FULLCOVER 9 português

Page 1

MDS MAGAZINE

ANTONIO HUERTAS E A MAPFRE Sucesso global aliado à responsabilidade social

VERSÃO PORTUGUESA

Nº 9 VERÃO 2016

ACCLAIM

FOSUN

A história de sucesso do “Mr Singapore”

Crescimento a alta velocidade no mercado segurador

RISCOS GEOPOLÍTICOS Os riscos da nova ordem mundial



Em exclusivo no

L I S B O A : A v. d a L i b e r d a d e , 2 0 4 , r / c P O RT O : A v. d a B o a v i s t a , 3 5 2 3 , E d i f í c i o A v i z w w w. r o s a e t e i x e i r a . p t


Rua Pedro Homem de Melo, 85 4150-599 Porto PORTUGAL Tel +351 220 991 485 porto@jesuspeiro.com www.jesuspeiroporto.pt www.facebook.com/jesuspeiroporto


WITH UNLIMITED OPTIONS, HOW DO YOU CHOOSE? Last year alone, we landed at nearly 2,000 airports in more than 100 different countries, often with just hours’ notice. With NetJets, the destinations within reach are limited only by your imagination. This is unparalleled access. Only NetJets.

NETJETSEUROPE.COM

+44 (0)203 811 3701

All aircraft offered by NetJets® Europe are operated by NetJets Transportes Aéreos S.A., an EU air carrier.


M D S  m a g a z i n e

Diretor José Manuel Fonseca Comité Editorial Ângela Fonseca Jacqueline Legrand Liliana Baptista Paula Rios Susana Neiva Colaboração Adrian Ladbury Alain Simon Anthony Lim Corey Gooch Daniel O’Connell David Anderson Gustavo Quintão International SOS/Control Risks Iulia Simon John Bugalla Jorge Luzzi José Ribeiro Karen Jenner Paulo Varela Pedro Castro Caldas Prakash Ratilal Rob Hough Título FULLCOVER Autoria Grupo MDS Edição 1ª Edição (FULLCOVER 9) Editor MDS Corretor de Seguros, S.A. Av. da Boavista 1277/81, 1º, 4100-130 Porto, Portugal mdsinsure.com Local da Publicação Porto Data da Publicação Julho 2016 Tiragem 2500 Design Studio Dobra Foto Capa Pedro Lobo Impressão Lidergraf Sustainable Printing Depósito Legal 374241/14 ISSN 2183-6787

Partner 4


fullcover

Editorial É uma alegria enorme concluir mais um número da FULLCOVER, a revista do grupo MDS , distribuída em muitas dezenas de países e hoje uma referência editorial no mercado internacional. Com uma novidade que é o facto de deixar de ser bilingue e passar a ser editada em duas versões, uma em inglês e outra em português, a quarta língua mais falada do mundo e da qual o grupo muito se orgulha. Creio que ganhamos muito em limpidez de leitura e na qualidade gráfica e de design. Antonio Huertas, o presidente do grupo MAPFRE é a grande figura deste número, numa conversa interessantíssima com a nossa equipa, plena de sabedoria e de entusiasmo pela extraordinária missão que a MAPFRE tem levado a cabo no mundo. Chamo a atenção para a peça sobre a Acclaim, partner da Brokerslink em Singapura, e o seu líder Anthony Lim, um amigo e uma figura incontornável no mundo asiático do risco e dos seguros; para o nosso tradicional dossier, desta vez sobre os riscos geopolíticos; para a importância que a Gestão de Risco e o ERM ocupam mais uma vez neste número; e finalmente para a revelação em primeiríssima mão no mercado da nova imagem da marca do grupo MDS, que poderão reconhecer nas páginas 146 e 147, acompanhando a trajetória de permanente crescimento, inovação e expansão da nossa empresa. JO SÉ M A NUE L F O N SE C A → MDS Group CEO

Se este número é mesmo especial, então esperem pelo próximo, onde celebraremos a décima edição deste projeto único. WE WILL BE THERE!

5


M D S  m a g a z i n e

Í 9

FOSUN Crescimento a alta velocidade no mercado segurador Lan Kang: a visão estratégica de um grupo verdadeiramente global Jorge Magalhães Correia: Fidelidade – de vento em popa

64

GRANDE ENTREVISTA A ANTONIO HUERTAS Presidente e CEO da MAPFRE

22

44

IMPOSTO SOBRE OS PRÉMIOS DE SEGURO – ERROS A EVITAR Por Karen Jenner

68

PEDRO CAMPOS

DOSSIER RISCOS GEOPOLÍTICOS Quando as notícias escrevem uma página da História

Vela, risco e paixão

Gerir e mitigar a ameaça crescente do terrorismo Segurança em viagem e gestão de crises

29

PEDRO MACEDO

Riscos Geopolíticos: que produtos e coberturas?

Recordando

Novas ideias para enfrentar os riscos geopolíticos nos negócios Panorama Geopolítico global

30

ACCLAIM INSURANCE BROKERS

91

Perseguir um sonho Singapura pelos olhos de Anthony Lim Mercado segurador de Singapura em números

RIO 2016: A GESTÃO DE RISCO NOS JOGOS OLÍMPICOS A visão de Jorge Luzzi

95

ERM Alessandro di Felice: um novo modelo para a gestão de risco ERM: uma vantagem estratégica para a sua empresa

6


fullcover

104 FRANÇOIS SETTEMBRINO Recordando

107 BROKERSLINK Brokerslink: do sonho à realidade – a história de uma transformação Brokerslink cresce em África: novos membros no Gana e na Tanzânia Jiřina Nepalová: um exemplo de liderança na indústria seguradora Brokerslink News

126 ANGOLA: PRESENTE E FUTURO

152 O MERCADO DE SAÚDE BRASILEIRO Por Gustavo Quintão

156 FUSÃO ACE E CHUBB Crescimento, disciplina, inovação e serviço de excelência no topo das prioridades da nova CHUBB Entrevista a Véronique Brionne sobre a CHUBB Ibéria

Por Paulo Varela

134 UM VISÃO DE (E PARA) MOÇAMBIQUE

163 TRIVIA: OS CAMINHOS DE FERRO DE BAGDAD Por Pedro Castro Caldas

Por Prakash Ratilal

166 LEITURAS 138 STEVE HEARN A criação do broker do futuro

139 MDS Jacques Goldenberg: do Egito ao Brasil, um percurso traçado pela paixão Enrique Schoch: um marinheiro no mundo dos seguros O poder da vontade: descubra a nova marca MDS MDS News

7



ENTREVISTA COM O PRESIDENTE E CEO DA MAPFRE

ANTONIO

HUERTAS De empresa espanhola a seguradora global, a MAPFRE corporiza a ideia de que o sucesso e ambição corporativa podem coexistir com um forte compromisso em termos de responsabilidade social. A fullcover falou com Antonio Huertas, Presidente e CEO da MAPFRE, para saber mais sobre a empresa e o que move o homem que a lidera.

9


M D S  m a g a z i n e

Enrique Schoch e Paula Rios do grupo MDS entrevistam Antonio Huertas.

Este mundo acaba por ser apaixonante. Quando começamos a envolver­‑nos nesta atividade, começamos a ver como ajudamos, de facto, as pessoas, as empresas e o nosso entorno. Na minha opinião, esta é a parte apaixonante do nosso trabalho.

10


fullcover

Como é que um homem que nasceu na Estremadura e estudou Direito na universidade se converte em presidente da MAPFRE? Estudei Direito, e queria ser advogado. Quando acabei o curso não sabia nada sobre seguros, nem conhecia a MAPFRE. Tive a oportunidade de começar a traba‑ lhar na MAPFRE, num programa de estágio, graças a um anúncio de jornal, no qual a companhia procurava jovens com pouca experiência em seguros. Embora essa não tenha sido a minha primeira opção de ingresso no mundo do trabalho, no final acabei por me entusiasmar pelo meu trabalho e por ficar apaixonado por esta profissão. Temos uma grande vantagem na MAPFRE porque é uma empresa que se baseia na meritocracia, ou seja, o desenvolvimento profissional está associado ao mérito de cada um. A empresa dá­‑nos formação e oportuni‑ dades de desenvolvimento profissional e as pessoas que têm atitude e tiram partido das oportunidades que lhes são dadas acabam por aproveitá­‑las ao máximo. Obviamente, nem todas as pessoas podem chegar a presidente. Penso que um fator muito importante é ter mentores. Eu tive vários mentores que me ajudaram muitíssimo, entre os quais se inclui o meu antecessor na presidência da MAPRE, que propôs ao conselho que eu fosse o seu sucessor.

É verdade que muitos dos profissionais do mundo dos seguros começam duma forma indireta, mas acabam por se apaixonar pelo setor? Sim, este mundo acaba por ser apaixonante. Quando começamos a envolver­‑nos nesta atividade, começamos a ver como ajudamos, de facto, as pessoas, as empresas e o nosso entorno. Na minha opinião, esta é a parte apai‑ xonante do nosso trabalho. Por detrás de uma vertente comercial, temos uma atividade social tremenda, prova‑ velmente a mais social que existe porque os prémios que as companhias de seguros recebem constituem fundos que permitem ajudar pessoas que, na contingência, na desgraça, na dificuldade, necessitam desse apoio.

Uma função social que às vezes é pouco compreendida, não é verdade? Provavelmente porque não a explicamos suficiente‑ mente bem. São relações complexas, temos que esta‑ belecer um quadro de relação muito fechado que nos permita controlar a nossa atividade, para que esta seja rentável para todos e sustentável a longo prazo, o que é efetivamente difícil de explicar. Penso que esse é o grande desafio que todos temos. Atualmente, está em curso um projeto de transparência para chegar a todos os stakeholders de forma direta e

clara. Queremos mostrar que há muito mais na ativi‑ dade seguradora do que aquilo que se vê à superfície e que a MAPFRE tem um papel social de referência para muitas outras atividades que se relacionam de uma forma direta ou indireta com a empresa e que devemos reforçar e apoiar.

Quais eram os seus projetos quando terminou a universidade? A minha vocação era clara: exercer advocacia. Por isso fui para um escritório de advogados para fazer um estágio. Mas, quando vi o anúncio no jornal, que referi anteriormente, para fazer um estágio na MAPFRE, concorri e fui selecionado. Quando começamos no mundo dos seguros não sabemos onde podemos acabar. Quando entrei na MAPFRE a minha intenção era tentar convencer alguém de que podia trabalhar no departamento de sinistros ou no departamento legal. Não foi isso que acabou por acontecer. Fui orientado de outra forma porque viram em mim outras capacidades, provavelmente uma vocação para aprender. Era um momento importante para a empresa e para a sociedade espanhola ­‑ o momento do nasci‑ mento da tecnologia aplicada aos negócios, da mudança dos hábitos de consumo, da aparição de uma concor‑ rência muito mais aberta e da flexibilização da relação com o cliente. O mercado de seguros em Espanha era apaixonante. Quando eu entrei em 1988, a MAPFRE era a companhia de referência nos seguros em Espanha, e claramente uma aposta muito atraente e apelativa. A minha carreira não seguiu o caminho que imaginei, mas não me arrependo de nada. Na MAPFRE as relações são muito abertas e sinceras. Ao fim de três ou quatro meses na empresa já tinha reuniões com o diretor general. Hoje em dia isto continua a acontecer. Ou seja, a MAPFRE proporciona aos seus colaboradores muitas oportunidades e condi‑ ções para crescerem e se desenvolverem. Eu digo sempre que a ambição é importante, não é negativa. A ambição é positiva se for usada da melhor forma. Ser ambicioso não significa ter que prejudicar os outros. Pelo contrário. É ter a capacidade de aprender, crescer, contribuir e querer continuar a fazer mais. Isso não implica de modo nenhum uma atitude negativa em relação aos colegas ou membros da equipa.

Ser ambicioso não significa ter que prejudicar os outros. Pelo contrário. É ter a capacidade de aprender, crescer, contribuir e querer continuar a fazer mais.

11


M D S  m a g a z i n e

Eu penso que é compatível: companheirismo e ambição. Na realidade, trata-se de um processo natural. Se o fizermos bem enquanto empresa, se a gestão de recursos humanos for a adequada, se tivermos as ferra‑ mentas certas para ir de encontro às necessidades dos membros das equipas, no final, devemos tentar pôr os melhores no lugar adequado. E nem sempre o melhor é o que mais aparece, o que tem mais conhecimento ou o que mostra mais aptidão para uma tarefa. Essa combi‑ nação exige uma análise muito complexa. Todos aqueles que gerem pessoas sabem que este processo de aprendizagem, de gestão da equipa, é muito importante para que tenhamos a certeza de que podemos contar com o apoio das pessoas, o que contribui para o sucesso dos projetos.

Quais eram os seus principais objetivos e metas, quando passou a ser presidente e CEO da MAPFRE? Conseguiu alcançá­‑los? Penso que há três objetivos básicos. Desde logo, tem que se ganhar o respeito e a credibilidade das pessoas que se vai liderar, ser um primus inter pares. Na MAPFRE, quando alguém chega a uma posição sénior é porque já está a trabalhar há muito tempo dentro da organização, pelo que tem de se converter em líder de uma equipa em que provavelmente alguém foi previamente o seu chefe. Este é o primeiro desafio. O segundo desafio passa por entender o modelo de sucesso. Quando eu assumi a presidência estávamos num momento de pleno sucesso na nossa história em termos de resultados e expansão internacional. Nesse momento tive que começar a trabalhar seguindo a mesma linha com o objetivo principal de convencer os meus colegas e a minha equipa de que o projeto tinha que sofrer certas mudanças para podermos alcançar os desa‑ fios que nós próprios nos estávamos a propor. Foi então que fizemos uma análise estratégica a todos os níveis, em todo o mundo, um estudo completo para determinar o que éramos e o que queríamos ser. Isso permitiu­‑nos definir um novo modelo de empresa. O segundo objetivo mais importante foi, por conseguinte, ter sucesso com este modelo e acho que estamos a conseguir. O terceiro objetivo foi entender o ADN da MAPFRE enquanto empresa socialmente comprometida. A nossa empresa tem valores, princípios institucionais e uma cultura interna que respeita esses valores. Não se trata só de fazer ações de beneficiência e doar dinheiro. É importante que nos comprometamos de forma efetiva em cooperar e em melhorar as coisas. Acho que também estamos a conseguir cumprir este objetivo. Assim, tudo tinha a ver com as pessoas, o projeto empresarial e a responsabilidade social da empresa.

12

Esses valores fizeram com que a MAPFRE hoje em dia seja vista como uma companhia mais próxima do que era há uns anos? Acho que estamos a ganhar proximidade porque estamos a ganhar transparência na MAPFRE. A MAPFRE sempre teve orgulho da sua proximidade em termos sociais, mas talvez não tenha sido capaz de o mani‑ festar duma forma clara. Isto significa que terá sido mais ao nível do pensamento do que de uma real perceção. Creio que estamos agora a consegui­‑lo com os nossos clientes, tentando ver como os clientes nos veem para podermos realmente corrigir as falhas. Não queremos ser uma empresa fechada. Venha quem vier, será recebido de portas abertas, seja concorrente, regulador, empresa de outro setor ou mesmo o público em geral. Mas também é certo que temos de entender que este é um modelo de sucesso que em 20 anos cresceu e se transforma duma forma muito rápida. O mundo também mudou. Vejamos o caso da tecnologia e o acesso à mesma. Hoje temos ao nosso dispor ferramentas que não existiam no passado. Não quero com isto dizer que antes fazíamos as coisas mal, mas tão­‑somente não estávamos consciencializados de que tínhamos que ter um pouco mais de proximidade. Nesse sentido, penso que atualmente estamos mais próximos das pessoas enquanto empresa.

A diversificação é a maior garantia de sucesso na nossa atividade. Quando não diversificamos o suficiente, concentramos muito mais o risco e não estamos a gerir adequadamente. Porque é que a MAPFRE decidiu converter­‑se numa companhia global estabelecendo­‑se como um dos principais seguradores da América Latina? E a Ásia está dentro dos planos da MAPFRE? A diversificação é a maior garantia de sucesso na nossa atividade. Quando não diversificamos o suficiente, concentramos muito mais o risco e não estamos a gerir adequadamente. A MAPFRE atingiu uma posição de mercado muito importante em Espanha no final dos anos 80, e entendeu que tinha de se expandir um pouco mais e ramificar o seu negócio. Começámos a desenvolver atividades de resseguro a nível internacional, constituindo uma MAPFRE RE embrionária que já fez 40 anos. Como tínhamos desenvolvido um forte conheci‑ mento do mercado latino­‑americano, o processo natural de diversificação da MAPFRE era ir para a América Latina, pela proximidade da língua


fullcover

Hoje em dia a MAPFRE trabalha com diversas companhias em mais de 100 países. Está presente em 50 países com estruturas próprias. Somos uma grande seguradora no Nordeste dos Estados Unidos e na Europa, inclusive sem considerar Espanha, porque temos filiais no Reino Unido, na Turquia, na Alemanha, em Itália, em Portugal e em Malta.

e da cultura, mas também porque era um mercado de seguros sub­‑desenvolvido, embora não tenha sido um processo fácil. O crescimento em Espanha exigia que os recursos se mantivessem no país, como tal, os investimentos na América Latina eram reduzidos. Comprávamos companhias novas no mercado, com problemas e pouca capacidade de manobra. Mas, com muito empenho e graças à mutualidade que ampa‑ rava esse desenvolvimento empresarial, conseguimos desenvolver um projeto a longo prazo que nos trouxe muito sucesso. Isso consolidou­‑nos como a primeira seguradora regional na América Latina. Mais tarde, de uma forma natural, através do resseguro e de outras atividades, fomos vendo que nos podíamos expandir para outros mercados. Hoje em dia a MAPFRE trabalha com diversas compa‑ nhias em mais de 100 países. Está presente em 50 países com estruturas próprias. Somos uma grande segura‑ dora no Nordeste dos Estados Unidos e na Europa, inclu‑ sive sem considerar Espanha, porque temos filiais no Reino Unido, na Turquia, na Alemanha, em Itália, em Portugal e em Malta. A Ásia representa um terço do mercado mundial do seguro e uma seguradora global como a MAPFRE quer ser, deve ter presença neste continente. A companhia está presente há mais de 20 anos nas Filipinas e há 12 anos entrámos na China. Naquela época as companhias de seguros estrangeiras não eram autorizadas a operar na China sem um parceiro local, que não tínhamos. Não foi fácil, mas decidimos começar a conhecer o mercado criando uma companhia de serviços que aportasse know­‑how, de assessoria e gestão de processos e de call centre, e é isto que estamos a fazer desde então. Fomos abrindo outras pequenas plataformas rela‑ cionadas com a assistência e, recentemente, também entrámos na Indonésia com a aquisição de uma partici‑ pação numa companhia relevante no mercado local. Num futuro próximo estamos prestes a obter uma licença para ser seguradores na China. A nossa expe‑ riência de doze anos de trabalho deu­‑nos capacidade para hoje podermos desenvolver negócios na China e vamos começar com o seguro automóvel. Eu costumo dizer que estamos a trabalhar para a geração seguinte da MAPFRE. A Ásia não vai ser importante, em termos de números, para esta geração de colaboradores e responsáveis, mas sim para a seguinte. Temos que estar na Ásia e temos que a conhecer. Temos sete centros regionais no mundo e um deles é o da Ásia Pacífico, com sede em Xangai, e isto permite­‑nos ter um conhecimento muito profundo daquela zona. O Sudeste Asiático apresenta oportuni‑ dades e a própria China também, dentro da sua imen‑ sidão: vamos trabalhar numa grande província, a de Shandong, que tem 90 milhões de habitantes. Estamos prestes a receber a autorização e pensamos que no final do próximo ano estaremos a vender seguro automóvel num modelo puramente digital.

13


M D S  m a g a z i n e

MAPFRE NO MUNDO

A MAPFRE é um grupo empresarial multinacional com 83 anos de atividade, de origem espanhola e que desenvolve uma vasta atividade em todas as áreas do setor segurador. A sua origem é uma entidade mutualista criada em 1933, a “Mutua Agrícola de los Proprietarios de Fincas Rústicas de España”. A MAPFRE está atualmente em 50 países, cinco continentes, conta com uma rede global de mais de 80.000 mediadores, mais de 38.000 colaboradores e 34 milhões de clientes.

Negócio em mais de 100 países

Mais de 50% do negócio do grupo deriva da sua atividade internacional.

34

+38.400

5.848

80.000

MILHÕES DE CLIENTES

COLABORADORES

ESCRITÓRIOS

MEDIADORES

PRÉMIOS Brasil

Península Ibérica

4.814,20 (20%)

América do Norte 2.776,80 (11,6%)

6.696,70 (27,8%)

23.995,9 MILHÕES DE EUROS

Mapfre Re

LATAM (Norte)

3.731,90 (15,6%)

1.849,60 (7,7%)

A PAC

LATAM (Sul)

114,6 (0,5%)

2.030,40 (8,5%)

EMEA

1.981,10 (8,3%)

14


fullcover

MAPFRE CRESCE NOS SEUS MERCADOS ESTRATÉGICOS

PRÉMIOS (MOEDA LOCAL)

E S PA N H A ⬏

E UA ⬏

PRÉMIOS NÃO VIDA

+8,7%

+1,8% SAÚDE

MÉXICO ⬏

+7,4%

+62,4%

AUTO

+0,9% BRASIL ⬏

+3,6%

DISTRIBUIÇÃO DE PRÉMIOS

27,8%

TURQUIA ⬏

+41,3%

72,2% EXTERIOR E S PA N H A

15


M D S  m a g a z i n e

Fundación MAPFRE Madrid.

Temos de conhecer essas especificidades, saber aquilo que o cliente necessita, ter a convicção de que estamos numa relação de longo prazo. Temos que tentar gerir essa relação a longo prazo sendo compreensivos com as necessidades do cliente e com aquilo que o cliente espera do seu segurador. Agradecemos à Sonae pela sua compreensão desta relação e pela confiança de tantos anos de trabalho e de continuidade.

16

O mercado de risco e seguros de empresas está a mudar muito rapidamente; os clientes de grande dimensão e em constante expansão estão a procurar serviços mais abrangentes e soluções internacionais para riscos emergentes cada vez mais complexos, mais do que uma mera capacidade em termos de preço. Como é que vê a evolução do serviço da MAPFRE neste novo ambiente, por exemplo, através dum cliente como a Sonae, um cliente tradicional da MAPFRE? O mundo das grandes empresas exige que os forne‑ cedores de serviços na área dos seguros ofereçam as soluções de que estas necessitam. Nós não podemos mudar o modelo de negócio da Sonae, temos que saber o que faz e a partir daí estar ao lado do cliente. Como é evidente, isto exige uma flexibilidade enorme. Nestes casos, praticamente tudo é personalizado, feito à medida do cliente e não ao contrário, como nos seguros standard, em que tradicionalmente éramos especialistas. Claramente podemos oferecer soluções que tenham tido sucesso noutros mercados ou que estejam já testadas e tentar adaptá­‑las a estes riscos.


fullcover

O plano estratégico a três anos da MAPFRE, a nível internacional, chama­‑se “Foco no crescimento rentável”. O crescimento e a rentabilidade andam de mãos dadas. Se não houver rentabilidade não queremos crescimento. Este ano não nos importa sacrificar algum crescimento em troca de manter os níveis de rentabilidade, porque isto é o que nos vai dar mais tarde a capacidade de continuar a crescer e de não ficarmos nervosos quando os mercados se descontrolam um pouco. Atualmente temos em cima da mesa o tema da ciber‑ segurança, que é uma necessidade óbvia para todas as grandes empresas. Não nos podemos atirar à piscina sem colete salva­‑vidas. Temos que aprender, e estamos a experimentar em alguns mercados com clientes específicos para podermos perceber que situações encontraremos quando ampli­ armos este serviço. Não é um problema de capacidade. Existe capacidade no mercado, e nesse campo a MAPFRE não pode aportar mais valor porque seguramente há outros que têm mais capacidade do que a nossa. Temos de conhecer essas especificidades, saber aquilo que o cliente necessita, ter a convicção de que estamos numa relação de longo prazo. Temos que tentar gerir essa relação compreendendo as necessidades do cliente e aquilo que ele espera do seu segurador. Agradecemos à Sonae pela sua compreensão desta relação e pela confiança de tantos anos de trabalho e de continuidade. Demonstramo­‑lo trabalhando com clientes onde somos capazes de manter essa confiança a longo prazo. E no âmbito dos grandes riscos não se pode ter uma visão de curto prazo. Não é interessante, nem para o cliente, nem para o mundo do seguro e resseguro.

Que impacto teve a crise da dívida espanhola no desempenho da situação financeira da MAPFRE e como geriu Espanha esta crise? Sem dúvida que nos afetou; primeiro, porque o principal mercado da MAPFRE continua a ser o espanhol e a situação económica espanhola nestes últimos anos não foi boa. O mercado segurador contraiu­‑se. As empresas tiveram muitíssimos problemas para sobreviver e muitas fecharam. Outras reduziram as suas atividades. O setor segurador também teve que reconhecer essa situação e adaptar-se, não só restringindo condições ou reduzindo limites, mas também ajustando as taxas à realidade do mercado.

Aqui tenho que destacar que o setor empresarial espa‑ nhol que sobreviveu foi tremendamente honesto e leal para com os seus seguradores, isto é não houve grandes convulsões no sentido de procurar preços mais baixos. De uma forma geral, a MAPFRE foi significativamente afetada pelo tema do teto da dívida soberana espa‑ nhola, principalmente nos riscos globais e resseguro, porque a descida do rating afetava a capacidade de contratação. Quando Espanha desceu para BBB, tivemos alguns problemas, e a MAPFRE Global estava dois e três graus acima da dívida soberana espanhola. Mas tivemos que percorrer o mundo inteiro visitando cliente por cliente, ressegurador por ressegurador para convencê­‑los de que uma coisa era o rating soberano e outra coisa era a situação da MAPFRE. Nunca tivemos problemas de solvência e os resultados foram reiteradamente posi‑ tivos ano após ano. A rentabilidade nunca desceu. O nosso rating continuou a ser bom e os clientes confiam na MAPFRE.

Destacaria outros impactos? Eu acredito na credibilidade da imagem do nosso país. Somos uma empresa de origem espanhola e chegámos a mercados onde há anos nos apreciávamos porque éramos uma grande economia europeia que tinha cres‑ cido e que tinha criado muito emprego. De repente, a crise começou a mostrar algumas incer‑ tezas. Convencer os mais críticos de que não éramos uma economia em crise como refletiam os números, mas que tínhamos a capacidade de nos recuperarmos de uma forma mais rápida do que outras economias – o que realmente ocorreu – este facto deu muita credi‑ bilidade à imagem da MAPFRE como uma empresa de origem espanhola. Além disto, atualmente só 30% do nosso negócio está em Espanha, mas 70% dos nossos rendimentos e a maior parte dos nossos lucros já provêm de fora de Espanha. Por outras palavras, a MAPFRE tem capacidade para trabalhar em ambientes adversos numa longa crise, como a que ocorreu em 2011 . Tudo isto permitiu­‑nos dizer “vamos fazê­‑lo e vamos fazê­‑lo bem”, e essa foi uma mensagem importante para a organização.

E de que modo a crise afetou a vossa atuação? Efetivamente, como não iríamos ser afetados pela crise espanhola, se o PIB reduziu quase 10%, se houve uma situação de perda de três ou quatro milhões de empregos adicionais prévios à crise, se as famílias não têm como pagar os seguros, se as pessoas ficaram desempregadas, se havia quase 2 milhões de famílias com todos os seus membros no desemprego? Isto tinha que nos afetar porque vivíamos nessa realidade.

17


M D S  m a g a z i n e

Mas soubemos adaptar­‑nos e ajustámos os custos para poder ser mais competitivos e oferecer soluções de seguro mais económicas. Modificámos os produtos para que pudessem ser mais acessíveis para o consu‑ midor e fizemos alterações importantes na nossa estru‑ tura interna para nos prepararmos para novas circuns‑ tâncias, mais flexíveis, mais ágeis, como por exemplo o uso da tecnologia para simplificação dos processos. A própria estrutura da MAPFRE foi simplificada para poder abordar novos desafios, e inclusive tivemos a ousadia de abordar novos modelos de negócio nos períodos mais difíceis da crise. O modelo Verti de distribuição digital de seguro auto‑ móvel foi lançado em plena crise. “Como é que vocês se atrevem?”, perguntavam­‑nos. Não só o lançámos em plena crise como também acreditamos que a crise nos serviu para aprender e desenvolver esse modelo para mais tarde exportá­‑lo para a China e para os Estados Unidos.

E o Brasil, pode ser um problema no futuro? Vendo os resultados da MAPFRE no primeiro trimestre, nota­‑se a descida do Brasil. Há dois anos crescíamos 16% e agora estamos a crescer em moeda local 1%, mas é normal. Em Espanha estivemos a decrescer durante 3 ou 4 anos. Isto não nos assusta. Diziam­‑nos: “Se Espanha se afunda, a MAPFRE vai deixar de ser a MAPFRE”. Não, a Espanha não se vai afundar, isso era evidente para nós. O Brasil não se vai afundar, mas necessita de um ajuste importante. Necessita de estruturas laborais mais flexiveis. Precisa de ser muito mais competitivo, em termos de produtividade e ganhos de eficiência, mas isso exige medidas políticas por parte dos governos. Estamos conscientes de que a realidade atual não lhes agrada, da mesma forma que não agrada aos investidores internacionais, mas é um grande país com uma capaci‑ dade produtiva enorme. Com uma população e um cres‑ cimento demográfico brutal que lhe permite fazer tudo aquilo a que se proponha. Além disto, dispõe de impor‑ tantes recursos naturais, de energia, de mercado interno. Por tudo isto, o Brasil não deve ser um problema. O plano estratégico a três anos da MAPFRE, a nível internacional, chama­‑se “Foco no crescimento rentável”. O crescimento e a rentabilidade andam de mãos dadas. Se não houver rentabilidade não queremos crescimento. Este ano não nos importa sacrificar algum crescimento em troca de manter os níveis de rentabilidade, porque isto é o que nos vai dar mais tarde a capacidade de conti‑ nuar a crescer e de não ficarmos nervosos quando os mercados se descontrolam um pouco. Também nos permite atuar com toda a naturalidade na abordagem dos problemas, sabendo que o negócio que temos é extre‑ mamente “saudável” e que ainda podemos ceder na margem e negociar com o mediador e com o cliente para que todos enfrentemos em conjunto os momentos mais difíceis.

18

Sede da MAPFRE, Madrid.

A Fundación MAPFRE tem um papel importante. É uma presença constante e é a maior acionista da MAPFRE. Isto dá­‑nos confiança a longo prazo, porque o principal acionista não tem interesses empresariais diferentes dos da própria MAPFRE, e desenvolve uma atividade que permite retribuir ou devolver à sociedade, vendo o retorno daquilo que, em nossa opinião, ajuda a melhorar as vertentes que consideramos básicas numa comunidade, como a educação, a saúde, a cultura e a melhoria das condições de vida.


fullcover

Portanto, temos confiança no Brasil, da mesma forma que a tivemos em Espanha. Em Espanha os políticos fizeram o seu trabalho e os políticos do Brasil também o terão de fazer. Nem tudo está nas mãos da empresa e da sociedade.

O que é que se deve fazer para que a crise como a que tivemos não se repita? A sociedade, a educação, os valores, a cultura do esforço, a luta por viver numa sociedade mais justa e mais equi‑ librada são conceitos intrínsecos à estabilidade da sociedade. Se isto se perder, a crise aparece. E não é uma crise económica. A parte económica é apenas uma consequência. Não conhecíamos a dureza das consequências finais que sofremos em países como a Espanha e Portugal, mas sem dúvida alguma que estávamos cientes de que se estavam a perder elementos de confiança social que há que recuperar. Entendo que temos que ir mais além e exigir à socie‑ dade e às empresas que a educação, a formação e o desenvolvimento estejam baseados no mérito, na apren‑ dizagem, na paciência, no compromisso a longo prazo. Esta é a principal lição moral que eu, como pessoa, e a minha empresa vimos em tudo isto.

Como é que a MAPFRE pode apoiar? Mantendo esta política de sermos fiéis à nossa palavra. Redefinimos os nossos valores. O primeiro é a solvência e o segundo a integridade. E então dissemos, “a integri‑ dade é tudo; é qualquer comportamento que implique que vamos ser respeitados a longo prazo por todos os stakeholders, os supervisores, o setor público, todos”. E temos que ser íntegros a todos os níveis.

Qual é o papel da Fundación MAPFRE? Qual é a sua contribuição, quer à MAPFRE, que é a maior comunidade de gestão de risco e seguros, quer à sociedade de uma forma geral? A Fundación MAPFRE tem um papel importante. É uma presença constante e é a maior acionista da MAPFRE. Isto dá­‑nos confiança a longo prazo, porque o prin‑ cipal acionista não tem interesses empresariais dife‑ rentes dos da própria MAPFRE, e desenvolve uma ativi‑ dade que permite retribuir ou devolver à sociedade, vendo o retorno daquilo que, em nossa opinião, ajuda a melhorar as vertentes que consideramos básicas numa comunidade, como a educação, a saúde, a cultura e a melhoria das condições de vida. O nosso compromisso é retribuir ou devolver à socie‑ dade. Quando falamos de prevenção de acidentes, quer particulares quer ao nível das empresas, assim como a prevenção de acidentes de circulação para melhorar

a segurança rodoviária, estamos a dar um contributo relevante. Fizemo­‑lo em Espanha há 30 anos e agora estamos a levá­‑la a todos os países da América Latina. Na segurança rodoviária, cada pequeno passo que damos evita centenas de mortes por acidentes de viação na América Latina. No âmbito da formação, temos uma formação geral financeira e seguradora. Entendemos que as pessoas tomaram decisões incorretas durante a crise por falta de formação. Compraram produtos que não deveriam comprar, não só por deficiente aconselhamento, mas também por falta de conhecimento. Acabamos de criar um jogo, que chamamos “PlayPension”, que é como o Monopólio e que nos ajuda a saber como tomar decisões financeiras na nossa vida. Queremos levá­‑lo de forma gratuita aos estabelecimentos de ensino de Espanha e da América para que as crianças possam aprender que o conhecimento financeiro básico é impor‑ tante para tomar decisões adequadas.

Queremos crescer, mas o mais importante é continuar a ser uma empresa sólida, estável e com uma continuidade a longo prazo. Do ponto de vista social, não só manter o compromisso da empresa, mas continuar a incrementá­‑lo. A cultura também é muito importante. As sociedades sem interesse pela cultura acabam por perder a sua perso‑ nalidade e os seus valores. Conhecer a história ajuda­‑nos a evitar erros futuros. Em todos os países estamos a traba‑ lhar com professores e historiadores locais que têm uma visão um pouco mais neutra do que foi a evolução desde a independência dos países latino­‑americanos até aos tempos modernos. Temos coleções próprias importantes e levamo­‑las a todo mundo. Em Espanha, fundamentalmente, e no Brasil, estamos a desenvolver exposições de obras­‑primas e a fazer uma contribuição de mecenato importante para poder ajudar à divulgação dessas grandes obras. Também estamos a promover a saúde e um estilo de vida saudável. Desenvolvemos com a FIFA uma app que está a ter imenso sucesso, porque foi apresentada com alguns jogadores de futebol. Esta app tem o objetivo de mostrar em poucos passos como salvar a vida a uma criança que sofreu um ataque cardíaco repentino. Só em Espanha já morreram mais de 200 adolescentes devido ao facto de jogarem futebol aos fins­‑de­‑semana em campos sem serviço médico, já que muitas crianças não têm diag‑ nosticado o problema de coração de que sofrem. Estamos a levar esta app a todo mundo onde o futebol faz parte do dia­‑a­‑dia. Tentar evitar as doenças cardio‑ vasculares, tentar evitar a obesidade, enfim, estamos envolvidos em tudo isto.

19


M D S  m a g a z i n e

Também colaboramos com muitas instituições de investigação. Colaboramos por exemplo, com a Fundación Pro CNIC, dirigida pelo Dr. Valentín Fuster, que é uma das mais avançadas do mundo em investigação cardiovas‑ cular. Estamos a trabalhar com esta fundação num projeto em Espanha que se chama “Mulheres pelo Coração”. Este compromisso social, esta compreensão de que temos que dedicar tempo a ajudar os outros, significa muito para nós. Da América chegou­‑nos uma experiência que aqui em Espanha não estava desenvolvida, o voluntariado. Na Europa tradicionalmente não tínhamos este conceito muito desenvolvido. Em Espanha as famílias estão mais ativas do que nunca porque tiveram que se ajudar entre si. O plano de voluntariado aprovado pela MAPFRE e desenvolvido pela Fundación MAPFRE implica que a própria empresa ceda dias de férias adicionais aos trabalhadores que queiram fazer voluntariado. O tema social é muito importante, como se pode ver, e temos que o compatibilizar não só pelo lado da Fundación, mas também pelo lado da própria empresa, o que tradicionalmente chamamos Corporate Social Responsibility. Neste âmbito, acabamos de aprovar dois objetivos de compromisso social importantíssimos. Em Espanha há uma obrigação legal de que pelo menos 2% dos trabalhadores sejam pessoas com defi‑ ciência. São poucas as empresas que cumprem esta disposição. Mas nós vamos assegurar que nos próximos três anos pelo menos 2% dos nossos colaboradores em todo o mundo serão pessoas com deficiência. Outro objetivo social é desenvolver ações para faci‑ litar a igualdade entre homens e mulheres. Não discri‑ minamos, mas há que fazer atuações positivas. Em todo o mundo os departamentos de recursos humanos da MAPFRE têm o compromisso de, neste plano estratégico, pelo menos 40% dos postos de responsabilidade serem atribuídos a mulheres. Pensamos que é necessário fazer sempre um pouco mais do que aquilo a nos obriga a lei; este é o nosso conceito de contribuir para a igualdade e o desenvol‑ vimento equilibrado da empresa e da sociedade. Além disto, temos que vender seguros, temos de ser rentá‑ veis e continuar a crescer. Esta é a parte que tradicional‑ mente sabemos fazer bem.

Que legado gostaria de deixar, tanto na MAPFRE como no mercado em geral? Gostaria que esta seja uma empresa fosse saudável e solvente. Queremos crescer, mas o mais importante é continuar a ser uma empresa sólida, estável e com uma continuidade a longo prazo. Do ponto de vista social, não só manter o compromisso da empresa, mas continuar a incrementá­‑lo. A MAPFRE tem uma origem mutual, ou seja, faz parte da nossa natureza ajudar os outros. Historicamente pertencemos a mutualistas. Quando nos desmu‑ tualizámos, o objetivo era o de manter o espírito da

20

mutualidade mesmo sendo uma sociedade anónima e cotada em bolsa. Este espírito foi transferido para a fundação e é ela quem nos ajuda a perceber quais as situações sociais com as quais nos temos de compro‑ meter e quais a desenvolver. O meu maior desejo é que continuemos a ser uma empresa melhor e cada vez mais solidária e envol‑ vida na melhoria da qualidade de vida das pessoas. Não temos de renunciar a uma coisa pela outra. Tal como não devem ser apenas as ONGs a trabalhar para melhorar a sociedade, também as empresas não se devem dedicar apenas aos negócios. Esta é uma obri‑ gação que temos na MAPFRE. Sempre o fizemos, mas agora acho que até o fazemos de forma mais organizada e mais visível e com maior foco estratégico. Essa é, e será a minha maior aspiração enquanto estiver à frente desta empresa.

Desenvolvemos com a FIFA uma app que está a ter imenso sucesso, porque foi apresentada com alguns jogadores de futebol. Esta app tem o objetivo de mostrar em poucos passos como salvar a vida a uma criança que sofreu um ataque cardíaco repentino. Quando não está a trabalhar, o que é que faz para relaxar? Muitas coisas. Hoje em dia, com a tecnologia, acabamos por trabalhar mesmo quando não o pretendemos fazer, e como tal também há que encontrar tempo para o lazer mesmo quando em trabalho. A verdade é que o trabalho absorve muito e às vezes temos que tentar parar. Tenho consciência que a conciliação familiar é importantíssima, não só para estar com a família, mas também porque nós como profissionais necessitamos do nosso tempo de lazer. Tento sair do trabalho a uma hora razoável, sempre que posso. Nunca marco reuniões ao fim da tarde para poder ir para casa, ir ao ginásio ou fazer um pouco de exercício. Gosto de ler, passear, ir ao cinema, ter uma vida absolutamente normal. O que faço quando viajo, sempre que possível, é caminhar tranquila‑ mente durante uma hora e conhecer as ruas da cidade onde estou. Os meus passatempos são muito simples. Costumo andar de bicicleta pela montanha com os meus amigos aos fins­‑de­‑semana. Sou muito competitivo, tento ser sempre o primeiro a chegar, mesmo que muitas vezes não o consiga. Gosto muito desta atividade porque nos permite estar moti‑ vados, sair da rotina e que a mente e o corpo possam estar mais equilibrados. Esta é minha vida, estar com a minha família e com os meus amigos.


fullcover

Enrique Schoch e Paula Rios do grupo MDS com Antonio Huertas.

Se se retirasse hoje mesmo, como ocuparia o seu tempo livre? Faria exatamente aquilo que faço atualmente, mas com uma pequena diferença: quando estivesse em viagem poderia conhecer verdadeiramente os lugares onde vou. Continuaria a viajar, mas estou certo de que aproveitaria mais. Não mudei nada na minha vida pessoal quando assumi funções executivas de relevância no grupo nem quando cheguei à presidência. Continuo a fazer exatamente as mesmas coisas com toda a naturalidade e normalidade. Vou ao cinema e ando pelo meu bairro em Madrid à procura dos restaurantes que abriram recentemente.

Se tivesse que organizar um evento desportivo para arrecadar fundos para uma boa causa, que desporto e entidade benificente escolheria e porquê?

de equipa e até profissionais, e dizemos ” isto não deveria ser assim”. Mas qualquer desporto que não implique uma “revanche” ajuda a transmitir valores. Há pouco tempo estive no Brasil a ver um dos campus que a Fundación MAPFRE tem com o FC Barcelona como com o Real Madrid. Nesta ocasião fui ver um campus do Barcelona e mostraram­‑me como ensinavam as crianças das favelas, de áreas muito humildes. Ensinavam­‑nos a não ganhar, ou seja, a não celebrar a vitória. Quando uma criança marcava um golo e tinha o impulso de celebrá­‑lo, expulsavam­‑na do campo. Não ganhava a equipa que mais golos marcava, mas sim a que mais passes de equipa dava. Estes são métodos diferentes para entender como deve ser o trabalho em equipa. Isto é importante. Para quê? Eu acho que devemos sempre ajudar o mais débil, que é sempre a criança. Se as nossas crianças estiverem bem cuidadas e bem­‑educadas e tiverem possibilidades de conseguir uma vida melhor, certamente isto será benéfico para toda a sociedade. •

Um desporto onde houvesse trabalho em equipa, porque transmite todos os valores que normalmente defendemos. Às vezes somos confrontados com determinados comportamentos desportivos, inclusive em desportos

21


M D S  m a g a z i n e

22


fullcover

U M D O S M E L H O R E S AT L E TA S E S PA N H Ó I S D E T O D O S O S T E M P O S

Pedro Campos: vela, risco e paixão Todos os desportos têm inerente uma dose considerável de risco, mas este risco assume proporções mais relevantes quando o desporto em causa depende da imprevisibilidade de um elemento como o mar. No entanto, é curioso perceber como, mesmo pensando no mar e em momentos de grande risco como por exemplo tempestades, por vezes é também na atenção aos pequenos detalhes que reside a diferença entre o sucesso e o fracasso de um empreendimento. E foi esta relação risco/sucesso de um desporto com a Vela que nos levou a Pedro Campos, prestigiado velejador espanhol e Diretor da equipa MAPFRE na Volvo Ocean Race.

A Volvo Ocean Race, um dos eventos desportivos mais importantes do mundo, mobiliza centenas de velejadores numa regata que dá a volta ao mundo por etapas, ao longo de nove meses, passando por todas as condições de mar e de vento, desde a calmaria equatorial até ao Cabo Horn, passando pelos Quarenta Rugidores. Esta é considerada uma das competições desportivas mais duras do mundo. Basta referir, por exemplo, que uma só etapa da Volvo Ocean Race é mais demorada do que toda a prova de ciclismo do Tour de França. Além disso, na Volvo Ocean Race a competição dura 24 horas por dia, o que praticamente não acontece em mais nenhum desporto. Pedro Campos iniciou a sua carreira no mundo da vela graças ao pai, que desde pequeno o levava a navegar com ele num galeón na ria de Arosa, na Galiza. E recorda que com três anos já se atrevia a segurar o leme do barco.

Risco e segurança Como em qualquer competição, a prepa­ração é um dos fatores críticos de sucesso, e requer tempo. Segundo Pedro Campos, a preparação da regata começa assim que se conseguem os patrocinadores necessá‑ rios para concretizar o projeto. Primeiro, é preciso escolher a tripulação e o barco, por esta ordem, porque os membros mais importantes da tripulação intervêm na decisão final sobre o barco e respetivas caraterísticas. Depois, o treino da equipa e a preparação do barco estendem­ ‑se por vários meses – e até anos – antes da partida, procurando treinar sempre nas mesmas condições que enfrentarão depois na regata. Todo este trabalho resulta num bom conhecimento do barco e das respetivas caraterísticas, o que permitirá atingir a velocidade máxima em todas as circunstâncias.

23


M D S  m a g a z i n e

Rei Juan Carlos de Espanha, amante da vela, e a equipa MAPFRE.

Falando de segurança, diz­‑nos que este é o fator mais importante da preparação e da própria competição, pelo que o treino da tripulação, bem como a manutenção do barco, são cuidados fundamentais para evitar riscos. Aliás, refere, “uma das coisas que o capitão deve conhecer melhor são os limites, tanto do barco quanto da tripulação”. Outro aspeto importantíssimo é a pre‑ visão de avarias e do material de repa‑ ração eventualmente necessário que deve ser levado a bordo, para resolver o maior número de problemas que possam surgir, e evitar que uma avaria menor se torne num dano mais grave. A propósito, Pedro Campos conta­ ‑nos uma história das muitas que lhe acon‑ teceram, e que demonstra claramente como em gestão de risco não se pode cair no erro de considerar que só as grandes questões contam – pelo contrário, num ambiente tão difícil e com tantos riscos é importante estar com atenção a tudo,

24

incluindo os mais pequenos detalhes, sob pena de poder pôr em causa um grande projeto ou empreendimento. Durante um treino no Pacífico Sul, a muitas milhas de distância de terra, caiu ao mar, por descuido, o único recipiente que existia no barco em que se podia aquecer água para preparar a comida liofi‑ lizada, e que era lavado normalmente na popa. O que parecia um acontecimento sem importância converteu­ ‑se num grande problema, porque não se poderia preparar a comida a bordo. É óbvio que sem uma alimentação adequada, o rendi‑ mento da tripulação cairia a pique e aumentariam exponencialmente os riscos de uma avaria grave. Por fim, a solução do problema passou por uma conversa com a equipa de terra para encontrar uma forma de aquecer água com outros objetos disponíveis a bordo. A equipa acabou por consegui­‑lo usando uma lata de fachos de socorro e muita fita adesiva. Depois deste incidente,

passaram a levar sempre um recipiente com asa, mantendo­‑o permanentemente preso por um cabo de segurança, para que não pudesse perder­‑se durante a lavagem. Deste pequeno exemplo contado por Pedro Campos podem­ ‑se retirar duas grandes lições de reter quando estu‑ damos ou implementamos processos de gestão de risco numa organização ou projeto: num primeiro momento, perce‑ bemos que a análise de riscos e as corres‑ pondentes medidas de prevenção a tomar sobre os riscos identificados não foram eficazes a identificar e preparar o barco e a sua tripulação para esta situação de perda de capacidade de produção e alimentação para os seus tripulantes; e a segunda lição é que a equipa, numa situação de adversidade, conseguiu reagir e encon‑ trar uma solução alternativa. No entanto, como à data do evento a equipa estava em treinos, não foi possível medir até que ponto esta situação poderia ter afetado o desempenho em fase de real competição e impedi­‑los de ganhar uma regata.


fullcover

O momento mais difícil Perguntamos a Pedro Campos pelos momentos mais difíceis da sua carreira, e pelas lições aprendidas. Este é o momento em que nos conta um episódio ocor‑ rido, curiosamente não no mar, mas no Pântano de Entrepeñas, que descreve como “um dos momentos mais difíceis da minha carreira desportiva” – e onde menos se poderia esperar. Era um domingo de fevereiro e Pedro e os companheiros tinham ido fazer uma regata num pequeno barco. Ao chegar ao clube, embarcaram num bote com motor fora de borda para ir até ao barco, que estava ancorado a pouca distância. Estava muito vento e fazia muito frio e, embora o pântano seja pequeno, tinha­‑se formado uma certa ondulação devido ao vento forte. A meio do caminho, depois de apenas 100­ ‑150 metros, a proa do bote afundou e este inundou­‑se, voltan‑ do­ ‑se em dois segundos. Por sorte, o bote manteve­‑se a flutuar, porque tinha um fundo estanque. Embora a margem estivesse muito perto, a temperatura da água e os agasalhos, que os impediam de nadar, dificultavam a chegada a terra.

Pedro Campos ao leme.

Além dos riscos, as equipas têm de enfrentar por vezes etapas duras em que estão a perder de forma sucessiva, mas em que ainda assim conseguem “mudar o rumo” e vencer. Segundo Pedro Campos, “a base da motivação é a mentalização de toda a equipa, que treina para estar habi‑ tuada a dar sempre o máximo”. Há muitos elementos que contribuem para manter a motivação da tripulação, a começar pela liderança dos principais responsáveis – e que poderia resumir­‑se em não confiar demasiado na vitória, nem desmoralizar­‑se com as derrotas. Também nos diz que “é necessário valorizar muito os rivais e ter­ ‑lhes um grande respeito, mas sabendo ao mesmo tempo que é possível vencê­‑los”. Por outro lado, a vida das dez pessoas a bordo é difícil, porque o ambiente é duro e porque se exige estar sempre a 100%. Para tal é fundamental que exista harmonia entre as pessoas, e esta deve conseguir­‑se logo na fase anterior à saída, durante a preparação do barco e durante os treinos.

Em gestão de risco não se pode cair no erro de considerar que só as grandes questões contam – pelo contrário, num ambiente tão difícil e com tantos riscos é importante estar com atenção a tudo, incluindo os mais pequenos detalhes, sob pena de poder pôr em causa um grande projeto ou empreendimento.

Por sorte, o armador do barco estava perto e chegou até Pedro e os companheiros num pequeno bote a remos. Decidiram que não tentariam subir para o bote, para não o afundarem e também porque era muito pequeno e eles eram muitos. Em vez disso, agarraram­‑se aos lados, mantendo metade do corpo fora da água para evitar estar completamente submersos na água gelada, e assim poderem chegar à margem sem mais problemas. Recorda que um dos tripulantes tinha um fato de neopreno, podendo assim ficar no bote naufragado, que continuava a flutuar, ajudando o marinheiro do clube, que não sabia nadar. Felizmente, tudo acabou bem e ninguém sofreu de hipotermia, mas sem a ajuda do barco a remos a situação certamente se teria complicado. Pedro Campos confessa­‑nos que a grande lição aprendida naquele dia foi a de que nunca se deve facilitar, em especial quando as condições são difíceis, e que as

25


M D S  m a g a z i n e

normas de segurança devem ser sempre sagradas e da máxima exigência, porque quando menos se espera pode surgir um problema.

Apoios: essenciais para a vitória De todos os troféus ganhos – e já são muitos e todos importantes – Pedro confessa­‑nos que “o que mais me orgulha é ter vencido cinco campeonatos do mundo seguidos, na classe ¾ Ton, entre 1990 e 1994, em três países diferentes” – e crê que ainda ninguém conseguiu ultra‑ passar este recorde. O rei emérito Juan Carlos é um amante da vela e amigo de longa data de Pedro Campos, que salienta o papel funda‑ mental da Família Real na dinamização deste desporto em Espanha, afirmando que “a sua presença habitual nas prin‑ cipais regatas e o permanente apoio aos velejadores espanhóis tem sido um dos elementos­‑chave para que todas as modalidades da vela tenham tido tanto êxito no nosso país”.

Pedro vê os patrocinadores como sendo essenciais para a sobrevivência de desportos como este e não hesita quando refere que “hoje em dia, nenhum desporto de alta competição sobrevi‑ veria sem patrocinadores e a vela não é exceção”. Desde as escolas de vela até à vela olímpica, os campeonatos do mundo ou a vela oceânica, a contribuição dos patrocinadores é indispensável para se poder competir com possibilidades de vitória. Cabe aos atletas rendibilizar esses investimentos. E conta­‑nos como tudo começou com a MAPFRE: a relação foi iniciada com uma volta ao mundo sem escalas, a Barcelona World Race de 2010­‑2011 em que a equipa, patroneada pelos campeões olímpicos Iker Martínez e Xabi Fernández, conse‑ guiu dar essa volta ao mundo sem aportar a terra, conquistando um segundo lugar em termos absolutos e sendo os primeiros espanhóis até hoje a ostentar este recorde. Em conjunto com a MAPFRE, são os espanhóis mais rápidos a fazer a circum­ ‑navegação. Foi tal o êxito daquela volta ao mundo que a própria seguradora destacou a notoriedade da marca MAPFRE, tal a quantidade de vezes que foi mencio‑ nada nos meios de comunicação. Desde então, a colaboração com a MAPFRE tem sido de tal forma intensa que já fizeram em conjunto mais duas voltas ao mundo, desta vez com escalas, na Volvo Ocean Race, passando pelos mercados mais importantes para a MAPFRE como Espanha, Brasil, China, Estados Unidos e o resto da Europa, alcançando valores de reconhecimento da marca muito elevados – já que a MAPFRE, além de estar presente nos 5 continentes, dá o nome a esta “equipa da volta ao mundo”. Naturalmente, esta situação contribui enormemente para a presença da marca, quer nos meios de comunicação social quer em ações diretas com clientes.

Qualidades essenciais ­‑ na vela e na empresa

Pedro Campos quando ia velejar com o pai na sua infância.

