A PRISÃO PREVENTIVA EM FACE AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

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FACULDADE DAMÁSIO CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM DIREITO PROCESSUAL PENAL

MAX RICARDO RODRIGUES TOSTA FILHO

A PRISÃO PREVENTIVA EM FACE AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

Franca – SP. 2017


FACULDADE DAMÁSIO CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM DIREITO PROCESSUAL PENAL

MAX RICARDO RODRIGUES TOSTA FILHO

A PRISÃO PREVENTIVA EM FACE AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

Monografia apresentada à Faculdade Damásio, como exigência parcial para obtenção do título de Especialista em Direito Processual Penal, sob orientação da professora Ma. Thaise Oliveira Pimentel.

Franca – SP. 2017


MAX RICARDO RODRIGUES TOSTA FILHO A PRISÃO PREVENTIVA EM FACE AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

TERMO DE APROVAÇÃO Esta monografia apresentada no final do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Direito Processual Penal, na Faculdade Damásio, foi considerada suficiente como requisito parcial para obtenção do Certificado de Conclusão. O examinado foi aprovado com a nota ________.

São Paulo, 17 de abril de 2017.


Agradeço primeiramente a Deus, pelo presente que é a vida e a alegria que é vivê-la; aos meus pais, pelo amor incondicional; aos meus amigos, por estarem sempre presentes nos momentos mais difíceis.


A liberdade ĂŠ um dos dons mais preciosos que o cĂŠu deu aos homens. Nada a iguala, nem os tesouros que a terra encerra no seu seio, nem os que o mar guarda nos seus abismos. Pela liberdade, tanto quanto pela honra, pode e deve aventurar-se a nossa vida. Miguel de Cervantes


RESUMO

A prisão preventiva, medida cautelar restritiva de liberdade decretada durante o processo, está prevista legalmente em uma Constituição que entende que a presunção de inocência do indivíduo é prevalecente, até que haja a condenação definitiva, para que esta medida não se mostre abusiva perante uma garantia do constitucional do tão importante direito de ir e vir. Para que a prisão preventiva seja aplicada eficazmente e de maneira justa, é preciso que sejam respeitados todos os requisitos legais, além de uma coerente fundamentação que justifique a necessidade da medida. Deve o Magistrado usar de sua razoabilidade e habilidade ao aplicar estas medidas, sempre que possível substituindo por outras medidas cautelares menos gravosas cabíveis. O presente trabalho é cabível pois vivemos em um país cujo sistema carcerário defasado e superlotado não consegue receber adequadamente o preso provisório. Em que o caráter processual e excepcional destas prisões não é obedecido e presos provisórios passam anos no cárcere esperando julgamento. Apesar de ser uma medida excepcional, pois a liberdade é sempre a regra e a prisão a exceção, a preventiva vem sendo utilizada de maneira irresponsável, sem necessidade comprovada e destoando da já preocupante questão carcerária no país. A banalização da prisão preventiva e a maneira errônea com que esta vem sendo usada afronta os princípios constitucionais e direitos fundamentais do indivíduo, estes indispensáveis para a organização de um verdadeiro Estado Democrático de Direito.

Palavras-chave: prisão preventiva. presunção de inocência. liberdade.


ABSTRACT

Preventive detention, a measure restrictive of liberty decreed during the legal process, is legally foreseen in a Constitution that understands that the presumption of innocence of the individual is prevailing until there is a final conviction, so that this measure does not prove abusive before a constitucional guarantee of the so important right to come and go. In order for pre-trial detention to be enforced effectively and fairly, all legal requirements must be respected, and a coherent substantiation justifying the need for the measure. The Magistrate should use his reasonableness and ability in applying these measures, whenever possible replacing with other less burdensome precautionary measures. This paper is appropriate because we live in a country whose lagged and overcrowded prison system can not adequately receive the provisional prisoner. In that the procedural and exceptional character of these prisons is not obeyed and provisional prisoners spend years in prison waiting for judgment. Although it is an exceptional measure, since freedom is always the rule and imprisonment the exception, the preventive has been used in an irresponsible, without proven need and disregarding the already troubling prison issue in the country. The banalization of pre-trial detention and the erroneous way in which it is being used violates the constitutional principles and fundamental rights of the individual, which are indispensable for the organization of a true Democratic State of Law.

Keywords: preventive detention. presumption of innocence. freedom.


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO....................................................................................................................09 1. O PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA...................................................11 1.1 O PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA NO PROCESSO PENAL............13 2. PRISÃO PREVENTIVA..................................................................................................17 2.1 BREVE HISTÓRICO.......................................................................................................19 2.2 CRÍTICAS DOUTRINÁRIAS À PRISÃO PREVENTIVA............................................20 3 NATUREZA JURÍDICA...................................................................................................22 4 PRESSUPOSTOS E REQUISITOS................................................................................25 4.1 FUMUS BONIS JURIS E PERICULUM IN MORA........................................................26 4.2 GARANTIA DE ORDEM PÚBLICA.............................................................................27 4.3 GARANTIA DE ORDEM ECONÔMICA......................................................................31 4.4 CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL.........................................................35 4.5 CERTEZA DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL...............................................................36 5. A ATUALIZAÇÃO ATRAVÉS DA LEI 12.403/2011.....................................................38 5.1 AS NOVAS MEDIDAS CAUTELARES INSTITUÍDAS...............................................39 6. DURAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA......................................................................41 7. DA FUNDAMENTAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA..............................................45 8. CIRCUNSTÂNCIAS QUE LEGITIMAM A PRISÃO PREVENTIVA......................49 8.1 CIRCUNSTÂNCIAS QUE IMPEDEM OU LIMITAM A PRISÃO PREVENTIVA.....50 9. DA EXCEPCIONALIDADE DA MEDIDA...................................................................51 10. O CLAMOR PÚBLICO E A PRISÃO PREVENTIVA..............................................54 11. O CONFRONTO ENTRE A PRISÃO PREVENTIVA E A PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA.........................................................................................................................60 CONCLUSÃO......................................................................................................................67 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...............................................................................68


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INTRODUÇÃO

A prisão preventiva é uma medida cautelar de caráter excepcional, que visa garantir o processo de conhecimento ou a execução da pena. Ou seja, é a privação da liberdade do imputado para fins de assegurar o prosseguimento do processo e a eventual de execução de pena. Ocorre que, caso a prisão preventiva não seja utilizada estritamente nos limites legais a ela inerentes, atingirá o espectro dos direitos e garantias fundamentais. Não sendo observados corretamente todos os pressupostos e requisitos desta medida cautelar, corre-se o risco de se tornar uma medida abusiva, antecipando o cumprimento da pena pelo imputado ou até mesmo caracterizando uma prisão manifestamente ilegal, desrespeitando, portanto o princípio constitucional da presunção de inocência. Há uma linha tênue separando a legalidade da imposição da prisão preventiva do desrespeito à presunção de inocência do indivíduo. Seja pela inobservância dos operadores do Judiciário, ou pelas lacunas presentes em nossa legislação, por vezes não ocorre a devida adequação da medida às normas e preceitos constitucionais que devemos proteger. Notoriamente, recentes esforços vêm sido realizados por parte da doutrina e de alguns julgadores para impedir que a prisão preventiva seja banalizada. Ocorre que, em diversas decisões judiciais estão presentes fundamentações rasas, meras indicações dos pressupostos legais, faltando a exposição da necessidade e da possibilidade da decretação da preventiva. Concomitantemente, fere-se o princípio da presunção de inocência, não tratando a medida com a cautela e excepcionalidade devida, atingindo o estado de inocência do indivíduo inerente ao decorrer do processo. O presente trabalho, inicialmente abordará o princípio da presunção de inocência, sua previsão legal, finalidade e benefícios que traz ao processo penal. Na sequência, exploraremos o instituto da prisão preventiva, seus elementos e conceitos, apontando um breve histórico da medida e algumas críticas pertinentes à essência deste instituto. No terceiro capítulo, aproximamo-nos da finalidade desta finalidade, traçando a natureza jurídica da prisão preventiva, seguida de uma exposição detalhada de seus tão


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importantes pressupostos e requisitos, como as garantias de ordem pública e econômica, que recebem inúmeras críticas doutrinárias. Após, lidaremos com a relevante atualização trazida pelo advento da Lei de nº. 12.403 de 2011, que instituiu novas medidas cautelares alternativas à prisão, talvez na tentativa de conter a forma com que estas vinham sido utilizadas de maneira irrestrita por alguns magistrados. Serão identificados os principais problemas da prisão, que também entram em confronto com a presunção de inocências e outras garantias humanas, como a questão da ausência de prazo de término da preventiva, a grande importância da fundamentação idônea tão cobrada nos Tribunais Superiores, além da perigosa questão do clamor público influenciando as decisões judiciais, o que desviaria a medida de sua real finalidade. No último capítulo sintetizamos toda esta discussão, colocando frente a frente o princípio da presunção com a prisão preventiva, procurando entender se estes dois elementos poderão coexistir pacificamente (ou não) em nosso direito pátrio, e qual a função do Magistrado perante este grande dilema.


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1. O PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

O princípio da presunção de inocência, também conhecido por princípio do estado de inocência ou da não-culpabilidade, é aquele que dita ser todo acusado presumidamente inocente, até que seja declarada sua culpa através de sentença condenatória. Este princípio encontra previsão no art. 5, LVII, da Constituição Federal. A verdadeira finalidade deste princípio é a de garantia fundamental, de que o ônus da prova caberá ao acusador e não ao acusado. É imprescindível que a acusação evidencie, com as provas necessárias, a culpa do acusado ao julgador, pois partimos da presunção de que todo indivíduo é inocente, tratando-se de uma qualidade inata ao ser humano, devendo aquele que afirma o contrário valer-se de provas para fazê-lo. O texto constitucional não fala expressamente em inocência do acusado, mas demonstra que o acusado não é detentor da culpa pela infração que lhe foi imputada. A intenção é protegê-lo de qualquer forma de sanção antecipada, sem o devido resguardo do processo e garantias do indivíduo. Nesse sentido, Nucci aduz que: “As pessoas nascem inocentes, sendo esse seu estado natural, razão pela qual, para quebrar tal regra, torna-se indispensável que o Estado-acusação evidencie, como provas suficientes, ao Estado-juiz, a culpa do réu.”1 A presunção de inocência existe para que se evite o risco de prejudicar a honra e a liberdade de uma inocente. Sendo presumidamente inocente até comprovada sua culpa, não pode o acusado ser submetido a coações e sanções, pois tratar-se-ia de uma punição prévia, e para tal deve haver a condenação. Entre a liberdade e a prisão daquele que não foi condenado, deve optar-se pela primeira. Beccaria dizia que: “Um homem não pode ser chamado de culpado antes da sentença do juiz, e a sociedade só pode retirar-lhe a proteção pública após ter decidido que ele violou os pactos por meio dos quais ela foi concedida”. Na visão do autor não existe outra condição do acusado, antes de proferida a sentença, senão a de inocente. 2 1

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 90. 2 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Tradução de Lucia Guidicini e Alessandro Berti Contessa. São Paulo: Martins Fontes, 1999. p. 69.


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A Declaração Universal de Direitos do Homem promoveu grande avanços no quesito de garantias do processo, contemplando o princípio da presunção de inocência. Seu artigo 11.1 dispõe: “Todo o homem acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que sua culpabilidade tenha sido provada, de acordo com as garantias necessárias à sua defesa”. Esta Declaração, além disto, trouxe importante elemento à presunção de inocência, uma vez que estipulou que quem deve provar a culpabilidade do acusado é a acusação. O acusado não deve ser forçado a produzir provas de sua inocência, pois esta deve ser presumida. Cabe, portanto ao acusador formar o conjunto probatório que aponte pela culpabilidade. Neste sentido, insere-se o conhecido termo in dubio pro reo, em que restando dúvidas sobre a culpabilidade do acusado opta-se pela inocência. Esta medida é válida, pois as decisões judiciais devem estar sempre revestidas de ampla certeza, não cabendo dúvidas. A incerteza atua em prol do acusado. O Ministro Aguiar Dias se posicionou coerentemente com o tema: Para a condenação é necessária prova cumprida, prova plena, prova suficiente, não bastando meros indícios que podem robustecer a acusação e podem, também, estar completamente desligados dos fatos criminosos. Em contraposição, surgem indícios e circunstâncias capazes, por seu lado, de mostrar que o apelante não estava envolvido nos fatos, como a sua ausência do local.3

Veja, na ausência de carga probatória suficiente ou fragilidade desta, permanece a dúvida sobre culpa do acusado. Não havendo o embasamento suficiente para tal, não pode ser realizada a condenação. Neste sentido o Ministro Raimundo Macedo já havia decidido: “Se a prova da acusação é deficiente e incompleta, impõe-se a absolvição do réu, em cujo favor milita a presunção de inocência.”4 Apesar da presunção de inocência e do in dubio pro reo serem conceitos distintos, estão intimamente ligados e muitos chegam a confundi-los e acreditar serem princípios

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BRASIL. Tribunal Federal de Recursos. Apelação no. 652. Relator Ministro Aguiar Dias. 12 nov. 1958. Revista Forense. Rio de Janeiro. v. 187. pp. 323-237. 1960. 4 BRASIL. Tribunal Federal de Recursos. Apelação no. 731. Relator Ministro Raimundo Macedo. 18 ago 1959. Revista Forense, Rio de Janeiro. v. 186. p. 316, 1959.


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sinônimos. A primeira está ligada ao fato do acusado ser inocente até que se prove o contrário, já a segunda a ausência de provas orientar pela absolvição. Nicolitt aponta que a presunção de inocência e o in dubio pro reo atuam em momentos distintos. O primeiro “atua durante todo o curso do processo”, desde o inquérito até a sentença, enquanto o segundo “tem incidência no julgamento, quando houver uma situação de dúvida”.5 A presunção de inocência é benéfica para nosso ordenamento, pois atua em prol da liberdade do indivíduo em face ao poder punitivo do Estado, presumindo o acusado inocente e delegando ao àquele comprovar a sua culpabilidade. É um preceito de suma importância, pois garante a preservação dos direitos inerentes ao indivíduo quando lhe é imputado um fato criminoso, protegendo-o de uma possível sanção antecipada. As normas que definem os direitos e fundamentais possuem aplicação imediata (art. 5 o, §10 da CF), devendo os operadores da Lei darem a elas não só a aplicabilidade imediata, mas também conferir a máxima eficácia, vide o caráter preceptivo.

1.1 O PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA NO PROCESSO PENAL

A presunção de inocência se faz necessária no processo penal, uma vez que o Estado detém o poder punitivo, deve-se contrabalancear com garantias e proteções ao indivíduo. Se o Estado possui para si todo o direito de punir, o indivíduo deve possuir o pleno direito de se defender. Diante de uma legislação repressiva, é necessário que existam garantias jurídicas àquele acusado de crime. São nas garantias constitucionais e direitos individuais à liberdade que o Estado enfrenta limites a seu poder punitivo. Dentre essas garantias, princípios como o da oralidade, publicidade e o direito ao contraditório protegem o acusado de excessos e abusos estatais. Na visão da autora Monica Ovinski de Camargo, o princípio da presunção de inocência é benéfico ao processo, pois: 5

NICOLITT, André. As subversões da presunção de inocência: violência, cidade e processo penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 56.


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A presunção de inocência ao ser adotada como viga mestre de uma determinada estrutura processual, indica a opção política do legislador que elegeu a proteção dos direitos individuais de liberdade como conteúdo orientador das formas processuais. Os atos do Processo guardarão entre si a coerência e a submissão ao postulado maior que é o indivíduo, limitando a persecução penal e a correlata autoridade punitiva do Estado para atuar em circunstâncias em que tais direitos estão resguardados. 6

A inclusão do princípio da presunção de inocência na Constituição Federal de 1988, além de seus outros princípios e garantias constitucionais trouxe modernidade ao uso do mesmo nos julgados e entendimentos pátrios. O princípio passou a ser usado amplamente em matéria de processo penal. Fauzi Choukr denota o caráter humanitário na presunção de inocência na Constituição vigente, aduzindo: A Constituição em vigor, no que tange ao processo penal, é mais que uma carta de direitos mínimos, ela verdadeiramente impôs um sistema processual penal de caráter exclusivamente acusatório, quadro esse não completamente entendido pelos operadores do direito de forma geral e pelos processualistas penais em particular. As bases desse sistema acusatório, expressão inseparável da democracia no processo penal, pululam por todo o texto constitucional. Inegavelmente é encontrada sua base no artigo 5 o., em diversas passagens: contraditório e ampla defesa (a mais citada das garantias por dez entre cada dez garantias (vez que pela primeira vez explicitada), a presunção de inocência, que dá ao acusado o status de sujeito do processo e não seu objeto, com todas as consequências humanitárias daí naturalmente decorrentes. (grifos nossos)7

Nosso ordenamento jurídico prevê a utilização de medidas cautelares, que possibilitam a prisão antes da condenação. Neste instituto, que será abordado elaboradamente em capítulo distinto, o indivíduo ainda na condição de inocência poder ser submetido ao cárcere privado, desde que devidamente demonstrada à utilidade da medida ao prosseguimento do processo e à ordem. Ocorre que, mesmo com a possibilidade da utilização dessas medidas, deve existir uma atenção ao princípio da presunção de inocência. No Brasil democrático, começam a surgir na jurisprudência, menções ao referido princípio outrora esquecido durante o regime militar.

