................................165 Bernardo-Eremita...................................166 Dragão voador.......................................167 Voluptuosidade.....................................168 Mar........................................................169 Trapezista..............................................170 Eco........................................................171 Um poema.............................................172 Cefas Carvalho..............................................173 Quase-amor...........................................175 A casa...................................................176 Chuva....................................................177

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Hades....................................................178 De cor(ação)..........................................179 Decisão.................................................180 Mar aberto.............................................181 Brincadeira de criança...........................182 Gilbamar de Oliveira Bezerra.........................185 Quimera................................................187 Canção para enternecer.........................189 João Batista...........................................190 Fratecídio..............................................191 Vagalhões.............................................192 Re + fri + ge + ran + te.........................193 Kama sutra............................................194 Tsunamis..............................................195 Autobusca.............................................196 Ser homem............................................197 No recôndito do meu ego......................199 João Batista dos Santos................................201 Chico Science........................................203 Sotero Potiguar......................................204 Cantar....................................................205 Soul.......................................................206 Lua bonita.............................................207 Um anjo................................................208 De pó....................................................209 Erótico..................................................210 Sob a Pedra do Rosário........................ . 2 1 1

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POETAS PREMIADOS

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1° Lugar Jeanne de A. Silva e Araújo

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Jeanne de A. Silva e Araújo

CANTARES I Porque aqui dentro tudo me cabe espalho lótus pelos corredores. Do outro lado da mesa meu coração amadurece espinhos e já não sou essa quem sou meu coração está plantando farpas. O que antes era cortina e aconchego caiu terrivelmente sobre mim (sentimento que conheço de antemão). Antecipo ciúmes e indagações. A alma lateja, reveste-se de prece o coração emudece nos corredores da boca.

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Jeanne de A. Silva e Araújo

II Aprendo encantamento com tuas poucas palavras. Noites? São muitas mas tu estendes a vigília no vazio das horas mortas até configurar-se no amor que me dás e que não vejo. Armadilha de pequenos sóis envoltos em papéis de seda. Deus está no perigo, na hipótese da seta lançada. Jamais sairia ilesa deste teu escuro.

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Jeanne de A. Silva e Araújo

III O anjo que me guarda acordou cruel demais. Postou filete de sangue na porta parte de sua própria carnadura e me trancou toda por dentro. Saiu às ruas, em claro testemunho e escreveu latente no portão: Aqui jaz. Despiu-se da pele de anjo cortou suas longas asas e foi morar entre pernas onde todo perfume é doce.

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Jeanne de A. Silva e Araújo

IV Perco as folhas expondo ternura. Pinto cavernas em transe absoluto. Me percorri extrema e cuidadosa pra vir do fundo, esquiva e retalhada. Há mistério de nudez sagrada na estátua branca de ventre exposto. Desvendei a secreta passagem do teu lado esquerdo. Canto um hino sacro em volta do oratório herdado. Queimo minha língua imerecida no incenso do invólucro do teu corpo. Em amor, me refazendo.

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Jeanne de A. Silva e Araújo

V Acredito em tardes e ruínas e imperfeições não me salvam. O outro me olha desconfiado e o que sou eu escurece enquanto enfia o pé na meia. Não há palavras para serem ditas nem silêncios para serem suportados. As escamas do teu olho são minha única certeza. Se partes, eu fico situada entre artifícios e asperezas.

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Jeanne de A. Silva e Araújo

VI Sobrevivo às palavras duras e reinvento o resto da paisagem. O tempo não é de resguardos ele exige impetuosidades e delicadas insinuações. As mulheres que fui fundiram-se nos quatro cantos do teu abraço. Sou preguiçosa demais para ser vasta. Não arrebento margens em vão.

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Jeanne de A. Silva e Araújo

VII Por mais que te diga concha, água, âncora não me escutas. Desmanchada pelos vendavais contemplo minha herança em sobressalto e retraio-me ante tanta escuridão. Depois, há o tempo refazendo os caminhos com meus próprios medos. Cansa-me o gesto repetido tua canção antiga e a solidão alheia. Sou minha própria inquisição. Deus, que eu não me perca.

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Jeanne de A. Silva e Araújo

VIII Quem, senão eu me fazendo extensa com dentes e pasto e mordeduras, sorvendo as horas que não passam, aprendendo demoras? Desfio pequenos rosários e não encontro o mais fundo de ti. Então escrevo, procuro em vão minha cálida matéria. Que eu te leve torto, suspenso, sem qualquer asa porque a mim importa a peçonha aveludada, a dor mais funda quando me percorres.

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Jeanne de A. Silva e Araújo

IX Não te reconheço. Nem mesmo entendo teus dons, tuas noites queimantes, tuas horas flamejantes de seculares desejos. O que é o amor esse menino que me seca todos os dias? O que eu busco escondido nuns olhos claros de água salobra? Tenho as narinas e as veias estufadas. Meu verso não suportaria o peso da palavra não na tua boca.

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Jeanne de A. Silva e Araújo

X No canto do mundo há um doce estranhamento. Minha pouca vestimenta é uma grande ameaça para quem não fala minha estranha língua. Quem ousa entrar na casa dos meus ontens sem nojo do meu grito? Estou à beira de uma palavra e nada salva esta última chama acesa.

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2째 Lugar Iara Maria Carvalho

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Iara Maria Carvalho

A MESA, A MESA na malha fria dos anos passadiços mainha costurou uma toalha de mesa bordada de azuis num recanto muito íntimo espalhada em doçura com néctar de frutas pintadas em molde vazado todo fim de tarde mainha organizava silenciosamente um ritual todo passivo e todo secreto a poeira em átomo desfeita a broa feito borra de alimento o mel circuncizado o jogo de luz entre as telhas a jarra a jarra e o zunir incandioso da água se fartando num caneco de ágata.

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Iara Maria Carvalho

HERANÇA há um sentimento indígena no pouco passo que dou no pouco tato que tenho : vou sentindo oca a raiz de que me lenho.

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Iara Maria Carvalho

MIGALHA no doce queirume da bicicleta apenas o caminho em linha reta me sobra

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Iara Maria Carvalho

DAS CARĂ?CIAS nas flores do mais o menos cheira a espinho fica a sobra que murchou daquilo que foi carinho

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Iara Maria Carvalho

OUTUBRO, OUTUBRO hoje não faço mais café. deixo que a flama do dia (pequena) me encarcere em dia gnóstico do amor de agora não cirzo roupas não talho leite não passo a limpo deixo o tempo do amor me levar ao infinito.

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Iara Maria Carvalho

MANEMOLÊNCIAS as sobras do meu antigo ficaram presas no sótão do nosso sítio panelas de barro ainda quentinhas chumaço de queimança na parede chão com pinturas de café e respingos de querosene a louça louça ouça há um tinir de palhas encardidas na borda das saias das moças e as pernas tergalizadas dos homens de minas atinavam para um tempo de barba feita para a sala sem cadeira um bilhete um carvão um espelho um incêndio.

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Iara Maria Carvalho

TEMPERATURAS quando seu passo vier à noitinha traga aquela camisa branca com o cheiro do amaciante que a sua mãe usa traga pente, flores e carinhos e deixe na quina da cama a marca de sua lágrima de amor. quando seu passo vier à noitinha não esqueça de desabotoar a luz de seus olhos deixe-os ancorar na foz do quarto na voz do parto e quando o seu passo retomar o rumo já amanhazando o tempo e o vento resvalando a poeira dos dias nascidos em nossos pêlos deixe esculpido na centelha de minha pele um álbum de retratos com cores amarelas a desenhar: o seu sorriso asiático que tempera as águas de um rio que já secou o modo como risca o nosso nome entrecortado com a ponta de suas unhas encardidas o jeito mavioso de esquecer sua calça sem vinco nem lágrima pendurada no espelho de minha cama as fogueiras acesas sem sombras de cinzas no amarelo-queimado da noite

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Iara Maria Carvalho

... a sua fotografia me lembra uma temperatura antiga dentro de uma olaria e suas m達os incandiadas do sol levam-me ao fogo fogo fogo e dentro da noite nosso sonho cresce.

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Iara Maria Carvalho

AMANH(ESSÊNCIAS) ao acordar dos sinos pessoas passam incógnitas sombras da noite deixam a praça triste o velho cansado a criança dormindo a cidade deixa sobras do antigo na poeira de suas grandes estátuas de seus pequenos homens ao acordar dos sinos as almas ingilhadas dos casais procuram a mística ciência do amor e descobrem na tarde desmaiada uma competência para dálias e paixões (o dia vai se fechando entre badaladas e cotovelos) ao adormecer dos sinos os casais esquecem de apagar as luzes e as amanh(essências) das carícias se libertam se ator(doam) no quarto, uma butija um trinco quebrado um torno sem roupa um sino tocando.

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Iara Maria Carvalho

POR 30 DINHEIROS quando nem bem amanhecia era a carroça andando e tinha um arfar de terra em suas rodas era o rio secando dentro dos seixos intumescidos era a paisagem devolvendo aos olhos o risco de ser contente quando nem bem anoitecia um cheque pré-datado ensimesmou a lua cheia e desde então vive nublado.

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Iara Maria Carvalho

RITO quando eu comprei meu vestido azul veio a c처lica e a manh찾 : hoje n찾o sangro mais.

