Genética

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MAURO BITTENCOURT

Genética A Genética é ciência que estuda a hereditariedade das características de uma determinada espécie através das gerações. Estas características são transmitidas através dos genes, presentes nos cromossomos dos seres vivos. O gene (ou gen) é o segmento do cromossomo, responsável por uma determinada característica. Normalmente eles aparecem em pares, sendo cada um deles herdado de um dos pais. A esses pares dá-se o nome de alelos. Estes alelos podem ser dominantes ou recessivos. Os alelos dominantes são aqueles que se expressam quando aparecem em homozigoze (os dois alelos iguais) ou em heterozigoze (alelos diferentes), porém os alelos chamados de recessivos só se expressam quando ocorrem e homozigoze. Para a indicação dos alelos convencionou-se que se deve usar uma letra, preferencialmente a primeira letra da característica recessiva em questão. Para os alelos dominantes utiliza-se a letra maiúscula e para as recessivas a letra minúscula. Os cromossomos são as estruturas responsáveis pelo transporte e armazenamento dos genes, localizando-se no núcleo das células. Nos seres humanos aparecem em número de 46, sendo 23 de origem paterna e 23 de origem materna. Os cromossomos aparecem sempre em pares, sendo chamados de cromossomos homólogos aqueles que correspondem ao mesmo par. Dos pares humanos podemos denominar de um a 22 de autossomos e o 23 de cromossomos sexuais ou alossomos. Segundo a história, a primeira pessoa a estudar a interação dos genes foi o monge austríaco Gregor Mendel, por volta de 1857, utilizando ervilhas de cheiro. Após anos de observações Mendel percebeu que algumas sementes apresentavam características distintas como a cor (verde ou amarela) e a forma (lisa ou rugosa). Após quase 10 anos de experimentos, Mendel concluiu que essas características eram passadas de geração e, geração por fatores existentes nas plantas. Estes “fatores” que Mendel se refere seriam os genes existentes nas células da planta.

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Seu experimento foi realizado de forma simples, onde o próprio Mendel polinizava as plantas, cortando seus estames, e fazendo com que indivíduos com diferentes características “trocassem” seus genes e gerassem herdeiros diferentes. Através de seus experimentos Mendel postulou duas leis que até hoje norteiam os estudos dos genes e suas interações.

OUTROS CONCEITOS IMPORTANTES: •

Genótipo – constituição genética do indivíduo; indica quais genes estão presentes em seus cromossomos.

Fenótipo – expressão do genótipo; características do ser determinadas pelos seus genes. Pode ser alterada pela interação com o meio ambiente.

Locos gênico – lugar do cromossomo onde se localiza um determinado alelo.

Genoma – conjunto de genes existentes em todos os cromossomos

PRIMEIRA LEI DE MENDEL – Segregação dos fatores Através de suas observações Mendel viu que os genes ocorriam sempre em pares, e que estes pares se dividiam na formação dos gametas, de modo que a prole de um indivíduo carregasse metade de seu patrimônio genético. A primeira Lei de Mendel, ou Lei da Segregação dos Fatores, diz que “cada caráter é determinado por um par de fatores que se segregam (separam) durante a formação dos gametas (gametogênese), onde aparecem em dose simples”. Atualmente, com o avanço da ciência, e o estudo mais detalhado do comportamento dos cromossomos pode-se enunciar esta mesma lei de outro modo; “o dois alelos de um gene separam-se um do outro durante a formação das células sexuais, de modo que metade dos gametas carrega um dos alelos e a outra metade o outro alelo”.

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TIPOS DE DOMINÂNCIA Nos experimentos de Mendel, com as ervilhas, o caráter amarelo sempre prevaleceu sobre o caráter verde, caracterizando uma dominância completa. Porém, o próprio Mendel observou que o fenômeno da dominância não é aplicável a todos os caracteres. Um exemplo é o tamanho do pedúnculo da flor, que às vezes apresentava um tamanho intermediário (médio), o que dificultava a classificação dos heterozigotos.