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OVINSKI DE CAMARGO, Monica. Princípio da presunção de inocência no Brasil: o conflito entre punir e libertar. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 56. 7 CHOUKR, Fauzi. Estudos de processo penal: o mundo à revelia. Campinas: Aga-Juris, 2000. p. 89.


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O Ministro Costa Leite, em decisão que opta pela prisão preventiva, ressalva que o princípio da presunção de inocência deve ser observado e usado com cautela, uma vez que se trata de decisão que priva a liberdade do acusado. São suas palavras: PROCESSO PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. PRESSUPOSTOS E CONDIÇÕES. I – qualquer prisão que anteceda decisão condenatória definitiva do Judiciário é medida que compromete o ‘jus libertatis’ e a presunção de inocência que milita a favor do acusado, daí ser reservada para casos excepcionais, em que, motivadamente, se examinem os pressupostos e condições que lhe dão suporte; II – situação concreta em que está comprovada a materialidade do delito, havendo indícios veementes que indicam a sua autoria; III – conduta recorrida que demonstra sua inequívoca vontade de frustrar e protelar a instrução criminal, havendo, inclusive, descumprido as condições impostas para que, em liberdade, respondesse ao processo contra ela movido. Antecedentes que não a favorecem; V – prisão preventiva que se decreta, dando provimento ao recurso do Ministério Público Federal.8

Em outra decisão do mesmo ano, o princípio mostra que já vem ganhado ampla aceitação no Judiciário como garantia da liberdade do acusado: PROCESSUAL PENAL – RELAXAMENTO DE PRISÃO – PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. 1) Dá-se o relaxamento da prisão quando o juiz verifica que ela se fez ilegalmente ou ante a inexistência de razões especiais que justifiquem sejam os réus mantidos presos, enquanto aguardam julgamento. 2) No direito penal brasileiro a regra é a presunção de inocência até a prova plena em contrário, proclamada por sentença. 3) Recurso denegado. 9

Observa-se que o princípio já não é mais confundido com o in dubio pro reo, se aproximando do ideal de que somente com a efetiva sentença penal condenatória poderá o acusado, agora condenado, ter sua liberdade física restringida. Na previsão da Constituição de 1988, o acusado tem o direito de permanecer na sua condição de inocente até que esta perdure. Ou seja, enquanto não sobrevier declaração judicial da culpa transitada em julgado, deve o indivíduo ser respeitado tal como se fosse inocente, mesmo que paire dúvida sobre este status. Sobre essa disposição, Gomes Filho partilha da seguinte opinião: “[…] a referência à ‘presunção de inocência’, traz à mente aspectos concernentes aos fundamentos do convencimento judicial, ao passo que ‘não considerar o acusado culpado’ importa privilegiar a 8

BRASIL. Tribunal Federal de Recursos. Recurso Criminal no. 1094. 24 out. 1985. Disponível em: <www.senado.gov.br>. Acesso em: 01. abr. 2017. 9 BRASIL. Tribunal Federal de Recursos. Recurso Criminal no. 1112. Relator Ministro Washington Bolívar. Disponível em: <www.senado.gov.br> Acesso em: 01. abr. 2017.


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temática do tratamento jurídico, o status do réu no curso do processo, que não pode ser assimilado ao culpado até a sentença definitiva”. 10 Existe na doutrina ainda certa resistência ao termo presunção de inocência. Há quem prefira a expressão princípio da não-culpabilidade, pois acreditam não se tratar de uma inocência presumida do acusado, mas sim de não considerá-lo culpado até que seja proferida a sentença penal condenatória. Tal rejeição se dá, pois presumir inocente um indivíduo, sobre o qual pairam dúvidas fundadas do cometimento de crime, seria para alguns um verdadeiro contrassenso. O art. 5.o, inciso LVII da Constituição Federal consagra a expressão “ninguém poderá ser considerado culpado”. Podemos notar que o princípio está inclina-se no sentido de estender-se a todas as pessoas, não só aos acusados ou investigados. Isso estabelece uma forma de tratamento, que nenhum indivíduo, parte processual ou não, pode ser tratado como culpado sem decisão que afirme sua culpabilidade. Usando do termo “não se considera culpado”, a Constituição foi assertiva ao determinar que ninguém será tratado juridicamente como tal no decorrer do processo, nem tratado, nem assimilado como culpado antes da sentença definitiva que o condene. O princípio da presunção de inocência pode ser violado de diferentes formas. A mais comum é a forma judicial, em que o acusado é tratado, no decorrer do processo, injustamente como culpado. Também pode ocorrer violação de maneira extrajudicial, pois a sociedade a mídia podem coagir o indivíduo acusado de tal forma que o mesmo receba tratamento não condizente à sua condição de inocente. A mídia e a opinião popular possuem tal força que se estas decidem por tratar um acusado como culpado, afeta-se de maneira irremediável a vida do cidadão, sua profissão, suas relações familiares, coisas estas que o Judiciário, mesmo inocentando-o posteriormente provavelmente não poderá reparar. A pressão midiática e o clamor público podem até mesmo macular o processo e a opinião do magistrado. Na sábia lição de Carnelutti: 10

GOMES FILHO, Antônio Magalhães. O princípio da presunção de inocência e a prisão cautelar. São Paulo: Saraiva, 1991. p. 32.


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O homem quando é suspeito de um delito, é jogado às feras, como se dizia uma vez dos condenados oferecidos como alimento às feras. A fera, a indomável e insaciável fera, é a multidão. O artigo da Constituição que se ilude em garantir a incolumidade do acusado, é praticamente inconciliável com aquele outro que sanciona a liberdade de imprensa. Logo que surge o suspeito, o acusado, a sua família, a sua casa, o seu trabalho são inquiridos, investigados, despidos na presença de todos. O indivíduo, assim, é feito em pedaços. E o indivíduo, assim, relembremo-nos, é o único valor da civilização que deveria ser protegido.11

Pelos apontamentos acima, podemos aferir que no prosseguimento do processo penal a presunção de inocência sofre diversas ameaças. Não se trata apenas da possibilidade do processo e seus integrantes não respeitá-la, mas também de partes externas como a imprensa, a sociedade, clamaram pela antecipação da culpabilidade do acusado.

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CARNELUTTI, Francesco. As misérias do processo penal. Tradução de José Antônio Cardinalli. São Paulo: Conan, 1995. p. 46.


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2. DA PRISÃO PREVENTIVA

A prisão preventiva nada mais é que uma medida cautelar que visa privar o indiciado ou réu de sua liberdade, por necessidade, motivada por requisitos contidos em lei, que serão abordados em capítulo distinto. Ela está presente nos artigos 311 a 316 do Código de Processo Penal. Pode ser decretada apenas por magistrados e tribunais, em qualquer fase da investigação criminal ou no decorrer do processo, em decisão obrigatoriamente fundamentada. Se decretada no prosseguimento do processo, poderá ser feita de ofício pelo juiz. Na alteração da Lei 12.403/2011, destaca-se o art. 311 do Código de Processo Penal, que aponta: Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial.

No website do Supremo Tribunal Federal consta a seguinte descrição: A prisão preventiva é um instrumento processual que pode ser utilizado pelo juiz durante um inquérito policial ou já na ação penal, devendo, em ambos os casos, estarem preenchidos os requisitos legais para sua decretação. O artigo 312 do Código de Processo Penal aponta os requisitos que podem fundamentar a prisão preventiva, sendo eles: a) garantia da ordem pública e da ordem econômica (impedir que o réu continue praticando crimes); b) conveniência da instrução criminal (evitar que o réu atrapalhe o andamento do processo, ameaçando testemunhas ou destruindo provas); c) assegurar a aplicação da lei penal (impossibilitar a fuga do réu, garantindo que a pena imposta pela sentença seja cumprida).12

Luiz Antônio Câmara preceitua que a prisão preventiva é: […] ato cautelar pelo qual se produz a limitação de liberdade individual de uma pessoa em virtude de declaração judicial e que tem por objeto o ingresso daquela em estabelecimento de custódia com o objetivo de assegurar os fins do processo e a eventual execução da pena, pois apesar de serem assemelhadas em sua aparência externa, diferenciam-se por sua finalidade. 13 12

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Prisão preventiva. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/ glossario/verVerbete.asp?letra=P&id=441>. Acesso em: 16. Fev. 2017. 13 CÂMARA, Luiz Antônio. Medidas cautelares pessoais: prisão e liberdade provisória. 2. ed. Curitiba: Juruá. 2011. p. 122


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É, portanto uma medida de caráter excepcional, que garante o prosseguimento adequado do processo de conhecimento, assim como a efetividade do processo de execução. Trata-se, em suma, de uma prisão cautelar que visa constringir à liberdade usando-se de requisitos estabelecidos em lei. Para que seja feita essa restrição do da liberdade do indivíduo, em razão do cometimento de infração penal prevista em nosso ordenamento jurídico, deve-se imprescindivelmente atentar-se aos fundamentos para sua decretação, assim como os pressupostos que a legitimam, que serão abordados com mais ênfase no presente trabalho em tópico específico. Na obra de Capez, a prisão preventiva é a “prisão processual de natureza cautelar decretada pelo juiz em qualquer fase da investigação policial ou do processo criminal sempre que estiverem preenchidos os requisitos legais e ocorrerem os motivos autorizadores”. 14 Podendo, portanto ser decretada sempre que necessária e possuir o devido respaldo na legislação, no objetivo de atender ao processo e seu regular prosseguimento. Outro objetivo além da cautelaridade não atenderia a sua real finalidade. Marcão conceitua que: A prisão preventiva é a modalidade de prisão cautelar de natureza processual que decorre da decisão judicial, podendo ser decretada em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, e mesmo no momento da decisão de pronúncia ou da sentença penal condenatória, desde que presentes os requisitos legais.15

Podemos notar dentre suas características a provisoriedade e a revogabilidade. Provisória, pois esta prisão perdura apenas durante o prosseguimento ou tramitação do processo. Ou seja, até uma solução que encerre o mesmo. Se eventualmente condenado, estará submetido a prisão pena, por força de decisão condenatória, não mais em razão de cautelar revestida de provisoriedade.

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CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 266. MARCÃO, Renato. Prisões cautelares, liberdade provisória e medidas cautelares restritivas. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 127. 15


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Revogável, pois na leitura do art. 316 do Código de Processo Penal: “Art. 316. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem”. Há ainda, a facultatividade da medida, pois nossa legislação aponta que a prisão preventiva “pode ser decretada”, na forma que a legitima. Será sempre uma faculdade permitida ao juiz, nunca uma medida obrigatória ou compulsória. O que confirma de seu caráter facultativo e excepcional. Machado afirma que “pode-se observar que a prisão preventiva reúne os mesmos caracteres da instrumentalidade, da facultatividade, da provisoriedade e da revogabilidade”. 16

2.1 BREVE HISTÓRICO

Na Antiguidade clássica da Grécia e Roma, já se conheciam medidas similares à prisão preventiva. No júri popular da Grécia se usavam de institutos de prisão preventiva e liberdade provisória através da caução. Na Idade Média, com a utilização do procedimento de forma inquisitória, ganhou nova vida a prisão preventiva, adquirindo caráter instrumental. Posteriormente, em Portugal, à época das chamadas Ordenações do Reino, em vigor também nas colônias, a custódia do acusado era facultada ao livre arbítrio do julgador. No Brasil, após a proclamação da independência, permitia-se a prisão cautelar mediante ordem escrita do juiz. No Código de Processo Criminal do Império, de 1832, estavam previstas modalidades de prisão sem culpa formada em seus artigos de números 133 e 175. Art. 133. Resultando do interrogatorio suspeita contra o conduzido, o Juiz o mandará pôr em custodia em qualquer lugar seguro, que para isso designar; excepto o caso de se poder livrar solto, ou admittir fiança, e elle a dér; e procederá na formação da culpa, observando o que está disposto a este respeito no Capitulo seguinte. 16

MACHADO, Antônio Alberto. Prisão cautelar e liberdades fundamentais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 117.


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Art. 175. Poderão tambem ser presos sem culpa formada os que forem indiciados em crimes, em que não tem lugar a fiança; porém nestes, e em todos os mais casos, á excepção dos de flagrante delicto, a prisão não pode ser executada, senão por ordem escripta da autoridade legitima. 17

Posteriormente chegaríamos ao Código de Processo Penal de 1941, responsável por regulamentar a prisão provisória no ordenamento jurídico brasileiro da forma como a conhecemos atualmente. Com a reforma de 2011, várias mudanças ocorrerão ao instituto da prisão preventiva, que serão melhores abordadas em tópico distinto.

2.2 CRÍTICAS DOUTRINÁRIAS À PRISÃO PREVENTIVA

Na doutrina pátria, alguns renomados autores apontam que a possibilidade do juiz decretar a prisão preventiva no curso da ação penal, demonstra um comprometimento da sua postura de juiz imparcial. Uma vez que, invadiria prerrogativa do órgão acusatório ao decretar prisão cautelar sem a solicitação dos mesmos, assumindo, portanto postura incompatível com a esperada do magistrado. É o entendimento de Aury Lopes Júnior: A imparcialidade do juiz fica evidentemente comprometida quando estamos diante de um juiz instrutor (poderes investigatórios) ou, pior, quando ele assume uma postura inquisitória decretando – de ofício – a prisão preventiva. É um contraste que se estabelece entre a posição totalmente ativa e atuante do inquisidor, contrastando com a inércia que caracteriza o julgador. Um é sinônimo de atividade e o outro de inércia. Assim, ao decretar uma prisão preventiva de ofício, assume o juiz uma postura incompatível com aquela exigida pelo sistema acusatório e, principalmente, com a estética de afastamento que garante a imparcialidade. 18

Neste mesmo sentido, Gomes e Marques: É mais uma mostra de que o juiz, no processo penal brasileiro, afasta-se de sua posição de absoluta imparcialidade, invadindo seara alheia, que é do órgão acusatório, decretando medida cautelar de segregação sem que qualquer das partes, envolvidas no processo, tenha solicitado. 19 17

BRASIL. Lei de 29 de novembro de 1832. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/leis/LIM/LIM-29-11-1832.htm>. Acesso em: 16. Fev. 2017. 18 LOPES JR, Aury. O novo regime jurídico da prisão processual, liberdade provisória e medidas cautelares diversas. 2. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2011. p. 61. 19 GOMES, Luiz Flávio; MARQUES, Ivan Luís (coords). Prisão e medidas cautelares, comentários à Lei 12.403, de 4 de maio de 2011. 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 156.


22

Conforme os entendimentos de Nucci e Lopes Júnior supramencionados, parte da doutrina tem divergido sobre a possibilidade de decretação de prisão preventiva durante todo o curso da ação penal. Tal impasse ocorre, pois, de acordo com nosso sistema acusatório, tal medida deveria ser decretada apenas por vias de requerimento ou representação. Outra crítica feita à prisão preventiva, é que esta não deveria servir para garantir a ordem pública ou econômica, uma vez que a função principal desta é garantir o processo, não fazer um tipo de prevenção social de novos delitos, que é a função da prisão pena. É a crítica feita por Nicolitt, que aduz: Quando a prisão cautelar é dirigida a evitar a prática de infrações penais, ou tutelar a ordem pública, o clamor público, a ordem econômica, assegurar a credibilidade da justiça, o que se busca na verdade, diversamente da tutela do processo, é o controle social, a prevenção, geral ou específica, que é o objetivo da pena e não das medidas cautelares. 20

Estas são algumas críticas que renomados processualistas fazem ao instituto da prisão preventiva, inferindo que este pode ser utilizado de maneira comprometedora da parcialidade do juiz, uma vez que permite que a segregação do preso preventivo sem requisição do órgão acusatório, conforme os apontamentos de Nucci e Lopes Jr., além do desvio de sua função originária de acordo com o entendimento de Nicolitt.