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3° Lugar Paulo André Benz

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Paulo André Benz

AMANHECER Erigi, como pedra, sem virtude, o estar ausente e de mim fazer-me ausente. O lapidar, com tempo e majestade, as coisas simples do não ser, do não estar, ao mesmo tempo em que estando, a nada consegui configurar senão estar apenas o corpo, enquanto a vaga alma se perdia nas lonjuras, nas planuras ou nas assimétricas costuras que os inefáveis morros teciam no horizonte, quando dos dias claros. Não dei importância aos pentes baratos de plástico, quando os podia ter levado aos cabelos e aninhado, ao depois, cheios de caspa e sorrisos puros, no bolso de trás das calças. Restei despenteado, como despenteado meu senso negou pentes, negou sorrisos, negou calmas e tranqüilidades. Estive a pensar todo esse tempo, quando mais devia ter sentido... Erigi, como pedra, um caminho falho, o de não ver o que via, o de não sentir o que sentia. Na trança da passagem dos dias e dos elos do tempo, as telas sobre os musgos da velha parede úmida, os impressionismos que apenas as baratas viram... Tenho a impressão de ter tido nos ouvidos, todas as vozes de todos os bares,

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Paulo André Benz

e nenhuma dirigiu-se a mim. Mas que importa, ouvi de todos as suas confissões, sem ser confessor. Fui, quando muito, pretenso professor de mim mesmo, nas eternas olhadas à ré do traço já feito, para não tornar a entortá-lo. Erigi, como pedra, miríades de planos: deixei-os, quase todos, colados na parede do corredor de espera. Consumi, com azeitonas e perplexidades, todos os filósofos verdadeiros, os que dirigem os ônibus da madrugada e os que fiam cachorros-quentes às mariposas noturnas, os garçons que ao final conduzem o último solitário à calçada, um louco que recitava a carta-testamento de Getúlio sob a estátua de um Bento a cavalo e... E o que trouxe, senão rumores, senão esquecimentos... alguns gostos variados... a vitrolinha que continua tocando seu séquito de ritmos almiscarados e meio romanceados, os que se deve ouvir na madrugada, pelas três, em profunda absorção entre o não estar ou não ser e outros pensamento escusos e menos puros, a volta trêmula de um sax suave escorrendo entre as teias, as de aranha do canto do teto e as que teci eu mesmo ao meu redor... Vaguidão na mente perpassando a dor nos om-

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Paulo Andr茅 Benz

bros, n贸s mesmos, a todo dia, segurando o mundo com nossas fragilidades, com nossos medos. Nosso eterno ciclo de ressuscitar a cada vez que o sol insiste em clarear...

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Paulo André Benz

VELAS O som do vento amplia a briga das palhas dos coqueiros, o rumor das ondas do mar espraiadas e cansadas, seu último gesto morrendo na areia... as velas enfunadas e os lemes ativos, o gestual da água e do céu em composição, a parede pintada a esmo em pincéis quase tão sujos quanto os pés. Não seria mesmo a vez de falar de pássaros, mas apenas de elementos, apenas a sombra purpúrea do esquecimento das prioridades e por fim a carga da bateria do celular que termina e não merece recarga... um dia sem dar adeus a causa alguma, a coisa alguma, um gosto leve no canto da boca e algumas deliciosas mentiras pensadas com calma. As paredes brancas ou brandas de alguma sala em que jamais pensei pisar, nada de alívio, nada de fogos, o riso constante da dobra da aba do chapéu que deixei de usar, sua poeira sábia de tantos dias sobre o armário escutando meus delírios, meus freios e medidas de condução dos planos dos outros.

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Paulo André Benz

Pés descalços, na ida ao menos, sem a compulsão do brilho nos sapatos. Há, oculta sob a suavidade morna da brisa marinha, a voz quase imperceptível de uma mulher ainda sem nome...

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Paulo André Benz

CAMINHO DIFÍCIL Estrelas cadentes riscam o céu da minha boca, quando nela é noite, e as minhas reflexões, todas, se desentranham de meus sentidos mais caros, não me reconheço – e nas minhas pulsações estremeço – quando de um par de lábios a brisa da solidão me envolve, quase me dissolve na passagem do tempo. São constelações que vejo refletidas no olhar do tempo quando a pálpebra se abre após um longo e pausado – quase eterno – piscar entre as nuvens do meu céu tão sem brilho, desse firmamento que trago e apresento perante os algozes sem qualquer certeza senão a da ruptura... como portal de nada mais que o universo que escuto ao tentar dormir, afinal, os planetas também pulsam e a eternidade respira ao modo das meninas que passam na calçada ao fim de tarde, essas que embalam o corpo cantando baixinho uma música quase inaudível, quase impossível de ser acompanhada senão por quem tenha já suas próprias asas, coisa que ainda não tenho... ... e a minha busca, persistente – desenfreada – da trilha de alcançar a profundeza da alma e, enfim, tocála...

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Paulo André Benz

BRINDE Com o vento culmina a voz, culmina o verbo que cansa, quando se entoa hinos ao corpo cansado, ao gole travoso da água salobra, à saudade das coisas que não ocorreram, a despeito de tantos objetivos. À passagem do tempo, nosso eterno brinde, o caminho do soluço etílico da sobra da noite e da soma de todas as vozes que não têm dono, as pedras da estrada com seus cantos arredondados de tantas rodas... minhas misérias, minhas picuinhas escrituradas e registradas em cartório, com selos holográficos e letras caprichadas de uma escrivã de seios fartos, as minhas incontidas solidões recriadas e redesenhadas como telas acadêmicas, – certo estava Picasso, quem fez guernica foram os militares... a pobreza de espírito que de vez em quando preciso reconhecer, quando me imaginava mais ameno e sem rancores, as minhas derrotas, as mais clamorosas, escondidas no vulto do silêncio e lagrimadas na madrugada ao travesseiro sem companhia.

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Paulo André Benz

Com o vento se esvai minha sinceridade, espalho o que não tenho pela sala, escrevo o que não sinto atrás da forma, atrás da fama, atrás da flama... o fogo se alimenta do vento, do veio que elaboro sem sombras nem sóis, os sapatos dos meninos são sempre tortos para os lados e os calções rasgam nos fundilhos, os muros não são altos quando não pensamos aos sobressaltos, se somos úteis, só nossos filhos dirão em nossos enterros: as mulheres de nossas vidas estarão descalças ou de sandálias? Círculos ventam intradérmicos, intramuros de nossas casas sem fachadas, e na parede de um meio banheiro se via o grafite vital, a percepção do desgaste na tão conhecida canção, da força da grana... as muralhas sem chão...

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Paulo André Benz

RUGAS O guizo ambivalente gestuado em prata na cor da palavra que imita a água sob o luar, a vela do barco que entra na barra calma do rio onde perdi por vago meu último olhar. Cravei os pés na varanda e de modo algum reconstituo ou restituo o estado anterior, lavo as mãos a cada aceno e balanço o corpo quando a música já não toca. Abuso das reticências, no texto e na voz, deixo sempre algo sem clareza: método. Entenda-se, assim, o que se queira entender: minhas explicitudes nunca deram certo! O alvorecer muitas vezes me traz mais cansado que o anoitecer, tamanha a multidão de fantasmas com que convivo. Macaquinhos no sótão, dizia a abuelita, pulando janelas. Violências nos espantam na mídia, desenganos nos açoitam nos noticiários, estamos ou não sob uma guerra? quais as nossas armas se não nos cremos lutando? sorrisos? nada é o que parece ser; isso se reconhece da direita à esquerda, do fim ao começo, por que então propugnas ter tamanha posse sobre o que pensas

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Paulo AndrĂŠ Benz

ser a verdade? ĂŠ, no mĂ­nimo, tolice... existe algum poema inscrito nas rugas da pele de algum general?

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Paulo André Benz

NOVA VELHA ESTAÇÃO Constitue erro crasso tratar as vísceras do tempo apenas como assunto de memória, assim como constitue erro fundamental buscar a essência daquilo que não a possui, por fútil ou por incompreensível... como mundos, divagações e planos de pousar em marte, quando o bar da esquina fica tão perto que a aterrissagem se assemelha tão mais branda... claro que vi em alguns pares de olhos um brilho invulgar, vi também meu mesmo reflexo criado em outros brilhos, mas desandei nos degraus das escadas que não cumpri; e dizer algo passado que sem ter havido é um maneirismo perante a lembrança interna, meias-mentiras para consumo interno: silente, restei abusado, distraído olhei relógios de vitrines quando nem mesmo pretendia comprar um, e assim fui perdendo, um após outro, os trens-bala que tinham como destino alguma estação onde saltar...