1 – Dominância Completa: quando se cruzam dois indivíduos homozigotos, sendo um dominante e outro recessivo, o caráter dominante prevalece. Bioquimicamente, pode-se dizer que o gene dominante codifica uma enzima funcional que expressa determinada característica, enquanto o recessivo não codifica nenhuma enzima. 2 – Dominância Incompleta: neste tipo de dominância o indivíduo heterozigoto apresenta uma característica intermediária em relação aos genótipos dominante e recessivo. Nestes casos é possível identificar os genótipos em função as simples observação do fenótipo. O maior exemplo da ocorrência deste tipo de dominância é a flor maravilha (Mirabilis jalapa) que apresenta três variedades de cor, as homozigotas branca e amarela e a heterozigota rósea. 3 – Co-dominância: É freqüentemente confundida com a dominância incompleta, apesar da diferença clara entre as duas. A co-dominância ocorre quando os dois alelos são ativos de forma independente, ou seja, o individuo híbrido expressa as duas características. O maior exemplo é o gado da raça shorthorn, onde o cruzamento de um animal de pelos brancos com um de pelos vermelhos origina uma prole malhada. Norma de reação do genótipo: dependendo da forma como reage com o ambiente, um genótipo pode originar um ou mais tipos de fenótipos. Esse fenômeno é conhecido como norma de reação. Um exemplo deste caso é o gato siamês, que apresenta pelagem preta nas patas, focinho e pavilhão auricular, com contraste com a pelagem branca do restante do corpo.

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RETROCRUZAMENTO Ocorre quando se cruza um indivíduo da geração F1 com seu progenitor (geração P) recessivo, tendo o resultado do cruzamento 50% de indivíduos heterozigotos e 50% homozigotos recessivos.

CRUZAMENTO-TESTE É usado para determinar se um individuo de genótipo desconhecido é homozigoto ou heterozigoto. Para isso, basta cruzar o individuo desconhecido com um homozigoto recessivo. Se o resultado do cruzamento for 100% de indivíduos com o fenótipo dominante, o desconhecido é dominante.

LETALIDADE GÊNICA Estes genes letais causam a morte dos indivíduos ainda no período embrionário, ou durante o desenvolvimento, o que causa proporções diferentes do monoibridismo clássico. O caso clássico de letalidade gênica é representado pelos camundongos, onde o cruzamento de pelo amarelo domina o pelo cinza, porém, não existem indivíduos de pelos amarelos homozigotos, pois este gene é letal em homozigose.

GENEALOGIA OU HEREDROGRAMA O heredrograma, ou árvore genealógica, é um conjunto de símbolos que representa a transferência de um caráter através das gerações. É uma representação gráfica de um determinado caráter de família. Na representação cada geração é identificada por um numeral romano e seus indivíduos devem estar alinhados horizontalmente, e cada um de seus membros deve ser identificado por um algarismo arábico. Os símbolos utilizados seguem uma convenção, de acordo com a figura abaixo.

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PROBRABILIDADE GENÉTICA Probabilidade é a aplicação estatística mais utilizada pela genética, pois permite calcular os resultados esperados em uma descendência. Esta probabilidade é obtida pelo número de vezes que um evento ocorre em relação ao número total de eventos. Probabilidade = n° de eventos esperados Total de eventos

A probabilidade genética obedece quatro regras básicas: 1 – Regra do OU – eventos mutuamente exclusivos: se a ocorrência de um evento exclui a possibilidade da ocorrência de outro, deve ser utilizada a Lei da Soma das Probabilidades. Quando dois eventos são mutuamente exclusivos, a probabilidade que ocorram é fornecida pela soma das probabilidades de que cada um deles ocorra em separado. Na prática aplica-se a “regra do OU”, que usa a fórmula P=p1 + p2. 2 – Regra do E – eventos independentes: para determinar a probabilidade de ocorrência de dois eventos independentes ocorrerem ao mesmo tempo, usa-se a Lei do Produto das Probabilidades. Ela consiste no produto das probabilidades da ocorrência dos eventos em separado. Na prática é aplicada a “regra do E”, com a fórmula: P=p1 x p2. 3 – Probabilidade condicional: é um tipo especial de probabilidade de eventos independentes, em que se tem apenas uma parte das informações necessárias para a resolução do problema. De modo geral já existe uma

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condição previamente estabelecida, não sendo necessário o preenchimento de outras características. 4 – Probabilidade com combinação de eventos: quando precisamos identificar a probabilidade de que determinados eventos possam ocorrer, utilizamos a distribuição binomial, pois estes eventos comumente esses problemas envolvem apenas dois eventos, como por exemplo, a determinação do sexo. Neste caso é aplicada a seguinte fórmula: n! Cpn = p!(n-p)!