20

NICOLITT, André Luiz. Lei 12.403/11: o novo processo penal cautelar, a prisão e as demais medidas cautelares. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. p. 69.


23

3 NATUREZA JURÍDICA

A prisão preventiva é uma medida de natureza cautelar. Seu objetivo é assegurar a ordem pública ou econômica, a conclusão da fase probatória assim como o efetivo prosseguimento do processo e aplicação da lei processual penal. Apesar da existência de divergências doutrinárias e polêmicas quanto a forma que é aplicada, os autores entram em consenso no sentido de que a prisão preventiva é uma medida indispensável ao nosso ordenamento. Em capítulos distintos discutiremos os elementos que compõem seu caráter. Dentre sua excepcionalidade, devendo estar demonstrados seus requisitos necessários, como o fumus boni iuris e o periculum in mora. Assim como sua natureza subsidiária, pois com a reforma da Lei de n. 12.403 de 2011, somente se aplicará a preventiva se não for suficiente a aplicação das outras medidas cautelares. Sobre a constitucionalidade da preventiva, na análise de Claus Roxin: [..] entre as medidas que asseguram o procedimento penal, a prisão preventiva é a ingerência mais grave na liberdade individual; por outra parte, ela é indispensável em alguns casos para a administração da justiça penal eficiente. A ordem interna de um Estado se revela no modo em que está regulada essa situação de conflito; os Estados totalitários, sob a antítese errônea Estado-cidadão, exagerarão facilmente a importância do interesse estatal na realização, o mais eficaz possível, do procedimento penal. Num Estado de Direito, por outro lado, a regulação dessa situação de conflito não é determinada através da antítese Estado-cidadão; o Estado mesmo está obrigado por ambos os fins: assegurar a ordem por meio da persecução penal e proteção da esfera de liberdade do cidadão. Com isso, o princípio constitucional da proporcionalidade exige restringir a medida e os limites da prisão preventiva ao estritamente necessário. 21

Antônio Alberto Machado conceitua que: O aspecto instrumental da prisão preventiva é visível já na hipótese legal de sua decretação por conveniência da instrução criminal (art. 312, CPP). Falase em ‘conveniência da instrução’, por exemplo, quando o autor do fato delituoso, em liberdade, possa causar algum embaraço à atividade probatória, seja desaparecendo com os vestígios que compõem o corpus delicti, seja

21

ROXIN, Claus. Derecho processual penal. Buenos Aires: Del Puerto, 2000. p. 258.


24

ameaçando eventuais testemunhas e peritos ou mesmo destruindo e inviabilizando outras fontes probatórias (documentos, coisas, etc.). 22

Aury Lopes Júnior leciona: As medidas cautelares não se destinam a ‘fazer justiça’, mas sim garantir o normal funcionamento. Logo, são instrumentos a serviço do instrumento processo; por isso, sua característica básica é a instrumentalidade qualificada ou ao quadrado.23

É seguro afirmar que a prisão preventiva não tem caráter definitivo. A duração desta medida nunca deve surpassar a condenação. A essência desta prisão se encontra na tramitação do processo penal, ou seja, durante seu prosseguimento, antecedendo a conclusão do processo. No momento de uma eventual condenação, o réu estará submetido a novo encarceramento, por força de decisão condenatória definitiva. A prisão preventiva é uma prisão cautelar e de caráter provisório, podendo subsistir apenas até a condenação definitiva do réu. A prisão preventiva é revogável a qualquer momento, conforme indica a leitura do art. 316 do Código de Processo Penal: “O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem”. Desta forma, da mesma maneira que poderá ser decretada a qualquer momento, poderá também ser revogada da mesma forma. Desde que, para tanto, estejam sanadas as indagações que motivaram sua decretação. Frederico Marques faz a seguinte análise: A prisão preventiva compulsória é um dos exemplos desse autoritarismo processual que devemos à política direitista do Estado Novo. Transladada do processo penal italiano da era de Mussolini, essa medida de coação é de profunda iniquidade e pode dar margem à prática de irreparáveis danos e injustiças.24

22

MACHADO, Antônio Alberto. Prisão cautelar e liberdades fundamentais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 114. 23 LOPES JÚNIOR, Aury. O novo regime jurídico da prisão processual, liberdade provisória e medidas cautelares diversas. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumes Juris, 2011. p. 90. 24 MARQUES, José Frederico. Estudos de direito processual penal. Rio de Janeiro: Forense, 1960. p. 227.


25

Sobre a necessidade das medidas cautelares para o direito, Lima, aduz: Em um estado que consagra o princípio da presunção de não culpabilidade, o ideal seria que a privação da liberdade de locomoção do imputado somente fosse possível por força de uma prisão penal, ou seja, após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Todavia, entre o momento da prática do delito e a obtenção do provimento jurisdicional definitivo, há sempre o risco de que certas situações comprometam a atuação jurisdicional ou afetem profundamente a eficácia e utilidade do julgado. Daí o caráter imperioso de adoção de medidas cautelares, a fim de se atenuar o risco. 25

Com a redação da Lei de n.º 5.359/67, restou a prisão preventiva compulsória revogada, podendo somente o juiz decretá-la estando presentes os pressupostos e requisitos previstos em lei, tornando-se, portanto uma faculdade possibilitada ao juiz, nunca uma medida de caráter compulsório. A prisão preventiva além de facultativa é, provisória e revogável. Esses fatores são de extrema importância, pois configuram a excelência desta medida cautelar em matéria de prisão processual. Para Machado, talvez seja “a única prisão provisória que realmente exibe traços de medida cautelar preparatória e incidental.” 26 Discute-se que, além da observação de todos os elementos técnicos da prisão preventiva, é necessária também uma visão crítica da mesma, considerando-se fatores éticos e ideológicos antes de decretá-la. Uma vez que, na prisão cautelar está se colocando em risco a liberdade do indivíduo, característica essa primordial a uma democracia. A prisão preventiva será decretada em qualquer momento da investigação ou ao decorrer do processo penal, em razão de requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, assim como mediante representação de autoridade policial. Ao juiz, é permitido decretá-la de ofício, durante o curso da ação penal. O consenso doutrinário é de que a prisão preventiva é uma medida de caráter excepcional, sua função é a de garantir o processo e assegurar sua efetividade. Restringir a liberdade de um indivíduo antes de uma sentença condenatória que demonstra sua culpa deve ser algo feito de maneira excepcional, cautelosa e devidamente motivada. Para tanto, devem

25

LIMA, Renato Brasileiro de. Nova prisão cautelar. 1. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2011. p. 115. MACHADO, Antônio Alberto. Prisão cautelar e liberdades fundamentais. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2005. p. 117. 26


26

ser observados todos os requisitos e pressupostos que legitimam sua decretação, que serão abordados no capítulo seguinte.


27

4 PRESSUPOSTOS E REQUISITOS DA PRISÃO PREVENTIVA

A doutrina converge no sentido da prisão preventiva possuir quatro pressupostos, dentre eles: a) natureza da infração (nem todos os delitos permitem a prisão preventiva); b) fumus boni juris; c) periculum in mora; e d) controle jurisdicional prévio. Sobre estes pressupostos, Nicolitt aponta que: Na parte final do art. 312 do CPP encontramos os requisitos ou pressupostos da prisão preventiva reunidos pela doutrina sob a expressão fumus boni iuris (ou, para nós, fumus commissi delicti), a saber: indícios de autoria e prova de materialidade.27

No art. 312 do Código de Processo Penal estão elencados os requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva. São eles: a) garantia da ordem pública; b) ordem econômica; c) conveniência da instrução criminal; d) assegurar a aplicação da lei penal (desde que haja prova da existência do crime e indício de autoria). Na prova de existência do crime há de estar presente a certeza da ocorrência do mesmo, pois não se pode determinar o recolhimento do investigado, presumidamente inocente, havendo ainda dúvida sobre a existência da infração penal. Não cabe decretar a prisão preventiva sem prova de que o delito realmente ocorreu (materialidade). Ainda, deve existir um mínimo de elementos que indiquem a provável autoria do agente. Ainda, é importante apontar que, ao tratar dos requisitos que autorizam a prisão preventiva, o CPP os elenca em seu art. 312, deixando, no entanto, suas condições de cabimento para o art. 313, quando a inversão do conteúdo destes artigos tornariam sua leitura mais lógica. É o que Nicolitt ensina em sua doutrina:

27

NICOLITT, André Luiz. Processo penal cautelar: prisão e demais medidas cautelares. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 94.


28

O CPP faz inadequada inversão lógica tratando primeiro os pressupostos (art. 312) para depois cuidar do cabimento ou condições (art. 313). Na verdade, primeiro é necessário ver se a prisão é cabível, pois não havendo previsão legal para a prisão, sequer é possível indagar sobre os pressupostos (art. 312).28

No indício suficiente de autoria, deve existir a fundada certeza de que o investigado, ou acusado é o autor do crime. Ou seja, não se exige a prova plena da culpa, pois esta não está disponível em um juízo cautelar, feito muito anteriormente ao julgamento definitivo sobre a culpa. Sobre a questão, Antonio Magalhães Gomes Filho, afirma que o indício suficiente (indício de autoria) é o que autoriza “um prognóstico de um julgamento positivo sobre a autoria ou a participação”. 29 O art. 239 do Código de Processo Penal demonstra: “Considera-se indício a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias”. Para garantir que o indivíduo em recolhimento cautelar não esteja sofrendo de grave injustiça, há de existir boas razões que justifiquem seu cárcere. O indício, na forma de prova indireta, conforme explicado acima, permite ao juiz, através do conhecimento do fato, atingir o conhecimento de outro através da indução. Sidnei Beneti apontou que a atual legislação brasileira se aproximou da alemã, destacando que: Os pressupostos processuais são: 1o.) a forte suspeita do cometimento de delito (dringend Verdach); 2o.) o motivo da prisão (Haftgrund), que se divide em quatro motivos possíveis: a) a fuga ou perigo de fuga (Flucht oder Fluchtverdach); b) perigo de obscurecimento da prova (Verdunkenlungsgefahr); c) gravidade do fato (Schwerer de Tat); d) perigo de cometimento de novos crimes (Wiederholungsgefahr).30

4.1 FUMUS BONI JURIS E PERICULUM IN MORA

28

Ibidem, p. 96. GOMES FILHO, Antonio Magalhães. A motivação das decisões penais. São Paulo: RT, 2001. p. 223. 30 BENETI, Sidnei. Prisão provisória: direito alemão e brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991. p. 267. 29


29

A certeza da materialidade do crime e os indícios de autoria configuram a existência de fumus boni juris, ou “fumaça do bom direito”. Verificando-se sua existência, entende-se pela possibilidade da decretação da prisão preventiva, uma vez que estariam presentes a existência do direito e fatores que autorizam a aplicação desta medida. Esta certeza material do crime é imprescindível para a prisão preventiva. É necessário que o fato delituoso esteja devidamente concretizado, ou seja, sua existência seja certa e provada, conforme o ensinamento de Basileu Garcia: “pode-se não saber, com inteira segurança, se o indiciado é o seu autor, mas a demonstração de que existe um fato delituoso, perfeitamente enquadrável na lei penal, é indeclinável.31 Na mesma ótica, Borges da Rosa aponta que: “desde que haja dúvida, quer quanto ao caráter criminoso do fato, quer quanto à sua ocorrência, prática, ou realização, o Juiz não pode decretar a prisão preventiva.” 32Isto é, a decretação não pode ser feita sem que a existência do fato criminoso esteja devidamente provada. O fumus boni juris representa a existência fundada de um direito material em ameaça. É a plausibilidade do direito à cautela, sendo não apenas um requisito de ação, mas sim um elemento intrincado ao mérito da ação cautelar. Enquanto o periculum in mora consiste na possibilidade de dano ou prejuízo ao direito que está sendo tutelado. No procedimento penal, principalmente, a demonstração do perigo é imprescindível para a decretação da prisão cautelar. Atenta-se, tal como no fumus boni juris, que os indícios devem estar revestidos de solidez, de forma que indiquem a alta probabilidade de uma futura ocorrência e seus possíveis danos, demonstrando o prejuízo caso venha a se concretizar o fato danoso.

4.2 GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA

31 32

GARCIA, Basileu. Comentários ao código de processo penal. Rio de Janeiro: Forense, 1945. p. 129. BORGES DA ROSA, Inocêncio. Processo penal brasileiro. Porto Alegre: Globo, 1942. p. 281.


30

Dentre os requisitos apontados está presente a chamada garantia de ordem pública. Podemos inferir por esta expressão a necessidade manter-se a ordem de nossa sociedade. Na ocorrência de uma infração criminal, corrompe-se esta ordem pública e surge a possibilidade da prisão preventiva para assegurá-la. A referência de ordem pública pode ser retirada do art. 282, inciso I, que aponta: Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: I - necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais;

Por vezes, devido ao caráter da infração criminal, e aos elementos que apontam a conduta do agente, fica claro o risco do agente vir a cometer outras práticas criminais durante o período de investigação ou do seguimento do processo. Havendo esta possibilidade, surge a insegurança na população, o medo de que este agente possa vir a repetir esta prática, atingindo outras pessoas e abalando a ordem social. Sobre o tema, Basileu Garcia faz o seguinte apontamento: Para a garantia da ordem pública, visará o magistrado, ao decretar a prisão preventiva, evitar que o delinquente volte a cometer delitos, ou porque é acentuadamente propenso a práticas delituosas, ou porque, em liberdade, encontraria os mesmos estímulos relacionados com a infração cometida. Trata-se, por vezes, de criminosos habituais, indivíduos cuja vida social é uma sucessão interminável de ofensas à lei penal: contumazes assaltantes da propriedade, por exemplo. Quando outros motivos não ocorressem, o intuito de impedir novas violações determinaria a providência. 33

Quando ocorre um delito muito grave, isto repercute diretamente em nossa sociedade e estremece a estabilidade da mesma, gerando medo e insegurança na população. É papel, portanto do juiz assegurar a paz social e a segurança determinando o cerceamento da liberdade do agente da infração criminal. Machado aponta que o conceito amplo de garantia da ordem pública, unido ao pouco rigor sistemático, pode comprometer uma decisão, tornando-a arbitrária e reduzindo sua eficácia perante o processo. É o que o autor sabiamente aduz: 33

GARCIA, Basileu. Comentários ao código de processo penal. Rio de Janeiro: Forense, 1945. p. 169.


31

Como se vê, a construção jurisprudencial do conceito de ordem pública é mesmo muito ampla, com tendência para abranger circunstâncias de vária natureza, sem grande rigor sistemático, o que nem sempre contribui para a redução do nível de incerteza que caracteriza essa locução legal e às vezes permite mesmo decisões arbitrárias, ditadas muito mais pelo objetivo de punir o autor do crime do que, propriamente, pelo escopo de se garantir a efetividade do processo.34

Como dito, a garantia de ordem pública permite uma bastante ampla, o que gera certa polêmica entre os doutrinadores, sendo que alguns deles chegam a questionar a validade desta como pressuposto da prisão preventiva. Sobre esse aspecto controverso, Machado aduz: Portanto, a finalidade da prisão cautelar não seria a de neutralizar as consequências e repercussões do crime, garantindo a ordem pública. Sua finalidade mais genuína é tão-somente a de garantir a efetividade do processo de conhecimento, seja assegurando a realização da prova, seja garantindo a aplicação da lei penal. De modo que, essa hipótese de decretação da prisão cautelar é mesmo muito controvertida, de um lado porque o seu conceito é notoriamente vago, prestando-se a um uso perigosamente alargado das custódias provisórias; de outro, porque o objetivo da prisão preventiva não é realizar a prevenção geral ou especial da violência ou criminalidade. Este último objetivo, na verdade, é uma das finalidades do processo principal.35

Veja, a ordem pública é também um tópico bastante sensível na questão da prisão preventiva. Não se pode confundir ordem pública com clamor social. A função do Judiciário é promover justiça, atentando-se a intranquilidade da sociedade, não atender a pressões políticas, sociais ou midiáticas baseadas em sensacionalismo e histeria coletiva. O Ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC nº. 80.719/SP, pontuou que: A prisão preventiva, que não deve ser confundida com a prisão penal, pois não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua decretação, mas sim atuar em benefício da atividade estatal desenvolvida no processo penal, não pode ser decretada com base no estado de comoção social e de eventual indignação popular, isoladamente considerados. Também não se reveste de idoneidade jurídica, para efeito de justificação de segregação cautelar, a alegação de que o acusado, por dispor de privilegiada condição econômico34

MACHADO, Antônio Alberto. Prisão cautelar e liberdades fundamentais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 64. 35 MACHADO, Antônio Alberto. Prisão cautelar e liberdades fundamentais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 141.