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Paulo André Benz

TEORIAS teorias, caro amigo, não me são fáceis, mas permeiam a tua existência como a sombra das passadas que deixamos sempre impregnadas no solo desses caminhos, quando nos dirigimos a algum bar, mesmo que mentalmente... a distância, que será dela, quando na verdade é bem menos significativa do que o silêncio que por certos momentos cultivamos... e nada vale mais do que uma mania bem regada, como a de abrir um vinho tinto sempre com a garrafa pousada sobre a coxa... e se tens uma teoria pronta para o exato momento em que reclamam do fato de eu ter deixado a casa das abelhas sem o mel que elas até aquele momento haviam fabricado, agradeço, pois que ao prová-lo, jamais pensei pronunciar uma explicação filosófica que fosse suficiente a desculpar a minha atitude, que a todos parecia inconseqüente... arroubos, irmão, assomos, e mais algumas veleidades que invadem a forma subcutânea de respirar aos respingos: teorias, teorias, nelas sempre me encaixo como objeto, como extrato de transtorno... se preciso, assino com lágrimas ou suores frios, ou qualquer outro sumo deixado ficar nos recantos... mas me arruma as malas a menina de olhos negros e brilhantes que até um mês atrás sequer nome tinha e hoje me entrega a chaves de abrir o mundo... e se fôssemos de novo à estrada, pelos milhares de quilômetros que separam o ponto a do ponto b, como estariam as nossas crianças no dia de nossa chegada, se tomássemos a lição que nos deu o porteiro do hotel no qual sequer pousamos... teo-

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Paulo André Benz

rias amigo, sei que terias uma para explicar a razão de não ser fácil a abertura dos cofres, a escrita dos versos quando mais fácil a escrita dos transeuntes do caderno, essas letrinhas sem destino que me fogem entre um e outro gole tomado do gargalo... não fui, nem serei referência, apenas devolvi com palavras o que o tempo me apresentou à guisa de contas a pagar, à revelia do meu mesmo comprometimento com qualquer meta... e sei também que se tudo se fizer falho, no ato de abrir com as unhas a cortina metálica do lugar de se encontrar que não remanesce, me brindarás com uma teoria nova em folha, capaz de sustentar meus pensamentos por alguns dias...

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Paulo André Benz

PAZ Me alcança uma paz incomum, quando nossos corpos serenados após a tempestade que dá vazão ao fluxo de todos os desejos se faz em turbilhão e o silêncio apenas sofre a ruptura das respirações ainda fortes, quando após alguns instantes de completa quietude de movimentos nos procuramos num abraço quase eterno... os longos momentos sem palavras, posto que dispensáveis, apenas se comunicam os corpos, as nossas peles... a tua, tão macia... a paz, de uma profundeza inconcebível, como se sobre as planícies e as montanhas em alto relevo do globo iluminado não houvesse guerras outras que não as travadas em busca do prazer, em busca da saciedade da alma. Me alcança uma paz incomum, capaz de retirar dos ponteiros do relógio o conceito exato do tempo, quando as horas passadas escoam viscosas e incoerentes: instantes duram a eternidade e a indesejada hora do retorno ao mundo se aproxima sempre antes de que desejássemos... Teu cheiro doce em minha cama. Uma neblina espessa me transporta a esse estranho lugar de serenidade... dessa paz incomum...

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Paulo André Benz

GRAVATAS Labaredas sob a pele que roça a suave chegada da manhã com teu cheiro ainda impresso em meus lençóis, a aragem adentrando os recônditos cantos da casa e da minha vida, não sei de mitos que tenham resistido a uma noite de amor... Os lábios, esses, extremados em sua precípua função, deixam em batom a marca no espelho com muito mais precisão do que num sorriso, a marca indelével de uma boca a beijar... em mim, ainda, a tua presença, o tato, o olfato... seremos, pela manhã, sinceros trabalhadores, mas durante as horas mais impróprias em que me postar e revestir da aura profissional, terei a tua lembrança a afagar o tempo... a madrugada, o amanhecer, o começo do trabalho dos raios de sol (the first rays of the rising sun...), enquanto eu, quase de terno, a pensar em como se trituram as gravatas...

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MENÇÕES HONROSAS

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Menção Honrosa Roberta Assunção Teixeira

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Roberta Assunção Teixeira

DESVANECER Nas entranhas fétidas Daquele casebre morto Os espectros rondavam soltos A agonia era quase lépida Nas paredes decrépitas Sussurravam vestígios do passado Suas telhas evidências do maltrato O seu ar era poeira cética O seu chão, areia grossa Portas e janelas carcomidas As armações oxidadas das suas vigas Faziam jus àquela carcaça torta Que o vento ao lamber se nauseava E os vermes compadecidos devoravam

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Roberta Assunção Teixeira

NUM QUARTO DE HORA Num quarto de hora Brincam os ponteiros A brincadeira séria Enquanto um apressa, outro demora Mas se todos chegam ao eixo Recomeça noutro quarto a brincadeira etérea

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Roberta Assunção Teixeira

EXPIROS O seu rosto é suor pálido E o seu peito suave arfar Ao seu toque penoso e cálido O desejo de se esquivar Só a penumbra o rodeia O vento lhe sopra fúnebre O seu corpo sobre a vil esteira Sequer lembra que já foi pulchre Exala o odor dos decompostos Nem mesmo os ratos lhe fazem companhia Na tez áspera transparecem os ossos Fere-lhe os olhos a luz do dia A vida como que por maldade Teima em não abandonar a criatura Com a sua soberba crueldade Às forças da morte se mistura

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Roberta Assunção Teixeira

POEMA FINAL OU ESTÁTICA Num sussurro leve A noite fez-se dia Pariu a aurora As flores se abriram Os bichos acordaram E para um José era chegada a hora Nem tirou o pijama Nem deu adeus À mulher, filhos e netos Num suspiro breve Pensou se encontrar com Deus E, no seu peito, tudo era quieto

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Roberta Assunção Teixeira

POEMA PRIMEIRO OU MUDANÇA Em mim morava uma menina Que há muito se foi Um dia cansada E com olhos insones Pegou sua boneca Sua inocência Sua alegria E partiu Correu em andanças Mandou cartas Mandou fotos Mandou lembranças Um dia mandaram a menina Num caixote bem cuidado De volta pra mim

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Roberta Assunção Teixeira

REI DE COPAS A folha cai lentamente Já não suporta o talo fino Vai cedendo ao vento matutino Perdendo orvalho pro Sol premente Suga o que inda pode de seiva E voa num estalo tímido Há de estar morta das nervuras ao limbo? Se deixa levar pelo vento que a deseja Já contorcida sobre si Despedaça-se aos poucos O vento que não lhe nega o sopro Transforma em pó o que não pode destruir

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Roberta Assunção Teixeira

SERENO A maré adentrou a boca da noite Matou o horizonte Além da areia branca do desconhecido Que estranho odor esse vento trouxe Pestilenta nostalgia em nossas fontes Entre o verde mato adormecido Nessa hora inerte e desvairada Badala o tempo na surdina A tristeza estende seus braços frios Mas então começa a serenata Dos astros, da brilhantina E o céu esquece que já foi vazio

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Menção Honrosa Deilson Melo Tavares

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Deilson Melo Carvalho

DAS REPRESAS Das represas só tenho a dizer que são minhas só tenho a dizer que são marcas só tenho a dizer da dureza de suas pedras marmóreas É que os pássaros ainda cantavam inocentes do vício e da morte e só tenho a dizer que eram pássaros que voavam sem sul nem norte como só tenho a dizer que era linda a miragem no ventre da mulher de onde um caudaloso rio vertia forte.

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Deilson Melo Carvalho

SONÉTICA DE UM SUSPENSE Ainda ontem eu estava velho e olhava imóvel para o meu retrato querendo descobrir no acetato a marca que me fez o escaravelho Mas antes que as mandíbulas vermelhas fechando em volta me sacrificassem para fazer comigo antigas telhas onde mudinhas quase mortas nascem um vento já levava-me à primeira subestação de entroncamento férreo para que eu, subindo lá do térreo chegasse ao topo desta ribanceira de onde pularei se algum mistério não me prender ao pé da feiticeira.

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Deilson Melo Carvalho

DESCONSTRUÇÃO E SÍNTESE Eu não posso ser tão sábio que não clame um beijo Eu não posso ser tão hábil que não seja um só Não posso ter terra e fouce não posso dar milho e alho nem ver andorinhas doces pararem no ar tardante e do viajar soprante não posso ser mico e mago Sem meus menestréis armênios tocando gaitas siamesas não posso ver deserto e vida nem cultivar vozes passivas Quando eu passo na rua sei que meu rosto é um quando ando na chuva sei que não sou demais quando vejo o mundo daqui e o mundo não me vê sei que tudo está sereno e as coisas continuam naturais.

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Deilson Melo Carvalho

O PASSEIO ATÉ AGORA Pequeno, de mão levado eu fui deixado no bosque e lá fiquei toda a noite de manhã não me lembraram Enquanto só, fui adiante de árvores rodeado e ali mesmo achei caminhos que só eu podia entender Eu hoje não mais entendo o que, acho, deu-se certo acho que cruzei o bosque porque o via como uma estrada.

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Deilson Melo Carvalho

AQUELA PARTE POR MILHÃO Ainda costumo trazer os olhos presos em castiçais ainda as penumbras e os tangos ainda o somenos, o vestígio O aroma residual, apesar da indiferença me acompanha e eu o sigo Ainda qualquer coisa no meu peito de uma antiga ternura resta uma fraqueza, um acometimento de cair em langor nas poças espelhadas que dias de luz esbranquiçada fazem canais para outros mundos.

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Deilson Melo Carvalho DA TERRA PARA O AR Quero ver a madrugada a brisa fria encontrar quero sentir em meu rosto se espalhando por meu corpo a vida que se consuma e quero as calmas e as brumas do pensamento vazio para andar no amplo e sem fundo oco do tronco frio de cujo pé escalvado uma mão lúgubre esgarça feito uma prévia trapaça que a madrugada acolheu: no céu estendida tarda a malha de aço cotada que ao céu inteiro sorveu E disto fez-se o meu sonho quase um galope certeiro em cujo fio de brilhantes meu sopro será levado Eu e o cavalo calados alados cavalo e eu.