Onde: C = n° de combinações, n = número total de eventos, p = eventos alternativos.

SEGUNDA LEI DE MENDEL (SEGREAÇÃO INDEPENDENTE) Ao iniciar seus experimentos, Mendel trabalhou com apenas uma característica de cada vez. Logo após ter dominado a transmissão de cada caráter, ele observou a transmissão simultânea de dois caracteres. Ao cruzar as ervilhas, Mendel observou que as características não apareciam obrigatoriamente associadas em seus descendentes. Isso fez com que ele levantasse a seguinte hipótese: “a cor e a forma da semente são determinadas, cada uma, por um par de fatores transmitidos de modo independente”.

OS ESPERIMENTOS Mendel removia o pólen das flores de ervilhas amarelas e lisas (VVRR) e a transferia para o estigma de flores de ervilhas verdes rugosas (vvrr), obtendo somente sementes amarelas e lisas (heterozigotas – VvRr). Sem interferir no processo de reprodução da prole (VvRr), ele permitia a autopolinização das plantas. Após a autopolinização, ele colhia, selecionava e contava as sementes, tendo descendentes na proporção 9:3:3:1. Após a interpretação dos resultados, Mendel formulou sua segunda lei, ou Lei da Distribuição (Segregação) Independente: “Os genes para dois ou mais caracteres não se fundem no heterozigoto, mas se distribuem independentemente para os gametas, onde se recombinam ao acaso”.

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Após o estudo do comportamento dos cromossomos na meiose, esta segunda lei pode ser enunciada da seguinte maneira: “Na meiose, durante a formação

dos

gametas,

os

dois

pares

de

genes

se

separam

independentemente e se recombinam ao acaso, desde que estejam localizados em cromossomos diferentes”.

FÓRMULAS DO POLIIBRIDISMO O mesmo principio utilizado na segregação independente (segunda lei de Mendel) pode ser utilizado no poliibridismo. Nas análises dos híbridos mais complexos pode-se determinar o número de gametas, genótipos e fenótipos e indivíduos formados em F2 a partir de fórmulas simples.

Fórmula

O que determina?

n

Número de pares de genes em heterozigose

2n

Número de gametas Número de fenótipos com dominância

3n

Número de fenótipos sem dominância Número de genótipos

4n

Número de indivíduos

POLIALELIA OU HERANÇA MÚLTIPLA Alem dos tipos de determinismos genéticos previstos pelas leis de Mendel, existe a polialelia, com determinismos não previstos no mendelismo. Nesse tipo de herança a característica depende de uma série de alelos do mesmo gene em um determinado lócus. Um exemplo de polialelia é observado nos coelhos, que apresentam quatro genes alelos para um mesmo lócus gênico. Entre estes genes há uma relação de dominância que obedece a seguinte ordem: C>cch>ch>ca. Os genes determinam as seguintes cores: •

Aguti (preto ou marrom escuro) → C;

Chinchila (cinza claro) → cch

Himalaia (branco com extremidades escuras) → ch

Albino (branco com olho vermelho) → ca

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GRUPOS SANGUÍNEOS DO SISTEMA ABO Em 1900 o austríaco Karl Landsteiner descobriu que o sangue humano apresenta 4 diferentes grupos. Sua descoberta ocorreu através de um simples experimento onde ele misturou sangue de algumas pessoas com o soro de outras, obtendo reações de aglutinação em algumas misturas. Diante destas reações Landsteiner classificou o sangue humano em seus grupos atuais, que são: A, B, AB e O. Atualmente se sabe que os grupos sangüíneos são determinados geneticamente, sendo condicionados por três alelos, os co-dominates IA e IB, que codificam os aglutinogênios A e B respectivamente e o recessivo i que não codifica nenhum aglutinogênio. Estes genes estão localizados próximo a extremidade do braço longo (braço q) do cromossomo 9. A determinação do tipo sangüíneo segue a associação mostrada na tabela abaixo: Aglutiogênio

Genótipo Fenótipo

nas Moderno

Clássico

O

OO

A

Aglutinina no plasma

ii

Hemácias Nenhum

Anti-A e anti-B

AA ou AO

IAIA ou IAi

A

Anti-B

B

BB ou BO

IBIB ou IBi

B

Anti-A

AB

AB

IA IB

AeB

nenhum

Para transfusões sangüíneas deve ser seguida a classificação acima para observar a compatibilidade entre o doador e o receptor, já que na transfusão ocorre a transferência maciça de aglutinogênio, enquanto apenas uma pequena parte de aglutinina é transferida.