32

financeira, deveria ser mantido na prisão, em nome da credibilidade das instituições e da preservação da ordem pública. 36

Em tópico distinto, será abordado como o clamor social, motivado pela sensação de impunidade e morosidade da justiça presente na população, pode distorcer essas medidas, banalizando e desvirtuando a existência do instituto da prisão preventiva. Ainda sobre o a garantia de ordem pública, Pacelli ensina que: A prisão para a garantia da ordem pública não se destina a proteger o processo penal, enquanto instrumento de aplicação da lei penal. Dirige-se, ao contrário, à proteção da própria comunidade, coletivamente considerada, no pressuposto de que ela seria duramente atingida pelo não-aprisionamento de autores de crimes que causassem intranquilidade social. 37

Embora o conceito de garantia de ordem pública seja por vezes vago e pouco incisivo, a doutrina e a jurisprudência convergem no sentido de associar o termo à três tópicos importantes, seja isoladamente, ou interligados. São estes, a periculosidade do agente; a necessidade de garantir a paz social, ou seja, a tranquilidade da sociedade; assim como a credibilidade da justiça, elemento importante este, pois a justiça não pode aparentar inércia diante de crime grave ou altamente repercutido. A garantia da ordem pública deve ser permeada por diversos fatores. Inicialmente, deve existir a gravidade da infração, pois não faria sentido uma medida de caráter excepcional, como a prisão preventiva, ser motivada por uma infração de gravidade mínima, irrelevante para a ordem social. Num segundo momento, há de se observar se houve algum tipo de repercussão social. Um crime pequeno, como, por exemplo, um simples estelionato, em que não houve nenhum tipo de violência ou conduta que coloque em risco a segurança da sociedade, não cria nenhum tipo de abalo à ordem. A doutrina também aponta a importância de existir uma periculosidade advinda do agente, como reforçado na lição de Basileu Garcia supramencionada. O agente perigoso coloca em risco a ordem social transmitindo o medo em pessoas que temem ser atingidas pelo mesmo mal. 36 37

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC nº 80.719/SP. 2.ª Turma, Rel. Min. Celso de Melo. OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de processo penal. 18. ed. São Paulo: Atlas. 2014. p. 435.


33

Este risco a ordem social, deve corresponder a situação fática presente, aos elementos do caso concreto que potencialmente possam ocasionar distúrbio à paz social. Deve ser imperativo que a conduta e os fatores presentes indiquem um risco real a tranquilidade da coletividade. Neste sentido é recomendado que o julgador produza decisões fundamentadas, argumentos pertinentes que justifiquem estas decisões. Não pode o magistrado valer-se de motivações rasas, baseadas em especulações ou apoiadas no imaginário da população. O risco que de fato pode abalar a ordem pública deve ser que aquele que de fato atinge e tormenta a paz social. Esta ameaça deve ser permeada pelo potencial de agonizar toda a coletividade. Não se tratando da vítima ou dos ofendidos diretamente ou indiretamente pela infração criminal. Para observar ou não a existência de periculosidade, que nada mais é que a probabilidade do sujeito tornar a cometer nova infração, deve-se inferir pontos como: a pesquisa sobre a possível existência de antecedentes criminais e a conduta do agente no cometimento do crime. Portanto, não é errôneo dizer que, aquele que possui extensa lista de antecedentes criminais ou é acusado de cometer crime grave, com resquícios de crueldade, pode ser apontado agente dotado de periculosidade. Um delito grave, como um latrocínio por exemplo, repercutirá amplamente na sociedade, gerando mal-estar coletivo e insegurança. Se o indivíduo da infração grave e violenta no exemplo, unindo-se a um possível histórico de maus antecedentes, fica claramente legitimado um quadro permissivo de prisão preventiva. Mesmo um réu primário, sem nenhum antecedente criminal, pode ser submetido a prisão preventiva. Cometendo um delito grave, que provoque indignação e medo na opinião pública, já está legitimada a prisão preventiva. Mesmo sem o agente apresentar periculosidade prévia por não possuir antecedentes, apresentando-a a partir do momento do crime torna-se possível a prisão.


34

Cabe ao juiz, na verificação de todos os elementos que configurariam o risco à ordem pública. Na opinião da doutrina, o mais correto é que no mínimo dois dos três elementos estejam presentes, como por exemplo, o crime grave unido aos maus antecedentes ou à afetação da ordem pública. Em suma, podemos constatar que tanto a doutrina pátria, quanto a jurisprudência enfrentam dificuldades para indicar de maneira precisa as situações que ensejam risco à ordem pública. Porém, para analisarmos a existência de ameaça ou não, existem alguns elementos recorrentes que podem ser utilizados para esse fim. São eles, a gravidade do delito, a periculosidade do agente e a reação do público gerada pelo crime. Tais elementos devem servir para justificar a prisão preventiva, desde que, somando-se estes elementos, uma vez que isoladamente considerados não há como apontarem para uma certeira ameaça à ordem. Ainda assim, nem sempre estando caracterizados todos estes elementos está presente a ameaça à ordem pública, devendo o Magistrado fazer uma avaliação prudente de sua real necessidade. Pois o que se observa é que por vezes a prisão do agente não preserva nem altera o status da ordem pública.

4.3 DA GARANTIA DE ORDEM ECONÔMICA

Na garantia de ordem econômica visa-se, com a decretação da prisão preventiva, evitar que o infrator motivador de um abalo a uma ordem econômica e/ou financeira, venha a causar novamente a determinada instituição pública ou privada maior prejuízo, privando-o de sua liberdade. O criminoso do chamado “colarinho branco” pode ser equiparado aos demais criminosos comuns, uma vez que seus crimes contra instituições financeiras, podem gerar repercussão fora do âmbito da instituição, atingindo pessoas comuns.


35

As condutas que atingem a ordem econômica, os chamados “golpes financeiros”, em sua maioria, podem atingir um número elevado de pessoas, pelo grande magnitude que estas lesões podem estar revestidas. Comumente, os crimes contra a ordem econômica são aqueles praticados por grandes empresas do mercado financeiro, abusando de seu poder e influência para a finalidade de obterem lucros ilícitos. Estes crimes normalmente envolvem a conduta de vários agentes, de forma organizada, usando de manobras complicadas e traiçoeiras como fraudes, sonegação e lavagem de dinheiro. Sobre a autoria destes crimes, Machado aponta que: Os autores dos crimes econômicos e financeiros agem dissimuladamente mediante práticas muitas vezes imperceptíveis ou muito bem ocultas, seja pela complexidade e sofisticação das manobras criminosas, seja pelo suborno ou corrupção que se valem para a consumação de suas fraudes. Além de tais fatores, que dificultam e muitas vezes impedem a apuração desse tipo de delito, há também o fato de que os seus autores são cidadãos insuspeitos, com grande respeitabilidade e reconhecimento social, muitas vezes são até autoridades com relevantes cargos públicos. 38

O conceito de ordem econômica para os crimes em questão surge para promover a tranquilidade na sociedade, que teme o poder e influência, muitas vezes imperceptível, das autoridades e empresários mal-intencionados. Quem retira e desvia verba dos cofres públicos, que deveriam ser utilizadas em prol da população, para enriquecimento pessoal, comete grave atentado à paz social, à democracia e à credibilidade do Poder Judiciário. Estes criminosos, em suma maioria, de alto poder aquisitivo, status social e influência seja na esfera econômica e financeira ou política, através de seus delitos raramente punidos e condutas reiteradas, expandem a já tão grave desigualdade social e injustiça na sociedade brasileira. A doutrina faz inúmeras ressalvas à prisão para garantia da ordem pública e econômica. Para alguns doutrinadores esta não é compatível com o princípio constitucional da presunção de inocência, traduzindo-se em antecipação de pena. Na visão destes o que garante a ordem pública ou econômica é a verdadeira prisão pena. A prisão preventiva tem o intuito apenas de tutelar o processo. 38

MACHADO, Antônio Alberto. Prisão cautelar e liberdades fundamentais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 155.


36

Na lição de Nicolitt estes institutos estariam revestidos de inconstitucionalidade, pois segundo ele: Usar a prisão processual para garantir a ordem pública é antecipar os efeitos da pena, o que é inconstitucional. O mesmo se pode dizer em relação a ordem econômica, pois toda prisão cujo objetivo transcenda a ordem processual padece de inconstitucionalidade.39

No mesmo sentido, Delmanto Júnior, ainda sobre a prisão cautelar utilizada como forma de garantia, faz as seguintes ponderações: Não resta dúvida de que nessas hipóteses a prisão provisória afasta-se, por completo, de sua natureza cautelar instrumental e/ou final, transformando-se em meio de prevenção especial e geral, e, portanto, em punição antecipada uma vez que uma medida cautelar jamais pode ter como finalidade a punição e ressocialização do acusado para que não infrinja a lei penal, bem como o consequente desestímulo de outras pessoas ao cometimento de crimes semelhantes, fins exclusivos da sanção criminal. 40

A medida cautelar possui natureza instrumental. Seu fim é o de tutelar o processo, seja de conhecimento ou de instrução. Na opinião de Nicolitt 41, quando é utilizada para tutelar a ordem pública, ordem econômica, proteger a credibilidade da justiça ou prevenir novas infrações, foge-se do objetivo da medida cautelar e invade a seara da pena. Lopes Júnior, também faz severas críticas à prisão preventiva para garantir a ordem pública ou econômica, tal como: Só é cautelar aquela medida que se destinar a este fim (servir ao processo de conhecimento). E somente o que for verdadeiramente cautelar é constitucional. […] As prisões para garantia da ordem pública ou da ordem econômica não são cautelares e, portanto, são substancialmente inconstitucionais.42

Por terem definições vagas e genéricas, as expressões garantia de ordem pública e ordem econômica são amplamente questionadas quanto à sua validade. Pois segundo alguns

39

NICOLITT, André Luiz. Processo penal cautelar: prisão e demais medidas cautelares. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 96. 40 DELMANTO JÚNIOR, Roberto. As modalidades de prisão provisória e seu prazo de duração. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 95. 41 NICOLITT, André Luiz. Processo penal cautelar: prisão e demais medidas cautelares. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 96. 42 LOPES JR, Aury. O novo regime jurídico da prisão processual, liberdade provisória e medidas cautelares diversas. 2. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2011. p. 90.


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pensadores proteger essas instituições não é a finalidade da prisão preventiva, falhando em atender a real missão da cautelar de garantir o andamento do processo. Luiz Fernando Lelis do Carmo resume bem as críticas feitas a estes institutos: A doutrina, em sua unanimidade, traz a tona o fato de que, além de as expressões garantia da ordem pública e da ordem econômica serem amplas e genéricas sob o ponto de vista da melhor hermenêutica pátria, tem-se que não tem a finalidade precípua de garantir efetivamente o regular andamento do processo, como instrumento, mas sim atender interesses, principalmente os sociais e políticos-criminais, que não aquela. 43

Eugênio Pacelli de Oliveira faz uma excelente observação acerca da garantia de ordem econômica, uma vez que a prisão preventiva para proteger esta seria uma medida incorreta, apontando que: “Se o risco é contra a ordem econômica, a medida cautelar que nos parece mais adequada é o sequestro e a indisponibilidade dos bens dos possíveis responsáveis pela infração.” 44 Apesar dos conceitos vagos de garantia da ordem econômica e ordem pública, e do consequente acúmulo de críticas de diversos doutrinadores, tais fundamentos estão expressamente previstos em nossa legislação, portanto, mesmo altamente questionáveis, são constitucionalmente válidos e comumente utilizados. É preciso atentar-se que, por mais tóxicos que estes agentes criminosos “do colarinho branco” sejam à nossa sociedade e democracia, deve-se sempre respeitar as regras da prisão preventiva, observando as funções essenciais do processo e da justiça, não podendo o Magistrado usar da prisão como ferramenta de satisfação ao clamor público, como será posteriormente discutido em mais detalhes no presente trabalho. O art. 30 da Lei 7.492/86 aponta que: “Sem prejuízo do disposto no art. 312 do Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-lei 3.689, de 3 de outubro de 1941, a prisão preventiva do acusado da prática de crime previsto nesta Lei poderá ser decretada em razão da magnitude da lesão causada (...)”. Observa-se na leitura desta lei que além da gravidade do dano causado contra a ordem econômica, há também o fator social a ser notado.

43

DO CARMO, Fernando Luiz Lelis. Prisão preventiva e o confronto aos princípios constitucionais. Disponível em: <https://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=12939> Acesso em: 10. abr. 2017. 44 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de processo penal. 13. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 527.


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Desta forma, o elemento garantia da ordem econômica, apesar de nos parecer inadequado para justificar uma prisão preventiva, concordando com a opinião de Pacelli, é válido e assegurado pelo Código de Processo Penal.

4.4 CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL

Garantida a aplicação do devido processo legal, resulta-se na conveniência da instrução criminal, que nada mais é que o processo seja realizado da maneira adequada, imparcial, justo. A conveniência do processo é a busca da verdade e da justiça. Na lição de Campos Barros, “a conveniência da instrução criminal tem função dúplice: a) utilizar-se do acusado como prova no processo; b) evitar que ele prejudique a colheita de prova, dificultando a descoberta da verdade”45 Fundamentada neste elemento da garantia da instrução criminal, a prisão só pode ser decretada enquanto vigente a fase instrutória do processo, ou seja, encerrada a colheita de provas, deve-se revogar a prisão, caso outro fundamento que a justifique não persista. A prisão preventiva está claramente relacionada com a prova no processo. Pode ocorrer da eventual liberdade do acusado ou investigado no processo comprometer a colheita de provas. O acusado solto pode corromper as provas, seja através da ocultação dos objetos do crime, destruição de vestígios, coação da vítima e das testemunhas, dentre outras. Admite-se a prisão nestes casos até que a fase de produção de provas esteja completa, inibindo o acusado de danificar ou extinguir elementos probatórios. Não podemos, no entanto, confundir a prerrogativa constitucional de não produzir provas contra si mesmo como uma tentativa de obstrução das provas ou do processo. A negativa do acusado em colaborar não atenta contra a instrução, pois está amparada pelos direitos ao silêncio e à ampla defesa. Uma vez colhida a prova que estava ameaçada pela liberdade do agente, deve-se imediatamente proceder à soltura deste, há não ser que perdure outro motivo que justifique 45

BARROS, Romeu Pires de Campos. Processo penal cautelar. Rio de Janeiro: Forense, 1982. p. 200.


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sua prisão cautelar. Deve-se ressaltar que a imposição de prisão cautelar, nestas situações previamente descritas, é necessária apenas quando a realização da prova potencialmente prejudicada for imprescindível ao processo. A prova irrelevante ou que pode ser obtida por qualquer outro meio não justifica a custódia preventiva.

4.5 CERTEZA DE APLICAÇÃO DA LEI PENAL

A prisão preventiva, majoritariamente, é utilizada como recurso para fazer-se cumprir a aplicação da lei penal. Um dos fins da prisão preventiva é tradicionalmente evitar a fuga do acusado. Entende-se que quando o acusado ausenta-se da localidade onde está formada sua culpa, pretende escapar da supervisão da justiça, assim como deixa de informar sua localização ou paradeiro para fins judiciais. Nos casos em que o acusado oculta seu paradeiro ou destino, é comum que exista a suspeita de que este pretende obstar o seguimento do processo, resultando na esquiva de possível punição para o crime praticado. Na análise de Marcão: Em certas situações, ciente da gravidade do crime cometido e convencido da correspondente condenação que daí advirá num futuro próximo, seguindo orientação ou mesmo por ideação sua, o increpado começa a se desfazer de seus bens móveis, pede demissão do emprego, coloca sua casa à venda, etc. Nestes casos em que a proximidade da fuga se faz evidente e desde que demonstrada nos autos, tem cabimento a prisão preventiva, se atendidos os demais requisitos legais.46

Esse risco iminente de fuga ou dificuldade de determinar seu paradeiro, atinge o andamento do processo, retardando-o e tornando incerta a devida aplicação da lei. Tal conduta do acusado autoriza a medida preventiva. Resumidamente, a certeza da aplicação da lei penal nada mais é que ferramenta utilizada quando o investigado dá indícios de descomprometimento com o seguimento da ação

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MARCÃO, Renato. Prisões cautelares, liberdade provisória e medidas cautelares restritivas. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 163.