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Deilson Melo Carvalho

ÁGUAS DE LEVAR A chuva já chegou e com ela os dias frescos e as horas muito dilatadas de esperas sem motivo A chuva no fim da tarde a chuva a se ver da porta longa, grossa e nebulosa enuviando a cidade A cidade são casas baixas e labirintos e vilas e coisas faladas baixo junto com as águas chovidas e levadas e vividas cor fraca, parede antiga corridas pela borrasca junto da cal e da brita Que tanto rio que me arde tarde, mulher sumida afogada em densidades de águas barrentas fundidas Que tanto rio que uma tarde arde até ser extinta no burburio que a cidade exsuda escura e esquisita

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Deilson Melo Carvalho

MODELO MATEMÁTICO tangentes e secantes secantes e parábolas parábolas e pontos e curvas e espaços e céus azuis e sonhos e linhas de argumentação e mentes fascinadas ternas moléculas seres não viventes e sóis azuis e sonhos e muita imaginação palavras e hipérboles conceitos e sentido conceitos e sementes palavras e ouvidos e caos azuis e sonhos de amor no coração caminhos e vertentes secantes e tangentes e números e astros e peles atraentes e mais azul e sonhos e nuvens neste dia ardente

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Deilson Melo Carvalho

POESIA ESTRUTURANTE Na sela do meu cavalo galopando sobre o vento que enfuna as velas da vida levando os homens aos fins tocar na viola o hino dos anjos e querubins que galopam sobre nuvens nos pégasos mandarins Nas asas do meu veleiro em direção ao acaso fugindo da veleidade de viver sem ter razão quero mais um verso longo alcançando o infinito subindo o cume dos montes eternas neves do olimpo Olímpicas curvadas frontes trindades santas celestes o hino rasgando vestes mostrando a vergonha infinda dos pés escuros de lama das mãos transformando em ouro da nudez inobscena massacrada em seu decoro

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Deilson Melo Carvalho

da inocĂŞncia sagrada pervertida em sua sina quebrando a ordem das coisas a mulher vira menina Quero mais o verso livre que rima onde ele quer que desvirgina a menina que a transforma em mulher que cresce junto com ela para ir aonde levar a pobre razĂŁo da vida que dĂĄ sentido ao passar.

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Deilson Melo Carvalho

O FIM DOS PRIMEIROS DIAS Um pequeno regato serpenteia da montanha escorrega, regateia serpenteia, regateia, rega as sementes que brotam sob a areia Um pequeno desejo se avoluma um obscuro futuro delineia s達o sementes de sonho que uma a uma desabrocham nas malhas desta teia Um tecido de fatos se conforma um tecido de homens conformados um pequeno regato se transforma leito seco rachando esvaziado.

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Menção Honrosa Jean Sartief

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Jean Sartief

MAIS OU MENOS EU Mais ou menos eu sabia e nada te disse. Nem meus olhos no teu espelho nem a boca na tua boca nem nada por todos os lados e de ímpeto uma coragem mais ou menos minha, que foi tua um dia, que perdemos no último encontro. Nem paciência

nem a toalha molhada caída no canto da porta nem o mar em revolta para eu perguntar às conchas o tal segredo não dito nos teus olhos. Mais ou menos o que era sonhado, mas nem eu nem ninguém nem mesmo a sombra... só o silêncio mais ou menos no íntimo, no certo, naquilo que sempre foi certo... no desvio à esquerda do eterno de nós dois.

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Jean Sartief

FIO A FIO Você costura e eu quieto começo a ver o mundo desenhado na tua pele.

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Jean Sartief

A BAILARINA Eu também não tenho os pés da bailarina, mas tenho em mim o mesmo silêncio. Oscilo entre a flor esquecida e a sombra dos pés na escada.

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Jean Sartief

LEMBRANÇA DE NÓS DOIS Construo essa lembrança e sinto falta do cheiro do mar, do teu porto, dos olhos afogados em terra firme.

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Jean Sartief

ESCOLHAS Olhos provocados. Todos os dias ando pelado pelo caminho das rosas. A mulher na calรงada avisa que se eu for por outro caminho vou me perder mais ainda.

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Jean Sartief

INQUIETAÇÃO EM SILÊNCIO Nenhuma pergunta sobre o meu dia sobre o meu segredo. Haverá espaço para mim no teu leito?

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Jean Sartief

PRIMEIRO A POESIA! Chuva por todos os lados. Salvo a poesia, um pouco de juĂ­zo e nada mais.

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Jean Sartief

ÍNFIMO Como admirar o que não alcanço em você se dos meus olhos só me sobrou o sal.

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Jean Sartief

,LUMINAÇÃO Todas as horas incertas e impaciente o céu me vem cheio de chamas. Assombrado e feliz eu descubro, em meio aos teus espinhos, que não há nada que eu queira mais desse mundo.

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Jean Sartief

DESPEDIDA Sem testemunhas. Dormente os olhos, a boca, os dedos, deixo-me morto, a tua carta na m達o e o ch達o do nosso primeiro encontro.

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Menção Honrosa Kalliane Sibelli de Amorim

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Kalliane Sibelli de Amorim

POETA Há três dias que durmo sobre papéis. – Coitadinha, não consegue escrever nenhuma linha! Impressos sobre as pautas os segredos de meus cílios o suor de meu pescoço as marcas do meu rosto a saliva do não-dito minha língua meu odor são motivos para versos? São poemas sem leitor! Ainda há quem se desgoste: onde estás? ninguém te vê! E não sabe que quando a noite desce, desce de uma vez, há um olho que se abre, há uma ausência que se chega, um pensar que não se fala, um sonhar que não se dorme: onde a palavra que suporte qualquer corpo em meu abraço?

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Kalliane Sibelli Amorim

AUSENTE Não sei o que farei com as palavras que não direi. Tenho-as tantas, engasgadas, modeladas por certa mão invisível e fatalista. Tenho-as em meu ventre, numa gestação tão árida... Tenho-as mesmo nessa ausência que me cala. Poesia – tu me chamas, incêndios no meu passar, mas eu não sei de onde falas nem de onde finges me esperar. Morrerei, é certo, na sombra do teu rastro. Morrerei: da palavra na boca da palavra cansaço.

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Kalliane Sibelli Amorim

INVENÇÃO Casulo-me os dedos para que somente os olhos se estendam, cotidianos, sob a pele da existência. Não me prendo a nada, vou larva, cega faca, pela seiva dos mundos mínimos. Mas os homens querem palavras, sejam aéreas, de aço ou de água. Os homens vestem palavras e eu vou abraçada ao vento vendo a morte, muda, jogando redes ao relento: casulo-me, calo-me, mas também me invento.

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Kalliane Sibelli Amorim

SENTENÇA E um dia, enquanto afogava formigas, viu-se descendo, sozinha, pelo ralo da pia. Que vida intrusa era aquela? E por que no espelho lágrimas feito estrias? E por que em seu rosto um outro rosto havia? Não faz sentido, não faz – e o rosário se estendia. Mas as xícaras lhe falavam das bocas agora frias, os varais lhe segredavam vontades já encolhidas, e quanto mais atenta às vozes, menos a mulher morria. Ela sequer suspeitava a trama que em si tecia, pensando que essa teia qualquer vento desfaria. Inventava uma desculpa: não estou pra poesia! e quanto mais a negava, mais seu peito se fendia.

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Kalliane Sibelli Amorim

E um dia quando nada mais lhe sorria, seu corpo encheu-se de olhos, seus olhos, de muitos vazios. Mas os homens não se entreviam, os homens nem se atreviam, e tudo voltou ao começo: o amor de um poeta dormia.

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Kalliane Sibelli Amorim

REMISSÃO O dia termina de pernas cansadas O dia com suas varizes profundas A agenda vestida de náufragas horas E à tona das horas, uns versos que bóiam À tona dos dias, canções se recordam À tona de mim, solidões que se acolhem

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Kalliane Sibelli Amorim

COLHEITA Vigias meus lábios maduros: a que saberão essas rugas? terá calor essa pele murcha? Vigias: meu corpo canta carícias, adivinha-te os temores, borda em si tanto impossível... Vigias: meu amor já nasceu velho, mas o tempo no meu tempo às vezes só, às vezes passa.

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Kalliane Sibelli Amorim

MARCHA Retorno pelo mesmo caminho, para a mesma casa, com o mesmo amor. Retorno porque outro é o passo, porque outro é o lar, porque outro és e o eterno. No percurso me descalço, me dispo, me desmonto sobre o ventre das coisas e pouso sobre todas elas meu corpo só. Agora nem importa a marcha tangendo, tingindo de cinzas meus pássaros dias. Importa é chegar, lembrar as pegadas, tinir essas xícaras, e em teu peito, amigo, o mesmo, o igual, florir sobre as linhas ainda vazias que trago nas mãos.

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Kalliane Sibelli Amorim

RETRATO DE MINHA AVÓ Quando ela enlaçava o ar com cordões de açúcar, e varria o tempo com vassouras de garrancho, e cantava A Francesinha para os moradores das lonjuras, dos distantes... Quando ela pintava a alma de tisna, e mirava-se na água das gamelas, e pensava ver não o rosto habitual, mas uma asa, quem sabe duas... Eu não assistira a esses quadros, mas eles escorriam tanto de seus lábios que a fazenda inteira descia pela minha garganta, como água de cacimba ou alfenim que se desmancha.