FATOR Rh Em 1940 Karl Landsteiner e seu colanorador norte-americano Alexander Wiener descobriram o fator Rh através de experimentos com o sangue de macacos da espécie Rhesus (Macaca mulatta). Em seu experimento eles injetavam pequenas quantidades de sangue do macaco em coelhos, o que levou a produção de anticorpos anti-Rh.

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Em uma segunda etapa, eles misturaram o sangue humano com os anticorpos isolados do soro dos coelhos e observaram que em algumas amostras ocorreu a aglutinação e destruição das hemácias, levando-os a concluir que algumas pessoas apresentam o fator Rh (Rh+) e outras não (Rh-) Geneticamente o fator Rh é determinado pelos alelos D (dominate, que codifica o aglutinogênio) e d (recessivo). O indivíduo Rh+ possui genótipos DD ou Dd e o Rh- genótipo dd. O aglutinogênio determinante do fator Rh está presente apenas nas hemácias, sendo ausente no plasma sangüíneo. Em caso de transfusão, diferente do sistema ABO, o indivíduo Rh- nasce sem aglutinina anti-Rh. Se este indivíduo Rh- nunca for exposto ao sangue Rh+ ele poderá receber uma transfusão incompatível sem nenhum problema pois não haverá reação antígeno-anticorpo. Porém, algumas semanas após a transfusão, o organismo já possuirá aglutininas anti-Rh, o que poderá, em uma próxima transfusão, causar aglutinação e destruição das hemácias recebidas. A incompatibilidade do fator Rh pode causar uma doença chamada de Eritroblastose Fetal ou Doença Hemolítica do Recém Nascido (DHRN), que ocorre quando uma mãe Rh- gera um filho Rh+. Esta doença ocorre após o nascimento do primeiro filho, que apenas deixará a mãe sensível ao Rh+. Em condições normais, a placenta não permite que a hemácias do feto passem para o organismo da mãe, mas, ao longo da gestação podem ocorrer rupturas que permitam esta transferência. Normalmente, este contato entre sangue materno e sangue fetal ocorre na hora do parto, quando as hemácias do filho passam para o organismo na mãe e estimulam a produção das aglutininas anti-Rh. No caso da mulher sensibilizada ter um segundo filho Rh+ ele passará por transfusões sangüíneas para tratar o problema. Atualmente já existe uma espécie de vacina, que deve ser tomada nas primeiras 72 horas após o parto, que poderá evitar o surgimento deste problema em futuras gestações.

HERANÇA LIGADA AO SEXO Quanto a determinação do sexo, os animais podem ser distribuídos em 4 sistemas diferentes: XY, XO, ZW e ZO. Nos seres humanos esta presente o sistema XY, onde as mulheres apresentam duas séries de autossomos (2 A) e

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um par de cromossomos sexuais iguais (sexo homogamético) e os homens apresentam as mesmas duas séries autossômicas e dois cromossomos sexuais diferentes (sexo heterogamético). Sistema XY

Sexo

Sexo

Homogamético

Heterogamético

Fêmea: 2 A + XX

Macho: 2 A + XY

Animais Mamíferos Insetos (barata,

XO

Fêmea: 2 A + XX

Macho: 2 A + XO

percevejo, gafanhoto) Aves, peixes e

ZW

Macho: 2 A + ZZ

Fêmea: 2 A + ZW

alguns insetos (mariposa)

ZO

Macho: 2 A + ZZ

Fêmea: 2 A + ZO

Répteis e algumas aves (galinhas)

O conjunto de cromossomos de uma espécie é chamado de cariótipo, e, na espécie humana, é representado da seguinte forma: 46, XX para mulher e 46, XY para homens, sendo esses 46 cromossomos representados por 23 pares, sendo 22 autossômicos e 1 sexual. Quanto aos cromossomos sexuais, o X e o Y são parcialmente homólogos, ou seja, apresentam um pareamento parcial durante a meiose, pois o cromossomo X apresenta apenas uma pequena parte homologa a outra pequena parte do Y. Isso acontece porque o cromossomo X é maior que o Y e também porque ambos tem genes exclusivos, como o caso do SRY (gene masculinizante), e os genes do daltonismo e hemofilia. No cromossomo X estão presentes alguns genes que se expressam tanto em homens quanto em mulheres, a chamada herança ligada ao sexo, e o cromossomo Y possui genes que se expressam apenas em homens, a herança restrita ao sexo ou herança holândrica.