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penal, demonstrada em sua conduta que fugirá de sua responsabilidade como parte do processo. No art. 282, I do Código de Processo Penal, a certeza da aplicação da lei penal está presente discriminada da seguinte forma: Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: I – necessidade para a aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais;

O inciso II do mesmo artigo menciona a “adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado”. Podemos observar com estes dois incisos que as medidas cautelares deverão sempre obedecer ao binômio necessidade e adequação. Não basta estar o fato possuir elementos que o adéquam a medida, mas também estar presente a necessidade de tomá-la. É a certeza da aplicação da lei penal que garante a efetividade da ação e que esta apresente um resultado. Se a liberdade do acusado compromete a certeza de que a lei penal será plenamente aplicada, cabe, portanto a prisão preventiva para assegurar a efetividade do processo.


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5 A ATUALIZAÇÃO ATRAVÉS DA LEI 12.403 DE 2011

A nova lei da prisão preventiva provavelmente teve como principal objetivo explicitar que a prisão é sempre uma medida de exceção. A regra sempre deve ser a liberdade. A aplicação de uma medida cautelar diferente do encarceramento pode surtir o mesmo efeito pretendido ou até um resultado melhor, evitando assim a prisão, que é a medida mais gravosa. Na visão de Nucci, um avanço visível na referida nova Lei: A Lei 12.403/2011 trouxe relevante novidade para legitimidade ativa do requerimento da prisão preventiva, permitindo que a vítima do crime, por meio do assistente da acusação, o faça. Cuida-se da ampliação da participação do ofendido no processo penal, não somente para assegurar eventual indenização civil, mas também para promover o andamento e o deslinde da cause, conforme seus anseios de justiça. 47

No entanto, a atualização feita em 2011, perdeu a oportunidade de esclarecer ou até mesmo excluir as motivações da “garantia de ordem pública ou privada” do Código, uma vez que tais pressupostos são amplamente criticados por seu caráter vago e genérico. Sobre a falta dessa reforma, Nucci observa que: O legislador poderia ter ousado, definindo ou detalhando o que vem a ser cada um dos fatores da prisão preventiva, ao menos os mais abrangentes, como garantia da ordem pública e da ordem econômica. Não o fez, possivelmente para continuar tolerando seja o juiz o protagonista da conceituação, conforme o caso concreto.48

Dentre os principais objetivos da advinda lei está regular e ponderar o uso da prisão preventiva, que vinha sendo usada em larga escala como ferramenta de antecipação de pena, contrariando sua essência de medida excepcional. Como abordado acima, algumas hipóteses vagas permaneceram na legislação, mas ainda assim houve efetiva melhora com as novas medidas cautelares criadas.

5.1 AS NOVAS MEDIDAS CAUTELARES INSTITUÍDAS

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NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 617. 48 NUCCI, Guilherme de Souza. Prisão e liberdade. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 67.


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As novas medidas cautelares alternativas à prisão, estão elencadas no art. 319 do Código de Processo Penal, que institui: Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão: I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; IX - monitoração eletrônica.

Todas estas medidas configuram relativo avanço e trazem modernidade ao tema das medidas cautelares que por muito tempo se encontravam defasadas. A prisão sem condenação deve ser sempre que possível evitada e decretada apenas quando configurada uma real necessidade decretação da mesma para assegurar o processo. Cada crime tem suas características, sua pena e cada agente sua periculosidade. Não há como adequar todos os fatos criminosos ao mesmo tipo de cautelar. Nem sempre a conduta do agente e o crime a ele imputado justificam uma medida gravosa como o cárcere. Na opinião de Greco Filho: As medidas cautelares acima relacionadas representam um avanço em relação ao sistema quase que maniqueísta anterior: ou havia a preventiva ou não havia nada. Procuraram elas estabelecer a maleabilidade de o juiz poder adaptar a situação do infrator penal à situação de fato, quando a prisão preventiva ultima ratio não for o caso, mantendo-o, porém, vinculado ao ônus do processo penal a que esteja submetido.49 49

GRECO FILHO, Vicente. Manual de processo penal. 9. ed. São Paulo: Saraiva,. 2012. p. 250.


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Apesar de extremamente importantes e bem-vindas para o processo penal, as novas medidas cautelares não foram poupadas de críticas. Principalmente quanto ao fato de inexistir regulamentação para a aplicação e fiscalização de seus procedimentos e efetivo cumprimento. Com seu advento, estas novas medidas cautelares se mostraram impopulares perante aqueles que defendem a prisão como punição única imediata, o advento Lei 12.403/2011 veio para modernizar o processo e trazer soluções mais eficazes e menos danosas para o mesmo. Vem-se evitando assim prisões desnecessárias e desproporcionais aos fatos, que outrora ocorriam com frequência.


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6 DA DURAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA

Nosso ordenamento jurídico não determina o prazo de duração da prisão preventiva, ao contrário da temporária. O entendimento é que aquela tenha a duração de sua necessidade, ou seja, enquanto cumprir seus pressupostos e julgar-se necessária. Não podendo surpassar eventual decisão absolutória (pois esta extingue os motivos de sua decretação), assim como uma decisão condenatória, pois a partir deste inicia-se o cumprimento da pena. Sobre o tema, Nucci aduz que: Observa-se, como fruto natural dos princípios constitucionais explícitos da presunção de inocência, da economia processual e da estrita legalidade da prisão cautelar, ser necessário consagrar, com status constitucional, a meta de que ninguém poderá ficar preso, provisoriamente, por prazo mais extenso do que for absolutamente imprescindível para o escorreito desfecho do processo. Essa tem sido a tendência dos tribunais pátrios, em especial do Supremo Tribunal Federal.50

A prisão preventiva demasiadamente longa desrespeita princípios constitucionais e torna-se uma verdadeira injustiça. Veja, atentando-se ao princípio da presunção de inocência, unido à ideia de celeridade processual, não há conceber sendo legal o indiciado ou réu permanecer meses, ou até mesmo anos tendo sua liberdade constringida sem ao menos ter sido condenado para tal ou ter culpa formada. A inexistência atual de regulamento ou entendimento na jurisprudência que determina o prazo máximo da prisão preventiva é um problema persistente na temática das cautelares. Com a omissão da Lei quanto ao que seria o excesso de prazo da preventiva, cabendo ao juiz usar do princípio da razoabilidade para estipular ou limitar sua duração. O Supremo Tribunal Federal se pronunciou da seguinte forma: Nada pode justificar a permanência de uma pessoa na prisão, sem culpa formada, quando configurado excesso irrazoável no tempo de sua segregação cautelar (RTJ 137/287 - RTJ 157/633 - RTJ 180/262-264 - RTJ 187/933934), considerada a excepcionalidade de que se reveste, em nosso sistema jurídico, a prisão meramente processual do indiciado ou do réu. O excesso de prazo, quando exclusivamente imputável ao aparelho judiciário - não 50

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 107.


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derivando, portanto, de qualquer fato procrastinatório causalmente atribuível ao réu - traduz situação anômala que compromete a efetividade do processo, pois, além de tornar evidente o desprezo estatal pela liberdade do cidadão, frustra um direito básico que assiste a qualquer pessoa: o direito à resolução do litígio, sem dilações indevidas (CF, art. 5º, LXXVIII) e com todas as garantias reconhecidas pelo ordenamento constitucional, inclusive a de não sofrer o arbítrio da coerção estatal representado pela privação cautelar da liberdade por tempo irrazoável ou superior àquele estabelecido em lei. A duração prolongada, abusiva e irrazoável da prisão cautelar de alguém ofende, de modo frontal, o postulado da dignidade da pessoa humana, que representa - considerada a centralidade desse princípio essencial (CF, art. 1º, III)- significativo vetor interpretativo, verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira todo o ordenamento constitucional vigente em nosso País e que traduz, de modo expressivo, um dos fundamentos em que se assenta, entre nós, a ordem republicana e democrática consagrada pelo sistema de direito constitucional positivo. Constituição Federal (Art. 5º, incisos LIV e LXXVIII). EC 45/2004. Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Art. 7º, ns. 5 e 6). Doutrina. Jurisprudência. O indiciado e o réu, quando configurado excesso irrazoável na duração de sua prisão cautelar, não podem permanecer expostos a tal situação de evidente abusividade, sob pena de o instrumento processual da tutela cautelar penal transmudar-se, mediante subversão dos fins que o legitimam, em inaceitável (e inconstitucional) meio de antecipação executória da própria sanção penal. 51

Como observado na lição, o excesso de prazo advindo da morosidade do Judiciário é fenômeno que compromete o processo, evidenciando um possível desprezo pela liberdade do indivíduo, inclusive ferindo suas garantias constitucionais e direito a ter um devido processo legal. Nucci assevera que, [...] a regra é que perdure, até quando necessário, durante a instrução, não podendo, é lógico, ultrapassar eventual decisão absolutória – que faz cessar os motivos determinantes de sua decretação – bem como o trânsito de decisão condenatória, pois, a partir desse ponto, está-se diante de prisãopena.52

O Pacto Internacional sobre Direitos Políticos e Civis, em seu Art. 9 o, número 3, é claro ao determinar que, […] qualquer pessoa acusada de um crime, quer esteja presa cautelarmente, quer esteja respondendo ao processo em liberdade, tem direito a ser julgada sem dilações indevidas. Porém, se o acusado estiver preso, tem o direito de ser julgado em um prazo razoável, sob pena de ser posto em liberdade. 53 51

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC: 95464 SP, Relator: CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 03/02/2009, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-048 DIVULG 12-03-2009. 52 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 545. 53 BRASIL. Decreto n.º 592, de 6 de julho de 1992. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0592.htm>. Acesso em: 10. abr. 2017.


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Rogério Schietti Machado da Cruz formula que [...] ninguém possa ser mantido preso, durante o processo, além do prazo razoável, seja ele definido em lei, seja ele alcançado por critério de ponderação dos interesses postos em confronto dialético. É dizer, todos têm o direito de ser julgado em prazo razoável e também o direito de não serem mantidos presos por prazo irrazoável.54 A ausência de definição legal para o que seria o prazo razoável da prisão cautelar, dificulta a estipulação da mesma. Mas, para tanto, deve utilizar-se do princípio da razoabilidade para determinar o prazo excessivo da prisão, delegando ao julgar utilizar-se de sua capacidade de avaliação do caso concreto aliada a sua sensibilidade e inclinação. O Supremo Tribunal Federal vem decidindo recorrentemente sobre a obrigatoriedade do prazo razoável para as prisões cautelares, evitando demoras excessivas que comprometam a efetividade do processo: Esta Corte tem considerado tratar-se de hipótese de constrangimento ilegal, corrigível via habeas corpus, a prisão cautelar mantida em razão da mora processual provocada exclusivamente em razão da atuação da acusação ou em razão do próprio (mau) funcionamento do aparato judicial (HC 85.237/DF, rel. Min. Celso de Mello, Pleno, DJ de 29-42005).55 A Resolução no. 66 do Conselho Nacional de Justiça em seu art. 3. o aponta: “Verificada a paralisação por mais de três meses dos inquéritos e processos, com o indiciado ou réu preso, deverá a Secretaria ou o Cartório encaminhar os autos imediatamente à conclusão do juiz para que sejam examinados”. Esta Resolução, na tentativa de frear estas prisões cautelares de duração excessiva, considera a extrema necessidade de revisão e andamento de processos parados, com indiciados ou réus presos. Visando também que estes presos, principalmente os preventivos, cuja duração da prisão não é limitada, não sejam esquecidos nas prisões.

54

CRUZ, Rogério Schietti Machado da. Prisão cautelar: dramas, princípios e alternativas. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2006. p. 107. 55 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 94.661/SP, 2.ª Turma, rel. Min. Ellen Gracie, j. 30-9-2008, DJe n. 202, de 24-10-2008.


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Trata-se de um problema recorrente das prisões no Brasil, o excesso ou ausência de prazo, em que milhares de presos esperam julgamento por tempo excessivo. A duração exacerbada e abusiva da prisão cautelar ofende gravemente o princípio da dignidade humana e também o da presunção de inocência. Outra agravante é a recusa ou ignorância dos magistrados em aplicar outras medidas cautelares disponíveis menos gravosas. Desatentos às garantias constitucionais do indivíduo e a problemática da superlotação das penitenciárias, adotam as privativas de liberdade como se fossem a única medida cabível. A pressão popular também infere nestas decisões, uma vez que parcela representativa da população rejeita as medidas cautelares alternativas à prisão, acreditando serem “benefícios aos criminosos” e medidas ineficazes, cobrando do Judiciário decisões mais extremas e gravosas, confundindo o ideal de justiça com vingança. A prisão cautelar em face à morosidade processual é um grande entrave de nossa justiça e, infelizmente, nosso Código de Processo Penal não dá solução a este problema. Para sanar esta lacuna jurídica, devem os magistrados observar não apenas a duração razoável do processo-crime, mas também, e, principalmente, a duração razoável da prisão cautelar. É necessário que os magistrados observem as medidas cautelares alternativas à prisão, e, não sendo estas cabíveis, possuam a habilidade de dosar e saber se utilizar da prisão cautelar. De forma a garantir que a norma não ultrapasse o bom senso, e termine por se revelar falha e injusta perante o acusado. Talvez a decisão mais correta é análise apurada do caso concreto e todos seus elementos para fixar a duração da medida. O princípio da razoabilidade deve ser o norteador para delimitar o excesso de prazo.


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7 DA FUNDAMENTAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA

O art. 93, inciso IX, da Constituição Federal aponta que “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade”. Da mesma forma está também previsto no art. 315 do Código de Processo Penal: “A decisão que decretar, substituir ou denegar a prisão preventiva será sempre motivada”. Conforme os artigos acima, podemos observar que além da obrigatoriedade da fundamentação das decisões judiciais estar expressamente prevista na Constituição Federal, a atualização feita em 2011 também a explicitou novamente no Código, talvez na esperança de que este dispositivo seja de fato respeitado. Para privar alguém de sua liberdade, é imprescindível que o Magistrado apresente suas razões de forma fundamentada, explicando no que se baseia para atingir tal conclusão. Esta decisão deve portando indicar como e de onde foram extraídos seus fundamentos, não bastando a mera reprodução do texto legal. O Ministro Sepúlveda Pertence, sobre a relevância da fundamentação adequada, em julgado do Supremo Tribunal Federal, demonstra: (...) II. Prisão preventiva: falta de fundamentação concreta de sua necessidade cautelar, não suprida pelo apelo a gravidade objetiva do fato criminoso imputado: nulidade. A fundamentação da prisão preventiva além da prova da existência do crime e dos indícios da autoria -, há de indicar a adequação dos fatos concretos a norma abstrata que a autoriza como garantia da ordem pública, por conveniência da instrução ou para assegurar a aplicação da lei penal (CPP, arts. 312 e 315). A gravidade do crime imputado, um dos malsinados ‘crimes hediondos’ (Lei 8.072/90), não basta a justificação da prisão preventiva, que tem natureza cautelar, no interesse dos interesses do desenvolvimento e do resultado do processo, e só se legitima quando a tanto se mostrar necessária: não serve a prisão preventiva, nem a Constituição permitiria que para isso fosse utilizado, a punir sem processo, em atenção a gravidade do crime imputado, do qual, entretanto, “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.” (CF, art. 5., LVII). 56

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BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RHC: 68631 DF, Relator: Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Data de Julgamento: 25/06/1991, Primeira Turma, Data de Publicação: DJ 23-08-1991.