26

Questionamos Pedro Campos sobre a tomada de decisões em situações de grande pressão e sobre as qualidades necessárias para liderar este tipo de


fullcover

A embarcação da MAPFRE na Volvo Ocean Race.

equipas. Confirma­‑nos que, de facto, a tomada de decisões numa competição, quando se está a participar num campeo‑ nato ou quando as condições são duras, e, sobretudo, quando coincidem as duas circunstâncias, “requer muito sangue frio e toda a experiência possível”. Neste sentido, as qualidades que considera essenciais são a confiança mútua entre o capitão e a tripulação, a experiência de trabalho em equipa, um grande conhe‑ cimento do barco e dos rivais, e a capaci‑ dade de concentração e sangue frio, que se conseguem com o tempo e a prática. Recorda muitos momentos de grande tensão em competição, salientando como aquilo que provavelmente mais o marcou o ocorrido em San Diego, em 1992, quando Espanha participou pela primeira vez na Copa América. No início da primeira regata, sentia que tinha nas suas, como capitão, a responsabilidade da imagem de todo um país numa data tão signi‑ ficativa como o quinto centenário do Descobrimento da América. No fim, saiu

tudo perfeito: ganharam a saída e a primeira regata contra os australianos, e com aquela vitória fizeram Espanha “entrar pela porta grande” na competição mais antiga do mundo. Também vê semelhanças entre a vela e o mundo empresarial, destacando como um dos paralelismos o da vela oceânica, onde se enfrentam primeiro os elemen­ t­os, cujo equivalente empresarial é o mercado: sempre variável, às vezes difícil de prever e onde o vento e o mar estão alternadamente a nosso favor ou contra, tal como acontece com as empresas. Como outro fator refere os rivais, que condicionam a nossa estra‑ tégia e a nossa tática, o que também acontece com as empresas concorrentes. O objetivo final de tentar fazer melhor que eles é também o mesmo. Questionado sobre se imagina algum dia deixar o mar, Pedro Campos responde: que “não tenho dúvidas de que esse momento chegará, mas espero que ainda

demore!” Isto porque, explica­ ‑nos, “o des­­­ ‑porto da vela tem uma grande vantagem relativamente aos demais: é que se pode competir praticamente durante toda a vida, ao contrário de outros desportos, cuja exigência física impõe o abandono, muito antes”. E termina, acrescentando que “na vela existem dois ingredientes cuja soma deve manter­‑se estável: um é a forma física e o outro é a experiência – e à medida que um vai diminuindo, o outro aumenta”. Afinal, na vela como na vida, se os anos retiram vigor, em contrapartida trazem sabedoria. No caso de Pedro Campos, em grande forma, atrevemo­‑nos a dizer que, para já, conta com ambos! Depois desta conversa, estamos certos que a paixão que traz desde pequenino – basta vê­‑lo na foto‑ grafia tirada aos três anos, já firme ao leme – o acompanhará pelo resto da sua vida. •

27



M D S  ma  m a g a z i n e

RECORDANDO

Pedro Macedo POR JOSÉ RIBEIRO

Pedro Macedo, CEO da MAPFRE RE e um reputado profissional no setor ressegurador faleceu em maio passado. José Ribeiro, Managing Director – Asia Pacific de A.M.Best e ex­‑diretor de Mercados Internacionais do Lloyd's, recorda o seu profissionalismo e generosidade.

Conheci profissionalmente o Pedro mais de perto quando ainda estava como responsável pelos Mercados Internacionais do Lloyd’s, região que basicamente cobria todas as operações mundiais excepto os EUA. Nessa capacidade precisava de contactar a MAPFRE ao mais alto nível e nessa altura o responsável era o Sr. Martinez Martinez (o nome é mesmo repetido!). O meu responsável e presidente na altura, Lord Peter Levene, que é uma pessoa fantástica e até hoje um amigo, era muito ansioso. Queria ir a Madrid ver o responsável da MAPFRE e tinha de ser nessa semana pois queríamos convencer a MAPFRE a criar um sindicato no Lloyd’s e para isso a janela de tempo era curta. Mandei um email, liguei pessoalmente mas era impossível sermos recebidos nessa semana.

Pedro Macedo.

“O Pedro era um trabalhador incansável, um excelente profissional e uma pessoa que conhecia muito bem o mercado mundial, com especial foco na América Latina”.

Até que me lembrei da “Tuga” connection! Pode-se pensar que não mas é uma ligação extremamente importante fora do nossos país. Liguei para o Pedro, que na altura era o CEO da MAPFRE RE, e basicamente disse-lhe que já tinha tentado tudo mas que o Sr. Martinez não nos ia poder ver nessa semana e que para mim isso era um problema. O Pedro prontificou-se para ajudar e no dia seguinte não só tínhamos a reunião marcada, como o hotel confirmado e um carro para andar connosco em Madrid! Este era o Pedro, um homem com H grande, bom amigo, generoso e prestável. A MAPFRE RE deve muito ao Pedro. Um trabalhador incansável, um excelente profissional e uma pessoa que conhecia muito bem o mercado mundial com especial foco na América Latina. Desenvolveu muito a MAFRE RE que sob a sua lideranca teve um excelente desempenho e aumentou a sua exposição geográfica. Na América Latina tivemos a oportunidade de nos encontrarmos várias vezes e fizemos vários negócios juntos. Bastava a palavra dele para o negócio ser feito. Faz muita falta à MAPFRE RE e aos amigos e colegas que com ele trabalharam e que o conheceram de perto. •

29


A INS B PERSEGU UM SONH


ACCLAIM SURANCE BROKERS UIR HO


Anthony Lim discursa no 30ยบ aniversรกrio da MDS.

32


fullcover

Ao longo dos últimos 34 anos, Anthony Lim, fundador e presidente­‑executivo da Acclaim, transformou a empresa num dos principais corretores independentes de Singapura, que conta hoje com mais de 60 colaboradores. A fullcover foi saber mais sobre o seu percurso para o sucesso e a relação com a Brokerslink.

Perseguir um sonho O percurso começa em 1982 com o sonho de Anthony Lim de “ser o melhor corretor de seguros possível”. “Eu era jovem, inocente e ingénuo”, afirma, “mas um ano depois, criei a empresa e fiz a minha primeira transação em janeiro de 1983. A empresa era só eu e, portanto, fui entregar a minha primeira apólice a pé. Embora a minha empresa fosse pequena em compa‑ ração com outras, a minha ambição era fazer dela uma empresa nacional”. Passado um ano, numa altura em que Anthony Lim ainda estava a aprender a “gatinhar”, Singapura sofreu a primeira recessão pós­‑independência. No início de 1984, já havia sinais alarmantes de abran‑ damento da economia, mas um mercado de construção em expansão fazia subir os números globais. No entanto, no final do ano, o mercado de construção estava saturado e só alguns projetos estavam em vias de conclusão. Singapura enfrentava uma crise! Para manter a empresa à tona, Anthony Lim trabalhou sem nenhuma remuneração durante um ano, mas asse‑ gurou que todos os membros da sua equipa recebiam atempadamente. Para crescer, a empresa tinha de se posi‑ cionar ativamente no mercado. Anthony Lim aderiu a várias organizações, incluindo a Associação de Corretores de Seguros de Singapura (SIBA), da qual foi eleito presidente em 1998. No mesmo ano, foi convidado pelo governo para traba‑ lhar em várias comissões de finanças e seguros (criadas para ajudar a tirar Singapura da crise que enfrentava) e,

numa tentativa de aumentar a visibili‑ dade internacional da Acclaim, Anthony Lim criou a Singapore International Insurance Brokers Conference, uma conferência que atraiu delegados de mais de 25 países (a Conferência de 1998 foi tão bem­‑sucedida que se tornou num grande evento bienal na região). Em 2003, foi eleito presidente da Federação Mundial de Mediadores de Seguros, uma asso‑ ciação global de corretores e agentes de seguros com membros em mais de 80 países. Durante este período, verificavam­‑se mudanças profundas em todo o mundo ao nível da regulamentação. Com a influência obtida através dos cargos internacionais que ocupou, Anthony Lim convidou profissionais de seguros com posições de destaque no mundo inteiro para um Fórum de Líderes de Seguros, em Singapura. Este Fórum não só deu às companhias de seguros e aos corretores locais e regionais uma oportunidade de entender o impacto das mudanças e a forma de atuar em função das mesmas, como juntou os corretores e os regu‑ ladores, permitindo que tivessem um diálogo aberto. Enquanto a maioria dos corretores de seguros ainda se debatia com as conse‑ quências da crise económica e as cons‑ tantes mudanças regulamentares, a Acclaim deu início a um conjunto de fusões e aquisições de corretoras de seguro locais. Com a consolidação das respec‑ tivas carteiras de negócios, a Acclaim ficou em melhor posição para competir no mercado.

33


M D S  m a g a z i n e

34 anos de serviço

José Manuel Fonseca e Anthony Lim no stand da Brokerslink, PARIMA, Singapura 2015.

O sonho de um homem de se tornar “o melhor corretor possível” é agora ultrapassado pelo sonho partilhado da equipa Acclaim de “ser um grupo de consultoria de riscos de grande proximidade, líder na alta tecnologia, num espaço de grande valor”

34

Anthony Lim refere: “Onde outros viam desafios, nós víamos oportunidades; muitas zonas da Ásia encontravam­ ‑se ainda relativamente inexploradas e com diferentes graus de liberalização, e o conceito de gestão de risco estava a começar a enraizar­‑se na Ásia, apresen‑ tando novas oportunidades. Singapura estava (e continua a estar) bem posicio‑ nada para trabalhar com os players exis‑ tentes no mercado e com os novos, pelo que, para aproveitar estas oportuni‑ dades, decidi expandir a equipa de lide‑ rança. Queria uma pessoa com expe‑ riência global, que tivesse trabalhado em empresas multinacionais e, depois de três anos de procura, convenci Tony Lim (não somos parentes!) a integrar a Acclaim como CEO e acionista”. Tony Lim integrou a Acclaim em 2011 como diretor­ ‑geral e CEO, trazendo consigo 28 anos de experiência de trabalho em alguns dos principais corre‑ tores de seguros à escala internacional e em todos os segmentos de negócio. A experiência e o conhecimento de Tony Lim na estruturação, implementação e oferta de soluções de risco globais e regio‑ nais aos clientes de vários setores em mais de 20 países são difíceis de encontrar.

Este ano, a Acclaim celebra 34 anos de ativi‑ dade. Uma das maiores empresas nacio‑ nais e independentes de consultoria de riscos e de corretagem de seguros e resse‑ guro em Singapura, a Acclaim é especia‑ lista na colocação de risco, na gestão dos de sinistros, na consultoria e na engenharia de riscos. Em 2015, a receita da empresa foi de 8 milhões de dólares – superior à de alguns corretores de seguros internacio‑ nais de Singapura. Ao longo dos anos, a Acclaim cons‑ truiu a reputação de ser “diferente de outros mediadores de uma forma posi‑ tiva”, sendo reconhecida pelos padrões elevados do seu serviço, pela rapidez de resposta, pelos preços competitivos, pela tecnologia de alto desempenho e pela gestão de clientes/sinistros. Para a equipa da Acclaim, a principal prioridade são os clientes. Esta prio‑ ridade, conhecida como Defesa do Cliente, significa mais do que a criação de soluções empresariais adaptadas às necessidades dos clientes, consubstan‑ ciando­‑se na oferta de uma ótima expe‑ riência ao cliente, na construção de rela‑ ções fortes e poderosas e na criação de equidade emocional. Outra prioridade é a Reclamação de Sinistros, um processo de gestão de sinis‑ tros, mais do que de resolução de sinis‑ tros, que dá à equipa uma vantagem competitiva. Tony Lim acrescenta: “Ter agilidade e reinventar a experiência com sinistros é fundamental. Os sinistros não devem ser vistos como um processo final que não acrescenta valor – deverão ser considerados o fator diferenciador de valor. E é nesta área que a Acclaim se pode orgulhar de um conjunto de casos de negociação bem­ ‑sucedida em favor dos clientes”. A Acclaim acredita que o sucesso presente e futuro da empresa depende das suas pessoas. Atrair e manter o talento é mais importante do que nunca e é por esta razão que a empresa se propôs iniciar um movimento de angariação de talentos, escolhendo profissionais de seguros experientes em várias áreas de especia‑ lidade, tais como: agricultura, aviação, construção, crime, Directors & Officers Liability (D&O), employee benefits, respon‑ sabilidade civil (geral), marítimo (cascos e carga), risco político, responsabilidade


fullcover

civil profissional, danos patrimoniais, resseguro, garantias e obrigações e crédito ao comércio. Cada um destes profissionais traz diferentes experiências de trabalho com empresas multinacio‑ nais, bem como clientes com escritórios regionais e globais. Por último, mas não menos importante, temos a tecnologia. Goste­‑se ou não, faz parte da nossa vida e é um dos ingredientes­ ‑chave para a sobrevivência neste ambiente acelerado. À medida que cada vez mais empresas se expandem além­‑fronteiras ou nas suas regiões, manter a ligação com os clientes é fundamental. Tony Lim explica: “Os clientes esperam que os corretores e as companhias de seguros ofereçam ferramentas infor‑ máticas de comunicação, informação e análise que lhes permitam acompa‑ nhar o desempenho e o progresso dos seus programas de seguro. A Acclaim está, de facto, a utilizar a tecnologia para aumentar a produtividade e melhorar a eficiência – estamos a desenvolver um sistema que permite aos clientes fazer a participação dos sinistros on­‑line e seguir o progresso dos mesmos todos os dias a qualquer hora em qualquer parte do mundo. Já não precisam de esperar por relatórios trimestrais para analisarem as tendências dos sinistros ou para levarem a cabo exercícios de gestão de riscos”.

E continua: “Este investimento em tecnologia demonstra o nosso compro‑ misso com o serviço ao cliente e irá ajudar­ ‑nos, bem como aos nossos clientes na região e no mundo e às respetivas estra‑ tégias de crescimento externo. Singapura tem um mercado nacional relativamente pequeno, pelo que não surpreende que a Ásia – com o suporte que implica a rati‑ ficação de acordos de comércio livre por parte do governo e da nossa condição de membros da Comunidade ASEAN – seja o nosso foco principal”.

Adesão à Brokerslink – alcance global, sem perder a proximidade A adesão à Brokerslink permite assegurar que a Acclaim continuará a prestar um serviço excecional. Reforça a capacidade da empresa para criar uma gama completa de soluções de seguro globais, coorde‑ nadas e geridas através dos parceiros locais da Brokerslink e, nas palavras de Tony Lim: “É como se fosse uma empresa multi‑ nacional sem ter de suportar os custos dessa dimensão”. A Brokerslink permite também o acesso a recursos especiali‑ zados de resseguro, a conhecimento espe‑ cializado, à gestão de cativas e à mode­ lação de riscos.

Anthony Lim, Tony Lim e Robert Tan nos escritórios da Acclaim em Singapura.

Mas como teve início esta parceria? Numa manhã gélida, em 2006, decorria num hotel de Londres a primeira Conferência Global Heath Lambert. Anthony Lim estava a tomar o pequeno­ ‑almoço e não pôde deixar de reparar no alvoroço de pessoas e atividades no hotel e no restaurante. A possibili‑ dade de conhecer quem quer fosse num ambiente tão agitado parecia ínfima. No entanto, naquele momento, José Manuel Fonseca (CEO da Brokerslink e orador na conferência), que não conseguia encon‑ trar uma mesa livre, dirigiu-se a Anthony e perguntou­ ‑lhe se podia sentar­ ‑se. A ligação foi imediata, continuou ao longo da conferência e mantém­ ‑se até hoje. Pouco tempo depois, José Manuel Fonseca visitou Anthony Lim em Singapura, esta‑ belecendo as bases para uma relação profissional e uma forte amizade, até um ponto em que, brincando, dizem ser “irmãos de pais diferentes”. Naquela altura, José Manuel Fonseca era presidente de uma pequena rede euro‑ peia chamada Brokerslink e a Acclaim era membro da PanAsia Alliance (PAA), uma aliança de corretores asiáticos. Em 2008, a PAA, a Alinter (uma rede de corretores da América Latina) e a Brokerslink fun­ diram­ ‑se, criando a Brokerslink Global. Anthony Lim refere: “O José estava tão entusiasmado com a fusão das nossas redes que começou imediatamente a planear e a definir estra­tégias para o nosso futuro comum. Quando ouvi a visão do José, tive a certeza de que ele era uma daquelas pessoas que fazem a diferença”. Anthony acredita que a Brokerslink Global não é como as outras redes: “É calorosa, acolhedora e, acima de tudo, os membros têm uma paixão e uma motivação inigualáveis. Há um ditado segundo o qual se nos rodearmos de sonhadores e criadores, os resultados serão exponenciais. Os nossos membros são, na sua maioria, empreendedores por natureza – não são apenas entidades com uma boa situação financeira – e todos eles pretendem deixar a sua marca no mundo”. Descrevendo outro momento marcante, Anthony Lim diz: “A Conferência Global da Brokerslink de 2013 foi o segundo evento da rede, que teve lugar na Ásia, e a Acclaim teve o privilégio de desempenhar o papel de anfitriã de mais de 50 países. Os programas foram uma

35


M D S  m a g a z i n e

A N T H O N Y L IM

José Manuel Fonseca e Anthony Lim em Sidney (Brokerslink Asia Pacific Regional Conference, 2016).

ACCLAIM E MDS – UMA RELAÇÃO PRÓXIMA NAS PALAVRAS DE ANTHONY LIM "Fiz questão de estar presente no 30.º aniversário da MDS para partilhar a alegria e o orgulho da empresa. Como parte das celebrações, fui convidado a dirigir um Fórum de Liderança para mais de 20 líderes da MDS durante dois dias. Lembro­‑me do entusiasmo dos líderes da MDS – em vez de se fixarem nas diferenças entre eles, centraram­‑se nos pontos fortes e naquilo que tinham em comum. Durante o tempo que estivemos juntos, mantiveram o espírito e a mente aberta e trabalharam na integração dos pontos de vista de cada um. Esta atitude reforçou a determinação e motivação enquanto equipa, abrindo caminho para o sucesso".

36

→ Anthony Lim é o fundador e presidente executivo da Acclaim. Fundou a empresa em 1982. → É presidente da Associação de Corretores de Seguros de Singapura desde 1997, o presidente eleito mais longevo de sempre. → Foi a primeira personalidade da região da Ásia-Pacífico a ser eleita presidente da Federação Mundial de Intermediários de Seguro (WFII), tendo cumprido o mandato em 2007/2008. → Tem uma pós-graduação da Asia‑Pacific Executive (APEX) e um MBA em Administração de Empresas da Universidade Nacional de Singapura. → Proferiu palestras em diversas conferências e em vários seminários internacionais de seguros. É um conversador nato e um entusiasta da boa comida. → Nos tempos livres gosta de velejar. É comodoro do Singapore Changi Sailing Club (CSC) desde 2009. A Acclaim Insurance Brokers patrocina a Regata da Acclaim desde 2009. → Anthony Lim gosta de restaurar casas tradicionais. A sua paixão pelo restauro começou em 1988 quando, em busca de uma nova casa, encontrou uma casa geminada em ruínas. “Estava suja e degradada, mas vi muito charme e muita beleza”, disse Lim.


fullcover

Anthony Lim, Robert Tan, Tony Lim e José Manuel Fonseca no 30º aniversário da Acclaim.

boa conjugação de debates sérios e expe‑ riências gastronómicas únicas e cara‑ terísticas de Singapura, o que permitiu que os nossos convidados aprendessem mais sobre a nossa cultura e história. Não obstante as muitas memórias felizes que tenho da conferência, pessoal‑ mente, a minha preferida foi a nossa sessão de “cantorias” no Jantar de Gala da última noite. Olhei em volta e vi todos os parceiros a cantarem em conjunto música da nossa juventude, e fiquei mara‑ vilhado como o facto de Beatles, Elvis Presley e outro ícones musicais ainda conseguirem juntar pessoas de todas as raças e contextos culturais. Recordo este momento em especial com grande carinho e fico muito grato por saber que as relações dentro da nossa organização e a nossa amizade acompanham os nossos negócios. Acredito que a confiança mútua e a interligação que estabelecemos na Brokerslink Global é única e irá resistir ao teste do tempo. Tenho grandes espe‑ ranças para todos nós e aguardo com muita expectativa o reencontro com parceiros de negócio e amigos na nossa Conferência em Amesterdão, no final deste ano”.

Seguir em frente O setor segurador está em constante mutação e a uma velocidade cada vez maior. Só em 2015, houve um número infi‑ nito de aquisições e fusões, e reestrutura‑ ções sem fim de seguradores internacio‑ nais. Uma situação que se tornou ainda mais complexa pelo facto de as autori‑ dades do mundo inteiro estarem a endu‑ recer a regulamentação. Os chineses têm um ditado, que traduzido à letra signi‑ fica “os peixes grandes comem os peixes pequenos”. Ser pequeno é ser vulnerável e quando os grandes ficam maiores, os pequenos parecem ainda menores. A direção da Acclaim está plenamente ciente da necessidade que os corretores independentes têm de oferecer um nível e uma gama de serviços sustentados na tecnologia semelhante ao dos corre‑ tores internacionais cotados e líderes do mercado. Ser parte de uma rede maior é uma forma de o conseguir, que permite aos membros tornar­ ‑se acionistas e proporciona financiamento e recursos fundamentais para oferecer um serviço personalizado, mas global. O sonho de um homem de se tornar “o melhor corretor possível” é agora ultra‑ passado pelo sonho partilhado da equipa Acclaim de “ser um grupo de consultoria de riscos de grande proximidade, líder na alta tecnologia, num espaço de grande valor”.

Nesta economia interconectada, alta‑ mente competitiva e complexa, a Acclaim sabe que os clientes estão mais bem infor‑ mados e mais sofisticados, pelo que os corretores de seguros já não podem ser apenas intermediários à espera de gerar receitas através da simples colocação de seguros. Para continuarem a ter um papel de relevância e serem bem­ ‑sucedidos, têm de ser prestadores de serviço de valor elevado que promovam a inovação e a colaboração no setor. Na Acclaim, continuarão a fazê­ ‑lo “à sua maneira”. Anthony Lim conclui: “Embarcámos numa aprendizagem e num serviço para o resto da vida com todo o entusiasmo. Integramos a nossa oferta de serviços nas cadeias de forne‑ cimento dos clientes, mas, procuramos compreender os negócios dos nossos clientes e os seus contextos antes de criarmos soluções de seguros adaptadas às suas necessidades”. Tal como a sua bem­ ‑amada nação, Singapura, evoluiu, passando de um pequeno ponto vermelho no sudeste da Ásia (um porto em dificuldades nos anos de 1950 sem um interior natural e sem recursos) para um país independente e próspero, a Acclaim também cresceu, tendo­‑se tornado num dos grandes players do mercado asiático. •

37


M D S  m a g a z i n e

Singapura Por Anthony Lim

Ilustração por José Cardoso

Uma das melhores formas de conhecer uma cidade é através dos olhos dos seus habitantes. Partner da Brokerslink, Presidente Executivo e Presidente da Acclaim Insurance, e amante de cozinha refinada, Anthony Lim é apaixonado por Singapura, motivo pelo qual foi com grande entusiasmo que partilhou com a FULLCOVER as suas experiências e o seu entusiasmo pela cidade. Anthony levou-nos numa viagem pela cidade, abordando a sua história e destacando locais de interesse, assim como os seus cafés, bares e restaurantes favoritos.

38


fullcover

A HISTÓRIA A história de Singapura começou há cerca de 200 anos, quando Sir Stamford Raffles fundou o país como entreposto comercial da Companhia das Índias Orientais. Quando a Companhia entrou em colapso, em 1874, o país tornou-se uma colónia britânica. Singapura declarou a independência do Reino Unido em 1963 e uniu-se a Sabah (Bornéu do Norte) e a Sarawak na Federação da Malásia. Dois anos depois declarou soberania. Apesar das mudanças no poder ao longo dos últimos 50 anos, Singapura cresceu e tornou-se um centro mundial de comércio, finanças e transportes; alguns comentadores descrevem-na como um dos “tigres económicos” da Ásia. O país é o exemplo clássico de “Oriente encontra o Ocidente”. Os edifícios asiáticos tradicionais surgem paredes-meias com a arquitetura colonial moderna. Batizada “cidade-jardim” (devido ao grande número de árvores que ladeiam as ruas),

residentes e turistas estão igualmente sujeitos aos elevados padrões de disciplina e comportamento. Mastigar pastilha elástica é proibido e os infratores apanhados a deitar fora pastilha elástica num local público ou a transportar grandes quantidades da mesma podem ser multados até 1000 dólares. Deitar lixo para o chão também dá direito a multas: 300 dólares para os infratores primários que atirem pequenas coisas, como beatas de cigarros ou papéis de rebuçados. O vandalismo é também um delito grave com sanções que incluem multas, prisão e três a oito vergastadas com uma cana. No Cais de Clarke, onde as mulheres em tempos trabalharam junto ao rio, irá encontrar atualmente bares prósperos e clubes e restaurantes chiques, paredes-meias com a arquitetura colonial histórica, lojas de antiguidades restauradas e com o Supremo Tribunal.

LOCAIS DE INTERESSE Kampong Glam É o reduto da comunidade árabe e malaia de Singapura e é reconhecido como o seu «centro nevrálgico». Veja o palácio de famílias aristocráticas de Singapura, atualmente um museu e, do outro lado da rua, na famosa Haji Lane, visite as fileiras de cafés independentes e lojas de especialidade. Aqui encontrará café artesanal, menta, discos de vinil, roupa vintage e bugiganga dos Himalaias, tudo a pouca distância entre si. Ao virar da esquina, lojas familiares, que ali estão há décadas, ladeiam a Rua Árabe. Aqui pode personalizar um perfume com óleos da Turquia, escolher um cesto de verga feito à mão ou fumar shisha – tabaco misturado com fruta e açúcar de melaço. Aprecie a mesquita ao pôr do sol, o palácio de Sultões do passado e saboreie uma chávena do melhor café da cidade – Anthony promete que não ficará desiludido.

Tiong Bahru É um dos bairros mais antigos de Singapura, contudo, ao longo dos últimos dois anos, cafés chiques e pequenos restaurantes surgiram por todo o lado, tornando a área num íman para os amantes de comida. Os mais notáveis são o PS Cafe Petit e a Padaria Tiong Bahru, ambos locais de culto apreciados por bloggers de comida e de moda de todo o mundo. E numa homenagem aos escritores, a Books Actually – uma das melhores livrarias independentes a nível mundial, um pilar da cena artística de Singapura e um refúgio para aspirantes a autores – localiza-se numa calma estrada secundária à saída da rua principal. Os edifícios inspirados na art déco, que remontam à era colonial, partilham o espaço com cafés em expansão e boutiques independentes. Se passear pelo bairro, os edifícios levam-no numa viagem no tempo desde os anos de 1950 aos anos de 1970.

Keong Saik É um antigo bairro da luz-vermelha a dois passos de Chinatown. Nas ruas sinuosas da zona encontra uma miríade de bares e restaurantes, mas os locais verdadeiramente únicos para tomar um copo podem passar facilmente despercebidos; estão escondidos e são apenas acessíveis a quem souber a palavra-chave dessa noite. A Biblioteca, por exemplo, é um restaurante normal durante o dia, com fantásticos menus fixos ao almoço e ao jantar, mas à noite a entrada para o bar só está acessível usando a palavra-chave divulgada no Facebook. A palavra-chave muda diariamente, por isso, se tiver sucesso, o porteiro autorizará a sua entrada no bar, através de uma porta secreta escondida por detrás de uma estante. As “jóias” de Singapura estão em todo o lado. Certifique-se de que explora o que a cidade tem para oferecer e não tenha medo de fazer perguntas ao singapurense que estiver mais perto. Tal como Anthony, eles adoram recomendar os seus locais favoritos a quem esteja a procura de uma experiência agradável.

39


Mercado Segurador de Singapura em números Singapura é ligeiramente menor que a cidade norte­ ‑americana de Lexington, no Kentucky, ou que Lake Taupo em Auckland, na Nova Zelândia. Em junho de 2015, estimava­‑se que tinha um total de 5,54 milhões de habitantes em apenas 719,1 quilómetros quadrados.

40


A história de Singapura Para um país pequeno e com poucos recursos naturais, a República de Singapura tem uma excecional história de sucesso. No ano passado, Singapura celebrou o seu 50.º aniversário e, embora não tenha uma história rica em acontecimentos,éumadassociedadesmaisbem­‑sucedidas na história da humanidade. Quando Singapura foi expulsa da Malásia em 1965 e empur‑ rada para uma independência indesejada, era um típico país de terceiro mundo: o rendimento per capita era de 500 dólares – à data o mesmo que o do Gana – e, embora não fosse extremamente pobre, a subnutrição era significativa. No entanto, as coisas começaram a melhorar de forma drás‑ tica: o rendimento per capita aumentou de 500 dólares em 1965 para 56 000 em 2014 – o maior crescimento registado por uma nação ainda recentemente independente.

A seguinte tabela compara o PIB per capita de Singapura com o de outros países desenvolvidos.

que moldou o seu primeiro quarto de século de existência enquanto nação independente e definiu o caminho para o seu sucesso atual. O primeiro­‑ministro Lee Kuan Yew mudou Singapura, transformando uma nação insular em dificul‑ dades numa metrópole florescente. Singapura é muitas vezes chamada a “Suíça do Oriente”. Num artigo da revista National Geographic intitulado “The Singapore Solution” é referido que o rendimento per capita dos seus 3,7 milhões de trabalhadores é superior ao de muitos países europeus, o sistema de educação e de saúde é capaz de competir com o dos melhores do Ocidente, prati‑ camente não existe corrupção por parte dos responsá‑ veis governamentais, 90% da pessoas têm casa própria, os impostos são relativamente baixos, as ruas e os passeios estão limpíssimos e não existem pessoas sem­‑abrigo nem bairros degradados. Singapura ostenta ainda uma taxa de desemprego inferior a 3%. Tendo alcançado tanto em tão pouco tempo, Singapura é um país cujo crescimento é muitas vezes visto como um milagre económico.

A tabela que se segue resume os sucessos de Singapura. PA Í S E S / P I B P E R C A P I TA (EM DÓLARES AMERICANOS)

1965

2014

Singapura

516

56.285

Suíça

2.621

85.594

Estados Unidos da América

3.665

54.630

Reino Unido

1.851

46.332

Japão

920

36.194

SUCESSOS

FATORE S

Segundo porto de contentores mais importante do mundo.

Localização estratégica, infraestruturas e tecnologias de apoio.

Cidade com o melhor potencial de investimento.

As condições de exploração favoráveis, os fortes laços diplomáticos e um clima político e económico estável criam o ambiente ideal para investir.

Segunda cidade mais competitiva do mundo.

A melhor na Ásia graças à ausência de corrupção, à eficiência governamental e ao desenvolvimento do mercado financeiro global.

Melhor inovação global na região da Ásia e Pacífico e no mundo.

O país asiático com melhor desempenho à frente de Hong Kong, da Coreia do Sul e do Japão. Distingue­‑se pelas instituições, pelo capital humano, pela investigação, pelas infraestruturas e pelo desenvolvimento das empresas.

Primeiro lugar no índice Business Environment Risk Intelligence’s Labour Force.

Força de trabalho comprovadamente produtiva e qualificada, criando um ambiente conducente ao crescimento das empresas.

Segundo lugar a nível mundial no que respeita às relações de trabalho/ empregador na Ásia.

A relação no local de trabalho entre os colaboradores e os empregadores é a melhor da região.

Fonte: Banco Mundial, 2014

Hoje, Singapura é o quarto maior centro financeiro do mundo, opera um dos mais movimentados portos de conten‑ tores do mundo e é o único país asiático com uma classifi‑ cação de crédito AAA atribuída pela Standard and Poor’s, pela Moody’s e pela Fitch. Em apenas meio século, Singapura tornou­‑se o país asiático com o maior número de milionários per capita e com algumas das pessoas mais ricas do mundo. É também uma das cidades mais agradáveis do mundo para se viver – classificada como a mais verde da Ásia. Uma das razões para este sucesso deve­‑se à combinação de alguns fatores: a posição estratégica de Singapura na impor‑ tante rota marítima entre a Índia e a China, o seu porto de grande qualidade, o seu estatuto de porto de comércio livre (concedido pelo fundador, Sir Thomas Stamford Raffles). Embora Sir Thomas Stamford Raffles tenha criado as bases para o sucesso inicial de Singapura, foi Lee Kuan Yew, cidadão ancestral e antigo primeiro ministro de Singapura,

Fonte: Conselho de Desenvolvimento Económico de Singapura, 2016

41


M D S  m a g a z i n e

O mercado segurador

Um futuro brilhante

Singapura é a base dos principais centros de decisão – é a sede de um grande número de empresas multinacionais, de mais de 70 corretores de seguros e quatro dos cinco corretores globais têm em Singapura uma plataforma regional.

Na 12.ª Conferência Internacional de Resseguro de Singapura, que teve lugar a 6 de novembro de 2013, Ravi Menon, diretor­ ‑geral da MAS afirmou: “Perspetiva­ ‑se que, na próxima década, a atividade seguradora na Ásia cresça a um ritmo anual de cerca de 8%. Até 2020, é provável que a Ásia represente quase 40% do mercado global”. Ravi Menon indicou três fatores que contribuirão para o crescimento: a Ásia está a crescer, é altamente suscetível a catástrofes naturais e está a envelhecer.

O governo tem um compromisso permanente com o desenvolvimento do mercado, criando instituições de investigação para a recolha e análise de dados em áreas de risco, promovendo ativamente Singapura não só como localização estratégica, mas também como centro de excelência em inovação; e, finalmente, criando um Quadro de Desenvolvimento de Talento – uma parceria entre a Autoridade Monetária de Singapura (MAS) e o setor segurador –, e um Programa Global de Estágios para garantir que Singapura se mantém na linha da frente.

Informação detalhada do mercado A N O D E 2 014

VALOR DE PRÉMIOS BRUTOS(EM DÓLARES DE SINGAPURA)

R ÁCIO DE SINISTR ALIDADE R E G I S TA D A

Fundo de Seguros de Singapura

3.850B

48%

Fundo de Seguros offshore*

7.918B

51,7%

*Empresas internacionais/regionais a entrar em Singapura Fonte: Autoridade Monetária de Singapura

Setor segurador asiático: um panorama em evolução O panorama no setor segurador está em evolução cons‑ tante e entre os fatores que contribuem para esta situação contam­‑se: o crescimento lento da economia, a descida das taxas e o aumento dos sinistros (o que coloca pressão nos resultados de subscrição), uma conjuntura de taxas de juro baixas (o que esmaga o retorno dos investimentos) e, à medida que o mundo avança para regimes baseados no risco, como o Solvência II, os requisitos regulamentares e de capital estão a tornar­‑se mais rígidos. Ao mesmo tempo, o potencial de crescimento é elevado. Grande parte do mundo continua numa situação de infra­‑seguro e, na Ásia, as perspetivas são especialmente animadoras. O panorama do risco da Ásia está a transformar­­‑se rapida‑ mente, levando a uma procura crescente de seguro e do resseguro.

42

Como centro de referência na área de seguros, Singapura está bem posicionada para servir as crescentes necessi‑ dades de seguro da região. O setor segurador é uma das estrelas mais brilhantes na constelação do setor finan‑ ceiro de Singapura. Sem surpresa, em 2015, o Conselho de Desenvolvimento Económico de Singapura indicou em relatório que “as empresas que pretenderem fazer negócios na Ásia deverão aproveitar a localização geográfica privilegiada de Singapura, no coração da região, bem como a coneti‑ vidade global e as políticas que favorecem as empresas. É a primeira escolha para as principais empresas globais no setor dos bens industriais e dos serviços e uma das primeiras cinco para as empresas de comunicação e financeiras”. Singapura é também membro da Comunidade Econó­ mica da ASEAN1 (CEA). A criação da CEA em 2015 é um marco muito importante no plano de integração econó‑ mica regional da ASEAN, oferecendo oportunidades que se consubstanciam num enorme mercado de 2,6 biliões de dólares e de mais de 622 milhões de pessoas. Em 2014, a CEA era, coletivamente, a terceira maior economia da Ásia e a sétima do mundo. Os países da CEA estão a traba‑ lhar na criação conjunta dum quadro abrangente de liberalização de seguros; a MAS indicou num relatório de 2013 que “existe a expectativa, por parte dos segura‑ dores, de virem a beneficiar de uma maior facilidade de oferta transfronteiriça de serviços e de um acesso signifi‑ cativo à base de clientes da ASEAN a partir de escritórios de qualquer país membro da ASEAN”. O país está, pois, bem posicionado para se tornar a plata‑ forma de seguros da Ásia e a Autoridade Monetária de Singapura prevê que se torne a próxima plataforma global (além de Londres) em 2020. Como membro exclu‑ sivo de Singapura na rede Brokerslink, a Acclaim está bem colocada para funcionar como fio condutor e traba‑ lhar com parceiros que pretendam alavancar­‑se a partir desta posição no mercado de seguros global. • 1  Association of Southeast Asian Nations


Corporate data

Cybercriminal

Cyber black market

To stop the bad guys, partner with the good guys. Social media, big data or your data: Today’s information technologies promise to enrich every area of our lives. But they also pose real risks – from fraud and identity theft to industrial espionage and cyberattacks. We work together with you to identify the full range of opportunities and threats, with solutions for mitigating them. It’s how we make technology work for you. Learn more at www.munichre.com Coverages are underwritten by individual member companies of Munich Re. Certain coverages are not available in all states. Some coverages may be written on a nonadmitted basis.

NOT IF, BUT HOW



Crescimento a alta velocidade no mercado segurador


EdifĂ­cio da Fosun em Xangai.

Crescimento a alta velocidade no mercado segurador 46


A Fosun, o maior conglomerado privado da China, tornou-se, no ano passado, num grupo segurador verdadeiramente global. Reforçou a participação que tinha no maior grupo segurador de Portugal, incluindo uma participação de quase 90% na companhia Fidelidade, e comprou a companhia de seguros norte-americana Meadowbrook Insurance Group (MIG) e a Ironshore, a companhia de seguros com sede nas Bermudas dedicada a seguros especializados, que se vêm juntar às companhias de seguro e resseguro que o grupo detém na Ásia. As operações na área dos seguros integram-se assim num conjunto de empresas em franco crescimento que a Fosun detém noutras áreas, tais como a industrial, a de lifestyle e a da saúde, numa altura em que o presidente do grupo, Guo Guanchang, tem como alvo tornar-se “o Warren Buffet chinês”, afirmando que o grupo se encontra na “superautoestrada” do crescimento. Adrian Ladbury lança um olhar mais atento à estratégia global para os seguros, além de refletir também sobre o recente crescimento do grupo.

47


M D S  m a g a z i n e

O grupo Fosun foi fundado em 1992 por cinco licenciados da Universidade de Fudan na China. Originalmente uma empresa de pesquisa de mercado transformou-se, nos últimos 24 anos, no maior conglomerado privado da China. Guo Guanchang, presidente do conselho de administração e principal acionista do grupo, baseia claramente a sua estratégia na que foi levada a cabo com tanto êxito pelo lendário investidor norte-americano Warren Buffet. Em termos muito simples, Buffet usa o fluxo gerado pelas companhias de seguros, que não tem de ser devolvido imedia‑ tamente aos titulares das apólices para investir numa grande variedade de outras empresas de setores não relacionados. Estas empresas beneficiam obviamente de termos e condições de cobertura preferenciais por parte das companhias de seguros do grupo, uma vez que estas conhecem respetivo perfil de riscos daquelas empresas melhor do que qualquer concorrente. Ao mesmo tempo, os prémios gerados alimentam o fluxo criando um círculo virtuoso. O grupo investe também de forma significa‑ tiva e detém atividades de gestão de ativos que beneficiam tanto as operações industriais quanto as companhias de seguros. É necessário um capital significativo para que este sistema funcione, uma vez que as companhias de seguros têm de diver‑ sificar a sua atividade através de vários segmentos e territórios para evitar cúmulos de risco indesejáveis; daí a recente expansão internacional. Além dos fundamentos da estratégia empresarial de Buffet, Guo Guanchang segue também o exemplo do investidor norte‑ -americano, escrevendo uma longa e reveladora carta aos acio‑ nistas quando apresenta os resultados anuais do grupo. Na última carta, publicada no mês passado por ocasião da divulgação dos resultados do ano de 2015, Guo Guanchang expli‑ cava assim a estratégia: “O grupo considerou a atividade segura‑ dora como uma boa forma de combinar a capacidade de investi‑ mento da Fosun com capital a longo prazo de alta qualidade. Por um lado, as companhias de seguros podem aumentar os resul‑ tados da subscrição alavancando-se na grande experiência e no conhecimento especializado das operações no setor segurador e financeiro, e, por outro, poderão também ajudar o grupo a obter maiores receitas de investimento por meio de práticas de inves‑ timento eficazes. Assim, seguros e investimento serão as nossas atividades de base no futuro”, explicou. Tal como a Berkshire Hathaway de Buffet, a Fosun está a sair-se muito bem neste mercado segurador global altamente competitivo. Guo Guanchang revelou que, à data de 31 de dezembro de 2015, o total de ativos de seguros geridos era de 180,6 mil milhões de yuans (27,9 mil milhões de dólares). Este valor representava 44,6% do total de ativos do grupo e significou um aumento em relação aos 32,9% registados no final de 2014. O total de ativos de investimento foi de 160,4 mil milhões de yuans (24,8 mil milhões de dólares), um aumento de 50,2% em comparação com 2014. O lucro anual da atividade seguradora atribuível aos proprietários da empresa-mãe subiu 88,4%, tendo atingido os 2,10 mil milhões de yuans (320 milhões de dólares) e representou 26,2% do resultado líquido do grupo. De 2013 a 2015, o lucro aumentou a uma taxa de crescimento anual composta de 100,5%, divulgou Guo Guanchang. Mas como conseguiu a Fosun construir uma presença tão forte no negócio segurador?

48

FOSUN – MARCOS HISTÓRICOS 1992 Um grupo de licenciados da Universidade de Fudan criaram a Fosun com um investimento inicial de US $4,000

1994 Criaram a Fosun Pharma e a Forte

1998 A Fosun Pharma é cotada na bolsa no mercado A-share na China

2002 Yuyuan

2003 Nanjing Iron & Steel

2004 Zhaojin Mining

2007 Yong'an P&C Insurance, Hainan Mining

2008 Focus Media


fullcover

Primeiro passo com a Yong’an A Yong’an P&C Insurance foi fundada em 2003, tem sede em Xi’an e constituiu o primeiro investimento da Fosun no mercado segurador. O grupo detém uma participação de 19,93% no capital da Yong’an, uma companhia de seguros chinesa que subscreve todo o tipo de seguros do ramo Não Vida e que estava classificada no 11.º lugar do mercado de seguros patrimoniais e de responsabilidades (P&C), em 2014. Atualmente, o mercado chinês é altamente compe­­ titivo e não é fácil obter lucros. É difícil encontrar informação financeira sobre a Yong’an, mas, na carta que acompanhava a divulgação dos resultados do grupo em 2015, Guo Guanchang afirmava que esta companhia de seguros “tomou a iniciativa de adaptar e transformar” a sua atividade e que continuará a fazê­‑lo em 2016, indicando que passou por momentos difíceis tal como o resto do mercado chinês. O grupo declarou que a Yong’an abandonou certos negócios “menos eficientes” e “otimizou constan‑ temente” o seu portefólio de negócios. Além disso, aumentou a capacidade de produção per capita, reduziu os custos de regularização de sinistros, reforçou o desen‑ volvimento e a inovação e explorou ativamente as aplica‑ ções para a Internet. Não obstante a necessidade de “adaptação”, a Yong’an registou uma receita bruta de prémios de 8,1 mil milhões de yuans, um resultado líquido de 833,3 milhões de yuans, ativos de investimento no valor de 10,9 mil milhões de yuans, um rácio combinado líquido de 98% e um rácio de solvência de 263,7%. O retorno sobre o inves‑ timento total foi de 10%. Os resultados mostram, assim, que a Yong’an não está a sair­‑se nada mal.

Segundo passo: Pramerica O grande passo seguinte da Fosun no mercado segurador foi dado em setembro de 2012, altura em que anunciou uma joint­‑venture com o gigante norte­‑americano de serviços financeiros Prudential Financial. A empresa, designada Pramerica Fosun Life Insurance Company Limited (PFI), é uma joint­‑venture que começou com um capital social de 500 milhões de yuans. Trata­‑se da primeira empresa do ramo Vida fundada em conjunto por um investidor privado chinês e um investidor estrangeiro. Guo Guanchang afirmou na altura: “O setor dos seguros de vida na China está a crescer rapidamente, movido por um enfoque crescente na proteção dos meios de subsis‑ tência das famílias do país inteiro. Esperamos tirar bene‑ fício da profunda experiência atuarial, do conhecimento no que respeita à gestão de ativos e da história de 137 anos de sucesso da PFI no setor dos seguros de vida, num momento em que avançamos juntos no desenvolvimento

de produtos que respondem às necessidades de seguro de vida deste mercado”. No mais recente relatório financeiro, o de 2015, a Fosun afirmava que, nos últimos anos, os prémios recebidos pela PFI aumentaram de forma rápida na sequência de vários projetos inovadores. Guo Guanchang afirmou que a empresa promove continuamente a inovação nos seus produtos e está também a explorar um novo modelo de vendas de “Seguro + Gestão de Saúde + Comunidade de reformados + Alocação de Ativos no Estrangeiro” e seguro para ações de crowd­funding. O grupo oferece um amplo pacote de seguros que vai desde o seguro de vida, ao de acidentes e doenças graves, passando pelo seguro de vida misto (“Universal Life”) e pelo seguro de saúde. Em 2015, a receita de novos prémios anuais e o total de prémios da PFI foi de 125,3 milhões e de 978,1 milhões de yuans respetivamente (incluindo, em ambos os casos, os depósitos dos titulares de apólices de seguro de vida misto “Universal Life”). A empresa registou também uma receita bruta de prémios de 57,2 milhões de yuans, um prejuízo líquido de 113 milhões de yuans, ativos de investimento no valor de 1,9 mil milhões de yuans, um rácio de solvência de 985,5% e um retorno sobre o investimento total de 6,9%.

O caminho para o topo Em janeiro de 2013, a Fosun criou a Peak Reinsurance Company Limited (Peak Re), um ressegurador sediado em Hong Kong e concebido para absorver a procura crescente por soluções de resseguro “state of the art” na região da Ásia­‑Pacífico. A empresa começou com um capital inicial de 550 milhões de dólares. A Peak Re é, na verdade, detida conjuntamente com a International Finance Corporation (IFC), uma orga‑ nização membro do grupo Banco Mundial centrada no desenvolvimento do setor privado. A IFC investiu 82 milhões de dólares em 14,9% da empresa. No momento do lançamento, Guo Guanchang afirmou: “Acreditamos que o investimento na Peak Re permitirá, juntamente com os outros projetos da Fosun na área dos seguros, um fluxo de receitas estável decorrente da ativi‑ dade seguradora que sustentará as nossas atividades de investimento, criando as condições para fazer da Fosun um ‘grupo de investimento de referência’”. O grupo salientou que há demasiado tempo que a região da Ásia­‑Pacífico se caracteriza por uma situação de infra-seguro, destacando que, na sequência de uma série de catástrofes naturais na região em 2011, incluindo as inundações na Tailândia, o sismo e tsunami de Tohoku no Japão, o sismo na Nova Zelândia e as inun‑ dações na Austrália, menos de 22% do total de prejuízos económicos registados estavam segurados.

49


M D S  m a g a z i n e

Este valor era consideravelmente inferior ao rácio de perdas económicas seguras nos Estados Unidos e na Europa naquela data, o qual se situava em cerca de 64% e 50%, respetivamente. Além disso, em 2010, a China sofreu as mais devasta‑ doras inundações em dez anos, que provocaram cerca de 50 mil milhões de dólares de prejuízos económicos, dos quais apenas mil milhões estavam cobertos por seguro. Assim, a Peak Re criou planos para investir “signi‑ ficativamente” na investigação e no desenvolvimento de soluções de gestão de risco para famílias e empresas da região. Segundo os responsáveis, nos seus primeiros cinco anos de existência, a Peak Re planeava entrar, juntamente com a IFC e a Fosun, nos mercados asiáticos emergentes como o chinês, o indiano e o indonésio. O novo ressegurador afirmou também que planeava crescer orgânica e estrategicamente através da aquisição de carteiras de seguros rentáveis. No ano passado, a Peak Re deu passos importantes no sen­­ tido de diversificar a sua atividade quer em termos geográ‑ ficos quer no que se refere aos produtos disponibilizados. A empresa anunciou um plano para adquirir uma parti‑ cipação de 50% no grupo de seguros caribenho NAGICO Holdings Limited, em julho de 2015. Esta aquisição está atualmente dependente da aprovação do regulador. A Peak Re abriu também escritórios em Zurique em setembro de 2015, de forma a ficar mais próxima dos seus clientes na Europa e a diversificar ainda mais a sua carteira de negócios. A Fosun revelou que a atividade do ressegurador na região da Ásia­‑Pacífico se expandiu gradualmente, acres‑ centando que fez também progressos significativos na Europa e na América do Norte. Em 2015, o valor bruto de prémios subscritos na Europa e na América do Norte representava 41,5% do total de receitas de prémios, o que significou um aumento de 24,4% relativamente aos 17,1% de 2014. No final do ano passado, a Peak Re contava com mais de 285 clientes em 47 mercados do mundo inteiro, em compa‑ ração com os 175 clientes registados no final de 2014. A empresa vendeu 582,7 milhões de dólares em prémios de seguros em 2015 em comparação com os 288,1 milhões de dólares registados no período homólogo de 2014. O resultado líquido foi de 59,2 milhões de dólares, uma subida de 17,6 milhões relativamente a 2014. O rácio combinado líquido foi de 96,8%, o rácio de solvência de 754%, os ativos de investimento represen‑ taram 913 milhões de dólares e o retorno sobre o investi‑ mento foi de 6,4%.

2010 Club Med

2011 Folli Follie

2012 Pramerica Fosun Life Insurance, Peak Reinsurance

2013 St. John, Alma Lasers, Saladax, Caruso, Atlantis Resort (Sanya), 28 Liberty em Nova Iorque, Loyds Chambers em Londres

2014 Fidelidade, Secret Recipe, REN, Osborne, Studio 8, Tom Tailor, ROC Oil, IDERA, Luz Saúde, BHF Kleinwort Benson Group SA, Hainan Mining IPO

2015 2015 Ironshore, MIG, Thomas Cook, Club Med, Cirque du Soleil, Hauck & Aufhauser Privatbankiers (H&A), Silver Cross, RPIM, Phoenix Holdings, Zhejiang Internet Commerce Bank Co., Ltd

Fosun chega à Europa… via Portugal O maior passo em frente na história de crescimento da Fosun na área dos seguros foi dado em maio de 2014, altura em que o Presidente da China, Xi Jinping, e o Presidente da República Portuguesa, Aníbal Cavaco Silva, testemunharam a assinatura dos documentos

50

Baseado na Apresentação Institucional da Fosun


fullcover

que asseguraram a conclusão da aquisição por parte da Fosun de 80% do capital e dos direitos de voto nas compa‑ nhias Fidelidade, Multicare e Cares, hoje conhecidas coletivamente como grupo Segurador Português, por 1038 milhões de euros. As três empresas eram subsidiárias detidas na totali‑ dade pela Caixa Seguros e Saúde (CSS), o ramo de seguros do banco estatal CGD. Os responsáveis da Fosun afirmaram, depois de concluída a aquisição, que a empresa tinha dado um “passo de gigante” no sentido de se tornar um grupo de investimento de primeiro plano movido por dois motores individuais: “capacidade financeira abrangente baseada na atividade seguradora” e “capacidade de investimento sustentada numa profunda consolidação industrial”. Este passo, disseram os responsáveis do grupo, apro‑ ximou o grupo da implantação do “modelo de desenvol‑ vimento de Warren Buffet”. O total de ativos não auditado do grupo Segurador Português era de 12,8 mil milhões de euros no final de 2013. Numa base pró­‑forma, depois da consolidação do grupo Segurador Português, a proporção de ativos de seguros da Fosun relativamente ao total de ativos do grupo aumentou significativamente de 3% para 39%. “Sendo a atividade seguradora a atividade central para o desenvolvimento da Fosun, a cooperação entre a Fosun e o grupo Segurador Português irá indubitavelmente ser duradoura e estável. A Fosun tem confiança total na equipa de gestão atual e tem o compromisso de manter a estabilidade da estratégia empresarial em curso. Através do trabalho de ambas as partes e das sinergias alcan‑ çadas com os recursos partilhados em vários aspetos, a Fosun espera desenvolver produtos e serviços de maior qualidade como parte dos seus esforços para alcançar um retorno sustentável para os acionistas, funcionários e clientes”, declarou a Fosun. O grupo chinês afirmou ainda que iria facilitar a colabo‑ ração e a sinergia com outras companhias de seguros em que investira, seguindo mais uma vez o modelo de Buffet. “Por exemplo, irá facilitar a colaboração com a Peak Reinsurance, de forma a baixar os custos de resseguro, e cooperará com a Yong’an P&C Insurance na área das tecnologias, dos produtos e dos canais de vendas, de modo a conseguir um desenvolvimento rápido da atividade. Por outro lado, a Fosun fará uso da capacidade de investimento de base para otimizar o portefólio de investimento e, assim, aumentar os retornos sobre o investimento do grupo Segurador Português, especial­ mente através da combinação com as estratégias de investimento global da Fosun. A Fosun irá também fazer uma análise completa das oportunidades de investimento na Europa e nos mercados da OCDE e alargará o âmbito da atividade, minimizando os riscos sistémicos da concentração geográfica através da diversificação”, explicou a Fosun. O grupo chinês acrescentou que tem vindo a iden‑ tificar ativamente diferentes tipos de “oportunidades de investimento de valor” no mundo inteiro e chegou à

conclusão de que, apesar dos recentes problemas econó‑ micos de Portugal, o país continua a ser um mercado­ ‑chave apelativo e que se enquadra perfeitamente na estratégia de expansão global da Fosun. “A Fosun mantém­‑se atenta a outras oportunidades de investimento noutros setores do mercado português, em especial do imobiliário, do turismo e dos produtos de marca”, acrescentou a Fosun. A Fosun abriu um escritório que representa a empresa em Lisboa, cidade a partir da qual poderá dar maior apoio ao grupo Segurador Português, explorar investimentos noutros setores em Portugal e reforçar o intercâmbio e a cooperação sino­‑portuguesa, afirmou o grupo. “Este passo permitirá também à Fosun dar uma contribuição, ainda que diminuta, para a recuperação da economia portuguesa. A Fosun pretende fazer a ponte no sentido de facilitar o desenvolvimento de negócios na China por parte de empresas portuguesas e o desenvolvi‑ mento de atividades em Portugal por empresas originá‑ rias da China”, acrescentou o grupo. No início de 2015, a Fosun reforçou a participação no capital da Fidelidade, tendo chegado aos 84,986%. A Fosun Insurance Portugal é, presentemente, um operador global significativo no mercado segurador português. A Fosun indicou, no mais recente relatório de resul‑ tados anuais, que vende produtos em todos os principais segmentos de negócio e que conta com a maior e mais diversificada rede de vendas de seguros de Portugal. Esta rede inclui agentes exclusivos e multimarca, corretores, dependências próprias, canais na Internet e no telefone. Conta também com fortes parcerias de distribuição com os CTT e a Caixa Geral de Depósitos, um dos principais bancos portugueses. A Fosun Insurance Portugal está também ativa em sete países de três continentes (Europa, Ásia e África). Durante o ano a que dizem respeito os resultados, a Fosun Insurance Portugal apresentou uma receita bruta de prémios de 3,9 mil milhões de euros, um rácio combi‑ nado líquido na atividade do ramo Não Vida de 98,4%, um rácio de solvência de 215,7% e um resultado líquido de 301,1 milhões de euros. “A atividade internacional da Fosun Insurance Portugal continua a revelar um elevado desempenho comercial, tendo atingido um total de 202,1 milhões de euros em prémios diretos de seguro, um aumento de 13,7% relativamente a 2014”, informou a Fosun no final de março do ano corrente.