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Abaixo algumas doenças humanas ligadas ao cromossomo X. Herança ligada ao X Daltonismo

Característica Dificuldade em distinguir determinadas cores

Hemofilia

Dificuldade de coagulação sangüínea

Distrofia muscular de Duchene e Becker

Fraqueza muscular progressiva

Síndrome do X frágil

Retardo mental moderado em meninos Pele áspera, com formação de

Ictiose ligada ao X

escamas devido a hipertrofia da camada córnea da pele. Os túbulos renais não reconhecem o

Diabete insípido nefrogênico

hormônio diurético, por isso a urina é muito diluída

Retinosquiose

Hipofosfatemia ou raquitismo resistente a vitamina D

Degeneração e deslocamento da retina Os túbulos renais não reabsorvem fosfatos, que são eliminados pela urina, atrapalhando o crescimento

A herança ligada ao sexo foi descoberta em 1910 pelo norte americano Thomas Hunt Moran. Na ocasião ele estudava a mosca drosófila (Drosophila melanogaster) e observou que o padrão se herança de algumas características seguia o padrão de herança do sexo. Em mamíferos a herança ligada ao sexo é exclusiva do cromossomo X, e os genes determinantes estão na posição não homologa ao cromossomo Y. Quando essas heranças são recessivas, no caso da hemofilia ou do daltonismo, elas costumam ocorrer com mais freqüência nos homens que nas mulheres. Hoje sabe-se que existem mais de 200 anomalias ligadas ao cromossomo X, distribuídas ao longo de seus dois braços. Este tipo de herança tem uma importância médica muito grande para a espécie humana por existirem diversas doenças ligadas ao X.

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DALTONISMO Em 1794 o químico inglês John Dalton percebeu que tinha dificuldade de identificar as cores verde e vermelha. A partir do estudo de seu próprio caso ele fez a primeira comunicação científica sobre a doença, que ficou conhecida por daltonismo. Esta doença é provocada por um gene recessivo ligado ao cromossomo X (freqüência de 1 : 10.000), o daltonismo afeta cerca de 8% da população masculina e 0,04% da população feminina. É pouco freqüente em mulheres por precisar de dois genes raros, o Xd, para expressar o caráter. Na tabela abaixo estão os genótipos e fenótipos do Daltonismo: Genótipo

Fenótipo

XD XD

Mulher normal

XD Xd

Mulher normal portadora

Xd Xd

Mulher daltônica

XD Y

Homem normal

Xd Y

Homem daltônico

Com os avanços da genética sabe-se hoje que a percepção das cores depende de três genes diferentes, dois localizados no cromossomo X e um no cromossomo 7. No cromossomo X estão os genes ligados à percepção das cores verde e vermelha, o daltonismo, herança ligada ao sexo, e no cromossomo 7 está o gene responsável pela percepção da cor azul, o daltonismo triatópico, que é uma herança autossômica.

HEMOFILIA A hemofilia se caracteriza pela dificuldade de coagulação do sangue, pela ausência de proteína que atuam nesse processo, os chamados fatores de coagulação. Essas proteínas atuam em cadeia, portanto, a ausência de uma delas compromete todo o sistema, tornando a coagulação muito lenta e dando ao indivíduo uma tendência a ter hemorragias. O gene é muito raro, segue a mesma freqüência do daltonismo (1 : 10.000) e é mais comum em homens. Abaixo estão representados os genótipos da hemofilia.