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No julgamento do Habeas Corpus de no. 87041, o Ministro Cezar Peluso, perante a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, fez importante apontamento sobre a prisão preventiva e seus fundamentos: 1. PRISÃO PREVENTIVA. Medida cautelar. Natureza instrumental. Sacrifício da liberdade individual. Excepcionalidade. Necessidade de se ater às hipóteses legais. Sentido do art. 312 do CPP. Medida extrema que implica sacrifício à liberdade individual, a prisão preventiva deve ordenar-se com redobrada cautela, à vista, sobretudo, da sua função meramente instrumental, enquanto tende a garantir a eficácia de eventual provimento definitivo de caráter condenatório, bem como perante a garantia constitucional da proibição de juízo precário de culpabilidade, devendo fundar-se em razões objetivas e concretas, capazes de corresponder às hipóteses legais (fattispecie abstratas) que a autorizem. 57

A fundamentação do Magistrado pode acatar o parecer de outras autoridades, como do Ministério Público, por exemplo, desde que este esteja devidamente fundamentado, abordando e esgotando todas as possibilidades pertinentes ao pedido de decretação. Não faria sentido o Magistrado ter de reescrever em seus termos o que já foi citado previamente. Na contramão a essa possibilidade, o autor Antonio Magalhães Gomes Filho, afirma que “incumbe ao juiz efetivamente decidir sobre esse ponto, até porque sua função indelegável, não cabendo remissão ao que entenderam a autoridade policial ou o órgão da acusação, sendo imprescindível, portando, a fundamentação expressa”.58 Apesar da exigência de fundamentação parecer uma tema de praxe, sem necessidade de grande discussão. O que se percebe é que parte das fundamentações são feitas de maneira sintética, com as simples indicações dos motivos que justifiquem a decretação da prisão. Da necessidade de uma adequada motivação por parte do magistrado, Câmara evidencia: Do magistério decretante da cautela excepcional, exige-se que motive a decisão, não lhe sendo conferido poder para restringir a liberdade pessoal conforme suas conveniências. Não é possível que o faça, outrossim, através de meros juízos de possibilidade. Em tema tão delicado quanto o da restrição legal da liberdade de ir e vir, exige-se da autoridade judicial que, ao exarar a cautela, demonstre concretamente a possibilidade de que o acusado venha a 57

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC: 87041 PA, Relator: CEZAR PELUSO, Data de Julgamento: 29/06/2006, Primeira Turma, Data de Publicação: DJ 24-11-2006. 58 GOMES FILHO, Antonio Magalhães. A motivação das decisões penais. São Paulo: RT, 2001. p. 221.


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dificultar a instrução criminal ou, ainda, impossibilitar a aplicação da lei penal.59

Tendo em mente que a medida cautelar privativa de liberdade é uma medida atrelada à excepcionalidade, esta necessita de fundamentação clara, idônea e assertiva. O Ministro Celso de Mello, em decisão no HC de no. 118.580, no Supremo Tribunal Federal, preceituou que a prisão preventiva requer “base empírica idônea”: Tenho para mim que a decisão em causa, ao converter, em prisão preventiva, a prisão em flagrante do ora paciente, parece ter-se apoiado em elementos insuficientes, destituídos de necessária base empírica idônea, revelando-se, por isso mesmo, desprovida da indispensável fundamentação substancial. Todos sabemos que a privação cautelar da liberdade individual é sempre qualificada pela nota da excepcionalidade (HC 96.219-MC/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), eis que a supressão meramente processual do “jus libertatis” não pode ocorrer em um contexto caracterizado por julgamentos sem defesa ou por condenações sem processo.É por isso que esta Suprema Corte tem censurado decisões que fundamentam a privação cautelar da liberdade no reconhecimento de fatos que se subsumem à própria descrição abstrata dos elementos que compõem a estrutura jurídica do tipo penal. […] o Supremo Tribunal Federal tem examinado a utilização, por magistrados e Tribunais, do instituto da tutela cautelar penal, em ordem a impedir a subsistência dessa excepcional medida privativa da liberdade, quando inocorrente hipótese que possa justificá-la. 60

Esta lição do Ministro é excelente para compreendermos o porquê de tanto de se falar em necessidade de fundamentação. Mesmo tratando-se de um conceito familiar para tantos, ainda não é plenamente atendido, sendo necessário que o Supremo reitere em inúmeras oportunidades a imprescindibilidade de uma fundamentação substanciosa para decretar-se a preventiva. Também não basta a mera menção da gravidade do fato para justificar a constrição da liberdade de ir e vir. A natureza do fato criminoso por si só não é suficiente para apontar para a preventiva. Sem a demonstração dos fatos concretos que a justifiquem não pode ocorrer a prisão processual, pois a função dessa é garantir o processo, a prisão pela natureza e gravidade do crime nada mais é que a prisão pena. A gravidade do fato e sua natureza serão apontadas pelo juiz em sua sentença e devidamente apenada concluído o processo. Quando se efetua a prisão processual pela 59

CÂMARA, Luiz Antônio. Medidas cautelares pessoais: prisão e liberdade provisória. 2. ed. Curitiba: Juruá. 2011. p. 145. 60 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC: 118580 SP, Relator: Min. CÁRMEN LÚCIA, Data de Julgamento: 09/07/2013, Data de Publicação: DJe-148 DIVULG 31/07/2013 PUBLIC 01/08/2013. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/MC_no_HC_118580.pdf>. Acesso em: 07. abr. 2017.


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natureza crime está se fazendo um juízo de pré-culpabilidade. Se não houve sentença conclusiva determinando a autoria do crime, não pode o acusado ser preso apenas por existência de crime de natureza gravosa. A autora Monica Ovinski de Camargo faz uma pertinente observação sobre a decretação da prisão preventiva: Ocorre que nem todas as decisões judiciais são finais, com exame de mérito de todo caso, quando o juiz conclui pela culpa ou pela inocência do acusado. Há decisões que são igualmente muito importantes para o acusado, como aquelas que decidem pela decretação ou manutenção da prisão preventiva. Em decisões desse naipe, o juiz deve ter redobrado cuidado com a linguagem empregada e com os motivos escolhidos para motivar seu conhecimento, isso porque o acusado não pode ser tratado como culpado antes do momento autorizado pela lei, que é o da decisão final de mérito. De que adianta para o indivíduo esperar a sentença final se o juiz já o considera culpado em suas decisões intermediárias, tratando-o como tal? 61

Concluímos, portanto que, a mera indicação dos pressupostos legitimadores da decretação da cautelar nem sempre é suficiente para uma fundamentação idônea e embasada. O Magistrado deve fundamentar-se não somente nos fatos e pressupostos legais, mas também usando da sensibilidade e proporcionalidade pertinentes a sua função. Não basta a convicção, é preciso também a motivação, os argumentos que o convenceram para optar por uma medida excepcional. Temos observado em diversas decisões judiciais fundamentações superficiais e lacônicas, apenas referenciando estar de acordo com os preceitos legais, mas sem compromisso algum com a demonstração da necessidade e admissibilidade da prisão cautelar.

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OVINSKI DE CAMARGO, Monica. Princípio da presunção de inocência no Brasil: o conflito entre punir e libertar. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 254.


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8 CIRCUNSTÂNCIAS QUE LEGITIMAM A PRISÃO PREVENTIVA

No art. 313 do Código de Processo estão contidos os casos de admissibilidade da prisão preventiva, que são: Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva: I – nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos; II – se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do DecretoLei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal; III – se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência; Parágrafo único. Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.

O primeiro inciso do artigo supramencionado, automaticamente descarta o uso da prisão preventiva em casos de crimes culposos e meras contravenções penais. Não faria sentido privar cautelarmente a liberdade do investigado que representa mínimo perigo para a sociedade ou que comportam penas de pequena duração (no caso, inferiores a quatro anos). No segundo inciso, prevê-se que quando já condenado definitivamente pelo cometimento de outro crime, também de caráter doloso, estará sujeito à prisão preventiva. Portanto, havendo condenação anterior por crime doloso, tal como o crime atual, cabe a prisão. No entanto, entre a condenação anterior e a atual não pode ter decorrido cinco anos, pois passado este período, conforme a legislação do art. 64, I do Código Penal, extingue-se a condição de reincidente. No terceiro inciso autoriza-se a prisão preventiva nos casos de violência doméstica e familiar contra vítimas altamente vulneráveis, como mulheres, crianças, idosos, enfermos e pessoas com deficiência. O grande objetivo desta medida é garantir que medidas protetivas de urgência sejam empregadas para estes grupos fragilizados por uma violência.


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Na hipótese prevista no parágrafo do artigo supramencionado, sanadas as dúvidas sobre identidade civil do investigado, deve-se imediatamente proceder-se à soltura deste, salvo se outro motivo que justifique a manutenção da prisão preventiva persistir.

8.1 CIRCUNSTÂNCIAS QUE IMPEDEM OU LIMITAM A PRISÃO PREVENTIVA

O art. 314 do Código de Processo Penal aponta que verificado ter o autor praticado o fato nas condições presentes no art. 23 e incisos do Código Penal, não poderá ser decretada a prisão preventiva. São estas as hipóteses referidas: Art. 23. Não há crime quando o agente pratica o fato: I – em estado de necessidade; II – em legítima defesa; III – em estrito cumprimento do dever legal ou no exercício regular de direito.

Observando o Magistrado que o agente praticou o fato delituoso em uma das situações acima referidas, não se decretará a prisão preventiva. Mesmo que incompleta a prova da excludente, havendo fortes indícios de sua existência à época da instrução, fica presente a restrição à prisão preventiva. A conclusão do processo será dada em momento oportuno. Nucci62 acredita que pode-se também, acrescentar dentre as circunstâncias que impedem a prisão preventiva, as excludentes de culpabilidade. Uma vez que estas, por analogia, também excluirão a existência de crime, invalidando a decretação de prisão preventiva.

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NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 627.


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9 DA EXCEPCIONALIDADE DA MEDIDA

A liberdade é a regra e a prisão a exceção, este é o entendimento conforme o princípio da presunção de inocência. Não podemos ver a prisão preventiva como pena ou tratá-la como tal. Como já dito anteriormente, seu caráter é estritamente instrumental e visa garantir o processo até o provimento definitivo. O Ministro Cezar Peluso, em voto no Supremo Tribunal Federal, alerta sobre a cautela que deve revestir a decretação desta medida: Medida extrema que implica sacrifício à liberdade individual, deve ordenarse com redobrada cautela, à vista, sobretudo, da sua função meramente instrumental, enquanto tende a garantir a eficácia de eventual provimento definitivo de caráter condenatório, bem como perante a garantia constitucional daproibição de juízo precário de culpabilidade, devendo fundar-se em razões objetivas e concretas, capazes de corresponder às hipóteses legais (fattispecie abstratas) que a autorizem. 63

Basileu Garcia dizia que a prisão processual é “uma medida violenta, apesar de seu cunho legal”. Por atingir a liberdade do indivíduo, deve a decretação da prisão preventiva ser tratada com extrema cautela, correspondendo às suas previsões legais mas também a eficácia que esta possa surtir.64 Sobre o caráter excepcional desta medida, o Ministro Marco Aurélio, destacou em julgado do Supremo Tribunal Federal: “PRISÃO PREVENTIVA – EXCEPCIONALIDADE. Em virtude do princípio constitucional da não culpabilidade, a custódia acauteladora há de ser tomada como exceção. Cumpre interpretar os preceitos que a regem de forma estrita, reservando-a a situações em que a liberdade do acusado coloque em risco os cidadãos ou a instrução penal. PRISÃO PREVENTIVA PRESUNÇÃO. A prisão preventiva há de estar lastreada em fatos concretos a atraírem a incidência do artigo 313 do Código de Processo Civil, descabendo partir para o campo das suposições, mormente contrariando a ordem natural das coisas. LIBERDADE PROVISÓRIA – AUSÊNCIA DE INCIDENTES. O fato de o acusado, simples acusado sem culpa formada, haver alcançado a liberdade ante liminar deferida, passando a atender, sem incidentes, aos chamamentos judiciais, respalda o direito de assim permanecer até o término 63

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC: 87041 PA, Relator: CEZAR PELUSO, Data de Julgamento: 29/06/2006, Primeira Turma, Data de Publicação: DJ 24-11-2006. 64 GARCIA, Basileu. Comentários ao código de processo penal anotado. Rio de Janeiro: Forense, 1945. p. 152.


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do processo-crime quando a prisão, se for o caso, resultar da execução do título judicial condenatório. 65

O Desembargador Santos do Amaral, em julgamento de HC, perante o Tribunal de Justiça do Distrito Federal, reforçou a ideia de que a liberdade é sempre a regra: HABEAS CORPUS. PACIENTES PRIMÁRIOS, DE BONS ANTECEDENTES, RESIDÊNCIAS FIXAS NO FORO DA CULPA E PROFISSÕES DEFINIDAS. OS OBJETOS SUBTRAÍDOS DAS VÍTIMAS SÃO DE PEQUENO VALOR. A LIBERDADE É A REGRA. A PRISÃO CAUTELAR A EXCEÇÃO. TESTEMUNHAS JÁ OUVIDAS. 66

Estas decisões demonstram que o Judiciário já vem se atentando a maneira errônea e banalizada com que a prisão preventiva vem sido tratada por alguns de seus integrantes. Devendo, portanto, estar afastada de convicções e pré-formação da culpa e intimamente ligada aos fatos e fundamentos concretos que possibilitem e justifiquem sua decretação. A prisão no curso do processo somente se justificará nas situações excepcionais, em que a liberdade do acusado compromete o regular prosseguimento e a eficácia da atividade processual. Odone Sanguiné, conclui: “em suma, há proibição constitucional de toda prisão provisória não dirigida à exigência de caráter cautelar, impostas ao imputado por uma simples suspeita de culpabilidade.” 67 Com o advento das novas medidas cautelares alternativas à prisão ficou ainda mais claro que a prisão deve ser a última medida para assegurar o processo, pois se tratando de uma medida extrema e excepcional deve ser evitada a todo custo, optando-se pela prisão quando esta for comprovadamente a única ou última medida possível para a garantia do processo. É o entendimento do advogado e doutrinador Aury Lopes Júnior, que em artigo publicado no portal jurídico Conjur, reafirma a necessidade de esgotamento de todas as outras medidas: [...] a prisão preventiva somente pode ser decretada quando inadequadas e insuficientes as medidas cautelares diversas, aplicadas de forma isolada ou cumulativa. Deveria o juiz ter afastado todas as possibilidades de eficácia das 65

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC: 92682 RJ, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 26/10/2010, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-233 DIVULG 01-12-2010 PUBLIC 02-12-2010. 66 BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal. HC: 20000020061400 DF, Relator: CAMPOS AMARAL, Data de Julgamento: 10/01/2001, Conselho da Magistratura, Data de Publicação: DJU 09/02/2001 Pág.: 22. 67 SANGUINÉ, Odone. Prisão provisória e princípios constitucionais. Fascículos de Ciências Criminais, Porto Alegre, ano 5, n. 2, p. 96-124, abr.-jun. 1992, p. 106.


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medidas cautelares diversas para, somente então, como último e derradeiro instrumento processual, lançar mão da prisão cautelar. 68

Um grande problema que permeia o judiciário é a banalização da prisão preventiva. A decretação da prisão preventiva é medida excepcional, devendo ser, quando utilizada, indispensável ao processo. A mera descrição do fato delituoso, desprovida de fundamentos e permeada por elementos insuficientes não pode justificar a utilização da medida. Outra questão preocupante é a utilização da medida como ferramenta de antecipação de pena, o que desvirtua completamente a função da medida cautelar, uma vez que esta é medida asseguratória, não punitiva, visando a proteção do processo, não a pena do acusado, que é característica da conclusão do processo, da sentença. Veja a posição do Ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal: A PRISÃO PREVENTIVA – ENQUANTO MEDIDA DE NATUREZA CAUTELAR – NÃO TEM POR OBJETIVO INFLIGIR PUNIÇÃO ANTECIPADA AO INDICIADO OU AO RÉU. - A prisão preventiva não pode – e não deve – ser utilizada, pelo Poder Público, como instrumento de punição antecipada daquele a quem se imputou a prática do delito, pois, no sistema jurídico brasileiro, fundado em bases democráticas, prevalece o princípio da liberdade, incompatível com punições sem processo e inconciliável com condenações sem defesa prévia. A prisão preventiva – que não deve ser confundida com a prisão penal – não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua decretação, mas destina-se, considerada a função cautelar que lhe é inerente, a atuar em benefício da atividade estatal desenvolvida no processo penal.”69

O Ministro Celso de Mello explicita a necessidade de que se diferencie prisão preventiva da prisão pena, não podendo em hipótese alguma a primeira ser utilizada como pena antecipada, o que seria incompatível com as prerrogativas de liberdade asseguradas pelo direito pátrio. Como apontado, a medida que priva a liberdade individual é sempre excepcional, principalmente quando de caráter instrumental, sem condenação ou formação da culpa, caso da prisão preventiva. O magistrado deve entender que a decretação da mesma deve estar revestida de real necessidade perante o caso concreto, de adequação à norma jurídico e principalmente de uma redobrada atenção ao fazer seu juízo. 68

LOPES JR. Aury. Prisão preventiva está para além de gostarmos ou não de Eduardo Cunha. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2016-out-28/limite-penal-prisao-preventiva-alem-gostarmos-ou-nao-eduardocunha>. Acesso em: 15. mar. 2017. 69 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC n.° 79.857 RTJ 180/262-264. Rel. Min. CELSO DE MELLO.