Próxima paragem: Estados Unidos! Apesar da importância da aquisição em Portugal, o “Warren Buffet chinês” não abrandou o ritmo sendo o alvo seguinte o gigantesco mercado de seguros dos Estados Unidos. Em julho do ano passado, a Fosun anunciou a conclusão da aquisição de 100% do Meadowbrook Insurance Group (MIG) por 439 milhões de dólares.

51


M D S  m a g a z i n e

“A Meadowbrook irá reforçar a capacidade da Fosun para aceder a capital de alta qualidade a longo prazo, bem como melhorar as capacidades do grupo na área da atividade seguradora quer no que respeita às responsa‑ bilidades quer aos investimentos. Estamos empenhados em alavancar os recursos globais da Fosun de forma a promover o desenvolvimento estável da Meadowbrook a longo prazo”, afirmou Guo Guanchang. A Meadowbrook é uma companhia de seguros patri‑ moniais e de responsabilidades e uma empresa de serviços de gestão de seguros que se centra em mercados especia‑ lizados de nicho. Comercializa e subscreve programas de seguros de patri‑ moniais e de responsabilidades e produtos de seguro numa base “admitted” e “non­‑admitted” através de uma rede diversificada de mediadores de seguros independentes, empresas de seguros, administradores de programas e agências generalistas. É importante notar que a Meadowbrook dispõe de uma gama completa de licenças de seguro do ramo Não Vida em 50 estados do país, que cobrem segmentos de produtos autorizados e não autorizados. A conclusão da aquisição da Meadowbrook deu à Fosun uma plataforma estratégica de seguros nos EUA, permitindo ao grupo estabelecer uma presença signifi‑ cativa no maior mercado de seguros de patrimoniais e responsabilidades do mundo. No ano passado, o MIG registou uma receita bruta de prémios de 726,5 milhões de dólares e um resultado líquido de 34,3 milhões de dólares, sendo o rácio combi‑ nado líquido de 100,3% e um rácio de solvência de 200,3%. O MIG detém ativos de investimento no valor de 1570,6 milhões de dólares.

E agora, o mercado especializado internacional Em fevereiro do ano passado, numa altura em que prepa‑ rava a aquisição do MIG, a Fosun concluiu a aquisição de aproximadamente 20% das ações ordinárias em circu‑ lação da Ironshore, o grupo de seguros especializado com sede nas Bermudas. O preço de compra foi de aproximadamente 466,6 milhões de dólares. Como seria de esperar, em novembro do ano passado, o grupo chinês concluiu a aquisição do capital restante da Ironshore por dois mil milhões de dólares em dinheiro. A Ironshore é um grande passo em frente para a Fosun no importante, e hoje muito procurado, mercado de seguros "corporate" de grandes empresas. Além das Bermudas, a Ironshore tem operações nos EUA, no Lloyd’s e na Irlanda. Em 2015, a receita bruta de prémios da Ironshore atingiu os 2,16 mil milhões de dólares, tendo o resultado líquido sido de 57,8 milhões de dólares sustentado por um rácio combinado líquido de 96,7%. O rácio de solvência foi de aproximadamente 166% e o total de ativos de inves‑ timento de 5,1 mil milhões de dólares.

52

Dada a presença atual do grupo nos mercados primá‑ rios do ramo Vida e Não Vida na China, cujo potencial é enorme, no mercado asiático e internacional de resse‑ guros, no mercado continental europeu de seguros Vida e Não Vida e nos mercados comerciais especializados dos Estados Unidos, a aquisição da Ironshore deu à Fosun aquela que será possivelmente a última peça do puzzle, pelo menos por agora. Aquando da divulgação do negócio, Guo Guanchang salientou as sinergias estilo Buffet de que as empresas irão usufruir na família Fosun, afirmando: “Agora e no próximo ano, a Fosun irá reforçar os esforços de integração e colaboração, procurando construir um grupo segurador e financeiro inter­‑regional e intersetorial. Incentivamos as empresas em que investimos a colaborar sempre que possível e procuramos ligá­ ‑las aos recursos da Fosun através das nossas plataformas seguradoras e financeiras de forma a melhorar a competitividade de cada empresa nos respetivos setores”. E a Ironshore não demorou a tirar partido do poten‑ cial do novo grupo, já que em janeiro anunciou que a sua subsidiária no Lloyd’s, a Pembroke Managing Agency, iria abrir um escritório em Xangai para integrar a plata‑ forma do Lloyd’s na China. A Pembroke Managing Agency de Xangai irá subscrever segmentos especializados de seguros, focando­‑se inicial‑ mente nos setores da agricultura, do mar e da saúde. Tracy Ma foi nomeada responsável pela subscrição nesta entidade, reportando a Hui Yun Boo, diretor execu‑ tivo da Ironshore para a região da Ásia­‑Pacífico. “A empresa­‑mãe da Ironshore, a Fosun, que tem sede em Xangai, coloca­‑nos numa posição diferenciada no mercado local, permitindo­ ‑nos oferecer produtos especializados no país para ir ao encontro da crescente procura que se verifica nesta cidade vibrante”, afirmou Mark Wheeler, CEO da Ironshore International. Hui Yun Boo afirmou que o novo escritório de Xangai complementa a presença atual da Ironshore nos centros de crescimento da região da Ásia­‑Pacífico, como Singapura, Hong Kong, Tóquio, Sidney e Auckland. É interessante notar que apenas dois meses depois, no dia 22 de março, o conselho de administração da Fosun anunciou que a empresa estava a considerar fazer uma oferta pública inicial (OPI) das ações ordinárias da Ironshore. “À data da presente comunicação, não foi ainda tomada a decisão final pelo conselho de administração da Empresa nem da Ironshore sobre a possibilidade, o momento ou o local de uma OPI”, declarou o grupo. Seja qual for a decisão da Fosun em relação à Ironshore, é claro que o grupo chinês continuará a construir a ativi‑ dade no espaço internacional dos seguros. Como afirma Lan Kang na entrevista nas páginas seguintes, a Fosun manter­ ‑se­ ‑á focada neste mercado e usará as bases portuguesa e internacional para procurar novas opor‑ tunidades de crescimento. Ficaremos atentos aos novos desenvolvimentos! •


fullcover

GUO GUANGCHANG ENCONTRA­‑ SE COM O SEU MODELO DE REFERÊNCIA EM MESA­‑ REDONDA DE CEOs NORTE­‑ AMERICANOS E CHINESES Em setembro passado, o presidente chinês Xi Jinping marcou presença na mesa­‑ redonda de CEOs norte­‑ americanos e chineses em Seattle organizada pelo Paulson Institute e pelo China Center for the Promotion of International Trade. Este foi o ponto alto do segundo dia da visita do presidente chinês aos Estados Unidos. Nesta mesa­‑redonda, Xi Jinping salientou que, devido às diferenças nas etapas de desenvolvimento, as economias da China e dos Estados Unidos são altamente complementares. O presidente chinês afirmou que há mais espaço e mais oportunidades para cooperação económica e comercial bilateral. Xi Jinping acrescentou que a China apoia grandes empresas norte­‑americanas que estabelecem sedes regionais e centros de investigação na China e instou mais pequenas e médias empresas dos EUA a expandirem a atividade na China. Por sua vez, os investimentos chineses nos Estados Unidos irão também continuar a crescer, afirmou. Participaram na discussão 15 CEOs das maiores empresas da China, incluindo Guo Guangchang da Fosun, e 15 CEOs das maiores corporações dos EUA, incluindo Warren Buffet da Berkshire Hathaway. Em jeito de brincadeira, Guo Guangchang afirmou ser um estudante de Buffet, na mesa­‑redonda em que apresentou os projetos de investimento da Fosun nos EUA, incluindo as recentemente adquiridas Meadowbrook Insurance Group (MIG),

e Ironshore e a participação em programas sino­‑americanos de cooperação e intercâmbio cultural e artístico. Durante a mesa­‑ redonda, Guo Guangchang afirmou que os Estados Unidos têm a maior concentração de recursos qualificados e que, dado o enfoque da Fosun em quatro grandes áreas – seguros, banca privada, saúde, bem­‑estar e “lifestyle” –, o grupo explora ativamente os melhores projetos de cooperação. Àquela data, o volume de investimentos da Fosun nos Estados Unidos já tinha ultrapassado os cinco mil milhões de dólares, tendo criado um total de 4895 oportunidades de emprego, afirmou Guo Guangchang. Além da Ironshore e do MIG, entre estes investimentos contam­‑se: o estabelecimento de três laboratórios farmacêuticos em Silicon Valley para a investigação e desenvolvimento global 24/7, bem como mais de dez projetos de investimentos em cooperação, tais como o edifício 28 Liberty, uma referência em Nova Iorque; a St John, reputada marca norte­‑americana de vestuário feminino; o Studio 8, empresa inovadora de cinema de Hollywood; e um conjunto de projetos de capital de risco. Durante a mesa­‑redonda, Buffet e o “Buffet chinês” tiveram a oportunidade de se encontrar pessoalmente e chegaram a um consenso: o de continuar a ser otimistas em relação à economia chinesa e o de continuar a aderir à disciplina de investimento em valor.

53


M D S  m a g a z i n e

Canadá

FOSUN, as oportunidades de negócio a nível global

2015  Circe du Soleil

Reino Unido 2013  Lloyds Chambers 2015 Thomas Cook RPIM Silver Cross

Espanha

EUA 2013 28 Liberty St. John 2014 Studio 8 2015 MIG Ironshore Ambrx NoMad Luxury Residential Tower (Madison Avenue, Nova Iorque)

2014  Osborne

Itália

Ilustração por José Cardoso

2013  Caruso 2015  Palazzo Broggi

Portugal 2014  Fidelidade   Luz Saúde   REN

54


fullcover

França 2010  Club Med

Alemanha 2014  Tom Tailor 2015  H&A

Japão

Israel 2013  Alma Lasers

Austrália Grécia

2014 ROC OIL 73 MILLER STREET

Malásia 2014  Secret Recipe

2011  Folli Follie

55

Nota: As empresas e os projetos mencionados incluem os investimentos feitos pela Fosun, pelas suas subsidiárias e por fundos que gere

2014  IDERA


M D S  m a g a z i n e

E N T R E V I S TA A L A N K A N G

A visão estratégica de um grupo verdadeiramente global O grupo Fosun, um conglomerado de empresas chinês, irrompeu no mercado de seguros europeu e internacional em 2014 quando adquiriu a Fidelidade, segurador líder em Portugal. Esta aquisição foi rapidamente seguida por grandes investimentos nas companhias de seguros de especialidade internacionais: a Ironshore, sediada nas Bermudas, e a Meadowbrook, dos Estados Unidos. Estes investimentos internacionais vêm juntar-se à carteira de investimentos em seguradores chineses da Fosun. A fullcover entrevistou Lan Kang, vice­‑presidente do grupo Fosun e presidente do Fosun Insurance Group, para saber mais sobre os planos do grupo para o mercado de seguros português e internacional e como se enquadra esta aquisição na estratégia mais ampla de rápido crescimento do grupo.

56


fullcover

Temos de fornecer os recursos que são necessários e criar sinergias entre todas as empresas do nosso portefólio. Temos também de construir uma “corporate governance” e sistemas de gestão do risco fortes e, claro, atrair e desenvolver talentos locais.

Lan Kang, Vice Presidente do grupo Fosun e Presidente do Fosun Insurance Group.

A Fosun foi fundada em 1992. Pode partilhar connosco como se tornou a empresa num dos maiores conglomerados chineses num período tão curto? O rápido crescimento da Fosun nas últimas duas décadas tem vindo a ser construído em grande parte com base no tremendo crescimento da economia chinesa, bem como nas decisões estratégicas que a empresa tem vindo a tomar ao longo do tempo, igual‑ mente importantes para o seu sucesso. Tendo criado a empresa em 1992, pouco depois de se terem licenciado, os fundadores do grupo Fosun começaram a ativi‑ dade na área da pesquisa de mercado e dos serviços de consultoria com pouco capital investido. Conseguiram acumular algum capital e depois de verificarem que a China se encontrava num período de rápida urbani‑ zação, entraram na área do imobiliário e também da saúde. Além disso, o investimento na indústria transfor‑ madora e nos recursos revelou­‑se muito bem­‑sucedido, graças ao rápido desenvolvimento do setor de infraes‑ truturas na China. A partir de 2008, à medida que o motor económico da China se transferia da industrialização e urbanização para o consumo e finanças pessoais, a Fosun continuou a investir “combinando a dinâmica de crescimento da China com os recursos globais”.

Quais são os objetivos do vosso investimento e da vossa estratégia? No que diz respeito às oportunidades de investimento, aquilo que é mais importante considerar é a forma como podemos criar valor através dos nossos investimentos. Hoje em dia, num momento em que o capital se está a tornar numa “commodity”, temos de pensar na razão por que outras empresas escolherão o nosso investimento em vez de outros e na forma como poderemos acrescentar valor ao capital que providenciamos. Focamo­‑nos em três áreas de investimento: saúde, bem­‑estar e riqueza pessoal. Já construímos as nossas vantagens competitivas no setor da saúde e do bem­‑estar. Por exemplo, a Fosun Pharma é uma das principais empresas farmacêuticas da China. Adquirimos o United Family Healthcare, o hospital mais sofisticado da China. Além disso, investimos em alguns projetos de “Internet + serviços de saúde”, como o Guahao.com. No ano passado, concluímos a privatização do Club Med, o grupo francês de complexos turísticos, cujo potencial para expansão global acreditamos ser elevado. O nosso investimento no setor dos serviços financeiros, em especial no setor dos seguros, também permite uma preservação da riqueza a longo prazo para os nossos clientes.

57


M D S  m a g a z i n e

Quais são os critérios de seleção para os vossos projetos de investimento? No que respeita aos projetos de seguro, temos dez dire‑ trizes para o investimento, nomeadamente: 1. liderança de mercado no segmento; 2. equipa de gestão de grande qualidade; 3. uma boa combinação de volume de ativos e capaci‑ dade operacional; 4. custo do passivo relativamente baixo; 5. uma avaliação razoável; 6. gestão do risco prudente; 7. oportunidade de mercado; 8. aquisição de posição de controlo acionista; 9. potencial de melhoria no que respeita aos ativos; 10. sinergias com o grupo Fosun e as empresas do seu portefólio. Para nós, cada projeto é único. Avaliamos sempre cada projeto de forma abrangente e rigorosa tendo em conta, embora não exclusivamente as dire‑ trizes acima referidas.

Quais são os grandes desafios que a Fosun enfrenta nos investimentos que faz no estrangeiro, por exemplo, na Fidelidade, Ironshore e Meadowbrook? Para este tipo de investimentos no estrangeiro, é neces‑ sário um conhecimento profundo da realidade local e a capacidade de aceder às melhores oportunidades de investimento. Este é um fator crucial, uma vez que existe uma concorrência crescente que leva à subida dos preços. É também necessário confiar nos reguladores estran‑ geiros e compreendê­‑los, sendo a complexidade da gestão do risco cada vez maior.

Quais são os princípios orientadores quando estão a lidar com as empresas do vosso portefólio? É preciso selecionar e/ou construir uma equipa de lide‑ rança com forte empreendedorismo e capacidade de esta‑ belecimento de parcerias. Temos de fornecer os recursos que são necessários e criar sinergias entre todas as empresas do nosso portefólio. Temos também de cons‑ truir uma corporate governance e sistemas de gestão do risco fortes e, claro, atrair e desenvolver talentos locais e proporcionar­‑lhes uma plataforma global através da qual possam crescer.

Porque escolheu a Fosun o mercado de seguros como um dos mercados­‑chave? De que forma este mercado se enquadra nas restantes atividades do grupo? O setor segurador é o melhor canal para combinar o conhecimento único da Fosun em investimentos e na indústria com capital estável e a longo prazo.

58

Por um lado, dadas as elevadas capacidades da Fosun no âmbito da gestão dos setores da saúde, do bem­‑estar, do imobiliário e da riqueza, o grupo pode ajudar as companhias de seguros a explorar sinergias no desenvolvimento e na otimização da distribuição de produtos, com uma plataforma financeira integrada e em várias outras áreas. Por outro lado, podemos ajudar a melhorar a gestão dos ativos e passivos e do portefólio de investimento da companhia de seguros alavancando­‑a com as excelentes capacidades de investimento da Fosun. Além disso, no que respeita às companhias de seguros estrangeiras, a Fosun pode acrescentar valor combinando a dinâmica chinesa com os recursos globais. A Fosun está empenhada em ajudar as companhias de seguros do seu portefólio a melhorar os resultados da subscrição através de um enfoque na excelência operacional, a reforçar os balanços e a aumentar a competitividade no mercado por meio da evolução e da inovação. Desta forma, apenas quando a parte operacional dos seguros é sólida e rentável é que é possível utilizar o fluxo de longo prazo para alcançar melhores retornos sobre o investimento.

Porque entrou a empresa no mercado segurador, que é tão competitivo, e cujos preços estão em baixa acentuada, especialmente no segmento Não Vida de empresas? É verdade que os mercados globais de seguros, especial‑ mente os mercados desenvolvidos, estão a enfrentar uma competição feroz e excedentes de capitais alternativos. No entanto, a distância entre as grandes empresas e as empresas medíocres é enorme. O nosso trabalho consiste em identificar oportunidades de investimento de valor, não obstante as condições de mercado difíceis, e criar valor depois do investimento. Por exemplo, os seguros especializados superaram os outros segmentos de negócio nos Estados Unidos nos últimos anos. A Ironshore, um player com forte presença nesse segmento, parece­‑nos uma oportunidade interessante e única para o grupo. Acreditamos que bases sólidas, conhecimento e experiência de subscrição e uma equipa de gestão talentosa são cruciais para o sucesso de uma companhia de seguros. Pode­‑se dizer com algum orgulho que todas as companhias de seguros estrangeiras do nosso portefólio foram financeiramente rentáveis em 2015.

Porque decidiu a Fosun expandir­‑se além da Ásia e alargar a atividade na área dos seguros? Porque não concentrar­‑se em mercados mais próximos? Na verdade, não temos restrições no que respeita a áreas geográficas. Selecionamos as melhores oportunidades que se enquadrem na estratégia da Fosun. Em 2014, foi a Fidelidade em Portugal e, em 2015, investimentos na


fullcover

Ironshore e na Meadowbrook nos Estados Unidos. É possível que, em 2016, venha a haver uma empresa da Fosun com um desempenho acima da média na Ásia ou noutra região do mundo. Mas nós não negligenciámos o nosso mercado doméstico. As nossas companhias de seguros da China e as companhias de resseguros em Hong Kong têm sido geridas por equipas de profissionais de seguros qualificados e os resultados têm sido bons.

Pode explicar­‑nos a importância da Fidelidade para a estratégia da Fosun? Sendo o nosso primeiro investimento na área dos seguros fora da Ásia, a Fidelidade abriu um novo capítulo no grupo Fosun. Olhando apenas para os números, em 2014, os ativos da Fosun tinham aumentado 13 mil milhões de euros com a aquisição da Fidelidade. E todos sabemos que existe muito mais valor intrínseco além dos números. A Fidelidade é uma plataforma estratégica na Europa que ajuda a Fosun a combinar melhor a dinâmica da China com os recursos globais, a compreender melhor as operações de seguros no contexto do regime Solvência II e a implementar melhor a nossa estratégia central “Seguro + Investimento” de forma prudente e eficaz. Nos últimos dois anos, a Fosun deu um forte apoio à Fidelidade para que esta aumentasse os resultados da subscrição e melhorasse o desempenho financeiro. Compreendemos perfeitamente que, para os titulares de apólices, a robustez financeira da companhia de seguros é a maior prioridade. Estamos empenhados em ajudar a Fidelidade a atingir um futuro sustentado e de ainda maior destaque. Como procura a Fosun as melhores oportunidades para um crescimento rentável nos mercados de seguros do mundo inteiro – por geografia ou por segmento de negócio? Mais do que geografias ou segmentos de negócio, vamos estar atentos a companhias de seguros com lideranças fortes, competitivas e com produtos e serviços inova‑ dores, bem como excelência operacional. A Fosun ambiciona expandir­‑se no espaço mais amplo das empresas multinacionais de seguros e, em caso afirmativo, quando? Irá a Ironshore ser a principal plataforma para este negócio? A resposta mais curta à primeira pergunta é sim; mas vale a pena aprofundar. O nosso objetivo no setor segu‑ rador é construir uma holding global com capacidades de gestão de seguros e investimento de primeiro plano. Vamos continuar a procurar oportunidades globais de investimento em seguros de alta qualidade tendo como base as nossas rigorosas diretrizes de investimento e a nossa gestão prudente do risco. Nunca iremos adotar uma estratégia de crescimento que seja agressiva e irracional. •

Xangai, a cidade onde a tradição e a nova arquitetura coexistem.

LAN KANG → Lan Kang é vice-presidente e detém o pelouro de recursos humanos da Fosun, além de presidente do Fosun Insurance Group. Pertence atualmente ao concelho de administração de seis companhias de seguros em que a Fosun investiu, incluindo a Yong'na P&C Insurance e a Pramerica Fosun Life Insurance, na China; a Peak Reinsurance, em Hong Kong; o Meadowbrook Insurance Group, nos Estados Unidos; a Ironshore, nas Bermudas; e o grupo Fidelidade, em Portugal. → Antes de integrar o grupo Fosun, Lan Kang era senior partner responsável pelos clientes, com foco em executive search e desenvolvimento de liderança nos escritórios da Korn/Ferry International na região da Grande China. Trabalhou também quatro anos como consultora de gestão nos escritórios da McKinsey & Company na região da Grande China. Apoiou diversas multinacionais de referência e empresas locais chinesas no desenvolvimento estratégico, otimização operacional e gestão da mudança, além de ter acumulado muita experiência em recrutamento de talentos e no desenvolvimento organizacional. → Lan Kang viveu nove anos nos Estados Unidos, antes de voltar à China em 2002, logo após de ter concluído cum laude o seu MBA na Wharton School, Universidade da Pensilvânia. Obteve também o bacharelato em Ciências, na Universidade de Zhejiang, na China, e o mestrado em Ciências , na Universidade de Tulane, nos Estados Unidos da América.

59


M D S  m a g a z i n e

1º I N V E S T IM E N T O D A F O S U N N O S E T O R S E G U R A D O R

Fidelidade: de vento em popa

Jorge Magalhães Correia é o presidente da comissão executiva das seguradoras Fidelidade, Multicare e Fidelidade Assistance e do conselho de administração da seguradora Universal Seguros (Angola). É ainda vice-presidente da Associação Portuguesa de Seguradores e membro da The Geneva Association. Conversou com a fullcover sobre a Fidelidade, a estratégia de crescimento e desenvolvimento, a relação com o novo acionista – a Fosun – e ainda a ligação com a MDS.

60


fullcover

Em entrevista a um jornal afirmou uma vez “O que se espera de nós é que façamos num ano o que fazíamos normalmente em três”. Tem conseguido acompanhar esta pressão ao nível dos resultados? Foi uma expressão destinada a ilustrar o entusiasmo que sentimos por parte dos nossos acionistas. Toda a organização tem­‑se adaptado rapidamente ao novo enquadramento após a privatização, baseado em dois acionistas fortes e que se complementam. Temos apro‑ veitado as oportunidades adicionais que esse contexto nos traz, quer em termos de uma visão mais universal da atividade seguradora, quer em termos de participação em projetos transnacionais que acrescentam valor e conhecimentos à empresa. Mas, fora disso, não tem existido uma pressão acionista particular ao nível dos resultados, os quais, aliás, têm permanecido na empresa para fortalecer a sua capacidade de crescimento.

A cultura organizacional sofreu alterações? Tirando a dimensão internacional antes referida, não sofreu alterações significativas. Naturalmente há coisas que mudaram, como termos mais de 150 colaboradores a estudar mandarim voluntariamente. Ou como termos uma “China Business Unit” a trabalhar em Portugal, Angola, Moçambique, Espanha e França. Mas a cultura da empresa e o modelo de gestão não mudaram. A Fidelidade, com o seu âmbito atual, foi sempre uma empresa de atitude privada, dinâmica e inovadora. A primeira a introduzir o seguro de transportes em Portugal, a primeira a comercializar seguros de vida e também a primeira que emitiu uma apólice de acidentes de trabalho. E vamos continuar a ser o principal motor de inovação e progresso nos seguros em Portugal.

JORGE MAGALHÃES CORREIA → Iniciou a vida profissional como docente da Faculdade de Direito de Lisboa. Foi dirigente da Inspeção­‑Geral de Finanças, da Comissão de Mercado de Valores Mobiliários e Advogado. → Desempenhou diversos cargos societários na área financeira e seguradora, tendo sido nomeadamente administrador e/ou presidente do conselho de administração das seguradoras Mundial­‑Confiança, Fidelidade Mundial, Império Bonança e Via Direta. → Na área hospitalar foi administrador da USP Hospitales (Barcelona) e administrador e posteriormente presidente do conselho de administração da HPP ­– Hospitais Privados de Portugal SGPS.

Os últimos números indicam que a Fidelidade viu a sua quota de mercado reforçada, rondando os 30%. Este crescimento espelha já a nova filosofia de gestão? Como antes referi, não há uma nova filosofia de gestão. Pelo contrário, a equipa está dar continuidade ao trabalho de fundo iniciado antes da privatização. O que mudou foi o mercado concorrente, que não pôde manter a trajetória de continuada depreciação dos preços e resultados. A Fidelidade, em praticamente todos os ramo Não Vida, tem melhores indicadores de gestão que a média do mercado: prémios médios mais elevados, menores frequências de sinistros, menos sinistros em curso, mais provisões e melhores níveis comprovados de serviço. Se somarmos a tudo isto a força da sua marca e uma rede de mediação muito profissional, não é de admirar que ganhemos quota de mercado Não Vida num novo ciclo de subscrição.

61


M D S  m a g a z i n e

Na área Vida será diferente. O ano de 2016 vai conhecer alguma alteração da nossa estratégia e posicionamento, pois concluímos que o novo regime de Solvência II europeu penaliza e praticamente inviabiliza o desenvol‑ vimento dessa linha de negócio nos moldes atuais.

A Fidelidade é hoje a única empresa portuguesa a atuar no mercado de capitais chinês. O que é que isto poderá significar para o futuro da seguradora e dos seus stakeholders? Várias seguradoras internacionais, também presentes em Portugal, obtiveram essa qualificação. Poucas pessoas sabem que as autoridades chinesas fazem uma análise muito pormenorizada dos candidatos, análise que pode demorar meses ou anos. O facto de a Fidelidade ter sido qualificada para operar no mercado de capitais chinês é mais uma prova da sua capacidade financeira e de gestão e devia ser um motivo de orgulho para o país. É conveniente não esquecer que a China é a segunda economia do mundo e a sua classe média vai ser tão numerosa como a da União Europeia. Embora qualificados para operar no mercado de capitais chinês

A Fidelidade é a seguradora líder de mercado em Portugal, registando atualmente uma quota de mercado de 29,8%. A companhia está presente nos vários segmentos de negócio da atividade seguradora e beneficia da maior rede em Portugal, marcando presença em vários países, nomeadamente Angola, Cabo Verde, Moçambique, Espanha e Macau.

FIDELIDADE EM NÚMEROS (2015) PORTUGAL PRÉMIOS GERIDOS

€3.768M Q U O TA D E M E R C A D O

29,8% 62

ainda não estamos a operar ao abrigo desse estatuto porque as oportunidades de investimento não o têm ainda justificado e precisamos aperfeiçoar alguns meca‑ nismos operacionais.

Temos assistido no mercado segurador português a uma crescente concentração. Como perspetiva este desenvolvimento? Uma década de práticas tarifárias menos prudentes, um contexto de taxas de juro próximas do zero e uma economia com fracas perspetivas de crescimento tornam inevitável o processo de concentração. Se acres‑ centamos a isso os desafios do regime Solvência II só podemos concluir que este processo vai ser bastante rápido. Estamos bastante satisfeitos por ter sido a Fidelidade a marcar muito cedo o rumo deste processo e termos atingido uma escala que nos permite sermos relevante no mercado ibérico.

2016 ficará marcado também pela entrada em vigor do Solvência II. Como é que encara este reforço de exigência por parte do regulador? O Solvência II representa, acima de tudo, capitais mais elevados para o mesmo nível de risco, ou seja, mais proteção para os segurados e maiores exigências para os acionistas. O Solvência II traz melhorias significativas em termos de gestão do risco e de obrigações de informação e de gestão. Porém, também introduz novos conceitos que podem ter impactos bastante negativos nalgumas áreas de negócio, como o seguro de vida, cujo modelo de negócio pode ficar, na sua essência, comprometido. É conveniente recordar que as seguradoras Vida, com os critérios que vigoraram até agora, foram um elemento de estabilização dos mercados e de suporte às economias e ultrapassaram a grave crise financeira que se iniciou em 2008 sem precisar de apoio dos contribuintes.

Como é que a Fidelidade se preparou para este novo desafio? A Fidelidade começou os trabalhos de preparação para Solvência II em 2006, há quase 10 anos, com a criação da Direção de Gestão de Risco, e tem hoje uma equipa alta‑ mente especializada que trabalha a full­‑time para este fim. Em 2014, precedendo a privatização, distribuímos quase 600 milhões de euros em dividendos acumulados e capital, o que naturalmente tornou essa adaptação mais exigente. Por este motivo, e de uma forma prevista, foi realizado um aumento de capitais próprios pelo valor de 520 milhões de euros em 2015. Mas a volatilidade estrutural dos mercados, em praticamente todas as áreas e geografias, somada à regra de valorização dos ativos market­‑to­‑market, regra


fullcover

que não faz sentido para uma atividade de longo prazo, vai trazer para todas as empresas seguradoras Vida uma permanente e insustentável pressão sobre o capital, que aliás está a mudar a face do seguro na Europa.

Estamos a trabalhar afincadamente na adaptação tecnológica à 4ª Revolução Industrial, com experiências bastante interessantes em “big data”, “digitization” e plataformas online. As novidades irão aparecer

A Fidelidade tem uma presença expressiva nos mercados angolano e moçambicano. Qual a estratégia do grupo para estes mercados?

Como antevê o relacionamento com os brokers de seguros no futuro?

Servir as famílias e as empresas de Angola e Moçambique como as servimos em Portugal, com produtos adequados às suas necessidades, a preços competitivos e com exce‑ lentes níveis de serviço. Aspiramos a ser um motor de inovação e progresso da atividade seguradora nesses países e a aproximar as novas classes médias do seguro. Estamos a fazer o nosso percurso, mas não deixaremos de olhar para possibilidades de crescimento desde que se mostrem consistentes com os nossos padrões.

Aspiramos a ser um motor de inovação e progresso da atividade seguradora em Angola e Moçambique e a aproximar as novas classes médias do setor segurador. Enquanto líder de mercado a Fidelidade tem sido pioneira em termos de desenvolvimento de produtos e serviços inovadores. Destacaria algum exemplo? O seguro oncológico, por ser o último produto que lançámos e pelo que implica ao nível do trabalho conjunto de duas empresas do grupo, a Multicare e a Luz Saúde. É um seguro que dá resposta integral ao desafio do cancro e é inovador em todos os aspetos, começando pela atenção que dá à prevenção da doença, aos capitais seguros ou à atenção personalizada para cada caso.

Qual as principais linhas estratégicas de crescimento para os próximos anos?

Partindo de um bom nível de relacionamento, que é o que temos agora, acredito que há espaço para o melhorar, pelo que espero que seja mais intenso e eficiente e criador de mais valor para as duas partes.

Como descreve a relação da Fidelidade com a MDS? A Fidelidade e a MDS têm uma relação de longa data, que remonta à década de 80, ao início da MDS. Ao longo destas três décadas foi criado e fortalecido um verda‑ deiro espírito de parceria que tem permitido, em nossa opinião, aportar valor a um conjunto importante de clientes, através de soluções diferenciadoras em termos de coberturas, gestão de risco e gestão de sinistros. A nossa relação extravasa a área de intermediação de seguros, estendendo­‑se a outras áreas de colaboração como a formação e o resseguro e está cimentada numa relação pessoal de confiança e apreço mútuo em todos os diversos níveis das estruturas. Esta forma de trabalhar tem contribuído para a fideli‑ zação e estabilidade da carteira ao longo deste período. O grupo Sonae tem, naturalmente, um peso significa‑ tivo na carteira da Fidelidade que, desde a origem deste grupo, assegura as coberturas de Acidentes de Trabalho e de Saúde. Mas a parceria existente com a MDS tem­‑nos permitido estar também presente junto de um conjunto alargado de empresas de referência do panorama empresarial português. Quando pensamos em melhorias em termos de organi‑ zação, processos e produtos, pensamos sempre de que modo tais alterações poderão contribuir para fortalecer a relação e beneficiar os nossos parceiros de referência, tanto em Portugal como noutros mercados externos em que estaremos cada vez mais presentes e onde este tipo de colaboração faz ainda mais sentido. •

Esperamos crescer em todas as áreas de negócio Não Vida, beneficiando da recuperação tarifária em curso e da melhoria da nossa posição competitiva quando comparada com a que tivemos nos últimos anos. O seguro de saúde continuará a ganhar peso no portefólio da Fidelidade assim como as atividades ligadas à assis‑ tência e prestação de serviços em correlação direta com os seguros. E seremos uma companhia mais multinacional, com 20% a 25% dos prémios com origem noutros mercados.

63


M D S  m a g a z i n e

Imposto sobre os prémios de seguro – erros a evitar

Ilustração por Tiago Galo

Karen Jenner, da FiscalReps, apresenta a sua visão sobre novos riscos que resultam de erros relacionados com o imposto sobre os prémios de seguro (IPS) e dá­‑nos conselhos sobre como evitá­‑los.

64


fullcover

O imposto sobre os prémios de seguro (IPS) é, muitas vezes, considerado um custo fiscal menor em comparação com outros impostos que incidem sobre companhias de seguros. Todavia as seguradoras que lidam com a subscrição de programas de seguros multinacionais, incluindo as do setor das cativas, enfrentam riscos crescentes decorrentes de erros e de desconformidades no IPS, que, em última instância, podem ter impacto nos lucros referentes às subscrições e nos resultados finais.

O crescimento do IPS

Precauções relativamente ao IPS

No rescaldo da última crise financeira mundial, um crescente número de governos de todo o mundo veio a criar o IPS ou a reforçar regimes de IPS existentes. Desde 2008 que diferentes governos do mundo inteiro têm vindo a desviar as atenções da tributação direta sobre as empresas para a tributação das transações, incluindo as operações de seguros, como meio de aumentar as receitas. À escala europeia, foram imple‑ mentados novos regimes de IPS na Hungria, na Bulgária e em São Marino. No que respeita a aumentos das taxas deste imposto na UE, ao longo dos últimos dez anos, as autoridades dos Países Baixos aumentaram o IPS no país de 9,7% para 21% e, em 2015, verificaram­‑se aumentos no Reino Unido, na Grécia, na Eslovénia e na França, assim como em muitos outros países. O enfoque crescente em impostos indiretos, e especificamente no IPS, é ainda demonstrado pelo aumento significativo das investigações e auditorias ao correto cumprimento das obri‑ gações relacionadas com o IPS, levadas a cabo por autoridades fiscais nacionais. As auditorias não são sempre dirigidas ao segurador; as mais recentes investigações relacionadas com o IPS têm resultado cada vez mais de auditorias feitas a empresas tomadoras de seguro. Recentemente, surgiram algumas destas investigações inde‑ pendentes levadas a cabo por autoridades fiscais belgas e austríacas. Num primeiro momento, as investigações procuraram avaliar os montantes de IPS liquidados e garantir que o tinham sido feito de forma atempada e de acordo com as regras estabelecidas. Agora, várias autoridades fiscais pretendem também analisar e até questionar as alocações de prémios. As autoridades fiscais do Reino Unido e da Alemanha estiveram recente‑ mente envolvidas em investigações deste tipo. No que respeita à Alemanha, se as alocações de prémios de um segurador aparentarem não estar estruturadas de uma forma que as autoridades fiscais considerem justa tendo em conta os riscos referentes ao país, o referido segurador poderá ver os valores em causa serem contestados pelas autoridades, que poderão alegar que o imposto pago foi menor do que o devido. É fundamental que o segurador seja capaz de demonstrar uma alocação justa e razoável de um prémio (e do valor correspondente de IPS) a uma determinada jurisdição. As investigações podem exigir a reali‑ zação de cálculos, documentação e registos de auditoria, por vezes relativamente a anos ante‑ riores. Outras investigações podem abranger os legacy settlements, análises do clausulado das apólices e aplicação de taxas adequadas de IPS.

Tem­‑se verificado também um nível crescente de escrutínio sobre o IPS, num desenvolvi‑ mento recente relacionado com as preocupa‑ ções das autoridades fiscais, especialmente na UE, no que toca à utilização de preços de trans‑ ferência. Cada vez mais, as autoridades fiscais consideram que estes custos deveriam ser distribuídos pelo grupo de uma forma equita‑ tiva, objetiva e independente. Este escrutínio mais recente pode muito bem vir a afetar a metodologia subjacente à alocação dos prémios de seguro nos próximos anos, uma vez que se trata de algo a que os governos começam a estar seriamente atentos. Embora as empresas tomadoras de seguros possam ter de comunicar o cumprimento das obrigações relacionadas com o IPS tendo em vista as suas próprias auditorias, na Europa é habitual ser o segurador a pagar o IPS, sendo que existem apenas algumas pequenas exceções em que este imposto não se aplica. Na prática, a responsabi‑ lidade pelo cumprimento das obrigações relacio‑ nadas com o IPS cabe tanto ao segurador quanto ao tomador de seguro, e ambos partilham a responsabilidade de assegurar que os prémios são alocados de forma razoável e que os vários fatores são calculados corretamente. As implica‑ ções das desconformidades podem afetar quer o segurador quer o tomador de seguro. Em última instância, a responsabilidade deverá recair sobre a companhia de seguros, uma vez que é a que responde diretamente perante a autoridade fiscal, mas há casos em que o tomador de seguro poderá ser responsabilizado. Alguns países da UE irão brevemente deixar de exigir que as companhias de seguros estran‑ geiras que subscrevem localmente tenham um representante fiscal (até muito recente‑ mente uma nomeação exigida por lei). Tanto assim é que os sócios da empresa que atua como representante fiscal são conjunta e soli‑ dariamente responsáveis pelo pagamento de quaisquer impostos devidos em nome do segu‑ rador estrangeiro. Nas instâncias da UE tem sido defendido que é injusto obrigar um segu‑ rador sediado na UE e não nacional a nomear um representante fiscal sem que os segura‑ dores nacionais tenham de fazer o mesmo. Nos últimos anos, temos vindo a assistir à revo‑ gação da obrigatoriedade de nomear um repre‑ sentante fiscal em alguns países, geralmente como resultado de pressões por parte da UE. A Espanha é um bom exemplo disto mesmo. Em 2010, a Comissão Europeia acionou um processo contra a Espanha defendendo que era

65


M D S  m a g a z i n e

K AREN JENNER → Karen Jenner integrou a FiscalReps na qualidade de consultora de seguros com mais de 20 anos de experiência no setor segurador. Antes de integrar a FiscalReps, Karen Jenner estava na AIG, tendo desempenhado várias funções na área de Major Accounts Practice da empresa, responsável pelos programas globais de seguros de algumas das principais empresas da FTSE 100.

66

injusto que a Espanha obrigasse seguradores não espanhóis a nomearem um representante fiscal. No ano passado, a Espanha cedeu final‑ mente na sequência de um segundo caso. No entanto, embora a obrigação de nomeação de um representante fiscal já não esteja em vigor, os seguradores, enquanto tal, continuam a ter de declarar e pagar IPS e de cumprir as regulamen‑ tações locais. Atualmente, a taxa média do IPS na Europa encontra­‑se entre os 10% e os 15%, o que tem implicações quer para os fornecedores quer para os compradores de seguro. Para as empresas compradoras de seguros, nomeadamente as multinacionais, 15% da totalidade do prémio será um valor considerável. É fundamental assegurar que se paga o valor correto de imposto, uma vez que os segurados não querem pagar mais impostos do que os estritamente necessários. Para os segura‑ dores, é importante garantir que estão a cobrar a totalidade do valor do imposto devido, sendo­ ‑lhes permitido transferir certos componentes do custo do imposto para o tomador do seguro. O valor deste custo que o segurador não trans‑ ferir para o tomador de seguro será efetivamente subtraído aos resultados de subscrição obtidos pelo segurador, os quais, devido ao atual soft market, são, na melhor das hipóteses, margi‑ nais. Na verdade, isto poderá significar um prejuízo ainda antes de se ter em conta as indem‑ nizações às empresas e os custos de serviço. Uma vez que tanto os seguradores quanto os resseguradores do ramo Vida estão frequente‑ mente isentos de IPS, o peso deste imposto recai especialmente sobre os seguradores do ramo Não Vida, incluindo as companhias de seguros cativas.

erros, a exposição pode aumentar. Se ao mesmo tempo o rácio combinado for de cerca de 95%, significando que num prémio de 100 milhões tem 5 milhões de lucros, este lucro é muito inferior à exposição ao IPS. Qualquer aumento indevido nos custos do IPS irá ter um impacto direto nos lucros. Os coeficientes combinados das companhias de seguros cativas podem divergir dos coefi‑ cientes dos seguradores gerais – as receitas de prémios das cativas são geralmente significa‑ tivas, como é sabido, e o custo de qualquer erro com o IPS afetará também significativamente a margem de lucro da cativa. Além disso, há também a questão dos danos reputacionais. Por exemplo, se um segurador, por qualquer razão, não pagar um processo de IPS num país da UE, um precedente aberto pelo Tribunal de Justiça da União Europeia no caso Kvaerner, em 2001, dá às autoridades fiscais nacionais o direito de atuar contra o segurador se este não regularizar a situação. Trata­‑se de um problema especialmente relevante no atual panorama de regulamentação e de confor‑ midade legal em que os assuntos fiscais das empresas estão sujeitos a níveis de escrutínio sem precedentes quer por parte das autoridades fiscais quer por parte dos média. Os segura‑ dores precisam de ter em conta, cada vez mais, a necessidade de implementação de sistemas que garantam o cumprimento eficaz das obri‑ gações fiscais devido às graves consequências que o incumprimento poderá acarretar: do não pagamento de impostos podem resultar multas, litígios e danos reputacionais. •

Evitar a incorreta gestão do IPS O potencial efeito da incorreta gestão do IPS nos resultados da subscrição de um programa de seguros multinacional pode ser conside‑ rável. Com base numa taxa de IPS de 15%, típica na Europa, e num coeficiente de exploração combinado médio de 95%, valor adotado em grande parte do mercado segurador do Reino Unido, um erro de 5% no IPS poderá reduzir o resultado de subscrição em 15%. Tome­‑se o exemplo de um segurador com 100 milhões de dólares de receitas em prémios. Com uma taxa média de 15% de IPS na Europa, existe uma exposição potencial ao IPS de 15 milhões de dólares. Se estiver tudo em conformidade, e se tudo o que tem que ver com o IPS for gerido corretamente, a exposição é nula. Mas havendo

O potencial impacto da gestão deficiente do IPS nos resultados de subscrição de um programa de seguros multinacional pode ser significativo.


fullcover

67


M D S  m a g a z i n e

68


DOSSIER

RISCOS GEOPOLÍTICOS QUANDO AS NOTÍCIAS ESCREVEM UMA PÁGINA DA HISTÓRIA AL AN SIMON – PHILE A S CON SULTIN G GROUP

GERIR E MITIGAR A AMEAÇA CRESCENTE DO TERRORISMO DANIE L O'CONNE LL – X L CATLIN

SEGURANÇA EM VIAGEM E GESTÃO DE CRISES INTE R NATIONAL SOS/CONTROL R ISKS

RISCOS GEOPOLÍTICOS: QUE PRODUTOS E COBERTURAS? P OR ROB HOU GH , CGSC

NOVAS IDEIAS PARA ENFRENTAR OS RISCOS GEOPOLÍTICOS NOS NEGÓCIOS DAVID ANDE RSON – ZUR ICH

PANORAMA GEOPOLÍTICO GLOBAL IULIA SIMON – CH TORO INTE R NATIONAL

Todas as ilustrações por Tiago Galo

69


M D S  m a g a z i n e

Quando as notícias escrevem uma página da História P O R A L A I N S IM O N

“A vingança dos territórios sobre os mapas, dos longos períodos de tempo sobre os períodos curtos, traz conflitos violentos que acompanham afirmações de identidade, que ressurgem de forma mais forte devido ao fato de terem sido previamente enterrados, como se do retorno dos reprimidos se tratasse. Estes conflitos desestabilizam os poderes estabelecidos, que abominam ceder os privilégios que detêm”.

70

Uma explicação geopolítica dos riscos na nova ordem mundial As testemunhas e os atores desta segunda década do século XXI são atingidos por sentimentos estranhos. O velho mundo parece­‑lhes estar inequivocamente morto, ao passo que o novo ainda não nasceu, e ainda não há uma data certa para o seu nascimento. A interação entre estas duas situações é muitas vezes a principal razão de algum pessimismo, mas também de perguntas, dúvidas, incertezas, receios e de alguma nostalgia, que é compreensível mas também potencialmente perigosa. Esta não é, de maneira nenhuma, a primeira vez que as gerações que dominaram a segunda metade do século XX enfrentam momentos de rutura de grande relevância entre o passado e o futuro. Em 1989 deu­‑se a queda do Muro de Berlim, o principal símbolo da Guerra Fria; em 2001, o 11 de setembro, dia em que vimos, de forma trágica, que a História não tinha chegado ao fim. Em ambos os casos, houve certamente lugares e imagens notáveis, mas também acontecimentos que é possível compreender e interpretar. Desde 2011, todos os países, regiões e continentes parecem mover­‑se em simultâneo, sem ligações aparentes. Este movimento (aparentemente) sem sentido, de natureza quase browniana, gera perplexidade e angústia. Vamos dar aqui, através de uma lente geopolítica, uma pequena contribuição para transformar a ansiedade em compreensão. Partindo do pressuposto que a geopolítica é a combinação da geografia com a História, vamos dar­‑lhe uma oportunidade. A tese que se segue tentará demonstrar, através de alguns exemplos, que, mais do que o mundo estar a mudar radicalmente, são as lentes com que o vemos, as nossas perspetivas geográficas e históricas, que se mantêm estagnadas e anacrónicas e tornam a compreensão difícil ou mesmo impossível.

Tomemos três lugares para análise: Líbia, Síria e Iraque. Estamos em 2016, passaram cinco anos desde o início daquilo que achámos por bem chamar a Primavera Árabe. De que estação do ano nos lembraríamos agora? Todos os leitores deste artigo, bem como o autor, aprenderam a identificar os nomes dos três países acima, a localizá­‑los em mapas de várias cores com nomes que identificam estados delimitados de forma exata. Não há dúvida de que estamos a lidar com países ou até estados. De que legado estamos a falar? Vemos as peças de um puzzle fragmentado sobrepostas aos nomes de antigos países em ruínas: no lugar da despedaçada Líbia estão agora a Cirenaica, a Tripolitânia e Fezzan. Entretanto, no Iraque e na Síria, sunitas e xiitas, árabes e curdos (a realidade é muito mais complexa do que esta simplificação) destroçaram, a ferro e fogo, os países que nos habituáramos a ver. Mas, na realidade, todas estas entidades já existiam muito antes de os nossos mapas terem sido impressos, muito antes de termos aprendido a conceber o mundo com linhas tão bem delineadas. Líbia, Síria e Iraque são, de facto, construções voluntárias e recentes, nascidas do desejo de ultrapassar divisões antigas concretizado com a atribuição da independência a aglomerações regionais heterogéneas na primeira metade de século XX. No que respeita à Líbia, o desejo partiu da Itália, ao passo que os casos da Síria e do Iraque se deveram ao acordo franco­‑britânico Sykes­‑Picot de 1916 — cujo centenário se celebra este ano, o que deveria levar à respetiva co-memorização, ou seja, a memória operativa comum e popular. Estas realidades antecedem a nossa memória. Muito antes de começarmos a delimitar mapas­ ‑múndi, existiam identidades complexas nos locais que pretendemos simplificar, às vezes com bons motivos, com um verniz de homogeneidade. Mas as antigas identidades mantiveram­‑se sob a fina camada da vontade dos homens. Parecia que queríamos esconder todas as fissuras com cal. Todos concordamos que a História é escrita pelos vencedores. Deveríamos acrescentar que também são os vencedores que desenham os mapas. Mas tal como “o hábito não faz o monge”, tal como “a barba não faz o filósofo”, também um mapa não cria um território, sobretudo quando tenta aglomerar uns e dividir outros. E a identidade perdura; pode ser reanimada a qualquer momento. E é o que está a acontecer perante os nossos olhos. Confundimos maquilhagem com pele, aparências construídas com realidades antigas. Esta incrível ilusão leva­‑nos a confundir mapas com territórios.


fullcover

A L A I N S IM O N → Alain SIMON é, desde 1985, o diretor executivo do Phileas Consulting Group, uma consultora especializada no processo de globalização. Anteriormente trabalhou durante sete anos para a COFACE, a empresa francesa de garantia de crédito à exportação. A sua área de especialidade é a de estratégias geopolíticas e corporativas (Vídeo, em francês, no YouTube "Clip Alain SIMON Géopolitique"). → Atualmente participa no processo de decisão de muitas empresas francesas e estrangeiras que pretendem desenvolver atividade à escala mundial. → Foi professor associado da Universidade de Rennes 1 (2003–2011) e é, há muitos anos, colaborador próximo da Essec Executive Education. → Publicou vários artigos e quatro livros. O primeiro, Géopolitique et stratégies d’entreprise, foi considerado o melhor livro financeiro francês em 1994. O seu segundo livro, Le sens des cartes, foi publicado em 1997. Ambos os livros estão publicados em francês por Éditions Descartes et Cie. O seu terceiro livro, Géopolitique d’un monde mélancoliqueo, foi publicado em 2006 (Éditions Eyrolles). O quarto livro, Le temps du discrédit, foi publicado em 2008 na forma de e­‑book e pode ser descarregado em onizibook.eyrolles.com

A minha hipótese de partida é a seguinte: aprendemos a ver o mundo através dos mapas mais recentes, enquanto a compreensão real do problema exige que conheçamos a composição dos antigos territórios. Toldados pela nossa habituação a espaços de curta duração, ficamos estupefactos com o ressurgimento de realidades de longa duração. As situações invertem­‑se em toda a parte e nada fica como dantes. É possível encontrar mais exemplos daquilo a que poderíamos chamar a vingança dos territórios sobre os mapas? Os exemplos são incontáveis, uma vez que o processo está em curso por todo o mundo. Todos podemos descobri­‑lo ao nosso redor. Vemos em África o reaparecimento de divisões entre povos nómadas e sedentários, habitantes antigos e recém­‑chegados, agricultores e criadores de gado, cristãos animistas e muçulmanos animistas. E alguns países recentemente desenhados no atlas já se fraturaram. Irão sobreviver? Também na Europa, as linhas de fratura, escondidas da vista pela cosmética artificial dos mapas, estão a reabrir­‑se: vemos na divisão da Ucrânia, que não é, em si mesma, senão um agregado construído a partir de 1945, as divisões que vieram à tona durante o cisma de 1054 entre as Igrejas Cristãs do Oriente e do Ocidente, e que sempre se mantiveram vivas, como atesta a reunião entre o Papa Francisco e Kirill, em fevereiro de 2016. Esta linha atravessou também a Crimeia, que só se separou da Rússia em 1954. Aqueles que só viram o mapa editado não estão cientes das circunstâncias. E esta situação é ainda mais grave para aqueles que viram apenas mapas criados depois de 1991. Conheceram um mundo sem referências cartográficas à URSS. Tal como o sinal de “tinta fresca” indica que é melhor não nos aproximarmos, deveríamos ser igualmente cautelosos em relação aos “mapas recentes”. Não temos aqui espaço suficiente para muitos outros exemplos. Vamos argumentar com apenas alguns para sublinhar quão problemático e sistemático é o atual contra­‑ataque que os territórios estão a fazer aos mapas. Os ortodoxos gregos parecem estar a afastar­‑se da União Europeia e a aproximar­‑se da Rússia. Não existe nenhuma ambiguidade neste caso: a influência advém em primeiro lugar não de crenças ou práticas religiosas, mas, acima de tudo, de um tropismo cultural, que engloba crentes, não crentes e infiéis. Desde o início de 2016, temos vindo a assistir a um projeto de Atenas para que a Grécia deixe de ser signatária do acordo de Schengen, o que alinharia o país com a Roménia e a Bulgária, que estão fora do espaço Schengen, recriando a linha divisória entre o Império Romano Oriental e Ocidental, que remonta ao século IV d. C.