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Genótipo

Fenótipo

XH XH

Mulher normal

XH Xh

Mulher portadora

Xh Xh

Mulher hemofílica

XH Y

Homem normal

Xh Y

Homem hemofílico

Com os atuais avanços da genética, hoje se sabe que existem três tipos de hemofilia, identificadas por A, B e C. A hemofilia A é a mais comum, ocorre em 85% dos casos e está ligada a uma deficiência no fator VII da coagulação ou fator A anti-hemofílico. A hemofilia tipo B (doença de Christmas) ocorre em quase 15% dos casos e está ligada ao fator IX ou fator B anti-hemofílico. No tipo C, a deficiência está no fator XI, ou fator C anti-hemofílico.

HERANÇA RESTRITA AO SEXO Conhecida como herança holândrica, ele é transmitida exclusivamente pelo cromossomo Y, por isso, só pode afetar homens. Os genes que determinam o desenvolvimento dos testículos, por exemplo, representam uma herança holândrica, pois só aparecem em indivíduos do sexo masculino. Outro exemplo é a hipertricose auricular (presença de pelos na orelhas), muito comum nas regiões da Índia e Paquistão, porém, pode ocorrem em caucasianos, aborígenes australianos e japoneses. Hoje se sabe que o gene deste caráter está presente tanto em homens quanto em mulheres, porém, só se manifesta nos homens, por ser limitado ao sexo.

HERANÇA INFLUENCIADA PELO SEXO Ocorre predominantemente em um dos sexos, caso da calvície, mais comum nos homens. Isso ocorre porque a testosterona altera a expressão do gene, dando a ele um comportamento dominante, enquanto na mulher ele só se expressa em homozigose, tendo comportamento recessivo, como mostrado no quadro abaixo.

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Genótipo

Homem

Mulher

CC

Calvo

Calva

Cc

Calvo

Normal

cc

Normal

Normal

HERANÇA LIMITADA PELO SEXO É a herança autossômica que ocorre em apenas um dos sexos. Na espécie humana podemos citar o câncer de próstata nos homens e o câncer de colo do útero nas mulheres.

PLEIOTROPIA Os genes pleiotrópicos são aqueles que determinam o aparecimento de vários caracteres ao mesmo tempo. Esses efeitos múltiplos podem ser explicados por uma reação seqüencial de causas que ocorre com um determinado “defeito” inicial determinando o aparecimento de problemas secundários, terciários e assim por deante. O principal exemplo de pleiotropia é a anemia falciforme, onde as hemácias assumem a forma de uma foice na ausência de oxigênio, pode se romper facilmente. Essa doença pode provocar o aparecimento de outras características como o fechamento de capilares e aumento do baço. Seu caráter é recessivo, e determina a síntese de uma hemoglobina defeituosa, chamada de hemoglobia siclêmica, representada por HbS (Hb = hemoglobina). Essa alteração ocorre pela simples troca de um ácido glutâmico por uma valina. No quadro abaixo estão os principais exemplos de pleiotropia. Caráter pleiotrópico

Gene defeituoso

Efeitos múltiplos Desenvolvimento físico retardado, insuficiência cardíaca, aumento do

Anemia falciforme

Alelo recessivo no

baço, reumatismo, dor

cromossomo 11

abdominal, aumento da quantidade de medula óssea, insuficiência renal, fraqueza.

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Diminuição do

Fenilcetonúria

Alelo recessivo no cormossomo 12

rendimento intelectual, retardo geral do desenvolvimento físico e pouca pigmentação Cirrose hepática,

Galactosemia

Alelo recessivo no

catarata, retardo mental

cromossomo 9

e anemia progressiva que pode ser fatal Defeitos cardíacos (dilatação progressiva

Síndrome de Marfan

Alelo dominante no cromossomo 15

da aorta), alterassões oculares (deslocamento do cristalino), elevado estatura e aracnodaltilia (dedos longos)

INTERAÇÃO GÊNICA Neste mecanismo dois ou mais pares de genes interagem para formar uma característica. Em vários casos estas interações podem ser reunidas em dois grupos principais: as interações epistáticas e as não-epistáticas. Nas interações epistáticas as proporções da geração F2 são diferentes das obtidas na proporção clássica do diibridismo mendeliano (9 : 3 : 3 : 1). Do ponto de vista da genética molecular a interação epistática, ou epistasia é um processo em que um gene oculta, ou elimina, a atuação de outro não-alelo. É uma situação onde um alelo de um gene mascara a expressão de um alelo de outro gene que utiliza a mesma via metabólica. A forma mais fácil de compreender este tipo de interação é interpretar que um gene (epistático) inibe a expressão de outro não-alelo (hipostático). Entre as interações epistáticas podemos citar 3 tipos: •