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10 O CLAMOR PÚBLICO E A PRISÃO PREVENTIVA

É de extrema importância para o presente trabalho ressaltar que o clamor público, a cobrança da sociedade, não legitimam a prisão preventiva. A medida cautelar visa sempre assegurar o processo. Não é ferramenta de controle ou satisfação popular. O magistrado atende aos interesses do processo. Como sabe-se, a mera existência do fato criminoso não é suficiente para justificar a prisão cautelar. Se assim fosse, milhares seriam presos instantaneamente, pelo simples motivo de estarem vinculados a crime grave ou de grande repercussão, sem sequer adentrar-se a fase probatória e a possibilidade de haver um justo processo. Para a população, leiga em direito, que muitas vezes acredita ser a justiça ineficaz e morosa, a primeira opção é quase sempre a punição. A vontade popular é, sumariamente, a pena. Deixa-se de lado o direito ao julgamento, à apuração da verdade, à justiça. Em sociedades violentas e desiguais, infelizmente, o que se observa é que parte da população tem visões radicais, acreditando mais na chamada “justiça com as próprias mãos”. Espera-se do Magistrado, como aplicador da lei, justamente estar desvinculado da opinião pública e sim atrelado à lei que deve conhecer e proteger. Se o Magistrado orienta-se pelo clamor público, passa a ser um cidadão comum, desconhecedor do direito, da liberdade e da cidadania pelas quais este devia zelar. É necessário bom senso e discernimento para entender quais medidas são realmente necessárias para assegurar o processo. Distinguindo a comoção popular da real gravidade do crime e periculosidade do agente. A mera indignação da sociedade não caracteriza por si uma ameaça à ordem pública. Discorrendo sobre o tema, o Ministro Celso de Mello do Supremo Tribunal Federal demonstrou em decisão: O CLAMOR PÚBLICO NÃO CONSTITUI FATOR DE LEGITIMAÇÃO DA PRIVAÇÃO CAUTELAR DA LIBERDADE. - O estado de comoção social e de eventual indignação popular, motivado pela repercussão da prática da infração penal, não pode justificar, só por si, a decretação da prisão


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cautelar do suposto autor do comportamento delituoso, sob pena de completa e grave aniquilação do postulado fundamental da liberdade. O clamor público precisamente por não constituir causa legal de justificação da prisão processual (CPP, art. 312) - não se qualifica como fator de legitimação da privação cautelar da liberdade do indiciado ou do réu, não sendo lícito pretender-se, nessa matéria, por incabível, a aplicação analógica do que se contém no art. 323, V, do CPP, que concerne, exclusivamente, ao tema da fiança criminal. Precedentes.70

Nos tribunais superiores já é consagrada a ideia de que o clamor público não constitui causa que justifique a prisão preventiva. Também no Supremo Tribunal, o Ministro Sepúlveda Pertence já havia ressaltado a impossibilidade de utilizar-se do clamor popular como elemento de motivação: I. Prisão preventiva: fundamentação: inidoneidade. Não constituem fundamentos idôneos à prisão preventiva a invocação da gravidade abstrata ou concreta do crime imputado, definido ou não como hediondo – muitas vezes, inconsciente antecipação da punição penal – ou no chamado clamor público: precedentes. (grifos nossos) II. Prisão preventiva: conveniência da instrução criminal. Regra geral, com o fim da instrução criminal, não há falar em sua conveniência para manter prisão preventiva. III. Prisão preventiva: a alegação de que o paciente é policial civil, per si, não constitui fundamento cautelar idôneo. 71

Um delito amplamente repercutido na sociedade afeta diretamente o Judiciário. Com o abalo da ordem pública, os olhos da mídia e da sociedade por vezes se voltam a figura do juiz, que como qualquer pessoa comum em uma profissão, sente-se pressionado para fazer seu trabalho da melhor forma. Sobre o tema, Nucci discorre da seguinte forma: Note-se, ainda, que a afetação da ordem pública constitui importante ponto para a própria credibilidade do Judiciário, como vêm decidindo os tribunais pátrios. Apura-se o abalo à ordem pública também, mas não somente, pela divulgação que o delito alcança nos meios de comunicação – escrito ou falado. Não se trata de dar crédito único ao sensacionalismo de certos órgãos de imprensa, interessados em vender jornais, revistas e chamar audiência para seus programas, mas não é menos correto afirmar que o juiz, como outra pessoa qualquer, toma conhecimento dos fatos do dia a dia acompanhando as notícias veiculadas pelos órgãos de comunicação. Por isso, é preciso apenas bom senso para distinguir quando há estardalhaço indevido sobre um determinado crime, inexistindo abalo real à ordem pública, da situação de divulgação real da intranquilidade da população, após o cometimento de grave infração penal.72 70

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 80.379-SP, Rel. Min. Celso Mello. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC nº 85.641, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, DJ de 03.06.2005. 72 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 622. 71


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A ordem pública não pode ser confundida, sob hipótese alguma com o clamor público. Observamos que em processos amplamente divulgados pela mídia e pela população, juízes vem usando da prisão preventiva como instrumento de satisfação popular. Nicolitt aponta que: Quando a prisão cautelar é dirigida a evitar a prática de infrações penais, ou tutelar a ordem pública, o clamor público, a ordem econômica, a ordem econômica, assegurar a credibilidade da justiça, o que se busca na verdade, diversamente da tutela do processo, é o controle social, a prevenção geral ou específica, que é objetivo da pena e não das medidas cautelares. 73

Privar de sua liberdade aquele que responde a processo penal ou é investigado pela suposta prática de infração, apenas para atender demanda do público é um erro grave. O clamor público não está previsto em nosso ordenamento jurídico como fundamento da prisão preventiva. A prisão cautelar não pode ser utilizada como ferramenta de controle da mídia opinião pública. Não é pertinente usar-se uma medida de caráter excepcional para satisfação da sociedade, pois este comportamento desvirtuaria sua real natureza.74

Em uma sociedade em que vigora o princípio da presunção de inocência, não podemos prisão processual para “acalmar” a opinião pública. Não é condizente com nosso ordenamento jurídico, nem com os direitos e garantias fundamentais do homem. A prisão não pode ter fins de prevenção, de antecipação de pena ou vingança. Conceder a prisão meramente por comoção social é antecipar a prisão, negar ao indivíduo o direito a produção de provas, ao contraditório, ao justo processo, à sentença judicial fundamentada, mesmo que condenatória. Aury Lopes Junior, em artigo veiculado no portal jurídico Conjur, expressou que “Processo Penal é um ritual de exercício de poder e, como todo poder, precisa ser condicionado e legitimado pela estrita, observância da principiologia cautelar e das regras da prisão preventiva”.75

73

NICOLITT, André Luiz. Processo penal cautelar: prisão e demais medidas cautelares. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 96. 74 LIMA, Renato Brasileiro de. Nova prisão cautelar. 1. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2011. p. 79. 75 LOPES JR. Aury. Prisão preventiva está para além de gostarmos ou não de Eduardo Cunha. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2016-out-28/limite-penal-prisao-preventiva-alem-gostarmos-ou-nao-eduardocunha>. Acesso em: 15. mar. 2017.


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A opinião popular muitas vezes desconhece os princípios e garantias constitucionais. Geralmente está maculada por sede de vingança dos criminosos, por indignação pela morosidade do Judiciário e impunidade de crimes altamente veiculados pela mídia. A justiça deve ser praticada de maneira rápida e eficiente para evitar os sentimentos de barbárie. Na doutrina de Sanguiné, o autor reitera a impossibilidade de associarmos a prisão preventiva com o clamor público: Na verdade, é inconstitucional atribuir à prisão preventiva a função de acalmar o alarma social ocasionado pelo delito, pois, por muito respeitáveis que sejam os sentimentos sociais de ‘vingança’, a prisão preventiva não está concebida como uma pena antecipada que possa cumprir fins de prevenção. Quando ainda não se determinou quem seja o responsável, somente raciocinando dentro do esquema lógico da presunção de culpabilidade poderia conceber-se a prisão preventiva como instrumento apaziguador das ânsias e temores suscitados pelo delito. Uma idéia desta natureza resulta insustentável em um sistema constitucional que acolhe um rigoroso respeito pelos direitos dos cidadãos e proclama a presunção de inocência. O caminho legítimo para aclamar o alarma social – essa espécie de ‘sede de vingança’ coletiva que alguns parecem alentar e por desgraça em certos casos aflora – não pode ser a prisão preventiva, encarcerando por qualquer motivo e ao maior número possível dos que prima facie apareçam como autores de fatos delitivos, mas uma rápida sentença de mérito, condenando ou absolvendo, porque somente a decisão judicial prolatada em um processo pode determinar a culpabilidade e a sanção penal. 76

Se a opinião popular está inclinada para a culpabilidade do acusado e o magistrado decide pela prisão cautelar para satisfazer a vontade do público, perde-se o caráter de prisão processual e aproxima-se da prisão pena, sanção esta que somente poderia ser imposta com a efetiva sentença condenatória. O professor Pedro Estevam Serrano, em artigo veiculado em revista periódica, exprime a seguinte opinião: Ora, prisão preventiva não serve para punir fatos pretéritos; ao contrário, tem justamente a finalidade de acautelar, proteger o processo de fatos graves, comprovados e ocorrentes no presente. Por isso, deve-se, no mínimo, suspeitar de que esteja ocorrendo nesta situação uma grave inconstitucionalidade, o que não contribui em nada para o bom funcionamento do Estado democrático de Direito. […] A banalização da prisão cautelar, antes aplicada, sobretudo, para segregar a pobreza, agora se estende aos setores incluídos economicamente. Em ambos os casos, caracteriza-se como típica medida de exceção. […] Prisões não devem ser feitas de forma ‘pedagógica’, guiadas pelo clamor social, mas sim na forma 76

SANGUINÉ, Odone. A inconstitucionalidade do clamor público como fundamento da prisão preventiva. Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, São Paulo, ano 9, n. 107, out. 2001.


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da lei. Não haver seletividade é fundamental, mas somente quando se acerta.77

Concordamos com o pensamento do professor supracitado. As prisões jamais podem ser feita de maneira pedagógica, para responder a apelo da sociedade ou demonstrar poder e severidade para esta. A função do Judiciário não é de “mostrar serviço” ao público, mas sim de fazer a verdadeira justiça. Tornaghi afirma que: [...] ao contrário, portanto, da prisão como pena, que é retributiva, que se baseia na responsabilidade do acusado, que é injusta para o inocente, a prisão provisória é cautelatória, funda-se na necessidade de chegar a uma solução correta e é justa de que o bem comum a exija. 78

Ocorre que, o Magistrado por vezes não consegue lidar com a notoriedade que adquire ao encabeçar um processo célebre. O juiz deve decidir sempre de acordo com a lei, nunca permitindo que a opinião popular e o constante assédio da mídia comprometam sua imparcialidade e influenciem em sua opinião. O controle da vontade popular não é papel do juiz, muito menos cabe a ele satisfazê-la. Na visão de Gomes Filho79 usar da prisão cautelar pra aplacar o alarme social se aproximaria da ideia de justiça sumária. Enquanto Choukr80 aduz que estaria tomada de inconstitucionalidade, próxima a ideia de desordem e às custas da liberdade individual. Tanto a doutrina quanto a jurisprudência, dando especial atenção a diversas decisões do Supremo Tribunal Federal, são certeiras ao deslegitimar o clamor público como elemento permissivo à prisão. Mesmo sendo um entendimento pacífico, o que se vê, infelizmente, é que muito ainda tentam infiltrar o clamor público no conceito de garantia de ordem pública, na tentativa de deturpar seu significado. Na importante lição de Sanguiné

77

SERRANO, Pedro Estevam. Eduardo Cunha e a banalização da prisão preventiva. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/politica/eduardo-cunha-e-a-banalizacao-da-prisao-preventiva.1>. Acesso em 22. Fev. 2017. 78 TORNAGHI, Hélio. Instituições de direito penal. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1978. p. 147. 79 GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Presunção de inocência e prisão cautelar. São Paulo: Saraiva, 1991. p. 68. 80 CHOUKR, Fauzi Hassan. Código de processo penal: comentários consolidados e crítica jurisprudencial. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 499-500.


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Seria errôneo considerar que a prisão preventiva possa cumprir com o fim de dar satisfação ao público sentimento de justiça, ante o qual é suficiente processar penalmente o imputado. Na prática, todavia, a autoridade judicial se inspira às vezes nestes falsos critérios, como se a justiça fosse servidora da política ou, pior, da demagogia. Antes que seja comprovada a perigosidade do imputado, tampouco é possível utilizá-la com tais finalidades: o que basta para rechaçar esta concepção da prisão preventiva entendida como mesure de sûreté.81

Entendemos que não cabem no Judiciário brasileiro figuras heroicas e mitológicas, responsáveis por atender os anseios de justiça e celeridade processual da população. É necessário para a justiça um juiz sério, imparcial, intimamente ligado com as provas presentes nos autos. Deve ele ser capaz de prover uma fundamentação completa, de qualidade, pertinente ao caráter cautelar. A garantia de ordem pública prevista pela legislação não se confunde com o clamor público e possuem significados bastante distintos. Não se pode decidir pela privação de liberdade do investigado motivando-se apenas pela insatisfação social, o que seria um atentado grave à presunção de inocência e retorno à época de justiça sumária.

81

SANGUINÉ, Odone. A inconstitucionalidade do clamor público como fundamento da prisão preventiva. Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. São Paulo, ano 9, n. 107, out. 2001.


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11 O CONFRONTO DA PRISÃO PREVENTIVA EM FACE AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

Chegamos ao ponto principal do presente trabalho, que tem por objetivo demonstrar o conflito existente entre a prisão preventiva o princípio constitucional da presunção de inocência. Sem a abordagem dos temas anteriores, do princípio da presunção em afinco, do regimento e das críticas ao instituto do tão polêmico instituto da prisão preventiva, não seria possível chegar até este debate. Nossa Carta Magna institui a regra de que “ninguém será levado a prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança” (artigo 5 o, inciso LXVI, da Constituição Federal). O inciso LVII do mesmo artigo estabelece regras para o tratamento do acusado no decorrer do processo penal, afirmando a obrigatoriedade desde ser tratado como inocente enquanto não sobrevier condenação penal definitiva. A consequência deste dispositivo é a preservação da liberdade do acusado. A presunção de inocência, ou presunção de não-culpabilidade, visa proteger a liberdade e inocência do acusado de juízos de mera probabilidade ou convicção, estabelecendo que somente a certeza por determinar uma condenação. A regra é que não deve o acusado provar sua inocência, mas sim o acusador que porta a obrigação de provar a culpa do acusado. Impondo ao acusador o ônus da prova, deve este comprovar todas afirmações sobre o acusado, sob a pena de resolver-se o processo em favor do acusado caso aquele não consiga sanar todas as dúvidas pertinentes ao caso. Na dúvida, decide-se em favor do réu (in dubio pro reo). Para que o princípio da presunção de inocência seja devidamente eficaz, exige-se respeito para com a pessoa do acusado, devendo este ser tratado com a dignidade inerente ao indivíduo inocente. Não pode o acusado receber o mesmo tratamento daquele que já possui uma condenação.