No que respeita aos movimentos independentistas na Escócia e na Flandres, saliente­‑se que se trata de territórios que não estavam incorporados no Império Romano, regiões habitadas por povos que eram considerados bárbaros. Parece que o passado não passa. Deixemos os exemplos por aqui. Não duvidemos de que é possível encontrar no contexto geográfico de cada um exemplos de processos deste tipo. No mundo chinês, a unidade não elimina as divisões entre Pequim e Xangai nem as particularidades identitárias dos Han e de outros povos. No Vietname verifica­‑se a presença e o ressurgimento de especificidades entre Tonquim, Aname, e Cochinchina. Muitas pessoas mais qualificadas do que eu podem demonstrar que a Índia continua a ser muito diversa enquanto país único. Nos próprios Estados Unidos, podemos estar certos de que as divisões da Guerra Civil foram esquecidas? Uma querela recente sobre bandeiras dá­‑nos motivos para duvidarmos desta presunção. É claro que admitimos que existem muitos exemplos do contrário. Não estamos a propor uma teoria absoluta, mas uma lente para usar, como chave com a qual não pretendemos abrir todas as portas. No entanto, através destes exemplos, os leitores podem tirar várias lições e construir perspetivas e reflexões mais informadas sobre os riscos do mundo. Nós propomos duas: • A vingança dos territórios sobre os mapas, dos longos períodos de tempo sobre os períodos curtos, traz conflitos violentos que acompanham afirmações de identidade, que ressurgem de forma mais forte devido ao fato de terem sido previamente enterrados, como se do retorno dos reprimidos se tratasse. Estes conflitos desestabilizam os poderes estabelecidos, que abominam ceder os privilégios que detêm. Embora cíclicas, as décadas servem de parênteses da História. É preciso explicar: a intensificação das tensões leva sempre a um aumento do risco e obriga a uma investigação mais ampla. • Uma segunda lição: a hipótese proposta mostra o perigo de confundir períodos curtos com períodos longos — a duração das nossas vidas, a extensão da nossa memória e o tempo da História. É arriscado considerar que um vulcão está extinto só porque parece adormecido há muito tempo. É o mesmo erro que leva alguns a recusar vacinas, nunca tendo experienciado uma epidemia. Um especialista em gestão de risco deve, pois, ter uma memória que ultrapasse largamente a sua data de nascimento. Cuidado, muito cuidado com os amnésicos! •

71


M D S  m a g a z i n e

Gestão do risco

Gerir e mitigar a ameaça crescente do terrorismo P O R D A N I E L O ’C O N N E L L

Um risco volátil e imprevisível

D A N IE L O ’C O N N E L L → Daniel O’Connell é Class Underwriter para riscos da Guerra, Terrorismo e Violência Política na XL Catlin. → Integrou a antiga XL em 2013, liderando a equipa de riscos da Violência Política no Lloyd’s. → Tem mais de 10 anos de experiência no setor segurador e já foi underwriter na Willis e na Hiscox. → Cumpriu serviço militar no regimento de infantaria dos Irish Guards depois de ter integrado a Royal Military Academy em 2001, e foi condecorado com a Cruz Militar pelos seus serviços no Iraque em 2013.

72

O risco de ataques terroristas assemelha­‑se, em certos aspetos, às catástrofes naturais – ambos tendem a ocorrer com alguma regularidade e a provocar um impacto económico significativo, bem como feridos e mortos. A natureza dos acontecimentos tende também a seguir um mesmo “guião”. No caso do terrorismo, são ataques bombistas e tiroteios; no que respeita às catástrofes naturais, são os ciclones, os tufões, os sismos, as inundações, etc. Porém, distinguem­‑se quanto à sua fonte e a previsibilidade. Conhecemos, por exemplo, as condições que dão origem a um ciclone e podemos prever de forma cada vez mais exata o local e o momento em que os impactos se irão verificar. Mas, estamos ainda a começar a perceber quais as circunstâncias que levam a que alguém decida infligir danos graves a pessoas inocentes. E mesmo quando começamos a compreender as motivações e patologias subjacentes a estes atos, é extremamente difícil prever o dia e a hora em que um terrorista poderá atacar. Mas, tal como acontece com as catástrofes naturais, isto não significa que as empresas não tenham opções para lidar com a ameaça terrorista, independentemente da volatilidade e da imprevisibilidade da mesma. Nos anos que se seguiram ao 11 de setembro, foi identificado um conjunto de ações preventivas que permitirá reduzir a possibilidade de uma empresa ser alvo de terroristas, bem como minimizar os impactos físicos e financeiros de um ataque terrorista. Simultaneamente, o setor segurador desenvolveu uma gama mais alargada de opções para mitigar potenciais impactos.

Por vezes, o terrorismo é tratado como uma ameaça isolada. No entanto, a melhor forma de lidar com este fenómeno é normalmente no âmbito de um programa global de gestão do risco. As medidas que reduzem o risco de ataques – como um maior controlo sobre o acesso às instalações – constituem também, em geral, boas práticas. Entre os passos que as empresas deverão considerar, incluem-se: • implementar medidas de segurança física e de proteção dos funcionários de modo a reduzir a exposição ao ataque; • ter em conta potenciais impactos indiretos relacionados com alvos próximos ou com perturbações nos sistemas de transportes ou nos serviços públicos; • assegurar que os planos de continuidade de negócio se mantêm atualizados e incluem medidas relacionadas com o terrorismo, como a gestão da atenção dos média; • avaliar os termos e condições da apólice de seguro e revê­‑los conforme necessário, de forma a mitigar os riscos de ataques terroristas. As empresas deverão também monitorizar de forma consistente as potenciais ameaças e avaliar as possíveis vulnerabilidades, nomeadamente à medida que vão evoluindo. Como em qualquer catástrofe, é provável que a distância temporal relativamente a qualquer plano ou acontecimento amplamente divulgado de caráter terrorista reduza a atenção aos sinais de alerta, bem como à probabilidade aparente de ocorrência de um acontecimento deste tipo.

Transferência do risco Um ataque terrorista a bens patrimoniais ou infraestruturas poderá afetar, direta e indiretamente, muitos aspetos das operações de uma organização e provocar um conjunto variado de perdas, incluindo danos patrimoniais e perdas de exploração por interrupção da atividade, bem como indemnizações por acidentes de trabalho ou responsabilidade patronal. E embora muitos países tenham alguma forma de seguro ou resseguro a nível nacional1 contra o terrorismo, estes planos têm algumas limitações materiais, que são enumeradas de seguida. • Poderá ser necessária uma declaração oficial de um ato de terrorismo para acionar o pagamento das indemnizações;


fullcover

• Nem todas as coberturas estão disponíveis; • A cobertura de perdas de exploração por interrupção da atividade, se estiver disponível, poderá ter limitações; • Têm de ser incluídos todos os ativos; • A cobertura de riscos de natureza química, biológica, radiológica ou nuclear (QBRN) poderá não estar disponível. No entanto, o mercado de seguros privado para o risco de terrorismo, quer isolados quer em combinação com sistemas de seguros de terrorismo a nível nacional, evoluiu consideravelmente desde o 11 de setembro. As empresas têm agora uma variedade de opções que permitem adequar os seus desejos e perfis de risco às coberturas que compram. As opções de transferência do risco de terrorismo incluem atualmente: Programas globais – atualmente é possível incorporar a cobertura dos riscos associados ao terrorismo num programa global, embora seja preciso ter em conta algumas questões, das quais as mais importantes são: se existem sobreposições ou lacunas entre a apólice contra atos terroristas e a cobertura de todos os riscos patrimoniais e de que forma um sistema de seguros contra o terrorismo a nível nacional, nos casos em que exista, se distingue do programa global no que respeita aos triggers e aos níveis de cobertura. Em ambos os casos, poderão ser usadas apólices de diferenças em condições (DIC) e/ou de diferenças em limites (DIL) para ajudar a criar programas consistentes; Extensões de apólices – além do clausulado “standard”, os subscritores podem disponibilizar um clausulado personalizado ou conforme ao programa geral, mas com sublimites e extensões elaborados especificamente tendo em conta as necessidades da empresa, seja no quadro dos seguros patrimoniais, seja na forma de cobertura isolada; Cobertura flexível – muitas seguradoras oferecem atualmente coberturas relacionadas com o terrorismo adaptadas às necessidades específicas das empresas, como sejam: • cobertura de perda de atratividade, no caso de uma empresa sofrer uma quebra no volume de negócios em resultado de danos em edifícios icónicos ou em infraestruturas localizadas nas proximidades; • perdas de exploração por interrupção da atividade, quando o acesso às instalações do segurado não é possível, nomeadamente em resultado de uma diretriz civil ou militar;

• para as empresas com sede nos EUA, cobertura para cativas TRIA2; Riscos QBRN – estes riscos são normalmente excluídos das apólices de seguros, mas podem ser adquiridos como «derrogação de uma exclusão» ou de forma independente. As coberturas de danos físicos (incluindo os custos de limpeza), de perdas de exploração por interrupção da atividade e de responsabilidade civil estão disponíveis num número limitado de mercados comerciais especializados; Período de indemnização – embora alguns peritos defendam que o período de indemnização da cobertura de perdas de exploração ligadas a atos de terrorismo deve ser de pelo menos 18 meses, normalmente os segurados podem estabelecer um prazo específico de cobertura, num limite mínimo de seis meses e no máximo de cinco anos; Perdas de exploração por interrupção da atividade – as empresas não têm de sofrer danos materiais diretos para sofrerem uma perda. Agora é possível cobrir o impacto de uma interrupção da supply chain em resultado de uma ação terrorista ou devido a outras causas indiretas de perda; Cancelamento de um evento – ataques terroristas ou até ameaças graves podem levar um organizador a cancelar um grande evento comercial. Trata­‑se de algo que aconteceu mais frequentemente depois do 11 de setembro, mas houve muitos outros casos de eventos cancelados em resultado de uma ameaça ou de um ataque terrorista. Os acontecimentos recentes mostram que, infelizmente, o terrorismo continuará a fazer parte do panorama do risco no futuro próximo. Não obstante, os riscos de ataques terroristas podem ser geridos de forma a minimizar a ameaça e a mitigar potenciais impactos. No momento anterior à verificação de qualquer dano, o seguro proporciona conforto à administração e aos acionistas de uma empresa, assim como uma via para a recuperação se, efetivamente, ocorrer um ato terrorista. Atualmente existe uma grande variedade de escolha de apólices e clausulados que permitem criar coberturas eficientes de um ponto de vista de custo – benefício e adaptadas às situações e necessidades específicas das empresas. • 1 Nota do editor: Como são os “pools” para riscos catastróficos ou de terrorismo existentes em certos países europeus. 2 TRIA – Terrorism Risk Insurance Act

73


M D S  m a g a z i n e

Segurança em viagem e gestão de crises P O R I N T E R N AT I O N A L S O S/ C O N T R O L R I S K S Quando as grandes organizações enviam colaboradores para o exterior ou para regiões perigosas, devem garantir a segurança dos mesmos. Tendo em conta esta necessidade e o pesadelo logístico que ela implica, tem vindo a aumentar o número de empresas que trabalham no sentido de fazer uma adequada preparação dos seus colaboradores para viajar e de os apoiar enquanto se encontram deslocados. A International SOS, a empresa líder mundial em serviços de segurança em viagem, realizou, entre 3 de dezembro de 2015 e 26 de janeiro de 2016, um inquérito junto de organizações europeias sobre as Perspetivas de Risco em Viagem para 2016. A quantidade de viagens de negócios deverá continuar a aumentar, tendo 91% dos inquiridos referido que é provável que o número de viagens internacionais na respetiva organização se mantenha ou aumente em 2016. Outra conclusão importante do inquérito foi o de que 88% dos inquiridos receiam que os riscos inerentes às viagens possam ter um impacto na atividade da empresa em 2016. Embora muitos riscos possam ser mitigados, uma em cada três organizações indicou que não preparava devidamente os seus colaboradores antes de da respetiva partida para o estrangeiro. Tendo em conta estes factos, é essencial que as organizações sejam capazes de formar e preparar os seus colaboradores antes de estes viajarem, bem como de lhes prestar assistência durante a viagem ou caso ocorra uma crise. A International SOS e a Control Risks dão aos gestores a possibilidade de mitigarem os riscos de segurança em viagem e de tomarem as decisões mais acertadas para a saúde, a segurança e a proteção dos seus colaboradores.

74

Ambas empresas contam com anos de experiência prática, que resulta num conhecimento especializado e devidamente ajustado, que colocam à disposição dos seus clientes. A equipa é composta por 200 peritos em segurança em viagem de mais de 30 nacionalidades e com conhecimento de mais de 30 línguas, que se dedicam em exclusivo ao setor e que viveram e trabalharam nas regiões que gerem. A extensa experiência destes profissionais inclui: análise, segurança comercial, gestão de crises, logística, operações militares, informações operacionais e polícia. Têm qualificações em áreas tão relevantes como a gestão de risco, as relações internacionais e os estudos de segurança.

Lidar com crises Lidar com crises e com o que nos confrontamos em situações de crise é difícil. Algumas das equipas de gestão de crises e das equipas de gestão de incidentes que tivemos para ajudar os nossos clientes foram altamente desafiadas. É a forma como tentamos mitigar os riscos, preparando melhor as empresas para as situações antes de viajarem para ambientes de alto risco, que pode ajudar a evitar acontecimentos trágicos. Não podemos prever a erupção de um vulcão islandês ou a ocorrência de um tsunami japonês, mas podemos preparar­‑nos para emergências e riscos, e conseguimos agir muito rapidamente para tentar mitigá­‑los. Quando algo como o ciclone Pam acontece, temos uma grande capacidade para olhar para várias direções ao mesmo tempo. Em primeiro lugar, certificamo­ ‑nos de onde estão os nossos clientes,


fullcover

fazendo­‑o através da nossa solução de localização em viagem, que acompanha os seus movimentos. Além disso, constituímos uma equipa de gestão de crises e uma equipa de gestão de incidentes que podemos colocar no terreno. E habitualmente fazemo­‑lo em 24 horas. Enviamos uma equipa médica, uma equipa de operações, um enfermeiro, um médico e pessoal de segurança para o local para nos certificarmos da localização das pessoas, sabermos se estão em segurança e garantirmos que chegamos até elas e as protegemos. Ao mesmo tempo, temos a nossa equipa de gestão de crises nos nossos centros de assistência para reenviar aos clientes a informação sobre o que estamos a ouvir.

Como gerimos as crises durante os ataques terroristas de Paris e do Mali Na noite de 13 de novembro de 2015, ocorreu uma série de ataques terroristas coordenados em Paris. Três bombistas suicidas atacaram junto do Stade de France em Saint­‑Denis, ao que se seguiram explosões suicidas e tiroteios em massa em cafés, restaurares e num recinto de espetáculos em Paris. Foram mortas 130 pessoas. As nossas equipas integradas de segurança em viagem e de apoio médico deram aconselhamento e assistência a quem estava em Paris no momento dos ataques, incluindo a clientes que se encontravam nas proximidades. Em resposta aos ataques e depois de nos apercebermos da magnitude dos mesmos, aumentámos imediatamente a nossa assistência 24/7 com novas equipas. As nossas equipas apoiaram os clientes na gestão da crise de várias formas, nomeadamente através de aconselhamento claro, equilibrado e fundamentado, e de assistência direta. A nossa atuação integrada em termos de avaliação e aconselhamento ajudou a contextualizar as especulações da comunicação social e os comentários das redes sociais e a tranquilizar os nossos clientes e colaboradores. Foi fornecido apoio no terreno, sob a forma de escoltas de segurança, proteção pessoal e vigilância. Demos apoio aos nossos clientes na utilização da nossa

solução de rastreamento para garantir que estava a ser usada da forma mais eficiente para localizar e ajudar os colaboradores. No dia 20 de novembro de 2015, um grupo de terroristas atacou o hotel Radisson Blu em Bamako, capital do Mali. Os terroristas fizeram 170 reféns e mataram 20 pessoas num tiroteio em massa. Ao longo do dia, as nossas equipas de gestão de crises, em Paris e Londres, deram um aconselhamento essencial aos clientes. A nossa rede de operações exclusiva permite­‑nos ter a capacidade de manter o contacto com clientes e membros afetados e coordenar a resposta em conformidade. O recurso de gestão de crises integrado da Control Risks permitiu ainda garantir a eficácia do apoio. Um membro da International SOS ficou retido no quarto de hotel durante o ataque e telefonou­‑nos a pedir ajuda. Um dos nossos peritos em segurança esteve ao telefone com ela durante quatro horas para a ajudar a ultrapassar este momento de aflição, dando­‑lhe um apoio emocional essencial, bem como aconselhamento especializado. “Durante a chamada, demos conselhos sobre como lidar com o fumo no quarto, sobre técnicas de salvamento, e sobre o que fazer no caso de os agressores tentarem entrar no quarto. Além do apoio no que toca à segurança, os nossos médicos conseguiram também dar conselhos médicos. Comunicámos com as forças de segurança e com o governo local para coordenar a libertação segura desta senhora, membro da International SOS. Ela sobreviveu ao ataque como consequência direta de nos ter ligado”. Todos na International SOS trabalham para o mesmo objetivo: garantir mais proteção e serviços de saúde e segurança de qualidade para cada vez mais clientes sujeitos ao risco. Neste mundo que se tornou mais horizontal e mais perigoso, a saúde, a segurança e a gestão do risco do viajante são um requisito essencial para as empresas.

A International SOS A International SOS é uma empresa líder mundial em serviços médicos e de proteção contra riscos de viagem. Acompanha clientes em mais de 850 localizações em 92 países. Dispõe de um conhecimento especializado único: mais de 11.000 colaboradores, chefiados por 1.400 médicos e 200 especialistas em segurança. As equipas da International SOS trabalham 24 horas por dia para proteger os seus membros. A empresa é pioneira num conjunto de programas de prevenção, reforçados pelo conhecimento especializado com que conta em cada país. Presta uma assistência incomparável em casos de emergência, doença grave, acidente ou alteração da ordem pública. Além disso, as suas equipas estão empenhadas em ajudar os clientes a concretizar o chamado “duty of care” (dever de diligência). Com a International SOS, os clientes que sejam empresas multinacionais, os governos e as ONG podem mitigar os riscos dos colaboradores que trabalhem à distância ou no estrangeiro.

A International SOS e a Control Risks Esta aliança junta dois dos maiores especialistas em serviços médicos e em segurança. A combinação de recursos e de conhecimento especializado das duas empresas coloca-as numa posição privilegiada para dar resposta à necessidade crescente de serviços integrados de proteção em viagem, sentida pelos clientes. As soluções apresentadas garantem a segurança e a produtividade dos colaboradores das empresas nas suas viagens, e ajudam os empregadores a cumprir as suas obrigações, no âmbito do dever de diligência. Cinquenta especialistas em todo o mundo, com acesso a 200 especialistas em proteção em viagem disponíveis em 27 centros de assistência regionais, e uma rede de parceiros com mais de 700 prestadores de serviços acreditados, produzem informação e análise global sobre proteção em viagem, 24 horas por dia, sete dias por semana. Fornecem também formação sobre proteção em viagem, análise preventiva de viagens, apoio no estabelecimento de apólices de risco de segurança em viagem, planos de evacuação e a mais avançada tecnologia, capaz de permitir aos clientes que acompanhem e comuniquem com os seus colaboradores deslocados.

75


M D S  m a g a z i n e

Riscos Geopolíticos: que produtos e coberturas? POR ROB HOUGH

ROB HOUGH → Rob Hough é Diretor da área de Riscos Políticos e Financeiros da CGSC. → Integra a divisão de Riscos e Politicos e Financeiros da NMB Financial & Political desde outubro de 2011, prestando apoio aos clientes nas áreas de risco de crédito, Impossibilidade de Cumprimento Contratual e riscos de terrorismo e violência política, com enfoque nos clientes das área das energias. Tem sete anos de experiencia na área do seguro e do resseguro e tem conhecimentos de espanhol.

76

Se por um lado é crítico que as organizações estejam cientes dos riscos geopolíticos que enfrentam, a boa notícia é a de que existem produtos de seguro que os podem cobrir, permitindo que as empresas continuem a desenvolver as respetivas atividades mesmo em áreas que podem ser consideradas de risco. Rob Hough, do Departamento de Riscos Políticos da CGNMB mostrou alguns dos produtos concebidos para este fim: “O mercado Lloyd’s e o mercado de Londres oferecem vários produtos que os bancos e as empresas podem usar para proteger os ativos e investimentos contra situações de índole política. Abaixo apresentamos um resumo dos principais produtos de transferência do risco disponíveis e da resposta que podem dar. A cobertura pode ser adaptada especificamente às necessidades do segurado e é importante salientar que os níveis de indemnização, franquias, períodos de carência e a amplitude da cobertura serão diferentes em cada caso, refletindo uma combinação de fatores, como sejam a localização do risco e quaisquer restrições de capacidade no mercado”.

Confiscação, Nacionalização, Expropriação e Privação de Bens As apólices de Confiscação, Nacionalização, Expropriação e Privação de Bens indemnizam empresas com atividade em jurisdições estrangeiras (ou seja, em países diferentes daqueles em que estão sediadas) pela perda de ativos, capital ou rendimento decorrentes de ações seletivas e discriminatórias de autoridades locais. Entre os eventos que podem ser cobertos contam­‑se ainda o cancelamento ou a não renovação de uma licença de importação/exportação ou a incapacidade de converter ou de transferir fundos devido a

restrições impostas ao segurado. É também disponibilizada cobertura contra a perda resultante de violência política ou guerra no solo. Quem adquire esta cobertura? Empresas com interesses seguráveis num país estrangeiro, credores com um interesse contratual segurável na forma de empréstimos e/ou investimentos e investidores que tenham uma participação accionista numa empresa ou empreendimento estrangeiro.

Impossibilidade de Cumprimento Contratual O seguro de Impossibilidade de Cumprimento Contratual é um produto que cobre as empresas e os credores face ao incumprimento de pagamento ou de obrigações contratuais por uma entidade estatal ou empresa pública. Os contratos governamentais são oportunidades de negócio muito importantes. No entanto, há o risco de poderem ser cancelados ou alterados unilateralmente pelo governo ou por organismos governamentais. O nível percebido de risco dependerá do país em questão, da história de cumprimento e do apetite dos seguradores. As condições contratuais e os preços refletirão esta perceção de risco. O nível de perda que pode ser compensado chega habitualmente a 90% do valor total do contrato. Quem adquire esta cobertura? Empresas que fazem aquisições ou vendas a entidades estatais ou empresas públicas e bancos/credores que financiam o ramo de negócio especificado.


fullcover

Seguro de Crédito

COBERTURAS DE RISCOS GEOPOLÍTICOS

CONFISCAÇÃO, NACIONALIZAÇÃO, EXPROPRIAÇÃO E PRIVAÇÃO DE BENS

IMPOSSIBILIDADE DE CUMPRIMENTO CONTRATUAL

↳ SEGURO DE CRÉDITO

↳ VIOLÊNCIA POLÍTICA

Quais as coberturas? Indemnizam empresas com atividade em jurisdições estrangeiras contra a perda de ativos, capital ou rendimento; cancelamento ou a não renovação de uma licença de importação/exportação ou a incapacidade de converter ou de transferir fundos; perda resultante de violência política ou guerra em terra.

Quem compra? → Empresas → Credores → Investidores estrangeiros

Quais as coberturas? Cobre as empresas e os credores face ao incumprimento de pagamento ou de obrigações contratuais por uma entidade estatal ou empresa pública.

Quem compra? → Empresas que façam aquisições a entidades estatais/ públicas → Banco/credores

Quais as coberturas? Garante contratos para o financiamento, a aqui‑ sição ou o fornecimento de produtos ou serviços a/ou de uma empresa privada.

Quem compra? → Empresas que façam aquisições a entidades estatais/ públicas → Banco/credores

O Seguro de Crédito completo é muito semelhante ao de Impossibilidade de Cumprimento Contratual, residindo a principal diferença no facto de garantir contratos para o financiamento, a aquisição ou o fornecimento de produtos ou serviços a/ou de uma empresa privada em vez de uma empresa pública ou entidade estatal. As reclamações ao abrigo da apólice podem ser desencadeadas pelo incumprimento do contrato ou de pagamento por parte da empresa privada. Quem adquire esta cobertura? Empresas que façam aquisições ou vendas a empresas privadas e bancos/credores que financiam o ramo de negócio especificado.

Violência Política

Quais as coberturas? Perda ou o dano material de um ativo devido a situações pré­‑acordadas, como: → Sabotagem e Terrorismo → Greves, Tumultos e Alterações da Ordem Pública → Guerra e Guerra Civil → Revolta, Golpe de Estado, Rebelião, Insurreição

Violência Política define­‑se como a perda ou o dano material de um ativo devido a situações pré­‑acordadas e definidas, como as que se seguem: • Sabotagem e Terrorismo; • Greves, Tumultos e Alterações da Ordem Pública; • Guerra e Guerra Civil; • Revolta, Golpe de Estado, Rebelião, Insurreição. A cobertura pode ser adquirida em qualquer território em que o proponente tenha um interesse segurável, incluindo no próprio país, contanto que os seguradores pretendam subscrever esse risco e tenham capacidade para tal. Além da cobertura para danos físicos, estão disponíveis extensões para as perdas de exploração daí resultantes e para responsabilidade civil. A localização e o tipo de atividade permitem ou restringem a cobertura disponível. O mercado de seguros continua a responder pró­‑ativamente às exigências e necessidades dos clientes com o desenvolvimento de coberturas adicionais, como a cobertura de riscos cibernéticos, de negação de acesso e de perda de atratividade, que podem complementar uma colocação já existente de riscos patrimoniais ou de riscos políticos. Este é um breve resumo das soluções que o mercado de seguros pode oferecer aos seus clientes para os ajudar a mitigar a exposição a riscos financeiros e políticos. Estas coberturas podem fazer a diferença entre a capacidade de uma empresa prosseguir um projeto ou perder a oportunidade de um potencial negócio. •

77


M D S  m a g a z i n e

D AV ID A N D E R S O N → David Anderson é responsável pelo escritório de Washington do Zurich Credit & Political Risk (ZCPR), uma das empresas líder de mercado na área dos seguros de crédito e riscos políticos a nível mundial. Colabora com a Risk & Insurance Management Society (RIMS) no papel de especialista e blogger na área, sendo presença assídua na comunicação social sobre estes temas. → Em 2002 integrou a Zurich e esteve no lançamento do escritório de Sydney, na Austrália, da ZCPR em 2006, bem como do escritório de Singapura em 2009. Até 2012 foi responsável pela gestão da equipa regional da Ásia-Pacífico. Em seguida, assumiu o cargo de Diretor do Negócio Internacional da equipa. → Antes de integrar a Zurich, liderou, a partir de Nova Iorque, a área de seguros de crédito multicliente da FCIA na costa leste e subscreveu seguros contra riscos políticos para a Citicorp International Trade Indemnity. → David Anderson é licenciado em Ciência Política (magna cum laude) pelo Amherst College e tem um Mestrado/MBA em Estudos LatinoAmericanos pela Universidade do Texas, em Austin.

78

Novas ideias para enfrentar os riscos geopolíticos nos negócios P O R D AV I D A N D E R S O N Num momento em que, segundo o Relatório de Riscos Globais de 2016 do Fórum Económico Mundial (FEM), os conflitos entre estados, os ataques terroristas e os fluxos de refugiados exigem uma maior atenção estratégica por parte dos empresários e têm um maior impacto na economia global, as empresas terão de se ocupar cada vez mais da segurança geopolítica. O relatório, elaborado em colaboração com o Zurich Insurance Group e outras instituições de primeiro plano, defende que os estados e governos têm menos capacidade para enfrentar as questões geopolíticas isoladamente, uma vez que estes desafios estão cada vez mais interligados. O setor privado tem experiência, conhecimento e recursos que podem ser úteis, tais como dados para identificar os fatores de risco, informação que pode ser partilhada sobre atividades criminosas e a capacidade de controlar as cadeias de fornecimento durante situações de emergência, o que é um fator crucial. “O papel da colaboração público­‑privado na resposta aos desafios globais é cada vez maior”, indica o relatório. “Temos de pensar claramente em novas alavancas que permitirão que uma grande variedade de agentes enfrente em conjunto os riscos globais, o que não poderá ser feito de forma centralizada”. No passado muitas empresas demostraram relutância em envolver­‑se diretamente em questões geopolíticas. Metade dos gestores inquiridos num estudo de 2011 da Wharton Business School afirmou que o método mais comum que usava para gerir os riscos geopolíticos era simplesmente o de evitar investir em zonas de instabilidade. No entanto, é improvável que esta tática se mantenha à medida que as empresas procuram novos mercados e num momento em


fullcover

que a agitação e volatilidade se propagam rapidamente de uns locais para outros.

Alianças setoriais Há, porém, evidências de que a situação está a mudar. Estão a surgir novas parcerias globais, e as ações levadas a cabo pelo setor privado contra o tráfico humano são um exemplo do tipo de influência que as empresas podem ter. As iniciativas de um conjunto variado de setores, como o setor da banca, da tecnologia ou do transporte de mercadorias, são descritas no relatório de 2014 do Fórum Económico Mundial denominado Hedging Risk by Combating Human Trafficking (Cobrir o Risco por meio do Combate ao Tráfico de Seres Humanos). Este relatório realça também o setor de viagens, que criou “O Código” (“The Code”), um conjunto voluntário de orientações, criado em 2004, para ajudar à prevenção do tráfico e turismo sexual infantil. Encabeçado por Marilyn Carlson Nelson, ex­‑presidente do conselho de administração e diretora­‑executiva das Carlson Companies, "O Código" foi ratificado em 2011 pelo grupo Hilton Worldwide e conta agora com 1.200 empresas signatárias de países como a Colômbia, a China, o Egito, a Tailândia, o Brasil e a Rússia.

Parcerias internacionais Nas últimas décadas, as empresas também passaram a ter um papel cada vez maior em parcerias alargadas com as organizações da ONU e com organizações não­‑governamentais. As parcerias assumiram várias formas, desde donativos financeiros, como o donativo de 27 milhões de libras (cerca de 34 milhões de euros) concedido pela Unilever para apoiar o programa Alimentar Mundial desde 2007, à iniciativa 5by20 da Coca­‑Cola com a ONU Mulheres, que tem o objetivo de apoiar cinco milhões de mulheres empreendedoras em toda a cadeia de valor da empresa até 2020. O economista David McWilliams, professor na School of Business do Trinity College de Dublin, destaca o Pacto Global da ONU – uma iniciativa voluntária do setor privado lançada oficialmente no ano 2000 para apoiar os objetivos de sustentabilidade da ONU – como um exemplo da influência que as empresas podem ter quando trabalham em conjunto com os governos em desafios globais. Cerca de 8000 empresas assinaram o código de comportamento do Pacto Global da ONU

79


M D S  m a g a z i n e

composto por dez pontos centrados nas áreas dos direitos humanos, do trabalho, do ambiente e do combate à corrupção. Estas empresas apresentam todos os anos uma auditoria para demostrar que estão a cumprir estes requisitos, sendo a mesma publicada on­‑line. Num relatório de 2013 da Coca­‑Cola Bottling Company do Gana, por exemplo, indicava­‑se que a empresa tinha comprado uma nova linha de enchimento de garrafas de plástico mais eficiente do ponto de vista energético e que tinha construído uma estação de tratamento de águas residuais para o seu fornecedor de sumo de fruta.

Ação contra as alterações climáticas Nas conversações de Paris sobre o clima, que tiveram lugar em dezembro, as 443 empresas signatárias da iniciativa Caring for Climate do Pacto Global da ONU definiram novas metas para o valor estimado de emissões anuais coletivas, poupando 93,6 milhões de toneladas de dióxido de carbono equivalente. Nunca antes tínhamos visto este nível de envolvimento das empresas e é claro que esta dinâmica é imparável. Ao congratular­‑se com o acordo de Paris sobre o clima, Lise Kingo, diretora executiva do Pacto Global da ONU, afirmou que o setor privado deveria ser elogiado por introduzir melhores práticas empresariais no processo e por enviar uma forte mensagem de afirmação da importância de um acordo sólido sobre o clima. “Acreditamos que o Acordo de Paris envia os sinais certos para o mercado e que irá criar previsibilidade, desbloquear capital, promover a inovação e premiar a atividade empresarial responsável”, sustentou. “Nunca antes tínhamos visto este nível de envolvimento das empresas e é claro que esta dinâmica é imparável”.

Enfrentar a crise da água Além da colaboração da ONU, as empresas contribuem de outras formas para as questões globais. A empresa alimentar internacional Nestlé, que fez do tratamento responsável da água um ponto “crítico” da atividade, propôs o próprio Objetivo de Desenvolvimento Sustentável ao Banco Mundial em 2013, que é o de reduzir o consumo de água da empresa para níveis sustentáveis. “Embora esta medida possa não parecer perfeita tendo em conta as complexidades das

80

captações, dos usos e dos fluxos de retorno de água”, diz Peter Brabeck­‑Letmathe, presidente da Nestlé, “estou convencido de que pode funcionar como uma boa abordagem prática para uma ação orientada para os resultados”. Brabeck­‑Letmathe leva a questão da água tão a sério que criou um blogue chamado Water Challenge (Desafio da Água) [https://www.water­ ‑challenge.com]. Num post intitulado “Não vamos conseguir alimentar o mundo enquanto não resolvermos a crise de água”, Brabeck­‑Letmathe cita a experiência do Punjab, onde os lençóis freáticos estavam a baixar um metro por ano depois de serem concedidos subsídios para as bombas de irrigação. Não houve nenhum incentivo para limitar o uso de água apesar das consequências inevitáveis – seca e declínio das colheitas.

A necessidade de parcerias “Os agricultores viram que era completamente inútil mudar os próprios hábitos sem que houvesse esforços conjuntos efetivos de todos as partes interessadas na bacia hidrográfica", escreve Brabeck­‑Letmathe. «Extrapolado para a escala internacional, este é o busílis: sem parceria entre todos os que partilham um interesse na resolução do problema, não avançaremos para uma solução significativa”. Das questões hídricas à crise de refugiados, as parcerias são cruciais para se encontrarem soluções para problemas cada vez mais interligados e globais e, como se sugere no Relatório de Riscos Globais de 2016, muitas empresas parecem estar prontas para desempenhar um papel mais importante.

Principais ideias a reter • No Relatório de Riscos Globais de 2016, acredita­‑se que o papel da colaboração público­‑privado na resposta aos desafios globais é cada vez maior. • Tradicionalmente as empresas multinacionais têm evitado envolver­‑se diretamente em questões geopolíticas. • As ações levadas a cabo pelo setor privado contra o tráfico de seres humanos são exemplo do tipo de influência que as empresas podem ter. • O Pacto Global da ONU é um exemplo da influência que as empresas podem ter quando trabalham em conjunto com os governos em desafios globais. •


fullcover

Quadro geopolítico geral P O R I U L I A S IM O N

A perspetiva para o ano de 2016 é deveras controversa. Há aqueles que têm uma visão quase apocalíptica, prevendo que nos enca‑ minhamos para uma “tempestade perfeita” criada por uma quebra do mercado bolsista, um novo colapso imobiliário e um aumento acentuado das taxas de desemprego. Por outro lado, existe a perspetiva mais otimista daqueles que prevêm uma recuperação débil mas cons‑ tante. Os economistas estão a analisar o labi‑ rinto de sinais económicos objetivos e a inter‑ pretá­‑lo de forma subjetiva, o que leva à criação de determinadas expetativas e de motivos de preocupação acrescidos. O que fazer a partir deste ponto? Em quem devemos acreditar e o que devemos esperar? Apesar das opiniões negativas que nos rodeiam, todos queremos agarrar­‑nos a uma réstia de esperança para o nosso futuro, bem como o dos nossos filhos. Assim, quando nos chegam notícias indesejadas, há uma tendência para as bloquearmos e para aplicarmos o prin‑ cípio segundo o qual “olhos que não veem, coração que não sente” – para alguns – muitas vezes uma tática de sobrevivência. No entanto, compreender o nosso mundo é um pré­‑requi‑ sito básico para construirmos a nossa vida e a nossa felicidade.

A previsão dos peritos

I U L I A S IM O N → Iulia Simon tem mais de 20 anos de experiência na avaliação, desenho e implementação de programas de gestão de risco específicos para o mercado institucional e de empresas. → É especialista na área de Seguros de Riscos Especiais e tem um profundo e abrangente conhecimento sobre as questões políticas, económicas e sociais na América Latina, Europa e Ásia. → Está envolvida nas atividades das Câmaras de Comércio da Alemanha, França e Rússia, bem como na STEP, uma associação profissional para aconselhamento familiar intergeracional. → Na qualidade de vice-presidente executiva de marketing, função que exerce a partir de Miami, é a principal responsável pelo relacionamento com o cliente da CH Toro International Ltd. nos EUA, na América Latina e na Europa. → Com um amplo conhecimento e uma larga experiência no mercado internacional, Iulia Simon tem sido muito bem-sucedida no apoio a executivos e membros das famílias no desenho de coberturas adaptadas às necessidades específicas dos seus clientes, na proteção da suas vidas e do seu património.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) projeta um crescimento da economia mundial de 3,4% em 2016 e de 3,6% em 2017, uma redução de 0,2% para os dois anos em relação às estimativas anteriores, datadas de outubro. Além disso, sublinha a ideia de que os decisores políticos deverão procurar formas de dinamizar a procura a curto prazo. O FMI divulgou uma Perspetiva Económica Mundial atualizada, num momento em que os mercados globais foram afetados pelos receios do abrandamento chinês e da quebra nos preços do petróleo, tendo mantido as previsões anteriores de crescimento da China – 6,3% em 2016 e 6,0% em 2017 –, o que significa um abrandamento acentuado em relação a 2015. A China revelou que o crescimento em 2015 atingiu os 6,9%, num ano em que a segunda maior economia mundial suportou enormes saídas de capitais, uma descida no valor da moeda e uma quebra no mercado bolsista durante o verão. As ações subiram na Europa e na Ásia e o dólar valorizou­‑se depois da divulgação dos dados da China, uma vez que os investidores anteviam que Pequim iria aumentar os esforços

81


M D S  m a g a z i n e

para estimular o crescimento. As incertezas acerca da intervenção de Pequim na política económica dispararam, em 2016, para o topo da lista de riscos dos investidores internacionais depois das quebras no mercado bolsista chinês e no yuan terem agudizado os receios de que a economia se esteja a deteriorar rapidamente. Uma desaceleração mais pronunciada da procura na China continua a ser um risco para o crescimento mundial e o facto de as importações e exportações chinesas terem ficado aquém das expetativas teve um peso muito forte noutros mercados emergentes e nos mercados exportadores de commodities. O abrandamento da procura por parte dos consumidores dos Estados Unidos e do Japão, a debilidade dos mercados emergentes devido a receios relativamente à quebra dos preços do petróleo e das commodities e as saídas de capital da China contam­‑se entre os principais riscos. Além disso, o FMI afirma que a perspetiva de uma aceleração da produção nos EUA se desvaneceu, uma vez que a valorização do dólar se faz sentir na indústria e a diminuição do preço do petróleo restringe o investimento em energia. A organização prevê agora que o crescimento económico nos EUA será de 2,6%, quer para 2016 quer para 2017, uma quebra de dois pontos percentuais relativamente à previsão de outubro para os dois anos. Na Europa, os preços do petróleo mais baixos irão ajudar o consumo privado, pelo que o FMI acrescentou um ponto percentual à sua previsão de crescimento para a zona do Euro, cifrando­‑a em 1,7%, valor que se manterá em 2017. O Brasil continuará em recessão em 2016, com a produção a contrair 3,5%, uma descida de 2,5 pontos percentuais relativamente à previsão anterior, e não registará nenhum crescimento substancial em 2017, numa altura em que a maior economia da América Latina se debate com a diminuição da procura chinesa. Bill Conerly, colaborador da revista Forbes, considerou, comentando a previsão do FMI, que os países dependentes das commodities, como a América Latina, a África e algumas regiões da Ásia estão a enfrentar tempos difíceis. O facto de os preços das commodities serem tão baixos representa uma redução na mineração, na produção de petróleo e na agricultura. Conerly acredita que o mundo irá provavelmente crescer um pouco mais lentamente do que a previsão do FMI. Do ambiente à segurança internacional, passando pela Quarta Revolução Industrial, o Relatório de Riscos Globais do Fórum Económico Mundial 2016 aponta para o aumento dos riscos em 2016. No inquérito anual deste

82

ano, quase 750 especialistas avaliaram 29 riscos globais distintos, no que respeita quer ao seu possível impacto, quer à probabilidade de ocorrências ao longo de um horizonte de dez anos. O risco com maior potencial de impacto em 2016 é o do fracasso na mitigação das alterações clImáticas e na adaptação às mesmas. No estudo considerou­‑se que, em 2016, este risco tem maior potencial danoso do que as armas de destruição maciça (2º), as crises de água (3º) a migração involuntária de grande escala (4º) e um grave choque nos preços da energia (5º). No que se refere à probabilidade, o principal risco em 2016, é, porém, a migração involuntária de grande escala, ao que se seguem os eventos climáticos extremos (2º), o fracasso na atenuação e adaptação a alterações climáticas (3º) conflitos entre estados com consequências regionais (4º) e grandes catástrofes naturais (5º). No topo da escala, os dois riscos mais interligados de 2016 – instabilidade social profunda e desemprego estrutural ou subemprego – representam 5% de todas as interligações. Nas páginas seguintes os nossos leitores encontrarão fichas de dados com excertos de uma Previsão de Ameaças para 2016 disponibilizada pela Red24, uma empresa de segurança de topo, que aponta os diversos riscos políticos, de segurança e de sequestro por região durante o ano. Esta informação traçará um quadro geral realista e preocupante das ameaças para o ano de 2016.


fullcover

Crime Marítimo A ameaça de pirataria e de outras formas de crime marítimo, em especial o roubo no mar, continuará a ser elevada em várias regiões de todo o mundo durante 2016. A pirataria continuará a constituir um risco de segurança específico no Golfo da Guiné e no Sudeste da Ásia. Embora se preveja que a maioria dos ataques­ ‑piratas continue a ocorrer nas regiões acima mencionadas, a possibilidade de ocorrência noutros locais não poderá ser descartada. É provável que, em 2016, a distribuição geográfica des tes ataques se alas tre gradualmente. É também de prever a continuação das tendências de 2014 e 2015 no que respeita à natureza dos ataques nas águas nigerianas e à evolução de situações de desvio e roubo de petróleo para ataques cada vez mais bem coordenados, e muitas vezes violentos, que têm como alvos os navios comerciais e a respetiva tripulação, incluindo desvios de navios com longa duração e casos de sequestros, resgate e extorsão. Este risco é salientado por um conjunto de incidentes desta natureza em 2015.

A segurança marítima nas águas que banham a Indonésia, a Malásia, as Filipinas e Singapura é um motivo de preocupação de longa data na região, e está previsto que se mantenha em 2016. De acordo com relatórios de meados de 2015 do Gabinete Marítimo Internacional, houve aproximadamente dois ataques­‑piratas por mês a petroleiros nas águas do Sudeste da Ásia. Num incidente de relevo que sublinha esta tendência, e que teve lugar no dia 8 de agosto, um pequeno petroleiro registado em Singapura, MT Joaquim, foi capturado no Estreito de Malaca ao largo da costa da Malásia. O aumento dos ataques em águas vietnamitas e no próprio Estreito de Singapura também terá de ser acompanhado com atenção em 2016. Os esforços de segurança concertados à escala regional e internacional, em especial as medidas de segurança a bordo e os esforços nacionais e internacionais de combate à pirataria, continuam a contribuir para o declínio significativo que se está a verificar na pirataria somali desde o final de 2011. Não obstante, a ameaça de pirataria regional ainda não foi eliminada e existem receios regionais e internacionais relativamente a um potencial aumento da pirataria. Depois da inexistência de incidentes relatados nos primeiros seis meses de 2015, no dia 22 de novembro, um navio de pesca com bandeira iraniana foi desviado e pelo menos dez membros da tripulação foram sequestrados por presumíveis piratas ao largo da costa leste da Somália. Informação de fontes abertas indica que o custo aproximado com medidas adicionais de combate à pirataria nas águas do leste de África para a indústria naval foi de um total de 1.300 milhões de dólares americanos em 2014. A este valor acrescem 103 milhões de dólares relativos a prémios de seguro de risco de guerra e sequestro, resgate e extorsão de navios que transitam nesta região. Além das regiões acima referidas, os riscos de pirataria e de roubo no mar estendem­‑se a outras águas. No subcontinente indiano, nos últimos 18 meses, verificou­‑se um aumento dos ataques ao largo da costa do Bangladesh. A pirataria e o roubo à mão armada continuarão a constituir potenciais riscos de segurança na América do Sul e Central e nas Caraíbas, sobretudo na imediação de portos e ancoradouros no Brasil, Peru, Haiti, Equador e na Guatemala. Incidentes esporádicos nesta região, como por exemplo o ataque a um iate de luxo, o Pelikaan, em águas haitianas em abril, sublinham o risco atual. Além disso, registou­‑se um aumento dos incidentes na Venezuela nos últimos meses, nomeadamente perto do Lago Maracaibo.

83


M D S  m a g a z i n e

O aumento acelerado da utilização da tecnologia já está a demonstrar ter impacto na forma como os sequestros com pedido de resgate são perpetrados e geridos.

84

Segurança da informação A segurança da informação continua a ser uma ameaça generalizada, sendo que quem viaja não tem, normalmente, o mesmo grau de proteção que quando se encontra no escritório. Os riscos de segurança na Internet aumentam a pressão sobre os governos para que haja maior regulamentação no futuro. É imperativo que todas as partes envolvidas, dos governos às empresas, passando pelas universidades e pelos consumidores, colaborem para assegurar que a regulamentação é abrangente e pró­‑ativa e que diminui as vulnerabilidades de segurança e privacidade dos dispositivos ligados à Internet. Para as empresas que procuram tirar partido da Internet das Coisas, uma das chaves do sucesso será assegurar que as novas tecnologias são impermeáveis a ciberataques. O aumento acelerado da utilização da tecnologia já está a demonstrar ter impacto na forma como os sequestros com pedido de resgate são perpetrados e geridos. Por outro lado, pode tratar­‑se de algo positivo tanto para as potenciais vítimas quanto para quem procura libertá­ ‑las. Por exemplo, a Aegis Response notou que houve uma mudança na forma como se fazem as negociações com os sequestradores, tendo­‑se passado do telefone para o e­‑mail. O Estado Islâmico, por exemplo, usa quase exclusivamente este meio de comunicação para fazer as suas exigências. Assim, as equipas de gestão de crises têm o tempo a seu favor num ambiente com menos pressão, o que lhes permite tomar

uma decisão sobre a estratégia a seguir e preparar uma resposta ideal “à porta fechada”. No que respeita à prova de vida, existem muitas mais opções de verificação — vídeo­ ‑chamadas, por exemplo — que podem proporcionar uma maior certeza de que a vítima está viva e detida pelo grupo em questão. No entanto, o uso quase indiscriminado de redes sociais e de aplicativos conhecidos de troca de mensagens cria novos problemas para a área do sequestro com pedido de resgate. As vítimas poderão agora estar vulneráveis a um simples reconhecimento da respetiva fortuna obtido através das fotografias publicadas on­‑line e da informação profissional que os raptores podem investigar no conforto das suas casas, sendo o leque de escolha de potenciais vítimas muito alargado. Já houve casos de raptores com capacidades informáticas sofisticadas que investigavam as contas bancárias das vítimas para as raptar e depois forçá-las a usar as contas bancárias on­‑line para transferirem pessoalmente um valor de resgate específico para assegurar a libertação. A bitcoin, a moeda anónima, é amplamente usada em ciberextorsões e começa agora a ser usada nas práticas de sequestro com pedido de resgate: já se conhecem casos em que os raptores exigiram que os resgates fossem pagos nesta criptomoeda. Por exemplo, em outubro, um executivo de Hong Kong foi libertado depois de ter sido raptado e mantido em cativeiro em Taiwan durante mais de um mês por um gangue que exigiu um resgate de 9 milhões de dólares em bitcoin. No próximo ano, a trajetória desta mudança tecnológica continuará a evoluir rapidamente e – para o bem ou para o mal – é provável que haja mais mudanças no campo do tradicional sequestro com pedido de resgate. Em suma, com base em todas as evidências, podemos deduzir com segurança que o risco de sequestro com pedido de resgate não vai desaparecer no próximo ano. Vivemos num mundo de desafios constantes, bem como de perigos em evolução. Enfrentá­‑los significa compreendermos as nossas circunstâncias. Conhecermos aquilo que nos rodeia e mantermo­‑nos informados sobre o caminho que o nosso mundo está a tomar é indispensável para a nossa sobrevivência. É importante que nos equipemos para a batalha pelo nosso futuro e pelo futuro dos nossos filhos, armados de conhecimento e com uma visão precisa do nosso mundo sem nunca perdermos de vista as coisas maravilhosas que a humanidade construiu; os atos de grandeza e de solidariedade que fazem com que a raça humana seja algo por que vale a pena lutar. •


fullcover

Análise detalhada dos riscos

seu sistema informático, o que tem um custo de vários milhões de euros. Entre outros ataques de grande escala, refira­‑se o ataque on­‑line à televisão francesa TV5Monde, em abril, durante o qual vários canais e plataformas de redes sociais da estação foram retirados do ar, tendo sido transmitido material negativo relacionado com a ação militar francesa no Iraque. Turquia, setembro de 2015: O filho de 13 anos de um destacado empresário sírio foi sequestrado, em Istambul, sendo o pedido de resgate de um milhão de dólares. Foi libertado pelas forças policiais numa operação de segurança que envolveu um resgate falso.

Europa No final de 2015, alguns dos riscos políticos e de segurança mais importantes que o mundo enfrentava foram claramente destacados por acontecimentos ocorridos na Europa, tradicionalmente a zona mais segura para negócios e viagens. A migração para a região de dezenas de milhares de pessoas oriundas de estados dominados por conflitos ou depressões económicas da África, da Ásia e do Médio Oriente não só afetou os transportes entre diferentes países europeus e dentro dos mesmos, como causou perturbações no movimento de pessoas e bens através das fronteiras, uma vez que os estados tomaram medidas para restringir o fluxo de pessoas à procura de asilo. Os ataques de novembro, em Paris, agravaram os receios relativamente à unidade regional e salientaram, uma vez mais, o longo alcance da ideologia extremista islamita. A relação entre a migração e os grupos de milícias foi o foco de fações de extrema­‑direita e de grupos esquerdistas, que continuaram a tentar tirar partido dos receios das populações relativamente à influência que o fluxo de migrantes terá nos estados locais a longo prazo. No próximo ano, haverá uma ameaça persistente de terrorismo por parte de grupos extremistas islâmicos internacionais e de indivíduos radicalizados e uma maior frequência de incidentes de menor grau de violência, que se confinarão a países que apresentam tensões políticas e sociais e que constituem alguns dos principais destinos preferenciais dos migrantes, como a Alemanha, a França, a Itália, a Grécia e a Hungria. Será um ano caraterizado por uma Europa mais militarizada, pelo crescimento dos partidos nacionalistas, bem como pelo aumento das atividades de protesto e dos atos de menor grau de violência a elas associados. Em 2016, as variantes não tradicionais de sequestro, nas suas formas físicas e virtuais, constituirão o risco mais significativo em toda e Europa e na Rússia. Os países que já têm uma componente de crime organizado bem

estabelecida poderão estar sujeitos a um risco elevado; entre eles podem contar­‑se a Rússia, os países da Europa de Leste, a Espanha, a Grécia e outros. Um outro foco de ameaça será o composto por indivíduos oportunistas, motivados pelo lucro ou por ressentimentos pessoais; antigos funcionários descontentes, sócios de empresas, fornecedores ou indivíduos mal­‑intencionados podem constituir um risco de segurança para operações empresariais, assim como riscos reputacionais difíceis de quantificar. Os recentes incidentes que afetam a continuidade da atividade empresarial, como a extorsão contínua à cadeia de supermercados holandesa, Jumbo, são um claro exemplo desta ameaça, bem como dos desafios que as vítimas poderão ter de enfrentar para a superar. Durante sete meses, indivíduos anónimos ameaçaram colocar explosivos em lojas da Jumbo em diferentes localidades da Holanda. Os responsáveis por estas ameaças exigiam o pagamento de um resgate na moeda digital anónima bitcoin. A situação agravou­‑se quando, entre maio e agosto, foram efetivamente detonados explosivos em várias lojas da cadeia holandesa. Há medida que as investigações prosseguiam a empresa foi forçada a aumentar a segurança em mais de 500 filiais de todo o país. Além disso, entidades políticas, hack tivistas, anti­‑União Europeia, ultranacionalistas, anarquistas ou extremistas poderão optar por recorrer à extorsão/ciberextorsão tendo como alvo pessoas ou empresas relacionadas com desenvolvimentos nacionais, regionais ou internacionais. Os ciberataques de grande escala levados a cabo por grupos estatais/não­‑estatais não confirmados contra várias grandes empresas europeias e instituições financeiras e políticas, em 2015, demonstram que os extorsionistas digitais e cibernéticos são capazes de se infiltrar numa variedade de alvos destacados. Devido ao ciberataque que teve como alvo o Bundestag (Parlamento) alemão em maio de 2015, esta instituição poderá ter de reformular completamente o

Letónia, maio de 2015: Dois executivos estrangeiros foram vítimas de uma tentativa de sequestro junto ao hotel em que estavam hospedados na capital, Riga. Foram presos sete suspeitos durante uma operação policial com elementos infiltrados quando tentavam transportar os reféns, um irlandês e um sueco, para um local não divulgado. França, agosto de 2015: Um milionário local foi sequestrado na sua residência, em França, e depois transportado para Marbella, em Espanha, onde foi mantido como refém por um grupo, já experiente, de sequestradores durante dois meses. Na sequência do sequestro, foi obrigado a ligar para a família dizendo que tinha tirado umas férias inesperadas; o gangue extorquiu­‑lhe aproximadamente 1,37 milhões de dólares e, após a libertação, exigiu que continuasse a pagar um montante de 106 000 dólares por semana. Alemanha, agosto de 2015: A filha de 17 anos de um empresário da Saxónia foi sequestrada e morta pelos criminosos pouco depois de estes terem feito um pedido de resgate de 1,27 milhões de euros. Esta morte ocorreu apesar de a família ter afirmado publicamente que faria o pagamento. Os criminosos eram inexperientes e procuravam dinheiro “fácil”; escolheram a vítima depois de terem visto a sua página de Facebook e de terem lido informação sobre a família. Alegadamente, um dos criminosos vigiava a vítima enquanto esta passeava o cão na mesma zona em que ele passeava o seu. Rússia, agosto de 2015: A polícia prendeu seis membros de um gangue de extorsão na sequência do sequestro de um conhecido empresário local. A vítima foi capturada na viatura em que seguia, tendo­‑lhe sido injetada uma substância que os sequestradores afirmavam ser veneno letal. Foi­‑lhe dito que receberia um antídoto se satisfizesse as exigências financeiras dos sequestradores – o pedido final de resgate foi de 106.000 dólares. A vítima terá contactado a família e providenciado o pagamento, tendo­ ‑lhe depois sido dado um antídoto não revelado.