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Kalliane Sibelli Amorim

A Francesinha é o título de uma música que minha avó costumava cantar e cujo autor desconheço. Há um trecho que diz: “A minha francesinha não tinha ninguém/ eu era o seu amante constante, porém...”. ÁLBUM De teu rosto ficaram as arestas e uma cor de folha ao relento. Onde, onde o rosto de outrora? Neste retrato em que sorris morta? Prendi-te nesse espaço raso, primeira cova, e meus olhos tolos abraçam o que não existe, a memória... Para que amando o que não há eu aprenda o não-ser sendo e tinja canções ao ouvido dos álbuns que vou tecendo.

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Kalliane Sibelli Amorim

APRENDIZADO Nossa pele arava a terra com o sonho da semente Cada sulco era um verso cavalgado de promessas Versos verdes granulados nos lรกbios lunificados Do alpendre algodoado nossas mรฃos jรก espiavam A morenice da terra com suas tranรงas escondidas E toda a espera do amor se fazia madureza Fruto-feto desfiando o seu mel por sobre a mesa

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Menção Honrosa Wescley José da Gama

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Wescley José da Gama

POEMA PARA UM CERTO ROSA: o velho e cansado João (recostou a velha cabaça d’água no chão da mesa riscada a faca e) respirou música pela última vez.

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Wescley JosĂŠ da Gama

Beraldo caminha lasso diluindo-se no marrom-escuro do horizonte engolindo o sol que se deita amarelo-queimando os casebres todos iguais

Beraldo nĂŁo volta mais

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Wescley José da Gama

nasce no tempo uma estirpe e cem anos de solidão não são capazes de liquidá-la. só o García e suas putas tristes.

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Wescley José da Gama

a beleza obscura e gráfica da cidade é a plástica idéia de que insistimos na possível e humana teia no sonoro sonho do recolhimento das fendas na cor úmida das virtudes do coração.

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Wescley JosĂŠ da Gama

clareira (os lilases do cĂŠu quase me desvanecem a lucidez fim de tarde desmaios de luz)

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Wescley José da Gama

facho de luz que cinde as frestas das árvores assomando no h o r i z o n t e rompendo a tardezinha amarelo-queimado a transpassar meus olhos: dois lampiões em chamas à procura de abrigo

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Wescley José da Gama

(primeiro e último ato: roçado, faca, homens, pôr-do-sol) ”sois umbuzeiro de estrada... argumento de foice... sois lodo sois timbungão...” Jessier Quirino

desassossegavam-se os ânimos assistidos pela vermelhidão do céu na roça e joão acocado já perto da noite não atinava para a vontade que nascia no vento: ir-se somente: mas – ao tinir das lâminas – t o d o s c a íram

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Wescley JosĂŠ da Gama

e a cor da tarde morrendo era a cor do sangue morrendo e a luz de um homem caindo era luz de um homem tecendo ... um destino.

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Wescley José da Gama

eu olhava a tarde sem desespero como a esperança marítima de uma borboleta azul que flutua levemente imensamente sobre a quilha das águas de um oceano vazio. os olhos insensatos e intensos agora viam a malha fina que adorna o beijo cru da vida brotando em qualquer ilha. os véus negros das nuvens diziam sim e não assustariam nem mesmo o mais frágil dos botões de rosa. a alegria era essa calma-terna após um ciclo tenso de aprendizagens a flor de soluços. o tédio era uma lembrança branda. A calma era um presente original de deus ou da natureza. (deus-natureza)

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Wescley José da Gama

no frêmito sigo fogo-fátuo

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Menção Honrosa Therlandeson Gley Alves

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Therlandeson Gley Alves

O SEXTO DIA ao fim do amor um resquício do sono de adão adormece o corpo lenta e delicadamente a sonhar-se deus. quando o amor recomeça um resquício de adão adormece o sono e deus sonha-se ainda uma vez corpo.

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Therlandeson Gley Alves

AMARGO O POEMA escrevo: morro-me aos poucos – meu suicídio diário discreto antigo. escrevo: a certeza de não haver fim – mesmo início – de todo verso mil vezes pensado mil vezes dito duas mil vezes esquecido. escrevo angústia de morte: sombra amarga de solidão – o verso esquecido no escuro pelo poeta antigo: o silêncio antigo por outro verso vivo morto ainda vivo.

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Therlandeson Gley Alves

QUIXOTE o herói caído entre sangue e fezes de seu cavalo. menos herói que homem envolto na fúria de seus inimigos em sua voracidade. o homem sorri o herói lembra-se do futuro: dulcinéia não está morta e seu rocim é ainda impávido. só o homem foi relegado ao chão – o herói é vivo sempre.

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Therlandeson Gley Alves

TIGRE os dentes frouxos do animal sanguinário sedento abatido: as veias secas vertidas em chão de terra quente os dentes frouxos do animal banhado de morte perdidos da carne alheia para os tempos futuros cada dente destituído é um verbo esquecido de fome os dentes frouxos deste poema ensanguentado: disléxico atonal e amargo.

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Therlandeson Gley Alves

ROSA DE SAROM – mel e leite estão debaixo de tua língua, e o cheiro dos teus vestidos é como o cheiro do líbano. cântico dos cânticos confortável é o calor de teus braços e pernas e neles é meu descanso gigantesco é o desejo de teu corpo e espírito e neles há meu labirinto imortal é o véu com que cobres o mundo e nele é meu o segredo doce é a boca tua – rosa de sarom – e nela é também doce minha boca.

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Therlandeson Gley Alves

MESSIAS sozinho ele está despido no deserto escreveu seu coração na areia para não carregar a angústia pétrea de seu medo até os últimos dias quando o povo vier ao seu encontro ele fugirá para mais longe ainda continuará despido e só sozinho ele estará despido no deserto

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Therlandeson Gley Alves

DA INFÂNCIA por trás das casas o sol incendiava seus vermelhos – todos brincavam na rua de terra seca e pés descalços – o mundo inteiro era feliz eu imaginava-me contente assistindo ao espetáculo do mundo pelo portão – enquanto por trás das casas o sol incendiava seus vermelhos.

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Therlandeson Gley Alves

POEMA PARA A MULHER PECADORA E JEAN GENET – e beijava-lhe os pés e ungia-os com o bálsamo. evangelho segundo lucas ela beijou-lhe os pés e o acariciou com seus cabelos – o carinho de sua história de seu caminho da terra em que seus pés deitaram-se um dia ela saiu às ruas e mendigou por seu homem – o carinho de seu corpo de sua abnegação do desejo e de sua humilhação o amor vivo em cada gesto – maior que o corpo mesmo a alma – o amor maior que o próprio amor.

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Therlandeson Gley Alves

DA CRIAÇÃO um verso me faz sangrar as narinas – o poema é sempre uma violência um verso me arrebata e me governa – o poema é sempre uma bastilha tomada um verso quebra os ossos de quem amo – o poema é sempre alguma culpa um verso me encarcera para sempre – o poema é sempre a pena irrevogável.

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Therlandeson Gley Alves

A BELEZA – para dulcinéia del toboso

o que há de mais belo em teu desenho dulcinéia são os olhos do quixote – a insensatez do amor e da esperança e quando revejo o quixote senhora dama dulcinéia del toboso o que nele mais me encanta é o amor indestrutível de tua presença.

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Menção Honrosa Francisco Júnior Damasceno Paiva

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Francisco Júnior Damasceno Paiva

REMINISCÊNCIAS Tenho atributos para vento. Ainda posso inventar uma tarde a partir de uma garça. Manoel de Barros

Barquinhos de papel na correnteza Banhos de chuva Bolinhas de gude Cavalinhos de folha de carnaúba Bandeirinha Sapoti Nas árvores Canários, sanhaços, juritis Estórias de Timiza Fadas, monstros, encantamentos Lampião subiu a Serra E conversou comigo Hoje tem espetáculo? Tem, sim senhor! Futebol no meio da rua Minhas primeiras leituras Cervantes, Verne, Bandeira, Drummond Um mundo novo descoberto Menina linda de estranha leveza Correndo de bicicleta pela rua Invento Menina de papel Correndo na chuva Pela rua Barquinhos de estranha beleza

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Francisco Júnior Damasceno Paiva

TEUS OLHOS Teus olhos são mais lindos Que todos os que já conheci Teu olhar tem mais calor Que todos os olhares que já senti Teus olhos têm mais mistérios Que os olhos da moça de Da Vinci Teu olhar tem mais brilho Que todas as estrelas que já ouvi

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Francisco Júnior Damasceno Paiva

América Latina “Yo tengo tantos hermanos que nolos puedo contar y una hermana muy hermosa que se llama libertad”. Ataualpa Yupanqui América das civilizações Inca, Maia e Asteca Sol, milho e paz América dos povos indígenas Nações ecológicas Sol, lua e tupã América de luta América libertária América das invasões Portuguesa, espanhola Holandesa, francesa Inglesa e americana América sifilizada Europeizada, “cristianizada” Americanizada América de luto América dominada

América das tiranias Do genocídio Da escravidão Da cruz e da espada

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Francisco Júnior Damasceno Paiva

América das correntes Dos roubos, dos saques E da ambição América de luto América dominada América dos líderes Dos índios guerreiros Dos negros dos quilombos Dos camponeses de Canudos América das lutas vividas Das lutas travadas Das lutas sonhadas América de luta América libertária América das ditaduras Dos Batistas, dos “Médicis” E dos “Pinochets” A serviço dos ianques América da tortura Do exílio, da morte Da “praça de maio” E das praças sem povo América da imprensa censurada a liberdade cassada América de luto América dominada

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Francisco Júnior Damasceno Paiva

América da liberdade Dos sonhos de Bolívar e de sua luta Da luta na Nicarágua e da esperança Do sangue de Romero e do povo de El Salvador Da luta de GUEVARA - Um tributo a Che Marighella, Araguaia... América de luta América libertária América viva América Latina Viva a América Latina!