Epistasia Recessiva – quando um gene homozigoto recessivo inibe a expressão de outro não-alelo. Como exemplo podermos citar uma planta, que usa um pigmento branco para sintetizar o

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pigmento vermelho, através das enzimas produzidas pelos genes A e B. Se a enzima do gene A estiver ausente (aa) a planta não poderá expressar a cor vermelha pois uma parte do processo não será realizado pela falta de um componente. •

Epistasia Recessiva Dupla – a presença de um homozigoto recessivo em qualquer um dos alelos inibe a expressão do outro. Como exemplo, podemos usar a surdes genética em humanos. Ela ocorre pela interação de dois genes que atual na formação de dois caracteres distintos necessários para a audição. Um deles, o gene D é o responsável pela formação da cóclea (elemento anatômico da audição) e o outro, o gene E, pela formação do nervo acústico (elemento neurológico da audição). Se apenas um deles for recessivo, o indivíduo será surdo, sendo a expressão do outro inibida. A interação segue a tabela abaixo:

Fenótipo

Caráter

Normal

Forma cóclea e nervo auditivo

Surdo

Não forma cóclea Não forma nervo auditivo Não forma cóclea nem nervo acústico •

Genótipo DDEE, DDEe, DdEE, DdEe ddEE, ddEe DDee, Ddee ddee

Epistasia dominate – neste caso a presença de um alelo dominante de um dos genes inibe a expressão do outro. Como exemplo podemos citar a interação existente em duas raças de galinhas, a Leghorn e a Plymouth. Quando cruzamos uma Leghorn branca (IICC) com uma Plymouth branca (iicc) obtem-se apenas

aves

brancas

na

geração

F1.

Quando

esses

descendentes são cruzados entre si surgem aves Leghorn coloridas misturadas com aves brancas. Quando aves Leghorn brancas são cruzadas entre si, só aparecem descendentes brancos. Neste caso, o gene C, que expressa a plumagem colorida, é inibido pelo I, expressando a plumagem branca.

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Interação não-epistática: se caracteriza pela interação de dois ou mais pares de genes, localizados em cromossomos diferentes, atuando de modo complementar. Foi descoberta pelo biólogo inglês William Bateson, em 1910, quando ele estudava a herança da crista de galinhas domésticas. Bateson percebeu que a forma da crista depende da interação de dois genes não homólogos, representados pelos alelos R, r, E, e, originando quatro diferentes variedades de cristas: noz, rosa, ervilhas e simples. Seus genótipos foram determinados de acordo com a tabela abaixo. Crista

Gene

Genótipo

Noz

R+E

Rosa

R

RRee, Rree

Ervilha

E

rrEE, rrEe

Simples

r+e

rree

RREE, RREe, RrEe, RrEE

O cruzamento de galo crista rosa com galinha crista ervilha produz 100% de descendentes com crista nos na geração F1. Cruzando estes descendentes, a geração F2 será constituída por: 9/16 noz, 3/16 rosa, 3/16 ervilha, 1/16 simples.

POLIMERIA OU HERANÇA QUANTITATIVA A herança quantitativa resulta do efeito quantitativo de vários pares de genes, que determinam peso, altura, e a cor dos seres vivos. Em humanos esses genes acumulativos, ou poligenes, determinam cor da pelos, dos olhos e cabelo, altura, peso, resistência a determinadas doenças e inteligência. Já em ovinos, determina a produção de leite, nas plantas a cor e o peso das sementes, além de comprimento do caule e peso dos frutos. Nas plantas, a polimeria foi descoberta através do estudo de grãos de trigo, quando se observou que ao cruzar trigo vermelho escuro com trigo branco se obtinha uma geração F1 com 100% de trigo vermelho. Ao cruzar a geração F1 entre si, se obtinha uma geração F2 com proporção fenotípica de 1:4:6:4:1, sendo 1 vermelho escuro, 4 vermelho, 6 vermelho médio, 4 vermelho claro e 1 branco. Como o resultado obtido não correspondia aos padrões

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conhecidos, os cientistas acreditaram que esse novo tipo de herança é condicionado por dois pares de genes com efeito aditivo, sem dominância, conforme a tabela abaixo: Cor da semente