85


M D S  m a g a z i n e

de 2016, não só no México e na Venezuela, mas também na Colômbia, na Argentina, no Brasil, em El Salvador, na Guatemala, nas Honduras, no Haiti e noutros países, embora a níveis diferenciados. Além disso, estima­‑se que as ameaças constituídas pelo “sequestro­‑relâmpago” e virtual e pela ciberextorsão venham a aumentar.

Alemanha, junho de 2015: O filho de 50 anos, deficiente mental, do dono do Grupo Wurth, foi raptado do lar para pessoas com deficiência onde se encontrava, perto de Frankfurt, e mantido como refém enquanto os autores do crime pediam o pagamento de um resgate de aproximadamente 2,3 milhões de dólares. O pai da vítima teria alegadamente uma fortuna líquida de 7,2 mil milhões de dólares. Depois de terem tido conhecimento da enorme operação policial que estava em curso, os criminosos deixaram o refém amarrado a uma árvore numa floresta perto de Würzburg.

Américas Nas Américas, a desaceleração do crescimento serviu para pressionar governos populistas que se baseiam em políticas de despesa social muito elevada. Já se verificou uma alteração na liderança na Argentina e são esperadas novas convulsões políticas. A pressão dos grupos da oposição e das populações da classe média que deixaram de apoiar os governos já aumentou em vários países­ ‑chave, como o Brasil, a Venezuela e o Equador. A instabilidade social associada a estas pressões continuará a ser uma preocupação e um risco essencial, pelo que, em 2016, quem viajar em negócios como quem viajar por outras razões deverá tomar medidas de mitigação de risco. A América Latina passou por um período de crescimento económico sem precedentes entre o início do século e 2013, que retirou dezenas de milhares de pessoas da pobreza e as levou a classe média. Este sucesso deveu­‑se em grande medida à exportação de bens para os quais havia muita procura por parte dos países asiáticos. As recentes diminuições na procura tiveram como resultado o aumento das taxas de pobreza e o abrandamento do crescimento nas maiores economias da região. Esta contração económica

86

coincidiu com um crescimento do sentimento antigoverno e parece estar a contribuir para que este sentimento aumente nas classes mais desfavorecidas, que estão a sentir o impacto direto da crise, e na classe média que, tradicionalmente, é mais propensa a responsabilizar o governo. Além dos perturbadores e violentos protestos relacionados diretamente com a economia, vieram ainda à tona em diversas zonas ressentimentos antigos, como a corrupção, a deficiente gestão estatal, as preocupações ambientais, as reformas políticas e os direitos das populações indígenas. A atividade criminosa organizada, especialmente no México e noutros países da América Central, manter­‑se­‑á em níveis elevados ao longo de 2016. A ligação entre as redes de crime organizado e as elites políticas continuará a ser trazida a público e, em algumas zonas, estas ligações poderão romper­‑se na sequência de reformas políticas ou mudanças na liderança. Em algumas regiões, a relação entre a política e o crime organizado poderá ser reforçada, incluindo em El Salvador, onde os gangues locais, que se estima que tenham 70 000 membros, aumentaram a sua atividade em 2015, em resposta às medidas repressivas do governo. Em geral, é provável que a contração económica, contrariando as tentativas dos estados de travar a atividade criminosa (incluindo a produção e o contrabando de droga) venha, ao invés, a beneficiar grupos criminosos. Em 2016, o risco de sequestro, resgate e extorsão continuará a ser um dos principais riscos de segurança para pessoas e empresas que operem em locais de alto risco da América do Sul e Central e das Caraíbas, uma região há muito reconhecida como o centro de sequestros do mundo. Os sequestros tradicionais e de curta duração para obter ganhos financeiros continuarão a afetar cidadãos locais e estrangeiros durante o ano

Os casos de extorsão realizada e tentada, seja de funcionários locais ou estrangeiros, poderão dificultar as atividades empresariais e afetar as margens de lucro. Num exemplo destes casos, um centro de distribuição da Coca­‑Cola em Guerrero, no México, foi encerrado em junho de 2015, alegadamente devido a tentativas reiteradas de extorsão por parte de um grupo criminoso. Além das ameaças de violência, que serão usadas para forçar a realização de pagamentos, incidentes anteriores ocorridos no México e na Venezuela, indiciam que há grupos que poderão atacar fisicamente infraestruturas críticas, como sejam oleodutos, fábricas e serviços de transportes, como forma de exigir pagamentos. É provável que se verifique um aumento na atividade de extorsão em zonas com previsão de aumento do investimento estrangeiro em 2016. Irão ocorrer com regularidade “sequestros­ ‑relâmpago”, com potencial de evolução para casos mais duradouros de sequestro com pedido de resgate, dependendo das circunstâncias, dos perpetradores e das vítimas. A morte de um turista espanhol durante um “sequestro­‑relâmpago” na cidade de Maracaibo, na Venezuela em dezembro de 2014, bem como desenlaces fatais semelhantes em casos ocorridos noutros locais da região, mostram o potencial de evolução deste tipo de incidentes para desfechos violentos. Além disso, a frequência e o alcance dos sequestros virtuais aumentou na América do Sul e Central durante o ano passado. Os sequestros virtuais, que muitas vezes têm origem em indivíduos que estão na prisão, têm vindo cada vez mais a incluir um elemento de cibercrime; a vigilância de potenciais vítimas é cada vez mais assegurada por meio do uso das redes sociais ou através de dados de identidade roubados. Por exemplo, em 2015, entidades criminosas sediadas na América do Sul orquestraram sequestros virtuais, que tinham como alvo vítimas nos EUA e em Espanha. Em 2016, prevê­‑se um novo aumento do número de incidentes, quer a nível nacional quer além­‑fronteiras. Estima­‑se ainda que os níveis de sequestro de longa duração se mantenham mais elevados no México e na Venezuela. Os sequestros perpetrados por grupos de crime organizado continuarão a constituir um risco de segurança em países como a Argentina e o Brasil, ao passo que a situação de persistente ilegalidade e as elevadas taxas de criminalidade (e de homicídios, em particular) em El Salvador, no Haiti e nas Honduras contribuirão para manter elevado o atual risco de sequestro nestes países.


fullcover

Por fim, a atividade de protesto político e/ou comunitário é comum em ambientes em que o risco de sequestro é menor, como a Bolívia, o Equador, o Peru, o Chile e o Paraguai. A possibilidade de os turistas serem afetados não pode ser descartada. Em 2015, aproximadamente 40 turistas foram detidos de um dia para o outro por membros de comunidades em protesto do Peru.

Médio Oriente e Norte de África Os problemas de segurança e políticos no Médio Oriente e no Norte de África continuam a fazer­‑se sentir fortemente. Em 2016, os conflitos na Síria, no Iémen e na Líbia, a ameaça constante do Estado Islâmico (EI) e dos diversos grupos afiliados e a tensão crescente entre as duas potências da região — a Arábia Saudita e o Irão — ameaçam trazer a este palco, ainda mais do quem 2016, os grandes poderes mundiais, assim como acentuar as tensões, já elevadas, entre as diferentes fações. A perspetiva de um final para os vários conflitos da região continua a ser remota, à medida que o risco de conflito entre os estados continua a aumentar. O conflito de grande escala na Síria continua a afetar o ambiente de segurança e a estabilidade política dos estados de toda a região. As grandes potências regionais e mundiais veem cada vez mais a Síria como um campo de batalha em que é preciso conservar ou reforçar a influência e recorrem a intermediários para apoiar ou derrubar o regime de Bashar al­‑Assad ou para conter um conflito cada vez mais sangrento e que, provavelmente, se prolongará por muitos anos. O apoio do Ocidente, da Arábia Saudita, da Turquia, da Jordânia e do Qatar às forças anti­ ‑Bashar al­‑Assad e o apoio do Irão, da China e do Hezbollah ao regime de Assad deverão acentuar­‑se durante o ano de 2016. O envolvimento de tantos estados e, consequentemente, de alianças militares alargadas, como a OTAN, servirá para aumentar o risco de conflitos de pequena escala entre países.

O apoio declarado da Arábia Saudita ao regime de Abd Rabbuh Mansur Hadi no Iémen tem sido significativo. Os combates no país, que se prevê que se venham a manter em 2016, fizeram milhares de mortos e continuaram a devastar o estado do Iémen. No instável Bahrein, continuará a verificar­‑se o apoio do Irão aos protestantes xiitas contra a minoria sunita e persistir o regime do Bahrein apoiado pela Arábia Saudita, sendo que o apoio político poderá vir a ser cada vez mais acompanhado de recursos de vária ordem. Desde a instauração de um califado em junho de 2014, com Abu Bakr al­‑Baghdadi como califa, o EI continuou a ganhar terreno, embora a um ritmo mais baixo em comparação com as vitórias de 2014 sobre os militares iraquianos. Em maio de 2015, o grupo tomou Ramadi e, apesar de ter perdido território na província iraquiana de Diyala e no norte da Síria para os curdos, conseguiu manter Raqqa, Mosul, Fallujah e partes de Ramadi. Em 2016, o EI procurará reforçar as defesas em Anbar, principal província sunita, e continuará a hostilizar as forças pró­‑iraquianas noutras partes do país. Na Síria, o EI irá concentrar­‑se na província de Alepo, de forma a conquistar terreno ao regime e às forças rebeldes, sem deixar de procurar novos avanços para o centro da Síria. O rápido crescimento do EI na Síria e no Iraque coincidiu com o surgimento de vários grupos afiliados ou províncias do EI na região e no globo. Surgiram províncias no Norte de África (Egito, Líbia e Tunísia), na Península Arábica (Iémen e Arábia Saudita), na Ásia (Bangladesh e Afeganistão) e na África (Somália e Nigéria). Muitos destes “novos” grupos são simplesmente antigos agrupamentos da Al-Qaeda com um novo nome. Estes grupos poderão constituir uma ameaça significativa para os interesses estrangeiros e para os setores turísticos locais. É provável que em 2016 se verifique a continuação de ataques de grande escala e com grande número de vítimas no Egito, na Líbia, na Argélia, no Iémen e nos estados do Golfo Pérsico.

O EI desempenhou um papel importantíssimo na promoção do sectarismo. Desde que, em meados de 2014, se tornou uma grande potência regional, a sua máquina de propaganda apresentou os xiitas, os estados apóstatas (os que estão em coligação contra o EI) e os infiéis (as forças estrangeiras) como os inimigos óbvios. O estabelecimento de um califado por parte do grupo e os assinaláveis êxitos no campo de batalha atraíram milhares de novos recrutas de todo o mundo para as fileiras. As comunidades mistas, como Trípoli na Líbia, Beirute no Líbano e a Província Oriental da Arábia Saudita, que faz fronteira com o Bahrein, tornar­‑se­‑ão cada vez mais áreas de risco de confrontos. O sequestro com fins financeiros, políticos e ideológicos será um risco de segurança importante em muitos países da região do Médio Oriente e do Norte de África (MONA) em 2016. Por sua vez, os riscos de sequestro já existentes por parte de grupos criminosos, extremistas e milícias continuarão a ser elevados. Os antecedentes mostram que, em comparação com outras regiões, o potencial de resultados negativos em incidentes de sequestro na região do MONA é elevado. Isto ficou claramente demonstrado pelo rapto e pela subsequente execução de dezenas de cidadãos estrangeiros (incluindo chineses, egípcios, noruegueses, britânicos e norte­‑americanos) por parte do EI e de grupos afiliados. No passado, o EI fez exigências financeiras para a libertação dos reféns na Síria. Em 2015, o grupo exigiu 200 milhões de dólares para o pagamento do resgate de um refém chinês e de um japonês, e 6,2 milhões de dólares para o resgate de um cidadão norte­‑americano de 26 anos. A ameaça tem origem em pessoas ou grupos afiliados do EI, bem como em simpatizantes desconhecidos da organização. O sequestro e a execução de um turista francês no nordeste da Argélia ilustram bem esta ameaça. Além disso, a possibilidade de ocorrência de sequestros oportunistas e de incidentes de tomada de reféns de curta duração, em países com um nível de ameaça médio ou até baixo, poderá aumentar. O sequestro e a decapitação de um cidadão croata perto do Cairo, no Egito, em 2015, por um grupo afiliado do EI anteriormente desconhecido é um exemplo desta nova ameaça constituída por grupos de milícias pouco conhecidos mas ávidos de chamar a atenção e obter o apoio do EI. Os pedidos de resgate e de pagamentos aumentaram em países como a Líbia, a Síria e o Iémen, dado o aproveitamento, por parte de grupos não afiliados do EI, de um crescente receio relativamente a um desenlace infeliz nas situações de tomada de reféns – situação decorrente da execução de reféns estrangeiros pelo EI. A este fato acresce um conjunto de casos em se acredita que grupos criminosos pouco sofisticados “venderam” reféns estrangeiros ao EI, depois de

87


M D S  m a g a z i n e

terem sido incapazes de lidar com os atrasos nas negociações devido à sua inexperiência ou incapacidade operacional de manutenção dos reféns por períodos mais longos. Esta possibilidade confere uma nova dinâmica à ameaça de sequestro regional e prevê­‑se que se venha a manter em 2016. O complexo ambiente político e de segurança em África continua a ser um motivo de preocupação para os empresários estrangeiros. A regionalização da insurreição do Boko Haram é uma área de incidência­‑chave, num momento em que a região do Congo, rica em minerais, continua a ter dificuldade em estabilizar regimes cada vez mais agitados. Nas zonas mais agitadas, as ameaças de sequestro manter­‑se­‑ão elevadas. O ano de 2015 foi um dos marcos da insurreição armada de quase uma década do Boko Haram contra o estado da Nigéria. O ano começou de forma agoirenta, tendo a seita cometido o mais mortífero ato de violência maciça desde que foi criada: alegadamente, os militantes do Boko Haram mataram um total de 2000 pessoas na vila de Baga no nordeste do país entre 3 e 7 de janeiro. O massacre de Baga e o clamor global que suscitou serviram como catalisador para uma contraofensiva coordenada regionalmente contra o grupo extremista islamita lançada em meados de janeiro. Pela primeira vez, as forças militares da Nigéria, dos Camarões, do Níger e do Chade levaram a cabo operações militares conjuntas contra a seita, o que levou a que o Boko Haram tenha perdido faixas de território no nordeste da Nigéria que, no final de 2014, tinham sido declaradas parte do califado embrionário do grupo. No entanto, o sucesso relativo destas operações militares conjuntas provocou outro, embora muito menos desejável, efeito da insurreição do Boko Haram. Embora o Boko Haram se tenha desenvolvido como uma organização de base nigeriana com uma forte componente doméstica, a retórica e ideologia do grupo sempre insinuou uma ambição muito mais ampla. A estratégia de recrutamento da seita foi construída em torno da manipulação da narrativa histórica do Império de Kanem­‑Bornu, um reino islâmico que em tempos integrou partes da Nigéria, dos Camarões, do Chade e do Níger modernos. Para atingir o objetivo declarado de ressuscitar este antigo império islâmico, o Boko Haram teria de exportar a sua insurreição armada e levá­‑la a atravessar as fronteiras da Nigéria.

88

Ao submeter­‑se ao EI, o Boko Haram comprometeu­‑se efetivamente a seguir o plano do EI, que pretende criar um califado islâmico unificado abrangendo as regiões dominadas pelos muçulmanos no mundo. Embora se estime que a ameaça terrorista em Lagos seja mais forte na região continental mais densamente povoada da cidade, a ameaça irá alargar­‑se aos bairros comerciais das ilhas de Victoria e de Lagos, que acolhem quer diplomatas estrangeiros quer diversos interesses empresariais. No Chade, é provável que os atos de terrorismo continuem na capital, N’Djamena, que também poderá servir como base operacional de uma força regional mandatada para liderar as operações de contraterrorismo contra o Boko Haram em 2016. No vizinho Níger é de prever, com algum grau de credibilidade, a expansão da atividade do Boko Haram para as regiões de Zinder e Dosso, no sul e sudoeste respetivamente, onde um conjunto de organizações humanitárias tem sediadas as suas operações.

África subsariana O sequestro com o objetivo de pedido de resgate, bem como variantes de curta duração, como a extorsão ou o “sequestro­‑relâmpago”, continuarão a ser uma preocupação de segurança prioritária em muitos países da África subsariana, onde o risco de sequestro é elevado e o número de casos poderá aumentar de frequência em alguns locais de baixo ou médio risco.

Os cidadãos estrangeiros envolvidos nos setores da construção e/ou engenharia têm­‑se revelado como alvos frequentes, sobretudo na Nigéria. Esta tendência deverá manter­‑se em 2016. Além disso, as pessoas que viajam durante períodos longos em negócios e os expatriados enfrentarão igualmente uma ameaça elevada de sequestro. Ainda o facto do sequestro de cidadão locais, funcionários de empresas estrangeiras, continuar a ser um grande motivo de preocupação em países de alto risco. Em 2016, a presença e as atividades de grupos criminosos bem organizados em ambientes relativamente estáveis e seguros no seio da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC), como o Quénia, Moçambique e a África do Sul, poderá continuar a contribuir para aquela que se pode tornar uma indústria de sequestro e extorsão cada vez mais integrada. É ainda de prever que, em 2016, ocorram sequestros esporádicos de cidadãos locais e estrangeiros levados a cabo por grupos extremistas, bem como tomadas de reféns de curta duração, como aquela que aconteceu no hotel Radisson Blu em Bamako, capital do Mali, que fez aproximadamente 19 mortos. O rapto de um cidadão romeno numa mina com segurança deficiente no norte do Burkina Faso pelo al­‑Mourabitoun, grupo dissidente do AQIM1, em agosto de 2015, é um bom exemplo do quão perigoso é trabalhar em regiões inseguras sem que sejam tomadas medidas adequadas de mitigação de risco.


fullcover

Ásia Em 2016, o principal problema de segurança na região da Ásia continuará a ser o conflito no Afeganistão. Por sua vez, o aparecimento de outros agrupamentos ligados ao EI no sul e sudoeste da Ásia e na Austrália atrairá a atenção popular e será um motivo de preocupação para as agências de segurança estrangeiras e locais. O Afeganistão serviu de viveiro para os extremistas islâmicos e a ameaça de um maior alastramento para os países vizinhos é uma probabilidade que se mantém de forma persistente. A relação entre as ameaças políticas e de segurança e os níveis de sequestro, resgate e extorsão mantem­‑se significativa e, nas áreas em que os riscos referidos estão presentes, os níveis de ameaça de sequestro e as taxas de ocorrência são, em geral, elevados. Os tipos de riscos de sequestro, resgate e extorsão associados às viagens ou ao trabalho desenvolvido em cada região são cada vez mais diversificados. O agravamento do conflito no Afeganistão deverá afetar negativamente a segurança dos países vizinhos do norte – Tajiquistão, Turquemenistão e Uzbequistão –, ainda que de forma indireta. Há muitos cidadãos de países da Ásia Central que estão a lutar em grupos de milícias no estrangeiro, incluindo nos estados mencionados acima e no Quirguistão. Estimativas sobre o número de combatentes da Ásia Central apontam para valores na ordem dos 1.000 a 1.500 só na Síria. As operações de segurança na Austrália também subiram em flecha devido aos receios do governo de que se verifiquem casos de radicalização entre a população. Na sequência do «Cerco a Sidney» em dezembro de 2014, uma crise de reféns provocada por uma única pessoa, aparentemente inspirada pelo EI e, mais recentemente, em outubro de 2015, do caso isolado de tiroteio em Parramatta, os serviços de informação australianos intensificaram a vigilância aos suspeitos de simpatias extremistas, tendo efetuado diversas rusgas e detenções. Em setembro e outubro foram assassinados no Bangladesh um cidadão italiano e um japonês, sem ligação aparente. Em 2016, o sequestro, nas suas várias formas, constituirá um risco credível de segurança para funcionários locais e estrangeiros, bem como

para interesses empresariais em muitos locais da Ásia. A ameaça de sequestros com motivações financeiras continuará a ser significativa em várias zonas da região. Embora o risco de sequestro por parte de grupos islâmicos extremistas tenha concentrado a atenção da comunicação social em 2015, nomeadamente no que respeita a taxas de frequência, a principal causa de ameaça de sequestro na maioria dos países da Ásia continua a dever­‑se a grupos criminosos e não se antevê uma mudança significativa em 2016. O risco de “sequestros­‑relâmpago” será mais elevado para pessoas que trabalhem em grandes cidades do Bangladesh, da China, de Hong Kong, da Índia, da Indonésia, da Malásia, das Filipinas e de Taiwan. A taxa de sequestros na Índia, país com mais de 40 000 sequestros registados por ano, deverá manter­‑se como uma das mais elevadas do mundo em 2016. A frequência de casos de sequestro virtual está também a aumentar. Em 2016, prevê­‑se que o risco tenha uma maior incidência na Índia, em Taiwan, em Hong Kong e na China. Na Índia e no Bangladesh, a previsão é a de que os gangues de “tiger kidnapping” 2 continuem a ter como alvos organizações com elevada liquidez, como bancos e instituições financeiras, bem como joalharias e outras lojas de luxo. A ciberextorsão poderá constituir­‑se como um risco de segurança significativo para pessoas e empresas em 2016. A extorsão continua a ser endémica em áreas inseguras e afetadas por conflitos como o Afeganistão, o Paquistão e as Filipinas, onde os grupos rebeldes, as milícias e os respetivos homólogos criminosos levam a cabo ações de extorsão bem organizadas que têm como alvo vários setores. Entre os contextos de alto risco contam­‑se o Bangladesh, a Índia e a Papua­‑Nova Guiné. No entanto, a extorsão não se limitará aos destinos de alto risco acima mencionados. Em 2015, registaram­‑se casos frequentes de extorsão na China, em Taiwan, em Hong Kong, na Indonésia, na Malásia, em Singapura e no Sri Lanka. A detenção injustificada ou ilegal por grupos estatais ou não estatais constituirá um risco para pessoas e empresas em alguns países da Ásia em 2016. A China, onde a detenção injustificada de quadros superiores por funcionários e parceiros de negócios/fornecedores é uma resposta comum a diferendos e desentendimentos empresariais,

emergiu como um ponto crítico específico. Além disso, as detenções injustificadas realizadas por entidades governamentais oficiais continuarão a ser um motivo de preocupação para quem viaja em negócios ou lazer. Os viajantes asiáticos enfrentam um risco geral de sequestro mais elevado em muitos países da região devido à fortuna aparente, história/cultura de pagamento de resgates e ao facto de ser menos provável que atraiam o tipo de atenção dos meios de comunicação associado ao sequestro de cidadãos ocidentais. Os cidadãos da China, da Coreia do Sul, de Taiwan e da Malásia, especificamente, estão sujeitos a um risco de sequestro elevado em vários estados asiáticos. Na Filipinas a ameaça criminosa de sequestro continuará a ser elevada nas zonas agitadas do sul, bem como em centros urbanos, como a capital, Manila. Os centros urbanos de destinos de risco baixo e médio, como a Malásia, a Indonésia, a China, Hong Kong, Singapura e Taiwan, não estão imunes à ameaça de sequestro, resgate e extorsão. Especificamente, o rapto de funcionários de empresas, designado “sequestro económico”, está a tornar­‑se rapidamente num negócio lucrativo. As pessoas que trabalham no setor do retalho e da indústria estão sujeitas a um risco mais elevado. Além disso, as pessoas com património líquido elevado, e os respetivos dependentes, são um alvo prioritário dos grupos criminosos, como demonstram os vários casos de grande visibilidade ocorridos em Hong Kong, em Taiwan e em Singapura em 2015. Acresce que, embora não constituindo o risco principal, o risco de sequestro por grupos extremistas islamitas, grupos motivados politicamente, grupos rebeldes e grupos separatistas em alguns locais de países de alto risco e de risco extremo continuará a ser elevado. •

1 AQIM - Al-Qaeda in the Islamic Magreb (Al-Qaeda no Magrebe Islâmico). 2 É um sequestro em que um ou mais reféns são raptados com o intuito de coagir outra pessoa, geralmente alguém com uma relação de parentesco com a pessoa ou pessoas detidas, para participar num crime (Definição do Dicionário Inglês da Collins).

89


Ilustração por Carlos Pinheiro

M D S  m a g a z i n e

90


fullcover

Rio 2016 A gestão de risco nos Jogos Olímpicos A VISÃO DE JORGE LUZZI

O Brasil tem vivido nos últimos anos muitas emoções, algumas relacionadas com a sua história, outras totalmente novas. Sabemos que, nos últimos dois anos, o tradicional bom humor, alegria e otimismo dos brasileiros têm sofrido com os problemas políticos do país, mas um novo “mega” evento, de caráter universal, está prestes a iniciar­‑se, e o coração dos brasileiros volta a bater rapidamente face a esta realidade inédita no Brasil. Trata-se dos Jogos Olímpicos que se realizam de 5 a 21 de agosto de 2016 e os Paralímpicos, de 7 a 18 de setembro. Jorge Luzzi, Presidente da Herco Global e Diretor de Gestão de Risco da Brokerslink, conta-nos como o Brasil se está a preparar para receber os Jogos Olímpicos Rio 2016, do ponto de vista da gestão de risco.

As cerimónias de abertura e encerramento das Olímpiadas de 2016 serão realizadas no histó‑ rico e majestoso Estádio do Maracanã, estando em competição 28 modalidades desportivas, mais duas do que nos Jogos Olímpicos de Londres, em 2012: o Comité Executivo do COI decidiu incluir o golfe e o rugby sevens como novos desportos olímpicos. Foram esta‑ belecidas quatro zonas olímpicas – Barra, Copacabana, Deodoro e Maracanã. Quando a cidade do Rio de Janeiro foi eleita sede dos Jogos Olímpicos e dos Paralímpicos de 2016, o Brasil foi confrontado com o desafio de, no reduzido espaço temporal de 2 anos entre ambos, organizar dois dos maiores eventos desportivos a nível mundial: o Mundial de Futebol de 2014 e os Jogos Olímpicos e Para­ límpicos de 2016. No Mundial de Futebol, os desafios ao nível da infraestrutura logística e da segurança eram enormes. A elevada dispersão geográ‑ fica dos estádios onde se realizavam os jogos, agravada pela vastidão do território brasileiro, acarretava avultados riscos ao nível das infra‑ estruturas de transporte, quer em termo das estruturas físicas, quer na segurança dos visi‑ tantes e participantes durante as viagens, quer ainda a nível logístico. As medidas de mitigação de risco implementadas foram bem sucedidas, permitindo reduzi­ ‑los ou quase eliminá­ ‑los. Foi um êxito do ponto de vista organizacional. À exceção do futebol, as competições das 21 modalidades destas Olimpíadas realizam­ ‑se nos diversos equipamentos desportivos espa‑ lhados pelo Rio de Janeiro, uma cidade relati‑ vamente pequena para os padrões brasileiros. Esta situação permite reduzir o panorama de risco acima descrito. De referir que as compe‑ tições de futebol se realizarão nas cidades de Belo Horizonte, Brasília, Salvador, São Paulo e, obviamente, no mítico Estádio do Maracanã. O Comité Olímpico Rio 2016 tem assim boas expetativas para este evento, quer pela redução do território (e, consequentemente, do risco) quer pela experiência acumulada na gestão de eventos desta magnitude. As questões relacionadas com a saúde e a capacidade hoteleira oferecida pela cidade­ ‑sede são outros riscos que constam do risk mapping do Comité Olímpico Rio 2016. No que diz respeito à saúde, há uma clara preocupação com o vírus Zika. À epidemia que está a afetar o território brasileiro foi dada uma resposta muito rápida por parte das autori‑ dades sanitárias do estado do Rio de Janeiro e do Estado Federal, bem como das autoridades

91


M D S  m a g a z i n e

do Comité Olímpico. O exército brasileiro foi convocado e um grande número de militares foi mobilizado para localizar os focos de criação dos mosquitos e para a aplicação de larvicida, de modo a reduzir ou eliminar o desenvolvi‑ mento do vírus. Felizmente, na altura da reali‑ zação dos Jogos Olímpicos estaremos em pleno Inverno no hemisfério sul, pelo que dificil‑ mente teremos as habituais chuvas tropicais, propícias à proliferação dos mosquitos. Foram construídos novos hospitais privados, grandes e muito bem equipados, nas proximi‑ dades da vila olímpica e dos estádios. Os estudos realizados indicam que o perfil do público internacional que assiste a uma olim‑ píada é mais pacífico do que o dos mundiais de futebol. Assim, se considerarmos o bom trabalho realizado na manutenção da ordem durante o mundial de futebol, e desde que as autoridades desportivas trabalhem de igual modo, não se esperam grandes dificuldades neste aspeto. A infraestrutura hoteleira no Rio de Janeiro não será um problema pois o Rio é uma cidade habituada a receber muitos turistas, com uma grande variedade de hotéis em termos de cate‑ gorias e preços. Outro risco a considerar é o do terrorismo. Ainda que o Brasil não seja habitualmente um país alvo de ações terroristas, estão a ser desen‑ volvidas diversas iniciativas para mitigar este risco, tal como um maior controlo de entradas e reforço das revistas individuais, pois algumas das delegações estrangeiras represen‑ tadas podem ser alvos de atentados. Este risco está a ser avaliado conjuntamente pelo Comité Olímpico brasileiro e as autoridades e comités olímpicos dos países considerados como poten‑ ciais alvos de ataques.

Infelizmente, a Baía de Guanabara não estará descontaminada a tempo dos Jogos, o que é de lamentar pois seria uma clara mais valia para a competição e para a própria cidade, visto que quase 1400 atletas irão velejar nas águas da Marina da Glória, na Baía de Guanabara, nadar na praia de Copacabana e praticar canoagem e remo nas águas da Lagoa Rodrigo de Freitas. No que diz respeito à infraestrutura dos está‑ dios, ainda que não seja perfeita, não apresenta grandes problemas e vai estar ao nível do que é necessário para competições deste nível, assim como a própria vila olímpica. Como em todas as grandes atividades huma­ nas existem riscos, que não são os mesmos em todos os lugares e em todas as épocas. Mas as olimpíadas são um dos eventos universais de maior importância para o ser humano, em que o desporto nos une a todos numa só voz e, como dizia o lendário presidente do Comité Olímpico Internacional, o Barão Pierre de Coubertin: “que a tocha olímpica siga o seu curso através dos tempos para o bem de uma humanidade cada vez mais entusiasta; corajosa e pura”. O risco sempre existiu e sempre existirá. Maior ou menor, é uma consequência do tempo em que vivemos. Em todo o caso, são muitas as pessoas que estão a trabalhar para que, em nenhuma situação, esta “celebração do homem e da humanidade” – os Jogos Olímpicos – seja colocada em causa, e para que possa assim ser celebrada como o maior espetáculo desportivo do mundo. Esta é a primeira vez que a América do Sul recebe os Jogos Olímpicos, a segunda na América Latina (Cidade do México 1968) e a terceira no Hemisfério Sul (Melbourne 1956 e Sydney 2000). •

JORGE LUZZI → Jorge Luzzi, uma das personalidades mais influentes do setor de seguros e risco, é o presidente da Herco Global. Luzzi é Vicepresidente executivo da IFRIMA (International Federation of Risk and Insurance Management – Federação Internacional de Gestão de Riscos e Seguros) e Presidente da Alarys (Associação de Gestão de Risco da América Latina). Entre 2009 e 2013 foi Vice-presidente e Presidente da Ferma (Federação Europeia das Associações de Gestão de Riscos e Seguros). Foi ainda, ao longo de muitos anos, diretor de gestão de riscos do grupo Pirelli na Itália e CEO da PIRCO e da Pirelli Reinsurance Company em Dublin, na Irlanda, e em Lugano, na Suíça. Formou-se em Administração de Empresas pela Universidade de Belgrano e integra o corpo docente da Academia Nacional de Seguros e Previdência no Brasil.

92


TRUST US TO GO FURTHER

The client, a global energy company has grown in the LATAM region largely by acquisition. Companies acquired can have different loss control cultures and approaches to managing risk. Changing these attitudes needs a solid argument in respect of risk benefit arguments in making the business case for investment against the losses prevented. MAPFRE GLOBAL RISKS has developed a risk management and risk assessment tool, specifically for the Energy sector, that enables clients to operate internal benchmarking across sites. For this client this has led to changes in their investment policy and the management of their maintenance programmes in the region.

Trust is at the heart of everthing we do


NOVO LEXUS RX 450h

VIVA A VIDA RX

OFERTA DE LANÇAMENTO

Upgrade para nível de equipamento Executive+ e F SPORT+.

Viva a vida RX 450h. Viva à velocidade de um híbrido de 313 cavalos, com um consumo de apenas 5,2 l/100 km. Viva com design arrojado e o sofisticado equipamento de segurança Lexus Safety System+. Viva ao volante de um modelo icónico, com as mais avançadas tecnologias. Pronto para começar a viver?

◀ Saiba mais sobre este modelo. Consumo Combinado (l/100 km): Mín. 5,2/Máx. 5,5. Emissões de CO 2 (g/km): Mín. 120/Máx. 127.

Oferta válida nas versões Executive e F Sport. Linha de informações Lexus: 808 250 220. De segunda a sexta-feira, das 9h às 20h, exceto feriados.


ENTREPRISE RISK MANAGEMENT

ERM UM NOVO MODELO PARA A GESTÃO DE RISCO E NTR E VIS TA : ALE S SANDRO D I FE LICE , PRYSMIAN

ERM: UMA VANTAGEM ESTRATÉGICA PARA A SUA EMPRESA COR E Y GOOCH , B ROK E RSLINK & J OHN BU G ALL A , E R MIN SI GHT S

RECORDANDO FRANÇOIS SETTEMBRINO J OR GE LUZ ZI

95


M D S  m a g a z i n e

Um novo modelo para a gestĂŁo de risco

96


fullcover

Alessandro di Felice é Chief Risk Officer da Prysmian, depois de uma longa carreira na área da gestão de riscos. Tem vindo a estar profundamente envolvido na ANRA, a Associação Italiana de Gestão de Risco, de que é o atual presidente. Jorge Luzzi, presidente da Herco Global no grupo MDS, e António Fernandes, Global Business Executive da Herco Portugal, encontraram­‑se com Alessandro di Felice num evento promovido pela MDS Portugal e pela MDS Brasil no Porto e falaram com ele sobre a sua carreira e sobre a gestão de risco.

Curiosamente, Alessandro di Felice começou a carreira não como gestor de riscos mas como corretor de seguros em Londres, depois de se licenciar em Gestão de Empresas na Universidade La Sapienza em Roma. Alessandro di Felice diz­ ‑nos que se “tratou de uma expe‑ riência muito importante, porque passar dois anos no mercado de corretagem de seguros mais avançado do mundo proporciona uma aprendizagem de todos os aspetos técnicos, da forma como este negócio funciona e do princípio básico mais importante da atividade – confiar na pessoa com quem estamos a nego‑ ciar”. Depois de alguns anos em Londres, regressou a Itália, desta vez para Milão, ainda no setor da corretagem. No final dos anos de 1990, Alessandro foi contra‑ tado pela Pirelli, para integrar o departa‑ mento de gestão de risco. Como diz Jorge Luzzi: “Começou a trabalhar do outro lado do muro”. Alessandro di Felice concorda: “Sim, descobri um mundo completamente novo e, no início, receei que o trabalho de gestão de risco fosse aborrecido. Temi que se tornasse demasiado repetitivo, mais ou menos sempre igual, ao passo que na corre‑ tagem conhecemos muita gente, diferentes clientes e fazemos diferentes atividades. Mas não foi, de todo, o que aconteceu – foi sempre um trabalho fantástico, desde o início até hoje”. Naturalmente, Jorge e António têm a mesma opinião – ambos sabem o que é trabalhar em gestão de risco – afinal também têm muitos anos de expe‑ riência. Jorge Luzzi quis saber o grau de compromisso da Pirelli com a gestão de

risco naquela altura, ao que Alessandro di Felice respondeu que a Pirelli tem há muito tempo um dos departamentos de gestão de risco mais evoluídos de Itália: “Começaram no final dos anos de 1970, criando um departamento de gestão de seguros, que, nos anos de 1980, evoluiu para um departamento de gestão avan‑ çada de risco e de seguros”. Alessandro di Felice explica: “‘Avançado’ significa olhar para um perfil de risco com uma abordagem diferente, mais abrangente, e não apenas de negociação. Nos anos de 1990, quando integrei a empresa, já havia algumas atividades de engenharia de risco, prevenção de perdas, análise de riscos e determinação de perfis de risco. No início, estas atividades centra‑ vam­‑se sobretudo nos riscos seguráveis, e não nos não­‑seguráveis, mas depressa evoluíram e passaram a incluir a gestão de riscos. Mais tarde, tornei­‑me gestor de riscos na Prysmian – uma spin­‑off do Grupo Pirelli. Trata­‑se de uma divisão da Pirelli especializada em cabos, que se tornou numa empresa completamente independente e, nos últimos cinco anos, sou o Chief Risk Officer da empresa. Isto significa que há cinco anos adotámos uma abordagem de gestão integrada de riscos na empresa e tornei­‑me responsável por uma série de riscos que tipicamente não são seguráveis”. Jorge quis saber a quem Alessandro di Felice reporta no que respeita à ativi‑ dade de Enterprise Risk Management e de seguros. Alessandro di Felice escla‑ rece imediatamente: “Respondo perante

o Conselho de Administração, ou melhor, perante uma comissão do Conselho de Administração. É o que está previsto na política de governo corporativa da empresa, e a gestão integrada de riscos insere­ ‑se na sua governação corpora‑ tiva. Como gestor de risco tradicional, respondo perante o diretor financeiro do grupo, ou seja, esta atividade insere­‑se nas funções de administração, finanças e controlo”. Jorge concorda com a concentração de ambas as atividades na mesma pessoa, mas com diferentes áreas de enfoque. Em seguida muda de assunto, pedindo a Alessandro que descreva a abordagem da gestão de risco nas empresas italianas, que não a Pirelli, nos anos de 1990 e na primeira década deste século. Alessandro reflete por um momento e recorda: “Eu diria que a evolução da nossa profissão tem sido mais ou menos semelhante em todas as outras grandes empresas. Quando falo em grandes empresas, refi‑ ro­‑me às 100­‑120 empresas que consti‑ tuem os maiores conglomerados a operar na Itália, tipicamente empresas cotadas, e que são também multinacionais ou têm um conjunto de operações multinacio‑ nais. Há poucas grandes empresas: 95% da economia italiana compõe­‑se de pequenas e médias empresas e, nesta área, as coisas são muito diferentes. Ao longo do tempo, nunca se mostraram especialmente inte‑ ressadas ou focadas em gerir riscos. No entanto, na Associação Italiana de Gestão de Risco, notámos que algo está a mudar nos últimos anos, talvez em consequência da recente crise económica”. “Muitas empresas compreenderam que uma forma de enfrentar a crise era gerir o risco e tentar controlar a volatilidade de resultados – estabilizando­ ‑os para evitar problemas inesperados – o que criou e continua a criar uma nova cultura de gestão de riscos no país. Refiro­‑me mais às médias empresas, porque as pequenas tendem a ser empresas fami‑ liares, geridas por duas ou três pessoas, ou seja, são muito pequenas. Outra possível razão para uma melhor gestão de risco é o facto de os bancos, os investidores e os clientes terem começado a exigir feedback e reporte sobre a forma como os riscos são geridos. Estou convicto de que existe realmente uma cultura de gestão de risco a crescer em Itália – o que é confirmado pelo que vemos na nossa Associação, em

97


M D S  m a g a z i n e

“Acho que o mercado de seguros precisa de estudar um novo modelo de negócio. Algo como um “seguro 2.0”

98

que duplicámos o número de associados no último ano e meio, o que é muito pouco habitual”. Alessandro continua: “A Associação está a ser mais procurada por pessoas que não são gestoras de risco; têm outras funções nas empresas em que trabalham, mas precisam de identificar os riscos e compreender como os gerir, além de fazer algumas atividades de trabalho em rede, benchmarking e formação”. Jorge concorda: “A profissão – a ativi‑ dade de gestão de risco – está a disse‑ minar­‑se mais do que nunca em Itália”. Alessandro acrescenta: “Talvez ainda não como profissão a tempo inteiro, mas é certamente uma função para alguém com responsabilidades mais alargadas na empresa”. Jorge prossegue com uma pergunta sobre o trabalho da Associação Italiana de Gestão de Risco, sobre como tem contri‑ buído para a gestão de risco em Itália e se influenciou a mentalidade de quem trabalha nesta área. Alessandro, presidente da ANRA há um ano e ativamente envolvido na sua gestão há mais tempo, explica: “Investimos muito para permitir às pessoas o acesso a uma grande variedade de informação e também na criação de cursos, de eventos formativos e de workshops para dar resposta a quem nos pede formação. As reações têm sido muito positivas e o inte‑ resse está a crescer. A gestão integrada de riscos (Enterprise Risk Management) tornou­ ‑se muito popular em grandes empresas e, através desta, estamos a assistir a uma redescoberta da gestão de risco e de seguros tradicional. Isto acon‑ tece porque, quando se leva a cabo uma análise de perfil de risco na gestão inte‑ grada de riscos, inclui­‑se um conjunto de áreas do risco como a jurídica, comu‑ nicacional, estratégica, financeira, de compliance e operacional. Numa empresa industrial, é habitual as prin‑ cipais conclusões destas análises colo‑ carem os riscos seguráveis no topo da escala, mas com esta nova abordagem o nível de informação e comunicação destes riscos é muito mais elevado do que anteriormente. Os riscos são comu‑ nicados aos executivos de topo: ao CEO e/ ou ao Conselho de Administração e, por conseguinte, a necessidade de comprar seguros tornou­‑se mais “popular”, junta‑ mente com outros aspetos do Enterprise

Risk Management. Estes executivos de topo compreendem que o mercado de seguros tem a capacidade financeira para reduzir a exposição a estes riscos. Há, claramente, outras áreas do risco que não são seguráveis e que, por isso, continuam a representar questões importantes para as empresas”. Jorge chegou recentemente da confe‑ rência de Gestão de Risco da RIMS (Risk Management Society) em San Diego, na Califórnia, e contou que vários gestores de riscos de grandes empresas norte­ ‑americanas referiram que as compa‑ nhias de seguros e de resseguro estão a centrar­‑se mais na cobertura de riscos não­‑tradicionais; situações relativamente às quais, até agora, não se tinham aperce‑ bido tratarem­‑se de verdadeiras necessi‑ dades para os clientes, mas para as quais as associações de gestão de risco estavam a chamar a atenção dizendo “sabem que se desenvolverem uma apólice para cobrir alguns gaps no balanço dos vossos clientes e se o mercado de seguros agir neste sentido, tecnicamente poderão fazer alguns negócios bastante rentá‑ veis”. Consequentemente, a pressão feita por associações regionais de risco está a gerar novos tipos de coberturas por parte dos seguradores. Jorge quis saber se isto também está a acontecer em Itália. Alessandro responde afirmativamente: “Sim, e indo mais além, acho que o mercado de seguros precisa de estudar um novo modelo de negócio. Algo como um ‘seguro 2.0’, ou seja: se uma grande empresa integrar, no quadro da sua governação corporativa, uma abor‑ dagem de Enterprise Risk Management, se levar a cabo uma análise de cenários possíveis e se avaliar o seu potencial de exposição, porque deverá o mercado de seguros continuar a considerar apenas seguros tradicionais como os patrimo‑ niais, de responsabilidade civil, marí‑ timo e carga e de acidentes pessoais etc.? Porque não se tornam os seguradores, por exemplo, uma espécie de empresa ‘parceira’ e respondem ao plano de gestão de risco dizendo ‘este é o risco que foi avaliado no plano de gestão da vossa empresa e eu proporcionarei uma certa capacidade para o caso de o resultado exceder as vossas expetativas, ou ficar aquém’…” E continua: “Assim segurar­ ‑se­‑ia um plano de gestão de risco em vez dos riscos que o compõem. Ainda não sei


fullcover

como será possível fazer isto, ainda não tenho a resposta, mas acredito que se trata de algo que deve ser avaliado e estudado para se criar um novo modelo de negócio. Não se trata apenas de lançar um novo produto, como um ciberseguro, ou um seguro de contingência/perdas de explo‑ ração por interrupção da atividade ou da evolução de linhas de negócio – trata­‑se de uma reformulação completa do modelo de negócio”. A discussão anima­‑se. Enquanto Jorge afirma que este modelo significaria que, além dos subscritores, também os clientes poderiam sugerir novos tipos de cober‑ turas, António junta­‑se à conversa pergun‑ tando a Alessandro qual é a posição das companhias de seguros neste modelo, se estarão abertas para este tipo de enfoque. Na opinião de Alessandro, algumas companhias de seguros estão a entender a mensagem, mas acrescenta cautelosa‑ mente: “Não sei qual é a abertura que têm nem qual é a disposição, porque se trata de uma questão estratégica para a empresa. Eu diria que atualmente o mercado de seguros, bem como parte do setor da cor‑ retagem, se encontra numa situação muito perigosa: existe muita capacidade e, dado o preço baixo, em certos segmentos do negócio, o seguro vai tornar­‑se uma com‑ modity. E se se tornar uma commodity, será de fácil acesso e haverá a necessidade de controlo. Isto pode significar uma redução de custos ou de colaboradores, pode resul‑ tar em aquisições, fusões, etc. Só os players fortes no mercado vencerão – os outros serão completamente afastados do jogo”. António intervém: “De certa forma, a sua empresa, a Prysmian, quer jogar este jogo, uma vez que fará aquisições signifi‑ cativas”. Alessandro di Felice concorda: “Sim, parte da nossa atividade – cabos de baixa voltagem – está no mercado das commodities, pelo que sabemos como funciona”. Funciona com a compra de pequenas empresas, com a redução de custos e aquisição de quota de mercado. Fazemo­ ‑lo porque não temos mais margem para reduzir os preços. Só pode‑ remos ter uma margem se os custos forem muito, muito baixos. De outra forma, é impossível. E o mercado de seguros está a seguir nesta direção atualmente – já há alguns anos que é fácil obter um desconto numa renovação de um programa tradi‑ cional de seguro de riscos patrimoniais, por exemplo, se estiver bem construído e

Alessandro di Felice com Jorge Luzzi e António Fernandes.

não tiver problemas de maior com sinis‑ tros e frequência. Então qual é o valor acrescentado se a discussão se centra apenas no preço? Trata­‑se de algo perigoso para a gestão e para os gestores de risco, porque se, num determinado momento, a aquisição de um seguro se tornar tão fácil e barata, não haverá estímulo para investir na prevenção de perdas, no controlo e na gestão de risco”. Jorge e António concordam. Alessandro continua: “A capacidade dis­ ponível no mercado segurador é enorme à escala mundial. As companhias de seguros também têm de ter em conta, por exemplo na Europa, a introdução das regras de Solvência II, que exigem uma signifi‑ cativa alocação de capital para asse‑ gurar o negócio, o que constitui um custo adicional. Por isso, não sei para onde vai este mercado. Poderá ser o momento certo para investir em algo completamente novo que não seja uma apólice de seguros nem um produto financeiro, mas uma espécie de híbrido”. Jorge acrescenta: “Isso poderia fun­ cionar com a criação de coberturas para casos como o de uma previsão estra‑ tégica de uma empresa estar errada ou de o cenário se tornar diferente da previsão feita quando o plano estraté‑ gico foi definido, por exemplo. É assim que, tipicamente, funciona o seguro contra danos provocados por fenómenos meteorológicos”. Mudando de assunto para o tema das cativas, Jorge pergunta: “A Prysmian é

uma das mais antigas proprietárias de cativas na Itália e, desde a origem, uma das primeiras da Europa. Como é que está a correr, qual é o apetite pelo risco exis‑ tente na vossa abordagem à prevenção de perdas etc., usando as cativas?” Alessandro responde: “Eu diria que, para nós, a cativa representa o nosso nível de apetite pelo risco em patrimoniais, responsabilidade civil e crédito. Ao longo dos anos, graças aos resultados positivos obtidos, manti‑ vemos sempre lucros na cativa, gerando mais capitalização de forma a que a cativa se autofinanciasse, aumentando progres‑ sivamente o nível de retenção. Em seguros tradicionais como os de riscos patrimo‑ niais, de responsabilidade civil e de crédito estamos apenas a comprar capacidade no mercado. Retemos todos os sinistros frequentes. Existe um equilíbrio, é susten‑ tável e o nosso enfoque continuará a ser o de segurar apenas eventos de risco muito alto, abaixo do qual será a nossa empresa a cobrir o risco”. Continuariam de muito boa­ ‑vontade a conversar sobre gestão de riscos, mas Alessandro tem um avião para apanhar. Enquanto se despedem, torna­‑se claro que se tratou de uma conversa muito interes‑ sante. E o que é ainda mais evidente é que todos partilham a mesma paixão pela gestão de risco. •

99


M D S  m a g a z i n e

ERM Uma vantagem estratégica para a sua empresa DE JOHN BUGALLA E COREY GOOCH

Em muitos setores, as empresas estão a ser pressionadas pelos reguladores no sentido da implementação de um programa de Enterprise Risk Management (ERM), ou seja uma gestão holística e integrada de riscos. No entanto, e embora a generalidade das empresas não esteja sujeita a um elevado grau de regulação, estas vogam pela adoção de um sistema deste tipo. Talvez a razão por que regula‑ dores e conselhos de administração veem com tão bons olhos a gestão integrada de riscos (ERM) se prenda com os benefícios estratégicos e operacionais que a mesma permite, e entre os quais se contam os seguintes: • o aumento da possibilidade de atingir objetivos estratégicos e empresariais; • a capacidade de prever eventos adversos e minimizar o seu impacto; • a capacidade de percecionar oportunidades de criação de valor como seja uma vantagem competitiva para o futuro; e • o facto de se constituir como um processo que permite que os membros do conselho de administração supervisionem as atividades de gestão de risco, o que é obrigatório em alguns países. A introdução e a adoção do programa de gestão integrada de riscos por parte de muitas empresas no mundo inteiro deverão ser acompanhadas de um outro passo. Este passo é o do planeamento e é crucial para a criação de um contexto que envolva o novo programa de gestão integrada de riscos. A fase de planeamento e preparação deverá ter lugar antes de se dar início a um programa deste tipo. É nesta altura que os líderes das organizações deverão debater a forma como o programa de gestão integrada de riscos se alinhará com os objetivos estratégicos da organização, que será utilizado pelos reguladores, quando necessário, como um instrumento de verificação da conformidade.

100

Ligar a gestão integrada de riscos à estratégia Para muitos, os programas de gestão integrada de riscos são iniciados ou promovidos por uma única pessoa ou departamento e executados da base para o topo sem dar a atenção necessária quer às necessidades quer aos obje‑ tivos de toda a empresa, atenção esta que é um conceito­ ‑chave da gestão integrada de riscos. O resultado é um trabalho de gestão integrada de riscos com um enfoque muito restrito. Por exemplo, um trabalho de gestão inte‑ grada de riscos promovido pelo grupo de compliance ou regulatório torna­‑se muitas vezes um programa tenden‑ cioso que se preocupa apenas com o cumprimento de aspetos legais ou regulatórios. Como é óbvio, estas capacidades organizacionais são importantes, mas deverão ser enquadradas no contexto geral dos objetivos estratégicos da organização. Uma iniciativa de gestão integrada de riscos que adote uma abordagem holística enquadrada numa cultura que a sustente irá não só alavancar a melhor identificação e os melhores tratamentos do risco já em vigor na orga‑ nização, mas também ajudar a incorporar os refe‑ ridos processos de risco no processo de planeamento estratégico. Quando a gestão integrada de riscos está alinhada com os objetivos estratégicos e operacionais da organização, poderá também gerar benefícios estratégicos e opera‑ cionais. A metodologia consiste em incorporar a gestão integrada de riscos no processo de planeamento estra‑ tégico anual da empresa. Dado que o plano estratégico define uma visão para o crescimento da organização ao longo de um período de vários anos, a incorporação do processo de gestão integrada de riscos irá auxiliar e não perturbar o plano estratégico. A razão é simples: embora o plano estratégico se baseie em várias projeções ao longo do tempo (entre elas as polí‑ ticas, económicas, tecnológicas, sociais, ambientais e legais), o ponto de partida são as condições existentes. No entanto, existe uma enorme variedade de circuns‑ tâncias mutáveis com consequências que variam com o passar do tempo – o futuro já não é o que era – e que, de um momento para o outro, podem transformar condi‑ ções operacionais favoráveis num ambiente extrema‑ mente difícil. Veja­‑se a ampla variedade de desfechos, como as taxas de juro, o preço do petróleo, uma saída da UE por parte do Reino Unido, a migração de refugiados, os riscos cibernéticos, que são possíveis no intervalo de cinco anos compreendido entre 2016 e 2020.


fullcover

Ambiente Atual de Operação

MAIS FAVOR ÁVEIS

Fatores de Risco Externos

Plano Estratégico At

ua l

• Político • Económico • Social • Tecnológico • Legal • Ambiental

MENOS FAVOR ÁVEIS

2016

Cronologia de Eventos

2018

ERM melhora o planeamento estratégico.

Ligar o planeamento estratégico e empresarial à tomada de decisões A incorporação da gestão integrada de riscos no planea‑ mento estratégico e empresarial não é um fim por si só. O processo de gestão integrada de riscos apoia o plano estratégico, mas é a execução do plano estratégico e do plano empresarial por meio de ações táticas que é essencial. Quando se introduzem os dados e a infor‑ mação sobre riscos ou obstáculos no início do processo e as decisões se baseiam nestes dados e nesta infor‑ mação, a organização começará verdadeiramente a pôr em prática uma gestão integrada de riscos. Incorporar este processo no planeamento estratégico é também importante para fazer a empresa crescer, uma vez que o outro lado do risco é a oportunidade. E um enfoque na oportunidade poderá gerar uma vantagem competitiva importante.

Iniciar o processo de gestão integrada de riscos O planeamento e a preparação adequados antes do início do programa de gestão integrada de riscos são cruciais. A fase de planeamento exige o envolvimento ativo e a liderança do CEO e da equipa de liderança. Com o CEO a liderar as sessões de planeamento, poderá dar­‑se início a um diálogo construtivo sobre a gestão integrada de riscos, que irá determinar o formato e os contornos espe‑ cíficos do programa da uma organização.