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Francisco Júnior Damasceno Paiva

REDIVIVO Já nasci várias vezes Morri outras tantas. Meu primeiro nascimento Foi sozinho E triste. Tinha mais de cem anos. O peso da idade Acabrunhava o bebê. Ninguém entendia. Mas fui ficando mais jovem. Cada dia valia anos, A menos. A minha primeira morte foi também Sozinho. Porém de festa e alegria. Redivivo, Fui ganhando saúde e viço. A cada ano mais jovem fico. Hei de morrer Na floridade.

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Francisco Júnior Damasceno Paiva

KADIDJA Quando estou diante de ti Não consigo decifrar O enigma da esfinge Escrito no verde do teu olhar. Quando procuro teus olhos Descubro a fúria do mar Que me arrasta sem piedade Para o infinito do teu olhar. Quando estou longe de ti A esperança de te encontrar É uma verde lembrança Da beleza plástica do teu olhar.

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Francisco Júnior Damasceno Paiva

ANTECITUTA Já li Saint-Exupéry Aquele de Terra dos Homens. Hoje tomo Augusto dos Anjos Em doses homeopáticas. Pois a morte é certa Os dias incertos E, sobretudo, não tenho pressa.

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Francisco Júnior Damasceno Paiva

ESTRELA DA MANHÃ Às vezes tento lembrar do teu rosto E não consigo. Você foge. Some. Como naquela manhã Em que você seguiu E deixou a beleza do teu sorriso Guardada para sempre comigo. Depois você volta. Toda. Inteira. Como naquela mesma manhã Em que tuas lágrimas molharam Teus olhos de menina E eu viajei no teu corpo Sem medo de que aquela Fosse a derradeira. E é nestes momentos Em que você aparece inteira Que percebo o quanto a vida É ilusória e passageira. Não deveria haver separação Nem aquela estrada terminar Bem que você poderia Minha estrela da manhã Ter me carregado No carinho dos teus olhos Para uma viagem sem fim.

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Menção Honrosa Márcio Rodrigo Xavier Sobrinho

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Márcio Rodrigo Xavier Sobrinho

I

Não sou eu o único a ver o propósito rítmico das coisas Engalhado dum saco arrastado no vento, Nem a ver sozinho a proporção assentada num movimento Se balançar pelo cimo da serra, Nem a comparar desacompanhado as medidas, As desmesuras descompassadas Com que me caem as gotas soltas das nuvens quando chovem, Com que me monta um quadro algébrico e antigo A despencada dos barrancos Com o que se lhes fica na cara depois que caem, Com o que me assegura com o giro do seu corpo Os restos das árvores a voltear (suas folhas soltas a volver) E voar – ser folha – é variar no vento, Subir-lhe quando ele pedir E pulando dum súbito em cima dele Agarrar-se-lhe em volteadas tontas e às loucas E celebrar com ele uma dança e uma música Que ele diz tê-la encarnado no corpo solto Que é estar a alma livre por toda parte. Quando eu vejo isso, Tudo isso também me vê. E me olha de sua altura descomparada

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Márcio Rodrigo Xavier Sobrinho

E me diz de seu mistério de não haver, havendo... E que na verdade isso de haver e de não haver É que não existe... Nem essa cegueira surda que é estar-se triste e sozinho... E que quando, no seu olhar para isso, Isso olha para você, não há ninguém se olhando. O que há é como alguém que se abaixa curioso entre a folhagem E sem querer se vê refletido numa gota de orvalho iluminado do sol, E se vê assim tão distraído e comum Que depois nem se dá conta... Corriqueiro como o riacho que corre, Ou o animal que pasta, desocupado... Com a mesma desocupação das estrelas, Que só se ocupam em ser desocupadas E olhar sem ver para o homem, E dizer no silêncio Como é alegre e bom estar-se desocupado e sozinho e pleno de si... Esquecido até do que se é... dormindo... E que isso de olhar sem vê Existe tanto como isso de ver olhando...

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Márcio Rodrigo Xavier Sobrinho

II

Quando me deito na grama, E subitamente dou conta dela Me espinhando as costas, E ligeiro arranco um punhado e o olho, Sei que há tanto mais por trás dele Como há dele a me tocar as costas; E sinto numa presença Tudo o que passou e mudou-se Pra ser agora ali aquela grama que arranquei à terra – Que arranquei num impulso e sem pensar – E me sinto assim um pouco como deve ser deus A desmoronar, trovejar e explodir, Nos arrancando e nos fazendo mortos Assim tão de súbito E sem se dar por conta... (e isso é pra ele do mesmo modo comum e sem motivo como é pra gente arrancar um punhado de grama) –

arremesso o tufo de grama ao vento –

Mas essa grama que eu matei arrancando à terra Eu mesmo devolvo à terra, E a terra a vai acolher, como antes a fazia brotar, E o mesmo saber que ela tinha antes, ela vai saber agora, E vai me dizer olhando pra ela, o mesmo que ela dizia antes; Que se fez de morta, pra dar mais de comer à

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Márcio Rodrigo Xavier Sobrinho

vida, Que se fez de muda, pra dar mais a gente de ouvir as coisas, Que se fez de surda, pra dar mais a gente de não perguntar aos outros Pra se saber de certeza, e que achar por si É melhor do que achar sem o senso Que descobrir as coisas sozinho ensina... E que se fez muito, porque é só uma... É por isso que eu também quero um dia ser terra Numa colina alta tendo por cima uma árvore com grama ao rés, E esperar num silêncio tranquilo algum menino afoito e sozinho Vir sentar-se um dia ao pé da árvore E atirar distraído ao vento um tufo extraído da grama.

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Márcio Rodrigo Xavier Sobrinho

III

Um dia ao crepúsculo Enquanto caminhava ligeiro a subir uma rua, E como viesse conversando ria bem alto e gesticulava, Vi subitamente uma velha senhora a olhar-me nos olhos, E notei que olhava para mim Como olhava para tudo, Apenas com a diferença que agora Era a mim que notava... E via-me, como se vê a um jovem Animal que passa fazendo alarde, Tão corriqueiro e comum como ela mesma sentada naquela calçada... Olhou-me do mesmo modo como se olha para as coisas mais simples, Sem precisar pensar muito mas reparando bastante... E me viu assim sem discriminar os meus trajes puídos, Nem a minha barba grande ou meus cabelos assanhados... Olhava-me simples como penso que sou, A me largar livremente Após me haver tocado com os olhos... Olhou-me sem esse olhar de gana, enredado, De quem deseja alguma coisa quando olha outro; Olhou e me deixou, como quem não quer nada.

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Márcio Rodrigo Xavier Sobrinho

E por isso, por me olhar do modo de quem repara para o céu Como quem espia pra chuva que cai e cessa (Que desejo pode haver em se olhar para as nuvens? Ou as estrelas? Olha-se-lhes simplesmente) Sua visão era boa e certa e verdadeira. Olhou-me com seu olhar desinteressado E me viu com um olho que era Todo um sorriso e uma satisfação de ver – Por isso cumprimentei-a num susto, Num impulso espontâneo e com a cabeça: ‘olá!’ Mas, ah minha avó, como pude sentir ao cumprimentá-la Sua solidão amarga sentada sozinha Na calçada esperando o crepúsculo! Sua solidão mundana de quem se despede cotidianamente! De quem tem já mais intimidade com as pedras E coisas caídas que com os homens... E rouba-lhes já um pouco do peso, E senta-se já tomada emprestada de sua imobilidade... E como tive impulso de virar-me, E sentar-me suavemente aos seus pés, E pegar-lhe a mão para dizer-lhe que nunca houve Nem haverá mais solidão alguma, E que algo que as coisas não nos permitem é estarmos sozinhos, E que tudo repercute num perene canto e uma mú-

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Márcio Rodrigo Xavier Sobrinho

sica, E que o tempo da solidão é o mesmo de isolar-se consigo mesmo, E fechar os olhos e tapar os ouvidos, E só ouvir um eco, e vê menos que uma sombra, E isso é que é triste... Mas antes, entendi que foi de você que eu sabia disso. Que foi do seu silêncio e da sua solidão que eu ouvi essas coisas. E que foi a sua presença sentada naquela calçada E seu olhar simples e correto que me ensinaram. (do mesmo modo silencioso que as coisas ensinam) Por isso não voltei-me, velha mãe aparentada das pedras, Por isso segui e não voltei-me... (sei que em breve se apagarás, como eu também sumirei um dia, para voltarmos a vala antiga e comum – mas antes disso veremos o sol, a terra, as pessoas e os dias a passarem em sua sucessão contínua... e depois disso estaremos com a terra, o sol, os dias e as estrelas voando em disparadas certeiras...)