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A presunção de inocência assegura que enquanto não culpado, o acusado terá o máximo de direitos preservados o possível. Pelo seu status de inocente, deve ter seus direitos como tal, respeitados, podendo sofrer ação restritiva de direitos desde que essa configure medida excepcional. Souto de Moura leciona: Ora, a presunção de inocência parece ter sido o expediente prático que permitiu configurar o tratamento processual do arguido em termos de manutenção do maior número de direitos possível. Em termos tais, que a negação dos direitos que o próprio funcionamento do ‘jus puniendi’ exija, será encarada como verdadeiramente excepcional. 82

Este princípio demonstra que, a prisão daquele sob o qual a culpa não está provada, ou seja, o presumidamente inocente, deve ocorrer somente em situação extremamente necessária, calcada em justificativas reais e devidamente motivadas. É imperioso para nossa Constituição e nossa democracia evitar que o acusado seja tratado como condenado. Na visão de Rogério Schietti Machado Cruz 83, a liberdade provisória é manifestadamente uma das características do princípio de inocência no processo, apontando a expressão de Martins Batista: “direito à coerção mais benigna”. 84 O princípio da não-culpabilidade assegura ao acusado o respeito e a dignidade quando este adentra o processa, permitindo que não seja prontamente tratado como condenado antes de efetiva condenação, o que é basilar para que exista um direito justo e democrático a todas as partes que venham a integrar a relação processual. Nesse sentido, da importância do princípio para o direito em si, mas também para a proteção do indivíduo perante o poder punitivo, Gomes Filho ressalta: […] se de um lado a própria existência da imputação caracteriza, por si só, uma condição de desvantagem do cidadão em face do poder punitivo estatal, a afirmação constitucional dos princípios de presunção de inocência e do ‘devido processo legal’ destina-se a contrabalancear essa carga negativa, indicando ao juiz não apenas uma atitude em face do acusado, ou uma regra de julgamento na hipótese de dúvida, mas o próprio modo pelo qual deve 82

MOURA, José Souto de. A questão da presunção de inocência do arguido. In: Revista do Ministério Público, Lisboa, no. 32, pp. 31-47, 1990. 83 CRUZ, Rogério Schietti Machado da. Prisão cautelar: dramas, princípios e alternativas. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2006. p. 69. 84 MARTINS BATISTA, Weber. Liberdade provisória. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 36.


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realizar-se a atividade processual, através da integração do direito ao processo com os direitos no processo.85

A redação do art. 5o, inciso LVII da Constituição Federal dispõe que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Este texto servia de parâmetro para dar-se início a execução da pena e também como marco final para a proteção do princípio de presunção inocência, porém este preceito constitucional veio a ser fragilizado recentemente em decisão do Supremo Tribunal Federal, medida esta amplamente criticada por aqueles que defendem a imperiosidade da presunção de inocência. A Convenção Americana de Direitos Humanos (incorporada pelo direito brasileiro pelo Decreto no 678/92), em exposição diferente da Carta Magna, aponta que “Toda pessoa acusada de delito tem direito que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa.” Nesse caso a situação limítrofe da presunção de inocência não estaria vinculada ao trânsito em julgado da sentença, mas sim à sua condenação definitiva, ou seja, a comprovação de sua culpa, o que encerraria a proteção da garantia constitucional. Opondo-se à presunção de inocência, alguns autores viriam a contestar este princípio, como Manzini, que afirmava: “Enquanto pendente um procedimento, não há nem um culpado, nem um inocente, mas somente um acusado: somente no momento em que sobrevém a sentença se saberá se o acusado é culpado ou se é inocente.” 86 Apesar de muitas vezes pertinentes as críticas, pois havendo indícios seria natural presumir a culpa do acusado. O princípio da presunção de inocência resiste justamente por uma questão mais social e política do que lógica. Não importa se o acusado é realmente culpado ou não, mas sim que enquanto não houver condenação ele não poderá ser tratado como tal. Martins Batista se coloca defendendo a tese de que não se trata de presunção de inocência ou defesa da mesma, mas sim de evitar uma prévia culpabilidade, na sua lição: […] considerar alguém não culpado, implica presumi-lo inocente, mas o só dizer que ‘não se considera’ alguém culpado, não tem outro significado senão o de negar qualquer presunção de culpabilidade em seu desfavor. A

85

GOMES FILHO, Antônio Magalhães. Presunção de Inocência e prisão cautelar. São Paulo: Saraiva, 1991. p. 48. 86 MANZINI, Vincenzo. Trattato di diritto processuale penale italiano. 3. ed. Torino: UTET, 1949. p. 197.


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exclusão do juízo de culpabilidade não impõe, necessariamente, a inclusão do de inocência.87

Mesmo havendo discordâncias quanto a expressão presunção de inocência perante o acusado, este princípio é extremamente válido, estando sua nomenclatura incorreta ou não. Mais do que proteger o status de inocência do acusado, o princípio serve também para repelir a presunção de culpa dele. Trata-se principalmente de garantir o respeito e a dignidade do acusado enquanto este desta forma permanecer, diferenciando-o do condenado definitivo. Evitando assim abusos e punições pertinentes à pena, não ao processo. Após estes elementos do princípio expostos. Aproximo-me do princípio da presunção preventiva e o íntimo confronto deste com as prisões provisórias. Um pensamento importante para começar a discutir a temática é o de Ibañez, que o abordou de maneira polêmica da seguinte forma: Trata-se em suma, de reconhecer que não existem práticas limpas da prisão provisória; (…) Pois, do princípio ao fim, a prisão provisória é sempre e já definitivamente uma pena. E é precisamente antecipando, de iure e de facto, esse momento punitivo que cumpre o fim institucional que tem objetivamente fixado. (…) Se o processo penal vigente na generalidade dos países pode permitir-se ser como é, mantendo o extraordinário grau de infidelidade ao modelo ideal-constitucional, o impressionante nível de desfuncionalidade e divergência em relação aos fins proclamados nesse plano, que o caracteriza, é porque a prisão provisória – e com ela o processo – ocupa, em notável medida e não de maneira acidental, o lugar da pena, e absorve boa parte do papel repressivo que a esta jurídico-formalmente corresponde.88

A discussão entre a comunidade jurídica sobre a constitucionalidade da prisão preventiva é bastante acalorada. É certo que não podemos enxergar a prisão preventiva como compatível ao princípio de presunção de inocência, ou não-culpabilidade se a decretação desta prisão são estiver revestida de fundamentos e fatos legítimos e concretos. A aplicação prisão só pode atingir o êxito se observadas todas as formalidades e requisitos jurídicos a ela pertinentes. Para a plena aplicação da lei não espera-se apenas a conformidade com os parâmetros legais, mas também a sensibilidade e a razoabilidade do 87

MARTINS BATISTA, Weber. Liberdade provisória. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 30. IBAÑEZ, Perfecto. Presuncion de inocencia y prision sin condena. Revista de Ciencias Penales, no. 13, agosto/1997. 88


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Magistrado, que sopesará os elementos jurídicos, mas também fáticos aliados a real necessidade da medida. Muito se questiona também, da prisão processual para garantir a ordem pública ou econômica estaria se antecipando a pena do acusado, uma vez que o que tutela estes elementos é a pena, não podendo relacionar a ordem pública e econômica com garantia do processo. Nicolitt aponta que: [..] o processo cautelar é instrumental, ou seja, serve apenas para tutelar o processo de conhecimento ou execução. Qualquer forma satisfativa de tutela jurisdicional, sob o nome cautelar, viola a presunção de inocência. Desta forma, não se pode, sob o nome cautelar, pretender qualquer outro objetivo que não a tutela do próprio processo (de conhecimento ou execução), sob a pena de se antecipar pena ou dar tratamento que diminua social, moral ou fisicamente o acusado diante de outras pessoas que não respondem ao processo.89

O autor ressalta que a garantia pública de que trata o art. 312 do Código de Processo Penal é a finalidade da pena, não da medida cautelar. Tratando-se de grave afronta ao princípio da presunção de inocência e um dispositivo, portanto, inconstitucional. Afirma, ainda, que há um verdadeiro atentado à dignidade da pessoa humana, pois utilizar da prisão cautelar para garantir estes conceitos vagos e indeterminados que permeiam estes dispositivos, “fere de morte o próprio imperativo Kantiano, eis que desconsiderado o indivíduo como sujeito de direitos e fi em si mesmo, instrumentalizando-o, viola-se frontalmente a cláusula fundamental da dignidade da pessoa humana, prevista no art. 1., III da CF/1988.”90 Não só a prisão preventiva para garantia da ordem pública e econômica está enveredada por dúvidas e críticas da doutrina, mas também a prisão utilizada meramente para identificação do acusado. Apesar do ideal de “prisão para identificação” ser majoritariamente execrado pela doutrina pátria, a Lei de no. 12.403/2011 trouxe dispositivo reafirmando algo que já se considerava obsoleto.

89

NICOLITT, André Luiz. Processo penal cautelar: prisão e demais medidas cautelares. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 96. 90 NICOLITT, André Luiz. Processo penal cautelar: prisão e demais medidas cautelares. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 97.


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Na atualização da nova lei supramencionada, no parágrafo único do art. 313 do Código de Processo Penal, está determinado: Parágrafo único. Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se ora hipótese recomendar a manutenção da medida.

Prender o acusado ou indiciado, seja qual for o seu delito e a possível pena imputada apenas para satisfazer dúvida que poderia ser saciada por outros meios é uma medida extrema, vez que a prisão tem caráter excepcional, não podendo ser utilizada de maneira banal apenas para realizar averiguações. Trata-se de uma medida questionável e acometida de falhas práticas. Devendo o legislador ao menos ter determinado qual espécie de crime, periculosidade do agente, ou quantidade de pena mínima que permitiria uma pessoa ser presa para a realização de uma mera identificação. É importante acrescentar a essa discussão o crescente problema da superlotação das prisões no Brasil, aliado ao fato de que significativa parte destes encarcerados são presos provisórios enfrentando o grave problema da paralisação e lentidão de seus processos e a não separação destes dos presos já condenados. O art. 300 do Código de Processo Penal dispõe que: “As pessoas presas provisoriamente ficarão separadas das que já estiverem definitivamente condenadas, nos termos da lei de execução penal.” No entanto, com todos os problemas de superlotação e falta de infraestrutura nas prisões, sabemos que esse dispositivo nem sempre é respeitado. Em dados contabilizados através de um relatório do Infopen (Sistema Integrados de Informações Penitenciárias), divulgado pelo Ministério da Justiça em 2015, o Brasil somava ao todo 607.731 pessoas encarceradas à época.91

91

Folha On Line. População carcerária cresce 7% ao ano e soma hoje 607 mil pessoas. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2015/06/1646639-com-607-mil-presos-brasil-tem-a-4-maiorpopulacao-carceraria-do-mundo.shtml>. Acesso em: 15. Mar. 2017.


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Os números são preocupantes, pois analisando o ritmo com que os números de presos vem crescendo desde o ano 2000, é possível que até 2022 o país atinja a alarmante marca de um milhão de presos. Sabe-se que nosso país passa por uma grave crise de superlotações em suas penitenciárias, sendo insuficientes a quantidade de vagas disponíveis para abrigar todos estes presos. Em cerca de um quarto dos presídios nacionais, a proporção é de mais de dois presos por vagas, estatística esta alarmante. Este estudo aponta, ainda, que quatro em cada dez presos são provisórios, ou seja, submetidos a alguma medida cautelar. Estão detidos sem terem sido julgados ainda. Esse dado mostra o quando a morosidade da prisão preventiva e a banalização da mesma, agrava seriamente a crise no sistema carcerário brasileiro. A duração prolongada e injustificada da prisão preventiva ofende não somente o princípio da presunção de inocência, mas também o da dignidade humana. A prisão sem julgamento e condenação já deve ser evitada ao máximo possível, prolongando-se abusivamente este cárcere é ainda mais gravoso e aproxima-se da prisão pena, afastando-se da prisão cautelar. Como já dito anteriormente neste trabalho, a antecipação de pena não é o objetivo da cautelar, mas sim o prosseguimento do processo, para que o acusado tenha assegurado seu direito a uma sentença sobre os fatos que lhe foram imputados. O princípio da presunção de inocência não impede a prisão do acusado antes da sentença condenatória, mas ajuda a fiscalizar essas medidas cautelares privativas de liberdade, sempre alertando do caráter de excepcionalidade que as revestem. A prisão marca o indivíduo que ainda está sendo processado com o rótulo da culpa, antes mesmo desta estar confirmada. Por isso é importante que a prisão efetuada antes da sentença condenatória definitiva seja realizada apenas em circunstâncias excepcionais e justificadas. Ao estabelecer a inocência como regra de tratamento do acusado, o princípio firmou também o entendimento de que a regra é a preservação e proteção da liberdade do acusado. A


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prisão resta apenas para casos excepcionais, que tenham sua necessidade propriamente demonstrada. Neste sentido, nossa posição assemelha-se à de Nicolitt, que assevera: “[…] a prisão só é compatível com o princípio da presunção de inocência quando tem por objetivo a preservação do processo, pois o contrário transforma-se em antecipação da pena”.92 Concordamos perfeitamente com a posição de Nicolitt. Entendemos que a prisão cautelar somente será condizente com o princípio da presunção de inocência quando possuir o caráter de preservação do processo, caso contrário seria na verdade uma antecipação da prisão pena. O princípio da presunção de inocência encontra respaldo na Constituição Federal de 1988. Suas disposições em nossa Carta Magna permitiriam que o princípio fosse aplicado de maneira efetiva e próspera em nosso sistema. A grande preocupação é que nossos operadores do direito tenham a sensibilidade e razoabilidade para aplicá-lo. Se não aplicado com a devida cautela e habilidade, o princípio pode assumir caráter inefetivo ou equivocado. É necessário que os direitos fundamentais e garantias presentes em nossa Constituição sejam mais do que preceitos a serem observados e respeitados, mas princípios a serem tratados com suma importância, norteando todas as decisões judiciais e inspirando a aplicação de todas as outras normas jurídicas. A presunção de inocência, portanto, pode coexistir pacificamente com a prisão preventiva. Basta notarmos que o primeiro preserva liberdade e as garantias processuais do acusado, e a segunda é a exceção a este princípio. Pela prisão ser uma exceção, uma medida excepcional, deve ser utilizada que houver a real necessidade, cautelosamente. Para que possamos realizar este juízo de necessidade, basta contrapô-lo à presunção de inocência. Tratando-se de caso verdadeiramente excepcional que ameaça o processo, pode ser aplicada a prisão cautelar.

92

NICOLITT, André Luiz. Processo penal cautelar: prisão e demais medidas cautelares. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 69.


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CONCLUSÃO

O presente trabalho tratou do princípio da presunção de inocência, ou da nãoculpabilidade, instrumento jurídico necessário para garantir um processo mais justo e imparcial, viabilizando uma regra de tratamento processual, em que o acusado não será considerado até sentença definitiva que o condene. Se de um lado está o poder punitivo estatal, do outro estão as garantias e liberdades constitucionais do indivíduo. O princípio da presunção de inocência impossibilita que a culpabilidade seja antecipada, ou seja, atribuída ao acusado sem o justo processo e sua efetiva condenação definitiva. O princípio não impede a prisão cautelar, aquela realizada durante o processo sem que haja condenação definitiva, mas atua também para limitá-la e exigir que seja utilizada com moderação, cautela e fundamentação plena. A presunção de inocência assegura o tratamento do indivíduo no decorrer do processo, protegendo-o do poder punitivo do Estado e de juízos de culpabilidade antecipados. É perfeitamente possível que o Magistrado respeite a presunção de inocência ao decretar a prisão preventiva. Desde que se atente não apenas a presença de seus pressupostos legais, mas também aos detalhes do caso concreto, sua necessidade e sua admissibilidade. Se aplicada de forma correta e justa, observada sua excepcionalidade, a prisão não obrigatoriamente será uma afronta ao princípio. Nota-se que fundamentação idônea do juiz não consegue se sustentar apenas com o mero apontamento dos fatos presentes e fundamentação jurídica, espera-se do magistrado que use de usa sensibilidade e razoabilidade como aplicador da lei, comprovando a necessidade e adequabilidade da medida. A fundamentação adequada para a restrição da liberdade é mais do que um direito do acusado, é um exercício de justiça, de cidadania e de respeito à dignidade humana do acusado. A liberdade é um bem inestimável, um direito e uma condição humana.


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A prisão é sempre medida excepcional, que deve ser tomada com cautela. Se a prisão preventiva não atende aos requisitos de cautelaridade e preservação do processo, perde seu caráter de medida cautelar e aproxima-se da prisão pena, o que cerceia as garantias individuais do acusado e ofende a tão duramente conquistada presunção de inocência.


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