Uma sessão de planeamento inicial com a ordem de trabalhos que se apresenta abaixo é um bom começo: • criar os princípios para a gestão integrada de riscos: visão, missão e finalidade; • identificar o líder do programa de gestão integrada de riscos: Chief Risk Officer, CFO ou CEO; • identificar a melhor forma de alinhar a equipa organi‑ zacional, que irá incorporar o processo de gestão inte‑ grada de riscos no plano estratégico da organização; • definir «risco» no seio da organização; • delinear um registo do risco inicial para a organização; • fazer um debate inicial sobre o apetite e a tolerância face ao risco; • identificar recursos internos e externos e colaborações que irão dar maior solidez ao programa. Além de assegurar que toda a liderança organizacional está em sintonia, a gestão integrada de riscos também permite que se tenha em conta os programas de infor‑ mação e formação e protocolos de comunicações para o futuro. Durante os momentos de incerteza económica e num ambiente de aumento de regulação, comunicar com o conselho de administração proporcionará maior conforto e garantias sobre a gestão de risco na organi‑ zação, mas também sobre a direção estratégica, a viabili‑ dade e o crescimento da empresa.

101


M D S  m a g a z i n e

A Carta de Princípios da gestão integrada de riscos A Carta de Princípios da gestão integrada de riscos criados durante a fase de planeamento são um registo interno para ser seguido pela liderança executiva e pelos quadros médios. A natureza estratégica do documento assegura a sua elaboração por quadros superiores que tenham uma visão ampla e poder dentro da organização. No mínimo, estes estatutos deverão apresentar a visão, a missão e a finalidade da gestão integrada de riscos no seio da organização. Marcarão o tom da gestão integrada de riscos a partir do topo definindo uma de duas direções diferentes: a gestão de risco ou é uma função de apoio estratégico ou é de auditoria e controlo. Acreditamos que a gestão integrada de riscos deverá alinhar­‑se com as atividades empresariais da organização e apoiá­‑las. O departamento de gestão do risco deverá colaborar com o departamento de auditoria e compliance, mas não deverá estar sob a alçada deste último, se tal for possível. Metade dos princípios fundacionais da gestão integrada de riscos tem que ver com a “preservação, proteção e conformidade”, mas a outra metade tem que ver com o apoio à construção da empresa. A gestão integrada de riscos deverá ser empregue para identificar, avaliar e enfrentar tanto as ameaças quanto as oportunidades para a organização. Mais especificamente, os objetivos de um programa de gestão integrada de riscos deverão ser: (1) minimizar o impacto de eventos adversos, (2) apoiar as oportunidades de crescimento da empresa, e (3) melhorar a administração da organização.

Conclusão A incorporação da gestão integrada de riscos no plano estratégico permitirá apoiar os objetivos de crescimento e minimizar o impacte de eventos adversos que pode‑ riam impedir uma organização de atingir os objetivos a que se propõe. Para nós, a gestão integrada de riscos é uma componente importante do processo de planea‑ mento estratégico. Na Brokerslink, temos a capacidade de ajudar os nossos clientes a construir e implementar um processo de gestão integrada de riscos que acres‑ cente valor e lhes dê uma vantagem competitiva. •

102

COREY GOOCH

JOHN BUGALLA

→ Corey Gooch é diretor de desenvolvimento de negócio na Brokerslink. Integrou a empresa depois de trabalhar na Towers Watson, onde desempenhou funções de diretor de contas, líder de vendas de consultoria de riscos nos EUA e líder de consultoria em gestão integrada de riscos de empresas de natureza global. Antes de integrar a Towers Watson, trabalhou nos departamentos de corretagem e consultoria de riscos da Aon durante 11 anos, tendo liderado a equipa de consultores para a EMEA a partir de Londres. Corey Gooch escreveu artigos para várias revistas e participa regularmente em diversas conferências internacionais do setor. É licenciado em Gestão de Empresas, tendo obtido uma dupla especialização (majors) em Gestão Financeira e de Riscos, na Universidade de Temple, e frequentou a Academia Naval dos Estados Unidos da América. → Com base em Chicago, Corey Gooch pode ser contactado através do endereço corey.gooch@brokerslink.com.

→ John Bugalla é diretor de inovação em gestão integrada de riscos. Tem um percurso de quatro décadas na criação de valor para os clientes, através da conceção de novos produtos, serviços, técnicas e métodos de gestão. → Entre 2002 e 2014, foi diretor­‑geral da Marsh & McLennan, Inc., função que já tinha desempenhado na Willis Corporation entre 1990 e 2000. Entre 2002 e 2004, foi Diretor Geral da Aon Corporation. → É, desde 2005, o diretor­ ‑geral da ermINSIGHTS, uma firma de consultoria e formação, especializada na gestão integrada de riscos e na gestão do risco de estratégia. A firma presta assessoria a clientes sobre como integrar a gestão integrada de riscos no planeamento estratégico e sobre como tirar proveito deste processo para criar valor novo. → Participa regularmente, como palestrante, em conferências de diretores executivos, de diretores financeiros e na RIMS. Colabora com empresas no sentido de tornar a gestão integrada de riscos num fator de criação de valor, e não apenas num exercício de compliance. → Publicou artigos em várias revistas, como sejam a CFO Magazine, a Risk Management Magazine, a The Risk Management Association, a The Journal of Risk Education, entre outras. → Com base em Indianápolis, John Bugalla pode ser contactado através do endereço jbugalla@indy.rr.com.


fullcover

103


fullcover

“François acreditava que as associações e a formação/educação seriam a única forma de construir uma cultura harmonizada de gestão de riscos na Europa”

François Settembrino.

Celebração do 40º aniversário da FERMA.

104


M D S  ma g a z i n e

RECORDANDO

François Settembrino POR JORGE LUZZI

François Settembrino, fundador da Associação Belga de Gestão de Riscos e da Federação das Associações Europeias de Gestão de Riscos (FERMA), faleceu, em setembro do ano passado, aos 86 anos, após um curto período de doença. François Settembrino foi presidente da FERMA durante dez anos (1984-1994) e o homem responsável pela criação do Fórum Bienal da Federação, tendo sido nomeado presidente honorário da associação depois de se aposentar. Antigo corretor e gestor de risco na Tabacofina na Bélgica, François Settembrino foi, manifestamente, alguém que deu uma enorme contribuição para o setor segurador e da gestão de risco, sendo descrito pelos seus pares e colegas como o “pai da FERMA”. Jorge Luzzi, Presidente da Herco Global e diretor de gestão de risco da Brokerslink, recorda este homem notável. François Settembrino foi uma grande influência para o setor da gestão de risco e, para mim, um verdadeiro professor, quer a nível pessoal quer a nível profissional. Foi, de facto, o “pai­‑fundador” da FERMA e o responsável pela sua antecessora – a “Association of European Industrial Insureds” (AEAI) –, que foi lançada em 1974. François Settembrino começou a sua carreira no setor segurador nos anos 60 no corretor belga Henri Jean. Uma das suas célebres expressões era: “Um prémio é visto por todos como uma recompensa financeira; no entanto, no setor segurador, é algo que tem de se pagar!” Especializou­‑se no seguro automóvel e para particulares antes de passar para a áreas das pensões e employee benefits. Naquela altura, muitas organizações estrangeiras, sobretudo nos Estados Unidos, começavam a estabelecer as suas sedes europeias na Bélgica. François – desiludido com a falta de harmonização na Europa – estava empenhado em ajudá­ ‑las a estabelecer as suas operações e a ultrapassar as evidentes diferenças culturais e legais entre os EUA e a Europa. Como consequência, ficou rapidamente conhecido como “o especialista europeu” nesta matéria. François acreditava que as associações e a formação/educação seriam a única forma de construir uma cultura harmonizada de gestão de risco na Europa e foi esta sua vontade de promover a formação em seguros e gestão de risco na Europa que conduziu à criação da AEAI e da FERMA.

Depois de alguns anos como corretor, François aceitou o cargo de gestor de risco numa empresa belga, onde desenvolveu e promoveu ativamente uma cultura de gestão de risco. Trabalhou de perto com a Comissão Europeia e, no início dos anos 70, foi incumbido, pela Direção­‑geral de Alfândegas1, de criar uma associação europeia que representasse os interesses do setor e trabalhasse de perto com seguradores e corretores. Foi o que fez com a ajuda de contactos na Alemanha, na Holanda, no Reino Unido, na Itália, na Espanha e em França. Pessoalmente, conheci­‑o no final dos anos 80. Eu era muito novo e estava a dar os primeiros passos no mundo da gestão de risco. Foi na sessão de abertura de uma das conferências da AEAI/RIMS em Monte Carlo. A sua capacidade de envolver o público e a sua competência linguística eram impressionantes, o que lhe permitiu fazer a palestra em seis línguas. François tornou­‑se uma referência durante os meus mais de 35 anos na área da gestão de risco e muitas das iniciativas que propus, enquanto presidente da FERMA e da Federação Internacional das Associações de Gestão de Risco, foram inspiradas pelos seus ensinamentos de vida e pelas conversas que tivemos. Em 2014, encontrámo­‑nos em Bruxelas para celebrar os 40 anos da FERMA, um evento que contou com a presença de todos os seus presidentes. Ele lá estava, elegante e lúcido como sempre. François nunca dava lições ou conselhos de forma tradicional. Pelo contrário, fazia­‑nos pensar e continuou sempre a fazê-lo. Mesmo muito tempo depois de se reformar, continuava a ter uma presença ativa no seio da FERMA, trabalhando em conjunto com o secretário­‑geral, Pierre Sonigo e a diretora executiva, Florence Bindelle; estava sempre pronto a ajudar, escrevendo artigos para a imprensa e partilhando o seu entusiasmo até aos últimos dias de vida. Em julho de 2015, enviou o seu último artigo a Florence: um texto muito espirituoso, mas demasiado provocador para ser partilhado publicamente. No texto da mensagem de e­‑mail que acompanhava o artigo podia ler­‑se: “Este artigo é como um Testamento, reflete os meus pensamentos e os meus desejos! Até breve e um beijo grande”. Esta foi a última mensagem de e­‑mail de François. Obrigado, François pelo teu contributo para a nossa profissão e para todos nós da comunidade da gestão de risco. •

1 General Customs Directorate, no original.

105



Brokerslink BROKERSLINK: DO SONHO À REALIDADE – A HISTÓRIA DE UMA TRANSFORMAÇÃO BROKERSLINK CRESCE EM ÁFRICA: NOVOS MEMBROS NO GANA E NA TANZÂNIA ENTREVISTA A JIRINA NEPALOVÁ FUNDADOR A E CEO DA R E NOMIA

BROKERSLINK NEWS

107


M D S  m a g a z i n e

Brokerslink

Do sonho à realidade – a história de uma transformação PA U L B I T N E R , M A N A G I N G D I R E C T O R B R O K E R S L I N K A G

Tudo começou com uma ideia, surgida em 2004, em Portugal, terra de exploradores. Motivados pela ideia de disponibilizar uma oferta de qualidade a clientes com crescente presença interna‑ cional que colmatasse a lacuna de soluções adaptadas às suas necessidades, José Manuel Fonseca e a MDS foram além das suas fronteiras para encontrar corretores de seguros independentes que partilhassem a sua visão: a criação de uma rede regional de corretores indepen‑ dentes. Assim nasceu a Brokerslink. Tal como os bons vinhos melhoram com o tempo, as boas ideias tornam-se num continuum que, quando acompa‑ nhadas de visão e sentido estratégico, evoluem ao longo do tempo. A Brokerslink, uma boa ideia, tinha assim come‑ çado a sua evolução. A primeira fase centrou-se, por um lado, na expansão geográfica da rede com o objetivo de prestar um serviço a clientes em todo o mundo e, por outro, na formalização da organização como uma associação. Em 2009, apenas 5 anos após o surgimento da ideia que esteve na origem da sua criação, a Brokerslink era já uma rede mundial de corretores presente em mais de 50 países com uma forte base de suporte em termos de corretagem de resseguro. 2009 marcou, igualmente, uma mudança significativa de estratégia. Do outro lado do mundo, em Hong Kong, local da sua primeira conferência global, a Brokerslink começou a transformar-se numa organização ativa na procura de novos negócios. A segunda fase estava assim em marcha. A transformação da natureza da organização exigiu uma maior expansão geográfica, e o desenvolvimento de uma oferta completa de soluções de risco. Os “exploradores”

108

dirigiram a sua ação para o Oriente e África, regiões‑ -chave até então inexploradas. Foram desenvolvidos esforços para o estabeleci‑ mento de novas parcerias em países estratégicos onde a Brokerslink não estava presente. Pelo caminho, foram-se estabelecendo relações fortes com corretores de refe‑ rência e empresas de consultoria de risco. A Brokerslink encetou igualmente esforços no sentido do fortaleci‑ mento de relações estratégicas com seguradoras globais lançando um website com uma plataforma de colabo‑ ração. Em 2013, a Brokerslink estava presente em mais de 85 países, integrando 10 empresas de referência mundial ao nível da consultoria de risco e corretores de especiali‑ dade, tendo estabelecido acordos estratégicos com segu‑ radoras-chave, aumentando assim a sua notoriedade. Durante este período, outra ideia começou a tomar forma: a Brokerslink tornar-se num corretor global distinto com a finalidade de se assumir como uma alter‑ nativa às redes de corretagem de seguros existentes no mercado, e que fosse viável e sustentável a longo prazo. A constituição de uma empresa com fins lucra‑ tivos vem acentuar a diferença entre a Brokerslink e as restantes redes, oferecendo assim uma alternativa aos corretores globais cotados em bolsa. A Brokerslink converte-se num corretor global, detido por corretores de seguros independentes que mantêm a sua identidade operacional. O capital obtido resultante da incorporação possibilitou um investimento adicional em capital humano, IT e branding, permitindo que cada corretor disponibilize ao mercado uma experiência de serviço diferenciada e um leque de soluções para a gestão de risco.


fullcover

20%

20%

20%

20%

20%

BROKERSLINK MANAGEMENT AG

50 N O V O S I N V E S T I D O R E S , 41 PA Í S E S DE 5 CONTINENTES

R E P R E S E N TA N D O

BROKERSLINK AG

Outubro de 2013: desta vez o cenário era a 5ª Conferência Global da Brokerslink, em Singapura. Os membros da Brokerslink deram o primeiro passo votando no sentido da transformação da associação numa empresa com fins lucrativos, dando assim início à terceira fase da exis‑ tência da Brokerslink. O primeiro passo do processo de incorporação foi con‑ cluído em 2014, quando a Brokerslink Management AG foi criada, registada e capitalizada na Suíça com cinco acio‑ nistas, todos agentes-chave na evolução da Brokerslink, como se mostra no gráfico acima. Em 2015, a Brokerslink AG, uma empresa global de corre‑ tagem, foi criada, registada e capitalizada pela Brokerslink Mananagement AG. O processo de subscrição privada de ações ficou concluído em maio de 2016. Estava assim criado um novo tipo de empresa global de corretagem. Pertencendo a 50 corretores indepen‑ dentes de seguros e empresas de consultoria de todas as regiões do mundo, a Brokerslink AG está capitalizada e tem capacidade para oferecer um serviço diferenciado ao cliente através de uma equipa altamente qualificada e de uma rede de 90 empresas afiliadas que têm um vasto conhecimento do setor.

A incorporação acentua a diferença entre a Brokerslink e as redes de corretagem de seguros existentes e oferece uma alternativa aos corretores globais cotados em bolsa.

Uma realidade em que certamente novas boas ideias estarão para chegar. •

109


M D S  m a g a z i n e

José Manuel Fonseca, Mohamed Jaffer, Youness Rhallam e Eric Addo-Mensah, na conferência EMEA da Brokerslink, 2016.

Brokerslink cresce em África: novos membros no Gana e na Tanzânia

110


fullcover

A Brokerslink vai de vento em popa em África, um continente em franco crescimento, no qual muitas empresas e clientes desenvolvem cada vez mais negócios. A Midas Insurance Brokers do Gana e a Tan Management Insurance Brokers, sediada na Tanzânia, são membros recentes da Brokerslink em África. Eric Addo‑Mensah, COO da Midas, e Mohammed Jaffer, CEO da Tan Management, estiveram no Porto para o encontro da Brokerslink EMEA, e a fullcover aproveitou para conversar com eles. Ambos falaram das suas carreiras, das suas empresas, dos seus mercados e das razões que os levaram a aderir à Brokerslink.

As empresas Eric Addo‑Mensah iniciou a sua carreira como professor, tendo posteriormente decidido estudar seguros no Reino Unido (como professor que era, sabia a impor‑ tância do conhecimento). Dez anos – e muitas horas de estudo – mais tarde, Eric regressou ao Gana e integrou a maior corretora de seguros do país. Em 2008, teve a oportunidade de criar a sua própria empresa que, ao fim de três anos, já era um dos dez maiores corretores de seguros no Gana. A Midas emprega 12 pessoas, que trabalham em duas sucursais em Tamale e Acra e que gerem, no total, cerca de oito a nove milhões de dólares em volume de prémios. Eric pretende expandir a empresa para outras cidades. A história de Mohammed Jaffer é um pouco diferente, embora haja aspetos comuns. Mohammed estudou na Ame­rican University em Sharjah (Emirados Árabes Unidos). Depois de se licenciar com 20 anos, Mohammed voltou para o país natal, a Tanzânia (a família era proprie‑ tária de várias empresas, desde imobiliá‑ rias a padarias, passando por empresas de serviços de saúde). Mohammed preten­dia concluir o mes­trado, mas, para isso,

precisava de ganhar alguma experiência profissional. A família sugeriu­‑lhe então que arranjasse um trabalho que não estivesse ligado aos negócios da família. O primeiro emprego que conseguiu foi na Jubilee Insurance – o maior segu‑ rador da África Oriental – onde trabalhou durante nove anos. Só quando foi promo‑ vido a diretor regional é que Mohammed achou ter chegado o momento de colocar a sua experiência no setor segurador ao serviço dos negócios da família. Em 2009, comprou uma agência de seguros – não se tratava sequer de um corretor – que intermediava um volume de prémios de 200 000 dólares. Em 2015, a empresa declarou cerca de três milhões de euros em prémios intermediados. O crescimento foi tal que a KPMG classi‑ ficou a Tan Management como a quinta melhor média empresa da Tanzânia. Além disso, a empresa ocupa a nona posição entre as 120 corretoras do país. A Tan Management emprega 26 pessoas, que trabalham em três sucursais loca‑ lizadas nas cidades de Dar es Salaam, Moshi e Arusha, e Mohammed, tal como Eric, continua a apostar no crescimento da empresa. Midas e Tan Management – duas em­presas nascidas por um acaso.

Os mercados As carteiras e os segmentos de negócio podem ser diferentes, mas ambos os mercados enfrentam os mesmos desafios: dar resposta a clientes com múltiplas neces‑ sidades em diferentes linhas de negócio, o que reduz a necessidade de especialização. Embora sejam corretores generalistas, têm mais experiência em determinadas áreas, como por exemplo nos seguros de terrorismo e riscos políticos. Como afirma Eric: “Com a exceção da África do Sul e talvez Marrocos, na maioria das outras zonas de África fazemos de tudo. Mas esta é também umas das razões pelas quais integrar um grupo como a Brokerslink é, na minha opinião, muito importante. Quando estudei no Reino Unido, havia um anúncio que costumava passar na tele‑ visão com um homem que dizia ‘se eu não sei, conheço quem saiba’. Damos o nosso melhor para seguir este princípio, pelo que, se não tivermos a experiência necessária, podemos falar com alguém que tenha”. No Gana e na Tanzânia, a especialização está, de momento, fora de questão. Na Tanzânia, o mercado empresarial representa 65% do total de receitas de pré‑ mios. O mercado de retalho é atualmente de 35%, mas tem um enorme potencial de crescimento. Mohammed afirma: “Fora do âmbito empresarial, as pessoas não consideram o seguro uma necessidade. O microsseguro está sem dúvida a ajudar e o regulador estima que a taxa de penetra‑ ção de seguros triplique até 2019­‑2020”. No Gana, o mercado de retalho é ainda mais pequeno, representando cerca de 15% do total. Em ambos os mercados exis‑ tem seguros obrigatórios, como seguros de responsabilidade civil geral e patro‑ nal na Tanzânia, e o seguro automóvel e de responsabilidade de empresas liga‑ das à construção no Gana. No mercado da Tanzânia, há regulamentação prestes a entrar em vigor que estabelece a obriga‑ toriedade do seguro de incêndio em esco‑ las e de contratação de seguros de enge‑ nharia em projetos de construção. Será também criado um programa de seguro de saúde para trabalhadores, o que justi‑ fica as estimativas de que o mercado tripli‑ cará nos próximos anos. No que respeita ao Gana, uma vez que não existe seguro obrigatório de acidentes de trabalho, as

111


M D S  m a g a z i n e

Mercado Segurador do Gana Dimensão do mercado – Os valores relativos à totalidade do mercado em 2012 foram enunciados da seguinte forma (os valores dos prémios de acidentes pessoais e saúde não estão disponíveis)

VIDA INCLUINDO CLÁUSULAS ADICIONAIS

VIDA

NÃO VIDA

TOTAL DO MERCADO

PRÉMIOS EM MILHÕES DE CEDIS GANESES

355.77

494.89

850.66

% D O T O TA L DO MERCADO

41.82

58.18

100.00

NÃO VIDA (PATRIMONIAIS E RESPONSABILIDADES)

ACIDENTES PESSOAIS E SAÚDE*

TOTAL

%

PER CAPITA

%

PER CAPITA

%

PER CAPITA

%

PER CAPITA

GANA

0,45

7.20

0.57

9.15

0,03

0.40

1,05

16.75

CAMARÕES

0,28

3.49

0.62

7.76

0,20

2.57

1,10

13.81

NIGÉRIA

0,16

2.28

0.47

6.92

n.d.

n.d.

0,62

9.20

Mercado segurador da Tanzânia Dimensão do mercado – À escala mundial, em 2013, o setor de seguros Não Vida da Tanzânia estava classificado na 97.º posição, e o setor de seguros de Vida na 119.º. Os valores relativos à totalidade do mercado em 2013 foram enunciados da seguinte forma:

PRÉMIO EM MILHÕES DE XELINS TANZ ANIANOS % DO TOTAL DO MERCADO

VIDA INCLUINDO CLÁUSULAS ADICIONAIS %

PER CAPITA

VIDA

NÃO VIDA

ACIDENTES PESSOAIS E SAÚDE

TOTAL DO MERCADO

56,411.00

338,972.00

78,702.00

474,085.00

11.90

71.50

16.60

100.00

NÃO VIDA (PATRIMONIAIS E RESPONSABILIDADES) %

PER CAPITA

ACIDENTES PESSOAIS E SAÚDE*

%

PER CAPITA

TOTAL

%

PER CAPITA

TANZ ÂNIA

0,11

0.72

0.64

4.30

0,15

1.00

0,89

6.01

QUÉNIA

0,93

11.63

1.32

16.38

0,51

6.30

2,76

34.32

UGANDA

0,09

0.53

0.51

2.90

0,13

0.75

0,73

4.18

Nota: *os dados relativos a seguros de acidentes pessoais e saúde dizem respeito aos seguros de acidentes pessoais e saúde e não aos seguros de saúde com cláusulas adicionais, subscritos por seguradores de Vida, Não Vida ou especializadas em saúde.

112


fullcover

empresas de construção são obrigadas a ter um seguro de responsabilidade civil que indemnize tanto os colaboradores das empresas quanto terceiros, em caso de acidente. A resposta à questão sobre as consequências da não contratação do seguro automóvel obrigatório, Eric diz­ ‑nos que a polícia é muito rigorosa e, se não apresentarmos uma prova de seguro do automóvel, podemos ser presos (sorri sarcasticamente).

o foco principal da Tan Management. Mohammed está também muito inte‑ ressado em expandir a atividade além­ ‑fronteiras, quer através de filiais na Tanzânia quer através da colocação de programas internacionais para os seus clientes.

As estratégias

A conversa incide agora sobre o setor da corretagem nos dois países. Mohammed, além das funções que desempenha na Tan Management, é presidente da Associação de Corretores de Seguros da Tanzânia (TIBA). Mohammed explica: “Tendo em conta as minhas funções, estou a assistir a um conjunto de mudanças, entre as quais o facto de os corretores se estarem a tornar mais profissionais. Num mercado tão jovem, a existência de 120 corretores que concorrem para o mesmo negócio é um desafio. Destes 120 corretores, 95 estão sediados em Dar­‑es­‑Salam, pelo que estão todos a lutar pela mesma fatia do bolo. Infelizmente, nem todos são profissionais, o que dificulta a vida dos que são”. Mohammed acrescenta: “Esta concentração é evidente quando lemos os relatórios do regulador – os corre‑ tores controlam 60% de um mercado que vale aproximadamente 300 milhões de dólares. Da fatia de 200 milhões, os 15 maiores corretores controlam 180 milhões e os cinco maiores quase 50% deste valor”. A falta de conhecimento especializado preocupa a Associação, pelo que a TIBA associou-se à KPMG com vista à consti‑ tuição de uma parceria para a formação na África Oriental, que ajude os corre‑ tores a tornarem­‑se mais profissionais e a servirem melhor os clientes. O setor está a evoluir a um ritmo acelerado; o regu‑ lador desenvolveu uma política nacional de seguros (ainda em fase de revisão) e uma estratégia nacional de formação em seguros, de forma a incluir os seguros nos currículos escolares e universitá‑ rios. O regulador introduziu também o seguro Takaful2 e a bancassurance e, ao contrário de outros países africanos, entende que o setor deverá tornar­‑se mais autorregulado.

Com o potencial de crescimento que existe em ambos os mercados, é interes‑ sante descobrir quais são as estratégias de futuro da Midas e da Tan Management. Eric adianta que, além do aumento das coberturas de patrimoniais e respon‑ sabilidades para clientes empresariais, uma das apostas de futuro será o seguro de vida: “Existe uma classe média em expansão e, dada a forma como está estru‑ turada a sociedade, ainda muito baseada nas relações familiares, a maioria dos jovens da classe média precisa de seguro de vida para os filhos, sobretudo se pretender salvaguardar a educação das crianças”. Nos últimos dois anos, estabe‑ leceram­‑se no Gana grandes seguradores de Vida, como a Credential e a Old Mutual. Para a Tan Management, a situação é ligeiramente diferente; cada região é única, pelo que as sucursais têm de adotar estratégias diferentes. Mohammed observa: “É difícil centrarmo­ ‑nos em segmentos empresariais num local como Moshi1 e, em Dar es Salam, o mercado de retalho está a tornar­‑se um pouco mais difícil, dada a introdução da bancassu‑ rance, que permite aos bancos vender seguros”. E continua: “Para vender seguros, os bancos têm de se registar como corretores, o que significa que não terão os conhecimentos técnicos neces‑ sários no que respeita à oferta de certos tipos de cobertura, como os de transporte marítimo”. Tendo­ ‑se afastado do mercado de retalho, a Tan Management identificou a área dos seguros de saúde como uma área de crescimento (tal como acontece com os seguros de vida no Gana). Os números deverão triplicar neste segmento de negócio, pelo que este é, juntamente com o segmento dos seguros empresariais,

Os setores da corretagem e dos seguros

Além de presidente da TIBA, Mohammed é também vice­ ‑presidente da Associação de Corretores da África Oriental (EABA). Esta associação é com‑ posta por cinco países: Tanzânia, Quénia, Uganda, Ruanda e Burundi. Mohammed aponta: “Os desafios que enfrentamos na África Oriental e na África em geral são bastante diferentes dos do mercado euro‑ peu e, perante estes desafios, só há duas opções – ou ficamos sentados e dizemos ‘muito bem, as coisas são como são, é assim a África’, ou avançamos com a con‑ vicção de que ‘se trata do nosso setor, do nosso mercado, do nosso país’ e se não fizermos uso da experiência que temos, para que nos servirá?”. O entusiasmo e a paixão de Mohammed pelo seu trabalho são evidentes, ainda que nos confidencie: “Estes cargos são exigentes – as viagens, a negociação com representantes gover‑ namentais etc., mas não há dúvida de que vale a pena, quando o nosso trabalho é reconhecido”. E Mohammed é reconhecido. No ano passado, recebeu o prémio anual para jovens profissionais da Tanzânia, na categoria de menos de 35 anos e foi distin‑ guido como o mais jovem empreendedor do país nos Prémios de Excelência da Tanzânia. Sucessos de que se deve orgu‑ lhar, mas que Mohammed afirma serem resultado de muito trabalho. O desenvolvimento é também evidente no mercado ganês. Eric explica: “O setor dos seguros no Gana evoluiu ao longo dos anos, tendo as companhias mais antigas mais de 80 anos. Nos anos 70 do século xx, houve uma mudança de governo e foi decretado que todas as companhias de seguros deveriam ter pelo menos 40% do seu capital detido por ganeses, o que levou uma série de empresas internacionais a deixar o país e as empresas locais a assumir o controlo”. Mas, nos últimos

1 Moshi é um mercado pequeno, mas habitualmente muito dinâmico na Tanzânia, com uma população urbana de 150 000 habitantes e uma população rural de 402 400. É a capital da região de Kilimanjaro. 2 De acordo com a Investopedia, o seguro Takaful é um tipo de seguro islâmico, em que os membros contribuem com dinheiro para um sistema comum, garantindo­‑se uns aos outros contra perdas e danos. O seguro Takaful baseia­‑se na Charia, o direito religioso islâmico, que nos diz que é responsabilidade dos indivíduos cooperarem e protegerem­‑se uns aos outros.

113


M D S  m a g a z i n e

anos, as coisas mudaram e voltaram a entrar no mercado ganês empresas estrangeiras; algumas vindas da Nigéria, mas também outras como a Allianz e a Saham. Ainda que o requisito relativo aos 40% de capital já não exista, continua a ser necessária uma participação local. E continua: “As companhias de seguros cresceram em número e dividiram­‑se entre os ramos Vida e Não Vida. Temos perto de 50 seguradores: 26 de Não Vida e os restantes de Vida. O número de corretores de seguros também aumentou. Há 20 anos, quando cheguei ao primeiro corretor onde trabalhei, havia cerca de 20 corre‑ tores; agora o número subiu para mais de 70. E, tal como na Tanzânia, os principais corretores representam 89% dos negócios. É um desafio considerável, uma vez que muitas das maiores contas correspondem a grandes projetos com participação do estado e, como é óbvio, temos de estar na linha da frente. Mas nós sempre esti‑ vemos presentes e continuamos a empenhar­‑nos; nunca desistimos e vamos fazer o possível para mantermos a nossa posição no top 10”. Tal como Mohammed, Eric está também envol‑ vido em atividades do setor, desempenhando funções na Comissão Técnica da Associação de Corretores de Seguros do Gana e tendo também sido nomeado para a Comissão Técnica do Instituto de Seguros do Gana.

Aderir à Brokerslink Em resposta às perguntas sobre como veem a Brokerslink no panorama internacional de seguros e sobre a razão pela qual se tornaram membros, Eric e Mohammed têm a mesma visão. Aderiram porque, como “genera‑ listas” nos seus próprios mercados, precisam de ter acesso a conhecimento específico, quando os clientes o exigem. Mohammed coloca a questão da seguinte forma: “Nós não temos acesso a um corretor de resse‑ guro na Tanzânia; a Brokerslink dá a corretores como nós, em países como o nosso, um suporte com o qual podemos contar. Se me telefonarem a perguntar sobre o seguro contra sequestro e resgate, basta­‑me enviar um e­‑mail para receber uma resposta de um membro da Brokerslink algures no mundo. Nós queremos propor‑ cionar o mesmo mecanismo de apoio aos membros da Brokerslink, razão pela qual nos expandimos para a África Oriental. Não queremos que a Brokerslink sinta a necessidade de ir para países como o Malawi, por exemplo, porque nós já lá temos alguém. Por exemplo, quando a Léons, membro da Brokerslink na Holanda, quis fazer uma colocação de risco no Malawi, nós ajudá‑ mo­ ‑la; conhecemos a região e conseguimos aconse‑ lhá­‑la. E a Léons teve confiança porque nos conhecia. A Brokerslink pode ter uma presença forte em África – nós temos o conhecimento local e os nossos colegas sabem que podem ter confiança”. Eric concorda sem reservas: “Quando criámos a Midas, percebi que este tipo de sinergia pode ajudar empresas novas como a minha, pelo que procurei

114

Mohamed Jaffer, CEO da Tan Management Insurance Brokers.

Será também criado um programa de seguro de saúde para trabalhadores, o que justifica as estimativas de que o mercado triplicará nos próximos anos.


fullcover

estabelecer uma relação internacional com uma rede que pudesse contactar para obter informação e conhe‑ cimento. Como Mohammed referiu, há alturas em que precisamos de know-how ou de uma visão especiali‑ zada e a Brokerslink dá­‑nos exatamente isto. Quando fui abordado pelo membro nigeriano da Brokerslink, não pensei duas vezes; tratava­‑se de algo que eu procurava há muito tempo. No entanto, isto são coisas que levam tempo. Temos de desenvolver uma relação e de ir conhe‑ cendo as pessoas. Quando as pessoas me perguntam: ‘o que conseguiram obter da vossa ligação à Brokerslink?’ Eu digo­‑lhes que as coisas não se fazem de um dia para o outro, é preciso construir uma relação; conhecer as pessoas e saber com quem falar. A Brokerslink terá sempre alguém capaz de dar respostas quando nós não tivermos nenhuma. Como disse anteriormente: ‘Se eu não sei, conheço quem saiba’”.

As pessoas Eric é casado e tem dois filhos: um com 26 anos, que está a frequentar Direito, e uma filha com 24 anos licenciada em Engenharia de Transformação Alimentar. Além dos negócios, gosta de jogar golfe. Foi secretário do clube de golfe durante três anos, tendo sido recentemente reeleito para um novo mandato, e costuma jogar todas as quartas­‑feiras à tarde e aos fins de semana. Eric diz: “É o desporto ideal para os negócios. Podemos reunir­‑nos num escritório de um CEO e falar durante 20 minutos, mas se fizermos um jogo, ao fim de seis horas ainda estamos a falar!” Não resistimos a contar­‑lhe que temos campos de golfe fantásticos em Portugal e que organi‑ zámos um torneio de golfe na MDS há alguns anos, num campo lindíssimo, no meio de uma paisagem única. Por coincidência – ou talvez não – Mohammed também joga golfe, tendo iniciado a prática há quatro anos. Entusiasta do desporto, joga futebol, squash e badminton e gosta de praticar mergulho. Mohammed também gosta de desportos radicais e, no dia anterior à reunião da Brokerslink EMEA, tinha ido a Évora, uma cidade na região portuguesa do Alentejo, para praticar skydiving. É também um leitor inveterado, tendo sempre um livro do professor espiritual indiano Osho à cabeceira. Mohammed é casado e tem um filho com sete anos. A mulher, tal como todas as mulheres da família, está profundamente envol‑ vida na empresa. Mohammed explica: “Tratando­‑se de um negócio familiar, as mulheres estão envolvidas na atividade das nossas empresas. Embora a nossa cultura seja a muçulmana, as nossas mulheres têm responsabi‑ lidade nas empresas; a minha mulher é gerente no nosso escritório de Dar es Salam; a minha irmã é a diretora responsável pela região norte e a minha mãe é diretora numa das nossas empresas de investimento”. E conclui: “As mulheres trazem equilíbrio à empresa. Sempre que ganhamos um prémio é a elas que o dedicamos”. Com a conversa a chegar ao fim, ficamos a saber por intermédio de Eric que o Gana é um conceituado produtor de chocolate – partilhou connosco algumas especialidades do país – e Mohammed confirma que a Tanzânia é um ótimo mercado para investir. Estão a acontecer muitas coisas interessantes na África Oriental, sendo uma delas a Comunidade da África Oriental, onde os governos trabalham na construção de um modelo semelhante ao da UE, com planos para a criação de um passaporte único, por exemplo. Quando nos despe‑ dimos e agradecemos a Eric e a Mohammed por parti‑ lharem as suas histórias e os seus sonhos, voltamos a sentir esta relação única que só existe entre membros da Brokerslink, parceiros de negócio e amigos, nos quais podemos confiar em todo o mundo – e agora também no Gana e na Tanzânia. •

Eric Addo-Mensah, COO da Midas Insurance Brokers.

115


M D S  m a g a z i n e

G AN A

TA N Z Â N I A

População 25,9 milhões Crescimento da população 2,1% PIB per capita $1.401 Esperança de vida 61,1 Literacia nos adultos 76,6% Inflação 15,3% Índice de desenvolvimento humano (entre 187 países) 138 Investimento direto estrangeiro $3,4 mil milhões Balança corrente como % do PIB ­‑8,3% Penetração de telemóveis 108% Principais exportações Petróleo e crude Última mudança de líder 2012

População 49,3 milhões Crescimento da população 3% PIB per capita $968 Esperança de vida 61,5 Literacia nos adultos 80,3% Inflação 5,6% Índice de desenvolvimento humano (entre 187 países) 159 Investimento direto estrangeiro $2,1 mil milhões Balança corrente como % do PIB ‑8,2% Penetração de telemóveis 55% Principais exportações Tabaco Última mudança de líder 2015

Crescimento do PIB (%)

Crescimento do PIB (%)

GDP ($bn) GDP ($bn)

2013

2014

2015

2016*

2013

2014

2015

* Estimativa outubro 2015

POPUL AÇÃO DA ÁFRICA O C I D E N TA L ( M I L H Õ E S )

POPUL AÇÃO DA ÁFRICA O R I E N TA L ( M I L H Õ E S )

2016

2016

2030

2030

2050

116

2016* *Estimativa outubro 2015

2050


fullcover

117



fullcover

RENOMIA: BROKERSLINK @REPÚBLICA CHECA E N A E U R O PA C E N T R A L E D E L E S T E

Jirina Nepalová:

um exemplo de liderança na indústria seguradora

Jiřina começou a trabalhar no setor em 1978 e é uma das especialistas de seguros mais reconhecidas da República Checa. Este reconhecimento deve­‑se sobretudo à sua enorme experiência na implementação de programas de seguros e na gestão de sinistros para empresas de mais variados setores de atividade. Em 1993, Jiřina fundou a Renomia e, com os seus dois filhos, continua a gerir a empresa e a fazê­‑la crescer, tendo alcançado a posição de maior corretor de seguros da República Checa e da Europa Central e de Leste. A Renomia é parceira da Brokerslink desde 2007, gerindo atualmente cerca de 240 milhões de euros em prémios de clientes. A empresa tem mais de 1000 colaboradores a trabalhar na República Checa, na Eslováquia, na Hungria, na Bulgária, na Roménia e na Sérvia, e está constantemente a expandir os serviços. Em novembro de 2015, lançou uma nova empresa – a Britanika –, que se ocupa principalmente de consultoria financeira, serviços de seguro, do crédito hipotecário e dos investimentos para os clientes do setor do retalho. Jiřina foi eleita presidente da Associação de Corretores de Seguros da República Checa em 2015, e entre os muitos prémios que recebeu contam­‑se o de Gestora do Ano de 2014 nos Setores da Banca e dos Seguros da República Checa, a nomeação como uma das dez mulheres mais influentes da República Checa pela revista Forbes e o de Empresária do Ano da Cidade de Praga pela Ernst & Young, em 2016.

Porque decidiu trabalhar no setor segurador?

Jiřina Nepalová, fundadora e CEO da Renomia, é uma das figuras de topo do mercado segurador na República Checa; o seu profissionalismo e conhecimento sobre o setor são extraordinários, como demostram os elogios que recebe frequentemente no seu país. A fullcover quis saber mais sobre esta mulher muito especial e sobre a sua empresa.

Foi por acaso, talvez sorte. Há 38 anos, a Česká pojišťovna, a única companhia de seguros existente à data e detida pelo estado, procurava um perito de seguro automóvel – eu estava a estudar engenharia eletrotécnica e abordaram­‑me. Foi uma grande mudança na minha vida. Tratou­‑se, desde o início, de um trabalho muito interessante, tendo­‑se tornado essencialmente um passatempo para toda a vida. Outra grande mudança verificou­‑se quando o meu filho, Pavel – que, em 1993, aquando da mudança de regime na República Checa, estava a estudar na Sorbonne em Paris – percebeu que os corretores desempenham um papel muito importante no mundo dos seguros e, juntamente com o meu outro filho, Jirka (também estudante universitário), convenceu-me a aproveitar os meus anos de experiência em seguros e fundar uma corretora. A decisão reforçou a minha relação com o setor segurador. O papel de um corretor de seguros é estar ao lado dos clientes, pesquisar e negociar as melhores condições para eles, lidar com os sinistros e proteger os interesses dos clientes em geral. Para mim tudo isto tem um grande significado.

119


M D S  m a g a z i n e

PRÉMIO S RE NOMI A 2011/2013 Corretora de Seguros do Ano Ruban d’Honneur (European Business Awards) Top 10 dos melhores empregadores da Europa 2015 Empregador da Região (Sodexo)

JIRIN A NEPA L O VÁ 2014 Gestora do Ano nos Setores da Banca e dos Seguros Top 10 dos Gestores do Ano (prémio

120

organizado pela Associação de Gestores da República Checa, as Associações das Confederações dos Empregadores e dos Empresários da República Checa e a Confederação Checa de Indústria). LADY PRO (organizado por Czech 100 Best) 2014/2015 – Top 25 – Mulheres nos Negócios (organizado por Hospodářské noviny, o nono jornal com mais circulação, com uma tiragem de cerca de 43 000 exemplares em setembro de 2013). 50 mulheres mais influentes da República Checa (organizado pela revista Forbes, artigo de dez páginas e fotografias de capa na edição de novembro de 2015). 2016 Empresária do Ano de 2015 da Cidade de Praga (organizado pela Ernst & Young)


fullcover

O que achou mais difícil na construção e no crescimento da Renomia, que é hoje um dos corretores mais fortes da Europa Central? O início, sem dúvida. No meu caso, foi necessário começar uma empresa do zero, sem capital e numa cidade pequena. Tive de pedir um empréstimo hipotecando a nossa casa. Tive também de convencer futuros colegas – profissionais do setor dos seguros – a juntarem­‑se a mim numa empresa que estava a dar os primeiros passos, o que não foi fácil. Por isso, comecei a trabalhar com pessoas de fora do setor, ensinando­ ‑lhes tudo. Deve ter sido uma decisão acertada, uma vez que algumas destas pessoas ainda estão a trabalhar na Renomia e são reconhecidas como especialistas de topo em seguros. Foi uma ajuda ter os meus dois filhos comigo, uma vez que também estavam empenhados em fazer a empresa crescer.

Como foi ser uma empresária de sucesso e mãe ao mesmo tempo? Tive a sorte de ter fundado a empresa numa altura em que os meus filhos já eram adultos. Além disso, conseguimos conjugar os nossos talentos e tirar partido do facto de eu ter experiência na área e eles terem ideias criativas, coragem, visão e conhecimento de línguas estrangeiras. Como mãe, tive sempre abertura para os ouvir. Desde o início, temos sido ótimos parceiros com posições igualitárias na empresa.

Qual é a sua visão? Como vê o futuro da Renomia? A minha visão pessoal e empresarial consiste em manter o cariz familiar da empresa, expandi­‑la na Europa Central e de Leste e prestar o melhor serviço aos clientes. Continuamos a trabalhar segundo os nossos valores, e a nossa missão é: “servimos as pessoas e as empresas e contribuímos para uma vida melhor”. Partilhamos a nossa visão com os nossos colegas em todos os países em que estamos presentes, para que se identifiquem com ela, para quererem naturalmente integrar esta visão e para que estejam empenhados em construir uma marca forte na Europa.

Porque é importante para a Renomia ser membro da Brokerslink? Um marco importante no sucesso do desenvolvimento da Renomia foi o trabalho com redes de corretores e parceiros internacionais. Juntámo­‑nos à Brokerslink em 2007 e esta parceria enriqueceu­‑nos, tendo­‑nos permitindo adquirir não só novo conhecimento e experiência, mas também amigos. Graças à Brokerslink temos a oportunidade de prestar serviço aos nossos clientes em países em que não estamos ativos e, ao mesmo tempo, esta cooperação traz­‑nos novos clientes. Gostamos muito das reuniões conjuntas e da comunicação sempre aberta e amigável. •

Acha que agora é mais fácil para as mulheres alcançar posições de liderança no setor segurador? Não deveria haver diferença entre um homem e uma mulher que visam uma posição de direção. Depende das capacidades e das oportunidades que uma pessoa tiver. No entanto, ele ou ela terão de estar preparados para fazer sacrifícios e ter coragem e perseverança.

Qual é a melhor memória que tem deste trajeto? Tenho muitas memórias bonitas que nunca vou esquecer. Uma que realmente significou um passo em frente para a empresa foi a minha primeira viagem ao estrangeiro de avião. Fui a Londres com os meus filhos e outro colega, que é agora acionista da Renomia, para uma reunião com um executivo de topo de um dos maiores corretores do mundo. Tivemos de o convencer a trabalhar connosco com vista à aquisição de uma grande conta – uma grande holding do setor químico na República Checa. E conseguimos. Mais tarde, vencemos o concurso em conjunto, derrotando a forte concorrência internacional e, desde então, mantivemos o cliente.

Não deveria haver diferença entre um homem e uma mulher que visam uma posição de direção. Depende das capacidades e das oportunidades que uma pessoa tiver. No entanto, ele ou ela terão de estar preparados para fazer sacrifícios e ter coragem e perseverança.

121


M D S  m a g a z i n e

BROKERSLINK NEWS

N

2016 Brokerslink Conference Amsterdam October 20-22

brokerslink.com @Brokerslink

Conferência anual da Brokerslink em Amsterdão O maior evento anual da Brokerslink realiza­‑se este ano em Amsterdão, no Hotel Okura, de 20 a 22 de outubro. Naquela que é a 8ª edição da conferência, são esperados mais de 250 participantes de todo o mundo, incluindo membros, gestores de risco e seguradores. Os novos desafios e oportunidades da Brokerslink e da indústria seguradora serão um dos principais focos da conferência, com destaque para os notáveis oradores que fazem parte do programa deste ano, tais como: Inga Beale – Lloyd’s CEO; Denis Duverne – Chairman of the Board of Directors, AXA Group; Jean­‑Marc Paihol – Head of Group Market Management and Distribution at Allianz SE; Steve Hearn – Group CEO, Cooper Gay Swett & Crawford e Fons Trompenaars – Founder and Director, Trompenaars Hampden­‑Turner.

122


fullcover

Brokerslink @ RIMS'2016 A Brokerslink participou em mais uma edição da conferência anual do RIMS – The Risk Management Society, considerado o evento líder da indústria seguradora a nível mundial. Este ano a conferência decorreu em San Diego, entre 10 e 13 de abril, e contou com mais de 440 expositores. O grupo MDS, a Crystal & Company e a In2Matrix marcaram a sua presença com balcões próprios no stand da Brokerslink. A atividade da Brokerslink no RIMS, através da forte participação da sua equipa e de um stand com um design original e de grandes dimensões, revela­‑se fundamental para elevar a organização ao nível dos maiores players mundiais da corretagem. Trata­‑se de uma oportunidade incomparável de estabelecer a presença no mercado, reforçar relações com seguradores e gestores de risco e descobrir novos clientes e parceiros. Nenhum outro evento da indústria consegue oferecer um público de tão alto nível e produzir resultados e oportunidades de negócio tão interessantes ano após ano. Mais de 60 participantes de membros da Brokerslink estiveram presentes e participaram nas reuniões e nos eventos organizados pela Brokerslink: o já tradicional pequeno­‑almoço exclusivo para os membros – ­ onde se reconectam ligações e se fica a par das últimas notícias – ­ e o famoso cocktail que este ano contou com a presença de mais de 200 convidados. O próximo RIMS realizar-se-á em Filadélfia, entre 23 e 26 de abril de 2017 e a Brokerslink voltará a marcar presença.

Brokerslink no Centro de Congressos de San Diego.

Cocktail da Brokerslink.

Stand da Brokerslink no Centro de Congressos de San Diego.

123


M D S  m a g a z i n e

Expansão da Brokerslink Atualmente a Brokerslink está presente em 90 países, com 400 escritórios e 10.000 profissionais em todo o mundo. A expansão desta plataforma está totalmente alinhada com o crescimento e necessidades dos seus membros e respetivos clientes. Neste sentido, as mais recentes integrações da Brokerslink aconteceram na Europa, com a entrada de brokers independentes, empreendedores e de elevada reputação nos seus mercados, como se segue: • Áustria: Aktuell • Espanha: Filhet­‑Allard España • Noruega: Norwegian Broker • Suécia: Söderberg & Partners

Brokerslink seleciona a Ventiv Technology para o seu portal RMIS – Risk Management Information System A Brokerslink anunciou uma parceria estratégica com a Ventiv – ­ a maior empresa independente no mercado mundial com soluções específicas de tecnologia de risco e seguros – ­ que permitirá entregar aos seus clientes um portal RMIS. Este portal vai proporcionar aos clientes multinacionais da Brokerslink as ferramentas necessárias para analisar os seus programas de seguros globais, bem como a possibilidade de aceder a outras ferramentas de gestão de risco. A parceria Brokerslink ­– Ventiv demonstra o forte compromisso com a estratégia de impulsionar o crescimento por meio da inovação, disponibilizando tecnologia de risco de classe mundial aos seus clientes.

124

Fotografia de grupo.

Zurich Multinational Insurance Training A parceria estratégica global entre a Zurich e a Brokerslink tem revelado um importante desenvolvimento da relação entre as duas organizações, em particular entre os membros da Brokerslink e as unidades locais/regionais da Zurich. O fortalecimento desta relação é fundamental para o encontro de soluções adequadas e um melhor serviço aos clientes existentes no espaço internacional. Para reforçar esta relação, foi realizada uma formação em programas internacionais, exclusiva para membros da Brokerslink, no Zurich Development Center, na Suíça. Durante dois dias, 25 participantes de 15 países estiveram focados no Multinational Insurance Training, com sessões muito dinâmicas, análise e discussão de case studies e a aprendizagem sobre como usar a Zurich Multinational Insurance Application (MIA), uma ferramenta premiada que proporciona o know­‑how necessário para apoiar e garantir soluções de seguros globais e sustentáveis. No final, o feedback dos participantes foi altamente positivo e demonstrou que todos compreenderam e saíram melhor informados sobre as opções disponíveis na estruturação de um programa internacional.

Conferência regional da Brokerslink Ásia-Pacífico No âmbito dos eventos da Brokerslink programados para 2016, teve lugar mais uma importante conferência Asiática, de 27 a 30 de abril, em Sidney, com a PSC Insurance Brokers – membro da Brokerslink na Austrália e Nova Zelândia, a assumir o papel de anfitrião. Sob o tema “Working Together for Better Results”, 60 delegados de 10 países apresentaram e discutiram temas como o ERM – Enterprise Risk Management, riscos emergentes, a nova capacidade tecnológica da Brokerslink – o portal RiskConsole, e o futuro da corretagem.


Get to know Chronopost. What makes us unique is the excellence in relationship with our customers, as well as innovation and technological leadership. Every day, our more than 750 employees in Portugal put at your disposal their commitment and dedication. As specialists, we always find new ways to make each customer experience something brilliantly simple. chronopost.pt


M D S  m a g a z i n e

Angola: presente e futuro P O R PA U L O VA R E L A

A quebra acentuada do preço do petróleo nos mercados internacionais desde meados de 2014 tem tido um grande impacto sobre a economia dos países tradicionalmente produtores e exportadores desta commodity, variando esse impacto na razão direta do grau de dependência das contas públicas de cada um em relação ao petróleo. Segundo o FMI, Angola e Nigéria foram os países da África subsaariana mais penalizados pela conjuntura internacional adversa, em 2015. Paulo Varela, Presidente da Direção da CCIPA – Câmara de Comércio e Indústria Portugal-Angola, fala dos desafios que Angola enfrenta.

126


fullcover

Conjuntura atual e medidas A diminuição registada nas receitas de exportação e fiscais oriundas do setor, até então responsáveis por cerca de 80% das receitas totais, obrigaram o Executivo angolano a rever os pres‑ supostos em que tinha baseado o Orçamento Geral de Estado para 2015: baixar a estimativa do preço do barril de petróleo de USD 80,00 para USD 45,00 implicou, desde logo, a adoção de medidas de contenção da despesa pública (nomeadamente através da suspensão, adiamento ou cancelamento de obras e projetos considerados não prioritários ao abrigo do Plano de Desenvolvimento Nacional 2013-2017), da referenciação de eventuais fontes alternativas de receitas e da diminuição da dependência do país face ao exterior. Com efeito, num país dependente do petróleo, cujas receitas provenientes dos outros produtos exportados são, comparavel‑ mente, residuais (embora os diamantes sejam a segunda maior fonte de receita, atingiram “apenas” 990 milhões de euros em 2015, que comparam com 8,8 mil milhões de euros do petróleo), foi fundamental a reação atempada das autoridades angolanas, com medidas internacionalmente reconhecidas como opor‑ tunas e adequadas. A mais relevante das diversas medidas preconizadas pelo Executivo angolano foi, na nossa opinião, precisamente a decisão de diversificar a economia: fomentar o investimento

em áreas não petrolíferas (os recursos naturais existentes são abundantes e encontram­‑se nos mais diversos setores econó‑ micos), nomeadamente as relacionadas com a indústria, e desenvolver a produção do setor primário, nomeadamente a agricultura, de forma a substituir as importações e, desta forma, não só conter a saída contínua de divisas mas também diminuir a dependência do país (principalmente em termos alimentares) face aos seus parceiros externos. É de salientar que a diversificação da economia angolana teve início com a crise de 2008-2009, numa imposição do FMI no âmbito do acordo de ajustamento estrutural celebrado com o Executivo angolano e que vigorou até maio de 2013. Este processo não beneficiou, porém, da adoção de uma estratégia concertada entre os diversos responsáveis pelo desenvolvimento económico, o que levou à implementação de alguns grandes projetos, viáveis e sustentáveis, mas reduzidos em número e áreas de atividade. Em meados de 2015, e considerando o agravamento da crise interna, o Governo de Angola publicou os primeiros diplomas no âmbito da definição de uma nova estratégia de atração do inves‑ timento privado: foi publicada uma nova Lei que, entre outros aspetos, eliminou o montante mínimo do projeto para ser elegível; concede um conjunto de benefícios e incentivos enquadrados por critérios objetivos e pré­‑definidos; assegura o repatriamento de capitais desde o início do projeto e salvaguarda 35% do investi‑ mento em áreas consideradas prioritárias (por exemplo, meios

127


M D S  m a g a z i n e

de comunicação social e hotelaria e turismo) para os investidores angolanos. Também são criados órgãos capacitados e orientados para o apoio e a promoção do investimento privado e do fomento das exportações nacionais, de entre os quais se destacam a APIEX – Agência para a Promoção do Investimento e das Exportações de Angola e as UTIP – Unidades Técnicas de Apoio ao Investimento, que funcionam junto dos diversos ministérios de tutela dos inves‑ timento, funcionando uma, em particular, junto da Presidência da República, à qual compete apreciar e decidir sobre projetos de valor superior a 10 milhões de dólares.