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Márcio Rodrigo Xavier Sobrinho

IV

Quando vejo o aberto... E ver o aberto é olhar pra fora. É olhar pra essas casas com suas árvores Plantadas pelo terreiro da frente e as Pessoas a entrarem e saírem delas, Com o fato presente de terem já entrado e saído e passado, E sabendo de antemão que tudo nunca mais volta Porque se renova sempre... Eu, por exemplo, nunca estou o mesmo. Estou mais como as casas com suas plantas e pessoas, Sou algo espalhado e muito, me ambientalizo, Sou um lar com ares de personalidade a insinuarse, Estou solto, mudado da novidade De olhar muito e de notar a mudança, Alterado substancialmente por conhecer e reconhecer – E digo: não sei de nenhum conhecimento que se adquira, Só que se experimenta... E posso por isso ver qualquer coisa. Posso ver toda coisa até o que não está na minha frente... Miro a linha do horizonte e vou adiante

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Márcio Rodrigo Xavier Sobrinho

Mas longe do que se me movesse Mais ligeiro do que na mais possante das máquinas! Dou um salto e não paro!... Isso porque olhar para as coisas é mais do que observá-las e notá-las, É mais do que poder achá-las boas ou más, E mais do que pensar sobre elas... É simples como vê-las, e para isso Nem é preciso estar de verdade diante delas (quem disse que há aqui casas e pessoas e árvores?) Pode-se ouvir seu murmúrio, adivinhar sua presença, Como quando você sabe de súbito que há alguém às suas costas mesmo antes de virar-se, Como quando de repente você se volta e olha no meio da multidão, Nos olhos, pra única pessoa que observava você, E com isso descobria que ela lhe olhava... E isso é do mesmo modo descobrir o que te fez virar Como saber sem ver das coisas que desejam o seu olhar, E vê-las vivas e vibrantes de quererem se amostrar e encantar... E afastar o cansaço dos olhos... e acabar o fastio de ver...

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Márcio Rodrigo Xavier Sobrinho

V Ando livre e solto. Sou um homem da multidão. Espalho meu corpo por tudo que vejo, Seja grande ou pequeno. Quando olho caminhando logo cedo uma flor E cumprimento-a com os olhos, Falo não só a ela, Mas digo também um bom e sonoro ‘olá!’ A mim mesmo e sigo contente. Sou um pouco de tudo que posso ver, E tudo que não posso ver é também um pouco de mim. Eu ando pelas manhãs Com a mesma presença espalhada de quem sentado, No batente de sua casa, Só por assim o desejar (como quem quer ficar quieto e não fazer nada) Anda e corre e sabe solto do mundo todo, Com essa sabedoria quieta Bem calada e muda de quem soube... E aprendeu com tempo que pra saber tudo Nem precisa saber muito... Que pra saber tudo nem se precisa saber nada... Nem de estudo, nem de viajar, nem de conversar... Só muito de buscar e querer, De querência bem verdadeira... (como quem para andar se levanta primeiro)... Por isso eu dou minha volta, e ando do meu passo largo;

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Márcio Rodrigo Xavier Sobrinho

E cumprimento de ver tudo, Com um aceno que é mais de verdade do que de gesto. E essa calma contente com que vou Não é alegria não... É mais como não fazer nada... É estar presente e atento pelo caminho... É olhar sem estar cego de tarefas e emoções... E pensar muito atrapalha (é como olhar para o outro lado)... Agora vou... vendo...

SÂNIE

Se dói dói, dói, dói se rói

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A VACA E O BOI o vento deu a curva nas rodas do carro de boi geme a canga toss e a vaca tosse o boi a estrada desce desce o sol morre a vaca morre o boi a estrada que desce não é a mesma que sobe que estrada me restará se eu chegar depois? se eu chegar depois!

Menção Honrosa Rachel Gomes de Oliveira Lúcio de Sousa

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Rachel Gomes de Oliveira Lúcio de Sousa rói rói rói numacusparadasó supuro suprimo s u s p i r o de açúcar e claras de ovos z u u m b i i d o nos meus ouvidos – rói-rói brinquedo de degredado dói

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Rachel Gomes de Oliveira Lúcio de Sousa

FATURAL meu sangue não tem rima nem métrica meu sangue é albumina sangue réptil, pois aprendi com as lagartixas a comer flores como se fossem insetos

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Rachel Gomes de Oliveira Lúcio de Sousa

BERNARDO-EREMITA começa o tormento já me copio e não me aguento bernardo-eremita não luto mais procura em teu umbigo a concha abandonada do inimigo

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Rachel Gomes de Oliveira Lテコcio de Sousa

DRAGテグ VOADOR penso no braseiro abro minhas longas costelas sustento de cada lado a membrana intercostal ave planadora fujo de ti minha pequena predadora

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Rachel Gomes de Oliveira Lúcio de Sousa

VOLUPTUOSIDADE não quero o teu abraço quero o abandono de ser cruz cálice água cálida onde a libélula pulsa ondeando a superfície

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Rachel Gomes de Oliveira Lúcio de Sousa

MAR no MAR de minhas gargalhadas enquanto RIO você NADA

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Rachel Gomes de Oliveira Lúcio de Sousa

TRAPEZISTA BRINCO quando mordo tua ORELHA

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Rachel Gomes de Oliveira LĂşcio de Sousa

ECO dedilhei nas tuas veias os acordes do deserto desertei das tuas teias na manhĂŁ de cĂŠu incerto

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Rachel Gomes de Oliveira Lúcio de Sousa

UM POEMA quis escrever um poema como a aranha que subia a parede: lenta, trêmula, com uma perna a menos. QUASE-AMOR Falas de desejo Como quem arde, carboniza... Como a louca sacerdotisa Do culto ao Quase-amor... Falas de paixão Como quem se imola na fogueira... Como a febril feiticeira Do templo ao amor partido... Falas de loucura Como quem derrama vinho em vão... Como a vestal do amor pagão Da seita do amor proibido... Falas de poesia Como Cecília, como Florbela... Como a desvairada sentinela Da catedral do Quase-amor...

171


Rachel Gomes de Oliveira Lúcio de Sousa

A CASA Eis então a tragédia... A Casa caiu sobre mim... A Casa sem você não é mais a casa, não é nada mais Salas vazias, paredes vazias Porta-retratos sem retratos

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Menção Honrosa Cefas Carvalho

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Cefas Carvalho

Vasos de flores sem flores Vida sem vida Travesseiro sem fronha florida... Dor sólida sobre almofadas... Lamentos que se confundem com o rangido da rede... Pratos sujos na pia... Restos de comida descendo pelo ralo... Minha vida descendo pelo ralo... Canções que ressoam pelos quartos Versos impressos nas paredes da memória E a solidão torna a Casa cada vez maior...

175


Cefas Carvalho

CHUVA Nove e quinze da noite Uma canção de Cartola inunda a sala Uma chuva rala cai lá fora Cubos de gelo dançam em transe Em um copo sempre cheio. O copo não se esvazia O coração, sim. Onze e quinze da noite De uma noite que não terá fim Um vazio que transborda o mundo... Cubos de gelo bailam em delírio Em um copo sempre presente Enfim, o copo se esvazia. O coração também.

176


Cefas Carvalho

HADES

Quantos demônios serão necessários dentro de mim para produzir o quinto dos infernos? E quantos infernos serão necessários, enfim para produzir um único verso?

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Cefas Carvalho

DE COR(AÇÃO) Coração que bate Lata na calada Da noite (que cala) Coração que bate Papo, Bate e volta E Vem embora Coração que pára Raios, no fio Da Navalha Coração que dispara Balas de festim No fim da festa Coração que late Como cão, sem razão De língua de fora Meu coração Eu conheço de cor... É cão sem dono... É do mundo...

178


Cefas Carvalho

DECISÃO Hoje acordei disposto A retalhar meus sonhos Navalha na carne das ilusões Esquartejar desejos... Hoje acordei disposto A não ser eu mesmo A me perder na multidão Desvanecer na fumaça... Hoje, serei milhares E ninguém Hades, Eros, Hécate Hoje, quebrarei juras Contarei mentiras Brincarei com meus pulsos...

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Cefas Carvalho

MAR ABERTO Entrei no Mar Como quem mergulha em um sonho Entrei no Mar De terno, gravata e sapatos... Este Mar azul, verde... espesso, esmeralda, quase sólido... Entrei no Mar marmóreo Para ter o Oceano em meus pulmões Para beber um licor de sal... Para arrebentar minh´alma nos corais Este Mar caleidoscópico... turvo, transparente, alucinógeno... Entrei no Mar Como Zila, como Sereia, como Netuno... Entrei no Mar como quem morre...

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Cefas Carvalho

BRINCADEIRA DE CRIANÇA...

Cercado então o animal, a brincadeira pode começar... Psss psss psss, vem cá bichano, que ninguém vai te machucar... Cinco garotos... um gato... o sol quente do verão... Férias, ócio... Que diabos, não temos o que fazer! Mas, há o gato, sim, o gato vira-lata preto e branco, sarnento Sujo! Quem liga para um gato de merda? Cercado então o animal... Um menino, o mais corajoso, o líder, pega o bichano pela cabeça... Um arranhão, sangue à vista, os meninos gritam... (eles ainda não sabem, mas sangue excita...) Por dentro, o sangue ferve... Gritos (de guerra)... meninos gostam de brincar de guerra! O gato olha em volta, olha... Os meninos riem... Em breve o gato não mais olhará para nenhum deles... Vem outro menino – bonito, sorridente, sardas – com um canivete...