Gene A/B

Genótipo

Vermelho escuro

4

AABB

Vermelho médio

3

AABb ou AaBb

Vermelho

2

AAbb, AaBa ou aaBB

Vermelho claro

1

Aabb, aaBb

Branco

0

aabb

A cor da pele humana depende da síntese de uma substância chamda melanina, nas células da epiderme. Em 1913, após um estudo com 240 descendentes de negros, mulatos claros e mulatos escuros, descobriu-se que a cor da pele humana também é um caso de polimeria. Pais

Mulatos

Descendentes Mulatos Mulatos

escuros

médios

claros

24

87

23

0

0

1

14

Negros

Negro x Negro Mulato claro x Mulato claro Mulato médio x Mulato médio

Brancos

Total

0

0

134

4

13

1

18

51

18

4

88

O efeito aditivo entre os genes não alelos A e B origina cinco diferentes fenótipos para a cor da pele humana. Indivíduos homozigotos dominantes são negros e homozigotos recessivos, brancos. Os intermediários ocorrem de acordo com a quantidade de genes dominantes existentes em seus genótipos. Fenótipo

Genes A/B

Genótipos

Negro

4

AABB

Mulato escuro

3

AABb ou AaBB

Mulato médio

2

AAbb, AaBb, aaBB

Mulato claro

1

Aabb, aaBb

Branco

0

aabb

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LIGAÇÃO GÊNICA Em 1903 o norte-americano Walter S. Sutton e o alemão Theodor Boveri observaram que os genes e os cromossomos tinham comportamentos semelhantes durante a meiose, o que os levou a elaborar a hipótese de que “os cromossomos poderiam ser os portadores dos genes”. Mais tarde, em 1910, Thomas Hunt Morgan, trabalhando baseado nessa possibilidade, criou as bases da teoria cromossômica da herança ao demonstrar que “o gene é parte do cromossomo”. Seis anos mais tarde, em 1916, Calvin B. Bridges demonstrou em moscas drosófilas (Drisophila melangogaster) que um indivíduo normal que recebe um cromossomo com um gene defeituoso, torna-se defeituoso. Com estes, e outros estudos posteriores, hoje se tem dois tipos de ligação gênica, a ligação completa (ou linkage sem crossing-over) e a ligação incompleta (linkage com crossing-over). •

Ligação gênica completa: também conhecida como linkage sem crossing-over, ocorre quando os genes estão muito próximos no cromossomo, não sendo possível a ocorrência do crossing-over, o que os faz ser transferidos em bloco. Genes com este tipo de ligação fogem da proporção da segunda lei de Mendel.

Ligação gênica incompleta: pode ser chamada de linkage com crossing-over, ocorre quando os genes estão afastados no cromossomo, o que permite que façam o crossing-over ou permutação, possibilitando o surgimento de gametas com diferentes combinações gênicas, porém, não obedecem as proporções da segunda lei de Mendel.

TAXA DE CROSSING-OVER Esta taxa, que varia de acordo com a distância entre os genes, determina a possibilidade de se formarem gametas diferentes, ou seja, se haver recombinação gênica no momento da formação dos gametas. Para se obter esta taxa somam-se os totais de gametas recombinantes obtidos no cruzamento em questão. Para se obter a taxa de linkage basta subtrair a taxa de corssing-over de 100%. Por se tratar de um fenômeno raro, a

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taxa de crossing-over pode chegar a um máximo de 50%, enquanto a de linkage pode chegar a 100%.

CONFIGURAÇÃO CIS E TRANS Em indivíduos heterozigotos os genes podem apresentar duas configurações distintas, a cis e a trans. Na configuração cis os alelos dominantes estão no mesmo filamento cromossômico, enquanto que em trans eles se encontram em filamentos diferentes.

MAPA GENÉTICO O mapa genético é um diagrama que representa a localização dos genes em seus respectivos locos gênicos num mesmo cromossomo. Para se saber a distância entre os genes, usa-se, por convenção, da taxa de crossingover. Para representar esta distância foi criada uma unidade de medida, correspondente a 1% da taxa de recombinação, chamada de unidade de recombinação (UR), também chamada de morganídeo (M) ou centimorgan (cM). Conhecendo as taxas de recombinação dos genes é possível se construir um mapa genético, e assim, representar sua localização no cromossomo.

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