PA U L O VA R E L A → Paulo Varela é licenciado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, com Pós-graduações em Gestão e Direção de Empresas. → É Administrador da Galp Marketing Internacional SA. Em representação da Galp Energia SA, exerce também funções de Presidente da Direcção da CCIPA – Câmara de Comércio e Indústria Portugal Angola. → De 2002 até 2014 foi Vice-Presidente do Conselho de Administração do Grupo Visabeira e desde 2006 de Presidente do Conselho de Administração da Visabeira Global SGPS SA. Entre novembro de 2009 e maio de 2014 exerceu funções de Presidente do Conselho de Administração da Vista Alegre Atlantis, S.A. → Foi Presidente do Conselho de Administração da Visabeira Moçambique SA de 1999 a 2014 e Presidente do Conselho de Administração da Visabeira Angola SA, desde 2002 a 2014. Foi também Administrador não executivo no Banco Único (Moçambique), PCI – Parque de Ciência e Inovação Aveiro SA.

O “pacote” de medidas adotadas pelo Governo angolano é, no entanto, mais vasto e reconhece a impossibilidade de o país cumprir, sozinho e atempadamente, os seus compromissos, o que torna fundamental encontrar fontes alternativas de finan‑ ciamento, internas e externas, públicas e privadas, em moeda nacional e em divisas, capazes de assegurar a satisfação das necessidades básicas da população e o desenvolvimento de projetos prioritários e indispensáveis para o país. Nesta sequência, o Banco Central de Angola colocou, durante o ano transato, dívida em títulos e obrigações do tesouro em moeda nacional, indexados ao dólar norte­‑americano; negociou finan‑ ciamentos diversos junto da banca internacional (Goldman Sachs, Bilbao Vizcaya Argentaria, Santander, Deutsche Bank); das insti‑ tuições multilaterais de desenvolvimento (Banco Mundial, prin‑ cipalmente através do BIRD; BAD e União Europeia); de empresas multinacionais (GemCorp Capital); doutros países através da cooperação bilateral (com destaque para a linha de 6 mil milhões de dólares negociada com a China, em junho); colocou 1,5 mil milhões de dólares de dívida soberana na Bolsa de Londres (euro‑ bonds), numa operação que foi a primeira experiência do país nos mercados financeiros internacionais e permitiu aferir da boa recetividade de Angola por parte destes. A par dos financiamentos e como forma de preservar o valor das reservas líquidas internacionais sem grandes oscilações (cobrem, presentemente, 5 a 6 meses de importações), o Governo optou, também, por dilatar o prazo dos pagamentos ao exterior e escaloná­‑lo de acordo com uma lista de prioridades definida pelo banco central, numa tentativa de conter o fluxo de saída de divisas. Estas medidas levaram fornecedores a suspender as exportações e, em consequência, à escassez de alguns produtos no mercado; à retração na importação de mercadorias – o setor automóvel foi dos mais penalizados; à suspensão da atividade de indústrias cuja produção assenta na importação de matérias­ ‑primas – cervejeiras, moageiras, produtos lácteos, vidreiras; à paralisação de obras diversas e ao aumento do desemprego. Foi, então, necessário aprovar legislação que atualizasse o enqua‑ dramento da crise e minimizasse os efeitos nefastos da mesma sobre a população, pelo que, por via da Pauta Aduaneira e do Regulamento do Imposto de Consumo, foi aumentada a tributação dos produtos de luxo, foram desonerados os produtos essenciais (principalmente os que compõem o cabaz de produtos básicos) e a gasolina e o gasóleo produzidos no país passaram a ser tributados. Foram, ainda, aprovados novos Códigos dos Valores Mobiliários e do Arrendamento Urbano e uma nova Lei Geral do Trabalho.

128


fullcover

A escassez de divisas e a contração nas importações levaram a uma desvalorização acentuada e contínua do Kwanza face ao dólar (24% em 2015) e ao euro, à subida dos preços e ao aumento da inflação, cuja taxa disparou para mais de 17% nos primeiros meses de 2016 (a taxa mais alta, e não obstante inferior a este valor, registou­‑se em 2010 com 15,31%, tendo registado 14% em 2009). Neste sentido, e tendo como propósito conter a especulação dos preços dos produtos essenciais, o Executivo adotou, em fevereiro de 2016, novas medidas tendo, para o efeito: • criado um Conselho Nacional de Preços, presidido pelo ministro das Finanças e integrando os ministros da Economia, do Planeamento e do Desenvolvimento Territorial, do Comércio, da Agricultura e das Pescas e dos Transportes e o governador do BNA, com competência para propor a formulação da política nacional de preços a aprovar pelo Executivo, traçar e gerir a execução das “políticas de regu‑ lação do mercado” e acompanhar a “atividade desenvolvida no domínio dos preços”;

No domínio mineral, Angola possui recursos que variam entre os diamantes (cuja produção em 2016 deverá atingir cerca de 9 milhões de quilates), as rochas ornamentais (granitos, mármores, calcário), os materiais de construção (areias, argila, gravilha) e os minérios (ouro, sílica, mercúrio).

129


M D S  m a g a z i n e

• criado uma lista de “preços vigiados”, que inclui 32 produtos e serviços, como arroz, leite e pão; • estipulado que seja o Governo a fixar os preços do gás, do petróleo iluminante, da água canalizada, da eletricidade e das tarifas do transporte público coletivo urbano.

Áreas de atuação privilegiada No âmbito da política de diversificação económica, é de realçar a importância que o Executivo vem dando ao setor primário (“Angola troca ouro negro por ouro verde”, segundo a Euronews), fundamental na medida em que assegura a satisfação das neces‑ sidades básicas da população, permite substituir uma parte substancial das importações e diminuir a saída de divisas. Foram implementados programas de desenvolvimento rural e pecuário, melhorado e alargado o fornecimento de água às zonas rurais (Programa Água para Todos), atribuídas sementes e instru‑ mentos de trabalho aos agricultores, adotado um programa de comércio rural com o propósito de estimular a agroindústria e a pecuária; as grandes fazendas cafeícolas investem, novamente, na produção e exportação de café, dado que os pés de café conti‑ nuam a existir, o que permite “saltar” o investimento inicial. Também as pescas foram objeto de um cuidado especial, com a concessão de incentivos, nomeadamente à pesca artesanal (que envolve cerca de 500 mil famílias), por via da atribuição de licenças, embarcações e redes. No domínio mineral, Angola possui recursos que variam entre os diamantes (cuja produção em 2016 deverá atingir cerca de 9 milhões de quilates), as rochas ornamentais (granitos, mármores, calcário), os materiais de construção (areias, argila, gravilha) e os minérios (ouro, sílica, mercúrio). É um setor com grandes potencialidades de crescimento, uma vez que as capacidades de exploração e transformação existentes são

A mais relevante das diversas medidas preconizadas pelo Governo Angolano foi a decisão de diversificar a economia: fomentar o investimento em áreas não petrolíferas (os recursos naturais existentes são abundantes e encontram-se nos mais diversos setores económicos), nomeadamente as relacionadas com a indústria, e desenvolver a produção do setor primário, nomeadamente a agricultura. 130

insuficientes, continuando as empresas a importar materiais de construção acabados ou a exportar rochas em bruto e depois a importá­‑las transformadas sob as mais diversas formas. Esta é, aliás, uma questão paralela ao setor madeireiro: as dificul‑ dades no acesso e no transporte dos troncos a partir dos locais de extração e a falta de energia elétrica nos locais de transformação (a utilização de geradores leva ao aumento dos custos das estân‑ cias, o que pode inviabilizar a sua atividade) impedem que os recursos deste setor se encontrem integralmente aproveitados. No domínio energético e mais concretamente da produção de energia elétrica, Angola, cujo potencial hídrico é o segundo maior da África austral, avançou para a conclusão e entrada em funcionamento de obras emblemáticas e indispensáveis como as centrais hidroelétricas de Capanda, Cambambe (a segunda barragem, na província do Kwanza Norte, vai fornecer 960 megawatts adicionais de energia, com a entrada em funciona‑ mento da primeira das quatro turbinas instaladas, já a partir de junho de 2016), Laúca (65% dos trabalhos de construção estão concluídos e as duas primeiras turbinas estarão operacionais em junho de 2017, com uma produção de 267 megawatts de energia, que será aumentada em 77 megawatts com a entrada em funcio‑ namento da terceira turbina, em dezembro do mesmo ano) e a barragem de ciclo combinado do Soyo (produzirá energia a partir de gás natural, em 2017, num total de 750 megawatts). Apesar de o projeto energético de Angola ser de longo prazo e carecer de avul‑ tados investimentos por parte do Executivo angolano e dos seus parceiros, para a produção como para a distribuição de energia, é um projeto que exige conclusão urgente, pois dele depende a viabilização da indústria nacional. O ambiente é outra área a que o Executivo angolano dedica muita atenção: os estudos de impacto ambiental tornaram­‑se obrigatórios em determinados projetos, as empresas de consul‑ toria passaram a estar registadas, são apoiados programas de proteção da fauna e flora locais através do combate à caça furtiva e ao abate de espécies em vias de extinção, incentiva­‑se a criação de reservas naturais (com destaque para o parque transfrontei‑ riço Kaza, dado o grande impacto, também, no setor do turismo). Na sequência da sua participação na 21ª Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP21), Angola recebeu, em 5 de junho de 2016, as celebrações oficiais do Dia Mundial do Ambiente, sob o tema “A Luta contra o Comércio Ilegal da Fauna e da Flora Selvagens”, tema de grande importância e atualidade no e para o continente africano. A logística é outra prioridade para Angola: há que fazer chegar a produção aos consumidores finais. As principais vias dos caminhos­‑de­‑ferro foram reabilitadas; as estradas e pontes continuam em recuperação; a construção do porto de águas profundas do Caio, em Cabinda, terá início no 1º trimestre de 2016; estão em implementação projetos diversos que visam melhorar a qualidade do tráfego na capital e arredores, nomea‑ damente através da repavimentação das principais artérias e da disponibilização de ligações fluviárias de passageiros entre Luanda e as zonas limítrofes.


fullcover

2016: preparando o futuro Não obstante todos os esforços e medidas adotadas pelo Executivo e os resultados positivos daí advenientes, 2016 não começou da melhor forma para Angola: o preço do petróleo continua a “cair” nos mercados internacionais, com algumas pequenas subidas logo seguidas por novas descidas e o contexto geopolítico no Médio Oriente (conflito entre o Irão e a Arábia Saudita e o regresso do Irão ao mercado petrolífero) não tem faci‑ litado a subida e a estabilidade internacional dos preços. Alguns dos problemas neste início de ano são, contudo, indi‑ ferentes à crise da cotação do petróleo (embora contribuam para piorar o seu impacto), têm a sua origem no final de 2015 e são igualmente gravosos para Angola e as suas relações econó‑ micas e empresariais externas: em novembro, a Reserva Federal dos Estados Unidos suspendeu, através dos bancos norte­ ‑americanos, a venda de dólares à banca angolana, alegando a não conformidade do sistema financeiro do país com as regras aprovadas internacionalmente, no que concerne ao branquea‑ mento de capitais e ao financiamento ao terrorismo. Aliada à crise da cotação do preço do petróleo, esta medida tem contri‑ buído para a falta de divisas no país, e, por seu turno, para a forte escalada dos preços. O Banco Central Angolano adotou, então, as iniciativas recomen‑ dadas pelo Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI), de onde se destacam a reforma regulamentar e a entrada em vigor de 23 de 41 novos regulamentos, nomeadamente o licenciamento de bancos, a governação de risco e a gestão de créditos; a definição de um “quadro jurídico apropriado”; o desenvolvimento de “procedi‑ mentos automatizados de vigilância” dos clientes “de forma mais rápida e precisa, levando a um melhor controlo das transações em curso e vigilância dos mesmos”; a autonomia da Unidade de Informação Financeira (UIF) e recomendação de “maior coesão e melhoria da qualidade dos relatórios” ao setor privado. Fruto das alterações introduzidas, e tendo por base a visita dos técnicos do GAFI a Angola em janeiro do corrente ano (“nenhum ativo relacionado [com o] financiamento ao terrorismo foi iden‑ tificado”), o BNA anunciou, em finais de fevereiro, que o país “saiu do radar internacional da vigilância sobre branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo”, devido ao “cumpri‑ mento escrupuloso das regras de compliance” por Angola e respetivas instituições bancárias nacionais”. É justamente expectável que este reconhecimento e os proce‑ dimentos inerentes venham a aliviar, em breve, as graves difi‑ culdades dos bancos angolanos no acesso a dólares no mercado internacional e incrementar a respetiva atividade, uma vez que o sistema financeiro angolano é desenvolvido, está a par do melhor que se faz na Europa, é merecedor de prémios interna‑ cionais que reconhecem a qualidade do trabalho desenvolvido e o colocam no primeiro lugar entre a banca africana. Ainda neste domínio, cabe a menção ao setor segurador nacional que teve, em 2015, o ano de referência à sua consolidação e cres‑ cimento, com a criação de novos produtos, adaptados às novas

necessidades do país; mais empresas, maiores e melhores cober‑ turas, que têm vindo a despertar o interesse de empresas do setor com origem em Portugal e na África do Sul, nomeadamente. A par da entrada em vigor do OGE para 2016, o Governo angolano aprovou uma estratégia para sair da crise financeira, visando “iniciar um novo ciclo económico de estabilidade não depen‑ dente do petróleo” “assente no pressuposto da substituição do petróleo como principal fonte de receita fiscal” e que passará pela implementação de uma série de medidas em termos fiscais, de política monetária, de comércio externo e do setor da economia real: o Executivo procurará “assegurar a expansão controlada do défice e da dívida tendo em vista a recuperação económica, o aumento dos financiamentos e a melhoria da eficiência e da eficácia do investimento estrangeiro, bem como adotar medidas diversas e incentivos que promovam as exportações no curto prazo”. As autoridades angolanas preveem, ainda, adequar “o calendário de pagamento da dívida pública; aumentar a receita fiscal não petrolífera; otimizar os custos públicos com pessoal, as pensões, as operações e a aquisição de bens financeiros; racio‑ nalizar a importação de bens e serviços e aumentar, em geral, a produção interna destinada à cesta básica e às exportações”. Finalmente, e no domínio da reforma fiscal, o Conselho de Ministros aprovou uma proposta de lei que permitirá a criação de um regime especial sobre as operações e transações bancá‑ rias, que permitirá aumentar o nível de receitas e o cruzamento das transações bancárias realizadas pelos contribuintes. Apesar de o Executivo angolano ter atuado desde os primeiros sinais de crise, através de políticas direcionadas e concertadas, a acentuada deterioração do preço do petróleo no contexto inter‑ nacional, o aumento exponencial dos stocks disponíveis, devido ao aumento da oferta e à redução da procura (regresso de países produtores ao mercado internacional, caso do Irão; a não impo‑ sição de restrições à produção por parte da OPEP; o apareci‑ mento dos Estados Unidos, autónomos em termos energéticos, como exportadores de petróleo de xisto; a redução do consumo na Europa, em consequência das crises económicas e das alte‑ rações climáticas; o abrandamento do ritmo de crescimento da economia chinesa para 7% em 2015, a taxa mais baixa dos últimos 25 anos, com a inerente redução das importações prove‑ nientes de Angola, o seu maior fornecedor de crude), são alguns dos fatores que têm impedido as medidas adotadas de produ‑ zirem os efeitos devidos e esperados, tendo até contribuído para o agravamento da crise em 2015. Este contexto internacional difícil tem afetado sobremaneira a relação de Angola com os seus parceiros externos, também com Portugal, principalmente porque não é, ainda, previsível o seu termo. Se, por um lado, Angola não está em recessão económica e cresceu 3% em 2015, por outro lado e mesmo sem recessão, é um facto que 2016 será um ano de contenção e austeridade, refletidas no défice de 5,5% do PIB previsto no OGE. Que, não obstante, prevê também um crescimento económico de 3,3%, um aumento de 48% na riqueza obtida pelo setor petrolífero e de 12% por parte do setor não petrolífero.

131


M D S  m a g a z i n e

Destacamos, também, a edição de 2016 do estudo doing busi‑ ness, no qual o Banco Mundial coloca Angola duas posições acima da que ocupava em 2015 (183 para 181), face à redução dos encargos com a constituição de empresas e às medidas facilita‑ doras do seu registo, o que significa que o ambiente empresarial melhorou. Não está tudo feito… mas está melhor! Enquanto o (lento) processo de diversificação da economia avança, a recuperação económica e financeira de Angola depende do aumento do preço do petróleo no mercado externo o que, segundo o FMI, poderá ocorrer a partir de finais de 2016. A passagem de um país do estádio de monoprodutor e monoex‑ portador para um estádio de economia industrializada e diver‑ sificada não é fácil nem rápida, é, antes, um desiderato moroso e muito trabalhoso que implica persistência mental, capaci‑ dade financeira e uma grande aposta na formação da mão de obra local. Se, contudo, um projeto de internacionalização for encarado numa perspetiva de médio ou longo prazo, de fixação da empresa e do empresário no mercado, os custos de estrutura tendem a baixar: grande parte dos trabalhadores expatriados pode ser substituída por trabalhadores qualificados locais; se o projeto tiver “raiz” angolana, ou seja, se estiver instalado local‑ mente, e ainda mais se envolver sócios nacionais, beneficia de uma maior recetividade por parte dos consumidores locais; sendo uma empresa de direito angolano, pode recorrer a finan‑ ciamentos, programas e apoios concedidos pelas entidades oficiais (programa Angola Invest, do ministério da Economia), pelo Banco Angolano de Desenvolvimento ou ainda pela banca angolana, uma vez que não há falta de moeda nacional e o crédito é concedido a taxas baixas; Angola tem múltiplos recursos natu‑ rais que podem servir de matéria­‑prima a diversas indústrias, tornando o empresário independente da disponibilidade de divisas por parte da banca comercial. Na sessão de abertura da Conferência 40 Anos de Independência de Angola – Construir um Futuro Sustentável, decor‑ rida em Lisboa, em 29 de fevereiro, o Embaixador angolano em Portugal, Professor Doutor José Marcos Barrica, afirmou que “Em Angola não há crise que resista, é tudo uma questão de tempo”! A crise económica e financeira é passageira e o país é conhecido pela sua resiliência na superação das dificuldades: a história está marcada por situações de adversidade mas também de superação e progresso. A CCIPA também acredita que o Executivo angolano está a fazer tudo o que está ao seu alcance para ultrapassar esta fase complicada da história económica de Angola e que, uma vez ultrapassada a crise, nada será como dantes: as características da economia angolana serão diferentes e isso exigirá um paradigma diferente para as rela‑ ções bilaterais. Mais do que nunca será preciso aproveitar as siner‑ gias existentes, a identidade cultural partilhada e a língua comum, pois é do interesse de todos os envolvidos, portugueses e angolanos, que a transição para uma maior aposta na produção local seja feita de forma gradual, assente em parcerias sustentáveis, incentivadas e apoiadas pelas autoridades dos dois países.

132

As empresas e os empresários portugueses já provaram estar à altura dos desafios e das necessidades que o desenvolvimento socioeconómico de Angola implica: estão presentes em todas as Províncias, atuam em todos os setores de atividade e dispõem de todas as condições para continuarem a ser parceiros sempre presentes de Angola. •

A crise económica e financeira é passageira e o país é conhecido pela sua resiliência na superação das dificuldades: a história está marcada por situações de adversidade mas também de superação e progresso.



M D S  m a g a z i n e

Uma visão de (e para) Moçambique Com base no discurso de Prakash Ratilal “Refelexões sobre o Percurso dos 40 anos da Economia de Moçambique”, proferido em 29 de Junho de 2015

P R A K A S H R AT I L A L → Prakash Ratilal tem um percurso profissional riquíssimo, que iniciou ainda estudante, no Banco do Fomento Nacional em Lisboa, tendo­‑se licenciado em Economia, aos 24 anos, no Instituto Superior de Ciências Económica e Financeiras (ISCEF) na Faculdade de Economia da Universidade Técnica de Lisboa. → Ainda nesse ano, 1975, o ano de independência do seu país, Moçambique, é nomeado Presidente do Conselho de Administração do Montepio de Moçambique, vindo a assumir, sempre muito cedo, funções da maior responsabilidade como a de Vice­ ‑Governador do Banco de Moçambique aos 27 anos e Governador do mesmo banco aos 31. → Depois de uma colaboração ativa com as Nações Unidas, onde desempenhou diferentes funções, desde consultor

134

junto do Governo de Angola e do Governo de Timor Leste, a membro do Painel de Pessoas Eminentes para a Reforma das Nações Unidas e Conselheiro Especial do Presidente Xanana Gusmão, até 2001, assumiu nesse mesmo ano a presidência do Moza Banco, acumulando ainda funções de presidente do Conselho de Administração da Moçambique Capitais, SA.. → Prakash Ratilal assinala como lições mais relevantes a retirar do seu percurso, a necessidade de ousar sem ter receio de falhar, a de nunca desistir, a de investir em pessoas que possam transformar ideias em realidades e, finalmente, a de perceber que o sucesso resulta de um envolvimento do maior número de stakeholders e de uma visão e estratégia consensuais, assim como de uma adequada partilha de protagonismo e resultados.


fullcover

Prakash Ratilal.

Prakash Ratilal nasceu em Moçambique em Março de 1950. Participou, in loco, no processo que conduziu à independência nacional e na construção do primeiro Estado Moçambique, sendo um dos protagonistas de uma história de resiliência e de superação que partilhou com a fullcover.

No discurso que proferiu no Polana Hotel, em Maputo, em Junho de 2015, Prakash Ratilal recorda, de forma notável, e numa perspetiva económica, mas sem a desligar do contexto político e social, o percurso de Moçambique desde a sua independência, em 25 de Junho de 1975. E fá­‑lo, começando por explicar o contexto econó‑ mico mundial através de “uma análise fria dos aconteci‑ mentos que ocorreram no período imediatamente ante‑ rior e que impactaram e condicionaram o futuro” do país, apontando como exemplo desses fatores “a desmonetari‑ zação do preço oficial do ouro, que alterou “para sempre os preços relativos mundiais”; a alteração do regime de taxa de câmbios fixa para o “sistema de câmbios flexí‑ veis” e, finalmente “o primeiro choque de petróleo: aumento drástico de 2,90 dólares para 11,65 dólares o barril de petróleo em apenas 3 meses!”. Todos estes fatores – continua Prakash Ratilal – tiveram efeitos devastadores num “país pobre como Moçambique, com instituições frágeis e grande carência de quadros, a ascender à independência (…) contando apenas com exportações e produtos agrícolas”. Já nos últimos anos anteriores à independência a “economia colonial apresentava importantes desequilíbrios estru‑ turais na balança de pagamentos e na balança comercial”. Prakash Ratilal recorda que “a independência de Moçambique aconteceu num espaço de grande confron‑ tação Este­ ‑ Oeste, já que os movimentos de indepen‑ dência não haviam sido apoiados pelos países ocidentais, com exceção dos países nórdicos”. Por outro lado, acres‑ centa: “O primeiro governo de Moçambique indepen‑ dente, composto na sua maioria por jovens com menos de 35 anos de idade, com pouca experiência de gestão social, económica e financeira, tinha a missão de assegurar a unidade nacional, construir o Estado, transformar profundamente a economia e a sociedade”. Missão gigan‑ tesca, com efeito, que incluía assegurar o funcionamento da economia (num país em que a maior parte dos lugares de chefia no comércio, indústria e serviços haviam sido anteriormente assegurados por colonos, que entretanto tinham abandonado o país), investir na educação (“Só 7% da população com mais de 7 anos sabia ler e escrever (…) e só havia uma Universidade em todo o país”), criar cuidados de saúde (“quase inexistentes para a maioria da população (…) esperança de vida média era de 44 anos”) e, finalmente, a necessidade de “edificar as instituições do Estado, quase sempre de raiz!”. A situação após a independência foi difícil, com “grande escassez de quadros técnicos e pouca expe‑ riência na gestão da vida económica”. Politicamente houve também muita instabilidade, na sequência de ataques do então regime Rodésia do Sul, condenado pelas Nações Unidas pela sua declaração unilateral de inde‑ pendência de cariz racista, que destruíram importantes infraestruturas numa guerra que levou a “prejuízos de várias centenas de milhões de dólares” segundo as diversas agências das Nações Unidas. Mas o Governo não baixou os braços, e Prakash Ratilal recorda momentos decisivos para o país: “O Governo

135


M D S  m a g a z i n e

lança uma ofensiva organizacional para a reorgani‑ zação da produção e circulação e mercadorias (…); fomenta a produção familiar e as zonas verdes” e, igual‑ mente, decide privatizar certos setores de atividade que, entende, não são função sua. Após 1980, Moçambique estreita relações com o Ocidente, nomeadamente com o Reino Unido. Segue­‑se “um período de relativa tranquilidade e paz”, durante o qual se acelera “o processo de formação intensiva de quadros”; se procede “à troca da moeda e à introdução do Metical como moeda nacional”; se inicia ”o estudo para a adesão ao FMI e ao grupo Banco Mundial, concretizada em 1984”; se elabora “o Plano Prospectivo Indicativo – PPI ‑­ ” com o objetivo de “vencer o subdesenvolvimento com base nos recursos naturais que já eram conhecidos na época” e, finalmente e a partir de 1982, se aponta para “o fomento do setor privado nacional e o início da aber‑ tura ao capital estrangeiro”. Houve, a partir de finais dos anos 80, um período de “terrível (…) desestabilização”, com “declínio geral da produção…desvalorização acelerada da moeda no mercado paralelo”, necessidade de introdução de “cartões de racionamento nas cidades para assegurar o essencial de alimentos às populações” e também “racio‑ namento de combustível que foi generosamente forne‑ cido com créditos concessionais pela Argélia, Líbia, Iraque e Angola”. Esta “guerra de desestabilização exigiu uma forte ação política, económica e diplomática”, com várias missões a países estrangeiros, como “Portugal, França e Reino Unido”, a assinatura de um acordo de boa vizinhança com a África do Sul, a conclusão da “1.ª reestruturação da divida externa de Moçambique” e a elaboração do “Programa de Ação Económica que permitia maior cres‑ cimento do setor privado em Moçambique, o que faci‑ litou a mobilização de novos fundos para a economia nacional”. Finalmente, após a adesão formal do país ao FMI, o Presidente de Moçambique, Samora Machel, é recebido em Washington pelo Presidente Ronald Reagan dos EUA. A situação económica do país melhorava e a visão que o mundo tinha do próprio país também. No entanto, Moçambique vai atravessar alguns anos de grandes provações, devido à desestabilização potenciada pelo regime do ´apartheid´, conhecida como a Guerra de 16 anos. Como conta o nosso interlocutor “nos finais dos anos 80, sob os efeitos das destruições e das sucessivas secas e inundações, a sociedade moçambicana viveu uma tragédia humana de grandes proporções, que era pouco conhecida no mundo”. E acrescenta: “Em 1989 escrevi um livro Enfrentar o Desafio onde, com base nos dados das Nações Unidas, escrevi que 200.000 crianças não sabiam do paradeiro dos seus pais e mais de 5,6 milhões estavam deslocadas e afetadas, dos quais cerca de um milhão estavam refugiadas nos países vizinhos”. Prakash Ratilal sublinha a importância da colaboração de várias ONGs, das Nações Unidas e dos Ministérios, que

136

A sua visão relativamente ao mercado de risco e seguros em Moçambique está estreitamente ligada ao desenvolvimento económico do país que, na sua opinião, vive momentos de grande esperança, com a possibilidade de, verificando­‑se uma conjugação positiva de fatores, Moçambique poder, a partir de anos 2020, tornar­‑se num dos países com maior crescimento económico à escala mundial. Prakash Ratilal prevê que este crescimento venha a exigir um conjunto de serviços financeiros de dimensão significativa, nos quais serão de destacar os serviços de seguro e de resseguro, e naturalmente de brokers de seguros, sendo de prever o seu crescimento exponencial. Será necessário cobrir os diversos riscos associados ao desenvolvimento da indústria de hidrocarbonetos, de infraestruturas associadas, de desenvolvimento dos portos, caminhos de ferro, da indústria florestal, do turismo, do agronegócio, entre outros. Nessa perspetiva, entende que a gestão destes riscos e a sua transferência para o setor segurador irão requerer o reforço de especialistas de qualidade internacional atualmente não disponíveis no mercado moçambicano.

contribuíram decisivamente para salvar vidas e reabi‑ litar o país económica e socialmente. Não obstante os momentos trágicos vividos nos finais dos anos 80 e inícios da década de 90, que marcaram profundamente o povo moçambicano e que tiveram um significativo impacto na economia, Prakash Ratilal recorda que “foram os jovens da geração da indepen‑ dência que, a par dos libertadores de Moçambique, de que me orgulho de ser parte, seguraram este país nos primeiros anos”. Essa geração, conta, foi chamada a Geração de 8 de Março. Muitos aceitaram interromper os seus estudos e responderam ao apelo de se deslocarem aos distritos e às unidades de produção; vários estu‑ dantes da 8ª ou 9ª classe davam aulas às classes infe‑ riores, outros aceitaram ir estudar para o estrangeiro. Estes ocupam hoje os lugares cimeiros da vida econó‑ mica e social de Moçambique. Na fase presente, em termos de Educação, o país apre‑ senta índices promissores, apesar de ainda haver, reco‑ nhece, um longo caminho por percorrer: “Em 2012 cerca de 5,3 milhões de estudantes frequentaram o ensino primário (…) e 760.000 estudantes o secundário ESG1 e 197.000 o ESG2!”1

1 ESG (Ensino Secundário Geral).


fullcover

E prossegue: ”Se foram cometidos erros? Claro que sim. Se valeu a pena o sacrifício? Foi duro, mas claro que valeu a pena”. 40 anos depois o país construiu o presente que desfruta de altas taxas de crescimento sustentável e conta com um futuro promissor assente na exploração do gás natural (a 3ª reserva do mundo), na energia hidroelétrica, nos recursos minerais, no agro­‑negócio, no turismo e na conservação da natureza. Acrescentou que Moçambique “continua indivisível, a sociedade moçambicana é pacífica (…) as divergências tendem a ser resolvidas pelos próprios moçambicanos. Os ciclos eleitorais regulares já permitem a alternância democrática. O País está em franco progresso”. Existem ainda desafios, como “a paz e a estabilidade, a criação de emprego, a promoção do mérito e do empreende‑ dorismo, a redução dos desequilíbrios e assimetrias, a distri‑ buição mais equitativa e uma sociedade mais inclusiva”. E Prakash Ratilal termina, deixando­‑nos a sua parti‑ cular visão para Moçambique: “As realidades em presença, os recursos naturais disponíveis em certas circunstâncias que dependem dos moçambicanos e, naturalmente, do mercado mundial, podem mudar a face de Moçambique a bem de todos os cidadãos. Isso exige: entendimento entre os diversos atores políticos e sociais com vista ao restabelecimento definitivo da paz (…) foco prioritário no desenvolvimento agrário e na promoção geral de competências e do ensino (…) políticas públicas para o desenvolvimento de uma economia competitiva;

maior capacidade de gerenciamento de empresas públicas; o fortalecimento da qualidade de gestão das micro, pequenas e médias empresas (PMEs), na promoção de um clima de negócios capaz de atrair maior investi‑ mento num ambiente credível de resolução e conflitos em matéria de negócios e o cumprimento de atos e contratos (…) punição severa pelas práticas de corrupção e, finalmente, “a transparência nos actos e contratos e a…elevação da competência do aparelho do estado”. Este processo, acrescenta Prakash Ratilal, exige a “colaboração e entrega de todos os moçambicanos”, através de uma “maior coesão nacional, maior tole‑ rância pelas diferenças e crenças de cada um e polí‑ ticas mais inclusivas e distribuição mais abrangente”. E vislumbra uma “janela de oportunidade que (…) pode permitir um futuro próspero e pacífico” – uma oportuni‑ dade histórica que os moçambicanos não podem perder. Prakash Ratilal deixa­ ‑nos uma última mensagem: “Estas são tarefas que envolvem todas as gerações. Cada um deve conquistar o seu espaço e fazer coisas concretas”. A mensagem é clara: não basta haver visão – a visão tem que ser credível, assente na realidade e é preciso lançar mãos à obra e fazer. Um testemunho inspirador, sem dúvida, de um moçambicano que conhece o passado, ajudou a cons‑ truir o presente e que caminha nos destinos que cons‑ troem o futuro do seu País. •

137


M D S  m a g a z i n e

Steve Hearn A criação do broker do futuro Steve Hearn é um gestor com reconhecida capacidade e uma longa experiência de mercado, o que leva a que a sua nomeação como CEO do Grupo Cooper Gay Swett & Crawford em novembro do ano passado, sucedendo a Toby Esser, fosse recebida sem surpresa e de forma muito positiva. Na liderança da CGSC, Steve Hearn está a construir uma operação global de distribuição wholesale que será um centro de excelência e inovação, e fala à fullcover sobre o seu entusiasmo perante este desafio.

No dia 2 de novembro de 2015, Steve Hearn foi nomeado CEO do grupo Cooper Gay Swett & Crawford (CGSC), sucedendo a Toby Esser. Hearn falou com a fullcover sobre a sua contratação. “A oportunidade de inte‑ grar a CGSC era irrecusável. A empresa tem uma história impressionante e equipas muito experientes, que estão entre as melhores do mercado. A CGSC é uma grande empresa com potencial para se tornar excecional. Temos as ferramentas necessárias para crescer e uma estratégia que nos distinguirá da concorrência. Em conjunto, poderemos construir uma empresa centrada na inovação, no conhe‑ cimento e no serviço, pronta para desafiar o mercado e tornar­‑se uma força líder nos setores em que atuamos”. Steve Hearn traz para a CGSC mais de 30 anos de experiência no mercado segu‑ rador – nos setores do retalho interna‑ cional, do resseguro e wholesale. No início da carreira, foi presidente e CEO da Marsh Affinity Europe e desem‑ penhou funções na gestão de clientes, de vendas e de perdas na Marsh and Sedgwick Limited. Entre 2005 e 2008, foi presidente e CEO do Gleincairn Group, um grupo whole‑ saler privado. Em 2008, integrou a Willis depois de esta ter adquirido a Hilb Rogal

138

& Hobbs, onde exerceu vários cargos de direção, incluindo o de presidente e CEO na Willis Global, Willis Re e Willis Limited, a principal entidade regulada do grupo no mercado britânico. Antes de integrar a CGSC foi CEO adjunto da Willis Group Holdings. Entre 2014 e 2016, Steve Hearn foi presi‑ dente do London Market Group (LMG), uma instituição que procura preservar e reforçar a posição do mercado Londres no panorama segurador internacional, e da London & International Insurance Brokers’ Association (LIIBA), que repre‑ senta os interesses dos corretores de seguro e resseguro que trabalham no mercado de Londres e no mercado inter‑ nacional. É também vice­‑presidente do Instituto de Seguros de Londres. O papel de Steve Hearn como presi‑ dente do LMG tem sido reconhecido pelo Mercado de Seguros de Londres: em 2015, ganhou o prémio Reactions London Market para Personalidade do Setor e o prémio de Inovação pela iniciativa London Matters do LMG. A CGSC é um dos maiores grupos corre‑ tores globais independentes de wholesale, de gestão de subscrição e de resseguro, colocando mais de 5 mil milhões de dólares em prémios para clientes nos mercados seguradores londrino e internacional.

O grupo MDS começou a trabalhar com a Cooper Gay em 2005 e, em 2007, tornou­‑se acionista da empresa, continuando a ser um forte parceiro da CGSC. A empresa continua investida na sua estratégia de crescimento. “Steve Hearn tem a capacidade de liderança, a visão e a energia para explorar o potencial que existe nesta atividade”, afirmou Martin Sullivan, presidente executivo da CGSC. Como parte desta estratégia, a CGSC vendeu a sua unidade empresarial norte­‑americana (a CGSC North America Holdings Corporation) à BB&T Corporation. Hearn explicou: “Esta venda permitirá à CGSC evoluir e construir uma empresa que promova a mudança no mercado. Já temos os alicerces para construirmos uma empresa verdadeiramente excecional e agora temos os recursos necessários para tal”. E como conclusão reafirma: “Espero trabalhar com ainda mais membros da Brokerslink. A CGSC tem sido um membro ativo nesta rede internacional de corre‑ tores independentes de seguros desde a sua criação e acredito que continuará a desempenhar um importante papel no desenvolvimento da nossa empresa de corretagem global”. •


GLOBAL INSURANCE & RISK CONSULTANTS

MDS JACQUES GOLDENBERG: DO EGITO AO BRASIL, UM PERCURSO TRAÇADO PELA PAIXÃO ENRIQUE SCHOCH: UM MARINHEIRO NO MUNDO DOS SEGUROS O PODER DA VONTADE: DESCUBRA A NOVA MARCA MDS MDS NEWS

139


M D S  m a g a z i n e

Jacques Goldenberg Do Egito ao Brasil, um percurso traçado pela paixão

140


fullcover

São já mais de cinco as décadas que o separam da viagem que o afastou do Egito, mas Jacques Goldenberg descreve com minúcia um passado que parece distante, mas que se mantém bem presente na sua memória. “Acho interessante contar um pouco da nossa vida, das experiências, das emoções que passamos. Assim pelo menos voltamos a viajar”, confessa. Talvez por isso mesmo, pela vontade de manter presente as suas origens, o seu último companheiro de cabeceira tenha sido o livro “Nasser, a águia do Egito”1. Com um percurso profissional ímpar, Jacques Goldenberg é atualmente Diretor Internacional e de Riscos Empresariais da MDS Brasil e mais do que um profissional, é hoje um modelo e uma inspiração para muitos.

O início da carreira A queda da monarquia em 1952 e a eleição de Gamal Abdel Nasser como presidente ditaria um novo rumo para o Egito e também para Jacques Goldenberg, que com apenas 12 anos, se viu forçado a deixar o Cairo na sequência do processo de nacionalização da companhia do Canal do Suez, até então propriedade da Inglaterra. “Para algumas nacionalidades foram concedidas 24 horas para abandonar o país”, recorda. “No caso dos judeus não havia propriamente um prazo, mas o meu pai ficou preocupado com a situação” e acabaria por rumar a Israel, de onde era natural. A estadia viria a ser no entanto bastante curta e em 1958 a família de Jacques juntar­‑se­‑ia aos restantes familiares que se encontravam no Brasil. No ADN trazia já o “bichinho” dos seguros, uma herança do pai, também ele profissional do setor e, embora a medicina fosse o seu sonho, acabou por se licenciar em Administração de Empresas pela Pontifícia Universidade Católica (PUC). “Sempre quis ser médico mas quando o meu filho Dov decidiu seguir medicina, pensei, o meu sonho está de uma certa forma a concretizar­‑se”, explica. “Não me arrependo do caminho que segui, só tive resul‑ tados ótimos”.

1  N.T.: Título Original: Sinoué Gilbert ­‑ Nasser, l’aigle égyptien

Iniciou a sua carreira na área dos seguros como office boy, com apenas 17 anos. Dois anos mais tarde assumia já a função de gerente de seguros nas áreas de Automóvel, Acidentes de Trabalho, Vida, Patrimonial. O seu percurso profissional ficaria indiscutivelmente marcado pela influência do pai, durante muitos anos responsável pela gestão da carteira de seguros da Mercedes­‑Benz, no seio da própria empresa. Nessa altura Jacques chegava a ir com o pai 3 a 5 vezes por semana para a Mercedes, num período de aprendizagem que considera ter sido bastante importante e que lhe permitiu adquirir um vasto know­ ‑how no setor automóvel. Jacques recorda a realidade do setor segurador, na altura monopólio do Estado: “quando comecei, no Brasil a área dos seguros era uma coisa muito quadrada. Existia uma tarifa e era aquilo que se chama de bíblia”. Depois, dependendo das características do risco, através de um processo específico, poder­‑se­‑ia solicitar um tratamento diferente. “O meu pai dizia: está aqui a tarifa de incêndio e você vai ler do início ao fim. Era algo sem graça, mas aprendi assim, lendo as tarifas, lendo os clausulados de todas as apólices. Foi desta aprendizagem que nasceu o hábito, ainda hoje, de efetuar uma constante auditoria a tudo”, explica Jacques. O pai acabaria por criar a sua própria corretora, a Integridade, sem nunca ter perdido no entanto a ligação à Mercedes­‑Benz, na qual continuou por 23 anos, período em que manteve uma corretora cativa em sociedade com a marca alemã.

141


M D S  m a g a z i n e

Com a criação da Integridade conseguiram alcançar alguns clientes no Egito e conquistar contas importantes no Brasil, como o Banco Bozano Simonsen, a Embraer ou a Anglo American.

A paixão pelos seguros e pela vida Apesar de apaixonado confesso pelos seguros, para além do curso de Administração de Empresas, fez alguns cursos paralelos, entre eles, Técnico de Laboratório, Eletrotécnica e Análise Transacional. Fê­‑lo por divertimento, para enrique‑ cimento cultural, para ter uma visão diferente daquela que a licenciatura e a própria experiência de vida lhe deram e dão. “Gosto muito da área de seguros ao ponto de tomar café, almoço e janta de seguros”, graceja. “Seguros é uma das poucas atividades que faz com que você não se canse, não ache a vida monótona. Porque são situações que não se renovam. Existem sempre coisas novas. É preciso usar a imaginação e a criatividade”. A par do percurso profissional viu também crescer a família. Teve quatro filhos – ­ Denys, Dov, Cyntia e Ariel ­– e 6 netos. Não escondendo o carinho por todos eles, não hesita em dizer que uma das suas fontes de energia e inspiração é Denys, aquele que seguiu as pisadas do pai no mundo dos seguros e que quis o destino que seguisse uma “outra missão, num outro mundo”. Tendo sempre acompanhado a evolução do setor no Brasil e a nível global, rapidamente se apercebeu do movimento de consolidação entre os corretores e, não tendo a possibilidade de adquirir uma outra corretora, mas tendo consciência da solidez da Integridade, encetou negociações e em Agosto de 2004 junta­‑se à Lazam-MDS (corretora de seguros resultante da joint venture entre o grupo Sonae e o grupo Suzano). Quando iniciou o seu percurso na Lazam-MDS era suposto ficar o tempo suficiente para assegurar a tran‑ sição da carteira. Juntamente com 7 outros colabora‑ dores, o filho Denys acompanhou­‑o neste percurso tendo assumido a função de Diretor Comercial. Infelizmente Denys não pode terminar o seu percurso e Jacques decidiu continuar o sonho do filho.

Um encontro decisivo É por ocasião da aquisição da Integridade pela Lazam‑MDS que Jacques vem a conhecer o CEO da MDS, José Manuel Fonseca. Nos primeiros tempos trabalham em conjunto, e cria­‑se uma grande empatia entre ambos – talvez, pensa Jacques, pelo facto de ambos terem um passado de seguros em comum. Jacques reconhece em José Manuel Fonseca uma grande visão de futuro e o facto de conseguir transmitir essa vontade de planear a médio/longo prazo – sem esquecer, todavia, o presente. É nesse período que nasce a Brokerslink, e rapida‑ mente se constata que a rede à qual a Lazam pertencia anteriormente – Uniba – nada tinha a ver com o perfil da

142

MDS, pois tratava­‑se de uma rede de pequenos corretores. Ao invés, a Brokerslink era uma associação de brokers maiores e tinha outra ambição – começou como uma rede e transformou­‑se em algo maior”. O José Manuel foi pai e mãe da Brokerslink” diz Jacques, sorrindo. Para Jacques, José Manuel tem uma faceta muito humana, a par da sua visão objetiva de negócio e de uma grande exigência. Reconhece­ ‑o como um homem de cultura – conhece história, geografia, música, o mercado de seguros e resseguros, e é respeitado em todos os continentes. E, a propósito, Jacques conta­ ‑nos uma história: “Num passeio de barco em Nova Iorque, falando com o José Manuel de algumas personalidades políticas, ele disse­‑me que tinha lido dois livros fantásticos – um sobre Golda Meir e outro sobre Nasser, e aconselhou­‑mos. Li ambos com muita atenção, até porque, tendo nascido no Egipto com origem judaica ambos me interessavam. E por incrível que pareça, tocou­‑me mais a história de Nasser que a de Golda Meir – algo que só foi possível graças ao conselho do José Manuel, sem o qual nunca teria comprado esses livros!”. E conclui: “a nossa é uma amizade muito bonita”.

A relação com a MDS “Estou na MDS há 11 anos e espero ficar aqui ainda alguns anos. Eu gosto de trabalhar, sempre gostei. Até hoje não levo um Não para casa. Tento que o Não seja um Talvez e, quando possível, se torne um Sim”, refere Jacques. É com orgulho que fala do percurso da MDS, do cres‑ cente reconhecimento do mercado como “corretora técnica, ética, dedicada aos seus clientes. A MDS de hoje é fruto do trabalho de pessoas que já estiveram, que ainda estão, da filosofia, e particularmente, do facto de existir uma orientação que vem da matriz – os grupos Sonae e Suzano”. Estes dois grupos fornecem “raízes muito profundas, com fortes valores associados – serie‑ dade, pujança, solidez”. Mas acrescenta: “a imagem da empresa era muito respeitada no mercado, mas José Manuel queria uma imagem mais ousada. E o facto é que hoje estamos no topo do ranking de corretores no Brasil. José Manuel encontrou no Hélio Novaes (CEO MDS Brasil) a pessoa que tornou possível realizar a sua visão para a empresa, que continua a ser respeitada, mas também, muitas vezes, temida pelos seus concorrentes”. Jacques recorda ainda um momento muito especial para si: “Foi no aniversário dos 30 anos da MDS. Fui convidado para vir à celebração no Porto. A dada altura, qual é a minha surpresa quando José Manuel Fonseca me chama ao palco para receber um prémio, como agradecimento pela minha colaboração de 10 anos com o grupo. Este gesto tocou­‑me muito, vindo do profissional, mas também do amigo”.


fullcover

Jacques Goldenberg discursa após receber um prémio das mãos de José Manuel Fonseca no 30º aniversário da MDS.

O papel do broker no futuro e a Brokerslink

Uma energia inesgotável

“A visão do broker vendedor vai, pouco a pouco, ser substituída pelo broker consultor, aquele que orienta o cliente, as empresas sobre o melhor caminho, a melhor alternativa, a melhor forma de gerenciar todos os riscos que possam colocar o negócio em risco”, explica. “O corretor tem de aprender a ser menos vendedor, tem de ser um consultor e oferecer ao cliente instrumentos e ferramentas que facilitem as tarefas e tenham sempre uma visão geral, a qualquer momento – online”. Referindo­‑se à Brokerslink, reconhece que tem desem‑ penhado um papel importante para a MDS no Brasil. “A partir de uma ideia, constituiu­‑se uma organização mundial respeitada, reconhecida, com bases sólidas de crescimento. A ideia é que faz a força dela”.

Incansável, dentro e fora do escritório, os seus hobbies são a leitura, a música e o ginásio. Todos os dias de manhã, bem cedo vai para o ginásio, “é muito importante para mim, sinto­‑me bem. É mais do que um hobbie, faz parte da minha vida. É a minha cocaína”. E afirma com satisfação: “eu não fico velho, quem está ficando velho são os meus filhos. Eu parei no tempo. Nesta idade estou ótimo, vou continuar nela! Com ela tenho a experiência de vida, a sabedoria que os jovens têm de conquistar com o tempo”. E deixa­‑nos um aviso: “É habitual as pessoas reformarem-se a partir de uma certa idade, mas eu não tenho planos para tal. Gosto tanto do que faço e da empresa onde trabalho, que enquanto estiver bem e de saúde, estarei por cá!”. Detentor de um sentido de humor apurado afirma que “o mercado de seguros tem uma relação direta com a culi‑ nária. Sempre que você apresenta um negócio com um risco diferente, algumas pessoas falam que não temos apetite por esse tipo de risco!”. E partilha connosco o seu lema de vida: “Eu vivo o momento que é a equação entre ontem, hoje e amanhã. Hoje é o sonho de ontem, hoje sonho o amanhã”. •

143


M D S  m a g a z i n e

Enrique Schoch sempre gostou do mar e foi por isso que iniciou a sua carreira na Marinha Mercante. Este amor só poderia vir do seu lado português. “Sou bisneto de um almirante da Armada Portuguesa”, diz com orgulho. Parece até quase natural que a sua escolha profissional tenha sido a vida de marinheiro. Esteve na Marinha Mercante durante oito anos até que o destino lhe trocou as voltas. Com a queda do muro de Berlim e a desagregação da União Soviética, o mercado da nave‑ gação comercial fica saturado com a chegada de um sem número de marinheiros dos países de Leste – da Polónia, da Rússia, etc. E, de repente, Enrique percebeu que estava na hora de mudar de rumo/profissão. Felizmente, a sua formação académica tinha­‑o prepa‑ rado bem. Para além de todos os temas relacionados com a navegação, estudara muitos temas legais, de seguros, de economia marítima, entre outros, que lhe permitiram encontrar um novo rumo.

O início no mundo dos seguros

Enrique Schoch Um marinheiro no mundo dos seguros Em final de 2015 Enrique Schoch assumiu o cargo de CEO da joint venture entre a Filhet-Allard e a MDS. Em conversa com a fullcover falou­‑nos dos seus 25 anos de experiência no mercado segurador, dos planos para o futuro e da sua visão para o sucesso.

144

E é aqui que a sua vida se cruza com o mundo dos seguros. Quis um feliz acaso que, nessa altura, as companhias de seguros em Espanha procurassem pessoal para alguns dos ramos que estavam em desenvolvimento: além do Ramo Vida, o Ramo de Transportes e, neste em parti‑ cular, o seguro marítimo. Uma dessas companhias, a Sun Alliance, procurava um responsável para o departamento de Transportes. E, a 1 de outubro de 1991, Enrique acaba por ser o escolhido para ocupar esta posição, ainda sem saber “realmente” de seguros: “Eu sabia de barcos, de transportes, de negó‑ cios de mercadorias – porque tinha navegado por todo o mundo. Mas de seguros, não”. É nesse momento que surge na sua vida uma figura que se tornará determinante, o diretor do departamento de Transportes da Sun Alliance (hoje já reformado): “Tive um grande padrinho, que me ensinou tudo o que sei de seguros e ensinou­‑me à moda antiga”. Enrique recorda com carinho o tempo que passou com este verdadeiro mentor, que ao longo de vários anos, todas as tardes, lhe respondia a todas as questões que formulava, enquanto ia estudando entusiasticamente as cláusulas das apólices: “Foi uma época verdadeiramente maravilhosa”. Até a assinatura num guardanapo era suficiente para fechar um negócio: “São 500 milhões, aqui está a minha assinatura e já está”. Foi este conceito algo “romântico” de subscrever que o apaixonou. No mundo dos seguros e na amplitude de possibili‑ dades que os seguros oferecem, Enrique reconhece a grandiosidade do mar: “No final, seguramos tudo”. É possível segurar tudo, desde uma multinacional, uma petrolífera até ao negócio da esquina. E as potenciali‑ dades são infinitas. Recorda uma história que o marcou profissionalmente no seu tempo na Sun Alliance – o “pior 31 de dezembro que vivi durante muitos anos”­– quando assumiu o


fullcover

risco de uma exposição (à época com um valor aproxi‑ mado de 5 milhões de dólares) desconhecendo que não havia cobertura de resseguro para o ano seguinte. O seu diretor, a pessoa que o tinha formado, manteve a calma, disse­‑lhe que ele se equivocara mas que o risco tinha de ser assumido. “Foi aí que entendi realmente o que era um subscritor e que me tornei um”. Na Sun Alliance, tornou-se diretor de Transportes e, mais tarde, assumiu a direção de brokers e de negócio industrial pela sua “capacidade para falar com os grandes brokers do mercado”. Quando se dá a fusão com a Royal que cria a Royal Sun Alliance, assume a gestão do negócio industrial da companhia. Em 2001, quando a Liberty compra a Royal Sun Alliance em Espanha, abraça um novo desafio na sua vida. Era sabido no mercado que a companhia pretendia aban‑ donar o negócio industrial. Na época, Enrique dedicava já grande parte do seu tempo ao mercado dos brokers e quando surge o convite da EOS para assumir o cargo de Diretor Geral resolve aceitar: “Toda a gente me dizia que eu estava do lado errado da mesa, que era mais broker do que segurador, e tanto mo disseram, que acabei por acre‑ ditar”. Pouco tempo depois será nomeado CEO e durante 14 anos, até 2015, fica a gerir a EOS RISK em Espanha.

Um desafio irrecusável Em 2015, Enrique Schoch é desafiado para um projeto inovador, a joint venture em Espanha de dois brokers europeus de primeiro nível, a Filhet­ ‑Allard e a MDS. “A união de uma empresa familiar de muitas gerações e com larga experiência no setor segurador na Europa e de uma empresa com a pujança, o tamanho, a grandiosi‑ dade e o volume de negócio como a MDS foi um desafio a que não consegui resistir”. Enquanto CEO desta joint venture Enrique entende que a empresa reúne todas as condições para ser bem­‑su‑ cedida: “O mercado a que nos dirigimos é um mercado fundamentalmente de empresas e este mercado neces‑ sita de mais brokers que atuem de uma forma profis‑ sional e sejam capazes de prestar um serviço espe‑ cializado aos seus Clientes. Há, de facto, um espaço interessante a ocupar no mercado espanhol de seguros – irá haver uma diminuição do número de atores e um aumento da dimensão destes. E logicamente este movi‑ mento de unificação só pode ser levado a cabo pelas empresas líderes e pertencentes a grupos fortes, como é o nosso caso. Temos a experiência, know­‑how, profis‑ sionalismo e dimensão global e desenvolvemos soluções personalizadas à medida das necessidades dos nossos clientes, quer a nível local quer internacional”.

O futuro do setor segurador Num momento em que a economia espanhola se encontra finalmente em recuperação e Madrid está a tornar­‑se um centro de seguro e resseguro internacional para o mercado da América Latina, Enrique Schoch identifica três grandes desafios para o setor segurador espanhol. O primeiro é o impacto do Solvência II no mercado segurador. Não pondo em causa a segurança que o novo regime traz, a verdade é que levanta a questão premente da capacidade das companhias de seguros resistirem às novas imposições e de se manterem em atuação. “Quantos serão, de facto, os players que se manterão no mercado dentro de cinco anos?” O segundo é questão da dimensão (escala) e da inter‑ nacionalização. Para Enrique, apenas duas empresas no mercado espanhol corporizam estes princípios. Uma delas é a MAPFRE, que é uma empresa verdadeiramente impressionante e de âmbito internacional. A outra, ainda que num setor muito concreto – o do crédito e caução –, é a Atradius. As restantes não têm capacidade para uma aventura global, atuando esporadicamente, numa ou noutra operação. Por fim, uma temática de âmbito mais interno, a da eficiência operacional. Num momento em que a preocu‑ pação comum ao mercado das companhias de seguros é a captação de cliente, é premente assegurar que todos estão alinhados do ponto de vista de assegurar um serviço de elevada qualidade ao cliente.