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Cefas Carvalho

Hesitação... Vai você!... Eu não!...Mariquinhas!... Mariquinhas é você! Eu vou mostrar que sou homem, porra!... Um gesto decidido, uma fração de segundo. Um olho arrancado... um miado lancinante Risos... Alguns nervosos... Não é fácil mutilar nem mesmo um gato... (Mas, que merda, o sangue excita...) Outro olho arrancado... Uma massa de carne cega, sem direção, rumo à rua, se debatendo... Risos, risinhos, tapinhas nas costas, um canivete sujo... O futuro da nação, senhoras e senhores... Advogados, médicos, jornalistas, doutores, enfim!... Afinal, por que tanta confusão, meu caro, são só crianças!...

O desejo… onde colocá-lo? Onde ele está? Saber, quem há de? Meu desejo, cão sem dono, nau sem rumo, montilla com coca-cola

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Cefas Carvalho

QUIMERA Colho rosas como quem rouba estrelas do Olimpo e enternece o tempo com gotas de pétalas. Ando por sobre as nuvens e confecciono almofadas para os anjos que voejam em derredor de meu sorriso Não obedeço à Lei da Gravidade nem sigo teoremas complexos como a cabeça da Hidra horrorosa Por mim, ofereceria flores a cada assassino das águas e eles entenderiam a grande importância dos mananciais Não quero sorrisos falsos em rostos desfigurados pela dor de não saber amar, de desconhecer a ternura Eu planto árvores como quem semeia ansioso a vida e deseja que as criancinhas não pereçam pela indiferença Quem dera se as flores fossem oceanos plácidos onde a ilusão se transformasse em plangente realidade e o temor desse lugar à fraternidade mais enternecedora, à mais linda e acolhedora de todas as Passárgadas

183 cada centímetro quaFosse meu o Universo, em drado eu armaria ciladas para laçar o melhor sentimento


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Menção Honrosa Gilbamar de Oliveira Bezerra

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Gilbamar de Oliveira Bezerra

captar o perfeito ângulo do mais belo sorriso feminino e guardar a pureza da mais cândida inocência infantil

CANÇÃO PARA ENTERNECER Onde, entre as folhas, se escondem os beija-flores quando, suavemente, a noite os envolve, será que se deleitam em tumultuados amores ou um fantástico manto mágico os recobre? Onde os amantes sorrateiros se enternecem se tão ínfimos são os seus momentos e eles, arfantes, em leitos brancos adormecem embalados pelo melhor dos sentimentos? Decerto em universos mágicos se refugiem ou em profundos oceanos azuis se deleitem e usufruam, enfim, da paz e da ternura E possam, então, aconchegados e felizes em jardins de muitas cores de tantas matizes esquecer o sofrimento, o temor e a amargura

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Gilbamar de Oliveira Bezerra

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Gilbamar de Oliveira Bezerra

JOÃO BATISTA Sobe no silêncio do deserto o profético clamor com hálito de gafanhotos e mel silvestre. Caminhos aveludados, cabeça decepada.

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Gilbamar de Oliveira Bezerra

FRATICテ好IO Das entranhas antediluvianas um macabro brado de dor: Abel (no cテゥu). Do coraテァテ」o maligno brotou o primeiro sorriso maldito: Caim (morte sem fim).

190


Gilbamar de Oliveira Bezerra

VAGALHÕES Mar encapelado à razão direta dos súbitos bocejos de Poseidon: naufrágios, destroços mortes; Netuno ri e o mar se acalma.

191


Gilbamar de Oliveira Bezerra

RE+FRI+GE+RAN+TE Co2 (gás carbônico) Coca (“viagem doida”) Cola (o ilusório mitigar da fome infantil) Co2 + coca + cola (gás carbônico + droga do sonho + droga ilusória) O vício doce, a morte lenta.

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Gilbamar de Oliveira Bezerra

KAMA SUTRA O mal do amor é o deleite que rejuvenesce; beijos são ouro líquido; carícias são bálsamo; sexo é a homenagem da natureza à vida, orgasmos são deliciosas bombas atômicas do corpo humano que explodem tântricas. Desperto pensando nela.

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Gilbamar de Oliveira Bezerra

TSUNAMIS Talvez o oceano dance a valsa com suas tsunamis e varra, súbito, os pretensos donos da terra para debaixo do tapete do esquecimento, para as sombras. A morte captura homens molhados. Morrer no mar não é doce, é salgado.

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Gilbamar de Oliveira Bezerra

AUTOBUSCA Quanto mais me busco no mais recôndito de mim, só consigo vislumbrar, malgrado todo esforço, ainda que eu seja assim, contornos de linhas tortas. É que nasci com a testa voltada para o sol, os olhos semicerrados, a boca entreaberta, e os traços de minhas mãos não passavam de linhas mortas Nem sei se sou poeta, se brado o canto de amor, se ando a esmo e sem meta, se intento desfazer o nó dessa amarga e imensa dor Decerto me fiz trovador cantando vãs ilusões e vi no brilho dos olhos de muitos não só o pavor, mas a extensão desses enormes senões

195 SER HOMEM


Gilbamar de Oliveira Bezerra

do não é trincar os dentes num rosto frio e taciturno mostrando os punhos cerrados e desafiando tudo para que não descubram a criança sob o ar casmurro Também não é conter sentimentos num ar de seriedade nem se achar valentão e espantar todo mundo quando, no recôndito d’alma, deseja chorar de saudade porque tristemente perdeu o seu amor mais profundo Não é só tórax musculoso e bíceps de aço, o homem, ou jeito de machão que não tem medo de ninguém nem o exibicionismo pueril do malhado abdômen – não se mede o homem pelos músculos que ele tem Ser homem é só e simplesmente fazer-se humano, é ter sensibilidade para não esconder a emoção e mesmo em qualquer instante, ainda que insano, escutar abertamente a voz que vem do coração É saber pedir perdão com humildade, o ser homem, reconhecer que errou porque a falha é bem gente e entender que no ir e vir do tempo os erros somem no perdoar, ser perdoado e sentir o que o outro 196 sente


Gilbamar de Oliveira Bezerra

NO RECÔNDITO DO MEU EGO Não há limite para meus devaneios, as fronteiras foram suprimidas pelo odor suave que emana dos sentimentos – eu dormi com as estrelas. Sou mensageiro da felicidade e me apaixonei por rosas esparsas – esses marvilhosos poemas de pétalas perfumadas no oceano do meu leito espalhadas; Talvez eu esteja enamorado de jardins e seja amante da brisa doce soprada suavemente por lábios com hálito de jasmins. Sonho, sim, sou filho do mito e sorvi o doce leite do empirismo cândido, então me deixo envolver por diáfanos sonhos côncavos e convexos

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Gilbamar de Oliveira Bezerra

que me abraçam com delicados braços de veludo. Eis que me atiro, inebriado, no turbilhão das ondas que formam os oceanos, no terno mar das ilusões.

UM POEMA PARA CHICO SCIENCE Ele nasceu da lama E descobriu os caranguejos Do mangue beat do Recife

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Gilbamar de Oliveira Bezerra

Assim como seus desejos As margens do cão sem plumas. E viveu das chamas Do batucar dos tambores Da velha / nova senzala E de todos seus amores Dos maracatus atômicos De São Jorge Mautner Guerreiro E das guitarras estridentes Dos nossos heróis brasileiros Ele ainda está presente No centro de nosso terreiro.

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Menção Honrosa João Batista dos Santos

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Jo茫o Batista dos Santos

SOTERO POTIGUAR Um mulato nato Aportou na Bahia S贸 alegria

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João Batista dos Santos

CANTAR Cordas de nylon Para cantar Meu coração voa.

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João Batista dos Santos

SOUL Melodia Morro de São Carlos Música da alma.

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João Batista dos Santos

LUA BONITA Lua bonita O azul sereno Bebo até a última gota.

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João Batista dos Santos

UM ANJO Do outro lado da cidade Existe um belo anjo E eu me arranjo Como posso Pra vê-lo e tocá-lo Bonde do desejo Que eu teimo em alçar Num conceito Pra lá de sublime Abro meu peito Confesso meu crime Um anjo assim Todo pra mim Um anjo Do outro lado da cidade Eu sei que dorme um anjo Entre sério e show de tamborim É do tipo suspeito Tem hálito perfeito E peito de jardim E eu insisto em dizer Que me arranjo Como posso Pra reivindicá-lo Num jasmim Um anjo assim Um anjo

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JoĂŁo Batista dos Santos

DE PĂ“ Nem o sabor da granada Nem o cheiro do granado - Grato por ti amor

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JoĂŁo Batista dos Santos

ERĂ“TICO Beijemelambamebebamenacama

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João Batista dos Santos

SOB A PEDRA DO ROSÁRIO Sob a Pedra do Rosário Rio, barcos, ponte velha Mangue, caranguejos, peixes, pescadores E a malha à vista Pôr-do-sol / lual refletindo sobre as águas. Sob a Pedra do Rosário Boca da barra, Redinha Trem do grude maquinista Albacora azul, diário? Sob a Pedra do Rosário Canais de esgotos incendiários Aonde vão dar essas águas? Sob a Pedra do Rosário Paço da Pátria lendário Saudade das águas limpas.

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Jo達o Batista dos Santos

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Este livro foi impresso na Editora, Livraria e Grรกfica Manimbu, Rua Aรงu, 666-A - Tirol - Natal-RN. Em papel Polen Bold 90g, fonte 11 Americana BT com tiragem de 1000 exemplares.

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