O lado pessoal Nos tempos livres Enrique gosta de praticar desporto. Atualmente dedica­‑se ao padel, uma modalidade em crescimento nos últimos anos. Os comboios em minia‑ tura e a fotografia, são velhas paixões, agora relegadas para segundo plano. Quando lhe perguntamos se tem um lema de vida, sorri e confessa­‑nos: “O meu lema de vida – fazer os outros felizes – ­ mudou”. Com o tempo, Enrique percebeu que a vida é longa e por vezes dura, com muitos obstáculos pela frente. E ainda que continue a ser fundamental fazer os outros felizes, é necessário que também nós sejamos felizes: “também eu tenho de ser feliz”. •

145


146


147


M D S  m a g a z i n e

MDS NEWS

N MDS reforça aposta no mercado africano No âmbito do fortalecimento da estratégia de crescimento a nível global e do reforço das suas operações no mercado africano, o grupo MDS nomeou João Alvadia como CEO da MDS África. João Alvadia tem uma longa carreira na área dos seguros, em Portugal e África, e terá a responsabilidade de liderar e coordenar toda a operação naquele continente, com prioridade para Angola e Moçambique. Esta aposta tem por objetivo garantir uma dinâmica de crescimento, consolidando o investimento já realizado e explorando novas oportunidades de desenvolvimento.

Parceria estratégica com S21sec permite oferta pioneira de serviços de cibersegurança

148

Com o objetivo de auxiliar as organizações a lidarem com os riscos cibernéticos, a S21sec e a MDS estabeleceram uma parceria estratégica que visa disponibilizar um serviço completo de cibersegurança para o mercado empresarial a nível mundial. Esta iniciativa pioneira permite às empresas protegerem­‑se contra ataques cibernéticos, conjugando uma política ativa de prevenção baseada nas soluções de segurança da S21sec com a minimização dos possíveis impactos através dos seguros específicos disponibilizados pela MDS. O leque de serviços disponibilizados engloba desde a prevenção, deteção, análise e atuação na área da cibersegurança, até à componente de seguros para riscos cibernéticos, incluindo a avaliação da maturidade de uma organização para a segurança da informação, auditorias técnicas, ações de sensibilização e formação, monitorização contínua de segurança, equipas de resposta a incidentes críticos de segurança e análise forense, permitindo às empresas uma abordagem assertiva e concreta na gestão de riscos cibernéticos.


fullcover

MDS Brasil inaugura nova sede e aposta em inovação e sustentabilidade A MDS Brasil tem uma nova sede em São Paulo, um escritório mais amplo, eficiente e sustentável e que reflete as transformações concetuais pelas quais a empresa tem passado, apostando num ambiente onde se valoriza a troca de informações, espaços favoráveis ao conhecimento, e o recurso ao conceito de clean desk, sem mesas fixas, o que possibilita uma maior flexibilidade e mobilidade. O escritório fica situado no Eldorado Business Tower, na Avenida das Nações Unidas em Pinheiros, um edifício considerado pela Revista Exame como um dos melhores locais do Brasil para se trabalhar. O prédio foi ainda o primeiro da América Latina a obter LEED® C&S – Platinum, o mais alto nível de certificação ambiental do mundo.

149


M D S  m a g a z i n e

Estratégia de desenvolvimento global reforçada com contratação de Frederico Casal­‑Ribeiro O grupo MDS reforçou a sua equipa de gestão com a contratação de Frederico Casal­‑Ribeiro, reputado executivo com vasta uma vasta experiência internacional no setor dos seguros, e que assume agora o cargo de Global Business Developer. Frederico Casal­‑Ribeiro conta com um relevante percurso internacional no setor, tendo passado por mercados como a Grécia, México, Rússia, Estados Unidos e Brasil, para além de Portugal. No novo cargo tem como missão potenciar as competências da MDS em todas as geografias, alavancando sinergias entre as diferentes equipas locais de forma a apoiar o crescimento da base de clientes nas diferentes linhas de negócio. Esta contratação veio reforçar a aposta da MDS na internacionalização como um vetor de crescimento, procurando responder às necessidades das empresas portuguesas, mas também colocando o conhecimento e competências ao serviço de empresas a nível mundial, dada a solidez da nossa oferta e capacidade de inovação.

MDS e Brokerslink na 24ª edição da AMRAE Jacqueline Legrand representou a MDS e a Brokerslink na 24ª edição dos Encontros da AMRAE ­‑ Association pour le Management des Risques et des Assurances de l’Entreprise, que decorreram em Lille, França, entre 3 e 5 de fevereiro. Esta presença espelha a contínua aposta do grupo MDS no apoio ao número crescente de investidores franceses em Portugal. Fundada em 1993, a AMRAE é a associação que representa a comunidade de gestão de risco e de seguros francesa. Baseada em França, a sua atividade tem uma forte expressão nos países de língua francesa da África do Norte e Ocidental.

MDS apoia campeão em título no International GT Open Miguel Ramos volta a envergar a marca MDS no International GT Open, que se iniciou em 23 de abril em Portugal, no circuito do Estoril. O piloto português vai estar ao volante de um BMW M6 GT3, com a equipa Teo Martín, e terá como companheiro de carro o espanhol Roldán Rodriguez. O International GT Open contará ainda com passagens pelos circuitos de Spa­‑Francorchamps, Paul Ricard, Silverstone, Red Bull Ring, Monza, terminado em Barcelona no dia 6 de outubro.

150


fullcover

Maílson da Nóbrega no MDS TALKS’ A convite da MDS o reputado orador Maílson da Nóbrega esteve em Portugal para abordar as “Perspetivas da Economia Brasileira” naquela que foi a quarta edição do MDS Talks’. Economista, homem de Estado, Maílson da Nóbrega foi ministro da Fazenda entre 1988 e 1990, um dos períodos mais difíceis da economia brasileira. Desde os 20 anos que se dedicou à vida pública envolvendo­‑se em ações governamentais, obtendo um conhecimento profundo da economia brasileira, tendo desempenhado um papel crucial nas áreas de Financiamento, Negociação e Relações com o Exterior. Conta já com cinco livros publicados, inclusive a sua autobiografia – “Além do Feijão com Arroz” ­‑, e vários artigos em jornais e revistas especializadas, sendo ainda Colunista da Revista VEJA. Em 2013 foi considerado Economista do ano, prémio concedido pela Ordem dos Economistas do Brasil.

151


M D S  m a g a z i n e

O mercado de saúde brasileiro POR GUSTAVO QUINTÃO

Ilustração por Tiago Galo

Texto escrito em Português do Brasil

152


fullcover

Gustavo Quintão, Diretor de Employee Benefits da MDS Brasil, falou com a fullcover sobre os desafios e as tendências do setor.

O mercado brasileiro de saúde passa por um momento de profundas transformações. É o início de um ciclo disruptivo com duas origens: o fim da proibição de investimento estrangeiro em empresas de assistência à saúde no Brasil e a necessidade de reinventar o modelo existente para permitir a sua sustentabilidade. De acordo com a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), o setor foi respon‑ sável por 9,3% do PIB e, 2014. Em 2015, foi o terceiro maior em geração de empregos com quatro milhões de trabalhadores e um total de 72,2 milhões de beneficiários(sendo 50,3 milhões em planos médicos e 21,9 milhões em planos odontológicos). A mesma instituição aponta que os principais desejos da popu‑ lação brasileira por ordem de prioridade são: educação, casa própria e plano de saúde. Todos estes números mostram oportuni‑ dades de investimento para o capital inter‑ nacional e um movimento de consolidação e profissionalização do segmento brasileiro de saúde. Tal movimento só passou a ocorrer de maneira clara e estruturada em 2015, após a sanção da Lei 13.097/2015, que altera a Lei 8.080/1990 e “permite a participação direta ou indireta, inclusive controle, de empresas ou de capital estrangeiro na assistência à saúde”. Assim, empresas como United Health, Bain Capital, Grupo Sanitas Internacional, dentre outras, já se posicionaram como impor‑ tantes players no mercado brasileiro. A United Health, por exemplo, inaugurou recentemente o Américas Medical City. Ele é um grande complexo médico (com dois hospitais, um centro de treinamento e mais de 72 mil metros quadrados) que será de grande importância na infraestrutura de atendimento médico nos Jogos Olímpicos de 2016. Apesar do tamanho e das oportunidades, o modelo brasileiro de saúde privada apresenta e sintomas de uma enfermidade grave com repercussões econômico­ ‑financeiras preocu‑ pantes. O índice de Variação do Custo Médico Hospitalar (VCMH, também conhecido como “inflação médica”), apurado pelo Instituto de Saúde Suplementar (IESS), aponta um desco‑ lamento em relação à inflação geral. Os custos

médios de internações pagas por planos de saúde individuais cresceram 53,7% entre 2008 e 2012. No mesmo período, a inflação acumulada pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) foi de 24,3%. Em relatório publicado em 2015 foi apontado: “A variação dos custos médico­‑hospitalares foi de 17,1% para o período de 12 meses encer‑ rado em junho de 2015, mantendo­ ‑se supe‑ rior à variação da inflação geral (IPCA) que foi de 8,9%, para o mesmo período. Durante todo o trimestre de abril a junho de 2015, o índice apresenta crescimento. No primeiro semestre de 2015 o aumento da VCMH foi de 1,8 ponto percentual: de 15,3% em janeiro de 2015 para 17,1% em junho de 2015”. Dentre as causas possíveis para este fenô‑ meno destacam­‑se basicamente o desperdício e a incorporação de novas tecnologias (novos medicamentos, exames complementares mais modernos, procedimentos de alta complexi‑ dade e de maior custo). De acordo com relatório da Abramge, as fontes de desperdício se distri‑ buem percentualmente da seguinte forma: • • • • • •

burocracia administrativa 27,2%, tratamento excessivo 21,1%, fraudes e abusos 19,4%, sobrepreço 14,4%, falhas no atendimento 14,1%, falta de coordenação do atendimento 3,8%.

Com o intuito de remodelar o mercado, mitigar riscos e evitar desperdícios, algumas inicia‑ tivas já foram implementadas por opera‑ doras de saúde. A criação de produtos nos quais o médico de família é um gatekeeper, e os cuidados em saúde têm abordagem inte‑ gral, com atuação nas premissas da atenção primária e medicina preventiva, já é uma estra‑ tégia crescente nas empresas do setor. Nessa nova dinâmica, espera­‑se redução no desper‑ dício, nos tratamentos excessivos, nas falhas em atendimento e na falta de coordenação do atendimento. Outra grande aposta está nas soluções avan‑ çadas em tecnologia da informação. A MDS Brasil já desenvolveu novas ferramentas que

153


M D S  m a g a z i n e

Mais de 70% dos usuários estão vinculados a carteiras empresariais e, por força da legislação brasileira, os funcionários das empresas brasileiras devem passar por um exame clínico com o médico do trabalho com a periodicidade mínima bianual. reduzem os altos custos com burocracia admi‑ nistrativa, fraudes e também podem ser fortes aliados na medicina preventiva. O MDS Health Report, um sistema de Business Intelligence com a capacidade de execução de algoritmos e cruzamento de dados de diversas bases de informações em saúde podem oferecer um cenário favorável de levantamento de riscos, com dados epidemiológicos e implementação de protocolos baseados em evidências de estudos científicos de relevância. A medicina do trabalho, também conhe‑ cida como saúde ocupacional, há muitos anos cumpre um papel meramente burocrá‑ tico, muitas vezes até semelhante à atividade cartorial, alheia à gestão do benefício saúde dos empregados., Cada vez mais, é um grande instrumento de promoção de saúde e prevenção de doenças a favor da redução de custos dos planos de saúde empresariais. Atualmente, mais de 70% dos usuários estão vinculados a carteiras empresariais e, por força da legis‑ lação brasileira, os funcionários das empresas brasileiras devem passar por um exame clínico com o médico do trabalho com a periodicidade mínima bianual. Assim, a MDS Brasil identificou uma grande oportunidade de realizar um levantamento dos dados clínicos populacionais com os registros dos exames clínicos preventivos dos trabalha‑ dores. Desta forma, é possível mapear condi‑ ções clinicas e fatores de risco antes que haja um desfecho catastrófico em âmbito hospitalar. Diante de toda a complexidade do mercado de saúde brasileiro, há oportunidade neste novo ciclo de transformações não só com a evolução do modelo de negócio pelas empresas do setor (consultorias de risco, seguradoras, hospitais e prestadores de serviço, indústria farmacêu‑ tica etc.), mas também pela evolução da agenda regulatória e das estratégias de redução de custos. •

154

G U S TAV O Q U I N TÃ O → Gustavo Quintão é Diretor de Benefícios da MDS Brasil. → É licenciado em Medicina pela Universidade Federal de Minas Gerais. Fez o internato no Cook County Hospital em Chicago, nos Estados Unidos, especializando-se em saúde corporativa durante o programa de Residência Médica credenciada pelo MEC em Medicina do Trabalho do Hospital Odilon Behrens em Belo Horizonte. Frequenta o MBA Executivo pelo IESE Business School – University of Navarra. → Já participou em vários projetos de consultoria em gestão de saúde para operadoras e empresas de diferentes setores. → Tem experiência de liderança em empresas multinacionais como a Telefônica, onde foi responsavel da area de Saúde e Segurança do Trabalho e no grupo Sanitas Internacional, onde exerceu funções de Diretor Médico.


Indirect Tax Solutions You Have Been PUBLICIDADE EM FALTA Searching For FiscalReps helps international insurance businesses to comply with IPT, VAT and parafiscal taxes internationally, offering a suite of solutions to assist clients in achieving and maintaining premium tax compliance:

• OUTSOURCING • TECHNOLOGY • TRAINING • CONSULTING

For a no obligation meeting, contact Karen Jenner, Client Management Director: t: +44 (0) 20 7036 8070 Karen.Jenner@fiscalreps.com

@fiscalreps

Fiscal Reps Limited


M D S  m a g a z i n e

Fusão ACE e Chubb O que contém um nome? Bem, bastante quando falamos do nome a dar à combinação do conhecimento especializado e dos recursos de dois gigantes mundiais da área dos seguros. Quando a aquisição da Chubb por parte da ACE fez as manchetes em 2015, as estatísticas eram impressionantes — o maior segurador de patrimoniais e responsabilidades de capital aberto do mundo, a operar em 54 países, com uma capitalização de mercado de 51,2 mil milhões de dólares americanos, um valor anual bruto de prémios emitidos de 37 mil milhões de dólares e um total de ativos de aproximadamente 150 mil milhões de dólares. Assim, que nome dar a este novo membro do grupo de elite de seguradores de patrimoniais e de responsabilidades? Em vez de seguir a prática aceite de usar a marca do comprador, a empresa decidiu avançar com o nome «Chubb» — uma marca histórica e forte e um símbolo único de robustez. Tanto a ACE como a Chubb viram uma oportunidade de adotar uma marca que representa valores partilhados de excelência, qualidade e serviço. Mas, longe de se manter agarrada ao passado, a nova Chubb apresenta uma marca moderna e renovada que reflete a vontade da empresa em prestar um serviço de excelência para a atividade de subscrição. Ouvimos duas perspetivas sobre a razão de ser e as oportunidades da nova Chubb. Andrew Kendrick, vice-presidente executivo do Chubb Group e presidente regional para a Europa, define o enquadramento referindo os grandes desafios e as principais oportunidades para a empresa na Europa. Véronique Brionne, presidente da Chubb na Península Ibérica, fala das novas aspirações da Chubb na região e da forma como a combinação de recursos e conhecimento da ACE e da Chubb está a permitir aumentar as ofertas de produtos, ao mesmo tempo que assegura um forte serviço local aos clientes, mas com conhecimento e alcance global.

156


fullcover

Crescimento, disciplina, inovação e serviço de excelência no topo das prioridades da nova Chubb POR ADRIAN LADBURY

Uma das principais questões que as pessoas colocaram a Andrew Kendrick nos últimos meses foi se ficou surpreendido com a notícia da aquisição da Chubb pela ACE, aquando da divulgação da mesma em julho. Falando abertamente, o veterano do Lloyd’s admite que ficou surpreendido porque foi um segredo muito bem guar‑ dado e porque se trata de um negócio de grande dimensão. Mas, tal como todos nós, Kendrick consi‑ dera que, assim que a poeira assentou, as razões por detrás da aquisição come‑ çaram rapidamente a fazer sentido. “Logo que Evan apontou as razões para a aquisição, fez todo o sentido. E assim que começámos o processo de planeamento da integração nos últimos trimestres e assim que tudo começou a tornar­‑se realidade, posso dizer honestamente que, aqui na Europa, as razões acabaram por fazer ainda mais sentido”, afirma Kendrick. O antigo subscritor do Lloyd’s, que dirige a Chubb em Londres e na Europa, disse que a aquisição iria ajudar a nova Chubb a enfrentar três grandes áreas de desafio e oportunidade que o mercado segurador enfrenta na Europa: cresci‑ mento, disciplina e serviço. Em primeiro lugar, Kendrick abordou a área algo complexa do crescimento numa economia global persistentemente volátil e retraída. “Os mercados globais tiveram um iní­cio de ano muito volátil. Estão claramente a tentar dizer­‑nos algo e, se conseguirmos ignorar o ruido diário e olhar mais além, não é muito difícil perceber do que se trata: o crescimento económico global está aquém das expetativas”, afirmou Kendrick sem rodeios.

Andrew Kendrick, Senior Vice President do grupo Chubb.

157


M D S  m a g a z i n e

Atualmente dou por mim a pensar que, no mercado de seguros, nem sempre remamos para o mesmo lado juntando as nossas capacidades e experiência, de uma forma que que seja vantajosa para os clientes. Muitas vezes dá-se pouco ênfase à necessidade de tornar as coisas fáceis de entender por meio de clausulados e definições claras.

158

O líder europeu da Chubb explicou que, de acordo com os números do Banco Mundial, em 2015 o Produto Interno Bruto (ou PIB) voltou a baixar, descendo dos 2,6% de 2014 para 2,4%. Além disso, prevê­‑se agora que o crescimento recu‑ pere a um ritmo mais lento do que era esperado anteriormente. De acordo com o Banco Mundial, dificilmente chegará aos 3% nos próximos anos. De facto, as previsões do Fundo Monetário Internacional (FMI) foram revistas em baixa num valor de 0,2 pontos percentuais para 2016 e 2017, acrescentou. “Pode não parecer significativo, mas quando temos em conta as baixas taxas de crescimento a que estamos a assistir – e o facto de algumas economias euro‑ peias prosseguirem no esforço para se libertarem do impacto da crise econó‑ mica global –, o panorama torna­‑se um pouco mais sombrio”, explicou. Desde o advento da crise financeira e da consequente desaceleração económica, a reação natural das empresas europeias, incluindo as companhias de seguros, foi claramente a de compensar este cres‑ cimento lento ou até negativo dos prin‑ cipais mercados europeus, procurando crescer em mercados com um ritmo de crescimento maior nas chamadas regiões emergentes do mundo, como a África, a América Latina e a Ásia. Mas as coisas não são tão simples como parecem. Nos últimos tempos, verificou­‑se uma desaceleração continuada nas econo‑ mias emergentes e em desenvolvimento, num contexto de declínio dos preços das commodities, de fraco crescimento do comércio global e fluxos de capital mais baixos, apontou Andrew Kendrick. Para agravar o problema, quando as empresas como a Chubb e os respetivos clientes procuram manter o crescimento neste ambiente macroeconómico difícil, existem muitos “riscos reais de deterio‑ ração à espreita”, indicou. “Um deles é a possibilidade de um abrandamento mais acentuado do que o

esperado em mercados emergentes. Outro é a possibilidade de uma nova agitação nos mercados financeiros. E há ainda o risco de maior instabilidade geopolítica. Por outro lado, é preciso ter em conta as ameaças à Europa vindas de dentro, e relacionadas, claro, com o Brexit, Schengen e outras questões”, explicou. “Ao mesmo tempo, o mercado segurador e ressegurador viu uma ‘enorme quantidade’ de capital a entrar no setor nos últimos anos”, afirmou. “Este novo capital não vai desaparecer de um dia para o outro e, pelo menos, a mobilidade de capital e a facilidade com que pode ser usado é muito diferente do passado”, acrescentou. Andrew Kendrick explicou que as três grandes corretoras (Aon, Marsh e Willis­ ‑Towers Watson) estimam que as fontes alternativas de capital representam atual‑ mente entre 12 e 17% do capital global de resseguros. Além disso, e apesar de a capa‑ cidade total do mercado de resseguros ter começado a estabilizar em geral, e até a decair ligeiramente em função das condi‑ ções de mercado, a percentagem de solu‑ ções alternativas continua a aumentar. Nestas condições, o crescimento de receitas torna­‑se “muito difícil” para qual‑ quer segurador à escala mundial, e ainda mais na Europa, pelo que era preciso tomar medidas, concluiu Kendrick. “Como organização conjunta, somos agora o maior segurador cotado de seguros patrimoniais e de responsabilidades (P&C) e, por exemplo, o segurador número um do mundo em seguros financeiros. Este facto incrementa o nosso conhecimento cole‑ tivo e uma maior capacidade de ‘ataque’”, afirmou. Andrew Kendrick entende que a nova Chubb irá conseguir ter maior presença no mercado e não apenas nos EUA, onde a marca Chubb é muito poderosa. “A antiga Chubb tem operações em 25 países, sendo 11 deles europeus. Por isso, juntos seremos ainda mais fortes na Europa, o que é uma boa notícia para os nossos clientes e para


fullcover

Ilustração por Tiago Galo

os nossos parceiros de corretagem, que irão beneficiar de uma oferta ainda mais ampla”, disse Kendrick aos clientes num evento em Amesterdão. “Existe igualmente a vantagem de ambas empresas terem negócios complementares. Por exemplo, aqui na Europa, a antiga ACE é mais conhecida pelas suas contas globais e liderança multinacional, ao passo que a antiga Chubb é mais conhecida pelo seu conhecimento no mercado de médias empresas. No entanto, ambas as empresas têm experiência nestes segmentos e esta união dá­ ‑nos uma base mais forte para crescermos – e para ajudarmos os nossos clientes a crescer”, continuou Kendrick. “Em suma, temos confiança de que a aquisição irá criar um potencial de crescimento maior do que a soma das duas empresas em separado. E temos a noção clara de que o facto de nos tornarmos maiores não nos impede de crescer ainda mais. Se olharmos para a história de aqui‑ sições da ACE ao longo dos últimos 20 anos

aproximadamente, do Brasil e México à Tailândia e Indonésia, podemos ver um forte historial de aumento da diversifi‑ cação e de reforço da solidez, seja no que respeita aos produtos, à distribuição ou à geografia”, acrescentou. O segundo grande foco da Chubb, e de qualquer outro segurador de relevo nestes tempos de dificuldades na economia e no mercado, é, claramente, a disciplina. Andrew Kendrick assistiu a muitas mudanças e viveu períodos verdadeira‑ mente desafiantes, desde que iniciou a carreira como subscritor no Lloyd’s no final dos anos de 1970. Mas, segundo indica, o mercado atual é o mais difícil que conheceu e será necessário tomar decisões difíceis para ter sucesso. “Sinceramente, não me consigo lembrar de uma outra altura na minha carreira em que o ambiente de subscrição tenha sido tão desafiante e, nos últimos 12 anos, tem vindo a tornar­‑se cada vez mais difícil, sobretudo na área das grandes contas”, explicou.

“Os tempos do lucro fácil já acabaram há muito. Enquanto indústria, é provável que tenhamos de estabelecer como obje‑ tivo um rácio combinado de cerca de 90% só para conseguirmos cobrir o nosso custo de capital”, afirmou. “E temos de partir do princípio de que, no que respeita à definição de preços, não conseguiremos melhor. Temos apenas de construir os nossos planos para o futuro segundo o princípio de que as coisas não vão melhorar”, acrescentou. O que é facto é que o contexto de taxas de juro baixas no mundo desenvolvido significa que se tornou mais difícil para os seguradores ganhar dinheiro com os investimentos que fazem. Mesmo o mais otimista dos seguradores tem de admitir que todos os indicadores mais recentes indicam que esta situação não se irá alterar a curto prazo. “Afinal, até temos políticas de taxas de juro negativas em alguns mercados. Vários bancos centrais da Europa

159


M D S  m a g a z i n e

cortaram taxas de juro­‑chave para valores abaixo de zero e mantiveram­ ‑nas assim durante mais de um ano. Agora o Japão está a tentar o mesmo. Por isso, não se iludam, é uma perspetiva difícil para qualquer segu‑ rador!”, afirma Andrew Kendrick. Nos bons velhos tempos, as companhias de seguro conseguiam subscrever com um rácio combinado superior a 100% e, ainda assim, obter dividendos assinaláveis supor‑ tados no resultado dos investimentos. Mas agora já não, salientou. Neste contexto, só as companhias de seguro e de resseguro com a disposição e a capacidade de subscrever com resultados positivos irão sobreviver e desenvolver­‑se e, felizmente, tanto a ACE quanto a Chubb têm essa tradição, garantiu. “As duas antigas empresas eram reco‑ nhecidas por terem uma cultura de subs‑ crição sólida. Na essência, somos subscri‑ tores – partilhamos uma paixão pela arte e pela ciência da subscrição. E eu espero que estejam de acordo que somos muito claros no que toca ao nosso apetite pelo risco. Temos, pois, muito em comum no que respeita à nossa abordagem de subs‑ crição e ao nosso enfoque na disciplina. Acredito que encaixamos bem e que todos iremos beneficiar enormemente do facto de estarmos juntos. Juntos estamos ainda mais bem colocados para enfrentar as difíceis condições de mercado”, afirmou. Ao mesmo tempo, num momento em que tanto as companhias de seguro como as de resseguro têm de se enfocar numa subscrição disciplinada, neste contexto de mercado é também necessário que exista um esforço sustentado para reduzir custos. “Assim se explica grande parte da recente atividade de fusões e aquisições no setor internacional de seguros e resseguros”, assinalou. “A questão da disciplina também se aplica aos custos. Uma base de custos elevada e um mercado competitivo são um problema para o nosso setor, e uma das principais razões para a imensa ativi‑ dade de fusões e aquisições que se verifica

160

neste momento. XL­‑ Catlin, Mitsui­‑Amlin e, quase, Zurich­‑RSA. Não me lembro de tempos como estes”, afirmou. Mais ainda, Andrew Kendrick está convencido de que este processo de conso‑ lidação ainda não terminou. Segundo ele, já tinham sido fechados ou anunciados quase 50 negócios este ano e, no momento desta palestra, o primeiro trimestre ainda não tinha terminado. “É muito pouco provável que esta tendência pare. No ramo Não Vida, a concorrência continua a ser intensa. As empresas encontram­‑se sob a pressão de diversificar, o que as leva a fazer aquisições. Regra geral, quanto mais baixos forem os preços no mercado segurador, maiores serão as razões para fazer aquisições”, disse. Embora seja difícil contrariar a conclusão de Andrew Kendrick segundo a qual a disciplina na subscrição e no controlo de custos é absolutamente crucial para o sucesso num mercado tão difícil, tal não significa que os subscritores possam esquecer­‑se das necessidades dos clientes. As companhias de seguros que se centrarem exclusivamente no preço e no controlo de custos, tentando assim manter os retornos para os investidores a curto prazo, irão inevitavelmente perder as melhores contas e entrar numa espiral descendente que será difícil de suster. E aqui jaz o maior desafio de todos para os subscritores de seguros do segmento de empresas: como responder a neces‑ sidades cada vez mais desafiantes e complexas dos clientes, e sobretudo de clientes empresariais e multinacionais, especialmente num ambiente de mercado tão difícil. Andrew Kendrick e a sua equipa de gestão na Chubb estão claramente cons‑ cientes deste dilema, mas acreditam que a combinação da ACE com a Chubb ajudará a encontrar uma resposta. “Deixámos bem claro que uma das razões para a aquisição da Chubb é o aumento da eficiência. A aquisição per­mitir­‑nos­‑á criar sinergias reais, o que,

por sua vez, nos dará a possibilidade de investir nas áreas que interessam aos clientes e, sobretudo, melhorar o nosso serviço”, assegurou. A extrema necessidade deste enfoque num serviço inovador e melhorado no mercado de seguros de empresas ficou bem patente no inquérito anual que a Commercial Risk Europe faz aos gestores de risco: Risk Frontiers. No ano passado, a Chubb, com o apoio da FERMA, levou a efeito a sua própria pesquisa junto de gestores de riscos europeus sobre a mudança do papel do gestor de risco. Sem surpresa, 79% dos gestores de riscos acreditam que, no futuro, terão de pensar e comportar­ ‑se como “inovadores” e “futuristas”, um número inequívoco que, segundo Andrew Kendrick, constituiu um dos principais resultados desta pesquisa. Mas é evidente que os gestores de risco não podem ser peritos de tudo por si sós, apontou. Kendrick afirmou que 22% dos gestores de risco que participaram no inquérito indicaram que havia atual‑ mente uma falta de conhecimento sobre riscos emergentes, por exemplo. “Assim, será cada vez mais importante para os líderes do risco de amanhã construir as relações e as parcerias corretas dentro e fora da sua atividade”, assinalou. “Como deverá então o setor segurador responder a este difícil desafio?”, pergunta Kendrick. A boa notícia para as companhias de seguros é que a pesquisa da Chubb dá a entender que os gestores de risco (78% dos que responderam ao inquérito) consideram o setor segurador uma parte fundamental da solução, no que se refere à gestão da mudança e à nova vaga de riscos emergentes. A questão central é a de saber se o setor estará à altura do desafio ou se irá apenas debatê­‑lo. Kendrick, por exemplo, acredita que não existe outra opção. “Acredito que o setor terá simplesmente de inovar para proporcionar o serviço de


fullcover

A grande capacidade da antiga Chubb de prestar serviço de alta qualidade, desde os sinistros à avaliação de perdas, é algo de que nos orgulhamos muito e em que continuaremos a apostar. que os clientes e os corretores precisam no futuro. Se não o fizermos, eles encontrarão outras soluções noutros locais”, assinalou. Questão central: onde irão clientes e corretores encontrar soluções alternativas se o mercado não lhes der resposta? O problema reside no facto de que uma coisa é concordar que tem de haver uma resposta e outra é encontrá­‑la, já que é claro como água que, para que o mercado responda verdadeiramente aos desejos dos clientes, será necessária uma ação coletiva e não apenas individual. Andrew Kendrick reconhece clara‑ mente este desafio e esta oportunidade. “Atualmente dou por mim a pensar que, no mercado de seguros, nem sempre remamos para o mesmo lado juntando as nossas capacidades e experiência, de uma forma que seja vantajosa para os clientes. Muitas vezes dá­‑se pouco ênfase à necessidade de tornar as coisas fáceis de entender por meio de clausulados e defini‑ ções claras. Muitos riscos emergentes – já de si complexos – estão a tornar­‑se ainda mais difíceis devido a uma ‘manta de reta‑ lhos’ de abordagens menos adequadas por parte do mercado” afirmou. A questão de fundo é que, como iden­ti­fica o inquérito Risk Frontiers da Commercial Risk Europe, a inovação não se faz apenas de produtos, mas também de abordagens e da oferta de uma gestão de risco mais holís‑ tica, profunda e abrangente bem como de soluções de transferência. “Também temos de alargar as solu‑ ções que fornecemos, se pretendermos continuar a ser importantes para os nossos clientes no futuro. No nosso setor insiste­‑se muitas vezes em “impingir o produto” – soluções inflexíveis que não vão ao encontro das necessidades indi‑ viduais. Temos também de ir para além da compensação financeira e aprofundar os conhecimentos em gestão do risco, serviços de avaliação de perdas e resposta ‘prática’ aos incidentes ao longo de toda a relação”, afirmou Kendrick.

“A inovação raramente é fácil. Mas o mercado segurador não foi inventado para fazer coisas fáceis, e não nos tornamos líderes mantendo­‑nos na nossa zona de conforto. Enfrentar problemas de risco complexos é a razão da nossa existência”, continuou. Kendrick admitiu que a Chubb não tem as respostas todas. No entanto, defendeu que a fusão das duas empresas significou um grande passo em frente neste sentido. “Agora temos um leque mais alargado de talento, de conhecimento e de ideias. Já este ano, anunciámos um novo serviço na área do risco cibernético, disponibi‑ lizando um serviço de resposta a inci‑ dentes 24/7 em parceria com a Crawford & Company. E continuaremos a investir e a trazer estes serviços com valor acres‑ centado para o mercado numa grande variedade de linhas de negócio, de forma a inovar para além dos clausulados das apólices de seguros”, explicou. Os programas multinacionais são uma área óbvia em que um serviço melhorado é muito mais importante para os gestores de riscos ou de seguros do que o produto ou o preço por si sós. A Chubb reconhece este facto, afirmou. Andrew Kendrick disse aos gestores de riscos holandeses e belgas presentes que a sua pesquisa com gestores de risco de empresas multinacionais europeias mostrou que menos de 30% dos gestores de risco estavam muito satisfeitos com os níveis gerais de serviço das suas segura‑ doras, no que se refere aos seus programas multinacionais. Havia ainda menos gestores de risco satisfeitos com o desem‑ penho na regularização de sinistros. Kendrick indicou que, com base na pesquisa da Chubb, atualmente, 70% dos gestores de risco europeus dizem que estão a lidar com mais sinistros fora do seu mercado nacional e, em geral, estão a trabalhar com sinistros multinacionais mais complexos do que era habitual. “Bons resultados no que se refere aos sinistros são seguramente o teste

do sucesso para qualquer programa de seguros global, pelo que se trata de algo que temos de fazer bem”, disse. “Outra área a melhorar, de acordo com a pesquisa, é a da eficácia das solu‑ ções tecnológicas. Como consequência, Andrew Kendrick assegurou aos gestores de riscos que a Chubb continuará a investir na melhoria da sua plataforma Worldview. “De um modo mais geral, a grande capa‑ cidade da antiga Chubb de prestar um serviço de alta qualidade, desde os sinis‑ tros à avaliação de perdas, é algo de que nos orgulhamos muito e em que continua‑ remos a apostar”, prometeu aos clientes. “Por isso, aqui têm – três temas e desa‑ fios centrais que acredito que estamos a enfrentar na Europa neste momento: um desafio de crescimento, uma necessidade de disciplina e uma procura de serviços inovadores e de alta qualidade. Na nova Chubb, acredito que estamos mais bem colocados do que nunca para dar resposta a estes desafios e esperamos traba‑ lhar convosco no âmbito da nossa nova marca”, concluiu Andrew Kendrick. •

161


M D S  m a g a z i n e

temos agora uma oportunidade de crescer em conjunto e melhorar o serviço para os clientes. Estes são apenas dois exemplos que eu penso que mostram que a nova Chubb é mais do que a soma das partes.

Véronique Brionne foi nomeada Presidente regional da Chubb para a Península Ibérica em fevereiro de 2016, na sequência da aquisição da Chubb pela ACE. Anteriormente, tinha sido presidente regional da ACE para a Península Ibérica durante dois anos. Antes de integrar a ACE, Véronique Brionne trabalhou durante 15 anos na AXA, onde teve a oportunidade de exercer a sua atividade em diferentes países, incluindo Espanha. A aquisição da Chubb por parte da ACE levou a que a nova empresa se passasse a chamar simplesmente Chubb. O que significam estas mudanças para a empresa? Acredito que somos uma combinação fantástica. A aquisição juntou os 130 anos de experiência de subscrição e dedicação ao serviço docliente da Chubb e os 30 anos de excelência técnica de subscrição, o amplo apetite pelo risco e a presença global da ACE. Em conjunto, somos o principal subscritor mundial de riscos profissionais e estou certa de que nos vamos tornar líderes de mercado em Espanha e em Portugal. De facto, existe uma grande variedade de segmentos – da responsa‑ bilidade civil de administradores e dirigentes, às ciências da vida ou viagens de negócios – em que a nossa capacidade combinada nos dá uma oportunidade única de melhorar os produtos e serviços que disponibilizamos no mercado, e a nossa intenção é aproveitar esta oportunidade ao máximo. Na minha opinião, o que é mais interessante na Península Ibérica é o facto de os nossos pontos fortes serem complemen‑ tares. A equipa da Chubb está muito entusiasmada por poder ter acesso ao nosso conhecimento especializado e à nossa tecnologia, de que é exemplo a plataforma Worldview no espaço multinacional. Por outro lado, estou muito entusias‑ mada relativamente à capacidade que os nossos colegas da antiga Chubb têm no mercado de médias empresas, no qual a ACE também tem vindo a investir bastante e, na verdade,

162

De um modo geral, como irão estas mudanças beneficiar os clientes atuais e futuros? Os nossos clientes e parceiros atuais e futuros na Península Ibérica irão beneficiar de uma relação comercial com uma companhia de seguros que tem uma capacidade e uma presença global quase sem paralelo, uma ampla oferta de produtos e uma robustez financeira excecional e que prima pela excelência na subscrição e por uma gestão de sinistros de primeiro plano. Mas nós somos mais do que a nossa dimensão e robustez financeira dão a entender. Podemos ser globais, mas, ao mesmo tempo, somos uma empresa verdadeiramente local nas regiões em que operamos. Podemos ser grandes, mas não somos maiores do que o nosso menor cliente. Em Espanha e em Portugal, a nossa rede regional de agências locais é espe‑ cialmente importante para os nossos clientes e para a nossa proposta de serviço. Por isso, penso que é muito importante tornar claro que esta fusão permitirá solidificar e reforçar esta presença.

Qual foi a reação que teve desses clientes desde que a aquisição se consumou no mês passado? A resposta dos clientes tem sido incrivelmente positiva e o nosso enfoque durante o processo foi o de assegurar que nada se alterava em relação a eles e que tinham o mesmo nível de serviço de sempre. Há ainda muito trabalho a fazer para harmonizar as duas empresas, mas deitámos imediata‑ mente mãos à obra e encaramos o futuro com otimismo.

Na sua opinião/da Chubb, quais são os principais desafios que as empresas enfrentam em Espanha e em Portugal neste momento? Creio que a maioria do mercado enfrenta os mesmos desafios neste momento – condições de mercado altamente compe‑ titivas, o desafio de conseguir crescer em economias euro‑ peias maduras e num cenário de crescimento reduzido pós­ ‑crise, bem como a necessidade de as companhias de seguros se tornarem mais eficientes em geral.

A nova marca Chubb é agora uma enorme entidade de seguros global de grande dimensão. Vamos ver mais consolidação no mercado de seguros? É evidente que a aquisição da Chubb é apenas uma de muitas a que assistimos nos últimos tempos. Não quero fazer previsões, especialmente num contexto tão volátil como o atual. Mas o que eu diria é que não é provável que estas pressões desapa‑ reçam num futuro próximo. A consolidação continua a ser uma resposta óbvia, embora haja muitas formas diferentes de fazer face aos desafios que o mercado coloca neste momento. •


fullcover

Os caminhos de ferro de Bagdad POR PEDRO CASTRO CALDAS

→ Pedro Castro Caldas nasceu em Lisboa em 1950 e licenciou-se em Engenharia Mecânica no Instituto Superior Técnico em Lisboa tendo recebido formação complementar de “project management” na Suíça. Exerceu funções de “project manager” na Divisão de Energia da Mague, até ingressar em 1987 na indústria seguradora na área dos riscos de engenharia, assumindo funções de Direcção Técnica nas áreas de seguro e resseguro Não-Vida sucessivamente na Companhia de Seguros Tranquilidade, na Mútua Seguradora da Indústria Alemã HDI e a partir de 1993 até 2013 na Ocidental Seguros e noutras parcerias de Seguros do Millennium bcp, onde no período de 1994 a 2004 foi membro do Risk Management Group, do grupo segurador pan-europeu EUREKO. Coordenou e participou em vários projectos de seguro e resseguro de grandes riscos de engenharia em regime de parcerias público privadas e outros entre os quais com principal destaque o projecto de construção e exploração da rede do Metro do Porto, tendo até 2013 coordenado várias Comissões Técnicas na Associação Portuguesa de Seguros. A partir de 2013 tem-se dedicado ao estudo e à consultoria de gestão de risco.

Na sequência da entente estabelecida entre a Alemanha Imperial e o Império Otomano nos finais do século XIX início do século XX e da visita em 1899 do Kaiser Guilherme II ao “Califa dos Crentes” o Sultão Abdul Hamid II, o Deutsche Bank, em apoio de investidores alemães, austríacos, suíços e de outras nacionali‑ dades, participou na criação da Sociedade Imperial Otomana dos Caminhos de Ferro de Bagdad, para ligação de Berlim a Bagdad do então Império Otomano, atra‑ vessando o Império Austro­ ‑Húngaro, a Roménia, a Bulgária, a Turquia, a Arménia a Síria e o Iraque, no que o sindicato de investidores que patrocinaram a inicia‑ tiva considerava vir a ser uma “grande avenida de comércio”.1 Com este projecto, os alemães pretendiam na prática aceder aos campos de petróleo no Iraque, e através de uma ligação ao porto de Baçorá garantirem um melhor acesso à parte oriental do império colo‑ nial alemão, sem estarem sujeitos ao atra‑ vessamento do Canal de Suez; e o Império Otomano desejava manter o controlo da Arábia e expandir a sua influência através do Mar Vermelho no Egipto que passara a ser controlado pelos britânicos. Este projecto, encarado miticamente como um meio de levar o conhecimento e as modernidades tecnológicas e cientí‑ ficas ocidentais ao “berço da civilização”,

punha em causa o status quo colonial exis‑ tente no Médio Oriente, controlado pela Grã­ ‑Bretanha, tornando­ ‑se numa fonte de tensão internacional nos anos imedia‑ tamente anteriores à 1ª Guerra Mundial, o que segundo alguns historiadores poderá ter sido uma das principais causas da sua deflagração, cujo teatro de opera‑ ções europeu se veio a alargar ao Médio Oriente, levando à queda e à ascensão de novos protagonistas e a novas partilhas territoriais nunca saradas na situação do pós­‑guerra. O estabelecimento de rotas de comuni‑ cação acessíveis a transporte de pessoas e bens, iniciadas com os “descobrimentos” portugueses para o Oriente e para o Novo Mundo, como defendem alguns autores, estarão na origem do fenómeno da “globa‑ lização” dos nossos dias, como processo de aprofundamento internacional da integração económica, social, cultural e política, assente nos seguintes aspectos básicos: comércio e transações finan‑ ceiras, movimentos de capital e de investi‑ mento, migração e movimento de pessoas e a disseminação de conhecimento2. Mesmo que, à data, os desígnios das potências imperiais, ao estabelecerem novas vias de comunicação, fosse o de organizar e perpetuar o domínio colonial, em ambiente de paz de forma a tornar mais eficiente a exploração dos domí‑ nios através da pacificação e submissão dos povos indígenas e do fácil acesso aos respectivos recursos naturais, subs‑ tituindo assim as ineficientes antigas práticas de organização do comércio desenvolvidas de “forma militar e análoga à da guerra, como uma actividade adicional do pirata e do corsário, da cara‑ vana armada, do caçador e do mercador de espada, dos burgueses armados das cidades, dos aventureiros e dos explo‑ radores, dos plantadores e conquista‑ dores, dos apresadores e dos traficantes de escravos…”, é um facto que estes desíg‑ nios de eficiência tornaram imparável a “globalização” assente nos aspectos básicos atrás referenciados. Ora, mau grado os efeitos perniciosos que justa‑ mente são atribuídos à “globalização”; resultantes da perda de parte da sobe‑ rania dos Estados com o surgimento de organizações supragovernamentais fora do controlo democrático e dos próprios

163


Ilustração por Carlos Pinheiro

M D S  m a g a z i n e

164


fullcover

Estados, dela resultou os “mais fracos” terem passado a ter acesso facilitado, ao conhecimento através das novas tecno‑ logias de informação e à livre circulação, sem que os “mais fortes”, em o querendo, tenham a possibilidade de o impedir com recurso a novos “muros” cada vez de menor eficácia e de mais difícil aceitação. Duma forma geral a geografia humana das várias regiões e continentes e em particular da Europa, resulta de uma miscigenação de culturas e de etnias em consequência de invasões e migrações imparáveis ao longo dos séculos. Sem ser necessário no caso europeu retroceder às invasões bárbaras fundadoras de novas Nações nascidas nas ruínas do Império Romano, ou às diásporas resultantes das perseguições religiosas, na história mais recente, os antigos Estados imperiais a par de terem promovido as suas emigrações para o exterior, absorveram no seu inte‑ rior e no interior dos seus domínios, vagas de imigrações, criando em ambas as situa‑ ções novas comunidades geradoras de oportunidades de progresso da humani‑ dade baseado na disseminação do conhe‑ cimento mútuo dos povos e do comércio associado à paz, sem prejuízo de por vezes eclodirem aqui e ali “ajustamentos” mais ou menos circunscritos e mais ou menos violentos, motivados por antagonismos étnicos e religiosos e de disputa de inte‑ resses comerciais e territoriais, resul‑ tando em confrontos, perseguições e no limite em genocídios e na guerra. Na actualidade, como que em movi‑ mento inverso do recente passado colo‑ nial, chegam às portas da Europa ondas migratórias geradoras de tensões, que muitos vêem como uma ameaça à paz e à segurança, por ironia da história, no caso dos imigrantes vindos do Médio Oriente, percorrendo cem anos depois o mesmo trajecto que o “caminho­ ‑de­ ‑ferro de Bagdad” com destino a Berlim,

que à data, é certo, foi construído com o desígnio unilateral do Reich alemão de acesso às colónias e às matérias primas – o que tanto incomodou o status quo do império britânico que sentindo­ ‑se ameaçado levou à guerra − mas também pensado miticamente como um meio de levar o “conhecimento ocidental” ao “berço da civilização”. Contudo, contrariamente aos que se sentem ameaçados no seu status quo, os mais esclarecidos, em Berlim e noutros lugares, são levados a identificar este trânsito percorrido através dos “novos caminhos­ ‑de­ ‑ferro de Bagdad”, desta feita não como trajecto para envio expe‑ dito de colonos e garantir o acesso fácil aos recursos naturais, mas como um processo de retorno facilitador de novas oportunidades de intercâmbio multi‑ lateral dos povos; quer através de um possível contributo demográfico e produ‑ tivo desta massa humana afluente porta‑ dora de esperança e do “conhecimento ocidental”, assim concorrendo para o progresso dos Estados acolhedores; quer no prospectivo fomento das rela‑ ções culturais e de comércio interna‑ cional após o desejável regresso a casa destes imigrantes, num possível futuro de pacificação e reconstrução das zonas de guerra que estiveram na origem dos movimentos migratórios, no pressu‑ posto que o progresso se conquista na capacidade de superação das dificul‑ dades ou dito de outra forma é na acer‑ tada avaliação das forças e das fraquezas que se constroem as oportunidades e se reduzem as ameaças. •

1 Com o mesmo desígnio de acesso expedito aos domínios coloniais, os britânicos projectaram uma linha de caminho­‑de­‑ferro de ligação do Cabo ao Cairo para unificar as suas possessões africanas, facilitar a governabilidade, permitir que o exército se movesse rapidamente para pontos críticos, ajudando na colonização e incentivando o comércio. 2 In AL­‑RHODAN, Nayef R.F, STOUDMANN, Gérard – Definitions of Globalization: a comprehensive overview and a proposed definition. Fontes Bibliográficas JASTROW, Morris – The War and the Bagdad Railway: the story of Asia Minor and its relation to the present conflict. [S.l]: Lippincott, 1918. MCMURRAY, Jonathan S. – Distant ties : Germany, the Ottoman empire, and the construction of the Baghdad railway. Westport, Conn.: Praeger, 2001. ISBN 0275970639 POLANYI, Karl – A grande transformação: as origens políticas e económicas do nosso tempo. Lisboa: Edições 70, 2012. ISBN 978­‑972­‑44­‑1660­‑1. O autor do texto não escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.

165


M D S  m a g a z i n e

LEITURAS

L

FUSE: FORESIGHT-DRIVEN UNDERSTANDING, STRATEGY AND EXECUTION KRISHNADAS, Devadas Singapore: Marshall Cavendish Business, cop 2015. ISBN 978-981-4721-12-7

Devadas Krishnadas é um reputado líder de opinião, sendo frequentemente convidado para participar em conferências e fóruns internacionais. Em março de 2014, Krishnadas foi

Devadas Krishnadas é o fundador e o CEO do grupo Future-Moves, tendo desempenhado um papel fundamental no desenvolvimento da política social e fiscal de Singapura. É autor de Sensing Singapore: Reflections in a Time of Change, e tem vindo a ser publicado e citado em periódicos internacionais dedicados a questões de estratégia e antevisão do futuro. Vivemos num mundo cada vez mais complexo e incerto, mas infelizmente a maioria das empresas e organizações não toma isto em consideração quando planeia as suas estratégias – ainda tem uma perceção do mundo como simples e estático. É essencial aceitarmos e prepararmo-nos para um futuro que está em constante mudança e que é imprevisível. FUSE oferece uma nova perspetiva para enfrentar problemas e incorporar a incerteza na análise. A leitura deste livro é de um valor incalculável para qualquer líder ou gestor empresarial. A obra dá conselhos práticos sobre competências estratégicas e abordagens necessárias para ajudar os que tomam as decisões a compreender o complexo mundo atual para nele poderem prosperar.

166

convidado para uma intervenção sobre o futuro da China no evento MDS Talks' (um fórum de discussão sobre assuntos atuais de relevância, organizado pelo grupo MDS). Krishnadas apontou três aspetos estratégicos para o século XXI: em primeiro lugar, os princípios estratégicos que determinam o sucesso no novo século; em segundo lugar, a forma como os governos, as empresas e as instituições poderão estar mais bem posicionadas para lidar com a mudança e, em terceiro e último lugar, as repercussões das alterações políticas e económicas na Ásia e a forma como os decisores poderão avaliar melhor a entrada no mercado da China.


fullcover

GOOD FOR THE MONEY: MY FIGHT TO PAY BACK AMERICA BENMOSCHE, Bob St. Martin’s Press, cop, 2016. ISBN 978-1250072184

Benmosche renunciou ao cargo em 2014, após cinco anos à frente da seguradora, a AIG tinha já devolvido 94 mil milhões de dólares dos empréstimos de emergência ao banco central e permitido ao Governo que recuperasse o seu investimento de 68 mil milhões de dólares em ações com lucro. Good For the Money é a história da carreira de Benmosche, do que aconteceu nos bastidores da AIG e da sua luta contra um Conselho de Administração hostil, um Congresso combativo e uma imprensa impiedosa. É uma história de perseverança e dos reveses de um homem empreendedor (um «Herói Americano», no livro Too Big to Fail, de Ross Sorkin), que fez tudo o que podia para salvar a AIG, o seu bom-nome, os seus colaboradores e a sua moral. O livro é a visão de um líder, um homem que viveu de acordo com os seus princípios e as suas incomparáveis lições de liderança. Não deixem de ler (ou reler) a entrevista a Robert Benmosche publicada na FULLCOVER n.º5 2012 onde ficamos a conhecer o homem e a sua visão para a recuperação da AIG: “I believe we are what we choose to make ourselves”.

Esta é a história da recuperação da AIG (American International Group) da falência iminente, contada pelo homem que a salvou quando estava à beira de um naufrágio financeiro. Em 2009, no auge da crise financeira, a AIG estava a afundar-se rapidamente. A companhia de seguros foi fortemente atingida pela crise do subprime de setembro de 2008, devido aos maus resultados da sua filial AIG Financial Products, salvando-se apenas pela intervenção do Governo Federal com um resgate na ordem dos 182 mil milhões de dólares. Quando o chamaram de uma situação de reforma e o convidaram para assumir o comando, em substituição do anterior CEO Ed Liddy, o plano de ação era fazer uma rápida venda de ativos para reembolsar o Governo, tão depressa quanto possível. Mas Benmosche tinha outras ideias. O seu plano era fazer com que a AIG desafiasse todas as probabilidades e pagasse os empréstimos na totalidade. E foi exatamente isso que fez. Estabeleceu novas diretrizes e, numa questão de meses, alterou completamente a situação. Em três anos, a AIG tinha reembolsado na totalidade a impressionante dívida que tinha ao Governo dos EUA – incluindo juros. Quando

THE CULTURE MAP: BREAKING THROUGH THE INVISIBLE BOUNDARIES OF GLOBAL BUSINESS MEYER, Erin New York: Public Affairs, cop. 2014 ISBN 978-1-61039-250-1

Organizacional da escola de gestão INSEAD, em Fontainebleau, França. No seu novo livro, The Culture Map, descreve a forma como as pessoas de diferentes culturas têm em conta e comunicam as respetivas ideias no seu trabalho, por vezes de modos bastante diferentes. Este livro expõe em pormenor dados recolhidos de investigações levadas a cabo em 20-30 países de uma maneira com a qual as pessoas se podem relacionar e que podem compreender. Neste mundo globalizado, os negócios não têm fronteiras; por esse motivo, está a tornar-se cada vez mais importante ter competências para navegar pelas diferenças culturais e compreender o “código oculto” das culturas estrangeiras, de forma a não cometer nenhum erro que possa arruinar negócios ou destruir uma carreira. As pessoas podem “perder-se na tradução”, como diz Erin: “Se interagirmos com outras pessoas presumindo que a cultura não importa, o nosso mecanismo-padrão levar-nos-á a ver os outros através das nossas próprias lentes culturais e a julgá-los de forma correta ou incorreta”. O livro contém vários exemplos destes choques culturais: os americanos normalmente fazem três comentários agradáveis antes de dizerem algo negativo para que, quando chegam ao ponto que interessa – a parte má –, alguém de outra cultura possa não prestar atenção à verdadeira mensagem, já que estará focado nos comentários positivos. Por outro lado, os franceses, os holandeses, os israelitas e os alemães vão diretos ao assunto, “a sua apresentação foi simplesmente horrível”, o que pode causar um ambiente estranho e algum desconforto a pessoas de outras culturas que não estão habituadas a esta mentalidade. O livro fornece-nos um enquadramento analítico com conselhos práticos e úteis para se ter sucesso num mundo global. Em 2015 Erin Meyer esteve no Porto no programa Oficina de Líderes da Universidade Católica do porto onde apresentou o seu livro, Culture Map, e abordou os impactos das diferenças culturais no mundo global e como é importante não nos deixarmos influenciar pelos estereótipos se quisermos ser bem-sucedidos num processo de

Erin Meyer é Professora Associada no Departamento de Comportamento

internacionalização.

167





Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.